O Setubalense, o seu diário da região nº 762 de 11 de Janeiro de 2022

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muitas deste tipo. Na regionalização, a Península de Setúbal deve ficar na actual AML? Essa discussão tem de ser feita, se calhar, com a mesma intensidade com que foi feita a mesma discussão da Península de Setúbal enquanto NUT. Foi uma discussão que envolveu o sector empresarial, as autarquias, as universidades, muitas entidades vivas da região e que foi uma discussão muito importante. Nós não temos, eu pelo menos não tenho, uma visão fechada sobre o mapa. Há uma coisa que é certa, a independência e identidade da Península de Setúbal existe e nós temos aqui duas realidades do ponto de vista administrativo. O distrito de Setúbal, que é muito diverso e que tem realidades socioeconómicas, culturais, geográficas, completamente diferentes, e, a

Península de Setúbal, que pertence à AML onde também existe, seja reconhecida ou não, esta interligação entre os municípios. É importante que a futura reorganização administrativa, a regionalização, vá de baixo para cima, que seja democrática, que e preveja órgãos electivos, eleições directas por parte da população. O mapa, vamos discuti-lo. O BE já teve a oportunidade de dizer que não é desejável nem uma maioria absoluta nem um bloco central. Presumo que, para a Joana Mortágua, o ideal seria um governo com maioria relativa dependente do BE. O que ganharia o país com isso? Queremos ter força para promover no país as alterações necessárias. Fazemos um balanço dos últimos anos, do período da austeridade, da recuperação que o país foi capaz de fazer a seguir, com o chamado governo da “geringonça”, dos impactos e das lições que aprendemos com a pandemia. O nosso balanço e as nossas propostas são claras: é preciso um investimento estratégico nos serviços públicos, que hoje sofrem um vazio de profissionais, e isso é visível na escola pública com a falta de professores, e o distrito de Setúbal é muito afectado por isso, sobretudo o sul do distrito, mas também aqui as zonas da AML. O SNS, que está carente de profissionais, e basta para o tempo que as urgências pediátricas do Hospital Garcia de Orta estiveram fechadas, mas não só. Para o Hospital do Litoral Alentejano, para a falta de médicos de família, que afecta os concelhos de Almada, Seixal, Sesimbra, Quinta do Conde; para a falta de centros de saúde. Investimento estratégico nos serviços públicos é uma das lições da pandemia. Mas há outras lições, na transição climática e combate à crise climática. Na protecção das zonas ambientalmente sensíveis, nós temos uma orla costeira que vai de Tróia a Sines, que é das zonas mais importantes não-urbanizadas da Europa e que neste momento está em perigo. Basta olhar para aquilo que aconteceu em Odemira, recentemente. Já para não falar dos problemas que vamos ter com a subida do nível das águas do mar na faixa costeira, sobretudo de Almada. A crise da habitação, é uma realidade que muitos não viram antes da pressão que a pandemia colocou e que, depressa, se tornou evidente.

A ideia de que o país não tem recursos é falsa, muitos são mal gastos O BE fala também em travar a devastação do SNS, melhorar o salário médio e recuperar o nível de rendimento das pensões afectadas pelo factor de sustentabilidade. Isso não é despesa a mais para o que o Estado pode suportar? Não creio. Por exemplo, neste momento estamos a perceber a dimensão do roubo que as transferências para offshores significam para o país. Quando vemos os casos de Ricardo Salgado, de Rendeiro, vários casos que vão aparecendo, vamos percebendo, que, mesmo durante os anos de crise, houve milhões de euros que foram drenados para offshores via Madeira e outros buracos negros que existem de fiscalidade. O país tem a possibilidade de ir buscar esses recursos. Há outros casos concretos. No caso da electricidade, Portugal é um dos países da Europa onde mais se morre de frio, temos dimensões de pobreza energética imensas. Isto significa duas coisas, que as casas não estão preparadas e que a factura de electricidade é demasiado alta. Se olharmos só para as rendas de energia, aquilo que seria possível ir buscar aos impostos não pagos das vendas barragens, às rendas que são pagas de forma completamente abusiva, era certamente dinheiro suficiente para combater a pobreza energética. Uma das marcas da região é a capacidade industrial. O que deveria ser feito com esta vocação? Há várias questões que são importantes. Uma tem a ver com o perfil que queremos para a nossa economia, se um perfil competitivo pelos baixos salários ou uma economia que compete pela inovação, pela qualificação da sua mão-de-obra, pela qualidade do seu trabalho e do produto. Nós optamos

pela segunda. Investimento que seja feito em inovação, em qualificação da mão-de-obra, é bem feito, para alterar o perfil da nossa economia, e deve ter incentivos públicos. A contrapartida para esses incentivos tem de ser a qualidade dos vínculos e a qualidade do trabalho e do emprego, e aí voltamos à questão de aumentar o salário médio. O salário médio não se aumenta por decreto. Houve um esforço, e o BE tem sido muito insistente nisto para aumentar o salário mínimo, esse esforço é importante, mas isso tem de impulsionar o salário médio. Como o salário médio, ao contrário do salário mínimo, não se aumenta por decreto, apesar de nós defendermos que deve haver medidas salariais de referência para evitar a desigualdade salarial, é preciso alterar as leis laborais. Recuperar a contratação colectiva, combater a precariedade, ter noção que um contracto precário é, em média, 300 euros mais baixo, em salário, do que um contracto com vínculo e que o país tem criado, sobretudo, contractos por trabalho precário. Sobre habitação, a Joana Mortágua, enquanto vereadora, esteve envolvida numa polémica com o PS, em Almada, onde a câmara agiu criminalmente contra pessoas que ocuparam fogos municipais. Reconhece que devem haver regras relativamente à ocupação dos imóveis municipais, e que regras defende? Claro que deve haver regras, e naturalmente que as pessoas que ocupam casas não têm direito àquelas casas, como é evidente, mas têm direito a uma casa. Se cumprirem os critérios económicos e sociais, que estão pré-estabelecidos, se cumprirem os critérios que estão regulamentados pelo município e pelo IHRU aquelas pessoas têm direito a uma casa. Viver na rua não está no código penal, não é um castigo para ninguém. As pessoas quando cometem algum ilícito respondem por ele, mas condenar uma família inteira a viver na rua não é castigo que se possa aplicar. No caso de Almada, se fosse presidente de câmara como faria? Só quero explicar uma coisa em relação a Almada. O que nós contestámos foi a decisão da câmara de colocar um processocrime àquelas pessoas, porque um processo administrativo permitiria despejá-las. Nunca esteve em causa

se aquelas pessoas ficariam ou não com aquelas casas. Só estiveram em causa duas coisas: se a câmara tinha legitimidade para colocar aquelas pessoas a dormir na rua concretamente crianças, pessoas acamadas, com velhotes - e nós dissemos que não; e a segunda coisa, é que aquelas pessoas não deveriam ser consideradas criminosas, porque já vêm de um processo de exclusão social, que não deve ser agravado por um processo-crime. Aquele caso não é único no distrito. Casos de ocupação de casas só acontecem porque há património público vazio e digam as várias câmaras o que disserem, eu conheço muito bem o caso de Almada, houve casas municipais e do IHRU, públicas, vazias durante muitos anos. Há muito património imobiliário público abandonado, e há muita gente sem casa, e sem direito a casa. E os preços na habitação, no mercado de habitação, não param de aumentar, e na Península de Setúbal, agora, estão a ter uma pressão imensa. O caso de Almada não é o único, mas no Barreiro, Seixal, Almada, Sesimbra e Setúbal, os preços têm aumentado entre 10 a 17% ao ano. Em alguns casos, subidas superiores aquelas que acontecem em Lisboa, quando nós temos salários inferiores. Estamos a falar, tal como aconteceu na crise entre 2012 e 2015, de famílias que, tralhando, não ganham para a renda. De jovens que não conseguem sair de casa. É engraçado que os centros das cidades precisam sobretudo destes trabalhadores, mulheres quem fazem limpezas e homens que trabalham na construção civil - um grande exército de trabalho, pouco qualificado e a quem se paga pouco - e não se permite que essas pessoas tenham acesso à habitação. É absolutamente impensável Em 2019, o BE elegeu duas deputadas por Setúbal. O que será um bom resultado agora? Estamos a lutar para manter a nossa representação. O BE pretende impedir uma maioria absoluta que daria ao PS a liberdade de não resolver os problemas do país, mas também força para impor as nossas soluções, que passam pelo controlo de rendas, por habitação pública para quem precisa, por investimento na indústria com garantia de emprego. Lembro-me, por exemplo, do abandono a que o Arsenal do Alfeite tem estado votado.


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