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João Cordeiro

João Cordeiro Vice-Presidente da Pöyry Consulting - Finlândia Um processo de seleção natural e industrial

Ao longo das ultimas três décadas, as transformações do mercado mun- dial e as mudanças do ambiente com- petitivo têm levado a uma profunda reestruturação da indústria mundial de base florestal. Ocorre um verdadeiro processo de seleção natural.

Este fenômeno apresenta dois componentes principais. O primeiro, associado a distintas dinâmicas de mercado. Há um incremento acelerado do consumo dos principais produtos florestais nos países emergentes. Si- multaneamente, percebe-se tendência à estabilização, saturação ou mesmo redução do consumo nas regiões tradicionais de demanda, como na América do Norte, no Japão e nos países mais desenvolvidos da Europa. O segundo componente acompanha a gradativa redução da rentabilidade financeira das empresas, com enfoque centrado nestes mercados maduros. A estabilização do consumo nestas regiões tem gerado sobre capacidade de produção e conseqüente redução do nível de preços. Verifica-se, também, que uma parte considerável dos ativos industriais, em certos países, encon- tra-se desatualizada tecnologicamente. Estas alterações fundamentais no ambiente de ne- gócios provocam reações diver- sas na busca pelo aumento da competitividade. Entre elas, destaca- mos alguns exemplos de mudanças tecnológicas, estímulos políticos e o fenômeno da migração industrial.

Mudanças tecnológicas: Ob- serva-se que, uma grande parte das inovações propostas tem enfoque na otimização do uso da matéria-prima fibrosa. Por exemplo, as gramaturas baixas ganham espaço, pois reduzem a necessidade de fibras e promovem economias na cadeia logística. Ao mesmo tempo, a evolução tecnológica da produção de papel e o aumento da coleta, impulsionam o consumo de fibras recicladas – cerca de 48% da produção mundial de papel hoje é baseada nestas fibras.

Também o víeis tecnológico pro- move o uso de fibras curtas, provindas das plantações de rápido crescimen- to, as quais se consolidam como as grandes fontes de fibra virgem de alta qualidade e homogeneidade. Es- tima-se que mais de 20% do consumo mundial de madeira para fins indus- triais, em 2020, virá destas plantações florestais (atualmente 14%).

Estímulos políticos: Diversas iniciativas políticas, muitas delas en- cabeçadas pela União Européia, pro- movem o uso energético dos recursos naturais renováveis. Esta atitude político-ambiental tem despertado in- teresse dos agentes econômicos pelo uso da biomassa de origem florestal (e agrícola).

Por exemplo, legislação específica promovendo a geração de eletricida- de provinda de biomassa, como na Espanha e em Portugal, altera a com- petitividade da produção de celulose nestas regiões – produzir celulose passa a ser um negócio literalmente energético. Ainda neste contexto, encontra-se o tema dos biocom-bus- tíveis. São lançados grandes metas e ambiciosos programas de pesquisa, envolvendo iniciativas governa- mentais e empresariais. A tecno- logia de produção das chamadas biorefinarias provavelmente ainda não assegura amplos retornos financeiros, porém, os compromissos políticos visam mudanças estruturais no médio prazo, incentivando o produtor rural e a indústria. Ainda neste tema político e cultural, os consumidores tornam-se mais exigentes quanto às credenciais ambientais dos produtos de base florestal. Basta observar a rápida evolução da impor- tância dos selos verdes e das diversas demandas sociais, associadas a grandes projetos de investimento, para constatar que a competitividade da indústria está hoje intimamente relacionada à sustentabilidade – e principalmente ao sucesso do tom do diálogo entre a indústria e a so- ciedade.

Migração Industrial: O fenô- meno da migração industrial está diretamente relacionado ao cresci- mento do mercado Asiático - leia-se China, e ao acesso às matérias-primas florestais competitivas - leia-se Brasil e plantações de rápido crescimento. Assim, o capital e, conseqüentemente, a indústria migram para estas regiões, na busca por maiores retornos.

Isto comprova claramente as pro- jeções da consultoria estratégica e industrial da Pöyry: até o ano 2020, mais da metade do consumo e da produção mundial de papel deverá ocorrer nas economias emergentes. Ao mesmo tempo, a celulose provin- da de plantações de alto rendimento, principalmente as de eucalipto, ga- nhará espaço.

Países como o Brasil beneficiamse em várias perspectivas. Sendo o mercado regional relativamente pequeno e a competitividade da pro- dução de fibras alta, a indústria ainda é essencialmente exportadora. Outra realidade importante diz respeito ao acesso a mais avançada tecnologia de plantações florestais do planeta, criada, desenvolvida e aperfeiçoada no Brasil.

A competitividade florestal e agrí- cola do Brasil é evidente. A continui- dade destas vantagens comparativas, porém, está na agenda dos investi- dores. Fazendo um breve paralelo histórico entre o sucesso comercial e tecnológico de algumas culturas agrícolas (soja, cana-de-açúcar) e florestais (eucalipto, pinus), percebese que a rentabilidade do negócio está ligada, essencialmente, ao acesso à terra, à tecnologia genética e à com- petitividade logística e estrutural.

No futuro, veremos se intensificar a concorrência provinda de plantações florestais em outras regiões – nota-se hoje interesse crescente por investi- mentos na África ou até mesmo em algumas regiões da própria China. Também no Brasil, as culturas (agrí- cola ou florestal) e os países que vierem a oferecer maiores retornos ao capital (e previsibilidade de riscos) atrairão a atenção dos investidores.

Em 1864, o filosofo inglês Herbert Spencer promoveu o princípio da “sobrevivência do mais apto” – a glo- balização da indústria de base florestal parece seguir regras semelhantes ao processo de seleção natural.

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