1 Da próxima vez Pensar a vida, e se ter a sensação, Que não foi dessa vez, Mesmo sincero, Mas buscando água no deserto, A agulha no palheiro, Segurando a água com a mão. Em vão. Viver a vida, Quem sabe na próxima, Não esteja tão perdido, Tão pouco arrependido, Fazendo do jeito certo, Eu chegue mais perto, Despertar o fogo do coração, Iniciação.
2 O crivo do eu Tudo que sei deste mundo, É aquilo que de mim espelhei, Conceitos muito bem definidos, Mas são coisas que penso que sei. Relaciono-me com as coisas, Mas não penetro o cerne do ser, Na verdade só falo comigo mesmo, E a empatia não é pra valer. São representações de mim mesmo, Daquilo que entendo do mundo, Nunca houve entre eu e tu, Um entendimento profundo. Como sair deste si mesmo, E vencer as amarras da ilusão? Como abrir mão do meu crivo, E praticar a compaixão?
3 A causa perdida Se a vida é uma causa perdida, E se começamos só para acabar Então seria muito cômodo, Deixar a vida me levar. E se tudo é a vontade de Deus, Não importando o que se queira, Então o que seria o livre arbítrio, Se não um engodo, uma cegueira. Mas uma coisa me parece certa, A vida foi feita para se gastar, Seja com os anseios dos sonhos, Seja com a loucura de amar. E ao preenchermos esse vazio, Que percebemos como vida, Talvez encontremos a reposta, No fundo da alma, a Rosa querida.
4 Ó vida Tu que és ávida, Intrépida e atrevida, Quanta duvida, Quanta dívida, Da história revivida, E na hora devida, O eu sucumbe em pele lívida, Com a alma comovida, Toda ilusão é removida, Para que na luz seja ela envolvida, Tu que és a vida.
5 Corpo-alma Corri toda uma vida, E agora com calma, Refletir sobre o que importa, Alimentar a minha alma, Se foi muito ou se foi pouco, Não importa vai ficar, Abster-me deste mundo louco, Para que o outro possa despertar. Já não importa mais o ente, Nem a máscara representada, Só importa a semente, Que no coração foi semeada, Ouço boa musica, como pouco, Leio mais e procuro fazer o bem, Não me detenho com as vaidades, Somente a devoção é que me convém,
6 Existe sim! Existe sim uma força, Ela penetra a terra e germina a semente, Ela permeia o ar e vitaliza o sangue, Ela está na água e alimenta o corpo, Ela é o fogo que tudo transforma. Que Que Que Que Que
força é essa que educa a natureza, estrutura os minerais, adapta os vegetais, ensina os pássaros a voar, fez o homem pensar e imaginar.
De onde ela vem e pra onde ela vai, Está no corpo, mas não podemos tocar, Percebemos fluir, mas não sabemos controlar, Sentimos na emoção, mas não podemos explicar, Encontramos sua razão, quando deixamos de pensar. Menos ciência e conjecturas, Mais dedicação ao corpo-alma, Sigo construindo o meu pedaço de céu, Com uma suave, mas flamejante calma.
7 Corpo e Alma Há quem diga que ama o outro, Que vive a felicidade plena, Mas cai em suas próprias tramas, No palco da vida, um triste dilema, Para as pessoas cotidianas, A paixão é a união de almas, Mas o amor é um desconhecido, Não participa das nossas causas, Talvez o amor de mãe se assemelhe, E muito perto se aproxime, Da graça da existência, Da luz que vem de cima, Corpos com corpos se entendem, Mas entre as almas não se vê ligação, O amor deveria subir ao Espírito, Mas os corpos se rendem a paixão.
8 Algo está para acontecer Uma Rosa sobre a mesa, Os mistérios da vida, arquétipos da beleza, Algo está para acontecer, Na pauta, o Evangelho do Senhor, Esgota-se a razão, o ímpeto do labor, Algo está para acontecer, Sonda-se os livros, do Homem e da Natureza, Muitas verdades, poucas certezas, Algo está para acontecer, A Mulher sugere o estudo do arcano, Saturno, o Sol, a Lua, até o cântaro aquariano, Algo está para acontecer, E quando tudo parecia certo, Vem o paradoxo, caímos no deserto, Algo está para acontecer, O tempo avança e a noite passa, A Rosa ainda no vaso, só nos resta a graça, Algo está para acontecer, E por fim vê-se a sala iluminada, O eu declina, já não serve mais pra nada, É um novo alvorecer.
9 Onde moro Já morei no simples, no senso comum, imbuído na lida, Laborando no tempo, que aos poucos, foi destilando a vida, Habitei o cerne populoso dos redutos da cidade, Orbitei a ambição, comi da ilusão e bebi da vaidade, Lancei-me sedento e , então já dentro, de terras estrangeiras, Percebi o mundo, outra gente, novas fronteiras, Já habitei o Éden, o sol e de lá pra cá, Sondando este mundo, o centro da terra, o meu lugar, Enfim, hoje eu moro em mim mesmo, pois me dei conta, Que o melhor lugar, de se estar, é quando a gente se encontra.
10 A Insuficiência do Ente O amor que a gente sente, Não é pelo ser amado, mas pelo ente, A imagem que está a nossa frente, Então, o ente passa a ser, a utilidade que ele tem pra gente, Que nos serve prontamente e, Quando nos falta,doente, Não poderia ser diferente, Perde a utilidade, fica indiferente, Esse engodo da nossa mente, É um fato bastante frequente, Confundir a essência do amor com a utilidade do ente.
11 Mansão dos Reflexos A verdade que virá depois do sono, Onde repousam as nossas expectativas, O esvaziamento das experiências já vividas, Por um tempo fazem-nos crer na continuidade do nosso trono. Belos jardins, cidades de cristal, hospitais de tratamento, Porque não uma gota d’água voltando ao mar, Se misturando ao eterno manancial do amar, Imagens mentais que nos servem de alimento. Expectativas de um mundo de paz, Quando se quer manter a vida já passada, Colher os espinhos da Rosa despetalada, O além verdadeiramente se desfaz. E abaixo do céu o mistério se perpetuou A dualidade é tudo o que tu acreditas, Rezas, encantamentos, frases benditas, Tudo é refeito para o Outro que voltou.
12 A “Selfie” de Narciso Hoje Narciso olhou para a câmera, Tirou uma “selfie” do seu semblante, Então pensou por um instante, Como deve estar dentro de mim? Se pudesse fotografar lá dentro, Que imagem ele revelaria, Um monte de quinquilharia, Ou a imagem de um belo jardim. Parece que sem querer, A cultura da “selfie” veio na hora certa, Para manter a porta aberta, De um universo que não tem fim. Voltando as lentes para si mesmo, Para contemplar as belezas do eu, Narciso não se esqueceu, Já é hora de acordar.
13 O que será O que será desses dias? Numa época de plena liberdade, Quando tudo favorece a mocidade, As canções são vazias. O que será dessa vida? Num tempo expresso e instantâneo, Onde o valor é momentâneo, Mal se curam as feridas. O que será desse amor? Numa época como essa, Onde tudo é feito as pressas, Quando se perdeu o sabor. O que será desse licor? Que se consumia lentamente, E que prazerosamente, Aliviava a nossa dor. E o que será dessa Poesia? Se os corações estão morrendo, Quando o supérfluo só vem crescendo, O amanhecer será apenas mais um dia.
14 O sal Mineral da vida, sem par, sem igual, Nas batalhas de terras, no sangue das guerras, No justo salário do bom operário, No suor da testa no fim do labor, Na carne de sol secando ao calor, Nas lágrimas de dor, na emoção do amor, Nos mares profundos, oceanos do mundo, Nas minas de sabor de puro brancor, No animal, no humano, na alta magia, No triplo elemento da fina Alquimia.
15 O Divino e o Humano O que há em Deus que não seja humano? O que espera o homem quando está contemplando? Aquele que É, refletirá a Si mesmo? Aquele que percebe, perceberá a si mesmo? O que há no homem que não seja Divino? Qual o sentido da alma, ó inevitável destino? Aquele que foi criado recriará a si mesmo? Aquele que nos expira, irá inspirar a Si mesmo? Ou será um lindo sonho de amor, desejo e ação, Na eterna noite, na obra da criação, Refletindo o Ser na criatura, a luz do Eu submerso, As glórias do mundo divino, mas sempre humano Universo?
16 O caminho O caminho secreto o fio direto, O andar calejado o ombro pesado, Destino errante da mente brilhante, De uma longa procura tateando as escuras. A Verdade de fato é vivida no ato, São cenas dolorosas na senda penosa, Fluxo de passos preso nos laços, Da luta da lida da roda da vida. Da vida de santo coberto com manto, Da mente desfalecida além da vida, Mas resta esperança de uma nova criança, De uma alma pura fonte de toda cura.