Pipa Comunicação Recife, 2016
CO PYRI GHT 2016 © K ÉLVYA FREITAS ABR E U E P IP A C O M U NIC AÇ ÃO . Reservados todos os direitos desta edição. É proibida a reprodução total ou parcial dos textos e projeto gráfico desta obra sem autorização expressa dos autores, organizadores e editores.
CAPA Mironaldo Borges de Araújo Filho PROJETO GRÁFICO Karla Vidal DIAGRAMAÇÃO Augusto Noronha e Karla Vidal REVISÃO Maria Marli Melo Neto, Ana Maria de Amorim Viana e Roberto Remígio Florêncio EDIÇÃO Pipa Comunicação - http://www.pipacomunica.com.br
CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP) Ficha catalográfica produzida pelo editor executivo
Ab86
ABREU, K. F. Múltiplos olhares sobre o agir científico do Campus Salgueiro / Kélvya Freitas Abreu. – Pipa Comunicação, 2016. 232p. : Il., Fig., Quadros. (e-book) 1ª ed. ISBN 978-85-66530-59-9 1. Educação. 2. Pesquisa. 3. IF Sertão-PE. 4. Campus Salgueiro. 5. Produção Científica. I. Título. 370 CDD 37 CDU c.pc:05/16ajns
Prefixo Editorial: 66530
COMISSÃO EDITORIAL Editores Executivos Augusto Noronha e Karla Vidal Conselho Editorial Alex Sandro Gomes Angela Paiva Dionisio Carmi Ferraz Santos Cláudio Clécio Vidal Eufrausino Cláudio Pedrosa Leila Ribeiro Leonardo Pinheiro Mozdzenski Clecio dos Santos Bunzen Júnior Pedro Francisco Guedes do Nascimento Regina Lúcia Péret Dell’Isola Rodrigo Albuquerque Ubirajara de Lucena Pereira Wagner Rodrigues Silva Washington Ribeiro
Presidente da República Dilma Vana Roussef Ministro da Educação Aloisio Mercadante Oliva Reitora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano Maria Leopoldina Veras Camelo Pró-Reitoria de Ensino Flávia Cartaxo Ramalho Vilar Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-graduação Cícero Antônio de Sousa Araújo Diretor Geral do campus Salgueiro Josenildo Forte de Brito Departamento de Administração e Planejamento Antônio Carlos Ferreira Departamento de Ensino Maria Marli Melo Neto Coordenação de Pesquisa, Inovação e Pós-graduação Camila Macêdo Medeiros Organizadora desta obra Kélvya Freitas Abreu Comissão Editorial do Instituto Presidente: Maria da Conceição Martins Ribeiro Membros: Cícero Jailton de Morais Souza, Gabriela Lapa Teles Barbosa,Rosana Amâncio Pereira, Samuel Alves Monteiro
PREFÁCIO Prof. Amâncio Holanda de Souza Vivemos no mundo de grandes transformações, em que o conhecimento é a mola propulsora perpassando modelos, teorias e atividades científicas em velocidades inimagináveis. Nesse cenário, o meio acadêmico precisa transformar-se e adaptar-se para exercer o seu objetivo maior, que é o de mudar para melhor a vida das pessoas e do planeta. Os trabalhos apresentados neste livro são uma pequena e valiosa prova da materialização desse intento. Com uma abordagem simples e, ao mesmo tempo, técnica, produzidos por jovens talentosos, professores, servidores e discentes – pesquisadores do Instituto Federal do Sertão Pernambucano – Campus Salgueiro. Portanto, cabe destacar que a figura dos Institutos criados no país pela Lei 11.892, de 29 de dezembro de 2008, é um passo gigantesco na tentativa de imprimir a marca de que a educação é o único caminho para transformação e emancipação das pessoas e, sobretudo, acompanhados das áreas que permitem a consecução desse esforço como Ensino, Pesquisa e a Extensão numa busca da verdade, de forma ética e reflexiva. 7
A busca desse ideário torna-se possível quando entendermos essa necessidade e urgência e com todos os autores do processo participando. Como bem frisa Paulo Freire: “Ninguém educa ninguém, ninguém se educa sozinho, as pessoas se educam reciprocamente, mediatizadas pelo mundo”. Por fim, imensamente agradecido pela honraria de fazer as primeiras considerações desse trabalho pioneiro no Instituto e com a esperança de que seja o início de muitos outros. Ainda, que possa servir de norte e de inspiração para aqueles que buscam o conhecimento como uma forma de mudar o mundo para melhor. Desejo a todos uma boa leitura. Salgueiro-PE, março de 2015.
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APRESENTAÇÃO
Múltiplos olhares sobre o agir científico Kélvya Freitas Abreu O Livro Múltiplos olhares sobre o agir científico no Campus Salgueiro surge da união dos servidores do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano, Campus Salgueiro, em divulgar os estudos, as investigações, as pesquisas produzidas por esta equipe ao longo dos anos. Desta forma, a obra se configura como um marco em comemoração aos cinco anos de implantação do Campus na cidade de Salgueiro, em Pernambuco. Portanto, o IF Sertão-PE, campus Salgueiro vem transformando a vida acadêmica da região do Sertão Central do estado ao oferecer uma educação de qualidade e ao 9
vivenciar de fato o que se propõe a sua missão enquanto instituição, a saber: “Promover o desenvolvimento regional sustentável, com foco na ciência e tecnologia, por meio do Ensino, Pesquisa e Extensão, formando pessoas capazes de transformar a sociedade” (PDI 2014-2018, p. 6). Desta forma, a presente obra nasce como um projeto ousado ao publicar de forma sistêmica a produção científica do Campus em formato de livro. Produção essa que é o resultado dos seis grupos de pesquisas já cadastrados e em efetivo trabalho no início de 2015, aliados a trabalhos científicos produzidos pelos servidores do Campus. Assim, para este primeiro trabalho foram selecionados oito artigos, subdivididos em duas grandes áreas do saber, tais como: Ciências Biológicas, Exatas e da Terra; e Ciências Humanas, Sociais e Educação. O trabalho que se concentra no primeiro eixo é o resultado de parcerias entre instituições ao fazer pesquisa. Ou seja, a união entre a Universidade Federal de Pernambuco e o IF Sertão-PE Campus Salgueiro possibilita a análise e estudo ao traçar a investigação cromossômica e molecular em pacientes com suspeita clínica da Síndrome de Turner. Deste modo, Angelim-Neto, Santos e Bispo discorrem sobre o resultado coletado em 2014 de pacientes com a suspeita da enfermidade. Ressalta-se que o estudo é um recorte do projeto de pesquisa de Iniciação Científica do Campus. 10
Por sua vez, Lima abre as investigações do segundo eixo relacionado a Ciências Humanas, Sociais e Educação. A autora discute, no capítulo, o conceito de sustentatibilidade ao retomar uma abordagem teórica sobre o tema. Ao passo que Maciel e Lima, no capítulo posterior, abordam a sustentabilidade sob a ótica dos impactos econômicos e ambientais causados pela implantação de um empreendimento atacadista no bairro São José no município de Juazeiro do Norte-CE, no capítulo III. Correia e Silva ao estudarem a linguagem trazem os resultados iniciais do projeto de extensão vivenciado e possibilitado pela Campus Salgueiro ao criar pontes com a comunidade do município. Assim, o Projeto Agentes Literários: Disseminando Poesias para Autorreflexão objetiva desenvolver atividades socioculturais, educativas e lúdicas, visando à elevação da autoestima para gerar cidadãos críticos e participativos na sociedade a qual estão inseridos. Não obstante, trabalhar a linguagem em suas mais variadas formas é um dos objetivos do próximo estudo. Souza, Clímaco, Simião e Gonçalves por meio dos estudos da tradução intersemiótica revisitam um conto social e trazem uma releitura do texto para as linguagens de desenho e teatro. Destaca-se ainda que o trabalho também é um projeto de extensão desenvolvido no Campus Salgueiro. 11
No capítulo posterior, Oliveira e Abreu discutem a literatura em torno dos Recursos Educacionais Abertos que auxiliam as propostas de ensino e aprendizagem. Os autores trazem as bases que norteiam as discussões do atual Grupo de Estudos e Pesquisas em Práticas Educacionais Tecnológicas – GEPET, do Campus Salgueiro. O debate em torno dos movimentos sociais é o escopo central de Leite. Neste estudo, a autora objetiva revisitar os conceitos e a produção acadêmica ao contrapor os novos e tradicionais movimentos sociais, revisando o berço continental dos movimentos. Por fim, Pereira, Torquato e Nascimento trazem uma pesquisa aplicada sobre a satisfação dos usuários da biblioteca do Campus Salgueiro. Valendo-se que ao diagnosticar, novas ações e adequações são possíveis para traçar novos rumos na gestão do Campus como um todo. Logo, a obra trata-se de um olhar múltiplo sobre o que é desenvolvido e vivenciado pelo Campus Salgueiro. Destaca-se que esse é apenas um pequeno recorte dos atuais 20 trabalhos do Programa de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC), dos 20 projetos do Programa de Bolsas de Extensão (PIBEX), dos seis grupos de pesquisa cadastrados no CNPq, dos mais de 100 servidores envolvidos em algum grupo de investigação e estudos. 12
Deste modo, o IF Sertão-PE Campus Salgueiro comemora os seus cinco anos de existência trazendo à comunidade um material que respalda o que esta instituição se propõe: desenvolver ensino, pesquisa e extensão de qualidade à população de Salgueiro e Região de Pernambuco.
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Sumário CIÊNCIAS BIOLÓGICAS, EXATAS E DA TERRA
17 Investigação cromossômica e molecular
em pacientes com suspeita clínica da síndrome de turner
Misael Cavalcanti Angelim-Neto, Neide Santos e Adriana Valéria Sales Bispo
CIÊNCIAS HUMANAS, SOCIAIS E EDUCAÇÃO
33 Sustentabilidade: do desdobramento
conceitual ao elo de práticas e saberes
impactos espaciais e ambientais de um empreendimento no município de Juazeiro do Norte - CE
para a autorreflexão
Ângela Kerley Pereira Lima
59 Sustentabilidade e externalidades dos
Samara Souza Maciel e Ângela Kerlhy Pereira Lima
89 Agentes literários: disseminando poesias
Antônia Aparecida Barros Alencar Correia e Állef Torres da Silva
113 Literatura e outras linguagens: (re)leitura
de conto a partir do desenho e teatro Edilaine Pereira Sousa, Ariadne Clímaco, Pedro Henrique Simião e Vinícius Gonçalves
149 O estado da arte dos Recursos Educacionais Abertos
Francisco Kelsen de Oliveira e Kélvya Freitas Abreu
177 Movimentos sociais: os principais
paradigmas e a “crise” Maria Jorge dos Santos Leite
201 Satisfação dos usuários da biblioteca do
campus Salgueiro do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano
Rosana Amâncio Pereira, Milene Alves Torquato e Genoveva Batista do Nascimento
229 Sobre os autores
Investigação cromossônica e molecular em pacientes com suspeita clínica da Síndrome de Turner
CIÊNCIAS BIOLÓGICAS, EXATAS E DA TERRA
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Investigação cromossônica e molecular em pacientes com suspeita clínica da Síndrome de Turner Misael Cavalcanti Angelim-Neto Neide Santos Adriana Valéria Sales Bispo
Introdução Descrita por Henry Turner em 1938 que observou características fenotípicas – Baixa estatura, infantilismo sexual, pescoço alado e cubitus valgus (TURNER, 1938) – e posteriormente associada à monossomia do cromossomo X em 1959 (FORD et al., 1959) –, a síndrome de Turner (ST) ocorre em 1/2500 à 1/5000 nascimentos femininos (KAMMOUN et al., 2000) e caracteriza-se citogeneticamente pela ausência parcial ou completa de um cromossomo sexual. O cariótipo 45,X está presente em 40-60% das pacientes com ST (HOOK, WARBURTON, 1983), os casos restantes apresentam outras alterações estruturais do cromossomo X ou Y e/ou mosaicismo. A taxa de aborto 17
Investigação cromossônica e molecular em pacientes com suspeita clínica da Síndrome de Turner
espontâneo está próximo dos 99% (OLIVEIRA et al., 2009. LIPAY et al., 2005). São Características fenotípicas notáveis da ST a baixa estatura, disgenesia gonadal, amenorreia primária e esterilidade (ARAÚJO et al., 2010). Há ainda estigmas como pescoço curto e/ou alado, tórax largo e em escudo, cubitus valgus, baixa implantação dos cabelos, orelhas proeminentes, palato em ogiva entre outros (ARAÚJO et al., 2010, GUIMARÃES et al., 2001). Verificam-se ainda anomalias cardíacas e renais que ocorrem em cerca de 40% das pacientes (GUIMARÃES et al., 2001) e que são responsáveis pela redução da expectativa de vida das mesmas. Frequentemente as portadoras da ST apresentam uma segunda linhagem celular, que pode incluir o cromossomo Y normal ou estruturalmente alterado em 5 a 12% dos casos. Estudos demonstram que há um aumento de 5-30% das chances do desenvolvimento de um tumor gonadal, o gonadoblastoma, em pacientes ST com a presença de sequências do cromossomo Y (HOOK and WARBURTON, 1983. GRAVHOLT et al., 2000. MAZZANTI et al., 2005). O Gonadoblastoma (GB) é um tumor não-maligno que ocorre nas gônadas não desenvolvidas de pacientes Turner, entretanto, mesmo sendo não-maligno, o GB pode estar vinculado ao desenvolvimento de disgerminoma e outros elementos malignos de células germinativas, sendo 18
MISAEL CAVALCANTI ANGELIM-NETO, NEIDE SANTOS E ADRIANA VALÉRIA SALES BISPO
recomendado então a gonadectomia bilateral profilática (OLIVEIRA et al., 2009. KILDAL et al., 2003. COLEMAN, MACLENNAN 2006), que consiste na retirada das gônadas incompletas antes do desenvolvimento do GB. As análises citogenéticas têm importância no que concerne à definição do cariótipo de pacientes com suspeita clínica da síndrome de Turner. Naquelas pacientes em que é confirmada a ST a análise de seus genomas por meio de uma técnica da biologia molecular conhecida como PCR, que poderá identificar a presença de sequências do cromossomo Y, tal informação tem grande importância visto que a presença de material do cromossomo Y ou parte dele no genoma de pacientes com ST pode levar ao desenvolvimento dos tumores gonadais. Dessa forma, no presente estudo foram realizadas análises citogenéticas e moleculares em pacientes com suspeita clínica da síndrome de Turner oriundas do Estado de Pernambuco, a fim de definir o cariótipo dessas pacientes bem como inferir a potencialidade do desenvolvimento de malignidades, relacionado à presença do cromossomo Y no genoma nas pacientes com ST.
19
Investigação cromossônica e molecular em pacientes com suspeita clínica da Síndrome de Turner
Materiais e métodos No período de maio de 2013 a fevereiro de 2014 foram realizadas a cariotipagem de pacientes com suspeita clínica da síndrome de Turner (ST), atendidas no Serviço de Genética Médica do Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira (IMIP) e no Serviço de Endocrinologia Pediátrica do Hospital das Clínicas da UFPE (HC-UFPE), ambos localizados em Recife - PE. Os dados clínicos foram obtidos a partir dos prontuários das pacientes incluídas no estudo. As amostras de sangue circulante periférico foram colhidas por punção venosa com seringas e agulhas descartáveis, previamente heparinizadas, após assepsia local com álcool 70%, sendo retirado 5mL de sangue de cada paciente. As preparações citológicas para as análises cromossômicas foram obtidas a partir da cultura de linfócitos, onde foram adicionados 0,5 mL de sangue total nos frascos de cultura contendo 4mL do meio RPMI 1690 suplementado com 1mL de soro bovino fetal e 0,2mL de fitohemaglutinina. Em seguida, os frascos foram mantidos na estufa a 37°C, por 72 horas. Após 70 horas, foi adicionado 0,1 mL de colchicina 0,0016%. Ao completar 72 horas de cultivo, o material foi centrifugado por 6 minutos a 1800rpm, o sobrenadante desprezado e adicionado 8mL 20
MISAEL CAVALCANTI ANGELIM-NETO, NEIDE SANTOS E ADRIANA VALÉRIA SALES BISPO
de KCl previamente aquecido a 37°C, para a realização do choque hipotônico. Os tubos foram mantidos no banho-maria a 37ºC por 15 minutos. Depois foram novamente centrifugados, sempre pelo tempo e velocidade previamente descritos, e o material foi fixado com metanol/ ácido acético, na proporção 3:1. O bandeamento G foi realizado segundo Seabright (1972). As lâminas foram envelhecidas por 48 horas e mergulhadas numa solução de tripsina a 37ºC (0,10g de tripsina para 100mL de tampão Dulbeco) por um período entre 6 a 10 segundos. Posteriormente, foram lavadas com soro fisiológico e coradas com Giemsa a 5% por 7 minutos. Os cromossomos foram identificados e classificados de acordo com o Sistema Internacional para Nomenclatura de Citogenética Humana (ISCN, 2009). A análise cromossômica foi realizada em microscopia óptica utilizando em média 20 células por paciente. O DNA foi isolado do sangue periférico utilizando o Kit de extração de DNA IllustraTM Blood GenomicPrep Mini Spin (GE Healthcare). A PCR (reação em cadeia da polimerase) foi realizada seguindo o protocolo para screening do material do cromossomo Y, no qual foram usados como marcadores para a detecção do cromossomo Y, pares de primers para amplificação de sequências dos genes: SRY (Gene de determinação sexual do cromossomo Y), AMGY (Gene Amelogenin Y), TSPY (Proteína específica 21
Investigação cromossônica e molecular em pacientes com suspeita clínica da Síndrome de Turner
do testículo ligada ao Y) e DAZ (Gene deletado na azoospermia) (Tabela 1), por abranger as principais regiões do cromossomo Y. O par de primer usado como controle interno de amplificação corresponde ao gene da proteína beta globina e foi utilizado como controle da reação o DNA de um homem e de uma mulher normais. Tabela 1. Pares de primers para reações de PCR.
Gene SRY
AMGY
DAZ
TSPY
ß-Globin
Primer 5’ GGA ATT CCC TAA CTC TAA GTA TCA GTG T 3’ - F 5’ GGA ATT CCG CAA ACT GCA ATT CTT CGG C 3’ - R 5’ AGC TTG GTT CTA TCC CAT CC 3’ - F 5’ ACA TTT GTC AGC AGC TTG TG 3’ - R 5’ TAA ATC TGT TGT ATC CTC TCA GC 3’ - F 5’ CAC AGA ACC AGG TTC TAA ATA AAC A 3’ - R 5’ GGC TTC TCA TTC CAC TCC A A 3’ - F 5’ CCT CTT CAG GTG GCT TCA TC 3’ - R 5’ CCT GAG AGC TTG CTA GTG ATT 3’ - F 5’ TAG TCC CAC TGT GGA CTA CTT 3’ - R
Temperatura Anelamento
Fragmento (bp)
58°C
314
64°C
367
64°C
210
60°
312
58-64°C
610
Fonte. Elaborado pelos autores, 2014.
A reação foi realizada em aparelho termociclador seguindo o protocolo de Innis et al. (1990). O volume total de cada reação foi de 25µl, sendo a mistura constituída por 100ng de DNA genômico; tampão de PCR 1x; 2mM MgCl2; 50µM de cada dNTP; 1U de Taq DNA polimerase e 10 pmol de cada primer sense e antisense (Tabela 1). As 22
MISAEL CAVALCANTI ANGELIM-NETO, NEIDE SANTOS E ADRIANA VALÉRIA SALES BISPO
condições da PCR foram: desnaturação inicial a 96ºC por 5min, seguida de 35 ciclos a 94ºC por 1min, temperatura de anelamento por 2 min (SRY e TSPY) ou 1min30s (DAZ e AMGY), 72ºC por 1min e uma extensão final de 72ºC por 10min. A eletroforese foi feita em gel de agarose a 2% com brometo de etídio, utilizando-se TBE 1x (0,045M de Tris-borato e 0,001M de EDTA) como tampão de corrida, a leitura foi realizada através de luz ultravioleta e o gel fotografado.
Resultados e discussão
A análise citogenética é necessária para que se possa confirmar a síndrome de Turner (ST) nas pacientes que apresentaram características clínicas compatíveis com a síndrome. Foram analisadas citogeneticamente através da microscopia óptica metáfases em lâminas das 27 pacientes estudadas durante o período do trabalho. Das 27 pacientes analisadas a confirmação da síndrome de Turner se deu em nove delas, um percentual de 33,3%. No mesmo grupo estudado 51,8% das pacientes apresentaram um cariótipo normal feminino da espécie humana, que é 46,XX, representado na figura 1. O restante das pacientes (14,9%) apresentou apenas alterações estruturais em outros cromossomos, o que não as caracteriza como portadoras da Síndrome. A Figura 2 ilustra o cariótipo 23
Investigação cromossônica e molecular em pacientes com suspeita clínica da Síndrome de Turner
descrito como o mais comum pela literatura em pacientes Turner, o 45,X. Os cariótipos obtidos no estudo estão representados como figuras na Ilustração 1 (Anexo A). Das nove confirmadas com ST, o cariótipo 45,X está presente em três das portadoras, um percentual de 33,32% como mostra a tabela 2. Esse percentual de pacientes com o cariótipo 45,X está abaixo dos números descritos na literatura que variam de 40-60% (HOOK and WARBURTON, 1983), tal discordância pode ser explicada pelo baixo número de pacientes estudadas no período. De acordo com a tabela 2, percebe-se a prevalência de pacientes que possuem duas linhagens celulares, fator conhecido como mosaicismo, um percentual de 66,6% das pacientes apresentaram duas linhagens celulares, fato que difere dos resultados obtidos em estudos anteriores onde o número de pacientes com mosaicismo está em torno de 35-40% (BISPO et al., 2013; ARAÚJO et al., 2010; GUIMARÃES et al., 2001), o que pode também ser atribuído ao pequeno número amostral do presente trabalho.
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MISAEL CAVALCANTI ANGELIM-NETO, NEIDE SANTOS E ADRIANA VALÉRIA SALES BISPO
Tabela 2. Distribuição dos cariótipos das pacientes com Síndrome de Turner. Cariótipo
Número de Pacientes
Frequência (%)
45,X
03
33,32%
46,X,i(Xq)/45,X
03
33,32%
46,X,der(X)add(X)(p?)/45,X
01
11,12%
45,X/46,X,+mar
01
11,12%
45,X/46,X,r(X)
01
11,12%
09
100%
TOTAL
Fonte. Elaborado pelos autores, 2014.
A análise citogenética permitiu a obtenção de cinco cariótipos diferentes das pacientes com ST. Na figura 3 observa-se o cariótipo 46,X,i(Xq) que nos resultados obtidos aparece acompanhado de mosaicismo com 45,X. No presente estudo o cariótipo mosaico 46,X,i(Xq)/45,X foi relatado com a mesma frequência de ocorrência do cariótipo de pacientes monossômicas, 45,X. Foram identificados ainda mais três casos de mosaicismo, são eles: 45,X/46,X,+mar (Fig. 4), 45,X/46,X,r(X) (Fig. 5) e o cariótipo 46,X,der(X)add(X)(p?)/45,X, sendo este último um raro cariótipo em pacientes com ST (BISPO et al., 2013). A alta incidência de pacientes com o cariótipo em mosaico 46,X,i(Xq)/45,X obtidas neste estudo é tida por muitos pesquisadores como o mosaicismo mais comum nas por25
Investigação cromossônica e molecular em pacientes com suspeita clínica da Síndrome de Turner
tadoras da síndrome (WOLFF et al., 2010; SYBERT VP and MCCAULEY, 2004; JACOBS et al., 1997). O percentual de 33,32% de Turners com tal mosaicismo está de acordo com o descrito na literatura, que fica em torno de 30% (OLIVEIRA et al., 2009). A análise utilizando-se de uma técnica de biologia molecular, conhecida como PCR (Reação em cadeia da polimerase), foi realizada no material das pacientes ST com o objetivo de identificar quais pacientes possuem sequências do cromossomo Y, essa análise se faz necessária uma vez que a presença do material deste cromossomo está associada ao desenvolvimento do Gonadoblastoma (HOOK and WARBURTON, 1983; GRAVHOLT et al., 2000; MAZZANTI et al., 2005). Foram utilizados como marcadores de sequência gênica o SRY, AMGY, DAZ e TSPY. As análises apontaram resultados negativos para todas as sequências em todas as pacientes, evidenciando a ausência de material do cromossomo Y nas pacientes Turner estudadas, estes resultados são apontados na tabela 3. De fato, a literatura descreve resultados bastante variantes quanto à presença de sequências do cromossomo Y na ST, que mostram uma frequência de 0-60% nesses resultados (PATSALIS et al. 1998; GRAVHOLT et al. 2000; BIANCO et al. 2006; ARAÚJO et al.2008; SALLAI et al. 2010). Essa variabilidade pode ser explicada, sobretudo pelo número de pacientes estudadas, metodologia molecular utiliza26
MISAEL CAVALCANTI ANGELIM-NETO, NEIDE SANTOS E ADRIANA VALÉRIA SALES BISPO
da, seleção dos pares de primers do cromossomo Y e a diferença entre os tipos de tecidos testados (SMERCI et al., 2007). Tabela 3. Resultados da biologia molecular do cromossomo Y nos casos com Síndrome de Turner.
Paciente Registro Hospital
GENES DO CROMOSSOMO
Resultado
01
358 SP
IMIP
45,X9qh+/46,X,r(X),9qh+[7]
SRY
AMGY
DAZ
TSPY
02
363 SP
IMIP
45,X[30]
(-)
(-)
(-)
(-)
03
370 SP
IMIP
45,X,i(Xq)[42]/45,X[3]
(-)
(-)
(-)
(-)
04
372 SP
HC
46,X,der(X)add(X)(p?)[9]45,X[16]
(-)
(-)
(-)
(-)
05
373 SP
HC
46,X,i(Xq)[11]/45,X[14]
(-)
(-)
(-)
(-)
06
391 SP
IMIP
45,X[30]
(-)
(-)
(-)
(-)
07
392 SP
IMIP
45,X[20]
(-)
(-)
(-)
(-)
08
397 SP
-
45,X[17]/46,X, i(Xq)[8]
(-)
(-)
(-)
(-)
09
400 SP
IMIP
45,X[20]/46,X,+mar[10]
(-)
(-)
(-)
(-)
Fonte. Elaborado pelos autores, 2014.
Considerações finais A síndrome de Turner (ST) é a única monossomia compatível com a vida. Através da análise citogenética realizada no presente estudo, a suspeita clínica da síndrome de Turner pôde ser confirmada em 9 pacientes no Estado de Pernambuco. A presença de material do cromossomo 27
Investigação cromossônica e molecular em pacientes com suspeita clínica da Síndrome de Turner
Y no genoma das pacientes ST está associado a uma probabilidade de cerca de 30% de desenvolver o tumor do Gonadoblastoma, tendo grande importância já que a confirmação dessas sequências indica que a paciente poderá desenvolver futuramente o GB, sendo recomendada então a retirada das gônadas não-desenvolvidas dessas pacientes a fim de se evitar o desenvolvimento do tumor. A análise utilizando-se do método de PCR não identificou sequências do cromossomo Y nas pacientes, excluindo assim as pacientes estudadas do grupo de risco para o desenvolvimento de malignidades. As técnicas citogenéticas e moleculares reunidas neste trabalho permitiram estabelecer um diagnóstico completo para cada paciente analisada, podendo assim ser direcionada a conduta terapêutica. Os autores agradecem ao consentimento das pacientes para realização da pesquisa e aos médicos pelas informações clínicas obtidas.
Referências
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MISAEL CAVALCANTI ANGELIM-NETO, NEIDE SANTOS E ADRIANA VALÉRIA SALES BISPO
Anexo A Ilustração 1. Cariótipos obtidos no presente estudo através das análises citogenéticas.
Fonte. Elaborado pelos autores, 2014.
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CIÊNCIAS HUMANAS, SOCIAIS E EDUCAÇÃO
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Sustentabilidade: do desdobramento conceitual ao elo de práticas e saberes1 Ângela Kerley Pereira Lima
Introdução Para iniciar o diálogo entende-se que sustentabilidade é uma proposta ousada à dinâmica planetária do momento, portanto, “qualquer revisão de definições de sustentabilidade, no momento atual, estará sempre ultrapassada” (LOPES, 2009, p.115); os conceitos devem evoluir para atender o processo dinâmico da complexidade do conhecimento produzido a partir de toda conjuntura que envolve a relação do homem com o espaço. Hoje, o termo sustentabilidade tornou-se intensamente usual, principalmente, na política e economia. Ao avaliar a disparidade do discurso com a prática do princípio da 1. Este texto trata-se de uma adaptação do 2º capítulo da dissertação da autora: Percepções de sustentabilidade a partir das mutações espaciais e paisagísticas do bairro João Cabral na cidade de Juazeiro do Norte-CE, defendida no dia 28 de novembro de 2014
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Sustentabilidade: do desdobramento conceitual ao elo de práticas e saberes
sustentabilidade na gestão pública, constata-se a distorção das ações em relação à nova proposta de pensar e conduzir a sociedade; a economia, por sua vez, elaborou novos desdobramentos de marketing ambiental para fundamentar o novo modismo discursivo econômico, provocando o desgaste terminológico da palavra. Por outro lado, a exaustão dos debates acerca de sustentabilidade é necessária em relação à nova maneira de repensar a sociedade. As mudanças ocorrem quando a sociedade incorpora novas atitudes no seu escopo cultural, portanto, concordamos com Neves (2013, p. 16) quando se refere à utilização do termo “como palavra de ordem, inserida nos discursos paradigmáticos politicamente corretos que buscam conciliar crescimento econômico e preservação ambiental”. Desse modo, é pertinente apresentar a base discursiva das definições clássicas a fim de ampliar as teóricas do contexto atual. O significado do termo sustentabilidade é uma teia de saberes que possui origem na biologia. Esta ciência o utilizou na observação do quadro populacional referente à exploração de recursos por certa atividade econômica, e os níveis de reprodução de uma determinada espécie, monitorando seu desenvolvimento a fim de controlar seu desaparecimento (VEIGA, 2008). A extração dos recursos deveria ser seguida dos padrões sustentáveis para que o percurso natural de resiliência da natureza não fosse 34
ÂNGELA KERLEY PEREIRA LIMA
atingido. Já na ecologia, as relações de trocas de energia entre os sistemas naturais poderiam ser sustentáveis ou não. Entraram em cena “as ciências naturais”. A sustentabilidade passa a ser problematizada na esfera epistemológica no campo da economia como reflexões inovadoras a fim de confrontar o pragmatismo da economia que ocasionou a gêneses e as causas dos maiores impactos ambientais e sociais do planeta. É preciso pontuar três fomentos para economia: a ciência, a técnica e o totalitarismo do capital, entra em cena “o combate à economia”. Se estes fomentos foram à base à supremacia da economia, interferir na dinâmica do planeta de uma maneira voraz causou em suas perspectivas, resultados inversos aos construídos enquanto ideologia de evolução social. A crise ambiental gerada pela intervenção da ciência positivista e cartesiana, como da técnica, é em muitos casos irreversível; contaminações de solo e água, envenenamentos, poluição de ar, mortes e extinções de espécies vegetais e animais, foram alguns dos problemas drásticos, sem contabilizar os danos a curto, médio e longo prazo de impactos sociais, como miséria e doenças. Esses problemas não haviam aflorado até, segundo Enrique Leff (2010), o último terço do século XX que os considerou como uma abertura à economia reconhecer o equilíbrio ecológico, a preservação da biodiversidade 35
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e a qualidade de vida dos seres humanos. Mas, para os economistas, os problemas estariam para além de valores extras à ciência econômica, no entanto, ligados diretamente a sua própria sustentabilidade. Em forma de crítica a economia que sempre via todos os efeitos de impactos negativos no meio ambiente como externalidades a si própria, embora, se colocasse como a ciência detentora das ideologias, técnicas e políticas, pressupostas de “solucionismos”. Leff (2010) coloca que todo esse conjunto de problemas fora do alcance da teoria do processo da economia, só poderia ser considerado externalidades, sendo a economia, uma ciência dominadora de todas as formas de organização social e de intervenções sobre a natureza; codificando e decifrando todas as coisas, objetos e valores sob a égide do capital. Sem ter refletido suas relações complexas com o mundo natural. Recordamo-nos o constante posicionamento teórico global de Santos (1987-2009): O dinheiro em seu estado bruto é o deus do universo; a ciência e a técnica são subservientes ao capital e a Globalização no mundo como ela está é perversa. Mas, entre estes queremos destacar o papel da ciência como meio imprescindível para o processo evolutivo dos outros dois aspectos. A ciência positivista enquanto conhecimento ou prática sistemática se incumbiu de fornecer garantias de inovações e soluções à humanidade gerando expectativas de 36
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controle absoluto e assim o fez mudando profundamente a economia. Evidente que a proposta da ciência do século XIX revelou alguns de muitos impactos e catástrofes já ditos, contrários às expectativas e toda conjuntura social, política, econômica, técnica e espacial geradas neste século para o futuro. As perspectivas relacionadas aos notes para o século XIX foram ideais características do capitalismo. A ciência seria capaz de prever e criar mecanismos interventivos a qualquer situação adversa. A concepção de bem-estar é uma relação diretamente ligada à condição de consumo com o Estado controlando e promovendo a estabilidade social e econômica, de modo que, havendo igualdade social, a paz se instalaria. O crescimento econômico consolidou-se veementemente nos países desenvolvidos, mas, sua concentração espacial e para poucos se tornou a base de dominação e desigualdade. A economia gerou o papel de ciência norteadora do planeta e catastrófica, fortalecendo o mercado com suas estratégias, levando-o a funcionar em rede, o que promoveu um mundo interligado. Para o século XX todas as perspectivas causaram o efeito contrário a tudo o que foi considerado como otimismo, criando um estado de insustentabilidade, sobretudo, social, espacial e ambiental. A ciência não pode resolver as problemáticas surgidas, assim, ela que antes deveria 37
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dar respostas a tudo agora é vista sob a ótica de fragilidades e com zona de limites. A pobreza consolidou-se fato geométrico deste século, somada às fragilidades de um mundo urbano. O mercado colocou-se como senhor mundial reinando com o neoliberalismo. Vários conflitos políticos e sociais emergiram. A natureza foi o principal alvo da ganância capitalista e o discurso de homogeneidade global produziu exclusão espacial e desterritorialização de culturas. As expectativas do século XIX deixou uma herança de puro pessimismo para o século XX, portanto, consideramos que nesse último o legado das ambições da segunda e início da terceira fase da industrialização somada às tragédias da Segunda Guerra Mundial levou a humanidade e a natureza a um alerta de crise. A ciência foi colocada em xeque e uma nova discussão ecologizante entra em cena novamente: as ciências naturais. No mundo científico, um dos grandes desafios para introduzir um pensamento ecológico ocorreu no momento em que a economia internalizou suas externalidades dando lugar ao surgimento de uma economia ecológica (LEFF, 2010). A economia deveria pensar o mundo a partir da teoria dos sistemas energéticos condicionados à dinâmica da natureza, ou seja, se o processo dinâmico natural produz ciclos sustentáveis em sua cadeia ecossistêmica, a economia deveria adaptar-se a esse processo. 38
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Segundo Leff (2010), as críticas científicas tornaram-se importantes para que os economistas descessem da nuvem abstrata e fictícia na qual pensavam, no entanto, continuaram a acreditar nas manipulações positivistas e empíricas na capitalização da natureza. Mesmo sabendo das condições ambientais e sociais planetárias, a economia gerou novos conceitos e mecanismos dos quais contornaram tais discursões impondo sua supremacia. “Ao contrário da sustentabilidade, incrementou-se a pobreza, ampliou-se a desigualdade social e aprofundou-se a insustentabilidade” (LEFF, 2010, p. 27). A economia intransigente provocou um lado reativo; as constatações de que a sociedade viveria outros tempos – um tempo de escassez e tempo de repensar suas posturas com a natureza – posturas somente possíveis no diálogo da interdisciplinaridade entre as ciências e o saber comum; da experimentação vivencial no espaço representativo da cultura de cada lugar. O grande desafio deste século diante de toda crise ambiental é levar a sociedade a outras posturas relacionais, de pertencimento, de valorização do seu lugar, de outros saberes, de outras produções, enfim, de um novo paradigma capaz de nortear o hoje para o futuro. Reconhecendo estes processos, intrinsicamente no âmbito cultural, no qual acontecem que o “modelo econômico e a 39
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maneira como os homens se relacionam com a natureza” (BUARQUE, 2007, p. 43) enraízam-se. As propostas do modelo econômico desarmonizaram a qualidade de vida desencadeando, simultaneamente, a “necessária emergência de um novo paradigma cultural e filosófico: o paradigma da sustentabilidade, decorrente das demandas por uma proposta pós-moderna de desenvolvimento” (NEVES, 2013, p.23). Apurando a fundamentação a partir da elaboração de Seiffert, o autor continua: “O paradigma da sustentabilidade, relacionado ao desenvolvimento, deverá se opor ao paradigma cartesiano, princípio fundamental do crescimento econômico” (ibidem). Introduzir o paradigma da sustentabilidade significa assumir um novo modelo de sociedade capaz de exigir de si própria uma ruptura com o paradigma antigo, a única maneira de ser sustentável.
Os desdobramentos de um caminho: sustentabilidade para o desenvolvimento
A crise ambiental instalada no século XX foi a denúncia de que o mundo não estava andando bem e o modelo econômico racionalista positivista não estaria dando conta a proposta de controlar e responder a dinâmica da sociedade e da natureza. 40
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A ideia de sustentabilidade como proposta de um novo paradigma é uma proposição entrelaçada aos impactos destrutivos sociais e ambientais que o crescimento econômico causou, implicando à ciência reinventar-se, com isto, qualquer intervenção de mudança reflete um posicionamento político e a sustentabilidade surge como uma proposição de racionalismo ambiental versus racionalismo capital. Parte-se do ponto que crescimento, desenvolvimento e desenvolvimento sustentável é um percurso de transição do qual envolve momentos históricos, dicotomias, dissimulações e esperança. Diferenciam-se, rapidamente, os conceitos de crescimento e de desenvolvimento de acordo com as teorias de Celso Furtado na década de 1950 para depois compreender-se o que é desenvolvimento sustentável na década de 1970, diferenciação conceitual necessária para um dos mais emergentes conceitos deste século. O crescimento econômico trata-se de uma visão quantitativa de produção; o desenvolvimento implica produção com distribuição equilibrada para a expansão da capacidade humana. No entanto, ele vai além fazendo um diagnóstico perspectivo de ambos: “crescimento econômico, tal como se conhece, vem se fundando na preservação de privilégios das elites que satisfazem seu afã de modernização; já o desenvolvimento se caracteri41
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za por seu projeto social subjacente”. (FURTADO, 2004, p.484). Nesse sentido, o modelo de crescimento é uma proposta desigual e o desenvolvimento é um caminho que convergiria seus objetivos para outra proposta política: o desenvolvimento social. Para o PNUD, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é o ponto de partida, mas o desenvolvimento é também uma ampliação por equilibrada extração de recursos naturais, educação com qualidade, respeito à democracia e às diferenças, enfim, equidade em toda relação homem e espaço, ou melhor, um modelo sustentável de sociedade. Diante desses pontos, o que vemos é uma convergência à ampliação da capacidade humana ao qual o desenvolvimento, em seu papel de um novo caminho econômico, proporcionaria. Assim, como previsto por Sem e Mahud, revisto por Veiga, o desenvolvimento indiscutivelmente está entrelaçado a uma nova percepção de condição humana, bem como, a igualdade no consenso do que realmente é necessário, freando a dominação da natureza. Na concepção de Sem e de Mahud, só há desenvolvimento quando os benefícios do crescimento servem à ampliação das capacidades humanas, entendidas como o conjunto das coisas que as pessoas podem ser, ou fazer, na vida. E são as quatro as mais elementares: ter uma vida longa e saudável, ser instruído, ter acesso 42
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aos recursos necessários a um nível de vida digno e ser capaz de participar da vida da comunidade (VEIGA, 2008, p.85).
Ainda Veiga: “O processo de desenvolvimento pode expandir as capacidades humanas, expandindo as escolhas que as pessoas têm para viver vidas plenas e criativas. E as pessoas são tanto beneficiárias desse desenvolvimento como agentes do processo e da mudança que provocam” (Ibidem). A grande questão é que o desenvolvimento no âmbito desta utopia não aconteceu. A economia revestida de “desenvolvimento” fez desta utopia possível um discurso com prática de crescimento, e nas últimas décadas as imagens de tragédias ambientais, políticas e sociais emergiram; embora, tenhamos sido alertados nas contracorrentes científicas às ações da economia predominante, considerando precoce a transição sustentável. No ano de 1972, o MIT (...) e o Clube de Roma publicaram estudos sobre Os limites do crescimento, criticando as bases do crescimento econômico e populacional sob a ótica dos pilares da sustentabilidade (LEFF, 2010). Antes de fundamentar o conceito de desenvolvimento sustentável em 1973 a elaboração de outros conceitos, como ecodesenvolvimento por Maurice Strong, já vinha sendo elaborado. Para Strong, este conceito descreveria 43
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um estilo de desenvolvimento equilibrado com as potencialidades locais sem exaurir a natureza. Ignacy Sachs, influenciado por este teórico, ampliou o conceito sugerindo um patamar de dimensões das quais o conceito se operacionalizasse, em geral, com o conhecimento da cultura local, de outras formas de produção, das potencialidades dos ecossistemas, da participação política e do equilíbrio espacial. Ampliações que podemos chamar de convocação a uma nova civilização. As medidas evocadas por Sachs para operacionalizar o conceito, lembradas por Montibeller Filho foram: um novo estilo de vida; conjunto de valores próprios; conjunto de objetivos escolhidos socialmente; e visão de futuro. (FILHO, 1993, p. 133). Deste ponto de vista conceitual, caberia no âmbito cultural o desafio em combinar as questões socioeconômicas com as ambientais. Cabendo desenvolver ações complementares entre as dimensões que Sachs considerou como o pluralismo do ecodesenvolvimento. Segundo Chacon (2007), observando o processo de urbanização do Brasil e os desequilíbrios socioambientais que circulavam na esfera do espaço urbano, Sachs alertou o país para a crise que enfrentaria se não tomasse novas posturas de desenvolvimento com ênfase na valorização das necessidades do seu povo, ao invés de preocupar-se com as imposições internacionais. 44
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A organização do homem no seu espaço ressalta nas contribuições de Sachs como indicação da harmonia possível quando considerou as dimensões: social, econômica, ecológica, espacial e cultural. Vista com equidade e inseparáveis, enquanto a proposta de crescimento econômico jamais seria proporcional. Conforme Veiga (2008) o ecodesenvolvimento não viria possibilidade de associação entre o crescimento e harmonia ambiental, colocando-se como divorciado deste, contudo, o desenvolvimento sustentável acredita nesta possibilidade. Então, vários momentos históricos de discursão e fundamentação conceitual do desenvolvimento sustentável se destacaram no decorrer das décadas2. A sustentabilidade para o desenvolvimento consolidou-se do conceito lançado no Relatório de Bruntland, chamado de Nosso Futuro Comum (Our commun future) em 1987, elaborado pela Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento: [...] o ‘Relatório Brundtlan’ manifesta a ambição de que o crescimento econômico – por enquanto o principal motor do desenvolvimento – possa respeitar os limites da natureza, em vez de destruir seus ecossistemas. E que, assim, possa satisfazer, citando o próprio relatório,
2. C.f “Da Revolução Industrial à Copenhague”, no livro PEARSON EDUCATION DO BRASIL. Gestão ambiental. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2011.
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“as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades (VEIGA, 2008, p.39).
A fundamentação conceitual de desenvolvimento sustentável proposto neste relatório nos parece não apontar com clareza quais as bases de ações econômicas e políticas para o que considerou “satisfação e necessidade” da geração presente e futura tornando o conceito generalista. É pertinente para toda conjuntura social sempre refletirmos o que entendemos por necessidade. Ou seja, repensar o que queremos consumir, também, é delimitar o que se deve produzir, consequentemente, com que e como esta produção ocorrerá. Em resumo, a sustentabilidade e desenvolvimento são dois caminhos de intersecção dando sentido as suas trajetórias no presente para o futuro. O primeiro trata de construir a racionalidade ambiental vinculada à ideia de relacionamentos humanos promotores de respeito, alteridade e pertencimento a natureza propositando ao homem à volta para casa. O segundo, não se reduz a índices de quantidade, dessa forma, só poderá fugir da proposta de racionalidade dominante de progresso aderindo o que o primeiro propõe. Mas por que o desenvolvimento sustentável ainda não aconteceu? Até em sua elaboração mais clássica concei46
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tual, o desenvolvimento admitiu, segundo Sachs (2002) e Seiffter (2009), dimensões primárias que expressam conflitos entre si, e por esta razão, tornam-se essenciais ao equilíbrio tripartite promovido por instrumentos de ações políticas e econômicas para garantir um equilíbrio dinâmico: ambiental, econômico e social; considerando a relação sistêmica entre os três fundamentos. A proposta do desenvolvimento sustentável como resposta à crise ambiental que se revela na crise civilizatória, ambas, senso comum para o mundo. A crise global pode ser categorizada, mas, de acordo com Ignacy Sachs, o que nos cabe enquanto pertinência não está na questão de escolhermos qual a crise mais ameaçadora (SACHS, 2013), e sim da exigência de mudança no presente – uma “mudança de paradigma é imediata” (SACHS, 2004, p. 17). A mudança trata-se de ver, pensar e discutir o mundo pelo ângulo de pertencimento à natureza, ao lugar, ao o outro; inclui o sujeito como elemento passivo e ativo. A mudança civilizatória, naturalmente, trata-se de dimensão racional complexa, pois exige da humanidade uma nova postura relacional com tudo ao seu redor dentro de um tempo consideravelmente curto, não nos sendo possível negar que é uma questão de transformação cultural; o que configura a complexidade da mudança. O saber local, decifrado pela experiência vivida no espaço, conduzido no processo cultural essencialmente 47
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do lugar sob a construção de símbolos e expressões tradicionais da cultura, é um conhecimento que retrata a realidade da qual não pode ser vista como uma amostra quantitativa e sim pelos sentimentos embutidos que há entre homem e seu espaço vivido, assim, valorizando-se os saberes locais. As memórias guardam histórias, relações, sentimentos e emoções. Elas são vozes patrimoniais de cada sujeito. Por isso, a utopia da mudança civilizatória é possível no emergir da reflexão e pertencimento de cada sujeito.
A interconectividade dos saberes
O conhecimento acerca de algo é um ato voluntário que amplia a percepção. Em etapa do seu processo, existem incógnitas a ser vencidas, mas nunca concluídas, pois o encanto de se fazer incógnito é sempre guardar o mistério que atrai o querer desvelar, contudo, centralizar o processo de conhecimento por uma única via provoca embates contínuos: a racionalidade e objetividade do saber científico com a subjetividade e sensibilidade do saber comum. Uma dicotomia desnecessária provocada pela postura suprema da ciência racionalista.
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Descreve Leff:
O processo de racionalização social constrói uma “jaula de ferro” que vai esgotando as possibilidades de pensamento e conduzindo os modos de pensar, valorizando, hierarquizando e dando o mais alto valor à ciência que as outras formas de pensar e de sentir, subjulgando os saberes culturais, os saberes pessoais. O pensamento e o sentimento foram se dissociando cada vez mais; o sentimento residia, quando muito, na vida íntima, cada vez mais corrompida pelo sentido racional do valor econômico (LEFF, 2010, p.85).
Ainda o autor diz que a crise de insustentabilidade deriva por esses eixos de racionalismo (ibidem). Retornar a relação harmoniosa com a natureza é um fator cultural no qual o homem confronta-se com ele mesmo combatendo a imposição do pensamento racionalista. O fato de enxergar as interconectividades da natureza ao seu redor é reconhecer que sua produção interfere no processo natural assim como ele é parte do processo natural. Entre os fenômenos naturais e sociais teremos o vivido, a experiência espacial, sentido de lugar. Ela, a experiência vivencial, é produtora de fluxos relacionais e neles há os encontros e transferências de conhecimento dando sentido ao fator cultural, pois a cultura porta sentidos e valores de significados compreendidos no intimo de quem vivencial um lugar. 49
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A subjetividade, contrariamente ao discurso objetivo do racionalismo, é reconhecida nas ciências sociais como uma das principais fontes de conhecimento fundamentada pelas interpretações culturais. Na geografia cultural, o espaço ganha interpretação de lugar das experiências vividas. E, aqui são diversas experiências e diversos lugares que podem ter sentido para quem as vivenciam - Das experiências culturais às práticas educacionais em sala de aula – todos com formas e lugares que marcam o vivido do sujeito. Conforme Tuan (1979), as ideias de um povo ou grupo de pessoas assim como os sentidos atribuídos ao espaço só serão considerados quando analisados a partir de suas experiências. A proposta de saberes múltiplos amparados por Leff (2010) trata-se de considerar diversos tipos de conhecimento dentro e fora da academia, saber científico ou senso comum. Quando traz que a sustentabilidade visa, sobretudo, o futuro, abrindo o percurso para uma nova racionalidade; as racionalidades das alternativas, ética da igualdade e diálogos de saberes. Estes diálogos são trocas entre a academia científica e culturas e experiências sociais e ambientais, com isto, estamos afirmando que a subjetividade é um discurso apropriado para a interconectividade entre eles. O paradigma dominante, racionalismo, segundo Souza Santos (1988) é um posicionamento presidido pela 50
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ciência moderna. Um modelo que atingiu tanto as ciências naturais como as ciências sociais, a esta última, especificamente, enraizando-se no século XIX, sempre colocou o senso comum como irracional e vulgar, impossível de ser considerado como fonte científica. Para ele “a nova racionalidade científica é também um modelo totalitário, na medida em que nega o carácter racional a todas as formas de conhecimento que não se pautam pelos seus princípios epistemológicos e pelas suas regras metodológicas” (SOUZA SANTOS, 1988, p.3). E, ao relembrar o que disse Bacon, fundamenta profundamente a quebra relacional (dissociação do sentimento de pertencimento) do homem com a natureza, posicionando-o como um elemento externo: “A ciência fará da pessoa humana ‘o senhor e o possuidor da natureza’ ”(ibidem). Com base, não apenas nesta colocação, mais diante da crise ambiental que se apresenta, crer-se na emergência de outros posicionamentos relacionais (ontológicos) entre homem e natureza somados à interconectividade dos conhecimentos: acadêmico e comum (outra epistemologia), percepção da qual foi conduzida, por exemplo, por autores como Souza Santos ao especular uma nova ordem científica emergente, analisando a crise ambiental sob cinco hipóteses, das quais apenas cita-se a última por ser apontada por ele como o objetivo principal da síntese da análise desta nova ordem: “[...] à medida que se der 51
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esta síntese, a distinção hierárquica entre conhecimento científico e conhecimento vulgar tenderá a desaparecer e a prática será o fazer e o dizer da filosofia da prática” (SOUZA SANTOS, 1988, p. 3). A maneira como se constrói o conhecimento ao longo do surgimento da ciência tem sido questionado e combatido, por autores como Boaventura de Souza Santos, Enrique Leff, Edgar Morin e Ignacy Sachs. Uma crítica, sobretudo, aos procedimentos metodológicos da ciência traduzidos na epistemologia, mas, problematizado na ontologia. Em síntese, o que querem dizer resume-se: a crise ambiental é uma crise civilizatória, portanto, emergente se faz a troca de saberes culturais e científicos. Suas críticas levantam discussões acerca da emergência de construir o conhecimento no processo híbrido: científico e senso comum, levando em consideração a amplitude e essencialidade do saber local e o diálogo de saberes. O saber local trata-se do conhecimento singular das manifestações culturais de um lugar, fato ainda desconsiderado pela ciência moderna. Já o diálogo de saberes surge da intercomunicação entre o saber científico e o saber local, mediado, sobretudo, pela interdisciplinaridade; propostas que fortalecem a sustentabilidade à crise ambiental, e esta os fazem emergir como uma construção de conhecimento emergente (SOUZA SANTOS, 1988; LEFF 2010). 52
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Sabe-se que o posicionamento da ciência moderna na construção do conhecimento pragmático é arbitrário, mas também, que entrou em crise por não conseguir solucionar as problemáticas que ele mesmo criou. Fato, a ciência moderna criou a percepção de que tudo deve ser considerado com objetividade e coisificado. Nesse percurso, “[…] construímos uma lógica e uma epistemologia que nos levam a pensar um mundo construído por objetos, por coisas, que nos levam a compreender o mundo como uma relação da palavra com a coisa, a conhecê-lo através da representação do real pela teoria” (LEFF, 2011, p. 98).
Claro, que as coisas (objeto em si) e a objetividade relacional, ambas, jamais se tornarão a interpretação do mundo. Mas, o ato de dialogar entre saberes é uma forma interventiva do ato relacional, assim como, é um objeto-alvo da intervenção do sujeito no seu espaço. Enxergar o diálogo de saberes como um caminho para a sustentabilidade é considerá-lo como uma autorreflexão de essencialidade social e de construção cultural que reflete saberes fortemente presentes e possíveis. Em suma, acreditando que a subjetividade do saber comum possível enquanto conhecimento reconhecido científico, assim, a “[...] ideia de que o conhecimento tradicional é prático, 53
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coletivo, fortemente implantado no local, refletindo experiências exóticas” (SOUZA SANTOS, 2010, p. 152). Provavelmente, o saber cultural, que é intrínseco às experiências, provoca mudanças de consciência como uma das principais instâncias para enraizar a sustentabilidade e vai ao encontro da análise e construção de pertencimento da qual se acredita existir em cada sujeito com o seu território e tem-se nele este saber cultural que lhe é intrínseco. Embora os valores do saber local da cultura e experiências vividas não tenham preço de valor monetário, é preciso acreditar que o processo de crescimento econômico trouxe a contrapartida de insustentabilidade provocando se projetar um futuro inverso ao já definido pelo sistema predominante atual; provavelmente, criando probabilidades geradoras de resultados prováveis por meio de um caminho capaz de conduzir ações cooperativas.
Considerações finais
A sustentabilidade surge como um caminho que recria condições de convivência planetária e produz um sentindo social. De certo, a mudança não inicia em um projeto, mas na mudança de mente dos atores que a externarão em suas ações. 54
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A própria sustentabilidade teve seus desafios e, tratando-se de sociedade, a via conceitual deste termo tronou-se mais complexa ainda. Os desdobramentos sociais pressupõem áreas de organizações espaciais complexas, com isso requer caminhos mais abrangentes da sustentabilidade que possam dar suporte ao desenvolvimento sob a tônica de dimensões interdisciplinares. O racionalismo ambiental defendido por Enrique Leff é uma forma de se relacionar com o mundo baseado em ações sustentáveis para o potencial ecológico, de racionalidades culturais, de identidades, de diversidades e de saberes; desvinculando-se da racionalidade positivista e tecnicista da economia. De modo que estes sejam os degraus do caminho sustentável e, portanto, uma transformação planetária sob a égide de uma nova consciência ambiental e social na qual com um tempo agregam-se as raízes de uma cultura global.
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Sustentabilidade e externalidades dos impactos espaciais e ambientais de um empreendimento no município de Juazeiro do Norte/CE Samara Souza Maciel Ângela Kerlhy Pereira Lima
Introdução O presente artigo resulta de uma pesquisa realizada por uma perspectiva interdisciplinar, e tem como objeto de estudo o bairro São José em Juazeiro do Norte/CE. Objetiva analisar os impactos espaciais e ambientais que estão relacionados com a implantação de um empreendimento neste bairro. A abordagem ora apresentada é de cunho teórico-empírico e se desenvolve sob o foco analítico da área de estudo. Localizada ao sul do estado Ceará, na região do Cariri, Juazeiro do Norte tem notório desenvolvimento econômico e constitui-se um dos maiores polos atrativos de investimentos do Estado. 59
Sustentabilidade e externalidades dos impactos espaciais e ambientais de um empreendimento
Dentre as expectativas da pesquisa, pretende-se comprovar ou refutar a hipótese de que os agentes produtores do espaço urbano são os principais articuladores do processo de espacialização de uma empresa atacadista analisada. Trazendo uma nova dinâmica local, esta, por sua vez, gerou impactos econômicos, espaciais e ambientais compreendidos pela percepção dos moradores, já que interferem no seu cotidiano. Dessa forma, a análise acerca da implantação desta empresa nesse espaço, se faz necessária sob o viés da sustentabilidade. Os objetivos específicos da pesquisa compreendem em apresentar o papel dos agentes produtores do espaço urbano no que tange à implantação do empreendimento; contextualizar a sustentabilidade como um parâmetro de análise dos impactos econômicos e ambientais ocorridos no bairro São José a partir da instalação da empresa em questão; e por fim, fazer um estudo de caso do bairro, trazendo a percepção dos moradores acerca das problemáticas existentes em seu cotidiano. A importância de se realizar uma pesquisa desse tipo está ligada ao fato de que fornece elementos para uma reflexão acerca do espaço. E pode contribuir, sobretudo à comunidade acadêmica, para um questionamento crítico do tipo de espaço que se tem produzido, e as consequências que tem levado os anseios de produção da sociedade 60
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capitalista, o perigo de não se pensar a construção espacial sustentável. Como o recorte da pesquisa, bairro São José, trata-se de um objeto pouco estudado, alguns questionamentos surgem e necessitam ser esclarecidos. Recorre saber como a produção desse espaço tem sido concebida, a quem o planejamento estratégico tem beneficiado, e como os moradores do bairro percebem estas questões. Segundo Yin (1994), a melhor forma para se responder esses pontos é o Estudo de Caso. Nos procedimentos metodológicos necessitou que se fizesse uma investigação no ambiente natural do bairro, a observação empírica deste, o estudo de campo. Esse processo conduziu a utilização de fontes e diversas técnicas como: “observação direta, narrativas e registros fotográficos” (COUTINHO & CHAVES, 2002, p. 224). Outra etapa da pesquisa de campo constituiu-se de entrevistas. Momento crucial que permitiu validar as indagações que motivaram o Estudo de Caso, pois, a partir de então, foi possível compreender as percepções que os sujeitos participantes desta etapa têm da temática trabalhada. Baseado na necessidade de uma pesquisa qualitativa escolheu-se conforme Patton (1987), a conversação informal. Essa modalidade proporcionou a fluidez de uma 61
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conversa cotidiana, dando liberdade ao entrevistado para agir com naturalidade sem que se sentisse pressionado com perguntas estruturadas, somando a isto a condução pelos percursos investigativos da organização socioespacial do objeto da pesquisa. Como critério de orientação da escolha das pessoas a serem entrevistadas, observou-se a identificação de cada um com o problema pré-concebido, o caso da inundação que será exposta no decorrer do texto. Foram entrevistadas duas pessoas que residem nas ruas mais afetadas pelo problema. Com a premissa de dar validade metodológica e formal ao estudo, e responder a essa problemática apresentada, faz-se uma revisão bibliográfica recorrendo-se aos autores clássicos e novos nomes que teorizam a temática sobre os agentes de produção do espaço urbano, a sustentabilidade (dimensão econômica e ambiental), bem como sobre as externalidades provocadas pelo empreendimento.
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À guisa da urbanização e os agentes produtores do espaço urbano: considerações introdutórias Compreende-se a urbanização enquanto processo indissociável da industrialização. Entre esses dois fenômenos, o espaço urbano tornou-se a maior materialidade geográfica impactada. Concomitantemente, o ambiente social é conectado à rede de conflitos espaciais, pois, há interferências diretas, econômicas e ambientais, no espaço vivido da sociedade urbana. Ao pensar em rede de conflitos espaciais, relacionam-se dois aspectos macros: a urbanização e o papel dos agentes produtores do espaço urbano. Estes aspectos são entendidos quando considerados o pano de fundo das estratégias capitalistas somadas às conjecturas do aumento demográfico, territorialização da cultura contemporânea de implantação industrial e os impactos socioambientais emergentes da urbanização não planejada, portanto, desordenada e insustentável, como produto concreto do espaço geográfico. A urbanização é um processo contínuo de transformação, reconstrução e reinvenção do espaço urbano, dando materialidade ao que se entende por cidade. As transformações, sobretudo sociais, engendradas pelas 63
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relações econômicas capitalistas geraram formas espaciais. “A urbanização como um processo, e a cidade, forma concretizada deste processo [...], (SPOSITO, 2010, p. 11), a todo o momento fragmentando e articulando espaços, objetos e relações sociais entre eles”. O capitalismo ganhou proporção de materialidade na cidade. A transformação na paisagem urbana reflete a imagem da acumulação do capital, trazendo aumento populacional, problemas urbanos e conflitos socioespaciais. O capital tornou a cidade o seu território fértil. Ela, em suma, é o centro de vida social e política, onde se acumulam não apenas as riquezas, mas, os conhecimentos, as técnicas e os monumentos arquitetônicos (LEFÉBVRE 1969). Com isto, a cidade é um lugar de gestão e domínio ligado à primazia social do aparelho político-administrativo (CASTELLS, 1983). A urbanização antes e pós a era moderna pode ser medida na produção material de sua paisagem e na intensificação dos problemas urbanos. Com o crescimento estrutural das cidades, o núcleo central tornou-se a área de maior concentração e especulação. Digamos de passagem o lócus mais caótico do espaço urbano. Assim, a expansão urbana às franjas periféricas tornou-se inevitável, bem como os problemas estruturais e sociais. Bairros sem planejamento urbano, esgotos, acúmulo de lixo, disseminação de doenças e pouca acessibilidade para outros espaços da cidade, são 64
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alguns dos problemas urbanos existentes da urbanização caótica e insustentável. Constantemente feito e refeito, o espaço urbano é palco dos acordos políticos, da especulação do capital e dos conflitos sociais. Neste sentido, o uso do solo urbano torna-se um produto, “espaço mercadoria [...] através da qual o espaço apropriado aparecerá como propriedade de alguém”, (CARLOS, 2008, p. 87), um controle da existência material, um lugar de reprodução direta do capital fixo em um dado momento histórico. “O uso do solo ligado a momentos particulares do processo de produção das relações capitalistas é o modo de ocupação de determinado lugar na cidade, a partir da necessidade de realização de determinada ação, seja de produzir, consumir, habitar ou viver.” (ibidem, p.85). Tais necessidades impulsionam o processo de transformação do espaço urbano liderado por atores específicos possuidores de ponto de vista diferentes: os grupos sociais excluídos, o Estado, os proprietários dos meios de produção, sobretudo os grandes industriais; os proprietários fundiários e os promotores imobiliários que negociam e travam combates entre si gerando conflito por terra urbana. Segundo Lipietz (1977), a sociedade urbana representaria hoje o quadro de vida, o conjunto das estruturas de instituições e práticas dos agentes, seria o reflexo do modo de produção capitalista e de 65
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seus agentes imperativos. Entre estes agentes, os grupos sociais excluídos, não menos importantes que os outros, são uma classe que não será discutida pela razão de não se enquadrarem no contexto populacional do bairro estudado, no entanto, a sua ligação com os demais agentes é indissociável. Os proprietários dos meios de produção são aqueles que necessitam de uma porção maior do espaço, grandes indústrias e comerciários, devidas instalações de suas atividades. A terra urbana tem um valor puramente expressivo de mercadoria. Para eles “a terra urbana tem, em princípio, um duplo papel: o de suporte físico e o de expressar diferencialmente requisitos locacionais específicos às atividades.” (CORRÊA, 1993, p. 13). A implantação de suas empresas possui uma logística executória de estrutura física no lugar de sua locação, devendo apresentar requisitos de atratividade: impostos baratos ou isentos, capacidade de água e energia, acessibilidade à população e, quando não existe, são demandados alguns aspetos de negociação com o Estado para que ofereça determinada estrutura de implantação. As atividades produtivas possuem duplo efeito em suas instalações, ao mesmo tempo em que ampliam a oferta empregatícia à população local, de outro, embora não seja o interesse de suas atividades, supervalorizam 66
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a área espacial que se encontra gerando o aumento da especulação fundiária, esta aumenta o preço da terra e, consequentemente, o preço dos imóveis gerando. Para determinar um valor ao espaço, existe uma soma de fatores vinculados à especulação, como, localização do terreno; acessibilidade a lugares privilegiados na cidade (Shopping, mercados, centro de saúde); infraestrutura (água, energia, transporte, asfalto); privacidade e, secundariamente, fatores vinculados ao relevo, pois implica em possibilidades e custos de construção. (CARLOS, 2003). A cidade de Juazeiro do Norte/CE revela alguns exemplos destas, como a instalação das empresas multinacionais e nacionais atacadistas na área periférica, entre os municípios do Crato e de Barbalha, que vem a ser o caso da empresa em questão na pesquisa ora apresentada. Quando os proprietários fundiários retêm a terra, criando escassez para elevar o seu preço na escala local, criam um campo de forças com os proprietários dos meios de produção, pois elevam seus custos e lhes impõem a um condicionamento local. Os proprietários fundiários possuem um objetivo central com a terra de gerar maior rentabilidade. E, para isto acontecer, uma das formas é interferir no zoneamento da cidade. A distribuição territorial é alvo de especulação na delimitação e percentual de área urbana e rural, estan67
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do interessados “particularmente na conversão de terras rurais em urbanas”, (CORRÊA, 1993, p. 16), interveem na desarmonia territorial. Outra possibilidade de lucratividade é terem suas terras valorizadas pelo poder público, através, por exemplo, da implantação de serviços de infraestrutura, principalmente, pavimentação, energia e água, como pela locação na área de empresas ao consumo direto, exemplo das atacadistas, catalizadoras de outros serviços. Suas terras tornam-se um gado de engorda na área urbana, sobremodo, aquelas que estão com seus lotes às margens das rodovias e vias principais. A área de localização também agrega valor a terra. Esta situação pode ser plenamente contemplada na pesquisa de campo no bairro São José, que será referenciada adiante. Esse fenômeno é conhecido em economia como “Externalidades”, conceito que será trabalhado ao longo da pesquisa e representa uma importante interface do presente artigo. Enquanto os proprietários fundiários negociam a terra em seu estado bruto, a moradia é uma produção espacial em terra em que o homem se identifica com o espaço que habita, incluindo a necessidade de abrigo e segurança; uma posição de status; de posse e de troca. A moradia torna-se então, objeto de barganha para os proprietários de imóveis, os quais colocam suas propriedades ou a construção destas como um capital fixo. 68
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Os promotores imobiliários, conforme Corrêa (1993), são diversos agentes capitalistas envolvidos no processo de construção e viabilidade da posse de um imóvel: o incorporador, o financiador, aqueles que fazem os estudos técnicos, os construtores e os corretores que estão na ponta final da produção residencial, comercializando e transformando capital-mercadoria em capital-dinheiro. Em relação à produção concreta da paisagem residencial, eles dão forma e estrutura aos imóveis, escolhendo seus espaços de construções por critérios de vantagens estruturais, pesquisa de público alvo e demanda social da classe solvável, estabelecendo relação com os proprietários fundiários e o Estado. Surge um acordo entre estes no que diz respeito à produção de duas categorias de residências: os imóveis de luxo, para a classe que dispõe de recursos, e os populares para a classe de baixa renda. De um lado temos uma classe com acesso fácil à posse de imóveis, de outro, temos uma classe insatisfeita com sua condição social, déficit de residências e pouca acessibilidade à posse de propriedade. Conforme Henri Coing (1980), quando surgem as inovações para construções de habitações os preços das vendas imobiliárias residenciais ficam cada vez maiores, ampliando a exclusão das camadas populares. 69
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Há, portanto, outra estratégia de segregação: a residencial, fomentada pelos promotores imobiliários. A crescente demanda populacional nas cidades é desencadeadora de disputa espacial ao uso do solo e com isso o segmento de moradia popular amplia-se à possibilidade de atuação do interesse do capital imobiliário pressionando o Estado para que torne viável a construção das residências, ao mesmo tempo em que este é pressionado pelas camadas sociais populares. Por sua vez, o poder público assume o papel de agente facilitador, desapropriando terras, expandindo a área urbana e criando créditos para os promotores imobiliários e futuros moradores. As atuações administrativas do Estado estão na criação dos mecanismos públicos e jurídicos que garantam as ações públicas, porém, em parceria econômica com o privado, como, o Banco Nacional de Habitação (BNH), as Cooperativas de Habitação (COHABs), o Programa Minha Casa e Minha Vida (PMCMV), a criação do Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social (SNHIS) e criação do mecanismo jurídico de financiamento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). A moradia não pode ser vista como commodity. A questão central é descobrir se você quer uma cidade para as pessoas ou para o lucro (HARVEY, 2013). 70
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O Estado e empresas privadas andam em parceria, porém, entende-se que os programas sociais, como os citados, possuem função social e tornam-se mecanismos legais com objetivos de garantir execuções de ações públicas, embora, no processo de construção, imperem as especulações e acordos puramente capitalistas. No entanto, não esquecendo de que a cidade continua a ser uma mercadoria em sua máxima espacial e concreta, onde todos disputam por seu espaço com o desejo de viver no lugar da modernidade. A cidade precisa de uma política administrativa que garanta as suas estruturas sociais e espaciais, e o poder público faz do espaço o lugar da gestão e do controle. O Estado é um agente produtor espacial complexo com atuação conectiva com todos os outros agentes, possui centralidade e autonomia decisória como gestor territorial, mais, a dinâmica da sociedade torna-o variável, principalmente, quando consideramos a sociedade e o seu papel capitalista. Como organizador territorial e gestor do uso do solo, o Estado implanta e executa diversos serviços públicos: zoneamento, planejamento urbano, ordenamento territorial, saneamento, organização de serviços viários, infraestrutura e outros. Todos de interesse da população que especializa e usufrui o espaço urbano, bem como, dos investidores empresários. Criam-se leis, normas e 71
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deliberações que legalizam o uso do solo urbano e com isso é o mais pontual agente na reprodução legalizada do espaço urbano. Segundo Corrêa (1993, p. 26), “A atuação do Estado se faz, fundamentalmente e em última análise, visando criar condições de realizações e reproduções da sociedade capitalista [..,] condições que viabilizem o processo de acumulação e a reprodução das classes sociais e suas frações”. Tendo uma ação deliberativa ou não, o Estado capitalista cria e ratifica a segregação em todos os seus termos, afinal, o seu comando é a lógica capitalista. O papel do Estado, portanto, na produção do espaço urbano, tem sido em grande parcela, o agente reprodutor do pensamento cartesiano. A crise da insustentabilidade urbana é produto da urbanização célere e sem planejamento, fato concreto das ações dos agentes produtores do espaço urbano, particular, àqueles com acesso direto e indireto ao capital. As ações interventoras no espaço urbano são percebidas na materialidade da paisagem dele, abrindo um campo de interpretações econômicas, analisada no cerne da economia enquanto ciência dogmática e ditatorial. Podemos apontar a economia como uma das ciências que mais se apropriou do pensamento cartesiano. Um modo de fragmentar o conhecimento científico e dissociá-lo da racionalidade ambiental, da qual suas propostas 72
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são de equilíbrio, preservação e qualidade ambiental e de vida dos seres humanos. Consequentemente, a sustentabilidade espacial contendo as dinâmicas sociais que produzem o espaço geográfico é atingida diretamente pelas externalidades econômicas – empreendimentos que implantados em algum recorte espacial impactam a dinâmica local tanto em aspectos positivos como negativos –, ao modo em que produzem outras externalidades que a própria economia chamou-as, segundo Leff (2010, p.20): “conjunto de problemas que se mostram fora do alcance da compreensão da teoria do processo econômico que tem dominado as formas de organização social e de intervenção sobre a natureza”. Este conjunto de problemas pode ser observado na escala local no aumento da pobreza; invasão da área rural desproporcional à harmonia espacial; poluição atmosférica, sonora e de aquíferos; impermeabilização do solo e alagamentos. Já em uma escala mais ampla, essas interferências socioespaciais e ambientais insustentáveis no local são partes da crise planetária gerada pela economia: A teoria econômica constitui-se como um paradigma ideológico-teórico-político – como uma estratégia de poder – que, desde seus pressupostos ideológicos e seus princípios mecanicistas – a mão invisível e o espírito empresarial; a criação da riqueza e do bem comum a partir do egoísmo individual e da iniciativa privada; 73
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o equilíbrio da oferta e da procura, dos preços e dos valores de mercado, dos fatores de produção –, gerou um mundo que hoje transborda sobre suas externalidades: entropização dos processos produtivos, alteração dos equilíbrios ecológicos do planeta, destruição dos ecossistemas, esgotamento dos recursos naturais, degradação ambiental, aquecimento global, desigualdade social, pobreza extrema (LEFF, 2010, p.21).
A economia é, sobretudo, uma condutora política institucional. Sistematicamente suas diretrizes recaem direta e indiretamente no território, comandadas pelos setores públicos e privados. As interferências econômicas atingem as dimensões ambientais e sociais, consequentemente, reproduzindo e impactando o espaço geográfico. As externalidades que o autor molda são mazelas ambientais e não devem ser tratadas do isolamento dos mecanismos fixos econômicos, empresas ou indústrias, que se instalam em um local. A relação entre objetos fixos e fluxos deve ser avaliada pelos parâmetros de impactos que esta relação causa no recorte espacial, sendo que o poder logístico privado é quem a valida. Conforme Salvatore (1984, p.86), “as externalidades são divergências entre custos privados e custos sociais ou entre lucros privados ou lucros sociais”, “ou em benefícios”, acrescenta Marta (2011, p.19). O que nos levou a busca pela compreensão da interconexão entre a pro74
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posta da sustentabilidade espacial e ambiental em um estudo de caso no bairro São José, cidade de Juazeiro do Norte, Ceará, Nordeste brasileiro, com as externalidades geradas a partir da implantação de uma determinada empresa atacadista por meio das percepções dos moradores deste local.
Externalidades, desencontros e sustentabilidade
Consumir pelo consumismo é um termo que descreve tanto o processo de produção como a etapa final de usufruir o produto. Dois modelos teóricos da microeconômica que trata do processo de produção e do consumo. Segundo Marta (s/d), entre produzir, consumir e proporcionar o bem-estar, os valores individuais sempre estarão superiores às condições que se agregam a este processo e os valores coletivos. A máxima concretiza-se em aumentar o lucro desassociado dos impactos que a produção, essencialmente industrial, bem como, o descarte do objeto de consumo causa ao meio ambiente. Pensamento economicista dos neoclássicos, do qual se acreditou que os resíduos gerados pelo processo industrial são elementos isolados da produção (MARTA, s/d). 75
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As condições humanas coletivas e ambientais, ou melhor, a crise ambiental que é civilizatória (LEFF, 2010), a pobreza como uma condição da ditadura do crescimento econômico (SANTOS, 2009), bem como, desigualdades e desarmonias ambientais formam fenômenos considerados como externalidades, “anomalias”, do capitalismo. Em uma abordagem essencialmente microeconômica o conceito diz respeito às vantagens e desvantagens que um empreendimento pode trazer à população que é afetada por este. Segundo Marta (s/d p. 19) Externalidade pode ser compreendida como um “bem sem preço, portanto uma categoria de bem público”. Isso se reflete no fato de que as consequências, benéficas ou não, de um empreendimento, não podem ser mensuradas no tocante a preços, porém, apesar de não serem palpáveis, podem ser perfeitamente sentidas. Segundo Pindyck & Rubinfeld (1994) apud Marta (s/d, p 19) externalidade é o que acontece quando a intervenção governamental ocorre para aumentar o bem-estar dos consumidores e produtores ao mesmo tempo. Esta situação se dá com a atuação dos consumidores ou dos produtores que se reflete no custo benefício.
Nesta perspectiva percebemos que os conceitos trabalhados até então podem ser contemplados na pesquisa 76
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de campo através das falas de moradores do bairro São José, que convivem com as externalidades produzidas pela atuação da empresa atacadista mensurada. Quando um empreendimento se estabelece em uma comunidade, existe uma parceria entre o poder público local e a empresa, no sentido de procurar a melhor maneira de executar a inserção. Esta etapa da instalação deve levar em consideração o bem-estar da comunidade, não podendo ser negligenciado nenhum aspecto que venha a provocar dano à população, que será de alguma forma afetada ou beneficiada por ele. Neste tocante foi possível perceber que o empreendimento atacadista analisado produziu externalidades positivas e negativas, premissa constatada, por exemplo, na fala do entrevistado A ao expor sua opinião sobre a instalação da empresa no bairro. O empreendimento é ótimo. Valoriza demais nossas casas. Mas o nosso problema com relação a ele é o desentendimento que houve entre o gestor municipal e a empresa na época que foi feita a obra. Porque eles fizeram um muro que barra tudo que vem do bairro. Porque tanto a Rua Antônio Torres como a Rua Daniela Matos se transformam em um verdadeiro rio de água suja, imunda. Além disso, as pessoas não têm consciência e jogam lixo na rua. Se você visse essa área aqui e quantos sacos de lixo já entraram por essa porta. Então, 77
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a presença dessa empresa valoriza os nossos imóveis, no entanto, o muro que eles fizeram nos prejudica ainda mais. (informação verbal)1.
O discurso ora apresentado traz imbricado elementos essenciais para uma discussão não somente sobre externalidades, visto que dispõem vantagens e desvantagens que a organização trouxe consigo para o bairro, mas também, pode-se tratar do conceito de sustentabilidade, bem como a respeito da atuação da gestão local em relação aos problemas que a comunidade enfrenta. Em se tratando de sustentabilidade, tem-se hoje um discurso exacerbado a respeito do conceito, o tal, em tese, não contempla a real necessidade de compreensão da problemática que há em torno deste tema. Na verdade, a questão do meio ambiente e das múltiplas facetas da sustentabilidade, visto que não se pretende ser reducionista no trabalhar desta temática, perpassa por uma complexidade que está para além da veiculação midiática circundante, saturada, sobretudo, pela política e economia. Assim, analisando a disparidade entre discurso e prática do princípio em questão na gestão pública, constatamos a distorção das ações em relação à nova proposta de pensar 1. Todas as informações referenciadas como fala dos moradores foram adquiridas através de informação verbal, a partir de entrevista estruturada como conversação informal.
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e conduzir a sociedade; a economia, por sua vez, elaborou novos desdobramentos de marketing ambiental para fundamentar este novo modismo, provocando o desgaste terminológico do termo. Entende-se aqui que sustentabilidade é uma proposta alternativa para o modelo de desenvolvimento vigente até então. Reduzir o termo a abordagens meramente econômicas seria minimizá-lo. Por outro lado, crê-se ser “necessária emergência de um novo paradigma cultural e filosófico: o paradigma da sustentabilidade, decorrente das demandas por uma proposta pós-moderna de desenvolvimento” (NEVES, 2013, p.23). Assim, este paradigma converge em si mesmo ciências e saberes, não se detendo a um ou a outro. Nesta perspectiva, internalizar a sustentabilidade significa reinventar uma sociedade capaz de exigir de si própria uma ruptura com o modelo antigo, a única maneira de ser sustentável. Por essa ótica, Cristovam Buarque nos afirma: Junte-se a essa cultura que desrespeita a natureza, a mente que anseia vorazmente o consumo, com os braços que produzem descontroladamente e a boca que consome viciadamente: um comportamento social esquizofrênico, uma civilização evidentemente louca, porque comemora e ri de sua autodestruição. [...] Minha contribuição, hoje, para a busca de um desenvolvimento 79
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sustentável, é mais no sentido de tentar mudar a mente das pessoas, criar uma consciência de sustentabilidade [...] (BUARQUE, 2000, p.51).
De fato, sem uma mudança interna nas pessoas, desde a dona de casa até o empresário capitalista, não será possível uma concepção exequível de desenvolvimento sustentável. Pois, se faz necessário que o homem se reconheça como parte de um todo, que precisa ser preservado; parte de uma natureza não adjacente, mas intrínseca a ele. Visto assim, a sustentabilidade é um caminho pelo qual precisam jornadear os vários atores sociais. E essa mudança não se detém a um projeto de ação quando se detecta um impacto, mas, é a metamorfose da consciência que fará com que tais atores exteriorizem suas ações. Para Edgar Morin (2012), as bases precisam estar juntas. O processo de mudança pertence a ambas, estrutura econômica e população. Pois, detendo-se somente a uma ou a outra o processo está fadado ao fracasso, mesmo que posterior. Por outro lado operando nos dois planos, ainda segundo o autor, um novo caminho é possível se “criarmos um novo modo de desenvolvimento e um novo tipo de sociedade que não podemos prever, mas que ultrapassa as expectativas dos indivíduos e da sociedade atual” 2 . 2. Entrevista concedida ao Le Monde Brasil Diplomatique acerca do Futuro da
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Impressões da pesquisa (resultados e discussões) Dentro deste panorama teórico, retomam-se aqui as impressões apreendidas durante a pesquisa de campo. A fala dos moradores entrevistados forneceu elementos para identificação dos conceitos elencados. As externalidades produzidas podem ser identificadas em seus dois modos de concepção, negativa ou positivamente. Identificam-se como negativas aquelas que trazem algum dano ou ônus para os moradores. Visto por outro ângulo, têm-se elementos identificados como vantagens para tais. Como exemplo de impactos produzidos pela espacialização da organização supracitada pode-se citar os alagamentos, acúmulo de lama e inundações residenciais, mostrados na Ilustração 1, (Anexo B), que desencadeiam uma série de problemas, como transmissão de doenças, prejuízo financeiro, entre outros. Como é possível perceber na fala do entrevistado B: Tem muitos problemas, porque teve as enchentes, quando chove bastante a água ela empoça nesta rua atrás do supermercado, e isso é prejudicial para nós, para
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nossa saúde. Eles deveriam fazer uma forma com que a água não fosse barrada, uma canalização para ela ir embora, e não ficasse parada tanto tempo nestas ruas das proximidades.
Percebe-se claramente que o problema da inundação é recorrente, quando também é identificado na fala do entrevistado A:
O que é dramático é você ver a rua inteira se transformando num rio, a água entrando na sua casa e você não poder fazer nada. Na primeira chuva que aconteceu depois que eu me mudei, e a gente não sabia o que acontecia. Alagou tudo. Nós perdemos documentos, livros, móveis, colchões, perdemos muita coisa, porque não sabíamos que era de tão grande proporção. E quando a água baixa deixa uma lama muito espessa e grudenta. Outra coisa que é muito prejudicial são os próprios moradores que não colaboram de maneira nenhuma pra reduzir os impactos da enchente. Porque já se sabe que quando vem uma chuva grande a água vai subir porque os bueiros não suportam o volume de água. Entretanto, a população faz questão de colocar as sacolas de lixo para a chuva levar.
Neste discurso pode-se contemplar ainda a perspectiva da sustentabilidade, tanto no que se refere à empresa, quanto à população. No tocante à primeira, entende-se que não houve o planejamento adequado na drenagem 82
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para evitar os transtornos com as inundações. Quanto à segunda, não há uma consciência ambiental sustentável que norteie o manuseio dos resíduos sólidos. Outra perspectiva de bastante notoriedade diz respeito à atuação do poder público local no sentido de solucionar o entrave. De acordo com o entrevistado B:
A responsabilidade de resolver o problema é das duas partes, da prefeitura e da empresa em questão. Eles precisam entrar em acordo e fazer uma canalização que a água não pare. Mas eles não se importam, há um descaso tanto de um como de outro. Mas principalmente da prefeitura, que não faz nada para resolver os problemas do bairro.
O mesmo pensamento é expresso na fala do entrevistado A:
Eu entendo que a empresa tem responsabilidade sobre a inundação, porque não fizeram a canalização que suportasse o volume de água que escoa do bairro. Mas eu acho que o principal responsável é a prefeitura, porque ela não fez a fiscalização quando foram construir o prédio. E agora que o problema se repete todo ano na época de chuva, a prefeitura continua sem fazer nada por nós.
Por outro lado, as entrevistas realizadas expressam pontos positivos do empreendimento em questão, consi83
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derada na abordagem teórica apresentada como externalidade positiva. Como na opinião do entrevistado B:
Foi muito gratificante para todos nós aqui do bairro, porque antes era muito difícil para todos nós fazermos as compras. Com a instalação do supermercado eu fiquei muito feliz, porque eu me sinto como se estivesse em São Paulo. Tudo que eu quero eu encontro lá.
Outro aspecto citado, e talvez o de maior representatividade como externalidade seja a crescente urbanização do bairro, que cresceu absurdamente após a instalação desse e de outros serviços nas proximidades. Pode-se perceber também como a especulação imobiliária atua neste processo, ratificando as ideias trazidas no início desta pesquisa sobre os produtores do espaço urbano. Para tanto, dispõem-se da fala do entrevistado B:
De repente teve um crescimento muito grande no bairro, e todos se alegraram, porque facilita muita coisa, e é um ponto de referência. Além disso, valorizou bastante o bairro, o valor dos imóveis, o aluguel. As vendas de casas e terrenos aumentaram porque as pessoas viram que estava valorizando o bairro.
Do ponto de vista das externalidades positivas, também foi identificado que o supermercado ao se instalar na região, além de trazer acessibilidade para comunidade 84
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que contempla, tem um alcance territorial macro da região. Já que não somente a população juazeirense usufrui dos serviços prestados, outrossim, a circunvizinhança oferece demanda. Somado a isto, ressalte-se o fato de que este tende a gerar empregos.
Considerações finais
Toda associação de urbanização-sustentabilidade-externalidade se converge na produção do espaço urbano e na maneira que os agentes produtores atuam no espaço em questão. O bairro São José é uma célula urbana da materialidade da apropriação capitalista produtora de impactos ambientais e sociais local. Dessa forma, considerou-se a contento evidenciar a forma que um empreendimento econômico pode influenciar na dinâmica local, e como suas premissas sempre estão a serviço do capital. No estudo de caso do bairro São José, o ponto crucial de análise foi a intervenção espacial e econômica de um empreendimento atacadista que cominou na vertente político-institucional, por exemplo, no entanto não se pretende esgotar aqui a discussão. É possível inclusive identificar outros caminhos de pesquisa a serem percorridos. Pode-se citar como exemplo qual seja a atuação da administração pública no fomento ao crescimento urbano da cidade, ou 85
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mesmo do bairro estudado. Quanto mais se olha para o espaço, mais se encontra nele o desconhecido.
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Sustentabilidade e externalidades dos impactos espaciais e ambientais de um empreendimento
Anexo Figura 1. Alagamento na Rua Maria OtĂlia Barbosa
Fonte. Eliza Pereira, 2013.
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Agentes literários: disseminando poesias para a autorreflexão Antônia Aparecida Barros Alencar Correia Állef Torres da Silva
Introdução A poesia consegue transmitir mensagens de forma lúdica e eficaz, ao contrário do que alguns pensam que ela tem função de fugir da realidade, na verdade, a poesia desperta o leitor para o que lhe cerca. Na educação hodierna, temos nos deparado com uma vida agitada, com falta de tempo para se perceber e perceber o próximo. Pensar em trabalhar poesia em sala de aula, desperta nos alunos todo um pré-conceito em relação ao sentido dado ao que venha a ser poesia. São tantos conceitos estereotipados, como: “coisa de mulher”; “muito chata”; “muito difícil de entender, de fazer e de sentir”. Mesmo assim, rompendo barreiras, buscamos pessoas que se sensibilizassem com o tema e, encontramos. Então, ousamos para a realização do nosso sonho! Sonho esse denominado projeto de extensão Agentes literários: disseminando poesias para a autorreflexão. É 89
Agentes literários: disseminando poesias para a autorreflexão
um projeto desenvolvido no Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia Sertão Pernambucano – Campus Salgueiro, tendo como bolsista Állef Torres da Silva, aluno do 3º ano do Médio Integrado em Informática e dois voluntários: os alunos Vítor Vinícius e Maria Eduarda, ambos os alunos do 1º ano do Médio Integrado em Informática, a professora orientadora Antônia Aparecida Barros Alencar Correia e a colaboradora, professora Maria Marli Melo Neto. O Projeto Agentes Literários se realiza na sede do Projeto Comunitário de Atendimento à Criança e ao Adolescente (PROAC) fundado em 17/02/1992 pelo Padre Remi de Vettor. É uma organização não governamental, localizada no município de Salgueiro/PE, cujo objetivo é servir como reforço escolar para alunos de classe social desfavorecida e que fazem parte de um grupo de risco. Atualmente é dirigido por Marcelo Figueirôa e Amélia Angelim. Assim, o objetivo deste artigo é descrever os recursos, as estratégias, os métodos e os resultados com os quais esse projeto vem contribuindo para a comunidade salgueirense e, principalmente, para a organização não governamental, Projeto Comunitário de Atendimento à Criança e ao Adolescente (doravante: PROAC). O projeto, pensando no grupo de risco atendido pelo PROAC, crianças de 07 a 16 anos, entra neste contexto com os objetivos de desenvolver atividades sociocul90
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turais, educativas e lúdicas, visando à elevação da autoestima para gerar cidadãos críticos e participativos na sociedade em que estão inseridos. De acordo com o psicólogo russo Alexander Luria (2012, p.52):
Novas experiências e novas ideias mudam a maneira de as pessoas usarem a linguagem, de forma que as palavras tornam-se o principal agente da abstração e da generalização. Uma vez educadas, as pessoas fazem uso cada vez maior da classificação para expressar ideias acerca da realidade.
Desse modo, o projeto está levando novas experiências literárias e culturais para as crianças do PROAC, propiciando o fortalecimento nos vínculos de convivência, na comunidade e na família; já que o homem, um ser extremamente social, necessita da convivência em sociedade para poder desenvolver-se e, com isso, criar espaços de reflexão e autorreflexão sobre a realidade do presente e as metas de seu futuro, além de pensar a sociedade como participante dela. Contudo, é preciso manter nessas crianças e jovens o fundo lúdico, intuitivo e criativo, que se identifica basicamente com a sensibilidade poética, por isso a escolha de trabalhar a cidadania através da leitura e produção poética foi proposital. Parafraseando Sant’Anna, não há quem não se sensibilize com a poesia, uma vez que esta é a expressão 91
Agentes literários: disseminando poesias para a autorreflexão
dos nossos sentimentos, do nosso íntimo e é mister ser cultivada. Assim sendo, através de visitas periódicas à Instituição, desenvolvemos leituras, declamações, audições e oficinas de poesia. Com essas ações, temos promovido momentos de sensibilidade e de valores estéticos. São momentos de muita riqueza de sentimentos, de interação, de reflexão e, acima de tudo, de muita autorreflexão. Com o projeto, mostramos que apesar de muitos acharem a poesia um texto distante da vida cotidiana, ela está o tempo todo dentro de nós. E para isso, partimos de poesias que retratassem o cotidiano, as brincadeiras infantis. Usamos, inclusive, as poesias musicadas de conhecimento da grande maioria. Com essa dinâmica, alcançamos o aluno interagindo espontaneamente e, o mais esperado: produzindo poesias naturalmente. Com isso, percebemos o quão estimulado está o aluno/ bolsista para a vida acadêmica, como também, a desenvolver ações voltadas para a melhoria da qualidade de vida da população, ampliando a função social do Instituto Federal como educação pública, gratuita e o com compromisso para a transformação da sociedade. Então, essa é uma das formas de familiarizar e de aproximar as crianças e os jovens da poesia. E essa forma de familiarização e aproximação está sendo feita com 92
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parcimônia e através de um planejamento para evitar as várias afirmações de que as poesias e os poemas são de difíceis interpretações e entendimento. Ressaltamos que o “agente literário” deve partir de uma leitura poética do mundo, fazendo da poesia motivo de apreciação lúdica e de motivação para a produção de intertextualidade (relação existente entre textos diversos, da mesma natureza ou de naturezas diferentes e entre o texto e contexto) e de muitas outras formas de criar com seriedade, mas brincando com palavras. Brincarmos sim, pois o material para tudo isso está ao nosso redor, ou seja, poesia é tudo que nos cerca e que nos emociona quando tocamos, ouvimos ou provamos. Poesia é a nossa inspiração para viver a vida. E para o autor Elias José (2003, p. 101), “ser poeta é um dom que exige talento especial. Brincar de poesia é uma possibilidade aberta a todos”. Então, se todos podem brincar de poesia, por que não trabalhar a poesia de forma lúdica? Assim propomos atividades que oportunizem momentos lúdicos aos jovens, tendo em vista exercícios de imaginação, de fantasia, de criatividade; e ao mesmo tempo, mostrar a vida de uma forma mais poética, com maior liberdade para construir seu conhecimento. Todas as estratégias capazes de aguçar a sensibilidade da criança e do adolescente para a poesia são 93
Agentes literários: disseminando poesias para a autorreflexão
válidas. É interessante para isso, que a poesia seja frequentemente trabalhada para que ocorra um interesse por ela. Por isso o Projeto – Agentes literários: disseminando poesias para a autorreflexão tem como uma de suas metas, que esses jovens fortaleçam os vínculos de convivência, de grupo, de comunidade e de família; que criem espaços de reflexão e de autorreflexão sobre a realidade do presente e as metas de seu futuro através das várias leituras-poéticas preservando em cada jovem o fundo mágico, lúdico, intuitivo e criativo, que se identifica basicamente com a sensibilidade poética. A poesia é a expressão do pensamento em sua carga máxima de significado e de reflexão. Ela apresenta ritmo, sentimento, emoção, e quiçá, denúncia; ou seja, uma poesia de caráter humanizador, ético, e por que não dizer de caráter social, capaz de transformar o mundo. Mundo esse que deve ser visto e enxergado a partir da realidade circundante, de maneira real, mostrando as possibilidades de perpetuá-lo ou de modificá-lo, ou ainda, de não ser “percebido” vivendo no conformismo “que cabe a mim o destino”. Para isso, é preciso contato no dia a dia com poesias de vários aspectos, em busca de interação, já que são textos pouco explorados pela escola.
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Metodologia e resultados alcançados até agora Esse projeto apresenta uma metodologia de estudo, pesquisas, ações, e para tal, faz uso dos seguintes passos: leitura, visitas exploratórias, aplicação de conceitos e produção poética. • Pesquisas bibliográficas contínuas de diversos assuntos relacionados à produção poética, tais como denotação e conotação e figuras de linguagem além de leituras diversas de poemas e de poesias de artistas nacionais e regionais; • Produção de material fruto de tais pesquisas; • Elaboração de oficinas de leitura e produção de texto (sendo ele escrito ou não); • Visitas exploratórias a cada 15 dias, com duração de uma a duas horas cada, ao PROAC, alternadas entre as duas turmas, uma com alunos de 7 a 11 anos e outra com alunos de 12 a 16; • Audição de poesias musicadas; • Aplicação do material através de palestras temáticas, divididas em três momentos: 95
Agentes literários: disseminando poesias para a autorreflexão
ABORDAGEM Para que os conceitos sejam introduzidos e entendidos com maior facilidade é feita, inicialmente, alguma atividade lúdica ou pergunta que, consequentemente, leva ao segundo momento. Para facilitar esse momento, o aluno bolsista sempre utiliza a música, tocando violão, como ferramenta de aproximação com as crianças. De preferência, sempre músicas que eles conheçam e que sejam de artistas regionais buscando exaltar e divulgar a produção cultural local, além de incentivar as crianças a também produzirem.
APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DE CONCEITOS Após a abordagem, os conceitos a serem trabalhados são apresentados aos alunos mediante abordagem dialógico-reflexiva, visando demonstrar sempre alguma aplicação do assunto no seu cotidiano.
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PRODUÇÃO DE POESIAS E/OU DESENHOS ENVOLVENDO OS TEMAS DISCUTIDOS Após visita ao PROAC, todo o material produzido é revisado e organizado para posteriores apresentações.
Poesia: o porquê da escolha desse gênero textual
A poesia se utiliza de uma linguagem que toca a essência do ser humano. E esse é o ponto chave do projeto: a busca do humano presente em cada pessoa. Desse modo, foi preciso discutir alguns conceitos preliminares ao de poesia, como:
Denotação e Conotação
“Nos textos literários nem sempre a linguagem apresenta um único sentido, aquele apresentado pelo dicionário. Empregadas em alguns contextos, elas ganham novos sentidos, figurados, carregados de valores afetivos ou sociais.” (Por Marina Cabral Especialista em Língua Portuguesa e Literatura Equipe Brasil Escola) 97
Agentes literários: disseminando poesias para a autorreflexão
• Quando a palavra é utilizada com seu sentido comum (o que aparece no dicionário) dizemos que foi empregada denotativamente. • Quando é utilizada com um sentido diferente daquele que lhe é comum, dizemos que foi empregada conotativamente. Este recurso é muito utilizado na literatura.
A linguagem conotativa não é exclusiva da literatura, ela é empregada em letras de músicas, anúncios publicitários, conversas do dia a dia. Assim, passamos a audição da canção Dois Rios de Samuel Rosa, Lô Borges e Nando Reis, o ‘Sol’ na canção aparece empregado conotativamente:
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Dois Rios Samuel Rosa, Lô Borges e Nando Reis
O sol é o pé e a mão O sol é a mãe e o pai Dissolve a escuridão O sol se põe, se vai E após se pôr O sol renasce no Japão Eu vi também Só pra poder entender Na voz a vida ouvi dizer Que os braços sentem E os olhos veem E os lábios beijam Dois rios inteiros Sem direção E o meu lugar é esse Ao lado seu, meu corpo inteiro Dou o meu lugar, pois o seu lugar É o meu amor primeiro O dia e a noite, as quatro estações Que os braços sentem E os olhos veem E os lábios sejam Dois rios inteiros Sem direção O céu está no chão O céu não cai do alto É o claro, é a escuridão
O céu que toca o chão E o céu que vai ao alto Dois lados deram as mãos Como eu fiz também Só pra poder conhecer Tudo que a voz da vida vem dizer Que os braços sentem E os olhos veem E os lábios beijam Dois rios inteiros Sem direção E o meu lugar é esse Ao lado seu, no corpo inteiro Dou o meu lugar, pois o seu lugar É o meu amor primeiro O dia e a noite, as quatro estações Que os braços sentem E os olhos veem Que os lábios sejam Dois rios inteiros Sem direção Que os braços sentem E os olhos veem E os lábios beijam Dois rios inteiros Sem direção
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Agentes literários: disseminando poesias para a autorreflexão
Trabalhamos, também, conceitos de Figuras de Linguagem (de som, de construção, de pensamento e de palavras); diferença entre Poesia e Poema; Gêneros Textuais (com enfoque em poesia) e Tipos Textuais.
O que é Poesia?
Poesia – composição em versos estruturados ou não de forma harmoniosa. É uma manifestação de beleza e estética retratada pelo poeta em linguagem verbal ou não verbal. No AURÉLIO (2001, p.541) “S.f. 1. Arte de criar imagens, de sugerir emoções por meio de uma linguagem em que se combinam sons, ritmos e significados. 2. Composição poética de pequena extensão. 3. Gênero poético. 4 Fig. Caráter do que emociona, toca a sensibilidade.” Portanto, conceituar Poesia é bastante subjetivo; contudo não é inimaginável, pois cada ser tem consciência do seu campo de ideia, de visão abstrato e concreto. No sentido figurado, poesia é tudo aquilo que comove, que sensibiliza e desperta sentimentos. É qualquer forma de arte que inspira e encanta, que é sublime e bela. Existem determinados elementos formais que caracterizam um texto poético – como, por exemplo, o ritmo, os versos e as estrofes – e que definem a métrica de uma 100
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poesia. A métrica de um poema consiste na utilização de recursos literários específicos que distinguem o estilo do poeta. Os versos livres não seguem nenhuma métrica. O autor tem liberdade para definir o seu próprio ritmo e criar as suas próprias normas. Esse tipo de poesia é também designado por poesia moderna, na qual se destacam elementos de modernismo. A poesia em prosa também dá autonomia ao autor para compor um texto poético não constituído por versos, desde que haja harmonia, ritmo e a componente emotiva inspirada pela poesia.
O que é Poema?
Poema é uma obra literária que pertence à poesia cuja apresentação pode surgir em forma de versos, estrofes ou prosa, com a finalidade de manifestar sentimento e emoção. Um poema possui extensão variável e ao longo do texto expõe temas variados em que há enredo e ação, escritos através de uma linguagem que emociona e sensibiliza o leitor. No AURÉLIO (2001, p.541) “S. m.1. Obra em verso ou não, em que há poesia. 2. Composição poética de certa extensão, com enredo.” O texto poético tem uma forte ligação com a música, a arte e a beleza. A poesia 101
Agentes literários: disseminando poesias para a autorreflexão
presente no texto é a componente que distingue o poema. Geralmente se apresenta em forma de versos e estrofes com rima e ritmo. A prosa poética tem o caráter de poesia devido ao efeito emocional provocado pela linguagem. A palavra “poema”deriva do verbo grego “poein”que significa “Fazer/ Criar/ Compor.” A literatura grega teve grande importância nas composições literárias de várias épocas e culturas. Na Grécia Antiga, todas as produções literárias – os gêneros épico, lírico e dramático – eram consideradas poemas. Após a apresentação e discussão desses conceitos, declamou-se a Poesia
Gastei uma hora pensando um verso que a pena não quer escrever. No entanto ele está cá dentro inquieto, vivo. Ele está cá dentro e não quer sair. Mas a poesia deste momento inunda minha vida inteira. Carlos Drummond de Andrade
Em visitas com as turmas de 07 a 11 anos de idade, explorou-se, também, o lúdico de variações de cantigas infantis, coletadas no Blog Eliete Soares (http://seriesiniciaisumapaixao.blogspot.com.br), como: 102
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A barca virou A barca virou, No fundo do mar, Porque a (nome da pessoa) Não soube remar. Adeus (nome da pessoa) ! Adeus, Maranhão ! Adeus, (nome da pessoa) ! Do meu coração !
Essa cantiga é uma variação de “A Canoa Virou” e foi usada em uma brincadeira de roda. Todos de mãos dadas, vão sendo ditos nomes e, consequentemente, o nome mencionado na cantiga, é indicador de que a pessoa saia da roda. Repetem-se as quadras, citando-se o nome de cada criança que estava à esquerda daquela que saiu. Prossegue a brincadeira até que a roda desapareça. Após essa dinâmica, as crianças foram para um momento de desenho livre, em que todos ficam sentados ou deitados no chão, em grupo e/ou individual para expressar-se da melhor forma. Trabalhou-se com poesias regionais musicadas como Vaca Estrela e Boi Fubá do poeta cearense Patativa do Assaré:
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Vaca Estrela e Boi Fubá Seu dotô me de licença Pra minha história contá Hoje eu tô na terra estranha E é bem triste o meu pená Mas já fui muito feliz Vivendo no meu lugá Eu tinha cavalo bom Gostava de campeá E todo dia aboiava Na porteira do currá Ê, vaca Estrela, ô, boi Fubá Eu sou fio do nordeste Não nego o meu naturá Mas uma seca medonha Me tangeu de lápra cá Lá eu tinha o meu gadinho Não é bom nem imaginá Minha linda vaca Estrela E o meu belo boi Fubá Quando era de tardezinha Eu começava a aboiá Ê, vaca Estrela, ô, boi Fubá Aquela seca medonha Fez tudo se trapaiá Não nasceu capim no campo Para o gado sustentá O sertão esturricô, fez os açudesecá Morreu minha vaca Estrela Se acabou meu boi Fubá Perdi tudo quanto eu tinha Nunca mais pude aboiá
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Ê, vaca Estrela, ô, boi Fubá Hoje nas terra do sul Longe do torrão natá Quando eu vejo em minha frente Uma boiada passá As água corre dos oios Começo logo a chorá Lembro minha vaca Estrela E o meu lindo boi Fubá Com sordade do nordeste Dá vontade de aboiá Ê, vaca Estrela, ô, boi Fubá
Assim suscitamos um clima de poesia pela terra natal, o que deu origem ao concurso de poesia “Meu Lugar” além de descobrir/despertar novos agentes literários. A iniciativa partiu da necessidade da aproximação das crianças e dos jovens com a poesia. O concurso apresentou as seguintes características:
Concurso de poesia: Meu lugar
• O tema “Meu lugar” - faz referência às origens do escritor, seja o país, estado, município ou mesmo sua casa. • O porquê do tema - coletar informações sobre como o aluno enxerga o mundo que lhe cerca, dando-lhe a oportunidade de escrever sobre algo que conhece. 105
Agentes literários: disseminando poesias para a autorreflexão
• Natureza do concurso - produção de trabalho inédito, escrito no gênero poema, em língua portuguesa com o tema específico: “Meu Lugar.” • Participantes: alunos envolvidos no projeto. • Normas Gerais
1. Cada participante poderá participar com apenas um trabalho; 2. O trabalho deverá ser inédito e elaborado por uma única pessoa; 3. Ao inscrever-se o candidato estará declarando que o trabalho é de sua autoria e o Projeto – Agentes Literários: Disseminando Poesias para a Autorreflexão poderá fazer uso dele para fins didáticos e publicitários; 4. O trabalho deverá ser entregue em papel A4 podendo ser digitado (com fonte Arial 12) ou manuscrito (legível) à professora orientadora do projeto ou ao bolsista; 5. Determinamos um prazo de entrega.
• Inscrição
1. Não foi necessária efetuação de inscrição. A entrega do trabalho já é a inscrição do participante; 106
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2. Cada trabalho deverá ser entregue devidamente identificado: nome do concurso, o nome do aluno; 3. Os trabalhos recebidos, selecionados ou não, não serão devolvidos aos participantes, sendo usados posteriormente na semana de linguagens.
• Premiação
1. Será selecionada a melhor poesia, de acordo com os critérios de escolha, e o autor poderá participar como um dos agentes literários, tendo sua poesia divulgada no resultado final do projeto, um livro.
• Os trabalhos serão corrigidos perante os seguintes critérios básicos:
1. Criatividade e originalidade do texto; 2. Adequação obrigatória ao tema, texto e linguagem; 3. Clareza de ideias; 4. Ortografia; 5. Concordância; 6. Coesão e Coerência. 107
Agentes literários: disseminando poesias para a autorreflexão
Dessas poesias que estão com os corretores, mostraremos algumas, aleatoriamente, e de maneira genuína, como fruto das produções. Logo divulgaremos os resultados do trabalho e, consequentemente, os mais novos agentes literários. Assim utilizaremos a denominação para os autores de: TEXTO 1 - Lugar Ideal
Meu lugar ideal é todo florido Lá tem música boa, Lá tem alegria e diversão No meu lugar ideal se pode fazer tudo que quiser Sem medo de ser feliz! Lá as pessoas são educadas e gentis Lá elas nunca perdem o humor Vivem cada dia como se fosse o último Em busca da paz e do verdadeiro amor. TEXTO 2 - Cidade Paraíso Leve-me de volta para lá Lá não terei que agradar Só mesmo a quem eu amar Leve-me de volta para lá! Não me obrigue a ser legal Conquiste-me e assim serei Livrai-me do mal E, assim, te farei rei
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Não sejas egoístas Pois te perseguirei Não tente ser mais que alguém Pois de ti não mais gostarei Faças o que te agradar Mas não tente machucar A cidade Paraíso só existe Se assim tu acreditares.
Percebemos nos dois textos apresentados que, de maneira ainda, principiante, os autores demonstram que apreenderam os conceitos trabalhados e buscam utilizá-los como ferramentas para a construção das suas próprias poesias.
Considerações finais
A execução desse projeto está refletindo, positivamente, na promoção da autoestima das pessoas envolvidas, tornando-as crítico-reflexivas para interagirem na sociedade em que estão inseridas. Está contribuindo, ainda, para a formação social e poética dos envolvidos, para valorização e divulgação da imagem do IF Sertão Pernambucano, bem como para o fortalecimento das parcerias produtivas culturais locais. Tais atividades até o presente momento propiciaram o fortalecimento nessas crianças e jovens vínculos de 109
Agentes literários: disseminando poesias para a autorreflexão
convivência em grupo, na comunidade e na família para que criassem espaços de reflexão e autorreflexão sobre a realidade do presente e as metas de seu futuro através das leituras-poéticas e das produções-poéticas, preservando nos jovens o fundo mágico, lúdico, intuitivo e criativo, que se identifica basicamente com a sensibilidade poética. Concluímos, por enquanto, que trabalhar poesias com atividades lúdicas, em que a criança e o jovem sejam protagonistas da construção dos próprios conceitos é prazeroso e desafiador. Devemos investir em atividades com essa finalidade. Os resultados obtidos com esse projeto até o presente nos fazem acreditar que as atividades lúdicas realmente contribuem para isso e que os envolvidos se tornam autores e coautores da produção de conhecimentos para a reflexão da própria vida, ou seja, a autorreflexão. Todos os envolvidos estão percebendo a eficácia do Projeto para a construção da autoestima. Houve uma participação efetiva e eficiente de todos. Os benefícios cognitivos e afetivos atingidos até agora, foram enormes. Portanto, trabalhar poesia para a autorreflexão, é a meta principal do nosso projeto. E vamos dar prosseguimento ao mesmo.
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Literatura e outras linguagens: (re)leitura de conto a partir do desenho e teatro Edilaine Pereira Sousa Ariadne Clímaco Pedro Henrique Simião Vinícius Gonçalves
Introdução Quando Leonardo da Vinci escreveu no livro “O Tratado da Pintura” que “a pintura é uma poesia muda e a poesia uma pintura cega” (DA VINCE, 1944), ele evidenciou a relação que se estabelece entre literatura e pintura mesmo sendo defensor da supremacia da pintura sobre as demais artes. Neste sentido, a ideia de intersemiose literária relação entre texto literário com outras linguagens, configurou-se como algo imprescindível, foco de muitas pesquisas que surgiriam nos séculos XX e XXI. Tal processo intersemiótico “se revela como um dispositivo que pensa as diversas formas de arte, colaborando entre o lúcido e o lúdico” (PLAZA, 2010, p. 209). 113
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No livro “Literatura e outras linguagens”, (BRAIT, 2010, p.194) enfoca que “os textos verbo-visuais formam um todo indissolúvel, cuja unidade exige do leitor a percepção e reconhecimento destas particularidades”. Ao analisar o conto contemporâneo, percebe-se que há muitas “roupagens”, tanto que Hohlfeldt (1991) analisa como sendo envolvente e repleto de sutilezas, conciso, o que é primordial para adaptação teatral, o uso do desenho para reflexão das cenas, pois os propósitos comunicativos contribuem para maior interação entre o texto e o leitor. Para Bosi (1994) o conto reveste-se de temáticas relevantes, organizados de modo atrativo para o leitor, sendo multifacetado. Assim, foi viável analisá-lo dentro de uma abordagem discursiva, segundo Maingueneau (2012) instituindo atividades lúdicas de internalização desta narrativa a partir dos estudos intersemióticos literários. Nesta ótica, o intuito desta pesquisa foi analisar o conto social “Inácio da Diná”, do escritor Rafael Rocha Neto dentro de uma perspectiva intersemiótica. O objetivo deste estudo foi despertar no discente o gosto pela leitura de narrativas ficcionais, atrelando ao processo de ‘reflexividade ficcional’ às várias artes e linguagens como uso do desenho, até a adaptação para o teatro a partir dos estudos de transposição intersemiótica. 114
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Procedimentos metodológicos A pesquisa foi desenvolvida no campus Salgueiro do IF Sertão-PE e os discentes usaram o desenho e a dramatização teatral para refletir sobre as principais cenas do conto supracitado. Foram instituídas atividades intersemióticas lúdicas, que incluiu a elaboração de desenhos até a adaptação do conto para o teatro. As imagens bem como o roteiro foram desenvolvidas pelo grupo de adolescentes do referido Instituto. Este artigo constitui parte de um projeto de mestrado e o grupo formado na instituição de ensino faz parte do projeto de extensão da unidade, intitulado: Teatro e dança no IF Salgueiro – Metamorfose literária para além da sala de aula. Houve análise do conto dentro de uma perspectiva intersemiótica, tendo como base a teoria de Maingueneau (2008), intitulada “semântica global”, que reflete sobre os textos de modo analítico-discursivo e estudos de ‘tradução intersemiótica’ veiculada por Plaza (2010), considerando formas lúdicas de análise de narrativas literárias. Estas foram viáveis tendo em vista que a reflexividade ficcional está associada a outras artes como desenho, teatro, cinema, enfim, com diferentes linguagens. Dessa forma, esta pesquisa se deu por meio dos seguintes procedimentos metodológicos: 115
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1. Em primeira instância, foi feita análise de desenhos pelos alunos que sintetizaram à temática tratada no Conto Inácio da Diná envolvendo a linguagem não verbal; 2. Após isso, foi analisado o roteiro de encenação teatral, considerando a transposição intersemiótica que contribuiu para apreço e a devida fruição literária. 3. Em um terceiro momento, foi feita a análise sistematizada do corpus, seguida de uma reflexão acerca do espaço da literatura no ensino básico.
Resultados e discussões
Análise do conto “Inácio de Diná”, publicado pelo escritor Rafael Rocha Neto em 1992 considerou a Teoria da semântica Global. O estudo do conto foi importante, sobretudo refletido como prática discursiva, pois ao fazer a análise do discurso literário, há outros aspectos cruciais que não são evidenciados se restringirmos ao modelo global de sequência narrativa. Assim, a análise do domínio discursivo indicado por (MAINGUENEAU, 2008, p. 77-85), serviu de base para a análise do conto considerando os seguintes aspectos da teoria da semântica global: 116
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Interdiscursividade – evidenciou-se que as relações interdiscursivas provenientes de diversas instâncias sociais aparecem no desenho e no roteiro composto pelos alunos, porque como indica Maingueneau (2012) e Zilberman (2003) os leitores têm autonomia para atribuir novos sentidos ao texto literário consoante as suas ideologias, valores, preceitos éticos adquiridos no seio familiar, nas instituições religiosas e nas demais instâncias sociais. Desse modo, a maneira como os discentes representaram o estupro seja no desenho ou na encenação, bem como os acréscimos feitos no roteiro mostram que de fato, o leitor é coenunciador do texto literário e isso precisa ser considerado em sala de aula. É preciso que o docente considere diversas possibilidades de sentido, tendo em vista que as relações interdiscursivas são essenciais para identificar aspectos nem sempre explicitados nos textos.
O vocabulário e a dêixis enunciativa – percebe-se que os itens lexicais são determinantes para indicar a intencionalidade do narrador, ou seja, ao escolher determinados sintagmas, o enunciador enfoca questões sociais. Um exemplo neste conto é o uso dos verbos “subir” e “descer” no gerúndio para mostrar a frieza do estuprador de uma garota de 13 anos. A 117
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repetição intencional presente no conto analisado, sobretudo em “subindo e descendo, subindo e descendo, sem ligar aos gritos e aos movimentos de fuga do pequeno corpo da menina de 13 anos”, evidenciam a relevância que devemos atribuir às expressões ao analisar o conto. Tais expressões não devem ser inseridas para reflexão de aspectos gramaticais como normalmente aparecem nos livros didáticos, mas segundo Maingueneau (2008), o vocabulário é crucial para analisar as cenas de modo mais detalhado. Trata-se de dêixis enunciativa, em que certos nomes e verbos em movimento assumem esta perspectiva. Assim, no exemplo citado, os verbos corroboram para a discussão em torno da temática já que o estupro é reflexo dos problemas de violência urbana, atrelado aos dilemas familiares nos quais são submetidas muitas crianças e adolescentes no país.
O tema, modo de enunciação e espaço – as ações que se desenvolvem na narrativa são relevantes, pois constituem um retrato dos fatos sociais. Destarte, é importante que o vocabulário, atrelado à temática sejam considerados na análise de narrativas para evidenciar o modo como os narradores compõem o discurso e a importância destes itens para reflexão do conto, que foca no cenário caótico 118
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no qual estão inseridos os personagens principais, Inácio e Diná, dois irmãos que são órfãos e vivem em condições socioeconômicas adversas. O autor trata tanto do componente físico composto por casebres desestruturados inseridos em local periférico, situado às margens do rio Capibaribe em Recife, como também de aspectos psicológicos dos personagens. Assim, fica clara a denúncia social, já que os personagens não estão apenas em um espaço físico, mas num espaço social representando pessoas que sofrem com as desigualdades provenientes do sistema capitalista vigente no Brasil. O escritor mostra a desestrutura familiar brasileira, bem como o sistema econômico e, numa perspectiva social, Inácio e os companheiros que ele conhece na “escola”, Carola, Bonifácio, Enildo, Espiridião representam meninos que, muitas vezes, enveredam por caminhos tortuosos. É um conto de cunho sócio documental segundo Hohlfeldt (1991). O cenário abaixo descrito pelo narrador contém itens lexicais específicas como “progresso” inserido de forma irônica. Tais cenas são fotografia dos fatos sociais. Assim, o narrador fez uma seleção vocabular para imprimir ao leitor este retrato, o que para Maingueneau (2008) constitui um evento intersemiótico. 119
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“1º PARÁGRAFO DO CONTO – Uma casa (?) de madeira, caindo aos pedaços em alguma das margens do Capibaribe. Numa das margens? Coisa de grande monta escrever assim. Talvez alguma área de lama em algum braço morto do rio. Um pedaço de mangue ainda não aterrado em nome do progresso. E do progresso, nesses espaços, para que falar? O mau cheiro das águas parecia vasculhar o perfil do casebre e dos outros casebres alinhados em torno. Qualquer olhar que se norteasse pelo espaço afora, conseguiria ver ao longe os grandes edifícios quase envoltos pela penumbra do entardecer” (NETO, 1992, p.1).
Para Maingueneau (2008) os enunciadores são levados a utilizar termos que marcam sua posição no campo discursivo. Para o autor, as palavras são empregadas em razão de propagar discursos. “As unidades lexicais tendem a adquirir o estatuto de signos de pertencimento” (MAINGUENEAU, 2008, p. 81). Para ele, o enunciador utiliza termos que remetem a discursos de diversas instâncias sociais. Assim, por meio do item lexical “progresso” percebe-se a interdiscursividade visto que atrelado ao discurso literário, há o discurso político presente, pois no plano social, comumente há tácito incentivo à construção de edifícios para remeter à ideia de desenvolvimento. Isso é criticado pelo autor, visto que é perceptível o uso deste termo no texto de forma sarcástica. É tácita a crítica ao sistema capitalista vigente no Brasil, marcado pelas po120
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líticas públicas ineficientes e a falta de atenção do poder público aos locais periféricos como evidenciado no conto “Inácio da Diná”. O autor utiliza uma linguagem pouco formal, metafórica para mostrar o ambiente caótico na qual estão inseridos os personagens principais e secundários. Assim, a linguagem coloquial e irônico presente nas cenas: “uma casa caindo os pedaços”, “mangue ainda não aterrado em nome do progresso” formam um contraponto com a presença de “ver ao longe os grandes edifícios” remetendo-nos à ideia de um falso progresso preceituado por empresários e políticos ao se referirem ao processo de urbanização das cidades que geram segregação socioeconômica.
“3° PARÁGRAFO DO CONTO – E sangue. Tudo sangue nessa periferia cidadã. E o rio sujo. O braço morto do rio apresentando o trágico: a vida zumbi de homens e mulheres e meninos e meninas. Contraste com o fumo Hollywood, carlton em mistura com o fumo barato e as cachimbadas dos velhos mais distantes catando coisas invisíveis na lama marginal” (NETO, 1992, p.1).
Maingueneau (2008) refere-se ao modo de coesão indicando que as ideias concatenadas contribuem para evidenciar as marcas enunciativas, para a argumentação enfática e progressão temática. No 3° parágrafo, perce121
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be-se a presença de períodos curtos, mas concatenados que complementam a ideia veiculada no 1° parágrafo trazendo o devido retrato do cenário. Assim, na análise discursiva, este cenário fictício descrito é apenas um recorte de cenários reais nacionais onde há o caos social; constitui um retrato fiel das mais diversas formas de violência e desigualdade social que são existentes. Ainda fazendo referência ao vocabulário, as expressões figuradas “periferia cidadã” e “lama marginal” contribuem para marcar o contraste evidenciado pelo fumo barato misturado com o fumo Hollywood, presentes nas cenas descritas. É importante analisar as figuras de linguagem não visando meramente à classificação, mas, sobretudo, à possibilidade de utilizá-las para reforçar o discurso do enunciador, e nesse caso, ainda mais a ideia de sociedade desigual. Em seguida, o narrador descreve a morte de Diná ainda fazendo referência ao espaço miserável conforme indicado nos parágrafos abaixo: “2º PARÁGRAFO – Um bulício de gente. Ordens. Militares fardados. Mulheres. Umas em pranto. Outras falando por falar. Homens maltrapilhos, descalços. Crianças de barrigas inchadas, nuas, magras. Na realidade, tudo em olhos de espanto. Olhos de comiseração. Olhos de fome e por que não dizer, olhos de miséria e olhos de desconfiança? Policiais militares. Policiais civis. Homens de branco saindo do casebre. Um corpo 122
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envolto num lençol sujo. Um rosto de menina. Olhos arregalados injetados de sangue.
4º PARÁGRAFO – E aos olhos de Inácio, o corpo ensanguentado de Diná envolto no lençol sujo. Os cabelos de Diná: as tranças caídas e balançando-se ao vento. E aos olhos de Inácio, as imagens do homem: nu e bestificado em cima do corpo da irmã, subindo e descendo, subindo e descendo, fazendo o sangue escorrer no chão de lama. Subindo e descendo, sem ligar aos gritos, sem ligar aos movimentos ásperos de fuga do pequeno corpo de treze anos.
5º PARÁGRAFO – E aos olhos de Inácio, o olhar do homem. A faca nas mãos, gestos rápidos de fuga, vestindo-se, ameaçando-o, batendo-lhe furioso no rosto com a palma da mão direita, suada, sangrando de alguma mordida da Diná. Diná se escondendo como um pequeno animal assustado. Um cãozinho que houvesse sofrido uma grande surra e depois, o grito, o pulo sobre o homem, a mordida na garganta e Inácio vendo a faca, subindo e descendo, subindo e descendo, subindo e descendo e o corpo da menina no mole, mole, caindo sobre a lama” (NETO, 1992, p.1).
O modo como o autor organiza os verbos na sequência já nos remete ao lamentável retrato de crueldade, frieza dos estupradores em geral. Aliás, a mesma sequência em que descreve a morte de Diná. Referente ao modo de coesão, Maingueneau (2008) discorre acerca da progressão temática que se constitui no 5° parágrafo na medida em 123
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que há repetição dos verbos no gerúndio, para descrever Diná desfalecendo. Nesse sentido, a expressão que se repete “E aos olhos de Inácio” indica a impotência do personagem diante da crueldade do assassino e estuprador da irmã. Assim, segue a narrativa repleta de questionamentos acerca do futuro de Inácio diante da morte precoce de Diná. Agora sozinho, o personagem se submete à assistência direta do poder público ineficaz. Nos parágrafos subsequentes, aparece novamente à interdiscursividade, pois há o discurso literário atrelado ao político conforme indicou Maingueneau (2008). “6º PARÁGRAFO – Que fazer com o garoto? Levá-lo. Para onde? Nada de perguntas idiotas. O menino não tem ninguém por ele. É órfão. É menor. Para a Fundação? Não. Juizado primeiro. Vamos ver se ele nos diz alguma coisa. 7º PARÁGRAFO – Dizer o quê? Não conhecia o homem. Se era dali do meio deles? Não. Nunca o tinha visto. Você está mentindo garoto. Não, não senhor, nunca vi ele. Primeira vez hoje. Nunca o vi. Nunca vi ele.
8º PARÁGRAFO – Você vai para a escola, falou a mulher toda cheirosa de perfume. Você vai aprender a ler, escrever, trabalhar. Vai ser um homem. Vai esquecer tudo isso. Aprenderá tudo na escola. 9º PARÁGRAFO – A escola? Que seria aquela escola para os seus onze anos? Muitos meninos. Meninos 124
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maus. Meninos tristes. O Carola, que fumava cigarros cheirosos encarapitado num imenso pé de jaca? O Bonifácio, que metera um canivete na bunda do vigilante? O Enildo, que dormia na cama de todo o mundo e tinha jeito de menina? O Esperidião, muito alto escuro como carvão e de quem todos tinham medo e diziam que já despachara dois caras da polícia lá pelas bandas de Afogados?
10º PARÁGRAFO – A escola? Ele não podia esquecer a escola. A mulher cheirosa de perfume ele lembrava pouco. Só a vira uma vez. Mas, a escola lhe ensinara muita coisa. Ensinara andar macio. Ensinara a fumar aqueles cigarros cheirosos. Ensinara a usar um canivete. E o Bonifácio, o melhor dos professores. Aprendera com ele a lidar com as ruas da cidade, com os edifícios, com as pontes, com os homens, com os soldados, com as mulheres, com os carros...” (NETO, 1992, p.2).
A partir do sexto parágrafo, há o intercruzamento de discurso, pois mais de uma voz aparece no conto indicando autoridade para tratar do destino de Inácio. As marcas discursivas são evidenciadas pelo narrador do texto na medida em que os questionamentos feitos ao protagonista de certa forma indicam insensibilidade da voz que menciona: “Você está mentindo garoto” e a subserviência de Inácio em tratá-lo de “senhor” indicando não saber da existência do assassino de Diná remete-nos também à ideia de abandono ao qual são submetidos 125
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muitas crianças e adolescentes no Brasil em virtude da desestrutura familiar e problemas socioeconômicos. Assim, a voz da “mulher toda cheirosa de perfume” representa o discurso enganoso de muitos representantes do poder público ao proferir que crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade vão ter assistência devida: “aprender a ler, escrever, trabalhar”, enfim, ter uma vida digna. As soluções ineficientes para os crônicos problemas sociais são evidenciadas no trecho: “vai ser um homem. Vai esquecer tudo isso. Aprenderá tudo na escola”. Em contrapartida, o enunciador segue descrevendo os companheiros de Inácio cujas ações são ilícitas, repreensíveis, opostas às preceituadas pela mulher “cheirosa de perfume”, mulher que representa o poder público. Nesse sentido, as ações de “andar macio”, “fumar”, “usar canivete”, “lidar com as ruas” se contrapõe ao ideal de “ler, estudar, trabalhar” preceituada por tal mulher que reproduz um discurso vazio que não se perpetua. Assim, o “Enildo”, o “Bonifácio” e demais garotos compõem o cenário escolar no conto podendo-se comparar a muitos menores infratores que são taxados indiscriminadamente de bandidos independente da análise do histórico familiar, ineficiência dos serviços sociais oferecidos a estes indivíduos. Do mesmo modo, Inácio, apenas uma criança de 11 anos como muitas existentes em nosso país cometem atos ilícitos e têm suas vidas cei126
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fadas precocemente. O enunciador nos remete ao espaço físico onde ocorrem as primeiras cenas e nos confirma a presença do protagonista dual, pois mesmo morta, a imagem de Diná está viva para Inácio. “11º PARÁGRAFO – E com o rio?
12º PARÁGRAFO – O rio não. Do rio ele tinha medo. O rio lembrava-lhe Diná. O sangue de Diná na lama. O rio lembrava-lhe a morte. Ele não sabia fazer nada contra o rio. Lidar com homens e mulheres, com os tiras (policiais), era muito fácil. Uma vez, um policial civil quase o prendera. Usou de todas as artimanhas, sabedorias do mestre Bonifácio, deu-lhe a metade do apurado de um roubo recente e ficou livre. Os homens são fáceis. As mulheres são fáceis. Mas, o rio não é fácil. Nem o rio, nem aquele tiro, nem o medo de morrer”(NETO, 1992, p.2).
O enunciador enfoca, pois, o que Inácio aprendeu na “escola”, mas novamente traz a imagem do menino indefeso que viu a cena de estupro e morte de Diná. Os adjetivos, “fácil” e “difícil” remetem à sucessão de fatos indicando-nos que Inácio, assim como muitos menores infratores no Brasil desenvolvem mecanismo de defesa em função da situação, tornando-se um “problema” para a sociedade, mas fica evidente a condição de vítima do sistema opressor, tanto que no parágrafo subsequente o narrador usa a personificação, suscitando sentimento à 127
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noite por meio das expressões “Como se estivesse com pena dele a noite escondeu a lua por trás de uma nuvem” já que com a condição de Inácio, órfão, sem ninguém que demonstrasse compaixão, resta ao enunciador o papel de encontrar seres inanimados para se compadecerem de Inácio. Este trecho remete-nos a crianças e adolescentes que de igual modo são mortos todos os dias em nosso país e muitas vezes são tidos como indigentes ou indivíduos sem prestígio social. Nessa ótica, a literatura como prática discursiva nos leva não somente a refletir sobre problemas sociais recorrentes, mas nos sensibiliza muito mais a ler de modo aprofundado textos ficcionais. Nessa perspectiva, esses têm uma função social relevante e deve ter um espaço maior nas instituições de ensino brasileiro.
“13º PARÁGRAFO – Correu pelo calçadão da Rua da Aurora. Ouvia atrás de si as fortes pisadas dos policiais e gritos de raiva. Uma sirene aberta fez doer os seus ouvidos. O sangue molhava sua camisa e pingava sobre o calçadão. Se fosse só os homens. Mas, agora era tudo. Os edifícios pareciam rir dentro da noite. As ruas metiam-lhe medo. Pareciam cheias de fantasmas. Como se estivesse com pena dele a noite escondeu a lua por trás de uma nuvem. Tinha de se esconder logo. Não aguentava mais. Com um salto felino, jogou-se nas águas escuras. O corpo caiu na lama. Arrastou-se sofregamente e conseguiu se esconder embaixo da ponte de 128
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ferro, deitando o corpo cansado num dos vãos abertos entre duas colunas. 14º PARÁGRAFO – Dormiu e sonhou com Diná. Sonhou com Diná e com a cidade. Os edifícios voando sobre sua cabeça, transformando-se em imagens de demônios. Sonhou com Diná e com o rio. A maré baixa. A maré alta. A maré subindo e nunca descendo. Subindo e nunca descendo. A água tocando-lhe os pés descalços. O frio. O frio. O frio... 15º PARÁGRAFO – Com o corpo meio ruído pelos siris ou caranguejos, num dos vãos abertos, entre duas colunas, em baixo da Ponte da Boa Vista, com uma bala no peito e um sorriso nos lábios, foi encontrado morto às onze horas do dia seguinte, o corpo de Inácio da Diná” (NETO, 1992, p.2).
No desfecho, o narrador evoca novamente a dêixis enunciativa utilizando os verbos “subir” e “descer”. Contudo, acrescenta o sintagma nominal “nunca”, ou seja, as imagens de outras cenas ficam evidentes, mas agora os verbos são utilizados para descrever a morte de Inácio. “Os edifícios voando com imagem de demônio”. O sintagma nominal “demônio”, no discurso religioso, remete a algo ruim atrelado à ideia negativa que o narrador já havia atribuído acerca do “falso progresso” decorrente do processo de urbanização marcado pelo aumento de edifícios e pelas desigualdades sociais. O dinamismo do último parágrafo é semelhante à sequência de fatos narradas pelo poeta Bandeira (1930) 129
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quando escreveu “poema tirado de uma notícia de jornal” em que descreve a morte de um carregador da feira livre. Do mesmo modo, Neto (1992) descreve a cena triste da morte oscilando com o estado de espírito de seu protagonista que não aguentava mais viver naquela situação e ao mesmo tempo sonhou com Diná e morreu com um sorriso nos lábios. Em Manuel Bandeira, temos que “João Gostoso” se divertiu antes da morte por, “beber, cantar e dançar” e só depois “atirar-se na lagoa Rodrigo de Freitas” no Rio de janeiro e morrer afogado. Inácio apesar de sentir medo antes da morte, também se atirou no rio... “Com um salto felino, jogou-se nas águas escuras” do rio Capibaribe”, em Recife e também morreu, pois “tinha uma bala no peito, mas um sorriso nos lábios”. Apesar do frio, ele sonhou com Diná, talvez isso justificasse o sorriso nos lábios. Como “protagonista dual”, lembrando-nos o clássico “Romeu e Julieta” de Willian Shakespeare, talvez o sorriso de Inácio mesmo com o sofrimento indicava que ele pudesse encontrar com Diná, pois ele só estaria completo com ela, pois ele era Inácio da Diná. Tal cena remete-nos a esperança. Interessante que ao analisar o roteiro feito pelos alunos, percebemos que eles acrescentam que Inácio viveu feliz após a morte, remetendo à ideia de paraíso, ou seja, a presença do interdiscurso religioso baseado na crença cristã da morte e repouso no paraíso celestial. 130
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Tradução intersemiótica literária: representação de cenas do conto por desenhos A análise de obras literárias envolvendo outras linguagens englobou aptidões diversas dos alunos, possibilitando-os captar ideias relevantes no momento da reflexividade ficcional. O discente com facilidade para desenhar, encenar, etc. pôde utilizar outras linguagens para interpretar narrativas ficcionais. Nesse sentido, o fenômeno da “tradução intersemiótica” possibilitou que uma mesma mensagem fosse expressa com mídias distintas. Plaza (2010) indica que o fenômeno da tradução intersemiótica poderá ocorrer com outros signos linguísticos, a exemplo de adaptação teatral em que se tem um roteiro ou em sistema de símbolos não verbais como é o caso das pinturas e desenhos. Ao analisar o desenho do aluno foi possível evidenciar algumas cenas lidas no conto. Estas imagens sintetizam a ideia principal presente no conto Inácio de Diná. O aluno ilustrou duas cenas cruciais: a primeira envolvendo o estupro e assassinato de Diná e em seguida, a vida de Inácio após a morte da irmã e o contato com meninos que ensinaram o personagem a viver nas ruas e a praticar atos ilícitos (FIGURA 1). 131
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Figura 1. Ilustração do aluno
Fonte: Elaborado pelo aluno Vinícius Gonçalves, 2014
Nessa perspectiva, mesmo que o aluno não tenha consciência da “interdiscursividade” preceituada por Maingueneau (2012), ele inseriu em sua ilustração o sintagma que justamente indica o discurso político enganoso acerca do futuro do personagem, mas que dentro desta perspectiva é um reflexo dos dilemas sociais. Isso está evidenciado no esquema a seguir em que é possível perceber a tentativa do aluno em captar informações relevantes do conto utilizando a linguagem sincrética. Assim, o discente afirmou que atrelar o desenho à leitura literária constitui uma atividade lúdica, dinâmica e está relacionada aos interesses dele tendo em vista a inclinação que possui para a área de edificações. Em suma, a partir desse exemplo, é possível inferir que a análise literária pode envolver outros signos e artes, sendo di132
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nâmica para os discentes. Não se trata de receita para a reflexividade ficcional, mas possibilidades de desenvolver uma metodologia eficaz visando à devida fruição literária. Figura 2. Esquema do conto para o desenho
Fonte: Elaborado pelos autores, 2014
Adaptação de Conto social para o teatro – criação de roteiro A adaptação teatral iniciou-se com a criação do roteiro, passando da narrativa ficcional às cenas interpretadas pelos alunos. Neste processo, houve operação semiótica de transferência havendo cortes que não prejudicaram 133
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o sentido global do texto, bem como a reorganização da narrativa e dos personagens, enfim, a adaptação do cenário se assemelhou ao máximo do conto. Acerca disso, Plaza (2010) afirma que:
“A tradução intersemiótica ou transmutação consiste na interpretação de signos verbais em não verbais ou de um sistema de signo para outro como da arte verbal para a música, a dança, o cinema, a pintura. A tradução como prática intersemiótica, depende muito mais das qualidades criativas e repertoriais do tradutor, quer dizer, da sua sensibilidade, do que da existência apriorística de um conjunto de normas e teorias” (PLAZA, 2010, p. 210).
Plaza trata dos acréscimos importantes para conferir maior dinamismo no palco. Assim, após as leituras de vários contos, os discentes selecionaram o Conto Inácio da Diná para a primeira adaptação por fazer parte da literatura regional, além de apresentar temática interessante, linguagem e o modo de enunciação envolvente. Na primeira cena adaptada, os alunos decidiram abordar à temática de modo sintético, com fundo musical dramático em que um narrador traz uma reflexão importante acerca do destino de crianças e adolescentes órfãos que necessitam de assistência governamental. Eles montaram um roteiro conciso que será descrito a seguir, trazendo alguns acréscimos sem alterar a ideia central do conto social. 134
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Quadro 1. Roteiro elaborado para peça teatral CENA 1 – ESTUPRO E MORTE DE DINÁ - O narrador vai situando os expectadores sobre o assunto tratado no conto. Com fundo musical dramático, ele ler por trás das cortinas uma parte do conto que chama a atenção do Estado para o abandono de crianças e adolescentes, bem como o descaso governamental no Brasil. NARRADOR - Até quando teremos crianças sendo apenas chamadas de “marginais” sem atentarmos para a responsabilidade dos governantes? Após isso, segue a leitura de parte do conto com pausas para as cenas que serão interpretadas no palco. CENÁRIO DA CENA 1 – No cenário, devem aparecer casebres desestruturadas para tornar a cena real. Por trás do casebre, com o refletor, devemos inserir a cena do estupro e morte de Diná, que é esfaqueada para evitar exposição dos participantes das cenas. Ouvem-se muitos gritos por trás de um lençol e a voz do estuprador furioso mandando-a calar-se, irando-se e batendo em Diná antes de esfaqueá-la. PERSONAGENS PRINCIPAIS: Inácio (garoto de 11 anos), Diná (13 anos), ambos são órfãos. PERSONAGENS SECUNDÁRIOS: Estuprador (homem mau e frio); Militares fardados (mínimo dois) que levam o corpo de Diná. FIGURANTES DA CENA 1 – Pessoas curiosas, (em torno de cinco pessoas) representam crianças seminuas, magras, de barriga inchada, homens maltrapilhos que falem alto, encenam a parte do “bulício de gente” quando os militares fardados chegam para levar o corpo de DINÀ. Fonte: elaborado pelos autores, 2014
Importante ressaltar que nesta primeira cena, os alunos evidenciaram com detalhes os cinco primeiros 135
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capítulos do conto. Isso enfraquece os argumentos negativos veiculados por alguns céticos que não admitem a interpretação literária envolvendo outras linguagens. Os discentes se preocuparam em conferir dinamismo à encenação, inserindo trilha sonora, acrescentando falas, mas sem destituir da temática principal que envolve nesta primeira parte do conto, o local do estupro e morte de Diná. Nesse processo, fica clara a tentativa de adaptação fiel do conto. Do mesmo modo, no roteiro da segunda cena, percebe-se que os discentes tentam veicular as informações principais acerca do futuro de Inácio após a morte de Diná. Para isso, reproduziram a descrição dos garotos que o ajudaram a viver nas ruas e “andar macio como gato”. Mesmo com a possibilidade de inserir falas aos personagens, além de trechos cômicos, o intuito foi mostrar o que representava a escola e o que de fato ela teria ensinado ao protagonista. Quadro 2. Roteiro elaborado para peça teatral
ROTEIRO DA CENA 2 – ÍNÁCIO NA ESCOLA. QUAL ESCOLA? A cena inicia com a mulher cheirosa de perfume que fala com Inácio (não se preocupe você vai esquecer tudo isso, vai ser um cidadão honrado. Aprenderá tudo na escola!) Podemos trazer humor crítico a esta cena, visto que do 6° ao 10° parágrafo temos a descrição ideal da ESCOLA e dos garotos que ensinam Inácio a entrar na criminalidade.
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PERSONAGENS DA CENA 2: Carola (fumante, usuário de drogas, tirado a gostosão), Bonifácio (com faca na mão, metido a matador), Enildo (homossexual promíscuo, dormia com todos do reformatório), Esperidião (negro metido a valente). Obs.: Nesta cena, podemos ter a presença do narrador que vai descrevendo estes personagens à medida que forem aparecendo no palco. Podemos acrescentar algumas falas para eles de modo a ficar claro o envolvimento de Inácio no crime. A trilha sonora será de suspense. CENA 3 – MORTE DE INÁCIO! ENCONTRO COM DINÁ NO PARAÍSO A cena inicia com Inácio sendo perseguido por policiais. Após assaltar alguém, começa a fuga com policiais, e Inácio acaba sendo morto por policiais às margens do Rio Capibaribe. Narrador: faz a leitura do 14° e 15° parágrafos enquanto Inácio vai caindo aos poucos no palco. Inácio fica estirado no palco e vai desfalecendo aos poucos enquanto o trecho da música “Sou Humano” da cantora evangélica, Bruna Carla começa a tocar. Quando iniciar a música, Diná entra de branco, toda coberta e pega na mão de Inácio como se estivesse levando o irmão para outro plano, no paraíso de Deus... Eles fazem uma coreografia enquanto a segunda parte da música é tocada... para emocionar o povo. Após esta música, começa outro fundo musical e Inácio faz a coreografia enquanto o narrador faz uma leitura reflexiva da quantidade de meninos e meninas que se envolvem com a criminalidade e acabam sendo mortos... Neste momento, todos os participantes entram no palco e acaba a dramatização. Fonte: elaborado pelos autores, 2014
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Literatura e outras linguagens: (re)leitura de conto a partir do desenho e teatro
Assim, novamente a ideia contida nos parágrafos é preservada. A última cena mostra o desfecho trágico de Inácio e os discentes fizeram inferências acerca do suposto encontro dos irmãos após a morte. Provavelmente, a última parte da narrativa tenha possibilitado aos alunos fazer tais inferências, devido à descrição do enunciador ao afirmar que Inácio estava com um tiro no peito, mas um sorriso nos lábios. Percebe-se a relevância da teoria da recepção ao indicar que na análise textual, os discentes são coautores, pois participam da construção de sentido do texto. Isso ocorreu, porque devido às sutilezas e particularidades literárias, o leitor é instigado a complementar os espaços, os vazios intencionais deixados pelo narrador. Evidencia-se o interdiscurso já no título da última cena adaptada, pois o suposto encontro de Inácio com Diná no “paraíso” remete- nos às convicções e crenças religiosas dos discentes. As vozes presentes na análise dos alunos foram explícitas nesta última parte do roteiro, pois para os que são adeptos do cristianismo, o paraíso é um local de descanso onde todos os que são salvos por Deus e não condenados ao inferno repousam até o dia do juízo final. Em suma, as marcas interdiscursivas conforme Maingueneau (2012) faz parte da análise dos alunos mesmo que não conheçam as teorias que versam sobre a interdiscursividade. Os acréscimos para a última cena alteraram, mas não 138
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anularam as ideias postas pelo enunciador do conto. Isso confirma que com a intermidialidade, os alunos não apenas internalizam à temática tratada no conto, mas se apropriam dela acrescentando ideias relevantes segundo as percepções e ideologias que possuem, bem como o contexto no qual estão inseridos. Tais alterações são vistas de modo positivo, pois indica autonomia no processo de análise e adaptação do conto. Figura 3. Conto numa perspectiva social para o teatro.
Fonte: Elaborado pelos autores, 2014.
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Literatura e outras linguagens: (re)leitura de conto a partir do desenho e teatro
No Anexo C seguem algumas imagens da dramatização feita pelos alunos. Foram três cenas adaptadas, sendo a primeira dramática (Ilustração 1 e 2: representam o estupro e a morte de Diná). A segunda cômica (Ilustração 3 e 4: representam Inácio no reformatório e os menores assaltando) e a terceira dramática (Ilustração 5 e 6: representam a morte de Inácio e o encontro de Inácio e Diná no paraíso). Foi perceptível que a “nova roupagem” envolvendo dramatização, trilha sonora, expressão corporal dos atores, bem como a coreografia agradou os expectadores, pois muitos mostraram interesse em ler o conto, bem como participar das oficinas teatrais. Os discentes conseguiram com êxito dramatizar conforme descrito no roteiro.
Relevância da leitura literária como prática discursiva
No ensino básico, quase sempre “a leitura literária tem sido rarefeita, ‘metaleitura’ no âmbito escolar”. Regina Zilberman (2003, p. 258). Isso significa que a análise das obras literárias tem se constituído considerando fragmentos, resumos, compilações, trechos de narrativas ou poemas. Por isso, nesta pesquisa, consideramos a leitura integral como prática discursiva em que os sujeitos 140
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estabelecem relações diversas de sentido do texto. Nesta ótica, o contexto, o intertexto, o interdiscurso, o modo de enunciação, estatuto do leitor, o modo de coesão foi crucial para apreensão de sentido textual.
Considerações finais
O processo intersemiótico, para Plaza, “se revela como um dispositivo que pensa as diversas formas de arte, onde a colaboração entre o lúcido e o lúdico equivale a um equilíbrio entre o que se considera como sensível e o inteligível” (PLAZA, 2010, p. 209). Esse autor trata, principalmente, do dinamismo ao instituir atividades intersemióticas. Nessa ótica, o estudo literário envolvendo diferentes linguagens e artes, constitui uma forma dinâmica de se discutir temáticas sociais, contribuindo para fomentar a cultura e o saber artístico. Interessante ressaltar que tanto as atividades envolvendo desenho como a adaptação teatral constituíram atividades lúdicas importantes para a fruição literária. Foi evidente o envolvimento dos alunos com o conto numa perspectiva social e um maior interesse pela leitura literária. Tais atividades serão base para a realização de outras oficinas e adaptação de outras obras literárias. A interdiscursividade refletida por Maingueneau (2012) na 141
Literatura e outras linguagens: (re)leitura de conto a partir do desenho e teatro
última cena do conto adaptado conferiram autonomia dos discentes, isto é, por meio de estudos intersemióticos é possível estudar literatura de modo autônomo, prazeroso e eficaz. Em suma, é viável estabelecer relação entre literatura com outras artes visando ampliar a percepção dos discentes considerando que estão inseridos em uma sociedade em que a capacidade de interpretar os textos, o contexto, o interdiscurso constitui passaporte para o elevo intelectual e consequente progresso sociocultural do país.
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Literatura e outras linguagens: (re)leitura de conto a partir do desenho e teatro
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Anexos Figura 1. Estupro de Diná
Fonte – acervo pessoal dos autores, 2014
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Figura 2. Morte de Diná
Fonte – acervo pessoal dos autores, 2014
Figura 3. Inácio no reformatório
Fonte – acervo pessoal dos autores, 2014
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Literatura e outras linguagens: (re)leitura de conto a partir do desenho e teatro
Figura 4. Menores assaltando
Fonte – acervo pessoal dos autores, 2014
Ilustração 5. Morte de Inácio
Fonte – acervo pessoal dos autores, 2014
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Ilustração 6. Inácio e Diná no Paraíso
Fonte – acervo pessoal dos autores, 2014
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O estado da arte dos recursos educacionais abertos Francisco Kelsen de Oliveira Kélvya Freitas Abreu
Introdução A Educação é um direito fundamental e não serviço que a nossa carta magna garante em seu Art. 6 º, (BRASIL, 1988). Embora tenha ocorrido uma expansão da oferta de vagas nas instituições de ensino brasileiras nos últimos anos, seja no ensino superior ou na educação básica, ainda há diversos problemas a serem solucionados, já que os resultados das avaliações de larga escala explicitam os baixos índices de rendimento dos alunos (OLIVEIRA, 2010). Assim, com o objetivo de solucionar alguns desses problemas ou melhorar a qualidade do ensino, vários projetos são implementados e desenvolvidos, como por exemplo, a distribuição dos livros didáticos aos alunos dos ensinos fundamental e médio, através do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD); oferta da merenda escolar aos alunos; criação de escolas em tempo integral; inclusão de computadores, tablets e internet nas escolas 149
O estado da arte dos recursos educacionais abertos
através dos Projetos Um Computador por Aluno (ProUCA) e Programa Nacional de Informática na Educação (ProINFO), bem como desenvolvimento de softwares educativos, no entanto os resultados obtidos não condizem com os investimentos na área. O número de projetos implantados com uso das ferramentas de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) em âmbito educacional e as suas avaliações mostram a sua ineficiência e ainda uma lacuna entre os resultados esperados e aqueles obtidos, principalmente, considerando o sucesso comercial dessas tecnologias, pois as poucas avaliações e projetos pilotos realizados em nosso país demonstram problemas relacionados à implementação e ao uso das tecnologias dentro da escola pública (CYSNEIROS, 2001; LAVINAS e CAVENAGHI, 2010; SORJ e LISSOVSKY, 2011). Cornils (2011) enfatiza, que o uso inadequado dos produtos e dos materiais ou das ferramentas comprometem as funções a serem desempenhadas, assim como os objetivos a serem alcançados. Isso é, até, explicado devido a simples cópia de projetos e programas existentes em outros países e trazidos para cá sem um estudo prévio de viabilidade em um ambiente diferente ao que estava funcionando e dando certo. Outra causa para o insucesso está na impossibilidade de adequação à nossa realidade, já que muitos produtos e ferramentas são vendidos sob 150
FRANCISCO KELSEN DE OLIVEIRA E KÉLVYA FREITAS ABREU
licença restritiva de uso que impedem qualquer tipo de modificação, principalmente, quando se trata de software. Cuban (2001) ainda cita problemas de gestão e até mesmo de adequação (quando possível) de programas e projetos, pois não se levam em consideração os contextos e as culturas escolares que propiciam uma variedade de desafios. Caso os materiais tivessem a possibilidade de serem adequados ou mesmo customizados às realidades dos alunos, bem como o professor tivessem capacitação e tempo para alterá-los e compartilhá-los independente de ser um livro, música, vídeo ou aplicativo, os conteúdos e materiais estariam mais próximos das realidades educacionais e sem barreiras legais que impedissem a difusão do conhecimento. Ao torná-lo uma propriedade privada cujo acesso é limitado e restrito apenas um pequeno grupo com poder financeiro pode adquirir. As TICs contribuíram para facilitar o acesso aos conteúdos produzidos por pessoas ao redor do mundo, cuja oferta pela Internet favoreceu a colaboração dos interessados em acessar e melhorar tais conteúdos. Além disso, as TICs auxiliam em diversas atividades cotidianas, tendo em vista proporcionar maior convivência diante da rapidez das informações da sociedade de hoje, seja para simples facilidade de comunicação entre pessoas em locais geograficamente distantes bem como em pro151
O estado da arte dos recursos educacionais abertos
porcionar capacitação e aperfeiçoamento profissional ou mesmo para fins laborais, como gerenciamento de tarefas, edição de textos, planilhas, vídeos e imagens. Esse modelo funciona de modo satisfatório com os softwares livres (SL), que são desenvolvidos por programadores que disponibilizam seus códigos a fim de que outros possam usar, estudar, alterar e distribuir, conforme menciona Taurion (2004). A mesma ideia seria trabalhada também com os recursos educacionais, pois poder-se-ia utilizar e melhorar diversos materiais desenvolvidos pelos professores que compartilhariam seus conteúdos, de tal forma a contribuir com a aprendizagem dos alunos, bem como se teria materiais atualizados e com adequações às diferentes realidades educacionais, coadunando com o conceito de Conteúdo Aberto apresentado por Wiley (2005).
Recursos Educacionais Abertos
O movimento para uma Educação Aberta é uma tentativa de conseguir alternativas sustentáveis para alguns dos empecilhos evidentes ao direito de educação de qualidade sem obrigatoriamente empregar meios tecnológicos (AMIEL, 2012, p. 18). Dessa forma, buscam-se fomentar através de recursos, práticas e ambientes abertos, diversas configurações 152
FRANCISCO KELSEN DE OLIVEIRA E KÉLVYA FREITAS ABREU
de ensino e aprendizagem, mesmo que aparentemente sejam redundantes, pois deve-se reconhecer a pluralidade de contextos e as várias possibilidades educacionais para o aprendizado no decorrer da vida. De acordo com a Declaração da Cidade do Cabo (2007):
Esse movimento [Educação Aberta] emergente de educação combina a tradição de partilha de boas ideias com colegas educadores e da cultura da Internet, marcada pela colaboração e interatividade. Esta metodologia de educação é construída sobre a crença de que todos devem ter a liberdade de usar, personalizar, melhorar e redistribuir os recursos educacionais, sem restrições. Educadores, estudantes e outras pessoas que partilham esta crença estão unindo-se em um esforço mundial para tornar a educação mais acessível e mais eficaz.
Ainda conforme Amiel (2012, p. 24), a Educação Aberta é uma forma dialógica das configurações de ensino e aprendizagem emergentes existirem ao mesmo tempo, desafiando a lógica e a estrutura da escola, cujo conceito está baseado no aprendizado combinado ou misto (blended learning), sendo a sinergia entre a educação presencial e à distância. Conforme Orey (2002), aprendizado combinado ou misto é um sistema de formação à distância combinado 153
O estado da arte dos recursos educacionais abertos
com encontros presenciais, inclusive possibilitando o uso de ferramentas síncronas ou assíncronas com recursos tecnológicos, diferentes abordagens pedagógicas e vários espaços de interação (acadêmicos e cotidiano). Os recursos educacionais abertos (REA), termo proveniente do inglês Open Educational Resources (OER), são todos os entes essenciais para o desenvolvimento de configurações mais flexíveis de ensino e aprendizado, sendo os reais impulsionadores das novas configurações de ensino e aprendizagem. Os princípios dos REAs são baseados nas liberdades dos SL: usar, estudar, alterar e distribuir (TAURION, 2004). Segundo Montoya e Aguilar (2010), as liberdades 4R’s garantem reusar, revisar, remixar e redistribuir materiais, conforme as licenças utilizadas em cada material. Para que isso se torne realmente possível, é essencial que se tenha ambientes de compartilhamento e divulgação de REA’s e suas práticas educacionais abertas (PEA’s) de forma organizada por metadados que possam ser identificados pelas ferramentas de busca online. Além disso, poderá ter acesso a materiais educacionais específicos e adequados às necessidades do usuário, já que ferramentas de desenvolvimento podem ser implementadas para abstrair profundos conhecimentos de linguagem de programação, a fim de que os professores possam criar seus próprios recursos educacionais ou 154
FRANCISCO KELSEN DE OLIVEIRA E KÉLVYA FREITAS ABREU
mesmo intermediar a comunicação entre os desenvolvedores e consumidores de tais conteúdos. Diante disso, cabe destacar que os REAs, por sua vez, podem ter maiores contribuições dos professores e desenvolvedores de software que compartilhariam seus conteúdos, de tal forma a cooperar com a aprendizagem dos alunos, bem como se teria materiais atualizados e com adequações às diferentes realidades educacionais em ambientes online centralizados com acesso pela Internet. Tais ideias coadunam com o conceito de teias de aprendizagem apontado por Illich (1973), antes mesmo da criação da Internet: […] deve ter três propósitos: dar a todos que queiram aprender acesso aos recursos disponíveis em qualquer época de sua vida; capacitar a todos os que queiram partilhar o que sabem a encontrar os que queiram aprender algo deles e, finalmente, dar oportunidade a todos os que queiram tornar público um assunto a que tenham possibilidade de que seu desafio seja conhecido (ILLICH, 1973).
Conforme Illich (1973), os bens comuns podem expandir o acesso à cultura e à educação de uma população. Já Helfrich (2008) e, Simon e Vieira (2008) afirmam que a maior produção e circulação de bens comuns, sejam eles com foco educacional ou produtos dos mais variados 155
O estado da arte dos recursos educacionais abertos
círculos culturais, enaltecem este espaço, o “rossio” ou commons. Litto (2006) sugere que está surgindo uma nova ecologia do conhecimento e aponta problemas a serem enfrentados:
• Reuso do REA: “Quanto mais elaborada for a estrutura pedagógica específica embutida em uma OER [REA], mas provável será seu insuficiente aproveitamento para reuso, adaptação e disseminação”; • Falta de incentivo à produção de REA: “Poucas instituições oferecem incentivos para membros do corpo docente que produzem OERs [REAs]; não há um sistema de reconhecimento e premiação”; • Substituição do trabalho humano: “Alguns profissionais se revelam apavorados diante da ideia de que seres humanos poderiam ser substituídos por máquinas inteligentes, sofisticadas e programadas para trabalhar 24 horas por dia, sem perder a paciência e sem risco de fazer greve”.
De fato, os fatores apresentados por Litto (2006) devem ser trabalhados de tal forma a que se tenha a perfeita utilização dos REA’s e seus benefícios ao invés de gerar repúdio ou aversão dos profissionais que poderiam colaborar ainda mais com a difusão de tais princípios. Atualmente, a educação básica e superior ainda depende do material impresso, sendo o livro didático o prin156
FRANCISCO KELSEN DE OLIVEIRA E KÉLVYA FREITAS ABREU
cipal recurso utilizado. Esse modelo gera um alto custo logístico na distribuição (ORTELLADO, 2009) e aquisição, chegando a 1,3 bilhão de reais com o PNLD (FNDE, 2012). Além disso, o modelo de compra e gestão do material didático ainda garante todos os direitos reservados aos editores, sendo impossíveis as alterações conforme as necessidades e peculiaridades de cada contexto escolar. As editoras, por sua vez, não têm nenhum interesse em alterar esse modelo de compra de livros didáticos para educação básica pelo governo federal, por ser bastante lucrativo. Conforme Gonzalez (2012), os preços médios unitários dos livros cresceram substancialmente nos últimos anos, enquanto que as quantidades compradas também aumentaram, assim se poderia barganhar menor preço devido ao grande volume de compra ou mesmo assegurar uma forma de garantir mais autonomia aos professores que escolheram tal obra, pois comprar-se-iam os direitos autorais e não apenas as cópias impressas dos materiais. Ainda de acordo com Gonzalez (2012), o atual modelo gestão de direitos autorais utilizado no PNLD e o tratamento conjunto das etapas de elaboração do conteúdo e produção industrial do livro tornam frágil a estrutural do programa. Os autores ficam reféns das grandes editoras, uma vez que precisam ter dinheiro para divulgação dos 157
O estado da arte dos recursos educacionais abertos
seus livros no mercado e incluí-los no próprio edital e catálogo a fim de que os professores da educação básica possam escolher seus livros. Assim, as editoras garantem as vendas das cópias dos livros escolhidos, mas não cedem os direitos autorais ao governo a fim de que os livros possam ser alterados ou digitalizados. A lei n° 9.610/1998 (BRASIL, 1998), lei do direito autoral, trata de dois feixes distintos: direitos morais (art. 24 que garante direitos de personalidade, ou seja, inalienáveis, irrenunciáveis e imprescindíveis) e direitos patrimoniais (podem ser cedidos às editoras). As editoras, consequentemente, garantem a impressão das cópias compradas e entrega em prazo estipulado, bem como possuem os direitos patrimoniais das obras, sendo responsáveis pelas negociações com o governo, enquanto os autores recebem apenas uma pequena parcela pela venda da sua obra. Os autores autônomos que não estão ligados a nenhuma editora ficam impossibilitados de terem as suas obras escolhidas, pois não conseguem divulgá-las assim como não possuem garantias de impressão das cópias, caso concorressem, porque não tem nenhuma grande editora que forneça tal compromisso. Caso o governo realizasse a aquisição dos direitos pelo uso da obra diretamente com os autores, esses receberiam mais e ainda os professores teriam liberdade 158
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para adequar as obras, sem esquecer-se de referenciar o autor do conteúdo, inclusive sendo possível imprimi-las em gráficas e distribuir aos alunos por um menor custo. Ainda seria possível a disseminação de uma cultura de uso de REA na educação básica através da inclusão dos alunos e professores na cadeia de autoria, seja nas atividades regulares associadas ao currículo, seja estimulando iniciativas autônomas de produção de conteúdo em atividades complementares – a produção dos grêmios, os saraus literários, os festivais de bandas, os grupos de ciência, os times de modalidades esportivas diversas etc. Já no ensino superior, não há uma política de aquisição de livros para cada aluno, as bibliotecas das Instituições de Ensino Superior (IES) não são atualizadas constantemente e os altos preços das obras afastam os estudantes da compra de livros e os levam às cópias (AMIEL, 2012, p. 26). Com a ideia de REA, surgem novas possibilidades de ensino ao invés de simplesmente excluir o material impresso. Segundo Amiel (2012, p. 26), a expansão da educação à distância (EAD) tornou possível a disponibilidade de recursos didáticos digitais abertos ou não sob diversas configurações. Esse acesso ao uso das novas mídias facilitou a produção e a reprodução de recursos educacionais e bens culturais. Conforme Pretto (2010), professores e alunos podem assumir o papel de autores 159
O estado da arte dos recursos educacionais abertos
dos seus próprios materiais de estudo ou críticos construtivos. Opal (2011) sugere buscar oportunidades com práticas abertas que contemple a criação, o uso e a gestão dos REAs, tendo em vista a inovação e a melhoria da qualidade da educação. Já Amiel (2012) enfatiza o compartilhamento, porque além de pesquisar, adequar e usar os REAs, o autor original e o material alterado são divulgados para centenas de pessoas. Enquanto Shneiderman (2002) menciona o ciclo gerado pelo compartilhamento, pois os recursos propiciam oportunidades para que outros utilizem esses recursos e gerem novas possibilidades educativas.
Políticas públicas e Leis sobre REA no Brasil e no mundo
A partir do reconhecimento das potencialidades oferecidas pelo uso REA para inovação em educação diversas nações, inclusive o Brasil, têm incluído políticas públicas e projetos de lei que tratam sobre o uso de REA. Os REA possuem grande potencial de libertar os indivíduos das barreiras geradas pela escassez de recursos educacionais, pois os sujeitos deixam de ser apenas consumidores para se tornarem o centro do processo produtivo do conhecimento. 160
FRANCISCO KELSEN DE OLIVEIRA E KÉLVYA FREITAS ABREU
A Declaração sobre Educação Aberta da Cidade do Cabo (2007) inspirou os projetos de lei em debate e tramitação se baseando em três diretrizes essenciais:
Política de educação aberta: governos, escolas, faculdades e universidades devem fornecer os recursos educacionais pagos com o dinheiro dos contribuintes como REA; Licenças de conteúdo aberto: os REA devem poder ser livremente partilhados através de licenças abertas, as quais facilitam o uso, a revisão, as melhorias e o compartilhamento; Produção colaborativa: educadores e estudantes podem participar criando, usando, adaptando e melhorando os REA.
O debate político sobre REA no Brasil estrutura-se em quatro eixos baseados nas novas oportunidades proporcionadas pela mudança em direção às redes digitais, na disseminação e na utilização de recursos educacionais, mas ainda com forte influência das estruturas internas da educação tradicional Gonzalez (2012):
• o acesso público a materiais educacionais em geral como estratégia de educação aberta inclusiva ao indivíduo, à família, à comunidade e a toda a sociedade no processo de aprendizagem e de produção colaborativa de conhecimento; 161
O estado da arte dos recursos educacionais abertos
• o ciclo econômico de produção de materiais educacionais e seu impacto no “direito à educação dos cidadãos”; • os possíveis benefícios que os REA podem trazer para as estratégias de aprendizagem, para a produção de recursos educacionais mais apropriados à diversidade regional e aos padrões regionais de qualidade; • impacto dos recursos digitais, online e abertos no desenvolvimento profissional continuado dos professores.
No Congresso Nacional, um projeto de lei foi proposto para fortalecer a ideia de REA como política pública para a educação, em sintonia com as estratégias traçadas pelo do Plano Nacional de Educação (PNE) e com os princípios da Constituição Federal (CF) (BRASIL, 1988). O referido projeto de lei reconhece a necessidade de o Estado receber o direito autoral sobre recursos educacionais e disponibilizá-los sob licenças livres para toda a sociedade, à medida que paga com dinheiro do contribuinte. Segundo Gonzalez (2012), as leis que tratam sobre REA no Brasil são o PNE (Lei Federal n° 8.035 de 2010) (BRASIL, 2010), o projeto de Lei Federal n° 1.513 de 2011 (BRASIL, 2011), o projeto de Lei Estadual n° 989 de 2011 do Estado de São Paulo (SÃO PAULO, 2011a) e o Decreto n° 52.681/2011 da Cidade de São Paulo (SÃO PAULO, 2011b). 162
FRANCISCO KELSEN DE OLIVEIRA E KÉLVYA FREITAS ABREU
No caso do projeto de Lei do PNE 2011-2020 (BRASIL, 2010), há duas propostas que tratam sobre REA na última versão:
7.10) Selecionar, certificar e divulgar tecnologias educacionais para educação infantil, o ensino fundamental e ensino médio, assegurada a diversidade de métodos e propostas pedagógicas, com preferência para software livre e recursos educacionais abertos, bem como acompanhamento dos resultados do sistema de ensino que forem aplicadas; 7.12) Implementar o desenvolvimento de tecnologias educacionais, e de inovação das práticas pedagógicas nos sistemas de ensino, inclusive a utilização de recursos educacionais abertos, que assegurem a melhoria do fluxo escolar e a aprendizagem de alunos. (BRASIL, 2010).
Assim, essas propostas sobre REA fazem parte da Meta 7 do PNE, que tratam sobre a qualidade da educação, com o objetivo de alcançar as médias nacionais para o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) que estão previstas no Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Já o projeto de Lei Federal n.º 1.513/2011 (BRASIL, 2011) trata sobre os recursos educacionais que deverão ser livres e abertos nos art. 3º, 4º e 5º, bem como todos aqueles comprados com subvenções públicas parciais 163
O estado da arte dos recursos educacionais abertos
ou integrais, ou contratações de serviços para desenvolvimento de materiais educacionais realizadas com base na Lei nº 8.666 de 1993, lei de licitações, (BRASIL, 1993) de recursos educacionais, cujos direitos intelectuais (Art 3º) tenham sido cedidos à Administração nos termos do artigo 111 da Lei de Licitações, relativo à prestação de serviços técnicos e de consultoria (Art 4º). Já o artigo 5º (BRASIL, 2011) determina que: “[...] as obras intelectuais previstas no artigo 6º da Lei n.º 9.610/1998 e aquelas resultantes do trabalho de servidor público em regime de dedicação exclusiva ou parcial, incluindo professores e pesquisadores da rede pública e de universidades, no exercício de suas funções, quando equivalentes a recursos educacionais, não poderão ser objeto de licenciamento exclusivo a entes privados e deverão ser, nos termos desta Lei, disponibilizadas e licenciadas à sociedade por meio de Licenças Livres”. (BRASIL, 2011)
Além disso, o projeto demonstra prioridades a padrões técnicos livres e SL, bem como estimula a criação de repositórios federados para o depósito e publicação de REA, de acordo com padrões de interoperabilidade internacionais. A Lei Estadual n° 989 de 2011 do Estado de São Paulo (SÃO PAULO, 2011a) baseia-se no Art. 6 º da CF que garante o Direito Fundamental à Educação a qual só pode 164
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ser plenamente pensada pelo Estado se der a oportunidade e acesso a todos à educação de forma moderna e inclusiva. Dessa forma, favorece também o art. 5º da CF, outro Direito Fundamental, que é o da Igualdade e trata sobre o papel da Administração pública na produção de Recursos Educacionais, tanto para uso em sua rede de ensino, como na produção técnico científica. Além da criação da lei estadual, o Estado de São Paulo através da Secretaria de Educação de São Paulo publicou diversos conteúdos pedagógicos em formato de REA, de tal modo a ampliar o acesso a esses materiais e possibilitar a cooperação entre profissionais e instituições de ensino no início de 2011. O Decreto n° 52.681/2011 da Cidade de São Paulo (SÃO PAULO, 2011b) dispõe sobre o licenciamento obrigatoriamente aberto das obras intelectuais produzidas com objetivos educacionais, pedagógicos e afins, no âmbito da rede pública municipal de ensino de São Paulo. Nos Estados Unidos da América (EUA), o governo pretende disponibilizar seus materiais didáticos em meios eletrônicos e digitais até 2017, sendo os livros digitalizados e comprados com dinheiro público a fim de que sejam abertos para alterações. Segundo Gonzalez (2012), o estado da Califórnia prioriza a compra de materiais abertos, assim como estimula a adoção de REA. Esse fator já é empregado pelos estados de Utah, Ohio e Flórida, este 165
O estado da arte dos recursos educacionais abertos
último, sabe-se que encomendou estudo sobre o assunto. O estado de Washington publica e mantém os materiais curriculares em uma Biblioteca de Cursos Aberta (Open Course Library). Além disso, os livros são impressos para os alunos por um custo unitário inferior a US$ 30. Isso pode ser feito dessa forma porque os materiais são abertos e mantidos sob licenças Creative Commons. Já no estado de Utah, a adoção do REA conseguiu reduzir os custos unitários dos livros a US$ 5. Já África do Sul, de acordo com Gonzalez (2012), o governo paga apenas pela impressão dos livros, porque o governo optou pelo incentivo à criação de REA. Na Polônia, há uma política totalmente voltada ao estímulo ao trabalho com REA que vai desde a criação e disponibilização de livros em ambientes on-line, passa pela capacitação dos professores para produção até a distribuição de computadores e demais dispositivos nas escolas a fim de garantir condições para manutenção de materiais abertos para acesso dos alunos, bem como ambiente disponível para criação.
Exemplos de REAs
Atualmente, existem diversos exemplos relacionados ao uso de REAs, sendo inspirada no projeto de SL, cuja ideia principal está no desenvolvimento e compartilha166
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mento dos aplicativos sem a necessidade de pagamento de licença pelo seu uso. Taurion (2004) demonstra que há diferenças entre uma aplicação livre e outra de código aberto (open source), já que esse deve atender às quatro liberdades básicas da licença GPL, enquanto aquele pode apenas liberar a liberdade nº 0. Ainda conforme Taurion (2004) as liberdades de SL podem ser: • Liberdade n° 0: liberdade de executar o software para qualquer propósito; • Liberdade n° 1: liberdade de estudar como o programa funciona e adaptá-lo para as suas necessidades, tendo como pré-requisito o acesso ao código-fonte; • Liberdade n° 2: liberdade de redistribuir cópias de modo que você possa ajudar ao seu próximo; • Liberdade n° 3: liberdade de aperfeiçoar o programa, e liberar os seus aperfeiçoamentos, de modo que toda a comunidade se beneficie deles.
O movimento do SL (GNU/Linux) tem como características fundamentais a colaboração e o trabalho em rede, sendo apresentado por Pretto e Silveira (2008) como um estímulo para a introdução de uma lógica colaborativa essencial à educação. Um exemplo a ser citado é o OpenREDU (Rede Social Educacional) que mantém um espaço com diversos 167
O estado da arte dos recursos educacionais abertos
softwares educacionais na plataforma a fim de que os professores das diversas áreas do conhecimento possam utilizá-los em suas aulas. Dessa forma, não há a necessidade de sair para outro ambiente para buscá-los e apresentá-los aos alunos. Isso possibilita também que outros professores e alunos trabalhem com projetos para desenvolvimento de outros softwares em outras áreas e assuntos ainda não contemplados ou até mesmo implementar melhorias nos atuais. Além disso, a equipe de desenvolvimento está buscando disponibilizar um próprio ambiente online de desenvolvimento de recursos educacionais para que os usuários interessados possam desenvolver suas aplicações ou materiais, seja para tal ambiente ou outros diversos. Os Cursos Abertos Massivos Online (MOOCs), termo proveniente do inglês Massive Open Online Courses, reúnem alunos e professores para aprender um tópico de interesse, tendo um ponto de partida a ser trabalhado por facilitadores e alunos, cujos desdobramentos do curso dependerão do interesse pessoal e coletivo (MCAULEY et al., 2010). Os livros didáticos abertos e digitais disponibilizados pela editora Flat World Knowledge são exemplos dessa iniciativa, pois seu modelo de negócios é aberto e seus livros são encontrados em repositórios específicos na Internet. 168
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Há também os repositórios de objetos educacionais e módulos abertos. Na África, os exemplos que se destacam são a rede Merlot-Man, com mais de 30 mil unidades, OER Africa, Open Course Aware Consortium e os projetos da Wikimedia Foundation (Wikipédia). Já o Science Commons é um projeto que visa o compartilhamento de dados de pesquisas, tendo o intuito da colaboração entre pesquisadores da mesma área. A Public Library of Science (Biblioteca Pública de Ciência) é uma organização não-governamental que publica artigos com resultados de pesquisas nas áreas de ciência e medicina, para promover o avanço da ciência por meio da comunicação científica. Ainda cita-se os projetos SETI@ , Einstein@home e DiYBio que possibilitam o trabalho e compartilhamento de recursos computacionais da população a fim de que possam processar aspectos requeridos na pesquisa com o objetivo de fazer com que várias máquinas consigam realizar o processamento que seria feito por uma máquina bastante robusta em vários anos, assim os resultados são obtidos em alguns meses, sendo um fator importante, principalmente, para projetos que buscam decodificar o DNA de vírus com alto grau de mutação.
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O estado da arte dos recursos educacionais abertos
Considerações finais Portanto, o debate acerca da proposta da utilização de REA contempla não apenas o âmbito da escola formal, mas também a superação da ideia de uma educação associada à produção em série, com cada um representando um específico papel, numa lógica de gestão que essencialmente retira a autonomia dos mestres e possibilita a colaboração entre professores e alunos. A autoria de materiais deixaria de ser realizada linearmente pelos educadores e passaria a ser função de uma operação reflexiva dentro do domínio coletivo de ações que podem ter como efeito a produção de uma diferença nessa rede de conversações, por causa das necessidades dos alunos. Além disso, as políticas públicas devem ser repensadas para que possam abranger aspectos de currículo, de formação docente e de avaliação. A própria escola precisa se renovar, tendo em vista sair dos prédios para adentrar no mundo virtual e na vida cotidiana de seus alunos. Assim, o modo de produção hegemônico vive a passagem de uma lógica da reprodução para uma lógica da inovação, ou mesmo de um regime de repetição a um regime de invenção (CORSANI, 2003, p. 15). Embora, o contexto da Educação Aberta esteja hoje voltado para solucionar 170
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os problemas em torno do REA, como: compartilhamento, direitos autorais, licenciamento, infraestrutura, política pedagógica, política de governo, pedagogia, formação de professores, sustentabilidade econômica, etc. Além disso, poderá gerar uma maior diversidade de REA’s e PEA’s possíveis de serem adequados aos diversos contextos escolares a partir do momento que tais usuários tornem-se desenvolvedores de novos recursos. Isso exigirá a organização e catalogação de tais recursos em ambientes de armazenamento online, bem como o uso de ferramentas de desenvolvimento sem profundos conhecimentos de linguagem de programação cujos resultados tenham formatos padronizados para facilitar a implementação das adequações dos materiais e das futuras reutilizações dos REA’s em outros contextos, plataformas educacionais, usuários e demais interessados sem a obrigatoriedade do uso apenas numa ferramenta e situação específicas.
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Movimentos sociais: os principais paradigmas e a “crise” Maria Jorge dos Santos Leite
Introdução É longo e cheio de divergências o debate sobre os movimentos sociais encontrado na literatura nacional e internacional, e complexas são suas aparições nas últimas décadas (FELTRAN, 2005). Autores como Manuel Castells (1974), Claus Offe (1988), Sidney Tarrow (1999), Ilse Scherer-Warren (1996), Alain Touraine (1977), Alberto Mellucci (2001), Glória Gohn (1997), entre outros, tematizaram e sistematizaram sobre as teorias e os projetos de mudança dos movimentos sociais, dentro ou para além da sociedade atual. A revisão que faço diante desse debate não contempla uma ampla discussão sobre o pensamento de todos esses autores; a produção acadêmica a ser comentada restringe-se a alguns aspectos teóricos e conceituais dos movimentos sociais, incluindo os “novos” movimentos sociais, abordados apenas por alguns desses autores, sobretudo Maria da Glória Gohn, Melucci (2001) 177
Movimentos sociais: os principais paradigmas e a “crise”
e Scherer-Warren (1996). Detenho-me, especialmente, sobre os “novos” movimentos sociais na identificação de elementos que os caracterize como “novos” e os diferencie dos movimentos tradicionais. Além de refletir sobre a ideia de “crise” dos movimentos sociais existente no meio acadêmico atual.
Discutindo os movimentos sociais
Apesar de não haver uma definição única e universalizante dos movimentos sociais, esses costumam ser entendidos como um conjunto de ações coletivas voltadas para a reivindicação de melhores condições de vida, de contestação e de busca por uma nova sociabilidade humana, o que significa a transformação das condições sociais e políticas vigentes em determinada sociedade. Como bem define Melucci (2001), “um movimento social é uma ação coletiva cuja orientação comporta solidariedade, manifesta conflito e implica a ruptura dos limites de compatibilidade do sistema ao qual a ação se refere” (p.35). A expressão “movimentos sociais” geralmente é utilizada para se referir aos fenômenos coletivos que se apresentam com uma certa unidade externa, mas com significados, ações e modos de organização internamente 178
MARIA JORGE DOS SANTOS LEITE
diferenciados. Entendidos também como “efeitos de uma situação histórica ou produtos de uma certa conjuntura” (MELUCCI, 2001, p. 29). Podendo ainda ser definidos como,
Ações sociais coletivas de caráter sociopolítico, construídas por atores sociais pertencentes a diferentes classes e camadas sociais. Eles politizam suas demandas e criam um campo político de força social na sociedade civil. Suas ações estruturam-se a partir de repertórios criados sobre temas e problemas em situações de: conflitos, litígios e disputas. As ações desenvolvem um processo social e político-cultural que cria uma identidade coletiva ao movimento, a partir de interesses em comum. Esta identidade decorre da força do princípio da solidariedade e é construída a partir da base referencial de valores culturais e políticos compartilhados pelo grupo (GOHN,1995, p. 44).
A noção de movimento social não é consensual entre os autores que trabalham com essa abordagem. Muitos trabalhos que tratam da temática apontam a existência de paradigmas divergentes. Gohn (1997) diferencia quatro grandes paradigmas de movimentos sociais. São eles: o marxista, o norte-americano, o dos novos movimentos sociais e o latino-americano. A autora destaca a contribuição do pensamento marxista na construção da teoria explicativa dos movimentos 179
Movimentos sociais: os principais paradigmas e a “crise”
sociais e sua influência na organização e prática desses movimentos. Ressalta que a grande contribuição de Marx foi a relação por ele estabelecida entre teorização e ação política dos movimentos sociais, através do conceito de práxis social. O termo práxis vem da antiguidade e apresenta-se na obra de Marx como um elemento fundamental na transformação da sociedade e da natureza através da ação humana. “A práxis significativa refere-se à práxis transformadora do social, que se realiza em conexão com a atividade teórica, por meio da atividade produtiva e/ou da atividade política” (GOHN, 1997, p.176). E ainda, como resume Scherer- Warren: Pode-se afirmar que Marx, desde o ponto de vista da Sociologia, foi um dos mais importantes criadores de um projeto de transformação radical da estrutura social, projeto este de superação das condições de opressão de classe. Para a realização deste projeto, além do amadurecimento das condições estruturais propícias, exige-se também uma práxis revolucionária das classes exploradas (1984, p. 35).
As citações acima apontam a preocupação de interpretes de Marx em demonstrar como esse autor, ao trabalhar com o conceito de práxis, articula a atividade prática (ação do movimento) e a teoria (concepção do movimento), num só conjunto, voltando-se para o objetivo de promover a transformação social. Dessa forma, o 180
MARIA JORGE DOS SANTOS LEITE
marxismo aplicado ao estudo dos movimentos sociais, é entendido não apenas como uma teoria explicativa, mas como uma teoria que fundamenta a própria ação desses movimentos. A abordagem clássica dos movimentos sociais nos Estados Unidos está associada ao próprio desenvolvimento da Sociologia naquele país. Embora tenha ultrapassado as fronteiras, foi ali que ela mais se desenvolveu. No decorrer dos anos 1980 o paradigma norte-americano promoveu um intenso debate com uma das correntes europeias – a dos “novos” movimentos sociais – provocando alterações em ambas as abordagens. A consequência disso foi o surgimento uma nova corrente teórica envolvendo europeus e americanos, que passou a predominar na América em que “a grande ênfase está no processo político das mobilizações e nas bases culturais que lhes dão sustentação” (GOHN, 1997, p. 15). Os novos movimentos sociais caracterizam-se, segundo Gohn(1997), pela construção de um modelo teórico baseado na cultura. Assim, esse paradigma apresenta diferenciações em relação ao marxista, por se centrar nos estudos dos processos históricos globais, nas contradições e nas lutas existentes entre as diferentes classes sociais. Suas categorias analíticas são as classes sociais, as contradições, os conflitos, os interesses de classe e a reprodução da força de trabalho. O paradigma dos “novos” 181
Movimentos sociais: os principais paradigmas e a “crise”
movimentos sociais, ao contrário, parte de explicações mais conjunturais, localizadas no âmbito da política, na vida cotidiana e nas observações de novos atores sociais. Tem como categoria de análise a cultura, a identidade, o cotidiano, as representações políticas e os atores sociais. O paradigma latino-americano voltou-se, quase totalmente para os estudos dos movimentos sociais libertários: índios, negros, mulheres e minorias; no meio popular urbano predominou as lutas por equipamentos coletivos e moradia, enquanto na área rural sobressaíram-se as lutas pela terra. As teorias que orientaram as produções sobre os movimentos sociais na América Latina foram as dos paradigmas europeus, com predominância da vertente marxista na década de 1970 e da abordagem dos “novos” movimentos sociais, na década de 1980. Os estudos baseados na teoria marxista voltaram-se para questões como hegemonia, contradições urbanas e lutas sociais; os estudos que aplicaram o paradigma dos movimentos sociais têm as categorias da autonomia e da identidade entre as mais destacados. Apesar de serem muitas, distintas e heterogêneas as abordagens sobre os movimentos sociais, Gohn (1997) considera tais questões como ainda não resolvidas do ponto de vista teórico suscitando, assim, constante aprofundamento. Entre as lacunas, a autora cita sete. São elas: 1- o conceito de movimento social; 2- o que os qualifica 182
MARIA JORGE DOS SANTOS LEITE
como novos; 3- o que os distingue de outras ações coletivas ou de algumas organizações sociais como as ONGs; 4- o que ocorre de fato quando uma ação coletiva expressa num movimento social se institucionaliza; 5- qual o papel dos movimentos sociais neste novo século; 6- como podemos diferenciar um movimento social criado a partir da sociedade civil, por lideranças e demandatários, de ações civis organizadas ao redor de projetos de mobilização social e que também se autodenominam movimentos e; 7- quais as teorias que realmente têm sido construídas para explicá-los. Do ponto de vista teórico, a literatura corrente nas ciências sociais sobre os movimentos sociais caracteriza-os como uma série de estudos sociopolíticos e aparecem sempre analisados dentro da problemática da ação coletiva. Cotidianamente se utiliza a expressão movimento social para nomear organizações estruturadas com vistas à formação de associações entre pessoas, grupos ou entidades que possuam algum interesse em comum, para a defesa, afirmação ou promoção de determinados objetivos perante a sociedade. Ou ainda, “ações coletivas de caráter sociopolítico e cultural que viabilizam distintas formas da população de organizar e expressar suas demandas” (GOHN, 2003, p.13). Trata-se de uma categoria abrangente que pode congregar, dependendo dos critérios de análise empregados, entidades voltadas para a promo183
Movimentos sociais: os principais paradigmas e a “crise”
ção de interesses materiais, legais, éticos e morais. São, pois, mais frequentes a existência de movimentos que defendem os princípios da legalidade, a promoção dos direitos humanos ou prerrogativas análogas, podendo, ainda, voltarem-se para a alteração radical (ou violenta) de ordens ou sistemas sociais, políticos, ou normativos vigentes, movidos por diferentes suportes ideológicos.
Os “novos” movimentos sociais
O paradigma tradicional marxista, considerado por alguns como clássico ou ortodoxo, passou a ser visto como inadequado para a análise dos movimentos sociais que ocorriam na Europa a partir da década de 1960. Assim, autores como Touraine (1977), Offe (1988) e Melucci (2001), entre outros, “partiram para a criação de esquemas interpretativos que enfatizam a cultura, a ideologia, as lutas sociais cotidianas, a solidariedade entre as pessoas de um grupo ou movimento social e o processo de identidade criado” (GOHN, 1997, p. 121). Surge, então, o paradigma dos “novos” movimentos sociais que se caracteriza pela construção de um modelo teórico baseado na cultura, pela negação do marxismo como teoria capaz de explicar a ação dos indivíduos e a ação coletiva da sociedade contemporânea como ocorre 184
MARIA JORGE DOS SANTOS LEITE
na realidade, pela eliminação do sujeito configurado pelas contradições do capitalismo; pela redefinição e valorização da política nas análises, pela análise dos atores pelos teóricos dos novos movimentos sociais sob dois aspectos: a ação coletiva e a identidade coletiva criada no processo. Nesse novo paradigma, o sujeito que surge é um coletivo difuso, que luta contra as discriminações e pelo acesso aos bens da humanidade. “Nos NMS a identidade é parte constitutiva da formação dos movimentos, eles crescem em função da defesa dessa identidade. Ela se refere à definição dos membros, fronteiras e ações do grupo” (GOHN, 1997, p. 124). São considerados novos os movimentos étnicos (negros, índios), de gênero (feminismo e de homossexuais), de faixa etária (crianças, jovens, idosos), os ecológicos, os que defendem os direitos das pessoas com deficiência, os pacifistas e os relacionados à diversidade cultural, entre outros. Os “novos” movimentos sociais desenvolvem atividades relacionadas às dimensões da identidade humana, dissociadas das condições socioeconômicas predominantes, de forma que suas ações não constituem um projeto de sociabilidade distanciada das relações sociais capitalistas, ou seja, não objetivam a transformação das atuais formas de dominação política e econômica, no sentido da construção de sociedade baseada na organização coletiva 185
Movimentos sociais: os principais paradigmas e a “crise”
e no desenvolvimento das potencialidades humanas na direção não-capitalista. Segundo Scherer-warren tem surgido novos movimentos sociais que:
Almejam atuar no sentido de estabelecer um novo equilíbrio de forças entre Estado (aqui entendido como o campo da política institucional: o governo, dos partidos e dos aparelhos burocráticos de dominação) e sociedade civil (campo da organização social que se realiza a partir das classes sociais ou de todas as outras espécies de agrupamentos sociais fora do Estado enquanto aparelho), bem como no interior da própria sociedade civil nas relações de força entre dominantes e dominados, entre subordinantes e subordinados. (1996, pp.49-50).
Tais movimentos indicam, inicialmente, uma separação entre os esses “novos” movimentos e os tradicionais movimentos sindicais e operários, de caráter classista, que se desenvolveram em torno do mundo do trabalho. Podendo ser diferenciados, segundo Gohn (2003), a partir alguns pontos característicos que os “novos” movimentos sociais apresentam: • Lutas de defesa das culturas locais, contra os efeitos devastadores da globalização; 186
MARIA JORGE DOS SANTOS LEITE
• Ética na política e vigilância sobre a atuação estatal; • Atenção a áreas do cotidiano de difícil penetração (sexo, crenças, valores etc); • Novo entendimento sobre autonomia (ter projetos para os grupos com autodeterminação, ter crítica, ser flexível, universalizar demandas particulares e priorizar a cidadania).
Os integrantes dos “novos” movimentos sociais não são identificados pela classe social à qual pertencem, ou pelo código político estabelecido (esquerda-direita, liberal-conservador); a identificação é feita a partir das diferenciações particulares e, também da totalidade do gênero humano e do ambiente (KAUCHAKJE, 2007). Através de ações diretas, os “novos” movimentos sociais denunciavam o “desmando” das práticas e valores hegemônicos objetivando a imediata transformação da vida das vítimas da opressão. Suas lutas não se restringiam exclusivamente à esfera política, estendem-se às dimensões social, pessoal e cultural. Os “novos” movimentos sociais começaram a se configurar no Brasil em meio às ações de enfrentamento ao regime militar, que começou a perder legitimidade junto à sociedade civil a partir de 1993 devido o agravamento das crises econômicas, políticas e sociais que já atingiam 187
Movimentos sociais: os principais paradigmas e a “crise”
o país desde o início dos anos 1970. Segundo Gohn(1995), havia uma crença na necessidade de retomada da democracia, da participação direta dos indivíduos na sociedade e na política. Muitos acreditavam no poder de mobilização do povo, das camadas populares, para realizar mudanças históricas que outros grupos sociais não tinham conseguido realizar no passado. Os moradores das periferias, favelas, cortiços e outros submundos saem da penumbra e das páginas policiais para se tornarem os depositários das esperanças de serem novos atores históricos, sujeitos de processos de libertação e transformação social. Retomando a questão levantada por Gohn (1997) sobre o que qualifica os movimentos sociais como “novos”, e o que os distingue dos demais movimentos “clássicos”, a própria autora afirma que essa diferenciação não é determinada pela época de surgimento de cada movimento, mas pelo teor de suas demandas. As próprias ações dos “novos” movimentos sociais anunciam sua autonomia em relação ao poder institucionalizado e o distanciamento dos mesmos em relação aos conflitos de classe e ideologias totalizantes. Esses movimentos caracterizam-se também por apresentar elementos culturais como: reconhecimento da diversidade biológica e cultural, interdependência da biosfera e democratização das relações sociais e políticas. Dessa forma, os “tradicionais” e “novos” não são 188
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necessariamente movimentos opostos, esses podem aproximarem-se, se os primeiros também forem portadores desses elementos.
Inclusive em sociedades com profundas desigualdades econômicas e culturais, as demandas tradicionais (trabalho, alimentação, habitação, educação, saúde, etc.) coexistem e são qualificadas pelos novos elementos de defesa do meio ambiente e pelas relações de gênero e de cultura (KAUCHAKJE, 2007, p.87).
No final da década de 1980, ocorreram mudanças nos movimentos de grande visibilidade, passando do movimento de trabalhadores e populares para “novos” movimentos sociais. O Brasil registra uma peculiaridade em relação a outros países pela existência constante dos conflitos de terra e trabalho no campo e a exclusão de parcelas da população do acesso aos bens materiais e culturais. Essa situação favoreceu a aparição, nesse período, do movimento dos trabalhadores sem-terra, juntamente com a emergências dos “novos” movimentos sociais. A partir da década de 1980, houve um redirecionamento no campo teórico e nas práticas dos movimentos, passando esses a priorizar as organizações formais, tais como as não-governamentais, distanciando-se das ações coletivas e aproximando-se das parcerias com o setor público estatal. Essas mudanças foram compreendidas 189
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como uma crise dos movimentos sociais, tanto no campo da mobilização quanto da pesquisa.
A “crise” dos movimentos sociais
Atualmente é comum se ouvir, nos mais variados espaços (universidades, imprensa, movimento popular), que os movimentos sociais estão em crise. De acordo com essa perspectiva a nova “onda” seria a do individualismo e da privacidade; a crença nas ações coletivas, nas utopias teria desaparecido. Mas, estariam certos os defensores da “crise dos movimentos sociais? Gohn (2005), considera positiva a participação política dos movimentos sociais na década de 1980, sobretudo no Brasil. As conquistas não foram de ordem material, os resultados não foram imediatos, “mas foram muito no sentido de instaurar uma nova racionalidade no social: a de que o povo, os cidadãos, os moradores, as pessoas, ou qualquer outra nação ou categoria que se empregue tem o direito de participar das questões que lhes dizem respeito” (p.97). Essas conquistas não desapareceram, elas continuam existindo e se multiplicando junto aos movimentos sociais, as organizações sociais, as organizações sindicais no serviço público, nas empresas, nos conselhos da administração pública. Para os brasileiros a grande conquista 190
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foi a Constituição de 1988. Os avanços obtidos nos setores dos direitos sociais, da educação e do trabalho não foram uma dádiva, mas o resultado de uma luta anterior dos diferentes setores organizados da sociedade civil e política. A atual Constituição Federal, e outros instrumentos jurídicos que lhe sucederam, demarcaram espaços e novas ações dos grupos organizados. Nessa perspectiva, parecem-me sem sustentação os argumentos dos defensores da crise dos movimentos sociais. Se os movimentos sociais estivessem mesmo em decadência como se justificaria o boom dos movimentos voltados para as questões ambientais? A expressividade e a “efervescência” do movimento negro quilombola na atualidade? O movimento negro quilombola parece-me um indicativo de que os movimentos sociais, principalmente os voltados para as questões étnicas, fortaleceram suas lutas a partir dos anos subsequentes à promulgação da Constituição Federal de 1988, tendo como um de seus principais objetivos a garantia da efetivação dos direitos que esse instrumento jurídico assegura à população afro-brasileira, como afirma Maria Givânia da Silva: O movimento quilombola tomou força a partir da Constituição de 1988 com a inserção do artigo 68 do ADCT – Atos das Disposições Constitucionais transitória da Constituição Federal que assegura aos remanescentes 191
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de quilombos o direito à posse da terra. Com a realização do I Encontro das Comunidades Negras Rurais Quilombolas, em 1995, as comunidades passaram a ter sua própria organização. Isso desencadeou encontros nacionais e diversas formas de mobilizações no sentido de tornar conhecida a Lei, para que as comunidades pudessem lutar e garantir esse direito1 (SILVA, 2004).
Entretanto, afirmar com base na análise de movimentos como o quilombola, ou nos ecológicos que estão em ascensão, que não há nenhuma apatia ou processo de desmobilização dos grupos organizados, seria uma visão muito simplista dos movimentos sociais. Gohn (2005), assevera que a crise existe, mas é parcial. Ela afetou alguns ramos dos movimentos sociais, notadamente os de ordem popular. No decorrer da década de 1980, os movimentos populares obtiveram conquistas importantes: estruturação de lutas isoladas, organização de movimentos em redes amplas; garantia, por lei, de espaços de participação popular; grupos dispersos foram constituídos em sujeitos coletivos. Hoje é diferente. O que se observa é uma descrença na eficiência das organizações sociais e no seu poder de mobilização, levando a uma drástica redução da participação popular nos movimentos. 1. Jornal Crioulas: a voz da resistência, nº 6 – dezembro 2004, p.2.
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Há um aparente contraste entre o desenrolar satisfatório das ações dos movimentos populares anos 1980 e os rumos que eles tomaram na década de 1990. Os fatores que contribuíram para isso são controversos. Questões de ordem externa como a crise econômica, o desemprego, a política neoliberal, a crise das utopias, a descrença na política e na ação do Estado, são apontados por assessores ou lideranças dos movimentos populares como causas básicas de sua crise. “Na realidade, a crise dos movimentos sociais é o acirramento de um processo que se instaurou no final dos anos 1980, fruto de problemas que os movimentos já carregavam no seu bojo” (GOHN, 2005, p.100). A autora não despreza os fatores de ordem externa, mas afirma ser no interior dos próprios movimentos que se encontram as principais explicações para a crise. Os argumentos são vários: ausência de projetos políticos próprios dos movimentos populares no decorrer dos anos 1980, dependência de assessorias externas, compromisso das lideranças afinados com determinadas tendências políticas-partidárias ou religiosas. Essas tendências acabavam deixando suas próprias impressões nas ações dos movimentos. Até 1988, os movimentos sociais pareciam ser detentores de grande força política. Denunciavam a não prioridade da gestão pública para os setores sociais mais necessitados, formulavam demandas, resistiam às 193
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pressões para a desmobilização e apresentavam soluções alternativas aos problemas. A desmobilização veio após o processo constituinte. Algumas lideranças passaram a dedicar-se muito mais à política partidária, sobretudo na disputa por cargos públicos e a negligenciar as ações do movimento, afirma Gohn (2005). Não obstante, ocorreu uma drástica redução nas verbas internacionais destinadas aos trabalhos comunitários, apenas os grupos mais estruturados, capazes de elaborar projetos bem fundamentados, conseguiram sobreviver. Foram fundados muitos núcleos de assessoria, com profissionais remunerados e surgiu uma rede de organizações não-governamentais - ONGs - para assessorar os movimentos populares. Como esses sofreram uma retração, as ONGs foram paulatinamente ocupando os espaços dos próprios movimentos. A partir de 1990, novos personagens fizeram suas aparições, como as ONGs e as entidades do Terceiro Setor, muitas se articulam com as empresas e suas políticas de responsabilidade social. Começa então uma fase de mobilização de ações de fora para dentro da comunidade. Esse novo associativismo tem o apoio dos programas oficiais governamentais e se estrutura ao redor de dois eixos: controle social e apoio financeiro (GOHN, 2010). 194
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Tudo isso significa mudanças, crise, mas não o desaparecimento dos movimentos sociais. Eles continuam encontrando espaços para fazer suas aparições.
Atuam em redes, formam fóruns, tornam-se protagonistas de novas políticas sociais no Brasil, junto com as ONGs e outras entidades do Terceiro Setor. Nos anos 2000, no urbano, o movimento de luta pela moradia é mais organizado e o grande articulador das mobilizações que ganha visibilidade na mídia. (....) No rural, a questão da terra leva a uma pluralidade de novos movimentos sociais sem-terra e a ampliação das pautas, com as lutas contra os transgênicos, biodiversidade, biopirataria, biopoder etc. [...] Vários outros movimentos sociais foram criados, principalmente contra a violência urbana. Temas como a identidade cultural, diferenças e de multiculturalismo deixaram de ser objetos de estudos acadêmicos ou regulamentações no campo das leis e passaram a ser suporte de inúmeros projetos sociais desenvolvidos junto a comunidades excluídas (GOHN, 2010, p. 172).
A crise existe, mas ainda é marcante a presença dos movimentos sociais neste novo século. Eles lutam para preservar princípios e identidades construídas e contra as formas de opressão e exclusão que não podem, em geral, ser abolidas com a mera concessão de direitos, como é típico da cidadania. 195
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Considerações finais A temática dos movimentos sociais constitui-se numa área clássica dos estudos das Ciências Sociais e da Política. No entanto, compreendeu-se, no decorrer deste estudo, que a noção de movimentos sociais não é consensual entre seus principais teóricos, existem abordagens conceituais diferentes para os mesmos movimentos. Também são vários os paradigmas explicativos desses movimentos sociais. Na América Latina, as produções acerca dos movimentos sociais são orientadas pelos paradigmas europeus, especialmente o marxista- e o dos “novos” movimentos sociais, a partir de década de 1980. Não obstante, os autores apontam, nesses estudos, algumas lacunas teórica a serem preenchidas: as questões conceituais, a qualificação desses movimentos como “novos”, a distinção entre eles e as ações coletivas das ONGs, o papel desses movimentos na atualidade e quais as teorias que de fato têm sido construídas para explicá-los. Compreendeu-se, ainda, que os novos movimentos sociais caracterizam-se por um modelo teórico fundamentado na cultura e na negação do marxismo enquanto teoria explicativa da ação coletiva na sociedade atual. Esse modelo elimina o sujeito originado nas contradições do capitalismo e apresenta um novo sujeito. Este é um 196
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sujeito histórico, social, político e coletivo, que luta contra qualquer forma de discriminação e pela sua inserção integral na sociedade. Esse sujeito é constituído pelos “novos” movimentos sociais, que apresentam novas propostas de organização e ações, mas não se opõem, necessariamente aos tradicionais movimentos sociais. Além dessas questões, este trabalho chegou à conclusão de que existe realmente uma “crise” dos movimentos sociais. Tal crise não é caracterizada pelo enfraquecimento ou desaparecimentos de alguns movimentos em si, mas por fatores como: aparecimentos das ONGs, redução das verbas internacionais no trabalho comunitário e o ingresso de lideranças na política partidária. Contudo, ainda é marcante a presença dos movimentos sociais no século XXI. É a partir deles que grupos étnicos (índios, negros, ciganos, etc.), ecologistas, mulheres, gays, idosos, populações de comunidades tradicionais, lutam pelo respeito à diversidade e para que as diferenças não sirvam de parâmetro para reprodução da desigualdade.
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Satisfação dos usuários da biblioteca do Campus Salgueiro do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano Rosana Amâncio Pereira Milene Alves Torquato Genoveva Batista do Nascimento
Introdução Esta pesquisa possui como foco a análise da satisfação dos usuários da Biblioteca do Instituto Federal do Sertão Pernambucano – Campus Salgueiro/PE (IF-Sertão PE), quanto aos serviços por ela prestados. O principal motivo para escolher esta biblioteca foi por sermos servidores desta, tendo, assim, a oportunidade de conhecer a vivência na biblioteca, como também no Instituto. Deste modo, vale salientar que a biblioteca, bem como o campus, foi fundada em 2010, tendo passado por grandes mudanças nos últimos anos, tanto de pessoal quanto no quantitativo de material que vem aumentando 201
Satisfação dos usuários da biblioteca do campus Salgueiro do IF Sertão-PE
consideravelmente. Com tantas mudanças, faz-se importante ter um retorno da comunidade quanto à qualidade dos serviços que estão recebendo, por isso essa pesquisa objetivou especificamente, através da metodologia de estudo de usuário, identificar o perfil dos usuários da biblioteca, bem como as suas necessidades de informação e o grau de satisfação deles quanto aos serviços oferecidos. Para que, a partir desse retorno, possa identificar as falhas existentes e buscar melhorias para torná-la um espaço agradável que prevaleça um clima de harmonia com o público, tendo em vista que as bibliotecas devem verificar se o usuário está satisfeito para não correr o risco de perdê-lo. Logo, o ambiente da pesquisa foi escolhido pelo fator geográfico, por se tratar do nosso ambiente de trabalho e esse tema por ser de extrema importância o conhecimento do grau de satisfação dos usuários para a gestão atual, por isso, resolvemos avaliar como esse serviço está sendo desempenhado na biblioteca na qual trabalhamos: a Biblioteca do Campus Salgueiro Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano (IF Sertão-PE). A questão que norteia nossa pesquisa é: “A Biblioteca oferece um serviço satisfatório para os seus usuários?”. Assim, o nosso estudo pretende identificar as necessidades dos usuários, objetivando criar mecanismos e ações para suprir as insatisfações 202
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identificadas, como também promover a publicidade dos serviços oferecidos à comunidade acadêmica, professores, servidores, dentre outros. Contribuindo assim para o bom desenvolvimento da biblioteca.
Estudo de usuários
O estudo de usuário é realizado com a intenção de identificar e entender as necessidades informacionais e uso da informação por um determinado grupo. Tais estudos começaram com o objetivo de agilizar e aperfeiçoar serviços e produtos oferecidos pelas bibliotecas, uma década depois passaram a estudar o uso da informação por grupos de usuários específicos das Ciências Aplicadas. Na década de 60 o foco de estudos passou a ser o comportamento dos usuários e como se dava o fluxo da informação, época em que os tecnólogos e educadores começaram a ser pesquisados. Já na década de 70, os estudos estavam direcionados para as necessidades informacionais do usuário, os quais começaram a atender outras áreas do conhecimento tais como: humanidades, ciências sociais e administrativas. Não obstante na década de 1980, os estudos se voltaram para avaliação de satisfação e desempenho. Portanto, percebemos que os estudos foram evoluindo gradativamente, porém nunca 203
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perderam a essência que é identificar as necessidades dos usuários. De acordo com Figueiredo (1991, p. 24, grifo nosso):
Os estudos de usuários se baseiam em técnicas usadas nas ciências sociais para observar ou questionar os usuários dos sistemas de informação com o objetivo de entender as suas necessidades, preferências, opiniões e avaliações a respeito de serviços que a eles são oferecidos.
A autora ainda afirma que esses estudos podem responder porquê, como e para quais fins os indivíduos usam a informação, bem como os fatores que afetam o uso, servindo, ainda, como canais de comunicação entre a biblioteca e a comunidade a qual serve. Essa modalidade de estudo permite questionar aos próprios usuários sobre os serviços que eles recebem, possibilitando identificar as necessidades e insatisfações possibilitando, a posteriori, promover respostas e melhoraria na qualidade dos serviços prestados, considerada uma ferramenta de grande importância para as unidades de informação. O usuário é a razão de existir das unidades de informação, a biblioteca é construída para atender um determinado grupo, se não tiver uma perspectiva de público 204
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não se faz necessário nem ao menos sua construção, pois todos os serviços são direcionados aos usuários. Para Silva (2006, p. 23), os usuários reais são aqueles indivíduos que utilizam frequentemente os serviços de informação, enquanto os potenciais são indivíduos a quem se destinam os serviços de informação. Os usuários reais são os que de fato fazem uso dos serviços oferecidos pelas unidades de informações, enquanto os usuários potencias sentem necessidades semelhantes, mas não fazem uso dos serviços ou seja, um público que a instituição ainda não conseguiu atender, talvez por não conhecer suas necessidades. Diante desta definição de perfil do usuário é significativo conhecermos as definições e categorias abordadas pelos autores supracitados com foco na prestação de um serviço de qualidade. A seguir conheceremos o ambiente da pesquisa que é o Campus Salgueiro do IF Sertão Pernambucano.
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Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano – Campus Salgueiro O Instituto Federal do Sertão Pernambucano foi criado no ano de 2008 pelo Projeto de Lei 3.775/2008 e regulamentado pela Lei nº 11.892/2008, que transformava o Centro Federal de Educação Tecnológica de Petrolina – CEFET Petrolina, em IF Sertão Pernambucano, como parte do programa de expansão/interiorização da Rede Federal de Ensino Tecnológico. O IF Sertão Pernambuco é constituído por (sete) campi localizados nas seguintes cidades: 2 campi em Petrolina (um na área urbana e outro na área rural, “Campus Petrolina Industrial” e “Campus Petrolina Zona Rural)” e nas seguintes cidades: “Campus Ouricuri, “Campus Floresta”, “Campus Salgueiro”, “Campus Santa Maria Boa Vista” e “Campus Serra Talhada”, já a Reitoria está localizada na cidade de Petrolina. Esta instituição proporciona ensino nas seguintes modalidades: ensino médio técnico, médio técnico subsequente, PROEJA, ensino superior em licenciatura, ensino superior tecnológico e ensino a distância, como também é um órgão ofertante, local do programa do governo federal – PRONATEC. 206
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O Campus Salgueiro faz parte da “Fase II” do projeto de expansão, em que o governo federal priorizou, na época, duas cidades do Sertão pernambucano para receber os campi: Salgueiro e Ouricuri, consideradas com boa localização geográfica e polo econômico em desenvolvimento, sendo estes fatores estrategicamente favoráveis para o acesso de alunos oriundos de cidades vizinhas, promovendo assim, acesso ao ensino tecnológico para pessoas moradoras das áreas rurais mais afastadas dos grandes centros urbanos. A microrregião do Sertão Central formada pelos municípios de Salgueiro, Cedro, Mirandiba, Parnamirim, São José do Belmonte, Serrita e Verdejante, tem uma população total de 134.794 habitantes, estando 71.283 (52,88%) localizados na zona urbana e 63.511 (47,12%) na zona rural, produzindo um PIB, em 2005, de R$ 439.762.000,00, sendo 10,49% provenientes do setor agropecuário, 11,05% da indústria, 72,73% dos serviços e 5,74% de impostos (IBGE 2007). O Campus Salgueiro está localizado a 03 (três) km da sede do município, possui atualmente 903 alunos na modalidade regular. No quadro de servidores conta com 61 professores titulares e 05 substitutos, 43 técnicos administrativos e ainda 31 funcionários terceirizados. Caracteriza-se como Autarquia, possuindo autonomia financeira e administrativa com ensino pluricurricular 207
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e destaca-se por ter uma característica particular que é a oferta de educação profissional e tecnológica nas diferentes modalidades: ensino médio integrado, médio técnico subsequente e superior, e ainda a modalidade PROEJA. Fundamentais as atividades para o processo ensino e aprendizagem coma junção de conhecimentos técnicos e práticas pedagógicas articuladas às atividades de pesquisa e extensão, considerando as características econômicas, sociais e culturais da região. Na fase inicial, percebe-se a intenção em desenvolver as potencialidades regionais diante da construção do Plano de Desenvolvimento Institucional, o Reitor afirma que: Investir nos arranjos produtivos locais e comandar a instalação do Instituto Federal do Sertão Pernambucano são as principais metas do diretor do Centro Federal de Educação Tecnológica (Cefet) de Petrolina (PE), Sebastião Rildo Fernandes, reempossado nesta sexta-feira, 12, em Brasília.
A promoção do serviço público de educação tecnológica na Região do Sertão central foi planejada com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento da mão de obra especializada local, atualmente em expansão devido aos investimentos governamentais de obras de importância imensurável para o desenvolvimento do Nordeste. Diante deste contexto social e econômico, o 208
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IF Sertão-PE, instituição de ensino pública de qualidade, tem a missão de:
Ofertar a educação científica e tecnológica em todos os níveis e modalidades do ensino, com base nos princípios produtivos e investigativos, buscando tornar-se um Centro de Excelência, pela indissociabilidade do ensino, pesquisa e extensão, disponibilizando cidadãos qualificados e críticos para o ingresso e permanência nos diversos setores da economia, dando sustentabilidade aos arranjos produtivos, sociais e culturais regionais, com a inclusão social e a preservação ambiental. (PLANO DE DESENVOLVIMENTO INSTITUCIONAL 20092013, 2009, p. 19).
Para concretizar os objetivos institucionais e proporcionar a população uma educação de qualidade e cumprir a missão proposta, o IF Sertão - PE apresenta uma visão dinâmica disposta a contribuir com o desenvolvimento econômico local sem perder de vista a sustentabilidade socioambiental necessária, demonstra uma visão de: Integração sistêmica entre todos os níveis de ensino e que a melhoria da educação deve passar por um processo continuado de formação e qualificação de seus profissionais; - O desenvolvimento sócio-econômico e cultural como função da elevação do fazer tecnológico dos seus arranjos, da preservação ambiental e inclusão social. (PLANO DE DESENVOLVIMENTO INSTITUCIONAL 2009-2013, 2009, p. 19). 209
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Por ser uma instituição pública o ensino é gratuito e o acesso se dá por meio de processo seletivo para alunos do ensino médio e médio subsequente, já para o curso superior em licenciatura e superior tecnológico as vagas são preenchidas pelo Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e a seleção é feita pelo Sistema de Seleção Unificada (SiSU) com duas entradas por ano. Pensando na missão institucional e responsabilidade social, o processo seletivo respeita a Lei de Cotas designando 30% do total das vagas disponíveis em todos os cursos para alunos oriundos de escola pública e auto declarados de origem indígena e/ou afrodescendentes. A responsabilidade social institucional está intrínseca desde a seleção para o acesso até a conclusão como êxito, do educando, para o acesso respeita-se a lei de cotas como também se propõe programas da política de Assistência Estudantil, dentre os programas destacamos os auxílios: moradia, alimentação e transporte que são programas de transferência de auxílios financeiros. Os alunos com deficiência fazem atendimento e são acompanhados pelo Núcleo de Apoio para Pessoas com Necessidades Especificas de Aprendizado (NAPNE), que conta atualmente com uma profissional Interprete de Libras para auxiliar os alunos surdos, conta também com a coordenação e o apoio da equipe multiprofissional do Campus. O Núcleo desenvolve atividades de promoção e 210
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inclusão social por meio de ação que preveem a eliminação das barreiras arquitetônicas, linguísticas e atitudinais. Todos os alunos têm acesso a atividades e atendimentos dispensados pela equipe multiprofissional do Campi que é constituída pelos seguintes profissionais: Assistente Social, Enfermeira, Nutricionista e Psicóloga que se caracterizam por realizar ações de prevenção e promoção da saúde, desenvolvimento de projeto de vida, boas práticas nutricionais e atendimento social. Para tanto, o IF-Sertão PE promove a educação tecnológica na perspectiva da inclusão social como está proposto no PDI. Amparada pelos princípios de integração pedagógica, administrativa, tecnológica e política na ação educativa, a Função Social do IF SERTÃO-PE é primar pela excelência acadêmica através da oferta de cursos e programas que proporcionem múltiplas formas de assimilação e produção do saber científico e tecnológico, com vistas ao desenvolvimento sustentado e a inclusão social, visando a formação de cidadãos aptos para atuarem nos diversos setores da cadeia produtiva e na sociedade. (PROJETO DE DESENVOLVIMENTO INSTITUCIONAL, 2019-2013, 2009, p 48).
Portanto o Instituto Federal do Sertão Campus Salgueiro completa 4 (quatro) anos de existência, ainda em fase de construção na perspectiva de conclusão do projeto inicial e com propostas de ampliação devido à demanda 211
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local que aumenta a cada dia. Segue assim, cumprindo sua missão e objetivos, contribuindo para o desenvolvimento, social, econômica e cultural, da população do Sertão Central, por meio da promoção do direito básico da educação “direito de todos e dever do estado” como afirma a nossa Carta Magna Constitucional.
Biblioteca do Campus Salgueiro
A biblioteca do Instituto Federal do Sertão Pernambucano funciona de segunda a sexta-feira no horário das oito horas até as vinte uma e trinta minutos, de acordo com o organograma institucional, está ligada à direção de ensino. A estrutura física é formada por: acervo bibliográfico (que até o final do ano de 2014 contávamos com mais de 3.000 (três mil) exemplares), balcão de serviços de atendimento e referência, laboratório de pesquisa com nove computadores conectados à internet, um salão para leitura, quatro cabines de estudos individuais, sala de processamento técnico e coordenação. Realizamos os serviços de normalização de publicações e orientação quanto ao uso das normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Os principais usuários deste serviço são os estudantes concluintes na 212
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elaboração dos trabalhos de conclusão de cursos. Contamos atualmente com uma equipe de quatro servidores, sendo: três auxiliares de biblioteca e uma bibliotecária. Os usuários reais da biblioteca são os docentes, servidores discentes, servidores técnicos administrativos e os funcionários terceirizados. Para realizar o cadastro na biblioteca o aluno deve entregar declaração de matrícula e uma foto de tamanho 3 x 4 cm, e apresentar um documento de identificação com foto, para docentes e técnicos administrativos troca-se a declaração de matrícula pelo número SIAPE. Os usuários regulares podem fazer o empréstimo domiciliar de no máximo 3 (três) exemplares, por um prazo inicial de oito dias, podendo renovar o empréstimo até cinco vezes por igual período, no caso, é permitido ao usuário passar até 48 dias com a obra da biblioteca, desde que o mesmo apresente a obra na biblioteca solicitando as renovações e que não haja reserva de algum dos títulos por parte de um outro usuário, pois se a mesma tiver uma lista de espera deve ser automaticamente devolvida e emprestada ao primeiro solicitante. Os usuários que descumprem os prazos da biblioteca ficam com situação irregular, tendo 5 (cinco) dias de suspensão por cada dia de atraso e por cada obra, ficam impedidos de realizar trancamento e renovação de matrícula, como também receber seu diploma ou certificado que é fornecido pelas Secretarias 213
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de Registro Acadêmico que exige a apresentação do nada consta da biblioteca. Como a biblioteca ainda não está automatizada os processos de empréstimo e devolução só podem ser concluídos com a assinatura do usuário. A biblioteca faz parte de rede de bibliotecas do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano, podendo fazer empréstimo entre bibliotecas que compõem o IF Sertão-PE, desde que sejam solicitados pelo bibliotecário por telefone ou e-mail e posteriormente passado para solicitante que pode permanecer com a obra por um prazo inicial de 15 (quinze) dias, podendo ser renovado por igual período. Aos usuários potenciais, comunidade externa, é facultado o uso do espaço para suas pesquisas, leitura do material disponível no acervo e uso da internet, mas não lhe é permitido o empréstimo domiciliar. O acervo é formado por livros, obras de referências, periódicos científicos, informativos, materiais cartográficos e material multimídia. A biblioteca conta, atualmente, com alguns projetos como o leitor do mês, premiando o usuário que pegou mais obras emprestadas dentro do período e terá esse ano o Clube do leitor. Em 2014, houve a primeira Semana da Biblioteca, o evento durou três dias e contou entre outras coisas com: exposições artísticas, exibições de filmes, 214
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palestras, apresentações culturais, oficinas e apresentações de trabalhos dos alunos a proposta é que o evento aconteça anualmente.
Metodologia
Trata-se de uma pesquisa descritiva e exploratória com abordagens quantiqualitativa que nos permite obter dados numéricos, conceitos, levantar as ideias do público sobre o problema pesquisado ao mesmo tempo em que quantifica opiniões. O estudo foi desenvolvido a partir de diferentes fases, a saber: pesquisa documental, bibliográfica e de campo. A ferramenta de coleta de dados escolhida para a pesquisa, direcionada aos usuários da biblioteca, foi o questionário, com perguntas abertas e fechadas, por abranger um maior número de pessoas e de informações num curto espaço de tempo, o questionário foi composto de 14 (quatorze) questões, sendo três (03) abertas e nove (09) fechadas, abordando o perfil do usuário, grau de satisfação e uso da biblioteca. A amostra constitui de 27 usuários da Biblioteca do IF Sertão-PE que se dispuseram a participar da pesquisa respondendo o questionário. A coleta dos dados foi realizada no mês de dezembro de 2014. 215
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Resultados A partir da coleta os dados foram analisados e interpretados a partir das suas colocações. Quanto ao gênero, as respostas revelam que dos 27 usuários que responderam ao questionário 59% são do sexo masculino e 41% do sexo feminino e quanto à idade, os dados revelam que 65% dos sujeitos têm idade entre 15 e 20 anos e 35% dos sujeitos da pesquisa tem mais de 20 anos, acredita-se que seja pelo fato da maioria dos alunos serem do ensino médio com idade entre 15 e 20 anos, tendo seu tempo mais livre que os alunos dos cursos superiores e, assim, utilizando-o na biblioteca para pesquisas e estudos. Quanto à categoria dos usuários, as respostas revelam que 48% são alunos do ensino médio integrado; 22% são técnicos administrativos; 15% são alunos dos cursos superiores; 7% são alunos dos programas de jovens e adultos; 4% alunos dos cursos subsequentes ao ensino médio e 4% usuários da comunidade externa, nenhum professor respondeu ao questionário. Vemos, assim, que prevalece o número de estudantes do ensino médio que se utilizam da biblioteca. Voltamos à questão do tempo livre destes usuários. Os graduandos geralmente estão inseridos no mercado de trabalho e não dispõem de tanto tempo disponível quanto aqueles, 216
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bem como os professores, que, segundo pesquisa, raramente utilizam os serviços oferecidos e/ou o espaço da biblioteca. Quando indagamos aos usuários pesquisados sobre os motivos que os levam a visitarem a biblioteca, obtivemos os seguintes resultados. As respostas mostram que 56% dos usuários vão à biblioteca apenas para fazer pesquisa acadêmica, 22% vão para ler ou por entretenimento e 22% responderam que vão por outros motivos como (estudos, reunião com equipes). A maioria dos usuários utiliza a biblioteca para estudos e realização de pesquisas acadêmicas, portanto verificamos a importância da qualidade e atualização do acervo, além do ótimo atendimento ao usuário se tornando um ambiente propício e agradável também para leitura e entretenimento. Na questão em que perguntamos sobre a frequência dos usuários à biblioteca, tivemos como respostas que 40% dos usuários vão à biblioteca de duas a três vezes por semana; 27% vão todos os dias; 17% vão uma vez por mês; 10% não costumam visitar a biblioteca; 3% visitam uma vez por semana; e 3% a visitam de 15 em 15 dias. Assim, podemos inferir que a biblioteca possui uma frequência de uso elevado, já que a maioria dos usuários costuma visitá-la todos os dias e 22% de duas a três vezes por semana, acredita-se que se deva ao bom rela217
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cionamento com os leitores e usuários da biblioteca, bom espaço de leitura e também agradável para descanso, apesar da biblioteca não ser um espaço para descansar e sim para estudos e pesquisas. Na questão em que perguntamos o horário que o usuário mais frequenta a biblioteca a maioria respondeu que frequenta a tarde. Quanto ao atual horário de funcionamento da biblioteca (8h às 21h 30) todos responderam que este horário atende suas necessidades, acreditamos que seja por realmente abranger os três turnos. Quando questionados numa pergunta aberta sobre as principais atividades que fazem quando vão à biblioteca, a maioria respondeu que vai para realizar suas pesquisas acadêmicas, leitura, estudar para as avaliações do curso, reunião com colegas para discussões sobre trabalhos em equipe, pegar livros, acessar a internet e ler os jornais. Quanto à ajuda prestada pelo profissional da biblioteca, os resultados apontam que 85% dos usuários já foram ajudados pelo profissional a biblioteca, e que 15% responderam que não. Vimos que 85% dos usuários já foram ajudados pelo profissional da biblioteca, acredita-se que os outros 15% dos sujeitos da pesquisa preferem ter autonomia na busca, como alterar o sistema de busca se necessário ou por confiar mais na própria busca, sem opiniões de terceiros, também pelo fato da biblioteca ser 218
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pequena e quase todo o acervo disponível está ao alcance dos seus olhos, dos usuários já receberam atendimento na biblioteca 96% tiveram êxito e 4% não. Tal porcentagem revela um índice elevando de eficiência no serviço prestado pela biblioteca, no entanto deve melhorar para atender os 4% que já foram atendidos pelo profissional da biblioteca e não obtiveram êxito na ajuda. Esse resultado mostra alguma ineficiência do serviço que deve ser melhorado. Quanto ao atendimento prestado pelos auxiliares de biblioteca e pelo bibliotecário, tomamos como resultado da pesquisa, o gráfico a seguir. Vimos que 78% dos usuários consideraram bom; 18% o consideraram regular e 4% consideram ruim. No geral podemos destacar como bom o atendimento ao usuário, visto que foi considerado assim pelo maior percentual dos sujeitos da pesquisa. Isso é o reflexo da busca pelos profissionais que realizam esse serviço em garantir um bom atendimento e prestação de serviços aos usuários. Buscamos saber se o usuário conhece todos os serviços oferecidos pela Biblioteca, tais como: a) empréstimo, b) serviço de renovação, c) reserva, d) acesso à internet e e) Serviço de normalização de publicações e orientação quanto ao uso das normas da ABNT, cada letra com quatro alternativas: conheço e utilizo com frequência, conheço 219
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e utilizo de vez em quando, conheço e não utilizo e não conheço. Quanto ao empréstimo, 45% conhecem e utilizam com frequência; 33% conhecem e utilizam de vez em quando, e 11% o conhecem, mas não o utilizam e outros 11% não conhecem o serviço de empréstimos, o que chama atenção, pois mostra que 3 sujeitos da pesquisa desconhecem que pode pegar emprestado até três exemplares de livros da biblioteca da instituição na qual estuda ou trabalha e permanecer com a obra por até oito dias. Quanto ao conhecimento e uso do serviço de renovação, percebemos que 30% dos usuários responderam que conhecem e utilizam com frequência; 37% conhecem e utilizam de vez em quando; 15% conhecem e não utilizam e 18% não o conhecem. Um dado importante a ser observado é o fato de 18% dos usuários da biblioteca não terem, sequer, conhecimento da existência de um serviço oferecido pela biblioteca. É preciso que haja uma maior divulgação de todos os serviços oferecidos pela mesma. As informações demonstram que 26% conhecem e o utilizam com frequência; 33% conhecem e o utilizam de vez em quando; 26% conhecem, mas não o utilizam e 15% dos usuários não o conhecem. Outro dado que nos chama a atenção é o desconhecimento do serviço de renovação, pois esse percentual representa 4 sujeitos da pesquisa que não tem conhecimento do serviço que o permite solicitar 220
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renovação das obras emprestadas pelo mesmo período o empréstimo inicial. Apesar de não ser um serviço muito utilizado pelos usuários, o seu não conhecimento não é justificável. Pode haver serviços que não sejam muito utilizados pelos usuários, mas não se justifica o serviço não ser conhecido. Ao longo dos resultados temos observado que a maior falta da biblioteca tem sido a publicidade de seus serviços. Quanto ao conhecimento e uso da sala de acesso a internet, 41% dos usuários responderam que conhecem e utilizam com frequência; 41% conhecem e o utilizam de vez em quando; 7% conhecem e não utilizam e 11% não conhecem. É grande o número de usuários que simplesmente não conhecem este serviço que tem uma importância significativa para a biblioteca. A biblioteca possui 6 computadores para que os alunos possam acessar a internet, ver suas notas no sistema e fazerem pesquisas acadêmicas, como também o serviço de internet sem fio – conhecida também como wireless ou Wi-Fi. Um serviço de alta qualidade, que dá ao cliente da biblioteca a opção de buscar outro meio de pesquisa que não o livro propriamente dito, meio pelo qual, talvez, a informação esteja mais atualizada. Quanto ao conhecimento e uso do serviço de normalização de publicações e orientação quanto ao uso das normas da ABNT, observou-se que 22% dos usuários 221
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conhecem e utilizam com frequência esse serviço; 34% conhecem e o utilizam de vez em quando; 11% conhecem e não o utilizam e 33% não o conhecem. Outro serviço bastante relevante e que não é conhecido por um terço daqueles que frequentam a biblioteca. O serviço ora mencionado é utilizado a todo o instante, ainda que não seja prestado pelo bibliotecário, demonstrando assim, sua importância. A falta de conhecimento da existência desse é justificada por se tratar de um serviço novo e pela ausência de política de divulgação que deveria ser desenvolvida dentro e fora da biblioteca. Acreditamos que falta uma maior divulgação quanto aos serviços oferecidos pela biblioteca. Pode ser feito um trabalho de marketing tanto dos serviços oferecidos aos usuários, quando do serviço de referência, aumentando assim a divulgação do serviço e consequentemente uma maior utilização do mesmo pelos usuários. Na penúltima questão, buscando conhecer as necessidades dos usuários, pedimos, em um quesito aberto que dissessem o que falta para que os serviços da biblioteca possam ser considerados satisfatórios e as principais respostas foram: divulgação dos serviços, silêncio, ajuda no manuseio com o computador aos alunos que ainda não sabem usar, maior disponibilidade de acervo, maior quantidade de livros, maior espaço físico, mais compu222
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tadores, ambiente de estudo em grupo e ar condicionado no laboratório de informática. Tomando como base as respostas aos questionários, deve ser elaborado um plano estratégico de marketing para a ampliação do serviço, com atenção para suprir a necessidade de informação do usuário como principal objetivo e recomendar uma maior atenção aos usuários por parte dos funcionários da biblioteca, como também buscar melhoria na estrutura e no quantitativo de livros. Quanto a estrutura da biblioteca, a maior parte dos pesquisados considera de regular a ruim, acredita-se que parte deles sejam os que em questão aberta pedem cabines e estudo em grupo e ar condicionado para o laboratório de informática. A biblioteca tem menos de 5 (cinco) anos e a atual equipe é nova. Um setor em construção, as vulnerabilidades dos serviços devem ser consideradas para melhorar o trabalho e construir um elo entre profissional e o usuário, para que o profissional possa suprir a necessidade de informação daqueles que a frequentam.
Considerações finais
Os resultados apontaram que os usuários da biblioteca são, em sua maioria, estudantes do Ensino Médio Integrado do sexo masculino, com idade entre 15 e 20 223
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anos, a maioria vai à biblioteca para realizar suas pesquisas acadêmicas, costumam frequentá-la diariamente, no período da tarde, já foi ajudado pelo bibliotecário ou pelo auxiliar de biblioteca, teve êxito na ajuda, considerando o serviço bom. Quanto a estrutura da biblioteca os usuários consideram regular. Quanto ao conhecimento e uso dos serviços, grande parte dos usuários conhece e utiliza com frequência o serviço de empréstimo; conhece e utilizam de vez em quando o serviço de renovação; conhece e utilizam de vez em quando o serviço de reserva; conhece e utiliza com frequência o laboratório para acesso da internet na biblioteca; conhece e utilizam de vez em quando o serviço de normalização de publicação e orientação quanto às normas da ABNT. Ao analisar o nível de satisfação do usuário com os serviços oferecidos pela biblioteca detectamos um bom nível de satisfação, pela capacidade de suprir a necessidade de informação de grande parte deles. No entanto, alguns sentem falta de divulgação dos serviços, querem mais silêncio no ambiente de leitura, já que grande parte do público é adolescente e usa o ambiente para descansar, fazer os trabalhos em equipe e conversar com os amigos, parte dos estudantes não tem muito conhecimento sobre o manuseio de computadores e pedem uma atenção maior na hora das buscas na internet, em virtude do acervo ser pequeno os usuários sentem falta de alguns livros neces224
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sários para suas atividades, pois a biblioteca conta apenas com pouco mais de três mil exemplares, consideram a estrutura regular, mas pedem maior espaço físico, mais computadores, que seja criado ambiente de estudo em grupo e ar condicionado no laboratório de informática. Desta forma, importa-nos dizer que, para a melhoria desses serviços é imprescindível que sejam feitas divulgações dos mesmos, além de preparar os funcionários para dá uma atenção ainda maior aos usuários. O acervo é pequeno, mas, para um bom funcionamento de uma biblioteca, não basta haver um acervo atualizado; é preciso funcionários dedicados e capacitados para caminhar buscando uma evolução do saber. Assim, como os livros não chegam sozinhos às suas estantes, alguns usuários não encontram suas desejadas informações sem a intermediação de um profissional com boa vontade em atendê-lo e um bom serviço para oferecê-lo. Propomos que seja elaborado um plano de marketing para uma melhor divulgação dos serviços oferecidos pela biblioteca e visto com os gestores as melhorias estruturais e o quantitativo de livros, pois, a real satisfação dos usuários depende do planejamento adequado para oferta dos produtos e serviços das unidades de informação. O apoio institucional é importante para melhorar os serviços da biblioteca, já que as maiores vulnerabilidades identificadas são da parte estrutural. A automação seria 225
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um passo importante para uma maior autonomia dos usuários, eles poderiam saber pelo sistema da biblioteca se o livro que precisam está disponível no acervo sem ter que adentrar as estantes ou pedir que o auxiliar de biblioteca faça isso por ele, como também capacitação voltada a ação cultural em bibliotecas para os servidores do setor, que é uma forma de amplitude do conhecimento e, aliada a experiência pode se tornar uma ferramenta de crescimento do trabalho voltando-se para a necessidade do usuário.
Referências
BRASIL. Lei nº 11.892, de 29 de dezembro de 2008. Disponível em: <http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11892.htm>. Acesso em: 13 dez. 2014. BRASIL. Projeto de Lei nº 3.775, de 2008. Disponível em: <http://portal.mec. gov.br/setec/arquivos/pdf3/projetolei_ifets.pdf>. Acesso em: 13 dez. 2014.
FIGUEIREDO, Nice Menezes de. Metodologias para a promoção do uso da informação: técnicas aplicadas particularmente em bibliotecas universitárias e especializadas. São Paulo: Nobel, 1991. INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DO SERTÃO PERNAMBUCANO. Plano de Desenvolvimento Institucional: 2009-2013. Disponível em: http://www.ifsertao-pe.edu.br/reitoria/documentos/pdi_ ifsertao-pe.pdf. Acesso em 24 dez. 2014.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. CEFET de Petrolina tem novo diretor. 2008. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&vie w=article&id=11804:&catid=209&Itemid=164. Acesso em: 24 dez. 2014.
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______. Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica. Regimento interno das bibliotecas do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do sertão pernambucano. 2012. Disponível em: < http://www.ifsertao-pe.edu.br/ petrolina/images/ascom/campuspetrolina/Editais/regimento.pdf>. Acesso em: 24 dez. 2014. SILVA, Divina Aparecida da; ARAÚJO, Isa Antunes. Auxiliar de biblioteca: técnicas e práticas para formação profissional. 5. ed. Brasília: Thesaurus, 2008.
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Sobre os autores Adriana Valéria Sales Bispo Possui graduação em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Pernambuco e mestrado em Genética pela Universidade Federal de Pernambuco. Atualmente é professor no campus Salgueiro Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano e doutoranda da Universidade Federal de Pernambuco. Tem experiência na área de Genética, com ênfase em Genética, atuando principalmente nos seguintes temas: Citogenética, Biologia Molecular, Polimorfismos Genético e Síndrome de Turner. Állef Torres da Silva Estudante do ensino médio integrado do curso de Informática do campus Salgueiro do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano. Bolsista do projeto de extensão “Agentes Literário: Disseminando Poesias Para Autorreflexão”. Ângela Kerley Pereira Lima Licenciada em Geografia, Mestre em Desenvolvimento Regional Sustentável pela Universidade Federal do Cariri (UFCA) e Professora no campus Salgueiro Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano. Tem experiência nas áreas de Educação, Mobilidade Urbana e Geografia Urbana. Atualmente desenvolvendo pesquisa focada na produção espacial da periferia do Juazeiro do Norte/CE, estudo de caso bairro João Cabral financiada pela CAPES. Tem como grande área de pesquisa: Geografia Urbana e Geografia Cultural.
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Múltiplos olhares sobre o agir científico no Campus Salgueiro
Antônia Aparecida Barros Alencar Correia Mestre em Educação pela Universidad de la Empresa em Montevideo – Uruguai. Doutoranda em Educação pela Universidad de la Integración de las Américas em Assunção - Paraguai. Atualmente, é professora de Língua Portuguesa do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano. Tem experiência na área de Educação e de Linguística Aplicada com ênfase ao ensino e aprendizagem de Língua Portuguesa. Ariadne Clímaco Estudante do ensino médio integrado do curso de Edificações do campus Salgueiro do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano. Bolsista do projeto de extensão “Teatro e dança no IF Salgueiro – Metamorfose literária para além da sala de aula”. Edilaine Pereira de Sousa Possui graduação em Letras pela Universidade de Pernambuco. Atualmente é professora titular do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano. Tem experiência na área de Literatura com ênfase nos estudos interartes, que envolve desenho, teatro e outras artes no processo de reflexividade ficcional corroborando com Análise do Discurso Literário de linha francesa e na perspectiva do leitor, estudos focados na estética da recepção. Francisco Kelsen de Oliveira Doutorando em Ciências da Computação pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Possui mestrado em Computação Aplicada, especialização em Gestão de Projetos e graduação em Licenciatura em Matemática pela Universidade Estadual do Ceará (UECE), especialização em Tutoria em EaD pela Universidade Cândido Mendes
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KÉLVYA FREITAS ABREU (ORG.)
(UCAM), bacharelado em Sistemas de Informação pela Universidade Estácio de Sá (UNESA) e técnico em Informática pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE). Atualmente é professor de Ensino Básico, Técnico e Tecnológico do curso de Informática do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano. Tem experiência na área de Ciência da Computação, com ênfase em Redes de Computadores, Sistemas Distribuídos, Engenharia de Software, Software Livre e Tecnologia Educacional, além disso, atua nas áreas de Educação a Distância e Educação Matemática. É líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em Práticas Educacionais Tecnológicas (GEPET) e participante do Grupo de pesquisa de Ciências Cognitivas e Tecnologia Educacional. Genoveva Batista do Nascimento Graduada em Biblioteconomia e mestre em Educação pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Professora Assistente do Departamento de Ciência da Informação da Universidade Federal da Paraíba. Integrante do projeto de pesquisa: Laboratório de Tecnologias Intelectuais (LTi) – CNPQ. Vice-coordenadora do Curso de Graduação em Biblioteconomia de UFPB e Coordenadora do Projeto de Monitoria do DCI/UFPB. Experiência docente nas áreas de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, atuando principalmente nos seguintes temas: ensino, leitura, gestão de documentos, bibliotecas públicas e escolares, educação patrimonial, estudo de usuários, preservação e conservação de acervos e educação à distância. Kélvya Freitas Abreu Mestre em Linguística e licenciada em Letras (Português – Espanhol) pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Professora de espanhol do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano. É líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em Práti-
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Múltiplos olhares sobre o agir científico no Campus Salgueiro
cas Educacionais Tecnológicas (GEPET) e atua na área de Linguística Aplicada com ênfase ao ensino e aprendizagem do espanhol como Língua Estrangeira em suas pesquisas. Maria Jorge dos Santos Leite Possui licenciatura em História pela Universidade Regional do Cariri (URCA), Mestrado em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC) e Doutorado em Educação pela UFC. Atualmente é ProfessoraAdjunta da Universidade de Pernambuco. Tem experiência na área de Sociologia, Filosofia e História – com ênfase em História do Nordeste Brasileiro, história do Brasil e história e cultura afro-brasileiras. Milene Alves Torquato Graduada em Serviço Social pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Assistente Social do campus Salgueiro do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano. Tem experiência de atuação profissional nas seguintes áreas: Política de Assistência Social nos serviços de CRAS, CREAS, Programa Bolsa Família e Cadastro Único; atuação no Sistema Único de Saúde em hospital de atendimentos de emergência e ambulatório; atuação em Política Habitacional e Situação de Calamidade Pública; e atuação na Política de Educação. Misael Cavalcanti Angelim Neto Estudante egresso do Curso de Edificações Médio Integrado do Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano (IF Sertão-PE) e bolsista de Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC Jr.) do IF Sertão-PE.
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KÉLVYA FREITAS ABREU (ORG.)
Neide Santos Professora Associada II da Universidade Federal de Pernambuco, Mestrado em Genética pela Universidade Federal de Pernambuco e Doutorado em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Pernambuco. Pedro Henrique Simião Estudante do ensino médio integrado do curso de Edificações do campus Salgueiro do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano. Bolsista do projeto de extensão “Teatro e dança no IF Salgueiro – Metamorfose literária para além da sala de aula”. Rosana Amâncio Pereira Graduada em Biblioteconomia pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Especialista em Biblioteconomia pela Faculdade Intrnaciona Signorelli. Auxiliar de Biblioteca no campus Salgueiro do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano. Samara Souza Maciel Especialista em Geografia e Meio Ambiente pela Universidade Regional do Cariri (URCA). Graduanda em Administração Pública pela Universidade Federal do Cariri (UFCA). Vinícius Gonçalves Estudante do ensino médio integrado do curso de Edificações do campus Salgueiro do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano. Bolsista do projeto de extensão “Teatro e dança no IF Salgueiro – Metamorfose literária para além da sala de aula”.
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ISBN 978-85-66530-59-9