CULTURA.SUL 81 - 12 JUN 2015

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Espaço AGECAL: d.r.

Territórios sustentáveis, paisagens culturais e o Algarve

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Letras e Leituras:

Nossa Senhora das Ondas: Regresso ao esplendor

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Eleanor Catton – Uma jovem autora confirmada

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Artes visuais: d.r.

Qual o ‘lugar’ da Psicologia da Arte? p. 6 d.r.

Espaço ao Património: d.r.

JUNHO 2015 n.º 81

A culpa é da Comunicação?

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Mensalmente com o POSTAL em conjunto com o PÚBLICO 8.166 EXEMPLARES

www.issuu.com/postaldoalgarve

As setes vidas de um programador cultural p. 5


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12.06.2015

Cultura.Sul

Editorial

Espaço AGECAL

Pela igualdade, assinar! Assinar!

Territórios sustentáveis, paisagens culturais e o Algarve

Ricardo Claro

Editor ricardoc.postal@gmail.com

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As menoridades, ainda que impostas por terceiros, vencem-se tendo delas consciência - e neste caso consciência da sua origem - e trilhando um caminho em prol da sua superação e/ou do desbaste dos seus pretensos argumentos. Nos apoios plurianuais da Direcção-Geral das Artes (DG ARTES) às NUTS nacionais, assentes num quadro legislativo, que a pouco mais convida do que ao aproveitamento do seu talhe recheado de conceitos indeterminados, a margem de manobra da DG Artes tem brindado o Algarve com uma sucessiva e despudorada menoridade. Sim, somos apenas um quinto da população nacional. Mas ainda que fosse a população o critério - inadmissível enquanto singela ponderante -, o Algarve não deveria contar com apoios de somente 250 mil euros para a totalidade das vertentes artísticas por oposição ao resto das regiões que - ainda que legitimamente - se amancebam com gloriosos 400 mil por cada área cultural. Enfumada de cerrado nevoeiro, a fórmula de ponderação da atribuição das dotações base da DG Artes, impõe a oposição do sonoro algarvio. Não podemos ser coniventes com a indefinição conveniente ao desmando e às lateralidades e se por cá não temos o silvo do Bugio que leva a bom porto os dinheiros da Cultura, ainda temos o Farol de São Vicente, entre os mais potentes do Mundo. Nem de propósito, Luís Vicente, director da ACTA, está entre os primeiros defensores de um abaixo assinado, disponível no Teatro Lethes para quem queira assinar, que exige tratamento igualitário para o Algarve na distribuição das verbas da DG Artes. Já assinou?!

Jorge Queiroz Sociólogo, Sócio da AGECAL

A palavra sustentável tem origem no termo latino “sustentare”, que significa segurar, apoiar, conservar. O conceito de “sustentabilidade” relaciona-se com actividades humanas correctas do ponto de vista ecológico, economicamente viáveis, socialmente justas e respeitadoras da diversidade cultural. Em 1987 a Comissão Mundial da ONU sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento definiu desenvolvimento sustentável como “o progresso ou desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer as capacidades das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidades”. A situação global não é animadora. A procura de recursos no planeta é hoje 50% superior ao que a natureza pode renovar, necessários seriam 1,5 planetas para os produzir. As populações de peixes, aves,

mamíferos, anfíbios e répteis diminuíram 52% desde 1970. Os países ricos deixam uma “pegada ecológica” cinco vezes maior do que a dos países subdesenvolvidos e as “doenças da civilização”, não transmissíveis e do comportamento, estão entre as primeiras cinco causas de morte no mundo. O rosto do planeta alterou-se. Em Maio de 2007, a população urbana ultrapassou a rural pela primeira vez na História da Humanidade e grande parte da população já não sabe ou pode produzir os seus alimentos. As 200 maiores bacias hidrográficas, das quais depende um terço da humanidade, têm escassez de água severa durante pelo menos um mês por ano. O discurso produtivista domina, como se não se verificassem alterações no clima. A protecção das paisagens culturais e alimentares é hoje uma das linhas de defesa da biodiversidade e da qualidade da vida humana. Na Convenção da UNESCO para a Protecção do Património Mundial, Cultural e Natural de 1972 define-se como paisagens culturais «bens culturais» que representam «obras conjugadas do homem e da natureza» (art.º 1). As paisagens culturais «ilustram a evolução da sociedade e dos esta-

belecimentos humanos ao longo dos tempos, os condicionalismos materiais e/ou as vantagens oferecidas pelo ambiente natural, as influências económicas e culturais, internas e externas». A «identidade paisagística» e a «qualidade paisagística» resultam da identificação das populações com a protecção do seu património cultural e ambiental, sendo as formas de vida colectiva parte integrante, como elementos de afirmação, diferenciação e personalização. Em Portugal foram classificadas como Património da Hu-

manidade a paisagem cultural de Sintra (1995), o Alto Douro Vinhateiro (2001) e a Paisagem da Cultura da Vinha na Ilha do Pico (2004). Confirmaram-se elevados benefícios, a melhoria e requalificação da economia local, nomeadamente nas produções e no sector do turismo. São necessárias medidas de ordenamento e gestão, com inclusão das paisagens culturais nos PDMs. Impõe-se legislação de protecção à agricultura familiar e às produções endógenas. Uma das questões que o Algarve enfrenta e de uma forma geral

todo o País, é como manter os territórios vivos, produtivos, atractivos e sobretudo sustentáveis. Entre os problemas já conhecidos acresce nos últimos anos a emergência de uma agricultura intensiva de “produções de todo o ano”, com elevados consumos de água em solos com valor biológico e maior fertilidade, que está a alterar a paisagem algarvia com proliferação de plásticos. Este tipo de agricultura que poderia encontrar zonas e terrenos mais apropriados, a crescer a este ritmo em breve comprometerá o futuro ambiental e turístico da região. Há alternativas de compatibilidade entre economia e preservação das paisagens culturais. Sinergias e complementaridades entre sectores económicos, ambientais e culturais, permitem inverter processos de desertificação, criar novas funções em espaços rurais, a revitalização demográfica e serviços de turismo sustentável, agriculturas de proximidade associadas à protecção da biodiversidade e à revalorização das paisagens culturais. O futuro está nas economias de alto valor ambiental e económico-cultural como a “dieta mediterrânica”, a que o Algarve está associado por decisão da UNESCO em 2013 com implicações jurídicas no plano da salvaguarda.

organizadas pelo município em parceria com as entidades vocacionadas para a juventude de todo o concelho. Esta tem sido uma oportunidade da juventude mostrar a sua dinâmica e da comunidade olhanense apoiar e orgulhar-se do trabalho apresentado pelas gerações mais novas. O apoio do Município tem sido essencial e revela que, em termos de polÍticas de

juventude, Olhão é inovador e sabe responder às necessidades e interesses dos jovens, disponibilizando recursos humanos e matérias para a concretização das várias iniciativas. Realizado no mês de aniversário da Casa da Juventude, esta é também uma forma deste espaço municipal mostrar a sua dinâmica e apresentar o trabalho que desenvolve ao longo do ano.

Também o Auditório, um espaço de excelência da nossa terra, abriu as portas ao talento dos jovens olhanenses, nas várias áreas. Um exemplo da utilização das estruturas e recursos em prol dos olhanenses. Ao longo do mês, foram vários os espetáculos de grande qualidade realizados pelos nossos jovens e sempre com sala cheia. Que venha a próxima edição!

Paisagem do Alto Douro Vinhateiro

Juventude, artes e ideias

IV MOSTRA-TE Jady Batista

Coordenação Jornal J

Olhão mostrou a sua vitalidade e a dinâmica da sua juventude em mais uma edição do MOSTRA-TE. Na sua

quarta edição, esta iniciativa é já um marco no concelho e a nível da região. Trata-se de uma iniciativa Ímpar, pelos objetivos, pelas entidades que envolve e pela sua duração. 31 dias sem parar Durante 31 dias, Olhão não pára, com atividades diárias de âmbito cultural, social, artístico e desportivo,

“AS MARIAS…” 12 JUN | 21h30 | Teatro das Figuras - Faro António Raminhos leva o público numa viagem pelos dramas e peripécias da infância, adolescência, casamento e paternidade, da forma muito própria a que já nos familiarizou...

“PORTUGAL, PAÍS DAS MARAVILHAS” 22 e 27 JUN | 21.00 | Centro Cultural de Lagos O Boa Esperança, apesar da crise já há algum tempo instalada e de tantas outras contrariedades, promete não poupar nas gargalhadas na sua Revista à Portuguesa


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Grande ecrã Cineclube de Faro

Programação: cineclubefaro.blogspot.pt MUSEU MUNICIPAL | 21.30 HORAS

16 JUN | FADO CAMANÉ, Bruno de Almeida, Portugal, 2014, 72’, M/6 23 JUN | SE EU FOSSE LADRÃO... ROUBAVA, Paulo Rocha, Portugal, 2012, 87’, M/14

30 JUN | MR. TURNER, Mike Leigh, Reino Unido, 2014, 150’, M/12

Momento

Ponha aqui o seu Pézinho Foto de Ana Omelete

Cinema no Museu de Faro Com a chegada do bom tempo, os claustros do Museu Municipal de Faro voltam a transformar-se numa sala de cinema a céu aberto, acolhendo as sessões do Cineclube de Faro. A abrir as hostes destas noites cinéfilas, dia 16 de junho, às 21.30: - Silêncio! Que vamos ter “Fado Camané”, do realizador Bruno de Almeida. Esta é uma longa-metragem documental sobre uma das maiores vozes da actualidade que vai explorar o processo de criação de uma das obras essenciais do fado, e centrar-se na relação de Camané com o compositor e produtor José Mário Branco e a poetisa Manuela de Freitas. A 23 de junho, continuamos com produções nacionais e o destaque vai para a derradeira longa-metragem de Paulo Rocha, “Se Eu Fosse Ladrão… Roubava”; uma evocação da infância e juventude do pai do realizador, em particular, o sonho obsessivo deste de emigrar para o Brasil, para onde partiu efectivamente em 1909. A fechar este mês, no dia 30 de

Cineclube de Tavira fotos: d.r.

Programação: www.cineclubetavira.com 281 971 546 | cinetavira@gmail.com SESSÕES REGULARES | CINE-TEATRO ANTÓNIO PINHEIRO | 21.30 HORAS 11 JUN | LEIJONASYDAN – HEART OF A LION (CORAÇÃO DE LEÃO), Dome Karukoski – Finlândia/Suécia 2013 (104’) M/16

Claustros do Museu Municipal de Faro junho, propomos “Mr Turner”, de Mike Leigh, que nos oferece um impressionante retrato (ou será impressionista?) dos últimos anos de vida de um dos mais importantes e radicais artistas ingleses, o pintor inglês Joseph Mallord William Turner. O cartaz de cinema do CCF para o Verão não fica no entanto por

aqui, a partir de Julho, as sessões de cinema ao ar livre mudam-se para o que pretende ser um espaço de cultura e lazer na cidade velha de Faro, que irá contar com a dinamização de várias associações culturais para trazer cinema, exposições, encontros, c≠oncertos e muito mais à zona histórica da cidade. Cineclube de Faro

18 JUN | GETT (O PROCESSO DE VIVIANE AMSALEM), Ronit e Shlomi Elkabetz – Israel/Al/F 2014 (115’) M/14 25 JUN | I LOVE KUDURO, Mário Patrocínio – Port/Angola 2014 (96’) M/12


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Letras e Leituras

Eleanor Catton – Uma jovem autora confirmada fotos: d.r.

Paulo Serra

Investigador da UAlg associado ao CLEPUL

Eleanor Catton é uma jovem autora, nascida em 1985 no Canadá, que cresceu e vive na Nova Zelândia. Formada em escrita ficcional publicou duas obras. O seu romance de estreia, O Ensaio, publicado pela Gradiva, gira em torno de um escândalo sexual numa escola secundária mas o que dá impulso à obra não é a história do escândalo em si, enquanto assunto mais ou menos recorrente e sensacionalista de tablóides, mas sim o tratamento dado ao tema. O escandâlo está aliás consumado quando conhecemos as várias personagens que estão mais ou menos directamente ligadas ao mesmo. A força motriz do romance é, afinal, a própria consciência que os estudantes ganham de si, da sua identidade e da sua

sexualidade, face ao sucedido, como se o tornar público de algo inominável e proibido despoletasse toda a libertação de desejos e pulsões íntimas. Um grupo de raparigas adolescentes ganha assim consciência do poder que detêm, nomeadamente quando são chamadas a reunir com um psicólogo que de alguma forma procura remoer o assunto de modo a assegurar que do escândalo não resultam traumas e mazelas. Se, por um lado, parece haver um tratamento cuidadoso e púdico do tema, por outro lado, a publicidade repentina que a escola sofre vai ser aproveitada como intriga central de uma peça de teatro que será inteiramente concebida e interpretada por um grupo de actores no primeiro ano do Instituto, uma escola de artes dramáticas local de grande reputação. Todos os anos é pedido aos jovens actores que criem a sua própria peça, de modo a mostrar aos professores bem como a toda a comunidade o seu valor e o próprio tema da peça é sempre mantido em segredo mesmo junto dos professores. Esta peça resolve converter o escândalo num espectáculo e,

Eleanor Catton é uma jovem escritora que já publicou ‘O Ensaio’ e ‘Os Luminares’ tal como o próprio título indica, ao longo da obra cada acto e cada gesto parecem resultar numa performance teatral. Os próprios diálogos parecem por vezes solilóquios dramáticos, e o livro acompanha afinal os ensaios desta peça que servirá de afirmação aos jovens actores, da mesma forma que este momento da vida das jovens protagonistas (e de um único rapaz, Stanley), entre os 15 e os 18 anos, se pode definir como uma prova de acesso, retratando-se os dilemas e os conflitos emocionais que definem estas idades. O final da adolescência surge assim como ensaio da própria idade adulta, em que é preciso experimentar e arriscar de forma a descobrir. A comprovar que são os adolescentes que ganham protagonismo no livro temos o pormenor de que todos os jovens têm nomes enquanto que os adultos, isto é, os professores ou pais, são apenas designados pela sua profissão: professor de Movimento, psicólogo, etc. A conduzir a intriga temos a figura um pouco soturna e misteriosa da professora de Saxofone. Esta figura que se coloca sempre distante, enquanto observadora, tem no entanto a capacidade de manipular as pessoas que passam pelo seu estúdio: não somente as alunas inocentes e ignorantes dos meandros da complexidade e da mal-

dade humana, mas também as mães que desesperadamente parecem apelar à professora que tenha uma atenção especial para com as suas filhas. No final do livro temos um momento muito bem orquestrado em que já não sabemos, de tal forma se cruza o ensaio com a realidade, se foi a professora a manipular duas das suas alunas a unirem-se amorosamente, numa espécie de compensação da história amorosa que ela nunca teve com a sua própria professora, que terá recusado os seus impulsos, ou se são as próprias alunas a vingar-se da professora por ter tentado manipular as suas vidas. A única personagem central masculina, Stanley, é um jovem actor promissor, tão competente que veste completamente a personagem de Mr. Saladin, desempenhando o seu papel até às últimas instâncias, quando, no final do romance, se apercebe de que está a namorar a irmã da jovem vítima de assédio sexual e ele próprio tem 18 anos, enquanto ela ainda não atingiu a maioridade. Numa espécie de reviravolta própria das antigas tragédias gregas, a própria jovem só irá tomar consciência na noite de estreia da peça, à qual levou os pais para lhes poder mostrar o seu novo namorado. Temos ainda o pai de Stanley, psicólogo, que mantém um sórdido jogo psicológico com o filho, que consiste em tentar chocar o outro com as mais ordinárias piadas relacionadas com pedofilia.

Em suma, temos um livro que toma como ideia central o facto de que todos nós usamos máscaras e desempenhamos constantemente um papel, e mesmo quando algo muito íntimo deflagra e se torna do domínio público, como o escândalo sexual entre Victoria e o professor, as fronteiras entre o real e a ficção continuam difíceis de esbater. A segunda obra, Os Luminares, publicada pela Bertrand, confirmou, quatro anos depois, o talento ficcional da autora que arriscou com um livro denso de 888 páginas, cuja originalidade foi reconhecida com o Man Booker Prize 2013, o que faz de Eleanor Catton a mais jovem autora de sempre a receber o prémio bem como com o romance mais extenso. Numa noite de tempestade, para realçar desde logo o ambiente de mistério, um jovem de Edimburgo, Walter Moody, entra no primeiro hotel que lhe aparece assim que desembarca da sua viagem até à cidade de Hokitika, na Nova Zelândia. É curioso notar como ao tentar guiar-se pelas estrelas, o jovem descobre que o céu agora lhe aparece invertido, com as constelações fora do seu lugar habitual, o que acentua todo o sentimento de estranheza em que se vê mergulhado bem como do que se seguirá. Apesar de abalado pelo incidente sobrenatural que presenciou no barco, aperceber-se-á que interrompeu uma reunião entre 12 homens que estão, eles próprios, a tentar deslindar o

seu próprio mistério, cujo segredo cruza peças tão díspares como uma prostituta, um traficante de ópio, um jovem misteriosamente desaparecido, uma fortuna desaparecida e a, até então, desconhecida viúva de um eremita, também vidente. Os Luminares situa-se, ao jeito pós-moderno, entre géneros, pois tem tanto de romance policial como de romance histórico, e arrisca a vários níveis: inovador pelo tema, com um mistério por resolver no século XIX; pelo número extenso de personagens, pois em torno desse mistério agrupa-se o destino desses 12 personagens, desde europeus a chineses, passando por uma personagem Maori, o que serve para definir a variedade intercultural desse novo mundo; pela estrutura que lembra a dos romances vitorianos, com pequenos resumos dos acontecimentos centrais de cada capítulo a abrir o mesmo; pela divisão do livro em várias secções, novamente em doze, bem como pelo tratamento sequencial da intriga, que no final, é contada de trás para a frente, em capítulos cada vez mais curtos, dado o conhecimento prévio que o leitor tem do que já leu e cujas peças começam finalmente a fazer sentido; e pela novidade da introdução de cartas astrológicas a abrir cada secção do romance, onde há inclusivamente a referência da posição dos planetas nas respectivas casas. Um desafio a não perder!


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Panorâmica

As sete vidas do programador cultural

Paulo Pires

Programador cultural no Município de Silves esteoficiodepoeta@gmail.com

No imaginário colectivo associa-se a expressão “sete vidas” ao gato devido à eficiência do seu sistema imunológico e à sua agilidade/habilidade e resistência quando confrontado com situações de adversidade e risco. O número sete é místico por excelência, indicando, segundo os antigos, o processo transformador de passagem do conhecido para o desconhecido. Não é difícil fazer o paralelismo com o perfil e função do programador cultural: imaginação, ousadia, (sobre) vivência e fôlego criativos, curiosidade (felina) e atenção sensível ao que o rodeia, resiliência, elasticidade (para saltar/fazer pontes), foco estratégico, capacidade de estimulação e envolvimento (do outro: político, público, agente, criador, intérprete). Sete vidas, que são, no fundo, sete desafios (+1) para o programador enquanto agente do circuito cultural: 1/ Há uma percepção (deseja-se que não acrítica nem passiva) de que o país vive actualmente, sobretudo em cidades pequenas/médias, numa frequência cultural (dominantemente) de concessão ao mainstream, dada uma maior secundarização da cultura em detrimento de necessidades mais imediatas e “básicas”. O consumo cultural imediato tem sido mais remetido para a esfera privada (casa) através do acesso aos livros, imprensa escrita, televisão e internet, e a fruição social da cultura (acesso a espaços públicos) parece passar mais pela adesão às tendências e modas dominantes, com menor disponibilidade psicossocial, dadas as restrições económicas, para formatos mais alternativos. Se esta realidade acaba condicionando as opções de programação de não poucos equipamentos culturais no sentido de uma (tentadora, menos arriscada e mais “pacífica”) aposta em propostas mais populares e mediáticas, a mesma também acentua a inegável importância de, em nome da criação/formação de públicos e dos valores de diversidade e complementaridade que as estruturas culturais estatais, de serviço público, devem estimular e perseguir, não prescindir, em paralelo, da apresentação de propostas mais out of the box que privilegiem áreas artísticas menos visíveis/conhecidas e suas diversas ramificações criativas, bem como linguagens mais contemporâneas e abordagens interdisciplinares centradas na fusão e experimentalis-

mo estéticos – explorando assim o incomum, o imprevisível, o desconhecido e questionando/alargando os horizontes dos seus destinatários. Trata-se, no fundo, de conjugar, dosear/temperar, reiterar e alternar (com sensatez, realismo e arrojo) estas duas vertentes, em moldes que variam em função das estratégias de programação, dos públicos, dos equipamentos em si (e recursos adstritos) e dos contextos culturais e criativos envolventes. 2/ Se os equipamentos culturais visam não só a formação de públicos,

afins, isto ao nível das áreas artísticas a priorizar, de eventuais colaborações a encetar e da própria calendarização dos eventos, de modo a reforçar a coexistência institucional e a tornar mais eficaz o impacto das várias propostas dirigidas a uma mesma comunidade. 4/ Dadas as assimetrias patentes no Algarve em termos de capacitação cultural e de adesão de público, as limitações orçamentais com que muitas entidades se deparam e as ainda reduzidas práticas de cooperação existentes entre municípios ao nível das suas estrutu-

tas vezes descurada pelos agentes culturais – com a componente de mediação de públicos revela-se, a este nível, fulcral, afirmando-se como um meio imprescindível para uma efectiva inclusão e captação de receptores para certos programas propostos que, pelas suas características, carecem de maior envolvimento ao nível da educação cultural e artística. Esta mediação, ou construção/facilitação de pontes, concretiza-se quer nas chamadas actividades paralelas (workshops, encontros, conversas pré ou pós-espectáculo, visitas guiadas e serviços especiais), quer nos serviços educativos vocacionados para d.r.

Cultura e escuta-inclusão-formação de públicos mas também o estímulo e interacção com os agentes culturais e criativos da comunidade em que se inserem, a realização de uma programação partilhada e/ou comprometida, assente em projectos participativos, afigura-se fundamental para alcançar esses objectivos. Para além das potencialidades inclusivas que esse caminho pode oferecer, a integração dos públicos e/ ou comunidades próximas no processo de programação – assumindo estes um papel criador e/ou curador – pode constituir ainda uma estratégia eficaz de escuta dos receptores culturais relativamente às suas reais necessidades e expectativas. 3/ Nos grandes centros urbanos é possível definir, para cada estrutura, linhas de programação para áreas artísticas específicas (segmentando mais determinado tipo de oferta e aprofundando toda a sua tentacularidade) dada a quantidade e heterogeneidade de equipamentos existentes, o arco geográfico que os mesmos cobrem e o considerável público-alvo a que se destinam. Nas cidades de menor peso demográfico, em que não abundam os espaços culturais, cada um destes procura, à partida, proporcionar um leque mais ecléctico de possibilidades e facetas, “tocando vários instrumentos”. Mas também nestes meios é essencial a articulação e complementaridade entre equipamentos de âmbito cultural inseridos no mesmo território de intervenção e dotados de missões similares/

ras/equipamentos culturais (recorde-se, contudo, um bom exemplo, ocorrido em 2011-2012, com o projecto “Movimenta-te”, financiado por fundos europeus e que juntou as autarquias de Faro, Loulé, Olhão, S. Brás de Alportel, Tavira e o Teatro Municipal de Faro na promoção das artes performativas), é fundamental o estabelecimento de parcerias ao nível local/regional e nacional, e de mecanismos intermunicipais de programação em rede (de maior ou menor espectro), de modo a captar financiamentos, agilizar recursos, reduzir/distribuir custos de produção, estimular fluxos de público e potenciar dinâmicas e projectos, sendo que a Rede de Museus do Algarve (criada em 2007 como estrutura informal e já com uma dinâmica assinalável), o surgimento da Rede de Arquivos do Algarve em 2011 e, mais recentemente, a concertação encetada entre os teatros/auditórios municipais da região visando uma articulação conjunta são indicadores esperançosos a este nível. 5/ No que toca sobretudo (mas não só) a propostas de programação mais alternativas, ligadas a certas linguagens performativas e a temáticas/conteúdos mais herméticos e complexos, há que adoptar ferramentas que, em conexão com a programação, convoquem públicos diferenciados (os “nichos”), promovam o conhecimento de novas práticas culturais e fomentem a reflexão, partilha e conhecimento, apurando sensibilidades e sentidos críticos. A preocupação – mui-

grupos escolares e famílias, quer ainda nos projectos continuados, sendo que as residências artísticas também podem ter aqui um papel de relevo. 6/ A comunicação é outro oxigénio essencial à vida do programador, visto ser uma área técnica que, como coadjuvante do processo de implementação de um projecto cultural e artístico, requer, por parte dos responsáveis por esse sector, um conhecimento consistente do mesmo e do seu target, e um domínio das ferramentas mais adequadas para a sua valorização e conhecimento públicos. Daí a importância de definir e difundir atempadamente um plano de programação a médio-prazo (trimestral, semestral, anual), de adoptar os meios e estratégias de divulgação mais adequados ao mesmo (a nível de timings, locais, segmentos de público, suportes, parcerias, etc.), bem como de envolver efectivamente (e qualificar quando necessário) todos os intervenientes que estão integrados nos vários contextos de interface com o público (as frentes de casa, a bilheteira, os gabinetes de comunicação), bem como as equipas técnicas, para os objectivos e conteúdos da programação apresentada. 7/ Acessibilidade cultural: muitos equipamentos, municipais e/ou ligados à administração central, debatem-se actualmente com orçamentos muito diminutos (ou menos, inexistentes), fruto de um gradual desinvestimento estatal na área cultural, já não falando em estruturas profissionais privadas ligadas às artes

performativas, que sofreram cortes significativos (ou até integrais) em termos de subsidiação pública. A ausência ou défice, nos equipamentos culturais públicos, de recursos financeiros para programação acarreta um notório aumento de “acolhimentos” e de partilhas de bilheteira em moldes de co-produção, o qual, não obstante permitir que muitos teatros/auditórios continuem a funcionar (dado o exíguo esforço económico empreendido), apresenta, quando se torna dominante e muito regular, várias desvantagens em termos de acesso, nomeadamente: um claro encarecimento do valor dos ingressos (o que, ainda assim, não parece inibir a procura sempre que se trata de certos fenómenos mediáticos [veja-se os efeitos “Zambujo” ou “família Carreira”, entre outros], mas que provoca, por exemplo, um maior retraimento dos receptores perante propostas de qualidade mas de teor mais alternativo); um significativo menor encaixe de receita de bilheteira para os equipamentos que acolhem as produções; e um menor controlo do programador sobre a qualidade, coerência, solidez, regularidade e impacto inerentes ao seu “plano”. Por outro lado, para as estruturas dotadas de orçamento a adopção de valores fixos de referência (com décalages próximas) para determinadas tipologias/ formatos de evento pode constituir uma mais-valia em termos de atractividade e adesão de público, criando um “chip” mental que permite consolidar rotinas de fruição relativamente à oferta cultural apresentada. A adopção de cartões aderentes com condições especiais de acesso (a valores reduzidos) para eventos programados, numa lógica de rede, por vários equipamentos é outra via que pode revelar-se frutífera. Duas notas finais sobre uma tentação: se o conceito de programação autoral constitui uma dimensão essencial do processo de produção cultural, conferindo identidade, originalidade e diferenciação ao projecto apresentado (dado que este também é, de alguma forma, o reflexo do gosto pessoal e, assim, subjectivo de quem o giza), é importante, ao mesmo tempo, não descurar (por eventuais motivações egocêntricas) criações e objectos de reconhecido interesse e qualidade artística que, não encaixando nas preferências do programador, podem, na óptica dos públicos, apontar valiosos caminhos de diversidade e democraticidade culturais que um serviço público deve trilhar. A um nível mais lato, e como enfatiza Maria Vlachou na sua obra Musing on Culture: management, communications and our relationship with people (2013), é importante lutar contra um certo autocentramento que ainda parece assaltar alguns programadores e gestores culturais, levando-os a questionar as suas práticas, a ler melhor o que os rodeia e a sair das suas zonas de conforto. Sim, porque os gatos podem até parecer narcisistas, mas nunca deixam de nos observar e de notar que existimos...


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Cultura.Sul

Artes visuais

Qual o ‘lugar’ da Psicologia da Arte?

Saul Neves de Jesus

Professor catedrático da UAlg; Pós-doutorado em Artes Visuais pela Universidade de Évora

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No último artigo analisámos de que forma as descobertas na ciência podem ser fonte de inspiração artística, verificando-se que diversos artistas têm procurado expressar nas suas obras descobertas ocorridas nas mais diversas ciências. A Psicologia tem sido uma das ciências mais inspiradora para os artistas. Desde logo, as descobertas ocorridas no âmbito da Psicologia da Forma (Gestalt), que se desenvolveu no início do século XX, tiveram influência no trabalho de Escher, artista gráfico que procurava criar imagens com efeitos de ilusões de ótica, representando construções “impossíveis”. A estreita relação entre o trabalho artístico de Escher e a Psicologia foi revelada no artigo de Penrose e Penrose, em 1958, no British Journal of Psychology, em que apresentaram os desenhos de Escher “Escada acima e escada abaixo” e “Queda de água”. Mas outros artistas foram influenciados pela teoria da Gestalt, pois segundo esta o que se vê depende do próprio observador, tendo em conta que o observador determina a própria realidade com a sua observação. Em particular, Salvador Dali realizou vários trabalhos em que são várias as percepções possíveis por parte do observador. Vejam-se, por exemplo, os seus trabalhos “O enigma interminável” (1938), “Rosto deitado” (1935) ou “O rosto de Mae West” (1934-35). Mas a influência da Psicologia na produção artística é apenas um dos vários aspetos que podem ser abordados quando se analisam as relações entre a Psicologia e as Artes Visuais. A Psicologia da Arte é um dos domínios de fronteira entre a ciência, neste caso a Psicologia, e

a arte. Traduz o desenvolvimento que a Psicologia tem tido em muitos âmbitos de investigação, sendo delimitados domínios cada vez mais específicos, constituindo áreas de fronteira entre a Psicologia e outras áreas científicas. Temos domínios mais actuais, como seja a Psicologia do Desporto, constituindo um domínio de fronteira entre a Psicologia e o Desporto, mas temos domínios de fronteira mais clássicos, como sejam a Psicologia da Saúde e a Psicologia da Educação. Daí estes domínios específicos tanto se incluírem na Psicologia, como nas outras áreas científicas, nestes casos, respectivamente as Ciências do Desporto, as Ciências da Saúde e as Ciências da Educação. No caso das Artes, talvez tivesse sentido a utilização da expressão Ciências Artísticas para traduzir as fronteiras que podem existir entre as Artes e certos domínios científicos próximos, podendo a Psicologia da Arte ser perfeitamente aqui integrada. Independentemente destes aspectos mais formais do enquadramento epistemológico da Psicologia da Arte, importa delimitar o conteúdo que dá especificidade a este domínio. Para tal, parece-nos importante fazer uma retrospectiva de como

se foi constituindo a Psicologia da Arte. Numa revisão da literatura sobre Psicologia da Arte, verifica-se que o primeiro trabalho consistente neste domínio é realizado por Vigotsky (1925), sendo a sua tese de doutoramento intitulada “Psicologia da Arte”, em que analisa os contributos das correntes do Behaviorismo, da Gestalt e da Psicanálise para o estudo da Arte. Curiosamente a formação de base de Vigotsky era em Direito, mas foi no domínio da Psicologia que mais se destacou. No início do século XX, também merecem destaque os estudos realizados por Freud, entre 1907 e 1928, sobre aspectos da vida e da obra de pintores, poetas e músicos famosos, como foram, respectivamente, Leonardo da Vinci, Goethe e Dostoievski. Estes trabalhos foram posteriormente compilados no livro “Psicanálise da Arte”. Um outro autor que se destacou na investigação em Psicologia da Arte foi Arnheim, em particular através dos livros “Art and Visual Perception” (1954) e “Towards a Psychology of Art. Entropy and Art” (1966). Embora na tradução do primeiro para a língua portuguesa, adquirida pela editora Thomson em 1980, o título seja

fotos: d.r.

Desenho “Queda de água”, de Escher “Arte e Percepção Visual. Uma Psicologia da Visão Criadora”, tendo sido acrescentado este subtítulo que aponta para o estudo dos processos criativos, os conteúdos deste não incidem directamente sobre o estudo da criatividade na produção artística. Assim, os tópicos

Desenho “Escada acima e escada abaixo”, de Escher “NOVOS MUNDOS” Até 19 de Julho | Museu de Portimão Timo Dillner nasceu em Wismar na Alemanha em 1966, vive em Bensafrim, Lagos, há 16 anos. ´e um artista multifacetado que apresenta p������������� inturas, poemas, obras gráficas, esculturas e vídeo

deste livro foram os seguintes: equilíbrio; configuração; forma; desenvolvimento; espaço; luz; cor; movimento; dinâmica; e expressão. Estes tópicos remetem fundamentalmente para aspectos relacionados com os contributos dos estudos no âmbito da percepção visual. É na segunda obra, traduzida para a língua portuguesa em 1997, pela Dinalivro, com o título “Para uma Psicologia da Arte. Arte e Entropia”, que a criatividade surge como um dos tópicos abordados. De entre os tópicos analisados neste livro, contam-se a visão, a gestalt, a emoção, os símbolos artísticos e a criatividade. Verifica-se assim que a criatividade, que não havia sido abordada até aos anos 50, predominando o estudo da percepção e dos contributos da Teoria da Gestalt, já surge nesta obra dos anos 60 como um dos tópicos de estudo em Psicologia da Arte. Embora estes livros tenham sido traduzidos para português, verifica-se que a primeira obra publicada em língua portuguesa ocorre nos anos 70 por Juan Mosquera (1973), no Brasil. No seu livro sobre “Psicologia da

Arte”, apresenta estudos sobre alguns artistas, no plano da arte visual (Van Gogh) e no plano da arte escrita (Gabriel Garcia Márquez), bem como sobre alguns temas como sejam a percepção, a estética, a educação artística e a criatividade. Nos anos 80, salientamos os livros de Howard Gardner (1982), “Art, mind and brain. A cognitve approach to creativity”, e de Ellen Winner (1982), “Invented worlds: The Psychology of the Arts”, este último publicado pela Harvard University Press e merecendo uma tradução em chinês no ano de 1997. Esta autora desenvolve ainda uma unidade curricular em Psicologia da Arte e da Criatividade no Boston College – Harvard Graduate School of Education, tendo como principais conteúdos o estudo da personalidade do artista, o cérebro e as aptidões artísticas, a influência da sociedade e do ambiente na criatividade e o pensamento criativo. Em Portugal salienta-se o livro de Carla Gonçalves (2000), em que, dentro da Psicologia da Arte, procura analisar os temas da percepção visual e da gestalt, da psicanálise e da criatividade. Embora os contributos iniciais da Psicologia para a Arte, no final do século XIX e início do século XX, se tivessem situado sobretudo nos aspectos ligados à percepção, como resultado das investigações realizadas no âmbito da Teoria da Gestalt (ou Teoria da Forma), verifica-se que a criatividade vai ocupando um lugar de cada vez maior destaque na Psicologia da Arte, incidindo muitas das investigações atuais sobre este tópico. Nota: Este artigo integra o livro “Construção de um percurso multidisciplinar, integrativo e de síntese nas Artes Visuais”, de Saul Neves de Jesus (snjesus@ualg.pt). Todas as receitas obtidas com a venda deste livro revertem a favor da compra de uma mesa de gravura para o curso de Artes Visuais da Universidade do Algarve. Pode ser adquirido na Fnac de Faro (Forum Algarve) ou em Fnac online (http://www.fnac.pt/ Construcao-de-um-Percurso-nas-Artes-Visuais-Saul-Neves-de-Jesus/a869599).

“AS MEMÓRIAS CIRCULAM NUM CANTO DO CÉREBRO” Até 30 JUN | Casa dos Condes - Alcoutim Exposição de artes plásticas de Maria Antónia Santos que, na sua obra, busca “uma relação inteligente entre o visível e o imaginário, entre o consciente e o inconsciente”


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Espaço ALFA

Novos horizontes na Fotografia

Paulo Côrte-Real Membro da ALFA

Atualmente, assiste-se a um crescente interesse pela fotografia. Quer se deva à proliferação e acesso relativamente fácil a máquinas fotográficas ou a dispositivos eletrónicos portadores de câmara fotográfica, nomeadamente telemóveis ou tablets, quer se deva ao fascínio que a imagem fotográfica exerce sobre as pessoas, com uma visibilidade quase viral através de aplicações e redes sociais, o facto é que nunca se assistiu a um tão intenso gosto pela arte fotográfica. A ALFA, Associação Livre Fotógrafos do Algarve, enquanto associação que visa a promoção da fotografia, de acordo com o objecto da sua actividade, tem vindo a desenvolver um Plano de

Atividade onde a formação, a par dos passeios fotográficos e exposições, tem assumido um forte papel social e cultural no campo fotográfico. Contando com fotógrafos profissionais como formadores, a ALFA tem dinamizado inúmeras formações de curta e média duração, onde os formandos podem optar por cursos de iniciação à fotografia, cursos de nível intermédio para aprofundamento de determinadas matérias ou ainda, cursos temáticos. Em todas as suas formações, a ALFA procura ir ao encontro das necessidades dos formandos, quer pela estruturação e rigor teórico dos assuntos abordados, quer pela disponibilização de uma forte componente prática, que confira aos mesmos a segurança na prática da arte fotográfica.

Workshop de Fotografia Noturna que foi ministrado na ALFA pub

Feira de artesanato e etnografia regressa a Alcoutim A envolvente da praia fluvial do Pego Fundo, em Alcoutim, vai receber, no próximo fim-de-semana, a 30ª edição da Feira de Artesanato e Etnografia, evento que atrai anualmente milhares de visitantes oriundos do Algarve e da vizinha Espanha. O certame constitui uma genuína viagem ao passado onde, a par do artesanato e da etnografia, também a gastronomia típica da

serra algarvia e a animação com música tradicional terão, como habitualmente, lugar de destaque. No sábado, os grupos “Ai Xico Xica” e “Ùs Sai de Gatas” vão animar o evento durante a tarde, ficando a animação nocturna a cargo de “Os Diabo na Cruz” e do “Duo José e Vítor Guerreiro”, que terminarão a festa com um baile tradicional com início marcado para as 23.30. No domingo, a

animação de rua durante a tarde estará mais uma vez a cargo dos grupos “Ai Xico Xica” e “Ùs Sai de Gatas”, estando o baile com o “Duo José e Vítor Guerreiro” agendado para as 21 horas. A Feira de Artesanato e Etnografia de Alcoutim é organizada pela Associação “A Moira”, em colaboração com o Município de Alcoutim, e decorre entre as 16 e as 24 horas.

Imouhar apresenta livro ‘Sentires de uma Alma’ em Albufeira O livro de poesia “Sentires de uma Alma”, da autoria de Imouhar, vai ser apresentado no próximo sábado, pelas 17 horas, na Biblioteca Municipal Lídia Jorge, em Albufeira. O evento vai decorrer num ambiente intimista de inspiração oriental. Imouhar é o pseudónimo escolhido por António Mourinho, um algarvio que desde muito cedo sentiu o apelo por viajar, conhecer o mundo e contactar com outras culturas. Um dia conheceu Marrocos e nasceu um amor que todos os anos o faz regressar a este país.

“Sou filho do vento que corre livre pelas areias do deserto … escrevo longe das prisões gramaticais. Escrevo todo o sentir que carrego na alma, e na alma vai a liberdade de uma alma perfumada de saudade”, é desta forma que o autor se define. Imouhar é bastante ecléctico, não se prende a conceitos nem a definições, utilizando um estilo simples, onde prevalece uma certa nostalgia associada à alegria de viver. A sua poesia é lírica, fala-nos directamente, despertando emoções, na exacta medida em que os versos surgem como estí-

mulos que provocam diferentes estados de alma. O livro “Sentires de Uma alma” é uma edição da Arandis editora, tem nota de apresentação de Vieira Calado e ilustrações de António Brigas, Beatriz Mourinho, Filomena Gonçalves e Maysi Vásquez Rubio. A apresentação de “Sentires de uma Alma” traz à cidade de Albufeira uma nova perspectiva de liberdade, sob a forma como a poesia é escrita pela mão e pelas palavras nostálgicas de Imouhar. A entrada é gratuita.


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Cultura.Sul

Um olhar sobre o património

Missão Cultura

António Rosa Mendes: Tavira mostra a renovada Igreja de N.ª Sr.ª das Ondas uma figura maior

Alexandre Ferreira

Licenciado em Património Cultural pela UAlg

No início do presente mês passaram dois anos sobre o falecimento de uma figura maior do Algarve, cujo contributo para a divulgação da História e da Cultura da região ainda está por alcançar. Ainda que no infortúnio do seu desaparecimento físico,

inconsciente colectivo. Homem pouco dado a encómios, não os poupando contudo a quem realmente os merecia, certamente coraria ao ver o número crescente de homenagens que são feitas em sua honra. Cada uma delas mais do que merecida, com certeza. É comovente constatar as homenagens que diversas entidades algarvias concedem em sua honra, seja através da atribuição do seu nome a Arquivos Históricos ou a Bibliotecas, seja através da atribuição de um Prémio Nacional de Ensaio Histórico do qual é patrono, atribuído pelo município de Vila Real

mentos académicos, de todo relevantes e fundamentais, o estimular e o promover a criação das condições necessárias para que cada um dos “seus” se pudesse exprimir na sua máxima plenitude. Também o autor destas linhas teve a boa fortuna de privar com este vulto maior da cultura do Algarve, cuja filosofia de vida humanista e com um profundo sentido de justiça, aliados aos seus princípios, sempre doseados com uma boa dose de humor, fazem com que a sua ausência seja porventura demasiado evidente. Como vem sendo hábid.r.

Direção Regional de Cultura do Algarve

De acordo com os registos históricos, a Igreja de Nossa Senhora das Ondas em Tavira remonta presumivelmente ao reinado de Manuel I, O Venturoso (Séc. XVI). Similarmente é denominada por Igreja de São Pedro Gonçalves Telmo ou Igreja do Corpo Santo, uma vez que foi erguida pela Confraria do Santo, composta por pescadores e mareantes.1 Por essa razão, igualmente era também conhecida pela Igreja do Compromisso Marítimo (edifício contíguo à Igreja), uma vez que os pescadores e mareantes se agremiavam na Corporação do Corpo Santo. Estilo renascentista, esta Igreja sofreu estragos com o terramoto de 1755, tendo sido posteriormente reconstruída parcialmente, e, desde 2012 é classificada como Património de Interesse Público 2. Percurso histórico

António Rosa Mendes marcou para sempre o panorama cultural algarvio para quem teve o privilé- de Santo António. Entregue to, permito-me desafiar o gio de com ele privar ficam de dois anos em anos, os caro leitor a partir na senos ensinamentos e a paixão laureados da primeira edi- da das riquezas do Algarve, pela Ciência, pela História, ção, cuja cerimónia ocorreu desta feita descobrindo “O Património Inpela Cultura e pela dustrial”, na 12ª Vida! Para aqueAntónio Rosa Mendes era assim. edição do Curso les que não tiveram Um apaixonado pelas tradições Livre de Históoportunidade de o da sua região ria do Algarve, conhecer, ficam as ocasião esta que suas publicações, os seus escritos e os projectos no passado dia 21 de maio, servirá também para homeque ficaram por acabar, mas data em que completaria 61 nagear o Professor António que na efemeridade da sua anos, Daniel Giebels e Mar- Rosa Mendes, por sinal um existência marcam significa- co de Sousa Santos, que por dos organizadores de grande tivamente o panorama cultu- sinal foram seus alunos, sin- parte das edições anteriores tetizaram nos seus discursos deste curso, numa organiral algarvio. António Rosa Mendes era de agradecimento, um dos zação do Centro de Estudos assim. Um apaixonado pelas maiores legados que o pro- em Património, Paisagem e tradições da sua região, pers- fessor António Rosa Mendes Construção e pelo Departacrutando as suas origens e de deixou aos seus alunos, e que mento de Artes e Humanidaque forma, de tão impregna- em boa hora é concretizado des da Faculdade de Ciências das que estão na sociedade, com a atribuição deste pré- Humanas e Sociais da Unise manifestam ainda hoje no mio: mais do que os ensina- versidade do Algarve.

Tendo sido herdada pela Segurança Social das antigas Casas dos Pescadores, esta, foi sua legítima proprietária durante largos anos até passar para “as mãos” do Município de Tavira através de um contrato de comodato. Cidade junto ao mar, com tradições e cultura marítimas presentes, sendo igualmente local de oração, foi-se assistindo aos malefícios provocados pelas intempéries e ausência de manutenção, vindo consideravelmente acentuar a sua degradação… tanto no interior como no exterior. Tomada de ação Decorre no ano de 2008 uma primeira fase de estudos, procurando-se soluções e técnicas que permitam a sua reabilitação, estudos estes elaborados pela equipa técnica do Município. Numa primeira fase, a cobertura e tetos, paredes interiores e exteriores, instalações e património integrado – conservação e restauro dos elementos que compõem todo o acervo religioso; numa segunda fase, o Coro Alto, o Arco Triunfal da Capela-mor e a estrutura de suporte do teto da nave da Igreja. Desenvolvidos os trabalhos a que se propuseram, procurando ter sempre presente a história e a

evolução artísticas das peças do acervo, verifica-se presentemente que através das técnicas de restauro utilizadas, confirmaram-se a existência de várias camadas de tratamentos (repinte) em muitos dos elementos, proporcionando-se desta forma restituir a estes, a sua beleza original. Exem-

Srª da Fruta e Nossa Srª das Ondas. Desde a consolidação de suportes, fixação e limpeza da policromia e superfícies douradas, passando pela execução efetiva de elementos em falta, tratamentos e reintegração de camadas cromáticas, enfim… tarefas executadas até à finalização, foram d.r.

Imagem do altar de São Pedro Gonçalves Telmo plo disso podemos observar no Mural do Coro Alto. Houve todo um conjunto de técnicas utilizadas e sobretudo aos técnicos que as realizaram (Fundação Ricardo do Espírito Santo Silva), que se tornou possível proceder à remoção de argamassas à base de gesso degradadas e sem qualquer função bem como a colagem de elementos fraturados e destacados, reconstituição de volumes em falta e colmatação de lacunas existentes. O acervo O modelo concebido para o tratamento de todo o acervo religioso e patrimonial passou pela total desmontagem das peças existentes, sua catalogação pormenorizada e transporte para as oficinas da Fundação em Lisboa. A título de curiosidade, o Teto da Nave foi desmontado peça por peça, catalogado e igualmente transportado. Todos os suportes em madeira foram escovados e aspirados e muitos dos elementos deteriorados ao nível de suporte foram repostos em madeira de casquinha; outros elementos tiveram que ser colados por apresentarem fraturas e/ou fissuras através de técnicas específicas e no que se refere a elementos metálicos oxidados, estes, foram substituídos. Quanto às imagens representadas, podemos visualizar a beleza de óleos sobre tela nos Retábulos de São Francisco de Paula, Nossa Srª da Conceição, Nossa

percorridas muitas semanas de minucioso e intenso trabalho. Foi um privilégio esta Direção Regional poder acompanhar o desenvolvimento do trabalhos e igualmente observar através dos Relatórios todas as ações desenvolvidas de pormenor e do detalhe. A equipa da Fundação Ricardo do Espírito Santo Silva foi verdadeiramente essencial em “devolver a vida” das imensas peças do espólio. Decerto que também para a população mareante e pescadora, sentirá esta a grata satisfação ao usufruir de um espaço de oração renovado e pensado num seu todo e em simultâneo em particular, nas suas gentes do mar… nas presentes e vindouras mas sobretudo nas que já passaram. Bem hajam todos os intervenientes que de uma forma ou de outra contribuíram para devolver a todos nós a formosura ímpar de um local erguido pelos nossos antepassados. 1

M a r ea n t e s – qu e m a re i a ,

homem do mar, marinheiro. 2

Um bem considera-se de interes-

se público quando a respetiva proteção e valorização represente ainda um valor cultural de importância nacional, mas para o qual o regime de proteção inerente à classificação como de interesse nacional se mostre desproporcionado in ponto 5 da Lei Nº107/2001, de 8 de setembro, que estabelece as bases da políticas e do regime de proteção e valorização do património cultural.


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O(s) Sentido(s) da Vida a 37º N

Junho Paulo Serra

cam mais este Mercadinho.

uso. Tratava-se de uma capa que cobria inteiramente quem a usava. A cabeça era oculta pelo próprio cabeção ou por um rebuço feito por qualquer xaile, lenço ou mantilha. Um século depois Joana Bandeira, jovem artista natural de Olhão, “agarra” no bioco Algarvio, despe-o do seu tradicional preto e reveste-o com novas cores, tecidos, padrões e acessórios, numa espécie de ode (e homenagem cromática) a todas as mulheres que outrora a usaram. A exposição estará patente em Santa Rita no CIIPC, Centro de Investigação e Informação do Património de Cacela/CMVRSA (Antiga Escola Primária de Santa Rita) até 12 de Julho de 2015 e pode ser visitada de segunda a sexta-feira das 9h às 13h e das 14h às 17h (Junho) e das 9h às 15h (Julho)

Pedro Jubilot

pedromalves2014@hotmail.com canalsonora.blogs.sapo.pt

Retratos Cinéticos fotos: d.r.

Concertos ao entardecer

Peixe-Futuro

Para ver até 27 de agosto na FNAC do Algarve Shopping na Guia, a exposição de fotografia de Jorge Jubilot baseada no álbum ‹Retratos Cinéticos› com a banda Orblua. Uma mostra da paisagem, da vida, da cultura e das gentes do Algarve, focada na direção de uma perspetiva artística pessoal, global e integrada do mundo onde nos movemos.

Manhã É no glorioso desta manhã em que o céu não se mexe e o mar se calou que o acordar é sinónimo de esperança, embora não se saiba já se a parte que se perdeu do seu significado ainda seja recuperável.

Sem Medos

AGENDAR

Sem medos, meu amor, a caminho do solstício, surfando uma onda de gigante combustão psicadélica, seremos levados para fora das trevas em que nos afogamos nos dias em que nos vemos representados na tv a cores de um país a preto e cinzento.

Diz sobre o seu trabalho: «dá rosto às palavras do meu sangue. É autodecifração. Não é tanto o gosto, mas a necessidade dele. O meu desenho sou eu enquanto somos. É este ser que me interessa e persigo. Anima-me. O desenhar enquanto actividade subjectiva e inconsciente, deixa de o ser quando o desenho está acabado. São desejos que decifro, são vontades. A arte cria assim uma paralela à linha que a vida risca. Estas duas linhas confundem-se e são. Quem não vê não sabe e a ignorância não deixa ver a beleza que deslinda o mistério do ar do artista». Ver sobre o seu trabalho: em Faro na Igreja da Sé – pintura: «Faro de StªMaria» e na Raposeira na Ermida Nª Srª de Guadalupe – desenho: colectiva «Sim».

~ da lua desviando as águas circundantes ~ fio-de-contas à vida estagnada nas margens ~ resoluções sem bóia presa à âncora fundeada ~ no mar de um futuro-peixe enrolado na onda breve ~

Biocos Regressaram em Maio à vista ria os ‘Concertos ao Entardecer’ com a banda First Breath After Coma e depois o músico brasileiro Momo. Na sede da associação ArQuente, na rua António Maria Labóia, nº 1. Imperdíveis. Cada novo concerto uma surpresa ou uma estreia. Os próximos concertos, desta 5ª edição, sempre às 19h30, terão lugar a 20 de Junho com Éme e a 4 de Julho com Sequin.

Mercado de Verão

Essência

Cacela Velha prepara-se para receber, no próximo dia 21 de Junho (Domingo), mais um Mercadinho de Verão. Velharias e antiguidades; trocas & baldrocas, espaço onde se vendem artigos em segunda mão (discos, cd’s, livros, roupa, brinquedos, quadros, …); artesanato tradicional (empreita, cestaria, latoaria, cerâmica, trapologia…) e novas criações; produtos alimentares da região como o mel, pão, bolos, compotas, licores; flores; cremes e sabonetes naturais; brinquedos de madeira; livros e música mar-

A essência do amor é algo que está para lá da poesia, desfaz-se perante a aproximação do verso certo, da estrofe perfeita, das sílabas contadas como favas, nada está seguro, pelo cinto preso no banco da vida do amo-te para sempre, de quem não sabe que um texto nunca está acabado, como nunca está perto do fim, e que assim também se pode perder por qualquer uma razão desconhecida, surgida mesmo na eternidade etérea do pc para onde transcreves essa volatilidade de sentidos.

“UMA CADEIRA NA MONTANHA” 13 JUN | 21.30 | Teatro das Figuras - Faro Leitura encenada com crianças com idades compreendidas entre os 8 e os 12 anos e que resulta numa apresentação final aberta à comunidade

É por muitos considerado um trajo mítico e verdadeiramente popular no Algarve. Associam-no muitas vezes a Olhão por ter sido dos últimos lugares onde foi usado até aos anos 30 do séc. XX, mesmo depois da proibição do seu

“PINTURAS DE ROMAN MARKOV” Até 6 de JUL | Espaço de atendimento da EMARP As inspirações e principal tema das obras de Roman Markov são as paisagens e as gentes, pelas quais se enamora, ao longo das suas viagens


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Espaço ao Património

Ficha Técnica:

A culpa é da Comunicação?

Direcção: GORDA Associação Sócio-Cultural fotos: d.r.

Cidália Pacheco

Técnica Superior de Marketing na Divisão de Comunicação da Câmara Municipal de Portimão

Apesar de habituada a usar a escrita no meu dia-a-dia, confesso que não sei por onde iniciar. Assim sendo, penso ser justo começar por agradecer à colega e amiga Isabel Soares, atual Chefe de Divisão do Museu de Portimão, o gentil convite que me endereçou para escrever este artigo. Sendo o ato de comunicar algo de essencial nos diversos planos que envolvem uma sociedade, neste caso em particular e tendo em conta a minha experiência profissional na comunicação de equipamentos e eventos, irei partilhar com os leitores desta rubrica algumas ideias acerca da comunicação enquanto processo que promove ou condiciona o sucesso de uma ideia. Penso que todos os Técnicos que trabalham nesta área, nalgum momento da sua vida profissional, já ouviram a frase “Foi a comunicação que falhou!”. Sim, quando algo corre menos bem e não se atingem os resultados esperados, por norma, ainda numa fase de pouca análise e reflexão, o primeiro ímpeto é assumir que a comunicação não funcionou. Sem dúvida pode acontecer, mas julgo que o insucesso ou sucesso de algo, na maioria das vezes, pois existem com certeza exceções, está sobretudo relacionado com a experiência de qualidade que é ou não percecionada, com a afinidade que é gerada perante determinada ideia, no fundo, com a necessidade que é ou não sentida de se fazer parte de algo. A última ideia exposta penso que é essencial na área dos equipamentos culturais, cada vez mais há uma necessidade premente de envolver, não queremos públicos passivos, precisamos de parceiros que são essenciais para a construção de uma história com futuro. O sucesso reside nas emoções, no sentimento de

Imagem do interior do museu de Portimão pertença. Este envolvimento não resulta de um “amor à primeira vista”. Uma marca bem posicionada, com uma identidade forte e definida, que é corretamente percecionada no seu mercado, não é o resultado de meia dúzia de ações de comunicação, é o produto de um longo caminho, que todos os dias é percorrido com empenho. Em outubro de 2008, entre outros projetos, fiquei com a responsabilidade de trabalhar a comunicação do Museu de Portimão, uma antiga fábrica de conservas, que tinha aberto as suas portas no ano anterior e eu ainda não tinha tido a oportunidade de visitar. Não demorou muito até me enamorar

e desde então que me confesso apaixonada por aquele espaço que, hoje com sete anos de existência, guarda na sua bagagem várias menções honrosas e algumas distinções internacionais, entre elas, o prémio “Museu Conselho da Europa”. “O meu Museu”, o “nosso Museu”, na larga maioria das vezes quando penso e escrevo sobre aquele espaço, é de forma natural que abuso de pronomes possessivos, e é precisamente com esta orientação que o trabalho é desenvolvido. É desta forma que queremos que este espaço cultural seja sentido no seio da sua comunidade, e este objetivo só é possível, porque é transversal a toda a

equipa, a qual tenho o maior orgulho de integrar, que tem feito um trabalho de proximidade, junto de diferentes gerações, absolutamente excecional. Assumidamente, no que diz respeito ao acesso à informação, entrámos numa nova era, em que o mundo digital alcançou um papel preponderante no universo da comunicação, em que é só querer e todos estamos conectados uns aos outros, bastando para isso ter acesso à internet. Comunicar tornou-se algo banal, qualquer pessoa tem uma enorme facilidade em disponibilizar conteúdos on line. Contudo, esta nova era que se apresenta fantástica na infinidade de

Uma noite à luz das conservas!

possibilidades e soluções que oferece aos comunicadores para serem bem-sucedidos no seu trabalho, particularmente num período em que a primeira variável a considerar num plano de comunicação é precisamente o orçamento, também traz consigo enormes desafios. O sentimento de quem privilegia a internet como canal informativo, deverá ser mais ou menos o mesmo sentimento de alguém que vai ao supermercado e entra num corredor com prateleiras repletas de um mesmo produto de marcas diferentes – o que escolher? O acesso a redes sociais como o Facebook é de tal forma massivo, que o verdadeiro desafio perante a panóplia de oferta, é precisamente promover a diferenciação, a mensagem tem que gerar algum tipo de emoção, promover empatia, fidelizar o utilizador. Através destes canais comunicamos, cada vez mais, para pessoas experientes, conhecedoras e com pouco tempo disponível, que com alguma facilidade estabelecem comparativos de avaliação, fazem as suas escolhas e com a mesma rapidez com que fizeram um “gosto” deixam de seguir essa mesma página. No caso do nosso Museu de Portimão, apanhamos naturalmente boleia da era digital que nos permite globalizar as ideias e o trabalho desenvolvido na escala local, mas o segredo reside sempre nas pessoas. Elas são a pedra basilar, a primazia do processo de comunicação, em primeira instância, acontece junto da comunidade que fez parte da história daquela fábrica, são as suas estórias que dão vida aos objetos, foram os seus relatos que permitiram dar corpo a um percurso. Não temos dúvidas que a era digital veio para ficar e continuará a evoluir à velocidade da luz, mas paralelamente com os novos canais, deveremos continuar a privilegiar os velhos métodos que promovem uma proximidade mais real e menos virtual, continuarmos a valorizar a troca de experiências é a nossa vantagem competitiva, porque não existem processos técnicos que dignifiquem um projeto, ideia ou evento que não tem essência.

Editor: Ricardo Claro Paginação e gestão de conteúdos: Postal do Algarve Responsáveis pelas secções: • Artes visuais: Saul de Jesus • Espaço AGECAL: Jorge Queiroz • Espaço ALFA: Raúl Grade Coelho • Espaço Cultura: Direcção Regional de Cultura do Algarve • Da minha biblioteca: Adriana Nogueira • Grande ecrã: Cineclube de Faro Cineclube de Tavira • Juventude, artes e ideias: Jady Batista • Letras e literatura: Paulo Serra • Momento: Ana Omelete • O(s) Sentido(s) da Vida a 37º N: Pedro Jubilot • Panorâmica: Ricardo Claro • Património: Isabel Soares • Sala de leitura: Paulo Pires • Um olhar sobre o património: Alexandre Ferreira Colaboradores desta edição: Cidália Pacheco Paulo Côrte-Real Parceiros: Direcção Regional de Cultura do Algarve, FNAC Forum Algarve e-mail redacção: geralcultura.sul@gmail.com e-mail publicidade: anabelag.postal@gmail.com on-line em: www.postal.pt e-paper em: www.issuu.com/postaldoalgarve

facebook: Cultura.Sul Tiragem: 8.166 exemplares


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Cultura.Sul

Da minha biblioteca

As mulheres que fizeram Roma, de Carla Hilário Quevedo d.r.

Adriana Nogueira

Pareceu-me importante esta contextualização para melhor enquadrar este livro, pois é sempre bom sabermos quem são os autores que lemos, principalmente quando não se trata de ficção.

Classicista Professora da Univ. do Algarve

Facto e ficção

adriana.nogueira.cultura.sul@gmail.com

Escrever sobre mulheres do mundo romano implica conhecer factos e reconhecer que muito do que foi escrito como verdade é, na realidade, ficção. A primeira história deste livro é a de Reia Sílvia, uma vestal (sacerdotisa da deusa Vesta, que tinha de ser virgem, sob pena de ser enterrada viva) que surge grávida, explicando o fenómeno por ter sido violada pelo deus Marte. Como contrapartida, os seus filhos (estava à espera de gémeos) seriam um marco na história da humanidade, visto que «um deles seria o fundador da grande cidade de um povo não menos grandioso» (p.24): Rómulo fundaria Roma. Para os romanos, Reia Sílvia fazia parte da sua história, tal como outras mulheres que sabemos que existiram. E sobre essas, o que se sabe é facto ou ficção? Carla Quevedo questiona muitas vezes as fontes que demonizavam algumas destas mulheres, não se coibindo de desmontar as acusações, quantas vezes absurdas, e emitir a sua opinião. Por exemplo, a propósito do desaparecimento de Tibério e do facto de Lívia, sua mãe, que tanto lutou para que o filho chegasse a imperador, ter sido uma das pessoas suspeitas de estarem envolvidas na sua morte, pois, «por causa do filho tinha perdido honras concedidas por Augusto», a autora afirma: «Esta hipótese que consideramos tresloucada é avançada por Tácito» (p. 112). Não quero com isto dizer que procure branquear os acontecimentos, mas sim que não aceita sem questionar as fontes que, muitas vezes, servem interesses políticos (contra os homens de

AGENDAR

Não é frequente serem editados livros de divulgação cultural, escritos originalmente em português, sobre a antiguidade clássica. Só isso já seria razão para me congratular com a recentíssima publicação deste As mulheres que fizeram Roma, da autoria de Carla Hilário Quevedo. Nestes dias em que saiu a notícia que os estabelecimentos de ensino podem ter, no Básico, como Oferta de Escola, disciplinas na área da Introdução à Cultura e Línguas Clássicas, a publicação deste livro só vem reforçar a importância desta componente na educação (relembro que o Latim e o Grego nunca saíram do Ensino Secundário, apesar de parecer que sim. Por exemplo, em Portimão, na Escola Secundária Manuel Teixeira Gomes, tem havido Grego no 12º ano, com muito sucesso). Mas a minha satisfação é maior, porque o livro é mesmo de leitura muito agradável. Não se deixem assustar com o subtítulo, 14 Histórias de poder e violência, pois também há histórias de amor, dedicação e honra. É verdade que tudo gira à volta do poder, mas a história tem destas coisas: não fala dos fracos. Carla Hilário Quevedo é cronista no jornal i e no semanário Sol, mas conheci a sua escrita no tempo em que publicava no Expresso, tendo depois passado a segui-la no blogue Bomba Inteligente. Já nessa época, Carla Quevedo manifestava o seu interesse pela antiguidade: conhecedora do grego moderno e licenciada em Línguas e Literaturas Modernas (Inglês/Alemão), fez mestrado em Estudos Clássicos, tendo aprendido grego antigo e latim.

Carla Hilário Quevedo lançou recentemente o seu primeiro livro poder), nos retratos que fazem das mulheres. Sobre Messalina, diz-nos, no final do capítulo: «Messalina pode não ter sido a meretriz entediada que chegou até nós, mas havia muito no seu comportamento que não se adequava ao que era esperado de uma mulher da sua posição. Por isso não nos deverá surpreender que tenha sido usada quando se tratou de denegrir Cláudio e a sua dinastia. É verdade que pode não ter sido bem assim. Porém, temos a certeza de que não seria a candidata ideal para honrar a deusa Vesta. Ou como diríamos hoje, Messalina não era santa nenhuma» (p.122). O que se aprende Aprende-se muito com este livro. Não só sobre história de Roma, mas sobre relações humanas, familiares e de poder. Mas mais do que isso: concentra-se aqui, explicado de uma forma clara e simples, elementos de

“SEA CHANGE” Até 12 JUN | Biblioteca Municipal de Olhão Exposição de Rachel Ramirez, que recorre a uma técnica de impressão japonesa, o “goytaku”, transformando espécimes marinhos naturais e objectos artificiais em obras de arte

legislação romana (tão próxima de nós, ou não fosse o direito romano o nosso antepassado), de tradições, de cultura. A situação das mulheres no casamento é a questão que mais aparece, por serem elas as protagonistas e por só existirem e serem faladas pelo seu relacionamento com homens (normalmente maridos e filhos). No cap. II, ao referir o rapto das jovens sabinas (por parte dos romanos que queriam constituir família, tal era a escassez de mulheres), conta que apenas uma mulher casada foi raptada e, mesmo assim, por engano. A lei permitiria «matar um adúltero, i.e., um homem que adulterava a mulher casada, apanhado em flagrante, mas um homem que violasse uma mulher que não era casada tinha apenas que pagar uma multa» (p.33). Por coincidência, esse adúltero era o próprio Rómulo e foi Hersília, a sabina, que convenceu o mari-

do a não entrar em guerra com os romanos. Vamos vendo, assim, como as leis mudam ao sabor dos quereres dos imperadores, influenciados ou não por mulheres. Augusto, preocupado com a natalidade, «decretou multas para homens e mulheres sem filhos e estabeleceu recompensas monetárias para os plebeus que provassem ter filhos», penalizando ainda «os homens que casassem com prostitutas ou actrizes e regulamentou o divórcio. Instituiu o dever de casar para homens e mulheres viúvos que não tivessem no mínimo três filhos. Em 18 a.C. criou a lex Iulia de adulteriis, que penalizava o adultério» (p.102). Mais: «o marido de mulher adúltera que não se divorciasse imediatamente dela era considerado seu proxeneta. Estava proibido de a matar, mas podia decidir sobre o seu exílio» (p.118). Quando Agripina viu uma

possibilidade de «colocar [o filho] Nero na linha de sucessão do trono», sabia também que «teria primeiro de casar com o tio, que seduziu com competência. Fazendo uso do direito que tinha de lhe tocar, por ser sua sobrinha, Agripina depressa encantou Cláudio. Os casamentos entre familiares eram considerados incesto e por isso eram expressamente proibidos por lei. (…) Um ou outro suborno pode ter ajudado a persuadir senadores indecisos» (p.129) e a verdade é que a lei foi alterada. Catorze são as histórias de vida de mulheres sobreviventes, ao longo de mil anos (de 510 a.C. a 450 d.C.). Carla Quevedo rodeou-se de uma bibliografia (que apresenta no final) que poderá ser também muito útil para quem quiser ler mais sobre o assunto. Cada capítulo tem notas no fim do livro e não no pé da página, fazendo com que a leitura flua escorreita.

“A ÚLTIMA SEMANA DO FASCISMO?” Até 30 JUN | Biblioteca Municipal de Lagos Exposição de pintura de Manuela Caneco constituída por 14 obras originais, estruturadas em cinco séries: “Corrosão do Sistema”; “Repressã������������������� o em Lisboa”, “Tortura”, “Luta” e “Emigração forçada e clandestina”


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