Caderno Especial - Edição 82

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À MODA DA CASA Inverno 2011

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TRAMAS

ORIGINAIS

A pesquisa Identidade regional da Serra Gaúcha como sustentação para o design, realizada pelo Polo de Moda, valoriza a cultura das tramas e inspira a moda do inverno

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primeira década do século XXI é jovem e rápida. Nascida nos anos 80 e fruto de um processo que começou nos 90, a chamada Geração Y é acostumada a pensar em diversos assuntos ao mesmo tempo, ficar sabendo das notícias quase instantaneamente pelo Twitter, compartilhar a vida pessoal e encurtar distâncias pelo Facebook, acompanhar bombardeios e desfiles ao vivo pelo YouTube ou no celular. É jovem não pela idade, mas porque entende, vivencia e incorpora essas novas linguagens e comportamentos. Para eles, a informação é fácil e abundante na internet, e já não é mais o problema. Agora, o tempo é a moeda de maior valor no mercado. Os momentos que permitem, nem que sejam cinco míseros minutos, sair da rotina alucinante e apreciar o contato com a família, com os amigos ou até consigo mesmo, como diz a propaganda, não têm preço. A moda, efê-


mera por natureza, refletiu imediatamente esse espírito do tempo. Em meio ao fast fashion, que levou muitas empresas a produzir novas coleções semanalmente, algumas marcas perceberam que manter a fidelidade às suas tradições e valorizar suas raízes seria o grande diferencial. Em Caxias do Sul, o Polo de Moda da Serra Gaúcha também aposta nisso e, há dois anos, iniciou a pesquisa Identidade Regional da Serra Gaúcha como base para o design. O estudo reúne informações sobre todos os aspectos culturais da nossa região. O objetivo final é que, com a ajuda desse banco de dados, os designers e empresas consigam desenvolver produtos com valor agregado, tendo a força e as raízes da Serra Gaúcha como base para criações originais. As professoras do curso de Tecnologia em Design de Moda Mercedes Manfredini e Bernardete Venzon e a historiadora Eliana Rela foram as responsáveis pela pesquisa, com participação dos bolsistas Simone Corso, Kira Manfredini, Tarciso Bressan e Tatiana Barreto. Além de analisar outros estudos sobre aspectos específicos da cultura, eles percorreram diversas cidades da região, especialmente o interior, fazendo entrevistas, registros fotográficos, conhecendo artesãos, feirinhas e pessoas que conservam as tradições na rotina. “É fundamental considerar todo o contexto”, diz Mercedes. Segundo ela, essa peregrinação revelou traços poloneses e franceses, dos gaúchos, tropeiros, escravos negros e índios que habitaram ou passaram pelo Campo dos Bugres e região, e confirmou o predomínio da influência italiana. “E a pesquisa não se esgota, porque hoje já não é mais assim. Boa parte dos moradores daqui não é mais caxiense nato, e traz consigo novas influências”, argumenta. A metodologia do trabalho já foi apresentada, em 2010, no 6º Colóquio de Moda, o maior congresso científico de moda no Brasil. Alguns resultados serão expostos durante o IV Simpósio Nacional de Moda e Tecnologia, que ocorre de 27 a 29 de junho, no Campus 8. A intenção é que, até 2012, esse material seja transformado em livro e, com a ajuda do estilista Walter Rodrigues – que realizou um trabalho semelhante na Colômbia –, os conceitos comecem a ser colocados em prática com um pequeno grupo de empresas. “Queremos ajudá-los a encontrar o seu caminho dentro desse conjunto maior, porque quando elas conseguem se reconhecer são capazes de se transformar sem perder a identidade”, explica Mercedes. O conceito do editorial de moda que você verá nas próximas páginas foi baseado nos resultados da pesquisa, especialmente no que a especialista em história da moda Bernardete chama de “cultura das tramas”. “São as diferentes práticas de tramar as linhas e tecer os panos que constroem nossa história”, afirma a pesquisadora.

[ ] Página 2: Vestido em trama de tecidos e fios: Ateliê Bia Verdi (acervo) | Short de tricô manual: acervo da produção | Body transparente: Adriana Degreas / La Vendela (R$ 99) | Bota de montaria: Gstock (R$ 319,90) | Página3: Tailleur de malha: Friolã (acervo 40 anos) | Manta: Friolã | Legging prata e colares: acervo da produção | Sandal boot over the knee: Miezko / Gstock (R$ 659,90)

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A história da indústria têxtil caxiense começou em 1894, quando um grupo de italianos vindos de Schio, da Província de Vicenza, junto com imigrantes que já moravam em Galópolis, fundaram uma cooperativa têxtil, a Società Tevere. Em 1911, Hércules Galló comprou a fábrica que, em 1928, passou a se chamar Sociedade Anônima Companhia Lanifício São Pedro – atual cooperativa Cootegal. Outro exemplo é o Lanifício Matteo Gianella, fundado em 1917. “A tecelagem da lã faz parte da nossa história e marca presença nas tramas que desenharam muitos metros de tecidos feitos para aquecer e ornamentar. Tecidos para colchas, capas e casacos, entre outros”, diz Beth. A malharia começou pouco depois, na década de 20, com o entrelaçamento de fios em teares manuais. Com o passar do tempo e desenvolvimento da tecnologia, a região se tornou um polo nacional na produção de peças em tricô, com auge nos anos 1970. A malharia Friolã, que completa 40 anos em 2012, é uma dessas empresas, e abriu seu acervo de peças históricas para a realização desse editorial.

[ ] Página 4: Casaco: Friolã | Vestido: Huis Clos / La Vendela (R$ 629) | Colar de malha: Friolã | Colares: Libra Brasil / Ateliê Bia Verdi (R$ 65) | Página 5: Na frente: Casaco de lã preto: Alcaçuz / La Vendela (R$ 1.930) | Corpete de couro: La Vendela (R$ 19,90) | Pantalona de malha: Friolã | Atrás: Maxipull: Ateliê Bia Verdi (R$ 380) | Vestido: Ton Âge / Capim Santo (R$ 496) | Cintos: acervo da produção Expediente | Produção e styling: Carol De Barba | Fotografia: Maurício Concatto | Modelos: Audrey Biegelmeyer (91612136), Madelaine Novelo (Super Agency - 51 3362-2779) e Rafael Parizoto. | Roupas e acessórios: La Vendela (Rua Andrade Neves, 956 – 3028-0113), Capim Santo (Av. Júlio de Castilhos, 2.729 – 3039.2275), Malharia Friolã (Rua Antônio Ribeiro Mendes, 2.024 – 3224-1444), Gstock (Av. Therezinha Pauletti Sanvitto, 172 – 30281778) | Cabelo e maquiagem: Estúdio Jefferson Hoffmann | Locação: Propriedade de Sétimo Pedrotti em Ana Rech | Agradecimentos: Sétimo Pedrotti, Carlos Bacchi, Juliano Busetti, Rafael Poletto e Rafaela Tomazzoni.

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Nos pontos do tricô, do crochê, dos bordados, do filé, do macramê, entre outras técnicas artesanais, passado e presente, necessidade e estética se cruzam. “São sensações e emoções das muitas mãos que construíram a base de uma tradição que ainda, para nós, não se tornou industrial na sua totalidade. Ainda resulta de dedos, tardes e noites que cruzam os fios e transmitem ideias, sonhos e ideais”, conta Beth. A cestaria, a partir do vime e da palha de milho, também é uma das tramas mais representativas da região, usada em cestas para colher uva ou cestões para transportar o milho, revestimentos de litros e garrafões. “A cultura do vinho se entrelaça ao vime que amarra parreiras, às mãos do homem que constrói os artefatos. Tons dourados do trigo brilham nas tranças das sportas, misturadas a outras cores sugeridas pela natureza, como verdes, azuis, vermelhos”, detalha a pesquisadora.

[ ] Página 6: Blusa de malha e paetê e legging de malha: Friolã (acervo 40 anos) | Casaco smoking: acervo da produção | Colares de trança usados no cabelo: Ateliê Bia Verdi (R$ 65) | Ankle boot: UZA Gstock (R$ 289,90) | Página 7: Manta de crochê marrom usada na cabeça: La Vendela (R$ 50) | Casaco, legging e polaina: Friolã | Colares: acervo da produção | Contracapa: Boá e casaco: Friolã | Vestido: Capim Santo (R$ 375) | Tapa-ouvido: acervo da produção

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