Brasil, uma marca em construção

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Título original Brasil, uma marca em construção. Capa e direção de arte Madson Bruno dos Santos Apodi Projeto gráfico e diagramação Eduander Martin Damasceno Aryovaldo de Castro Azevedo Jr.

FICHA CATALOGRÁFICA Azevedo Junior, Aryovaldo de Castro (org), 1968 – Azev994b

Brasil, uma marca em construção. São Paulo, Parágrafo Comunicação,2012. ISBN: 978-85-66192-00-1 Disponível online: www.paragrafocomunicacao.com.br

1.Brasil. 2.Marca. 3.Cultura. 4.Comunicação. CDD: 300 CDU: 304

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Índice Introdução (pág. 06) Prof. Dr. Ary Azevedo Jr. 1. Música Popular Brasileira, um produto com identidade nacional. (pág. 13) Prof. Dr. Leonardo Saldanha 2. O que vão pensar de nós lá fora! (pág. 25) Prof. Dr. Mauricio Gonçalves 3. Telenovela é a cara do Brasil. (pág. 37) Profa. Dra. Maria Angela Pavan 4. Criatividade Made in Brazil. (pág. 53) Prof. Dr. Ary Azevedo Jr. 5. O outro na moda: a cara e a cor da moda brasileira. (pág. 73) Dra. Valeria Brandini 6. Made in Brazil: Yes, I have banana. (pág. 89) Prof. Dr. Olavo Bessa 7. Marcas Urbanas: A Modernidade Esquecida. (pág. 105) Profa. Dra. Lisabete Coradini 8. O uso da internet na construção da marca país: estudo de caso do Portal Oficial do Turismo Brasileiro. (pág. 133) Dra. Luciana Paolucci 9. A expressividade estética do site de artistas brasileiros internacionais como forma de representação / divulgação da marca Brasil. (pág. 157) Prof. Dr. Fabio Caim 10. A Propaganda institucional celebra a corrida das marcas para o Rio 2016. (pág. 172) Prof. Ms.Ronaldo Neves, Maríllia Graziella Oliveira da Silva e Erivaldo Gomes de Souza 11. Tecnologias e empresas brasileiras de energia no cenário internacional. (pág. 188) Dr. Egberto Gomes Franco, Ms. Daniel Ladeira de Araújo e Esp. Miguel Valione Junior 12. Posicionamento competitivo e de comunicação: aspectos estratégicos na construção das marcas de calçados infantis. (pág. 203) Prof. Dr. Luís Roberto Rossi Del Carratore e Marcio Antônio Rodrigues Sanches 13. A percepção da marca Brasil. (pág. 240) Esp. Marisa A. Camargo 14. Representações sobre o Brasil em língua inglesa sob a perspectiva da Linguística Sistêmico-Funcional. (pág. 258) Prof. Dr. Orlando Vian Jr. 15. Carnaval, festejos populares regionais, marcas e folkmarketing. (pág. 275) Profa. Dra. Lucimara Rett 16. Os processos eleitorais brasileiros. (pág. 292) Profa. Dra. Luciana Panke e Prof. Dr. Roberto Gondo (Mackenzie) Sobre os autores (pág.307)

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Prefácio Cercada de clichês, a imagem do Brasil atravessa um dos mais intensos processos de transformação que o conceito de marca-país pode aglutinar. Samba e bossa-nova, mulata e futebol, muito verde e muita praia, com tudo tropical, são típicas percepções que ainda caracterizam boa parte das referências sobre a maior nação da América do Sul, a quinta maior do planeta, um gigante até então adormecido, que se tornou a maior economia latinoamericana e a sexta maior do mundo. Mas, tais percepções estão cada vez mais misturadas a números que confirmam um enorme potencial mercadológico para as estratégias de globalização e a dados de um desenvolvimento social que chamam a atenção pela qualidade da evolução de consumo, pela sofisticação da mídia, e também pelo mapa de oportunidades de negócios tão diversificadas como a variedade de estereótipos que tentam identificar a pluralidade do Brasil. Neste contexto, é muito pertinente a iniciativa dos autores que participam de “Brasil, uma marca em construção”, um trabalho de posicionamento e de branding, que se propõe a sair do lugar-comum para mostrar e analisar a dinâmica do atual momento do Brasil através de interessantes temas que fogem das imposições e das representações mentais estabelecidas pelos clichês, dando espaço a uma nova dimensão imagética da realidade brasileira através de uma abordagem transdisciplinar que envolve música, cinema, televisão, arquitetura, politica, design e publicidade, entre outras áreas de criação e produção de ideias, que estão repletas de brasilidade. No caso específico da publicidade, uma área diretamente ligada à natural divulgação da marca Brasil, o livro traz uma completa avaliação sobre a participação brasileira no Festival Internacional de Criatividade de Cannes, o principal termômetro de inovação e qualidade da publicidade mundial. Em Cannes, o Brasil passou de um player tímido, praticamente sem brilho, com um ou outro prêmio, nos anos 70, a uma das três maiores forças publicitárias mundiais da atualidade. Passou a ostentar uma imagem, sustentada por ótimos resultados na premiação que superam, inclusive, mercados com verbas extremamente maiores, como os Estados Unidos, e culturas com altíssimo nível de produção gráfica, como a do Reino Unido e a da Alemanha. Essa trajetória, com o respeito que ela transferiu a tudo que é “Created in Brazil”, reflete a importância do Brasil no panorama internacional e sua força como exemplo de criatividade, originalidade e capacidade de gerar soluções. Reflete sobretudo, dentro e fora do território brasileiro, o quanto é imprescindível cuidar de um incrível patrimônio, que é a nossa marca-país. Marcello Queiroz Jornalista Diretor de Redação do jornal Propaganda & Marketing

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Apresentação Aryovaldo de Castro Azevedo Junior A proposta deste livro digital (ebook) é desenvolver o tema brasilidade e sua relação com a construção de marcas brasileiras em nível internacional como forma de agregar valor aos nossos produtos e serviços, potencializando a lucratividade e a relevância de marcas nacionais, gerando uma percepção atraente à variada gama de produtos e serviços que caracterizam a economia brasileira neste início de século XXI. Ainda percebido como um local exótico, o que muitas vezes é corroborado com estereótipos usados em nossos produtos culturais ou em referências estrangeiras ao Brasil, este conjunto de artigos procura explicar e desmistificar esta percepção ainda dominante com a exposição de fragmentos que compõem o mosaico que caracteriza nossa sociedade, verdadeiro caldeirão de ideias e comportamentos, produtos e serviços, tradição e modernidade, que retratam de modo mais efetivo nosso complexo panorama atual. A abordagem transdisciplinar que caracteriza o livro possibilita sua utilização em áreas e em momentos variados, principalmente para universitários das áreas das Ciências Sociais Aplicadas, que podem navegá-lo de modo linear, como nos livros tradicionais, ou de modo fracionado, característica destacada na leitura em tempos de internet. Pode-se saltar do ebook para textos de referência, para outros trechos do próprio livro, para vídeos, para músicas e para outras tantas possibilidades enriquecedoras que justificam a escolha por esta plataforma digital. Somem-se a isto aspectos como custos de impressão e distribuição, amplitude de alcance, de facilidade de acesso e de praticidade para o uso acadêmico, e temos os fatores que possibilitam a difusão do conhecimento pretendida com este material.

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Introdução Aryovaldo de Castro Azevedo Junior O conceito-país é vinculado a estereótipos sobre uma nação e se fundamenta em representações mentais sobre a cultura, as pessoas, os produtos e serviços, os símbolos, a música, a tecnologia, a economia, o esporte dentre outras variáveis. Estas diversas representações mentais da imagem de um país são associadas, pelo consumidor, aos seus produtos e marcas. A percepção do consumidor sobre a qualidade de um ou mais produtos fabricados no país é construída psicologicamente pelas relações com os produtos e serviços desenvolvidos nele ou vinculados a ele, somados ao conjunto de estereótipos com os quais ele tem contato, principalmente, pelas informações divulgadas pela rede midiática. Torna-se fundamental se valer das mídias, de modo planejado e integrado, para fomentar uma percepção positiva relacionada ao conceito de brasilidade. Este trabalho de posicionamento e branding, que visa desenvolver uma percepção atraente do Brasil, deve ser uma amplificação positiva do que já existe (ou pode realmente existir), e não uma invenção fantasiosa que pode gerar um discurso vazio, sem efeitos práticos exceto o de gerar descrédito e enfraquecer a participação brasileira no cenário internacional. No campo da comunicação promocional tem sido utilizado um ideário de brasilidade que valoriza os estereótipos da exuberância natural, da hospitalidade, da ginga, da criatividade e da sensualidade. Clichês que reificam o conceito de um país pleno de belezas naturais (praias e florestas), do povo hospitaleiro (multirracial, integrado e alegre, com pessoas sorridentes, cantando e dançando), da ginga (movimentação na capoeira, no samba, no futebol e na vida), da criatividade (inventividade para resolver problemas ou inovar, na culinária, na música e no famoso jeitinho brasileiro) e do improviso (informalidade nas relações, a despreocupação e o carpe diem). No entanto, mais relevante que enfatizar esses estereótipos dominantes no cenário internacional é complementá-los com o conceito de Brasil moderno, um país multifacetado, no qual se valorizam o cosmopolitismo como integrante de uma sociedade contemporânea globalizada, o desenvolvimento socioeconômico diversificado, os variados elementos culturais locais que particularizam a brasilidade como um mosaico de fontes e referências para gerar sua unidade e, assim, se integrar à sociedade global. Resultado da atuação em áreas variadas, a marca Brasil, como aqui proposta, será reflexo de um processo constante de 8


relacionamento entre o conjunto de marcas brasileiras e os variados consumidores e prospects, nos mais diversos pontos de contato desta relação permanente de construção um posicionamento global efetivo e diferenciado. O recorte possível neste ebook passa pela força da produção audiovisual brasileira, com a análise sobre cinema, música, publicidade e telenovela, seu alto padrão de qualidade e criatividade que geraram sua aceitação no mercado internacional. A realização de grandes eventos com repercussão internacional, como a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016, são abordados com a identificação de alguns impactos internos e externos. Arte, Design e Moda são objetos de reflexão na projeção de elementos de uma nova brasilidade que busca sua identidade e respeitabilidade ao mesclar nossa tradição cultural com criatividade e inovação. Empresas e tecnologias brasileiras ganham espaço em sua incipiente participação internacional, seja pela capacidade de inovar, seja pelo dinamismo em sobreviver frente à enorme concorrência estrangeira. E, como estamos integrados à aldeia global, é importante entender como tudo isso repercute na mídia internacional, com uma análise linguística de termos que conotam a transição para uma nova percepção do Brasil.

Em Música Popular Brasileira, um produto com identidade nacional, Leonardo Saldanha apresenta a Música Popular Brasileira (MPB) sendo constituída de gêneros vivos, captados na essência do cotidiano da população, com seus hábitos e memórias mesclados às múltiplas influências adquiridas, até assumir a característica de produto cultural. Com riqueza de detalhes na evolução musical do país, o autor explicita como a mídia se apropria da música, com o estabelecimento de nomes e rótulos dos seus variados gêneros, contribuindo para a sua consolidação, em direta associação entre sua popularização e os interesses de mercado. Como bem imaterial adotado pelos meios de produção e comunicação de massa, cria novas configurações à tradição musical, resultando em produtos que, ressignificados, ganham coloridos rítmicos e sonoros novos, tornando-se representativos da identidade contemporânea do povo brasileiro. A MPB torna-se produto representativo da identidade nacional, ícone transformador, divulgador e qualificador da imagem do país como sendo exportador de uma cultura reconhecidamente rica em volume e qualidade.

Em O que vão pensar de nós lá fora!, Maurício Gonçalves aponta que desde a sua origem o cinema nacional tem sido instado a representar uma identidade brasileira, com um discurso sobre o que é o Brasil e o que é ser brasileiro. Destaca que, principalmente a partir da 9


década de 1950, despontaram filmes que projetaram, para além de nossas fronteiras, elementos da cultura nacional. Seja apresentando uma filmografia de caráter mais clássico, seja trazendo filmes inovadores e ousados em termos de forma e conteúdo, em sua trajetória internacional, o cinema brasileiro conseguiu construir uma imagem do Brasil que reforça nossa densidade cultural, nossa capacidade de expressão criativa numa forma de arte sofisticada, a audiovisual. Isto contribui para uma maior e melhor visibilidade do Brasil no exterior sem ter de depender de superproduções, logística volumosa e forte apelo comercial em escala internacional, estratégias típicas - e quase exclusivas - de inserção do cinema hollywoodiano mundo afora.

Em Telenovela é a cara do Brasil, Maria Angela Pavan mostra sucintamente a história da televisão atrelada às telenovelas brasileiras e a distribuição do gênero. Reflete sobre a televisão e produção da telenovela, que nasceu e desenvolveu-se pela abnegação de alguns visionários. Enquanto produto cultural, a telenovela brasileira está presente em mais de 180 países, levando um pouco de nossos valores para o exterior e trazendo dólares para a economia nacional. A evolução deste produto audiovisual denota de modo claro o desenvolvimento técnico da TV brasileira e a criatividade no desenvolvimento de uma linguagem característica que transformou a telenovela feita no país numa referência internacional. Em Criatividade Made in Brazil, Ary Azevedo Jr. apresenta o funcionamento da estrutura do mercado publicitário internacional, de modo que permite identificar a relevância da publicidade brasileira no cenário global. O recorte das premiações do Festival da Criatividade de Cannes simboliza o reconhecimento da criatividade que transcende as fronteiras da nação e faz da publicidade brasileira referência para o marketing global, transformando o país num player destacado na área.

Com O Outro na Moda, Valéria Brandini propõe que o sistema da moda no Brasil se desenvolve sob o princípio da experimentação e ousadia, característicos de estruturas ainda em formação, buscando sua identidade na criação de um circuito próprio que envereda pela associação com o capital econômico para produzir suas coleções e inseri-las no mercado. Esta integração comercial-midiática fortalece o setor de confecções, tecelagens e grandes empresas da área têxtil, o que ajuda a consolidar a ‘moda brasileira’, que se volta às questões culturais e à busca por uma identidade própria. 10


Em Made in Brazil - Yes, I have banana, Olavo Bessa compara o design de um país tradicional na área (Itália), com o de um país emergente (Brasil). Constata que, se no primeiro, o design é um fenômeno decorrente de uma longa tradição que mescla cultura, arte, artesanato e história, no segundo é estimulada a percepção de que o design, além de conferir qualidade estética e funcionalidade aos produtos, está relacionado também a fatores estratégicos como inovação, competitividade e desenvolvimento econômico. E, para efetivar a percepção de um design eminentemente brasileiro, deve-se buscar principalmente na rica diversidade cultural que caracteriza o país os elementos diferenciadores que permitam uma identidade do design nacional.

Em Marcas Urbanas: A Modernidade Esquecida, Lisabete Coradini indica que a arquitetura moderna brasileira é uma marca identitária que atingiu seu ápice nos anos 50, com a construção de Brasília e reverberou, através dos meios de comunicação, para todo o país. Esta verdadeira cultura midiática se transformou em fonte disseminadora de modelos, comportamentos e gostos para forjar uma identidade brasileira que, para a arquitetura, mesclava o regional com o nacional, a tradição com a modernidade, a ordem com o progresso. A autora constata, com um estudo de caso feito na cidade de Natal/RN, a substituição do antigo pelo novo, num processo de permanente reconstrução urbana, sem a valorização da tradição, ao adotar permanentemente o que é entendido, no momento, como moderno.

Com O uso da internet na construção da marca país: estudo de caso do Portal Oficial do Turismo Brasileiro, Luciana Paolucci evidencia a importância econômica do turismo na sociedade contemporânea e demonstra a associação entre a informação turística e a construção de uma marca país. A autora analisa informações oficiais do Ministério do Turismo (Plano Aquarela 2020), onde fica evidente o objetivo de atualizar a imagem do Brasil de destino turístico exótico para uma nação multifacetada e integrada à dinâmica global. Para tanto, o uso da internet como suporte para uma comunicação em nível global é de suma importância devido a sua abrangência mundial, crescimento exponencial e a possibilidade de segmentação por temas e públicos, fundamental para um país diversificado que promoverá eventos mundiais como a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016, período em que os olhos do mundo se voltarão para o país com a grande exposição na mídia mundial.

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A expressividade estética do site de artistas brasileiros internacionais como forma de representação / divulgação da marca Brasil é o artigo onde Fabio Caim analisa websites dos artistas brasileiros Romero Britto, Vik Muniz, Os Gêmeos (Gustavo e Otávio Pandolfo) e Adriana Varejão e demonstra que sua utilização serve como plataforma de negócio, de visibilidade e de compartilhamento daquilo que o artista faz e que carrega índices daquilo que ele é e de onde veio. Mas esta indicialização pouco valoriza o conceito de brasilidade na divulgação destes artistas na plataforma digital, o que poderia trazer benefícios na criação de uma marca nação que se pretende compreender, dentre outros elementos, pela criatividade de seu povo.

Com A Propaganda institucional celebra a corrida das marcas para o Rio 2016, Ronaldo Neves faz uma interessante correlação entre branding e as Olimpíadas de 2016, no Rio de Janeiro, onde identifica a perspectiva para as marcas brasileiras construírem e/ou reforçarem identidades. Some-se a isto a questão da realização do evento em si poder representar o conceito da marca país em variados níveis, como capacidade de planejamento e organização, implementação de infraestrutura, desempenho esportivo, aspectos culturais, dentre outros, e os Jogos Olímpicos ganham a força de um cartão de visita da capacidade de realização do brasileiro.

Em Tecnologias e empresas brasileiras de energia no cenário internacional, Egberto Gomes Franco, Daniel Ladeira de Araújo e Miguel Valione Jr., indicam a imagem que o Brasil transmite hoje, como nação que utiliza predominantemente fontes limpas em sua matriz de energia, o que contribui para estabelecer o país em uma posição favorável junto à comunidade internacional, a qual valoriza aspectos como sustentabilidade ambiental e responsabilidade social. Mas estes aspectos podem se contrapor à exploração do petróleo da camada pré-sal que, se por um lado representa uma oportunidade de crescimento econômico para o país, com a possibilidade de minimizar mazelas sociais principalmente em áreas como saúde e educação, por outro lado coloca o Brasil na condição de fomentador do uso de combustíveis fósseis, com significativo potencial poluente.

Posicionamento competitivo e de comunicação: aspectos estratégicos na construção das marcas de calçados infantis é o artigo onde Luís Roberto Rossi Del Carratore e Marcio Antônio Rodrigues Sanches analisam empresas do setor calçadista paulista e constatam que, 12


embora estas sejam unânimes quanto à importância de se promover a marca Brasil no mercado externo, elas não conseguem se articular setorialmente, o que prejudica o estabelecimento de associações que construam conceitos uniformes para as marcas Made in Brazil. Os autores identificaram como principal ferramenta de promoção internacional a participação em feiras e eventos setoriais, cujo foco é principalmente a relação corporativa (business to business) em detrimento de um trabalho junto aos consumidores finais, o que dificulta o estabelecimento de marcas brasileiras no mercado internacional.

Em A percepção da marca Brasil Marisa Amaral Camargo aborda alguns paradoxos brasileiros: player na globalização, o Brasil recebe grandes investimentos estrangeiros, ávidos pelas oportunidades de lucro mas são desobrigados de se integrar às estratégias e políticas econômicas de interesse nacional; parte significativa da produção brasileira está sob controle de empresas multinacionais, contribuindo para o crescimento das remessas de lucro e dividendos para o exterior. Heterogeneidade social com um sistema econômico vigoroso e integrado à ciranda global cresce em torno de um mercado interno de respeitável dimensão e grande potencialidade de crescimento. A compreensão desta complexidade heterogênea que caracteriza a nação é fundamental para o estabelecimento de políticas ou estratégias de produção, inovação e competitividade que valorizem a soberania nacional, a coerência macroeconômica, a regulação pública e uma verdadeira inclusão social.

Em Representações sobre o Brasil em língua inglesa sob a perspectiva da Linguística Sistêmico-Funcional, Orlando Vian Jr. atua num cenário onde o crescimento da participação brasileira no sistema global aumenta também a sua relevância no aspecto midiático internacional. O Brasil é notícia, não só quando o tema é samba ou futebol. Esta percepção cada vez mais multifacetada do país é crescente e nítida em matérias especiais em publicações diversas e, dentro desta variada gama de veículos de informação, o autor nos lembra que os textos jornalísticos vêm carregados de variáveis ideológicas que trazem em seu bojo indícios de como o país pode ser percebido no exterior. Ao analisar duas publicações da área econômica - Financial Times e Business Week – o autor nota que é sugerido ao leitor que o país e seus representantes estão trabalhando para que mudanças ocorram, imprimindo, ao mesmo tempo, dinamicidade e credibilidade. Mas ao observá-las em conjunto, percebe a valorização das dicotomias do país, como os mercados externos veem tais contradições e os impactos que estas podem ter no mercado mundial. 13


Em Carnaval, Festejos Populares Regionais, Marcas e Folkmarketing Lucimara Rett apresenta o mosaico festivo que retrata as diversas regiões do país e as influências culturais dos variados imigrantes que ajudaram a forjar a identidade nacional. Aponta como isto reverbera pelos canais midiáticos e ganha força na representação e construção da identidade nacional, sendo muitas vezes apropriados por marcas comerciais na sua tentativa de aproximação com os mercados regionais que compõem o Brasil. Esta correlação entre cultura e negócios é feita sob a ótica do folkmarketing e ilustra de modo eminente a diversidade cultural e o potencial econômico nacional.

Em Os processos eleitorais brasileiros Luciana Panke e Roberto Gondo se debruçam sobre as eleições brasileiras e apresentam uma síntese da implementação do modelo de votação eletrônica no país, bem como as técnicas comunicacionais que foram elaboradas pela Justiça Federal, com o objetivo de promover conscientização da população acerca do modelo eletrônico de voto. A maior democracia do hemisfério sul do planeta é um caso singular que mescla o desenvolvimento de uma nova tecnologia (urna eletrônica) que possibilita a votação a apuração em tempo recorde, conferindo celeridade e credibilidade ao sistema eleitoral e, a difusão de ideias políticas por meio dos programas veiculados no Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral, o que ajuda a difundir propostas de partidos e candidatos para os cidadãos eleitores.

No conjunto de textos que integram este ebook, percebe-se que este mosaico paradoxal que compõe a imagem brasileira é algo bastante significativo e merece um aprofundamento na busca de sua compreensão e consequente uso planejado para a construção de uma marca país brasileira. Longe de uma postura ufanista, todos os autores deste ebook são conscientes de que há muitos problemas estruturais, mazelas sociais e disfunções culturais que ainda atravancam o progresso da nação, retratando o atraso em várias áreas da sociedade brasileira que ainda impossibilitam o pleno aproveitamento da cidadania. Mas como o objetivo principal foi fazer um recorte de aspectos onde o país tem possibilidade de ser um player global, o intuito deste livro é discutir esta relação internacional do país, com conceitos e estudos de caso, de modo a servir como um conjunto de indicativos em algumas áreas que podem ser valorizadas na construção desta que pode vir a ser a maior riqueza nacional: a marca Brasil. 14


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Música Popular Brasileira: um produto com identidade nacional Leonardo Vilaça Saldanha Introdução

A qualificação da música popular brasileira, como bem imaterial representativo da identidade nacional, se dá na medida em que esta se torna um produto comercializável com imagem espelhada na indústria cultural e de produção de massa, sem, no entanto, perder características da cultura primária tupiniquim. Ou seja, tem a sua produção em larga escala, é amplamente divulgada pelos meios de comunicação e entretenimento, adquire características e se torna efetivamente um bem de consumo e exportação. Contudo, preserva na sua essência elementos constitutivos básicos característicos do cotidiano do seu povo. Elementos esses, rítmicos, melódicos, literatos, fonéticos e da oralidade brasileira recorrente. Portanto, um breve aprofundamento na pesquisa etnográfica e da música popular urbana, na história recente do país, se faz necessário para uma melhor compreensão do processo evolutivo desses gêneros musicais vivos que constituem a chamada Música Popular Brasileira. Este estudo anseia observar a trajetória de surgimento, transformação, consolidação, divulgação e massificação dos variados gêneros da música popular urbana desse país, vistos a partir de sua exposição junto aos meios difusores. Ou seja, pretende-se apresentar a música popular em sua trajetória de consolidação através dos agentes midiáticos. O papel importante desempenhado pelas variadas mídias na ampla divulgação e emblematização dos variados gêneros da cultura musical brasileira como ícones representativos da identidade nacional. Símbolos identificadores da imagem do país no mercado mundial. Inicialmente vistos a partir do foco que permeou as suas relações identitárias, por quase todo o século XX, a dicotomia interno versos externo, o próprio e o alheio, seguindo-se as suas relações no mundo atual, em que, a questão da identidade é tecida a partir de um espaço globalizado. Ou seja, a música que se coloca nesse mercado se relaciona de um lado com a própria capacidade de se mover dentro dele e de outro com o reconhecimento de valoração da sua própria identidade posta à luz da indústria e do mercado global.

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O Surgimento da música como produto

A música popular como entendida nos dias de hoje, surge com o processo de industrialização e adensamento populacional urbano. Atrelados a estes, com influência direta para a sua consolidação, estão à importação de Bens de Consumo Duráveis e a formação da Classe

Trabalhadora

Operária. Esse contexto, aqui representados através da

possibilidade de impressão de partituras, importação de instrumentos musicais como o piano, a invenção do fonógrafo e os cilindros de música, o gramofone e os discos e a sua importação para o Brasil, em seguida, a divulgação massificada através do rádio, viabiliza o ambiente necessário à estruturação da música como um bem comercial e industrial. Como consequência desse processo a música aparece como um produto da indústria que surge e, como tal, passa a ser tratada e entendida. Enquanto produto massificado pela indústria, mobiliza grandes aparatos comerciais, provoca a venda de artigos correlatos ao seu universo, institui modas e, por seu apelo e sedução, advindos com a grande exposição, cria ícones formadores de opinião. É, portanto, consequência do processo de industrialização e o início do adensamento populacional urbano a possibilidade de contato e usufruto de outras culturas musicais. A assimilação e incorporação dos conteúdos alheios à cultura própria provocam a geração do novo. Esse novo passa a ser entendido como o próprio, representante de uma ideia de atualidade e modernidade.

Transformação, consolidação e massificação.

Data do final do século XIX o início da fusão rítmica que se consolida nos gêneros musicais ditos brasileiros. Batuques, lundus, maxixes, polcas, modinhas, marchas, dobrados, galopes e canções, expressões musicais de origem africanas, indígenas e europeias começam a se fundir em novos padrões rítmicos e melódicos e esboçam o que se tornaria a chamada Música Popular Brasileira. Essa fusão é, também, uma consequência do processo de urbanização das tradições rurais que passam a ser adotadas e reconhecidas pelas emergentes classes urbanas. 18


Aos poucos começam a ser qualificados choros, frevos e sambas, entre outros. A fixação desses gêneros no cenário cultural do país é definitiva na afirmação de uma linha de condução no desenvolvimento da tradição musical do Brasil. Tem papel preponderante o gênero canção que, na acepção popular da palavra, significa peça musical cantada de curta duração. Como gênero híbrido, que se constitui da movimentação rítmica e melódica da palavra, transita entre a oralidade e a escrita, a poesia e a música, é uma manifestação cultural da língua falada no cotidiano, dentro de um contexto artístico musical. A canção se insere, fundindo-se, para abrandar a rispidez primária dos gêneros instrumentais e torna-los mais acessíveis, compreensíveis e representativos da realidade cotidiana. Ela, quase sempre, é uma crônica jornalística do seu tempo. Narrativa de usos e costumes, personagens e linguagens. Surge no contexto para viabilizar a comercialização do produto musical. No ano de 1867, o flautista Joaquim Antônio da Silva Calado compôs aquele que é considerado como o primeiro choro, a polca-choro Flor Amorosa. Logo após a sua morte, em 1880, começa a ser divulgada comercialmente e colocada à venda a partitura de sua música que, mais tarde, seria letrada por Catulo da Paixão Cearense. Foi Calado quem primeiro usou a expressão choro em uma partitura musical. Muito embora tenha como data de nascimento oficial o ano de 1907, o frevo já aparece como produto em disco a partir de 1905 com a marcha A Província, de autoria de Juvenal Brasil, ainda com sua denominação de época, marcha-polca (instrumental). Já a primeira gravação de samba aparece em 1916, com Pelo Telefone, controversa autoria de Donga e Mauro de Almeida, frequentadores da casa da Tia Ciata, fundadora do Rancho Rosa Branca. A partitura manuscrita para piano foi escrita por Pixinguinha, já a partitura impressa, comercializada, foi lançada em 16 de dezembro do mesmo ano, pelo Instituto de Artes Gráficas do Rio de Janeiro. A música foi gravada pelo cantor baiano e se tornou grande sucesso no carnaval de 1917. Absorvendo influências através de suas principais mídias, os impressos, as gravações em disco e posteriormente o rádio, a música com base na tradição popular passa por um processo de transformação e consolidação do gênero. A divulgação de outras culturas, pelas mesmas mídias, influencia compositores e intérpretes que passam a adotar fragmentos dessas em aspectos de suas composições. Como no exemplo do uso da expressão One-Step, usada no subtítulo das composições na década de 1920. A expressão americana usada para designar a música de andamento rápido pôde ser observada no Brasil em gravações de sambas e frevos. 19


A consolidação da música popular enquanto produto da indústria de entretenimento e consumo se dá durante as décadas de 1920 e 1930, com a popularização da indústria fonográfica e o surgimento e consolidação das emissoras de rádio. Como produto consolidado, o seu sucesso passa a ser medido, não mais só por questões estéticas ou locais, mas, pelas vias de difusão do capitalismo e o seu êxito passa a ser dado pelo tamanho do público atingido e pelo montante do capital gerado. Nesse período, gozando de ampla divulgação e massificação, os gêneros musicais populares se consolidam como produtos representativos da cultura brasileira. Tornam-se, a partir de então, um dos principais produtos da indústria cultural contemporânea. Contribui para esse processo, a Política do Estado Novo do então presidente Getúlio Vargas. Essa política exaltava os símbolos de brasilidade na cultura nacional. Também, através do decreto lei nº 21.111, de 01 de março de 1932 que determinava o rádio como veículo de prestação de “serviço de interesse nacional e de finalidade educativa”. Essa lei permite ao rádio veicular propaganda e captar recursos. Assim, transforma-se em um empreendimento comercial educativo, de lazer e entretenimento. O rádio passa a divulgar com maior afinco a música e a cultura popular. A programação mais próxima do cotidiano das camadas populares trás maior audiência, consequentemente, viabiliza melhor e maior captação de recursos financeiros, firmando-se cada vez mais como principal veículo de divulgação e comunicação de massa. Em meados da década de 1930, auge da Era do Rádio, os principais gêneros da música popular já contavam com divulgação nacional através do rádio. Necessidades mercadológicas advindas da indústria fonográfica e da mídia radiofônica, que precisavam melhor identificar a grande variedade dos produtos veiculados, instituíram novas nomenclaturas de subgêneros aos gêneros musicais existentes. Foram surgindo, de acordo com as particularidades em cada gênero, novos subgêneros: o samba se torna samba-exaltação, samba-canção, samba de partido alto, etc. o frevo se torna frevo-de-rua, frevo-canção e frevo-de-bloco, entre outros. Sendo assim, veiculados e conhecidos. Nesse período, por intermédio de Noel Rosa (Rio de Janeiro – RJ, 11 de dezembro de 1910 — Rio de Janeiro – RJ, 04 de maio de 1937), o samba adquire um discurso mais coloquial, aproxima a sua narrativa do cotidiano e o canto da fala. Com introduções menores, a música adota uma estética padronizada quanto a sua duração de tempo, modelo também seguido por outros gêneros, passa a conter em média três minutos de permanência.

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O modelo estético assumido, em certa medida, por influência direta das mídias, se revela preponderante na formação de um grande mercado de música popular no Brasil. A temática do cotidiano possibilita a identificação do público com as canções, o tempo de duração menor permite a audição de um maior número de músicas. A junção desses fatores viabiliza a comercialização do produto musical. A década de 1930 fecha um ciclo que consolida os gêneros musicais populares ditos brasileiros. No entanto, foi a partir deste momento que estes começam a gozar de maior prestígio, divulgação e reconhecimento como representativos da cultura do seu povo, tendo a sua exposição tanto nos mercados interno quanto externo. Desde então, abrem-se novos ciclos de influências, transformações, consolidações e reconhecimentos de tais como próprios. A eterna reinvenção da tradição coloca o Brasil como um dos principais mercados, de reconhecida qualidade, exportadores de cultura musical.

Os Meios Difusores, profissionalismo e impacto tecnológico.

O profissionalismo na música popular brasileira inicia-se com a chegada ao Brasil do tchecoslovaco de origem judaica Frederico Figner, em fins de 1891, quando desembarca em Belém do Pará. Nesta cidade, por ocasião da festa do Círio de Nazaré, faria a primeira apresentação pública com um fonógrafo em terras brasileiras. Depois, Fred Figner, como ficou conhecido, seguiria para Manaus, Fortaleza, Natal, João Pessoa, Recife e Salvador. Desembarcando no Rio de Janeiro, no dia 21 de abril de 1892, onde se estabeleceria residencial e comercialmente para fazer suas exibições públicas de música com o fonógrafo. Percebendo o potencial industrial e comercial do aparelho, deixa de explorar as audições públicas pagas, exibidas com o fonógrafo, para então, em 1897, após ter aberto sua loja, a Casa Edison, explorar o comércio de vendas de aparelhos e cilindros. Desde logo, enfrentando concorrência, resolve, em sociedade com seu irmão Gustavo Figner, partir para a gravação de cilindros com música popular brasileira, conquistando em definitivo o mercado interno. Iniciava-se, em 1897, o profissionalismo na música popular do país. Fred Figner convida os cançonetistas, Manoel Evêncio da Costa Moreira, conhecido pelo apelido de Cadete (Ingazeira – PE, 1874 – Tibagi – PR, 1960) e Manuel Pedro dos Santos, conhecido como Baiano (Nazaré das Farinhas – BA, 1887 – Rio de Janeiro – RJ, 1944), para gravar fonogramas com acompanhamento de violão. Figner paga aos

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cançonetistas um cachê de mil-réis por cada canção gravada. Com isso, torna-se o responsável pelo surgimento do profissionalismo e pelo início das gravações com cantores brasileiros. No ano de 1900, Figner publica os seus primeiros catálogos. Dois anos depois, já com o nome de Casa Edison, contava com uma extensa lista de cilindros gravados por Cadete e Baiano. A música popular, em especial a música de carnaval, já era lançada pela indústria fonográfica desde os primeiros catálogos da Casa Edison. No início do século XX, antecedendo o rádio, a divulgação de marchas, sambas e choros, era feita através dos aparelhos de reprodução fonográfica, comercializados pela Victrola. O rádio surge no Brasil no ano de 1919 com o Rádio Clube de Pernambuco, em seguida, no ano de 1923, surge a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro que se tornaria a primeira rádio educativa do país. Já ao final da primeira década de existência, o rádio alcança boa audiência com a divulgação de música popular. Nesse período, artistas de alguns dos maiores centros culturais do país como, São Paulo, Rio de Janeiro e Pernambuco dedicavamse a produção de discos com as cores da música local. Ao final da década de 1920, com o acontecimento da gravação elétrica, os discos de goma–laca em 78 rpm se consolidam como o principal meio de gravação e armazenamento de música, as gravações aconteciam como em uma apresentação ao vivo. Contendo até duas faixas de áudio por lado, passam a dominar o mercado. Mais precisamente em 1927 a gravação elétrica chega ao Brasil, o que representa um avanço extraordinário no processo de gravação. Com ela, os cantores não mais precisam se esgoelar para terem a sua voz impressa no disco. Essa possibilidade trouxe para o mercado um novo modo de cantar, mais coloquial, mais próximo do recitativo. Teve em Mário Reis um dos seus maiores expoentes. O mercado começava a mudar com os avanços tecnológicos, também, a concorrência se acirrava cada vez mais, com a chegada de novas gravadoras multinacionais como a Parlophon, Brunswick, Columbia e Victor. Em 1928 a Casa Edison começa a perder mercado para as concorrentes e termina por desaparecer. Em 1929, Nelson Ferreira grava a primeira música de carnaval lançada pela Victor Talking Machine Company no Brasil, então recém instalada no país. Era uma marchanortista, frevo cantado. “Não Puxa Maroca”, lançada em 1930, teve orquestração e regência de Pixinguinha, comandando a Orquestra Victor Brasileira. Contratado pelo Rádio Clube de

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Pernambuco, em 1931, Nelson Ferreira, como diretor e produtor musical, se torna o maior responsável pela divulgação da música e do carnaval de Pernambuco através do rádio. Durante a década de 1930, na chamada “Era do Rádio”, o veículo se torna de fundamental importância na divulgação e consolidação dos gêneros ditos populares. Também, o principal responsável pela assimilação de outras culturas musicais que terminam por influenciar a nossa. Por seu intermédio, grandes nomes, artistas da cultura popular, como Carlos Galhardo, Francisco Alves, Ataulpho Alves, Mário Reis, Noel Rosa, Carmen Miranda, Aracy de Almeida, Sílvio Caldas, Luiz Gonzaga, Orlando Silva, Linda e Dircinha Batista, Capiba e Nelson Ferreira, entre outros, ficam conhecidos e se tornam ícones da música popular brasileira. Com o aparecimento dos programas de auditório na década de 1940, o rádio, já capitalizado pelas agências de publicidade, começa a contratar, além dos artistas nacionalmente conhecidos, já citados acima, consagrados artistas internacionais como José e Maria Iturbi, Ema Zack, Tito Guizar, Tommy Dorsey, Bing Crosby, Ortiz Tirado, Raul Roulien, Mercedita Garcia, entre tantos outros. A presença, a performance ao vivo, os arranjos trazidos por esses artistas influenciaram os músicos e a música do país. Nesse momento, por exemplo, o samba já era influenciado pelo bebop e pelo bolero. Em 1948 uma revolução no mercado de gravação, surge o LP (Long Play) disco de 33 1/3 rpm, feito de vinil era mais leve, flexível e resistente que o 78 rpm. Além de possibilitar um tempo muito maior de gravação, em média 20 minutos por lado, em decorrência dos sulcos de gravação menores. Um avanço também por permitir, com qualidade sonora muito melhor, a gravação analógica em canais separados. Inicialmente eram quatro canais, que permitiam a inserção de vozes e instrumentos em etapas distintas do processo, possibilitando uma posterior mixagem e finalização da gravação. Na década de 1950, além do surgimento da televisão que toma para si o lugar até então ocupado pelo rádio, tem o incremento dos investimentos na produção musical.

Em

concordância com as suas matrizes norte americanas, visando à amplitude dos negócios, as grandes gravadoras começam a investir mais pesadamente na qualidade, imagem e divulgação dos artistas nas variadas mídias, tornando o produto musical cada vez mais “necessário” e participante do cotidiano das pessoas. A política da boa vizinhança imposta pelos EUA no período pós Segunda Grande Guerra, trouxe mais uma vez a importação de gêneros e produtos musicais, também, do mesmo modo, em escala bem menor, possibilitou a exportação dos produtos musicais 23


brasileiros. Desta feita, a música local, através da elite social brasileira que, ávida por consumir modismos internacionais representativos de uma pretensa modernidade, passa a sofrer em esferas diferentes fortes influências do rock e do jazz. Assim, novos gêneros ou, subgêneros de alguns já existentes, passam a existir, mesclados às novas influências são reconhecidos como próprios, mas, com traços de uma identidade nova, representativa de uma modernidade almejada. Talvez o mais representativo dos gêneros ou, subgêneros surgidos, seja aquele que consolida o movimento que aparece por volta de 1958 e se concretiza com o lançamento, em fevereiro de 1959, do disco Chega de Saudade. Esse movimento provoca uma ruptura no curso da música popular brasileira ao ter instituído novos paradigmas a execução, instrumentação, concepção e temática do samba tradicional. Nesse momento, com direção musical e arranjos de Tom Jobim, interpretação vocal e violão de João Gilberto, o samba passa a apresentar-se, como dizia a gíria da época, sob uma nova bossa ou, sob uma nova forma, um novo contexto, uma nova moda representativa da modernidade pretendida pelo Brasil na era do Presidente Juscelino Kubitschek. Surge assim, o samba em bossa nova ou, simplesmente, Bossa Nova. Contudo, é a partir do concerto dos músicos brasileiros no Carnegie Hall em Nova York em 1962 que, se abre uma nova perspectiva de divulgação e reconhecimento para a música popular brasileira no cenário internacional. A suavização da temática das letras, agora não mais ufanista e eloquente como até então, mas, tratando de assuntos mais cotidianos e urbanos como o mar, o amor, a cidade e a beleza feminina, assim como, um cantar quase falado e sussurrado, possibilitado pelo avanço tecnológico das gravações com o uso de potentes microfones, confere a Bossa Nova um caráter mais “simplista” e intimista. Contudo, de certa forma, alguns desses aspectos já podem ser observados, como anteriormente citado, na obra de Noel Rosa e Mário Reis. Por outro lado, uma sofisticada harmonia baseada no bebop e cool jazz, as influências de Schoenberg e Debussy, sofridas por Tom Jobim, o desenho melódico típico de canção e uma levada rítmica bastante singular com batidas irregulares ao violão, confere a Bossa Nova uma ruptura à tradição da música popular brasileira. Resulta desta um novo colorido sonoro não só aos ouvidos brasileiros, mas, também aos ouvidos de outras culturas. Tem o seu período áureo entre os anos 1958 e 1963 quando os discursos “engajados” de esquerda passam a considerá-la ideologicamente submissa e alienada. Garota de Ipanema, ícone da Bossa Nova é, até o presente momento, a música brasileira mais executada no exterior, tendo sido gravada por inúmeros artistas internacionais, entre eles, Frank Sinatra. 24


Entre os períodos de 1963 e 1967 desponta o samba-jazz. Música popular que já havia dado os seus primeiros passos no início dos anos 1950 com Johnny Alf, Dick Farney e Bola Sete, retorna após o patrulhamento ideológico sofrido pela Bossa Nova. Para fugir ao patrulhamento, músicos retomam o estilo mais voltado para a música instrumental, com influências claras do Hard Bop, estilo surgido depois do be bop, com sessões de improvisações intermináveis. A música continha uma construção jazzista montada sobre as matrizes do samba. Teve à época alguns destaques como Bossa Três, Jongo Trio, Milton Banana Trio, Eumir Deodato, Quarteto Sambacana, Sergio Mendes e Bossa Rio, Tenório Jr. e Moacir Santos, entre outros. Em 1967, o Quarteto Novo formado por Hermeto Pascoal, Heraldo do Monte, Theo de Barros e Airto Moreira encerra o ciclo do chamado samba-jazz. Com a entrada de Hermeto, o grupo que tinha se formado 1966, como Trio Novo, para acompanhar Geraldo Vandré, em shows e festivais da TV, passa a adotar as matrizes rítmicas nordestinas do forró, como o baião, xote e xaxado, nas suas composições. O samba já não era mais a matriz única para a improvisação, o seu universo ampliara-se aos chamados ritmos nordestinos. Também, os improvisos já não se davam tão somente dentro do universo jazzista, as escalas e o modalismo da música nordestina passam a integrar a estética musical adotada. O discurso instrumental também se torna mais “engajado”. Estes posicionamentos conferem certo grau de autenticidade e propriedade à música, intencionando assumir características claras de brasilidade. Estava nascendo uma moderna música popular instrumental brasileira. Se dos anos 1920 até a década de 1950, o que se destacava no mercado fonográfico e no rádio sobre música popular instrumental brasileira estava mais diretamente relacionado ao choro no Rio de Janeiro, com nomes como Pixinguinha, Jacob do Bandolim e Waldir Azevedo. Assim como, ao frevo em Pernambuco, com nomes como Mathias da Rocha, Zuzinha, Nelson Ferreira e Capiba. Muito embora, já se tomasse conhecimentos de tantos outros gêneros. A partir dos anos 1960 aflora o samba-jazz e ao final da década a moderna música popular instrumental brasileira começa a se consolidar. Desde então, amadurece uma música com influências múltiplas, criadas e executadas por artistas que se consagram no mercado da música instrumental. Nomes como o do próprio Hermeto Pascoal, Egberto Gismonti e tantos outros, que representam tão bem a nossa música instrumental no mercado globalizado, se destacam em carreira internacional. Ao final dos anos 1960, paralelamente, outros movimentos surgem, como a antropofagia do Tropicalismo que mesclava o rock a canção de protesto, teve entre seus 25


expoentes os cantores baianos Gilberto Gil e Caetano Veloso e o grupo paulista Os Mutantes. Também, mesclando influências dos Beatles a Bossa Nova e às toadas do interior de Minas, surge o Clube da Esquina, movimento de artistas mineiros como Flávio Venturini, Beto Guedes e Lô Borges, liderados por Milton Nascimento e Wagner Tiso. Esses movimentos se consolidam durante os anos 1970, em meio à ditadura militar. É importante ressaltar que todos terminam por se fundir em torno de um grande caldeirão musical que se concretiza como MPB, Música Popular Brasileira. Ratifica nomes como Chico Buarque, Elis Regina, Gonzaguinha, Edu Lobo, Ivan Lins, entre muitos outros. Os principais membros desses movimentos consolidam suas carreiras em âmbito internacional. Em certa medida, ainda representam a imagem musical do país no mercado exterior. Na década de 1980 é à vez do Rock Nacional, destaque para as bandas surgidas em Brasília como Legião Urbana, além das do Rio, São Paulo e Belo Horizonte. Com características próprias, mescla elementos do rock à já consagrada MPB. Também, nesse período surge uma nova leva de artistas nordestinos como Alceu Valença, Geraldo Azevedo, Zé Ramalho e Elba Ramalho. O engajamento político ressurge em torno das Diretas Já. A década de 1990, além das novas correntes musicais que se consolidariam na década de 2000, é fortemente marcada pelo começo das transformações digitais. O aparecimento do CD, Compact Disc, as gravações digitais, a miniaturização dos aparelhos de escuta, tornam a fruição da música acessível em qualquer ambiente e lugar. Iniciam-se uma série de transformações que revolucionariam o mercado da indústria cultural. O Momento Atual A diversidade cultural do país se expande e não mais somente os negros, índios e a cultura européia são as nossas influências. Desde antes, já havia entrado em cena a cultura norte americana, agora, também, as culturas árabes, asiáticas e outras se fundem e coexistem com as nossas. Não somos mais somente samba, futebol, praia e carnaval, como país miscigenado temos uma suposta capacidade de convivência e aceitação do diferente. Isso, também, nos confere uma identidade e é colocado como um diferencial em relação a outras culturas e povos. A diversidade cultural nos coloca em uma posição de construção identitária a partir de um espaço globalizado. Não muito diferente do que já acontecia anteriormente, como visto a música brasileira quase sempre se consolida a partir de fusões miscigenadas para a criação do novo. Agora, novos elementos se fundem. Entram em cena sonoridades asiáticas, o pop, rock, reggae, hip26


hop, funk e a música eletrônica, mesclados à tradição, a religiosidade e ao local. Contudo, releituras da música regional, do rock nacional e novas versões da MPB continuam muito bem aceitas e conferem uma distinção no mercado internacional. Nomes como os do Skank, Nação Zumbi, Maria Rita e Lenine se firmam nesse espaço. A música surge de todos os recantos do país, o hip-hop paulistano, o funk carioca, a nova cena mineira, o manguebeat pernambucano, o tecnobrega paraense, o reggae maranhense, etc. Esses seguimentos encontram identidade, espaço e consumo em um mercado paralelo criado pelas novas mídias digitais. O avanço tecnológico e o advento da internet transformam o mercado da indústria cultural. Mais especificamente, no caso da música, a chamada revolução digital possibilita o consumo direto e mais barato, muitas vezes gratuitos, da produção musical. Essa relação direta público e produto, sem grandes intermediadores comerciais, provoca mudanças drásticas nas relações de mercado, consumo e produção da obra musical, estabelecendo um novo paradigma entre compositor, música e indústria cultural nesse princípio do século XXI. A tal revolução digital tem provocado o barateamento nos custos de produção, em consequência, compositor e intérprete passam a ter uma visão mais abrangente da possibilidade de atuação em todo o processo de produção musical. Essa relação restringe bastante o modo de influência e atuação das grandes gravadoras e provoca o quase desaparecimento destas. Essa nova realidade proporciona modificações nas relações do compositor, a sua obra e o público. Ganha cada vez mais espaço a veiculação e comercialização através do mercado da internet e as suas inúmeras possibilidades de difusão. Surge um novo mercado consumidor, dentro de um ambiente coletivizado virtualmente. Porém, cada vez mais individualizado nas suas escolhas musicais pessoais.

Considerações Finais

O processo de consolidação da música popular, como bem imaterial representativo e divulgador da imagem do seu povo, passa pelo processo de consolidação, crescimento e ampla divulgação dos agentes midiáticos. Os meios de produção e divulgação fonográfica, a indústria de comunicação de massa e de entretenimento exerceram e ainda exercem importante influência, através do mercado, na consolidação, transformação e sobrevida de determinados gêneros e culturas musicais.

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Com a necessidade de se manter ativo e renovado, o mercado está sempre à procura de novos caminhos, produtos e estratégias. Desse modo, contribui, na medida em que influi, para que se mantenham vivos e em transformação os gêneros musicais. No Brasil, a influência desses meios proporcionou a música com base na tradição popular uma constante transformação e evolução, assimilando novas características de estilos, linguagens e de terminologias. Tais características se tornaram definitivas na sua estruturação como música popular urbana, como produto comercializável e de fácil aceitação no mercado da indústria cultural. Resultado de uma configuração que adquire característica diferenciada e própria, passa a distinguir com rótulos de reconhecida qualidade a identidade musical contemporânea do seu povo. Assim apresentada, essa nova configuração passa a espelhar um modelo estético identificador das características de modernidade, bem como, de criatividade desse povo. Esse modelo ressignificado que passa a ser trabalhado pela Indústria de Entretenimento e Comunicação de Massa, ganha status de produto representativo e identificador dessa cultura, ante outras culturas e povos. As características rítmicas, harmônicas e melódicas da Música Popular Brasileira qualificam o seu status como de excelência no cenário da mídia e da Indústria Cultural internacional. É sem dúvida um dos bens mais populares e representativos da imagem do país no exterior. Ícone, ela divulga com destaque e ajuda a vender a Marca Brasil dentro de um mercado globalizado.

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Popular

Brasileira

Versão

online

Enciclopédia da Música Brasileira: Popular, Erudita e Folclórica – 3ª Ed. – 1ªreimp. – Art Editora: Publifolha. São Paulo, SP – 2003.

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O que vão pensar de nós lá fora! Mauricio R. Gonçalves Já as primeiras imagens em movimento que passaram a viajar o mundo a partir de 1896, e que nos acostumamos a chamar de cinema, traziam (e levavam) representações de povos, costumes, culturas as mais diferentes. Era uma família japonesa reunida para a refeição, mexicanos a festejar, turistas em torno de uma pirâmide nas proximidades do Cairo ou o burburinho das ruas movimentadas de Nova York. Surgido em meio ao processo de expansão imperialista eurocêntrica sobre as demais nações e culturas do planeta, o cinema tornou-se instrumento interessante para a construção de discursos a respeito das nações hegemônicas e sobre os povos e culturas alvo da dominação alheia. A produção cinematográfica no Brasil, apesar de existir desde 1898, começa a ganhar consistência somente por volta de 1907, quando donos de salas exibidoras – notadamente no Rio de Janeiro – passam a investir na produção de filmes para oferecer a seu público cada vez maior. Diante do fato de que o público nacional apreciava “ver-se na tela”, um número grande de filmes apresentava histórias, ambientes, cenários ou personagens familiares ou do cotidiano dos espectadores aos quais se destinavam. A partir da segunda metade da década de 1910, no entanto, o cinema norte-americano assume cada vez mais o papel preponderante nos mercados exibidores mundiais – incluindo aí o mercado brasileiro –, ocupando um espaço majoritário nesses mercados por todo o século XX. Sua articulação com os distribuidores, exibidores e com a imprensa, proporcionou-lhe uma inserção cada vez maior nas telas e no imaginário nacionais. A burguesia carioca, segundo Roberto Moura, “compreendendo-se como classe transformadora dentro dos novos padrões dos cultuados países centrais, se aproxima atenta e divertida dos enredos e personagens do cinema norte americano, que passam a ter papel civilizatório e ideológico considerável” (MOURA, 1987, p.47). O cinema norte-americano vai tornando-se paradigma para a realização e avaliação do cinema nacional. Fazer cinema no Brasil passa a ser fazer cinema nos moldes hollywoodianos e apresentar o Brasil nos filmes, mesmo que seja apenas como cenário para enredos os mais diferentes, passa a ser representar um país idealizado, constituído no imaginário daqueles que pontificavam a respeito do assunto, a parir do modelo de nação norte-americana visto nos filmes de Hollywood. Vejamos o que diz sobre isso um artigo de Cinearte, revista especializada em cinema, editada no Rio de Janeiro entre 1926 e 1942: 32


Um cinema que ensina o fraco a não respeitar o forte, o servo a não respeitar o patrão, que mostra caras sujas, barbas crescidas, aspectos sem higiene alguma, sordicies e um realismo levado ao extremo, não é cinema. Imaginem um casal de jovens que vão assistir um filme norteamericano médio. Vêem lá um rapaz de cara limpa, bem barbeado, cabelos penteados, ágil, bem cavalheiro. E a moça bonitinha, corpo bem feito, rosto meigo, cabelos modernos, aspecto todo fotogênico. Depois há o cômico e o vilão que também são higiênicos e também distintos. E ainda uma fazenda moderna, fotogênica, os subordinados se submetem aos seus superiores com alegria e com satisfação, e um ritmo que é o ritmo da vida de hoje, ágil, leve, moderno... O parzinho que assistir o filme comentará que já viu aquilo vinte vezes. Mas sobre seus corações que sonham, não cairá a penumbra de uma brutalidade chocante, de uma cara suja, de um aspecto que tira qualquer parcela de poesia e de encantamento. Essa mocidade não pode aceitar essa arte que ensina a revolta, a falta de higiene, a luta e a eterna briga contra os que tem direito de mandar (Cinearte, 18 jun. 1930) 1

No entanto, é também nas páginas de Cinearte que vemos elogios a Thesouro Perdido (1927), de Humberto Mauro, por serem “nossos os ambientes, os typos, os usos, os costumes todos”. São várias as manifestações que enalteciam os filmes, independente

de

suas

qualidades, pelo fato de possuírem “o nosso sentimento, o nosso ambiente, o nosso aspecto característico”. (Cinearte, 28/11/1928) (GOMES, 1974, p. 331-332). Aos poucos, o interesse por filmes que

refletissem um Brasil rústico vai diminuir e desaparecer em favor da

apresentação de um Brasil desenvolvido, desaguando num “universo diegético socialmente mais alto... equivalente ao expresso na média dos filmes urbanos dos Estados Unidos”. (GOMES, 1974, p. 332). As fitas de cinema já apareciam, nesse momento, como local da representação da vida vivida por aqueles que as apreciavam. Os filmes retratavam os acontecimentos na cidade e, neles, as pessoas podiam se reconhecer e ser reconhecidas. Começa-se a construir aí a relação de “reflexo e refletido” entre o cinema nacional e a sociedade brasileira. Esta começava a perceber naquele um local em que podia identificar-se, conhecer-se, e obter parâmetros para sua configuração. Jean-Claude Bernardet diz que o público brasileiro relaciona-se com os filmes nacionais de maneira diferente do modo com o qual se relaciona com a cinematografia estrangeira. Os filmes brasileiros falam da realidade social e cultural em que vive o público brasileiro. Não necessariamente tem uma visão crítica sobre essa realidade, mas, mesmo 1

Idem, p. 56, 57. 33


assim, “oferece uma determinada imagem desta sociedade”. Os filmes nacionais acabam por mexer com os brasileiros que os assistem, “com a imagem que eles têm de si próprios, da sua sociedade, da sua vida cultural, da sua moral”. (BERNARDET, 1991, p. 18.49.) Nos primeiros anos do cinema brasileiro, a palavra nacional, referindo-se à produção de filmes, limitava-se a significar filmes produzidos em território brasileiro. No entanto, já em 1910, como ressaltam Jean C. Bernardet e Maria R. Galvão, indicando um texto da Gazeta de Notícias, o vocábulo “nacional” já era empregado no intuito de distinguir algumas das produções realizadas no Brasil: aquelas que tinham por tema os assuntos nacionais. Assim, por algum tempo, a questão nacional ficou resumida aos temas abordados pelas películas, não importando onde ou por quem tivessem sido produzidas,

o que caracteriza o Brasil é a matéria-prima, não o método de tratá-la. Este é ‘universal’ e, em última instância, tanto faz seja ela tratada por brasileiros ou americanos, desde que seja por quem saiba usar o método, e se disponha a fazê-lo no Brasil. Embora essa matéria-prima também possa ser exportada (...) (BERNARDET; GALVÃO, 1983, p. 18.24.) É nesse sentido que as idas de atores e realizadores brasileiros aos Estados Unidos, para trabalhar na indústria cinematográfica norte-americana, eram tidas como elemento enriquecedor de nosso cinema, ao mesmo tempo em que se faziam comuns os pedidos, em nossa imprensa especializada, para que empresas norte-americanas viessem produzir seus filmes em território e com assuntos brasileiros. A partir da década de 1920, com o aumento do espaço na imprensa para as questões cinematográficas, e com o surgimento de publicações especializadas, o cinema começa a ser visto e tratado de modo diferente. Começa-se a perceber uma preocupação com a imagem do Brasil que seria construída no exterior.

Tomemos o depoimento de João Cypriano a Maria Rita E. Galvão. (GALVÃO, 1975, P.193). Ele conta que, por ocasião da exibição de O Segredo do Corcunda (1924), em Portugal, ouviu do embaixador brasileiro em Lisboa, Antônio Carlos, entre inúmeros elogios ao filme, “que não ficava nada bem mostrar no estrangeiro que os caboclos das fazendas do interior viviam em choupanas tão miseráveis como a que aparecia no filme; também não gostou da cena em que o capataz espanca o colono. “Sugeriu que estas cenas fossem cortadas...”. Percebemos aí uma grande semelhança entre a ideia que o diplomata brasileiro tinha da nação brasileira e a imagem de nação que o texto de Cinearte, citado acima, pretendia que os filmes brasileiros 34


contivessem. E a preocupação com a imagem do país que o cinema brasileiro veicularia no exterior não se limitava apenas ao embaixador Antônio Carlos. A ideia do cinema como poderoso instrumento de propaganda a favor do Brasil no exterior parecia ocupar a mente de grande parte das pessoas envolvidas com o cinema do país na década de 1920. Eram os cavadores que insistiam no argumento de que seus naturais mostrando fazendas de café trariam enormes benefícios às vendas do produto no estrangeiro, ou os jornalistas que atacavam ou defendiam filmes dependendo da imagem que apresentavam do país. Paulo Emílio Salles Gomes (GOMES, 1974, p.311) cita um artigo da colunista Chrysanthème, publicado em O Paiz e reproduzido por Para Todos, em 12 de dezembro de 1925, no qual ela apresenta essa visão: “A autora ataca Nas Selvas do Extremo Norte e elogia Esposa do Solteiro, produção e fotografia de Paulo Benedetti e direção de Carlo Campogalliani, preocupada com a opinião do exterior.” Diz ela:

Nenhum paiz como o Brasil se presta mais sobejamente a ser filmado. Pode-se asseverar que elle é essencialmente photogenico. Porque explorar somente o seu sertão e a população deste, ainda inferior, como propaganda delle? ... Esposa do Solteiro no mostra a nossa capital debaixo do seu verdadeiro aspecto e no seu mais bello e delicioso prisma. É de fitas dessas que precisamos, aproveitando artistas brasileiros, as nossas obras de arte, as nossas avenidas, todas as nossas riquezas, enfim. O teor racista percebido no artigo de Chrysanthème é exacerbado numa carta de leitor publicada, em Cinearte, em 28 de abril de 1926, “na íntegra sem qualquer restrição”, como observa Paulo Emílio (GOMES, 1974, p.310). A carta tratava do filme O Brasil Pitoresco (1925) de Cornélio Pires.

Quando deixaremos desta mania de mostrar índios, caboclos, negros, bichos e outras ‘avis-rara’ desta infeliz terra aos olhos do espectador cinematographico? Vamos que por um acaso um destes films vá parar no extrangeiro? Alem de não ter arte, não haver technica nelle, deixará o extrangeiro mais convencido do que elle pensa que nós somos: uma terra igual ou peor a Angola, ao Congo ou cousa que o valha. Ora vejam se até não tem graça deixarem de filmar as ruas asphaltadas, os jardins, as praças, as obras de arte, etc, para nos apresentarem aos olhos, aqui, um bando de cangaceiros, ali, um mestiço vendendo garapa em um 35


purungo, acolá, um bando de negrotes se banhando num rio, e cousas deste jaez. Em 20 de junho de 1928, vemos, num artigo de L. S. Marinho, representante de Cinearte em Hollywood, essa mesma concepção de cinema como veículo de propaganda do Brasil no exterior e, de quebra, idealizador de uma imagem nacional distante de nossa realidade. Marinho escreve, por ocasião da exibição de O Encouraçado Potenkin, de Sergei Eisenstein, em Nova Iorque:

O resultado foi eficaz, plantou a propaganda e despertou interesse e curiosidade. Porque não fazemos cousa identica, com um film brasileiro, onde viesse patentear nosso progresso? Seria facil, assim creio, fazer passar para a mesma audiencia, um film forte de enredo, com o qual pudesse mostrar ao povo daqui que somos uma raça civilizada...2 Por outro lado, Mario de Andrade, em artigo atribuído à sua autoria, publicado na revista modernista Klaxon, de junho de 1922, deixa clara sua preocupação com a representação cinematográfica que seja fiel à realidade brasileira, deixando de mimetizar uma imagem idealizada e que não nos represente. Nesse artigo, o escritor modernista comenta o filme de José Medina, Do Rio a São Paulo para Casar, dizendo:

acender fósforos no sapato não é brasileiro. Apresentar-se um rapaz à noiva, na primeira vez que a vê, em mangas de camisa, é imitação de hábitos esportivos que não são nossos (...). É preciso compreender os norte-americanos e não macaqueá-los. Aproveitar deles o que têm de bom sob o ponto de vista técnico e não sob o ponto de vista dos costumes. (MACHADO, 1987, p105 e 106) O que predominava, no entanto, era a intenção de utilizar o cinema para apresentar um Brasil moderno, “civilizado”, compartilhando das mesmas qualidades dos países eurocêntricos. Há aí uma defasagem importante explicada por Renato Ortiz como sendo uma modernidade associada ao advento do capitalismo mas que, nas sociedades dependentes de origem colonial, apresenta uma defasagem entre sua instalação enquanto dado cultural (superestrutura) e enquanto dado do sistema social de produção (infraestrutura). No Brasil, “o ideário liberal chega antes do desenvolvimento das forças socioeconômicas que o originaram no contexto europeu, ele se encontra na posição esdrúxula 2

Apud: Ibidem, p.364. 36


de existir sem se realizar”. Ortiz refere-se ainda à cultura ornamental, que essa “posição esdrúxula” do liberalismo em nosso país origina, dizendo que:

Sua ornamentalidade aponta para uma falsidade, a vontade da classe dominante de se perceber enquanto parte da humanidade ocidental avançada; a doutrina liberal se transforma assim em valor ostentatório, o que em princípio asseguraria o pertencimento da burguesia nacional aos ideais de civilização e acomodaria na consciência da classe dominante o atraso brasileiro em relação aos países centrais. (ORTIZ, 1989, p.30, 32, 34) Talvez esteja aí a chave para entendermos como, até hoje, as classes médias brasileiras se incomodam com a existência de tantos filmes brasileiros tematizando a vida e o cotidiano das favelas e daqueles de pele um pouco mais escura que a dos integrantes dessa camada social, dizendo algo como “até parece que no Brasil só existe isso!”. Negando, assim uma identificação necessária com a realidade da qual faz parte, a classe média brasileira busca, como seus congêneres de há noventa anos, uma identificação com uma representação idealizada de uma realidade outra, nada mais fazendo do que “macaquear” um modo de vida constituído nos países centrais do hemisfério norte. Vemos, então, que desde seus momentos iniciais, de consolidação como produto relevante de nossa cultura, o cinema brasileiro tem sido instado a representar-nos, isto é a constituir uma identidade brasileira, um discurso sobre o que é o Brasil e o que é ser brasileiro. E, desde então, esse discurso vem envolto com a preocupação de como ele poderia ser lido no estrangeiro. A preocupação de o que poderiam pensar de nós lá fora. Seria necessário que mais de um quarto de século se passasse, no entanto, para que o cinema brasileiro tivesse uma projeção significativa no exterior e contribuísse efetivamente para a divulgação de nossa cultura e nossos produtos culturais para além de nossas fronteiras.3 Isso aconteceu com o sucesso internacional de O Cangaceiro, produção da Companhia Cinematográfica Vera Cruz que estreou, em janeiro de 1953, no cine Art-Palácio, na Cinelândia paulistana, e que não demorou em ganhar as telas internacionais. O filme dirigido por Lima Barreto foi sucesso de crítica e público, no Brasil e no exterior. O Cangaceiro correu o mundo pelas mãos da Columbia Pictures que recebeu os direitos de distribuição no Brasil e no mundo como pagamento de dívidas que a Vera Cruz tinha com o estúdio 3

Não abordarei, neste texto, o caso de Carmem Miranda, importantíssima personagem de nossa cultura mas que, ao ocupar as telas internacionais, o fez através de filmes não brasileiros. Aqui, trato de filmes feitos no Brasil e exibidos no exterior. 37


hollywoodiano. Ficou seis meses em cartaz em Paris, onde virou moda, com sandálias femininas, por exemplo, sendo feitas inspiradas nas alpercatas nordestinas. As canções do filme tornaram-se sucessos nas rádios francesas. O dinheiro feito com O Cangaceiro poderia ter resolvido os problemas financeiros da Vera Cruz evitando a falência do estúdio paulista, mas todo ele acabou ficando com os norteamericanos. O filme de Lima Barreto ganhou o premio de melhor filme de aventuras no Festival de Cannes de 1953 – num momento em que o principal festival de cinema do mundo ainda não tinha instituída sua Palma de Ouro – e o de melhor filme no Festival de Edimburgo, no mesmo ano. Sua trilha musical levou também Menção Especial no festival francês. Foi o primeiro longa-metragem brasileiro a ganhar um prêmio internacional, posicionando, pela primeira vez, um título brasileiro na ribalta da cinematografia mundial. O Cangaceiro acompanha o bando de Capitão Galdino Ferreira (Milton Ribeiro) e mostra a disputa que surge entre este e Teodoro (Alberto Ruschel), seu braço direito, quando o bando, depois de saquear um vilarejo, leva consigo Olivia (Marisa Prado), a professorinha do lugar, que acaba se enamorando de Teodoro e sendo correspondida. Se o tema e personagens característicos do cangaço já tinham freqüentado as telas brasileiras em filmes como Sangue de Irmão, de 1926, ou o documentário Lampião, o Rei do Cangaço, de Benjamin Abrahão, de 1936, o primeiro grande sucesso a abordar a vida no cangaço, apresentando o nordeste como paisagem dramática e social, foi O Cangaceiro. Poucos anos depois, em maio de 1962, outro filme brasileiro alcançaria enorme destaque internacional ganhando a Palma de Ouro do Festival de Cannes daquele ano: tratavase de O Pagador de Promessas, segundo filme dirigido por Anselmo Duarte4. Não era um feito qualquer. Naquele ano, competiam filmes de cineastas como Otto Preminger, John Frankenheimer, Agnès Varda, Satyajit Ray, Pietro Germi, Michelangelo Antonioni, Michael Cacoyannis, Sidney Lumet, Robert Bresson, Tony Richardson e Luis Buñuel. E, compondo o júri, François Truffaut tornou-se um entusiasta do filme brasileiro. Estar ali e levar o que é, até hoje, o maior prêmio da cinematografia mundial, era uma contribuição importante para a construção da imagem de um Brasil produtor de cultura sofisticada e capaz de compartilhar o mesmo cenário que os melhores da área. Poderia ser um espasmo de criatividade e competência, um lance de sorte. Não era. O cinema brasileiro ganhava o mundo. Se a questão social aparecia tangencialmente em O 4

Em abril do ano seguinte, O Pagador de Promessas participaria do Oscar, premiação da indústria hollywoodiana, concorrendo na categoria de melhor filme de língua estrangeira. Desta vez, no entanto, não levou o prêmio. 38


Cangaceiro; em O Pagador de Promessas a cultura popular, a institucionalização da cultura, relações de poder, os meios de comunicação de massa na sociedade brasileira, ganhavam a tela na adaptação que Anselmo Duarte havia feito da peça de Dias Gomes. A história de Zé do Burro, impedido por um padre de finalizar o pagamento de uma promessa que fizera a Santa Bárbara (diante de uma imagem consagrada a Iansã, num terreiro de Candomblé – “... no meu povoado num tem uma Santa Bárbara”, justificava Zé do Burro) evidenciava magistralmente a distância entre as construções culturais brasileiras genuinamente populares e o controle que querem delas fazer as instituições no e a serviço do poder (igreja, justiça, meios de comunicação). Ainda numa moldura clássica – fotografia / iluminação bem cuidadas, ao estilo hollywoodiano, narrativa linear – O Pagador de Promessas, com direção impecável e diálogos muito bem construídos conseguia, finalmente, colocar o cinema brasileiro entre o que de melhor havia na produção mundial da sétima arte. Mas se parte das qualidades – e do sucesso – de O Cangaceiro e de O Pagador de Promessas deveu-se a sua filiação a um tipo mais clássico de cinema, de caráter hollywoodiano em muito de sua concepção narrativa e característica estética, algo de completamente novo e inusitado apontava no horizonte cinematográfico brasileiro. Contemporâneo a O Pagador de Promessas aparecia, no cenário nacional e mundial, um rol de realizações que, sem qualquer exagero, configurar-se-ia num dos mais importantes movimentos da história do cinema mundial: O Cinema Novo Brasileiro. Filmes como Vidas Secas, de Nelson Pereira dos Santos, Barravento, Deus e o Diabo na Terra do Sol e Terra em Transe, de Glauber Rocha, Os Fuzis, de Ruy Guerra, chamariam a atenção de cineastas e cinéfilos mundo afora, por sua inventividade e ousadia narrativa, pela urgência de sua discussão política e por sua sintonia com o que de mais moderno se pensava sobre cinema nos principais centros culturais do mundo. Glauber Rocha, em 1969, já na fase final do movimento, ganha o prêmio de melhor direção no Festival de Cannes por O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro. O percurso internacional trilhado pelo cinema brasileiro desde O Cangaceiro até O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro parece ter consolidado a imagem do Brasil como um país capaz de apresentar ao panorama cultural mundial produtos dos mais relevantes desta que seria a expressão cultural e artística mais moderna, e estética e tecnologicamente mais sintonizada com o século XX: o cinema. Se não tínhamos então, como não temos até

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hoje (e, de resto, nenhum cinema nacional5 o tem) acesso a um grande número de telas no mercado mundial, construíamos uma respeitabilidade cinematográfica que foi se confirmando nas décadas seguintes, pela continuidade das premiações de nossos filmes e/ou de nossos atores a atrizes e profissionais de cinema, nos mais variados festivais internacionais. A esta altura, seria natural que a seguinte pergunta surgisse: Em que medida essa respeitabilidade é poderosa suficiente para construir uma imagem internacional do Brasil, uma “marca Brasil”, capaz de vender massivamente nossos produtos como o fazem os filmes hollywoodianos, há quase um século, com as idéias e produtos do capitalismo norteamericano? A resposta deveria iniciar-se, então, pela constatação de que os dois cinemas: o brasileiro, de caráter nacional e não hegemônico e o hollywoodiano, de caráter eminentemente hegemônico nos mercados mundiais, não poderiam ser encarados como produtos de igual capacidade nessa área. Não por qualquer deficiência intrínseca do produto cinematográfico nacional ou por qualquer qualidade exclusiva do produto hollywoodiano, mas sim por situações historicamente dadas que determinaram o domínio dos filmes de Hollywood nos mercados exibidores do mundo inteiro. Essa presença maciça de Hollywood nas telas do mundo – já há quase um século – viabilizou que seu modo de contar histórias e o conteúdo dessas histórias transformassem cada tela de cinema – desde aquelas nas salas mais simples das pequenas cidades do interior até as das sofisticadas salas dos shopping-centers das principais metrópoles do mundo – em verdadeiros balcões onde tudo estaria a venda, seja a idéia de que era justo exterminar os apaches pelo bem da marcha da “civilização” para o oeste até os mais modernos modelos de automóveis e o mais gorduroso dos hambúrgueres. Se pretendemos que os cinemas nacionais alcancem essa mesma eficiência de caixeiros viajantes planetários, estamos fadados ao fracasso, uma vez que nos falta agora, como nos faltará a médio e longo prazos6 a premissa básica desse processo, que é a presença asfixiante do produto cultural hollywoodiano nos mercados internacionais. Diante desta impossibilidade, “joga-se a toalha” e desiste-se de encarar o cinema como um meio de construção identitária, de construção de uma imagem, de uma marca para o seu país de origem? Obviamente que não. Impossibilitado de vender os produtos brasileiros 5

A expressão “cinema nacional”, aqui, refere-se à produção cinematográfica realizada no âmbito dos Estados nacionais e que sofre restrições de distribuição e de exibição (em seus países de origem e fora deles) em função da hegemonia do produto hollywoodiano nos mercados das mais diferentes nações. 6 Dizemos dessa impossibilidade a médio e longo prazos, não devido a uma descrença num eventual declínio do poderio hollywoodiano sobre os mercados internacionais, mas devido a uma crença, talvez utópica, mas certamente necessária, de que uma vez finda, essa hegemonia não será substituída por outra, mas sim por uma divisão minimante justa dos mercados / telas internacionais entre a produção audiovisual global, policentricamente produzida e multiculturalmente representada. 40


como Hollywood faz com os produtos estadunidenses, o cinema brasileiro pode, sim, construir uma imagem do Brasil que apele para a nossa densidade cultural, para a capacidade nacional de se expressar criativamente numa forma de arte sofisticada como a forma audiovisual – como observamos no percurso, descrito acima, da produção cinematográfica nacional, por festivais e mercados internacionais. Utilizando-se dos formadores de opinião, profissionais de cinema, cinéfilos e frequentadores de salas especiais de exibição nas grandes cidades, de mostras e festivais, o cinema brasileiro pode espraiar essa imagem, essa “marca Brasil”. Pode até, eventualmente, “vender” um produto aqui, um local para turismo ali, mas, sua grande contribuição será confirmar a presença do país no cenário da produção cultural relevante do século XX – e agora do século XXI. Caberá às outras instâncias culturais, econômicas e sociais da vida brasileira se apropriar dessa “marca Brasil” criada por nosso cinema (e, necessário dizer, também por outras manifestações culturais nacionais) como um elemento de contribuição para o estabelecimento de relações geopolíticas e econômicas que nos tragam benefícios e que, numa visão mais generosa, sejam capazes de construir uma realidade mundial mais democrática e igualitária para todos. Quem sabe esteja aí o papel da cultura audiovisual brasileira, no século que há pouco se iniciou.

Referências BERNARDET, Jean-Claude. Cinema brasileiro: proposta para uma história. São Paulo: Paz e Terra, 1991. BERNARDET, Jean Claude, GALVÃO, Maria Rita. Cinema: Repercussões em Caixa de Eco Ideológica (as ideias de nacional e popular no pensamento cinematográfico brasileiro). São Paulo: Brasiliense, 1983. GALVÃO, Maria Rita Eliezer. Crônica do Cinema Paulistano. São Paulo: Ática, 1975 GOMES, Paulo Emilio Salles. Humberto Mauro, Cataguases, Cinearte. São Paulo: Perspectiva, 1974. GONÇALVES, Mauricio R. Cinema e Identidade Nacional no Brasil - 1898 – 1969. São Paulo: LCTE, 2011. MOURA, Roberto. A Bela Época (Primórdios – 1912) Cinema Carioca (1912 – 1930), in: RAMOS, Fernão (org.) História do Cinema Brasileiro. São Paulo: Art, 1987. RAMOS, Fernão (org.) História do Cinema Brasileiro. São Paulo: Art, 1987.

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Telenovela é a cara do Brasil Maria Angela Pavan Pequena história da televisão no Brasil

Falar da história da televisão no Brasil é realçar o nome de Francisco de Assis Chateaubriand Bandeira de Melo, o Chatô, um homem que pensava a frente de seu tempo, criou a primeira televisão da América Latina, quinta televisão do mundo. O marco histórico da primeira exibição foi o dia 18 de setembro de 1950 quando houve a estreia das primeiras imagens da PRF-3, TV Tupi de São Paulo (MORAIS, 1994, p.498) A televisão é comemorada em duas datas no Brasil, no dia de Santa Clara - 11 de agosto e no dia 18 de setembro. Os relatos e fatos desta história são repetidos em vários livros que resgatam a história da televisão. Nestes livros aparecem os desbravadores do início da televisão que contam sobre o processo de produção com os equipamentos existentes em cada época. O acelerar de novos equipamentos e a forma de produção ativaram a estética e a maneira de produzir. A telenovela ganhou destaque no Brasil depois do videoteipe. A adoção do videoteipe (VT) em escala comercial a partir de 1962 (...) vai facilitar e tornar rentável a realização das novelas diárias, shows, transmissão de jogos de futebol gravados no eixo São Paulo -Rio (...) Ele liberta a TV da camisa-de- força da transmissão ao vivo (...) Introduz a linguagem específica da televisão, com os cortes de edição, a velocidade e um novo ritmo (SIMÕES, 2004, p.21) Novas formas de produção, estéticas, luz e percepção entram em cena e na grade de programação.

As experimentações estéticas com a nova tecnologia denotam novas

sensibilidades aos receptores e também preferências. Qualquer telespectador sempre tem algo para acrescentar sobre o que está vendo na telenovela. Tanto que hoje muito do que é realizado nos episódios depende da preferência da audiência. Na verdade são críticos e realizadores vorazes dos produtos ficcionais que assistem.

Bem antes mesmo da

convergência e da internet, as telenovelas se balizavam pelo que o telespectador desejava. Ainda hoje a audiência é que decide os rumos dramáticos dos personagens. O século XX nos fornece a experiência tecnológica no excesso de invenções e criações em relação aos equipamentos eletrônicos e também de broadcasting para realização da 44


produção televisiva. Os historiadores Hobsbawn, Asa Briggs e Peter Burke complementam suas pesquisas a respeito das invenções para os meios de comunicação. Como nos salienta Briggs & Burke sobre a televisão: Uma data merece ser lembrada é o dia 30 de setembro de 1929, quando Baird (John Logie Baird), depois de infindáveis negociações com a relutante BBC, obteve permissão para lançar um serviço experimental de televisão. O presidente do Conselho Britânico do Comércio, dando sua benção, disse aos espectadores (ainda não descritos assim) que esperava ansiosamente que “esta nova ciência aplicada estimulasse e criasse uma nova indústria, não somente para a Grã Bretanha e para o Império Britânico, mas para o mundo todo”. (...) A televisão já havia se tornado uma realidade “de fato” quando uma peça de Pirandello foi televisionada em julho de 1930. (BRIGGS & BURKE, 2006, p. 177-178) Voltando a história para nosso contexto brasileiro, o cenário da primeira televisão é São Paulo, exatamente no bairro do Sumaré, onde hoje está a sede matriz da MTV. Quem passar pelo bairro poderá ver ainda algumas antigas casas ao redor, de antigos artistas e trabalhadores da televisão. Em uma destas casas encontramos o museu da televisão construído pela atriz Vida Alves. A atriz é lembrada pelo primeiro beijo na televisão como parceira de Walter Foster na primeira telenovela não diária exibida na TV Tupi em “Sua Vida me pertence” de 1951. Vida Alves antes da novela e depois, foi garota propaganda, na era sem videoteipe. Imaginem que as garotas propaganda tinham que mostrar o produto e as falas ao vivo sem gravação. Faziam propaganda de perfumes, talcos, sabão de pó, fogão, televisão e muitos outros. Esta televisão sem o videoteipe durou seis anos e as garotas propagandas atuaram como as belas da televisão desta época. Uma história que é recontada em vários livros de pesquisadores da história da comunicação são os patrocinadores da televisão que estava nascendo (REIMÃO, 2006, p.21). Chatô tinha os patrocinadores para a primeira televisão no Brasil: Moinho Santista, SulAmérica de Seguros, Cervejaria Antarctica e Laminação Nacional de Metais - talheres Wolff (MORAIS, 1994, p.502). Na época não havia condições objetivas para esta implantação, afinal o Brasil ainda tinha 70% da população vivendo no campo, não havia profissionais da área de televisão, sendo que a experiência acumulada vinha da área radiofônica.

Há que levar em conta o fato de que o quadro socioeconômico do país não era favorável à implantação da TV em 1950. Na atividade econômica prevalecia o setor agrícola, com mais de 2/3 da população 45


vivendo na área rural, onde a maioria absoluta das propriedades não contava sequer com energia elétrica. (SIMÕES, 2004, p.19) Chatô já iniciava nesta época também a consolidação do Museu de Arte de São Paulo, além de ser o dono de uma das maiores cadeias de comunicação do país, os Diários Associados. Conseguiu ainda levar à falência os Diários Associados, já que a televisão consumiu quase todos os recursos em um mercado que ainda não tinha condições de compreender este empreendimento. Vale ressaltar também que, tecnicamente, o país não tinha um parque industrial compatível com essa nova tecnologia e os aparelhos de televisão tinham que ser importados. No campo técnico específico do novo meio também não havia profissionais qualificados. Daí o formato televisivo tão verborrágico da televisão neste início. A história da televisão brasileira, segundo Inimá Simões (2004, p.14), pode ser dividida em três períodos. A primeira vai do início dos anos 50, principalmente, da segunda metade do governo de Juscelino Kubitschek (55/60) até 1964, foi caracterizada como uma televisão com baixa audiência e pequena expressão econômica. A segunda, durante a ditadura militar, que durou aproximadamente 20 anos e onde houve o conluio entre governo e emissoras, fez da televisão a grande unificadora do território nacional.

Um terceiro tempo surge ao final da ditadura militar e alcança até os dias atuais, marcado pela distribuição a granel das concessões e recuo nas funções regulatórias do Estado, enquanto veículo assume o topo da pirâmide do poder, como principal formador de opinião pública brasileira e acima dos controles institucionais. (SIMÕES, 2004, p.61)

Além disso o primeiro período se caracteriza pelo capital nacional; o segundo, pela entrada de investimentos estrangeiros na indústria da informação, indicando que a internacionalização do mercado brasileiro também marca a norte-americanização da indústria cultural, especialmente no setor da televisão." (AVANCINI, 1988, p.162) É interessante notar que a televisão surge nos dois polos economicamente mais desenvolvidos, São Paulo e Rio de Janeiro. Surge também com uma dependência muito grande dos Estados Unidos, afinal as empresas que implantam a televisão no país são a RCA (Radio Corporation of America) e a General Electric, inclusive fornecendo assistência técnica. A exemplo do modelo radiofônico, a televisão também segue o esquema privado, em que prevalece o sistema comercial. 46


Até hoje a televisão segue a tendência do oligopólio. A rede de comunicação de Chatô, por exemplo, em seu período de auge na década de 60, tinha 34 jornais, 36 estações de rádio, 28 revistas, entre as mais importantes revistas para adultos, doze revistas infantis, 18 emissoras de TV, uma editora, agências de notícias, agências de propaganda, duas empresas de gravação, um castelo na Normandia, nove fazendas produtivas espalhadas por quatro estados brasileiros, indústrias químicas e laboratórios farmacêuticos, este encabeçados pelo poderoso Schering. (MORAIS, 1994, p.16) Em 1951 nasce a TV Tupi do Rio de Janeiro; no final de 1951, a TV Paulista; em 1953, a TV Record; em 1955, a TV Rio e a TV Itacolomy, de Belo Horizonte; em 1960, TV Excelsior e assim sucessivamente várias outras televisões. Os espetáculos de teatro eram a principal atração das televisões neste período. Como por exemplo: O Grande Teatro Tupi (toda segunda), O TV de Vanguarda, também na Tupi com direção de Walter George Durst. A Tupi estreou também em 1953, o programa infantil Sessão Zig Zag, com teatro infantil, o primeiro foi o Sítio do Picapau Amarelo ao vivo e já com realização de Tatiana Belink e Julio Gouveia. Já a TV Paulista optava por uma programação de esquetes de cinco minutos e filmes de curta metragem. O problema dos teleteatros é que o ator vinha com os vícios do teatro, impostação de voz, ignorando os microfones e ainda expressão facial e corporal exagerada, bem diferente do que deveria ser na televisão. A televisão utiliza desde sempre planos mais fechados e os gestuais do teatro deixam as expressões exageradas, a televisão mudou a forma de interpretação dos atores do teatro. Com a estreia da Record, considerada a mais equipada da América Latina, a música tem um espaço garantido com Dorival Caymmi e Inezita Barroso. Na linha musical destaque para os festivais de música e o programa apresentado por Blota Júnior chamado Grandes Espetáculos (FEDERICO, 1982, p.87) É na década de 60 que o grupo de mídia norte-americano Time-Life Corporation busca um sócio brasileiro para operar emissoras de radiodifusão no Brasil. Entretanto a Constituição brasileira (desde 1946) vedava a propriedade estrangeira da mídia impressa e eletrônica no país. Este grupo encontrou um sócio em 1962, o empresário Roberto Marinho, presidente das empresas Globo.

A fim de se evitar um conflito com os dispositivos constitucionais, um contrato de assistência técnica foi assinado, no qual, em resumo a Time-Life transferiria para a Globo, por tempo determinado, moderno 47


suporte técnico para a atividade de radiodifusão. Em troca, o grupo americano receberia participação nos lucros da nova emissora. A TV Globo foi inaugurada em 1965 e gradualmente adotou o modelo americano de administração, tecnologia e programação de radiodifusão (ALMEIDA, 1993, p.115) Com a nova política econômica, os capitais estrangeiros começam a chegar em grande volume ao país, na perspectiva do lucro rápido. A indústria eletroeletrônica, a indústria mecânica e também a indústria cultural. Isso colabora com as produções das telenovelas. A reorganização da antiga produção industrial, agora com novas técnicas produtivas, em setores mais dinâmicos como indústria química e automobilística, traz consigo uma reorganização administrativa, tecnológica e financeira que implicam em uma reordenação das formas de controle político e social, segundo Inimá Simões (2004, p. 72). A televisão vai desempenhar, nesta fase, um papel importante para a legitimação das novas tendências, em especial para a divulgação das ideias vindas dos Estados Unidos, país que serve de parâmetro às tendências do desenvolvimento econômico. Os norte-americanos conhecem muito a malha de distribuição desde o início da televisão. A televisão desde sempre associou os primeiros programas a seus patrocinadores: Show Musical Nobis, Repórter Esso, Divertimentos Ducal, Gincana Kibon, Sabatinas Maisena. Não poderia ser diferente ao longo dos anos e o uso da telenovela para vender produtos e distribuir para o mundo todo. Quem assiste o filme de Robert Redford Quiz Show (1994) consegue visualizar o início da televisão nos Estados Unidos e consegue perceber a semelhança com o modelo adotado no Brasil.

A história da Telenovela e sua internacionalização

O rádio é que começou com as novelas no Brasil (radionovelas), é muito comum ouvirmos quem tem setenta anos nos dia de hoje, que ouvia as radionovelas e se informava através da revista da rádio nacional sobre as radionovelas, moda e produtos para beleza. A importante tese de doutorado de Marta Regina Maia, da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP – 2003) mostra de forma evidente estas lembranças e memórias. Não demorou muito para que o gênero novela ganhasse destaque no rádio e televisão no Brasil, com audiência garantida desde a década de 60 e como um dos produtos mais exportados pelo país. Segundo o site sobre memória da Rede Globo, foi através das radionovelas cubanas e mexicanas que a telenovela firmou-se como gênero dramático. Em 1951 é veiculada a 48


primeira telenovela "Sua Vida me Pertence", pela TV Tupi de São Paulo, que era transmitida duas vezes por semana, com duração de 15 minutos e que teve duração de três meses. No início, as novelas imitavam o tempo e formato do rádio: as radionovelas também duravam quinze minutos e aconteciam duas vezes por semana. No filme A Hora Mágica de Guilherme de Almeida Prado (1998) podemos sentir o clima da construção das radionovelas. A trama também mostra o pouco entusiasmo com que foi olhada a chegada da televisão nesta época. Ninguém conseguia prever que a televisão teria um destaque tão grande em tão pouco tempo. Em uma das cenas comentam sobre a chegada da televisão e eles perguntam quando olham pela primeira vez para um aparelho de TV: “O que é isso?” depois passam carregando o aparelho televisivo pelo corredor do estúdio de rádio, e dizem assim sem muito interesse durante as gravações de uma radionovela: “Então é isso...”. A invenção chega e com ela descobrem que as novelas podem ser diárias. Aqui no Brasil a primeira telenovela diária foi 2-5499 Ocupado, produzida pela TV Excelsior, com duração de três meses, de julho a setembro de 1963, veiculada às 19 horas, com os atores Glória Menezes, Tarcisio Meira e Lolita Rodrigues com o patrocínio da Colgate-Palmolive. Foi o investimento da fábrica de sabonetes - que já vinha dando apoio às soap-operas norteamericanas que permitiu a produção do texto do argentino de Alberto Migré que também foi o diretor da novela. O nome soap-operas (ao pé da letra significa ópera sabão) é uma menção à venda de sabão entre os quadros do gênero. E as telenovelas passaram, então, a ocupar um espaço garantido na programação diária. As mais variadas tramas foram levadas às telas da TV. Um dos maiores sucessos foi "O Direito de Nascer" (TV Tupi - 1968/69), que repetiu os altos índices de audiência que conseguira no rádio. A Excelsior foi responsável por grandes sucessos do gênero, como "Ambição" e "A Deusa Vencida", que marcaram o início da carreira de Ivani Ribeiro como autora de novelas. Revelou ainda grandes intérpretes, como Regina Duarte, Stênio Garcia, Juca de Oliveira e Mauro Mendonça. Em meio aos inúmeros dramalhões que comoviam os telespectadores, a TV Tupi apresentou uma novela revolucionária pela inovação temática e interpretativa: "Beto Rockfeller" (1968/69), de Bráulio Pedroso. Descobriram que as questões mais singelas do cotidiano poderiam ser importantes dentro da ação dramática. Assim, Luís Gustavo, em um estilo de interpretação mais natural, viveu um jovem ambicioso, sem dinheiro, que se faz 49


passar por rico para conseguir um casamento de interesses. Sem nenhuma das qualidades até então indispensáveis a um herói, "Beto Rockfeller" foi um grande sucesso, consagrando-se como o primeiro anti-herói da televisão brasileira e também a primeira novela que começa a mostrar o cotidiano da vida brasileira. O merchandising entra na ação dramática televisiva nesta novela, o personagem principal Beto Rockfeller fica com ressaca de suas noites e toma um antiácido pela manhã (Alka Seltzer da Bayer) Para fortalecer sua teledramaturgia, que não proporcionava bons índices de audiência, já que o público dividia-se entre as novelas da Tupi e da Excelsior, a Globo chamou para dirigir este núcleo a autora Glória Magadan, profissional cubana com larga experiência no assunto. Seu método foi encomendar aos novelistas brasileiros adaptações das novelas latinas. Foi a precursora de Janete Clair. Magadan tinha várias funções na empresa Globo, era escritora, produtora e supervisora de novelas. A frase que é repetida sempre por María Magdalena Iturrioz y Placencia (o nome verdadeiro de Gloria Magadan) é que a telenovela é um produto industrial e tem que ser vendida. Sua experiência com produtos se deu no departamento de publicidade da Colgate-Palmolive em São Paulo, empresa que seria, nas décadas seguintes, uma das principais patrocinadoras das telenovelas brasileiras. Na verdade Glória Magadan pode ser elencada como a responsável por organizar a produção de telenovelas segundo o processo industrial nos meados da década de 1960. Ela já organizava pesquisa de opinião e construía seus personagens e tramas a partir do gosto popular. Próximo da década de 70, as novelas brasileiras tornaram-se o centro da programação da Globo. Às primeiras produções, "Véu de Noiva" (69) e "Irmãos Coragem" (70/71), seguiuse uma verdadeira invasão do gênero. Às 18 horas, predominavam novelas românticas, geralmente baseadas em obras da literatura brasileira, como por exemplo: "Senhora", "A Moreninha", "A Escrava Isaura". Às 19 horas, temas mais leves, com um toque de humor: "Estúpido Cupido", "Te Contei?", "Feijão Maravilha" e, às 20 horas, novelas mais "sérias", como "Cavalo de Aço" (1973). Continua esta mesma lógica de horários na grade da Rede Globo e a novela é o produto que garante a audiência e prestígio das TVs brasileiras no Brasil e exterior. Em 1974 começa a exportação de telenovelas. A Globo exporta para o Uruguai "O Bem Amado". Depois vende para outros países da América Latina as novelas "Pecado Capital" (75) e "Escrava Isaura" (76). Vale citar que a primeira novela colorida da televisão

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foi "O Bem Amado", de Dias Gomes, com Paulo Gracindo e Sandra Bréa, veiculada em 1972 e que abriu o mercado de novos aparelhos televisivos. A primeira telenovela brasileira a entrar no mercado europeu foi "Baila Comigo", em 1984, vendida para a TF1 da França. Era uma versão de 55 capítulos, porque nas novelas que são exportadas são retiradas as cenas redundantes, as cenas regionais e o merchandising. Hoje elas têm por volta de 70 capítulos. Atualmente a TV Globo exporta suas novelas para 176 países. O pesquisador Cesar Bolaño (2007) afirma que o marco internacionalização foi a década de 70, e diz que existem quatro formas de internacionalização do gênero na televisão: “1) exportação de programas (telenovelas e seriados), 2) exportação de formatos, 3) exportação de capital, através da implantação em mercados nacionais determinados e 4) exportação de programação (grade individualizada ou pacotes de canais).” ( BOLAÑO, MOURA, 2007, p.2) E foi na década de 70 que a Globo ousou um pouco mais, apresentando seriados brasileiros com temáticas até então impensáveis. Foi o caso de "Malu Mulher", "Carga Pesada" e "Plantão de Polícia". Algumas minisséries, igualmente inovadoras, receberam os anos 80: "Quem Ama Não Mata", "Avenida Paulista" e outras. O investimento é grande em telenovela porque ela preenche longos períodos da programação e mantém o público atento e interessado. Como a televisão está fortemente ligada a audiência para poder vender seus espaços publicitários, a telenovela colabora com este movimento financeiro da televisão. As histórias fluem lentamente, criando suspense diário, motivando os telespectadores a retomarem a trama no dia seguinte e seduzindo-o, assim, até o último capítulo. É impossível entendermos o fenômeno telenovela sem levarmos em consideração seu significado econômico. Hoje, a telenovela é o produto mais rentável da TV brasileira, que paga quase todo o restante da programação. Inclusive é por isso que as telenovelas brasileiras estão em todo mundo. Podem ser vendidas a um custo mais baixo porque já saem pagas daqui. É o mesmo processo dos enlatados norte-americanos que dominam a programação televisiva desde o seu início na década de 50. Um exemplo ilustrativo, a novela Roque Santeiro, produzida em 1985, teve um gasto de US$ 2 milhões, com um custo por capítulo de US$ 10 a 15 mil. Mas o custo por inserção de um comercial na novela das oito é no valor de US$ 20 mil. Além do merchandising. Na

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Globo, cada ação custa 20 a 30% mais que um minuto de comercial. E são feitos mais ou menos 20 contratos por novela, com 5 a 6 inserções por contrato, todo mês. No Brasil o modelo de televisão vigente é esta televisão aberta com o canal público complementar (semelhante dos Estados Unidos). Não existe uma lei que proíbe os merchandisings dentro da trama da novela. Desta forma a novela se torna cada dia mais rentável. Ao escrever o roteiro o autor já incrementa os sinais de ação de merchandising com o personagem ou coloca o sinal de merchandising dentro da ação dramática. Lembrando que não existem políticas públicas para todo o processo de produção audiovisual no Brasil como : produção, distribuição e exibição. (BRITTOS, BOLAÑO, 2005, p. 30-33) Para exportar as formas industriais de imagens para alguns países as empresas precisam elaborar a trama com possíveis cortes de capítulos que usam merchandisings. Muitos países, Itália, França e Grécia, por exemplo, possuem regulamentações sérias em relação ao audiovisual, com leis específicas e forte controle governamental sobre as imagens. Citamos como exemplo filmes que enaltecem delicadamente o poder da imagem na persuasão nas formas industriais da imagem. O filme do cineasta Giuseppe Tornatore, Cinema Paradiso (1988) mostra Alfredo que conversa com Totó sobre os sentimentos que regem a vida sempre busca os exemplos do cinema, e Totó, como bom aprendiz usa esta mesma tônica, quando se torna jovem, para conquistar seu primeiro amor. Outro filme que revela de forma delicada a persuasão da imagem é do cineasta americano Wood Allen, A Era do rádio (1987) numa cena quando os ladrões entram em uma casa vazia e um dos ladrões atende ao telefone que toca, e do outro lado era um programa do rádio de perguntas e respostas. O ladrão responde corretamente cada uma das respostas. Os ladrões ao terminar o roubo, levam da casa apenas cinquenta dólares. Quando os donos chegam na casa, recebem um caminhão de mercadorias referentes ao quiz show, e não entendem nada. Esta cena nos envolve, pois mostra claramente que estamos todos envolvidos pela indústria da imagem, desejo e ilusão que a televisão descobriu há muito tempo. Este formato televisivo que estabiliza a linguagem e com os chamados breaks criam a suspensão e manutenção e reatamento do gênero televisivo. Desta forma podem vender e criar todas as formas de comercialização de produtos. Há muito tempo a TV Globo descobriu que a trilha sonora podia ser um produto mercadológico independente da própria novela. Daí criou a Som Livre em 1971 e lançou o primeiro LP de novela: "O Cafona". Segundo Bortoloti (2006) a Globo não divulga números, mas “estima-se que fature 40 milhões de dólares com a exportação de novelas.” (MOURA, 52


BOLAÑO, 2007, p.4). Depois com a criação de Globo Vídeos, Globo Filmes (Núcleo da Rede Globo em 1998). Segundo Ricardo Scalamandré (2006), diretor da Globo Internacional, o formato seriado com ganchos passou a ser valorizado pelos grandes executivos da mídia internacional depois do êxito dos reality shows, e a experiência da Globo em produção de novelas a coloca em posição de competir de igual no mercado global. Cita como exemplo a Telemundo que faz a mediação de nossas novelas no mercado hispânico dubladas no ar. A Rede Globo tem sempre duas novelas nos horários importantes destes países. E para garantir o mercado, a Rede Globo oferece coprodução: “Por isso a Globo está se estruturando para produzir novelas no mundo inteiro, em tudo quanto é língua: russo, alemão, espanhol, português de Portugal etc. Esse vai ser o nosso grande passo daqui para frente. É um jeito de manter o mercado com participação na produção de novela, que é o que a gente sabe fazer, em língua estrangeira” (SCALAMANDRÉ, 2006).

Considerações finais sobre a telenovela

Como constatamos a telenovela é um produto aceito no mundo inteiro. Hoje as televisões brasileiras enfrentam muito concorrência com a Televisa (México) e Clarín (Argentina). (MOURA, BOLAÑO, 2007, p.4). Há concorrências também na produção deste gênero com os norte-americanos que descobriram o filão e também os europeus. Scalamandré diz que a Alemanha hoje em dia produz telenovela, a Rússia realiza telenovelas com coprodução da Sony, mas ainda compra as novelas brasileiras. Sem dúvida o gosto pelo gênero tem feito com que as grandes empresas de produção televisiva invistam em telenovela como por exemplo a Endemol (Holanda), FremantleMedia (Austrália) e Telemundo (EUA/Canadá). Estas empresas estão competindo com as telenovelas latino americanas. Daniel Filho disse que a “novela já está incorporada ao gosto brasileiro como um tipo de divertimento e de uma forma ou de outra, vai continuar assim indefinidamente” (MELO, 1988, p.36/37).

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Acreditamos que o gênero já está sendo incorporado no mundo todo e desta forma haverá muitos mercados a serem descobertos indefinidamente. Vamos ver o que reserva para os próximos capítulos e para as próximas tramas televisivas daqui cinco anos.

Referências ALMEIDA, André Mendes de. Mídia eletrônica - seu controle nos EUA e no Brasil. Rio de Janeiro:Forense,1993. AVANCINI, Walter. TV ao vivo - Depoimentos. São Paulo: Brasiliense, 1988. BORTOLOTI, Marcelo. Global ‘pero no tanto’ in MOURA, Fabio Rodrigues. BOLAÑO, Cesar. A internacionalização da TV Brasileira nos anos 90 e 2000: Globo e Record. Artigo apresentado no Congresso Nacional de Comunicação, 2007. BRITTOS, Valério, BOLAÑO, Cesar Ricardo Siqueira (orgs). Rede Globo: 40 anos de poder e hegemonia. São Paulo: Paulus, 2005. CAPARELLI, Sérgio. Televisão e Capitalismo no Brasil. Porto Alegre: LPM, 1982. FEDERICO, Maria Elvira Bonavita. História da Comunicação: Rádio e TV no Brasil. Rio de Janeiro: Vozes, 1982. MAIA, Marta Regina. Quadros Radiofônicos: memórias da comunidade radiouvinte paulistana (1930/1950). Tese de doutoramento da ECA/USP, 2003. MELO, José Marques de. As Telenovelas da Globo. Produção e Exportação. São Paulo: Summus, 1988. MORAIS, Fernando. Chatô: o rei do Brasil, a vida de Assis Chateubriand. São Paulo: Cia das Letras, 1994. MOURA, Fábio Rodrigues. BOLAÑO, Cesar. A internacionalização da TV Brasileira nos anos 1990 e 2000: Globo e Record. Artigo de Iniciação Científica apresentado no Congresso Nacional de Comunicação, Salvador, 2007. REIMÃO. Sandra (Org.). Em instantes: notas sobre programas na TV brasileira (1965-2000). São Bernardo do Campo/ SP.UMESP, 2006. SCALAMANDRÉ, Ricardo. Queremos produzir em todas as línguas. Folha de São Paulo, São Paulo, 19 de fevereiro de 2006. SIMÕES, Inimá. A Nossa TV Brasileira. Ed SENAC: SP, 2004. Memória Globo. Disponível em: http://memoriaglobo.globo.com/Memoriaglobo/ 0,27723,GYP05271-273535,00.html,Acesso em: 10 de março de 2012 às 19 horas. QUIZ SHOW: A VERDADE DOS BASTIDORES. Direção: Robert Redford. EUA. Roteiro: Paul Attanasio. 130 minutos, 1994.

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A HORA MÁGICA. Direção e Roteiro: Guilherme de Almeida Prado. Brasil/ Star Filmes, 103 minutos, 1998. CINEMA PARADISO. Direção: Giuseppe Tornatore. Itália/ 140 minutos, 1988. A ERA DO RÁDIO. Direção, roteiro e produção: Wood Allen. EUA/ Distribuidora: LKtel, 80 minutos, 1987.

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Criatividade Made in Brazil Aryovaldo de Castro Azevedo Junior Introdução

A publicidade e sua inter-relação com o mercado fazem desta ferramenta da comunicação de marketing uma das principais forças motrizes do sistema capitalista. No Brasil, decorrente de sua origem e desenvolvimento peculiares, acabou por desenvolver uma identidade própria que a tornou reconhecida no cenário mundial. A compreensão do funcionamento da estrutura do mercado publicitário internacional permite identificar a predominância do poder econômico dos países desenvolvidos, principalmente da Inglaterra e dos EUA. À publicidade brasileira, no contexto global, cabe o destaque quanto a sua criatividade, o que é constatado com o as premiações do Festival Internacional de Criatividade de Cannes, que representa o reconhecimento à competência dos criativos e à organização e relevância do mercado publicitário brasileiro. O bom desempenho da economia brasileira na década de 2010 e o incremento da presença de agências e criativos no Festival de Cannes fez da publicidade brasileira referência internacional para o marketing global, transformando o país num player destacado na comunidade internacional, seja por suas premiações e reconhecimento de sua criatividade, seja por seus custos de produção e por sua efetividade no contexto de marketing. Agradecimento especial aos discentes Jailton Senna, Lucas Souza, Leandro Fonseca da Costa, Raíssa Ramos Pereira, Rhovany Faustino de Carvalho e Tatiana dos Santos Pais sem os quais não teria sido possível a realização deste trabalho.

Onde está a Publicidade?

A lógica capitalista apresenta-se fundamentada na produção e no consumo e, entre elas, na comunicação entre produtores e consumidores, a publicidade ganha relevância sistêmica enquanto propagadora de comportamentos que perpetuam o capitalismo por estimular a aquisição de bens e serviços oferecidos à sociedade como forma de saciar desejos e necessidades, naturais ou socialmente construídas. Para tanto, é fundamental contextualizar a publicidade associando-a aos elementos fundamentais para a sua existência. 58


Marca

Marca é um sistema de valores que engloba rótulos, nomes, design, símbolos, slogans, jingles, know-how, patentes e relações comerciais ou, em outras palavras, é o atestado de idoneidade, origem, qualidade e respeito de uma corporação / linha de produtos / produtos. A marca é mais do que um produto; é uma entidade física e perceptual, simultaneamente. O seu aspecto físico (produto e embalagem) pode ser encontrado na prateleira do supermercado. O seu aspecto perceptual existe no espaço psicológico – na mente do consumidor. É dinâmico e maleável (MARTINS & BLECHER, 1997). A construção identitária da marca considera aspectos como design, preço, características técnicas e tecnológicas, área de atuação/distribuição, imagem institucional do fabricante, etc. (KOTLER, 2003).

Este somatório caracteriza o brand-equity, que é o

conjunto de todas as qualidades e atributos relacionados à marca (AAKER, 1998).

A

construção de valores na mente do consumidor, resultando na percepção marcária, considera os atributos dela, os benefícios por ela proporcionados e as atitudes pessoais sobre ela. O sucesso de uma marca relaciona-se a uma alta percepção de valor. Quanto maior o desejo, maior o valor (WEILBACHER, 1994).

Marketing

No âmbito contemporâneo de marketing, tem-se notado o incremento do trabalho de valoração da marca em detrimento do produto. Se nos anos 50 e 60 do século XX o foco estava no produto fabricado, nos anos 70 no fabricante, nos anos 80 no cliente, a partir dos anos 90, o foco é a relação entre empresa e consumidor. O foco passa a ser a marca, que é o resultado da integração do cliente com o fabricante numa relação permanente de interação. Assim, com a evolução, objetivo do marketing tem sido criar marcas fortes e lucrativas, o que gera a busca da publicidade como ferramenta de alavancagem da percepção da qualidade de marca. “Sem marca, um produto é uma coisa – uma mercadoria, um saquinho de café ou uma lata de sopa. Por outro lado, embora seja verdade que o consumidor geralmente recebe o produto genérico, sem marca, como entidade física, uma coisa, a maioria dos produtos (a não ser que se trate de categorias de produtos completamente novas), também tem um aspecto psíquico latente, uma mitologia latente de produto. A percepção da existente mitologia latente de um produto varia de produto para produto e de 59


consumidor para consumidor. A mitologia latente do produto vai além dos atributos físicos/benefícios e uso do produto. Esta mitologia abarca a totalidade das percepções, crenças, experiências e sentimentos associados com o produto. Ela é importante porque, como vemos mais tarde, muitas vezes é a base para formar e manter uma forte e duradoura mitologia de marca” (RANDAZZO, 1997)

A marca não se cria somente através da relação entre comunicação publicitária e receptores de informação. Ela se da através do processo de relacionamento entre a corporação e os consumidores, atravessando etapas que vão desde a fabricação até o suporte pós venda, passando pela distribuição do produto e sua precificação no ponto de venda. Todo e qualquer tipo de contato entre cliente e empresa é parte do processo de construção da percepção de marca por parte do consumidor. O trabalho de valorização de marca feito pelo anunciante busca fornecer aos seus clientes, de forma consistente, seu valor intrínseco ou, pelo menos, a ilusão deste. Com a utilização da comunicação de marketing é possível interferir na construção da percepção da imagem da marca pelos consumidores e nos benefícios que eles percebem. A publicidade intensifica o valor da marca apresentada ao público, singularizando-a e diferenciando-a de seus concorrentes, agregando-lhe valor na relação com o consumidor.

Comunicação Integrada

A comunicação de marketing é responsável por identificar um produto/serviço e realçá-lo positivamente através do destaque de qualidades positivas inerentes ao mesmo, como diferenciais técnicos ou tecnológicos, preço, facilidade de acesso, inovação e outras características distintivas como sabor, aroma, cor, design etc. Ou, valorizar aspectos extrínsecos ao produto/serviço, o que geralmente ocorre quando da impossibilidade de sua diferenciação de similares produzidos e oferecidos pela concorrência. Neste caso, busca-se um diferencial conceitual, ligado à percepção da marca. Cabe à comunicação de marketing fazer o consumidor notar e, possivelmente, se interessar pelo produto/serviço anunciado. Para tanto, divide-se entre ações promocionais e publicitárias, sendo o intuito da primeira informar sobre aspectos que estimulam o consumo mais imediato, enquanto a segunda preocupa-se, principalmente, em posicionar a marca na mente do consumidor. Sua função principal é servir de base de apoio na construção e sustentação da marca conforme o posicionamento desejado pelo anunciante, utilizando 60


ferramentas como assessoria de imprensa, relações públicas, merchandising e publicidade e outros possíveis métodos de promoção do produto e/ou marca (COBRA, 1986). Fica claro porque o processo de comunicação integrada ganha cada dez mais espaço, deixando a antiga publicidade “vendedora” que predominava até os anos 80. Afinal, o que interessa é manter uma relação permanente com o consumidor e isto é muito mais abrangente que a simples comunicação publicitária. Isto faz parte do conceito de branding, que nada mais é que a empresa ser o que diz que é. Ou seja, não basta anunciar bons produtos, tem de produzi-los. Não basta anunciar bons serviços, tem de oferecê-los. Não basta dizer que tem responsabilidade social, tem de praticá-la. Não basta informar ao consumidor, a empresa deve se comunicar com ele, num processo permanente e planejado do composto de comunicação de marketing: publicidade e propaganda, assessoria de imprensa, design do produto e da embalagem, eventos, design de lojas, venda pessoal, relações públicas, promoção de vendas, marketing direto e quaisquer outras formas de gerar pontos de contato com o potencial consumidor (KOTLER, 2003).

Publicidade

A estetização da vida cotidiana e a sua abundante utilização pela publicidade reforçam o conceito de que o consumo não deve ser compreendido apenas pela busca de valores de uso, mas primordialmente pelo valor simbólico atribuído aos produtos e marcas.

Esta

comunicação hiperbólica domina a cultura de consumo e retrata a sociedade do excesso de bens, mercadorias, experiências, imagens e signos que caracterizam o homem pós-moderno. “A publicidade traduz a produção para que esta possa virar consumo, e ensina modos de sociabilidade enquanto explica o que, onde, quando e como consumir. O consumo é onipresente na sociedade contemporânea, e é através do sistema publicitário que ele adquire sentido social, pois as marcas, os bens, os produtos e serviços ganham as suas identidades nesse discurso, e, com elas, uma existência concreta em nossas vidas” (ROCHA, 2006, p.11)

A função da publicidade, mais que simplesmente vender um produto e aumentar o consumo, é idealizar um universo simbólico e difundí-lo principalmente através dos meios de comunicação de massa, que ratificam os valores de uma sociedade baseada no consumo, o qual se converte num meio de identificação do ser, tornando-se parte significativa da definição diferencial dos grupos sociais e dos indivíduos (BARBOSA, 2005). 61


Enquanto se consome símbolos autodefinidores, aumenta-se a imersão no simulacro criado pela indústria cultural, uma vez que estes símbolos são por ela construídos e postos à venda no mercado como determinantes/representantes do comportamento. A coisificação da personalidade transforma o ser humano numa vitrine. O sujeito passa a ser objeto numa clara inversão de valores (BAUDRILLARD, 2000). Mercadologicamente, o papel da publicidade é informar de modo sedutor sobre as características de produtos/serviços para a sociedade em geral e, para os potenciais consumidores, em particular. Em outras palavras, transformar em comunicação as propostas do marketing corporativo. Para o propósito de construção de um posicionamento, os objetivos da publicidade podem ser classificados em função do seu intuito de informar, persuadir ou lembrar o consumidor, visando estabelecer uma relação positiva entre a marca e o consumidor, potencializando o share of mind e a participação de mercado da empresa (SAMPAIO, 2003). Segundo Willian Weilbacher, o valor agregado pela propaganda pode determinar as marcas que o consumidor leva em consideração, e, portanto, os estabelecimentos comerciais que ele decidirá visitar. Se a propaganda de um produto agrega valor a este, o produto pode ser vendido por um preço mais alto ou mais estável do que o seria se o consumidor não o percebesse como distinto dos produtos com os quais concorre. Quando a propaganda é eficaz ao fazer um produto parecer diferente e melhor, ela realmente conseguiu duas coisas para o anunciante: fez o consumidor pensar da forma como o anunciante desejava que ele pensasse e, predispôs o consumidor a agir como o anunciante desejava que ele agisse (WEILBACHER, 1994). No discurso publicitário, pode-se compreender a marca como um nome / símbolo (logotipo, marca registrada, embalagem, etc.) destinado a identificar e diferenciar o produto / serviço, representando a crença da empresa no mesmo; diferenciando-a da concorrência, agregando-lhe valor e influenciando o consumidor em sua ação de compra. Para isto, lança uso de personagens, lugares e situações fictícios a fim de envolver e interessar ao consumidor, comunicar-lhe os atributos e benefícios físicos e emocionais da marca e posicioná-la perceptualmente em sua mente. Busca associar a marca com sentimentos como elegância, sofisticação, prestígio, sucesso, racionalidade, afetividade, vigor, força, saúde etc., aproximando-a da cognição humana, tornando-a quase tangível e material. “Enquanto existir a função econômica da estética da mercadoria, enquanto, portanto, o interesse de lucro a impulsionar, ela irá manter sua dupla tendência: na medida em que ela se serve dos homens para segurá-los, trará à 62


luz um desejo após outro. Ela satisfaz somente com a aparência, torna o indivíduo mais faminto do que saciado. Como falsa solução da contradição, reproduz a contradição em outra forma e talvez bem mais ampla”. (HAUG, 1988. p.189)

A publicidade humaniza a marca, tornando-a um ente real e palpável, que deixa de existir numa relação exclusivamente abstrata e comunicacional e passa a ser percebida como um aspecto indissociável de algo físico - a empresa e o produto. Idealmente, ela funciona como o espelho no qual as pessoas vêem o que são e o que desejam ser; ao imitar aquilo propagado pela publicidade acabam por tornar real o mítico e, ao fazê-lo, criam um processo de autoalimentação que perpetua esta realidade aparente, mítica e ideal, mas que só é real no imaginário coletivo da sociedade de consumo: o mito da Abundância. No ideário da ideologia do consumo, não basta consumir o produto, deve-se consumir o simbólico agregado a ele, o imaginário no qual abunda o bem estar, o sucesso, a beleza, tudo que se pode possuir desde que se integre à sociedade de consumo. De sujeito passa-se a objeto, de fim passa-se a meio (BAUDRILLARD, 2008).

Economia, Mercado e Publicidade

Segundo um relatório da Conferência da ONU para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad), a economia brasileira, no primeiro semestre de 2011, atraiu US$ 32,5 bilhões em investimentos estrangeiros diretos (IED), ficando apenas atrás da China entre os países que integram o BRIC - Brasil, Rússia, Índia e China. Resultado da crise financeira nos países avançados, o fluxo de IED no mundo concentrou-se nos países emergentes, que atraíram mais da metade do fluxo de IED em 2010, enquanto nos países avançados houve queda de quase 4% no primeiro semestre de 2011 (FERNANDES, 2011). Como a atividade publicitária acompanha o desenvolvimento econômico dos países e das regiões, pois está vinculada ao consumo, numa estreita relação de interdependência entre economia e mercado, não é surpresa que a atividade tenha ganhado espaço entre os BRIC. Como a construção de marcas internacionais requer fortes investimentos publicitários, a corrente concentração de crescimento econômico nos países do BRIC tem gerado também maior incremento da inversão publicitária nestes países, com incremento, em 2011, de 16,5% na Rússia, 14% na Índia, 11,5% na China e 8,5% no Brasil, altas superiores às dos EUA e de países da Europa, segundo o centro de pesquisa Warc (BRIC...,2012) (FOLHA DE SÃO PAULO, 07/02/2012). 63


Mesmo assim, as principais marcas globais ainda são predominantemente norteamericanas, embora os países emergentes comecem a despontar no mercado internacional. De acordo com a pesquisa BrandZ Top 100 Most Valuable Global Brands da empresa de pesquisa Millward Brown, das dez marcas globais mais valiosas de 2011, nove tem origem nos Estados Unidos, conforme Tabela 1.

Tabela 1: Marcas globais mais valiosas Posição

Empresa

País

1

Apple

EUA

2

Google

EUA

3

IBM

EUA

4

McDonald’s

EUA

5

Microsoft

EUA

6

Coca Cola

EUA

7

AT&T

EUA

8

Marlboro

EUA

9

China Mobile

China

10

General Eletric / G&E

EUA

Fonte: http://www.millwardbrown.com (2011)

O gasto global com publicidade cresceu 12,8% nos primeiros seis meses do ano, chegando a US$ 238 bilhões. Segundo a Nielsen, a recuperação do mercado publicitário se deve ao crescimento dos países emergentes e à volta dos investimentos na publicidade de automóveis, bens de consumo duráveis e não duráveis, serviços financeiros e de telecomunicações. O Brasil foi o país do mundo que registrou a maior alta nos gastos com publicidade no primeiro semestre de 2010, com incremento de mais de 50% em comparação com 2009 (BARBOSA, 2010). Neste cenário, o Brasil figura entre os países de maior potencial no setor de publicidade e propaganda, sendo considerado o sexto principal mercado global para ações de marketing (País..., 2011) (FOLHA DE SÃO PAULO, 09/09/2011). Este processo de florescimento econômico brasileiro também é refletido na expansão de suas empresas no mercado mundial, o que pode ser acompanhado em estudo da Fundação 64


Dom Cabral que mensura a internacionalização de empresas brasileiras, conforme apresentado na Tabela 2.

Tabela 2: Rankings transnacionais brasileiras Posição Corporação

Setor Econômico

1

JBS Friboi

Produtos alimentícios

2

Gerdau

Siderurgia e metalúrgica

3

Ibope

Pesquisa de mercado

4

Metalfrio

Máquinas e materiais elétricos

5

Odebrecht

Obras e infra estrutura

6

Marfrig

Produtos alimentícios

7

Vale

Extração de minerais metálicos

8

Sabó

Autopeças

9

Tigre

Material de construção

10

Suzano

Celulose e Papel

Fonte: http://www.fdc.org.br (2010)

Mercado Global de Publicidade e Propaganda

Quatro grandes grupos de alcance internacional (WPP, Omnicom, Publicis e Interpublic) controlam um grande número de agências espalhadas por todo o globo. Geralmente, a holding não se envolve muito no dia-a-dia do marketing, mas incentiva a sinergia entre as empresas do grupo como forma de potencializar sua participação no mercado global.

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Tabela 3: Grupos Mundiais de Publicidade Ranking

Corporação

faturamento (bilhões de US$)

1

WPP

$14,4

2

Omnicom

$12,5

3

Publicis

$07,2

4

Interpublic

$06,5

Fonte: Folha de São Paulo (2012)

WPP

Estabelecida em 1985, a britânica WPP é líder mundial em faturamento relacionado a serviços de marketing e publicidade. Emprega 153.000 pessoas em 2.400 escritórios em 107 países. No Brasil, conglomera, dentre outras: JWT, Grey, NewComm, Y&R, Energy, Wunderman, Ogilvy Brasil, Ogilvy & Mather, 141 SoHo Square, I-Cherry, 9ine, Ibope Media e Millward Brown Brasil (http://www.wpp.com/wpp/about/whoweare/).

Omnicom

Fundada em 1986, a americana Omnicom Group é uma holding de empresas que atuam com publicidade, serviços de marketing, comunicações especializadas, mídia digital e compra de mídia. No Brasil, conglomera, dentre outras: Almap/BBDO, DM9DDB, RAPP, Interbrand, Lew’Lara/TBWA, ID/TBWA (http://www.omnicomgroup.com/home) dentre outras.

Publicis

Multinacional francesa fundada em 1926, é um dos maiores grupos mundiais de publicidade, oferecendo serviços de marketing, publicidade digital e tradicional, mídia e serviços especializados aos clientes nacionais e multinacionais. São mais de 200 escritórios, em 82 países e cerca de 9.000 especialistas em comunicação. No Brasil, conglomera dentre 66


outras: Neogama/BBH, Leo Burnett, Publicis Brasil, Talent, QG Propaganda, Saatchi & Saatchi e F/Nazca S&S (http://www.publicisgroupe.com/)

Interpublic

Fundada na década de 1870, com sede em New York, o grupo tem 41.000 funcionários e obteve

receita de 6,5 bilhões dólares em 2010. Possui subsidiárias

especializadas em publicidade, marketing interativo, planejamento e compra de mídia, relações públicas e outras áreas especializadas, como esportes e, marketing de eventos. No Brasil, conglomera dentre outras: Giovanni+DraftFCB, Borghierh/Lowe e W/McCann (http://www.interpublic.com/interpublicgroupinfo).

Mercado Brasileiro de Publicidade e Propaganda

A constituição típica das agências instaladas no Brasil está caracterizada em dois tipos principais. O primeiro e crescente grupo é constituído por agências multinacionais, integrantes de grupos de comunicação globais, que atendem predominantemente contas internacionais: BBDO, DDB, DraftFCB, Grey, JWT, Leo Burnett, McCann Erickson, Ogilvy, TBWA, Saatchi and Saatchi, Y & R etc. O segundo grupo é formado por milhares de pequenas agências espalhadas pelo país cujos clientes são principalmente locais (O'BARR,2008). Exceção a este padrão são os grupos (ainda) eminentemente brasileiros TotalCom, de Eduardo Fischer, e ABC, de Nizan Guanaes, que buscam crescer para além das fronteiras nacionais, embora sejam cortejados quase que permanentemente pelos principais grupos mundiais. Fontes do mercado indicam que a Dentsu, quinta maior holding da área, negocia a aquisição da Fischer & Friends ou da Neogama/BBH (MEIO & MENSAGEM, n.1498, 13/02/2012) Das 10 principais agências brasileiras, somente a Africa ainda é eminentemente brasileira, conforme ranking elaborado pelo IBOPE, considerando os dados entre 01 de janeiro e 30 de abril de 2011 e publicado na revista Exame em julho de 2011:

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Tabela 4: Ranking das dez maiores agências publicitárias brasileiras Posição

Agência

1

Y&R

Grupo

Investimento (R$)

WPP

1.746.107

2

EURO RSCG BRASIL

Havas

803.848

3

ALMAP BBDO

Omnicom

800.163

WPP

715.836

4

OGILVY & MATHER BRASIL

5

W/McCANN

Interpublic

673.453

6

JWT

WPP

634.520

7

BORGHIERH LOWE

Interpublic

609.479

8

NEOGAMA

Publicis

523.669

9

AFRICA

ABC

511.366

10

F NAZCA S & S (Publicis)

Publicis

502.972

Fonte: http://exame.abril.com.br (2011)

Publicidade e o Brasil

A partir de 1808 com o surgimento do primeiro jornal brasileiro, a Gazeta do Rio de Janeiro, surgiram também primeiros anúncios de venda de imóveis, escravos, carroças, artesanato, serviços de profissionais liberais e outros produtos característicos da época, que compunham com os cartazes, folhetos e painéis, principalmente nas cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo, a incipiente publicidade brasileira. Em meados do mesmo século os classificados ganham ilustrações, rimas e tamanho. A propaganda ganha relevância econômica e criativa a ponto de atrair poetas e artistas como Casimiro de Abreu, Olavo Bilac, entre outros. ”Puderam levantar o nível dos nossos anúncios... Se noutros países a redação principiou com vendedores, aqui os escritores já partiram de um plano superior, não o da chapada mensagem de vendas... Inteligentes, descontraídos, de certo modo anteciparam o ângulo do consumidor. 68


Casimiro de Abreu fez graça, Lopes Trovão fez paródia, Olavo Bilac fez sátira. Batendo na tecla alegre, divertida, lançaram a semente do que talvez mais distinga a propaganda brasileira: o seu tom irreverente.” (CASTELO BRANCO; MARTENSEN; REIS, 1990).

No início do século XX, com o crescimento das revistas, a propaganda brasileira tenta apropriar-se do refinamento francês e do tecnicismo americano e desenvolve belos anúncios. Nessa época surgiam os grandes anunciantes e, a partir daí, os agenciadores de propaganda (pessoas que faziam a intermediação entre anunciante e veículo) começam a ganhar clientes. A primeira agência brasileira surgiu em meados da década de 1910, a Castaldi & Bennaton, logo tornando-se A Eclética. Em 1918 o Brasil possuía cinco agências em São Paulo: A Eclética, a Pettinati, a Edanée, a de Valentim Harris, e a de Pedro Didier e Antônio Vaudagnoti (CASTELO BRANCO; MARTENSEN; REIS, 1990 & RAMOS, 1985). Na década de 1920 as primeiras agências americanas como a J. Walter Thompson, N. W. Ayer & Son e McCann Erickson chegam ao país junto de seus clientes, General Motors, Ford Company e Standard Oil, respectivamente, trazendo consigo os padrões internacionais de publicidade da época, que incluíam as mais recentes estratégias de mercado e técnicas de pesquisa.

A vinda das agências estrangeiras possibilitou uma qualificação técnica da

propaganda brasileira, pois as agências estrangeiras traziam consigo seus sistemas organizacionais e profissionais talentosos para reforçar os departamentos de criação, o que possibilitou excelentes resultados no treinamento das equipes, e melhora dos layouts e estética dos anúncios (CASTELO BRANCO; MARTENSEN; REIS, 1990 & RAMOS, 1985). A percepção da importância sistêmica da publicidade no desenvolvimento do mercado brasileiro marcou um grande avanço: da simples tradução dos anúncios em inglês para o português, que tinha caracterizado os anúncios de produtos norte-americanos até este momento, passavam a refletir os costumes locais, pontos de referência, padrões de linguagem e senso de moda. Mas o estabelecimento de escritórios brasileiros não foi nada simples para as agências americanas, que tiveram grande dificuldade em encontrar

gestores locais

especializados na comunicação promocional. Contrataram egressos de áreas tradicionais como direito, finanças, jornalismo ou pessoas criativas, como escritores e artistas. O progresso das agências nacionais se deve em grande parte às agências multinacionais, que criaram competitividade, formaram profissionais e fomentaram a qualificação concomitante ao desenvolvimento do mercado produtor e consumidor nacional(CASTELO BRANCO; MARTENSEN; REIS, 1990 & RAMOS, 1985).

69


Os anos 1940 representaram os anos dourados do rádio no país, assim como as décadas de 1950 e 1960 caracterizaram o crescimento da televisão. Nos anos 1970, consequência do “milagre econômico brasileiro”, as multinacionais incrementam a presença no país, buscando agências nacionais para se associarem, visto que os profissionais do país já apresentavam qualidade técnica adequada aos padrões internacionais, além de profundo conhecimento dos valores sociais e culturais que integram a identidade nacional. Vale ressaltar aspectos legais determinados pelos governos militares que limitavam a cessão de contas públicas a empresas predominantemente brasileiras. Verbas milionárias fomentaram a busca de parceiros locais por multinacionais da comunicação

(CASTELO BRANCO;

MARTENSEN; REIS, 1990 & RAMOS, 1985). A década de 1980, conhecida como década perdida, quando o país atravessou crises cíclicas, consolidou a criatividade publicitária, obrigada a conviver com constantes cortes nas verbas e o acirramento da concorrência. Fê-la diminuir custos e buscar alternativas economicamente viáveis para manter a atividade em funcionamento. A elaboração de conceitos fortes com baixa verba repercutiu internacionalmente, gerando reconhecimento em festivais e trazendo algumas premiações relevantes para o país (CASTELO BRANCO; MARTENSEN; REIS, 1990 & RAMOS, 1985). Com a abertura econômica de 1990, a onda de importados chegou ao Brasil: carros, produtos eletrônicos e bens de luxo tornaram-se disponíveis. As fusões e aquisições ganharam força na junção de criatividade e conhecimento local com expertise e força econômica multinacional. Este movimento de internacionalização da publicidade moldou a realidade do mercado brasileiro.

Em termos criativos, a publicidade nacional consolidou a abordagem

coloquial, superando definitivamente a linguagem formal utilizada no passado. Isso aproximou o discurso publicitário dos consumidores, que responderam positivamente. Estava surgindo a identidade publicitária brasileira. Mais que copiar e adaptar conceitos externos, comum na publicidade brasileira até então, os criativos passaram a forjar valores eminentemente brasileiros, envolventes, bem humorados e tecnicamente qualificados (CASTELO BRANCO; MARTENSEN; REIS, 1990 & RAMOS, 1985). Corporações multinacionais começaram a comprar empresas brasileiras e usá-las para ampliar seu alcance global. Como conseqüência dessa transformação do mercado brasileiro, a indústria da publicidade também mudou. O foco não era mais nacional, mas regional. As campanhas das multinacionais focavam, pelo menos, a América Latina e isto estimulou

70


agências nacionais a investirem pesado na sua projeção mundial para abocanhar as contas regionais, com maior participação em festivais publicitários internacionais. A necessidade de transcender a barreira linguistica, do singular português para o amplo espanhol, mesclada com uma abordagem agressiva para superar a concorrência externa potencializou a criatividade da publicidade brasileira, que ampliou a apropriação do conceito original de Bill Bernbach 7que valorizava a utilização de conceitos simples e fortes. Os criativos brasileiros potencializaram a valorização da imagem impactante, ancorando ou sendo ancorada pela parte textual, potencializando a amplitude de alcance da publicidade para além das fronteiras nacionais, suplantando as dificuldades linguisticas com o aprofundamento do apelo imagético.

Festival da Criatividade de Cannes

Pensada para ser mais um encontro informal entre dirigentes de empresas de propaganda e cinema de vários países, interessados em trocar informações sobre comerciais, o festival de Cannes, deu seus primeiros passos em 1950. Três anos depois, em 1953, o inglês Ernest Pearl, o francês Jean Mineur, o alemão Fritz Rotschild e o argentino Curt Lowe deram um caráter mais formal às reuniões com a criação da SAWA - Screen Advertising World Association, entidade sem fins lucrativos que teve como uma das primeiras ações a criação de reuniões bienais em Londres e a criação da primeira edição do festival da SAWA, uma mostra internacional de filmes publicitários que aconteceu no antigo Palais de Cannes, cidade escolhida por abrigar, desde o fim da década de 1940, o festival internacional de filmes. Em 1969 foram criadas categorias, com os leões de ouro, prata e bronze, cujos troféus faziam referência a escultura “leão alado de Veneza”. Em 1986, o festival passou a ser conhecido como Cannes Lions. Em 2011, nova alteração em sua nomenclatura, passando de Festival Internacional de Publicidade para Festival Internacional de Criatividade (http://www.portaldapropaganda.com/cannes).

Brasil em Cannes

7

William (Bill) Bernbach, diretor de criação e um dos fundadores da Doyle Dane Bernbach

(DDB). 71


No cenário mundial o Festival Internacional de Criatividade de Cannes ganhou prestigio e reconhecimento, sendo que o evento e suas premiações tornaram-se sinônimo de reconhecimento profissional no ramo da publicidade, consolidando a tradição do evento e principalmente a valorização dos trabalhos publicitários ali expostos. Foi em 1970 que o Brasil despertou para a importância do panorama publicitário internacional com a implantação da CP - Cinema e Publicidade, dirigida pelo argentino Victor Petersen e o brasileiro Luiz Antônio Ribeiro Pinto, responsáveis por filiar a nova empresa de exibição e distribuição de filmes à SAWA. (http://www.portaldapropaganda.com/cannes) Em 1971, o Brasil garantiu sua participação no evento conquistando seus primeiros Leões, um de Prata para o comercial O nobre, para a mortadela Swift, protagonizado pelo ator Raul Cortez, criado pela então Julio Ribeiro/Mihanovitch e produzida pela Última Filmes. E dois Leões de Bronze atribuídos à Overturn, da Lince e Rui Agnelli para Cofap, e The Big Class of Satisfaction, da Hot Shop e Última Filmes para os chocolates Lacta. A partir de tais prêmios, o Brasil mostrou seu potencial para o mundo. A participação do publicitário Alex Periscinoto, que integrou o júri de Cannes por dois anos consecutivos, veio consolidar as aptidões criativas do país no exterior. O Brasil garantiu seu prestígio internacional, em 1974, com o filme Homem com mais de quarenta anos, criado por Washington Olivetto e Francesc Petit, pela agência DPZ, para o Conselho Nacional de Propaganda. O anúncio foi responsável por conquistar o primeiro Leão de Ouro (http://www.portaldapropaganda.com/cannes) da publicidade brasileira. Na década de 1980, o país se firmou no Festival de Cannes com o status de terceira nação mais premiada, atrás de Inglaterra e dos Estados Unidos. Em 1993 o Brasil faturou o Grand Prix na área de mídia impressa com a campanha criada pela DM9 para Guaraná Antarctica Diet. Em 1998 a DM9DDB foi eleita a Agencia do Ano, com um Leão de Ouro, quatro de Prata, seis de Bronze, um Cyber Lion, além de 19 finalistas. Em 1999, não houve muitas mudanças, exceto em termos quantitativos, com quatro Leões de Ouro, dois de Prata, quatro de Bronze, outro Cyber Lion (http://www.portaldapropaganda.com/cannes) e mais 41 finalistas. Na década de 2000 a publicidade brasileira permaneceu em evidência, a AlmapBBDO foi a agência mais premiada do mundo em 2000, conquistando quatro Leões de Ouro, dois de Prata, três de Bronze e 23 Finalistas, além dos prêmios obtidos nas áreas de mídia e interativa. Neste mesmo ano o Brasil foi o segundo país com o maior numero de inscrições, com um total de 2.686 peças, ficando atrás somente das 2.794 inscritas pelos Estados Unidos. Em 72


2001, foi a vez da F/Nazca Saatchi & Saatchi alcançar o título de Agência do Ano. E, na categoria Young Creatives, o primeiro Leão de Ouro foi ganho pela dupla Guga Ketzer e Marco Aurélio Monteiro. O crescimento alcançado pelo Brasil em Cannes é significativo, tanto em termos qualitativos como quantitativos. Poucos mercados do mundo se mantêm estáveis na liderança criativa do Festival. Mas tanta criatividade gerou um ônus inesperado. Na gana de serem premiadas, agências desenvolveram técnicas para inscrever peças não veiculadas. Embora não seja exclusividade nacional, devido ao volume e projeção do país no Festival, estas peças ganharam a alcunha de “brazilian scam ad” e essa prática de peças fantasmas em Cannes rendeu o cancelamento de prêmios e até a mudança de regras dentro do festival, como ocorreu em 2009 com a peça “Tsunami” feita pela agência brasileira DM9DDB para a WWF, onde comparavam o tsunami ocorrido no sudeste asiático ao ataque terrorista de 11 de Setembro. O comitê organizador concluiu que a peça era fantasma e puniu o criativo envolvido em seu desenvolvimento. (Ver a peça em http://www.youtube.com/watch?v=nCXEpdF53v8). Independente de avaliações técnicas sobre o que caracteriza as peças fantasmas, é inegável que a criatividade fica indelevelmente associada aos publicitários brasileiros, independente de questões éticas que podem ser aventadas neste contexto fantasmagórico, já que este tipo de ação ocorre em escala planetária.

O desempenho brasileiro em Cannes (a partir de 2004)

Analisando o website oficial do Festival Internacional de Criatividade de Cannes (www.canneslions.com) e fontes fidedignas e especializadas, como os jornais Meio e Mensagem (www.mmonline.com.br), Propaganda & Marketing (www.propmark.com.br) e Portal da Propaganda (www.portaldapropaganda.com) consegue-se identificar a evolução do desempenho brasileiro. Em 2004 o Brasil manteve a terceira colocação de 2003, atrás apenas da Grã-Bretanha e dos Estados Unidos. Conseguiu 31 Leões, sendo 10 de Ouro, 12 de Prata e 19 de Bronze. O destaque brasileiro foi na categoria Cyber Lion. Das 31 premiações recebidas pelo Brasil, 23 vieram dessa categoria, sendo cinco Leões de Ouro. Na categoria mais badalada do festival, a Films Lion, o Brasil não obteve destaque, mas marcou presença com três Leões de Prata e dois de Bronze. Nas categorias Press e Outdoor, o Brasil manteve a tradição de destaque e trouxe três Leões de Ouro. 73


Em 2005 o Brasil se manteve na terceira colocação, com 42 Leões, sendo 6 de Ouro, 10 de Prata , 26 de Bronze e um Grand Prix, obtido na área de Cyber Lions, por uma ação da DM9DDB para Super Bonder, que também lhe rendeu o título de Agência Interativa do Ano. Em Films levou Leão de Ouro com o comercial "Azarados", da JWT. Em Press & Outdoor foram 2 Leões de Ouro, que ajudaram o País a manter a segunda colocação na área; já em Radio foram apenas 2 Leões de Bronze. Em Media, Titanium e Direct nenhuma agência brasileira foi premiada e os rendimentos ficaram abaixo do esperado. Em 2006 foram 29 Leões, sendo 5 de Ouro, 8 de Prata, 16 de Bronze. O destaque brasileiro foi novamente o Cyber Lion, que levou 4 Leões de Ouro, 2 de Prata, 5 de Bronze e foi o grande vencedor da Categoria Cyber do Young Creatives. O Brasil também se destacou na categoria Press, onde garantiu um Leão de Ouro, e na categoria Media. Em 2007 o Brasil garantiu 30 Leões, sendo 6 de Ouro, 4 de Prata e 20 de Bronze. Ficou em terceiro no ranking do festival, atrás apenas dos Estados Unidos e da Alemanha. O ponto positivo em 2007 foi a consistência das premiações que o Brasil conquistou, em todas as áreas do festival. Nesse ano o destaque do Brasil foi a categoria Press, com 3 Leões de Ouro, 1 de Prata e 3 de Bronze. Tornando o país o primeiro do mundo na categoria. Outro destaque foi na categoria Outdoor, que também rendeu 3 Ouros. Em 2008 foram 41 Leões, sendo 1 Ouro, 15 de Prata e 25 Bronze. O destaque do Brasil foi a categoria Press, que levou 14 Leões. Outro destaque foi a estréia da categoria Design, com 3 Leões, sendo 2 de Prata e 1 de Bronze. Em 2009 foram 30 Leões, sendo 6 de Ouro, 9 de Prata e 15 de Bronze. O destaque brasileiro foi a categoria Press com 4 Leões de Ouro. Na categoria Design, belo desempenho com 1 Ouro, 3 Prata e 3 Bronze e, categoria Media, o primeiro Leão de Ouro. Além disso, o país faturou o prêmio de Agency Of the World, com a DM9DDB. Em 2010 foram 57 Leões, sendo 7 de Ouro, 17 de Prata e 35 de Bronze, um Grand Prix de Press e o título de Agency of the World para a AlmapBBDO. Com este desempenho, o Brasil seguiu como quarto no ranking, mas voltou a ter consistência em suas premiações. Mostrou a força do design brasileiro trazendo 1 Leão de Ouro, 1 de Prata e 1 de Bronze, mostrou a qualidade do filme publicitário ganhando Leão de Ouro em Film Craft, ganhou Ouro também na categoria Radio Lion, pela primeira vez ganhou um Leão de Prata na categoria Titanium e, mais uma vez, comprovou a qualidade e a criatividade do anúncio impresso brasileiro, ganhando 4 Leões de Ouro entre Outdoor e Press.

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No ano de 2011 o Brasil bateu recorde de inscrições no Festival Internacional de Criatividade de Cannes, segundo o jornal O Estado de São Paulo, representante oficial do Festival no Brasil: crescimento de 20% comparado com a edição anterior, passando de 2.115 em 2010 para 2.647 trabalhos. O Brasil foi o segundo país em peças inscritas, ficando atrás apenas dos EUA com 4.045 peças. Além do recorde em peças inscritas o Brasil também bateu recorde de prêmios. Foram 68 Leões no total sendo 6 de Ouro, 24 de Prata e 37 de Bronze. A AlmapBBDO levou pela segunda vez consecutiva e, terceira vez em sua história, o prêmio de Agency Of the World. O Brasil ficou novamente em segundo lugar no ranking dos ganhadores de Cannes, atrás dos EUA. O desempenho crescente da criatividade brasileira na premiação de Cannes faz o Brasil ocupar uma posição privilegiada na publicidade mundial por sua criatividade e inovação reconhecidas, o que aquece a economia e aumenta o número de empresas dispostas a trazer suas contas para agências brasileiras ou tornar as agências aqui estabelecidas em base criativa para campanhas globais.

Considerações Finais

Se o alinhamento internacional de contas ocorre no âmago das redes de agências internacionais, como nas já citadas WPP, Omnicom, Interpublic e Publicis, a resposta criativa se torna uma realidade no quesito de desenvolvimento de campanhas globais nas subsidiárias brasileiras, como será apresentado na análise da participação brasileira no Festival da Criatividade de Cannes, ou na expansão de agências nacionais no mercado externo, como fazem os grupos ABC e Totalcom. As empresas brasileiras em processo de internacionalização ainda pouco trabalham o desenvolvimento de uma marca brasileira forte.

Isto pode ser uma oportunidade para

agências de publicidade brasileiras encabeçarem o processo de expansão das marcas nacionais em escala internacional, aproveitando a posição de destaque com que o Brasil é reputado em sua criatividade publicitária, estabelecida inicialmente pela adaptação de peças estrangeiras ao mercado local e pela valorização da comunicação visual, o que redundou na construção de uma identidade clara da comunicação promocional nacional, com mensagens de forte apelo estético e visual, geralmente com textos curtos e objetivos. Este conjunto tornou a publicidade brasileira uma referência internacional para o marketing global, transformando o país num player destacado na comunidade internacional, 75


seja por suas premiações em festivais e o reconhecimento de sua criatividade, seja por seus custos de produção e por sua efetividade no contexto de marketing. Isto deve ser considerado pelas multinacionais brasileiras para que agências nacionais encabecem o processo criativo e sejam responsáveis pelo planejamento da comunicação integrada de marketing, podendo ser uma forma da criatividade publicitária brasileira ajudar a construir um posicionamento internacional unívoco, consistente e positivo associado ao conceito de Marca Brasil. Este conceito, originalmente utilizado pelo governo federal para promoção do Brasil como destino turístico no mercado nacional e internacional, acabou tendo seu uso ampliado também para a área de negócios, através da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), na promoção comercial de produtos e serviços brasileiros no exterior e na atração de investimentos estrangeiros para setores estratégicos da economia brasileira (http://www.apexbrasil.com.br/). As agências de publicidade, cientes desta necessidade de posicionamento do país e, com um trabalho integrado gestado pelo governo federal, em parceria com empresas e associações que objetivem o mercado externo, podem ajudar na construção da Marca Brasil com o uso de sinergias que integrem diferentes áreas de negócios e diferentes plataformas de comunicação sob a égide da construção de uma identidade nacional para as marcas aqui estabelecidas, funcionando como catalisador para o estabelecimento de um posicionamento singular e atraente em escala planetária, que tem na criatividade a sua matriz e que possibilita adaptações setoriais sempre mantendo o core conceitual Created in Brazil.

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78


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O outro na moda: a cara e a cor da moda brasileira Valéria Brandini

A esse processo miscigenador, já característico no Brasil, é preciso que correspondam modas crescentemente sensíveis a essa realidade que, em vez de desonra, só faz honrar uma mentalidade brasileira mais que democraticamente interracial: metarracial. (Gilberto Freyre8)

A exemplo de muitos traços e valores culturais que são divergentes, muitas vezes opostos, entre o velho mundo e o novo mundo, o sistema da moda no Brasil não foge à regra. A teoria de Pierre Bourdieu sobre o campo da moda encontra-se ainda hoje válida para o campo da moda européia, vinte e sete anos após ter sido escrita, contudo, não se aplica uniformemente à moda latina e, em especial à moda brasileira. O sistema de valores acerca da moda no Brasil obedece a uma diferente hierarquia. O sistema da moda no Brasil não se desenvolve sob o princípio da tradição, já que a América Latina não possui tradição no mundo da moda e pode abusar de experimentação e ousadia, pois ainda em formação, não dispõe de princípios de legitimação estética próprios. Diferentemente de Paris, o Brasil não possui maisons de Haute Couture, mas grifes de moda jovem. No Brasil dos anos 90, a moda brasileira destituída da legitimidade fundada na moderna tradição que ancora as grifes européias, encontra sua identidade na criação de um circuito próprio. A legitimidade alcançada por determinados costureiros brasileiros, como Dener e atualmente Ocimar Versollato, está calcada na exímia forma como estes criadores seguiram as regras fundamentais dos princípios legitimados pela moda européia, como as variantes estéticas que operam em torno de princípios de ‘elegância’ sob o signo da Haute Couture, calcada na xenofilia de costureiros que buscam legitimar suas criações convertendo-se em 8

Freyre, Gilberto. Modos de Homem e Modas de Mulher. 1986 80


“discípulos” das maisons europeias, desenvolvendo produções muito próximas às tendências do hemisfério oposto. Diferentemente do circuito europeu, o capital inicial para um jovem designer de moda entrar nesse universo não se encontra na ‘passagem’ por uma Maison de renome, na aquisição do capital simbólico; mas na disposição do capital econômico para produzir suas coleções e inseri-las no mercado, além é claro do imprescindível talento, o que despertará o interesse dos jornalistas especializados que o projetarão na mídia. Enquanto os princípios de legitimidade da Alta Costura fundam-se na moderna tradição de padrões estéticos de moda (que expressam referenciais da grande arte) desenvolvidas no restrito circuito das maisons, a moda dos novos designers brasileiros evoca a inovação, a ruptura como padrão para a aquisição de legitimidade em seu campo. Já que a moda de rua tornou-se, conforme Glória Kallil, o topo da atual pirâmide da moda, os empresários de moda brasileiros voltaram suas atenções para novos talentos, na busca de designers que pudessem, a partir da demanda de consumo gerada em torno da legitimidade adquirida por seus nomes, alavancar o mercado da moda no Brasil. Para tanto, surgiram nos anos 90, eventos como o Morumbi Fashion (atualmente São Paulo Fashion Week), o Phitoervas Fashion e a feira Streetfashion, eventos semestrais e anuais que visam despertar a atenção e interesse do público consumidor e lojistas. Nestes eventos, novos designers e grifes de moda de rua encontram a oportunidade de expor seu trabalho e o mercado elege novos nomes para o circuito da moda brasileira. Vimos que, conforme Bourdieu (1975), o capital inicial para um jovem pretendente ao campo da moda (um novo costureiro), é a posição que este venha a ocupar numa maison de

O estilista Alexandre Herchcovitch adquiriu notoriedade através do 1º Phitoervas Fashion, em 1994, ganhando o prêmio como melhor estilista, prêmio este que lhe conferiu uma viagem a Paris para divulgação de seu trabalho na Europa.

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prestígio (como Saint Laurent na maison Dior), o que serve como referência para a qualidade de seu trabalho. No caso dos jovens designers brasileiros que criam moda de rua, esta não é uma regra, já que Alexandre Herchcovich (talvez o maior nome da área) nunca criou para outra grife senão a sua, para alcançar legitimidade, mas apenas participou da criação de algumas coleções de marcas como Arezzo e Zoomp, assim como Fause Haten. Todavia, tal qual o campo da Alta Costura, o universo do ready to wear é restrito, possui hierarquias referentes ao nome dos costureiros, e as condições para inserção no grupo, ainda estão atreladas à consolidação do nome do jovem costureiro junto a seus pares, assim como o respeito a determinados padrões estéticos de modelagem, cores e estilo compartilhados pelo universo da moda como um todo. Embora princípios e estruturas do campo da Alta Costura estejam presentes no universo de produção da moda ready to wear, (ou no caso do Brasil, simplesmente moda, pois aqui não há Haute Couture), a grande contribuição deste novo segmento para o campo da moda brasileira, é a ruptura com a ditadura da moda européia, o circuito das grandes maisons, que sempre caracterizou a moda latina em geral, como “o lixo do 3º mundo” , relegando-a à periferia da moda. O apelo simbólico, o “plus” que desperta o interesse pelo consumo da moda está atrelado ao aspecto do novo, do singular, do diferente. Na busca por atribuir significados à roupa, designers reconhecem variantes estéticas da indumentária de países exóticos como referenciais prospectivos e buscam captar aspectos destes estilos em iminência para o desenvolvimento da concepção estética em novas peças do vestuário. E assim consolidar novos ciclos de criação. Desse modo, manifestações da moda exótica, urbana, transgressora e marginal brasileira, ao promoverem a ruptura com padrões preestabelecidos tornam-se fontes de inovação e diversidade providencial na busca de elementos estéticos e comportamentais, que vão ao encontro dos interesses do mercado das confecções. 82


Designers europeus reproduzem referenciais estéticos em criações ousadas e polêmicas, promovendo novos ciclos de estilos de moda, paralelamente à captação de estilos e padrões de moda que se evidenciam em países marginais ao campo da Alta Costura européia em vários lugares do mundo. A articulação entre o processo criativo e condições da indústria das confecções determinam a produção da moda. Todavia, a necessidade por parte do mercado de criação de demanda, encontra no estilo latino, marginal à Alta Costura, um elemento imprescindível para a dinâmica mercadológica. É aí que a moda brasileira, com forte apelo étnico, quase teatral torna-se nova tendência de moda, A bola da vez, ditando comportamento e padrões estéticos. Na busca de novas fontes de criação de moda (assim como em outros setores como na música, no cinema e nas artes), empresários do hemisfério oposto agora passam a acreditar na “latinidad” como nova referência para padrões estéticos de moda, com isto, não apenas profissionais da moda brasileira encontram chance para uma proveitosa carreira no exterior, como a moda erotizada, étnica, ou rústica, que ressalta raízes brasileiras e torna-se foco de atenção internacional. Até mesmo o padrão de beleza, antes anoréxico e pálido, cede agora lugar às curvas da beleza latina , assim como a alegria das cores, o apelo étnico e a rudimentaridade dos materiais (lona, algodão cru, couro vegetal), contrastam com o desenvolvimento de tecidos sintéticos pela alta tecnologia. Diferentemente de padrões norte-americanos ou europeus que se enquadram no conceito “moda de rua” e cuja produção se volta à representação de padrões sócio-culturais americanizados ou ingleses, a moda brasileira representa a “rua brasileira”, ressaltando aspectos nacionais que agregam significados de identidade nacional, diferenciando a moda de rua brasileira das demais modas no universo da criação fashion.

A brasileira Gisele Bundchen, ganhadora do concurso de melhor modelo do Morumbi Fashion de 1998, foi eleita este ano uma das mais belas mulheres do mundo, graças à sua “brasilidade”. 83


A rua enquanto categoria brilhantemente desenvolvida por Da Matta, em referência à obra de Jorge Amado, ilustra a realidade do território onde são desenvolvidas relações sociais entre grupos tipicamente brasileiros (os nossos malandros, os nossos heróis), servindo à representação de um ethos brasileiro que está expresso na vivência de seus personagens. Os grupos e etnias que estão por trás da concepção estética da moda concebida no Brasil são a expressão desta essência brasileira, da rua que serve de palco para estes personagens carregados de brasilidade que teatralmente dramatizam a vivência cotidiana em composições indumentárias tão peculiares. Em comparação ao que foi observado em pesquisa de campo na Inglaterra, o Brasil possui um pólo industrial que se fortalece a cada dia, confecções, tecelagens e grandes empresas da área têxtil subsidiam o desenvolvimento de um circuito de moda brasileira não só apostando em novos designers como também patrocinando eventos de grande porte que ajudam a consolidar o que cresce a cada dia como ‘moda brasileira’. Muitas griffes que se destacam no mercado brasileiro, se dedicam exclusivamente ao que, conforme Zandra Rhodes é pura edição de moda. Em nossas pesquisas sobre moda observamos todas as tendências do verão europeu de 2001 e do inverno 2001/2002. Retornando ao Brasil, poucos meses depois, observamos que grande parte das grifes brasileiras mais conhecidas não criaram nada de novo, apenas ‘editaram’ padrões desenvolvidos no circuito Paris – Milão - Nova York – Londres. A ‘grande indústria’ da moda ‘cria’ padrões que serão lançados no mercado com muitos meses, às vezes anos de antecedência. Esses padrões estão relacionados com a disposição de matéria prima existente, produções da engenharia têxtil, de pigmentos, de equipamentos e produção e de sistema de marketing e vendas. Eles são ditados inicialmente pelos detentores do capital de renome: as maisons francesas e atualmente as griffes/editoras norte-americanas. 84


Com base nos padrões ditados pela grande indústria, designers podem segui-los adequando suas criações a estes padrões, como no caso das griffes norte-americanas e grande parte das griffes de sucesso brasileiras, o que comercialmente é mais seguro e rentável ou simplesmente ‘desviar’ deles, a exemplo dos designers britânicos que criam uma moda paralela à grande indústria (que muitas vezes é posteriormente expropriada por ela) por razões que envolvem arte, ideologia e também a inexistência de estrutura industrial no país. Acreditamos que o mercado da moda, com o estatuto que esta adquiriu nas últimas duas décadas, aproxima-se do mercado da música, objeto que foi estudado em nosso trabalho de mestrado9, onde a relação criação artística X mercado, reflete a relação entre produtores de valores culturais e a produção de valores econômicos, campos que interagem no universo da produção simbólica numa relação simbiótica. Certamente que, para uma griffe de grande porte é mais interessante seguir os padrões consensualmente aceitos como tendência de moda vigente do que arriscar uma produção autêntica, pois nesse caso, o compromisso com a indústria fala mais alto que o compromisso com a ‘arte’. Na Inglaterra, por exemplo, temos entre os designers eXtremos britânicos, uma sucessão de falências de griffes que se tornou um lugar comum na moda britânica, como o caso de Hussein Chalayan, que atualmente tenta erguer-se novamente, mas que embora detentor de um enorme capital cultural e de renome, não teve seu trabalho convertido em capital econômico e, diferentemente de McQueen ou Galliano, não possui a produção em uma grife de renome para subsidiar sua produção independente. Na última década, contudo, o advento das escolas de moda e do investimento por parte da grande indústria em jovens talentos emergentes, além da produção dos grandes eventos, entre eles o mega evento São Paulo Fashion Week, organizado por Paulo Borges, têm aberto novos horizontes para a criação de moda no Brasil. 9

Ver Rock Alternativo, do Underground ao Mainstream, 1998 85


Passamos de um país que só produzia ‘estilos editados’ das coleções européias para um emergente pólo de criação de moda, aclamado pela imprensa britânica como um novo grande centro da moda, com cobertura internacional dos eventos de moda brasileiros e matérias elogiosas escritas pelos maiores nomes da mídia internacional especializada. Acreditamos que o Brasil caminha para o desenvolvimento de um circuito de moda próprio, peculiar e de auto-gestão. Pensemos que os jovens talentos britânicos precisam trabalhar numa grande maison francesa para conseguir subsidiar suas grifes, como McQueen, Galliano, Marc Jacobs, Jill Sander, pois a Inglaterra não possui estrutura industrial e de mercado. Já no Brasil, a indústria da moda é uma das grandes vantagens do País e o mercado é extremamente receptivo a esse campo, temos isso a nosso favor. Ao mesmo tempo, conforme o universo da moda consolida-se industrial e comercialmente, as mentes que encabeçam esse universo voltam-se às questões culturais e à busca por uma identidade brasileira, que anteceda e estruture o que chamamos de moda brasileira. Quanto mais cresce o interesse de mercado, mais o elemento cultura se evidencia como uma tendência brasileira de moda, os novos designers apostam menos na edição de tendências européias e norte-americanas e mais na criação de elementos conceituais e estéticos que ecoem a origem brasileira. Por outro lado, grifes já consolidadas economicamente passaram a apostar na criação de moda conceitual como uma facção alternativa dentro de suas empresas, como é o caso de Carlos Mielle da M. Officer, que, paralelamente à sua grife de moda jovem cuja produção edita tendências de moda, criou a grife Carlos Mielle, com peças conceituais que evocam cultura brasileira folclórica e que hoje são apresentadas no London Fashion Week. A atitude de Mielle e de outros empresários que seguem o mesmo caminho gera polêmica, muitos criticam sua atitude como ‘expropriação cultural’, a exemplo de jornalistas

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que criticam Mielle argumentando que ele colocou alguns índios na passarela e já acha que é Orlando Villas Boas. Contestados também são os jovens designers que criam moda radical, muitos destes recém-formados das escolas de moda, que são rotulados como ‘infantis’, teatrais ou escandalosos por jornalistas especializados que desprezam essas criações. Contudo, acreditamos que isso seja uma questão cultural da formação de opinião da imprensa especializada brasileira, que durante muito tempo concebeu como moda de fato as criações das maisons francesas calcadas em noções reificadas de elegância e bom gosto e que concebe como moda apenas o que espelha esse padrão. Ora, os jovens criadores de moda no Brasil estão mais interessados em espelhar-se em McQueen, Galliano e Westwood do que se tornarem ‘novos Balenciagas’; eles estão mais próximos da moda conceitual do que da Haute Couture. Independentemente do trabalho de Mielle e outras grandes grifes possuir ‘legitimidade cultural’ em suas criações (ou não), fato é que todo este movimento em torno da busca por referenciais estéticos do Brasil folclórico abriu um novo horizonte para a discussão sobre uma moda realmente brasileira e ampliou o espaço para novas experimentações e aventuras mercadológicas para grifes detentoras de grande capital. Atualmente, moda é espetáculo e certamente quando um designer faz referências a um dado universo cultural, não será de forma comedida. A discussão sobre o quanto a moda ‘expropria’ culturas usando seus elementos simbólicos para fins comerciais ou as eleva, transformando seus conteúdos estéticos em criações que exaltam suas grandezas é uma polêmica infinita que recai sobre questões de legitimidade e arte X mercado. Pensemos então, nos resultados destas criações, que trazem para o palco da moda uma realidade brasileira a ser discutida e não um simulacro das criações européias.

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Aos críticos destas criações, lembramos das criações dos designers ingleses, que também se estribam em questões étnicas, a exemplo das criações de McQueen, e da história social de seus países, o que auxiliou a moda inglesa construir uma identidade que hoje é requisitada como fonte de criação pelas maisons francesas. Contudo, se os ingleses têm a alfaiataria como tradição, nós temos a criatividade ilimitada como capital cultural, elemento que tem se desenvolvido através de experimentações nos espaços mais inusitados, como na favela da Rocinha, com a empresa Copa-Roca, composta por moradores da favela que criam peças usadas por muitos dos designers brasileiros de sucesso. A grife Ellus, que completou 30 anos em 2002, também incorporou a experimentação à empresa, abrindo um espaço para a exposição do trabalho de jovens e ‘radicais’ designers de moda brasileiros denominado ‘Ellus Second Floor’, localizado no segundo andar da loja da rua Oscar Freire em São Paulo. O novo espaço apresenta também exposições e festas temáticas sobre moda. As escolas de moda e cursos livres promovem, a exemplo do que fazem as escolas de moda na Inglaterra, desfiles e eventos especiais para a exibição do trabalho de seus alunos. São verdadeiros shows que contam muitas vezes com o apoio financeiro de empresas do ramo têxtil, de produção de aviamentos e maquinário e que recebem cobertura de imprensa especializada, o que ajuda a enaltecer as criações dos novos talentos. Mas nenhum evento é tão importante no Brasil quanto o São Paulo Fashion Week, realizado duas vezes ao ano, para exibir as coleções verão e inverno e que se tornou uma verdadeira vitrine para tudo o que ocorre em torno da moda gerada no Brasil. São dezenas de patrocinadores que tornam o evento possível, entre tecelagens, companhias aéreas, empresas do ramo de bebidas, lojas, empresas de cosméticos, da imprensa, de telefonia, de TV à cabo entre tantas outras. Paralelamente aos desfiles, são organizadas exposições de trabalhos artísticos e fotográficos referentes ao universo da moda brasileira. 88


Os desfiles, concorridíssimos por sinal, são a atração principal, onde as principais grifes brasileira mostram suas criações sazonais. Os estandes montados por revistas, marcas de cosméticos, lojas e empresas do ramo têxtil são uma atração à parte pois estas empresas que também patrocinam o evento expõem o que há de mais novo em tendências de moda no Brasil. O SPFW também se tornou um grande sucesso de mídia, dado às celebridades que comparecem ao evento e à intensa cobertura de imprensa entre outras áreas da TV. Sobretudo, o evento tornou-se importante para o conhecimento do público ‘leigo’, para que todas as pessoas que não se relacionam com a moda possam tomar conhecimento do que ocorre neste universo em termos de Brasil. O evento realizado em julho de 2002, o São Paulo Fashion Week coleção verão 2003, veio ao encontro das expectativas de nossa pesquisa, no mesmo ano em que o tema da Bienal de São Paulo foi a cidade, a rua, a urbe, o tema do SPFW foi a cultura, a busca por uma identidade brasileira, por uma moda brasileira. Conforme a revista World Fashion Daily: “O temário que serviu de palco para o lançamento da coleção primavera/verão 2002/2003 cultiva as nossas raças, as nossas peles, as nossas culturas, a nossa estética e supera o nosso modo de ver as coisas.”10 A capa da edição já mostra uma das mais admiráveis criações para o evento, a Cartela de Cores dos Brasileiros, obra do artista plástico e curador das exposições do SPFW, Maurício Ianês, também diretor artístico da grife de Alexandre Herchcovitch, que, tal qual uma cartela de cores de tecidos, apresenta através das fotografias produzidas por Fernando Lazlo, a imagem da pele das costas de pessoas diversas, com as imperfeições, cicatrizes e pelinhos naturalmente expostos. A idéia era justamente associar o tema das escolhas de cores em moda, à diversidade étnica expressa nos mais variados tons de pele que compõem a raça brasileira.

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Segundo o realizador do evento, Paulo Borges, a intenção nesta edição do evento era mostrar a consistência, o conteúdo e a profundidade do processo de moda, criando um calendário específico a fim de construir uma história da cultura de moda e da indústria no Brasil, associando sempre moda com cultura, arte, na busca da compreensão do que vem a ser uma moda brasileira. Borges salienta que estamos no caminho para o desenvolvimento de uma moda por e para os brasileiros, contudo, ainda precisamos discutir a identidade do Brasil de forma geral. Ele critica os que vêem o Brasil tal qual os europeus e norte-americanos, segundo Borges, uma visão colonizada e reduzida do País. Sua idéia é criar em moda uma visão do Brasil ‘de dentro para fora’.11 Infelizmente, jornalistas extremamente competentes ainda vêem a moda brasileira pelo viés de colônia européia, esperando que, os designers do País vistam a mulher brasileira como Carmem Miranda, uma expectativa comum a estrangeiros que procuram no Brasil um paraíso exótico de mulheres seminuas. Ao lado da busca por referenciais essencialmente brasileiros, os designers desta geração evocam a contemporaneidade, mais do que isso, a cultura urbana, a exemplo das criações de Glória Coelho para o desfile do SPFW: “Suas meninas carregam no corpo um novo conceito, verdadeiras guerrilheiras do bem. Seu utilitarismo é romântico e tem o pé em Avalon. Urbanas que são, usam underwear sem costura. Sutilmente andróginas, mostram cueca com estampa de poema”.12 A arte completa a tríade que representa o universo em criação da moda brasileira: cultura-arte-mercado, talvez não necessariamente nesta ordem, mas certamente são estes os elementos que compõem o panorama atual da moda observada. Uma das exibições mais interessantes da composição arte/cultura do SPFW foi Sonhos Vestidos de Papel, da artista 11 12

idem idem 90


plástica italiana Caterina Crepax. A mostra apresentou esculturas de papel em forma de vestidos, modelos criados pelos mais importantes designers de moda brasileiros. Usando o papel em várias versões, como reciclado, industrializado, liso, brilhante, fosco, com diferentes fibras e texturas, as criações de Crepax aproximam moda e arte. As criações são modeladas em manequins, fora deles, são esculturas, ‘seres’ com forma e volume próprios. À primeira vista, não parecem de papel, dada a perfeição estética, mas observando-se de perto, percebe-se a originalidade dos materiais utilizados, como forminhas de brigadeiro e papéis de balas de coco. O conjunto dos vestidos pendurados por fios de nylon e iluminados de baixo para cima, lembra um baile de personagens abstratos, criaturas de papel. Exposições fotográficas, verdadeiras etnografias visuais também compõem o universo artístico/cultural do SPFW, como o trabalho de Mari Stockler, que mostra garotas do subúrbio se divertindo em bailes funk do Rio de Janeiro em sua forma de vestir, muita lycra em verde, rosa e branco. Mulheres normais, nada de top models, mas mulheres ‘de verdade’, flácidas, barrigudas, bundudas, peitudas e extremamente alegres, alheias a noções de elegância e bom gosto, sem lipoaspiração, silicone ou personal trainer, brasileiras reais e suburbanas vivendo a vida à sua maneira. Em termos de indústria e tecnologia, a moda brasileira também possui uma estrutura invejável para muitos países europeus. A parceria entre designers e empresas é a maior responsável. Grande parte dos designers de moda brasileiros de sucesso são patrocinados por empresas do ramo têxtil que, não apenas subsidiam coleções e eventos mas que também criam através de engenharia especializada, tecidos, aviamentos entre outros materiais usados na criação das roupas. Muitas vezes o design de uma peça pede o brilho de um shantung mais o caimento da seda, então engenheiros da área têxtil que trabalham nestas empresas se empenham em conseguir um tecido sintético que vá ao encontro das necessidades do designer. 91


No ramo dos aviamentos, a situação se repete, empresas desse setor criam padrões específicos para as criações dos designers que patrocinam, o que promove o diferencial nestas peças e acaba por ditar novas tendências a serem incorporadas por outros criadores ou pela grande indústria da produção em massa. Diferentemente do que acontece na Inglaterra, a criação de moda no Brasil encontra na indústria subsídio para a sua produção, assim como espaço para os novos talentos que deixam as escolas de moda. De forma muito gratificante, observamos que, embora o Brasil não tenha tradição em criação de moda, as criações brasileiras têm se destacado em originalidade e ousadia e, ao contrário do que passam os designers ingleses, os brasileiros contam com uma estrutura industrial, de produção de eventos, de mercado e de mídia que pode sustentar o desenvolvimento de um novo pólo de criação em moda. Más línguas sempre sugerem que todo o hype em torno da criação de um conceito de moda brasileira não passa de uma profecia de auto-realização, como se o apelo à arte e cultura brasileiras fosse, na verdade, mais uma mera tendência da moda em voga. Contudo, não importa se todo este movimento em torno da busca de um R.G. para moda no Brasil possua legitimidade, ou se a intenção de seus idealizadores seja idônea, o que importa é que para milhares de jovens talentos que não conseguiriam espaço no mercado há quinze anos atrás, as oportunidades são autênticas, para as dezenas de estudantes que deixam as escolas e cursos de moda no Brasil todo ano, existe um mercado em expansão que os absorva, para uma imprensa especializada que até duas décadas era compota por xenófilos que buscavam nas criações brasileiras o traço das maisons francesas, uma nova safra de jornalistas conscientes produz massa crítica para discutir a moda feita no país, para um consumidor que sempre esteve alheio ao universo da produção de moda, eventos abrem esse universo de forma democrática para o acesso indistinto de todos e, para uma moda que ainda está engatinhando tal qual o Brasil na busca de denominadores comuns  ou não  para se reconhecer culturalmente o campo das 92


idéias que agora integra a moda brasileira propõe um processo de descoberta, de reconhecimento, da busca de uma moda com a cara e a cor do Brasil.

Referências BOURDIEU, Pierre. “Le couturier et as griffe”: contribution à une théorie de la magie. Actes de la recherche en sciences sociales. Paris, 1975. BRANDINI, Valeria. “Rock Alternativo, Do Underground Ao Mainstream: Mercado Fonográfico, Produção E Tendências Do Rock Nos Anos 90”. Dissertação de Mestrado. Escola de Comunicações e Arte – USP. Ano de Obtenção: 1998. MIMEO. BRANDINI, Valeria. “Vestindo a rua, Moda, Cultura e Metrópole”. Doutorado em Ciências da Comunicação. Escola de Comunicações e Artes. USP, Brasil. Título: Ano de Obtenção: 2003. FREYRE, Gilberto. Modos de Homem e Modas de Mulher. Rio de Janeiro, Editora Record, 1996. REVISTA World Fashion Daily, ano VII – nº 1 – 15, julho, 2002.

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Made in Brazil: Yes, I have banana. Olavo Bessa

Este texto está impregnado da minha vivência na Itália durante o meu doutoramento que começou em 2003. Os meses que passei em Milão antes de começar o curso foram essenciais para eu aprender um pouco sobre os italianos e seus costumes. Este foi um tempo que bastou para aprender bem a língua e começar, então, a aprender um pouco a cultura. Digo aprender a cultura e não aprender sobre aquela cultura porque não podemos entender completamente um idioma se não vivemos imersos num aprendizado “osmótico” que não dá conta de explicar como aquele conhecimento foi adquirido, um conhecimento que passa a estar entranhado em nós. Por isso tive dúvidas por qual aspecto deveria abordar este ensaio: se falar do meu percurso acadêmico, do parque tecnológico ou se abordar pelos aspectos culturais que aproximam, mas que também separam o Brasil da Itália. Na esperança de que seja a própria narrativa a me orientar pela estrada que devo seguir, decidi contar a minha experiência como pessoa, de maneira mais alargada. Narrar minhas impressões será mais útil do que tentar entender algum fenômeno com profundidade, até porque não saberia descrever com rigor acadêmico as sensações que me ficaram sobre o que é o “Made in Italy” e tentar, por este viés, entender o que eu tenho achado que seja o “Made in Brazil”. De uma coisa, pelo menos, estou certo: a história de lá fala um pouco da história de cá e a história de cá reconta, um pouco, a história de lá. Por muito tempo o Brasil foi impregnado pelo design europeu, hoje se pode dizer que aqui existe uma identidade – nem sempre muito bem estruturada – que fala de um percurso próprio, ainda que recorde suas origens no design europeu. Alguém já terá se perguntado se o título deste texto é uma ironia. Pode parecer que sim – e talvez em alguns casos o seja–, mas a intenção é fazer uma alusão ao espírito do designer brasileiro que se afirma em uma identidade própria e que, algumas vezes, expressa também o seu nacionalismo. A primeira intenção ao usar a frase Yes, I have banana foi a de fazer uma referência à identidade própria do designer brasileiro que, mesmo se valendo muitas vezes de recursos ufanistas, conseguiu criar uma relação com o gosto internacional. Costumo dizer que um “bom design” reúne três características: as universais, quando pessoas de qualquer cultura podem acolher o artefato proposto; as culturais, quando conteúdos de uma cultura são veiculados nas entrelinhas do objeto e as pessoais, quando uma identidade forte é 96


assinalada no produto. Ao dizer Yes, I have banana, quis fazer uma alusão aos designers brasileiros que conseguem fomentar a representação da realidade a partir destes três símbolos de forma equilibrada e, por isso, conseguem conquistar o mercado internacional. Mas a frase não exclui aqueles designers que levaram seus produtos ao exterior apenas reproduzindo o imaginário europeu sobre o que é o Brasil, reforçando o estereótipo de uma república das bananas. De fato, uma pesquisa feita pelo SEBRAE no exterior aponta que a imagem do Brasil para o estrangeiro está associada à explosões de cores com temas referentes à selva, à cultura negra ou à cultura indígena. O italiano mediano acha que tudo o que provém do Brasil deveria ter este gosto exótico e se surpreende cada vez que vê algum produto brasileiro com características e qualidade que poderiam ter sido conseguidas em qualquer outra parte do mundo. Não falo somente dos designers que produzem para a massa, falo também dos designers brasileiros com peças exclusivas de mobiliários e de decoração que colocaram seus produtos nos circuitos mais refinados do design e têm suas peças expostas em importantes museus do mundo. São, porém, as indústrias calçadistas, as confecções de roupa íntima e de vestuário para a praia que levam o Brasil a se destacar comercialmente no exterior como exportador de um design de gosto cosmopolita. Feito este preâmbulo, temos que delimitar algumas questões. A primeira se refere ao fato de nem todo Made in Brazil/Italy ser um produto de design. Podemos até considerar um tecido como um trabalho de design se houver um tratamento gráfico ou a aplicação de uma textura, contudo a geração de matérias-primas ou a produção de artefatos estritamente tecnológicos não são necessariamente o resultado da atividade do designer. Uma segunda questão a ser delimitada é se o design é um campo de estudo e projetação com múltiplas possibilidades de aplicação. Quando se fala de exportação de produtos, isto não quer dizer que se deva restringir a compreensão do vocábulo produto somente como sendo os artefatos produzidos, tanto em pequena quanto em larga escala, normalmente por meio de processos industriais. Podemos incluir neste rol os produtos intangíveis, tais como: serviços, ações para a sustentabilidade, soluções ergonômicas etc. Em terceiro lugar, existe a questão de devermos considerar ou não a simples promoção no exterior de produtos consagrados nacionalmente como um resultado da atividade do designer, como é o caso das sandálias de plástico brasileiras ou das “Moka”, cafeterias domésticas à pressão italianas. Muitas vezes estes produtos adquirem sucesso no mercado exterior com as ações de publicidade e de marketing que podem ter muita ou nenhuma relação com as ações normalmente desempenhadas no campo do design. O território do design não é precisamente demarcado, então, é conveniente 97


definir o que se está considerando neste estudo como sendo design. Define-se, portanto, como sendo design todo produto, tangível ou intangível, que tenha sido desenvolvido por meio de processos projetuais com a intenção de atender a demandas das pessoas. Desta forma, compreende-se o produto desenvolvido no âmbito do design de forma alargada, incluindo as ações planejadas para resolver alguns dos problemas das pessoas, sem entrar em discussões aprofundadas sobre o que é efetivamente o design.

O Made in Italy

A crise européia, que somente em 2010 deu enfaticamente as caras no noticiário, em 2003 já dava seus pré-avisos no ambiente acadêmico italiano. Existia uma preocupação bastante difusa, quase nunca declarada, sobre os então chamados países emergentes. Era um momento em que se ouvia muito frequentemente o termo Made in Italy, porém não mais com o sentido de construção que houve nos anos 80. A intenção era claramente a de opor-se ao Made in China. O Made in Italy é aquele tipo de conceito que não se consegue identificar bem a origem. Há aqueles que dizem não existir nada de nobre na procedência do termo. Quem defende esta hipótese afirma que nos anos 60 os importadores europeus – nomeadamente, da França e da Alemanha – impunham aos produtores italianos – principalmente os das indústrias têxteis e calçadistas – que se colocasse bem visível a expressão Made in Italy para notificar aos consumidores que aqueles produtos não eram fabricados em seus próprios países. A intenção não era preservar as indústrias nacionais, mas evitar que a opinião pública considerasse que o parque industrial daqueles países estivesse em atraso. A França, a Alemanha e a Inglaterra tinham abolido no pós-II Guerra as indústrias manufatureiras por considerá-las indústrias ultrapassadas, destinadas somente aos países mais pobres e tecnologicamente menos avançados para onde exportavam este tipo de tecnologia. Diz-se, por esta linha de pensamento, que o fato de a Itália não ter abandonado precocemente a indústria manufatureira, fez com que o termo Made in Italy sobrevivesse e fosse transformado, com o tempo, de uma pejorativa designação de procedência a um emblema de qualidade. A Itália não somente preservou a indústria manufatureira, como aplicou recursos para desenvolver tecnologicamente as pequenas empresas. Com isso, um país considerado à época menos desenvolvido industrialmente, acabou por ser preconizado como um produtor de alta qualidade.

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A outra linha de pensamento, porém, atribui o surgimento do conceito Made in Italy em decorrência de um estudo desenvolvido pelos japoneses na década de 80, tanto sobre a qualidade dos produtos, quanto sobre o contexto tecnológico e organizativo do parque industrial italiano(VITALE, 1998). Este estudo foi conduzido nas regiões da Lombardia, Veneto e Emília e queria responder basicamente a uma pergunta: qual era o segredo de empresas aparentemente tão pequenas e frágeis terem o sucesso que tinham? A resposta que emergiu foi que estas empresas se apoiavam em uma cultura fortemente radicada em uma história artística e artesanal antiga, com origens nas oficinas do renascimento e nos milhares de museus e igrejas difundidas em todo o território. O estudo aponta que esta herança cultural – com um caráter fortemente estético – acompanhada do orgulho típico do artesão italiano – que procura realizar um produto perfeito para a sua satisfação pessoal – são os principais sustentáculos do sucesso destas empresas. Por este viés, o Made in Italy é reconhecido como um fenômeno decorrente de uma longa tradição que mescla cultura, arte, artesanato, habilidade manufatureira, território e memória histórica, por meio daquilo que se chama cross fertilization. Não é incongruente considerar que o Made in Italy tenha origens tanto em um fenômeno recente com o propósito de o país se recuperar das desgraças da II Guerra Mundial, valendo-se de estratégias de empreendedorismo, quanto em um fenômeno advindo da sobrevivência de modelos antigos favoráveis à instauração de processos produtivos de alta qualidade. A Itália teve o bom senso de não rejeitar suas tradições ao pensar nas soluções que resolveriam os problemas que iria enfrentar em um futuro imediatamente posterior à II Grande Guerra. Na Itália, quando me deparava com uma pequena empresa, a sensação era a de estar em uma oficina que conseguia aplicar um alto grau de tecnologia sem abandonar a habilidade artesanal. Percebia que o operário não estava alienado do seu trabalho, como aconteceu na maior parte do mundo no período industrial. Na situação comum das oficinas, esta mentalidade está completamente distante daquela que possa ser a mentalidade de seus governantes, havendo pouca relação entre o modo manufatureiro de produzir e aquilo que é objetivado pelo governo nacional. Enquanto o Estado italiano quer as grandes políticas e a vivência de uma prática globalizada, o mestre de ofício quer viver sendo admirado na sua comunidade por sua habilidade, pela sua capacidade de chegar próximo à perfeição e, economicamente, quer somente poder pagar suas contas no final do mês. Para se ter uma ideia deste distanciamento entre o Estado e o produtor, somente em 2009 foi sancionada uma lei 99


regulamentando, em minha opinião com algum exagero nacionalista, o uso da marca Made in Italy. O Decreto Lei 135 de 25 de setembro de 2009 apresenta um artigo, intitulado Made in Italy e prodotti interamente italiani, que discrimina as condições que os produtores devem responder para fazer uso desta bandeira. Quando este Decreto Lei passou a tutelar o Made in Italy, a comunidade européia já estava há muito tempo acordada para a proteção dos pequenos produtores, sobretudo rurais, que tivessem produtos de alta qualidade. Cheguei na Itália em 2002 quando havia uma invasão de produtos chineses. Havia um segmento da sociedade bastante preocupado com essa invasão, por dois motivos: ou os produtos eram de baixa qualidade, mas mesmo assim invadiam o mercado, denotando que os consumidores europeus estavam se rendendo ao preço baixo em detrimento da qualidade ou, muitas vezes, os produtos tinham boa qualidade e, ainda assim, os preços eram bem mais baixos do que o dos produtos fabricados na Europa, mudando, então, o perfil do mercado. Não sei quanto tempo antes da minha chegada os produtos chineses tinham começado a entrar no mercado italiano, mas, de 2002 a 2009 decorreram-se pelo menos sete anos até que o governo se movesse para tutelar seus produtores. Obviamente havia já uma série de leis para assegurar os direitos do consumidor, regulamentando a informação indicativa da origem, tanto dos processos, quanto da origem geográfica. Um produto poderia ser de concepção italiana, mas fabricado na China e essas indicações deveriam ser precisamente identificadas pelo consumidor. Com o Decreto Lei, no entanto, o Made in Italy passa a ser somente o produto que tenha sido desenhado, projetado, e confeccionado na Itália. Neste caso o produto recebe a etiqueta full made in Italy ou al 100% italiano. Paralelamente, nas televisões havia uma viva campanha contra o trabalho escravo nos países do Oriente e contra a intensa produção de poluentes das indústrias chinesas. A lição que fica é que os produtores têm a certeza de que o Made in Italy não é uma questão de governo, mas de cada produtor, de cada operário, de cada agente intermediador. Não é raro que os governantes das Regiões, governos mais ponderados e ligados ao pequeno fabricante, estejam mais atentos aos benefícios de se associar à iniciativa privada do que às excessivamente burocráticas políticas do governo nacional. Não é raro, também, que os dirigentes das regiões invistam nestas pequenas empresas mais recursos em inovação tecnológica do que o governo nacional. A percepção geral das pessoas é que normalmente o governo italiano não consegue lidar de maneira adequada com as suas obrigações. Atualmente, os itens que mantêm um padrão de alta qualidade e que carregam nas costas as exportações italianas são as máquinas-ferramenta, os produtos têxteis, o couro e os 100


produtos de química fina (ETERNO, 2011). No caso dos tecidos e do couro italianos, não são exportados somente como matérias-primas, mas como produtos de grife voltados a um mercado de luxo que não conhece crise. Mas gerar produtos tangíveis não é a única forma de a Itália atrair o capital estrangeiro. Existe uma muito bem orquestrada rede de serviços para o turista que, hoje, conta também com o profissional da área do design para promovê-la e melhorá-la. Mesmo que a Itália tenha uma grande discrepância no desenvolvimento encontrado entre o Norte e o Sul, o turismo é bastante bem organizado em qualquer parte do território e o turista disposto a pagar encontrará uma das melhores estruturas turísticas do mundo. No coração da Toscana ou no meio da Barbaggia, na Sardegna, em centros cosmopolitas ou em minilocalidades, você terá pelo menos um bom serviço de apoio ao turista (hospedagem, comida e indicação de atrações interessantes) e, talvez, onde você possa se deparar com serviços que apresentem uma qualidade mais baixa, seja justamente nas localidades turísticas praticamente obrigatórias, como Roma, Veneza, Florença, Nápoles entre outras destinações. Desta forma, os serviços oferecidos na Itália, acabam por se configurar como importantes fontes de divisas externas e se tornaram um padrão de referência para quem deseja desenvolver produtos intangíveis.

O Made in Brazil

O que é, então, o Made in Brazil? É uma construção feita pelas instituições. Talvez possamos definir o Made in Brazil como sendo o esforço das instituições para dirimir a imagem que pouco interessa ao mundo dos negócios. O carnaval, belas mulheres, as praias, o futebol e, por último, o café são, pelo menos na Itália, os elementos mais pregnantes da imagem do Brasil. Apesar de serem imagens interessantes e que atraem algum tipo de turista, à exceção do café, não são imagens de muita ajuda quando se quer promover uma ação empresarial do país no exterior. Mesmo a produção agropecuária e o fornecimento de matéria prima que, segundo a Apex-Brasil, são os setores brasileiros mais ativos no mercado internacional, acabam passando ao resto do mundo uma ideia de que há uma extrema fartura e de que os recursos naturais brasileiros são infindáveis. Várias vezes ouvi dizer, na Itália, que no Brasil não há fome, que as pessoas assaltam porque não querem trabalhar. A esta situação acabaram-se associando uma série de outras imagens desfavoráveis ao país, tais como a violência, a corrupção e o desmatamento para satisfazer a ganância dos ricos. Na Itália ouvi mais de uma vez fazerem relação entre a corrupção no Brasil e a pobreza, como se a única 101


corrupção possível fosse aquela que subjuga os pobres ao dinheiro do rico. E ouvir esta opinião distorcida justamente dos italianos (obviamente não de todos) reflete a imagem que o Brasil ainda tem no exterior de república das bananas. A sensação que tenho é que, devido a esta carga de o Brasil ser uma república das bananas, parte da produção dos designers brasileiros se moveu para a oportunidade de mostrar que república das bananas também faz produto de qualidade, reafirmando com orgulho esta identidade e outra parte da produção se moveu para escapar de tudo o que pudesse conter algum traço de ufanismo, procurando imprimir no design brasileiro as linhas conciliadoras de um gosto internacional. Visto que as principais exportações do país estão relacionadas à agropecuária e ao fornecimento de matérias primas, então o carro chefe das exportações brasileiras não está relacionado com o design, mas a Apex arrola a produção de alimentos industrializados, material para a casa e a construção, produtos e serviços para o entretenimento, design de serviços, máquinas e equipamentos, moda, tecnologia e saúde como importantes setores no cenário das exportações brasileiras. São estes setores que estão imprimindo uma imagem sobre um padrão de qualidade dos produtos brasileiros e o design tem contribuído de forma significativa para o desenvolvimento da qualidade nestes setores. O Made in Brasil, no entanto, é levado ao exterior também por outras instituições, igualmente responsável pela construção da imagem do país no exterior. Tem-se a EMBRATUR, responsável pela divulgação dos potenciais turísticos no Brasil; o DPR, Departamento de Promoção Comercial e Investimento ligado ao Ministério das Relações Exteriores e ações de entes privados como a Agência Investe Brasil, ligada à Confederação Nacional da Indústria, todas, empresas que dão uma identidade brasileira ao produto. O Brasil construiu o seu “Made in” apoiado nas instituições e é dependente delas para manter a imagem que conquistou no exterior. O governo federal e alguns governos estaduais têm um importante papel na construção das relações internacionais e arrisco a dizer, inclusive, que o Made in Brazil nasce com o superávit comercial de US$ 40 bilhões na década de 90 que permitiu ao governo federal implementar o plano Real. E foi justamente no início da década de 90 que concluí minha graduação em Desenho Industrial. Naquela época, quando uma empresa solicitava um designer ela estava procurando um desenhista técnico que copiasse e adequasse os produtos de sucesso no exterior à realidade brasileira. O design de qualidade era aquele restrito a um grupo cuja produção era baixa (quando não era feito somente um único exemplar) e o produto era destinado a uma elite intencionada, sobretudo, em arte. O percurso para a constituição de um pátio onde se 102


desenvolveu o design brasileiro não está, porém, destacado destas experiências históricas. Foi principalmente pelo incentivo das indústrias brasileiras que o designer brasileiro começou a se afirmar com uma produção própria e interna. Esta produção era restrita e quase artesanal, porém, durante o governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961) houve um rápido crescimento do parque industrial brasileiro, deflagrado pelo capital estrangeiro e, ainda na década de 60, o setor industrial superou os demais setores da economia do país. Além disso, nos anos 60 São Paulo e Rio de Janeiro viviam um grande momento de efervescência cultural que favoreceu a instalação, primeiro em São Paulo, depois no Rio de Janeiro, de duas escolas de design. Estas escolas ficaram por muito tempo presas à ideia de uma sociedade industrial, custando a perceber os novos paradigmas da sociedade da informação, onde o papel do designer é mais amplo do que projetar objetos industrializados para o consumo ou elaborar campanhas de publicidade. Porém, no final dos anos 80 as escolas de design começaram a se multiplicar no país, começando a diversificar, então, o enfoque acadêmico. Fora do meio acadêmico, no entanto, no início dos anos 90, muitas pessoas ainda não sabiam o que era design. Hoje a maior parte das pessoas conhece a profissão, ou melhor, supõem conhecê-la, devido ao fato de, nos últimos anos, o termo ter entrado na moda, principalmente pelos trabalhos desenvolvidos no campo do design digital (mais especificamente o design de interfaces, o design de games e o web-design). No meu campo de estudo, design de produtos e de serviços, o conhecimento sobre o que seja design melhorou muito pouco, entretanto, quando atualmente se fala em design, sabem-se, pelo menos grosso modo, quais são as atribuições ortodoxas do designer. O senso comum, porém, quase sempre associa o design ao trabalho voltado para as interfaces de dispositivos digitais. No Brasil ainda temos que entender melhor o que é a profissão; temos que aprender a construir uma conversa mais articulada com as empresas (apesar de as empresas estarem mais despertas para a importância do design) e temos que distinguir uma bem intencionada valorização do design por parte de empresários, do uso publicitário que se quer fazer do termo. Na década de 90 o Brasil começou a abandonar a ideia de que o design serve somente a conferir qualidade estética e funcionalidade aos produtos e passou a entender que o termo está relacionado também a fatores estratégicos (BERNARDES & KAULING, 2011). Atualmente é o governo quem principalmente tem defendido o Design como fator de inovação, competitividade e desenvolvimento econômico. O governo percebeu que não bastava haver uma valorização do design, seria necessário que houvesse também uma política de exportação dos produtos. Somente em 2003, no entanto, criou-se uma política massiva de 103


apoio às exportações com a criação da Apex. A empresa tem obtido grande sucesso na colocação dos produtos brasileiros no exterior e a partir de 2007 vem estimulando a internacionalização das empresas brasileiras, auxiliando-as na implantação de subsidiárias no exterior. Isto denota que a colocação dos produtos Made in Brazil no cenário internacional tem sido bastante dependente da tutela do Estado. Uma rápida consulta no site da Apex nos mostra que as exportações brasileiras de produtos de design são prevalentemente de pequenas e médias empresas, muitas vezes de gestão familiar. A instabilidade econômica crônica dos anos precedentes aos anos 90 e o subemprego estimularam os brasileiros a investir nas chamadas atividades de fundo de quintal. Uma publicação da revista ExamePME de 2008, intitulada “As pequenas e médias empresas que mais crescem no Brasil”, aponta, no entanto, que estas empresas evoluíram e passaram a contar com a governança corporativa como um importante fator de crescimento. As empresas brasileiras estão se profissionalizando e começam a competir com mais igualdade no cenário internacional. Mas nem tudo são rosas. A primeira vez que fui ao salão de design de Milão fiquei bastante decepcionado com a participação brasileira. Esperava um resultado surpreendente, mas o que vi, salvo raríssimos exemplos, foi somente mais um monte de produtos em meio a tantos outros de igual teor e, às vezes nem isso. A criatividade brasileira se resumia na maioria das vezes em aplicação de bandeiras e cores verde-amarelas em vários produtos. Os europeus (e acho que outras nações fora da Europa também) veem o Brasil de forma positiva quando se refere ao afeto e tendem, quando reconhecem as cores e as formas da Bandeira Nacional, ver o produto de forma simpática e com uma carga afetiva alta, mas isto não que dizer que eles confiem nesses produtos (ROCHA & MELO, 2011). Na verdade, os artefatos colocados no salão se assemelhavam muito mais a trabalhos de graduação (mas não somente os produtos brasileiros, os de outras nações também) do que o resultado de atividades programadas de produção e mostra. Isso sem falar no agravante de, muitas vezes, estes produtos não corresponderem à capacidade de projeto, à qualidade de produção do parque industrial brasileiro ou ao gosto dos vários estratos da sociedade brasileira, mas responderem àquilo que o brasileiro acha que os outros pensam que ele seja. Alguns nomes levam uma imagem mais isenta do design brasileiro ao exterior: Carlos Motta; Claudia Moreira Salles; Etel Carmona; Maurício Klabin; Paulo Mendes da Rocha; Sergio Fahrer; Sérgio Rodrigues; Rafic Farah; os irmãos Campana, entre outros. Algumas empresas também estão no cenário internacional como: a Ronconi; a Amazonia Fibras; a Ital Móveis; a Dall Móveis; a Tela Sul; a SCA. Malgrado eu não goste de alguns dos produtos 104


desenvolvidos por alguns destes designers/escritórios de design, eles reentram no gosto de uma elite que consome produtos exclusivos. No mais, ainda há uma forte declinação do mercado brasileiro com relação ao design estrangeiro.

O Made in Brazil versus o Made in Italy

Sabemos que, muito diferentemente da Itália, o Brasil não tem uma tradição artesanal de alta qualidade nem de refinamento estético muito apurado, salvo alguns exemplos bissextos. Além disso, ainda que possamos mesclar o artesanato com o design, não podemos confundi-los: enquanto o artesão opta por exercer transformações lentas, que ocorrem ao longo de uma existência, como resultado de uma inter-relação pessoal que ele, o artesão, estabelece com o objeto que produz; o designer opta por imprimir mudanças radicais e procura atender a uma demanda externa a si mesmo, ainda que seja ele mesmo, o designer, a se colocar como a pessoa que deverá interagir com aquilo que ele produz. Enquanto o artesão procura satisfazer as próprias idéias e vontades, ou as idéias e vontades de alguém que emite a própria opinião, transformando o artefato que ele está produzindo com base em suposições intuitivas ou observação de casos isolados, obedecendo a uma cega criatividade (e por isso, muitas vezes, este artefato é confundido com arte), o designer procura estabelecer um programa externo à sua própria vontade, seguindo preceitos metodológicos, para imprimir mudanças sobre os objetos de forma que acolha às demandas de um outro diferente de si mesmo a quem o artefato ou serviço deverá atender. Se ambos fossem desenvolver uma faca para cortar e retirar as sementes de um fruto cítrico, o artesão produziria esta faca de forma a atender ao próprio modo – ou ao modo de um seu conhecido – de operar o corte e a retirada das sementes, atendendo a um outro difuso, permeado e definido somente pelas próprias experiências, enquanto que o designer produziria esta faca para atender aos vários e possíveis modos de operar o artefato, procurando atender a milhares de pessoas, circunscritas e definidas por uma projeção daquilo que o designer pensa que é a experiência do outro. Como é sabido, o design nasce não somente da necessidade de se dar uma resposta à falta de qualidade dos produtos industriais, mas também da necessidade de se produzir em larga escala. O sucesso do produto italiano é, em parte, devido ao fato de os artesãos terem sustentado as decisões projetuais que deveriam atender à qualidade e à produção em massa. Isso permitiu que se mesclassem a competência artesanal com as necessidades do mercado 105


para as massas. No Brasil, apesar de alguns exemplos pontuais de design autóctone de alta qualidade, mas de baixa produção e circunscrito a uma elite, a regra era copiar o que era produzido na Europa ou nos EUA sem agregar uma competência artesanal. Tanto o Brasil, quanto a Itália, ainda hoje, em 2012, não tem a profissão do designer regulamentada. Os motivos são completamente diferentes. No Brasil não era necessário que houvesse uma regulamentação para que os produtos fossem copiados e, mais tarde, quando os setores produtivos começaram a entender a importância do design para o desenvolvimento das empresas, foram os próprios designers que, talvez por uma questão de soberba ou por uma questão de preservação de nicho, se recusaram a participar do processo de regulamentação da profissão que reunia arquitetos e engenheiros civis em um só conselho (o CREA); na Itália, o design era visto somente como uma competência artesanal e os artesãos nunca precisaram de uma regulamentação para operar, apesar de haver leis de tutela das suas competências e dos domínios territoriais onde as suas práticas são exercidas (sobretudo quando se trata da produção de alimentos, mas a produção de artefatos também pode ser geograficamente tutelada como é o caso da produção de violinos em Cremona). Enquanto que no Brasil é o sucesso comercial no mundo que sinaliza que o produto tem qualidade, na Itália é o próprio artefato produzido que intrinsecamente atesta a qualidade, portanto nem lá, nem cá, havia motivos externos ao interesse dos próprios designers para que o design se tornasse uma profissão regulamentada. Mas o fato de não ser uma profissão regulamentada não quer dizer que nestes países não tenha havido a formação de uma competência profissional no campo do design. É curioso notar, porém, que as empresas exportadoras de produtos de design, tanto brasileiras quanto italianas, são pequenas e médias empresas de gestão familiar. A diferença fundamental é que no Brasil estas empresas não têm uma longa tradição na formação de competência artesanal, mas uma inventividade neonata, muitas vezes sem qualquer formação especializada. Se por um lado as empresas brasileiras não têm um padrão rígido de qualidade industrial, tem inventividade e, com o apoio dos designers, tem conseguido propor novas formas autóctones. Além disso, enquanto que na Itália o design nasce do chão da fábrica, no Brasil somente nos últimos anos os designers têm se encontrado mais com a linha de produção. Isto claramente reflete na viabilidade dos produtos. Se na Itália o termo Made in Italy deriva de uma apropriação lenta e gradual de um espaço no mercado exterior, promovendo produtos de alta qualidade devido ao empenho coletivo do pequeno e do médio produtor para, somente depois, haver a interferência do 106


governo italiano, no Brasil o termo nasce como uma proposta institucionalizada e é trazido provavelmente por corruptela do Made in Italy. Na verdade a proposta do governo brasileiro é veicular o termo “Marca Brasil”. No Brasil se tende a achar que tudo o que tem investimento público é melhor (Universidades ou empresas de extração e produção de matérias primas, como a Petrobrás e a Vale do Rio Doce). Na Itália acontece justamente o oposto: acredita-se que tudo o que é privado funciona melhor do que aquilo que é feito exclusivamente pela iniciativa pública. Podemos efetivamente intuir esta afirmação como verdade quando estamos mais próximos da cultura italiana. Se o funcionamento de algum órgão público italiano se mostra muito competente é porque aquele mesmo orgulho e espírito do mestre de ofício estão presentes naquele departamento. O sucesso do design italiano é conseguido no exterior corroborado pela sua própria história, mas existe também um forte mercado interno endossando este sucesso: o italiano é um consumidor de design. No Brasil pagar pelo design é ainda uma realidade restrita a um segmento muito limitado da população. Se você entra na casa de um italiano, muitos dos objetos são produtos de design originais, no Brasil, muito raramente. E, muitas vezes, a pessoa que possui um objeto de design, não conhece o seu valor como tal.

Algumas Questões Atuais Sobre o Design

Em nenhuma parte do mundo o termo design ainda é usado somente para se referir ao design de produto ou ao design gráfico. Sem considerar a Escola de Engenharia e a Faculdade de Arquitetura que também têm cursos voltados ao design, a Faculdade do Design do Politécnico de Milão tem vários cursos, desde os tradicionais design do produto industrial e design gráfico, até os cursos de design da comunicação, design da moda, design de interiores, design do produto para a inovação, design naval e náutico, design para o sistema-moda, design de sistema de serviços etc. No Brasil também houve uma explosão de cursos de design com vários endereços de estudo e, se não estão concentrados em uma mesma faculdade, estão espraiados nas muitas escolas que surgiram em todo o território. O que todos estes cursos de design têm em comum é o fato de o design funcionar como uma ponte entre a pessoa que atua no mundo e aquilo que foi projetado para que a pessoa pudesse atuar e, de fato, o mundo tem cobrado dos designers aquilo a que eles vieram: ser um elo na conversa da pessoa leiga com o técnico especializado. Se antigamente esta relação se resumia à conversa dos engenheiros que produziam os artefatos com as pessoas que os usariam, hoje o técnico especializado é 107


qualquer um cujo discurso se mostre obscuro ao entendimento da maior parte das pessoas (como no caso do discurso dos cientistas ambientalistas, que deve ser traduzido em propostas projetuais de novos serviços, de novos produtos ou de novas atitudes menos impactantes ao ambiente) ou cujas ações possam estar completamente destacadas dos interesses dessas pessoas (como pode ser o caso da oferta de algum serviço desnecessário ou da falta de algum serviço imprescindível). Muitas vezes o técnico especializado e o titular de um investimento fazem uso do poder (poder determinado, respectivamente, pelo conhecimento e pelo capital investido) para criar e fazer coisas que funcionem da forma como eles acreditam que devam funcionar. Hoje é mais raro encontrar algum destes casos, mas, quando ocorrem, as pessoas podem somente decidir se adquirir – ou não – o serviço ou artefato projetado. Tanto pior quando o técnico especializado é o titular do investimento, porém, infelizmente, muitas vezes é o próprio designer quem se confunde em seu papel e se coloca como um criador-todopoderoso, esquecendo-se das pessoas que usarão o que ele projetou. A responsabilidade, normalmente esquecida, de atender às demandas das pessoas é em todas as instâncias uma responsabilidade social que levou o designer a adotar e desenvolver algumas técnicas de projeto relativamente sofisticadas para responder com mais propriedade às demandas das pessoas. Mas, além de olhar para o que deseja a pessoa, o designer resolveu que seria sua função olhar também pelo bem estar de todos em todas as circunstâncias, questionando e trazendo para si preocupações com o meio ambiente, com as relações psicossociais na vida e no trabalho, com a qualidade dos produtos e dos serviços, com as condições de trabalho e de uso de serviços e artefatos etc. Isto, sem deixar de lado questões como a fome e o perigo de catástrofes naturais. Hoje quando se observam as atividades dos designers temos que falar muito mais em metodologias adotadas pelo design e aplicadas em diversas áreas, do que em uma prática profissional restrita ao campo do design. Os instrumentos projetuais usados pelo designer têm sido difundidos como solução para outras áreas organizativas, tais como: a gestão de pessoal nas empresas; a oferta de serviços; a administração das empresas etc. Na Itália, como o design emerge das antigas “botteghe” esta proximidade entre as pessoas e o que será projetado para que as pessoas usem acontece com mais naturalidade do que no Brasil. Na Itália, o artesão se manteve afastado da academia e prosseguiu construindo seus objetos sem abandonar o olhar sobre as pessoas. Para entender que o design brasileiro viveu um processo bem distinto daquele italiano, basta lembrar que primeira faculdade de design italiana foi fundada somente em 1994 e, como é de conhecimento geral, o design italiano conquistou o mundo muito antes disso. No Brasil, olhar as pessoas foi garantido pela academia. Esta 108


preocupação com as outras pessoas – e não importa se adquirida nas universidades ou se passada de geração em geração nas oficinas – tem levado os designers, diante do mundo atual, a fazer considerações que antes não eram feitas e, destas considerações, nasceram áreas de estudo. Uma questão é a inclusão das pessoas no processo projetual. Foi necessário que o designer desenvolvesse um aparelho de escuta e de negociação para conciliar os interesses das pessoas com a competência do técnico especializado ou as determinações do titular de um investimento. Estes atores se colocam facilmente em extremos opostos e o designer assumiu para si a difícil tarefa de projetar atendendo às demandas do usuário sem conflitar com os interesses dos investidores ou disposições dos técnicos. Quando as pessoas se colocam diante de algo a ser usado, elas se tornam usuários, portanto, o usuário é um projeto do designer. Com o tempo o designer aprendeu que seria melhor ouvir as pessoas. Escutar os usuários em potencial nem sempre aconteceu pelo nobre motivo de tornar a vida das pessoas melhor, mas pelo fato de se ter descoberto que ouvir as pessoas diminui a possibilidade de fracasso nas vendas. Sinto o primeiro discurso – tornar a vida das pessoas melhor – mais forte no Brasil e o segundo – melhorar as vendas pela qualidade – mais forte na Itália. Outra questão muito em voga é referente ao que a imagem do país agregada ao produto. Não entendo muita coisa sobre os estudos feitos sobre a imagem do país na intenção de compra, mas no período que estive na Itália percebi que há certa predisposição para somente alguns produtos brasileiros. Ou estes produtos conservam uma relação com a imagem do Brasil, como: o café, os produtos com fibras naturais etc. ou estes produtos eram completamente inusitados para o italiano, como: softwares e produtos de alta tecnologia. Os produtos provenientes do Brasil que também são produzidos na Itália e têm uma tradição na produção italiana, como os tecidos, são automaticamente considerados produtos ruins pelos italianos. Realmente, sobre estes produtos o Brasil não faz grande alarde, apenas uma pequena indicação na etiqueta sobre o país de proveniência. Encontrei muitas vezes toalhas de banho, toalhas de mesa, roupa de cama e até vestuário com etiqueta brasileira nas lojas italianas. Há, portanto, uma área de estudo em design que coloca o produto – no seu sentido mais alargado – no mercado internacional. Da mesma forma a Itália vive transformando qualquer coisa em produto para ser vendido com o selo de qualidade “Made in Italy”, o Brasil também está investindo em estudos avançados e políticas de governo para transformar idéias em produtos para o mercado internacional.

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Um pouco menos atual, mas sempre necessário é o “design para a sustentabilidade ambiental e social”. A tomada de consciência com relação aos problemas ambientais obviamente não é exclusividade dos designers, mas, hoje, é cobrado que ele se ocupe dos efeitos negativos que as atividades produtivas provocam sobre o ambiente. A mentalidade que norteia o projeto é a principal responsável pelos impactos ambientais produzidos pelos produtos, pelos serviços e pela infraestrutura que nos circundam. Quando cursei no doutorado uma disciplina que tratava do assunto, percebi que vários textos e projetos ou tratavam sobre como prolongar a vida útil dos produtos industriais ou iam buscar comunidades subdesenvolvidas onde não havia um sistema produtivo implantado para aplicar suas idéias de sustentabilidade. O primeiro caso é uma forma de reduzir o descarte de materiais no ambiente e o segundo é o modo mais fácil de avisar ao mundo superdesenvolvido que existe outra forma de fazer dinheiro. Alguns projetos implementados no campo da sustentabilidade ambiental, acabaram por gerar também um desenvolvimento social e econômico. Estas, então, passaram a ser preocupações concernentes ao design para a sustentabilidade. A Itália é uma forte referência nas questões sobre sustentabilidade, mas o Brasil tem conseguido se destacar bem neste campo, reforçado por acordos bilaterais Brasil-Itália. Atualmente o designer tem que lidar com subjetividades, com relações sociais dinâmicas, com os mercados instáveis, novas e complexas tecnologias, uma miríade de situações em contínuo movimento e transformação. A resposta que se tem usado para tratar destas questões de alta complexidade tem sido frequentemente a visão sistêmica do metadesign, que é o “processo de projeto que projeta o processo de projeto” (VASSÃO, 2010). O metadesign é especialmente aplicado quando se trabalha com situações de alta complexidade, pois em sua abordagem sistêmica é capaz de criar uma impressionante simplificação de modelos que facilita o entendimento dos fenômenos complexos, abrindo um largo caminho para a solução de problemas altamente imbricados. Em todos os setores da economia, sejam eles produtivos ou não, a palavra de ordem tem sido “inovação”. Os designers sempre tiveram como meta a concepção de modelos exnovo, isto é, nunca pensado antes, mas atualmente tem sido um objetivo a ser perseguido também por outros campos da atividade humana que antes não se preocupavam com esta questão e a pressão sobre os profissionais criativos tem sido bastante alta. Talvez a inventiva e a inovação, sejam as questões sobre as quais os designers mais têm sido cobrados, pois empresas, governos, grupos financeiros estão apostando no inusitado para conquistar novos mercados. A política econômica busca por meio da inventividade, tanto na concepção formal, 110


quanto na aplicação dos dispositivos tecnológicos em novos produtos, driblar os percalços econômicos agravados pelas últimas crises mundiais. A obsessiva busca pela inovação, no entanto, abriu as portas para experimentações, sobretudo com o uso da tecnologia, sem que seja cobrada dos projetistas uma aplicação imediata. Isto é o que acontece na área de interação humano-máquina, em domótica (tecnologia aplicada nas casas), em dispositivos de realidade aumentada, na geração de ambientes digitais, na construção de cenários para a investigação do comportamento humano e todo campo de experimentação em design. Por último, faço menção aos investimentos sociais que pensam na formatação e na gestão da cultura, podendo ocupar-se também do investimento em políticas que promovam o bem-estar social. O social design talvez seja a área de estudo mais marcante no que se refere ao desenvolvimento humano e podemos arrolar, entre as suas várias faces: as ações para promover a qualidade de produtos e serviços; a ergonomia, o ergodesign e os estudos sobre usabilidade; os projetos para inclusão digital; a constituição do respeito ao gênero; os projetos para comunidades; o desenvolvimento sustentável, além de muitos outros assuntos relevantes que motivam a construção de uma sociedade mais igualitária. Mas os investimentos sociais também podem ocupar-se da aplicação de estudos culturais para: promover o uso da cultura como instrumento que agrega valor a produtos com origem em uma determinada região; entender como a cultura afeta a propagação de determinados hábitos; entender o gosto de uma determinada cultura; entender a relação entre mercado e cultura, além de se ocupar de temáticas com claro aproveitamento por parte do design, pelo menos como informação de base aos projetos que devem migrar de uma cultura a outra. De qualquer forma é marcante na Itália a aplicação do social design de forma a conciliar a tradição com a economia de mercado.

Um Futuro Próximo

O fato mais desconcertante no período que vivi na Itália foi ver que muitos designers brasileiros, querendo evitar as culturas estrangeiras, pensando estar criando coisas brasileiras, estão na verdade apenas reafirmando o estereótipo que existe sobre o Brasil no exterior. O grande trunfo do brasileiro, porém, não é referente a nenhum estereótipo, mas à capacidade de se mover bem em ambientes caóticos. A atual economia mundial conturbada acabará por criar um terreno onde os investidores brasileiros conseguirão se mover com agilidade, acompanhando sem muito esforço as bruscas mudanças de rumo. Ainda que muitas empresas 111


estejam se articulando com seriedade no cenário internacional, o Brasil terá, no entanto, que lidar com questões sérias como as desigualdades sociais internas, as transgressões às normas, falta de segurança nas grandes e médias cidades, a falta de cultura, o desprezo pela qualidade dos produtos e serviços, a má condução das políticas públicas e a falta de compromisso com os acordos que firma. Todas estas são questões que podem comprometer a imagem do país no exterior. Como já são vocações, os setores agroalimentar, de artesanato, das confecções, de móveis e do entretenimento não terão grandes problemas para se afirmarem no mercado internacional, mas novas iniciativas irão requerer uma organização interna do setor produtivo que se quer promover e exigirá uma atuação política maciça e eficaz para criar uma organização do setor. De qualquer forma, será necessário que o país consiga sair desta atual posição autocentrada, que observa o mercado somente pelas características que percebe de si mesmo, passando a observar dentro de sua própria cultura os elementos que podem ser universalizados de forma a atender ao mercado externo. Será necessário, ainda, que o Brasil mantenha uma política de fortalecimento das estratégias de aquisição de competência científica e tecnológica. Esta competência em Ciência & Tecnologia deverá ser estimulada não somente para aplicações em produtos de alta tecnologia, mas deverá estar voltada também para a defesa do patrimônio natural, buscando o uso dos recursos de forma sustentável; para a construção de uma sociedade mais igualitária, que poderá usufruir de uma política pública mais justa (sobretudo em educação, moradia e saúde); para a construção de uma cultura mais isenta do subjugo ao poder político e econômico; para a consolidação de ações menos individualistas e mais cooperativas. Estas atitudes irão melhorar a imagem do país no exterior e irá estimular a quebra de barreiras que hoje existem. As deficiências empresariais estão sendo sanadas com as infinidades de empresas incubadas que estão se espalhando pelo território nacional, porém, muitas das atividades, como a dos artesãos, continuarão a ser fonte de subemprego se não houver uma política voltada também ao seu desenvolvimento. Não basta, portanto, incentivar empresas de alta tecnologia ou de produtos refinados, temos que estimular as atividades que hoje geram subempregos a se consolidar como atividades que geram empregos regulares, procurando imprimir ações para a melhora da qualidade (qual qualidade?) e da inventiva. Neste campo a maior dificuldade está em transformar o produto ou a atividade artesanal em um produto ou

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atividade que possa atender a um gosto universal, sem que suas raízes e tradição sejam perdidas. Além disso, não devemos mais obedecer às ortodoxas determinações capitalistas que geraram as dificuldades ambientais pelas quais estamos passando hoje. Os designers terão um importante papel nas futuras transformações dos processos produtivos, no uso de novos materiais, na difusão de novas técnicas, na aplicação de recursos renováveis etc. Isto aponta para outro caminho bem menos glamoroso e comercial do que aqueles atualmente praticados pelos designers, levando-os a migrar para ações que promovam soluções simples e econômicas para os mais variados problemas que afligem milhares de pessoas (que provavelmente nunca ouviram falar em design). Devido à sua experiência com projetos sociais e o confronto diário com problemas que afetam estes milhares de pessoas que vivem em estado de pobreza, os designers brasileiros, mais do que os designers de qualquer país desenvolvido, terão instrumentos para lidar com estas questões.

Referências FONTES, A. (2009). A imagem do Brasil. <<http://needesign.com/design/a-imagem-do-brasil-sopode-ser-plural/>> (postado em 27 de março de 2009, recolhido 01/08/2011). VITALE, M. (1998). Made in Italy. qualitas1998. net: Mario Pagliaro's website <http://www.qualitas1998.net/qualityreport/marco_vitale.htm> (postado em 9 de fevereiro de 2005) ETERNO, S. (2011). Le eccellenze che trascinano (per quanto?) l’Italia. <http://www.qualitasicura.it/?p=1476> (postado em 17 de outubro de 2011). Categorie: news, qualità. Agência Brasileira de Promoção <http://www.apexbrasil.com.br>

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Investimentos

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Marcas urbanas: a modernidade esquecida Lisabete Coradini Ser moderno é encontrar-se em um ambiente que promete aventura, poder, alegria, crescimento, autotransformação e transformação das coisas em redor - mas ao mesmo tempo ameaça destruir tudo o que temos, tudo o que sabemos, tudo o que somos. (...) ela [a modernidade] nos despeja a todos num turbilhão de permanente desintegração e mudança, de luta e contradição, de ambigüidade e angústia. Ser moderno é fazer parte de um universo no qual como disse Marx, "tudo o que é sólido desmancha no ar". Berman (1985, p. 15)

Introdução Menos que uma apresentação de dados e/ou de resultados de pesquisa, este texto tem como propósito esboçar uma reflexão –ainda que exploratória – com vistas à realização de um projeto mais amplo, ancorado na análise de leituras de obras que versam sobre imagem, arquitetura e cidade. O ponto de partida deste exercício diz respeito ao modo como a modernidade aparece nas cidades brasileiras, principalmente em Natal, RN. O objetivo é fazer uma reflexão sobre a construção da imagem moderna da cidade de Natal, principalmente a partir dos anos 50, através da exploração do seu potencial imagético. Partindo de uma breve retrospectiva histórica, iremos mostrar, através do registro fotográfico, as intervenções urbanas e arquitetônicas (em monumentos, prédios, casas residenciais) que fomentaram e instalaram a modernidade, procurando Observar todos os tipos de intervenções urbanísticas e entender tanto o simbolismo produzido por estas no espaço urbano, onde as relações entre o local e o global se configuram de modo intenso, quanto a forma como tais articulações propiciam a criação de novas identidades (étnicas, sociais, históricas, etc.) - conquanto saibamos não haver outra maneira de se entender esse processo que não a da observação in loco, ou seja, no contexto em que este ocorre.. Atualmente as cidades litorâneas do nordeste do Brasil estão vivendo um ritmo de construção/demolição do seu espaço urbano, tornando-se difícil a apreensão de como realmente ocorrem as transformações implícitas nesse urbano, pelo ritmo acelerado da chegada de novos moradores e do turismo. Na Antropologia, a arquitetura moderna é pouco explorada como viés importante para se entender o cotidiano e estilo de vida dos moradores das cidades. A nosso ver, a Arquitetura 117


Moderna Brasileira foi e continua sendo uma marca identitária de uma época e de um estilo de vida. Para Fernando Lara (2005), essa Arquitetura foi fortemente influenciada por Le Corbusier e pela Bauhaus, e, diferentemente de outros países, no Brasil, conseguiu alcançar uma disseminação nacional e foi extremamente popular, chegando a se inserir no cerne da identidade nacional e a representar um papel fundamental na Cultura Brasileira. O autor afirma ainda que tal sucesso devese à euforia dos anos 50 (relativa à estabilidade política e econômica) e ao desejo de formação de uma imagem de Nação. A partir do referido período (Anos 50), podemos observar uma produção arquitetônica significativa no Brasil, sob a influência do Modernismo Europeu, em especial de Le Corbusier, produção esta que seguia os exemplos das obras realizadas no Rio de Janeiro por Lúcio Costa, Carlos Leão, Afonso Reidy, M. M. Roberto, entre outros. Esse Movimento no Brasil atingiu seu ápice com a construção de Brasília, momento a partir do qual, a obra de Niemeyer passa a exercer uma grande influência sobre a produção moderna local. No nordeste brasileiro, destaca-se a Escola Pernambucana de Arquitetura Moderna, que, devido ao seu pioneirismo e proximidade geográfica, influenciou na realização de projetos arquitetônicos nas cidades de Natal e João Pessoa (clubes, residências, estação rodoviária, escolas públicas, entre outros). Segundo Scocuglia, J.,Monteiro,L. e Tavares de Melo,Marieta (2005), num estudo sobre projetos modernistas realizados na capital paraibana, de 1960-70, a Arquitetura Moderna de João Pessoa - PB realizada entre os anos desse período recebeu forte influência dos profissionais então atuantes em Recife-PE e, indiretamente, da escola carioca. Em Natal, segundo entrevistas realizadas com moradores dos bairros Tirol e Petrópolis, até aquele momento não havia curso de Graduação em Arquitetura na cidade, e muitos estudantes foram buscar capacitação na “Escola do Recife” (PE) . Para alguns estudiosos, no entanto, Natal antecipou-se ao Movimento Modernista Nacional, com a criação do primeiro Plano Urbanístico da Cidade, através da Resolução nº. 15, de 30/12/1901, que criou a Cidade Nova.

Marco Inicial da Cidade Segundo os historiadores locais, a cidade de Natal tem a origem do seu povoamento em torno de uma capelinha (a antiga Catedral) e de uma praça (A Praça “André de Albuquerque”). Os habitantes com maior poder aquisitivo viviam em sítios e vinham à cidade para as missas de domingo e dias santos. 118


Em 1700, Natal tinha praças, três igrejas, o Palácio da Câmara e prédio prisional. No século XIX, a Ribeira aparece como o segundo núcleo mais povoado da cidade, mas é só no século XX que surge a preocupação em ordenar o crescimento da cidade. Para tanto, foi contratado o italiano Antonio Polidrelli, que desenhou a Cidade Nova (atuais bairros de Tirol e Petrópolis) Em 1929, Giacomo Palumbo, a convite do Prefeito Omar O'Grady, elaborou o Plano de Sistematização para Expansão Urbana de Natal. Mas, foi durante a Segunda Guerra que Natal, escolhida pelos militares americanos para a instalação de uma base aérea, passa a se destacar no cenário nacional, ficando conhecida como "Trampolim da Vitória, devido à posição geográfica estratégica do Rio Grande do Norte. Somente na década de quarenta, a cidade de Natal sofreria transformações mais significativas no seu crescimento, com o advento da Segunda Guerra Mundial e com a presença de tropas estrangeiras em solo potiguar. A partir desse período, começam a chegar novos moradores de diversos pontos do Brasil e do exterior. Natal começa a perder características de cidade provinciana. A cidade expandiu-se e continua crescendo a cada dia. Nos anos 60, começa a receber migrantes de outros estados e dá início a um turismo incipiente. Nos mesmos anos 60, a Via Costeira foi construída, com uma rede de hotéis, pousadas e restaurantes. A atividade turística, aliada ao processo de urbanização e ao crescimento populacional, provocou uma reorganização do espaço. Os bairros centrais se expandiram em direção ao outros eixos e avenidas (Prudente de Morais, Roberto Freire, Bernardo Vieira). No entanto, a cidade cresceu sem uma legislação atuante. Tirol e Petrópolis são bairros antigos e tradicionais da cidade de Natal que ostentam imagens simbólicas, como as ruas e largas avenidas projetadas pelo arquiteto Giácomo Palumbo, o que dá um ar de modernidade ao bairro. Atualmente ainda continuam atraindo as classes elitizadas, embora venham sofrendo um processo de verticalização e renovação da paisagem urbana. Natal possui atualmente 167,9 km de extensão e está cercada por águas em quase todos os seus lados. Faz fronteira com Parnamirim, Macaíba e São Gonçalo do Amarante. O relevo é caracterizado por dunas fixas e móveis de areia branca e por trecho de mata atlântica. Na sua grande maioria, os moradores acordam cedo, o sol aparece às cinco da manhã e às dezoito horas já desaparece. Natal é cidade litorânea turística de porte médio, com 712.317 mil habitantes (IBGE,2001). Observar a área central das cidades, vale ressaltar, é entender as transformações que marcaram a estrutura delas - a memória do seu passado. Vários foram os autores que discutiram o processo de evolução urbana de Natal, como: Câmara Cascudo (1980), Cunha (1987), Maria 119


Livramento Clementino (1995), Ângela Ferreira (1996), Edmilson Lopes Junior (2000) Ângelo Silva (2003), Edna Furtado (2005), entre outros. Através do mapeamento e do registro fotográfico, percebemos que, na área central de Natal, Tirol e Petrópolis abrigaram casas e equipamentos urbanos com características da Arquitetura Moderna. As afinidades da cidade de Natal com o Movimento Moderno foram intensas. Vejamos as fotos a seguir (vide anexos, figuras de 1 a 5):

Essas experiências marcaram de forma significativa os lares e as cidades brasileiras a partir de fins dos anos 50 e início dos anos 60. Tanto na cidade do Recife como em João Pessoa e Natal, os projetos arquitetônicos modernos foram sendo recriados, remodelados e readaptados não só às condições climáticas, mas também aos materiais locais, criando-se uma nova forma de se morar e viver nas cidades.

É importante salientar que, nesse período, travou-se entre intelectuais brasileiros uma fértil discussão sobre a identidade e a cultura brasileira: Afinal, o que é isto que chamamos Brasil? A discussão girava em torno do nacional e regional, da tradição e modernidade, da ordem e progresso, e tudo isto contribuiu para a formação de um entendimento de que era preciso progredir, romper com o passado europeu e voltar-se para as raízes coloniais. Com relação à arquitetura, Fernando Lara (2005,5) demonstra que lares brasileiros adotaram o Modernismo como estilo nos anos 50. (....) Após ter sido adotada pelo governo como estilo oficial e pelas classes mais favorecidas como signo de status, a arquitetura moderna brasileira foi adotada pela classe média como paradigma estético, apesar das diferenças regionais ou discrepâncias sociais. Uma identidade fora construída intelectualmente e estava sendo massiva e entusiasticamente aplicada”

No entanto, segundo este autor, houve uma adaptação ao estilo moderno de acordo com as possibilidades locais, ou seja, a grande maioria das casas foi construída pelos proprietários com a ajuda de algum especialista e principalmente seguindo um modelo imposto pelas revistas de grande circulação nacional nos anos 50 e 60, como a revista “Manchete”, responsável pela divulgação de matérias e reportagens sobre o Movimento Moderno no exterior e sua repercussão no Brasil. Afirma Fernando Lara a seguir: A vasta maioria deste nosso espaço construído não foi (e continua não sendo) projetada por arquitetos, mas mesmo assim apresenta elementos modernistas. Construídos pelos próprios usuários com ajuda de mestres-de-obra e operários muito pouco qualificados, as casas revelam uma adaptação engenhosa 120


do vocabulário modernista. Características volumétricas como telhados invertidos e marquises ocorrem em milhares de casas de classe-média enquanto elementos menores como colunas metálicas, pastilhas e brise-soleils foram ainda mais comuns. Usados para indicar uma modernidade incipiente, este Modernismo Popular (como eu o chamo) alcançou durante os anos 50 o status de identidade social (Lara, 2005,5)

Esta situação foi possível de ser confirmada através das entrevistas com moradores dos bairros Tirol e Petrópolis, que afirmaram que, naquela época, não era possível contratar arquiteto, pois não havia escola de Arquitetura na cidade. As entrevistas indicam também que era possível contar com experiência dos mestres - de- obra, que muitas vezes adaptavam os modelos veiculados nas revistas de grande circulação nacional, como a já citada “Manchete” e “O Cruzeiro”, reforçando a ideia defendida por Lara de um “modernismo popular”. Para Trigueiro,E.; Elali,G.; Veloso, M. (2007,4), a Arquitetura Modernista atinge seu apogeu nos anos em Natal, Representa o diálogo direto entre o espaço privado da moradia e o espaço público da rua, para a qual aquela se abre em jardins e terraços protegidos, quando muito, por grades/muros baixíssimos, de caráter essencialmente simbólico, e se mostra através da transparência de amplas superfícies envidraçadas e elementos vazados.

Através da seleção de um conjunto de imagens produzidas em diferentes épocas sobre a cidade, torna-se possível refletir sobre a construção de um imaginário de cidade –“ a cidade moderna” -, que se deu a partir da adoção de um estilo de morar. Por conseguinte, o modo de vida dos moradores foi sendo reformulado pela cultura da mídia, que se transformou em fonte disseminadora de modelos, comportamento e gosto. O Modernismo esteve associado à construção de uma marca identitária, ou seja, a uma identidade nacional. A primeira foto mostra uma casa situada na rua Hermes da Fonseca, Natal RN, onde é possível verificarmos alguns dos elementos da arquitetura moderna: casa com pilares com formas em “V, fachada geométrica (vide anexos figura 6): Também é possível ilustrar a afirmativa sobre a preocupação com a identidade regional, através das duas fotos a seguir, onde podemos perceber o desenho no azulejo de elementos da cultura local, como trabalhadores do sal, (vide anexos figuras 7 a 10) Segundo Trigueiro, E.; Elali,G.; Veloso, M. (2007, 6), As poucas casas modernistas que lograram conservar alguma integridade formal indicativa de suas origens desaparecem agora, atrás de muros altos e densos gradis, comumente contíguos às paredes cegas e ainda mais altas das torres de apartamentos que as substituem, vedadas por portas automáticas controladas por seguranças armados, e sobre as quais se elevam, guaritas, cercas eletrificadas e câmeras de circuito interno de TV. 121


Hoje em dia, algumas casas foram encobertas com muros altos ou outdoors, como mostra a foto a seguir (vide anexo figura 11): Seguem outros exemplos remanescentes da arquitetura moderna em Natal: platibandas que escondem a cobertura em telha de barro francesa, combogós, elementos vazados, brise-soleil, pergolados de concreto, pilares falsos (vide anexos figuras 12 a 20). Para finalizar, convidamos e desafiamos o leitor a olhar para a sua rua, o seu bairro e a sua cidade e procurar vestígios de uma arquitetura moderna, afinal sempre fomos modernos, como diz Lara (2005) Todos somos modernos em maior ou menor grau. Todos fazendo parte desta nossa gigantesca herança moderna a qual estamos apenas arranhando ao estudarmos apenas os arquitetos que já conhecemos. Nosso patrimônio moderno é imenso ... Nota 1- Este artigo faz parte de projeto intitulado “Modernidades e Intervenções Urbanas: as imagens e os discursos sobre as cidades (Natal, RN) “ . Agradecemos à bolsista pibic/cnpq Giovanna Rego integrante do grupo de pesquisa NAVIS (Núcleo de Antropologia Visual /UFRN), pela colaboração nas pesquisa, e pelo acervo fotográfico. Nota 2 - Para uma melhor compreensão da Arquitetura Moderna Brasileira, especialmente sua apropriação tardia pela Classe Média, e para um melhor esclarecimento sobre algumas relações contraditórias entre modernidade, modernismo e modernização, ver o artigo de Fernando Lara “Modernismo popular: elogio ou imitação” in Cadernos de Arquitetura e Urbanismo, Belo Horizonte, v. 12, n. 13, p. 171-184, dez. 2000. Nota 3 – Um excelente exemplo é a construção de Brasília, no final dos anos 50 do século XX, que representa a tentativa de concretização de uma utopia urbana. A ideia de uma capital moderna como nova representante política do Brasil traduzia um projeto de sociedade. Para se entender melhor a relaçâo entre arquitetura, ideologia e identidade, ver “A cidade modernista”, de James Houston (1993).

Referências AMARAL, Izabel. Um olhar sobre a obra de Acácio Gil Borsoi: obras e projetos residenciais, 1953-1970. (2004). Dissertação (Mestrado). Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo, Universidade Federal do Rio Grande do Norte. ARRAIS, Raimundo (org.). Crônicas de Origem: a cidade de Natal nas crônicas cascudianas dos anos 20. Natal, RN: EDUFRN, 2005 (p.30-31). CASCUDO. O novo plano da cidade II. A República, 7 de novembro de 1929. In: ARRAIS, Raimundo (org.). Crônicas de Origem: a cidade de Natal nas crônicas cascudianas dos anos 20. Natal, RN: EDUFRN, 2005. p.146-147). CLEMENTINO, Maria do Livramento. Impacto urbano de uma base militar: a mobilização militar em Natal durante a 2a Grande Guerra. Natal: EDUFRN, 1995. CORADINI, Lisabete. Praça XV: espaço e sociabilidade. Florianópolis: Letras Contemporâneas,1994. 122


HOULSTON, James. A cidade Modernista: uma crítica de Brasília e sua utopia. São Paulo: Companhia das Letras, 199 LARA, Fernando. “A insustentável leveza da modernidade” in Arquitextos 057, ISSN 1809-6298, texto Especial 276 – fevereiro 2005, http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/esp276.asp consultado em 02/07/2011. LARA, Fernando. “Modernismo popular: elogio ou imitação” in Cadernos de Arquitetura e Urbanismo, Belo Horizonte, v. 12, n. 13, p. 171-184, dez. 2000. LOPES JUNIOR, Edmilson. A construção social da cidade do prazer: Natal. Natal: Editora da UFRN, 2000. MIRANDA, João Maurício F. de. 380 anos de história foto-gráfica da cidade de Natal 1599-1979. Natal: UFRN. Ed. Universitária,1981. MIRANDA, João Maurício F. de. Evolução urbana de Natal em 400 anos 1599-1999. Natal: Prefeitura Municipal de Natal, 1999. NESI, Jeanne Fonseca Leite. Caminhos de Natal. Natal (RN): Instituto Histórico e Geográfico do RN, 1997. TRIGUEIRO,E.; ELALI,G.; VELOSO, M “Urbanismo modernizador, consolidação modernista, reuso pósmoderno: a dinâmica de transformação urbana em Natal e a dilapidação de seu acervo arquitetônico” in anais do 7 seminário do.co.mo.mo-Brasil, Porto Alegre 22 a 24 de outubro de 2007, consultado em 15 de fevereiro de 2012. . SILVA, Ângelo Magalhães. Objeto imobiliário e a produção do espaço na zona sul de Natal/RN, dissertação de Mestrado, 2000.

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Anexos

Figura 1:Hotel Internacional dos Reis Magos. Autor: Jaeci Fonte: acervo Natal 500 anos

Figura 1 IPASE Autor: Luiz Grevy da Silva Fonte: Natal de Ontem (DVD Ă lbum Fotos)

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Figura 2 cine Rio Branco Autor : Jaeci Fonte Natal de Ontem (DVD Ă lbum Fotos)

Figura 3 cine nordeste Autor: Jaeci Fonte Natal de Ontem (DVD Ă lbum Fotos)

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Figura 4 Colegio Estadual Atheneu Autor: Jaeci Fonte Natal de Ontem (DVD Ă lbum Fotos)

Figura 6 rua Hermes da Fonseca Autor: Giovanna Rego 126


Figura 7 rua TrairĂ­ Autor: Lisabete Coradini

Figura 8 varandas de uma casa moderna Autor: cedida por Nilton Xavier Bezerra 127


Figura 9 varandas de uma casa moderna Autor: cedida por Nilton Xavier Bezerra

Figura 10 casa com azulejos Autor: cedida por Nilton Xavier Bezerra

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Figura 11 rua Hermes da Fonseca Autor: Lisabete Coradini

Figura 12 rua Hermes da Fonseca Autor: Giovanna Rego

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Figura 13 rua JundiaĂ­ Autor: Giovanna Rego

Figura 14 rua Hermes da Fonseca Autor: Giovanna Rego

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Figura 15 rua Hermes da Fonseca Autor: Giovanna Rego

Figura 16 rua Ă‚ngelo Varela Autor : Lisabete Coradini 131


Figura 17 Fundação Jose Augusto Autor: Lisabete Coradini

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Figura 18 Palรกcio dos Esportes Autor: Lisabete Coradini

Figura 19 ASSEN Autor: Lisabete Coradini

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Figura 20 Antiga estação rodoviária, atual museu da cultura popular Autor: Giovanna Rego

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O Uso da Internet na Construção da Marca País: Estudo de Caso do Portal Oficial do Turismo Brasileiro Luciana Paolucci

Introdução A difusão de valores internacionalizados é perceptível em distintos campos: economia, cultura,

consumo,

política,

tecnologia,

ecologia

etc.,

gerando

uma

aproximação

comportamental na sociedade contemporânea sendo aqui definida como globalização. Na área do turismo, notam-se tendências dentro deste quadro globalizado, calcado nas ações das corporações transnacionais, como as cadeias hoteleiras e companhias aéreas, e na influência que a indústria cultural tem na difusão de hábitos de comportamento e consumo internacionalizados, fundamentais para a expansão de mercados para as corporações internacionais: concentração do marketing e da estratégia de comunicação em escritórios centrais que determinam diretrizes para a unificação da marca em escala mundial; a valorização da menor cultura comum globalizante para anúncios de produtos e/ou serviços, com o incremento de marcas internacionais; a transformação de símbolos nacionais em produtos e a sua valorização promocional através do discurso regionalizado na atividade turística. Com a realização, em um curto período, da Copa do Mundo de 2014 e dos Jogos Olímpicos de 2016, o Brasil ganha condições de atingir uma posição mais relevante como destino turístico global, que consequentemente influenciará na percepção da marca país. As previsões iniciais da Embratur (Instituto Brasileiro de Turismo), com base em experiências de outros países, indicam um número de cerca de 500 mil estrangeiros a mais em visita ao Brasil durante a Copa do Mundo. A realização dos jogos em doze cidades-sede será uma oportunidade para ampliar o conhecimento do Brasil além de seus grandes ícones, mostrar a diversidade turística natural e cultural e ainda ampliar para todas as regiões brasileiras as possibilidades de receber visitantes, aumentando sua permanência e seu gasto médio (MTur, 2010). Perguntas como que imagens os turistas estrangeiros ficarão do país, qual o posicionamento no mercado global e qual o papel do da internet na construção do Brasil como destino devem ser respondidas neste processo. 137


Compreendendo a utilização das novas tecnologias da comunicação no funcionamento do sistema turístico, compreende-se melhor o turismo internacional, que é parte significativa do processo de globalização. Assim, em ultima instância, compreende-se melhor o próprio processo de globalização na sociedade contemporânea. O trabalho de construção de marca ou branding, que visa desenvolver uma percepção atraente do Brasil, deve ser uma amplificação positiva do que já existe, utilizando um ideário de brasilidade que valoriza os estereótipos da exuberância natural, da hospitalidade, da ginga, da criatividade e da sensualidade, somados ao conceito de Brasil contemporâneo, que valoriza o cosmopolitismo, a diversidade e crescimento de sua economia, a cultura multifacetada e a abertura para a modernidade. Uma das formas de atuar na construção da identidade de marca de empresas (ou nações, no caso) é através da utilização de espaços virtuais que reforcem o posicionamento desejado pela marca, por meio da oferta de elementos que reforcem características desejadas de um modo intenso e singular. Neste sentido, este trabalho tem como objetivo realizar uma análise heurística do portal oficial do turismo brasileiro, julgando o sistema de acordo com os princípios de usabilidade, e avaliando a qualidade de interação (navegabilidade) do portal em seus aspectos relevantes para a atração, persuasão e conversão, identificando pontos de melhoria e gerando recomendações de correção e boas práticas. O ponto focal desta etapa foi entender as relações entre arquitetura da informação, arquitetura de design, navegabilidade, conteúdo e interatividades, itens da usabilidade, pensando no interpretante, ou seja, no internauta que procura informações.

Construindo a marca Brasil

Imagem país pode ser compreendido como o resultado das crenças e impressões que as pessoas têm acerca de um país. As imagens representam uma simplificação do conjunto de associações e informações relacionadas com um lugar. É vinculado a estereótipos sobre uma nação e se fundamenta em representações mentais sobre a cultura, as pessoas, os produtos e serviços, os símbolos, a música, a tecnologia, a economia, o esporte dentre outras variáveis. 138


Essas diversas representações mentais da imagem de um país são associadas pelo consumidor às marcas e produtos do mesmo (KOTLER E GERTNER, 2005). Philip Kotler, em artigo para a revista HSM Management (2004), expôs como o marketing estratégico de lugares deve ser gerenciado e, destacando a relevância da análise e definição dos principais pontos fortes e fracos e das principais oportunidades e ameaças e; da seleção de setores de atividade, personalidades, marcos naturais e eventos históricos que possam formar a base de uma sólida estratégia de marca e uma narrativa interessante. A construção de uma a marca país é um processo de longo prazo, que deve se valer de variadas ferramentas de marketing para perpetuar um relacionamento baseado no posicionamento desejado. Dentre estas ferramentas, vale destacar a imersão do prospect dentro da marca, fato que é bastante útil para materializar o conceito de posicionamento junto ao consumidor. É neste sentido que a utilização de ações de marketing digital podem gerar o início de uma experiência para o internauta ao oferecer informações claras, precisas e variadas sobre o país e, de modo complementar, gerenciar as redes sociais de modo a influenciar a difusão de informações positivas e aproveitar as críticas como fonte de identificação de problemas que necessitam de ações direcionadas para serem solucionados. Estas ações somadas a publicidade, relações públicas e assessoria de imprensa podem se tornar fundamentais na composição de uma efetiva comunicação integrada de marketing, já bastante influenciável por situações intangíveis decorrentes dos variados pontos de contatos, principalmente os midiáticos, que podem contribuir

significativamente na percepção da

marca país. A política governamental de criação de uma marca país nacional fica a cargo, principalmente, dos Ministérios do Turismo, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio e o das Relações Exteriores, com órgãos específicos para fomentar a imagem do Brasil internacionalmente.

Neste trabalho, foi analisada uma das frentes relevantes para a

construção de uma identidade brasileira no mercado mundial: o turismo. A EMBRATUR é a autarquia especial do Ministério do Turismo responsável pela execução da Política Nacional de Turismo no que diz respeito à promoção, marketing e apoio à comercialização dos destinos, serviços e produtos turísticos brasileiros no mercado internacional. Para tanto, tem o ‘Plano Aquarela – Marketing Turístico Internacional do Brasil’ como orientador de seus programas de ação, cuja primeira edição do em 2004, com atualizações anuais desde então. 139


Atualmente, o governo está trabalhando com o Plano Aquarela 2020, que oferece, para esta década, o planejamento, a estratégia e as principais ações para trabalhar a promoção e a imagem do Brasil como destino turístico. Os objetivos da promoção internacional, segundo este documento, são: contribuir para o sucesso da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos, maximizar os resultados para o turismo brasileiro e otimizar a exposição mundial do país para que ele se torne mais conhecido (MTur, 2010). Um dos grandes objetivos do Plano Aquarela 2020 é atualizar a imagem que o mundo tem do Brasil. Segundo o Ministério do Turismo (2010), os estrangeiros que já visitaram o país têm opinião bastante diversa daquela imagem que têm aqueles que nunca vieram ao Brasil. Por isso, em um período em que os olhos do mundo se voltam para o país, com a grande exposição na mídia no período em que se realizarão os dois megaeventos esportivos, é fundamental promover uma mudança de percepção das pessoas de todos os cantos do planeta sobre o país, seu povo, sua economia, seus produtos e seu papel no cenário internacional. Otimizar informações, melhorar canais de comunicação com a imprensa, utilizar a internet e seus infinitos recursos são atividades agregadas às campanhas de publicidade e às ações de relações públicas desde 2010.

Turismo e Globalização

Em relação ao turismo, a globalização contribui para uma mudança na sua natureza, a partir de uma grande segmentação na demanda e o crescimento do sentimento de orgulho na oferta, trazendo o desenvolvimento de novas destinações e de novos produtos turísticos, e a facilidade de acesso a estes produtos, equipamentos turísticos, serviços turísticos e facilidades turísticas. Considerando os efeitos ampliadores da globalização, surgiram estratégias globais para identificar, desenvolver e comercializar o turismo de base local em clusters e redes corporativas de empresas, como, por exemplo, operadoras turísticas, empresas de transporte aéreo, cadeias hoteleiras e um pool promocional de pequenas e médias empresas agregadas à cadeia produtiva do Turismo. A globalização, ao estimular a descentralização das operações, muda a natureza do Turismo Internacional, pois traz a prosperidade em nações emergentes, aumenta a divisão do trabalho internacional e potencializa a informação via web. O Turismo, por conta da 140


globalização, é um dos mais importantes setores da economia no mundo no total de bens e serviços de exportação. Conforme divulgado pela Organização Mundial de Turismo – OMT no documento Panorama do Turismo Internacional – Edição 2009 (OMT, 2009), até aquele ano, o mercado de viagens representava 30% das exportações mundiais de serviços e 6% das exportações mundiais totais, se situando, como categoria, em 4º lugar, depois dos combustíveis, produtos químicos e automóveis. No Brasil, em

2008, o

turismo figurou entre os principais itens da pauta de exportação do país, em quinto lugar. Na pauta de serviços, foi o líder na geração de receitas (Mtur, 2010). Segundo dados da Organização Mundial de Turismo (OMT, 2011) (vide tabela 1), entre 1999 e 2009, as viagens internacionais cresceram 35%, alcançando o total de 880,5 milhões de turistas em 2009, gerando uma renda de aproximadamente US$ 5 trilhões (World Travel & Tourism Council - WTTC).

A OMT (2012) estima que em 2012, o fluxo

internacional de turistas chegue a 1 bilhão de passageiros. A América do Sul, durante este período, acompanhou o crescimento mundial e manteve sua participação de 2,3% na fatia mundial. Já o Brasil se manteve praticamente igual em chegadas internacionais, oscilando entre 4 e 5 milhões, mas viu reduzida sua participação na América do Sul, em quase 10%. Tabela 1: Turismo no mundo

1. Fluxo receptivo internacional Comparativo de chegadas de turistas internacionais: Mundo, América do Sul e Brasil - 1999-2009 Ano Mundo

1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009

650,2 689,2 688,5 708,9 696,6 765,5 801,6 846,0 900,5 919,0 880,5

Turistas (milhões de chegadas) Participação (%) América do Brasil América do Sul Brasil na Sul no Mundo América do Sul

15,1 15,2 14,6 12,7 13,7 16,2 18,3 18,8 20,1 20,8 20,5

5,1 5,3 4,8 3,8 4,1 4,8 5,4 5,0 5,0 5,1 4,8

2,3 2,2 2,1 1,8 2,0 2,1 2,3 2,2 2,2 2,3 2,3

Fonte: Organização Mundial do Turismo e Ministério do Turismo, 2011 Notas: 1. Dados de 2005 a 2008 revisados.

141

33,82 34,95 32,69 29,80 30,17 29,55 29,28 26,69 25,00 24,28 23,42

Brasil no Mundo

0,79 0,77 0,69 0,53 0,59 0,63 0,67 0,59 0,56 0,55 0,55


É notável que ao longo dos últimos sessenta anos, a atividade turística tem experimentado uma desconcentração contínua. A Europa declinou sua fatia de mercado cerca de 10 pontos percentuais desde 1950, ao passo que a América do Norte perdeu 13 pontos percentuais. Ainda assim, ambas as regiões mantêm-se como as principais receptoras de turistas (representavam, conjuntamente, cerca de 95% da fatia de mercado em 1950, 82% quarenta anos depois, 76% em 2000, e 69% em 2008). A participação da chegada de turistas internacionais nos países em desenvolvimento tem aumentado paulatinamente, de 31% em 1990 para 45% em 2008. (http://www.dadosefatos.turismo.gov.br/export/sites/default/dadosefatos/outros_estudos/down

loads_outrosestudos/Turismo_no_Brasil_2011_-_2014_sem_margem_corte.pdf ) Em relação à receita cambial gerada em 2009, o Brasil teve uma receita de US$ 5,3 bilhões, com um aumento de cinco vezes se comparado com o ano de 1999. Entretanto, este número representa apenas 0,62% de participação

em

relação

ao

total.

(http://www.dadosefatos.turismo.gov.br/export/sites/default/dadosefatos/estatisticas_indicador

es/downloads_estatisticas/Estatxstica_e_Indicadores_de_turismo_no_Mundo__2009_1__3_.pdf) Com a competitividade dos destinos cada vez mais acirrada,

uma destinação, para continuar seu

processo de desenvolvimento turístico, deve tentar diferenciar-se de seus competidores. Não se trata, pois, de uma questão de vantagem, e sim de sobrevivência. Nesse sentido, a imagem de um destino turístico parece desempenhar um papel vital no processo de escolha, satisfação e possível repetição da visita ao destino (CHAGAS e DANTAS, 2009). São, justamente, as tendências do turismo nesse quadro de globalização, que apontam para as décadas iniciais do terceiro milênio – este século XXI –, em seus aspectos econômicos e sociais mais distintamente, que estão a merecer destaque, considerando-se que expressivos contingentes de novos viajantes preparam suas malas para conhecer novas destinações turísticas. Sua imaginação criativa, sonhadora e especulativa, alimentada por desafios e pela comunicação global da internet, TV a cabo, profusão de novas publicações de excelente qualidade gráfica e conteúdo ilustrativo, transpõem os limites de seu horizonte e os mergulham na virtualidade do concreto imaginado.

Internet e Turismo

A sede pela descoberta do novo, pelo abandono da paisagem cotidiana e pelo enriquecimento cultural é a essência do Turismo, que é, antes de tudo, uma exploração: toda pessoa que se aventura a conhecer um lugar diferente deseja, no fundo, extrair o máximo de sua experiência de vida, através do contato com diferentes e surpreendentes realidades. 142


Esta mesma vocação exploratória em busca do conhecimento também tornou a internet a maior e mais popular rede de informações do planeta, exatamente porque permite a experiência da interatividade e da troca de experiências. Logo, não é surpresa que o turismo esteja encontrando na internet um forte sustentáculo para suas atividades, já que esta última é, por definição, uma fonte de pesquisas rápidas e acessíveis. É possível afirmar que a internet facilitou o acesso à informação e a interatividade entre oferta e demanda, promovendo mudanças nos canais de distribuições dos produtos e serviços. Em relação ao turismo, BONIN (2003) afirma: “a www (World Wilde Web) oferece uma infraestrutura para distribuição global e fornecimento de informação multimídia de natureza turística. Ela também dá mais poder ao consumidor, através do fornecimento dirigido que atendem a suas necessidades individuais, diminuindo assim, a distância entre o consumidor e a destinação/oferta, de uma forma interativa e flexível.”

É significativa a oportunidade que a internet trouxe para as destinações e empreendimentos turísticos, tornando-se um dos principais canais de comunicação direta com a demanda, atingindo segmentos diferenciados e ampliando as possibilidades de uso de diversas ferramentas de marketing (COSTA, 2000). Um dos setores que mais cresce, no mundo virtual, é o de agências online de viagens. Neste ano (2012), só na América Latina, as vendas de passagens e pacotes turísticos por meio dessas companhias devem dobrar na região, chegando a US$ 5 bilhões. A Decolar.com, empresa argentina líder em vendas online de passagens aéreas na região, está investindo US$ 8,5 milhões para entrar no segmento de hotéis e pacotes turísticos, incluindo cruzeiros. A companhia pretende ainda dobrar o número de funcionários, atualmente em cerca de 550. Os planos incluem o mapeamento de todos os hotéis brasileiros até o final deste ano e o lançamento de uma plataforma de pesquisas melhorada.

143


(http://www.istoedinheiro.com.br/noticias/56917_O+TURISMO+NAVEGA+NA+INTERN ET ) Para os turistas internacionais que visitam o Brasil, a internet é uma das principais fontes de informação na organização da viagem, juntamente com amigos e parentes. É a referência que mais cresce, dentro da lista do MTUR, totalizando 30% de preferência, com um crescimento de mais de 10% nos últimos cinco anos. Já em pesquisas qualitativas realizadas pela EMBRATUR com turistas estrangeiros de 27 nacionalidades diferentes, no momento em que encerravam sua visita ao Brasil, os resultados de 2009 mostram que a internet foi fonte para 63% dos turistas que buscaram informações sobre o país antes da viagem, e 13% acessaram o portal (www.braziltour.com) (MTtur, 2011). Estes números são importantes indicadores do crescimento do acesso a busca de informações dobre o pais na internet, e mais especificamente no site oficial do turismo brasileiro. Por isso é fundamental que esta ferramenta seja construída de forma a refletir a marca país. Um dos principais diferenciais da internet é a possibilidade de se ter acesso a grandes quantidades de informações que dão suporte às questões que emergem naturalmente durante o processo de tomada de decisão de compra (BONIN, 2003). Desta forma, uma boa estratégia pode instigar o cliente no momento de sua pesquisa, estimulando-o a obter mais informações sobre o produto desejado e, desta forma, aumentando seu interesse pelo mesmo. Mas o que realmente torna a internet especial para o turismo são as suas características bastante peculiares de praticidade, interatividade, mobilidade e instantaneidade. O fácil acesso a informações e serviços tornam atraentes não apenas o portal ou o serviço, mas também o destino turístico pretendido. Com a facilidade do acesso às informações, o processo de escolha passa a ser muito mais fácil, deixando de demandar tanto esforço da parte interessada. Esta é a mentalidade que está norteando a direção dos negócios turísticos.

Tendências

Como toda inovação que traz oportunidades e riscos, a internet posa como uma ferramenta essencial para os profissionais de turismo. Segundo dados da Internet World Stats, em

2008,

o

número

de

usuários

de

internet

era

de

1,5

bilhões

(http://webcetera.com.br/blog/2009/01/23/usuarios-de-internet-no-mundo-por-pais/), devendo 144


chegar em 2012 a mais de 2 bilhões. No Brasil, segundo a F/Nazca, são 81,3 milhões de internautas brasileiros (a partir de 12 anos). Já para o Ibope/Nielsen, este número é de 78 milhões (a partir de 16 anos - setembro/2011). De acordo com a Fecomércio-RJ/Ipsos, o percentual de brasileiros conectados à internet aumentou de 27% para 48%, entre 2007 e 2011. O Brasil é o 5º país com o maior número de conexões à Internet. (http://tobeguarany.com/internet_no_brasil.php) Nos principais mercados emissores do mundo, a busca pela internet, é atualmente a principal fonte de informação para planejamento de viagens, ultrapassando a consulta a amigos e parentes. Outra tendência importante para os sites de destino é o uso das redes sociais como fonte de informação sobre viagens. Os turistas consideram que o conteúdo gerado pelos usuários destas redes tem mais credibilidade do que as análises de profissionais e empresas de turismo. As pessoas estão preferindo marcas atestadas por consumidores, exemplificado por sites populares em que os internautas podem ler diários de viagens, críticas sobre hotéis, serviços e destinos, como booking.com e tripadvisor,com, entre outros. O crescimento dos blogs sobre turismo, combinados com o uso de vídeos, também tem influenciado as escolhas de viagens. Este item é particularmente útil para o marketing de produtos turísticos que se utilizam destas ferramentas para comunicar a essência do seu destino à distância (OMT, 2011). Outra tendência que deve ser destacada é o uso da mobilidade para o turismo, que já está trazendo mudanças na experiência do viajante. Segundo dados de uma pesquisa realizada pela Tech Travel Consulting Inc, em 2011, com viajantes nas regiões da Ásia, Europa, América Latina, Oriente Médio e América do Norte, um terço desse público já utiliza aplicativos para fazer reserva em smartphones e tablets. Questionados sobre quais serviços usariam por meio dos gadgets móveis, os viajantes entrevistados responderam: 39,9% dos entrevistados usariam para receber alertas, em tempo real, com o status de seus voos; 36,7% para rastrear sua bagagem; 36,3% para acessar a internet dentro do avião e durante o voo; 35,7% para receber direções dentro do aeroporto (portão de embarque, entre outros); 31,7% para realizar o check-in. Dados do IDC revelam que o uso smartphones cresceu 79,7% na base ano a ano (número referente ao primeiro trimestre de 2011) e já há cinco bilhões de dispositivos móveis no mundo todo (www.brasilturis.com.br). Segundo a The George Washington University (2004), o uso da internet e do banco de dados mudou a forma como os negócios turísticos são realizados, alterando o uso dos canais de distribuição com a chegada de novos canais online e a busca de informações via web pela 145


demanda. Experiências anteriores demonstram que a internet tem recompensado os profissionais que sabem mesclar a ousadia com a perfeita compreensão das necessidades e dos anseios do cliente. Assim, para obter a vantagem competitiva, é preciso enxergar a internet não como uma revolução, mas como o catalisador de mudanças anunciadas e desejadas há tempos. Principalmente, é preciso ter em mente que a Internet, apesar de inovadora em muitos aspectos, continua sendo mais uma ferramenta, que certamente traz ótimos resultados para aqueles que souberem combiná-la às outras disponíveis.

Aspectos da Análise Heurística

Segundo DIAS (2003), as heurísticas basearam-se na experiência prática de vários pesquisadores em testes com usuários. Neste trabalho, foram consideradas, em especial, as heurísticas de usabilidade para web de NIELSEN (1993 e 2002), e as recomendações de DIAS (2003) e SANTAELLA (2002), além das indicações da OMT (2003 e 2011). Grande parte das vezes este tipo de análise tem como base um conjunto de heurísticas que são usadas como balizamento para a avaliação de um site. No exemplo abaixo há uma tradução livre feita a partir de uma heurística de NIELSEN (2002): “Pontos de interação não devem conter informações que sejam de baixa relevância ou de difícil utilização. Cada unidade adicional de informação compete com as unidades relevantes e diminuem sua visibilidade relativa.”

A análise heurística, nada mais é do que a análise da interação homem-computador (HCI). Exatamente por ser o elo entre o Homem e o Computador, as interfaces, pautadas nas heurísticas, definem o eixo que deve ser considerado como primordial para o desenvolvimento de websites e, em seu bojo, é necessário considerar os elementos relacionados à sua adequada estruturação: Arquitetura da Informação, Arquitetura de Design, Navegabilidade, Conteúdo e Interatividade, que relacionados entre si, definem a usabilidade de um website.

Arquitetura de Informação (AI) 146


É o design estrutural do espaço da informação para facilitar o acesso intuitivo ao conteúdo de um site e a estrutura de comunicação entre as páginas de um website (ou intranet, ou software ou outro meio digital). A arquitetura da informação permite que os internautas saibam onde estão e para onde podem ir – graças à definição clara do caminho lógico para se encontrar a informação (http://www.usability.com.br/arquitetura.html). A arquitetura da informação deve trabalhar com a estruturação hierárquica do conteúdo e a definição dos fluxos de navegação. O planejamento adequado de todos os fluxos de informação e das funcionalidades de um website torna-o coerente e amigável para o usuário final. Segundo REIS (2005), a Arquitetura de Informação trata da organização da informação para torná-la clara, compreensível. Na web, esse objetivo se mantém: criar as estruturas de organização da informação de um website para que o usuário consiga compreendê-lo com facilidade, ou seja, é responsável por projetar a estrutura, o esqueleto, sobre o qual todas as demais partes irão se apoiar. Ela é o esquema do website sobre o qual todos os outros aspectos são construídos – forma, função, metáfora, navegação e interface, interação e design visual.

Arquitetura de Design (AD) É o design dos elementos da interface para facilitar a navegação do usuário junto ao conteúdo apresentado. Em outras palavras, a Arquitetura de Design é aquilo com que o usuário entra em contato para navegar num site, mesclando o conteúdo e sua estruturação feita pela Arquitetura de Informação, com elementos estéticos e funcionais, tornando a navegação coerente, intuitiva e agradável. Assim, em decorrência dos objetivos do website e de seu público-alvo, a Arquitetura de Design irá estruturar a apresentação da informação de maneira diferenciada, visando, principalmente, tornar a experiência de navegação em algo esteticamente agradável e estruturalmente funcional, valendo-se, para tanto, de elementos de ergonomia, de tecnologia, de marketing, de identidade visual, de elementos gráficos referenciais, de usabilidade e de características comportamentais do perfil do usuário desejado pelo site que, em última instância, irão definir as características que serão valorizadas pelo design. Resumindo, a Arquitetura de Design define a interface entre o usuário e o website. 147


Navegabilidade

Navegação é o resultado do conjunto de funcionalidades de acesso e localização dentro de um website. A navegabilidade considera a estruturação da informação aplicada à Interface Homem-Computador (HCI) e valoriza elementos de design que tornam a utilização / busca de informações no website mais amigável e rápida. Um dos itens da navegação é acessibilidade, que no contexto deste trabalho, foi definida como a capacidade de encontrar o website no universo virtual, normalmente a página de acolhimento no website (homepage). O mesmo conceito deve-se aplicar a outra qualquer página para além da página principal. Esta facilidade tem a sua relevância porque deverá ser fácil para qualquer cidadão encontrar rapidamente o espaço digital do organismo ou serviço da, neste trabalho, Administração Direta e Indireta do Estado que procura para, uma vez lá, identificar a informação que necessita ou solicitar o serviço que deseja. Essencial para cumprir esta missão será o registro do website em vários diretórios e motores de pesquisa, nacionais e internacionais, a promoção do endereço através da sua inclusão em outros websites, e a inclusão do endereço em todas as publicações ou material promocional do organismo.

Conteúdo

Para se elaborar um website atraente e interessante é, antes de qualquer coisa, necessário definir o objetivo do mesmo, tanto em termos de informação quanto em termos de marketing (função, público etc), item fundamental na análise realizada neste artigo. Após esta definição, devem-se buscar estes conteúdos eleitos nas mais diversas fontes, criando-se roteiros de pesquisa e prospecção de informações pertinentes aos objetivos do site. Os conteúdos necessários ao site para ir ao encontro das necessidades do usuário devem considerar o perfil do público objetivado. Segundo NIELSEN (2002), a criação de um conteúdo eficaz é um dos aspectos mais críticos de um website, pois a maioria dos usuários “bate o olho” no conteúdo online, em vez de ler cuidadosamente, ou seja, o conteúdo online deve ser diferenciado do conteúdo inserido em material impresso.

148


Em relação aos sites de destinos turísticos, é fundamental que o conteúdo esteja organizado de forma fácil e atrativa, priorizando as informações que devem ser conhecidas pelos viajantes em potencial (OMT, 2003). Os conteúdos de portais oficiais devem priorizar as informações turísticas e gerais, sendo, as principais: cultura e história; clima; transportes; roteiros; produtos (hospedagem, atrativos, serviços); gerais (segurança, câmbio, legislação); mapas; fotos, vídeos, contato; segurança das transações online; dados do local e links.

Interatividade

Segundo DIAS (2003), a interatividade se resume em diversas formas criativas de se trabalhar usando várias maneiras de interação em uma apresentação, onde o emissor consiga transmitir a mensagem para o receptor. Para se desenvolver qualquer tipo de interatividade é necessário utilizar-se de tecnologias avançadas, através disto, há a possibilidade de um maior controle do receptor pelo emissor, proporcionando um conhecimento maior do mesmo, fazendo com que a interatividade seja benéfica, por exemplo, a uma empresa em seu processo de customer relationship management (CRM) com seus clientes. Os sites interativos geralmente funcionam de acordo com desenvolvimento de cada projeto, mas todos têm o mesmo objetivo de deixar o site personalizado, dinâmico e sempre procurando atender as necessidades do seu internauta ao mesmo tempo em que subsidia de informações o emissor, através, principalmente de novas tecnologias que permitem acompanhar a navegação do usuário, fornecendo informações relevantes a ações customizadas de marketing. Em relação aos sites de turismo, as principais ferramentas de interatividade são: mecanismos de busca em banco de dados interativo; planejador de viagens; pasta pessoal; mecanismos de reserva online; bate-papo / fórum; depoimentos; enquetes e sites personalizáveis.

Usabilidade

Usabilidade é a eficiência, eficácia e satisfação com a qual os públicos do website alcançam seus objetivos. É o somatório dos elementos de conteúdo, de arquitetura da

149


informação e de arquitetura do design, e que, em ultima instância, verifica se o usuário do website consegue ou não executar uma tarefa com sucesso durante o processo de navegação. Conforme NIELSEN (1993), os cinco atributos da usabilidade são: facilidade de aprendizado, eficiência de uso, facilidade de memorização, baixa taxa de erros e satisfação subjetiva. Em outras palavras, usabilidade é a avaliação geral do funcionamento do website em termos estruturais, estéticos, funcionais e tecnológicos. Se estes elementos estão integrados de modo eficiente e amigável, possibilitando o acesso à informação desejada, de modo intuitivo e amigável, considera-se que o website tem boa usabilidade e atende às necessidades tanto de quem oferece a informação (website) quanto à de quem procura pela informação (internauta). Em ultima instância, segundo a OMT (2011) o planejamento de site de destino deve contemplar técnicas de marketing eletrônico para responder as principais necessidades dos clientes de turismo, nas diversas fases de uma viagem: fase 1 – sonhar e selecionar; fase 2 – planejar; fase 3 – reservar; fase 4 – visitar e fase 5 – pós-viagem. Análise heurística do Portal Oficial do Turismo Brasileiro – www.braziltour.com

O Portal Oficial do Turismo brasileiro (www.turismo.gov.br) foi lançado em sua primeira versão em 2003 e segunda versão em 2005, como meta principal do GT de Governo Eletrônico do Ministério do Turismo (MINISTÉRIO DO TURISMO, 2005). Desde 2004, as diretrizes para o portal de turismo estão sendo guiadas pelo Plano Aquarela, que é a ferramenta oficial do marketing turístico internacional do Brasil, e a partir de 2005, com o foco de implementar novas estratégias de imagem e posicionamento do destino Brasil no mercado internacional que pudessem ser aplicadas em todos os mercados, foi lançado o Portal de

Turismo

internacional,

o

(www.braziltour.com),

que

juntamente

com

o

(www.turismo.gov.br) (institucional) e o (www.brasilnetwork.tur.br) (relacionamento com o trade turístico) compõem os canais de acesso virtual aos serviços e informações oficiais do turismo brasileiro. A versão do site considerada neste artigo está no ar desde fevereiro de 2011 (MTur, 2012), e foi analisada entre dezembro de 2011 e abril de 2012.

Arquitetura da Informação, Arquitetura de Design e Navegabilidade

150


Desde uma perspectiva top-down do site, ou seja, um olhar de cima para baixo, foi averiguado que sua estrutura informacional é deficiente, pois ela surge, primeiramente, como imagem animada transmitindo idéias de cenários brasileiros, para depois dar continuidade aos aspectos regulares de uma página da internet. A home tem uma sequência impactante, pois começa construindo uma relação emocional, com um vídeo intitulado “o Brasil te chama, celebre a vida aqui!” que mostra uma casal de turistas estrangeiros conhecendo os principais atrativos do país e vivenciando experiências nestes lugares, como mergulho, banho de mar, prática de esportes e esportes de aventura, música, em

cenários paradisíacos, ou seja, trabalhando com signos icônicos,

dispensando os indiciais que ofereceriam roteiros de navegação pelo site, para logo em seguida abusar do simbólico, da convenção e do cultural, como por exemplo, a presença de banners dos principais nichos. Os dois pólos – icônico e simbólico – que são fortes no site contrastam um pouco entre eles. Na tela do vídeo, também podem ser acessados: lista com cidades da Copa e vídeos no canal YouTube. O logo marca Brasil, localizada na parte superior esquerda, fica visível em todas as páginas do site, com bastante exposição. Através dela é possível voltar para home, de qualquer página do site. De acordo com Chias (2007): “A criação da marca Brasil foi, inicialmente, resultado das decisões estratégica tomadas no Plano Aquarela, e estruturada sobre um excelente trabalho de análise da imagem e do posicionamento atual do Brasil perante os turistas internacionais e potenciais dos dezoitos países emissores mais importantes do mundo para o país”

A marca turística foi inspirada na capa de um livro sobre a obra de Burle Marx, e de acordo com o Plano Aquarela, possui a capacidade de competir no mercado internacional por se destacar entre os conjuntos de marcas mais importantes do mundo. Suas cores representam cenários e ícones brasileiros: o vermelho representa as festas populares, o verde as florestas, o amarelo, sol e luminosidade, e o azul o céu e mar. Hoje o logo marca Brasil tem presença em todo material promocional produzido para o mercado exterior e foi adotada pela Apex-Brasil (Agência de Promoção de Exportações e Investimentos), estampada em milhares de produtos de exportação brasileiros (Plano Aquarela, 2007-2010). Abaixo da marca está o slogan “Sensacional!”, também chamada de mensagem permanente, que segundo o Ministério do Turismo (2010), sintetiza a experiência do turista no Brasil, declarada em pesquisas realizadas com turistas em visita ao país, quando foi identificado um alto nível de satisfação com a visita. 151


Em relação a Arquitetura de Design, é nítida a apropriação de referências do logo marca Brasil, com a presença das cores, que destacam a escolha do idioma e do link para os outros portais do ministério, e dos elementos orgânicos, sobressaindo as curvas que aparecessem na parte superior da home e que separam os textos nas páginas internas. A estrutura encaminha o internauta para acessos de interesse do turista com elementos de relacionamento, que estão logo abaixo da parte superior da home. Os links que se seguem são: Sobre o Brasil, Multimídia, Dicas ao turista, Tire suas dúvidas, Contato, o que mostra o pouco cuidado com a arquitetura de informação. Logo abaixo estão os ícones representativos dos segmentos eleitos prioritários pelo governo federal: Sol e praia, Esporte, Ecoturismo, Cultura e Negócios e eventos. Porém, esta divisão por segmentos mostra-se um pouco confusa, quando, logo abaixo do vídeo, estão localizados banners de acesso ao Turismo náutico, Golfe e Patrimônios da humanidade do Brasil, que são nichos destes segmentos iconizados. Seria mais interessante que o Mapa de destinos, e o banner O que você está procurando no Brasil, seguidos dos ícones dos segmentos, estivessem localizados em áreas mais estratégicas, e não escondidos na parte inferior da home. Reforçados por um box com um destino em destaque, outro com destinos rotativos em destaque e um com acesso às redes sociais, compõem o conjunto de navegabilidade. Todos estes elementos são utilizados com pouca interatividade, restrita ao acesso aos vídeos e fotos, mecanismos de busca interna, formulários para informações e links para as redes sociais. Novamente, o site se encaminha para um lado menos funcional e mais emocional, oferecendo signos icônicos como atrativos de visitação. A funcionalidade, extremamente ligada à navegabilidade, talvez se encontre mais no eixo do índice, quer dizer, um site que tem condições de mostrar, apontar caminhos para o internauta, de maneira mais fácil, mais cômoda, que lhe preste uma assistência direta ao lhe oferecer direções simples e encaminhá-lo pelas conexões mais interessantes para ele. A troca de idioma é relativamente simples, com a possibilidade de troca, em destaque, na parte superior central da home, com possibilidade de visualização em português (versão Brasil e Portugal), inglês (versão americana e UK), espanhol, francês e alemão, privilegiando os mercados emissivos já tradicionais para o país. A construção da linguagem não se altera, sendo de fácil compreensão ao internauta, no entanto, alguns textos em inglês, segundo o jornalista Seth Kugel, colunista do portal IG, em março de 2012, apresentavam traduções incompreensíveis:

152


“O site existe também em espanhol, francês, italiano e alemão, mas eu não sei avaliá-los. O que posso dizer é que o inglês é péssimo.(...).Vamos para alguns exemplos. As primeiras mensagens que aparecem são:“Brazil has scheduled its stars to the 2014 World Cup” e depois “Click here and get to know our Cities Selection”. Li as duas frases pelo menos 20 vezes sem consegui entender nenhuma das duas. Será que o primeiro significa “As estrelas da seleção brasileira vão estar presente na Copa do Mundo”, pensava. Ou talvez “As estrelas do céu estão alinhadas para a Copa ser maravilhosa”?A segunda parte também foi difícil. “Cities Selection” significa o quê? Deve ter algo a ver com as cidades que vão receber a Copa, mas o quê exatamente? Fiquei perplexo.” (http://colunistas.ig.com.br/viagens/)

Questionada sobre os problemas apontados no site, a Embratur, por meio de sua assessoria de imprensa, informou que estes erros de tradução já tinham sido identificados, afirmando que a empresa prestadora de serviço iria trocar seus tradutores e revisar todo o conteúdo do site (http://colunistas.ig.com.br/viagens/ ). Em termos de navegabilidade, uma consulta no Google, sistema de busca mais utilizado no planeta, do termo “tourism in brazil” retornou a página da Braziltour encabeçando a lista, seguida por Wikipedia, Embratur, guia privado e Ministério do Turismo, o que resulta num excelente retorno para o website estudado, em particular e pelos órgãos responsáveis pelo fomento ao turismo no país.

Conteúdo e Interatividade No geral o conteúdo não se mostra alinhado ao que deveria ser o objetivo do site – fornecer informações turísticas – pois, apesar da existência de textos informativos, variando com explicativos, mostrando a existência de lugares, explicando as possibilidades de aventuras, as informações são escassas, algumas vezes desatualizadas e pouco provocativas. O portal não é conceitual, ou seja, ele não trabalha, necessariamente, os valores da marca Brasil, com exceção do design e cores, não ressalta as características mais subjetivas, nem seu conteúdo, ou a arquitetura da informação, estão direcionados para este caminho. Normalmente, excetuando-se os textos puramente informativos, valoriza-se como conteúdo às qualidades do povo brasileiro, às belezas naturais e ao folclore, como atividades tipicamente brasileiras – por isso mesmo, o tom é sempre ameno, nada formal e sua

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linguagem tem características didáticas, talvez, por isto a repetição seja um recurso bastante usado no site. Quando se fala em conteúdo, pode-se incorrer no erro de achar que só se deve olhar para os textos escritos, mas as imagens constituintes do site oferecem qualidades, hipóteses e argumentos que devem ser analisados. Foi observado que as imagens informam mais do que argumentações positivas, elas reforçam determinados estereótipos, como por exemplo: São Paulo é metrópole; Amazonas é exótico; Minas Gerais é barroco ou rococó; Ceará é do jangadeiro, praias e natureza, assim como outras partes do Norte e Nordeste. O conteúdo destas imagens é orientado para propor argumentações extremamente válidas ao turista, que busca formar uma imagem do país, saber o que irá encontrar, as possibilidades de entretenimento e assim por diante, porém, tais argumentações apenas reforçam os estereótipos tão divulgados no exterior. Mas há de se prestar o devido deferimento ao site, pois em momento algum ele faz alusão ao turismo de cunho sexual, não explora imagens com tal teor, nem seus textos abordam esta questão. No geral, a usabilidade do website é bastante restrita, limitando-se a informações básicas ao turista, com pouco aprofundamento na apresentação dos destinos e nas dicas de viagens. Em relação à interatividade, o portal ainda oferece poucas possibilidades, pois além da newsletter e de um sistema de busca básico, não existe a possibilidade de realizar reservas online, assim como não há planejador de viagens, consultas online, fóruns e depoimentos. O trabalho nas redes sociais acontece de modo incompleto, sendo o Youtube único bem elaborado, com vários vídeos disponíveis sobre o país. No Flickr, canal que abriga fotos, existe a galeria do Visit Brasil, com o upload de quase 1000 fotos dos principais atrativos do país. Entretanto, não existem informações sobre serviços e infraestrutura, além do baixo índice de comentários. O relacionamento se dá também por uma conta no Twitter, onde são postadas, principalmente, mensagens sobre eventos e destinos brasileiros, além de uma página no Facebook, onde é possível curtir o Brasil e inserir comentários. Pelo aspecto virtual, é possível alguém começar uma experiência que reforce positivamente a marca Brasil dentro do ambiente oficial do turismo, pois as informações básicas sobre o destino existem, mas a continuidade do relacionamento se mostra vaga e pouco acessível. O caminho provável para o turista será buscar fontes externas, as quais não sofrem influência da comunicação de marketing oficial.

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Considerações Finais

Como já mencionado, este artigo buscou analisar a usabilidade do portal oficial do turismo brasileiro, através do diagnóstico de elementos heurísticos. A análise heurística de sites de destinações turísticas deve enfocar a interação do usuário com a interface, ou seja, o internauta deve conseguir, de forma eficaz, estabelecer uma ligação com o site ou portal, através do uso de ferramentas disponíveis, produzindo satisfação e produtividade na execução das atividades requeridas, como reserva, acesso a informações específicas, entre outros. O que foi verificado é que a interatividade ainda é pequena, bem como o uso das mídias sociais. Pior é a ausência de referência aos universos offline (mídias tradicionais) e ações de comunicação publicitária, se existirem. O pequeno uso das mídias sociais integradas aos websites estudados demonstra a falta de investimento necessário para a manutenção de uma equipe especializada somente neste tipo de abordagem, denotando a baixa integração e planejamento da comunicação de marketing. Em relação ao atendimento das necessidades dos turistas em todas as fases da viagem, notou-se que elas não são plenamente satisfeitas. O portal traz inúmeras imagens e alguns vídeos, com cenários e situações que motivam o imaginário do potencial viajante a sonhar e selecionar o Brasil como destino. Entretanto, para as fases seguintes o conteúdo e a interatividade disponíveis não são suficientes, pois não facilitam o planejamento com informações atualizadas sobre serviços, facilidades e infraestrutura, além disso, o site não oferta ferramentas especificas para organização da viagem, e nas redes sociais não há espaço para troca de conteúdos entre os turistas. No que se refere às reservas de serviços e equipamentos, mais uma vez não existem ferramentas específicas, sendo impossível realizar buscas de produtos, ou comparar preços e disponibilidade entres diversas possibilidades. O mesmo acontece durante a estada dos turistas no Brasil, quando a oferta de serviços virtuais poderiam ser um diferencial do portal. Mais uma vez, nota-se a ausência de mecanismos de planejamento, ofertas, informações e ferramentas específicas que tornem viagem do usuário mais fácil e agradável. Outras aplicações interessantes para geração de conteúdo e interatividade seria incentivar o uso de “mash-ups”, ou seja, a combinação e modificação de conteúdos de diversas fontes, abrindo os mapas e Flickr, por exemplo, para os turistas compartilharem suas informações e experiências.

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Para o relacionamento pós-viagem, além do uso das redes sociais, são necessárias medidas mais efetivas para manter a comunicação com o turista. Pesquisas de satisfação no próprio portal, possibilidade de geração de conteúdo, criação de blogs específicos e outras ferramentas de interatividade, sempre sob a tutela dos gestores, poderiam ser disponibilizados com o intuito de aumentar cada vez mais a capacidade de repercussão positiva do país. Enfim, tudo tem um início e ainda há muito a ser feito quanto a construção da marca país Brasil. Mas é importante perceber que finalmente o país começa a praticar ações de um player global em áreas estratégicas, semeando seu futuro como um país que, além de exótico, é desenvolvido e contemporâneo. Seja no turismo, na cultura, na economia, nos negócios, na qualidade de vida. A marca Brasil está em construção. As sugestões ou recomendações feitas neste trabalho são referências a estas boas práticas e devem ser avaliadas e contextualizadas. Sua implementação, portanto, deve ser conseqüência da percepção de sua relevância segundo um dado contexto, não sendo percebidas como regras inflexíveis. As boas práticas de usabilidade evoluem com o tempo, com as tecnologias e com o feedback dos usuários. Referências BONIN, M. V. Tecnologia de comunicação e informação e as adequações do mercado de distribuição de produtos turísticos. São Paulo: ECA/USP, 2003. Dissertação de mestrado. CARTER, R. Value for tourism destinations on the web: the portal potential. In: International Conference on Information and Comunications Technologies in Tourism, 5, 2001. Presentations, 2001. Disponível em: <http://www.enter2001.org>. Acesso em 09 de junho de 2008. CHIAS, J. Turismo, o Negocio da Felicidade. São Paulo: Ed. Senac, 2007. COSTA, L.A.A. Internet: um canal de vendas : um estudo de caso em agência de viagens online. São Paulo: FEA/USP, 2001. Dissertação de mestrado. CHAGAS, M. M ; DANTAS,A. V. A imagem do Brasil como destino turístico nos websites das operadoras de turismo europeia. In: Observatório de Inovação do Turismo – Revista Acadêmica. Volume IV – Número 2 – Junho de 2009. Disponível em <<http://www.fgv.dr/observatorioacademico>>. Acesso em 22 de fevereiro de 2012. DIAS, C. Usabilidade na Web - Criando Portais Mais Acessíveis. Rio de Janeiro: Alta Books,2003. DRAMALI, Bianca Leite. O mito de um novo país: Brasil no intervalo comercial. In: Anais do XXXIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação realizado de 2 a 6 de setembro de 2010. Caxias do Sul:INTERCOM, 2010. KOTLER, Philip; GERTNER, David...et al. Marketing de lugares: como conquistar crescimento de longo prazo na América Latina e no Caribe.São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2005. 156


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A expressividade estética do site de artistas brasileiros internacionais como forma de representação/divulgação da marca Brasil Fábio Caim

Introdução

Entender a marca de um produto ou serviço em suas dimensões de contato com o consumidor é uma tarefa complexa e envolve grande investimento por parte das organizações. Quando a marca atinge uma escala continental, como é a marca Brasil, então a tarefa é ainda mais hercúlea do que se poderia imaginar. Compreender o Brasil como uma marca é uma decisão inteligente, para que se possa mudar a forma como os players internacionais enxergam nosso país. Desta forma, este trabalho se propõe a analisar se os sites de artistas brasileiros renomados internacionalmente na área de artes plásticas conseguem estabelecer vínculo com a marca Brasil, divulgando-a e disseminando-a em outros mercados, onde eles atuem. A proposta é bastante simples e parte da perspectiva de que são os produtos culturais de um país, que efetivamente possibilitam sua entrada em outras culturas e territórios. Sendo assim, esta análise terá como objetivo desvendar se os sites dos artistas indicados são uma ponte de acesso aos conceitos do país, divulgados pelo Ministério do Turismo, em seu manual da marca Brasil.

A marca Brasil

A marca é uma construção semiótica interessante, porque se faz pelo encadeamento de diversos signos, que atuam como uma trama de marketing e comunicação revestindo bens tangíveis e intangíveis de significados. A marca é, em essência, a camada comunicacional do produto, que se estende além dele e por isso ela plasma, identifica, distingue, protege, valoriza e segmenta produtos. Também, a marca é uma forma de conexão simbólica e afetiva estabelecida entre uma organização, sua oferta material, intangível e aspiracional e as pessoas para as quais se destina. (Perez, 2004: 10). A marca é uma representação, ou melhor, ela se constitui como um conjunto de representações, que são construídas e gerenciadas por organizações empresariais, com objetivos específicos e que em seu fim último devem visar o lucro. Contudo, estes construtos também sofrem interferências colaterais que são as próprias significações que seus usuários vão lhe conferindo. 161


Portanto, uma marca não é só uma construção empresarial, ela é também uma forma de expressividade individual, que comunica sentidos de uma individualidade compartilhada pelos próprios usuários da marca, ou por aqueles que não a usam, mas a reconhecem. Nesse sentido, a marca percorre e encabeça um espaço semântico. Segundo Batey (2010: 137-142), o espaço semântico além de ser um conceito é também uma técnica de pesquisa por composição dicotômica, ou seja, aplica-se uma metodologia por oposição de sentidos, em que o entrevistado deve escolher entre um sentido positivo ou outro negativo relacionado à alguma marca. Essa técnica foi desenvolvida por C. E. Osgood, G. Suci e P. Tannenbaum, que eram psicólogos interessados em como traduzir os valores, a potência e a atividade (considerados como dimensões por eles) das relações dos indivíduos com as marcas que consumiam. No entanto, mais além da técnica interessa-nos o conceito de espaço semântico, como o campo delimitador de significados da marca. Ou seja, entender que determinadas marcas carregam significados plurais, mas não ilimitados e muito menos apenas dicotômicos. Estes significados, por sua vez, podem ser compreendidos como estabelecendo ou sendo contidos dentro de um espaço semântico, ou campo de influência da marca. O espaço semântico da marca é construído pelas estratégias de marketing da organização, especialmente, aquelas que envolvem comunicação. É através destas ferramentas que é possível gerenciar quais sentidos a marca deve transmitir aos seus consumidores. Em nossa sociedade a marca é uma maneira de compor aquilo que somos. Ela se interliga a outros significados realimentando o que somos ou desejamos ser. Vestir e usar uma marca são ações de demonstração de nossas singularidades, que perpassam o espaço semântico dela. São expressões sutis ou explícitas de algo que pretendemos apresentar como nosso, por meio daquilo que compramos dos outros. Esse consumo que toma proporções inacreditáveis em nossa sociedade assume, de forma simplificada, cinco aspectos segundo análises de Semprini (2010: 58-68). Estes aspectos são considerados como dimensões, que são: o individualismo, o corpo, a imaterialidade, a mobilidade e o imaginário. Dos cinco temas discutidos por Semprini (2010), o mais relevante para nossas análises é o do imaginário. Enquanto que na modernidade os relatos e discursos estavam sempre muito associados ao pragmatismo, à produção industrial e à materialidade, na contemporaneidade as narrativas tendem para a fantasia, exploração da criatividade, da expressão pessoal e da procura por sentido, o que constitui uma dimensão onde o consumo ocorre e a qual ele chama de imaginário. Ainda segundo Semprini (2010: 58-68) o crescimento das mídias foi um dos grandes motivadores 162


dessa temática do imaginário, especialmente, com a explosão dos reality shows que borraram ainda mais a relação entre real e ficção. Por sua vez, também, possibilitaram a criação de novos mundos embasados em práticas cognitivas e midiáticas. Sobre esse assunto, fala-se de atividade de world-making, de – construção de mundos – (Goodman, 1978) (...) Esses mundos funcionam, então, como verdadeiros relatos, que ajudam os indivíduos a dar um sentido à sua experiência e a orientar sua escolha e suas ações. (...) o universo do consumo, e principalmente as marcas que o habitam, representa um papel importante na produção de mundos possíveis e que os indivíduos podem, eventualmente, decidir se apropriar desses mundos. A partir de um esquema de funcionamento análogo ao de outros lugares de produção imaginária (a literatura, a arte, o cinema), o consumo e as marcas apropriam-se de territórios, desenvolvem temas, constroem relatos atraentes, dotados de sentido para os indivíduos. (SEMPRINI, 2010: 58-65).

É dentro desta dimensão do imaginário, discutida por Semprini, que a marca Brasil ou country brand (termo cunhado pela consultoria Future Brand13) se desenvolve. Isto é, explorando a construção de um mundo imaginário, que faça sentido e seja atraente para os seus consumidores. A marca faz uso do próprio território imaginário que cerca o país, para se desenvolver como vendável ao mercado internacional. Segundo a consultoria Future Brand, em seu relatório Country Brand Index 201014, o país se torna uma marca poderosa quando consegue se distinguir em cinco dimensões: Turismo; Herança e Cultura; Habilidade para os Negócios; Qualidade de Vida e Sistema de Valores. Tendo como base estes sentidos a Future Brand desenvolve um relatório anual com ranking para cada dimensão. O Brasil não aparece em nenhuma posição efetivamente expressiva, mas é inegável que o país tem se esforçado em desenvolver estratégias para vender a marca. Por exemplo, o Ministério do Turismo desenvolveu um manual da marca Brasil, que pode ser consultado por qualquer um em seu site15. Este manual traz informações sobre como deve ser a aplicação da marca (do layout), suas cores, dimensões e outras características técnicas, além de uma pequena introdução conceitual, conforme transcrição abaixo.

Nada representa tão bem o Brasil quanto a curva. A sinuosidade das montanhas, a oscilação do mar, o desenho das nuvens, das praias. A alegria de nosso povo é carregada de subjetividade, e a subjetividade é curva, assim como a objetividade é reta. A curva envolve e aconchega, é receptiva. Quem vem ao Brasil sentese imediatamente em casa. 13

Future Brand – www.futurebrand.com – acessado em 02/02/2012. Ibid. 15 Ministério do Turismo – www.turismo.gov.br 163 14


O Brasil também é um país luminoso, brilhante e colorido. Conta-se que os astronautas que circundaram a terra observaram que o Brasil é o lugar mais luminoso do planeta. Mito ou realidade, sabemos que o Brasil tem uma energia especial, que atrai e fascina os visitantes. É um país alegre. É comum ouvir dos estrangeiros que o brasileiro está sempre em festa! (Ministério do Turismo, 2010)

Sem preocupações efetivamente acadêmico conceituais, a citação acima expressa uma opinião apaixonada pelo país e tece significados dicotômicos, portanto simplistas entre o layout e seus sentidos. Estabelece a curva como o padrão comportamental da logomarca, porque ela expressa descontração, flexibilidade e subjetividade. De certa forma, repete o imaginário que há sobre o Brasil e seu povo, pois não há como esquecer, que o sexo também é sinuoso, curvo, subjetivo e aconchegante e por muito tempo o país era visto como um lugar para fazer turismo sexual. O logo também carrega um slogan bastante objetivo, mas muito emocional: Sensacional! Reforça a característica de surpresa e promove o encontro de sensações prazerosas. As formas curvas que se sobrepõem transmitem a ideia de fluxo, de continuidade e ao mesmo tempo de diversidade. A mescla, ou a miscigenação conforme a citação acima compõe o imaginário de um país tolerante e, principalmente, alegre em suas produções culturais. Portanto, usando como base a construção de uma dimensão do imaginário provocada pela marca Brasil e levando em conta seu espaço semântico é que analisaremos os sites dos seguintes artistas brasileiros: Romero Britto, Vik Muniz, Os Gêmeos (Gustavo e Otávio Pandolfo) e Adriana Varejão. Estes artistas foram escolhidos por terem

suas

obras

e

estilos

divulgados

internacionalmente tanto em galerias de artes, em publicações especializadas, em museus internacionais, patrocinados

como por

grandes

em

projetos

marcas.

Por

consequência são artistas com excelente entrada no cenário internacional das artes e de certa forma levam consigo e disseminam a imagem do Brasil. Consequentemente, o objetivo desta proposta é verificar se a marca Brasil, com seu espaço semântico é capaz de ser transmitida por meio desses artistas brasileiros com visibilidade internacional. 164


Os artistas e a marca Brasil

A marca Brasil é um símbolo, ou seja, uma representação convencional do objeto Brasil. Convencional, pois foi construída e socialmente aceita como capaz de representar em parte o que o país significa, ou deve significar. O símbolo, de acordo com a perspectiva da semiótica peirceana estabelece uma relação por imposição cultural e social com o seu objeto (o país Brasil). Esta relação, por sua vez, quando pensada a partir do intérprete (quem interpreta o signo) se dá por proposições e argumentos (também, da perspectiva da semiótica peirceana). Os argumentos que chegam ao intérprete, conduzidos pelo signo marca Brasil, correspondem aos conceitos desenvolvidos para a marca, pelo Ministério do Turismo, mais todos os outros sentidos, que colateralmente o intérprete já carrega sobre o país. Contribuindo com a experiência colateral que o intérprete pode ter sobre o país estão diversos dispositivos, ou ferramentas. Para este trabalho interessa-nos estudar uma ferramenta específica de comunicação, que é site do artista. Portanto, são os sites dos artistas brasileiros internacionais e como seus layouts podem contribuir com a valorização da marca Brasil, que interessarão a esta análise. Os admiradores e ou compradores das obras dos artistas são, potencialmente, consumidores da marca Brasil. Então, devemos entender consumidores, nesta situação, como o público internacional que “compra” de uma forma ou de outra a marca Brasil, seja por meio de pacotes turísticos, ou por meio de produtos oriundos do país, inclusive, produtos culturais como obras de arte. Os sites escolhidos para serem analisados são dos artistas já citados, pois servem como plataforma não apenas de negócio, mas também de visibilidade e compartilhamento daquilo que o artista faz, que invariavelmente carrega índices daquilo que ele é e de onde veio. Romero Britto (www.britto.com.br) é um destes artistas plásticos brasileiros, que se tornou expoente em sua área, contribuindo assim para a divulgação da marca Brasil. De acordo com a biografia divulgada no site, Romero Britto nasceu em Recife, em 1963 e se mudou para Miami, em 1988, cidade em que vive atualmente e onde se consagrou como artista internacional. Trabalhou em diversos projetos com marcas conhecidas, entre elas: Absolut Vodka's "Absolut Art" campaign, Audi, Bentley, Disney, Technomarine, Evian e FIFA. Sua obra já foi exposta nos seguintes países: Estados Unidos, Emirados Árabes Unidos, Alemanha, Porto Rico, Panamá, China, Áustria, Itália,

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Coréia do Sul, Chile, Suiça, França, Mônaco, Holanda, Inglaterra, Canadá, Japão, Venezuela, Colômbia, Suécia, Brasil. Vik Muniz (www.vikmuniz.net), o outro artista (artista plástico) brasileiro expatriado participante da amostra desta análise, nasceu em 1961 em São Paulo e atualmente reside em Nova York. Suas obras já foram expostas em vários países: Espanha, Itália, França, Portugal, Coréia do Sul, Japão, Alemanha, México, Rússia, Canadá, Ucrânia, Irlanda, Suíça, Estados Unidos, Holanda, Suécia, Havaí, Áustria, Colômbia, República Dominicana, Inglaterra, Chile, Brasil. OSGêmeos (www.osgemeos.com.br) – Gustavo e Otávio Pandolfo, nascidos em 1974, na cidade de São Paulo onde residem atualmente, têm no grafite seu expoente artístico, que os tornou mundialmente conhecidos, expondo em países como: Estados Unidos, Holanda, Itália, França, Japão, Suíça, Alemanha, Inglaterra, Cuba, Grécia, Escócia, Brasil. Por fim, Adriana Varejão (www.adrianavarejao.net/site#/) reside no Rio de Janeiro e é uma artista que cria pinturas e esculturas, tendo nascido em 1963, também na capital carioca. Suas obras já foram expostas em países como: Inglaterra, Japão, Estados Unidos, Espanha, Portugal, Suécia, Holanda, Turquia, Alemanha, México, Itália, Romênia, Austrália, Finlândia, Canadá, República Tcheca, Dinamarca, França, Brasil.

Os sites dos artistas e a marca Brasil

Romero Britto O primeiro site a ser analisado é do artista Romero Britto (www.britto.com.br) reconhecido mundialmente por suas obras coloridas, alegres, divertidas e geometrizadas. Há um humor infantil nas peças que ele cria. Sua elaboração mantém certa identidade extremamente fácil de ser reconhecida. Além disso, a apresentação em português como língua oficial é uma estratégia interessante, mas que não é valorizada no layout do site. O interessante na obra de Romero Britto é como sua arte se presta ao uso por grandes marcas. Talvez, a vibração das cores aliada ao elemento infantil valorize e dê visibilidade à marca. Alguns projetos interessantes podem ser vistos nas imagens abaixo:

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Seu site, em contrapartida, é bastante simples. Todas as seções estão sobrepostas a um fundo azul. No cabeçalho existem as opções de botões, que levam para algumas seções dentro do site. Ao clicar em algum botão há apenas uma mudança no centro da página em uma composição simples de imagem à esquerda e texto à direita.

O fundo azul remete indicialmente à marca Brasil, porém o site carece de atrativos que sejam interessantes para divulgar o país. Sua arquitetura simplista empobrece o espaço semântico da marca Brasil, pois traduz um sentido ingênuo e sem sofisticação. Por sua vez, o logotipo de marca Brasil foi desenvolvido em cima de uma perspectiva de movimento e sobreposição traduzindo um sentido de profundidade e complexidade. O site de Romero Britto apenas informa e negocia as obras do autor, sem fomentar nenhum tipo de discussão sobre seu repertório ou suas influências, portanto, sobre sua origem. 167


O incentivo a compartilhar o site pelas redes sociais (facebook e twitter) se dá por meio de uma boneca de braços abertos colocada ao lado dos links. A ideia, também, simplista de que o abraço reforça uma condição sentimental, que é o eixo de qualquer comunidade. Enfim, o conjunto da obra do Romero Britto, com certeza, remete ao Brasil em seu aspecto de alegria, jovialidade e carnaval. Entretanto, o site se apresenta de maneira pobre e pouco contribui com o espaço semântico da marca.

Vik Muniz O outro expatriado é o Vik Muniz (www.vikmuniz.net), que nasceu em São Paulo e vive e trabalha em Nova York. Seu site é consideravelmente mais sóbrio e profissional, do que o do Romero Britto. O destaque maior é dado para a composição da obra, ocupando 2/3 da página, enquanto a parte textual fica com apenas 1/3. Além disso, a parte gráfica possibilita certa interatividade para o internauta, que ao passar o mouse sobre o pontilhismo identifica links para as demais obras, que aparecem na seção Gallery.

O uso das cores é simplista e essencialmente trabalha com 3, que são: roxo, preto e cinza. Nenhuma destas cores têm relação com a marca Brasil. O site deste artista apresenta uma sobriedade, que de forma alguma se relaciona com o conjunto de conceitos desenvolvidos pelo Ministério do Turismo, para promover a imagem do país. O pontilhismo como cartão de visita do site é sofisticado, inteligente e transmite elegância, até porque gera um efeito visual diferenciado, mas tanto o pontilhismo como este efeito não estabelecem nenhum tipo de relação com a identidade visual da marca Brasil. 168


Outro fato que destoa da identidade brasileira é que o site se apresenta em inglês, sem possibilidade de tradução para o português. O artista até valoriza seu local de nascimento no texto introdutório do site – Welcome to Vikmuniz.net. Vik was born in Sao Paulo, Brazil - entretanto, o nome da cidade e do país estão escritos em inglês. Apesar de ser um artista brasileiro bastante expressivo internacionalmente sua apresentação não agrega nenhum tipo de valor à marca Brasil.

OSGêmeos Os irmãos Gustavo e Otávio Pandolfo conhecidos internacionalmente como “OSGêmeos” são artistas de rua, grafiteiros que transformam os espaços urbanos em galerias ao ar livre.

O site (www.osgemeos.com.br) assume configuração de blog, pois apresenta uma diagramação vertical e cronológica, ou seja, postagens que seguem uma ordem baseada na data de sua inclusão, que é uma característica deste formato de diário encontrado na internet. De aparência simples, o site traz os trabalhos mais recentes desenvolvidos pelos OSGêmeos, mas sem maiores preocupações com explicações. O fundo é branco e o impacto maior fica a cargo dos grafites realizados e outros projetos desenvolvidos. Apesar da pouca proximidade estética com a marca Brasil, o site se relaciona bastante com seu espaço semântico, pois é irreverente, alegre, complexo, diferente e diverso. Várias postagens referem-se a projetos desenvolvidos no Brasil, com tradução dos textos para inglês. Contudo, o português é o idioma principal no site dos “Gêmeos”. 169


A irreverência é característica predominante da obra, que traduz a realidade cotidiana em fantasia

fantástica.

Esteticamente o site se afasta por completo da marca Brasil, pois seus elementos

não

se

encontram na construção das páginas, por exemplo, as cores da marca não são encontradas no site ou mesmo Entretanto,

nas

obras. conforme

afirmado acima, há um tangenciamento entre o espaço semântico da marca Brasil e o espaço semântico da arte dos OSGêmeos, contribuindo assim para a disseminação do país. Um aspecto importante a ser considerado nesta situação é que o português é o idioma principal, portanto, o site se torna pouco convidativo para o público internacional e neste sentido não é uma ferramenta institucional de divulgação interessante para o Brasil.

Adriana Varejão Por fim, a última artista desta análise é a Adriana Varejão, que reside no Rio de Janeiro (www.adrianavarejao.net/site#/). Adriana é artista plástica, com trabalhos em pintura, fotografia e desenhos. Seu site parece traduzir suas obras – minimalista, sóbrio e monocromático. O fundo é de

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um azul desinteressante, com a tipologia em branco, sendo que a fonte é bastante diminuta mediante o tamanho da página. Por exemplo, na seção abaixo, que apresenta parte de suas obras há apenas um título, o ano a reprodução imagética da obra. Novamente, parece não haver nenhuma relação institucional entre o site e a marca Brasil, apesar da artista ser respeitada internacionalmente. Ao contrário do site dos OSGêmeos o da Adriana Varejão não estabelece vínculo semântico com a marca Brasil, já que suas obras apresentam uma seriedade compacta, com propostas bastante objetivas e definidas.

Visualmente o site é simplista e desinteressante, serve apenas como portfólio online das obras e, nitidamente, não possui nenhuma outra função.

Considerações finais

É fato de que o desenvolvimento do manual da marca Brasil, pelo Ministério do Turismo, é um instrumento interessante e importante de condicionamento e organização do logotipo, para divulgação do país, porém, com base nas análises desenvolvidas fica nítido de que se faz necessário uma amplitude de estratégias de marketing mais coerentes e eficientes, para que a marca possa se disseminar esteticamente e semanticamente. Nenhum dos sites da amostra possui relação explícita com a marca Brasil, nem ao menos a ostentam em suas páginas. Dois artistas residem nos Estados Unidos e os outros no Brasil. Fica 171


claro que o Ministério do Turismo não tem foco na promoção da marca como um selo de originalidade e diferenciação, ela é apenas um logotipo desenvolvido para assinar peças publicitárias. Por sua vez, os artistas analisados também não demonstram nenhuma preocupação em vincular suas produções ao seu país de origem. De fato, seria de se pressupor que esta vinculação fosse uma ocorrência natural, até para aproveitar o momento positivo que o Brasil vive no cenário internacional. O ponto comum aos sites analisados é a falta de sofisticação e a opção por um material de divulgação simplista, objetivo e informativo. Apenas o site do Romero Britto apresenta um foco em construção de negócios; já os demais são meramente expositivos servindo como portfólio virtual dos artistas. Para que a marca Brasil alcance o patamar desejado, ou acompanhe positivamente o progresso do país é necessário um esforço de marketing cultural expressivo. É preciso que se construa uma abordagem estratégica com análise do macroambiente de forma que seja possível determinar as variáveis do mercado de produtos culturais e encontrar formas de usá-lo como ferramenta de divulgação da marca Brasil. É, especialmente, pela disseminação cultural que a marca do país conseguirá se impor e configurar internacionalmente como um espaço semântico desejável e consumível.

Referências

BATEY, Mark. O significado da marca: como as marcas ganham vida na mente dos consumidores. Rio de Janeiro: Editora Best Seller Ltda, 2009. KOTLLER, Philip, KELLER, Kevin Lane. Administração de Marketing. 12ª edição. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2006. LINDSTROM, Martin. Brandsense: a marca multissensorial. Porto Alegre: Bookman, 2005. Manual de uso 2010 da marca Brasil. Ministério do Turismo. www.turismo.gov.br NEUMEIER, Marty. The brand gap – o abismo da marca: como construir a ponte entre a estratégia e o design. Porto Alegre: Bookman, 2008. PEREZ, Clotilde. Signos da Marca: expressividade e sensorialidade. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2004. SEMPRINI, Andrea. A marca pós-moderna: poder e fragilidade da marca na sociedade contemporânea. São Paulo: Estação das Letras e Cores, 2010.

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A propaganda institucional celebra a corrida das marcas para o Rio 2016 Ronaldo Mendes Neves Maríllia Graziella Oliveira da Silva Erivaldo Gomes de Souza

Introdução

No dia 2 de outubro de 2009, o Rio de Janeiro bateu Madri na rodada final da disputa para organizar as Olimpíadas de 2016, por 66 votos a 32. Com isso, encerrou-se um sonho que começou em 1992 e que, de acordo com o Portal UOL (2009), já custou mais de R$ 180 milhões só em candidaturas. A mídia impressa se valoriza no momento em que há uma enorme procura por parte das agências de propaganda e de anunciantes para celebrar, através de mensagens institucionais, a cidade do Rio de Janeiro pela conquista. O jornal Globo, terceiro maior jornal em circulação do país de acordo com a Associação Nacional de Jornais (ANJ), planejou um caderno especial para a cobertura

jornalística

da

possível conquista da cidade para

sediar os Jogos Olímpicos, na edição de sábado, 03 de Outubro de 2009. Depois do anúncio oficial da cidade vencedora, com a enorme procura por espaço publicitário no jornal O Globo, foi necessário abrir outro caderno especial sobre o evento e ainda transferir anunciantes para o domingo, dia 04 de outubro, a fim de atender aos anunciantes que não conseguiram espaço publicitário na edição anterior. Portanto, esse artigo analisa anúncios institucionais publicados nas edições do jornal O Globo nos dias 03 e 04 de Outubro de 2009. Eles expressam a preocupação dos anunciantes em se associar ao Rio de Janeiro, cidade que vai sediar o maior evento esportivo de âmbito internacional. Isso faz com que as marcas se promovam através das ações institucionais de marketing esportivo, tendo as olimpíadas Rio 2016 como um produto esportivo. Hoje, o jornal impresso O Globo faz parte do Infoglobo, empresa de comunicação responsável pela edição dos impressos pertencentes às Organizações Globo, e conta com 175


colunistas de peso como os jornalistas Anselmo Góis, Renato Prado e Miriam Leitão. Em 2009, O Globo se reafirmou como um veículo “multiplataforma”, dando seqüência ao movimento lançado em setembro de 2008, com a assinatura "O Globo. Muito além do papel de um jornal", que posiciona a marca como sinônimo de informação confiável. Nas edições de 03 e 04 de outubro, O Globo fez cadernos especiais para registrar a escolha do Rio de Janeiro como cidade sede dos Jogos Olímpicos de 2016 e, desde então, também abriu uma categoria denominada “Rio 2016” em sua página online, onde todas as notícias sobre o evento estão centralizadas num só clique:

Figura 1: site O GLOBO (WWW.oglobo.globo.com)

Propaganda Institucional São quatro as formas da Comunicação Organizacional que se integram e garantem o bom funcionamento de uma organização: A comunicação cultural, a comunicação administrativa, a comunicação social e o sistema de informação. Dessa maneira, Torquato (2004, 34) explica que “a comunicação organizacional é, portanto, a possibilidade sistêmica, integrada, que reúne as quatro modalidades descritas acima, cada uma exercendo um conjunto de funções”. Com o intuito de facilitar as discussões sobre a comunicação organizacional, apresenta-se no quadro abaixo, a proposta de gestão estratégica de comunicação:

176


Quadro 1: Proposta de gestão estratégica de comunicação

Fonte: LUPETTI (2007,16)

De acordo com a autora, no universo da gestão estratégica da comunicação organizacional, a comunicação institucional desempenha a função central para gerar identidade e uma boa imagem para as marcas, produtos e serviços oferecidos ao mercado. Conforme é apresentado na figura acima, a propaganda institucional, o jornalismo empresarial, a assessoria de imprensa, o marketing social, esportivo e cultural, a editoração multimídia e as relações públicas integram as ações de comunicação institucional da organização, dentro do contexto planejado da gestão estratégica da comunicação integrada. A propaganda institucional desempenha função indispensável a qualquer organização que deseja a identificação corporativa da marca, seja para criar, mudar e influenciar atitudes, ou seja, para estabelecer novos comportamentos: [...] a função clássica da propaganda – estimular as demandas potenciais de um determinado mercado e obter do consumidor a motivação e a decisão de compra sobre o produto – está sendo redimensionada. Trata-se de direcionar o consumidor para a marca, o que implica estratégias de marketing individualizado, criação de formas de interação com o consumidor, exigências de uma economia centrada basicamente na informação. (TORQUATO, 2004, 73)

Sendo assim, a propaganda institucional se insere no preceito de que o consumidor não se interessa em saber apenas se o produto é bom e confiável, mas se aquela marca merece respeito e consideração. Dessa forma, torna-se evidente a efetiva preocupação das 177


organizações com a comunicação institucional. As marcas desejam estar presentes em eventos beneficentes, associadas às ações sociais, culturais e esportivas, para deixar na mente do mercado consumidor a imagem de organização socialmente responsável. (TORQUATO, 2004) Contudo, é pertinente dizer que a mensagem da propaganda institucional tem o objetivo e a intenção de influenciar comportamentos: A propaganda institucional consiste na divulgação de mensagens pagas e assinadas pelo patrocinador, em veículos de comunicação de massa, com o objetivo de criar, mudar ou reforçar imagens e atitudes mentais, tornando-as favoráveis à empresa patrocinadora. (GRACIOSO, 2006, 35)

Pode-se ressaltar ainda a relevância da identidade corporativa transmitida através da propaganda institucional para divulgar a concepção de valores atributos das marcas. Na mensagem institucional, está representada toda a imagem da organização e a percepção do mercado consumidor e opinião pública, “o processo de administração de percepções assume sua relevância e imprescindibilidade”, adverte Andrade (2004,145). Portanto, a Comunicação Organizacional (Empresarial ou Corporativa) compreende um agrupamento de atividades, ações, estratégias mercadológicas e/ou institucionais da organização (empresas, sindicatos, órgãos governamentais, ONGs, associações, universidades e afins) junto aos seus vários públicos de interesse (consumidores, colaboradores, formadores de opinião, classe política, empresarial, acionistas, comunidade acadêmica, mídia e etc) para criar e reforçar a identidade corporativa das marcas junto à opinião pública. Cabe, então, frisar que a identidade corporativa da organização tem origem no planejamento estratégico sob a inspiração da comunicação integrada do marketing, Andrade (2006), ou seja, a comunicação que articula integradamente as várias ações de promoção da marca: Propaganda, relações públicas, promoção de vendas, marketing direto, merchandising, embalagens e a comunicação virtual.

Marca Rio 2016

Os Jogos Olímpicos surgiram originalmente na Grécia antiga, no século VII a.C. São um evento internacional, que acontecem a cada dois anos – anos pares – e onde milhares de atletas participam de competições de várias modalidades. Em 1894, o Barão Pierre de 178


Coubertin fundou o Comitê Olímpico Internacional (COI), organização não governamental responsável pela reinstituição dos Jogos Olímpicos. Após uma pausa de 1500 anos, o COI realizou a primeira Olimpíada da era moderna, em 1896, na cidade de Atenas. Desde então, já passou por cidades como Paris, Londres, Estocolmo, Amsterdã, Roma, Tóquio, Montreal, Barcelona, Los Angeles e, a última, Pequim. A escolha do país anfitrião e a cidade-sede se dá normalmente sete anos antes de seu início. Com o Brasil não foi diferente, o anúncio do Rio de Janeiro como sede das Olimpíadas de 2016 aconteceu em 02 de outubro de 2009, na cidade de Copenhague, Dinamarca. O sonho que se iniciou em 1992 tornou-se realidade, pela primeira vez na história, os brasileiros recebem o evento esportivo. Na ocasião da candidatura, o Rio, com 66 votos, superou cidades como Madri, Chicago, Tóquio e Praga. Também é a primeira vez que os Jogos acontecem num país da América do Sul, tornando o fato ainda mais importante para a história. Oficialmente denominado Jogos da XXXI Olimpíada, os Jogos Olímpicos de Verão de 2016, serão um evento multiesportivo realizado no segundo semestre, entre os dias 5 e 21 de agosto. O local de abertura e encerramento será o Estádio do Maracanã. De acordo com o site do Comitê Organizador, em 2016 serão 4.000 empregados permanentes e temporários no Comitê, 48.000 adultos e jovens preparados por um programa extensivo de treinamento profissional e 70.000 voluntários. Segundo dados divulgados pela Secretaria da Fazendo do Estado do Rio de Janeiro, em outubro de 2009, os gastos com infraestrutura e melhorias para a cidade com vistas exclusivamente aos Jogos devem consumir R$ 11,39 bilhões. No total, a previsão é de que as despesas totais atinjam cerca de R$ 28 bilhões. Vale salientar que a cidade também vai sediar os Jogos Paraolímpicos, entre os dias 7 e 18 de setembro do mesmo ano. Nas ações de marketing esportivo, associar-se à marca Rio 2016 possui papel fundamental para a boa imagem das organizações patrocinadoras, já que será o destino dos esportes e atletas olímpicos. O patrocínio do esporte leva vantagens, já que promove a diferenciação do produto, facilita a publicidade, destaca a promoção e origina a compra repetitiva pela fidelidade obtida. Além disso, garante pontos positivos também para o marca, como a rápida identificação do produto ou serviço. A escolha da Logomarca do Rio 2016 reuniu 138 agências de propaganda brasileiras. No fim, depois da análise de uma comissão julgadora de 12 membros, quem venceu foi a agência carioca Tátil. O lançamento da logo aconteceu no dia 31 de dezembro de 2010, em 179


Copacabana. Ela representa a união de três figuras humanas unidas pelas mãos e pés nas cores da bandeira nacional, expressando a cultura acolhedora do povo carioca. Figura 5. Logomarca das Olimpíadas Rio 2016

Fonte: Google imagens

Marketing esportivo

“Marketing é um processo social por meio do qual pessoas e grupos de pessoas obtêm aquilo de que necessitam e o que desejam com a criação, oferta e livre negociação de produtos e serviços de valor com outros” (KOTLER, 2000, 30). De acordo com Morgan e Summers (2008, 6), como produto, o esporte possui uma combinação única de qualidades, processos e capacidades que levou as aplicações-padrão de marketing a serem, grande parte, malsucedidas. O marketing esportivo surge, então, como um campo diferenciado, que vai além de um único evento esportivo ou da aparição de um atleta famoso. Ele é a “aplicação específica dos princípios e processos de marketing aos produtos esportivos e ao marketing de produtos não esportivos por meio da associação com o esporte” (SHANK apud MORGAN & SUMMERS, 2008,6). Dessa maneira, o marketing esportivo é a aplicação dos quatro Ps (preço, produto, promoção e ponto-de-venda). Para melhor compreensão, apresenta-se no quadro abaixo o mix do marketing de esportes:

Quadro 2: Mix do Marketing de esportes

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Fonte: MORGAN & SUMMERS (2008, 7)

O número de empresas que tem investido em patrocínios e em eventos esportivos é a maior prova de que o esporte como veículo de imagem e venda de produto é eficaz. Como destacou Teitelbaum (1997), optar pelo marketing relacionado ao esporte engloba interesses, tanto da empresa investidora, quanto de um público interessado: [...] A decisão pode ser voltada primeiramente ao esporte como produto, envolvendo o despertar de interesse por uma determinada modalidade. Depois disto, voltando-se para seu próprio mercado, a organização passa a utilizar seu marketing integrado para desencadear atividades que podem abranger o patrocínio de equipes ou atletas, a criação de produtos ou a geração de eventos. (TEITELBAUM, 1997,9)

Nesse contexto, o papel do agente de comunicação nas relações do marketing esportivo pode ser representado no quadro a seguir:

Quadro 3: Papel do agente de comunicação nas relações do marketing esportivo

181


Fonte: TEITELBAUM & LUCE, 1997, 47

Como se pode ver, todo o processo de consumo no esporte gira em torno de comunicação e da sua eficácia. Os consumidores gastam dinheiro, tempo e energia em troca da vivência no esporte, acompanhando e participando dele. No caso da propaganda institucional, as empresas investem para fazer parte desse meio e associar suas marcas a um produto esportivo, adquirindo, assim, credibilidade e respeito por parte do público.

Propagandas institucionais: Amostra dos anúncios

A análise dos anunciantes apresentada constitui uma amostra do movimento do mercado publicitário causado pela escolha do Rio de Janeiro como cidade-sede dos Jogos Olímpicos de 2016, nas edições dos dias 03 e 04 de Outubro de 2009 do Jornal O Globo. No sábado (03), houve a publicação de 70 anúncios, dentre eles 46 se referiam à conquista da cidade. No domingo (04), dos 50 anúncios vinculados, 23 tratavam do Rio 2016. Por motivos didáticos, foram escolhidos 6 propagandas institucionais dos dois dias de publicação que estão caracterizadas a seguir:

Marcas

Propaganda Formato

Slogan

3

1/2 página Página Inteira

2016 do Brasil. O maior evento esportivo do mundo é do Brasil. O banco que mais investe no esporte, também Parabéns, cidade vitoriosa. A Embratel se orgulha de ter apoiado

7 21

Página Inteira Página

Muita gente vai ganhar com as olimpíadas, muita mesmo Olimpíada 2016. Parabéns, Rio!

Banco do Brasil

3

Embratel Sistema Firjan Multiplan

182

Foto Ilustração

Cores

Duas atletas olímpicas Letras azuis, se abraçando e ao fundo destaques corcovado e por do sol amarelos Fundo azul, Atleta comemorando letras brancas Fundo azul, letras brancas Pódio e pretas Atleta em salto olímpico Fundo azul


Inteira

OI

14

1/2 página

Golden Cross

69

Página Inteira

sob o fundo da praia no pão de açúcar Ser sede das olimpíadas de 2016? Com o sucesso do Pan 2007, O Rio disse "eu posso"

Atleta de judô

O Brasil provou que para ganhar uma Olimpíada é preciso espírito de equipe.

Equipe de remo

Tabela 1: Anúncios relacionados às Olimpíadas Rio 2016

Figura 3: Anuncio Banco do Brasil

Figura 4:Anuncio Embratel

183

claro, letras azuis Fundo laranja. Letras brancas Fundo azul, verde. Letras azuis e brancas


Figura 4 : Anuncio Sistema Firjan

Figura 5: Anuncio Multiplan

Figura 6: Anuncio da OI

Figura 7: Anuncio da Golden Cross

Fonte: O Globo

184


Na amostra descrita, percebe-se as ações de marketing esportivo (Morgan,2008), que diz respeito a promoção de um produto não-esportivo por meio da integração com o esporte. Todos os anúncios selecionados possuem imagens que se relacionam ao esporte, como um atleta campeão, o pódio ou a dupla de vôlei. Como citado anteriormente, a propaganda institucional se encaixa numa nova perspectiva de mercado, a qual o consumidor se interessa também em saber se a marca merece respeito e consideração. É relevante acrescentar que projetar-se em um veículo de grande circulação é de fundamental importância para gerar uma boa imagem da organização e confirmar a credibilidade da mídia impressa na transmissão de mensagens institucionais. Uma curiosidade ainda pode ser ressaltada: O grande número de anúncios fez com que algumas propagandas se aproveitassem do mesmo “gancho” de criatividade para parabenizar o Rio. As marcas Sérgio Franco, Ponto Frio, Wise Up e Tigre utilizaram mensagens parecidas:

Tabela 2: Marcas e seus anúncios semelhantes em relação as Olimpíadas Rio 2016 Marcas

Propaganda Formato

Sergio Franco Medicina diagnostica

14

Ponto Frio

22

Wise Up inglês inteligente

34

Tigre

29

1/2 página Página Inteira

Página Inteira Página Inteira

Slogan

No lugar mais abençoado do pódio O espírito olímpico chegou no ponto frio: acabamos de bater o recorde de melhor preço

O rio no lugar mais alto do pódio Um país com alguém constantemente no lugar mais alto do pódio merece mesmo receber os jogos

185

Foto Ilustração

Cores

Cristo redentor, pão de açúcar e por do sol

Fundo laranja, letras brancas

Cristo redentor

Fundo azul, letras brancas

Fundo preto, Cristo redentor e por do laranja e azul. Sol Letras brancas Fundo cinza e Cristo redentor azul, Letras pretas


Figura 8: Anuncio da Sergio Franco

Figura 9: Anuncio do Ponto Frio

Figura 10: Anuncio da Wise up

Figura 11: Anuncio da Tigre

Fonte: O Globo

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Considerações Finais

A propaganda institucional está presente na mídia como parte integrante das ações da comunicação organizacional e, através das ações do marketing esportivo, proporciona a visibilidade da marca na transmissão de mensagens que ampliam a boa imagem e a percepção da opinião pública com relação aos valores da marca atrelados ao apoio ou patrocínio do evento esportivo. Sendo assim, com a vitória do Rio de Janeiro para sediar as Olimpíadas de 2016, abrese uma enorme perspectiva para as marcas brasileiras construírem identidades e/ou mudarem atitudes em relação às suas marcas, através da propaganda institucional e das ações do marketing esportivo. Com isso, sendo sede da maior competição esportiva internacional, o Rio de Janeiro apresenta-se como cenário apropriado para divulgar e promover as marcas institucionalmente. Os tradicionais anúncios impressos, publicados principalmente em jornais, ainda representam a credibilidade de um veículo de comunicação que luta contra as inovações tecnológicas para sobreviver no mercado publicitário. E, através das páginas impressas do jornal, as organizações registram suas marcas para divulgar essa boa imagem ao público. Com a realização dos Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro, contexto inédito e histórico para o mercado esportivo nacional, o jornal O Globo se adianta e registra as mensagens institucionais das marcas do Brasil. Nesse sentido, o planejamento da comunicação organizacional para se associar à marca “Rio 2016”, representa uma oportunidade única para utilizar as ações de marketing esportivo e seus atores em mensagens institucionais como instrumento de consolidação da identidade das marcas no mercado consumidor. Portanto, a propaganda institucional ocupa um espaço relevante na mídia brasileira, confirmando-a como uma atividade estratégica de comunicação para gerar identificação de marcas e organizações no mercado consumidor do século XXI.

Referências ANDRADE, Luiz Carlos. Identidade corporativa e propaganda institucional in KUNSCH, Margarida (Org.). Obtendo resultados com relações públicas. São Paulo, Thomson learning, 2006. 187


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de

comunicação

organizacional

e

política.

SP:

VAI COM TUDO. O Globo: classificados e história. Disponível em: << http://www.vaicomtudo.com/jornal-o-globo-classificados-e-historia.html>>. Acesso em: 27 de junho de 2011. WIKIPEDIA, a enciclopédia livre. O Globo. [S.I.]: [s.n.], 2011. Disponível em: <<http://pt.wikipedia.org/wiki/O_Globo>>. Acesso em: 26 de junho de 2011. WIKIPEDIA, a enciclopédia livre. Comitê Olímpico. [S.I.]: [s.n.], 2011. Disponível em: <<http://pt.wikipedia.org/wiki/Comit%C3%A9_Ol%C3%ADmpico_Internacional>>. Acesso em: 26 de junho de 2011. WIKIPEDIA, a enciclopédia livre. Jogos Olímpicos. [S.I]: [s.n.], 2011. Disponível em: << http://pt.wikipedia.org/wiki/Jogos_Ol%C3%ADmpicos>>. Acesso em: 26 de junho.

188


189


190


Tecnologias e empresas brasileiras de energia no cenário internacional Egberto Gomes Franco Daniel Ladeira de Araújo Miguel Valione Júnior Introdução

“O Potencial Energético Brasileiro em um Ambiente Global de Sustentabilidade Ambiental”

A pressão governamental e social, em âmbito global, no sentido da redução progressiva na emissão de CO2 na atmosfera, gera a necessidade de uma resposta energética que atenda com uma eficiência semelhante a do petróleo, mas sem as implicações negativas para com o ecossistema. Tais pressões tomam dimensões ainda maiores do ponto de vista da construção de marca de nações e empresas do setor energético, uma vez que as marcas podem simbolizar os valores compartilhados por uma sociedade (DIAS, 2006). Quanto

maior

o

valor

da

sustentabilidade ambiental à sociedade, maior deve ser o investimento para construção de marcas aliadas a esse conceito. Do ponto de vista estratégico do marketing socioambiental, as organizações devem encontrar um equilíbrio entre os lucros, o interesse do consumidor e o bem-estar da sociedade (OLIVEIRA, 2008). Nas últimas décadas países industrializados passaram a investir de maneira maciça em pesquisas sobre novas fontes energéticas com caráter sustentável. O Brasil, por sua vez, passa a ocupar lugar de destaque internacional com as pesquisas da biomassa integral da canade-açúcar e com a utilização comercial do etanol de cana. Assim, os valores de uma marca não são apenas ativos intangíveis, mas sim ativos tangíveis, que possuem valor econômico, impactando de maneira direta no comportamento de investidores. (DIAS, 2006). Partindo deste pressuposto, o Brasil conseguiu um grande valor agregado à sua marca, como nação, por ocupar lugar de destaque internacional na utilização e em pesquisas de novas fontes energéticas que respeitam a ideia de sustentabilidade ambiental.

Contextualização da Matriz Energética Brasileira 191


De acordo com o BEN, Balanço Energético Nacional de 2010, ano base de 2009, 85% da eletricidade brasileira, somando as importações, carregam consigo características de sustentabilidade ambiental. Dado que ilustra os motivos que levaram o Brasil a ocupar hodiernamente lugar de destaque neste cenário. Para a contextualização desta matriz energética nacional e sua relação no cenário mundial, há a necessidade de traçar um panorama sintético dos tipos de energia explorados. O levantamento de tal cenário merece a citação em primeiro lugar do potencial hidrelétrico. A energia gerada por hidrelétricas representam mais que 76,9% da oferta interna de eletricidade no país, o que ilustra, em volume, a grande importância desta matriz energética (BEN, 2010). Ribeiro define que “entende-se por usina hidrelétrica aquela instalação geradora de eletricidade a partir do aproveitamento de um potencial gravitacional de um fluxo d´água.” (2003, p.26). Assim, a partir deste sistema, o Brasil experimentou um grande crescimento para o suprimento de eletricidade a partir da década de 1970. Em 1973 foi criada a Itaipu Binacional, com um tratado entre o Brasil e o Paraguai para regular a operação e construção de hidrelétricas no rio Paraná (GUENA, 2007). Já o ano de 1984 foi simbólico para o desenvolvimento das hidrelétricas. Neste, o sistema de transferência de energia elétrica entre as regiões norte e nordeste teve sua primeira fase concluída. É nesse período que as usinas hidrelétricas de Itaipu, no Paraná, e Tucuruí, no Pará, entram em funcionamento. Vale citar também que há mais de 20 anos há o debate sobre a construção da usina de Belo Monte, na Bacia do Rio Xingu, no Pará. Em fevereiro de 2010, o Ministério do Meio Ambiente concedeu licença ambiental para construção da usina, que continua alvo de debates na sociedade sobre seu caráter ecologicamente sustentável. Em especial na região geográfica na qual se situa. De acordo com Dias Leite (apud GUENA, 2007, p.13), na década de 1990 o presidente José Sarney editou uma medida provisória instituindo a criação do IBAMA, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais, e foi formado um consórcio entre concessionários e autoprodutores para a exploração e construção de usinas hidrelétricas. A maioria dos impactos ambientais gerados por uma hidrelétrica diz respeito à modificação do uso do solo pelo alagamento da área do reservatório (RIBEIRO, 2003). Como, por exemplo, o lago de Belo Monte que irá inundar uma grande área geográfica 192


representando a expulsão da população ribeirinha local. Por outro lado, essa matriz energética detém características sustentáveis se comparadas com a utilização de combustíveis fósseis. O investimento em usinas hidrelétricas e a criação do IBAMA contribuem para a construção da marca Brasil associada com o conceito de sustentabilidade ambiental em nível global. A construção de uma marca, seja de uma nação ou empresa privada, deve focar parte de seu esforço estratégico em um produto mais social ou ambientalmente responsável (OLIVEIRA, 2008). No setor de cosméticos, por exemplo, a empresa brasileira Natura investe estrategicamente neste quesito. Com a criação da marca Natura Ekos, a empresa alia à sua marca uma série de valores associadas ao desenvolvimento sustentável. Oliveira elabora sobre o comportamento do consumidor, ou da sociedade no caso de uma nação, quanto a associação da imagem de sustentabilidade e responsabilidade ambiental.

Os consumidores estão cada vez mais interessados não somente em embalagens recicláveis. Estão interessados na garantia de uma qualidade de vida melhor, de poderem viver e permitir que seus filhos vivam melhor. Gradativamente, o ato de compra tende a se tornar também um ato de cidadania. Portanto, vender rótulos com informações do tipo ´biodegradável´ não é suficiente. O público quer saber quem é e como é a empresa/indústria/fábrica de quem está comprando. (2008, p.130)

Além das hidrelétricas, o carvão, petróleo e o gás natural também representam um percentual significativo do potencial energético brasileiro. O carvão representa uma fatia de 1,3% do potencial energético nacional. A combustão do carvão é muito poluidora. (CARVALHO, 2009) Os derivados do petróleo ocupam 2,9% da participação do potencial energético brasileiro (BEN, 2010). Percentual superior ao do carvão e do gás natural. Somente em 1851 foi fundada a primeira empresa dedicada ao petróleo:

A descoberta de uma maior utilidade para o petróleo nasceu da intuição de um americano chamado George Bissel, que previu que o uso desse produto teria usos mais importantes do que os até então conhecidos. Em 1851, [...], funda a primeira empresa dedicada ao petróleo. O passo inicial desta empreitada foi o de contratar a consultoria de um iminente químico para analisar o petróleo e sugerir utilizações mais nobres que pudessem ser atrativas economicamente. (GUENA, 2007, p.26)

George Bissel conseguiu encontrar formas mais atrativas economicamente para comercialização de derivados do petróleo. Entre a atitude empreendedora deste americano e a 193


invenção de motores a diesel e a gasolina, os derivados de petróleo passam a ocupar um lugar cativo como protagonista na economia mundial.

De acordo com International Energy Agency, IEA 2006 (apud GUENA, 2007, p.31) “Em 2003, 66% da energia elétrica produzida no mundo era proveniente de combustíveis fósseis.”. Dado bem diferente da realidade brasileira. O gás natural é formado em condições semelhantes ao petróleo, não renováveis em escala temporal humana e, constituído ao longo de milhões de anos. Essa fonte de energia, aliada ao petróleo, constituem-se como matérias primas de inúmeros produtos fundamentais, como por exemplo o plástico. Como os combustíveis fósseis não são renováveis, é importante o planejamento e implantação de novas tecnologias energéticas antes de um colapso de abastecimento (CARVALHO, 2009). Enquanto o uso de combustíveis fósseis alimenta debates internacionais sobre o ecossistema, a energia solar, de biomassa e a eólica, crescem rapidamente em âmbito global, como fontes renováveis de encontro com o conceito de sustentabilidade ambiental. A aceleração da exploração destas fontes está intrinsecamente ligada ao nível de apoio governamental e, com muita relevância neste processo, os movimentos sociais que apoiam a adoção de fontes de energia verde. Toda incidência de radiação solar no planeta, se convertida em energia, é maior que a soma de todas as fontes não renováveis, incluindo neste comentário os combustíveis fósseis e nucleares.

O potencial eólico do planeta é enorme. Segundo estimativas do Conselho Mundial de Energia, se 1% da área terrestre fosse utilizada na geração de energia eólica, a capacidade mundial de geração seria equivalente ao total gerado através de todas as outras fontes. A capacidade ao largo da costa é ainda maior, sendo que no caso da Europa, o potencial até 30 km da costa é suficiente para atender às necessidades energéticas atuais da União Europeia. (VICHI & MANSOR, 2009, pg.764)

Tais afirmações, aliadas com a vasta oferta de energia hidrelétrica e ao uso de novas tecnologias como bioeletricidade, apontam que há a possibilidade técnica de geração de energia verde suficiente para substituir fontes não sustentáveis. Assim, outros aspectos, como interesses políticos e econômicos, tornam-se necessários no debate sobre a redução progressiva na emissão de CO2 na atmosfera e o cuidado com o ecossistema. 194


Se, como afirma Oliveira, um plano de marketing que ressalte atributos social ou ambientalmente responsáveis, precisa contemplar os quatro Ps da teoria de marketing, sendo que o P de produto deve ter como característica indutora a responsabilidade social e ambiental, por que não investir mais em tecnologias para geração de energia verde como a solar, biomassa e eólica? Esse não seria o princípio para construção e consolidação de uma marca de nação com tais atributos? Por outro lado, enquanto há possibilidades técnicas de gerar energia socialmente responsável, o Brasil respira com otimismo, do ponto de vista de geração de riqueza econômica, a exploração da camada pré-sal, ampla faixa com mais de 800 quilômetros entre os litorais de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo. A camada pré-sal, há mais de sete mil metros de profundidade, contém petróleo, segundo geólogos, com qualidade conservada. De acordo com uma reportagem do jornal Folha de São Paulo de 31 de agosto de 2009, a descoberta desta reserva colocará o Brasil entre os dez maiores produtores de petróleo do mundo. Por outro lado, a exploração do ouro negro em águas profundas coloca em risco todo o meio ambiente costeiro.

Tecnologias Brasileiras

O uso da cana como matriz de energia seria um ótimo complemento às bacias hídricas nacionais.

A energia da biomassa da cana-de-açúcar tem todos os requisitos para complementar a hidroeletricidade. Mas, sendo o Brasil um país abastecido sobretudo pela energia gerada pelas águas, e com tantos rios ainda não aproveitados como fonte energética, é de se perguntar por que defender a opção por uma fonte complementar. Afinal, as enormes bacias hídricas brasileiras não seriam suficientes? Um estudo coordenado por Nivalde José de Castro, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro e coordenador do Gesel (Grupo de Estudos do Setor Elétrico), demonstra por que a resposta é negativa, e por que a biomassa da cana seria complemento fundamental à geração de energia hídrica. (UNICA, 2009, p.28)

O Brasil figura entre os maiores produtores de etanol do mundo, entre esses estão também os Estados Unidos e a China. A diferença é que o Brasil produz a partir da cana-deaçúcar, e, os Estados Unidos e China, do milho (VICHI & MANSOR, 2009). A desvantagem dos outros vegetais em relação a extração da cana se dá pois, nestes, há a necessidade de 195


transformar o amido em açúcar antes da fermentação para o etanol. Tal característica da canade-açúcar impacta em uma redução no custo de produção do etanol brasileiro. Um fato que deve ser destacado diz respeito a característica climática e territorial do Brasil, que favorece o cultivo de espécies vegetais que potencialmente tornar-se-ão fonte de energia literalmente verde. Há outros pontos positivos como, por exemplo, a geração de empregos na zona rural e o baixo índice de impacto ambiental no cultivo com o advento de novas tecnologias como o corte automatizado da cana. Vale ressaltar também que a safra da cana se dá no momento em quem os reservatórios das usinas hidrelétricas brasileiras estão com um nível baixo, ponto que ilustra uma sinergia entre a utilização do etanol e o sistema hidroelétrico (CARVALHO, 2009).

Proálcool

O panorama histórico da utilização do etanol, ou álcool, no Brasil, inicia em 1922, quando a Escola Politécnica investiu no desenvolvimento de motores movidos com álcool. Já na década de 30 foi criada a CEAM, Comissão de Estudos do Álcool Motor. Tal comissão fora responsável em “estudar a viabilidade do emprego do álcool como combustível e como aditivo para a gasolina”. A ideia central era motivar a produção de álcool combustível em usinas do Estado. Em 1933 foi criada a IAA, Instituto do Açúcar e do Álcool, para regular o mercado de açúcar brasileiro e destinar parte da cana para a fabricação de álcool. Em 1973 o valor do barril de petróleo atingiu um patamar muito elevado. A partir desta crise internacional o governo brasileiro, então liberado pelo General Ernesto Geisel, cria o Proálcool, Programa Nacional do Álcool (CARVALHO, 2009). A medida inicial consistia em novas instalações e modernização de usinas e de toda infraestrutura brasileira para o desenvolvimento desta nova matriz energética. No início da década de 1980, um em cada quatro carros comercializados tinham como combustível o álcool. Em junho de 1.975 foi instituído o Plano Nacional do Álcool e, em novembro do mesmo ano foi criado o Programa Nacional do Álcool – Proálcool, tendo por objetivo a substituição, em larga escala, dos combustíveis derivados de petróleo, por álcool e, paralelamente, o apoio ao desenvolvimento de tecnologia adequada para a adaptação, ao álcool, dos motores Otto a gasolina, até então usado pelas montadoras de automóveis instaladas no Brasil.(CARVALHO, 2009, p.67)

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No final da década de 1980 o preço do petróleo retrocedeu, o governo brasileiro deixou de subsidiar o álcool e novas tecnologias para motores a gasolina surgiram, como a injeção eletrônica e catalisadores. Esses fatores enfraqueceram o mercado de veículos movidos a álcool no país (MARCOCCIA, 2007). Em 2003, com o advento da tecnologia dos motores flex fuel, que pode combinar em qualquer proporção tanto o álcool como a gasolina, o consumo de álcool no país ganhou um novo impulso.

Veículos Biocombustíveis (Flexfuel)

Há inúmeros pontos que merecem destaque no que se refere à comercialização de veículos bicombustíveis no país. Com ênfase na utilização de etanol, aspectos como sua vertente renovável, a emissão de CO2 como ponto favorável se comparado com combustíveis fósseis e a infraestrutura brasileira para produção e pesquisa de avanços tecnológicos para o desenvolvimento constante desta matriz energética verde.

No Brasil vê-se o surgimento de uma nova tecnologia, que estabelece um novo parâmetro ao consumidor, o carro tipo Flex, veículo com motor equipado com recursos eletrônicos, gerenciados por computador, que possibilitam ao motor funcionar com qualquer proporção de combustível entre álcool e gasolina com componentes cujos materiais são mais resistentes à corrosão e adequados a esta mistura. A possibilidade de escolha no abastecimento trouxe ao consumidor mais segurança na utilização do álcool, uma vez que a melhor relação custo-benefício era a chave motivacional, não colocando o proprietário do veículo preso a um determinado produto. A introdução sofreu grande aceitação no mercado sendo a produção destes veículos elevada mês a mês chegando à ordem de 70% dos carros produzidos em dezembro de 2005 serem Flex. (MARCOCCIA, 2007, p.34).

Do ponto de vista histórico, depois da criação do Proálcool, na década de 1970, o lançamento do Gol 1.6 Total Flex da Volkswagen do Brasil, impulsionou de maneira gritante este novo tipo de produto para o mercado consumidor local. Durante os meses seguintes ao lançamento do Gol, diversas montadoras aderiram a esse tipo de tecnologia que conseguiu lugar de destaque na economia brasileira. Em 2005, 70% dos carros brasileiros produzidos eram flex. Fato que ilustra a importância comercial deste advento. (MARCOCCIA, 2007). As características verdes do etanol, aliadas com o uso da tecnologia, podem representar um acréscimo no potencial competitivo desta matriz energética durante as próximas décadas. 197


Tal crescimento e amadurecimento desta matriz energética verde esbarram em um problema global. Grande parte do mundo utiliza combustíveis fósseis como principal fonte geradora da energia que movimenta a economia global. O diferencial do etanol, e, consequentemente do advento e da utilização de veículos bicombustíveis, diz respeitos aos impactos positivos que este gera à sociedade. Aspectos negativos da utilização de combustíveis fósseis devem ser relatados. A poluição do ar oriunda de veículos queimando gasolina; contribuição para o aquecimento global, com a emissão de gases como o dióxido de carbono, um dos responsáveis pelo efeito estufa; dependência comercial de países que detêm e exploram petróleo, implicações políticas e sociais que são gerados a partir deste ponto. As implicações políticas e esses aspectos negativos da utilização de combustíveis fósseis abrem um campo de oportunidades para a tecnologia brasileira dos veículos bicombustíveis. O Brasil, assim como diversos países emergentes, passa a ocupar um lugar importante na economia global. A descoberta e exploração de petróleo na camada pré-sal, o desenvolvimento tecnológico do etanol e veículos flex ou bicombustíveis e o fortalecimento da marca Brasil aliada à sustentabilidade, diminuição da miséria e aumento da renda, apontam para uma tendência de crescimento no cenário internacional. Keegan, em seu livro Marketing Global, chama a atenção para as reformas políticas das nações latino-americanas e uma participação maior na economia global. A conjunção dessas reformas políticas, como a estabilização da moeda no Brasil e um cenário político mais seguro, além da necessidade de repensar as matrizes energéticas mundiais rumo ao potencial cada vez mais ecologicamente responsável e, o caráter pioneiro do Brasil em relação aos veículos bicombustíveis, chamam a atenção mundial para o comportamento do país.

As reformas latino-americanas mostram uma ampla mudança das políticas de protecionismo para o reconhecimento dos benefícios das forças de mercado e das vantagens de participar plenamente na economia global. As empresas globais observam de perto a evolução da região. (KEEGAN, 2005, p.118)

De acordo com a com a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores, ANFAVEA, a tecnologia dos motores flex fuel chegou ao Brasil doze anos após o desenvolvimento primário que se deu nos Estados Unidos, porém, com um nível de eficiência muito superior, que levou o país para um patamar de referência mundial. O Brasil 198


passou a figurar na lista dos países que detêm uma tecnologia avançada do ponto de vista da utilização de energia verde, e em especial à utilização do álcool combustível. Há uma tendência contemporânea, no marketing global, para oportunidades de alta e baixa tecnologia oriundas de qualquer parte do globo. (KEEGAN, 2005). Tal afirmação vai de encontro com o papel do Brasil no desenvolvimento de tecnologia referente ao bioetanol, à produção e comercialização de veículos flex e até mesmo na produção e comercialização de um avião de pequeno porte, de cunho agrícola, produzido pela EMBRAER, primeira aeronave de série do mundo que utiliza motor álcool, o Ipanema.

Empresas Brasileiras e a Construção da Imagem da Marca como Diferencial Competitivo

Montadoras Com Carros Flex

De acordo ANFAVEA, primeiro ano de venda dos carros flex fuel no país, foram comercializadas mais de 48,2 mil unidades. A partir dos anos 2000, com os avanços tecnológicos, em especial com o início da operação flex fuel, aliados com a rapidez dos novos veículos de comunicação, como a internet, geraram para os profissionais da área de comunicação a necessidade crescente de dados que outrora eram tão escassos. Oliveira cita sobre o papel da comunicação na estratégia de construção de marca com vantagens competitivas do ponto de vista social e ambiental. “Vantagem competitiva também pode ser criada através da comunicação, quando as ferramentas são utilizadas com eficiência para construir uma reputação positiva. O posicionamento de marca, usando como diferencial de comunicação, estabelece um lugar forte na mente dos consumidores, e envolve aspectos emocionais ligados a produtos e serviços.” (2008, p. 127)

Petrobrás

Fundada em 1953, a Petrobras é uma empresa brasileira no setor da indústria do petróleo, em especial na exploração e produção. Também trata do refino, comercialização, distribuição e transporte dos produtos e subprodutos, além de atuação muito forte referente aos derivados, como o gás.

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Essa empresa também desenvolve pesquisas de cunho renovável atuando no campo do etanol e biodiesel e, em menor grau, com energia solar e hidrogênio. A Petrobras situou-se entre as principais empresas petrolíferas em âmbito global. Como menciona Amstalden: “A empresa exerceu durante quase toda a sua existência o monopólio de exploração e refino de petróleo. Ao longo de quatro décadas, tornou-se líder em distribuição de derivados no País, num mercado competitivo fora do monopólio da União, colocando-se entre as seis maiores empresas petrolíferas na avaliação internacional.” (AMSTALDEN, 2009, p.69)

A atuação internacional da empresa ganhou visibilidade com a compra de refinarias em outros países da América do Sul, a partir do ano 2000. A principal aquisição neste cenário se deu com a compra em 2002 da Perez Companc, atual PESA S/A, considerada a maior empresa de energia da Argentina. (AMSTALDEN, 2009). A partir de 2009 a Petrobrás instalou no país dez Centros de Defesa Ambiental e treze Bases Avançadas, com o intuito de proteger a operação de qualquer dano ambiental no campo de Tupi, nova fronteira se estende pelas Bacias do Espírito Santo, Campos e Santos. Por atuar globalmente e, aliando questões de sustentabilidade no campo de matrizes energéticas mundiais, a Petrobrás também nutre aspectos do marketing para a construção de uma marca de forma estratégica para atuação internacional. A valorização da marca em uma plataforma mundial esbarra de modo vital em questões de responsabilidade social e ambiental. Aliando programas para esse fim, a empresa conseguiu lugar de destaque entre as marcas brasileiras e mundiais, como diz Amstalden. “Em uma recente pesquisa feita pela Brand Finance (2006), dados mostram que a Petrobras é a marca de maior valor do Brasil, com o valor de R$ 9,24 bilhões em 2006. De acordo com a Revista Petrobras, edição 127 de julho de 2007, em avaliação feita pela empresa consultora BrandAnalytics, a marca Petrobras aparece em sétimo lugar no ranking das marcas brasileiras mais valiosas, estima-se o valor em US$ 1,012 bilhão. [...] Pela metodologia aplicada pela Interbrand, o valor da marca aumentou mais de onze vezes em um período de quatro anos. Os resultados representam o crescimento da companhia atuando em negócios competitivos, sobretudo, no exterior, e principalmente na gestão de sua marca e expansão das atividades de comunicação.” (AMSTALDEN, 2009, p.72)

O autor ainda cita que a empresa é reconhecida pelo Índice Mundial Dow Jones de Sustentabilidade (DJSI) como uma das sete empresas mundiais do segmento com perfil mais sustentável. Aspectos como a preocupação ambiental, a transparência, o relacionamento com 200


clientes e com os recursos humanos e a criação de marca são avaliados globalmente por esse índice. Entre diversas premiações a Petrobrás também recebeu o primeiro lugar pela empresa Management & Excellence (M&E). Além disso, em 2008 passou a ocupar destaque como referência mundial em ética e sustentabilidade, considerando 387 indicadores internacionais, entre eles queda em emissão de poluentes e em vazamentos de óleo, menor consumo de energia e sistema transparente de atendimento a fornecedores. (AMSTALDEN, 2009).

Considerações Finais

A criação de diferenciais competitivos para agregar valor à marca deve permear diversas esferas, pois lida com valores, imagem e identidade. A imagem que o Brasil transmite hoje, como nação que utiliza fontes limpas de energia, contribuiu para estabelecer o país em uma posição favorável no cenário geopolítico atual (OLIVEIRA, 2008). Desde a década de 1970, passando pela construção de hidrelétricas e o programa Proálcool, o Brasil investe na geração de energia limpa e, consequentemente, na construção desta imagem favorável. O investimento na exploração de petróleo na camada pré-sal pode representar, futuramente, uma alteração no percentual das matrizes energéticas limpas a menor em relação à utilização de combustíveis fósseis. Além dos riscos exploratórios e danos ao meio ambiente. A exploração do petróleo na camada pré-sal representa uma oportunidade de crescimento econômico, mas em contrapartida pode ajudar a desconstruir a imagem favorável que o país criou ao longo dos últimos trinta e cinco anos, como nação que se destaca pela grande incidência de fontes renováveis de energia. A crescente demanda da sociedade por energia limpa, sustentabilidade e responsabilidade social se coaduna com as fontes renováveis de energia de baixo impacto ambiental, como a eólica, solar e biomassa. Aspecto que se contrapõem à exploração do petróleo da camada pré-sal. Nessa questão dois pilares da sustentabilidade entram em rota de colisão, a menos que o petróleo extraído da camada pré-sal seja utilizado na fabricação de insumos derivados de petróleo e não como combustível. 201


O país pode optar em abrir mão da extração de petróleo e investir cada vez mais na vertente verde que o consagrou nas últimas décadas? Quão grande é o poderio econômico em jogo em relação ao futuro do planeta?

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Posicionamento competitivo e de comunicação: aspectos estratégicos na construção das marcas de calçados infantis Luís Roberto Rossi Del Carratore Marcio Antônio Rodrigues Sanches Introdução

O presente artigo, que objetiva descrever, analisar e comparar diferentes estratégias de marcas, a partir das diretrizes estratégicas, de posicionamento competitivo e ações comunicacionais e mercadológicas de indústrias de calçados infantis, adota, num primeiro momento, a pesquisa documental – de natureza bibliográfica – e, posteriormente, a pesquisa descritiva, de natureza qualitativa, sob a modalidade de estudo de caso. Neste sentido serão estudados conceitos de estratégia, estratégia competitiva e posicionamento estratégico segundo a abordagem da gestão empresarial, visando melhor interpretar as estratégias deliberadas das organizações pesquisadas e, sobretudo, de que modo suas decisões refletem nas ações de marketing, no posicionamento de comunicação e, principalmente, na gestão das marcas. Segundo Godoy (1995), o intuito da pesquisa qualitativa não é o de enumerar ou medir os eventos estudados, mas obter dados descritivos sobre pessoas, lugares, instituições e processos interativos. Busca-se compreender, por meio de contato direto do pesquisador com a situação estudada, os fenômenos segundo a perspectiva dos participantes da situação analisada que, no caso, são os aspectos estratégicos e mercadológicos das empresas calçadistas, tanto no Brasil quanto no exterior. Trata-se, portanto, de um estudo de caso que, segundo Campomar (1991), é uma modalidade de pesquisa que envolve a análise intensiva de um pequeno conjunto de situações, enfatizando a completa descrição e entendimento dos fatores relacionados, pois discute comparativamente os tipos de posicionamento competitivo e de comunicação das empresas estudadas. A coleta de dados da pesquisa utilizou tanto fontes primárias quanto secundárias – consulta a publicações e sites de empresas, além de entidades representativas do setor, como a Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (ABICALÇADOS) e o Sindicato das Indústrias do Calçado e Vestuário de Birigui (SINBI) –, sendo que o levantamento de dados primários ocorreu no mês de Junho de 2011, sob a forma de dois instrumentos distintos: um 206


aplicado diretamente junto aos executivos principais das indústrias envolvidas; o outro aplicado junto aos responsáveis pela área de Marketing e Comunicação. Em ambos os casos, os instrumentos de coleta foram questionários estruturados com questões abertas e fechadas.

Estratégia: origem, evolução e conceitos O termo ‘estratégia’ é oriundo dos meios militares, sendo que sua aplicação ao ambiente de negócios é relativamente recente. Apesar de o conceito de estratégia aparecer já na década de 30 em análises de economistas institucionalistas, é no final da década de 50 e no início dos anos 60, nos estudos de casos da Harvard Business School, que o conceito de estratégia começa a ganhar a conotação atual, relacionando as políticas de negócio das empresas com o ambiente competitivo em que elas operavam. (GHEMAWAT, 2000; MONTGOMERY & PORTER, 1998). A abordagem de estratégia como busca de adequação das capacidades internas da organização ao contexto e às exigências do setor é atribuído a Kenneth R. Andrews e C. Roland Christensen ( MONTGGOMERY e PORTER, 1998). Por meio de um modelo no qual eram analisados os pontos fortes e fracos da empresa e identificadas ameaças e oportunidades do ambiente, eram formuladas ações que envolviam as diversas áreas funcionais da administração (marketing, produção, finanças etc), que tinham como objetivo a obtenção de resultados globais para a empresa. Desta forma, a abordagem de Andrews e Christensen de estratégia buscava dar um caráter holístico às diferentes funções organizacionais, articulandoas ao contexto em que a organização estava inserida. O processo de formulação da estratégia de forma consciente, planejada e estruturada pelos níveis hierárquicos superiores da organização, é definido por Mintzberg (1994) como “estratégia deliberada”. Para o autor, um dos principais críticos destes modelos, uma vez que a natureza do ambiente empresarial é complexa e imprevisível, é fundamental que a formulação de estratégia não se resuma a um processo estruturado, formal e deliberado, pois isto bloquearia a capacidade da organização de utilizar todo o seu potencial para aprender com suas experiências e com o ambiente, uma vez que na sua visão a estratégia é prioritariamente um processo de aprendizado (MINTZBERG, 1994). Na abordagem de Mintzberg (1994), estratégias surgem nas organizações a partir de padrões de atuação que se estabeleceram ao longo do tempo e que vão se alterando de acordo com as experiências vividas pela organização. Estas ações, chamadas pelo autor de estratégias 207


emergentes, apesar de não estarem planejadas, acabam sendo implantadas em função de oportunidades vislumbradas pela organização e, em decorrência dos resultados, acabam sendo incorporados como novos padrões. Segundo o autor, “poucas - ou nenhumas - estratégias são puramente deliberadas, assim como poucas são totalmente emergentes” (MINTZBERG, AHLSTRAND, LAMPEL, 2000, p. 18). Porter (1999 p- 63) define a estratégia como “a criação de uma posição única e valiosa envolvendo um conjunto diferente de atividades.” Para o autor, o conceito de estratégia está relacionado à maneira como a organização se posiciona frente à competição. Dentre as proposições do autor sobre estratégia, destacam-se as seguintes:

A estratégia envolve lidar com as forças competitivas que atuam no setor (PORTER, 1986); As organizações podem assumir posições competitivas genéricas de custo, diferenciação e enfoque nos setores em que operam (PORTER, 1986); As empresas precisam ter um posicionamento que as diferencie em relação às demais empresas do setor (PORTER, 1999); A construção de um posicionamento depende da coerência do conjunto de atividades desempenhadas pela organização em sua cadeia de valor (PORTER, 1989); Assumir um posicionamento competitivo significa fazer escolhas dentre diferentes atividades (trade offs) (PORTER, 1999). Prahalad e Hammel (1998) propõem uma abordagem na qual a estratégia deva ser centrada nas capacidades das organizações, ou seja, que os recursos internos das organizações serão o vetor de geração de competitividade. Entretanto, a vantagem competitiva não é decorrente apenas dos produtos ou do posicionamento de mercado, mas sim das capacidades que se desenvolvem nas organizações, por meio de um aprendizado coletivo, que ficam enraizadas nas empresas gerando competências específicas para a criação dos produtos e para a competição em outros mercados. Estratégias empresariais são desenvolvidas tanto no nível corporativo, quanto nas unidades de negócio e como níveis funcionais das organizações (WRIGHT, KROLL e PARNELL, 2000).

Estratégia Competitiva

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A estratégia desenvolvida no âmbito da unidade de negócios é definida como estratégia competitiva. Neste nível as unidades de negócio definem de que forma irão competir com os rivais no negócio em que operam. O objetivo deste nível da estratégia é estabelecer vantagens competitivas frente aos concorrentes que atuam no setor. Apesar de cada unidade de negócio buscar estabelecer estratégias relacionadas ao seu ambiente competitivo, elas devem guardar coerência e consistência com a estratégia corporativa (WRIGHT, KROLL e PARNELL, 2000). Para Porter (1999, p 24), “a essência da formulação de uma estratégia competitiva consiste em enfrentar a competição”. Desta forma a estratégia competitiva, segundo o autor, vai relacionar-se à capacidade da estabelecer barreiras que protejam as empresas dos competidores estabelecidos ou potenciais. Porter (1986) define ainda, uma tipologia de estratégias competitivas a serem escolhidas pelas empresas para enfrentar e se posicionar frente às forças da concorrência. As estratégias genéricas prescritas pelo autor são: liderança no custo total, diferenciação e enfoque. A estratégia de liderança em custo significa que a empresa irá posicionar-se para obter em suas operações um custo total menor que as empresas concorrentes do setor, permitindo assim que ela concorra, via preço, com seus competidores, ou que obtenha retornos maiores que os concorrentes. Apesar de a empresa estar focada em baixo custo, o autor sugere que a qualidade, a assistência técnica e outros aspectos não sejam ignorados. Outra estratégica genérica proposta por Porter (1986) é a diferenciação, que significa um posicionamento no qual a organização deva entregar aos seus clientes algum valor que seja considerado único ao âmbito de toda a indústria. A diferenciação pode ser resultado de um projeto especial, da imagem da organização no mercado, de sua marca, da aplicação de tecnologia, de especificidade dos produtos, de serviços agregados, ou de atributo que a diferencie de seus competidores. A terceira estratégia genérica proposta por Porter (1986) é o enfoque, que significa o posicionamento em nichos específicos de mercado. A organização se orienta para um grupo específico de compradores, para um segmento específico de produto ou para um mercado geográfico, e busca atendê-los de forma mais eficiente que os concorrentes. Nesta estratégia genérica a empresa também poderá optar se enfoca seu nicho por meio de uma estratégia de baixo custo ou de diferenciação.

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A vantagem competitiva, na visão de Porter (1989), pode se originar em diversas atividades específicas realizadas pela empresa. O instrumento proposto pelo autor para analisar as diferentes atividades das empresas e identificar as fontes de vantagens competitivas é a cadeia de valor. Por meio da cadeia de valor as atividades de relevância estratégica da empresa são desagregadas para que o comportamento dos custos e as fontes existentes e potências de diferenciação possam ser mais bem entendidas. Para Porter (1989), são as atividades desempenhadas nos diferentes elos da cadeia de valor de uma empresa que irão gerar as vantagens competitivas e dar sustentação à estratégia competitiva estabelecida.

Posicionamento Competitivo Segundo Porter (1989), a estratégia é criação de uma posição ‘exclusiva e valiosa’, envolvendo um diferente conjunto de atividades. Para o autor, a essência do posicionamento estratégico está em escolher e desenvolver atividades diferentes das que os rivais oferecem. Desta forma a estratégia vai implicar em fazer opções sobre quais valores serão entregues pela empresa aos clientes e como se estruturará a cadeia de valor, ou seja, o conjunto de atividades desempenhadas pela organização, para dar sustentação a este posicionamento. Na abordagem de Treacy e Wiersema (1995), o posicionamento competitivo está relacionado às disciplinas de valor. Segundo o modelo proposto pelos autores, existem três formas de oferecer valor aos clientes: excelência operacional, liderança em produtos e intimidade com o cliente. A estratégia competitiva consistirá na escolha de uma destas disciplinas de valor que passará a ser perseguido pela organização, o que vai implicar na estruturação de organizações com diferentes características. Tanto para Treacy e Wiersema (1995) quanto para Porter (1986), a estratégia competitiva é um processo de escolhas de posicionamento de mercado com base num conjunto limitado de alternativas de atendimento para diferentes requisitos de clientes. Esta escolha irá determinar o propósito da organização, não sendo recomendáveis conciliações entre as diferentes alternativas de posicionamentos. Cumpre-nos ressaltar, também, que além das estratégias corporativa e competitiva, existem também as estratégias funcionais, nas quais os requisitos de competitividade estabelecidos pela estratégia competitiva são traduzidos em atividades a serem desempenhadas pelas diversas funções da organização, tais como: Marketing, Finanças, 210


Produção, Recursos Humanos, dentre outras. De maneira geral, são as atividades localizadas no nível funcional que viabilizam a obtenção de vantagens competitivas e dão sustentação às estratégias das unidades de negócios (HAYES e UPTON, 1998 e WRIGHT, KROLL e PARNELL, 2000). . Gestão de Marca: Origem, Evolução e Conceitos O interesse pelo tema ‘marcas’ no mundo dos negócios vem crescendo dia-a-dia e as causas deste fato são inúmeras. O especialista em branding, ou gestão de marcas, David Aaker (1998), aponta três fatores principais: 1) As empresas com predisposição para pagar cifras substanciais por nomes de marcas, porque o desenvolvimento alternativo de novos nomes ou não é viável ou é muito oneroso; 2) Os profissionais de marketing percebem que uma ênfase crescente sobre o preço, frequentemente envolvendo o uso excessivo de promoções e descontos, está resultando na deterioração das indústrias, transformando-as em áreas de negócios assemelhadas a commodities. Acreditam que mais recursos deveriam ser desviados para atividades de construção da marca, para desenvolver pontos de diferenciação. Reconhecem a necessidade de desenvolver vantagens competitivas sustentáveis, baseadas em competições fora da área de preços. O problema é que os esforços de construção de marca, diferentemente de promoções de preço, têm pouco impacto visível sobre vendas a curto prazo; 3) Por fim, estão os gerentes das organizações, que compreendem a necessidade de explorar completamente seus ativos com a finalidade de maximizar o desempenho do negócio. Um ativo-chave é usualmente a marca, cujo gerenciamento envolve questões do tipo: corno ela pode ser explorada? Pode ser estendida a novos produtos, ou exposta a novos mercados? Há a oportunidade de se tirar mais dela mediante o seu fortalecimento ou com a alteração de seus componentes? Contrariamente, o que pode prejudicá-la, e como isto pode ser evitado?

O Conceito de Branding Aplicado aos Negócios Na visão de Kotler, “a marca é uma das decisões referentes ao desenvolvimento e marketing dos produtos, destacando-se também os atributos do produto, embalagem, rótulos e serviços de apoio ao produto” (1993, p.177). E define marca, num sentido bastante restrito, como “um nome, termo, signo, símbolo ou design, ou uma combinação desses elementos, a

211


fim de identificar produtos ou serviços de um vendedor ou grupo de vendedores a fim de diferenciá-los dos de seus concorrentes” (1993, p.177). Kotler ressalta que a marca pode ser considerada uma promessa de oferecer, de forma consistente, um grupo específico de características, benefícios e serviços aos compradores, com o intuito de apresentar a garantia de qualidade. Dessa forma, os consumidores veem na marca a certeza de que suas necessidades e desejos serão atendidos, compra após compra, sem a necessidade de se depararem com os custos psicológicos, característicos da ansiedade e dúvida que acompanham as decisões de compra. Kotler, enfim, recomenda: “não faça propaganda da marca. Vivencie-a. Em última instância, a marca é construída pelos empregados, que transmitem uma experiência positiva aos clientes. Será que a experiência da marca correspondeu à promessa da marca? Eis por que as empresas devem conjugar a experiência da marca com a promessa da marca” (2003, p.123). As grandes marcas, em sua opinião, são a única trajetória para a rentabilidade sustentável, acima da média. “As grandes marcas trabalham mais com as emoções. E, no futuro, as melhores marcas demonstrarão responsabilidade social - um interesse zeloso pelas pessoas e pelo estado do mundo”, observa Kotler (2003, p.124). De acordo com Al Ries e Laura Ries (1998), a nova função do marketing é construir uma marca na mente do cliente em potencial. Marketing, portanto, é branding. Segundo eles, os dois conceitos estão tão indissoluvelmente ligados e é impossível separá-los. Definem branding, então, como sendo a gestão das marcas: o ato de gerir completamente as marcas, desde a sua criação, desenvolvimento, ações necessárias para a manutenção e sucesso. Aceitam, também, que um bem-sucedido programa de branding se baseia no conceito de singularidade, isto é, a criação, na mente do público-alvo, da percepção de que não há outro produto no mercado igual ao da organização. E proclamam que está havendo uma mudança sísmica no mundo dos negócios. “A mudança do vender para comprar. Essa mudança é acentuada, acelerada e provocada pela ascensão das marcas” (1998, p.13).

Sistema de Identidade da Marca

David Aaker propôs um modelo para a gestão estratégica da marca, alicerçado num sistema de identidade de marca. Para ele, a “identidade da marca é um conjunto exclusivo de associações com a marca que o estrategista de marcas ambiciona criar ou manter. Essas 212


associações representam aquilo que a marca pretende realizar e implicam uma promessa aos clientes, feita pelos membros da organização” (Aaker, 1996, p.80). Na visão de Aaker, a identidade de uma marca proporciona sentido, finalidade e significado a essa marca. Ela é, portanto, central para a visão estratégica da marca e impulsiona urna das quatro dimensões principais da eqüidade da marca: as associações, que compõem o coração e o espírito da marca. A identidade da marca deve ser projetada de modo a estabelecer um relacionamento entre a marca e o cliente, por meio de uma proposta de valor envolvendo benefícios funcionais, emocionais ou de auto-expressão. A criação da identidade de marca é, de acordo com Aaker, algo mais que descobrir o que os clientes dizem querer. A identidade deve espelhar também o espírito e visão da marca, aquilo que ela espera conseguir. Aaker diferencia imagem de identidade, esclarecendo que, embora a imagem da marca seja habitualmente passiva e voltada para o passado, a identidade da marca deve ser ativa e contemplar o futuro, espelhando as associações desejadas em relação à marca. “Enquanto a imagem da marca tende a ser tática, sua identidade deve ser estratégica, refletindo uma estratégia empresarial que conduza a uma vantagem sustentável. A identidade da marca deve, portanto, refletir também suas qualidades duradouras, ainda que estas não sejam aparentes na imagem da marca”, esclarece Aaker (1996, p.82). A identidade da marca representa as características básicas que persistirão ao longo do tempo: ela é, para a estratégia da marca, aquilo que o objetivo estratégico é para a estratégia empresarial. A identidade da marca, enfim, não deve aceitar as percepções existentes mantendo-se, em vez disso, disposta a considerar modificações nas percepções que seus mercados têm acerca da marca.

Posicionamento de Marca

Além da identidade e da imagem de marca, outro conceito igualmente importante é o da posição da marca – ou posicionamento –, que corresponde à “parcela da identidade e da proposta de valor da marca que deve ser ativamente comunicada ao público-alvo e apresenta uma vantagem em relação às marcas concorrentes” (AAKER, 1996, p.82). A posição da marca, assim, orienta os programas de comunicação e é distinta da abstração mais geral da identidade da marca. 213


Aaker destaca, também, a importância da distinção entre um produto e uma marca. O produto, segundo ele, inclui características como âmbito (a Crest fabrica produtos para a higiene bucal), atributos (o Volvo é um carro seguro), qualidade/valor (a Kraft fornece produtos de qualidade) e usos (o Subaru é feito para se locomover sobre a neve). A marca inclui essas características dos produtos e muito mais (AAKER, 1996, p.85):

-Os usuários do produto (a mulher Charlie); 1

País de origem (a mão-de-obra do Audi é alemã);

2

Associações organizacionais (a 3M é uma empresa inovadora);

3

A personalidade da marca (Bath and Bode Works é uma marca de varejo com

energia e vitalidade); 4

Os símbolos (a diligência representa o Banco Wells Fargo).

Aaker reconhece que, em geral, a construção da marca concentra-se com demasiada frequência nos atributos do produto, nas imagens existentes da marca, em sua posição e em seu papel externo de influenciar os clientes. Uma das chaves para o desenvolvimento de uma marca sólida é a ampliação do conceito da marca para incluir outras dimensões e perspectivas. Ries e Trout (1993) entendem que, no cenário atual, cada vez mais competitivo – particularmente por existir uma infinidade de empresas lançando enorme variedade de produtos, suas respectivas extensões e inúmeras modalidades de serviços – é praticamente impossível que os consumidores reajam a estratégias de modo semelhante àquelas que deram certo no passado. Está se tornando cada vez mais difícil criar ou desenvolver alguma ideia, conceito ou proposta de comunicação que ainda não tenha sido processada pelos consumidores ou, na melhor das hipóteses, que provoque alguma reação significativa e duradoura nas pessoas, saturadas de informações e de mensagens publicitárias a todo o momento. Trata-se, segundo eles, de uma nova realidade – a da sociedade supercomunicativa – onde tudo comunica de maneira contínua e insistente e muito pouco desse excesso de comunicação atinge o seu destino com eficiência. É nesse contexto que propõem, então, o conceito de posicionamento, que se baseia nos seguintes pressupostos (RIES e TROUT, 1993, p. 14-27): 

Posicionamento não é o que você faz com o produto. Posicionamento é o que se faz na mente do consumidor; 214


Posicionamento é o primeiro sistema de pensamento que enfrenta, pra valer, o difícil problema de se fazer ouvir nesta nossa sociedade saturada de comunicação;

A abordagem básica do posicionamento não é criar algo de novo, inédito ou diferente, mas manipular o que já está lá dentro da mente, e ‘realinhar’ as conexões que já existem;

Não há lugar na mente para o que é diferente e novo, salvo se houver possibilidade alguma relação com o que já é habitual e conhecido;

De uma forma geral, a mente só aceita aquilo que de certa forma coincide com o seu conhecimento ou com a sua experiência anterior;

É por isso que se você tiver um novo produto verdadeiro, é muitas vezes melhor dizer ao consumidor potencial o que o seu produto não é, do que dizer o que ele é;

A única realidade que conta é aquela que já está na mente do seu consumidor potencial;

Já que tão pouco de sua mensagem irá chegar ao seu destino, concentre-se no receptor, na forma como o seu cérebro funciona. Em síntese, concentre-se nas percepções do cliente em potencial, e não na realidade do produto;

Aceite que o campo de batalha, em posicionamento, não é a empresa, o produto ou o serviço: é a mente;

É melhor ser o primeiro a conquistar uma percepção na mente intocada do que ser o melhor em termos de produto ou serviço;

Em posicionamento, o ‘quando’ é mais importante do que ‘o quê’. Uma marca, nesse sentido, deve ter como objetivo precípuo a seletividade ao definir

os seus segmentos prioritários e, sobretudo, na maneira como a mensagem será comunicada. O grande desafio, nesse sentido, é o de concentrar os esforços de comunicação em conceitos bem definidos, pois a mente filtra e rejeita informações dissonantes, como forma de se defender do excessivo volume de comunicação. Ries e Trout defendem que, de modo geral, a mente só aceita aquilo que coincide com o conhecimento ou com a experiência anterior. O segredo, então, seria simplificar sobre o que está se querendo comunicar, criando uma posição clara, única e objetiva na mente do segmento objetivado, considerando suas próprias forças e fraquezas além, obviamente, das posições ocupadas pelos concorrentes, uma vez que o posicionamento se configura num ângulo mental competitivo, isto é, uma maneira focada e singular de a empresa e/ou marca serem percebidas em relação aos demais competidores. A comunicação, nessa perspectiva, deve ser utilizada não apenas para comunicar as características e vantagens de um produto, mas prioritariamente para posicionar a marca. 215


Aspectos Gerais Relativos à Gestão da Marca

Como sugere o modelo teórico proposto por Aaker, para assegurar-se de que identidade da marca possua textura e profundidade, a empresa deverá considerá-la como um produto; como uma organização; como uma pessoa e; finalmente, como um símbolo. Essas quatro perspectivas são muito diferentes, mas o objetivo é auxiliar o estrategista na considerarão dos diferentes elementos e padrões da marca, que podem ajudar a esclarecer, enriquecer e diferenciar uma identidade. Nem toda identidade de marca precisa de todas essas perspectivas ou dimensões. Conforme a marca, o produto, a categoria, a situação competitiva de mercado, o segmento visado e outras questões, uma única dimensão poderá ser viável e adequada. Não obstante, cada marca deverá ponderar todas as perspectivas e utilizar aquelas que sejam proveitosas para articular o que a marca deve representar na mente do cliente em potencial. As dimensões sugeridas por Aaker são, resumidamente, as seguintes (AAKER, 1996, p.86110): A marca como produto, organização, pessoa e símbolo.

A Marca como Produto

Embora os estrategistas devam evitar a armadilha da fixação nos atributos do produto, as associações relacionadas ao produto serão quase sempre um componente importante da identidade da marca, porque diretamente vinculadas às decisões de escolha e à experiência de uso da marca. Dentro dessa perspectiva, Aaker considera algumas dimensões específicas: o âmbito do produto; atributos relacionados ao produto; qualidade/valor relacionado ao produto; associações com o momento da utilização ou aplicação; associações com o perfil dos usuários; vínculo com um país ou uma região.

A Marca como Organização

A perspectiva da marca como organização concentra-se nos atributos da organização, não do produto ou serviço. Esses atributos da organização, como a nação, a busca da qualidade e uma preocupação com o ambiente, são criados pelas pessoas, pela cultura, pelos valores e pelos programas da empresa. Alguns aspectos da marca podem ser descritos como atributos do produto, em 216


determinados contextos, e como atributos organizacionais, em outros. Os atributos organizacionais, segudo Aaker, são mais duradouros, mais resistentes à comunicação da concorrência que os atributos relacionados ao produto. Em tese, é muito mais fácil copiar um produto do que duplicar uma organização detentora de pessoas, valores e programas exclusivos. Além disso, os atributos organizacionais aplicam-se habitualmente a um conjunto de classes de produtos e o concorrente descobrirá a dificuldade para competir em apenas urna classe de produtos. Por fim, uma vez que os atributos organizacionais, conto uma essência inovadora, são difíceis de avaliar e comunicar, será árduo também para os concorrentes demonstrar que superaram alguma deficiência percebida. Os atributos organizacionais podem contribuir para uma proposta valor.

A Marca como Pessoa

A perspectiva da marca como pessoa sugere uma identidade de marca mais rica e interessante do que aquela baseada nos atributos físicos e tangíveis do produto. A personalidade da marca pode ser definida como um conjunto de características humanas associadas a uma determinada marca. Assim, isso inclui características como gênero, idade e classe socio-econômica, além de traços clássicos da personalidade humana como carinho, interesse e sentimentalismo. Aaker afirma que a “personalidade da marca pode criar uma marca mais sólida, de diversas formas. Em primeiro lugar, a personalidade da marca pode auxiliar na criação de um beneficio de auto-expressão que se converterá em um veículo para o consumidor expressar sua própria personalidade. Em segundo lugar, assim como as personalidades humanas afetam os relacionamentos entre as pessoas, a personalidade da marca pode constituir a base sólida do relacionamento entre o cliente e ela mesma. Em terceiro lugar, a personalidade da marca pode auxiliar na comunicação de algum atributo do produto, contribuindo assim para um beneficio funcional” (1996, p.106).

A Marca como Símbolo

Na opinião de Aaker, um símbolo poderoso pode proporcionar coesão e estrutura à marca, facilitando a obtenção de reconhecimento e a recordação. 217


A elevação do símbolo ao status de componente da identidade reflete seu poder potencial. Qualquer coisa, no entanto, que represente a marca pode ser um símbolo, conquanto que seja memorável, forte e marcante. Em geral, os símbolos mais poderosos se traduzem em imagens visuais.

Cada imagem visual capta grande parte identidade da

respectiva marca, porque as conexões entre o símbolo e os elementos da identidade são construídas ao longo do tempo. Basta um vislumbre, portanto, para que a marca seja lembrada. Os símbolos são mais significativos quando envolvem uma metáfora pois, dessa maneira, o símbolo, ou uma de suas características, representa um benefício funcional, emocional ou de auto-expressão. A grande meta da edificação de um sistema de identidade de marca é o relacionamento marca-cliente. Essa relação pode ser baseada numa proposta de valor que, de acordo com Aaker, pode estar vinculada a qualquer um dos tipos de benefícios esperados – funcional, emocional ou de auto-expressão – ou, então, pode emanar diretamente da identidade como um todo, ou da personalidade, ou de quaisquer outros aspectos que ofereçam sensações positivas agradáveis e memoráveis. A proposta de valor eficiente pode conduzir a um relacionamento sólido e influenciar decisivamente as decisões de compra. As Indústrias de Calçados Infantis do Polo de Birigui – SP

Na cidade de Birigui, situada no interior do estado de São Paulo, cuja população é de 109 mil habitantes (IBGE 2010), estão instaladas 170 de indústrias fabricantes de calçados, na sua grande maioria fabricantes de calçados infantis, que geram 19 mil empregos diretos e produzem cerca de 250 mil pares de calçados por dia, de acordo com números do Sindicato da Indústria do Calçados e Vestuário de Birigui (SINBI). Além de um grande número de empresas calçadistas rivais, estão presentes em Birigui um grande número de empresas fornecedoras de matérias primas, componentes e serviços especializados para o setor (transportadores, manutenção de equipamentos, etc.), um conjunto de instituições voltadas ao apoio a este setor (organizações representativas da indústria, órgãos públicos de fomento, instituições de ensino e outros) e compradores dos principais mercados de consumo do Brasil e do mundo.

218


Segundo dados do SINBI, o polo calçadista de Birigui produziu em 2008, 63,5 milhões de pares de calçados, o que corresponde a quase 8% dos 804 milhões de pares de sapatos produzidos no Brasil neste ano e 52% dos 120 milhões de pares produzidos no Estado de São Paulo, o que torna o município um dos principais centros de fabricação de calçados do Brasil e um dos principais de fabricação de calçados infantis do mundo. As unidades analisadas neste artigo são três indústrias de calçados infantis, instaladas em Birigui – SP. As indústrias foram escolhidas, preferencialmente, com base no porte – tanto de produção quanto de número de funcionários – estando elas entre as maiores e mais expressivas do setor, conforme demonstra o Quadro 1:

Quadro 1: Caracterização das indústrias pesquisadas. Informações gerais sobre as indústrias analisadas: Empresa A

Empresa B

Empresa C

Porte da empresa

R$ 50 e 80

Acima de R$ 100

Acima de R$ 100

(faturamento)

milhões/ano

milhões/ano

milhões/ano

1.200 funcionários

1.400 funcionários

2.400 funcionários

3,5 milhões

4,3 milhões

5 milhões pares/ano

pares/ano

pares/ano

350 mil pares/ano

350 mil pares/ano

550 mil pares/ano

Mais de 30 países da

28 países da

Países da América

Países para onde

América Latina,

América Latina,

do Sul, África e

exporta

Europa, África,

Europa, África e

Oriente Médio

Oriente Médio.

Caribe.

Porte da empresa em

(número

funcionários diretos) Produção Anual de Pares Número de Pares Exportados ao ano

Fonte: http://sindicato.org.br/system/pictures/553/original/Sinbi_60.pdf?1267500588

Observa-se, no Quadro 1, que juntas, as três empresas pesquisadas respondem por uma produção anual de quase 13 milhões de pares de calçados infantis, o que equivale aproximadamente a 20% do total produzido no polo industrial de Birigui.

219


Aspectos Relativos à Concorrência, às Estratégias Competitivas e ao Posicionamento Competitivo das Empresas Pesquisadas.

Quadro 2: Aspectos estratégicos das indústrias pesquisadas. Aspectos da Estratégia Competitiva Empresa A Empresa B

Empresa C

% da produção 90% 92% 90% voltada ao mercado nacional % da produção 10% 8% 10% voltada ao mercado externo Principais Empresas nacionais Empresas nacionais Empresas nacionais concorrentes (Brasil) Empresas locais (em Empresas Empresas países produtores de Principais internacionais internacionais calçados) e empresas concorrentes (Asiáticas, em (Asiáticas, focadas internacionais (Exterior) especial Chinesas). em preço). (Chinesas) Diferenciação e Foco Diferenciação (calçados para Diferenciação (Conforto e Design) e público alvo (Qualidade e Foco (calçados para específico, com Principal vantagem Conforto) e Foco atividades e distribuição em lojas competitiva: (segmento infantil) segmentos especializadas, ao específicos). invés do grande varejo). Fonte: http://sindicato.org.br/system/pictures/553/original/Sinbi_60.pdf?1267500588

As empresas pesquisadas comercializam seus produtos tanto no mercado doméstico brasileiro quanto no mercado exterior, destinando de 90 a 92 % da sua produção para o mercado nacional e um percentual entre 8 a 10 % para as exportações para vários países de diferentes continentes, conforme mostrado no quadro 1.

220


Observou-se ainda que as empresas entrevistadas identificam como seus principais concorrentes no mercado brasileiro as empresas calçadistas nacionais, enquanto no mercado externo a concorrência se dá principalmente com empresas asiáticas (em especial chinesas) e em alguns países fabricantes de calçados, como é o caso da Colômbia, participam também da competição empresas locais. Quanto aos aspectos estratégicos propriamente ditos, os executivos das empresas foram questionados sobre os principais recursos disponíveis e a forma como eram utilizados, conforme a seguinte pergunta: De quais estratégias a empresa tem se valido para ampliar sua participação nos mercados nacional e internacional? As respostas foram: Empresa A: No mercado nacional, investimento no produto (busca aliar, além do conforto e qualidade, estilo inovador de acordo com as tendências da moda). Outro aspecto estratégico é a presença no cliente, por meio de uma logística que envolve diversos escritórios. Além disso, busca oferecer preço justo e condições favoráveis de financiamento aos clientes. No mercado internacional, a estratégia principal é a participação em feiras, com a oferta de produtos com diferenciais em qualidade, conforto e design. Empresa B: No mercado nacional, participação em feiras no país todo, além da instalação de showrooms em diversas regiões do país. Investimento em mídia voltada a públicos específicos: TV a cabo, Discovery e Disney Chanel (Classe A e B); TV aberta, SBT (Classe C); Revistas (Mônica, Pais etc.); ações na Internet. Investimentos na força de vendas: treinamento, capacitação e estruturação das ações de vendas visando fortalecer o processo de vendas de modo a melhorar a performance da equipe. Busca de canais diferenciados: sapatarias, lojas especializadas em roupas e produtos infantis. No mercado internacional, as ações concentram-se principalmente na divulgação nos eventos da APEX (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos) via ABICALÇADOS (Associação Brasileira da Indústria de Calçados) e na participação de feiras internacionais (Exemplos: Alemanha; Argentina; Colômbia; dentre outras). Empresa C: No mercado nacional, a principal estratégia é a valorização da marca visando que ela se torne desejada: foco e comunicação com o seu público alvo buscando passar valores e um mundo melhor. Diferenciação de produtos, buscando lançar moda e produtos inovadores. Segmentação de mercado: foco em lojas menores que cuidam melhor da apresentação do produto e da marca. Valorização dos colaboradores. No mercado internacional, ações realizadas para difundir os produtos nacionais no exterior são normalmente realizadas pela APEX, que participa de feiras com os produtos brasileiros, 221


porém, a cada dia, menos empresários estão participando em função das atuais dificuldades da exportação. Em termos de mercado internacional, pode-se afirmar que as três empresas estudadas valem-se, basicamente, dos mesmos recursos, isto é, a presença nas feiras e eventos correlatos do setor. A intenção, muito provavelmente, é obter visibilidade junto aos compradores internacionais da maneira menos dispendiosa e/ou dispersiva. Já em relação ao mercado interno, as estratégias são muito distintas: a Empresa A se concentra prioritariamente no Produto (diferenciação) e também visa à construção de relacionamento com o cliente, especialmente o varejo (trade). Já a Empresa B enfoca prioritariamente a Promoção – do ponto de vista dos 4 Ps do marketing-mix – pois atua fortemente na comunicação publicitária e na força de vendas. Preocupa-se, também, com a Distribuição, objetivando a diferenciação a partir dos canais de vendas. Por fim, a Empresa C visualiza a marca como recurso estratégico prioritário, adotando as estratégias genéricas de foco em segmento específico e também em relacionamento com o consumidor final, por meio de ações voltadas para o mesmo, como, por exemplo, a própria adequação dos produtos em relação às suas preferências e tendências da moda. Apesar disso, quando questionados sobre as principais vantagens competitivas da organização, os executivos foram praticamente unânimes em destacar duas delas: 1) a diferenciação e; 2) o foco em segmento específico. Ainda do ponto de vista estratégico, o Quadro 2 também demonstra que as três empresas pesquisadas adotam praticamente a mesma política de mercado externo, isto é, destinam algo em torno de 10% do total produzido para outros países, principalmente da América Latina e da África. Além disso, classificam igualmente as empresas nacionais como as principais concorrentes no mercado interno, bem como as empresas asiáticas – especialmente as chinesas – como principais concorrentes no exterior. Quanto às rivais chinesas, aliás, as considerações dos executivos são muito próximas: produtos sem marca, com preços imbatíveis, sendo vendidos com o nome do próprio lojista ou do distribuidor. E revelam, ainda, uma preocupação: são produtos que têm melhorado a sua qualidade em função do aprendizado com os norte-americanos e com os muitos brasileiros que hoje trabalham na China. Ao serem questionados sobre as principais dificuldades encontradas no processo de ampliação de mercado – tanto em âmbito nacional quanto internacional – os executivos relataram o seguinte: 222


Empresa A: No mercado interno, a concorrência dos fabricantes chineses não é mais o principal problema desde que foram estabelecidas medidas restritivas a importação dos calçados chineses. A concorrência mais forte, atualmente, é com empresas nacionais de determinadas regiões que operam com custos muito menores em função de trabalharem com exigências legais e tributárias menores, ou por receberem incentivos fiscais, ou por não cumprirem legislações que oneram os produtos ou, até mesmo, por copiarem produtos, reduzindo assim os investimentos em pesquisa e desenvolvimento. No mercado externo, já houve um período em que até 18 % da produção era destinada à exportação, pois era um negócio rentável. Atualmente, paga-se para trabalhar no mercado externo e a empresa só não o abandona porque já investiu muito nisto. Por exemplo: um calçado brasileiro que custa US$8 para fazer no Brasil, na China custa US$5. Dentre os motivos principais: câmbio; carga tributária e o custo da mão-de-obra. Empresa B: Recursos para investir nestas ações de divulgação da marca para ganhar mercado, pois estas ações são caras e demandam muito recurso financeiro. Empresa C: Internamente, a grande dificuldade é a carência de mão-de-obra especializada. No cenário internacional, a exportação já correspondeu a 17% da produção e, hoje, está no patamar de 10%. Motivos principais: o câmbio e os custos de produção no Brasil que inviabilizam a exportação. A empresa só vende no mercado externo em função da marca, mas teme que, no futuro, o aumento dos custos no Brasil (que sobem em torno de 15% ao ano e a constante queda do dólar) inviabilize as vendas no exterior. A persistir este processo, acredita que nem mesmo os produtores que possuem marcas fortes conseguirão manter as exportações. Como resultado das estratégias adotadas nos últimos anos, os executivos revelaram o seguinte: Empresa A: Crescimento de 5% ao ano. Empresa B: Bons e imediatos são os resultados nos investimentos em feiras e ações de comunicação da marca. Empresa C: Crescimento da marca no mercado. Maior parte do público-alvo a conhece, o que favorece a formação do cliente fidelizado. Há, também, um sentimento de harmonia entre empresa e os colaboradores. Retorno financeiro. Em relação aos próximos cinco anos, os objetivos das organizações são os seguintes, segundo seus dirigentes:

223


Empresa A: Manter o crescimento de 5 % ao ano, com o fortalecimento da marca, da distribuição e da qualidade do produto, melhorando ainda mais a tecnologia de produção e aspectos de inovação. Empresa B: Hoje, a empresa está mais concentrada no público C e D. Para os próximos anos, o objetivo é a participação nos segmentos B e C. Lançar produtos para diferentes situações de uso do calçado, pois com a melhora da renda, as famílias estão começando a proporcionar maior demanda para variadas finalidades como escola; práticas esportivas; eventos sociais (festas, Igrejas); dentre outras. Empresa C: Abrir novas lojas próprias nas principais capitais para expor a essência da marca para a clientela, por meio da exposição de todo o portfólio de produtos e até mesmo de um aroma próprio nas lojas que remeta à marca. Investimento contínuo para estar mais próximo das meninas, sempre transmitindo os valores da marca. A empresa não tem a pretensão de aumentar o volume nem a participação de mercado no Brasil, mas sim de agregar valor aos produtos e a rentabilidade. Em termos de futuro, as pretensões e intenções estratégicas das empresas são bastante distintas, pois variam desde o aprimoramento do produto, da tecnologia e dos processos (Empresa A), passando pela penetração em novos segmentos de mercado (Empresa B), até a alteração no sistema distribuição com vistas à valorização da marca (Empresa C). Quando questionados em relação à importância, ou não, de se associar a marca ao país de origem, no caso, o Brasil, para atuar no mercado internacional e enfrentar a difícil concorrência dos produtos asiáticos, os executivos responderam: Empresa A: Muito importante. Porque agrega valor ao produto, devido aos seguintes fatores: calçado nacional é considerado um dos melhores do mundo; as tendências de moda do Brasil são admiradas no exterior; o Brasil tem modelos próprios de calçados; a ‘brasilidade’ é, enfim, bastante valorizada. Empresa B: Indispensável. Porque a marca Brasil representa a alegria do povo brasileiro, o colorido do país, uma imagem muito positiva de um país de gente bonita, de produtos bonitos, é um avesso à China. Na Europa, admite-se pagar um pouco mais caro em detrimento do produto chinês. Toda embalagem tem a bandeira brasileira e, se possível, uma etiqueta com a Marca Brasil, sempre tentando associar o produto ao país. Empresa C: Muito importante. Porque transmite qualidade, criatividade e inovação. A marca da empresa aliada à marca Brasil ajudam a empresa a se manter no mercado externo,

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mesmo com os preços mais altos. Clientes internacionais aceitam pagar mais pelos produtos brasileiros em função da associação a estes atributos. Nota-se, portanto, que a marca ‘Brasil’ desfruta de alto prestígio na percepção dos clientes e consumidores de calçados no mercado internacional, sendo importante fator de diferenciação de produtos.

Aspectos Relativos ao Marketing

Segmentos de Mercado Focados nos Mercados Nacional e Internacional

Quando se trata de marketing, o ponto de partida para qualquer ação ou análise é a definição dos segmentos de mercado, ou seja, os perfis de consumidores objetivados. Assim, os entrevistados respondendo à Questão 1 do roteiro de entrevista (Anexo 2) definiram seus públicos prioritários – apenas com base em critérios socioeconômicos - tanto para o mercado nacional como internacional Com base nas respostas dos entrevistados observou-se que uma das empresas pesquisadas atua com foco em perfis socioeconômicos distintos nos mercados interno e externo, outra apresenta uma maior variedade de públicos atendidos no mercado interno e externo, atendendo públicos desde a classe D até a B1 em ambos os mercados, e apenas uma das empresas entrevistadas apresenta maior foco num único segmento (perfil de classe médiaalta).

Composto de Marketing do Ponto de Vista de Forças e Fraquezas

Questionados sobre as variáveis do composto de marketing (ou marketing-mix), os profissionais avaliando seus produtos, preços, praças e promoções como pontos fortes ou fracos para o nacional e externo. Analisando as respostas da Questão 2 do roteiro dos profissionais de marketing (Anexo 2), observa-se que as três indústrias assumem como ponto fraco o quesito ‘Promoção’ (que, no caso, envolve inúmeras ações como publicidade, vendas, pós-venda, comunicação da marca, merchandising, relações públicas, dentre outras) no mercado externo. Outro aspecto em comum das três empresas diz respeito ao item ‘Produto’ (que envolve aspectos de qualidade, durabilidade, design, embalagem, garantias etc.) no mercado interno, no qual todas 225


o consideram como ponto forte. Além destas coincidências, é interessante destacar que uma das empresas reconhece fraqueza também em sua ‘Promoção’ no Brasil e em seu ‘Produto’ no exterior; outra empresa considera como sendo ponto fraco o seu ‘Preço’ em comparação aos concorrentes (que envolve não somente o preço final ao consumidor, mas também ao varejo e aos distribuidores, os custos de produção, as condições de pagamento, políticas de negociação, dentre outras questões), tanto no Brasil quanto no exterior. Cumpre-nos ressaltar, nesse momento, que o reconhecimento das condições das variáveis de marketing é de substancial importância para a definição das estratégias, do posicionamento competitivo e, por consequência, do posicionamento de comunicação.

Fatores de Influência nos Seguimentos Atendidos Adentrando na questão dos mercados-alvo – quer sejam, os consumidores finais – e das influências que os cercam, os profissionais entrevistados foram questionados sobre a influência da sensibilidade ao preço, da valorização da marca, da qualidade e durabilidade e conforto dos produtos, da publicidade, das promoções, do design, da influência do canal de venda e de terceiros nos segmentos atendidos, tanto no mercado nacional quanto externo, conforme Questão 4 (Anexo 2). Observa-se que, na maioria dos aspectos e fatores de influência abordados, os profissionais de marketing das três empresas não veem muitas diferenças entre os consumidores brasileiros e os estrangeiros. As únicas exceções são quanto à influência do varejo, isto é, a interferência dos vendedores e atendentes das lojas, bem como a influência exercida por terceiros, ou seja, a opinião de amigos e outras pessoas do mesmo grupo de referência do consumidor. Nestes dois quesitos, há uma unanimidade entre os respondentes que, no Brasil, tais influências sejam, de alguma forma, mais intensas do que nos outros países. Outro aspecto interessante na análise é que há coincidência também nas respostas dos três profissionais quanto aos seguintes quesitos: a) nível de exigência de qualidade do produto; b) valorização do estilo (design) e; c) nível de exigência em termos de conforto do calçado. Em síntese, todos os aspectos relatados como sendo indispensáveis (níveis de exigência muito elevados) e, além disso, todos eles referentes ao ‘Produto’ do composto de marketing.

226


Ainda que não seja unanimidade, as respostas também são muito convergentes e indicam forte influência da publicidade e das promoções, especialmente no Brasil.

Recursos de Marketing Utilizados (Brasil x Exterior)

Os profissionais de marketing foram questionados se e como utilizavam, no Brasil e no exterior, os seguintes recursos de marketing: publicidade em mídia, patrocínio, eventos e feiras, promoções ao consumidor, promoções ao varejo, incentivo a vendedores, ações no ponto de venda, internet e mídias digitais, programa de relacionamento, telemarketing e callcenter, marketing direto, assessoria de imprensa e relações públicas (Questão 4, Anexo 2). Com base nas respostas, verifica-se que as três empresas se valem dos instrumentos de marketing de modo bastante variado, pois existem poucas coincidências nas respostas. Ainda assim, é possível identificar alguns pontos em comum: a) uso das feiras e eventos como recurso mais recorrente, tanto no Brasil quanto no exterior; b) uso regular da publicidade na mídia no Brasil (recurso, aliás, pouco utilizado no exterior); c) uso de ações promocionais (tanto ao varejo quanto ao consumidor) e de materiais de ponto-de-venda com maior regularidade no Brasil do que no exterior; d) pouca utilização de instrumentos como programas de relacionamento, relações públicas, assessoria de imprensa, marketing direto e telemarketing no mercado externo (exceção à regra é o uso da internet e das mídias digitais, bem mais utilizadas tanto no Brasil quanto no exterior). A partir destas considerações, o estudo segue agora para a análise mais detalhada da comunicação procurando, inclusive, adentrar nos aspectos de conteúdo e nas questões relativas à comunicação da marca.

Aspectos Relativos à Comunicação e ao Posicionamento de Marca

Em relação aos investimentos em comunicação da marca (Questão 6, Anexo 2), o primeiro aspecto que nos chama a atenção é que as três empresas adotam o mesmo critério para a definição do orçamento de comunicação, isto é, o do percentual sobre as vendas. Em outras palavras, o montante de recursos investidos em comunicação deriva, diretamente, dos resultados de vendas sendo, portanto, variável de período para período. Já a questão 7 (Anexo 2), trata dos meios de comunicação utilizados pelas três indústrias, bem como a frequência de utilização, no Brasil e no mercado externo. 227


O que se pode constatar – num primeiro momento – a partir da análise das respostas dos profissionais de marketing, é que os investimentos em comunicação das empresas são, de modo geral, bem mais frequentes no Brasil do que no exterior, sendo o meio de comunicação internet o mais utilizado de todos, na comparação entre Brasil e exterior. Além da internet, veículos como televisão, revista, painéis luminosos e impressos (panfleto, folder, banner e cartaz) são os mais utilizados, no Brasil. Ao contrário, veículos de mídia exterior (como busdoor e outdoor) e o rádio são os menos utilizados. Disso decorre a seguinte consideração: de modo geral, as empresas estão mais focadas nos meios de comunicação mais seletivos, isto é, aqueles que conferem às suas mensagens maiores possibilidades de segmentação de audiência e promovem ações de comunicação mais direcionadas. Isto pode ser considerado importante fator na construção de uma marca, dependendo do estágio de aptidão (nível de conhecimento, de lembrança espontânea, de preferência, etc.) dela com o seu público visado e, sobretudo, da maneira como estes investimentos são gerenciados do ponto de vista do planejamento de comunicação (considerando-se aspectos como o perfil do público e suas motivações, fatores de influência internos e externos, atuação da concorrência, dentre outros). Já em relação ao teor da comunicação ensejado pelas três empresas na busca de um posicionamento exclusivo na mente dos consumidores, temos o seguinte: se fosse para definir a proposta de posicionamento em apenas uma palavra, o profissional de uma empresa afirmou que enfatiza a ‘confiança’, outra trabalha o conceito de ‘saúde’ e, por fim, outra empresa tem como proposta de posicionamento ‘moda’. No aspecto de posicionamento de comunicação, é possível observar que as três indústrias adotam propostas claramente distintas entre si, ainda que do ponto de vista de posicionamento competitivo tenham se colocado de modo bem semelhante (diferenciação e foco). Assim, uma marca tenta promover a noção de confiança, como algo inerente não somente aos produtos que fabrica (qualidade, durabilidade etc.), como também à própria organização em seus aspectos institucionais. Outra marca, por sua vez, enfatiza a ideia de saúde como algo resultante do conforto proporcionado por seus calçados. De modo geral, ambas desenvolvem propostas de posicionamento com base em benefícios do produto e/ou institucionais. E apenas uma empresa, por sua vez, desenvolve sua comunicação de marca mais no sentido do intangível, focada nas expectativas dos mercados-alvo, num posicionamento orientado para o consumidor por meio dos benefícios de auto-expressão. 228


Em relação aos atributos que se almeja associar à marca, num conjunto exclusivo de ideias particularmente intangíveis que constitui a identidade da marca, os profissionais de marketing elegeram (Questão 9, Anexo 2) – dentre um rol de opções – os seguintes: uma empresa pretende que a marca seja vista, prioritariamente, como alegre, confiável, respeitável, responsável e simpática, distanciando-se de noções como corajosa, atrevida, ousada, glamorosa, moderna e festiva. Outra empresa, por sua vez, quer sua marca percebida, preferencialmente, como correta, criativa, divertida, elegante, moderna, jovem e bacana, além de alegre, confiável, respeitável, responsável e simpática, distanciando-se de noções como atrevida, feminina e sensível. E, finalmente, outra empresa também procura construir uma imagem da marca alegre, confiável, correta, respeitável, responsável e simpática, acrescentando ainda as noções de glamorosa, delicada, divertida, romântica e sensível, atributos afinados com a sua proposta de foco no perfil de maior poder aquisitivo. Observa-se, assim, que apesar da convergência entre vários atributos, as diferenças se acentuam quando as marcas são analisadas sob o enfoque dos aspectos que não desejam associar às mesmas. Temos, portanto, uma marca com postura mais tradicional, outra com personalidade mais descontraída e uma terceira com estilo bem mais arrojado. Finalmente, quando os profissionais foram questionados (Questão 10, Anexo 2) sobre a importância de se vincular a marca da empresa ao país de origem, no caso, o Brasil, no mercado externo, houve concordância nas respostas. Assim, ao atribuírem uma nota numa escala de zero (0) a dez (10), sendo a nota zero representativa de nenhuma importância e a nota dez para a importância máxima, duas das três empresas atribuíram nota dez (10) e uma empresa nota oito (8). Na sequência, os responsáveis pelo marketing das empresas foram indagados sobre como promoviam a ‘Marca Brasil’ no mercado internacional, uma vez que consideram tal ação de grande relevância para as suas estratégias. As explicações foram assim descritas: Empresa A: Os produtos nacionais são reconhecidos no exterior como produtos de qualidade, por isso, o Brasil é promovido através das feiras e publicações dirigidas, bem como no próprio produto e suas embalagens onde há o destaque para o ‘Made in Brazil’. Empresa B: Através do ‘made in Brazil’ nas embalagens, nas etiquetas com a bandeira do Brasil nos produtos, além das cores tropicais (alegres) nas coleções. Empresa C: Através de produtos e campanhas que trazem elementos de ‘brasilidade’.

229


Considerações Finais

Não se pretende, com esse estudo, apontar eventuais falhas e/ou inconsistências no trabalho das empresas envolvidas, nem tampouco analisar se os caminhos estratégicos que estão trilhando – tanto do ponto de vista da organização quanto de marketing ou comunicação – são os mais ou menos indicados, melhores ou piores. Ao contrário, nossa proposta é a de tentar explicar, à luz do referencial teórico adotado, de que forma a prática organizacional consegue aliar as diretrizes estratégicas com as orientações de mercado e de comunicação da marca. Além disso, objetivou-se também compreender a importância da ‘marca Brasil’ para empresas nacionais que atuam no mercado externo. Sem a pretensão de esgotar o assunto, mas, antes de tudo, servir como mais uma referência nas pesquisas sobre a articulação das estratégias competitivas e das estratégias da marca, por meio da análise dos tipos de posicionamento competitivo (estratégico) e de comunicação (da marca), o estudo levanta algumas reflexões após a observação das respostas fornecidas tanto pelos executivos quanto profissionais de marketing. São elas: a) Quando uma empresa afirma que a sua principal vantagem competitiva é a diferenciação, isto significa – do ponto de vista estratégico – desenvolver produtos de excelência (inovação, acabamento, qualidade, design etc.) e, além disso, sustentar essa proposta com um intenso trabalho de marketing e de comunicação, pois a marca é um ativochave nesse processo, capaz de manter e garantir uma posição única, exclusiva e diferenciada na mente dos consumidores; b) O foco no ‘atributo tangível’ conforto, no caso de setor calçadista, tende a se tornar, ao longo do tempo, mera ‘commoditização’ do ponto de vista de posicionamento de comunicação. Isto porque tal conceito pode ser facilmente suplantado por ofertas concorrentes, com maiores ou menores recursos disponíveis. É provável, neste sentido, que este atributo ou benefício, por si só, não seja suficiente para gerar uma percepção de diferenciação no produto, sobretudo com volumes de investimentos relativamente baixos em marketing e comunicação; c) Considerando a outra vantagem competitiva declarada nas entrevistas, o foco num segmento específico de mercado, observa-se que, das empresas estudadas, apenas uma empresa direciona suas ações num único perfil de público definido, possibilitando assim maior coerência e sinergia das ações relativas à construção da marca;

230


d) Na continuidade da reflexão anterior, a postura estratégica da referida empresa em relação ao foco num segmento e à sua comunicação de marca se manifesta quando é a única empresa que não vê tanta sensibilidade ao preço por parte de seus mercados-alvo e, ao mesmo tempo, reconhece que seus consumidores valorizam por demais a marca. As duas outras empresas, ao contrário, admitem ser o fator preço (aliado às condições de pagamento, descontos etc.) mais determinante que a própria marca, especialmente por estarem atuando numa gama maior de segmentos de mercado e, principalmente, de menor poder aquisitivo; e) Além das considerações anteriormente expostas, é importante salientar também que o processo de construção de marca passa, inevitavelmente, por um trabalho denominado ‘Comunicação Integrada de Marketing’, que articula todas as modalidades de comunicação organizacional (Administrativa, Interna, Institucional e Mercadológica) no sentido de conferir, de acordo com Galindo (2008) um ‘alinhamento conceitual’ de todas as manifestações da marca com seus respectivos públicos, internos e externos, clientes ou não. Finalmente, podemos entender que o referido alinhamento conceitual encontra respaldo num ponto em comum nas ações estratégicas, de marketing e de comunicação das três empresas estudadas: todas reconhecem a importância de se promover a marca Brasil no mercado externo e desenvolvem, além disso, cada qual à sua maneira, ações que as possibilitem associar a marca ao conceito de ‘brasilidade’, haja vista que no ramo de atuação das mesmas isto se caracteriza como importante fator de diferenciação e, ao mesmo tempo, fonte de vantagem competitiva.

Referências

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GALINDO, Daniel (org.) Comunicação mercadológica: uma visão multidisciplinar. São Bernardo do Campo: Universidade Metodista de São Paulo, 2008. GHEMAWAT, P. A Estratégia e o Cenário dos Negócios: texto e casos. Porto Alegre: Bookman, 2000. GODOY, A.S. Pesquisa Qualitativa: Tipos fundamentais. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v.35, n.3, p.20–29, mai/jun. 1995 b. 231


HAYES, R. H. e UPTON, D.M. Operation Based Strategy. California Management Review Berkeley. Summer, 1998, p. 1-15.

KOTLER P. & ARMSTRONG, G. Princípios de marketing. Rio de Janeiro: Prentice-Hall do Brasil, 1993. KOTLER, Philip. Administração de marketing: análise, planejamento, implementação e controle. São Paulo: Atlas, 2003. MARTINS, J. A natureza emocional da marca: como escolher a imagem que fortalece a sua marca. São Paulo: Negócio, 1999. MARTINS, José Roberto. BRANDING: um manual para você criar, gerenciar e avaliar marcas. São Paulo: Negócio, 2000. MINTZBERG, H. The rise and fall of strategy planning. New York: The Free Press, 1994. MINTZBERG, H., AHLSTRAND, B. e LAMPEL, J. Safari de Estratégia: um roteiro pela selva do planejamento estratégico. Porto Alegre: Brookman, 2000. MONTOGMERY, C. A. e PORTER M. (org) Estratégia: a busca da vantagem competitiva. Rio de Janeiro: Ed. Campus 1998. PORTER, M. Estratégia competitiva: técnicas para análise de indústrias e da concorrência. 7ª ed. Rio de Janeiro: Campus, 1986. PORTER, M. Vantagem competitiva: criando e sustentando um desempenho superior. Rio de Janeiro: Campus, 1989. PORTER, M. Da Vantagem Competitiva à Estratégia Corporativa. In: MONTOGMERY, C. A. e PORTER M. (org) Estratégia: a busca da vantagem competitiva. Rio de Janeiro: Ed. Campus 1998a. p.237–270. PORTER, M. Competição: On Competition - estratégias competitivas essenciais. 2ª ed. Rio de Janeiro: Campus, 1999.

RIES, Al; TROUT, Jack. Posicionamento, a batalha pela sua mente. São Paulo: Makron Books, 1981. RIES, Al; RIES, Laura. As 22 consagradas leis das marcas. São Paulo: Makron Books, 2000. SAMPAIO, Rafael. Marcas de A a Z: como construir e manter marcas de sucesso. Rio de Janeiro: Campus, 2002.

232


ANEXO A Roteiro de Entrevistas – Setor de Calçados de Birigui - SP

Executivos:

Razão Social da Empresa Nome Fantasia

Informações sobre o entrevistado Nome Cargo Área Tempo na Empresa

Informações Gerais sobre a Indústria Porte da empresa em relação a faturamento Porte da empresa em relação a número de funcionários Produção Anual de Pares Número de Pares Exportados Países para onde exporta

Estratégia Competitiva 

A produção da empresa percentualmente é voltada para quais mercados?

( ) mercados regionais ( ) mercado nacional ( ) mercado externo

233


1 Quem são seus principais concorrentes no Brasil? ( ) empresas regionais ( ) empresas nacionais ( ) empresas internacionais

Quem são seus principais concorrentes no Exterior?

( ) empresas locais ( ) empresas brasileiras ( ) empresas internacionais 1- O que a empresa considera ser sua principal vantagem em relação aos seus

concorrentes? ( ) seu preço ( ) a diferenciação do seu produto ( ) foco em segmentos específicos de clientes ( ) outras 1- De quais estratégias a empresa tem se valido para ampliar sua participação nos

mercados nacional e internacional? Quais são as principais dificuldades neste processo? Quais são os resultados obtidos? 1- Quais são os principais objetivos da empresa para os próximos 5 anos? 1- Em relação à marca (imagem, posicionamento, etc.), associá-la ao Brasil no

mercado externo é: ( ) indispensável ( ) muito importante ( ) indiferente ( ) pouco importante ( ) nada importante 1- Por quê?

ANEXO B Roteiro de Entrevistas – Setor de Calçados de Birigui - SP

Departamento de Marketing / Comunicação: 234


Razão Social da Empresa Nome Fantasia

Informações sobre o entrevistado Nome Cargo Área Tempo na Empresa

ASPECTOS DE MARKETING: 1- Caracterização

do perfil preferencial do mercado consumidor (segundo classe

socioeconômica) objetivado pela marca:

No

( ) A1 ( ) A2

( ) B1

( ) B2

( ) C1

( ) C2

( )D

( )E

( ) A1 ( ) A2

( ) B1

( ) B2

( ) C1

( ) C2

( )D

( )E

Brasil No Exterior

2- Comparativamente à concorrência, analise a empresa (marca) do ponto de vista do

composto mercadológico (4Ps) no Brasil e no Exterior:

Produto

Brasil

Preço

Praça/Distribuiçã o

( ) Ponto Forte ( ) Ponto Forte

( ) Ponto Forte

( ) Ponto Fraco ( ) Ponto Fraco

( ) Ponto Fraco

Exterior

235

Promoção ( ) Ponto Forte ( ) Ponto Fraco


( ) Ponto Forte ( ) Ponto Forte

( ) Ponto Forte

( ) Ponto Fraco ( ) Ponto Fraco ( ) Ponto Fraco

( ) Ponto Forte ( ) Ponto Fraco

3- Dos aspectos abaixo descritos, assinale a melhor descrição para os segmentos de mercado

no Brasil e no Exterior:

Muito / Totalmente Neutro / Indiferente Sensibilidade ao preço e às condições de pagamento Valorização da marca (fabricante conhecido, etc.)

Pouco / Nada

( ) Brasil

( ) Brasil

( ) Brasil

( ) Exterior

( ) Exterior

( ) Exterior

( ) Brasil

( ) Brasil

( ) Brasil

( ) Exterior

( ) Exterior

( ) Exterior

( ) Brasil

( ) Brasil

( ) Brasil

( ) Exterior

( ) Exterior

( ) Exterior

( ) Brasil

( ) Brasil

( ) Brasil

( ) Exterior

( ) Exterior

( ) Exterior

( ) Brasil

( ) Brasil

( ) Brasil

( ) Exterior

( ) Exterior

( ) Exterior

( ) Brasil

( ) Brasil

( ) Brasil

( ) Exterior

( ) Exterior

( ) Exterior

( ) Brasil

( ) Brasil

( ) Brasil

( ) Exterior

( ) Exterior

( ) Exterior

( ) Brasil

( ) Brasil

( ) Brasil

( ) Exterior

( ) Exterior

( ) Exterior

Nível de exigência em termos de qualidade / durabilidade Influência da publicidade (anúncios, material no PDV) Influência de promoções (prêmios, brindes) Valorização do estilo (design) e beleza Influência do varejo (vendedores, etc.) Nível de exigência em termos de conforto

236


Influência de terceiros (opinião de amigos, etc.)

( ) Brasil

( ) Brasil

( ) Brasil

( ) Exterior

( ) Exterior

( ) Exterior

4- Assinale os principais recursos de marketing utilizados tanto no mercado interno quanto

externo bem como sua regularidade:

Sempre

Quase Sempre

Às vezes / Eventualmen Quase Nunca

Nunca

te

Publicidade

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

na mídia

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

Eventos e

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

Feiras

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

Promoções

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

(ao varejo)

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

Incentivo aos

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

vendedores

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

Patrocínio

Promoções (ao consumidor)

Ações no ponto de venda Internet / Mídias Digitais

237


Programas de

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

relacioname

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

Marketing

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

Direto

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

Assessoria de

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

Imprensa

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

Relações

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

Públicas

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

nto Telemarketi ng / Callcenter

ASPECTOS DA COMUNICAÇÃO: 5- A empresa possui uma verba definida (ou orçamento) para investir em divulgação

(comunicação, publicidade, etc.)?

( ) SIM

( ) NÃO

6- (Se SIM) Em geral, como a verba é definida?

( ) Valor fixo e pré-determinado ( ) Percentual sobre as vendas ( ) De acordo com a disponibilidade de caixa ( ) De acordo com a necessidade (objetivos) ( ) Conforme oportunidade e negociação com os veículos (permuta, descontos, etc.)

7- Assinale as principais mídias utilizadas tanto no mercado interno quanto externo bem como

sua regularidade:

Sempre

Quase

Às vezes /

Sempre

Eventualmen

Quase Nunca

Nunca

te Televisão

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

238


( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

Painéis /

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

Luminosos

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

Folder /

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

Panfleto

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

Busdoor

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

Cartaz /

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

( ) Bra

Banner

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

( ) Ext

Rádio

Jornal

Revista

Outdoor

Internet

8- Em termos de posicionamento, descreva em apenas 1 única palavra (ideia ou conceito) o

que a marca deve significar para os seus consumidores: __________________________________________________________________________

9- Atribua valores de 1 a 5 (de acordo com a escala abaixo) conforme os atributos que a

empresa objetiva associar à marca:

Não descreve absolutamente

Descreve

Descreve

ligeiramente a razoavelmente a

nada a marca

marca

marca

1

2

3

Descreve muito a marca 4

Atributos: 239

Descreve totalmente a marca 5


[

] Alegre

[

] Divertida

[

] Jovem

[

] Atualizada

[

] Elegante

[

] Legal (bacana)

[

] Atrevida

[

] Emotiva

[

] Masculina

[

] Bem-humorada

[

] Educada

[

] Moderna

[

] Confiante

[

] Espontânea

[

] Ousada

[

] Confiável

[

] Extrovertida

[

] Respeitável

[

] Corajosa

[

] Feminina

[

] Responsável

[

] Correta

[

] Festiva

[

] Romântica

[

] Criativa

[

] Glamorosa

[

] Sensível

[

] Delicada

[

] Imaginativa

[

] Simpática

10- Numa escala de 1 a 10 (sendo 1 o fator nada relevante e 10 o fator totalmente relevante),

atribua uma nota para a importância de – no mercado externo de um modo geral – se associar a marca ao país de origem (no caso, o Brasil):

( )1

( )2

( )3

( )4

( )5

( )6

( )7

( )8

( )9

( ) 10

11- Comente, de modo geral, como a empresa promove o ‘Brasil’ por meio de suas ações de

comunicação e marketing no mercado externo:

240


241


242


A percepção da marca Brasil Marisa Amaral Camargo Introdução A transformação positiva que o Brasil vem passando desde a implementação do Plano Real até o momento atual, reflete-se de forma bastante consistente na forma como os brasileiros percebem o país. Esta percepção positiva é demonstrada através dos dados que compõem este ensaio, extraídos do estudo Brand Asset Valuator16 realizado pela agência de publicidade Young & Rubican / Young Lab. O BAV, como é conhecido, é uma poderosa ferramenta utilizada mundialmente por profissionais de Marketing e Publicidade, para medir o valor de uma marca. Aqui, cabe o enfoque do Brasil como uma marca e sua posição em relação a outros 22 países que compõem os dados consolidados do estudo de 2010, bem como, a percepção dos brasileiros e de habitantes das demais nações, de cinco marcas globais. No contexto brasileiro, o estudo é realizado a cada dois anos, em três regiões brasileiras – Grande São Paulo, Grande Rio de Janeiro, Interior de São Paulo – e três capitais – Belo Horizonte, Porto Alegre e Recife. Foram entrevistadas três mil pessoas – homens e mulheres, de 18 a 64 anos, classes A, B, C e D.

Análise do modelo do BAV

No BAV as marcas são avaliadas de acordo com quatro pilares: diferenciação, relevância, estima e familiaridade. Os dois primeiros são derivados das atividades de marketing e comunicação, realizadas por uma marca; os dois últimos pilares são derivados diretamente da percepção e experiência do consumidor com a mesma. É feita uma análise conjunta dos pilares, onde é possível obter um diagnóstico da marca determinado pelos

16

Brand Asset Valuator: estudo realizado periodicamente pela agência de publicidade Young

& Rubican / Young Lab em 44 países. O estudo avalia países, marcas de bens de consumo e personalidades utilizando a mesma metodologia, de forma a garantir a comparação dos resultados. 243


resultados obtidos da sua vitalidade (atribuída através da diferenciação e relevância) e sua estatura (vindas da estima e familiaridade). As marcas que desfrutam da melhor avaliação apresentam equilíbrio entre os quatro pilares e, em alguns casos, podem ter menor nível de diferenciação, o qual é compensado por maior relevância, estima e familiaridade. Uma marca de nicho destaca-se pela diferenciação, cenário contrário de uma marca commodity, que se caracteriza por ser forte em familiaridade e estima, tendo menor relevância e pouca diferenciação. Na matriz abaixo, é possível entender como uma marca é analisada pelo modelo do BAV. Gráfico 1: Brand Asset Valuator (BAV)

Fonte: Young & Rubican / Young Lab, 2010

Como o brasileiro percebe o Brasil

Assim como acontece com os demais países avaliados no estudo, a marca Brasil é uma das melhores avaliadas por seus habitantes: o patriotismo é um fenômeno comum aos países de todos os continentes.

244


Entre os habitantes das regiões e capitais investigadas, a percepção do Brasil é extremamente positiva.

Gráfico 2: Ultima Onda (BAV) – Base de dados do Brasil

Fonte: Young & Rubican / Young Lab, 2010

Vale destacar que este é um resultado recente: o comparativo dos resultados da avaliação do Brasil desde o início da década mostra uma expressiva melhora na percepção dos brasileiros, sendo a maior variação percebida, no pilar Estima. Gráfico 3: Ultimas Ondas (BAV) – Base de dados do Brasil: evolução de 2000 a 2011

245


Fonte: Young & Rubican / Young Lab, 2010

Analisando a evolução recente do país, a partir de 1994, a economia no Brasil passa a ter um caráter de estabilidade desconhecido por parte da população até aquele momento. Ao longo dos anos seguintes, mesmo com a transição de governo ocorrida em 2002, este caráter se manteve, dando condições para o país passar por uma grande transformação social, uma vez que milhões de habitantes ascenderam economicamente e passaram a ter acesso a condições de vida melhores, propiciadas pela aquisição de bens e serviços. O maior salto na avaliação do Brasil se dá justamente entre as ondas realizadas em 2000 e 2003. O expressivo aumento da classe C que, ao ganhar maior poder de compra, seja através de programas sociais de transferência de renda, seja por uma melhoria real de salário, transforma a pirâmide social, modificando sua estrutura, que passa a contar com uma faixa intermediária mais robusta e uma base menor. A partir de 2002 até o final da primeira década do século XXI, cerca de 30 milhões de pessoas migraram das classes D/E para a classe C. Milhões de indivíduos atravessaram a barreira de classe, para ingressar num extrato superior e nele permanecer. Essa migração trouxe mudanças de comportamento sustentadas pelas mudanças econômicas e da ampliação do poder aquisitivo, impactando alguns setores diretamente como, por exemplo, a explosão do mercado de higiene pessoal e limpeza, o consumo de alimentos industrializados de maior valor agregado, a compra da casa própria, o recorde na venda de veículos, a expansão das escolas privadas, a ampliação do setor de serviços, sobretudo de 246


telecomunicações, entre tantos outros exemplos. Houve uma alteração significativa na economia do país. De imóveis populares a carros de luxo, a aquisição dos bens desejados pelas diferentes camadas da população, passa pela possibilidade do parcelamento, muitas vezes em longos prazos. Assim, a abundante oferta de crédito e a disposição em comprometer parcela mais representativa da renda, auxiliam toda expansão pela qual o Brasil está passando. Estes fatores têm ajudado a mudar o perfil de consumo, em todas as classes, sendo que a percepção do país passa por uma transformação positiva entre todas as faixas avaliadas.

Gráfico 4: Ultimas Ondas (BAV) – Base de dados Brasil: evolução de 2000 a 2011 por classe social

Fonte: Young & Rubican / Young Lab, 2010

Percepção regional

A forma de ocupação do território desde seu descobrimento, marcada em geral pela especialização produtiva (açúcar, gado, ouro, borracha), bem como a dimensão continental do 247


Brasil são fatores que contribuíram expressivamente para que as regiões do país sejam bastante distintas, em suas características, ainda hoje. Soma-se a este fato a intensa imigração de contingentes europeus e japoneses no início do século XX, que se estabeleceram muitas vezes em regiões específicas do país, reproduzindo colônias fechadas em seus hábitos e valores, que acabaram por introduzir formatos específicos de cultivo e de comércio, na sua faixa de fixação. Com o processo de intensa urbanização sofrido pelas capitais a partir da segunda metade do século XX, houve uma transformação da economia brasileira. Os programas de distribuição de renda que vem sendo aplicados desde o início do Plano Real e mais intensamente a partir de 2002 transformaram os níveis de consumo no país: o que se vê de forma levemente mais horizontal é um crescimento de outras regiões que não o Sudeste, mesmo com a cidade de São Paulo sendo o motor econômico do país, com PIB equivalente a 12% do total brasileiro. É nesta dimensão que se situa um dos grandes desafios da nação: minimizar as desigualdades regionais, que precisam deixar de representar a realidade dos Estados de maior desenvolvimento econômico e social, horizontalizando os indicadores favoráveis para o país como um todo. Em relação à percepção de seus habitantes na primeira década do século XXI, os resultados do Interior de São Paulo, Recife e Porto Alegre apresentam forte evolução na percepção da marca Brasil. Gráfico 5: Ultimas Ondas (BAV) – Base de dados Brasil: evolução de 2000 a 2011 por região

248


Fonte: Young & Rubican / Young Lab, 2010

Percepção externa do Brasil Um olhar sobre os avanços recentes do país evidencia a importância do Brasil, que hoje desponta como liderança global. O país consolidou, ao longo dos últimos 20 anos, um impressionante conjunto de conquistas na economia, na política e na sociedade, marcadamente com o fim da ditadura militar, a abertura da economia e a estabilização da inflação, a incorporação das regras básicas da macroeconomia, a retirada de milhões de pessoas da pobreza, tendo como desdobramento o surgimento de um enorme mercado consumidor. Estas transformações são percebidas de forma desigual, externamente. De acordo com o gráfico abaixo, é possível constatar que a percepção externa do Brasil concentra-se mais expressivamente no quadrante de vitalidade do que no quadrante de estatura. O mesmo ocorre com a média de todas as nações, representada pelo ponto vermelho. Entre os pilares avaliados, é a diferenciação que contribui de forma mais expressiva para este resultado, seguido por familiaridade e relevância.

Gráfico 6: Ultima Onda (BAV) – Comparativo entre os países

249


Fonte: Young & Rubican / Young Lab, 2010

Comparativamente com estudos anteriores é interessante perceber como a percepção externa do Brasil é mais favorável em 2010, em potências como EUA e Alemanha. Para este último país, a percepção do Brasil é a de um líder, onde a estima tem a mesma importância dos demais pilares. Para os EUA, há uma forte migração da marca Brasil no sentido do quadrante de marcas com grande potencial, onde a diferenciação e a relevância se destacam. Esta evolução certamente está baseada na profunda transformação que a sociedade brasileira está experimentando, reflexo da crescente solidez registrada nos fundamentos macroeconômicos do país nos últimos anos (área fiscal, comércio exterior e política monetária), colocando o Brasil numa posição de destaque desde o início da crise de 2008 nos EUA, e com o acirramento recente da crise na zona do Euro, onde países como Itália, Grécia, Espanha e Portugal estão em situação de insolvência. Contribuem para o atual processo de sustentabilidade de crescimento da economia do Brasil, o comportamento dos investimentos em linha com as expectativas e com o ritmo de crescimento da produção e da utilização da capacidade industrial instalada, elementos que favorecem uma classificação positiva do risco de investimento no país. Gráfico 7: Ultimas Ondas (BAV) – Evolução da percepção do Brasil pela França, Alemanha e EUA

250


Fonte: Young & Rubican / Young Lab, 2010 Em relação aos outros componentes do bloco dos países em desenvolvimento com enorme potencial de crescimento – o BRIC – o Brasil é percebido como o país com maior vitalidade entre os quatro, apesar de a China ter PIB superior. Podem influenciar este resultado, o maior amadurecimento da democracia e dos direitos civis no Brasil, questões ainda controversas nos outros três participantes do bloco.

Gráfico 8: Ultima Onda (BAV) – Comparativo BRIC

251


Fonte: Young & Rubican / Young Lab, 2010

Outro ponto importante para esta percepção do Brasil, provavelmente ocorre em função de que, entre os quatro países, o Brasil é a única nação que tem a capacidade de prover todos os elementos econômicos, ou seja, fornecendo bens da indústria, serviços e recursos simultaneamente. O Brasil continua a ter vantagem comparativa em diversos setores, em especial naqueles em que consegue aliar suas condições naturais favoráveis com uma boa produtividade Em contrapartida, China e a Índia, respectivamente, estão a caminho de tornar-se os principais fornecedores mundiais de produtos manufaturados e serviços respectivamente, enquanto a Rússia tende a permacecer principalmente como fornecedora de matéria-prima.

Identidade brasileira

Impossível pensar na população brasileira como detentora de traços comuns, homogêneos. Ao contrário, a diversidade cultural é uma dos traços definidores da identidade brasileira, que foi se formando desde o descobrimento, de forma ambígua, a partir de influências externas – dos colonizadores portugueses e dos negros escravos – e internas – dos índios que aqui viviam. A identidade brasileira desenvolveu-se por um tortuoso caminho: é a partir das gerações de mestiços que começou a se formar um traço coletivo próprio, apesar da diversidade interna de seus indivíduos, os quais se sentiam desafiados a construí-la a partir de 252


uma mistura sem tradição: esta identidade teve, ao mesmo tempo, que anular as identificações étnicas dos povos de origem, dos mestiços e criar um traço coletivo que os definiu como brasileiros. Apenas na década de 1990 a abertura da economia começou a acontecer e, com o Plano Real, o Brasil encontrou uma relativa estabilidade econômica, mesmo ainda vivendo algumas sequelas do alto endividamento externo, uma das heranças diretas do “milagre econômico” dos anos 70 e da ditadura militar. Assim, a reorientação da estratégia e da política governamental com a liberalização cambial e a desregulamentação internacional de capitais foi resultado das restrições impostas por este contexto, da necessidade de atrair capital e da falta de um plano alternativo de ajuste e desenvolvimento. Através das políticas neoliberais, o país começa a participar, de forma mais intensa, da interdependência das economias dos países desenvolvidos, que necessitam de acesso aos mercados internacionais de bens e serviços, como uma saída para seus mercados internos já saturados, um dos principais fatores determinantes do fenômeno da globalização. Nesta medida, é interessante perceber como marcas estrangeiras são bem aceitas e, em muitos casos, tem seu melhor resultado no Brasil, conforme demonstram os gráficos abaixo, comparando o desempenho de cinco marcas globais, nos países que compõem o BAV.

Gráfico 9: Ultima Onda (BAV) – Avaliação de OMO

253


Fonte: Young & Rubican / Young Lab, 2010 Gráfico 10: Ultima Onda (BAV) – Avaliação do Mc Donald’s

Fonte: Young & Rubican / Young Lab, 2010

254


Gráfico 11: Ultima Onda (BAV) – Avaliação de Hellmann’s

Fonte: Young & Rubican / Young Lab, 2010 Gráfico 12: Ultima Onda (BAV) – Avaliação da Fiat

Fonte: Young & Rubican / Young Lab, 2010

255


Gráfico 13: Ultima Onda (BAV) – Avaliação da Nestle

Fonte: Young & Rubican / Young Lab, 2010

Características de personificação: o Brasil tem muito a melhorar Apesar da evolução positiva pela qual o Brasil está passando, atualmente um passo decisivo é entender que forma o Estado deverá ter, pois historicamente, ele é o responsável por algumas das principais mazelas do país, como a péssima qualidade da educação, o deficiente sistema de saúde, uma carga tributária asfixiante, a burocracia que sufoca o empreendedorismo e se perpetua governo após governo, além da corrupção institucionalizada. Alguns atributos de imagem analisados no BAV mostram o quanto as transformações recentes do Brasil contribuíram positivamente na percepção do país como uma marca de prestígio, confiável, com responsabilidade social, avançada e líder (dados de 2011 vs. 2000). No entanto, o mesmo gráfico traz a percepção externa do país: os resultados explicitam o reflexo dos problemas estruturais. A confiança no Brasil é o pior resultado, seguido pela baixa percepção de prestígio, responsabilidade social e liderança.

256


Gráfico 14: Personificação do Brasil

Fonte: Young & Rubican / Young Lab, 2010

Dentro das prioridades do país, o Estado precisa de eficiência. O Brasil, como todos os países que são participantes do fenômeno da globalização, sofrem a influência de que o ingresso de capital estrangeiro é determinado pelas oportunidades de lucro e não necessariamente pelas estratégias e políticas econômicas do país que recebe o investimento; parte significativa da produção nacional está sob controle das empresas multinacionais, contribuindo para o crescimento das remessas de lucro e dividendos para o exterior. Os desafios com os quais o Brasil se defronta são próprios de um país de dimensões continentais caracterizado pela heterogeneidade social, mas com um sistema econômico integrado em torno de um mercado interno de respeitável dimensão e grande potencialidade de crescimento. ‘É de assinalar que, apesar de feitos pela fusão de matrizes tão diferenciadas, os brasileiros são, hoje, um dos povos mais homogêneos linguística e culturalmente e também um dos mais integrados socialmente na Terra. Falam uma mesma língua, sem dialetos. Não abrigam nenhum contingente reivindicativo de autonomia, nem se apegam a nenhum passado. Estamos abertos é para o futuro.’ (RIBEIRO, 2010, página 410) 257


No entanto, a redução sustentada da pobreza é impossível sem um crescimento sustentado. Ganhos sistêmicos e dinâmicos de produtividade só podem ser obtidos se as políticas ou estratégias de produção, inovação e competitividade estiverem concebidas e relacionadas à satisfação das condições postas pelas dimensões da soberania externa, da coerência macroeconômica, da regulação pública e de uma verdadeira inclusão social. O Brasil encontra-se em um momento extremamente favorável. Cabe de forma premente um maior equilíbrio entre suas reconhecidas qualidades e potencialidades, com maciços investimentos em educação e infra-estrutura que, se pode dizer, são dois lados da mesma moeda. O que o Brasil precisa é priorizar os recursos humanos e a capacidade de suportar de forma eficiente a riqueza que o país é capaz de gerar. E, assim como os quatro pilares do modelo do BAV, atingir um verdadeiro equilíbrio.

Referências

MELLO, João Manuel Cardoso de; NOVAIS, Fernando A. Capitalismos tardio e sociabilidade moderna in História da vida privada no Brasil, volume 4. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. GONÇALVES, Reinaldo. Globalização e desnacionalização. São Paulo: Paz e Terra, 1999. NAPOLEONI, Cláudio. O pensamento econômico do século XX. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990. YOUNG & RUBICAN / YOUNG LAB. Brand Asset Valuator. Young & Rubican / Young Lab , 2010.

258


259


260


Representações sobre o Brasil em língua inglesa sob a perspectiva da Linguística Sistêmico-Funcional Orlando Vian Jr. A construção linguística das representações

O objetivo deste texto é discutir como imagens sobre o Brasil são construídas linguisticamente em textos jornalísticos de dois veículos da área econômica escritos em língua inglesa: a revista estadunidense Business Week e o jornal britânico Financial Times, com o intuito de demonstrar como as escolhas linguísticas constroem sentidos em um texto e, por conseguinte, constroem imagens e representações sobre o país. Os dois textos (cf. Anexos 1 e 2) foram produzidos em momentos sócio-históricos distintos: em junho de 2010 e em março de 2011. Para discussão de alguns aspectos de sua análise, utilizamos elementos da Linguística Sistêmico-Funcional (LSF, doravante) de Halliday (1985, 1994) e Halliday e Matthiessen (2004), que concebe a linguagem como um sistema semiótico, multifuncional e estratificado. O arcabouço teórico da LSF é bastante amplo e abrangente, pois é uma teoria que concebe a linguagem como um fenômeno estratificado em três níveis: grafo-fonológico, léxico-gramatical e semântico-discursivo. A língua é um sistema de escolhas à disposição dos usuários e as escolhas feitas em um estrato são realizadas linguisticamente no estrato seguinte. Por exemplo: ao escrever ou dizer algo (estrato grafo-fonológico) são feitas escolhas lexicais e gramaticais (estrato léxico-gramatical) e são construídos sentidos no discurso (estrato semântico-discursivo). A análise das escolhas realizadas pelos produtores textuais, desse modo, permite que observemos as representações de mundo construídas nos textos, pois toda escolha é simultaneamente metafuncional, ou seja, sempre expressamos nossos desejos, vontades, pensamentos, visões de mundo, opiniões (metafunção ideacional17), na interação com nossos interlocutores (metafunção interpessoal) e tudo o que expressamos é organizado em um texto (metafunção textual) para que nossos objetivos sócio-comunicativos sejam atingidos.

17

As três metafunções são explicitadas e desenvolvidas no item 2. 261


Com base nesse arcabouço teórico, apresentaremos, neste capítulo, por restrições de espaço e devido ao escopo do trabalho, apenas uma das facetas léxico-gramaticais dos textos sob análise: algumas escolhas léxico-gramaticais relativas à metafunção ideacional e, mais especificamente, determinadas escolhas de processos e de participantes de maneira a ilustrar o modo como a linguagem é realizada em textos e como tais textos trazem em si marcas do contexto em que são produzidos. Nosso objetivo central é apresentar as distintas possibilidades sobre o modo como algumas representações de mundo, nesse caso, sobre o Brasil, são construídas pelos produtores textuais.

Uma perspectiva linguística das representações: a Linguística Sistêmico-Funcional

Adotamos, neste texto, conforme sinalizado, a perspectiva da LSF para observarmos como ocorrem determinadas escolhas léxico-gramaticais na construção da imagem do Brasil conforme avaliados por dois veículos: a revista estadunidense Business Week e o jornal inglês Financial Times, cujos textos (cf. Anexos 1 e 2) foram acessados da versão on-line dos veículos citados. Apenas como localização teórica do leitor, sinalizamos que a LSF caracteriza-se como uma dentre diversas outras possibilidades de analisar a linguagem a partir de uma perspectiva funcionalista. A LSF proposta por Halliday (1978, 1994, dentre outros) e Halliday e Matthiessen (2004), desse modo, concebe a linguagem como uma prática social e o uso é motivado por uma finalidade. Dentre os diversos sistemas semióticos existentes à disposição dos usuários, a linguagem verbal é apenas um deles e é utilizada, nessa perspectiva, como um recurso para construir sentidos.

Os significados em todas as interações humanas, sejam elas orais ou escritas, são realizados mediante a produção de textos e cada texto produzido está inserido em um contexto de cultura (Gênero) e em um contexto de situação (Registro), sendo que esses aspectos estarão presentes no texto, já que todo texto traz em si marcas do contexto. Desse modo, o contexto de situação possui características extralinguísticas que se materializarão na produção do texto. Esses três aspectos do contexto são denominados Campo, Relações e Modo. O Campo diz respeito ao assunto que está sendo tratado, sobre o que está se falando ou 262


escrevendo; as Relações dizem respeito às relações estabelecidas entre o produtor textual e seu leitor/ouvinte e o Modo está relacionado ao papel que a linguagem está desempenhando na interação, bem como o meio ou canal de transmissão da mensagem (EGGINS, 1994, p. 52). A partir dessa relação texto/contexto, as escolhas linguísticas feitas em um texto são afetadas diretamente por essas variáveis de contexto, já que usamos a linguagem com três grandes propósitos:

(1)

falar sobre o que está acontecendo ao nosso redor no mundo, expressar nossos sentimentos, atitudes, emoções, desejos, etc.;

(2)

interagir com nossos interlocutores, seja de forma oral ou por escrito e expressar nossos pontos de vista;

(3)

organizar o que expressamos em um texto coerente.

Essas três funções estarão presentes em toda e qualquer interação e, por essa razão, Halliday as nomeia de metafunções: ideacional, interpessoal e textual. Tem-se, assim, uma relação dialética entre o contexto e o texto, pois as variáveis de contextos são realizadas linguisticamente no texto e, desse modo, fica estabelecida uma relação entre as variáveis de contexto e as metafunções, conforme Quadro 1:

Quadro 1: Relação variáveis de registo/metafunções Variável de registro

Metafunção

Campo

Ideacional

Relações

Interpessoal

Modo

Textual

Se pensarmos em nossas interações cotidianas, é óbvio perceber que interagimos com nossos interactantes para a troca de ideias, pensamentos, sentimentos e emoções e organizamos, mesmo que inconscientemente, cada um dos enunciados, ou seja, representamos nosso mundo interior e exterior ao transmitirmos ideias (ideacional) na interação com o outro (interpessoal) e organizamos nossa fala ou escrita (textual). 263


Neste artigo, como estamos interessados nas representações, discutiremos apenas a metafunção ideacional e não abordaremos as metafunções interpessoal e textual. Remeto o leitor a Halliday (1978, 1994), Halliday e Matthiessen (2004) e Eggins (1994/2002) para uma visão pormenorizada da dos princípios teóricos da LSF.

A metafunção ideacional

Podemos analisar as orações componentes de um texto a partir do modo como o produtor textual usa a linguagem para representar o mundo e suas experiências nele, o modo como descrevemos eventos, atividades, comportamentos e estados, assim como quem ou o que está envolvido nessas experiências (pessoas, lugares, coisas, conceitos), além das circunstâncias nas quais esses eventos ocorrem (quando, onde, como, de que modo, porque, etc.). A análise da oração como representação considera-se o sistema de transitividade, responsável pela construção da experiência. Em função das experiências construídas no texto, gramaticalmente temos que os grupos verbais representam atividades e estados e expressam diferentes tipos de significados por meio de verbos de ação, sensação, relação, existência, verbalizações. Os grupos nominais representam pessoas, lugares, coisas, ideias, etc. e as condições em que ocorrem tais eventos são representadas por grupos adverbiais e grupos nominais. A transitividade é o recurso gramatical por meio do qual são realizados os significados experienciais em um texto. Halliday classifica os processos em seis tipos: material, relacional, mental, verbal, existencial e comportamental. Cada processo terá, desse modo, participantes específicos, resumidos no Quadro 2:

Quadro 2: Tipos de orações, processos e participantes (baseados em Halliday e Matthiessen, 2004) Tipo de oração

Participantes

Significado

fazer, beber, praticar,

Ator, Meta, Escopo, Material

Beneficiário

Exemplos de processos

Fazer, acontecer

aparecer, pagar, exercer, ocorrer

Mental

Experienciador,

Perceber, pensar,

perceber, ver, ouvir,

Fenômeno

sentir, desejar

lembrar, pensar, saber,

264


gostar, odiar, amar, querer Portador, Atributo, Relacional

Caracterizar,

Identificado,

Identificar

ser, ter, estar

Identificador Comportante, Comportamental

Comportamento

Comportar-se

rir, chorar, dormir, pular, golpear dizer, perguntar,

Verbal

Existencial

Dizente, Verbiagem,

Dizer

responder, contar, relatar,

Receptor, Alvo

explicar Existir

Existente

haver, existir

O Quadro 2, portanto, ilustra o aspecto de que a transitividade “é compreendida pela LSF como a gramática da oração, como uma unidade estrutural que serve para expressar uma gama particular de significados ideacionais ou cognitivos (FURTADO DA CUNHA; SOUZA, 2007, p. 53). Além disso, esse sistema “permite identificar ações e atividades humanas que estão sendo expressas no discurso e que realidade está sendo retratada” (FURTADO DA CUNHA; SOUZA, 2007, pp. 53-54), distinguindo-se do modo como o paradigma formalista concebe tal sistema. Estes elementos possibilitam a análise dos mecanismos de transitividade nos textos para se compreender como o mundo é representado com base nas escolhas disponíveis no sistema linguístico feito pelo produtor textual, conforme veremos a seguir.

Metodologia

A utilização de programas para quantificação de dados, como o WordSmith Tools (Scott, 2009), para a análise de textos permite que estes sejam observados por um ângulo quantitativo, fornecendo pistas para que, assim, com base neles, possamos proceder a análises qualitativas. Embora analisemos apenas dois textos, utilizamos a ferramenta WordList, do software WordSmith Tools para quantificar as ocorrências lexicais e nos fornecer pistas para análise.

265


A metodologia utilizada para as análises e discussões aqui apresentadas, portanto, caracteriza-se como quali-quantitativa (BAUER; GASKELL, 2002), pois observa os fenômenos linguísticos ocorridos nos textos e os interpreta por meio de suas ocorrências quantitativas.

Os textos analisados

A análise aqui desenvolvida baseia-se em apenas dois textos: Emerging markets [Mercados emergentes], retirado da revista estadunidense Business Week de junho de 2010, referido aqui como Texto 1 e Statistics and lies [Estatísticas e mentiras], retirado do jornal inglês The Economist de 10 de março de 2011, referido aqui como Texto 2.

Quadro 3: Tamanho dos textos Texto 1

Texto 2

Total de palavras (Tokens)

651

410

Palavras diferentes (Types)

370

232

56.84

56.59

Razão entre o total de palavras e palavras diferentes

As cinco palavras de conteúdo18 mais frequentes nos dois textos estão elencadas no Quadro 2:

Quadro 4: Palavras mais frequentes no corpus Texto 1

Texto 2

Item lexical Frequência Item lexical

18

Frequência

is

15

Brazil

8

inflation

7

economy

7

economy

6

but

6

are

5

is

5

Palavras de conteúdo são aquelas que carregam sentido e foram excluídos dessa contagem, por exemplo, preposições e artigos. 266


Brazil

5

year

5

Procedimentos de análise

Para análise dos dados utilizamos como ponto de partida a ferramenta WordList do programa computacional WordSmith Tools (Scott, 2009), que fornece a lista de frequência das palavras nos textos, o que permite que se visualizem todas as palavras ocorridas em um corpus ou em corpora distintos. Com base nesta pista quantitativa, obtida pela lista de palavras, restringiremos nossa análise a apenas dois aspectos do sistema de transitividade: os processos relacionais e materiais, já que foram evidenciados como um dos itens mais frequentes na lista de palavras, como ilustra o Quadro 5 para os processos relacionais:

Quadro 5: Ocorrências dos processos relacionais Ocorrências

Ocorrências

no Texto 1

no Texto 2

Is

15

5

Were

-

4

Are

5

-

Have

4

-

Had

-

4

Item lexical

Nossa análise, portanto, partirá dos resultados evidenciados pelo programa computacional para que possamos observá-los a partir de uma perspectiva qualitativa e nosso foco será apenas no verbo ‘ser’ em inglês em sua forma no presente e no singular (is), que ocorre tanto na composição de processos materiais (ações, atos do fazer) em sua forma contínua, quanto nos processos relacionais (estados, relações de ser).

As representações construídas: discussão dos dados

267


A partir dos resultados obtidos na lista de palavras (Quadro 4), observou-se uma frequência significativa do verbo ‘ser’, conforme ilustra o Quadro 2. O verbo ‘ser’ figura nos textos em processos relacionais que, em termos sistêmico-funcionais (Halliday, 1994; Halliday e Matthiessen, 2004), estabelece relações atributivas ou identificadoras, isto é, revelam ao leitor atributos das entidades envolvidas nos processos ou aspectos identificadores dessas entidades. Por exemplo, se dizemos que Fulana é inteligente, estamos atribuindo algo e se dizemos Fulana é brasileira, estamos apenas identificando, isto é, os processos relacionais podem ser classificados em atributivos e identificadores, conforme exemplos de (1) a (4) do Texto 1:

Texto 1: (1)

… and the currency, which is up 4.4 percent …

(2)

… the Brazilian outlook is "very positive"…

(3)

"The market is calmer," says Saddi Castro…

(4)

…inflation is higher than the government…

Os exemplos acima revelam aspectos econômicos relacionados ao Brasil na visão de seus produtores textuais, que seguem uma estrutura que indicam quem é o portador e que atributo ou identificação a ele está relacionada, como ilustra o Quadro 6:

Quadro 6: Exemplos de ocorrências de processos relacionais Portador

Processo

Identificador/Atributo

...currency

is

up to 4.4 percent

...the Brazilian outlook

is

very positive

...the market

is

calmer

...inflation

is

higher

Outra ocorrência frequente são os processos materiais, isto é, processos em que alguma entidade realiza alguma coisa, desempenha alguma ação (EGGINS, 1994, p. 230). Um critério para que se identifiquem os processos materiais é por meio da pergunta: O que x 268


fez? Revelando, assim, quem são os participantes envolvidos nas ações. Ocorrem, nos dois textos, casos como os apresentados nos exemplos de (5) a (12) a seguir:

Exemplos: (5)

Meirelles' tough act is already having an impact.

(6)

…and the government is trying to cool things down…[

(7)

Brazil is experiencing its fastest…

(8)

Elsewhere, a truck shortage is pushing up the costs of…

(9)

…which is what's setting off those…

(10)

…that the country's economy is "overheating" and…

(11)

"Demand is growing at a Chinese pace…

(12)

Inflation, now at 5.2percent, is increasing faster than…

Como se pode observar, os processos materiais envolvem um ator, ou seja, a entidade que realiza a ação e, nos exemplos apresentados, seguem a seguinte estrutura:

Quadro 7: Exemplos de ocorrências de processos materiais Ator

Processo: Material

Meirelles' tough act

is already having

the government

is trying

Brazil

is experiencing

a truck shortage

is pushing up

what

is setting off

the country's economy

is overheating

Demand

is growing

Inflation

is increasing

O que percebemos pelos exemplos acima é que os processos materiais indicam ações que estavam ocorrendo no Brasil no momento em que o texto foi produzido e o uso dos processos em sua forma contínua (verbo ser + verbo/ing) indicam ações dinâmicas, que estavam efetivamente acontecendo, sugerindo ao leitor que o país e seus representantes 269


estavam trabalhando para que mudanças ocorram, imprimindo, ao mesmo tempo, dinamicidade e credibilidade. As representações construídas pelos produtores textuais, desse modo, revelam escolhas linguísticas que demonstram que o texto possui uma relação com seu contexto de produção, a partir da relação entre as variáveis de registro (campo, relações e modo) e as metafunções (ideacional, interpessoal e textual) e que, ao mesmo tempo, estabelece-se uma interação entre autor e leitor de modo a evidenciar as representações construídas e revelando, ao mesmo tempo, aspectos ideológicos das escolhas feitas. O Texto 1, veiculado na revista produzida nos Estados Unidos, revela o aspecto do desenvolvimento da economia brasileira desde o seu título, pois já sinaliza ao leitor que se trata de um mercado emergente, mesmo indicando na sequência que há um lado negativo (downside).

Já o Texto 2, veiculado em um jornal produzido na Inglaterra, mostra aspectos contraditórios da economia brasileira. Uma pista linguística significativa para tal aspecto são as ocorrências do item lexical but, ocorrendo 6 vezes no texto, indicando aspectos adversativos, o que sugere, desde o princípio, as estatísticas e as mentiras (statistics and lies), mas apontando, do mesmo modo, aspectos indicativos do desenvolvimento do país. As escolhas lexicais feitas pelos produtores textuais estão diretamente relacionadas aos fatores ideológicos dos veículos e são perceptíveis pela materialidade linguística do texto que, como preceituado pela LSF e já apontado anteriormente, traz em si marcas do contexto em que é produzido e a análise de tais elementos permite que se desvelem os diversos significados e sua relação com o modo como as representações sobre economia brasileira foram construídas a partir da perspectiva dos Estados Unidos, no caso do texto 1, e na perspectiva da Inglaterra, no caso do texto 2. Ao observarmos ambos em conjunto, no entanto, percebemos um aspecto comum: as dicotomias do país e a forma como os mercados externos veem tais contradições e os impactos que estas podem ter no mercado mundial.

Considerações finais

Foram apresentados, neste capítulo, possíveis encaminhamentos de aspectos da análise linguística com base nos elementos teórico-metodológicos da LSF de dois textos 270


produzidos em língua inglesa, um publicado nos Estados Unidos e outro na Inglaterra, como modo de observar os mecanismos linguísticos pelos quais as representações sobre o Brasil são construídas nos textos. É possível perceber, pela análise de apenas alguns dos significados ideacionais, com base no sistema de transitividade (Halliday, 1994), o modo como os atores sociais são representados no discurso por meio das escolhas léxico-gramaticais. O Brasil é apresentado como ator em processos de contínuas realizações, sendo atribuído ao país processos típicos de pessoas, indicando o modo como a economia do país está, na época da publicação do texto, em desenvolvimento e como o país está trabalhando continuamente para combater seus problemas, em contrapartida a aspectos negativos. Outros atores sociais, como Meirelles e Lula são representados executando ações que levam o país a superar seus problemas. Um aspecto a ser sinalizado é a quantidade mínima de textos utilizada. Apenas dois exemplares, um de cada país. Em análises mais densas com um corpus mais extenso, outras escolhas poderão emergir e, por conseguinte, resultados diferentes dos aqui apresentados podem ser revelados. Há que se sinalizar ainda uma característica relevante dos textos, já que ambos são jornalísticos e, pesquisas com textos pertencentes a outros gêneros que circulam em outras esferas discursivas também farão emergir outros significados, principalmente em razão de fatores sócio-ideológicos. Sinalizamos ainda que a análise aqui apresentada ateve-se apenas a alguns tipos de processos, portanto, detivemo-nos na análise da metafunção ideacional e em seu sistema de transitividade, mas as outras metafunções (interpessoal e textual) também podem ser analisadas e ocorrem simultaneamente no texto. Uma vez que nosso intuito neste texto foi apenas o de mostrar a vasta gama de possibilidades de análise linguística de um texto jornalístico, detivemo-nos nos elementos mais relevantes revelados pelos dados quantitativos indicados pelo programa computacional Word SmithTools, mas outras possibilidades ficam abertas e passíveis de realização, já que este programa permite trabalhar com corpora vastíssimos e grande quantidade de textos. Nosso intuito foi apenas o de indicar caminhos que ficam abertos para futuras pesquisas.

Referências

BAUER, M.W.; GASKELL, G. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático. Petrópolis: Vozes, 2002. 271


FURTADO DA CUNHA, M.A.; SOUZA, M.M. Transitividade e seus contextos de uso. Rio de Janeiro: Lucerna, 2007. EGGINS, S. An introduction to systemic functional linguistics. London: Continuum, 1994. HALLIDAY, M.A.K. Language as social semiotic: the social interpretation of language and meaning. London: Edward Arnold, 1978. HALLIDAY, M.A.K. An introduction to functional grammar. London: Edward Arnold. 1985. HALLIDAY, M.A.K. An Introduction to Functional Grammar (Second Edition). London: Arnold, 1994 HALLIDAY, M.A.K.; MATHIESSEN, C.M.I.M. An Introduction to Functional Grammar (Third edition). London: Arnold, 2004 SCOTT, Mike. WordSmith Tools. Oxford: Oxford University Press, 2009.

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Anexo 1 –Texto da revista Business Week, junho de 2010

EMERGING MARKETS Brazil's Economy: Growth May Have a Downside

The challenge for Lula and Brazil's policymakers is to tame inflation and cool off the economy without slowing growth—a tough assignment By Carla Simoes and Iuri Dantas

Cia de Bebidas das Américas (ABV) (AmBev), Latin America's largest brewer, recently had to import beer cans into Brazil for the first time in its 125-year history after local supplies were exhausted. One of Brazil's top sugar producers, Açúcar Guarani, left 10 percent of its crop sitting in the fields an extra 40 days because it couldn't acquire enough tires for its harvesters. "We tried to buy directly from China, but they didn't have tires for delivery either," says Jaime Stupiello, agricultural director for Açúcar Guarani. Elsewhere, a truck shortage is pushing up the costs of shipping goods from Brazil's industrial heartland to the rest of the country. Brazil is experiencing its fastest economic growth in almost two decades, which is what's setting off those nationwide shortages. The country's government statistics office announced on June 8 that gross domestic product expansion hit 9percent in the first quarter. That's well above the potential growth rate of 4.5percent most economists have calculated for Brazil. Inflation, now at 5.2percent, is increasing faster than the government's target of 4.5percent. Central bank President Henrique Meirelles has jacked interest rates up twice this year, to 10.25 percent. The latest hike was on June 9. He won't stop there, says Elson Teles, chief economist at Maxima Asset Management in Rio de Janeiro. "Demand is growing at a Chinese pace," says Teles. "That's why the central bank will keep raising the Selic [the overnight lending rate]." Meirelles won't explicitly state his policy on interest rates for the rest of the year. He did, however, tell Bloomberg Television on June4 that the country's economy is "overheating" and policymakers are in a "tightening mood." It sounds as if the Brazilians are about to wage a pitched battle against rampant inflation. Yet here's the puzzle—inflation is higher than the government's target, but it hardly seems out of control. Economists as prominent as New York University professor NourielRoubini still think the Brazilian outlook is "very positive," as he told an audience in São Paulo on May 31. Several issues are at play here. One concerns the economic ghosts that haunt the Brazilians, who endured debilitating bouts of hyperinflation in the recent past. No one wants to see inflation reach gale force. Brazilians are also aware that they can do better at managing the economy. Nearby Peru has lower inflation and still enoys rapid growth.

273


Meirelles also wants to reassure international bond and stock investors. The former Bank Boston executive did a good job cutting inflation in half from 17 percent in 2003. But many investors feel the central bank kept monetary policy too loose earlier this year after it lowered rates rapidly in 2009 to combat the global recession. Brazilian bond and stock prices suffered, and the currency, which is up 4.4 percent against the dollar overall in the past 12 months, has taken a dive in recent weeks. Meirelles' tough act is already having an impact. "The market is calmer," says Saddi Castro, chief investment officer at money managers Sul-America Investimentos in SĂŁo Paulo. Investors are also fully aware that there is a critical national election in October. They want to see the government of President Luiz InĂĄcio Lula da Silva maintain a steady course and avoid the temptation to juice the economy even further to secure votes for the ruling party. Lula is behaving responsibly thus far, and the government is trying to cool things down by cutting government spending. Finally, Brazil faces an uncertain global economy. There's a risk that double-dip recession in Europe and a slowdown in the U.S. will shrink global demand for Brazil's soybeans, coffee, and iron ore. No one knows for sure. It may be better for Brazil to have its economic house in order in case things get turbulent.

DisponĂ­vel em: http://www.businessweek.com/magazine/content/10_25/b4183011311897.htm Acesso em: 14.03.11

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Anexo 2 – Texto do jornal The Economist, 10 março de 2011

Measuring Brazil's economy Statistics and lies Very big, but not the world’s fifth-largest economy quite yet THE release of last year’s economic figures on March 3rd was cue for much crowing in Brazil. The economy grew by a blistering 7.5%, a rate unmatched since 1986. Since the currency started 2010 strong and ended it stronger, a GDP of 3.675 trillion reais converted at the year’s average exchange rate into $2.089 trillion. This meant that Brazil overtook Italy to rank as the world’s seventhbiggest economy (see chart). And income per head in Brazil has surpassed that in Mexico. The president, DilmaRousseff, welcomed the figures, but warned Brazilians not to expect a similar rise in 2011. Worried about overheating, her government is trimming 50 billion reais from this year’s budget. On March 2nd the Central Bank raised interest rates by half a percentage point for the second time this year. The aim is for growth to ease to a more manageable annual rate of 4.5-5%. But her finance minister, Guido Mantega, could not resist a little boosterism. Brazil had grown fifth fastest of the G20 countries, he said, adding that, if its GDP were calculated taking into account purchasing power, it had overtaken Britain and France, too. Some of his listeners inferred that it had become the world’s fifth-biggest economy. (But the same trick bumps Russia and India up from tenth and 11th respectively to fourth and sixth, leaving Brazil seventh overall.) It was a confusing performance, and many were duly confused. The following day Brazilians were told by some of their newspapers that they were living in the world’s seventh largest economy, and by others, the fifth. Jim O’Neill of Goldman Sachs, who coined the BRIC acronym in 2001, sent an e-mail to clients in which he asked why Brazil’s ascension to the top five had attracted so little comment. Converting currencies by purchasing power, rather than market rates, is useful when comparing living standards in different countries. But measuring GDP in current dollars shows an economy’s international clout—and by that yardstick, Brazil needs no statistical smoke and mirrors. Even the modest 4.5% growth MsRousseff hopes for is likely to be more than France or Britain manages in 2011. And with interest rates and the price of its commodity exports rising, there is no sign of the real weakening much. Brazil did not break into the big five last year. But it may well do so during this one. Disponívelem: http://www.economist.com/node/18333018?story_id=18333018&CFID=165023176&CFTOKEN=98 121119 Acesso em: 14.03.11 275


276


277


Carnaval, festejos populares regionais, marcas e folkmarketing Lucimara Rett

Introdução O Brasil, de acordo com o IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística19, possui uma área territorial superior a 8 milhões de quilômetros quadrados. Ainda segundo o instituto, o mapa político atual é o apresentado abaixo, sendo o país dividido em cinco regiões: Norte (verde), Nordeste (laranja), Sudeste (amarela), Sul (azul) e Centro-Oeste (rosa). O país tem um histórico de imigração específico em cada uma das regiões. A identidade nacional foi, aos poucos, sendo forjada por um mosaico de culturas que abarca, com maior destaque, influências de imigrantes

japoneses,

libaneses,

alemães, italianos, espanhóis, entre outros,

além

dos

portugueses

colonizadores e dos africanos que vieram, a princípio, como escravos. Da mesma maneira, essas influências

repercutem

especificidades

para

os

em festejos

populares brasileiros, que agregam o universo simbólico cultural de cada uma das regiões, mas também, com a intervenção dos meios de coFigura 1 – Mapa político brasileiro 1 Fonte: IBGE

municação de massa, transformam-se em grandes espetáculos midiáticos, cada vez

mais homogeneizados. Lucena Filho (2006, p. 268) discorre acerca da dinâmica com que fluem os processos comunicacionais como uma alternativa para as culturas populares e sua integração aos cenários da sociedade do espetáculo. “As manifestações folclóricas atuam 19

Disponível em <http://www.ibge.gov.br/home/geociencias/cartografia/default_territ_area.shtm>. 278


como

elemento

de

mediação/decodificação

e

refuncionalização,

no

âmbito

da

contemporaneidade”. José Marques de Melo (2008. p. 78) acrescenta que “o ‘clima de festa’ vigente no Brasil é em grande parte construído pelos meios de comunicação de massa. Eles não apenas divulgam as festas populares, mas se convertem em seus principais fomentadores/formatadores”. O autor conta que Jesus Martín-Barbero chama esse fenômeno de ‘popular folclorizado’, onde há articulações entre a dinâmica urbana e a da resistência popular. Melo (2008, p. 78-79), também esclarece que as festas passam a ter valor conteudístico, preenchendo espaços na programação das emissoras de rádio ou televisão, bem como motivando reportagens e coberturas especiais nos jornais diários ou revistas semanais. Ao mesmo tempo, funcionam como alavancas para o acionamento da engrenagem econômica, mobilizando produtores industriais, entrepostos comerciais e prestadores de serviços. Nesse sentido, viabilizam comercialmente os veículos difusores, através da captação de anúncios, além de estimular as empresas ao patrocínio das festas propriamente ditas. Cria-se uma teia complexa de relações e interesses, da qual participam também o Estado e o aparato político, responsáveis pela normatização do uso daqueles espaços públicos onde as festas se realizam.

Tais eventos, embora transformados pela mídia, ainda conseguem manter intrínsecos alguns traços culturais populares e tornam-se uma ótima oportunidade de visibilidade para as marcas nacionais e multinacionais que buscam estabelecer uma relação de identidade com os consumidores regionais. A evolução dos mercados tem evidenciado, nos últimos anos, a importância da comunicação integrada, com foco para o marketing local. Assim, grandes recursos são investidos pelas instituições públicas e privadas, que buscam alcançar maior evidência nos mercados locais, em especial, promovendo uma dinamização no relacionamento com seus públicos e conquistando sua credibilidade e simpatia, na vinculação [sic] de suas marcas, produtos e serviços, em megaeventos culturais, como esses desenvolvidos durante as manifestações dos ciclos das festas populares do Natal, de São João e do Carnaval, com objetivos mercadológicos e institucionais. [...] Nesse contexto, são mobilizados diferentes sentidos de pertencimento, de fortalecimento e de valoração da cultura local, na busca da sedimentação da identidade cultural (LUCENA FILHO, 2006, p. 270-276). Essa aproximação é buscada pelas organizações, que realizam ações mercadológicas específicas para as datas dos eventos, aproveitando a oportunidade de comunicação em nível regional, captando, assim, estrategicamente, certa ‘simpatia’ desse público. O autor (2011, p. 111) propõe o Folkmarketing (folk = povo, aliado à palavra marketing) como uma modalidade comunicativa, adotada pelas organizações públicas e privadas, para buscar identificação com seus públicos-alvo, falando a linguagem que eles 279


querem ouvir, e mostrando as imagens que eles querem ver, fazem assim com que elas sejam percebidas segundo uma semântica de valoração das culturas. Exemplos apropriações de festejos populares regionais pelas marcas para ações de marketing e comunicação serão apresentados mais à frente, delimitados por território. Lucena Filho (2006, p. 274-275) sistematizou e fez uma classificação de alguns tipos diferenciados de ações de Folkmarketing, definidas a seguir: a) aproximação do mercado regional e seus consumidores, graças à visibilidade de seus produtos e serviços, durante os eventos nos múltiplos cenários das festas populares; b) cenários montados em empresas, como agências bancárias, clínicas odontológicas, hotéis, lojas de comércio varejista, supermercados, bares, fachadas das empresas, shopping centers, usando símbolos, imagens e mitos da festa junina, como reforço do processo de identidade e valoração da cultura local; c) expressões comunicativas, verbais e não verbais, focando a cultura regional e local; [...] d) uso de expressões ligadas aos saberes e práticas da cultura popular que buscam fortalecer a identidade e o relacionamento da marca com seus públicos, em nível regional e local. Antes de discorrer sobre algumas dessas ações, é importante expor que o carnaval brasileiro também é um evento cultural e folkmidiático de tal dimensão que acaba por extrapolar as questões regionais, tornando-se um grande atrativo para turistas do mundo inteiro, bem como um ícone da cultura brasileira no exterior.

As nuances do carnaval brasileiro A historiadora Rita de Cássia Araújo (apud TERRA, s/d, online) explica que “as festas populares que ocorriam na era pré-cristã no Hemisfério Norte, principalmente no Egito, em Roma e na Grécia, para celebrar o fim do inverno e a chegada da época do plantio de lavouras impulsionaram o que se caracterizou como a origem do Carnaval”. Quanto à origem da palavra, não se sabe ao certo. Há algumas suposições explicitadas no site Carnaval do Brasil (s/d, online)20: Para uns, o vocábulo advém da expressão latina "carrum novalis" (carro naval), que quer dizer uma espécie de carro alegórico em forma de barco, com o qual os romanos inauguravam suas comemorações. Para outros, a palavra seria derivada da expressão do latim carnem levare, modificada depois para carne, vale! (adeus, carne!), palavra que teve sua 20

Disponivel em <http://www.carnavaldobrasil.com.br/index.php?mod=mat&id_materia=863>. 280


origem entre os séculos XI e XII que designava a quarta-feira de cinzas e anunciava a supressão da carne devido à Quaresma. A festa, que em sua origem não tinha cunho religioso e já era caracterizada por brincadeiras e máscaras, chegou ao Brasil no século XVII por meio dos portugueses, com o nome de intrudo, sendo que as pessoas se sujavam umas às outras (mela-mela). Voltaire Schilling (apud TERRA, s/d, online), afirma que “a partir de 1935, com o crescente centralismo estatal determinado pela Revolução de 1930, começou-se a sufocar a espontaneidade popular submetendo os desfiles populares a regulamentos, horários e trajetos a serem cumpridos à risca”. Seria, então, o começo dos desfiles das escolas de samba, principalmente no Rio de Janeiro. Hoje a data é comemorada nacionalmente, mas os eventos de maior repercussão são os do Rio de Janeiro, RJ, Recife e Olinda, PE, Salvador, BA, e São Paulo, SP. Há especificidades em cada uma dessas comemorações, sendo que São Paulo segue a formatação do Rio de Janeiro, com desfiles de escolas de samba e carros alegóricos. O carnaval de Pernambuco tem grande influência do maracatu e conta com um complexo de shows em Recife Antigo e blocos e bonecos gigantes que circulam as ruas de Olinda. Já em Salvador, o formato baseia-se, sobretudo, em circuitos percorridos por trios elétricos – caminhões equipados com som para apresentação de música ao vivo –seguidos por uma multidão. Esse tipo de apresentação foi inventado por Antonio Adolfo Nascimento e Osmar Macedo, mais conhecidos como Dodô e Osmar. Dessas manifestações, acredita-se que o carnaval que mais represente o Brasil no contexto nacional e internacional seja o do Rio de Janeiro. Embora as festas da Bahia e de Pernambuco apresentem números igualmente impactantes, de acordo com a Riotur – Empresa de Turismo do Município do Rio de Janeiro (apud ESTADÃO, 2012, online)21, Na folia de 2012, foram movimentados US$ 850 milhões, ou aproximadamente R$ 1,5 bilhão, contra US$ 740 milhões de dólares no ano passado (R$ 1,280 bilhão), de acordo com o órgão. O sambódromo esteve lotado nos dois dias de desfile das escolas de samba e teve a capacidade ampliada em cerca de 12 mil lugares. Na folia de rua, cerca de 5,3 milhões de pessoas desfilaram nos 425 blocos pela cidade de sexta-feira de carnaval ao último domingo, um incremento de aproximadamente 10% a festa de 2011, quando foram registradas 4,9 milhões de pessoas.

21

Disponívem em <http://www.estadao.com.br/noticias/geral,carnaval-do-rio-cresce-em-folioes-e-receita-em2012-diz-riotur,841242,0.>. 281


Ainda de acordo com a reportagem, os hotéis do Rio registraram uma taxa de 95% de ocupação e cerca de trinta e sete navios atracaram no porto da cidade durante o carnaval de 2012. No mesmo período, foi registrado um total superior a 1 milhão de turistas na cidade, sendo 32% destes, estrangeiros, segundo a Riotur. Para se ter uma ideia da força do evento como catalisador de investimento publicitário, somente o plano comercial de patrocínio do carnaval da Rede Globo, uma das principais emissoras de televisão do país, contemplou, para o ano de 2012, os seguintes valores de cotas divulgados pelo site GREGORIPAVAN (2011, online)22: “quatro cotas nacionais e uma cota local. Cada cota nacional sai por R$ 22.800.000,00. A cota local para São Paulo custa R$ 3.734.220,00 e a local para o Rio de Janeiro sai por R$ 1.960.430,00”. Segundo o site, a Direção Geral de Comercialização da Rede Globo informou ainda em 2011, a renovação das quatro cotas de patrocínio nacional para o evento de 2012: Procter & Gamble (Pantene), Bradesco, TIM e Grupo Schincariol (Nova Schin).

Festejos populares e visibilidade nos mercados regionais brasileiros No Norte do Brasil, um dos eventos de maior repercussão é o Festival Folclórico do Boi Bumbá de Parintins, denominado popularmente ‘Festa do Boi’. A festa, que em 2012 completou 47 edições, mistura o folclore indígena com a tradição nordestina do Boi Bumbá e é considerada como o espetáculo de maior expressão artística da Amazônia, trazendo, anualmente investimentos e desenvolvimento para a região. A festa representa o imaginário popular e descreve, por meio de uma competição entre duas associações – o Boi Caprichoso, de cor azul e o Boi Garantido, de cor vermelha, um pouco das lendas locais e da tradição do homem amazônico. O site Parintins (2012, online)23 explica as possíveis origens dos rivais do festejo: CAPRICHOSO - Simbolizado pela estrela azul, pela versão oficial o boi começou em 1925 após a saída de um de seus componentes, que foi substituído por dois irmãos cearenses, os quais criaram o boi para pagar uma promessa, mas existem outras interpretações da história: Uma é de que teria surgido em meados da década de vinte, através de moradores de Parintins que se reuniram para fundar um Boi-bumbá, e homenagear o Boi Caprichoso, que já existia na cidade de Manaus. [...] Finalmente dizem que dois cearenses que ali chegaram, criaram o Boi para pagar promessa. Segundo eles, um Boi 22

Disponível em <http://gregoripavan.blogspot.com.br/2011/10/globo-apresenta-plano-comercial-parao.html>. 23

Disponível em <http://www.parintins.com.br/rivalidade.asp>. 282


seria colocado para dançar nas festas de São João caso os dois tivessem sucesso na nova terra. GARANTIDO - Simbolizado pelo coração vermelho, o boi foi fundado em 1913 por Lindolfo Monteverde, famoso cantor de versos do local. Durante o serviço militar Monteverde adoeceu, e fez promessa para São João de que, caso recobrasse a saúde, criaria um Boi que sairia todos os anos à rua enquanto ele vivesse. E assim continua até hoje. Quanto ao nome Garantido, as versões são muitas. Uma delas é de que teria surgido durante uma briga com o Boi contrário (em Parintins a torcida de um Boi chama o rival de contrário). Segundo Lindolfo, o seu Boi saia inteiro, enquanto o contrário sempre tinha o chifre quebrado. "Isso é garantido" dizia ele. Outra hipótese envolve o repentista Emídio Vieira, que fez um desafio a Lindolfo: "... vou caprichar no meu Boi". E a resposta veio em seguida: "Pois capriche no seu que eu garanto o meu".

O Centro Cultural e Esportivo Amazonino Mendes, conhecido como ‘Bumbódromo’, é o espaço onde a disputa entre os bois acontece e tem capacidade para 35 mil pessoas. De acordo com o site Parintins (2012, online)24, a festa, realizada anualmente no último final de semana de junho, na cidade de Parintins, AM, tem um público de mais de 100 mil pessoas. O principal patrocinador do evento é a Coca-Cola e um dos cases de marketing e comunicação mais conhecidos relacionado à Festa do Boi é o da ‘Coca-Cola azul’. Em 2005, a empresa resolveu mudar a cor da embalagem, historicamente vermelha, para uma versão azul (figura 2), em edição especial para o festejo. Os participantes do Caprichoso não consumiam os produtos da empresa, por ela possuir a cor do rival, e muitas vezes compravam produtos Pepsi (que usam a cor azul). Com autorização da matriz em Atlanta – EUA , para não perder market share para a concorrente, [desde 2005] são feitas [para o evento] latas azuis, azul e vermelha (meio a meio) e as normais vermelhas [Alguns dizem que essa decisão não foi

inédita, que no Grêmio e no Boca Juniors o logo da Coca já é usado em azul. Concordo com quem fala isso, mas no quesito "mudar a cor da embalagem do produto", isso sim, de fato é inédito]. [...] Essa iniciativa mostra que por mais que queiramos manter uma identidade visual rígida e global, muitas vezes culturas específicas e consumidores específicos merecem atenção especial que acabam quebrando paradoxos de empresas centenárias (LOGOBR, 2011, online) 25.

24

Disponível em <http://www.parintins.com.br/>.

25

Disponível em <http://logobr.wordpress.com/2008/09/17/coca-cola-azul-parintins/>. 283


E não somente a embalagem muda de cor durante o evento. Embora a Coca-Cola mantenha, normalmente, uma comunicação única mundialmente, para a Festa de Parintins, toda a comunicação é regionalizada. Outras empresas também utilizam a mesma estratégia, regionalizando a sua comunicação e chegam, inclusive a alterar sua identidade visual com a utilização de seus logos

nas cores do evento.

Figura 2 – Embalagens da Coca-Cola para a Festa de Parintins Fonte: www.comlimao.com

Na região Nordeste, os festejos de maio destaque são o São João de Caruaru, PE, e o de Campina Grande, na PB. Ambos disputam o título de Maior São João do Mundo. Com uma organização cada vez mais profissional e maior exposição em mídia, ano após ano, as festas juninas da região Nordeste têm sido alvo de disputas entre as marcas por um lugar de destaque entre os patrocinadores. Juntas, as comemorações de Campina Grande (PB) e Caruaru (PE), que disputam o título de Maior São João do Mundo, devem receber dois milhões de turistas para as festas deste ano (TOLEDO, 2011, online)26.

Marlei Sigrist (2006, p. 251), explica que a origem dos festejos juninos perde-se no tempo, mas está ligada à celebração da fertilidade e das colheitas. “O culto a São João no mês de junho foi estabelecido pela Igreja Católica com a finalidade de substituir os rituais pagãos e, no Brasil, foi introduzido pelo colonizador português através da catequese jesuística”. Mais uma vez, o evento é atrativo para a comunicação. Lucena Filho (2006, p.270), afirma que as redes de significações geradas na festa junina do “Maior São João do Mundo” alimentam o processo do folkmarketing, modalidade comunicativa adotada pelas organizações públicas e privada para buscar identificação com seus públicos-alvo. Falando a linguagem que eles querem ouvir e mostrando as imagens que eles querem ver, fazem assim com que elas sejam percebidas segundo uma semântica de valoração das culturas locais.

A Natura, por exemplo, além de associar sua marca à comemoração de São João realizada em Caruaru, PE, durante o evento de 2009, lançou a Água de Banho Cheiro de Moça Bonita, exclusivamente para a região. Logo depois, as vendas do produto foram

26

Disponível em <http://www.meioemensagem.com.br/home/marketing/noticias/20110601Festas-juninasatraem-marcas-para-o-Nordeste.html>. 284


estendidas para o restante do país (GRANDO, 2010). Em 2011, novamente no ciclo de vendas que corresponde à data comemorativa, a empresa lançou a linha completa da fragrância. Na descrição disponível no site da Natura (2011, online)27, percebe-se a apropriação dos elementos simbólicos dos festejos juninos utilizados para a concepção do produto: “Natura Ekos é uma marca que conta através das Águas de Banho as tradições do nosso país. Inspirada na tradição e na riqueza das Festas Juninas, Natura lança a Água de Banho Cheiro de Moça Bonita”. A embalagem da água de banho (figura 3) e dos demais produtos da linha, foi inspirada na obra ‘Quermesse de Santo Antonio’, da artista plástica Edina Síkora. A festa pernambucana conta com um site,

Figura 3 – Embalagem Água de Banho Cheiro de Moça Bonita Fonte: Bazar DELLI

www.caruaru.com.br, que compila várias informações sobre o evento, com destaque para a programação e para os patrocinadores, entre eles, Cachaça 51 e Banco do Brasil. Abaixo (figura 4), mais um exemplo de comunicação que se apropria dos elementos do São João, utilizada pela ‘51’ em outdoors veiculados no Nordeste, na época do evento.

Figura 4 – Outdoor veiculado em Natal, RN, em 2011 Foto da autora

27

Disponível em <http://scf.natura.net/perfumarianatura-diversos-naturaekosaguadebanhocheirodemocabonita>. 285


No Sudeste do Brasil, dentre outras comemorações, destacam-se em São Paulo, capital, as festas de rua promovidas pelas colônias italianas ou por descendentes de italianos radicados na cidade. São elas: Festa da Santa Achiropita, Festas de São Vito, São Genaro e Santo Emídio. Todas representam a cultura italiana por meio de música, apresentações folclóricas e comidas típicas servidas em barracas de rua nos bairros paulistanos tradicionalmente ligados à colônia italiana, como o Bixiga, Brás e Moóca. A Festa de São Vito Mártir nasceu da devoção dos imigrantes italianos que chegaram a São Paulo no final do século XIX. A chegada da primeira imagem e a construção da primeira capela estimularam ainda mais essa devoção das famílias italianas e de seus descendentes pelo santo, que se tornou mártir no bairro do Brás. O evento é normalmente realizado no dia 15 de junho, nas ruas do bairro, entretanto, em 2011, ele aconteceu de 14 de maio a 19 de junho, com um público estimado em 10 mil pessoas por final de semana, entre pessoas da capital, visitantes do interior e de outros estados. A antecipação da data da comemoração foi justificada: O motivo da mudança da data é a vinda, pela primeira vez ao Brasil, da relíquia de São Vito, um pequeno fragmento do osso do braço do santo menino que deixará a igreja de Polignano a Maré, na Itália. Uma comitiva trará a relíquia que ficará exposta aos fiéis brasileiros dentro de uma reprodução do braço de São Vito (“Braccio di San Vito”). A esta relíquia são atribuídos diversos milagres. Na ocasião da chegada haverá uma missa solene as 19:00 horas que marcará o início das festividades também (FESTA, 2011, online)28.

Além da parceria com a rádio Nativa FM, do grupo Bandeirantes, para a divulgação, a organização da festa contou, entre outros apoios, com o patrocínio da Liquigás, distribuidora de GLP (Gás Liquefeito de Petróleo) do Sistema Petrobras, que forneceu cerca de 1,5 mil kg de gás, abastecendo os fornos das 30 barracas durante todo o evento (figura 5).

Figura 5 – Barraca da festa de São Vito Mártir com logomarca da Liquigás Fonte: http://liquigasnoseucondominio.blogspot.com.br/

Os executivos de comunicação da Liquigás reforçaram, no site da companhia, a

28

Disponível em <http://www.festadesaovito.com.br/festa-de-sao-vito-martir-2011.html>. 286


importância da visibilidade da marca durante o evento: “O patrocínio está alinhado à estratégia da Liquigás de realizar ações de divulgação de sua marca e estar mais próxima ao seu consumidor residencial e comercial”, explica Antonio Rubens Silva Silvio, presidente da Liquigás. Paolo Ditta, diretor de GLP Envasado, observa que “a utilização do GLP durante o evento é outro aspecto que tem sinergia com o negócio da empresa, pois muitas das tradicionais receitas italianas que dão vida à festa são preparadas em fogões movidos a gás” (LIQUIGÁS, 2011, online)29.

Na região Sul, a Semana Farroupilha é um evento festivo que acontece em setembro, no estado do Rio

Grande

do

Sul,

com

desfiles

em

homenagem aos líderes da Revolução Farroupilha, que tinha como ideal, a fundação de uma república independente do antigo Império Brasileiro. Durante a semana acontecem bailes e festejos que fulminam no desfile, ápice da comemoração. Mais uma vez, marcas nacionais se apropriam da visibilidade promovida pelo festejo para lançar produtos e comunicação específicos para a região. Para o evento, a empresa de telefonia Oi, que tem uma identidade visual característica em termos de utilização das cores institucionais na sua comunicação, usou a imagem da silhueta de um gaúcho caracterizado, em um anúncio publicitário veiculado durante a Semana Farroupilha de 2011

Figura 6 – Anúncio da Oi com o tema da Semana Farroupilha Fonte: http://promoview.com.br

(figura 6).

A logomarca da peça (figura 7) faz menção à Revolução Farroupilha, conquistando a simpatia do gaúcho e valorizando a sua identidade.

Figura 7 – Logomarca do anúncio da Oi durante a Semana Farroupilha Fonte: http://promoview.com.b

29

Disponível em <http://www.liquigas.com.br>.

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As principais festas populares do

Centro-Oeste são a Procissão do Fogaréu, em

Goiás, e a Cavalhada, em Pirenópolis. A Procissão do Fogaréu acontece na Semana Santa, quando os ‘farricocos’ percorrem as ruas de Goiás encapuzados e com tochas nas mãos, representando os soldados romanos que perseguiram e prenderam Jesus Cristo. As cavalhadas tiveram origem nos torneios medievais. Têm origem portuguesa e vieram para o Brasil no século XVII. Elas acontecem durante a Festa do Divino nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste do país. No Centro-Oeste, uma das que mais se destaca é a de Pirenópolis, em Goiás, onde foi construído em 2012 um espaço específico para o festejo, conhecido como ‘Cavalhódromo’ (figura 8). Mário Cruz (2012, 30

online)

critica a criação do espaço, afirmando que ele descaracteriza o evento popular.

Figura 8 – Cavalhódromo de Pirenópolis Fonte: http://cidadedepirenopolis.blogspot.com.br

Nos dois casos, não foram identificadas ações mercadológicas estratégicas efetivas durante os festejos, apenas apoio do governo, bem como contribuições dos próprios cidadãos e de estabelecimentos turísticos. A Festa do Divino Espírito Santo de Pirenópolis foi tombada como Patrimônio Imaterial Brasileiro.

CONSIDERAÇÕES FINAIS 30

Disponível em <http://www.pirenopolis.tur.br/noticias/noticia/Cavalh%C3%B3dromo:%20Ignorante%20descaracteriza%C3% A7%C3%A3o%20ou%20nova%20forma%20de%20dom%C3%ADnio>. 288


Os festejos populares, a princípio, são a expressão da cultura popular regional, entretanto, a presença ostensiva da mídia na divulgação dos mesmos cria uma relação de simbiose e interdependência. Se por um lado essa presença corrobora para o sucesso dos eventos, para o aumento de sua credibilidade e, por consequência, para o crescimento do público, por outro lado, transforma uma manifestação genuinamente popular em um acontecimento midiático normatizado, o que pode interferir na preservação dos elementos simbólicos da cultura que cada festa representa. Exemplo disso foi a crítica apresentada no último case, acerca da construção do Cavalhódromo em Pirenópolis, Goiás. Corre-se sempre o risco de que o evento seja descaracterizado com uma interferência externa. O carnaval destaca-se como o evento de maior repercussão nacional e internacional do Brasil. Atrai investimentos publicitários, movimenta a economia do país e atrai, anualmente, um grande número de turistas de todo o mundo. Mesmo sendo um evento nacional, tem nuances diferenciadas nas manifestações regionais, tais como as do Rio de Janeiro, São Paulo, Pernambuco e Bahia. Além do carnaval, há eventos tipicamente regionais que vêm ganhando destaque na mídia. Dada a extensão territorial do Brasil e as especificidades de sua colonização e da imigração, tem-se eventos populares de características extremamente diferentes nas diversas regiões do país, como os apresentados neste trabalho. Percebe-se, portanto, que a identidade brasileira projetada nacional e internacionalmente pelos eventos populares, constitui-se de um mosaico de culturas e manifestações folkmidiáticas. Se for considerada a expansão dos mercados regionais e a dificuldade que as organizações encontram para estabelecer uma comunicação adequada com esses mercados, os festejos populares tornam-se uma grande oportunidade para que as marcas consigam explorar a visibilidade nesses eventos. Por meio de ações estratégicas de folkmarketing, as empresas buscam estabelecer laços de identidade e captar a simpatia do público regional, lançando mão de elementos culturais, seja na criação das peças de comunicação, em ações promocionais ou até mesmo, na criação de produtos em edições comemorativas limitadas. Dado o contexto, o desafio é encontrar um posicionamento que represente com fidelidade esse rico universo simbólico, sem que a imagem seja retratada, sobretudo no exterior, sob a forma de estereótipos não representativos dessa riqueza e diversidade cultural do país.

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Marca “Brasil” nos processos eleitorais Luciana Panke Roberto Gondo

A amplitude do território brasileiro, as diferenças sociais, econômicas e a diversidade ética são aspectos que evidenciam a complexidade da organização política no país. Com 190 milhões de habitantes, de acordo com o Censo 2010, entre os quais, mais de 135 milhões são eleitores, estabelecer os parâmetros de consolidação democrática não é tarefa fácil. Além disso, a execução das atividades no que tange o processo eleitoral exige dos órgãos reguladores um sistema pautado em um processo detalhado de controle. Neste sentido, a implementação da urna eletrônica no país nos anos 90 se destaca como um dos melhores sistemas eleitorais do mundo no que tange a apuração e a minimização das fraudes. Integrante desse momento cívico, o Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral também é um modelo único de regulação estatal das formas de comunicação durante o pleito. Apesar de vários países oferecerem a distribuição de espaços para divulgação de propostas de campanha, a quantidade de espaço e a forma de distribuição do tempo em rádio e televisão tornam o Brasil outra realidade peculiar. Assim, a partir de agora, buscamos elencar alguns aspectos dos dois sistemas.

Sistema de votação eletrônico brasileiro Com um aumento populacional significativo de eleitores com a redemocratização brasileira nos idos dos anos 80, a Justiça Eleitoral compreendeu a necessidade de organizar sistemicamente o momento pré-eleitoral, com a estruturação de cadastramento de eleitores, capacitação de equipes de trabalho, análise organizacional e logística das seções eleitorais pelo país, bem como garantir a idoneidade do sistema eleitoral brasileiro. O momento eleitoral é o ponto alto da manifestação democrática, principalmente na manifestação da população ao livre direito de escolher seus representantes. Na visão de Sousa (1996, p.99) “a Justiça Eleitoral da atualidade, e a que será exercida no próximo século XXI, há de criar raios de atuação que não abalem a confiabilidade do jurisdicionado nos seus propósitos institucionais”. Principalmente em uma sociedade envolta a uma velocidade informacional nunca antes presenciada. 294


O avanço das tecnologias de informação e comunicação resultou no desenvolvimento de um grande número de aplicações, como telemedicina, ensino a distância, comércio eletrônico, etc. que podem melhorar significativamente a qualidade de vida dos cidadãos e elevar a competitividade das empresas. Em um mundo crescentemente globalizado, as transações econômicas entre países e as interações entre indivíduos e comunidades tendem a ser realizadas por uma infraestrutura global, baseadas em redes de alta velocidade. (TAKASASHI, 2002, p.28). Visto esse cenário tecnológico desenvolvimentista, o sistema eleitoral brasileiro deveria seguir pelo caminho da otimização e incentivo à migração tecnológica nos parâmetros evolutivos da sociedade da informação e do conhecimento. Até a implantação do sistema eleitoral eletrônico em forma de amostragem no Brasil, as eleições eram realizadas manualmente, com cédulas de papel, urnas de tecido e posteriormente apuradas manualmente. Esse sistema pode ser considerado funcional, mas não eficaz, principalmente em um país com um número estimado em 190 milhões de habitantes, sendo mais de 125 milhões de eleitores distribuídos pelos estados da federação. A probabilidade de burla do sistema eleitoral era representativa, com a possível troca de urnas, cédulas e até mesmo o preenchimento posterior de cédulas deixadas em branco, seja como voto de protesto do eleitor ou a livre escolha de votar em nenhum dos candidatos disponíveis. De acordo com Camarão (1997, p.16) “em 1983, foi iniciado um amplo processo de modernização e atualização tecnológica, cujo marco é o recadastramento geral do eleitorado e unificação do cadastro de eleitores efetivado em 1985/86”. Na visão de Neves (2005, p.149) “em 1986 foi dado ao que me pareceu o primeiro passo para a informatização do voto, com o recadastramento eleitoral [...] a partir daquele momento passamos a ter um banco de dados seguro, cujos registros eram conferidos para evitar duplicações”. Naquele momento, a população participou do processo de cadastramento, permitindo a criação da base de dados atualizada, evitando antigos cadastros que poderiam ser de ordem de fraudes com eleitores que jamais existiram, ou com eleitores que já faleceram e sua baixa ainda não havia sido computada manualmente no sistema eleitoral anterior. No ano de 1989, a Justiça Eleitoral iniciou testes de armazenamentos e controle informatizado nas eleições presidenciais daquele ano, porém com procedimento de testes foi realizada apenas em seis estados nacionais. O processo de armazenamento não substituiu nada do método anterior, apenas permitiu que logo após a confirmação apurativa, os resultados pudessem ser armazenados no sistema

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informatizado da época, servindo de base para o fornecimento futuro de dados e informações para gráficos e relatórios estatísticos. Tudo demonstrava, já há algum tempo, a necessidade de modernizar o processo de apuração eleitoral. Não se podia continuar com uma prática que não acompanhava o progresso que encontramos em outras áreas. As denúncias de fraudes começavam a pôr em dúvida a essência do processo democrático, pelo qual se lutou tantos anos. Os países mais desenvolvidos mostram o caminho: é preciso informatizar a eleição integralmente, levando a informatização de onde está, isto é, da digitalização de boletins, para o próprio processo de votação, eliminando as manipulações de votos, a lentidão do processo que, por si só, gera dúvidas quanto a justeza dos resultados finais. (SOUSA, 1996, p.102). No ano de 1994, a Justiça Eleitoral criou uma rede própria de comunicação, ligando a base de troca de dados todos os Tribunais Regionais Eleitorais, bem como grande parte das zonas eleitorais do país, fato que nos dias atuais já se encontra interligado na totalidade à interface eleitoral. Essa estrutura foi fundamental para que o projeto da Urna Eletrônica tivesse sustentabilidade tecnológica e informacional.

Estrutura da urna eletrônica A fase de licitação para os componentes da urna e a distribuição estratégica da equipe de análise do processo teve operacionalmente início em setembro de 1995, com reuniões semanais e acompanhamento das fases de desenvolvimento do projeto. De acordo com Camarão (1997, p.85) “nessa época, a atual urna eletrônica ainda era denominada, em nível técnico, Coletor Eletrônico de Voto – CEV, nome esse que permaneceu até o final da licitação, quando foi alterado, por determinação da presidência do TSE”. Para o acompanhamento do processo de licitação e do desenvolvimento das fases do sistema pelas empresas ganhadoras, foram destinados para acompanhamento dois escritórios, instalados na sede do Tribunal Superior Eleitoral, em Brasília, escolhido pela proximidade no processo decisório do projeto e no Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, devido à proximidade na maior parte das empresas interessadas no contrato do projeto. O procedimento de distribuição estratégica e logística de esforços é uma situação comum na área de tecnologia, pois permite maior garantia de acompanhamento das fases do sistema. De acordo com Bio (1996, p.169) “a coordenação desses esforços, de diferentes especialistas, numa

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variedade de atividades, voltadas para objetivos comuns do projeto, requer um ordenamento metodológico do trabalho, uma metodologia de sistemas”. Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral, nas eleições de 1996, considerando primeiro e segundo turno, foram distribuídas nacionalmente 77.479 urnas eletrônicas, incluindo as que foram destinadas aos TRE´s para treinamento e ao Tribunal Superior Eleitoral. Respectivamente, o número de urnas de plástico foi de 162.685. No ano de 1994, o sistema da Justiça Eleitoral se fundamentou em plataforma aberta para todo o país, conseguindo totalização de votos na apuração em 100% do território. Em 1996, processo de urna eletrônica se inicia com uma abrangência territorial que representou 33 milhões de eleitores. Em 1996, começamos, então com as urnas eletrônicas. Foram perto de 75 mil urnas, correspondentes a 32% do eleitorado. Foram escolhidas cidades com mais de 200 mil eleitores. E a experiência do voto eletrônico foi um sucesso. Tanto que, na eleição seguinte foi instalado nas cidades com mais de 40,5 mil eleitores, o que significou que 56,61% do eleitorado votaram em urnas eletrônicas, sem qualquer dificuldade. (NEVES, 2005, p.150). No ano de 2000 a tecnologia da urna eletrônica já envolvia toda população brasileira, em todas as regiões do país e tanto no campo, como na cidade, envolvendo todas as escalas sociais e de instrução, bem como toda a diversidade cultural e racial presente no território brasileiro. Por ser uma eleição onde seriam escolhidos apenas os prefeitos e os vereadores, o processo de interpretação pela população foi mais rápido quanto a assimilar os procedimentos de votar, campanha essa desenvolvida previamente pela Justiça Eleitoral em âmbito nacional. Em 2002, para as eleições presidenciais, o processo era mais complexo no que tange à compreensão da sociedade na sequência de votação, pois estavam em disputa cinco cargos: deputado federal, deputado estadual, senador, governador e presidente da república. O desafio estava na potencial dificuldade do eleitor, principalmente àqueles cujo grau de instrução não favorecia a compreensão e armazenamento da sequência numérica de votação ou para os idosos, que poderiam apresentam dificuldade de transcrever os números de seus candidatos no momento do voto. Era possível que o candidato entrasse com uma pequena anotação no momento do voto, denominada posteriormente como “cola ou colinha eleitoral”, com o objetivo de auxílio na transcrição da informação numérica dos candidatos via interface da urna eletrônica. Em eleições posteriores ao ano de 2000, as campanhas publicitárias de conscientização do TSE estimulavam o uso desse recurso, com a finalidade de diminuir as chances de confusão e 297


esquecimento no momento do sufrágio. Segundo Neves (2005, p.151) “a implantação do voto eletrônico foi feita de modo progressivo e seguiu uma estratégia cuidadosamente estabelecida. Teve início com a sensibilização dos eleitores, o que foi sempre será fundamental para qualquer inovação”. As eleições que se seguiram nos anos de 2004, 2006, 2008, 2010 e 2012, sendo as de 2006 e 2010 para Presidente, governador, deputados e senador foram assimiladas pelo eleitorado como um processo comum de votação, o que foi um bom sinal em uma visão tecnológica, pois o grande desafio de um processo de informatização é quando o usuário do sistema cria entraves quanto sua funcionalidade ou interface de dados. As garantias do sistema, incluindo a geração dos programas, a criptografia dos dados e senhas, a segurança contra vírus, fazem uso das tecnologias mais modernas que existem no mundo, de modo que aqueles que fraudaram no passado ficarão perplexos diante da segurança do processo em que irão encontrar, e tudo farão, sem dúvida, para inviabilizar o sistema de desmoralizá-lo. Trata-se, contudo de um avanço histórico no fortalecimento da verdade eleitoral, no respeito ao voto do cidadão. (SOUSA, 1996, p.105). Em uma visão sistêmica, o procedimento relacionado à capacitação de usuários e agentes multiplicadores é considerado uma das partes mais importantes do processo de estruturação de um sistema, pois permite que as informações de recursos e operações sejam direcionadas e registradas por profissionais que acompanharam o processo de desenvolvimento e compreendem com precisão às limitações e potencialidade dos recursos. Em uma visão organizacional, Caldas (2009) descreve a relevância de um suporte eficaz de sistemas de informação O suporte técnico é uma das partes mais importantes de um projeto. Ele é responsável pela instalação e homologação do produto, além da manutenção pós-venda, processo fundamental para potencializar todas as funcionalidades do produto, identificar possibilidades de melhoramento da ferramenta ou ainda de novas necessidades de expansão do projeto. [...] É preciso despertar a consciência de que imprevistos são acontecimentos que podem significar gastos adicionais ou prejuízos incalculáveis. Por isso, saber evitar tais falhas inesperadas ou ter em mãos uma solução rápida para oferecer é essencial para evitar crises e fidelizar os clientes, que devem ter a certeza de cobertura em todas as situações, por mais complexas que sejam. (CALDAS, 2009) Para que a urna eletrônica tivesse aceitação perante a sociedade, o equipamento deveria compor alguns diferenciais que propiciassem uma interação harmoniosa com características do 298


comportamento das regiões e respectivas populações, como fatores climáticos, organizacionais, logísticos, relação de interface do usuário com a urna, considerando seu grau de instrução e nível de facilidade na compreensão dos passos eleitorais. É pertinente salientar que um dos maiores problemas na implantação de um sistema informacional é a rápida evolução na capacidade de armazenamento e composição dos componentes eletrônicos, portanto o TSE, como qualquer outra instância de utilização tecnológica de grande porte, deve atentar-se previamente para incorporar novas métricas, com o objetivo claro de manter a estrutura funcional e evolutiva, melhorando constantemente a qualidade de dados e seguridade da informação. Em contrapartida, é ponto pacífico compreender que a estrutura da urna tende a se adaptar às condições e inovações tecnológicas com o objetivo de continuar garantindo a mesma funcionalidade apresentada desde sua implantação. O sistema eleitoral brasileiro agora baseado em tecnologia eleitoral deve compreender que a velocidade de mudança no campo tecnológico é muito intensa, pois softwares e hardwares são desenvolvidos de acordo com as potencialidades de inovação ocorridas com os anos. Os sistemas de segurança, validação de informações e interpretação de dados devem seguir o ritmo evolutivo da sociedade da informação e do conhecimento, com vistas ao seu processo não ficar obsoleto na contemporaneidade. Para Castells (1999, p.572) “os processos de transformação social sintetizados no tipo ideal de sociedade em rede ultrapassam a esfera de relações sociais e técnicas de produção: afetam a cultura e o poder de forma profunda”. O sistema eleitoral deve acompanhar essas mudanças para que o sentido de inovação e diferencial não se perca em médio prazo diante de outras formas funcionais tecnologicamente. Apesar do modelo atual de votação interagir com toda a população, independente de sua capacidade de assimilar tecnologias em seu cotidiano ou possuir condições financeiras para tal fim, não representa um processo de inclusão digital para o cidadão. De acordo com Marques de Melo (2002, p.40) “a sociedade da informação tem atuado como instrumento que amplia o distanciamento de classes e de povos. Estamos falando da muralha digital entre o norte e o sul, os pobres e os ricos, e por outro lado também entre povos super-informados e sub-informados”. O sistema eleitoral brasileiro informatizado é uma amostra da potencialidade estratégica que o povo brasileiro possui para se envolver em novas tecnologias, cabe portanto, às instâncias públicas criarem projetos que fomentem todas as vertentes de inclusão digital, permitindo a população brasileira, principalmente a mais desfavorecida economicamente à inclusão 299


democrática em uma sociedade verdadeiramente do acesso a informação e conhecimento para todos. Com a aplicação do processo de urnas eletrônicas nas eleições de 1996, várias delegações de países da América Latina e demais blocos continentais começaram acompanhar às eleições brasileiras com o objetivo de compreender as fases do sistema de votação, bem como sua estrutura de dados e informações, armazenamento e apuração de votos. Utilizar o novo sistema de votação como cartão de visita para demais negociações com países de interesse nacional é uma ação deveras produtiva, pois quando uma nação torna-se referência em um determinado tipo de projeto, demonstra institucionalmente credibilidade em pesquisa, onde contribui para as demais áreas do conhecimento. Torquato do Rego (2002, p.121) contribui na fundamentação do pressuposto O planejamento eficaz sabe dispor os programas principais e os programas secundários, dando a cada um a graduação merecida e o momento certo de ser veiculado. [...] na área de articulação, serão planejados os contatos com o universo de entidades, programas de visitas a lideranças, as formas de integração com as entidades organizadas da sociedade; e, por fim, na área da mobilização, serão previstos os eventos internos e externos, os seminários e encontros, que conferem a instituição a imagem de ação, energia e liderança. (REGO, 2002, p.121) Essa mesma inovação pode contribuir para transmitir à população do próprio país lisura perante o sistema implantado, visto que em uma visão publicitária e mercadológica, seu sistema ou produto manufaturado, no caso a urna eletrônica, é admirada por diversos países. Para Gomes (2007, p.203) “a difusão da informação política constitui atualmente um campo de interesse dentro da comunicação política, assim como também a prática habitual das campanhas de informação e/ou persuasão nas atuais democracias”. No caso da Justiça Eleitoral, o sistema de votação eletrônica foi uma forma de fomentar um novo marco na manutenção de imagem do órgão público, posicionando o país em uma situação provedora de tecnologia para demais nações, no sentido de um ambiente eleitoral democrático funcional e eficaz. O Brasil se encontra em uma situação de estabilidade tecnológica quando o assunto é o sistema eleitoral. Está conseguindo acompanhar os processos evolutivos dos anos e se manter em uma situação de vanguarda da aplicação da tecnologia a favor da democracia. Nas eleições de 2008, com os mesmos cargos de 1996, implantou em modelo pequeno de amostragem testes para a incorporação biométrica, com o objetivo de combater possíveis fraudes na identificação dos

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eleitos, combatendo o voto em duplicidade e na votação ilegal de uma pessoa com o título de outro eleitor. Em 2010 e 2012, as biométricas foram ampliadas gradativamente utilizando à mesma estrutura estratégica de ampliação gradativa a cada eleição, de modo sustentável e com possibilidade de intervenção e análise, até o momento de realizar e aplicar o novo recurso em todo o país, na sua totalidade. Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral

Sem ter como objetivo a comparação com outros países da América Latina, é importante, entretanto, considerar que a propaganda eleitoral gratuita no país é um sistema no qual o governo garante subsídios para a veiculação das propostas em todas as emissoras de rádio e televisão, independentemente de serem privadas ou estatais. Para se ter uma ideia, no Paraguai, há “espaço gratuito em mídia durante 10 dias antes das eleições (3% de tempo diário em rádio e tv e 1 página diária nos jornais)” (Speck, 2003, p. 16). Na Colômbia e na Venezuela há acesso ao espaço de emissoras estatais, Na Costa Rica não há nenhum subsídio como esse. O autor ainda explica que na Guatemala, desde 1986 é permitido o acesso gratuito a rádio e televisão estatal durante 30 minutos semanais durante o processo eleitoral. Ao estudar as formas de financiamento público de partidos e campanhas eleitorais, Speck (2003) argumenta que no Brasil: A forma mais importante de financiamento público indireto é o acesso gratuito a rádio e televisão, desde os anos 1970. Hoje, fora da época eleitoral, cada partido tem por semestre 40 minutos em rádio e TV, desde que tenha obtido 5% nas últimas eleições. Os nanicos têm 2 minutos por semestre. Nos 45 dias antes da eleição, tem aproximadamente 1 hora de propaganda eleitoral gratuita durante 6 dias da semana. Deste tempo 1/3 é distribuído de forma igualitária entre os partidos e 2/3 de forma proporcional à composição da Câmara de Deputados. Não existe possibilidade de contratar espaço adicional a este em rádio e TV (Speck, 2003, p. 15) No ano em que completa meio século de existência, o Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral segue promovendo questionamentos a respeito da sua eficácia. Criado a partir da lei Lei 4115/1962 com o objetivo de oferecer tempos igualitários entre os candidatos. O Código Eleitoral anotado e legislação complementar foi organizado pelo TSE em estreita observância à Lei nº 4.737/1965 e 301


posteriores modificações, das quais se destacam a Lei nº 9.504/1997, que constitui norma especial para as eleições, além das normas permanentes editadas pelo TSE em regulamentação às leis eleitorais e partidárias. (TRE, 2012) Portanto, um tempo depois de sua criação, a propaganda eleitoral brasileira passou a ser regulamentada pelo Código Eleitoral, cuja atualização pode ser acompanhada pelo Tribunal Superior Eleitoral. Esta lei estabelecia que as emissoras deveriam reservar espaço diário de duas horas nos 60 dias anteriores à eleição. A chamada “Lei das Eleições” – n°9.504 de 30 de setembro de 1997, regulamenta as orientações gerais para os pleitos para escolha do Presidente e Vice-Presidente da República, Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal, Prefeito e Vice-Prefeito, Senador, Deputado Federal, Deputado Estadual, Deputado Distrital e Vereador. Deste modo, entre as determinações está a formatação da propaganda eleitoral. A lei determina que a propaganda eleitoral em geral não pode iniciar antes do dia 05 de julho de cada ano e aponta instruções para todas as formas de divulgação das campanhas, entre elas o Horário Gratuito em rádio e televisão. São 45 dias de transmissão em rádio e televisão cuja veiculação segue um rodizio entre as retransmissoras e é de responsabilidade dos partidos entregar os programas com antecedência, de acordo com um plano de mídia. Uma peculiaridade da propaganda brasileira é a obrigatoriedade de exibição no segundo idioma oficial do país. “§ 1º A propaganda eleitoral gratuita na televisão deverá utilizar a Linguagem Brasileira de Sinais – LIBRAS ou o recurso de legenda, que deverão constar obrigatoriamente do material entregue às emissoras”. (TSE, Lei 9.504, art. 44) O HGPE divide o tempo de exposição gratuita em rádio e televisão conforme a coligação de cada candidato, cuja explicitação de quais partidos estão unidos é um dever legal em cada programa.

§ 2º Na propaganda para eleição majoritária, a coligação usará, obrigatoriamente, sob sua denominação, as legendas de todos os partidos que a integram; na propaganda para eleição proporcional, cada partido usará apenas sua legenda sob o nome da coligação. (TSE, Lei n°9.504)

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O art.47 da “Lei das Eleições” explica a distribuição do tempo e da ordem na semana conforme o cargo pleiteado. Lembrando que as eleições no Brasil ocorrem a cada dois anos para cargos distintos, o que influencia a organização determinada pelo TSE31.

Horário Gratuito de Projeção da Imagem Pública

Independente dos questionamentos sobre a eficácia desse sistema de propaganda eleitoral, é a partir do início da exibição do Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral que se estabelece formalmente o começo da campanha. É quando se sinaliza ao eleitor médio que o processo de exposição de ideias e promessas está em andamento. Além do mais, em democracias como a brasileira, é comum se pensar que a política se resume às eleições. Deste modo, a veiculação do HGPE seria um marco do processo político nacional.

Até o início do horário eleitoral o cidadão comum só acessa informações sobre os candidatos em espaços públicos e as leva para a esfera privada – caso tenha interesse no assunto. Já com o HGPE essa lógica se inverte. As informações políticas surgem no espaço privado e são “levadas” para o debate em espaços públicos. (PANKE, CERVI, 2011, p. 392) A construção da imagem pública é composta por elementos subjetivos cujos códigos de comunicação se compõem por elementos linguísticos, imagéticos, sonoros, gestuais. Qualquer uma dessas formas de concretização da mensagem contém subcategorias cujos elementos devem ser cuidadosamente elaborados durante uma campanha eleitoral. Os programas eleitorais são plataformas de veiculação de um discurso unilateral onde o candidato apresenta suas supostas qualidades e onde estes elementos são exibidos sem influência de outros atores políticos, com a imprensa, por exemplo.

O fato é que a apropriação da tecnologia pela política gerou um deslocamento das campanhas eleitorais das ruas para as telas de televisão, o que Santos (2006) chama de “palanque eletrônico”. (Panke, Cervi, 2011, p. 394)

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Para mais detalhes sobre a distribuição, sugerimos a leitura integral da lei, disponível em http://www.tse.jus.br/legislacao/codigo-eleitoral/lei-das-eleicoes/lei-das-eleicoes-lei-nb0-9.504-de-30-desetembro-de-1997 303


Neste sentido é que o HGPE pode ser considerado como uma “vitrine” das candidaturas a partir de uma leitura tendenciosa que evidencia os benefícios da vitória daquele pretendente. A ênfase nos aspectos positivos ganha força com uma narrativa emocional e lúdica para seguir a lógica do entretenimento, presente nos meios massivos. Como não há fiscalização prévia dos conteúdos, o que ocorre, muitas vezes são propostas que não se adequam aos cargos disputados. Candidatos a vereador, por exemplo, que prometem alterar leis federais. Candidatos que não conhecem as responsabilidades e funções dos cargos, independente de qual esfera esteja concorrendo ou de qual região geográfica esteja alocado. Questões como essa exigem uma reflexão mais aprimorada sobre o verdadeiro papel da propaganda eleitoral no modelo atual pois uma linguagem persuasiva sem informação correta provavelmente cause mais desserviço à população.

Considerações finais O Brasil destaca-se mundialmente em função de diversos aspectos, como suas características continentais, socioeconômicas e a pluralidade étnica e cultural. Mesmo diante das desigualdades sociais oriundas justamente das mesmas características, o país vem se destacando na área econômica sendo considerado um dos países emergentes com mais chances de se tornar potência mundial nos próximos anos. Integrante do bloco denominado “Bric” (Brasil, Rússia, Índia e China), o país também alcançou o posto de 7° PIB mundial. Ao mesmo tempo, o Brasil não consegue índices semelhantes em educação, por exemplo. Dado que acaba por se refletir, diretamente, no tema ‘eleições’. Se há uma predominância no analfabetismo, na baixa escolaridade e na renda, pode haver também mais oportunidades para candidatos com más intenções tentarem comprar o apoio de eleitores menos esclarecidos e mais necessitados. Com uma propaganda eleitoral que exibe promessas muitas vezes milagrosas e fora de contexto, a implantação do sistema eletrônico de votação diminui as chances de fraudes no momento do voto. Agora, com a implementação da votação biométrica, há identificação fiel dos eleitores, reduzindo a presença de falsos eleitores no dia da eleição e também inibindo a falsificação de títulos. Observadores mundiais estão todas as eleições no Brasil para acompanhar o processo eleitoral e também a tecnologia brasileira, nominada como referência em diversos outros países. 304


Lembrando que o próprio país subsidia a veiculação de propaganda eleitoral gratuita, deduz-se que há, também, uma tentativa de publicização em massa das propostas eleitorais teoricamente para propiciar um voto mais consciente e informado. Estes aspectos referentes aos processos eleitorais brasileiros são únicos, portanto, e merecedores de diversas análises para adequar às necessidades desse país tão plural.

Referências BIO, Sérgio Rodrigues. Sistemas de Informação: um enfoque gerencial. São Paulo: Atlas, 1996. CALDAS, Ricardo. A importância do suporte <http://www.xthor.com.br/blog/?p=45>. Acesso em 11 jun.09.

técnico.

Disponível

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Autores 01. Leonardo Vilaça Saldanha Licenciado em música pela Universidade Federal de Pernambuco, Mestrado em Artes - Música pela Universidade Estadual de Campinas e, Doutorado em Música pela Universidade Estadual de Campinas. Professor efetivo da Escola de Música da Universidade Federal do Rio Grande do Norte - EMUFRN atuando nas disciplinas de Piano Popular, Harmonia Funcional, Improvisação e Instrumento Harmônico (piano em grupo). 02. Mauricio R. Gonçalves Doutor em Ciências da Comunicação pela ECA / USP, pesquisador e professor do mestrado em Comunicação e Cultura da Universidade de Sorocaba e autor do livro “Cinema e Identidade Nacional no Brasil – 1898/1969”. 03. Maria Angela Pavan Doutora em Multimeios pela UNICAMP/SP, professora adjunta do curso de Comunicação Social e do Programa de Pós Graduação em Estudos da Mídia na linha de Pesquisa: Estudos da Mídia e Produção de Sentido, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) 04. Aryovaldo de Castro Azevedo Jr. Graduado em Publicidade e Propaganda pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP), mestre em Ciências da Comunicação (ECA/USP) e doutor em Multimeios pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas. Professor e Coordenador do curso de Comunicação Social da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. 05. Valéria Brandini Graduada em Antropologia pela Universidade Estadual de Campinas; mestre em Ciências da pela Universidade de São Paulo; doutora em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo em convênio com a Central Saint Martins School of Fashion and Design e a Universitá La Sapienza. 06. Olavo Bessa Graduado em Desenho Industrial pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, mestre em Desenho Industrial pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e doutor em Desenho Industrial pelo Instituto Politécnico de Milão. Professor e Coordenador do curso de Design da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. 07. Lisabete Coradini Graduada em Ciências Sociais pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos e em Administração de Empresas pela Universidade Federal de Santa Maria, mestre em Antropologia Social pela Universidade Federal de Santa Catarina e doutora em Antropologia pela Universidad Nacional Autonoma de Mexico. Professora adjunta da PPGAS da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. 08. Luciana Paolucci Graduada em Turismo pela ECA/USP e Jornalismo pela PUC/SP, Mestre e Doutora em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo (ECA/USP). 09. Fabio Vianna Caim Graduado em Publicidade e Propaganda pela Universidade Anhembi Morumbi, mestre em Comunicação e Mercado pela Faculdade Cásper Líbero e doutor em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professor titular da FACAMP /SP e Coordenador do curso de Publicidade e Propaganda da Universidade Nove de Julho/SP. 307


10. Ronaldo Mendes Neves (i), Marília Graziella Oliveira da Silva (ii) e Erivaldo Gomes de Souza (iii) (i) Graduado em Comunicação Social / Publicidade e Propaganda (FACHA-RJ), mestre em Administração (UFRN) com especialização em Marketing (ESPM-RJ), doutorando em Ciências da Comunicação (UFRN) e docente do curso de Comunicação Social da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. (iii) Jornalista O Globo. 11. Egberto Gomes Franco (i), Daniel Ladeira de Araújo (ii) e Miguel Valione Junior (iii) (i) Doutor em Tecnologia Nuclear pela Universidade de São Paulo (USP), professor do curso de Publicidade e Propaganda da FAPSP e coordenador do curso de Arquitetura da UNIB. (ii) Mestre em Comunicação pela Universidade Paulista (UNIP), professor do curso de Rádio, TV e Internet da FRB e do curso de Publicidade e Propaganda da FAPSP. (iii) Especialista em Marketing pela Fundação Getúlio Vargas, coordenador e professor do curso de Publicidade e Propaganda da FAPSP e da UNIB. 12. Luís Roberto Rossi Del Carratore (i) e Marcio Antônio Rodrigues Sanches (ii) (i) Graduado em Publicidade e Propaganda pela Faculdade de Comunicação Social Casper Líbero, mestre em Comunicação pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho e doutor em Comunicação pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Professor adjunto do Curso de Comunicação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. (ii) Graduado em Ciências Econômicas pela Universidade Estadual de Campinas, mestre em Administração Pública e Governo pela Fundação Getulio Vargas - SP e doutor em Administração de Empresas pela Fundação Getulio Vargas - SP. Professor da Fundação Getúlio Vargas. 13. Marisa Amaral Camargo Graduada em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP); Especialista em Sociologia pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo. Fez cursos de Extensão em Marketing e Comunicação pela Fundação Getúlio Vargas (FGV/SP) e Análise do Discurso no COGEAE/PUC-SP. Consultora especializada em Comunicação, Branding, Plataformas Digitais e Inovação em Pesquisa de Mercado. 14. Orlando Vian Jr. Mestre e doutor em Lingüística Aplicada e Estudos da Linguagem pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professor adjunto de inglês no Departamento de Línguas e Literaturas Estrangeiras Modernas e no Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. 15. Lucimara Rett Publicitária pela Unitau e Doutora em Comunicação pela UMESP. Professora na Escola de Comunicação da UFRJ. Integrante dos grupos de pesquisa Imagem, Mercado e Tecnologia (UFRN) e Mídia, Cultura e Memória (Unip). 16. Luciana Panke (i) e Roberto Gondo (ii) (i) Doutora em Ciências da Comunicação (USP); Professora da Universidade Federal do Paraná nos cursos de graduação em Comunicação Social (Publicidade e Propaganda e Relações Públicas) e do Programa de Pós-Graduação em Comunicação. Coordenadora do Grupo de Pesquisa “Comunicação Eleitoral”, vicePresidente da Sociedade Brasileira de Profissionais e Pesquisadores de Marketing Político (Politicom) e autora do livro “Lula do sindicalismo à reeleição: um caso de comunicação, política e discurso”. São Paulo, Editora Horizonte: 2010. (ii) Doutor em Comunicação Social, Mestre em Administração Pública, MBA Executivo em Marketing. Consultor em Comunicação Política e docente dos cursos de Pós-Graduação Lato Sensu na Universidade Presbiteriana Mackenzie e Universidade Metodista de São Paulo. Diretor de Planejamento e Marketing do Instituto Gestão do Conhecimento. Presidente da Sociedade Brasileira dos Pesquisadores e Profissionais de Comunicação e Marketing Político - POLITICOM.

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