Quinzenalmente com o POSTAL em conjunto com o
MAIO 2018 | n.º 115 10.000 EXEMPLARES
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Espaço AGECAL
Portugal Cultural, uma radiografia breve A AGECAL organizou durante os dias 4 e 5 de Maio de 2018 em Tavira uma “Conferência Internacional sobre Gestão Cultural” cujos textos, reflexões e perspectivas partilharemos com as pessoas interessadas e também no “CulJorge Queiroz tura.Sul”. Sociólogo - AGECAL Portugal é um ser históricojorge.queiroz1@gmail.com -cultural de cuja preservação e evolução positiva depende um futuro inclusivo e integrador. Num território soberano há mais de oito séculos, continental e insular, Estado e nação continuam a coincidir. O português com 290 milhões de falantes é a quinta língua mundial e idioma oficial de oito Estados independentes. A importância cultural do Pais é uma evidência, existe património de origem portuguesa reconhecido pela UNESCO em todos continentes, o que transcende largamente a dimensão geográfica ou demográfica. A cultura e a língua deveriam ser, em nossa opinião, eixos estratégicos das políticas públicas. Para analisar com profundidade e detalhe a situação cultural portuguesa e das políticas publicas nas últimas décadas, a sociologia da cultura recorre e analisa informação caracterizadora produzida por organismos oficiais e séries estatísticas dispo-
níveis. Do ponto de vista da economia cultural portuguesa o saldo das transações de bens culturais teve em 2016 um agravamento de -25,7 %, isto é o País importou nesse período 150 milhões e exportou apenas 39,55 milhões de euros. Interessa a todos aprofundar estes dados. A atribuição à Cultura de 0,2% do Orçamento Geral do Estado representa o desfasamento entre a importância da cultura nacional e os meios disponibilizados para a sua afirmação. As dificuldades do sector em se organizar e de ter uma voz resultam de estruturas excessivamente corporativizadas e pouco cooperantes entre si, a que se juntam outros fenómenos negativos internos. A discussão dos regulamentos sobre os apoios à criação artística parece ser o principal motivo mobilizador, como se as políticas públicas para a cultura se resumissem ao modelo de distribuição de recursos financeiros para as artes. O sector profissional da cultura em Portugal com 81.700 trabalhadores era em 2016 o mais qualificado de todos, 43,9% dos seus trabalhadores possuíam o ensino superior, contudo continuava a precariedade laboral e instabilidade, necessidades de reforços e de formação. Não existe ainda em Portugal licenciatura em Gestão Cultural, disciplina fundamental e incontornável na formação de quadros para a crescente complexidade das tarefas, mas algumas pós-graduações e mestrados. No plano do consumo cultural, que inclui despesas com tecnologias, as assimetrias são evidentes, as famílias portuguesas gastaram em média 845 euros anuais contudo nas zonas pub
O sector profissional da cultura em Portugal era em 2016 o mais qualificado de todos
rurais apenas 500 euros enquanto em Lisboa e Vale do Tejo 1138 euros e no Algarve 829 euros. Monumentos, museus e palácios tiveram entre 2011 e 2016 uma enorme procura com +44% de visitantes, um aumento médio de 10% anuais. Contudo subsistem velhos problemas de manutenção de edifícios, escassez de recursos humanos, pouco investimento na investigação, em reservas e na aquisição de espólios. As bibliotecas públicas em Portugal registaram ligeira diminuição do acesso à leitura presencial mas aumento das actividades complementares como conferências, encontros de leitores, hora do conto. Cerca de 17,7 % de adultos e 24,7 do público infanto-juvenil estão inscritos nas bibliotecas portuguesas. No cinema em 2016 dos filmes 1168 exibidos em Portugal 63,5 % eram de origem norte-americana, 30% co-produções internacionais e apenas 5% produzidos na União Europeia. Os filmes de origem portuguesa foram apenas 2,3%, 0,9 % de França e 0,5% de Espanha. Em 2016 surgiram 64 novos festivais em Portugal sendo nesse ano 249 o total de festivais, a grande maioria de música ligeira e jazz, apoiados por empresas e autarquias. Todos os dias surgem novos festivais para onde são canalizados importantes recursos financeiros. Algumas tendências actuais são evidentes: o aumento de actividades culturais efémeras, designadas por “eventos”, virtualização, festivalização e turistificação da cultura. Os centros históricos das cidades europeias estão a ser transformados em parques temáticos, polos de negócios das empresas multinacionais com saída dos habitantes para as periferias. A continuar este processo ficarão os monumentos e museus como plataformas que interessam na atracção de consumidores. Do ponto de vista económico-cultural a globalização é predominantemente anglo-saxónica, o que induz dependências várias na esfera da economia, diminuição de capacidades regionais e locais, empobrecimento da riqueza e diversidade cultural. Face ao enorme potencial cultural do País e da Europa será decisivo que Governos, profissionais da cultura e cidadãos compreendam e tomem as medidas, e não apenas defensivas, para preservar e transmitir a herança cultural do País, tal com defende a UNESCO nas suas Convenções para a defesa do equilíbrio ambiental e social do planeta. l
20 18.05.2018
Cultura.Sul
Editorial
Missão Cultura
O ‘País das Maravilhas’ para os jovens
DiVaM 2018, porque o Património do Algarve 'mais do que vale a pena' d.r.
religioso, e até a criação e a recriação de novos patrimónios. O que se procura é que na visita
Direção Regional
aos lugares-património sob gestão
de Cultura do Algarve
da DRCAlg, todas as pessoas sintam
O Programa de Dinamização e Va-
que retiraram daí algum valor pes-
Maria Simiris /
lorização dos Monumentos (DiVaM)
soal, educativo, histórico, social e
Henrique Dias Freire
da Direção Regional de Cultura do
Jornalista
Algarve reabriu a 14 de abril passado,
mariasimiris.postal@gmail.com
com a obra de salvaguarda e valoriza-
A Semana Académica do Al-
ção em Alcalar e do seu monumento
garve, em Faro, celebra este ano
9. O contexto arqueológico dos Mo-
O desafio lançado ao tecido cultural
a 33ª edição entre os dias 3 e 12
numentos Megalíticos de Alcalar, em
regional tem sido muito bem acolhido
No seu desenvolvimento o progra-
ção sobre esta programação, com um
de Maio. Apesar de nos últimos
particular do Monumento 9, teve es-
e resultado num conjunto crescente
ma assume particularidades que teve
novo suporte, porque se acredita na
anos o evento decorrer na Penha,
cavações arqueológicas no ano 2010
de actividades culturais que transfor-
que ter em consideração: adaptabi-
qualidade do Programa DiVaM. No
esta edição rumou ao largo de São
e conhece um novo momento de
mam o visitante dos monumentos
bilidade das iniciativas às condições
seu 5º ano consecutivo as parcerias
Francisco, no centro da cidade.
valorização.
num interveniente ativo no desen-
físicas e funcionais dos monumentos;
alargaram-se e o trabalho em rede
volvimento de experiências culturais
dinâmicas dos públicos envolvidos;
com vários municípios e agentes
marcantes. Somou-se um número
os recursos internos disponíveis e as
consolida-se, mostrando que o esfor-
elevado de candidaturas, que resul-
necessidades identificadas; e a neces-
ço e empenho empreendido têm
retorno.
Este evento, tão importante para a comunidade universitária, reúne
Património – Que futuro?
grandes nomes da música e faz a
até económico. Esta é uma propos-
O Monumento 9 de Acalar
ta de envolvimento com o nosso património.
é: Património - Que futuro?
Barranco Longo e dos media partners Rua FM e Sul Informação.
Foi também uma oportunidade de reformulação e reforço da comunica-
festa na capital algarvia. Não são só
O reconhecimento público da
tou numa seleção de 21 projetos de
sidade de transversalidade das várias
os jovens que gostam de assistir a
importância global do património
18 associações culturais da região, que
expressões artísticas, bem como, a
Porque este património é de to-
bons concertos e o “País das Maravi-
cultural é quase sempre determinado
correspondem a 45 ações ao longo
criação de um programa coerente no
dos e porque sentimos que mais
lhas” é a prova disso ao reunir uma
por decisões oficiais dos organismos
deste ano. Conta-se com o apoio prin-
seu conjunto.
do que vale pena, não percam
panóplia diversificada de artistas.
de tutela, sem que aconteça uma ver-
cipal dos municípios de Aljezur, Vila
É com grande entusiasmo que
as oportunidades de se envolve-
Rock, Pop, hip-hop, electrónica
dadeira apropriação ou tomada de
do Bispo, Portimão, Albufeira, Loulé e
continuamos a receber propostas
rem emocionalmente nestes Bons
e até reggae estão presentes no
consciência da maioria da comunida-
Faro. A Caixa de Crédito Agrícola pa-
inovadoras que nos desafiam a pensar
Momentos!
palco da Semana Académica do
de, em relação aos seus significados.
trocinou a nova brochura informativa
sobre a diversidade de património do
Algarve. A diversidade é grande e
Pelo que, neste Ano Europeu do
e a Quinta dos Avós, e a Doca Pesca, a
nosso Algarve, incluindo este ano um
Alexandra Rodrigues Gonçalves
consegue desta maneira abranger
Património Cultural, o tema deter-
sessão de lançamento do DiVaM. Man-
ciclo de cinema, debates e palestras so-
Diretora Regional da Cultura
todos os gostos.
minado para a 5ª edição do DiVaM
teve-se ainda a parceria com os vinhos
bre património imaterial, património
do Algarve l
Este é um evento cultural de extrema importância não só para a capital como para a região algarvia, que todos os anos tem vindo a crescer no número de eventos culturais que apresenta.
Juventude, artes e ideias
7ª Mostra da Juventude de Olhão não pára
d.r.
Evento já vai na 33ª edição
inteiro, as entidades de Olhão
Olhão antigo e moderno. A Hip
Olhão, que conta com mais de
vocacionadas para a Juventude
Hop Fusion encheu o primeiro
60 participantes, nas diversas
são chamadas a mostrar a sua di-
espectáculo no Auditório Muni-
faixas etárias; 9º Campeonato
nâmica ao público, constituindo
cipal de Olhão; seguiu-se o pri-
Concelhio de Leitura, LER – Lei-
um programa intenso de ativida-
meiro Ecofest no Parque Natural.
tura Rápida e Expressiva; Galas
Jady Batista
des, perto de uma centena, em
Mas ainda há muito para ver!
no Auditório Municipal das es-
Marketing Digital
áreas como a cultura, o desporto,
Destaque para: Mostra-te ao Vi-
colas de dança e música, uma
o ambiente, entre outras.
vo - em dia de aniversário da
oportunidade dos jovens talen-
A Casa da Juventude de Olhão
A abertura do evento teve lu-
Casa da Juventude, as bandas
tos se apresentarem ao público
comemora, este ano, o seu 14º
gar nos Mercados Municipais
olhanenses vão apresentar-se
num espaço de excelência, ape-
aniversário. Nesse âmbito, orga-
com a inauguração da exposição
no coreto, com a Ria Formosa
trechado com as melhores con-
niza pelo sétimo ano consecutivo
“Olhão e a Ria”, pelo OLHAM -
como cenário, em dois dias de
dições técnicas.
o MOSTRA-TE, uma iniciativa ím-
Clube de Fotografia de Olhão,
música, de grande qualidade, a
Consulta o programa online e
par no país, sob o mote “Olhão
onde foram apresentados tra-
julgar pela experiência do ano
participa: http://bit.ly/programa-
Não Pára!”. Durante um mês
balhos de fotógrafos locais de
passado; 7ª Mostra de Teatro de
Mostra-te2018 l
18.05.2018 21
Cultura.Sul
Filosofia dia-a-dia
Maias & Maios fotos: d.r.
se colocam na beira das estradas no
do naipe das madeiras, estabelece
feriado do 1º de Maio. Basta percor-
de imediato a ligação com o bu-
rer a EN 125 para encontrar os Maios!
colismo normalmente associado a personagens míticos como os fau-
Maria João Neves Ph.D Consultora Filosófica
Os filósofos limitaram-se a interpretar o mundo de diversas maneiras;
nos e as ninfas. O solo inicial da
arrulho de seus lábios
flauta remete-nos para a syrinx, um
O beijo que, bem baixo,
instrumento de sopro da Antiguidade
é perfídia segura,
Clássica mencionado por Mallarmé.
Atesta uma mordida
Alguns dos motivos apresentados
este meu seio virgem.
nesse solo de flauta serão utilizados
Mallarmé, A tarde de um fauno
em diálogos entre os instrumentos,
Manifestação da chamada Geração à Rasca em 2011
nomeadamente outros instrumentos Na minha imaginação Maio é o
de sopro de madeira. O facto de estes
e nós mesmos – actuem em conjunto
fogueiras acesas no topo dos montes
mês das Ninfas e dos Faunos. O poe-
motivos não sofrerem alterações ou
o que importa é modificá-lo. Karl Marx
Mais que esse doce nada,
para uma alteração rápida desta rea-
e em lugares considerados sagrados.
ta francês Stéphane Mallarmé publica
desenvolvimentos significativos ao
Maio é um mês que se inicia com
lidade, que se tornou insustentável”.
Celebra-se o fogo que livra das doen-
em 1876 a écloga A tarde de um fauno,
longo da obra demonstra que De-
um feriado. É o Dia do Trabalhador,
De salientar como neste protesto
ças e purifica, e o reinício da vida na
com ilustrações do pintor impressio-
bussy tentou, mais do que trabalhar
portanto, não se trabalha! A História
não se coloca a culpa apenas nos ou-
natureza de forma primordial, sim-
nista francês Manet. O poema, cujo
o desenvolvimento temático, criar
mostra, com uma frequência avassala-
tros, pelo contrário, a própria geração
ples e pura. Em tempos remotos esta
excerto se cita acima, continua a ser
sonoridades evocativas e timbres or-
dora, como os dias festivos costumam
traz para si o peso da responsabilida-
festa da fertilidade da terra e da união
um marco na história do simbolis-
questrais inovadores, nomeadamente
ter origens violentas. O feriado de 1 de
de e a vontade de mudar as coisas.
entre a energia masculina e femini-
mo na literatura. Evoca as emoções
na conjugação de instrumentos de
Maio não é excepção. A sua origem
Apesar das operações de cosmética,
na, incluía a relação sexual livre entre
sensuais de um fauno, despertadas
sopro de madeira com as harpas
foi uma manifestação de 500 mil tra-
como por exemplo a da passagem a
homens e mulheres, mesmo que es-
pela passagem das ninfas pelo bos-
e sonoridades em surdina nos ins-
balhadores que ocorreu nas ruas de
contrato de trabalho de alguns Bolsei-
tivessem casados. Todos os filhos
que. A trama de eventos é vagamente
trumentos de metal e cordas”. (H.
Chicago, em 1886, seguida de uma
ros de Investigação — que acontece de
gerados em Beltane eram considera-
aludida. A linguagem simbólica de
Marinho, Casa da Música, 2012). Es-
greve à escala nacional. Foi a primeira
forma aleatória, com base em datas de
dos filhos do deus — Belenos — deus
Mallarmé apenas sugere.
tas novidades na forma de compor
reivindicação de direitos dos trabalha-
atribuição de bolsa e não por mérito
do fogo e da Luz.
dores de que se tem conhecimento!
científico! — sete anos passaram e os
Quando em França, três anos depois, o Congresso Operário Internacional
Inspirado no poema, Debussy
pareceram bizarras e desagradaram
O que talvez o caro leitor não saiba
compõe em 1894 o Prélude à L’après-
ao público, tendo Debussy sido acu-
problemas persistem. Continua actual
é que, em Portugal, a Festa das Maias
-midi d’un Faune, tão belo aos nossos
sado — imagine-se! — de ausência de
este manifesto da Geração à Rasca que
é um vestígio desse ritual celta. As
ouvidos de hoje, mas que causou
melodia. Em 1912, em Paris, Nijinsky
convocou uma manifestação anual
possui “o maior nível de formação na
portas e janelas das casas ou as gre-
uma imensa estranheza na época!
assina a sua primeira coreografia
em homenagem às lutas sindicais de
história do país”. Vale a pena ler na
lhas dos automóveis são enfeitadas
As características gerais do simbo-
para os Balés Russos de Diaghilev,
Chicago, a primeira acabou com 10
íntegra! Actuais continuam também,
com ramos de giesta amarela ou com
lismo poético acima mencionadas
interpretando como bailarino prin-
mortos!
algumas das teorias marxistas sobre
coroas de flores chamadas Maia ou
estão também presentes na música
cipal o papel de fauno. Inspirado no
Se no século XIX foi de grande ori-
a sociedade, a economia e a políti-
Maio. Também as crianças se enfei-
orquestral de Debussy, embora a
monólogo onírico de Mallarmé e ao
ginalidade lutar pelos direitos dos
ca, que também valeria a pena reler.
tam de flores e vão de casa em casa
relação com o poema de Mallarmé
som do Prélude de Debussy, Nijinsky
cantar e pedir. Aqui no Algarve há o
seja propositadamente não explici-
simula que se masturba com uma
Sempre depois da sesta
costume de se fazerem bonecos em
ta. Fazê-lo seria atraiçoar a própria
écharpe, antes de voltar a adormecer,
ou empregados precários. Em Por-
chamando as flores
tamanho natural, normalmente de
natureza do poema e da música
deixando-se levar pela fantasia de um
tugal, em 2011, realizou-se uma
Era o dia da festa Maio de amores
palha e trapos, vestidos de forma
simbolista. No entanto, “a utilização
encontro amoroso com uma bela nin-
grande manifestação da chamada
Zeca Afonso, Maio, Maduro Maio
alusiva a profissões específicas, que
frequente de instrumentos de sopro
fa. O publico escandaliza-se! Como se
trabalhadores, no Séc. XXI temos outra maré: a dos desempregados
não bastasse a novidade que o sim-
Geração à Rasca, que se considera a si mesma “apartidária, laica e pací-
Para a religião católica, Maio é sem
bolismo literário introduz com este
fica”. No seu manifesto pode ler-se:
dúvida o mês de Maria, da celebração
poema, alia-se-lhe a extravagância da
“Nós, desempregados, ‘quinhento-
das aparições de Nossa Senhora aos
música de Debussy e, sobretudo, a
seuristas’ e outros mal remunerados,
três pastorinhos na Cova da Iria. A
ousadia da coreografia de Nijinsky!
escravos disfarçados, subcontratados,
primeira aparição da Virgem Maria
Quando tudo parecia perdido,
contratados a prazo, falsos trabalha-
terá ocorrido no dia 13 de Maio de
Diaghilev, fundador e director dos
dores independentes, trabalhadores
1917, repetindo-se durante seis me-
Balés Russos, tem um golpe de gé-
intermitentes, estagiários, bolseiros,
ses seguidos. Por este motivo, Maio é
nio: em vez de retirar o bailado de
trabalhadores-estudantes, estudan-
denominado mês Mariano.
cena, repete o espectáculo. As lota-
tes, mães, pais e filhos de Portugal. (...)
Maio é também o mês daquele
Protestamos para que todos os res-
que é considerado o mais alegre dos
ponsáveis pela nossa actual situação
festivais celtas: Beltane! Os participan-
de incerteza – políticos, empregadores
tes cantam e dançam em redor das
ções esgotaram! Inscrições para o Café Filosófico:
No 1º de Maio é hábito colocar os Maios junto à EN 125
filosofiamjn@gmail.com l
22 18.05.2018
Cultura.Sul
Reflexões sobre urbanismo
Urbanismo e políticas de habitação fotos: d.r.
presente uma intervenção urbanís-
qualidade de vida dos cidadãos. Es-
tica completa e com escala, da época
tando em fase de revisão dos PDM's,
modernista. Porém, a sobreposição
e devendo possuir uma estratégia
das infraestruturas rodoviárias aos
global, considera-se aqui que o pa-
centros históricos foi uma versão
pel do urbanismo sai reforçado, na
Teresa Correia
light à nossa maneira, deste pensa-
medida em que é imperioso definir
Arquitecta / urbanista
mento filosófico, em que acabou por
áreas suficientes de habitação face às
arq.teresa.correia@gmail.com
existir diversas demolições de bair-
necessidades, podendo esta habita-
ros, ficando a meio, com pedaços por
ção ser a custos controlados ou não.
Conceitos de urbanismo: Modernismo e Pós-Modernismo
completar e acertar.
As misturas de usos e de vivências
O Urbanismo Pós-Moderno, já
populacionais, de modo contrário à
com Kevin Lynch, procura contrariar
segregação de camadas da popula-
As cidades no Algarve foram sendo
esta filosofia, criando a imagem da
ção em “guetos” é fundamental para
construídas ao longo dos séculos por
cidade da perspetiva do utilizador,
uma sociedade equilibrada, evitando
camadas, por gerações e gerações,
valorizando um conceito de estru-
tendo malhas urbanísticas clara-
tura urbana nas ruas e percursos,
mente distintas face à época da sua
passando a existir um conjunto de re-
formação. Estas marcas do território
ferências, como limites, nós e bairros.
que são transmitidas pelos traços de
Nesta teoria, os centros históricos
um conjunto de arruamentos, assim
são defendidos e este pensamento
como pela morfologia de ocupação,
acabou por durar até aos dias de hoje.
biram face à procura económica de
tempos.
e o próprio desenho das fachadas, fazem o equilíbrio e a identidade
Habitação: que acesso?
soluções desumanas e pouco dignas.
A política de habitação é importante e exige um debate sério
Esta questão que parece ser óbvia e sem qualquer tipo de dúvida face
jada, por ser esforço financeiro mais
cal de apoio ao arrendamento, assim
às experiências anteriores, coloca-se
fácil de suportar.
como a construção de fogos habita-
nos dias de hoje, dadas as grandes
Por outro lado, como os preços
cionais por parte do Estado que foi
dificuldades de criar soluções de
dentro dos Centros Históricos su-
largamente descurada, nos últimos
realojamento. Terrenos privados livres e disponí-
negócios de todo o tipo, os espaços
A habitação e o povoamento é a
veis nos arrabaldes da cidade de Faro
de habitação serão naturalmente
essência das nossas cidades, sendo
são hoje ocupados com comunida-
uma cultura arquitetónica de uma
Com o crescimento da economia, e
instalados mais nas periferias das ci-
desejável a mistura entre as diferen-
des de etnia cigana, os quais uma vez
época, e são também um espelho
com um mercado de arrendamento
dades, assim como em zonas que não
tes funções, com o comércio local e
instalados, crescem em condições
do que foi a sociedade, do seu pen-
ainda débil, constata-se que esta-
tenham tanta pressão. Começam-se
os serviços. Sem pessoas não exis-
de insalubridade e de precaridade.
samento filosófico, dos seus traços
mos numa época em que os valores
a gerar de forma muito significativa,
te segurança, nem conforto, nem
Esta realidade deverá ser tratada,
sociais, da sua economia, etc.
de um local. Transmitem sobretudo
de mercado das habitações são real-
fenómenos de periferização, que na-
saudável convívio humano, pelo
procurando soluções alternativas
Durante a primeira metade do
mente excessivos para a generalidade
da têm de Modernismo, em termos
que é imperioso pensar as cidades
de habitação, adaptados à comuni-
século XX, o urbanismo moderno
dos cidadãos, empurrando os jovens
teóricos, mas apenas às lógicas de
com uma lógica do nosso tempo,
dade, eventualmente em habitações
defendeu a atribuição de zonas na
e a classe média ou média baixa para
mercado imobiliário.
mas equilibrando questões menos
térreas, e com áreas exteriores, em
cidade por funções, o comércio num
uma inacessibilidade à habitação de
positivas.
terrenos municipais.
espaço, as residências noutro, as liga-
forma generalizada.
O alojamento local face à procura turística em crescente produziu nal-
A política de habitação é impor-
A integração de outras comunida-
ções eram feitas por infraestruturas
Cresce, assim, um modelo econó-
gumas cidades, alguma turistização
tante e exige um debate aberto e
des como a dos pescadores da Praia
rodoviárias e os negócios nos centros
mico para o endividamento ou para
dos centros históricos, embora na sua
sério, sendo que é uma necessidade
de Faro, deverá ter uma solução con-
das cidades deverão estar próximos.
intervir. A subida de preços resultan-
digna, fora das zonas de risco, mas
Defendia-se, neste caso, a segmen-
te do desenvolvimento económico
em locais adaptados, coerentes com
tação, ou seja, a separação da cidade
é uma realidade. Em contraponto, a
o seu modo de vida. A localização
por partes, ou funções: Habitação,
urgência nas necessidades de habi-
do espaço ideal será uma tarefa dos
Comércio, Transportes e Negócios,
tação por tantos milhares de pessoas
técnicos urbanistas que serão es-
tendo como principal mote: a racio-
poderá fazer renascer os bairros de
pecialistas na procura de soluções
nalização, na verdade, foi chamado
lata e os subalugueres.
estratégicas para problemas mais específicos.
Urbanismo Racionalista, cujo mentor
O papel de uma autarquia ou de
principal foi o arquiteto “Le Corbu-
um governo deverá ser um regula-
A habitação é um direito cons-
dor destes casos, apoiando também
titucional, mas será de difícil
os desprotegidos, por ser esse o pri-
compreensão a reinstalação de habi-
meiro e principal papel do Estado.
tação em áreas vulneráveis em espaço
sier”. A concentração dos edifícios, sendo muitas vezes de altura sig-
Valores de mercado das habitações são excessivos para maioria
nificativa, com espaço livre no piso térreo, e verde, no restante espaço é
a vivência em casas partilhadas com
maioria, anteriormente estivessem
uma das imagens caraterísticas deste
os pais, ou no limite para o prolon-
desocupadas ou devolutas. Não se
dunar, quando tanto se demoliu, a Que urbanismo pretendemos?
pretexto deste fundamento.
Todos devemos procurar parti-
gamento da vida de solteiro, dado
poderá entender de forma simplista
Em Faro ou no Algarve, apesar de
que é mais fácil, cómodo e acessível.
que este problema de acesso à habi-
O ato de projetar próprio dos ar-
cipar nas decisões, com uma visão
termos excelentes exemplares de ar-
A procura por apartamentos peque-
tação é apenas uma consequência do
quitetos deverá ter uma lógica que
abrangente e integradora, e exigir
quitetura modernista e com muito
nos, muito mais reduzidos, flexíveis,
alojamento local, dado que existem
possa dar força a opções de pla-
as soluções adequadas para o nos-
valor patrimonial, não consigo ter
é agora uma solução também dese-
outras questões como a legislação fis-
neamento determinantes para a
so território. l
tipo de urbanismo.
18.05.2018 23
Cultura.Sul
Letras e leituras
Florinhas de Soror Nada - A Vida de Uma Não-Santa, de Luísa Costa Gomes Luísa leica
Paulo Serra Doutorado em Literatura na Universidade do Algarve;
Luísa Costa Gomes, nascida em
d.r.
Investigador do CLEPUL
Lisboa em 1954, licenciada em Filosofia, professora, directora da
Luísa Costa Gomes gosta de dispersar a sua escrita pelas mais variadas área
revista de contos FICÇÕES, gosta de dispersar a sua escrita pelas mais variadas áreas, do teatro
religioso, como convém a uma
vincada que por vezes aproxima
idade da protagonista, como se a
sou, teve filhos, e netos, e adoe-
ao conto, da crónica à tradução
hagiografia ou narrativa de vi-
o livro da sátira. É emblemático
consciência da vivência do tem-
ceu, sem grande encantamento
e legendagem, da mesma forma
da de santo, mas quase sempre
o episódio em que Teresa arranca
po fosse mais lata quanto mais
ou marcos assinaláveis que dis-
que gosta de alternar a escrita de
aplicado com humor. Igualmen-
a orelha da estátua, como quem
pequenos somos e menos vida
tingam a vida dessa mulher de
um romance com outras tarefas.
te marcante é a ironia da autora,
leva uma relíquia…
acarretamos.
outra qualquer. É também nesse
Sob a chancela da Dom Quixote,
por vezes com um sentido crítico
Teresa Maria mostra um exces-
A autora parece ainda expla-
momento que é mais fácil para
este é o mais recente romance
mais cáustico, enquanto procu-
so de autoconfiança que é, aliás,
nar o modo como na infância a
o leitor simpatizar ou criar em-
da autora, quatro anos depois
ra retratar a natureza contradi-
o que lhe permite desafiar mes-
vocação ou o sentido de missão
patia com as vivências da prota-
de Claúdio e Constantino (2014),
tória desta criança que se quer
mo a família, que pouca impor-
é muito mais forte, mas confor-
gonista. Mas também assistimos
e cerca de dois anos depois da
santa (note-se o subtítulo A Vida
tância lhe dá, quando toma a pei-
me se dá a sua imersão na vida
ao modo como em Teresa Maria,
reedição revista de A Vida de Ra-
de Uma Não-Santa), ao mesmo
to a sua vocação ou o ofício de ser
mundana e quotidiana, a «Ida-
no decurso da sua vida, há um
mon (1991, reeditado em 2016),
tempo que critica os religiosos,
santa. Tal como outros exemplos
de Média», Teresa Maria é cada
decréscimo da fé, em particular
curiosamente um texto de ca-
nomeadamente os padres, e os
bem documentados da história
vez menos uma Teresa de Ávila
após o «Sermão à Ranhosa», ao
rácter hagiográfico, um roman-
mitos e tabus.
das hagiografias, não se pense
e cada vez mais uma Maria, uma
ponto de renegar completamente
ce biográfico sobre Ramon Llull,
«[Teresa Maria] Reconhece-se
que a santidade de Teresa Maria
mulher sofredora, pois mesmo
a sua paixão de outrora por Deus,
místico e missionário nascido em
na indiferença com que as paro-
nasce sem mácula. Pelo contrá-
escapando ilesa aos martírios de
enquanto paradoxalmente au-
Maiorca, que viveu entre 1232 e
quianas recebem a indigna in-
rio, é depois do pecado, isto é,
santos, sobre os quais discorria
menta o seu apetite pelo vinho.
1316 e percorreu o mundo, do
vectiva, um encolher de ombros
das brincadeiras sexuais que tem
com um certo contentamento sá-
A narrativa estende-se numa
Mediterrâneo a África e à Ásia.
perante as tais e quais birras do
com Rafael, filho da criada de ca-
dico em criança, torna-se eviden-
via sacra de 13 capítulos, se bem
Florinhas de Soror Nada conta
padre; elas bem sabem que não
sa, que Teresa Maria mais acirra-
te como a vida humana é bastan-
que chegando ao fim, é como
a vida de Teresa Maria, nascida
pecaram, não têm o hábito de
damente procura redimir-se.
te difícil por si só, sem o estigma
se estivéssemos já mergulhados
no seio de uma família burgue-
pecar, não porque não queiram,
A autora brinca com a lingua-
da diferença:
na leitura de um outro livro, tão
sa na segunda metade do século
ou não possam, mas na aldeia
gem da mesma forma que des-
«Sofrer ou morrer, cumprindo
forte é o cisma que se sente nu-
XX e perante um pai distante e
a oportunidade raramente se
monta dogmas, enquanto narra
o lema de Teresa em Ávila? Teresa
ma segunda parte da narrativa,
uma mãe incrédula, vai afirman-
apresenta. Vivem ambas num
a história de uma jovem que tão
que se aguentasse em Ávila, era
com a mudança de paradigma
do a sua vontade em ser santa:
dia-a-dia de caldos e cuidados,
depressa tem brincadeiras explo-
forte e façanhuda, tinha a sua
por parte de Maria Teresa, quan-
«São Francisco jejuou quarenta
de quando em vez há um pen-
ratórias sexuais com Rafael (com
própria ambição de vir a figurar
do aos 97 anos se prepara para
dias, e ela não pode saltar o jan-
samento menos caridoso, um
nome de anjo) como depois corta
no calendário. Mas ela não. Não,
morrer. Chegados ao final do
tar?» (p. 33)
afundar-se no desespero, mas de
o cabelo à tesourada ou põe cin-
assim não.» (p. 134)
livro, retoma-se o que lemos no
Ler esta narrativa é como ou-
passagem, ao fim da tarde, antes
zas na comida. A infância desta
Perto do final do romance, no
início, num género de prólogo,
vir uma reza, tal o ímpeto da
da solidão da noite, que dormem
jovem é desfiada num rosário
último capítulo justamente in-
onde se pressentia a desconexão
linguagem que corre escorreita,
dum sono só.» (p. 125)
lento e espaçado, para depois no
titulado «Vida», lê-se em cerca
de uma mente perdida, próxima
límpida, musical, coloquial, por
A ironia e o humor pautam a
fim a narrativa ganhar novo fôle-
de quarenta páginas a súmula
da demência ou do esquecimen-
vezes com arcaísmos. Há ainda
escrita da autora, se bem que nes-
go e ímpeto, enquanto passa em
de toda a vida da protagonista,
to: «A morte já passou, falta mor-
uma profusão de vocabulário
te livro haja uma intenção mais
revista a idade adulta e a terceira
ficando o leitor a saber que se ca-
rer.» (p. 12) l
24 18.05.2018
Cultura.Sul
Artes visuais
Podem as artes visuais expressar felicidade? XXI, com o incremento da Psicolo-
tuir um meio para a felicidade
Através de vídeo, infografias,
quanto mais vezes se pratica, e de
gia Positiva, a felicidade começa a
de quem as produz. Inclusive, no
esculturas e instalações intera-
forma mais convicta, melhores são
ser avaliada e estudada com rigor
artigo “Onde está a “pureza” na
tivas, bem como de humor e
os resultados. Conforme ele próprio
metodológico.
produção artística?”, analisámos
interação, esta exposição convida
refere, “estudo o tema da felicida-
Até aí, a investigação em Psico-
a questão da “liberdade” do artis-
os participantes a pensarem sobre
de há vários anos e percebei que 15
logia tinha-se centrado mais sobre
ta e fizemos referência à teoria de
a felicidade de uma forma geral e
minutos de exercício matinal fazem
Saul Neves de Jesus
os aspetos negativos do ser hu-
Csikszentmihalyi. De acordo com
sobre a sua própria felicidade em
a diferença”.
Professor catedrático da UAlg;
mano do que sobre os positivos,
esta teoria, quando se encontram
particular. Trata-se duma viagem
Nesse sentido, quis ter na expo-
Pós-doutorado em Artes Visuais
tendo-se verificado, por exemplo,
em estado de fluxo, as pessoas apre-
pela mente de Sagmeister e pelas
sição um elemento que remetesse
pela Universidade de Évora
através duma meta-análise dos arti-
sentam um sentimento de total
suas visões inovadoras, aparente-
para a atividade física. Trata-se da
gos referenciados no “Psychological
envolvimento e têm a consciência
mente simples, sobre como sermos
“bicicleta mensageira”, em que
“Ser feliz” é o principal objetivo
Abstract”, entre 1987 e 1999, que
totalmente focada na atividade em
mais felizes. Apela a uma atitude
o visitante é convidado a peda-
da maioria das pessoas, sintetizan-
foram publicados mais artigos
si. A motivação intrínseca e a felici-
mais participativa na busca dessa
lar uma bicicleta estática frente a
do desta forma vários aspetos que,
sobre emoções negativas do que
dade do artista estão relacionados
felicidade, afirmando inclusiva-
um grande letreiro de néon. Até
subjetivamente, contribuem pa-
positivas, na ordem de 14 para 1.
com este estado de fluxo.
mente que esta se treina, tal como
que se acendam luzes. Qualquer
treinamos o nosso corpo.
pessoa pode sentar-se e pedalar e,
ra a felicidade de cada um, desde
A influência do modelo médico
objetivos mais materialistas e lon-
fotos: d.r.
gínquos, como ter um bom carro
Além disso, conforme explicitámos no artigo “Pode a arte
Durante mais de dez anos,
enquanto o faz, tem um painel de
motivar?”, para além da felicidade
Sagmeister realizou uma inten-
néons que vai mudando a mensa-
ou uma boa casa, até objetivos mais
de quem produz arte, esta questão
sa pesquisa sobre o conceito de
gem, sendo visualizadas mensagens
intrínsecos e imediatos, como apro-
também pode ser analisada na
felicidade, tendo inclusivamen-
inspiradoras, do que se pode fazer
veitar cada momento.
perspetiva da mensagem visual
te passado por três atividades:
para ser mais feliz, ou pelo menos
poder ter impacto na própria fe-
meditação, terapia cognitiva e pro-
tentar.
licidade de quem aprecia a arte.
dutos farmacêuticos que alteram
Tendo em conta que o sorriso é
Considera-se impossível alcançar uma felicidade permanente, pois como quase tudo na vida é
A este propósito, fizemos referên-
o humor. Assim, fez três meses de
contagiante, nesta exposição tam-
cíclico, começando desde logo pe-
cia à obra que realizámos em 2018
meditação baseada em mantras bu-
bém pode ser vista a instalação
lo bio-ritmo do sujeito, também a
intitulada “Secrets for a happy life
distas na Indonésia; três meses de
de cubos de açúcar que reagem
perceção de felicidade implica o su-
(Homage to Banksy and Einstein)”,
terapia cognitiva com uma psicó-
ao sorriso das pessoas, ficando os
jeito já ter tido também a perceção
em que uma mão segura dois ba-
loga em Nova Iorque; e três meses
cubos iluminados quando as pes-
de alguma infelicidade. É por isso
lões, cada um deles com uma frase
que a felicidade é uma construção
que constitui um segredo para uma
Além disso, na exposição tam-
soas sorriem.
vida com mais qualidade ou mais
bém podem ser vistas frases escritas
uma pessoa não é o mesmo que o
Imagens da exposição 'The
feliz. Das duas frases, destacamos
na parede, como por exemplo: “Se
que faz feliz outra. Há medida que
Happy Show”, de Stefan
aquela que é considerada o segre-
eu viver nos EUA e ganhar mais de
o tempo de vida passa, tornamo-
Sagmeister (2018)
do da felicidade de Einstein, escrita
85 mil dólares por ano, qualquer
subjetiva, sendo que o que faz feliz
em 1922 e leiloada em 2017 por 1,3
dólar a mais não faz praticamen-
própria felicidade, pelo que po-
encontrava-se bem presente nesta
milhões de euros, sendo conside-
te diferença nenhuma. Para o meu
demos aprender a avaliar o que
bem-estar geral, não interessa se
-nos mais especialistas da nossa abordagem, sobrevalorizando-se a
rada a frase mais cara de todos os
nos faz bem. Embora possa haver
identificação e a resolução de situa-
tempos: “A quiet and modest life
ganho 100 mil, 100 milhões ou 10
alterações no estado de felicidade
ções de doença.
brings more joy than a pursuit of
mil milhões de dólares por ano.”
do sujeito, não sendo possível en-
A Psicologia Positiva emerge da
success bound with constant un-
A própria avaliação da felicidade
contrar-se constantemente num
constatação de que era necessário
rest” (“Uma vida calma e humilde
de cada visitante pode ser feita nes-
estado de felicidade absoluta, pode
alterar a tendência predominante-
traz mais felicidade do que a bus-
ta exposição, através de rebuçados.
aprender a desenvolver um esta-
mente negativa. Assim, dever-se-ia
ca pelo sucesso numa agitação
São dez tubos gigantes cheios de
do de maior felicidade geral pela
estudar o lado positivo do ser huma-
constante”).
aproximação àquilo que começa a
no e intervir no sentido de ajudar as
Nesta perspetiva da abordagem
Integra a exposição 'The Happy
guindo as instruções, o participante
considerar ser a sua vocação ou o
pessoas a aumentar as suas forças e
da felicidade através das artes vi-
Show', de Stefan Sagmeister
deve retirar apenas um bombom
sentido da sua vida.
a desenvolver o seu potencial para
suais, destacamos a exposição
uma maior alegria, satisfação com
“The Happy Show”, de Stefan
de medicação antidepressiva. Das
a vida, bem-estar e felicidade.
Sagmeister, a qual poderá ser vi-
três experiências, a terapia cogni-
“The Happy Show” conta já com
Sendo uma expressão muito usada na linguagem do dia a dia,
rebuçados numerados de 1 a 10. Se-
que corresponda ao nível da sua felicidade naquela escala.
o conceito de felicidade só recen-
No âmbito das artes visuais, a
sitada no MAAT (Lisboa), até ao
tiva terá sido a que mais o marcou,
um total de mais de meio milhão
temente começou a ser objeto de
felicidade tem sido sobretudo
dia 4 de junho. Esta é a décima
levando-o agora a aventar a hi-
de visitantes em todas as cidades
investigação científica pois, até
analisada na perspetiva de ser o
apresentação, tendo a primeira si-
pótese de que podemos treinar o
em que esteve presente.
final do século XX, o estudo da fe-
resultado da prática da produção
do realizada em 2012, no Instituto
cérebro para que este sinta felicida-
Aproveite para visitar esta ex-
licidade estava muito associado ao
artística, sendo que a realização
de Arte Contemporânea da Univer-
de. Compara até este treino a uma
posição agora em Lisboa. Vale a
esoterismo. Só no início do século
de obras artísticas pode consti-
sidade da Pensilvânia, nos EUA.
ida ao ginásio, no sentido em que
pena... l
18.05.2018 25
Cultura.Sul
Espaço ALFA
Vida selvagem do Botswana e África do Sul
Vítor Azevedo Vice-presidente
Sempre gostei de fotografar a na-
sidade de conhecer e respeitar os
Depois de muitos anos sem expor
e sobrevivência que surgiu o título
tureza e a vida selvagem pelo prazer
hábitos e os espaços dos animais, o
decidi desenvolver um conjunto de
para este conjunto de fotografias.
de poder estar em campo aberto em
seu ciclo de vida e a adrenalina que
trabalhos fotográficos a que atribuí
Porque a vida e a morte andam de
contacto com a vida, perto de peque-
sobe no momento do encontro são
o nome genérico “VIDA”. O primei-
mão dada numa constante renova-
nas aves ou de grandes mamíferos e
alguns dos motivos que dão imen-
ro desse conjunto de fotografias tem
ção, gerando mais VIDA.
em especial felinos de grande porte.
so prazer a quem faz este tipo de
como título “Vida” – Vida selvagem
fotografia.
do Botswana e África do Sul”.
A sensação de liberdade, a neces-
da Assembleia Geral da ALFA pub
Estas fotografias foram feitas no Parque Nacional do Chobe, no Bots-
A vida, a sobrevivência, a cadeia
wana e na Reserva de Timbavati, na
alimentar. A morte que está inti-
África do Sul. Ficam convidados a
mamente ligada à vida e que se
visitar a exposição “Vida” - Vida Sel-
transforma num renascer constan-
vagem do Botswana e África do Sul
te e cíclico, foi o motivo que me
que está patente até 26 de Maio na
moveu para iniciar este primeiro
ALFA - Galeria Arco, Rua António
trabalho. Foi da mistura de beleza,
Maria Labóia, nº 1, em Faro, de se-
brutalidade, doçura, agressividade
gunda a sábado das 15 às 19 horas. l d.r.
Imagem que pode ser apreciada na exposição 'Vida'
26 18.05.2018
Cultura.Sul
Espaço ao Património
Ficha técnica: Direcção: GORDA Associação Sócio-Cultural
‘Pelos que andam sobre as Águas do Mar’: documentário a partir de 'Os Pescadores', de Raul Brandão
Editor: Henrique Dias Freire Paginação e gestão de conteúdos: Postal do Algarve
fotos: d.r.
de Residências Artísticas nas localidades onde o espetáculo é
• Espaço ALFA: Raúl Grade Coelho
apresentado. Durante esses períodos de Residência é feita uma
• Espaço AGECAL: Jorge Queiroz
pesquisa sobre a comunidade, Raquel Belchior
privilegiando o contacto direto
Produtora
com a população, recolhendo
raquel_belchior@hotmail.com
• Espaço ao Património: Isabel Soares
testemunhos e histórias de vida que posteriormente são integrados
Notas sobre o projeto:
na dramaturgia do espetáculo, que
Espectáculo de teatro inspirado na obra de Raul Brandão
“Pelos que Andam sobre as Águas
se alimenta dessa profusão de estó-
não seria possível. Interessa-nos
almoçar e, na impossibilidade de tal
do Mar” é um espetáculo de teatro
rias, factos, mitos do passado e do
fazer deste projeto um lugar de
acontecer, prepara-se um saco com
documental onde convocamos
presente. Posteriormente estas ex-
encontro efetivo e afetivo com as
sarguetas para levarmos para casa.
a obra OS PESCADORES, de Raul
periências e recolhas serão também
pessoas. Neste sentido, o contacto
Para o almoço as favas serão apanha-
Brandão, adaptando à cena as suas
incluídas numa edição em livro so-
com os vários Museus que connos-
das na pequena horta que o Sr. Zé
palavras e inspirando-nos no iti-
bre o processo artístico do projeto,
co colaboram foi essencial, pois são
Miguel fez à beira-mar. A solidarie-
nerário que o autor realizou pela
algo que consideramos de extrema
eles as instituições locais que mais
dade e a partilha são características
costa portuguesa no início do séc.
importância para memória futura,
incorporam uma missão de proxi-
que temos encontrado em todas as
XX para a escrita do seu livro. As
combatendo a indubitável efeme-
midade e investigação permanente
comunidades onde temos trabalha-
com e sobre a população.
do e aqui não é exceção. E também
sua memórias e deambulações são acompanhadas pelo forte croma-
estas mãos, cujos dedos engrossa-
tismo das paisagens que nos dão a
Portimão – notas prévias
ver a dimensão do nosso mar e de
ram com o tempo e com o sal, nos testemunham a sabedoria de quem
quem dele fazia vida.
Depois de Nazaré, Sesimbra, Tróia,
conhece os mares e os seus fundos,
Esta obra, escrita há mais de 90
Montijo e Setúbal, chegamos a Porti-
como as linhas que caminham nas
anos, permanece como um dos
mão. Raul Brandão não se demorou
suas palmas.
mais belos roteiros literários dos
por aqui, mas imaginamos os seus
nossos portos, praias e rias, e um
olhos vivos no deslumbramento da
testemunho fundamental da reali-
luz, da cor e da “cenográfica Praia da
dade litoral do nosso país. Partindo
Rocha”. O seu destino era Sagres. O
No dia 1 de junho, no Auditório
do livro de Raul Brandão e do traba-
nosso foi Alvor, que visitámos pela
do Museu, duas atrizes darão corpo
lho de pesquisa junto de diferentes comunidades piscatórias, “Pelos que
Peça sobe ao palco de Portimão a 1 de Junho
Andam sobre as Águas do Mar” assenta numa abordagem antropo-
ridade teatral.
Responsáveis pelas secções: • Artes visuais: Saul de Jesus
Notas para o futuro
primeira vez em março, não sem
e voz às histórias recolhidas, convo-
antes conhecermos os três percur-
cando de forma poética a memória
sos que a antiga fábrica de conservas
e a paisagem da nossa costa e das
La Rose, hoje Museu de Portimão,
suas gentes. A elas se juntará um
lógica que nos possibilitou explorar
No cruzamento e interligação
nosso parceiro, nos oferece. A visita
coro de mulheres da comunida-
linhas de pensamento e perspeti-
de diferentes olhares e narrati-
à vila piscatória acontece graças à
de de Alvor, entoando a tragédia
vas diferentes sobre o livro e sobre
vas, construímos uma abordagem
colaboração do Museu, que nos pos-
e a esperança que o mar sempre
aquilo que define as comunidades
multidisciplinar que traça uma
sibilitou ter como guia a Dra. Patrícia
nos convoca, numa homenagem a
marítimas à luz da contemporanei-
ponte entre a realidade da pesca,
Ramos, já conhecida na comuni-
quem faz ou fez do mar a sua vida.
dade. Partimos do pressuposto que
a etnografia, a literatura e o teatro.
dade. Somos recebidos de braços
Procuramos com este projeto um
a pesca é um fenómeno humano e
Porém, nesta procura de estar perto
abertos entre as centenas de fios de
tipo de teatro que fale das pessoas,
por isso social, cultural e identi-
daqueles que fazem do mar o seu
nylon que recebem o isco. Prepara-
dos lugares e do nosso património
tário, encerrando em si vivências
chão seguro, são da maior impor-
-se o aparelho e fala-se da vida junto
conjunto, local e universal! O que
e conhecimentos que apontam
tância as instituições que connosco
ao rio, do velho salva-vidas. Rapida-
contamos não é nosso. Não nos
para especificidades locais e ter-
colaboram, pois o encontro com as
mente alguém nos traz um copo de
pertence. Pretendemos apenas que
ritoriais. Sendo a proximidade ao
comunidades implica um trabalho
medronho… É de manhã ainda, mas
não sejam esquecidas as histórias
mar e àqueles que dele fazem vi-
continuado, de investimento físico
está fresquinho e não há qualquer
que nos unem. O teatro servirá em
da um dos pilares deste projeto,
e emocional que, sem parceiros que
hipótese de renunciar a oferta. So-
última instância para isso. Sejam
tornou-se imperativo a realização
a ele se dediquem regularmente,
mos rapidamente convidadas para
bem-vindos ao palco do Museu! l
• Filosofia dia-a-dia: Maria João Neves • Juventude, artes e ideias: Jady Batista • Letras e literatura: Paulo Serra • Missão Cultura: Direcção Regional de Cultura do Algarve • Na Ágora: Adriana Nogueira • What ever happened to... Pedro Jubilot • Reflexões sobre urbanismo: Teresa Correia Colaboradores desta edição: Raquel Belchior, Vítor Azevedo Parceiros: Direcção Regional de Cultura do Algarve e-mail redacção: geralcultura.sul@gmail.com e-mail publicidade: anabelag.postal@gmail.com on-line em: www.postal.pt e-paper em: www.issuu.com/ postaldoalgarve facebook: https://pt-pt.facebook.com/postaldoalgarve/ Tiragem: 10.000 exemplares
18.05.2018 27
Cultura.Sul
Na Ágora
A falácia da vitória
Adriana Nogueira Classicista; Professora da Univ. do Algarve adriana.nogueira.cultura.sul@gmail.com
Havia na casa dos meus pais um livro de contos de Mark Twain (autor sobejamente conhecido por ter criado as personagem de Tom Sawyer e Huckleberry Finn), que eu muito gostava de ler. Ao mesmo tempo que me fascinava algum absurdo que caracterizava aquelas histórias, incomodavam-me outras, que me deixavam a pensar, durante uns tempos, no seu conteúdo. O que não é mau: um pouco de inquietação tira-nos da nossa zona de conforto, como agora se diz, mas isso também é estimulante. Esse livro tem contos com bastante graça, a roçarem o surreal (como «O criado negro de George Washington», que descreve o nonsense da notícia da morte daquele homem, repetida durante décadas; ou «A entrevista», uma história em que o entrevistado não sabe se foi ele ou o irmão gémeo que morreu afogado em criança), porém, houve um que me perturbou especialmente, por destruir as crenças que me confortavam. Nunca mais me esqueci de «A história do menino que não teve contratempos». É uma narrativa bem-humorada, mas desencantada, que descreve a realidade (ou uma realidade), em confronto com o idealismo a que a Literatura, por vezes, nos leva, ridicularizando um certo tipo de textos piedosos e moralistas. Assim, enquanto, nessas histórias, os meninos maus (normalmente chamados Jaiminho, diz o autor) «têm uma mãe doente, piedosa e tísica, dessas que desejariam estar em repouso no túmulo, se não fosse o grande amor que dedicam ao filho», a mãe deste Jaiminho «nada tinha de tuberculosa, ou coisa parecida. Era, antes, robusta, e muito pouco piedosa. Além disso, preocupava-se muito pouco com o filho. Dizia mesmo que, se ele morresse, não se perderia grande coisa». O narrador dá vários exemplos de como a realidade diverge da ficção, como daquela vez em que, na escola, Jaiminho roubou um corta-papéis ao professor e o escondeu dentro do chapéu de George, um menino bom e excelente aluno. «O professor acusou-o de roubo, ia bater-lhe, mas – coisa estranha! – não apareceu lá nenhum daqueles inverosímeis juízes de paz, de cabelos brancos, a dizer em atitude teatral: “– Perdoai a esse nobre jovem! Ele está a ocultar o verdadeiro culpado! Eu passava casualmente pela porta, e vi sem ser visto, como o roubo foi perpetrado!” Jaiminho não apanhou uns bofetões, nenhum venerável juiz condecorou a comovida escola, ninguém agarrou George pelo braço, dizendo-lhe que um jovem como ele merecia todos os aplausos. (…) Não. Assim está e é nos livros, mas a
Jaiminho não aconteceu tal coisa. Nenhum intrometido juiz se interpôs, e George, o menino modelo, apanhou as pancadas, com grande alegria de Jaiminho (…). Mas a coisa mais estranha ocorreu, quando, num domingo, indo remar, não se afogou (…). Podeis procurar e reprocurar nos livros religiosos e nada entrareis de parecido. Qual! Vereis que todos os meninos maus que vão remar aos domingos, invariavelmente se afogam. (…) Jaiminho cresceu, casou-se e teve muitos filhos. (…) Agora é o canalha mais perverso da terra, desfrutando de respeito universal e foi eleito membro do corpo legislativo da cidade.» Esta história veio-me à memória, há dias, ao assistir a uma palestra de Robert Wallace, docente na Northwestern University (E.U.A.), sobre Tucídides (historiador grego que, no século V a.C., escreveu sobre a guerra que opôs Atenas a Esparta durante 27 anos). A tese do professor Wallace é a de que Tucídides, no fundo, é um moralista, porque apresenta os factos presentes na Guerra do Peloponeso de modo a salientar a ideia de que Atenas perdeu devido às suas más ações, como uma espécie de punição que sempre acontece a quem não age corretamente. Claro que Tucídides não nos conta tudo, nem o que narra é exatamente fiel aos acontecimentos (a que temos acesso por outras fontes), mas esta leitura do professor Robert Wallace é interessante e, de algum modo, satisfaz a nossa necessidade de explicação para o resultado final. O comportamento dos Atenienses mudou ao longo do tempo. Se, inicialmente, mantêm uma posição de bom senso, afirmando não desejar entrar em guerra e ajudando os aliados, mostram, com as sucessivas vitórias que vão tendo, ser tão impiedosos como os seus inimigos. Um dos momentos mais intensos é a conversa travada entre Atenienses e Mélios (habitantes da ilha de Melos. Curiosidade: foi aqui que foi encontrada a famosa estátua que está no Museu do Louvre, conhecida como «Vénus de Milo». Na verdade, esta obra deveria ser chamada de «Afrodite [porque é o nome grego da deusa Vénus] de Melos»). Diálogo dos Mélios Este encontro entre Atenienses e os representantes dos Mélios mostra como aqueles se comportaram quando consideraram ser os mais fortes. Os Atenienses querem que os Mélios se aliem a si, contra os Espartanos. Os Mélios, aliados dos Espartanos, querem manter-se neutrais. Atenas não pode consentir. Os Mélios relembram-lhes que, um dia, poderão estar na mesma situação, mas os Atenienses não se comovem, talvez, porque, diz Tucídides, é «costume dos homens confiar aquilo que desejam vivamente à esperança, que não pensa, e usar raciocínio teimoso para rejeitar o que não querem» (5.108.4). O que eles revelam, sem pejo, é a sua política de manutenção e aumento de poder e o seu envolvimento nessa engrenagem: submetem os mais fracos, receiam os mais fortes, e têm necessidade de apresentar os Mélios como exemplo da sua força, pois, como potência
Obra de Tucídides marítima, não podiam permitir que houvesse uma ilha que não fosse sua aliada. O diálogo é cru: «Atenienses: (…) sabeis, como nós sabemos, que o que é justo na vida humana só é avaliado em circunstâncias equivalentes, e que os mais fortes fazem o que podem, enquanto os mais fracos fazem o que devem. (…) Mélios: Desta forma vós não permitis que, ao sermos neutrais, sejamos vossos amigos em vez de inimigos, sem sermos aliados de nenhuma das partes? Atenienses: Não é assim. A vossa hostilidade não nos fere tanto quanto a vossa amizade, porquanto esta será uma prova da nossa fraqueza frente aos que são nossos súbditos, enquanto o ódio é prova do nosso poder» (5. 94-5) Os Mélios não cederam. Um tempo depois,
'Contos' de Mark Twain os Atenienses mataram todos os homens da ilha e escravizaram as mulheres e as crianças. Contudo, como já os Espartanos lhes haviam dito: «não é normal que [...] pensem que a sorte estará sempre convosco» (4.18.3.), no final, Atenas perde a guerra. Mark Twain acaba por cair na mesma lógica, porque Jaiminho não pode ter tido só sucessos com as suas maldades, assim como Esparta não ficou vitoriosa para sempre, nem Atenas permaneceu como eterna perdedora. Antes pelo contrário. Uns séculos mais tarde, já súbdita do império romano, o poeta Horácio afirma que a Grécia (referindo-se, provavelmente, a Atenas, a mais significativa representante da cultura helénica), mesmo capturada, na verdade, foi ela que capturou o seu feroz vencedor, aludindo ao valor que Roma, apesar de vitoriosa, dava àquela civilização: Graecia capta ferum victorem cepit l pub
28 18.05.2018
Cultura.Sul
Marca d'água
Dos Templários à Ordem de Cristo no Algarve: Um património com potencial turístico a valorizar fotos: d.r.
que têm potencial para desen-
bens dos Templários extintos em
Templária, que atraísse visitantes
volver actividades de valorização
1312, mas foi a Ordem de Cristo a
entusiastas do turismo religioso e
histórico-patrimonial e turística
principal herdeira.
militar.
associadas ao legado templário e
Em Castro Marim, tal como já foi
Poderia promover por exemplo
ao legado da Ordem de Cristo. Exis-
referido, estiveram os Cavaleiros
umas Jornadas sobre Templários
tem muitos factos históricos e mui-
Templários, também conhecidos
e/ou sobre Ordem de Cristo. Por
Maria Luísa Francisco
tas histórias que podem fazer parte
por Cavaleiros da Ordem do Tem-
exemplo os encontros, retiros ou in-
Investigadora na área da Sociologia;
de uma narrativa orientada para a
plo. Nesta vila foi criada, em 1319,
vestiduras das Ordens que têm por
Faculdade de Ciências Sociais e Humanas
informação a viajantes e turistas.
a primeira sede da Ordem de Cristo,
base a Cavalaria Espiritual Templá-
posteriormente transferida para To-
ria, poderiam realizar-se em Castro
mar em 1356.
Marim.
da Universidade Nova de Lisboa
luisa.algarve@gmail.com
Neste artigo farei um breve en-
Os Templários foram os primeiros a, em nome do Rei de Portugal, guardar a entrada do Rio Guadiana.
O facto de uma Ordem de ma-
A peça escultórica existente na
Foi uma zona de grande im-
triz nacional ter tido implantação
rotunda principal e entrada da vi-
Ermida Nª Srª de Guadalupe
quadramento da presença Templá-
la, com a inscrição “Cavaleiro da
um cunho internacional, nacional
ria e da Ordem de Cristo no Algarve.
Ordem”, chama a atenção para a
e regional a partir do Algarve.
Farei também algumas sugestões
presença das Ordens de Cavalaria
O Infante passou uma impor-
para actividades de valorização
e abre o desejo ao visitante de co-
tante parte da sua vida no Algarve
patrimonial e turística associadas
nhecer algo mais neste âmbito.
e foi o único príncipe português
ao legado templário e da Ordem
O facto de o Castelo estar classi-
de Cristo.
ficado como Monumento Nacional
que morreu nesta região, a 13 de Novembro de 1460.
Os Templários caracterizam-se
(desde 1910) poderia ser “explora-
A Ermida de Nossa Senhora de
como um dos maiores fenómenos
do” com mais actividades para além
Guadalupe (situada entre Budens e
da história ocidental, inclusivamen-
da Feira Medieval, designada por
Raposeira - Vila do Bispo), segundo
te a temática templária tem sido
Dias Medievais em Castro Marim, que
alguns historiadores, foi construí-
um fenómeno literário.
irá este ano para a sua XXI edição.
da aquando da presença templária,
Desde o surgimento dos Tem-
Documento encontra-se depositado na Torre do Tombo
plários como Ordem Militar inter-
Em Tavira a presença templária
para outros está associada ao Infan-
está associada ao antigo Convento
te D. Henrique. Existe uma placa
nacional em 1119 até ao declínio,
portância estratégica, tanto que
regional, ou seja, em Castro Marim,
de São Francisco, que foi fundado
na Ermida que refere que o Infante
alcançaram a condição de maior
D. Afonso III ordenou o repovoa-
valorizou este território, no entanto,
pelos Templários. Existe um Do-
rezava naquele local. Este espaço
força bélica e religiosa da Europa
mento de Castro Marim, em 1272,
com a ida da Ordem de Cristo pa-
cumento, na Torre do Tombo, que
tem sido utilizado para concertos
medieval.
para lhe conceder, em 1277, carta
ra Tomar a importância do Castelo
refere a Fundação deste Convento.
e também poderia ter um percur-
A Ordem do Templo (Templá-
de foral, com o objectivo de atrair
foi diminuindo e a vila começou a
rios) introduzida em Portugal a
população para esta localidade.
despovoar-se, apesar dos privilégios
partir do ano 1126, para além da
Nesta altura já o Algarve tinha si-
atribuídos pelos monarcas.
presença no campo de batalha
do conquistado aos mouros, por D.
contribuiu para a consolidação
Paio Peres Correia, com a ajuda dos
do espaço geográfico do território
Cavaleiros da Ordem de Santiago,
português.
da qual chegou a ser Grão-Mestre.
Com este forte legado, Castro
so ligado à presença do Infante D. O Infante D. Henrique
Henrique, aos feitos associados aos
e a Ordem de Cristo
Descobrimentos como reforço da identidade regional.
O legado no Algarve
Em Maio de 1420, o Infante D.
No mês passado decorreram em
Henrique foi nomeado Grão-Mes-
Lagos Jornadas Templárias. O tema
tre da Ordem de Cristo, cargo que
destas Jornadas foi - Esperança e Ca-
deteve até ao fim da vida.
ridade - na perspectiva da corrente
Os Templários tiveram um pa-
O Castelo de Castro Marim foi
Marim poderia valorizar mais o
pel importante desde a fundação
construído em 1274. Em 1279 já no
seu património criando uma Rota
do país com D. Afonso Henriques
reinado de D. Dinis, foi construída a
espiritual ou religiosa professada
até aos Descobrimentos, nessa al-
cerca medieval, que protegia o casa-
por cada um dos convidados.
tura já transformados em Ordem
rio exterior. Este Castelo tornou-se
Por ter sido investida em 2016
de Cristo.
um dos mais importantes do Algar-
numa Ordem Internacional de ins-
ve e foi a sede da Ordem de Cristo
piração templária apreciei esta ini-
entre 1319 e 1356.
ciativa e espero que mais Jornadas e
Os Templários fazem assim parte da história de Portugal. No que diz
Com D. Henrique a Ordem teve
doutrinária, filosófica, sociológica,
respeito ao Algarve a sua presença
Castro Marim, pela sua localiza-
Celebrações aconteçam para maior
remete para Castro Marim e Tavira.
ção geo-raiana, conseguiu atrair,
conhecimento, aceitação e partilha,
Quanto à Ordem de Cristo a pre-
com a ajuda do rei D. Dinis e pe-
caminhando para um mundo me-
sença remete para Castro Marim,
la bula papal instituída pelo papa
lhor, mais fraterno, em que os va-
Lagos e Vila do Bispo.
João XXII, a Ordem de Santiago.
lores cristãos sejam uma bandeira
Trata-se, por isso, de localidades
Ordem que terá herdado alguns
Peça alusiva aos Templários
a elevar bem alto. l
18.05.2018 29
Cultura.Sul
Última What ever happened to... ? ali está apenas lata e outros, como o autor,
centradas na liberdade terá dito?
que ali está uma jóia dos Gorjões. (adapta-
mas a liberdade é sempre efémera,
bém na editora CanalSonora está previsto
ção do texto de Adolfo Contreiras, do seu
e palavras ditas mesmo alto e bom
para o final de Maio. Terá a sua apresentação
blogue APC Gorjeios)
som
por Luís Ene, no ARCM Bar (rua do castelo,4)
para muita gente, leva-as sempre
na Associação Recreativa e Cultural de Mú-
o vento.
sicos, no sábado 9 de Junho pelas 18 horas.
Para o efeito Adão Contreiras, escreveu o poema: Pedro Jubilot
O lançamento deste segundo livro, tam-
já todos ouvimos alguém gritar
pedromalves2014@hotmail.com
Jornal do Pau (Coisa triste é partir)
esta verdade!
POEMA BILINGUE
Todo o mundo tem fim
sophia,no mesmíssimo dia,
Que ao longo dos anos a loucura
Todo o mundo começa
na primavera já inteira e limpa de lagos
apertasse o cerco, isso eu já sabia.
Juntos no pau sem clarim
e apenas munida de lápis, escreveu-as,
Meu pai, desertado pelas palavras,
Oferta-se a notícia à peça
palavras livres eternizadas na substância
morreu rodeado de seus dicionários.
canalsonora.blogs.sapo.pt
.... Jornal do Pau fotos: d.r.
do tempo Já muitos daqui partiram
da voz do mar irrompia o marulho
Encomendaram-me hoje o derradeiro
Saudades que disso deixam
da esperançaenquanto esperava
desvario: um poema bilingue.
Das vozes que aqui se ouviram
em silêncio
Bem sei, um bom tradutor é traidor,
Lembram as estátuas, que se queixam
a madrugada azul
mas do poeta ou de si próprio?
junto à janela da liberdade, o início… Todo o mundo que começa
já todos lemos o nome das coisas?
Todo mundo tem seu fim Juntos aqui no pau à conversa Foram claros dias de festim Já muitos daqui partiram
«Eis uma questão filosófica para pessoas com tempo para
[Pedro Jubilot in Revista Eufeme nº2 – 2017] .... Marco Mackaaij
heterónimos internacionais», cogitei antes de afinar o original. .... Maluda
Saudades vindas no vento No início dos anos 80 do século passado, os gorjonenses, alguns regressados da
Das vozes que aqui se ouviram Resta o pau e o seu lamento
emigração, quando se viram privados dos velhos poiais de rua, onde os pais e depois
Todo o mundo tem fim
eles próprios costumavam juntar-se para ca-
Todo o mundo começa
vaquear à vontade, sentiram necessidade de
Juntos no pau sem clarim
voltar a ter um espaço próprio para estarem
Oferta-se a notícia à peça
juntos e “dar à língua”. Foram buscar um pau de poste da linha telefónica abandona-
.... Sophia M.B.A / Francisco S.T.
do numa berma da estrada, e duas pedras iguais para ser suporte. Na esquina de cruzamento local e centralidade dos Gorjões, surgiu um banco de pau improvisado mas perfeito para a função de seu destino. Os
Influenciada pelo construtivismo e pela
gorjonenses, voltaram a juntar-se para tro-
pop art, aquando da sua passagem de quatro anos por Paris, Maluda (Goa,1934 - Lis-
car histórias antigas locais e novas histórias da emigração, matando saudades com ale-
Vive em Portugal há quase tantos anos
boa,1999) usa a linearidade nas paisagens
gria e felicidade. Deram em chamar ao dito
quantos viveu na Holanda. Escritos origi-
urbanas recorrendo ao hiper-realismo e ao
banco o “Jornal do Pau”. Agora, no mesmo
nalmente em português, os poemas do seu
foto-realismo. Começa a ser mais conhecida
lugar surgiu um monumento escultórico
novo livro ‘Em Segunda Língua’, apresentam
na década de 70, pelas paisagens tradicio-
do artista Adão Contreiras, representando a
um balanço poético entre dois países e duas
nais do país. Tanto os famosos quiosques
história desses homens numa homenagem
culturas, numa mesma vida. O autor editou
como as janelas portuguesas, exploram os
e perpetuação de sua memória no próprio
o seu livro de estreia ‘E Se Não For’ em 2015,
reflexos e os efeitos de luz. Mas essa intensi-
“palco”, onde foi representada. Será uma
e a plaqueta ‘Perdidos e Achados’, no final do
dade da luz ficou ainda mais vincada na ar-
singela homenagem para a humanidade
francisco, no dia da revolução
ano passado. Entretanto alguns poemas seus
quitectura cubista que Olhão reflectia ainda,
mas grande para o pequeno povoado. E pa-
andava em lisboa de megafone na mão.
foram publicados nas revistas Eufeme, En-
quando Maluda a pintou na série «Olhão»,
ra que a discussão continue, uns dizem que
quantas palavras importantes
fermaria 6 e Nervo.
que ficou como uma das suas marcas. l