5 minute read
APRESENTAÇÃO
APRESENTAÇÃO
Ana Beatriz Oliveira Reis1
Advertisement
Sonho que se sonha só É só um sonho que se sonha só Mas sonho que se sonha junto é realidade Prelúdio – Raul Seixas
A publicação do livro “A luta pelo direito à cidade na Amazônia: o processo de revisão do Plano Diretor de Santarém” se realiza quando o Grupo de Pesquisa “O direito à cidade Santarém” (GDAC) completa dois anos de atuação. Essa ocasião é importante para resgatarmos uma curta, porém intensa, trajetória.
O GDAC se propõe, por meio da pesquisa coletiva, a compreender a dinâmica do direito à cidade em Santarém nos espaços institucionais e não institucionais de participação. Entendemos que o direito à cidade não se restringe apenas à um direito formal de acesso aos equipamentos urbanos. Nas palavras do “tio Harvey”, esse é um direito reivindicado coletivamente que nos permite transformar a cidade de acordo com os nossos mais profundos desejos.2
Iniciamos nossas atividades de pesquisa em junho de 2017, num grupo formado majoritariamente por estudantes do curso de Gestão Pública e Desenvolvimento Regional da Universidade Federal do Oeste do Pará (GPDR/UFOPA). Além dos encontros semanais para leitura e aprofundamento teórico sobre temas relacionados à questão urbana, nos propomos, desde o início, a realizarmos pesquisa empírica em Direito, como forma de aproximação do real, por meio do contato direto com os sujeitos coletivos que reivindicam esse direito à cidade e que vivem numa materialidade específica, o interior da Amazônia.
1 Coordenadora do Grupo de Pesquisa “O direito à cidade em Santarém” (GDAC). 2 HARVEY, David. Cidades Rebeldes. São Paulo: Martins Fontes, 2014.
Paralelo ao início das atividades do GDAC, Santarém começou a experimentar o processo de revisão do Plano Diretor da cidade. Verificamos que acompanhar esse processo, tanto nos espaços institucionais como não institucionais de participação, seria fundamental para nossa investigação. Nesse sentido, antes mesmo do início das atividades oficiais de revisão do Plano Diretor, participamos do seminário organizado pelos movimentos sociais da cidade “O que é o Plano Diretor” cujo objetivo foi capacitar os diversos segmentos sobre a política urbana. Esse encontro foi o início da consolidação de laços que se fortalecem até hoje com os movimentos sociais da cidade.
Participamos do processo de revisão do Plano Diretor por meio do acompanhamento das três audiências públicas, das oficinas comunitárias na zona urbana e da conferência municipal de revisão. Esse acompanhamento foi além da simples observação direta, sendo a pesquisa participante a motivação da nossa atuação. E, nesse processo, nós nos forjamos enquanto sujeitos desejantes de uma outra Santarém.
Além disso, buscamos compreender a política urbana do município por meio das trajetórias e experiências dos sujeitos coletivos que historicamente têm reivindicado o direito à cidade em Santarém, em que pese suas bandeiras de luta nem sempre estarem relacionadas à questão urbana. Recebemos em nossas reuniões semanais representantes da UES, FAMCOS, CJP, FASE e STTR para realização de entrevistas estruturadas. Esses momentos foram fundamentais para nós compreendermos, um pouco mais, a complexidade do direito à cidade numa realidade tão plural como o Oeste do Pará, onde urbano e rural se confundem. Foram ainda grandes oportunidades para nos aproximarmos dos movimentos sociais da cidade, fortalecendo o diálogo entre a academia e esses sujeitos coletivos. Nesse processo de revisão, destacamos a conferência como o espaço mais importante, pois foi nesse momento que podemos
melhor verificar o que seria essa dinâmica do direito à cidade em Santarém. Os diversos segmentos sociais, na sua pluralidade de bandeiras e cores, se unificaram na luta contra os discursos e práticas daqueles que querem, a qualquer custo, impor um modelo de desenvolvimento predatório para a região. A disputa pela cidade se tornou mais acirrada naquele fórum. O desfecho trágico do processo de revisão em dezembro de 2018, que é aqui resgatado, nos coloca desafios para se pensar a luta pelo direito à cidade não só em Santarém. A reflexão e a ação política se fazem ainda mais necessárias em tempos de ataques e violações aos direitos duramente conquistados nas últimas décadas e de desmonte de quaisquer garantias mínimas de participação no planejamento e na gestão das cidades. O capital se impõe “a todo vapor” e o aprofundamento da espoliação da Amazônia e do seu povo está na agenda do Estado nas três esferas federativas. Não obstante a vitória dos movimentos sociais na conferência, em especial, contra a construção da área portuária no lago do Maicá, a violação à ordem constitucional urbanística consagrada na Constituição Federal de 1988 pelo poder público municipal, nos impulsiona a pensar esse direito para além dos marcos das institucionalidades do Estado. Construir novas formas de reivindicar esse direito bem como consolidar espaços outros de participação popular podem ser caminhos importantes para conquistarmos a cidade que queremos. No ensejo dessas reflexões, aproveitamos para a agradecer a todos aqueles que contribuíram de diversas formas para a construção desse livro. Primeiramente, agradecemos aos movimentos sociais de Santarém por todo aprendizado e parceria que, atualmente, se dá também na extensão universitária por meio do Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária Popular, o NAJUP CABANO. Agradecemos, em especial, à UES, à FAMCOS, à FASE, à CJP e ao STTR que contribuíram diretamente para a pesquisa.
Agradecemos ainda à Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA), especialmente, ao curso de Gestão Pública e Desenvolvimento Regional pela oportunidade de desenvolvermos nossas investigações e por todo apoio às atividades acadêmicas realizadas pelo GDAC nesses dois anos, como o I e o II Seminário de direito à cidade em Santarém. Ao professor Alex Ferreira Magalhães, coordenador do LEDUB, agradecemos pela parceria que se fortalece desde a realização do nosso I Seminário de direito à cidade em dezembro de 2017. Estendemos nossa gratidão aos discentes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) que contribuíram com importante análise sobre a efetividade da legislação urbanística nesse livro. Gostaríamos de registrar nosso carinho por todas/os as/os estudantes que passaram pelo GDAC e que também foram importantes para essa pesquisa direta ou indiretamente: Evanderson, Ana Margarita, Elza, Paula, Carla, Josemir, Jacqueline, Michael, Iago, Giuliane, Thiago, Lincon, Samuel, Andrew e Keuller. Por fim, agradecimento especial àquele que tem sido “co-sonhador” e responsável também pela materialização e concretização dessa obra. Yuri Rodrigues, nosso muito obrigada por construir o GDAC conosco e por fazer práxis seu sonho de uma nova sociabilidade. Que esse livro possa contribuir para o resgate de um processo que não merece ser esquecido por seus protagonistas, fortalecendo nossa utopia concreta3, e que nos possibilite novas reflexões sobre o direito à cidade na Amazônia.
3 BLOCH, Ernst. O Princípio Esperança. Trad. Nélio Schneider, Werner Fucks. Rio de Janeiro: Contraponto, 2005.