A PROLIFERAÇÃO DA BURRICE: ANÁLISE DO CRESCIMENTO
A DESCOBERTA DE TATOOINE PELA SONDA KEPLER
PETRÓLEO ABIÓTICO: UMA NOVA FÉ INSUSTENTÁVEL
CETICISMO
EDUCAÇÃO
EVOLUÇÃO
FILOSOFIA
ANÁLISE ATRAVÉS DA NAVALHA DE OCCAM
CRIPTO MEDIEVALISMO TARDIO
O OVO OU A GALINHA E A ORIGEM DAS AVES
OS LIMITES DA CIÊNCIA
NATUREZA HUMANA
OPERANDO O COMPORTAMENTO
PEDAGOGIA
RESENHAS DE LIVROS
ESTEREÓTIPOS: UMA QUESTÃO CULTURAL?
DEFININDO
COMO ESTRELAS NA TERRA
“ASSIM FALOU VARGAS VILA”
Revista Livre Pensamento – Número 2 Índice - Página 1
17/11/2011
Editorial Carta ao Leitor O Leitor Escreve Dicas do Leitor
Página 04 Página 05 Página 05
Matérias Página 07
A proliferação da burrice Uma análise sobre a burrice e a estupidez humana, seu crescimento e vários aspectos.
Por Jeronimo Freitas
A descoberta de Tatooine pela sonda Kepler
Página 11
Texto sobre a descoberta do planeta Kepler-16b pena sonda Kepler da NASA.
Por Mário César Mancinelli de Araújo
Petróleo Abiótico: Uma Nova Fé Insustentável – Parte I Primeira parte de um texto sobre as alegações de que o petróleo encontrado na terra não teria origem biológica.
Por Francisco Quiumento
Página 13
Revista Livre Pensamento – Número 2 Índice - Página 2
17/11/2011
Colunas Página 19
Ceticismo Ufologia: Análise Através da Navalha de Occam Por Mário César Mancinelli de Araújo
Educação
Página 22
Cripto medievalismo tardio Por Wagner Kirmse Caldas
Página 31
Evolução O Ovo ou a Galinha e a origem das aves. Por Gustavo Melim Gomes
Filosofia
Página 39
Os Limites da Ciência – Uma nova perspectiva para a realidade Por Eder Juno N. Terra
Natureza Humana
Página 46
Estereótipos - Uma questão puramente cultural. Ou não. Por Felipe Carvalho Novaes
Operando o Comportamento
Página 49
O que é comportamento? Definindo para evitar confusões conceituais. Por Marcos Adilson Rodrigues Júnior
Pedagogia
Página 50
Como Estrelas na Terra Por Kelly R. Conde
Resenhas de Livros
Página 55
“Assim falou Vargas Vila” Por Fred Lins Junior
Humor A Terra e a Lua em: O Rebaixamento de Plutão.
Página 58 Por Mário César Mancinelli de Araújo
Gerais
Ser Humano
Página 60
Declaração Universal dos Direitos Humanos
Dicas para a Internet Sites recomendados, sites úteis e blogs que fazem parte do Projeto Livres Pensadores
Página 64
Editorial - Carta ao Leitor, O Leitor Escreve e Dicas do Leitor
Caro leitor,
Carta ao Leitor Como devem saber, a Organização Livres Pensadores é uma associação formada por brasileiras e brasileiros, que unem esforços e tempo na tentativa de construir uma sociedade mais justa – na qual as decisões sejam tomadas com base no uso da razão, do pensamento crítico, da observação dos valores democráticos e do conhecimento científico. Esta luta não é fácil, nem nunca será. Por incrível que possa parecer, acaba trazendo muitos inimigos, principalmente aqueles que querem que o mundo continue como está ou, se possível, piore ainda mais. Isto sem falar em egos inflamados, que acabamos encontrando pelo caminho. Mas, agora, esta luta torna-se cada vez mais importante.
Recentemente tivemos a notícia de que temos 7 bilhões de seres humanos vivendo no planeta Terra. Isto mesmo, você não leu errado: sete bilhões de seres humanos. Estamos cada vez mais próximos de uma superpopulação, coisa que trás consigo diversos riscos. Risco de desabastecimento de alimentos, devido à capacidade de produção; risco de falta de água potável, inclusive devido à poluição dos rios e mares, entre outros. Saindo deste contexto, mas igualmente preocupante, temos o risco de uma revolução protestante, como parece estar prestes a acontecer no Brasil, com movimentos de religiosos como Malafaia. Assim, fica cada vez mais urgente a necessidade de passar conhecimento de qualidade às pessoas, principalmente às novas gerações. E mais do que isto, é preciso ensinar estas pessoas a pensar. É com este pensamento que mais esta edição da Revista Livre Pensamento é lançada. Esperamos, sinceramente, que possa te trazer novas formas de pensar, novos ângulos de visão sobre os assuntos sem, jamais, impor qualquer tipo de dogma. E pedimos que, por favor, passe-a para o maior número de pessoas que puder. A revista é gratuita e de livre distribuição.
Atenciosamente,
Mário César Mancinelli de Araújo e Jeronimo Freitas, Presidente e vice-presidente da Organização Livres Pensadores. Revista Livre Pensamento - Número 2
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Editorial - Carta ao Leitor, O Leitor Escreve e Dicas do Leitor
O Leitor Escreve
Este espaço é destinado à publicação das mensagens enviadas pelos leitores à redação da revista Livre Pensamento. Para esta edição apenas a Joana Maria da Silva escreveu, mas não informou a cidade e estado de onde escreve. Sua mensagem foi a seguinte: Excelente ideia, precisamos mesmo de espaço. Adorei a revista, parabéns! Participe! Escreva para revista@livrespensadores.org, incluindo seu nome, a cidade e o estado onde vive e, caso more no exterior, o país também.
Dicas do Leitor
Se você conhece um site, blog, tumblr, ou outro e quer enviar sua dica aos leitores da Revista Livre Pensamento, escreva para revista@livrespensadores.org com o título “dica do leitor”. Não se esqueça de colocar seu nome e de onde você é (cidade e estado, além do país caso você viva no exterior).
Revista Livre Pensamento - Número 2
Página 5
Matérias - Autor: Jeronimo Freitas
A proliferação da burrice
Estaria a burrice crescendo? Será que não estaríamos testemunhando uma proliferação alarmante da irracionalidade e a exuberância da ignorância?
Já faz um bom tempo que eu penso sobre esse assunto e agora vejo que o aumento alarmante do número de pessoas burras tem preocupado um grupo crescente de estudiosos. Recentemente, foram publicados dois artigos (aqui e aqui, em inglês) ambos inspirados num ensaio feito a 35 anos pelo historiador econômico italiano Carlo Cipolla e intitulado “As Leis Básicas da Estupidez Humana“. Neste tratado cheio de humor e um tanto quanto provocativo, Cipolla adverte contra o poder da estupidez (burrice). Dele, três leis eu exponho abaixo. A primeira fornece uma definição para a burrice, e as duas últimas destacam a abundância e a eficácia da estupidez: 1. “Uma pessoa burra é uma pessoa cujos atos causam perdas à outra pessoa ou a um grupo de pessoas, enquanto ela própria, ou não obtêm nenhum ganho ou até também perde por causa deles.” 2. “Sempre e inevitavelmente todos subestimam o número de indivíduos acéfalos em circulação.”
mente saber, entender ou explicar o que faz aquela criatura absurda fazer o que faz. De fato não há explicação - ou melhor, há apenas uma explicação: A pessoa em questão é burra”.
Desde que o ensaio de Cipolla apareceu em 1976, vários autores têm constatado suas descobertas. Em particular o artigo “A navalha de Hanlon”, publicado por Robert Hanlon, quatro anos após o ensaio de Cipolla, nos propõe “Nunca atribuir à malícia aquilo que pode ser adequadamente explicado pela burrice”. A navalha de Hanlon pode ser interpretada como um corolário das leis básicas da estupidez listados acima.
Um Enigma para Darwin Embora os pensamentos acima sobre os efeitos da estupidez possam parecer atraentes, eles nos apontam um enigma ignorado por Cipolla e seus seguidores: como é que a burrice prolifera? Não deveria a estupidez ter sido eliminada há muito tempo pelo processo de seleção natural?
À primeira vista, a burrice seria uma característica que esperamos ver ser penalizada e conseqüentemente ex3. “As pessoas não estúpidas sempre subestimam tinta ao longo do processo de seleção natural. Afinal, a capacidade que têm os indivíduos burros em as pessoas burras por definição tendem a não obter causar dano. Em particular, as pessoas não nenhum ganho através de seus atos inconseqüentes estúpidas sempre esquecem que em qualquer e... burros. Coloque uma pessoa burra ao lado de pesmomento ou lugar e em qualquer circunstância, soas “normais”, em um ambiente competitivo. A peslidar e/ou associar-se a pessoas burras sempre soa estúpida, provavelmente, sairá como a perdedora, acaba por ser um erro grave e caro.” e certamente não como a mais apta. Como poderia Cipolla descreve pessoas burras como um grupo, não então a estupidez sobreviver e até mesmo florescer? estruturado, porém poderoso. Ele argumenta que quando você sofre devido às ações dos outros, talvez Eu vou tentar dar uma resposta satisfatória para esta não seja devido às ações malévolas, mas simplesmen- pergunta ainda que não tenha a mínima pretensão de chegar a uma resposta definitiva, mas o sistema te por causa das ações impensadas: que proponho, mesmo que não possa explicar exaus“Nossa vida cotidiana é, em grande parte, reple- tivamente o mecanismo que leva à sobrevivência da ta de situações em que perdemos dinheiro, tem- burrice, irá pelo menos fornecer algumas pistas para po, energia, apetite, alegria e saúde por causa da isso. Como muitas vezes acontece, o caminho em direação insensata e estúpida de uma criatura que, ção à resposta será, no mínimo, um exercício filosófico no entanto, não tem nada a ganhar com aquilo interessante. Ele irá nos conduzir desde a estratégia e que de fato nada ganha. Ninguém parece real- básica do pôquer aos limites de aplicabilidade da teoRevista Livre Pensamento - Número 2
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Matérias - Autor: Jeronimo Freitas ria dos jogos. Uma característica fundamental da estupidez é que seu poder reside na sua abundância. Uma pessoa burra isolada é impotente, mas uma manada desses jumentos pode ser invencível. Coloque uma pessoa inteligente em um grupo de pessoas burras e você vai presenciá-la sucumbir diante da burrice. Em um ambiente infestado de burros “ser o mais inteligente” não equivale a “ser mais apto”. Para obter um controle sobre o mecanismo por trás da eficácia da abundancia da burrice, voltemos a 1997. Naquele ano, Andy Morton, um biólogo molecular especializado no jogo de pôquer postou na internet um artigo com estratégias desse jogo as quais resumo como: “Cuidado com o poder da burrice” Um slogan que resume igualmente bem as conclusões de Cipolla. Em sua estratégia de jogo, Morton efetivamente demonstra que também em jogos de soma zero, como é o caso do pôquer, o efeito nocivo de uma estupidez pode se estender bem além dos limites do próprio burro. Morton explica como, num cenário realista de pôquer, onde se espera que todos jogadores façam jogadas inteligentes, uma jogada estúpida de um deles vai te prejudicar. O que acontece neste cenário é que o movimento impensado de um de seus oponentes prejudica as expectativas de ganho dele mesmo, mas também as suas, ao passo em que causa um efeito oposto (efeito positivo) nas expectativas dos outros jogadores. Note que este “efeito de Morton” (uma jogada estúpida de seu oponente machucando você) não pode ocorrer em jogos de soma zero com apenas dois participantes. Ou seja, para o efeito Morton poder ocorrer em um jogo de soma zero, é necessário que você esteja enfrentando vários adversários.
Suponha que você está jogando contra Maria e Pedro num jogo de apenas três jogadores. Nesse jogo, Maria poderá fazer um movimento idiota que venha a prejudicar a ela e a você, ao mesmo tempo em que favorece a Pedro. Do mesmo jeito, Pedro pode efetuar um movimento estúpido prejudicando a você e a ele, mas favorecendo Maria. O que aconteceria se Maria e Pedro fizerem, ambos, movimentos estúpidos? O resultado será uma perda pra você e um ganho pra eles. Pois você será prejudicado duas vezes (uma por Maria outra por Pedro) enquanto Maria uma (por Pedro) e Pedro uma (por Maria). Este efeito duplo Morton é o que faz a burrice ser desproporcionalmente eficaz em grupos infestados, contaminados, pela estupidez. Ele favorece a burrice devido a um ciclo de feedback positivo em que o resultando é a criação de mais estupidez. Esse exemplo de efeito Morton não é exclusivo do pôquer, tanto ele como o duplo Morton são comuns em muitos jogos de múltiplos jogadores.
O Dilema do Tênis
O duplo Morton Agora vamos dar o segundo e último passo em nossa tentativa de explicar a abundância da burrice no mundo: o chamado duplo Morton. O mecanismo por trás do duplo Morton é de fácil compreensão, com base no efeito Morton em jogos com vários jogadores. Revista Livre Pensamento - Número 2
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Matérias - Autor: Jeronimo Freitas A reserva de duas cobiçadíssimas quadras de tênis em um clube da moda é proposta de forma independente e simultânea a você e a seus dois parceiros de tênis dos fins de semana. Cada um de vocês tem que decidir na hora para qual das duas quadras se inscrever, sob pena de perderem a vaga se não forem rápidos, sem ter mesmo tempo para consultar os demais por telefone, e sem ter o direito a qualquer possibilidade de modificação posterior. As opções são: a quadra A, por 45 minutos, ou a quadra B, por 60 minutos. Se todos os três optarem pela mesma quadra, todos os três vão ter a oportunidade de jogar durante dois terços do tempo total disponível. Se um de vocês escolhe uma quadra diferente da dos outros dois, ficará sozinho e não poderá jogar tênis, enquanto que os outros dois poderão jogar, cada um, durante o tempo inteiro. Qual a quadra de tênis que você escolheria, a A ou a B? Claro que escolheria a quadra B. Pois, sendo a quadra B exatamente igual à A, custando o mesmo preço e ainda por cima disponível por um período mais longo, 60 minutos, apenas pessoas burras iriam escolher a opção ‘A’. Assumindo que os seus dois amigos também farão uma escolha racional, cada um de vocês vai desfrutar de 40 minutos de tênis. Não há problema, você poderia dizer. A escolha é óbvia! Você sabe que ‘B’ é a melhor opção, e saberá que os outros dois vão atinar pra o mesmo fato, pois todos querem jogar tênis durante o maior tempo possível, pagando o mesmo preço. Você nunca iria selecionar a quadra ‘A’, já que essa escolha iria te proporcionar menos tempo de jogo, pelo mesmo preço.
O quão estúpido é isso? Imagine a discussão que se seguiria quando vocês três se encontrassem ao término do horário. “Vocês deveriam ter escolhido a quadra B”, você vai gritar pra seus amigos. “Por quê?”, perguntariam os asnos. “Porque escolher ‘A’ é uma decisão realmente estúpida!”, você grita. “Escolhendo ‘B’, teríamos muito mais tempo de jogo”. “Quanto tempo nós teríamos recebido se tivéssemos selecionado a opção ‘B’?”, perguntam eles. “Teríamos jogado cada um 40 minutos”, responde você. “Há é? Nós jogamos 45 minutos”, replicam os quadrúpedes. Eu acho que você é que é quem não pensa por aqui!”. Eles saem rindo em direção ao bar e te deixam falando sozinho com cara de besta.
Estúpidos 2 = Inteligente O dilema de tênis acima torna claro como duas escolhas estúpidas, não estando nenhuma delas voltada a potencializar os ganhos, pode gerar um resultado imbatível. Dois ‘estúpidos’ podem bater um “inteligente”. Isso é, na verdade, um atentado à “inteligência”, uma vez que reduz efetivamente o benefício total para o grupo (neste caso, reduzindo o total de jogadores em tempo 120-90 minutos).
Se você pensa assim, você corre o risco de ser vítima do Efeito Cipolla por subestimar o poder que têm as Note que, de acordo com a definição de Cipolla, um pessoas burras de causar dano às pessoas normais. Va- jogador que selecionou ‘A’ é individualmente culpado. Se esse jogador tivesse mudado a sua escolha de mos ver porque este é o caso. ‘A’ para ‘B’, ele teria aumentado seu tempo na quadra Como vimos, você estará certo em sua escolha lógica de tênis de 45 a 60 minutos e o tempo total dos dois pela opção ‘B’, desde que pelo menos um dos outros outros também 45-60 minutos. Assim, por não ter sedois se comporte também de forma lógica (inteligente). lecionado ‘B’, a escolha deste jogador reduziu não só o seu próprio tempo na quadra de tênis por 15 minutos, Mas o que aconteceria se os dois outros se comporta- mas também o tempo dos outros na mesma proporrem estupidamente escolhendo a quadra A? Isso mu- ção. No entanto, os dois jogadores que selecionaram daria as coisas de forma dramática. Você acaba sozi- ‘A’ não são coletivamente estúpidos de todo. Tendo nho na ‘B’ e não pode jogar, enquanto os outros dois você optado por ‘B’, a escolha racional, a única maneivão, cada um, desfrutar de 45 minutos de tênis. ra deles aumentarem o tempo deles de jogo seria os Revista Livre Pensamento - Número 2
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Matérias - Autor: Jeronimo Freitas dois optando por ‘A’. Em ‘B’ todos ganham, em ‘A’ dois ganham e um perde tudo. Vemos aqui o ‘duplo Morton’ em pleno andamento: uma massa crítica de resultados estúpidos com um potencial destrutivo imbatível. Isso não ocorre apenas na mesa de pôquer, mas igualmente na vida real. O duplo Morton coloca limites para a aplicabilidade da teoria dos jogos, já que esta teoria é baseada na premissa do comportamento racional. Em grupos em que as falsas crenças, como “A escolha ‘A’ é melhor se torna a regra”, a teoria dos jogos tem efeito limitado. Isso não significa que uma pessoa racional será uma vítima indefesa da irracionalidade em torno dela. Para que ela sobreviva, terá que proceder “inteligentemente” deduzindo que, se pelo menos 64% da população tende a aderir à essa falsa crença “A é melhor”, o comportamento ideal para ela será acompanhar a maioria e também escolher ‘A’. Por isso, numa população dominada pela burrice, pessoas racionais são forçadas a se comportar burramente.
Vítima da estupidez Todos nós somos repetidamente vítimas do efeito Morton. As pessoas agem estupidamente prejudicando não só a si mesmas, mas a você também. O fato de que isso pode acontecer em jogos de soma não-zero é bastante trivial. Morton deixou claro que este cenário se estende a vários jogadores de jogos de soma-zero. Mesmo uma pessoa que conheça bem o poder da burrice continua vulnerável quando na presença desta.
Quando ele revelou sua teoria em 1997, Andy Morton tinha 33 anos. Ele morreu tragicamente um ano O cenário a seguir é, portanto, perfeitamente possí- depois. Quer saber qual foi a causa de sua morte prevel: três indivíduos racionais participam no dilema das matura? Andy foi vítima do efeito Morton e pagou com quadras de tênis sem saber da escolha de qualquer a sua vida pelo fato de alguém ter agido estupidamenum dos outros jogadores. Todos os três, no entanto, te. Andy estava conduzindo sua motocicleta quando estão conscientes de que, na população onde vivem, uma mulher dirigindo uma caminhonete da qual ele se a escolha ‘A’ é feita mais de 64% do tempo. Todos aproximava, mudou brusca e desnecessariamente de os três, portanto, fazem a escolha racional da opção direção, no meio do tráfego, atingindo-o na cabeça. Ele ‘A’. Quando confrontados a tal dilema, os três devem teve morte instantânea. raciocinar da seguinte forma: “Bem, é melhor antecipar o comportamento irracional dos outros dois e escoSobre o Autor: lher ‘A’!”. O interessante é verificar que, em se agindo Jeronimo Freitas é recifense, assim, a irracionalidade nesta população passou a ser radicado em Bruxelas desde uma coisa do passado: todos os indivíduos agora agem 1998. Biólogo com doutorado em Ecologia Humana. Apaixoracionalmente, respondendo matematicamente às esnado pela natureza. Defensor tatísticas. Logo, comportamento estúpido não é sinônida ciência e do uso da razão. mo de comportamento irracional. Ateu, humanista e secular, vicepresidente da Organização Espero que eu tenha deixado mais ou menos claro o Livres Pensadores. O principal processo de como o duplo Morton fornece uma explimotivo que me leva a escrever cação para a proliferação da burrice. Levando-se em artigos sobre ceticismo e ateísmo é poder fazer uso da minha experiência como cientista e cético contriconsideração que duplos Mortons ocorrem no jogo dibuindo assim para o combate aos males causados ário da sobrevivência ao qual costumamos nos referir pela superstição, pela crença irracional em divincomo o “jogo da vida”, a estupidez abundante tenderá dades, o uso da fé dogmática como um guia moral a ser ainda mais abundante. em detrimento ao uso da razão e pela ignorância científica. Revista Livre Pensamento - Número 2
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Matérias - Autor: Mário César Mancinelli de Araújo
A descoberta de Tatooine pela sonda Kepler
Para quem não é fã da série de filmes “Guerra nas Estrelas”, ou mesmo para quem não lembra, Tatooine é um planeta fictício que orbita dois sóis, onde o personagem principal da série, Luke Skywalker, cresceu. Segundo a Wikipedia: Na saga de George Lucas, Star Wars, Tatooine é o planeta natal da família Skywalker e cenário de grande parte da ação dos vários filmes da série (bem como de muitos romances e outras peças literárias de ficção científica). No roteiro original do episódio IV da saga, há explicações e detalhes que não saltam aos olhos das pessoas que assistem ao filme, como por exemplo o fato de o planeta pertencer a um sistema solar duplo,ou seja, que tem dois sóis girando em torno do centro do sistema. Um deles é amarelo(como o Sol terrestre) e o outro é vermelho.Também é dito no roteiro que no planeta há aves de rapina que se alimentam de metal, devorando máquinas usadas e robôs fora de funcionamento. A existência de tal tipo de planeta já havia sido teorizada, contudo era alvo de muita dúvida. Alguns chegavam até mesmo a afirmar que tal tipo de planeta era impossível, devido às complicações e excentricidades envolvidas no movimento orbital de 3 corpos.
As duas estrelas de Kepler-16 têm tamanhos diferentes: uma possui massa equivalente a 69% da massa do Sol e a outra, menos brilhante e de espectro mais avermelhado, de 20%. Contudo, as condições climáticas de Kepler-16b, infelizmente, não se parecem com o deserto ensolarado de Tatooine. Trata-se de um lugar frio e com uma densa atmosfera, com temperaturas entorno de -100°C a -70°C. Segundo o artigo do Diario do Nordeste: Lançada em 2010, a missão Kepler tem como objetivo encontrar planetas fora de nosso sistema solar - principalmente os que possam reunir condições para o desenvolvimento da vida. Sistemas planetários inteiros já foram detectados pelo projeto, além de vários “candidados”a planetas. Assim, provavelmente Kepler-16b seja incapaz de abrigar vida, apesar de atravessar a zona habitável em torno do par binário em alguns momentos de sua órbita (ou ano, se preferir), a qual, como pode-se imaginar, é bastante intrincada, dependendo do posicionamento de cada uma das estrelas. Veja abaixo um esquema demonstrando isto, numa imagem gentilmente cedida por Carlos Apodman Bella.
Contudo, a ciência transformou o “impossível” na realidade: segundo um artigo publicado no dia 15 de setembro na revista americana “Science”, a sonda Kepler da Nasa descobriu um planeta que orbita dois sóis. O par de estrelas (ou sistema binário), chamado Kepler-16, está a cerca de 200 anos luz de distância da Terra e se localiza na constelação Cygnus (Cisne), próximo da constelação Lira. Assim, o planeta que as orbita foi nomeado Kepler-16b (formalmente Kepler-16 (AB)-b). Revista Livre Pensamento - Número 2
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Matérias - Autor: Mário César Mancinelli de Araújo “Kepler-16b é o primeiro exemplo de planeta circumbinário - que orbita não uma, mas duas estrelas - de existência confirmada. (...) Mais uma vez, descobrimos que nosso sistema solar é apenas um exemplo da diversidade de sistemas planetários que a natureza pode criar.” – Josh Carter, astrônomo do Centro HarvardSmithsonian de Astrofísica, um dos autores da descoberta. Devido ao fato de sistemas binários serem comuns em nossa galáxia, isto aumenta consideravelmente o possível número de planetas extrassolares que devem existir na Via Láctea. Kepler-16b foi observado durante uma órbita completa (ou “ano completo”) e foi possível determinar que o raio médio de sua órbita é de aproximadamente 100 A descoberta do novo planeta foi possível porque milhões de quilômetros (dois terços da distância entre o telescópio Kepler observa sua órbita de perfil, e o Sol e a Terra). é capaz de perceber a tênue queda de luminosidade cada vez que o planeta eclipsa uma das duas Para confirmar a descoberta, porém, os astrônomos realmente tiveram um trabalho hercúleo, pois não tiestrelas. veram de estudar apenas a órbita de Kepler-16b, que (...) dura 229 dias: as estrelas A e B também exercem força gravitacional entre si e mudam de posição o tempo Batizado de Kepler-16b, o planeta faz a lumino- todo em relação ao centro do sistema. Isso fez com sidade do sistema sofrer uma queda de 1,7% du- que os períodos de órbita detectados pelos cientistas rante o eclipse da estrela maior e de 0,1% durante em um primeiro momento variassem entre 221 dias e o eclipse da estrela menor. 230 dias, um dado difícil de interpretar.
Segundo o artigo da Folha.com:
Veja abaixo uma concepção artística de um destes eclipses.
Finalmente, Kepler-16b é um planeta de massa comparável à de Saturno (tem um terço da massa de Júpiter), sendo metade rochoso e metade gasoso. Seu raio é cerca de um quarto menor do que o de Júpiter. Assim, a versão “real” de Tatooine seria bastante parecida com Saturno. O seguinte vídeo tem uma animação de como poderia ser Kepler-16b: http://www.youtube.com/ watch?v=L8wgJK9S45I Sobre o Autor: Mário César Mancinelli de Araújo é um apaixonado por ciências em geral, que adora pesquisar a ufologia (com uma visão científica/cética).
A sonda Kepler monitora mais de 150 mil estrelas (a região dos quadros da imagem abaixo), além de ser o único telescópio com sensibilidade suficiente para detectar variações tão pequenas e capaz de acompanhálas sem interrupções.
É formando em Ciência da Computação e pretende fazer mestrado em Inteligência Artificial. Pretende ainda se formar em astronomia ou astrobiologia. Blog: agloriousdawn.livrespensadores.org
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Matérias - Autor: Francisco Quiumento
Petróleo Abiótico: Uma Nova Fé Insustentável Parte I
Tem crescido pela internet, e até nascido um ferrenho nicho na Wikipédia, um círculo de defensores da “origem abiótica do petróleo” (e até do carvão, o que veremos, merece um “pasmemos!”).
O esquema básico da hipótese do petróleo abiótico.
Assim, podemos afirmar também que petróleo abiótico existe, mas está em quantidades insignificantes, minúsculas, não comercialmente viáveis, e a taxa em que é produzido não tem se mostrado mais rápida do que os óleos bióticos, que é de cerca de 20 milhões de anos.
A imagem da utopia de um mundo com petróleo na prática inesgotável dos defensores do petróleo abiótico (news.softpedia.com).
Primeiramente, deixaremos bem claro que ninguém aqui defenderá que a reação de Fischer-Tropsch não produz hidrocarbonetos na crosta terrestre ou mesmo abaixo [NOTA 1]. O problema é que hidrocarboneto pode ser tanto algo como o metano, o etano e suas variedades insaturadas (com ligações carbono-carbono duplas e triplas, como o eteno), e podemos aqui colocar o propano e os butanos e suas já variadas geometrias, até os hidrocarbonetos frágeis de 20 ou mais carbonos, as diversas cadeias cíclicas, os aromáticos mais variados, sem falar dos compostos heterocíclicos, com enxofre, nitrogênio e oxigênio, que não apresentam evidência alguma de se formarem em altas temperaturas, em ambiente geológico “puro e simples”. Logo, dizer “hidrocarboneto” é, se estrito, afirmar algo até perigoso quando se tenta tratar o que seja petróleo.
A primeira evidência que encontra-se é, naturalmente, que o petróleo é a base de cadeias de carbono longas e complexas, muito parecidas com as produzidas pela vida. A segunda é que porfirinas [NOTA 2], encontradas em coisas vivas, são encontradas em depósitos de petróleo quando perfurados. As porfirinas não podem sobreviver a temperaturas de mais de cerca de 200° C, comuns nas profundezas abaixo da superfície da Terra. [1][2]
Estrutura básica das porfiniras (withfriendship.com).
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Matérias - Autor: Francisco Quiumento Na maioria das vezes, quando realmente se busca a composição química de óleos brutos de petróleo, encontram-se biomarcadores. Entre estes, espécies químicas chamadas hopanos e fitanos e ainda outros [NOTA 3]. Estes compostos químicos podem ser atribuídos diretamente a, digamos, os lipídios que compõem as membranas das células de cianobactérias se (e somente essas membranas), ou para a cera que reveste as folhas de uma árvore extinta da Tasmânia e os fósseis das mesmas folhas são encontrados 100 km afastados em carvão de mesma idade. Devo aqui acrescentar também o arqueol [NOTA 4][3][4][5][6].
negar-se isto tem-se de apresentar boas explanações para as seguintes observações: 1. A quase universal associação de petróleo com rochas sedimentares. 2. A ligação íntima entre reservatórios de petróleo e rochas geradoras como evidenciado pelos biomarcadores (as rochas geradoras contém os mesmos marcadores orgânicos que o petróleo, ao ponto de serem como impressões digitais que associam, mesmo quando em afastamento por migração, um ao outro).
Uma evidência muito importante é o fato da maioria do petróleo ocorrer em/ou perto de rochas sedimen- 3. A variação consistente de biomarcadores no petróleo de acordo com a história da vida na Terra tares de origem marinha. Se o óleo estava migrando (biomarcadores indicam as plantas terrestres que das profundezas da crosta, seria de se esperar que tal eram encontradas somente no Devoniano e rochas ocorresse perto de linhas de falhas nas rochas ígneas. jovens, que formaram-se pelo plancton marinho O afloramento costeiro, um fenômeno associado a somente no Neoproterozoico e rochas mais jovens, grande parte da hipótese de formação de óleo biótico, os óleos mais velhos contém somente biomarcadoincorpora grandes quantidades de fósforo nas camares de bactérias). das de plâncton marinho morto que o produz, cria, mais do que no oceano em geral. Assim, se encontra 4. A ligação íntima entre os biomarcadores na rocha geradoras e o ambiente deposicional (rochas petróleo com teor de fósforo muito alto em lugares geradoras contendo biomarcadores de plantas como Califórnia e Montana, que antes eram costas [7] terrestres são encontradas somente em sedimen[8]. tos terrestres e de bacias marinhas, o que indica Retornando o tema “estruturas”, e tal é decisivo, a escondições marinhas somente em sedimentos trutura molecular de hidrocarbonetos, e exatamente marinhos, aqueles de lagos hipersalinos contendo os mais complexos, muitas vezes estão diretamente somente marcadores bacterianos). relacionados com pigmentos, clorofila, ceras de folhas, etc, de espécies que a biologia e a paleontologia nos 5. A destruição progressiva de óleo quando aquecido acima de 100°C (negando a formação e/ou migdizem que foram dominantes nesses lugares durante ração em altas temperaturas como afirmado pelo os tempos nos quais o petróleo formou-se [9]. postulado abiogênico). Por ‘n’ caminhos, conclui-se que o óleo que temos utilizado para gerar energia e produzir derivados no 6. A produção de petróleo do querogênio pelo aquecimento em laboratório (completa e com biomarcanosso mundo é um combustível fóssil. Enquanto uma dores), como sugerido pela teoria biogênica [10] origem abiótica tem sido proposta por vários geólogos [11]. notáveis, há coisas que tornam isto improvável.
Alguns argumentos contrários à hipótese 7. O forte enriquecimento de C12 do petróleo é um indicativo de fracionamento biológico (nenhum abiótica. Os fatos acerca da teoria da origem abiótica do petróleo tem zero credibilidade para questões econômicas, e convenhamos que poucas coisas apresentam mais interesse econômico no mundo que a produção de petróleo. Estima-se que 99,9999% dos hidrocarbonetos líquidos no mundo são produzidos pela maturação de matéria orgânica derivada de organismos. Para
processo inorgânico pode causar algo como o fracionamento de carbono “leve”, como visto no petróleo). Em outras palavras, o C14 nas formas de vida fixa-se em suas espécies químicas, e decai após a morte dos seres vivos, pois é produzido na atmosfera a partir de N14 e absorvido na cadeia alimentar (inicialmente, pela fotossíntese). O C13 e C14 de diamantes e grafita, assim como em carvão
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Matérias - Autor: Francisco Quiumento mineral, por exemplo, é produto de transmutação por contato com material radioativo, e não relaciona-se com a cadeia alimentar [12].
9. A quase completa ausência de ocorrência significativa de petróleo em rochas ígneas e metamórficas (com raras exceções que se discutirá adiante).
Uma curiosidade: a argumentação dos criacionistas é que C14 nos diamantes prova a “Terra Jovem” [NOTA 5][13]. Assim, este tipo de argumento, pelo seu contrário, é péssimo para os defensores do petróleo abiótico.
As provas geralmente citadas em favor de petróleo abiogênica podem ser melhor explicadas pela hipótese biogênica, como por exemplo:
8. A localização dos reservatórios de petróleo abaixo do gradiente hidráulico da rocha geradora em muitos casos (aqueles que não estão em áreas onde há clara evidência de migração posterior pelo tectonismo).
10. Traços raros de pirobetumes que passaram por “cozimento” em rochas ígneas (melhor explicados pela reação com áreas de rochas ricas em orgânicos, com o qual os pirobetumes geralmente podem estar associados).
Aqui, é conveniente se entender o que sejam “trapas”, no jargão da indústria do petróleo e na geologia que permite sua obtenção.
Como exemplo clássico, os campos de óleo de Badejo e Linguado, situados na porção sul da Bacia de Campos, produzem óleo a partir de basaltos fraturados da Formação Cabiúnas, mas sua origem é de outro depósito sedimentar [14].
Exemplos de trapas (Taioli, 2000) - www.cprm.gov.br
PLANETA TERRA - Versão para Retardados - forum.jogos.uol.com.br
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Matérias - Autor: Francisco Quiumento 11. Traços raros de pirobetumes que passaram por “cozimento” em rochas metamórficas (melhor explicados pelo metamorfismos de carbonetos residuais no protolito). 12. A ocorrência muito rara de pequenas acumulações de hidrocarbonetos em rochas ígneas ou metamórficas (em todos os casos são adjacentes a rochas sedimentares ricas em orgânicos, às quais os hidrocarbonetos podem ser associados através de biomarcadores). 13. A presença de gases indubitavelmente derivados do manto (tais como o He e algum CO2) em alguns gases naturais (não há nenhuma razão para que as acumulações de gás devam ser tidas de uma única fonte, dado que alguns campos de petróleo são de origem mista, é inevitável que alguma contaminação de gás do manto em hidrocarbonetos biogênicos ocorrerá sob algumas circunstâncias). 14. A presença de traços de hidrocarbonetos em poços profundos em rochas cristalinas (estes podem ser formados por uma variedade de processos, incluindo síntese metamórfica pela reação de FischerTropsch, ou de matéria orgânica residual como em 11). 15. Traços de gases hidrocarbonetos em voláteis de magma (na maioria dos casos, magmas ascendem através da sucessão sedimentar, e qualquer matéria orgânica presente sofrerá “craqueamento” térmico e alguns serão incorporados à fase volátil, alguma síntese Fischer-Tropsch também pode ocorrer). 16. Traços de gases hidrocarbonetos em cristas oceânicas (tais vestígios não são surpreendentes uma vez que o manto superior tenha sido contaminado com matéria orgânica biogênica através de vários bilhões de anos de subducção, a resposta à questão 15 pode ser aplicada também neste caso). A evidência geológica é totalmente contra o postulado abiogênico. Elaborado e desenvolvido basicamente a partir de texto de Jon Clarke e outros, disponível em longo conjunto de correspondências em: http://www.oilempire. us/abiotic.html Continuaremos...
Notas [NOTA 1] A reação de Fischer-Tropsch, que dá origem ao processo industrial de mesmo nome, é uma reaçao na qual hidrocarbonetos são produzidos a partir de gases, como o monóxido de carbono e o hidrogênio. http://pt.wikipedia.org/wiki/Processo_de_FischerTropsch [NOTA 2] Para conhecer esta família de substâncias: http://en.wikipedia.org/wiki/Porphyrin [NOTA 3] Para mais informações sobre tais espécies químicas: http://en.wikipedia.org/wiki/Hopanoids http://en.wikipedia.org/wiki/Phytane [NOTA 4] Arqueol, substância típica das primitivíssimas bactérias Archaea http://en.wikipedia.org/wiki/Archaeol [NOTA 5] Um debate interessante sobre o tema: http://www.scienceforums.net/topic/34531-problemwith-carbon-14-radiometric-dating/
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Matérias - Autor: Francisco Quiumento roleum&source=bl&ots=EUZh2QCXBY&sig=nMx_ mf_8SufHxkj0PH_X6NMk7fU&hl=pt-BR&ei=aBOGTvfr LunksQK0q8WfDw&sa=X&oi=book_result&ct=result& resnum=3&ved=0CDEQ6AEwAg#v=onepage&q=Hopa noids%20petroleum&f=false
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Sobre o Autor: Francisco Quiumento é Engenheiro Químico, Consultor de Empresas, divulgador científico e um cruzado contra mitos e distorções de fatos. x
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Ceticismo Colunas - Ceticismo
Ufologia: Análise Através da Navalha de Occam
importante a se entender é a direção que ela passaria (Noroeste para Sudeste) e que ela se pareceria com Não é incomum que pessoas vejam “coisas” no céu, uma estrela bastante brilhante (para referência, Vênus, as quais não consigam identificar imediatamente, ou que é a “estrela” mais brilhante de nosso céu, alcança mesmo depois, com maiores análises. Às vezes o ob- um máximo de cerca de -4,6 de magnitude). Quanto jeto está tão alto no céu que não se pode ver mais do menor o valor da magnitude, mais visível o objeto é. que um “ponto de luz”. Pois bem... Tendo a previsão, saímos para o jardim Para designar tais objetos foi criada uma expressão de casa uns 4 minutos antes do horário previsto. E aí que, depois, virou acrônimo. Falo da expressão “Ob- aconteceu o evento que quero explicar: uns 2 ou 3 mijetos Voadores Não Identificados” e de seu acrônimo nutos antes da hora em que a ISS apareceria, apareceu OVNI. Não há nada de mais em tais palavras, por mais outra luz no céu. Com a mesma magnitude com a qual que pessoas simples e sem conhecimento as associem a ISS apareceria, talvez um pouco mais brilhante, cona “ETs visitando a Terra”, “naves extraterrestres”, etc. tudo com uma luz amarelada e vindo de Nordeste para Aliás, a comunidade científica deveria utilizá-las mais, Oeste (ou seja, numa direção diferente). até mesmo para desmistificá-las. Como o objeto passou no céu com uma velocidade Sobre visões de OVNIs em si, o que acontece, basica- comparável com a da ISS, minha primeira hipótese foi mente, é que a pessoa se surpreende a tal ponto que a de que seria outro satélite. Contudo, após verificar acaba se fechando a qualquer explicação racional que no Heavens Above, vi que não era o caso. seja dada ao evento. Mas ver coisas e não conseguir identificá-las é algo normal, faz parte da própria natu- O que seria, então, o objeto que gerou tal visão? Minha reza humana. Somos falíveis, por mais que não goste- conclusão é de que não passava de um balão, como este da imagem abaixo. mos de reconhecer isto.
Introdução
Por consequência desta surpresa, as pessoas se entusiasmam com o mundo da pseudociência chamada ufologia. Mas isto é natural, afinal a sociedade nega que tais coisas existam, nega até mesmo que o engano possa acontecer, assim, ao vê-las, as pessoas realmente perdem o chão. Mas não precisa ser sempre assim. Basta que haja um mínimo de conhecimento para que a pessoa busque explicações, ao invés de simplesmente se jogar na crença ao ter tal visão. Para exemplificar isto, vou contar uma experiência pessoal que eu e meus pais tivemos.
A experiência pessoal Não lembro exatamente a data que isto aconteceu, mas no início de julho entrei no site Heavens Above para ver as previsões de passagens visíveis da ISS para a minha região e vi que teria uma passagem para aquele dia. A ISS passaria vinda aproximadamente de Noroeste para Sudeste, com uma magnitude de cerca de -2.5.
Isto significa que era realmente um balão? Não poderia ser outra coisa? Quem sabe uma “nave extraterrestre”? Bem... De fato, pode ter sido qualquer coisa. Então como eu posso afirmar ser um balão? É aí que entra o conceito científico chamado Navalha de Occam.
Sobre como fazer para ver as previsões, o significado Vou explicar como a coisa funciona. Basicamente o que da magnitude, etc, não há grande importância aqui. O fazemos é listar as hipóteses, ver quais delas se encaiRevista Livre Pensamento - Número 2
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Colunas - Ceticismo xam ao ocorrido e, então, optamos pela mais fácil de ocorrer. Façamos isto com o caso que citei acima, para que a coisa possa ficar mais clara.
mal, é extremamente difícil ETs não existirem e podem até mesmo existir civilizações mais avançadas do que a nossa, com “naves brilhantes” voando pela galáxia. Apenas não temos evidências disto. Ainda assim, de pronto, não posso descartar esta hipótese. • Um balão
As hipóteses • Algum satélite artificial (criado pelo homem) Verifiquei no Heavens Above, como disse anteriormente, e não havia previsão da passagem de um satélite para aquele dia e horário, com direção e magnitude comparáveis. Portanto, esta hipótese está descartada.
Dependendo da cor do papel usado para a construção do balão, poderia ter a exata aparência do objeto que vimos. Não reparei quanto ao vento naquele momento, mas não havia nada de errado com a velocidade ou a forma como o objeto se movia, de forma que eu pudesse descartar esta hipótese.
• Um asteróide Existe o Projeto NEOS, que procura por objetos (asteróides e cometas) próximos à Terra e sempre notifica quando um vá se aproximar tanto assim. E, para ser o caso, o asteróide teria de estar bem longe, devido à velocidade, e precisaria ser bastante grande, devido à magnitude aparente. Mas não houve notificação alguma, tanto anterior, quanto posterior ao ocorrido, para aquela data. Hipótese descartada. • Um avião, helicóptero ou algum outro meio de transporte aéreo Para ser o caso, tal objeto teria de ter certas luzes, de certas cores. Mesmo em um avião passando em grandes altitudes tais luzes ficam visíveis. E não era o caso. O objeto não tinha nenhuma destas luzes, era apenas uma “luz amarelada se movendo”. Isto, claro, para não se falar sobre o som: qualquer veículo aéreo faz som (afinal tem um motor) e o objeto não emitia qualquer ruído. A hipótese também não se encaixa, portanto também está descartada. • Uma nave extraterrestre Bem... Por mais que pessoas aleguem ter visto ETs e suas naves, o fato é que nunca houve um registro fiel, que pudesse ser analisado cientificamente, de tais coisas. Não me entenda
Avaliando as hipóteses No final, o que temos são duas hipóteses válidas: nave extraterrestre ou balão. Devo admitir que poderia ser o caso de uma nave extraterrestre, sabe-se lá. Da mesma forma que não tenho elementos para afirmar que era, também não tenho elementos para afirmar que não era. Simplesmente não tenho elementos sobre a aparência, velocidade, forma de se mover, etc. de naves extraterrestres. Não há evidência alguma que suporte qualquer consideração sobre o tema. Já quanto a balões, sabemos que eles existem. Basta fazer uma simples pesquisa no Google para conseguir evidências suficientes para isto. Há casos, inclusive confirmados pelo Corpo de Bombeiros, de balões que caíram e causaram incêndios, por exemplo. Como evidência anedótica, eu mesmo já vi balões sendo soltos, quando criança. E então, como resolver isto? Balão ou nave extraterrestre? Bem... O que é mais fácil? Uma nave extraterrestre, vinda dos confins da Via Láctea, dar uma passadinha sobre minha cabeça, sobre minha casa, ou alguém ter soltado um balão aqui por perto e eu tê-lo visto? Mesmo não podendo afirmar que a hipótese de nave extraterrestre seja impossível, posso afirmar que é
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Colunas - Ceticismo bem mais fácil que tenha sido um balão. É aí que entra a Navalha de Occam: “Se em tudo o mais forem idênticas as várias explicações de um fenômeno, a mais simples é a melhor.” – William de Ockham Por isto posso concluir que se tratava de um balão, nada além disto.
“Os seres humanos podem ansiar pela certeza absoluta; podem aspirar a alcançá-la; podem fingir, como fazem os partidários de certas religiões, que a atingiram. Mas a história da ciência ensina que o máximo que podemos esperar é um aperfeiçoamento sucessivo de nosso entendimento, um aprendizado por meio de nossos erros, uma abordagem assintóica do Universo, mas com a condição de que a certeza absoluta sempre nos escapará.” – Carl Sagan
Conclusão
“Quer dizer que a ciência é só isto? É só fazer as coisas A verdade é que nem tudo temos como descobrir, funcionarem e a realidade que se dane?” Não. O pondesmistificar, entender em 100%. No caso deste obje- to é que se você for analisar simplesmente “o que é” to que eu e meus pais vimos, a única forma de se ter a realidade, filosoficamente, você enlouquece. Não há certeza sobre o que era seria voando até ele, de forma como saber sequer se existimos de verdade, a não ser a vê-lo de perto, tirar uma amostra dele para futuras pelo fato de pensarmos. análises, etc. Mas a verdade é que isto não é necessá“Eu duvido, logo penso, logo existo.” rio. Mesmo não tendo como “voar até ele” podemos, – René Descartes sim, chegar a conclusões sobre a sua natureza. A função da ciência é descortinar a verdade, contudo, Mais do que isto, conclusões assim são tiradas diaria- só conseguimos isto através do tempo. Através da semente na ciência. Por exemplo, não podemos voltar 14 quência de trabalhos que vão se acumulando sobre o bilhões de anos no tempo para ver como foi, de fato, mesmo tema, um depois do outro, cada um apontano início do universo. O que podemos fazer é estudar do um aspecto novo, uma nova evidência, um ponto como ele é hoje, como ele se desenvolve e evolui, para, que escapa da curva. Pois é só assim que corrigimos com isto, criar modelos matemáticos para tentar expli- nossas teorias, nossos modelos matemáticos. É, verdacar como ele surgiu. E, claro, procurar evidências disto. deiramente, errando que se aprende. O mesmo se aplica a colisões no espaço, e à colisão que gerou a nossa Lua, por exemplo. Não temos como voltar no tempo para ver Theia colidindo com a Terra e, como resultado, a Lua se formando. Mas podemos propor modelos matemáticos e, nestes casos (que são menos complexos), até simulá-los em computador. Pode parecer estranho para quem não tem familiaridade com a ciência, mas o importante não é encontrar as respostas absolutas, indiscutíveis, mas sim as perguntas corretas. Porque é só a partir delas que conseguiremos chegar às respostas válidas. “Toda a nossa ciência, comparada com a realidade, é primitiva e infantil - e, no entanto, é a coisa mais preciosa que temos.” – Albert Einstein O importante na ciência é que a coisa funcione. No caso do objeto que vimos, a explicação do balão se aplica, funciona no caso? Se sim, então a explicação é suficiente. A mesma coisa se aplica, por exemplo, à fabricação de aviões: o importante é que eles funcionem, isto é, voem, sendo indiferente se a explicação dada realmente retrata a realidade de forma fidedigna, absoluta.
“A Ciência é a melhor ferramenta já criada para entendermos como o mundo funciona.” – Michael Shermer Observação: o texto é baseada numa experiência pessoal minha e tais tipos de experiências não valem como evidências. É a chamada “evidência anedótica”, sobre a qual falarei em outro texto.
Sobre o Autor: Mário César Mancinelli de Araújo é um apaixonado por ciências em geral, que adora pesquisar a ufologia (com uma visão científica/cética). É formando em Ciência da Computação e pretende fazer mestrado em Inteligência Artificial. Pretende ainda se formar em astronomia ou astrobiologia. Blog: agloriousdawn.livrespensadores.org
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Educação Colunas - Educação
Cripto medievalismo tardio Por Wagner Kirmse Caldas1
1. VENHA A NÓS O VOSSO MEDIEVALISMO
“Do lado de fora da abadia, ao longo dos arredores de Westminster, uma multidão de curiosos se acotovelava para ver passar a procissão do casamento real. O ‘sim’ da então plebeia ao príncipe foi dito e, então, trocaram alianças. Os noivos deixaram a Abadia em uma carruagem aberta até o palácio, seguidos em cortejo por outras carruagens que transportavam a rainha, e outros membros da monarquia”. Lido assim, sem contexto, parece-nos mais um dos belos contos de fada, onde a menina da vila encontra seu príncipe encantado. Nada como os retratos literários da idade média, com reinados floreados nas histórias, belas princesas e príncipes em corcéis brancos. Mas, ao adicionarmos os nomes de Kate e William, descobrimos que essa descrição se passa no século XXI, em um país de primeiro mundo, o qual ainda não abandonou o medievalismo e sustenta, à custa do povo, uma família real que não governa e tem apenas papel social e de relações internacionais. Esse texto, que foi extraído do portal G1, de 29 de abril de 2011, é um claro exemplo de medievalismo tardio vivenciado no ocidente dos anos dois mil. Entretanto, tal exórdio só tem a função de nos aproximar do tema deste excerto, que é problematizar as formas como esse medievalismo tardio está presente no mundo ocidental e, principalmente, em nosso país. Não temos reis, príncipes ou outra forma de dominação monárquica, mas, vivemos, como outras partes do mundo, sobre uma forma de poder que dividia, a partir da idade média, com as monarquias o controle sobre o corpo e a mente das pessoas: a religião. Poder-se-ia dizer, que vivemos um cripto (oculto “EJ”) medievalismo tardio no Brasil, dado que alguns grupos religiosos entendem que sua forma de pensar é moralmente mais correta que a de outros grupos, não reconhecendo o fato de que cada pessoa conduz seu pensamento por caminhos diversos, como diria Descartes (2006, p.29): o poder de bem julgar e distinguir o verdadeiro do falso, que é exatamente o chamado bom sendo ou razão, é, naturalmente, igual em todos os ho1
Aluno do Doutorado em Educação do PPGE/UFES (2011).
mens, do que resulta que a diversidade de opiniões existe, não porque uns são mais sensatos que outros, mas, somente por conduzirmos nossos pensamentos por diversos caminhos e não considerarmos as mesmas coisas.
Desde a proclamação da república, em 15 de novembro de 1889, demos adeus à monarquia e sua representatividade. O Brasil desligou-se desse vínculo medieval e passou a tratar-se como uma república federativa. Porém, o país ainda era um país católico, pois, como nos diz Moraes (2004, p.215): A constituição de 25-3-1824 previa, em seu artigo 5º, que a ‘religião Catholica Apostólica Romana continuará a ser a religião do Império. Todas as outras Religiões são permitidas com seu culto doméstico ou particular, em casas para isso destinadas, sem forma exterior de templo’. Somente “com o advento da primeira Constituição da República, o Brasil passou a ser um Estado laico e a consagrar ampla liberdade de crença e cultos religiosos” (MORAES, 2004, p.215). O DECRETO Nº 119-A, de 7 de janeiro de 1890, em seu Art.1º diz: “ É prohibido á autoridade federal, assim como á dos Estados federados, expedir leis, regulamentos, ou actos administrativos, estabelecendo alguma religião, ou vedando-a, e crear differenças entre os habitantes do paiz, ou nos serviços sustentados á custa do orçamento, por motivo de crenças, ou opiniões philosophicas ou religiosas. Este Decreto foi reafirmado na Constituição de 1891, em seu Art. 72, parágrafo 7º: “Nenhum culto ou igreja gozará de subvenção oficial, nem terá relações de dependência ou aliança com o Governo da União ou dos Estados”. A Constituição de 1934, por sua vez, em seu Art. 17, item II, diz que “É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: [...] estabelecer, subvencionar ou embaraçar o exercício de cultos religiosos”. Texto que foi repetido na Constituição de 1937, em seu Art. 32, alínea b, na constituição de 1946, em seu Art. 31, item II, na Constituição de 1967, em seu Art 9º, item II é repetido e ampliado, dizendo que:
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Colunas - Educação É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: [...] estabelecer cultos religiosos ou igrejas; subvencioná-los; embaraçar-lhes o exercício; ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada a colaboração de Interesse público, notadamente nos setores educacional, assistencial e hospitalar;
dos cristãos. A existência das indulgências é justificada pelo entendimento que o perdão obtido pela confissão não é a eliminação das penas temporais, sendo necessária a obtenção de indulgências e das práticas de “boas obras” a fim de resguardar-se do pecado cometido. Porém, em alguns casos, essas indulgências eram vendidas de forma desonesta e contrárias aos preceitos da religião, havendo abusos por parte de algumas pessoas, que as vendiam em benefícios financeiros Essa intenção é mantida na Constituição de 1988, em próprios, sob o mote que “assim que uma moeda tilseu Art. 19, item I: inta no cofre, uma alma sai do purgatório” (AZEVEDO, 2007, p.143). É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: [...] estabelecer cultos religio- Atualmente, algumas igrejas promovem uma ideia sos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o moderna das indulgências. Os fiéis devem contribuir funcionamento ou manter com eles ou seus rep- mensalmente com aquilo que chama dízimo, o qual se resentantes relações de dependência ou aliança, refere há 10% das receitas das pessoas, seja de salário, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de in- prestação de serviços ou qualquer outra forma pela teresse público; qual a pessoa gera sua subsistência. Esse tipo de cobrança é entendido como uma obrigação daquele que Mas, onde está essa laicidade? Ao longo desse texto, professa aquela fé, pois, está determinado em seu livro vamos discorrer sobre o assunto, bem como abordar religioso. outros aspectos onde a religião exerce seu “poder” e “vontade”. Ocorre, porém, que, esse dízimo é incentivado pela certeza da “graça”, ou seja, aquele que dá com fé, será agraciado com a materialização de suas orações e pe2. A RELIGIÃO NOSSA, DE CADA DIA, NOS didos pelo deus daquela religião. Ora, se considerarmos que existem as probabilidades de ocorrência e DAI HOJE não ocorrência há um equilíbrio entre as chances de A religião se manifesta de várias formas em nosso ocorrer ou não ocorrer a providência esperada. meio, para além de seu aspecto que visa cuidar de um Acontece que o ardil de certos líderes religiosos transhipotético lado espiritual. formam “vitória” e “derrota” sempre em sucesso da A igreja, para além de se ocupar com aquilo que lhe igreja. Se o fiel obtiver aquilo que pediu, isto foi fruto é confiado, abusa, em algumas religiões, do con- do pagamento de seu dízimo e de sua fé; se não obtistrangimento pessoal, do enriquecimento ilícito e da ver, a culpa é da pouca fé do indivíduo ou dízimo dado cobrança de doações de forma abusiva e criminosa, (a) contragosto. transformando o ato da doação voluntária em novo pagamento de indulgências. Ela, ainda, opina no currículo das escolas públicas; cuida de se ocupar da política do país, tentando influenciar o voto de seus seguidores a partir do conformismo do candidato com sua filosofia; interfere nas decisões das políticas públicas; opina na forma como a ciência deve trabalhar; e impõe seus dogmas aos fiéis criando (a) eles risco de vida, através de sua representatividade no poder.
Os constrangimentos tomam vieses ainda mais cruéis, quando as pessoas são conclamadas (a) doar uma moedinha que seja, e, caso a pessoa não a tenha, que o “irmão” ao lado, possa emprestar a moeda para que o outro não fique sem doar e, consequentemente, sem a benção. Essa idéia da graça pela doação é oriunda da teologia da prosperidade, onde se entende que uma pessoa crente deve ter uma vida abastada, como prova de sua fidelidade ao seu deus.
3. VENHA A NÓS AS NOVAS INDULGÊNCIAS Podemos assistir, nas redes de televisão controladas Originalmente, a indulgência é compreensão de que era possível a eliminação parcial ou total dos pecados
pelas igrejas, inúmeras campanhas de doação, como a “semente do aluguel”, proposta pelo Pr. Silas Malafaia, para que o contribuinte possa receber como benção
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Colunas - Educação a casa própria. A campanha consistia do “fiel” contribuir com o valor de seu aluguel, dividido em 10 vezes, e doado em parcelas. Assim, deus iria retribuir o ato de fé, contemplando o doador com sua casa própria. Um engodo engendrado por pastores espertalhões, que abusam da boa vontade e da ingenuidade de pessoas simples, em prol de seu enriquecimento ilícito e acúmulo de riquezas para a igreja. Esta, sim, vive uma teologia da prosperidade, em seu aspecto mais questionável.
4. ENSINO RELIGIOSO QUE ESTAIS NAS ESCOLAS PÚBLICAS Conforme já foi mencionado, o Brasil é um país laico, portanto, não deve professar nenhum tipo de ideologia religiosa, porém, nem tampouco negá-las o direito de serem expressas em seus locais apropriados. Ocorre que o dispositivo do ensino religioso é mencionado como disciplina escolar na Constituição de 1988, em seu art. 210, § 1º: “O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental”. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (lei nº 9.394/96), originalmente, trazia o seguinte texto em seu art. 33:
componente curricular. Esta disciplina poderia ser ocupada por outra, a qual realmente pudesse ser útil para a formação acadêmica do indivíduo, porém, esta carga horária é subtraída em favor do ensino religioso. (Outrossim), na redação inicial, registrava-se algo de positivo, que é o trecho que diz que o ensino religioso deve ser “oferecido, sem ônus para os cofres públicos”. Como é de se imaginar, o cripto medievalismo tardio não deixaria isso passar de forma ilesa. As autoridades religiosas, principalmente representantes da igreja católica, pressionaram o Governo, e fizeram com que o mesmo alterasse a redação a partir da lei nº 9.475/97, onde o art. 33 passou a ter a seguinte redação: O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural e religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. § 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores. § 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso.
Mais um absurdo, em um país laico, pois, o ensino religioso passa a ser bancado pelos cofres públicos, sem se pensar na população que não professa nenhuma religião e deverá contribuir para que se opere esse ato inconstitucional, dado que na Constituição de 1988, em seu art. 19, item I, é clara a instrução de que o Estado não deve subvencionar nenhum tipo de fé. Como I – confessional, de acordo com a opção religiosa alteração positiva, vale destacar o trecho que diz que do aluno ou do seu responsável, ministrado por deve ser assegurado “o respeito à diversidade culturprofessores ou orientadores religiosos preparados al e religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de e credenciados pelas respectivas igrejas ou enti- proselitismo”. Dessa forma, não deveria haver o constrangimento de determinada religião fixar seus alicdades religiosas; ou erces dentro do ensino público, postulando-se como II – interconfessional, resultante de acordo entre religião oficial daquela região. as diversas entidades religiosas, que se responsabilizarão pela elaboração do respectivo pro- Porém, sob o aspecto do estado laico, a Lei 9.475/97, grama. traz um trecho polêmico, quando diz que “o ensino religioso [...] é parte integrante da formação básica do Demonstrando a possibilidade da existência do en- cidadão”. Desde quando, sobre a perspectiva da laicisino religioso como disciplina curricular, facultativa, dade, o ensino religioso deve ser entendido como fornas escolas públicas. Ora, o que não é vislumbrado é mação básica do cidadão? Esse extrato é justamente o prejuízo dos alunos que a nela não se matriculem, contrário ao princípio do “respeito à diversidade culpois, estão perdendo, semanalmente, o direito à um tural e religiosa do Brasil”, pois, ao entender que esse O ensino religioso, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, sendo oferecido, sem ônus para os cofres públicos, de acordo com as preferências manifestadas pelos alunos ou por seus responsáveis, em caráter:
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Colunas - Educação componente curricular deve fazer parte da formação do cidadão, o Estado desconsidera a porcentagem dos cidadãos que não professa nenhuma fé e que merecem respeito, ao invés de serem considerados cidadãos incompletos, dado seu desinteresse por um componente de “formação básica do cidadão”. Assim, estabelece-se, em um ambiente público, um assunto que devia ser tratado em recinto privado, como as igrejas, mesquitas, templos e locais de adoração. À escola, deve caber o princípio da educação laica acadêmica, sem ser permeada e/ou censurada por olhares religiosos, os quais, jamais, conseguirão concentrar a ideologia das totalidades, pois, são a crença de determinados grupos e não uma unanimidade. Porém, Todorov (2008, p. 72) nos explica o porquê dessa intenção, quando diz:
Porém, esse impacto não foi sentido d’além mar. Observamos, por exemplo, a presença de vários símbolos religiosos em repartições públicas, tribunais de justiça e outros espaços públicos. Por um lado, temos o Ministério Público (como o de São Paulo) que ajuíza ações para a retirada desses símbolos, e do outro a CNBB, na figura de Dom Geraldo, que defende a manutenção, pois, alega que a história do Brasil é muito ligada à religião, alegando que a permanência dos símbolos religiosos é uma demonstração de “tolerância religiosa” pelas pessoas de “outros credos”, conforme podemos ver na publicação da “Gazetaonline”, de 23 de agosto de 2009.
Mas, o que dizer da Constituição em relação a isso? A tradição é maior que a Lei magna da nação? Devemos nos ater ao simbolismo ao invés da legislação? Onde o clérigo aponta “tolerância” seria possível vermos Controlando a escola, transforma a instrução, que ela refletida se, em prédios públicos fossem adotados supostamente deveria trazer a liberação, em fer- como costume bater a cabeça no gongá2 ou beijar a ramenta de uma submissão ainda maior. Ele apre- mezuzá3? senta como dogmas imutáveis ou, pior, verdades científicas, as últimas decisões políticas. Ainda nos dias de hoje, a igreja exerce um forte poder na opinião pública, principalmente quando se trata de política.
5. POLÍTICA E RELIGIÃO, PERDOAI AS Nas últimas eleições, houve um cabo de guerra entre situação e oposição, na busca do apoio da igreja. Os NOSSAS OFENSAS No passado, a partir da legitimação do cristianismo, pelo Édito de Milão em 313; da conversão do imperador Constantino; e pela proclamação como religião oficial de Roma, em 392, pelo imperador Teodósio I; a igreja passou a exercer um poder direto nos governos e no mundo ocidental. Mesmo com a queda do último imperador romano, deposto pelo bárbaro Odoacro, em 476, a igreja permaneceu (em) sua posição de poder na Europa Ocidental, e, a partir da Idade Média, também manteve o poder intelectual, através da vida monástica. Durante a Idade Média esse poder se fortaleceu. A Igreja mantinha uma estreita relação com a monarquia, além de demonstrar sua influência com o incentivo às Cruzadas e o uso da Inquisição para punir aqueles que se mostravam contrários à fé cristã. Segundo Todorov (2008, p.66): “A partir do momento em que o imperador Constantino impôs o cristianismo como religião de Estado, no século IV, a tentação de apoderar-se de todos os poderes de uma vez revelou-se”. Esse poder teve uma queda acentuada com o crescimento do movimento Iluminista em algumas nações.
principais temas foram o casamento entre pessoas do mesmo sexo e o aborto. Os candidatos que dessem a entender que eram favoráveis a esses temas sofriam o ataque dos religiosos fundamentalistas.
Chegou-se ao ponto da atual presidente, Dilma Roussef, ser conclamada a manifestar seu “ponto de vista religioso”, para que se estabelecesse um diálogo com a igreja, conforme as palavras de dom João Braz de Aviz: “Não temos uma ideia clara de quem é Dilma do ponto de vista religioso. Ela precisa explicar melhor as suas convicções religiosas para que o diálogo possa progredir”, em entrevista à Folha de São Paulo, no dia 19 de janeiro de 2011. Durante as eleições, a candidata teve que se explicar e contrariar o que era dito de sua pessoa, conforme a 2 Gongá é a denominação do altar, na umbanda e em alguns cultos afro heterodoxos.
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Mezuzá (do hebraico “ הזוזמumbral”) é o nome de um mandamento da Torá que ordena que seja afixado no umbral das portas um pequeno rolo de pergaminho (klaf) que contém as duas passagens da Torá que ordenam este mandamento, “Shemá” e “Vehaiá” (Deuteronômio 6:4-9 e 11:13-21). A mezuzá deve ser afixada no umbral direito de cada dependência do lar, sinagoga ou estabelecimento judaico como lembrança do criador. Deve ser posto a sete palmos de altura do chão, apontando para dentro do estabelecimento com a extremidade de cima. Os judeus costumam beijar a mezuzá toda a vez que se passa pela porta, para lembrar das orações que estão contidas ali dentro e os princípios do judaísmo que elas carregam.
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Colunas - Educação revista Veja, do dia 20 de setembro de 2010, que publicou:
pelo povo que, de antemão, “vende sua alma” a uma moral de perspectiva religiosa.
Dilma tentou agradar os religiosos de todas as formas. Disse ser contra o aborto e delegou a responsabilidade por eventuais mudanças na legislação sobre o assunto ao Congresso Nacional. Ela também prometeu combater a gravidez precoce, a prostituição infantil e as drogas.
Não bastasse isso, a autoridade católica máxima, o papa, de seu distante Vaticano, ainda resolve irromper com o que eu chamo de “abuso diplomático medieval”, ao dizer que o clero brasileiro “tem dever de emitir um julgamento moral, inclusive na política, quando assim exigem os direitos fundamentais da pessoa ou a salvação da alma” (NEVES, 2011).
Dilma reafirma esse compromisso e acrescenta a menção da defesa da família, que é outro “espinho na carne” dos religiosos, em carta aberta, divulgada no G1, no dia 15 de outubro de 2010: 2. Sou pessoalmente contra o aborto e defendo a manutenção da legislação atual sobre o assunto; 4. O PNDH3 é uma ampla carta de intenções, que incorporou itens do programa anterior. Está sendo revisto e, se eleita, não pretendo promover nenhuma iniciativa que afronte a família; Dessa forma, a candidata tenta provar aos eleitores cristãos suas intenções de manter o status quo inalterado, buscando tranquilizar e conquistar os votos destes. O candidato da oposição, por sua vez, recebeu o apoio declarado da Assembléia de Deus, conforme foi veiculado no “Terra Notícias”, em 30 de setembro de 2010:
Não bastasse os líderes religiosos brasileiros influenciarem nas eleições do país, o papa Joseph Ratzinger, propõe que o clero faça um tipo de “boca de urna”, dizendo ao católico em quem deve votar. Partindo de um entendimento que a indicação de um candidato por parte de um sacerdote, para o fiel, é algo que tem inspiração/anuência divina. Não seria um exagero imaginar que uma parte desses eleitores se sinta constrangida em tomar uma decisão contrária, pois, acreditam que o que fazem é conhecido aos olhos de seu deus, e votar diferente seria um ato de desobediência. Assim, estabelece-se, imageticamente, uma situação arcaica de “voto de cabresto divino”. Para além das eleições, as quais já apontam uma realidade longe da laicidade, temos ainda as chamadas “bancadas religiosas”, as quais se dividem em “bancada católica” e “bancada evangélica”. Ambas digladiam entre si em assuntos em que discordam diametralmente, porém, quando o tema lhes é simpático, unemse e influenciam grandemente nas decisões.
Integrantes da cúpula da Assembleia de Deus têm se reunido com o PSDB e já sinalizaram o apoio ao partido nestas eleições. Embora a candidata Recentemente essas bancadas conseguiram impedir do PV à presidência, Marina Silva, seja membro a distribuição do chamado “kit anti-homofobia4”, nas da igreja, a direção da Convenção Geral das Asescolas. A “Folha.com” do dia 24 de maio de 2011, traz sembleias de Deus do Brasil (CGADB) tem manio seguinte texto: festado discordâncias políticas com o programa do Partido Verde. A candidata passou a ser mal Segundo o deputado João Campos (PSDB-GO), o vista pelos religiosos quando não se posicionou ministro Fernando Haddad quebrou a palavra e diametralmente oposta ao aborto, tendo em vista decidiu distribuir o kit sem consultar os deputados que este é um posicionamento defendido pelos evangélicos e católicos como havia prometido. Os fiéis. deputados querem ainda uma CPI para investigar o Ministério da Educação. “Não se admite que um Essa negociação declarada com princípios religiosos, ministro minta para o parlamento e para a socieos quais estão além da moral social, pois, prescindem dade. Estamos propondo uma CPI para o Minisde um atestado divino de validade, batem de frente tério da Educação, são vários os fatores como com a ideia de laicidade, pois, subtende-se que os fufraude do Enem e agora a produção de material turos governantes devem estar validados por um tipo para induzir nossos filhos, utilizando a rede públide fé, no caso, a cristã. Essa ideia demarca um princípio ca, a serem homossexuais”, disse. de observância ilegal, dado que o Estado não pode O “kit de combate à homofobia nas escolas”, que teve sua produção “manter com eles ou seus representantes relações de 4 distribuição suspensas pela presidente Dilma Rousseff na manhã desta quartadependência ou aliança”. Ora, não é o Estado quem efeira, tinha como destino as escolas de Ensino Médio que optassem por receber o estabelece a aliança, mas, o representante escolhido material caso estivessem sofrendo situações de bullying entre seus alunos e alunas.
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Colunas - Educação Novamente os termos “evangélicos” e “católicos” aparecem, como se eles fossem os guardiões da boa moral e dos bons costumes da sociedade. Como arcanjos e suas espadas de fogo, protegem os brasileiros do mal. O deputado ainda traz, em seu discurso, a voz do preconceito e da ignorância, ao afirmar que a intenção do material (é) “induzir nossos filhos [...] a serem homossexuais”.
6. A RELIGIÃO, CIÊNCIA E SOCIEDADE, NÃO NOS DEIXEIS CAIR EM TENTAÇÃO Outro aspecto a ser observado é a tentativa de influência da religião na ciência, e o impacto de alguns de seus dogmas na sociedade. Porém, estas condutas não deveriam ser comuns em pleno século XXI, pois, essa etapa de uma ciência centrada na religiosidade já deveria ter sido superada, conforme nos diz Huhne (1994, p.79):
Não obstante, lutam com todas as forças para coibir qualquer esforço na direção do PL 1225, sustentandose no ataque, por entender que os religiosos estarão Uma cultura teocêntrica, própria da Idade Mésob a lei da mordaça, ao não poderem mais dizer que dia, com intelectuais vinculados exclusivamente à o homossexualismo é contrário às leis de seu deus e Igreja, é substituída por uma cultura antropocênque estas pessoas precisam mudar seu modo de vida. trica, humanista, sobretudo a partir do RenasciPorém, as bancadas religiosas vêm acenando com mento. Pensadores leigos, - não ligados à Igreja a possibilidade de apoiarem o PL 6418, que trata da – vão aos poucos ocupando o espaço dos padres criminalização da homofobia, porém, também protege na produção da cultura. os religiosos, como podemos ver nesse trecho do ProPodemos afirmar que essa substituição já se integraljeto de Lei: izou? Penso que não. Vejamos o exemplo da opinião CAPÍTULO I da Igreja com relação à produção de células-tronco embrionárias, segundo Luna (2008): DA DISPOSIÇÃO PRELIMINAR A Igreja Católica, em declaração emitida pela PonArt. 1º Serão punidos, na forma desta Lei, os tifícia Academia para a Vida, em agosto de 2000, crimes resultantes de discriminação e preconceiposicionou-se contra a produção de células-tronto de RAÇA, COR, RELIGIÃO, ORIENTAÇÃO SEXUco embrionárias, sua aquisição ou a manipulação AL, descendência ou origem nacional ou étnica. dessas células através da técnica de transferênParágrafo único: Para efeito desta Lei, entendecia nuclear para produção de tecidos compatíveis se por discriminação toda distinção, exclusão, com o doador, a chamada clonagem terapêutica. restrição ou preferência baseada em raça, cor, Em todos esses casos se estaria lesionando um religião, orientação sexual, descendência ou ori“indivíduo humano” com direito à vida desde a gem nacional ou étnica que tenha por objeto ou concepção. resultado anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício em igualdade de condições de Nesse sentido, o entendimento da igreja sobre a condireitos humanos e liberdades fundamentais nos cepção da vida é humana é contrária àquela entendida campos político, econômico, social, cultural ou em pela ciência. Entendendo que a “alma” do indivíduo é qualquer outro campo da vida pública. ligada materialmente no momento da fecundação do óvulo pelo espermatozóide. Ou seja, pune-se a homofobia, mas, excetua-se a religião, onde devem ser respeitados seus entendimen- Não obstante, esse tipo de interpretação e imposição tos sobre o assunto homossexualismo, os quais não dogmática é levada, pela igreja, até os centros de dedevem ser entendidos como crime de preconceito. cisão política do país, conforme mencionado por Luna (2008): A pergunta que não quer calar é: “onde está, afinal, a separação entre Estado e Religião”? Nas eleições de A presença de atores do campo religioso ou mani2010 podemos constatar que essa fronteira é tênue e festações de adesão religiosa, quer no debate que, cada vez mais, tende a desaparecer. científico, quer nas discussões referentes à formulação de leis, têm sido constantes quando o tema da pesquisa com células-tronco embrionárias vem à esfera pública mais ampla. 5 Este projeto intenciona alterar a lei nº 7.716, incluindo a discriminação por orientação sexual, e também a discriminação por gênero, identidade de gênero, e os preconceitos contra idosos e pessoas com deficiência.
Assim, nesse sentido, as várias religiões que são con-
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Colunas - Educação trárias a essas pesquisas, tem sua voz representada nas figuras das bancadas religiosas. Enquanto isso, milhares de pessoas, vítimas de vários tipos de doenças, aguardam que os avanços nas pesquisas nessa área avancem e lhes tragam as boas novas da salvação.
o o
Barreiras químicas: espermicidas; Medicamentos hormonais: pílulas anticoncepcionais (injeção, comprimidos, anovulatórios)
Esse tipo de proibição não é seguido, efetivamente, Para além do aspecto da “intromissão” na ciência, ai- por aqueles que professam a religião católica, porém, nda temos as recomendações da igreja católica sobre não se pode negar a possibilidade que essa instrução os métodos contraceptivos: faça com que algumas pessoas sigam esse modelo, gerando condições de vulnerabilidade social, quando, Em conformidade com estes pontos essenciais da por exemplo, famílias de baixa renda deixam de cuidar visão humana e cristã do matrimônio, devemos, do controle de natalidade por conta de dogmatismo uma vez mais, declarar que é absolutamente de imposto. Outrossim, tais proibições podem acarreexcluir, [...] a esterilização direta, quer perpétua tar problemas de saúde pública, como a proliferação quer temporária, tanto do homem como da mul- de doenças sexualmente transmissíveis, dado o deher. É, ainda, de excluir toda a ação que, ou em sestímulo à utilização de preservativos. previsão do ato conjugal, ou durante a sua realização, ou também durante o desenvolvimento Pensando, um pouco, fora dos muros da natalidade, das suas conseqüências naturais, se proponha, o que dizer a perspectiva de mortalidade imposta por como fim ou como meio, tornar impossível a pro- dogmas? Existem crenças, em pleno século XXI, que criação. (PAULO VI, 1968) proíbem que pessoas recebam o atendimento médico adequado, por estar em dissonância com sua interpreEssa recomendação é repetida no catecismo, em seu tação de um texto em seu livro sagrado. Mas, o que há artigo 2370: de mais “sagrado” que a vida humana? A continência periódica, os métodos de regulação da natalidade baseados na auto-observação e no recurso aos períodos infecudos(5) estão de acordo com os critérios objetivos da moralidade. Estes métodos respeitam o corpo dos esposos, animam a ternura entre eles e favorecem a educação de uma liberdade autêntica. Em compensação, é intrinsecamente má “toda ação que, ou em previsão do ato conjugal, ou durante a sua realização, ou também durante o desenvolvimento de suas conseqüências naturais, se proponha, como fim ou como meio, tornar impossíveis a procriação” Ou seja, a igreja não admite as formas de contracepção dos seguintes métodos: interceptivos – impedem que o óvulo fecundado realize a implantação no útero, provocando, assim, a sua destruição (DIU (Dispositivo Intrauterino); pílula do dia seguinte); • esterilizantes – provocam a infecundidade permanente, embora não necessariamente irreversível (Vasectomia; Ligadura de trompas); • anticoncepcionais – impedem a fecundação: o Interrupção do ato sexual (“Coito interrompido”); o Barreiras mecânicas: preservativos masculino e feminino (camisinha), diafragma; •
Recentemente, no Estado de Goiás, a Advocacia-Geral da União (AGU), através da Procuradoria Federal no Estado de Goiás - PF/GO e da Procuradoria Federal junto à Universidade Federal de Goiás - PF/UFG, obteve no dia 5 (cinco) de julho, deste ano, liminar em ação cautelar inominada (processo nº 28765-06.2011.4.01.3500) que autoriza a transfusão de sangue de um bebê cujos pais são adeptos da seita Testemunhas de Jeová. Que cripto medievalismo é esse que faz com que pais estejam dispostos a fazer um sacrifício abraâmico em nome de uma crença infundada e confusa? Essa atitude é baseada em um texto de um livro religioso que diz que a pessoa deve “abster-se de sangue”, por isso, a transfusão é “proibida”. Ora, o sangue é composto por várias substâncias, uma delas são os glóbulos brancos (leucócitos), responsáveis pela função de proteção do organismo. Pois bem, o leite é rico em leucócitos, e me pergunto: essas pessoas são proibidas de beber leite? Não. Não são. Superando esse medievalismo, a justiça entendeu que a vida deve estar acima das crenças, e divulgou em seu site (AGU), no dia 07 de julho: Acolhendo a tese defendida pela PF/GO de que o princípio do ‘direito à vida’ deve prevalecer sobre o princípio da ‘liberdade de crença’, o Juiz Federal da 8ª Vara da Seção Judiciária do Estado de Goiás
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Colunas - Educação deferiu o pedido de liminar, autorizando a realização dos procedimentos requeridos, incluindo a hemotransfusão.
algo a seu respeito; sem eles vagar-se-á em vão por um obscuro labirinto.
Dir-se-á que a ordem temporal reina sobre os corpos, a ordem espiritual sobre as almas, Mas alma e corpo não são entidades simplesmente justapostas, no interior de cada ser eles formam inevitavelmente uma hierarquia. Para a religião cristã, a alma deve comandar o corpo; por isso cabe às instituições religiosas, isto é, à igreja, não somente dominar diretamente as almas, mas também, indiretamente, controlar os corpos e, portanto, a ordem temporal.
Isso me lembra minha fase infantil, quando minha mãe dizia que “papai Noel” só me traria presentes se fosse um “bom menino”. Nessa crença na dádiva ou castigo, baseava minha infância. Devo assumir que não era a criança mais comportada, porém, vivia tomado do receio de não ser presenteado pelo “bom velhinho”. Porém, eu cresci, e descobri que não existia um papai Noel, que tudo isso havia sido uma forma de meus pais tentarem exercer, sobre mim, uma potência, uma maneira de docilizar minhas atitudes.
Esse cripto medievalismo tardio parece-me um obNestes dois pequenos exemplos, apresento aspectos scuro labirinto, talvez possa ser decorrência de seronde a religião influencia, ou tenta influenciar, não só mos um país muito jovem, se comparado ao ocidente na ciência, como na vida da sociedade. Ao invés de se europeu. Parece-me que vivemos um período de caocuparem daquilo que pregam existir, no caso o espíri- tecismo, onde somos levados (a) acreditar nos novos to, parecem que também desejam dominar as mentes jesuítas, que nos vendem uma verdade com uma mão e os corpos, como nos diz Todorov (2008, p.66): e com a outra nos ameaçam com o castigo do inferno.
Nessa direção, parece-me que falta ao Brasil amadurecer e entender que o mundo vai muito além de nos7. MAS LIVRAI-NOS DO MAL. AMÉM. sas fronteiras, sejam geográficas ou de mentalidade. O país não é mais um país católico, o país, em si, não Diante da apresentação de algumas das formas com pode ser considerado um país cristão. A maioria de que a religião se impõe em nosso país, me pergunto: seus habitantes é, mas, o Estado é laico. Dessa forma, quando veremos a constituição ser cumprida nesse integralizar o que está escrito na Constituição não é quesito? Não é contra o direito ao culto, a crença, as atender a uma minoria, é observar aquilo que é resmanifestações religiosas que me levanto, mas, sim peitar (a) todos. contra a exploração e imposição das coisas da fé ao Estado e a sociedade. Se a maioria das pessoas da nação professa uma fé, isso não significa que o Estado deva lhes agraciar com Não quero pagar, com meus impostos, para que as direitos diferenciados aos das minorias. A Lei é para igrejas sejam isentas dos mesmos. Não quero que meu todos, não pode, nem deve, privilegiar um grupo ou dinheiro seja utilizado para subsidiar aulas de ensino outro baseada em “tradições”. Tradições devem ser religioso. Não quero correr o risco de depender de cé- mantidas pelo povo, não pelo Governo. Cabe a esse lulas-tronco embrionárias e não poder tê-las, pois, a incentivar (que) se cuide da cultura, que se preservem religião não entende como correto. Desejo não ver um os costumes, mas, não deve lhes subsidiar. presidente ser eleito por suas convicções religiosas ao invés de sua competência e comprometimento com a Parece que peço muito, mas, não, o que peço é um nação. Gostaria de não mais ver pessoas morrendo por país laico, de fato. crenças em dogmas injustificáveis. Tal qual escreveu, há tanto tempo atrás, Galileu (II Saggiatore, 1623): A Filosofia está escrita nesse grandíssimo livro que continuamente está aberto diante de nossos olhos (eu digo, o Universo), mas não se pode entendê-lo se antes não se aprender a língua e os caracteres em que está escrito. Está escrito em língua matemática, e os caracteres são triângulos, círculos e outras figuras geométricas, e sem tais meios é impossível entender humanamente
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Blog: bardoateu.blogspot.com
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Evolução Colunas - Evolução
O Ovo ou a Galinha e a origem das aves.
Afinal, quem veio primeiro? Já respondi essa questão no final do meu artigo no 1º número desta revista, lembram?
Se não lembra ou não viu, tudo bem, porque eu até respondi, mas não expliquei – coisa que vou fazer agora. Antes de começar a fazê-los pensar a respeito, temos que ter em mente de que a pergunta do título é muito mais antiga do que se supõe. Mais antiga que Cristo. Não se sabe quem a cunhou, mas o filósofo grego Aristóteles já quebrava a cabeça com ela lá na Grécia clássica, há uns 2.300 anos. Ele concluíra na época que tanto um quanto o outro sempre existiram. Obviamente, estava enganado.
ovo da forma clássica como conhecemos a palavra, sem aplicá-lo a um sujeito específico, então concluímos que foi ele de fato que veio primeiro, pois os animais vertebrados mais antigos já se reproduziam por oviparidade bem antes da galinha ou de qualquer outra ave, e isso se mantém até hoje com os peixes, anfíbios e répteis; e, finalmente, mesmo que estejamos nos referindo ao ovo da galinha de fato, a resposta à questão continuaria exatamente a mesma, e é o registro fóssil que comprova isso. Resumindo de forma bem básica: o que saiu do ovo pode até ser sido uma galinha, mas quem o COLOCOU não era.
É também uma questão versátil. Mantendo a lógica, mas mudando-se os personagens, podemos aplicá-la a inúmeros campos. Quem pensa apenas na questão biológica talvez nem imagine que ela pode ser aplicada à filosofia (pode existir A antes de B, se A precisa de B para existir?), à teologia (pode algo ser criado a partir do nada, se quem o criou já existia?) e até mesmo à economia (pode haver consumo sem consumidor, se é justamente o consumo que atrai o consumidor?). Existe outro ponto a ser explorado aqui. Afinal de contas, de que ovo estamos falando? Esta é a grande falha da pergunta. Percebam, ela não indaga especificamente sobre o ovo de galinha, mas simplesmente o ovo, e isto, mesmo podendo ser considerado mera forma de semântica, dá margem para N interpretações. Pode-se estar falando do ovo zigótico, a partir do qual um animal é concebido: chamamos o óvulo fecundado – zigoto – de ovo; descendo mais fundo, podemos considerar como ovo a própria célula, no sentido de ser a estrutura básica dos seres vivos; se estivermos falando do
Depois deste artigo, você nunca mais a verá com os mesmos olhos...
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Colunas - Evolução Mas para continuar, precisamos antes de uma definição: o que é uma ave, afinal? Pra começar, as aves formam o grupo mais homogêneo de vertebrados que existe. Desde o minúsculo beija-flor até o gigantesco avestruz, todas as aves são bípedes, têm 4 membros (o par superior sem dedos aparentes, inicialmente transformados em asa), cauda reduzida, corpo coberto por penas e focinho modificado em um bico córneo queratinizado sem dentes (com inumeráveis formatos e funções diferentes). Pronto, isto serve para definir qualquer ave. Agora, se você compará-la a um dinossauro Theropoda (aqueles carnívoros bípedes estilo Tyranosaurus ou Velociraptor) vai ver que as diferenças são inacreditavelmente poucas! Uma ave nada mais é do que um desses dinossauros, com muitas penas, cauda curta e boca sem dentes. E SÓ! É claro que eles não começaram cheios de penas logo de cara. Houve – como sempre, aliás – uma gradativa EVOLUÇÃO das mesmas até as maravilhosas e coloridas plumagens que as aves ostentam hoje. Em virtude de sua ancestralidade com os répteis, muitos cientistas defendem a extinção da classe Aves e da subclasse reptiliana Diapsida e sua fusão em uma única grande classe, que se chamaria Sauropsida. Há um movimento similar com os mamíferos, com a fusão da classe Mammalia e de outra subclasse dos répteis, Therapsida, na nova classe Synapsida, também pela questão da ancestralidade (daqueles com os últimos).
Os dinossauros são classificados em duas grandes ordens, Ornitischia (pélvis de pássaro) e Saurischia (pélvis de lagarto), ambas com representantes famosos em suas fileiras. Ironicamente, quem deu origem às aves não foram os que tinham pélvis de pássaro, mas o outro grupo. Dentro de Saurischia, duas subordens, Sauropoda e Theropoda. O primeiro compreende os maiores animais que já existiram no planeta, quadrúpedes de pescoços longos com nomes bastante apropriados como Ultrasaurus, Sismosaurus, Supersaurus e por aí vai. O outro grupo tem predominantemente dinossauros bípedes carnívoros, como os da família Tyrannosauridae.
Família Tyrannosauridae: o Tyrannosaurus é o primeiro à esquerda, mas vários outros animais bastante parecidos se juntam a ele no grupo.
Desculpem, erro meu... Não devia ter colocado essa imagem do Tyrannosaurus rex. Aliás, vamos aproveitar acabar logo com um grande mito! Já faz algum tempo que ele deixou de ser aquele monstro gordo, estúpido e “nu” que há décadas aprendemos a temer. Não que ele não seja mais temível, mas agora está mais “fofinho”! Veja a imagem abaixo.
Se os bracinhos já eram pequenos antes... Agora eles literalmente somem no meio da plumagem!
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Colunas - Evolução Pois é... A maioria dos cientistas agora acredita que ele tinha o corpo coberto por penas. Se não de penas completas, ao menos de seus folículos. Não só ele, mas todos os Theropoda avançados, aqueles que estavam por aqui quando o tal meteoro chegou arregaçando tudo. Outros botam fé que seus filhotes nasciam cobertos de penugem e que as perdiam conforme se tornassem adultos, tal qual os fetos de golfinhos, que ainda têm pêlos antes de nascer. Os Tyrannosauridae também é uma exceção por seu tamanho: a maioria dos dinossauros Theropoda eram bem menores, do taO Sinosauropteryx foi também o primeiro dinossauro a ter sua coloração manho de perus anabolizados. Inclusive, com relação a comprovada com base em evidências físicas (melanossomos preservados). isso, faz-se necessário salientar algo bem importante: esqueçam a trilogia Jurassic Park! A bem da verdade, esqueçam tudo que já viram no cinema a respeito de Os Ornitischia também tiveram representantes com penas, ou ao menos com estruturas similares: eram o dinossauros. Aquilo lá tá tudo errado! Tudo! Psittacosaurus e o Heterodontosaurus, que também O próximo passo é esquecer os Theropoda gigantes eram de grupos bastante separados, mesmo dentro de e se concentrar nos pequenos – é deles que surgirão sua ordem. Embora estes nada – NADA MESMO! – tenossas amiguinhas emplumadas. Para isso, vamos ter nham a ver com a linhagem das aves, servem como que retroceder um pouco, para antes dos Tyrannosau- exemplo para mostrar que a origem de estruturas como as penas não precisa ser necessariamente excluridae. sividade de um único grupo. Há algum tempo debaOs primeiros registros confiáveis e indubitavelmente te-se se o filo Arthropoda (que compreende insetos, seguros de plumagem foram encontrados no Sinosau- aracnídeos, crustáceos, etc.) tem de fato uma mesma ropteryx, da família Compsognathidae, que viveu a origem evolutiva ou se seus múltiplos representantes, 124 milhões de anos e foi descoberto em 1996. Ele é o embora com origens totalmente distintas, sofreram primeiro dinossauro fora da linha evolutiva direta das mútuo processo de “artropodização” em suas patas. aves com evidências de penas. Voltando aos répteis, há décadas um fóssil chamado
Famílias Caudipteridae, Oviraptoridae e Ornithomimidae. Mesmo sem estarem diretamente relacionados às aves, todos esses animais lhes eram fisicamente bastante parecidos.
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Colunas - Evolução Longisquama insignis, réptil filogeneticamente bem distante de qualquer dinossauro, quase levou a pique toda a teoria a respeito da origem das aves. Criou-se a suspeita de que lagartos haviam virado aves, e aves haviam virado dinossauros, e depois dinossauros haviam virado aves de novo... Enfim, uma zona! No entanto, o registro evolutivo a favor da origem dinossauriana das aves é amplo e seguro demais para ser desconsiderado agora. Só um fóssil altamente improvável, como uma ave do Permiano, por exemplo, colocaria a teoria de fato em xeque. Se animais tão diversos puderam desenvolver estruturas emplumadas, para os Theropoda mais aproximados entre si isso foi praticamente corriqueiro. Mesmo aqueles não diretamente envolvidos na formação das aves também tinham penas, tornando o desenvolvimento das mesmas quase algo padrão entre as várias famílias do grupo.
anatômicas. A própria redução de tamanho foi fundamental. As maiores aves de hoje (como o avestruz e a ema), mesmo bastante emplumadas, não conseguem alçar vôo, em virtude de seu peso. Idem às aves gigantes do passado, como Gastornis e Dyatrima. Assim, um Tyrannosaurus, por mais penas que possuísse, jamais poderia voar. Desta forma, a miniaturização foi uma parte fundamental do processo de fazer esses animais ganharem os céus. A grande maioria dos dinossauros indubitavelmente emplumados do Cretáceo já era do tamanho dos pequenos pássaros atuais. Eles não começaram gigantescos e foram diminuindo até criar penas – ao contrário, criaram penas e depois sim foram ficando cada vez menores.
Família Troodontidae. Todos eram bastante pequenas e já bastante emplumados. Faltava pouco para aparecer uma ave de verdade.
As asas eram braços, cujas mãos tinham dedos normais como os nossos. Mas, para voar (assim como para nadar), dedos são estruturas totalmente inúteis. Estes então foram gradativamente retrocedendo, minguando, até serem totalmente absorvidos pela asa. Mas as aves, mesmo na atualidade, nunca os perderam – apenas os modificaram.
Árvore evolutiva baseada no grau de desenvolvimento das penas. A presença de um “?” antes do número sugere a incerteza quanto ao fato de tal grupo ter possuído este tipo de plumagem.
A evolução das penas foi bastante lenta, mas gradu- Família Dromaeosauridae. Quase todos aqui são raptores, totalmente al, tornando os dinossauros cada vez mais “penados”. diferentes do que se vê no cinema. O Velociraptor é o último, abaixo do Microraptor, que está planando no alto. Mas é claro, para um dinossauro ser ave não basta apenas isso. Outras transformações se fizeram necessárias, não apenas fisiológicas mas, principalmente, Aves com dedos... Que absurdo! Não, não é. Ainda existe uma assim hoje em dia, a cigana (Opisthocomus Revista Livre Pensamento - Número 2
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Colunas - Evolução hoazin), que vive aqui mesmo no Brasil, na Amazônia. Naturalmente que não são dedos extremamente ágeis, mas ainda assim são bastante discerníveis, munidos até mesmo com garras, especialmente nos filhotes (que inclusive os usam para se apoiarem nos ramos das árvores). Quando a ave se torna adulta, esses dedos regridem às formas similares às de outras aves típicas, numa bela demonstração evolutiva de como esses mesmos dedos podem ter regredido naqueles dinossauros para dar origem à conformação óssea das asas atuais. Até mesmo a estrela desse artigo, a galinha, tem dedos visíveis! Ou, ao menos, um deles, o polegar. Da próxima vez que vir uma asa de galinha, repare bem.
À esquerda, a cigana com seu filhote (repare nas garras deste); à direita, a asa da galinha, mostrando o polegar vestigial equipado até com uma pequena unha na ponta.
Além do próprio tamanho corporal, algumas estruturas específicas também tiveram que ficar pequenas. A cauda curta das aves de hoje terminam num osso chamado pigostílio, que na verdade é apenas a fusão de várias vértebras numa única peça, tal qual nosso cóccix. O registro fóssil mostra passo a passo como essa regressão ocorreu, e mesmo dentro da mesma família já haviam indivíduos com cauda reduzida.
A bacia pélvica dos atuais crocodilianos é extremamente parecida com a dos dinossauros Saurischia – justamente os ancestrais das aves. A figura abaixo mostra a gradativa evolução da mesma desde os Theropoda até chegar à configuração que se apresenta nas aves de hoje.
Com o processo evolutivo em andamento e a transformação dos braços em asas, as garras foram se atrofiando juntamente com os dedos, até o total desaparecimento na grande maioria das aves. Estes últimos, por sua vez, também atrofiaram ou sofreram processo de fusão. Praticamente toda ave ainda conserva três dedos (ainda que internos) em suas asas: I, II e III, ou popularmente, polegar, indicador e médio. Há de se considerar também que as próprias patas traseiras daqueles dinossauros tiveram que sofrer fortes adaptações para permitir que os mesmos alçassem vôo. Grandes e pesadonas daquele jeito, não ajudariam muito nesse sentido. Assim como ocorre com muitos outros animais corredores, os ossos do metatarso sofreram progressivo fusionamento – e isso quando não sumiram, como no caso do tarso. E assim aquela patona gigante com garras enormes deu lugar a um delicado e pequeno pé. Com garras menores. Revista Livre Pensamento - Número 2
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Outra grande adaptação das aves foi o bico. Um focinho envolto em uma capa de queratina não é exclusividade das aves – muitos dinossauros de diferentes linhagens também o tinham, e as tartarugas atuais idem. O bico foi uma solução para um animal que estava ficando cada vez menor e mais leve para conseguir voar. Um bico “oco” é muito mais leve do que um focinho cheio de dentes e músculos, e requer pouca massa, pouco volume, para ser eficiente para diversos tipos de alimentação. Importante salientar que TODAS essas transformações estão amplamente documentadas através de centenas de fósseis. Não são meras formas hipotéticas supostas pelos cientistas.
Fósseis de Microraptor, Smilicaudipteryx, Archaeopteryx e Confuciusornis. Penas tnitidamente impressas na rocha.
Ainda com relação aos fósseis de transição, hoje se discute se o Archaeopteryx era de fato uma ave ou apenas um dos (MUITOS) dinossauros emplumados de sua época (suspeita-se que ele sequer possuía um bico). Mas o que quer que seja decidido, o grande mérito dele foi demonstrar pela primeira vez para a ciência de que havia uma ligação entre os répteis e as aves. Por esta razão ele é colocado no top-5 de fósseis mais importantes de todos os tempos, muito mais por seu impacto científico do que por sua posição dentro do contexto evolutivo. Mas ele não é o animal de transição entre os dois grupos, simplesmente porque não existe UM animal nessa circunstância, mas uma série deles. O Archaeopteryx foi apenas o primeiro a ser encontrado. A grande maioria dos fósseis de dinossauros emplumados foi descoberta nos últimos anos, e num local específico: a província chinesa de Liaoning.
Archaeopteryx lithographica e Confuciusornis sanctus: no limite entre répteis e aves.
Tudo muito bonito, tudo muito legal... Mas o que fez uma ave começar a de fato voar? Existem duas hipóteses: a arbórea, segundo a qual esses dinossauros viviam em árvores e que, saltando de galho em galho, adquiriram a capacidade de planar para em seguida desenvolver o vôo; e a de curso, em que eles usavam suas
pernas longas para adquirir velocidade e davam saltos cada vez maiores à medida que suas asas foram ficando cada vez mais emplumadas. Esta última é defendida pelos cientistas que afirmam que as garras dianteiras daqueles dinossauros não eram adequadas para uma escalada. Mas há uma nova explicação, desenvolvida
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Colunas - Evolução por James Carey, que sugere o cuidado com os filhotes como fator determinante, não só para o vôo, mas até mesmo para o surgimento do bico desdentado das aves – algo que não contemplei neste texto. Você vai encontrar um link a respeito no final do artigo. E se apenas o registro fóssil não lhe basta para provar a origem reptiliana das aves, então talvez evidências moleculares possam lhe fazer aceitá-lo...
destes, conseguiram amostras de colágeno que reagiram com os mesmos anticorpos que reagem ao colágeno da galinha, ligando molecularmente as aves aos dinossauros Theropoda. Na verdade as semelhanças evolutivas não se limitam apenas aos ancestrais extintos das aves. Hoje, o animal não-aviário que mais se aproxima da galinha – bem como de qualquer outra ave – é o crocodilo (!).
Foi o que conseguiram cientistas da Faculdade de Me- Sim, parece absurdo, mas é só ter boa vontade (e cabedicina de Harvard em 2007, a partir de tecidos moles ça aberta) para constatá-lo perfeitamente. descobertos num fêmur de Tyrannosaurus. Através
Olhe bem... Não são extremamente parecidos!?
Quando falo em crocodilos, incluo no grupo também os jacarés, aligátores, gaviais... Enfim, todos os crocodilianos, membros da ordem Crocodilia. Eles e aves compartilham muitas similaridades: crocodilianos são uma das poucos répteis que constroem ninhos e cuidam, não apenas de seus ovos, mas de seus filhotes nascituros; esses mesmos filhotes, assim que eclodem de seus ovos, emitem sons (piados) como os de pássaros, para chamar sua mãe, que responde prontamente a tais ruídos, ajudando-os a sair da casca e do ninho. Após o nascimento, a mãe crocodilo traz alimento, cuida dos filhotes (por vezes até os dois anos de idade) e por aí vai. Outra característica, comum não apenas às aves e crocodilianos mas àquelas e a todos os répteis... É o próprio ovo, que se chama amniótico e tornou possível a reprodução em ambiente seco, protegendo o embrião de impactos mecânicos e proporcionando trocas gasosas com o meio. O coração também é similar nos dois grupos: crocodilianos são os únicos répteis com coração de 4 câmaras, não exatamente igual mas muito mais parecido com o das aves (e mamíferos) do
que com qualquer outro réptil. Um crocodilo, enfim, é muito mais parecido com uma galinha do que com um lagarto, aceite você ou não.
Para os criacionistas, a galinha veio primeiro. Segundo eles, Deus criou todos os animais de uma sapatada só, seguindo uma sequência sem pé nem cabeça descrita no livro de Gênesis. Eles se apegam artificialmente ao “argumento” de que não existem fósseis transitórios
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Colunas - Evolução entre grupos tão distintos como répteis e aves para que a ciência bata seu martelo sobre o veredicto. Digo artificialmente porque eles SABEM SIM que existem, não apenas um ou dois, mas dezenas de fósseis com essa função, mas precisam desprezá-los ou alegar sua ineficácia para se manterem “coerentes” em suas apelações a respeito. E mesmo assim não conseguem, assim como não conseguem ridicularizar a ciência com suas tentativas de desacreditá-la, divulgando informações absurdas e/ou imagens grotescas atribuídas a ela. Ah sim, existe outra coisa que eles (convenientemente) ignoram: o fato de que, em seu santo e infalível livro, as aves são criadas ANTES dos répteis (conforme Gênesis 1:20-25), quando o amplo registro fóssil prova, confirma e ratifica que isso não aconteceu mas nem a pau! O Hylonomus lyelli, mais antigo réptil conhecido pela ciência, foi encontrado em camadas do período Carbonífero, que datam de 312 milhões de anos. Os primeiros dinossauros só apareceram no Triássico, 80 milhões de anos depois – e os primeiros dinossauros Theropoda só aparecem entre 220 e 200 milhões de anos. O Archaeopteryx data de 150 milhões de anos – e, portanto, uns 60 milhões de anos depois dos primeiros Theropoda. Noves fora, entre o primeiro réptil e as mais antigas aves decorrem nada menos que 170 milhões de anos. Não tem como elas terem aparecido primeiro. Um erro crasso que cristão algum admite. Para eles, há um “erro de interpretação” das Escrituras por parte dos céticos... Aham...
Referências: O ovo ou a galinha? http://www.evo.bio.br/layout/galinhaovo.html Mamãe crocodilo alimentando a filharada: http:// www.youtube.com/watch?v=wZdWRR5tRmc&feature =fvwrel Dinossauros podem ter sido bem coloridos: http:// hypescience.com/penas-preservadas-revelam-dinossauros-coloridos/ Terceira explicação para a origem do vôo das aves: http://www.eurekalert.org/pub_releases/2002-01/ uoc--nto012902.php Vários links bons: http://darwiniana.org/dinobirds. htm Excelente site de imagens: http://www.geocities.co.jp/ NatureLand/5218/ Evidências moleculares da ligação aves/dinossauros: http://noticias.uol.com.br/ultnot/reuters/2007/04/12/ult729u66518.jhtm A nova revolução chinesa: http://www.luisrey.ndtilda. co.uk/html/chin1to4.htm
Sobre o Autor: Gustavo Melim Gomes é formado em Biologia, totalmente apaixonado pela área evolutiva geral e pela filogenia de Chordata. Ama Charles Darwin pelo tamanho da descoberta que fez, para a qual o mundo não estava (e ainda não está) preparado, e Carl Sagan, pela facilidade e paixão com que consegue explicar ciência para o público leigo. É professor do ensino público e também voluntário em ONG’s de proteção animal da cidade em que mora (Itajaí / SC). É esse tipo de coisa ridícula que os criacionistas querem te fazer acreditar que a ciência defende. Um desserviço à inteligência humana.
Blog:outrasverdadesinconvenientes.blogspot.com
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Filosofia Colunas - Filosofia
Os Limites da Ciência Uma nova perspectiva para a realidade
Antes de criticar a ciência, preciso me apresentar: sou ateu, especialmente cético em relação à minha própria percepção de mundo, e também que fique claro que desejaria viver para sempre. Vejo a ciência como a coisa mais democrática que existe e a ferramenta mais poderosa que o ser humano possui. Ambos, cientistas e filósofos são muito preocupados com impossibilidades. Os cientistas gostam de mostrar que as coisas amplamente consideradas impossíveis são, na verdade, totalmente possíveis. Os filósofos, em contrapartida, são mais inclinados a demonstrar que coisas amplamente consideradas como, perfeitamente, viáveis, são de fato impossíveis.
previsões precisas.
Mas então que algo de estranho e inesperado acontece. Somos contrariados pelas teorias e Natureza. Um dos lados se sobressai, prevêem que há coisas que não podemos prever, observações que não podem ser formuladas, declarações cuja verdade não se pode afirmar, nem negar. Revela-se uma inconsistência interna, a teoria produz um “no-go”.
É inegável que a ideia do impossível faz sinos alarmantes tocarem na mente de muitos, mas não sejamos partidários, expandemos nossa visão. Paradoxalmente, a ciência só é possível porque algumas coisas são de fato impossíveis. As provas incontestáveis de que a Natureza é governada por “leis” confiáveis, é o que nos permite separar o possível do impossível.
Ela acaba por ser não apenas um alcance limitado, mas “auto-limitado”, como diz o cientista e professor John D. Barrow. Filósofos e cientistas começam a questionar sobre a esperança de uma ciência do futuro explicar o “como” de tudo, e até se o fim da descoberta científica está a vista.
Autores como Roger Penrose e John D. Barrow olham por outra perspectiva, não apocalíptica, e sugerem que este seria um bom sinal. Poderiamos começar a reconhecer as teorias científicas maduras o suficiente para indicar seus próprios limites, ou autolimites. Tais limites surgiriam não apenas porque as tePara alguns, qualquer sugestão de que possa haver li- orias são imprecisas ou inadequadas, mas podem nos mites para a cognição e compreensão humana, espe- dizer algo profundo sobre a natureza do conhecimento cialmente ao progresso científico, aparece como um e as implicações de se investigar o Universo de denmeme (ideia, vírus) perigoso que gera desconfiança e tro. repulsa. A questão dos limites da ciência tem grande importânIgualmente acríticos são aqueles que, entusiastica- cia para que possamos olhar para nós mesmos (seres mente, abraçam qualquer sugestão de que a ciência humanos), e percebermos em que grau de evolução pode ser limitada porque suspeitam dos motivos e pe- estamos - a partir da observação dos problemas que rigos, com um medo desenfreado da investigação do até então são impossíveis de serem resolvidos. desconhecido. Digo, podem existir limites impostos pela natureza da Lembremos que a cada final de século parece surgir nossa humanidade. Tudo indica que o cérebro humaum novo inventário em ciência. Também não podemos no não foi feito para evoluir tendo a ciência em mente negar que, desde o último século, seus passos foram – como nos esquecemos. A investigação científica, asgrandiosos e a teoria científica adquiriu sucesso, tanto sim como nossos sentidos artísticos, são subprodutos na quantidade, quanto na qualidade - a partir de suas de uma mescla de atributos que sobreviveu porque, Revista Livre Pensamento - Número 2
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Colunas - Filosofia preferencialmente, estavam mais bem adaptados para sobreviver em ambientes que enfrentaram - num passado distante. É de se suspeitar que essas origens ambíguas poderão comprometer a nossa busca por uma compreensão do Universo. Nossa investigação do mundo surge toda através do raciocínio e lógica humana, caso haja um limite, a priori, nessa nossa percepção, estaremos fadados ao fracasso procurando respostas por este caminho. De fato, o que sabemos é que os limites e barreiras que não podem ser atravessados, que não podem ser conhecidos, o que não pode ser feito, e nem visto, definem o nosso Universo da forma como o conhecemos, ou como podemos conhecer. É fácil pensar sobre a história do sucesso científico, mas tenho outra história para contar: aquela que não fala sobre o conhecido, mas do desconhecido; das coisas impossíveis, de limites e barreiras que não podem ser atravessados. Talvez isso soe um tanto perverso. No entanto, o impossível é uma poderosa e persistente noção. Despercebida, sua influência sobre a nossa condição é profunda e ampla, e seu lugar na nossa imagem do Universo no mais profundo nível é inegável. O objetivo é descobrir alguns dos limites da ciência para ver como nossa mente, diante a consciência do impossível, nos dá uma nova perspectiva sobre a realidade. Se um cientista diz que algo é possível, ele certamente tem razão, mas se ele diz que algo é impossível ele provavelmente está errado? Dependendo do assunto sobre o qual está sendo questionado, não. E é sobre isto que os convido a explorar. Eis os grandes mistérios à percepção humana que estancam nossa investigação: o Teorema de Gödel e o Princípio da Incerteza de Heisenberg.
Comecemos pelo Teorema de Gödel. No início do último século, o mundo parecia simples o suficiente para ser totalmente conhecido. Observações do mundo eram feitas; padrões discernidos e descritos por fórmulas matemáticas. As fórmulas previam mais e mais do que era visto; nossa confiança em seu poder explicativo e preditivo só crescia. Desta forma, por um longo
período de tempo, as fórmulas pareciam ser infalíveis. Alguns começavam a argumentar que os cientistas nos permitirão entender tudo. Outros diziam que o fim de um ramo da investigação humana estaria à vista! Tudo seria revelado! Livros começam a ser escritos e prêmios começam a ser entregues através de comemorações majestosas com grande exposição popular. O desejo profundamente humano, em nossas vísceras, de ligar todas as coisas, começava a ser saciado. Observamos na história que a noção do “tudo é possível” tem uma longa história ligada aos desejos humanos – principalmente os religiosos. A maioria das culturas humanas demonstra um desejo de adorar ou reconhecer seres ou espíritos superiores a si mesmos. Esses “deuses” são geralmente creditados com poderes sobre-humanos: é o que os distingue dos simples mortais humanos. Seus poderes podem ser amplitudes do que já faz um ser humano, ou poderes que os seres humanos não possuem em medida alguma. No caso mais extremo dos deuses, podem possuir poderes ilimitados que lhes permitam saber de tudo e fazer tudo. Mas alguns fiéis da ciência aos poucos começaram a perceber que “O Dia” nunca chegaria. Assim, muitos acabaram por migrar este desejo para correntes de pensamentos engessados, ditos, pseudocientíficos, tal como a Cabala e Parapsicologia. Kurt Gödel foi o responsável por uma parcela especial da destruição da “fé científica”. Graduado em Matemática, e doutorado em Filosofia, Gödel provou de maneira lógica, formal e irrefutável que há limites para o conhecimento dos limites da mais pura das ciências. Titulado de Teorema da Incompletude, o Teorema de Gödel demonstra como uma máquina, ou um computador, teria problemas em avançar muito na matemática. É fato que os computadores são bons para cálculos, mas frente a uma questão que não possa ser provada verdadeira ou falsa, um paradoxo, o computador poderia travar, o robô poderia exclamar “Isso não pode ser computado!” e seu cérebro artificial explodiria, fazendo referência às mais antigas obras de ficção científica. A palavra “paradoxo” é uma síntese de duas palavras gregas, “para” que significa algo semelhante a “contrário a”, e “doxos” que significa “crença”, assim, “crença contrário a”. Ou seja, algo que parece contraditório, mas que é, de fato, verdadeiro, ou algo que parece verdadeiro, mas que é, de fato, contraditório, ou uma corrente inofensiva de deduções a partir de uma autoevidencia do ponto de partida que leva a uma contradição. O fato é que paradoxos têm desempenhado um papel dramático na história intelectual, muitas vezes anteci-
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Colunas - Filosofia pando desenvolvimentos revolucionários na ciência, matemática e lógica. Sempre que, em qualquer disciplina, descobrimos um problema que não pode ser resolvido dentro do quadro conceitual que, supostamente, deveria aplicar-se, nós experimentamos o choque do paradoxo. Este choque pode obrigar-nos a descartar o antigo quadro e adotar um novo. É a este processo das mudanças intelectuais que devemos o nascimento de muitas das principais ideias em matemática e ciências. Desde pequeno, muito questionador e até chamado de “Sr. Porque” (por conta do grande número de perguntas que fazia), Gödel levava isto um tanto a sério. Para ele, a capacidade de enxergar além destes paradoxos indicava o fato de não sermos robôs, que estamos acima das máquinas. Seríamos compostos de algo mais do que a simples mecânica de 1+1=2. Esta crença em ‘algo mais’ foi uma constante na vida de Gödel. Uma de suas maiores pretensões era transformar a metafísica em uma ciência exata. Assim, talvez não seja uma surpresa que tenha trabalhado por décadas por uma prova formal sobre a existência de Deus – mas não obteve sucesso, tal qual seu Teorema da Incompletude.
O Teorema diz que o enunciado não pode ser simultaneamente completo e consistente, e caso o sistema seja consistente, sua consistência não pode ser provada internamente ao sistema. Um exemplo: Caso eu diga: “Eu nunca digo a verdade!” Essa afirmação é verdadeira ou falsa? Caso seja verdadeira, eu não estaria dizendo a verdade, assim existiria uma inconsistência nesta atual afirmação. Mas caso esta afirmação seja falsa, sendo assim eu diga a verdade, então existe também uma inconsistência, pois então eu estou dizendo a verdade sobre nunca dizer a verdade. Este é um tipo de problema, até então, sem solução, que demonstra o que Kurt Gödel pretendeu exprimir com o Teorema de Incompletude.
Mas independente da razão que o motivou, os ditos “fenômenos não computáveis” são um desafio real para a ciência, com ou sem crença. Que não somos limitados como computadores aritméticos é evidente. O que também deve ser evidente é que é mais comum que pensemos de forma ilógica e incoerente. E Gödel via nossa capacidade de enxergar uma declaração como verdadeira ou falsa como derivada de uma lógica maior, a evidência, contudo, sugere que nossas certezas podem ser, não raro, fruto de simples arbitrariedades, desenvolvidas e racionalizadas a posteriori de forma inconsciente. Uma moeda lançada ao ar também pode decidir entre cara ou coroa, sem nenhum sistema axiomático ou conexão com uma entidade maior e perfeita. Ironicamente, a própria fé metafísica de Kurt Gödel pode ser vista como uma destas arbitrariedades ultimamente incoerentes. Se ela o levou a desenvolver e provar algumas das mais revolucionárias ideias na história das ideias, no entanto, está mais do que demonstrado o valor do acaso. Esta forma de gerar um paradoxo, fazendo com que uma declaração faça referência a si mesma, foi o truque que o matemático Kurt Gödel utilizou em 1931 para provar seus Teoremas de Incompletude, entre as mais importantes descobertas científicas e filosóficas do século passado.
Esta trágica história começou por cerca do início do século XX, logo após as diversas e mais complexas áreas da ciência terem passado por uma Era de Ouro e se assentarem com confiança sobre a mesma. Uma das maiores obras representando este ideal foi o “Princípio Matemático” (traduzido) de Whitehead e Russell. Com os limites de Isaac Newton, contudo, suas leis impunham ordem no mundo. Uma das mais brilhantes de uma série de todo tipo de leis naturais, que ordenaram e ampliaram nosso domínio e conhecimento da natureza, iluminando com certezas o que antes era incerto e ambíguo. E o poder e precisão científicos só aumentavam, até o ponto em que se descobriram os átomos e suas propriedades, e foram nelas que a ciência descobriu, para desagrado de sua ambição, a primeira grande barreira: o Princípio da Indeterminação. O responsável foi Werner Karl Heisenberg, físico ale-
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Colunas - Filosofia mão, que descobriu um limite para o conhecimento humano, uma indeterminação de como as estruturas pequenas do nosso Universo devem se comportar. Para os mais espirituais, a arbitrariedade é apenas um sinal de que “tudo é possível” (como no famoso documentário “Quem Somos Nós?”), já para os mais sensatos, um abismo se abria diante nossos olhos. Por um lado, nos permite uma perspectiva maior da nossa realidade, por outro, nos afastava um pouco da nossa compreensão do Universo.
se tornam possíveis e algumas coisas classicamente possíveis acabam por ser impossíveis.
A indeterminação é vista através do processo de medida mais evidente e claro para a observação, realizado a partir da utilização de um fóton de luz, que pela sua natureza proporciona a “melhor” observação possível, no entanto abre portas para um mundo indeterminado – impondo um limite para uma evolução de sua observação.
Mas não estamos aqui celebrando um fracasso fundamental da Ciência, pelo contrário, é um atestado poderoso de que a maior descoberta dos cientistas é a própria Ciência, capaz de descobrir limites a seus limites, e com isto, o vislumbre de uma infinitude de caminhos a perseguir. E essa infinitude indeterminada surge, paradoxalmente, de uma história rumo ao encontro de limitações.
Por exemplo, em ciência newtoniana clássica, assumimos que é possível conhecer, simultaneamente, a posição e o movimento de uma partícula com uma precisão absoluta. Na prática, pode haver limites tecnológicos para a precisão com que isso poderia ser feito, mas não há razão para esperar resultados contraditórios com a tecnologia necessária em mãos. O esperado é que a tecnologia permitiria uma preciA física quântica é o ramo da ciência que estuda esses são ainda maior. Mas a mecânica quântica nos ensina eventos complexos. Ela nasce, basicamente, quando que, mesmo com os instrumentos ideais, é impossível os físicos descobrem que quantizando quantidades medir a localização e a velocidade de um corpo simulcomo a energia da órbita do elétron em torno de um taneamente com uma precisão melhor do que alguns átomo, chegavam a resultados satisfatórios - pela física limites críticos definidos pela constante de Planck – a clássica, um corpo emitiria radiação com energia infi- priori pela natureza. nita -, e formulações matemáticas que levavam a contradições. Assim, a radiação de corpo negro, o efeito Assim, o nobel de física, Heisenberg, nos ensina que “o fotoelétrico e a quantização das órbitas eletrônicas são cientista não é como um observador de pássaros em um esconderijo perfeito”. a pré-quânticas.
Nas palavras de John D. Barrow, especialista no assunto:
Na mecânica quântica, nada pode ser observado com alguma probabilidade, embora essa probabilidade “A teoria quântica nos ensina que todos os obje- possa ser muito pequena (remetendo à obra “O Andar tos possuem um aspecto wave-like. Este aspecto Do Bêbado”, do físico Leonard Mlodinow). é wave-like no sentido de uma onda de crimes, ao invés de uma onda de água. Ou seja, é uma onda No entanto, ainda que não tão arbitrária, a mecânica de informações. Se uma onda de neutron passar quântica não deve ser vista como uma mágica místiatravés de seu detector, isso diz a você que um ca que permite tudo, mas de fato como uma ciência neutron é mais provável de ser detectado lá. O precisa que dita mais limitações, de uma natureza dicomprimento desta onda em questão é inversa- ferente. mente proporcional ao seu tamanho físico. Quando um objeto tem comprimento de onda quânti- Para aqueles presos ao paradigma clássico científico, ca que é maior do que seu tamanho físico ele se muito se cogitou que este limite imposto pela física comporta em um modo abertamente quantum; quântica seja algum mal-entendido, mas é indiscutível Quando seu comprimento de onda é menor do que muitos experimentos sugerem o contrário. que seu tamanho, se comporta na forma clássica de Newton.” (BARROW, ����������������������������������� John D. The Limits of Sci- Como exemplo, um experimento foi determinante ence and The Science of The Limits. 1998, pg. 20.) para a física quântica (análogo ao realizado por Young no século XIII) ao revelar uma realidade perturbadora [tradução minha]. para o consenso científico da época. Realizado com um Assim, o comportamento clássico é apenas o limite fóton, partícula da luz, e usando uma montagem de extremo do comportamento quântico, quando o ta- placas geralmente utilizadas para detectar o fenômemanho físico de um objeto é muito maior do que seu no de interferência de ondas, observou-se o comporcomprimento de onda quântica. O intrigante é que, no tamento das partículas atômicas quando submetidas mundo quântico, algumas coisas clássicas impossíveis ao mesmo processo. t
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Colunas - Filosofia subjetivo, tal como se suas interpretações fizessem parte do evento percebido pela ciência. Enquanto a física começava a se deparar com o horror da indeterminação, os matemáticos sonhavam com a pureza absoluta da lógica. Diziam que, exatamente, por ser abstrata, a matemática poderia ser o fundamento claro, último e absoluto de qualquer ciência. Encontraríamos todos os seus limites.
Como vemos na primeira imagem, quando passa pelos orifícios da primeira placa, um feixe de ondas dá origem a dois feixes que interagem entre si, o que termina em um registro na segunda placa das intensidades das ondas que a atingem, definido como uma seqüência de máximos e mínimos, ou seja, um perfil oscilatório. Na segunda imagem, em vez de usar um emissor de ondas, bombardeou-se a primeira placa com elétrons e nêutrons. O esperado era que os registros dos impactos destas partículas na segunda placa formassem duas concentrações distintas, definidas pelas trajetórias das partículas através dos orifícios. Na análise de Max Planck, o surpreendente resultado mostrou um perfil para os impactos das partículas na segunda placa muito semelhante ao apresentado pelas emissões de ondas, com máximos e mínimos de característica tipicamente oscilatória distribuídos ao longo da superfície alvo. Planck também observou que quando tapava um dos orifícios de modo a ter certeza sobre a trajetória das partículas, estas registravam apenas uma concentração de impactos na segunda placa, evidenciando um comportamento corpuscular, totalmente desprovido das características ondulatórias que demonstrara no teste com dois orifícios. Os resultados desta experiência definiram o princípio básico da física quântica, a dualidade onda-partícula, que determina que partículas atômicas podem se comportar tanto como corpos materiais, quanto como ondas. Este enunciado estabelece a mecânica quântica como uma ciência probabilística, que ocupava o lugar da ciência determinista dos séculos anteriores. Falar em dualidade e incerteza, em oposição ao determinismo, pode dar margem à impressão incorreta de que a física quântica seja alguma forma alternativa de ciência, que rompe com os modelos matemáticos convencionais. Talvez por isto, esotéricos, místicos e terapeutas holísticos gostem tanto da ideia – interpretam de modo
Não foi bem assim o final da história (como vimos). Mais tarde, o teorema de Gödel demonstrou o contrário, para a infelicidade daqueles que sonhavam. Assim, esses são os dois problemas indiscutíveis que limitam a ciência, mas ainda não são as únicas pedras que estão no caminho daqueles que buscam a investigação de uma suposta verdade. Embora possa ser acusado de “ciência irônica”, não posso negar minha percepção; John Horgan é um jornalista, ex-editor da revista Scientific American, que dedica porções consideráveis em uma crítica voraz para o que chama de ciência irônica – talvez o maior militante. Horgan procura demonstrar que, nos casos mais citados da literatura, tais afirmações sobre os limites não se teriam comprovado. Os cientistas, para Horgan, seriam figuras igualmente retardatárias e trágicas, que devem carregar o peso, ainda maior, de belas e verdadeiras teorias associadas aos nomes de Newton, Darwin e Einstein. Não devemos desmerecer Horgan, mas como Thomas Kuhn, sabiamente, nos mostrou, a ciência não é feita de conhecimentos cumulativos, o que não a impede de que por vezes os tenha. Kuhn assemelha a ciência à estrutura arquitetônica de uma casa, onde em certos momentos só a simples quebra de um banheiro, ou a troca completa das telhas não é suficiente. Algumas vezes, em busca do melhor para a construção, é necessário derrubar toda a casa e começar a construí-la do zero novamente – assim seria a ciência em busca de certezas. Horgan critica Roger Penrose, afirmando que, em geral, “ele e os outros de sua espécie só têm uma opção: explorar a ciência de modo especulativo e pósempírico”, o que chama de ciência irônica. Diz ainda que “essa ciência irônica se assemelha à crítica lite-
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Colunas - Filosofia rária por oferecer pontos de vista, opiniões que são, na melhor das hipóteses, interessantes, provocando outros comentários. Mas elas não convergem para a verdade. Não pode realizar surpresas empiricamente verificáveis que forcem os cientistas a fazer revisões substanciais na sua descrição básica da realidade (HORGAN, John. O fim da ciência: uma discussão sobre os limites do conhecimento científico. São Paulo, Companhia das Letras, 1998, p. 18)”.
do mundo parecem ser tão semelhantes.
Talvez todas as fronteiras sejam ilusórias, sejam erguidas por nós mesmos através de nossa falta de informação sobre a natureza das coisas, ou pelas escolhas de um modelo simplista, ou mesmo um muito complicado, da realidade. Esta é uma questão que deve ser levada a sério. Todas as nossas tentativas de descrever o funcionamento da Natureza, e de prever ou controlar eventos futuros, são norteadas por uma base científiA afirmação de Horgan é no mínimo injusta, desme- ca de métodos que constróem um “modelo” de como recendo um trabalho que contribui para uma investi- alguns aspectos da natureza operam. Fazemos as mais gação humana, mesmo que não possam ser feitas ve- diversas observações, completas e precisas, destas rificações ou observações. Lembremos que a ciência representações da Natureza - que podemos vesurgiu, a priori, da filosofia, e quando o filósofo não rificar e entender. Nossos modelos da Natureza tem mais perguntas, o cientista perde o rumo. Não te- são invariavelmente de caráter matemático. Isto nho mais nada a dizer sobre o Horgan. não é tão exato quanto parece em primeiro lugar. Embora o forasteiro vê a matemática como Para aqueles que compreendem a filosofia como a raiz uma forma friamente analítica de olhar para do conhecimento humano, o cerne das perguntas e ca- o mundo, é algo mais profundo do que minhos a seguir, estará claro; lá vai, não mais um pro- isso: algo que está intimamente ligado a blema, mas uma pergunta: outras imagens humanas do mundo. Na raiz, a matemática é o nome que damos à coleção de todos os Existiriam limitações na nossa linguagem científica perpossíveis padrões e inter-relações – isso na percepção, ceptiva com que vemos o mundo e o prevemos? dito, lógica humana. Essa mesma percepção humana Neste último aspecto, o ponto mais significativo é a incapaz de compreender, com sua lógica, o compordistinção entre o mundo tal como ele realmente é, e tamento apresentado pelo Princípio da Incerteza no nossa percepção e apreensão do mesmo. Nesta distin- mundo quantico, e que se depara com fenomenos não ção, feita cuidadosamente pelo argumento do filóso- computáveis, paradoxos que não podem ser resolvifo alemão Immanuel Kant, no século XVIII, incita que dos, como bem percebeu Gödel. a nossa apreensão do mundo sempre foi processada Ambas as três barreiras partem de um fenômeno paatravés dos conceitos mentais fornecidos pelo nosso radoxal sobre podermos saber sobre o que não saber. cérebro. Assim, algo sempre seria deixado de fora ou distorcido dentro desse processo, e o real nunca alcan- A impossibilidade está na raiz de muitos dos floresçado. Não poderiamos ter acesso à verdade nua e crua cimentos da imaginação humana - o conceito de im- não expurgada sobre as coisas. possibilidade, tanto como uma restrição em ações humanas, quanto por meio do contraste com o conceito Sempre deve haver uma lacuna entre a realidade e o de um Ser para quem nada é uma impossibilidade. nosso conhecimento sobre ela – seja objetiva ou subTambém tem desempenhado um papel estimulante jetiva. Assim, Kant pode muito bem revelar, a partir na arte, filosofia, natureza da linguagem, verdade e lódo amor à sabedoria e os fatos apresentados pela regica, nos afortunando com persistentes juros, levando alidade, que, há um limite fundamental para o nosso a profundas novas considerações: o problema do inficonhecimento das coisas: uma lacuna intransponível nito, a origem das forças naturais e a consciência huentre o que é, e o que podemos saber sobre. Enquanto mana. O desenvolvimento de descrições complexas do esta lacuna é inegável, ainda há espaço para discutir funcionamento do mundo físico parecem nos conduzir sobre o quão grande é este abismo. inevitavelmente a teorias que compreendem suas próprias limitações. Mas o que Kant não sabia, e agora nós conhecemos, é que as categorias de pensamento que usamos para fa- Para a simples contextualização de todo o transcorrer zer o sentido do mundo são resultado de um processo do texto, evoco Roger Penrose: de seleção natural. Eles têm presumivelmente sido se“...melhor expressa a minha posição sobre essa lecionados para o sucesso em dar uma representação questão, onde cada um dos Três Mundos, platôniprecisa das partes da realidade que são importantes co-Matemática, Física e Mental tem o seu próprio para a sobrevivência dos organismos. Sem dúvida, um tipo de realidade, e onde cada um é (profundanotável argumento do por que a imagem e impressão Revista Livre Pensamento - Número 2
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Colunas - Filosofia mente e misteriosamente) encontrado em um, que o precede (os mundos assumem um ciclo). Eu gosto de pensar que, em certo sentido o mundo platônico pode ser o mais primitivo dos três, já que a matemática é uma espécie de necessidade, quase evocando sozinha a sua própria existência através da lógica. Seja como for, há um rico mistério ou paradoxo, sobre cíclicos aspectos desses mundos, onde cada um seja capaz de abranger a um sucesso, na sua totalidade, enquanto si mesmo depende de apenas uma pequena parte do seu antecessor.” (PENROSE, Roger. The Road to Reality. 2004, Pg.1028).
Talvez a ciência enfrente um destino subjetivo, considerado por muitos cientistas como um destino pior do que a própria morte da ciência. Independentemente de saber se tal especulação tem atrações especiais para o sucesso dos cientistas empíricos em determinadas fases de sua carreira, esta é realmente uma previsão sobre a natureza do Universo. É uma possibilidade de que existe um limite para o modo como lidamos com a observação sobre a natureza das coisas. Haverá coisas que nós não podemos ver, eventos que não podemos gravar, possibilidades que não seremos capazes de prever e nem descartar. Quando isso acontece, tudo o que podemos fazer é pintar quadros de possíveis cenários que são consistentes com o pouco que sabemos. Mas as lacunas que permanecerem em nosso conhecimento vão permitir muitas possibilidades diferentes de existir. Considerando que essas lacunas formam uma pequena parte da ciência hoje, seu tamanho relativo pode crescer rapidamente. Um dia, nossos descendentes poderão acordar e descobrir o quão grande seria a fronteira entre o conhecido e o desconhecido. É notado que, nos últimos anos, os pronunciamentos e as previsões da ciência tornaram-se cada vez mais ousadas e especulativas. Cientistas parecem ter deixado o papel de meramente descrever o que fizeram ou o que a Natureza é, ansiosos para contar o profundo significado de suas descobertas para uma gama cada vez maior de questões filosóficas, especular sobre o futuro - possibilidades de formas que parecem mais próximas do reino da ficção científica do que para a ciência de
fato. Alguns exemplos disso são: a busca para fabricar formas de inteligência artificial, a busca por seres extraterrestres avançados, a explicação dos sentimentos e emoções humanas através da evolução adaptativa, as possibilidades que a leitura do código genético da vida nos traz e a certa erradicação de doenças e prolongamento da vida humana. Me parece que essa tendência para o transcendental na popularização da ciência nos aparece como um substituto para o suposto declínio das religiões atuais. Já outros, veem a ciência como uma fonte de ideias transcendentais alternativas, que nos levam para além da monotonia dos noticiários. Parece haver no ser humano um profundo desejo por algo maior que nós mesmos e pela compreensão do significado do Universo. Para finalizar, é importante distinguir um olhar subjetivo visando o trancesdental, e o olhar subjetivo em busca da verdade – tal como a ciência surge. Caso nossa Ciência e percepção sejam limitadas à apreensão real do Universo, que seja sabido por todos os cantos do Universo que nós identificamos isto através da ciência e filosofia.
REFERÊNCIAS PENROSE, Roger. The Road to Reality. 2004. BARROW, John D. The Limits of Science and The Science of The Limits. 1998. HORGAN, John. O fim da ciência: uma discussão sobre os limites do conhecimento científico. São Paulo, Companhia das Letras, 1998. Sobre o Autor: Eder Juno N. Terra, 22 anos, é jornalista, pós-graduando em Cinema e Vídeo, graduando em Física-Biológica e músico. Autor do blog CCAL e integrante do Projeto Livres Pensadores, tem uma visão secular, e é contrário a qualquer tipo de fé, valor, crença, moral, ideologia, doutrina, religiosidade, cientificismo ou filosofia de vida. Blog: criandocondicoesaliberdade.blogspot.com
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Natureza Humana Colunas - Natureza Humana
Estereótipos - Uma questão puramente cultural. Ou não.
Estereótipos geralmente são vistos como informações equivocadas e às vezes até ofensivas. Parece que o simples fato de encaixarmos uma pessoa, ou uma característica de uma pessoa, num grupo específico é uma atitude segregadora e preconceituosa. Mas, nunca me saiu da cabeça a possibilidade (às vezes até uma constatação) de certos estereótipos corresponderem à realidade. Talvez um dos estereótipos mais difundidos seja a preferência de meninos por carrinhos e objetos geralmente relacionados à mecânica, e a de meninas por bonecas, rostos e bebês (bonecos). A maioria das pessoas acharia óbvio que essas predileções se originam de convenções sociais. Bom, não é bem por aí. Uma boa quantidade de estudos com humanos e
chimpanzés sugere que esse dimorfismo sexual tem suas raízes na biologia. Para testar a natureza dos estereótipos atribuídos a meninos e meninas e suas preferências de brincadeiras, 60 bebês (36 meninos e 24 meninas) foram recrutados em clínicas locais e por meio de publicações médicas. Nenhum era prematuro. O acompanhamento dessas crianças se deu por alguns meses porque a experiência iria avaliá-los em diferentes períodos: aos 3, 9 e 18 meses de vida. No experimento, o bebê ficava no colo da mãe a uma distância de 60 centímetros de dois monitores, onde, entre eles, ficava uma câmera que registraria o tempo que cada bebê gastaria olhando para as telas. Cada um
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Colunas - Natureza Humana dos monitores exibia um brinquedo, de acordo com os estereótipos de gênero indicados por dois pesquisadores (Berenbaum e Snyder, 1995). Assim, quando um exibia um brinquedo masculino, o outro exibia um feminino e vice-versa. Na segunda parte, os bebês assistiam a diversos videos de crianças de 6 e 7 anos brincando. O sexo das crianças dos videos era sempre igual ao da espectadora, e no video, as crianças apareciam brincando também de acordo com os estereótipos (Fagot e Leinbach, 1989).
Vamos aos resultados: • A partir de 3 meses, os bebês do sexo masculino tendiam a olhar mais para os rostos dos meninos do que as meninas. • Aos 9 meses, os meninos olhavam mais tempo para brinquedos ditos masculinos do que para os ditos femininos. • A partir de 9 meses, os meninos olhavam muito mais para os menininhos no vídeo que apareciam brincando de caubói e pulando, do que as meninas. Querendo definir mais precisamente a natureza dessas preferências, se a influência maior era da cultura ou de característias biológicas, pesquisadores resolveram observar o comportamento de 100 recém-nascidos. O objetivo da pesquisa era observar como eles reagiam quando lhes era apresentado um rosto ou um móbile (objeto físico-mecânico). Os resultados mostraram que os menininhos olhavam móbiles por mais tempo do que as menininhas, que por sua vez, observavam rostos por mais tempo. Para os pesquisadores, esse experimento mostra de maneira clara a origem biológica desse dimorfismo sexual entre homens e mulheres (Conellan, Baron-Cohen, Wheelwright, Batki, Ahluwalia, 2001).
ses (meninos e meninas). Foram mostradas às crianças carrinhos e rostos. E, assim como no estudo anterior, meninas observaram por mais tempo os rostos e os meninos, os carrinhos. Outros estudos parecem se relacionar com esses, convergindo para os mesmos resultados. Mas, curiosamente, são estudos com primatas não-humanos, como os chimpanzés (Pan troglodytes). Segundo os primatologistas Sonya Kahlberg, do Bates College, e Richard Wrangham, da Universidade Harvard, nos EUA, as macacas jovens, às vezes, “brincam de boneca”. Eles estudaram 68 chimpanzés que vivem em liberdade. Foi analisado como eles lidavam com gravetos e pedaços de galhos de árvores. Os animais foram acompanhados por dois anos no Parque Nacional de Kibale, em Uganda. Foi descoberto que além do uso como armas e ferramentas para buscar água, mel e cupins em cavidades profundas em buracos e troncos de árvore, eles também brincavam com os gravetos! Os primatologistas observaram que mais de 40% do tempo passado com galhos foi dedicado a brincadeiras de “casinha”, em que os galhos eram levados para lá e para cá e eram embalados nos braços das fêmeas, como se ninassem um filhote (Mente & Cérebro, 2011). E não eram só as fêmeas que usavam os gravetos para atividades lúdicas: “O exemplo mais incrível foi o de um macho de 8 anos que pegou uma pequena tora e a colocou em um ninho e ‘brincou de avião’” diz Wrangham da Universidade de Harvard ao Discovery News: “Ele deitou sobre suas costas segurando a tora sobre as palmas de seus pés e mãos, mo-
Para assegurar a validade dos resultados dessa pesquisa, em 2002 ela foi reproduzida pelos pesquisadores Lutchmaya e Baron-Cohen, com 60 bebês de 12 meRevista Livre Pensamento - Número 2
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Colunas - Natureza Humana vendo-a de um lado ao outro.” (retirado e traduzido por Bule Voador http://bulevoador.haaan. com/2010/12/19374) E prossegue:
Referências: Brincando de ser mãe: chimpanzés fêmeas tratam galhos como se fossem boneca, Mente & Cérebro, nº 221, Duetto, 2011.
CICCOTI, Serge, É verdade que os meninos gostam de “A brincadeira de ‘avião’ é algo que os humanos carrinhos e as meninas, de bonecas? Experimentos fazem com seus filhos, e as mães chimpanzés essenciais de psicologia, São Paulo: Duetto Editorial, 2010. também.” E continua: “Mais tarde esse macho, Kakama, fez um pequeno ninho onde colocou a VIEGAS, Jennifer; Female chimps play with stick dolls, tora, antes de ir para seu próprio ninho.” (retirado Discovery News, 2010. http://news.discovery.com/anie traduzido por Bule Voador http://bulevoador. mals/female-chimps-dolls-sticks-101220.html haaan.com/2010/12/19374) BERENBAUM, S. A. e E. Snyder, Early hormonal influences on childhood sex-typed activity and playmate Wrangham afirma, ainda, que os chimpanzés machos preferences: implications for the development of sexmanifestavam uma nítida preferência por bolas e car- ual orientation; Developmental Psychology; 31, págs. rinhos quando eram apresentados a, além desses dois, 1-42, 1995. potes e bonecas. As fêmeas preferiam lidar mais com FAGOT, B. e M. Leinbach, The young child’s gender os potes e com as bonecas. schema: environmental input, internal organization, Child Development, 60, págs. 663-672, 1989. Por muito tempo acreditou-se que as diferenças entre homens e mulheres eram produzidas socialmente, de CONELLAN, J., S. Baron-Cohen, S. Wheel Wright, A. forma que, se criássemos um filho dando a ele bonecas Batki. E J. Ahluwalia, Sex differences in human neoele iria crescer com preferência por bonecas e não por natal social perception, Infant Behavior and Developbrinquedos tipicamente masculinos. Não passariam de ment, 23, págs. 113-118, 2001. estereótipos culturais. Parece que, como acontece inúmeras vezes, a nossa razão não foi tão boa em prever Sobre o Autor: cenários, tendo sido mais elucidativo aliar nossa racioFelipe Carvalho Novaes é nalidade com a experimentação. Ainda assim, alguns um graduando em psicoestudiosos preferem ignorar essas pesquisas, alegar logia que quer seguir as áreas de psicologia evolusimplesmente que não acreditam nos resultados ou cionista e/ou psicologia mesmo dizer que tudo não passa de construção histócognitiva e/ou neurociênrica e social. Os experimentos falam por si mesmos. A cia mas que não deixa de cada dia que passa, Darwin se mostra mais correto, em ser fascinado pelo universo, natureza e pela história A Expressão das Emoções nos Homens e nos Animais, humana, o que o leva a ter um pé também na astroquando nos diz que o homem compartilha sua natunomia, cosmologia, filosofia e história. Dentro da psicologia, um de seus temas preferidos é o autismo reza com os outros animais não-humanos não só em (especialmente a síndrome de Asperger) e as exrelação à anatomia, mas em relação a muitos aspecpressões faciais, além de pesquisar sobre as raízes tos do comportamento também. Claro que o ambiente da psicopatia e da genialidade. Nerd de carteirinha, pode modular nossas habilidades e propensões, exaltambém é fã de um bom filme de ficção científica, tando ou neutralizando-as até certo ponto, mas nossa de revistas em quadrinhos e de video game. Blog: nerdworkingbr.blogspot.com base evolutiva sempre fará ouvir sua voz. Revista Livre Pensamento - Número 2
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Operando o Comportamento Colunas - Operando o Comportamento
O que é comportamento? Definindo para evitar confusões conceituais.
Muitas pessoas dizem que o Behaviorismo é reducionista, só estuda o comportamento, e ignora emoção, sentimento, pensamento, etc. Especulam que existe muito mais que comportamento na complexidade dos conhecimentos humanos. E realmente existe.
A resposta, que é o que o organismo está a fazer, em relação a uma alteração ambiental que pode ter acontecido antes (estímulo discriminativo, condicional, Operações Motivadoras) ou depois (Conseqüências reforçadoras, punitivas, extinção).
Mas a questão é: o que essas pessoas chamam de comportamento é o mesmo que o behaviorista (radical) considera? Para as pessoas em geral, e outras teorias psicológicas, o conceito de comportamento é apenas o movimento mecânico de um organismo - “o que ele faz”.
O simples fazer, ou “resposta” não pode ser estudado, pois não acontece no vácuo, nem é tão pouco possível estudar o que acontece - “estimulo” -, independente do responder.
Como Descartes disse: “Cogito ergo sun”, penso logo sou (existo), penso logo faço, assim atribuindo a ação mecânica a uma causa interna, o pensar, dizendo que o pensar não era uma ação da mesma substância que o simples andar, por exemplo.
Importante: A ciência do comportamento é a ciência de relações entre estímulos e respostas, e/ou entre contexto, responder e consequências. Assim, comportamento, para o Behaviorista Radical, é SINÔNIMO DE RELAÇÃO. Ao contrário de Descartes, não diferenciamos pensar de fazer como substâncias distintas. Pensar é fazer, é relação com o mundo, portanto pensar, sentir, etc., todos estes são comportamentos.
Comportamento, na cultura em geral, virou apenas um “sintoma”, uma expressão de algo interno ao sujeito chamado “mente”. Mas quando um behaviorista radical diz ou pensa em comportamento está se referindo a outra coisa. E esta coisa é um processo. Então, digamos que o processo do comportamento para nós, behavioristas, implica sempre na relação do organismo com o ambiente. Isso inclui desde se movimentar, até a estudar, resolver problemas, pensar, lembrar, sentir. Assim, o limite desde conceito é bem mais amplo do que é de forma errônea considerado grande parte do que fazemos é comportamento.
Sobre o Autor: Marcos Adilson Rodrigues Júnior é estudante do 8° Período do curso de Psicologia, Ateu, Cético, Pragmático e Behaviorista Radical. Acredita que a Ciência é a melhor forma que temos de obter conhecimento seguro e resultados satisfatórios para a espécie humana e o universo que a circunda. Blog: analisefuncional.livrespensadores.org
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Pedagogia Colunas - Pedagogia
Como Estrelas na Terra
Uma lousa de sala de aula preenchida por números e letras misturados e, na frente dela, professoras típicas anunciando as notas de seus alunos. Aqueles que tiveram bom desempenho ganham um sorriso de satisfação, e aquele que sempre vai mal recebe uma expressão de decepção. Assim inicia-se o filme que nos mostra, através da história de um menino com dislexia, o sofrimento pelo qual uma criança em idade escolar pode passar, cercada de pessoas incapazes de entender o que se passa com um outro, especialmente quando este é uma criança. “Como Estrelas na Terra” é dirigido pelo, até então, ator e produtor Aamir Khan, que impressiona pela qualidade, criticidade e sensibilidade do filme, no qual atua como o professor substituto Ram Shankar Nikumb. Embora a história seja focada em uma criança em especial, o filme mostra as negligências, falta de cuidado e de atenção com a maioria das crianças. Em especial,
mostra o real papel do educador para a formação de um novo ser. Diferente da maior parte do cinema indiano, as músicas neste filme não são apenas para promoção do mesmo, mas uma parte importante da construção deste, sendo inseridas na historia quase como nos dizendo o que as situações representam, sem as cenas de dança típicas do cinema bollywoodiano - nome dado à indústria de cinema hindi, a maior indústria de cinema indiana, em termos de lucros e popularidade, cujo nome se deve à fusão de Bombaim (antigo nome de Mumbai, onde se localiza a indústria) e Hollywood (indústria cinematográfica americana). Sendo diferente de todas as outras pessoas, o menino Ishaan – protagonista do filme - sempre arranja confusão, mas por não estar dentro do mundo deles, consegue enxergar coisas que os outros deixam passar despercebidas.
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Colunas - Pedagogia A primeira música do filme nos mostra exatamente isso, ao criticar o ritmo de vida pré-moldado e frenético da família de Ishaan - que enfrenta diariamente uma “luta maluca para chegar a um destino”. Em oposição a isso, as crianças “não são escravas do tempo, são livres, tem reuniões com as borboletas e debates com as árvores.”
Tendo sua dificuldade ignorada, o garoto fica nervoso (como era de se esperar) e utiliza-se de ‘mal-comportamento’ para sair da situação. Não importa muito aqui o motivo pelo qual os professores fazem isso, mas sim o que acabam fazendo às crianças, que sempre pagam pela ignorância dos outros. Todos os outros alunos zombam de Ishaan, acabando por humilhá-lo, e, triste, o menino foge da escola à procura de liberdade, o que não encontraria naquele lugar. A música que se segue explicita o pensamento do menino: “Existem outros como eu? Não estou sozinho sonhando acordado, de olhos abertos?”
Para os pais, Ishaan é preguiçoso, desatento. O pai é agressivo, não percebe que ele é apenas uma criança e o quanto pode ser assustador para ele. Ambos os Mas não é isso o que a sociedade espera delas, como pais deveriam apoiar o menino, mas ficam nervosos, vemos com a mãe do menino, que, mecanicamente, xingam, batem – não conseguem ver com os olhos do assume o papel de tirá-lo desse estado, procurando filho, apenas através dos seus. adaptá-lo para a vida no mundo dito real, o do trabalho, com horários marcados. Na escola, vemos a religião impondo regras e organização utópicas, sem levar em consideração as crianças, que não escutam, muito menos entendem, o que lhes dizem. No mesmo cenário, surge a professora enérgica que grita, impaciente, com os alunos que ela não enxerga. Ao ser ordenado a ler um texto, Ishaan responde que “As letras estão dançando”, e a professora acha que o aluno zomba dela.
Logo, Ishaan deverá mudar-se de escola, pois suas professoras dizem que ele não progride, erra de propósito e não se interessa pelas aulas. Mas a culpa é dele ou as aulas eram desinteressantes? Quem deveria fazê-lo se interessar e ajudá-lo a progredir? Frente ao “fracasso” do filho, os pais só conseguem pensar em si mesmos: o pai sente-se insultado por ter um filho chamado de retardado e a mãe, por sua vez, sente-se culpada, questionando-se sobre onde teria errado. Nenhum dos dois pensa em como o menino está se sentindo e o punem (colocando realmente a culpa pelo fracasso em Ishaan), mandando-o a um colégio interno, com o qual o menino tem pesadelos e implora para não ir. Ainda assim, ele não tem chances, pois está sozinho – sem alguém que possa entendê-lo. As cenas em que Ishaan é deixado no colégio interno, ao som da música ‘Maa’, que significa mãe – uma das mais belas do filme –, mostram a dor e desencanta-
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Colunas - Pedagogia mento do menino, ao se ver abandonado. “Sou tão ruim assim, mãe?”, ouvimos na canção que mostra os sentimentos de culpa e sofrimento pelos quais toda criança passa ao ser castigada por aqueles que mais ama. Toda criança passa por isso, ao apanhar dos pais – ou mesmo brigar com eles – e logo em seguida ser impulsionado a chorar no colo deles, afinal de contas não há a quem mais recorrer (são como o Deus que ama, e por isso pune, mas não deixa de merecer o amor do filho).
O filme também destrói a crença de que a mãe sabe o que é melhor para o filho, mostrando que apenas o sentimento que se tem por este não é suficiente. Para criar uma criança do melhor modo é preciso ter conhecimento sobre o mundo, saber entender o outro e poder ajudar quando preciso, sabendo identificar necessidades e enxergar oportunidades.
“Por que você não consegue?”, berram os professores na música que se segue, onde vemos o desespero de Ishaan, que não consegue se adaptar ao sistema insano de obediência e repetição. Impossível não lembrar de “Another Brick In The Wall”, pelo tom agressivo com que as críticas à educação são feitas, com a diferença que, no filme em questão, os professores são quem têm a palavra, demonstrando toda a sua prepotência e arrogância frente ao papel de professores. Longe da família e ridicularizado no novo ambiente, Ishaan torna-se apático, vazio. A vivacidade, alegria e curiosidade que o levavam a produzir ricos desenhos e pinturas, agora são substituídos pela tristeza do abandono, pela decepção, em especial com a atitude da mãe, pela repressão e autoritarismo que agora lhe são contínuos, sem ter para onde fugir.
Anestesiado, o menino parece entrar em um ciclo autodestrutivo – não estando descartadas as possibilidades de suicídio ou abandono social – e não se dá conta de que poderia obter ajuda do novo professor que se apresentava de modo diferente, dizendo aos alunos que a partir de então, em sua aula, estavam livres.
No colégio interno, a regra é disciplina. As crianças se adaptam ao sistema e apenas reproduzem o que lhes é dito, assim agradando aos ‘mestres’. “Lembre-se do que ele diz e imite-o”, sugere um colega de Ishaan, demonstrando o método com o qual é possível sobreviver ali (cenário idêntico às escolas tradicionais daqui – Brasil). Ao longo dos dias, Ishaan ouve de todos ao seu redor (pai, mãe, professores, etc) a mesma opinião, de que é preguiçoso, desatento, incompetente... Ninguém bus- Este professor, Ram Shankar Nikumb, vindo de uma ca compreender os motivos de seu comportamento, escola de crianças especiais, tem uma outra visão do ensino, que olha para o aluno e atende às suas necesmas todos o julgam. sidades, bem como abre novos caminhos. Os outros Revista Livre Pensamento - Número 2
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Colunas - Pedagogia professores dizem-lhe, por sua vez, que seus métodos não funcionariam ali, onde as crianças eram preparadas para a “batalha da vida”. “Crianças têm de competir, fazer sucesso, vencer”, diz um dos professores, que deveria ser um profissional apto a lidar com as diferenças e mostrar que as coisas mais importantes não consegue-se passando por cima de ninguém, mas se obtém da própria vida. Mas ainda são poucos os professores que realmente sabem o valor e importância de sua profissão. Assume-se simplesmente o papel de adaptar as crianças ao mundo competitivo e alienante do trabalho – e achando que com isso estão contribuindo suficientemente para a formação dessas pessoas. Ram, diferente dos outros, olha para Ishaan e vê o que ninguém percebia, que “seus olhos berram por socorro”, e seu papel é ajudar o menino. Mas não é precipitado, antes busca analisar os cadernos, conversar com o único amigo de Ishaan e, inevitavelmente, procurar a família – essencialmente, busca entender quem é aquela criança.
e seus significados. O mal comportamento de Ishaan, explica aos pais, vem da dificuldade de admitir suas incapacidades: é mais fácil dizer “não quero”, ao invés de admitir que não consegue. O professor, então, depara-se com a dura realidade de que os pais não se importam que o filho esteja bem, mas que seja bem-sucedido perante os outros. “Como ele vai competir? Terei de alimentá-lo a vida toda?” questiona o pai, mostrando sua real preocupação com a própria imagem e desejo, desconsiderando as dificuldades, bem como o bem-estar do filho. “Nessa corrida desesperada, alimentam cavalos de corrida, não crianças”, indigna-se Ram, completando que forçar crianças a carregar o fardo das ambições de seus pais é pior do que trabalho infantil. Então que, compreendendo o ambiente onde viveu Ishaan e percebendo características de dislexia nos materiais e comportamento do aluno, o professor parte para sua missão de resgatar o garoto para a vida, despertando-lhe o interesse pelo estudo e mostrandolhe que ele não está sozinho. Após Ishaan estar alcançando progressos em relação aos estudos, graças à compreensão do professor, o pai do menino vai ao colégio dizer a Ram que andaram pesquisando sobre dislexia, para que ele não ache que sua família não se importa com Ishaan. Neste momento marcante, o professor diz o que é importar-se e como isso é essencial para uma criança.
Ao som da música que dá título ao filme, vemos o professor Ram Nikumbh em contato com as crianças especiais e, em seguida, indo conversar com os pais de Ishaan. Antes de mostrar o papel do educador, o filme ensina, mais do que isso, o significado e as implicações de se ter um filho. O professor interpela os pais de Ishaan sobre as dificuldades do garoto, que para eles são apenas erros e indisciplina, e tenta mostrar-lhes Dar suporte, apoiar, encorajar, oferecer ajuda e carique Ishaan não faz nada daquilo por ser preguiçoso ou nho são coisas indispensáveis. É isso o que uma criança burro, mas por ter dificuldade em entender as palavras precisa dos pais, mas, na grande maioria das vezes, esRevista Livre Pensamento - Número 2
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Colunas - Pedagogia tes são muito mais eficazes em desencorajá-las e lhes fazer achar que são ruins, que são o problema. Isto foi o que fizeram também os pais de Ishaan – apontado por Ram. “Que bom que vocês acham que se importam”, conclui o professor, demonstrando que não concorda com o modo como os pais agiram com Ishaan, fazendo o pai perceber o quão responsável pelo sofrimento do filho ele era. É importante deixar claro que não é o diagnóstico de dislexia que desperta Ishaan, mas a grande oportunidade do garoto surge da compreensão, identificação e ajuda que lhe oferece o educador. Partindo do olhar da criança, e entendendo seu mundo, fica fácil abrir portas para a aprendizagem, utilizando métodos e recursos apropriados e interessantes. Ram teve a capacidade de colocar-se no lugar de seu aluno e, partindo de seu mundo, apresentá-lo aos conhecimentos que o menino tanto ansiava por construir, mas não tinha oportunidade ou auxílio. Aí vemos a diferença de um professor – educador – que se compromete com o aluno, não com os conteúdos. Em contato com outros professores, iguais aos tantos outros das escolas que frequentou, ou outros profissionais que poderiam lhe sugerir que tomasse remédios que apenas o adaptariam e entorpeceriam, o diagnóstico de dislexia pouco favoreceria Ishaan. Fracassada é a forma de ensinar que vemos incansavelmente no inicio do filme e por diversas vezes em nossas vidas, com a separação dos conhecimentos, descontextualização dos conteúdos com a vida das crianças e a obediência em oposição à reflexão e criticidade. A diferença está no modo como as dificuldades são observadas e trabalhadas, respeitando-se o ser humano por trás dos rótulos, observando suas potencialidades e dando importância ao que realmente fará a diferença na vida dessas crianças: o conhecimento. Diga-se de passagem que erros ou trocas grafêmicas (troca de letras semelhantes) e espelhamentos de letras são naturais quando as crianças entram no processo de alfabetização, e não indicam necessariamente que a criança seja disléxica. Ao final do filme, vemos os professores e pais de Ishaan reconhecendo suas limitações, se humanizando e percebendo os outros – cena difícil de ser vista na vida
real. Temos realmente um final feliz – que não cabe aqui exprimir em palavras. Mas junto com os créditos, vemos que o final feliz é apenas na ficção, talvez apenas para algumas poucas crianças da vida real, pois surgem na tela imagens de crianças reais, malcuidadas, maltratadas, exploradas, que, ainda assim, sorriem e não deixam de ser crianças, ávidas por conhecimentos. O filme como um todo nos apresenta uma ficção que não tem nada de irreal – é a história da vida de incontáveis crianças e adultos. Quiséramos nós que tudo isso fosse apenas mais uma história de ficção.
“No mundo, há essas pequenas pedras preciosas, que desafiaram os caminhos do mundo, pois podiam olhá-lo com olhos diferentes. Seu pensamento era distinto e nem todos os entendiam. Eles enfrentaram oposição e, ainda assim, venceram, e o mundo ficou maravilhado.”
Sobre a Autora: Kelly R. Conde, 22 anos, é formada em Ciências Contábeis, graduanda em Pedagogia e musicista. Autora do blog CCAL e integrante do Projeto Livres Pensadores, tem uma visão secular, e é contrária a qualquer tipo de fé, valor, crença, moral, ideologia, doutrina, religiosidade, cientificismo ou filosofia de vida. Blog: criandocondicoesaliberdade.blogspot.com
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Resenhas de Livros Colunas - Resenha de Livros
“Assim falou Vargas Vila”
“Assim falou Vargas Vila” (Companhia das Te- nem os bibliotecários, nem os departamentos de letas, 111 páginas, 20,00 reais), de Ezio Flavio tras, os filósofos e os estudantes em geral têm a míniBazzo ma idéia da obra de Vargas Vila. Niilista, ateu, anticlerical e obsessivamente indignado com a palhaçada fastidiosa (sinônimo) reinante na América Latina, principalmente com o carneirismo vergonhoso de sua política e de suas assembleias. Vargas Vila odiava a velharia supersticiosa e os caudilhos criminosos que se sucediam por todos os países do continente, da mesma maneira que detestava a dominação imperialista dos “yankees”. Banido de sua terra natal, mudou-se, definitivamente, para a Europa e incluiu em sua agenda a luta contra as conhecidas máfias intelectualistas, contra os fabricantes de filosofias para entregadores de pizza e contra os conhecidos PHDéspotas que só se valiam da escrita para ruminar e puxar o saco de quem estava no poder. Além dos padres e dos déspotas políticos, também os escritores que sempre florescem em abundância nos quartinhos de fundo dos palácios, das paróquias, da imprensa oficial e dos antros diplomáticos não se cansavam de tentar desqualificá-lo.
José María Vargas Vila (Bogotá, 23 de julho de 1860 Barcelona, 23 de maio de 1933) foi um livre pensador, romancista, jornalista, escritor e poeta latino-americano. Escreveu mais de 70 livros, durante toda a sua vida, dirigiu certeiramente suas bazookas contra todos os gêneros de cretinices, de despotismos, de vaselinismos e puxa-saquismos ordinários. No Brasil, nem os livreiros,
“Os intelectuais não mencionavam sequer o nome de Vargas Vila. Falavam do expatriado, do satânico, do bastardo, do ‘lenguaraz depreciable’, do desnaturalizado, do blasfemo, do luciferiano mendaz, do inimigo da paz, da ordem e da autoridade, do decadente pernicioso, do dissolvente, do degenerado”. – Carlos Vidales Ressuscitá-lo no Brasil, principalmente em Brasília, nesta cidadela de caixotes, de burocratas errantes, de botecos de filhinhos e netinhos dos agentes da ordem, de escritorzinhos engravatados e de shopping centers, neste momento político brochante, com a América
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Colunas - Resenha de Livros tLatina ainda mergulhada em seus esgotos e ainda de joelhos diante da mesma quadrilha do século passado, é quase um dever de quem pensa e de quem tem desprezo pela pobreza mental e generalizada do cotidiano. É quase uma obrigação de quem tem horror a esses magotes ainda não nascidos plenamente, que além da televisão e das feijoadas só conseguem dialogar sobre os ângulos e os pregos da cruz. Dever de quem se sente asfixiado no meio de toda essa ignorância instituída, desse atraso social incurável onde todos os projetos pretensamente revolucionários foram para a merda, e onde a vida se resume em falar mal dos outros, em ir às soirées (sinônimo), ter um emprego, uma casa, uma falsificação de Picasso, um carro e o certificado de filiação a umas tantas e nefastas agremiações idólatras, idealistas e teológicas que, apesar do poder difamatório que dispõem, não são mais do que prostíbulos de infâmia.
trado em psicologia clínica na Universidade Nacional Autonoma do México e doutorado na Universidade Nacional de Barcelona. Mais tarde dedicou-se a um pós doutoramento no Instituto de Altos Estudos da América Latina, em Paris. Apesar dessa longa permanência no meio acadêmico, Bazzo considera o estudo formal uma grande fraude, um adestramento desnecessário e inútil que vai deixar limitações e cicatrizes profundas na capacidade de pensar dos estudantes e dos futuros “doutores”. Bazzo faz questão de ressaltar e de colocar em primeiro lugar sua bagagem como auto didata e como “viajante inveterado”.
Contemporâneo de Freud, admirador de Ibsen, amigo de Pompeyo Gener e leitor de Stirner, seus livros são um manifesto contra a ignorância e a bestialização social, mas também contra o absurdo da existência e todas as hipóteses divinas. “Curar-se de certas excentricidades, é fazer como os outros: cretinizar-se; a primeira condição de ser coletivo é ser abjeto.” – Vargas Vila, Del Rosal pensante, vol. 40, p.188 Para Vargas Vila, a religiosidade é uma doença hereditária. O medo e a ignorância engendraram a divindade. O livro “Assim Falou Vargas Vila”, contem 323 anátemas especialmente selecionados por Ezio Flavio Bazzo, que, por simpatia e identificação, traduziu e editou. Apesar de terem sido escritos há praticamente um século, têm tudo a ver com o hospício vigente do nosso cotidiano e com as psicopatologias secretas e reincidentes de nosso imaginário. Ezio Flavio Bazo é graduado em psicologia, cursou mes-
Sobre o Autor: Fred Lins Junior é alguém que luta por uma sociedade onde o trabalho alienado deve dar lugar a uma criatividade coletiva, regulada pelos desejos de cada um, onde o direito de comunicação real pertence a todos.
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Humor A Terra e a Lua em: O Rebaixamento de Plutão.
Autor da tirinha: Mário César Mancinelli de Araújo Imagens utilizadas na montagem de: http://www.nasa.gov/ Revista Livre Pensamento - Número 2
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Ser Humano Matérias - Autor:
Declaração Universal dos Direitos Humanos
Tradução oficial, UNITED NATIONS HIGH COMMISSIONER FOR HUMAN RIGHTS teram a promover, em cooperação com a Organização das Nações Unidas, o respeito universal e efetivo dos direitos do Homem e das liberdades fundamentais; Considerando que uma concepção comum destes direitos e liberdades é da mais alta importância para dar plena satisfação a tal compromisso:
Preâmbulo Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo; Considerando que o desconhecimento e o desprezo dos direitos do Homem conduziram a atos de barbárie que revoltam a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que os seres humanos sejam livres de falar e de crer, libertos do terror e da miséria, foi proclamado como a mais alta inspiração do Homem; Considerando que é essencial a proteção dos direitos do Homem através de um regime de direito, para que o Homem não seja compelido, em supremo recurso, à revolta contra a tirania e a opressão; Considerando que é essencial encorajar o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações; Considerando que, na Carta, os povos das Nações Unidas proclamam, de novo, a sua fé nos direitos fundamentais do Homem, na dignidade e no valor da pessoa humana, na igualdade de direitos dos homens e das mulheres e se declaram resolvidos a favorecer o progresso social e a instaurar melhores condições de vida dentro de uma liberdade mais ampla; Considerando que os Estados membros se comprome-
A Assembléia Geral proclama a presente Declaração Universal dos Direitos Humanos como ideal comum a atingir por todos os povos e todas as nações, a fim de que todos os indivíduos e todos os órgãos da sociedade, tendo-a constantemente no espírito, se esforcem, pelo ensino e pela educação, por desenvolver o respeito desses direitos e liberdades e por promover, por medidas progressivas de ordem nacional e internacional, o seu reconhecimento e a sua aplicação universais e efetivos tanto entre as populações dos próprios Estados membros como entre as dos territórios colocados sob a sua jurisdição.
Artigo 1° Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.
Artigo 2° Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na presente Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação. Além disso, não será feita nenhuma distinção fundada no estatuto político, jurídico ou internacional do país ou do território da naturalidade da pessoa, seja esse país ou território independente, sob tutela, autônomo ou sujeito a alguma limitação de soberania.
Artigo 3° Todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.
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Matérias - Autor: necessárias de defesa lhe sejam asseguradas.
Artigo 4° Ninguém será mantido em escravatura ou em servidão; a escravatura e o trato dos escravos, sob todas as formas, são proibidos.
Artigo 5° Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.
Artigo 6° Todos os indivíduos têm direito ao reconhecimento, em todos os lugares, da sua personalidade jurídica.
Artigo 7° Todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito a igual proteção da lei. Todos têm direito a proteção igual contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.
Artigo 8° Toda a pessoa direito a recurso efetivo para as jurisdições nacionais competentes contra os atos que violem os direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição ou pela lei.
Artigo 9° Ninguém pode ser arbitrariamente preso, detido ou exilado.
Artigo 10° Toda a pessoa tem direito, em plena igualdade, a que a sua causa seja eqüitativa e publicamente julgada por um tribunal independente e imparcial que decida dos seus direitos e obrigações ou das razões de qualquer acusação em matéria penal que contra ela seja deduzida.
Artigo 11°
1. Toda a pessoa acusada de um ato delituoso presume-se inocente até que a sua culpabilidade fique legalmente provada no decurso de um processo público em que todas as garantias
2. Ninguém será condenado por ações ou omissões que, no momento da sua prática, não constituíam ato delituoso à face do direito interno ou internacional. Do mesmo modo, não será infligida pena mais grave do que a que era aplicável no momento em que o acto delituoso foi cometido.
Artigo 12° Ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua correspondência, nem ataques à sua honra e reputação. Contra tais intromissões ou ataques toda a pessoa tem direito a proteção da lei.
Artigo 13° 1. Toda a pessoa tem o direito de livremente circular e escolher a sua residência no interior de um Estado. 2. Toda a pessoa tem o direito de abandonar o país em que se encontra, incluindo o seu, e o direito de regressar ao seu país.
Artigo 14° 1. Toda a pessoa sujeita a perseguição tem o direito de procurar e de beneficiar de asilo em outros países. 2. Este direito não pode, porém, ser invocado no caso de processo realmente existente por crime de direito comum ou por atividades contrárias aos fins e aos princípios das Nações Unidas.
Artigo 15° 1. Todo o indivíduo tem direito a ter uma nacionalidade. 2. Ninguém pode ser arbitrariamente privado da sua nacionalidade nem do direito de mudar de nacionalidade.
Artigo 16° 1. A partir da idade núbil, o homem e a mulher têm o direito de casar e de constituir família,
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Matérias - Autor: sem restrição alguma de raça, nacionalidade ou religião. Durante o casamento e na altura da sua dissolução, ambos têm direitos iguais.
2. Toda a pessoa tem direito de acesso, em condições de igualdade, às funções públicas do seu país.
2. O casamento não pode ser celebrado sem o livre e pleno consentimento dos futuros esposos.
3. A vontade do povo é o fundamento da autoridade dos poderes públicos: e deve exprimir-se através de eleições honestas a realizar periodicamente por sufrágio universal e igual, com voto secreto ou segundo processo equivalente que salvaguarde a liberdade de voto.
3. A família é o elemento natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção desta e do Estado.
Artigo 22°
Artigo 17°
Toda a pessoa, como membro da sociedade, tem direito à segurança social; e pode legitimamente exigir a satisfação dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis, graças ao esforço nacional e à coopera2. Ninguém pode ser arbitrariamente privado da ção internacional, de harmonia com a organização e os sua propriedade. recursos de cada país. 1. Toda a pessoa, individual ou coletiva, tem direito à propriedade.
Artigo 18°
Artigo 23°
Toda a pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; este direito implica a liberdade de mudar de religião ou de convicção, assim como a liberdade de manifestar a religião ou convicção, sozinho ou em comum, tanto em público como em privado, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pelos ritos.
Artigo 19° Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e idéias por qualquer meio de expressão.
Artigo 20° 1. Toda a pessoa tem direito à liberdade de reunião e de associação pacíficas. 2. Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação.
1. Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições eqüitativas e satisfatórias de trabalho e à proteção contra o desemprego. 2. Todos têm direito, sem discriminação alguma, a salário igual por trabalho igual. 3. Quem trabalha tem direito a uma remuneração eqüitativa e satisfatória, que lhe permita e à sua família uma existência conforme com a dignidade humana, e completada, se possível, por todos os outros meios de proteção social. 4. Toda a pessoa tem o direito de fundar com outras pessoas sindicatos e de se filiar em sindicatos para defesa dos seus interesses.
Artigo 24° Toda a pessoa tem direito ao repouso e aos lazeres, especialmente, a uma limitação razoável da duração do trabalho e as férias periódicas pagas.
Artigo 25°
Artigo 21° 1. Toda a pessoa tem o direito de tomar parte na direção dos negócios, públicos do seu país, quer diretamente, quer por intermédio de representantes livremente escolhidos.
1. Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos serviços
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Matérias - Autor: sociais necessários, e tem direito à segurança Artigo 29° no desemprego, na doença, na invalidez, na 1. O indivíduo tem deveres para com a comunidaviuvez, na velhice ou noutros casos de perda de de, fora da qual não é possível o livre e pleno meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade. desenvolvimento da sua personalidade. 2. A maternidade e a infância têm direito a ajuda e a assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozam da mesma proteção social.
Artigo 26° 1. Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos a correspondente ao ensino elementar fundamental. O ensino elementar é obrigatório. O ensino técnico e profissional dever ser generalizado; o acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos em plena igualdade, em função do seu mérito. 2. A educação deve visar à plena expansão da personalidade humana e ao reforço dos direitos do Homem e das liberdades fundamentais e deve favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos, bem como o desenvolvimento das atividades das Nações Unidas para a manutenção da paz. 3. Aos pais pertence a prioridade do direito de escolher o gênero de educação a dar aos filhos.
Artigo 27° 1. Toda a pessoa tem o direito de tomar parte livremente na vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar no progresso científico e nos benefícios que deste resultam. 2. Todos têm direito à proteção dos interesses morais e materiais ligados a qualquer produção científica, literária ou artística da sua autoria.
No exercício deste direito e no gozo destas liberdades ninguém está sujeito senão às limitações estabelecidas pela lei com vista exclusivamente a promover o reconhecimento e o respeito dos direitos e 2. liberdades dos outros e a fim de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar numa sociedade democrática. 3. Em caso algum estes direitos e liberdades poderão ser exercidos contrariamente e aos fins e aos princípios das Nações Unidas.
Artigo 30° Nenhuma disposição da presente Declaração pode ser interpretada de maneira a envolver para qualquer Estado, agrupamento ou indivíduo o direito de se entregar a alguma atividade ou de praticar algum ato destinado a destruir os direitos e liberdades aqui enunciados. Fonte: http://www.oas.org/dil/port/1948%20 Declara%C3%A7%C3%A3o%20Universal%20dos%20 Direitos%20Humanos.pdf Seria interessante se a Organização das Nações Unidas (ONU) estabelecesse uma meta para que todos os seus estados membros aplicassem, por inteiro, esta declaração em suas legislações nacionais, fazendo com que tais direitos sejam garantidos a todos. Não seria algo fácil, mexeria com muitos interesses (principalmente religiosos), mas com uma data limite como 2050, por exemplo, seria perfeitamente possível. E, claro, aqueles que não conseguissem, sofreriam sanções.
Artigo 28° Toda a pessoa tem direito a que reine, no plano social e no plano internacional, uma ordem capaz de tornar plenamente efetivos os direitos e as liberdades enunciadas na presente Declaração. Revista Livre Pensamento - Número 2
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Revista Livre Pensamento - Número 2
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Revista Livre Pensamento - Número 2 Revista Livre Pensamento – Número 2 Editores das Matérias: Jeronimo Freitas
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