foto: vinĂcius carvalho
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Dilma Rousseff, candidata do PT
“Temos a possibilidade concreta de inserção do Brasil como um País desenvolvido no contexto internacional” Após uma longa trajetória administrativa em diferentes camadas do poder público, Dilma Rousseff diz que representa bem o horizonte de possibilidades que o país possui atualmente: “nós sabemos o que fazer, como fazer e qual a direção”. Para ela, dar continuidade significa avançar, e o Brasil está apto para assumir um papel de destaque e liderança internacional por Ricardo Schaefer
Filha de uma família de classe média alta de Belo Horizonte, Dilma Vana Rousseff nasceu em 14 de dezembro de 1947. Os pais, o engenheiro e empreendedor búlgaro naturalizado brasileiro Pedro Rousseff e a professora Dilma Jane Silva, tiveram outros dois filhos: um mais velho, Igor, e uma mais nova, Zana. Desde a infância, recebeu uma educação tradicional.
Começou a se interessar por ideais socialistas na juventude, após o Golpe Militar de 1964. Engajou-se na militância estudantil que se revoltou contra o Golpe e atuou em organizações que combatiam a ditadura. Nesse período, conheceu o jornalista Cláudio Galeno Linhares, com quem se casou aos 19 anos, e o advogado
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Carlos Franklin Paixão de Araújo, com quem mais tarde teve o segundo casamento. Durante o regime militar, foi perseguida, fugiu para diferentes estados, acabou sendo presa em São Paulo e permaneceu em cárcere por três anos, entre 1970 e 1972, onde foi torturada. Reconstruiu sua vida no Rio Grande do Sul, região para a qual se mudou em 1973. Na capital gaúcha, já no segundo casamento, teve sua filha Paula. Em 1975, começou a trabalhar na Fundação de Economia e Estatística e, em 1977, concluiu sua graduação na Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Junto com o marido, participou da fundação do Partido Democrático Trabalhista (PDT) gaúcho e de diversas campanhas eleitorais. Em 1986, Alceu Collares foi eleito prefeito de Porto Alegre pelo PDT e nomeou Dilma para a Secretaria da Fazenda. Este foi o início de uma longa trajetória administrativa, que passou pela Secretaria Estadual de Minas, Energia e Comunicação, tanto no governo de Collares como no do petista Olívio Dutra. Filiada ao Partido dos Trabalhadores (PT) desde 2001, coordenou a equipe de infraestrutura do governo de transição entre o último mandato de Fernando Henrique e o primeiro de Lula, tornando-se membro do grupo responsável pelo Programa de Energia do governo petista. Assumiu o Ministério de Minas e Energia em 2003, com a incumbência de afastar o risco de um novo racionamento de energia, condição fundamental para o governo colocar em prática o seu projeto de desenvolvimento econômico e social do país. Como ministra, coordenou uma reformulação no setor, iniciando pela criação de um novo marco regulatório. Investimentos privados foram atraídos para a construção de usinas hidrelétricas, termelétricas e eólicas, o biodiesel foi introduzido na matriz energética e o programa Luz para Todos proveu energia elétrica para cerca de 11 milhões de moradores da zona rural. Em 2005, passou a ocupar a chefia da Casa Civil, após a renúncia do então ministro José Dirceu. No novo ministério, assumiu a coordenação de projetos estratégicos, como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e o Programa Minha Casa, Minha Vida. Coordenou também a Comissão Interministerial encarregada de definir as regras para a
exploração do Pré-Sal e integrou a Junta Orçamentária do governo. Neste período, participou ainda de projetos na área das comunicações, como a definição do modelo de TV digital adotado pelo Brasil e a implantação da internet de banda larga em escolas públicas. Em abril de 2009, revelou que estava com câncer no sistema linfático, descoberto em um exame de rotina, do tipo agressivo, mas ainda em fase inicial. Após tratamentos de quimio e radioterapia, foi considerada curada pela equipe médica. Entretanto, conforme o respectivo protocolo médico, deverá manter o monitoramento pelos próximos 5 anos. Da década de 70 na Fundação de Economia e Estatística, até a participação ativa da administração pública Federal em diferentes
“Não basta a taxa de crescimento do PIB. Estou falando de um processo de ascensão social no Brasil, uma das condições essenciais para que sejamos de fato um país desenvolvido”
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níveis e períodos, Dilma tornou-se uma figura central do governo e foi indicada pelo próprio Presidente Lula como candidata para a sua sucessão nas eleições presidenciais deste ano. A Performance Líder participou do almoço-debate promovido por um importante Grupo de Líderes Empresariais, em São Paulo, onde Dilma Rousseff falou sobre as perspectivas para o desenvolvimento econômico e social do país, respondeu a perguntas de empresários e concedeu uma entrevista coletiva à imprensa.
Como a senhora vê a atual posição do nosso país? O Brasil assume o papel de protagonista no cenário internacional? Temos a possibilidade real, concreta de inserção da economia brasileira, da sociedade brasileira e do Brasil como um dos países desenvolvidos na comunidade internacional, como uma economia dinâmica e com uma elevada taxa de crescimento e de justiça social. Entre as condições
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fundamentais para que isso ocorra está a erradicação da miséria. Nós tivemos um longo caminho, tiramos 24 milhões de pessoas da situação de pobreza extrema e agora se trata de tirar mais 19,5 milhões, se considerarmos as estatísticas já finais da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. Em relação aos outros 34 milhões que ganham em torno de metade do salário mínimo, o nosso objetivo é elevá-los em conjunto a um patamar de classe média. Portanto, estou falando de um processo de ascensão social no Brasil, uma das condições essenciais para que o nosso país seja de fato um país desenvolvido. Não basta a taxa de crescimento do PIB. Essa elevação a classes mais altas, ao poder de consumidor, ao poder de trabalhador, de empreendedor deste segmento da economia brasileira tem um importantíssimo aspecto humanitário e social, mas também uma grande consequência econômica, que é o fortalecimento do nosso mercado interno. Isto é pré-condição para que nós sejamos uma economia desenvolvida, sustentavelmente equilibrada.
Como devemos aproveitar esta oportunidade que se apresenta ao Brasil? Devemos transformar as vantagens comparativas que nós temos em vantagens competitivas, que são os pilares dessa
colocarmos o nosso empenho. A exploração do pré-sal é crucial porque impulsionará, como uma espécie de passaporte para o futuro. É uma das nossas vantagens comparativas. Além disso, a insolação do nosso país, o clima, o solo, a dimensão continental combinados com uma sistemática trajetória de inovação, de aplicação do conhecimento à questão da agricultura e da pecuária, transformam o nosso país em um dos maiores produtores de alimento do mundo. Não só através do agronegócio e de todo o nosso esforço exportador, mas também através da busca de uma agricultura familiar qualificada, que tenha financiamento, assistência técnica e que instaure de fato a paz no campo. De outro lado, temos um parque industrial que também está à nossa vantagem, é diversificado. Ao contrário dos grandes exportadores de petróleo, que têm uma economia muito pobre, muito pouco diversificada, nós temos um grande parque industrial. Esse parque industrial, combinando inovação e política industrial, vai se transformar cada vez mais em um grande agregador de valor. Acho que esse é o nosso objetivo. Obviamente, sei que relações macroeconômicas também contribuem para isso, mas podemos perceber, retomando o aspecto anterior, que o pré-sal, por exemplo, precisa dessa diversificação da nossa indústria para ser de fato um grande agregador de riqueza, tanto através da construção de fornecedores de máquinas e equipamentos, quanto através da agregação de valor pela exportação de derivados petroquímicos.
“Somos a maior democracia entre os emergentes e uma das maiores democracias ocidentais do planeta. Isso é importantíssimo, porque configura um quadro de respeito às regras do jogo” estratégia de transformação do Brasil em uma economia desenvolvida. O primeiro desses pilares é o fato de que nós temos uma matriz energética que, do ponto de vista do mundo, é diferenciada: 50% dela é hoje uma matriz renovável. Falamos de hidrelétricas, biocombustíveis, energias alternativas como eólica, biomassa etc. Combinado a isso, temos uma imensa descoberta que é o pré-sal. Essa é uma vantagem natural, física, que só será uma vantagem econômica e social se 12
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Em termos de vantagens comparativas, quais são as nossas reservas de valor? Primeiro, a Floresta Amazônica, que é uma grande reserva potencial de valor para o nosso país, uma grande riqueza que tem que ser preservada, que deve ser mantida e transformada em preservação e garantia da nossa biodiversidade. De outro lado, o próprio pré-sal é outra grande reserva que nós temos; e a terceira é o nosso próprio acúmulo de reservas em dólar, chegando hoje a 253 bilhões. Essas três reservas são também estratégicas para essa transformação.
Nesse processo, qual é o ponto-força do brasileiro, o que podemos usar a nosso favor? Além das circunstâncias que já mencionei, que são ou históricas ou naturais, existem outras recentemente construídas,
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sobretudo no período do governo Lula. Primeiro, vindo lá de trás, mas cada vez mais consolidada, a nossa democracia. Vivemos em um país diferenciado, quando olhamos os grandes emergentes, os grandes como nós. Nós somos a maior democracia entre os emergentes e uma das maiores democracias ocidentais do planeta. E isso é importantíssimo, porque configura um quadro de respeito às regras do jogo, aquela questão eterna de não-mudança das regras no meio do jogo. Além disso, nós tivemos uma prolongada estabilidade,
macro e, eu diria, também no espectro político. Neste ponto, elenco duas: reforma política e reforma tributária.
O governo Lula não conseguiu atingir uma meta específica para preparar o Brasil em infraestrutura, especialmente em aeroportos, portos e malha ferroviária. A senhora vai fazer investimentos para corrigir essa deficiência? Eu não concordo com essa avaliação. Eu participei do imenso esforço que foi voltar a investir em um país que parou. Este país parou de fazer projetos, não havia projeto básico, executivo, projeto básico ambiental, enfim, não havia requisitos para se investir. Nem mesmo se sabia o tamanho do projeto que se iria fazer. O que nós fizemos foi um esforço enorme para colocar projetos no papel e, em seguida, começar a tirá-los do papel. Neste ano de 2010, como se esperava, houve um nível de aceleração altíssimo nos investimentos, principalmente em infraestrutura: rodovias, saneamento, logística, energia elétrica, tudo cresceu. Acho que nós demos um grande passo. O Brasil teve um apagão de investimento em infraestrutura ao longo dos 20 anos anteriores ao governo do Presidente Lula. E agora nós temos clareza da necessidade de um planejamento, de uma gestão e de uma parceria público-privada para se conseguir levar à frente não só um novo modelo de logística para o país, mas também garantir segurança energética com tarifas adequadas.
“Temos que ter clareza de um projeto de nação. Projeto de nação não é só crescimento econômico e social. É um projeto também cultural, educacional e de desenvolvimento científico e tecnológico” uma política de crescimento com distribuição de renda e uma inserção diferenciada do Brasil em várias esferas: na esfera econômica, o G-20; na esfera ambiental, toda a nossa presença afirmativa dizendo que nós cumpriremos as metas que nós mesmos nos impomos; e também no campo que eu considero importantíssimo, que é a paz mundial.
Quais riscos a senhora enxerga nesta transformação? Quais passos são fundamentais? Temos que atentar à soberba e perceber que existe ainda muito a fazer. Em primeiro lugar, teremos que qualificar as conquistas macroeconômicas e manter o esforço fiscal que nós fizemos nesse período e que reduz o endividamento público. Eu tenho certeza que nós poderemos, nesse horizonte de 2011 a 2014, atingir uma dívida líquida em relação ao produto interno em torno dos seus 30%. E isso permitirá que nós, de fato, consolidemos taxas nacionais de juros que convirjam para as taxas internacionais. Precisamos elevar os investimentos públicos e privados, bem como garantir que a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016 também se transformem em ganhos de investimento público e privado. Teremos que estruturar uma nova agenda de reformas, tanto micro quanto 14
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E quanto aos jovens brasileiros que assumirão no futuro um Brasil internacional? Para o crescimento do Brasil no sentido da sua ascensão social – e esse é um critério com o qual todas as nações se medem –, é fundamental a proteção que se dá aos seus jovens e às crianças. Porque eles são a perspectiva de futuro que o país tem. Portanto, devemos oferecer condições para que possam se preparar – em que pese sermos todos diferentes uns dos outros – e possam ter oportunidades de escolha. Devemos proteger as nossas crianças e adolescentes do crime organizado, da droga, do craque, etc. Nossos jovens e nossas crianças têm que estar no centro de uma proposta de desenvolvimento do país, que foque na nossa transformação de economia emergente para desenvolvida.
Quais os planos para qualificar a educação? A educação de qualidade é uma das questões mais estratégicas do país. Devemos apostar no desenvolvimento das crianças com uma política de creches que inclua a capacidade do Brasil de ter uma política pedagógica com melhores condições de aprendizado, obviamente combinado com higiene, saúde e alimentação. Além disso, promover a formação continuada de professores e garantir o pagamento efetivo, condizente com a situação de prioridade deste setor, porque pré-condição para a qualidade é necessariamente professor bem pago, família que possa ser levada a apoiar o aluno e escola garantindo ao aluno em dificuldades um apoio pedagógico. Acho fundamental a questão da educação e da nossa aposta em transformação cada vez maior das nossas universidades em centros de excelência.
estados e da União, congregados em torno desse processo; de todos os órgãos da sociedade civil, dos empresários e dos seus sindicatos, dos trabalhadores e dos seus sindicatos; e sobretudo de todos os cidadãos e cidadãs brasileiras. Esse é um dos grandes legados do governo do Presidente Lula: não se governa para um segmento, não se governa para uma área e não se governa para um setor. Quando se chega ao governo, governa-se para todos os brasileiros e para todas as brasileiras, mesmo em um país com a nossa desigualdade. Do contrário, o que estaríamos fazendo é pondo foco nos mais pobres, sem cuidar dos mais ricos. Esta é uma questão crucial, que é essa visão integrada de país. Eu tenho certeza de que as principais economias e nações só conseguiram dar seu salto quando um projeto de país, um projeto de economia, de sociedade e de nação mobilizou toda a sua população.
O brasileiro está preparado para assumir a posição de liderança econômica para a qual o Brasil encaminha-se no cenário mundial? O que é necessário desenvolver? Na questão da educação e da democratização do acesso à cultura reside um elemento fundamental para o país ser uma economia desenvolvida: a afirmação da nossa identidade cultural. Nós temos uma diversidade cultural quase tão rica quanto a nossa biodiversidade. E geralmente os países que passam por processo de desenvolvimento, por uma transição e mudam de qualidade, têm que ter também grandes momentos culturais, têm que olhar para si mesmos e perceberem que a visão do país e a visão de nação que o país tem é algo fundamental e que funciona também como uma das maiores alavancas para essa nação avançar. Isso é fundamental. Temos que ter clareza de um projeto de nação. Projeto de nação não é só crescimento econômico, não é só crescimento social. É um projeto também cultural, educacional e de desenvolvimento científico e tecnológico.
O Brasil está pronto para este avanço? Eu acredito que o Brasil está pronto para partilhar esse desafio tanto do ponto de vista subjetivo quanto objetivo. Objetivo, porque nós transformamos as condições materiais do país. Subjetivo, porque a grande conquista do Brasil é
“Nessa questão da educação e da democratização do acesso à cultura, reside um elemento fundamental para o país ser uma economia desenvolvida: a afirmação da nossa identidade cultural”
Como chegar a isto? Este é um dos grandes desafios que se colocam à nossa frente, e esta proposição, bem como o esforço na área econômica e social, não pode ser só desenvolvida pelo governo, ela deve ser desenvolvida por todos os brasileiros e brasileiras. Sem ganhar corações e mentes, não se faz isso. E perceber que nós precisamos de todos os níveis de governo, dos municípios, dos
essa imensa autoestima que a população brasileira adquiriu, não só porque nós conquistamos um lugar para o Brasil internacionalmente, mas sobretudo porque os brasileiros e as brasileiras conquistaram um lugar no Brasil.
Algumas vozes dizem que Dilma é Brasil, ou seja, se Dilma vence, mantemos nossa liderança brasileira e primado econômico. Se a oposição ganha, vencem os interesses norte-americanos. O que a senhora diz sobre isso? Eu só posso falar pelo meu lado e asseguro que, vencendo, vence uma visão brasileira.
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