Descobertas na selva

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FAPESP SUPLEMENTO ESPECIAL

CLONAGEM



30 Em Rondônia, pesquisadores avançam no estudo da malária e dos mecanismos de transmissão de doenças emergentes

CARTAS .......•.•.....••..•..... EDITORIAL MEMÓRIA ••..................... • POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA .•.•..•.•..•.•.... ESTRATÉGIA ...........•......... VOTORANTIM INVESTE EM INOVAÇÃO UM PERFIL DAS EMPRESAS BRASILEIRAS DE BIOTECNOLOGIA UM REFORÇO PARA A CTNBIO O IMPACTO DO SCIELO

4 5 6

8 8 16

12

19 22 24

Parceria entre FAPESP e Terremark vai ampliar serviços oferecidos pela Rede ANSP á comunidade

• CIÊNCIA ••..................• LABORATÓRIO NOVOS GENES DE EUCALIPTO PARA EVITAR A AFTOSA A MORTE DE BERNHARD GROSS RAIO DO SOL É DEZ VEZES MENOR ILHA DA ANTÁRTICA PERDE GELO ENTREVISTA: BOA NOTÍCIA PARA O BRASIL EM MEIO AMBIENTE .....

26 26 44 46 47

• TECNOLOGIA LINHA DE PRODUÇÃO TRÊS SOFTWARES INOVADORES LÍNGUA ELETRÔNICA DIFERENCIA TIPOS DE VINHO E DE ÁGUA MULTIPLICAÇÃO DE FLORES

60 60 64

• HUMANIDADES DOCUMENTOS DO DEOPS OLIVEIRA LIMA RESGATADO CULTURA EMPRESARIAL LIVROS ...•.................... LANÇAMENTOS ........•......... ARTE FINAL ..•.................

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Capa: Hélio de Almeida Fotos: Eduardo Cesar

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Dois tanques de provas, um virtual, da Poli-US~ e outro físico, da Coppe, vão trazer novos avanços para a exploração de petróleo em águas profundas e ultraprofundas

74 78

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Incor está desenvolvendo uma vacina contra a febre reumática, que começa com uma amigdalite e ataca o coração

Coleção completa de esculturas de Degas no Museu de Arte de São Paulo é objeto de estudo PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 3


CARTAS Laranja transgênica É com profundo pesar e até um certo choque que venho comunicar minha insatisfação com a reportagem Engenharia genética contra a Xyllela na revista Pesquisa FAPESP. Com relação ao desenvolvimento de laranjas transgênicas, a reportagem diz: "A primeira variedade de laranja doce geneticamente modificada, que abre caminho ..." A primeira variedade de laranja doce transgênica foi desenvolvida há mais de dez anos (Hidaka et al., 1990 - Ipn Breed. 40: 199-207) com a variedade Washington Navel. No mesmo texto, Pesquisa FAPESP afirma: "Beatriz Mendes... (Cena), e Francisco Alves Mourão Filho ..(Esalq) ... apresentaram a primeira variedade de laranja doce geneticamente modificada, obtida a partir de tecido adulto': A primeira laranja doce transgênica a partir de tecido maduro foi obtida por um grupo de pesquisa da Espanha (IVIA) com a variedade Pineapple (Cervera et al., 1998 - Transgenic Res. 7: 51-59). No Brasil, os primeiros resultados com plantas transgênicas foram obtidos pelo grupo de biotecnologia vegetal do Instituto Agronômico do Paraná (Iapar), do qual eu fazia parte até novembro do ano anterior. Esta pesquisa produziu não apenas uma laranja transgênica de tecido maduro, mas plantas contendo um peptídeo de ação antibacteriana. Uma matéria que foi amplamente coberta por diferentes veículos de comunicação, inclusive pela revista Pesquisa FAPESP. Os resultados foram apresentados no IV Encontro Latino Americano de Biotecnologia Vegetal (Kobayashi et al., 2001 - REDBIO programas e resumos p. 125). Informações adicionais também podem ser encontradas no último número da revista de divulgação Biotecnologia - Ciência & Desenvolvimento. ADILSON

KENJI KOBAYASHI

Embrapa Mandioca e Fruticultura Cruz das Almas, BA 4 • MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

Na reportagem Engenharia genética contra a Xylella (revista Pesquisa FAPESP 71), foi apresentada a informação de que os pesquisadores Beatriz Mendes e Francisco Mourão (Esalq) obtiveram ''A primeira variedade de laranja geneticamente modificada ..." e «... apresentaram a primeira variedade de laranja doce modificada, obtida a partir de tecido adulto". A primeira planta de laranja doce transgênica foi obtida no Japão com a variedade Washington Navel a partir de células em suspensão (Hidaka et al., Iapanese Breeding 40:199-207,1990). Já as primeiras plantas transformadas usando tecido maduro foram obtidas pelo grupo do pesquisador Leandro Pena, do IVIA, da Espanha, com a variedade Pineapple (Cervera et al., Transgenic Research 7:51-59, 1998), que inclusive patenteou o processo de transformação (US0061 03955A). No Brasil, nosso grupo de pesquisa (Adilson K. Kobayashi, João Carlos Bespalhok e Luiz Filipe P. Pereira) foi o primeiro a obter plantas trans-' gênicas de laranja utilizando uma metodologia inovadora e com maior , eficiência do que a descrita por Pena. Esta metodologia utiliza segmentos finos de tecido maduro de variedades adaptadas às condições brasileiras e foi utilizada para obter plantas transgênicas com maior resistência ao cancro cítrico. Já foi enviada para publicação na revista Plant CeU, Tissue and Organ Culture. LUIZ GONZAGA

ESTEVES VIElRA

Instituto Agronômico do Paraná Londrina, PR Resposta da pesquisadora Beatriz M.I. Mendes: Em nenhum momento nos apresentamos no congresso de Serra Negra como responsáveis pelo desenvolvimento da primeira variedade de laranja doce transgênica no mundo ou no Brasil, utilizando tecido jovem ou maduro como explanteso Temos conhecimento dos trabalhos apresentados na literatura, em

revistas científicas de corpo editorial, pelos grupos de pesquisa em biotecnologia de citros do Japão e da Espanha, e a utilização dos termos ''primeira variedade'; no texto da revista Pesquisa FAPESP, provavelmente se refere à primeira planta transgênica de citros dentro do Projeto Genoma Funcional da FAPESP No congresso de Serra Negra foram apresentados dados de transformação genética de laranja doce, utilizando tecido jovem, os quais foram submetidos e aceitos para publicação na revista Pesquisa Agropecuária Brasileira, e até onde temos conhecimento é o primeiro artigo científico, publicado no Brasil, tratando de transformação genética, com variedades brasileiras de citros. Com relação ao trabalho com tecido adulto, ele foi desenvolvido por recomendação do Steering Committee, do Projeto Genoma Funcional, pelo fato de os pesquisadores estarem encontrando dificuldades em reproduzir o protocolo apresentado na literatura pelo grupo de pesquisa liderado pelo dr. Pena, da Espanha. Assim, os dados apresentados no congresso foram obtidos seguindo um protocolo diferente do descrito pelo grupo da Espanha, com relação ao meio de cultura utilizado para o cultivo dos explantes e a temperatura de incubação dos explantes no período de co-cultivo. Não podemos comparar o protocolo descrito em nosso projeto de pesquisa com o descrito pelo grupo do lapar, já que temos conhecimento deste trabalho apenas por artigo de divulgação em jornal (Folha de São Paulo, 23/3,2001), na revista Pesquisa FAPESP (vol. 63, 2001) e do resumo do congresso REDBlO, os quais não fornecem detalhes da metodologia utilizada. BEATRIZ M.].

MENDES

Coordenadora do Projeto Piracicaba,SP Nota da Redação: De fato, pode não ter ficado claro que o texto se referia exclusivamente aos resultados do Projeto Genoma Funcional.


EDITORIAL

Um passo próprio da maturidade PESQUISA FAPESP É UMA.pUBLICAÇÃO M,ENSAL DA FUNDAÇAO DE AMPARO A PESQUISA DO ESTADO DE SAO PAULO PROF, DR, CARLOS HENRIQUE DE BRITO CRUZ PRESIDENTE

PROF, DR, PAULO EDUARDO DE ABREU MACHADO VICE-PRESIDENTE

CONSELHO SUPERIOR AD!LSON AVANSI DE ABREU ALAIN FLORENT STEMPFER CARLOS HENRIQUE DE BRITO CRUZ CARLOS VOGT FERNANDO VASCO L~A DO NASCIMENTO JOSÉ JOB~Õ~MD~NAN~m~ ARRUDA MARCOS MACARI NILSON DIAS VIEIRA JUNIOR PAULO EDUARDO DE ABREU MACHADO RICARDO RENZO BRENTANI VAHAN AGOPYAN CONSELHO TÉCNICO-ADMINISTRATIVO PROF, DR FRANCISCO ROMEU LAND! DIRETOR

PRESIDENTE

PROF, DR, JOAQUIM J, DE CAMARGO ENGLER DIRETOR ADMINISTRATIVO

PROF, DR, JOSÉ FERNANDO PEREZ DIRETOR CIENTíFICO

EQUIPE RESPONSÁVEL CONSELHO

EDITORIAL

PROF, DR, FRANCISCO ROM EU LANDI PROF, DR, JOAQUIM J, DE CAMARGO ENGLER PROF, DR, JOSÉ FERNANDO PEREZ EDITORA CHEFE

MARILUCE MOURA EDITORES

ADJUNTOS

MARIA DA GRAÇA MASCARENHAS NELDSON MARCOLIN EDITOR DE ARTE

HÉLIO DE ALMEIDA CARLOS FIJ2~S~~\I (CIÊNCIA) CLAUDIA IZIQUE (POLÍTICA C&Tl MARCOS DE OLIVEIRA mCNOLOGIA) EDITORES-ASSISTENTES

ADILSON AUGUSTO, DINORAH ERENO REPÓRTER

ESPECIAL

MARCOS PIVETTA CHEFE DE ARTE

TÂNIA MARIA DOS SANTOS ,

DIAGRAMAÇÃO

JOSE ROBERTO MEDDA, LUCIANA FACCHINI FOTÓGRAFOS

EDUARDO CESAR, MIGUEL BOYAYAN COLABORADORES

ALEXANDRE AGABITI FERNANDEZ, CARLOS HAAG MAR(i~~f~~I~~C~~~~~'R~~~~~I~I~OI~I{~~~SSIF TÂN~;~AJ:Qt~~!;::G~~~E~ET~~~iIRA WANDA JORGE, YURI VASCONCELOS PRÉ-IMPRESSÃO

GRAPHBOX-CARAN IMPRESSÃO

PROL EDITORA GRÁFICA TIRAGEM: 30,000 EXEMPLARES FAPESP RUA PIO XI, N° 1500, CEP 05468-901 ALTO DA LAPA - SÃO PAULO - SP TEL, (Q -lll 3838-4000 - FAX: (Q - 11) 3838-4181 SITE DA REVISTA PESQUISA FAPESP: http://www.revistapesquisa.fapesp.br cartas@trieste.fapesp.br

Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião da FAPESP É PROIBIDA A REPRODUÇÃO TOTAL OU PARCIAL DE TEXTOS E FOTOS SEM PRÉVIA AUTORIZAÇÃO

IfJAPESP SECRETARIA DA CIÊNCIA TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

GOVERNO

DO ESTADO

DE SÃO PAULO

sta edição de Pesquisa FAPESP marca o começo de uma nova etapa na vida desta revista de divulgação científica. De uma publicação de circulação dirigida aos pesquisadores do Estado de São Paulo - encontrem-se eles nas universidades, instituições de pesquisa ou empresas -, aos editores de ciência e tecnologia da mídia nacional e aos formuladores e gestores das políticas de ciência e tecnologia de todo o país, passamos agora à condição de uma revista de circulação ampla e aberta a todo leitor que se interesse por ciência e tecnologia, e especialmente pelo que se passa em seus domínios no Brasil. Uma revista acessível a todos que queiram acompanhar de forma sistemática os resultados, muitas vezesfascinantes, dos mais importantes projetos de pesquisa em curso em São Paulo e no país, em qualquer área do conhecimento, incluindo as ciências humanas; que desejem compreender seus impactos científicos, sociais e econômicos; que queiram conhecer os programas e as políticas estaduais e nacionais voltados para o desenvolvimento científico e tecnológico no país, e perceber tudo isso dentro de marcos referenciais internacionais, que aparecem nas notícias do exterior que também publicamos. Em síntese, Pesquisa FAPESP abre-se a todo leitor que queira saber a quantas anda realmente, neste país, o par Ciência & Tecnologia, componente estrutural das sociedades contemporâneas. Porque é isso que esta revista conta, a cada mês. Para viabilizar a abertura da circulação, aliás, reclamada por candidatos a leitores de todo o país, passamos da distribuição exclusivamente gratuita para um modelo misto, que inclui a venda de exemplares e de assinaturas da revista - que de resto é praxe em revistas de divulgação científica editadas por instituições.Os pesquisadores de São Paulo continuarão a receber gratuitamente' como sempre, seus exem-

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plares de Pesquisa FAPESP, porque a Fundação entende que oferecer, sem ônus para esses profissionais, informações relevantes sobre a produção de ciência e tecnologia faz parte de sua missão institucional de amparo à pesquisa neste Estado. Da mesma forma, os editores de C&T e os formuladores e gestores das políticas de ciência e tecnologia permanecerão na mala direta gratuita da revista. Porque a FAPESP entende, em relação aos primeiros, que por meio deles é que pode prestar contas, em larga escala, à opinião pública nacional, sobre o uso que faz da parcela de recursos dos contribuintes do Estado de São Paulo, que por preceito constitucional lhe cabe - em que projetos a aplica e com que resultados. E, em relação aos demais, entende que fazparte da função política da Fundação lhes oferecer sistematicamente informações que contribuam para o traçado de estratégias conjuntas de desenvolvimento científico e tecnológico nacional e para uma visão mais aberta, arrojada e integrada sobre as possibilidades do país nesse campo. Complementará o modelo de sustentação econômica de Pesquisa FAPESp, na nova etapa, a veiculação de anúncios publicitários, prática também usual nas revistas de divulgação científica editadas por instituições em todo o mundo. Para concluir: esta revista, que tem em sua origem um modesto boletim de quatro páginas, o Notícias FAPESP, cujo primeiro número foi publicado em agosto de 1995, e que quatro anos mais tarde, em outubro de 1999, transformou-se na Pesquisa FAPESP, alcançou o estágio de um projeto sólido, maduro, pronto para ser lançado a novos desafios. E maturidade com vigor criativo é traço de caráter especialmente caro à FAPESP neste ano em que ela completará 40 anos de atividades, sempre "realizando o futuro", como resume o slogan que quer marcar a data. No mais, boa leitura. PESQUISA FAPESp· MARÇO DE 2002·5




• POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

ESTRATÉGIAS • Ações mais eficazes contra a pobreza Dois milhões de pessoas morrem a cada ano vítimas de febre tifóide, cólera ou shigelose em sete países da Ásia - China, Índia, Indonésia, Bangladesh, Paquistão, Vietnã e Tailândia. Mas, agora, esses países não querem compartilhar apenas estatísticas trágicas. Eles estão se unindo na busca de soluções para o crônico problema de saúde pública, com o apoio de um programa chamado de Doenças dos Mais Empobrecidos (Domi). Com um financiamento de US$ 40 milhões da Fundação Bill e Melinda Gates, o Domi é o mais ambicioso projeto do Instituto Internacional de Vacinas (IVI), criado em 1997 pelo Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas. O objetivo é estimular a pesquisa, o treinamento e a assistência tecnológica para a produção de vacinas nos países em desenvolvimento. "Vacinas para febre tifóide e cólera estão disponíveis há 15 anos", disse o diretor do IVI Iohn Clemens, à revista Science (25 de janeiro). "Mas elas não têm sido usadas na maioria dos países em desenvolvimento", afirmou. Além da escassez de recursos, os cientistas precisam lutar contra a desinformação da população e das autoridades. Os frutos do trabalho já estão aparecendo. O Vietnã fornece à Indonésia tecnologia para produzir uma vacina oral de baixo custo contra cólera, e a China compartilha com a Índia e o Vietnã o conhecimento na fabricação de imunizante contra febre tifóide. • 8 • MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

Investimento no futuro

Nave vai ao espaço: foguete econômico só em 2025 A Nasa, a agência espacial americana, descobriu que, para economizar amanhã, às vezes é preciso gastar um pouco mais hoje. Mesmo depois de estourar os orçamentos da Estação Espacial Internacional, a agência quer desenvolver tecnologia para um foguete espacial de terceira geração - embora ainda não tenha um de segunda. Segundo a revista New Scientist (12 de janeiro), no futuro, a Nasa espera contar com uma máquina que reduza muito os custos da entrada em órbita, graças à capacida-

de de consumir oxigênio da atmosfera. Como queimará ar atmosférico em grande parte do vôo, a nova nave não necessitará carregar os pesados tanques de oxigênio líquido que reduzem a eficiência do lançamento. A Nasa já concedeu contratos de até US$ 16 milhões para que companhias desenvolvam o projeto. Neste ano, está investindo US$ 900 milhões em um foguete de segunda geração, que deverá pôr em órbita por volta de 2012. O novo modelo supereconômico só deverá voar lá por 2025. •

• Agência francesa na linha de tiro Rigidez, morosidade e até displicência no estabelecimento de estratégias de trabalho. As críticas pesadas são para o Centro Nacional de Pesquisa Científica da França (CNRS), e quem as faz é o Tribunal de Contas daquele país. Com US$ 2,2 bilhões de orçamento anual e 11.400 pesquisadores, o CNRS é alvo freqüente das avaliações do Tribunal de Contas. Mas o relatório do ano fiscal de 2001 é particularmente duro. Os auditores criticaram a agência por falhar no controle das atividades de seus vários laboratórios e por dar pouco valor a iniciativas de pesquisa que poderiam levar a aplicações comerciais. A diretora-geral do CNRS, Genevieve Berger, refuta as acusações. "Ter uma visão estratégica não significa sufocar os pesquisadores", diz. Anne-Marie Duprat, do Centro de Desenvolvimento Biológico de Toulouse, concorda: "Os laboratórios precisam ter uma certa liberdade. E o Tribunal de Contas precisa entender que o CNRS não pode funcionar como um posto dos correios': Para Genevieve, a melhor prova da eficácia do CNRS está nas publicações científicas: mais de 70% dos papers publicados na França têm como autores ou co-autores pesquisadores da casa. •

• Combate ao terrorismo A ameaça do bioterrorismo chegou ao Congresso norteamericano e está pesando nas contas para o orçamento de


dos geneticistas que solicitaram informações adicionais sobre estudos já publicados receberam pelo menos uma negativa nos últimos três anos. Curiosamente, apenas 12% dos geneticistas entrevistados admitiram ter negado alguma informação. Entre as justificativas apresentadas, a mais citada - por 80% dos sonegadores - foi a dificuldade para reunir as informações solicitadas pelo colega. Como resultado da falta de colaboração, 28% dos geneticistas foram incapazes de confirmar estudos publicados, 24% tiveram que atrasar a publicação de seus próprios trabalhos e 21% acabaram por abandonar a linha inicial de pesquisa. O estudo foi coordenado por Eric Campbell, do Hospital Geral de Massachusetts e Faculdade de Medicina de Harvard, que fez o trabalho em julho de 2000 com 1.240 geneticistas. •

Dinheiro contra o bioterrorismo Quantia Categoria

Proposta

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Pesquisa básica

Quatro a sete novos centros de pesquisa, genômica de patógenos e proteômica

Novas vacinas e drogas

Testes com drogas, diagnósticos, modelos animais

Estudos clínicos

Testes com a vacina contra variola

Instalações para pesquisa

Centros de biosegurança niveis 3 e 4 em três câmpus do NIH e novos centros independentes

Total

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1.473

2003, de acordo com a revista Science (10 de fevereiro). Por enquanto, a balança pende a favor do Instituto Nacional de Saúde (NIH). O presidente George W. Bush vai propor um adicional de US$ 3,7 bilhões para os cofres do instituto, o que representa um aumento recorde de 16%. Verba para a saúde era mesmo uma promessa de campanha do presidente, mas nem todos os pesquisadores do NIH podem comemorar: mais da metade dos recursos iria para o combate ao bioterrorismo (US$ 1,473 bilhão) e para as pesquisas sobre câncer, às quais Bush também havia prometido uma atenção especial. O grande beneficiário mesmo seria o Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas (NWD), que receberia 95% de todos os dólares destinados a combater o bioterrorismo, segundo seu diretor Anthony Fauci. Os projetos incluiriam pesquisa básica, como o seqüenciamento do genoma de agentes do bioterrorismo, assim como a produção de vacinas e a construção de laboratórios especiais para pesquisa de patógenos de alto risco. Resta saber se o Congresso será tão generoso - ou preocupado - quanto Bush .•

• Segredos guardados a sete chaves O conhecimento científico é construí do por meio de experimentos, cujos resultados possam ser reproduzidos por vários cientistas, até que se elabore uma teoria. É isso mesmo? Parece que esse princípio não se aplica a um significativo grupo de geneticistas norte-americanos. Um estudo publicado no [ournal of the American Association (vo1287, número 4, 23/30 janeiro de 2002) revela que 47%

• Falta médico nos Estados Unidos Sempre se acreditou que os Estados Unidos formavam médicos em demasia. Agora,

Porque eles dizem "não" [DifiCUldade para reunir material ou informação Necessidade de proteger estudantes bolsistas e ,LP.Ós-doutorandos

I

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Necessidade de proteger direito de publicação Custo do fornecimento de material ou transferência de informa ões

rrRisco de não haver (illciprocidade no futuro

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Necessidade de honrar compromissos com o atrocinador do trabalho Necessidade de proteger a patente

~ Necessidade de proteger o I valor comercial de resultados I

Fonte: Journal of the American Medical Association

porém, mudanças econômicas e demográficas apontam para uma iminente escassez desses profissionais. A informação surpreendente vem de um estudo realizado por uma equipe de pesquisadores do Instituto de Política Médica da Faculdade de Medicina de Wisconsin e da Universidade Temple. Segundo o trabalho, publicado na edição de janeiro-fevereiro de 2002 da revista Health Aftairs, os Estados Unidos têm menos médicos, proporcionalmente, do que a maio-

O

20

40

60

80

100

ria dos países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico. E essa carência tende a aumentar nas próximas décadas. Levando em conta o número de faculdades de medicina, a quantidade de médicos estrangeiros e a progressiva substituição de enfermeiros, auxiliares de enfermagem e parteiras por médicos, os autores do estudo publicado estimam que os Estados Unidos terão falta de 50 mil profissionais em 2010. Se essa tendência continuar, a escassez de médicos aumentará para 200 mil em 2020, mais do que 20% da demanda total. • PESQUISA FAPESP . MARÇO DE 2002 • 9


Como eliminar a dengue A atual epidemia de dengue, que cresce descontroladamente, poderia ser combatida com muito menos dinheiro. Apenas uma campanha educativa constante, sem as interrupções tão comuns no setor, seria mais eficiente. As campanhas teriam de ser feitas por equipes especializadas em contato direto com a população para orientar sobre a forma de evitar a propagação da doença. O estudo, publicado na revista Optimal Control Applications and Methods (vol. 22, edição 2, 2001), foi realizado pelo matemático Marco Antônio Leonel Caetano, do Instituto de Geociências e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista (Rio Claro), e por Takashi Yoneyama, da Divisão de Engenharia Eletrônica do Instituto de Tecnológico da Aeronáutica (ITA). Eles utilizaram modelos dinâmicos matemáticos e simulações no computador para chegar a essa conclusão. •

• A volta da vacina contra varíola Os atentados terroristas contra os Estados Unidos continuam trazendo conseqüências para o Brasil. O governo brasileiro vai retomar a produção da vacina contra varíola este ano. A razão é o medo de que o bioterrorismo venha a provocar uma epidemia mundial da doença, erradicada desde 1980 em todo o mundo. A produção brasileira deverá ocorrer já

uso até meados do segundo semestre deste ano e 30 milhões de doses do concentrado viral, que pode ser transformado em vacina rapidamente. De eficácia comprovada, o imunizante será o mesmo usado até a década de 1970. A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) foi encarregada da produção. A varíola é uma doença infectocontagiosa de fácil disseminação causada pelo Orthopoxvírus variolae, um vírus altamente resistente a variações de temperatura. •

• Rede para decifrar proteínas

neste começo de ano - Brasil e Estados Unidos serão os únicos países a fabricar o

imunizante. O objetivo é ter em estoque cerca de 3 milhões de doses prontas para

Vacinação contra varíola em 1966: epidemia poderá voltar

10 • MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

As proteínas são, definitivamente, a bola da vez. O Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNSL), ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia, quer ampliar a competência do país em estruturas de proteínas e recebe até o dia 31 de março projeto de grupos interessados em integrar a Rede Nacional de Biologia Molecular Estrutural. Inicialmente, serão escolhidos até dez grupos de instituições acadêmicas ou de institutos de pesquisa. Por quatro anos, eles receberão financiamento para aquisição de insumos necessários à pesquisa, ao treinamento e acesso à infra-estrutura do LNLS e do Centro Nacional de Ressonância Magnética Nuclear de Macromoléculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que atuará em cooperação com o laboratório. Elucidar a estrutura de uma proteína é importante para entender a função que ela tem no organismo. Os interessados podem acessar o site www.lnls.brv rio qual há mais informações. •

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Ciência na web Envie sua sugestão de site científico para cienwebêtrfestê.tapesp.br

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www.cetacea.org

www.ifi.unicamp.br/-knobel/radar/newspro/

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Uma pequena enciclopédia com informações e fotos com a maioria dos tipos de baleia e golfinhos

Seção Radar, da revista eletrônica ComCiência, com artigos comentando os vários aspectos da ciência

Um sistema de busca feito para pesquisas específicas sobre o genoma da mosca Drosophila melanogaster

• Projetos em compasso de espera

o

Congresso Nacional tem 264 projetos de lei com temas relacionados ao desenvolvimento científico e tecnológico em tramitação. De acordo com a assessoria parlamentar do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), desses, 56 são considerados importantes sob a ótica do governo federal. E oito deles foram incluídos como prioritários dentro da agenda legislativa do Palácio do Planalto para este ano. O texto do acordo entre Brasil e Estados Unidos sobre salvaguardas tecnológicas para utilização do Centro de Lançamento de Alcântara é um deles. A partir deste mês, também o texto da Lei de Inovação Tecnológica deverá ser considerado prioritário pelo Planalto. No ano passado, foram aprovadas e transformadas em lei 26 matérias de interesse do MCT. •

• O acordo Brasil e Rússia Matemática, nanotecnologia, energia nuclear e novos materiais são algumas das áreas

em que pesquisadores brasileiros e russos trabalharão em conjunto já a partir deste ano. O acordo foi selado durante a visita do presidente Fernando Henrique Cardoso à Rússia em janeiro deste ano. O presidente da Agência Espacial, Yuri Koptev, demonstrou interesse em lançar foguetes russos do Centro de Lançamento de Alcântara, no Brasil. Também o Conselho Nacional de Desenvolvimento Cie~tífico e Tecnológico (CNPq) deverá definir com a

Academia Russa de Ciências as áreas prioritárias para desenvolvimento de projetos tecnológicos e intercâmbio de pesquisadores. •

• Presidente destaca setor de C&T O crescimento do setor de ciência é tecnologia foi um dos destaques do discurso que o presidente Fernando Henrique Cardoso fez no dia 6 de fevereiro ao comentar os sete anos de seu governo. Ao falar sobre o desenvolvimento industrial, o presidente lembrou também o desenvolvimento humano e a importância das bolsas e dos 14 fundos setoriais criados recentemente, que proporcionarão R$ 1 bilhão livres para a pesquisa, por ano. Fernando Henrique disse acreditar em tempos mais fartos para a ciência brasileira. "Assim como existe, em São Paulo, a FAPESP, que tem recursos, até hoje, sobrantes, espero que, no CNPq, venhamos a ter também recursos sobrando porque eles têm que ser bem usados", afirmou. Outros fatos que demonstram a força

da pesquisa é o número de doutores formados por ano no Brasil, 6.300, e a quantidade de artigos publicados em revistas especializadas. "No tempo em que alguns mais velhos, como eu, faziam doutoramento, isso saía no jornal, com fotografia e tudo." Para o presidente, o país está formando "uma base técnica-científica, que é a condição necessária para a sociedade de informação". •

• Publicações estatais estão no Publishop O Publishop, lugar para consulta e venda das publicações mais importantes e recentes dos órgãos públicos estaduais de São Paulo, conta agora com 90 parceiros. Ele pode ser acessado no endereço www.seade.gov.br/publishop, que permite pesquisa por título, tema, autor, órgão editor, coleção e secretaria, além de possibilitar a compra online das publicações. Hoje há 3.500 títulos entre livros, vídeos, CDs-ROM, mapas, disquetes e cartões-postais distribuídos por 40 temas. Mais informações podem ser obtidas pelo tel. (lI) 3313-5777. •

PESQUISA FAPESP . MARÇO DE 2002 • 11


I

POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLOGICA COOPERAÇÃO

Parcerias estratég icas Acordo entre FAPESP e Terremark vai melhorar ponto de troca de tráfego na Internet, serviço até agora prestado pela Rede ANSP à comunidade

A

:APESPassinou termo de coope-

ração técnica com a Terremark

Latin America (Brazil) Ltda., transferindo à empresa a tarefa de operar, manter e comercializar o Ponto de Troca de Tráfego (PTT), serviço até então operado pela Rede :ANSP (Academic Network at São Paulo). O PTT é um ponto neutro de interconexão na Internet onde provedores de acesso e concessionárias de telecomunicações - entre eles DO L, IG, Terra, :AT&T L:A,Telefônica, Diveo - trocam diretamente tráfego de clientes comuns, sem a intermediação da Embratel. :Aparceria com a Terremark permitirá à F:APESP beneficiar-se de todos os investimentos em tecnologia da informação que a empresa fará na expansão do PTT e ainda garantirá o acesso da comunidade acadêmica paulista a redes norte-americanas, inclusive à Internet 2. Também criará condições

12 . MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

para a expansão do programa especial Tecnologia da Informação no Desenvolvimento da Internet Avançada (Tidia). '':A Rede :ANSP está madura e pronta para se tornar uma base de apoio infra-estrutural para as universidades e os institutos de pesquisas, trazendo ainda mais benefícios à comunidade acadêmica", diz José Fernando Perez, diretor científico da F:APESP. Troca de tráfego " :A Rede :ANSP foi criada como um programa especial da F:APESP em 1989. Atualmente, é um dos principais pontos de conexão na Internet do Brasil com o exterior e responsável pela interligação das redes acadêmicas universitárias, dos institutos e centros de pesquisa paulistas. :A partir de 1998, a :ANSP passou a apostar em novas tecnologias para melhorar a qualidade de acesso da comunidade à Internet, até então muito lenta e pouco eficiente. Implementou


um PTT conectando provedores e concessionárias de telecomunicações, com o objetivo de acelerar a troca de tráfego, criando uma espécie de atalho entre backbones (conexão de várias redes locais). "Foi o primeiro PTT do Brasil': lembra Hartmut Richard Glaser, diretor da Rede ANSP. Com um roteador doado pela 3Com, a Rede ANSP montou, naquela época, um ponto neutro de interconexão na Internet onde a própria ANSP e mais 26 clientes de grande porte passaram a trocar tráfego diretamente. "Todos os clientes ligados a essas empresas e instituições, assim como as universidades paulistas, não precisam mais da Embratel para trocar tráfego': explica Glaser. Além de acelerar a troca de informações na

rede, o PTT também reduziu os custos de conexão, já que os valores cobrados pela Embratel incluem o preço de uma porta de Internet. "Hoje, a ANSP e seus clientes pagam apenas pelo enlaceque as interligaao PTT,em lugar de pagar uma porta de Internet. E uma porta de 2 megabits por segundo (Mbps) custa mais ou menos R$ 15 mil. Ao usar o ponto de troca de tráfego, dois provedores passam a dividir entre si a manutenção do nó e pagariam por um enlace comum de 2 Mbps algo em torno de R$ 5 mil': exemplifica Glaser. O PTT da Rede ANSP funciona no terceiro andar do prédio da FAPESP, dividindo espaço com o Centro de Processamento de Dados (CPD) da Fundação e o Registro de Domínio na Internet. Ali, cada cliente mantém seus próprios equipamentos - cabo de fibras

ópticas, servidores, roteadores, modens, etc. -, compartilhando o mesmo espaço, serviços e custos (energia elétrica, ar-condicionado, serviços técnicos, entre outros). São clientes da Rede ANSP, as seguintes empresas: Agência Estado, Brasil Telecom, .comDominio, COMSAT, Diveo, Global One (Equant), Hexxa, IG, Impsat, KDD, Netstream (AT&T LA), ORNP, UOL, Unisys, Via-Networks (Dialdata), Intelig, NTT do Brasil, Metrored, Telefônica, CTBC, Terra, IFX, Genuity, Compugraf, Telemar, Pegasus. A falta de espaço, no entanto, limita a expansão do PTT que hoje, apesar do aumento da demanda, opera no limite de sua capacidade. E a FAPESP não tinha plano de expandi-lo. "Esse é

tin America Ltda., subsidiária da Terremark Worldwide Inc., empresa responsável pela operação do Network Access Point (NAP) das Américas, instalado em Miami, na Flórida. Um NAP é um grande terminal de prestação de serviços para provedores, concessionárias de telecomunicações e grandes clientes que, entre suas funcionalidades, inclui um PTT semelhante ao da Rede ANSP. O interesse da Terremark pelo PTT da ANSP se justifica: a empresa se prepara para implantar um NAP no Brasil e vai investir US$ 40 milhões, de acordo com o seu presidente e Chief Executive Officer (CEO), [airo Klepacz, na instalação desse serviço. No Brasil, o NAP da Terremark con-

um investimento de iniciativa privada, que a FAPESP não poderia fazer': explica Perez.

tará, numa primeira fase, com investimentos de US$ 15 milhões, que incluem desde a infra-estrutura de cabos de fibras ópticas até a construção de um prédio com 15 mil metros de piso, no prazo de um ano, que abrigará comutadores, roteadores, data centers, entre outros serviços oferecidos aos futuros clientes. A expectativa da empresa é que os clientes do PTT da Rede ANSP migrem para o NAP, beneficiando-se dos demais serviços prestados pela empresa.

Melhor conexão - O crescimento do tráfego da Internet no Brasil, a qualidade do acesso do PTT da ANSP e, sobretudo, a sua condição de neutralidade - já que, por estar ligado à FAPESP, o serviço não tem vínculos ou representa interesse de nenhum provedor ou empresa de comunicação atraíram a atenção da Terremark La-

PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 13

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Neutralidade - Para a Terremark, a parceria com a FAPESP é estratégica, já que garante a neutralidade exigida nesse tipo de serviço. "A Fundação será avalista permanente da imparcialidade': diz Klepacz. Para a FAPESP, a transferência da operação do PTT para a Terremark vai ampliar a capacidade de operação da Rede ANSP e trazer benefícios à comunidade científica, inclusive com redução de custos da ordem de US$ 120 mil mensais, gastos na manutenção desse serviço. "Será uma ótima oportunidade para melhorar a qualidade de um serviço prestado à comunidade científica, sem onerar a Fundação e ainda trazendo para São Paulo investi-

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rante os cinco anos seguintes e 1% durante os últimos dez anos. O prazo de participação poderá ser prorrogado por um período adicional de mais dez anos, durante o qual a Fundação contará, trimestralmente, com 1% da receita dos serviços prestados pela empresa. A Terremark iniciará, em breve, a construção do prédio que vai abrigar o NAP do Brasil. De acordo com Klepacz, o prédio estará pronto dentro de mais ou menos 12 meses. Até lá, o PTT continuará a ser operado nas instalações da FAPESP, co-gerenciado pela Terremark e a ANSP. A Terremark será responsável por todos os custos que excederem os gastos atuais da FAPESP. Está previsto também que, nos

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mentos internacionais ri.úma· area tão estratégica como a de Tecnologia da Informação", diz Carlos Henrique de Brito Cruz, presidente da FAPESP. A parceria com a Terremark representará, ainda, um reforço no orçamento, já que a Fundação terá participação na receita do NAP do Brasil. O termo de cooperação técnico-científica, assinado entre as partes no dia 28 de fevereiro, com validade de 20 anos, prevê que a FAPESP terá participação de 6% nas receitas decorrentes dos serviços prestados pelo NAP do Brasil por um período de cinco anos, 5% du14 • MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

primeiros seis meses de operação do novo PTT nas instalações da FAPESP, toda a renda auferida será da Fundação. Após esse período, a Terremark assumirá o pagamento de salários, encargos sociais e previdenciários da equipe da rede. A FAPESP está autorizada, quando julgar necessário, a fazer a análise contábil dos livros e documentos da Terremark, a fim de verificar a procedência dos valores para efeito dos cálculos. Quando as instalações do NAP do Brasil estiverem prontas, a empresa se compromete a fornecer gratuitamente à FAPESP espaço para dez

estações que abrigarão técnicos e funcionários da Rede ANSP. A parceria, já aprovada pelo Conselho Superior da FAPESP, foi avaliada por especialistas que analisaram os dados da empresa e os termos do acordo e obteve parecer favorável da Fundação Getúlio Vargas (FGV). "Temos de fazer um bom negócio para a comunidade científica. Não podemos arriscar': afirma Perez.

Internet 2 - Uma das exigências do acordo de cooperação técnica é que a Terremark adote novas tecnologias de telecomunicações e Internet, elevando o PTT da Rede ANSP à condição de Primeira Linha (Tier 1) - categoria

atribuída a NAPs que reúnem grandes clientes e com grande capacidade de troca de tráfego. Essas inovações trarão, evidentemente, enormes benefícios para os clientes da ANSP e para a comunidade acadêmica. Mas, além disso, já está acertado que a Terremark vai oferecer à FAPESP pontos de conexão e eletricidade no NAP das Américas, em Miami, o que terá grande repercussão no desenvolvimento das pesquisas em São Paulo. Isso porque o NAP das Américas abriga a American Path (Ampath), uma rede virtual mantida pela Florida University em colaboração com a Global Crossing, que conecta pesquisadores de dez universidades da América do Sul, América Central, México e Caribe. A Ampath é uma porta de acesso para a Internet 2, mantida por um consórcio que reúne


180 universidades e 45 empresas norte-americanas, o University Consorcio for Advanced Internet Development (Ucaid). O acesso à Internet 2 é estratégico para o desenvolvimento das pesquisas no país, já que essa rede de alta velocidade tem por objetivo ampliar a capacidade de troca de dados e informações na comunidade de pesquisadores e buscar novas aplicações para a Internet. Brasil já tem um link com a Ampath no Rio de Janeiro, por meio da Rede Nacional de Pesquisa (RNP), mantida pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). A Rede ANSP também solicitou e já obteve autorização para link com a Ampath, fato ainda não

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consumado. As universidades e os institutos paulistas estão igualmente credenciados, desde o início do ano passado, para acessar a Internet 2. Nesse caso, o passaporte para o ingresso foram os projetos Biota/FAPESP e o Genoma. O acesso a essas redes, no entanto, depende de acordos para utilização de conexões físicas, o que inclui cabos submarinos. A FAPESP já iniciou negociação com a Global Crossing Ltda - fornecedora de serviços em banda larga e proprietária dos cabo submarino -, para usar sua rede de fibra óptica. A parceria agora formalizada com a Terremark, garantindo o acesso ao NAP das Américas, vai levar a ANSP mais perto da Internet 2. O programa especial Tecnologia da Informação no Desenvolvimento

da Internet Avançada (Tidia), da FAPESP - que tem como objetivo transformar a Internet em objeto de pesquisa -, também será beneficiado pelo acordo de cooperação fechado entre FAPESPe Terremark. "Os pesquisadores terão acesso ao PTT e a uma tecnologia mais avançada do que temos hoje", comemora Hugo Luis Fragnito, do Instituto de Física Gleb Wataghin, da Universidade Estadual de Campinas, e um dos coordenadores do Tidia. O acordo, ele prevê, vai permitir que boa parte dos projetos que integram o programa seja testada em campo. E exemplifica: "Um dos gargalos para o desenvolvimento da Internet está em desenvolver uma tecnologia capaz de chavear, de forma eficiente e barata, o tráfego de uma fibra de uma rede lógica para outra. E a solução para isso

York, Washington, D.e., Chicago e São Francisco - durante o período de transição da rede financiada pelo governo para as redes de operação comercial. Os quatro pontos de conexão, no entanto, passaram a ser operados por empresas com interesses em provedores que controlavam preços. "Surgiu então a idéia de criar um consórcio neutro no sul da Flórida, formado por cem membros, entre eles AT&T, Global Crossing e Sprint, para atender clientes com a mesma grandeza operacional", conta Klepacz. O NAP das Américas, implementado em parceria com a Telcordia, está instalado no Technology Center of the Americas (Tecota), um prédio blindado e à prova de desastres, com 85 mil metros quadrados de área, ao

tem de ser testada na rede." O link com a Ampath, continua, também deverá alavancar o programa, já que a Florida University mantém linhas de pesquisa semelhantes.

qual estão conectados, por meio de cabos de fibras ópticas, 56 grandes clientes que trocam um tráfego de algo em torno de 120 milhões de pacotes por segundo. Esse volume de operações e a capacidade de troca de tráfego colocam o NAP das Américas entre os cinco classificados na categoria Tier-l. O serviço tem, ainda, 100% de garantia de energia elétrica e, segundo Klepacz, é o único "falha zero" em toda a América. A Terremark aposta que o Brasil será um excelente mercado para a expansão dessa conectividade em massa, já que ela é pré-condição para a expansão do sistema bancário e redes de telecomunicações, por exemplo, além de criar condições para a implementação da telemedicina, teleducação, TV digital, entre outras. •

Rede comercial - Existem pelo menos 200 NAPs em operação nos Estados Unidos. Um NAP pode ser definido como um ambiente neutro, de alta tecnologia, onde provedores de acesso à Internet e empresas de telecomunicações, ainda que na condição de concorrentes, trocam tráfego, armazenam dados de clientes e guardam informações, entre outras funcionalidades, com segurança e de forma compartilhada. Os primeiros quatro NAPs foram criados pela National Science Foundation (NSF) na costa leste dos Estados Unidos - Nova

PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 15


• POLÍTICA CIENTÍFICA

E TECNOLÓGICA

CAPITAL

DE RISCO

Garim ando Votorantim Ventures investe em empresas de biotecnologia


Grupo Votorantim, o maior conglomerado industrial brasileiro, com faturamento anual de US$ 4 bilhões, está investindo US$ 300 milhões em negócios de alta tecnologia. Há dois anos, o grupo criou um fundo de capital de risco, o Votorantim Ventures, por meio do qual já participa de empresas nas áreas de telecomunicações e comércio eletrônico, como Optiglobe, .comDominio, Telefutura, Quadrem e Estrutura.net. As atenções se voltam agora para projetos emergentes no setor de biotecnologia que, em sua grande maioria, estão sendo gestados nos laboratórios das universidades. Nos próximos dias, o Grupo vai divulgar uma

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genético das bactérias Xylella fastidiosa e Xanthomonas citri e viveu, ele próprio, a experiência de empreendedor quando criou, em 2000, com recursos de investidores privados, a .comDominio, hoje o terceiro data center do país, depois da Diveo e da Optiglobe, maior que o da Embratel. Reinach percorre, desde dezembro, universidades e institutos de pesquisa para, primeiro, explicar o que é capital de risco e, depois, garimpar negócios. "O meu mandato é o de olhar na universidade, o que é uma tarefa simples porque falamos a mesma língua", resume. Ele não tem dúvidas de que ali existe um celeiro de boas idéias. "Há 25 anos, agências como a FAPESP e o Conselho Nacional de De-

bons lista de propostas - selecionadas entre 50 - em cujo futuro quer apostar valores que variam entre US$ 50 mil e US$ 50 milhões. Trata-se, sem sombra de dúvidas,' de uma aposta arriscada. Nos Estados Unidos, por exemplo, as estatísticas dão conta de que nove entre dez empresas emergentes investidas de capital de risco não vingam. A identificação e seleção dos bons projetos, ainda que por si só não garantam o sucesso do investimento, são um passo fundamental. A palavra de ordem, portanto, é prospectar, cuidadosa e criteriosamente, os projetos desenvolvidos na academia para descobrir aqueles que têm potencial de mercado. Para essa tarefa, a Votorantim contratou Fernando Reinach. Professor e pesquisador do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP), Reinach foi assessor da FAPESP,coordenou os projetos de seqüenciamento

senvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) investem, com sucesso, no desenvolvimento da pesquisa. Mas dá para contar nos dedos o número de empresas geradas nas universidades." E por que razão os bons projetos não se traduzem em negócios? Ele responde: "É porque falta no Brasil o capital de risco". Empreendedorismo . Mas, além de recursos, também faltam aos pesquisadores informações sobre o que é, de fato, essa modalidade de investimento. O capital de risco, ou venture capital; é uma espécie de financiamento a longo prazo - sustentado por uma participação societária do investidor -, recuperado após o desenvolvimento da empresa por meio de oferta de ações no mercado ou venda total ou parcial do empreendimento. Nos Estados Unidos, ele opera desde a década de 40. Foi o capital de risco que permi-

tiu, por exemplo, a criação de empresas como Microsoft, Intel, HP, apenas para citar casos mais recentes. "O capital de risco opera muito perto da universidade. Alavanca a criação de empresas pequenas, com não mais de dez pessoas, onde o pesquisador entra com a idéia e o capital de risco com o dinheiro': explica. No Brasil, o capital de risco é um investimento relativamente recente. Foram esses recursos que alavancaram o desenvolvimento de empresas de Internet, a partir de 1999."Quando a bolha da Internet explodiu, sobraram a idéia do empreendedorismo e os fundos de capital de risco, que, desta vez, estão à cata de investimentos de longo prazo': afirma Reinach. Há fortes sinais de que esses fundos que apostaram nas pontocom se voltam agora para apoiar empresas emergentes no setor de biotecnologia. Essa mudança de direção, aliás, fecha o que Reinach chama de "círculo virtuoso tecnológico": o Governo investe a fundo perdido em pesquisa - como no caso do Projeto de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE) da FAPESP, por exemplo -, alavanca um invento e o capital de risco financia o estabelecimento de uma empresa que, bem-sucedida, vai pagar impostos ao governo. Participação no capital· É na condição de fundo de risco que o Votorantim Ventures vai injetar dinheiro em boas idéias, por meio da compra de sociedade. "Podemos participar com 5% ou até 90% do capital da futura empresa': adianta o pesquisador. Ele acredita que o fundo possa realizar uma média de dez investimentos por ano. De acordo com Paulo Henrique de Oliveira Santos, chief executive officer (CEO) da Votorantim Ventures, a estratégia é apostar num maior número de projetos menores. Mas existem alguns pressupostos para consumar essa associação. O primeiro é que à boa idéia corresponda um bom mercado. Um saca-rolhas eletrônico, produzido a um custo unitário de US$ 5 mil, pode ser uma "superdescoberta", mas, certamente, o taPESQUISA FAPESP . MARÇO DE 2002 • 17


co para bancar um investimento de US$ 50 milhões': lembra. A maior parte dos recursos veio do banco norte-americano JP Morgan, desde o início o maior acionista da empresa. O Votorantim Venture também participou do empreendimento. "Sempre tivemos menos da metade da participação", ele relata. "Se não desse certo, eles perdiam dinheiro e nós teríamos colocado a carreira em risco, inutilmente." O negócio deu certo e a .comDominio é um empresa profissionalizada. "Continuamos acionistas. Somos donos, mas não somos mais funcionários:' A condição de empreendedor não exige que o pesquisador se afaste da universidade. "É de interesse da empresa que o vínculo continue. Estamos montando projetos de forma que eles não precisem se afastar totalmente", afirma. Reinach ressalta, no entanto, que tudo depende da estrutura e da legislação de cada universidade. Ele próprio tem planos de, no próximo semestre, retomar suas aulas no Instituto de Química. "Eu não quero deixar a universidade': •

manho do mercado não justifica nenhum investimento, exemplifica Reinach."Contamos com um grupo de analistas que vai avaliar o projeto e, junto com o pesquisador, elaborar um plano de negócio", diz. O segundo pressuposto é chegar a um acordo quanto ao percentual de participação do investidor na composição da futura empresa. Nesse ponto, como diz Reinach, as negociações são "completamente subjetivas". Um pesquisador que supõe ter descoberto a solução para o tratamento de uma doença calcula que a empresa, no futuro, valerá US$ 150 milhões. Acredita necessitar de US$ 15 milhões para implantar o negócio e propõe a venda Reinach: universidade é celeiro de boas idéias de uma parte do valor estimado da futura empresa, no caso 10%, para parceiros de risco. Os investidoEle viveu essa experiência quando res, por seu lado, contabilizam o risco criou a .comDomínio. "Tivemos a de fracasso, potencial de mercado e idéia de fazer um data center, um serpreço, projetando um valor inferior viço que ainda não existia no Brasil. para a empresa, o que amplia a partiReunimos um time competente, recipação na composição do capital. crutado na universidade, licenciei-me "Como é ele que corre o risco, espera do tempo integral na USP, fizemos uma remuneração a mais alta possíum plano de negócio e fomos para os ver: justifica. Estados Unidos atrás de capital de ris-

Um mercado de futuro Os investimentos de capital de risco crescem lentamente no país. Em 2000, somaram US$ 747 milhões e, no ano passado, algo em torno de US$ 800 milhões, de acordo com dados divulgados pela Associação Brasileira de Capital de Risco (ABCR) com base em pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (FGV), patrocinada pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). A boa notícia é que, apesar da queda da bolsa eletrônica Nasdaq, o volume de investimentos não caiu, ressalva Robert Binder, diretor executivo da ABCR. Nos Estados Unidos, o fim da bolha da internet custou caro: o mercado de investimento de risco, de US$ 100 bilhões, em 2000, caiu para US$ 40 bilhões, em 2001.

18 • MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

De acordo com a pesquisa, até o ano passado, os setores de tele,comunicações e as novas mídias atraíam mais da metade dos recursos de risco. As start-ups ficaram com apenas 15% das aplicações, e as empresas maduras, em fase de expansão, com 78%. Com exceção da Extracta, do Rio de Janeiro, nenhuma empresa de biotecnologia foi alvo de investimento de risco, ele diz. "O grande problema é o tempo de maturação dessas empresas", observa Binder. Esse quadro, na sua avaliação, começa a mudar. ''A atuação do governo, por meio do programa Inovar, da Finep, foi decisiva." A privatização de setores, como o de

telecomunicações, por exemplo, já está gerando novos negócios. Os investimentos em biotecnologia podem crescer, já que o Brasil, além da biodiversidade, tem vantagens competitivas para apostar no desenvolvimento desse mercado. A propósito, nos Estados Unidos, sete empresas de biotecnologia já fazem parte do índice Nasdaq 100, que classifica as maiores empresas não financeiras, segundo seu valor de mercado. A ABCR tem 64 associados entre fundos de investimentos, consultorias, bolsas de valores, empresas e incubadoras. A entidade estima que o potencial de investimento de capital de risco no país, desde 2000, some US$ 3,8 bilhões.


• POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

BIOTECNOLOGIA

U m mercado em expansão Biominas constata que 51 % das empresas têm até sete anos

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Fundação B.io~i,n~s,por ~?lic~tação do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), realizou ampla pesquisa para identificar e qualificar as empresas de biotecnologia em operação em todo o país.Constatou que o Brasil abriga 354 empresas, em sua maioria com menos de sete anos, com um faturamento estimado entre R$ 5,4 bilhões e R$ 9 bilhões. Juntas, essas empresas geram um total de 27.825 postos de trabalho. Esta radiografia do setor vai subsidiar o planejamento de políticas e investimentos públicos no setor. Até então, o único levantamento disponível tinha sido realizado pela Associação Brasileira de Biotecnologia (Abrapi) e pelo Instituto Internacional de Empreendimentos em Biotecnologia (I1CA), em 1993. O parque biotecnológico brasileiro tomou impulso a partir de 1994. MeL tade das empresas que hoje operam no Brasil, contabilizadas pela pesquisa, foi criada depois desse período. A Biominas levantou dados de 304 das empresas do setor e classificou-as por região, segmento de mercado, grau de maturidade, tamanho, faturamento, investimentos em P&D, pedidos de patentes, entre outras informações. Numa segunda fase da pesquisa, a fundação ouviu 50 empresas selecionadas, trançando um perfil mais detalhado do setor. Constatou-se que São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro concen-

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A Biominas constatou que 28% das empresas de biotecnologia são start up, com até três anos de operação PESQUISA FAPESP . MARÇO DE 2002 • 19


tram 81% das empresas de biotecnologia do país. Pelo menos 57% dos empreendimentos paulistas são de grande porte e se enquadram na categoria fornecedores e empresas multinacionais. Em Minas, predominam as empresas nacionais, a maioria voltada para as áreas de saúde humana, animal e vegetal. No Rio, o setor está equilibrado entre multinacionais e empresas nacionais da área de saúde humana.

8%

Tempo de maturação - A pes-

quisa observou que o parque biotecnológico brasileiro é formado por empresas extremamente jovens: 28% são start up, com até três anos de operação, e 23% foram classificadas como novas, com idade entre quatro e sete anos. Pelo menos 78% delas foram classificadas como micro e pequenas empresas. As empresas maduras, com mais de sete anos de mercado, representam 49% do setor. Outro dado significativo revelado pela pesquisa é que um quinto das empresas do setor ainda está incubado. Vale ressaltar que Minas Gerais é o Estado que mais tem investido em incubadoras de biotecnologia, ou de incubadoras que atendam a estas empresas: pelo menos 45% das empresas incubadas estão instaladas naquele Estado. Em São Paulo e no Rio de Janeiro, esse percentual é de 8%. A Biominas estima que o conjunto das empresas de biotecnologia no país gere um total 27.825 postos de trabalho. Desse, 74% estão nas microempresas, 10% nas pequenas, 6% nas médias e 10% nas grandes empresas. Resultados financeiros

- A Fundação

calcula que o setor fature entre R$ 5,4 bilhões e R$ 9 bilhões, valor que corresponde de 0,9% a 1,5% do Produto Interno Bruto (PIE) do país. Ressalta, no entanto, que esses números são aproximados e que a metodologia de cálculo pode ser revista. As grandes corporações - multinacionais e públicas, entre elas - são responsáveis por 20 • MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

91% do valor projetado. Algumas delas chegam a faturar até R$ 300 milhões/ano. Em contrapartida, 56% das empresas foram classificadas na faixa de faturamento de até R$ 2 milhões e, dentre essas, 8% ainda não faturavam efetivamente. O tempo de maturação da empresa está diretamente relacionado' com os resultados financeiros, observa a pesquisa. No caso do setor de biotecriologia, a maturação das empresas é lenta. Mesmo as empresas com até sete anos de existência ainda se encontravam, no período em que foi reali-

zada a pesquisa, em fase de desenvolvimento e não tinham colocado produtos no mercado. Essa característica das empresas exige financiamento para investimentos e capitalização. A Biominas registrou necessidade generalizada de recursos, tanto nas grandes como nas microempresas, de forma a permitir um necessário equilíbrio durante o seu longo ciclo de maturação marcado por elevados custos de desenvolvimento e produção. Das 50 empresas estudadas, 23 contam ou já contaram com recursos externos. Mas apenas três delas utili-

Critérios de classificação As 354 empresas brasileiras de biotecnologia mapeadas pela Fundação Biominas foram analisadas, avaliadas e classificadas em nove categorias: saúde humana (diagnósticos, fármacos, fitofármacos, vacinas, etc.); multinacionais, empresas públicas, fármacos, genéricos e agro; fornecedores (equipamentos, insumos e suprimentos); agronegócios

(melhoramento de plantas, transgênicos, produtos florestais, plantas ornamentais e medicinais, bioinseticidas, biofertilizantes inoculantes); industriais (química fina e enzimas); biomateriais, biomedicina, consultoria em biotecnologia (saúde humana, animal e vegetal) - identificação genética e análise de transgênicos -; saúde animal (veterinária,


zam recursos de capital de risco, contando com o apoio de oito investidores privados. A baixa capitalização compromete o aproveitamento das capacidades e potencialidades tecnológicas e de inovação. Na avaliação dos empresários ouvidos pela Biorninas, o financiamento e a capitalização são um dos pontos mais sensíveis do setor. Aqueles ligados a empresas fora de São Paulo lembraram o bom exemplo a empresas de tecnologia pelos programas Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE) e Parceria para Inovação Tecnológica (PITE), sugerindo que esses modelos fossem adotados por agências de fomento nacionais. Outro gargalo para o desenvolvimento apontado pelos empresários consultados foi o alto nível de taxas e impostos incidentes sobre as micro, pequenas, médias ou grandes empresas que trabalham com equipamen-

Empresas por segmento de mercado

tos e insurnos importados. Também foram apontados problemas como a necessidade de regulamentação do acesso à biodiversidade brasileira, legislação de transgênicos, integração das atividades coordenadas pelos diversos ministérios envolvidos, entre outros. Inovação - A pesquisa avaliou também o grau de absorção de tecnologia das empresas tomando como medida a internalização de P&D e a cooperação com universidades e institutos de pesquisa. Constatou-se que 90% das empresas pesquisadas têm realizado desenvolvimento tecnológico próprio e 93% possuem relações formais ou informais com os setores acadêmicos e de pesquisa. As empresas pequenas, com até dez postos de trabalho, tendem a ter entre 50% e 100% do time em atividades de P&D. No outro extremo, empresas grandes possuem

Instrumentos Complementares

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Meio Ambiente

8

Saúde Animal Saúde Humana, Animal, Vegetal Em Sinergia

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Química Fina, Enzimas --.,...-,

10

6

entre 5% e 6% da equipe voltada para essas atividades. As empresas do setor investem pesado na inovação. As organizações pesquisadas apresentaram 47 patentes, sendo 21 concedidas e 26 solicitadas. A média é de urna patente por empresa. Mas apenas urna, com apenas três anos de existência, foi responsável pela solicitação e obtenção de 13 patentes. Essa, aliás, é uma empresa capitalizada, investida por capital de risco. Pelo menos 34 das instituições pesquisadas têm planos de exportação, sendo o Mercosul, a América Latina e a União Européia os principais mercados alvos. De fato, 28% delas já iniciaram negócios com o exterior. Gargalos - A partir desses resultados, a Fundação Biominas faz uma série de sugestões ao MCT. A primeira delas aponta a necessidade de expandir e diversificar instrumentos de financiamento a empresas de biotecnologia no país. A segunda sugere um contínuo ordenamento e aperfeiçoamento das atividades de regulamentação por parte das esferas públicas competentes. A ausência de regulamentação ou a morosidade de sua implementação contribuem para a retração dos investimentos e comprometem as exportações. Por fim, a fundação identifica o excesso de tributação como um problema crítico para as empresas. •

Fornecedores

L Amostra

L População

Multinacionais

e Públicas

Saúde Humana

reprodução animal, pet, vacinas, probióticos); meio ambiente (biorreme diação, tratamento de resíduos, análises); instrumentais complementares a biotecnologia (software, bioinformática e e-commerce) e em si-

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nergia (biomateriais, biomedicina, consultoria em biotecnologia). No segmento saúde humana foram identificadas 24% das empresas. No segmento fornecedores de equipamentos, insumos e suprimentos

foram encontradas 17%. Os agronegócios contavam com 12% e as empresas do setor química fina e enzimas, 6%. Outras 5% foram classificadas como em sinergia, setor que inclui a área de biomateriais, biomedicina e consultoria em biotecnologia, entre outros menos representativos. As multinacionais e empresas públicas de fármacos, genéricos e agro representaram 22%.

PESQUISA FAPESP . MARÇO DE 2002 • 21


• POLÍTICA

CIENTÍFICA

E TECNOLÓGICA

BIOSSEGURANÇA

Reforço na CTN Bio Especial istas vão integrar equipe que avalia transgênicos

grupo de especialistas para agilizar os pareceres dos processos avaliados pelos 36 cientistas que formam a CTNBio. ''A biossegurança é um tema permanente, e o fortalecimento da CTNBio fará com que ele progrida", afirmou Sardenberg. Também estão previstos o credenciamento e a criação de novos laboratórios para o exame de produtos relacionados à utilização da engenharia genética. A comissão deverá, ainda, estreitar relações com a comunidade científica internacional e aumentar o intercâmbio com instituições estrangeiras. "Precisamos ampliar os contatos para que possamos avaliar como caminha a questão da biossegurança nos países mais avançados': acrescentou Sardenberg.

governo federal vai reforçar o trabalho da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), responsável pela avaliação de risco e estabelecimento de normas e regulamentos sobre a utilização de organismos geneticamente modificados, utilização de técnicas de engenharia genética, entre outros. O ministro Ronaldo Sardenberg anunciou em reunião realizada no dia 15 de fevereiro, no Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer, em São Paulo, que o Ministério da Ciência e Tecnologia Política nacional - A CTNBio foi cria(MCT), órgão responsável pela coda em 1995. Tem, entre suas atribuimissão, vai criar um programa para ções, a tarefa de propor a política nafortalecer a política nacional de bioscional de biossegurança, o Código de segurança com projetos de pesquisa Ética de Manipulações Genéticas, clasespecíficos. Participaram do enconsificar os organismos geneticamente tro, além do ministro, o secretário modificados segundo o grau de rísco, executivo do MCT, Carlos Américo emitir pareceres técnicos sobre os Pacheco; o diretor científico da FAPESP, José Fernando Perez; o diretor do Instituto Ludwig, Ricardo Brentani; o coordenador do Laboratório de Genética do Câncer do Instituto, Andrew Simpson; Carlos Alberto Moreira Filho, do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo; o representante da indústria de biotecnologia na CTNBio, Joaquim Machado; e o representante do Centro de Biotecnologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Jorge Guimarães. A intenção é contratar, ainda neste semestre, um Justiça analisa ação contra o plantio de organismos

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projetos relacionados a transgênicos e fiscalizar o desenvolvimento desses projetos. Desde a sua criação, a comissão já avaliou mais de mil processos de experimentos com transgênicos. "A CTNBio tem uma concepção original: toma decisões genéricas, mas avalia processo por processo", explica o ministro. Nos últimos anos, no entanto, o avanço da polêmica em torno de organismos geneticamente modificados exige que os trabalhos da comissão - formada por 18 titulares e 18 suplentes indicados pelos diversos ministérios - ganhem, como diz o ministro, um caráter de rotina. "É preciso lhes garantir melhores condições de trabalho para que esses temas sejam tratados em regime normal", justifica Sardenberg. Desde a sua criação, a CTNBio autorizou o plantio e o cultivode um único organismo geneticamente modificado, a soja Roundup Ready, da Monsanto. Mas uma ação judicial movida pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e pelo Greenpeace impediu o início do plantio. Os dois órgãos querem condicionar a liberação do cultivo de qualquer transgênico a estudo de impacto ambiental (EIARima) e à elaboração de normas para avaliação de riscos à saúde. O processo está sob julgamento do Tribunal Regional Federal, em Brasília. •

geneticamente

modificados, como o milho

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As publicações científicas brasileiras ganharam visibilidade internacional. Graças ao SciELO, seus artigos são cada vez mais citados. SciELO - Scientific Electronic Library Online é uma biblioteca de revistas científicas disponível na Internet. Uma biblioteca virtual que reúne 67 publicações científicas brasileiras. Sua interface permite o acesso fácil aos textos completos de artigos científicos, por meio das tabelas de conteúdos dos números individuais das revistas ou da recuperação de textos por nome de autor, palavras-chaves, palavras do título ou do resumo. A SciELO publica também relatórios atualizados do uso e do impacto da coleção e dos títulos individuais das revistas. Os artigos são enriquecidos com enlaces dinâmicos a bases de dados bibliográficas nacionais e internacionais e à Plataforma l.attes no CNPq. SciELO é produto do projeto cooperativo entre a FAPESp,a BIREME/OPAS/OMS e editores científicos brasileiros, iniciado em 1997, com o objetivo de tornar mais visível, mais acessível e incentivar a consulta das mais conceituadas revistas científicas brasileiras. Em 1998, a coleção SciELO Brasil passa a operar normalmente na Internet e projeta-se rapidamente como modelo de publicaçãp eletrônica de revistas científicas para países em desenvolvimento, em particular da América Latina e Caribe. Ainda em 1998, o modelo é adotado pelo Chile e em 1999 começa a operar a coleção SciELO Saúde Pública, com as melhores revistas científicas de saúde pública ibero-americanas. Outros países estão em processo de incorporar-se à rede de coleções SciELO. O modelo SciELO destaca e valoriza a comunicação científica brasileira. Ao mesmo tempo, proporciona mecanismos inéditos de avaliação de uso e de impacto das nossas revistas científicas, em consonância com os principais índices internacionais de produção científica.

Adote a SciELO como sua biblioteca científica.

~~ GOVERNO

~ DO ESTADO

DE

SÃO PAULO

Secretaria da Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico

BIREME

I OPAS IOMS

www.fapesp.br


• POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

PUBLICAÇÕES

CIENTÍFICAS

SciELO, um modelo reconhecido Biblioteca virtual amplia visibilidade da ciência brasileira programa Scientific Eletronic Library On-line (SciELO), biblioteca virtual que reúne 93 jornais e revistas científicas produzidas no Brasil e na América Latina, começa a dar visibilidade para grande parte das pesquisas divulgadas em publicações nacionais, até recentemente inacessíveis à comunidade internacional. Prova disso é que a edição 415 da revista Nature, de 31 de janeiro deste ano, traz carta assinada por dois pesquisadores do Departamento de Zoologia da Universidade de Oxford - Wladimir J. Alonso e Esteban Fernández- Juricic -, em que defendem a implementação de redes regionais de acesso rápido, como o SciELO, para ampliar a comunicação dos pesquisadores de países em desenvolvimento. O argumento dos pesquisadores se apóia na avaliação do desempenho de cinco jornais e revistas brasileiras indexados, há cinco anos, no Institute for Scientific Information (ISI), que, depois de incorporados ao SciELO, há dois anos, tiveram aumento de 132,7% nos seus fatores de impacto. Esse indicador é medido pelo número de artigos publicados num ano, dividido pelo número de vezes em que eles foram citados por outra revista.

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Maior visibilidade - O SciELO é um programa especial da FAPESP desenvolvido em parceria com o Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciência da Saúde (Bireme) e apoio do Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Foi implementado em 1997, com a intenção de aumentar a visibilidade e acessibilidade de publicações científicas brasileiras que, em

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sua maioria, não estão indexadas em bases de dados internacionais. Apenas 22 revista brasileiras estão entre os cerca de 6 mil títulos indexados no ISI, por exemplo. O reconhecimento de que existia um nicho de pesquisadores que não tinham possibilidade de se comunicar internacionalmente foi reforçado pela publicação do artigo Ciência Perdida no Terceiro Mundo (Lost Science in the Third World), de W. Wayt Gibbs, publicado na revista Scientific American 273, em 1995, em que ele constata que pesquisas importantes não incluídas em bases de dados internacionais, por não serem referenciadas, acabavam invisíveis. "Foi daí que surgiu a idéia de tornar essa produção mais visível e, ao mesmo tempo, criar uma base de dados para publicações nacionais", conta Rogério Meneghini, coordenador do Centro de Biologia Molecular Estrutural (CBME) do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), coordenador do SciELO na FAPESP e um dos idealizadores do programa. O SciELO tomou forma num encontro entre Meneghini, professor do Instituto de Química da Universidade de São Paulo, e Abel Packer, diretor da Bireme, atualmente coordenador operacional do programa. A Bireme já realizava o controle institucional de produção científica na área da saúde, mas a instituição tinha planos de implementar uma publicação eletrônica para facilitar a localização e indexação dos artigos científicos. O SciELO começou em escala piloto, com poucas revistas, mas, rapidamente, tornou -se referência obrigatória entre pesquisadores de diversas áreas. O número de visitas mensais, por exemplo, saltou


de menos de dez, em fevereiro de 1998, para algo próximo de 10 mil, em 2001, número que deverá ser ultrapassado em fevereiro deste ano (ver quadro abaixo). "Estamos chegando a uma massa crítica de resultados para avaliar o impacto das publicações aqui no Brasil", adianta Meneghini. Ele credita o sucesso do SciELO às circunstâncias favoráveis em que vive a ciência brasileira e cita como exemplo o aumento dos recursos destinados à pesquisa e à institucionalização da pós-graduação. "Para avançar é preciso ter boa ciência." Seleção criteriosa - Atualmente, o modelo de comunicação científica adotado pelo SciELO já está implantado também no Chile e em Cuba, com o apoio da Bireme e de agências de fomento locais. Em breve, também estará sendo implementado na Costa Rica, na Espanha, em Portugal, no México e na Venezuela. Ao todo, já estão disponíveis, on-line e gratuitamente, 98 publicações científicas. "Até

o final do ano esperamos chegar a 300': prevê Packer. No Brasil, o SciELO conta com 67 títulos selecionados entre as cerca de mil publicações científicas brasileiras. "O programa deverá atingir a sua maturidade no final do ano, quando deveremos chegar a cem publicações': prevê Packer. "Nesse momento, o programa passará a ser utilizado por agências de fomento para medir a comunicação, utilizando indicadores específicos por revista e por instituição': completa. O critério de seleção dos títulos que integram o acervo do SciELO é rígido, já que a grande maioria das revistas e jornais científicos publicados no Brasil não cumpre os requisitos de qualidade de conteúdo, de originalidade das pesquisas e tampouco tem regularidade garantida, comenta Packer. Os títulos candidatos a ingresso são avaliados por um comitê consultivo e aprovados por pares. Os indicadores utilizados para a sua admissão aplicam-se também para a avaliação de sua permanência na SciELO.

Metodologia do programa - O modelo SciELO é formado por três componentes. O primeiro é a metodologia que permite a publicação eletrônica de edições completas, a organização de dados bibliográficos, a produção de indicadores. Inclui ainda, critérios de avaliação de revistas, baseado em padrões internacionais de comunicação científica. Os textos completos podem ter links de hipertexto com bases de dados nacionais e internacionais. O segundo componente do modelo é a aplicação da metodologia na operacionalização de sites na web de coleções de revistas eletrônicas, como aqueles que já operam no Brasil, Chile e Cuba. O terceiro é o desenvolvimento de alianças entre autores, editores, instituições científico-tecnológicas, agências de financiamento, entre outros, com o objetivo de disseminar e atualizar a SciELO. ''A carta da Nature é a maior evidência na literatura internacional de que a SciELO está cumprindo seus objetivos': conclui Packer. •

Número de visitas mensais ao SciELO, por ano (escala logarítmica) 1000000

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• CIÊNCIA

LABORATÓRIO

Contra dor no coração Notícia promissora para cardíacos: wn medicamento empregado normalmente em doenças neurológicas, a piridostigmina, provavelmente funciona também contra problemas do coração. Antônio Cláudio Lucas da Nóbrega, da Universidade Federal Fluminense (UFF), no Rio de Janeiro, verificou que a droga reduz a pressão arterial e a freqüência cardíaca e retarda o aparecimento da chamada isquemia (falta de irrigação sangüínea de uma parte do coração). Em conseqüência, permite esforços físicos mais intensos a pessoas com insuficiência cardíaca ou com obstrução da artéria coronária, que abastece o coração com sangue oxigenado. "Se antes um paciente

• Como ouvir um joelho machucado Pesquisadores da Universidade Ryerson, de Toronto, Canadá, desenvolveram um equipamento que poderá ajudar os médicos a diagnosticar lesões no joelho - e os técnicos de futebol a decidir se deixam um jogador contundido voltar para o campo. Trata-se de um aparelho de diagnóstico que conta com sensores de vibração iguais aos existentes nas estações sismográficas para registrar terremotos, informa a revista New Scientist (12 de janeiro). Sinais sísmicos estão normalmente abaixo de 20 hertz, inaudíveis ao ouvido huma-

Droga foi usada durante a Guerra do Golfo como antídoto contra bombas de gás sentia dor ao subir escada, tomando o medicamento só sentirá se subir rápido demais", exemplifica. Seus estu-

no. O mesmo ocorre com os ruídos feitos por joelhos com danos na cartilagem. Quando uma articulação entra em ação, a cartilagem fica comprimida e vibra. Estetoscópi-

dos demonstram que o remédio, adotado na forma de brometo de piridostigmina (ou C9li13BrN202), di-

os ou microfone amplificam o som que ela faz. Mas é difícil distinguir os sons de cartilagens saudáveis e danificadas. O aparelho desenvolvido facilita essa leitura. Basta que

minui em 65% a arritmia do coração de pacientes com insuficiência cardíaca e doença de Chagas (foram avaliados

o paciente se sente sobre uma mesa e balance a perna. Sensores amarrados ao joelho transmitem as informações de baixa freqüência para um computador, que codifica a informação para uma freqüência mais alta. Foi encontrada grande diferença entre os sons da cartilagem degradada e da normal. Acreditase que os médicos poderão identificar um joelho anormal com 80% de precisão. •

• Onde os mares se encontram

Passe articulado: novas possibilidades para diagnóstico

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Todos os anos, mais de 800 mil pessoas viajam para Cape Point, a uma hora de Cape Town, na África do Sul. O


20 pacientes do primeiro grupo e 12 do outro). Nóbrega espera iniciar nos próximos meses ensaios clínicos com um número maior de pacientes no Hospital Universitário Antonio Pedro, da UFF, de modo a comprovar definitivamente o efeito benéfico do medicamento, que, como ele está verificando, age também contra estresse mental. Nóbrega começou em 1995 os estudos com indivíduos sadios, nos quais o composto químico produziu bradicardia (desaceleração dos batimentos cardíacos). Indicada desde 1955 para amenizar a fraqueza muscular decorrente da miastenia grave, um tipo raro de doença neurológica, a piridostigmina inibe a ação de uma enzima, a acetilcolinesterase,

que as atrai é algo bem subjetivo: o encontro de dois gigantes, os oceanos Atlântico e Índico. "Elas estão sendo enganadas", acusam os indignados moradores de Cape Agulhas, que fica 100 quilômetros a leste, à revista The Economist (26 de janeiro). Para eles, o verdadeiro ponto de encontro das águas frias do Atlântico e mornas do Índico é ali mesmo, no local onde eles levantaram um modesto marco de pedras. Não é fácil julgar onde um oceano termina e começa outro. Uma forma é estudar qual a temperatura da água e o que vive lá. A costa do Atlântico é fria e preferida por pingüins, focas e tuba-

que aciona o sistema nervoso parassimpático, conjunto de nervos responsável pelo controle involuntários dos músculos e órgãos do corpo, cuja falha aumenta o risco de problemas cardiovasculares. Foi também utilizada por cerca de 250 mil militares dos Estados Unidos na Guerra do Golfo (1990-1991), como um antídoto contra as bombas de gás que atuam sobre o sistema nervoso, ainda que sob a classificação de "nova droga sob investigação': Nóbrega enfatiza que o objetivo mais amplo de seu trabalho não é avaliar o medicamento, mas verificar se a melhoria do funcionamento do sistema nervoso parassimpático pode proteger pacientes com doenças cardiovasculares. •

rões machos. Mergulhadores e fêmeas grávidas de tubarão preferem as águas mornas do Índico. Assim, onde a temperatura muda, exatamente a

leste de Cape Point, em False Bay, poderia ser onde os oceanos se encontram. Mas os partidários de Cape Agulhas não aceitam o argumento. Eles retrucam que False Bay é rasa e abrigada e sempre será mais quente que o mar aberto. A prova a seu favor, afirmam, seriam as correntes dos oceanos, que se encontrariam mais freqüentem ente em Cape Agulhas. "Os oceanos trocam de água o tempo todo e não há linha divisória entre eles", pondera Howard Waldron, oceanógrafo da Universidade de Cape Town. •

• Conversa de bebê no computador Todo adulto perde um pouco a compostura quando conversa com um bebê. Até o jeito de falar se altera: em geral, a voz fica mais aguda e as vo-

Turistas em Cape Point: disputa subjetiva com Cape Agulhas

gais são pronunciadas com maior ênfase. Pode parecer apenas corujice, mas faz o maior sentido para os bebês. Um novo software de reconhecimento de fala criado na Universidade de Washington, Estados Unidos, está provando que esse jeito infantilizado de falar é mais fácil de compreender do que a fala normal. Patrícia Kuhl, a criadora do programa, estudou as vogais que os adultos usam para falar com bebês e descobriu que elas não apenas são faladas mais claramente, mas são foneticamente diferentes das suas equivalentes adultas. As pessoas parecem falar dessa forma seja qual for o idioma. Assim, os pesquisadores conjecturaram que, talvez, essa fala especial para bebês os ajude a aprender a falar. •

• A estréia da revista Neotropica Os resultados das pesquisas do BIOTA, programa de mapeamento da diversidade animal e vegetal em São Paulo, financiado pela FAPESP, ganharam mais um meio de divulgação: a revista eletrônica BIOTA Neotropica, que vai publicar resultados originais de pesquisas, vinculadas ou não ao programa, sobre conservação e uso sustentável da biodiversidade. O endereço é www.biotaneotropica.org.br. •

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o elo perdido das plantas Uma planta aquática da mesma família da vitória-régia brasileira (Victoria amazonica) pode desvendar um dos maiores mistérios da biologia: como, há 150 milhões de anos, as angiospermas, plantas floríferas, se diferenciaram de suas parentes mais próximas, as gimnospermas, plantas de sementes nuas, como os pinheiros e outras coníferas. Foi estudando a nenúfar (Nuphar polysepalum) que os pesquisadores Ioseph Williams e William Friedman, da Universidade do Colorado, Estados Unidos, encontraram uma pista para resolver o enigma. Eles explicam que escolheram uma planta da família das ninfeáceas por causa de registros fósseis e recentes

• Em defesa do uso de cobaias A Royal Society, a academia nacional de ciências britânica, publicou em fevereiro uma severa defesa do uso de animais em pesquisa científica. O gesto fez parte do contra-ataque liderado pela associação das bioindústrias contra ativistas que querem a proibição das experiências com animais alegando maustratos e crueldade. Todos os 21 integrantes do conselho da Royal Society assinaram o documento - na verdade, a primeira declaração formal da sociedade sobre o assunto. O documento ressalta que todos são beneficiados imensamente pelas pesquisas científicas envolvendo animais. Além disso, virtualmente to-

análises moleculares que a coloca entre as mais antigas famílias de plantas com flores. Nesse trabalho, publicado na revista Nature (31 de janeiro), os pesquisadores lembram que uma característica que distingue as plantas com flores é que cada semente se divide em duas partes: um embrião similar ao de todas as outras

dos os medicamentos desenvolvidos no século 20 dependeram de testes com cobaias para se ter certeza de que a droga funcionava. "O conselho fez esta declaração porque quer pFeservar e fortalecer o uso ético de animais em pesquisa por meio do debate", afirmou Patrick Bateson, secretário de Biologia da Royal Society. •

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plantas e um tecido único chamado de endosperma, que serve para nutrir o embrião. Todas as angiospermas têm endosperma, que é triplóide, ou seja, contém três cópias de cada cromos-

• Perguntas para o século 21 Quais questões vão reger o trabalho científico nos próximos anos? Em busca de respostas, a Fundação Edge pediu para que 99 cientistas, filósofos e artistas expusessem as questões que mais os afligem (disponíveis em www.edge.org). Há indagações para todos os

Cobaia: não se conhecem alternativas mais seguras para testes com drogas

somo: duas da mãe e uma do pai. Esse endosperma triplóide contrasta dramaticamente com as sementes das gimnospermas, nas quais o tecido nutritivo é haplóide, contém uma única cópia de cada cromossomo. Williams e Friedman avaliaram o conteúdo de DNA das células do embrião e endosperma e descobriram: a nenúfar tem um endosperma diplóide, com um conjunto de cromossomos da mãe e outro do pai. A hipótese é que a nenúfar pode representar um intermediário entre gimnosperma haplóide e angiosperma triplóide. •

gostos. O físico e escritor Paul Davies tortura-se por querer saber se há apenas um ou mais universos, o chamado multiverso, que tanto pode ser uma forma de substituir Deus como explicação para o design do mundo físico quanto uma mera hipótese teórica ainda não comprovada. Clifford Pickover, do Centro de Pesquisas da IBM, vai além e propõe a situação: "Suponha que existem dois universos. No primeiro, o Universo Ômega, Deus não existe, mas seus habitantes acreditam que Ele existe. No outro, o Universo Upsilon, Deus existe, mas nenhum de seus ocupantes acredita em Sua existência. Qual universo você escolheria para viver?" Deus é bastante lembrado - seria Ele uma inteligência extra-terres-


tre extremamente avançada? Stuart Kauffman, bioquímico da Universidade de Pensilvânia, prefere buscar os requisitos que um sistema biológico deve ter para agir sobre seu próprio comportamento, enquanto a pergunta que persegue Daniel Dennett, filósofo da Universidade Tufs, é: "Que tipo de sistema de codificação de informações o cérebro usa?" Após examinar o estágio em que as pesquisas nesse campo se encontram, o próprio Dennett considera a possibilidade de que outra indagação melhor poderia ser feita. A Edge realiza assim seu objetivo de promover o debate e deixa alertas como o lançado por Roger Schank, da Universidade Carnegie-Mellon: "O que significa ter uma mente educada no século 21?" •

• À espera do fenômeno EI Nino É provável que o El Nino se

repita este ano, mas os meteorologistas só terão certeza absoluta no segundo ou terceiro trimestre. De concreto, talvez anunciando a futura ocorrência do fenômeno meteorológico, que pode alterar o padrão do clima em várias partes do globo, inclusive no Brasil, os pesquisadores norte-americanos e australianos colheram indícios de que, precocemente, neste ano, as águas superficiais do oceano Pacífico já se mostram ligeiramente mais quentes do que o habitual. O El Nino, que costuma atingir seu ápice perto do final do ano, é justamente isso: um aumento fora do normal, que pode ser superior a 4° C, na temperatura do Pacífico Equatorial, geralmente perto do litoral do Peru e Equador. A grosso modo, o impacto do esquentamento das águas do oceano, depen-

terá a opção exclusiva de licenciar a tecnologia quando ela for viável. Em um futuro próximo, a empresa deverá oferecer serviços para clonagem de gatos de estimação. •

• Estrelas destroem a vida na Terra

Inundação no interior do Rio, em 1997: culpa do EI Nino dendo de sua intensidade, é provocar mais chuvas em algumas partes do planeta e menos em outras. No Brasil, o fenômeno costuma causar mais enchentes na Região Sul e agravar a seca no Nordeste, as duas partes do país que normalmente mais sofrem os efeitos do fenômeno. O último El Nino ocorreu em 9798 e foi de grande intensidade, causando prejuízos em várias partes do mundo. •

• Enfim, um clone de sucesso A maioria das experiências com animais clonados é vista com reserva pela sociedade, mas com Cc (de CopyCat) foi diferente. Talvez por ser o primeiro animal doméstico a passar pela experiência e pelo

seu jeito sedutor, a gata clonada feita por pesquisadores da Universidade do Texas, nos Estados Unidos, está sendo recebida com afagos. A técnica usada foi a de transferência nuclear, a mesma usada com a ovelha Dolly e a maioria dos outros clones produzidos até agora. O nascimento de Cc também foi quase um acidente: dos 188 óvulos resultaram 87 embriões elonados, transferidos para oito mães de aluguel. Apenas Cc vingou. A gata é, de fato, um clone, mas a pelugem não é igual à de Rainbow, sua mãe genética. Isso ocorre porque a pigmentação de animais é determinada também por fatores de desenvolvimento da placenta. O projeto, de US$ 3,5 milhões, foi financiado pela Genetic Savings & Clone, que

A gata que foi clonada (esq.) e Cc com a mãe de aluguel

A extinção de animais marinhos ocorrida na Terra há 2 milhões de anos pode ter sido causada por explosões de estrelas supernovas, um dos mais energéticos e potencialmente letais fenômenos do Universo. Um grupo de físicos sob a coordenação de Narciso Benítez, da Universidade Iohn Hopkins, Estados Unidos, verificou que, mais ou menos na mesma época da extinção, no período Plioceno- Pleistoceno, ocorreram explosões de cerca de 20 supernovas do grupo de estrelas ScorpiusCentaurus, que então se encontrava a 130 anos-luz da Terra. A hipótese se apóia no excesso de ferro-60 encontrado em amostras da crosta terrestre retiradas do fundo do mar, que pode ser antigo o bastante para ter se originado em supernovas. Mas não foi o ferro que destruiu os pequenos organismos que sustentam a vida no mar. Segundo os pesquisadores, os raios cósmicos resultantes das explosões danificaram a camada de ozônio na Terra e permitiram que a radiação ultravioleta do Sol atravessasse a atmosfera, provocando o desaparecimento em massa dos organismos marinhos. No caso da devassa biológica que ocorreu há 65 milhões de anos, sobrevive a hipótese da queda de um asteróide e catástrofes vulcânicas - até o momento, não foi necessário usar supernovas para explicar o fenômeno que eliminou os dinossauros do planeta. •

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lho repercutiu internacionalmente e rendeu um artigo científico publicado na revista inglesa Lancet, uma das mais renomadas publicações médicas do mundo. A localização de casos assintomáticos de malária em Rondônia é, talvez, o maior feito científico dos dois centros de pesquisa instalados nesse Estado, que realizam estudos de forma conjunta e em separado. Mas não o único. O núcleo amazônico do ICB levantou fortes evidências da existência de uma ainda desconhecida espécie de protozoário do gênero Leishmania que seria um novo agente causador da leishmaniose tegumentar americana (LTA), doença infecciosa que todo ano ataca pele e mucos as de 28 mil brasileiros, de Norte a Sul do país. Em Monte Negro, município a 250 quilômetros ao sul de Porto Velho onde funciona a base do ICB, os pesquisadores também constataram uma altíssima incidência, uma das maiores do mundo, de uma doença de pele pouco diagnosticada, a cromoblastomicose, e identificaram um novo tipo de carrapato, do gênero Amblyomma, encontrado em animais terrestres, sobretudo antas (Tapir terrestris), que pode transmitir ao homem alguma doença. "Em Rondônia, quase tudo é novo e há muito o que pesquisar', diz Erney Plessmann de Camargo, 66 anos, ex-professor titular do ICB, recém-nomeado diretor do Instituto Butantan e coordenador de um projeto cujo objetivo é levantar a fauna de carrapatos em Rondônia e verificar a prevalência de três gêneros de bactérias potencialmente patogênicas, Rickettsia, Borrelia e Erlichia, nesses artrópodes. lessmann é co-autor do artigo sobre a descoberta de portadores assintomáticos do plasmódio da malária em Rondônia, ao lado de Fabiana Alves (ICB) e Luiz Hildebrando Pereira da Silva, diretor científico do Cepem e autoridade mundial em doenças tropicais. Ex-diretor de dois departamentos do Instituto Pasteur da França, Luiz Hildebrando é, possivelmente, o principal responsável por Rondônia ter entrado no mapa da pesquisa nacional. "Acreditamos que essas pessoas assintomáticas apresentem imunidade à malária e sirvam como reservatórios da doença", diz o veterano parasitologista, com mais de quatro décadas dedica das à ciência. Na visão dos especialistas do ICB e do Cepem, identificar e tratar os portadores não-sintomáticos de P. vixax é tão importante para deter o avanço da malária quanto pôr em prática as medidas tradicionais de controle dessa endemia: combater o agente transmissor, o chamado vetor (no Brasil, fêmeas de mosquito Anopheles darlingi infecta-

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das com o plasmódio), e medicar o mais rapidamente possível os casos sintomáticos. Estudar os assintomáticos é também uma forma de entender os mecanismos envolvidos na aparente imunização natural adquirida por essas pessoas, o que pode ser útil para o desenvolvimento de uma vacina contra a malária por P. vivax, um sonho distante pelo menos uma década, na opinião de Luiz Hildebrando. ''A maioria das pesquisas de vacinas contra malária trabalha com os casos de infecção causada pelo P. falciparum", diz ele. O genoma do falciparum, por sinal, foi recentemente seqüenciado por um consórcio internacional de laboratórios (veja quadro na pág. 40). Numa intervenção piloto em termos de Amazônia, pesquisadores do Cepem devem iniciar ainda este mês a identificação e o tratamento de casos assintomáticos de malária na Vila Candelária, bairro de Porto Velho, também às margens do rio Madeira, só que muito mais próximo da cidade que o distrito de Portochuelo. A comunidade ribeirinha de Candelária, por onde passavam os trilhos da mítica Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, está a dez minutos de carro da parte asfaltada da capital rondoniense - município


o pano vermelho com 330 mil habitantes, espalhados por uma área plana de mais de 34 mil quilômetros quadrados, 20 vezes maior do que a cidade de São Paulo - e é freqüentada nos finais de semana por uma população flutuante de veranistas vindos da Porto Velho mais urbanizada. !

Médicos fazem a diferença - Na vila, onde vivem 260 habitantes fixos, estudos do Cepem mostram que 30% dos moradores carregam o P. vivax no sangue, mas não têm os sintomas de malária (febre de até 40 graus e suor contínuo, de duas a quatro horas), sem contar os 40% que têm as duas coisas, o plasmódio e as manifestações clínicas. "Tratar os assintomáticos pode mudar o destino da malária", diz o paulista Mauro Shugiro Tada, médico-chefe do Cepem. Tada mudou-se há 17 anos para Rondônia com o intuito de pesquisar doenças tropicais num centro, embrião de seu atual local de trabalho, em Costa Marques, na divisa com a Bolívia, onde, diz ele, "dava malária até em pé de mamoeiro". Falar de malária no Brasil é, na verdade, falar de malária na Amazônia, região que concentra mais de 99% dos casos nacionais da enfermida-

de. Em 2001, segundo dados parciais da Fundação Nacional de Saiíde (Funasa), houve no país 340 mil casos de malária e 85 mortes. Em Rondônia, o número de registros ficou na casa dos 50 mil. Em 2000, o número de doentes em todo o país chegara a 610 mil, com 240 mortes. Por pior que seja nosso sistema de saúde - e na Amazônia é pior ainda que em outras partes do país -, a realidade brasileira ainda é nitidamente melhor do que a africana, o que ameniza o peso das endemias por aqui. "Nossa malária grave é diferente da africana': diz Luiz Hildebrando, que já pegou a enfermidade no Senegal e é portador do Trypanosoma cruzi, mas não sofre do mal de Chagas. "Lá o atendimento médico é muito pior e as crianças são as vítimas preferenciais do falciparum, que com freqüência provoca complicações cerebrais e morte. Aqui quem pega malária grave são adultos, geralmente agricultores, garimpeiros ou gente que mora na beira de rio e os problemas cerebrais são raros." Há poucos médicos nas áreas rurais da Amazônia, mas, andando alguns quilômetros, é até possível que um doente encontre algum atendimento minimamente capacitado, diz o cientista.

em frente à casa indica que há um caso suspeito de malária: sinal para o motoqueiro da prefeitura de Candeias parar e coletar sangue para o exame

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Iscas humanas: estagiários da USP capturam mosquitos

(em destaque, o Anopheles) em horário, temperatura e umidade monitorados

Na África, o caminhar geralmente não leva a nada. Quase todo mês, apesar dos compromissos em São Paulo, Erney Plessmann vai à Amazônia. "Estamos em Rondônia com o espírito de sentinela, para acompanhar doenças antigas, emergentes e reemergentes', resume. "Nunca se sabe quando pode aparecer algo diferente, como um caso de ebola," Até agora, não há relatos confirmados de VÍtimas do misterioso VÍrus, que provoca uma febre hemorrágica capaz de matar o paciente em dias. Os pesquisadores da USP e do Cepem não atuam em Rondônia com o intuito específico de procurar casos de ebola. Mas, como o hábitat natural do VÍrus são as selvas africanas e asiáticas, faz sentido pensar que sua existência possa se estender ao Brasil, às nossas florestas tropicais. Portanto, como escoteiros, eles têm de estar sempre alertas.

Expondo-se aos mosquitos - Mesmo quando não pode viajar, Plessmann sabe que o projeto dos carrapatos está em boas mãos, nas de seu filho, Luís Marcelo Aranha Camargo, 40 anos, coordenador do Núcleo Avançado de Pesquisa do ICB. Com duas malárias em seu currículo - Monte Negro tem alta incidência tanto de malária quanto de leishmaniose tegumentar americana -, Ca34 • MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

margo permanece a maior parte do ano em Rondônia. Vem a São Paulo para dar aulas e orientar alunos, em média, a cada 45 dias. Na cidade de 12 mil habitantes, onde faltar luz e o telefone ficar mudo não chega a ser uma novidade, uma de suas tarefas é coordenar um trabalho sistemático de captura de vetores de doenças, mosquitos e carrapatos. Muitas vezes, na busca por um mosquito, usam-se as chamadas iscas humanas: oferece-se ao inseto a suculenta perna descoberta de um funcionário ou estagiário. O método envolve o risco de uma picada, mas dá certo. O ICB já capturou mais de 80 mil mosquitos e, com outras técnicas, 10 mil carrapatos. Foi em coletas de vetores na floresta que a equipe de Camargo pegou exemplares do candidato à nova espécie de carrapato, extremamente parecida com o Amblyomma incisum. Os pesquisadores do ICB buscam evidências de que os carrapatos, além dos mosquitos, são transmissores ainda pouco estudados de uma série de doenças, velhas ou emergentes, aos animais e aos seres humanos. Em muitos casos, essa relação ainda é obscura. Em outros, já conhecida. É o caso da febre maculosa, causada pela bactéria Rickettsia rickettsii, transmitida ao homem pelo carrapatoestrela (Amblyomma cajennense), comum em cavalos e outros animais silvestres. Engana-se quem pensa que a moléstia está presente apenas na Amazônia. A febre maculosa é uma endemia


Em Monte Negro, à beira do rio Jamari, a coleta prossegue: carrapatos como a provável nova espécie de

Amb/yomma (acima) grudam na flanela

em áreas até de São Paulo, como na região de Campinas, onde já provocou mortes. ém do candidato a novo carrapato, a equipe permanente de Camargo em Monte Negro e Ieffrey Shaw, pesquisador baseado na sede paulista do ICB, também identificaram em pacientes de leishmaniose tegumentar americana o que parece ser uma espécie ainda não descrita na literatura científica do parasita que causa a doença. Até agora, sabe-se que seis espécies de protozoários do gênero Leishmania, transmitidos ao homem por mosquitos do gênero Lutzomyia, desencadeiam no Brasil a infecção de pele nas pessoas: Leishmania braziliensis, L. amazonensis, L. guyanensis (as três mais importantes) L. lainsoni, L. naiffi e L. shawi. "Temos fortes evidências de que descobrimos uma sétima espécie do parasita que também causa a leishmaniose tegumentar", diz Camargo. Em seus estudos sobre a doença, o

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chefe do núcleo amazônico do ICB também conta com o auxílio do médico Sérgio Basano, seu orientando de mestrado na USP e um dos membros da equipe do instituto em Rondônia, que dispõe de dois laboratórios e uma pequena área rural para pesquisas de campo. Ainda em Monte Negro, os pesquisadores constataram uma altíssima incidência de uma quase desconhecida doença de pele causada por fungos encontrados em restos de animais e detritos da floresta, a cromoblastomicose, pouco diagnosticada por ser muitas vezes confundida com a leishmaniose tegumentar americana, que causa feridas na pele. Entre os habitantes da cidade, dez ocorrências da doença, que também provoca feridas na pele, foram identificadas entre 1997 e 2001. "Isso dá uma taxa de incidência anual de 1,6 caso da doença por 10 mil habitantes, a maior do mundo, e sugere que a cromoblastomicose deve ser de grande prevalência também nos municípios vizinhos': diz Camargo. O país que exibe o maior índice de cromoblastomicose é Madagascar, com 1,2 caso por 10 mil habitantes. Para estudar doenças tropicais, os cientistas, obviamente, precisam ter acesso direto a casos PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 35


José Máximo, pescador na Vila Candelária: tratamento de portadores assintomáticos do Plasmodium pode mudar o rumo da malária

o cientista que trocou Quando deixou para trás uma brilhante carreira de 32 anos em solo francês e seu último cargo no Instituto Pasteur de Paris, o de chefe da unidade de Parasitologia Experimental, Luiz Hildebrando Pereira da Silva - o professor Hildebrando, como é costumeiramente chamado - iniciou sua tão sonhada volta ao país natal com o intuito de estudar prioritariamente aspectos moleculares, clínicos e epidemiológicos de complicações decorrentes de casos graves de malária, aqueles causados pelo P.falciparum. Em 1997, então beirando 70 anos, acelerou sua aposentaria no Pasteur e prestou concurso para professor titular do ICB/USP. Passou e, em vez de trabalhar num dos campi da universidade situados no Estado de São Paulo, instalou-se em Porto Velho.Afinal, no início dos anos 90, Rondônia, que tem 1,2 milhão de habitantes (menos de 1% da população brasileira), tinha um perfil atrativo para trabalhos com malária - concentrava metade dos casos do país, entre 250 e 300 mil ocorrências por ano. Um quarto dos casos das três Américas.

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o Sena pelo Madeira

Hoje, cinco anos após trocar as margens do rio Sena pelas do Madeira, já aposentado pela USP, mas ativo no Cepem, Luiz Hildebrando, cujos estudos de malária são em parte financiados pela FAPESP,não conseguiu lograr totalmente seu objetivo. É que os casos de malária por P.falciparum em Rondônia, cerca de 20% do total de ocorrências do Estado, rarearam na área de atuação do Cepem. Ou melhor, as complicações decorrentes de casos graves de malária é que rarearam. Num universo de 1.500 casos da enfermidade decorrentes da ação do P. falciparum que passaram pelas mãos dos pesquisadores do Cepem num período de dois anos, somente dois pacientes acabaram apresentando complicações gravesem razão da doença. Moral da história: a simples presença de equipes do Cepem dispostas a entender as particularidades da malária nacional- e bem treinadas para diagnosticar e tratar a moléstia, intervindo rapidamente nos casos mais graves que podem levar à morte e provocar seqüelas - fez minguar o objeto de estudo do parasitologista.

Comunista assumido e cientista engajado, Luiz Hildebrando, um paulista de Santos quase tão francês quanto brasileiro, está longe de ser um cientista comum. A começar pela idade, 73 anos. Nessa altura da vida, as pessoas pensam mais na aposentadoria do que em trabalhar, mas o professor Hildebrando, que aparenta ter uns dez anos a menos, quase sempre dá expediente nos frns de semana no Cepem. Na verdade, ele já está oficialmente aposentado. Três vezes, aliás. Uma na França, pelo Instituto Pasteur, em 1997, após três décadas de serviços prestados. E duas no Brasil, ambas pela USP: a primeira em 1980, num ato administrativo que foi uma espécie de reparação por ter sido afastado duas vezes da universidade durante a ditadura militar, e a segunda em 1998, um ano após ter regressado à USP, via concurso para professor titular, quando atingiu a idade máxima de um servidor público, 70 anos. Antes que alguém pense que o grande parasitologista é um marajá do serviço público, convém informar


dessas moléstias. Em Porto Velho, muitos doentes, quando sentem uma febre mais forte, que pode ser um sintoma de malária, procuram espontaneamente os serviços do Cepem, em Porto Velho. No ano passado, 18 mil pessoas fizeram ali exame para ver se tinham a moléstia. Sete mil tinham malária. Nas outras onze mil pessoas, o diagnóstico foi inconclusivo - os testes laboratoriais não conseguiram estabelecer a causa do problema, um indício de que há um campo fértil para quem deseja estudar novas doenças em Rondônia. pequena a Monte Negro, a população também já se acostumou com a presença permanente de pesquisadores do ICB/USP e de outras universidades, que lhes prestam regularmente atendimento médico, auxiliando o poder público local na tarefa de cuidar de seus habitantes. Mas nem sempre os pa-

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cientes conseguem ou podem vir ao encontro dos pesquisadores. Os estudiosos do Cepem e ICB têm então de ir regularmente a campo, visitando áreas de acesso mais difícil. Ainda que em muitas viagens, os pesquisadores, em vez de encontrar uma doença rara, nada mais façam do que uma boa medicina geral junto a populações carentes - algo raro nas regiões mais pobres da Amazônia. Rondônia, que não mantém nenhum curso superior de medicina, conta, por exemplo, com um médico para cada 2.200 habitantes, aproximadamente. A Organizacão Mundial da Saúde (OMS) recomenda pelo menos um médico para cada mil pessoas. São Paulo tem um médico para cada 500 . habitantes. ''A situação da malária e da saúde em geral em Rondônia estaria bem melhor apenas com o aumento no número de médicos no Estado, para algo como um profissional para cada mil ou 1.500 habitantes': diz Luiz Hildebrando. Por isso, prestar atendimento às comunidades

Luiz Hildebrando: rigor científico admirável, visão social e humor refinado

que a última aposentadoria, a por idade, lhe rende cerca de R$ 30 mensais. "Mas dá para ter uma boa vida e ir uma vez por ano à França", diz Luiz Hildebrando, que, pelo seu trabalho no Cepem, é remunerado com uma bolsa de pesquisador-visitante do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Por que ir para a França se já ficou tanto tempo ao lado da torre Eiffel? Bem, sua mulher e a maioria

dos filhos (e netos) moram lá, e o cientista os vê apenas durante três meses do ano - os outros nove meses fica em Porto Velho estudando malária e outras doenças tropicais. "No futuro, devo aumentar progressivamente os meses de permanência na França e diminuir o tempo da minha estada no Brasil", diz o pesquisador, que recentemente lançou seu segundo livro de memórias, Crônicas de Nossa Época (Editora Paz e Terra).

Se fizer isso, seus colegas de Cepem sentirão sua ausência. Todos o admiram. O professor Hildebrando é daquele tipo de pesquisador que, com sua inegável competência técnica e carisma para formar e liderar grupos, é difícil de ser substituído. Ainda que às vezes seu rigor científico possa parecer demasiadamente europeu para os brasileiros, povo amante de jeitinhos e artimanhas, e dos latinos em geral. "Se não é para fazer do jeito que o professor Hildebrando quer, seguindo o método científico,é melhor nem fazer': comenta o médico Iuan Abel Rodrigues, 26 anos, boliviano de Cochabamba, que faz mestrado no Cepem com bolsa da Capes."Mas é isso que eu mais gosto nele." Ah, o professor também tem, à sua maneira, senso de humor. No fim de janeiro, no dia seguinte à vitória de 6 a O da seleção brasileira de futebol sobre a Bolívia, num jogo disputado em Goiânia, disse a [uan que a Bolívia era campeã mundial de futeboL De futebol jogado a 3 mil metros de altitude, bem entendido. Uma referência ao fato de a seleção de Iuan só tratar bem a bola quando o jogo se desenrola em cidades bolivianas de elevada altitude, o que causa mal-estar nas equipes adversárias.

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r Plessmann à beira do rio Madeira: "Nunca se sabe quando pode aparecer algo diferente, como um caso de ebola"

rurais, além de ser uma fonte de subsídios para os estudos científicos, é encarado como um dever ético pelos pesquisadores. Uma jornada ao campo pode ser mais ou menos aSSIm. Por volta das 8h30, o médico Rui Durlacher, paulistano de 34 anos, e a enfermeira Jussara Brito, gaúcha da mesma idade, sobem na picape do Cepem, que ocupa uma antiga ala do Centro de Medicina Tropical de Rondônia (Cemetron), um dos hospitais do estado, na periferia de Porto Velho. A essa hora, já há um movimento de pesso-

as febris à procura de um serviço que só ali funciona, noite e dia, todos os dias do ano: espetar o dedo e tirar uma gota de sangue, que indica se há um caso a mais de malária, dengue ou sabese lá o quê. Mas não são esses os pacientes que levam a dupla a se ajeitar no carro enquanto o motorista dá a partida. Às terças e quintas-feiras, Durlacher e [ussara vão ao município de Candeias, especificamente ao distrito rural de Triunfo, com 2.700 moradores, a maioria com incontáveis malárias, sem falar de outros problemas de saúde.

Decifrado genoma do causador da malária grave

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Foram necessários seis anos de trabalho e US$ 20 milhões para decifrar o genoma de uma das quatro espécies de plasmódio que provocam malária. Em fevereiro, pesquisadores ingleses do Sanger Centre e norte-americanos do Instituto para Pesquisa Genômica (Tigr) concluíram o seqüenciamento do genoma do Plasmodium falciparum, causador da maioria e dos mais graves casos de malária no mundo, 90% dos quais concentrados na África (1 a 2 milhões de

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mortes por ano, sobretudo crianças). Para um protozoário, de apenas uma célula, o P. facilparum exibe um código genético complexo, mais parecido com o genoma de um animal do que com o de uma bactéria. Os 25 milhões de pares de bases de seu DNA contêm 5.600 genes, um sexto da quantidade encontrada no homem. O estudo das funções dessesgenes e das proteínas por eles produzidas pode ser vital para a pesquisa de novas drogas contra a doença. No Brasil, há três

agentes causadores da doença: o P. vivax (80% dos casos), o P. malariae (menos de 1%) e o próprio P. falciparum (em torno de 20%). O P.falciparum é transmitido ao homem na África principalmente pelo mosquito Anopheles gambiae, erradicado do Brasil, cujo genoma está sendo seqüenciado por um consórcio internacional de laboratórios, entre os quais a rede Onsa (Organização para Seqüenciamento e Análise de Nucleotídeos), montada pela FAPESP.


o médico

paulista Rui Durlacher examina Perpétua Severiano, 62 anos, hipertensa: atendimento é dever ético dos pesquisadores

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A viagem dura cerca de uma hora e meia, com rápidas paradas no modesto posto de saúde de Candeias - não há hospital nem na sede do município, de 13 mil habitantes, aí incluídos os de Triunfo - e num escritório da Funasa à beira da BR 364. Até seu destino final, são percorridos 110 quilômetros, 80 na estrada federal, até que razoavelmente bem conservada nesse trecho, e 30 numa vicinal de terra, chamada, no linguajar da região, de linha. izo mineiro Antonio Eusébio da Silva, administrador do núcleo urbano de Triunfo, 42 anos e quatro malárias: "A saúde de Triunfo chama-se Cepem e doutor Rui. Se eles saírem daqui, estamos enrolados". Durlacher explica que o distrito, apesar de abrigar menos de um quarto da população de Candeias, chegou a responder, há alguns anos, por quase metade dos casos de malária do município. Hoje, há morador sem a doença há mais de dois anos. No núcleo, Durlacher e Iussara passam pelo posto de saúde local. Falam com os funcionários, atendem pacientes e reembarcam na picape rumo às linhas menores de Triunfo, vicinais mais estreitas e esburacadas que desembocam nas mais afastadas comunidades. Num dia produtivo, visitam pelo menos seis casas, para acompanhar a evolução de variados quadros clínicos. Ocupamse de qualquer problema de saúde que surja pela frente: hipertensão em idosos, desnutrição e diar-

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réia em crianças, a evolução de uma gravidez, um bebê que tomou sol em excesso e sofreu queimadura. E, claro, a ocorrência de casos de malária, o carro-chefe dos estudos do Cepem, e outras doenças infecciosas. "Não escolhemos paciente': comenta Jussara, no melhor estilo clínico geral. Ao cair da tarde, já à hora de voltar à base, não é raro os pesquisadores depararem com uma cena semelhante à da foto que abre esta reportagem: crianças e adultos se refrescando inocentemente num riacho ou lagoa. Justamente na hora, fim do dia, e local, beira de rio, que o mosquito transmissor da malária na Amazônia, o Anopheles darlingi, gosta de picar suas vítimas. É provável que panos vermelhos sejam em breve colocados na casa dos outrora alegres banhistas, um sinal usado pelos moradores para informar aos motoqueiros da prefeitura, que periodicamente passam por ali, que há gente com febre alta e suspeita de malária naquela casa, precisando fazer uma lâmina com urgência. • OS PROJETOS Levantamento da Fauna de Carrapatos de Rondônia e Determinação da Prevalência de Rickettsia, Erlichia e Borrelia nesses artrópodes MODALIDADE

Projeto temático

Antígenos

Variantes

de

Plasmodium Falciparum: Participação no Fenômeno de Citoaderência e Repercussões na Patogenia da Malária grave MODALIDADE

Linha regular de auxílio

à pesquisa COORDENADOR ERNEY FELÍCIO PLESSMANN CAMARGO - ICB/USP

COORDENADOR LUIZ HILDEBRANDO

PEREIRA

DA SILVA - ICB/USP

INVESTIMENTO

R$ 410.079,07

INVESTIMENTO

R$ 392.269,81

PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 39


• CIÊNCIA

MEDICINA

A vacina que protege ,.." o coraçao Começa o ambicioso projeto de combate à febre reumática, que ataca o tecido cardíaco

ADILSON

As crianças são o alvo principal da pesquisa em desenvolvimento no Incor

AUGUSTO

material está pronto. Seqüências de proteínas da bactéria responsável por uma reação do organismo que desencadeia a febre reumática começarão a ser testadas em laboratório e animais experimentais. Elas servirão de base para uma vacina contra as infecções de garganta causadas pelo microrganismo que iniciam essa grave doença. O isolamento das seqüências de proteínas é o combustível para a arrancada de um projeto recém-aprovado no âmbito do programa Parceria para Inovação Tecnológica (PITE) e coordenado por Luiza Guilherme Guglielmi e Jorge Kalil, ambos do Instituto do Coração (Incor) da Universidade de São Paulo (USP). Com investimentos de US$ 3 milhões, em proporções iguais da FAPESP e do Laboratório Teuto-Brasileiro, uma indústria farmacêutica nacional com sede em Anápolis (GO) que produz medicamentos

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genéricos, o projeto da vacina aponta para a solução de um mal que em sua forma mais grave ataca o tecido cardíaco, destrói as válvulas mitral e aórtica, atinge predominantemente populações pobres e pesa nos gastos dos sistemas públicos de saúde. A bactéria fatídica, a Streptococus pyogenes, também conhecida como estreptococo do Grupo A, que está na mira da futura vacina, é objeto de 12 anos de estudos da equipe do Laboratório de Imunologia do Incor, dirigido por Kalil.Não causa diretamente a doença, mas desencadeia um processo que faz o organismo voltar-se contra si mesmo - característica das chamadas doenças autoimunes, como a febre reumática. Sem tratamento, o que no início é uma simples amigdalite causada pelo estreptococo evolui para estados febris, dores nas articulações e, finalmente, ataque ao tecido do coração. A cada ocorrência da infecção, o quadro se repete. Quando partes do tecido cardíaco


já foram destruídas, o paciente pode ser salvo somente por meio de uma cirurgia - em geral de troca das válvulas mitral ou aórtica, com alto custo e possíveis seqüelas. Em 1998,90% das cirurgias cardíacas infantis feitas no Brasil se deveram à febre reumática. Com adultos, esse índice vai para 30%, ainda considerado alto. Há um total de cerca de 10 mil cirurgias por ano, a um custo de US$ 8 mil a US$ 10 mil cada. ''A febre reumática é uma doença muito cara para o sistema de saúde de qualquer país': diz Luiza. No Brasil, onde se registram 18 mil novos casos por ano, um paciente de febre reumática com problemas no coração custa US$ 10 mil por ano ao Sistema Único de Saúde (SUS). Alvo errado - A reação destruidora do organismo tem uma lógica. Kalil faz uma analogia bem-humorada com as investigações do recente seqüestro do publicitário Washington Olivetto, no qual estavam envolvidos cidadãos chilenos. Suponha-se que houvesse um sistema de rastreamento telefônico capaz de identificar idiomas, mas não sotaques: sem a prisão dos chilenos, todas as pessoas de fala espanhola seriam potencialmente suspeitas. No caso da febre reumática, existem no tecido cardíaco proteínas com uma acentuada semelhança com às da bactéria. A semelhança faz as células do sistema imunológico atacarem não a bactéria, mas o coração, por uma reação chamada mimetismo biológico. O organismo estabelece a identificação fatal: passa a atacar não só a bactéria, mas também o tecido. Já que a confusão pode surgir, é crucial barrar o avanço do processo. Isso é normalmente feito com o tratamento rápido das infecções de garganta com antibiótico - nem sempre possível em regiões carentes de serviços de saúde. A solução - radical e definitiva - seria evitar o ataque bacteriano por meio de uma vacina capaz de imunizar todas as crianças, as principais vítimas da doença. A febre reumática incide em geral sobre a faixa etária dos 5 aos 18 anos, predominantemente em países po-

bres, e atinge universalmente de 3% a 4% dos infectados e não tratados. Entre esses, de 30 a 45%, provavelmente devido a uma predisposição genética, desenvolvem a forma mais grave da doença, a que ataca o coração. O sistema imune ataca o próprio tecido de quatro a oito semanas depois do início da infecção de garganta, que costuma durar de sete a dez dias, não havendo mais bactérias a combater. Normalmente, o sistema combate a bactéria ativando células do sangue chamadas glóbulos brancos ou leucócitos (sobretudo os linfócitos T e B), responsáveis pela destruição dos estreptococos. as cnanças com suscetibilidade genética, ocorre uma agressão ao próprio tecido, a chamada reação autoimune. O sistema imunológico armazena numa espécie de memória a estrutura da bactéria, que permite que seja reconhecida caso reapareça. Nessas crianças, ele reconhece estruturas - pedaços de proteínas - do coração, semelhantes às da bactéria. Num mecanismo conhecido como reação cruzada, essas estruturas passam a ser atacadas. "Essa espécie de 'erro biológico' faz com que as doenças auto-imunes sejam muito estudadas': salienta Kalil. O caminho da equipe para a concepção da vacina foi traçado a partir da parede celular do estreptococo. Luiza explica que a bactéria tem uma proteína externa na parede celular, chamada proteína M. É essa proteína que ocasiona a reação cruzada entre as proteínas do coração e as da bactéria, ambas com estruturas semelhantes. Mas essa mesma proteína tem regiões que não desencadeiam essas reações cruzadas e aparentemente dão proteção contra a bactéria. "Estudamos as duas regiões, as que desencadeiam reações contra o coração e as que não", comenta a pesquisadora. A equipe do Incor pretende fazer uma vacina com as regiões que não desencadeiem a reação cruzada, mas uma resposta de proteção.

Existem três abordagens distintas. ''A seqüência 'boa' pode ter combinações de peptídios (fragmentos de proteínas) que componham a vacina", conta Luiza. "Ou podemos construir uma proteína recombinante, obtida por meio de uma bactéria inócua, que contenha essas seqüências." A terceira alternativa, a menos provável, segundo Kalil, é a vacina de DNA (ácido desoxirribonucléico, portador do código genético) por meio de um vetor. "Essa possibilidade está conceitualmente desenvolvida, mas tecnologicamente não': diz ele. "Ainda não há nenhuma vacina de DNA em uso:' Os pesquisadores estão na fase de escolha das regiões das proteínas. "Temos de começar a síntese dos peptídeos dessas regiões, desenvolver a proteína recombinante e implantar a metodologia para uma possível vacina de DNA': comenta Luiza. Tecnologicamente, o grupo do Incor propõe uma vacina ou com fração de proteína ou com o DNA desnudado, sem risco de desencadear a doença. Os testes - Em qualquer das abordagens, a vacina será evidentemente testada em modelos animais antes de chegar aos seres humanos. Serão utilizados camundongos de dois tipos: não manipulados geneticamente (isogênicos) e manipulados (transgênicos). Os do segundo grupo conterão um gene humano que atua no reconhecimento da vacina e é extremamente importante para desencadear a resposta do sistema imune. "Queremos nos aproximar o máximo possível do que seria uma resposta nos seres humanos", explica Luiza. Essa é a primeira fase. Na etapa seguinte, os pesquisadores passarão para o ensaio com primatas e, mais tarde, com seres humanos. Não contam ainda com um modelo primata. O modelo do rato, aliás, o rato Lewis, só foi encontrado no fim de 2001, por desenvolver a doença cardíaca no caso de febre reumática. A experimentação com animais deve durar cerca de cinco anos. Depois, haverá mais dois a três anos de ensaios clínicos com seres humanos. PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 41


o raio de ação da vacina não abrange apenas a prevenção da febre reumática. Luiza salienta que esse é o ponto fundamental, mas o medicamento que deve emergir das pesquisas terá uma ação bem mais abrangente. Primeiramente, impedirá, de modo geral, as infecções por estreptococos tipo A, como o causador da infecção de garganta, comum em crianças: um estudo recente realizado em creches de Curitiba mostrou que 24,5% das crianças tinham o estreptococo na garganta. "Como não podemos saber quem vai desenvolver a Streptococus: na membrana, a chave da vacina doença", comenta Kalil, "a vacicil" Por essas razões, lembra ela, é elena tem de proteger a todos". Outra vantagem seria reduzir a vado o número de crianças que não carga de antibióticos sobre os pacienadere ao tratamento. tes de febre reumática. A princípio, alil acrescenta: "Há o bastaria a vacina para impedir novas infecções mais permanentemente em problema social, o ecocrianças que já têm a doença e são nômico e o de saúde obrigadas a tomar penicilina (benzapública. É uma doença tina em geral) a cada 21 dias. Esse peque atinge mais as poríodo de medicação com antibiótico pulações pobres provavelmente porse baseia no ciclo de desenvolvimento que os ricos tratam mais precocemente a infecção de garganta. E há o risco da infecção de garganta pelo estreptococo, que, afinal, anda solto por aí. inerente ao desenvolvimento da vaci"Todos estamos sujeitos a essa infecna, o desafio de se conseguir uma vação, que tem picos de ocorrência: oucina que produza uma resposta boa e tono, inverno e começo da primavera", eficaz, sem o risco de desenvolvér a lembra a pesquisadora. doença, já que a mesma proteína ligaO problema é que, nas crianças da à resposta protetora pode desencadear a doença': Enfim, a vacina não que já desenvolveram a doença, a cada nova infecção causada pelo espode causar doença alguma, nem treptococo voltam os problemas - femesmo a infecção de garganta. O objetivo é fazer a vacina constar bre, dores articulares e os danos cardíacos. Em casos mais brandos, o entre as obrigatórias, que toda criança deve tomar em determinada idade. coração não chega a ser atingido, mas os pacientes podem desenvolver a coréia, um distúrbio neurológico que PROJETO provoca movimentos involuntários e Desenvolvimento de Vacina costuma ser confundido com a chacontra o Estreptococo Beta mada doença de São Vito. Nesses caHemolítico do Grupo A sos, o diagnóstico é prococe, porque MODALIDADE o problema é bem visível, o que não Parceria para Inovação Tecnológica ocorre na cardiopatia. COORDENADORES Os pesquisadores do Incor acenLUIZA GUILHERME GUGLIELMI E tuam a dimensão social do problema. JORGE ELIAS I(ALIL FILHO ''A maioria das crianças atingidas", INSTITUTO DO CORAÇÃo/U SP observa Luiza, "é de baixa renda e às INVESTIMENTO vezes vivem em locais onde falta posto US$ 1,5 milhão de saúde ou o acesso a um deles é difí-

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42 . MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

''Ainda temos de avaliar essa idade, mas seguramente não será antes dos três anos, pois há vacinas às quais crianças muito novas não respondem bem, sobretudo as feitas a partir de proteínas': diz a pesquisadora. O grupo começou há 12 anos a identificar fatores de suscetibilidade à febre reumática nos pacientes do Hospital das Clínicas da USP. Em seguida, estudou o desencadeamento da auto-imunidade - o ataque ao próprio organismo - e em 1995 publicou um artigo sobre o assunto em Círculation, a publicação científica top em cardiologia. O editorial da revista considerou os achados do grupo um marco na compreensão dessa doença. Nesses anos de trabalho, o grupo conquistou outros reconhecimentos. Um deles foi o Prêmio Unibanco de Saúde de 1997. Os pesquisadores atribuem o resultado à insistência no estudo intensivo da descrição da doença. Luiza conta que jamais se esqueceu do encerramento do Congresso Vacina do Futuro, em outubro de 2001, no Instituto Pasteur de Paris, quando se comentou que, apesar dos avanços de dos grupos de estudo em todo o mundo, ainda não havia uma fórmula de vacina, mas que à melhor alternativa chegará quem tiver maior conhecimento da doença a ser tratada. Os pesquisadores se apóiam também em equipamentos de ponta e um laboratório expandido para uma área de 750 metros quadrados. Uma parte especial do projeto envolve o estudo do proteoma: "Quanto mais estudarmos proteínas, mais poderemos evitar a reação cruzada e mais segura será a vacina': conclui Luiza. Kalil conta que uma das dez grandes questões não resolvidas pela ciência, citadas num balanço feito no final do século 20, é saber como ocorre o desencadeamento de uma doença auto-imune. O acordo do Incor com a empresa prevê que a FAPESP vai receber 3% do faturamento líquido (faturamento bruto menos impostos) gerado pela comercialização da vacina. •


Bolsas de pós-doutoramento da FAPESP. O sistema brasileiro de pesquisa se expande. f

A FAPESP está revolucionando sua política de pós-doutoramento, ampliando o prazo de duração das bolsas e possibilitando estágios no exterior dentro de uma concepção que torne o intercâmbio com centros de pesquisa de outros países produtivo para a ciência brasileira. Os bolsistas devem vincular-se aos mais importantes programas de pesquisa financiados pela Fundação. São centenas de projetos, em todas as áreas do conhecimento, que permitem uma sólida formação aos jovens doutores integrados a grupos de excelência. Para mais informações, acesse www.fapesp.br ou ligue (11) 3838 4000. Projetos Temáticos (150 projetos de pesquisa) Grandes equipes formadas por pesquisadores de diferentes instituiçâes em busca de resultados científicos, tecnológicos e socioeconômicos de grande impacto. Programa Genoma (60 laboratórios) Projetos com o objetivo de pesquisar genomas, identificar e analisar genes com impacto sobre o conhecimento genômico, a saúde humana e a produção agropecuária.

Secretaria da Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico

Programa CEPID (10 centros de pesquisa) Centros para desenvolver pesquisas inovadoras na fronteira do conhecimento, transferir seus resultados para os setores público e privado e contribuir para a criação de novas tecnologias e empresas.

Programa Biota (25 projetos) Projetos que visam ao levantamento e novos conhecimentos sobre a biodiversidade do Estado de São Paulo e outras regiões do país.

Programas Jovens Pesquisadores (270 projetos) Programa que fomenta a formação de novos grupos de pesquisa em centros emergentes do Estado de São Paulo.

Rua Pio XI, 1500 - Alto da Lapa 05468-901 - São Paulo - SP Tel.: (11) 38384000 - www.fapesp.br


• CIÊNCIA

GENÔMICA

o mapa

da árvore do papel Descoberta de 6.800 genes do eucalipto impulsiona a busca por aumento de produtividade no setor florestal mmeados de fevereiro, o fim da primeira fase do p~ojeto F~rES!s, que previa o sequenClamento parcial do genoma de árvores de eucalipto (Eucalyptus spp), bancado pela FAPESP em parceria com quatro empresas do setor de papel, celulose, aglomerados e laminados (Votorantim, Ripasa, Suzano e Duratex), trouxe duas boas notícias. A primeira foi o término dos trabalhos dessa etapa um mês antes do prazo previsto, depois de terem sido seqüenciadas 110 mil ESTs (etiquetas de seqüências expressas, fragmentos do código genético que ajudam a identificar os genes). A segunda, mais importante, foi a descoberta, em meio aos prováveis 27.500 genes encontrados com o auxílio das ESTs, de 6.800 genes novos, nunca antes localizados em outros projetos mundial de seqüenciamento de genomas. "A maioria dos novos genes deve ser específica do eucalipto", comenta Helaine Carrer, da Escola Su-

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Baseada no eucalipto, a indústria de papel e celulose responde por 4% do PIB


perior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da Universidade de São Paulo (USP), coordenadora do projeto, que se utiliza da rede de 20 laboratórios do projeto Genomas Agronômicos e Ambientais (AEG), da FAPESP. "Consultamos os bancos de dados internacionais e não os encontramos no genoma de outros organismos." Na fase inicial do ForESTs, a Fundação destinou US$ 530 mil ao projeto e o consórcio, R$ 500 mil. Próxima fase - Justamente por não haver informação disponível sobre os novos genes, essas quase 7 mil seqüências capazes de codificar proteínas serão examinadas com atenção redobrada na segunda fase do ForESTs, que deverá se estender por três anos, com investimento previsto de mais R$ 1 milhão por parte das empresas. Na busca por genes de importância econômica para a indústria florestal, que possam ser úteis para aumentar a produtividade e reduzir custos nos processos de produção de papel e celulose, os pesquisadores vão, a partir de agora, vasculhar todo o material genético já mapeado do eucalipto. Para isso, vão lançar mão de uma série de técnicas destinadas a jogar luz sobre a função de genes, entre elas o uso dos chamados microarrays ou chips de DNA (ácido desoxirribonucléico), diminutas lâminas especiais nas quais se colocam milhares de genes. A metodologia permite estudar simultaneamente o padrão expressão de um conjunto de genes nas mais diversas situações. Em outras palavras, ver quais genes são ou não usados (e com que intensidade) durante o desenvolvimento de um ser vivo. "Hoje em dia, trabalha-se cada vez mais com a noção de que a ação de um grupo de genes - e não de apenas um gene - determina os traços de uma pessoa, de um animal ou de uma planta", diz Helaine. No caso do eucalipto, o emprego dos chips de DNA deve ser útil na procura por genes envolvidos, por exemplo, nas sínteses químicas que regulam a produção das fibras de celulose, a matéria-prima do papel, e de lignina, substância que se deposi-

ta nas paredes das células vegetais e confere resistência à madeira. De acordo com o tipo de lignina, que pode responder por até 25% da composição da madeira, a extração da celulose do eucalipto torna-se fácil ou complicada, cara ou barata. "Já são conhecidos os genes que atuam nesses processos", afirma Helaine. Nessa segunda fase do projeto, também deverão ser estudados genes que possam conferir ao eucalipto maior resistência a doenças, à escassez de água e ao frio. Essas são apenas algumas das abordagens que deverão ser testadas pelos membros do projeto ForESTs, com o intuito de encontrar formas para melhorar a produtividade das indústrias de polpa, papel, celulose e painéis laminados, que emprega 150 mil pessoas no país, movimenta algo como 4% do Produto Interno Bruto (PIB) e responde por cerca de 8% das exportações anuais. Com o tempo, outras alternativas poderão se firmar, à medida que as pesquisas avançam. Simque descobrirem os grupos de genes relacionados a melhorias de produtividade, os pesquisadores informarão às empresas, que vão procurar. esses genes nas plantas já cultivadas em viveiros e selecionar as variedades mais adequadas a seus propósitos. Os cientistas não descartam a possibilidade de produzirem espécies geneticamente modificadas, embora esse não seja o objetivo primordial. Para averiguar se um gene introduzido na planta foi incorporado e é expresso, não seria ne-

A

o PROJETO FORESTs: Euca/yptus Genome Sequencing Project Consortium MOOALIDADE

Programa Parceria para Inovação Tecnológica (PITE) COORDENADORA HELAINE

CARRER - ESALQ/USP

INVESTIMENTO

R$ 500.000,00 e US$ 530.000,00

cessário esperar o eucalipto crescer, o que demora em média sete anos. Em laboratório, poucos meses após a alteração no genoma, já se consegue determinar, com o auxílio de marcadores moleculares, se o gene introduzido se manifesta na planta em formação. Concorrência internacional - Ser rápido e eficiente é importante num projeto como o ForESTs. Até por que a concorrência internacional na área de melhoramento genético do eucalipto entre as empresa de papel e celulose é grande. De acordo com Mathias Kirst, pesquisador brasileiro do Grupo de Biotecnologia em Florestas da Universidade da Carolina do Norte, nos Estados Unidos, que visitou a Esalq no mês passado, uma iniciativa conduzida por uma empresa da Nova Zelândia já seqüenciou 500 mil ESTs do genoma dessa árvore. É um resultado quase cinco vez maior do que o projeto paulista. "Esses dados nunca vão se tornar públicos por que o trabalho foi feito por uma companhia privada': comenta Kirst. Até o momento, a equipe de pesquisadores sob sua coordenação seqüenciou apenas 12 mil seqüências de genoma de eucalipto. Também em fevereiro, dois dias após o anúncio do término da primeira fase do ForESTs, o governo federal lançou uma iniciativa nacional destinada a pesquisar formas de melhoramento genético do eucalipto, o Projeto Genolyptus. Um grupo de 12 empresas, sete universidades e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) participa do projeto, previsto para durar cinco anos, em sua primeira fase. O orçamento inicial do projeto federal é de R$ 12 milhões, dos quais 70% deverão ser bancados pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, com verba do Fundo Verde-Amarelo, e 30% pelas empresas. Os pesquisadores da rede Gelolyptus pretendem estudar em plantações espalhadas por todo o território nacional as melhores formas de aumentar a produtividade, diminuir a poluição das indústrias do setor florestal e criar plantas mais resistentes e adequados aos diferentes usos • PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 45


• CIÊNCIA

PECUÁRIA

Um tiro certeiro Vacina garante que só os animais infectados pela aftosa sejam sacrificados m pesquisador mineiro desenvolveu uma vacina alternativa - do tipo recombinante, feito por engenharia genética - contra o terror dos pecuaristas: a febre aftosa, doença virótica que faz os bovinos perderem peso, capacidade de movimento e potencial reprodutivo. Num rebanho onde se constata a infecção, todos devem ser sacrificados, imposição legal para evitar o avanço de uma das doenças mais contagiosas que existe: pode infectar mil animais num dia. A vantagem da vacina de Mauro Moraes, da Universidade Federal de Viçosa (MG), é que permite identificar os animais infectados e salvar os demais. Moraes, que desenvolveu a vacina nos dois anos que passou em Nova York, como professor do centro veterinário Plum Island, do governo americano, não usou o vírus inteiro morto, como é comum. Em vez disso, é um inofensivo adenovírus humano tipo 5 que atua como veto r, levando tão-somente a estrutura protéica do vírus - chamada cápside. Essa parte contém dois trechos da sequência codificadora das chamadas proteínas estruturais: Pl, retirado da cepa (variedade) A24 do vírus, e 3C, da cepa A12. São esses os trechos que funcionam como antígenos. Eles acionam a produção de anticorpos contra a aftosa. Esse procedimento também descarta a molécula de RNA (ácido ribonucléico), que contém o genoma do vírus e lhe garante a reprodução. Testada em 38 porcos Yorkshire, a vacina teve 100% de eficiência - a mesma do produto comercial, que foi

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o padrão de comparação. Houve um experimento com 24 animais e outro com 14. Eles receberam uma só dose da vacina e em seguida foram desafiados com o vírus vivo, em três etapas: 7, 14 e 42 dias depois. No final, só os animais do grupo de controle - nãovacinados - desenvolveram os sinais da doença. Os resultados fundamentaram um artigo de Moraes, aceito para publicação na revista Vaccine. A nova vacina oferece menos riscos. No uso da vacina atual, é difícil distinguir animais infectados ou não. Tanto a proteção gerada pela vacina quanto a resposta ao ataque do virus real são medidas pela presença de anticorpos no sangue dos animais. O problema é que, nesse exame, não dá para distinguir os anticorpos produzidos em resposta ao vírus dos que resultaram da aplicação da vacina. Por ser feita só com as proteínas do envelope viral, que leva a reações muito restritas, a nova vacina permitiria distinguir a presença de anticorpos provocados por ela dos que resul-

tam da infecção. Assim seria possível reconhecer e eliminar os infectados. "A vacina recombinante poderia ser utilizada em casos de emergência, diminuindo os custos de combate da doença': diz o pesquisador. Outra vantagem é a produção descentralizada. Para Moraes, a vacina pode ser feita sem risco em regiões livres de aftosa, o que a lei atual não permite, por temer que o vírus se espalhe no ar. "Até laboratórios de pouca experiência na manipulação de vírus poderiam multiplicar o adenovírus com o antígeno, sem perigo", destaca. Hoje, a inativação do vírus e a produção da vacina se concentram em laboratórios de alta segurança. Moraes fez um teste com quatro bovinos. ''Avacina também protegeu, mas ainda é preciso muito trabalho até definir a melhor dosagem". Para avançar, ele precisa de um laboratório de segurança nível 3 em Pedro Leopoldo, perto de Belo Horizonte (MG), que o Ministério da Agricultura está construindo este ano. O laboratório fará controle de medicamentos e pesquisas: serão as únicas instalações públicas aptas a lidar com o vírus da aftosa. ''A produção depende da iniciativa privada, mas empresas com experiência em vacinas não teriam maiores dificuldades, pois se trata de produção de vírus com tecnologia utilizada em outros sistemas." • Próxima etapa: mais testes com bovinos para definir a dosagem


• CIÊNCIA rio r para fazer pesquisas e participar de conferências. Entre 1957 e 58, tornou-se representante brasileiro na Agência Internacional de Energia Atômica, em Viena, e permaneceu como seu diretor de Departamento de Informação Científica até 1967. Foi um dos primeiros a medir a queda de que levasse ao bacharelado de Física. radioatividade no Hemisfério Sul cau"Portanto, todos os físicos tinham de Morto aos 96 anos, sada por testes de bombas de hidroser autodidatas': lembrou Gross em Bernhard Gross unia teoria gênio no Hemisfério Norte. Também palestra dada em 1984, depois publie prática com raro brilho desenvolveu um aparelho, chamado cada na Revista Brasileira de Ensino de dosímetro de Compton, para detectar Física (junho de 2000). Ele começou a raios gama, empregado pelos nortetrabalhar em pesquisa no Brasil em americanos em testes nucleares. uando se ouve falar sobre as 1934, no Instituto Nacional de TecnoGross participou ativamente de qualidades profissionais do fílogia, no Rio. Lá, voltou-se para o esorganizações que viriam a ser fundasico Bernhard Gross é difícil saber em tudo dos dielétricos sólidos submetimentais para o desenvolvimento da que área ele atuava melhor: na parte dos a campos elétricos, tanto do ponto ciência no país. "Álvaro Alberto, Joateórica, experimental ou no ensino? A de vista teórico como experimental, quim Costa Ribeiro e Gross formadificuldade em classificar esse alemão assunto em que se tornou um dos mais vam a espinha dorsal nos primeiros naturalizado brasileiro é tão comum respeitados especialistas no mundo. anos do Conselho Nacional de Desenentre amigos e discípulos quanto a Depois da Segunda Grande Guervolvimento Científico e Tecnológico admiração que ele causou nos 69 anos ra, Gross passou a viajar para o exte(CNPq)': conta Sérgio Masvividos no Brasil. Gross, um carenhas, diretor do Instifísico completo, morreu no tuto de Estudos Avançados dia 1 de fevereiro, em São (IEA/USP), em São Carlos. Carlos (SP), aos 96 anos. Mascarenhas o levou para Bernhard Gross chegou trabalhar no Instituto de ao Brasil em 1933, aos 28 Física da Universidade de anos, vindo da Escola de São Paulo, de São Carlos, no Engenharia de Stuttgart, começo dos anos 70. na Alemanha, onde nasGross casou-se com ceu. Mas ele havia visitado Gertrude, com quem teve o país uma vez, aos 9 anos, os filhos Antônio e Robercom sua mãe. Ao desemto. "Até 1996, ele mantevebarcar no Rio de Janeiro, o físico trazia na bagagem se ativo, quando orientou sua última tese de doutorapelo menos um trabalho do", diz Guilherme Leal importante sobre raios cósmicos (partículas ele- Gross dando aula no IF aos 85 anos: atividade extraordinária Ferreira, outro físico muito próximo. Quando morreu, mentares energéticas que deixou cerca de 200 artigos chegam à Terra), feito na publicados em revistas do Europa. Posteriormente, esBrasil e do exterior. O atual se estudo levou seu nome: a pró-reitor de Pesquisa da "transformação de Gross" USP, Luiz Nunes, que foi relacionava o fluxo vertical aluno de Gross, conta de das partículas com o fluxo uma rara qualidade. "Ele hemisférico, detectado por incentivava e dava um vacâmaras de ionização. lor notável para idéias Ao chegar ao Rio, Gross alheias, mesmo que parincorporou-se rapidamentissem de pesquisadores te ao meio científico, conmuito jovens e ainda sem centrado na Escola Politécnica. Na época, não existia expressão", diz. Para um cientista com seu vulto, não no Brasil a profissão de físiGross C1 o à direita) em 1959, na reunião sobre energia atômica co, nem curso especializado era pouco. •

PERSONALIDADE

Um físico completo

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PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 47






vista

Em quase 50 anos, desaparecem 22,S km2 da cobertura de gelo da BaĂ­a do Almirantado

Campo de gelo Warzawa

Campo de gelo Krakow


• CIÊNCIA

AM BIENTE

o gelo perdido

de uma ilha

Mapa de pesquisadores gaúchos mostra a retração das geleiras da ilha Rei George, onde fica a base do Brasil na Antártica

dmos pontos do globo terrestre que sofre mais claramente os primeiros efeitos do aquecimento global são as geleiras ou glaciares da Antártica. Entre essas formações, as que reagem mais rapidamente ao aumento de poucos décimos de grau na temperatura são as situadas nas bordas do continente branco, coladas ao litoral, normalmente mais finas e expostas constantemente a temperaturas próximas de seu ponto de derretimento (O°C). Num trabalho recém-concluído, pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e da Universidade de Freiburg, Alemanha, produziram o mais completo e atual mapa digital da topografia de um desses sensíveis fragmentos de terra recoberta de gelo: a ilha Rei George, que abriga a base brasileira na Antártica e mais oito estações de pesquisa, 120 quilômetros ao norte da península Antártica. Gerado a partir do cruzamento de uma série de fontes de informação - imagens de sensoreamento remoto fornecidas pelo satélite europeu SPOT,

U ...a península ...

...e o continente gelado

PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 53


dados produzidos em recentes pesquisas de campo com aparelho GPS (Sistema de Posicionamento Global), consultas a mapas topográficos e ao banco de dados digitais sobre o continente mantido pelo Serviço Antártico Britânico -, o novo mapa é um instrumento importante para a realização de estudos glaciológicos, climatológicos e de manejo ambiental. Confrontando os dados do mapa atual com antigas cartas geográficas, os pesquisadores constataram que um importante grupo de geleiras da ilha perdeu 10% da extensão em pouco menos de meio século. Entre 1956 e 2000, as massas de gelo da baía do Almirantado, a zona escolhida para o estudo - onde, por sinal, fica a estação de pesquisa brasileira - encolheram 22,5 quilômetros quadrados. As informações se referem às geleiras de maré, que se situam de frente para o mar, sujeitas à ação do oceano. Mas não há evidências de que o encolhimento das massas de gelo da baía se deva a mudanças na dinâmica das marés. "A magnitude dessa retração indica que o processo não faz parte da dinâmica natural de avanços e retrocessos de geleiras", diz Iefferson Cardia Simões, chefe do Laboratório de Pesquisas Antárticas e Glaciológicas (Lapag) da UFRGS, um dos autores do mapa. "Essas massas de gelo estão provavelmente respondendo a um aumento da temperatura da região". - O grau de definição da carta virtual produzida pelos brasileiros e alemães permite monitorar alterações em áreas tão pequenas quanto 0,5 quilômetro quadrado, uma resolução no mínimo cinco vezes maior do que a dos mapas antigos. Com 1.157 quilômetros quadrados (80% da área do município de São Paulo), a Rei George, aquecida e com geleiras derretendo, não gera grandes icebergs, como os que ficam vagando meses ou anos pelos mares e põem em perigo populações de animais marinhos. Um exemplo é o BISA, massa de gelo de 5.400 quilômetros quadrados (três municípios de São Paulo) que se desprendeu daAnAquecimento

54 • MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

!

tártica em março de 2000 e hoje atormenta colônias de pingüins adélia (Pygoscelis adeliae) no mar de Ross, oeste do continente. Ainda assim, o encolhimento das geleiras na ilha - quase 93% do 'território da Rei George são cobertos de gelo e neve - pode produzir impactos regionais, além de sinalizar que o clima ali está realmente mudando. Localmente, a retração dos glaciares faz surgir novas áreas de terra firme livres de gelo na ilha, criando ambiente fa-

vorável ao surgimento de colônias de animais. Afinal, onde antes havia gelo, há rocha exposta. "A regressão das geleiras ainda pode afetar a vida aquática': diz Jefferson. O impacto ambiental pode ser agravado pela farta presença de pesquisadores e turistas (4 mil por verão) na ilha, um dos pontos acessíveis da Antártica. Ela faz parte do arquipélago das Shetlands do Sul, a cerca de 900 quilômetros da Terra do Fogo, ponta meridional da América do Sul.

Uma hipótese na contramão Um estudo publicado na revista norte-americana Science (edição de 18 de janeiro) põe em cheque uma tendência de interpretação dos fenômenos climáticos que se frrmara nos últimos anos em termos de Antártica: a de que a camada de gelo e neve que recobre quase integralmente o continente está derretendo em razão do aquecimento do clima da Terra. Feito

pelos pesquisadores Ian Ioughin, do Instituto de Tecnologia da Califórnia, e Slawec Tulaczyc, da Universidade da Califórnia, o novo trabalho mostra um aumento na espessura do recife de gelo de Ross, também chamado de plataforma de Ross, um conjunto de geleiras que recobrem o oeste da Antártica e avançam mar (de Ross) adentro.

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Efeitos do calor crescente: surgem áreas de terra firme livres de gelo e ambientes favoráveis às skuas, aves típicas da Antártica

o padrão do recuo mostrado pelas geleiras da Rei George na segunda metade do século 20 reforça a hipótese de que o derretimento se deva ao aquecimento do clima. Em quatro décadas e meia, a velocidade da retração parece aumentar à medida que o aquecimento se torna mais evidente, sobretudo após os anos 70. Os números ratificam esse raciocínio. Entre 1956 e 1979, desapareceram da baía do Almirantado 4,3 quilômetros quadrados de massas de gelo. PraDe acordo com os cálculos da dupla de cientistas, a plataforma de Ross ganha entre 14,9 e 26,8 bilhões de toneladas de gelo/neve por ano. O resultado contradiz os de trabalhos anteriores, que indicavam um encolhimento (derretimento) anual de até 20,9 bilhões de toneladas de gelo na plataforma. Mas, segundo os próprios Ioughin e Tulaczyc, as aparentes discrepâncias entre os dados de seu trabalho e os de medições mais antigas podem ser menores do que se pensa, por dois mo-

ticamente a mesma área de geleiras (4,9 quilômetros quadrados) esvaiu-se de 1979 a 1988, período que não chega à metade do anterior. Entre .1988 e 1995,apenas oito anos, o ritmo se acentuou e sumiram mais 6,2 quilômetros quadrados de massas de gelo. Por fim, de 1995 a 2000, o último e mais recente período analisado, o tamanho do recuo foi o maior de toda a série histórica: 7,1 quilômetros quadrados. Surpreendente é que o vilão dessa história pode ser um mísero aumento

tivos. Primeiro: há fartas evidências de que no passado a plataforma realmente encolheu. Segundo: o engrossamento da plataforma pode ter pouco a ver com variações na temperatura da Terra e ser apenas fruto de um ciclo natural de aumento e encolhimento das geleiras. Por esse raciocínio, num golpe de sorte, os pesquisadores norteamericanos teriam feito as medições no momento em que a tendência à diminuição das geleiras teria dado lugar ao aumento de sua massa.

de 1,08°C na temperatura média da Rei George, registrado entre 1947 e 1995, de acordo com dados de pesquisadores do Lapag. Pode parecer pouco, mas é muito: quase o dobro do aumento médio na temperatura da Terra verificada ao longo dos últimos 100 anos, que foi de 0,6oC. Na península Antártica, entre as latitudes 65° e 70° sul, região um pouco mais ao sul da Rei George, o aquecimento foi ainda maior: cerca de 2°C nos últimos 50 anos. Há um consenso de que essa região, na margem do continente, passa por um processo de aquecimento. Quanto à Antártica como um todo, há dados conflitantes: estudo publicado na revista inglesa Nature (edição de 31/1/2002) afirma que, em vez de ter aumentado, a temperatura média do continente, sobretudo nos meses de verão e outono, diminuiu ligeiramente entre 1966 e 2000. Efeito estufa - Acredita-se em geral que o aquecimento global é conseqüência do aumento no efeito estufa, que elevaria a temperatura da atmosfera. O efeito estufa é natural, necessário à vida: sem a cortina de gases atmosféricos, especialmente dióxido de carbono (C02) e metano, que retém parte da energia emitida pelo Sol, o globo seria frio e inóspito. O problema é que a elevação brutal nas concentrações atmosféricas de CO2 desde o início da Revolução Industrial - de 280 ppm (partes por milhão), em 1850, para 370 ppm hoje - tende a intensificar o efeito estufa. Algumas projeções apontam para a possibilidade de a temperatura da Terra aumentar mais de 3°C até o final do século. O derretimento de geleiras na Antártica, no oceano Árticoe na Groenlândia deve se intensificaro que significariaum aumento de até 90 centímetros no nível do mar em 2100, capaz de provocar a inundação de cidades costeiras, no mundo todo. • PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 55


começo o de fevereiro, o Brasil recebeu uma boa notícia: ocupa, em 2002, a 20a posição, entre 142 países, no Índice de Sustentabilidade Ambiental (ESI, na sigla em inglês), elaborado, pelo segundo ano consecutivo, por especialistas das universidades norte-americanas Yale e Columbia. A lista, com a Finlândia como primeira colocada, seguida pela Noruega e Suécia, foi divulgada em Nova York, no Fórum Econômico Mundial, responsável pela encomenda do trabalho. E possui alguns dados reconfortantes para a auto-estima nacional. Por exemplo: o Brasil, com uma pontuação geral de 59,6, numa escala de zero a cem, situou-se 31 posições à frente dos Estados Unidos, que obtiveram 52,8. E registre-se que a po-

N ENTREVISTA Carlos Alfredo Joly

e Vanderlei Perez Canhos

Entre 142 países, o Brasil obteve uma posição de destaque no recém-anunciado Índice de Sustentabilidade Ambiental. Mas os coordenadores do programa Biota FAPESP alertam: ainda há muito espaço a se conquistar no cenário internacional

MARILUCE

MOURA

56 • MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

te do Centro de Referência em Informação Ambiental (Cria) e professor aposentado de Microbiologia de Alimentos da Unicamp. A longa conversa não se restringiu ao ESI - enveredou pelo Biota, por questões da pesquisa em biodiversidade no Brasil e no exterior. A seguir, estão os principais trechos da entrevista com os pesquisadores: • Vou começar pela questão do índice de sustentabilidade. Tem importância para o Brasil a posição alcançada? Carlos Alfredo Joly - É um pouco difícil dizer. Eles apresentaram esse índice pela primeira vez em 2001. Agora apresentaram essa versão de 2002. E começam a nova versão dizendo assim: esqueçam a de 2001, porque a metodologia foi completamente modificada. Então esses dados de 2002 não podem ser comparados com os

Em favor do meio derosa nação ocupava, em 2001, o Ll= lugar na lista, enquanto estávamos no modesto 51 lugar hoje tomado pelos EUA. No composição do ESI versão 2002 entraram 20 indicadores, obti.dos a partir de 68 variáveis. Elas incluem informações ambientais, propriamente, sociais e institucionais. Buscamos, para comentar o ESI, seus critérios e real importância, um reconhecido especialista brasileiro em biodiversidade. Mas como o premiado programa Biota FAPESP,que completa três anos neste mês de março, é um celeiro deles, terminamos conversando não com um, mas com dois pesquisadores, compondo, assim, uma entrevista um tanto incomum, com Carlos Alfredo Ioly e Vanderlei Perez Canhos. O primeiro é coordenador do Biota, professor titular de ecologia vegetal do Departamento de Botânica do Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp); o segundo é membro do núcleo de coordenação do Biota, diretor-presiden0

de 2001. É um início, eles vão ter que melhorar os parâmetros, ampliar o número de coisas consideradas e conhecer um pouco melhor a realidade de cada país, saber o quanto se investe aqui no Brasil, por exemplo, dentro da área de pesquisa, ete. Mas é uma boa notícia. • Iniciativas como o programa Biota FAPESP têm influência na posição alcançada pelo Brasil? J - Têm um impacto positivo, sem dúvida, uma vez que um dos parâmetros considerados para a atribuição do índice é o investimento em pesquisas voltadas para a conservação ou para a solução de problemas ambientais. Mas da maneira como foi feita a composição do índice, agora em 2002, pesa muito para a posição do Brasil o fato de termos a maior área florestal tropical do mundo, com algo em torno de 80% de seu total intactos. Não temos informações efetivas para vários dos parâmetros, mas teve também


Joly: apesar de mais impactada, a região Sudeste é a mais equilibrada

o ambiente e o 1-

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uma influência forte a qualidade da água. No estado de São Paulo discutimos essa questão como um problema, dentro de uma visão do esforço que está sendo feito para recuperação das bacias e manutenção do potencial hídrico. Mas a disponibilidade hídrica da Amazônia, considerada intacta, primária, com um volume de água gigantesco,certamente jogou lá para cima a pontuação do Brasil nesse aspecto (66 pontos em sistemas ambientais). Os responsáveis pelo índice também fizeram um certo agrupamento de critérios em que levaram em conta renda per capita, o produto bruto nacional. Acho que o Brasil poderia ganhar mais na área, por exemplo, de cooperações internacionais, que é outra coisa que eles levaram em consideração, e em que os Estados Unidos, por exemplo, perderam muito ponto. • Os Estados Unidos ficaram com 28 pontos e o Brasil com 50. J - Porque nós participamos da Convenção da Biodiversidade, de Mudanças Climáticas, somos um país atuante em relação ao protocolo de Kyoto, apesar de ele não obrigatoriamente se aplicar ao Brasil, porque prevê metas para países já desenvolvidos. Temos uma boa inserção, mas poderia ser maior. Em algumas iniciativas novas, como a Global Biodiversity Information Facilities, o GBIF, por exemplo, o Brasil poderia estar tomando parte mais ativa e, até o momento, sua participação é de ouvinte, porque ainda não houve uma manifestação do governo brasileiro. • Mas olhando os números, um pesquisador brasileiro preocupado com a biodiversidade agora sente uma certa tranqüilidade? J - A ansiedade aumenta, no sentido de que o país pode ter a falsa impressão

Canhos: pontuação favorecida pela participação internacional do Brasil

de que as coisas estão melhores do que efetivamente estão. E que portanto não necessitamos de um esforço ou de um investimento tão significativo, porque os ambientalistas teriam pintado o quadro muito mais negro do que é. • Tomando conjuntamente o que temos de reserva, de biodiversidade não muito ameaçada, e mais as iniciativas de política de governo, de qualidade de vida, produto interno, enfim, tudo o que o índice considera, que região do Brasil estaria mais equilibrada? J - A região Sudeste. Ela é a que sofreu mais as influências dos ciclos econômicos que levaram à destruição da cobertura vegetal, mas é aquela onde é mais fácil mobilizar a opinião pública em relação a assuntos relativos à conservação ou poluição ou melhora da qualidade de vida. É também a região que tem a mais complexa legislação para a área ambiental. Então, apesar de ser a área mais impactada em termos ambientais, pela contrapartida do investimento em ciência e tecnologia e pelo arcabouço legal de que dispõe para conservação, a região sudeste é ainda a mais equilibrada. • Aproveito a chegada do professor Canhos para perguntar por que só somos ouvintes no GBIF? Vanderlei Canhos - Primeiro, gostaria de fazer um comentário: nossa pontuação relativamente alta no índice se deu em função dos recursos naturais que temos e, também, da participação pró-ativa do Brasil na política e nos tratados internacionais da biodiversidade . Acho, no entanto, que a participação brasileira na esfera de ciência e tecnologia ainda não está acontecendo plenamente. É o exemplo aí do GBIF, que é uma iniciativa internacional para se trabalhar na questão tecnológica de compartilhamento de informação sobre biodiversidade. • E por que o Brasil, tendo um programa da envergadura do Biota FAPESP, bem estruturado inclusive no que se refere a base de dados, não participa ativamente do GBIF? C - É que biodiversidade é um tema PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 57


estratégico para o governo brasileiro, então os representantes do governo são muito cautelosos em aderir a qualquer iniciativa sem fazer antes muita consulta interna. • O GBIF é uma iniciativa de governos, de Estados ou de ONGs? C - É uma iniciativa de estados, mas está fora da Convenção sobre Diversidade Biológica. O que aconteceu é que vários países mais pró-ativos na questão de ciênciae tecnologia para biodiversidade, como os países escandinavos, a Holanda, a Austrália, perceberam que, embora a Convenção seja extremamente importante, porque trabalha na questão política, na questão da mudança de paradigma, em assuntos polêmicos, como os alimentos transgênicos e a questão de espécies invasoras, a agenda de ciência e tecnologia ainda não chegou lá. Então, o GBIF surgiu no âmbito da discussão do Mega Science Forum, dos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), com o objetivo principal de tratar da questão científica da informação da biodiversidade. Quando ficou bastante clara a necessidade de se ter uma infra-estrutura global que servisse de apoio para o desenvolvimento científico e tecnológico nessa área, depois de uma série de workshops, estudos e documentos que ocorreram num período de cinco anos, eles resolveram implementar essa iniciativa. • As facilities dizem respeito sobretudo à rede de internet? C - Isso, troca de informação. E é uma coisa extremamente indispensável porque um dos principais produtos dessa infra-estrutura é a basicamente a organização do Catálogo da Vida, um projeto imenso. Isso não é uma coisa muito simples, porque ao longo dos últimos 300 anos acumulamos um conhecimento sobre quase 2 milhões de espécies já descritas pela ciência. É extremamente difícil organizar esse conhecimento que está distribuído 58 • MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

"Começamos a ter uma distribuição espacial de ocorrência de espécies em São Paulo"

em diferentes instituições internacionais, em gavetas de herbários, de museus, em coleções de microorganismos, ete. Isso só pode ser feito com colaboração internacional.

!

• Um programa como o Biota, até onde entendo, seria uma iniciativa fundamental para essa colaboração. J - Temos que ter a seguinte percepção: o Biota nasceu de um processo de maturação da comunidade que assimilou documentos como a Convenção da Diversidade Biológica, trabalhou em cima disso e se organizou na forma de um programa. Ele não se repetirá assim em outros estados brasileiros. Podemos ampliar o Biota em outros estados, em território nacional, usar essas ferramentas que foram desenvolvidas. Mas o processo de criação do programa foi único, porque estávamos num estágio de maturidade que em nível nacional ainda não aconteceu. Em São Paulo se conseguiu ter uma Secretaria de Estado do Meio Ambiente implementando a convenção da biodiversidade, um governador que colocava a Agenda 21 como um parâmetro das suas metas de governo, e isso não aconteceu ao mesmo tempo no país como um todo. Portanto, há uma certa dificuldade para órgãos como o Ministério da Ciência e Tecnologia ou o Ministério do Meio Ambiente entrarem numa discussão, porque eles não se sentem suficientemente respaldados por uma comunidade científica do país inteiro, que possa dizer "olha, nós podemos entrar no GBIF, vamos fazer porque isso realmente é bom': O que eles ouvem é "o pessoal que está envolvido com o Biota acha o GBIF uma excelente idéia", mas é uma visão localizada. Então acho que esse é que é o problema, como é que você consegue dar

esse salto político e dizer "realmente isso é uma coisa que interessa para o país, e não só a determinada parcela da comunidade científica"? • Que resultados efetivos vocês apresentam para os diferentes grupos de pesquisa espalhados pelo país, capazes de mobilizá-los na mesma direção? J - O Biota tem cerca de 35 projetos em andamento, envolve de 300 a 350 doutores no estado de São Paulo e um elevado número de mestrandos e alunos de iniciação científica. Só neste estado, engloba no total quase 600 pesquisadores. Nos outros estados, são cerca de 70 pesquisadores que colaboram com o programa, e no exterior, quase 60. Desenvolvemos uma ferramenta que padroniza a maneira como é feito o registro da coleta, tornando obrigatório o uso do GPS (sistema de posicionamento global), que indica a coordenada geográfica precisa da coleta, e a possibilidade de casar essas informações com uma base cartográfica. Assim, se começa a ter uma distribuição espacial de ocorrência de espécies. Poder visualizar isso é o maior atrativo do Biota. • Nessa base cartográfica quanto por cento das espécies estão levantadas? J - Essa base é um mapeamento da vegetação remanescente nativa no estado. Também aparecem nela áreas de reflorestamento com pinus e eucaliptos, que achamos importante colocar porque permitem a existência de uma indústria de papel e celulose do porte que temos em São Paulo, sem que haja maior pressão em cima da vegetação nativa. A base cartográfica está casada com o banco de dados. Então, no momento em que o pesquisador observa uma espécie, registra sua ocorrência, ele entra com essa informação no banco de dados. Eu peço, por exemplo, a distribuição de tal espécie de peixe no estado de São Paulo, e o banco vai fazer pontos no mapa mostrando a ocorrência. Esse é o estágio atual. Na etapa seguinte, que é o projeto que o Vanderlei começou a desenvolver agora e está coordenando, vai se trabalhar em cima desse sistema


para desenvolver ferramentas de modelagem. Aí vamos ter uma capacidade de previsão que não temos hoje. • Previsão de quê? J - De onde a espécie ocorre. • Dá para fazer um cálculo de quantas espécies são dentro vegetação remanescente? J - Da flora, dá, porque existe um projeto financiado pela FAPESP, Flora Fanerogâmica do Estado de São Paulo, que estima que no estado se tenha algo em torno de 8 mil espécies de plantas. De animais é mais complicado. Temos estimativas de vertebrados, são perto de 2 mil espécies, considerando a soma de 773 peixes, 250 anfíbios, mais ou menos 750 aves, 186 répteis. De inverte brados, ninguém sabe. C - De microorganismos menos ainda. Como a gente estima que conheça apenas 1% de tudo que existe e falamos em 2 milhões de espécies conhecidas no mundo, então se estima que esse número total de todas as espécies possa variar de 20 a 100 milhões. Mas eu gostaria de fazer alguns comentários mais do Biota em nível internacional. Acho que o programa tem algumas peculiaridades muitos interessantes e que não são só fruto desses três últimos anos, mas de todo o investimento que a FAPESP fez em biologia ao longo dos últimos 40 anos. Então, agora, estamos chegando num momento, na biologia no Estado de São Paulo, onde estamos fazendo síntese das coisas. E da maneira como o Biota está sendo construído, podendo-se fazer análise de espécies em cima de informações geográficas, e ligar tudo isso a informações taxonômicas da flora, a mapas digitais de dados dos inventários já realizados da flora e outros que estão sendo realizados dentro do escopo do Biota, temos uma convergência da informação que fazdo Biota um programa único em nível internacional e eu tenho sentido isso em várias reuniões. • Em síntese, qual é a singularidade do Biota em relação a outros projetos? J - Olha, o que o marca é que é um programa muito bem amarrado, por-

"O Biota é um protótipo funcional que pode ser extrapolado para outros programas e regiões do país"

que ao mesmo tempo em que a FAPESP está financiando o sistema de informação financia também os projetos de levantamento. C - Uma outra coisa que também marca o Biota é que sendo um programa grande, é pequeno em termos de país, então dá para administrar. Nos Estados Unidos há um grande projeto em que basicamente o que estão tentando fazer é integrar todos os dados sobre ecossistemas americanos e biodiversidade americana dentro de um sistema comum chamado National Biological Information Infrastructure. Aí, eles fazem reuniões mensais com representantes de 11 agências do governo, mais organizações não-governamentais e torna-se um problema de uma dimensão muito grande estabelecer e harmonizar padrões. • O Biota, menor, consegue ser mais ágil e articulado nos seus métodos e procedimentos. C- Isso. Porque o Biota não é apenas um plano, ele é um protótipo funcional que pode ser extrapolado para outros programas, outras regiões do país. E aí é muito interessante essa questão da GBIF porque agora é que se está discutindo a questão de padrões, de metadados para integrar informação de diferentes fontes, para integrar dados biológicos com dados ambientais. Isso ainda não existe. Agora é que vaise estar trabalhando em ferramentas de maior escala, essa é a grande questão que ainda não está resolvida, e nesse sentido o Biota é um programa único, exemplar. J - Acho que tem pelo menos mais duas características do Biota que reforçam sua singularidade. Houve todo um trabalho com a comunidade, que levou muito em consideração aquilo que o pesquisador fazia e isso o levou

a participar. Nós não quisemos mudar as características de trabalho de ninguém, pelo contrário, se aquela pessoa foi treinada, capacitada, ele é a mais indicada para definir o que é relevante para o grupo que ele trabalha. Quero que continue trabalhando naquilo, só que vai gerar uma informação que não é mais só para seus trabalhos científicos, mas vai estar entrando num esqueleto maior e pode ter um uso maior. A única coisa centralizada no Biota são os mapas e as listas de espécies, todo o resto o pesquisador disponibiliza através de sua home page. É o pesquisador que tem a decisão sobre o quê e como disponibilizar. Isso cria uma relação de confiança muito grande. As pessoas confiam no sistema e vêem vantagens em poderem cruzar suas informações com as de outras pessoas. E a outra coisa que é fundamental para o programa é o fato de ele ter um financiamento garantido, de longo prazo, baseado exclusivamente no mérito científico, uma coisa que os membros do Steering Comittee (comitê de avaliação externa do programa) sempre ressaltam. • Insisto em que o professor Canhos, dê sua opinião sobre o índice. É bom para o Brasil ter ficado na 20a posição? C - É bom se fazer esse esforço comparativo, e que esse esforço seja anual. No ano passado os Estados Unidos estavam na 11a posição, em 2002 caíram para a 51a. Isso pode ser uma coisa absolutamente questionável, mas, tentando fazer uma análise do que pode ter feito os Estados Unidos caírem, penso que é o efeito Bush. Quando vemos a questão ambiental interna, a liberação das áreas de reserva no Alasca para extração de petróleo, a não ratificação do Tratado de Kyoto e da Convenção de Biodiversidade ... E no entanto uma das conclusões do ESI é que nenhum país atingiu ainda a condição de sustentabilidade ambiental. Nem a Finlândia. É uma coisa que temos de perseguir e está muito longe. • PESQUISA FAPESP . MARÇO DE 2002 • 59


• TECNOLOGIA

LINHA

DE

PRODUÇÃO

A construção da tela do futuro Um novo tipo de tela para equipamentos eletrônicos está nascendo em Campinas. Uma equipe do Centro de Pesquisas Renato Archer (Cenpra) - antiga Fundação Centro Tecnológico para a Informática (CTI) -, do Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT), já patenteou e continua a desenvolver um tipo de membrana para o novo display - palavra usada para designar tanto as telas de aparelhos de televisão, como de computador e de telefone celular. A tecnologia, chamada de Field Emission Display (FED), é a grande promessa para substituir parcialmente - ainda nesta década - os tubos de raios catódicos usados na TV, principalmente quando for adotado o sistema de alta definição, em gestação no Japão e nos Estados Unidos. Os FEDs também deverão ser usados em ambientes externos, como em outdoors, e na fabricação de lâmpadas porque possuem boa eficiência luminosa, além de serem produzidos com matéria-prima que não agride a natureza com os indesejáveis resíduos que seguem para o lixo no momento do descarte. "Os FEDs abrem novas perspectivas tecnológicas. Eles possuem condições de ocupar um importante espaço no mercado de displays planos em futuro próximo, porque aliam baixo consumo de energia elétrica - ao contrário dos displays de plasma que são

Na câmara de vácuo no Cenpra, o novo display é testado

Membrana que forma a nova tela ganhou prêmio no Japão grandes consumidores - e excelente qualidade de imagem em grandes áreas': explica o pesquisador do Cenpra Victor Pellegrini Mammana. A membrana desenvolvida pela equipe do centro ganhou no final do ano passado o único prêmio da categoria FED concedido durante o Congresso Internacional de Displays (Asia Display 2001) realizado em Nagóia, no Japão. As outras categorias, já disseminadas, são as tecnologias de cristal líquido (LCD), usada em laptops, de plasma, em TVs, e de Leds, em painéis de car-

60 • MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

ro, por exemplo. O prêmio colocou o Brasil no grupo de países que possuem tecnologia em displays. A pesquisa tem a colaboração do professor Francisco Tadeu Degasperi, do Laboratório de Vácuo da Faculdade de Tecnologia de São Paulo (Fatec), e também conta com a participação da Motorola por meio de publicações conjuntas. A expectativa é que os FEDs estejam dentro de dois anos no mercado, ocupando 1% do total da comercialização de displays no mundo, estimado em US$ 30 bilhões. •

• Janela controla a luminosidade Uma "janela inteligente", capaz de controlar automaticamente a luminosidade de ambientes fechados, está sendo testada por pesquisadores do Laboratório de Polímeros Condutores e Reciclagem do Instituto de Química da Unicampo Construída com diferentes polímeros "inteligentes': a janela é, na verdade, um dispositivo eletrocrômico, o que significa que pode mudar de cor ao receber impulsos elétricos. Uma superfície, formada por duas folhas de plástico transparente e flexível, é recoberta por uma fina camada de óxido de estanho, produto capaz de conduzir energia elétrica, e dois diferentes tipos de polímeros (o-metoxianlina e tiofeno). O recheio se completa com uma camada de borracha impregnada com perclorato de lítio, que tem por função transportar íons e permitir o equilíbrio de cargas elétricas. Ao receber o impulso elétrico, os substratos químicos reagem e mudam de tonalidade, da transparência total ao opaco, segundo a intensidade da corrente. "Assim a janela deixa passar mais ou menos luz': explica Marco Aurélio De Paoli, coordenador do projeto e professor do Departamento de Química Inorgânica da Unicamp. Ainda em fase laboratorial, o produto, que tem menos de meio milímetro de espessura, deverá estar pronto para industrialização em três anos. As pesquisas estão sendo apoiadas pela FAPESP e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). •


• Eletricidade a partir do açaí

o açaí e a azeitona preta são as novas matériasprimas utilizadas para produzir eletricidade. Pesquisas feitas no Parque de Desenvolvimento 'Iecnológico (Padetec) da Universidade Federal do Ceará (UFC) mostraram a viabilidade de se empregar corantes dessas plantas para a fabricação de células fotovoltaicas, usadas para geração de energia elétrica a partir da luz solar. Normalmente, essas células são feitas de silício, material semicondutor que absorve a luz e separa as cargas elétricas. Mas sua fabricação é muito cara, e esse é um dos motivos que inviabilizam o uso de energia solar em larga escala. As células solares com corantes fotoexcitáveis (CSCFs), desenvolvidas no Padetec, são bem mais baratas e substituem as de silício. Elas são formadas por uma placa de vidro condutora onde foi depositada uma fina camada de óxido de titânio (Ti02) impregnado com corante orgânico, um eletrólito constituído de iodo/triiodo e placa de vidro condutora. O princípio de funcionamento das CSCFs se baseia na excitação do corante pela incidência de fótons de luz. O corante excitado fica energeticamente apto a transferir um elétron para a superfície condutora formada pelo óxido de titânio, o que dará origem à corrente elétrica. "Além do fator econômico, as CSCFs utilizam em sua fabricação materiais simples e processos não poluentes", diz o superintendente do Padetec e coordenador da pesquisa, Afrânio Aragão Craveiro. A expectativa do pesquisador é que essas células estejam no mercado em um ano. •

teriormente para aterros sanitários e tem potencial para ser usado como fertilizan.te para plantações. O uso dos traçadores auxiliará no controle de eficiência dos processos de tratamento nos digestores. Segundo Pedro Eiti Aoki, do Ipen, "a quantidade de material radioativo aplicado é bem menor do que a concentração máxima permitida, de acordo com as normas vigentes de proteção radiológica, e só pode ser detectada por equipamentos". •

• Radioatividade em estações de esgoto Duas estações de tratamento de esgotos da Sabesp, em Suzano e Barueri, terão à disposição, durante este ano, mais uma alternativa para rnonitorar o nível de toxicidade de seus efluentes industriais. O Centro de Tecnologia das Radiações do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen) vai aplicar nessas estações a técnica de traçadores para a determinação do tempo médio de residência ou DTR. Os traçadores, material radioativo bromo-82 ou iodo-Iô l em solução aquosa, permitem conhecer a partir da DTR dados importantes sobre o funcionamento do sistema de tratamento, como a existência de zonas de estagnação ou as trajetórias preferenciais numa lagoa de tratamento de efluentes - fenômenos indesejáveis ao sistema. No caso das estações de esgoto de Suzano e Barueri, eles serão aplicados em digestores, tanques fechados das duas estações onde o lodo é transformado em matéria orgânica mineralizada. Esse lodo é enviado pos-

.A favor da estabilidade Um dispositivo capaz de proteger os processos industriais das reduções momentâneas na tensão da rede elétrica pode representar a solução para problemas como falta de estabilidade de tensão e queda de energia. Trata-se de um compensador dinâmico de variações de tensão - CDvT, desenvolvido graças a uma parceria en-

tre a Escola de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig). Dois protótipos já foram construídos e estão em fase de testes. "O restaurador de tensão é similar a um estabilizador de tensão ou no break, mas difere deste porque trabalha com a diferença entre as energias oferecidas antes e depois da queda, enquanto o no break desliga a rede e fornece toda a energia da carga'; explica Braz Cardoso Filho, professor do Departamento de Energia Elétrica da UFMG e coordenador das pesquisas. O projeto conta com investimentos da Cemig no valor de R$ 560 mil e com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico de Tecnológico (CNPq) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e tem duração prevista de quatro anos. Por enquanto, devido ao alto custo de produção do equipamento, os protótipos foram dirnensionados para aplicação no setor industrial. •

Aparelho em teste na UFMG compensa variações de tensão PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 61


CTPetro financia célula a combustível do Ipen Apontada como importante fonte de produção de energia elétrica para o futuro, a célula a combustível ganha novo impulso no Brasil. Em dezembro, o Fundo Setorial do Petróleo e Gás Natural (CTPetro) aprovou R$ 1 milhão para um projeto de construção de um protótipo de bancada de célula a combustível que será coordenado pelo professor Marcelo Linardi, do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen). A célula é uma espécie de sanduíche de eletrodos e catalisadores que gera energia elétrica a partir do hidrogênio retirado do gás natural, gasolina, álcool ou metanol. Linardi, que trabalha desde 1998 com os componentes da célula, pretende construir um protótipo de 1 quilowatt (kW) de potência. "Queremos também patentear o

• Resina dentária sob análise Um banco de ensaios inovador deve melhorar a qualidade das resinas compostas fabricadas no país e usadas por dentistas para fazer restaurações. O principal problema desse material é o seu desgaste, provocado tanto pela mastigação quanto pela escovação. Usando equipamentos simples, desenvolvidos na própria universidade ou comprados no mercado, os pesquisadores Eduardo Carlos Bianchi e César Antunes de Freitas, da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Bauru, testam, em poucos segundos, a durabilidade da resina por

processo de fabricação dos componentes da nossa célula': diz Linardi. A tecnologia desenvolvida será repassada para a Electrocell, empresa incubada no Centro Incubador de Empresas Tecnológicas (Cietec) que possui um projeto de construção de célula no Programa de

meio do atrito do material com um disco de cerâmica. "Prever a' durabilidade das resinas compostas é essencial para saber quando elas devem ser trocadas", diz o professor Bianchi. Os resultados ajudarão os fabricantes a melhorar seus produtos e os dentistas a escolher a resina mais adequada para cada tipo de tratamento. Os pesquisadores receberam apoio financeiro da FAPESP para desenvolver o banco de ensaios. Agora que já está comprovada a viabilidade do invento, ele está sendo patenteado no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) com financiamento da própria Unesp. •

62 • MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE) da FAPESP. Além de um acordo já existente de assessoria técnica entre o instituto e a incubadora, o edital do CTPetro exigia a participação de uma empresa. O financiamento, ainda não repassado, está assim dividido:

• Arma contra o melanoma Entre os vários tipos de radiação ultravioleta, a UVC é a menos comum, porque é bloqueada pelo ozônio presente na atmosfera. No entanto, com o aumento do buraco da camada de ozônio, a radiação UVC começa a preocupar a comunidade médica, já que pode causar câncer de pele. Pensando numa forma de atenuar esse perigo, uma equipe de pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) realizou estudos para encontrar uma substância que ampliasse a proteção aos raios UVC, uma vez que os bloqueadores solares exis-

Linardi: desenvolvimento de tecnologia, patente e repasse para empresa R$ 200 mil para bolsistas do Ipen, R$ 200 mil para a empresa, que serão gastos com pesquisa de mercado e bolsistas, e R$ 600 mil para a compra de equipamentos para a pesquisa. •

tentes no mercado atuam nas faixas UVA e UVB. As pesquisas apontaram que os derivados de dibenzoilmetano cumprem essa função, além de atuarem contra a proliferação de células de melanoma e tumores de mama e pulmão, conforme experiências feitas in vuro. O estudo, conduzido pelas equipes de cientistas do Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agrícolas (CPQBA) e do Instituto de Química, recebeu menção honrosa no XXVII Concurso Prêmio Governador do Estado de 2001. Segundo Anita Iocelyne Marsaioli, do CPQBA, esses resultados foram fruto dos esforços de sua pós-doutoranda e bolsista da


• Microusina mais ágil e econômica

FAPESP Marisa Alves Nogueira, que sempre acreditou na potencialidade dos derivados de dibenzoilmetano e foi à procura de testes e colaborações que culminaram na descoberta da estabilidade desses compostos à irradiação do tipo UVc. O próximo passo da pesquisa será o teste da substância em células tumorais de animais e pessoas. •

• Interferências investigadas Um sofisticado aparelho instalado no Centro Espacial de Cachoeira Paulista do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), no interior de São Paulo, permitirá aprofundar os estudos a respeito do clima espacial sobre o território brasileiro, especialmente das "bolhas de plasma". Esse fenômeno, descoberto por pesquisadores do instituto em 1978 e ainda pouco conhecido, causa interferências em sinais de satélites e na navegação de aeronaves que empregam o sistema GPS (Global Positioning System). Batizado de interferômetro, o instrumento da marca Fabry-Perot foi importado da Inglaterra e financiado pela FAPESP em US$ 220 mil. Dotado de um detecto r supersensível à luz vermelha, com comprimento de onda de 630 nanômetros (o nanômetro é a milionési-

ma parte do milímetro), ele fará medidas de velocidade do vento e temperatura de regiões de alta atmosfera, parâmetros indispensáveis ao estudo do clima espacial. Os dados serão colhidos em noites de céu limpo, numa faixa da termosfera que abrange a ionosfera, região da atmos-

fera onde as bolhas de plasma se formam. O interferômetro também permitirá estudar, pela primeira vez no país, as ondas de gravidade que se originam na Antártica, na ocorrência de tempestades magnéticas, e que se deslocam para a região tropical do planeta. •

As microusinas elétricas poderão, em um futuro próximo, realizar várias operações sem a presença de um operador, como acionar e desligar o gerador, regular a velocidade da turbina e controlar o nível de tensão que o gerador produz. A automatização de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) com potência instalada de até 1.000 quilowatts (kW), que está sendo estudada por pesquisadores do Departamento de Engenharia Elétrica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), propiciará redução de custos, maior produtividade e agilidade operacional. •

Embalagem interage com alimentos A última novidade na pesquisa de tecnologia de alimentos são as embalagens ativas, projetadas para conservar e melhorar a qualidade dos alimentos. No Brasil, um estudo está em desenvolvimento na equipe' da professora Nilda Ferreira Soares, do Departamento de Tecnologia de Alimentos da Universidade Federal de Viçosa (UFV), em Minas Gerais. "Nosso objetivo é conservar alimentos - como pães, leite, carnes, queijos e vegetaispor mais tempo usando doses menores de aditivos químicos", explica Nilda, que é apoiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig). No caso dos pães de fôrma, o filme antimicrobiano criado na UFV libera gradativamente uma substância química chama-

Doses menores de conservantes para alimentos embalados com filmes anti microbianos

da propionato, que inibe o crescimento de microrganismos. Com isso, menos propionato é adicionado ao pão. A equipe também avalia sachês absorvedores de oxigênio e retardadores do amadurecimento de vege-

tais. No primeiro caso, o objetivo é retirar das embalagens o oxigênio,que propicia o aparecimento de fungos e bactérias. O outro tipo de sachê tem por finalidade prolongar a vida útil dos vegetais na embalagem. •

PESQUISA FAPESP . MARÇO DE 2002 • 63


TECNOLOGIA INFORMÁTICA

Programas de bom tamanho Três empresas do PIPE desenvolvem projetos de software que vão contribuir para que o Brasil se torne mais competitivo nesse setor

TÂNIA

MARQUES

om projetos diferentes entre si, três empresas apoiadas pelo Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE), da FAPESP,têm como ponto com um a busca de soluções ainda pouco contempladas pelas companhias de todos os portes que desenvolvem softwares no Brasil. A InfoDinâmica, de São Paulo, investe em um sistema de controle predial que, combinando hardware e software, possibilitará um novo passo no monitoramento local e remoto de quase todos os equipamentos eletroeletrônicos de residências e escritórios. A também paulistana Invenire desenvolve um software para as mesas de câmbio dos bancos e os departamentos de comércio exterior das grandes corporações. A Spall, de São Carlos, está muito próxima de lançar a primeira versão de um pro-

C

64 • MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

grama que simula a formulação de materiais para a indústria cerâmica. E, melhor, as três empresas, que , investem em nichos importantes dentro do país, contribuem para que o software brasileiro se torne mais competitivo nos mercados interno e externo. Enquanto a participação do software desenvolvido aqui é de 76% nas vendas domésticas, a balança comercial do setor ainda apresenta números negativos (veja quadro na pág. 56). Embora as exportações do país tenham alcançado o patamar dos US$ 120 milhões em 2001, com um crescimento perto dos l.200% desde 1995, as importações chegam a US$ 1 bilhão por ano. Falar em geração de software, portanto, é uma questão estratégica porque o conhecimento e o desenvolvimento tecnológico nessa área são imprescindíveis para o suporte do crescimento de todos os setores da economia.

Controle remoto - O software para controle de sistemas residenciais e prediais, da InfoDinâmica, é um objetivo antigo das gigantes mundiais da indústria eletroeletrônica. "Pesquisei para verificar se havia algo similar e descobri que, apesar de já existir tecnologia disponível para tanto, não há sistema semelhante", conta o engenheiro mecânico Eduardo Vettori, proprietário da empresa. Ele trabalha desde 1972 na área de tecnologia de informação e teve passagens pela NEC e pela sede inglesa da Shell International Petroleum Company. O sistema que Vettori está finalizando, chamado de Suit, é a concretização de um antigo sonho dos escritores de ficção científica. O software pode monitorar e controlar, de forma remota ou não, qualquer aparelho que integre um circuito, desde um televisor a um mecanismo de alarme de


segurança, de uma geladeira a um jogo de persianas. O software permite o comando desses artefatos por meio da interface com os controles digitais dos equipamentos e com uma interconexão em rede. O usuário define e altera as configurações, adequando os controles a suas rotinas, a partir de um computador padrão PC, palmtops ou um telefone. Além das utilizações em sistemas de segurança e controle de residências, prédios e empresas, outro uso que Vettori indica para o Suit é o segmento hoteleiro. "A partir de um Personal Digital Assistant (PDA) com boa memória, como um palmtop, o supervisor de um hotel pode controlar todos os aparelhos de cada apartamento." Nas casas de espetáculos, o software pode, entre as utilizações possíveis, ligar e controlar a temperatura dos condicionadores de ar.

"O processo do Suit fundamentase em apenas três variáveis: qual é o aparelho, o que se quer controlar e em que nível ou estado, como, por exemplo, as funções de liga-desliga, volume, etc., além de quem quer fazê-lo", observa Vettori. "Trata-se de uma solução simples': diz ele, que deu início ao processo de registro de patente do produto em 1996. O programa básico inicial, desenvolvido nas linguagens C e Visual Basic, das mais comuns e disseminadas, roda nos sistemas operacionais Windows, Windows CE, Mac, Palm e Unix. Outras linguagens também podem ser usadas. Sua instalação pode utilizar a infra-estrutura da rede elétrica, sem nenhuma modificação, ou a comunicação em radiofreqüência, sem fio. Os sistemas atualmente disponíveis, além de controlar apenas alguns dispositivos, por falta de uma in-

terface universal, demandam variadas reformas na infra-estrutura. O controle a longa distância aproveita a infra-estrutura de serviços públicos - pode ser feito de qualquer linha telefônica, fixa ou móvel, ou pela Internet. O sistema terá sete acessórios de hardware, que estão sendo projetados no Centro de Pesquisas Renato Archer (Cenpra), unidade do Ministério da Ciência e Tecnologia que sucedeu a Fundação Centro Tecnológico para a Informática (CTI). Esses acessórios permitem o controle de aparelhos sem nenhuma modificação. Cinco deles já estão prontos: um atendedor telefônico, um equipamento emissor de raios infravermelhos, um transceptor de radiofreqüência, tomadas e interruptores. "Falta ainda um multissensor, para identificar, entre inúmeras coisas, a presença humana': diz Vettori, que prevê a conclusão do projeto no segundo trimestre. Ele acredita que o produto esteja disponível no mercado ainda este ano. Hoje, a InfoDinâmica praticamente não tem faturamento. Fora alguns trabalhos de consultoria, Vettori está totalmente voltada para o desenvolvimento do Suit. Ele estima, em seu plano de negócios, que o mercado brasileiro de controles prediais poderá, em breve, movimentar US$ 1 bilhão por ano. No cálculo, ele não inclui possibilidades na área de automação industrial, um segmento ainda não contemplado na estratégia de vendas inicial. Protótipo Me3 - A Invenire também acredita no grande potencial mercadológico do seu produto. Segundo projeções de José Carlos Arruda Alves, sócio da empresa, o software, batizado provisoriamente de MC3, pode conquistar dezenas dos cerca de 150 bancos do país, entre os que utilizam soluções próprias e aplicações menos avançadas de software houses concorrentes. "Também vamos oferecer a aplicação a empresas multinacionais de grande porte, que operam mesas de câmbio em função do alto índice de transações internacionais': diz. O MC3 é uma multiplataforma que opera nos PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 65


ambientes Windows, Unix e Linux, pode rodar até em grandes computadores (mainframes) e deverá estar à venda entre este ano e o próximo. Fundada em 1999, a empresa entrou no mercado com a oferta de serviços de implementação e manutenção de soluções para a integração à rede Swift (Society for Worldwide In-

terbank Financial Telecommunication), atendendo, principalmente, bancos de pequeno e médio porte. A Invenire é uma iniciativa dos irmãos José Carlos Arruda Alves, engenheiro que fez carreira na área de negócios da IBM, e Valter Francisco Arruda Alves, professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP). "Nosso objetivo sempre foi desenvolver produtos de software inovadores", conta José Carlos. O desafio da Invenire no sistema de câmbio é, talvez, menos importante que o exercício de programar em lava - linguagem da Sun Microsystems com grande participação de mercado na área de desenvolvimento para a Internet - de acordo com o conceito de componentização. Ele se fundamenta

na premissa

de que

uma

software house não precisa desenvolver sozinha todas as partes que compõem seu produto. Parte de suas necessidades técnicas é comprada de outras empresas. Isso permite integrar componentes . de qualidade já comprova- . da, fornecidos por empresas especializadas em determinado tipo de software. Entre os utilitários, um bom exemplo é o dos instaladores de programas - produtos com funções complexas cujo desenvolvimento interno demandaria grande investimento de tempo e dinheiro. A componentização é uma das fortes tendências em todo o mundo e é fundamental para o progresso da indústria do software na Índia, país com alto desempenho nesse setor (veja quadro na pág. 58). Na definição da estratégia a adotar, os irmãos Alves levaram em conta não só as grandes tendências do consumo de software no ambiente empresarial,

mas a capacidade da empresa de aproveitá-Ias a partir de estrutura e de disponibilidade de investimento reduzidas. ''A opção pelo desenvolvimento de componentes emergiu como um caminho natural': diz Valter. Na prática, isso significa que a Invenire não pretende conceber uma plataforma completa para a auto mação de empresas - quer, sim, desenvolver aplicações que pos-

Certificação garante futuro do setor As exportações brasileiras de soft- , ware tiveram um crescimento espantoso entre 1995 e 2000: saltaram de US$ 10 milhões para US$ 100 milhões. "Os resultados de 2001, que ainda não estão fechados, devem situar-se entre US$ 120 e US$ 130 milhões", prevê Fábio Pagani, coordenador executivo de desenvolvimento de negócios da Sociedade para Promoção da Excelência do Software Brasileiro (Softex), que foi criada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) em 1993 e em 1997 se transformou em entidade privada sem fins lucrativos. O crescente aumento das exportações de softwares desenvolvidos no Brasil, no entanto, ainda está longe de garantir ao país uma boa fatia no mercado mundial. A

66 • MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

produção local está mais voltada ao mercado interno, onde responde por 76% das vendas domésticas, que em 2000 totalizaram US$ 3,2 milhões, segundo a Secretaria de Política de Informática, do Ministério da Ciência e Tecnologia. Mesmo os números do mercado interno não trazem ao país tranqüilidade quanto à possibilidade de crescimento e de aproveitamento do produto brasileiro. Em 2000, de acordo com projeções do Banco Central, as importações de software atingiram US$ 1,02 bilhão, resultando em um déficit de US$ 920 milhões na balança comercial do setor. De 1995 a 2000, as compras de softwares produzidos fora do Brasil registraram incremento de 500%, enquanto o mercado brasileiro cresceu 74%. Uma

simulação apresentada por Kival Weber, vice-presidente da Softex, no Fórum Minas Gerabytes, realizado na Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais, em Belo Horizonte, no final do ano passado, prevê que, se a situação não mudar, a participação do software importado, hoje em 24%, atingirá 94% em 2010. Capacidade comprovada - O fato é que a produção de software no Brasil, que tem na criatividade e na flexibilidade seus pontos altos, não se orienta por padrões de qualidade universalmente aceitos. ''A certificação é, hoje, uma das nossas principais bandeiras': diz Vanda Scarterzini, titular da Secretaria de Política de Informática (Sepin), do Ministério da Ciência e Tecnologia. O país precisa se


Alvo da Invenire: 150 bancos e centenas de empresas que operam com mesas de câmbio

sam ser integradas a grandes guarda-chuvas, como, por exemplo, os sistemas de gestão empresarial, ou enterprise resource planning (ERP), segmento em que atuam a alemã SAP, a norte-americana People Soft e as brasileiras Microsiga e Datasul, entre diversas outras companhias. A tendência de componentização tende a se fortalecer com a dissemina-

adequar aos padrões internacionais da indústria do software e alardear isso pelos quatro cantos do planeta, não só para exportar mais, mas para não perder posições no mercado doméstico. Para isso, a Softex busca acordos com consultorias especializadas na preparação de empresas para a obtenção do Capability Maturity Model (CMM), ou Modelo de Maturidade da Capacidade, que define conceitos e práticas de desenvolvimento de software. Segundo dados da Sepin, apenas 10% das 3.500 software houses estabelecidas no Brasil já haviam conquistado essa certificação em 1999, índice que deveria chegar a 20% em 2001. O CMM, que se propõe a aprimorar o processo e os resultados do desenvolvimento de software tanto do ponto de vista de engenharia quanto de gerenciamento, promove a definição de uma estrutura para a

ção do modelo dos application service providers (ASP), servidores que abrigam serviços de Internet, hospedando bancos de dados de forma remota. A componentização também ganha força com o aparecimento dos serviços de web services, que possibilitam às empresas usuárias "procurar" na Internet determinadas soluções em sistemas. Por exemplo, um banco pode analisar o crédito de seus clientes, via Internet, por meio de empresas especializadas nessa atividade. Os web services permitem aos usuários formar pacotes de software com os produtos que considerarem mais adequados às suas necessidades sem se preocupar com a integração das aplicações - um dos maiores desafios para os departamentos de informáti-

promoção de melhorias contínuas. Ele é dividido em cinco níveis - ini. cial, repetitivo, definido, gerenciado e otimizado. ''As companhias brasileiras que já exportam têm, no mínimo, a certificação até o nível 3': comenta Pagani. "Investir na qualidade do nosso software também é uma maneira de combater o déficit social do país': reflete Vanda. Segundo estatísticas da Softex, as software houses brasileiras geram mais de 180 mil empregos diretos. Delas, indicam levantamentos de 1998, 40% são microempresas, com menos de dez empregados, e 33% têm de 11 a 50 funcionários. Do total, 8% têm médio porte e 19% são grandes companhias, com quadro funcional superior a 100 pessoas. A Lei de Informática, aprovada em 2001, não contempla diretamente a indústria do software, mas pode estimular fortemente o setor, observa

ca e prestadores de serviços - baseando-se em padrões de comunicação entre programas, como o Extensible Markup Language (XML). O padrão XML permite que vários softwares conversem entre si, pela troca de documentos e dados em formato padronizado. "Trabalhamos com o Simple Object Access Protocol; ou Soap, com base em XML': observa Mauricio Nacib Pontuschka, coordenador do Núcleo de Computação Científica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e instrutor da Sun na área de lava, que presta consultoria para a Invenire. Sob a orientação de Pontuschka e de Carlos Eduardo de Barros Paes, também professor da PUC-SP e consultor da Invenire, o time de desenvolvimento é formado por nove estagiários do curso de Ciências da Computação da PUC-SP. Com receita anual de R$ 60 mil, a Invenire utiliza os recursos do PIPE para pagar esses estagiários e os dois consultores envolvidos no desenvolvimento do MC3. Além de Pontuschka e de Carlos Paes, a empresa conta também

a secretária Vanda. Seu artigo 1°, em vias de regulamentação, incentiva a utilização de software produzido no Brasil e cria arcabouço legal para que o governo use seu poder de compra como instrumento de incentivo à pesquisa e ao desenvolvimento. Fundo setorial - Outro avanço do processo de regulamentação da nova lei foi a criação do Comitê da Área de Tecnologia da Informação (Cati), para gerir os recursos destinados pelas empresas de informática e telecomunicações que recebem benefícios fiscais. As verbas formam o Fundo Setorial para a Tecnologia da Informação (CTInfo) e devem ser aplicadas em pesquisa e desenvolvimento. "Em 2002, o valor deve atingir R$ 50 milhões, correspondendo a 0,5% do faturamento das empresas beneficiadas pela legislação", prevê Vanda.

PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 67


Promessa de mais qualidade para a indústria cerâmica com o software Ceramix, da Spall

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com os conhecimentos de um especialista no setor bancário, Rui Cabral de Mello, que orienta a concepção do software em seus aspectos funcionais, para garantir sua adequação às necessidades do público-alvo. Outro passo importante, na visão que os dirigentes da Invenire têm do futuro, é a certificação de seus produtos. "Nosso objetivo é começar a exportar dentro de poucos anos e para isso precisamos de certificações que atestem a qualidade dos nossos softwares', explica José Carlos. Um certificado essencial é o Capability Maturity Model (CMM), ou Modelo de Maturidade da Capacidade, um aval de qualidade de produtos e processos de software reconhecido internacionalmente. A obtenção desse aval não é barata, porque envolve serviços

de consultorias autorizadas pelo órgão certificado r, papel exercido hoje pela Universidade de Carnegie Mellon, na cidade de Pittsburgh, licenciada, por concorrência, do Software Engineering Institute, centro de pesquisa patrocinado pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos.

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A India como paradigma A Índia é o primeiro país citado quando o assunto é a produção de softwares nos países do terceiro mundo. Entre 1996 e 2001, as vendas externas daquele país, das quais 62% destinam-se aos Estados Unidos, aumentaram de US$ 1 bilhão para US$ 8,5 bilhões. A exportação está promovendo o crescimento do mercado interno da Índia, que, de apenas US$ 670 milhões no ano fiscal 1996/1997, chegou a mais de US$ 2 bilhões em 2000/2001. A ex-colônia britânica tem por vantagem competitiva o fato de usar o inglês como segunda língua - que todas as crianças aprendem ao ingressar na escola. Além disso, a Índia voltou-se para a programação ainda no final da

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, década de 70, quando a IBM deixou o país - um daqueles casos em que, de fato, a necessidade faz o gato pular. Por tudo isso, a transformação do país em um celeiro de cérebros foi um caminho natural, porque os salários oferecidos pelas empresas norte-americanas mostraram-se muito atraentes para os padrões dos indianos. Depois, as grandes companhias globais se deram conta de que se estabelecer na Índia, ou lá formar parcerias de negócios, seria mais vantajoso para aproveitar os baixos custos de mão-de-obra do mercado local. O comércio explodiu, e as chamadas fábricas de software, que desenvolvem produtos sob encomenda, proliferaram.

Mistura fina - A Spall, terceira empresa do PIPE, concentra seus investimentos tecnológicos e comerciais em soluções para o setor industrial. Mais precisamente para a indústria de revestimento cerâmico, responsável pela produção de pisos, pias, vasos sanitários e azulejos. A empresa planeja lançar, ainda neste semestre, a primeira versão de um programa que simula a substituição de materiais para esse setor. Sem concorrente conhecido no país e no exterior, o Ceramix poderá economizar milhões de reais para as empresas do segmento de cerâmica industrializada e, de quebra, viabilizar procedimentos de controle de qualidade capazes de torná-Ias mais competitivas no mercado internacional. O produto será lançado em versão para o sistema Windows. "A operação em rede pode ser feita facilmente, se houver solicitação de algum cliente': diz Fábio Leme de Almeida, gerente de Pesquisa e Desenvolvimento da empresa. O potencial mercadológico também é grande para o Ceramix. Quarto maior produtor do mundo - perde apenas para a Itália, a China e a Espanha -, o país tem dificuldade de uniformizar seus azulejos, louças e porcelanas, em função da falta de ferramentas da tecnologia da informação capazes de simular resultados


na inevitável substituição com Edgar Dutra Zanotto, de matérias-primas, que professor do Departamento de Engenharia de Materiais demanda reformulação de da Universidade Federal toda a massa. de São Carlos (UFSCar). A "Mesmo a argila proceregião é um importante dente de uma mesma jazipólo cerâmico, e a UFSCar da pode apresentar variamantém laboratórios volções físico-químicas, e é tados para o setor. Zanotto quase impossível garantir a colabora no projeto do manutenção de caracteríssoftware da Spall, que conticas como capacidade de ta ainda com a consultoria retenção de água, rigidez e de um matemático e está a resistência no produto cerâmico", observa Edélcio cargo de três estudantes do Departamento de CompuLeme de Almeida, diretor tação da UFSCar. administrativo da Spall e A Spall, que tem receita coordenador do projeto. O 94 95 97 98 91 92 93 96 99 2000 líquida anual em torno de problema em torno da substituição de matériasR$ 40 mil, nasceu em 1994 Fonte: SEPIN/MCP(*) já com uma encomenda primas não se limita à questão da uniformidade. para atender. O negócio mulação de massas e esmaltes cerâmi"As empresas evitam ao máximo a que motivou a fundação da empresa cosoA partir de uma base de dados, o resultou no lançamento do SIM - Sissubstituição, armazenando quantidasoftware auxilia os usuários a identifides enormes de material, e ficam atretema de Informações Maçônicas, que, car equívocos na formulação de produdepois, atrairia 5 mil clientes no Braladas aos fornecedores", comenta Altos. "Trata-se de um software baseado meida. Ou seja: o problema afeta o sil. A Spall também presta serviços de em modelos científicos, com um móconsultoria nas áreas de redes e Interaproveitamento de espaço e o giro fidulo totalmente voltado para cálculos': nanceiro das companhias e transfornet, além de desenvolver projetos de explica Fábio. O novo sistema está em Web sites. "Com o Ceramix, pretendema-as em presas fáceis de eventuais testes numa companhia paulista que aumentos abusivos de preços. Além mos pelo menos dobrar nosso faturaprefere não ter seu nome revelado, mento ainda este ano", afirma Edélcio. disso, os testes com novas matériaspor questões estratégicas. ''A colaboO Ceramix, o MC3 e o Suit são primas, baseados em tentativa e erro, ração dessa empresa tem sido muito causam perdas enormes. "Dado o exemplos de que criatividade e empreendedorismo, aliados ao desenvolporte dos equipamentos utilizados, a, importante para a verificação da efiquantidade mínima para testes é de 1· ciência do software", comenta Fábio. vimento de produtos inovadores nas Segundo suas previsões, o lançamentonelada e, normalmente, a substituipequenas empresas, podem lançar o to do produto deve ocorrer até o final ção demanda vários deles, com elevapaís para um patamar mais alto na deste semestre. do consumo de matéria-prima, recurprodução de softwares, um produto sos humanos e energético," A viabilidade em desenvolver o que está na cesta de necessidades báCeramix, conta Edélcio, surgiu em O Ceramix simula a utilização de sicas de qualquer setor neste início 1998, a partir de conversas técnicas várias matérias-primas para a reforde século 21. • OS PROJETOS Sistema Universal de Interface de Telecontrole MODALIDADE

Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPEl COORDENADOR

EDUARDOVETTORI - InfoDinâmica

INVESTIMENTO

R$ 166.200,00

Sistema de Câmbio e Comércio Exterior MODALIDADE

Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPEl COORDENADOR

VALTER FRANCISCOARRUDA ALVES Invenire INVESTIMENTO

R$ 232.370,00 e US$ 30.000,00

Sistema para Formulação e Reformulação de Massas Cerâmicas MODALIDADE

Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPEl COORDENADOR

EDÉLCIO LEME DE ALMEIDA - Spall

INVESTIMENTO

R$ 97.360,00

PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 69


• TECNOLOGIA ENGENHARIA

NAVAL

Simulações na tela e nas águas da baía YURI VASCONCELOS E WAGNER

DE OLIVEIRA

oistanques de provas, um virtual e um físico, vão reforçar a posição do Brasil de líder tecnológico na exploração de petróleo em alto-mar. A Escola Politécnica (Poli) da Universidade de São Paulo (USP) inaugurou, no fim de fevereiro, um sofisticado laboratório, batizado de Tanque de Provas Numérico (TPN), que viabilizará a exploração em poços submarinos posicionados a mais de 2.000 metros de profundidade - atualmente, o campo de Roncador, na bacia de Campos, no Rio de Janeiro, a 1.800 metros da lâmina d'água, é o mais profundo operado pela Petrobras. E, na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), pesquisadores da Coordenação dos Programas de Pós-Graduação e Pesquisa em Engenharia (Coppe) estão dando os retoques finais em um tanque oceânico que mais se parece com um mar artificial, com 22 milhões de litros de água, previsto para ficar pronto em junho. Instalado às margens da baía de Guanabara, no campus da UFRJ, o tanque oceânico tem cerca de 1,5 mil metros quadrados, 40 metros de comprimento por 30 de largura e profundidade média de 15 metros e máxima de 25 metros. Supera tanques do mesmo tipo existentes nos Estados Unidos, com 5,8 metros, na Holanda, com 10,5 metros, e na Noruega, com 10 metros de profundidade. Os dois projetos fo-

ram financiados com recursos do Fundo Setorial do Petróleo e Gás Natural (CT-Petro), do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). Adquirir know-how para exploração de petróleo e gás em grandes profundidades é de importância decisiva para o Brasil porque 75% das reservas da Petrobras, estimadas em 9,8 bilhões de barris, encontram-se em águas profundas (400 a 1.000 metros) ou ultraprofundas (a mais de 1.000 metros).

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Ensaios virtuais - «O TPN fará a simulação do comportamento de plataformas marítimas de petróleo em alto-mar, permitindo que a Petrobras avance com mais segurança na exploração em águas ultraprofundas", conta Kazuo Nishimoto, professor de Engenharia Naval e Oceânica da Poli e coordenador do recém-inaugurado laboratório. O engenheiro André Paiva Leite, consultor técnico do Departamento de Exploração e Produção da Petrobras, confirma a importância do TPN: ''A confiabilidade nos sistemas flutuantes ficará muito maior com os ensaios a serem realizados no novo tanque virtual de provas': O TPN é, na verdade, um sistema computacional composto por um grupo de 60 computadores operando em paralelo. Até o fim do ano, outros 60 micros serão incorporados à rede, que tem capacidade para receber até 300 aparelhos. «Iremos ampliar a capacidade na medida em que a demanda justificar tal investimento", diz Nishimoto. A vantagem do grupo em relação a computadores isolados é a

Tanques da USP e da Coppe- U F RJ vão ajudar a Petrobras a explorar petróleo em águas ultraprofundas

produção de cálculos muito mais complexos em pouco tempo. «Simulações que levariam dias para serem executadas numa estação isolada são finalizadas em poucos minutos na rede", explica o pesquisador. tridimensional - Além dos computadores, o laboratório terá também uma sala de realidade virtual, que empregará tecnologia de animação Silicon Graphics. Essa sala será utilizada para projeção da imagem tridimensional da simulação numérica processada pelos computadores. «Decidimos incorporar ao projeto do TPN uma sala estereográfica com recursos de computação gráfica 3-D para visualizarmos, da maneira mais real possível, todos os fenômenos estudados", conta Nishimoto. Esse recurso permitirá que a análise numérica de cada ensaio seja acompanhada, simultaneamente, da análise visual, facilitando sua compreensão e auxiliando na aferição dos resultados. As simulações de modelos hidrodinâmicos e estruturais feitas no TPN resultarão em informações sobre o comportamento das plataformas seImagem


mi-submersíveis e dos navios-tanques fundeados, conhecidos por FPSOs sigla de Floating, Production, Storage and Offloading, ou sistema flutuante de produção, armazenamento e descarga -, estruturas responsáveis pela exploração de petróleo em alto-mar. Os ensaios também mostrarão como se comportam os cabos de ancoragem, que fazem a amarração da plataforma ou do navio ao fundo do mar, e os risers, as tubulações que levam o petróleo do poço até a plataforma na superfície. Todos esses elementos estão continuamente sujeitos a fatores ambientais, como ação de ventos, ondas e correntezas, que podem provocar avarias e desestabilizar a plataforma ou o navio, prejudicando a produção. Saber como mantê-los com a maior estabilidade possível é fator decisivo para o sucesso da exploração. O projeto do Tanque de Provas Numérico contou com a participação de quatro instituições de pesquisa, além da USP: Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT), Coppe, Grupo de Tecnologia em Computação Gráfica (Tecgraf), da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do

Rio de Janeiro, e Centro de Pesquisas da Petrobras (Cenpes). O investimento total no projeto, que integrou a primeira concorrência do CT-Petro, realizada no final de 2000, foi de quase R$ 3 milhões. Desse total, R$ 2,56 milhões foram repassados pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), órgão que exerce a Secretaria Executiva dos Fundos Setoriais do MCT, e os R$ 400 mil restantes ficaram por conta da Petrobras. Os recursos começaram a ser injetados em janeiro do ano passado, e o laboratório foi montado em apenas um ano. Segundo Nishimoto, o TPN municiará projetistas e engenheiros envolvidos nos projetos de construção de estruturas flutuantes com dados preciosos. "Iremos simular, principalmente, parâmetros básicos como os movimentos e as acelerações da plataforma e as tensões nas linhas de amarração e nos tubos:' Escala reduzida - O TPN complementa e estende as aplicações dos tanques de provas físicos, que realizam ensaios com modelos reduzidos. Por sua vez, o TPN depende de resultados

Imagem tridimensional na Poli-USP: óculos especiais para ver os fenômenos estudados

obtidos nos tanques de prova físicos para validar e calibrar os modelos numéricos utilizados no modo virtual. Os tanques físicos são eficientes mas sofrem restrições nas simulações em águas ultraprofundas por causa do efeito escala. Restrições que podem ser atenuadas na integração com estudos realizados no TPN. Hoje, a profundidade máxima possível para a realização de simulações é de 1.000 metros. Quando o tanque da Coppe estiver pronto, poderão ser simuladas operações em até 2.500 metros de profundidade. Para extra polar esses limites, estudos complementares baseados em ensaios nos tanques virtuais representam uma efetiva contribuição. Uma vantagem do TPN é o custo de seus ensaios, muito inferior ao dos realizados no tanque de provas físico. A economia de custos vale também no âmbito do tanque físico- seus testes são imprescindíveis em projetos pioneiros e concepções originais e inovadoras - citada pelos pesquisadores da PESQUISA FAPESP . MARÇO DE 2002 • 71


P-40 no campo Marlim Sul a mais de 150 km da costa: ambiente hostil

Coppe. A taxa diária de utilização do tanque oceânico não chegará a US$ 15 mil, enquanto nos tanques localizados no exterior cobramse valores superiores a US$ 20 mil. A Petrobras, segundo a Coppe, chega a desembolsar até US$ 400 mil por 15 dias de ensaios fora do Brasil. Equipado para produzir ondas, ventos e correntezas, o tanque oceânico, de 25 metros de profundidade máxima, irá possibilitar ensaios de modelos de estruturas e equipamentos para atividades de produção de petróleo e gás offshore (em alto-mar), em grandes profundidades, pesquisas na área de engenharia naval, além de estudos associados a novas estruturas oceânicas e a operações submarinas. "Os ensaios de modelos nas condições que teremos no tanque oceânico são fundamentais para prever o que se vai encontrar no mar na extração de petróleo. E, quanto mais profundo o tanque, melhores os resultados", diz o engenheiro civil Ricardo Franciss, da Gerência de Tecnologia Submarina do Cenpes da Petrobras. "No tanque, poderemos observar com maior eficiência, confiabilidade e menores riscos fatores como fadiga,

Profundidade estratégica Uma expressiva fatia das reservas brasileiras de petróleo, que chega a 23%, está localizada na faixa de lâmina d'água entre 1.000 e 2.000 metros de profundidade. A Petrobras estima que 50% das reservas a serem descobertas estarão situadas em águas profundas e ultraprofundas. "Hoje as

72 • MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

colapso, vibração, variação de tensão e vórtice (redemoinho) das linhas de riser, por exemplo, além de testar equipamentos envolvidos em operações marítimas. Teremos o comportamento de tudo que está flutuando ou submerso quase nas mesmas condições que encontramos, por exemplo, na bacia de Campos': completa ele. Segundo os pesquisadores, vários tipos de equipamentos e estruturas ligados à exploração de petróleo poderão passar pelos ensaios no tanque: plataformas, navios de exploração e armazenagem de petróleo, cabos de fixação de plataformas no fundo do mar, linhas de transmissão, entre ou-

tecnologias e inovações estão especialmente voltadas para a produção em águas profundas pela importância estratégica que essa área adquiriu': diz Ricardo Franciss, do Cenpes da Petrobras. A empresa lidera a corrida pela exploração de petróleo e gás em águas profundas. No campo de Roncador, descoberto em 1996 e localizado na bacia de Campos, litoral norte do Rio de Janeiro, é extraído petróleo a uma profundidade de mais de

tros itens. O tanque possui mecanismos para provocar a formação de ondas de até meio metro, a intervalos que podem variar de 0,3 a cinco segundos. As ondas são produzidas por 75 painéis batedores posicionados numa das bordas do tanque. Cada painel tem um motor independente e pode criar ondulações com diferentes movimentos e direções de propagação. Correntes submarinas - Já os ventos que açoitarão esse "mar artificial" serão programados por ventiladores que podem ser posicionados em qualquer ponto próximo ao espelho da água. Os aparelhos podem gerar ven-

1.800 metros, recorde mundial de exploração no mar. Nas bacias de Santos e do Espírito Santo também já foram descobertos poços em grandes profundidades. No exterior, o ritmo das descobertas é menor. "Com exceção de um poço no golfo do México, explorado pela Shell e localizado a 1.800 metros, os poços no exterior não passam de 1.200 metros de profundidade': revela Franciss. A produção da empresa em águas profundas vem aumentando signifi-


Sistemas de produção, armazenagem e transporte ligados ao fundo do mar

tos com velocidade de até 12metros por segundo e direção e variação no tempo pré-programadas. O tanque terá um fundo móvel, que pode subir e descer, graduando a profundidade entre 1,4 metro e 15 metros, dependendo do tipo de ensaio realizado. A construção que custou R$ 13,6 milhões, foi bancada com recursos do CT-Petro. Na segunda etapa, prevista para ser concluída em um ano, será montado o sistema de correntes submarinas. Bombas despejarão água no tanque a partir de galerias submersas instaladas num dos lados da obra, formando as corren- ' tesoA água, em seguida, sairá do reservatório por aberturas posicionadas na

cativamente. Em 1987, petróleo e gás extraídos de poços localizados em grandes profundidades representavam apenas 1,7% da produção total da companhia. Em 2000, esse percentual avançou para 55%. A Petrobras tem como meta atingir, em 2005, a faixa de produção de 1 milhão e 850 mil barris de petróleo por dia. Cerca de 75% dessa produção será retirada de poços localizados em lâminas de água profundas e ultraprofundas.

extremidade oposta do tanque, seguindo por tubulações até voltar a ser injetada novamente no tanque. Será possível gerar correntezas em diferentes intensidades e profundidades. Para instalar esse sistema o grupo está captando recursos suplementares de R$ 8,2 milhões. A Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) já alocou R$ 1 milhão. Cerca de 15 profissionais, entre pesquisadores, técnicos, mergulhadores e pessoal de apoio, trabalharão no tanque. Sensores ligados aos modelos reduzidos de plataformas, navios, cabos ou robôs submarinos registrarão as respostas dos equipamentos testa-

Desde meados da década de 80 a Petrobras realiza pesquisas para viabilizar a extração de petróleo em profundidades maiores. O Programa de Capacitação Tecnológica em Águas Profundas (Procap) foi criado em 1986 para impulsionar essa atividade. O programa está em sua terceira edição, o Procap-3000, que, entre outras metas, pretende viabilizar novas descobertas em lâminas d'água de até 3.000 metros de profundidade.

dos. Um sistema de vídeo gravará imagens fora e dentro da água. Através de escotilhas localizadas abaixo da linha da água também será possível acompanhar visualmente os ensaios. Mas as aplicações do empreendimento vão além dos ensaios com modelos de equipamentos ligados principalmente à exploração de petróleo e gás. Para o professor de Engenharia Oceânica Segen Estefen, um dos coordenadores do projeto do tanque oceânico, a robótica submarina será outra área a ser beneficiada com o novo tanque. "Um mergulhador hoje não pode ultrapassar os 400 metros de profundidade. Por isso, equipamentos robotizados serão cada vez mais necessários à medida que a exploração dos recursos do mar desce a profundidades cada vez maiores", diz. A área ambiental também terá sua cota de vantagem. Simulando ondas, correntes e ventos, é possível estudar o comportamento de uma mancha de óleo na água. "Ao analisar um derramamento de óleo no mar, podemos disponibilizar dados para uso na ação de combate ao problema", diz o professor de Engenharia Oceânica Carlos Levi, outro coordenador do projeto do tanque.

Parcerias importantes - O grupo da Coppe gerou quatro teses de doutorado, oito dissertações de mestrado e 15 trabalhos de iniciação científica com temas referentes ao tanque. Todas as etapas do projeto foram acompanhadas por um comitê técnico formado por pesquisadores do 1PT, da USP, da Coppe e da Petrobras. As parcerias, por sinal, são muito valorizadas pelos dois grupos. "Nós vamos trocar muitas informações a partir dos dados gerados nos novos campos de provas': completa Levi. "Trata-se de ferramentas de grande importância para a área de ensaios ligados ao setor de exploração de petróleo': diz Franciss, da Petrobras. • PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 73


ITECNOLOGIA

ENGENHARIA

QUÍMICA

Degustação virtual Embrapa desenvolve língua eletrônica para monitorar a qualidade na produção de bebidas e detectar contaminação na água por herbicidas esquisadores da Embrapa Instrumentação Agropecuária criaram um dispositivo mais sensível que a língua humana para degustação e análise de bebidas. Batizado de língua eletrônica, o equipamento é dotado de seis sensores que desempenham função semelhante à das papiIas gustativas, mas são mais eficientes. A língua eletrônica não só é capaz de identificar um legítimo vinho tinto Cabernet Sauvignon como também consegue detectar diferenças quase imperceptíveis ao paladar humano, como as existentes entre as várias marcas de água mineral. O invento, já patenteado pela Embrapa e FAPESP,está em fase de finalização para uso industrial e deverá estar disponível no mercado em três anos. O potencial de aplicação é enorme. O equipamento pode ajudar no controle ambiental, monitorando os níveis de contaminação por metais pesados e pesticidas em rios e mananciais, e no saneamento básico, controlando a qualidade da água nas estações de tratamento. Na indústria alimentícia, a língua eletrônica pode aumentar o rigor do controle de qualidade na fabricação de bebidas, por meio do mo-

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74 • MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

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nitoramento contínuo. Por enquanto, o equipamento está apto para operar com vinhos, café e água mineral, mas os pesquisadores já estão desenvolvendo sensores para analisar leite, suco de uva e de laranja. Na indústria farmacêutica, a língua eletrônica pode ser usada para testar medicamentos e melhorar o sabor dos remédios amargos. De acordo com a literatura sobre o assunto, esta é a primeira língua eletrônica à base de polímeros condutores do mundo. Resultado de seis anos de um trabalho multidisciplinar que envolveu o apoio de físicos e engenheiros de materiais, mecânicos, eletrônicos e elétricos da Embrapa, em São Carlos, o projeto, coordenado pelo pesquisador Luiz Henrique Capparelli Mattoso, também contou com parcerias importantes - o Instituto de Física e o Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da Universidade de São Paulo (USP), em São Carlos, a Escola Politécnica da USP, a Embrapa Uva e Vinho, em Bento Gonçalves (RS), e o Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital), de Campinas. Além disso, foi acompanhado de perto por um ilustre colaborador, o neozelandês naturalizado norte-americano Alan MacDiarmid, professor da Universi-

dade da Pensilvânia, ganhador do Prêmio Nobel de Química em 2000 ao lado do japonês Hideki Shirakawa e do americano Alan Heeger. Em novembro do ano passado, a língua eletrônica recebeu uma das mais importantes premi ações do país na área de desenvolvimento científico e tecnológico - o Prêmio Governador do Estado, concedido pelo Serviço Estadual de Assistência aos Inventores (Sedai), da Secretaria de Ciência, e Tecnologia e Desenvolvimento Econômico de São Paulo, na categoria Invento Brasileiro. Alta sensibilidade - A língua eletrônica

funciona de forma muito semelhante à humana. É capaz de reconhecer sabo-

res: o doce, o salgado, o azedo e o amargo. A diferença é que consegue medir concentrações bem abaixo do limite de detecção biológico. Para o paladar humano, só é possível identificar uma bebida doce se a concentração de açúcar for superior a 685 miligramas (rng) para um copo (200 mililitros) de água. Já a língua eletrônica consegue detectar até 342 mg de açúcar na mesma quantidade de água. Para o salgado, a língua eletrônica detecta até 58 mg de sal em um copo de água, en-


quanto a humana precisa de, no mínimo, 117 mg. O segredo está nos seis sensores que compõem o dispositivo. Eles são formados por microeletrodos revestidos com uma camada ultrafina de polímeros condutores (plásticos que conduzem eletricidade), que levam em sua composição substâncias presentes na saliva humana, como os lipídios. Quando mergulhado numa bebida, o composto polimérico interage com as substâncias presentes no líquido e provoca uma resposta elétrica específica para cada substância, que é captada pelo eletrodo e enviada para um computador. Os sinais recebidos dos eletrodos são então interpretados e convertidos em gráfico, uma espécie de assinatura digital da bebida. A língua eletrônica é resultado de várias pesquisas que permitiram sintetizar polímeros condutores acrescidos de substâncias capazes de torná-los sensíveis a sabores específicos. As polianilinas, por exemplo, são polímeros que interagem com substâncias ácidas presentes na bebida e permitem detectar o sabor azedo. Essa tecnologia, desenvolvida pelo químico Alan MacDiarmid, foi trazida para a Embrapa por Mattoso como parte de seu doutorado nos Estados Unidos sob supervisão direta do pai da matéria. Na Embrapa já foram estudados cerca de 40 compostos poliméricos, específicos para detectar vários padrões de paladar. Os sensores à base de polímeros condutores também

Língua eletrônica detecta sabores quase imperceptíveis para o paladar humano PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 75


Equipamento analisa água contaminada por herbicidas usados em lavouras

são capazes de medir a concentração de minerais presentes na água. Com isso, a língua eletrônica consegue diferenciar perfeitamente a água de torneira de água mineral ou ultrapura (deionizada e destilada), além de detectar contaminação por metais pesados, como chumbo, cromo e outros metais tóxicos.

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Filmes ultrafinos - O desafio agora é desenvolver sensores para detectar contaminação por pesticidas em rios e mananciais. As bases para encarar esse novo desafio foram construídas num projeto anterior à língua digital. Coordenado pelo pesquisador Carlos Vaz, também da Embrapa, ele permitiu o desenvolvimento de um equipamento para detecção de dois herbicidas amplamente utilizados no cultivo de cana-de-açúcar e soja para combater o crescimento de ervas invasoras de folhas largas: o Imazaquin (também conhecido como Scepter) e o Atrazina, produtos que podem causar câncer. Parte da água pulverizada com os herbicidas sobre as plantações escorre para os cursos de água ou penetra no solo, contaminando os lençóis freáticos. "O próximo passo é desenvolver uma língua eletrônica com sensores específicos para detectar essas substâncias e comparar resultados", explica Mattoso. 76 . MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

Além da composição dos polímeros, outro fator determinante para a alta sensibilidade da língua eletrônica é a maneira como são revestidos os eletrodos. "Quanto mais fina a camada polimérica, mais facilmente a bebida é absorvida, o que torna a resposta elétrica quase que instantânea': diz o pesquisador. Para isso, os eletrodos são revestidos com filmes ultrafinos, ou nanofilmes, que têm a espessura de apenas uma camada de moléculas poliméricas (milionésimos de milímetro). Duas técnicas são utilizadas. A automontagem é feita na Embrapa, pelo pós-doutorando Antonio Riul Iúnior, e a deposição, pela técnica Langmuir Blodgett, que consiste na deposição de filme para revestimento dos eletrodos de ouro, em colaboração com o

o PROJETO Utilização de Medidas Elétricas de Corrente Alternada para Caracterização de Sensores Poliméricos de Interesse na Agroindústria MODALIDADE Linha regular

de auxílio à pesquisa

COORDENADOR LUIl

HENRIQUE

CAPPARELLI

MATTOSO

- Embrapa INVESTIMENTO

R$ 32.470J2

e US$ 31.7%55

professor Osvaldo Oliveira, do Instituto de Física de São Carlos, da USP. Todos os componentes do dispositivo foram desenvolvidos no projeto. Os microeletrodos são confeccionados em ouro no Laboratório de Microeletrônica do Departamento de Engenharia de Sistemas Eletrônicos da Escola Politécnica de São Paulo, também da USP, sob coordenação do professor Fernando J. Fonseca. O software que analisa os sinais elétricos captados pelos sensores está sendo elaborado em parceria com o professor André Carvalho, do Instituto de Ciências Matemáticas e Computação da USP, em São Carlos. O programa é baseado em redes neurais, um sistema que opera à semelhança do cérebro humano e permite ser "treinado" para análise de diferentes tipos de bebida. Nos últimos seis anos, as pesquisas com a língua eletrônica na Embrapa resultaram na formação de quatro alunos de mestrado e cinco de doutorado e, atualmente, há 11 pesquisas em andamento. O texto científico foi publicado na revista Langmuir, da Sociedade Americana de Química, em janeiro, e o assunto já marcou presença inclusive no site da revista Nature, também em janeiro. Sabores diferenciados - "Por parte das indústrias de bebidas, o interesse é grande", afirma Mattoso. Nas vinícolas, por exemplo, o equipamento é capaz de determinar, entre vinhos da mesma marca, qual a safra de procedência. As vantagens são muitas. "A língua não se cansa, o que permite monitorar a produção continuamente. E também pode testar produtos que poderiam causar riscos para a saúde do degustador, como remédios:' Mesmo com essas vantagens, ele faz uma ressalva: "A língua eletrônica não foi projetada para substituir o trabalho do especialista em degustação, mas deverá, sim, auxiliá-Io" Isso porque, embora seja capaz de diferenciar vinhos, ela não consegue saber qual deles vai agradar mais ao ser humano. Em se tratando de paladar, a língua humana, pelo menos por enquanto, é que dá a palavra final. •


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GOVERNO DO ESTADO DE

Sテグ PAULO

Secretaria da Ciテェncia, Tecnologia e Desenvolvimento Econテエmico

Rua Pio XI, 1500 - Alto da Lapa 05468-901 - Sテ」o Paulo - SP Tel.: (11) 3838-4000 www.fapesp.br


ITECNOLOGIA

BIOTECNOLOGIA

Cópias da perfeição A ProClone trabalha para adicionar qual idade e competitividade à produção de plantas ornamentais no Brasil eproduzir a beleza de algumas flores, repetir aquele tom que só uma orquídea consegue ter no auge de sua floração são os desafios que a donagem de plantas ornamentais tem exercitado há alguns anos. A técnica utiliza um pedacinho minúsculo de um broto - mais precisamente o meristema, um aglomerado de células de O,1mm - para multiplicar flores exemplares sem diferenciação genética. Embora empregada comercialmente há mais de 20 anos, a técnica passa constantemente por aperfeiçoamentos. Quem consegue utilizá-Ia com maior precisão e baixos custos, produzindo cópias perfeitas em grandes quantidades, livres de doenças e com combinações inesperadas, ganha mercado e nome. Um objetivo que está na trajetória da empresa ProClone Biotecnologia, instalada na cidade de Holambra, na região de Campinas. A empresa busca qualidade e cornpetitividade ao incrementar a produção de dones de diversas espécies de plantas, como orquídeas, gérberas e copos-de-leite. Com o apoio da FAPESP dentro do Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE) desde 1997, a ProClone, que produz 40 mil mudas por mês, está se preparando tecnicamente para ganhar o mercado externo. Sua estrutura de exportação está pronta, mas "dormente': diz a proprietária da empresa, a bióloga Monique Inês Segeren, que se associou a uma empresa holandesa, a Ceres Vitro, para poder conquistar o consumidor externo. Com isso, Monique atingirá um dos objetivos que a levaram a abrir as portas de seu laboratório em 1989: participar do mercado mundial de flores e plantas, que movimenta, em toda sua cadeia produtiva, cerca de US$ 100 bilhões ao ano. Desse total, os produtores são responsáveis por valores próximos a US$ 16 bilhões. A Holanda é o principal exportador e importador mundial de flores e plantas ornamentais e serve de base para as maiores multinacionais do setor. No Brasil, o seg-

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78 • MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

Orquídea (Phalaenopsis)


mento da produção responde por 30% do faturamento, que alcança R$ 1,3 bilhão anualmente, cabendo ao Estado de São Paulo a responsabilidade por 70% desse valor. Só em Holambra, são comercializados mais de R$ 273 milhões em flores por ano. Esse pequeno município de 10 mil habitantes, distante 155 quilômetros da capital paulista, teve origem em uma fazenda, onde foi formada uma cooperativa de agricultores holandeses que deixaram a Europa depois da Segunda Guerra Mundial. Nas últimas décadas, esses agricultores se dedicaram ao cultivo de flores, tornando-se referência nacional no setor. o atraente mercado da produção de flores, a especialidade da ProClone é clonar mudas criadas por especialistas em melhoramento, propiciando uma multiplicação acelerada com todas as características originais da planta preservadas. Esse processo, além de ser designado de clonagem ou clonação, é chamado de micropropagação in vitro. O aperfeiçoamento dessa técnica está em desenvolvimento pela empresa desde que ela participa do PIPE há quatro anos. As inovações tecnológicas resultaram em um equipamento próprio de autoclavagem que faz a esterilização e prepara o meio de cultura usado em recipientes para a multiplicação das mudas. Depois de pronto, o meio de cultura é distribuído, de forma controlada, para 650 recipientes num período de três horas. "No processo manual, seria possível encher apenas 20 no mesmo tempo." Além da demora e margem de erro, o método manual implica maior gasto de energia e custo de mão-de-obra. Por enquanto, o equipamento de auto clave está instalado na ProVitro, joint venture formada entre a empresária e a Ceres Vitro, que está incubada na Companhia de Desenvolvimento do Pólo de Alta Tecnologia (Ciatec) de Campinas. Segundo a empresária, a esterilização do meio de cultura com a auto clave será feita no laboratório da ProClone, em Holambra, assim que as obras de expansão estiverem concluídas e forem instaladas outras duas máquinas de autoclavagem. Melhor esterilização - A autoclave foi projetada pelo en-

genheiro Sérgio Koseki com equipamentos totalmente nacionais. Foi patenteada pela ProClone com o nome de Equipamento de Esterilização de Meio de Cultura e Distribuição Automática e, segundo Monique, não tem similar nacional. A máquina existente com funções semelhantes é alemã, mas a desenvolvida pelo técnico brasileiro tem como diferencial uma hélice, que torna os líquidos mais homogêneos e melhora a esterilização. Para Monique, o fato de a ProVitro estar localizada dentro de uma incubadora é fundamental para o desdobramento da segunda fase do projeto, o desenvolvimento de uma máquina complementar para o processo de donagem de plantas que já está em fase de testes. Trata-se do esterilizador a plasma da Valitech - outra empresa participante do PIPE e incubada no Ciatec -, que usa peróxido PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 79


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de hidrogênio na esterilização de potes plásticos, um processo revolucionário e com reduzido gasto energético. Segundo o pesquisador da empresa, Tadashi Shiosawa, a máquina esteriliza até 2 mil potes plásticos em uma hora. As outras formas de esterilização causam danos à saúde e ao meio ambiente, além de consumir muita energia, afirma o pesquisador. "O óxido de etileno é cancerígeno e causa danos ambientais e a radiação por raio gama tem restrições por sua periculosidade." A máquina também vai permitir a reutilização dos potes plásticos após a lavagem, o que não é feito nem na Holanda, acrescenta Monique. Com os novos equipamentos, a ProClone terá condições de prestar um serviço mais elaborado e rápido para o primeiro elo da cadeia produtiva de plantas e flores, o chamado melhorista. Esse profissional tem espécimes guardados em estufas, que funcionam como ferramentas para pesquisas de variação genética e mutação. Com elas, é possível criar mudas com características próprias, como, por exemplo, um copo-de-leite com cor diferente ou uma banana resistente a determinada praga. Segundo Monique, esses experimentos visam, fundamentalmente, ao aproveitamento comercial do resultado. No caso de flores, o melhorista mostra sua criação em exposições que funcionam como vitrine para reprodutores de plantas e flores em busca de novidades. Ganho de escala - Como o melhorista

tem apenas algumas mudas do novo produto, é necessária uma multiplicação para que o produtor possa levar a planta para o mercado com rapidez e ganho de escala. Assim, o melhorista passa a matriz para um laboratório como o da ProClone, onde é realizada a multiplicação de mudas por micropropagação. Após testes com o grupo de plantas para verificação da qualidade, 80 . MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

Canteiros de calanchoe na estufa: última etapa da clonagem

Acima, detalhe da autoclave que esteriliza o meio de cultura usado em potes, ao lado, para multiplicar as mudas

é escolhido o lote a ser multiplicado em larga escala. A próxima etapa ainda está no mesmo laboratório, ou na chamada biofábrica. A muda é transformada em milhões de mudas, sob condições controladas, em meio de cultura e com reduzido espaço de tempo. Após essa multiplicação, as mudas são entregues ao produtor, e só então sairão de seus potes para serem plantadas em canteiros de terra da estufa, para crescimento, floração e conseqüente entrega aos distribuidores e floriculturas. Para garantir que a muda a ser multiplicada por esse sistema está livre de doenças conhecidas, é feito um teste de qualidade baseado no método Elisa (Enzyme Linked Immunosorbent Assay). A aceitação no exterior de mu-

das donadas no Brasil passa pelo teste Elisa. Trata-se de um método de padrão internacional usado para testar as reações ocorridas com as mudas diante da ação de vírus conhecidos e específicos para cada planta. Certificado de origem - O consultor contratado pela ProClone, o pesquisador José Alberto Caram Souza Dias, do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), acrescenta que esse teste é determinante para obter certificado fitossanitário de origem, que comprova a qualidade e a inexistência de vírus e funciona como garantia de entrada da muda lá fora. Em seu trabalho na ProClone, Caram desenvolve máquinas para realizar o teste:


ProClone são a gérbera (Gerbem), a calanchoe (Kalanchoe), além de folhagens como samambaias (Dicksonia e Polypodium) e filodendros (Philodendron). A ProClone também faz reprodução in vitro de variedades de antúrio (Anthurium) desenvolvidas e produzidas pelo IAC. A estratégia de Monique é bastante dara: dona e desenvolve mudas que o mercado deseja e se antecipa à concorrência e ao desejo dos consumidores. Para isso inova na produção de equipamentos, procura brechas de mercado e se associa a parceiros tecnológicos e de investimento. A empresa tem seis funcionários e cinco bolsistas. O apoio financeiro de instituições de fomento à pesquisa faz parte de sua rotina desde o início das atividades da empresa, com o Programa de Capacitação de Recursos Humanos para Atividades Estratégicas (Rhae) do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). trata-se de uma injetora-lavadora e de um aspirador para secagem das microplacas com 96 cavidades onde são depositadas amostras e reagentes, uma operação que se repete por três vezes com cada amostra. O preço do conjunto importado varia de US$ 2 mil a US$ 8 mil. Caram estima que as duas máquinas adaptadas por ele custem menos de R$ 1 mil. Evasão de matrizes - A maior capacitação técnica na produção de plantas ornamentais no Brasil pode reverter uma situação no mínimo preocupante: a evasão de matrizes brasileiras, em que o caso mais flagrante é o de várias espécies de orquídeas nativas que estão sendo reproduzi das no exterior e reexportadas para o Brasil. Segundo Monique, uma muda importada de orquídea custa R$ 4, enquanto é possível reproduzi-Ia aqui a R$ 10 o lote de 50 mudas. A empresária acrescenta que existem hoje quatro grupos (gêneros) de orquídeas com excelente aceitação comercial - Phalaenopsis, Dendrobium, Oncidium, a chamada chuva-de-ouro, e Paphiopedilum, conhecida como sapatinho - e dois outros também com muita procura para

reprodução: Catleya e Laelia, gêneros apreciados pelos orquidófilos, profissionais que reproduzem e vendem essas plantas em exposições e feiras. "A coleção brasileira está bastante espalhada, mas a orquídea é uma planta altamente dependente de laboratório", diz Monique. A ProClone também acelera a multiplicação do copo-de-leite (Zantedeschia), gênero com 40 espécies de variadas cores, que tem demanda crescente no mercado nacional. Essa planta é importada da Holanda, mas sua origem é a África do Sul. Outras plantas que compõem a prateleira da

o PROJETO Desenvolvimento de Controle de Qualidade de Mudas em Laboratórios Coligados de Biotecnologia MODALIDADE

Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE) COORDENADOR MONIQUE

INÊS SEGEREN

INVESTIMENTO

R$ 263.000,00

-

ProClone

Investimento na produção - Enquanto esperava o projeto da FAPESP ser aprovado, Monique cumpriu um programa de trabalho de oito meses no Quênia, onde gerenciou um laboratório com mais de cem funcionários da Ceres Vitro. Essa experiência foi importante para solidificar os laços empresariais com o sócio Hendrikus Petrus Schouten, para a formação da ProVitro. Ele,além da CeresVitro, também é proprietário da Ceres International, com sede na Holanda. O olhar do sócio holandês pousa pelo menos quatro vezes ao ano na nova e embrionária empresa, para a qual já adquiriu uma área de sete hectares na região de Holambra. Ali, tão logo o empresário identifique o momento certo de investir, vai iniciar a construção de uma biofábrica que irá produzir mudas donadas de várias espécies - em larga escala - com grandes perspectivas de exportação. O custo avaliado para esse empreendimento é de R$ 1,5 milhão. Por enquanto, Monique diz que seu sócio, em suas vindas ao Brasil, prospecta o terreno e conhece os produtores parceiros, que em suas estufas reproduzem as mudas melhoradas da ProClone. • PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 81


HUMANIDADES ARTES PLÁSTICAS

• Pesquisa analisa a coleção de esculturas de Edgar Degas no Museu de Arte de São Paulo

pintura, a ele espreitava as bailarinas por trás das coxias. Mulheres nuas prestes a tomar banho, cavalos sendo preparados para a corrida, retratos de personalidades importantes. O francês Edgar Degas (1834-1917) foi um artista do mundo privado. Mas suas cenas intimistas não servem obrigatoriamente para retratar o cotidiano de um parisiense culto, assíduo freqüentado r da Ópera de Paris. Considerado o menos impressionista dos impressionistas, Degas cultivou o fascínio pelo movimento. Em sua trajetória artística, bailarinas clássicas e cavalos de corrida adquirem importância por possuírem corpos treinados para o movimento e a repetição. A expressão maior de seu estudo sobre esses temas está em sua obra escultórica que, jamais exposta ao público enquanto ele viveu, foi descoberta tardiamente em seu ateliê, um ano após a sua morte. Ela é muito querida pelo público brasileiro. É difícil dissociar o nome do Museu de Arte de São Paulo (Masp) da imagem da Bailarina de Quatorze Anos, de Degas, espécie de ícone do museu, o qual possui a maior coleção de arte da América Latina. À jovem feita em bronze, com os

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braços estendidos para trás e o pé à frente, como se ela se aquecesse para o espetáculo, juntam-se dezenas de outras bailarinas, jóqueis, cavalos e moças em toalete. As 73 peças formam uma das quatro únicas coleções completas de esculturas de Degas do mundo - outras três estão no The Metropolitan Museum of Art, em Nova York, no Musée d'Orsay, em Paris, e no Ny Carlsberg Glyptotek Museum, em Copenhague. As esculturas de Degas do Masp mereceram a atenção da historiadora Ana Gonçalves Magalhães que, em novembro de 2000, defendeu a tese de doutoramento Degas Escultor: Do Processo de Fundição à Coleção de Bronzes do Museu de Arte de São Paulo (Masp), no Departamento de Artes Plásticas da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (ECAJUSP). Orientada pelo importante historiador da arte e professor Walter Zanini, Ana desenvolveu suas pesquisas por quatro anos com auxílio da bolsa de doutorado da FAPESP e ainda recebeu auxílio-viagem da instituição, o que lhe permitiu ir à Inglaterra e à França. Naqueles países, entrou em Bailarina de Quatorze Anos: quando chegou ao Brasil, a peça virou ícone representativo da arte de Degas no bronze


contato com grandes especialistas na obra de Edgar Degas, como o inglês Richard Kendall e a francesa Anne Pingeot, conservadora-chefe de escultura do Orsay. "A idéia de desenvolver essa tese nasceu em 1995, quando eu realizava uma visita guiada no Masp e me deparei com a coleção completa exposta", narra Ana. "Fiquei fascinada pelas peças e percebi que com elas poderia realizar um trabalho semelhante ao do meu mestrado", explica. Este, desenvolvido na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) sob orientação do professor Jorge Coli, analisava os dois quadros do também impressionista Claude Monet (1840-1926) pertencentes ao acervo do Masp. Naquele trabalho, Ana estudou a composição da obra de Monet, preocupando-se com a maneira como o pintor lidava com o movimento e como estabeleceu relações entre a sua arte e as artes da fotografia e do cinema, incipientes naquela virada do século 19 para o 20. O trabalho resultou no livro Claude Monet - A Canoa e a Ponte, editado pela Editora Pontes, com apoio da FAPESP. Como parte de sua investigação sobre o movimento nas esculturas de Degas, Ana fotografou cada uma das peças da coleção do Masp. O procedimento teve início em janeiro de 1999, após um período de levanta-O mento bibliográfico. "Isso me permitiu obter informações sobre o percurso dessas obras antes de chegarem ao Brasil", explica ela. Alguns indícios desse caminho foram rastreados a partir de carimbos das galerias pelas quais as esculturas passaram pelo menos uma alemã, a Galerie Fleichtheim, e uma inglesa, a Marlborough Gallery, que as venderam ao Masp. Outros, a partir do cachê de assinatura de Degas criado pelo fundidor das esculturas. Nesse ponto reside a maior curiosidade sobre a coleção de esculturas de Degas. Nenhuma das peças foi feita em bronze por seu criador. "Toda a fundição foi póstuma. Os materiais originais eram cera, estopa, pedaço de arame, rolha, argila e plastilina,

uma espécie de material sintético", explica a pesquisadora. Após a morte do artista, seu marchand, Ioseph Durand-Ruel, deixou a Albert Bartholomé, escultor e amigo íntimo de Degas, a incumbência de mandar fundir 150 estátuas que tinham sido encon-

Dança Espanhola: obras do artista sem limites de realismo

tradas em seu ateliê. O trabalho ficou a cargo da casa de fundição de Adrien A. Hébrard. Estando muitas delas em péssimo estado de conservação, apenas 72 puderam ser aproveitadas. Conforme contrato firmado entre o fundidor e os herdeiros de Degas, de cada uma delas foram feitos 22 exemplares, formando, assim, 22 séries, das quais 20 foram colocadas no mercado. Essas 20 séries foram batiza das de ''1\' a "T" e a maior parte das peças pertencentes ao Masp são da série 'S', ou seja, da 19a série comercial. "Somente uma meia dúzia não faz parte dela", diz Ana. A peça de número 73 é justamente A Bailarina de Quatorze Anos, única exibida por Degas em vida, na exposição impressionista de 1881. Ela foi fundida separadamente das 22 séries de 72 peças e dela foram feitos 25 exemplares, três a mais do previsto no contrato. Os originais de cera das esculturas de Degas encontram-se atualmente na National Gallery de Washington. "Não se sabe muito bem como foi o processo de fundição, mas sabe-se que ele durou pelo menos uma década, a partir de 1919", diz a historiadora. A coleção do Masp foi adquirida em 1951, cerca de dois anos após Gilberto Chateaubriand e Pietro Maria Bardi terem recebido uma carta de Londres. O remetente era o dono da Marlborough Gallery, que se dizia interessado em vender a coleção completa de Degas a um grande museu, desde que esse se comprometesse a mantê-Ia na íntegra. "Não conheço os valores, mas acredito que a coleção não tenha sido muito cara, pois havia muitos espólios de famílias e o comércio da arte estava falido", observa Ana. "O impacto da chegada das peças ao Brasil foi muito grande", afirma Luiz Hossaka, curado r do Masp. Ele já trabalhava no museu em 1954, quando a coleção Degas chegou ao país. "Além disso, Chateaubriand sabia mobilizar artistas, políticos, empresários, todo mundo", diz ele. Assim que desembarcaram, as esculturas foram expostas no Palácio do Itamaraty, no Rio de Janeiro, e, depois, no Museu de Arte MoPESQUISA FAPESP . MARÇO DE 2002 • 83


derna de São Paulo (MAM-SP). Isso aconteceu mais ou menos simultaneamente a uma exposição itinerante da coleção do Masp por várias capitais européias, que culminou em uma grande mostra no The Metropolitan Museum, em Nova York."Asesculturas de Degas não foram porque se tratava de uma mostra apenas de pintura", destaca Ana. Curiosamente, diz a pesquisadora, quando aquela mostra chegou a Nova York, as peças de Degas arrematadas por Bardi e Chateaubriand já valiam dez vezes mais do que em 1951, quando foram adquiridas. Das 6.800 obras que formam o acervo do Masp, os 73 bronzes de Degas representam a principal coleção no que diz respeito à arte da escultura. "Sempre temos receio quando elas são pedidas por museus de outros países. Mas, devido à sua importância, é difícil negar o empréstimo", diz Eunice Morais Sophia, coordenadora do acervo do museu. "Entre os cuidados, exigimos que elas sejam transportadas em pelo menos três aviões diferentes, pois, caso haja um acidente, evita-se danificar a coleção inteira", explica. O meio ambiente em que as peças são expostas também deve receber cuidados. "Ao mudarem de um ambiente para outro, as esculturas podem se danificar. O ideal é que elas permaneçam em um local de umidade baixa", diz Karen Cristine Barbosa, coordenadora do Departamento de Conservação e Restauração do Masp. As esculturas de Degas do museu foram expostas em diversas instituições americanas e européias, como por exemplo o Museu Van Gogh, em Amsterdã. "É muito interessante notar que a coleção permite a realização de exposições completamente diferentes entre si", observa Eunice. "Pode-se fazer uma exposição só sobre as técnicas do balé clássico, ou só com as cenas íntimas das moças no banho, ou, então, apenas de corridas de cavalos. Quando os curadores internacionais pedem as peças emprestadas, em geral, já têm uma idéia de 84 • MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

Cavalo a Galope: paixão por dança e por equitação

que forma podem aproveitá-Ias para realizar o que desejam em suas mostras", diz. Luiz Hossaka relembra que, nos anos 50, era comum ver estudantes de desenho e de dança visitando a coleção. A obra escultórica de Degas é rodeada por alguns mistérios, ainda não decifrados pela história da arte. Uma pergunta a se fazer é por que motivo o mestre da pintura, herdeiro da tradição do desenho

Bailarina fazendo a reverência

desenvolvida por Raphael (14831520) e Ingres (1780-1867), teria deixado suas esculturas escondidas no ateliê, tendo levado a público somente A Bailarina de Quatorze Anos. "Uma hipótese defendida pelos estudiosos até a década de 80 é que a exposição da Bailarina, em 1881, fora um fracasso tão grande, que Degas teria desistido de exibir suas esculturas", explica Ana. "Pessoalmente, pelo que li sobre sua personalidade, acho difícil que Degas fosse um homem que se intimidasse com esse tipo de coisa",pondera. O fato é que, em 1881, A Bailarina de Quatorze Anos não foi compreendida como uma peça escultórica. "Degas escolheu materiais muito alternativos para realizá-Ia. Originalmente, era de cera, vestida com um tutu de balé e um corpete de pano de verdade. Na cabeça, um laço de fita e uma peruca", relata Ana. "Para o século XIX, aqueles eram materiais facilmente utilizados em um esboço e não em uma peça acabada", continua. Havia, também uma contradição, pois a cera era um material muito utilizado nos museus de ciência e de cera, para fazer peças ultra-realistas. E a bailarina de Degas brincava com este aspecto realista, a começar


Mulher Lavando: artista começou a fazer esculturas ainda jovem, antes da pintura

pelo tamanho, equivalente a dois terços do natural. Porém, depois que a coleção escultórica de Degas veio a público, a jovem bailarina virou um sucesso. "Quando chegou ao Brasil, a bailarina já era um ícone representativo da obra de Degas", diz ela. Linguagens - Muitos teóricos acreditam que Degas costumava deixar as esculturas longe do público pois serviriam de esboço para seus desenhos e pinturas. Outros acham que sua relação com a escultura só tenha se intensificado nos últimos anos de vida, quando, paulatinamente, foi perdendo a visão, em função de um acidente que sofrera durante a guerra franco-prussiana. "Sem dúvida, a pintura sempre foi o cartão de visitas da obra de Degas, mas durante toda a vida ele trabalhou em diversas linguagens com a mesma intensidade", explica Ana. "Ele desenvolveu a escultura desde cedo, na década de 1860. Um dos primeiros cursos em que se inscreveu na Escola de Belas Artes foi o de escultura. Então, o que talvez tenha acontecido é que ele acreditava que sua escultura ainda não chegara a uma maturidade a ponto de ser exposta", conclui a pesquisadora. Algo compreensível para um artista contem-

!

porâneo a Auguste Rodin (18401917), segundo hipóteses levantadas na tese da pesquisadora. Por outro lado, conforme ela diz, de fato, a cegueira contribuiu para a aproximação do artista do trabalho tridimensional. "Mas, a certa altura, em 1912, Degas foi obrigado a abandonar o prédio onde mantivera seu ateliê. Ele ficou muito mal e começou a perambular pelas ruas de Paris. Acabou abandonando a pintura'Lrelata a historiadora. Entre as informações históricas descobertas por Ana a partir do manuseio e das fotografias feitas das peças, está a de que elas devem ter pertencido a uma importante galeria alemã na década de 20, a Galerie Fleichtheim. O marchand, que também foi editor de

o PROJETO A Coleção de Esculturas de Edgar Oegas no Masp MOOALIOAOE

Bolsa de doutorado ORIENTADOR WALTER ZANINI - Departamento de Artes Plásticas da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP)

INVESTIMENTO

R$85.824A2

uma expressiva revista alemã de arte moderna, migrou para a Inglaterra com a ascensão do nazismo, o que dá uma pista sobre como as esculturas foram parar em Londres. As peças também possuem carimbos da alfândega francesa, os quais eram muito utilizados, até a década de 40, cada vez que uma obra de arte saía do país. Para compreender o processo de transformação de esculturas feitas em diversos materiais em trabalhos feitos de bronze, Ana teve de visitar o ateliê de artesãos especializados na técnica da cera perdida. Nessa técnica, uma peça original é envolvida por gesso, o qual dá origem a uma fôrma. Essa fôrma é recheada de cera. O conjunto é levado a um forno em alta temperatura, com o qual a cera derretida deixa a fôrma por um orifício. A partir daí, a cavidade do recipiente serve de receptáculo para o bronze e a peça originária é reproduzida tal e qual o seu original. "É curioso notar que o fundidor preocupou-se em reproduzir as peças exatamente da forma como Degas as deixou': diz Ana. Marcas de ferramentas, ausência de braços ou detalhes foram mantidos, o que mostra que não houve preocupação, por parte do fundidor, em tentar imaginar que resultado final diferente o artista desejava. Segundo Ana, seria necessário implementar técnicas mais sofisticadas para identificar outros detalhes sobre o processo de fundição dos bronzes de Degas. O uso dos raios X, por exemplo, permitiria identificar como foram moldadas as peças: se foram fundidas por partes ou soldadas do mesmo modo. "Essa coleção de esculturas é uma das prediletas do público. Por isso também temos pena quando ela é emprestada a outras instituições", diz Eunice. É bom notar que o cuidado com as moças e cavalos de Degas é tanto, que os laços nos cabelos das bailarinas da exposição não são os originais. Estes estão preservados na reserva técnica. Hoje, duas dúzias de esculturas podem ser vistas no segundo andar do Masp, ao lado de duas telas do artista francês. • PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 85


• HUMANIDADES HISTÓRIA

A repressão arquivada em nome dos ideais do golpe de 1964: mapeando o terror de forma temática

·

Uma história feita de papel

agem de milhares de pastas Dois projetos trazem à luz os muitos contendo uma infinidade de documentos guardados nos porões relatórios, memorandos, ofícios, tele- do Deops/S P de 1940 a 1983 gramas, termos de declaração, informes e notas, amarelados e ordenados de acordo Vargas) e entre 1964-1985 (Regime Micom critérios inicialmente desconhelitar). Exercendo simultaneamente a cidos fornece uma idéia precisa do inprevenção e a repressão de crimes, essa tenso trabalho realizado por pesquipolícia se notabilizou pelo emprego de sadores financiados pela FAPESP métodos ilegais e violentos. sobre os arquivos do Deops/SP (Delegacia Estadual de Ordem Política e Pessoas "perigosas" - A enorme quantiSocial), um dos mais importantes órdade de documentos inéditos do argãos do aparato repressivo da História quivo do Deops/SP vem sendo sisteRepublicana Brasileira. matizada, decodificada, analisada e Durante 59 anos, entre 1924 e 1983, interpretada desde 1994, quando finaluma polícia política, preocupada exmente o acervo foi aberto à consulta clusivamente em perseguir idéias, teve de pesquisadores e transferido para o forte atuação no Brasil, mesmo nos Arquivo do Estado de São Paulo. São momentos em que o país vivia distan150 mil prontuários de pessoas ou inste dos estados de exceção registrados tituições consideradas "perigosas" à seentre 1930-1945 (governo de Getúlio gurança do Estado, além de 6,5 mil

A

86 • MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

dossiês - esses com ainda maior variedade documental, somando 2 milhões de diferentes tipos de registros, 1,1 milhão de fichas remissivas e 9.636 pastas codificadas alfa-numericamente. Dois projetos financiados pela FAPESP, envolvendo numerosos pesquisadores, desde estudantes de graduação que têm bolsas de iniciação científica até mestrandos e doutorandos sob a coordenação de professores doutores, acrescentam conhecimentos e estimulam a construir uma nova versão para a história contemporânea do Brasil. O Projeto Integrado (Proin) Arquivo/ Universidade e o Projeto Mapeamento e Sistematização do Acervo Deops/SP: Série Dossiês (1940-1983) envolvem

duas instituições: a Universidade de São Paulo (USP) e o Arquivo do Estado de São Paulo. O ambicioso Proin mapeia os prontuários e já publicou sete volumes da Coleção Inventário Deops, de


diferentes módulos temáticos, como resultado. Até o final de 2004, enquanto será custeado pela FAPESP, lançará outros 20 livros. O projeto também abrange a Coleção Teses & Monografias, com um volume publicado e outros dois no prelo. As edições são fruto de parceria entre o Arquivo e a Imprensa Oficial do Estado de São Paulo. A Série Dossiês acaba de lançar o primeiro volume: No Coração das Trevas: O Deops/SP Visto por Dentro. Em 31 de março, dia de aniversário do golpe de 1964, o Projeto Mapeamento e Sistematização do Acervo Deops/SP dará à sociedade um banco de dados por meio do qual será possível estabelecer diversos cruzamentos entre as informações desejadas pelos pesquisadores. Em setembro, no Encontro Regional de São Paulo da Associação Nacional de História (Anpuh), realizado em Franca, serão lançados outros quatro livros, com todo o temário constituído no banco de dados e conclusões do projeto.

política, iconografia, religião, grupos étnicos e de gênero e operariado. Estão envolvidos 16 bolsistas de iniciação científica, seis mestrandos e quatro doutorandos. "O início da coleção, em 1997, partiu de um convite do Instituto Goethe para participar de uma exposição que seria organizada no Centro Cultural São Paulo e cuja temática eram os alemães refugiados no Brasil", conta a professora Maria Luiza. ''A partir da necessidade de localizar documentos sobre a Alemanha, diante daquela enormidade de prontuários, sentimos falta de um banco de dados que nos facilitasse a localização de documentos por temáticas. Daí surgiu a idéia do projeto." O volume inaugural da série Inventário Deops, intitulado Alemanha, foi publicado em 1997. Ana Maria Dietrich, Elaine Bisan Alves e Priscila Fer-

ros de Guerra - Os Cidadãos do Eixo nos Campos de Concentração Brasileiros (1942-1946). Essa tese será igualmente publicada pela Teses & Monografias, coleção idealizada para os trabalhos de pós-graduação stricto sensu, enquanto os trabalhos originados de alunos de iniciação científica integram a Inventário Deops. Espionagem" "Nós fomos o primeiro grupo a trabalhar com os alemães, desconhecíamos a organização interna do Deops/ SP, mas conseguimos levantar dados sobre as organizao ções de espionagem e ideário nazista, que começam em 1940 e em 1942 foram desbaratadas': explica a pesquisadora Priscila. "Estima-se que havia cerca de 200 dessas organizações espalhadas por São Paulo, pelo Rio de Janeiro, Recife e por toda a Região Sul do Brasil." A professora Maria Luiza fala sobre o êxito da série inaugurada pelo volume Alemanha e os resultados a que chegou até agora: "Hoje temos um modelo de projeto de pesquisa que se tornou oficial, sugerido pela FAPESP. Chegamos a uma proposta de banco de imagens e de banco de dados de documentos escritos, que já foi colocado à disposição do público há dois anos", conta a pesquisadora. "No Arquivo do Estado temos uma sala de informática equipada. Os consulentes podem ter acesso ao banco de dados com a parte iconográfica, ou seja, é possível chamar o item desejado por uma palavra-chave. Se queremos fotografias sobre nazismo, aparecerão na tela não só

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Coordenação" O Proin Arquivo/Universidade ou Coleção Inventário Deops/SP e Teses & Monografias foi coordenado por Maria Luiza Tucci Carneiro, do Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP), responsável pelos inventários; por Boris Kossoy, do Departamento de Jornalismo e Editoração da Escola de Comunicações e Artes (ECA/USP), que responde pela parte iconográfica do projeto; e pelo responsável pelo acervo do Deops/SP, Fausto Couto Sobrinho, diretor do Arquivo do Estado, o ambicioso Proin lançará ainda este ano mais seis volumes. Até 2004, serão 20 volumes da Coleção Inventário Deops divididos em módulos temáticos que abordam comunistas, japoneses, anarquistas, polícia política, geopolítica do controle, meios de informação e propaganda

reira Perazzo foram as autoras da pesquisa, que teve grande repercussão, merecendo algumas páginas de reportagem na revista alemã Der Spiegel. Priscila continuou pesquisando os desdobramentos do tema em seu mestrado (O Perigo Alemão e a Repressão, publicado na coleção Teses & Monografias) e em seu doutorado, a ser defendido em abril, que se chama Prisionei-

Foto de Prestes discursando, tirada em 1946

PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 87


as fotos, mas a identificação e outras referências a ela ligadas." Esse banco de dados é alimentado concomitantemente com textos escritos e material iconográfico, diz Maria Luiza. Para o professor Boris Kossoy, a inovação da metodologia do projeto, que leva os alunos a aulas no Arquivo do Estado, é que pela primeira vez os estudantes trabalham com documentos. São historiadores que têm em mãos documentos inéditos para serem descritos e interpretados. "O documento deixa, então, de ser mera abstração, passando a ser algo real. Isso tem despertado um interesse muito grande e essas turmas vêm se renovando desde 1996. Este é o sétimo ano do trabalho e a cada dia o entusiasmo demonstrado pelos alunos é maior", diz Kossoy. Ainda neste ano serão lançados outras obras. Cultura Amordaçada. Artistas, intelectuais e músicos sob a vigilância do Deops, 1930-1945), de Álvaro G. Antunes Andreucci e Valéria Garcia de Oliveira, dentro do módulo dos comunistas, O "perigo amarelo" segundo a lógica da desconfiança (19381945), que integra o módulo dos japoneses, e também Na boca do sertão: o perigo no interior do Estado, de Beatriz de M. Brusantin, que inaugura o Módulo geopolítica do controle.

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Decodificação - O Projeto Mapeamento e Sistematização do Acervo Deops/ SP: Série Dossiês (1940-1983) foi organizado pelos pesquisadores Maria Panfleto apreendido pela polícia brasileira Aparecida de Aquino, Marco Aurélio Vannuchi Leme de Matos e Walter Cruz Swensson Jr., todos tir do crime, mas sim o crime através do Departamento de História da de seu (suposto) criminoso': os pesFaculdade de Filosofia Ciências e quisadores envolvidos trabalharam Letras da USP. Além de analisar em quatro anos na decodificação dos pormenores os bastidores de criação dossiês, que receberam códigos alfae estabelecimento do órgão repressivo numéricos cujo significado precisou que "não buscava o criminoso a parser decifrado. "Foram duas equipes

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com dez pessoas cada, composta por alunos graduandos e já graduados em história trabalhando com afinco e dedicação. Ao final, pudemos dizer algo como 'Abre-te Sésamo!' diante da decifração dos códigos", afirma Maria Aparecida. "Mesmo porque a série Dossiês foi produzida pelo serviço secreto do Deops/SP, que ocupava posição estratégica dentro da estrutura administrativa da delegacia." Segundo Maria Aparecida, os prontuários têm mais força na década de 30 e os dossiês no período militar. Entre 4S e 64, período de democracia e estado de direito, o Deops/SP não deixou de atuar. O aparato repressivo não se calou. "Todo esse nosso trabalho significa que não basta acabar com a ditadura, mas que os limites da democracia se conhecem melhor estudando esses arquivos e as histórias que nos trazem", afirma a pesquisadora. "Hoje se pode conhecer mais o sentido do autoritarismo no Estado brasileiro, o que é o pensamento de um Estado repressivo e autoritário. Se conhece mais o coração das trevas, com essa documentação mapeada e sistematizada."

Banco de dados - Os quatro volumes da série Dossiês Deops/SP que serão lançados em setembro, além das explicações sobre o banco de dados que foi constituído, mostrarão "pesquisas verticalizadas e profundas" sobre algumas das possibilidades de pesquisa inauguradas pelo arquivo. Um dos volumes falará sobre o ex-governador paulista Ademar de Barros, outro a respeito do II Exército e o aparato do DOI/ Codi, um terceiro dos arquivos secretos do Serviço Nacional de Inteligência (SNI) e um último sobre os relatórios dos agentes infiltrados em organizações clandestinas. •


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• HUMANIDADES

DIPLOMACIA

o quixote liberal da república Livro recupera as idéias de Oliveira Lima, o pioneiro da nacionalidade anoel de Oliveira Lima (1867 -1928) - historiador e diplomata recifense - foi um destacado intelectual de um período decisivo da história do Brasil, a passagem do Império para a República. Além da mudança de regime de governo, essa fase tem particular relevância, pois marcou o fim do alinhamento do Brasil com a Inglaterra e o início da tutela dos Estados Unidos. Membro do serviço diplomático entre 1890 e 1913, Oliveira Lima consagrou boa parte dos seus escritos à reflexão sobre temas importantes para a compreensão desse momento histórico, que mostram o processo de construção do Estado Nacional e os debates em tomo da noção de nacionalidade. Esquecido durante décadas, Oliveira Lima está saindo do ostracismo graças à historiadora Teresa Malatian, professora da Universidade Estadual Paulista (Unesp), que dedicou-lhe uma tese de livre-docência, apresentada em 1999 e agora publicada: Oliveira Lima e a Construção da Nacionalidade (Edusc/FAPESP, 2001, 460 págs.). A pesquisa contou com o apoio financeiro da FAPESP, que concedeu uma bolsa de pós-doutorado no exterior à autora. Oliveira

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90 . MARÇO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

A pesquisadora começou a se interessar por Oliveira Lima há alguns anos, quando estudava o pensamento monárquico no Brasil e se deparou com a penetração das idéias liberais do diplomata. "Por ser autor de uma obra histórica e ter entrado em vários conflitos com o Barão de Rio Branco ministro das Relações Exteriores - ao longo da gestão deste à frente do Itamaraty (1902-1912), Oliveira Lima foi marginalizado pela historiografia dominante, que exaltou e exalta até

hoje o papel de Rio Branco. Oliveira Lima ficou com fama de bom historiador e de diplomata rebelde", comenta a pesquisadora. Um dos raros intelectuais a assumir a influência de Oliveira Lima foi Gilberto Freyre, que admirava sua capacidade de observação e a densidade de suas descrições. Freyre chegou a elaborar um estudo sobre o conterrâneo, Oliveira Lima: D. Quixote Gordo (1970). "A qualidade das descrições é o melhor da produção de Oliveira Lima': avalia o historiador José Iobson de Andrade Arruda, que explica o esquecimento da obra do diplomata por sua identificação com a historiografia positivista, dominante entre o fim do século 19 e o início do 20. "Com a emergência da historiografia marcada pelo marxismo, baseada na análise, na reflexão e na conceituação, os textos de Oliveira Lima caíram no limbo, pois eram muito empíricos", afirma. Outra grande virtude do diplomata pemambucano era a sua enorme capacidade para coletar documentos, como livros e manuscritos muitos deles raríssimos -, desenhos e pinturas. Sua biblioteca, que tem um acervo de 16 mil itens, está em Washington, na Catholic University of America, onde o historiador lecionou depois de sua aposentadoria como diplomata. A coleção acabou indo para os Estados Unidos, pois o Itamaraty se recusou a pagar o transporte para o Brasil. Além de colecionador voraz, Oliveira Lima manteve uma corresBranco

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Lima: história o colocou à sombra de Rio


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pondência regular com mais de uma centena de personalidades de seu tempo, como Euclides da Cunha e Machado de Assis, o que permite recompor grande parte do ambiente cultural e do pensamento brasileiro na época. Hoje, as descrições de Oliveira Lima podem ser vistas com novos olhos, segundo Arruda. "Em D. João VI no Brasil (1908), o diplomata mostra uma notável capacidade para descrever os eventos da corte. Ele é de certo modo um precursor da história do cotidiano': diz. Baseado em documentos inéditos, o livro mostra um D. João VI muito diferente do descrito pela historiografia portuguesa, que o considerava como uma figura burlesca e indolente. Para Oliveira Lima, trata-se de um "rei humanizado e popular, dotado de argúcia camponesa, ardiloso, perspicaz", escreve Malatian. O diplomata concebe o monarca como o fundador da nacionalidade brasileira, que foi desenvolvida pelo Império. As concepções do nacional formuladas por Oliveira Lima se baseiam nas três raças que se misturam, no Estado-nação e no cristianismo. A teoria das três raças integra os cânones historiográficos do século 19, com a preponderância do homem branco, legitimando a dominação das elites. O Estado - que organiza a nação e lhe dá identidade - demonstraria a superioridade do branco. O cristianismo é' valorizado apenas enquanto instrumento civilizatório, paralelo e dissociado do Estado. Os relatos sobre as impressões provocadas por alguns dos países onde viveu são outro ponto alto de sua obra. Teresa Malatian considera que o mais interessante deles No Ja-

Pensador de peso: diplomata

rebelde

O fato de ter exercido a atividade diplomática está intimamente ligado à evolução do pensamento do historiador. Serviu sucessivamente em Lisboa (1890-1896), Washington (18961900), Londres (1900-1901), Tóquio (1901-1903), Caracas (1905-1906) e Bruxelas (1908-1912). Com exceção de Tóquio e Caracas, sempre esteve em postos de observação privilegiados da conjuntura internacional, linhas de frente na execução da política externa brasileira. Além disso, dispunha de excepcionais condições de pesquisa, pois tinha acesso a documentos di-

o PROJETO

pão: impressões da terra e da gente (1903), reeditado em 1905 e 1997. No livro, o diplomata observa o Japão e a sociedade japonesa combinando descrição, sensações pessoais, história, sociologia, etnografia e especulações psicológicas. Oliveira Lima foi um dos primeiros brasileiros a viajar ao país, que na época se abria ao Ocidente e iniciava uma política expansionista na Ásia, e mostra lucidez ao perceber o país como uma potência emergente.

Oliveira lima e a construção da nacionalidade MODALIDADE

Bolsa de pós-doutorado COORDENADORA TERESA MALATIAN - Faculdade de

História, Direito e Serviço Social Unesp/F ranca INVESTIMENTO

US$ 5.141

plomáticos. As andanças determinaram mudanças em seus pontos de vista, de modo que não se pode entender sua obra sem conhecer sua vida. A pesquisadora leva isso em conta, pois sua análise repassa ambas cronológica e simultaneamente. "Ele viveu no Portugal monárquico, foi discípulo de Oliveira Martins historiador português monarquista e conviveu com os monarquistas brasileiros exilados em Lisboa. Por outro lado, Oliveira Lima era um diplomata nomeado pela República, num momento de renovação de quadros em que a diplomacia devia fazer uma profissão de fé republicana", diz. Por dever de ofício, escreveu textos republicanos, destinados a criar uma imagem positiva do Brasil no exterior que contribuísse para dar credibilidade ao país junto aos investidores europeus. Sua convicção monárquica começou a aparecer entre 1903 e 1904, período que passou no Brasil e se fortaleceu a partir de 1908. Apesar de nunca ter aderido ao movimento monarquista organizado, Oliveira Lima insistia na idéia da unidade nacional brasileira como obra do Império, período de estabilidade política e institucional. Durante o ano vivido na Venezuela, tomou contato com a instabilidade dos regimes republicanos da América Latina, dominados por caudilhos. O temor que o caudilhismo pudesse se instalar no Brasil a partir das constantes crises que envolveram os vários governos republicanos, desagregando a unidade nacional, reforçou sua defesa de um governo centralizador. Os pendores monarquistas de Oliveira Lima devem ser entendidos também como conseqüência de suas controvérsias com Rio Branco, do desencanto com a diplomacia republicana, que, a seu ver, privilegiava a questão das fronteiras em detrimento das relações comerciais com o exterior. A ponto de defender uma política de aproximação do Brasil com a América Latina como contraponto ao expansionismo econômico e político dos Estados Unidos, alinhado com a velha proposta de Simón Bolívar em 1825. • PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 91


• HUMANIDADES ANTROPOLOGIA

Capitalismo com cara brasileira Estudo revela as particularidades da gestão nacional de empresas MARIA

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ÊS NASSIF

lObaliZaçãOdo capital e das comunicações incorporou anglicismos à língua portuguesa, internacionalizou a tecnologia e o fast-food, pasteurizou a moda e trouxe às emissoras de rádio e televisão músicas, assuntos e sentimentos de culturas alienígenas. Não ocorreu, no entanto, a devastação da brasilidade. Ela persiste inclusive no ambiente de trabalho das grandes multinacionais instaladas no país. Os brasileiros que lá trabalham estão vestidos de uma carga cultural própria, diferente da cultura do capital que os submete, e desconhecer isso pode comprometer o sucesso econômico de qualquer empreendimento. Após 15 anos de pesquisa em empresas nacionais, multiaácionais e estatais, seis deles com financiamento da FAPESP, o antropólogo Guillermo R. Ruben consta ou que as empresas não são caixas de ferro, impermeáveis à brasilidade. Ruben é o coordenador do projeto Culturas

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Empresariais Brasileiras: Estudo Comparativo de Empresas Públicas, Privadas e Multinacionais, que hoje envolve quase cem pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), com ramificações pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Universidade Federal Fluminense (UFF) e Escola de Administração do Estado de São Paulo (EAESP), da Fundação Getúlio Vargas (FGV). O projeto temático foi inspirado nas pesquisas feitas por Ruben em 1987, em urna empresa binacional, de capital brasileiro e argentino. "A empresa tinha tudo: capital, tecnologia e pessoas instruídas e despidas dos preconceitos que existem entre brasileiros e argentinos': conta o antropólogo, ele próprio nascido argentino e naturalizado brasileiro. No entanto, discordava-se em um detalhe: os brasileiros queriam instalar a fábrica em Alphaville, em Barueri, e o escritório na avenida Paulista - um endereço avaliado pelos "nacionais" como um ícone do sucesso, como um showroom da empresa. Os argentinos desejavam manter escritório e fábrica juntos. "Parece uma discussão tola, mas a motivação dela era inconsciente, cultural", explica o antropólogo. No Brasil, a herança escravista isolou o trabalho manual, o chão de fábrica, do capital. "Anossa matriz de trabalho separa mui- , to claramente, até hoje, a casa grande e a senzala': afirma. Na Ar-

gentina, onde a escravidão foi abolida 70 anos antes da brasileira e teve pouca expressão econômica, a referência é outra. "A riqueza do país vizinho era o gado, que não precisava de muita mão-de-obra - ao contrário, dependia mais dos olhos do dono", observa. Foi o primeiro trabalho feito por Ruben utilizando os instrumentos teóricos tradicionais da antropologia aqueles usados para analisar sociedades primitivas - na sociedade moderna. De lá para cá, já como coordenador de uma equipe multidisciplinar da Unicamp, o antropólogo viu o projeto se expandir para as relações de trabalho em empresas grandes, pequenas, estatais e privadas. Aspectos brasileiros - Em 1996, a FA-

PESP passou a financiar o projeto temático dos pesquisadores da Unicamp, da EAESP e UFF. O projeto propunha-se a "caracterizar os aspectos tipicamente brasileiros capazes de influenciar na gestão e no desenvolvimento do processo produtivo de qualquer tipo de empresa

neste país e mapear identidades e diferenças entre empresas públicas, privadas e multinacionais que atuam aqui': A antropologia é avessa a generalizações. Os componentes culturais "locais" observados nas empresas estudadas são considerados apenas naquele universo. Como os instrumentos utilizados pela equipe para analisar as empresas são os da etnologia, os pesquisadores insistem que cada caso é único. Mas o coordenador do projeto consegue apontar "processos sociais à brasileira': comuns aos casos pesquisados. Um deles é a forma de lidar com o poder e a hierarquia: os brasileiros constroem e reconstroem constantemente as regras, em oposição a culturas empresariais mais rígidas, como a alemã, a nipônica ou mesmo a norte-americana. "Este fato muitas vezes desorienta os estrangeiros e é fonte permanente de conflitos': afirma Ruben. Da mesma forma, existe uma tendência dos brasileiros, no ambiente de trabalho, de evitar o conflito, em vez de resolvê-lo. Os pesquisadores também observaram, em empresas brasileiras, uma abertura maior para "ouvir" o de fora, mas uma tendência igualmente grande de minimizar a contribuição do outro. "A empresa é movida à cultura, não apenas por lucros", afirma o antropólogo. O núcleo de pesquisas do projeto, certamente, aferiu essa afirmação. Após penoso trabalho de aproximação com as empresas, as pesquisas hoje envolvem um universo razoável de empresas, dos mais diferentes perfis. Brasil e Japão - Uma das pesquisas, por exemplo, foi feita no Banco América do Sul, fundado pela colônia nipônica brasileira na década de 1940. A instituição financeira, comandada por japoneses nascidos no Brasil, tentava sobrepor as culturas brasileira e nipônica. Era uma forma de manter intocado o universo ritual da cultura empresarial nipônica, que envolvia e orientava apenas os descendentes de japoneses (40%) e excluía os brasileiros (60%). "O problema do banco não foi financeiro, mas de duas culturas PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 93


em choque", afirma o antropólogo. Os conflitos culturais foram os responsáveis por uma imensa crise na sua administração. A divisão entre nipônicos e brasileiros, no mínimo, dificultou as decisões de consenso, que para os Japoneses é fundamental. O banco enfrentou dificuldades por causa disso. Antes de quebrar em definitivo, Viveu uma pequena fase de crescimento, quando reconheceu o erro e tentou incluir os 60% nos seus rituais empresariais. "Mas aí já era tarde", acrescenta Ruben. Os resultados dos estuLinha de montagem de Fusca na Autolatina, em 1993: dos de campo mostram que é um equívoco gerencial importar modelos de administra"Em Pernambuco, estado consideração. "Eles não têm a ver com o nosso do machista, o homem era mais presestilo de vida", diz o pesquisador. O tativo, cooperava com a mulher", conconflito cultural acaba sendo o granta Ruben. "Em Vinhedo, ao contrário, de responsável pelo fracasso de assohavia uma relação de dominação do ciações de capital nacional com emhomem sobre a mulher muito forte, presas estrangeiras. "Não temos que beirava o assédio sexual", relata. estatísticas muito precisas, mas calcuO antropólogo Alcides Guczi, ao la-se que 90% das joint ventures conspesquisar duas empresas espanholas, tituídas no Brasil não deram certo", a Telefônica e o banco Banespa/Sanafirma. Foi o caso, por exemplo, da tander Viscaya, com a proposta de Gevisa (associação entre a General entender "a reconquista da América Eletric, a Villares e o Banco Safra nos , Latina pelos espanhóis", deparou-se anos 80/90) e da experiência fracassacom uma outra variável cultural: da da Autolatina. existia uma arraigada cultura dos As diferenças - mostram as pesquifuncionários das ex-estatais, que sas derivadas do projeto temático mantinham antes uma relação quase também são regionais. A antropóloga familiar com os seus empregos antes Kátia Muniz, da Unicamp, pesquisou da privatização. A gerência espanhola gerou, além de um conflito interno, a deduas fábricas de uma mesma empresa holandesa, uma sediada em Vinhedo sestruturação pessoal dos funcionári(SP) e outra no Recife (PE). A intenos remanescentes. A "cultura banesção era a de comparar, nas duas, as repiana", já ameaçada quando da lações de poder e hierarquia e, princiintervenção federal no banco, foi palmente, a relação entre o homem e simplesmente "destroça da" com a a mulher no ambiente de trabalho. privatização para o Santander. Ser funcionário do Banco do BraAssédio sexual - Ao contrário do que sil, também, era quase um projeto de poderia supor o senso comum, a anvida. As investidas do governo federal tropóloga constatou que o relacionasobre o quadro funcional do banco mento entre homens e mulheres na produziram um somatório de dramas fábrica no Recife era de cooperação; pessoais, segundo pesquisa feita por em Vinhedo, de completa hostilidade. Lia Caravaglio Rodrigues, da Uni94 • MARÇO DE 2002 • PESQUISA

FAPESP

fracasso da join venture no Brasil

campo ''As políticas em relação às empresas públicas mudam de acordo com o governo - e este foi um dos mais sangrentos do mundo em relação às estatais", afirma Ruben. Segundo Lia, no Plano de Demissão Voluntária (PDV) de 1995 saíram cerca de 13.500 funcionários, de um total de 107.000. Nos dois anos seguintes demitiram-se mais 29.611. "No final de 1997, ocorreu uma redução de 42.980 funcionários, ou cerca de 37% do total existente em dezembro de 1994", constata a antropóloga. A mudança da política do Estado em relação à empresa produziu suicídio, alcoolismo e segregação. "Todas as metáforas usadas pelos funcionários do banco eram metáforas familiares", relata Ruben. "Dediquei minha vida ao banco e fui traído por ele" essa era a representação mais comum das frustrações pessoais decorrentes da quebra do padrão de relacionamento entre o governo e a instituição financeira estatal. Segundo Lia, no ano posterior ao Plano de Demissão Voluntária - um processo que teve muito pouco de voluntário - registraram-se 20 casos de suicídios (oito relacionados com o endividamento das pessoas com o banco, quatro no decorrer do PDV e oito após o PDV).


organizações complexas podem ser objeto de estudo da antropologia - superou as expectativas. E decorre do enfrentamento de três Saques grandes dificuldades. A priPag.lmt'nfOS Tlansfer~n'ldS meira delas foi a de adaptar os conceitos clássicos da antropologia ao mundo moderno. "Nós nunca abrimos mão dos conceitos clássicos de cultura, mito, relação familiar, parentesco, representações e gênero", afirma. A segunda foi enfrentar a reação dos colegas antropólogos. "Eles não chegaram a ser hostis, mas foram céticos'; conta Ruben. A última, foi a de convencer as empresas de que antropólogos podiam cumprir um papel estuBanco do Brasil: implantação de novas tecnologias também provocam problemas na empresa dando as relações interpesainda em número pequeno, na Inglasoais entre os seus funcionários. Não quantificados, mas incluídos na Vencidas as dificuldades, já com o terra, nos Estados Unidos e na França. pesquisa - que se propunha a uma reconhecimento da Associação Brasianálise qualitativa - estão os casos Hoje, a antropologia das organizações é reconhecida como uma área de coleira de Antropologia, o grupo que asde alcoolismo, enfartos, ameaças de nhecimento. A Unicamp adotou, a sumiu o desafio de pesquisar relaçõsuicídio, depressão e afastamento partir de 1996, uma disciplina optaties de trabalho como quem investiga por Lesões por Esforço Repetitivo (LER). va no curso de Ciências Sociais denouma comunidade indígena - com a minada Antropologia das Organizaconvicção de que, qualquer que seja A inovação tecnológica também ções. A UFES passou a oferecê-Ia a o agrupamento humano, as relações é a imposição de um padrão cultural partir de 1998. são dadas por matrizes culturais - e, de certa forma, há problemas na passou a denominar a especialidade incorporação de novas tecnologias Adaptações - Para Guillermo Ruben, o como Etnografia do Capitalismo. tanto por parte da empresa como resultado do trabalho do Grupo de O ramo do conhecimento, na dos funcionários. É o que constataPesquisas em Culturas Empresariais da concepção de Ruben, pode ter muita ram os antropólogos em uma outra Unicamp - estudos em empresas, disutilidade para as empresas entendepesquisa do projeto temático, ao qual sertações e teses de doutorado sobre o rem suas dificuldades internas. "Estaforam também incorporados ]acques assunto e o reconhecimento de que as mos preocupados com isso porque o Wainer (Ciências da Computação) e o cientista político Tom Dywer, amenfraquecimento das empresas leva ao empobrecimento do Brasil", diz o bos da Unicamp. As empresas, em PROJETO busca de produtividade, adquiriram antropólogo. O conceito de que a emCulturas Empresariais presa é uma criação cultural, que vive uma tecnologia excessiva e inadequaBrasileiras: Estudo Comparativo e é organizada nos padrões locais, da. Os funcionários, por sua vez, rede Empresas Públicas, sistiram à substituição de uma relaestá sendo assimilado, à custa de fraPrivadas e Multinacionais cassos gerenciais, por algumas empreção interpessoal no trabalho pela MOOALIOADE sas multinacionais. O executivo-paimpessoal, feita pela máquina. Projeto temático drão de tempos atrás era o estrangeiro No Brasil, o estudo de organizaque não tinha compromisso com o ções complexas (empresas e organizaCOORDENADOR ções não-governamentais) pela antropaís, ficava aqui por alguns anos, vivia GUILHERMO R. RUBEN - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas em guetos, fazia um pé-de-meia e volpologia feita pela equipe coordenada da Unicamp por Guillermo Ruben é pioneiro. A tava para o lugar de origem. Hoje, há um número cada vez maior de brasiequipe manteve contatos com o munINVESTIMENTO R$ 161.592,50 leiros comandando, no Brasil, empredo inteiro, segundo o antropólogo, e existem estudos similares, embora sas de capital estrangeiro. • Extril!DS

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RESENHA

Da antropofagia ao fim do pecado original o encontro dos universos espirituais de padres e índios

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SARANA

fácil imaginar o choOs vivos e que cultural ~ntre um ~~ ................. povo guerreiro e antropofágico e homens monoteístas, dispostos a tudo para impor sua fé. Mas o melhor de Os Vivos e os Mortos na América Portuguesa da Antropofagia à Água de Batismo, de Glória Kok, é a apresentação que a historiadora faz do universo espiritural indígena antes do encontro entre tupis-guaranis e jesuítas. O livro é resultado da dissertação de mestra do desenvolvida pela autora entre 1988 a 1993. Foi realizado pela Editora da Unicamp (183 págs., R$ 19,00), com apoio da FAPESP. Sua análise é baseada em documentos quinhentistas e na leitura de autores da História e da Antropologia. Glória trata das disputas simbólicas em torno do sobrenatural ocorridas no Brasil após a chegada dos jesuítas (1549). Para isso, descreve os universos simbólicos de cada parte envolvida, apontando que características permitiram o surgimento da noção de sobrenatural que vingou nos séculos posteriores. Ao leitor dessa obra são familiares termos como batismo e paraíso. O triunfo da pedagogia cristã é abordada no terceiro e último capítulo do livro. Mas cabe à primeira parte o saboroso relato sobre o que significava a morte para os tupis-guaranis e sobre as práticas e rituais que impulsionavam suas vidas. Vivendo em grupo, esses índios tinham uma noção coletiva da morte. O propósito de suas existências era vingar o assassinato de seus antepassados. A vendeta era o motor da sociedade, o que foi logo notado pelos viajantes e cronistas, ao se surpreenderam com a ausência de prosperidade econômica entre aqueles grupos. Perceberam, também, que as lutas entre os nativos não eram incitadas pelo espírito conquistador, como caberia a um bom europeu. Quando um grupo atacava o povo responsável pela morte de seus pais e avós, trazia para sua aldeia os sobreviventes da batalha. Os prisioneiros

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eram devorados, mas o que acontecia antes do ritual antropofágico variava de acordo com suas idades. Os mais jovens passavam bom temGlória Kok po fazendo o papel de maridos das mulheres cujos hoEduc/FAPESP mens tinham sido mortos 183 páginas por seus antepassados. ReceR$ 19,00 biam as armas e pertences do morto. Curioso é que eles nunca fugiam dessa situação, a qual jamais deixaria de preceder a morte, pois seriam considerados covardes por seus pares. As mortes naturais ou por doença eram rejeitadas. Os tupis-guaranis tinham dúvidas sobre o destino do espírito após o sepultamento. Quando um índio adoecia, o pajé extirpava a parte de seu corpo que estava enferma. Se o doente não melhorasse, era abandonado pela comunidade. Entre os hábitos que os jesuítas fizeram força para impçr aos tupis, alguns encontraram fácil aceitação. Por exemplo, o batismo. Era hábito, entre as tribos, que o homem responsável pela morte da vítima a ser devorada tocasse o cadáver e recebesse o nome do morto, para despistar o espírito deste, caso ele decidisse se vingar. Assim, foi fácil aos tupis compreender que receberiam um novo nome após o batismo cristão. Já os ritos de sepultamento cristãos foram caros aos nativos, visto que já em sua cultura o enterro era motivo de muita dor. Mas os jesuítas foram estratégicos. Ao perceber que os índios temiam as doenças, trataram de dar os melhores préstimos em termos de medicamentos, de forma a enfraquecer o papel do pajé junto às comunidades. Enquanto isso, a imagem dos padres era valorizada e, conseqüentemente, a religião trazida por eles. Os Vivos e os Mortos na América Portuguesa é enriquecido com xilogravuras de Hans Staden, as com cenas de antropofagia do século XVI. Um livro que ajuda a redescobrir o Brasil. Os Vivos e os Mortos na América Portuguesa

RENATA SARAIVA

é jornalista e historiadora.


LIVROS

o Que Sabemos

REVISTAS Sobre o

VIII

Universo

Jorge Zahar Editor Richard Morris 224 páginas I R$ 26,50

Com uma dose inusitada de bom humor, Richard Morris faz um amplo panorama das revoluções da ciência, desde as primeiras perguntas feitas pelo homem sobre o universo até as dúvidas atuais dos pesquisadores sobre o cosmo em que vivemos, deixando claro a necessidade de se separar o que é realidade científica e o que não passa de palpites inspirados. Morris discute a origem e a evolução do universo, o mundo microscópico e, por fim, revela como funciona a imaginação científica, o "como sabemos o que sabemos" hoje. Leitura deliciosa.

Diálogos "ira Somtira:::=

Diálogos na Sombra Companhia das Letras I<enneth P. Serbin 566 páginas I R$ 46,00

O brasilianista americano mostra aqui o diálogo secreto estabelecido entre a Igreja e as Forças Armadas em 1970, durante a ditadura militar. Pouco antes, ambos os setores do Brasil haviam se separado por causa de diferenças que rompiam uma união secular das duas instituições. Em novembro de 1970, bispos e militares se reuniram secretamente na chamada Comissão Bipartite, instância criada para tentar resolver as diferenças entre os dois poderes.

Cadernos Espinosanos 2002 - Edição Especial

O feminismo junta-se com a competência filosófica num dossiê feito pelo Departamento de Filosofia da FFLCH-USP e pelo Grupo de Estudos Espinosanos. Nestaedição: Espinosa e a Essência Singular, de Marilena Chauí; Hobbes e o Véu do Cortesão, de Maria Isabel Limongi; Substância e Realidade, de Maria das Graças de Souza; William Harvey: Explicações Mecânicas e Finalismo, de Regina André RebolIo; As Cartas a Elizabeth: Uma Terapêutica Epistolar, de Marisa de Oliveira Franco Donatelli; Bibliografia sobre Leibniz, de Tessa Moura Andrade, entre outros. Psicologia

USP

Psicologia USP 2001 - número 50

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A publicação traz) como de praxe, aproximações entre a psicologia e outras ciências do conhecimento. Neste número, artigos que trazem a relação entre a matéria e a filosofia. Entre os ensaios: Comentários Críticos das Referências Textuais de Freud a Kant, deLeopoldo Fulgêncio; A Noção de Consciência n'A Estrutura do Comportamento (Merleau-Ponty), escrito por Reinaldo Furlan; Considerações sobre o Conto "Terror'; de Vladimir Nabokov, por uma perspectiva heideggeriana, de João Rodrigo Oliveira e Silva; O papel do Coordenador de Grupos, de Carmen de Arruda Andaló, entre outros.

Cientistas, Jornalistas

e a Divulgação Científica Editora Autores Associados I FAPESP Lilian Márcia Simões Zamboni 167 páginas I R$ 22,00

A fronteira entre o texto científico e o de divulgação científica é estudado por Lilian Zamboni, da Universidade Estadual de Campinas. Um é essencial para a comunidade científica, outro é fundamental para o público leigo entender o que se passa nas universidades e nos institutos de pesquisa. A autora analisa os dois gêneros, que apresentam construções e estilos de linguagem diversos e tenta responder a questões como: a divulgação científica é mera prática de reformulação de papers? Ou: de onde se originam tantos mal-entendidos entre cientistas e jornalistas? É uma boa leitura para os profissionais envolvidos nessas práticas.

Brazilian Journal of Biology 2001 - número 3 BRAZILIAN JOURNAL OF BIOLOGY

Nesta edição da revista, os seguintes artigos: Heavy Metais in Tributaries of Pampulha Reservoir, Minas Gerais, de Fonseca e Lopes; The Effect of Abiotic Factors on the Hatching of Moina micrura Kurz, de Rojas, Marins e Rocha; Ecological Aspects of Black -Pincelled Marmoset and Dense Cerrado of the Brazilian Central Plateau, de Miranda; A New Species ofTerrestrial Planaria, de Carbayo e Leal-Zanchet; Ultrastructure and Morphometry of Ovarian Follicles in the Armadillo, de Codón, Estecondo e Casanave; Differentiation and Numerical Analysis of Oral Yeasts, de Pereira e Rosa; Vegetation Structure in Cerrado, de Mantovani. PESQUISA FAPESP • MARÇO DE 2002 • 97


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