ARTE MODERNA E CONTEMPORÂNEA EM OLINDA
Euclides Francisco Amâncio
Coleção Prefeitura Municipal de Olinda
ARTE MODERNA E CONTEMPORÂNEA EM OLINDA
Euclides Francisco Amâncio
Coleção Prefeitura Municipal de Olinda
Esta exposição é um recorte dos quarenta quadros de Bajado pertencentes à Prefeitura Municipal de Olinda. Estas obras foram doados em 1980, com o intuito de contribuir pata a formação de um acervo de obras de artistas da cidade, pelo colecionador italiano, marchand de tableau e pintor Giuseppe Baccaro. Ele viveu em São Paulo e se mudou para cá na década de 1960 quando teve notícia dos movimentos de arte em Olinda e das características da cidade propícia para a arte. Instalando aqui o acervo e ateliê, ele criou uma instituição particular de apoio à população carente, a Casa da Criança de Olinda que, enquanto existiu, manteve uma tipografia especializada em “cordel”, uma oficina de xilogravuras onde artistas da qualidade de J. Borges e Costa Leite produziam e editavam suas obras, um alojamento para artistas e um teatro de Arena onde eventualmente realizava festivais de cantorias. Ele também apoiou a criação da Oficina Guaianases de Olinda criada por João Câmara, cedendo em comodato seu acervo de prensas e pedras que até hoje são utilizadas pelos alunos do curso de artes plásticas do Centro de Artes da UFPE.
Baccaro foi um dos incentivadores de Bajado, cujo nome é Euclides Francisco Amâncio, e de outros artistas de Olinda, especialmente os naifes.
Recife-Olinda, a cidade dupla, é uma terra de artistas plásticos que vagueiam por todas as categorias das artes do olhar, chamadas hoje, em conformidade com os cânones da arte contemporânea, de artes visuais. Até meados do século XIX todas elas eram cingidas pelas leis da academia, a Academia de Belas Artes da França, que dominou a formação dos artistas até o Romantismo. Naquela visão não havia lugar para o artista que classificamos hoje como naife, ou melhor, ingênuo, ou ínsito – instintivo – ou primitivo como querem alguns, ou ainda folclórico, religioso ou outras formas espontâneas de se expressar.
Podemos dizer que o reconhecimento de Henry Rousseau como artista de importância em Paris despertou no mudo o fenômeno destes artistas que ocorre em todos os países, ricos e pobres, de Norte a Sul, de Leste a Oeste.
Esta breve introdução se faz necessária para a compreensão deste fenômeno no território da arte que se coloca na cidade dupla, sendo o lado de Olinda especialmente rico de manifestações de arte do povo, como se poderia também classificar a arte naife. Aqui, inclusive, uma questão social se levanta: seria a arte do povo arte de gente pobre? Teria a arte do povo menos qualidade do que a arte dita erudita? Ou o mercado simplesmente dominou também este território do saber? Outra questão se apresenta: Seria o prestígio
da arte de Rousseau uma apropriação do mercado, desde que ele foi reconhecido primeiramente pelos artistas do impressionismo, seus contemporâneos, e por Picasso, principalmente?
Este tema será sempre discutido, mas não se pode negar que a originalidade dos artistas do povo transcende a praticidade do quadro na parede, existe nos universos vários da vida das cidades, nas representações folclóricas como os adereços das representações como o mamulengo e todas as formas de teatro de bonecos, o carnaval e seu enorme acervo de adereços, estandartes, bonecos gigantes e fantasias, a xilogravura popular normalmente utilizada nas capas dos folhetos de cordel, e muitas outras manifestações do riquíssimo imaginário popular.
Bajado sintetiza para nós toda esta realidade. Ele desenhou e pintou a cidade de Olinda em seu multifacetado cotidiano onde se destacam as brincadeiras populares, como o Carnaval com o Homem da Meia Noite e a Mulher do Dia e os Passistas de Frevo, o Bumba Meu Boi, o Maracatu de origem e o rural com seus Caboclos de Lança, as religiões populares como o Espiritismo e o Candomblé, as antigas Gafieiras, entre cenas das ruas da cidade e as paisagens que compões todos os quadros. Seria inútil tentar descrever em um texto de apresentação de uma coleção, pequena, porém importante, de obras de um artista tão profícuo.
Por toda sua vida Bajado trabalhou, ganhou a vida e manteve a família com a arte. Não é por acaso que Deda de Bajado, uma de suas filhas, se tornou pintora, a herdeira de seu imaginário. Desde cedo ele trabalhou como desenhista de letreiros e de cartaz de cinema, especialmente o Cine Olinda da Praça do Carmo e o Cine Duarte Coelho, do Varadouro, ambos desativados. Também pintou figuras e letreiros em fachadas de casas comerciais, como açougues, e lojas. Como desenhista e ilustrador ele conviveu com outros artistas importantes na arte nacional como os desenhistas seus amigos Gato Felix e Péricles, autor de O Amigo da Onça que foi editado semanalmente por 16 anos na revista O Cruzeiro do Rio de Janeiro.
Os desenhistas são um capítulo importante de nossa história artística. A título de honrosa lembrança, pois grande parte deles se tornou destaque nacional, citar os que a memória me permite e me desculpar, de antemão, de algum esquecimento. Eles são, incluindo Bajado: Augusto Rodrigues, líder do grupo dos independentes que aqui existiu na década de 30, ao lado do grande ilustrador Manoel Bandeira e do peruano Percy Lau que aqui viveu naquela década; Aloisio Magalhães, o primeiro grande designer brasileiro, um dos criadores da Escola Superior de Desenho Industrial; Ladjane Bandeira, também pintora, jornalista e crítica de arte; Guita Charifker; Maria Carmem, que Pietro Maria Bardi ao conhecer seus desenhos nos anos de 1960 realizou uma exposição no MASP; Cavani Rosas, desenhista
e escultor com obras espalhadas perla cidade; Petrônio Cunha, também arquiteto, autor de do livro de desenhos “Varadouros de Olinda”; e os jovens artistas Antônio Paes, Raoni Assis, Jeims Duarte, sem esquecer aqueles que são mais conhecidos como pintores ou gravadores como Gilvan Samico, José Cláudio, Gil Vicente, José de Barros e Delano.
O desenho foi sua ferramenta principal. Todos os seus quadros são desenhos coloridos, mas não coloco aqui esta questão como defeito de um pintor, mas como a qualidade de um desenhista que, mesmo em sua singeleza, criou uma forte marca pessoal. Ele se identifica com o Sítio Histórico e com a Olinda periférica dos banhos de mar e das comunidades pobres, e nisso está também o humor popular, a forma engraçada de plasmar as figuras que habitam seus quadros.
Importante também é dizer que Bajado não é o único naife de Olinda, e certamente não é o primeiro: Olinda é pródiga de artistas espontâneos e generosos como ele. Na arte naife a qualidade não vem do mercado ou do bem-fazer, vem da pureza, da originalidade, e nestes limites não se pode criar uma escala de valores. É a obra do cidadão Bajado, que se auto intitulava “Um artista de Olinda”, com sua vivência cotidiana, sua curiosidade jornalística e sua alegria inteligente que interessa a todos nós, os admiradores deste grande ser humano que tanto faz falta, mas que deixou sua vida plasmada em forma de arte.
Raul CórdulaOlinda, junho de 2018
Governo do Estado de Pernambuco
Paulo Henrique Saraiva Câmara
Governador do Estado de Pernambuco
Secretaria de Desenvolvimento Econômico
Antônio Mário Abreu Pinto
Secretário de Desenvolvimento Econômico do Estado de Pernambuco
Agência de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco - AD Diper
Leonardo Cerquinho Monteiro
Diretor-presidente da AD Diper
Companhia Editora de Pernambuco - CEPE
Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco - FUNDARPE
Prefeitura Municipal de Olinda Lupércio Carlos do Nascimento
Secretaria de Patrimônio e Cultura João Luiz da Silva Júnior
Curador Raul Córdula
Fotografia Gustavo Bettini
Projeto Gráfico
Pedro Alb Xavier