Fibra para inovar

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Debater os caminhos da Ciência, Tecnologia e Ino em Brasília, cientistas, professores, técnicos, e no Brasil para os próximos 10 anos. Uma aposta te

REALIZAÇÃO

Academia Brasileira de Cliodas

CTBRASIL MlflIStério da CIência e TecnoIogla

.. I.

I


54 Apoiada pelo Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas, a AsGa desenvolve tecnologia e fatura R$ 100 milhões neste ano EDITORIAL

5

MEMORIA ..•........................

6

OPINIÃO

9

POLíTICA CIENTíFICA ETECNOLOGICA .....•.•.•..........

10

ESTRATÉGIAS

10

NOVA MODALIDADE

DE BOLSA

21

EDITAL PARA REDE DE ALTA VELOCIDADE .........•...........

22

CIÊNCIA

24

LABORATÓRIO

24

A AMAZÔNIA

TODA VIA SATÉLITE

32

REDE MUNDIAL CONTRA O CÂNCER

36

A CORRIDA PELA AGROBACTERIUM

37

REMÉDIOS RETIRADOS DO MAR

38

TATURANA CONTRA TROMBOSE

42

PRECISÃO REDOBRADA EM EXAMES DE TIREÓIDE

44

FíSICOS APROVAM SUPERCONDUTOR

46

AS FORÇAS QUE REGEM O MOVIMENTO HUMANO

48

TECNOLOGIA

........•.....

..•...................

14 Conferência Regional de Ciência,Tecnologia e Inovação reúne pesquisadores e empresários paulistas e formula propostas para a Conferência Nacional

26

52

LINHA DE PRODUÇÃO

52

A OPTOLlNK SE PREPARA PARA A EXPORTAÇÃO

58

o primeiro volume da Flora

61

Fanerogâmica do Estado de São Paulo, que reúne informações sobre quase 500 espécies de gramíneas, vai ser lançado em setembro

NOVO EDITAL PARA O CIETEC, INCUBADORA DA USP A MOSTRA DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE CAMPINAS

62

MAIS PRECISÃO NAS CIRURGIAS ~CmRm

M

NOVAS ANÁLISES CLíNICAS COM BASE NAS ENZIMAS

66

HUMANIDADES

68

A IMPORTÂNCIA DA ATIVIDADE FíSICA PARA OS IDOSOS

68

VIAGEM AO PASSADO PRÉ-COLONIAL BRASILEIRO

71

BALANÇO E RUMOS DA PESQUISA EM HISTÓRIA

74

LIVROS ..................•.•.•.....

80

LANÇAMENTOS

..•.................

81

;

82

ARTE FINAL Capa: Hélio de Almeida,

sobre fotos de Eduardo Cesar

77 23 o Projeto Genoma Cana-de-Açúcar assina acordo com a empresa belga CropDesign e entra na era da genômica aplicada

Pesquisa procura redefinir os critérios que orientam o projeto e a construção de casas populares, adequando-os ao modo de vida contemporâneo e à nova organização do grupo familiar PESQUISA FAPESP • AGOSTO DE 2001 • 3


CARTAS Infra-estrutura

de alimentos

como amigos, podemos também brincar, por que não? Existem brin-

Recebi com satisfação o exemplar 66 desta respeitada

revista. Surpre-

cadeiras

de bom

em questão

minerais e

endeu-me o conteúdo do suplemento

brilho poucas vezes vistos. Quantas

especial, que retrata os investimentos

palavras seriam necessárias

da FAPESP (no Programa

primir o espanto ao constatarmos a violência de uma extração dentária,

estrutura).

de Infra-

Esta, nos últimos

cinco

anos, investiu cerca de R$ 244 milhões em infra-estrutura de laboratórios científicos no Estado de São Paulo. Como

aluno

de doutorado

em

Entomologia na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq),

apesar dos supostos

para ex-

avanços

de ou

por via medicamentosa.

gosto e a charge

é de uma inteligência

e de suplementação

por meio de alimentos

MARIAINÊSRÊ Instituto de Pesquisas Tecnológicas São Paulo, SP

Micro e pequena empresa

nessa

área? Moa está de parabéns.

Recebemos

LUIZJABORY CARVALHO DEABREU São Paulo, SP

Pesquisa

a revista

FAPESP nO 66, que trará contribuição

grande

para a divulgação

ações de pesquisa e inovação Fiquei surpresa ao ler a reclama-

das

tecno-

lógica no ambiente

das micro e pe-

da USP, foi fácil perceber a transformação e o impacto desses investimen-

ção do sr. José Luiz Lage-Marques,

quenas

empresas

paulistas.

presidente

do Conselho

Diretor

bém

será importante

tos em nossos laboratórios.

Sociedade

Brasileira

de Pesquisa

Tudo isso

tem elevado o Estado de São Paulo à

da

que o Sistema

Tam-

mecanismo

Sebrae

usará

para

ampliar

condição de um dos mais bem dota-

Odontológica São Paulo. A assessoria deste senhor não foi feliz ao criti-

dos centros de pesquisa no mundo.

car, duramente,

sa e desenvolvimento tecnológico apoiados pela FAPESP.

Isso se reverterá em inúmeros

bene-

inteligentes

fícios para a sociedade. Essa demos-

humor.

tração de valor ao mundo

lisonjeados

científico

deveria ser seguida pelo governo federal, que, de forma contrária,

urna das formas mais

e criativas

Os dentistas

de se fazer

deveriam

ficar

com a brincadeira.

Que,

anunciando

cortes

do Ministério

da Ciência e Tecnolo-

gia e das universidades

Revista

Participação decisiva

federais.

MARCOSBARROSDEMEDEIROS Professor da UFPB Campus de Bananeiras-PB

Com referência à matéria "Saúde revista Pesquisa. FAPESPde junho 2001, págs. 70-71, em Microcápsulas",

solicito urna complementação

Charge Gostaria

de deplorar

o comen-

ção-Minerais

a respeito da charge publicada na revista de nv 65. Como leigo inte-

Alimentos

ressado em ciência e tecnologia, claro para mim

que o sucesso

impor-

tante' referente à participação e co'laboração do Laboratório de Nutri-

tário do sr. José Luiz Lage-Marques

do Departamento e Nutrição

da Faculdade

de

Experimental

de Ciências

Farma-

da USP naquele

projeto.

está

cêuticas

da

Todo o estudo de biodisponibilida-

Pesquisa FAPESP está em desmisti-

de do ferro

ficar o trabalho

feito naquele laboratório,

sob a coor-

denação

Célia Colli,

do pesquisador

ao

traduzi-lo

- com maestria

dia-a-dia

dos comuns. Assim, o her-

mético torna-se científico

cristalino

já não

- para o e o jargão

consegue

mais

afastar o interesse dos demais. Sentimo-nos parecem

próximos

daqueles

falar a mesma

que

liguagem.

microencapsulado

da professora

orientadora

da aluna

Santos (mencionada laboratório

Tatiana

dos

na matéria).

O

minerais,

tendo

pesquisas como

a recomendação

Passamos a compreender seus. objetivos, admirar seu trabalho, sentir

tão desses nutrientes

simpatia

suas dietas. Tem também

nossos

como a que sentimos mais próximos

amigos.

4 • AGOSTO DE 2001 • PESQUISA FAPESP

por E,

foi

É sempre

um prazer

ler as ma-

térias da Pesquisa FAPESP, mesmo as que não têm relação

direta

nossa área de atuação,

pois é uma

forma de nos mantermos

atualiza-

dos e sabermos está caminhando.

para onde a ciência Apesar

vista estar disponível

de a re-

on-line, ainda

prefiro a forma tradicional, pel, onde observamos ção e cores originais, pressora consegue

com

em pa-

a formatao que a im-

a nossa disposição recuperar.

não

PROF.ROGtRIONOGUEIRADEOLIVEIRA Faculdade de Odontologia - USP São Paulo, SP

de Nutrição-Minerais

vem desenvolvendo principal

de pesqui-

SILVERIO CRESTANA Unidade de Inovação e Acesso a Tecnologia do Sebrae São Paulo, SP

SONIABARROS São Paulo, SP

no orçamento

das pequenas

empresas nos programas

com certeza, não foi de mau gosto.

anda

a inserção

características do pesquisas

com

Quero

objetivo

mento

de inges-

parabenizar

em função das

dos indivíduos

e de

conduzi-

na área de fortificação

agradecer

pelo

desta maravilhosa

recebirevista

pela qualidade

formações. A revista é uma de consulta para a assessoria.

e

das infonte

VER.JOÃOANTONIO- PT/SP São Paulo, SP


• Pesquisa

EDITORIAL

I

PESQUISA FAPESP , UMA PUBLICAÇÃO MENSAL DA FUNDAÇÂO DE AMPARO À PESQUISA DO ESTADO DE sAo PAULO PROF. DR. CARLOS HENRIQUE DE BRITO CRUZ PRESIDENTE PROF. DR. PAULO EDUARDO DE ABREU MACHADO VICE-PRESIDENTE CONSELHO SUPERIOR ADILSON AVANSI DE ABREU ALAIN FLORENT STEMPFER CARLOS HENRIQUE DE BRITO CRUZ CARLOSVOGT FERNANDO VASCO LEÇA DO NASCIMENTO HERMANN WEVER JOS, JOBSON DE ANDRADE ARRUDA MAURICIO PRATES DE CAMPOS FILHO NILSON DIAS VIEIRA JUNIOR PAULO EDUARDO DE ABREU MACHADO RICARDO RENZO BRENTANI VAHAN AGOPYAN CONSELHO T~CNICO-ADMINISTRATIVO PROF. DR FRANCISCO ROMEU LANDI DIRETORPRESIDENTE PROF. DR. JOAQUIM J. DE CAMARGO ENGLER DIRETORADMINISTRATIVO PROF. DR. JOS, FERNANDO PEREZ DIRETORCIENTíFICO EQUIPE RESPONSÁVEL CONSELHOEDITORIAL PROF. DR. FRANCISCO ROMEU LANDI PROF. DR. JOAQUIM J. DE CAMARGO ENGLER PROF. DR. JOSÉ FERNANDO PEREZ EDITORACHEFE MARILUCE MOURA EDITORESADJUNTOS MARIA DA GRAÇA MASCARENHAS NELDSON MARCOllN EDITORDE ARTE HÉLIO DE ALMEIDA EDITORES CARLOS FIORAVANTI (CI(NClA) CLAUDIA IZIQUE (POLinCA C&D MARCOS DE OLIVEIRA [TECNOLOGIA) EDITOR·ASSISTENTE ADILSON AUGUSTO REPÓRTERESPECIAL MARCOS PIVEnA ARTE JOS, ROBERTO MEDDA (DIAGRAMAÇAO) TÂNIA MARIA DOS SANTOS (DIAGRAMAÇAO E PRODUÇÃO GRÁFICA) FOTOGRAFOS EDUARDO CESAR MIGUEL BOYAYAN COLABORADORES ALEXANDRE AGABITI FERNANDEZ AMILCAR DE CASTRO ANA MARIA FlORI CARLOS TAVARES JOS, TADEU ARANTES LUCAS ECHIMENCO MAURICIO LIBERAL AUGUSTO MAURO BELLESA ono FILGUEIRAS RENATA SARAIVA ROBSON BORGES SIMONE BIEHLER MATEOS TÂNIA MARQUES YURI VASCONCELOS FOTOLITOS GRAPHBOX·CARAN IMPRESSÃO PADILLA INDÚSTRIAS GRÁfiCAS S.A. TIRAGEM: 24.000 EXEMPLARES FAPESP R~tT6Ig;IL~~l ~0~AÕE~A~~~-~~1 TEL.(O - 11) 3838·4000 - FAX: (O - 11) 3838-4181 SITE DA REVISTA PESQUISA FAPESP: httpJ/www.revistapesquisaJapesp.br cartas@trieste.fapesp.br

Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião da FAPESP t PROIBIDA A REPRODUÇÃO TOTAL OU PARCIAL DE TEXTOS E FOTOS SEM PRÉVIA AUTORIZAÇAo

SECRETARIA DA CltNCIA TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO

AsGa, um caso exemplar esdeque o antigo boletim Notícias FAPESP tornou-se Pesquisa FAPESP, em outubro de 1999, ainda não havíamos encontrado uma oportunidade para transformar em objeto da reportagem de capa da revista um caso de sucesso de pequena empresa, baseado em suas atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D). Foram muitos, é verdade, os bons resultados de projetos apoiados pela FAPESP,dentro do Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE), apresentados na seção de Tecnologia. Mas, ao longo das 20 edições anteriores, outros temas terminaram se impondo como assunto da capa. E ainda que os critérios para eleger o que merece a capa pareçam sempre óbvios a qualquer editor, trata-se, de fato, de escolha nem sempre fácil. Nesta edição, no entanto, as dúvidas não prosperaram. Tínhamos a reportagem com uma charmosa pesquisa mostrando que forças atuam nos movimentos do corpo humano e indicando até a forma ideal de bater na bola de tênis (página 48). Tínhamos uma outra reportagem importante sobre o lançamento, em breve, do primeiro livro contemporâneo sobre a flora fanerogâmica do Estado de São Paulo, que reúne informações sobre quase 500 espécies de gramíneas nativas ou originárias de outros países (página 26). Seriam, em outras ocasiões, possibilidades de capa, mas não desta vez: o caso da AsGa (página 54) se impôs porque ele é, no mínimo, emblemático do potencial de um setor - o das pequenas empresas - que o senso comum, pelo menos no Brasil, nem sempre associa à capacidade de inovar e fazer tecnologia de ponta. Essa pequena empresa de Paulínia, a 15 minutos da Unicamp, fabricante de multiplexadores e modens ópticos, conseguiu elevar seu faturamento de R$ 16,5 milhões, em

D

1999, para R$ 31,5 milhões, em 2000 e, finalmente, para os esperados R$ 100 milhões deste ano. Está obtendo essa marca impressionante, com certeza, graças à visão estratégica, à capacidade empreendedora, à saudável teimosia, até, de seus criadores, mas também e talvez principalmente por sua determinação inarredável de investir em P&D, e pelo apoio financeiro que para isso obtiveram - no caso, apoio do PIPE que, lançado em 1997, hoje financia 165 projetos de inovação em pequenas empresas, das quais muitas deverão repetir o sucesso comercial da AsGa. Vale deter-se um pouco sobre esse exemplo da AsGa num momento em que o país propõe-se a discutir, sob os auspícios do Ministério da Ciência e Tecnologia e da Academia Brasileira de Ciências, uma política de ciência, tecnologia e inovação (CT&I) para os próximos dez anos. Ora, nas conferências regionais preparatórias para esse debate nacional (ver reportagem a respeito na página 14), entre os múltiplos diagnósticos sobre o setor, mostrou-se à exaustão que um dos mais sérios problemas da CT&I no país é sua parca capacidade de transformar conhecimento em riqueza, por uma razão fundamental: é muito baixa ainda a participação das empresas nos investimentos totais do setor, algo em torno de 30%. Será por distorções da cultura empresarial brasileira, porque faltam mecanismos suficientes de apoio ao investimento em P&D, por dificuldades conjunturais que barram os investimentos de retorno mais longo e alto risco, seja pelo que for, o que o exemplo da AsGa indica é que, com os apoios adequados, há chances, sim, de se criar no país um ambiente empreendedor novo, fundado na nítida compreensão de que conhecimento é a grande fonte de riqueza nas sociedades contemporâneas. PESQUISA FAPESP • AGOSTO DE 2001 • 5


MEMÓRIA/

HOMENAGEM

As lições do pesquisador Aleir José Monticelli, professor da Unicamp e colaborador da FAPESp,morreu no começo de agosto "Ser professor não era exatamente uma profissão para ele. Era um jeito de viver: observava tudo e ensinava o tempo todo. Tinha enorme prazer em viver assim." Isadora Monticelli

depoimento de Isadora sobre seu pai, Alcir José Monticelli, é corroborado por todos os que trabalharam e conviveram com ele. Professor titular da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação da Universidade Estadual de Campinas (FEEC/Unicamp), autor de três livros sobre potência e energia, pesquisador com 35 artigos publicados em periódicos de primeira linha do exterior e mais de SOOcitações catalogadas no Science Citation Index. Era assessor da National Science Foundation (NSF) e membro das principais conferências de sua área de atuação. Monticelli ainda teve uma passagem de grande valia pela FAPESP, onde foi o mentor de um dos mais importantes projetos já colocados em prática pela Fundação, o Programa Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE). Doente havia alguns anos, o professor morreu no Hospital de Clínicas da Unicamp, em razão de complicações decorrentes de problemas no rim, no dia 5 de agosto, aos 54 anos.

Ü

6 • AGOSTO DE 2001 • PESQUISA FAPESP

Monticelli com a mulher Maria Stella, em 1994: trabalhos no Brasil, Estados Unidos e Japão

Monticelli era natural de Rio Capinzal, Santa Catarina, mas mudouse com a família para Sorocaba, São Paulo, e graduou-se em engenharia eletrônica em São José dos Campos, no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), em 1970. Formou-se e foi para Campina Grande fazer o mestrado na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), terminado em 1972. De volta a São Paulo, decidiu se instalar em Campinas e cursar o doutoramento em automação na Unicamp, completado em 1975. Daí em diante, sempre manteve o vínculo com essa universidade na qual se tornou professor titular em 1982. "Alcir Monticelli foi uma liderança acadêmica importantíssima", testemunha Carlos Henrique de Brito Cruz, presidente da FAPESP e diretor do Instituto de Física da Unicamp.

"Ele colocava os valores da academia acima de qualquer outra coisa dentro da universidade." Embora sempre tivesse preferência por trabalhar no Brasil, em 1982 foi le. . cionar, escrever e pesquisar na Universidade da Califórnia, em Berkeley, Estados Unidos, com a mulher Maria Stella e as filhas Viridiana, Isadora e Leonora, esta última recém-nascida. Também passou uma temporada no Japão, entre 90 e 91, como pesquisador do grupo de inteligência artificial e computação paralela da Mitsubishi Electric Corporation. A atuação na FAPESP começou em 1987, como assessor. Durante a década de 1990, passou pela coordenado ria de inovação tecnológica, de engenharias e integrou o Conselho Superior da Fundação. "Certo dia, em 1996, ele entrou na minha sala e começou a falar, cheio de entusiasmo, sobre um interessante programa norte-americano de inovação tecnológica em pequenas empresas': lembra o diretor científico da FAPESP, José Fernando Perez. Monticelli havia recebido a incumbência de analisar dois projetos científicos em trâmite na NSF, que usavam seus artigos como a principal referência. Esses projetos faziam parte do Small Business Inovation Research (SBIR), um programa mantido


por agências governamentais de fomento à pesquisa com verbas superiores a US$ 100 milhões. As agências destinam de 2,5% a 5% de seu orçamento para o SBIR, que apoia inovação tecnológica em pequenas empresas. Monticelli propôs a criação de algo semelhante para a FAPESP. "A idéia era muito boa e pedimos a ele para trabalhar numa primeira versão da adaptação do que viria a ser o PIPE", conta Perez. Alguns meses depois, em 18 de junho de 1997, o PIPE foi lançado com a presença do então governador Mário Covas (19302001) - foi o primeiro programa a apoiar a pesquisa para inovação tecnológica diretamente na empresa por meio da concessão de financiamento ao pesquisador vinculado a ela ou associado. "Graças a ele, temos um espaço mais adequado para que a Fundação cumpra sua função constitucional que é fomentar a pesquisa para o desenvolvimento científico e tecnológico", diz Perez. Superando todas as expectativas, no primeiro edital do PIPE foram recebidas 82 propostas - es-

Entre 1990 e 1991, Monticelli pesquisou inteligência artificial e computação no Japão

STATE ESTIMATION INELECTRIC POWER SYSTEMS A Ceneralizcd Approach

A. MonuceJli

o livro feito sob encomenda: sucesso na pós-graduação dos Estados Unidos

perava-se em torno de 20. No fina], 32 acabaram aprovadas e, de lá para cá, já foram aprovados 165 projetos. Um dos mais vistosos é objeto de capa da atual edição, a AsGa, fabricante de equipamentos para sistema de telecomunicações. Participante do PIPE, a empresa prevê alcançar US$ 100 milhões de faturamento neste ano. "Por ter dado contribuições como essa, do PIPE, Monticelli foi muito especial para a FAPESP", diz Perez. O pesquisador era rigoroso e criativo em todas as suas áreas de trabalho. Um dos três livros que escreveu, State Estimation In Electric Power Systems: a Generalized Approach, publicado sob encomenda da Kluwer Academic Publisher, editora norte-americana, foi adotado por numerosos cursos de pós-graduação em engenharia elétrica nos Estados Unidos. "É o texto definitivo para essa área", afirmou em carta à mulher de Monticelli, Maria Stella, o professor Bruce S. Wollenberg, do Departamento de Energia Elétrica da Universidade de Minnesota. Tanta competência como professor, pesquisador, escritor e formulador de políticas para inovação tecnológica não roubava tempo da família e do lazer. Monticelli tocava flauta transversal, adorava astronomia e era adepto de caminhadas. "Se qualquer pessoa entrasse na biblioteca do meu pai, não saberia dizer qual era sua especialidade", conta Isadora, a filha do meio. "Ele tinha em igual quantidade livros de história, literatura, música e filosofia, tanto quanto de engenharia." Integrando o Conselho da FAPESp,em 1997: idéias inovadoras PESQUISA FAPESP • AGOSTO DE 2001 • 7


~ GOVERNO

DO ESTADO DE

SÃO PAULO

Secretaria da Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico

#tJAPESP

Rua Pio XI, 1500 - Alto da Lapa 05468-901 - São Paulo - SP Tel. (11) 3838-4000 www.fapesp.br


OPINIÃO

MARCO ANTONIO

ZAGO

Um debate fora de foco Muitas das discussões sobre células embrionárias têm base em especulações Outra conseqüência benéfica desses estudos é evidência que a pesquisa com células progenitoras embrionárias (stem cells ou céluo estímulo à pesquisa com células progenitoras de adultos, células multipotenciais presentes em las-tronco) alcançou nos últimos meses é vários tecidos humanos, das quais as mais bem resultado do progresso e da controvérsia. Os proconhecidas e exploradas são as células hernatogressos obtidos nessa área indicam que essas pespoéticas. Paralelamente, o sangue de cordão umquisas vão produzir numerosas aplicações práticas bilical poderá revelar-se fonte de células progenipara a medicina e a biologia, mas ao mesmo temtoras mais imaturas, como já ocorreu no caso da po estão gerando uma viva controvérsia no terreno da ética, levando a intervenções de governantes, linhagem hematopoética. A comunidade científica tem parlamentares e líderes religiosos. É um papel central para sustentar a necessário enfatizar que muitas das discussões têm por base especulapesquisa nessa área e promover o diálogo com a sociedade para afasções que estão distantes da realidatar temores e ajudar a definir os liI "A comunidade de científica atual, situando-se quamites das intervenções. Devemos se no campo da ficção científica, científica tem enquanto a multiplicidade de células promover pesquisas básicas e aplium papel central progenitoras no organismo contricadas sobre o uso de células progepara promover nitoras de diferentes fontes e, ao bui para confundir a questão, pois as o diálogo com a mesmo tempo, estimular um debarestrições éticas relacionam-se apete fundamentado no conhecimento nas aos experimentos com uma das sociedade" categorias dessas células: células emcientífico e no interesse da sociedabrionárias totipotenciais, derivadas de, para permitir que os pesquida massa interna de blastocisto obtisadores participem do grande prodo de óvulo fertilizado in vitro ou de gresso que ocorrerá nessa área no tecidos fetais obtidos em gravidez infuturo imediato. Nesse sentido, o terrompida precocemente. A semedebate ético sobre experimentação lhança entre a transferência de núcom células embrionárias parece cleo em célula somática representa estar muitas vezes deslocado. um método alternativo de produção de célulaPor exemplo, qual o destino de embriões sutronco embrionária, e a semelhança desta abordapranumerários congelados obtidos por fertilizagem com os passos iniciais da clonagem de mamíção in vitro, guardados em clínicas de fertilização que não serão mais utilizados para implantação e feros tem contribuído para aumentar a confusão. desenvolvimento de fetos? O debate ético deveria As possíveis aplicações dessas células na medicina incluem a regeneração de tecidos (como concentrar-se na sua produção. Se a sociedade e as miocárdio após o enfarte, o pâncreas em diabétiorganizações médicas consideram ético produzicos, o tecido muscular de portadores de distrofia los para reprodução (e são produzidos aos milhamuscular, e mesmo o tecido nervoso, tido até há res) e não são capazes de encontrar um destino útil para eles, a sua utilização para fins médicos e pouco tempo como impossível de ser reparado). de pesquisa biológica não parece indefensável. Essas linhagens poderiam ainda servir para testes de medicamentos e para a compreensão dos mecanismos complexos envolvidos no desenvolvimenMARCO ANTONIO ZAGa é professor da Faculdade to humano e os fatores que controlam a formade Medicina de Ribeirão Preto da USP e coordenador ção de células especializadas, com importantes do Cepid Centro de Terapia Celular reflexos sobre a pesquisa do câncer.

A

r

o

PESQUISA FAPESP . AGOSTO DE 2001 • 9


POLíTICA CIENTíFICA E TECNOLÓGICA

Reengenharia no Smithsonian

porcionalmente, investe menos em C&T do que a média das nações da União Européia. A comparação é ainda mais desconfortável para os italianos quando do outro lado figuram Alemanha, Japão ou Estados Unidos, países que chegam a alocar entre 2,5% e 3% do PIE para C&T. O Brasil investe 1% no setor - ou R$ 15 bilhões. •

• o apelo dos cientistas japoneses

Fóssil de Triceratopis no Museu de História Natural do Smithsonian: enxugamento

o Instituto

Smithsonian, um dos maiores conglomerados científico-culturais dos Estados Unidos, passa por uma reengenharia administrativa de tirar o sono de muitos dos 6.300 funcionários. Sediada em Washington, onde mantém o zoológico nacional e 14 de seus 16 museus, a entidade decidiu fechar no fim do ano um dos seis centros pesquisa que patrocina fora da capital norte-americana. Encerrando em 31 de dezembro deste ano as atividades do Centro de Pesquisa de Material e Educação, que fica no Es-

• Itália dobra verba para pesquisa Para tirar o atraso em relação às potências científicas do planeta, o governo italiano prometeu recentemente dobrar a verba destinada à pesquisa e tecnologia. A ministra 10

• AGOSTO DE 2001 • PESQUISA FAPESP

tado vizinho de Maryland, os dirigentes do Smithsonian vão economizar US$ 2 milhões por ano. O valor pode não parecer muito significativo para uma instituição que conta com um orçamento anual de cerca de US$ 450 milhões, 70% dos quais provenientes do governo federal. O problema é que 'o Smithsonian, fundado há 155 anos, passa por um momento delicado: o número de funcionários aumentou, as doações de particulares já não são tão gordas quanto antigamente e uma nova mentalidade reina na casa. Seu

da Pesquisa e Educação, Letizia Moratti, disse que, nos próximos cinco anos, a terra de Dante e Galileu vai elevar o valor da verba investida anualmente no setor de 1% para 2% do PIE nacional, segundo a revista Nature (2 de agosto). Se a promessa sair

atual chefão, Lawrence Small, ex-executivo do Citibank e primeiro homem de fora do meio acadêmico a gerir a instituição, quer reduzir as linhas de pesquisa que produzem ciência de menor impacto e concentrar esforços e verbas nas áreas em que o Smithsonian é referência mundial. Além disso, muitos dos museus e centros estão deteriorados e precisam de reforma urgente (dois deles estão neste momento fechados para reparos). O custo da remodelação de todo o complexo assusta: US$ 1,5 bilhão. •

mesmo do papel, algo como US$ 22 bilhões passarão a entrar a cada 12 meses nas universidades e centros de pesquisa do país. O reforço orçamentário é mais do necessário. Hoje, embora esteja entre as oito maiores economias do globo, a Itália, pro-

As diretrizes da política científica do primeiro-ministro japonês, Junichiro Koizumi, estão provocando mal-estar entre os pesquisadores do país. Os cientistas estão preocupados na ênfase que Koizumi dá à pesquisa e desenvolvimento em detrimento do apoio considerado insuficiente para pesquisa básica, segundo informa a revista Nature (26 de julho). As linhas determinadas pelo Conselho para Política de Ciência e Tecnologia japonês priorizam quatro áreas - ciências da vida, tecnologia da informação, meio ambiente e nanotecnologia -, além da reforma do sistema de C&T, para ter uma economia mais competitiva e vigorosa. Dezoito líderes de alguns dos principais institutos de pesquisa do país discordaram da iniciativa e escreveram uma carta aberta - um gesto dramático para os padrões japoneses - ao primeiro-ministro afirmando que a nova política asfixia a pesquisa básica "mobilizando completamente a ciência e tecnologia para objetivos de curto prazo dirigidos para a competitividade industrial': "Não há clareza


Envie sua sugestão de site científico para cienweb@triesteJapesp.br

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www.aventuradasparticulas.ift.unesp.br

www.salmonella.org

www.nit.ufscar.br/lamav

Página em português sobre física de partículas com explicações relativas ao Modelo Padrão e teorias diversas.

Dados fartos sobre a bactéria Salmonella, inclusive com uma seqüência de genes disponível on-line.

Informações sobre pesquisas, ensaios, consultoria, patentes e artigos científicos sobre vidros.

Koizumi: diretrizes criticadas na nova política científica da distribuição de verbas para ciência básica e isso é preocupante", alerta Yoshiki Hotta, diretor do Instituto Nacional de Genética. Alguns empresários fizeram coro com os pesquisadores. "O governo não tem clareza de qual é o melhor tipo de pesquisa para o país", disse Toshiaki Ikoma, presidente da Texas Instruments no Japão. •

vista Nature (19 de julho). Em seu último estudo, o NRC aponta queda de matriculados em química, física, matemática e engenharia e mostra os investimentos federais dirigidos para as ciências biológicas. Por exemplo, o número de estudantes de física caiu 22% entre 1993 e 1999, enquanto o de ciências médicas cresceu 41%. Um aumento do valor para os fundos de pesquisa talvez detenha essa queda. Michael Lubell, físico do City College de Nova York, prevê que o efeito da diminuição do investimento na área e de estudantes será sentido gradualmente: "Com os pesquisadores fora dos laboratórios nacionais e das universidades, será difícil repor mão-deobra altamente cualificada" •

• Petróleo ajuda academia africana Quando se trata de ciência, a África não é levada em conta pelo mundo desenvolvido, mas tenta investir no setor sempre que pode. A Nigéria, país rico em petróleo, doou US$ 5 milhões para a Academia Africana de Ciências (AAS) em agosto e aumentou

Porcentagem do número de estudantes graduados nos Estados Unidos (1993-1999)

• Ciências exatas perdem mão-de-obra

40000000000""0

o número de estudantes ma-

10

triculados nos cursos de ciências exatas nos Estados Unidos está caindo dramaticamente, de acordo com o Conselho Nacional de Pesquisa (NRC), segundo a re-

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a dotação do organismo para US$ 20 milhões, de acordo com a revista Science (10 de agosto). A doação é três vezes maior que o orçamento anual da academia e indica que o interesse pelo setor cresce no continente. O presidente nigeriano Olusegun Obasanjo criou um conselho de ciência para inforrná-Io sobre assuntos correntes, como os avanços e possibilidades da biotecnologia, por exemplo. O dinheiro doado à AAS ajudará o fundo de pareceristas que fazem a revisão dos trabalhos científicos em toda a Africa, "Foi uma ação visionária para o continente", diz o presidente do organismo, Mohamed Hassan. Fundada em 1985, com sede em Nairóbi, a academia tem 112 integrantes de 24 países. • PESQUISA FAPESP . AGOSTO DE 2001

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Maisvagas nas universidades estaduais novas unidades na Baixada Pressionadas pela demanda melhorar o quadro nos setor privado. O Conselho dos Reitores das Universipróximos dez anos. Entre as Santista, no centro e na Zocrescente de estudantes que principais medidas a serem na Leste de São Paulo, e em saem do ensino médio, as dades Estaduais (Cruesp ) Limeira, Paulínia e São Caruniversidades estaduais paupreparou o estudo Expantomadas, o Cruesp indica a los. O relatório também enexpansão dos cursos tradilistas aprovaram a abertura são do Sistema Estadual fatiza a necessidade de se de 1.185 novas vagas para cionais dentro dos campi Público do Ensino Superior, instalar cursos seqüenciais e com o diagnóstico da atual existentes, mas apresenta a 2002. A medida é parte do básicos nas escolas técnicas esforço para expandir o sispossibilidade da criação de situação e sugestões para estaduais do sistema tema público de educaPaula Souza e a criação ção paulista, que deverá EXPANSÃO PLANEJADA de outras 20 escolas suter, em breve, de 400 mil Como as universidades criarão mais vagas periores próximas a cidaa 500 mil alunos por des populosas do Estado. Item Novas Novas Tempo %de ano batendo nas portas necessário III crescimento 1'1 vagas I" matrículas Além disso, as Fatecs dedas faculdades em busII 20.730 Expansão 4.145 10 anos 26 verão ser ampliadas aproca de cursos superiores. II Criação de cursos 47.000 94.000 3 anos 118 As instituições públicas veitando as estruturas seqüenciais e básico disponíveis nessas escodo Estado de São Paulo 600 4,5 Cursos 3 anos 3.600 las e devem ser implesão responsáveis por profissionalizantes de nível superior 10% das vagas oferecimentados programas de das - as estaduais responformação de professores 3 anos 19 15.000 Formação de 5.000 I professores para para o ensino básico, pedem por apenas 5,5% o ensino básico -< delas (ou 17,5 mil) nas las três universidades. O 133.330 56.745 167 Total geral estudo prevê a abertura universidades de São 1.Total de vagas oferecidas ao longo da implantação; 2 Total de novas matriculas Paulo (USP), Paulista de 56,7 mil vagas e 133 ao final da implantação; 3.Tempo necessário para a implantação total; 4. Porcentagem mil matrículas no ensino de crescimento em relação a 80.000 matriculas atuais (Unesp) e de Campinas superior público pau(Unicamp). Os outros Fonte: Cruesp lista em dez anos. • 90% são supridos pelo (21

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• Bahia cria fundação de amparo à pesquisa Depois de vários anos de reivindicação da comunidade científica baiana, o governo do Estado e a Assembléia Legislativa aprovaram a criação da Fundação de Amparo. à Pesquisa na Bahia (Papesb), no fim de agosto. A mobilização por um organismo descentralizado e com autonomia política e administrativa vem desde os debates para a preparação da Constituição de 1988 e das Constituições estaduais, de 1989..A Fapesb incorporará o Centro de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CADCT), uma superintendência que funciona como 12 • AGOSTO DE 2001 • PESQUISA FAPESP

órgão da adminstração central com muita rigidez operacional. A lei prevê 1% da receita tributária líquida do Estado, mais. 3% do lucro líquido da Agência de Desenvolvimento da Bahia (DesenBahia, o antigo Desenbanco) para a fundação, que terá autonomia gerencial e flexibilidade administrativa. "A Fapesb nascerá também com . maior visibilidade social do que um órgão centralizado, como é o CADCr: explica a superintendente Cleilza Ferreira Andrade. A previsão é que a fundação comece a funcionar efetivamente nos primeiros dias de 2002 com um orçamento de R$ 21,5 milhões, fora o dinheiro da DesenBahia, impossível de ser

calculado hoje.A Fapesb ficará alocada num prédio antigo da Colina de São Lázaro, em Salvador, de 19.200 metros quadrados. •

• Competência reconhecida A seção News Focus da edição de 31 de agosto da Science, revista científica editada pela American Association for the Advancement of Science, dedica uma página ao programa Rede de Biologia Molecular Estrutural (SMOLBnet), da FAPESP. A reportagem também faz um panorama e descreve as potencialidades da pesquisa brasileira em genômica, apresentando os resultados dos projetos de se-

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qüenciamento concluídos pela Organização de Seqüenciamento e Análise de Nucleotídeos (ONSA), o instituto virtual de genômica criado pela Fundação em 1997. A revista situa a FAPESP como a mais bem-sucedida agência de fomento do Brasil e destaca as opiniões dos professores Wayne Hendrickson, da Universidade de Colúmbia, e Iohann Deisenhoffer, da Universidade do Texas, ganhador do prêmio Nobel de Química em 1988. Hendrickson afirma que o Brasil atingiu a mesma capacidade de competição de países avançados na área e Deisenhoffer elogia a qualidade da luz síncrotron utilizada nas pesquisas do programa SMOLBnet. •


Homenagem à FAPESP

Perez descobre placa na Unifesp: dimensão coletiva Numa pequena cerimônia, a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) homenageou o diretor científico da FAPESP, o físico José Fernando Perez, dando seu nome ao Centro de Pesquisas do Genoma, inaugurado oficialmente na manhã de 28 de agosto é uma tradição da escola dar nomes de pessoas vivas a seus laboratórios e centros. "A inserção do Brasil na competitiva área da Ciência Genômica, liderada pelo professor Perez, é fato já conhecido por todos", disse Marcelo Briones, professor do Departamento de Microbiologia da Unifesp e um dos coordenadores de seqüenciamento do Genoma Câncer. Depois de listar os principais dados do currículo de Perez, Briones estendeu a homenagem aos funcionários da FAPESP. Falaram também o reitor da universidade, Hélio Egydio Nogueira, o pró-reitor de Pós-Graduação e Pesquisa, Nestor Schor, o pró-reitor de Extensão, Manoel Lopes dos Santos, e o coordenador de pes-

quisa da Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa, Ruy Maciel, para quem "um centro de pesquisas que trata da genômica e congrega diversos grupos de pesquisadores traz a marca típica da visão e gestão de José Fernando Perez e só poderia levar o seu nome': Perez ressaltou "a nítida dimensão coletiva" da homenagem. "Só com esse entendimento posso me sentir à vontade para aceitá-Ia", disse. "É uma homenagem à FAPESP como um todo, do Conselho Superior ao quadro de funcionários, em razão da in'iciativa ousada da instituição no campo da genômica." Perez dirigiu-se também aos pesquisadores responsáveis pelo projeto desde a idéia inicial e à equipe de adjuntos da diretoria científica, "l'arrnata Brancaleone", comparou, com humor, lembrando o filme de Mario Monicelli, "que compartilha o sonho da busca por Aurocastro, pela utopia cada vez mais realizável de nos tornarmos um país forte em ciência e tecnologia". •

li Inaugurado Centro de Terapia Celular Foi inaugurado, em Ribeirão Preto, no início de agosto, o prédio do Centro de Terapia Celular (CTC), um dos dez Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) da FAPESP. "Aproveitamos o antigo prédio do Hemocentro Regional que está sendo ampliado': conta Marco Antonio Zago, diretor científico do CTC, que desenvolve várias linhas de pesquisa utilizando como matéria-prima a célula-tronco, presente no sangue do feto e no cordão umbilical, que dá origem a vários tipos de células sangüíneas, como as hemácias, linfócitos e plaquetas, por exemplo. As pesquisas desenvolvidas no CTC com as células-tronco têm o objetivo de desenvolver terapias contra algumas doenças auto-imunes e leucemias. •

• Ação para recuperar aeroportos A Infraero decidiu investir na recuperação de 19 aeroportos brasileiros e assinou convênio com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) para restaurar áreas degradadas em estado crítico. O trabalho

começa com o diagnóstico de cada região e a avaliação do estado do solo. Depois, serão elaborados os projetos e propostas as medidas para diminuir a degradação. Finalmente, os pesquisadores da Embrapa acompanharão a execução dos projetos, a cargo de terceiros. "Como toda grande obra, os aeroportos movimentam grande quantidade de terra, em razão das escavações, aterro de estradas e drenagem, entre outras ações, o que provoca problemas ambientais", diz Aloísio Granato, coordenador da equipe que trabalhará no projeto, da Embrapa Solos. O estudo começou pelo Galeão/Antônio Carlos [obim, do Rio de Janeiro, no final do ano passado. "Mostramos que tínhamos condição de fazer um trabalho mais amplo e assinamos um contrato com a Infraero para fazer o mesmo trabalho em outros lugares do país." Granato calcula que a operação deve durar um ano até conseguir ter as áreas afetadas estabilizadas, dependendo da região onde está o aeroporto - Cerrado, Mata Atlântica, Amazônia, etc. O valor do investimento é de R$ 722 mil e os pesquisadores estimam o prazo de execução em 42 meses. •

Obra de contenção de águas em área erodida no Galeão PESQUISA FAPESP • AGOSTO Df 2001 • 13


POLíTICA CIENTífiCA

E TECNOLÓGICA

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São Paulo propõe • • novos Incentivos • para pesquisa Pesquisadores, cientistas, empresários e parlamentares pedem a implementação de política fiscal para estimular investimentos de empresas em inovação Brasil deve tomar medidas urgentes para superar o atraso tecnológico que compromete o seu desenvolvimento e competitividade. É preciso estimular investimentos em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (P,D&I). As atividades de pesquisa, hoje concentradas nas universidades, têm que ser levadas também para dentro das empresas. Esse desafio exige a implementação de políticas de incentivos fiscais e apoio do governo. Essa avaliação, endossada por empresários, parlamentares, pesquisadores, jornalistas e representantes de universidades e institutos de pesquisa, norteou os debates da Conferência Regional de Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado de São Paulo, realizada na Assembléia Legislativa nos dias 16 e 17 de agosto. O encontro te~e por objetivo discutir as prioridades de São Paulo para a área e preparar as contribuições paulistas para a Conferência Nacional que o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) e a Academia Brasileira de Ciências realizarão em Brasília, entre os dias 17 e 21 de setembro, com a ambição de traçar uma política científica e tecnológica para os próximos dez anos. Em São Paulo, assim como nas demais regiões do país (ver página 20), os debates foram orientados por cinco grandes temas propostos: Avanço do Conhecimento, Qualidade de Vida, Desenvolvimento Econômico, Desafios Estratégicos e Desafios Institucionais. "Este é um debate estratégico para o futuro do país", afirmou o secretário da Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico do Estado de São Paulo, Ruy Altenfelder Silva. "O desafio de transformar conhecimento em riqueza só será possível com apoio oficial e para viabilizar o envolvimento da empresa em atividades de P&D", disse Carlos Henrique de Brito Cruz, presidente da FAPESP, um dos debatedores do tema C&T&I e Desenvolvimento, coordenado pelo jornalista Roberto Müller Filho, da Gazeta Mercantil. Brito lembrou que foi a ação do Estado, por meio de uma bem-sucedida política de incentivos fiscais, que permitiu que a Coréia expandisse sua economia e

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ampliasse sua participação no mercado mundial. Enquanto o Brasil tem hoje apenas 11% de seus cientistas e engenheiros trabalhando em empresas e 89% nas universidades e institutos de pesquisa, a Coréia tem 54% desses profissionais na iniciativa privada. "É preciso criar um ambiente menos hostil para as empresas investirem em P&D", completou. Nos países desenvolvidos, as empresas têm papel fundamental na implementação da pesquisa aplicada, sempre apoiadas por subsídios oficiais. Brito lembrou o Buy American Act, lei norte-americana que prioriza as empresas nacionais nas compras governamentais. "Os Estados Unidos dedicam US$ 25 milhões ao ano para isso", destacou. No Brasil, a situação é diversa. Gilberto Câmara Neto, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), lembrou que o governo contrata apenas 10% de seus projetos de satélites de empresas brasileiras. "O programa espacial tem de ser um instrumento de política industrial, privilegiando a indústria nacional nesse setor estratégico, como ocorre nos países desenvolvidos': disse Câmara, garantindo que mais da metade do que é contratado no exterior poderia estar sendo comprado aqui. A ausência de uma política de incentivos tem seu preço. Aqui, o setor privado é responsável por, no máximo, 35,7% do total de gastos em P&D, enquanto nos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) o percentual médio chega a 70%. Nos Estados Unidos, o governo paga cerca de 40% I do total de gastos feitos em pesquisa aplicada e desenvolvimento, embora realize apenas 10% das atividades relativas a esses gastos: 90% são feitas pelas empresas. A isenção fiscal por investimentos em pesquisa chega a 30% em alguns desses países, enquanto no Brasil é de apenas 5%. "Precisamos rever isso': ressaltou Brito. Incentivos fiscais - Nas regras do comércio internacional, não existem impedimentos para a implementação de políticas de incentivo a investimentos em P&D das empresas. José Augusto Correia, do Departamento de Tecnologia da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), ressalvou que o subsídio à inovação é um dos poucos não penalizados pelo acordo da Organização Mundial do Comércio (OMC), assinado por 142 países, que ad-


mite que esses auxílios cuInvestimento empresarial em P&De patentes: lkasU e COl'éía bram até 75% do custo da pesquisa. O Brasil também BRASIL CORÉIA dispõe de uma Lei de Incenti10,0 10,0 3500 3500 vos à P&D, a 8.661/93. Mas eu eu '" '" ela representa apenas 2% do 'o 'o 3000 ,f; ,f; :õ valor total da renúncia fiscal 7,5 ~ 7,5 ~ :3 2500 a título de incentivo à pesqui22w sa, desenvolvimento e capacitas ::l ::l ~ :;; 2000 ~ ção tecnológica nas empresas, 5,0 E ~ 5,0 E c <IJ <IJ que, no ano passado, somou a. a. c, 1500 R$ 1,55 bilhão. Dois terços êS o c c 1000 desse total resultaram da Lei 2,5 E 2,5 E de Informática (8.248/91), -." ~<IJ <IJ 500 > > um quarto é fruto da lei espe.E .E cífica para a Zona Franca de 0,0 o 0,0 o 1980 82 84 86 88 90 92 94 96 98 00 1980 82 84 86 88 90 92 94 96 98 00 Manaus (8.387/91) e 5%, das Número de patentes leis de incentivo à importação de equipamentos de pesquisa (8.010/90 e 8.032/90). Os resultados, no período, somaram Bruto (PIB), de acordo com José MiA Lei 8.661/93 foi inspirada em leguel Chaddad, diretor executivo da apenas R$ 33,7 milhões. Associação Nacional de Pesquisa, Degislação semelhante adotada por paíTanto a Anpei, entidade responsáses como Canadá, Estados Unidos, senvolvimento e Engenharia das Emvel pela implementação da 8.661/93, França, Japão e Coréia. Entre 1995 e presas Inovadoras (Anpei). Em 1997, como a Fiesp consideram prioritário 1998, o total de subsídios concedidos no entanto, os incentivos foram redurecuperar e até ampliar os percentuais pela Lei 8.661 tinha crescido quase zidos para 4% do imposto de renda concedidos por esta lei. A Anpei pro250%, a ponto de ampliar a participa(IR) das empresas, e a lei passou a inpõe que se estabeleça dedução de ção dos investimentos em tecnologia corporar também subsídios do Fun15% do IR de todas as despesas com de 0,8% para 1% do Produto Interno do de Amparo ao Trabalhador (FAT). P&D, sendo 25% para as regiões

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Sebrae e FAPESPpreparam parceria no PEMP A FAPESP criou, em parceria com o Sebrae-SP, um novo programa de estímulo à inovação tecnológica. O pesquisador na Empresa (PEMP) vai apoiar, por meio de bolsas, a realização de projetos de pesquisa desenvolvidos em ambiente empresarial. "Num segundo momento, poderemos pensar em estabelecer acordos semelhantes também com a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e Confederação Nacional da Indústria (CNI)': diz José Fernando Perez, diretor científico da FAPESP. As novas normas ainda serão anunciadas. A arquitetura do PEMP se assemelha à do Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas

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Empresas (PIPE). A diferença é que o Sebrae financiará os primeiros seis meses do programa, período em que o pesquisador deverá detalhar o projeto de pesquisa a ser desenvolvido na empresa. Aprovada a proposta, ele passará a contar com recursos de bolsas da FAPESP durante os 18 meses subseqüentes. Os objetivos do PEMP são estimular a prática de pesquisa e fomentar a inovação nas empresas paulistas, conciliar os esforços da pesquisa aplicada com os interesses empresariais e fomentar a contratação de pessoal de alto nível para funções relacionadas à pesquisa e desenvolvimento na empresa, entre outros.

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De acordo com Perez, a expectativa é que o PEMP também gere maior demanda para o PIPE, cujo principal problema é a carência de pesquisadores que conheçam o ambiente empresarial. O PEMP distribuirá duas modalidades de bolsas - Pesquisador na Empresa (PDI) ou Iniciação Científicae Tecnológica (IC) -, dependendo da qualificação do pesquisador. A PDI vai atender pesquisadores recentemente formados, com competência documentada. Os bolsistas da categoria IC receberão auxílio-transporte. As empresas poderão complementar a remuneração dos pesquisadores de forma a compatibilízá-la com os valores do mercado.

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pação dos municípios no Centro-Oeste, Norte e NorCientistas e engenheiros em P&D esforço de desenvolvimendeste, além de isenção do to, não contemplada pela Imposto sobre Produtos BRASIL USA Industrializados (IPI) soConstituição de 1988, seDocentes em universidades 56.760 68% 128.000 13% ria mais uma possibilidade bre material destinado à Universidades Federais 32.652 de apoio à inovação. E copesquisa tecnológica nas Universidades Estaduais 17.062 mentou que a Lei de Resempresas, isenção do imUniversidades Privadas 7.046 ponsabilidade Fiscal deveposto de importação e re12.336 70.200 15% ria ser utilizada para obrigar dução de outros impostos os Estados a repassar às Funaplicados à importação de 8.765 764.500 11% dações de Amparo à Pesquibens e serviços destinados Total 77.861 100% 962.700 100% sa os percentuais exigidos à pesquisa tecnológica. Fonte: C. H. Brito Cruz por lei."Seriam mais R$ 300 A Anpei sugere também milhões todos os anos paa criação de mecanismos ra a ciência e tecnologia," de incentivo que estimuCientistas e engenheiros no Brasil e Coréia lem a inovação em empre74.665 Indicadores - Entre os parsas que não pagam imposticipantes dos debates, tamto de renda, como é o caso E 56.760 bém houve consenso sobre da maior parte das organi'w ..c C a necessidade de se criar zações de pequeno porte, e Cl instrumentos para avaliar o abatimento em dobro de C W de maneira sistemática o despesas com cursos de <tl •... nível de investimento das mestrado e doutorado de .~ Empresas em P&D. Na UniC empregados, entre outras 15.185 o camp, por exemplo, já está medidas. Chaddad propôs sendo criado um instituto ainda a simplificação do BRASIL (1966) CORÉIA (1977) virtual para estudar os improcesso de concessão de Empresas Institutos Universidades pactos da ciência e tecnoincentivos; a certificação logia na sociedade, segundas empresas; abertura de do anunciou o ex-reitor Carlos Vogt, linhas de financiamento para o fiNa perspectiva da Receita Federal, atualmente vice-presidente da Socieno entanto, incentivo fiscal é uma nanciamento da aquisição de mádade Brasileira para o Progresso da quinas, equipamentos e aparelhos forma de evasão de recursos, como para atividades de P&D; empréstiCiência (SBPC). ressalvou Gerson Ferreira Filho, da Esse instituto virtual pretende famos a fundo perdido para projetos Secretaria de Governo do Estado de zer o mapeamento da estrutura emSão Paulo. "Mas se estamos pensancooperativados; e a criação de uma agência nacional de tecnologia. presarial brasileira, avaliando os rado em sair do patamar de 1,2% do mos de atividade que cresceram, os PIB destinado a P&D e para atingir, que estagnaram e os que decaíram, Lei de Inovação - Rui Quadros, profes-, por exemplo, 2,5% nos próximos sor da Universidade Estadual de Camalém de analisar as tendências de cinco anos, precisamos permitir que fragmentação, concentração e morpinas (Unicamp) e coordenador aduma parcela de incentivos para aplitalidade das empresas, assim como junto da Conferência Nacional de cações em P&D seja também acessídos processos produtivos, do perfil Ciência, Tecnologia e Inovação, destavel a qualquer empresa, e não apenas da mão-de-obra em cada setor e das a indústrias ou agroindústrias que teca que uma das prioridades do MCT é a aprovação de uma Lei de Inovação nham seu Plano de Desenvolvimento modificações na estrutura ocupacional brasileira. Esses dados serão crupara proteger a propriedade intelectuTecnológico 'aprovado': sugere. Essas zados com uma análise dos investial e a transferência de tecnologia, estimedidas deveriam incluir, por exemmentos em tecnologia, registros de mular a mobilidade de pesquisadores plo, a autorização para que empresas patentes, importações e exportações do setor público para o privado e a com ações na Bolsa de Valores posconstituição de capital de risco. Tamem cada setor. sam emitir uma classe de ações, com bém estão sendo estudadas mudanças carências, para investimentos em na Lei de Licitações, de forma a flexiPequenas empresas - Os debates tamP&D. As empresas com IR a pagar bém enfatizaram a importância dos bilizar a participação das empresas de poderiam destinar a parte incentivaestímulos à pesquisa no setor privado tecnologia nas concorrências públicas da para aquisições dessas ações novas, e permitir a contratação pelo governo dirigirem-se prioritariamente às pepor um período determinado. Quaquenas e microempresas. "No Brasil, dros lembrou, ainda, que a particide pesquisas junto a empresas. I

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a participação das pequenas empresas não chega a 25% do PIE e 2% das exportações. Temos que ampliar essa relação agregando valor ao produto dessas empresas por meio do estímulo à inovação", disse o diretor-superintendente do Serviço de Apoio à Micro e Pequena Empresa do Estado de São Paulo (Sebrae-SP), Fernando Leça, que participou da mesa O Apoio à Inovação Tecnológica, coordenada pelo jornalista Luís Nassif. Ele destacou a importância das incubadoras de empresas de alta tecnologia, assim como o estímulo à inova-

ca (PITE), implementados pela FAPESP. De acordo com José Fernando Perez, diretor científico da Fundação, com apoio, as pequenas empresas desenvolveram tecnologias tão diversas como uma vacina que previne a má formação de ovos, um software para o reconhecimento de caracteres, biotecnologia nacional para produção de insulina humana, além de dois projetos de desenvolvimento de célula a combustível. Uma das empresas apoiadas pelo PIPE - a AsGa Microeletrônica - chegará este ano a R$ 100 milhões de faturamento, quase

Painéis mostraram efeitos socioeconômicos

dos projetos financiados

ção. No Estado de São Paulo, o Sebrae participa em 35 dessas incubadoras, que abrigam 400 empresas e 1.650 postos de trabalho. O Sebrae-SP, parceiro da FAPESP no Programa Pesquisador na Empresa (Ver box na página 16), sugere, ainda, a elaboração de um grande programa de inovação tecnológica para os próximos cinco ou dez anos, reunindo a FAPESP,Fiesp, universidades e outros órgãos, além da criação de centros tecnológicos setoriais para as áreas prioritárias da política governamental. O potencial de inovação das pequenas empresas de tecnologia pode ser demonstrado pelos resultados dos programas de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE) e de Parceria para Inovação Tecnológi-

19 vezes o resultado alcançado em 1997 (Ver página 54). I Outros dois programas da FAPESP foram apresentados como exemplos de projetos em áreas estratégicas, com grande aplicabilidade, que geraram expertise que já está expandida para todo o país: os programas Genoma e Biota. O Projeto Inovar, exposto na conferência por Mauro Marcondes Rodrigues, presidente da Financiadora de estudos e Projetos (Finep), também é exemplo de iniciativa destinada a ampliar os investimentos privados em ciência e tecnologia. O projeto estimula o capital de risco no país por meio da seleção dos projetos mais promissores e pela organização de uma incubadora de fundos de capital de risco.

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pela FAPESP

o desafio da educação - Dados como o da escolaridade média dos brasileiros, de 6,1 anos de estudos, contra 9,5 anos dos mexicanos e 10,4 anos dos chilenos, deixam claro que a educação é um dos principais desafios do desenvolvimento tecnológico. Na avaliação de Hermano Tavares, reitor da Unicamp, o Brasil precisa superar o atraso, sobretudo no ensino superior, e investir no que ele chama de capacidade de antecipação. "Os estudos apontam que a demanda por vagas nas universidades deverá dobrar em sete a dez anos", diz, lembrando que é preciso criar estrutura para absorver essa população. Ele foi um dos debatedores do tema No Caminho do Futuro, coordenado pela deputada estadual Célia Leão, que preside a Comissão de C&T e Educação da Assembléia Legislativa de São Paulo. No Brasil, ele revelou, das 900 mil vagas no ensino superior, 750 mil estão na rede privada. E concluiu. "Se quisermos pensar no futuro da educação no país, temos que levar em conta a rede privada': A estrutura e legislação das universidades também estiveram em pauta no simpósio Desafios Institucionais, coordenado por Ivan Chambouleyron, da Unicamp. ''A universidade privada tem muito mais espaço para a inovação que a pública", constatou Nina Ranieri, da Universidade de São Paulo (USP). A Lei de Diretrizes e Bases (LDB), disse, flexibilizou a estrutura da universidade pública, mas criou um paradoxo na medida em que, reconhecendo seu estatuto jurídico especial- ainda não regulamentado -, não assegura compromissos claros com seu financiamento. "É difícil definir novos rumos dentro do esquema jurídico vigente", disse ela. ''A universidade privada tem a mesma autonomia, regida, porém, pela vontade e a liberdade de contratação", comparou. A criação de novas estruturas para atender aos novos desafios depende da definição de um regime jurídico especial, concluiu a especialista. Dificuldades estruturais e institucionais também comprometem o de-


sempenho dos institutos de pesquisa. Guilherme Ari Plonski, diretor superintendente do Instituto de Pesquisa Tecnológica (IPT), em São Paulo, abordou as dificuldades que os pesquisadores enfrentam em função da instabilidade de recursos, dos impedimentos legais na sua aplicação e dos baixos salários oferecidos aos cientistas. Plonski chamou atenção para a necessidade de uma redefinição do papel dos institutos de pesquisa, que devem assumir funções mais claras e relevantes no processo de inovação, como operar como grandes portais tecnológicos, articular redes cooperativas, formar capital humano e funcionar como observatórios capazes de produzir informações consistentes sobre CT&I no país. As universidades e os institutos de pesquisa não podem se afastar da missão de produzir conhecimento e fazer ciência. O presidente da Academia Brasileira de Ciências, Walter Colli, fez uma apaixonada defesa da importância da ciência básica. "É um equívoco pensar que a ciência básica é um luxo para um país em desenvolvimento, que investir apenas em tecnologia tirará o povo da miséria mais rapidamente, porque sem bons cientistas um país não consegue sequer compreender as invenções feitas por outros para transformá-Ias em tecnologia', afirmou. Destacou também que os dois pilares de toda a atual revolução biotecnológica estão fundados em duas descobertas da pesquisa básica que não pareciam ter nenhuma aplicação prática: a dupla hélice do DNA, descoberta por Watson e Crick, e as enzimas de transmissão. "Necessitamos formar mais engenheiros e cientistas capazes de desenvolver produtos, mas jamais em detrimento da ciência básica", enfatizou Colli. Concluiu dizendo que o financiamento da pesquisa básica é obrigação do Estado e o da pesquisa aplicada, responsabilidade das empresas. Desenvolvimento social - Os debates sobre Ciência, Tecnologia e Inovação e Qualidade de Vida reuniram espe-

cialistas em saúde, violência, agropecuária e meio ambiente. As mesas foram coordenadas por Marcos Macari, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), e Hernan Chaimovich, da Universidade de São Paulo(USP). Na área da Saúde, José Carvalheiro, da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, destacou a necessidade de diálogo entre a comunidade científica e os representantes do sistema de saúde nos diversos níveis de governo. Na sua avaliação, saúde faz parte do sistema de C&T. Ele defendeu a proposta de criação de um fun-

não só do ponto de vista da freqüência e da relevância das doenças, mas também da capacidade construída para contê-Ias. Marco Antônio Zago, da Universidade de São Paulo, destacou que a missão de qualquer plano de C&T em saúde é a de identificar modelos de ação e pontos de intervenção com efeito multiplicador. "O primeiro passo é reconhecer os problemas da educação superior em saúde, da formação de pesquisadores na área e do planejamento e da gestão em saúde pública", disse ele.

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do setorial para o setor, fazendo ressalvas à idéia de estruturação de uma agência especializada em C&T em saúde. Observou que São Paulo, com a maior capacidade instalada em pesquisa na área do país, deve estar atento à partilha de recursos se essa agência vier de fato a ser implementada. "O Brasil não tem experiência com agências específicas, e o segmento de saúde coletiva estuda o assunto com cautela", enfatizou. Carvalheiro disse ainda que não se pode ignorar que, dos US$ 60 bilhões que os setores público e privado destinam, mundialmente, à saúde, 90% são consumidos por doenças que atingem apenas 10% da humanidade. Ele apontou a necessidade de adotar metodologias que indiquem o que é prioritário nas investigações,

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EUA

Infra-estrutura

Canadá

Zago enfatizou também a importância de adequar os recursos disponíveis com estratégias de C&T que produzam alto impacto sobre as condições de saúde da população e a economia. Mencionou, a título de exemplo, a importação de 225 milhões de unidades de fator de coagulação VIII para tratamento de hemofílicos, obtido por fracionamento de plasma, uma tecnologia ultrapassada que consome US$ 90 milhões anuais, ou 75% do valor empenhado na compra de hemo derivados no mercado externo. Para montar fábricas de fracionamento, o Brasil- que tem um excedente de plasma suficiente para produzir 165 milhões de unidades anuais e tecnologia para isso precisaria investir pouco mais que o dobro do valor anualmente destinaPESQUISA FAPESP

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dados por Machado foram do às importações. A alternativa mais adequada a necessidade de oferecer aos seria, porém, a produção agricultores alternativas de nacional com base na tecsistemas de produção que nologia hoje utilizada pelevem em consideração valores ecológicos, sociais e los países desenvolvidos, baseada em DNA recomeconômicos e o potencial binante. "Um projeto coladas técnicas de irrigação. borativo com esse objetiMaria Inês Pagani, da vo, que envolve quatro Unesp, que tratou das recentros de pesquisa, está lações entre C&T e meio ambiente, sugeriu que o recebendo investimento de apenas R$ 3 milhões da Fi- ) MCT encampasse algu, ,I» nep', disse Zago. '---"""---'''-''-_'''''''''---'----1L_ mas propostas da Agenda 21, como, por exemplo, os Abordando as relações Conferência paulista reuniu pesquisadores e parlamentares entre C&T e qualidade de projetos de zoneamento A C&T também tem papel preponvida, Sérgio Adorno, também da ambiental; recuperação, revitalização e conservação das bacias hidrográfiderante no desenvolvimento da agroUSP, tratou da questão da violência. pecuária. Raul Machado Neto, da Escas e de seus recursos vivos; e estuNo seu entender, a C&T pode contribuir para o controle da violência, em cola Superior de Agricultura Luiz de dos de difusão de tecnologias para o Queiroz, da USP, salientou, por exemtratamento e reutilização da água. três flancos: a construção de um sisplo, a importância fundamental dos tema de estatísticas criminais em níJoão Furtado, também da Unesp, vel nacional, a formação de recursos sistemas de localização geográfica sublinhou que as políticas de C&T por satélite, do acúmulo de conhecihumanos especializados para enfrendevem ter sustentabilidade econômimentos dos recursos genéticos nacioca e estabelecer prioridades claras patar o desafio de reformar o sistema de nais com o mapeamento da biodiverjustiça e a formulação de um prograra fazer frente à competição entre emsidade animal e vegetal, da proteção ma articulado com a pesquisa visanpresas, instituições e países em um das espécies e do manejo racional de do à implementação de políticas de cenário em que a riqueza depende, animais silvestres.Outros tópicos abormédio e longo alcance. cada vez mais, das informações. • -

Cinco regiões debatem Ciência, Tecnologia e Inovação . dos Estados do Nordeste e do EsAlém de São Paulo, foram reaEstados do Sul propuseram, enlizadas, simultaneamente, outras cinco Conferências Regionais de Ciência, Tecnologia e Inovação. Cientistas, pesquisadores e empresários do Rio de Janeiro e Minas Gerais, reunidos no Rio, manifestaram seu apoio ao projeto de lei do senador Roberto Freire (PPS-PE) que autoriza pesquisadores de universidades públicas a realizar trabalho temporário em empresas privadas. Também apontaram a necessidade de aperfeiçoamento da formação profissional e da ampliação do sistema de educação a distância. Em Florianópolis, representantes de universidades, institutos de .pesquisas e empresários dos

20 • AGOSTO DE 2001 • PESQUISA FAPESP

tre outras medidas, a regionalização das ações de fomento do MCT e a criação de Centros de Excelência em Inovação e Gestão de Tecnologia nas diversas regiões dos três Estados. Representantes dos Estados da Região Norte, reunidos em Belém, sugeriram a elaboração de um plano de ação regional em CeT&1 para os próximos dez anos, a criação de um Fundo Amazônico de CeT&1 e de mecanismo de formação fixação de recursos humanos, integrado com projetos e recursos, além de um Fundo Setorial para produtos da biodiversidade. Reunidos em Maceió, cientistas, pesquisadores e empresários

pírito Santo apontaram a capacitação de recursos humanos como o principal entrave para o desenvolvimento da região e sugeriram novas estratégias para a capacitação do potencial humano existente, que favorecesse a fixação de jovens talentos e a formação de pesquisadores. Em Goiânia, pesquisadores e empresários da região Centro-Oeste cobraram do governo federaluma definição política para as desigualdades regionais e investimentos na instalação de centros de pesquisas e esperam que os Fundos Setoriais criem fluxo regular de recursos para pesquisa e desenvolvimento em várias áreas da C&T.

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POLíTICA CIENTíFICA E TECNOLÓGICA

Estímulo ao doutoramento direto Nova modalidade de bolsas poderá ter duração de cinco anos FAPESP acaba de criar uma nova modalidade de bolsas de pós-graduação, a bolsa de doutorado direto (DD), para atender à demanda de alunos cuja qualificação dispensa o título de mestre. As bolsas de doutorado direto terão duração de quatro anos, podendo ser prorrogadas por mais 12 meses, dependendo da necessidade e da evolução do projeto. Elas serão concedidas em quatro níveis (DD-l, DD-2, DD-3 e DD-4), cada um com duração de um ano. Os programas de doutorado direto passam, portanto, a ser uma maneira ordinária de qualificar pesquisadores - e não algo justificável apenas em situação excepcional. E o mestrado segue sendo uma etapa possível, mas não indispensável, no processo de formação de pesquisadores. A implantação do novo programa é resultado de uma reavaliação do sistema de distribuição de bolsas diante do espetacular aumento do número de solicitações à FAPESP e da redução dos recursos federais concedidos a estudantes de pósgraduação de instituições paulistas. A nova política adotada pela FAPESP prevê a implantação de critérios mais seletivos para a concessão de bolsas de pós-graduação, de forma a estimular demandas especialmente qualificadas e garantir uma proporção ade-

A

quada entre os recursos destinados a bolsas e os destinados a financiar o desenvolvimento de projetos de pesquisa, que, no caso da Fundação, atingiu um ponto crítico. A experiência nacional e internacional demonstra que o desequilíbrio nessa distribuição de recursos compromete o desenvolvimento saudável do sistema de pesquisa, a ponto de impedir a formação e absorção de novos pesquisadores. Essa política mais seletiva de concessão de bolsas, na prática, já vem sendo adotada pela FAPESP, como conseqüência da competitividade crescente dos processos de avaliação. e independência - Nessa perspectiva, a FAPESP vai priorizar programas de formação que resultem na confecção de teses de doutoramento a partir de pesquisas originais e relativamente independentes, sob a responsabilidade de orientadores bem qualificados. A idéia é apoiar projetos de pesquisa avaliados como ótimos no que se refere ao desempenho e à orientação do pesquisador. Em relação às bolsas de mestrado, considera-se que elas não são absoluOriginalidade

tamente indispensáveis. Entretanto, há muitos casos e circunstâncias em que podem ser desejáveis e até mesmo necessárias. Portanto, elas continuarão a ser concedidas pela FAPESP, com duração máxima de dois anos. Já as bolsas de doutorado, passarão a ter a duração normal de três anos, podendo ser prorrogada, em condições excepcionais, por no máximo um ano. Poderão pleitear bolsas de DD os alunos inscritos em programas de doutorado direto e que: a) não tenham usufruído bolsas de pós-graduação de quaisquer agências; b) tenham usufruído, no momento da solicitação, bolsa de doutorado de outra agência por período não superior a seis meses; c) tenham usufruído, no momento da solicitação, bolsa de mestra do de outra agência por período não superior a 18 meses. das bolsas dos níveis DD-l e DD- 2 corresponderão às das bolsas de mestrado 1 e 2 e as das bolsas dos níveis DD-3 e DD-4 às bolsas de doutorado 1 e 2, respectivamente. A reserva técnica das bolsas de DD, em todos os níveis, corresponderá a 30% do valor das mensalidades e obedecerá às normas em vigor para as bolsas de doutorado. Os bolsistas de mestrado da FAPESP poderão ter suas bolsas convertidas em bolsas DD se tiverem sido aceitos em programas de doutorado direto, após avaliação da assessoria ad hoc, no fim do primeiro ano ou do segundo. Para tanto, deverão encaminhar à Fundação formulário de solicitação de bolsa de doutorado direto. • Mensalidades

- As mensalidades

PESQUISA FAPESP . AGOSTO DE 2001 • 21


POLíTICA CIENTíFICA E TECNOLÓGICA

INTERNET

Pesquisa em alta velocidade Fundação lança edital para programa de Internet Avançada FAPESP lança, em outubro, edital para a apresentação de pré-projetos para o programa especial Tecnologia da Informação no Desenvolvimento da Internet Avançada (Tidia). O programa quer mobilizar universidades e institutos de pesquisa em torno de projetos relacionados, por exemplo, à engenharia de rede, ao controle de tráfego, às características de fibras ópticas, softwares e desenvolvimento de aplicativos específicos para cada área de conhecimento. "O Tidia vai transformar a Internet em objeto de pesquisa", diz Luis Fernández López, do Departamento de Informática Médica da Faculdade de Medicina da USP e membro da comissão que coordena 'o programa. A Fundação deverá investir no nummo, R$ 10 milhões no programa, que terá duração de cinco anos. Existe também a possibilidade de o Tidia contar com recursos adicionais da Lei de Informática e de empresas privadas. O primeiro passo será criar, em parceria com o setor privado, uma rede de fibras ópticas com velocidade de até 400 gigabites, ligando, inicialmente, as cidades de São Paulo, Campinas e São Carlos e, posteriormente, outros municípios do Estado. A rede atual possui velocidade de 155 me-

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22 . AGOSTO DE 2001 • PESQUISA FAPESP

gabites. A nova rede será um test bed, uma espécie de campo de teste, que vai funcionar como um laboratório comunitário para multiusuários, para o desenvolvimento de pesquisas e implementação de redes acadêmicas. O test bed permitirá, por exemplo, a realização de videoconferências em rede multipontos. Outro objetivo do Tidia é formar especialistas em desenvolvimento de

projeto. A expectativa é de que o poder público atue como um agente facilitador, autorizando, por exemplo, a utilização dos dutos de fibra óptica que se estendem ao longo das rodovias. Com o novo programa, a FAPESP consolida sua participação na história da Internet no Brasil. Desde 1989, por meio da rede ANSP, a Fundação desempenha papel pioneiro nessa área. A FAPESP já foi o

tecnologias para Internet. "Precisamos de gente que conheça rede': diz Hugo Fragnito, do Instituto de Física da Unicamp e membro da comissão. O ponto de partida é a parceria com empresas privadas, sobretudo as de telecomunicações. Cada companhia poderá participar em área de interesse específico, como acontece nos Estados Unidos, onde a Internet 2 não é só um projeto de rede de alta velocidade, mas também de cooperação com a iniciativa privada. O apoio do governo também é considerado fundamental para o desenvolvimento do

uruco e principal link internacional, responsável pelo tráfego acadêmico, e, por solicitação do Comitê Gestor da Internet no Brasil, assumiu a responsabilidade de registrar domínios br. O Programa Genoma, por exemplo, só foi possível porque existia a rede ANSP, desenvolvida pela Fundação. O mesmo ocorre com o Programa Biota, que mapeia a biodiversidade paulista. Com o Tidia, o processo será invertido: de infra-estrutura para a pesquisa, a Internet se tornará, ela própria, objeto de pesquisa. •


POLíTICA CIENTíf'ICA E TECNOLÓGICA

Clones previamente

selecionados do Genoma Cana serão introduzidos

no arroz

CEN()MICA

Os frutos do Genoma Cana Cooperação entre SucEST e CropDesign pode levar à formação de empresa m novembro do ano passado, o Projeto Genoma Cana-de-Açúcar (SucEST), da FAPESP,concluiu o seqüenciamento de 50 mil genes da planta. De lá para cá, os pesquisado-' res do projeto obtiveram a seqüência completa de 9 mil genes e formaram o maior banco de dados genéticos sobre a cana-de-açúcar do mundo. Agora, se preparam para um grande e inusitado salto para o país: fazer genômica aplicada, isto é, transformar os dados e informações gerados pelo seqüenciamento em produtos ou aplicações com valor comercial. O primeiro passo para isso foi dado com o anúncio, no dia 30 de agosto, na sede da FAPESP, de um acordo de cooperação entre o SucEST e a CropDesign, pequena empresa de biotecnologia agrícola, criada na Universidade de Gent, na Bélgica. O

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acordo prevê o desenvolvimento de programa conjunto para análise funcional de genes da cana-de-açúcar, mas o seu alcance é bem maior. "Esse acordo reflete o nosso compromisso de construir uma empresa líder no desenvolvimento de produtos de genômica aplicada': disse Herman Van Mellaert, executivo chefe da CropDesignoPara o biólogo Paulo Arruda, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e coordenador do Genoma Cana, o acordo pode ser, de fato, o ponto de partida para a instalação de uma vigorosa indústria de biotecnologia no país. O SucEST participa com os genes. Os pesquisadores brasileiros selecionarão mil genes da cana, dentre os 50 mil seqüenciados, que se sabe estarem relacionados com a resistência da planta a doenças e ao estresse (frio, seca, condições do solo) e, ainda, ao metabolismo da planta, isto é, seu crescimento, produtividade e produção de açúcar. A CropDesign entra com a tecnologia TraitMill, uma usina de fenótipos robotizada, capaz de avaliar a função de um gene

muito rapidamente e, portanto, em larga escala. "A TraitMill tem também uma linha de montagem para a introdução de genes em plantas", explica Arruda, acrescentando que a usina de fenótipos faz a rápida introdução dos genes em uma planta modelo para observação da sua funcionalidade. Pelo acordo, os genes da cana serão introduzidos no arroz também uma gramínea, e que, portanto, tem genes comuns à cana, com a mesma função. O arroz foi também escolhido por ter um ciclo de vida curto, de quatro meses. "Assim, rapidamente será possível observar os resultados", diz Arruda. As descobertas poderão depois ser utilizadas para melhorar a produtividade ou as características da própria cana ou de outros cereais. A empresa belga, além da tecnologia, colocará à disposição do Genoma Cana até o máximo de 50 sementes de arroz contendo clones selecionados e já previamente testados na TraitMill. O acordo terá a duração de 30 meses, mas a expectativa é que, em oito meses, os parceiros já conheçam os primeiros resultados e consigam a patente de pelo menos dez produtos ou funções dos genes. "Estamos numa corrida científica. Muito em breve, outros genes de outras plantas estarão disponíveis para análises semelhantes. A parceria com a CropDesign nos garante a vantagem de sair na frente e chegar a resultados que poderão representar um grande impacto no desenvolvimento da biotecnologia de plantas no país': afirma o coordenador do Genoma Cana. O acordo concede aos pesquisadores brasileiros direito a 100% sobre o que render no Brasil o licenciamento de produtos ou informações referentes à cana-de-açúcar e a 50%, sobre o que render no exterior. Quanto aos cereais que possam beneficiarse dos genes da cana, os brasileiros receberão 50% dos royalties no país e 7,5% quando forem negociados no resto do mundo. É o Genoma Cana dando seus frutos comerciais. • PESQUISA FAPESP . AGOSTO DElOOl

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CIÊNCIA

L A B ti R A 1 O I~I O 1

A lógica invertida do trânsito nas metrópoles Parece não ter lógica, mas as grandes cidades - do Brasil e do exterior -, com maior frota de veículos, têm menor taxa de acidentes por veículo em comparação com municípios pequenos. Proporcionalmente, cidades pequenas com poucos carros têm mais acidentes com óbitos por carro do que as metrópoles. A descoberta consta de um estudo da equipe conduzida pelo economista Samuel Kilsztajn, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), a partir da análise do número de veículos por habitante. "Em relação à população, cidades como São Paulo têm mais acidentes, mas isso só ocorre porque a frota por habitante é enorme", diz Kilsztajn. O pesquisador recuperou um estudo feito pela Fundação Sistema Estadual de Dados (Seade) de 1977, que mostra como melhor indicador do grau de

• Testesgenéticos para crianças Pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisa do Genoma Humano, nos Estados Unidos, e da Universidade Lund, na Suécia, finalizaram um método que pode ajudar a diferenciar quatro tipos de câncer infantil facilmente confundidos no exame ao microscópio. O método combina a tecnologia microarray (chips de genes), que analisa o padrão de atividade de milhares de genes de qualquer tipo de célula, com a rede neural artificial (ANN), um programa de inteligência artificial capaz de processar quantidades elevadas de informações. É a primeira vez que aANN, empregada na identificação de impressão digital de criminosos, é usada nesse tipo de 24 . AGOSTO DE 2001 • PESQUISA FAPESP

~ res utilizaram dados de 61 países e 51 ;<; iil localidades brasileiras. Os resultados w ~ demonstram que, quanto maior o número de veículos por habitante, menor o número de óbitos por veículo. Por exemplo, a taxa de mortalidade no trânsito por 100 mil habitantes, em 19~)7,era de 14,8 óbitos em Teresina (PI) e 23,5 em São Paulo - ocorre que Teresina possuía 0,9 veículo para cada dez habitantes, e a capital paulista, 4,8 carros para cada dez habitantes. Logo, o número de óbitos por veículo em Teresina (17,1 por 10 mil) era 3,5 vezes o de São Paulo (4,9 por 10 mil). Kilsztajn arrisca uma explicação: "Em lugares com poucos Trânsito em São Paulo: menos mortes carros há pouco conhecimento tanto por parte dos motoristas como dos pedestres em como lidar com eles': O violência no trânsito o número de óbitos por veículo e não o número de estudo foi publicado na Revista de óbitos por habitante. Os pesquisadoSaúde Pública. •

análise, que abre caminhos para tratamentos individualizados, de acordo com os genes específicos que se manifestarem em cada tipo de tumor. Os quatro tipos de câncer que agora podem ser diferenciados são: neuroblastoma, rabdomiosarcoma, linfoma de Burkitt e sarcoma de Ewing .•

.Spraydeferomônios contraTPM Mulheres que sofrem com Tensão Pré-Mestrual (TPM) devem ter, em breve, um alívio graças à ação dos feromônios, substâncias liberadas por animais mais conhecidas pela capacidade de atrair o sexo oposto. Já há uma empresa nos Estados Unidos trabalhando em um spray nasal à base de feromônios, informa a revista New Scientist (21

de julho). O produto poderá livrar as mulheres da irritabilidade constante e depressão, comuns na TPM, e de alguns outros distúrbios ligados à síndrome. Testes com 20 mulheres mostraram que o spray melhora o humor e sintomas como dor nos seios. A TPM afeta duas em cada cinco mulheres durante a vida fértil (entre a menarca e menopausa) e alguns especialistas acreditam que a tlutuação de hor-

mônios nesses períodos afeta a atividade cerebral. Nos casos mais graves, os médicos receitam antidepressivos que elevam o nível de serotonina no cérebro e melhoram o estado geral do humor. Os feromônios humanos são poderosos mediadores na atração sexual, ansiedade e distúrbios relacionados a hormônios, de acordo com David Berliner, um dos fundadores do laboratório Pherin Pharmaceuti-


cals, de Mount View, Califórnia, a companhia que está desenvolvendo o spray. Berliner foi também um dos pesquisadores que comprovaram a existência dos feromônios nos seres humanos, na década passada. O composto criado pela Pherin, o PH80, ajuda o hipotálamo a manter o equilíbrio da atividade cerebral evitando o desconforto da síndrome. •

• Osenigmas do clima no Brasil Como será o clima no Brasil daqui a cem anos? O meteorologista José Antonio Marengo, do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (CpTec/Inpe), em Cachoeira Paulista, cruzou os prognósticos fornecidos por dez modelos globais e viu que a resposta está longe de ser simples. Marengo constatou que o grau de confiabilidade dessas simulações - feitas por sete institutos de pesquisas localizados em seis países varia de acordo com a região brasileira analisada. As previsões parecem ser mais consistentes para o Norte, Nordeste e Sul do país. Já para o Sudeste e o Centro-Oeste, os dados são contraditórios ou sem detalhamento. Em razão do efeito estufa, as temperaturas médias anuais poderiam aumentar em todo o país. A maior elevação seria na Amazônia (de até 5 graus no invemo, num cenário pessimista, ou quase 2 graus, num quadro otimista). O Sudeste seria menos afetado pelo fenômeno, com uma elevação da temperatura no inverno entre 1 grau e pouco menos de 3 graus. "Já para o Nordeste, a maioria dos modelos aponta um aumento de chuvas", diz Marengo. •

Pesquisa com neutrinos fortalece Modelo Solar Só agora se definem os prováveis ganhos científicos da descoberta da transformação de um tipo de neutrino solar em outro, a chamada conversão de sabores, anunciada em junho como um dos primeiros resultados do recém-inaugurado Sudbury Neutrino Observatory (SNO), um imenso tanque de água instalado a dois quilômetros de profundidade em Ontário, no Canadá. Associouse o resultado à confirmação da massa do neutrino, algo procurado há quase 20 anos, mas ainda não há consenso a esse respeito. Já é certa, sim, a revisão de diretrizes. Volta à tona, fortalecido, o Modelo Solar Padrão, que explica o fluxo de partículas do Sol: chegam à Terra em média 60 bilhões de neutrinos solares por centímetro quadrado por segundo. O modelo expli-

• O sucessode Beethoven no pasto Se fosse possível criar uma hit parade para medir a preferência musical do gado britânico, Beethoven estaria na frente dos Beatles. Mas isso não significa que existam vacas eru-

SNO: experiências forçaram revisão de diretrizes

cou com exatidão os resultados experimentais do SNO. De agora em diante, na visão de Marcelo Guzzo, do Instituto de Física da Unicamp e um dos coordenadores do Grupo de Estudos de Física e Astrofísica de Neutrinos (Gefan), mais importante que saber se os neutrinos têm ou não massa é descobrir como se dá a transformação de um tipo para outro depois que

ditas. Esp.ecialistas da Universidade de Leicester, na Inglaterra, afirmam que elas apenas apreciam mais a batida das obras mais suaves do compositor alemão do que o ritmo rápido do rock, informa a revista Science (13 de julho). De acordo com eles, a

Vacas relaxadas: música lenta aumentaria

produção de leite

saem do Sol. "Há outros mecanismos que explicam mudança de sabor dos neutrinos, que não dependem da massa", lembra ele. Os físicos do Gefan criaram há dez anos uma hipótese própria: a conversão de sabores poderia ocorrer por meio de uma interação de forças não previstas no modelo padrão clássico de comportamento das partículas elementares. •

exposição de vacas leiteiras à música lenta aumenta a produção de leite. Os pesquisadores de música Adrian North e Liam Mackenzie trabalharam com mil vacas do tipo Holstein e duas leiterias da seguinte maneira: dividiram os animais em grupos e os expuseram a músicas rápidas (mais de 120 batidas por minuto), lentas (menos de 100 batidas por minuto) e sem música das 5 horas às 17 horas todos os dias por nove semanas. Algumas das sinfonias de Beethoven e das canções de Simon e Garfunkel teriam feito a produção de leite aumentar em 3%. "Acreditamos que esse tipo de música, mais lenta, relaxa os animais", diz Adrian North. • PESQUISA FAPESP . AGOSTO DE 2001

25


CIÊNCIA

BOTÂNICA

Entre capins~

e bambus

Primeiro livro sobre a Flora Fanerogâmica paulista reúne informações de quase 500 espécies de gramíneas nativas ou originárias de outros países MARCOS

PrVETTA

ara quem acha que capim é tudo igual e nasce em qualquer lugar, aqui vai uma má notícia: há 458 espécies de gramíneas apenas no Estado de São Paulo, equivalentes a 38% das variedades conhecidas no país e 5% das identificadas no planeta. A boa notícia é que essas quase 500 espécies estão descritas no primeiro livro da Flora Fanerogâmica do Estado de São Paulo, obra inaugural de uma coleção de 17 volumes que dá uma nova dimensão à biodiversidade paulista, ao reunir informações fornecidas por cerca de 300 botânicos sobre as plantas que representam 80% da flora do Estado. O título inicial, que será lançado oficialmente pela Editora Hucitec no dia 26 de setembro, a um custo próximo a R$ 50, é inteiramente dedicado à família das Poaceae, as populares gramíneas. Trata-se de um catálogo taxonômico de quase 300 páginas, com chaves de identificação, descrições, ilustrações, comentários e distribuição geográfica de 458 espécies, embora no livro, por falha de revisão, constem 475. ''As pessoas custam a acreditar que há tantos tipos de capim em São Paulo': reconhece Maria das Graças Lapa Wanderley, do Instituto de Botânica da Secretaria do Meio Ambiente do Estado, uma das coordenadoras do projeto temático da Flora Fanerogâmica, que promoveu visitas a herbários e coletas de 20 mil plantas. A família das gramíneas é a terceira maior das 180 em que se dividem as plantas fanerogâmicas, espécies que têm órgãos reprodutores aparentes (flores). Apenas as orquídeas, com mais de 700 espécies (cerca de 10% da flora), e as compostas, com mais de 600 espécies, compõem uma família mais numerosa. Antes da publicação do primeiro volume, conferir as semelhanças e diferenças de cada espécie ou variedade de gramínea era algo extremamente complicado. Como acontece com qualquer família vegetal, as informa-

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26 . AGOSTO DE 2001 • PESQUISA FAPESP


ções sobre as Poaceae estavam dispersas em dezenas de obras de referência. ''Agora, basta olhar em um só livro", diz o botânico escocês George Iohn Shepherd, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), outro coordenador da Flora, cujos dados vão abastecer o programa Biota-FAPESP, que está mapeando toda a biodiversidade (fauna e flora) do Estado. Nativas e estrangeiras - Das 458 espécies de gramíneas catalogadas no Estado, 403 são plantas nativas, típicas da flora brasileira, e 55 são originárias do exterior. Como se adaptaram muito bem ao clima e terreno daqui, esses exemplares estrangeiros hoje crescem espontaneamente, independentemente de serem ou não cultivadas, às vezes, ao lado de espécies nativas. Echinolaena inflexa: capim-flechinha Por terem praticamente se incoruma planta africana. A botânica gaúporado à biodiversidade genuinamente nacional, foram incluídos na cha coordenou e fez parte de uma obra. "Quando colhe uma gramínea equipe de 21 autores, que produziram os textos impressos na obra. numa beira de estrada, um leigo não sabe se ela é nativa ou não': afirma Composto de centenas de varieHilda Maria Longhi -Wagner, da Unidades de grama e bambu, o universo versidade Federal do Rio Grande do das Poaceae é mais rico do que um Sul (UFRGS), especialista em Poaceae leigo possa pensar. Atrás de nomes científicos indecifráveis para o cidae organizadora do primeiro volume dão comum, escondem-se, às vezes, da Flora. O capim-colonião (Paniplantas conhecidas pelas pessoas. cum maximum), por exemplo, muito Quando cultivadas, algumas espécies encontrado à margem de rodovias, é são fonte de alimentos, como a canade-açúcar (Saccharum officinarum), Cortaderia sel/oana ou capim-dos-pampas: a aveia (Avena sativa) e o sorgo (Sororiginária da Argentina, muito comum ghum bicolor). Outras, de crescimennas encostas das serras do Sul do Brasil

to espontâneo, dão origem a tipos de vegetação rasteira muito populares. É o caso do sapé (Imperata brasilienses) e do capim-gordura (Melinis minutiflora). Há ainda espécies que, por sua beleza, tornaram-se ornamentais, como a grama-inglesa, também chamada de grama-de-jardim (Stenotaphrum secundatum), muito comum em praças e parques, e a cortaderia (Cortaderia selloana), espécie originária da Argentina. Durante o trabalho de pesquisa da Flora, iniciado há sete anos, os pesquisadores levantaram informações sobre 7.500 espécies vegetais, distribuídas em 1.500 gêneros e 180 famílias. Dados preliminares apontam para a descoberta de 44 novas espécies de plantas fanerogâmicas (veja Pesquisa FAPESP n° 50). Por uma decisão editorial, os coordenadores do projeto decidiram não incluir no primeiro livro da coleção seis novas espécies de gramíneas que foram identificadas em coletas de campo. Pelo menos não com esse status. "Quando citamos essas espécies até então desconhecidas, damos apenas o seu gênero sem mencionar a espécie': explica Maria das Graças. Esses tipos de gramíneas recentemente descobertas serão descritos em artigos científicos em revistas de botânica do Brasil e do exterior. Além das novas espécies ainda não descritas, a família das Poaceae reservou outras surpresas aos pesquiPESQUISA FAPESP • AGOSTO DE 2001 • 27


Botânica em milímetros Uma equipe de seis desenhistas retratou com riqueza de detalhes cada estrutura das espécies estudadas

Estrutu ras de proteção das flores de Cenchrus setigerus (capim-birdwood) e C.tribuloides (carrapicho ou carrapicho-de-praia)

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Inflorescência de Loudetiopsis chrysothrix (brinco-de-princesa ou trigo-da-felicidade, esq.),Arthropogon xerachne, Chusquea oxylepis, Arundinella hispida (capim-maquiné) e Hyparrhenia rufa (capim-jaraguá)

sadores. Foram mapeados pelo menos seis tipos de gramíneas endêmicas do Estado - encontradas apenas aqui. Boa parte dessas espécies típicas de São Paulo se concentra em áreas de Mata Atlântica, onde a riqueza biológica é grande. Entre as espécies endêmicas, o destaque recai sobre um grupo de bambus lenhosos não registrado em nenhuma outra unidade da federação (Merostachys caucaiana, Merostachys scandens, Chusquea erecta, Chusquea sellowii e Chusquea pulchella). Alguns desses bambus, como o C. sellowii, são de difícil identificação, pois florescem a cada 32 anos.

geográfica parecia se restringir aos Estados do Sul do país, de clima temperado e subtropical. Com o trabalho de pesquisa da Flora Fanerogâmica, os botânicos se deram contá de que o território paulista é o limite mais ao norte no país de incidência dessas espécies de Poaceae. Foi exatamente isso o que ocorreu com as duas espécies pertencentes ao gênero Stipa (Stipa sellowiana e Stipa setigera). Até serem coletadas em campos

o PROJETO Flora Fanerogâmica do Estado de São Paulo MODALIDADE

Espécies resgatadas - Mesmo

quando não depararam com tipos novos ou endêmicos de Poaceae, os pesquisadores trouxeram boas notícias para casa. Eles identificaram pela primeira vez em São Paulo algumas espécies de gramíneas cuja distribuição 28

• AGOSTO DE 2001 • PESQUISA

FAPESP

Projeto temático COORDENADORA MARIA DAS GRAÇAS LAPA WANDERLEY -

Instituto

de Botânica

INVESTIMENTO

R$ 510.427,84

de altitude da Serra da Mantiqueira, ambas eram descritas na literatura científica como presentes apenas no Rio Grande do Sul, em Santa Catarina e no Paraná. "Esse tipo de informação é muito importante", comenta Hilda. Por ser um estado com um clima de transição, nem muito quente nem muito frio, São Paulo tem a vocação para ser o limite mais ao norte de algumas espécies vegetais de ambientes temperados e a fronteira mais sul de variedades típicas de zonas quentes. Outro tipo de conhecimento adquirido com os trabalhos de campo da Flora: algumas espécies de gramíneas que os botânicos julgavam praticamente extintas no estado foram novamente resgatadas na natureza paulista. A história da Ctenium cirrhosum, uma espécie muito bonita e ornamental, serve para ilustrar essa linha de contribuição do projeto. Normalmente encontrada em áreas


Espiguetas de Chusquea bambusoides (extrema esq.) e de Actinocladum verticil/atum

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Espigueta feminina (maior) e masculina (menor) de O/yra g/aberrima (taquarinha)

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~l Eragrostis perennis

~[ ~[ Folha dos ramos e inflorescência de Chusquea capitata

de cerrado em Mato Grosso, Goiás e Minas Gerais, a C. cirrhosum ficou 48 anos sem ser coletada em São Paulo. O primeiro exemplar dessa espécie foi resgatado em campos rupestres do estado em 1959. O segundo, apenas em 1997, numa das cerca de 200 expedições a campo' para coleta de espécies empreendidas pelos participantes da Flora. Se os pesquisadores tivessem demorado mais dois anos para lograr tal feito, essa forma de gramínea seria considerada extinta em São Paulo. Para os botânicos, uma espécie não coletada em seu hábitat há 50 anos extinguiu-se. Estados brasileiros, não há notícias de nenhuma publicação com a abrangência e atualização do primeiro volume da Flora paulista, que, até o final do ano, deve lançar seu segundo volume, abordando várias famílias de dicotiDificuldades

- Nos outros

Estruturas protetoras da flor feminina (vista dorsal, esq., e ventral) de Parodio/yra micrantha (taquari ou taquara)

ledôneas, plantas cuja semente é seccionada em duas partes, como o feijão - e a partir de 2002 devem sair três volumes por ano. A única exceção é Santa Catarina, que, dentro dos fascículos da série Flora Ilustrada., já enfocou a família das gramíneas. "O modelo de São Paulo poderá servir de embrião para a produção da flora nacional e de outros Estados': diz Hilda. Escolhida para a coordenação do volume sobre gramíneas, a botânica gaúcha lembra as dificuldades que teve par~ concluir a obra no prazo estipulado. "Era complicado lidar com tantos colaboradores e ter de cuidar dos problemas de uniformização e editoração dos textos", afirma a pesquisadora da UFRGS. Morando em Porto Alegre, Hilda comunicava-se sobretudo por correio eletrônico com as duas dezenas de autores que redigiram os textos do primeiro volume. Ela recorda-se especialmente de um feriado de Pás-

Lâmina foliar de Paspa/um dasytrichum

coa, em que ficou em casa enquanto toda a família ia para a praia. O esforço tinha uma boa justificativa: aproveitar a data para conversar, por e-mail, com a norte-americana Lynn Clark, da Universidade Estadual de Iowa, nos Estados Unidos, uma das maiores especialistas mundiais em uma subfamília de Poaceae, as Bambusoideae. Hilda tinha dúvidas sobre o formato que deveria adotar no livro para esse grupo de bambus, um pouco diferente das demais gramíneas. "No final do feriado, o 'esqueleto' das Bambusoideae estava pronto, e eu com alguns fios de cabelos brancos a mais", comenta a botânica, com bom humor. Se ainda estivesse entre seus companheiros, o professor Hermógenes de Freitas Leitão Filho - o primeiro coordenador da Flora Fanerogâmica, que morreu em 1996 durante uma coleta - ficaria orgulhoso do trabalho da equipe. • PESQUISA FAPESP . AGOSTO DE 2001

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das novas imagens com as anteriores mostra ainda a dimensão e a rapidez da savanização da floresta pelo uso excessivo do fogo em áreas de Cerrado. Isso é particularmente visível no norte do Pará, onde o Cerrado, ao longo de toda a sua borda de centenas de quilômetros, avança dezenas de metros por ano. A Embrapa também está na fase final do retrato por satélite do Nordeste, que deverá jogar muita luz na discussão sobre os impactos da eventual transposição do Rio São Francisco, sobre a conveniência de expansão da irrigação, os impactos da seca e a intensidade do desmatamento da Caatinga. Até o fim do ano, a empresa pretende concluir o retrato de todos os Estados. Menos focos - O ecólogo Evaristo Eduardo de Miranda, gerente de pesquisa da Embrapa Monitoramento por Satélite e responsável pelo projeto, conta que a idéia de produzir o mosaico de imagens de satélite é antiga, mas só se tornou viável há dois anos, com o financiamento do Programa de Infra-Estrutura da FAPESP para a modernização das redes de computadores da empresa. "Não tínhamos capacidade para analisar, selecionar e processar tantas imagens, com tantos detalhes", lembra. O empurrão final foi dado pelo aumento das queimadas. "O Ministério da Agricultura entendeu que multas e leis não bastavam: era preciso oferecer alternativas tecnológicas aos agricultores para substituírem as queimadas em diversas situações", revela o pesquisador. Com as informações de dez anos de monitoramento de queimadas por satélite, a Embrapa chamou a atenção do ministério para o fato de 75% do problema concentrar-se em quatro Estados: Mato Grosso, To32 . AGOSTO DE 2001 • PESQUISA FAPESP

Pastagens (rosa) em fazendas do sul do Pará: desmatamento avança

cantins, Pará e Maranhão, "Propusemos identificar os municípios onde o problema era mais grave e concentrar neles a campanha para aproveitar melhor os recursos". Isso exigia mosaicos de imagens de satélite com um nível de detalhe muito maior que os disponíveis. No início de 2000, o ministério financiou a compra das imagens, que passaram a ser processadas. Em

um mês e meio, o trabalho estava pronto. Mostrava não só onde se concentrava o problema, mas o tipo de uso do solo feito em cada área, o que ajudou a levar tecnologias alternativas adequadas a cada caso. Impressionado, o ministro decidiu financiar a compra das imagens do restante da Amazônia e depois de todo o país. O resultado foi que, depois de anos de crescimento ininterrupto das queimadas, pela primeira vez no ano passado, o número de focos registrados no país caiu. A redução média foi de 24,5% nos Estados onde o governo promoveu a campanha direcionada pelo satélite e de só 8,6% nos demais. Internet eCOs - Além de orientar campanhas oficiais de combate às queimadas, o mosaico da Amazônia é um instrumento poderoso para que organizações não-governamen-


tais monitorem os impactos ambientais. Muitas imagens já são usadas por estudantes de segundo grau, pois parte do material foi disponibilizada em junho pela Internet (www.cdbrasil.cnpm.embrapa.br.). Mais de 90% das 228 imagens que compõem o mosaico são de 1999 e 2000. Só foi aproveitado material mais antigo quando as imagens atuais tinham qualidade inferior ou muitas nuvens. "Fizemos um retrato fiel da Amazônia na virada do milênio e o colocamos ao alcance do público em geral: nunca ninguém viu o conjunto da região toda com essa riqueza de detalhes", diz Miranda. O material também está disponível em nove CD-ROMs, um para cada Estado amazônico, a R$ 40,00 cada. Os CDs podem ser adquiridos no site da Embrapa citado acima ou

Projeto de colonização em Machadinho do Oeste: uso diversificado da terra

pelo telefone (019)3252-5977. E, a pedido, a Embrapa disponibiliza gratuitamente os CDs para instituições brasileiras de pesquisa. Também há cópias de uma grande fotografia de alta definição da Amazônia, com quase 3 metros de extensão. Os CDs oferecem quatro zooms sucessivos sobre o mapa geral de cada Estado, chegando a uma proximidade que corresponde mais ou menos ao

que se vê de helicóptero em condições de poucas nuvens. É possível distinguir rios, praias fluviais, estradas, cidades, montanhas, pastagens, áreas queimadas e desmatadas, culturas agrícolas diversas, bem como as paisagens naturais da região florestas alta e baixa, várzea, mangue, cerrados, lavrados e até as florestas de bambus. Os CDs também oferecem orientação básica para o usuário interpretar as imagens. O projeto confirmou certos estudos e trouxe surpresas, como a intensidade da urbanização e a grande extensão do uso de queimadas em áreas indígenas. Chamou atenção especial a reserva dos tiriós, na fronteira com o Suriname, onde a faixa queimada tem mais de 100 quilômetros de larPESQUISA FAPESP • AGOSTO DE 2001 • 33


gura. Muitas tribos usam o fogo há milhares de anos para caçar ou preparar terras para plantio.

Floresta preservada: estudo indica alternativas para o ecoturismo

Cidades desmatam - Ao

desmatada é indício certo de ocupação ilegal e devastadora. Também se pode observar quão invadidas ou cercadas por fazendas estão as áreas indígenas no Pará, Mato Grosso e Tocantins.

cruzar as informações de seu mosaico com as do satélite do programa DMSP (Defense Meteorological Satellite Program), que fornece imagens noturnas do planeta, a Embrapa mapeou mais de 1.300 cidades, vilas e povoados amazônicos que dispõem de eletricidade - a estimativa oficial era de que fossem menos de mil. a trabalho confirmou que hoje são as cidades que comandam o desmatamento: a maioria das áreas desmatadas concentra-se num raio de 30 quilômetros em torno das zonas urbanas. "Hoje é principalmente o investimento urbano no campo que está desmatando e não tanto as grandes fazendas ou o pequeno agricultor tradicional': diz Miranda. "Descobrimos, por exemplo, que uma cidade praticamente desconhecida como Itaituba, um fim de linha da Transamazônica, no Pará, tem um entorno muito mais desmatado que Manaus. Falta investigar por quê." a mosaico mostra até mesmo a intensidade da contaminação causada pelas fundições de gusa na região da cidade de Açailândia, no Maranhão: a fuligem impregnada nas ruas e nos telhados transformou a cidade numa mancha roxa escura. Mesmo pequenas áreas de garimpo podem ser localizadas. Isso porque o satélite Casa de extrativista em Rondônia: convivência harmoniosa com a mata 34 . AGOSTO DE 2001 • PESQUISA FAPESP

Alternativas à queimada -

registra em tons bem distintos as águas barrentas (azul claro) e as translúcidas (negro). Como o garimpo revolve a margem do rio, cria uma mancha bem visível. "Na origem dessas manchas, quase sempre vemos uma área desmatada", conta o pesquisador. a trabalho evidencia a ocupação ilegal, especialmente em Rondônia. Aqui, a pista não é a cor, mas a forma. Segundo Miranda, numa área de pequenas propriedades - identificada por manchas geométricas na beira de estradas -, uma entrada estreita que acaba numa grande área I

De positivo, confirmou-se o aumento de produtividade nas culturas de grãos e de algodão no sul do Maranhão e no Mato Grosso: embora a área plantada não tenha aumentado, a produção agrícola não parou de crescer nos últimos anos, como revelam as imagens. Acredita-se que as imagens podem ser úteis até no combate ao gafanhoto - praga no Mato Grosso -, pois permitem localizar e qualificar o tipo de hábitat onde ele se reproduz, para direcionar o monitoramento da espécie em função das condições climáticas, com o objetivo de agir ao primeiro indício de superpopulação. Quanto às alternativas à queimada, é preciso identificar primeiro o que se pretende com ela. Nas regiões de pastagem, como Mato Grosso, sul do Pará e Ilha do Bananal' no Tocantins -, a queimada costuma servir para combater o carrapato ou eliminar a palha do solo, para que o pasto germine mais cedo. Contra o carrapato, basta deixar a pastagem sem gado por dois ou três meses. E, para garantir alimentação ao gado, recomenda-se armazenar pasto no fim do verão para o uso no inverno. A pro-


pósito, os pesquisadores lembram que, sem queimada, a produtividade do pasto aumenta. Na agricultura, a queimada elimina restos da última safra a fim de facilitar um novo plantio. No caso, a alternativa depende do tamanho da propriedade - o que se pode avaliar nas imagens orbitais. De qualquer modo, há equipamentos, manuais ou motorizados, que permitem o plantio na presença da palha ou a incorporação dela ao solo.

Miranda: clareza sobre áreas com potencial ou restrições para uso agrícola

das junto com as comunidades de cada região maranhense para buscar os melhores caminhos para conciliar desenvolvimento e preservação': diz Miranda. Cores e Timor Leste - O

Impulso à pesquisa - O retrato amazô-

nico nos CDs deve baratear e acelerar projetos de monitoramento de impacto ambiental. Alejandro Dorado, doutor em gestão ambiental pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), exemplifica: "Para fazer minha tese, tive de comprar 28 imagens de satélite ao preço de R$ 1.000 cada e passar meses selecionando e montando os trechos com menos nuvens. Agora, tudo isso já está pronto nos CDs". Como as imagens correspondem exatamente às cartas (mapas) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e podem ser facilmente impressas em papel ou transparências, os CDs permitem que qualquer geógrafo atualize essas cartas. Mesmo em pesquisas que transcorrem há anos, as imagens permitem saltos qualitativos. É o caso do estudo do impacto ambiental da co-' lonização em Machadinho do Oeste, norte de Rondônia, numa área de 5 mil quilômetros quadrados com 10 mil colonos. A pesquisa acompanha 500 propriedades rurais há 16 anos, a partir de 250 variáveis de meio ambiente, atividade econômica e indicadores sociais. Classificadas as propriedades conforme sua situação nessas três áreas, foram seleciona das 36 com bom desempenho em todas e fez-se um estudo sobre os padrões de exploração adotados. Observou-se a diversificação espacial do uso da terra em cada propriedade, proporção entre culturas perenes e anuais e associação de pe-

cuana com agricultura. "Com as imagens de satélite mais detalhadas podemos agora observar cada propriedade e obter muito mais informações. Hoje temos uma das mais completas bases de dados sobre impacto ambiental e sustentabilidade da agricultura na Amazônia." Com as imagens, a Embrapa ajuda o Maranhão a fazer zoneamento econômico e ecológico: assim, identificados problemas e vocações de cada área, pode-se traçar uma política de desenvolvimento sustentável. Já se revelou a dimensão do desmatamento da faixa oeste às margens da ferrovia de Carajás, a invasão por madeireiras de reservas indígenas e unidades de conservação - como a Reserva do Gurupi - e a modernização das culturas de soja e algodão no sul maranhense. "As informações fornecidas pelas imagens, já disponíveis na Internet (www.ma.gov.br). são analisaZoneamento

estadual-

o PROJETO Expansão da Rede Local da Embrapa Monitoramento por Satélite MODALIDADE

Programa de Infra-Estrutura COORDENADOR EVARISTO EDUARDO DE MIRANDA -

Embrapa Monitoramento INVESTIMENTO

R$ 115.320,00

por Satélite

aumento da capacidade de processamento de imagens da Embrapa gera subprodutos. Ao tratá-Ias no computador, pode-se obter informações mais detalhadas (15 metros) e abrangentes (registro da luz em sete faixas visíveis e invisíveis ao olho humano). Isso porque o computador distingue 256 tons de cinza, enquanto o olho humano só diferencia cerca de 13. "Identificando a qual desses tons corresponde a água contaminada por sedimentos, por exemplo, podemos pedir ao computador para colorir artificialmente esses pontos, de forma que nos permita enxergar poluições que na realidade são invisíveis a olho nu. Isso já se faz com o despejo de esgoto doméstico em rios e lagos", diz Miranda. Outro subproduto foi um presente. Durante o dramático processo de independência do Timor Leste, a Embrapa decidiu dar ao país seu retrato tirado do espaço: www.cnpm.embrapa.br/projetos/timor/index.html. Comovido ao ver a imagem em papel fotográfico de quase 3 metros de extensão, um líder timorense disse: "Há 20 anos luto pelo meu país, mas é a primeira vez que o vejo inteiro". O pôsterregistra exatamente um dos dias do grande massacre promovido pelas milícias pró- Indonésia. Incêndios, fumaça e destruições são perfeitamente visíveis. "Acabamos produzindo um documento histórico da independência do Timor", comemora o pesquisador. • PESQUISA FAPESP • AGOSTO DE 2001

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CIÊNCIA

COOPERAÇÃO

Rede mundial contra o câncer Estudo de mil genes põe em destaque contribuição do projeto brasileiro urante seis dias, entre 20 e 25 de agosto, trinta especialistas dos dois maiores projetos que estudam as origens genéticas do câncer reuniram-se no Instituto Ludwig de São Paulo, onde, com o auxílio de uma rede de 20 computadores, discutiram e compararam seus dados com o objetivo de descobrir marcadores da doença. O encontro juntou pesquisadores do Genoma Humano do Câncer, iniciativa conjunta da FAPESP e da filial paulista do Ludwig, e do The Cancer Genome Anatomy Project (CGAP), do Instituto Nacional do Câncer dos Estados Unidos. Participaram também especialistas da Universidade de Oxford, da Inglaterra, e do Instituto Nacional de Bioinformática da África do Sul (Sanbi). Esse tipo de evento, chamado de jamboree (congresso internacional de escoteiros, em inglês), é uma reunião de trabalho informal e prolongada, que se estende por dias. Um esforço concentrado, com pesquisadores de vários países, com o intuito de proporcionar uma visão integrada so-

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36 . AGOSTO DElOOl

• PESQUISA FAPESP

bre um assunto. Na área de genomas, houve recentemente dois jamborees, um sobre a Drosophila melanogaster, a mosca-da-fruta, e outro sobre o camundongo (Mus musculus). No encontro sobre o câncer, os pesquisadores centraram suas análises nos 2,7 milhões de seqüências expressas (fragmentos de genes) extraídas de tecidos humanos com tumores, 1,5 milhão provenientes do trabalho do CGAP e 1,2 milhão do projeto brasileiro. Além de se debruçar sobre essas seqüências, os pesquisadores estudaram o padrão de expressão e mutação de um grupo de mil genes relacionados a tumores. ''A partir dessas discussões, queremos produzir um artigo para uma revista científica", diz Andrew Simpson, do Instituto Ludwig e coordenador do Genoma Humano do Câncer. Para Robert Strausberg, diretor do CGAP, o trabalho conjunto de brasileiros e norte-americanos, responsáveis pelos projetos mais produtivos na área de genoma do câncer, pode

acelerar a busca por novas formas de diagnóstico e tratamento das várias manifestações da doença. O otimismo se justifica: os dois grupos usam metodologias distintas, mas complementares na tarefa de procurar fragmentos de genes ligados ao câncer. Meios e pontas - O Genoma Humano do Câncer utiliza a técnica Orestes, criada no Brasil, que extrai informações sobretudo das regiões codificadoras (expressas) do código genético, que vão fornecer as instruções para a produção de proteínas. Situadas geralmente na parte central dos genes, essas regiões representam cerca de 3% do genoma humano, composto de 3 bilhões de pares de bases. O CGAP usa técnicas que obtêm informações das extremidades dos genes. O sonho de todo cientista que estuda as causas genéticas do câncer é encontrar marca dores para cada tipo de tumor, descobrir alterações no genoma que sejam a marca registrada das várias formas da doença. Não é fácil. Afinal, trata-se de uma das enfermidades mais mutáveis de que se tem notícia. Algumas formas de câncer são, por Melanoma, um tipo de câncer de pele, e o chip de DNA (ao fundo): visão integrada


CIÊNCIA

exemplo, localizadas e de progressão lenta. Outras se espalham pelo organismo numa velocidade impressionante. Apesar de todos os avanços na medicina, um diagnóstico preciso - e precoce - nem sempre é possível. Na procura por marcadores do câncer, uma das ferramentas dos pesquisadores são os chips de DNA. Com o auxílio desses arranjos, que permitem colocar milhares de genes clonados numa lâmina, os pesquisadores conseguem saber quais deles são usados numa determinada situação. Dessa forma, podem verificar, por exemplo, quais genes atuam em um tecido sadio do pulmão e quais se expressam em células desse órgão tomadas por tumores. O sul-africano Winston Hide, diretor do Sanbi, que participou do encontro em São Paulo, acredita que cerca de um terço dos estimados 30 mil genes humanos esteja relacionado com o câncer. No primeiro time - Para Hide, a contribuição do projeto brasileiro - um . investimento de US$ 20 milhões, rateado meio a meio pela FAPESP e Ludwig - tem sido decisiva, maior até do que a contribuição do CGAP. A quantidade de dados fornecidos pelo CGAP é maior, mas a informação proporcionada pelo Genoma Humano do Câncer é de maior qualidade. "Acho que 70% do conhecimento do mundo sobre genes expressos do câncer vem do Brasil e apenas 30% dos Estados Unidos", afirma Hide. "O jamboree foi muito interessante, pois, pela primeira vez, tivemos a chance de ter uma visão integrada do genoma do câncer." •

GENÔMICA

Nova conquista da ONSA Equipe de bioinformótica paulista conclui o disputado genoma da Agrobacterium

antes da outra o artigo científico com as descobertas, que marcaria o pioneirismo sobre o trabalho. O genoma da Agrobacterium tem 5,6 milhões de pares de bases, com dois cromossomos e duas seqüências menores, os plasmídeos. "Um dos cromossomos é linear e não circular, algo bastante raro entre as bactérias", comenta João Carlos Setúbal, um dos coordenadores do LBI, que permanece até dezembro como professor visitante na Universidade de Washington. Análises preliminares

ois grupos independentes um deles com a participação de pesquisadores da equipe de bioinformática da rede ONSA, criada pela FAPESP - anunciaram a conclusão do seqüenciamento do genoma de uma das bactérias mais empregadas em engenharia genética, a Agrobacterium tumefaciens, que apresenta mecanismos naturais de transferência de genes para plantas, nas quais causa a doença chamada galha da coroa. Acredita-se que o conhecimento sobre o genoma facilite a pesquisa de vegetais transgênicos. Uma das equipes, formada pela Du Pont e Universidade de Washington, ambas dos Estados Unidos, com participação de pesquisadoAgrobacterium: sobre célula de tabaco res do Laboratório de Bioinformática (LBI) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), indicam semelhanças genéticas acenliberou no dia 14 de agosto as infortuadas entre a Agrobacterium e duas mações sobre esse genoma na página bactérias não-patogênicas, a Sinorhida Internet www.agrobacterium.org, zobium meliloti e a Mesorhizobium um dos resultados do financiamento loti, que vivem dentro de plantas. "A de US$ 900 mil da National Science colaboração com a Universidade de Foundation e de R$ 91.148,68 da FAWashington, via Setúbal, foi perfeiPESP, na forma de bolsa de pós-douta", diz João Paulo Kitajima, também coordenador do LBI. torado no exterior. O LEI montou o banco de dados do genoma e, na etaPraga mundial, a Agrobacterium pa de anotação (interpretação), emataca videiras, tomateiros, roseiras, pregou programas desenvolvidos pessegueiros e caquizeiros, entre oupelo próprio laboratório. tras. Após transferir seus genes para No mesmo dia, a Monsanto, que o genoma da planta, as células vegecontou com a colaboração dos pestais crescem desordenadamente e se quisadores da Universidade de Richformam as galhas (tumores), normond, anunciou o depósito das semalmente na coroa (junção do tronqüências no GenBank, um banco co com a raiz) ou na própria raiz. Os internacional de genomas. As duas nutrientes vão para essas regiões e as equipes correm agora para publicar plantas definham até morrer. •

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PESQUISA FAPESP . AGOSTO DE 2001 • 37


CIÊNCIA

BIOQUÍMICA

Remédios domar Pesquisa de recursos marinhos encontra substâncias antitumorais em esponjas e tunicados do litoral ANA MARIA FlORI

egundo país com a maior costa contínua no mundo, o Brasil tem um litoral que se estende por cerca de 8 mil quilômetros e só perde para o da Austrália. É uma posição privilegiada para a exploração racional de recursos marinhos, o que inclui a obtenção de substâncias com potencial de uso em sistemas biológicos, como as que foram pesquisada&num

S pw·

átko ~


sileira. Das esponjas retiradas numa faixa de cerca de 50 quilômetros de extensão, no perímetro do canal, dez eram inéditas para a ciência - entre elas a Aplysina caissara, também com potencial antitumoral. Para coletar e estudar esponjas e tunicados, o biólogo e taxonomista Eduardo Carlos Meduna Hadju mergulhou mais de 200 vezes na costa de Ilhabela. Por quase dois anos, ele praticamente morou em São Sebastião. Hadju, que é pesquisador do Museu Nacional da Universidade do Brasil e no início do projeto estava vinculado à Universidade de São Paulo (USP), recebia duas ou três vezes por ano a visita de Roberto Gomes de Souza Berlinck, um pós-dou-

torado em química de animais marinhos da USP de São Carlos. Com Hadju, que havia levantado a distribuição das espécies na região, Berlinck selecionou os animais coletados para a extração de substâncias e enviou os extratos para o laboratório do biólogo José Carlos de Freitas, coordenador do projeto, para testes farmacológicos. Patente contra câncer - Os extratos das substâncias coletadas são feitos de modo muito simples. O animal é posto no álcool - etanol ou metanol - e as substâncias que contém se dissolvem nesse meio. Depois que o álcool evapora, o extrato é submetido a um teste farmacológico preliminar realizado pela equipe de Freitas, que dirige o Centro de Biologia Marinha (Cebimar) da USP. Durante estágio no exterior, Berlinck também submeteu 40 extratos a um teste novo, que acabara de ser desenvolvido no Canadá. Alguns extratos se revelaram

e.o ~~-

mores. Em março de 1998, a universidade canadense fez em nome de ambos um pedido de patente dessas substâncias, o que está sob avaliação. teste farmacológico foi feito em células humanas de câncer de mama e detectou, basicamente, a interferência das substâncias na organização do DNA (ácido desoxirribonucléico, portador do código genético) durante o processo da divisão celular. Nesse processo, as substâncias inibem o chamado ponto de checagem G2. As células fazem duas paradas para verificar a integridade do material genético. A primeira parada, ou ponto de checagem G1, acontece logo depois da divisão celular, para verificar se o material genético não foi danificado no processo. Então a célula tem um certo tempo de vida, que nos mamíferos é de 24 horas, antes de se dividir novamente. Nesse período, cada célula faz nova verificação bioquímica, o ponto de checagem G2. "Cerca de 50% das células de tumores sólidos'; explica Berli.nd4 »onto de checagem

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Ascídia Didemnum granu/atum: substâncias contra tumores

atividade citotóxica e antibiótica contra microrganismos resistentes a antibióticos - os que causam infecções hospitalares. Noutra esponja, a Aplysina caissara, que também só existe aqui, a equipe detectou grande quantidade do alcalóide aeroplisinina-l, também com potencial de ação antitumoral. Nos anos 60, pesquisadores italianos já haviam encontrado noutra esponja a mesma substância, que hoje passa por testes clínicos em seres humanos. Caso os resultados sejam positivos. o Brasil poderia fazer maricultura da A I 'Sina CIlÍSSlWae se

Esponja Ap/ysina caissara: também com potencial antitumoral

te ligada à biológica. Poríferos e tunicados, em especial, são fontes potenciais de compostos bioativos. O pesquisador acentua que "esses grupos também têm importância estrutural em diversos ecossistemas e são uma das prioridades globais no estudo da biodiversidade marinha". Presença no AZT - Muitas substâncias

já foram isoladas em todo o mundo na pesquisa com organismos marinhos, mas poucas estão em testes clínicos. Todo o processo, da desco ta de

desenvolvimento do AZT, remédio básico no tratamento da Aids. mtese, qualquer substância pode ser sintetizada, mas a síntese pode demorar muito tempo, enquanto num organismo cultivado e manejado a biossíntese é bem rápida. "Por isso': acentua Freitas, "há necessidade da interação dos químicos com os biólogos • nhos, conhecedores dos. ci vida det s. dos

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Baiacu-rouba-isca: rico em veneno

identificar moléculas ainda desconhecidas da ciência, até com bioatividades também inéditas". ''A outra linha", prossegue, "é o monitoramento dos efeitos de moléculas já conhecidas, no ambiente e na saúde das pessoas': Freitas, que também é pesquisador do Centro de Toxinologia Aplicada - um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) qualifiçados pela FAP 1'1 p~ um

fatal

graças ao monitoramento, isso é raro. No litoral brasileiro, um peixe rico em tetrodotoxina é o baiaeu-rouba-isca ou baiaeu-pintado (Sphoeroides spengleri), odiado pelos pescadores tanto por roubar a isca do anzol como por sua toxicidade: ingerir 50 gramas dele é uma sentença de morte. Por experiência e tradição, os caiçaras sabem que esse peixe não deve ser consumido, ao contrário do baiacu, de maior porte, cujos filés são encontrados nas peixarias.

o PROJETO Recursos Marinhos Renováveis do Litoral Paulista. Biodiversidade de Porifera (Demospongiae) e Chordata (Tunicata) - Taxonomia, Química e Farmacologia MODALIDADE

Projeto temático COORDENADOR

JoséCARLOS DEFREITAS - Instituto de Biociências e Centro de Biologia Marinha (Cebimar) da USP INVESTIMENTO

R$ 600.000,00

Também o fenômeno ambiental da maré vermelha pode levar toxinas direta ou indiretamente ao ser humano. Trazida pela proliferação de um dos pequenos organismos do plâncton marinho - ora um, ora outro -, às vezes a maré vermelha é causada por uma espécie tóxica. Organismos filtradores, como mexilhões e tunicados, acabam por concentrar a toxina - o que causa problemas, como diarréias, em quem os mgere. A maioria das marés vermelhas acontece com a proliferação de alguma alga microscópica, mas também podem ser provocadas por animais: no litoral paulista, já houve uma causada pelo protozoário ciliado Mesodinium rubrum e outra pelo tunicado Weelia cilindrica. Freitas, que nasceu em São Sebastião e é filho de pescador, pretende prosseguir com essas pesquisas. Há

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CIÊNCIA

BIOQUÍMICA

Veneno "

"de taturana contra trombose Isolamento de proteína do veneno de lagarta que causa síndrome hemorrágica pode levar a medicamento anticoagulante esquisadores do Instituto BuPtantan conseguiram isolar e elonar o componente responsável pelos acidentes de síndrome hemorrágica que ocorrem no Sul do país devido ao contato com a taturana Lonomia oblíqua. "Trata-se de uma proteína que recebeu o nome de lopap', revela a farmacêutica Ana Marisa Chudzinski-Tavassi, coordenadora do grupo. Três artigos, assinados pelo farmacêutico bioquímico Cleyson Valença Reis e outros membros da equipe e publicados nas revistas Lancet e Thrombosis Research em 1999 e junho últimos, coroam o trabalho de caracterização da proteína, que começou em 1996, na tese de mestrado de Cleyson. Identificada a proteína, a atenção deles se concentra na sua possível utilização como princípio ativo de um anticoagulante para tratamento da trombose. "Com o extrato das cerdas da Lonomia; conseguimos dispor de um montante muito pequeno, de 10papo Porém, já estamos desenvolvendo o método para produzi-Ia em larga escala, a partir de bactérias genetica42 . AGOSTO DE 2001 • PESQUISA FAPESP

mente modificadas. Toda a biologia molecular necessária para isso foi estabelecida ao longo deste ano. Dispondo de grande quantidade do material, será possível pensar na fabricação do medicamento': revela Ana Marisa. Epidemia no Sul - Desde 1989, mais de mil acidentes causados pelo contato com Lonomia oblíqua foram registrados na região Sul. Caracterizado por síndrome hemorrágica, acompanhada de drástica diminuição de alguns fatores de coagulação, o fenômeno tornou-se alarmante. Dor de cabeça, náusea, dermatite urticante,

Extrato das cerdas da lagarta: veneno

equimoses, hematomas, sangramentos em feridas recentes, gengivas e narinas são manifestações comuns. As mais graves incluem sangue na urina e hemorragias abdominais, glandulares, pulmonares e cerebrais, que podem levar à morte. A epidemia repercutiu na imprensa, mas acredita-se que sua dimensão esteja subestimada, porque, tendo ocorrido na zona rural, muitos casos não foram comunicados às autoridades médicas. Conhecida como oruga ou ruga, a Lonomia oblíqua é uma taturana esverdeada, com manchas e listras, e que muitas vezes mimetiza as plantas em que habita. Simetricamente dispostas ao longo do dorso estão cerdas em forma de espinhos ramificados e pontiagudos, de aspecto arbóreo. É o contato com essas cerdas, onde está a proteína lopap, que causa os acidentes. E eles se tornam graves porque dificilmente a pessoa toca uma só taturana, mas toda uma colônia. As conseqüências dependem, então, da quantidade de lagartas, da intensidade do contato e das predisposições do paciente. Mas, como se sabe desde os primórdios da medicina, o que mata pode também salvar. A trombose é a interrupção do fluxo sangüíneo devido à presença de coágulos. Como o contato com essa taturana provoca síndrome hemorrágica, uma substância que impedisse a formação de coágulos ou mesmo os eliminasse poderia tornar-

1


se o princípio ativo de um medicamento contra a trombose. Seria o caso do princípio ativo do veneno da taturana, a proteína lopap (sigla em inglês de Lonomia obliqua prothrombin activator protease - ou protease ativadora de protrombina da Lonomia obliqua).

se recomendou tratar também com antifibrinolíticos os indivíduos vitimados no Brasil. Mas esses medicamentos impedem a destruição da fibrina (fibrinólise) e a pesquisadora contesta energicamente a orientação. "Usar antifibrinolíticos é matar os pacientes. Eles impedem que ocorra a fibrinólise seReação estranha - Os cundária. Os coágulos pesquisadores obtivese acumulam e a pessoa ram a lopap pela puriacaba morrendo pela ficação do extrato das Ana Marisa: pesquisa abrange soro mais específico para envenenados coagulação intravascucerdas da taturana. Velar disseminada". Ela fala com a autorificaram, in vivo, por microscopia cionar contra a trombose, sem prointravital em ratos, que ela provoca ridade de quem conduziu um projevocar reações hemorrágicas. to anterior financiado pela FAPESP hemorragias. "Ela ativa uma substância do sangue chamada protrombina, justamente para estudar o envenenaOrientação fatal - O grupo chama a mento em pacientes (Determinação produzindo a trombina, enzima que atenção para o fato de que, nos acidos Parâmetros de Coagulação e Pibridesencadeia o processo de coaguladentes com a Lonomia obliqua, a desnólise em Plasma de Pacientes Acidenção", diz Ana Marisa. Aqui há uma truição de fibrina é um fenômeno setados por Contato com Lonomia oblicundário, provocado pela reação do contradição aparente: exatamente qua). Além do mais, acrescenta, os por estimular uma coagulação exageorganismo e não pelo veneno. Isso é envenenamentos no Brasil têm sido rada, a lopap rouba da circulação importante para diferenciar os casos perfeitamente tratados com o soro que grande quantidade da substância que registrados aqui dos ocorridos na Veo Butantan criou, ainda antes da pesfaz o sangue coagular, o fibrinogênio. nezuela. Lá, os envenenamentos são Instala-se a chamada coagulopatia de quisa do grupo, que agora 'quer dar causados por outra espécie, a Lonoum passo adiante: é que o soro atual mia achelous, em cujo veneno pesconsumo - reação do organismo que é fabricado a partir do veneno total, e quisadores venezuelanos afirmam ter priva o sangue daquilo que o faz coaa equipe já produziu um novo soro, gular. Cleyson Reis, principal responencontrado componentes destruidosável pela caracterização da lopap, baseado exclusivamente na lopap. res de fibrina. descreve o processo: Esse soro já é testado em animais Com base no modelo venezuelano, e pode ser uma alternativa mais "lim"A lopap ativa a protrombina, contudo, no início da década de 90 já pa", pois responde à proteína específormando trombina. A trombina requisita e quebra as moléculas de fifica causadora dos acidentes e não ao OS PROJETOS brinogênio, produzindo fibrina, a complexo pacote de proteínas do veDeterminação dos Parâmetros neno. "Depois de inocular o soro espematéria-prima dos coágulos. Isso de Coagulação e Fibrinólise no Plasma cífico, queremos desafiar os animais provoca uma coagulação intravascude Pacientes Acidentados por Contato com o veneno total, de modo a prolar disseminada (que leva à trombocom Lagarta Lonomia obliqua e Proteínas de Venenos Animais var que a lopap é realmente o fator se). O organismo reage à presença que Interferem nos Mecanismos mais importante", diz Ana Marisa. dos coágulos, promovendo uma fide Coagulação e Fibrinólise: Análise A meta mais ambiciosa, porém, brinólise (destruição de fibrina) sede Interações com Receptores Celulares cundária. Espoliado dos componencontinua a ser, a partir da lopap, criMODALIDADE ar um medicamento desfibrinogenantes que o levam a coagular, o sangue Linha regular de auxílio à pesquisa se torna incoagulável. Sobrevêm daí te de combate à trombose. Ana Marias hemorragias que, nos acidentes sa sabe que há um longo percurso COORDENADORA entre o teste de um princípio ativo com a lagarta, podem até levar o paANA MARISA CHUDZINSKI-TAVASSIInstituto Butantan ciente à morte, por complicações reem animais - fase atual- e a fabricanais e cerebrais". ção de um remédio para consumo INVESTIMENTO humano em escala comercial, mas Com um controle rigoroso da doR$ 93.000,00 sagem, porém, a lopap poderia funestá entusiasmada. • PESQUISA FAPESP . AGOSTO DE 2001 • 43


CIÊNCIA

MEDICINA

Precisão em dobro Exames combinados aprimoram diagnóstico de câncer de tireóide

o volume, conteúdo sólido ou líquido, contornos e presença ou não de calcificações nos nódulos. Se as imagens indicarem algo anormal, fazem uma punção e realizam a biópsia apenas nas formações suspeitas, para terem uma avaliação microscópica das células dos caroços. Combinando os resultados do ultra-som e da biópsia, conseguiram um índice de acerto de 76% na detecção de câncer de tireóide.

punções eram guiadas pelo resultado do ultra-som, e os nódulos classificados, segundo essas imagens, em graus que indicavam as chances de malignidade. De volta a São Paulo, Rosalinda e Tomimori prepararam uma classificação específica para a realidade brasileira, diferente da japonesa. Naquele país, o câncer de tireóide é muito mais freqüente do que aqui, onde 2% da população apresenta esse tipo de tumor. Em seguida, fizeram estudo relacionando imagens de ultra-som e laudos citológicos de 2.025 pacientes com nódulos de tireóide. Foi quando se chegou a um sistema de atribuição de notas aos tumores, baseado no potencial de malignidade da forma-

eses atrás, com dois nódulos na tireóide, Neide G.W., de 60 anos, encontrava-se na iminência de submeter-se a uma cirurgia desnecessária. A biópsia do nódulo maior, feita a partir de uma amostra do tecido extraída por uma agulha fina, não foi conclusiva sobre a possibilidade de tratar-se de câncer. O procedimento mais comum nesses casos, dado o tamanho do nódulo, de dois centímetros de diâmetro, é a extração parcial ou total da Nódulo grau 2, benigno, e outro (ao lado), grau 4 ... ... maligno: contornos regulares ou irregulares tireóide - opção que implica riscos pela localização ção. Cada nódulo recebe duas ponPor essa abordagem, três de cada dessa glândula em uma região, o tuações, uma fornecida pela biópsia quatro pessoas encaminhadas para a (1,2,3 ou 6) e outra pelo ultra-som pescoço, intensamente irriga da e mesa de operação efetivamente aprerica em terminações nervosas. Neide (1,2,3 ou 4). Quando a soma das nosentam tumor maligno. Segundo Roescapou do bisturi graças a um novo tas é igual ou superior a seis, o paciensalinda, os casos duvidosos não serão método de diagnóstico de câncer de te segue para cirurgia. Consideramnegligenciados: "É pouco provável tireóide desenvolvido pelo especiase benignos os nódulos cuja nota que um paciente passe pela dupla lista em ultra-sonografia Eduardo final fique entre 2 e 4 pontos e duviavaliação com diagnóstico falsamenKiyoshi Tomimori e a endocrinolodosos, mas provavelmente benignos, te negativo". Nas cirurgias recomengista Rosalinda Camargo, médicos dadas a partir do método tradicional os com 5 pontos. Tumores com 6 do Hospital das Clínicas da Faculdapontos são casos suspeitos e entre 7 de diagnóstico (palpação e punção e 10 pontos, provavelmente malignos. de de Medicina da Universidade de somente do maior nódulo), a suspeiSão Paulo (USP). Esse resultado surgiu da compata de câncer é confirmada em, no Em vez de usar apenas um parâmáximo, 20% dos casos operados. ração do diagnóstico fornecido pelo metro ao decidir pela cirurgia, os novo método com a análise do nódupesquisadores formularam um mélo extraído de 224 pacientes operaInspiração japonesa - A idéia do médos no Hospital das Clínicas da USP. todo que leva em conta dois indica1todo começou a ganhar corpo em dores. Primeiro, tiram um ultraDos 52 portadores de nódulos tidos 11996, com uma visita a um centro som - um exame de baixo custo, como benignos, apenas dois (3,8%) es~ecializado em doenças da tireóicapaz de fornecer informações sobre apresentaram carcinoma papilífero, de em Kobe, Japão. Ali, todas as

M

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o tumor de tireóide menos agressivo. Entre os 35 com caroços no pescoço classificados como duvidosos, quatro (11,4%) tinham câncer. O porcentual de malignidade subiu para 44,6% entre as 56 pessoas com nódulos suspeitos. Quase 99% dos 81 pacientes com índice maior ou igual a 7, claramente maligno, tinham câncer. Conclusão: se tivessem encaminhado para a sala de cirurgia apenas quem tivesse nota final igual ou maior que 6, chegariam a um elevado índice de acerto no diagnóstico da doença, 76,9% dos casos. Daí surgiu a nota final 6 como divisor de águas. Como norma geral de procedimento, os médicos do HC recomendam que todas as punções, sempre que possível, sejam guiadas pelo ultra-som. Com o auxílio desse exame, a punção de nódulos pequenos, não palpáveis mas de aspecto suspeito, se torna mais produtiva. O ultra-som permite escolher a região do nódulo com mais chance de conter células malignas, reduzindo o porcentual de aspirações que precisam ser repetidas devido à coleta insuficiente ou inadequada de material. "O que se gastará a mais em ultra-som será muito menos do que economizaremos com despesas e sofrimento em cirurgias e punções desnecessárias", diz Tomimori. Segundo ele, a extração da tireóide pode custar mais de R$ 5 mil quando não é coberta por um plano de saúde. Além do HC paulista, o Hospital Socor, de Belo Horizonte, já usa o método criado na USP. •

o PROJETO

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~.----------------------------------------------------------------------------CIÊNCIA

Fios de até 5 centímetros

NOVOS

de diboreto

de magnésio produzidos

pelo Laboratório

Ames: material promissor

MATERIAIS

Prova de qualidade Físicos da Unicamp reforçam propriedades de material supercondutor esquisadores do Instituto de FíPsica da Universidade Estadual

l

de Campinas (Unicamp) foram os primeiros a medir e descrever uma característica importante do diboreto de magnésio (MgB2)' identificado em janeiro deste ano como supercondutor e agora com boas perspectivas de se tornar o material dominante no setor nos próximos anos. Liderada por Oscar Ferreira de Lima, a equipe paulista mostrou que esse material exibe um valor relativamente baixo para um parâmetro definido tecnicamente como anisotropia. Em 46 • AGOSTO DE 2001 • PESQUISA FAPESP

outras palavras, os físicos comprovaram que as propriedades supercondutoras do diboreto - inclusive sua capacidade de transmitir corrente elétrica com resistência zero, sem perda de energia na forma de calor são quase totalmente uniformes, variando pouco de acordo com a direção do espaço em que se manifestam. Isso quer dizer que os elétrons fluem de forma mais ou menos semelhante em qualquer direção de um cristal de MgB2' tanto ao longo de seu eixo vertical como no horizontal. Na verdade, há uma diferença de cerca de 70% na capacidade de transmitir corrente entre os dois eixos, sendo o plano horizontal o mais eficiente. Entre os supercondutores, uma disparidade dessa ordem não é considerada elevada. "Nas cerâmicas supercondutoras, a anisotropia cos-

tuma ser muito maior", diz Lima. "Em alguns compostos, a corrente criada numa direção pode ser até 200 vezes maior que na outra:' As medições são de extremo valor para empresas e universidades interessadas em elaborar produtos com o novo supercondutor, ao mostrarem que a anisotropia do MgB2 não compromete seu potencial de conduzir altas correntes. Os resultados do trabalho foram relatados no final de junho na Physical Review Letters, uma das mais prestigiosas revistas científicas de Física. Desde o início do ano, quando o pesquisador japonês Iun Akimitsu, da Universidade Aoyama Gakuin, anunciou que o quase esquecido diboreto de magnésio, descoberto em 1953, comportava-se como supercondutor quando resfriado a -234 graus Celsius, físicos do mundo todo passaram a estudar o material detalhadamente. O interesse se deve a dois motivos: o MgB2 é o composto intermetálico com temperatura crítica (Te) -limite abaixo do qual um material passa a conduzir corrente com resistência zero - mais elevada que se conhece e


seu custo de produção é meEstrutura do MgB2 nor que o dos supercondutores à base de nióbio, hoje os Átomos de magnésio separam as camadas de boro mais utilizados em aplicações como aparelhos de tomografia por ressonância magnética. "O diboreto de magnésio não é um material revolucionário': pondera Lima. "Mas é possível que venha a substituir com algumas vantagens os supercondutores hoje em uso." Até a entrada em cena do diboreto, os físicos achavam que não havia muito mais o que descobrir em termos de supercondutores feitos exclusivamente com metais. As obter cristais de alta pureza, os pespesquisas com esse tipo de material quisadores da Unicamp preferiram pareciam ter chegado ao seu limite. produzir o composto ali mesmo. Como não se conseguia descobrir Compraram lascas de boro e magcompostos ou ligas supercondutoras nésio e as colocaram num tubo fecom Te mais altas, a partir da segunchado em um forno a 1.200 graus da metade da década de 80, os esCelsius. Sintetizaram o MgB2 na forforços se voltaram para as cerâmicas ma sólida e o moeram até virar um supercondutoras, compostos nãopó muito fino, filtrado numa peneimetálicos capazes de transmitir corra que só deixava passar grãos, os rente com resistência zero a temperacristalitos, de 5 e 20 micra (um míturas mais elevadas. cron equivale à milésima parte do milímetro). Por fim, os cristalitos Olhar renovado - A chegada do diboforam espalhados mecanicamente reto de magnésio mudou esse cenásobre os dois lados de uma folha de rio. Ninguém esperava que a novidapapel texturado (Canson), geralde mais quente estaria escondida mente utilizado por artistas: num composto tão simples como o Foi justamente sobre um minúsMgB2: seus átomos de boro, a exemculo pedaço dessa folha revestida plo dos de carbono no grafite, forque foram feitas as medições que mam estruturas hexagonais, separaconstataram uma suave anisotropia das por uma camada de átomos de do MgB2• Ao pintarem o papel com magnésio. De repente, os laboratórios o pó de diboreto, os pesquisadores começariam a ver com bons olhos conseguiram produzir um alinhanovamente os estudos com materiais mento perfeito dos cristalitos de feitos exclusivamente de metais. Assim que soube da descoberta O PROJETO de supercondutividade no composto à base de magnésio e boro, Lima Estudo de Materiais Supercondutores reuniu três alunos de doutorado e um técnico de laboratório e expôs MODALIDADE Projeto temático seu plano de ação. Se trabalhassem rápido, poderiam ser os primeiros a COORDENADOR provar se o MgB2 era isotrópico ou Joss ANTONIO SANJURJO - Instituto de anisotrópico, uma dúvida que paiFísica da Unicamp rava naquele momento. O diboreto INVESTIMENTOS de magnésio é vendido comercialR$ 221.250,00 e US$ 530.900,00 mente na forma de pó, mas, para I

MgB2• Todos se encaixavam da mesma maneira nos poros do papel, criando as condições ideais para aplicar campos magnéticos sobre a amostra e determinar o valor da corrente elétrica em várias direções do composto. "Um material é anisotrópico porque, em nível microscópico, não é homogêneo", afirma Lima. "Olhando para diferentes direções no interior de um cristal, vemos paisagens distintas." A imagem B gerada por microscopia eletrônica da amostra permite visualizar cada grão do material sobre o papel e o intervalo espacial entre eles. "Fiz medições em pleno Carnaval", lembra Lima. Os físicos começaram a estudar o MgB2 no dia 10 de fevereiro, como desdobramento de um projeto temático coordenado por José Antonio Sanjurjo. Vinte dias depois, já tinham o resultado em mãos. Fios ainda pequenos - Mesmo com bom potencial de transmissão de corrente, o diboreto de magnésio terá de vencer algumas restrições para se firmar como uma alternativa aos supercondutores já usados comercialmente. "Como os demais compostos metálicos, o diboreto de magnésio tem de ser resfriado com hélio líquido, num processo relativamente caro, para exibir suas propriedades supercondutoras", diz Lima. Outra desvantagem: diferentemente de outros supercondutores metálicos, o diboreto é quebradiço, um defeito típico das cerâmicas, que dificulta a produção de fios condutores. Dificulta, mas não inviabiliza, a julgar pelos resultados obtidos por físicos do Laboratório Ames, nos Estados Unidos. Os pesquisadores desse centro já conseguiram fabricar fios de MgB2 de até 5 centímetros. É um resultado modesto. Os cientistas, no entanto, esperam encontrar em breve meios de confeccionar filamentos de diboreto mais longos. • PESQUISA FAPESP • AGOSTO DE 2001 • 47


CIÊNCIA

Estudo revela forças que atuam no corpo em ação e indica até a forma ideal de bater na bola de tênis JOSÉ TADEU ARANTES

om as vitórias espetaculares de Guga, o Brasil pode deixar de ser o país do futebol para se tornar a terra do tênis, e os iniciantes no manejo da raquete também já podem contar com uma ajuda da ciência. Junto com especialistas de vários países, liderados pela psicóloga alemã Dagmar Sternad (da Universidade Estadual da Pensilvânia, Estados Unidos), o físico brasileiro Marcos Duarte, professor da Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo (USP), descobriu uma receita infalível para controlar a bolinha, tão fácil que até um robô é capaz de seguir. "A idéia convencional é que a pessoa fica o tempo todo olhando para a bolinha e a raquete e, inconscientemente, faz os ajustes necessários para corrigir o movimento. Mas isso demanda muita atenção e contrasta com a facilidade desse ato. Então, propusemos um modelo alternativo, baseado na teoria do caos", afirma o pesquisador. Sua pesquisa foi publicada em janeiro na Physical Review E, da American Physical Society, e teve uma resenha na página da revista Nature na Internet. Outro artigo do grupo será veiculado em outubro no Journal of Experimental Psychology. Mas a investigação do movimento de bater bola é, por assim dizer, uma estrada vicinal no itinerário desse jovem físico, pós-doutorado pela Universidade da Pensilvânia. Seu principal objeto de estudo são os mecanismos de controle da postura e do equilíbrio humanos. Tanto numa área quanto na outra, Duarte tem feito descobertas instigantes e úteis. Para descrever o movimento de bater bola, ele utilizou um modelo criado, no estudo dos raios cósmicos, pelo físico italiano Enrico Fermi (19011954). "Trata-se de um modelo de sistemas dinâmicos, cujas equações não-lineares trazem embutida a idéia de caos", diz Duarte. ''A partir dele, concluímos que, em vez de controlar a cada instante as posições e velocidades da bolinha e da raquete, tudo o que a pessoa precisa fazer é frear a raquete antes de bater na bolinha." Se esse único fator - a freagem da raquete, ou seja, sua aceleração negativa (menor que zero) - for respeitado, o resultado será um sistema dinamicamente estável, em que qualquer perturbação no movimento da bolinha será atenuada ou corrigida pelas interações consecutivas com a raquete. Visão e impacto - Ocorrerá

exatamente o contrário se a aceleração da raquete for positiva. Nesse caso, uma eventual perturbação será acentuada, até tornar o movimento da bolinha incontrolável. A terceira possibilidade, uma aceleração nula (igual a zero) - isto é, o deslocamento da raquete com velocidade constante -, produzirá um estado indiferente, em que as perturbações tanto podem progredir quanto regredir, dependendo de outros fatores. Se o modelo remonta a estudos de Fermi no final da década de 1940, a novidade está em sua aplicação ao tênis. "Inicialmente, fizemos uma simulação do modelo em computador. Depois confirmamos a previsão em experimentos com seres humanos': relata Duarte. "Esses indivíduos não tinham nenhuma experiência anterior com o tênis, mas, após aprender a tarefa, chegaram, empiricamente, muito perto da aceleração ideal: um valor negativo, mas não excessivo. Bastou controlar essa única variável para que obtivessem a perícia." Para isolar o fenômeno e evitar efeitos produzidos por outros fatores como a inclinação lateral da raquete, por exemplo -, num dos experimentos, os pesquisadores acoplaram a ela um dispositivo tipo gangorra. Os testados moviam a "gangorra" e esta comunicava o movimento à raquete. Desse modo, a trajetória da raquete ficava rigorosamente inscrita num plano vertical.

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"Procuramos eliminar também várias informações sensoriais, como as proporcionadas pela visão e pela sensação cinestésica decorrente do impacto da bolinha na raquete", informa o físico. Para cumprir a primeira condição, bastou vendar os olhos das pessoas. A segunda exigiu um expediente mais complicado: acoplar um braço robótico entre o sujeito e a raquete. "Para nossa surpresa, verificamos que a performance dos indivíduos é mais prejudicada pela eliminação da informação cinestésica do que pela supressão da visão."

ram oito artigos em revistas especializadas internacionais, o brasileiro teve por supervisor no pós-doutorado o matemático russo Vladirnir Zatsiorsky. Trata-se do ex-diretor do lendário Instituto Central de Cultura Física da antiga União Soviética, a fábrica de campeões responsável pelas medalhas de ouro das equipes olímpicas. Zatsiorsky, que vive hoje nos Estados Unidos e redirecionou sua atuação dos ginásios esportivos para a área de saúde, continua como colaborador de Duarte. "Queremos saber como o ser humano controla sua postura, para entender como ele perde esse controle", sublinha o pesquisador. Essa questão é especialmente significativa para os idosos. Uma em cada três pessoas com mais de 65 anos cai pelo menos uma vez ao ano. E essas quedas, que geralmente provocam fraturas de quadril

robô - Com tudo o que aprenderam nos experimentos, chegaram à etapa mais divertida: ensinar robô a bater bola. Não fizeram isso do modo clássico, com câmeras de TV acompanhando os movimentos da raquete e da bolinha e computadores calculando, momento a momento, suas trajetórias. Bastou programar o robô para imprimir à raquete uma aceleração negativa na intensidade apropriada. "Esse robô não está sendo desenvolvido para jogar tênis com o Guga. Ele tem a habilidade de uma criança de 2 anos. E isso é o máximo que podemos almejar no momento", diz Duarte. "Quando consideramos que, num Jogoessencialmente mental como xadrez, o robô Deep Blue foi capaz de vencer o campeão mundial russo Garry Kasparov, nos damos conta de como é complexo o movimento corporal humano." O físico sabe bem do que fala, porque sua linha de pesquisa, focada no controle da postura e do equilíbrio, evidencia toda a complexidade envolvida numa atividade tão simples como ficar de pé. Nesses Estudo com Tiago Filgueiras, 23 anos: bola sob controle estudos, que já lhe rende-

Treinando

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ou fêrnur, são, por suas complicações, o segundo fator de morte por acidentes. Nos Estados Unidos, o ônus desses acidentes para o sistema de saúde é de alguns bilhões de dólares por ano. Por isso, governos e instituições privadas de vários países investem grandes somas no estudo dos mecanismos naturais de controle da postura e do equilíbrio. Como parte de seu projeto, Duarte acaba de montar, na Escola de Educação Física da USP, um laboratório com o que há de mais avançado em aparelhagem de investigação sobre o tema. Placa de força - O pesquisador aponta, numa pequena plataforma no solo de seu laboratório, um equipamento que considera o mais importante: uma placa de força que mede qualquer esforço feito sobre ela. O funcionamento é análogo ao de uma balança, mas, enquanto esta só determina o peso - uma força vertical, de cima para baixo -, a placa é capaz de detectar forças exercidas em todas as direções, bem como seus pontos de aplicação. "Pedimos a uma pessoa que fique de pé, em cima dela, durante meia hora, e, por meio de um software que desenvolvemos, somos capazes de identificar, classificar e quantificar todas as mudanças posturais ocorridas nesse período de tempo", diz ele. Um dos objetivos é estudar a chamada postura ereta natural, a que as pessoas assumem, por exemplo, quando estão de pé, esperando o ônibus. "Jamais ficamos totalmente imóveis", assegura Duarte. "De pé, nosso corpo realiza o tempo todo pequenas oscilações que nos ajudam zaliviar a fadiga. Na média, realizamos uma mudan-


ça postural a cada 30 não praticam uma atisegundos." vidade física adequada e regular. Para contro-Essas mudanças polar o movimento ântedem ser reduzidas a três tipos básicos. O primeiro ro-posterior - as oscié a transferência (shift) lações para frente e para trás -, o ser huque ocorre quando o sujeito muda sua posimano usa basicamente os tornozelos e os quação média, deslocando, dris. Com o envelhecipor exemplo, o peso de uma perna para a oumento, tende a ocorrer tra. O segundo, o souma perda da chamabressalto (fidjet), é um da sensibilidade distal: movimento rápido, com quanto mais distante volta à posição anterior. uma parte do corpo O terceiro, chamado está do cérebro, menor a sensibilidade da pesderiva (drift), é a tenMaria Alice Ferretti, 57 anos, na plataforma: mantendo o equilíbrio dência que as pessoas soa na região. Resultatêm de derivar, ou seja mover-se do: a estratégia dos tornozelos come"Se adotarmos o shiftcomo referência, muito lentamente para um lado e deça a ser preterida em relação à poderemos dizer que o fidjet é compois voltar à posição inicial. estratégia dos quadris. posto por dois shifts muito rápidos, de A transferência e o sobressalto sentidos opostos, enquanto o drift é eram há muito conhecidos. São mecaTornozelos fracos - O problema é que um shift de longa duração", explica. nismos naturais que permitem Para ele, essa associação talvez esas duas estratégias não são equivalentes do ponto de vista físico. Para transferir o esforço de determinados clareça o mistério da deriva, que pagrupos musculares para outros, estidemonstrar esse princípio, o pesquirece ser uma estratégia corporal que mular a circulação sanguínea e aliviar sador pede ao repórter que experipermite obter os mesmos efeitos produzidos pela transferência com memente consigo mesmo, ficando de pé a pressão sobre os pontos de apoio previamente solicitados, de modo a e oscilando para frente e para trás. nor consumo de energia por unidade Há realmente uma diferença notável. prevenir edemas. A contribuição do de tempo. De outro modo: é uma pesquisador foi quantificar rigorosaSe a oscilação é feita a partir do torforma inteligente de trocar os pontos mente esses movimentos, antes apenozelo, imprimimos ao chão forças de apoio, redistribuir o peso e pronas relatados de modo subjetivo. sensivelmente verticais. Ao transfemover a circulação sanguínea. rirmos a oscilação para os quadris, A atual fase dos estudos já permiVariação é fractal - Já a deriva é uma essas forças se tornam praticamente te ter uma primeira idéia de como descoberta nova, um movimento horizontais. As conseqüências são um adulto saudável controla sua muito lento, que só pôde ser observapostura. A partir daí, é possível coprevisíveis: do graças aos recursos da aparelhagem, "Quando experimenta uma ligeimeçar a entender a progressiva perda Sua causa é muito mais difícil de dera perda de equilíbrio, o idoso geralde controle que acompanha o enveterminar. Por que as pessoas derivam? lhecimento, principalmente dos que mente recorre aos quadris para se Por que pendemos vagarosamente reequilibrar. Com isso, aplica ao solo para um lado e depois voltamos, com forças quase horizontais. Se estiver OS PROJETOS igual lentidão, à posição anterior? andando sobre um tapete com pouEstudo do Equilíbrio Postural "Descobrimos que o sinal da placa aderência ao chão ou num terree da Mard]a de Idosos em Ambiente ca de força, que informa como o indino escorregadio, terá grande probaTerrestree Aquático viduo controla a sua postura e equilíbilidade de cair': conclui Duarte. Um brio, é um fractal', responde Duarte. objetivo dele é construir um protocoMODALIDADE Programa Jovem Pesquisador Fractais são padrões que se repetem lo experimental que permita mensuem diferentes escalas de espaço ou de rar as duas estratégias e ajudar as pesCOORDENADOR tempo ou de espaço e tempo, simulsoas a desenvolver aquelas em que MARCOS DUARTE - Faculdade de taneamente. Afirmar que o sinal da sentem maior dificuldade. Para os Educação Física da USP placa é um fractal equivale a dizer idosos que perderam o domínio dos que a transferência, o sobressalto e a tornozelos, o treinamento oferecerá INVESTIMENTOS deriva são variações, em diferentes a perspectiva de recuperar, ao menos R$ 223.795,04 e US$ 100.596,04 escalas, de um mesmo movimento. em parte, essa habilidade. • PESQUISA FAPESP • AGOSTO DE 2001 • 51


TECNOLOGIA

LINHA

DE PRODUÇÃO • IPT aponta riscosde implantes e piercings

Plantação de algodão: importação desordenada A cotonicultura nacional está ameaçada pelo agravamento de doenças, provocado pela importação desordenada de sementes, alertam os engenheiros agrônomos Edivaldo Cia e Milton Geraldo Fuzatto, do Instituto Agronômico de Campinas (IAC). Num amplo estudo, eles pesquisaram 250 variedades e concluíram que só 12 têm resistência múltipla às principais doenças. No CentroOeste, Sudeste e Sul, o problema atinge quase todas as variedades. "Os agricultores e as empresas que plantam no Mato Grosso só conseguem manter a produtividade alta - 3.000 kg de algodão em caroço colhidos por hectare, contra 2.400 kg em São Paulo - porque controlam as doenças com o uso excessivo de inseticidas e fungicidas" diz Fuzatto. Dos genótipos estudados, só três do Instituto Agronômico de Campinas - IAC RR-97/86, IAC 20-RR-740 e IAC RR-97/86-847 - têm resistência múltipla e segu-

52

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• AGOSTO DE 2001 • PESQUISA FAPESP

de sementes pode causar grandes perdas

rança satisfatória para as doenças mancha-angular, murcha de Fusarium, nematóides, ramulose e viroses. "Se não houver desenvolvimento de cultivares resistentes às doenças, o país gastará US$ 1 bilhão por ano com a importação das 800 mil toneladas de fibra de algodão que consome e precisa produzir': diz Edivaldo Cia. O país já foi exportador, mas, há cinco anos, as doenças derrubaram a colheita para 350 mil toneladas anuais e o restante foi importado. Hoje, já produz

Fuzatto e (ia: alerta geral

700 mil toneladas anuais com o crescimento do plantio no Mato Grosso, que colheu 335,8 mil toneladas na safra passada. "As variedades importadas são introduzidas no Brasil sem respeito às regras técnicas': diz Cia. Paralelamente a instituições públicas como Embrapa, Instituto Agronômico do Paraná (Iapar), Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig) e IAC, surgiram várias empresas privadas que vendem novas variedades. As importadas, na maioria, são resistentes só à mancha-angular e suscetíveis a outras doenças. O cultivar norte-americano Deltaopal foi exceção, pois revelou resistência múltipla a parasitas, embora se mostrasse suscetível a doenças secundárias como a ramulária. Os agrônomos anunciaram que o IAC lançará este ano a variedade IAC 23 e que outras linhagens com características de resistência às doenças estão em fase final de testes. •

Três anos de estudos metalográficos em cinco implantes ortopédicos que se romperam durante o uso apontaram falhas no material metálico utilizado. O problema é que materiais inadequados liberam partículas solúveis no organismo, o que pode desencadear reações de hipersensibilidade, desordens neurológicas, doenças ósseas e câncer. "A baixa qualidade eleva o risco de corrosão em placas, pinos e parafusos, podendo provocar reações inflamatórias e novas fraturas", diz Cesar de Farias Azevedo, pesquisador do IPT, que conduziu o estudo com o colega Eduardo Hippert Iúnior, em parceria com o Hospital das Clínicas da USP. Os pesquisadores também estudaram piercings que causaram reações alérgicas e constataram que os materiais não eram biocompatíveis. Eles lamentam a falta de regulamentação no Brasil para materiais de implante e piercings. •

• Construído circuito de uma molécula Utilizando nanotubos de carbono, pesquisadores da IBM criaram o primeiro circuito de computador formado de uma só molécula. O circuito é um conversor de voltagem e foi feito numa molécula com átomos de carbono dispostos em forma tubular, que é 100 mil vezes mais fina que um fio de cabelo. Na linguagem binária dos computadores, o conversor serve para mudar "1" para "O" e vice-versa. Também conhecido como passa-


gem "não", é um dos três circuitos básicos dos computadores - os outros são os circuitos "e" e "ou". Espera-se que o novo nanotubo permita diminuir o tamanho dos computadores, aumentar sua velocidade e diminuir o consumo de energia. A possibilidade de construir chips com nanotubos ainda requer dois anos de estudos. •

• Cúpula do telescópio Soar fica pronta Ficou pronta e segue para o Chile no início de setembro a cúpula ou o domo do grande telescópio do Soar - sigla de Southern Observatory for Astrophysical Research ou Observatório do Sul para Pesquisa Astrofísica -, projeto

Montagem

da cúpula do Soar antes da viagem para o Chile

de uma parceria com os Estados Unidos em que o Brasil investiu US$ 14 milhões (ver Pesquisa FAPESP 61). O domo, de 20 metros de diâmetro por 14 metros de altu-

ra e orçado em US$ 1,8 milhão, foi construído sob o encargo da empresa Equatorial Sistemas, de São José dos Campos, que também desenvolveu os controles eletrôni-

Embalagens brasileiras premiadas nos EUA Três embalagens metálicas produzidas por empresas brasileiras ganharam prêmios na última edição do concurso Cans of the Year (Latas do ano), durante a Feira Internacional Cannex realizada na cidade de Denver, nos Estados Unidos. Entre os melhores projetos de embalagens na área de alimentos deste ano estão uma de aço para acondicionamento de ração seca para cães, produzida pela Companhia Siderúrgica Nacional, a empresa Dumilho e a empresa Packing Design. O outro premiado foi o protótipo Plus UN da empresa Brasilata, na categoria de embalagens inovadoras que se encontram em tiragem experimental. A lata foi planejada para o envase de solventes, tintas e outros produtos perigo-

sos e inflamáveis que necessitem de embalagens com resistência redobrada. O terceiro destaque brasileiro na mostra foi um galão com alças plásticas, uma solução premiada na categoria linha geral. A Real Embalagens, fabricante do produto, demonstrou que as alças plásticas são mais versáteis que as tradicionais alças metálicas. Os novos galões possuem diâ-

metro de fundo menor para permitir a colocação da alça plástica, proporcionando melhor empilhamento. As escolhas noticiadas no boletim do Centro de Tecnolegia de Embalagem (Cetea) do Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital) mostram a mobilização da indústria nacional para o aprimoramento tecnológico das embalagens metálicas.

Qualidade e design na lata de ração e praticidade da alça do galão de tinta

cos dos mecanismos de abertura. A Fibraforte, da mesma cidade, foi contratada para o projeto mecânico, e a Santin, de Piracicaba, para fabricar a base do domo - um anel de aço de 50 toneladas, que foi usinado na Metalúrgica Atlas, em São Paulo. O projeto, em que o país é representado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), teve várias fontes de financiamento, entre elas a FAPESP. O telescópio tem 4,2 metros de diâmetro e será instalado em Cerro Pachón, no deserto do Atacama. Sua operação, a começar em setembro de 2002, será proporcional ao investimento dos parceiros: o Brasil usará o observatório por 30,9% do tempo. •

• Excelência em eletrônica no Sul Os gaúchos terão um Centro de Excelência em Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec), dedicado ao desenvolvimento de protótipos de circuitos integrados e à formação de recursos humanos. O centro servirá de âncora ao Programa Nacional de Microeletrônica do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), que tem a parceria da empresa Motorola e o apoio das secretarias estaduais de tecnologia dos Estados de São Paulo e Rio Grande do Sul. O projeto do Ceitec foi lançado em 22 de agosto, em Porto Alegre, por meio da assinatura de convênio entre o MCT, a prefeitura local, o governo gaúcho e a Divisão de Produtos Semicondutores da Motorola, que fornecerá todo o equipamento necessário. Orçado em R$ 93 milhões, o centro terá uma sede de 7.300 metros quadrados que incluirá área de apoio a empresas do setor. • PESQUISA FAPESP • AGOSTO DE 2001 • S3


CAPA TELECO

M UN I CA ÇO ES

Participante do PIPE, a AsGa desenvolve tecnologia dentro da empresa e torna-se referência nacional MARCOS

DE OLIVEIRA

54 . AGOSTO DE 2001 • PESQUISA FAPESP

o atingir 12 anos de vida, a AsGa, fabricante de equipamentos para sistemas de telecomunicações com transmissão via fibra óptica, deverá alcançar neste ano a marca dos R$ 100 milhões de faturamento. O fato marca mais que o sucesso comercial de uma empresa comprovado por um tremendo salto no faturamento - que atingira R$ 31,5 milhões em 2000 e R$ 16,5 milhões em 1999. Na verdade, ele é emblemático de um sucesso empresarial baseado no desenvolvimento tecnológico. A AsGa investe, hoje, 12% de seu faturamento em projetos de pesquisa tecnológica dentro de suas instalações, na cidade de Paulínia, a 118 quilômetros de São Paulo e vizinha a Campinas. A partir de uma estrutura de pequena empresa, a AsGa, do mesmo modo que a OptoLink, outra empresa de equipamentos ópticos para telecomunicações (veja reportagem na página 58), cresceu impulsionada por fatores como a reunião de pesquisadores com experiência acadêmica na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e vivência empresarial, além do financiamento do Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE), da FAPESP. Sob o comando do engenheiro eletrônico José Ellis Ripper Filho, diretor-pre-


sidente da empresa, e de outro sócio, o engenheiro Rege Scarabucci, diretor de Pesquisa e Desenvolvimento, a empresa foi capaz de desenvolver uma linha de multiplexadores e modens ópticos que estão na vanguarda das transmissões telefônicas. Esses aparelhos são usados nas redes de acesso de telefonia - fazendo a ligação de um PABX de uma empresa, por exemplo, à rede de conexão existente na rua e que faz a ligação com as subestações ou centrais telefônicas.

mento da FAPESP foi um grande estímulo e aí resolvemos ousar", conta Ripper. A ousadia maior, no entanto, viria depois, em 1998. Com um novo projeto dentro do PIPE, Ripper e outros quatro sócios resolveram apostar no desenvolvimento de um multiplexador mais rápido e mais sofisticado. Daí nasceu a linha Synchronous Transport Module (STM), própria para funcionar na faixa de 155 megabits por segundo (Mb/s) contra os 34 Mb/s do 16E1. O novo equipamento vai permitir também o acesso aos troncos digitais telefônicos (que interligam as estações telefônicas dos bairros de São Paulo ou de cidades do interior, por exemplo) e aos provedores de Internet. "Ele já vem com tecnologia de protocolo Internet (IP)'~ explica Scarabucci. Essa nova linha de equipamentos está prestes a entrar na linha de produção da empresa.

Melhor desempenho - Os multiplexadores fazem a transmissão de vários sinais - ligações telefônicas ou processamento de dados - por uma única via, unindo-os e combinando-os. Eles permitem também que uma fibra óptica possa transportar até 1.890 vezes mais linhas ou canais de voz que um fio de cobre. Além disso, os multiplexadores proporcionam Nova concorrência - ''A AsGa é a prium desempenho melhor da transmeira empresa fora das grandes famissão, com a diminuição da necesbricantes de equipamentos telefônisidade de repetir sinais entre o ponto cos que ousou entrar nessa categoria de partida e o destino final da ligação. Acoplados aos multiplexadores estão os modens, que fazem a conversão dos sinais elétricos em sinais de luz. A AsGA foi a primeira empresa a produzir multiplexadores no país e hoje detém 70% do mercado, um acréscimo de 16% sobre a participação da empresa em relação ao ano passado (60%), como mostrou a Pesquisa FAPESP nv 57. O carro-chefe da empresa é o MM016xE1, do qual já foram fabricados mais de 4 mil aparelhos em várias formatações. "Ele já está em todos os Estados do país, em pontos onde é preciso interligar as redes de fibra óptica', diz Searabucci. É justamente esse equipamento o objeto do primeiro projeto da AsGa no PIPE. A empresa, aliás, foi uma das primeiras a se candidatar ao financiamento desse programa da FAPESP,em 1997. Naquele ano, seu faturamento 16El: liderança em multiplexador e modem fora de R$ 11 milhões. "O investi-

de aparelhos', diz Ripper. Nessa faixa, ela vai concorrer com grandes empresas do mercado mundial. Com o 16E1, a empresa compete com outras pequenas e médias empresas de fora do país. ''A linha STM representa um novo patamar tecnológico e comercial para a empresa', afirma Ripper. Alguns aparelhos em forma de protótipos de engenharia já estão sendo testados por alguns clientes da empresa. Ripper espera o mesmo sucesso do 16El, como uma evolução natural da família de multiplexadores e modens da empresa. "Nossos equipamentos têm flexibilidade, são de fácil instalação", explica Scarabucci. "Contamos com um suporte técnico ágil e de qualidade para enfrentarmos a " .» concorrencia. A confiança que a AsGa tem nela mesma permite que alce vôos também para o mercado externo. Recentemente, a empresa montou um escritório na Argentina, de onde espera iniciar uma arrancada comercial na América Latina. Antes disso, já pusera um pé no México, onde seus equipamentos receberam qualificação. "Lá, as operadoras não querem apenas distribuidoras, querem a presença da empresa no país", explica Ripper. Pedras no caminho - O recente sucesso da AsGa não foi feito só de crescentes incrementos na produção de equipamentos ópticos e os conseqüentes milhões de reais. Não existiram apenas caminhos floridos - apareceram também grandes pedras nas trilhas do intricado novelo industrial brasileiro. No início de suas atividades, em 1992, a empresa precisou mudar de rumo para não ir à falência. "Fabricávamos componentes, como fontes de laser e detectores ópticos, mas a abertura às importações no início da década de 90 nos quebrou', lembra Ripper. Os preços baixos do mercado externo derrubaram o sonho de Ripper e seus sócios de fabricar componentes eletroeletrônicos no PESQUISA FAPESP • AGOSTO DE 2001 • SS


CAPA país. Assim, outras emmontar uma outra empresas sucumbiram à presa para fabricar concorrência externa, e componentes': diz Ripo Brasil amarga hoje per. A missão de estudar a montagem de um grande déficit no uma possível fábrica de comércio externo justamente com a importamicrocomponentes e o ção de micro-compodesenho do que vai ser nentes para a indústria a AsGa em 2005 estão eletroeletrônica. nas mãos do sócio-diretor Francisco Prince. A empresa só se reerguena com a muSua função é desenvolver novos negócios, dança de foco na produção. No início da principalmente em relação ao comércio exdécada anterior, cometerior. "Por isso, ele çou a fabricar equipaBancada de laboratório: pesquisa na empresa garante tecnologia está fora do dia-a-dia mentos ópticos para a rede de acesso à telefoda AsGa", diz Ripper. nia. O primeiro deles foi um converintenção é desenvolver vários tipos de Físico e professor do Instituto de Físor de sinais elétricos, conhecido lasers de alta potência para uso em sica da Unicamp, Prince foi aluno de como Elo-2, ou elinho, depois chaRipper na universidade e se destaequipamentos médicos e outras aplimado modem óptico. A escalada da cações comerciais. "É quase um procou a ponto de ser chamado para ser AsGa contou também com um fijeto de caráter emocional em que sócio do mestre. nanciamento do BNDESPar, empremantemos viva a tecnologia de laser", Eficiência e custos - Além de Ripper, sa de aporte de capital em empresas afirma Ripper. Scarabucci e Prince, também são privadas do Banco Nacional de DeA área de microcomponentes é senvolvimento Econômico e Social sócios Francisco Mecchi e Claudio tratada com carinho e está nos pla(BNDES). "Recebemos de empréstiGouvêa. Mecchi é outro egresso da nos futuros da AsGa. "Poderemos mo, em 1993, US$ 1 milhão, valor que teve como garantias, meio a meio, ações da empresa e debêntures conversíveis", conta Ripper. Em 1997, a empresa recebeu um outro para demonstrar o funcionamento empréstimo, de US$ 2 milhões, da A AsGa começou a nascer quanFinanciadora de Estudos e Projetos daquela nova máquina. do José Ellis Ripper Filho voltou ao Em 1962, foi a vez do atual direBrasil, em 1971, para instalar o Gru(Finep). Dívidas eliminadas recentetor de Pesquisa e Desenvolvimento mente. "Acabamos de pagar os empo de Pesquisa em Comunicações da AsGa, Rege Scarabucci, pegar o Ópticas no Instituto de Física da préstimos em julho deste ano." Unicamp. Ele deixou os Estados diploma do ITA e seguir para a UniNome de semicondutor - Os primeiversidade de Stanford, nos Estados Unidos depois de doutorar-se no Unidos. Assim como Ripper, ele volMassachusetts Institute of Tecnoros grandes contratos da AsGa foram feitos, em 1996, com várias operadotou ao Brasil, em 1971, chamado logy (MIT) e trabalhar nos Laborapara a Unicamp pelo fundador da ras de telefonia. E, dos tempos de tórios Bell da AT&T (hoje, Lucent). produção de componentes, ficou seu universidade, o médico Zeferino Mesmo antes de sair do Brasil, RipVazoEm 1974, Scarabucci apresentapróprio nome, tirado da sigla de um per já se destacava no Instituto Tecmaterial semicondutor, o arseneto de va os primeiros modens ópticos na nológico da Aeronáutica (ITA), em Faculdade de Engenharia. Eram frugálio. Também ficou a esperança de São José dos Campos, no curso de tos do financiamento de dois projegraduação de engenharia eletrônica. voltar a fabricar emissores de lasers e tos encomendados à Unicamp pela "Como projeto de final de curso outros componentes. Essa pretensão Telebrás, a holding estatal das ope(em 1961), eu e mais três colegas aparece num projeto que a empresa radoras de telefonia. construímos o primeiro computatem em conjunto com a Fundação Centro de Pesquisa de DesenvolviO primeiro projeto, sobre comudor do Brasil, chamado de Zezinho." mento (CPqD), financiado pela FAnicação óptica, foi coordenado pelo Era um computador didático com PESP dentro do Programa Parceria professor Ripper e outro, de transtransístores brasileiros que servia para Inovação Tecnológica (PITE). A

Entre as origens e as razões do sucesso

S6 . AGOSTO DE 2001 • PESQUISA FAPESP


Ripper: experiência e ousadia da sede da empresa, em Paulínia, para o mercado externo

Unicamp. Era técnico de manutenção na Elebra, empresa de equipamentos eletrônicos de capital nacional, onde trabalharam Ripper e Scarabucci nos anos 80 (veja quadro abaixo). Mecchi formou-se engenheiro e fez mestrado na Unicamp. Gouvêa trabalhou na IBM, onde foi gerente de logística industrial da empresa na área de microcomputa-

Scarabucci: equipamentos em todos os pontos do país onde é preciso interligar fibras ápticas

dores. Na AsGa, é o responsável pelas compras de componentes e por manter os custos baixos sem perda da eficiência. "Eu falo sempre que cortar custos. É como cortar as unhas; é preciso cortar toda sem ana", afirma Ripper. Ele também reclama da dificuldade em fazer um orçamento. "Nesses anos, nunca conseguimos fazer

um orçamento real. Quando terminamos um, as premissas já são outras. As mudanças na vida econômica deste país são muito rápidas, por isso precisamos ser rápidos também nas decisões." Para essas situações, ele conta com a coesão entre os sócios, que possuem 100% do poder de voto nas decisões. Sem crises - Essa união vai facilitar à

missão digital, teve o comando do professor Scarabucci. "A universidade começou a gerar conhecimento, porém, esse não era o ambiente para transformá-Io em produto", comenta Ripper. Essa função foi desempenhada pelo Centro de Pesquisa de Desenvolvimento em Telecomunicações (CPqD), criado, em 1976, pela Telebrás, que passou a contratar pesquisadores da Unicamp e a utilizar os resultados das pesquisas. Ripper e Scarabucci só deixariam a dedicação integral como professores da Unicamp no início dos anos 80, quando foram contratados pela Elebra, de capital nacional. "A Elebra foi a primeira empresa a receber tecnologia do CPqD e colocá-Ia na linha de produção", lembra Scarabucci. Com a abertura ao mercado externo e os sucessivos planos econômicos, a Elebra entrou em dificuldades financeiras no iní-

cio de 1987. Parte da empresa foi vendida para o banco Itaú e para a multinacional Alcatel. Ripper quis ficar com uma subsidiária da Elebra, que produzia componentes eletrônicos. Com dinheiro da família e de um ex-colega dos tempos do ITA, João MacDowell, Ripper montou a AsGA. MacDowel, mais tarde, vendeu a parte dele no negócio. Scarabucci só iria se juntar à AsGa em 1997, depois de ter saído da Elebra em 1990 e voltar ao período integral na Unicamp. A trajetória de ambos mostra que um investimento feito há mais de 25 anos, com a criação da Unicamp e do CPqD, propiciou ao Brasil ser um dos seis países, no final dos anos 80, a possuir tecnologia própria para uso nas telecomunicações via fibra óptica. Um investimento que continua valendo.

empresa suportar a maré baixa dos próximos meses, quando os investimentos em telecomunicações por parte das operadoras devem recuar. Elas anteciparam as metas que atingiriam em 2003 e as perspectivas de crescimento do setor de telecomunicações estão menores que há dois anos. "Passou o boom de investimentos pesados", afirma Ripper. "Tivemos agilidade para crescer e OS PROJETOS Desenvolvimento de Multiplexador/ Modem Óptico 76xE7 com Inovações Tecnológicas Desenvolvimento de Multiplexador STM- 7 para a Rede Óptica de Acesso MODALIDADE

Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE) COORDENADOR REGE SCARABUCCI - AsGA INVESTIMENTOS

R$ 299.810,00 e US$ 153.060,00

PESQUISA FAPESP • AGOSTO DE 2001 • 57


CAPA

agora estamos preparados para encolher sem crises." . O número de empregados não deve sofrer grandes modificações. Elas devem ocorrer somente no chão de fábrica, que deve perder os dois turnos extras necessários no rápido crescimento da empresa. Atualmente, a AsGa conta com 140 funcionários, 15 dos quais - a maioria engenheiros - ligados diretamente ao desenvolvimento de produtos. No ano passado, todos os funcionários tiveram direito à participação nos lucros da empresa. O prêmio foi de 3,5 salários para cada um. Estímulo em prêmios - Como forma de incentivar novos empreendedores e estimular a pesquisa, a AsGa lançou recentemente o prêmio AsGa Ciência, para alunos e professores do primeiro e segundo grau, e AsGa Tecnologia, para as escolas técnicas de segundo grau nas áreas de telecomunicações e informática. "Queremos alunos e professores da região de Campinas desenvolvendo projetos e pesquisas escolares", diz Ripper. Os prêmios são diplomas, troféus e um computador para a escola e outro para o professor. Logo depois de escolher os vencedores com uma bancada de júri que inclui notáveis, como o físico Rogério Cerqueira Leite, da Unicamp, no dia 10 de novembro, Ripper e toda a AsGa preparam-se para inaugurar o novo prédio da empresa no dia 26 de novembro. "Serão mais 2 mil metros quadrados de área para produção e desenvolvimento de novos produtos", afirma Ripper. A inauguração do prédio será o coroamento de um ano brilhante para a AsGa. Ela passou a ser referencial e um exemplo de empresa que apostou no desenvolvimento de tecnologia a partir do conhecimento de seus dirigentes, implementando um projeto comercial eficaz. Mas para Ripper ainda falta muito. "Faltam mais "asgas" no Brasil. Há espaço e necessidade de mais empresas como a nossa." • 58 • AGOSTO DE 2001 • PESQUISA FAPESP

TELECOMUNICAÇOES

Hora de crescer

Empresa incubada na Ciatec de Campinas desenvolve equipamentos para transmis~ão óptica e se prepara para exportar CARLOS

TAVARES

ma pequena empresa que produz equipamentos e componentes para as comunicações via fibra óptica prepara-se para um salto decisivo: a partir de setembro, a OptoLink dobrará a produção de acopladores de fibras ópticas - usados em amplificadores nas redes de telecomunicações - para atender à demanda de clientes nacionais e, simultaneamente, colocar esse produto no mercado externo. A produção receberá aporte financeiro da Solectron, multinacional americana, especializada na prestação de serviços de montagem de circuitos eletrônicos, que dividirá com a OptoLink o total dos lucros obtidos. Com essa associação, a OptoLink projeta uma receita total de aproximadamente R$ 1 milhão para este ano e prevê o dobro desse valor no próximo, quando os acopladores e


outros produtos, que estão em desenvolvimento na empresa, estarão prontos para exportação. Dentre esses produtos, estão rabichos de fibra óptica com microlentes para uso nos equipamentos de laser utilizados nas transmissões via fibra óptica, amplificadores ópticos e fontes de laser. Usados em sistemas de transmissão e distribuição de sinais ópticos de centrais telefônicas, redes de TV a cabo e Internet, os acopladores e amplificadores ópticos "são essenciais para a modernização do setor de telecomunicações': segundo Ildefonso Félix de Faria Iúnior, sócio e diretor técnico da empresa. São produtos que já estão em uso e vão estar presentes em volumes cada vez maiores nas conexões telefônicas do futuro. ''Apenas uma fibra óptica conectada a uma residência será suficiente para transmitir sinais de telefone, de TV e de Internet", prevê Faria, que é físico formado na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj).

fônica de longa distância ou em área metropolitana, formando a rede de acesso aos usuários." É nesse percurso que a OptoLink entra, com a fabricação de elementos ópticos imprescindíveis à transmissão e distribuição de sinais ópticos de boa qualidade. O aperfeiçoamento desses equipamentos, obtido com tecnologia nacional, permite que o amplificador óptico, por exemplo, possa ser integrado mais facilmente aos sistemas de telecomunicações já existentes. Hoje, as redes de acesso usam cada vez mais fibras ópticas. Esse uso extensivo de fibras aumentará de maneira exponencial a necessidade de uso

Os acopladores servem também para fazer amostragem da qualidade do sinal óptico que uma central telefônica, por exemplo, transmite e distribui dentro de uma cidade, ou entre diferentes cidades. Unicamp e Telebrás - A aquisição dos conhecimentos para o desenvolvimento da tecnologia desses equipamentos começou nos anos 80, quando Faria fez mestrado em Fibras Ópticas no Instituto de Física da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Ainda hoje, ele mantém um estreito relacionamento de trabalho com o Centro de Pesquisas em

Subproduto valioso - A OptoLink possui dez funcionários e é uma das pequenas unidades industriais que integram a incubadora da Companhia de Desenvolvimento do Pólo de Alta Tecnologia de Campinas (Ciatec). Firmou-se na área depois do terceiro ano Acopladores ópticos: subproduto do projeto do PIPE que está pronto para exportação de participação no Programa de Inovação Tecnológica em Óptica e Fotônica (Cepof), um dos Pequenas Empresas (PIPE), da FAde componentes como os acopladores ópticos, além de aumentar o uso em PESP, com um projeto de produção dez Centros de Pesquisa, Inovação e larga escala de amplificadores que teDifusão (Cepids) da FAPESP. de amplificador óptico que termirão a finalidade de manter o nível do nou resultando num subproduto "A OptoLink tem participação sinal óptico ao longo das transmissões. mais rentável, os acopladores óptiativa no Cepof, com acesso ao LaboOs acopladores são utilizados coso A função dos amplificadores é ratório de Fibras Opticas, onde fazeintensificar a luz de um sinal emitinos amplificadores e têm por função mos a caracterização de nossos comdo por sistemas de centrais telefônijuntar ou separar os sinais (às vezes ponentes e experimentamos novas cas ou de TV a cabo que funcionem são dezenas de ligações telefônicas configurações de amplificadores", com fibras ópticas. A amplificação é ao mesmo tempo) transmitidos via conta Faria. necessária porque os sinais perdem fibra óptica. Por meio desses equiA Unicamp e outras universidaintensidade no caminho entre um pamentos, é possível saber quando o des brasileiras são hoje os únicos amplificador recebe luz, além de ponto e outro. clientes de amplificadores ópticos ''A luz amplificada é transportada controlar a qualidade dessa luz para da OptoLink, em versões diferenciamelhorar a performance do sistema. em fibra óptica para comunicação teledas para testes de laboratório: os PESQUISA FAPESP . AGOSTO DE 200!

• S9


CAPA

Faria: experiência no CPqD, estudos na Unicamp e pesquisa realizada dentro da empresa

componentes ópticos ficam na parte frontal do amplificador, para melhor manuseio do aluno. Assim como a AsGa, mostrada na matéria anterior (página 54), toda a tecnologia desenvolvida, hoje, na OptoLink teve origem nos estudos iniciados entre as décadas de 70 e 80 no Instituto de Física da Unicamp e no Centro de Pesquisa de Desenvolvimento Tecnológico (CPqD) da então estatal Telebrás. O CPqD deu continuidade aos estudos acadêmicos, convertendo os protótipos de laboratório em produtos semi-industriais. Posteriormente, a tecnologia foi transferida para a indústria nacional. A história de Faria segue esse caminho de transferência tecnológica. Depois de sua tese de mestrado na Unicamp, ele ingressou na equipe de pesquisadores do CPqD, onde trabalhou entre 1985 e 1998. Nesse período foi responsável pelo desenvolvimento de protótipos de componentes optoeletrônicos para os sistemas de telecomunicações. Dentre esses trabalhos estão estudos com microlentes para fibras ópticas, sistema holográfico e aparelhos de laserpara longas distâncias aplicados às redes ópticas de acesso à telefonia. Faria também trabalhou dois anos como pesquisador visitante no Centro Nacional de Estudos em Telecomunicações, na França. Em 1998, ele saiu do CPqD para se dedicar ao projeto do PIPE junto com a empresa AGC, uma das pri60 • AGOSTO DE 2001 • PESQUISA FAPESP

meiras a adquirir tecnologia daquele centro da Telebrás. A OptoLink, então, criada por Faria, era uma subsidiária da AGe. Independência empresarial - No ano passado, entretanto, a AGC foi vendida para a empresa dinamarquesa GN NetTest e as atividades da OptoLink, incluindo o projeto do PIPE, não eram de interesse da nova controladora. "Eu quis que a OptoLink ficasse independente. As pesquisas não podiam parar e a idéia era transformar os protótipos de bancada em protótipos rentáveis, comerciais, em escala industrial", conta Faria. Então, ele comprou a participação acionária da AGC e passou a ser o sócio majoritário da OptoLink. No início dG 2000, o físico Sérgio Celaschi foi convidado para ser sócio na OptoLink. Celaschi traz na bagagem a co-

o PROJETO Atualização Tecnológica de Amplificadores Õpticos à Fibra Dopada com Érbio MODALIDADE

Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE) COORDENADOR ILDEFONSO

FtLlX

DE FARIA JÚNIOR -

OptoLink INVESTIMENTOS

R$ 82.900,00 e US$143.460,00

ordenação do grupo de componentes em fibras ópticas do CPqD. O projeto apoiado pela FAPESP está na fase final. Os amplificadores desenvolvidos apresentam inovações importantes para o campo das telecomunicações ópticas. Eles usam um circuito de controle desenvolvido pela OptoLink e módulos de ganho óptico com fibras dopadas com érbio, um elemento que proporciona a absorção de luz laser. "Em função da concentração de dopantes e comprimento da fibra, o amplificador apresenta diferentes comportamentos. Um deles refere-se à banda de utilização. A OptoLink desenvolveu, em conjunto com o Cepof, da Unicamp, um protótipo de fonte de luz que cobre as bandas C e L, abrangendo as faixas de 1.520 a 1.610nanômetros (nm)" explica Faria. Ganhar espaço - A empresa

também tem um olho em novos equipamentos que devem dominar o cenário das transmissões via fibra óptica. Ela está desenvolvendo um aparelho que facilita a combinação das fontes de energia com o sinal óptico. Tratase do chamado sistema de multiplexação de divisão do comprimento de ondas de luz - ou WDM, na sigla em inglês. Esse componente, acoplado ao circuito óptico do amplificador, faz a mistura ou a separação de diferentes comprimentos de onda. O objetivo da empresa é reforçar suas especialidades no desenvolvimento dos novos produtos voltados ao mundo da fotônica, que se renovam e se reciclam a cada ano, e ganhar espaço no mundo com produtos com tecnologia 100% nacional. Para Faria, "o Brasil já desponta neste campo como um dos países que melhor dominam a tecnologia de equipamentos para uso nas transmissões via fibra óptica". •


TECNOLOGIA

tem uma boa idéia, mas não tem recursos. Nós o ajudamos na captação", explica Risola. A incubadora de empresas residentes destina-se a empreendimentos constituídos que já tenham domínio da tecnologia, disponham do capital mínimo e de um Wigberto Risola, gerente do Cietec. plano de negócios definido. Para "Nossa missão é apoiar empresas geeles, será cedida área de até 50 meIncubadora abre espaço para radoras de tecnologia." tros quadrados. mais 78 vagas para novos A incubadora de empresas associaVárias modalidades - A expectativa das tem o mesmo perfil, com a difeprojetos com a FAPESP de Risola é que 350 interessados conrença de que essas empresas têm sede corram às 78 novas vagas abertas em outro local e usam o Cietec para epois de passar por ampla renas áreas de biomedicina, biotecnofazer a ponte tecnológica com a uniforma que consumiu R$ 1,1 logia, tecnologia de informação, quíversidade e os centros de pesquisa. milhão e triplicou suas instalações, o mica, meio ambiente, técnicas nuPor fim, a incubadora de software é Centro Incubador de Empresas Teccleares, instrumentação, engenharia direcionada exclusivamente para pronológicas (Cietec) de São Paulo abriu de materiais e softwares. jetos desse segmento. concorrência para abrigar 78 novos As empresas poderão escolher As empresas incubadas dispõem empreendimentos que também poentre quatro modalidades: hotel de de completa infra-estrutura para dem receber financiamento da FAPEprojetos (ou pré- incubação), em-suas atividades. Além das instalaçõSP. Os interessados a um lugar na presa residente, associada ou de softes do Cietec, também contam com o incubadora devem retirar o edital até ware. O hotel de projetos apóia a apoio de consultores de tecnologia, o dia 20 de setembro no Cietec, que criação de negócios que ainda não marketing e comercialização, assisfica nas instalações do Instituto de Pestenham 'Condições de início imedia tência jurídica e assessoramento soquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), to. "Muitas vezes, o empreendedor bre patentes. "O mais importante, dentro da Cidade UniversitáI-----I'=~==s;:----T-----IN talvez, seja a possibilidade de ria em São Paulo. As propostas « acesso a todo conhecimento devem ser encaminhadas ao ~ gerado na USP, no Ipen e no Cietec para uma pré-seleção ~ IPT (Instituto de Pesquisas até 24 de setembro. O resulTecnológicas)", diz Risola. tado final será conhecido em 28 de fevereiro de 2002. OuIntercâmbio mundial - Criado tras informações no site www. em setembro de 1996, o Cieipen.br /cietec/ cietec.html. tec foi eleito pela Associação Maior pólo incubador do Nacional de Entidades Promopaís, o Cietec abriga 53 emtoras de Empreendimentos de preendimentos caracterizaTecnologias Avançadas (Anprotec) como núcleo de referência dos por inovação tecnológica em marketing e comercializade produtos, serviços ou processos. Entre esses empreenção entre as 145 incubadodimentos, oito têm financiaras do país. "Queremos dissemento da FAPESP dentro do minar nossos conhecimentos Programa de Inovação Tecnopara as demais incubadoras lógica em Pequenas Empresas brasileiras': afirma Risola. Esse intercâmbio ganhará vulto du(PIPE), e outros 17 estão em rante a Conferência Mundial processo de análise. Somados, os financiamentos superam de Incubadoras de Empresas R$ 1,5 milhão, o equivale a (WCBI), que acontecerá en60% dos recursos obtidos petre 23 e 26 de outubro, no Rio las empresas incubadas em de Janeiro, reunindo todas as agências financiadoras. "A FAincubadoras brasileiras e os PESP é a maior apoiadora dos melhores especialistas de ouprojetos do Cietec", diz Sérgio tros países. • INOVAÇÃO

Parcerias com o PIPE e

D

i1

PESQUISA FAPESP . AGOSTO DE 2001 • 61


TECNOLOGIA

CIENTEC

2001

Exposição de bons motivos Campinas reúne 11 instituições de pesquisa e faz mostra de projetos ampinas mostrou porque foi escolhida como um dos 46 centros mundiais de inovação tecnológica pela Organização das Nações Unidas (ONU) - no Índice de Realização Tecnológica - durante a primeira edição da Mostra de Ciência e Tecnologia para o Desenvolvimento - Cientec 2001, de 24 de agosto a 2 de setembro, na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Foram 11 instituições de pesquisa e ensino que se uniram para expor inovações desenvolvidas em seus laboratórios, com o objetivo de aproximar a população - e estimular estudantes de primeiro e segundo grau - do universo da produção científica e tecnológica. Durante os dez dias de visitas aos estandes e os 21 debates em torno de três eixos básicos - Vida e Saúde, Tecnologia e Meio Ambiente - promoveu-se a integração entre pesquisadores, técnicos e público. "Nossa intenção maior foi popularizar a ciência e a tecnologia e dar oportunidade ao público da região de entender melhor as atividades dos pesquisadores da Unicamp e das outras dez instituições que integram esse evento", comentou o físico Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor do Instituto de Física (IF) da Unicamp e presidente da FAPESP.

C

Milhares de pessoas, a maioria estudantes, estiveram na Unicamp nos dez dias da mostra 62 . AGOSTO DE 200!

• PESQUISA FAPESP

Na abertura do Cientec 2001, o ministro da Ciência e Tecnologia, Ronaldo Sardenberg, ressaltou que o evento na Unicamp é um exemplo de que a noção de ciência e tecnologia no país começa a mudar. "O importante é o desafio de continuar a aventura do conhecimento, a liberdade de pesquisa e a sua aplicação em benefício da sociedade", disse. Para ele, a mostra faz com que o tema tecnologia seja cada vez mais assimilado pelo cidadão comum e por vários segmentos da sociedade. "O Brasil não pode ficar marginalizado na nova economia mundial. Neste sistema globalizado, o conhecimento científico se traduz na agregação de valor a produtos e serviços", disse o ministro. História e inovação - Um dos estandes da feira que melhor ilustrou os objetivos da mostra foi o do Instituto de Física da Unicamp, ao apresentar as principais realizações de ensino e pesquisa na área de comunicação por fibras ópticas voltada para as teleco-

municações. Estavam expostos vários equipamentos, como amplificadores e acopladores ópticos utilizados em centrais de telecomunicações para melhorar os sinais de transmissão de telefonia, Internet e TV a cabo. "Os estudos com fibras ópticas em Campinas começaram em 1971, portanto completam 30 anos de evolução e a idéia é aperfeiçoar nossas pesquisas': comentou o físico Hugo Fragnito, que coordena os trabalhos do Grupo de Fenômenos Ultra-Rápidos e Comunicações Opticas do Instituto de Física da Unicamp. Fragnito também é coordenador de transferência de tecnologia do Centro de Pesquisas em Optica e Fotônica, um dos Centros de Pesquisa de Inovação e Difusão (Cepid) da FAPESP.''As empresas nascidas do Instituto de Física já faturam mais de R$ 250 milhões por ano': informa o professor Brito. As áreas de telecomunicações e informática também estiveram bem delineadas nos estandes do Instituto Nacional de Tecnologia da Informa-


ção (ITI) e da Fundação Centro de Pesquisa de Desenvolvimento em Telecomunicações (CPqD), que mostrou produtos desenvolvidos ao longo dos 25 anos da instituição. - As telecomunicações e o desenvolvimento de softwares são duas marcas tecnológicas da cidade e contribuem para a geração de riquezas do município. Campinas concentra hoje 10,6% do Produto Interno Bruto (PIE) paulista - ou 3,2% do PIE nacional. Dados da Secretaria de Ciência e Tecnologia do Estado de São Paulo indicam que a região tem atraído anualmente cerca de US$ 2,5 bilhões de investimentos privados. "Mas nada disso teria acontecido sem o trabalho das universidades, daí a importância do ensino e da pesquisa no desenvolvimento de idéias, produtos e serviços para o bemestar da sociedade': comentou o reitor da Unicamp, Hermano Tavares. Outro destaque da Cientec 2001 foi o estande do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS) e sua exposição de fontes de luz, robôs e peças miniaturizadas que fazem parTrabalho das universidades

te do Projeto Multisuário de Microfabricação (Musa). "Um exemplo de microestrutura construída experimentalmente no LNLS é o das micropeneiras com furos de dimensões inferiores a 20 mícrons, que servem para filtrar partículas tóxicas existentes em efluentes industriais': disse Luiz Otávio Saraiva Ferreira, líder do Grupo de Microfabricação do LNLS. Outra microestrutura é o contador de bactérias do leite, capaz de análises em menos de 40 minutos. O LNLS também desenvolve microrreatores químicos para análise de DNA, urina e sangue. "Por esse processo é possível fazer um exame com uma só gota de sangue, gastando menos tempo e menos dinheiro': diz Ferreira.

No estande do LNLS, amostras de micropeneiras e um jogo-da-velha robotizado com perguntas e respostas

Ainda no estande do LNLS, o público infantil e adolescente pôde se divertir com um curioso jogo-da-velha robotizado, cuja função principal é estimular o raciocínio de compreensão do processo produtivo de equipamentos industriais. Ao manusear o jogo, com a ajuda de um robô, percebe-se um conjunto de pesquisas nas mais variadas áreas: informática, eletrônica, mecânica e design. A área mais tradicional da vocação científica e tecnológica de Campinas esteve presente nos estandes das instituições ligadas à produção de alimentos, à agricultura e ao meio ambiente, como o Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital), a Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati), o Instituto de Zootecnia (IZ) e o Instituto Agronômico de Campinas (IAC). Nesse contexto, estavam expostas maquetes reproduzindo os ecossistemas da região, sementeiras de produtos orgânicos e até bezerros de proveta. O IAC também mostrou cachos de uva sem sementes e novas variedades de café e de maracujá. Na mesma área também expuseram o Instituto Biológico (IE), com seus programas de combate a doenças de vegetais, e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que mostrou novas tecnologias para o controle biológico de pragas e para o tratamento do solo. Políticas públicas - A Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas) deu ênfase aos seus programas de ensino e pesquisa nas áreas de saúde e políticas públicas, como o de promoção de leitura para moradores de bairros periféricos de Campinas. Além de participar da mostra como uma das grandes patrocinadoras, ao lado da Telefônica, a FAPESP montou um estande de 400 metros quadrados para o público conhecer melhor suas atividades de apoio à pesquisa em diversos setores do conhecimento, como o projeto Genoma, os programas de políticas públicas e de incentivo à inovação tecnológica em pequenas empresas. • PESQUISA FAPESP • AGOSTO DE 2001 • 63


TECNOLOGIA

ENGENHARIA

BIOMÉDICA

Operação de olho no topógrafo Pequena empresa desenvolve equipamento que auxilia em cirurgias oftalmológicas epois de nove anos no mercado desenvolvendo equipaentos para uso oftalmológico, a empresa Eyetec, de São Carlos, prepara o lançamento de um topógrafo intracirúrgico. Uma novidade que vai garantir maior precisão e eliminar grande parte dos riscos existentes em operações de catarata e transplante de córnea. O equipamento mede a curvatura dessa membrana do olho durante as operações e detecta variações muito pequenas, que ajudam no trabalho do cirurgião e evitam problemas pós-operatórios. O novo implemento médico recebeu financiamento da FAPESP num projeto iniciado há três anos no âmbito do Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE). Topógrafos convencionais já existem no mercado há quase 20 anos. "Um bom topógrafo é fundamental desde a fase de planejamento de uma cirurgia", diz o oftalmologista Gustavo Paro, consultor da Eyetec. O equipamento é útil para se evitar o astigmatismo (distorções na captação da imagem), mal decorrente de alterações milimétricas na superfície da córnea no momento da sutura do corte cirúrgico. "Ao analisar o olho de um paciente com catarata (opacificação do cristalino do olho), por exemplo, analisamos a curvatura da córnea e, se for o caso, já definimos a correção do astigmatismo', acrescenta ele. "Nos últimos dez anos, as cirurgias tornaram-se mais precisas': explica Paro. Como exemplo, a eliminação da catarata é feita por meio de

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um processo chamado falcoemulsificação, uma técnica que reduziu a incisão de 12 milímetros para 3 milímetros no máximo. A busca de precisão tem motivado a corrida pela produção de equipamentos técnicos de alta performance. Parceria acadêmica - Para os avanços

que a Eyetec precisava fazer no topógrafo convencional foram fundamentais as interações da empresa com o Laboratório de Óptica Oftálmica do Instituto de Física (IF) da Universidade de São Paulo (USP), de São Carlos, e com os departamentos de Oftalmologia da Escola de Medicina da USP, de Ribeirão Preto, e da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Como relata Luís Alberto Vieira de Carvalho, pesquisador do IF de São Carlos e um dos sócios da Eyetec, nessas conversas constatou-se que as formas de acompanhamento das alterações oculares eram indiretas e sempre tardias em relação aos cuidados médicos requeridos. "Por isso, antes de buscarmos recursos na FAPESP, nós tínhamos feito, ainda como estudantes, um protótipo muito básico", reforça o engenheiro eletrônico Sílvio Tonissi Iúnior, também sócio e coordenador do projeto. Ao procurar soluções tecnológicas para o problema, o grupo de pesquisadores da Eyetec buscou Topógrafo intracirúrgico: software permite análise milimétrica da curvatura da córnea

inspiração na história dos aparelhos de monitoramento do olho humano. Como explica Carvalho: "Em 1820, o oftalmologista francês Ferdinand Cuignet propôs o primeiro método para estudar as imagens refletidas pela superfície anterior da córnea, designando o nome da nova técnica de ceratoscopia, conceito válido até hoje", conta o pesquisador. "Uma luz era projetada num anteparo colocado em frente ao olho do paciente, a partir do qual se faziam estudos, comparações e conclusões. Só que havia vários problemas com esse sistema. O processo de alinhamento dependia muito da habilidade do observador e não havia nenhum sistema óptico de aumento, o que dificultava a análise das imagens refletidas."


Foi graças a um lance de gênio do pesquisador português Antônio Plácido, em 1880, que os pesquisadores conseguiram ultrapassar os limites da época. Ele preparou uma espécie de cartolina sobre a qual havia pintado uma série de círculos pretos, tendo ao centro um orifício. A partir da análise do padrão refletido pelo olho do paciente, o profissional podia deduzir o formato da superfície e daí captar o grau da anomalia existente. Pelo formato, essa técnica passou a ser conhecida como os "discos de Plácido". "O topógrafo intracirúrgico coloca essa técnica no seu mais refinado grau, aplicado em cirurgias que podem gerar altos índices de astigmatismo pós-cirúrgico devido à ausência de métodos eficientes de detecção de irregularidades na superfície da córnea", relata Carvalho. Testes visuais - Na primeira

fase do projeto foram produzidas peças mecânicas e ópticas, ao mesmo tempo em que era desenvolvido um softwa-

o PROJETO Desenvolvimento de um Topógrafo Intracirúrgico MODALIDADE

Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE) COORDENADOR

SILVIOANTÔNIOTONISSIJÚNIOR- Eyetec INVESTIMENTOS

R$ 195.720,00 e US$ 42.688,00

re de captura e processamento de imagens. Também foram armazenadas as medidas de córneas de pacientes voluntários. O passo seguinte foi desenvolver um protótipo que, na prática, apresentasse as características de um produto comercialmente operacional. Novos testes foram feitos, "em diversas situações reais de cirurgia", segundo Carvalho. Além disso, o software do sistema passou por novas etapas de desenvolvimento, destinadas a robustecer o grau de confiabilidade do sistema. O aparelho recebeu melhorias para que seu uso não entrasse em conflito com as necessidades específicas do ato cirúrgico, como o ângulo de variação da incidência de luz sobre os olhos do paciente e sua capacidade de manipulação. Para isso, o topógrafo recebeu uma espécie de braço mecânico, facilmente manuseado pelo médico. "O paciente fica numa posição em que o eixo óptico do microscópio eletrônico se estabelece no mesmo eixo do olho. A imagem virtual feita pelos reflexos dos anéis do projetor se for-

ma em dois lugares, na ocular e na câmera que fica acoplada ao divisor de feixes do microscópio", detalha Tonissi J únior. O grau de correção dos problemas oculares é mostrado na tela de um computador. Na tela aparecem faixas de cores que indicam a situação da córnea. Cores quentes, como laranja, vermelho e amarelo, indicam altas curvaturas ou distorções localizadas. As cores azul e violeta representam as curvaturas menores e indicam regiões com poucas distorções. As médias são verdes e representam a normalidade. "Tudo isso é visto de uma maneira fácil de ser interpretada pelo médico", conta Luís Alberto Carvalho. Mercado promissor - Um dos mais sérios desafios da equipe da Eyetec é baratear o produto. "Hoje, ele custaria cerca de R$ 30 mil", informa Carvalho. A câmera é japonesa, o sistema óptico é nacional, a placa de aquisição de imagens é canadense, ficando a cargo da Eyetec o desenvolvimento de rotinas de controle do software. "Os novos testes mostram ser possível baratear bastante o topógrafo intracirúrgico", diz Tonissi. O preço deve cair para cerca de R$ 10 mil até o final do ano, quando for lançado no mercado. A Eyetec tem planos de produzir dois sistemas para o topógrafo, um gerido por um computador estacionário e outro para ser conectado a um notebook. O mercado para o novo produto, apesar do preço, é bastante promissor, diz Tonissi. Na disputa por preços, os oftalmologistas têm como opção os modelos convencionais importados, que chegam a custar de US$ 14 mil a US$ 18 mil, fora taxas de importação. O novo modelo brasileiro, da Eyetec, acoplado a um PC, deverá ficar, portanto, 60% mais barato. Pelos cálculos da empresa, existem no mercado brasileiro hoje cerca de 9 mil oftalmologistas, dos quais 3.600 são cirurgiões, alvo específico para o produto. Além do mercado nacional, a empresa já olha para o mercado externo. • PESQUISA FAPESP • AGOSTO DE 2001 • 65


TECNOLOGIA

QUÍMICA

Reação luminosa em análise clínica Novas técnicas permitem exames laboratoriais mais baratos e eficientes ois pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) desenvolveram uma tecnologia inédita no Brasil para diagnósticos clínicos baseados na utilização de reações que emitem luz e permitem mensurar o nível de várias enzimas de interesse laboratorial. A presença e a quantidade dessas enzimas determinam a existência de uma doença relacionada a elas. Nas novas técnicas, as enzimas crescem e provocam reações químicas em substâncias orgânicas, chamadas de substratos, o ponto central do estudo das equipes dos professores Luiz Henrique Catalani, do Instituto de Química, e Ana Campa, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas. Na pesquisa, foi possível sintetizar os substratos utilizando matéria-prima mais simples e mais barata do que os produtos importados disponíveis no mercado. Ana destaca também que o objetivo é criar substratos menos tóxicos para os profissionais da área de análises clínicas e para o descarte nos efluentes, além de serem mais práticos, sensíveis e estáveis. Segundo Catalani, esses substratos são moléculas que possuem uma estrutura principal fixa e uma parte variável, em função do tipo de enzima que atuará sobre eles. "A ação da enzima sobre o substrato dispara

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Análises clínicas com matéria-prima mais barata e menos tóxica

uma série de reações que culminam na produção de luz." A emissão total de luz do sistema não é visível pelo olho humano. Ela é medida por um equipamento chamado luminômetro. O resultado fica visível num gráfico onde a intensidade de luz emitida é comparada com uma curva-padrão, permitindo obter informações sobre a quantidade de enzima presente, por exemplo, na porção de sangue analisada. A enzima atua como um marcador propositadamente conectado a um anticorpo, em um processo chamado de enzimaimunoensaio (ElA), que pode indicar a presença de uma doença. Enzima da pancreatite - A ação enzimática pode ser verificada num exame de fluido corporal- soro sanguíneo ou qualquer outro - para a identificação da atividade de uma enzima que indica a ocorrência de uma doença. Um exemplo é a pancreatite, que gera um aumento no nível da enzima lipase no sangue. "Esse aumento pode ser detectado se for utilizado um substrato que possa ser reconhecido pela lipase", diz Catalani. Quando tem uma dúvida sobre qualquer patologia do pâncreas, o médico costuma pedir um exame de lipase pancreática. "Talvez apenas um laboratório de São Paulo faça esse exame como base no novo procedimento. A maior parte usa o que chamam de marcadores secundários outras enzimas que marcam a patologia:' Para isso, fazem o ensaio a partir de uma mistura de óleo de oliva e de água. Quando a lipase é adicionada a essa mistura ocorre uma diferença na turbidez que pode de-


terminar a atividade da lipase no soro. "Nosso processo é muito mais sensível e mais preciso."

Marcar anticorpos - Ana explica que a terceira utilidade das técnicas desenvolvidas pelo grupo é a marcação de anticorpos por enzimas em diversos procedimentos. Nas técnicas de identificação de proteínas e fragmentos de DNA e RNA, que são preparados em um gel (polímero orgânico) de eletroforese, a revelação é uma etapa crucial. Apesar dos incon-

macêuticas da Universidade Estadual Paulista (Unesp) em Araraquara, e Roberto Passetto Falcão, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Além dos radioisótopos - Outro uso Preto da USP, que tem uma coleção da tecnologia com enzimas em análide células de leucemia para pesquises clínicas é a substituição dos rasas. Num dos trabalhos, constatoudioisótopos como marcadores para se que um substrato desenvolvido verificar a presença no organismo de pelo grupo tem possibilidade de ser um antígeno - vírus ou bactéria, por usado na classificação de alguns tiexemplo. Nos radioimupos de leucemia. no ensaios (RIA), em Na identificação uso desde os anos 50, dessas doenças, num anticorpos são previaprimeiro momento o mente produzidos, isolaboratorista analisa o lados e marcados com formato das células um elemento radioatibrancas do sangue e, a vo. Durante o ensaio, seguir, são feitos testes eles ligam-se ao antígedas características e no formando um comações químicas dessas plexo que é separado células. Para alguns tido meio de análise. Sepos, a enzima esterase gundo Catalani, essa passa a ser um marcatécnica tem perdido dor importante. De terreno gradativamenacordo com Ana, um te nos últimos 20 anos dos substratos criados para o uso dos enzimapela equipe permite imunoensaios. "Houve uma diferenciação de um avanço grande duatividade da esterase rante muito tempo dos em monócito (tipo de Ana e Catalani: publicação de trabalho sobre leucemia afastou patente radioimunoensaios, incélula branca) em relaclusive com a facilitação do trabalho. venientes, essa revelação tem sido ção a outros tipos de células. "Com feita com radioisótopos: "Como alPorém, essa técnica é muito cara, por base nisso, estamos propondo um ternativa a essa técnica, pode-se utivários aspectos, como a produção e método para classificação de alguns lizar enzimas como marcadores e a descarte do radioisótopo, o uso de tipos de leucemia." conseqüente emissão de luz para aparato especial de segurança para o laboratório, normas trabalhistas a seavaliação dos resultados". Sem patentes - O trabalho que reverem observadas, entre outros fatores:', Catalani e Ana desenvolvem oulou a possibilidade de identificação tros trabalhos com Luiz Marcos da O pesquisador exemplifica essa de tipos de leucemia já foi publicado, Fonseca e Iguatemy Lourenço Brumudança com o trabalho da equipe bem como outros sobre enzimas em relação à enzima ALP (fosfatase netti, da Faculdade de Ciências Farmarcadoras de doenças, o que imalcalina), que hidrolisa (reage com a possibilita o patenteamento dos proágua) fosfatos: ''A parte do substrato cessos. Catalani lamenta: "Durante o PROJETO variável é um fosfato, que teve sua esalgum tempo, tentamos obter condiBiotecnologia Clínica: Desenvolvimento trutura alterada de forma que a enzições de patenteá-los, mas na época de Sistemas Quimiluminiscentes ma passe a reconhecer o substrato. ainda não havia o Núcleo de Patentes Disparados por Enzimas e sua Aplicação em Diagnóstico Clínico Podemos agora desenvolver uma mee Licenciamento de Tecnologia (Nutodologia que, em vez de radioisótoplitec) da FAPESP.Além disso, tínhaMODALIDADE po, use um substrato simples, barato mos de apresentar os resultados do Linha regular de auxílio à pesquisa e eficiente para quantificar a ação da projeto': Contudo, o grupo tem em . . . COORDENADOR enzima num imunoensaio com meandamento outras linhas de pesquiLUIZ HENRIQUE CATALANI dida de quimiluminescência. Esse sa, passíveis de patentes. São a contitipo de tecnologia tem varrido os ranuação do desenvolvimento de noINVESTIMENTOS R$ 79.596,66 e US$ 81.340,00 dioimunoensaios do mercado", afirvos substratos que vão servir a novos ma Catalani. tipos de exames clínicos. • PESQUISA FAPESP . AGOSTO DE 2001 • 67


HUMANIDADES

SOCIOLOGIA

Novoritmo •

naterceíra idade Nos tempos atuais, em que as pessoas vivem mais, estudo alerta para a importância da atividade física na auto-estima do idoso S cabelos brancos

estão começando a aparecer na fronte do brasileiro. Segundo a tese Ser Idoso no Mundo: O Indivíduo e a Vivência de Atividades Físicas como Meio de Afirmação e Identidade Social, defendida na Faculdade de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP), em 2025, 15% da população do país (34 milhões) estará acima dos 60 anos. Nesse período, haverá um aumento médio de 6,5% de velhos ao ano e, ao mesmo tempo, uma redução nos números absolutos de jovens entre O e 14 anos. "Com o envelhecimento da sociedade, o brasileiro vai conviver mais com idosos, permitindo às gerações que amadurecerem ter um paradigma do que é ser velho': observa Andréa Krüger Gonçalves, autora da tese. "Os idosos de hoje têm de criar parâmetros, porque não tínhamos uma referência. Além disso, com o avanço tecnológico, as pessoas vivem cada vez mais", prossegue. A proposta da tese, apoiada pela FAPESP, é justamente oferecer algumas pistas de como se relacionar melhor com essa fase da vida, cada

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vez mais longa. A aposta da pesquisadora é na atividade física. "Considero que para combater a inércia à qual os idosos estão confinados, nada melhor do que o movimento. É uma forma de adiar o repouso absoluto': afirma. De fato, a pesquisa caminha na contramão do espaço que a sociedade reserva aos mais velhos. Na terceira idade, de acordo com Andréa, há um processo comum de vivência negativa: aposentadoria (ausência de produção), viuvez (morte), mudanças físicas, como rugas e cabelos brancos (desgaste) e ninho vazio (sem papel). Tal conjuntura seria um caminho' fácil para a imagem depreciativa do velho, que está sempre associada à falta de utilidade e à perda de papel social. "São esses os fatores que desencadeiam o preconceito relacionado ao envelhecimento, tanto por parte da sociedade, como dos próprios velhos", justifica. O estudo de Andréa parte do princípio de que a participação em atividades físicas poderá contradizer esse estereótipo e tornar os rumos da terceira idade mais positivos. "O ob-

jetivo principal é resgatar a auto-estima das pessoas com mais de 60 anos, por meio da participação em atividades físicas. Isso porque se acredita na sua influência na identidade e, conseqüentemente, na afirmação social': explica a pesquisadora. Para realizar o trabalho, Andréa Krüger Gonçalves reuniu 20 idosos para o curso "Atividades de Movimento para a Terceira Idade", oferecido na Universidade Aberta da Terceira Idade da USP. Apesar do enfoque na atividade física, o trabalho não se concentrou apenas na questão do movimento. "Isso seria uma limitação. O projeto também está muito associado à convivência com novas pessoas': explica. Nesse contexto, o trabalho adquiriu um outro objetivo complementar: o de realizar uma interferência direta na vida dos participantes. Para isso, destacaram-se as atividades para a reestruturação de um autoconceito positivo do idoso, o que poderia propiciar uma conscientização do papel social a partir da ênfase em si e em sua capacidade. "Esse autoconceito é fortemente relacionado com a sensação


Idosos em forma, correndo e dançando: pesquisa adverte para o erro de se pensar a atividade física para o "velho de espírito jovem"

de auto-eficiência - possibilitada pelas atividades - e permite à pessoa assumirse como idosa a partir de uma avaliação da situação real de vida, que não será vista como predominantemente negativa': afirma. Apesar de a professora ter atingido o objetivo inicial de elevar a auto-estima dos participantes, a maior parte dos idosos continuou negando o envelhecimento e reproduzindo a máxima: "velho com espírito jovem': "O problema é que a atividade física estimulada pelo nosso trabalho ainda está vinculada, para eles, à negação do envelhecimento': avalia Andréa. "Essa não me parece a melhor solução, porque as pessoas não reconhecem diretamente o aspecto positivo de envelhecer bem. A pessoa deveria assumir que

tem 60 anos -e está em forma, mas não é isso que ocorre': diz. A pesquisadora rechaça veementemente a resposta do idoso de negar anos de sua existência para se sentir satisfeito consigo. "Nós chegamos aos 60 anos de idade e dizemos que nos sentimos como uma pessoa de 30. Com isso, estamos matando metade de nossa vida. Não podemos jogar tudo isso fora': sustenta.

Embora não tenha conseguido comprovar sua hipótese de fazer com que o idoso aceite seu bem-estar com a idade real, Andréa pondera que obteve resultados relevantes. "Eles saíram do curso com uma relação mais positiva de si e dos velhos em geral': afirma a pesquisadora. Segundo Andréa, o fato de os participantes do curso "Atividades de Movimento para a Terceira Idade" se inscreverem na Universidade Aberta da Terceira Idade já é um indicador da disposição de cada um em melhorar sua condição de vida. "Partimos do pressuposto de que as pessoas procuram, ou não, um curso desses por necessidades pessoais", justifica. O critério de seleção, portanto, foi a adesão natural. Para a pesquisadora, as pessoas que buscam os grupos da terceira idade se interessam por essas atividades porque querem se sentir desafiadas. "Elas pretendem checar o que ainda podem fazer na vida, mesmo velhas. Acreditam claramente que é preciso saber seus limites para se sentirem capazes e vivas. Isso é uma questão já verificada em muitas outras pesquisas': afirma. O perfil dos 20 participantes é bastante variado. A maioria estava entre 60 e 69 anos, com alguns superando os 70 anos. Dezoito deles eram mulheres e dois homens. Uma das respostas para a pouca presença masculina nos grupos da terceira idade está no fato de que toda produção do homem, ao longo da vida, é dirigida ao trabalho. "Eles têm preconceito em relação às atividades de cunho meramente social, que não tenham objetivo produtivo': avalia a professora. De acordo com outras pesquisas realizadas sobre a terceira idade, é possível detectar que há também um comportamento diferente entre sexos, quando se perde o companheiro. ''A viuvez é um aspecto muito PESQUISA FAPESP • AGOSTODE2001

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forte para o idoso. A estrutura e respeito. Em mulher quase sempre Lisboa, eles já são até tem um círculo de relaacompanhados pela Internet", conta. Andréa ções maior durante a vida e, por isso, tem identifica que a mumais condições de busdança do quadro populacional do mundo car apoio fora de casa. também é resultado do Mas o homem não. Em geral, se casa novamenaumento da expectativa de vida atual- bem dite, ou morre em seguida", explica Andréa. ferente da que se tinha "A mulher dificilmente há 30 anos. "Nos países Diversão sem idade: hoje,jovens é que sofrem mais ao pensar no futuro volta a se casar. Boa pardesenvolvidos, já se diste teve seu casamento imposto pela Diante desse cenário, é complicacutem os problemas da quarta idade, a partir dos 80 anos', diz Andréa. família e muitas se sentem mais lido determinar quais são as melhores "Dos anos 60 para cá, a Europa pasvres com a viuvez", continua. condições para uma qualidade habiDos 20 participantes do curso, tacional para o idoso - sobretudo, sou a lidar melhor com a terceira idanove estavam casados, sete viúvos e quando ele se depara viúvo. "Há uma de. Eles também não tinham esse requatro separados ou divorciados. Os interdependência direta da escolha de ferencial de envelhecimento", diz. dois homens eram casados. O tempo Para a professora, esse aumento da favida com a situação financeira da pesde casamento variava de 30 a 54 soa. Mas se o velho não tem problema tia de idosos tem levado também a uma melhor convivência com a idade anos. Todos tinham filhos e a maiomental e tem a disposição de viver sozinho, essa é a melhor opção" afirria, netos. O nível de escolaridade que as próprias pessoas têm. "O estigma do envelhecimento está diminuintambém era heterogêneo: sete conma Andréa. Mas há controvérsias. cluíram o ensino fundamental, oito "Quem mora sozinho reclama que do. As pessoas mais velhas estão profinalizaram o ensino médio e cinco curando fazer as mesmas coisas que tem um contato muito distante com faziam quando eram jovens', afirma a chegaram ao curso superior. "Apesar os filhos. E os velhos que moram com das diferenças, chegou-se a uma inpesquisadora. Essa é a atitude adequaos filhos dizem que não conseguiram teração muito boa, o que eu consideter uma vida independente", avalia. As da, de acordo com ela, porque a pesro um dos pontos positivos do cursoa será sempre a mesma, embora vipossibilidades de escolha para o idoso so', observa a pesquisadora. vendo diferentes momentos de vida. no Brasil, porém, estão muito distan"A dialética da vida perpassa por Depois de iniciarem o curso de tes do ideal: "A maior parte da poatividade física, muitos participantes todas as idades. Todas apresentam os pulação da terceira idade não pode dois lados da moeda", afirma. "Temcomeçaram a fazer cursos de língua, optar por viver sozinha ou com os pintura e informática, na própria USP. se as ausências da velhice, mas é posfilhos. As pessoas são impelidas pela "Uma ação começou a puxar a outra. sível encontrar encantos na falta de família e por suas condições finanChegou a um ponto em que eles ticeiras. São esses dois aspectos que deobrigações do trabalho, com seu rinham atividade todos os dias. Ao coterminam o modo de vida do velho gor de horário, na despreocupação I brasileiro', diz a pesquisadora. "Na Eude criar um filho, sendo que o relameçar a ocupar o tempo, o resultado foi positivo, pois a família deu um reropa é comum os idosos viverem socionamento com os netos é só de amor", avalia. torno para esses trabalhos", revela. zinhos, porque há muito mais infraApesar das melhores condições A abordagem desse trabalho, de acordo com a pesquisadora, é fundao PROJETO do idoso, a pesquisadora considera mental nos dias de hoje, porque ao que a mídia tem um papel bastante Ser Idoso no Mundo: O Indivíduo e a Vimesmo tempo em que o envelheciimportante e negativo no fortalecivência de Atividades Físicascomo Meio mento populacional reflete um promento do preconceito contra os vede Afirmação e Identidade Social cesso de desenvolvimento de uma lhos, que ainda é enorme. "Os meios MODALIDADE sociedade, ele pode implicar um grade comunicação pegam muito pesaBolsa de doutorado ve problema social. "Se não existirem do na propaganda do rejuvenescitransformações socioeconômicas, mento, sobretudo na questão da COORDENADORA que propiciem melhoria das condiECL~A BOSI- Faculdade de Psicologia imagem física", analisa. "Mas é verdada USP de também que os jovens sofrem ções de vida e do bem-estar geral das pessoas mais velhas, teremos um uma pressão muito maior com relaPESQUISADORA quadro muito problemático num fução a esse dilema. Com pouca idade, ANDR~A KRÜGER GONÇALVES já temem o futuro", conclui. • turo breve", analisa. 70 • AGOSTO DE 2001 • PESQUISA FAPESP


HUMANIDADES

EXPOSIÇÃO

o Brasilque é mais do que quinhentos Mostra Brasil 50 Mil Anos, em Brasília, recupera o passado nacional pré-colonial pesar de nascido há 10 mil anos atrás, ele não podia afirmar, como se vangloriou na música, que não havia nada deste mundo que ele não soubesse demais. Prova disso está na exposição Brasil 50 mil Anos: Uma Viagem ao Passado Pré-Colonial, mostra organizada pelo Museu de Arqueologia e Etnologia da USP (MAE-USP), aberta no dia 3 de setembro (fica em cartaz até o dia 2 de dezembro), em Brasilia, no Salão dos Espelhos do Superior Tribunal de Justiça. Os 50 mil do título são uma saudável provocação à badalada mostra "Brasil+500". "São, em verdade, 12 mil anos de história que mos-

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traremos, mas a referência à exposição do ano passado serve para deixar clara a intenção de ajudar o público a repensar esse tipo de organização da nossa história': explica Paula Montero, diretora do MAE e uma das curadoras da exibição. "Em geral, só se conhece a história colonial de conquista, o lado dos vencedores. As pessoas precisam descobrir que, quando os brancos chegaram por aqui, já existia uma população que conhecia bem o seu território, que mantinha rotas de comércio, etc. e que foi graças à experiência desses povos, aproveitada pelos conquistadores, que a colonização foi possível", observa a pesquisadora. "Eles não se apropriaram apenas dos braços dos nativos

como força de trabalho, mas de seu conhecimento", avisa. Para contar essa história mal contada, a mostra utilizou uma área de 2 mil metros quadrados, que será dividida em seis módulos (o custo da exposição foi de R$ 2 milhões), um túnel do tempo arqueológico e etnológico. "Mas não se trata de uma história evolucionista, sem a idéia de um progresso crescente entre as diversas sociedades nativas. Há mesmo várias que são contemporâneas. Afinal, mais importante do que o tempo é a geografia dessas populações, que se reflete na forma em que a exposição foi organizada", fala. "Em cada ambiente, o público poderá ver o artefato inserido em seu ambiente e perceber as razões que levaram a sociedade, dado aquele contexto, a criar tal ou tal objeto", explica. E, tam-

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bém como resposta à mostra "Brasil +500': a curado ria de "Brasil 50 mil Anos" acabou com o fetiche do objeto. "O que se viu no ano passado, na exibição, era a peça sacralizada. Aqui, a peça não fala por si, antes, ela é importante porque é o gesto do homem deixado na história e só pode contar algo em relação com outros objetos': avalia Paula. Assim, não espere maquetes e caixas de vidro com longas plaquetas explicativas. O grupo também pretende inovar na forma de apresentação. ''A mostra exige um esforço cognitivo do público, é dinâmica, faz as pessoas caminharem por entre os objetos para tentar apreender o seu significado total, não se restringindo ao entendimento parcial de peças com cartazes", conta a professora. Acreditando na inteligência dos seus espectadores, os organizadores da exposição permitiram-se a licença de reunir passado e presente continuado. "Você vê, ao lado de pontas de flechas antigas, cestos feitos hoje, na mesma região, por pessoas que ain-

Objetos da exposição: curadoria se preocupou em não "fetichizar" as peças, mas deixá-Ias em seu contexto, evidenciando a razão por que foram criadas pelos ameríndios

da têm ligações com aqueles povos do passado. Essa reunião de arqueologia e etnologia, tão necessária, bem como o fato de que a mostra se concentra na história antes da chegada dos portugueses, só foi possível porque queremos que o público seja capaz de, sozinho, fazer o link entre o passado e o presente': fala a diretora do MAE. Além disso, a mostra igualmente servirá como "prestação de contas" entre a moderna arqueologia brasileira, seus profissionais e a sociedade. "Da mesma forma que os enganos da Brasil+500 geraram o nosso desejo de fazer essa mostra, os seus acertos igualmente nos motivaram a usar a nossa exposição para entender o novo papel ocupado pela arqueologia brasileira': diz. ''Após um período em que estávamos numa posição marginal, hoje, por causa até daquele evento, temos maior visibilidade e respeito da comunidade. Isso, por um lado, é positivo, mas traz novas responsabilidades': avalia. Para Paula Montero, visibilidade precisa vir acompanhada de quali-

Tese analisa tendência de teatralização das exposições A imagem que ilustra esta página é um exemplar tímido de uma série de recursos cênicos usados na mostra "Brasil + 500 Anos': que comemorou os 500 anos dos descobrimentos no ano passado. Paredes coloridas, intervenções feitas por meio de objetos e até a criação de um ambiente especial, como foi o módulo de arte barroca - em que milhares de flores de papel feitas por presidiários ladeavam santos e estátuas -, são reflexo de uma tendência mundial: a dramatização das exposições de arte. O assunto, embora tenha ganhado evidência junto ao público a partir daquela mostra, já vinha sendo

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analisado pela professora Lisbeth Rebollo Gonçalves desde 1994, quando ela assumiu a direção do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MACUSP). Feito com apoio do programa USP/Cofecub, um convênio realizado entre a ljSP e o governo francês, o projeto incluiu palestras sobre o assunto, realizadas com apoio da FAPESP em 97, 98 e 99, e ainda a realização de duas mostras no MAC- USP, "Modernismo, Paris Anos 20" (95) e ''Arte e Paisagem: A Estética de Roberto Burle Marx" (97). Em junho, o resultado da extensa pesquisa realizada por Lisbeth foi apresentado na defesa de sua tese

de livre-docência, "Entre Cenografias: O Museu e a Exposição de Arte no Século XX': na Escola de Comunicações e Artes (ECA-USP). A professora pretende transformar o trabalho em livro. Colocando sua lente de historiadora da arte sobre o assunto, Lisbeth fez um retrospecto de como a cenografia foi tratada em exposições de arte desde o início do século 20. Conforme ela demonstra, os salões de arte do início do século ocorriam em grandes palácios. Os quadros e esculturas eram expostos aleatoriamente, nem sempre obedecendo à prerrogativa de isolar cada obra, para sua melhor apreciação.


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rigosa: a lei quer salvar o passado, mas não temos pessoal especializado suficiente para levar a cabo essa missão': conta a pesquisadora. Mas, na mostra, não apenas a comunidade científica será exposta ao desafio de se pôr nos sapatos de um arqueólogo. "Enquanto o público caminha pelo túnel do tempo, poderá ver, no chão e nas paredes dos corredores da exposição, respectivamente, como a partir de cacos de um jarro se pode contar a história e de que forma a terra, por meio das suas camadas, nos conta como o tempo passou:' O espectador chega a um cenário que reproduz, em detalhes, um laboratório Paula Montero: esforço cognitivo do público de arqueologia, com seus instrumentos, microscópios, etc. dade. "A profissão ainda não é regulamentada, seu projeto está na Câ"Será a chance de as pessoas entenderem como funciona o nosso trabamara dos Deputados. Além disso, a lho': avisa Paula. conquista feita pela Constituição de 1988, que exigia a salvaguarda do No fim do túnel, uma cobra. Ou patrimônio, mostra uma lacuna pemelhor, a reprodução do esqueleto

Foi em 1939, com a inauguração do então novo prédio do Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA), que surgiu o conceito de "cubo branco': em que os quadros são pendurados na altura dos olhos do espectador em ambientes completamente neutros. "Esse conceito revolucionou a forma de ver a arte moSala da mostra Brasil+SOO:cenografia transforma público derna e a própria história dessa arte': comenta a pesquisadora. mada "revolução romântica" da Embora ainda seja referência França. "Os museus começaram a repara a maior parte do público de pensar o seu papel': diz a professora. museus, o cubo branco passou a ser Tudo começou com a inaugurarevisto a partir de 1968, após a chação do Centro Georges Pompidou,

da mítica Cobra Grande, que, narra a lenda indígena, nadava pelo Amazonas e a cada vez que tirava a sua cabeça fora da água criava um novo povoado. É a ciência se reencontrando com o universo cosmogônico. Mas com razão de ser. "Para todos os momentos da mostra havia um acervo disponível, menos para a Amazônia. Após pensarmos a razão, vimos que a explicação estava no caráter daquelas populações, uma marca, aliás, que permanece em vigor: são povos filosóficos, míticos e nisso reside o seu fascínio': analisa. "A interação entre sociedade e natureza se fazia por meio do mito. Daí, então, a Cobra Grande que fecha a mostra. Também uma forma de nos lembrar de que, para aquelas populações, não houve uma ruptura tão grande entre o passado colonial e o presente': fala. Daí, igualmente, o prazer de se fazer a mostra em Brasília. "A capital é um espaço de reunião de raças, local ideal para que os vários tipos de brasileiros possam se reconhecer numa herança passada comum", completa. Mesmo para quem não nasceu há, no mínimo, 10 mil anos atrás. •

em Paris, em 1977. O Beaubourg, como ficou conhecido, marcou o início de uma era em que os museus quenam popularizar o acesso à arte. Hoje, conforme diz Lisbeth, o cubo branco e a dramatização são recursos usados pela museologia nos quatro cantos do mundo. "Conforme a opção do curador, um ou outro recurso pode ajudá-lo a expressar o que em ator quer com a mostra, principalmente quando ele usa a dramatização" diz Lisbeth. Para ela, a cenografia nas exposições de arte faz com que o espectador se sinta um ator dentro do palco.

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HUMANIDADES

HISTÓRIA

Separados apenas pelo mar A coletânea Agenda do Milênio reúne comunidades de historiadores brasileiros e portugueses, trazendo um balanço da área e os rumos futuros da pesquisa em história em mesmo o mar conseguiu nos separar e a comunidade de historiadores luso-brasileiros tem motivos de sobra para comemorar. É o que se conclui da leitura de BrasilPortugal: História, Agenda para o Milênio, organizado pelo historiador José Iobson de Andrade Arruda, professor da USP, Unicamp e Universidade do Sagrado Coração (USC), de Bauru. O livro, que tem também na organização o historiador português Luís Adão da Fonseca, é resultado de uma megarreunião de historiadores portugueses e brasileiros, cerca de 90

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profissionais. "Apesar de todos os esforços dos últimos anos, a distância entre Portugal e Brasil continuava muito grande. Há o Projeto Resgate, que busca documentos indispensáveis à história do Brasil em Portugal, mas estávamos preocupados com o outro desdobramento: o que fazer com essa documentação?", explica Iobson Arruda. "Por isso, essa idéia de estabelecer uma agenda em que portugueses e brasileiros, em conjunto, pensando determinados temas, pudessem nos dar essa diretriz. Essa é uma atitude concreta, não é retórica",

afirma. "O que nós esperamos é que essa experiência se transforme numa sementeira e que ela possa se multiplicar", completa o pesquisador. Se a Agenda tem um caráter programático, de olho no futuro da pesquisa, isso não significa, entretanto, que ela se resuma a uma simples carta de intenções. Há parcerias já em curso como, por exemplo o Projeto Portugal-Brasil: populações e migrações - que envolve o Centro de Estudos de Demografia Histórica da América Latina (Cedhal), da Universidade de São Paulo. e o Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade (Cepese), da Universidade do Porto -, bem como balanços vigorosos da produção historiográfica existente nos dois lados do Atlântico, que vão permitir com que se estreitem as parcerias à busca de novos paradigmas e


à luz de renovados horizontes historiográficos, capazes de dar uma maior visibilidade a essa produção numa escala internacional. Segundo Iobson, os desdobramentos podem incluir um dicionário biográfico luso-brasileiro em CD-ROM, uma revista luso-brasileira de história, um boletim eletrônico da Agenda do Milênio que possa abrigar links para seminários, colóquios e cursos de pós-graduação no I Brasil e em Portugal, bem como um site que reúna um banco de teses digitalizadas num clicar de mouse. E isso não é tudo. Planeja-se também newsgroups de história do mundo luso-brasileiro, um banco de dados dos processados da Inquisição, um conjunto de índices digitalizados de revistas, uma base bibliográfica lusobrasileira organizada por assuntos, a aquisição, pela Internet, de um livro português de uma livraria de Lisboa isento de taxas de importação e, de quebra, créditos de pós-graduação reconhecidos em qualquer universidade portuguesa. "Dada a qualidade dos interlocutores e do projeto, bem

como pela própria sustentação que a

Agenda do Milênio nos dá, os projetos têm toda a chance de frutificar", garante o professor. "E a Agenda do Milênio é um documento importante em si", assegura. Mapa da mina - O livro está organizado em torno de seis grandes blocos temáticos que congregam o que de bom se produziu na "velha" história e na história "nova", cada qual coordenado por uma dupla de historiadores brasileiro e português. São eles, respectivamente: Cultura e Religiosidade, sob a coordenação de Laura de Mello e Souza e Francisco Bethencourt; Dinâmicas Locais e Sistema Mundial; de Amado Luiz Cervo e Joaquim Romero Magalhães; História Econômica, de Carlos Roberto Antunes dos Santos e Antônio Marques de Almeida; Sociedade e Movimentos Sociais, de Zilda Márcia Gricoli Iokoi e José Manuel Tengarrinha; Demografia, Família e Migrações, de Eni de Mesquita Samara e Fernando de Souza; e Historiografia e Memória Social, de Fernando Antônio Novais e Luís Reis Torgal.

E as 635 páginas do livro não interessam apenas ao estudante de pósgraduação, que ali certamente vai encontrar um verdadeiro "mapa da mina" a lhe sugerir os "caminhos do ouro" da pesquisa em história. O caráter do livro é prospectivo e nisso está a sua força dinamizadora, uma vez que traça rumos, delineia projetos, fomenta parcerias, sugere traduções, anima polêmicas, ete. Os blocos não existem como camisas-de- força. Há entre eles uma transversalidade. Afinal, resgatar a história do mundo luso-brasileiro é defrontar-se com os valores do Ocidente cristão e sua crise, com a Renascença e a revolução científica e, mais tarde, com o legado iluminista da razão. "Quando decidimos fazer um balanço da produção historiográfica existente e o seu destino, percebemos que não era uma mera questão de estudar para o passado, mas estudar para o futuro, algo prospectivo: ou seja, em relação ao que fizemos o que é que poderíamos fazer mais? Aonde mais poderíamos ir além?': avalia o pesquisador. Um dos caminhos foi a PESQUISA FAPESP . AGOSTO DE 2001 • 7S


A necessidade não é menor em relação à produção estrangeira, que precisa ser traduzida para o português. O efeito prático da Agenda do Milênio, a esse respeito, é fundamental, uma vez que para cada linha de investigação os autores arrolam as obras que carecem de tradução imediata e aquelas que ainda podem esperar. Mas se engana quem achar que no interior do próprio mundo luso-brasileiro não existam muros. Os portugueses conhecem muito pouco do que se produz em matéria de história no Brasil, o mesmo se dando com os brasileiros em relação aos portugueses.

Realizações a longo prazo ..• Revista luso-brasileira de história Projeto Brasil-Portugal: populações e migrações Dicionário biográfico luso-brasileiro Banco de dados dos processados da Inquisição Continuidade do Projeto Resgate Revisão da legislação sobre importação de livros portugueses Banco de teses digitalizadas

...e a curto prazo Boletim Agenda do Milênio Formação de newsgroups Seminários e colóquios sobre o mundo luso-brasileiro Bibliografia luso-brasileira organizada por assuntos

dos efeitos da Agenda do Milênio é político e, para tanto, Efeitos - Outro

Revisão do Guia Brasileiro de fontes para a história da África e da escravidão Digitalização dos índices das principais revistas e periódicos

transversalidade. Afinal, não é possível se fazer uma História das Religiosidades e da Cultura que não contemple a esfera da política e da Sociedade, bem como um estudo dos cristãosnovos no Brasil ou da ação missionária não pode prescindir da Demografia Histórica, que por sua vez precisa da História Econômica e que é Social e assim por diante. Hoje, somos mais mundiais do que nunca e os centros hegemônicos impõem uma certa homogeneidade que nem todos encontram formas de resistir. As Dinâmicas Locais na sua articulação com o Sistema Mundial podem estar a sugerir um caminho para entender aquilo que brasileiros, portugueses, angolanos, enfim, têm de singular como nacionalidades, ao mesmo tempo em que se reconhecem como parte de uma comunidade universal, para além mesmo do luso-brasilianismo. Para além das especificidades dos grupos temáticos e dos problemas particulares daqueles campos de pesquisa, há questões comuns que perpassam todos os grupos envolvidos. O mundo acadêmico também vive um processo de intenso intercâmbio global. Assim, os grandes centros hegemônicos de pesquisa acabam ditando as regras desse gigantesco universo intelectual. Mas ele não é 76

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impermeável, existem frestas, e é necessário estar de olho nas oportunidades que se abrem. A barreira da língua precisa ser transposta. ''A nossa língua é minoritária em termos de comunicação mundial.Se nossos grupos que pensam história e que pensam história do Brasil e Portugal não tiverem seus textos traduzidos para as línguas hegemônicas não há possibilidade de uma interação com esses grupos, daí a urgência de verter para o inglês aquilo que de representativo existir na produção luso-brasileira em história", avisa Iobson.

Brasil- Portugal: História, agenda para o milênio josé jobson Arruda e Luís Adâo lia Fonseca (org.)

It.:)APfSP

Livro: caráter prospectivo

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e dinamizador

veio para o lançamento do livro o vice-presidente de Portugal, António de Almeida Santos, que é também o presidente da Assembléia da República. Segundo o professor Iobson, ele tem 16 livros publicados em Portugal, acabou de publicar um livro no Brasil que se chama Do outro lado da Esperança e assumiu um compromisso claro de lutar pela implementação de uma nova política capaz de rever essa legislação. "Mas para isso ocorrer, é preciso dos instrumentos. E para esses chegarem às mãos de brasileiros e portugueses, é preciso que eles possam estar lá e cá. Com essa política, porém, que os portugueses têm com relação aos livros ela absolutamente impede que isso aconteça': completa Iobson. Como se vê, a comunidade de historiadores está bastante consciente de que as tarefas que lhe aguardam não são fáceis, mas nem por isso se acomoda no subterfúgio da tão propalada "crise dos paradigmas". "Você não terá uma volta do jeito que era. Mas você terá uma retomada de uma história síntese, que enlace as notáveis contribuições da "velha" e da "nova" história. Porque elas poderão se complementar, elas não são necessariamente excludentes, elas não são inimigas mortais, que uma tenha que enterrar a outra para poder justificar a sua existência", diz Iobson, •


HUMANIDADES

ARQUITETURA

Resultado prático da pesquisa feita pelos professores: dificuldade

na gestão logística de obras dentro de estrutura universitária

Repensando a habitação popular Projeto concebe espaços flexíveis, compatíveis com o modo de vida moderno uando se fala em moradia popular, imediatamente se imaginam casas minúsculas, anônimas, dispostas numa série monótona em algum terreno da periferia. A pesquisa Habitação Social; Concepção Arquitetõnica e Produção de Componentes em Madeira de Reflorestamento e em Terra Crua - coordenada por professores do Departamento de Arquitetura e Urbanismo

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da Escola de Engenharia de São Carlos, da Universidade de São Paulo, e do Departamento de Engenharia Civil da Universidade Federal de São Carlos - busca redefinir os critérios que orientam o projeto e a construção de casas de interesse social. O ponto de partida foi a constatação das mudanças na constituição do grupo familiar e no modo de vida contemporâneo, caracterizados pelo desenvolvimento do trabalho doméstico, pela mudança do perfil demo gráfico da população, por novas relações entre os membros da família e pela grande variedade de perfis familiares. A pesquisa questiona os espaços da habitação popular con-

vencional, pensada para a típica família nuclear, que nas últimas décadas tem perdido terreno para novas formas de organização doméstica. A reflexão sobre o espaço doméstico levou a uma concepção mais flexível deste, para se adaptar à conjuntura. A pesquisa propõe casas com grandes espaços, que possam ser integrados ou segmentados, a um custo equivalente ao da casa convencional. Realizada entre agosto de 1996 e julho de 2000, a pesquisa compreendeu o projeto e a construção de duas casas no campus da USP, em São Carlos. Contou com o apoio financeiro da FAPESP, por meio do programa de Auxílio a Jovens PesquisaPESQUISA FAPESP • AGOSTO DE 2001 • 77


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dores em Centros Emer~ espaço doméstico como gentes, que destinou R$ ~ preferir, adaptando-o às suas necessidades", explica 129 mil para a construção Tramontano. das casas e o pagamento O conjunto formado da maioria das bolsas, enpelo bloco servido, o bloquanto que o CNPq conco de serviços e a área cencedeu algumas bolsas de tral é um sistema espacial. iniciação científica. A eAs duas casas construídas quipe reuniu 12 professosão duas alternativas de res colaboradores, alunos agenciamento desse sistede graduação e de pósma, que apresenta diversas graduação, além de consultores externos. A coorpossibilidades de combinação. Tais variações imdenação foi do professor plicam também múltiplas Marcelo Tramontano, da conformações externas, eviprofessora Akemi Ino, ambos da USP - São Carlos, tando a uniformidade de um conjunto habitacional e do professor loshiaqui convencional, estendendo Shimbo, da UFSCar. ao aspecto exterior da casa O desenvolvimento do algo da especificidade de projeto se deu em torno de Vista de uma das casas do projeto: materiais de baixo custo seus ocupantes. cinco áreas de pesquisa: No bloco de serviços, as paredes concepção espacial, estruturas, es- com equipamentos de banheiro e são feitas por meio de duas técnicas. quadrias, cobertura e vedações. Ducozinha - e o chamado bloco serviA primeira é a taipa-de-mão, o paurante dois anos, foram feitos estudos do, sem equipamentos fixos, cujos a-pique das tradicionais construe produção experimental em oficinas espaços podem ser usados como sala e laboratórios sobre os materiais ções brasileiras, que foi revisto e de estar, quarto, oficina. Os dois blootimizado. A ossatura das paredes madeira de reflorestamento, terra cos estão ligados por uma área cenemprega painéis de pinus pré-fabricrua e palha, escolhidos por seu baitral, que tanto pode ser um espaço cados, em vez do bambu e dos gaxo custo. Após vários testes, os matede encontro e de circulação como riais foram sendo integrados a prolhos da técnica primitiva. Fixado à pode se incorporar a um dos dois estrutura principal da casa, o painel blocos. "Dessa área central se aprepostas tecnológicas para a produção é preenchido de terra crua misturados componentes das casas. O projeende toda a circulação da casa, se vai da com palha, obtida a partir de cato arquitetônico, a cargo de Tramona qualquer cômodo sem passar por pim coast-cross. A adição da palha tano, caminhou paralelamente. O nenhum outro. Ela tem pé-direito Grupo organizou workshops, usados evita que a parede trinque, como duplo numa casa e triplo na outra, e acontece com o pau-a-pique. Depara divulgar os resultados da pesé separada do exterior por um porquisa e funcionavam como canteiro pois da secagem da terra, aparecem tão, As pessoas que visitaram as casas fendas na junção entre as paredes e experimental de mão-de-obra. e responderam nosso questionário os pilares, que foram vedadas com A pesquisa enfrentou algumas atribuíram vários usos à área central: uma resina à base de óleo de mamodificuldades. "A principal foi a gesgaragem, vendinha, oficina, sala, vana, desenvolvida pelo Instituto de tão logística do canteiro de obras randa. O morador pode modular o Química de São Carlos, da USP. Os dentro de uma estrutura universitárevestimentos dessas paredes são de ria. Além disso, a mão-de-obra da OS PROJETOS argamassa de terra crua, pintada construção civil deprecia esses maHabitação Social: Concepção com tinta látex, garantindo um acateriais. Isso exigiu um acompanhaArquitetônica e Produção de Componentes em Madeira bamento de ótima qualidade. O cusmento muito mais intenso da obra. de Reflorestamento to do metro quadrado desse tipo de Mas acabamos formando duas pesMODALIDADE parede ficou em torno de R$ 27, soas durante esses quatro anos, que Programa de auxílio a jovens com mão-de-obra incluída. hoje constroem tudo que necessitapesquisadores mos", conta Tramontano. COORDENADOR Terra-palha - A outra técnica testada é AKEMI INO - UFSCar Bloco servido - As duas casas têm área a terra-palha, muito usada nos países INVESTIMENTOS total de 54 m- cada. Possuem dois esdo norte da Europa como vedação R$ 170.925,00 e US$ 19.000,00 ou isolamento termo acústico. Para paços principais: o bloco de serviços 78 • AGOSTO DE 2001 • PESQUISA FAPESP


chumbadas em fundações de concreto, permitindo que as casas sejam construídas em qualquer tipo de terreno. As telhas são feitas de resíduos de celulose prensados com betume. Toda a instalação elétrica e hidráulica é aparente, reduzindo custos. A mesma preocupação orienta a disposição da cozinha e do banheiro: agrupados lado a lado (unidade 002) ou sobrepostos (unidade 001), consegue-se reduzir drasticamente a metragem dos encanamentos. Nomads - ''A unidade

Fechamento com chapa de fibra de vidro ondulada: usada, em geral, por populares

adaptá-Ia às condições brasileiras, foi utilizado o capim coast-cross, adicionado a barro e água. Essa técnica é simples e permite a pré-fabricação de blocos ou de paredes monolíticas no próprio local da construção. Os blocos receberam um revestimento interno de argamassa de terra, posteriormente pintada, e tábuas na parte externa. A produção dos blocos é longa, exigindo cuidados na secagem do capim e no transporte. Seu custo é de R$ 45 por m', com mão-de-obra e acabamento incluídos. As paredes monolíticas são executadas mais rapidamente, e seu custo é de R$ 410m2• As paredes do bloco servido são de madeira, com uma ossatura de pinus, fechada internamente com lambris e externamente com tábuas. As peças estruturais em eucalipto foram tratadas pelo processo de autoclave, que impede o desenvolvimento de fungos. Várias possibilidades de isolamento térmico foram testadas nas paredes de madeira: colchão de ar, argila expandida, mantas de lã de vidro e placas de isopor. O rendimento e a durabilidade de cada uma está sendo medido e só poderá ser avaliado no longo prazo. Outro tipo de fechamento utilizado é a chapa de fibra de vidro ondu-

lada. Esse material é tradicionalmente usado por moradores de casas populares para cobrir boa parte da área não construída de seus lotes. Translúcida, a chapa cobre as áreas centrais das casas, garantindo uma generosa luminosidade natural. As esquadrias foram experimentadas em madeira de reflorestamento: eucalipto e pinus. A estrutura é feita de vigas e pilares de eucalipto e se apóia sobre esperas de metal,

Tramontano: acompanhamento

intenso

002 foi COllStruída em 1998. A partir das lições tiradas da construção, revimos o projeto da unidade 001, que foi levantada em 1999, e reformulamos algumas soluções da 002. Essa retroalimentação fazia parte do projeto", explica Tramontana. Após o final da pesquisa, a equipe se dividiu em dois grupos: o Nomads (Núcleo de Estudos sobre Habitação e Modos de Vida), da USP, coordenado por Tramontano, e o Abis, coordenado pela professora Ino e pelo professor Shimbo. O Nomads está mais voltado para projetos de arquitetura e o Abis tem um viés mais tecnológico. Os dois grupos continuam trabalhando nas casas: o Nomads estuda novas formas de evolução da distribuição interna e o Abis faz medições do isolamento térmico. Na opinião de Tramontano, o espaço doméstico deve ser pensado para o conjunto da população. "Por isso convidamos pessoas de todas as faixas de renda e de várias regiões para visitar as casas. A maioria aprovou os projetos. Os questionários nos permitiram saber detalhes sobre alguns aspectos interessantes." Divisórias móveis feitas de madeira foram aceitas pela maioria dos visitantes, mas a peça feita em chapa de zinco foi reprovada em massa. "O zinco tem conotação de precariedade. Já a madeira e a terra crua encontraram resistência só de visitantes que ganham de 12 a 20 salários mínimos, que só admitiriam os materiais em casa de campo ou praia", diz. • PESQUISA FAPESP . AGOSTO DE 2001 • 79


LIVROS

Diálogos com a brasilidade de Bastide Obra analisa o pensamento do francês que queria entender a alma nacional REGINALDO

PRANDI

sociólogo francês Roger Bastide (1898-1974) chegou ao Brasil em 1938.Veio para ensinar sociologia na Faculdade de Filosofia da então recém-fundada Universidade de São Paulo. Fazia parte da missão estrangeira que veio instalar o ensino profissional universitário de ciências básicas em nosso país. Ficou 16 anos. Conheceu e compreendeu o Brasil, escreveu e publicou muito, formou gente e fez escola, transformou-se num clássico. Autor de obra plural, que se abria para a sociologia e antropologia, crítica literária, estética e psicanálise, Bastide queria entender, sobretudo, como se constituía a "alma brasileira", como se formava a cultura do país com o encontro de diferentes fontes, como se interpenetravam as culturas formadoras, especialmente a africana. Com o tempo, a maior parte da obra de Bastide foi se esgotando nas livrarias e em certos períodos sua leitura foi se tornando mais restrita a grupos de,especialistas. Em 2001, dois estudos fundamentais de Bastide sobre as religiões afro-brasileiras foram postos novamente nas livrarias: a Companhia das Letras relançou O Candomblé da Bahia, em edição revista e ampliada, e a PalIas republicou seu estudo sobre o catimbó, incluído na coletânea Encantaria Brasileira. Aparece então Diálogos Brasileiros: Uma Aná~ lise da Obra de Roger Bastide, de Fernanda Arêas Peixoto, um livro sobre a obra bastidiana e sua inclusão, no domínio da interpretação da cultura nacional, nos quadros do pensamento social brasileiro, ao qual Roger Bastide contribuiu com sua obra de autor e com a formação, como professor da USP, de mais de uma geração de cientistas sociais que atuaram decisivamente na consolidação da sociologia como disciplina cultivada profissionalmente. De modo muito apropriado e inteligente, Fernanda Peixoto analisa a obra brasileira de Bastide

O

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Diálogos Brasileiros: Uma Análise da Obra de Roger Bastide

a partir da sua interlocução com o modernismo, da reflexão sobre as relações raciais e dos dilemas da modernização, procurando Fernanda Arêas entender o diálogo de BasPeixoto tide com autores fundamentais que trataram dessas temáticas. São Paulo, Edusp, Os diálogos acompanha224 páginas R$ 25,00 dos por Fernanda Peixoto, que destacam no cenário nacional as figuras de Mário de Andrade, Gilberto Freyre, Florestan Fernandes, traduzem a interlocução de Roger Bastide com três matrizes distintas: uma artístico-literária, uma sociológica de feição ensaística e outra também sociológica, só que de cunho acadêmico-universitário. Da análise dessas três interlocuções emerge um conjunto de temas que fundamenta a obra sociológica de Roger Bastide: o misticismo, a arte e a religião; o imaginário, o sonho e a psique; a cultura popular e os contatos culturais. A leitura deste livro de Fernanda Arêas Peixoto, que é uma versão aprimorada de sua tese de doutorado no Departamento de Antropologia da USP, nos ensina sobre Bastide e seu tempo, sobre a constituição da cultura e o pensamento social brasileiro de lá para cá, mostrando que as escolhas temáticas e metodológicas de Bastide continuam presentes e decisivas nas ciências sociais de hoje. De escrita precisa e leitura agradável, Diálogos Brasileiros oferece ao leitor a análise competente e vigorosa, e muito oportuna, de uma sociologia viva articulada às mais expressivas matrizes de reflexão da época sobre o Brasil e sua capacidade de mudança social e cultural, que busca desvendar o lugar ocupado, no desenho do presente, por tradições e heranças formadoras da nossa sociedade.

PRANDI é professor titular de Sociologia da USp, autor, entre outros livros, de Os candomblés de São

RECINALDO

Paulo e Mitologia dos orixás.


REVISTAS

LANÇAMENTOS

Memória

\tes)sen\\men\o

Memória e (re)sentimento

Economia e Sociedade

Editora da Unicamp Stella Bresciani (org.) 554 páginas / R$ 58,00

volume 15

Os textos que compõem esse livro resultaram de um colóquio realizado na Unicamp entre maio e junho de 2000, coordenado por Stella Bresciani e Claudine Harouche. O tema estudado é a complexa relação que se estabelece entre a História e a memória e de que formas lembrança e esquecimento se conectam. É justamente no ponto de contato entre ambos que surge o ressentimento, componente importante na relação entre os homens. Entre os textos, estão artigos de Pierre Ansart e Edgar Salvadori de Decca. O livro contou com apoio da FAPESP.

Sociedade e Estado em Transformação Editora Unesp L.c. Bresser Pereira, Jorge Wilheim, Lourdes Sola (organização) 451 páginas / R$ 38,00

Outra importante coletânea de artigos escritos para o seminário Reforma do Estado e Sociedade, realizado em 1998 pelo Conselho de Reforma do Estado e pelo Ministério da AdministraçãoFederal e Reforma do Estado. Em discussão, a relação entre Estado, em constante mundança dada a crise mundial e a globalização, e a sociedade, igualmente modificada pela nova era de informação.

Uma Biografia do Universo Editora Joerge Zahar Fred Adams e Grag Laughlin 292 páginas / R$ 35,00

Uma Biografia do Universo D.b>,'.o,' d,""""'".

O título ousado do livro não impediu seus autores, ambos

professores de respeitáveis U", universidades americanas, de dar F""'.'".""".,,",,,,," conta do recado e efetivamente documentar a biografia do universo, com direito a teorias sobre o futuro que o espera. Essa súmula, do big bang à desintegração final, traz os mecanismos essenciais da astro física e com a determinação das cinco eras do universo: a era primordial, com a vitória da matéria sobre a antimatéria; a era estelífera, a nossa, dominada pelo brilho das estrelas; e as futuras era dos buracos negros, em que a radiação, prevista por Hawking, será a única luz criada, e a era das trevas, em que o universo poderá se recriar.

A revista editada pelo Instituto de Economia da Unicamp traz em seu número mais recente os seguintes artigos: O Império Contra-Ataca: Notas sobre os Fundamentos da Atual 15 Dominação Norte-Americana, de Aloisio Teixeira; O Papel Desempenhado pelo BNDES e Diferentes Iniciativas de Expansão do Financiamento de Longo Prazo no Brasil dos Anos 90, de Daniela Prates, Marcos Antonio Macedo Cintra e Maria Cristina Penido de Freitas; O Endividamento dos Governos Estaduais nos Anos 90, de Francisco Luiz C. Lopreato; O Sistema de Crédito Internacional, de Claus Germer; entre outros.

Educação e Pesquisa

Educação e Pesquisa

2001 - volume 26

Publicada pela Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), a revista chega agora ao seu segundo ano, reunindo artigos de profissionais nacionais e estrangeiros na área. Entre os destaques desta edição: Educação, Ampliação da Cidadania e Participação, de Pedro Roberto Iacobi, O Senhor Diretor: Fragmentos de uma História de Atores e Práticas Escolares em Portugal, de Luis Miguel Carvalho; Psicologia Moral e Educação: para além de Crianças "Boazinhas", deLarry Nucci; Escola, Democracia e a Construção de Personalidades Morais, de Ulisses F. Araújo; entre outros.

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Arquivo em Imagens '.

2001 - número 5 Série Última Hora Artes

Um fruto da reunião entre o governo do Estado de São Paulo, a Editora Arquivo do Estado e a Edições Imprensa Oficial, a revista dedica da à memória do jornal Última Hora chega a seu quinto número, enfocando nesta edição a iconografia apresentada pelo veículo de imprensa, fundado em 1951 por Samuel Wainer, sobre o setor de artes. O período cobre os anosentre 1951 e 1971, o que resultava num acervo impressionante de 165 mil fotografias. Portanto, não foi nada fácil fazer a seleção final das imagens para esta revista. Sempre inusitadas e trazendo o artista em poses inesperadas. PESQUISA FAPESP . AGOSTO DE 2001 • 81


VASQS

TSKI

MATOU O CLONE

...

82

• AGOSTO DE 2001 • PESQUISA

FAPESP

E AGORA? ,

E ASSASSINATO ,

OU SUICIDIO?




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