Manifestações ed 09 julho 2013

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Ano 01 Julho/2013

BRASÍLIA TAMBÉM MOSTROU SUA CARA NOSSOS COLUNISTAS COM MUITO HUMOR E PIMENTA ESPORTE, SAÚDE E MODA


EDITORIAL

BRASIL

O silêncio das ruas é apenas aparente

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uito já se falou sobre as origens e as motivações que levaram milhões de jovens às ruas das principais cidades brasileiras durante o mês de junho, que passará à história como o mês do “clamor das ruas”. Os analistas se empenham até hoje em encontrar uma explicação para tais movimentos, que surgiram de forma espontânea e aparentemente sem liderança. Tudo começou com um grupo de jovens que se reuniu em passeata na capital paulista para protestar contra o aumento de R$ 0,20 – isso mesmo, 20 centavos – nos preços das passagens dos ônibus urbanos. Os jovens exigiam a revogação do aumento, o que já ocorreu, e a instituição do passe livre. Ou seja, transporte coletivo gratuito para todos. O movimento “contra os 20 centavos”, como ficou conhecido, acabou contagiando outros jovens de todo o País, especialmente em Brasília. Se em São Paulo, Belo Horizonte, Salvador, Recife e em outros importantes centros urbanos nos estados os movimentos de protesto se caracterizavam muito mais pelas reivindicações regionais, foi em Brasília que os protestos ganharam dimensão nacional. Foi aqui que a massa jovem brasiliense mostrou sua força. Num único dia reuniram na Esplanada dos Ministérios mais de 60 mil pessoas, que pacífica e ordeiramente exigiam mudanças no comportamento dos políticos e ações efetivas contra a corrupção. Eventuais ações de vandalismo foram contidas pela polícia, que às vezes agiu com exagerada violência. O poder de mobilização se 2

repetiu durante vários dias, assustando o Poder. A maioria, jovens entre 16 e 25 anos, foi convocada às manifestações através dos novos instrumentos de mobilização disponíveis nas chamadas “redes sociais”, tais como o Facebook e o Twitter. A juventude brasiliense, consciente da importância de Brasília como centro de aglutinação dos interesses nacionais, agiu no sentido de pressionar o Congresso Nacional a promover mudanças que vão muito além dos “20 centavos”. Deputados e senadores

prontamente responderam ao “clamor das ruas” e se empenham em aprovar uma série de medidas, incluídas numa “agenda positiva”. A juventude brasiliense saiu vitoriosa, mas que as autoridades não se iludam. O “clamor das ruas” não se calou. O silêncio é apenas aparente. Apenas abaixou o volume. A mobilização continua nas universidades, nos cursos de especialização, nos locais de trabalho e nos momentos de lazer. Os jovens estão prontos para retornar às ruas caso sintam necessidade de aumentar a pressão junto

ao Congresso Nacional e aos governos federal, estaduais e municipais. A Revista Pepper esteve presente aos movimentos de protestos que agitaram Brasília em junho e dedica a edição deste mês aos jovens que souberam se organizar em defesa dos interesses nacionais e demonstraram sua força para exigir um Brasil melhor, mais justo e sem corrupção. Um futuro que os aguarda a cada dia que saem de casa para estudar, trabalhar e até para lazer. Jorge Rosa

“Brasil, mostra a sua cara!” Por Pedro Wolff e Janaína Camelo Fotos Santini

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Colaboradores Sérgio Assunção

Belo Horizonte, MG. Foto: Yuri Cortez

ma situação inédita nos seus mais de 500 anos de descoberta. Nunca antes na história deste País foram vistas manifestações populares assolarem o Brasil na sua dimensão continental. O gatilho que gerou a comoção nacional foi a truculência policial ocorrida em São Paulo. Em julho, os protestos deram uma esfriada, mas a promessa é de uma grande manifestação para o 7 de setembro. Na Capital da Esperança, as manifestações começaram sob o mote: “Copa para quem?”, em protesto contra a suposta supervalorização do Estádio Nacional de Brasília – Mané Garrincha. Um dia antes da abertura da Copa das Confederações, 14 3


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“Eu vejo esse movimento social como algo positivo, naturalmente que seja pacífico, uma energia do bem, uma energia da paz, essa energia criativa, construtiva que está vindo das ruas e da sociedade brasileira certamente fará muito bem ao país.” (Luís Roberto Barroso, ministro do STF)

de junho, cerca de 500 pessoas fecharam o Eixo Monumental. A partir daquele pontapé inicial, Brasília apresentou protestos diários que tiveram dois momentos de destaque para as câmeras de televisão: a tomada da marquise do Congresso Nacional e a tentativa de invasão do Palácio do Itamaraty, cujo vandalismo foi orçado em R$ 18 mil. E uma menção honrosa às crianças, que também realizaram seu piquenique-protesto, no dia 26 de junho, no gramado do Congresso Nacional.

“Temos que nos renovar permanentemente ou ficaremos superados. Com toda irreverência e com toda indignação senti um desejo grande de melhorar o país. O sentimento é que nós políticos pensamos muito nas próximas eleições e pouco nas próximas gerações. Ou seja, ou mudamos ou seremos mudados!” (Rodrido Rollemberg, senador)

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A massa observada nos protestos era amorfa, mas parecia ter um norte em comum: o acúmulo de aborrecimentos com a Administração Pública Federal. A Revista Pepper ouviu quatro brasilienses e traçou o perfil dos jovens que tiveram participação nos protestos. O músico Mairaue Menezes, 31 anos, foi um dos que atendeu à convocação via Facebook. Sua primeira impressão foi a de que todas as Unidades da Federação começaram a lutar por seus problemas individuais, mas que no fim das contas foram nacionais. Na sua opinião, o gatilho inicial foi a violência observada na capital paulista, mas naturalmente a coisa ganhou maiores proporções. “Eu vi um brasiliense bem interessante. Todos juntos de maneira ordeira e com várias palavras de ordem interessantes”, definiu. O músico conta que percebeu que todos registravam vários problemas em comum, que não cabiam em um único cartaz. Ele prossegue afirmando que esta foi uma vivência única para sua vida, mesmo tendo sofrido três borrifos de spray de pimenta e uma “borrachada” nas costelas. Quanto à violência sofrida, ele diz que foi acompanhada com a Copa das Confederações. “À medida que o torneio foi acabando e a imprensa internacional partindo, a

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repressão foi aumentando”. Por fim, o jovem engajado nos protestos diz que “ou muda o País no voto ou nós mesmos teremos que tomar posição e nos eleger e mudar a cidade e espero que o gigante não volte adormecer”. O estudante Charles Pintat, 23 anos, apresenta seu ponto de vista. Ele achou muito importante toda a situação porque marcou um novo momento na história política do Brasil pelo fato de a sociedade clamar por mudanças ao perceber que não é retribuída nos serviços públicos. Diferente da opinião de muita gente que abominou representações partidárias, Charles acha que deve haver sim partidos políticos para orquestrar as manifestações e observou uma

“É claro que isso iria acontecer [o movimento popular]. Não sabia quando exatamente. Porque os ingredientes da crise que levam as pessoas às ruas já são conhecidos há muito tempo. O ingrediente do descrédito do Congresso, dos partidos, dos políticos. O equívoco das prioridades que fazem com que o Brasil consiga ter exonerações para produzir automóveis e não tem um sistema de transporte público nem mesmo razoável. As prioridades que constroem estádios caríssimos e não se tem creche para as crianças. O ingrediente de governo arrogante, distante do povo, como se fosse dono da verdade e achando que sempre convence todo mundo por meio do marketing. Mas agora não é mais tempo de surpresa. É tempo de se pensar no que fazer.” (Cristovam Buarque, senador)

leve inclinação de todos para a esquerda. “Por que somente com os partidos que conseguimos alguma coisa, mesmo estando cheios de corruptos”. O estudante comemorou, entre outras coisas, a repercussão que o movimento do qual ele participou teve na classe política.

Adote as manifestações Um dos coordenadores do projeto Adote um Distrital, Diego Ramalho, 27 anos, tem uma opinião um pouco distinta de Charles. Ele considerou muito positiva a onda de manifestações pelo fato de

“Embora nós tenhamos avançado muito nos últimos anos, houve uma ascensão social de 40 milhões de pessoas para a classe média, é natural que se anseie por condições ainda melhores: que melhore a segurança, o transporte, a saúde e a educação. As manifestações são eventos normais numa democracia e assim devem ser encarados, com exceção de atos de vandalismo, que não podem ser tolerados.” (Guido Mantega, ministro da Fazenda)

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não ter surgido de um movimento organizado ou de um partido político. “Foi uma construção horizontal”, define. Diego comenta que, diante de várias pautas, não sabe dizer se a falta de um líder era positiva ou negativa. “Mas foi muito bom ver a população deixar as redes sociais”, pontua. Ele ficou muito satisfeito ao ver no dia a dia de protestos a discussão de qual seria a reivindicação do dia seguinte, e o fato de esse espírito não se restringir a Brasília. “E são na sua maioria cidadãos apartidários que querem fortalecer a transparência e desejosos por uma reforma política”. Outro convocado pelo Facebook foi o estudante de Direito Lucas Duarte, 24 anos. Experiente, ele conta que já havia ido às marchas contra a corrupção, mas que dessa vez percebeu logo no início que a onda de protestos iria ter um impacto maior. “Com o surgimento de gigantescos estádios de um lado e do outro nada parecia mudar na vida do brasileiro, é como se o brasileiro pagasse por uma festa a que ele não tivesse sido convidado”, definiu. Lucas Duarte soma todas as insatisfações do povo brasileiro como motivadoras deste engajamento coletivo. “Era como se estivesse muita coisa entalada na garganta”. Lucas também reclamou da truculência policial sofrida no dia 15 de junho, mas elogiou a atuação policial da segundafeira, 17 de junho, quando foi tomada a marquise do Congresso Nacional. Naquele dia ele postou em seu Facebook: “Hoje eu vi uma manifestação muito bonita. Uma postura por parte da polícia muito digna e respeitosa. Parabéns a todos os participantes e aos policiais. Agora, como em todo evento, não se pode ter uma homogeneidade intelectual. Fico triste em ver a falta de respeito de alguns manifestantes que entraram no espelho d’água e ficaram jogando água nos policiais. 6

“Quando a política não se reinventa se desfaz a utopia e nada pode viver sem utopia. Nem a política. Acho que a maior demonstração de humildade que o Parlamento pode dar, como casa do povo, é exatamente estabelecer uma nova agenda em função das manifestações.” (Renan Calheiros, presidente do Senado)

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“A presidente da República quer dizer aos brasileiros [com o plebiscito] que aquilo que os fez ir às ruas foram as propostas que interessam ao PT na reforma política. E a calamidade da saúde pública, a falência da mobilidade urbana, o aumento da criminalidade? Mais uma vez, o governo mostra que não entendeu absolutamente nada que a população brasileira quis dizer.” (Aécio Neves, senador, presidente do PSDB)

No geral, buscamos hoje em Brasília uma demonstração de que é possível expor ideais e pontos de vista de maneira pacífica. Um belíssimo dia, e uma linda cena dos manifestantes em cima do templo do poder legislativo, local onde, em tese, o próprio povo fala através de seus representantes eleitos”.

Outra opinião e conclusões

“Acredito que [as manifestações] vão interferir [no mensalão] no sentido de buscar que se dê uma resposta rápida. Eu já deixei claro que esses embargos vão ser julgados em agosto. Não acredito em nada que venha a colocar em risco a nossa democracia. Evidentemente que as respostas à crise devem ser as mais corretas. As pessoas que pensam em soluções que beneficiem a grande maioria não devem se desviar e perder tempo com discussões que só levam à dispersão.” (Joaquim Barbosa, presidente do STF)

Entretanto, há pessoas que pensam diferente de como as citadas acima. O professor de história Nielsen Gomes, 31 anos, disse ter ficado surpreso ao receber, via Facebook, um convite de evento em solidariedade aos manifestantes de São Paulo. “Fiquei confuso porque aqui em Brasília não havia uma reivindicação concreta, não havia lideranças que eu conhecesse ou já tivesse ouvido falar frente às manifestações e, a meu ver, havia uma certa instabilidade, forte probabilidade de confronto contra a polícia. Que, afinal, veio a acontecer”, explicou. Assim como os comentários de Nielsen podem sugerir, o Brasil teme que este mês de protestos possa acabar em pizza. Afinal, depois que o gigante despertou, ele parece ter se sentado em sua poltrona. Aguardemos as cenas do próximo capítulo.

“É preciso prestar atenção às faixas e cartazes das últimas manifestações para entender que as centenas de pessoas nas ruas das principais cidades brasileiras querem do Estado muito além dos vinte centavos das passagens de ônibus. Elas querem atenção. Querem ser ouvidas. Estão cansadas de práticas políticas dissociadas dos interesses dos contribuintes. Querem saúde, educação, segurança, o fim da corrupção, enfim, querem qualidade de vida.” (Marcus Vinícius Furtado, presidente da OAB)

“Os protestos começaram em São Paulo, onde não há jogos da Copa das Confederações. Digo isso porque houve quem tentasse relacionar as manifestações com a Copa do Mundo. Foram motivos muito distintos. No caso de São Paulo, a origem foi a insatisfação com o transporte público. Depois, pediram melhorias na saúde, na educação, na segurança pública e assim por diante.” (Aldo Rebelo, ministro dos Esportes)

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