Jornal A Tarde: Celular ao Volante

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SALVADOR SEGUNDA-FEIRA 8/9/2014

SALVADOR REGIÃO METROPOLITANA

Editor-coordenador Luiz Lasserre

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POR HORA, DOIS CONDUTORES SÃO FLAGRADOS AO CELULAR

TRÂNSITO Entre janeiro e agosto deste ano, 14.056 motoristas cometeram a infração na capital baiana, segundo a Transalvador Fotos Joá Souza / Ag. A TARDE

Número de pessoas notificadas aumentou 176,5% em oito meses

LUAN SANTOS

O número de condutores flagrados usando o celular enquanto dirigem aumentou 176,5% entre janeiro e agosto deste ano na capital baiana, em comparação com o mesmo período de 2013. Nos oito primeiros meses de 2014, 14.056 motoristas foram notificados de acordo com dados da Superintendência de Trânsito e Transporte do Salvador (Transalvador). Isso significa que 2,4 condutores cometem essa infração a cada hora. No ano passado, o órgão de trânsito registrou 5.083 ocorrências. Atender a uma chamada, mandar um SMS, ler uma mensagem no WhatsApp ou checar o e-mail são ações frequentemente praticadas ao volante. Apesar de se tratar de um fenômeno recente, pesquisas em todo o mundo já apontam uma série de riscos do uso do celular ao volante. Um dos estudos, realizado pela Universidade de Utah (EUA), revela que o risco de acidente no trânsito aumenta em 400% com o uso do aparelho (leia mais sobre as pesquisas abaixo). O principal fator apontado pela pesquisa é a falta de atenção e diminuição do tempo de reação. Usando o celular, o condutor dificilmente olha para o retrovisor, divide fai-

xas, tem dificuldade para trocar marchas, não fica atento à sinalização e ultrapassa a velocidade da via. “As pessoas sabem que se trata de uma infração. O que falta é a percepção de risco, entender que aquele ato pode causar acidentes”, ressalta o médico Roberto Douglas, presidente da Associação Brasileira de Medicina do Tráfego (Abramet). Percepção foi o que faltou a um administrador de 31 anos, que pediu para não se iden-

tificar, para evitar um acidente. “Estava dirigindo na avenida Paralela e, ao mesmo tempo, olhando o WhatsAapp. De repente, senti um tombo: tinha batido no carro da frente”, conta. Por sorte, ninguém se machucou. “Tomei esse episódio como um aprendizado, pois poderia ter sido pior. Quando o celular toca, paro em um local seguro”, relata. Por outro lado, a percepção evitou um acidente com o representante de vendas Paulo

Martins, 34, também na avenida Paralela. “Vi que a motorista que vinha atrás de mim estava olhando o celular e dei passagem. Mais à frente, ela bateu no fundo de outro carro”, relata.

Fiscalização

O superintendente da Transalvador, Fabrizzio Muller, destaca que o aumento no número de notificações está ligado à maior proatividade dos agentes do órgão e ao crescente uso de celulares.

Usar o celular leva o condutor à falta de atenção no trânsito e perda de tempo de reação

“As pessoas acham que é algo inofensivo. A melhor forma de educação é a fiscalização, mas tudo depende da conscientização. As pessoas precisam entender que o uso de celular pode provocar acidentes”, destaca Muller. Hoje, a Transalvador conta com 800 agentes. A engenheira de tráfego Cristina Aragón diz que o rigor da fiscalização é uma forma de conscientizar a população sobre o perigo de se usar o telefone ao dirigir. “Esse crescimento (do número de notificações) não significa que mais pessoas estão usando o celular, mas que a fiscalização aumentou”, acredita a especialista. Ela ressalta que a vigilância deve ser mais intensiva para inibir os condutores. “A presença da fiscalização faz com que as pessoas evitem cometer a infração. É uma forma de prevenção”, frisa. Para o engenheiro Paulo Guimarães, responsável pela área de Pesquisa e Desenvolvimento do Observatório Nacional de Segurança Viária, o uso do celular ao volante está relacionado ao “deficiente” processo de formação de condutores. “Não serve para criar percepção de risco das pessoas. Deve-se mudar a linguagem de ‘não use celular’, para mostrar pesquisas que apontem os riscos”, salienta.

Valor da multa está defasado, defendem especialistas Especialistas consultados por A TARDE concordam que o valor da multa para quem usa celular ao volante está defasado. Para eles, este é um dos principais responsáveis pela “banalização” da infração. O Código de Trânsito Brasileiro (CTB), no artigo 252, considera o uso do celular infração de natureza média e estabelece multa de R$ 85,13 e 4 pontos no prontuário. “O valor da multa está congelado. Há 20 anos, as pessoas não usavam ao celular como utilizam hoje”, afirma o sociólogo Eduardo Biavati, especialista em segurança e educação do trânsito. Biavati defende que o uso do celular ao volante deveria ser classificado como infração gravíssima. Neste caso, a multa saltaria para R$ 191,54 e sete pontos no prontuário. “Ele não coloca em risco apenas a sua vida, mas as demais que estão no trânsito”, diz. Condutores acreditam o aumento da multa seria positivo. “As pessoas só aprendem quando sentem no bolso, não tem jeito”, opina o aposentado Manoel Borges, 56.

Rigor Paulo Guimarães / Divulgação

“O valor da multa está congelado há pelo menos 20 anos” EDUARDO BIAVATI, sociólogo

Pesquisa aponta o telefone como a principal causa de distração Pesquisas apontam que o uso de celular ao volante reduz a atenção e o tempo de reação e pode ser pior do que dirigir embriagado. Levantamento feito pela Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia com 1.020 pessoas mostrou que, para 84% dos entrevistados, o celular é o principal fator de distração ao volante. Por outro lado, pesquisa realizada pela Allianz – empresa seguradora europeia – revela que cerca de 30% dos acidentes ocorrem por distração do motorista.

Estudo realizado pelo Departamento de Medicina e Saúde da Universidade de Toronto, no Canadá, aponta que enviar SMS ao volante é quatro vezes mais perigoso do que dirigir embriagado. Para chegar ao resultado, os professores fizeram testes de atenção, como tempo de reação a curvas e sinalização, com condutores. A engenheira de tráfego Cristina Aragón discorda deste resultado. “O efeito do celular acaba quando você desliga o aparelho. Dirigir alcoolizado é a pior de todas as

infrações, porque não tem o botão de desligar”, diz.

Mortalidade

Cerca de 1,3 milhão de pessoas morrem a cada ano em acidentes de trânsito em todo o mundo. No Brasil, o número de mortos chega a 48 mil. O presidente da Abramet, Roberto Douglas, ressalta que 2011-2020 é considerada a década da segurança viária. A meta é reduzir em 50% o número de vítimas. “Todos os dias, 130 pessoas morrem. É uma morte silenciosa, a sociedade não exige mudanças”.

O QUE DIZ A LEGISLAÇÃO CÓDIGO O artigo 252 do CTB classifica o uso de celular ao volante como infração de natureza média PENALIDADE A multa é de R$ 85,13 e quatro pontos no prontuário ALTERAÇÃO Um projeto de lei em trâmite na Câmara dos Deputados propõe alterar a infração para grave. A multa seria de R$ 127,69 e cinco pontos no prontuário

O presidente da Abramet, Roberto Douglas, concorda que o valor deve ser aumentado e diz que o caminho para conscientizar a população passa pelo tripé educação, fiscalização e punição. “Se aumentasse o valor, a quantidade de infrações diminuiria”. O engenheiro Paulo Guimarães lembra que um projeto de lei está em trâmite na Câmara dos Deputados para alterar a infração de média para grave. Para ele, além do aumento da multa, a intensificação da fiscalização e a punição são o caminho para inibir a prática. Um dos problemas da fiscalização, segundo Guimarães, é o uso de películas nos vidros dos veículos. “Isso dificulta, pois o agente não identifica, assim como o viva-voz”, destaca.


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