Edição 26, julho de 1985

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to entre as áreas aparentemente mais "avançadas" e as regiões onde parecia imperar um clima de marasmo e desmobilização. Fel izmente, antes mesmo de o seminário acontecer, os próprios fatos se encarregaram de desmentir esta dicotomia tão radical entre áreas " avançadas" e áreas "problemáticas". Durante o primeiro semestre de 1984 vêm à tona os movimentos grevistas de São Paulo e do Rio de Janeiro, mostrando a existênc ia da capacidade de mobilização por parte dos assalariados sem dúvida ainda frágil, mas muito superior ao que se poderia imaginar a partir de uma impressão superficial. Podemos dizer, neste sentido, que nos últimos anos tem início uma modificação qualitativa da própria forma como os assalariados rurais se apresentam ao conjunto da sociedade: não apenas como as miseráveis vítimas de um sistema capaz de promover o avanço simultâneo da produção agrícola e da fome, mas também como os agentes de construção de sua própria cidadania. Este avanço não pode, entretanto, obscurecer as enormes dificuldades que o trabalho de educação popular enfrenta no meio dos assalariados rurais. Foi para promover o debate tanto a respeito do avanço até aqui já alcançado como das dificuldades ainda existentes que decidimos reunir pessoas com experiências diferenciadas de vários Estados onde é significativo o trabalho com assalariados rurais. Não se pode dizer que tenha sido um seminário conclusivo, nem era este nosso objetivo. O essencial para nós era que fossem levantadas certas pistas básicas de reflexão sobre o tema. E isto, no fundamental, parece-nos ter sido alcançado . VOLANTES: UM TRABALHO IMPOSSfVEL? Em primeiro lugar o seminário contribuiu para que fosse derrubado um mito ainda hoje vigente entre os que realizam trabalhos de educação popular : de que é praticamente impossível realizar uma atividade frutífera de mobilização entre os assalariados rurais temporários, em virtude do próprio caráter irregular e itinerante do seu trabalho. As experiências não só de Pernambuco, mas também do Rio de Janeiro e de São Paulo mostram, ao contrário, que quando o movimento sindical decide levar adiante um trabalho de organização e mobilização efetivo, os resultados se traduzem em movimentos sociais muito mais rapidamente do que se pEnsa. No caso de São Paulo, inclusive, as formas de mobilização adotadas passaram por cima dos freios burocráticos impostos pela legislação de greve. Ao contrário do que vem ocorrendo em Pernambuco desde 1979, a greve de São Paulo não respeitou em 1984 o ritual de negociações previsto na Iegi si ação. A situação do Norte do Paraná é um verdadeiro contra-exemplo do que acaba de ser exposto.

Ali as negociações trabalhistas são feitas na ausência de qualquer tipo de mobilização de base e seus resu Ita dos são absolutamente decepcionantes, tanto do ponto de vista da conquista de melhores condições de vida como também sob o ângulo de edu cação popular. Nesse contexto de inércia do trabalho sindical com os assalariados, as tentativas de mobilização que passam por fora dos sindicatos encontram também enormes dificu Idades pára se traduzirem em lutas efetivas. Aliás, a questão do trabalho organi zativo realizado por organizações não-s indicais foi um dos pontos mais importantes da discussão. O papel das entidades de assessoria e de educação popular não é importante somente naquelas situações em que o movimento sindical é dominado por uma burocracia descomprometida com as lutas. Ao contrário, o trabalho de assessoria e de educação popular torna-se tanto mais relevante quanto mais firme é a decisão das direções sindicais de se engajarem nas lutas. É nesse momento que a educação popular pode revelar o seu potencial de mobilização, estimu Iando não só a compreensão dos problemas vividos pelos trabalhadores mas sobretudo a participação ativa das bases (e não 'só das direções) em todas as etapas da luta. TERRA OU TRABALHO? Mas qual a natureza dessas lutas? O que querem realmente os trabalhadores rurais? Evidentemente, a célebre discussão "terra ou salários" não poderia estar ausente do encontro. Em algumas situações em que o peso social dos assalariados na população trabalhadora total é reduzido e onde é escassa a experiência coletiva de mobilização traba1h ista - como é o caso do Sudoeste do Paraná a luta pela terra apresenta-se, de certa forma, desvinculada do combate por melhores salários e condições de trabalho. São situações em que os trabalhadores se unem para arrendar ou ocupar uma terra, estabelecendo aí, tanto quanto possível, formas coletivas de produção. O eixo da unidade aí não está tanto no combate à exploração salarial capitalista, mas sobretudo no estabelecimento de formas, por assim dizer, independentes de produção. A experiência de Pernambuco e São Paulo aponta já em outra direção. A batalha pela aplicação da "Lei do Sítio" mostra, em Pernambuco, que a conquista da terra não é a válvula de escape que vai possibilitar o abandono da situação de proletário, mas está integrada na luta salarial e trabalhista. IDENTIDADE SOCIAL E OBJETIVOS DE LUTA Esta questão se relaciona, evidentemente, com outra questão também já clássica: a da identidade social dos assalariados e sobretudo dos volantes. Vale a pena transcrever um trecho da exposição de

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