N
o,
o
Ganhamos juntos. A gente como a melhor empresa e você com as melhores soluções.
A Itautec é ganhadora do prêmio de melhor empresa do ano e de melhor empresa de hardware da INF0200. A Itautec está há 25 anos no mercado oferecendo soluções completas em tecnologia, com softwares e hardwares sob medida para atender a todo tipo de necessidade. É líder em Automação Bancária e Comercial, já vendeu mais de 1 milhão de micros e exporta sua tecnologia para o Mercosul, a Europa e os Estados Unidos. E a Itautec não pára por aí. Investe constantemente em pesquisa e desenvolvimento para continuar sendo a melhor empresa e oferecendo a seus clientes os melhores produtos.
,"-11
Itautec
-
Soluções para o futuro.
• Pesql!!!ta
Ciência e Tecnologia no Brasil www.revistapesquisa.fapesp.br
REPORTAGENS
SEÇÕES CARTAS
5
CARTA DO EDITOR
7
MEMÓRIA
8
Centro Acadêmico XI de Agosto completa cem anos
ESTRATÉGIAS Ciência para 1 bilhão de chineses A inútil arte de divulgar remédios Terremoto rompe isolamento argelino
10 11 11
CAPA
FUNDOS
Começa a fase final de construção do Observatório Pierre Auger de Raios Cósmicos, plantado no meio do deserto argentino .... 28
Programa paulista criado pela FAPESP servirá de modelo para inovação .....
SETORIAIS
22
CIÊNCIA POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA Saudável continuidade Será que Abel pode ser um Nobel? O Ebola e as fotos de satélite Ciência na web Maratona fervilhante Pesquisa FAPESP faz parceria com IG Acesso a recursos da União Européia Nova chance para o astronauta brasileiro Há vagas para 2 mil professores
11 12 12 12 13 13 13 14 14
PROPRIEDADE
ECOLOGIA
INDUSTRIAL
r-----~-----------o
~ ~ ~ >-
w ec
~ A descoberta dos insetos polinizadores de árvores da Amazônia
36
GENÉTICA Em meio a uma grave crise, INPI espera pela ajuda do governo
O adeus ao poeta dos hologramas A Internet monitora a devastação Fapesbapóia curso de medicina Os nós da Lei de Biossegurança
14 15 15 15
16
Laboratório da USP identifica as causas de alterações hormonais raras
EDUCAÇÃO
MEDICINA
Alunos do ensino médio fazem estágio no Instituto de Física da USP
20
Autópsia aponta erros na identificação de causa de mortes
FINANCIAMENTO
IMUNOLOGIA
Fórum das FAPs quer medidas para garantir repasse de recursos estaduais
Substâncias do camapu são 30 vezes mais potentes que alguns antiinflamatórios .....
21
40
45
46
PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 3
_______________________
P·
•
~...;;~~!i~qlll!i...;;il~c...;;iê...;;nc~ia~eT...;;ec~no~log~ia~n~OB...;;ra~Si~1
SEÇÕES LABORATÓRIO Entre o bem e o mal A árdua batalha para contar genes Deprimidos e mal tratados A polêmica faxina no Davi O Sol visto bem de perto
FAPESP
_
-
REPORTAGENS
MEDICINA VETERINÁRIA 24 24 24 24 25
Novas técnicas para tratar câncer em cães
ENERGIA 48
GEOLOGIA
Reservatórios menores para gás natural vão se adaptar a espaços vazios nos carros ... 72
ENGENHARIA Testes diferenciam venenos Infecções ligadas à esquistossomose Mudança no clima favorece florestas Mulheres se viciam em menos tempo
26 26 26
SCIELO NOTÍCIAS
54
27
Equipe gaúcha faz o mapa do fundo do oceano próximo ao litoral do Brasil
50
56 56 56 57 57
ENGENHARIA
74
HUMANIDADES
ECONOMIA
TECNOLOGIA LINHA DE PRODUÇÃO Assento inteligente "entrega" terrorista Pequenostubos em silício e carbono Conversão de hidrogênio no carro Emissões de energia do tungstênio Parque Tecnológico em Itaipu
QUÍMICA
Pastilhas eliminam bactérias e fungos de aparelhos de ar-condicionado
Pesquisador da Unicamp analisa as dificuldades para o país voltar a crescer
DE MATERIAIS
78
CULTURA POPULAR Como adolescentes da periferia encontram identidade na cultura do hip hop
83
PATRIMÔNIO Livro revela a arqueologia dos altares do Estado de São Paulo
86
ARTES PLÁSTICAS Nanotecnologia chama a atenção da iniciativa privada brasileira Laser para a indústria de plásticos Máquina reconhece paredes e objetos Técnica para avaliar hidratação capilar Amazônia ganha centro de tecnologia Patentes
58 58 58
RESENHA Palhaços, de Mário Fernando Bolognesi
94
LANÇAMENTOS
95
CLASSIFICADOS
96
ARTE FINAL Claudius
98
4 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
59 59
ENGENHARIA
60
DE MINAS
Processo diminui a dispersão de fibras de amianto
66
AGRICULTURA Soja e crotalária funcionam como adubo natural e aumentam a produção .....
68
FÍSICA MÉDICA Aparelho detecta excesso de ferro no fígado, sem necessidade de biópsia
70
As técnicas científicas capazes de apontar se obra é falsa ou verdadeira Capa: Hélio de Almeida Foto: Miguel Boyayan
90
cartas@fapesp.br
p
Cerrado Sobre a foto de uma árvore na reportagem "Tragédia e Riqueza", na edição nv 88 desta revista, mais uma vez constatei o quanto o cerrado é menosprezado. Vejamos: segundo uma pesquisa feita por um professor de Brasília publicada recentemente na revista Ciência Hoje, o docente concluíra que a abordagem do assunto em livros didáticos na maioria das vezes é depreciativa - mostram geralmente a vegetação nas épocas de seca, com pouquíssimas folhas, sem animais, sem flores ... Acho que vocês gostariam de conhecer o cerrado de Bauru, embora pequeno, há nele inúmeras árvores, com muitas folhas (verdes por sinal!), aves, mamíferos. O cerrado precisa ser restaurado e preservado - desprezado, não dá mais. CHARLES FERNANDO
Bauru,SP
Idosos na metrópole Na edição de número 87 de Pesquisa FAPESP, a questão do idoso foi alvo de matéria de capa. Além de parabenizá-los pela alta sensibilidade demonstrada, quero informar que atualmente sou vice-presidente da Comissão Municipal do Idoso da Câmara Municipal de São Paulo. Teremos imenso prazer em colaborar para que questões sobre o tema sejam debatidas com maior amplitude e participação de veículos importantes como esta revista. GILSON BARRETO, VEREADOR
São Paulo, SP
Dança Como engenheiro eletrônico envolvido em pesquisas da escrita do movimento eletrônico por meio de dispositivos eletrônicos, gostaria de parabenizar Débora Crivellaro pela reportagem "Plugados no Mundo"
Ciência, Tecnologlo •
no Brasil
__ .~sq,!!,a
tml!"'& ""'"""'''''' "
GfIIOIU.~"'mm:
~
-.a,==-COM
OUTRA VEZ
(Pesquisa FAPESP nO 88). A exposição da relação da arte do movimento humano e tecnologia está muito bem dimensionada, mas as informações históricas carecem de atualidade. Em face à seriedade do artigo e desta revista, julgo apropriado acrescentar dados com relação à seguinte afirmação contida na matéria: "Datam de 1964 os primeiros registros da utilização de computador na dança, mas praticamente não há estudos no Brasil sobre esse tema". Acompanho e colaboro com o trabalho de notação de movimento desenvolvido pela brasileira Analívia Cordeiro desde 1983 e posso dizer que ela está entre os pioneiros mundiais da criação coreográfica por meio do computador e do vídeo. Como cita Iohn Lansdown, presidente da Computer Art Society: "Em 1964, Jeanne Beaman e Paul Le Vasseur, da University of Pittsburg, usaram o computador para gerar um simples conjunto de instruções para serem interpretadas por dançarinossolo. Em 1966, Michael NoU produziu um filme de animação por computador mostrando bonequinhos esquemáticos movendo-se num palco seguindo instruções coreográficas programadas. Mais recentemente, a coreógrafa brasileira Analívia Cordeiro usou programas para gerar danças para TV" (Lansdown, J.; The Computer in Choreography. Computer Magazine, London, 1978). Seu
::...-.::""
primeiro trabalho data de 1973, tendo estreado no International Festival of Edinburgh, cujo tema neste ano foi Interact Man: Machine: Society. Ao mesmo tempo, este trabalho é considerado a primeira obra de videoarte no Brasil, de acordo com a citação do programa Oficina de Vídeo da TV Senac, junho de 2003. A FAPESP foi e é fundamental no trabalho dessa artista. O motivo central desta carta é valorizar com justiça a arte e tecnologia desenvolvida em nosso país, onde existem vários pesquisadores de alto valor. NILTON
GUEDES
São Paulo, SP
Correções Na nota "Vacina Comercial contra Carrapato" (edição n= 89), carrapatos foram incorretamente chamados de insetos. Na verdade, eles são classificados como ácaros da classe Arachnida (a mesma das aranhas e dos escorpiões) e da subclasse Acari. Uma das diferenças é que os ácaros têm o corpo globular, enquanto os insetos têm cabeça, tórax e abdome.
Cartas para esta revista devem ser enviadas para o e-mail cartas@lapesp.br. pelo lax (l1) 3838-4181 ou para a Rua Pio XI, 1.500, São Paulo, SP, CEP 05468-901. As cartas poderão ser resumidas por motivo de espaço e clareza.
PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 5
As reportagens de Pesquisa FAPESP retratam a construção do conhecimento que será fundamental para o desenvolvimento Acompanhe essa evolução sem perder nenhum movimento.
• Números atrasados Preço atual de capa da revista acrescido do valor de postagem. Tel. 3038-1438
oi:
• Assinaturas, renovação e mudança de endereço
o i:
Ligue: 3038-1434 Mande um fax: (Ll ) 3038-1418 Ou envie um e-mail: fapesp@teletarget.com.br
• Opiniões ou sugestões Envie cartas para a redação de FAPESP Rua Pio XI, 1.500
Pesquisa
São Paulo, SP 05468-901
i:
pelo fax n 3838-4181 ou pelo e-mail: cartas@fapesp.br
• Para anunciar Ligue para: Nominal Propaganda e Representação:
tel. 5573-3095
do país.
• Site da revista No endereço eletrônico www.revistapesquisa.fapesp.br você encontra todos os textos de Pesquisa FAPESP na íntegra e um arquivo com todas as edições da revista, incluindo os suplementos especiais. No site também estão disponíveis as reportagens em inglês e espanhol.
• ,Pesquisa
CARTA
A força da imaginação
FAPESP CARLOS VOGT PRESIDENTE PAULO
EDUARDO DE ABREU VICE-PRESIDENTE
MACHADO
CONSELHO SUPERIOR ADILSON AVANSI DE ABREU, ALAIN FLDRENT STEMPFER, CARLOS HENRIQUE DE BRITO CRUZ, CARLOS VOGT, FERNANDOVASCO LEÇA 00 NASCIMENTO, HERMANN WEVER, JOSÉ JOBSON DE ANDRADE ARRUDA, MARCOS MACARI, NILSON DIAS VIEIRA JUNIOR, PAULO EDUARDO DEABREU MACHADO,
RICARDO RENZO BRENTANI,
VAHAN AGOPYAN
CONSELHO TÉCNICO-ADMINISTRATIVO FRANCISCO ROMEU LANDI DIRETOR PRESIDENTE JOAQUIM J. DE CAMARGO ENGLER DIRETOR ADMINISTRATIVO JOSÉ FERNANDO PEREZ OIRETOR CIENTIFICO
PESQUISA FAPESP CONSELHO EDITORIAL
lUIZ HENRIQUE lOPES DOS SANTOS (COOROENADORC1EHTiFlCO), EDGAR OUTRA ZANOHO, FRANCISCO ANTONIO BEZERRA CDUTINHO, FRANCISCO ROM EU lANDl, JOAQUIM J. DE CAMARGO ENGLER, JOSÉ FERNANDO PEREZ, LUIZ EUGÉNIO ARAUJO DE MORAES MELLO, PAULA MONTERO, WALTER COLLI DIRETORA DE REDAÇÃO MARllUCE MQURA EDITOR CHEFE NELDSON MARCOLlN EDITORA DA GRAÇA
MARIA
S~NIOR MASCARENHAS
DIRETOR DE ARTE HÉLIO DE ALMEIDA CARLOS
EDITORES I<lÉNCI'), CLAUDIA
FIORAVANTI
MARCOS DE OLIVEIRA
IZIQUE
mCHOLOGIAl,HEITOR SHIMIZU REPÓRTER MARCOS
lPOL!TICACIlI (VERSÃOON-LIHEl
ESPECIAL PIVETTA
EDITORES-ASSISTENTES ERENO, RICARDO
OINORAH
ZORZETTO
CHEFE DE ARTE
TÂNIA MARIA DOS SANTOS •
DIAGRAMAÇÃO
JOSE ROBERTO MEODA, lUCIANA FOTÓGRAFOS CESAR, MIGUEL
EDUARDO
FACCHINI
BOYAYAN
COLABORADORES AFFONSO NUNES, BRAZ, CAMILA PEORAL SAMPAIO, CARLOS HAAG, CLAUDIUS, DÉBORA CRIVELLARO, EDUARDO GERAQUE IOHINEI, ELlSA ALMEIDA FRANÇA, ELlZABETH TOGNATO, FABRlpO MARQUES, GIL PINHEIRO, JORGE COTRIN, JOSE ANTÔNIO SANTILLI, LAURABEATRIZ, MARILI RIBEIRO, NEGREIROS,
RENATA PAIVA, RENATA SARAIVA, SAMUEL ANTENOR, J. B. CANÇADO, TÂNIA MARQUES, TATIANA PETlT,
SIRIO
THIAGO
TEL.IlU
ROMERO
IO'-UNE), T1AGO MARCONI
ASSINATURAS TELETARGET 3036-1434 - FAX: IlU
3036-141B
e-mall: fapesp@teletarget.com.br APOJOOE MARKETING SINGULAR ARQUITETURA singular@sing.com.br
DE MIOIA
PUBLlCIDAOE TEL/FAX: 11I) S573-3095 e-mail:redacao@fapesp.br PRÉ-IMPRESSÃO
GRAPHBOX-CARAN IMPRESSÃO EDITORA E GRAFlCA
PLURAL TIRAGEM:
43.500
EXEMPLARES
DISTRIBUIÇÃO DINAP CIRCULAÇÃO
E ATENDIMENTO AO JORNALEIRO (ALESSANORA MACHADO) TEL: 11I) 38b5-4949 atendimento@lmx.com.br
lMX
FAPESP RUA PIO XI, N" 1.500, CEP 054b8-901 ALTO DA LAPA - SÃO PAU LO - SP TEL. 11I) 3838-4000 - FAX: 11I) 3B3B-4181
http://www.revistapesquisa.fapesp.br cartas@fapesp.br NÚMEROS TEL.IlU
ATRASADOS 3036-1438
Osartigos assinados não refletem necessariamente a opinião da FAPESP E PROIBIDA A REPRODUÇÃO TOTAL OU PARCIAL DE TEXTOS E FOTOS SEM PREVIA AUTORIZAÇÃO
FUNDAÇÃO DE AMPARO
À
DO EDITOR
PESQUISA DO ESTADO DE SÃO PAULO
SECRETARIA DA CIENCIA TECNOlOGIA E DESENVOLVIMENTO ECONOMICO
•
GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO
E
m meio ao deserto argentino, a 100 quilômetros das montanhas dos Andes, há dois telescópios e 150 tanques cheios.de água espalhados por 3 mil quilômetros quadrados. Tal estrutura compõe o Observatório Pierre Auger, um megaprojeto que envolve instituições de pesquisa de 18 países e 250 pesquisadores a um custo estimado de US$ 54 milhões. Quando estiverconcluído, daqui a provavelmente três anos, 24 telescópios e 1.600 tanques disputarão com as touceiras de plantas espinhosas a primazia da paisagem. Tudo para detectar e interpretar os raios cósmicos, partículas subatômicas de grande energia, que são importantes para entender fenômenos físicos como a constituição da matéria e a formação do universo, entre outros. O curioso dessa empreitada é que nem os pesquisadores mais enfronhados no assunto sabem definir com precisão o que são raios cósmicos, nem de onde vêm ou como se formam. Hoje, eles têm mais dúvidas que respostas. Mesmo assim - ou talvez por isso -, não se importam em passar temporadas no meio do nada, trabalhando ao ar livre, montando equipamentos. O que entusiasma os atores desse cenário montado no deserto é justamente a possibilidade de decifrar mistérios que outros observatórios similares, mas menores, não conseguiram elucidar. Essa situação, de investir muitos milhões e um enorme esforço em um projeto aparentemente enigmático, é um límpido exemplo de como a imaginação dos cientistas pode superar a de autores de histórias de ficção. É como se a aventura da ciência repetisse a aventura do homem, do qual se conhece apenas alguns pontos de partida. O Brasil tem participação no projeto, com 32 pesquisadores financiados pela FAPESP (R$ 1,8milhão) e pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (R$ 700 mil). Para contar a história da construção do Observatório Pierre Auger, ainda incompleto, o editor Carlos Fioravanti e o fotógrafo Miguel Boyayan passaram três dias vivendo o cotidiano dos físicos que se revezam em Malargüe instalan-
do os equipamentos produzidos em seus países. A reportagem que começa na página 28 é um bonito testemunho de um trabalho que, muito possivelmente, implicará mudanças nos vários ramos da física. Desde já, os resultados preliminares sugerem que a própria teoria dos raios cósmicos precisa de ajustes. A imaginação também foi fundamental para o desenvolvimento da nanotecnologia, um setor que já traz resultados concretos, e é tema de outra boa reportagem desta edição (página 60). O mundo das coisas que pareciam infinitamente pequenas, impossíveis de serem manipuladas, cresceu e tornou-se factível.A ponto de a nanotecnologia começar a ser vista com interesse por empresas privadas do Brasil e não apenas do exterior. No momento, um grupo de pesquisadores apoiados pela FAPESPe executivos da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) planeja atrair a atenção de investidores para o tema. É sabido que o país dispõe de infraestrutura e pessoal qualificado para dar essesalto e ter bons rendimentos futuros. A análise cuidadosa da economia brasileira é o mote da principal reportagem de Humanidades (página 78). O trabalho originou-se de um projeto temático e focaliza o desempenho econômico nos últimos 25 anos do século passado para tentar entender por que a retomada do crescimento no país é tão difícil de acontecer. Por fim, uma boa notícia para quem também não é pesquisador. Embora tenha seu próprio site (www.revistapesquisa.fapesp.br), Pesquisa FAPESP iniciou em julho uma parceria com o portal IG (www.ig.com.br).Isso significa que o conteúdo da revista pode ser acessado por um grupo de leitores bastante eclético, diferente da comunidade científica brasileira. Outras parcerias semelhantes deverão ocorrer até o final do ano. O objetivo é oferecer a um público muito maior as reportagens sobre ciência e tecnologia brasileiras publicadas pela revista. NELDSON MARCOLlN - EDITOR CHEFE
PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 7
As lutas do
Onze
Centro acadêmico da Faculdade de Direito completa cem anos
NELDSON
MARCOLIN
8 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
E
m julho de 1903, os estudantes da Faculdade de Direito de São Paulo decidiram que-já era hora de unir os vários grupos de alunos dispersas pela academia em torno de uma agremiação que representasse seus interesses. A faculdade tinha então 76 anos - foi fundada em 1827, por meio de decreto de D. Pedro I. No momento da fundação, os jovens estudantes decidiram adiar o evento e esperar mais um mês. A razão: fazer coincidir a data do primeiro centro acadêmico brasileiro com a da instituição dos cursos jurídicos no Brasil, em 11 de agosto. A diretoria que fundou o Centro Acadêmico Xl de Agosto tinha o escritor Monteiro Lobato
Voto secreto em eleição da diretoria do Onze, em 1925: antecipando tendência
(1882-1948) e o poeta Ricardo Gonçalves (1883-1916) entre seus integrantes. Ambos moravam em uma república com outros estudantes chamada por eles de Minarete, na verdade um chalé no bairro de Belenzinho, em São Paulo, onde realizavam encontros literários. A primeira diretoria do Onze, como passou a ser chamado, foi escolhida por unanimidade, algo não muito comum no grêmio - normalmente, as eleições são bastante concorridas. O fato é que, nesses cem anos, o centro tornou-se, de longe, a mais
o Onze De 11goslo Orgão do Centro Academico 11 de Agosto
Anno I COMMlssAo
o adeus do academíco ao velho edifieio da Academia 1If"'fe ser dado entre Ia}!rilllns ch' saudades: assim foi. sempre. () I'entro ..lel/tI,miro 11 de Agosto pren-ndr- tornar a vida academica cheia de taes ,!ttl'ac·!h'os. que assim contínuará a ser. O Hf'atl!'mit'() (ll1l' SI' ~PpaJ'('1I df" nossa academia. tlt'i'\o!l :"lt'IHI)I'(' m-lla I1l11apart« de St'U!; ntT(\ctl)~, lima parte df" :0.«"11 r-ornrão, t: lil féra continúa a voneral-a, Encontre o Centrfj em todos os seus socios o auxilio enthusiasta ,Ir que necessita para a consecução de seus grandiosos fins. " seja O Onze de AfIO"Io, seu orgão zemuno.
DE REOACçAo:
Pedro
Dorla-J. B. Montelro Lobato, Paulo Oatvão Sampalo, Armando Rcdrígues=-Líno Morelra
o
N. I
Faculdade de Direito de S. Paulo, 11de Agosto de 1903
Onze de Agosto
Todos os dia!'. em todos 'OS tons. ~(' repete como recordação ainda guardada. t.a,1 uma preciosa. relíquia, no coração lia mocídado estudiosa, a IIRI'I'11Ção dos triumphos (111(' fiíWl'am respeitadas as passada ..~ /.!N·n<,:Õj·~ academicas. dos louros que. colhidos n gol)!!' d,· talento. c opcrosldade, lhes aureolavn «splendorosamente a fronte. das glorias f1' das víctorias iutellectuaes, 111'" uia. forma... varn UIIl rico díadema, em nnda iucompntlvol ('(JlU as alacres e ruidosas manifestações, que, nuura expontaneidade admiravol, írrompem da juw·ntudp. Como um eoroâario da idadfl primaveril. (~uantos jovens de então, encanecidos hój(·. lançando um olhar retrospecuvo para O~ doces tempos de outrora, om que lhos era dado, r-ntre risos e ror~l4\(los, atravessar o largo de s.. Francisco. direeção dos -xtcusos corredores de nossa velha Academia. uâo sentem alancearem-Ihc o coração as l"audad{,~ pungentes daquclla ora feliz. ('111 IJUf' uma vida despreoccupada o folgnz.1. SP ("il'.;avu. ('!li f'xt.raordinaria harmonia. com as IlIhHoI J!i~\J1t4'!o!f'nsque travavam! <lUt' f'Htos dt- enthusiasmo nâoirromplam. 111111I a «xpoutuneldado eousoladoru. :-O('IIIJ1I'" 1111I' uma illjll~t.içn socínl ahi ,'slHra <I n-rl.uuur
importante associação de estudantes do país, com participação em todos os fatos relevantes da história do Brasil. Não é à toa: no total, nove presidentes da República e 12 governadores do Estado de São Paulo passaram pelos bancos do Largo de São Francisco. Ao longo do século, os estudantes foram às ruas participar ativamente da Revolução Constitucionalista de 1932 e, logo, na luta contra a ditadura de Getúlio Vargas, na resistência ao regime militar, na luta pelas Diretas Já, pelo impeachment de Fernando Collor de Mello e na criação de campanhas pela cidadania. Por vezes, antecipou tendências, como na eleição para a diretoria do XI de Agosto em 1925, feita por meio do voto
Lentes da Academia Em vista de ter sido jubilado o distincto cathedratlco de direito romano, sr. dr. Fredencc Abranches., foi nomeado para substítuil-c o sr. dr. R:eynaldo Porcbat, cujo talento, amor ao estudo e trMo affa\'tl. o ttm d~~s~~~:d~lis respeitados symp.
~~::~sud'!
e
Por esse facto, os estudantes de dIretto lIeram-1tIe !llgnificatfva rnemfestaçãc de apreço.
Barão de Ramalho
)Commagem ao " Cotro 1icakmico 11 ae i4gosto"
Digna, pOI' certo, dos maiores en.comios, 'Ó a consagração significativa e sincera glijl a mocidade aeademica pretende fl\Z4lr a quem, além de ter sido excellente pae de fanúlia, uni cumprider de todos 08 Sl'US deveres de homom puhlico r particular, soube tambem StW mil aumute devotado do magisterie. e um idolatra da nossa Academía. A llIuC'idndt, 1u.'udt·'mieH URda mais faz tlu lIm' 1·U1UIH'il'.ll11u\ divida de honra. tácita-
Primeiro número do jornal do Onze e Monteiro Lobato: participação importante
secreto antes que essa modalidade de escrutínio fosse efetivamente adotada no país, em 1932. A história da agremiação, cheia de marcos significativos para a história nacional, é também recheada de fatos pitorescos.
Boa parte deles está no livro que será lançado neste mês do centenário, A Heróica
Pancada - Centro Acadêmico XI de Agosto, Ce11JAnos de Lutas, editado pelo Instituto Brasileiro de Memória Jurídica
(Memojus) em parceria com o próprio XI de Agosto. Os casos vão desde o furto, feito pelos estudantes, da estátua de José Bonifácio, o Moço, de dentro de um depósito municipal para dentro da faculdade, em 1936, até a abolição da "esgravatura", em 1974, quando os alunos conseguiram, após dois anos de pressão, acabar com a obrigatoriedade do uso do paletó e gravata na escola, exigido até dos candidatos que prestavam vestibular.
PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 9
• POLÍTICA CIENTÍFICA
ESTRATÉGIAS
E TECNOLÓGICA
MUNDO
Ciência para 1 bilhão de chineses O governo da China fixou uma meta ambiciosa. Até o ano de 2049, todos os cidadãos do país deverão ter um nível básico de conhecimento que lhes permita aplicar a metodologia científica na solução de problemas cotidianos, informou o site SeiDevNet. Hoje, apenas 1,4% dos 1,3 bilhão de chineses atingiram esse patamar de discernimento. Na Europa, são 4,4%. Nos Estados Unidos, 6,9%. No Brasil, não há dados semelhantes. Para chegar lá, o investimento em ciência vai crescer. Estão previstos incentivos fiscais para museus de' ciência, planetários e laboratórios universitários. O gasto em pesquisas de interesse nacional deverá incluir recursos para divulgá-ias ao público. "A
10 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
popularização da ciência e a inovação científica são as duas pernas de uma pessoa. Nenhuma pode estar faltando se um país quer obter progresso", disse o ministro da Ciência e Tecnologia, Xu Guanhua. A heterogeneidade do território e da população são entraves para alcançar a meta. O objetivo estipulado uma década atrás de gastar 0,5 yuan (US$ 0,06) per capita por ano em divulgação científica só foi atingido em áreas ricas, como Pequim e Xangai. A Associação Chinesa de Ciência e Tecnologia está desenvolvendo critérios para classificar o grau de conhecimento científico da população e elabora planos de ação para atingir os diferentes grupos sociais do país .•
• A inútil arte de divulgar remédios Os representantes de vendas de companhias farmacêuticas têm pouca influência nas prescrições de remédios, de acordo com estudo sobre o comportamento dos médicos nos Estados Unidos. Conforme informou a revista New Scientist, de 18 de junho, os pesquisadores Nathalie Mizik, da Universidade de Colúmbia, e Robert Iacobson, da Universidade de Washington, em Seattle, cruzaram dados sobre as visitas de propagandistas e as prescrições de três drogas por mais de 75 mil médicos. Calcularam que os representantes tinham que fazer até 6,5 visitas adicionais para convencer os médicos a receitar uma das drogas. "Os
propagandistas não são vistos como fontes confiáveis", diz Mizik. Críticos do sistema lembram que os custos do marketing acabam repassados a todos os consumidores - e que os médicos dispõem de meios mais adequados de se informar sobre medicamentos. As empresas argumentam que seus representantes são uma fonte complementar de informação e prestam o serviço de fornecer amostras grátis, que os médicos não dispensam. Na prática, tornaram-se reféns do marketing: temem perder espaço para os concorrentes se suspenderem a divulgação de seus remédios. •
• Terremoto rompe isolamento argelino O terremoto que devastou a costa da Argélia no dia 21 de maio, matando mais de 2 mil pessoas, produziu pelo menos uma notícia consoladora. Cientistas europeus estão voltando ao país, depois de um duradouro afastamento provocado pelas turbulências políticas da última década (Nature, 12 de junho). Trinta franceses, especialistas em ciências da Terra, já chegaram à Argélia para trabalhar em parceria com os colegas do Centro de Astronomia, Astrofísica e Geofísica. O país fica ao sul da falha em que as placas tectônicas da África e da Eurásia se encontram - um prato cheio para os sismólo-
gos. Alain Mauffret, que ajudou a coordenar a missão do Centro Nacional de Pesquisa Científica da França, afirma que é vital para a Argélia continuar medindo as ondas sísmicas após o terremo-
to. Os pesquisadores instalaram um sistema de monitoração que registrou mais de mil novos abalos. A tragédia de maio, a pior em 20 anos, atingiu 6.7 graus na escala Richter. •
Saudável continuidade
A notícia de que o presidente argentino, Néstor Kirchner. manterá Eduardo Charreau na presidência do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia (Conicet), principal órgão científico do país, foi recebida com alívio pela comunidade acadêmica (Nature, 12 de junho). "É a primeira vez na história que a administração do Conicet não muda na troca de governo", diz Charreau, ex-diretor do Instituto de Biologia e Medicina Experimental de Buenos Aires. Para a Secretaria de Ciência e Tecnologia, que supervisiona a Conicet, foi indicado Túlio Del Bono,
aliado político do presidente. Ex-reitor da Universidade Nacional de San Iuan, Del Bono preconiza o aumento do orçamento para pesquisa de 0,4% para 1% do PIB. Neste ano, a Argentina vai gastar 400 milhões de pesos e apoiar cerca de 21 mil pesquisadores, entre os quais os 3,8 mil cientistas do Conicet. O orçamento do Conicet para 2003 subiu 30% - o que ainda representa menos da metade do que recebia dois anos atrás, antes da trágica desvalorização do peso. "O sistema está combalido e precisa de uma urgente reativação orçamentária", diz Eduardo Charreau .•
PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • l1
Será que o Abel pode ser um Nobel? Em cerimônia realizada no dia 5 de junho, na Universidade de Oslo, na Noruega, o rei Harald V passou o primeiro Prêmio Abel de Matemática às mãos de IeanPierre Serre, do Collêge de France, em Paris (New Seientist, 17 de junho). O prêmio foi instituído para preencher a lacuna deixada por Alfred Nobel, que ignorou solenemente a matemática ao criar sua premiação. Não que faltem prêmios importantes. O Canadá, por exemplo, oferece a disputada Medalha Fields. Mas só acontece de quatro em quatro anos, paga bem menos
• O Ebola e as fotos de satélite Pesquisadores do Centro Internacional de Pesquisa Médica, baseado no Gabão, debruçam-se sobre imagens da África feitas por satélites
que o Nobel (em torno de US$ 11 mil) e está longe de ter apelo popular. O Abel, por sua vez, será entregue anualmente e, já no nascimento, contemplou Serre
na tentativa de desvendar a gênese dos surtos do Ebóla, o vírus devastador que chega a matar por hemorragia 70% das vítimas. O desafio é descobrir se os locais onde houve surtos da doença têm características ecológicas
com US$ 816 mil. Há quem pergunte: será que a matemática tem charme suficiente para emprestar ao Abel? Não há dúvida de que Serre é um grande matemático .
comuns. Se houver convergência nos dados, será possível criar um modelo capaz de identificar potenciais "reservatórios" do vírus. "No Gabão e I}o Congo, a periodicidade dos surtos sugere que há fatores am-
Foi o mais Jovem ganhador da Fields, em 1954; seu trabalho teve influência em várias áreas da matemática - da teoria do número à geometria algébrica - e sua teoria foi fundamental para ajudar Andrew Wiles a desenvolver a prova do último teorema de Fermat. Mas, do ponto de vista do público, que peso isso tem? Talvez nenhum. Por isso, pode ser que conte o estilo da apresentação, no melhor estilo Nobel, com presença de rei e tudo. O nome Abel é uma homenagem a Niels Henrik Abel, matemático norueguês do século 19. •
bientais deflagrando a doença", diz o pesquisador Ghislain Moussavou (BBC, 21 de julho). Se a tese se confirmar será mais fácil monitorar áreas de risco e evitar que a moléstia pegue populações desprevenidas. •
Ciência na web Envie sua sugestão de site científico para cienweb@trieste.fapesp.br
_;;;....
,-, •• ii-
..=:' ~=--+ -~'"' RoY1.' efLOOOS
www.ibb.unesp.br/departamentos/anatomia/a natosecsup.html
Site apresenta módulos de anatomia seccional com desenhose informações.
12 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
www.naspe.org/ep-history/
www.marsquestonline.org
A história de implante de marca-passos, desfibriladores e outros métodos de tratamento para cardíacos.
Um excelente espaço para explorar Marte sem sair da cadeira, com muitas informações e lindas fotos.
•
ESTRATÉGIAS
BRASIL • Pesquisa FAPESP faz parceria com IG
Maratona fervilhante
A 55a Reunião da SBPC espalhou-se em sete cidades e teve 15 mil participantes Foi uma maratona científica. Em seis dias, da noite de 13 de julho, quando houve a sessão de abertura da 55a Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), até a noite do dia 18, quando um concerto de encerramento da Orquestra Sinfônica de Recife reuniu Iohann Strauss e Chico Science, milhares de pessoas circularam pelo campus da Universidade Federal de Pernambuco para acompanhar 91 simpósios, 53 conferências, 56 minicursos, 3.895 painéis, sete assembléias de sociedades científicas e três sessões especiais. Além, é claro, das cerimônias de entrega dos prêmios José Reis de Divulgação Científica e Érico Vannuci Mendes e de divulgação dos resultados do 46° Concurso Cientis-
tas de Amanhã. Em número de participantes, foi a maior reunião já realizada pela SBPC: 15 mil inscritos e participação diária estimada em 12 mil pessoas. A 55a Reunião também inovou com o seu projeto de interiorização. Em faculdades de seis municípios pernambucanos - Arcoverde, Caruaru, Nazaré da Mata, Palmares, Salgueiro e Vitória de Santo Antão - foram instalados telões em que se podia acompanhar conferências em tempo real. Ao todo, nos seis municípios, foram cerca de 2.500 inscritos e o dobro disso em participantes. Um sucesso que a SBPC tentará ampliar na próxima Reunião Anual, em Cuiabá. O evento mudou também de perfil em relação ao anterior, realizado em Goiânia, em 2002. Foi mais
político, como já sinalizava o seu tema geral: Educação, Ciência e Tecnologia para a Inclusão Social. Não por acaso, como assinalou a secretária-geral da SBPC, Regina Pekelmann Markus: "Proc~ramos juntar o rigor científico a análises, tirando o cientista apenas da geração de conhecimento e trazendo-o para o debate de ações políticas para a superação de problemas': Entre esses problemas, destacaram-se os da educação, da universidade, da saúde, da habitação popular, da violência, das desigualdades regionais e da biodiversidade. Entre os méritos do evento, o principal foi mostrar que a ciência e a tecnologia são um importante instrumento de formulação de políticas públicas na solução dos problemas brasileiros. •
Pesquisa FAPESP está presente, agora, no portal do Internet Group (IG). A revista tem seu próprio site (www.revistapesquisa.fapesp.br), desde o começo do ano passado no ar, com o conteúdo completo da edição impressa, as versões em inglês e espanhol, além de notícias diárias sobre ciência e tecnologia. A parceria, que começou no final de julho, é o primeiro para Pesquisa FAPESP estender o alcance das reportagens exclusivas sobre projetos de pesquisa em um portal de grande audiência para um público muito mais amplo que o de pesquisa-dores - hoje, o IG é líder na Internet brasileira. A revista tem em vista outras parcerias com portais diferentes para divulgar seu conteúdo. O leitor que acessar o IG (www.ig.com.br) encontrará as notícias de Pesquisa FAPESP no canal Último Segundo, o princial canal de notícias do portal. "A revista traz um importante conteúdo de ciência e tecnologia, áreas de interesse crescente, que permaneciam inéditas no último Segundo", diz a diretora de Jornalismo do portal, Andrea Fornes. •
• Acesso a recursos da União Européia Grupos do Brasil terão prerrogativas semelhantes às de um país da União Européia na luta por recursos da Comissão Européia, mas devem encontrar parceiros europeus. Mais informações no www.cordis.lu/ist. •
PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • l3
Nova chance para o astronauta brasileiro A Nasa e a Agência Espacial Brasileira (AEB) fazem um esforço derradeiro para salvar a participação do Brasil na Estação Espacial Internacional, o laboratório instalado numa órbita a 400 quilômetros da Terra construído por um consórcio de 16 nações. O país corre o risco de ser desligado do projeto desde meados do ano passado, quando o governo brasileiro voltou atrás no compro-
misso de investir US$ 120 milhões em equipamentos para a estação. Uma revisão de contrato, sugerida pela Nasa, propõe que o Brasil forneça peças mais baratas, com potencial para serem fabricadas por empresas nacionais. Dos seis equipamentos previstos no primeiro acordo, apenas um foi mantido, o Contêiner Despressurizado para Logística, cuja função é transportar e fixar
• Há vagas para 2 mil professores Reitores das 53 universidades federais definiram, em conjunto com o Ministério da Educação, critérios para distribuição de 2 mil vagas de professores. Cada universidade contratará pelo menos dez professores. As demais vagas serão distribuídas proporcionalmente, de acordo com as aposentadorias registradas em cada instituição. Só as univer14 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
experimentos científicos no exterior da estação. O novo repertório de peças custaria por volta de US$ 70 milhões. Mas o governo brasileiro só está disposto a destinar US$ 12 milhões. Os técnicos das duas agências estão discutindo valores e prazos, mas a palavra' final caberá aos ministérios da Ciência e Tecnologia e da Fazenda. Se o final for feliz, seria preservado um símbolo: o major
sidades em fase de consolidação, como da região Norte, preencherão todas as vagas existentes. •
• O adeus ao poeta dos hologramas Vítima de um derrame cerebral, morreu em São Paulo, em 17 de junho, o artista multimídia Julio Plaza, precursor da dobradinha entre arte e tecnologia no Brasil. Nascido na Espanha e natu-
Marcos Pontes, o "astronauta brasileiro'; seguirá em seu treinamento em Houston, onde vive desde 1998. A Nasa o convocaria para uma missão nos próximos anos. Mas outras prerrogativas brasileiras, como o direito de levar cargas nos ônibus espaciais e o tempo de uso das janelas de observação da estação, serão reduzidas na mesma proporção do corte das verbas. •
ralizado brasileiro, Plaza ficou conhecido quando lançou volumes de poesia manipulável, em que o leitor transformava textos em objetos. Nos anos 80, dedicouse ao estudo do videotexto e mobilizou artistas para experiências com hologramas, convertendo poemas em peças tridimensionais. Com vários projetos apoiados pela FAPESP, Plaza lecionou na Escola de Comunicações e Artes da USP. •
• A Internet monitora a devastação
• Fapesb apóia curso de medicina
A Amazônia Legal amargou, em 2002, o maior índice de desmatamento dos últimos sete anos. Foram destruídos 25,5 mil km2 de vegetação, extensão menor apenas que a da tragédia de 1995, quando se perderam 29 mil km2 de área verde. Não serve de consolo, mas agora é possível acompanhar pela Internet a situação em cada ponto da floresta e saber onde a devastação avança com mais intensidade. O site www.obt.inpe.br/prodes, lançado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), é abastecido com fotos do satélite Landsat, capaz de monitorar 6 mil pontos da região a cada 20 dias. "Basta digitar o nome de um município da região para saber a quantidade de área desmatada e os motivos da exploração", afirmou Gilberto Câmara, responsável pelo projeto e chefe da Coordenação Geral de Observação da Terra, do Inpe. O site revela uma situação crítica em 60 municípios do Pará, de Mato Grosso e Rondônia. Um dos piores focos é a cidade de Novo Progresso, em Mato Grosso do Sul, que cresce à margem da rodovia Cuiabá-Santarém. Ali, a derrubada da floresta saltou de 225 km2 em 2001 para 767 km2 no ano passado. Os trechos remanescentes da floresta se beneficiam das mudanças climáticas (veja pág. 26). •
A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (Fapesb) assinou convênio com a Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), no valor de R$ 363 mil, destinados à criação de curso de medicina e a implantação de quatro
laboratórios: anatomia, informática, morfofunção e habilidades profissionais, além do acervo bibliográfico. Os recursos também vão financiar parte dos laboratórios do curso de Engenharia da Computação, recém-criado. A criação do curso de Medicina atende à demanda de democratização e interioriza-
ção do ensino. Deve contribuir para suprir a defasagem de médicos nos 21 municípios da região e para a fixação desses profissionais no interior. O convênio é o primeiro resultado de medida aprovada pelo Conselho Curador da fundação, que vincula 40% dos recursos da entidade às universidades estaduais. •
Os nós da Lei de Biossegurança O mês de agosto deve consolidar vitórias e derrotas na guerra dos transgênicos. O Palácio do Planalto promete enviar ao Congresso um anteprojeto para atualizar a Lei de Biossegurança, em vigor desde 1995. O ponto mais polêmico são os poderes da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), agência com forte influência da comunidade científica, que dava a palavra final sobre pedidos de plantio de transgênicos. A autoridade da CTNBio foi questionada na Justiça em 1998 e, desde então, a agricultura geneticamente modificada mergulhou num limbo jurídico. Para fazer o anteprojeto, o Gabinete Civil da Presidência realizou seminários em que ouviu ministérios e entidades da sociedade civil. Pouca gente aposta que a CTNBio vá manter os poderes originais e, com isso,
o governo deverá ter um controle maior sobre os transgênicos. Mas a polêmica vai continuar. Ocorre que cada ministro tem uma opinião particular sobre o assunto. Enquanto a pasta do Meio Ambiente defende uma política restritiva, com o argumento de que é preciso avaliar melhor os potenciais danos à saúde, o Ministério da Agricultura é contrário a soluções ra-
dicais. O ministro da Ciência e Tecnologia, Roberto Amaral, não concorda com os poderes concentrados na CTNBio. "É natural que ministros de origens diferentes tenham divergências", diz Johaness Eck, assessor do Gabinete Civil, envolvido na elaboração do projeto de lei. "Vamos harmonizar diferenças e compor uma política comum. " •
PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 15
irq~~~~~~~~~~~~~~~ '" ~ ~t:tl~~11''( >w
~
w ., ~
~ ~
16 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
I
POLÍTICA CIENTÍFICA PROPRIEDADE
E TECNOLÓGICA INDUSTRIAL
Alavanca
emperrada
Em meio a uma crise sem precedentes, I N PI espera ajuda do govero federal
CLAUDIA
IZIQUE
O
Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), que deveria ser alavanca estr~tégica de ~olíticas de desenvo~viment.o e inovação, VIve uma de suas maiores cnses administrativas e financeiras. Opera com menos da metade do seu quadro de funcionários, sendo que 57% destes se aposentam até 2007. Desde o ano passado, tenta obter autorização do governo federal para realizar concurso público e contratar 108 servidores, a maioria para a função de examinador de patentes. A principal tarefa desses novos funcionários seria a de desobstruir uma fila de 45 mil processos de registro de patentes e de 300 mil pedidos de registro de marcas que, há anos, aguardam para ser examinados. O corte de 30% no orçamento deste ano foi um golpe fatal para uma série de projetos - como o que daria acesso ao escritório europeu de patentes, por exemplo - e para os programas de difusão do instituto. E o cargo de presidente do INPI está vago desde março. O governo federal promete investir e redefinir as funções do instituto. O projeto de recuperação do INPI, aliás, faz parte do programa nacional de desenvolvimento industrial e tecnológico, que tem como objetivo aumentar a eficiência produtiva, a capacidade de inovação das empresas brasileiras e as exportações. O modelo do novo INPI já está pronto. Roberto Iaguaribe, secretário de Tecnologia Industrial do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MIDC), explica que a idéia é transforrná-Io num instrumento de capacitação tecnológica e industrial. "O instituto não deverá mais funcionar como um cartório ou autarquia. Vai atuar em rede com as agências de fomento e os institutos de pesquisa, como a FAPESP e o Instituto de Pesquisa Tecnológica (IPT), por PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 17
por exemplo. E não há verbas para a puexemplo. Deverá também integrar-se com a indústria e dialogar com as uniblicação da revista Panorama de Tecnologia ou de qualquer outro material de versidades, de forma que o tema prodivulgação institucional. priedade intelectual passe a fazer parte O instituto tem 560 servidores - no dos cursos superiores", adianta. Falta final da década de 1980 tinha 1.085. apenas concluir o novo desenho admiDesse total, 34 deverão se aposentar nistrativo e as projeções dos recursos este ano e outros 289 até 2007. Esses necessários para dar início ao processo funcionários não conseguem colocar de recuperação do instituto. Iaguaribe em dia os pedidos de regarante que "há receptigistro protocolados na vidade do Ministério da instituição. No ano passaFazenda" para a liberação do, por exemplo, foram de R$ 10 milhões, ainda Cronograma depositados mais 24 mil este ano. Também já está pedidos de patentes e 94,9 autorizado um reajuste de de recuperação mil pedidos de marca. 30% na tabela de preços do INPI é Há ainda alguns prode registro de marca ou patente, o que permitirá, de no mínimo blemas tecnológicos que precisam ser resolvidos. segundo ele, a geração de quatro anos receitaadicionale a ampliaToda terça-feira, o institução do quadro de funcioto envia aos escritórios de patentes de todo o munnários. "A defasagem dos do as patentes concedidas no Brasil, preços, de fato, é de 90%. Vamos recuutilizando um meio obsoleto: o papel. perar apenas parte disso': ele afirma. Recebe os documentos de patentes registradas nos outros países gravados Crise financeira - O cronograma de reem CD-ROM ou, no caso do escritório cuperação do instituto - que já foi vande patentes norte-americano (USPTO), guarda entre os escritórios de patentes na América Latina, no início dos anos 90 em DVD. Já foram digitalizados os doé de, no mínimo, quatro anos. Em 2003, cumentos de patentes concedidas no Brasil entre 1982 e 1998, mas os usuáo orçamento de R$ 36,8 milhões para investimento e custeio sofreu corte de rios interessados em consultar os re30%. Somado aos R$ 6,6 milhões de resgistros têm que buscar informações em processos, ou seja, em papel. O institutos a pagar relativos a 2002, chega-se a uma perda real de 40% de receita. A falto já adquiriu dez computadores, que vão funcionar como terminal de conta de recursos comprometeu todas as sultas. Devem entrar em operação. em atividades, desde o registro de marcas e dois meses, permitindo o acesso às inpatentes até ações de difusão da cultuformações digitalizadas, não só do ra de propriedade intelectual. As nove banco de dados do INPI como dos dounidades do INPI em todo o país, por cumentos de patentes dos escritórios exemplo, estão há quase dois meses sem acessoao sistema de informação integraestrangeiros. do (Sinpi). O acesso ao sistema foi coro preço do atraso - Os problemas do tado pela Embratel por conta de uma instituto, portanto, não serão resolvidos dívida de R$ 800 mil que cresceà base de de uma penada. Nos cálculos de Luiz R$ 250 mil a R$ 280 mil, mensalmente. Otávio Beaklini, presidente em exercíAlguns projetos tiveram que ser abortacio do INPI, qualquer mudança iniciados, como o da fase 2 do programa de da neste ano só trará resultados efetivos acesso ao banco de dados de patentes do em 2007. Ele explica que, para superar escritório europeu de patentes, que previa a instalaçãode 150terminais no INPI, todo esse atraso, será necessário contratar 600 funcionários, entre os quais 400 para consultas públicas, com acesso diexaminadores de marcas e patentes. reto ao banco de dados europeu, que "Acontece que não temos como treinar tem mais de 90 milhões de patentes disesse pessoal ao mesmo tempo nem teponíveis em meio eletrônico. O projeto mos espaço físico para abrigá-los. Por estava orçado em R$ 6 milhões. Também, por faltade recursos,foram suspenisso,as contratações terão que ser escalonadas': afirma. Neste ano, ele prevê, sesos todos os eventos de disseminação da cultura de propriedade intelectual, rão admitidos 108 servidores por meio de concurso público solicitado desde o com cursos e programas de capacitação, 18 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
ano passado, mas cujo edital ainda não foi autorizado. As novas contratações, no entanto, "só surtirão efeito': como ele diz, no final do ano, já que o período de treinamento de um examinador de patentes é de seis meses. A partir de 2004, serão incorporados anualmente entre 100 e 150 novos funcionários até que se complete o quadro de 600 novos servidores em 2007. A expectativa é que, até lá, o INPI tenha zerado o seu débito em relação aos registros de marcas e patentes. "Aí então estaremos próximos de uma situação em que será possível conceder registro de marca em um ano, e de patentes, em menos de quatro anos", justifica. e essas projeções se confirmarem, Beaklini acredita que, a partir de 2007, o instituto estará preparado para operar como uma alavanca para a inovação.Hoje essaalavancaestá emperrada. Mas o projeto do novo INPI prevê que, oito meses após o pedido de registro - ainda durante o período de sigilo de 18 meses que protege o pedido de registro -, o órgão já possa tomar decisõesem relação à anterioridade da patente requerida, ou seja, adiantar aos interessados que a patente é original e deverá ser registrada. Mais que isso: poderá recomendar o depósito da patente em determinados países."Essa é a verdadeira tarefa do INPI: facilitar e dar instrumentos para que as empresas decidam se vão explorar e investir,ou não, naquela idéia",diz Beaklini. Atualmente, o registro de uma marca no Brasil leva, em média, três anos e a concessão de uma patente pode demorar até oito anos, no caso de tecnologias mais complexas. Esse é o caso dos pedidos de patentes registrados pelo Núcleo de Patenteamento e Licenciamento de Tecnologia (Nuplitec), criado em 2000 pela FAPESP para o licenciamento de inventos resultantes de pesquisas por ela patrocinadas. Na avaliação de Ricardo Bérgamo, assessor de patentes do Nuplitec, essa demora pode ser um entrave no licenciamento do projeto. "É impossívelprecisar o valor correto dos negócios feitos com base em pedidos de patentes sem exame, que têm que ser fechados na base da confiança': observa. O atraso também corre o risco de comprometer o desenvolvimento das pesquisas. "Desconhecendo se seu tra-
S
..
t balho será aceito como patente, os pesquisadores sentem-se desestimulados a prosseguir com a pesquisa. Isso sem falar na desconfiança das empresas interessadas. Elas podem supor que a demora na concessão signifique que o invento não é bom, o que não é verdade", observa Ciro de Ia Cerda, coordenador do Escritório de Difusão de Tecnologia (Edistec), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Expectativa de direito - O atraso na avaliação dos pedidos de patente, no entanto, não chega a impedir o licenciamento da tecnologia, já que os contratos são firmados com base na expectativa de direito, que se confirmará no momento em que o INPI formalizar a concessão. "O licenciamento de tecnologia é feito mediante termo de confiabilidade. É risco do parceiro", diz Sueli Conceição da Silva, coordenadora de Proteção da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), instituição que depositou 186 pedidos de patentes,
sendo que 56 também no exterior. "Mas carta patente concedida só temos cinco", ressalva Sueli. A demora também não compromete os negócios do Instituto de Pesquisa Tecnológica (IPT), de acordo com Angela Azanha Puhlmann, coordenadora do Núcleo de Proprie'dade Intelectual. Para contornar esse problema, empresas de ponta e institutos de pesquisa se antecipam aos examinadores do INPI e realizam o rastreamento da originalidade do invento para não desperdiçar recursos em tecnologias já patenteadas. Mas o país paga um preço alto pelo fato de o INPI não atuar como um órgão de estímulo à inovação, diz Maria Celeste Emerick, do escritório da patentes da Fiocruz. Enquanto a Organização Mundial da Propriedade Industrial (Ompi) inicia o debate sobre a patente global, num cenário em que as novas tecnologias ficam obsoletas cada vez mais rapidamente, o Brasil ainda tenta definir uma política para alavancar a inovação e se esforça para rees-
truturar e dar maior agilidade ao seu escritório de patentes. Essa defasagem compromete, cada vez mais, a competitividade do Brasil no mercado internacional. E, nesse aspecto, a Fiocruz é um bom exemplo. Atua numa das áreas mais competitivas do mercado internacionala de biotecnologia e confronta-se com gigantes da indústria farmacêutica. Tem 110 patentes requeridas: 36 no Brasil e 74 no exterior. Outras 40 patentes já foram concedidas, 13 no Brasil e 27 no exterior. "O problema é que as patentes registradas no Brasil não geram negócios'; comenta Maria Celeste. Os registros obtidos no exterior, ao contrário, atraem o interesse das empresas, até pela rigidez com que escritórios como o USPTO, por exemplo, investigam a originalidade da tecnologia. Ela menciona o exemplo de três patentes de um mesmo projeto desenvolvido pela Fiocruz, depositadas no exterior, que já estão sendo negociadas, ainda protegidas por sigilo, com uma grande indústria do setor veterinário. • PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 19
• POLÍTICA CIENTÍFICA
E TECNOLÓGICA
EDUCAÇÃO
Portas abertas Instituto de Física da US P de São Carlos recebe alunos do ensino médio ~~~~~r=~~~~~~~~=======-~----------~~~~
mgrupo de 61 jovens de cinco estados brasileiros, entre 15 e 19 anos, dedicou uma semana de suas férias escolares ao estudo da ressonância nuclear magnética, biotecnologia, teletermografia e outros temas que não costumam constar do currículo do ensino médio. Entre os dias 13 e 20 de julho, eles ocuparam o Instituto de Física de São Carlos, da Universidade de São Paulo (USP), onde, nesse período, funciona a Escola Avançada de Física, criada em parceria com a Associação Paulista de Professores de Física (Aprofi). Ao longo de 14 horas diárias, freqüentaram aulas teóricas e experimentais, assistiram a palestras, realizaram observações astronômicas e seminários. Para medir o desempenho, elaboraram um trabalho de final de curso, apresentado na forma de seminário a uma banca de especialistas, nos mesmos moldes dos congressos internacionais. "O objetivo dessa escola é mostrar para alunos talentosos como é o mundo da pesquisa e como funcionam alguns dos principais grupos de pesquisa no país", diz Luiz Antonio de Oliveira Nunes, coordenador. O curso é ministrado por professores e pesquisadores do instituto. A programação aborda tópicos da Física Clássica e Física Moderna, mas inclui incursões em outras áreas do conhecimento, como biotecnologia e eletrônica. "Apostamos na multidisciplinariedade", explica o coordenador. Há ainda a intenção de chamar a aten-
U
20 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
~ '" :; w
"s
;;; ;;: w
" " ~ I-
~
Estudantes têm aulas teóricas e experimentais durante as férias
ção do aluno para o empreendedorismo, tanto que, entre as atividades programadas, ocorreu uma visita à Opto Eletrônica - empresa dirigida por um professor titular do Instituto de Física, Iarbas Castro -, fabricante e exportadora de equipamentos e dis,positivos ópticos sofisticados. Escolas avançadas, criadas na extinta União Soviética, na década de 60, e há muito adotadas nos Estados Unidos, começam a surgir também no Brasil. No caso da unidade de São Carlos, o grande diferencial está no critério de seleção dos alunos: todos têm que ter participado de competições estudantis, como, por exemplo, olimpíadas paulistas de física e matemática ou apresentar carta de recomendação de professores. "Só temos alunos talentosos", orgulha-se unes. O curso, que já está na sua segunda edição, é bastante concorrido. "No primeiro ano tivemos um grupo de 42 estudantes. Agora em 2003, encerramos as inscrições quando atingimos a marca de 250 concorrentes e ampliamos o número
de vagas, previstas para 50, por não termos mais critérios para corte", conta o coordenador. A divulgação do curso é feita pela Aprofi e repercute em todo o país. Os alunos da última turma, por exemplo, vêm de 32 cidades. A grande maioria estuda em escolas particulares: apenas um é aluno de escola pública. O curso é pago. A inscrição custa R$ 630 por aluno e inclui alimentação e estadia em dois hotéis da cidade. "Mas isso não impede que quem não tem condições de pagar participe do curso, já que temos bolsas de estudo", diz Nunes. Há ainda empresas que financiam matrículas. É o caso da Embraer, que mantém uma escola em São José dos Campos e pagou o curso de um aluno. Como esse trabalho não visa lucro, o dinheiro que sobra em caixa é convertido em prêmios para os melhores estudantes. "Certamente, esseesforçoatrairá bons talentos para as carreiras científico-tecnológicas, bem como contribuirá para a elevação do nível da educação brasileira", afirma Nunes. •
• POLÍTICA CIENTÍFICA
E TECNOLÓGICA
FINANCIAMENTO
Pressão e diálogo Fórum das FAPs analisa medidas para garanti r repasse de recursos estaduais .ntenção
do governo federal de desconcentrar as atividades de pesquisa e estimular a geração de conhecimen- . ~ to nas várias regiões do país tem como obstáculo a falta de disposição dos governos estaduais de cumprir a legislação e repassar integralmente os recursos devidos às Fundações de Amparo à Pesquisa (FAPs). São Paulo é a única exceção: cumpre a Constituição estadual e repassa à FAPESP 1% da arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Sem recursos, a grande maioria das FAPs tem de adotar medidas drásticas, como a suspensão da concessão de bolsas e de editais, que comprometem o desenvolvimento da pesquisa. Mas, lentamente, começa a se criar um clima de reação. Em junho, um grupo de 200 pesquisadores tomou a Praça da Liberdade, que
abriga a sede do governo mineiro, para exigir o repasse integral de 1% do ICMS à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig). No Sul, organiza-se um movimento em defesa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (Fapergs). O cumprimento da lei e do efetivo repasse de recursos às fundações é uma das principais e mais antigas reivindicações do Fórum Nacional das FAPs, criado em 1996. No último encontro, realizado em São Paulo nos dias 29 e 30 de julho, representantes de 22 estados reuniram-se com o jurista Dalmo Dallari, que realizou, a pedido do Fórum, um estudo dos estatutos das diversas fundações e das constituições estaduais para avaliar os aspectos jurídicos da falta de repasse. "A idéia é municiar os movimentos estaduais. É preciso pressão e diálogo", diz
Francisco Romeu Landi, presidente do Fórum das FAPs e diretor presidente do Conselho Técnico-Administrativo da FAPESP. O encontro também reafirmou o pleito do Fórum pela autonomia administrativa e financeira das fundações, de forma a afastar o risco de ingerência política. "Queremos que os conselhos tenham capacidade de propor o orçamento da Fundação e que isso seja respeitado': explica Landi. Os representantes das FAPs reivindicam, ainda, "o respeito aos mandatos dos conselheiros e diretores" como reforço à proposta de autonomia e garantia de estabilidade da instituição. "Está claro que as fundações não são independentes. São operacionais e devem seguir os interesses da sociedade, interpretada pelos respectivos conselhos e política de governo': ressalva Landi. "Entender e aceitar a autonomia e respeito aos mandatos é demonstração de cultura." • PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 21
• POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
FUNDOS SETORIAIS
Modelo de sucesso PIPE da FAPESP será referência dos programas de inovação empresarial do M CT
Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) vai firmar convênio com as Fundações de Amparo à Pesquisa (FAPs)para implantar programas de inovação empresarial nos estados. Financiados com recursos dos 14 fundos setoriais criados para fomentar a pesquisa e o desenvolvimento, os programas receberão contrapartida idêntica das FAPs. "A idéia é fazer editais conjuntos", explica Wanderley de Souza, secretário executivo do MCT. A estratégia do ministério se inspira no modelo do Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE), de acordo com Souza. Criado e patrocinado pela FAPESP, o PIPE apóia projetos de desenvolvimento de produtos e processos inovadores apresentados por pesquisadores ligados a pequenas empresas.A Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (Fapemig), por exemplo, já está elaborando seu programa nos mesmos moldes do PIPE, como conta o seu presidente,
O
22 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
José Geraldo de Freitas Drumond. No Rio de Janeiro, os convênios serão adequados ao Programa Tecnologia na Pequena Empresa (TPE), implementado pela Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj), atualmente desativado em razão de contingenciamento de recursos. "Em todos os estados os convênios vão apoiar a pesquisa nas empresas",afirma o secretário executivo. Anúncio em bloco - O MCT já tem au-
torização do Conselho Gestor do Fundo Setorial de Biotecnologia para aplicar R$ 10 milhões em projetos de inovação tecnológica em empresas da área. "Mas o anúncio dos convênios será feito em bloco': adianta Souza. O ministério está aguardando apenas a autorização dos conselhos gestores dos fundos setoriais de Agronegócios e Saúde para anunciar investimentos totais de R$ 20 milhões em programas nas três áreas. "Como o convênio envolve contrapartida, sairemos com um programa de R$ 40 milhões", calcula Souza."Em
São Paulo, com certeza, o programa vai fluir. Em outros, pode ser mais difícil." O MCT vai adotar esta estratégia de transferência de recursos dos fundos setoriais para empresas - por intermédio das FAPs - até que o Congresso aprove um projeto alterando a legislação dos fundos e autorize o repasse direto dos recursos às empresas. "Já que os recursos dos fundos vêm da própria atividade econômica, talvez possamos promover as mudanças na lei por meio de instrução normativa", supõe Souza. A transferência de recursos para a pesquisa empresarial, garante o secretário do MCT, não comprometerá as pesquisas acadêmicas. "Os fundos foram criados para apoiar a inovação. Estamos desenvolvendo estudos para apoiar também a pesquisa básica em universidades, a integração universidade-empresa, a formação de recursos humanos, além desse novo programa de inovação empresarial': afirma. "A idéia é harmonizar todo o sistema de pesquisa." Wanderley de Souza adiantou ainda que o Conselho Nacional de Desen-
volvimento Científico e Tecnológico (CNPq) vai lançar um programa de bolsas para «colocar doutores em empresas tanto no Brasil como no exterior". O programa terá provavelmente duração de três anos. No primeiro financiado pelo CNPq e depois com custos compartilhados com a empresa. No terceiro, está previsto a contratação do bolsista. «O programa está pronto para começar", diz. Parceria promissora - Os recursos dos fundos setoriais permitirão à Fapemig, por exemplo, retomar programas de apoio à pesquisa empresarial, encerrado em 2002. «O rascunho dos novos programas já está pronto", adianta Drumondo A intenção é começar com 15 bolsistas em empresas nos pólos de biotecnologia de Belo Horizonte e no norte do Estado; de informática, em Santa Rita do Sapucaí, Pouso Alegre e Itajubá; ou ainda nos setores de agronegócios e têxtiL "Estamos desenhando o instrumento jurídico para implementar os convênios", afirma. O programa de inovação empresarial, desenvolvido em parceria com o MCT, deverá levar ao mercado um enorme estoque de pesquisa mantido pelas universidades. «Nos últimos 16 anos, temos 3 mil pesquisas concluídas e não sabemos onde elas estão. As pesquisas básicas a gente pode contar nos dedos. O resto é inovação", diz o presidente da Fapemig. «Esse é um exemplo da parceria necessária e possível entre o governo federal e os estados na articulação da política científica e tecnológica no país", diz José Fernando Perez, diretor científico da FAPESP. «O PIPE tem que ser ampliado em escala nacional." Os convênios e editais conjuntos vão, ainda, fortalecer as FAPs, o que, na sua avaliação, é outro passo importante na direção do novo
versidades, dos quais não se exige título de mestrado ou doutorado, apenas a graduação ou currículo que comprove sua competência e experiência na área específica da pesquisa. Até 2003, o programa já tinha investido R$ 34,9 milhões e US$ 3,9 milhões na inovação (veja quadro). As pesquisas se desenvolvem em três fases. Na primeira, a Fundação destina até R$ 75 mil para teste de viabilidade do projeto. Na segunda, a empresa pode receber até R$ 300 mil para desenvolver processo ou protótipo. Na terceira fase, quando o produto entra em escala comercial ou linha de produção, a FAPESP oferece apoio para a execução de um plano de negócios por meio de convênios mantidos com a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) de São Paulo, além de instituições de capital de risco. •
pacto federativo para o desenvolvimento da ciência e tecnologia no país. Perez sublinha que a contrapartida prevista no programa é estratégica para envolver os governos estaduais no processo. «Sem isso, seria paternalismo." O PIPE financia, desde 1997,258 projetos de desenvolvimento de produtos e processos inovadores. Os projetos são coordenados por empresários, pesquisadores da empresa ou vinculados às uni-
Projetos e investimentos ÁREA DE CONHECIMENTO Agrárias Biológicas Computação Desenho Industrial Engenharias Física Geociências Humanas e Sociais Matemática Química Saúde Total
NÚMERO DE PROJETOS FASE I FASE 11 30 16 20 1 150 12 3 8 1 11 6 258
.
18 5 7 O 86 6 2 1 O 6 3 134
Mecânica Minas Nuclear Produção Qufmica Sanitária Transportes Outras Total Engenharias
5
4
17
10
3
1
44 34
29 14
9 2
8 O
o 6 17
1 3 8
8 3 2
3 3 2
150
86
INVESTIMENTOS R$
US$
4.054.146,60 1.312.436,20 1.794.825,54
330.394,69
67.829,00 22.973.757,89 1.386.863,50 438.391,40
NÚMERO DE PROJETOS FASE I FASE 11 Aeroespacial Biomédica Civil Elétrica Ma!. e Metalúrgica
no PIPE
497.085,21 95.745,00 0,00 2.395.075,80 411.494,50 30.126,18 1.200,00
580.104,49 75.000,00 1.572.591,70
0,00 159.392,24
790.716,40 34.971.662,72
18.278,45 3.938.792,07
R$
US$
1.107.899,13 2.333.92530 513.346,60 6.537.57483 5.177.967,00
100.112,00 418.48972 0,00 1.068.247 80
115.673,20 328.570,40
0,00 895,00 3.000,00 357.991,98 33.750,00 44.730,80 0,00 2.395.075,80
704.277,80 2.2227.687,80 1.289.541,10 428.204,20 357.740,00 22.973.757,89
124.583,50
PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 23
• CIÊNCIA
L A B O -R .LX -T Ó- ~R.._-~~ [ O ~': M U N D O --~...:::~~
•..
Entre o bem e o mal
Dois dados preocupantes vieram à tona ao fim de um estudo com 9 mil norte-americanos com mais de 18 anos, publicado na edição de 17 de junho do The [ournal of the American Medical Association (Iama). Pouco mais da metade das pessoas com depressão - 52% dos doentes - procura um profissional de saúde em busca de auxílio para seu problema. Se esse resultado não parece muito animador, o que dizer de outra constatação do trabalho? Menos da metade dos pacientes que recorreram aos serviços de um psiquiatra segue o tratamento da forma como foi prescrita pelo médico. Segundo o estudo, somente 47% dos doentes que se consultaram com um especialista seguem as recomendações clínicas: quatro visitas ao médico durante o prazo de um mês ou oito sessões de psicoterapia de pelo menos 30 minutos antes de iniciar o uso de antidepressivos ou estabilizadores de humor. •
Um papel especial pode estar reservado aos gatos nos estudos sobre a síndrome respiratória aguda severa (Sars), forma atípica de pneumonia identificada em fevereiro que matou 800 pessoas em mais de 30 países. Para alguns pesquisadores, os felinos representariam o melhor modelo animal para estudo da doença - os atuais testes, com macacos, são caros, e ainda não se conseguiu infectar camundongos com o vírus da Sars. Para outros, os gatos seriam os transmissores da doença ao homem (Nature, 5 de junho). A suspeita se baseia na descoberta de que felinos de um condomínio de Hong-Kong, onde 100 moradores contraíram a pneumonia, eram portadores do tal vírus semelhante ao da Sars. •
Gatos: aliados ou inimigos na luta contra a Sars?
• A árdua batalha para contar genes "Desconfio de que não conheçamos o número certo de genes em nenhum organismo, e menos ainda no homem", desabafou Phil Green, especialista em bioinformática da Universidade de Washington, Estados Unidos, durante um encontro realizado em maio no Laboratório de Cold Spring Harbor, Estado de Nova York (Nature, 5 de junho). "Acho
• Deprimidos e mal tratados
que nunca teremos um número final", disse [ean Weissenbach, diretor do centro francês de seqüenciamento Genoscope, outro participante da reunião. Entre as causas que dificultam o estabelecimento de uma contagem definitiva, os pesquisadores destacaram a ainda baixa confiabilidade dos programas de computador encarregados de identificar e contar os genes de um genoma. Em alguns casos, os softwares erram para menos: não
24 . AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
conseguem prever a existência de genes muito pequenos, que se encontram escondidos no meio de genes maiores. "Nenhum programa de computador jamais conseguirá pegar esses genes", afirmou Gerald Rubin, da Universidade da Califórnia em Berkeley. Em outros, erram para mais: contabilizam duas ou mais vezes a presença de um gene no genoma, confundindo as cópias de um gene com o seu original. •
• A polêmica faxina no Davi Venceu a modernidade. Sem passar por uma faxina pesada desde 1843, a estátua de Davi, uma das obras-primas de Michelangelo, começará a ser limpa em setembro com um preparado à base de água destiladada - e não por um antigo método de restauração a seco, como defendiam alguns restauradores. A decisão tomada pelas autoridades italianas põe fim, salvo alguma reviravolta de última hora, a
renunciou ao seu posto no museu, acredita que a adoção do método molhado pode danificar o Davi, que faz 500 anos em 2004. •
• O Sol visto bem de perto Em 14 de junho de 2002, em sua missão científica de estréia, as lentes do telescópio Vault, do Laboratório de Pesquisa Naval dos Estados Unidos, produziram um feito e tanto. Conseguiram captar as imagens mais próximas do Sol já
cie visível do Sol (troposfera) e a carona, a camada mais externa. As imagens devem ajudar a entender como funciona o Sol, que não é um corpo sólido, mas sim uma bola de gás, basicamente hidrogênio e hélio. Com cerca de 10 mil quilômetros de espessura, a cromosfera é uma região de
A estrela em ação: atividade intensa na camada mais baixa da atmosfera
o gigante
de M ichelangelo: opção pelo uso de água destilada na limpeza da estátua
um acalorado debate que já se arrastava por onze anos. Não havia consenso a respeito da melhor maneira de apagar os efeitos da passagem do tempo sobre o gigante nu, de 4 metros e meio de altura e quase 500 anos de vida, esculpido em mármore Carrara. A opção pelo método mais tecnológico era defendida por Franca Falletti, diretora da Galleria dell'Accademia, em
Florença, museu que abriga a estátua. A decisão desagradou a alguns restauradores, entre os quais a italiana Agnese Parronchi, que havia sido escalada pelo museu para realizar a faxina em Davi e era defensora de uma velha técnica de limpeza a seco, com o auxílio de escovas macias e pedaços de um tipo de couro muito macio (chamais). Agnese, que em abril
obtidas por qualquer artefato de observação. Só divulgadas em julho deste ano, as 21 fotos feitas pelo Vault - que capta a luz ultravioleta emitida num comprimento de onda chamado Lyman-alpha - apresentam uma resolução cerca de três vezes superiores às melhores imagens obtidas do Sol a partir do espaço. As lentes do Vault, lançado ao espaço a bordo de um foguete da Nasa, podem tlagrar porções do Sol que se estendem por áreas tão pequenas quanto 240 quilômetros. As fotos mostraram um inesperado nível de atividade na camada mais baixa da atmosfera solar, a cromosfera, entre a superfí-
transição em termos de temperatura. Nela, o calor passa de 6.000° C para 20.000° C. Na carona, as temperaturas são ainda maiores, atingindo até 1 milhão de graus Celsius. Entender a atividade do Sol é importante para a humanidade. Explosões solares podem afetar o funcionamento de satélites e danificar os sistemas de navegação, comunicação e energia. •
PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 25
Testes diferenciam venenos
Poderia ser mais fácil tratar quem chega ao pronto-socorro picado por cobra, escorpião ou aranha. Testes criados pela equipe do biólogo Carlos Chávez Olórtegui, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), permitem identificar de modo preciso a espécie do animal e a quantidade de veneno injetada, informações importantes para a administração do soro correto e na dose mais adequada. Mais rápidos que os métodos de diagnóstico atuais fundamentados no reconhecimento de sinais clínicos (como suor intenso, náuseas e vômitos), que podem levar horas para aparecer -, os testes poderiam ser realizados em
• Infecções ligadas à esquistossomose Uma notícia nada animadora: os 10 milhões de pessoas que têm as formas mais graves da esquistossomose, doença causada pelo verme Schistosoma mansoni, possivelmente correm risco maior de contrair outras infecções, causadas por bactérias (como hanseníase e tuberculose), protozoários (toxoplasmose e leishmaniose) ou vírus
Sem erro: exame identifica o veneno de
[araraca
(acima),
cascavel ou coral
cerca de uma hora com apenas alguns mililitros de sangue. Feitos com reagentes nacionais e pequenas placas importadas com 96 furinhos, os testes devem sair por menos de R$ 10 cada, estima Chávez. Com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (Fapemig), ele iniciou há poucos meses a produção em escala piloto de um dos exames, capaz de distinguir entre a picada de
(hepatite), segundo estudo de pesquisadores pernarnbucanos publicado na Infection and Immunity. Por um motivo ainda desconhecido, o sistema imunológico desses indivíduos deixa de funcionar como deveria. Frederico Abath e Silvia Montenegro, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em Recife, em conjunto com a Universidade Federal de Pernambuco e os Institutos Nacionais de Saúde (NIH), dos Estados Unidos,
26 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
duas aranhas, a aranhamarrom (Loxosceles sp.) e a aranha-armadeira (Phoneutria sp.), e a do mais letal escorpião, o amarelo (Tityus serrulatus), cujo veneno pode matar por parada respiratória ou cardíaca. Chávez começou a desenvolver os exames há oito anos, quando ainda estava na Fundação 'Ezequiel Dias, um centro de produção de soros e vacinas em Minas Gerais, após constatar que havia uma relação direta
examinaram o sangue de 32 pessoas contaminadas e constataram: quanto maior a gravidade da doença, menor a produção de interferon gama, molécula que ativa as células de defesa do organismo. "Os resultados estão de acordo com o que observamos no dia-a-dia", comenta Abath. "Agora estamos planejando estudos epidemiológicos para avaliar se a propensão a desenvolver outras doenças realmente existe." •
entre a concentração de veneno no sangue e a gravidade dos sintomas. Nesse tempo, fez também outros dois exames: um deles capaz de discernir entre a picada da cobra surucucu (Lachesis muta) e a da jararaca-de-rabo-branco (Bothrops atrox), que causam reações semelhantes - poderia ser útil especialmente na Amazônia, onde essas duas serpentes respondem por 98% das picadas. O outro identifica o veneno da picada de três cobras comuns nas regiões Sudeste e Centro-Oeste: a cascavel (Crotalus spp.), a jararaca (Bothrops spp.) e a coral verdadeira (Micrurus spp.). Chávez pretende agora reduzir o tempo dos testes de uma hora para 20 minutos. •
• Mudança no clima favorece florestas O aumento da temperatura, mudanças nos regimes de chuvas tropicais e a elevação dos índices de gás carbônico na atmosfera parecem provocar um crescimento da vegetação na Amazônia e em outras regiões do mundo nas últimas duas décadas, desmatamentos à parte. Em uma nova interpretação das informações climáticas e ob-
servações de satélites feitas entre 1982 e 1999, pesquisadores norte-americanos mapearam o crescimento da vegetação no planeta e viram que a produtividade das plantas cresceu em média 6% e que a região amazônica responde por 40% desse crescimento global (SciDev, 6 de junho). Esses saltos de crescimento da vegetação costumam ser atribuídos ao aumento do dióxido de carbono na atmosfera, mas os autores do estudo sugerem que um aumento na radiação solar, devido à diminuição das nuvens, é a causa principal, sendo menor a contribuição do gás carbônico, dos fertilizantes e do reflorestamento. Ainda não é possível dizer se esses efeitos se devem a mudanças de curto ou longo prazo, já que o estudo abrange apenas um aspecto das complexas respostas do planeta à mudança climática. •
Menos nuvens e mais calor: matas tropicais crescem mais após começarem a jogar, já num estágio em que a diversão tornou-se um problema. Já os homens se transformam em apostadores compulsivos - ou jogadores patológicos, como classificam os médicos - em muito mais tempo, de dez a 20 anos. Silvia atribui essa vulnerabilidade fe-
minina ao fato de as mulheres jogarem mais por escapismo, procurando fugir de problemas, aliviar a ansiedade e a depressão ou compensar a perda de seus papéis sociais, como a saída dos filhos de casa. Outra razão é que as mulheres têm maior preferência que os homens por
• Mulheres se viciam em menos tempo
e
,il1
D-
Afinal, as mulheres são mesmo o sexo frágil? Se o assunto for relacionado ao bingo e a outros jogos eletrônicos, como o videopôquer e o caça-níqueis, a resposta parece ser sim. Embora tenham contato inicial com o jogo mais tarde, entre 35 e 40 anos, elas se tornam dependentes mais rapidamente que os homens, que normalmente começam entre 20 e 25 anos a desafiar a sorte com assiduidade. Em um estudo com 78 mulheres e 78 homens atendidos no Ambulatório do Jogo Patológico e Outros Impulsos (Arnjo), da Universidade de São Paulo (USP), a psiquiatra Silva Saboia Martins constatou que as mulheres ficam dependentes de dois a sete anos
o perigo eletrônico: escapismo facilita o vício
jogos eletrônicos, os que mais viciam. De acordo com esse estudo, as mulheres apresentam maior dificuldade que os homens para abandonar as apostas. ''As mulheres só buscam ajuda mais cedo porque se viciam no jogo mais rápido do que homens", diz a pesquisadora. Quando o prazer se transforma em vício, tanto os homens quanto as mulheres não conseguem mais parar de jogar, perdem dinheiro e começam a passar cheques sem fundos ou mesmo a roubar para se manter na mesa de apostas. As jogadoras compulsivas levam, em média, 7,5 anos para procurar tratamento, enquanto os homens - que estabelecem com o vício uma relação social, jogam com várias pessoas, em busca de ação - só recorrem à ajuda após 18,5 anos. "Conhecer as diferenças de comportamento entre os homens e as mulheres é crucial para que se adotem formas mais eficazes de prevenir e de tratar os jogadores patológicos", comenta Silvia, que segue para o pósdoutoramento na Universidade Iohns Hopkins, Estados Unidos. •
PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 27
Los Leones, um dos olhos do Pierre Auger: ainda há mais perguntas do que respostas
Distante pelo menos 100 quilômetros, a cadeia de montanhas mais altas da América do Sul parece próxima por causa da excelente visibilidade, que resulta da baixa umidade e da ausência quase absoluta de poluição. As condições climáticas e a amplidão desta planície, cuja linha do horizonte, a leste, parece fundir-se com um mar imaginário, fizeram dessa região semidesértica argentina o espaço perfeito para abrigar o Observatório Pierre Auger de Raios Cósmicos, um dos maiores e mais ambiciosos empreendimentos da história da física, que neste mês de agosto inaugura uma nova fase. Começa a etapa de produção, a terceira e última, com a montagem intensiva de equipamentos segundo os padrões testados e definidos nas duas fases anteriores, de protótipo e de pré-produção, que tomaram os últimos três anos. Maior laboratório a céu aberto já projetado, o Pierre Auger começou em fevereiro de 2000 a ocupar os arredores de Malargüe, cidade de estimados 20 mil habitantes (e dois cruzamentos com se30 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
máforo) a 420 quilômetros de Mendoza, o centro urbano mais próximo dotado de linhas aéreas regulares. Para cobrir seus custos, estimados em US$ 54 milhões, formou-se um consórcio com instituições de 18 países. O Brasil participa com R$ 2,5 milhões, por meio de um projeto temático da FAPESP (R$ 1,8 milhão) e do Programa de Núcleos de Exceléncia em Pesquisa (Pronex) do Ministério da Ciência e Tecnologia (R$ 700 mil). O chairman do finance board, que reúne representantes dos países, é o diretor científico da FAPESP, José Fernando Perez. "O fato de o chairman ser um brasileiro dá a dimensão da importância da pesquisa brasileira para o projeto': diz ele. O propósito dessa empreitada que reúne 250 cientistas é detectar e interpretar os raios cósmicos, partículas subatômicas com uma energia colossal, pelo menos 100 milhões de vezes superior à daquelas produzidas no mais potente acelerador de partículas, o Tevatron, nos Estados Unidos. Em termos mais concretos, esses raios cósmicos têm uma energia equivalente à de uma bola de futebol movendo-se a 54 quilômetros por hora ou à de uma bola de tênis após o saque por um profissional como
o Guga. Quando estiver operando a plena capacidade, daqui a provavelmente três anos, o Pierre Auger deverá ocupar 3 mil quilômetros quadrados, o dobro da área da cidade de São Paulo, e os resultados que fornecer talvez sejam valiosos para entender uma série de fenômenos físicos, da constituição da matéria à formação do universo. Desde já, porém, impõe-se à paisagem ao pé dos Andes.
Contrastes - Entre touceiras de plantas espinhosas que crescem sobre um solo pedregoso, espalham-se os chamados tanques Cerenkov, cada um com 3,7 metros de diâmetro. Dentro deles há 11 mil litros de água puríssima e, por fora, um painel solar, que lhes fornece a energia armazenada em uma bateria feita pela empresa Moura, de Recife, e usada por um miniprocessador acoplado a uma antena de rádio. A esse conjunto dá-se o nome de detector de superfície, um dos recursos usados para registrar os raios cósmicos de forma indireta, já que ao entrar na atmosfera os raios cósmicos formam trilhões de outras partículas. Ao atravessarem as paredes do tanque e passarem pela água, as partículas formadas pela fragmentação dos raios cósmicos geram uma
r
a
radiação azulada, a luz Cerenkov. Captada por sensores, é enviada por ondas de rádio para a sede do observatório, uma construção moderna na entrada de Malargüe, com paredes laterais de vidro, das quais se pode ver, ao longe, fileiras de álamos que nesta época do ano, por causa da seca e do frio, estão cinzas, completamente desfolhados. Até agora, estão montados 131 tanques, dos quais 50 em funcionamento. Separados por uma distância regular de 1,5 quilômetro entre si, estão alinhados com os detectores de fluorescência, como são chamados os telescópios munidos de espelhos e fotodetectores, os tais olhos-de- mosca que registram a luz tênue emitida pelo nitrogênio do ar após a colisão com as partículas na alta atmosfera - equivalente à energia de uma lâmpada de 5 watts a 20 quilômetros de distância. Por serem tão sensíveis é que os detectores de fluorescência só funcionam às escuras, em noites sem lua, enquanto os tanques captam os raios cósmicos o tempo todo. O Pierre Auger será o primeiro observatório a integrar esses dois métodos de observação, até hoje adotados isoladamente em observatórios menores, como o Fly's Eye, que funcionou de 1981 a 1992 nos Estados Unidos
com 67 telescópios, e o Agasa, no Japão, com 111 detectores de superfície. Há hoje dois telescópios em operação - só um deles, o número 4, está completo' agora com a cortina de chamois. Ambos fazem parte de um prédio ou olho - em formato de semicírculo, o Los Leones, que ocupa um morro a 6 quilômetros de Malargüe. Sob a supervisão de Carlos Escobar, da Unicamp, a equipe brasileira - 22 pesquisadores paulistas, incluindo dois da Universidade de São Paulo (USP), e outros dez do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), do Rio de Janeiro, e das universidades federais fluminense (UFF) e da Bahia (UFBA) - trabalha nos telescópios e na instalação dos tanques, fabricados pela Alpina, uma empresa de São Paulo. No Los Leones, os brasileiros põem para funcionar os motores e as caixas de controles dos shutters, portas que protegem os telescópios. Têm ainda pela frente a montagem das lentes corretoras - produzidas pela Schwantz, de Indaiatuba, interior paulista - nos outros quatro telescópios a serem instalados em Los Leones. Feitas com vidro alemão, as lentes convergentes em formato de trapézio, com 25 centímetros
de altura, formam um anel corretor ao longo das bordas do diafragma, que regula a entrada de luz, como o diafragma de uma câmera fotográfica, e aumenta o raio da lente de 85 para 110 centímetros, sem perder a qualidade da imagem. Quando os shutters e as cortinas estão abertos, a tênue luz gerada pelos raios cósmicos atravessa os filtros ultravioleta e a lente, incide em um espelho parabólico, formado na verdade por 60 espelhos, e se reflete nos fototubos, conjuntos de 440 células de 4 centímetros cada, os olhos-de-mosca. Luzes raras - De acordo com o planejado, haverá quatro prédios - dos outros três, apenas o segundo, Coihueco, a 60 quilômetros de Los Leones, já está construido, em fase inicial de montagem dos equipamentos. Juntas, as quatro construções terão 24 telescópios, com um ângulo de visão que cobre quase a superfície até 32° do céu do Hemisfério Sul. A planície andina será também pontuada por um total de 1.600 tanques Cerenkov, de modo que se possa captar o maior número possível dessas raras partículas cósmicas. Calcula-se que chegue à Terra uma partícula de alta energia por quilômetro quadrado PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 31
mais antigos - o plano deles era termipor século. Portanto, quanto maior a nar a instalação de 50 novos tanques área ocupada com os equipamentos, em algumas semanas. "Às vezes chove maior a probabilidade de registrar mais por aqui': diz Bertou, "e o equipamento eventos. Com todos os detectores de protótipo não estava bem protegido superfície e de fluorescência em operacontra a água." Quem os ção, espera-se registrar 20 visse na oficina da cidade ou 30 eventos por ano. nos dias anteriores, aperRumo a essa meta, tratando parafusos ou monbalha-se intensamente. Resultados No início de julho, físicos tando com destreza as preliminares já novas caixas de controle eslovenos, italianos, frandos tanques, com peças ceses, brasileiros, nortesugerem ajustes americanos e argentinosque vieram dos Estados na teoria sobre Unidos, da França e da Inna maioria pós-doutores glaterra, poderia pensar na casa dos 30 anos raios cósmicos que seriam eletricistas montavam equipamentos ou, vá lá, engenheiros, durante o dia nos tanques mas dificilmente pósou em Los Leones e, à doutorandos em física de noite, muitas vezes até 3 altas energias. "Temos de fazer o que for da madrugada, nas oficinas do prédio preciso", diz o diplomático francês de da cidade. E é provável que esse ritmo 30 anos, ligado à Universidade de Chise intensifique a partir deste mês, quancago, Estados Unidos, que parece desfrudo começa a montagem em série de tar muito pouco a solenidade de seu equipamentos. Pretende-se chegar a cargo de coordenador de operações cidezembro com ao menos 250 tanques entíficas. Bertou deixou Paris no comee seis telescópios em operação (quatro ço do ano passado para se instalar em em Los Leones e dois em Coihueco). Malargüe e hoje não passa mais sem o Por respeito aos prazos é que, no chimarrão no final de tarde. mesmo domingo em que os dois paulisAllison, um dos mais jovens intetas testavam a cortina no Los Leones, o grantes da equipe, tem 26 anos, mas pafrancês Xavier Bertou e o norte-amerirece ter menos de 20. "Esse garoto é um cano Patrick Allison subiam os tanques crânio': comenta o argentino Ricardo instalados no campo, expostos ao venPerez ao observá-lo testando os controto frio, montando caixas de controle les eletrônicos dos tanques. "Graças a ele mais compactas e com menos fios que existe o Auger", reforça Perez. Foi o a versão usada nos tanques Cerenkov Allison e Bertou: correndo com a nova eletrônica dos tanques
32 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
jovem norte-americano, doutorando da Universidade da Pensilvânia, quem criou os programas de comunicação entre os detectores de superfície e o escritório central, com o horário exato, a intensidade e a localização precisa dos registros de raios cósmicos. Mesmo tendo vindo a Malargüe 14 vezes desde que entrou no projeto, há sete anos, Allison ainda fala pouquíssimo espanhol. A razão, ele explica, é que se sente irritado por não conseguir se expressar em outro idioma tão rapidamente como em inglês. iscreto, preferindo falar dos outros, Perez é essencial no dia-a-dia. E não apenas por resolver problemas práticos de instalação dos tanques Cerenkov. Como responsável pela manutenção, esse argentino de 31 anos nascido em Malargüe acompanhou a montagem dos primeiros tanques, que no início não funcionavam por uma razão simples: as vacas do pasto em que ficam os tanques comiam os fios de transmissão de dados. Foi Perez, técnico em mineração, quem bolou uma caixa de proteção dos fios - e as vacas nunca mais atrapalharam a ciência. Seu valor vai além. Perez parece ter conseguido entender, respeitar e conciliar o estilo de trabalho dos alemães, franceses, norte-americanos e argenti-
D
Oliveira e Barroso: diante dos espelhos do Los Leones
OS PROJETOS Observatório
Projeto
Pierre Auger
COORDENADOR
COORDENADOR CARLOS OURÍVIO ESCOBAR -
Unicamp
INVESTIMENTO R$ R$
Pierre Auger
1.884.287,12 (FAPESP) 600 mil (Pronex, MCT)
nos. "Temos de valorizar as coisas boas e amenizar as deficiências de cada grupo'" comenta Perez, com uma clara visão da grandiosidade desse trabalho. Para ele, o fato de ao menos oito tanques Cerenkov terem sido batizados com o nome de Paz, em português, inglês, espanhol, francês e mesmo em árabe - embora a maioria dos tanques tenha nomes de mulheres, a partir de um primeiro nomeado por pesquisadores cariocas -, significa que é possível deixar de lado a política e estabelecer uma colaboração internacional com objetivos comuns, com base na ciência.
Incertezas - Por meio dos programas de Allison e dos fios agora protegidos das mordidas bovinas (nos controles eletrônicos novos os fios são embutidos), chegaram informações sobre cerca de 300 episódios - alguns registrados ao mesmo tempo por 20 tanques - com M ichela no contêiner: laser para regular a precisão dos detectares
RONALD CINTRA SHELLARD - CBPF
INVESTIMENTO R$
100 mil (MCT)
energia superior a 1018 (o número 1 seguido de 18 zeros) elétrons-volts (eV), 1 milhão de trilhão de vezes superior à de um elétron. São resultados preliminares, sujeitos a confirmações, mas já num patamar de energia 3 mil vezes mais alto que o dos raios cósmicos detectados pelo físico francês Pierre Victor Auger (1899-1993), inspirador desse projeto por ter registrado o primeiro chuveiro de partículas, em 1938. A esperada matéria-prima da pesquisa começa a chegar. Mas existe um acordo entre os pesquisadores: a despeito da tentação, decidiram não parar para analisar os dados - até porque ainda são considerados poucos - enquanto as obras de construção dos detectores não estiverem próximas do fim. Há, porém, uma questão intrigante que ocupa os momentos de descanso dos físicos. É a diferença - ou discrepância - entre os dados registrados pelos dois tipos de detectores: os de superfí-
cie captaram partículas com o dobro da energia da que foi verificada nos detectores de fluorescência, de acordo com os métodos de análise de cada tipo de equipamento (e são as mesmas, sim, porque chegaram exatamente no mesmo horário). "Os modelos teóricos de análise de dados estão provavelmente errados': assegura Allison, diante do impasse, que na verdade se exibe como uns dos primeiros trunfos desse gigantesco trabalho: "Se não tivéssemos dois tipos de detectores, não saberíamos que algo pode estar errado': Não há dúvidas de que é um desafio rever as bases conceituais de algo cuja natureza se desconhece. O que são, afinal, os raios cósmicos? "Podem ser prótons (partículas que formam o núcleo atômico), fótons (partículas de luz) ou mesmo núcleos inteiros de átomos como os de ferro", diz Miguel Mostafa, engenheiro nuclear de 33 anos que integra a equipe da Universidade do Novo México, Estados Unidos. Antes de se mudar, há um ano, para Albuquerque, no Novo México, esse argentino de Bariloche fez o pós-doutoramento na Universidade de Turim, na Itália, com Rosanna Cester - com mais de 70 anos, ela acompanha pessoalmente a construção das lentes dos telescópios. Foi ela quem orientou o pós-doutoramento de Marcelo Oliveira de fevereiro de 2000 a maio de 2001 e agora faz o mesmo com Michela Chiosso, doutoranda
Randria, na central de aquisição de dados: matéria-prima valiosa
PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 33
• CIÊNCIA
ECOLOGIA
Encontros fugazes A sobrevivência de árvores de até 40 metros depende de minúsculos insetos e pássaros polinizadores MARCOS
PrVETTA
msilêncio, após passarem até 12 horas seguidas no alto das torres de madeira de 30 metros de altura, espalhadas na Floresta Nacional do Tapajós, no Pará, biólogos da Embrapa Amazônia Oriental começam a desvendar os mecanismos de reprodução de algumas espécies de árvores tropicais comercialmente importantes como fonte de madeira nobre. Esse trabalho de observação é uma forma de identificar quem são e como atuam os agentes polinizadores - normalmente insetos - de um conjunto de sete espécies arbóreas com nomes populares de sonoridade bem brasileira: jatobá, andiroba, parapará, maçaranduba, cumaru, anani e tatajuba. Até recentemente não havia estudos precisos sobre o processo de polinização da maioria dessas árvores, mas já há o que comemorar. A equipe da Embrapa descobriu que uma espécie de pica-pau do gênero Celeus, de pelagem alaranjada com pontos pretos, é um dos polinizadores do anani (Symphonia globulifera), árvore de até 40 metros de altura cujo tronco solta um látex de um amarelo intenso. "Foi uma surpresa", afirma a bióloga Márcia Motta Maués, coordenadora do grupo de seis pesquisadores. "Vimos o pica-pau procurar as flores avermelhadas da árvore três vezes num mesmo dia." Já havia registros de beija-flores e sobretudo de aves da ordem dos Passeriformes, como o pipiravermelho (Ramphocelus carbo), que agem como polinizadores do anani, mas ainda
E
36 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
União vital: a maçaranduba e a mosca Ornidia obesa
A flor do anani: sem perfume, mas rica em néctar
A flor do cumaru: procurada por mariposas, vespas, beija-flores e abelhas
o pica-pau
polinizador do anani: para os biólogos, "urna surpresa" Inflorescências do cumaru com abelhas Epicharis: visita importante
PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 37
não de uma ave tão grande como esse pica-pau de 25 centímetros de comprimento, visto do alto de uma das seis torres de observação. Quando os animais visitam as flores, normalmente buscam comida - as flores do anani, por exemplo, mesmo sem perfume, que facilitaria sua localização, são ricas em néctar, uma mistura de açúcares. Enquanto se alimentam, pássaros e insetos cumprem uma tarefa vital para as plantas, a polinização, ao transportarem os grãos de pólen de uma flor, com as células sexuais masculinas, até o estigma, a estrutura feminina, de outra flor. E assim os seres vivos - ou mesmo o vento e a água da chuva - detonam o processo reprodutivo, ao unir as células sexuais masculinas e femininas. Desse modo se formam os frutos e as sementes, que garantem a sobrevivência e a diversidade genética das plantas. Conhecer os polinizadores das árvores mais ameaçadas pela ação do homem na Amazônia é fundamental para determinar com precisão o limite máximo de exploração racional das espécies arbóreas. "Se descobrirmos que urna espécie de árvore é polinizada só por um determinado inseto ou animal, a preservação do polinizador se torna essencial para a sobrevivência da planta", explica Márcia, cujo trabalho integra o projeto Dendrogene - Conservação Genética em Florestas Manejadas da Amazônia, gerenciado pela Embrapa Amazônia Oriental e com participações de instituições do exterior, como o Department for lnternational Development (DFID), do governo britânico. Os pesquisadores estão cada vez mais preocupados, à medida que conhecem melhor a profunda dependência entre as árvores e os polinizadores - o desaparecimento de um grupo implica o desaparecimento do outro. Em 1998, especialistas do mundo inteiro, reunidos durante a Convenção da Biodiversidade, lançaram a Declaração de São Paulo, com recomendações de proteção e pesquisas mais intensas sobre o declínio dos insetos polinizadores, com ênfase nas abelhas. Abundância e escassez - A maçaranduba (Manilkara huberi), uma árvore que chega a 40 metros de altura, dotada de pequenas flores brancas, exibiu uma riqueza de polinizadores sem paralelo entre as espécies estudadas. Bor38 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
Florada de parapará e uma maçaranduba: medidas de proteção agora incluem os polinizadores
boletas, moscas, vespas, besouros, pássaros e pelo menos 15 espécies diferentes de abelhas, entre elas a Apis mellifera e as sem ferrão, visitam as flores da árvore. "Havia representantes dos principais grupos de agentes polinizadores na maçaranduba, com exceção de morcegos': conta a bióloga. Essa forte atração provavelmente decorre do fácil acesso às recompensas alimentares das flores dessa árvore, nas quais o néctar e o próprio pólen não se encontram protegidos por estruturas da flor. Mas se a fartura de polinizadores da Manilkara huberi é uma boa notícia, a eventual escassez de flores a serem fertilizadas preocupa. A equipe da Embrapa verificou que a maçaranduba pode ficar até quatro anos sem florir, provavelmente por causa de mudanças climáticas provocadas pelo EI Nino, o aquecimento anormal das águas superficiais do Pacífico Sul que altera o regime de chuvas e as temperaturas em parte do planeta. O cumaru, com 30 a 35 metros de altura - de seu fruto se extrai a cumarina, usada na indústria de cosméticos -, é outra espécie que apresenta uma no-
tável variedade de polinizadores. Pelo menos 25 espécies de mariposas, vespas, besouros, beija-flores e abelhas de várias famílias, entre as quais a Epicharis, visitam as flores e podem carregar o seu pólen. Além do néctar, as flores brancas com detalhe violáceo oferecem outro atrativo para insetos e animais: são muito aromáticas, como dá a entender o nome científico dessa espécie de árvore, Dipteryx adora ta. Para estudar a polinização do jatobá (Hymenaea courbariT), os biólogos tiveram de varar madrugadas na torre situada ao lado de um exemplar dessa espécie, que chega a 50 metros de altura. Por fim, descobriram que as flores do jatobá na Amazônia só abrem depois das 22 horas, o que significa que as condições ideais de polinização se concentram à noite. Notívagos, os morcegos parecem constituir um importante grupo polinizador do jatobá. O problema é que esses mamíferos alados destroem as flores, o que as torna pouco interessantes para polinizadores diurnos como as abelhas. Situação semelhante ocorre com a flor lilás do para-
pará (Jacaranda copaia), procurada por vários grupos de abelhas. Só que, nesse caso, o papel de polinizador-vilão cabe a uma espécie de mamangava corpulenta, uma abelha de até 5 centímetros de comprimento, a Xylocopa frontalis, além de algumas borboletas, que perfuram as flores em busca de néctar. Flores hermafroditas - A reprodução das árvores parece simples, mas às vezes surgem complicações. O pólen está na estrutura masculina das flores e o estigma se encontra na parte feminina. Mas, com exceção da andiroba ( Carapa guianensis) e da tatajuba (Bagassa guianensis), as outras cinco espécies arbóreas estudadas têm flores hermafroditas, com estruturas reprodutivas de ambos os sexos - em outros termos, são masculinas e femininas ao mesmo tempo. Mas o hermafroditismo não quer dizer necessariamente que nessas espécies possa ocorrer a chamada auto fecundação, quando as células sexuais masculinas encontram as femininas da mesma flor. "O pólen de uma flor hermafrodita de uma maçaranduba não consegue
fertilizar o estigma dessa mesma flor", diz Márcia. "E também não tem sucesso em fertilizar outras flores hermafroditas da mesma maçaranduba." O pólen só é capaz de fecundar flores de outra maçaranduba - e se for transportado por um polinizador. A situação da andiroba, aparentemente polinizada por abelhas sem ferrão, besouros e mariposas, é diferente. Suas flores são chamadas de monóicas: na mesma planta há dois conjuntos de flores, as masculinas e as femininas. No início do período de florescimento, que dura cerca de cinco meses, a andiroba apresenta apenas flores masculinas e depois flores de ambos os sexos - mas nunca hermafroditas. Só que as flores de uma mesma andiroba, ainda que de sexos diferentes, não conseguem promover a fecundação entre si. Testes preliminares indicaram que, para ocorrer a fecundação nessa espécie, o pólen de uma andiroba deve ser levado até uma flor feminina de outra andiroba. "A exemplo do que ocorre com as árvores tropicais dotadas de flores hermafroditas, as espécies arbóreas com flores mo-
noicas parecem ter mecanismos de proteção de sua diversidade genética que impedem a auto fecundação", explica Márcia. Árvores que se fecundam com seu próprio pólen tendem a perder variabilidade genética e põem em risco a sobrevivência da espécie. Os pesquisadores notaram uma peculiaridade das flores masculinas da andiroba, ligeiramente maiores que as femininas, que podem dificultar o trabalho dos polinizadores. No período de floração, elas permanecem abertas por menos de 24 horas e, em seguida, despencam da árvore. Os insetos que espalham o pólen dessa espécie têm de agir rápido. Caso contrário, não há fertilização. Talvez a tatajuba, espécie relativamente rara na Amazônia, da mesma família da figueira, apresente o contexto reprodutivo mais complicado entre as variedades de árvores estudadas. Tratase de uma espécie dióica. Algumas tatajubas são árvores machos, apenas com flores masculinas. Outras tatajubas são árvores fêmeas, só com flores femininas. "Vimos que apenas um tipo de inseto, os tripes, visitam as flores, de aroma forte e adocicado", conta Márcia. Os tripes ou lacerdinhas são insetos de poucos milímetros, da ordem Thysanoptera, cuja eficiência na polinização depende de um fator natural: o vento. Se venta bastante, muitos tripes desembarcam na tatajuba. Se venta pouco, esse número se reduz bastante. Para complicar, há a questão do sexo das árvores. Marivana Borges Silva, pesquisadora da Universidade Federal do Pará (UFPA), associada ao projeto, procura saber se a proporção de tatajubas macho e fêmea é a mesma. O que já se verificou é que os conjuntos de flores (inflorescências) masculinas e femininas são distintas: as inflorescências masculinas são em forma de espiga, com flores extremamente simples, sem pétalas nem sépalas, as estruturas de proteção da base das flores, enquanto as femininas também são nuas e lembram uma minibola de golfe. Mas os madeireiros, ao derrubar uma árvore dessa espécie, raramente prestam atenção nesses detalhes. Resultado: ainda não se sabe ao certo, mas a tatajuba pode estar correndo o risco de desaparecer, sobretudo em áreas de intensa exploração madeireira, devido ao desequilíbrio entre a proporção de plantas masculinas e femininas. • PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 39
CIÊNCIA
GENÉTICA
Identidade
sem ambigüidade Laboratório da US P descobre as causas genéticas e as formas de tratamento de alterações hormonais raras FABRÍCIO
MARQUES
m prêmio concedido nos Estados Unidos pela primeira vez a um pesquisador brasileiro, a endocrinologista Ana Claudia Latronico, de 39 anos, chamou a atenção para a produtividade científica de uma equipe da Universidade de São Paulo (USP) que lida com um material riquíssimo. Todos os meses, o grupo da Unidade de Endocrinologia do Desenvolvimento do Hospital das Clínicas da USP atende 400 pessoas vindas de todo o país com distúrbios horrnonais que impedem o crescimento normal de crianças, interferem na puberdade de adolescentes ou geram anomalias no desenvolvimento dos órgãos sexuais, como o herrnafroditismo, em que o indivíduo nasce com ovários e testículos, além de genitais externos mal definidos. Tamanha diversidade de pacientes - e a oportunidade de tratá-los e acompanhá-los - transformou a unidade em um centro de pesquisa de referência internacional. É ali que, sob a orientação de Berenice Bilharinho de Mendonça, Ana Claudia participa há 12 anos de uma série de estudos pioneiros que descrevem novas mutações genéticas causadoras de doenças hormonais. O conjunto desses trabalhos é que rendeu a Ana Claudia o Prêmio Richard E. Weitzman, concedido em junho pela Sociedade Americana de Endocrinologia a pesquisadores com menos de 40 anos de idade. A equipe de 2S pesquisadores liderada por Berenice - mulheres, na maioria, como é comum na área de endocrinologia - enfrenta diariamente o desafio de mostrar a quem apa-
U
40 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
rece por lá em busca de atendimento que em geral é possível tratar esses problemas genéticos marcados por um forte preconceito. É o caso da identificação do sexo de indivíduos que nascem com genitais ambíguos - com estruturas masculinas e femininas completas ou não. Esse problema compreende três grupos de doenças diferentes. Um é o hermafroditismo verdadeiro, em que o indivíduo apresenta ovários e testículos e os órgãos genitais externos com estruturas masculinas e femininas, a chamada ambigüidade genital. Geneticamente, a maioria dos hermafroditas verdadeiros tem em cada célula dois cromossomos X - os homens normais têm um crornossomo X e um Y e as mulheres, dois X. Portanto, eles deveriam ser mulheres. Mas como explicar o desenvolvimento dos testículos? Provavelmente, isso se deve a alterações em genes ainda desconhecidos que atuam como o gene SRY do cromossomo Y, responsável pela formação dos testículos. O segundo grupo é o pseudo-herrnafroditismo masculino: do ponto de vista genético, o indivíduo é um homem (XY), mas o pênis não se desenvolve completamente e a abertura da uretra fica em posição anormal. "Os pseudo-hermafroditas deveriam ter sido homens normais, mas não foram completamente virilizados, por causa de defeitos ocorridos ao longo do desenvolvimento sexual embrionário", diz Berenice. Até os dois meses de gestação, lembra ela, os homens e as mulheres têm a genitália idêntica - o que os diferencia, a partir desse momento, é a ação do hormônio sexual masculino, a testosterona. As
mulheres pseudo-hermafroditas constituem a terceira categoria: apresentam dois cromossomos X e possuem o aparelho reprodutor feminino completo, como toda mulher qualquer, mas durante a vida intrauterina sofreram um processo de virilização dos genitais: o clitóriscresceexcessivamentee se apresenta como uma estrutura semelhante ao pênis. Desde 1976, chegam a 500 os casos de ambigüidade genital diagnosticados nessaunidade do Hospital da Clínicas da USP.A causa mais freqüente - responsávelpor um em cada três casos - é urna doença de nome complicado, a hiperplasia adrenal congênita virilizante. Mutações no gene CYP21A2 resultam na deficiência de uma enzima, a 21 hidroxilase.A escassezdessa enzima impede a síntese do hormônio cortisol, produzido nas glândulas supra-renais. Numa reação em cadeia, a falta desse hormônio aciona urna glândula da base do cérebro, a hipófise, que intensifica a produção de outro hormônio, o hipofisário corticotrófico, estimulante da atividade das supra-renais. Em resposta a esseestímulo, as supra-renais aumentam de tamanho e produzem mais hormônio masculino, a testosterona. Nos fetos do sexo feminino, o excesso desse hormônio provoca virilização: as mulheres nascem com um clitóris hipertrofiado, que lembra um pênis, e uma bolsa escrotal sem testículos, que recobre completamente a vagina. Mas o aparelho reprodutor interno e os cromossomos são de uma mulher, caracterizando um caso clássico de pseudohermafroditismo feminino. "Às vezes, mesmo em berçários de maternidades grandes, esse tipo de bebê é registrado como menino", diz Berenice. Sem o auxilio de exames hormonais e da determinação dos cromossomos sexuais,médicos se confundem e imaginam que se trata de um bebê do sexo masculino eujos testículos só irão descer para a bolsa escrotal mais tarde. Nos fetos do sexo masculino,a mutação dessegene fazcom que haja apenas o crescimento anormal das supra-renais, sem alterações nos genitais externos. Duas pesquisadoras dessa equipe, Tânia Bachega e Ana Elisa Billerbeck, descobriram, nos últimos quatro anos, cinco novas mutações do CYP21A2, como parte dos resultados de dois projetos temáticos apoiados pela FAPESP. 42 . AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
Desse modo, a análise de mutações genéticas ligadas a doenças sexuais integrou-se ao diagnóstico pré-natal, permitindo assim às mulheres que já tiveram uma filha pseudo-hermafrodita evitar que o problema se repita. No terceiro mês de gestação, a futura mãe submete-se a um exame de um fragmento da placenta que revelará se o embrião é do sexo feminino e se apresenta alguma alteração no gene CYP21A2. Se o teste indicar mutações, a equipe de Berenice sabe como evitar as conseqüências: a mãe deverá tomar um medicamento, o corticóide sintético dexametasona, que evita que os órgãos sexuais da menina se apresentem como os de um menino. Chegando ao feto por meio da corrente sangüínea, a dexametasona ingerida pela mãe inibe a produção excessiva do hormônio adenocorticotrófico (ACTH), que impede a produção exagerada do hormônio sexual masculino. Nesse caso, a equipe brasileira desenvolveu os estudos moleculares e atestou no Brasil a eficácia desse tratamento, criado em meados dos anos 70 na França. Puberdade precoce - A identidade sexual se cristaliza por volta dos 2 anos de idade e, depois disso, é muito complicado mudá-Ia. Por essa razão, lembra Berenice, identificar precocemente a disfunção é essencial para evitar traumas nos pais e na criança. Mas, lamentavelmente, o diagnóstico tardio ainda ocorre com freqüência no Brasil. Metade dos casos de ambigüidade genital que chegam a esse ambulatório do HC é de pessoas adultas. Nesses casos, definir o sexo torna-se uma questão que não se resume à genética. Pode estar escrito no núcleo de cada célula se um indivíduo é uma mulher, se apresenta dois cromossomos X, mas o que fazer se foi criado como homem e desenvolveu uma identidade masculina? A equipe de Berenice enfrentou um caso desse tipo em junho, quando apareceu um hermafrodita verdadeiro, de 20 anos, com genitais masculinos e femininos. Havia sido registrado como mulher, mas criado como homem. Ele (o nome não pode ser divulgado, em respeito à privacidade) chegou ao HC depois de cumprir um calvário de constrangimentos públicos. Nascido no interior de Pernambuco, veio a São Paulo em
busca de tratamento e foi parar num desses programas de televisão vespertinos que tratam anomalias como atração de circo. O programa lhe ofereceu tratamento médico, mas ele deveria dizer para a namorada, ao vivo, que era hermafrodita - ela não sabia. Aproveitando a exposição no programa, um médico disse que se disporia a tratá-lo, de graça. A violência moral só terminou quando o rapaz fez os exames para iniciar o tratamento e outro médico - um herói anônimo - encaminhou-o para o Hospital das Clínicas. A análise cromossômica, embora apresentasse genitais ambíguos, identificou dois cromossomos X. Portanto, geneticamente era do sexo feminino. Por opção própria, como apresentava identidade masculina, submeteu-se à retirada do útero, ovários e vagina e à chamada masculinização (a uretra foi transposta para a glande) dos genitais externos. om freqüência, as pesquisas desse grupo da USP desvendam a origem de doenças raras ou que se confundem com outras, desse modo incentivando a busca de novos tratamentos. Por exemplo, um estudo conduzido pela médica Sorahia Domenice, publicado em setembro de 2001 no [ournal of Clinical Endocrinology and Metabolism, mostrou que uma mutação já conhecida do gene DAX1 produzia manifestações mais amplas do que se acreditava. Os principais sintomas da doença eram o funcionamento precário da supra-renal e o atraso da puberdade. A equipe do HC descreveu há dois anos outra mutação no gene DAX1, encontrada em um menino, que, em vez do atraso, provocou puberdade precoce, com o surgimento de caracteres sexuais antes dos 3 anos de idade. Em um estudo de grande repercussão publicado em 1996no New England [ournal of Medicine, os pesquisadores do HC descreveram um defeito genético no receptor do hormônio luteinizante (ou LH, na sigla em inglês), produzido pela hipófise, que estimula a fabricação de testosterona pelos testículos. Com a mutação no receptor do LH, o organismo não produz testosterona em quantidades adequadas e os fetos, embora apresentassem cromossomos
C
por vários mecanismos diferentes. Até masculinos, nasciam com genitália feentão, só se conhecia uma causa da mominina ou ambígua. Um ano depois de léstia: alguns pessoas produziam cortipesquisadores do Hospital Universisol em excesso, devido, por exemplo, ao tário de Nijmegen, da Holanda, terem peptídeo chamado GIP, secreta do pelo publicado a primeira descrição de uma pâncreas em resposta à chegada de alimutação no receptor de LH causando mentos ao aparelho digestivo. pseudo-herrnafroditismo masculino, Outra especialidade do grupo do o estudo brasileiro mostrou que o esHC é o estudo de doenças endocrinolópectro dessa anomalia era maior, ao gicas que levam à baixa descrever um menino estatura, que afeta 3% da com micropênis e um população. Nessa área, efeito até então descoum trabalho de grande nhecido: as irmãs dos Há crianças repercussão, devido à sua portadores de pseudobaixas que aplicabilidade, foi feito no hermafroditismo masculino, devido à mutação do tomam hormônio ano passado pelo doutoreceptor do LH, são inférrando Alexander Jorge, de crescimento que mostrou a fragilidade teis, com menstruação irdo teste mais usado no regular ou ausente. sem precisar diagnóstico de casos em A médica Regina Marque as aplicações do hortin comprovou este ano a mônio de crescimento origem genética de outra parecem não funcionar moléstia rara, o excesso de para corrigir a baixa estatura. Jorge veriaromatase, uma enzima que transforficou que não havia reprodutibilidade: ma testosterona em estrógeno, o hordois testes com amostras idênticas não mônio feminino. Essa disfunção geapresentam os mesmos resultados. nética resulta do excesso de produção Este ano, em outra pesquisa, Eveline de estrógeno e faz os meninos apreGadelha, ex-aluna de Berenice e hoje sentarem micropênis e desenvolverem professora na Universidade Federal do seios, enquanto as meninas sofrem auCeará, avaliou a precisão dos exames mento do útero e crescimento exageque embasavam o diagnóstico de defirado dos seios. Em todos os casos, a ciência de hormônio de crescimento e síndrome provoca baixa estatura. O concluiu: o diagnóstico laboratorial, estudo que descreve a quinta família muitas vezes, pode estar equivocado. As encontrada no mundo com essa doenpesquisadoras, que publicaram os reça - e a primeira no Brasil - saiu em sultados deste estudo em maio na Hotjunho no [ournal of Clinical Endocrimone Research, avaliaram 30 crianças nology and Metabolism. normais e 26 com deficiência de hormônio de crescimento para definir o Baixa estatura- Um mês antes, Maria ponto de corte para os métodos mais Cândida Fragoso publicou nessa mesmodernos: a deficiência hormonal só ma revista uma pesquisa sobre a identifipode ser realmente atestada quando a cação de duas mutações genéticas que concentração de hormônio está abaixo podem causar a síndrome de Cushing ACTH-independente, doença caracterizada pelo aparecimento nas supra-rePROJETO nais de nódulos que produzem em demasia o hormônio cortisol, regulador Diagnóstico Molecular de Distúrbios do metabolismo do açúcar e da pressão da Diferenciação Sexual arterial. O excesso desse hormônio na e Diagnóstico Molecular das Alterações do Eixo GHRH, GH, IGFl circulação provoca uma série de efeitos colaterais, como obesidade localizada MODALIDADE no centro do corpo, a face em forma de Projeto temático lua cheia, atrofia da pele e hipertensão arterial. Segundo Berenice, a descoberCOORDENADORES BERENICE BILHARINHO DE MENDONÇA ta das mutações genéticas não altera os e Ivo JORGE PRADO ARNHOLD - USP rumos do tratamento - que consiste na retirada das supra-renais seguida de reINVESTIMENTO posição hormonal-, mas ajuda a entenR$ 648.094,20 e R$ 1.565.450,00 der essa doença, que pode ser causada
o
44 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
de 3,3 nanogramas por mililitro de soro sangüíneo. Segundo Berenice, os médicos ainda utilizam o corte de 7 nanogramas, válido para métodos de dosagem mais antigos, com sensibilidade menor. "Há crianças com diagnóstico de baixa estatura que tomam horrnônio sem nenhum problema endocrinológico", alerta a pesquisadora. "São mais baixas que a média devido à herança genética dos pais:' Para meninos ou meninas de 4 ou 5 anos, por exemplo, deficiência de hormônio de crescimento significa ter 7 a 8 centímetros abaixo da média da altura esperada. Luciani Carvalho, aluna de doutorado de Ivo Arnhold, do mesmo laboratório, descobriu recentemente uma nova mutação no HESX1, gene que interfere no desenvolvimento da glândula hipófise. O defeito já era associado a uma manifestação gravíssima, a displasia septo-ótica: as vítimas nascem cegas e com alterações no sistema nervoso central. A contribuição desse estudo, a ser publicado no [ournal Clinical Investigation, foi a descoberta de uma manifestação mais branda da mesma doença, quando o erro ocorre numa região diferente do gene. O caso que deu base à pesquisa pioneira é um exemplo típico da rotina do HC. Em 1985, a equipe de Berenice atendeu uma garotinha de 5 anos vinda de Recife com deficiência de crescimento - tinha 87 centímetros, 20 a menos do que deveria. Era uma deficiência grave na produção de hormônios, que pôde ser tratada com reposição. Para crescer, a menina tomou hormônio de crescimento e hoje, aos 23 anos, alcançou 1,65 metro de altura. Desenvolveu o útero e seios e menstrua regularmente. Os pesquisadores descobriram agora na amostra de DNA dessa menina a origem exata da doença: uma mutação no gene HESXl. Sua versão alterada só se expressa quando é herdada tanto do pai quanto da mãe, o que raramente ocorre, mas se deu nesse caso porque a menina era fruto de um casamento consangüíneo - os pais são primos. Antes dessa descoberta, seu caso se perdia em meio a centenas de outros. Na última década, a equipe de Berenice acumulou cerca de 300 amostras de DNA de brasileiros com baixa estatura de origem desconhecida e sabe que tem em mãos um tesouro genético que esconde histórias como a da garotinha do Recife. •
• CIÊNCIA
MEDICINA
Verdade oeuIta Autópsia aponta erros na identificação de causa de mortes
r---~------~--------~------------~----~~ Ana Lúcia, esses números são
xames caros e modernos nem sempre são sinônimo de diagnóstico preciso. Um estudo coordenado pela oncologista Ana Lúcia Coradazzi, do Hospital Amaral Carvalho, de Iaú, interior paulista, indica que a identificação correta de uma doença ainda depende mais da habilidade do médico em investigar as queixas do paciente e fazer um bom exame físico do que de novos testes de laboratório e equipamentos como os de ultra-som e tomografia, que produzem imagens dos órgãos internos do corpo. O objetivo do trabalho, publicado no Brazilian Iournal af Medical and Bialagical Research e idealizado pelo patologista Mário Rubens Montenegro, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), era verificarse os novos métodos de diagnóstico poderiam substituir os exames feitos Obra pelos médicos. Parece que não, e os resultados conferem com uma antiga suspeita de Montenegro, um dos primeiros professores da Faculdade de Medicina da Unesp em Botucatu. A seu ver, os médicos atribuem importância excessiva à tecnologia e um menor valor aos métodos ainda hoje considerados mais acurados, como o exame clínico e a análise da história do paciente. Em parceria com o cardiologista Antônio Luís da Costa Morganti, da Universidade de São Paulo, os pesquisadores confrontaram o histórico médico de 252 pacientes atendidos no
E
z
de
semelhantes aos de outros hospitais do Brasil ou de países nos quais são comuns os exames mais refinados. O nível de acerto dos médicos diminuiu mais ainda na hora de identificar a causa terminal da morte, o problema agudo que provoca o óbito. Em 40% desses casos, em geral atendidos por plantonistas, que não haviam acompanhado a evolução da doença, o resultado da autópsia foi diferente do diagnóstico dado pelo médico. E em um de cada quatro casos a causa imediata da morte só foi determinada na autópsia por esse motivo, é considerada essencialpara a obtenção de dados confiáveis sobre a freqüência das doenças e para o controle de qualidade dos serviços médicos. Outro dado que chamou a atenção: muitas vezes os médi1803 de Cajetano Bosa: exames a céu aberto cos não registraram no prontuário as doenças secundárias, hospital da Unesp com as informações que não provocaram diretamente a obtidas no exame pós-morte. Foram morte, mas afetaram a saúde dos paanalisadas 96 autópsias feitas de 1975 a cientes, como a obstrução de vasos san1982 e outras 156 realizadas de 1992 a güíneos ou mesmo câncer. "Testes es1996, após a inauguração do setor de pecíficos e de alta sensibilidade são tomografia do hospital. necessários, mas não substituem a prática clínica para o diagnóstico correto A autópsia confirmou o diagnóstide uma doença", conclui Ana Lúcia. co das causas básicas de morte em 77% "Sem a história clínica e o exame físidos casos. Os outros 23% é que chamaram a atenção - o diagnóstico estava co bem-feitos, o médico pode ser inerrado em quase metade deles e a cauduzido a pedir exames desnecessários e a interpretá-los de maneira incorresa de morte do restante, que não constava do prontuário médico, só foi deta, encarecendo o diagnóstico sem torná-lo mais preciso." • terminada por meio da autópsia. Para PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 45
·CIÊNCIA
IMUNOLOGIA
Alívio
multiplicado Substâncias extraídas do camapu são 30 vezes mais potentes que os antiinflamatórios hoje conhecidos
A planta promissora, cultivada em laboratório, e o fruto: regulando as defesas do organismo
ara um olhar menos atento, o camapu não passa de mato. Também chamado de balãozinho, é um arbusto de 1 metro, caule fino, folhas ovaladas e delicadas flores amarelas, que cresce em pastagens, plantações e à beira de estradas. Abundante em regiões quentes, essa planta é usada há tempos por povos da Ásia, da África e da América Latina em chás e infusões contra asma, hepatite, malária e reumatismo. Agora, pesquisadores da Bahia e do Rio de Janeiro constataram que ao menos três moléculas extraídas das folhas e do caule desse arbusto ajudam a regular o sistema de defesa do organismo e são até 30 vezes mais potentes que alguns dos medicamentos mais usados para aliviar inflamações, como atestam em um artigo publicado em janeiro no European [ournal of Pharmacology. Mas essas moléculas, as fisalinas, quimicamente classificadas como este-
P
46 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
róides, ainda têm de passar por outros experimentos até se concluir se podem realmente substituir fármacos como a dexometasona e a hidrocortisona, que, . em excesso, podem prejudicar a produção de hormônios sexuais e de outros, essenciais para o desenvolvimento do corpo. "São esses testes que indicarão se as fisalinas podem ser usadas com segurança em seres humanos': explica a imunologista Milena Soares, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em Salvador, coordenadora dessa pesquisa, que faz parte do Instituto do Milênio do SemiÁrido, programa do Ministério da Ciência e Tecnologia destinado a investigar o potencial farmacológico de plantas nativas ou exclusivas do norte de Minas Gerais até o Piauí. Identificadas no início dos anos 70, as moléculas extraídas do camapu foram chamadas de fisalinas em referência ao nome científico da planta, Physalis angula ta, chamada de balãozinho por dar
frutos semelhantes a tomatinhos, encapsulados em folhas que formam uma espécie de bexiga (em grego, Physalis significa bexiga). Mais do que o amplo uso popular dessa planta, o que mais intrigava Milena era a estrutura molecular das fisalinas, bastante semelhante à dos glicocorticóides, hormônios produzidos pelo organismo que regulam a atividade do sistema imune e servem de base para a produção industrial da dexometasona e a hidrocortisona. Uma das dúvidas era saber se as fisalinas também agiam como os glicocorticóides e inibiam a atividade das células de defesa.
Macrófagos sob controle - Milena e sua equipe decidiram tirar a prova dos nove e verificar se as proteínas do camapu eram tão eficientes quanto os glicocorticóides. Em uma série de experimentos, feitos em colaboração com um grupo da Fiocruz no Rio, a pesquisadora aplicou as fisalinas dos tipos B, F e
G - em doses que variaram de 0,01 micrograma por mililitro a 2 microgramas por mililitro - em tubos de ensaio com uma mistura rica em um dos principais tipos de células do sistema imune, os macrófagos. Quando ativados, os macrófagos chegam ao local da inflamação e liberam óxido nítrico, um mensageiro químico que recruta outras células de defesa para eliminar as células danificadas ou combater os microrganismos invasores. Em geral benéfica, essa ativação se torna nociva quando em excesso. Os resultados surpreenderam. Nas dosagens mais elevadas, uma das fisalinas, a B, reduziu em 90% a produção de óxido nítrico - uma eficiência 30 vezes superior à de doses equivalentes de dexometasona. Análises mais detalhadas revelaram que a ação da fisa-
lina B não se restringe ao óxido nítrico. O esteróide do camapu, como se comprovou nesse trabalho, impede a produção de outros dois mensageiros químicos, as interleucinas 6 e 12. Doses altas de fisalina B diminuíram em 60% os níveis de interleucina 6 e em 90% os de interleucina 12. Reduziram ainda em um terço a fabricação do fator de necrose tumoral alfa. Uma das proteínas liberadas pelos macrófagos, o fator de necrose tumoral, auxilia o sistema imune a eliminar microrganismos estranhos. Em taxas elevadas, porém, diminui a pressão sangüínea e a oxigenação dos tecidos, uma situa-
ção conhecida como choque endotóxico, que pode levar à morte. Ultrapassada a etapa dos tubos de ensaio, os pesquisadores da Fiocruz testaram o efeito das fisalinas em camundongos, uma vez que os resultados no organismo podem ser muito diferentes. Aplicaram nos roedores doses letais de uma molécula formada por açúcar e gordura - um lipopolissacarídeo - da membrana de bactérias que aciona o sistema imunológico e estimula a produção intensa do fator de necrose tumoral alfa. Em seguida, deram doses variadas das três fisalinas a grupos separados de camundongos. Todos os animais apresentaram os sinais de um choque endotóxico, com pêlos eriçados e tremores, e quase não conseguiam se movimentar. Os sintomas dos que receberam fisalinas, porém, foram muito mais brandos. E, o mais importante: todos os camundongos tratados com doses elevadas (1 miligrama) dessas moléculas do camapu sobreviveram, enquanto os animais não-tratados morreram. "Esse teste mostrou que as fisalinas têm uma ação potente o suficiente para impedir a morte dos animais", comenta Milena. Num experimento complementar, a equipe da Bahia constatou ainda que as fisalinas, por um mecanismo ainda desconhecido, bloqueiam os mensageiros químicos do organismo de um modo diferente do da dexometasona. Os pesquisadores deram a grupos distintos de camundongos proteínas do camapu e dexometasona. Em seguida, aplicaram um composto que funciona como um antídoto contra a dexometasona, que, como esperado, cortou o efeito do glicocorticóide, mas - eis agora o inesperado - não apresentou ação nenhuma sobre as fisalinas. Enquanto aguarda os resultados dos testes de segurança, Milena pensa adiante e planeja um passo mais ousado: investigar se esses compostos seriam potentes o suficiente para controlar uma resposta imune muito mais exacerbada, como a que se observa em casos de transplantes de órgãos. • PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 47
CIÊNCIA MEDICINA
VETERINÁRIA
Vítimas
do tempo Pesquisadores aperfeiçoam tratamentos de câncer em cães, cada vez mais longevos
ais bem tratados do que nunca, com rações especiais, vacinas, fisioterapia e até acompanhamento psicológico, os cães estão vivendo mais. Pode ser bom para seus donos, mas a longevidade traz um problema: amplia o risco de câncer, hoje visto como uma das principais causas de morte entre os animais domésticos, que mata mais da metade dos cachorros e um terço dos gatos criados nos lares norte-americanos. É um problema também no Brasil, onde vivem cerca de 28 milhões de cães (quase metade da população canina dos Estados Unidos) e 12 milhões de gatos, considerados idosos - e mais sujeitos ao câncer - após os 7 ou 8 anos de idade. Atentos a essa situação, pesquisadores da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias (FCAV) da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Iaboticabal, criam alternativas para, de acordo com a tendência mundial, tratar e se possível curar os animais domésticos acometidos pela doença, para os quais há alguns anos só havia uma saída: eram sacrificados. Em vez da amputação, procedimento padrão em caso de osteossarcoma, tumor responsável por cerca de 85% das ocorrências de câncer ósseo canino, a equipe da Unesp demonstra a viabilidade, em muitos casos, do implante de ossos, cuja eficiência tende a aumentar com o uso de novos materiais. Em um estudo publi48 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
cado em março na Acta Cirúrgica Brasileira, um grupo de seis veterinários da Unesp atesta a possibilidade de uso no Brasil da resina poliuretana de mamona como cimento para o implante de fragmentos ósseos retirados de doadores saudáveis e conservados em glicerina à temperatura ambiente. Esse material substitui outra resina, o polimetil metacrilato, que libera gases tóxicos, desprende calor (chega a 70° Celsius) e pode provocar arritmias cardíacas. Cimento de ossos - Os resultados se apóiam em um experimento com seis cães (quatro machos e duas fêmeas) setn raça definida, em cujas tíbias (o osso equivalente à canela da perna humana) se fez o implante. Cinco dos seis animais tratados apoiaram a pata operada no primeiro dia após o implante e corriam normalmente em média após um mês e meio. Nesse estudo, a resina de mamona - uma massa esbranquiçada usada para rechear o enxerto, no lugar da medula óssea retirada - deu maior resistência na fixação da placa metálica que faz o implante aderir ao osso original. E não desencadeou processos infecciosos, um resultado atribuído ao bom estado de saúde dos animais. Em outros estudos em que se utilizaram os mesmos procedimentos cirúrgicos, exceto o cimento ósseo, adotado experimentalmente há cerca de seis anos nos Estados Unidos, um terço dos animais tratados, em média, apresentou infecção. No experimento feito na Unesp também não
se notou a absorção da resina nem sua substituição por tecido ósseo novo. Por atuar como bactericida, dispensou o uso de antibióticos, imprescindíveis com a resina anterior, o polimetil metacrilato. Tais evidências representam indicadores positivos para que a resina de mamona seja usada como cimento ósseo em uma escala mais ampla, no futuro, pelas clínicas veterinárias. Mas, lembra Carlos Roberto Daleck, da equipe da Unesp, o implante é uma alternativa à amputação somente se restar pelo menos metade do osso - o osteossarcoma, mais comum nas raças de maior porte, como o são-bernardo ou o doberman, é um tumor bastante agressivo, que muitas vezes leva à desintegração dos ossos. A preservação dos ossos atingidos leva em conta também o bem-estar dos proprietários dos animais. "Há casos em que seria mais simples amputar o membro afetado e o animal deixaria a clínica andando tranqüilamente sobre três patas': diz Daleck, "mas a idéia da mutilação costuma tirar o sono do dono do cão': Em outro estudo recente, a ser publicado na Acta Cirúrgica, feito com dois grupos de seis cães, a equipe da Unesp de Jaboticabal mostrou que um medicamento chamado furosemida pode atenuar os efeitos indesejados, sobretudo as alterações nas funções renais, causados pela cisplatina, quimioterápico adotado para tratamento de câncer nos ossos, na bexiga ou nos testículos de cães, por exemplo. Outro trabalho, pu-
blicado no ano passado no Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, reitera a importância do tratamento precoce ao detalhar as possibilidades de diferenciar,por meio do exame no microscópio eletrônico de transmissão, as alterações que ocorrem em um tipo de célula da pele, os mastócitos: à medida que o tumor evolui, o núcleo dessas células ganha volume, surgem grânulos no citoplasma e as rugosidades da membrana se tornam mais evidentes. Com base nesses parâmetros, a equipe da Unesp curou 60% dos 108 cães atendidos nos últimos quatro anos com mastocitoma, o tipo de câncer de pele mais comum, que afeta especialmente buldogues e boxers a partir dos 8,5 anos de idade. É muito difícil saber com precisão quais as raças mais afetadas e os tipos de câncer mais comuns entre os cães no Brasil. Um levantamento publicado na
o PROJETO Químíoterapia com Cisplatína em Cães MOOALIDADE
Linha regular de auxílio à pesquisa COORDENADOR CARLOS
ROBERTO DALECK
-
FCAV/Unesp INVESTIMENTO
R$ 42.103,55
Archives of Veterinary Science, com base em 333 cães atendidos no hospital veterinário da Universidade Federal do Paraná (UFPR) entre 1998e 2002, indicou que as fêmeas são mais suscetíveis que os machos, numa proporção de dois para um. Predomina o tumor de
mama, encontrado em quase metade das fêmeas (45,6%), com um agravante: na maioria dos casos (68%), tratava-se de lesões malignas. De acordo com esse estudo, coordenado por Suely Rodaski, essa predominância pode estar associada ao uso de hormônios como método contraceptivo e à pouca atenção dada à castração precoce - a retirada dos ovários e do útero antes do primeiro cio reduz a quase zero o risco de surgimento de câncer de mama. A equipe do Paraná verificou também que, entre os cães com raça definida, o câncer é mais freqüente no pastor alemão (12,61 % dos casos atendidos), poodle (11,41%) e boxer (10,81%), com maior incidência entre os animais de 6 a 12 anos. Quando submetidos a cirurgia e tratamento quimioterápico, ganharam uma sobrevida de em média 19 meses. •
astor-alemão: uma das raças mais suscetfveis ao câncer
o
Biblioteca de Revistas Científicas disponível na Internet www.scielo.org
Notícias • Saúde
Terceira idade no Brasil Os Cadernos de Saúde Pública trazem em sua edição de junho um especial sobre a terceira idade. O motivo é expresso por Maria Fernanda Lima, do Centro de Pesquisas René Rachou, e por Renato Veras, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), no editorial. "Temos de encontrar os meios para incorporar os idosos em nossa sociedade, mudar conceitos já enraizados e utilizar novas tecnologias, com inovação e sabedoria, a fim de alcançar de forma justa e democrática a eqüidade na distribuição dos serviços e facilidades para o grupo populacional que mais cresce em nosso país", dizem. A publicação da Escola Nacional de Saúde Pública, da Fundação Oswaldo Cruz, revela que a cada ano cerca de 650 mil novos idosos são incorporados à população brasileira. O número de idosos com mais de 60 anos de idade passou de 3 milhões em 1960 para 7 milhões em 1975 e 14 milhões em 2002, registrando um aumento de 500% em 40 anos. A estimativa é que esse número alcance 32 milhões de pessoas em 2020. A edição traz, em artigos, opiniões e resumos de estudos recentes, temas como políticas de saúde para o idoso e uso de medicamentos, cuidados familiares, violência contra o idoso, desigualdades sociais e abordagem antropológica do envelhecimento. CADERNOS NEIRO -)U
DE SAODE POBLICA - VOL. .
19 -
N°
3-
RIo DE JA-
2003
www.seielo.brlseielo
.ph p?seri
ptesciIssuetocêpt
d =0102-
311 X20030003&lng=en&nrm=iso
• Antropologia
Estudo das religiões Tomando como ponto de partida a bibliografia produzida sobre o assunto, o artigo Religião, Ciência ou Auto-ajuda? Trajetos do Espiritismo no Brasil, de Sandra Iacqueline Stoll, professora do Departamento de Antropologia da Universidade Federal do Paraná, apresenta as relações estabeleci das entre espiritismo e catolicismo
54 . AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
na medida em que, segundo ela, essas religiões precisaram adotar novas linguagens como estratégia de inovação de suas doutrinas. Para a autora, o espiritismo "definiu sua identidade elegendo como sinais elementos do universo católico e isso significa que sua relação com-a religião dominante no país não se resumiu simplesmente ao endosso de certas idéias ou práticas rituais". Sandra defende que a presença do catolicismo no universo espírita brasileiro decorre da incorporação de um dos substratos fundamentais da cultura religiosa ocidental: a noção cristã de santidade. A pesquisa publica da na Revista de Antropologia se baseia em estudos de caso, numa discussão que se constitui em torno de três personagens: Chico Xavier, Waldo Vieira e Luiz Antonio Gasparetto, os quais sintetizam, por meio de seus percursos pessoais, diferentes formas de expressão da tradição espírita. REVISTA
DE ANTROPOLOGIA
www.seielo.brlse
- VOL.
45 -
°2 -
2002
i e Io. Ph P?se ri pt=se i_a rtte xt&p id = S00 34-
77012002000200003&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt
• Medicina
Na dose exata Se praticarmos exercícios físicos muito intensos, corremos o risco de sofrer algum tipo de dano tecidual, o aumento dá produção de hormônios do estresse e ainda alterações do número e função de diversas células do sistema imune no sangue circulante. É o que mostra o ensaio Effects ofThree Different Types of Exercise on Blood Leukocyte Count During and Following Exercise, escrito por Valéria Maria Natale, do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, e por cinco pesquisadores canadenses e publicado no Sao Paulo Medical [ournal: Depois de realizar quatro diferentes tipos de experimentos com oito indivíduos do sexo masculino, na Defence and Civil Institute of Environmental Medieine, em Ontário, Canadá, os autores concluíram que existem evidências de que a prática de exercícios em excesso poderia facilmente ser um método que causa quantidades variadas de trauma muscular, o que, por exemplo, apesar de prejudicial, serviria como um modelo experimental para o estudo de respostas inflamatórias do corpo. SAO PAULO MEDICAL LO -
JOURNAL - VOL.
121 - N° 1 - SÃO
2003
www.seielo.brlseielo.
php?seript=sei_arttext&pid=S1516-
31802003000100003&lng=pt&nrm=iso&tlng=en
PAU-
• Zoologia
• Agricultura
Criação de tartarugas
Colheita para os nervos
Filhotes da tartaruga-da-amazônia (Podocnemis expansa) foram acompanhados em oito criadouros comerciais licenciados pelo Ibama, no município de Diorama (GO), para que os parâmetros de rendimento e a composição química de suas carcaças fossem avaliados. O resultado do estudo pode ser conhecido no artigo Rendimento e Composição Quí-
mica de Carcaça da Tartaruga-daamazônia em Sistema Comercial, publicado na Revista Brasileira de Zootecnia. Segundo os autores, além de desempenhar papel importante como recurso natural, a espécie em questão teve nos índios seus primeiros consumidores. O costume indígena foi logo estendido às populações ribeirinhas e tornou-se um hábito alimentar. A caça da tartaruga-da-amazônia, que antes era apenas para consumo próprio, passou a ser dividida entre a família e o comércio nas cidades. REVISTA
BRASILEIRA
DE ZOOTECNIA
- VOL. 32 - N° 1 - VI-
Estudar a reprodução vegetativa da Lippia alba e fornecer subsídios para a escolha de uma forma mais eficiente de produção de suas mudas foi o desafio de Luiz Antônio Biasi e Giampalolo Costa, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), cujo estudo está no artigo Propagação Vegetativa de Lippia alba, publicado em Ciência Rural. Conhecida por diversos nomes populares, do tipo ervacidreira-do-campo, alecrim selvagem, erva-cidreira-brasileira ou cidró, a L. alba é uma planta medicinal nativa da América do Sul. Como tem propriedade calmante, é utilizada em substituição à espécie Melissa officinalis na forma de chás, compressas, banhos e extratos alcoólicos. No estudo, as estacas medianas com quatro folhas apresentaram a maior taxa de adaptação ao solo, ao contrário das estacas sem folhas. As estacas com duas folhas também apresentaram bom crescimento, facilidade de manuseio e o dobro do rendimento no preparo das estacas em relação às com quatro folhas. "Diferentes tipos de mudas foram analisados e praticamente todas as espécies apresentaram altas taxas de enraizamento, comprovando que a L. alba é uma espécie de fácil adaptação com grande facilidade de formação de raizes" afirmam os pesquisadores.
ÇOSA - jAN.!FEV. 2003 CIÊNCIA
www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S151635982003000100001
RURAL
- VOL. 33 - NO 3 - SANTA MARIA
- MAIO/
jUN.2003
&Ing=pt&nrm=iso&tlng=pt www.scielo.br/scielo
.ph p?scri ptescjarttextêpld
=SO 103-
84782003000300010&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt
• Sociologia
Emoção ou amizade
• Psiquiatria
Qual o verdadeiro significado da palavra "amizade" nos dias de hoje? Essa é a questão proposta no artigo de Claudia Barcellos Rezende, Mágoas de Amizade: um Ensaio em Antropologia das Emoções, onde a pesquisadora destaca os diversos lugares que o elemento emotivo pode ocupar na amizade. Num primeiro momento, os estudos priorizaram as categorias de emoções entre as culturas, verificando um movimento no sentido de tomar os discursos emotivos como práticas situadas em jogos de relações sociais e negociações de poder. Com isso, a emoção deixa de ser vista como experiência interna, subjetiva, para ser analisada como prática discursiva com efeitos externos. Para a pesquisadora, a palavra amizade, em português, refere-se tanto a um sentimento quanto a uma relação específica. Para Claudia, professora do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), a amizade é vista em geral como uma relação afetiva e voluntária, que envolve práticas de sociabilidade, trocas íntimas e ajuda mútua, necessitando de algum grau de equivalência ou igualdade entre as partes envolvidas.
Depressão em questão Elaborar diagnósticos e facilitar o tratamento de transtornos de humor em diferentes instituições e localidades fo'ram os objetivos do trabalho de Irismar Reis de Oliveira, da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia, e Pedro Antônio Prado Lima, do Instituto de Pesquisas Biomédicas da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, cujos resultados estão no artigo Uti-
lidades e Limitações do Uso de Diretrizes no Tratamento da Depressão, da Revista Brasileira de Psiquiatria. Os autores revisaram 45 diretrizes clínicas sobre depressão feitas no Reino Unido, que servem de recomendação para que os clínicos identifiquem casos de depressão maior, diagnóstico que prediz maior taxa de respostas aos antidepressivos, contribuindo para que o tratamento seja feito em dose adequada, por tempo adequado. Segundo o artigo, há um grande número de pessoas utilizando antidepressivos sem conhecimento, o que tem acarretado piora do quadro clínico e do prognóstico desses pacientes. REVISTA
MANA
- VOL. 8 - N° 2 - RIO DE JANEIRO - OUTUBRO 2002
www.scielo.br/scielo
.php?scri
ptesciarttextêp
93132002000200003&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt
id=S01 04-
BRASILEIRA
DE PSIQUIATRIA
- VOL. 25 - N° 2 -
SÃo
PAULO - jUN. 2003
www.scielo.br/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S1516-
44462003000200002&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt
PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 55
ITECNOLOGIA
L I N H A ~,_E PRÓ D U ç Ã O
•
M U N DO
Assento inteligente "entrega" terrorista A crescente preocupação com segurança nos vôos comerciais levou o laboratório britânico Qinetiq, em Hampshire, a trabalhar no desenvolvimento de um assento de avião capaz de avisar o piloto de que o passageiro com um comportamento excessivamente nervoso pode ser um potencial terrorista (NewScientist, 14 de junho). Se o projeto der certo, esse banco com seus sensores ocultos, ligados a um monitor na cabine, além de detectar possíveis terroristas ou seqüestradores, tem tudo
• Pequenos tubos em silício e carbono Pesquisadores da Universidade da Califórnia, em Berkeley, descobriram um novo meio de produzir nanofios de silício e nanotubos de carbono no interior das microestruturas em temperatura ambiente (Applied Physics Letters, 24 de junho). Esses nanomateriais são filamentos ultramicroscópicos que prometem revolucionar a ciência nanotecnológica, permitindo a fabricação de aparelhos que vão de ultra-sensíveis detectores de vírus no organismo humano a sofisticados sensores óptico-eletrônicos. O processo de produção é feito a temperaturas que variam de 6000 C a 1.0000 C. Em uma pastilha de silício de 1 centímetro quadrado coberta com fina camada metálica provoca-se uma reação quí-
para, quem sabe, propiciar um controle discreto dos passageiros. Na cabine, por exemplo, uma luz se acen-
mica, gerando bilhões de precipitações de nanotubos ou nanofios. A etapa mais difícil é manipulá-los e montá-los em uma placa de circuito eletrônico. Esse desafio foi vencido com a criação dos nano materiais diretamente nos circuitos das placas. E o problema passou a ser outro: como produzi-los a altas temperaturas sem danificar
Corrente elétrica
56 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
dirigida
deria no painel quando um passageiro estivesse sentado há muito tempo na mesma posição, com o risco de ter
sensíveis componentes microeletrônicos a uma distância de um décimo da espessura de um fio de cabelo. "Como na resistência de uma torradeira", responde Ongi Englander, coordenador da pesquisa. "A corrente passa por dentro do componente para gerar calor:' Dirigindo a corrente para os locais em que queriam criar os
para produzir nanotubos
uma trombose, alertando a equipe de vôo. Já o saracoteio além da conta poderia acionar outra luz - e os comissários ficariam de olho para avaliar se essa ansiedade significa apenas medo de avião ou algo mais perigoso. No futuro, a combinação dos sensores com um software de análise da temperatura do corpo ou umidade da pele poderá até fazer esse julgamento pela tripulação. O assento inteligente faz parte de uma série de projetos para melhorar o atendimento ao passageiro. •
nanotubos ou nanofios, os pesquisadores conseguiram aquecer uma área a 7000 C, enquanto ao redor tudo se mantinha em confortáveis 250 C. •
• Conversão de hidrogênio no carro - jointventure entre empresas dos
A HydrogenSource
grupos Shell e United Technologies - anunciou nos Estados Unidos a invenção de um processador, também chamado de reformador, para converter gasolina em hidrogênio dentro do próprio veículo. O sistema, que tem capacidade para alimentar células a combustível de 50 quilowatts do tipo PEM, sigla do nome inglês para membrana para a troca de prótons, foi projetado para processar 78 litros de gasolina e acomoda-se facilmente ao
chassi de um carro. Outra novidade é que leva menos de quatro segundos em temperatura ambiente para produzir hidrogênio de qualidade - o que antes não ocorria em menos de 30 segundos. "Estamos dando um grande passo para tornar os veículos a célula de combustível uma opção compacta e de rápido funcionamento, o que, até pouco tempo atrás, parecia impossível", comemora Phil Snaith, presidente da HydrogenSource. Um processador a bordo permitirá, por exemplo, uma passagem mais suave da atual infra-estrutura de distribuição de gasolina para o regime de hidrogênio. •
• Emissões de energia do tungstênio
, os ram o
c,
) se veis
•
re iintdos echnos
Cientistas dos Laboratórios Sandia em Albuquerque, no Estado norte-americano do Novo México, conseguiram mostrar que filamentos aquecidos de uma estrutura microscópica e reticulada de tungstênio irradiam mais energia de comprimento de onda próxima do infravermelho do que filamentos feitos do mesmo elemento, mas sólido. Na prática, isso pode significar uma nova e mais potente fonte de energia para carros elétricos, equipamen-
tos eletrônicos em barcos e geradores industriais. Ou mais: como o comprimento de onda próximo ao infravermelho é a região mais perto da luz visível, no futuro os cristais fotônicos (como também são conhecidas as estruturas microscópicas de tungstênio) poderão substituir com vantagem os métodos de iluminação atuais. Chegou-se a pensar que a descoberta desbancava a teoria de Max Planck um dos precursores da física moderna, que, no início do século, calculou a quantidade máxima de energia passível de ser emitida por um corpo sólido. Quando os cientistas aqueceram a estrutura reticulada de tungstênio a 1.250° C, a energia irradiada foi três vezes maior que a prevista por Planck. Mas o físico Shawn Lin, que conduziu a experiência, não crê que a lei de Planck foi quebrada, mas modificada. "Comparar a emissão de energia de um sólido com a de uma estrutura reticulada é como comparar um gato com um supergato." •
ição
bém , pa1 hi.prio tem ntar e 50 sigla iempróproilina :e ao
Disco com mais de mil fi lamentos de cristais fotônicos: energia e luz
Parque Tecnológico em Itaipu
Ao lado da usina, um pólo de inovação
O uso do hidrogênio na geração de energia elétrica é um dos objetivos do novo Parque Tecnológico de ltaipu (PTI), que está em construção às margens do lago da usina hidrelétrica instalada no rio Paraná. "Queremos desenvolver tecnologia para gerar e armazenar hidrogênio para células a combustível, nas horas da noite, domingos e feriados em que o consumo da energia elétrica gerada pela usina é baixo", diz Iuan Carlos Sotuyo, coordenador do PTI. No parque vai ser instalada uma incubadora de empresas de tecnologia integrada à Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste) - que possui campus em cidades da região e terá um ao lado de Itaipu - para as áreas de software, engenharia elétrica, engenharia mecânica e meio ambiente. "Vamos incentivar a sinergia que
vai se formar com a atuação do pessoal da Itaipu, empresários, professores e alunos, criando empresas e tecnologias", diz Sotuyo. Durante três anos serão investidos cerca de US$ 10 milhões pela ltaipu Binacional na infraestrutura e construção de laboratórios. A primeira fase será inaugurada em outubro de 2004. Outra ação da empresa foi a adoção de um programa para combater o assoreamento do lago, reunindo 28 municípios da zona de influência da Bacia Hidrográfica do Paraná. São mais de 1.500 rios, córregos e nascentes que trazem toneladas de sedimentos para o lago. "Além de conscientizar a população, vamos incentivar programas de agricultura orgânica, reflorestamento da mata ciliar, entre outros projetos", afirma Nelton Friedrich, coordenador do programa. •
PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 57
Laser para a indústria de plásticos o laser ganhou
nova função no meio industrial. Ele é usado pela empresa LaserTools, de São Paulo, para desenhar eletrodos de cobre em três dimensões que vão servir para gravar por eletroerosão peças de aço usadas nas máquinas injetoras de plástico. Essas máquinas preenchem o molde de aço com plástico para a reprodução das peças. A nova técnica substitui a pantografia, um processo mecânico e lento de gravação que usa fresas e brocas para desenhar os moldes e os eletrodos. O laser é dez vezes mais veloz e faz peças com mais detalhes e precisão. Os primeiros trabalhos foram feitos para a Fiat, por meio da Mecanel, na confecção da coroa de louros que for-
• Máquina reconhece paredes e objetos Um robô que funciona de forma autônoma, com capacidade para explorar e produzir mapas de ambientes desconhecidos, chamou a atenção de uma empresa que prospecta novas tecnologias para a agência espacial norteamericana, a Nasa. Detalhe: o robô é americano, mas o programa de software responsável pela sua autonomia foi desenvolvido por pesquisadores do Instituto de Informática da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). "Não importa se o ambiente é grande ou pequeno. Ele consegue detectar se é interno ou externo e se adaptar", relata Paulo Engel, coor-
Coroa de louros e manopla de cobre: para gravar o molde ma o logotipo da empresa. Para a General Motors foi feito um eletrodo para a produção da manopla do câmbio. Outro uso do laser é gravar diretamente nos moldes para inserir inscrições nas paredes de utensílios de plástico, como da marca Ziplock e peças da
denador do projeto, que tem ainda a participação de um professor do Instituto de Física e de dois alunos de doutorado. "Primeiro tínhamos pensado em utilizar o robô autônomo 'apenas em ambientes inóspitos, como em situações de resgate em incêndios ou em lugares contaminados. Mas ele tem várias outras aplicações, porque consegue saber onde tem parede, objetos", diz Engel. Um artigo publicado em uma revista internacional sobre sistemas robóticos resultou em um contato da empresa norte-americana em busca de novidades que pudessem interessar à Nasa. O acordo só não foi fechado porque depende de acertos burocráticos. •
58 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
Pial Legrand utilizadas em conectores elétricos. A LaserTools continua, dessa forma, a inovar. Fundada em 1999 por pesquisadores do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), a empresa instalouse no Centro Incubador de Empresas Tecnológicas
• Técnica para avaliar hidratação capilar Antes de lançar uma nova linha de produtos para trata-
(Cietec) na Cidade Universitária. Com o financiamento do Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE) (veja Pesquisa FAPESP n° 50), a LaserTools implementou com equipamentos e técnicas desenvolvidos na empresa - estampagens metálicas de alta precisão, gravações de logo marcas, além de produção de painéis de auto-rádios. Em 2002, com faturamento de R$ 1 milhão, saiu da incubadora. "Lançamos técnicas copiadas por empresas que compraram equipamentos e agora são nossas concorrentes", diz o físico Spero Penha Morato, um dos sócios fundadores da empresa. "Mas continuamos na frente, sempre inovando." •
mento de cabelos à base de água-de-coco e algas marinhas, há três meses no mercado, a empresa paranaense O Boticário estabeleceu uma parceria com o Laboratório de Eletroquímica e Cerâmica (Liec), da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). "Procuramos o laboratório não só para estudar a formulação, mas também a comprovação da eficácia dos produtos", conta Richard Schwarzer, gerente de pesquisa e desenvolvimento da empresa. Ele ressalta que alguns atributos são muito complicados para se comprovar, especialmente a hidratação. "O consumidor atribui hidratação ao condicionamento do cabelo, mas essa propriedade só pode ser
comprovada tecnicamente se o produto proporcionar absorção de água à estrutura capilar." Os pesquisadores desenvolveram metodologias novas, fruto de associação de técnicas, para verificação do efeito de determinadas substâncias. "Nosso papel foi analisar quanto esse novo xampu hidratava os fios", diz o coordenador da pesquisa, Elson Longo, do Liec, que pertence ao Centro Multidisciplinar para o Desenvolvimento de Materiais Cerâmicos. Foram aplicados dois métodos associados para verificar como as moléculas de água interagem com a superfície do cabelo. "Pela microscopia eletrônica de varredura pudemos analisar o grau de desidratação do fio e pela análise molecular medimos a quantidade de água, avaliando a hidratação das fibras capilares", conta Longo. O projeto durou um ano. •
• Amazônia ganha centro de tecnologia A Philips do Brasil vai instalar em Manaus um centro de pesquisa e desenvolvimento em parceria com a Escola Superior de Tecnologia da Universidade do Estado do Amazonas e a Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. O Laboratório Philips da Amazônia será formado por diversas células com projetos na área de tecnologia digital de equipamentos eletroeletrônicos. Inicialmente, as pesquisas estarão concentradas em dois núcleos. O primeiro terá como foco o desenvolvimento de ferramentas e soluções para televisão digital interativa. O segundo é um projeto global já em andamento, que visa a integrar tecnologia de celulares e TV digital. •
Patentes Inovações financiadas pelo Núcleo de Patenteamento e Licenciamento de Tecnologia (Nuplitec) da FAPESP. Contato: nuplitec@fapesp.br
Título: Candidatos Vacinais para Leptospira
Inventores: Ana Lucia Tabet Oller do Nascimento, coordenadora, e mais 35 pesquisadores Titularidade: Instituto Butantan/FAPESP
• Adesão entre madeira e plástico
Nova técnica reduz carga sobre valas subterrâneas
• Tubulações mais próximas do solo
Inventor: Benedito de Sou-
Processo desenvolvido no Departamento de Geotecnia da Escola de Engenharia de São Carlos, da Universidade de São Paulo, utiliza materiais geossintéticos - produtos à base de poliéster ou polipropileno, formados por mantas de alta resistência - sobre as valas subterrâneas, criando um espaço vazio onde são instaladas as tubulações. A redução da carga sobre os tubos', proporcionada por essa técnica chamada Geovala, permite instalações mais próximas da superfície. O uso é indicado tanto para áreas de abastecimento de água e esgoto e coleta de águas pluviais como em condutos enterrados de grandes dimensões utilizados em substituição de pequenas pontes.
Titularidade: USP/FAPESP
Título: Geovala- Uma Solução Técnica para Reduzir Tensões Verticais em Tubulações Enterradas
za Bueno
• Proteínas candidatas a combater a leptospirose Pesquisadores de várias instituições brasileiras que participam do projeto genoma da Leptospira interrogans escolheram 24 genes e suas respectivas proteínas, obtidos entre os mais de 200 clonados da variedade Copenhageni da bactéria, como candidatos para o desenvolvimento de vacinas contra a leptospirose humana e de kits mais eficientes para diagnosticar a doença. O principal hospedeiro do Copenhageni, responsável pela maioria dos registros da doença no Brasil, é o rato de esgoto. Em testes preliminares feitos em laboratório, esses genes e proteínas apresentaram reação positiva com o soro de pacientes diagnosticados com a doença ou de ratos imunizados pela bactéria.
Mistura de materiais de origem vegetal, como fibras ou pó de madeira, e polímeros termoplásticos, como poliésteres e náilons, resultou em um produto que não absorve água e possui resistência mecânica semelhante à do concreto. Como, em geral, a fibra lignocelulósica (da madeira e das plantas) e os polímeros são dois materiais incompatíveis, é preciso utilizar uma substância intermediária para que eles se transformem em um único material. Mas, no caso desse compósito desenvolvido no Instituto de Física de São Carlos, da Universidade de São Paulo (USP), essa etapa não é necessária, porque o polímero escolhido tem na sua estrutura radicais semelhantes aos da madeira.
Título: Material Compósito: Termoplástico, Fibra Vegetal e ou PÓ de Madeira e Cerâmica Inventores: Milton Ferreira de Souza, Washington Luiz Esteves Magalhães, José Augusto Marcondes Agnelli Titularidade: USP/FAPESP
PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 59
I
TECNOLOGIA
ENGENHARIA
DE MATERIAIS
,."",
evouçaoem A nanotecnologia começa a interessar a iniciativa privada no Brasil depois de bons resultados no mundo acadêmico MARILI
RIBEIRO
egueum fio de cabelo. Olhe para ele e tente imaginar uma espessura 10 mil vezes menor do que essa insignificância em suas mãos. Pronto, é disso que vamos tratar. Ou, melhor, de como a ciência lida com objetos desse tamanho, essas minúsculas superfícies obtidas no universo dos nanômetros, a escala que mede átomos e moléculas equivalente à divisão do metro em bilhões de vezes. Impossível, dessa forma, ver a olho nu ou manipular um objeto nanométrico sem um arsenal de equipamentos, tendo à frente os microscópios eletrônicos mais avançados, que permitem acesso a um mundo antes intocado e capaz,agora,de gerar conforto, negócios e riquezas. Assim, as descobertas em torno dos nanomateriais inauguram uma nova etapa na escala industrial. O Brasil, desta vez, está em condições de corrigir uma rota desprezada no passado, quando a microeletrônica introduziu o chip, ditando o roteiro da atual modernidade. Há consenso de que o país dispõe de boa infraestrutura e de pessoal qualificado para fazer nanociência. Precisa agora superar um sério desafio para tornar-se competitivo: tem de somar competências.Um dos caminhos para atingir esse objetivo e atrair a atenção de investidores que transformem esseconhecimento em produtos é uma ação conjunta preparada por um grupo de pesquisadores
P
60 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
apoiados pela FAPESPe por executivos da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). A idéia é promover palestras e exposição de programas e projetos já existentes e apoiados pela Fundação. O encontro, ainda sem data definida, deverá permitir, de um lado, a identificação das necessidades do setor privado para a aplicação de pesquisa dirigida. De outro, pretende estimular e ampliar a participação e o potencial empreendedor de cientistas e pesquisadores. Para tanto, uma seleção de trabal'hos em nanotecnologia estará em uma mostra aberta ao público nas próprias dependências da Fiesp, de maneira a tornar o tema mais concreto para uma platéia que desconhece o assunto ou tem poucas referências sobre ele, além de mostrar a capacidade brasileira em se habilitar para entrar na corrida em paralelo às potências mundiais. A coordenação desse trabalho é do físico e professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Cylon Gonçalves da Silva, que liderou a implantação do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron, do Ministério da Ciência e Tecnologia, em Campinas. Ele foi responsável também pela proposta de um Programa Nacional de Nanotecnologia no governo passado e coordenador do projeto de um Centro Nacional de Referência em Nanotecnologia. "Essas propostas visavam colocar o debate sobre a nano-
tecnologia para fora dos muros acadêmicos no Brasil",comenta Cylon. - A revolução patrocinada pela chegada das nanoestruturas cria inovações na área da engenharia de materiais que, ainda limitadas pelos elevados custos operacionais, começam a ganhar escala industrial. Caso evidente é o do vidro autolimpante, lançado em 2002 na Europa. Sobre ele é aplicado uma película com espessura de 40 nanômetros, com incrustações de partículas de óxido de titânio (Ti02). Quando a luz ultravioleta existente nos raios de sol bate no vidro, ocorre uma mudança no estado de oxidação que rouba os elétrons de bactérias, fungos e outros microrganismos, matando esses seres. A película também proporciona alta tensão superficial fazendo a água não grudar no vidro. Ela se transforma em esferas e cai ao chão levando as sujeiras. As poeiras e outras substâncias que aderem ao vidro junto com a água são também eliminadas. Sem microrganismos e sem água fica mais fácil o vidro ficar limpo. O preço desse novo produto está entre 30% e 40% acima das linhas convencionais em uso. A opção autolimpante economiza, a longo prazo, gastos de limpeza. Situação que deverá se repetir em breve na indústria têxtil com a chegada de tecidos à prova de manchas, já desenvolvido e, atualmente, em fase Vidro autolimpante
experimental nos Estados Unidos. A empresa Nanotex tem a proposta de trabalhar em engenharia molecular em nível nanométrico e submicrométrico da fibra para produzir esses tecidos. Devido a um processo similar ao aplicado no vidro, um tratamento com nanopartículas atribui ao pano a propriedade de repelir líquidos. Pode-se derramar café quente ou Coca-Cola gelada que nada pega. Será o paraíso das donas de casa e dos desastrados em geral. Os avanços das utilizações práticas reforçam as projeções crescentes de investimentos na área de nanotecnologia. Somente no último ano, os recursos globais mais que dobraram. Países como Estados Unidos, Japão, China, Canadá, Coréia do Sul, Taiwan, Austrália e a União Européia aplicam algo em torno de US$ 5 bilhões por ano entre capital privado e estatal em pesquisas no segmento. A National ScienceFoundation (NSF), fundação norte-americana de fomento à ciência, por seu lado, estima um mercado global para produtos e processos baseados em nanotecnologia capaz de atingir US$ 1 trilhão em dez ou, no máximo, 15 anos. No Brasil, cálculos preliminares do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), que elabora um Programa Nacional de Nanotecnologia, projetam R$ 1,2 bilhão em investimentos para os próximos quatro anos, sendo 30% desse total provenientes do setor privado por meio de estímulos patrocinados pelo governo. A intenção é dirigir os investimentos para áreas prioritárias previamente definidas como agropecuária, petroquímica, comunicação, saúde e indústria aeronáutica. Dada a importância que a nanotecnologia começa a assumir no cenário mundial, o professor Cylon acredita que a métrica de sucesso para a implantação de qualquer programa voltado para a área no Brasildeveria considerar a conquista de uma fração do mercado global em nanotecnologia, desenvolvidano país 62 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
Língua eletrônica: sensores revestidos com nanofilmes de apenas uma camada de moléculas poliméricas
continuem existindo e empregando dentro do Brasil, em vez de correr o risco de outros países assumirem a liderança se habilitando em novas tecnologias, é fundamental o apoio da pesquisa científica direcionada para atender às necessidades do setor privado. Evidentemente que a contrapartida esperada do empresariado requer maior envolvimento no financiamento desses estudos, como o incentivo na formação de pequenas empresas de caráter altamente tecnológico.
por empresas e centros de pesquisas nacionais. Entusiasta do tema e de suas perspectivas, particularmente no Estado de São Paulo, onde se concentra boa parte da pesquisa em nanociência, ele tem se dedicado nos últimos dois anos, por meio de palestras e apresentações, a provocar um despertar do empresariado para a questão. No início de julho, Cylon esteve em Santa Catarina, na sededa Embraco,uma empresa nacional que é líder mundial na fabricação de compressores usados em geladeiras e afins, para falar desse futuro nanométrico. "Lá, eles já estão preocupados com o que poderá acontecer com a indústria de refrigeração em decorrência dos avanços nessa área", conta o professor. "Asnovas tecnologias podem tornar obsoleto o principal produto deles,os compressores, assim como o transistor acabou com a válvula eletrônica", exemplifica. "Esse horizonte se reproduzirá em muitos outros segmentos da economia." Para garantir que empresas de porte e da importância de uma Embraco
Peneiras moleculares - No universo da nanotecnologia, o país não está tão atrasado em relação aos outros. O conhecimento acumulado nesse campo ainda é bastante inicial nos quatro cantos do globo. Um exemplo da situação promissora no Brasil está no empenho do pesquisador Aparecido dos Reis Coutinho, professor do Grupo de Área de Física da Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep), em erguer um negócio voltado para aplicações práticas de suas descobertas que resultou na empresa Multivácuo. Com uma proposta de pesquisa dirigida para a síntese de peneiras moleculares a partir de materiais à base de carbono, Coutinho recebeu financiamento do Projeto de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE) da FAPESP. Atualmente, ele está concluindo a montagem de uma planta piloto para produzir um quilo diário de peneira molecular de carbono (PMC). As PMCs são materiais com estrutura porosa com predomínio de nanoporos, classificadas em função de tamanho e forma. Integram a família dos materiais carbonosos avançados, produtos de baixo peso e alta resistência, e são aplicadas em processos especiais de absorção, como controle e purificação do ar atmosférico, processos de separação de gases, sis-
temas industriais que empregam vácuo ou ar comprimido, separação de impurezas orgânicas e recuperação de solventes, em cromatografia gasosa, entre outras possibilidades. O pesquisador revela que deverá assinar um contrato comercial com a Petrobras para fornecimento dessas peneiras moleculares de carbono, que serão usadas em sistemas de armazenamento de gás natural, a ser empregado em tanques de veículos auto motores (veja reportagem na página 72). A intenção é diminuir a pressão no armazenamento de gás natural e possibilitar a diminuição das paredes de aço, além da adoção de outros formatos de tanque. O emprego das PMCs dentro desse recipiente promoverá a adsorção do gás natural pelos nanoporos da estrutura carbonosa (nesse caso, denominado de gás natural adsorvido-GNA), o que possibilitará a redução do volume do tanque e a diminuição da pressão de armazenamento do combustível. "A concretização do contrato de fornecimento com a Petrobras possibilitará ampliar
em um curto espaço de tempo a produção para 10 quilos por dia e, no futuro, a implementação de uma unidade industrial de PMC." A importância inicial está no fornecimento dessas peneiras para pesquisas realizadas por vários grupos que importam esses produtos. Fora as aplicações dos materiais carbonosos em segmentos industriais, outro de potencial mercado é o da saúde, para a incorporação da tecnologia em filtros usados em tratamento de hemodiálise nos pacientes que sofrem de insuficiência renal. Atualmente, o Brasil importa dos Estados Unidos e Europa praticamente todo o material desse tipo de filtragem. O mais recente motivo de orgulho para Coutinho foi encaminhar para o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) o registro de patente do processo de produção das peneiras moleculares de carbono em reatores de plasmas a frio por meio de gases ionizados obtidos por corrente elétrica e em temperatura ambiente. O uso desse reator foi a grande inovação nesse pro-
cesso que contou com a participação fundamental e decisiva de pesquisadores do Laboratório de Plasmas e Processos do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), na forma de assessoria técnica. O uso da tecnologia de plasmas frios apresenta como vantagens, em relação ao processo convencional, a obtenção de PMC com estrutura nanoporosa mais ordenada, a redução do tempo de ativação dos materiais, além de se constituir em um processo limpo, do ponto de vista ambiental. Em área similar à de Coutinho, no que também já resultou em parceria com a Petrobras, o químico e professor [airton Dupont, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), buscou retirar compostos do petróleo que poluem o ambiente utilizando os recursos da nanotecnologia. Desenvolveu nanocatalisadores - catalisadores são substâncias que aceleram ou modificam as reações químicas - que permitem diminuir a concentração dos compostos aromáticos durante as fases de refino de petróleo quando aparecem a PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 63
gasolina e o benzeno. Assim, a combustão dos motores a gasolina, por exemplo, fica mais completa, sem deixar no ar resíduos que podem ser cancerígenos e contribuir para a formação de chuva ácida. O catalisador, patenteado em conjunto com a Petrobras, agrega ainda a vantagem de ser reaproveitado, sendo que as reações podem ser realizadas em condições brandas de pressão e temperatura (600 C e apenas 2 atmosferas). Os normalmente empregados nesse tipo de reação funcionam em temperatura e pressão elevadas (3000 C e 150 a 200 atmosferas). Dupont contou até fevereiro com o apoio financeiro do Fundo Nacional do Petróleo (CTPetro). Agora, ele recebe financiamento direto do Centro de Pesquisas da Petrobras (Cenpes). Sempre tendo em mente o custo e a facilidade de produção no desenvolvimento de métodos de síntese que possibilitem o processamento de materiais nanométricos, o professor Edson Roberto Leite, do Centro Multidisciplinar para o Desenvolvimento de Materiais Cerâmicos (CMDMC), um dos dez Centros de Pesquisa Inovação e Difusão (Cepids) da FAPESP, está elaborando uma série de tecnologias que devem ganhar o mercado em breve. Em seu laboratório na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), ele trabalha com materiais nanoestruturados desde 1999. As principais linhas de
Imagem de nanocompósito de óxido de estanho para o catal isador da UFSCar em escala de 2 nanômetros (nm)
tamos trabalhando também no desenvolvimento de precursores moleculares para geração de nanopartículas de óxidos metálicos com financiamento de uma empresa nacional que ainda não permite a divulgação", completa. '
atuação são em torno de nanocristais de óxidos cerâmicos e filmes finos nanoestruturados. "Os trabalhos mais avançados que permitem pensar em comercialização são os relacionados ao desenvolvimento de catalisadores nanocompósitos. Esses produtos têm aplicações em reações catalíticas em alta temperatura, tais como reforma do metano e oxidação do metanol, processos usados para a geração de hidrogênio", explica o professor Leite. "Es-
o PROJETO
O PROJETO
Sistema de Peneiras Moleculares a Partir de Precursores de Carbono MODALIDADE
Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE) COORDENADOR APARECIDO DOS REIS COUTINHO -
e US$
4.538,00
64 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
O PROJETO Caracterização de Sensores Poliméricos de Interesse na Agroindústria
MODALIDADE
Programa de Apoio à Propriedade Intelectual (PAPI) COORDENADOR
INVESTIMENTO
INVESTIMENTO
307.112,00
Catalisador Nanocompósito e seu Processamento
EDSON ROBERTO LEITE - U FSCar
Multivácuo
R$
Papel eletrônico - Muitas das pesquisas em andamento envolvem compromissos com estratégias que desaconselham sua divulgação, dado o ambiente de concorrência. Nesses casos, a reserva e a cautela costumam ser a regra. Edson Leite pondera que entre os projetos coordenados por ele existem aqueles com propensão à aplicação prática ainda neste ano, dependendo de investimentos do capital privado, e outros em estágio de desenvolvimento para uma média de três a seis anos para implantação. "Sem dúvida a área de catalisadores é a de mais curto prazo para implementação." Os nanocompósitos devem revolucionar os materiais para catálise, possibilitando uma série de avanços, principalmente na geração de energia limpa e controle de poluição e do meio ambiente. "Na área eletrônica, por exemplo, estamos trabalhando em um projeto para desenvolver filmes finos transparentes e condutores para deposição
R$
6.000,00
MODALIDADE
Linha regular de auxílio à pesquisa COORDENADOR LUIZ HENRIQUE CAPPARElLI
MATTOSO
- Embrapa INVESTIMENTO R$
32.470,12
e US$
31.794,55
em substratos flexíveis que vão permitir a criação de displays de cristal líquido (LCD) maleáveis e originar um tipo de papel eletrônico considerado para substituir, no futuro, as páginas de livros, revistas e jornais. Isso só pode ser viável com a obtenção de nanopartículas. Outro projeto nessa área é o desenvolvimento de filmes finos superparamagnéticos com potencial aplicação em memórias magnéticas." Língua eletrônica - Uma história que endossa o futuro animador do país na área de nano vem do árduo, mas bastante saboroso, trabalho efetuado por pesquisadores da Empresa Brasileira de Pesq uisa Agropecuária (Embrapa), em São Carlos, ao longo de oito anos. Coordenados pelo engenheiro de materiais Luiz Henrique Capparelli Mattoso, em parceria com a Universidade de São Paulo (USP), eles criaram a primeira "língua eletrônica" à base de polímeros condutores nanoestruturados, baseada em filmes ultrafinos compostos por moléculas "desenhadas" para reagir às substâncias. Construíram assim um dispositivo mais sensível que a língua humana para degustação e análise de bebidas. O equipamento, dotado de um conjunto de sensores que desempenham função semelhante à das papilas gustativas, consegue atingir a eficiência de um enólogo. Tem capacidade, por exemplo, para identificar com precisão um vinho tinto produzido de uvas Cabernet Sauvignon ou Chardonnay, assim como dá conta de detectar diferenças quase imperceptíveis ao paladar humano, existentes entre várias marcas de água mineral ou tipos de café, chegando a ter uma sensibilidade até 10 mil vezes maior que o ser humano para detectar os paladares-padrão, como a presença de açúcar ou sal em água. O invento, formulado com financiamento da FAPESP, foi patenteado em vários países e tem perspectiva de amplo uso industrial. Já é adotado pela Associação Brasileira da Indústria do
Nanopartículas de níquel e óxido de silício em escalas de 100 nanômetros (nrn), imagem maior, e de 10 nm
da universidade", conta ele. "Acredito que seja a primeira empresa brasileira com uma plataforma em micro e nanotecnologia," Eles começaram produzindo nanopartículas biodegradáveis, no formato de nanocápsuIas que envolvem o princípio ativo de medicamentos e até de vacinas, capazes de interagir somente quando atingem o alvo, muito usadas em tratamentos quimioterápicos e também na indústria de cosméticos. "O atual investimento é em uma planta industrial para produção de microesferas para viabilizar estudos clínicos de medicamentos", explica.
Café (Abic) e poderá ajudar no controle ambiental, monitorando os níveis de contaminação por metais pesados e pesticidas em rios e mananciais, assim como controlar a qualidade da água nas estações de tratamento. Na indústria alimentícia, a língua terá o papel de aumentar o rigor do controle de qualidade na fabricação de bebidas. Por enquanto, o equipamento está apto para operar com vinhos, café e água mineral, mas os pesquisadores já estão desenvolvendo sensores para analisar leite, suco de uva e de laranja. Na indústria farmacêutica, a língua eletrônica pode ser usada para testar medicamentos e melhorar o sabor dos remédios amargos. Há mais tempo na estrada do nanomundo está o pesquisador José Maciel Rodrigues Iúnior, com dez anos de trabalhos desenvolvidos com sistemas nanoestruturados, inicialmente na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e atualmente na Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto. "Estamos incubando agora em agosto a Nanocore Biotecnologia, no campus
Instrumentos de luz - As conquistas que podem ser mobilizadas para projetos maiores, em escala de importância econômica, e que dêem expressão ao país no âmbito da nanotecnologia já somam experiências consideráveis. Há também instrumentos potentes disponíveis, como a fonte de luz síncrotron e o mais poderoso microscópio eletrônico para fazer nanociência na América do Sul, instalados no Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), em Campinas, mantido com recursos do MCT. Ele é aberto a profissionais tanto de instituições de pesquisa públicas e privadas como para empresas. A expansão das fronteiras do conhecimento e da evolução da humanidade tem sido pontuada pelo domínio dos materiais e das fontes de energia, como gosta de explicar Cylon: ''A nanotecnologia prenuncia uma nova onda de inovações, como acontece desde a Revolução Industrial, quando se aprendeu a manipular algumas fibras naturais (algodão, lã) em grande escala e criou-se a indústria têxtil. Ela é a última onda tecnológica possível, porque manipula o elemento básico dos materiais que é o átomo': • PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 65
ITECNOLOGIA ENGENHARIA
DE MINAS
A salvação do minério Processo diminui a dispersão de fibras de amianto e evita doenças provocadas pela manipulação do produto
uito utilizado nas últimas décadas, o amianto tornou-se um sério problema de saúde pública ao ser usado como matéria-prima em produtos industriais, como telhas, caixas d'água e componentes de freios automotivos. O pó originário desse minério provocou doenças pulmonares nos trabalhadores que manipularam esse material nas indústrias e nas jazidas. Proibido ou usado com restrições em muitos países, o amianto, também chamado de asbesto, poderá ter um alento com um novo processo que inibe a dispersão de partículas de suas fibras. A novidade vem dos pesquisadores do Grupo de Materiais Fotônicos do Instituto de Quimica (IQ) da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Araraquara. "Nós utilizamos uma substância chamada coacervato, formada a partir de um polímero inorgânico 66 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
de polifosfato de sódio e cloreto de câlcio. Ele é parecido com um gel e pode ser espalhado sobre a superfície do amianto pa):"aenvolver e imobilizar suas fibras, de forma que elas não fiquem em suspensão no ar durante a manipulação': explica o professor Younes Messaddeq, coordenador do projeto. Desenvolvido de modo semelhante a outros que também estão surgindo na Europa, o produto é aplicado nas paredes internas das minas, antes da extração do minério, com brochas ou na forma de spray, diminuindo a dispersão das fibras e partículas. A aplicação desse gel, no entanto, não é suficiente para evitar os problemas com as fibras durante o transporte e a manipulação do amianto, porque, depois de secas, elas voltam a se dispersar novamente. Para serem imobilizadas completamente, é necessário um tratamento térmico, processo também desenvolvido pelos pesquisadores
de Araraquara, do qual resultou uma patente, financiada pela FAPESP e depositada no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). O método consiste no tratamento das fibras de amianto com solução de polifosfato de sódio em diferentes temperaturas, de forma inovadora às técnicas similares desenvolvidas no exterior. Os processos atuais de destruição das fibras desse mineral demandam temperaturas elevadas (entre 1.800 e 2.000° C), a um custo de cerca de US$ 1.200,00 por tonelada. Pelo novo método, elas são destruídas a 300° C. "Isso reduz em 75% os custos em relação ao processo tradicional', diz Messaddeq. "Na Europa, num processo semelhante, os pesquisadores chegaram a 1.200° c." A adoção do processo completo pode resultar em novos materiais para a construção civil. "São vitrocerâmicas (materiais cristalizados que lembram os vidros
Amianto tratado com coacervato: novos materiais com elevada estabilidade térmica e mecânica
no aspecto visual) de elevada estabilidade térmica e mecânica, que mantêm as principais propriedades do amianto, porém com as fibras imobilizadas'; diz Messaddeq. Outra vantagem é que a técnica poderá ser usada na reciclagem de produtos fabricados com asbesto, como as telhas e caixas d'água, além de ser útil na imobilização de outras fibras inorgânicas que oferecem riscos à saúde quando inaladas, como a fibra de vidro.
na le:0-
~de ns-
lteros
O
Grupo de Materiais Fotônicos começou a trabalhar nessa área em 1999, após um debate com pesquisadores franceses, durante um evento internacional sobre vidros especiais. O primeiro trabalho sobre esse tema foi um projeto de pós-doutorado do químico Marco Antonio Utrera Martines, abrindo uma nova linha de pesquisa para o grupo. Com bolsas da FAPESP, também foram desenvolvidos o pós-doutorado de Veronique Andries e o mestrado de Daniela Grando. Na mesma área, com bolsa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), trabalha o doutorando Francisco Audísio Dias Filho. O projeto de Martines foi realizado entre 1999 e 2001 e teve a participação de Pierre Vast, da Universidade de Lille, na França, que produziu as pesquisas iniciais com o coacervato.
Com a nova técnica, os trabalhadores poderão deixar de inalar as partículas das fibras que se desprendem do mineral e, ao longo do tempo, se acumulam no pulmão, causando doenças ocupacionais, como asbestose e câncer de pulmão. No caso da asbestose, as fibras alojam-se nos alvéolos pulmonares. Para se defender, o organismo deposita sobre elas uma proteína semelhante a um "cimento" que cicatriza o alvéolo, impedindo que se encha de ar. Esse processo, que se repete ao longo dos anos, pode tórnar o pulmão fibroso e sem elasticidade, resultando em dificuldades respiratórias. O amianto, além de ser barato e de fácil extração, apresenta propriedades físicas e químicas especiais: alta resistência mecânica, baixa condutividade térmica, resistência a produtos químicos e estabilidade em diferentes níveis de aci-
o PROJETO Processo de Imobilização e Destruição de Fibras de Amianto MODALIDADE
Programa de Apoio à Propriedade Intelectual (PAPD COORDENADOR VOUNES
MESSADDEQ
INVESTIMENTO
R$ 6.000,00
-
IQ-Unesp
dez, além de prover isolamento elétrico, acústico e proteger contra o fogo. Por apresentar esse conjunto de propriedades, a matéria-prima foi usada de forma intensiva no século 20 em muitos produtos industriais. Atualmente, o amianto está praticamente banido em todo o mundo, embora ainda seja usado com restrições em vários países, como China e Rússia. Leis mcdlficadas - No Brasil, os Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul aprovaram projetos de lei banindo o produto, inicialmente em obras públicas. Mas, em decisão tomada no dia 8 de maio deste ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou inconstitucional as leis estaduais que proibiam o comércio e uso do amianto em São Paulo e Mato Grosso do Sul. A lei paulista previa que, a partir de janeiro de 2005, seriam proibidos a importação, a extração, o beneficiamento, o comércio, a fabricação e a instalação no Estado de materiais contendo amianto. A ação que resultou na decisão do STF foi impetrada por Goiás, estado onde se encontra a única mina em operação no país, a de Cana Brava, no município de Minaçu. Com ela, o Brasil ocupa o posto de quarto produtor mundial, atrás apenas da Rússia, do Canadá e da China. • PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 67
ITECNOLOGIA
FÍSICA
MÉDICA
Leitura magnética Equipamento detecta se há excesso de ferro no fígado em pessoas que fazem muitas transfusões de sangue SAMUEL
ANTENOR
ós mais de cinco anos de estudos, pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), em Ribeirão Preto, concluíram a construção de um aparelho capaz de medir a quantidade de ferro no organismo sem a necessidade de biópsia. A análise é feita por meio da intensidade do campo magnético emitida por esse elemento químico que se concentra principalmente no fígado. Um índice excessivo nesse órgão, que absorve e retém cerca de 75% do total dessa substância no corpo, pode levar à destruição das células, causando fibrose, cirrose, etc. Também podem ser afetados o coração e o baço. Os problemas relacionados com a presença de altas concentrações de ferro no organismo são enfrentados principalmente por pessoas que recebem constantes transfusões de sangue. É o caso daqueles portadores da talassemia beta maior - um distúrbio na síntese das hemoglobinas (os glóbulos vermelhos do sangue) que provoca o acúmu10 de ferro no fígado - ou ainda da anemia falciforme e outros tipos de anemia crônica. Outra doença é a hemacromatose, a absorção excessiva de ferro ingerido na alimentação. Pacientes com essas enfermidades vão ter grandes benefícios com o equipamento. O primeiro é a eliminação da biópsia, um procedimento cirúrgico invasivo e caro que consiste em retirar, via incisão, uma amostra do órgão para análise química. O aparelho permite ainda a quantificação precisa do ferro
A
70 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
existente no fígado, facilitando o controle clínico com a prescrição de medicamentos na medida certa. Segundo o médico Dimas Tadeu Covas, diretor do Hemocentro de Ribeirão Preto, será útil principalmente para pacientes que necessitem de tratamento à base de quelação química - substâncias que se agregam ao ferro e provocam sua exereção do organismo, auxiliando na determinação do período necessário para o tratamento. Chamado de biossusceptômetro, o aparelho foi desenvolvido e está instalado em um espaço de aproximadamente 12 metros quadrados no Laboratório de Biomagnetismo do Departamento de Física e Matemática da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP. O aparelho já passou pelo Comitê de Ética do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto e também pelo Comitê Nacional de Ética
o PROJETO Sistema Pneumático em Grandes Dimensões para Levantamento de Plataforma MODALIDADE Programa de Apoio à Propriedade Intelectual (PAPIl COORDENADOR ANTÔNIO ADILTON OLIVEIRA CARNEIRO - Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da U SP INVESTIMENTO
R$ 6.000,00
e Pesquisa (Conep), em Brasília, órgão vinculado ao Ministério da Saúde. Após a aprovação, foram feitas medidas dos níveis de ferro no fígado de 32 indivíduos saudáveis e em 42 pacientes com excesso dessa substância no organismo. Todo o sistema baseia-se em um sensor magnético supercondutor chamado Squid (superconducting quantum interference devices), o mais sensível detector de fluxo magnético existente, que mede a concentração de elementos magnetizados em quantidades muito pequenas. "Como o campo magnético emitido pelo ferro hepático é muito fraco (10 milhões de vezes menor que o campo aplicado), todo o sistema tem que ser não-magnético para possibilitar a sua medida. Por isso, em todo o espaço em que o biossusceptômetro é instalado, usamos madeira, fórmica, plástico, nada que contenha qualquer metal", conta o físico Antônio Adilton Carneiro, autor da tese de doutorado "Um Biossusceptômetro Supercondutor AC para Quantificar o Ferro Hepático", orientada pelo professor Oswaldo Baffa Filho, coordenador do Laboratório de Biomagnetismo. Escala comercial - A idéia de quantificar ferro hepático usando um biossusceptômetro supercondutor não é original. Já existe um equipamento comercial produzido por uma empresa norte-americana com custos em torno de US$ 1 milhão. Existem grupos nos Estados Unidos, na Alemanha e na Itália que estudam medidas de ferro no fígado com esse aparelho comercial. "Estamos pro-
duzindo resultados similares com a tecnologia desenvolvidaem Ribeirão Preto. O custo do nosso equipamento foi cerca de dez vezes menor': diz Carneiro. onstrução do aparelho gerou vários sistemas inovadores e um deles poderá ter uso amplo em outros equipamentos que não necessitem de campos magnéticos e material condutor, como, por exemplo, os de Imagens por Ressonância Magnética. A inovação é a cama de posicionamento do paciente. Ela permite movimentos verticais com o auxílio de um mecanismo de deslocamento pneumático que rendeu uma patente depositada no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) e financiada pelo Núcleo de Patenteamento e Licenciamento de Tecnologia (Nuplitec) da FAPESP.O sistema pneumático da cama é composto por material não magnético e permite o deslocamento com precisão de décimo de milímetro. Outra vantagem do mecanismo pneumático é o seu baixo custo, possibilitando a produção em escala industrial. Embora apresente vantagens sobre os aparelhos existentes no mundo, o biossusceptômetro desenvolvidona USP não deverá ser produzido em série nesta etapa. "Os custos são muito elevados e teríamos que trabalhar com pessoal extremamente especializado, o que inviabilizaria nossas pesquisas", afirma Baffa Filho. Os pesquisadores acreditam que apenas três unidades já seriam suficientes para atender à demanda por esses exames no Brasil, onde estão catalogados entre 400 e 600 pacientes com necessidade de transfusões regulares de sangue. O aparelho existente vai ser instalado na Fundação Hemocentro de Ribeirão Preto, ligada ao Hospital das Clínicas da USP na mesma cidade. Com isso, poderá ser medida também a demanda pelo equipamento, o que deverá determinar quais locais poderão receber uma segunda unidade do biossusceptômetro, pois não compensaria manter um número grande de aparelhos em diferentes localidades. •
A
é a e e n 1-
Cama do paciente: uso em outros equipamentos que não necessitam de campo magnético e material condutor PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 71
• TECNOLOGIA
ENERGIA
Mudancas no porta-malas Veículos adaptados para gás natural ganham reservatórios mais leves e com formatos diferentes AFFONSO
NUNES
ma nova etapa na história do gás natural para veículos automotores está começando em Natal, no Rio Grande do Norte. A promessa é dos pesquisadores do Centro de Tecnologia do Gás (CTGás), instituição formada em parceria entre a Petrobras e o Serviço Nacional da Indústria (Senai). Um projeto promete eliminar uma das dores de cabeça dos donos de carro com esse tipo de combustível: o enorme e pesado cilindro instalado no porta-malas dos veículos para acondicionamento do gás natural veicular (GNV). São cerca de 350 mil automóveis ou caminhonetes no Brasil com o problema, ainda um número pequeno, representando 1% do total de 34 milhões da frota. Esses carros possuem o tanque normal para armazenamento do combustívellíquido (gasolina ou álcool) e mais um cilindro para o gás. Se depender do CTGás,esseincômodo deixará de existir em breve. Os cilindros deverão ser menores e mais leves e, melhor, vão se adaptar ao formato dos espaços vazios existentes embaixo do veículo, em volta do estepe ou no teto. Por enquanto, muitos desses formatos ainda são mantidos em sigilo porque até o final do ano a instituição vai depositar patentes das novas geometrias dos tanques no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). Os pesquisadores acre-
U
72 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
Menores e mais leves, cilindros vão acondicionar o gás em baixa pressão
ditam que no máximo em dois anos esses novos produtos estejam no mercado a um preço competitivo. Os novos desenhos serão possíveis com uma drástica redução na pressão usada para armazenar o GNV. Os atuais cilindros possuem paredes de 2 a 3 centímetros em aço, para suportar a alta pressão do gás acondicionado a 200 bars (basta lembrar que, ao nível do mar, a pressão está em média a 1 bar). Nessa pressão, as moléculas de gás ficam "espremidas" dentro do cilindro. No posto de abastecimento, o gás natural atinge pressão que varia de 6 a 10 bars. Com essas pressões menores e a alta dispersão das moléculas não se poderia empurrar para dentro do cilindro os 17 metros cúbicos de gás, sufi-
cientes para autonomia de 200 quilômetros do veículo. Diminuir a pressão do gás sem baixar o número de quilômetros rodados é o desafio dos engenheiros do CTGáS, que integram a Rede Nacional de Núcleos de Tecnologias do Gás Natural (Regás), formada por unidades do Senai, que pretende contribuir para uma maior participação do gás natural na indústria e em outros ramos da atividade econômica. As pesquisas, que começaram há três anos, são financiadas pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e pela Rede Gás Energia, composta pela Petrobras e Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil. Os estudos se baseiam no fenômeno chamado adsorção, em que moléculas se
Testes em laboratório com o carvão ativado (acima) e o espaço que o cilindro ocupa hoje no porta-malas do carro
i
e
fIxam na superfície de substâncias sólidas. "Preenchemos os reservatórios com uma substância adsorvente, de alta porosidade, como o carvão ativado, proveniente de materiais orgânicos. Assim, as moléculas do gás, naturalmente dispersas, entram nos poros das partículas de carvão. Elas se agrupam e diminuem o espaço existente entre elas", diz José Roberto de Souza, responsável pelo Laboratório de Processamento de Gás. É como se o carvão aumentasse a área interna dos reservatórios fazendo as moléculas encontrarem mais lugar para se acomodar (veja na página 60 reportagem sobre nanotecnologia). Com isso, é possível incrementar a quantidade de gás dentro do cilindro ou de outro recipiente em até 70 vezes.
A nova tecnologia, batizada de GNA, Gás Natural Adsorvido, permite que a pressão caia de 200 para 40 bars. Assim, quando o trabalho estiver concluído, os tanques receberão praticamente os mesmos 17 metros cúbicos, sem comprometer a autonomia do veículo, e poderão ser bem menos resistentes por causa da baixa pressão. O aço usado nos cilindros dará lugar à fibra de carbono, alumínio ou outros materiais mais leves. O peso cairá em 30%. Os tanques de metal poderão ter pontos de solda - impossível nos cilindros de hoje - e serão fabricados em formatos que se adaptem à engenharia do veículo para favorecer a distribuição de peso.
Blocos compactos - "Ainda precisamos encontrar meios para melhorar a adsorção e saber qual a quantidade máxima de carvão ativado possível de ser colocada dentro dos vários tipos de tanques. Também estudamos formas estruturadas, blocos compactos com superfícies maiores onde o gás possa se alojar, em vez das partículas que usamos hoje", diz Souza. A tecnologia GNA também poderá contribuir para uma nova etapa para o gás usado em veículos ao propiciar um
aumento do número de pontos de abastecimento. Pelos dados da BR Distribuidora, o Brasil possuía 486 postos de gás até o fInal do ano passado, quase 70% localizados em São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Em II estados brasileiros não havia sequer um posto que oferecesse gás natural. Dois são os motivos para esse quadro. O primeiro é o custo proibitivo de US$ 250 mil dos potentes compressores disponíveis no mercado que recebem o gás por meio de dutos a uma pressão média de 8 bars para elevá-Io aos necessários 200 bars. A queda da pressão de armazenamento para 40 bars reduziria esse custo para US$ 125 mil. Empresas com frotas de carros a gás também poderiam criar pequenos postos para fazer o próprio abastecimento. O outro é a ainda pequena malha de gasodutos, pouco mais de 5.300 quilômetros que cortam 14 estados. Se o gás não chega aos postos pelos dutos, tem que chegar em cima do caminhão, carregado com grandes e pesados cilindros individuais, por causa da alta pressão de armazenamento. Um único grande tanque com pressão a 40 bars terá capacidade bem maior que vários cilindros empilhados. O gás natural é uma boa energia alternativa para os carros e indústrias. Hoje, esse combustível tem participação de 3% na matriz energética nacional. As projeções são de que cresça para 10% até 2005. Atenta à expansão desse ainda tímido mercado, a Petrobras criou a Rede Gás Energia, que encomendou, dentre outros projetos, a pesquisa de redução da pressão do gás. O gás para veículos traz vantagens significativas, Ao mesmo tempo, alivia o bolso do consumidor - além de mais barato, é 20% mais econômico - e polui 50% menos que a gasolina. Mas os pesquisadores do CTGás ainda terão de resolver outro problema que desestimula a opção pelo carro a gás. Além do transtorno de carregar um cilindro no porta-malas como um eterno passageiro, o custo da conversão é alto. Hoje, está entre R$ 2 e R$ 3 mil. Para reduzir esse valor, eles começarão nos próximos meses um estudo detalhado dos componentes necessários para o equipamento, de diferentes fabricantes. O objetivo é encontrar peças de qualidade a preços mais baixos e reduzir o custo final da conversão. • PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 73
• TECNOLOGIA ENGENHARIA
QUÍMICA
Pastilhas da limpeza Empresa desenvolve dispositivos que eliminam bactérias e fungos dentro de aparelhos de ar-condicionado
olegas no programa de doutorado na área de química inorgânica no Instituto de Química da Universidade de São Paulo (IQ-USP) no início dos anos 90, Carlos Alberto Alves de Carvalho e Rubén Dario Sinisterra Milllán já nutriam expectativas de, um dia, transformar seus conhecimentos científicos em produtos tecnológicos que beneficiassem a sociedade. A realização desse projeto aconteceu em 2000, quando eles montaram uma empresa para produzir pastilhas impregnadas de bactericidas e fungicidas com a finalidade de higienizar equipamentos de ar-condicionado. Muito da idéia empresarial foi fortalecida por Sinisterra nos Estados Unidos, de onde ele voltou no final da década de 1990 depois de um pós-doutorado no Massachusetts Institute of Technology (MIT), instituição que o inspirou ainda mais na perspectiva de aliar pesquisa e desenvolvimento com objetivos
C
74 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
empresariais. Atualmente, ele é profeso ar contendo agentes biológicos afeta a produtividade das empresas e é responsor do Departamento de Química da sável por muitos afastamentos do traUniversidade Federal de Minas Gerais balho': explica Carvalho. (UFMG). O amigo Carvalho, que moDe acordo com o empresário, a susra em São Paulo, viaja toda semana peita de síndrome deve ser levada em para trabalhar no Departamento de conta sempre que 20% dos freqüentaQuímica da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop). dores de um prédio apresentem proOs dois, mais a professora Nelcy blemas respiratórios e alergias em curtos intervalos de tempo ou quando os Della Santina Mohallem, também do departamento de Sinisterra, na UFMG, sintomas não se manifestarem em ousão os três sócios fundatros ambientes. "Para hidores da Scientia Tecnogienizar os aparelhos de logia Química (STQ). A ar-condicionado, os proempresa está instalada no dutos hoje disponíveis A ação Centro Incubador de Emcomercialmente têm dois do bactericida presas Tecnológicas (Cietipos de limite: matam bactérias e fungos, mas te c) abrigado no prédio e do exigem manutenção diádo Instituto de Pesquisas fungicida Energéticas e Nucleares ria, ou têm ação prolon(Ipen), localizado na Cigada, mas apenas inibem dura 15 dias dade Universitária, em o crescimento de microrSão Paulo. ganismos, não agindo so"Fizemos uma avaliabre aqueles que já se acumularam nos equipamentos", explica. ção cuidadosa dos nossos conhecimen''Além disso, existem produtos no mertos e sobre o potencial de possíveis produtos no mercado e decidimos nos cado para a limpeza dos duetos que reconcentrar no desenvolvimento de uma movem poeira e materiais particulados que são necessários também para uma solução eficaz e com efeito duradouro para o combate a bactérias e fungos em manutenção completa do equipamento sistemas centrais de condicionamento de ar-condicionado em conjunto com o produto da STQ." de ar': conta Carvalho. Trata-se de um A opção tecnológica da STQ foi, problema grave e muito comum. Ao desde o início, o desenvolvimento de reciclar o ar que circula nos espaços fechados, os aparelhos de ar-condicionauma pastilha de matriz cerâmica que contém um bactericida e um fungicida do de prédios comerciais, aviões e trens, extensivamente testados e que não agripor exemplo, condensam uma parcela dem o ambiente natural e as pessoas. do vapor d'água que se forma durante o processo de resfriamento, gerando Esses produtos são preparados para seum acúmulo de líquido em suas banderem liberados de maneira progressiva. . Para que isso aconteça, os princípios jas internas. Se não receber tratamento adequado, a água parada inevitavelmenativos são encapsulados em uma subste se transforma em um ambiente altamente propício para a formação de coPROJETO lônias de bactérias e fungos dos mais variados tipos. E o ar que passa pelo Desenvolvimento de um Dispositivo equipamento leva os microrganismos Químico de Liberação Controlada para dentro dos prédios. de Princípios Bioativos para
o
Edifícios doentes - Por isso, os sistemas de condicionamento de ar acabam contribuindo para a configuração da chamada síndrome dos edifícios doentes. A contaminação do ar interno pode causar dores de cabeça, irritação nos olhos e na garganta, rinites, bronquites, crises de asma e pneumonia nas pessoas que permanecem por muito tempo em lugares contaminados. ''Além do impacto sobre a saúde e o bem-estar humano, 76 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
Tratamento Microbiológico do Ar Interior em Ambientes Climatizados MODALIDADE
Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPEl COORDENADOR CARLOS ALBERTO
ALVES
DE CARVALHO
- STQ INVESTIMENTO
R$ 312.271,72
e US$ 4.000,00
tância chamada ciclodextrina, um oligossacarídeo (do grupo dos açúcares) que permite incluir ou hospedar moléculas no interior de suas cavidades. mtodo o mundo, as ciclodextrinas são cada vez mais utilizadas por diversas indústrias, como, por exemplo, a farmacêutica, a de alimentos e a têxtil. "Esse produto que utilizamos torna os princípios ativos mais solúveis em água, deixando a matriz cerâmica absolutamente intacta", comenta a pesquisadora Mariângela de Burgos Martins de Azevedo. Antes de se juntar ao time da STQ, em 2002, ela acumulou experiência na área de compostos com ciclodextrinas para encapsulamento de hormônios vegetais com o objetivo de aumentar, com pulverizações desse produto, a massa e as sementes de vários tipos de planta. Ela fez pós-doutoramento no Laboratório de Química Biológica do Instituto de Química da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e depois atuou como pesquisadora no Instituto Agronômico de Campinas (IAC), com um projeto do Programa Jovens Pesquisadores da FAPESP (veja Pesquisa FAPESP nO 80).
E
Capital inicial - A constatação de um problema de saúde pública e o domínio de uma tecnologia com potencial para solucioná-lo não eram suficientes, porém, para a empreitada de Carvalho e Sinisterra. "Faltava-nos capital inicial para comprovar a viabilidade técnica do projeto", lembra Carvalho. "O que possibilitou a criação da empresa foi o apoio da FAPESP, que, por meio do Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE), garantiu verba para a compra de equipamentos para o laboratório e a remuneração de assessorias de negócios, além de permitir a nossa instalação no Cietec", diz ele. Também o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnologico (CNPq), por meio do Programa de Fixação de Doutores (Profix), aprovou em abril de 2002 um projeto coordenado por Mariângela, em conjunto com os empresários da STQ, para o desenvolvimento de tecnologia para os dispositivos bactericidas usados nos equipamentos de ar-condicionado.
Movimento do ar dentro dos sistemas centrais de condicionamento
1 . No ambiente de trabalho, o ar é poluído com fumaça de cigarro, fungos, bactérias, ácaros e outras sujeiras •.•.•.••...•••••.• ""'••••.•••••••••••••.••• ,, ••••••••·•."n •••••.'••••••.•
2 . O ar é absorvido pelo equipamento, passa pelo filtro e pelo trocador de calor onde vai se resfriar
0"'---'"
3 . Com o resfriamento do ar, gotículas caem na bandeja de água. Se o local não estiver limpo (figura Al, os microrganismos proliferam e são levados pelo ar para o ambiente.
r
1I1'1111i
•.••.•.•..•..•.•..•.•.•• n."•••••••••••.••••••.•..••••••.••••••.••.••••..•• •••••••••••••••••••• u••••••••••••••••••• ,•••u••••••••••••••••••••• " ••••• ••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••.•• n••n••••••••••••••••••••••••••••
4· Pastilhas colocadas na bandeja impedem a proliferação de microrganismos (figura Bl. 5· O ar limpo e frio é enviado para o ambiente de trabalho
No final do ano passado, conta Mariângela, a viabilidade técnica da pastilha foi comprovada. "Agora na segunda fase do projeto, estamos trabalhando na simplificação e na viabilização econômica': diz. A idéia é testar novas matrizes de suporte para o bactericida, o fungicida e a ciclodextrina que apresentem boa resistência mecânica sem exigir muito aquecimento no processo de produção. A necessidade de utilizar fornos industriais com temperatura de até 500 graus centígrados encarece a fabricação das pastilhas em razão da enorme demanda energética para produção de calorLiberação gradual - "Já obtivemos resultados promissores com um material de custo relativamente baixo e de grande disponibilidade no país': afirma Carvalho. Esse material, além dos nomes dos fungicidas e bactericidas encapsulados na pastilha, e o tipo da ciclodextrina que assegura a liberação gradual dos princípios ativos são segredos do negócio e não podem ser revelados. Mariângela diz, contudo, que nos primeiros testes o novo candidato a matriz assegurou a ação dos princípios ativos por mais de 15 dias. E, pelo menos no mercado brasileiro, dobrar a duração do efeito será suficiente. "No início, trabalhamos com a perspectiva de efeito prolongado por três meses, que era en-
tão o intervalo mínimo para a manutenção dos sistemas de ar-condicionado, conforme norma da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)", conta Carvalho. Hoje, a Portaria número 9, de abril de 2003, desse órgão exige que os aparelhos sejam verificados a cada mês. Evidentemente, a necessidade de limpar os equipamentos e purificar a água neles acumulada com maior freqüência aumenta os custos de sua manutenção. testes oS a serem realizados daqui para a frente também existe o objetivo de avaliar o desempenho da pastilha fora do laboratório, e a STQ já mantém parcerias com algumas empresas de manutenção de aparelhos de ar-condicionado. Recentemente, uma delas sugeriu o desenvolvimento de mais um produto, voltado para a manutenção de sistemas de condicionamento de ar em automóveis. A sugestão está em análise pelo grupo de pesquisadores-empresários. Para o produto que motivou a fundação da STQ, que deve estar pronto para o lançamento comercial no final de 2004, mercado é o que não falta. Conforme dados da Associação Brasileira de Refrigeração, Ar Condicionado, Ventilação e Aquecimento (Abrava), cerca de 400 companhias, na maior
N
parte de pequeno e médio porte, atuam nesse segmento, movimentando, no total, cerca de R$ 1,1 bilhão por ano. E o mercado de sistemas de ar-condicionado central está em plena expansão já há oito anos - sua taxa de crescimento gira em torno dos 20% ao ano. Se a STQ vai produzir a pastilha é uma questão ainda em aberto. "Talvez optemos pela terceirização do processo de produção e até mesmo pela transferência da tecnologia para uma grande companhia", comenta Carvalho. E um novo projeto em fase de detalhamento talvez fortaleça a perspectiva de prestação de serviços high tech, com receita baseada em projetos e royalties. No final do ano passado, a STQ, que logo no início de suas operações passou a ter apenas três sócios-fundadores - além de Carvalho, Sinisterra e Nelcy Mohallem -, atraiu para a sociedade o professor Robson Santos, do Departamento de Fisiologia e Biofísica do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que vai trabalhar em projetos de formulações farmacêuticas e sistemas de liberação controlada de fármacos e testes pré-clínicos para companhias do setor. "Três delas já manifestaram interesse pelos nossos conhecimentos, com o objetivo de encapsular seus produtos em ciclodextrinas e polímeros biodegradáveis",revela Carvalho. • PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 77
I
HUMANIDADES
dinamismo exibidopela economia brasileira ao longo dos 50 anos corridos entre 1930 e 1980 distinguiram o Brasil no cenário mundial. Poucas foram as nações que lograram o crescimento médio de 6% ao ano, que destacou o país no período da moderna industrialização. A partir dos anos 80, no entanto, a história econômica nacional tomou rumo oposto e a expansão média do Produto Interno Bruto (PIE) encolheu para algo ao redor de 2% ao ano - um terço da média anterior. Em parte, é verdade, essa tendência refletiu a retração global das taxas de crescimento. O que tem inquietado parte dos economistas, contudo, é o fato de o Brasil não ter conseguido tirar partido de algumas condições favoráveis que, ao longo dos anos 90, marcaram a economia mun-
O
78 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
dial, aí incluídos alguns países emergentes, e retomar a rota original. A desaceleração rompeu o século, as taxas de desemprego continuam aumentando, enquanto os rendimentos médios reais seguem encolhendo. Somados, esses indicadores têm afastado o Brasil do grupo de países dentre os quais se sobressaiu no século passado. Esse cenário tem levado alguns economistas a propor alternativas para romper .essa espécie de "resistência" à retomada do crescimento. Ricardo Carneiro, professor do Instituto de Economia e diretor do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), faz parte desse grupo. Essa é a razão pela qual dedicou anos ao desenvolvimento de uma pesquisa em que buscou responder às razões pelas quais o país não conseguiu retomar o fôlego e fazer a necessária correção de curso.
Conjuntura histórica - A síntese desse empreendimento, que contou com o apoio da FAPESP por meio de uma' bolsa de pesquisa no exterior e, posteriormente, com a continuação dos trabalhos no âmbito de projeto temático financiado pela instituição, resultou no livro Desenvolvimento em crise - A economia brasileira no último quarto do século 20, que saiu pela Editora Unesp no ano passado. Nele, Carneiro examina as condições que permitiram ao Brasil crescer rapidamente entre 1930 e 1980; os motivos pelos quais elas saíram de cena; e de que modo esses fatores pesaram no "esgotamento do dinamismo do capitalismo brasileiro': O texto evidencia a permanente articulação entre fatores internacionais e domésticos que interferiram na vitalidade econômica brasileira, assim como o
peso de conjunturas históricas específicas, que, ora fizeram preponderar determinantes externos ora internos como estímulo ou obstáculo ao crescimento brasileiro e pontua diferentes graus de dependência nacional à ordem econômica internacional. A relativa estabilidade do padrão tecnológico, que, até a década de 80 difundiu e consolidou a matriz produtivo-tecnológica originada na Segunda Revolução Industrial, sustenta o autor no livro, foi fundamental para que o país conseguisse superar até mesmo as contingências internacionais adversas que marcaram o período 1929-1950 e se mantivesse crescendo. Na mesma direção, o mercado interno foi extremamente relevante, ajudando no crescimento do produto brasileiro. Do ponto de vista externo, contribuíram ainda a disponibilidade de fi-
nanciamentos e a vigência de uma ordem econômica internacional, cujas regras relativas ao comércio e às finanças favoreciam os países periféricos, permitindo-lhes maior autonomia no planejamento e execução das respectivas políticas econômicas domésticas. Do ângulo interno, a intervenção direta do Estado na economia e sua articulação com o setor privado representaram outro pilar. Estruturalmente, a combinação dos setores produtivos que lideraram a expansão econômica no período, junto com a possibilidade de sincronizar financiamentos de longo prazo para atender à demanda de investimentos nos prazos e volumes requeridos foram igualmente relevantes. No curso dessa trajetória, alguns solavancos definiram três períodos analisados em Desenvolvimento em Crise. O PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 79
primeiro situa-se em 1973, época em que se abandona o regime de taxas cambiais fixas mas ajustáveis que pôs fim à ordem de Bretton Woods. Este foi o nome dado à Conferência Monetária e Financeira realizada em 1944 da qual participaram 44 países com o objetivo de planejar a estabilização da economia internacional e das moedas internacionais, então prejudicadas pela Segunda Guerra Mundial. Nessa reunião nasceram o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (Bird). Plano nacional - No plano interno, em meados da mesma década, enquanto a elevação dos preços do petróleo esboçava uma crise internacional e doméstica, o governo de Ernesto Geisel anunciava, em 1975, o 2° Plano Nacional de Desenvolvimento Econômico (11 PND), com a pretensão de transformar o Brasil em "potência emergente", e de incluí-lo no rol de países altamente industrializados por meio da substituição de importações, elevação das exportações e ampliação do mercado interno consumidor. O relativo insucesso do 11 PND, que teve por pano de fundo o crescente agravamento das condições internacionais e a dependência brasileira dos financiamentos externos, levou ao que Carneiro chama de derrocada do nacionaldesenvolvimentismo. Os resultados que se apresentaram foram muito distintos dos almejados - entre outras coisas, elevar o PIB a US$ 120 bilhões e a renda per capta a US$ 1 mil, quatro anos mais tarde, em 1979. Segue-se a década de 80, conhecida como a "década perdida", caracterizada pela crise da dívida externa dos países periféricos e pela transferência de recursos ao exterior, fatos que desorganizaram crescentemente a economia brasileira e contribuem para pôr em curso a hiperinflação. A partir de então, o vigoroso e rápido crescimento obtido a partir dos anos 30 foi interrompido. Começa o segundo solavanco. Alternam-se ciclos 80 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
Fuscas prontos para serem vendidos, em 1973: a rigor, ciclo do "milagre econômico" chegou ao fim em
breves de recessão e expansão econômica e a taxa de crescimento passou praticamente a acompanhar o aumento da população. O financiamento externo, até então abundante e fonte relevante dos investimentos no país, desapareceu. Simultaneamente, o pagamento do serviço da dívida externa estreita as alternativas de desenvolvimento. A rigor, a desaceleração no ritmo do crescimento já começou a ser constatada a partir de 1974, quando chegou ao fim o ciclo do "milagre éconómico" Mas a chegada dos anos 80 imprimiu-lhe outro perfil, oscilando entre a redução absoluta e uma intensa, mas episódica, variação. Entre 1981 e 1983 a retração foi intensa. No intervalo entre 1984 e 1986, ano em que foi instituído o Plano Cruzado, houve uma expansão de intensidade equivalente à trajetória anterior. Finalmente, de 1987 a 1989 ocorre nova estagnação. Padrão de crescimento - Essa foi a maior expressão da ausência de um padrão de crescimento sustentado retratado na profunda incerteza em relação ao cenário econômico brasileiro. O Brasil vira os anos 90 sem vitalidade, apesar da recuperação do cenário internacional, que abre espaço para oportunidades de melhora para os países periféricos, mas apresenta mudanças que se traduzem em imensos desafios para as
1974
nações em desenvolvimento. Com a queda das taxas de juros internacionais, as aplicações financeiras tornaram-se altamente atrativas nos países periféricos. A liberalização econômica e financeira patrocinada por muitos países latino-americanos combinada com a liquidez de capital em busca de lucros mais atrativos do que os oferecidos pelos países centrais, foram decisivos para a reinserção do continente e, junto com ele, o Brasil, no circuito financeiro internacional. evolta ao palco internacional e animados com a ampliação dos fluxos de comércio e financiamentos, muitos entre esses países animam-se a promover reformas estruturais nas áreas comercial, financeira e produtiva. No mundo, verificase a aceleração global das taxas de crescimento, embora de maneira desigual. Também ganha corpo a proposta de uma ordem plenamente liberal, em que se destacam a eficiência dos mercados como mecanismo de alocação de recursos e a idéia de que a interferência do Estado na economia é ineficaz. São intensas e velozes mudanças de toda ordem e em diferentes planos do tecido comercial, financeiro e produtivo na esteira da globalização. Muitas tornamse protagonistas de decisivos revezes para os países periféricos. A velocidade
D
Bolsa de Valores de São Paulo, em 1971: dinamismo do capitalismo brasileiro não durou até o fim da década
impressa às inovações tecnológicas nos países centrais, já a partir dos anos 80, por exemplo, fez com que muitos deles deixassem de acompanhar o ritmo de atualização, dificultando e até impedindo a manutenção dos respectivos processos de substituição de importações. Com isso e por conta da indisponibilidade de tecnologia e de escalas de produção economicamente viáveis, a internalização de novos processos produtivos instituídos nos países desenvolvidos tornou-se mais difícil. A globalização impôs profundas transformações no comportamento do investimento direto estrangeiro. Entram em cena as fusões e aquisições e o global sourcing. A ação conjunta desses atores resulta em sobrecarga para o balanço de pagamentos dos países periféricos. Somados, eles passaram a ampliar a remuneração do capital sem a geração correspondente de divisas e a elevar de maneira global as importações realizadas por essas economias. Esse problema foi agravado pelo caráter volátil de parcela expressiva de financiamentos externos. Além disso, a integração do país à globalização resultou em flutuações exacerbadas nas taxas de câmbio e taxas de juros excessivamente altas, binômio que prejudicou o crescimento doméstico. O Brasil não escapou à intensidade e variedade das mudanças implemen-
tadas nos anos 90. Junto com a retomada dos fluxos de capital, instaurou-se uma âncora cambial, controlou-se a inflação, as importações cresceram, o processo de privatização das empresas estatais colocou o país na berlinda internacional e reduziu-se extraordinariamente o papel do Estado, enquanto ganhava espaço a abertura financeira. Um espaço, que do ponto de vista de Carneiro, foi muito liberal, mal regulamentado e permitiu uma excessiva vulnerabilidade externa da économia brasileira visível nas dimensões do endividamento externo de curto e longo prazo e na deficiente transformação produtiva, da qual a inserção pouco dinâmica do Brasil no comércio internacional é a resultante mais evidente.
o PROJETO Líberalização, e Crescimento e Perspectivas Brasileira nos
Estabilidade (Balanço da Experiência Anos 90)
MODALIDADE
Projeto temático COORDENADOR LUIZ GONZAGA DE MELLO BELLUZZO-
Instituto de Economia da Unicamp INVESTIMENTO
R$ 94.388,28
A partir de 1994, com a instituição do Real, a política econômica brasileira, em um ambiente de plena abertura financeira, adotou o câmbio fixo. O programa de estabilização deu impulso à recuperação do PIB e dos rendimentos, embora não tenha conseguido reduzir substancialmente o desemprego. Mas seu fôlego foi restrito. O ciclo de crescimento começou a desacelerar em meados de 1997. Não tardou para que os efeitos do câmbio fixo sobre o conjunto da economia provocassem uma deterioração constante e crescente dos indicadores, empurrando o país para uma crise. Ainda assim, foi mantido até 1998, quando uma nova correção de política econômica instituiu o câmbio flutuante, metas de inflação, política fiscal contracionista e uma política monetária independente. "Os resultados da mudança, traduzidos pela timidez da expansão do PIB, pela elevação da taxa de desemprego, e pela redução dos rendimentos médios reais, além da trajetória da inflação, mostram que essa receita também não funciona", afirma. Segundo Carneiro, ao adotar os sistemas de câmbio fixo e, posteriormente, o flutuante, o Brasil apenas substituiu seu foco de instabilidade econômica. Durante 20 anos, diz ele, a vilã foi a inflação. Agora, o país está submetido à instabilidade provocada pela excessiva flutuação da taxa de câmbio. Como país emergente, endividado e com baixa inserção no mercado internacional, o Brasil não atrai capital de longo prazo e sofre com os efeitos da volatilidade do capital de curto prazo e com seus reflexos sobre o aumento da dívida pública, parte dela indexada ao dólar. "A alternativa para retomarmos o crescimento e resolvermos os problemas atrelados à desaceleração é abandonar a idéia de que, num ambiente globalizado, seja possível promover o desenvolvimento simplesmente desregulando a economia e deixando o mercado conduzir o processo", diz Carneiro. "O Brasil não pode querer sustentar um modelo de política econômica como se fosse um país desenvolvido:' • PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 81
PROJETO
Instituto
MusAS
REALIZAÇÃO
PROMOTORES
Itaú cultural
Teatro AlliilE,;s~EnH1Çaise www.atiaucafmnccea.com.br
• HUMANIDADES CULTURA
POPULAR
RG com ritmo e muita cor Estudo mostra como adolescentes da periferia encontram identidade na cultura hip hop CARLOS
Jovens: mídia ora glamouriza, ora demoniza juventude
HAAG
er ou não ser? Se na fria Dinamarca de Hamlet se ouvisse hip hop ou, se o príncipe angustiado pudesse grafitar as paredes do castelo do titio malvado, talvez, a tragédia de Shakespeare tivesse um final menos sangrento. Disposta a entender o mecanismo da adolescência, em que o jovem se vê jogado em um limbo, definido pelo que não é (não mais uma criança e ainda não um adulto), forçado a "achar" sua identidade a qualquer custo, Viviane Melo de Mendonça Magro, da Universidade
S
Estadual de Campinas (Unicamp), entrevistou jovens, moças e rapazes, da periferia de Campinas (SP). Em Meninas do Graffiti: Adolescência, Identidade e Gênero nas Culturas Juvenis Contemporâneas (título provisório), sua tese de doutorado, somos apresentados a um novo retrato dos adolescentes, em especial os tão estigmatizados jovens negros da periferia das grandes cidades. Longe dos "marginais" de músicas barulhentas, temos um grupo que faz da cultura hip hop sua maneira de mostrar o que são e não são na sociedade.
se PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 83
"A cultura hip hop é composta de pouco tempo é reelaborada pela mídia e revendida para os adolescentes como três expressões principais: o rap, que é tendências a ser seguidas, sob a pena da uma música com letras longas, quase exclusão de quem não as segue. A confaladas, e tem como base samplers musicais e batidas fortes elaboradas pelos testação vira mainstream e, assim, a cultura jovem cai em poder da lógica DJs; o grafite, uma técnica que compõe do mercado. Em várias entrevistas com pinturas coloridas feitas em muros, metrôs e paredes; e o breakdance, que se jovens da periferia, a autora nota a inconstitui de coreografias baseadas nas coerente admiração-ódio pelo hip hop, músicas de rap e elaboradas com movipelo rap, pelo grafite, ora visto como mentos quebrados que siexpressão legítima, ora corroído pelo comerciamulam lutas ou robôs, e são geralmente dançadas lismo da sociedade capiem grupo", afirma a pestalista. Longe de confusão, Meninas é a visão do real. ''A juvenquisadora. sofrem Não parece grande notude tem estado presente vidade. Perceber a músimaciçamente na mídia, discriminação ca pode ser um mediador tanto no sentido de demode gênero no para que os adolescentes nização como de sua glorificação", observa Viviane. tenham maior compreenmeio grafite são de si mesmos, mas ViA pesquisadora, porém, insiste na existência viane vai mais longe ao revelar, empiricamente, de novas perspectivas. ''A relação adolescente, identidade e eduque a cultura hip hop "se constitui pela necessidade de sociabilidade e afirmacação afasta-se da necessidade de uma ção étnica-cultural dos jovens e adodefinição de identidade, como meta ou lescentes, bem como oferece elementos um pré-requisito para a entrada no mundo adulto, pois não há uma idenpara a configuração das suas identidades pessoais, marcados pela busca de tidade, mas instantes de identidades, outras alternativas de pensar o mundo sempre mutantes, em devir, em um proe atuar dentro dele como resistência a cesso constante de autorizar-se", avalia. Esse engano, constante na visão geral dos uma pedagogia discriminadora, mercadológica e reificadora da exclusão adolescentes, tem causa. "Raramente social", como observa a autora. Assim, aquilo que é dito sobre os adolescentes inusitadamente, "os jovens com sua emerge de suas próprias vozes, mas são cultura hip hop surgem como protagoditos por meio de uma categoria vazia nistas de seu próprio processo educadenominada adolescência, que é depotivo, no qual se tornam 'autores de si sitária da própria crise de sentido, de mesmos', ou seja, resgatam a educação. identidade, de lugar da sociedade contemporânea." como uma formação de 'autores-cidadãos": A contradição, no entanto, vai mais longe e, no movimento de rebeldia esEsse é um ponto fundamental para a pesquisadora, que se preocupa em tão, também, sementes da repetição. mostrar o jovem como um sujeito que formula questões relevantes no campo PROJETO social e não o alienado mostrado pela mídia ou analisado por estudos conserMeninas do Graffiti: Adolescência, vadores. Acima de tudo, a professora Identidade e Gênero nas Culturas quer fazer de sua pesquisa um instruJuvenis Contemporâneas mento prático que ressalte a importânMODALIDADE cia da valorização desses movimentos Bolsa de doutorado culturais para a melhoria das condições de crescimento dos adolescentes. Em ORIENTADORA ISAURA ROCHA FIGUEIREDO especial nos momentos mais recentes, GUIMARÃES - Faculdade nota a pesquisadora, há uma interpede Educação/Unicamp netração crescente entre cultura juvenil, mídia da juventude e indústria da BOLSISTA cultura juvenil: o que, de início, era fruVIVIANE MELO DE MENDONÇA MAGRO - Faculdade de Educação/Unicamp to das experiências vividas por jovens, forma de expressar suas aspirações, em
o
84 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
''As falas dos adolescentes são falas marginais, transgressoras e que estão construindo também sentidos que atuam como uma forma de resistência como um modo de manter aquela ordem social", observa. Nesse contexto, está o outro eixo importante da pesquisa de Viviane: as diferenças de gênero entre os adolescentes no mundo hip hop, e mais especificamente no grafite.
/ complexa a inserção das meninas nesse mundo contestador de sons e grafites e as entrevistas da pesquisadora revelam essas dificuldades. ''As meninas vivem uma mesma situação de preconceito e discriminação por serem mulheres e gostar de hip hop, ou de ouvir rap ou de fazer grafite, embora respondam de forma diferenciada a essa situação", conta. "Elas demonstram uma necessidade de respeito e aceitação, por serem mulheres, negras e brancas, pobres que gostam e participam do hip hop. Parecem querer se superar, diferenciar, quebrar os padrões que se impõem sobre seus corpos para que assumam sua posição de 'verdadeira mulher'. " Assumindo um movimento fortemente marcado pelo masculino "um espaço de aceitação que as permite 'ser quem são', o que não exclui que continuem lutando mesmo dentro do movimento por esse espaço", observa Viviane. Afinal, tudo se resume a um processo de constituição de um sentimento de pertencimento a uma comunidade, em que consciência de si e consciência social estão amalgamadas, como nota a professora, levando "a uma necessidade de superação da situação de exclusão social juntamente com a transformação de si': Daí, o jogo complexo dos gêneros, repetindo modelos que pretende superar. "O hip hop é um instrumento de expressão de si próprios e de conscientízação social, por meio do qual a masculinidade é afirmada, reproduzindo os papéis hegemônicos e dicotômicos de homem e mulher, em que o espaço público é tomado pelos homens e o espaço privado, subordinado, é ocupado pelas mulheres", nota. Seja como for, o movimento nascido nos Estados Unidos dos anos 70, para dar conta da desilusão de negros e hispânicos em meio à decadência do . american dream, o hip hop chegou ao
E
Brasil e se tornou para muitos jovens "a primeira forma de refletir culturalmente e lingüisticamente os problemas de sua comunidade e do mundo, assim como elaborar uma reflexão crítica de suas próprias experiências e posições, tornando-se o fundamento da auto-expressão juvenil", diz Viviane. "Em especial, nos espaços de exclusão social, de um país subdesenvolvido, nas periferias dos centros urbanos, no cotidiano, nas experiências de adolescentes e jovens negros e 'pardos' em uma manifestação cultural juvenil, no grafite, e principalmente nas experiências das . " menmas. A mistura de salto (hip) e balanço dos quadris (hop) serve a uma razoável gama de propósitos para esses jovens.Nas entrevistas, Viviane detectou alguns deles, como: a experiência de se identificar com a cultura hip hop, ou seja, um meio de se sentir pertencendo a um grupo, a uma comunidade e a uma nação, escapando da desesperança, dando sentido às suas vidas e com capacidade de ajudar aos outros colegas; a experiência do compromisso social, a capacidade de autonomia do "construir-se a si mesmo" como um ser em um mundo social, interessado e capacitado a mudar a mentalidade geral das pessoas sobre o que eles efetivamente são; a experiência de pertencer a uma família, ser aceito após amargarem a rejeição da família real e extensa;a experiência de ser alguém, já que o hip hop dá aos jovens excluídos um aumento na auto-estima e a compreensão do valor de suas idéias e sentimentos, expressos pelo movimento e pelacapacidade de narrar a si próprios, a ponto de ser admirados por amigos e familiares; e, por fim, a experiência deter amigos e de ser mulher e gostar dehip hop. Em suma, tudo aquilo que permite aos jovens ser, mesmo que muitos adultos ainda insistam que elesnão são. •
Ícones: adolescentes como protagonistas da sua formação PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 85
• HUMANIDADES
PATRIMÔNIO
A alma
sacra brasileira
Livro revela a arqueologia das igrejas do Estado de São Paulo DÉBORA
CRIVELLARO
muitas á formas de contar uma mesma história. É possível, por exemplo, aprender sobre São Paulo do período colonial detendo-se nas igrejas erigidas nessa época. Na verdade, nem é necessário fazer uma análise minuciosa desses templos. Um detalhe pinçado de cada um deles pode descortinar uma série de informações preciosas. No livro Igrejas Paulistas: Barroco e Rococó (Editora Unesp/Imprensa Oficial SP), o autor Percival Tirapeli, professor livredocente de Arte Brasileira e Pintura no campus de São Paulo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista (Unesp) escolheu igrejas, pinturas, esculturas e retábulos, estes popularmente conhecidos como altares. A intenção de Tirapeli era mais explícita: o especialista em arte sacra e artista plástico propôs-se a analisar a obra mais importante de cada igreja do Estado que visitou - 69, em 37 cidades diferentes. Com isso, traçaria um panorama da morfologia das ornamentações, sob a lente da arqueologia. "Meu livro não é sobre história das igrejas", avisa o autor. O objetivo é retratar o lado arqueológico, a gênese da arte sacra preservada em São Paulo. Não bastasse o inédito levantamento realizado por Tirapeli, o pesquisador deparou, já ao final de seu trabalho, com um tesouro, que pode ser a mais antiga obra de talha da arte brasileira
H ~ '" ~ v; ;5
~ z ~ z ~ w
w o z
. :l
~
o >--
-"""'-"~"""""'"~~~:;' 86 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
(fotos que ilustram estas páginas). O objeto de madeira teria sido parte da segunda matriz de São Vicente (a primeira foi destruída por um terremoto), dedicada à Nossa Senhora da Conceição, datada de 1559, no litoral de São Paulo. Até agora, essa atribuição era dada aos altares dos Santos Mártires, preservado na Sé de Salvador. O autor optou por trilhar dois caminhos anteriormente traçados para elaborar seu livro. O primeiro, de sua pesquisa de dissertação A Construção Religiosa no Contexto Urbano do Vale do Paraíba, Estado de São Paulo, defendida na USP em 1984. A segunda inspiração veio de Mário de Andrade, que realizou o primeiro levantamento fotográfico das igrejas paulistas, ao lado do fotógrafo Germano Graeser, em 1937, quando da criação do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Sphan). Em Igrejas Paulistas: Barroco e Rococó, Percival Tirapeli decidiu organizar a pesquisa da mesma maneira de Mário de Andrade. Assim, 69 igrejas estão organizadas por caminhos - litoral, caminho para as minas de ouro, caminhos jesuíticos, os arredores de São Paulo, os caminhos para o Sul, para o Vale do Paraíba e para o Vale do Tietê - e em 474 fotos, a maioria inéditas. O livro começou a tomar forma em dezembro de 2001. O autor peregrinou por todas as cidades, após a pré-produção da mestre em artes PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 87
Maria José Spiteri Tavolaro Passos, a abrir caminhos - e, principalmente, seguindo suas indicações, as portas das igrejas - para ele mergulhar na história do lugar. Como base, Tirapeli usou obras consolidadas, como As Igrejas de São Paulo, de Leonardo Arroyo (1954). O Arquivo da Cúria de São Paulo, que tem um dos mais preciosos acervos do período colonial, também foi bastante visitado. E, para conhecer as particularidades de cada uma, lançava mão dos livretos de cada localidade e dos textos básicos das igrejas. erminado o circuito, o professor convocou o fotógrafo Manoel Nunes da Silva para registrar as imagens. Começou tudo outra vez. "Percorri duas vezes quase todas as 37 cidades", conta Tirapeli. A intenção era preservar a atmosfera original dos templos, empreitada muitas vezesdifícil,pois eles estavam descaracterizados pela ação dos fiéis, acostumados a dar um toque pessoal aos altares e às imagens. A primeira atitude ao adentrar uma igreja era tirar toalhas e flores do altar. "Em alguns lugares eles estavam absurdamente enfeitados': conta o autor. Em algumas localidades, ele se atrevia a pedir mais do que uma mera remoção de vasos de flores. No Embu, por exemplo, requisitou ao sacristão que se tirassem os bancos, já que eles não existiam no período colonial. Obviamente, muitas vezes não foi possível anular a ação dos séculos. Alguns adornos já haviam se integrado à decoração original, a ponto de ser impossível retirá-Ias do local. Caso de singelos coraçõezinhos vermelhos milimetricamente ordenados na primeira fileira de bancos de uma igreja, ou das flores de plástico graciosamente ajustadas emoldurando uma imagem de altar lateral. A iluminação também foi outra grande preocupação. Manoel Nunes da Silvautilizou só o recurso do flash, sem outros artifícios de iluminação. A intenção era deixar reinar a luz natural, que, no caso das igrejas, é mais sinuosa. O problema é que a empreitada dos autores do livro foi realizada
no período pós-apagão e muitos templos estavam infestados de lâmpadas brancas. A alternativa foi fotografar com as luzes desligadas. "Lutamos para deixar os modismos de lado, mantendo as obras tal como foram planejadas e executadas pelos seus artistas e arquitetos." O calendário católico foi naturalmente cumprido. Em um ano e meio de viagens, a dupla deparou com a decoração do tempo da Quaresma, de Corpus Christi, do Natal. Elas foram muito bem aceitas pela lente de Manoel Nunes
da Silva."Decidimos respeitar a coloração litúrgica de cada período:' Outra inovação do livro é a de fotografar altares com suas bases, inteiros. Segundo o pesquisador, os livros de arte ignoram solenemente essas bases dos altares por ser muito difícil enquadrá-Ias. Para conseguir tal feito, é necessário tirar bancos da igreja, afastar tudo, pois tais obras de arte chegam a medir 8 metros de altura. Algumas das fotos de Germano Graeser também estão estampadas no
T
88 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
Santa Madalena (século 18), de Itu. Retábulo Nossa Senhora das Dores na nave da Catedral de Campinas
livro, auxiliando no reconhecimento das igrejas. Quadros de Benedito Calixto e Miguelzinho Dutra também. Sempre que possível, Tirapeli organizou a explicação de uma igreja com todos os olhares possíveis. Feito o trabalho, surgem as inevitáveis perguntas: qual a igreja mais bonita? E a mais rica? Como bom professor de História da Arte e artista plástico que é, Tirapeli evita todo e qualquer comentário desse tipo.
Mas não se furta a enfileirar alguns rankings menos subjetivos. Por exemplo, a cidade que tem mais igrejas do período colonial é Itu (são cinco no livro). A mais completa, ou preservada, é a Igreja da Ordem Terceira do Carmo, que fica na avenida Rangel Pestana, no Centro de São Paulo, sendo seguida de perto pela Igreja da Ordem Terceira de São Francisco, no Largo São Francisco, também no Centro; pela Capela de São
Miguel, dos jesuítas, em São Miguel Paulista, também na capital; e pela capela do Sítio Santo Antônio, em São Roque. A mais portentosa é a Catedral de Campinas, toda talhada em cedro, e feita por um escultor baiano num período colonial mais tardio. Um leitor mais sagaz concluiria que elaborar um ranking de igrejas paulistas seria mais difícil porque elas são mais modestas frente à majestade dos tradicionais exemplares mineiros ou baianos. Tirapeli refuta veementemente essas insinuações. Primeiramente, faz alusão ao valor histórico da arte sacra de São Paulo, mais antiga que das outras regiões. As igrejas paulistas começaram a ser erigidas por volta de 1560, enquanto as de Minas Gerais, por exemplo, por volta de 1700. Mas ele se curva às evidências no que diz respeito à estética. "Aqui não há templos estonteantes como os de Minas e da Bahia, é um barroco mais espartano, mas a essência da arte portuguesa está presente", diz. Há uma vantagem nessa beleza acanhada: as igrejas paulistas estão mais preservadas do que as de outros estados - justamente por não ostentarem tanta riqueza, tanto ouro, foram menos saqueadas. O trabalho do autor de livros como As Mais Belas Igrejas do Brasil (Metalivros, 1999) e Barroco Memória Viva (Editora Unesp/ Imprensa Oficial, 2001) durou um ano e oito meses. Ex-aluno do Seminário Redentorista de Santo Afonso, desde os 14 anos acompanhava os padres sempre a venerar a imagem de Nossa Senhora Aparecida, em Aparecida. Tirapeli sabe que cada foto do seu livro conta histórias de objetos onde estão depositados o sagrado, a cultura, a história. Nada como uma peça sacra para retratar a alma brasileira, aposta ele. • PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 89
.HUMANIDADES ARTES
PLÁSTICAS
Será que ela é? T UdO começou como uma pesquisa técnico-científica. Hoje, quatro profissionais ligados à Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) formam o grupo mais experimentado do Brasil numa arte preciosa: descobrir pinturas, esculturas e objetos de arte falsos. Os falsários agem na surdina, mas seu trabalho, extremamente especializado, é capaz de aquecer mercados, supervalorizando obras de certos artistas e reproduzindo centenas de peças inexistentes na história da arte.
, .,
....-----==---
90 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
Faculdade de Belas Artes da UFMG desenvolve técnicas científicas capazes de dizer se uma obra é falsa ou verdadeira
RENATA
SARAIVA
Caso de polícia, que demorará um bom tempo para ser resolvido.Além de não existir uma lei nacional capaz de regular as penas para a falsificação de obras e objetos de arte, é difícil, conforme constatou a reportagem de Pesquisa FAPESP, que marchands e leiloeiros falem abertamente sobre o assunto,embora muitos delessaibam quem são e onde atuam as quadrilhas falsificadoras. Dos oito laudos realizados pelo grupo da Escola de Belas Artes de Minas em 2002, sete obras foram consideradas falsas. Um único documento emitido por esses profissionais, que
PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 91
Di Cavalcanti: "Um verdadeiro artista não se repete. Quando isso ocorre, é motivo para desconfiar", diz pesquisador
além das técnicas científicas usam faro de detetive, é capaz de determinar se uma obra é verdadeira ou não. Geralmente, trata-se de laudos de mais de 150 páginas, com cerca de 200 fotografias. "O mercado de falsificações está crescendo cada vez mais, conforme a crise econômica aumenta", explica o professor Luiz Antônio Souza, coordenador dos trabalhos. Novas combinações - O bom falsário é o que copia características do artista, misturando-as em uma nova combinação, jamais existente em uma obra original. Muitas vezes, porém, essa colcha de retalhos é tão malfeita que não é preciso ir muito longe para se ter os primeiros indícios de uma falsificação. Foi o caso de um quadro em acrílico atribuído a Guignard analisado pela equipe de Souza. A peça era um contra -senso, uma vez que Guignard morreu em 1962 e o acrílico só começou a ser utilizado em pintura em 1969. Uma peça como essa é reprovada já na análise de materiais feita pelo coordenador, Luiz Souza. Químico, ele é capaz de identificar a idade do material utilizado. Essa análise, bastante técnica, é complementada pelo trabalho de Mário Anacleto, um técnico em restaura92 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
ção que define qual a idade exata do quadro, escultura ou objeto de arte. Muitas vezes, a peça não é contemporânea, mas se trata de um objeto atribuído ao século 17, por exemplo, mas que se descobre ter sido produzido no 18, não deixando claro aos pesquisadores se é o caso de uma falsificação ou de um artefato feito por uma oficina herdeira daquela do século 17. Depois deuma análise técnica, a peça é encaminhada ao historiador Marco Elísio. "Analiso as características formais da obra, para 'avaliar se do ponto de vista estilístico a datação confere': explica o professor, que já trabalhou como perito para a Hantington Gallery, em Ostin, nos Estados Unidos. Ele é capaz de identificar se a obra de um pintor corresponde mesmo à fase da década atribuída no quadro. "É preciso ficar atento para o fato de que um verdadeiro artista jamais se copia ou se repete. Quando um elemento formal aparece várias vezes na obra, esse é um motivo para se desconfiar dela", explica o historiador. As análises materiais e estilísticas são complementadas por um banco de assinaturas originais de artistas como Guignard, Pancetti, Di Cavalcanti e Djanira. A análise grafodocumentoscópica é de responsabilidade de Maurício Brandão
Ellis, do Instituto de Criminalística. Utilizando réguas e transparências, Ellis é capaz de identificar se uma assinatura é falsa ou verdadeira, informação que é entrelaçada com as demais análises para uma conclusão final. "Analisamos obras atribuídas a qualquer artista, com exceção daqueles que já têm institutos ou especialistas voltados para isso, como é o caso de Portinari, por meio do Projeto Portinari", diz Marco Elísio. historiador menciona o exemplo de uma obra atribuída a Pancetti e datada por meio de uma informação escrita no verso do quadro. Sua desconfiança surgiu quando notou que a musa a quem o pintor dedicava o quadro no mesmo verso, seu hábito por quase toda a carreira, não correspondia à mulher por quem se dizia apaixonado no mesmo período que os traços estilísticos do quadro revelavam. "Aquilo me intrigou, pois embora o falsário pudesse copiar os traços estilísticos, não obrigatoriamente ele conhecia a biografia de Pancetti", recorda. Foi então que ele pediu a análise de Brandão Ellis. "Logo se viu que a assinatura era falsa. Tínhamos a prova de uma desconfiança levantada pela análi-
O
Pancetti: falsificação de uma das obras do pintor só foi descoberta porque o perito conhecia sua biografia
ill-
er'giu ill-
so, na, em do veora Iilísecia e de
se do estilo, misturada com o conhecimento da biografia do artista", observa Elísio. As análises técnicas do grupo de pesquisadores da UFMG são desenvolvidas nos laboratórios do Centro de Conservação e Restauração de Bens Móveis (Cecor), órgão complementar da Escolade Belas Artes. Foi no Cecor que toda a pesquisa desenvolvida por Souza e seu grupo se iniciou. "No passado, o serviço era oferecido pelo próprio centro. Hoje, a Escola de Belas Artes assumiu essa responsabilidade, mas continuamos usando a infra-estrutura do centro, além de recebermos apoio da Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa (Fundep)", diz Luiz Antônio Souza. O primeiro caso de análise feita por Souza no Cecor ocorreu em 1995, quando ele e o conservador e restaurador Edson Motta [únior foram chamados para fazer a peritagem de 150 obras apreendidas no Rio de Janeiro. O caso, muito divulgado pela imprensa, envolveu o galerista italiano Giuseppe lrlandini, que organizava uma mostra com obras de Matisse, Picasso, Miro, Boccioni, Di Cavalcanti, Guignard e outros. A apreensão ocorreu depois que um profissional ligado ao Projeto Portinari identificou um carimbo no verso de um quadro atribuído a ele que jamais
fora criado pelo projeto. "O Ministério Público abriu um processo contra Irlandini e mais de 150 obras ficaram sob ação da Justiça': lembra Souza. Globalização - Após analisar 28 obras, o perito descobriu que todas elas tinham uma base branca composta de borato de cálcio, caulim, branco de titânio e PVA. "Até hoje brinco, dizendo que se aquelas obras fossem verdadeiras, poderíamos dizer que a globalização começou no início do século 20, pois parecia que todos os artistas tinham comprado material na mesma loja': explica o pesquisador. "Acontece que Boccioni, por exemplo, morreu em 1902, e o PVA só chegou ao mercado na década de 20." As pessoas que procuram o serviço desses profissionais são as mais variadas: de colecionadores a galeristas, passando por possíveis representantes dos próprios falsários. "Muitos falsários plantam a situação. Arriscam na tentativa de obter um laudo verdadeiro. Por isso, temos que ser extremamente rígidos. Nenhuma análise dura menos de seis meses", diz Marco Elísio. "Sempre que aparecem obras com preços mais baixos que o normal, deve-se desconfiar, pois pode ser um falsário querendo fazer dinheiro rapidamente", observa Souza.
Marco Elísio descreve situações em que se suspeita ser um representante do falsário, o chamado "laranja". "Pode ser uma senhora que diz possuir um quadro de Guignard, uma herança do marido que morreu. Ela precisa vendê-lo, então precisa se certificar de que é verdadeiro", conta ele. "Geralmente, quando fazemos mais perguntas, ela entra em contradição." Há também pessoas que acreditam piamente possuírem obras de inestimável valor, como um morador de Belo Horizonte que afirmava ter um Leonardo Da Vinci. "Ele dizia que o desenho já passara por peritagens na Europa. Quando fizemos exame de raios X, vimos uma anotação sob o desenho: 'Da Vinci'. Podia fazer parte até de uma série de falsificações que incluísse dezenas de artistas consagrados." Os pesquisadores da UFMG não são os únicos profissionais brasileiros que emitem laudos de peritagem sobre obras de arte. Seus relatórios, porém, costumam ser os mais completos, já que envolvem todos os campos de pesquisa ligados a essa atividade. "Além de todas as informações técnicas, fazemos questão de escrever sobre o significado simbólico do artista e a fase a que a obra pertence, quando verdadeira", diz Marco Elísio. • PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2'003 • 93
Os palhaços e a lona Manifestações
circenses nas grandes cidades são objeto de estudo
quenos circos, que o mesmo jogo se realiza ali: a entrada do palhaço Mário Fernando Bolognesi ragmentos de exibições cirfaz contracenarem o sublime e o grotesco, o medo e o riso, o drama censes têm atravessado nosEditora Unesp e a comédia. so cotidiano nas grandes 293 páginas cidades: grupos de palhaços cheO que se constata é o fato de R$ 29,00 que o espetáculo não se dirige ao gam aos restaurantes; malabarisintelectualismo ou à elevação motas, aos grandes cruzamentos, meral. "Ele tem o corpo como a base ninos de rua tentam pequenos primordial da cena, quer seja sob números com bolinhas de tênis. "Cirquização" da vida na cidade? os moldes do sublime corpo acrobático, quer seja o grotesco do palhaço", escreve BologLembranças tristemente nostálgicas do circo, em sua alenesi. Seus artistas não apresentam "interioridades": "Eles gria espetacular? O excelente trabalho de Mário Fernando Bolognesi, são puro corpo exteriorizado, sublime ou grotesco, que se realiza e se extingue na dimensão mesma do seu gesto': A Palhaços, situa-nos bastante bem em relação a tais questões. Dir-se-ia, a partir de sua leitura, serem, estas, manifestaação dos palhaços, em reprises que parodiam as próprias exibições de excelência circense, em entradas de duos ou ções esgarçadas do circo na cidade, às quais falta propriatrios de palhaços, contracenando mímica ou verbalmenmente a lona, ou seja, o próprio circo. A nós, espectadote, ou, ainda, em encenações curtas características dos res, faltaria a disposição ao espetáculo, capaz de tomar em sobressalto as atenções daquele que atravessa a lona. circos-teatros, explora, seja na mímica, seja nos duplos efeitos das palavras, a emergência do corpo, em sua diDe fato, o que a pesquisa permite perceber é que é o circo mensão grotesca, indisciplinada, vivaz. que confere sentido à figura do palhaço e organicidade à O circo traria em si, portanto, uma dimensão inerensua relação com as outras exibições circenses. E o circo, a te de alternância de poderes e de emoções, em que conpartir de transformações históricas, parece apresentar tracenam perfeição e imperfeição, magia e incapacidade, atualmente a tendência a subjugar-se ao mundo do mercado, em seus valores rígidos de excelência e beleza, e a vôos nas alturas e quedas em pleno chão. Ali dentro, a reaperder sua potência, num processo de sedentarização, solidade é como que revertida em suas leis, mas, ao mesmo tempo, nessa alternância de exibições, algo das leis da reabretudo nas grandes cidades. Percorrendo o país, no entanto, o autor nos leva a constatar que o circo, não só o lidade se revela. É o que se expressa naquilo que se consde grande porte, permanece vivo e conserva sua essência. tituiu historicamente como dupla típica de palhaços, em Como diz Bolognesi, a matéria do circo é o corpo, suque contracenam tipos antagonistas, um dominado r e um dominado. O conflito que ali se encena tem uma diblime, como o dos ginastas e acrobatas, ou grotesco, como o dos palhaços. Do espanto, do fascínio com as mensão política, que se irradia pelo terreno mais cotidiano da vida, através das inabilidades e virtudes do corpo. manobras sobre-humanas, passa o espectador ao riso, produzido pelo relaxamento e pela impressão de superioridaPalhaços no restaurante? Malabaristas no semáforo? de, dada pela experiência de, afinal, ser mais que aquele Poder-se-ia, sim, arrematar dizendo que o Brasil é um grande circo. No entanto, é preciso convir com o autor humano, o palhaço. É no jogo incessante entre o sublime e o grotesco, portanto, que se produz, segundo o autor, a que algo de essencial se dissolve na ausência da lona: a emoção do espetáculo circense. Aliando a preocupação potência de uma imaginação feérica e contagiante, que se defronta com a morte a cada movimento e com o riso a em situar historicamente as origens e o desenvolvimento das formas do circo e do palhaço ao interesse em discucada vitória da vida. Executamos, no espetáculo fora da tir, a partir de vários vértices, a significação desses fenôlona, meras tentativas de sermos espectadores frente às menos em termos antropológicos, culturais e artísticos, o tentativas de acerto dos pobres meninos dos pequenos siautor realiza uma pesquisa valiosa, procurando situar as nais de trânsito. Qual das inquietações é mais potente? especificidades e transformações que foram sendo incorporadas aos circos brasileiros, sobretudo os de pequeno CAMlLA PEDRALSAMPAIOé doutora em psicologia clínica e médio porte, que em grande parte se caracterizaram pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e procomo circos-teatros. Descobrimos, percorrendo suas análises das encenações de melodramas levadas em pefessora da Faculdade de Psicologia da mesma universidade CAMILA
PEDRAL
SAMPAIO
F
94 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
Palhaços
LIVROS ~f~i Passagens - Estudos sobre a Filosofia de Kant
o ldeérlc Urbano Paulista na Virada do âécclo
Ricardo Terra Editora UFRJ 196 páginas' R$ 30,00
o Ideário Urbano Paulista na Virada do Século Luiz Augusto Maia Costa RiMa Editora' FAPESP 404 páginas' R$ 44,00
Ricardo Terra conseguiu encontrar em sua obra um notável e inusitado viés para estudar um filósofo algo esquecido, seja pelas suas idéias, seja pela dificuldade na sua compreensão: Kant. Aqui, ele é revestido de uma modernidade surpreendente, que, diz Terra, antecipa Max Weber e Habermas, a saber, a cisão artificial entre as diferentes esferas da cultura: arte, política e ciência. Para Kant, elas existiriam independentes e reunidas.
A rua é conhecida, mas poucos falam sobre o profissional, que deixou grandes marcas na cidade de São Paulo entre 1886 e 1903: Theodoro Sampaio. Fruto de uma pesquisa cuidadosa, o livro traz as realizações urbanas executadas pelo engenheiro, que se formou em 1877 na Escola Politécnica do Rio de Janeiro e, não contente de seu trabalho técnico, também transitou pelo estudo da língua tupi, pela geografia e pela história.
Editora UFRJ: (21) 2295-1535, ramal 111 www.editora.ufrj.broueditora@editora.ufrj.br
RiMa Editora: (16) 272-5269 martes@terra.com.br ou vendas@rimaeditora.com.br
História, Memória, Literatura - O Testemunho na Era das Catástrofes Márcio Seligmann-Silva (orqanizador) Editora Unícamp z FAPESP 558 páginas' R$ 54,00 O livro reúne uma coleção de ensaios sobre um tema cada vez mais delicado e próximo a nós: o testemunho. Cada pesquisador analisa o impacto do teor testemunhal, em que se coloca em xeque a noção de realidade, quando o assunto são as situações-limites nas quais o ser humano é exposto. Assim, artigos discutem o Holocausto, Auschwitz, as imagens do terror, etc., sem deixar de lado o aspecto brasileiro, em especial nos anos 70. Um livro de referência. Editora Unicamp: (19) 3788-7728/7786 www.editora.unicamp.brouvendas@editora.unicamp.br
Ecótonos nas Interfaces dos Ecossistemas Aquáticos Raoul Henry (orqanlzador) RiMa Editora' Fundibio 360 páginas' R$ 39,00
A (NEXISTÉNCIA DA TURA filME
A~oII..;.l,o
••\lb..\r.v.MoMllJ)
,""" ..•..
A Inexistência da Terra Firme - A Imigração Galega em São Paulo, 1946-1964 Elena Pájaro Peres Edusp' Imprensa Oficial' FAPESP 424 páginas' R$ 62,00
A pesquisadora, com sua experiência pessoal de filha de galegos e brasileiros, traz à luz essa onda migratória pouco estudada, ao contrário de italianos e japoneses. As várias peculiaridades do povo espanhol, com todas as suas muitas especificidades regionais, ganha um complicado r quando o assunto são os espanhóis provenientes da Galícia. Surge daí e "deslocado" em sua própria pátria no Brasil. Edusp: (11) 3091-4008/4150 www.usp.br/eduspouedusp@edu.usp.br
Odontogeriatria Noções de Interesse Clínico Ruy FonsecaBrunetti Fernando Luiz Brunetti Montenegro Artes Médicas - Divisão Odontológica 500 páginas' R$ 236,50
Eis um estudo pioneiro de Raoul Henry, que contou com o apoio da '-----'-'-----,,----:::L' FAPESP, sobre a Ecologia de Águas Continentais, cobrindo uma lacuna importante para os pesquisadores dessa área. Neste volume: "Zooplâncton e Características Limnológicas da Planície de Inundação do Rio Paraná"; ''A Comunidade Zooplanctônica ao Longo de Gradientes Longitudinais do Rio Paranapanema"; entre outros.
Um ramo muito específico da odontologia ganha um manual muito precioso para os vários pesquisadores, com uma reunião vasta de artigos sobre o tema ligado à terceira idade: "O Conceito Atual da Medicina Bucal"; "Interações entre Medicina e Odontologia"; "Distúrbios Bucais na Terceira Idade"; "Plano de Tratamento Integrado em Odontogeriatria"; "Revisão sobre Disfunções de ATM na Terceira Idade"; "Nutrição na Terceira Idade"; entre outros.
RiMa Editora: (16) 272-5269 martes@terra.com.br ou vendas@rimaeditora.com.br
Editora Artes Médicas: 0800-559033 (atendimento ao consumidor) www.artesmedicas.com.brouartesmedicas@artesmedicas.com.br
PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 95
PeiqeTeCniiisa
CLASSIFICADOS
• Anuncie você também: tê!. (11) 3838-4008
www.revistapesquisa.fapesp.br
FAPESP
Escola Avançada em Metrologia de Tempo e Freqüência
IPT Instituto de Pesquisas Tecnológicas
CURSO Balanço de massa, energia e controle das emissões atmosféricas aplicados a processos industriais de combustão.
Objetivo Apresentar as principais técnicas de medição e instrumentação, parâmetros que influenciam na eficiência de equipamentos, tratamento de dados, escolha de variáveis de interesse e condições operacionais para execução de ensaios.
Público-alvo Profissionais que atuem na área de processo e necessitem do levantamento de dados experimentais ou operacionais em equipamentos para processos que envolvam transferência de calor e massa (caldeiras, fornos, secadores, incineradores, etc.), para a realização de balanço de energia e de massa e controle das emissões atmosféricas (CO, NOx, SOx e Material Particulado) .
Data: 20 a 24 de outubro de 2003 Horário: 8h30 às 17h30 Local: IPT Vagas: 25 vagas Inscrição A taxa de inscrição é de R$1.200,00 até 19/09 ou R$ 1.500,00 após 19/09, por participante, incluindo material didático, refeições no restaurante do IPT e churrasco de confraternização. Após as inscrições serão enviadas, por fax, a cada participante, informações adicionais sobre hotéis, trajeto de ônibus entre o IPT e hotéis, etc.
A escola vai oferecer aos pesquisadores nacionais a oportunidade de contato com os tópicos atuais na área de padrões de tempo e freqüência. Nessa escola estarão presentes especialistas nos seguintes segmentos: padrões atômicos primários e secundários; relógios ópticos e os pentes de freqüência; tratamentos estatísticos empregados na avaliação dos padrões de freqüência; síntese de radiofreqüência e microondas; travamento de osciladores em fase (PLL); GPS e relógios atômicos aplicados às telecomunicações e rastreamento; programas espaciais; tempo atômico internacional; manutenção da hora nacional como também o selo do tempo; aplicações às teorias fundamentais, entre outros. Período De 5 a 15 de outubro Local Estância Santa Clara, Dourado
(SP)
Apoio FAPESP, CNPq - Programa TIB, Fundo Verde Amarelo, USP, Tec Fly Viagens e Turismo, Opto Eletrônica Realização Centro de Pesquisa em Optica e Fotônica, Inmetro Sociedade Brasileira de Metrologia Informações e inscrições Instituto de Física de São Carlos/USP Caixa Postal 369 CEP 13560-970 e-mail monica@if.sc.usp.br www.if.sc.usp.brr -escola/
Mais informações Sandra ou Andrea Telefone: +55 (l1) 3767-4226 Fax: +55 (11) 3718-0464 e-rnail: cursos@ipt.br
----------~. '---
\, I
/li 96 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
PesaqeTeC"iiisa
'\
\
FAPESP
I
Ligue 3838-4008 ou acesse www.revistapesquisa.fapesp.br
e
• Anuncie você t-ambém: tel. (11) 3838-4008
Ir
= ==
www.revistapesquisa.fapesp.br
~tl ..•• r
=-
•
VAGAS PARA DOCENTES
UNICAMP
Estão abertas até o dia 23 de setembro de 2003 as inscrições para provimento de cargo na categoria de professor doutor, nos Departamentos de Anatomia, Microbiologia, Imunologia e Histologia e Embriologia do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (USP).
VAGAS PARA DOCENTE Faculdade de Engenharia Mecânica Departamento
de Engenharia do Petróleo
até 11/9/2003 (publicação D.O.E., 12/6/2003, página 70) Disciplinas: Escoamento Multifásico em Tubulações, Mecânica dos Fluídos I, Mecânica dos Fluídos 11 Cargo: Professor titular Regime: RTP Inscrições:
mais informações
www.icb.usp.br página do Serviço Acadêmico, Item Concurso e-mail
svacadem@icb.usp.br até 11/9/2003 (publicação D.O.E., 12/6/2003, página 71) Disciplinas: Engenharia de Reservatórios, Fenômeno de Transporte, Simulação Numérica de Reservatórios I Cargo: Professor titular Regime: RTP Inscrições:
telefone
(11) 3091-7395/3091-7423
unesp UNIVERSIDADE
(fax)
i."/fi.
ESTADUAL
até 11/9/2003 (publicação D.O.E., 12/6/2003, página 71) Disciplinas: Engenharia de Operações Marítimas, Introdução a Engenharia do Petróleo, Sistemas Marítimos de Produção Cargo: Professor titular Regime: RTP Inscrições:
i."/f*!*"/f
PAULISTA
"JÚLIO DE MESQUITA FILHO"
FACULDADE DE ODONTOLOGIA Concurso público de prova e título para provimento de um cargo de professor assistente, em regime de turno completo (RTC), na disciplina de Anatomia, do Departamento de Ciências Básicas, da Faculdade de Odontologia do câmpus de Araçatuba/Unesp.
Inscrição Até 10/8/2003
Local Seção de Comunicações Faculdade de Odontologia do Câmpus de Araçatuba/UNESP
Mais informações Telefone (18) 620-3219 e-rnail: uearb@foa.unesp.br
Mai$ informações: Margarida Seixas Maia e-rnail: margarid@fem.unicamp.br; tel. (19) 3788-3209
UFPE Universidade Federal de Pernambuco Departamento de Energia Nuclear abre inscrições para cursos de pós-graduação O Departamento de Energia Nuclear da UFPE estará aceitando inscrições, até o dia 15 de agosto, de candidatos ao ingresso no Programa de Pós-Graduação em Tecnologias Energéticas e Nucleares (Proten). São dez vagas para mestrado e cinco para doutorado. Mais informações Professor Carlos Brayner, coordenador do Proten e-rnail: proten@ufpe.br
PESQUISA FAPESP 90 • AGOSTO DE 2003 • 97
-E F I N A L CLAUDIUS
98 • AGOSTO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 90
,~;Ç ,,J,.
~
VOCE
CONHECE os tons de
Van Gogh, os harmonias
de
Mozart o lirismo de
\
Drummond, os formos de
Niemeyer. VOCE
~
DEVE
CONHECER
A CULT
o·org
WWW.SCI
I
Scientific Electronic Library Online Adote SciELO como sua biblioteca
científica
Adopte SciELO como su biblioteca
científica
Make SciELO your scientific
»»»»»»»»»»»»»)
II
. 4'11'"
I
n- '.
t ion "f IIrazili lihlilr.,
Til.·
qlli',1 :: ••• : 'ho
i-,
rio E,la,
('t'
"0111'
111M'i,'nlifí,· '111
jnl"g'I;d
n dr-
:"'0
. ,
..•1 li'·'
]01111 I'
" l..
1';lIdo. '" 1""'''"'1'''''1' ~.~ 1111,,11h S,'jPllt'P"'; l nfnr mnt io n. Sin lj\dOIlH <1(' Dt'Sf'Il\'HI\'inu'lllo CiPHtifir'u
• -r] h~
r
p.""
- 1-·11 Hla\:iill
d(o ,'.::~:
!\
rv, -,_
111111hIHL~'E - ,"" Lati I. mr r ir-nn nrul r.nrilJhl'all ':lHO'l. Ihf' ProjP('1 h .11. (I SlIp )orl('d by C'NPq - Cou,. '1\'( IIU::'~::''',
t~j(·) ~~
BIREME· OPS· OMS BIREME· OPAS· OMS BIREME· PAHO· WHO
biblioteca virtual en salud
library