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histórico em que vivíamos e sobre a importância de se afirmar uma presença presente: Eu diria que é uma instigação, como muita gente já falou do Benjamin, eu vou chamar Machado de Assis: o presente emerge sobre o passado que ressignifica e contingencia, tanto o presente quanto o passado. Este, sempre imperfeito por sua potência de emersão, que também é constitutivo do presente, que o experimenta tanto pelas lentes do retrovisor, quanto pelas retinas da presença presente. A cada dia, reinaugurada essa presença presente, a cada dia reinaugurada na constância das nossas atuais angústias e sobressaltos.13
Nesta mesa de debate também estava presente o professor Gustavo Silveira Ribeiro, que era um dos orientadores da pesquisa de iniciação científica que originou a mostra. Conheci o poema “A máquina do mundo” em uma aula de Gustavo sobre o livro Junco (2011), de Nuno Ramos, em que o artista plástico citava o poema de Drummond, transformando, melancolicamente, os últimos dois versos “tudo se perdeu, bateu/ na trave”: olha repara ausculta essa riqueza sobrante a toda pérola essa ciência sublime e formidável mas hermética essa total explicação da vida — tudo se perdeu, bateu na trave.14
Discutíamos, nessa aula, as relações entre a vida e a morte, a criação e a destruição, as metamorfoses e as fusões. Era uma disciplina sobre as relações entre literatura e filosofia. Um ano depois, Gustavo me chamou para participar de uma iniciação científica sobre imagens de violência no cinema brasileiro contemporâneo, chamada Narrativas da violência: O Brasil de perto e de dentro.15 Junto com Frederico Canuto e Simone Cortesão, fizemos um grupo de estudo para estudarmos livros como Levantes (2017), de Didi-Huberman, A imagem pode matar? (2009), de Marie José Mondzain, Aos meus amigos: Crise e insurreição (2016), do Comitê Invisível. Debatíamos filmes como A vizinhança do tigre (2014), de Affonso Uchôa, e No intenso agora (2017), de João Moreira Salles. No começo de 2018 propus aos coordenadores do grupo que fizéssemos uma mostra com seminário para debatermos junto aos cineastas e pesquisadores, que se tornaria a Mostra 68 e depois. Um dos filmes que exibimos foi Lígia (2017), de Nuno Ramos, em que o artista se apropria das imagens do Jornal Nacional que narraram o Impeachment de Dilma Rousseff. As sílabas dos locutores foram 13
MARTINS, Leda Maria. “Torquato Neto - Debate com Gustavo S. Ribeiro e Leda Maria Martins”. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=OVG8d-Mg_9M. Acesso em: 06 de jul., de 2022. 14 RAMOS, Nuno. Junco. 2011, p. 110. 15 Site da pesquisa Narrativas da violência: https://narrativasdaviolencia.wordpress.com. Acesso em: 11 de jan. 2022.