Terra2

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EDITOR Otávio Duarte AUTORES O grego Heródoto, nascido em Halicarnasso, na atual Turquia, no século V a.C., é considerado o primeiro historiador, ainda que a narrativa de suas viagens possa conter fantasias. Visitou o Egito, Babilônia, Sicília e a Itália. Ao relatar a guerra contra os Persas, deixou uma imagem viva do mundo que conheceu. A arte é a vida de Rogério José de Moura Dias, que nasceu em Jacarezinho, PR, em 1945. Os trabalhos aqui apresentados são de épocas distintas e incluem desenho e pintura sobre madeira, desenho e aguada sobre papel e sketchs digitais. selmaalbano@hotmail.com O poeta Sérgio Rubens Sossélla nasceu em Curitiba, em 1942, e morreu em Paranavaí (PR), em 2003, onde morava na Rua Martin Luther King, 3.360. Juiz, trabalhou e viveu em diversas cidades do Paraná. Publicou, às próprias expensas, mais de 200 títulos. O pintor Rones Tadeu Dumke nasceu em Curitiba, em 1949, e vive em permanente inquietação, a medir a métrica do mundo. De fases diversas, suas obras aqui mostradas incluem desenho sobre papel e colagens com intervenções de pintura. dumke.rones@gmail.com Otávio Duarte é poeta, escritor e jornalista. Nasceu em Campo Mourão, PR, em 1953. Publicou os livros Alice, Notíciários dos Heróis, Fanfarra Infante, Seis Romances e Uma Pintura, Amor Absoluto, e, em parceria com Rones Dumke, Clepsidra. otaviodu@gmail.com Carlos Alberto Xavier de Miranda, o fotógrafo Nego Miranda, nasceu no bairro do Batel, em Curitiba, em 1945. Vive em Morretes, na Serra do Mar. Publicou os livros Engenhos e Barbaquás, Paraná de Madeira, Igrejas de Madeira do Paraná, A eterna solidão do Vampiro, Morretes meu pé de serra e Puxando o fio: histórias de armarinhos. contato@negomiranda.com.br O poeta e escritor Roberto Prado, nasceu no bairro das Mercês, em Curitiba, em 1959. Entre os trabalhos que publicou e dos quais participou estão os livros Sala 17; Reis Magros; Sangra:Cio; OSS; O Feiticeiro Inventor; Pérolas aos Poukos & Erdeiros do Azar; Motim; Eu, aliás, nós; Passagens e Fantasma Civil. Traduziu obras de Poe, Dante, Rimbauld, Mickiewkis, Baudelaire, Yeats,Gogol e Lao-Tsé. becoprado@yahoo.com.br Capa Otávio Duarte Daniel Duarte Fotos da capa e contracapa Otávio Duarte 2


Heródoto

Há na Arábia, perto da cidade de Buto, um certo lugar para onde me dirigi, a fim de me informar sobre as serpentes aladas. Vi logo à minha chegada uma quantidade prodigiosa de ossos e de espinhas dessas serpentes. Esses ossos — grandes, médios e pequenos — estão espalhados por todos os lados. O local onde se encontram fica situado numa garganta apertada entre duas montanhas, de onde se abre vasta planície que confina com a do Egito. Dizem que as serpentes aladas voam da Arábia para o Egito assim que chega a Primavera, mas que as íbis, indo ao encontro delas no ponto de junção do desfiladeiro com a planície, impedem-nas de passar, matando-as. Os Árabes asseguram que é em reconhecimento desse serviço que os Egípcios têm grande veneração pelas íbis, e os próprios Egípcios confirmam isso. De História – o relato clássico da guerra entre Gregos e Persas. Prestígio Editoral, tradução de J. Brito Broca. 2001.

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Rogério Dias

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sérgio rubens sossélla

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para georg trakl, tomando café (para José de arimatéia de-clamar)

é afinal uma dupla tristeza afasto subitamente o copo em que bebia em 3 de novembro de 1914 vejo o teu rosto no fundo o teu rosto numa clínica psiquiátrica em cracóvia igrejas pontes hospital horríveis no lusco-fusco já quase além do mundo no cemitério de mühlau em innsbruck as tuas pálpebras estão pesadas de papoila e sonham baixo linhos sangrentos incham as velas sobre o canal eu não tenho o direito de me furtar ao inferno ¿morrer em paz após a tua sorte? cristo é o filho de deus nossa irmã a lama podre e negra olham-se a tremer na voz de prata do vento pastores sepultaram o sol no bosque calvo depois que um pescador tirou (em rede de crina) a lua dum tanque a gelar as flautas acabam de nascer 18.8.1990

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(a)onde está? se não está no gibi encantou-se na floresta amazônica se não está na floresta amazônica vive entre o cowboy e o último disparo se não está no último disparo o trem que parte levou o trem mendigo se não está no trem mendigo um lexicógrafo-caçador hibrida-se em orion se não está em orion ficou na terceira dimensão e meia se não está na terceira dimensão e meia pulsa nas crateras lunares de artem’ev e mee se não está em artem’ev e mee ou em mim milton carneiro sumiu na procissão de eus se não está na procissão de eus glorificou-se nos dentes podres de van gogh se não está nos dentes podres de van gogh grafita a pax christi nos muros do mundo se não está nos muros do mundo quadrinizou-se nos olhos quietos de Borges se não está nos olhos quietos de borges escandaliza o verso do poeta e o seu escarro se não estiver no escarro nem procure no gibi ou na enciclopédia britânica porque até os neutrinos se recusam a atravessar de novo a imagem — plúmbea e emulsionada — dos ratos guardando o corpo de artaud 15.2.90

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sim, ele passou por aqui então o cowboy abruptamente envelheceu (desde menino trazia os olhos de um cão chutado pelo destino) nem mais com as crianças da rua ele brincava (como costumava) e nas raras vezes em que surgiu (arqueado e tropeçando) a mão vazia desenhava saques lentos para um alvo que não existia monologando só passagens da sua infância (saberia que por ser quem era sairia miseravelmente derrotado pelas vitórias que fizera?) assim rapidamente ele morreu levando na garganta mugidos estrangulados vermelhos e largos vergões na alma trincada sinais de tiro e marcas de punhais no frágil corpo atormentado morreu ele rapidamente assim pedindo ao deus misericordioso jamais nascesse de novo tão sozinho e abandonado que até a sua sombra não lhe acompanhava sim ele passou por aqui (aldeia dos canibais) alongando o quanto pode a amargura da permanência além dos próprios limites suportáveis da existência e foi embora para nunca mais mas todas as noites o seu fantasma alucinado teima em repassar aí em frente (naquele veloz corcel invisível) deixando uma grossa nuvem de poeira e de remorso para nós 27.2.87 15


na tipografia da província (colada à casa da justiça) revejo o fantasma de gutenberg sorrindo para as aldeias globais gutenberg em pitanga

nem chegou ao conhecimento do iii reich o número 16.670 tatuado na braço esquerdo do padre maximiliano kolbe a eternidade em auschwitz

d. joão iii conquistou reinos nas ruas de santarém esmolando o pão dos cegos para duarte pacheco pereira o sonho real

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traspassado na cruz órfão do mundo e vencido ou cantando a vida em 16 r.p.m. morto nas funduras celestiais insepulto assoviando adiós agoniando na calmaria do inferno ou lúcido e louco remirando as mãos perdido em ushuaia comerciando em hong kong a passeio no quartier latin ou trancafiado em sing sing atrás de um seagram’s 7 crown transmutando-se em arco-íris ressurecto ouvindo jalouise ou subitamente surdo surdo surdo e jogado num depósito de velhos obrigado jacob gade onde quer que você se encontre muito obrigado gade, jacob

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Rones Dumke

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Otรกvio Duarte

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el gato azul é o nome de um bar, visto de passagem no filme quatro minutos, da diretora chris kraus lucas 15:18 está na placa de um prédio ou imagino levantar-me-ei, irei ter com meu pai e dir-lhe-ei: pai, pequei contra o céu e diante de ti

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nunca senti a necessidade de inimigos por que me sento à sombra das árvores a esperar cadáveres na corrente do rio?

eliot: terra devastada kafka: culpa oculta ezra: política no saguão as mulheres vão e vêm a falar de buonarroti

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nouvelle vague cinema novo bang bang marxista italiano andrĂŠ courrĂŠges mary quant roland barthes valentina marshall mcluhan hal 9000 ĂŠ proibido proibir corto maltese o sol nas bancas de revistas os mutantes ou qualquer bobagem

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entre a catedral e a sinagoga pereiras, teixeiras e oliveiras entre elas e a mesquita alfaces, alcaides e alfaiates

se o mundo, afinal, inexiste e nĂŁo passamos de um sonho a embalar o sono eterno de algum ser de que matĂŠria serĂŁo feitos os outros devaneios desse grande sonhador?

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deve ser o outono uma andorinha escapou do verão desceu pela chaminé invadiu a sala e morreu no terraço a ciência chegou à incerteza nem tudo pode ser demonstrado e reproduzido as probabilidades contam já os sábados, são convenções

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cigarros não tenho conhaque? dry martini, um negroni? hemingwaves faulkner escreveu ou deveria em palmeiras bravias pisei em brasas numa festa de são joão minha pele era mais dura minha alma mais leve e havia fé hoje não posso nem andar sobre as águas 34


tenho saudades de vocês que se foram, danados para o nada para algum lugar, talvez sei que pouco sabemos do muito sob o microscópio de tudo o que imaginamos ao telescópio mas tenho a esperança de ficar em paz e de sorrir, uma vez mais com as velhas piadas de vocês

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Nego Miranda

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Fazenda Florestal, antiga Serraria Alberico Xavier de Miranda, em Irati (PR). Na pรกgina anterior, caminho da Serra do Mar. 41


Pinheiral.


Casa em Pinheiral de Baixo, Palmeira, PR.

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Marumbi.


Campos Gerais.



Superagui.

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Roberto Prado

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1ª aula de ilusionismo a luz se curva ante a matéria? nada nesta mão e nada resta mais espaço, a mágica começa a frase sai sem ter ideia diz tanto quanto dá na telha um som nenhum puxado pela orelha cartola tola, fraque de aluguel, atrás, estrelas, furos em fundo negro que a partir de agora passa a ser o céu bruxuleio que faz do real um erro palavra, luz luxo, miss miséria o poema se curva ante a plateia?

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tantã por fora por dentro e entre pela vida afora e antes hora após hora por exemplo, agora, eu rimo sempre dono de batuque nato às vezes bato fraco nenhuma razão para dor nenhuma razão de orgulho somente mais uma canção apenas mais um coração fazendo barulho

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destróia pedra que sobre pedra quer restar o que eu sou não é mole desmanchar implosões, marretadas e de quebra um novo shopping center no lugar nasci assim, fico sem jeito de morrer vai a alma, o corpo ainda quer ser e debaixo de uma outra civilização bate o coração, ruína dura de roer

sobre o poder sábio não é bobo nem nada sabe que lobo não come lobo esse labirinto não vale a lábia

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uma letra puxe um silêncio do estoque e deixe a letra bater chame um batuque exato para o silêncio dançar puxe chame dance e deixe evoque que vem no espírito da letra todas as letras que o silêncio tem

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sinfonia para gritos, resmungos, choro e ranger Barulho, barulho, barulho nunca abandona um bom ouvinte. Barulho, barulho, barulho esse mar de orgulho, meu caro caramujo, não vale um pedinte. A volta triunfal aqui vamos fazer nossa casinha ali a fábrica não ficará muito longe uma escola com vista pra montanha e o templo sem imagem nenhuma desta vez não vamos sujar o rio nem inventar leis desalmadas apenas novamente simples heróis descobrindo mundos, trocando fraldas 55


ultimato est sobe! crosta terrestre desce! abĂłbada celeste

musas anos a fio dando ouvidos a deuses muito discretos amigas, amigos, amiguinhos se sou mero objeto de meus afetos quem Ê aquilo sozinho que vai tropeçando em meus versinhos?

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subtraçþes que tal pegar tudo que temos e deste todo fazer a grande falta um salto que cai, uma queda que salta essa soma assim sem mais nem menos? por que não juntar o nosso nada o eterno que move, o nunca que repousa e fazer destas perdas somadas o achado de alguma coisa?

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CARTAS DA TERRA

“Quando o carteiro chegou E o meu nome gritou Com uma carta na mão Ante surpresa tão rude Nem sei como pude Chegar ao portão” Da canção Mensagem. Aldo Cabral e Cícero Nunes

“Querido Gabe, graças aos remédios, posso dobrar os dedos e segurar a caneta. Às vezes, tenho a impressão de que a doença está toda concentrada em minhas mãos. Tenho tido vontade de escrever, mas não ditando a seu pai. Mais tarde, não quero sussurrar-lhe meus últimos desejos, em meu leito de morte: o pânico e a ansiedade lhes darão demasiada importância. Atualmente, seu pai vive se debruçando sobre a minha cama. Vem até aqui, depois de cada cliente, e fala-me do tempo lá fora. Nunca confessa que lhe fiz uma injustiça ao casar-me com ele. Segura minha mão cinqüenta vezes por dia. Mas nada disso modifica o que aconteceu: o mal está feito. Toda a infelicidade que houve em nossa família partiu de mim. Por favor, não censure seu pai, embora eu, durante anos, o tenha levado a fazê-lo. Desde menina, sempre desejei ser muito correta com todos. As outras garotinhas queriam ser enfermeiras ou pianistas. Eram menos hipócritas. Eu não: era mais esperta, e desde cedo escolhi uma virtude, e persisti nela. Vivia fazendo coisas para o bem do próximo. Assim, pude manipular pessoas pela vida a fora, com a consciência tranqüila. Agora só me resta dizer que não quero dizer mais nada. Desisto das prerrogativas de pessoas normais ao morrerem. Estou escrevendo para que saibam que não deixo instruções. Lá vem seu pai outra vez. Está me trazendo três tipos de suco de frutas. Gabe, deveria confessar tudo isso a ele. Jamais me condenará, se eu própria não me condenar. Passei todo o nosso casamento melhorando a vida para ele, empurrando-o, refreando-o. Fui correta, tão correta. Meu bem, a caneta está me caindo das mãos.” De Círculos da Angústia (Letting Go), de Philip Roth. Editora Expressão e Cultura. Tradução de Elza Martins.

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“Meu marido morreu e nem um só filho tenho. Mas diz-se de vós que tendes muitos filhos. Se me derdes um dos vossos filhos, ele poderia ser meu marido. Pois, como posso eu tomar um de meus escravos e fazer dele um marido e honrá-lo?” De carta de Anches-en-Amen, viúva do faraó Tutankamon, ao rei hitita Supiluliumas. De A Estreita Garganta e a Montanha Negra, de C.W. Ceram (Kurt Wilhelm Marek). No Brasil, O Segredo dos Hititas. Editora Itatiaia, 1973. “Dos que ali andavam, muitos — quase a maior parte — traziam aqueles bicos de osso nos beiços. E alguns, que andavam sem eles, traziam os beiços furados e nos buracos traziam uns espelhos de pau, que pareciam espelhos de borracha. E alguns deles traziam três daqueles bicos, a saber um no meio, e os dois nos cabos. E andavam lá outros, quartejados de cores, a saber metade deles da sua própria cor, e metade de tintura preta, um tanto azulada; e outros quartejados d’escaques. Ali andavam entre eles três ou quatro moças, bem novinhas e gentis, com cabelos muito pretos e compridos pelas costas; e suas vergonhas, tão altas e tão cerradinhas e tão limpas das cabeleiras que, de as nós muito bem olharmos, não se envergonhavam. Ali por então não houve mais fala ou entendimento com eles, por a barbana deles ser tamanha que se não entendia nem ouvia ninguém. Acenamos-lhes que se fossem. E assim o fizeram e passaram-se para além do rio. E saíram três ou quatro homens nossos dos batéis, e encheram não sei quantos barris d’água que nós levávamos. E tornamo-nos às naus. E quando assim vínhamos, acenaram-nos que voltássemos. Voltamos, e eles mandaram o degredado e não quiseram que ficasse lá com eles, o qual levava uma bacia pequena e duas ou três carapuças vermelhas para lá as dar ao senhor, se o lá houvesse. Não trataram de lhe tirar coisa alguma, antes mandaram-no com tudo. Mas então Bartolomeu Dias o fez outra vez tornar, que lhe desse aquilo. E ele tornou e deu aquilo, em vista de nós, a aquele que o da primeira agasalhara. E então veio-se, e nós levamo-lo. Esse que o agasalhou era já de idade, e andava por galanteria, cheio de penas, pegadas pelo corpo, que parecia seteado como São Sebastião. Outros traziam carapuças de penas amarelas; e outros, de vermelhas; e outros de verdes. E uma daquelas moças era toda tingida de baixo a cima, daquela tintura e certo era tão bem feita e tão redonda, e sua vergonha tão graciosa que a muitas mulheres de nossa terra, vendo-lhe tais feições envergonhara, por não terem as suas como ela.” Da Carta a El-Rei D. Manuel, por Pero Vaz de Caminha. “Deste Porto Seguro, da Vossa Ilha de Vera Cruz, hoje, sexta-feira, primeiro dia de maio de 1500”. 61


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