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Pesquisa Brasil e a telona Ciência na sétima arte Rádio Eldorado AM
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Novidades de ciência e tecnologia
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Entrevistas com pesquisadores
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Profissão Pesquisa
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Memória dos grandes momentos da ciência
E o que não poderia faltar: sua participação nas seções ■
Pesquisa Responde
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Promoção da Semana
Cineasta Nelson Pereira dos Santos, que foi recém-indicado para a Academia Brasileira de Letras, fala de sua obra
Apresentação Tatiana Ferraz Comentários Mariluce Moura Diretora de redação de Pesquisa FAPESP
Sábados, às 12h30 Reprise aos sábados às 19h30 e aos domingos às 14h
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PESQUISA RESPONDE 22.04.06
Cristiano Cardoso — O que causou a explosão recente de aparelhos celulares? E que cuidados é preciso ter para que isso não ocorra?
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nais. Não se deve adquirir produtos de camelôs, que não garantem a qualidade das peças. Quem faz isso aumenta muito a chance de ocorrer falhas e defeitos no celular.
FOTOS EDUARDO CESAR
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PROFISSÃO PESQUISA 22.04.06
■ João
Antonio Zuffo, da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP) — Num dos casos, o telefone pegou fogo no bolso da menina. Era um telefone que tinha sido alterado. Normalmente, não se usa plástico inflamável. E aquele telefone, segundo me consta, era cor-de-rosa e o plástico exterior parecia ter sido mudado. Num outro caso que conheço, a história é um pouco diferente. O telefone estava recarregando a bateria quando explodiu. Isso pode ter acontecido por dois motivos diferentes: a bateria estava mesmo estragada, aqueceu e explodiu; ou havia um defeito no próprio carregador, que era de má qualidade ou pode ter sofrido um impulso muito forte da rede elétrica. A queda de um raio próximo pode ter queimado os diodos retificadores. Por isso é preciso manter o telefone com muito cuidado e sempre comprar peças origi-
Márcia Barbosa, física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) — Trabalho com fluidos complexos. É interesssante dizer que um desses fluidos complexos é a água. Uma das minhas linhas de pesquisa tenta entender por que a água é tão especial e apresenta comportamento diferente dos demais fluidos. Explico: quando se deixa por muito tempo uma lata de cerveja no freezer, ela congela. E expande e se deforma. Se se tivesse feito o mesmo experimento com outro líquido, e ele também tivesse passado para o estado sólido, esse líquido iria se contrair. Portanto, a água tem um comportamento diferente dos demais fluidos e é por isso que a gente tem vida. Quando, por exemplo, um rio se congela, o gelo fica por cima e a água, por baixo. Por isso, os peixes sobrevivem. Embora comum, esse comportamento não é ainda completamente compreendido. ■
Água: fluido complexo Outra área de meu trabalho é tentar compreender por que há tão poucas mulheres na física. Nos nossos estudos descobrimos que muitas dessas barreiras são comuns a outras profissões, mas se tornam mais fortes na física porque há, historicamente, um número muito pequeno de mulheres trabalhando nessa área. Essa situação decorre de muitos fatores. Um dos mais mais graves é o estereótipo de que o cientista é um ser feio, isolado, que não trabalha com outras pessoas.
NOTA 01.04.2006 ■ Apresentadora
Celular: peças não originais aumentam o risco de explosões
— No Brasil, os casos de morte por câncer de mama ocorrem sobretudo em mulheres na faixa etária de 40 a 69 anos. Na maior parte dos casos, a doença foi descoberta em estágio avançado. O caminho usual paraa identificação precoce do tumor, fundamental para aumentar as chances de sucesso no tratamento, é a mamografia. Quando a imagem do exame deixa no ar uma suspeita, em geral o médico propõe que a paciente seja submetida a uma biópsia, com a retirada para análise de
um pequeno fragmento do tecido mamário. Mas apenas uma em cada oito biópsias realizadas confirma as suspeitas de câncer. As demais têm resultado negativo. Essas biópsias representam gastos desnecessários para o sistema de saúde, além de ser um transtorno — talvez evitável — para as mulheres. Exatamente de olho nisso, foi desenvolvido na Universidade de Mogi das Cruzes (UMC) um novo sistema de processamento de imagens por computador, que melhora a qualidade e a sensibilidade do diagnóstico por meio da mamografia. A coordenadora da pesquisa, Annie Slaets, conta que com o novo sistema é possível reduzir em 25% o número de biópsias benignas, ou de oito para seis os resultados negativos, sem diminuir a detecção de casos malignos.
ENTREVISTA 29.04.06
Apresentadora — Você acredita que os temas políticos podem estimular uma produção de qualidade no cinema nacional?
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■ Nelson
Pereira dos Santos — Acho que a temática não pode ser única. Tem que ser variada, como é o atual cinema brasileiro. Quer dizer, o bonito do cinema brasileiro de hoje é a pluralidade. Cada um faz o filme que tiver mais necessidade de fazer, alguma coisa que responde a um projeto pessoal, estético, artístico e filosófico. Então, se for um tema que ajude as pessoas, melhor. Mas, se não for, tudo bem. A temática política não pode ser obrigatória, mas, com certeza, ela é muito fértil. Tem muita coisa para contar — e não só por causa do escândalo atual. Há muitas histórias do passado e do presente que podem dar ótimos roteiros.
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POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
32 PROGRAMA ESPACIAL A viagem do astronauta terá influência rala no desenvolvimento tecnológico do país
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ETOLOGIA
MICROELETRÔNICA
Disputas sociais e capacidade de orientação moldaram o cérebro dos primatas
Película produzida com composto cerâmico evita perdas de energia elétrica FABIO COLOMBINI
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82 NOVOS MATERIAIS Cerâmicas à base de manganês podem melhorar o funcionamento dos computadores
INFRA-ESTRUTURA FAP-Livros libera recursos para compra de 130 mil títulos
HUMANIDADES CIÊNCIA
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ANTROPOLOGIA
GENÉTICA Equipe de Minas emprega novos marcadores para agrupar as populações do planeta
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54 ANFÍBIOS Filhotes de cobra-cega se nutrem com secreção e epiderme da mãe
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CARDIOLOGIA Equipe da FMUSP associa pressão alta severa à compressão de região cerebral por artéria
RÉPTEIS Fóssil encontrado na Argentina fortalece a hipótese sobre a origem terrestre das cobras
58 FÍSICA O emaranhamento de partículas de luz é medido por pesquisadores brasileiros
TECNOLOGIA
Religiões da ayahuasca sugerem um caminho para uma boa guerra antidrogas
72 SENSORIAMENTO REMOTO Aviões não tripulados podem ser usados para aumentar a produtividade das lavouras no país
76 DESENHO INDUSTRIAL Minilavadora de roupas pode ser transportada no carro e pendurada no teto ou na parede
SEÇÕES
3 CARTAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6 CARTA DA EDITORA . . . . . . . . . . . 9 MEMÓRIA . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10 ESTRATÉGIAS . . . . . . . . . . . . . . . 22 LABORATÓRIO . . . . . . . . . . . . . . 36 SCIELO NOTÍCIAS . . . . . . . . . . . 60 LINHA DE PRODUÇÃO . . . . . . . . 62 RESENHA . . . . . . . . . . . . . . . . . . 94 LIVROS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95 FICÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 96 CLASSIFICADOS . . . . . . . . . . . . . 98 IMAGENS DO MÊS . . . . . . . . . . . .
Capa: Hélio de Almeida Fotos: Miguel Boyayan
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SANDRO CASTELLI
HÉLIO DE ALMEIDA
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INOVAÇÃO
PATENTES
Universidades brasileiras ocupam espaço que deveria ser das empresas em ranking de patentes
Projetos desenvolvidos pela Unicamp são apresentados nos Estados Unidos
40 MEDICINA
HÉLIO DE ALMEIDA
MIGUEL BOYAYAN
Nova pediatria propõe a prevenção de doenças crônicodegenerativas ainda na infância
86 HISTÓRIA Episódios recentes obrigam acadêmicos a repensar o papel dos militares
CAPA/ENTREVISTA
MIGUEL BOYAYAN
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Paulo Mendes da Rocha, ganhador do Prêmio Pritzker, analisa os caminhos da arquitetura e do desenvolvimento das cidades
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ADOLFO BITTENCOURT
Cartas cartas@fapesp.br
Álcool
As reportagens de Pesquisa FAPESP retratam a construção do conhecimento que será fundamental para o desenvolvimento do país. Acompanhe essa evolução.
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Números atrasados Preço atual de capa da revista acrescido do valor de postagem. Tel. (11) 3038-1438
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Site da revista No endereço eletrônico www.revistapesquisa.fapesp.br você encontra todos os textos de Pesquisa FAPESP na íntegra e um arquivo com todas as edições da revista, incluindo os suplementos especiais. No site também estão disponíveis as reportagens em inglês e espanhol.
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Como coordenador da Frente Parlamentar pela Energia Limpa e Renovável da Assembléia paulista,tenho defendido a importância estratégica da biomassa da cana,do álcool combustível,valorizando o uso do combustível ecologicamente correto, renovável e gerador de renda e empregos.E tive uma grata surpresa ao ler a reportagem de capa de Pesquisa FAPESP (edição 122).Foi muito bem discutida e apresentada a questão mote da reportagem,de como aumentar a oferta de álcool combustível no país. Assim como as dualidades que envolvem todo esse mercado da cana,as pesquisas para tornar a cana mais resistente às pragas até a já conhecida discussão sobre o trabalho dos bóiasfrias,questões complexas e arcaicas que fazem parte do cotidiano deste setor. Gostaria de parabenizar Yuri Vasconcelos pelo cenário traçadona matéria,englobando fatores tecnológicos, econômicos e sociais,além de apresentar um bom panorama para discutirmos as inovações como os carros flexíveis.Creio que em meio ao empreendedorismo da iniciativa privada em ampliar e conquistar novos mercados,o que mechama a atenção é a falta de visão estratégica por parte dos governantes em delimitar e estabelecer quala matriz energética que desejamos para as próximas décadas. Matérias como essa auxiliam a definir rumos e questionar a estabilidade necessária para este mercado crescer e se desenvolver. ARNALDO JARDIM deputado estadual (PPS-SP) São Paulo,SP
Parabéns pela reportagem sobre o álcool (edição 122).Nós,enquanto pesquisadores inseridos nesse setor, ficamos entusiasmados com essa retomada do assunto etanol.Mas sentimos falta da menção dos projetos fi-
nanciados pela FAPESP,os quais nos foram contemplados. Acreditamos que a sua inclusão teria contribuído para o enriquecimento da reportagem.Um dos nossos projetos estuda um sistema alternativo para produção de etanol;outro tr ata das características das leveduras isoladas de destilarias brasileiras;e,ainda nessa linha,o grupo conduz um projeto que estuda a utilização de gomas produzidas por linhagens de bactérias isoladas de canaviais brasileiros. Sendo assim,esperamos que em uma próxima oportunidade esses nossos projetos possam ser apresentados. MARIA DA GRAÇA S. ANDRIETTA (coordenadora da DBP/CPQBA/ Unicamp) e SÍLVIO R. ANDRIETTA, MARIA DA GRAÇA S. ANDRIETTA e CLÁUDIA STECKELBERG (pesquisadores) Campinas, SP
Nota da redação: A cada grande tema fazemos muitas entrevistas,mas infelizmente não conseguimos abranger todo o universo das pesquisas envolvidas.Agradecemos os elogios à reportagem e a indicação dos projetos, que abordaremos em outros textos.
Mulheres É de extrema relevância a iniciativa da revista Pesquisa FAPESP em trazer dois textos com assuntos relacionados à condição da mulher no mercado de trabalho (edição 122). Destaco a importante nota “Combate ao clube do Bolinha”,inserida na seção Estratégias,na qual relata a criação de um programa para integrar pesquisadoras japonesas que se afastaram da carreira para ter filhos e cuidar deles,um programa para sanar as desigualdades de gênero em cargos nas universidades e laboratórios públicos no Japão. Aproveito para falar das pesquisadoras brasilei-
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ras: em nossas universidades o período da licença-gestante não é descontado do prazo de integralização dos cursos. Infelizmente, a mentalidade de combate às desigualdades de gênero ainda é nova nas políticas brasileiras. É o que também demonstra o artigo “Licença para criar”, de Carlos Haag, sobre o projeto de aumento da licença-maternidade que traz à luz as questões do mercado de trabalho das mulheres. Fiquei surpreendida com a ausência de discussão sobre a mulher-mãe-pesquisadora e também com o descuido ao ignorar as questões da diversidade de gênero, especificamente a defesa da licença-paternidade. Temos também que defender um projeto de licença-paternidade para possibilitar a opção de uma vivência plena da paternidade. O Brasil pode estar em segundo lugar do ranking no que diz respeito à remuneração semanal de benefícios dados à mulher trabalhadora depois do nascimento de um filho, mas não ocupa lugares de prestígio em relação à igualdade dos benefícios salariais entre homens e mulheres. Nós, mulheres mães ou não, também queremos ter a tranqüilidade para desempenhar os diferentes papéis que temos na sociedade moderna, principalmente aqueles em carreiras profissionais sem distinções de gênero. DANIELA FINCO Faculdade de Educação/USP São Paulo, SP
Evaporação de água Ficou excelente a reportagem “Mistura fina” (edição 122) de Pesquisa FAPESP, e o retorno foi imediato, pois já há pessoas entrando em contato comigo. Parabéns e muito obrigado pela valiosa divulgação. MARCOS GUGLIOTTI Lótus Ambiental São Paulo, SP
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Baquelite Quando li, na reportagem “A era do plástico” (edição 121), a resposta de Baekeland acerca de seu motivo para entrar no ramo das resinas sintéticas (“... para ganhar dinheiro...”), não pude deixar de lembrar a “história do vidro inquebrável”, que aparece no Satíricon, de Petrônio, obra da literatura latina de meados do século I d.C. A história é a seguinte: “Houve um vidreiro que fez uma tigelinha de
EMPRESA QUE APÓIA A PESQUISA BRASILEIRA
vidro que não se quebrava. Por isso, foi admitido junto a César levando com ele o seu presente. O vidreiro fez com que César examinasse a tigelinha com bastante atenção e em seguida atirou-a de encontro às lajes do chão. César se espantou a não mais poder. O vidreiro, contudo, recolheu a tigelinha do chão; ela estava amassada como um vaso de bronze. Em seguida, pegou um martelinho que levava consigo e sossegadamente arrumou a tigelinha com perfeição. Por causa disso pensava que tinha prendido um dos bagos de Júpiter, ainda mais depois que César lhe disse: ‘Por acaso alguém mais sabe dessa maneira de fazer vidros?’ Espia só... Como o vidreiro dissesse que não, César man-
dou que lhe cortassem o pescoço: se a coisa se espalhasse, ouro não ia valer mais que barro” (Satíricon, 51). CLÁUDIO AQUATI Língua Latina e Literatura Clássica/Unesp São José do Rio Preto, SP
Tijolo com pet Sou professor universitário de física da Ulbra Manaus e assinante há quatro anos de Pesquisa FAPESP, e leitor da seção Linha de Produção. Li na edição 118, de dezembro de 2005, uma notícia sobre um projeto de dissertação de mestrado de tijolo com pet. Quero acrescentar que também desenvolvi a partir do segundo semestre de 2003 uma idéia idêntica à da estudante de arquitetura da Universidade Federal de Santa Catarina do artigo em questão, que em outubro de 2005 apresentei na 2ª Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, em Manaus. Na época gerou pouco interesse na instituição, porém ao ler o artigo em Pesquisa FAPESP fiquei muito motivado pela idéia e me senti muito bem por ter executado o projeto. Estou escrevendo para parabenizar a revista por divulgar idéias simples mas interessantes. NEWTON LIMA Manaus, AM
Revista Tenho recebido com regularidade a revista Pesquisa FAPESP, que me tem sido de grande valia. Faço votos pela continuidade de sua excelência. NÍVIA NOHMI São Paulo, SP Cartas para esta revista devem ser enviadas para o e-mail cartas@fapesp.br, pelo fax (11) 3838-4181 ou para a rua Pio XI, 1.500, São Paulo, SP, CEP 05468-901. As cartas poderão ser resumidas por motivo de espaço e clareza.
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Imagens
FUNDAÇÃO CASA DE CABANGU
CELSO JÚNIOR/ AGÊNCIA ESTADO
do Mês
O vôo da réplica Uma réplica do 14-Bis (alto) saiu do chão por 40 segundos numa pista de asfalto em Caldas Novas, em Goiás, no início de abril, para marcar o centenário da façanha de Santos Dumont (foto de baixo). A cópia foi construída pelo piloto e empresário Alan Calassa, de 43 anos, um aficionado aos aviões sem formação universitária. Sem o projeto original, ele recalculou as dimensões do 14-Bis com base em fotografias, construiu-o com canada-índia, freijó e seda, e municiou-o com um motor adaptado de um Fusca. O projeto teve supervisão do Comando da Aeronáutica do Brasil e participação da Embraer e do Museu Aeroespacial do Rio de Janeiro. Ao todo, quatro réplicas foram construídas. Uma delas está na França, doada pelo governo brasileiro.
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Carta ISSN 1519-8774
da Editora
Um brilho intenso na arquitetura brasileira
FAPESP CARLOS VOGT
PRESIDENTE MARCOS MACARI
VICE-PRESIDENTE CONSELHO SUPERIOR CARLOS VOGT, CELSO LAFER, HERMANN WEVER, HORÁCIO LAFER PIVA, JOSÉ ARANA VARELA, MARCOS MACARI, NILSON DIAS VIEIRA JUNIOR, SEDI HIRANO, SUELY VILELA SAMPAIO, VAHAN AGOPYAN, YOSHIAKI NAKANO
MARILUCE MOURA – DIRETORA DE REDAÇÃO
CONSELHO TÉCNICO-ADMINISTRATIVO RICARDO RENZO BRENTANI
DIRETOR PRESIDENTE CARLOS HENRIQUE DE BRITO CRUZ
DIRETOR CIENTÍFICO JOAQUIM J. DE CAMARGO ENGLER
DIRETOR ADMINISTRATIVO
PESQUISA FAPESP CONSELHO EDITORIAL LUIZ HENRIQUE LOPES DOS SANTOS (COORDENADOR CIENTÍFICO), CARLOS HENRIQUE DE BRITO CRUZ, FRANCISCO ANTONIO BEZERRA COUTINHO, JOAQUIM J. DE CAMARGO ENGLER, LUIZ EUGÊNIO ARAÚJO DE MORAES MELLO, PAULA MONTERO, RICARDO RENZO BRENTANI, WAGNER DO AMARAL, WALTER COLLI
DIRETORA DE REDAÇÃO MARILUCE MOURA
EDITOR CHEFE NELDSON MARCOLIN
EDITORA SÊNIOR MARIA DA GRAÇA MASCARENHAS
DIRETOR DE ARTE HÉLIO DE ALMEIDA
EDITORES CARLOS FIORAVANTI (CIÊNCIA), CARLOS HAAG (HUMANIDADES), MARCOS DE OLIVEIRA (TECNOLOGIA)
EDITORES ESPECIAIS FABRÍCIO MARQUES, MARCOS PIVETTA (EDIÇÃO ON-LINE)
EDITORES ASSISTENTES DINORAH ERENO, RICARDO ZORZETTO
CHEFES DE ARTE JOSÉ ROBERTO MEDDA, MAYUMI OKUYAMA
ARTE FINAL LILIAN QUEIROZ
FOTÓGRAFOS EDUARDO CESAR, MIGUEL BOYAYAN
SECRETARIA DA REDAÇÃO ANDRESSA MATIAS TEL: (11) 3838-4201
COLABORADORES ANA LIMA, ANDRÉ SERRADAS (BANCO DE DADOS), BRAZ, FRANCISCO BICUDO, GONÇALO JUNIOR, JAIME PRADES, LAURABEATRIZ, MÁRCIO GUIMARÃES DE ARAÚJO, MARGÔ NEGRO, SANDRO CASTELLI, SIRIO J. B. CANÇADO, THEREZA DE ALMEIDA, THIAGO ROMERO ( ON-LINE), VERONICA STIGGER E YURI VASCONCELOS
COORDENAÇÃO DE MARKETING E PROJETOS ESPECIAIS CLAUDIA IZIQUE (COORDENADORA) TEL. (11) 3838-4272 PAULA ILIADIS (ASSISTENTE) TEL: (11) 3838-4008 e-mail: publicidade@fapesp.br
ASSINATURAS TELETARGET TEL. (11) 3038-1434 – FAX: (11) 3038-1418 e-mail: fapesp@teletarget.com.br
IMPRESSÃO PLURAL EDITORA E GRÁFICA TIRAGEM: 35.700 EXEMPLARES
DISTRIBUIÇÃO DINAP
CIRCULAÇÃO E ATENDIMENTO AO JORNALEIRO LMX (ALESSANDRA MACHADO) FAPESP RUA PIO XI, Nº 1.500, CEP 05468-901 ALTO DA LAPA – SÃO PAULO – SP
Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião da FAPESP É PROIBIDA A REPRODUÇÃO TOTAL OU PARCIAL DE TEXTOS E FOTOS SEM PRÉVIA AUTORIZAÇÃO
FUNDAÇÃO DE AMPARO À PESQUISA DO ESTADO DE SÃO PAULO SECRETARIA DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA, DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E TURISMO GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO
té esta edição 123, Pesquisa FAPESP jamais tivera uma personagem como capa da revista.Quest ão de política editorial. Queríamos, sim, valorizar sempre o trabalho do pesquisador e a atividade de pesquisa,quer íamos chamar a atenção para sua dinâmica,com freq üência sua beleza,seus resultados e seus efeitos sociais,mas sem espa ço para os personalismos indesejáveis e sem estímulo à rivalidade no meio científico. Dessa vez,contudo,um coment ário do diretor científico da FAPESP,Carlos Henrique de Brito Cruz,nos levou a pensar se não era esta a hora exata de quebrar tal orientação geral,n ão, é claro,para abandoná-la de vez,mas para flexibiliz á-la. Ele falava do Prêmio Pritzker que o arquiteto Paulo Mendes da Rocha acabara de ganhar e,entusiasmado,situava o feito como uma das mais relevantes conquistas intelectuais que o país teria doravante para comemorar,algo de peso ímpar em seu panorama cultural e da produção do conhecimento.Por isso mesmo,Brito Cruz disse,isso mereceria a pr óxima capa da revista. Sim, fazia todo sentido. A reportagem de capa desta edição, portanto,assinada pelo editor de humanidades,Carlos Haag, é aberta por uma bela entrevista pingue-pongue com Paulo Mendes da Rocha,a partir da página 12,na qual ele lan ça de forma primorosa e contundente seu olhar filosófico,denso e percuciente sobre a arquitetura – esse campo que em seu olhar lida com todas as formas de conhecimento –, o espaço urbano,a cidade,e muito mais. Complementa-a um segundo texto de Haag no qual ele aborda o chamado Grupo Brutalista,formado por jovens arquitetos de São Paulo,que,sob as luzes de Vilanova Artigas,vai compor ali pelos anos 1950 e 60 do século passado um outro pólo da arquitetura brasileira capaz de contracenar com o racionalismo que ganha corpo no Rio e,principalmente,com a leveza elegante e as formas flutuantes que se materializavam em Brasília. Aliás, é inevitável lembrar aqui que,antes de Paulo Mendes da Rocha, Oscar Niemeyer fora contemplado com
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o Pritzker,dividido entre ele e o norteamericano Gordon Bunshaft em 1988. Portanto,em s íntese, não resta nenhuma dúvida de que a arquitetura brasileira tem um grau de excelência e uma profundidade de reflexão que lhe valem indiscutível reconhecimento internacional. Pesquisa FAPESP se regozija com isso. A par de uma grande celebração nos domínios da arquitetura,esta edi ção traz uma boa notícia no campo da medicina: está em curso no país a montagem de uma espécie de nova pediatria,digamos assim.Trata-se de uma bem fundamentada revisão do papel do pediatra que, em lugar de se concentrar apenas nas infecções agudas e,a rigor,de pequena repercussão na saúde das crianças a mais longo prazo,ou mesmo naquelas mais graves que ainda continuam a matar milhares de pequenos pacientes a cada ano no mundo inteiro,passaria a tentar evitar também que seus clientes desenvolvam as chamadas doenças crônico-degenerativas.Conforme relata o editor assistente de ciência,Ricardo Zorzetto,a partir da página 40,se os novos pediatras conseguirem impulsionar um bom trabalho de prevenção desses males,as crian ças de hoje podem chegar fortes e saudáveis aos 100 anos. Mais boas notícias:a editora assistente de tecnologia,Dinorah Ereno,detalha em reportagem a partir da página 66 os três projetos inovadores desenvolvidos na Unicamp que serão apresentados num importante evento internacional com representantes de escritórios de patentes de várias partes do mundo,o TechConnect Summit 2006,nos pr óximos dias em Boston, Estados Unidos. Aliás,a lideran ça que a Unicamp vem conquistando no terreno do registro de patentes está bem explicada na reportagem do editor especial Fabrício Marques,a partir da p ágina 28.Ele aborda um levantamento realizado pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) que comprova que as universidades brasileiras ocupam um espaço que deveria pertencer às empresas no ranking de patentes. PESQUISA FAPESP 123
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emória
MARC FERREZ/ACERVO INSTITUTO MOREIRA SALLES
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Hartt sobre barreira de recifes, em Recife, em trabalho pela Comissão Geológica
O cientista múltiplo Há 136 anos Charles Hartt fazia as primeiras pesquisas arqueológicas na Amazônia N ELDSON M ARCOLIN
‘N
o Amazonas, o geólogo que não se interessar por algum outro ramo da ciência perderá muito tempo; porque, distanciadas, como são ali as localidades geológicas, terá de viajar dias consecutivos sem poder fazer uma observação importante.” A frase abre o texto do livro Mitos amazônicos da tartaruga (Perspectiva, 100 páginas) e revela a clara índole de seu autor, o naturalista Charles Frederick Hartt. O canadense naturalizado norte-americano (1840-1878) se referia a suas visitas à Amazônia quando tentava entender a geologia da região. Para não desperdiçar tempo, decidiu fazer outros tipos de pesquisa.
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Intrigado pelas diferentes versões sobre o mito da esperteza da tartaruga contada pelos índios, compilou oito narrativas e as publicou em 1875, no Rio de Janeiro, em inglês.Em 1950,o folclorista Luís da Câmara Cascudo, admirador de Hartt,a quem considerava “um precursor, um veterano do folclore”,traduziu o pequeno livro e o acresceu com notas pessoais. O norte-americano dedicou-se também a compor um dicionário da língua tupi, que ficou inacabado. Hartt foi um dos naturalistas que visitaram o Brasil no século 19. Nas ocasiões em que esteve na Amazônia não foram apenas a mitologia indígena e a língua tupi que prenderam sua atenção.Hartt passeou pela geografia,
O naturalista morreu aos 38 anos, no Rio
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IMAGENS: HARTT: EXPEDIÇÕES PELO BASIL IMPERIAL (1865-1878)/METALIVROS
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Cerâmica marajoara, óleo sobre tela de Hartt: pioneirismo na arqueologia amazônica
Capivara, óleo sobre tela, e Índios botocudos, gravura: talento também para desenho e pintura
zoologia, antropologia, etnografia, paleontologia e arqueologia. “Na monografia Contribuições para a etnologia do Vale do Amazonas, ele sugere que o sítio Taperinha, um sambaqui fluvial perto de Santarém, deveria ser muito antigo por causa de sua implantação na paisagem”, diz Eduardo Góes Neves, do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo (MAE/USP) e pesquisador com amplo trabalho na Amazônia. Cem anos depois,
a norte-americana Anna Roosevelt datou as conchas recolhidas por Hartt e confirmou sua antiguidade. Decidiu, então, ir a Taperinha e lá, ao reescavar o sítio, encontrou algumas das cerâmicas mais antigas do continente. “Ele foi o pai da arqueologia amazônica”, resume Neves. Em 2001 o professor de
literatura brasileira da Universidade Federal de Minas Gerais Marcus Vinicius de Freitas lançou Hartt: expedições pelo Brasil imperial (Metalivros, 252 páginas) em edição bilíngüe, recheado de fotos da época e de ilustrações do próprio Hartt. Em seguida publicou Charles Frederick
Hartt, um naturalista no império de Pedro II (Editora UFMG, 282 páginas), síntese de sua tese de doutorado sobre o tema, feita na Brown University, Estados Unidos. A pesquisa de Freitas provocou um novo interesse sobre o trabalho do geólogo. Hartt chegou ao país em 1865 na expedição Thayer, liderada pelo suíço-americano Louis Agassiz (1807-1873), ícone da ciência nos Estados Unidos. Criacionista ferrenho, Agassiz acreditava que poderia achar no território brasileiro provas geológicas de sua teoria sobre a ação glacial no país que derrubassem o evolucionismo de Charles Darwin. Não obteve sucesso, mas os 15 meses passados aqui convenceram Hartt a voltar. No total, o naturalista veio cinco vezes ao Brasil. Em 1870 e 1871 comandou sua própria expedição, a Morgan. Com ele vieram nove estudantes da Universidade Cornell, onde Hartt trabalhava. Entre eles, Orville Derby, que se tornaria importante para a geologia no Brasil. O naturalista dirigiu a Comissão Geológica do Império, criada em 1875 graças em boa parte aos seus esforços. O serviço foi extinto em janeiro de 1878 por motivos políticos e Hartt morreu em março do mesmo ano com febre amarela, no Rio. Tinha 38 anos. Deixou cinco livros e mais de 50 trabalhos científicos, além de desenhos, pinturas e gravuras sobre o país. “Até hoje há material inédito colhido por ele esperando para ser estudado”, diz Freitas.
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Paulo Mendes
Entrevista
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riou-me, desde eu menino/ Para arquiteto meu pai/ Foi-se-me um dia a saúde.../ Fiz-me arquiteto? Não pude!/ Sou poeta menor, perdoai!”, lamentou-se Manuel Bandeira, optando pela dicotomia quando podia ter a dialética. Quem diz que um poeta não é um arquiteto de palavras? Tampouco é impossível pensarse num arquiteto como poeta de formas concretas. Em ambos os casos há apenas um requisito: não ser menor. Como não o era Bandeira e como não o é o Paulo Mendes da Rocha, saudado pelo colega Francisco Fanucci como capaz de “fazer a poesia do concreto”. Daí, não se entender a surpresa geral quando se anunciou, no mês passado, que ele fora o vencedor do Prêmio Pritzker de Arquitetura de 2006, que premia anualmente um arquiteto que reúna talento, visão e comprometimento, tendo contribuído de forma significativa para a humanidade e o ambiente fabricado. Antes dele, apenas Oscar Niemeyer havia recebido a honraria, cujo apelido é um retrato de sua importância: o Nobel da arquitetura. O júri, que incluía, entre tantos, Frank Gehry, justificou sua escolha pela capacidade de Paulo em “modificar a paisagem e o espaço com sua obra, sempre com um profundo entendimento da poética espacial e senso de responsabilidade pelos habitantes”.
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Nascido em 1928, em Vitória, Espírito Santo, Paulo elenca entre as suas influências Burle Marx, Affonso Reidy, Niemeyer, Vilanova Artigas, “mas sem esquecer, naturalmente, as minhas memórias de infância: tanta ventania, tantas águas, a Bacia do Prata, a Bacia Amazônica, 8 mil quilômetros de costa, navios etc.”, como gosta de ressaltar, de uma forma que arrancaria, com certeza, o perdão do pai de Bandeira. O dele, Paulo, era um engenheiro que trouxe a família para São Paulo nos anos 1930 e deu aulas na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, nos anos 1940. O filho preferiu estudar no Mackenzie e se formou em 1954, ano da morte de Vargas. Curiosa coincidência, já que o período de formação da arquitetura moderna brasileira ocorreu exatamente durante o Estado Novo, cujo caráter autoritário fez com que a arte nascente crescesse desprovida da lógica e desejável ideologia social. Se o resto do Brasil se deleitava com as curvas e a leveza dos cariocas, São Paulo não podia parar. A sua natureza de potência industrial exigia soluções urbanas e arquitetônicas diversas do conservadorismo varguista e da capital federal. O edifício Copan é um claro exemplo de descompasso entre a escola do Rio e a dura poesia das esquinas paulistanas, como, aliás, reconhece o seu autor, Oscar Niemeyer. A metrópole rejeitava uma arquitetura de prédios ensimesmados, auto-suficientes, mas, paradoxo, exigia um traçado que privilegiasse a “sociabilidade” entre a construção e seu entorno. Para tanto, a união entre o técnico, o intelectual e o proletário urbano deu origem ao mar de concreto – “nas circunstâncias exacerbadas dos anos 1960, Mendes da Rocha consolida um rico vocabulário que vai influenciar gerações: abstração formal, pré-fabricação, engenhosidade técnica que inclui o desenvolvimento de detalhes construtivos de escala mecânica e a redução da arquitetura a seus elementos espaciais e construtivos essenciais”, na síntese certeira do arquiteto da FAU-USP, Luiz Recamán. O grande passo foi dado em 1958, com o projeto do ginásio, praça de esportes e piscinas do Clube Atlético Paulistano. No ano seguinte, Vilanova Artigas, vendo o seu amor pelo ensino, convida-o para lecionar na FAU e, em 1962, Mendes da Rocha realiza o proje14
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to para o edifício da Faculdade de Antropologia e Sociologia, na USP. O reconhecimento internacional ocorre em 1969, com a criação do pavilhão do Brasil na Expo 70, em Osaka, no Japão. Depois foram vários sucessos: é finalista para o concurso de construção do Beaubourg, de Paris; desenha a nova sede do Museu de Arte Contemporânea, da USP; projeta o Museu Brasileiro da Escultura; ousa, ao criar o espaço da Loja Forma, em São Paulo; faz a renovação urbana da praça do Patriarca e do viaduto do Chá; reestrutura a Pinacoteca do Estado, onde reúne a modernidade ao passado da cidade, em harmonia perfeita. Mas chega de formas. É a vez das palavras de Paulo. O seu prêmio foi saudado como uma vitória da arquitetura brasileira. O senhor acredita numa “arquitetura brasileira”? — É uma questão intrigante. Não se trata, porém, de buscar, a qualquer custo e em qualquer coisa, a idéia de que “essa arquitetura é brasileira”, porque aí entraríamos numa rota de degenerescência, de absurdo. Deveria haver, entretanto, um traço brasileiro na arquitetura, uma vez que é a América, envolve toda uma questão de território. O filósofo espanhol Eduardo Subirats, num de seus livros, vocifera contra essa destruição da América Latina pela mão da política colonialista que destruiu tudo. E chama o livro de O continente vazio. Mas é uma forma maliciosa de dizer: não estava vazio, foi tratado como vazio. Lembro-me sempre, por exemplo, da questão da construção dos nossos índios, de uma engenhosidade extraordinária, com estruturas pênseis, madeiras envergadas. O que me faz ver que, onde o homem estiver, há uma arquitetura. E aqui havia qualquer coisa que se deveria considerar. A nossa herança ocidental cristã não deve ser a única fonte de informação. Mas esse traço brasileiro seria justamente por estarmos diante dessa inauguração. Portanto, é a mesma arquitetura do neolítico, é o que o homem sabe, pela história, como experiência, e pelos desejos. Esses podem não ser especificamente brasileiros, mas, com um olhar atento, você vê coisas que não se vê fora daqui. Se você observa a nossa transformação da natureza, é diferente de quem observa só o patrimônio de, por exemplo, uma cidade
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como Roma. Um arquiteto romano disse que “para nós, geografia é aquilo que está construído”. O nosso caos é diverso. Ainda assim, a nossa geografia in natura deveria dar alguma força, ainda que na direção lírica ou poética da forma. Mas o processo foi muito desastrado. Pense na orla carioca: aquele “mar de edifícios”, cuja justificativa foi “as crianças querem tomar banho de mar, fiquemos todos aí”. Assim, dá-lhe vertical, elevador, cubículo. Para nós, o mar só tem graça se visto de uma janela dentro de uma cidade. Não temos vocação de explorador. Porque a partir da janela se pode voltar para o interior, onde estão os móveis, a cozinha, os confortos. A natureza nos dá medo. Assim vamos construindo. E nada foi redesenhado. Um dos males nesse processo é justamente isso, não poder editar a última expressão da inteligência humana. Há também uma falta de ideais sobre a cidade, uma falta de desejo de cidade. Pior: há uma ausência de reividicação de urbanidade por parte da sociedade. Uma parte dela não deseja a cidade e se exclui, foge dela nos condomínios fechados. O arquiteto sofre muito quando raciocina com essas coisas, porque vê o que não foi feito. E o que se poderia ter feito. ■ Qual o peso dessa angústia? — As coisas se formam e se desenvolvem mais rápido do que eu posso acompanhar e me vejo sempre correndo atrás do mundo. Então prefiro ver na arquitetura os recursos da construção e o ideário da cidade. Podemos fazer tudo o que quisermos. Nessa contradição habita, digamos, nosso espanto sempre diante das coisas. Você trabalha com o que aprende. Eu gostaria de dizer aos meus colegas, aos jovens principalmente, de um modo geral à universidade, que prestassem atenção no seguinte: nós temos uma boa formação e ao mesmo tempo estamos na beira de um abismo de perder a consciência sobre essa formação no âmbito da universidade. Os cursos de arquitetura tendem a degenerar, na minha opinião, muito facilmente, pelas indigências do profissionalismo, digamos assim, do mercado. Perde-se o horizonte de que a arquitetura lida com todas as formas de conhecimento. Se você quer mobilizar a idéia da vontade, você tem que mobi-
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Perde-se o horizonte de que a arquitetura lida com todas as formas de conhecimento
lizar não a sua, mas a vontade dos seus conterrâneos, do povo. E se você, movido por essa vontade que não é sua, precisa construir, você tem que saber construir muito bem. E essa vontade, por sua vez, obriga você a levar em consideração a situação que estamos no universo hoje. Você se envolve com filosofia, lingüística, antropologia, geografia, a questão do lugar, do recinto. Na arquitetura, você pode discutir a casa. A casa, hoje, se ela tem um atributo fundamental é o endereço. Você não pode imaginar uma casa. Gótica, colonial, normanda. Não faz sentido, você tem que ver onde ela está. A arquitetura não pode pretender saber de tudo isso em profundidade. Obriga-se a ter uma forma peculiar de conhecimento, porque ele solicita esses horizontes todos do conhecimento humano. A flor do co-
nhecimento humano é a cidade. É tudo o que temos. E é tudo o que de melhor podemos fazer. Assim, justamente as grandes contradições que estão aí (que a cidade é caótica, que a cidade destrói a natureza com sua poluição etc.), tudo isso é triste por um lado, mas é um grande estímulo para você convocar o conhecimento e dizer “vamos consertar tudo isso, vamos inverter essa rota do desastre”. É muito político e a arquitetura se torna, na minha opinião, muito importante no âmbito da universidade. Devíamos assumir isso. E, se possível, zelar para que não proliferem tantos cursinhos e coisinhas separadas. Principalmente nesse dilema que está aí posto para nós: privado ou público. Que haja liberdade, mas os paradigmas nós temos que manter. Nisso a universidade pública é fundamental. Os profes-
sores que nós tivemos, o âmbito em que vivemos e fomos formados é muito rico. A Escola Politécnica de São Paulo é algo extraordinário. Mas pode se perder nesses horizontes do esfacelamento, do esgarçamento dos interesses fundamentais. Acho que a formação da consciência hoje é fundamental para a educação. A grande revolução, para mim, será no plano do ensino e da cultura. Do cultivo do que possa vir a ser uma cultura oportuna no tempo que estamos vivendo. Porque a questão da natureza está posta, no papel. O mundo inteiro debruça-se sobre essa questão assim ou assado. Por aproximações que sejam um tanto supérfluas, como essa questão da ecologia. A chamada “cultura popular” moveu a Idade Média para o Renascimento. Precisamos dessa tomada de posição por indignação: “Isso nós já sabemos, isso é uma besteira, vamos sair para lá”. Eu tenho a impressão de que nós podíamos assumir que está se forjando uma dimensão de cultura popular sobre a natureza no mundo, apesar de alguns desenganos e algumas reações em contrário, como a PESQUISA FAPESP 123
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proliferação de religiões em cada fundo de quintal, coisa assim, uma espécie de reação àquilo que já se viu. E essa consciência talvez mova o mundo de um modo que nós nunca vimos tão veloz e tão extraordinário. Porque nos coloca juntos, todos, nesse pequeno planeta, pela consciência. Não adianta estarmos juntos como um confinamento. Estamos juntos, porque está se forjando essa consciência. E você pode pôr isso para diante, pode dizer “olha, não sei se o homem não pode viver serenamente”, sem bravata. Estamos começando efetivamente a experimentar, a ensaiar, a expansão da vida humana no Universo. Como é que diz Hannah Arendt? “Sabemos que vamos morrer e estamos tão animados por quê?” Porque sabemos que não nascemos para morrer, nascemos para continuar. A arquitetura toma um sentido muito interessante nesse âmbito, nesse espaço, nesse Universo. Eu achava que as crianças deveriam ser ensinadas assim, depois vai-se à prática, à construção. Esse ideário humano de necessidades e desejos, como diria Marx, é que nos move. Portanto temos que forjar e discutir essas necessidades e desejos. ■ O senhor é um exemplo do arquiteto engajado, irrequieto, como outros de sua geração. Hoje os novos profissionais têm essa mesma visão ampla do mundo? — Não acredito muito no arquiteto de hoje e no arquiteto do passado. Nem no homem de hoje e homem do passado. Estamos sempre perseguindo a nossa condição humana, senão não haveria história e a história não teria valor como experiência. Nem haveria mesmo o que nós chamamos conhecimento, essa consciência sobre o estado em que estamos no Universo. O que pode se medir é um certo descuido em relação a essas questões, no geral, estamos degenerando. O que é possível corrigir, retomando a rota. O que se pode também imaginar, para não ser sonhador em vão, não viver no mundo da lua, é que, nem que seja por estrita necessidade, já que se convocou essa dualidade, às vezes prevalece a necessidade, às vezes, o desejo. A necessidade pode chegar ao extremo. Nós aceitamos com uma passividade coisas que seriam incríveis. Por exemplo, em São Paulo há instrumentos na rua que marcam a qualidade do
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ar: “regular”, “sofrível” etc. Se aparecer “ruim”, o que você faz? Respira devagarinho? Então, eu não tenho medo do desastre inclusive. Enfrenta-se. Fala-se abertamente, com convicção, na construção da paz. Até pouco tempo a guerra era louvável, os países se gabavam de ter um exército imbatível. Isso tudo já é um horror hoje em dia. Portanto, a expectativa do homem é que ele acerte seus horizontes para que sua presença no Universo seja eterna. E não é uma questão de arquiteto. Nenhum arquiteto pode salvar o mundo, a idéia não é essa. É que o mundo tenha alguma coerência em relação aos seus horizontes, a ponto de a arquitetura poder fluir com graça. Se o mundo pegar fogo, não adianta você chamar dez arquitetos e dizer “agora os senhores salvem essa porcaria”. Não tem jeito. Porque antes da forma a questão é de modo. É o modo que nós vivemos que está destruindo a cidade, não é a forma da cidade. A forma da cidade é uma conseqüência que está amparando tudo isso porque querem assim. Nós temos que mudar o querer. A arquitetura só reflete que, desse modo, não há arquitetura que seja possível. A idéia de cidade que nós temos seria, em duas palavras, uma cidade para todos. Todos entendem esse conceito? O passante distraído das ruas percebe o esforço do arquiteto, do urbanista em melhorar a cidade? — As coisas devem ser vistas como os livros devem ser lidos. Não adianta você ficar andando concentradíssimo de lá para cá, na biblioteca de Alexandria, sem ler nada. Se você ler dez livros numa pensão do Catete, sendo um estudante pobre, você pode ficar sábio. Nós só falamos uns dos outros e só construímos uma coisa pela outra. Só pensamos o pensamento que já vinha sendo pensado. Essa é a graça da nossa vida. Nós não estamos sozinhos, estamos amparados pelo desejo, que está no futuro, e pelo passado como experiência. O presente é muito breve. É uma questão interessante na arquitetura a idéia de urgência. Não temos muito tempo. Não pode salvar pelo fato que fez, pelo fato feito. Mas pode ajudar pelo que faz refletir. Ou seja: a arquitetura é um discurso, antes de mais nada. Flávio Motta, que é um filósofo maravilhoso, me ligou para parabenizar pelo prêmio e eu reclamei
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de ter que viajar para Istambul para recebê-lo. “Você está enganado, é esse o prêmio”, ele me disse, falando sobre a cultura do Oriente, sobre a Igreja de Santa Sofia etc. É uma perspectiva de que a reflexão sobre a arquitetura está ligada diretamente à cidade, ao hábitat humano. Veja você: vê os problemas que nós temos nas cidades brasileiras são hoje os problemas, de certo modo, que tem a França com seus argelinos, que tem a Espanha com o Marrocos, que tem a Holanda com Sumatra etc. Agora, eu não tenho a preocupação se a arquitetura é funcional. Ela não o pode ser, porque não conhecemos nem bem as funções que queremos. Lembro de alguém que perguntou ao Niemeyer por que ele tinha feito o Senado sem janelas. Ele parou, pensou e respondeu: “Só de sacanagem”. Voltando a Santa Sofia, ela é símbolo da resolução de um problema arquitetônico (colocar uma cúpula redonda numa estrutura quadrada) que tem muito a ver com o seu entusiasmo pela técnica. — Essas coisas estão aí como patrimônio universal, são conhecimento. Você quer ver uma reflexão interessante? Se você vê a famosa cúpula do Brunelleschi, ela está centrada numa virtude como essa que você mencionou agora, engenhosa.Você disse “com seu entusiasmo”: mas não sou eu, somos todos nós. É novamente a questão do patrimônio universal. Se você inverter o Brunelleschi, tem a catedral de Brasília. Há o pequeno círculo lá em cima trabalhando a compressão e o círculo que não se vê, que seria a borda superior do cilindro, daquela escavação que está lá para baixo, que trabalha, no caso, a tração. Então Brasília é uma reflexão que o Oscar deve ter feito. Não é uma cópia do Brunelleschi, que iria sorrir se visse aquilo. As nossas conquistas, de hoje e de sempre, são sonhos antigos que se realizam. Mas se realizam porque se prometeu que iam se realizar. Nós estamos há muito tempo desenhando tudo. Portanto são revelações de uma observação meticulosa. É fácil. É só prestar atenção. Com que absurda alienação qualquer um de nós abre uma torneira no 20º andar de um prédio e não temos consciência da maravilha de realizar aquilo. Qualquer bisavó de um de nós ia buscar água na fonte. Às vezes não
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para lá. São muito mais civilizados do que os outros que se retiram, então, e fazem uma muralha, contratam os mesmos favelados para tomar conta deles com metralhadora e tudo isso, e está dando no que nós estamos vendo. Uma cidade não pode ter segurança nenhuma, ela tem que ser aberta, livre e democrática. A segurança se faz pelo nível de civilização da cidade. É impossível você botar cerca, guarda, arame farpado em cada propriedade. Assim você não faz uma cidade. Para um arquiteto, ou para o universo da arquitetura e do urbanismo, não há privado, nada privado. É tudo público. Não existe uma arquitetura privada nem um urbanismo privado. Privado só temos a mente. Se você engendra um poema, a primeira preocupação é publicá-lo, torná-lo público. Ou então ninguém sabe que você é poeta, não adianta nada. Portanto a nossa vida é pautada, é configurada pela dimensão pública da nossa existência. Você não consegue ser privado nem que queira. A cidade, hoje, para o senhor, é motivo de beleza ou de horror? — Toda cidade é belíssima pelo simples fato de ela existir. São Paulo é belíssima. Porque você imaginar que esses 20 milhões de habitantes todo dia dormem, se divertem e no dia seguinte voltam para trabalhar direitinho, mesmo com todo esse horror que está aí. Não existem cidades feias. Essa população que está ali de qualquer modo mostra que o desejo há. Vamos fazê-la, mais cedo ou mais tarde. Revitalização de áreas centrais abandonadas. Elas estão abandonadas, mas estão povoadas de uma população que não era aquela. A cidade será deles, de um modo ou de outro. Ou fazemos uma bela parceria ou... Existem prédios em São Paulo emparedados por dentro para que não sejam invadidos. Todos vazios. Você vê de fora, através das janelinhas, o tijolinho posto lá dentro para proteger o prédio. Na Inglaterra, se você prova com testemunhos que o prédio está abandonado há seis meses, você pode ocupá-lo. O que é muito lógico. Melhor do que você emparedar e ver o cara morrendo morando na rua, dormindo ao relento. Não creio que o homem vá, para sempre, contrariar tanto uma idéia tão lógica. •
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A flor do conhecimento humano é a cidade. É tudo que temos e o que de melhor podemos fazer
voltava, a onça comia. Essa engenhosidade tem que ser avaliada, pensada e gozada, portanto, muito mais. Nós gozamos pouco a vida e não usamos a questão da consciência sobre o saber. É um pouco apavorante você imaginar o mundo feito por alienados. ■ Nesse contexto, como o senhor vê a cidade partida de hoje, em que a elite se isola em guetos e as favelas, na contramão, parecem mais orgânicas no todo da cidade? — A famosa periferia, agora, é dos mais ricos. O que a cidade pretende, antes de mais nada, é introduzir, garantir a tranqüilidade e o sossego para as pessoas. O famigerado tempo livre, que é o tempo da reflexão, entender a cidade como o lugar do saber e da reprodução do saber. A cidade é uma invenção e tanto e não temos outro hábitat possível. As
favelas, do jeito que estão aí, muito particularmente porque são mais visíveis e têm uma implantação, uma disposição espacial evidentemente selecionada, escolhida pelos homens, estão ali, no coração da cidade. A favela é a manifestação justamente da consciência da necessidade de se urbanizar. É um desejo. O homem mais urbano do Brasil, do ponto de vista da consciência sobre urbanização, é o favelado. Com grande dificuldade ele foi para ali de qualquer modo, para poder conviver principalmente com o que a cidade engendra, que é serviço, prestação de serviço à sua disposição. Mostra o modo maligno com que isso tudo é feito porque nunca se fez habitação para aquela população e eles chegaram ao ponto que nós estamos vendo aí. O modelo que está ali é da civilização daqueles que foram
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Grupo Brutalista paulista questionou a arquitetura após triunfo internacional
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e em 1978 Caetano ainda reclamava da “dura poesia concreta” das esquinas de São Paulo, dá para imaginar o tamanho da ousadia de um grupo de arquitetos paulistanos, em plenos anos dourados, ao renegar a leveza elegante do frisson nacional e internacional arquitetônico, Brasília, a capital bossa-nova, louvada por Vinicius e Tom Jobim, em Sinfonia da alvorada, como a “cidade branca e pura” construída em meio ao “deserto ermo”. Em oposição direta ao racionalismo do traçado carioca e das formas flutuantes da coqueluche candanga, eles propunham caixas de concreto, de absoluta austeridade, em que todos os equipamentos funcionais, em especial canalizações, sempre ocultados dos olhares burgueses, apareciam com uma sinceridade desconcertante, orgulhosa de sua função. O Brasil da garota de Ipanema estava se transformando numa nação de consumidores, com a ascensão das classes média e alta, que seria reforçada com a chegada ao poder dos militares em 1964. Gosto e dinheiro nem sempre andam juntos, em especial nos tempos em que o maior intermediário entre o feliz proprietário de uma casa e sua construção eram as revistas de decoração. Mas nas escolas de arquitetura se desenvolvia uma geração que queria mudar o
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Passado encontra futuro: intervenção de Mendes da Rocha na Pinacoteca de São Paulo
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país, construir para o povo, “sem separação entre a arte, a sociedade e a ação individual, que sempre deve refletir uma tomada de posição filosófica em termos utilitários no plano prático”, como gostava de explicar o mentor dessa nova arquitetura, Vilanova Artigas. Em 1950, quando Le Corbusier e Gropius eram vistos como deuses do desenho, o paulista publicava artigos raivosos contra eles, acusando-os de “burgueses vendidos aos interesses do imperialismo norte-americano”. Com o golpe e as perseguições políticas, muitos arquitetos acham pouco o conforto da prancheta e passam a denunciar as relações de produção capitalistas na construção, recusando a colocar seu saber a serviço dessas relações. O novo ideal é a revelação do que estava escondido atrás dos ornamentos, a “verdade” arquitetônica que mostra as marcas do trabalho nas casas burguesas e o que elas escondiam. Não sem razão, Artigas seria considerado o líder de um grupo de jovens arquitetos cujas inovações seriam batizadas de “brutalismo paulista” (epíteto execrado por quase todos eles), em verdade um amor pelos materiais sem revestimento, pela austeridade draconiana do concreto exposto, que davam, na sua simplicidade, uma monumentalidade às construções, conseguindo, num curioso paradoxo, com que formas geométricas rígidas e estruturas nuas, brutais, superassem o sonho que Oscar Niemeyer e Lúcio Costa tentaram conseguir, sem sucesso, em Brasília: uma arquitetura que facilitava o contato humano, privilegiava o espírito comunitário. Basta olhar as ruas da capital para perceber que ele não está lá. Ainda assim, o paulista admirava, para horror de seus colegas de esquerda, o criador da Pampulha: “Oscar e eu temos as mesmas preocupações e encontramos os mesmos problemas. Mas, enquanto ele sempre se esforça para resolver as contradições numa síntese harmônica, eu as exponho claramente. Em minha opinião, o papel do arquiteto não consiste numa acomodação; não se deve cobrir com uma máscara elegante as lutas existentes. É preciso revelá-las sem temor”. Poética brutalidade. A influência de Artigas concretizou-se no prédio que projetou para a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU-USP) e na concentração de um grupo de discípulos de suas idéias. Um dos primeiros foi Joaquim Guedes, um arquiteto da FAU que cursou a Escola de Sociologia e Política. Seus projetos reúnem o brutalismo paulista à leveza da “moderna” arquitetura brasileira, em que o cimento nu entra como convidado digno da casa, um elemento de requinte, apesar da sua rudeza originária. O seu colega
Carlos Millan era um seguidor severo da severidade de Artigas, não fazendo concessões para a plasticidade pura, de sinceridade total, foi um digno “brutalista”. Sem ser aluno de Artigas, Paulo Mendes da Rocha trilhou o mesmo caminho. “O arquiteto Vilanova Artigas legou-me essa visão crítica. Minha arquitetura sempre foi inspirada por idéias, não evoca modelos de castelos ou palácios, mas a habilidade do homem em transformar o lugar que habita, com fundamental interesse social, através de uma visão aberta, voltada para o futuro”, escreveu Mendes da Rocha. As casas que projeta nos anos 1960 são de um rigor extremo, onde as fachadas de cimento são jogadas na cara dos passantes a ponto de provocar mal-estar pela sua atmosfera paulistana de cidade de concreto. Sua casa, quase como na música de Vinicius, “não tinha porta, não tinha parede”: os quartos não eram isolados e o arquiteto, observa o historiador Yves Bruand, “impõe seu ideal de vida comunitária, impedindo qualquer morador dessa casa de escapar dele, fato que fez Flávio Motta a descrever como ‘favela racionalizada’. Mas Artigas jamais tinha ido tão longe”. Como ele, viriam outros. érgio Ferro, Ruy Ohtake, Cândido Campos, entre outros, cada um a seu tempo e maneira, iriam adotar o tal brutalismo, visto por Bruand como “o primeiro questionamento da arquitetura pelos brasileiros após o triunfo internacional pós-Segunda Guerra, e merece o respeito em razão de sua honestidade básica”. Ainda segundo o autor de Arquitetura contemporânea no Brasil, o movimento tratava de “uma volta aos princípios de um funcionalismo estrito, de essência decididamente técnica e aspirando a uma industrialização da construção, mesmo quando se expressa pelo caminho artesanal, e de uma estética que valoriza a força, a massa e o peso, amando os contrastes violentos e a psicologia de choque”. Curiosamente, Artigas e seus seguidores percorreram um caminho inverso ao de Niemeyer e Lúcio Costa sem, no entanto, voltarem ao ponto de partida racionalista, da mesmice mecânica arquitetônica pesada dos desenhos dos anos 1930, tão criticados pela dupla que criou a “cidade branca e pura”. Os brutalistas, dignos ou não do seu apelido, eram a cara da metrópole onde viviam, o avesso do avesso do avesso. Ainda assim, como prova Caetano, capaz de provocar a imaginação e “criar coisas belas”. “A arquitetura é uma visão poética sobre a forma, que ultrapassa, na sua dimensão humana, a estrita necessidade. Arquitetura não deseja ser funcional, mas oportuna”, nas palavras de Mendes da Rocha. A imaginação de concreto. •
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POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
Estratégias
Mundo
Aversão às mulheres Acusações de machismo assombram sociedades científicas européias e norte-americanas. O caso mais recente, segundo a revista Nature, envolve a renúncia da geneticista Theresa Markow ao cargo de presidente da Sociedade para o Estudo da Evolução (SSE), em protesto pela escolha do novo editor do jornal da entidade, Evolution. De acordo com as normas da SSE, deve ser constituído um comitê para selecionar o editor. Mas o conselho da sociedade realizou apenas uma consulta informal e indicou um homem. Em 60 anos de existência, queixou-se Markow, o jornal foi dirigido só uma vez por uma mulher – ela própria, nos anos 1990. O problema se repete em outras entidades. Daphne Fairbairn, da Universidade da Califórnia, Riverside, teve uma experiência ruim quando propôs nomes de mulheres para dirigir o jornal da Sociedade Européia de Biologia Evolucionária. “Me olharam como se eu fosse idiota.” O jornal da União Americana 22
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chai De-Eknamkul, conselheiro da Comissão de Educação Superior da Tailândia. Nos próximos dez anos, o programa espera treinar 9.600 doutores, contratar 2.800 pesquisadores em instituições públicas, celebrar 700 parcerias internacionais e criar 60 centros de excelência.
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■ Lentidão
que mata
dos Ornitologistas nunca teve uma mulher editora em 123 anos de história. Kimberley Sullivan, da Universidade do Estado de Utah, recebeu uma bolsa da National Science Foundation (NSF) para estudar o problema. Primeiro, ela testemunhou o hábito de desqualificar nomes femininos na seleção de membros da entidade, realizada nas reuniões anuais. “Sempre alguém falava mal da candidata”, lembra. Kimberley apresentou seu estudo no último encontro da União. Causou polêmica. Mas, na hora de escolher os novos sócios, os ornitólogos dessa vez mediram palavras ao avaliar as colegas.
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■ Em honra do
velho monarca Em 60 anos de reinado, o monarca da Tailândia, Bhumibol Adulyadej, ficou conhecido como um incentivador da ciência. Nascido nos Estados Unidos e formado na Suíça, ele patrocinou a criação dos seis principais centros de pesquisa agrária do país. Agora, para comemorar o jubileu de seu longo reinado, o governo tailandês lançou um programa de US$ 500 milhões para revitalizar o ambiente científico. “Precisamos formar massa crítica de pesquisadores”, disse à revista Science o bioquímico Wan-
A organização não-governamental Médicos Sem Fronteiras (MSF) denunciou em Genebra que os tratamentos adequados contra a malária continuam a faltar aos doentes da África, continente onde a moléstia mata uma criança a cada 30 segundos. O MSF, segundo a agência de notícias EFE, afirma que suas equipes vêem os pacientes receber remédios antigos, como a cloroquina, mesmo quatro anos depois de a Organização Mundial da Saúde (OMS) ter recomendado a adoção de uma terapia combinada baseada em outro remédio, a artemisina. Em muitos países, o parasita da malária criou resistência aos métodos convencionais. O problema é que a artemisina, mais eficaz, custa dez vezes mais. “A transição entre os dois tratamentos está lenta demais”, informou o comunicado do MSF.
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ILUSTRAÇÕES LAURABEATRIZ
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■ Ciência alvejada
Reencontro histórico
no Iraque Na guerra civil iraquiana, pesquisadores e professores universitários são alvo recorrente de seqüestros, ameaças e assassinatos. Um grupo de defesa dos direitos humanos baseado na Bélgica, o Tribunal de Bruxelas, compilou uma lista de mais de 200 acadêmicos mortos no país conflagrado desde 2003. Ninguém foi preso por participar dos crimes. A maioria foi morta em meio a atentados a civis. Mas há casos de perseguições, como o de Jamhour Al Zargani, professor de história de uma universidade em Basra, seqüestrado, torturado e assassinado em 2005, e de vítimas das próprias forças de ocupação norte-americanas, como Basil Abbass Hassan, alvejado por engano. “Ao atingir aqueles que detêm a chave para a reconstrução e o desenvolvimento do Iraque, os causado-
Duzentos pesquisadores das duas Coréias se encontraram secretamente em Pyongyang, capital da Coréia do Norte, no início de abril, para discutir formas de impulsionar a cooperação científica na península dividida. Histórica em tamanho e em ambição, a reunião havia sido marcada para março, mas foi adiada pela Coréia do Norte, comunista, em protesto contra os exercícios militares conjuntos da Coréia do Sul e dos Estados Unidos. Autoridades do norte disseram aos rivais do sul
res dessa violência colocam em risco o futuro do país”, disse Koïchiro Matsuura, diretor-geral da Unesco, braço das Nações Unidas para a Educação, a Cultura e a Ciência, em declaração divulgada no site da entidade.
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que o encontro seria suspenso se uma palavra vazasse para a imprensa. O acordo foi cumprido e, no final, o diálogo fluiu. Após um estranhamento inicial causado pelas diferenças de sotaque, “o gelo desmanchou-se quando começaram a falar de ciência”, disse à revista Science o organizador da conferência ChanMo Park. Os pesquisadores discutiram projetos comuns. Um deles, no campo dos softwares, busca reduzir o fosso tecnológico que separa os vizinhos. Os norte-co■ Base na
América Latina A América Latina vai ganhar um escritório do grupo editorial britânico que publica a prestigiada revista científica Nature. A Cidade do México
reanos expressaram interesse em energias alternativas, agricultura e na mitigação dos efeitos das tempestades de areia vindas da China. Os sul-coreanos acenaram com dinheiro: dispunham de US$ 600 mil para projetos conjuntos. O sucesso do encontro é atribuído à tenacidade da Soon-Kwon Kim, da Universidade Kyungbuk, em Daegu, que visitou a Coréia do Norte 27 vezes desde 1998. “A ciência é a melhor opção para mudar e ajudar a Coréia do Norte”, disse Kim.
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foi escolhida para sediar a divisão regional, que terá jurisdição também sobre a Espanha e será comandado pelo executivo Juan Pablo Guereño, que já trabalhou na Argentina, no Brasil, na Espanha e no México. O grupo editorial Nature também vai abrir um escritório na Índia, baseado na cidade de Gurgaon.“Estes escritórios vão ajudar o grupo Nature a construir relações com sociedades médicas e científicas de prestígio, estreitar laços com universidades e tornar nosso conteúdo mais acessível”, disse Annette Thomas, diretora administrativa do grupo.
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Estratégias
Ciência na web
Mundo
Envie sua sugestão de site científico para cienweb@trieste.fapesp.br
LAURABEATRIZ
De olhos mais abertos
http://haydenplanetarium.org/hp/vo/ava/
O governo japonês quer mudar o programa espacial do país, contemplando, pela primeira vez, aplicações militares. Um comitê do Partido Liberal Democrático (PLD), do premiê Junichiro Koizumi, propôs revisão da política espacial traçada em 1969, que limita o uso do espaço a finalidades pacíficas. Sob a atual legislação, o Japão abriu mão de desenvolver satélites militares de alta tecnologia até para defesa. Coisas de um país obrigado pela Constituição a devotar-se à paz – decorrência da derrota na Segunda Guerra Mundial. Segundo o site do jornal Mainichi Daily News, o porta-voz do comitê do PLD, Takeo Kawamura, anunciou que será proposta a revogação da barreira jurídica para que o país possa construir satélites espiões de alta resolução. A proposta será apresentada ao Parlamento em 2007. O governo está preocupado com ataques da Coréia do Norte, que lançou mísseis nas águas japonesas em 1998. Desde então o Japão já lançou dois satélites, mas a resolução das imagens é insu24
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ficiente para fins de defesa. Os nipônicos dependem dos Estados Unidos para obter imagens adequadas.
Acervo de filmes e animações sobre eventos astronômicos ou astrofísicos, como explosões solares e choques de cometas.
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■ Criacionismo
canadense O biólogo Brian Alters, na Universidade McGill, em Montreal, pediu uma dotação de US$ 40 mil a um órgão público de fomento para pesquisar como o design inteligente, controversa teoria criacionista sobre a origem da vida, está se tornando popular no país. Ficou surpreso ao receber a resposta do órgão, o Conselho de Pesquisa em Humanidades e Ciências Sociais. A verba foi negada sob o argumento de que Alters não reuniu evidências de que a Teoria da Evolução de Darwin está correta. “É um absurdo. O design inteligente é pseudociência”, disse Alters ao jornal The Gazette. “A prova de que essa teoria está causando estragos é que convenceu até um órgão de fomento”, reclamou o pesquisador. A Universidade McGill pediu ao conselho que reconsidere a decisão.
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http://www.discoverlife.org/
A enciclopédia virtual sobre a biodiversidade abrange 270 mil espécies espalhadas pelo planeta e reúne informações, descrições e fotos.
http://www.casadaciencia.ufrj.br/
O site traz a agenda de eventos e exposições da Casa da Ciência, centro de divulgação científica da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
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Brasil
Pesquisa FAPESP na rede
sível superar os gargalos”, diz Roberto Jaguaribe, presidente do INPI. A segunda frente é a informatização dos pedidos, hoje feitos em papel. “A partir de maio tudo será feito por meio eletrônico, o que vai poupar muito tempo”, diz Jaguaribe. A capacidade de analisar pedidos de marca vai crescer de 50 mil para 150 mil por ano e a de patentes, de 13 mil para 35 mil anuais, mas serão necessários dois anos para que o atual estoque de pedidos represados seja atendido.
O site da revista: conteúdo aberto e gratuito
■ Oxigênio
para o INPI O Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI) passa por uma reestruturação que, espera-se, irá reduzir de nove para cinco anos o prazo de análise de patentes e de seis
gens e notas publicadas na versão impressa da publicação, o internauta vai encontrar na versão digital do periódico seções especificamente produzidas para o meio virtual, como “O melhor das revistas”, que traz um resumo dos principais artigos publica-
para apenas um ano o exame de pedidos de marcas. A reforma do INPI se dá em duas frentes. A primeira passa pela renovação dos quadros da instituição, que, até o final de 2006, crescerá de 630 para 1.091 funcionários. Os responsáveis pelo exame de mar-
dos nas revistas Nature e Science. Também é possível ouvir amostras do programa semanal de rádio Pesquisa Brasil, uma parceria da revista com a emissora Eldorado AM. O acesso ao conteúdo do site é totalmente aberto e gratuito aos internautas.
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■ Talentos
cas, que hoje são apenas 43 pessoas, em breve serão mais de cem. O quadro de examinadores de patentes irá triplicar. Hoje são 105 funcionários de nível superior. Até o final do ano haverá mais 240.“Sem pessoal em quantidade e qualificação necessárias não é pos-
femininos
LAURABEATRIZ
O novo site de Pesquisa FAPESP está no ar. Totalmente redesenhado, com um sistema de busca mais eficiente, o endereço eletrônico www.revistapesquisa. fapesp.br traz o conteúdo integral de todas as edições da revista, do número 1 ao atual. Além das reporta-
Jovens pesquisadoras têm até 15 de maio para se inscrever no programa de apoio patrocinado pela L’Oréal do Brasil em parceria com a Academia Brasileira de Ciências (ABC). As bolsas de auxílio vão ser atribuídas nas áreas de ciências físicas, biomédicas, biológicas e da saúde. Serão selecionadas cinco pesquisadoras que obtiveram título de doutorado entre 1º de setembro de 2002 e 1º de setembro de 2006. O formulário para inscrição e a lista de documentos a ser entregues estão disponíveis no site www. abc.org.br/loreal
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Brasil
O governador Cláudio Lembo nomeou Maria Helena Guimarães para assumir a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico do Estado de São Paulo no lugar de João Carlos Meirelles. Maria Helena é professora do Departamento de Ciência Política da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e ex-secretária executiva do Ministério da Educação.
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■ Conselheiros
são nomeados
Uma lista de 3 mil nomes de plantas tradicionais do Brasil, entre as quais o açaí, a acerola, o cajá, o cupuaçu, o maracujá, o quiabo, o pinhão e o umbu, será divulgada mundo afora. Busca-se, com isso, prevenir apropriações indevidas, como a da empresa nipônica Asahi Foods, que registrou a marca cupuaçu e conseguiu bloquear a venda de produtos brasileiros feitos com a fruta tropical de sabor exótico nos mercados do Ja-
pão, dos Estados Unidos e da Europa. Levantamento da Associação Brasileira de Propriedade Intelectual (ABPI) sustenta que há outros 84 casos de nomes de espécies brasileiras registrados como marcas em vários países. O caso do açaí rendeu uma ação judicial no Japão, movida por organizações não-governamentais, que terminou em vitória para o Brasil, com a revogação do registro, e deixou lições sobre a necessidade de
prevenir ataques desse gênero. Integrantes do Grupo Interministerial de Propriedade Intelectual (Gipi) passaram os últimos dois anos compilando nomes de espécies da biodiversidade brasileira. O resultado será enviado, em forma de software, a escritórios de patentes de diversos países. Assim, quando uma marca for requerida, os escritórios poderão saber de antemão se há apropriação de espécies tradicionais brasileiras.
universidade, será a segunda mulher a integrar o Conselho Superior da FAPESP. O sociólogo Sedi é pró-reitor de Cultura e Extensão Universitária da USP. Agopyan é engenheiro civil e professor da Escola Politécnica, da qual foi diretor. Conselheiro desde 2000, será reconduzido ao cargo. Saem Adilson Avansi de Abreu, do Departamento de Geografia, e Hugo Aguirre Armelin, do Instituto de Química. Os novos integrantes foram escolhidos a partir de três listas tríplices feitas pelo Conselho Universitário da USP e enviadas ao governador.
■ Integração de
consulta, clicando-se sobre elas. Para disponibilizar um maior número de informações, o CNPq, que comemorou 55 anos de criação no dia 26 de abril, irá solicitar aos seus bolsistas de doutorado no exterior que depositem suas teses no banco do Ibict. O acesso facilitado à produção dos programas de pós-graduação é um assunto recorrente no governo federal: em fevereiro, um decreto da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) determinou a criação de um novo banco de teses e dissertações, disponível no site www.dominiopublico.gov.br.
O Conselho Superior da FAPESP tem três novos integrantes escolhidos pelo governador Cláudio Lembo. Suely Vilela Sampaio, Sedi Hirano e Vahan Agopyan serão os representantes da Universidade de São Paulo (USP) na Fundação, para cumprir mandatos de seis anos. Suely é reitora da USP e professora da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto. Primeira mulher a dirigir a MAIO DE 2006
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bancos de dados A plataforma de currículos Lattes, organizada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), será integrada à Biblioteca Digital de Teses e Dissertações do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (Ibict). Ambos os órgãos são vinculados ao Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT). Com a integração, que deve acontecer nos próximos meses, teses citadas nos currículos estarão disponíveis na internet para
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■ Os
premiados do ano
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pasta de C&T
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Prevenção à biopirataria
■ Nova titular na
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Foram anunciados os ganhadores do Prêmio FCW de Ciência e Cultura, concedido anualmente pela Fundação Conrado Wessel. Na categoria Ciência Geral, o vencedor foi Wanderley de Souza, professor do Instituto de Biologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ),
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professor da Universidade Federal de Minas Gerais. Cada um dos vencedores receberá R$ 100 mil.
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■ Política de boa
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vizinhança
que atualmente é secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação do governo fluminense. Na categoria Ciência Aplicada à Água, o laureado foi José Galizia Tundisi, do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP), em São Carlos. Luiz
Carlos Fazuoli, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da USP, em Piracicaba, e do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), ganhou na categoria Ciência Aplicada ao Campo. O geógrafo Aziz Ab’Saber, professor emérito da Faculdade de
Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, foi premiado na categoria Ciência Aplicada ao Meio Ambiente. Na categoria Medicina, o vencedor foi Adib Jatene, professor da Faculdade de Medicina da USP. O Prêmio de Literatura coube ao crítico Fábio Lucas,
A Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), agência de fomento à inovação vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), vai investir R$ 6 milhões em pesquisas voltadas para o estudo da Violência Urbana e da Desigualdade Social. Podem concorrer projetos de instituições científicas com dotações entre R$ 300 mil e R$ 600 mil. A apresentação de propostas segue até as 18 horas do dia 25 de maio (envio eletrônico) ou até 26 de maio (envio de cópia impressa). O formulário de apresen-
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V iolência e desigualdade tação de propostas está disponível no portal Finep (www.finep.gov.br). Os resultados da seleção serão conhecidos em meados de julho. A chamada pública Pesquisa em Ciências Sociais, lançada no início de abril, busca financiar projetos que aprofundem o conhecimento sobre violência e desigualdade social e contribuam para o surgimento de soluções práticas capazes de enfrentá-los e também para a formulação de políticas públicas. O prazo de execução dos projetos é de 24 meses.
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Países vizinhos do Brasil poderão usar gratuitamente imagens de seus territórios obtidas pelo Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres (Cbers). A abertura foi decidida em março, na reunião do Comitê Conjunto do Programa Cbers, que reúne representantes do Brasil e da China, os dois países responsáveis pelo projeto. A distribuição de imagens beneficiará Guiana Francesa, Suriname, Guiana, Colômbia, Equador, Uruguai, Paraguai e Bolívia; Argentina, Chile, Peru e Venezuela.
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■ Em defesa da
Terra do M eio O paraense Tarcísio Feitosa da Silva, de 35 anos, foi um dos seis vencedores da edição de 2006 do prêmio da fundação norte-americana Goldman, um dos mais importantes do ambientalismo mundial. O prêmio é um reconhecimento ao trabalho de Feitosa na defesa da Terra do Meio, entre os rios Xingu e Tapajós, no Pará. Foi ele quem denunciou a extração ilegal de madeira na região que resultou na apreensão de 6 mil toras de mogno. Ligado à Comissão Pastoral da Terra, articulou a criação de um mosaico de unidades de conservação no Xingu que somam 240 mil quilômetros quadrados de área. Antes dele outros dois brasileiros ganharam o prêmio: Carlos Alberto Ricardo, do Instituto Socioambiental, e a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.
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INOVAÇÃO
Sistema imaturo Universidades brasileiras ocupam espaço que deveria pertencer às empresas em ranking de patentes
F ABRÍCIO M ARQUES
A
s universidades ocupam um espaço que deveria ser das empresas na produção de conhecimento tecnológico no Brasil. Um levantamento realizado pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) mostra que uma universidade pública, a Unicamp, detém o primeiro lugar no ranking de pedidos de patentes no país. O estudo leva em conta os registros depositados no INPI entre 1999 e 2003. Nesse período, a Unicamp apresentou 191 solicitações. Em segundo lugar aparece a Petrobras, com 177 pedidos, seguida por empresas como a Arno, a Multibrás, a Semeato e a Vale do Rio Doce. A disputa entre Unicamp e Petrobras foi acirrada, mas a universidade esteve em primeiro lugar em três dos cinco anos contemplados no estudo. Chama a atenção que, entre os 20 primeiros colocados, oito estejam vinculados ao setor público e cinco sejam universidades. A FAPESP, em 7º lugar, é o órgão de fomento mais bem colocado no ranking, com 83 pedidos. Outras universidades também figuram na lista, como a Fe28
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deral de Minas Gerais (UFMG), em 10º lugar, a Universidade de São Paulo (USP), em 12º, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), em 16º, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), em 17º, a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em 18º, e a Universidade Estadual Paulista (Unesp), em 19º. “Esse resultado deve ser comemorado, porque é fruto de um esforço consistente da Unicamp, mas também é motivo de grande preocupação”, diz Maria Beatriz Amorim Páscoa, diretora de articulação do INPI. “Continua a faltar uma participação mais efetiva de empresas neste ranking”, ela afirma. Nos países desenvolvidos, o quinhão das universidades na proteção à propriedade intelectual costuma ficar muito aquém do da indústria. Nos Estados Unidos, por exemplo, apenas 5% das patentes concedidas para depositantes nacionais pertencem a universidades. A Universidade da Califórnia, com seus dez campi, foi a instituição de ensino superior que mais teve patentes concedidas no país em 2003. Foram 439. Esse número é uma pequena fração do desempenho da líder entre as empresas, a IBM, com 3.415 registros. Funciona assim porque as empresas privadas é que têm a
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A Pesquisa Nacional de Inovação Tecnológica (Pintec) de 2003 registrou uma queda no número de empresas brasileiras que fazem pesquisa e desenvolvimento de forma contínua – eram 2.432 em 2003 ante 3.178 em 2000. “Isso é muito grave e o prejuízo vai além daquilo que os indicadores sugerem”, observa Eduardo da Motta e Albuquerque, professor do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG. “A interação entre as empresas e a academia não funciona bem. Em outros países, a inovação nas universidades é impulsionada por demandas geradas nos centros de pesquisa e desenvolvimento das empresas. Aqui no Brasil, como as empresas fazem pouca pesquisa, esse impulso é fraco”, diz Albuquerque.
necessidade crucial de proteger suas invenções dos concorrentes. A missão da universidade é muito mais abrangente: cabe a ela educar estudantes e produzir e difundir o conhecimento. Eventualmente, isso leva à geração de patentes. “Os dados do INPI contrariam o argumento de que as boas universidades brasileiras deixam em segundo lugar o interesse em tecnologia. Apesar das restrições materiais, algumas universidades estão conseguindo resultados relevantes com a obtenção e o licenciamento de patentes, o que ainda se vê em menor escala do lado das empresas, com honrosas exceções”, diz Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da FAPESP e ex-reitor da Unicamp. É certo que as empresas participantes do ranking brasileiro ostentam histórias exemplares no caminho da inovação. A Arno, que apresentou 148 pedidos entre 1999 e 2003, pertence ao grupo francês SEB, que investe 3% de
sua receita em pesquisa e tem tradição internacional no registro de patentes. A indústria de máquinas agrícolas Semeato, do Rio Grande do Sul, mantém 300 funcionários desenvolvendo produtos e sentiu a necessidade de preservar a propriedade intelectual para combater as cópias criadas por concorrentes. Mas se pode afirmar que tais casos não são representativos do comportamento das empresas brasileiras. O que seria necessário para que aconteça essa alteração? “É preciso mais pesquisadores atuando em empresas, como tem demonstrado a experiência de vários outros países”, diz o professor Brito Cruz, da FAPESP. O caso da Espanha é emblemático (veja quadro). Entre 1981 e 2000, o número de pesquisadores trabalhando em empresas sextuplicou. E cresceu na mesma velocidade do número de patentes espanholas registrados no Uspto, o escritório de marcas e patentes dos Estados Unidos.
Dianteira - A debilidade das empresas pode ser mensurada segundo vários indicadores. A comparação entre o Brasil e a Coréia do Sul é significativa. Em 2002, os sul- coreanos depositaram mais de 3,4 mil pedidos de patentes nos Estados Unidos, ante pouco mais de uma centena do Brasil. Os dois países têm uma comunidade de cientistas de tamanho semelhante, mas, na Coréia, cerca de 80% dos cientistas dedicam-se a fazer pesquisa e desenvolvimento na indústria, enquanto no Brasil a indústria não absorve mais que 10% dessa qualificada força de trabalho. A dianteira da Unicamp é fruto de uma estratégia traçada nos anos 1980. Foram criados inicialmente a CPPI (Comissão Permanente de Propriedade Industrial), em 1984, em seguida o ETT (Escritório de Transferência de Tecnologia), em 1990, e depois o Edistec (Escritório de Difusão e Serviços Tecnológicos), em 1998. Estes escritórios nasceram com o objetivo de estimular parcerias com empresas e órgãos do governo e buscar aplicações práticas para o conhecimento científico (leia reportagem sobre projetos desenvolvidos pela Unicamp na página 66). Nos primeiros anos, a média de patentes depositadas ficou em torno de uma dezena por ano. Em 2003 foi criada a agência de inovação da Unicamp, a Inova Unicamp, iniciativa muito mais ousada e eficaz, incluindo na agenda o licenciaPESQUISA FAPESP 123
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mento de propriedade industrial. Hoje a média subiu para 60 patentes por ano, o que perfaz mais de um pedido de patente por semana. Com um acervo acumulado de 300 pedidos, a Inova Unicamp passou a se dedicar mais fortemente a um segundo desafio: a comercialização das patentes por meio da celebração de contratos de licença com empresas. Se nos 15 anos anteriores à criação da agência a universidade havia feito apenas sete licenciamentos, com a criação da Inova Unicamp esse número subiu para dez contratos em 2004 e 12 em 2005. Já há empresas que celebraram vários contratos de licenciamento com a Unicamp, como é o caso dos laboratórios Cristália. Como demora no mínimo cinco anos para uma patente ser concedida, a comercialização inicia logo após o pedido do depósito de patente. Os possíveis riscos são compartilhados entre a universidade e a empresa. O mérito da agência de inovação da Unicamp, observa seu diretor executivo Roberto de Alencar Lotufo, foi o de inaugurar no Brasil o estilo de um núcleo universitário de inovação focado na co-
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mercialização da propriedade industrial, porém respeitando o caráter acadêmico da universidade.“A Unicamp talvez seja a instituição que mais investiu numa agência de inovação, esforço que começa a ser compartilhado hoje por outras instituições como o IPT e a USP”, diz Lotufo.“A qualidade da pesquisa acadêmica feita na universidade é a base de tudo. Não por acaso, as unidades da Unicamp com maior número de licenciamentos têm as notas mais elevadas na avaliação da Capes e o maior número de publicações internacionais.”
O
interesse da universidade vai além daquele conceito tradicional de transferência de tecnologia. A experiência internacional mostra que está ultrapassada a idéia de que a vantagem de patentear é ganhar royalties para financiar suas atividades acadêmicas. Isso porque são raríssimos os exemplos de ganhos financeiros significativos. Editorial publicado pela revista Nature no dia 13 de abril abordou essa mudança. “Embora as pessoas às vezes suponham que a função dos escritórios de transferência de tecnologia seja fazer caixa para as universidades por meio de arre-
cadação de royalties, o pensamento dos dirigentes acadêmicos vem mudando”, registrou o editorial. “Em vez disso, seu principal papel é desenvolver os laços das universidades com o mundo dos negócios de uma forma que possa beneficiar os estudantes, os pesquisadores e a sociedade.” Quase as mesmas palavras estão na deliberação com a qual o Conselho Universitário da Unicamp institucionalizou a Inova, na qual se afirma justamente: “Artigo 1º – Fica criada a Agência de Inovação da Unicamp – Inova Unicamp – junto ao Gabinete do Reitor, com a missão de fortalecer as parcerias da Unicamp com empresas, órgãos do governo e demais organizações da sociedade, criando oportunidades para que as atividades de ensino e pesquisa se beneficiem dessas interações e contribuindo para o desenvolvimento econômico e social do País”. A utilidade das agências de transferência de conhecimento é proteger a propriedade intelectual para garantir que a difusão do conhecimento produzido pela universidade aconteça de forma segura, por meio de um contrato com uma empresa. “E não será das patentes das universidades que sairá o desenvolvimento tecnológico do país. Este só poderá nascer nas atividades de pesSIRIO J. B. CANÇADO
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O exemplo espanhol 25000
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Patentes registradas no Uspto (United States Patent and Trademark Office)
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O número de patentes espanholas registradas nos Estados Unidos cresceu junto com o contingente de pesquisadores trabalhando em empresas
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quisa e desenvolvimento em empresas”, diz Roberto Lotufo. “Entretanto as universidades têm o papel de formar profissionais educados na fronteira do avanço tecnológico, e ter experiência em propriedade intelectual faz parte desta educação”, completa. Inventores - A leitura do levantamen-
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to do INPI revela outros sinais de imaturidade do sistema de inovação, observa Maria Beatriz Páscoa, do INPI. O ranking de instituições que a Unicamp lidera responde por apenas uma terça parte do total de pedidos de registro no órgão. Os outros dois terços são pulverizados em milhares de pessoas físicas. “A maioria dos pedidos parte de inventores isolados, que poderiam estar articulados com instituições”, diz a diretora da articulação do INPI. Enquanto as instituições conseguem emplacar mais da metade dos pedidos, entre as pessoas físicas esse número é bem menor, por uma série de fatores que vão desde as dificuldades de redigir um pedido até a inadequação do conteúdo da patente. O INPI busca democratizar esse tipo de informação oferecendo cursos para capacitar gestores – foram 23 só no ano de 2004. “A meta é mostrar que o objetivo último não é obter a patente, mas garantir o mercado. Nem sempre o inventor isolado consegue enxergar isso e briga para obter a patente de uma inovação que não terá aplicação comercial”, diz Maria Beatriz. Mesmo empresas inovadoras são menos afeitas a procurar patentes do que suas concorrentes internacionais. Segundo a diretora do INPI, a Embraer, uma das empresas brasileiras mais inovadoras, não tem registro de patente nos Estados Unidos. Já sua concorrente Bombardier tem mais de 700. Há, é certo, alguns dados alentadores. Entre os depósitos de patente de instituições, a metade deles vincula-se a invenções e a outra metade a aperfeiçoamentos de modelos. A relação mostra que as instituições devotadas à inovação estão levando o trabalho a sério. Maria Beatriz acredita que, com os mecanismos previstos na Lei de Inovação, o quadro poderá sofrer mudanças em levantamentos futuros. “O contexto é de incentivo à inovação dentro das empresas. Falta verificar se isso será suficiente para alterar esse ambiente de maneira substancial”, afirma. • PESQUISA FAPESP 123
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POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
PROGRAMA ESPACIAL
Com os pés longe do
chão
A viagem do astronauta brasileiro terá influência rala no desenvolvimento tecnológico do país
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ozes respeitadas da comunidade científica brasileira quebraram o coro ufanista que cercou a viagem de dez dias à Estação Espacial Internacional (ISS) do tenente-coronel Marcos César Pontes,o primeiro brasileiro a entrar em órbita.“Os experimentos levados ao espaço não justificam um investimento de US$ 10 milhões”,disse o físico Rogério Cézar Cerqueira Leite.“É carona paga”,afirmou Ennio Candotti,presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC),referindo-se ao fato de que a viagem não gerou demandas à tecnologia nacional.Em artigo publicado no jornal O Estado de S. Paulo, o biólogo Fernando Reinach propôs umaco nta:com o dinheiro que o país pagou à Agência Espacial Russa para garantir a viagem,seria possível duplicar o número de bolsistas de doutoramento no campo aeroespacial no exterior ou formar quase 300 doutores no Brasil.“É mais um caso em que investimentos em educação foram trocados por publicidade”, disse. Mas,afinal,qual foi o saldo da viagem de Pontes à ISS? Do ponto de vista prático,a Missão Centenário – alusiva aos cem anos do vôo do 14-Bis e celebrizada pela imagem do astronauta usando uma réplica do chapéu de Santos Dumont – serviu para levar a cabo oito experiências científicas em ambiente de microgravidade,área de interesse de dis32
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ciplinas como biologia,biotecnologia, medicina,materiais,combustão e desenvolvimento de fármacos.Exemplo:um desafio à permanência do homem durante longos períodos no espaço é o conhecimento das conseqüências da ausência de gravidade sobre a fisiologia humana.O gerente da Missão Centenário,Raimundo Mussi,lembra que a Agência Espacial Brasileira (AEB) oferece há anos oportunidades a cientistas de testar experimentos em microgravidade a bordo de foguetes de sondagem,pequenas cápsulas que levam experiências ao espaço por alguns minutos.“A viagem de Pontes é um desdobramento natural dessas pesquisas”,afirmou Mussi. Um desses experimentos prestou-se ao campo da popularização da ciência, como a germinação na ISS de sementes de feijão enviadas por estudantes de escolas públicas de São José dos Campos. Os outros eram desdobramentos de projetos de pesquisa.Entre eles destacaram-se um teste de reações enzimáticas de interesse industrial,a submissão de bactérias à radiação cósmica para estudo de mecanismos de reparo celular e a indução do fenômeno da bioluminescência usando como matéria-prima as substâncias responsáveis pelo brilho dos vaga-lumes:a enzima luciferase e seu substrato luciferina.“A análise das imagens da reação com luciferase e luciferina em gravidade zero ajudará a compreender a ligação de pequenas moléculas com as enzimas”,diz o biólogo molecular Vadim Viviani,do Grupo de Bioluminescência e Luciferases do Instituto de Biociências da Universidade Esta-
dual Paulista (Unesp), campus de Rio Claro. A pesquisa sobre a bioluminescência, apoiada pela FAPESP, tem interesse terapêutico.Os genes das luciferases podem ser utilizados como biomarcadores luminosos,já que,ao serem transferidos para uma bactéria,ela fica iluminada.“Quando a bactéria adquire luz,é possível acompanhar a sua progressão dentro do organismo.Esse procedimento já é utilizado para testar o funcionamento de medicamentos,detectar se há contaminação bacteriana em alimentos ou mostrar a evolução de células cancerígenas em modelos animais”, diz Viviani. O estudo de microgravidade é apenas um dos braços do programa espacial brasileiro.Os outros objetivos do programa,de conteúdo notadamente estratégico,são a construção de novos satélites nacionais,o desenvolvimento de um foguete lançador capaz de levar os satélites ao espaço e a reconstrução do Centro Espacial de Alcântara,no Maranhão,destruído após a explosão do Veículo Lançador de Satélite (VLS), em 2003,tragédia que matou 21 pessoas. A viagem do tenente-coronel Pontes não tem influência direta sobre essas faces do programa.O presidente da Agência Espacial Brasileira,Sérgio Gaudenzi,admite que o ganho principal da viagem pertence ao terreno do marketing. “O nosso programa espacial teve uma cobertura da mídia e uma repercussão que
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nunca teve antes e isso tem um valor inestimável”, afirma. As vantagens dessa exposição são difíceis de mensurar, mas Gaudenzi espera que isso tenha peso nos próximos anos nas discussões no Congresso sobre o orçamento do programa espacial. “Os parlamentares seguem a vontade da população”, diz. Em 2006 o programa espacial brasileiro terá US$ 150 milhões para gastar. Trata-se do maior valor destinado nos últimos anos. Em anos anteriores o orçamento chegou a cair a escassos US$ 25 milhões. Atribui-se a essa asfixia financeira o atraso no desenvolvimento de foguetes lançadores. A tragédia de Alcântara chamou a atenção para o problema e provocou uma mudança de postura do governo. No ano passado os cerca de US$ 100 milhões destinados ao programa espacial foram quase integralmente disponibilizados e gastos, um caso raro em meio ao contingenciamento generalizado de verbas. “Empenhamos 99,5% de nosso orçamento de 2005, um recorde na Esplanada dos Ministérios”, afirma Gaudenzi. Se o Congresso e o governo serão generosos, o tempo é que vai dizer. Não será por falta de projetos capazes de de-
senvolver tecnologia nacional que o dinheiro não será gasto. O programa de construção do VLS foi retomado com assessoria de especialistas da Agência Espacial Russa e hoje prevê o lançamento de um protótipo em 2007 e outro em 2008. Na prática, os dois lançamentos servirão apenas para testar a tecnologia e nenhum deles levará carga útil. A idéia é usar a experiência com o VLS para desenvolver uma nova geração de foguetes, batizada de Alfa, que terá um estágio de combustível líquido, tecnologia que o Brasil ainda tenta dominar. O primeiro protótipo da família Alfa deve ir ao espaço em 2009. No campo dos satélites, estão previstos até 2010 o envio ao espaço de mais três membros da família Cbers, de sensoriamento remoto, desenvolvidos em parceria com a China, e a criação de plataformas capazes de realizar missões variadas. Outro objetivo de curto prazo é reerguer a base de Alcântara, em parceria com a Ucrânia, e colocá-la no mapa dos lançamentos comerciais de foguetes. Segundo astronauta - Por fim, há dú-
vidas sobre o que fazer com a participação brasileira na Estação Espacial Internacional. O tenente-coronel Pontes
começou a receber treinamento para ir à ISS em 1998, quando o Brasil comprometeu-se em construir peças para a estação no valor de R$ 120 milhões e havia a expectativa de manter até sete astronautas em órbita permanentemente. O Brasil não honrou sua parte no acordo, mas Pontes seguiu com seu treinamento em Houston. Em 2003 a explosão do Columbia interrompeu as viagens dos ônibus espaciais, as principais responsáveis por levar peças e gente à estação. Desde então, a tarefa cabe às cápsulas russas Soyuz e apenas dois ou três astronautas ficam em órbita de cada vez. No próximo mês o presidente da Agência Espacial Brasileira irá à Nasa, acompanhado pelo astronauta Pontes, para discutir se o Brasil continua ou não a integrar o consórcio internacional da ISS.“Somos sócios minoritários e precisamos avaliar se os sócios principais vão levar adiante a iniciativa. Hoje há uma discussão entre eles se os benefícios da estação estão compensando os custos”, diz Gaudenzi. Se o acordo for renovado, a AEB deverá deflagrar um processo seletivo para recrutar o segundo astronauta brasileiro. •
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POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
INFRA-ESTRUTURA
Biblioteca
contemporânea FAP-Livros libera recursos para a compra de 130 mil títulos
A
s instituições de ensino superior e institutos de pesquisa do estado de São Paulo receberam nas últimas semanas uma formidável injeção de informações em forma de livros.Pelo menos 130 mil unidades – a esmagadora maioria composta de material impresso, mas também de e-books, microfilmes e CDs – estão em fase de aquisição.Todo o material passará a fazer parte do acervo das bibliotecas que tiveram seus pedidos apreciados e aprovados pelo FAPLivros,o programa da FAPESP que financia periodicamente a compra de livros científicos e tecnológicos. Essa é a quinta versão do programa, que recebeu investimento de R$ 27 milhões.“Inicialmente estavam previstos R$ 20 milhões,mas decidimos aumentar o valor em razão da demanda e da qualidade dos pedidos”,diz o diretor científico da FAPESP,Carlos Henrique de Brito Cruz.Foram aprovadas 161 solicitações das 172 recebidas.O FAP-Livros apóia a compra de obras destinadas à pesquisa científica e tecnológica para a atualização dos acervos. Pela primeira vez os livros em formato eletrônico, os e-books, também foram contemplados.O Consórcio Cruesp/Bibliotecas,que reúne os três sistemas de bibliotecas das universidades estaduais paulistas,integra 92 bibliotecas que aten34
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dem a mais de 230 mil estudantes e foi o responsável pela indicação dos títulos de obras eletrônicas.“A aprovação para a compra de e-books foi muito importante por colocar à disposição da comunidade do Cruesp o mesmo conjunto de informações,com a vantagem de transcender as barreiras físicas e geográficas das bibliotecas”,explica Adriana Cybele Ferrari,uma das três gestoras do consórcio e diretora do Sistema Integrado de Bibliotecas (SIBi) da Universidade de São Paulo (USP).“Todas as bibliotecas das três universidades estaduais se beneficiarão dos livros virtuais,na sua maioria títulos estrangeiros”,diz.“Esse projeto complementa os pedidos individuais feitos pelas bibliotecas.” Uma das contrapartidas exigidas pela FAPESP é a garantia de manutenção do acesso aos e-books ou às publicações em outras mídias,com recursos próprios das instituições,por cinco anos,no mínimo.De acordo com Adriana,a exigência é uma garantia de continuidade de acesso a essas coleções e fez com que os projetos fossem bem dimensionados. Microfilmes e CDs - Dos 130 mil títulos aprovados pelo programa,a maior parte,cerca de 30 mil,coube à biblioteca do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).Quase a totalidade dos livros virá do exterior. “Há coisas fantásticas na Europa e nos Estados Unidos e conseguir comprá-
las para nossa biblioteca representa um grande avanço”,conta Michael Mcdonald Hall,coordenador da Comissão de Biblioteca da Unicamp e professor de história. Além de livros,serão comprados microfilmes e CDs.“Existem atas de reuniões,material publicado na imprensa e documentos históricos que não viraram livro,mas estão microfilmados e serão importantes para o trabalho dos pesquisadores”,diz Clarinda Rodrigues Lucas,bibliógrafa e ex-diretora da biblioteca do IFCH.“A Inglaterra,por exemplo,tem excelente documentação sobre o tráfico de escravos.”A história da África foi um dos temas de interesse indicados pelos pesquisadores do instituto,assim como livros e CDs sobre história da arte. A Biblioteca Florestan Fernandes da Faculdade de Filosofia,Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP teve aprovada a compra de cerca de 20 mil livros.O ex-diretor da faculdade e atual pró-reitor de Cultura e Extensão Universitária,Sedi Hirano,comemora a atualização da biblioteca que já tem um acervo de 500 mil volumes sobre filosofia,ciências sociais,literatura,história e geografia.Embora o FAP-Livros seja voltado para acervos comprados especialmente para pesquisa,utilizados mais pelo pessoal da pós-graduação, ele ressalta que o benefício atingirá todos os docentes e alunos da FFLCH. “O conhecimento que o professor da
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pós-graduação acumula é repassado para o estudante, não fica restrito ao pesquisador”, diz Hirano. “Os novos livros tornarão a biblioteca mais contemporânea.” Como ocorre com o Consórcio Cruesp/Bibliotecas e com o IFCH, quase todo o material comprado pela FFLCH vem do exterior. “Coletamos as sugestões dos professores e cremos ter conseguido contemplar a grande maioria delas”, afirma Márcia de Grandi, diretora da Florestan Fernandes. A biblioteca recebeu uma média de 2,5 mil consultas por dia no ano passado. Maior unidade da USP, a FFLCH tem 10 mil estudantes de graduação, cerca de 2,5 mil de pós, 4 mil de extensão universitária e pode fechar 2006 com 440 docentes. “Com tanta gente, é natural que o volume seja grande.” Uma das vantagens do FAP-Livros muito apreciada pelos gestores das bibliotecas é o fator desburocratização. “Às vezes, o pesquisador fica muito aflito porque precisa de determinado livro e a demora no processo de compra termina por prejudicar o trabalho”, diz Adriana Ferrari, do SIBi/USP. Também ocorre de o processo de licitação chegar ao fim, mas a obra não é entregue pelo fornecedor por estar esgotada. Ou, ainda, a licitação simplesmente fracassa. “Com os recursos liberados pelo programa da FAPESP as aquisições são feitas imediatamente. Ganhamos duas vezes: ao atualizar o acervo e em agilidade.” • PESQUISA FAPESP 123
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CIÊNCIA
Laboratório
Mundo
A indústria farmacêutica Eli Lilly financiou cinco estudos comparando um medicamento contra esquizofrenia que ela própria produzia com outro, feito pela Janssen. Resultado: todos os cinco trabalhos mostraram que o medicamento da Eli Lilly era o melhor. Porém, quando a Janssen patrocinou seus próprios estudos comparando os dois remédios, foram os dela que ficaram na frente. Não são casos pontuais. Nove em cada dez testes de novos medicamentos psicotrópicos pagos por indústrias ■ As
raízes do comportamento
Por que começamos a falar mais alto perto de outras pessoas que falam alto ou mais baixo diante das que murmuram? Simples: outras pessoas nos influenciam e geralmente nem percebemos, concluiu um estudo publicado na Current Directions in Psychological Science. Nesse trabalho, a equipe de John Bargh, da Universidade de Yale, Estados Unidos, mostra como pode
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Meu remédio, claro, é o melhor
chegam à conclusão de que a droga mais eficaz é aquela feita pela empresa patroci-
ser contagioso o modo pelo qual outras pessoas se comportam ou expressam seus sentimentos. Quando os pesquisadores mostraram uma imagem de uma biblioteca para um grupo de pessoas e as instruiu a irem lá depois do experimento, elas começaram a falar mais suavemente, sem estarem conscientes do porquê. Quando preparadas para serem rudes, as pessoas interrompiam o instrutor, enquanto as que foram motivadas a serem polidas não o inter-
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nadora, de acordo com um artigo publicado na American Journal of Psychiatry.
Um dos autores, o psiquiatra John Davis, da Universidade de Illinois, nos Estados Unidos, mostra nesse trabalho que podem existir potenciais vieses no desenho ou na interpretação dos dados, de modo que saem esses resultados contraditórios. Porém, quando uma agência governamental comparou uma série de medicamentos contra esquizofrenia em um amplo teste com pessoas, as duas medicações que se saíram melhor eram as mais baratas – e já estavam livres de patentes.
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rompiam. Mas a equipe de Yale tranqüiliza: as influências sobre o comportamento são, normalmente, benignas.
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■ Vírus
híbrido marca tumores
Um grupo de pesquisadores brasileiros que trabalham na Universidade do Texas, Estados Unidos, participou do desenvolvimento de uma nova classe de vírus híbridos que podem ser úteis para identificar e combater células tumo-
rais. Descrito na edição de 21 de abril da revista Cell, o vírus contém partes de dois vírus, um adenovírus e um bacteriófago. Pode dirigir-se a células tumorais, como foi demonstrado em camundongos, e sua atividade pode ser acompanhada por meio da tomografia de emissão de pósitrons. Esse vírus pode servir como vetor para genes a serem usados em terapia gênica para encontrar ou combater tumores, além de ajudar a avaliar a eficácia de medica-
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mentos contra câncer, segundo Renata Pasqualini, pesquisadora brasileira que trabalha na Universidade do Texas e participou desse estudo, ao lado de Wadih Arap, outro brasileiro.
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■ Dano
extra da malária
O protozoário Plasmodium, causador da malária, destrói a capacidade do organismo de se defender dos microorganismos. Essa habilidade explica por que as pessoas com malária são suscetíveis a outras infecções e podem não responder bem a vacinas, de acordo com um estudo da Journal of Biology. A equipe de Owain Millington, da Universidade de Strathclyde, no Reino Unido, verificou que o Plasmodium chabauti inativa as células dendríticas, fundamentais para iniciar e regular as reações contra microogranismos, depois de terem entrado em contato com as células vermelhas do sangue que haviam sido infectadas.
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■O
irmão maior de Plutão
A mais recente previsão do tamanho do 2003 UB313, o distante mundo gelado apelidado de Xena, indica que o candidato a décimo planeta do sistema solar pode ser apenas ligeiramente maior do que Plutão. Medições feitas com o telescópio espacial Hubble, da Nasa, sugerem que o diâmetro do novo objeto deve ser de 2.400 quilômetros, no máximo 5% maior que o do nono planeta solar. Segundo a estimativa anterior, feita por meio de instrumentos baseados em terra, o longínquo e frio corpo celeste era cerca de 30%
maior do que Plutão. Saber o tamanho de Xena é fundamental para que ele seja realmente elevado ao status de planeta. Segundo uma regra informal, aceita pela maioria dos astrofísicos, um objeto celeste situado em nosso sistema só deve receber essa designação se for maior do que Plutão, o menor dos nove planetas solares até agora oficialmente reconhecidos.
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O laboratório da evolução
Os biólogos descobriram as cidades, agora vistas como um espaço ideal para observar o comportamento dos animais porque tendem a apresentar menos variáveis que o campo (New Scientist, 22 de abril). Nas ilhas de calor, comuns nas metrópoles, os insetos podem viver mais que nas
matas. As atividades humanas representam fontes estáveis de comida e água para outras formas de vida urbana, mas nem sempre é bom. Comida farta como amendoins e pipocas que engordam os pombos das praças não é a mais adequada para os filhotes, que precisam de larvas de insetos, raras nas cidades. Resultados: os filhotes de aves das cidades podem ficar famintos mais facilmente que os das matas. Todo ano morrem também milhares de aves migratórias que colidem com prédios e torres de rádio. Desafios desse tipo fazem dos espaços urbanos um autêntico laboratório. “A cidade é o Velho Oeste da evolução”, comentou Joel Brown, um ecólogo da Universidade de Illinois, nos Estados Unidos.
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A bola dribla o olho humano Da próxima vez que a bola fizer aquela curva inacreditável no último instante e o goleiro do seu time errar o golpe de vista, dê um desconto. O gol pode não ter sido culpa do arqueiro. Segundo um estudo de Cathy Craig, da Universidade Queen’s Belfast, Irlanda, o olho humano não está preparado para prever a brusca mudança de trajetória de uma bola extremamente rápida que esteja girando horizontalmente sobre o seu próprio eixo. Em outras palavras, um chute assim envenenado engana qualquer um. Cathy chegou a essa conclusão após simular, com o auxílio de um equipamento de realidade virtual, o caminho percorrido por uma bola que rodava a
600 revoluções por minuto. Nesse teste, mesmo jogadores de futebol com grande experiência não acertavam o destino final das bolas chutadas com esse tipo de efeito. Não conseguiam dizer com certeza se elas iriam parar dentro das redes ou fora do gol. “Essas bolas giratórias não acontecem de forma natural”, comentou Cathy à revista New Scientist. “A natureza não equipou o homem com um sistema visual adaptado a elas.” A idéia para o estudo surgiu depois que a pesquisadora viu, em 1997, uma potente cobrança de falta do lateral Roberto Carlos, da seleção brasileira.Todo mundo achava que a bola iria para fora. Mas foi gol.
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Laboratório
Brasil
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■ Os macacos mais
■ Os custos da
antigos do Brasil
esquizofrenia O tratamento de portadores de esquizofrenia consome 2,2% do total de gastos de saúde em São Paulo, o equivalente a R$ 222 milhões (US$ 191,7 milhões), embora esse distúrbio psiquiátrico atinja 0,7% da população adulta do estado – cerca de 177 mil pessoas. E pode não ser o bastante, concluíram Raquel Jales Leitão, Marcos Bosi Ferraz, Ana Cristina Chaves e Jair Mari, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), em um estudo da Revista de Saúde Pública. A pesquisa em hospitais públicos, aliada a levantamentos epidemiológicos, mostrou que 71% dos portadores de esquizofrenia não são tratados ou recebem tratamento irregular. É uma proporção que os autores do estudo consideram alarmante.
Um zoológico muito estranho Como se entrasse em uma floresta às avessas, o físico italiano Enrico Fermi criou uma expressão notável, zoológico de partículas, para designar a variedade de formas e de comportamentos – muitas vezes bizarros – das infinitamente pequenas porções de matéria que não paravam de surgir. Agora é a vez de Maria Cristina Batoni Abdalla, professora do Instituto de Física da Universidade Estadual Paulista (Unesp), explicar o que são e as forças que controlam os elétrons, antielétrons, fótons, píons e múons – já eram 11 em 1950 – no livro O discreto charme das partículas elementares (Ed. Unesp), com ilustrações criativas e bem-humoradas de Sergio Kon, algumas delas mostradas acima. Percorrendo a história – dos filósofos gregos, que tudo explicavam, à matéria escura, que ninguém ainda conseguiu explicar –, Maria Cristina lembrou-se de que a física pode interessar também a quem não é físico: ela parece saber que os leitores realmente não conhecem quase nada do mundo atômico – e não que já deveriam conhecer, o pressuposto mais comum nos livros escritos por físicos. Ela não teme ser simples, sem perder precisão.
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De uma só tacada paleontólogos do Brasil e dos Estados Unidos apresentam fósseis de duas novas espécies e de um gênero já conhecido de primatas que viveram entre 9 milhões e 6 milhões de anos atrás onde atualmente é o Acre. “São os macacos mais antigos do país”, diz Mario Cozzuol, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. O mais antigo desses fósseis é de um macaco de cerca de 5 quilos que se alimentava principalmente de frutas: o Solimoea acrensis, parecido com o macaco-aranha (Ateles geoffroyi), de pouco mais de meio metro de altura e uma longa cauda que usa para se pendurar. A segunda espécie identificada por Cozzuol e Richard Kay, da Universidade Duke, Estados Uni-
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dos, é a Acrecebus fraileyi, parente distante do macacoprego (Cebus apella). No Journal of Human Evolution, Cozzuol e Richard afirmam que o terceiro fóssil, um dente antes atribuído a um mamífero semelhante ao quati, pertence a um macaco do gênero Stirtonia, parente do guariba que já havia sido identificado na Colômbia. “Nenhum desses macacos é ancestral dos atuais”, diz Cozzuol. “A descoberta desse gênero e das duas espécies no Acre é um sinal de que a diversidade atual da região pode ter sido ainda maior.”
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■ Guerra de
estrelas Perto do centro da Via Láctea, duas estrelas, uma anã branca e sua companheira no sistema binário V 617 Sagitarii, tra-
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ILUSTRAÇÕES SERGIO KON
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vam um combate de vida e morte. O primeiro astro não pára de sugar gás do segundo. Para que um deles permaneça em nossa galáxia, o outro terá de desaparecer: ou a anã branca vai explodir por excesso de matéria, ou a estrela companheira vai se esvair, sem gás. Em no máximo 1 milhão de anos, mil vezes menos do que dura um sistema binário normal, um dos corpos terá su-
cumbido à força de seu oponente. Pela primeira vez esse raro duelo, ou suicídio estelar assistido, foi flagrado. Foi um feito de uma equipe chefiada por João Steiner, da Universidade de São Paulo (USP), que descreveu o embate de astros na Astronomy and Astrophysics Letters. “Uma estrela está tentando freneticamente destruir a outra e vice-versa”, afirma Steiner.
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■A
ameaça das águas
Saiu o primeiro estudo mostrando o que poderia acontecer no Brasil se o nível do mar continuar subindo, em conseqüência do aquecimento global: poderia desaparecer, coberta pelo mar, metade do arquipélago de Marajó, na foz do rio Amazonas – com quase 50 mil quilômetros quadrados, é maior que o estado do Rio de Janeiro. Em algumas décadas, de acordo com esse estudo de uma equipe do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), baseado em previsões de elevação do mar publicadas na Science, pelo menos duas outras localidades geologicamente semelhantes – as cidades de Santos, no litoral paulista, e de Atafona, no Rio – poderiam sofrer problemas semelhantes.
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Os biólogos Carlos Jared e Marta Antoniazzi, do Instituto Butantan, tiveram muita sorte no início deste ano quando visitaram a Caatinga: após andarem por lá há 20 anos, viram pela primeira vez uma chuva cair sobre o sertão nordestino. Chegaram na tarde de 22 de fevereiro a Angicos, no Rio Grande do Norte, dispostos a procurar anfíbios enterrados na terra seca. À noite
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A Caatinga antes e depois da chuva
caiu a primeira e imprevisível chuva após mais de dois anos. Cobras, sapos e rãs
começaram a sair dos esconderijos. Seis dias depois choveu ainda mais, por dois
dias seguidos. “De uma hora para outra, fica tudo verde”, comenta Jared. Nas poças d’água dezenas de sapos coaxavam, enquanto outros se acasalavam ou já cuidavam dos ovos envoltos por uma espuma branca. “Estou sonhando ou os bichos continuam cantando?”, perguntou-se Marta na primeira manhã sem chuva. Ao meiodia os sapos ainda não haviam parado de coaxar.
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CIÊNCIA MEDICINA
Crianças Por uma vida longa e saudável
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inda hoje os pediatras acordam no meio da noite para tratar a febre que não baixa, a tosse que não cessa ou a dor de ouvido que não deixa a criança dormir – nem seus pais. Desde o aparecimento dessa especialidade médica na Europa do século 18, a pediatria voltou-se quase exclusivamente ao combate da desnutrição, das verminoses e das infecções que continuam a matar a cada ano milhões de crianças no mundo todo. Agora, uma transformação em curso no quadro dos problemas de saúde das crianças e dos adolescentes está obrigando os pediatras a reverem seu papel. Além de acudir de madrugada pais aflitos com a infecção dos filhos, eles terão de se preocupar também em evitar que seus pequenos clientes desenvolvam as chamadas doenças crônico-degenerativas – problemas que surgem na infância, avançam silenciosamente durante décadas e só vão se manifestar 40 ou 50 anos mais tarde, afetando a qualidade de vida dos adultos. Esse redirecionamento da ação do pediatra é o que especialistas brasileiros estão chamando de nova pediatria, uma correção de rumos necessária para cuidar de crianças que possivelmente chegarão aos 100 anos e se tornarão os idosos do século 22. “O pediatra está habituado a lidar com problemas agudos”, comenta Magda Carneiro Sampaio, professora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). “Mas quem atende hoje uma criança em seu consultório deve ficar atento aos pro-
FOTOS MIGUEL BOYAYAN
Prevenção de doenças crônicas pode permitir que meninas e meninos cheguem com saúde aos 100 anos
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blemas de saúde que ela pode desenvolver no futuro”, afirma a pediatra pernambucana. Especialista em doenças imunológicas, Magda consolidou há um ano a idéia dessa pediatria voltada para a prevenção em um ambicioso projeto: Uma nova pediatria para as crianças que viverão 100 anos ou mais. Em parceria com o pediatra João Guilherme Bezerra Alves, do Instituto Materno Infantil de Pernambuco, ela reuniu esforços de cerca de 200 especialistas de quatro instituições brasileiras que atualmente investigam a origem e a evolução de cinco grupos de doenças crônicas que surgem na infância e vêm se tornando cada vez mais comuns: os problemas cardiovasculares, as alergias, os distúrbios nutricionais, os transtornos de comportamento e as doenças crônicas de origem genética, que muitas vezes podem ser evitadas durante a gravidez. O objetivo é encontrar formas de prevenir esses problemas – ou modos mais eficazes de combatê-los – e permitir que as crianças cresçam sem contratempos maiores que um braço quebrado ou um hematoma no joelho. Essa nova postura da pediatria, que começa a surgir também na Europa e nos Estados Unidos e exigirá dos pediatras conhecimentos mais profundos de genética, epidemiologia e das doenças da terceira idade, é uma resposta à transformação que a humanidade viveu ao longo do século 20. Desde o surgimento da nossa espécie há 150 mil anos, jamais o ser humano viveu tanto quanto hoje, conseqüência da melhoria das condições de vida proporcionada pelo acesso ao saneamento básico, aos medicamentos e às vacinas. Em geral quem nasceu no início do século passado tinha poucas chances de passar dos 50 anos. Uma criança de hoje, porém, muito provavelmente chegará, em países desenvolvidos como o Japão ou a França, aos 90 ou 100 anos de idade, próximo do limite da longevidade humana, que, acredita-se, é de cerca de 120 anos. Mesmo em nações mais pobres como o Brasil a situação não é muito diferente. A expectativa de vida dos brasileiros na década de 1950 era em média de 47 anos e atualmente é de 71 anos. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, nesse período em que boa parte das pessoas migrou do campo para a cidade a população do 42
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país triplicou: atualmente são 185 milhões de brasileiros. A proporção de pessoas com 65 anos ou mais também aumenta continuamente desde 1980 e hoje está em quase 11 milhões – de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), há 600 milhões de idosos no mundo, dois terços vivendo em países em desenvolvimento. Transição nutricional - Um dos efei-
tos imediatos desse aumento de longevidade é percebido no sistema de saúde pública: tornam-se mais comuns as doenças crônico-degenerativas, como os problemas cardiovasculares, a osteoporose ou o câncer, muitas vezes associadas às condições em que se envelhece. Simultaneamente, a população brasileira atravessa uma fase de mudanças que complica mais o quadro. Estudos da equipe do epidemiologista Carlos Augusto Monteiro, da USP, reunidos no livro Velhos e novos males da saúde no Brasil, revelam que nas duas últimas dé-
cadas o perfil nutricional do brasileiro encontra-se em transição: a desnutrição diminuiu entre adultos e crianças, em especial no Sudeste, ao passo que a obesidade aumentou, resultado do crescimento do consumo de proteínas de origem animal e de açúcares. Outro agravante é o sedentarismo aparentemente elevado entre as crianças e adolescentes, que, ao lado do consumo de calorias superior aos níveis indicados pela OMS, integra o american way of life adotado em quase todo o Ocidente, Brasil inclusive. Um levantamento com alunos de 10 a 19 anos de escolas públicas e particulares de Campina Grande, Paraíba, mostra que só um quarto dos garotos e um décimo das meninas realizam mais de três horas de atividade física por semana. Em Ribeirão Preto, interior de São Paulo, uma das cidades mais ricas do país, um terço dos homens e metade das mulheres entre 23 e 25 anos não praticam exercícios com freqüência.“Se
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Sob novo olhar: mais atenção à alimentação e cuidados médicos freqüentes podem favorecer a aprendizagem
a criança desenvolve o gosto por esporte desde pequena, é maior a chance de que continue fisicamente ativa na idade adulta”, comenta Magda. Convidada a retornar ao Instituto da Criança no ano passado, depois de dedicar 15 anos à investigação de doenças que debilitam o sistema de defesa das crianças, Magda imaginou que era hora de agir para tentar mudar o cenário que se descortina. “É preciso fazer os pediatras entenderem que as medidas de prevenção tomadas nos primeiros 20 anos de vida podem ser decisivas para o futuro dessas crianças”, afirma. Por que tão cedo? Por uma razão nem sempre óbvia: “Essa é a fase da vida mais crítica para a prevenção eficaz de muitas doenças”, explica Magda. Além dessas alterações em hábitos e estilo de vida, pesou na decisão de Magda de propor uma redefinição de rumos na pediatria a descoberta recente de que muitas doenças comuns nos adultos têm suas raízes na infância.
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ma das correntes de pesquisa em saúde mental, por exemplo, acredita que alguns transtornos psicológicos como ansiedade e depressão podem surgir na infância ou adolescência e se agravar no decorrer da vida. Em entrevistas com pais de 959 alunos de escolas públicas e particulares no Distrito de Saúde do Butantã, que inclui cinco bairros da capital paulista, as pediatras da USP Sandra Grisi e Ana Maria Escobar constataram que as principais queixas sobre a saúde dos filhos são de suspeita de distúrbios psicológicos e alergias crônicas. Um quarto dos pais disse acreditar que suas crianças tinham dificuldade de prestar atenção ao que fazem, enquanto 21% afirmaram que os filhos pareciam sofrer de ansiedade, proporção semelhante à de casos de alergia. Esses números
não indicam que essas crianças realmente tenham algum distúrbio psiquiátrico. Mas são um sinal de que é bom prestar atenção, pois o que se passa com elas pode ser mais que uma saudável agitação. Diante desses dados as equipes de Sandra Grisi e Maria Cristina Kupfer, do Instituto de Psicologia da USP, trabalham no desenvolvimento de um teste que poderá ajudar na identificação dos problemas de saúde mental a partir dos primeiros meses de vida. Trata-se de um questionário, atualmente em avaliação em São Paulo, Belém, Rio, Curitiba e Brasília, que o pediatra deve aplicar a pais e bebês para detectar se a criança apresenta sinais de transtornos psicológicos, uma das principais causas de perda de anos de vida saudável, segundo a OMS. Outro grupo de problemas de saúde que começam muito cedo e prejudicam a qualidade de vida do adulto são as doenças alérgicas, como a asma, que nos últimos anos estão se tornando mais comuns entre crianças e adolescentes no mundo todo. Em estudos conduzidos na cidade de São Paulo, Dirceu Solé e Charles Nasptiz, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), constataram que quase 12% da população sofre de asma e uma em cada três pessoas apresenta sinais do problema. A fim de compreender melhor os fatores que desencadeiam essa forma de alergia que provoca intensa falta de ar e impede o desenvolvimento adequado dos pulmões, a equipe do pediatra Joaquim Carlos Rodrigues e da epidemiologista Regina Cardoso acompanha há quase três anos no Instituto da Criança, ligado à FMUSP, a saúde de quase 300 crianças filhas de mães com asma. Mas o exemplo mais contundente de doença com raiz na infância é o da aterosclerose, o acúmulo de placas de gordura nos vasos sangüíneos responsável pelo bloqueio da chegada de oxigênio e nutrientes ao coração, no infarto, ou ao cérebro, no acidente vascular encefálico (AVE). Considerados as principais causas de morte no mundo, o infarto e o AVE tiram a cada ano a vida de 17 milhões de pessoas, um terço dos óbitos do planeta. Os custos desse problema em um país como o Brasil são elevados. Em 2002 as doenças cardiovasculares levaram à internação de 1,2 milhão de pessoas e à realização de 50 mil cirurgias para restabelecer o fluxo PESQUISA FAPESP 123
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normal de sangue para o coração, a um custo aproximado de R$ 281 milhões, segundo estimativas publicadas nos Arquivos Brasileiros de Cardiologia pelos epidemiologistas Denizar Araújo e Menos tevê e mais esporte: Marcos Bosi Ferraz, da Unifesp. para viver Até pouco tempo atrás acreditavamais e amenizar se que a aterosclerose fosse um probleos problemas ma exclusivo de adultos com hábitos de que surgem vida pouco saudáveis, que jamais trocacom a idade riam uma partida de futebol pela tevê por uma caminhada no parque ou a picanha do almoço por uma fatia de carne mais magra. Mas um estudo publicado na década de 1980 no Journal of the American Medical Association mudou essa idéia. Jack Strong, da Universidade do Estado de Louisiana, Estados Unidos, analisou as artérias do coração de soldados norte-americanos mortos na Guerra da Coréia em 1952 e constatou: embora se tratasse de indivíduos jovens e aparentemente saudáveis, entre 45% e 77% deles já estavam com as coronárias parcialmente entupidas. Trabalhos mais recentes confirmaram esses resultados e mostram que esse problema começa ainda mais cedo, na infância. Estudos feitos no Japão, onde o consumo de gordura é menor que no Ocidente, apontaram que 50% das crianças com 1 ano de idade e todas com 10 anos apresentavam artérias cardíacas com as lesões iniciais da aterosclerose. de de Southampton, na Inglaterra, pro“O problema é que essa enfermidade médico de uma criança com história de pôs uma idéia que ainda não é consenso avança sem alarde até a idade adulta e, doença cardíaca na família deve orientar entre especialistas, mas indica um quaem um terço dos casos, sua primeira os pais a estimularem o filho desde cedo dro mais preocupante: os problemas manifestação é um infarto fatal”, afirma a ingerir pouco açúcar e gordura e a cardiovasculares começariam durante a o cardiologista Francisco Fonseca, da praticar exercícios”, afirma Magda. “Os formação do feto. Essa suspeita surgiu Unifesp, um dos editores da Primeira hábitos, em geral adquiridos cedo na da observação de que regiões pobres da diretriz de prevenção da aterosclerose na vida, são a segunda natureza dos seres Inglaterra com elevadas taxas de mortainfância e na adolescência, elaborada humanos. É difícil alterá-los mais tarlidade infantil no início do século 20 pela Sociedade Brasileira de Cardiolode”, justifica a pediatra. apresentavam índices de doenças cardiogia. Publicado em português na edição Após as primeiras evidências da orivasculares superiores à média nas décade dezembro de 2005 dos Arquivos Bragem infantil da aterosclerose, o epidedas de 1970 e 1980. sileiros de Cardiologia e em inglês na edimiologista David Barker, da UniversidaCom base nessas inção deste mês do formações, Barker forInternational JourOS PROJETOS mulou a teoria da pronal of Atherosclerogramação fetal, segundo sis, esse documento COORDENADOR(A) 1. Da saúde perinatal à saúde a qual o organismo do orienta os pedia1. H ELOISA B ETTIOL E M ARCO do adulto jovem bebê submetido a condiANTONIO BARBIERI — FMRP/USP tras a investigarem 2. Leitura da constituição 2. MARIA CRISTINA KUPFER — e da psicopatologia do laço ções anormais na gravidesde cedo a saúINSTITUTO DE PSICOLOGIA/USP social por meio de indicadores dez, como a falta de nude cardiovascular clínicos trientes por defeitos da das crianças, em INVESTIMENTO placenta ou pela desnuespecial daquelas 1. R$ 684.371,94 MODALIDADE trição da mãe, sofreria cujos pais ou avós 2. R$ 478.965,20 1. Projeto Temático adaptações fisiológicas e sofrem de proble2. Projeto temático pouparia energia duranmas cardíacos. “O 44
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te a privação. Uma conseqüência no longo prazo é a propensão ao acúmulo de gordura em épocas de fartura e o provável desenvolvimento posterior de obesidade, fator de risco para o aumento do colesterol, o diabetes e as doenças cardiovasculares. Heloisa Bettiol e Marco Antonio Barbieri, da USP em Ribeirão Preto, buscam nos últimos anos indícios que confirmem associação entre o desenvolvimento de obesidade na idade adulta e a nutrição inadequada no útero – um problema relativamente comum, identificado em 19% das 2.839 crianças nascidas em Ribeirão em 1994. A avaliação da saúde de 519 garotos logo após o nascimento e, mais tarde, aos 10 e aos 18 anos, mostrou a Heloisa e Barbieri que apenas aqueles com sinais de alimentação insuficiente durante a gestação e excesso de peso aos 10 anos continuaram com peso superior ao ideal na idade adulta. Além de defeitos genéticos, outra provável causa da restrição
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do acesso aos nutrientes no útero é o consumo de cigarro na gravidez. e há dúvidas sobre a influência do desenvolvimento intra-uterino na saúde do adulto, dá-se por certo que certas características do bebê no nascimento podem indicar problemas futuros. As crianças com baixo peso ao nascer, menos de 2.500 gramas, ou prematuras, que não completam 37 semanas de gestação, correm risco maior de desenvolver obesidade. A comparação das condições de saúde de 6.746 crianças que nasceram em Ribeirão entre junho de 1978 e maio de 1979 com a de 2.846 nascidas em 1994 sugere que a principal razão dos nascimentos com peso inferior ao desejável ou menos tempo de gestação que o normal foi o aumento dos
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partos cirúrgicos, que permitem a pais e médicos anteciparem a chegada do bebê. Resta saber como esse peso mais baixo ao nascimento, ainda que adequado à idade gestacional, afeta o desenvolvimento da criança e do adulto. No Rio Grande do Sul, o grupo da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) coordenado pelos epidemiologistas Bernardo Horta e César Victora observou que certas fases da infância têm peso maior que outras na determinação da saúde do adulto. No acompanhamento de 6 mil pessoas nascidas em Pelotas em 1982, a equipe de Victora avaliou a pressão sangüínea e os níveis de colesterol de 750 jovens em quatro momentos da vida: no nascimento, aos 2, aos 4 e aos 15 anos. Resultado: as crianças que engordaram além do normal para a idade nos dois primeiros anos de vida não apresentaram na adolescência pressão sangüínea mais elevada nem níveis de colesterol mais altos que as demais. Já o ganho de peso acima do recomendado entre o segundo e o quarto ano de vida mostrou-se relacionado com a piora dos níveis desses fatores de risco para doenças cardiovasculares. Em ambos os casos, o peso da criança ao nascimento não afetou os indicadores de saúde. “Aparentemente há períodos críticos que influenciam o surgimento de problemas de saúde futuros”, explica Horta. De qualquer modo, não são só as condições de vida ao nascer e na infância que determinam a saúde do adulto. “Essas doenças crônicas são provocadas por múltiplos fatores”, lembra Horta.“A ocorrência de um ou mais fatores não significa que a criança necessariamente desenvolverá a doença mais tarde, mas é um sinal de que ela corre mais risco”, explica o epidemiologista da UFPel. Felizmente, em geral é longo o caminho entre a exposição aos fatores de risco e o desenvolvimento dos problemas de saúde, o que permite a intervenção dos pediatras para reduzir os danos. A melhor saída, na opinião de Magda, é não acreditar na sorte e seguir alguns dos sábios conselhos que antigamente os filhos recebiam dos pais: manter uma dieta equilibrada; praticar atividades físicas; e evitar o fumo e o consumo de álcool. Nada complicado demais, mas que exige esforço e disciplina, além de bom senso dos pais para saber quando é hora de buscar ajuda médica. • PESQUISA FAPESP 123
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GENÉTICA
As tribos do mundo Equipe de Minas emprega novos marcadores para agrupar as populações do planeta C ARLOS F IORAVANTI
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lgumas pesquisas, mesmo chegando aos mesmos resultados que outras,ganham valor quando revelam caminhos inexplorados.Foi assim com um trabalho de uma equipe da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) coordenada por Sérgio Danilo Pena,que examinou o DNA de 1.064 pessoas de 52 populações do mundo.A conclusão é a mesma obtida por um grupo de pesquisa norte-americano:a população mundial pode ser agrupada em cinco grandes blocos,que correspondem aproximadamente às grandes regiões geográficas mundiais: América,África Subsaariana,Leste da Ásia,Oceania e um bloco formado por Europa,norte da África,Oriente Médio e Ásia Central.Esses subconjuntos podem ser vistos como os representantes atuais de grupos que viveram isolados nos primórdios da civilização humana. A equipe de Belo Horizonte usou uma estratégia diferente da empregada pelos norte-americanos para detectar as diferenças entre as longas tiras de DNA. No trabalho que deu origem ao de Pena, Noah Rosenberg,da Universidade de Michigan, Estados Unidos,examinou 46
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amostras de DNA de 1.056 pessoas de 52 populações por meio de marcadores genéticos chamados microssatélites,definidos como seqüências repetidas de nucleotídeos,os elementos básicos do DNA – adenina,guanina,citosina e timina.As pessoas são diferenciadas pelo número de repetições:cada uma pode ter,por exemplo,10,11,12 ou 13 repetições de guanina-adenina-timina-adenina.Apresentada na Science em 2002,essa classificação da população mundial em cinco grupos,incluindo as semelhanças lingüísticas e culturais,exibiu uma precisão bem maior que a obtida por Richard Lewontin em 1972 usando proteínas do sangue.Mas houve críticas:microssatélites seriam instáveis e poderiam causar distorções estatísticas. Já a equipe de Minas se valeu de 40 marcadores chamados indels,sigla que aglutina duas palavras,inserções (ganhos) e deleções (perdas) de adenina, guanina,citosina ou timina.São mutações inofensivas transmitidas de uma geração a outra;cada variação funciona como marcador porque se propagou a partir de uma mutação ocorrida em uma só pessoa.Pena e suas alunas Luciana Bastos-Rodrigues e Juliana Pimenta, que assinam com ele o estudo publicado em março na Annals ofHuman Genetics
com esses resultados,acreditam que os indels,mais estáveis que os microssatélites,talvez possam ser usados para complementar os estudos sobre a população brasileira e para definir com mais precisão a suscetibilidade a doenças associadas à ancestralidade. Visão parcial - A história genética da
população brasileira tem sido analisada principalmente por meio de marcadores de dois tipos:os do cromossomo Y, encontrado no núcleo das células dos homens,que ajuda a reconstruir a linhagem paterna;e os do DNA mitocondrial,contido em outro compartimento celular,a mitocôndria,e utilizado para estudar a linhagem materna.As respostas obtidas dependem muito dos tipos de marcadores:nenhum deles oferece uma visão completa ou irrefutável, já que outros marcadores podem levar a outros resultados. Pena reconhece que pode haver o que ele chama de “aparente correspondência”dos cinco grupos geográficos e as cinco raças definidas no século 18 pelo antropólogo alemão Johann Friedrich Blumenbach com base em perfis do crânio e na cor da pele:a caucasóide,a mongolóide,a etiópica,a americana e a malaia.“Mas essa semelhança é mera-
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mente superficial e enganadora”, diz Pena. O próprio Rosenberg, após refazer seu trabalho de 2002 usando 993 marcadores em vez dos 377 empregados da primeira vez, mostra em um artigo publicado em dezembro de 2005 na PLoS Genetics que esses grupos são realmente consistentes – ou, diriam os especialistas, os clusters são robustos. Rosenberg havia encontrado um valor de até 5% para a variação genética que ocorre entre os grupos continentais. Para a equipe de Minas a diferença pode chegar a 12%. Miscigenação - Em 2000, com o Retrato Molecular do Brasil, Pena demonstrou que a miscigenação no país era tão intensa que impossibilitava qualquer tentativa de formar grupos distintos. A análise de marcadores dos cromossomos Y e do DNA mitocondrial indicava que os homens autodenominados brancos nem sempre descendiam de brancos. A maioria descendia de pais europeus, mas a probabilidade de a mãe também ser européia era de apenas 39%: um em cada três dos 250 homens que participaram do estudo representava uma linhagem materna ameríndia e um pouco mais de um em cada quatro (28%) trazia no sangue a herança indelével de uma mãe africana.
“Não podemos generalizar”, comenta Francisco Mauro Salzano, pesquisador da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), que trabalha nessa área há 50 anos.“Para termos uma idéia mais precisa dessas contribuições temos de verificar a história de cada comunidade.” Surgem então redutos de miscigenação extremamente baixa. É o caso de Veranópolis, cidade da Serra Gaúcha habitada quase integralmente por descendentes de europeus, pela linhagem materna e pela paterna, de acordo com um estudo da UFRGS, com a participação de Salzano, publicado em 2005 no American Journal of Human Biology. Em outras 13 cidades gaúchas os pesquisadores encontraram na linhagem materna 36% da herança dos antigos indígenas que viviam na região – os guaranis – e 16% de sangue africano. E a miscigenação tende a aumentar, no Brasil e no mundo, ressalta Marco Antonio Zago, professor da Universidade de São Paulo (USP) em Ribeirão Preto. Em um dos estudos mais recentes de sua equipe, publicado na Human Biology, o foco são os negros que vivem em comunidades isoladas – os quilombos – no Pará e no Maranhão, estudados por meio do cromossomo mitocondrial. Zago e Wilson Araújo Silva, também da
USP de Ribeirão Preto, com biólogos do Rio Grande do Sul e do Pará, concluíram que houve uma expressiva contribuição de mulheres ameríndias na formação dos quilombos. Os historiadores já haviam concluído que o número de homens que fugiam para formar os quilombos era muito maior que o de mulheres, mas não tinham como chegar a esse nível de detalhe. Esse estudo também trouxe informações novas sobre o tráfico negreiro para o Brasil. Os registros históricos sustentam que a maioria dos negros da África que chegavam ao Brasil entre os séculos 16 e 18 era da etnia benin, do oeste da África. No entanto, os geneticistas encontraram sinais predominantes de representantes de outra etnia, os bantos, que vieram do centro-oeste e do oeste da África. Dos laboratórios sai assim, pouco a pouco, um quadro claro sobre as conseqüências da mistura de etnias promovida pelos vendedores de escravos nos armazéns do porto de Salvador como forma de evitar rebeliões e pelas migrações internas, após a chegada ao Brasil. “Por causa dessa miscigenação entre as etnias”, comenta Zago,“o Brasil abriga hoje uma população muito específica de negros, diferente da de qualquer outro lugar do mundo”. • PESQUISA FAPESP 123
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CARDIOLOGIA
Batuque
na cabeça
Equipe da FMUSP associa pressão alta severa à compressão de região cerebral por artéria
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ara uma parcela das vítimas da hipertensão,o arsenal de medicamentos e terapias disponíveis não é capaz de controlar a doença de modo adequado.A moléstia resiste a tratamentos e se apresenta de forma severa,provocando lesões em órgãos como o coração,o rim e o sistema circulatório.Um estudo de uma equipe de pesquisadores da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) ajuda a compreender e a diagnosticar uma das causas da manifestação refratária da doença.Liderado pelo professor Eduardo Moacyr Krieger,um grupo de pesquisadores do Instituto do Coração e do Departamento de Radiologia da FMUSP criou uma ferramenta de diagnóstico e demonstrou como um problema na anatomia do sistema nervoso – a existência de uma artéria comprimindo uma região do tronco cerebral – pode ser um dos fatores causadores da hipertensão severa e resistente. Essa região,conhecida como região rostral ventrolateral do bulbo,é responsável pela chamada atividade simpática, aquela que mantém o funcionamento do sistema cardiovascular.Na maioria das pessoas,a artéria em questão,em geral um ramo da artéria vertebral,passa ao largo dessa área do tronco cerebral.Mas há indivíduos que apresentam a artéria encostada na região.E em outros a artéria não apenas está colada à região rostral ventrolateral do bulbo como ainda provoca uma compressão tão forte que chega a deformá-la.“Desde o final dos anos 1970,surgiram evidências de que o pulsar dessa artéria pode excitar a região e aumentar a atividade simpática,o que leva à contração dos vasos e a um aumento da pressão arterial”,diz Fernanda Marciano Consolim-Colombo,coordenadora do laboratório de pesquisa clínica da Unidade de Hipertensão do InCor e uma das responsáveis pela pesquisa.
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A equipe da FMUSP desenvolveu um método para detectar o problema anatômico e,por meio dele,associou o grau de compressão com o aumento da atividade simpática ligada à hipertensão.A pesquisa foi realizada em duas frentes.Uma delas,a cargo de Claudia Costa Leite,chefe do Setor de Ressonância do Departamento de Radiologia da FMUSP,criou um padrão de obtenção de imagens por meio de ressonância magnética capaz de mapear a existência ou não do problema anatômico.Essa etapa rendeu um artigo científico divulgado em janeiro na revista Neuroradiology. Mão no gelo - A etapa seguinte,reali-
zada na Unidade de Hipertensão do Incor, consistiu em mapear a atividade simpática de três grupos de pacientes: um que exibia forte compressão da artéria,outro que apresentava a artéria encostada à região,mas sem pressionála,e um terceiro com a artéria passando ao largo.Por meio de um exame chamado microneuromiografia,no qual um eletrodo é colocado num nervo da perna,avaliou-se o grau de estimulação elétrica do sistema vascular em duas situações:em repouso e com estimulação (colocando-se a mão do paciente num balde de gelo,o que faz a pressão subir).Descobriu-se que o grupo com forte compressão provocada pela artéria apresentava uma atividade simpática acima do normal até mesmo durante o repouso. Em outro achado,constatou-se que não há diferença na atividade simpática de indivíduos nos quais a artéria passa longe da região rostral ventrolateral do bulbo e aqueles em que a artéria apenas aparece encostada.Ou seja:o problema se concentra nos pacientes com deformação no tronco cerebral.Essa etapa foi descrita na tese de doutoramento de Mauricio Sendeski,orientada por Eduardo Krieger e pela médica Fernanda Marciano Consolim-Colombo,e rendeu um artigo científico publicado em fevereiro na revista Hypertension. A descoberta da associação da compressão provocada pela artéria no siste-
ma nervoso e a hipertensão foi feita por acaso por um neurocirurgião norte-americano,Peter Jannetta,então professor do Centro Médico da Universidade de Pittsburgh,estado da Pensilvânia, que se especializara num tipo de microcirurgia para separar também na região do tronco cerebral um vaso que comprime o nervo facial e provoca dor ou reflexos involuntários no rosto. Teflon - Ao fazer essas cirurgias,ele observou que algumas pessoas exibiam também a compressão da região rostro ventrolateral da medula e que,entre elas,eram comuns os casos de hipertensão severa.Jannetta propôs um tratamento cirúrgico para o problema, que consiste em separar a artéria da região e instalar entre elas um isolamento feito de teflon.O tratamento cirúrgico apresentou bons resultados em 50% dos casos,numa evidência de que,em parte significativa dos doentes,não é causa isolada da hipertensão.Desde então,essa variável é considerada por médicos que tratam da doença,mas não se sabia qual era o grau de compressão provocado pelo vaso capaz de gerar o problema. Um dos méritos do trabalho da FMUSP foi, pela primeira vez,mostrar que apenas os casos de compressão grave provocam a hipertensão severa.“As descobertas são importantes para identificar,entre pacientes hipertensos com sinais de compressão neurovascular,os indivíduos que tenham atividade simpática alterada”,diz o médico Eduardo Krieger.O próximo passo será mapear as lesões causadas em órgãos em pacientes que apresentam a compressão.Isso poderá abrir caminho para encontrar os tratamentos mais adequados.A descompressão cirúrgica é uma das possibilidades,desde que se comprove que há uma indicação clara do problema. Outra possibilidade é o tratamento com medicamentos que atuam especificamente nessa área,e o uso de doses e quantidades maiores de drogas anti-hipertensivas,uma vez que se sabe que o organismo,por razões fisiológicas,é refratário a eles. • PESQUISA FAPESP 123
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onhecido como bigodeiro, o sagüi ao lado gosta de mandar. Na hora de comer permanece a distância e deixa os outros sagüis do grupo procurarem frutos na copa das árvores. Quando vê que encontraram algo, imediatamente solta gritos agudos como um assobio e expulsa os companheiros de perto, deixando claro quem é que dá as ordens por ali. Esse comportamento de chefão à italiana não vale apenas entre esses macacos. Mesmo quando sai à procura de comida com espécies menores, o capo também impõe aos outros sua superioridade... no grito. Mas a capacidade de reconhecer o papel que cada animal desempenha em seu grupo não é a única a reger a vida dessas duas espécies de micos. Após acompanhar diariamente durante quatro meses dois grupos de bigodeiros e dois de sagüisde-cara-suja em um trecho de Floresta Amazônica em plena área urbana de Rio Branco, o primatólogo Júlio César Bicca-Marques, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), verificou que tão importante quanto saber quem é o manda-chuva é a capacidade de usar sinais disponíveis no ambiente para encontrar comida. Associadas, essas habilidades ajudaram a moldar a inteligência desses macacos e de outros primatas – grupo de animais que inclui os seres humanos, embora não se possa transpor esses resultados diretamente para nossa espécie, sujeita a relações sociais mais intricadas e capaz de alterar o próprio ambiente. Essa conclusão nasceu de duas idéias independentes sobre o desenvolvimento do cérebro e da inteligência dos primatas lançadas na década de 1970. Observando macacos africanos, a antropóloga Sue Taylor Parker concluiu
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Disputas sociais e capacidade de se orientar no ambiente para achar comida moldaram o cérebro dos primatas
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Como um chefĂŁo: bigodeiro espera subordinados acharem comida para furtĂĄ-la em seguida
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em 1977 que a capacidade de lidar com informações ambientais ou ecológicas, como encontrar o caminho de volta para casa ou descobrir uma árvore com comida, havia sido essencial para a sobrevivência dos primatas. Assim, ao longo de milhares de anos a natureza teria favorecido a sobrevivência daqueles com maior habilidade de tirar proveito desse tipo de informação. Segundo esse raciocínio, a necessidade cada vez maior de lidar com informações ambientais teria proporcionado o surgimento de cérebros mais e mais volumosos – o dos sagüis, distantes 35 milhões de anos dos seres humanos do ponto de vista evolutivo, tem aproximadamente 30 gramas, enquanto o nosso, aproximadamente 40 vezes maior, tem em média 1.350 gramas. Articulação maquiavélica - Nem todos
concordavam. Em 1976 o psicólogo britânico Nicholas Humphrey havia sugerido que o fator que teria conduzido a evolução do cérebro dos primatas seria de ordem social. A natureza teria beneficiado aqueles com habilidade de se relacionar com os outros membros do grupo – e mesmo de manipulá-los com o objetivo de manter o grupo coeso. Segundo Humphrey, essa habilidade estaria relacionada à capacidade de lidar com outra categoria de informação, conhecida como social ou maquiavélica, em referência ao pensador florentino Nicolau Maquiavel, que em 1513 descreveu na obra O príncipe as articulações políticas e sociais usadas pelos soberanos para preservar o poder. É essa categoria de informação que um filhote de bigodeiro, ou mesmo um adulto cara-suja, usa quando abandona um cajá ou ingá recémdescoberto e deixa o macho dominante refestelar-se sozinho. Respeitadas as particularidades de cada espécie, é uma decisão semelhante à de alguém que deixa um assaltante armado roubar seu carro sem esboçar reação porque sabe que são maiores as chances de não se ferir e conseguir outro carro mais tarde. Humphrey argumentava que os primatas têm de ser “seres calculistas”: devem ser capazes de avaliar as conseqüências do seu próprio comportamento, do comportamento dos outros e do equilíbrio entre vantagens e perdas, decisões tomadas com base em informações nem sempre confiáveis. Supondo que essa tenha sido a situação encontrada com 52
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mais freqüência na natureza, essa habilidade ou inteligência teria sido a principal força a modelar as transformações por que passou o cérebro dos primatas desde o surgimento desse grupo de animais, há cerca de 50 milhões de anos.
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or quase três décadas os apoiadores de uma e outra hipótese colecionaram evidências sem alcançar um consenso. Agora, nessa série de experimentos com os sagüis amazônicos, Bicca-Marques chegou a uma conclusão conciliadora. É impossível determinar a supremacia de uma forma de inteligência sobre a outra: ambas são essenciais para a sobrevivência dos micos. “Uma conseqüência da vida em grupo”, afirma Bicca-Marques, “é que os primatas devem decidir sobre onde buscar comida levando em consideração a probabilidade de encontrar alimento em um determinado local, uma informação ambiental, aliada à possibilidade de ter acesso à comida ou de compartilhá-la com outros membros do grupo, uma informação social”. Bicca-Marques começou a suspeitar de que esses fatores não atuaram isoladamente sobre o desenvolvimento do cérebro durante a observação de como esses macacos se comportam na hora do lanche. Em 1993 ele demitiu-se do emprego no Ministério do Meio Ambiente, em Brasília, e instalou-se na Universidade Federal do Acre (Ufac) para estudar esses micos que conhecia apenas dos livros. Em paralelo, procurou o antropólogo norte-americano Paul Garber, da Universidade de Illinois em Urbana, especialista no comportamento desses sagüis, que o ajudou a planejar os experimentos que permitiram controlar o acesso dos macacos à comida. Em uma área de 3 hectares do Parque Zoobotânico da Ufac, Bicca-Marques instalou estações de alimentação em que era possível controlar as condições em que os bigodeiros (Saguinus imperator) e os sagüis-de-cara-suja (Saguinus fuscicollis) encontravam comida – cada estação era formada por oito tabuleiros dispostos em um círculo de 10 metros de diâmetro. A uns 15 passos de
cada estação montou uma torre de observação semelhante a uma casa sobre palafitas, de cujo interior era possível ver os micos sem ser notado. De 22 de setembro de 1997 a 29 de janeiro de 1998, Bicca-Marques e três alunos de biologia levantaram-se todos os dias às três e meia da manhã e seguiam mata adentro até as torres onde passavam, muitas vezes sob um calor de quase 40 graus, de nove a dez horas sentados acompanhando as refeições dos sagüis. Em quase 4 mil horas de monitoramento, os macacos visitaram as estações 1.294 vezes. Na maioria delas, cinco ou seis sagüis de uma mesma espécie – S. imperator ou S. fuscicollis – apareciam para o lanche. Durante os 120 dias de experimento a equipe do primatólogo gaúcho preparou simultaneamente nas quatro estações testes nos quais os micos tinham de aprender que as bananas estavam sempre nos mesmos tabuleiros – enquanto os outros exibiam bananas de plástico – ou que um cubo amarelo ou um poste de madeira colorido indicava a posição da comida. Os macacos se saíram bem no primeiro teste, mas apenas alguns integrantes dos grupos de bigodeiros e caras-sujas descobriram que o cubo amarelo e o poste de madeira indicavam o tabuleiro com a banana. O fato de alguns sagüis não usarem esses sinais para encontrar alimento não significa que não sejam capazes de fazer a associação. Quando se analisam esses resultados levando em consideração a espécie – S. imperator ou S. fuscicollis – e não cada indivíduo do grupo, conclui-se que tanto os bigodeiros quanto os caras-sujas sabem lidar com informações ambientais para encontrar comida. Perdas e ganhos - Mas foi o comportamento desses sagüis – quando chegavam para se alimentar em grupos de uma única espécie ou em grupos mistos – que revelou: realmente não é possível separar a influência da inteligência ambiental sobre o desenvolvimento do cérebro da influência da inteligência social. Sempre que um dos dois bandos de bigodeiros aparecia para comer desacompanhado, o macho mais forte do grupo – chamado de dominante ou alfa, uma espécie de capo – esperava seus subalternos localizarem as bananas antes de se manifestar e tomar conta do que considera seu. É algo semelhante ao que
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JÚLIO CÉSAR BICCA-MARQUES/PUC-RS
Submisso, mas esperto: o sagüi-de-cara-suja aprende a chegar à comida antes do mandão bigodeiro
se passava nos grupos mistos. Apenas entre os sagüis-de-cara-suja o nível de colaboração era maior: com freqüência todos se empenhavam em procurar as bananas nos tabuleiros. Essa colaboração aparentemente injusta, a protocooperação, na verdade beneficia os dois lados. Ganham os bigodeiros, que poupam energia enquanto seus subordinados procuram comida nas partes mais baixas da mata, e ganham os caras-sujas, que aguardam a vez de comer os frutos encontrados pelos bigodeiros na copa das árvores ou capturam os insetos que deles escapam e fogem para perto do solo. Além disso, ambos se beneficiam com a vigilância contra predadores realizada por seus companheiros. Outra peculiaridade da convivência entre essas duas espécies é que o peso de cada tipo de informação parece variar de um momento para outro. “Esses pequenos primatas lidam com ambas as formas de informação alternadamente ao longo do dia”, afirma Bicca-Marques, que descreveu suas descobertas em uma série de artigos, os mais recentes publicados no American Journal of Primatology, no International Journal of Primatology e no Journal of Comparative Psychology. Quando aprendem que determinado tabuleiro sempre contém um pedaço de banana, os subordinados usam a informação ambiental para encontrar a comida. Para os sagüis dominantes é a informação social que vale quando usam sua posição hierárquica para tomar o alimento encontrado pelos outros, embora também saibam usar sinais ambientais. •
R ICARD O Z ORZET TO PESQUISA FAPESP 123
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CIÊNCIA
ANFÍBIOS
Apele
como alimento
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ormalmente elas são viscosas e consideradas um tanto repugnantes, mas não há como negar que são mães abnegadas,ainda que não possam ver os filhotes.Pelo menos duas espécies de cobras-cegas – a Siphonops annulatus, encontrada no Brasil,e a Boulengerula taitanus, do Quênia – deixam a prole roer-lhes as camadas mais superficiais da pele,que contêm uma secreção rica em gorduras e proteínas durante as quatro ou cinco semanas em que se dedicam aos cuidados maternais.A pele,cinza-escura antes da reprodução,torna-se então cinza-clara e é reposta à medida que os herdeiros a devoram. Quando eles estão por perto,provavelmente param de funcionar as glândulas de veneno,que se espalham por toda a superfície do corpo alongado da mãe. Essa forma de cuidar da cria não chama a atenção só por ser exótica:é também importante do ponto de vista evolutivo.Segundo Carlos Jared,biólogo do Instituto Butantan,esse comportamento das cobrascegas que põem ovos emergiu há pelo menos 150 milhões de anos,quando a América do Sul e a África formavam um único bloco continental,e talvez esteja na base da evolução desse grupo de animais que começou a surgir há cerca de 250 milhões de anos.Só muito mais tarde é que devem ter aparecido as espécies de cobras-cegas vivíparas,cujos ovos se desenvolvem dentro do corpo da mãe – e os filhotes já nascem parecendo adultos.Antes de nascerem,os filhotes se nutrem raspando com seus dentes pontiagudos a parede do útero,que libera um suco nutritivo.“Comer o útero da mãe seria uma forma derivada de comportamento”, diz ele. Não se trata,porém,de um artifício exclusivo dos anfíbios,a classe de animais a que pertencem as cobrascegas,também chamadas de cecílias.Ainda hoje se nota algo similar no ornitorrinco (Ornithorhynchus anatinus),possivelmente o mais estranho dos mamíferos,com um bico chato como o de um pato,corpo
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coberto de pêlos e quatro nadadeiras,que vive em rios e lagos da Austrália.Os filhotes do ornitorrinco nascem de ovos e lambem o leite materno secretado pelos poros da pele da barriga das fêmeas,que não têm mamilos,diferentemente dos outros mamíferos. “Notamos nessas cobras-cegas africana e brasileira um comportamento de agregação muito interessante,já que as mães ficam enrodilhadas em volta dos filhotes enquanto estão cuidando deles”,comenta Marta Antoniazzi,bióloga do Butantan.Um teste bastante simples sugeriu que a secreção liberada pela pele,além de servir como alimento,pode conter feromônios capazes de atrair a prole.Os pesquisadores afastaram da mãe os filhotes de poucos dias,muito parecidos com minhocas cor-de-rosa,e observaram: em poucos segundos eles começaram a voltar em direção a ela, mesmo sendo completamente cegos. No sul da Bahia - As cobras-cegas têm apenas olhos primitivos,também chamados de vestigiais. Os olhos ficam sob a pele e só distinguem o claro e o escuro,o que basta para indicar se é dia ou noite e se é possível sair com segurança dos túneis subterrâneos em que esses animais vivem.Dotadas também de tentáculos sensitivos,pequenas saliências com as quais tateiam os caminhos,as cerca de 180 espécies de cecílias mundialmente conhecidas representam as gimnofionas,uma das três ordens dos anfíbios,ao lado dos anuros (sapos,rãs e pererecas) e das salamandras.Parecem cobras ou minhocões, mas não erra quem as vir como sapos alongados sem patas que vivem,se acasalam e cuidam da prole em canais e câmaras cavadas sob a terra.Às vezes podem também ser encontradas,solitárias ou com a prole,em outros ambientes escuros como tocos de árvore ou entre cascas de cacau que apodrecem dentro da mata,em meio a insetos e minhocas,seus alimentos prediletos. Foi em um desses amontoados de cascas podres, os chamados casqueiros,em mais uma das expedições à Mata Atlântica entre Ilhéus e Itabuna,no sul da Bahia,que o grupo liderado por Jared e Marta
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Filhotes de cobra-cega se nutrem com secreção e epiderme da mãe
tou seu achado com Mark Wilkinson, especialista em anfíbios do Museu de História Natural de Londres com quem já havia trabalhado. Wilkinson também ficou intrigado e escreveu para Ronald Nussbaum, especialista em gimnofionas que trabalha na Universidade de Michigan, Estados Unidos. Nussbaum, que já sabia que em algumas cobras-cegas os filhotes raspavam o útero da mãe, propôs aos colegas que a cobra-cega ovípara poderia apresentar um comportamento semelhante, com os filhotes se nutrindo da pele da mãe. Estabelecida uma hipótese, os biólogos começaram a trabalhar para caracterizar o que parecia um tipo de
comportamento maternal que ainda não havia sido descrito. A descrição desse mecanismo, incluindo as transformações na pele e a identificação da composição preliminar da secreção, que deve ser bastante nutritiva, já que os filhotes crescem em torno de 1 milímetro por dia, mobilizou também Hartmut Greven, da Universidade de Düsseldorf, Alemanha, e outros dois biólogos do Museu de História Natural de Londres, Alexander Kupfer e Hendrik Muller, ligado também à Universidade de Leiden, da Holanda. Eles já combinaram voltar às matas úmidas do sul da Bahia no final deste ano para colher amostras de secreção e observar o comportamento da cobra-cega brasileira desde o nascimento dos filhotes. •
C ARLOS F IORAVANTI
MAYUMI OKUYAMA
encontrou em 1993 a espécie Siphonops annulatus com a pele mais clara que o habitual. Começou então uma articulação científica que terminou no dia 13 do mês passado, quando saiu na revista científica Nature um artigo em que se descrevem pela primeira vez os cuidados maternais da espécie africana, adotada como modelo de estudo porque já era mais conhecida que a brasileira. A Siphonops pode atingir 40 centímetros de comprimento, enquanto a Boulengerula taitanus chega no máximo à metade e é mais fina. Intrigado com a mudança de cor da espécie brasileira, Jared comen-
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RÉPTEIS
Fóssil encontrado na Argentina fortalece a hipótese sobre a origem terrestre das cobras
As patas da serpente
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inha intuição diz que a mais antiga é uma espécie terrestre,daquelas que chamamos de fossorial,pois passa a maior parte do tempo escondida debaixo de pedras ou rastejando por túneis.”Foi com essa suspeita que Hussam Zaher,pesquisador do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo,encerrou a entrevista concedida a esta revista em julho de 2002. Zaher falava sobre a origem das serpentes.Naquela época,o debate sobre o tema era intenso e acalorado.A disputa, travada por meio de artigos científicos, colocava duas equipes e interpretações em pólos opostos. O canadense Michael Caldwell e o australiano Michael Lee garantiam:as cobras haviam surgido em ambiente marinho.Zaher torcia o nariz e contestava:mesmo em tempos remotos,eram animais que viviam em terra firme.Nos quatro anos seguintes poucas novidades surgiram e a discussão esfriou,embora os dois lados não arredassem pé de seus argumentos.Agora,em um artigo publicado no mês passado na Nature, Zaher descreve um fóssil encontrado em 2002 na província de Rio Negro, sul da Argentina,que reacende a polêmica e fortalece a suspeita da origem
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terrestre das cobras.Trata-se de um animal com patas,de 1 metro de comprimento,que viveu há 90 milhões de anos.“É a serpente mais primitiva que conhecemos”,afirma Zaher.“Ela tem características de uma espécie primitiva e fossorial e foi retirada de uma área de sedimentos continentais.São elementos que confirmam a origem terrestre e descartam o ambiente marinho.” O fóssil,em ótimo estado de conservação e quase completo,foi descoberto pela equipe do paleontólogo argentino Sebastián Apesteguía,do Museu Argentino de Ciências Naturais Bernardino Rivadavia,que imediatamente convidou Zaher a participar da descrição do animal.O trabalho começou na Argentina e terminou no Brasil.Atentos aos mínimos detalhes e analisando cada milímetro de dezenas de minúsculos ossos,os pesquisadores não demoraram a encontrar o segredo guardado pela nova espécie.A serpente apresenta,de forma evidente e definida,duas vértebras sacrais – localizadas na região da pélvis do animal,são as responsáveis pela fixação e sustentação das patas posteriores,que têm cerca de 20 milímetros.“Essa é uma característica inusitada,que não existe em nenhuma outra das espécies atuais nem nas serpentes com patasdescritas até então”,diz ele.“Essa é a mais primitiva das serpentes já descobertas.”Há
evidências de que a musculatura das patas seria bastante desenvolvida,o que indica que esses órgãos seriam usados de forma intensa e constante,auxiliando, por exemplo, na locomoção. A análise da região posterior do crânio revela uma mandíbula curta,que limitaria os movimentos e indica a incapacidade de ingerir grandes presas. “Nesse sentido,guarda semelhanças com as Aniloideas e da cobra fóssil Dinilysia, dois grupos que estão próximos da base do ramo evolutivo das serpentes”, compara Zaher.Com escamas amarronzadas e anéis em tom quase negro em uma reconstituição artística,a mãe de todas as serpentes foi chamada de Najash rionegrina.O pr imeiro nome faz referência ao animal bíblico que teria habitado o Jardim do Éden e seduzido Adão e Eva;o segundo homenageia a região onde o fóssil foi encontrado. A cobra de Israel - A polêmica sobre
a origem das serpentes remonta ao século 19,quando o paleontólogo norteamericano Edward Drinker Cope apresentou,pela primeira vez,a idéia de que esses animais teriam surgido em ambiente marinho e seriam os sucessores dos mosassauros,grandes lagartos já extintos,que também habitavam os mares.Essa tese foi retomada com grande repercussão em 1997,quando
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A Najash rionegrina: reacendendo um debate que começou no século 19
Caldwell e Lee publicaram na Nature um artigo onde descreviam a Pachyrhachis problematicus, uma serpente com patas posteriores e cerca de 95 milhões de anos, encontrada no sítio arqueológico de Ein Yabrud, em Israel – área formada por sedimentos marinhos. Os dois pesquisadores garantiam: era o elo perdido entre os mosassauros e as atuais serpentes. Ao ler o artigo, Zaher não se deu por convencido. “Notei uma série de imprecisões”, lembra. Uma resposta mais consistente só pôde ser apresentada dois anos depois, quando o brasileiro, em parceria com Olivier Rieppel, curador de fósseis do Field Museum de Chicago, Estados Unidos, teve acesso a uma cópia fiel de um
outro fóssil de cobra com patas – que mais tarde seria chamada de Haasiophis terrasanctus –, encontrado na mesma região de Israel. A descrição do animal, publicada pela Science em 2000, mostrava, no crânio, dentição especializada no céu da boca e mobilidade da mandíbula. Para Zaher, essas são características de um grupo de cobras atuais, as macrostomatas, que incluem a jibóia (Boa constrictor) e a cascavel (Crotalus durissus).“Mostramos que tanto a Pachyrhachis quanto a Haasiophis não poderiam ser consideradas as cobras mais primitivas conhecidas, na base da árvore evolutiva das serpentes, pois estavam muito mais próximas das macrostomatas, que formam uma linhagem mais moderna
de serpentes”, diz. “Nas duas espécies, além de as patas serem acessórias e não funcionais, as vértebras sacrais já estão incorporadas ao tórax, outra evidência de evolução mais recente.” A descoberta e descrição da Najash representam, ao menos momentaneamente, a solução do embate científico. A mãe das serpentes junta-se a uma série de outros ancestrais anunciados recentemente: no início de abril, Tiktaalik roseae, um peixe com patas descoberto por paleontólogos norte-americanos em uma ilha do Canadá, tornou-se conhecido do grande público. Em 2003, pesquisadores chineses já haviam encontrado fósseis de dinossauros com asas, que podem corresponder aos parentes mais antigos das aves atuais. Segundo Zaher, o esforço dos paleontólogos e o conhecimento mais detalhado de bacias sedimentares argentinas, chinesas e canadenses são alguns dos principais responsáveis por alimentar o debate sobre a origem dos grandes grupos de animais, ajudando a preencher lacunas e a construir de forma mais precisa a história das linhagens no tempo. Zaher sabe que a descrição da serpente mais primitiva conhecida até agora reacende o antigo debate. “Estamos aguardando as reações.” •
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FÍSICA
Os fantasmas dos fótons
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ma pequena bruxaria de outro mundo, concebida e executada por físicos nacionais, apoderou-se de três páginas da revista britânica Nature de 20 abril passado. Chefiada por Luiz Davidovich e Paulo Henrique Souto Ribeiro, uma equipe de pesquisadores da Universidade Federal do Rio Janeiro (UFRJ), com o auxílio teórico de colegas do Instituto Max-Planck de Dresden, publicou um artigo no renomado periódico científico dando conta do que dizem ser a primeira medição direta de uma estranha propriedade do universo quântico: o emaranhamento ou entrelaçamento de átomos ou partículas. Essa propriedade, que Albert Einstein descrevia como tendo uma “fantasmagórica ação a distância”, talvez seja a assinatura mais característica da mecâ58
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nica quântica quando confrontada com a física clássica – compreendê-la e, se possível, dominá-la é uma etapa imprescindível para o estabelecimento da criptografia e do computador quânticos, uma idéia que ganhou força a partir dos anos 1990. Isso porque partículas entrelaçadas parecem ser capazes de processar e transmitir informações com muito mais eficiência que um chip convencional. No caso do experimento feito no Laboratório de Ótica Quântica do Instituto de Física da UFRJ, os cientistas criaram um sistema no qual geraram dois pares de fótons, partículas de luz, a partir da emissão de um feixe de laser sobre um cristal. Em seguida, determinaram a quantidade de entrelaçamento no sistema por meio de uma única medição das propriedades físicas de duas partículas, realizada sobre um dos fótons de cada par. Normalmente, os físicos quânticos realizam várias medi-
das e, em seguida, fazem cálculos para determinar a quantidade de emaranhamento de um conjunto de partículas. Mas os pesquisadores brasileiros acreditam ter desenvolvido uma forma mais simples e eficaz de atingir esse objetivo: mediram a polarização (direção das vibrações do campo elétrico da luz, por exemplo, vertical ou horizontal) e o momento (relacionado com a direção de propagação, se à direita ou à esquerda) dos corpúsculos de luz e estabeleceram uma associação entre esses parâmetros e a quantidade de emaranhamento presente nas duplas de fótons. “Determinar a quantidade de emaranhamento e entender as implicações físicas desse fenômeno é um dos maiores desafios da física quântica”, afirma Davidovich. Do ponto de vista prático, níveis elevados de entrelaçamento seriam necessários para botar em funcionamento os futurísticos PCs quânticos.
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HÉLIO DE ALMEIDA
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Pesquisadores brasileiros medem o emaranhamento de partículas de luz, passo importante da pesquisa rumo ao computador quântico M ARCOS P IVET TA
Mas o que é exatamente esse tal de emaranhamento? Formulado teoricamente na década de 1930 e comprovado experimentalmente nos anos 1960, é um fenômeno com um quê de mistério para as pessoas acostumadas com as leis da física newtoniana, ou seja, a maioria dos mortais. De acordo com o conceito de entrelaçamento, as propriedades de duas ou mais partículas emaranhadas (átomos, elétrons, fótons etc.) só podem ser conhecidas na medida em que elas, as partículas, formam um conjunto, no qual medidas realizadas sobre uma das componentes do sistema altera o estado da outra independentemente de sua localização no espaço. Independentemente de as partículas estarem praticamente coladas ou separadas por milhares de quilômetros. Daí o tal de efeito quase sobrenatural ao qual Einstein alude ao descrever o entrelaçamento quântico. Posto dessa forma, o complicado conceito de emaranhamento quântico
dá um nó na cabeça das pessoas. Para entendê-lo, em vez de pensar em fótons e partículas, é mais didático imaginar um sistema composto de dois dados. Por estarem entrelaçados, quando jogados, ainda que um esteja no Brasil e o outro no Japão, os dados dão sempre o mesmo resultado: a soma de seus valores é, por exemplo, oito. Esse parâmetro final do exótico sistema é conhecido, facilmente mensurável, mas não se sabe qual combinação numérica (quatro e quatro, cinco e três, seis e dois) levou a esse resultado. Nesse caso, quando se descobre finalmente o valor de um dos dados, o enigma em relação ao outro também desaparece. Polarização perpendicular - Com os
pares de fótons da experiência realizada na UFRJ, que estão emaranhados em relação a dois parâmetros físicos (a polarização e a direção de propagação), acontece mais ou menos a mesma coi-
sa. Se os físicos determinam que uma dessas partículas de luz vibra na posição vertical, a outra, sua parceira no conjunto quântico, só pode oscilar na horizontal. Mas, no mundo estranho da física quântica, a polarização do segundo fóton só pode ser bem determinada após a medição desse parâmetro físico na primeira partícula de luz. “Nesse sistema, sabemos de antemão que a polarização de um fóton é perpendicular à do outro, mas a de cada fóton individualmente é completamente indeterminada”, diz o físico Stephen Patrick Walborn, estagiário de pós-doutorado na universidade carioca e principal condutor do experimento realizado no Laboratório de Ótica Quântica da UFRJ, uma das treze instituições nacionais de pesquisa que fazem parte do Instituto do Milênio de Informação Quântica, iniciativa patrocinada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). • PESQUISA FAPESP 123
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Biblioteca de Revistas Científicas disponível na internet www.scielo.org
O diretor da Bireme/OPAS/OMS e coordenador da Rede SciELO, Abel Packer, e Hussam Zaher, do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo, lançaram a proposta do projeto de criação de uma coleção SciELO Biodiversidade de periódicos científicos em acesso aberto, de um repositório de artigos em acesso aberto e de uma coleção digital de preservação de obras raras em biodiversidade. A proposta foi divulgada durante a Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica, realizada em Curitiba, em março. O projeto propõe a criação do espaço SciELO Biodiversidade, integrado à Rede SciELO, com o objetivo de promover o aumento da visibilidade, acessibilidade, uso e impacto da informação científica em biodiversidade no Brasil e no exterior.
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Negócios
Gestão ambiental José Carlos Teixeira e Jair de Souza Manfrinato,da Universidade Estadual Paulista (Unesp), e Marcos Schaaf,da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp),decidiram analisar a relação entre gestão tecnológica e ambiental em empresas de manufatura.O estudo aplicou uma série de questionários em dezenas de corporações de porte pequeno e médio.A análise desses documentos evidenciou uma série de obstáculos encontrados pelos empresários. “Pode-se dizer que as maiores dificuldades em gestão ambiental estão nas empresas de menor nível de capacidade tecnológica,as quais não têm habilidade de interferir nas microtecnologias de produtos e de processos,tanto para as tecnologias principais como para as tecnologias complementares”,concluem os cientistas. Na maioria das 78 empresas pesquisadas foi verificada correlação positiva entre os níveis tecnológico e ambiental,com incorporação da dimensão meio ambiente dentro das atividades das organizações. PRODUÇÃO – VOL.15 – MAIO/AGO. 2005
Nº
2 – SÃO PAULO –
www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010365132005000200006&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt
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Saúde
A cada ano,o tabagismo mata cerca de 5 milhões de pessoas em todo o mundo e esse número tende a crescer ainda mais.Apenas no Brasil,são 200 mil óbitos.O estudo “Tratamento farmacológico do tabagismo”,de Guilherme Focchi e Ivan Braun,pesquisadores do Grupo Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas, do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo,mostra a importância da farmacoterapia no tratamento da dependência de nicotina.Além de uma revisão das principais terapias farmacológicas usadas atualmente,o artigo analisa combinações de di-
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REVISTA DE PSIQUIATRIA CLÍNICA – VOL. 32 – Nº 5 – SÃO PAULO – SET./OUT. 2005 www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010160832005000500003&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt
Independência da nicotina
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ferentes produtos usados para reposição de nicotina. “Estratégias educacionais mostraram-se insuficientes para mudar comportamentos relacionados ao hábito de fumar”,afirmam os autores. Por conta disso,a identificação da dependência de nicotina,como transtorno psiquiátrico,levou ao desenvolvimento,sobretudo nas duas últimas décadas,de terapias farmacológicas para a doença.Isso fez com que a importância dos medicamentos no tratamento do tabagismo crescesse progressivamente.De coadjuvantes da terapia cognitivo-comportamental,os diferentes fármacos passaram a ter papel central na abordagem da maioria dos pacientes.O artigo mostra que atualmente existe uma série de tratamentos eficazes para o tabagismo e que os especialistas recomendam o emprego de medicamentos para todo paciente que esteja tentando parar de fumar.
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Esporte
Atletas especiais A fraqueza muscular,a assimetria de forças e o desequilíbrio entre músculos são fatores de risco para lesão dos joelhos.Jogadores de futebol portadores de paralisia cerebral (PC),possivelmente,apresentam estes fatores de risco exacerbados em decorrência da doença e do esporte.O artigo “Força muscular isocinética de jogadores de futebol da seleção paraolímpica brasileira de portadores de paralisia cerebral” analisou 21 futebolistas paraolímpicos,submetidos à avaliação dos músculos flexores e exten-
EDUARDO CÉSAR
Notícias
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sores dos joelhos. O estudo é assinado por Marília dos Santos Andrade, Anna Maria Fleury e Antônio Carlos da Silva, pesquisadores do Departamento de Fisiologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).“A paralisia cerebral pode ser definida como uma doença não progressiva que afeta o desenvolvimento do sistema nervoso central. A atividade física tem sido prescrita para indivíduos portadores de paralisia cerebral com o objetivo de reduzir e, eventualmente, até reverter alguns prejuízos musculares”, explicam os autores. Segundo o estudo, como os jogadores de futebol portadores de PC apresentam fatores de risco para lesão dos joelhos, um programa de avaliação e fortalecimento muscular deve ser indicado para esta população.“Futebolistas com paralisia cerebral, mesmo que altamente treinados, podem apresentar risco elevado de lesões traumáticas ou por esforços repetitivos da articulação do joelho”, revela o estudo. Recomenda-se, portanto, que os atletas sejam submetidos a programas de fortalecimento muscular, independentemente do estágio de treinamento. REVISTA BRASILEIRA DE MEDICINA DO ESPORTE – VOL. 11 – Nº 5 – NITERÓI – SET./OUT. 2005
Educação, Cultura e da Saúde do Brasil. Segundo o artigo, apesar de ser um acordo conjunto entre diferentes entidades, o destaque maior na condução do projeto e do planejamento da Bireme coube à própria Opas, em concordância com as diretrizes de trabalho que a organização passou a assumir no período posterior à Segunda Guerra Mundial. “As mudanças decorrentes da guerra, e suas conseqüências no âmbito do pensamento, da cultura e da tecnologia, influenciaram fortemente o universo das ciências da saúde, repercutindo principalmente no campo das políticas sanitárias”, escrevem os autores. A escolha do Brasil como sede da Bireme pode ser avaliada, entre outros motivos, sob a perspectiva do crescimento do ensino de medicina no país e da comparação deste com o conjunto dos países da América Latina. Nos anos 1960, 44% das escolas médicas latino-americanas estavam sediadas no Brasil. HISTÓRIA, CIÊNCIAS, SAÚDE-MANGUINHOS – 1 – RIO DE JANEIRO – JAN./MAR. 2006
VOL.
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www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S151786922005000500007&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt
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www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010459702006000100006&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt
História ■
Biblioteca sem paredes Analisar o processo de criação do Centro LatinoAmericano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde (Bireme) com base nos contextos social, político e econômico. Essa é a proposta de Márcia Regina da Silva e Dante Gallian, da Universidade Federal de São Paulo, e Luis Ferla, da Fundação Armando Álvares Penteado, autores do estudo “Uma biblioteca sem paredes: história da criação da Bireme”. A criação da Biblioteca Regional de Medicina, para os autores, é um exercício duplamente significativo, uma vez que permite compreender parte da história da saúde e da educação médica no Brasil e também parte dos processos de consolidação e expansão da própria Organização Panamericana da Saúde (Opas). O artigo resgata uma série de documentos e depoimentos referenciais para discutir as questões envolvidas na implantação da então Bireme, iniciativa que teve grande influência no âmbito da integração cultural e científica latino-americana no campo das ciências da saúde. O nome Biblioteca Regional de Medicina inspirava-se no da instituição modelo, National Library of Medicine, e reafirmava a ambição da instituição em tornar-se um centro de referência para toda a América Latina. Em 1982, a biblioteca passou a ser denominada Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde, mas sua sigla persistiu. A Bireme foi fundada em 3 de março de 1967, por meio de convênio firmado entre a Opas, Escola Paulista de Medicina e os ministérios da
Literatura
Construção de sentidos O artigo “Leitor e leituras: considerações sobre gêneros textuais e construção de sentidos”, de Sandra Ferreira e Maria da Graça Dias, da Universidade Federal de Pernambuco, define a leitura como uma atividade de construção de sentidos que implica uma relação dinâmica entre leitor e texto. “A leitura varia de acordo com o leitor e seus objetivos, concebendoa como uma atividade afetivo-cognitiva e como prática social”, dizem as autoras. Os conceitos de texto, contexto e gênero textual são discutidos, enfatizando a idéia de que o sentido se constitui na relação dialética entre autor, texto, leitor e contexto. “Essa relação favorece uma multiplicidade de sentidos e, ao mesmo tempo, delimita as possibilidades desta variação, determinando o jogo do implícito e do explícito”, contam. Para as pesquisadoras, ao mesmo tempo que o leitor precisa compartilhar dos sentidos construídos pelo autor, ele precisa também ser capaz de construir os seus próprios sentidos, que serão constituídos e orientados pelas suas vivências, experiências e conhecimentos. PSICOLOGIA: REFLEXÃO E CRÍTICA – VOL. 18 – Nº 3 – PORTO ALEGRE – SET./DEZ. 2005 www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010279722005000300005&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt
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TECNOLOGIA
Linha de Produção
Ao atingir o preço internacional de US$ 70,00, o barril de petróleo apressou novas decisões em todo o mundo no sentido de ampliar o uso de combustíveis renováveis. Países como Indonésia, Suécia e China anunciaram unidades produtoras de biodiesel em seus territórios. A partir de 2008, a Indonésia vai produzir entre 60 e 100 mil toneladas de biodiesel de óleo de palma. Inicialmente, ele vai substituir o diesel usado em indústrias. A empresa química sueca Perstorp Oxo vai produzir, a
■ Banda larga
interplanetária Cientistas do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) desenvolveram um pequeno detector de luz que pode vir a ser a versão espacial de uma espécie de conexão a jato entre a Terra e outros planetas. Com essa banda larga celestial, que usa o mesmo comprimento de onda atualmente empregado pelas fibras ópticas para receber e transmitir seus sinais, o envio 62
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de fotos e vídeos coloridos se tornaria muito mais rápido. “Hoje, usando a tecnologia sem fio das freqüências de rádio, demoramos horas para receber informação científica relevante de Marte”, diz Karl Berggren, do MIT, inventor do novo sistema (em artigo na MIT Tech Talk).“Mas um link óptico entre a Terra e o espaço pode ser milhares de vezes mais rápido.” O detector, que conta com nanofios que se comportam como supercondutores a temperaturas próxi-
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partir do final de 2007, biodiesel com um composto químico chamado de Esterfip-H produzido com uma mistura de óleos vegetais de soja, girassol e outras plantas. Na China, ainda sem uma definição de planta e de datas, será construída uma unidade de produção de biodiesel na cidade de Pequim. Para isso, uma enorme parceria está sendo montada com financiamento do Asia ProEco, programa da Comissão Européia. Estão na empreitada as universidades de Jaen e de Córdoba,
da Espanha, o Instituto de Biocombustíveis da Áustria, a Universidade de Milão, da Itália, a Universidade Malaia, da Malásia, e a Universidade de Tianjin, da China. Pesquisadores alemães e do Vietnã também serão incorporados ao projeto. Na onda dos biocombustíveis, a Rússia também anunciou em abril a construção de uma usina de etanol com capacidade para 300 milhões de litros anuais produzidos a partir de trigo para ração. A produção será destinada à União Européia.
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Mundo
Biodiesel cresce no mundo
mas do zero absoluto, pode captar sinais extremamente tênues, inclusive a presença de um único fóton, a unidade mais básica de luz.
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■ Supercola de
bactéria A cola que a bactéria Caulobacter crescentus, encontrada em rios, córregos e galerias, produz para se agarrar a tubulações e cascos de navios está sendo considerada o mais forte adesivo natural conheci-
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■ Nanopele
flexível Um novo processo para fabricar uma nanopele flexível e condutora, indicada para aplicações que vão desde o papel eletrônico até sensores para detecção de agentes químicos e biológicos, foi desenvolvido por uma equipe de pesquisadores do Instituto Politécnico de Rensselaer, de Nova York, nos Estados Unidos. O material combina a força e a condutividade dos nanotubos de carbono (folhas enroladas de átomos de carbono) com a flexibilidade dos polímeros tradicionais. A
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Cola com alto poder de adesão produzida por uma bactéria
grande dificuldade encontrada até então para juntar os dois materiais foi transposta com a adoção de um novo
procedimento que permite fazer com que os arranjos de nanotubos cresçam em uma plataforma rígida para só de-
pois serem preenchidos com um polímero. Quando o polímero endurece, é retirado da plataforma, resultando em uma pele flexível com os arranjos organizados de nanotubos incrustados nela. As peles podem dobrar-se ou enrolar-se como um pergaminho, mantendo sua capacidade de conduzir a eletricidade, o que torna esses materiais ideais para servir como papel eletrônico ou outros produtos eletrônicos flexíveis. O mesmo processo pode ser empregado ainda para muitas outras aplicações, desde estruturas de adesivos similares ao velcro a materiais para a interconexão dos nanotubos na eletrônica. Os pesquisadores também estudam usar a técnica para fabricar detectores de gases e sensores de pressão miniaturizados.
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Lentes bifocais do futuro Todos aqueles que passam dos 40 anos de idade sentem dificuldade em enxergar a curta distância. É a presbiopia ou “vista cansada”. Para quem é míope (dificuldade em enxergar de longe) e usa óculos, a situação se complica com a necessidade de lentes bifocais. É preciso focar cada parte da lente para ver algo a curta, média ou longa distância. Um problema que começa a ser resolvido com um protótipo elaborado por pesquisadores da Universidade do Arizona e do Instituto de Tecnologia da Geórgia, nos Estados Unidos. Eles desenvolveram uma camada de cristal líquido entre duas lentes de vidro que ajustam o foco de
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do pela ciência. Um dos primeiros microorganismos a aparecer em materiais submersos em água, resistente até mesmo a jatos de água de alta pressão, a bactéria é tão forte que é capaz de resistir, sem se desprender, a uma força equivalente ao peso de quatro carros pendurados. Se for encontrado um caminho para produzir em larga escala o material, ele poderá ser usado em colas cirúrgicas mais eficazes que as atuais, principalmente considerando que o adesivo da bactéria atua com bastante eficiência em superfícies molhadas. Além da medicina, ela também seria de grande utilidade na tecnologia marinha e em outras aplicações. A força de adesão da C. crescentus foi calculada por pesquisadores das universidades de Brown e Indiana, nos Estados Unidos, por meio de uma técnica de micromanipulação. O resultado do teste de adesão entre a bactéria e um substrato utilizado foi superior a 68 newtons (N) por milímetro quadrado. Os superadesivos comerciais ficam na faixa dos 25 N por mm.
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YVES BRUN, UNIVERSIDADE DE INDIANA
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acordo com a vontade do usuário. A mudança é feita por meio de um pequeno botão (on/off) que altera a voltagem da corrente elétrica das lentes (existem eletrodos ligados a uma pequena bateria), de 1,8 volt, alterando as moléculas do cristal lí-
quido. Em off, a visão é para longe, em on, para perto. O estudo foi realizado entre o instituto e a universidade em parceria com a empresa Johnson & Johnson, que financiou a pesquisa e já licenciou três patentes relativas aos novos óculos.
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Brasil
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Linha de Produção
Biossensores aplicados a controle de qualidade, certificação de alimentos, caracterização e síntese de novos materiais, filmes finos e superfícies para a fabricação de embalagens inteligentes, compósitos e fibras para o desenvolvimento de materiais usando produtos naturais como fibras de sisal, nanopartículas para liberação controlada de nutrientes e pesticidas em solos e plantas são algumas linhas de pesquisa que serão desenvolvidas no Laboratório Nacional de Nanotecnologia para o Agronegócio (LNNA), inaugurado em abril. Foram destinados R$ 4 milhões para o laboratório, vinculado à Embrapa Instrumentação Agropecuária, MAIO DE 2006
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Um amplo levantamento realizado no estado do Paraná encontrou 168 invenções de agricultores, pequenos fabricantes e ferreiros para solucionar dificuldades encontradas nas atividades agrícolas. O estudo foi realizado numa parceria entre o Instituto Agronômico do Paraná (Iapar) e o Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (Ipardes), financiado pela Secretaria de
unidade da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária sediada na cidade de São Carlos, em São Paulo, com o objetivo de fortalecer o agrone-
Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Seti). Segundo o coordenador do projeto, as invenções buscam aumentar a produtividade da exploração agropecuária ou diminuir o esforço ou o desconforto do trabalho. Algumas aliam os dois objetivos e trazem o baixo custo como outra característica. Uma das inovações é um sistema de limpeza de barracões de bicho-da-seda, coletado na ci-
dade de Nova Esperança, que facilita a retirada de resíduos e diminui o trabalho de dois dias para quatro horas. Outro produto é um escarificador para preparo do solo feito de cilindros de madeira e pregos. Das 168 inovações, 54 foram escolhidas como de amplo interesse para a agricultura familiar e as suas descrições estão disponíveis nos sites www.iapar.br e www.ipardes.gov.br
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■ Corte
da cana no computador
gócio brasileiro. Além das atividades de pesquisa, o laboratório também prestará serviços para instituições públicas e empresas.
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EMBRAPA
para o agronegócio
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Invenções na agricultura
■ Laboratório
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Maquete do novo laboratório da Embrapa em São Carlos
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O uso de redes neurais artificiais para a colheita de canade-açúcar é uma possibilidade que poderá ajudar muito os agricultores no momento do corte. Se ocorrer na hora certa, a colheita da cana pode render mais sacarose e, conseqüentemente, mais álcool ou açúcar. A nova perspectiva está num estudo, que está em fase final de elaboração na Universidade de Pernambuco (UPE), coordenado pelo professor Fernando Buarque de Lima Neto, da Escola Politécnica. “A decisão de colheita não é uma tarefa fácil, porque muitos fatores estão envolvi-
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O atual necessita de cinco equipamentos, que custam em torno de R$ 200 mil, para avaliar se o combustível está ou não adulterado. O cromatógrafo gasoso custa em média R$ 50 mil e pode ser utilizado para fazer outros tipos de análise. Com essas vantagens, o novo método torna-se mais acessível às grandes distribuidoras, refinarias e redes de postos de combustível.
OZ
dos, como o clima e a umidade. Às vezes o lote não está todo maduro”, diz Lima Neto. “Nós estamos desenvolvendo uma aplicação computacional que leva em conta indicadores como sacarose, fibras e a tonelada de cana por hectare, que ajuda na decisão de colheita.” O objetivo dos pesquisadores agora é tornar o software disponível para ser operado em um palmtop para uso dos encarregados responsáveis pelas frentes de corte.
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em detalhes O universo da nanotecnologia traduzido para estudantes e interessados em geral. Essa é a proposta do DVD Nanotecnologia: futuro, lançado no dia 13 de abril na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Com 14 minutos de duração, o documentário é o primeiro de uma série de cinco que, além de mostrar os aspectos históricos da nanotecnologia, vai apresentar todo o processo evolutivo e divulgar as principais pesquisas em desenvolvimento na área. Entre os assuntos tratados na série estarão temas como cosméticos, energia, nanofios, nanofitas, nanotubos e a influência da nanotecnologia na elaboração de produtos e processos que beneficiam a sociedade. No documentário é possível compreender por que uma extensão tão pequena como 1 nanômetro, que corresponde a 1 bilionésimo de metro, tem despertado o interesse tanto de pesquisadores como de empresários no mundo todo. Produzido em parceria entre o Centro Multidisciplinar para o Desenvolvimento de Materiais Cerâmicos, um dos dez Centros de Pesquisa, Inovação e
ainda mais organizada
Universo nano explicado em detalhes
Difusão (Cepid) da FAPESP, e a Oz Produtora, o DVD será distribuído em escolas da rede pública de ensino médio e fundamental da região de Araraquara e São Carlos, no interior de São Paulo, e também a órgãos federais, estaduais e municipais da área de ciência e tecnologia, além de entidades empresariais.
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■ Análise
rápida e econômica
Um novo método de análise da qualidade de combustíveis utiliza um único equipamento, o cromatógrafo gasoso, para avaliar parâmetros como cor do combustível, teor de álcool, densidade, destilação, octanagem e composição da gasolina, resultando em economia de tempo e de pessoas necessárias para realizar a tarefa de avaliar vestígios de adulteração. A eficácia da técnica,
Combustível avaliado em um único equipamento
com 95% de segurança nos resultados, está descrita no trabalho de mestrado de Danilo Luiz Flumignan, do Instituto de Química da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Araraquara, orientado pelo professor José Eduardo de Oliveira, coordenador do Centro de Monitoramento e Pesquisa da Qualidade de Combustíveis, Petróleo e Derivados (Cempeq). Durante seis meses, foram coletadas 2.400 amostras de gasolina em 1.400 postos de 227 municípios do centro-oeste do estado de São Paulo, que compõem a região monitorada pelo Cempeq, para fazer a comparação entre os dois métodos.
EDUARDO CESAR
■ Nanotecnologia
■ Inovação
Além da preocupação em criar conhecimento tecnológico, a inovação, dentro das jovens empresas, também passa por uma gestão mais eficiente. Durante o workshop sobre “Apoio a Empresas de Base Tecnológica (EBTs) em SP”, realizado na sede da FAPESP em abril, muito se discutiu sobre como melhorar o rendimento do financiamento investido em inovação tecnológica. Atualmente existem centenas de empresas incubadas no estado. Muitas delas são financiadas pela FAPESP, por meio do Programa Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (Pipe). O Sebrae, que também investe capital em processos de incubação, tem em carteira outras 300 empresas. Além de criar um ambiente interno propício dentro das novas instituições comerciais – em vez de tentar transformar o cientista em executivo, o mais fácil talvez seja contratar profissionais já disponíveis no mercado –, o estabelecimento de grandes zonas urbanas, voltadas para a tecnologia, também é fundamental. Assim, o primeiro Parque Tecnológico do Estado de São Paulo deverá surgir, até o fim do ano, em São José dos Campos.
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TECNOLOGIA PATENTES
Remédios para exportação Projetos desenvolvidos na Unicamp serão apresentados pela Inova nos Estados Unidos
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rês projetos com resultados inovadores em áreas tão distintas como fitoquímica, novos materiais e biotecnologia foram escolhidos pela Agência de Inovação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), a Inova, para serem apresentados no TechConnect Summit 2006. O evento, marcado para os dias 8 e 9 de maio em Boston, nos Estados Unidos, reúne representantes de escritórios de patentes de instituições norte-americanas como a Universidade de Boston, a Universidade da Califórnia e a Universidade de Minnesota, a Universidade de Estocolmo, na Suécia, a Escola Politécnica Federal de Lausanne, na Suíça, entre outras, além de empresas como Basf, IBM, Motorola, Ford e de investidores em busca de boas oportunidades de negócios. “É a primeira experiência que temos em participar de um evento dessa natureza para avaliar a atratividade das tecnologias da Unicamp em um cenário internacional”, diz o professor Roberto Lotufo, diretor executivo da Inova. A participação reveste-se de um significado especial porque permite de forma pioneira que uma universidade brasileira tome parte do TechConnect.“Estamos abrindo portas para outras universidades e ampliando 66
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as oportunidades de comercializar novas tecnologias.” No processo de submissão, em que concorreram propostas do mundo todo, a Inova exibiu cinco tecnologias e teve três aprovadas. Um número bastante representativo, considerando que apenas 40% de todas as inovações apresentadas foram escolhidas. O critério de seleção da Unicamp, que possui 425 patentes depositadas, levou em conta as patentes mais novas e que se encaixassem na demanda de mercado, como um novo fitoterápico extraído da planta Bidens alba, popularmente conhecida como picão, com resultados promissores para alguns tipos de câncer e leucemias (veja reportagem sobre a liderança da Unicamp no ranking de patentes na página 28). A segunda tecnologia é um peptídeo, uma molécula composta por 12 aminoácidos que combate os parasitas causadores da coccidiose aviária, doença responsável pelo atraso do crescimento de aves de granja e ocasionadora de prejuízos ao setor. A última patente escolhida é de um adesivo para metais, como alumínio e aço, que dispensa o tratamento prévio das superfícies a serem coladas. “Atualmente as empresas internacionais possuem executivos de negócios que rodam o mundo em busca de uma boa tecnologia”, diz Rosana Di Giorgio, diretora de Propriedade Intelectual e Desenvolvimento de Parcerias da Inova. “Por isso é importante mos-
ESCULTURA HÉLIO DE ALMEIDA FOTOS EDUARDO CESAR
D INORAH E RENO
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Medicamento veterinário, cola e fitoterápico: inovações em busca de parcerias
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trar a essas empresas que a Unicamp tem boas tecnologias, está disposta a licenciá-las e o Brasil tem leis favoráveis para que isso ocorra.” O estudo do fitoterápico teve início em 2000, quando a pesquisadora Maria Tereza Grombone Guaratini, dentro do programa Biota, financiado pela FAPESP, começou a estudar em seu projeto de pós-doutorado a variabilidade genética do picão-preto (Bidens pilosa), a mais importante planta invasora da cultura de soja. “O estudo dos compostos químicos encontrados nas plantas, como os sesquiterpenos e poliacetilenos, associado à pesquisa cromossômica permitiu constatar a existência de três espécies”, diz Maria Tereza. Além de duas espécies de picão-preto, a pesquisadora verificou que existia uma terceira, a Bidens alba, originária do México e encontrada apenas no litoral de São Paulo. A explicação para a localização restrita da planta em território brasileiro é que ela deve ter sido trazida por navios que aportaram em Santos. Em conversas informais sobre a planta, a pesquisadora ouviu várias pessoas dizerem que já haviam usado o picão-preto em forma de emplastros, para combater dores musculares, ou mesmo como chá. Na literatura científica ela também encontrou referências à ação antimicrobiana, anti-helmíntica (contra vermes) e antiulcerogênica da Bidens pilosa, em estudos que procuravam explicações para a utilização dessa espécie em práticas médicas na África e na Amazônia. Como a Bidens é uma planta invasora, ela ocorre em vários países do mundo em áreas agrícolas ou locais modificados ambientalmente.“A maioria dos trabalhos era realizado por químicos que especulavam sobre a ação de compostos encontrados na planta ou por farmacologistas que testavam os extratos em modelos animais, sem, no entanto, verificar o real conteúdo do extrato”, diz Maria Tereza. Na literatura pesquisada não foi encontrada nenhuma referência sobre a Bidens alba, que nos estudos feitos pela pesquisadora revelou ser uma planta quimicamente diferente das outras duas espécies de Bidens pilosa estudadas. Maria Tereza foi então mostrar o extrato da planta para a professora Alba
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Regina Monteiro Souza Brito, do Departamento de Fisiologia da Unicamp, que sugeriu que o material fosse levado ao Departamento de Fisiologia do Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Botucatu. Lá, uma ex-aluna de Alba, a professora Clelia Akiko Hiruma Lima, do Laboratório de Produtos Naturais, dispôs-se a fazer testes com a Bidens alba. Testado em camundongos com úlcera gástrica aguda, o líquido de cor verde-escura funcionou como um excelente protetor da mucosa gástrica. “Nos testes de comparação, o extrato de Bidens alba respondeu melhor que o produto comercial mais usado para úlcera gástrica”, diz a pesquisadora. O depósito de patente do extrato com atividades antiulcerogênicas foi feito pela Inova em 2004. Algumas empresas já entraram em contato com a agência, interessadas em dar continuidade aos trabalhos e desenvolver produtos.
Folha e extrato da Bidens alba: propriedades anticancerígenas em testes
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s pesquisas com a Bidens alba não pararam nesse ponto. Para saber se o extrato apresentava também efeito anticancerígeno, a pesquisadora levou o líquido para ser avaliado no Centro Integrado de Pesquisas Onco-Hematológicas da Infância (Cipoi), da Unicamp, um laboratório de pesquisa básica e aplicada destinada ao estudo das crianças portadoras de leucemias agudas. Como o extrato está dividido em 73 frações e não se sabe exatamente a composição química de cada uma delas, foram escolhidas três para serem testadas. Duas delas apresentaram resultados bastante promissores. O trabalho de separação química de cada fração foi feito pela pesquisadora Carmen Lúcia Queiroga, do Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agrícolas (CPQBA), também da Unicamp. Quando receberam o extrato, os pesquisadores Alexandre Eduardo Nowill e Gilberto Carlos Franchi Junior, do Cipoi, médico e farmacêutico que se dedicam a pesquisas sobre leucemia, limitaram-se a testar o novo produto, sem saber o que era. Após os resultados iniciais, ao verem que o extrato realmente funcionava e prometia, os dois pesquisadores comunicaram a Maria Tereza que iriam dar continuidade à pesquisa. Os testes in-
cluíram várias linhagens de câncer, inclusive o adenocarcinoma de próstata, um dos principais tipos dessa doença que atinge o homem. “Cerca de 50% dos homens vão ter problema de próstata e são raros os medicamentos que funcionam para esse tipo de câncer”, diz Franchi Junior. “Então se existe um que funciona, pelo menos in vitro, já é um bom resultado.” Os testes em animais serão iniciados no próximo mês, etapa que consiste em induzir câncer de próstata humana com as mesmas células usadas in vitro em animais especialmente desenvolvidos para essa finalidade. Após 18 dias de inoculação, ou seja, logo após o diagnóstico de câncer feito por apalpação, os animais começarão a ser tratados com a droga. No fim do tratamento os tumores serão avaliados por patologista credenciado. A equipe está entusiasmada com o fato de os animais que receberam o extrato na pesquisa de cicatri-
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zação de úlceras não terem apresentado intoxicação nas primeiras 24 horas de tratamento. Além de avaliar a eficácia do extrato para combater o câncer de próstata in vitro, também foram feitos estudos para câncer de mama e de ovário e para quatro tipos de leucemia. A comparação foi feita sempre com um quimioterápico existente no mercado. “O extrato de Bidens alba funcionou para todos os adenocarcinomas estudados e para as leucemias”, diz Franchi Junior. Atualmente a pesquisa está na fase de reprodutibilidade, com novos testes in vitro. A equipe multidisciplinar composta por botânico, farmacêutico, médico e químico depende de parceria da iniciativa privada, o que esperam conseguir assim que for fechado um contrato de transferência de tecnologia. O depósito da patente do novo fitoterápico à base de Bidens alba com atividade antineoplásica foi feito no final de
2005. E é essa capacidade do extrato de inibir o crescimento das células cancerígenas in vitro que será apresentada no TechConnect no dia 8 de maio. Crescimento lento - O projeto do pep-
tídeo antimicrobiano é o resultado de uma pesquisa realizada no Centro de Biologia Molecular e Engenharia Genética (CBMEG) e no Departamento de Parasitologia do Instituto de Biologia da Unicamp. O peptídeo, que é um fragmento de uma proteína, é uma combinação certeira de 12 aminoácidos batizado de PW2 (veja Pesquisa FAPESP n° 78). Ele é capaz de destruir o protozoário do gênero Eimeria, um organismo unicelular e agente causador da coccidiose, doença que atua nos processos digestivos de frangos e impede uma maior absorção de nutrientes pelo animal. O projeto começou a partir da tese de doutorado do pesquisador Arnaldo da Silva Júnior do CBMEG, orientado
pelo professor Adilson Leite, falecido no início de 2003, e que contou também com a participação dos professores Urara Kawazoe e Paulo Arruda. A doença, uma das principais que acometem as aves, tem conseqüências diretas sobre a produtividade do setor avícola. “Quando as aves são infectadas pelo parasita, o ritmo de crescimento é bem mais lento do que o de uma ave sadia, o que faz com que sejam descartadas como refugo”, diz Urara, do Instituto de Biologia da Unicamp e co-orientadora de Silva Júnior, que hoje trabalha em uma empresa privada em Indaiatuba, cidade próxima a Campinas. O protozoário causa prejuízo na absorção de nutrientes importantes para o crescimento normal das aves, que devem atingir o peso ideal de 2 quilos com cerca de 40 dias, na época do abate. A tentativa de controlar a coccidiose aviária nas granjas comerciais engloba o uso de vacinas e, em menor escala, a administração de medicamentos preventivos anticoccidianos. O efeito desses medicamentos tem sido ineficiente devido à presença de cepas resistentes do parasita. Além disso, em aves destinadas ao comércio exterior não é permitido o uso desses medicamentos, de acordo com as legislações dos países importadores dessas aves. A proteção oferecida pelo peptídeo PW2 está relacionada com a capacidade de essa estrutura protéica danificar a membrana protetora do protozoário antes que ele consiga invadir a célula intestinal do animal e, conseqüentemente, impedir o desenvolvimento da doença. Quando não há nenhuma barreira capaz de combater a coccidiose, o parasita leva, em média, de quatro a cinco dias para completar o seu ciclo de vida, que começa com a eliminação dos oocistos imaturos, forma de resistência dos parasitas, juntamente com as fezes do frango. Os oocistos amadurecem no ambiente criando no seu interior as formas infectantes do parasita, chamadas de esporozoítos. Quando as aves ciscam no chão adquirem o parasita ao ingerir oocistos maduros, envolvidos por duas membranas externas resistentes e impermeáveis a líquidos, além de outra membrana dupla que envolve os esporozoítos, forma inicial do parasita. Ao passar pelo aparelho PESQUISA FAPESP 123
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digestivo do frango, conhecido como moela, o oocisto é triturado, rompendo as membranas externas. A partir daí, pela ação de enzimas digestivas, os esporozoítos, primeira forma assexuada, aderem e penetram em uma célula da mucosa intestinal e são envolvidos por uma membrana do próprio hospedeiro, formando um envoltório ao seu redor. “Dessa forma, o parasita fica bem protegido e o próprio hospedeiro não o reconhece como um corpo estranho”, explica Urara.“É um mecanismo de escape do parasita.”
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urante o desenvolvimento, ocorre uma primeira fase de formação de novos parasitas que procuram outras células e multiplicamse novamente, sempre em progressão geométrica. O último ciclo de reprodução é feito de forma sexuada e resulta nas formas finais do protozoário, que, antes de ser expelido nas fezes das aves, ganha uma dupla camada de proteção para poder resistir ao ambiente externo, mais hostil, e conseguir novamente infectar uma outra ave sadia. A obtenção dos peptídeos com o “encaixe” adequado para aderir à membrana do protozoário demandou quatro anos. Os pesquisadores selecionaram várias séries de aminoácidos de uma grande biblioteca de peptídeos para entrar em contato com o parasita. Quando os 12 aminoácidos do peptídeo foram testados in vitro, eles funcionaram como se fossem um anticorpo, com poder de atuar como um agente antimicrobiano. O peptídeo, além de destruir a fase inicial do parasita, não deixa resíduos químicos na carne porque é absorvido pelo organismo como proteína. Esse fator benéfico é importante no mercado internacional. Os importadores, principalmente europeus e asiáticos, colocam barreiras comerciais à carne de frango com resíduos de substâncias utilizadas para tratamentos de doenças. “A nossa intenção é fornecer o peptídeo junto com a ração dada às aves”, diz Urara. Mas para chegar a esse ponto mais duas etapas ainda precisam ser trans70
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postas. Uma delas é fazer os testes finais com frangos, inicialmente no biotério da universidade e depois em uma granja, porque até agora os experimentos foram feitos in vitro. E estabelecer a concentração ideal para obter o melhor resultado. Para isso é preciso sintetizar o peptídeo em grande escala, etapa que necessita de parceria com empresas pelo alto custo que representa. A patente que assegura os direitos de uso do peptídeo para combater a coccidiose, suas variáveis e o método usado para identificá-lo foi depositada no Brasil, nos Estados Unidos e na Europa com a ajuda do Núcleo de Licenciamento de Patentes (Nuplitec), da FAPESP. Diferenças estruturais - Também será apresentado em Boston um adesivo polimérico formado por um polí-
O PROJETO Pedido de patenteamento para um novo método de seleção de peptídeos antimicrobianos e do peptídeo anticoccidiano PW2 MODALIDADE
Programa de Apoio à Propriedade Intelectual (Papi) COORDENADOR
PAULO ARRUDA — Unicamp INVESTIMENTO
R$ 26.875,29 e US$ 48.320,07
Adesivo fixa metais sem preparação prévia e resiste à água e ao calor
mero acrílico nanoestruturado que adere fortemente ao alumínio e ao aço e, portanto, com um bom potencial para substituir parafusos, porcas e rebites em superfícies metálicas. As aplicações incluem as indústrias metalúrgica, automobilística, aeronáutica, construção civil e de móveis. Para chegar ao novo adesivo, pesquisadores do Instituto de Química da Unicamp, coordenados pelo professor Fernando Galembeck, dedicaram-se a estudar sistematicamente uma família de polímeros que, embora parecidos, guardam pequenas diferenças estruturais provocadas pela mudança de um dos seus componentes, chamado de tensoativo e empregado no processo de fabricação.“O tensoativo muda a estrutura do polímero em escala nanométrica”, diz Galembeck. A mudança da nanoestrutura muda as interações entre o polímero e o metal, bem como as proprie-
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Aves de granja são infectadas pelo protozoário Eimeria (à esquerda)
dades mecânicas do próprio polímero, tornando a junta adesiva mais resistente a solicitações mecânicas. Em um dos ensaios realizados no processo de caracterização, os polímeros eram passados por uma extrusora, máquina muito usada para processar plásticos. Quando foram utilizadas duas das resinas da família estudada pelos pesquisadores, a técnica responsável teve dificuldades em limpar a rosca do equipamento. “Fomos ver o que estava acontecendo e percebemos que havia uma adesão muito forte da resina ao aço da rosca”, diz Galembeck. “Era um problema que no final mostrou ser uma solução.” O novo adesivo, embora tenha em sua composição muitas substâncias presentes em outros produtos do gênero, possui como diferencial a vantagem de dispensar a preparação prévia das superfícies metálicas que serão coladas.
Normalmente, a colagem de metais como alumínio e aço exige, além da limpeza, vários tratamentos que criam uma estrutura química na superfície que favorece a fixação do adesivo, mas isso pode comprometer a estabilidade da peça, principalmente quando há muita umidade no ar ou em ambientes extremamente quentes. No caso do novo adesivo, a estabilidade não é a única vantagem. Ele também apresenta boa resistência à água. No laboratório do Instituto de Química existem algumas peças coladas com o polímero que estão imersas em água há mais de dois anos. “O metal está bem manchado, mas a parte recoberta pelo adesivo está perfeita”, diz Galembeck. A patente que trata do processo de fabricação do produto foi depositada no início de 2005. Testes em laboratório que comprovam a resistência do adesivo a esforços de flexão e tração, tanto a seco como em
ambiente úmido, já foram feitos. “Precisamos agora fazer ensaios em campo em grande escala, para avaliar a adequação do produto às demandas de mercado”, diz Galembeck. Embora sejam usados em pequenas quantidades, os adesivos movimentam um mercado mundial estimado em US$ 18 bilhões, dos quais metade está nos Estados Unidos. E são nesses mercados que a Inova tem interesse em comercializar a patente. Negócios internacionais - A apresentação no TechConnect é mais uma etapa na busca de parcerias internacionais empreendida pela Agência de Inovação. No ano passado, representantes da Inova estiveram no Licensing Executives Society (LES), realizado em Fênix, nos Estados Unidos, uma conferência de negócios que trata de propriedade intelectual e transferência de tecnologia e contou com a participação de mais de 20 empresas do porte de IBM, HP, Roche e congêneres. O LES é organizado pelos Estados Unidos e Canadá e é realizado em vários países diferentes. Neste ano, o evento foi realizado de 9 a 12 abril em Seul, na Coréia, e novamente a Agência de Inovação esteve presente. “Foi uma oportunidade de começar a ter contato com a Ásia”, diz Rosana Di Giorgio. No evento realizado em Fênix, a Intelect Ventures, pequena empresa sediada nos Estados Unidos que busca novas tecnologias de acordo com a demanda e tem clientes como Microsoft e Intel, procurou a Inova para propor parceria na intermediação de patentes na área de tecnologia da informação. A remuneração só ocorre quando o negócio é fechado. Por enquanto é necessário esperar o resultado do primeiro edital publicado no Diário Oficial do Estado e da União, em março, com as novas tecnologias desenvolvidas na Unicamp. O edital é uma exigência da Lei de Inovação, regulamentada em outubro de 2005, e precede o licenciamento das tecnologias desenvolvidas por órgãos públicos. “As tecnologias que não forem licenciadas por meio do edital serão oferecidas pela Intelect Ventures ao mercado norte-americano”, diz Rosana. • PESQUISA FAPESP 123
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S E N S O R IA M E N T O R E M O T O
Ajuda do céu Aeronaves não tripuladas podem ser usadas para aum entar a produtividade das lavouras do país Y URI VASCONCELOS
O
s agricultores brasileiros poderão contar no segundo semestre deste ano com um poderoso aliado para monitorar e elevar a produtividade de suas lavouras. Tratase de uma aeronave não tripulada, autônoma, planejada para sobrevoar as plantações e captar imagens que depois serão analisadas e processadas por softwares especializados. O pequeno avião, que está em estágio final de desenvolvimento, tem autonomia de vôo de quatro horas e capacidade para registrar 6 mil fotos por dia, voando a 100 metros do solo. “As imagens, captadas por uma câmera digital acoplada à aeronave, podem ser usadas pelos produtores rurais para detectar vários problemas no desenvolvimento das culturas, como falhas no plantio, infestação por pragas, deficiência de nutrientes, presença de doenças e de plantas invasoras, entre outros”, destaca o pesquisador Onofre Trindade Júnior, coordenador do projeto que envolve pesquisadores e técnicos da Universidade de São Paulo (USP), Embrapa Instrumentação Agropecuária, 72
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unidade da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária e AGX Tecnologia, empresa de São Carlos focada no desenvolvimento de soluções tecnológicas para o setor agrícola. Essa empresa, que faz parte do grupo da Fazenda Campo Bom, de Mato Grosso do Sul, investiu a maior parte do R$ 1,5 milhão gasto até o momento com o projeto. Veículos aéreos não tripulados, conhecidos pela sigla Vants, podem ser empregados em muitas aplicações civis e militares, explica Onofre Júnior, que é professor licenciado do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da USP em São Carlos. As aeronaves desenvolvidas por seu grupo integram o Projeto Arara (Aeronaves de Reconhecimento Assistidas por Rádio e Autônomas), iniciado em 1998, e são dirigidas para aplicações de monitoramento agrícola e ecológico. Isso é feito por meio da coleta de imagens de vídeo e de fotografias, que são posteriormente processadas para extração das informações de interesse. A maioria das imagens é coletada no espectro de luz visível, mas algumas são obtidas na região do infravermelho distante (imagens termais), ideais para de-
Imagem mostra a regularidade do plantio de lavoura de eucalipto
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IMAGENS E FOTOS USP/EMBRAPA
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Imagem a 600 metros de altitude permite contar as árvores de cítrus
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tectar focos de incêndio e a presença de animais. Atualmente, os pesquisadores estão finalizando a modificação de uma câmera fotográfica digital para a obtenção de imagens na faixa do infravermelho próximo que permitem melhor identificação de vários fatores que afetam as culturas, como falta d’água, alguns tipos de doenças, além de obter índices de desenvolvimento como, por exemplo, a quantidade de biomassa na lavoura. No caso do monitoramento agrícola, as imagens coletadas são posteriormente processadas, dando origem a uma série de informações úteis como o número de plantas por hectare, tamanho das copas das árvores, distribuição de palha no solo, fator importante na técnica de plantio direto, e a regularidade na plantação, que mede a variação da distância entre plantas. No monitoramento ecológico, as principais informações colhidas pela aeronave são o mapeamento e o acompanhamento da erosão, a detecção e previsão de incêndios florestais, o mapeamento de recursos hídricos e a contagem de animais silvestres. B oa resolução - Com 2,3 metros de
comprimento e 3,2 de envergadura (da ponta de uma asa até a ponta da outra), o avião é feito de fibra de vidro com alguns componentes madeira e alumínio aeronáutico e conta com um motor a gasolina da marca ZDZ, normalmente utilizado em aeromodelos, com 40 cilindradas e 4,8 cavalos-vapor (cv). A aeronave é capaz de voar, controlada por meio de sinais de rádio como um aeromodelo, a até mil metros de distância e o vôo é executado entre 100 e 300 metros de altura. Segundo o coordenador do projeto, ela apresenta uma série de vantagens em relação a outros dispositivos também utilizados no monitoramento agrícola, como os satélites. “A resolução espacial 74
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C om 2 ,3 metros de comprimento, o avião é produzido com fibra de vidro, madeira e alumínio aeronáutico
da imagem proporcionada pela nossa aeronave é muito mais alta, permitindo identificar características não mensuráveis pelo satélite, como contagem de plantas pequenas”, explica Onofre Júnior.“Além disso, também permite a coleta de imagens a qualquer momento, enquanto satélites possuem uma janela de tempo limitada (quando ao circular a Terra passam no local que se quer a informação) para aquisição das imagens.” Na captação de imagens, existe uma outra vantagem. Enquanto a obstrução de nuvens pode impedir a aquisição de boas fotos dos satélites em determinados momentos, a aeronave do Projeto Arara normalmente voa abaixo do nível das nuvens, não sofrendo desse problema. Por fim, destaca o pesquisador, com o uso de satélite, há uma área de cobertura mínima para a compra da imagem, que pode ser muito maior do que a área de interesse. Assim, com a aeronave desenvolvida em São Carlos, é possível obter imagens com menor custo. Aviões convencionais também podem ser utilizados para monitoramento agrícola e, nesse caso, diz Onofre
Júnior, a principal vantagem do pequeno avião são os custos mais baixos – tanto de aquisição quanto de manutenção e operação.
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principal motivação para realização do Projeto Arara, destaca o pesquisador, veio das atividades de aeromodelismo desenvolvidas por insistência de um de seus filhos.“Após muitas horas de envolvimento com o esporte, surgiu a idéia da utilização das aeronaves em pesquisa e desenvolvimento”, afirma. O pontapé inicial do projeto foi dado com o trabalho de mestrado de uma pesquisadora da Embrapa, Nilda Pessoa de Souza, onde se procurou avaliar a qualidade das imagens obtidas com aeromodelos e sua aplicabilidade na agricultura. A partir daí vários outros trabalhos de mestrado foram desenvolvidos, priorizando subsistemas da aeronave e técnicas para processamento das imagens. A aeronave utiliza uma arquitetura distribuída de sensores e servomecanismos, contando com um total de 11 microprocessadores a bordo. Servomecanismos são dispositivos que transfor-
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Imagem de uma cultura de cana-de-açúcar captada a 2 00 metros de altitude mostra falhas no plantio
mam sinais elétricos em movimentos dos controles existentes nas asas e no corpo da aeronave como leme, ailerons, profundor e flapes. Os microprocessadores englobam o processador central, sensores barométricos (altitude e velocidade aerodinâmica), monitor de motor (rotação, temperatura etc.), controle de gerador de energia e carga de bateria, controladores de servomecanismos, sistema de estabilização de vôo e piloto automático. Além disso, o veículo dispõe também de equipamentos comprados no mercado, como câmera de vídeo, receptor de GPS (localizador geográfico baseado em satélites), de alta precisão, câmera fotográfica digital de 8 megapixels e transmissores e receptores de rádio e de vídeo. Um dos desafios do Projeto Arara é construir aeronaves autônomas, capazes de tomar decisões por meio da análise dos dados coletados em tempo real, como, por exemplo, seguir uma estrada, o curso de um rio ou uma linha de transmissão de energia. Para finalizar o pequeno avião ainda é necessário desenvolver o mecanismo de coleta automática de imagens a bordo e o registro das suas coordenadas, refinar os ajustes dos controladores atuais para maior
precisão e desenvolver um controlador de rota que permita executar as manobras necessárias para obtenção de imagens em missões de varredura visual de áreas agrícolas. Quando ficar pronta, provavelmente no segundo semestre, ela vai funcionar assim: antes do vôo, os operadores definem uma missão, contendo pontos de coleta de imagens e pontos da rota (latitude, longitude e altitude) a ser seguida. Esses dados são carregados no processador central da aeronave, ainda em solo, e ela executa a missão autonomamente, sem intervenção do piloto. Os parâmetros da missão podem ser modificados em vôo por meio de comunicação de rádio com a estação de controle ou qualquer outro canal de comunicação como telefonia celular ou satélite. Testes e reg u lam en tação - Até o momento, foram produzidos dez protótipos do veículo, que vem sendo submetido a testes em culturas de cana-deaçúcar, laranja, soja, milho e eucalipto desde o início de 2004. “Estamos contentes com os resultados. Constatamos que o posicionamento das imagens foi preciso e houve correta identificação das características de interesse no pro-
cessamento digital das imagens, confirmada pela sua análise visual.” Os pesquisadores também realizaram projetos piloto com algumas empresas dos setores agrícola e florestal para sondar a receptividade do mercado e avaliar a utilidade do sistema. Segundo Onofre Júnior, para entrar em operação comercial, a aeronave vai precisar, inicialmente, passar por um processo de licenciamento que já está sendo conduzido pela USP, por meio da Agência USP de Inovação, e pela Embrapa. “Como ainda não existe uma regulamentação no país sobre a operação de aeronaves autônomas, inicialmente as operações poderão ser remotamente pilotadas ou na forma de projetos, intermediadas por uma instituição de pesquisa junto aos agricultores interessados”, afirma o Onofre Júnior. “Independentemente disso, existem várias empresas interessadas no equipamento no país e acreditamos que também exista mercado para ele no exterior.” Um avião desses custará entre R$ 60 mil e R$ 70 mil. Existem no mundo e no Brasil, em fase de operação ou em estudos, vários tipos e tamanhos de veículos aéreos não tripulados, sendo que a grande maioria atua na área militar. Embora aeronaves não tripuladas não sejam novidade, Onofre Júnior garante que não há nenhum outro equipamento que ofereça uma solução completa para monitoramento agrícola e florestal. “O Projeto Arara cobre desde a coleta de imagens em áreas agrícolas e florestais, com um equipamento voltado para essa aplicação – possibilitando pouso e decolagem em áreas rurais, baixa velocidade mínima de vôo (40 km/h), câmeras com alta resolução para avaliação de pequenos detalhes e baixo custo –, até o processamento digital das imagens, extração e exibição de dados para o produtor.” • PESQUISA FAPESP 123
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TECNOLOGIA
DESENHO INDUSTRIAL
Sonho de consumo
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ma lavadora de roupas leve, pequena e barata, que pode ser transportada no porta-malas de um carro, é o sonho de muitos consumidores. Se, além de portátil, ela puder ser encaixada na parede ou no teto e funcionar como uma secadora, melhor ainda. Essa é a proposta de uma minilavadora de roupas que está em fase final de desenvolvimento pelos designers Marcelo Monteiro e Ricardo Mondella, da empresa Santos Dumont, e tem como principais inovações a criação de um motor elétrico com formato anelar e um controle remoto. O projeto da minilavadora, financiado pelo Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (Pipe), da FAPESP, teve início em maio de 2004 como desdobramento de um projeto chamado Duplo Sentido, que previa a criação de uma lavadora com um cesto de lavagem esférico para girar simultaneamente no sentido vertical e horizontal com o auxílio do novo motor. O Duplo Sentido foi realizado entre 1998 e 2003, patrocinado em parte pela empresa Multibrás, fabricante de eletrodomésticos que engloba as marcas Brastemp e Cônsul. “O fato de o cesto rodar em duplo sentido aumenta o atrito entre a água e a roupa, acelerando o processo de lavagem com conseqüente redução do consumo de água e energia”, diz Monteiro, formado em desenho industrial na Fundação Armando Álvares Penteado (Faap). A empresa bancou a construção do primeiro protótipo e a manutenção das patentes internacionais da lavadora esférica. Cesto esférico - Para colocar em prática as inovações sugeridas para a lavadora, várias soluções foram criadas durante a construção do protótipo. Uma das questões levantadas durante o processo era como fazer um cesto esférico girar em 76
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Minilavadora de roupas pode ser transportada no carro e pendurada no teto ou na parede
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IMAGENS SANTOS DUMONT
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Motor elétrico com formato anelar é a principal inovação da minilavadora
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duplo sentido, ou seja, em torno de dois eixos simultaneamente sem o auxílio de engrenagens. Para resolver isso, surgiu a idéia de incorporar o novo motor diretamente na superfície do tanque e do cesto de roupas. O conceito do motor elétrico anelar está baseado em um rotor, mecanismo giratório em forma de anel composto por ímãs permanentes. Para garantir a vedação contra água e o isolamento da corrente elétrica, previu-se o encapsulamento ou a injeção das partes do motor, durante o processo de fabricação. Encerrada a primeira fase de desenvolvimento, Monteiro decidiu dar continuidade ao projeto. À idéia original do motor anelar foram acrescidas outras inovações, como um chip para ativar o produto apenas no ato da venda, que funciona como um instrumento para impedir o roubo de cargas, além de permitir ao fabricante mapear a compra e a venda do produto, e um controle remoto com timer, que pode ser conectado ou desconectado da lavadora. 78
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m único controle remoto, um dos componentes mais caros do novo produto, pode ser usado em duas lavadoras. Ter duas máquinas facilita a vida das pessoas que não gostam ou não podem misturar peças de vestuário, como os profissionais da saúde que lavam separadamente roupas do trabalho. Outra novidade é a possibilidade de a lavadora ter um duplo papel e funcionar também como uma secadora de roupas. Para que isso ocorra, basta acoplar ao final do ciclo de lavagem um acessório parecido O PROJETO Minilavadora de roupas MODALIDADE
Programa Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (Pipe) COORDENADOR
MARCELO MONTEIRO — Santos Dumont Criação e Design INVESTIMENTO
R$ 219.691,00
com um cartucho de impressora que possui uma resistência e uma ventoinha responsável pela injeção de ar quente no tanque. Produtos para a higiene de roupas, como sabão, amaciante e alvejante, também podem ser fabricados em forma de cartuchos ou cápsulas com medidas adequadas para uma boa lavagem. Dessa forma, o consumidor poderá recarregar o produto na quantidade desejada. Por enquanto, ainda não há previsão de quando a minilavadora estará no mercado, mas negociações nesse sentido já estão sendo feitas com algumas empresas do setor. Menor consumo - A minilavadora foi
concebida inicialmente para comportar 3,5 quilos de roupas. Mas pode ser adaptada para lavar até 8 quilos. “O conceito é o mesmo, não importa o tamanho”, diz Monteiro. A escolha da míni ocorreu por uma questão mercadológica. Nas grandes cidades brasileiras e no exterior é cada vez maior o número de pessoas que residem sozinhas em moradias cada vez menores. Portanto, um mercado potencial para uma lavadora de pequenas dimensões que reduz em 40% o peso, o tamanho e o
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Almofada nos pés funciona como recipiente para água e o controle remoto (à esquerda)
volume das atuais lavadoras e consome menos água e energia. As lavadoras convencionais de 5 quilos consomem em média 230 litros de água no processo de lavagem. Com a míni, esse consumo é reduzido em cerca de 30%. “Uma das grandes vantagens do projeto diz respeito à simplicidade construtiva proporcionada pelo novo conceito de motor elétrico anelar”, diz Monteiro. Com isso quase todos os componentes mecânicos necessários para a movimentação do cesto são eliminados, como correias, polias e transmissões, tornando a assistência técnica
extremamente simples e o produto 90% reciclável. A concepção do motor também elimina o eixo com aletas utilizado nas lavadoras convencionais, que muitas vezes agride as roupas diminuindo a vida útil dos tecidos. Em função do peso da míni, cerca de 9 quilos no total, foi criado um novo conceito de suspensão para a lavadora, parecido com uma almofada, que poderá desempenhar simultaneamente a função das molas, do contrapeso e dos pés. A almofada, concebida para ser inflável e confeccionada em materiais como polímero ou borracha, poderá servir ainda como um recipiente da água ao final da lavagem. A água passa por um filtro na almofada, onde permanece até ser reutilizada. Formas variadas - A pequena quantidade de componentes mecânicos simplifica a fabricação e reduz consideravelmente o custo final do produto em cerca de 30% a 35%. Com isso, o preço para o consumidor cairia bastante e ficaria próximo do preço de venda das lavadoras semi-automáticas, os populares tanquinhos. No Brasil, o mercado de lavadoras semi-automáticas é quase
duas vezes maior que o mercado de automáticas, em torno de 1,1 milhão de máquinas por ano. Esse é um dos nichos de mercado de interesse para a minilavadora, que pode ser fabricada tanto em formato cilíndrico como esférico. “Depende da opção do fabricante”, diz Monteiro. “Uma das vantagens do projeto é possibilitar uma grande variação de formas, cores e materiais.” O projeto envolve não só um novo conceito de fabricação como também de comercialização. Um dos modelos de negócios propostos é aproximar as duas pontas da cadeia produtiva. “O varejo, se desejar, não precisa comprar, transportar e armazenar o produto, ele simplesmente simula a venda e comunica ao fabricante que fatura e entrega diretamente na casa do consumidor”, diz o pesquisador. Essa relação é possível por conta da simplicidade de construção do produto. O conjunto de inovações técnicas e conceituais da míni estende-se às lavadoras e secadoras convencionais para 4, 5 e 6 quilos e a vários outros eletrodomésticos, aumentando o potencial comercial do produto, inclusive no que se refere ao mercado externo. Por isso elas já se encontram protegidas por patentes nacionais e internacionais nos Estados Unidos, Europa, Japão, Canadá, México, China, Índia. As inovações relacionadas ao projeto vão mais além e englobam a possibilidade de criar uma bolsa eletrônica de valores para produtos industrializados, em que seriam comercializadas e trocadas ações de produtos e não mais de uma empresa. “Essas ações poderiam estar vinculadas diretamente à compra do produto ou estar à disposição antes do lançamento, possibilitando assim às empresas captar recursos para o seu desenvolvimento”, diz Monteiro. Uma nova patente internacional já está a caminho para garantir negociações futuras nas bolsas de valores. •
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TECNOLOGIA
MICROELETRÔNICA
Película produzida com composto cerâmico evita perdas de energia elétrica
Trilha supercondutora M ARCOS
DE
O LIVEIRA
A
evolução dos circuitos eletrônicos cobre,por exemplo,que funciona em temperatura não pára de crescer com o objetivo ambiente,a colisão de elétrons provoca perda de enerde disponibilizar mais rapidez de gia em forma de calor. processamento,avançar na miniaA tecnologia supercondutora já é usada em bobiturização e permitir maior capa- nas de motores de alto desempenho,baterias ou acucidade de armazenamento a cente- muladores de energia,conectores eletrônicos e em nas de tipos de equipamento,de equipamentos de ressonância magnética.Nesses casos, computadores a celulares e televi- utilizam-se fios de material supercondutor envoltos sores.Um dos caminhos dessa evolução é o uso de em nitrogênio líquido que mantém a temperatura baimateriais supercondutores na elaboração desses apa- xa.A expectativa é que materiais supercondutores tamrelhos,como mostra um projeto elaborado pelo Grubém possam ser usados comercialmente para que trens po de Vidros e Cerâmicas do Departamento de Física possam levitar sobre os trilhos (com a adoção de podee Química da Faculdade de Engenharia da Universi- rosos campos magnéticos criados com eletromagnetos dade Estadual Paulista (Unesp),na cidade de Ilha Sol- supercondutores),além de substituir cabos ou sistemas teira,no oeste paulista.Coordenado pelo professor elétricos que evitam a perda de energia elétrica. Cláudio Luiz Carvalho,o grupo produziu um circuiOs pesquisadores da Unesp desenvolveram um to impresso com material supercondutor no lugar das circuito eletrônico formado por um composto cerâtrilhas de cobre que servem para interligar os diversos mico que funciona à temperatura de 80 Kelvin (K), componentes de uma placa eletrônica,como transisigual a 193°Celsius (C) negativos.“O desafio maior tores e capacitores,responsável pelo funcionamento dos grupos de pesquisa em todo o mundo é aumende um computador,por exemplo. tar a temperatura de operação A supercondutividade é a cados materiais supercondutoO PROJETO pacidade que certos materiais, res”, diz Carvalho.Atualmente, metais ou cerâmicas,têm em conos cabos supercondutores coDispositivos supercondutores: duzir eletricidade em temperatumerciais trabalham em 77 K ou preparação e caracterização ras extremamente baixas sem -196°C.Experimentalmente já apresentar resistência ou perdas se atingiu materiais que trabaMODALIDADE na condução da corrente elétrica. lham com 136K (-137°C). Linha Regular de Auxílio à “No material supercondutor os “Nosso maior sucesso foi Pesquisa elétrons caminham livremente, fazer filmes (películas) finos COORDENADOR sem colidirem,de forma muito que podem ser utilizados na CLÁUDIO LUIZ CARVALHO — Unesp mais ordenada que um fio de cofabricação de circuitos eletrôbre comum”,explica Carvalho, nicos com uma técnica que foi INVESTIMENTO que conta no grupo com a particiaprimorada por nós”,diz CarR$ 107.863,26 e US$ 17.775,00 pação dos mestrandos Raphael valho.“Essa técnica de deposi(FAPESP) Otávio Peruzzi e Rudi Solano.No ção de filme chamada de dip80
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Nas placas eletrônicas, trilhas supercondutoras vão permitir melhor fluxo de elétrons
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coating (um método químico com uso de soluções) é muito mais barata que outras usadas por algumas indústrias, como a Molecular Beam Epitaxy, ou crescimento com camadas moleculares (um método físico de deposição de moléculas até compor a película). Fazemos aqui todo o processo de obter filmes finos supercondutores a 80K, mas esperamos alcançar em breve os 100K (-173°C).” No Japão, os filmes finos supercondutores já estão sendo usados na construção de supercomputadores muito mais velozes que os atuais, mas lá eles usam materiais e equipamentos muito mais caros. O material desenvolvido em Ilha Solteira é uma cerâmica produzida com seis elementos químicos: Bismuto (Bi), Estrôncio (Sr), Cálcio (Ca), Cobre (Cu), Oxigênio (O) e Chumbo (Pb). Esse composto é chamado de óxido supercondutor. Em vez de cabos ou equipamentos, a equipe de Carvalho planeja fazer filmes bem finos com esse material e usá-los como material supercondutor em circuitos eletrônicos. “Agora estamos no caminho para desenvolver um dispositivo para ser usado em um chip.” Para avançar nas pesquisas, os pesquisadores querem formar parcerias com empresas que pudessem industrializar no futuro esses dispositivos. O trabalho dos pesquisadores da Unesp foi apresentado em abril no congresso da Materials Research Society (MRS), ou Sociedade de Pesquisa de Materiais, na cidade de São Francisco, nos Estados Unidos, que contou com participantes de todo o mundo.“Muitos pesquisadores nos procuraram, principalmente de países que estão investindo bastante em tecnologia supercondutora, como China e Coréia. Recebemos propostas para visitá-los e desenvolver ou ensinar a técnica que estamos usando”, conta Carvalho. • PESQUISA FAPESP 123
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TECNOLOGIA
NOVOS MATERIAIS
Disco rígido flexível Cerâmicas à base de manganês podem se tornar condutoras de eletricidade e melhorar o funcionamento dos computadores F RANCISCO B ICUD O
FOTOS EDUARDO CESAR
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resce dia a dia a capacidade de armazenamento de informações nos discos rígidos, que constituem um dos tipos de memória do computador. É o resultado do desenvolvimento de novos materiais, usados nos dispositivos chamados cabeças de leitura, que trazem da memória os textos e imagens. As cabeças de leitura dos discos rígidos fundamentam-se em um princípio físico que poderá soar com pouca simpatia para quem entende muito pouco das entranhas dos computadores: é a chamada magnetorresistência – a variação da resistência elétrica de um material submetido a um campo magnético. Esse processo de recuperação de informações é usado também em sensores magnéticos que controlam freios e embreagens de automóveis, em detetores de minas terrestres e em aparelhos de marca-passos. Mas, para que possam caber ainda mais informações no mesmo espaço, com base nesse mesmo princípio, um grupo de físicos da Universidade de São Paulo tem chegado a resultados que alimentam a perspectiva de uma família de cerâmicas conhecidas como manganitas substituir outros dispositivos fundamentais do computador, que diminuem a resistência à passagem da eletricidade e assim ampliam a precisão e velocidade de leitura de dados: são as multicamadas magnéticas, adotadas nos computadores a partir das descobertas por um físico da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Mario Norberto Baibich.
Baibich identificou em 1988 o potencial de multicamadas magnéticas ao utilizar 40 minúsculas placas empilhadas de ferro, um material magnético, e de cromo, não-magnético. Ele percebeu então que o material escolhido e a distribuição em paralelo e alternada das camadas, submetidas a um campo magnético, reduziam em até 100% a resistência às correntes elétricas – a redução conseguida até então não chegava a 5%. Esse efeito, considerado fantástico para a época, ficou conhecido como magnetorresistência gigante e fez escola. “A magnetorresistência gigante possibilitou a construção de sensores magnéticos de tamanhos bastante reduzidos, com maior capacidade de leitura e sensibilidade”, afirma Baibich, cujo artigo comunicando esses resultados, publicado em novembro de 1988, ainda é um dos mais citados da Physical Review Letters. “Foi a partir de então que a indústria de informática começou a produzir os discos rígidos que atualmente encontramos em nossos computadores.” As manganitas podem ir além do que Baibich descobriu.“Há situações em que a variação da resistência elétrica das manganitas à aplicação de um campo magnético é muito maior que as observadas em multicamadas magnéticas, o que permitiria acelerar o processo de leitura e transmissão de informações no mesmo espaço físico”, comenta Renato de Figueiredo Jardim, professor do Instituto de Física. “Teríamos uma leitura mais rápida, com maior sensibilidade e precisão.” Os estudos coordenados por Jardim, que correm em paralelo aos desenvolvidos pelas equipes das universidades de Tóquio, no Japão, e da Califórnia, nos Estados Unidos, revelaram novas propriedades desse PESQUISA FAPESP 123
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Cabeça de leitura de discos rígidos atuais: manganitas serão mais rápidas
material que contribuem para a explicação de como uma cerâmica normalmente isolante se transforma a ponto de conduzir eletricidade tão bem quanto algumas ligas metálicas. Já mostraram, por exemplo, que é de forma contínua e gradual, sem sofrer alterações bruscas, que as manganitas adquirem suas propriedades mais notáveis, deixando de ser um material isolante para se tornar condutor de eletricidade e transformando-se de um material não-magnético para começar a se comportar como um ímã. Conhecer a natureza dessas transformações, que os físicos chamam de transições de fase, é essencial para utilizar esse material. Formadas majoritariamente por manganês, ao qual se acrescenta o oxigênio, um elemento químico da família dos lantanídeos, em especial o lantânio, e outro do grupo dos alcalinos terrosos, como cálcio ou bário, as manganitas não são boas condutoras de eletricidade a temperatura ambiente. Para que se tornem condutoras, é preciso substituir parcialmente o lantânio
por cálcio e submeter o material a temperaturas bastante baixas, da ordem de 120 graus Celsius negativos. “Nessa temperatura”, observa Jardim, “as manganitas perdem suas propriedades de material isolante e se transformam em compostos com características metálicas, bons condutores elétricos”. Submetidas a essa temperatura, elas se tornam também um material ferromagnético, dotado de propriedades magnéticas similares às de um ímã.
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m um material que se comporta como ímã, os elétrons se alinham, girando em torno do próprio eixo sempre na mesma direção e sentido – uma propriedade magnética das partículas atômicas conhecida como spin. Nessas condições, a aplicação de um campo magnético cria uma enorme variação da resistência elétrica, que constitui um tipo de magnetorresistência – não a gigante, como a descoberta por Baibich, mas ainda maior, chamada de colossal, identificada nas manganitas em 1993 por físicos alemães.“Com o alinhamen-
to de spins, surge um caminho preferencial, pelo qual a corrente elétrica pode transitar sem muitos obstáculos”, diz Fábio Coral Fonseca, físico do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen) que também faz parte da pesquisa. Como resultado, dependendo do campo magnético aplicado e da temperatura, a resistência à passagem da corrente elétrica pode cair até 10.000%. Jardim e seu aluno de doutorado José Antonio Souza, com físicos da Universidade de Montana, Estados Unidos, demonstraram em um artigo publicado em maio de 2005 na Physical Review Letters que essa transformação, chamada de transição de fase de segunda ordem, ocorre de forma contínua e gradual, sem que a cerâmica passe por alterações bruscas. “A transição de fase contínua era aceita apenas para algumas famílias de manganitas, mas a verificamos em muitas delas, independentemente dos elementos que a compõem”, comenta Jardim. Em conseqüência, algumas propriedades dessa cerâmica, como a transição de fase de isolante para metal e de um material não-magnético para magnético, devem ser revistas.
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Em outro estudo, publicado na Physical Review B, Jardim e Souza demonstraram outro detalhe importante: o efeito de magnetorresistência pode ser muito amplificado quando o lantânio é substituído parcialmente pelo ítrio, aumentando o potencial de uso tecnológico das manganitas. Essa substituição de um elemento químico por outro resulta, na verdade, em um material novo, com propriedades distintas. Seria um híbrido, constituído por pequenas ilhas de material magnético, embebidas em uma matriz de material isolante, e dotado de características metálicas. Outra descoberta diz respeito aos estímulos que podem ser usados para que as manganitas passem por essas transformações – de isolante para condutor e de não-metálico para metálico. Em um artigo de janeiro deste ano também na Physical Review B, Jardim, Fonseca e o doutorando Alessandro de Souza Carneiro observaram que grandes variações na resistência elétrica das manganitas podem ser obtidas não apenas na presença de um campo magnético mas também com a aplicação de corrente elétrica através do material.
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Quando as manganitas estão em seu estágio inicial isolante, a corrente elétrica encontra dificuldades para percorrer o material, mas procura caminhos alternativos, que ofereçam menos resistência. Mas, nessas condições, pode também se dar uma transição do estágio condutor para isolante. Caso as aplicações se concretizem, as manganitas representarão um terceiro estágio na história recente dos sensores e leitores magnéticos. O primeiro foi o chamado sistema indutivo e o segunO PROJETO Estudo de fenômenos Intergranulares em óxidos cerâmicos MODALIDADE
Projeto Temático COORDENADOR
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do, o sistema magnetorresistivo, com base nas multicamadas magnéticas. As multicamadas substituíram o sistema anterior, o indutivo, constituído por uma bobina feita de fio fino de cobre, que detecta o campo magnético gravado gerando uma corrente. A leitura dessa corrente é que permite, por sua vez, a leitura dos campos magnéticos gravados. Como essa bobina é muito pouco sensível, o campo magnético que a aciona deve ser muito intenso. “Para cumprir essa exigência”, diz Baibich, “o conjunto sensor, composto de bobina de gravação e bobina de detecção, também precisa ser muito grande e não pode ser alojado em espaços tão apertados como o interior de um disco rígido”. Apesar das limitações, o sistema indutivo ainda é usado em cartões magnéticos como os de banco e em fitas magnéticas para gravadores.“Depois da revolução que as multicamadas magnéticas promoveram na informática”, comenta Jardim, “se conseguirmos utilizar o potencial das manganitas e da magnetorresistência gigante poderemos construir uma nova geração de dispositivos para computadores”. • PESQUISA FAPESP 123
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Espectros da ditadura militar
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azia tempo que, num mês de março, o Exército brasileiro não ocupava o noticiário com tanto destaque. Foi em 31 de março de 1964 que teve início o movimento golpista que derrubaria o presidente João Goulart dois dias depois. Em 15 de março de 1985 os militares devolveram o poder a um presidente civil, José Sarney. Este ano, no mesmo mês de março, dois episódios envolvendo militares colocaram o Exército na mídia de modo desconfortável. No dia 1º, o comandante do Exército, Francisco Albuquerque, recorreu ao velho jeitinho da “carteirada” para, segundo a Infraero, exigir que um avião da TAM retornasse da pista de decolagem. Em seguida, a companhia teve de convencer dois passageiros a ceder seus lugares para o oficial e sua mulher. Dias depois, o Exército surpreendeu a todos com a invasão das favelas cariocas em busca de armas roubadas. O mesmo general se envolveu, no ano passado, num episódio polêmico, quando o então ministro da Defesa, José Viegas, renunciou depois da leitura, por Albuquerque, de uma ordem do dia com elogios à ditadura militar, após a divulgação de supostas fotos do corpo do jornalista Vladimir Herzog, morto sob tortura em 1975. O conteúdo da mensagem fora escrito por pessoas ligadas a Albuquerque. Enquanto os militares agiam nos
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Episódios recentes obrigam acadêmicos a repensar o papel dos militares
morros, a Comissão de Ética Pública da Presidência da República tratou de colocar panos quentes na história do embarque. Embora tenha deduzido que o comandante obteve “tratamento privilegiado”, a conclusão foi que ele não havia faltado com a ética. Recomendou-se apenas que autoridades tivessem “mais cuidado” ao tratar de sua vida privada. Para os mais temerosos, os dois fatos aparentemente traziam de volta uma questão recorrente: o medo de uma nova investida da caserna causado pelo trauma da ditadura militar. Como se, mesmo passados 21 anos, esse espectro continuasse a rondar o país. Um temor que quase sempre leva a complacências dos civis de um lado e a prepotências de alguns fardados de outro. A democracia brasileira vive de sobressaltos provocados por fantasmas de um período que não deixou saudades para a maioria. De vez em quando, a publicação de um livro, a revelação de algum detalhe
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ou a manifestação pública de algum militar de alta patente é suficiente para acender a luz vermelha de uma volta da farda ao poder. Questões se tornam inevitáveis: existe risco de alguma movimentação golpista nos quartéis? Noutro aspecto, menos temerário, qual é o pensamento militar brasileiro hoje e suas prioridades? Ao mesmo tempo, nota-se que o tema tem sido cada vez mais estudado na universidade e novos livros iluminam momentos de tensão, como a versão do general Sylvio Frota para um dos mais turbulentos episódios da ditadura, durante o governo Geisel, numa biografia que acaba de chegar às livrarias pela Jorge Zahar Editora. O volume foi organizado pelos professores Maria Celina D’Araújo e Celso Castro, da Fundação Getúlio Vargas, que há mais de 15 anos registram a memória militar a partir de depoimentos e documentos de oficiais de alta patente.
Castro tranqüiliza os temerosos. Assim como outros especialistas consultados, ele acredita que os episódios recentes são eventos isolados e que não existem indícios de nada semelhante a um desejo dos militares de retornarem ao poder. Mestre e doutor em antropologia, ele afirma que a visão das Forças Armadas quanto ao poder nas duas últimas décadas está adaptada ao regime democrático. Por um lado, explica, deve-se observar que, ao contrário do que ocorreu em países vizinhos do Cone Sul, os militares brasileiros não foram punidos por atos cometidos durante o a ditadura. Por outro lado, aceitaram os governos civis democraticamente constituídos e o país passou por eventos como o impeachment, o funcionamento da Comissão dos Desaparecidos e a eleição de um presidente de esquerda sem nenhuma turbulência institucional na área militar. Dentro de uma perspectiva histórica de mais longo prazo, porém, Castro obILUSTRAÇÕES HÉLIO DE ALMEIDA
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serva que nada impede que, em cenários de grave crise social ou institucional, voltem a ressurgir apelos messiânicos em relação a uma intervenção militar na política. Não há, ao menos no horizonte visível, essa ameaça, destaca. Para ele, a geração do regime militar já está “de pijama”, como se diz na caserna.“As novas gerações de oficiais têm um distanciamento emocional muito maior em relação a esse período. Com isso, eventos outrora sensíveis passam a ser vistos cada vez mais como históricos.” Assim, as maiores preocupações dos militares da ativa, acrescenta Castro, têm sido com questões como melhores salários e orçamentos, que permitam aprimorar o quadro material muito precário no qual as Forças Armadas brasileiras se encontram e que as tornem aptas a cumprir minimamente suas missões básicas. Os militares procuram também preservar sua identidade institucional e simbólica como elemento importante da constituição da nacionalidade brasileira. Tanto que o governo Lula foi bem aceito e não houve nenhuma turbulência militar a esse respeito.“O impacto negativo do regime militar sobre a instituição foi muito sentido pelos próprios militares, e isso funcionou e ainda funciona como um antídoto preventivo contra qualquer idéia intervencionista.” Presidente do Grupo de Pesquisa Forças Armadas e Política, do Departa88
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mento de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), João Roberto Martins Filho avalia que as Forças Armadas sabem que não há clima para intervenções e têm consciência de que o desempenho do poder político tem alto custo para a corporação militar. Martins Filho ressalta, entretanto, que o problema principal hoje é a falta de disposição da sociedade e da classe política em discutir a temática militar no país. A questão central, na sua avaliação, é responder o que o país quer de suas Forças Armadas. “Que recursos elas necessitam para desempenhar suas missões? Quais são as prioridades de defesa do país?”, questiona. Como não há discussão substantiva sobre o tema, os incidentes isolados tomam o lugar do problema principal. O historiador Roberto Baptista Junior considera o episódio do general tema para reflexão. Em outros tempos, mesmo no período democrático (1945-64), o chefe do Exército jamais teria sua autoridade questionada. Nem ele seria denunciado. “O fato de o funcionário da Infraero ter em depoimento contradito as informações do general, somado à vaia que este tomou ao entrar no avião, mostra que os cidadãos exercem plenamente seus direitos e os militares não mais são sujeitos aterrorizantes.” O pesquisador acaba de defender a tese de
doutorado Anti-sovietismo: reflexos e práticas compartilhadas de repressão no sistema interamericano na Unicamp, com bolsa da FAPESP.
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ua pesquisa discute a formulação de políticas compartilhadas e dissociadas entre os governos da América Latina – em especial do Brasil – e dos Estados Unidos, a partir da influência da União Soviética antes do golpe de 1964. Isso permite a ele fazer uma interpretação diferenciada do período que antecedeu o movimento armado contra Goulart e a paranóia que sempre ronda o poder quanto à volta da ditadura desde 1985. Na prática, diz, a não resolução dos problemas de corrupção que dominam o noticiário hoje pode acarretar a curto, médio e longo prazos o fortalecimento de um discurso autoritário moralizante – ou em nome da moral. “Discurso autoritário, em nome da moral, que pode vir da esquerda ou da direita ou de ambos via bandeira nacionalista. Mesmo assim, acho muito difícil os militares se aventurarem novamente.” Além disso, diz, as Forças Armadas atualmente estão devidamente subordinadas ao poder civil e tentam construir um perfil baseado no profissionalismo. Os líderes militares transitam muito pouco na política nacional. Na sua opi-
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nião, diferentemente de antes de 1964, o país está mais maduro politicamente. A única preocupação é que um período classificado como decadente sempre pavimenta o retorno de discursos autoritários moralizantes.“Antes, para os norte-americanos, Goulart deveria ser tirado do poder por causa de sua falta de compromisso, e não porque era de esquerda. No regime atual, os investimentos estrangeiros no país vão muito bem e estão devidamente protegidos pelo governo.” O professor Durbens Martins Nascimento não pensa diferente. Ele é um dos que articulam a criação, em breve, do Laboratório de Estudos de Defesa da Amazônia (Laed), espaço acadêmicoinstitucional de suporte às atividades de ensino, pesquisa e extensão da graduação e pós-graduação da UFPA na área de Concentração em Defesa Nacional. Com mestrado (guerrilha do Araguaia) e doutorado (programa Calha Norte) sobre o regime militar, Martins Nascimento acredita que as condições políticas emergidas com o fim da Guerra Fria, o fortalecimento das instituições e um quadro de relativa estabilidade política na América do Sul não encorajam iniciativas de intervenção. Entretanto, as tendências que se apresentam quanto às incertezas de um cenário conturbado em algumas regiões do globo e o aparecimento de novas ameaças, como contrabando, terroris-
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mo, narcotráfico e biopirataria, colocam, concretamente, a hipótese do acompanhamento permanente das Forças Armadas brasileiras em relação a seus objetivos e função na sociedade. A rigor, essa valorização de princípios constitucionais não é diferente nos demais países que formam a comunidade internacional. A brecha para isso, observa ele, está na própria Constituição brasileira, quando estabelece a possibilidade da defesa das instituições. “Mas isso independeria de quem tomasse a iniciativa, se os militares da reserva ou da ativa.” Painel - O pesquisador defende que
se desenvolvam estudos para se saber atualmente como anda esse movimento no sentido de aferir em que medida está se dando essa influência política. “Sobretudo no que se refere à dimensionalidade política, tanto dos militares da ativa quanto dos da reserva.”A partir das falas desses atores, prossegue, será possível traçar um painel acerca do peso dos diversos segmentos militares no andamento da crise política atual. “Evidentemente que em circunstâncias especiais nas quais há uma radicalização do processo político as Forças Armadas se colocam como alternativa de solução para impasses institucionais. Porém para que se efetivem as pretensões desses setores é necessária a ocorrência de várias motivações as quais necessitam estar conectadas com interesses econô-
micos, financeiros e políticos de segmentos civis desejosos da saída militar, o que acho fora de propósito.” A discussão sobre o papel das Forças Armadas remete a um ponto polêmico: a defesa das fronteiras brasileiras na Amazônia. Em Amazônia e defesa nacional, que acaba de ser lançado pela Editora FGV, Celso Castro apresenta um quadro sobre o que tem sido produzido na área de ciências sociais e história relacionado ao assunto. Ele escreve que, para o Exército em particular, a Amazônia tem ocupado cada vez mais uma posição central em termos estratégicos e simbólicos. A soberania brasileira sobre a região é vista pelos militares como o elemento central de seu papel. Noutro aspecto, em geral, vêem com suspeita a atuação dos movimentos ambientalistas naquela área. “A falta de informações de qualidade e uma maior interação com instituições acadêmicas civis tendem a dar uma dimensão distorcida do problema. Novamente, é preciso que a questão deixe de ser militar e se torne efetivamente nacional.” Martins Filho acrescenta que a “imensa” preocupação das Forças Armadas com a defesa da Amazônia se expressa na importância do projeto Sivam e na criação de uma doutrina terrestre de resistência a uma eventual invasão daquela área do país.“O problema é que as visões militares sobre a região não foram discutidas pela sociedade brasileira.” • PESQUISA FAPESP 123
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ANTROPOLOGIA
A batalha dos vegetais Religiões da ayahuasca podem indicar caminho para uma boa guerra contra as drogas
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eorge W. Bush pode se gabar de ser o homem mais poderoso do globo, um “guerreiro” invencível, mas perdeu, e feio, a “batalha dos vegetais”. Por decisão unânime, a Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu, em fevereiro, que o presidente não pode impedir a filial ianque da União do Vegetal (UDV) de usar, em seus rituais religiosos, o chá de ayahuasca (ou huasca ou santo-daime), visto pelo presidente norte-americano como “um alucinógeno que altera o funcionamento da mente e causa danos irreparáveis nos esforços de combate ao tráfico de narcóticos transnacional”. No mês passado, os cultos ayahuasqueiros conseguiram outra vitória: durante o Seminário Ayahuasca, promovido pelo Conselho Nacional Antidrogas, o Conad, foi apresentado um relatório recente da ONU que exclui o DMT, princípio ativo do chá, da lista de psicoativos proibidos pelo Tratado Internacional de Drogas, de 1971. Mais: em 2007, o Brasil está convidado para apresentar na sede
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da organização, em Nova York, a sua forma de trabalhar com a ayahuasca. “O aparecimento de religiões que fazem do uso de uma substância psicoativa o ponto central de seus conjuntos rituais traz à tona novos modos de pensar e de tratar a questão do consumo de substâncias alteradoras da percepção no mundo moderno, sobretudo daquelas classificadas como drogas ilícitas”, avalia a antropóloga Sandra Lucia Goulart, pesquisadora do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre Psicoativos (Neip) e autora da tese de doutorado Contrastes e continuidades em uma tradição amazônica: as religiões da ayahuasca, defendida na Unicamp. Ayahuasca é o termo quíchua (significando algo como cipó dos mortos ou dos espíritos) dado à bebida preparada com a infusão de um cipó e as folhas de um arbusto. Seu uso por índios sul-americanos da região amazônica é pré-colombiano e age diretamente nos neurorreceptores, provocando uma sensação descrita pelo cantor Sting como “conseguir falar com Deus, uma das experiências mais extraordinárias de minha vida”. O poeta beat Allen Ginsberg chegou a ir até Lima, no Peru, para provar a bebida, aconselhado pelo amigo
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junkie William Burroughs. “Senti-me como o filho do Senhor, como se eu mesmo fosse o Senhor que tivesse voltado para casa e aberto os portões do paraíso ancestral”, escreveu. O que Bush chama de droga os pesquisadores, tão entusiasmados como Ginsberg, preferiram batizar de “plantas de poder” ou “enteógenos”, deixando claro, no uso da palavra grega theo (deus), que reconheciam o papel que muitas sociedades e religiões deram e dão ao preparado: uma forma de facilitar a comunicação entre as esferas humana e divina, uma experiência transcendental, curativa, que remete diretamente às culturas xamânicas.
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inda que exista uma tradição de consumo da ayahuasca em vários países da América do Sul, apenas no Brasil se desenvolveram religiões de populações não-indígenas que usam esta bebida. Religiões que usam esta beberagem reelaborando antigas tradições dos sistemas locais a partir de uma leitura influenciada pelo cristianismo”, observa a antropóloga da Unicamp Beatriz Labate. Foi com o ciclo da borracha, que atraiu grandes ondas migratórias para a Amazônia, que “brancos” entraram em contato com as práticas terapêuticas e as crenças religiosas dos nativos, baseadas no uso da ayahuasca. Iniciado no uso da bebida por um mestiço peruano, o seringueiro maranhense Raimundo Irineu começou o seu movimento, apelidado de Santo Daime (já que, nas rezas, sempre se pede alguma coisa), em 1930, em Rio Branco, capital do então território do Acre. Mestre Irineu, como ficou conhecido, reuniu em torno de si a camada mais pobre da região e exerceu sobre eles uma influência positiva e de segurança. “Os rituais que ele presidia estavam dentro do espectro da tradição xamânica do uso de enteógenos, que eram utilizados não de forma recreacional, mas para estabelecer contato com o sagrado. Mais do que uma válvula de escape da miséria cotidiana, o daime era uma forma de evocar e validar valores culturais”, explica o antropólogo da Universidade Federal da Bahia Edward MacRae. “De início, a nova religião aju92
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dava migrantes da floresta a se adaptar ao novo ambiente urbano incipiente e o uso da bebida se dava num contexto ritual, dentro de uma ética conservadora cujo objetivo mais importante era o desenvolvimento de comunidades em que o indivíduo podia se integrar com seu hábitat físico e social”, analisa o pesquisador. O daime, para Mestre Irineu, ligavase diretamente ao sacramento cristão, considerado como o sangue de Cristo. “O Santo Daime preserva o caráter sagrado de festa, dança e música, por meio dos hinos que os daimistas cantam no rito, do catolicismo popular. No seu panteão juntam-se santos católicos, figuras do universo afro-brasileiro e seres da natureza, como estrelas, o sol, a lua. Tudo misturado com doses de kardecismo, dentro de um espírito militar, de ordem e disciplina, que exige o uso de uniformes etc.”, conta Beatriz. Um discípulo de Irineu, o marinheiro Daniel,
fundou, em 1945, na mesma região, o seu próprio culto, também baseado no uso da ayahuasca e batizado de Barquinha, já que seus adeptos se consideram “marujos do mar sagrado”. Rica em imagética e ritualística, a religião igualmente usava santos católicos, mas tinha forte influência da umbanda, com uma ênfase na remoção de espíritos maus e na luta contra a bruxaria. A terceira das seitas ayahuasqueiras é a mais jovem e a mais despojada, voltada para a “concentração mental” e a “evolução espiritual”: a União do Vegetal (UDV), o Davi que venceu recentemente o Golias americano na Suprema Corte. Criada em fins dos anos 1950 por outro seringueiro nordestino (como Irineu e o marujo Daniel), Mestre Gabriel, a UDV, com
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seu processo seletivo rigoroso de membros, reuniu a classe média urbana em suas fileiras. De início restritas à região amazônica, as religiões ayahuasqueiras hoje estão em todo o Brasil e em 20 países do globo, com direito a dissidências, como o Alto Santo e o Cefluris, ambas nascidas do Santo Daime, após a morte de Mestre Irineu. O Cefluris tem a particularidade de associar, ao daime, o uso da cannabis, levada pelos hippies nos anos 1970 ao culto e associada à Virgem Maria. “Inovações” como estas foram responsáveis pela ruptura entre os vários cultos que, apesar de comungarem dos mesmos credos e ritos, pretendem se diferenciar uns dos outros pelo ataque a supostas “impurezas” que seus diferen-
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ciais teriam no preparo ou no uso, não ritualístico, da ayahuasca. “A delimitação de fronteiras entres estes grupos se dá a partir de um complexo jogo acusatório que se relaciona ao debate mais geral sobre o consumo de ‘drogas’ em nossa sociedade”, avalia Sandra Lucia. “Seja como for, o funcionamento ordenado dessas organizações religiosas ajuda a validar uma aproximação mais tolerante na questão da droga que vá além da mera ênfase nos aspectos farmacológicos do problema e leve em conta o ambiente social, físico e cultural onde se dá o uso dessas substâncias”, acredita MacRae, para quem os cultos da ayahuasca confirmam a eficiência do controle social na determinação das conseqüências do uso de drogas ilícitas. Para o pesquisador, o uso disciplinado da infusão pode ser uma alternativa à “atual política de combate às drogas, que, limitando-se a declará-las
ilícitas, não tem conseguido erradicá-las e nem mesmo reduzir seus usos psicologicamente e socialmente nocivos”. Observações de MacRae o fizeram perceber que esses movimentos conseguiram afastar muitos da bebida e das drogas de forma efetiva, embora usem substâncias psicoativas (cujo uso ritual é liberado no Brasil desde 1987). Dentro do ambiente ritual, com líderes controlando o acesso à infusão, bem como a quantidade a ser bebida, e provendo limites doutrinários na estruturação de suas vidas, acredita o pesquisador, as religiões da ayahuasca merecem um estudo mais aprofundado pelo seu potencial de ajudar a minorar o problema do uso descontrolado de drogas.
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Rituais - “Os cultos veiculam uma série de valores e regras de conduta que dotam o adepto com uma vida bastante estruturada ao colocá-lo em convivência com outros seguidores da doutrina e a prescrever-lhe toda uma sorte de comportamentos não só quando participam dos rituais, mas em todos os momentos da existência cotidiana”, analisa MacRae. “Muitas vezes, a distinção entre um uso ritual e religioso e um uso profano da ayahuasca é bastante recorrente e parece orientar boa parte das relações de contraste entre os vários grupos. Membros de um grupo acusavam um outro grupo de fazer uso inadequado da ayahuasca, ou seja, de consumi-la fora de um contexto plenamente sagrado. Assim, atualmente, o estigma de uso de droga ou ‘drogado’ é extremamente temido, ao mesmo tempo que é recusado por todos os grupos das religiões ayahuasqueiras”, lembra Sandra Lucia. Allen Ginsberg, em sua expedição de 1960 ao Peru, foi até Pucallpa para experimentar a infusão. Tomou com um brujo três doses caprichadas. Enquanto o curandeiro esperava, assobiando e batendo o pé, o beatnik viu-se num universo multidimensional observado por uma imensa serpente. “Ela, apesar disso, não era assustadora e oferecia uma resolução para a morte. A visão parecia me dizer que a morte, embora inevitável, não era tão terrível como eu imaginara. Morte, pensei, era a quebra de uma dimensão familiar.” Alívio ou terror? Seja como for, no dia seguinte, o poeta pegou, correndo, um avião de volta aos EUA. • PESQUISA FAPESP 123
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Resenha
Sempre aos domingos Uma vibrante — e pouco conhecida — experiência em divulgação científica N ELDSON M ARCOLIN
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m 1949 havia o espantoso número de 25 jornais diários na cidade do Rio de Janeiro – em 2006, são apenas 13.O Rio era habitado por 2,1 milhões de moradores,a maior população do país,que tinha um total de 48 milhões de pessoas.No ano anterior,um desses diários apareceu nas bancas com uma novidade:um suplemento tablóide de 12 páginas sobre ciência.Era 28 de março de 1948,um domingo.O suplemento tinha o nome de Ciência para Todos (CpT) e vinha encartado em A Manhã no último domingo de cada mês. Ao conhecer o suplemento,o editor da Ciência Hoje On-line,Bernardo Esteves,encontrou um belo tema de investigação para sua dissertação de mestrado sobre divulgação científica,apresentada na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Orientado por Ildeu de Castro Moreira,pesquisador da mesma universidade,e por Luisa Massarani, da Fundação Oswaldo Cruz,Esteves levou a termo em 2005 o trabalho agora publicado no livro Domingo é dia de ciência – história de um suplemento dos anos pós-guerra (Azougue Editorial). A iniciativa esclarece definitivamente que a divulgação de ciência e tecnologia no Brasil não começou apenas nos anos 1940 – com o jornalista e biólogo José Reis – nem passou a freqüentar a imprensa com regularidade e importância apenas nas últimas duas décadas.Mesmo no s éculo 19 havia periódicos que publicavam artigos sobre temas científicos e afins,embora de modo esparso.Esteves cita estudo do britânico Martin Bauer que comparou dados sobre como a ciência aparecia em jornais norte-americanos e ingleses ao longo de 170 anos. Ele mostrou que havia períodos em que o tema estava mais presente na imprensa seguido por fases de esquecimento.Para Bauer,isso se deve principalmente aos períodos de expansão e retração da atividade econômica e das inovações tecnológicas. No Brasil, conclui Esteves, não foi muito diferente. A experiência do CpT é ímpar. Não se tem notícia de um jornal brasileiro que,at é aquele momen-
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to,mantivesse um suplemento de ciência com tanto espaço (12 páginas) duBernardo Esteves rante tanto tempo (cinco anos) e publicado de forAzougue Editorial ma regular (mensal).Os 200 páginas tempos, naturalmente, ajuR$ 34,90 daram.Entre 1948 e 1953, período em que o CpT circulou,foram criados a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC),o atual Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e o Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF).Um m ês antes José Reis havia estreado sua coluna “O mundo da ciência” na Folha da Manhã, atual Folha de S.Paulo.E C ésar Lattes descobriu a partícula méson pi em colaboração com Giuseppe Occhialini e Cecil Powel um ano antes. Ao perceber o momento amplamente favorável à ciência,o ent ão diretor de A Manhã,Ernani Reis, irmão de José Reis,decidiu pela cria ção do CpT. Para desenvolver o projeto e dirigi-lo,convidou o sobrinho de ambos,Fernando de Sousa Reis,redator da seção diária “Nota científica” e auxiliar de ensino no Colégio Pedro II.Por sua vez,Fernando chamou para ajudá-lo professores interessados em divulgação científica:Oswaldo Frota-Pessoa,Roberto Peixoto,Newton Dias dos Santos e Fritz de Lauro,entre outros.Praticamente n ão havia jornalistas escrevendo para o CpT. Na época,vigorava no Brasil a idéia de que o cientista é o melhor divulgador de sua obra,embora na Europa e nos Estados Unidos já houvesse profissionais especializados em ciência que não eram pesquisadores. A estratégia dos professores/divulgadores foi bem descrita por Frota-Pessoa:“Éramos um grupo de jovens envolvidos entusiasticamente na melhoria do ensino,e nossa preocupa ção influenciava a maneira de apresentar os artigos.A forma ção que tivemos nos levou a ter esse tipo de psicologia:faz íamos no jornal como fazíamos nas classes”. O suplemento terminou praticamente junto com A Manhã,em 1953.A experi ência foi marcante para a época,mas parece ter sido esquecida com o tempo.Far á bem aos novos divulgadores da ciência – sejam jornalistas ou pesquisadores – conhecer essa história. Domingo é dia de ciência
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Livros
Estado e gestão pública: visões do Brasil contemporâneo Paulo Emílio Martins (org.) FGV Editora 340 páginas, R$ 28,00
Preocupados com a fragilidade das instituições brasileiras,no papel da democracia e na relação do Estado nacional com a sociedade civil,16 pesquisadores dão sua contribuição para o debate numa série de artigos que discutem o passado,o presente da administração Lula e o futuro. Entre os autores:Carlos Eduardo Martins,Enrique Saraiva,Frederico Lustosa,entre outros.
A paixão do negativo: Lacan e a dialética Vladimir Safatle Editora Unesp/FAPESP 336 páginas, R$ 40,00
Lacan foi um dos grandes e mais influentes militantes modernos do anti-hegelianismo,dentro do contexto de seu tempo de romper o pensamento francês com a noção moderna de sujeito,como preconizado por Hegel e em voga na França.Safatle mostra como ele usou o pensador alemão sem aceitar seu sistema filosófico. Editora Unesp (011) 3242-7171 www.editoraunesp.com.br
FGV Editora (021) 2559-5543 www.editora.fgv.br
A violência revolucionária em Hannah Arendt e Herbert Marcuse Maria Ribeiro do Valle Editora Unesp 192 páginas, R$ 38,00
Lidando com duas concepções filosóficas diversas,a de Arendt e Marcuse,a pesquisadora trabalha a questão do uso da violência e seu contraponto,o diálogo, como instrumentos de transformação radical da sociedade.Usa,para tanto,as formas de pensar dos dois filósofos sobre Marx e suas concepções políticas e a retomada das utopias anticapitalistas. Editora Unesp (011) 3242-7171 www.editoraunesp.com.br
História da literatura hispano-americana Bella Jozef Editora UFRJ/Francisco Alves Editora 420 páginas, R$ 42,00
Um clássico escrito pela professora emérita de literatura da Universidade Federal do Rio de Janeiro e que chega agora a sua quarta edição,mais do que justificada pela lacuna que preenche.Se sabemos tanto sobre um grupo restrito de autores hispano-americanos (como Borges,Sábato,Cortázar,Llosa,García Márquez,entre tantos outros),desconhecemos um número imenso de grandes criadores,desde os tempos coloniais até a modernidade.A edição é revista e ampliada. Editora UFRJ (021) 2542-7646 www.editora.ufrj.br
Reforma política: lições da história recente
Histórias de quadros e leitores
Gláucio Ary Dillon Soares (org.) FGV Editora 357 páginas, R$ 32,00
Marisa Lajolo (org.) Editora Moderna 108 páginas, R$ 23,00
Hoje poucos falam dela em termos concretos,mas a reforma política está na cabeça de todos os brasileiros como uma necessidade.Será? É o que se perguntam os especialistas em artigos reunidos nesse estudo sobre o formato das instituições políticas no país,se há necessidade de mudanças e os custos e benefícios dessa empreitada.
A professora da Unicamp Marisa Lajolo reuniu um time de primeira qualidade para mostrar que letras e idéias também podem ser expressas em outros veículos que não a literatura.Assim,autoridades nos seus campos (nas artes plásticas e nas letras),como Ana Maria Machado,Carlos Vogt,Ferreira Gullar,Lourenço Diaféria,Ignácio de Loyola Brandão,entre outros,revelam como contar histórias.
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enhoras e senhores,muito boa noite.É com grande satisfação que venho aqui falar das experiências cronológicas de Jakoo,um pequeno país localizado no oceano Pacífico,à altura do paralelo 30°sul.Trata-se de não mais que uma única ilha de cerca de 110 mil quilômetros quadrados.Acredito que poucos de vocês conheçam esta localidade ou seus habitantes.Lá não há aeroportos,e um único porto – este que vocês podem ver no slide – controla a entrada e a saída dos poucos estrangeiros que se aventuram por aquelas terras.Refiro-me apenas aos estrangeiros porque os jakooanos não costumam viajar para o exterior.Nos meus quinze anos de trabalho l á, não conheci sequer um jakooano que alguma vez tivesse deixado seu país. Além de avessos a viagens,os nativos também são arredios a estranhos.Era muito dif ícil estabelecer contato com aquela peculiar civilização. Mas que civilização! Os jakooanos possuem uma visão bastante particular do mundo e,principalmente,do tempo – uma visão que decorre fundamentalmente de suas mais profundas crenças. E é sobre o modo como este povo compreende o tempo que vim falar aqui. Todos nós sabemos que,por convenção,a Terra se divide em 24 fusos horários,cada um deles compreendendo uma área formada por 15 graus de longitude. Cada fuso corresponde a uma determinada hora,em atraso ou adiantamento em relação ao meridiano de Greenwich,o meridiano zero.Os jakooanos perceberam que,com essa convenção,o que se ganha em uniformidade – o mundo inteiro segue os mesmos parâmetros cronológicos – se perde em precisão – nunca é real o tempo em que nos encontramos.Para eles,estamos quase sempre minutos atrasados ou adiantados em relação ao horário arbitrariamente determinado para todo o fuso.Como o territ ório abarcado por cada fuso horário é inegavelmente muito vasto,os jakooanos acreditam que seria mais exato se este vasto território e a hora que lhe diz respeito fossem fracionados em unidades menores.
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Cabe ressaltar que,para os jakooanos,o tempo é assunto de suma importância.Extremamente religiosos, eles adoram um único deus,o deus I-Ih,que na l íngua local significa “aquele que controla o tempo”. Assim, do ponto de vista deste povo singular,iludir o tempo seria como iludir o deus I-Ih,e nenhum jakooano está preparado para arriscar tanto.Em fun ção disso e com vista a, abre aspas,corrigir,fecha aspas,o que eles identificaram como uma falha na convenção universal de medida do tempo,um grupo de cientistas locais,liderado por Haalaan Kook,criou relógios de altíssima precisão, ligados a um sofisticado sistema de orientação global por satélite.Os cientistas dividiram,longitudinalmente,o território de Jakoo,que tem 1.050 quil ômetros de extensão de leste a oeste,em 3.600 partes,estabelecendo submeridianos com um espaço entre eles de 291,6666 metros(sendo um destes intervalos,o central,de 292 metros, já que a divisão resultava numa dízima periódica).Determinaram ainda que cada uma destas partes, isto é,que cada um destes submeridianos corresponderia a 1 segundo.Desta forma,os rel ógios não poderiam mais indicar somente a hora;eles teriam que associar a hora,os minutos e os segundos a uma determinada posição no espaço.Como era complexo o que se passava a exigir dos relógios,os cientistas inventaram esta imensa placa quadrada e violeta que vocês vêem no slide – violeta é a cor tradicionalmente associada ao deus I-Ih.Esta placa cont ém uma série de intrincados dispositivos que alteram a marcação da hora conforme a pessoa se movimenta.A partir do dia em que se decretou que todos jakooanos deveriam utilizar a placa,a cada 291,6666 metros de deslocamento no sentido leste-oeste/oeste-leste a placa aumentaria ou diminuiria automaticamente 1 segundo; a cada 17,5 quilômetros,1 minuto,e assim por diante. Imaginem duas pessoas que morassem,respectivamente,nos extremos leste e oeste do pa ís e que marcassem um encontro na capital Lemboo,bem no centro da ilha.Estas duas pessoas teriam uma diferen ça de quase
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1 hora entre elas e, para se encontrar pontualmente num dado lugar, teriam que calcular não só o tempo de seu próprio deslocamento, mas também as mudanças de minutos e segundos que tal deslocamento acarretaria. Nos primeiros meses, quando a população de Jakoo ainda se adaptava à nova rotina, um jornal inglês publicou fotografias, tiradas defronte ao templo a I-Ih, que mostravam os jakooanos portando a grande placa violeta na cintura, a tiracolo, dentro de bolsas, em carrinhos de mão e até no alto da cabeça, como um chapéu. Com 25 centímetros de comprimento de cada um dos lados, não era possível carregá-la no pulso, como os relógios. No texto que acompanhava as fotos, o jornal ridicularizava o invento deste povo do Pacífico, qualificando-o de, cito, extravagant and completely useless. Os jakooanos reagiram mal. Tomaram o sarcasmo como ofensa ao deus I-Ih. Em desagravo – cito Kook: “já que a Europa não respeita nosso altíssimo deus, nós não iremos mais respeitar suas estúpidas convenções” –, decidiram estabelecer um sistema próprio de medida do tempo. Dividiram o território de Jakoo novamente, em sentido longitudinal, em 24 áreas, cada uma delas correspondendo a 1 hora. Cada área destas era dividida, por sua vez, em 60 partes, compreendendo, cada uma delas, 1 minuto. Por fim, as pequenas áreas dos minutos foram divididas em outras 60 partes ainda menores, equivalentes a 1 segundo. Assim, em números aproximados, a cada 12 metros de deslocamento leste-oeste/oeste-leste a placa violeta registrava uma mudança de 1 segundo, a cada 729 metros de 1 minuto e a cada 43,75 quilômetros de 1 hora. Como 1 hora do sistema universal foi convertida em 24 horas no sistema jakooano, 1 dia nosso correspondia a 576 horas do sistema deles. O tempo passou a ser vivido lá como uma espécie de fluxo contínuo e acelerado, em perpétua mutação, já que não só continuaram a usar, mas aprimoraram as placas violetas. Em pouco tempo, a nova medida levou Jakoo ao caos. As pessoas não conseguiam cumprir seus com-
promissos porque estavam sempre em horários diferentes. Embora os jakooanos soubessem precisamente o horário de dada posição no espaço, eles não tinham mais um parâmetro com o qual comparar este horário. Todo movimento no sentido leste-oeste/oeste-leste implicava uma considerável mudança de horário. O primeiro a se rebelar contra o sistema foi o chefe da estação de trens. Em estado avançado de estresse, em decorrência dos complicados cálculos que era obrigado a realizar para controlar a entrada, a saída e o trajeto dos trens, o chefe da estação arremessou sua placa violeta contra o templo a I-Ih, quebrando um dos belos vitrais. Ele foi preso e açoitado dia após dia por cinco policiais durante 20 ciclos de 576 horas locais. O fato ocupou as capas dos jornais, e uma série de artigos censurando tal heresia foi escrita pelos cientistas. Porém, ao mesmo tempo que o ato do chefe da estação deflagrou violentas recriminações do Estado e da opinião pública, ele inspirou vários insurgentes. Outros revoltosos, jovens em sua maioria, atiraram suas placas violetas contra o templo, destruindo outros belos vitrais. Grupos de manifestantes fizeram passeatas defronte ao santuário de I-Ih, lançando suas placas violetas contra a edificação. Muitos rebeldes foram presos e açoitados. Chegou um momento em que não havia mais lugar na cadeia – nem açoite – para tantos descontentes. Resumindo, pois avisam que meu tempo está acabando, em cinco meses o templo a I-Ih foi completamente destruído, e as esculturas do deus destroçadas. Apenas os governantes e os cientistas continuaram a usar a placa violeta. O resto da população voltou a se orientar pelo sol, como seus antepassados faziam antes mesmo da adoção do padrão de Greenwich. VERONICA STIGGER nasceu em 1973, em Porto Alegre. Formada em jornalismo, atualmente é doutoranda em teoria e crítica de arte pela USP. É autora de O trágico e outras comédias (Editora 7 Letras). PESQUISA FAPESP 123
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PESQUISA EM TERAPIA CELULAR Posições de Pós-doutorado e de Jovem Pesquisador
O Centro de Terapia Celular, parte do Programa de Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) estabelecido pela FAPESP, está recebendo inscrições de interessados em obter bolsa de pós-doutorado e de jovem pesquisador financiadas pela FAPESP. Nesta primeira fase estão sendo oferecidas três bolsas de pós-doutorado para início de atividades até 1/08/2006, e duas de jovem pesquisador para início até setembro de 2006. A data limite para a inscrição para pósdoutorado é 5 de maio de 2006, e para jovem pesquisador é 31 de maio de 2006. Os interessados podem consultar o site htpp://ctc.fmrp.usp.br para obter informações sobre o programa e os requisitos para inscrição. Cópia do edital pode ser obtida pelo e-mail: marazago@usp.br
Área: Uro-Oncologia FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS DEPARTAMENTO DE CIRURGIA
Inscrições: 29/3/2006 a 26/6/2006 Disciplinas: Clínica Cirúrgica, Urologia I, Urologia II, Urologia III Cargo: Prof. Titular Regime: RTP Processo: 02-P-01854/2006 Contato (e-mail): secgeral@fcm.unicamp.br e carmen@fcm.unicamp.br Telefone: (19) 3788-8933 Área: Microbiologia e Imunologia FACULDADE DE ODONTOLOGIA DE PIRACICABA DEPARTAMENTO DE DIAGNÓSTICO ORAL
Inscrições: 8/3/2006 a 5/6/2006 Disciplinas: Imunologia, Microbiologia Geral, Pré-Clínica II Cargo: Prof. Titular Regime: RTP Processo: 01-P-26523/2005 Contato (e-mail): atu@fop.unicamp.br Telefone: (19) 3412-5205
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