Aerovisão nº 251 JAN/FEV/MAR

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Com a inauguração de um centro para transferência de tecnologia, o desenvolvimento do futuro caça da FAB ganha DNA brasileiro

GDDN, centro inaugurado no interior de São Paulo, concentra todas as trocas de informações envolvidas na transferência de tecnologia

“Efetivamente, integramos os times de desenvovimento do Gripen”, afirma engenheiro brasileiro que esteve na Suécia

Conheça três empresas brasileiras que desenvolvem soluções para o caça Gripen NG


Sgt Johnson Barros / Agência Força Aérea



Prepare seu plano de voo

SGT Bruno Batista / Agência Força Aérea Cb André Feitosa / Agência Força Aérea

Edição nº 251 Ano 44 Janeiro / Fevereiro / Março - 2017

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MEIO AMBIENTE

Energia sustentável como solução

FAB busca economia de recursos e promove preservação do meio ambiente ao investir em energia solar.

ENTREVISTA

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Ministér io da Defesa completa 18 anos

Raul Jungmann comenta desafios, perspectivas, integração e interoperabilidade sob a perspectiva do Ministério da Defesa.

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REESTRUTURAÇÃO

CAPA

Transfor mação em curso

Desenvolvimento conjunto

Saiba que mudanças a Força Aérea Brasileira tem realizado para se tornar mais eficiente e operacional.

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Os processos de transferência de tecnologia e absorção do conhecimento do projeto Gripen NG começam a virar realidade.

EXPEDIENTE Publicação oficial da Força Aérea Brasileira, a revista Aerovisão é produzida pela Agência Força Aérea, do Centro de Comunicação Social da Aeronáutica (CECOMSAER). Chefe do CECOMSAER: Coronel Av Antonio Ramirez Lorenzo Vice-Chefe do CECOMSAER: Coronel Av Flávio Eduardo Mendonça Tarraf Chefe da Divisão de Comunicação Integrada: Coronel Av José Frederico Júnior Chefe da Subdivisão de Produção e Divulgação: Ten Cel Av Rodrigo José Fontes de Almeida

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Jan/Fev/Mar 2017 Aerovisão

Edição: Tenentes Gabrielli Dala Vechia (Jornalista Responsável - 16128/RS) e Iris Vasconcellos (Jornalista Responsável - 4420/BA) Repórteres: Tenentes Cynthia Fernandes, Flávio Nishimori, Gabrielli Dala Vechia, Humberto Leite, Iris Vasconcellos e Jussara Peccini. Editoração/infográfi cos/arte: Tenentes André Eduardo Longo e Rachid Jereissati de Lima; Suboficial Edmilson Alves Maciel, Sargentos Ednaldo da Silva, Emerson Linares, Lucemberg Nascimento, Marcela Cristina Mendonça Santos e Daniele Teixeira de Azevedo; Cabo Pedro Bezerra. Fotógrafos: Tenente Enilton Kirchhof; Sargentos Alexandre Manfrim, Bruno Batista e Johnson Barros; Cabos André Feitosa, Vinícius Santos.

Contato: redacao@fab.mil.br Esplanada dos Ministérios, Bloco M, 7º Andar CEP: 70045-900 - Brasília - DF

Tiragem: 18 mil exemplares.

Período: Janeiro / Fevereiro / Março 2017 - Ano 44 Estão autorizadas transcrições integrais ou parciais das matérias, desde que mencionada a fonte. Distribuição Gratuita Acesse a edição eletrônica: www.fab.mil.br/publicacao/listagemAerovisao Impressão: Gráfica Editora Pallotti.


MISSÃO DA FAB

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‘Integrar’ faz parte da nova missão

Ao lado da manutenção da soberania do espaço aéreo brasileiro, a missão da FAB, agora, engloba a integração do território brasileiro.

Cb André Feitosa / Agência Força Aérea

TEN Enilton Kirchhof / Agência Força Aérea

SGT Alexandre Manfrim/ Agência Força Aérea

Veja a edição digital

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OPERACIONAL

Estandes de tiro aeronáutico

Saiba quais são e como funcionam os locais onde os pilotos da Força Aérea Brasileira se preparam para a guerra.

Veja na FAB TV (youtube.com/portalfab) ESTA FORÇA É BRASIL O vídeo “Esta Força é Brasil” destaca o papel da Força Aérea Brasileira nas mais diversas áreas de atuação com foco na proteção e desenvolvimento do País. A produção ressalta o envolvimento da FAB em um modelo próprio de defesa aérea e controle de tráfego aéreo, na busca constante da integração de todo o território nacional, na qualificação do seu efetivo, no segmento de ciência e tecnologia, e muito mais, tudo em prol da sociedade brasileira.

CONEXÃO FAB O “Conexão FAB” mostra mensalmente as principais notícias da FAB. No programa de fevereiro, você acompanha a ativação do Comando de Preparo (COMPREP) que vai estabelecer as normas e diretrizes de treinamento para as 15 Alas. Mostramos também os locais utilizados para que as tripulações façam exercícios com uso de armamento e como foi a atuação da Força Aérea na missão de Garantia da Lei e da Ordem no Espírito Santo. Aerovisão

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Aos Leitores

O futuro é logo ali... Quando se fala em Força Aérea, imediatamente tem-se a ideia de modernidade e avanço tecnológico. E com a FAB não poderia ser diferente... Vivendo uma rotina especial em que prepara a chegada de seu mais moderno vetor de combate, o caça Gripen NG, denominado F-39 dentro da Força, a FAB trabalha paralelamente a isso para consolidar uma nova estrutura que visará dar mais agilidade e, acima de tudo, uma maior lógica administrativa e operacional ao seu dia a dia. Ao participar da inauguração do Centro de Desenvolvimento do Gripen (GDDN, na sigla em inglês), em Gavião Peixoto, no interior de São Paulo, testemunhamos um dos principais marcos da transferência de tecnologia de primeira linha inerente ao contrato de compra das aeronaves suecas. E nesta edição, vocês vão conhecer como é o funcionamento do GDDN, local que vai concentrar o desenvolvimento colaborativo do Gripen NG. Ainda nessa mesma matéria, vocês poderão saber mais sobre os profissionais que vão trabalhar na unidade e como o sigilo de informações dos projetos será mantido. Mas, como já dissemos, além da implantação de aeronaves modernas, a FAB vive intensamente um momento de reestruturação administrativa e operacional, e aproveitaremos para aprender um pouco mais sobre esse processo. Afinal de contas, mudanças sempre geram ansiedades e dúvidas, e estamos certos de que a informação clara e acessível é o melhor remédio. Por isso, também é muito importante que todos saibam que nossa missão foi ampliada, de modo que ela pudesse contemplar algo que sempre fizemos: integrar o País por meio das nossas asas. Assim sendo, incorporamos efetivamente esta atividade à de defesa da soberania do espaço aéreo,

tendo agora como missão da Força Aérea Brasileira “defender a soberania do espaço aéreo e integrar o território nacional, com vistas à defesa da Pátria”. Destacamos também em nossas páginas uma entrevista com o Ministro da Defesa, Raul Jungmann, onde ele nos mostra que a interoperabilidade já é algo rotineiro entre as Forças, apesar de o Ministério ter apenas 18 anos de existência. Operar conjuntamente tem sido uma realidade constante para as Forças Armadas brasileiras, como bem ficou provado nos grandes eventos recentes. Nessa entrevista, ainda, o Ministro nos fala sobre os principais desafios para os próximos anos. Por fim, não se pode falar em modernidade sem se levar em conta a questão da sustentabilidade, pois o futuro que queremos também envolve uso sustentável dos recursos naturais, aumentando a eficiência dos recursos da administração. Esse é o foco do projeto de geração de energia sustentável do Comando da Aeronáutica. Nossas páginas mostram que grandes painéis solares vão, cada vez mais, começar a fazer parte da paisagem de algumas organizações da Força Aérea nos próximos anos, como já podemos constatar em algumas das nossas unidades do Norte e do Nordeste. Em suma, a edição deste trimestre traz a todos os leitores a oportunidade não só de se atualizar sobre o que houve de mais significativo no período, mas também a possibilidade de se verificar que estamos na direção certa, com plano de voo definido e com todos os parâmetros monitorados continuadamente, pois sabemos que para uma Força como a nossa, o futuro é logo ali...

Nossa capa: A arte, de autoria do suboficial Edmilson, mostra o projeto F-X2 tomando forma e o papel que diversos fatores têm no desenvolvimento do Gripen NG.

Boa Leitura! Coronel Av Antonio Ramirez Lorenzo

Chefe do Centro de Comunicação Social da Aeronáutica

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Ten Heitor Nascimento / Agência Força Aérea

ENTREVISTA

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Defesa, desenvolvimento e sociedade À frente de um dos maiores orçamentos dentre as pastas do Executivo, o Ministro da Defesa (MD), Raul Jungmann, avalia que a importância das Forças Armadas tem ganhado outra dimensão: não se trata somente do emprego militar, mas do desenvolvimento do País e da atuação junto à sociedade. Para ilustrar, cita exemplos de grandes projetos estratégicos, como o Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégicas (SGDC), que trazem como efeitos o incremento das áreas científicas e tecnológicas, a geração de empregos e a produção de riquezas. Também destaca o modo como os militares foram engajados em missões de Garantia da Lei e da Ordem, transporte de órgãos para transplante e combate ao mosquito Aedes aegypti. Ao completar 18 anos, com o objetivo de fomentar o diálogo entre os meios civil e militar, o Ministério da Defesa tem investido em ações de interoperabilidade e integração entre as Forças, não só no que diz respeito a operações conjuntas, mas também no reaparelhamento comum – como aconteceu na compra dos helicópteros H225M (antigo EC-725). Segundo Jungmann, a integração das Forças precisa ser um processo gradativo, já que cada uma possui sua cultura. “Pretendemos conseguir cada vez mais a interoperabilidade entre as Forças Armadas. Isso não apenas no emprego de pessoal, mas também de materiais e equipamentos específicos”, explica. Tenente Jornalista GABRIELLI DALA VECHIA

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Ten Paulo Rezende / Agência Força Aérea

Completar 18 anos é o marco da maioridade na cultura brasileira. Com quais ensinamentos/ lições aprendidas o MD chega a essa idade? Fundado para ser um órgão de interlocução entre os meios civil e militar, o Ministério da Defesa coleciona importantes conquistas ao longo desses anos, além de se consolidar na realização de operações conjuntas entre as Forças Armadas. O Ministério tem dado sua contribuição para o avanço da Defesa no Brasil, não só no que diz respeito ao emprego das Forças Armadas (FFAA), mas também como ação junto à sociedade e em prol do desenvolvimento do País. Entre os avanços destaca-se o fato de o Ministério da Defesa ser um dos maiores orçamentos da Esplanada, com investimentos nos projetos estratégicos fundamentais ao País, como o Programa de Submarinos (Prosub), o Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras (Sisfron), o programa FX-2 (caças Gripen NG) e o Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégicas (SGDC). Coube ainda à Defesa atuar na coordenação de grandes eventos realizados no Brasil, como a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Rio 2016. Além disso, são grandes os avanços na área de indústria de defesa, em missões de paz e projetos sociais. O aprendizado é contínuo e crescente. Recentemente, tem-se aprimorado

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o trabalho integrado com órgãos de segurança pública, como para Garantia da Lei e da Ordem, e, ainda, o apoio em questões logísticas, como eleições, e operações com outros Ministérios, por exemplo, o emprego das Forças para o transporte de órgãos para transplantes e o combate ao mosquito Aedes aegypti.

“O Ministério

tem dado sua contribuição para o avanço da Defesa no Brasil, não só no que diz respeito ao emprego das Forças Armadas, mas também como ação junto à sociedade e em prol do desenvolvimento do País”.

O MD não possui, ainda, uma carreira específica de servidores civis efetivos. Existe um projeto de lei para mudar essa situação? Como está o andamento? No que a contratação desses profissionais pode vir a somar para as atividades do Ministério? A proposta de criação da Carreira de Defesa Nacional origina-se de determinação da Estratégia Nacional de Defesa, aprovada pelo Decreto nº 6.703, de 18 de dezembro de 2008. Dessa forma, a proposta foi submetida ao Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão em 2010, órgão competente para análise. Em fevereiro de 2015, a proposta foi restituída ao Ministério da Defesa para reavaliação, tendo em vista o início de um novo mandato presidencial. Portanto, não se tornou Projeto de Lei, uma vez que não chegou ao Congresso Nacional. Desde então, diante da crise econômica do País, o MD tem avaliado o momento oportuno para reapresentação da proposta, considerando que a criação da carreira gerará aumento de despesa. O prazo para apresentação de propostas para criação ou reestruturação de carreiras é 31 de maio de cada exercício. Atualmente, a força de trabalho civil do MD é composta basicamente por requisitados de outros órgãos e cargos comissionados. Pela proposta, a Carreira de Defesa Nacional será composta de 300 cargos de Analista de Defesa


Cb Vinícius Santos / Agência Força Aérea

As Forças Especiais que atuaram nos Jogos Olímpicos Rio 2016 foram compostas por militares das três Forças. Nacional, de nível superior, a serem providos gradualmente no decorrer dos anos, por meio de concurso público. A carreira terá perfil estratégico, possibilitando aos civis participarem da formulação de políticas e programas na área de Defesa Nacional. Nesse sentido, representa um ganho significativo para o desenvolvimento das atividades institucionais do MD. A aquisição dos helicópteros H225M foi o primeiro projeto de reaparelhamento conjunto das FFAA, certo? Qual a avaliação desse projeto? Existe a perspectiva de outro projeto nesses moldes? O processo de aquisição dos helicópteros H225M [foto na página anterior] representa, realmente, o primeiro projeto de reaparelhamento de grande vulto, conduzido de forma conjunta no âmbito das FFAA. Mais do que um simples projeto de aquisição de helicópteros, o projeto HX-BR contempla, principalmente, atividades de transferência de tecnologia, capacitação das nossas indústrias e especialização de recursos humanos. O objetivo fi nal do projeto é que o Brasil possua as capacidades tecnológicas e industriais para projetar, desenvolver e produzir helicópteros, sendo ainda capaz, por meio de sua

Base Industrial de Defesa (BID), de apoiar e dar suporte às operações ao longo do seu ciclo de vida. Além dos aspectos operacionais decorrentes, como doutrina de operação e planejamento tático, esse projeto permitiu comprovar as vantagens da interoperabilidade logística, visto que toda a frota em operação, Marinha, Exército e Força Aérea, é suportada por uma única estrutura contratual e logística, gerenciada por equipes das três Forças, conjuntamente, propiciando altos níveis de disponibilidade operacional com custos de operação muito mais baixos. Considerando essas vantagens, o Ministério da Defesa vem estudando, em parceria com as Forças Armadas, a adoção de uma Diretriz de Obtenção Conjunta que garanta, por meio de estudos comparativos e de viabilidade, a adoção de programas de reaparelhamento conjuntos, garantindo a entrega de equipamentos eficazes aos nossos combatentes e a busca pela autonomia tecnológica e industrial da BID. Como o senhor avalia a integração das Forças Armadas? Quais as perspectivas para os próximos anos? A integração da Marinha, do Exército e da Aeronáutica foi um processo gradativo, uma vez que as Forças

Armadas tinham culturas próprias e mudá-las rapidamente poderia causar um impacto negativo. Nós procuramos durante esse tempo fazer um trabalho nas escolas, de modo que, aos poucos, os alunos, tanto das escolas de formação quanto das escolas de Estado-Maior, pudessem ver a necessidade do trabalho em conjunto entre as Forças. Atingimos um patamar considerável e para os próximos anos pretendemos conseguir cada vez mais a interoperabilidade entre as Forças Armadas. Isso não apenas no emprego de pessoal, mas também no emprego de materiais e equipamentos específicos, como o link de dados, sistema de rádios, linguagens e criptografias comuns, entre outros. De que forma a Olimpíada contribuiu para estreitar o relacionamento entre as Forças e para o diálogo com outros órgãos de segurança? Qual a principal lição aprendida nesse evento? A interoperabilidade entre a Marinha, o Exército e a Aeronáutica foi totalmente exercitada durante os Jogos Rio 2016. Foram criados Comandos Conjuntos, responsáveis pela segurança em diversas áreas e que exercitaram o comando e controle e a relação entre as Forças Armadas. A atuação da Defesa na parte da segurança ocorreu com as Aerovisão

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mais diversas ações, como inspeções marítimas, escoltas de dignitários, patrulhamentos e missões de defesa do espaço aéreo. Nos Jogos Rio 2016 também se colocou em prática a atividade interagências, em que se atuou em conjunto com o Ministério da Justiça e o Gabinete de Segurança Institucional, reunindo, assim, os três eixos responsáveis pela segurança: Defesa, Inteligência e Segurança Pública. Essa integração entre os órgãos de segurança pública e as Forças Armadas garantiu maior interoperabilidade, com novas capacitações e aprimoramento. Ela já vinha sendo adotada nos últimos grandes eventos, como a Copa de 2014, e pode ser vista como a grande lição aprendida e o legado dos Jogos para o País. Como está a agenda para 2017 de operações reais que envolvem as FFAA? A agenda para 2017 prevê uma nova Ágata, composta de operações de duração limitada, baseada em inteligência e fator surpresa. Já estamos iniciando os

testes dessas operações, inclusive em coordenação com a Receita Federal e a Polícia Federal. Também teremos um grande exercício, a Operação Laçador, no sul do País, onde vamos testar o emprego conjunto das Forças Armadas dentro de uma hipótese de emprego de tropas.

nizou os dados, direcionou o foco aos projetos estratégicos do Ministério da Defesa e das Forças Armadas, na transparência e simplificação dos dados orçamentários, e suprimiu as listas de equipamentos das Forças, mantendo sua organização e articulação.

O Livro Branco de Defesa Nacional, proposto pelo Sr. em 2008, quando era presidente da Comissão de Segurança Nacional na Câmara, está em processo de atualização. Já foi aprovado pelo Presidente e segue para o Congresso. Quais as principais mudanças que o documento traz? Qual a importância estratégica do livro? Criado em 2012, o Livro Branco de Defesa Nacional passou pela sua primeira atualização em 2016. O documento é uma espécie de inventário das Forças Armadas com informações orçamentárias, cenário internacional, equipamentos bélicos, projetos estratégicos, entre outros. A revisão manteve a estrutura geral com seis capítulos, atualizou e padro-

A Estratégia Nacional de Defesa e a Política Nacional também estão em processo de revisão, certo? Em que estágio se encontram essas atualizações? Quais as novidades? O processo de revisão, realizado a cada quatro anos, está previsto na Lei Complementar nº 136. Dessa forma, os três importantes documentos do segmento da Defesa Nacional que são a Estratégia Nacional de Defesa (END), a Política Nacional de Defesa (PND) e também o Livro Branco, após aprovação da Presidência da República, foram entregues em novembro de 2016 ao Congresso Nacional. Agora, seguem em análise para que, se aprovados, possam ser publicados em decreto. O novo posicionamento da PND

Sgt Johnson Barros / Agência Força Aérea

Operação conjunta entre militares da Marinha e da Aeronáutica.

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Há oito anos, a Estratégia Nacional de Defesa delegava a área nuclear à Marinha, cibernética ao Exército Brasileiro e espacial à FAB. Quais foram os avanços nesse aspecto? E quais os desafios? A governança é o grande ganho com essa divisão. A Marinha continua desen-

Cb André Feitosa / Agência Força Aérea

inclui, entre outras coisas, apoiar o multilateralismo no âmbito das relações internacionais; atuar sob a égide de organismos internacionais, visando ao respaldo jurídico internacional e à legitimidade; apoiar as iniciativas para a eliminação total de armas químicas, biológicas, radiológicas e nucleares, nos termos do Tratado sobre a Não Proliferação de Armas Nucleares, ressalvando o direito ao uso da tecnologia para fins pacíficos (sem prejuízo à dissuasão). Também estabelece a necessidade de se promover maior integração da região amazônica brasileira; busca a manutenção do Atlântico Sul como zona de paz e cooperação; e defende a exploração da região Antártica somente para fins de pesquisa científica, com a preservação do meio ambiente e sua manutenção como patrimônio da humanidade. Os objetivos da PND direcionam a formulação da Estratégia Nacional de Defesa, documento que estabelece as ações para a consecução dos objetivos e mostra que as capacidades nacionais de defesa são aquelas compostas por diferentes parcelas das expressões do poder nacional, por intermédio da participação coordenada e sinérgica de órgãos governamentais e de entes privados, orientados para a defesa e para a segurança em seu sentido mais amplo. As capacidades incluem proteção, resposta imediata, dissuasão, coordenação e controle, gestão da informação, mobilidade estratégica e mobilização. Com a segunda atualização, a END tem em sua estrutura introdução; concepção estratégica de defesa; fundamentos, incluindo “ações de diplomacia” como novo item; e ações estratégicas de defesa.

Ministro Jungmann visita maquete do novo caça da FAB, Gripen NG, durante a 4ª BID Brasil. volvendo o programa de submarino de propulsão nuclear, o Exército cuidando da parte de defesa cibernética e a Força Aérea responsável pela parte espacial, agora com o Programa Estratégico de Sistemas Espaciais (PESE). Com essa centralização, temos ações concentradas, e não pulverizadas, reunindo-se esforços em cada objetivo desses programas. Essa é a grande vantagem de se estabelecer essa divisão que é, até certo ponto, didática. O ano de 2017 será um marco histórico importante no ingresso das mulheres nas Forças Armadas. A primeira turma de combatentes ingressou na Escola Preparatória de Cadetes do Exército (ESPCEX) e também a Escola Preparatória de Cadetes do Ar (EPCAR) recebeu as primeiras alunas. Por que isso é importante? Quais os próximos passos? De fato, são boas notícias e expectativa de um futuro cada vez mais promissor, já que ainda existe restrição a todos os quadros e segmentos militares no Brasil, pelo critério de gênero. Quase todos os países entendem que a eficiência das forças armadas é pautada em critérios técnicos, ligados à competência e à capacidade para desempenhar tarefas, e por isso não estabelecem qualquer exclusividade aos homens.

O interesse do Ministério da Defesa, no avançar dessa temática, é essencialmente estratégico. Permitir a presença de mulheres em todos os postos, quadros e funções militares significa evitar desperdício de talentos e ampliar a qualidade dos recursos humanos nas forças armadas. Quando se trata da Marinha, do Exército ou da Aeronáutica, ser “homem” ou “mulher” torna-se irrelevante. O importante é a competência e o desempenho do militar. Por isso, o ano de 2017 chega com duas excelentes notícias para as mulheres no Brasil. Em Barbacena (MG), a EPCAR da Força Aérea Brasileira (FAB) passa a receber mulheres, que ao final do curso, ingressam automaticamente na Academia da Força Aérea (AFA), para se formarem oficiais aviadoras ou intendentes. Algumas dessas jovens, que iniciam neste ano o curso, sairão pilotos da FAB em 2023. Da mesma forma, o Exército recebe as primeiras mulheres na EsPCEx, em Campinas (SP). É o primeiro ano, de um total de cinco, do curso de formação para oficiais. Os quatro últimos anos são realizados na Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN), em Resende (RJ). Aerovisão

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INTEROPERABILIDADE

Reabastecimento entre caças No céu do planalto central brasileiro, uma esquadrilha de F-5 modernizados se forma. Em seguida, o A-4 da Marinha do Brasil se aproxima, liberando a mangueira de reabastecimento, que é acoplada à aeronave de combate da Força Aérea Brasileira e inicia a transferência de combustível. Ambos os caças, além de responsáveis por missões de ataque, participaram de uma operação inédita em conjunto: reabastecimento em voo, conhecida como REVO. Pela primeira vez, as duas forças se integram para cumprir essa missão.

MAJ Romanelli / Agência Força Aérea

Tenente Jornalista CYNTHIA FERNANDES

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AerovisĂŁo

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MAJ Romanelli / Agência Força Aérea

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operação durou três dias, na Base Aérea de Anápolis (GO), a 150 km de Brasília. O objetivo da missão foi a transferência de combustível no ar do caça da Marinha para as aeronaves da FAB, aumentando a autonomia dos caças reabastecidos em um cenário de combate. O reabastecimento em voo dos F-5M, regularmente, é feito por aviões cargueiros como o KC-130 Hércules. Dessa vez, a diferença é que a operação aconteceu a 420 km/h. “Embora a técnica seja a mesma que a gente faz no Hércules, fazer (reabastecimento) numa aeronave de caça, um A-4, mostra que a Força Aérea tem uma capacidade que, até então, era desconhecida”, declara o Tenente

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Raphael Kersul, do Primeiro Grupo de Defesa Aérea (1º GDA). Graças à oportunidade de os caças A-4 trabalharem, também, como aeronaves reabastecedoras, é possível fazer a transferência de combustível de forma rápida e segura. A quase 7 mil km de altitude (22 mil pés), o processo é feito pelo sistema denominado Buddy Store, o qual tem formato de um casulo, que através da mangueira de reabastecimento permite o contato com a outra aeronave, possibilitando a transferência de até 2 mil libras do tanque extra. Segundo o Comandante do esquadrão de caça da Marinha, Capitão de Fragata Alexandre Vasconcelos Tonini, missões de REVO como essa podem ser

empregadas em operações integradas em porta-aviões, quando é necessário aumentar a capacidade de autonomia dos caças envolvidos. “Podemos aumentar a transferência de combustível, caso seja necessário utilizar o tanque das asas do caça. É um momento de orgulho estar à frente do esquadrão e trabalhar junto com o GDA na defesa aérea do País”, comenta. De acordo com o Comandante do GDA, Tenente-Coronel Paulo Cezar Fischer, a interoperabilidade é um fator importante para garantir a segurança do espaço aéreo. “Importante essa integração porque podemos, em uma situação de necessidade, tomar as ações necessárias e garantir o resultado esperado”, declara.


SGT Alexandre Manfrim/ Agência Força Aérea MAJ Romanelli / Agência Força Aérea MAJ Romanelli / Agência Força Aérea

À direita, caça A-4 da Marinha, também conhecido como Skyhawk, reabastece F-5M da FAB, a uma velocidade de 420 km/h. Acima, momento em que a mangueira acopla na probe (sonda) de reabastecimento.

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SUSTENTABILIDADE

SGT Bruno Batista / Agência Força Aérea

Economia que vem do céu

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Estudo conduzido por engenheiros eletricistas em 95% das organizações militares do Comando da Aeronáutica indica que geração de energia sustentável pode reduzir o valor das faturas de energia elétrica. Iniciativa deve começar com projetos de usinas fotovoltaicas em Goiás e no Rio Grande do Sul. Tenente Jornalista JUSSARA PECCINI

em tempos de orçamento apertado que surgem ideias para tornar mais eficiente a resolução de desafios. No caso do Comando da Aeronáutica, o período deu um novo impulso na busca por fontes de energia renováveis que permitam colaborar com a preservação do meio ambiente e contribuir com a redução de custos de operação, como as temidas faturas de energia elétrica. “Temos áreas propícias para instalar e queremos utilizar mais o recurso da usina de energia solar nas nossas unidades. Os norte-americanos, por exemplo, utilizam muito isso”, exemplificou o Comandante da Aeronáutica, Tenente-Brigadeiro do Ar Nivaldo Luiz Rossato, na ocasião em que discutiu a iniciativa de apostar em energias renováveis com o ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho. Em 2016, a Força Aérea dos Estados Unidos dispunha de 18 usinas solares, contabilizando aquelas que estão em operação e aquelas em desenvolvimento, distribuídas por todo o país. A preocupação da Força Aérea Brasileira, além de contribuir com a redução do impacto ambiental das suas ações, é reduzir os custos operacionais. Os motores de partida usados para energizar aeronaves e os radares de controle de tráfego aéreo, que funcionam ininterruptamente, são exemplos de equipamentos com alto consumo de energia. A conta anual de uma unidade movimentada como uma base aérea pode chegar a R$ 3 milhões. A iniciativa também pode colocar a instituição como pioneira no uso de energias renováveis para compor sua matriz energética. “Não tenho dúvida de que o projeto da Aeronáutica será o primeiro a sair”, afirmou o ministro de Minas e Energia. “E que sirva de exemplo, não só para as outras Forças Armadas, mas também universidades, institutos federais, enfim, vários outros órgãos pelo País afora”, destacou o chefe da pasta. Aerovisão

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SGT Bruno Batista / Agência Força Aérea

O estudo , realizado a pedido do Comandante da Aeronáutica, foi conduzido por engenheiros da Ala 3, localizada em Canoas (RS), e reuniu dados de consumo anual e tarifas de energia elétrica de 95% das unidades da Força Aérea Brasileira. Os profissionais da unidade já tinham se debruçado sobre o assunto desde junho de 2015 para encontrar alternativas que ajudassem a reduzir a conta de energia daquela organização. A expertise foi usada, então, visando identificar possíveis caminhos para as demais unidades. Por isso, a pesquisa também indicou áreas disponíveis que poderiam receber estrutura para parques geradores de energia solar. Os dados integram uma minuta de diretriz enviada ao Estado-Maior da Aeronáutica (EMAER) com o objetivo de fomentar uma Comissão de Implantação de Sistemas de Geração de Energia no âmbito do Comando da Aeronáutica. Entre as funções do grupo

a ser formado estariam a de elaborar uma nova política ambiental, propondo a redução do custo com energia por meio da readequação das instalações; a realização de investimentos em eficiência energética; a conscientização do efetivo e, fundamentalmente, a busca e avaliação de fontes de energia de baixo custo, dando ênfase àquelas oriundas de fontes alternativas, renováveis e não poluentes. A necessidade de investir nessa área é fundamental. A maior parte das unidades da FAB se enquadram como grandes consumidoras. Nesses casos, a fatura é diferente da residencial. O valor é calculado considerando três fatores: a demanda contratada (uma quantidade mensal previamente estabelecida entre cliente e concessionária de energia); a energia em ponta (que compreende o horário de pico de consumo - entre 18h e 21h -, quando o valor da tarifa pode chegar

A FAB já possui usinas solares em Tiriós e Surucucu, locais de difícil acesso na região norte, onde a Força mantém destacamentos de controle do espaço aéreo. Lá, não há disponibilidade de rede elétrica convencional.

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a três vezes mais que a geral); e fora de ponta (restante do dia). “A demanda contratada pode ser comparada aos créditos do celular. Você estabelece uma cota mensal. Se não usar tudo, sobra. Se ultrapassar, o cliente vai desembolsar um extra para pagar o que exceder”, explica o Tenente Engenheiro Gustavo Cruz Campos, da equipe que realizou o estudo. Entre as conclusões, o estudo indicou dois fatores que são determinantes para a escolha dos locais. “O local onde mais vale a pena instalar uma usina é onde o valor da tarifa de energia é maior e a taxa de insolação é mais alta. Nesse perfil se encaixam os Estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Goiás e o Distrito Federal, por causa do valor da tarifa, e nos estados do Nordeste por ser a taxa com maior insolação ao longo do ano”, explica o engenheiro. Energia solar – Dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) acessados no início de janeiro mostram que o Brasil dispõe de 42 usinas que utilizam radiação solar. Elas respondem por 23.008 KW de capacidade de geração. Na matriz de energia, indicam o percentual de 0,0144% do total. O valor é extremamente baixo quando considerado o mapa de insolação brasileiro. Segundo informação do Ministério de Minas e Energia, a irradiação média anual brasileira varia entre 1.200 e 2.400 KWh/m²/ano, bem acima da média da Europa, que figura entre os maiores exploradores desse recurso de energia renovável. Na Alemanha, por exemplo, segundo um estudo apresentado pelo professor Ricardo Rüther, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a região mais ensolarada possui radiação solar 40% menor que a região menos ensolarada do Brasil. Ainda assim, 10% da energia gerada naquele país são provenientes de placas fotovoltaicas. O ministro Fernando Coelho acredita que, nos próximos anos, o uso de


energia solar no Brasil vai se expandir em “uma velocidade muito rápida”. Uma das razões é o compromisso que o país assumiu na COP 21 (acordo internacional que busca manter o aquecimento global abaixo dos 2°C), de aumentar as fontes renováveis de energia, além da hídrica. Os estudos do Plano Nacional de Energia (PNE 2050), em elaboração pela Empresa de Pesquisa Energética, também são otimistas. A estimativa é que 18% dos domicílios em 2050 contarão com geração fotovoltaica (13% do consumo residencial). Já a projeção da Agência Internacional de Energia (IEA), é de que, em um cenário moderado, a energia solar poderia responder por cerca de 11% da oferta mundial de energia elétrica em 2050. Primeiros projetos - Um dos processos mais usuais de aproveitamento da luz solar para geração de eletricidade é o uso de painéis fotovoltaicos, que convertem a luz do sol em energia elétrica. É nessa opção que o Comando da Aeronáutica aposta. Os primeiros

projetos desenvolvidos para geração de energia preveem a construção de usinas fotovoltaicas (parques solares) em áreas da FAB para suprir o consumo de energia elétrica em unidades no Rio Grande do Sul e em Anápolis (GO). A ideia envolve duas modalidades de contrato, permuta e compensação, feitas com a iniciativa privada. Na área da Ala 3, em Canoas (RS), em um espaço de 20 hectares, a projeção é gerar 16 GWh / ano. A quantidade seria suficiente para abastecer 5 mil residências do município, por exemplo. A região Sul não é campeã na taxa de incidência solar média. Fica abaixo do Nordeste. Porém, está acima da região Amazônica. Segundo o Major Engenheiro Rodrigo Prado dos Santos, a incidência solar anual média é determinada basicamente por dois fatores: a proximidade com a linha do Equador e a nebulosidade da região. “A taxa é superior às taxas de insolação na Europa e boa parte dos EUA, onde esse tipo de sistema de geração de energia é amplamente empregado”, compara. A expectativa de redução na conta de

energia é entre 10% e 15%, ou seja, aproximadamente R$ 180 mil por ano ou R$ 15 mil por mês. A fatura média mensal passará de R$ 122 mil para R$ 107 mil. Para a Base Aérea de Anápolis, o projeto prevê que, com o mínimo de 3,3 GWh/ano, uma usina de 1,6 MWp já pode suprir todo o consumo da unidade. “Caso sejam ofertadas possibilidades de usinas de 1,8 ou 2 MWp, os créditos excedentes gerados poderão ser transferidos para as outras unidades da FAB atendidas pela mesma concessionária de energia (CELG), como por exemplo, a Prefeitura de Aeronáutica de Anápolis”, explica o major. Desafios – Os técnicos explicam que, para a viabilidade da implantação de uma usina de energia solar, deve-se realizar um amplo estudo multidisciplinar. Os dados constantes nas faturas de energia permitem dimensionar a usina necessária para suprir a energia de uma determinada instalação consumidora. “Uma das possibilidades é dimensionar a usina para que a energia solar Aerovisão

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transformada em energia elétrica corresponda ao total anual de kWh consumidos da rede da concessionária. Isso permite a maior economia proporcionada por uma única usina. Levando-se em conta a taxa de insolação da localidade e o rendimento energético dos equipamentos da usina, determina-se a potência ideal”, afirma o Major Prado.

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Um dos desafios para criação de usina de energia solar é estabelecer uma localização na unidade. A área deve possuir relevo adequado e apresentar características e dimensões que atendam não apenas à demanda de energia pretendida e a ser explorada, mas também que não causem grandes impactos ambientais.

“Para se ter uma ideia, uma usina que atende somente à energia da Ala 3 ocupa uma área de aproximadamente quatro hectares. Se for um quadrado, seria de 200m X 200m”, compara. Na indisponibilidade de uma área grande, os equipamentos fotovoltaicos também podem ser instalados sobre os telhados das edificações.


Em Noronha, usina solar já é realidade

Rodrigo Valença

Desde julho de 2014, quando começou a gerar energia, a primeira usina solar do Arquipélago de Fernando de Noronha ajudou a reduzir, em média, metade da fatura paga pelo Destacamento de Controle do Espaço Aéreo (DTCEA-FN), que está instalado na ilha. A usina, que funciona na área da Aeronáutica, reduziu o consumo em cerca de 200 mil litros de óleo diesel por ano, de acordo com a Celpe, distribuidora de energia na região. “A fatura reduziu de uma média entre 20 a 25 mil para 10 mil reais. Mas esse valor varia de acordo com a produção da usina e do consumo do destacamento”, explica a Chefe da Seção de Sistemas Elétricos do Terceiro Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo (CINDACTA III), Capitão Andreza de Gomes de Santana. Localizada em uma área de 4.467 m2, próxima ao aeroporto, a usina tem uma capacidade 402,78 kWp. Em conjunto com a usina solar Noronha II, segundo a Celpe, gera em torno de 8 a 10% do consumo total de Fernando de Noronha. “A energia solar fotovoltaica é intermitente, como toda energia renovável, por isso a usamos como uma fonte complementar”, detalha a oficial e mestranda na área de energia solar. “Por questões de segurança, na falta de energia da rede comercial, a usina solar deixa de funcionar e o destacamento passa a ser abastecido por geradores”, conclui.

S1 Douglas Queiroz / Agência Força Aérea

Em Campo Grande, a tecnologia é a solução

A solução encontrada pela Ala 5 para reduzir o valor da fatura de energia foi investir em equipamentos mais modernos. Assim, o ano começou com obras para instalar uma central de banco de capacitores automatizada na entrada da unidade, que concentra esquadrões de voo da FAB na capital sul-mato-grossense. O equipamento tem a função de monitorar o consumo e corrigir o fator de potência da rede. Ligado na baixa tensão e conectado na média tensão, o banco atua na correção de uma questão técnica que envolve energia reativa. O fenômeno é caracterizado por picos de energia provocados principalmente por acionamento de motores de partida, geradores, transformadores ou equipamentos que exigem fortes cargas. Quando isso ocorre, as concessionárias de energia multam o consumidor por extrapolar o fator de potência, que deve estar entre 0.92 e 1.00. Nos consumidores residenciais, eventuais picos se traduzem em multas irrisórias, convertidas em centavos. Mas, para consumidores de grande porte, como é o caso de indústrias e também de unidades da FAB, isso pode entrar na casa de dezenas de milhares de reais. “Se considerarmos uma fatura mensal de R$ 200 mil, por exemplo, pode-se embutir em torno de R$ 10 mil, só de excedente reativo”, explica o Tenente Engenheiro Reriton Hoffmeister, responsável pela obra. O valor do investimento deve ser recuperado em até 12 meses e, com isso, há a perspectiva de a unidade economizar 5% no valor das contas de energia. Aerovisão

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INTEGRAÇÃO

Sgt Johnson Barros / Agência Força Aérea

Do Pampa à Floresta Amazônica, nas asas da Força Aérea

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“Integrar o território nacional” passou a compor, em 2017, a missão da Força Aérea Brasileira. As atividades de integração, agora, deixam de ser subsidiárias, para ficarem lado a lado com a manutenção da soberania aeroespacial. Mas, embora a redação seja nova, esse tipo de missão não é novidade para os militares. Integrar o Brasil está no DNA da Força: em 1941, quando foi criado o Ministério da Aeronáutica, aviões do Correio Aéreo Nacional (CAN) já realizavam a entrega de 70 toneladas de correspondência e perfaziam 14 rotas diferentes pelos quatro cantos do País. Segundo o Comandante da Aeronáutica, a Força nasceu com a responsabilidade de integração. “Nós não temos malha rodoviária, nem ferroviária ou aérea adequada às dimensões do Brasil; nós dependemos de um órgão público para isso, que é a Força Aérea Brasileira”, disse o Tenente-Brigadeiro do Ar Nivaldo Luiz Rossato. Tenente Jornalista GABRIELLI DALA VECHIA

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Acervo MUSAL

Saúde para 120 mil, apenas na última década

Sgt Johnson Barros / Agência Força Aérea

As equipes de saúde da Força Aérea Brasileira também servem à população do País. Faz parte da rotina de médicos, enfermeiros, dentistas e farmacêuticos militares deixarem os quartéis para levar atendimento de saúde a comunidades carentes e tribos indígenas. Mesmo que isso signifique, por exemplo, atender dentro de uma casa de madeira, em um município ribeirinho distante quase 900km de Manaus (AM). São as chamadas Ações Cívico-Sociais (ACISO) que, nos últimos dez anos, levaram atendimento médico e odontológico para aproximadamente 120 mil cidadãos.

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Correio Aéreo Nacional é atribuição constitucional

Elemento essencial na criação da Força Aérea, o Correio Aéreo Nacional (CAN) mantém sua importância ainda hoje, 86 anos depois do primeiro voo: sua manutenção é obrigação constitucional da União. A história considera como marco do CAN um voo entre Rio e São Paulo, em 1931, com a remessa do primeiro malote de correspondências. A partir de então, a expansão foi rápida. No mesmo ano, criou-se uma linha Rio-Minas e, no ano seguinte, Mato Grosso e Paraná entraram na rota das aeronaves. Em 1934, foram incluídas a região Nordeste, comunidades ribeirinhas do São Francisco e cidades do Rio Grande do Sul. Em 1935, foi a vez da Amazônia.

SGT Alexandre Manfrim/ Agência Força Aérea

Transporte aerologístico

Por ser trabalho de bastidor, às vezes passa despercebido. Mas as aeronaves da Força Aérea estiveram por trás de missões como o transporte de tropas para intervenção em presídios, do traslado das vítimas da equipe da Chapecoense, de estudantes participantes do projeto Rondon – que completa 50 anos em 2017, e de médicos voluntários da ONG Expedicionários da Saúde, que levaram uma mesa de cirurgia para dentro da selva amazônica, entre outros. Na foto, militares embarcam na aeronave Boeing 767, da FAB, rumo ao Haiti.

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João Evangelista

Direito à cidadania

É pelos rotores dos helicópteros da Força Aérea Brasileira que as localidades de difícil acesso recebem as urnas eletrônicas, garantindo o exercício do direito ao voto. A maioria das seções eleitorais atendidas fica em seringais, comunidades indígenas e ribeirinhas da região Norte do País. Na última eleição presidencial, em 2014, por exemplo, helicópteros Black Hawk deram apoio a comunidades isoladas nos estados do Acre e Amapá. Já nas eleições municipais de 2016, além do Acre, foram atendidas seções no Pará e em Roraima. “Nós vivemos em um país de dimensões continentais com algumas localidades de difícil acesso. Para superar essas barreiras geográficas, o apoio da Força Aérea Brasileira é primordial para garantir que todo eleitor brasileiro possa participar das eleições e exercer seu direito constitucional de escolher seus representantes”, afirmou o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Ministro Gilmar Mendes.

Transporte de órgãos

Cb André Feitosa / Agência Força Aérea

Capa da última edição da Aerovisão, a menina Ana Júlia Aleixo, de 9 anos, recebeu um dos 190 órgãos para transplante transportados pela Força Aérea Brasileira em 2016. Foram 130 missões, envolvendo em torno de 550 horas de voo. Ana Júlia, que sofria de miocardia dilatada e dependia de um transplante para continuar vivendo, recebeu um novo coração – órgão com o menor tempo de isquemia (ou seja, período em que “sobrevive” sem irrigação sanguínea). Desde junho do ano passado, a Força Aérea Brasileira possui uma aeronave sempre à disposição para esse tipo de emprego, em Brasília (DF). Mas, na prática, esquadrões de todo o País são acionados, a depender de onde estão localizados doador, equipe médica e receptor do órgão.

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Sgt Johnson Barros / Agência Força Aérea

Apoio na Amazônia

O Exército Brasileiro possui, só na fronteira ocidental da região amazônica, 24 Pelotões Especiais de Fronteira (PEF). Esses quartéis, localizados nos estados do Amazonas, Acre, Roraima e Rondônia, foram estrategicamente criados para defender a integridade do território e reprimir crimes transnacionais. Pelas características da região, a manutenção dos pelotões depende quase que exclusivamente de apoio aéreo – que é realizado por esquadrões da Força Aérea Brasileira. É por meio de aviões da FAB que chegam alimentos, tropas, combustível e todo o tipo de materiais de consumo até esses locais. Só o Esquadrão Arara (1º/9º GAV), sediado em Manaus (AM), voou 560 horas em apoio ao Exército em 2016. Aerovisão

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CIÊNCIA E TECNOLOGIA

De olho no futuro Para o Comandante da Aeronáutica, a soberania do País também está ligada à autonomia tecnológica. Sediado em São José dos Campos, no interior de São Paulo, o polo de desenvolvimento científico e tecnológico da Força Aérea Brasileira tem mais de cinco mil pessoas trabalhando em 117 projetos de pesquisa. Os temas vão desde a geração de energia no espaço até a colocação de microssatélites em órbita. Tenente Jornalista IRIS VASCONCELLOS

Para navegar, localizar-se e enviar informações para equipes em solo, um drone, também conhecido como Veículo Aéreo Não Tripulado (VANT), ou uma Aeronave Remotamente Pilotada (ARP), depende de diversos sistemas - por exemplo, o GPS - alimentados por tecnologias que o Brasil ainda não domina. O que fazer se os detentores dessas informações deixarem de fornecê-las? Reduzir a dependência de tecnologias e sistemas externos é um dos objetivos do projeto PITER, sigla para Processamento de Imagens em Tempo Real, que é desenvolvido pelo Instituto de Estudos Avançados (IEAv), subordinado ao Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA). A meta é instalar o sistema em drones, para que eles reconheçam o local sobrevoado e corrijam a navegação sem a intervenção humana. Na prática, se o drone for informado sobre os locais de saída e chegada, ele poderá fazer a rota sozinho. Para a FAB, que possui um esquadrão composto por Aeronaves Remotamente Pilotadas - o Hórus (sediado no Rio Grande do Sul), o sistema é estratégico e determi-

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TEN Enilton Kirchhof / Agência Força Aérea

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Sgt Johnson Barros / Agência Força Aérea

nante para as configurações de combate do futuro. Esse é só um dos 117 projetos de ciência e tecnologia que estão em desenvolvimento nos institutos que compõem o DCTA. Estão sendo desenvolvidas pesquisas de acesso ao espaço, projetos que envolvem a propulsão - por turbina ou hipersônica - para os vetores aeronáuticos, inteligência artificial, que está sendo buscada por diversos países; e a produção de energia com dispositivos compactos em potência elevada. “São tecnologias que quem sabe não ensina e, muitas vezes, os detentores do conhecimento não fazem nem parcerias. Cada um tem a sua”, destaca o chefe da divisão de projetos do DCTA, Coronel Maurício Pozzobon Martins. Ele explica que os projetos podem surgir ou de uma necessidade operacional da Força ou de um vislumbre por inovação dos pesquisadores. Para ele, o diferencial

TEN Enilton Kirchhof / Agência Força Aérea

Elcio Shiguemori é um dos pesquisadores do PITER. O drone que está em suas mãos está equipado com o sistema que testa o uso de algoritmo para navegação autônoma.

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da FAB é que a instituição possui um centro de pesquisa e desenvolvimento, enquanto Forças Aéreas de outros países são compradoras de tecnologias prontas. “Assim, em termos de soberania, a posição do Brasil é diferenciada, pois a tecnologia que nós não temos pode ser desenvolvida para a FAB pelo DCTA”, complementa. Sistemas autônomos, capazes de tomar decisões independentes da ação humana, por exemplo, são tendências do mercado de tecnologia, que também investe na produção de materiais leves e resistentes. Já na área das Forças Armadas, o foco é o domínio do espaço aéreo e o desenvolvimento de sistemas espaciais, que são um diferencial para o cenário de guerra. “A perspectiva é sempre de aumento dos projetos estratégicos para a FAB, pois a realidade e a desvantagem do poder aeroespacial são a rápida obsolescência tecnológica. E uma sociedade capaz de desenvolver tecnologia


Divulgação IAE

“O desenvolvimento de turborreatores de pequeno e de médio porte no País é de importância estratégica para a independência do Brasil nesta área”, afirma o gerente do projeto. militar avançada, certamente, terá produtos na sociedade civil importantes, gerando renda, emprego e desenvolvimento para o país”, ressaltou. Turborreatores nacionais Como mísseis, alvos aéreos e drones adquirem velocidade e direção no espaço aéreo? Eles são propulsados por turbojatos considerados de pequeno porte. Um deles, o Turborreator de 5.000 N (TR5000), é um dos projetos desenvolvidos pelo Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE) com foco na área de turbinas a gás aplicadas à propulsão aeronáutica. O projeto prevê o desenvolvimento de protótipos de um turborreator aeronáutico nacional, atendendo, principalmente, requisitos de instalação em veículos aéreos, de uso militar e civil. Segundo o pesquisador Helder Carneiro, os turborreatores são artefatos que assumiram papel de destaque nos arsenais das maiores potências mundiais, tanto para treinamento de artilharia, quanto para qualificação

de armamento, observação e defesa. “No Brasil, os exemplos de aplicação são o uso de alvo aéreo fornecido por empresa estrangeira para as campanhas de teste do míssil MAAR, o alvo DIANA adquirido recentemente pelo Exército e, ainda, o míssil de cruzeiro em desenvolvimento pela Avibras”, destacou. Segundo ele, o fornecimento de turborreatores (turbojatos e turbofans) desse porte é controlado pelas grandes potências. “O desenvolvimento de turborreatores de pequeno e de médio porte no País é de importância estratégica para a independência do Brasil nessa área”, complementou. Satélite em órbita Imagine um veículo lançador de satélite, ou seja, um modelo de foguete que tem a fi nalidade de colocar satélites em órbita, composto principalmente por fibra de carbono. Esse é o diferencial do projeto VLM-1, que está sendo desenvolvido no Instituto

de Aeronáutica e Espaço (IEAv). Com propelente sólido, ele está sendo projetado para colocar satélites de até 150 kg na órbita baixa da Terra, mais especificamente, a uma altitude de 2000 km com relação à superfície terrestre. Se o VLM-1 for bem sucedido, o Brasil vai se tornar um dos dez países a conseguir tal feito. Segundo o gerente do projeto, Coronel Fábio Andrade de Almeida, o uso de estruturas em fibra de carbono aumentam a eficiência do veículo como um todo, diminuindo o peso da carga não útil. “O desempenho esperado para o VLM-1 requer perfeita sincronia e funcionamento adequado de todos os sistemas do lançador. Para isso, motores, eletrônica embarcada, sistemas estruturais e módulo de carga útil precisam ser fabricados dentro dos mais rigorosos requisitos estabelecidos pelo IAE. O atingimento destes requisitos colocará a indústria nacional em um novo patamar de Aerovisão

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fornecimento de produtos altamente tecnológicos”, explicou o gerente. Experimentos no espaço Outro foco do IAE é a produção do Satélite de Reentrada Atmosférica. Denominado projeto SARA, o objetivo é desenvolver e fabricar dois módulos espaciais recuperáveis para o cumprimento de duas missões diferentes. A primeira é a realização de experimentos de curta duração (aproximadamente 10 minutos) em local de microgravidade, ou seja, com a atuação mínima da força da gravidade. Nesse contexto, permite-se observar e explorar fenômenos e processos em experimentos científicos e tecnológicos que seriam mascarados sob a influência

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da gravidade terrestre. “A condução de experimentos num ambiente de microgravidade possibilita o melhor entendimento, e o posterior aperfeiçoamento na Terra, de processos físicos, químicos e biológicos”, destaca o gerente do projeto, Major Élcio Jeronimo de Oliveira. Já a seg u nda m issão prevê a inserção e permanência do módulo em ambiente espacial, em órbita equatorial baixa (300km de altitude), por até 10 dias. Nesse período, poderão ser realizados diversos tipos de experimentos que necessitem das peculiaridades do ambiente espacial em um intervalo de tempo maior que o praticado pelo módulo suborbital. Uma das diferenças entre as duas

missões é a forma de chegada até o local pretendido. Na primeira, são utilizados foguetes e na segunda é necessário um veículo lançador de satélites que possui maior porte e é mais complexo. Nos dois casos, após o término da missão, o SARA reentra na atmosfera, tem o sistema de paraquedas acionado e é recuperado em um ponto pré-determinado para ser reutilizado durante a sua vida útil. Veja como funciona o

SARA no infográfico abaixo.

Energia em ambientes remotos Já no Instituto de Estudos Avançados (IEAv) está sendo desenvolvido o projeto TERRA, com o objetivo de produzir um dispositivo gerador de energia elétrica com possibilidades


de ser transportado para locais de difícil acesso. O dispositivo é baseado no princípio de geração de calor utilizando energia nuclear. Os ambientes de difícil acesso podem ser locais variados, como o espaço, incluindo órbita da Terra e outros astros, a superfície de astros como a Lua, Marte, asteroides, etc. Também está incluso o leito oceânico (a 2000m de profundidade) para exploração do petróleo do pré-sal, regiões extremas (regiões polares) da Terra e locais de catástrofes ambientais que venham a ser isolados da malha elétrica. O sistema possui como fonte térmica o calor produzido em um reator de fissão nuclear. Além de ser utilizado para fazer funcionar satélites, o sistema térmico também proverá propulsão ao dispositivo permitindo o controle da trajetória tornando-o um dispositivo exploratório. “Eventualmente, o sistema poderá ser utilizado no espaço em satélites, naves espaciais, entre outros”, explica o gerente do projeto, Lamartine Guimarães.

Foguete VS-40 equipado com satélite SARA, em posição de lançamento. Divulgação IAE

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REESTRUTURAÇÃO

Foco na missão Reestruturação da Força Aérea Brasileira concentra esforços nas atividades operacionais e muda organizações militares em todo o País.

Ten Paulo Rezende / Agência Força Aérea

Tenente Jornalista FLÁVIO NISHIMORI Tenente Jornalista HUMBERTO LEITE

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AerovisĂŁo

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Sgt Johnson Barros / Agência Força Aérea Sgt Johnson Barros / Agência Força Aérea

Aeronave de reconhecimento R-99.

Aeronave de reconhecimento R-35A.

Sgt Johnson Barros / Agência Força Aérea

O

ano novo marca uma nova fase da instituição. Em todo o País, mudanças de unidades, remanejamento de pessoal e transferências de aeronaves compõem a parte prática de um amplo programa de reestruturação. O objetivo é tornar a FAB mais operacional, com foco no cumprimento de suas missões, como defesa do espaço aéreo, busca e salvamento, transporte de órgãos e patrulha marítima. Canoas, cidade na região metropolitana de Porto Alegre (RS), representa bem o cenário de mudança. Lá, foram desativadas a Base Aérea de Canoas (BACO) e o Quinto Comando Aéreo Regional (COMAR V). Nos mesmos espaços físicos, foram ativados a Ala 3 e o Grupamento de Apoio (GAP) de Canoas. Mas a mudança não é uma mera troca de nomenclaturas e envolve, efetivamente, uma nova forma de a Força Aérea se organizar. Antes, os esquadrões aéreos sediados na Base Aérea de Canoas se reportavam operacionalmente aos seus comandos operacionais e, administrativamente, à BACO. Mesmo sediados lado a lado e compartilhando o mesmo espaço físico, os tripulantes de esquadrões vizinhos poderiam até nem saber as atividades desenvolvidas no hangar ao lado. Enquanto isso, a Base Aérea apoiava as unidades sediadas independente da missão em que elas estivessem efetivamente envolvidas. A Base era subordinada ao Comando Aéreo Regional, uma unidade essencialmente administrativa, e, em segunda instância, a um Grande Comando em Brasília. Na prática, o comandante da Base e do COMAR eram os representantes máximos da FAB na região, mas não atuavam diretamente na coordenação das atividades aéreas das unidades sediadas ali. Apesar de reunirem a maior experiência em uma Base, seus

P-95 Bandeirulha.


SGT Bruno Batista / Agência Força Aérea Sgt Simo / Agência Força Aérea

P-3 Orion.

Sgt Johnson Barros / Agência Força Aérea

C-95 Bandeirante.

H-36 Caracal.

comandantes estavam sempre ligados às atividades administrativas, sem se envolverem no dia a dia da aviação. Ao mesmo tempo, cada unidade mantinha-se numa doutrina que previa a separação dos diversos tipos de aviação. Agora é diferente. À frente da nova organização militar batizada de Ala, um Brigadeiro ou Coronel será a autoridade máxima da Força Aérea no local e irá coordenar diretamente a atuação dos esquadrões aéreos e dos batalhões de infantaria da área, com base no planejamento elaborado pelo Comando de Preparo (COMPREP). Nesse planejamento, estará detalhado como serão utilizadas as horas de voo, a programação dos treinamentos, enfi m, o uso das aeronaves. A i nteg ração dos esquadrõ es como parte de uma só unidade, a Ala, permite agora a troca constante de experiências, o desenvolvimento de treinamentos com tipos distintos de aeronaves e até facilidades de manutenção. No caso de Canoas, esse último aspecto foi um dos que justificaram a transferência do Esquadrão Phoenix (2°/7° GAV) de Florianópolis para Canoas, onde os aviões de patrulha P-95 poderão dividir hangares com os cargueiros C-95 do Esquadrão Pégasus (5° ETA), aeronaves com grandes semelhanças no que se refere à manutenção e suprimento. Para que a Ala se concentre nas atividades operacionais, o Grupamento de Apoio (GAP) foi criado. A função do GAP é realizar atividades administrativas como licitações, convocações, prestação de apoio de transporte terrestre e de alimentação, etc. Com o GAP, as unidades de uma mesma localidade passam a não ter mais setores como o de gestão pessoal ou de compras, e essas atividades são realizadas por pessoal dedicado somente a esse fim, que fica concentrado no GAP. Em todas as cidades onde houver uma

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Ala, seu respectivo GAP será criado. Em Brasília (DF), por exemplo, o GAP-DF ocupa as instalações do antigo VI COMAR e o GAP-BR atua em suporte às unidades do prédio do Comando da Aeronáutica. Modelo nacional Ao todo, serão 15 Alas distribuídas pelo território nacional. Elas serão subordinadas diretamente a dois comandos criados recentemente: o Comando de Preparo (COMPREP) e o Comando de Operações Aeroespaciais (COMAE). O primeiro coordena as atividades de treinamento, enquanto o segundo conduz as operações reais. Caberá ao comandante de cada Ala se manter pronto para at uar conforme as determinações do COMPREP e preparar seu efetivo e suas

aeronaves para qualquer demanda do COMAE. Nenhuma Base Aérea será fechada; algumas estão sendo desativadas. Apesar disso, a atividade aérea continuará da mesma forma, porém no âmbito de uma Ala. Por exemplo, a Base Aérea de Natal foi extinta no dia 9 de dezembro. Porém, a partir daquela data, os mesmos esquadrões continuaram suas atividades, no entanto, subordinadas à chamada Ala 10. O termo “Base Aérea” permanecerá apenas em Florianópolis, Fortaleza e Santos, além da Base Aérea dos Afonsos, na zona oeste da cidade do Rio de Janeiro. Estas unidades têm um efetivo menor que as Alas e não possuem unidades aéreas sediadas permanentemente. O papel dessas Bases, subordinadas diretamente ao

COMPREP, é permanecerem prontas para receber aeronaves de maneira temporária durante treinamentos ou operações reais. Mudanças de esquadrões A Ala 2, instalada onde ficava a Base Aérea de Anápolis, reúne agora dois esquadrões de reconhecimento. Além do Esquadrão Guardião (2°/6° GAV), equipado com os aviões E-99 e R-99, em 23 de janeiro foi ativado no local o Esquadrão Carcará (1º/6º GAV). Equipado com os jatos R-35A e R-35AM, este último modelo de reconhecimento eletrônico, o esquadrão estava sediado em Recife (PE) há 65 anos, mas agora amplia sua capacidade de atuar nacionalmente. “Anápolis fica no centro do País e isso possibilita que em cerca de duas

Reestruturação em construção

O comandante da Ala será a autoridade máxima da Força Aérea em determinadas áreas Origem Destino 40

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operacional”, destaca o comandante do Esquadrão Puma, Tenente-Coronel Eduardo Barrios. O Puma é atualmente equipado com helicópteros H-36 Caracal. A outra mudança, a transferência do Esquadrão Phoenix (2°/7° GAV) de Florianópolis para Canoas, teve como foco a redução de custos de logística e de administração. Também estão previstas as transferências do Esquadrão Pastor (2° ETA) de Recife para Natal, do Esquadrão Falcão (1°/8° GAV) de Belém para Natal e do Esquadrão Orungan (1°/7°GAV) de Salvador para Santa Cruz, no Rio de Janeiro. Há ainda o estudo em andamento para fundir os Esquadrões Pioneiro e Carajá, atualmente sediados no Galeão e em São Paulo respectivamente.

TEN Camila Barbieri / Agência Força Aérea

horas e meia de voo as aeronaves do esquadrão consigam se deslocar para qualquer localidade do País”, explica o comandante do Carcará, Tenente-Coronel João Gustavo Lage Germano. Além disso, como parte da Ala 2, os tripulantes vão conviver e trocar experiências com os colegas do Guardião, esquadrão que realiza missões semelhantes. Na cidade do Rio de Janeiro, o Esquadrão Puma (3º/8º GAV) deixou a Base Aérea dos Afonsos (BAAF) e se transferiu para a Base Aérea de Santa Cruz (BASC), Ala 12, no antigo hangar do Esquadrão Adelphi (1°/16° GAV), desativado em dezembro de 2016. “O sentimento geral é de esperança de que o esforço despendido leve a Força Aérea Brasileira para um futuro de excelência administrativa e

Como em Campo Grande (MS), diversas Alas foram ativadas em todo País.

FAB mais operacional

Ativação de 15 Alas Criação de Grupamentos de Apoio

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SGT Alexandre Manfrim/ Agência Força Aérea



CAPA

Divulgação SAAB

Em sueco, samarbete; Em português, cooperação

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Samarbete é o termo em sueco que corresponde à cooperação. Essa é a palavrachave para falar da construção conjunta Brasil-Suécia do novo caça que irá proteger os céus do Brasil, o Gripen NG. Isso porque não se trata de uma aquisição, mas de desenvolvimento colaborativo, transferência de tecnologia, offset e fomento à base industrial de defesa. Com a inauguração do Centro de Desenvolvimento do Gripen (GDDN), principal marco na transferência de tecnologia do projeto F-X2, todos esses processos começam a virar realidade. Tenente Jornalista JUSSARA PECCINI Tenente Jornalista GABRIELLI DALA VECHIA

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a inauguração do Centro de Desenvolvimento do Gripen (GDDN), localizado em Gavião Peixoto, no interior de São Paulo, chamou a atenção o modo como foi conduzido o descerramento da placa do edifício que vai concentrar o desenvolvimento da nova aeronave de combate do Brasil. Em vez do típico corte de uma fita, a placa foi “construída” pelos três principais atores envolvidos no projeto: o governo brasileiro – representado pelo Ministério da Defesa e pela Força Aérea Brasileira; a Saab – fabricante do Gripen; e a Embraer – empresa que vai concentrar a maior parte do processo de recepção da tecnologia. O momento sintetiza a cooperação entre os envolvidos. Afinal, a parceria não é estratégica apenas para o Brasil. De acordo com o presidente e CEO da Saab, Håkan Buskhe, este é o maior projeto de transferência de tecnologia já realizado em toda a história do país nórdico. “Já fizemos pequenas transferências de tecnologia no passado, não essa transferência integral que estamos fazendo com o Brasil”, afirmou Buskhe. Pelo projeto F-X2, ao final do ciclo de entrega de 36 aeronaves de combate, previsto para 2024, o Brasil deverá estar apto para desenvolver aeronaves supersôn icas. Competências que serão adquiridas por meio da concretização do processo de transferência

de tecnologia com a capacitação de recursos humanos. Desde 2015, engenheiros brasileiros participam de intercâmbios nas plantas industriais da Saab, na Suécia. Cerca de 350 profissionais serão enviados para cumprir programas direcionados a diferentes áreas de desenvolvimento, totalizando cerca de 25 mil horas de treinamentos teóricos e práticos. Chamado de programa on-the-job, os engenheiros, profissionais experientes na sua área de atuação no Brasil (leia relato a seguir), são preparados para absorver todos os processos de desenvolvimento da aeronave. Ao retornarem para o Brasil, os profissionais atuam no GDDN. Segundo o presidente da SAAB, uma coisa é fazer transferência de tecnologia, a outra é assegurar que o processo ocorra de maneira sustentável. “Você precisa se certificar de que existe um recebedor do outro lado e também mensurar a capacidade de cada indivíduo em aprender o processo, os detalhes. Tudo é feito na transferência de tecnologia. Você também precisa ter um programa que possa capacitar, um trabalho contínuo”, explica Buskhe. Cérebro blindado Com quase 4 mil metros quadrados de área construída, o Centro de desenvolvimento do Gripen no Brasil está instalado na planta industrial da Embraer em Gavião Peixoto. O

Autoridades envolvidas no projeto Gripen constroem pedra fundamental do GDDN.

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local concentra o desenvolvimento e a produção de segurança e defesa da empresa brasileira, principal beneficiada do processo de aprendizado no desenvolvimento de aeronaves supersônicas. Vizinho ao prédio do GDDN, está a pista a partir da qual os protótipos do KC-390 decolam para os testes do maior cargueiro desenvolvido no Brasil. A área é estratégica, afinal, de acordo com Mikael Franzen, diretor do programa Gripen Brasil, cerca de mil horas de voo em missões de teste da aeronave Gripen NG devem ser cumpridas a partir dali. As áreas do GDDN são subdivididas em dois grandes ambientes: um para o desenvolvimento de estruturas e softwares; outra reservada para testes operacionais de voo. O local vai funcionar como um hub para todas as empresas envolvidas no processo de transferência de tecnologia. Um ambiente para a execução de projetos de desenvolvimento, testes e verificação, bem como sistemas de suporte. O espaço de testes em voo contempla locais para os pilotos de ensaios, como salas de briefing e debriefing, planejamento e avaliação e espaço para equipamentos de voo. Os testes serão monitorados a partir da sala de telemetria. Mas a maior parte do GDDN é dedicada ao ambiente para estrutura e desenvolvimento de sistemas. O Gripen é uma aeronave de combate de quinta geração, que, além de ser

Fotos: SGT Alexandre Manfrim/ Agência Força Aérea


Divulgação SAAB

Fachada do GDDN, em Gavião Peixoto (SP), onde está sendo encabeçado o processo de transferência de tecnologia do caça. São quase 4 mil m2 de área construída. preparada para os desafios do combate moderno, tem a possibilidade de ser atualizada. Os projetos estrutural e de cargas e estresse (fadiga) estão concentrados na parte central do prédio. No desenvolvimento de soft ware, por exemplo, uma das áreas é destinada ao Cockpit S-Rig, uma plataforma usada para testar, verificar e simular ensaios de soft wares antes de ser efetivado no sistema da aeronave. Os sistemas ainda envolvem comunicação, sensores, integração de armas, propulsão, aviônica e mecânicos. Com tantas informações críticas, não é exagero a preocupação com a segurança física e de dados. O projeto e a construção foram avaliados e aprovados pela FMV (Swedish Defence Material Administration), o órgão que equivale ao Gabinete de Segurança Institucional (GSI) no Brasil. “Cumpre todos os requisitos de segurança física e de tecnologia de informação para a comunicação”, explica o gerente do projeto F-X2, Coronel Paulo Rogerio Sobrinho, sobre o cumprimento de protocolos de segurança da informação estabelecidos pelas autoridades

dos dois países. Só após os testes é que o prédio pode ser inaugurado. “O GDDN é a plataforma estrutural que permitirá a transferência de tecnologia voltada para o estabelecimento das capacidades relacionadas ao Gripen no Brasil. Vai permitir o desenvolvimento, a produção e a operação do Gripen”, afirma o Coronel. Apenas profissionais credenciados poderão acessar o edifício. Ainda assim, cada um terá uma autorização específica. Imagens internas do local e visitas estão proibidas. A conexão on line com o centro similar em Linköping, na Suécia, é criptografada. Segundo a gerência do projeto F-X2 da Comissão Coordenadora do Programa Aeronave de Combate (COPAC), há um sistema de codificação de todas as informações que saem do centro brasileiro. Os dados são decodificados ao entrarem no centro nórdico. O mesmo ocorre no caminho inverso. Smart fi ghter Antes de apresentar as áreas internas do centro no layout do edifício, Mikael Franzén destacou que o Gripen

NG é chamado de smart fighter. O caça é chamado de inteligente porque reúne características que o destacam em diversos aspectos, como os custos de operação e a plataforma multimissão. Na apresentação do executivo, o Gripen é definido como “três caças em um”, sobre a possibilidade de uso como ar-ar, reconhecimento e ar-superfície. Operado em seis países (Suécia, República Tcheca, Hungria, Tailândia, África do Sul e Reino Unido), o sistema é considerado maduro e já atingiu 250 mil horas de voo. O Brasil, que será o sétimo, comprou 36 unidades que devem ser entregues em cinco anos a contar de 2019. Deste total, 23 serão produzidas pela Embraer, sendo 15 totalmente fabricadas no Brasil. Oito unidades serão fabricadas na versão biposto, ou seja, terão dois lugares dentro da cabine. A configuração é nova para o modelo. Por isso, será desenvolvido em conjunto por engenheiros brasileiros e suecos. Para o CEO da Saab, a nova configuração pode abrir novos mercados e promover uma possível exportação do Gripen a partir do Brasil. “Temos um enorme Aerovisão

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cação e montagem de uma aeronave de última geração. Além dos aspectos técnicos, existem os comportamentais: desde 2009 temos aprendido a praticar um estilo de trabalho mais objetivo e direto”, explica Ferraz. A empresa, desde que começou a trabalhar no novo caça, aumentou em 350% o número de funcionários, e a equipe do Gripen quase triplicou. “De simples fornecedores, evoluímos para parceiros de fato”, resume Fernando Coelho Ferraz.

O Targo, ou Helmet Mounted Display, é um capacete considerado de quinta geração. Ele está sendo desenvolvido pela AEL Sistemas, no Rio Grande do Sul.

interesse pelo Gripen E/F New Generation adquirido pela Força Aérea Brasileira e ao mesmo tempo nós previmos uma enorme necessidade de produção e capacidade de desenvolvimento, daí vermos as equipes suecas e brasileiras como uma só, bem como a fonte de produção como uma só. Então, é bem provável que exportemos o Gripen do Brasil para outros países”, afirmou. Fomento à Base Industrial de Defesa - “De simples fornecedores, evoluímos para parceiros de fato” Embora a Embraer, pela sua expertise na indústria aeronáutica, esteja encabeçando o processo de transferência de tecnologia, outras empresas brasileiras também estão ajudando a construir o novo caça brasileiro. Partes da fuselagem, por exemplo, estão sendo desenvolvidas pela Akaer, localizada em São José dos Campos (SP). A empresa possui, hoje, sete colaboradores trabalhando em Linköping na fuselagem dianteira e traseira, cone

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de cauda (onde fica, por exemplo, o exaustor do motor), air brake (freios aerodinâmicos) e montagem da asa. O vice-presidente de operações da empresa, Fernando Coelho Ferraz, explica que a experiência dos funcionários na Suécia tem sido, efetivamente, colaborativa: “a rotina deles é praticamente a mesma que a dos engenheiros da SAAB, dividem o mesmo local de trabalho e cumprem os mesmos horários”, disse. Os brasileiros já realizaram, inclusive, usinagem de peças reais que serão montadas nas aeronaves. Ao final do estágio, previsto para julho de 2017, cada um dos engenheiros terá cumprido uma carga de 1700 horas. O número é pequeno perto das mais de 400 mil horas somadas no programa Gripen desde 2009. “O ganho que a transferência de tecnologia vai trazer para a Akaer é muito alto. Por um lado, teremos um grupo de pessoas com um grande conhecimento em métodos de fabri-

“Certamente irá alavancar novos negócios”. A declaração do presidente da Atech, Edson Mallaco, dá a dimensão do que o programa Gripen deve representar às empresas envolvidas na transferência de tecnologia. Produtora de sistemas, ela está envolvida no desenvolvimento de cinco módulos para o novo caça. Segundo ele, além do sistema que vai alimentar o simulador para adestramento em solo dos pilotos, a Atech é responsável pelo programa de ensino a distância que vai embasar o treinamento básico para manutenção da aeronave e pela produção de dados georreferenciados com base em mapas brasileiros, para uso nos sistemas embarcados. Os sistemas mais complexos, porém, dizem respeito à criação dos simuladores que serão utilizados na concepção de um cenário para desenvolvimento dos sistemas eletrônicos da aeronave e do Mission Support System. Esse último é o sistema de solo mais crítico, responsável pela execução de toda a carga do plano de voo e de missão do caça. Ele compreende as etapas de planejamento, análise, briefing e debriefing. WAD, HUD e HMD As siglas parecem estranhas à primeira leitura, mas fazem parte da rotina dos colaboradores da AEL, empresa gaúcha que também participa do processo de transferência de tecnologia. O WAD, Wide Area Dis-


Divulgação SAAB

O Wide Area Display é uma tela panorâmica inteligente que, além de mostrar informações, também processa dados. Esse é outro item que está sendo desenvolvido pela AEL. play, é um dos itens que estão sendo desenvolvidos. Trata-se de uma tela panorâmica inteligente que não só exibe informações, mas também processa dados. O formato widescreen, ou seja, maior na largura que na altura, é mais semelhante ao olho humano, o que facilita a visualização das informações por parte do piloto. Já o HUD, Head Up Display, é um equipamento que permite ao caçador ter as informações

básicas de voo e missão projetadas em um visor no capacete (Helmet Mounted Display – HMD), para quando ele estiver olhando para frente, através do canopy. Esse capacete, conhecido como Targo, é considerado de 5ª geração, tecnologia inédita na Força Aérea. Este modo de operação evita que o piloto precise olhar para dentro do cockpit, onde estão os displays convencionais, durante um combate aéreo, além de

facilitar o emprego de armamentos. Para a AEL, o aprendizado com organizações estrangeiras, fomentado pelas Forças Armadas, não é novidade. A empresa produziu 5 mil itens no projeto AMX, em parceria com os italianos. Já no caso da compra dos caças F-5, a israelense Elbit, vencedora da licitação, também precisou produzir sistemas no Brasil – devido ao contrato de off set – e investiu na AEL. Aerovisão

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De volta Ent rev istados pela Aerov isão em janeiro de 2016, logo após terem trocado o verão brasileiro pela temperatura de -20º C do inverno nórdico, os engenheiros Marcelo Takase e Viviam Lawrence já estão de volta ao País. Eles integraram o primeiro grupo de 46 brasileiros a participar do intercâmbio na Saab para o desenvolvimento do Gripen. O s doi s c u mpr i ra m jor n ada s iguais aos demais engenheiros da Saab, integrando as equipes na busca de soluções para os desafios que o projeto de uma aeronave de combate de 5ª geração impõe. “Nossa opinião foi ouvida. Efetivamente integramos os times e nossa experiência no desenvolvimento de outras aeronaves contou”, relata o engenheiro, que é especializado em sistemas ambientais aeronáuticos (ECS - Environmental Control System), como ar condicionado e sistemas de resfriamento de aviônica, com 18 anos de Embraer.

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Casados e com dois filhos, que tinham um e sete anos quando viajaram em outubro de 2015, eles se mudaram para Linköping, cidade da sede da Saab, onde permaneceram por um ano. “Os dois primeiros meses foram de cursos, o dia todo. No começo, eram sobre os processos de trabalho e a segurança da informação. Mas a maior parte dos treinamentos foi sobre o produto, a aeronave Gripen, e também sobre cada tecnologia de engenharia”, relata Takase, sobre o programa de formação cumprido. Após abordagens mais generalistas, cada profissional seguiu para capacitações específicas de sua área. “Dificilmente havia mais de dois engenheiros para cada área. Às vezes, o curso era para apenas uma pessoa”, explica o engenheiro sobre a alta especialização dos profissionais envolvidos em cada sistema. Para Takase, a experiência no desenvolvimento e certificação de diversas aeronaves militares e civis

foi um fator fundamental para obter o melhor aproveitamento do processo de transferência de tecnologia entre os dois países. “Não se pode enviar engenheiros inexperientes para essa oportunidade porque ele pode não absorver tudo e não vai ter a capacidade de solicitar mais coisas”, analisa. Um exemplo de resultado efetivo do intercâmbio foi o conhecimento de uma nova tecnologia para resfriamento da eletrônica e da cabine. Tradicionalmente, a indústria aeronáutica utiliza ar para remover o calor de dentro da aeronave. No voo supersônico, o aquecimento do ar externo é mais elevado e também as superfícies externas têm temperaturas elevadas devido ao atrito com o ar. No caso do Gripen, que conta com novos recursos eletrônicos, o calor é ainda maior. “Eles utilizam o resfriamento por líquido. Para a Embraer, é uma tecnologia nova. Isso foi bastante interessante”, avalia o engenheiro. Mestre em engenharia mecânica


Processo decisório – Apesar de a indústria aeronáutica ser similar na sua estrutura de desenvolvimento de projetos, algumas diferenças culturais entre Brasil e Suécia podem ser identificadas nos processos decisórios. Segundo Takase, a tradição nórdica busca a construção do consenso no interior das equipes, cuja marca é da igualdade entre os integrantes, independente da hierarquia. A vantagem que o brasileiro visualiza nesse processo é que “pensa-se mais na solução”. “Diminui o risco”, sintetiza Viviam.

Divulgação SAAB

Gripen NG durante cerimônia de roll out, em 2016, na Suécia.

Divulgação SAAB

pela USP, com 14 anos de Embraer e o desenvolvimento do KC-390 no currículo, Viviam trabalhou na Suécia com modelagem e simulação de sistemas usados em projetos de aeronaves. Para ela, foi uma oportunidade de dominar novas ferramentas e processos. “Aprendi como eles usam esses recursos nas várias etapas para o desenvolvimento do avião, desde as fases iniciais. E como eles reusam os modelos para integração nos diversos simuladores”, explica. Sobre a vivência a mais de dez mil quilômetros do Brasil a engenheira resume em uma frase. “Foi a melhor experiência na minha carreira até agora. E eu tive uma carreira muito boa”, afirma a primeira mulher a integrar o grupo de cem engenheiros que estão envolvidos nesse processo de capacitação até o momento. Outras cinco mulheres também fazem parte do grupo. De volta ao Brasil, Viviam e Takase integram o time do Centro de Desenvolvimento do Gripen no Brasil. O local vai abrigar cerca de 300 engenheiros, incluindo profissionais da Saab, no desenvolvimento da aeronave para a Força Aérea Brasileira, especialmente a versão F ou biplace (biposto). Até 2022, 350 terão cumprido o programa que envolve 25 mil horas de treinamento teórico e on-the-job, ou seja, integrando as equipes da Saab no projeto Gripen NG.

Os engenheiros brasileiros Viviam e Takase vivenciaram, por um ano, a experiência de compor os times da Saab para desenvolvimento do caça. Aerovisão

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OPERACIONAL

Lembrai-vos da guerra É nos estandes de tiro aeronáutico que os pilotos da Força Aérea Brasileira são formados na arte da guerra. Em cinco áreas isoladas, distribuídas nos estados do Pará, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Rio Grande do Norte, acontecem operações, exercícios e treinamentos com emprego de armamentos, como bombas e foguetes.

SGT Alexandre Manfrim/ Agência Força Aérea

Tenente Jornalista GABRIELLI DALA VECHIA

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m caça A-29 Super Tucano se aproxima e, ao avistar o alvo em solo, inicia um mergulho para, logo após, recuperar altitude. A manobra, conhecida como balsing, serve para que a aeronave não seja reconhecida pelos radares, ao mesmo tempo em que ganha altitude para realizar um lançamento de bomba. Quem autoriza, ou não, o lança-

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mento, é o crupiê – um militar com treinamento específico que fica no alto de uma torre, correspondente à altura de um prédio de seis andares, e tem visão privilegiada da área que será atingida pelo armamento. Por uma estação de rádio instalada na sala, o crupiê informa ao piloto do caça o comando de “cassino livre”, ou seja, de que não há impeditivos para

o lançamento. Em seguida, ouve-se, na fonia, a expressão “senta a pua!” – grito dos pilotos combatentes na Segunda Guerra Mundial, utilizado até hoje na aviação de caça. Em instantes, vê-se a fumaça subindo, e, segundos depois, ouve-se o som da explosão – tão forte que faz estremecer a estrutura da torre do crupiê. Essa sequência de eventos acontece de forma muito


rápida – talvez leve o mesmo tempo que a leitura dessa descrição. A atividade parece coisa de cinema, mas essa é a rotina nos estandes de tiro aeronáutico da Força Aérea Brasileira. Ao todo, a Força possui cinco áreas distribuídas pelo País, utilizadas para treinar os pilotos e tripulações para a guerra. É lá que são realizados empregos de mísseis,

bombas, foguetes, metralhadoras de calibre .50 e até a destruição de itens bélicos que, devido a falhas ou vencimento, não podem mais ser utilizados. São dois no Rio Grande do Sul, Saicã e Butiá; um no Rio Grande do Norte, Maxaranguape; um no Rio de Janeiro, Marambaia; e, finalmente, um no Pará, Campo de Provas Brigadeiro Velloso – mais conhecido entre os

militares como Cachimbo, por estar localizado em uma serra homônima. Além da torre do crupiê – que, na verdade, são duas, uma principal e uma secundária – outros elementos são importantes para um estande de tiro aeronáutico. Roleta é o nome dado ao alvo utilizado para as bombas e foguetes de treinamento, que não é nada mais que uma grande circunferência marcada no Aerovisão

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Sgt Johnson Barros / Agência Força Aérea

solo, indicando também um ponto central, o bingo. Nesse caso, o objetivo do treinamento é o lançamento em si, não importando a detonação. Para isso, são utilizadas as chamadas BEX, bombas de exercício, que não causam explosão, mas liberam uma fumaça branca, para indicar onde caíram. O Tenente Diego Mendes, do Esquadrão Joker (2º/5º), explica que as bombas reais são lançadas fora da roleta. Isso porque cada uma abre crateras de 2 a 3m de profundidade e cada lançamento

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significaria a ‘perda’ de um alvo. Para identificar se a localização do lançamento foi bem sucedida, há os chamados teodolitos, espécies de binóculos que possibilitam a triangulação dos acertos. “Já para tiros de metralhadora .50, por exemplo, há um alvo de fundo branco, o bacará. Ele é equipado com um microfone e um sensor capaz de identificar o número de acertos”, afirma o Tenente Mendes. Segundo o Tenente-Coronel Jorge Peixoto Junior, que é especialista em

Sgt Johnson Barros / Agência Força Aérea

SGT Alexandre Manfrim/ Agência Força Aérea

Torre do crupiê, elemento importante para observação dos erros e acertos nos lançamentos. Ao lado, diferentes aeronaves realizando emprego de armamento nos estandes de tiro. Bacará é o nome dado aos alvos utilizados no emprego de metralhadora calibre .50, por exemplo.

armamento, cada um dos estandes de tiro aeronáutico possui especificidades, principalmente devido às características de sua implementação histórica. Porém, alguns itens são imprescindíveis. “Destaco as torres de observação principal e secundária, para a devida coordenação de comando e controle entre as aeronaves e os observadores, que identificam, a partir da triangulação, erros e acertos de lançamentos de bombas e foguetes, conforme setores específicos demarcados em solo.


SGT Alexandre Manfrim/ Agência Força Aérea Ten Paulo Rezende / Agência Força Aérea

Também são essenciais os contadores acústicos de tiro, para o cômputo de acertos no caso de emprego ar-solo com metralhadoras e canhões”, destaca o Tenente-Coronel Peixoto. Ocupando uma área de 8480 hectares, o estande de tiro aeronáutico de Maxaranguape fica a, aproximadamente, 80 km da sede da Ala 10, em Parnamirim (RN). Se percorrido pelo ar, em um C-95 Bandeirante, por exemplo, são só 20 minutos. Se o percurso for por terra, são duas horas,

passando por pequenas cidades e vilarejos, e quase metade do caminho é percorrido por estradas de chão. Essa dificuldade toda é proposital: em função dos danos colaterais que o emprego de armamento real pode trazer, as áreas são sempre isoladas das áreas urbanas e população em geral. É por Maxaranguape que passam todos os pilotos da Força Aérea Brasileira, sem exceção. Isso porque é para a Ala 10 que vão todos os aspirantes a oficiais aviadores, após terminarem a

Academia da Força Aérea (AFA), para realização do estágio de especialização operacional. Na prática, os militares passam a compor as aviações de transporte (Esquadrão Rumba), caça (Esquadrão Joker) e asas rotativas (Esquadrão Gavião). “Mesmo os pilotos do Rumba, que não realizam emprego de armamento, utilizam o estande, pois há aqui, também, uma ZL [zona de lançamento], para treinamento de lançamento de cargas”, explica o Tenente Mendes. Aerovisão

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Descontaminação Embora sejam muito conhecidos ‘de cima’ pelos aviadores, que estão nas funções de piloto ou de crupiê, não são todos os militares que conhecem de perto um estande de tiro aeronáutico. Trata-se de um terreno imenso recortado por crateras com profundidade correspondente à altura de uma pessoa adulta, trechos de vegetação queimada e restos metálicos, geralmente nas cores azul e verde, relativos às bombas inertes (BEX) e reais, respectivamente. Esse tipo de cenário é conhecido do Tenente Pedro Paulo Pinto, responsável pelo curso, no âmbito da Força Aérea Brasileira, que capacita militares a realizarem a descontaminação de estandes de tiro. Às vezes, o lançamento não sai como previsto e a detonação é incompleta, fazendo com que o item bélico fique ativo, em solo, criando um ambiente inseguro. É aí que entra a equipe do Tenente Pedro, da Diretoria de Material Bélico (DIRMAB), para avaliar o que aconte-

ceu com o item e estabelecer a melhor forma de torná-lo inativo. Dois fatos recentes indicam a i mpor tâ nc ia desse t raba l ho. Em dezembro do ano passado, a cidade de Augusburg, ao sul da Alemanha, precisou ser evacuada devido à descoberta de uma bomba britânica da Segunda Guerra Mundial. O artefato, encontrado durante as escavações para uma obra, no centro da cidade, causou o deslocamento de 54 mil pessoas. O mesmo aconteceu na cidade grega de Tessalônica, onde houve a necessidade de evacuação de mais de 70 mil pessoas, em fevereiro de 2017. “Com os sistemas aviônicos das aeronaves que temos hoje, na Força, é mais raro que aconteçam lançamentos mal sucedidos”, explica o Tenente Pedro. Ainda assim, a descontaminação é rotina de segurança nos estandes de tiro aeronáuticos. Para detonar qualquer item bélico é preciso conhecer seu princípio

básico de funcionamento: o trem explosivo composto por um iniciador, um reforçador, a espoleta e a carga principal. “Isso serve para segurança, para que o dano só seja causado quando realmente o desejarmos, não no simples manuseio”, explica o militar. Portanto, para detonar uma bomba ainda ativa, por exemplo, é preciso avaliar quais elementos ainda estão presentes no artefato, para que se complete o trem explosivo. Quando a detonação, durante o lançamento, não aconteceu de forma correta, o problema, geralmente, é na espoleta. Para a desativação de uma bomba, criam-se focos – ou seja, buracos no chão, onde o item bélico é colocado. Ligado a ela, coloca-se um cordel detonador e, para acioná-lo, um estopim hidráulico. São os próprios militares especializados que calculam quanto tempo precisam para deixar o local, após o acionamento desse aparato. Se o tempo para chegada à torre do crupiê, de carro, por exemplo, levaria seis minutos, coloca-se cordel para o dobro do tempo, 12 minutos, como medida de segurança. O Tenente Pedro explica que o poder de fogo de uma bomba não se limita à explosão em si e nem ao efeito de fragmentação – que faz com que estilhaços metálicos se espalhem em um raio de até 15 metros. “Também há a chamada ‘onda de choque’, que se propaga a partir da detonação, e é altamente letal”, afi rma.

À esquerda, restos metálicos do estande de tiro de Maxaranguape. À direita, militares envolvidos no processo de descontaminação do estande.

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SGT Alexandre Manfrim/ Agência Força Aérea

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Sequência de fotos mostra a explosão de uma bomba real.

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AERONAVE HISTÓRICA

C-115 Búfalo O

Sgt Johnson Barros / Agência Força Aérea

C-115 Búfalo é uma das aeronaves que fizeram história no Correio Aéreo Nacional, e uma das principais referências quando se fala em integração do território brasileiro. O avião, com capacidade de decolagem e pouso em pistas curtas, voou no Brasil de 1968 a 2007. Entre as diversas missões, o C-115 Búfalo realizou transporte de tropa, transporte logístico e ressuprimento para as unidades da FAB, do Exército e da Marinha do Brasil, principalmente na região amazônica, onde as características dos aeródromos faziam com que a aeronave pousasse e decolasse em locais de difícil acesso.

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Ficha técnica

Comprimento: 27m Envergadura: 32m Altura: 9m Peso máximo: 18.000 kg

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SATÉLITE BRASILEIRO

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Satélite que irá servir, ao mesmo tempo, à defesa e à inclusão digital do País já tem data marcada para entrar em órbita: 21 de março. A partir deste dia, inicia-se uma maratona de testes e procedimentos para que, em maio, o Brasil disponha do seu próprio satélite geoestacionário.

Agência Espacial Européia

Tenente Jornalista GABRIELLI DALA VECHIA

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AerovisĂŁo

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Thales Alenia Space

Estação Espacial de Kourou, localizada no litoral da Guiana Francesa, é considerada um dos principais centros para lançamento de satélites do mundo. Isso porque fica muito próxima à linha do Equador, onde a velocidade de rotação da Terra é maior do que em qualquer outra parte do planeta, o que possibilita a economia de combustível. É de lá que, no dia 21 de março, o primeiro satélite próprio brasileiro será lançado, a bordo do veículo lançador Ariane 5. Desenvolvido pela empresa francesa Thales Alenia Space, que assinou um contrato com a Visiona (uma joint venture formada pela Embraer e pela estatal Telebras), o Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégicas (SGDC) envolve os ministérios da Defesa (MD) e da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (MCTI). A parceria já indica que o uso do satélite será dual, ou seja, civil e militar. De um lado, utilizando a banda Ka, possibilitará acesso à conexão em banda larga a todos os locais do País, sem exceção. De outro, a partir da banda X, será possível tramitar informações afetas à área de defesa e governamental. O satélite, segundo o presidente da Telebras, Antonio Loss, tem o objetivo de fazer do Brasil um País mais igual.

“Nenhuma região do Brasil ficará de fora da cobertura do SGDC; todas serão atendidas com a mesma qualidade. Hoje, o acesso à banda larga em nosso território corresponde ao tamanho do Chile”, disse. O envolvimento da Força Aérea Brasileira no projeto está relacionado ao fato de a instituição estar a cargo, segundo a Estratégia Nacional de Defesa, do desenvolvimento da área espacial no País. É da FAB a responsabilidade pela operação e pelo monitoramento do satélite. Foi criada, para isso, uma nova organização militar, o Núcleo do Centro de Operações Principal (NUCOPE-P), em Brasília (DF), onde cerca de cem profissionais irão se revezar em três turnos para dar suporte ao funcionamento do satélite – 24 horas por dia. Lá foi instalada a antena responsável por esse contato; ela tem 18 metros de altura, 13 metros de diâmetro e pesa 42 toneladas. O Comandante do NUCOPE-P, Coronel Marcelo Vellozo Magalhães, explica que, no centro, há militares das três Forças trabalhando em conjunto, além de equipes da Telebras. Para ele, o lançamento do satélite marca um momento histórico para a área de defesa do País, pois vai representar segurança em todos os sistemas de comunicação mili-

Profissionais envolvidos no desenvolvimento do satélite, na sede da fabricante, em Cannes, na França.

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tares. “Não há como se isolar, não existe outro caminho que não a integração. Esse é o presente e o futuro”, afirma o coronel Magalhães. Ele disse, também, que após a consolidação das operações com o SGDC, é possível começar a vislubrar operações com satélites de órbita baixa - aqueles que obtêm imagens da superfície da Terra. De acordo com o Comandante da Aeronáutica, esse satélite irá mostrar a importância da questão espacial para que a população consiga entender o que esse tipo de tecnologia representa. “Precisamos mais do que equipamentos de solo para controlar, por exemplo, os quase 17 mil quilômetros de fronteira seca. A melhor solução de que dispomos hoje são os satélites”, disse. Além do centro de operações na capital federal, há outro, no Rio de Janeiro, que vai servir como backup. As Forças Armadas também cederam áreas militares à Telebras, para alocar estruturas de apoio ao satélite. Só a FAB assinou um termo de cessão de uso de mais de 70mil m2, nas cidades de Brasília, Salvador e Florianópolis – onde ficarão os chamados gateways, para comunicação com o satélite e distribuição de sinal. Também serão instalados gateways nas cidades de Campo Grande e Rio de Janeiro, em áreas do Exército e da Marinha, respectivamente. “Todo brasileiro, do Oiapoque ao Chuí, da Cabeça do Cachorro, lá no Amazonas, até Fernando de Noronha, vai dispor de banda larga. É o maior projeto de inclusão digital que nós já tivemos. Mas, além disso, esse satélite vai propiciar segurança das comunicações na área de defesa e na área governamental”, afirmou o Ministro da Defesa, Raul Jungmann. Para ele, por ampliar a segurança das comunicações de defesa, o SGDC expandirá a capacidade operacional das Forças Armadas, por exemplo, em operações conjuntas nas regiões de fronteira terrestre, em operações de resgate em alto mar e, ainda, no controle do espaço aéreo.


Thales Alenia Space

Projeção do SGDC em órbita. O satélite vai servir à área governamental e de defesa, além de promover o acesso à banda larga em todas as áreas do País.

Atualmente, as Forças Armadas utilizam os satélites Star One, da multinacional Embratel – o que não será mais necessário após o lançamento. Segundo o Ministério da Defesa, o Brasil passará a fazer parte do seleto grupo de países que conta com seu próprio satélite geoestacionário de comunicações, não tendo mais a necessidade de alugar equipamentos de empresas privadas, o que vai gerar uma economia significativa aos cofres públicos e maior segurança em suas comunicações. “Na área militar, vai nos assegurar soberania e impedir que ocorram casos de espionagem”, explica Jungmann. Próximos passos - Após o lança-

mento, o satélite ainda demora aproximadamente 10 dias para entrar na órbita geoestacionária correta, já que o Ariane o levará apenas até a órbita baixa. Em seguida, inicia-se um período de testes, que deve durar entre 4 e 6 semanas, para checar se todos os componentes estão atendendo ao esperado. Um dos envolvidos nesses testes será o Tenente-Coronel Christian Taranti, que está em Cannes, sede da Thales Alenia Space, desde 2014. Ele explica que o centro de controle durante os testes ficará na França. De lá, serão enviados comandos para uma estação na Itália, que, então, seguem para antenas colocadas nos EUA, Austrália ou África do Sul – e, então, para o satélite.

“Só depois de concluídos os testes é que o satélite será, efetivamente, entregue para o Brasil. O controle deixará de estar nas mãos da empresa e passará para o centro de operações em Brasília, será ativada a criptografia e a fabricante perde o acesso ao SGDC”, explica o militar da FAB. Esse processo está previsto para ser finalizado em maio. Engenheiro eletrônico, o Tenente-Coronel Taranti foi um dos 51 profissionais brasileiros que acompanharam o desenvolvimento do SGDC junto à empresa francesa. O objetivo foi aprender sobre o satélite para estarem aptos a realizarem intervenções, quando necessário, como manutenção da posição correta e reconfiguração em caso de problemas. Aerovisão

Jan/Fev/Mar 2017

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