Edição 33 - O Praça (2006)

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JORNAL DA ASSOCIAÇÃO DE PRAÇAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA - DEZEMBRO DE 2006 - ANO V - NÚMERO 33

Sargento Soares é eleito deputado estadual Com 40.108 votos em todas as 293 cidades do Estado, Amauri Soares conquistou uma vaga na Assembléia Legislativa. LEIA A ENTREVISTA EXCLUSIVA NA PÁGINA CENTRAL.

OBRIGADO PELA CONFIANÇA

SUICÍDIO: UM TABU QUE AUMENTA CADA VEZ MAIS ENTRE OS POLICIAIS pag. 8

Nesta oportunidade, quero agradecer todas as pessoas que ao longo das sucessivas jornadas têm apoiado nosso movimento e nossas lutas. De forma especial, quero agradecer o voto e o apoio no último processo eleitoral, quando nossa candidatura recebeu 40.108 votos, em todas as cidades catarinenses. Não existem palavras para exprimir o sentimento de gratidão pela confiança que nos foi depositada. Confiança é um sentimento que não tem preço, e só isso explica a expressiva votação em uma candidatura com poucos recursos financeiros e pouca estrutura. O que tivemos em abundância foram pessoas comprometidas com o processo, e é por elas que nos movemos e com elas que vencemos. Todos os irmãos de farda, policiais ou bombeiros, esposas, filhos, pais, irmãos, avós e – através destes – uma infinidade de outras pessoas de relações familiares, de compadres e amigos. Pessoas que dedicaram a confiança em nome do respeito que nossos iguais têm junto a sociedade. Policiais civis e agentes prisionais. Militantes e lutadores do povo de outros setores da sociedade, como saúde, educação, pequena agricultura, etc. Gente que arregaçou a manga e foi à luta por acreditar que a justiça é possível. Na impossibilidade de agradecer pessoalmente a cada um, enviamos esta carta para dizer que não esquecemos de ninguém, que sabemos que tivemos apoio em todas as cidades, e que faremos todo o esforço para nos encontrarmos no menor espaço de tempo possível. Reafirmamos nossos compromissos de honrar nossa farda, honrar cada voto e cada apoio, o gesto de carinho, a cordialidade e hospitalidade com que nos receberam por onde passamos, durante a campanha e depois dela. Nossa luta será sempre a mesma, e seguiremos lutando por nós e pelos nossos, por todos aqueles que vivem do esforço do seu próprio trabalho. Desejo um bom Natal e um ano de 2007 promissor, que encontre a todos com saúde, no aconchego das pessoas mais queridas, e que possamos ter forças, todos juntos, para o seguir da luta por nossos objetivos mais altos. Um abraço a todos, em especial aqueles que trabalharam de forma anônima! São José, 14 de dezembro de 2006. Amauri Soares Sargento Soares Deputado Estadual Eleito

LEIA ENTREVISTA COM O CABO J. COSTA, PRESIDENTE DA APRASC pag. 3


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Jornal da Associação de Praças do Estado de Santa Catarina (APRASC) Ano V - no 33 - dezembro 2006 Tiragem: 12.000 exemplares Distribuição gratuita e dirigida Endereço Rua Deodoro, 176 - Edifício Soraya - 1º andar Sala 11 - Centro - Florianópolis/SC - CEP 88010-020 Telefone (48) 3223-2241 www.aprasc.org.br / imprensa@aprasc.org.br Presidente Cb. Manoel João da Costa (Forte Santana - Fpolis) Secretário Geral 2º Sgt. Edson Garcia Fortuna (São José) 1º Secretário 1º Sgt. Saul Honorato Filho (Laguna) 2º Secretário 3º Sgt. Tito Leonir Schüller (Campo Erê) 1º Tesoureiro Cb. José Leal de O. Godoy (Cia de Guarda -Fpolis) Vice-Presidente Regional Extremo Oeste 3º Sgt. Pedro Paulo Boff Sobrinho (Pinhalzinho) Vice-Presidente Regional Oeste Sd. Luiz Antônio de Souza (Chapecó) Vice-Presidente Regional Meio Oeste ST. Vanderlei Kemp (RR - Monte Carlo) Vice-Presidente Regional Planalto Serrano ST. Dejair Nascimento Jerônimo (RR - Lages) Vice-Presidente Regional Médio Vale do Itajaí 3º Sgt. Armindo Maria (Blumenau) Vice-Presidente Regional Alto Vale do Itajaí ST. Odemir da Silva (Lontras) Vice-Presidente Regional Norte Sd. Elisandro Lotin de Souza (Joinville) Vice-Presidente Regional Planalto Norte Cb. Irineu Voginhack (RR - Mafra) Vice-Presidente Regional Sul Cb. Claudemir da Rosa (Tubarão) Vice-Presidente Regional Extremo Sul Cb. José Augusto Rodrigues (Içara) Vice-Presidente do 1º BBM Cb. Jorge Pereira da Cruz (Araranguá) Vice-Presidente do 2º BBM ST. Moacir Tadeu Wasielewsky (Curitibanos) Vice-Presidente do 3º BBM Sd. Ângelo José Castellain (Blumenau) Coordenação de Imprensa 2º Sgt. Jadir Vieira (DALF - Florianópolis) Sd. Elton Biegelmeier (São Miguel do Oeste) Sd. Joaquim Francisco de Souza (Joinville) Coordenação de Assuntos Jurídicos Sd. Antônio Francisco da Silva (4º BPM - Fpolis) 2º Sgt. Lauri Nereu Guizel (Chapecó/ Passos Maia) ST. Edison Pedro Demoro (RR - Florianópolis) Coordenação de Relações Públicas ST. Flori Matias (RR - Mondaí) Sd. Flávio da Silva Damiani (Laguna) ST. Nelson Gomes (RR - São Miguel do Oeste) Coordenação de Direitos Humanos Sd. Jair Ventura (Dionísio Cerqueira) Sd. Dilnei Lavezo (Criciúma) Sd. Wilson Carlos Alves Lourenço (Porto União) Coordenação de Assuntos Culturais Sd. Elói Bazo (São Lourenço do Oeste) Sd. Joares Dias de Oliveira (Blumenau) Sd. Paulo Serafim Rodrigues (Brusque) Coordenação de Patrimônio 3º Sgt. RR José Luiz Lazzarotto (RR - Campos Novos) Coordenação de Saúde e Promoção Social Sd. Paulo César Aguieiras (ASU - Florianópolis) 2º Sgt. Ângela Ventura de Oliveira (HPM - Fpolis) Sd. Ronaldo Roque Claudino (Laguna) CONSELHO FISCAL Titulares 2º Sgt. Marco Aurélio Hillesheim (Fpolis - 4º BPM) Sd. Adilson Elizeu Pereira (CPGd - Florianópolis) Sd. Clemilson da Silva (Palhoça) Suplentes Sd. Marcos Antônio de Paula Cordeiro (Brusque) Sd. Gilmar Farnandes (Florianópolis - TJ) Sd. Daniel Dakmar (São José - BOE) Textos, diagramação e edição Alexandre Brandão

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Liberdade vigiada A concentração de renda na mão dos milionários estão Pobres morrendo de fome nessa grande imensidão Ricos morando em casas que mais parecem mansão Todas cercadas de grades Buscando sua liberdade dentro das grandes cidades Que mais parecem prisão Cabo J. Costa CAMPANHA

Doação de medula óssea O bombeiro militar Sérgio Narbal de Cássio está em campanha para conquistar a doação espontânea de medula óssea para os seus dois filhos Robinson Narbal de Cássio (14 anos) e Rodrigo Narbal de Cássio (18 anos), que são portadores de uma doença degenerativa, progressiva e irreversível chamada andrenoleucodistrofia. Recentemente, o cabo Narbal, do Corpo de Bombeiros de São José, recebeu uma resposta do Hospital das Clínicas de Porto Alegre (HCPA) de um possível transplante de medula óssea para o filho mais velho. Se o transplante não for realizado, pode levá-los a morte, por isso a necessidade de doação. “Essa prática ainda assusta um pouco os possíveis doadores, por não ser muito difundida, mas trata-se de uma coleta rápida, prática e segura do material (san-

gue)”, explica o bombeiro militar. Para a doação, é preciso deixar claro ao hemocentro de sua cidade que trata-se de uma coleta de sangue para doação de medula óssea. Após o resultado do exame de tipagem de medula óssea (HLA), os dados passam a fazer parte do Registro Brasileiro de Doadores Voluntários de Medula Óssea (Redom). Com esse banco ampliado, aumentam aa chances dos filhos do cabo Narbal serem servidos por um doador em potencial. A APRASC se junta a essa campanha e pede a todos aprasquianos que façam esse exercício de companheirismo para salvar as vidas filhos de um guerreiro. Mais informação Sérgio Narbal de Cássio Telefone: (48) 3357-3428 E-mail: snarbal@ig.com.br O Praça - dezembro 2006


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ENTREVISTA: PRESIDENTE DA APRASC

“Nós trabalhadores temos obrigação de nos fortalecer para buscar justiça salarial” Presidente da APRASC defende unificação dos praças para ampliar as conquistas da classe Desde 30 de março desse ano, o cabo Manoel João da Costa, também muito conhecido como cabo J. Costa, assumiu a presidência da APRASC após o desligamento do sargento Amauri Soares, que lançava sua candidatura para a Assembléia Legislativa. Mesmo ao lado de Soares nos cinco anos de existência da entidade, reconhece que assumir a presidência da APRASC é uma tarefa difícil. “Pegar uma associação depois de uma pessoa como ele, você tem que se desdobrar para poder dar conta do recado”, diz, acrescentando que a tarefa está sendo feita da melhor forma possível, “acho que estamos fazendo um bom trabalho e vamos continuar avançando”. O atual presidente da APRASC foi protagonista ao lado do Sargento Soares, nesses últimos meses, de importantes conquistas para os praças e demais servidores da Segurança Pública, como a denúncia para o Ministério Público do Trabalho contra a instituição do chamado soldado temporário, que resultou em pedido da Justiça para que a Secretaria de Segurança Pública (SSP) faça concurso público. Além disso, contribuiu para derrubar dois desastrados decretos da SSP que atacavam as licenças, horas extras e férias dos servidores. Ao lado do governador e do comandante geral da PM, assinou – depois de meses de negociação – a regulamentação de uma das leis mais esperadas pelos praças, a regulamentação do Plano de Carreira. Também foi responsável, recentemente, pela conquista de 530 vagas para promoções e a criação de uma lei complementar que corrige a situação de praças reformados. Sob sua presidência e com o apoio do Sargento Soares foi construída a maior assembléia dos praças em cinco anos de existência da APRASC, quando no segundo turno os candidatos ao governo do Estado foram sabatinados pelos policiais e bombeiros militares. No momento, o presidente da APRASC está empenhado em fortalecer a campanha pela revogação do Regulamento Disciplinar dos Militares de SC, e para isso quer contar com a organização e fidelidade da classe. Mesmo com a determinação do governador, o oficialato não pretende mudar o RDMSC. “Eles não têm nenhum interesse em perder o poder discricionário”, afirma. Leia a entrevista e conheça melhor o cabo J. Costa, dono de frases incisivas e sinceras. O Praça – Que balanço você faz desse período que assumiu a presidência da APRASC desde a saída do sargento Amauri Soares para se candidatar? Cabo Manoel João da Costa – Nós estamos dando continuidade do trabalho que já vem sendo feito desde os primeiros dias de APRASC, até porque estamos juntos há cinco anos e vamos continuar o trabalho de reivindicações para melhorar, principalmente, a questão salarial e a questão de justiça e dignidade dentro das instituições militares. O Praça – Do ponto de vista pessoal como você avalia esse trabalho? Cabo J. Costa – Eu fiz o possível para manter o trabalho que vinha sendo feito. Não é fácil assumir uma presidência depois do Sargento Soares, que já tinha uma grande experiência nas lutas estudantis e nos movimentos sociais. Se você assumir uma associação depois de uma gestão como a dele, você tem que se desdobrar para poder dar conta do recado. Mas acho que estamos fazendo um bom trabalho e O Praça - dezembro 2006

vamos continuar avançando. O Praça – Qual vai ser a relação da APRASC com o mandato do deputado eleito Sargento Soares? Cabo J. Costa – Nós não temos nenhuma dúvida que a eleição do Sargento Soares foi um grande avanço. Sinto-me feliz de ter participado efetivamente desse processo na condição de presidente e de ter contribuído para a vitória do nosso deputado, um momento em que vai marcar um período de transição na história do movimento dos praças. Também temos certeza que vamos ter um bom relacionamento com o mandato, até porque o nosso deputado vai estar dentro da APRASC, assim como nós, os praças, vamos participar efetivamente do mandato. Não trabalhando dentro da Assembléia Legislativa, mas trabalhando junto com ele, dando todo respaldo necessário para que os projetos possam chegar lá e serem efetivamente aprovados. Ou seja, não vai faltar o respaldo e a força dos aprasquianos. A APRASC vai estar junto com ele em todas as demandas. O Praça – E qual vai ser a relação da APRASC com o governador reeleito Luiz Henrique da Silveira? Cabo J. Costa – O nosso relacionamento com o governador Luiz Henrique sempre foi bom. E continuar assim só depende dele e não de nós. Até porque as nossas reivindicações vão continuar. Nós não somos governos, isso é preciso ficar bem claro, nós somos uma entidade de policiais e bombeiros militares, a qual eu sou presidente, e o meu dever é continuar organizando a luta para buscar nossos objetivos. Isso tanto na questão salarial, como nas promoções, dignidade e respeito dentro das instituições. O policial e bombeiro militar, acima de tudo, precisam ser valorizados e motivados. E esperamos que isso possa acontecer nos próximos anos. O Praça – O que você espera por parte do próximo governo que seja diferente da gestão anterior? Cabo J. Costa – Eu espero que as demandas sejam cumpridas efetivamente, ou seja, que as determinações do governo cheguem aos Comandos e à Secretaria de Segurança Pública e sejam cumpridas. No período anterior, depois que os projetos foram aprovados, a aplicação da lei foi deturpada justamente por aqueles que deveriam aplicar a lei. Na prática, nós deveríamos ter um ganho superior, mas os projetos caíram nas mãos de pessoas que tinham interesses particulares e desvirtuaram todo o projeto. O Praça – As determinações do governo então não estão sendo cumpridas? Cabo J. Costa – Em alguns aspectos elas não foram cumpridas. E nós esperamos que nesse governo todas determinações sejam cumpridas. O Praça – Qual vai ser a prioridade da luta dos praças no próximo ano? Cabo J. Costa – A nossa prioridade com certeza será a Lei 254, que o governo possa pagar efetivamente. Vamos trabalhar para isso, vamos sentar e negociar. Segundo, que todos os cursos de cabos e sargentos saiam já no início de março, e vamos cobrar isso do governo. E, terceiro, a revogação do Regulamento Disciplinar. É preciso nesse momento valorizar ainda mais o policial e bombeiro militar para que ele possa ter um pouco mais de tranqüilidade salarial e motivação profissional e, assim, dar uma resposta na rua para a sociedade. O Praça – Como a APRASC vai organizar a luta para fazer o governo pagar a Lei 254 e implementar

o Plano de Carreira? Cabo J. Costa – Tão logo o governador assuma, nós vamos procurar conversar, apresentar novamente nossa carta de reivindicação, que ele já conhece, e vamos sentar para negociar. E para nós tudo isso tem prazo. Os cursos têm que sair no início de março. A Lei 254 a gente espera que o governador faça um cronograma de pagamento já no início do governo. Se não sair, vamos organizar nossas atividades, como sempre tivemos. O Praça – Como vai ser feito o trabalho da APRASC para conquistar a revogação do Regulamento Disciplinar? Cabo J. Costa – Essa já foi uma promessa do governador Luiz Henrique nos primeiros quatro anos e não aconteceu justamente porque as várias ações que ele determinou não foram cumpridas. Ou seja, os coronéis não cumpriram aquilo que ele determinou. Não cumpriram porque eles não querem perder o poder discricionário. Criaram várias comissões, assim como, tem uma comissão rolando que não atende as nossas necessidades. Já foram designados três companheiros, o sargento Fortuna, o sargento Armindo e o cabo Augusto que estão elaborando um novo Código de Ética para substituir o atual Regulamento Disciplinar, que será apresentado no primeiro mês ao governador LHS. O Praça – Especificamente, o que o governador determinou aos oficiais que não foi encaminhado? Cabo J. Costa – Mudar o Regulamento Disciplinar. O governador determinou em duas oportunidades que chamassem uma comissão para elaborar o novo regulamento. Mas é preciso dizer que, em todas as comissões, eles estão em número muito maior, no mínimo, em dobro. Ou seja, a mudança efetivamente não passa. Eles chegaram a elaborar um projeto de regulamento que era muito pior que o atual. O Praça – Como você avalia as mudanças dentro da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros Militares nesses últimos anos? Cabo J. Costa – Com a unificação das lutas dos praças no Estado, com certeza, mudou um pouco o caráter dentro da instituição. Nós avançamos bastante. Na questão salarial mudou bastante, mas mudou porque nós fomos buscar, não mudou simplesmente porque alguém foi bonzinho e quis conceder aumento. Todas as conquistas nós fomos buscar na rua. E vale a pena dizer que em alguns aspectos os oficiais também foram beneficiados nas atividades que promovemos. Do contrário, eles não seriam beneficiados porque nunca se manifestaram. Conversando com os companheiros, a gente percebe que o tratamento profissional dentro das instituições parece que mudou um pouco. Eles começaram a perceber que não dá mais para tratar ninguém no bico do coturno. Ou seja, eles começaram a respeitar um pouco mais os praças policiais e bombeiros. A camaradagem aumentou um pouco, mas é preciso avançar ainda mais. O Praça – Como você avalia o futuro do movimento dos praças? Cabo J. Costa – Só com a união dos praças nós vamos conseguir nossos objetivos. Não podemos cruzar os braços e esperar para que o comandante ou o governador venha resolver nossos problemas. Jamais isso vai acontecer. Nós trabalhadores temos obrigação de nos fortalecer, unificarmos as categorias para buscar justiça salarial e bom relacionamento nas instituições. Precisamos avançar muito. Todas essas conquistas que tivemos até agora é porque estávamos unidos. A maior conquista foi ter nos fortalecido com a eleição do Sargento Soares. É preciso continuar trabalhando dessa forma para buscar nossos objetivos. 3


O dia 1 de outubro de 2006 vai ficar para a história como o data em que os praças policias e bombeiros militares elegeram um praça deputado estadual da Assembléia Legislativa de Santa Catarina. Amauri Soares, ou Sargento Soares, foi eleito com 40.108 votos. Na verdade, ele não foi primeiro praça eleito para a ALESC, mas a forma que foi construída sua candidatura e conduzida sua campanha foi um feito inédito. O conteúdo de seus compromissos também assumiram um caráter diferenciado. Com o desenvolvimento e fortalecimento da APRASC, criada em agosto de 2001, sentiu-se a necessidade de eleger um parlamentar que fosse o espelho do movimento dos praças. Na eleição de 2002, diversos candidatos surgiram, mas nenhum teve a capacidade de unifica a categoria. Em março desse ano, a APRASC, atendendo determinação de assembléia, organizou uma consulta prévia com três concorrentes, na qual o sargento Amauri Soares foi escolhido o candidato de consenso por 4.312 votos (96,16% do total). Em resumo, sua candidatura não nasceu da vontade um partido, de um grupo econômico ou da tradição de uma família, foi a vontade de uma classe organizada que o escolheu para ser o representante dos praças na Assembléia. A campanha do Sargento Soares foi feita apenas por praças, familiares, amigos e trabalhadores em geral. “Sozinho não teria

existido a APRASC, sozinho eu não teria sido eleito”, disse Soares após a eleição se referindo aos milhares de apoiadores e voluntários da campanha pelo Estado. O financiamento de campanha também foi feito pelas mesmas pessoas que trabalharam pedindo votos sem remuneração. Em seis de dezembro, o Tribunal Regional Eleitoral de SC aprovou sem ressalvas suas contas, declarando em R$ 39.174,98 o valor total da despesa e R$ 39.225,29 a arrecadação. Foi a campanha mais barata entre 40 deputados eleitos, menos de um real por voto. Ainda elencando números, o Sargento Soares foi o único parlamentar que recebeu votos em todos os 293 municípios catarinenses. Além disso, visitou 274 cidades e encontrou diretamente cerca de 6 mil pessoas, em 92 dias de campanha. Nessa entrevista exclusiva para o jornal O Praça, Soares conta como vai ser a experiência para os próximos quatro anos e aponta suas metas de ação na Assembléia Legislativa. “O trabalho vai continuar na mesma lógica que sempre foi e nossos compromissos de campanha não serão esquecidos”, afirma. Sobre o mandato, Soares comenta da dificuldade de montar uma estrutura estadualizada de gabinete, outra especificidade do deputado-praça, e sua relação com o governo e a APRASC. O deputado dos praças tem dificuldade de falar na primeira pessoa do singular (eu), só se expressa na terceira pessoal do plural (nós). Confira.

O Praça – O que representa sua eleição de deputado estadual para o praças de Santa Catarina? Deputado Eleito Sargento Amauri Soares – A gente vê que tem um otimismo muito grande na categoria depois da eleição. Representa o resultado de uma luta de cinco anos de organização dos praças da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros. Para os praças, significa uma vitória política sem precedente, pela forma como foi estruturado, como a gente organizou, pelo nível de relação que a gente tem. Não por mim propriamente, mas pelo nível de organização da classe. Significa que nós estamos em um nível de organização superior do que nós estávamos nos períodos anteriores, na eleição anterior, porque aglutinou mais, teve mais trabalho, justamente por causa desse nível de consciência superior. E também o empenho do pessoal, com uma crença e uma fidelidade ao projeto coletivo que até hoje não existiu dentro da PM e do BM. Representa também a vontade dos praças de fazer justiça através do voto, votando em um praça – que eles sentem como sendo parte deles, um igual –, estariam fazendo justiça de forma mais eficaz, dedicando o voto, o trabalho e o empenho. O Praça – O que explica sua maior votação proporcional na região do Extremo-oeste e em Imbuia, sua cidade natal? Deputado Soares – Na minha cidade natal representa boa parte da família que ainda mora lá, alguns amigos da minha geração que ainda estão lá, pessoas de geração mais antiga que foram conhecidos durante minha infância e juventude, velhos conhecidos e compadres de meus pais e toda uma empolgação da cidade de ter um deputado nascido na cidade. Na Imbuia nunca teve nenhum candidato a deputado e muita gente já votou porque tem um candidato imbuiense. E os que se convenceram que o candidato poderia chegar trabalharam mais intensamente. No Extremo-oeste, votou uma proporção significativa que já era esperado pelo nível de organização maior dos praças. A proporção de praças filiados na APRASC do Extremo-oeste é maior, um local que está bem articulado, toda a região. Em outras regiões, nós temos que cidades que estão fortes e outras que estão fracas na organização dos praças. No Extremo-oeste é bastante equilibrado em todas as cidades, tem trabalho em todos locais, existe referências em todas as cidades, não só em algumas ou nas principais, como é em muitas regiões. O batalhão, a companhia e o destacamento estão todos articulados, por isso que teve essa votação proporcionalmente mais expressiva.

ENTREVISTA EXCLUSIVA: DEPUTADO SARGENTO SOARES

“As demandas dos trabalhadores em geral são todas justas e esse é o primeiro elemento que devemos ter como concepção na Assembléia”

O Praça – Que trabalho você tem desenvolvido desde sua eleição em 1º de outubro e vai fazer até a posse em 1º de fevereiro? Deputado Soares – Nós temos feito um esforço para voltar no máximo de cidades possíveis para agradecer os votos e o trabalho e reafirmar os compromissos, dizer que nós vamos trabalhar para alcançar os objetivos da categoria. Têm muitas demandas que não estavam previstas que aparecem e dificultam as viagens. A gente tem feito visitas com muito esforço e sacrifício, meu salário agora é de segundo-sargento sem hora extra a adicional noturno, então as condições financeiras e materiais têm sido mais complicadas. Não existe mais um comitê de campanha que aglutinava um conjunto considerável de pessoas. Então estamos fazendo o possível com o recurso que nós temos. Estamos trabalhando de forma permanente, até porque a demanda na área de Segurança Pública, a demanda dos praças não cessou, em nenhum momento, nem durante as eleições e nem agora. Fomos em várias regiões e vamos continuar indo. Reafirmamos aquele compromisso de reservar quatro dias a cada mês para visitar uma região diferente. O método é o de sempre, vamos buscar conversar com o máximo de companheiros possível. Nosso trabalho de contato permanente com a base é uma necessidade para agora, que estamos fazendo mesmo diante das dificuldades, e vai ser também durante o mandato. O Praça – Quais vão ser suas principais metas como deputado estadual? Deputado Soares – Vamos continuar o trabalho que temos feito até agora de buscar que as leis já aprovadas sejam cumpridas. Falta metade da Lei 254 de escala vertical de salários, então é prioridade o pagamento integral dessa lei. Colocar em exercício o Plano de Carreira que também já está aprovado, fazer que ele seja cumprido, que todas as vagas de cabo, de terceiro, segundo e primeiro-sargento estejam preenchidas permanentemente. Mudar o regulamento disciplinar. Há também outros projetos na área de habitação e transporte, o passe-livre para policiais e bombeiros, uma gratificação de periculosidade e insalubridade. Não vamos esquecer a defesa do serviço público, em geral, como necessidade não só dos praças, mas como necessidade do povo catarinense.

“É preciso envolver a sociedade no debate sobre segurança”

Portanto, pleitear mais investimento na educação e na saúde, apoio ao pequeno agricultor. Essa é a nossa luta geral: segurança pública, incluindo todas as demandas da categoria, dos profissionais da área, educação pública, compreendendo as demandas do magistério público, saúde pública, compreendendo as necessidades de mais gente na área, e apoio a pequena agricultura, colocar em debate o preço mínimo do produto agrícola e mais financiamento com menos juros para os pequenos agricultores. O Praça – Especificamente sobre política de segurança pública, o que pretende defender na Assembléia Legislativa? Deputado Soares – Precisamos fortalecer as instituições. Temos uma carência de efetivo na Polícia Militar, no Corpo de Bombeiros, na Polícia Civil e no sistema prisional. Nossa defesa é que haja concursos regulares todos os anos para preencher as lacunas que existem, que acontece no Estado inteiro. Pretendemos debater a filosofia e a estrutura das instituições de segurança. Democratizar as instituições de segurança. É preciso redistribuir o poder de polícia nas instituições, que está praticamente todo concentrado nas mãos dos delegados. É preciso discutir isso e transformar cada policial num agente efetivo de segurança, que seja ele mesmo responsável pela segurança e se sinta com poder de polícia. Além do que, todos os servidores da área possam participar do debate, do planejamento e do gerenciamento das ações na área de segurança, em conjunto com a sociedade. Um elemento fundamental é envolver a sociedade nesse debate porque não se faz segurança pública só pensando em logística e efetivo. É preciso mudar a lógica de fazer segurança pública, e isso vamos buscar debater com a sociedade. Mais que isso: vamos buscar que policiais e bombeiros debatam com a sociedade em seu local de trabalho e moradia as questões de segurança pública. O Praça – Como você pretende integrar a demanda de outras categorias de trabalhadores no seu mandato? Deputado Soares – As demandas dos trabalhadores em geral são todas justas, esse é o primeiro elemento que devemos ter como concepção. Os professores estão ganhando mal, os servidores da saúde estão ganhando mal, os servidores da Casan, da Celesc, os trabalhadores em geral estão ganhando mal. É preciso que a gente organize os trabalhadores em geral para lutar pelo fortalecimento do serviço público, pelo fortalecimento de todas as instituições públicas, e achar as formas de encontrar os recursos. E onde vamos encontrar os recursos? Nos setores que estão ganhando mais

“Temos que ter a justa medida do que é correto para o Brasil e SC”

na sociedade. Os banqueiros, que todo ano estão fazendo uma comemoração nova, batem recorde de lucro todo ano e, apesar disso, suas demandas são sempre atendidas pelos governos na esfera nacional pelo menos. No mais, os monopólios e os grandes empresários que também estão desestruturando a sociedade e levando lucro. É comum falar que vai discutir a reforma tributária, o que precisamos fazer é discutir essa reforma e instituir uma forma de imposto que recaia principalmente sobre as grandes fortunas, sobre os lucros dos bancos e monopólios, sobre o latifúndio em geral. É preciso pensar uma forma de tributação que arrecade recursos de onde tem excesso para garantir que o Estado possa ampliar seu poder de intervenção na assistência e no investimos nas áreas fundamentais, como educação, segurança e saúde. A nossa forma de integração com esses setores é com essa concepção. Assim como sendo solidários com todas as demandas coletivas. Estamos a disposição para assinar embaixo e trabalhar junto com todas as demandas dos trabalhadores em geral e, em especial, com os servidores públicos estaduais, assim como nos solidarizar com os servidores municipais e federais. O Praça – Qual vai ser o instrumento e o método de participação coletiva e democrática no mandato? Deputado Soares – Nossa intenção é fazer plenárias, assembléias e reuniões permanentes com a nossa categoria uma vez por mês em cada região diferente do Estado. Com os outros setores da mesma forma, organizando plenárias, reuniões para que haja participação e que o mandato esteja integrado permanentemente e saber quais são as demandas desses setores. O fundamental para o mandato dar certo é nós termos uma dinâmica de troca de informações entre o mandato e os mais diversos setores organizados da sociedade para que a gente possa sempre defender a posição requerida pela maioria. Não quer dizer que a gente vai ganhar sempre porque a maioria do parlamento defende a lógica da retirada de direitos. Nosso desafio é que o mandato esteja suficientemente informado e articulado com outros setores para que todas as necessidades sejam discutidas. Estamos a disposição desse debate. É fundamental a articulação de todos aqueles que vivem do esforço do seu próprio trabalho. Tem setores que já estão organizados e isso facilita muito e nos setores que estão menos organi-

zados ou desorganizados precisamos ir lá, estudar e ver o que é preciso e possível fazer. Temos que investigar mais para aonde estão indo os recursos do Estado. As instituições públicas de fomento estão financiando o quê? O que o Estado de Santa Catarina está fazendo com os recursos que recolhe? E não podemos nos furtar com as questões nacionais: o que o BNDES está fazendo? O que o governo federal está fazendo? Não dá para achar que vamos resolver todos os problemas em Santa Catarina e nem achar que nossas posições vão estar circunscritas ao território catarinense. Temos que ter uma posição sobre as políticas que estão sendo instituídas pelo governo federal, até para facilitar a compreensão das dinâmicas no Estado. Não dá para a gente se furtar disso. Como, por exemplo, mirar para o governo do Estado e esquecer que tem um governo federal. Como é possível que setores dentro da Assembléia Legislativa vão fazer. Da mesma forma que não dá para mirar todos os canhões para o governo federal para justificar todas as vontades do governo estadual. Temos que ter a justa medida do que é correto para o Brasil e o que é correto e necessário no Estado de Santa Catarina. O Praça – Como representante de um setor importante da Segurança Pública, vai pleitear a presidência da Comissão de Segurança Pública da Alesc? Deputado Soares – Vamos ser o único deputado na próxima legislatura que é da segurança pública. Faz quatro anos que não tem nenhum policial ou bombeiro eleito deputado. Então nada mais justo do que quem é setor coordenar essa comissão. É uma comissão importante e a sociedade precisa debater e também precisa de posicionamento e de iniciativa por parte das autoridades do governo na área de segurança. E a Comissão de Segurança Pública existe para isso, para fazer esse debate e clarear as questões na área de segurança, deve estar a disposição da sociedade. Se a comissão não for coordenada pelo nosso mandato, vai ser a perda de um espaço de importante. Nos últimos períodos, essa comissão teve dificuldades porque não tinha um profissional da segurança na Assembléia. Alguns deputados fizeram um trabalho razoável, com iniciativas aqui e acolá, mas não foi um trabalho estruturado que tivesse uma continuidade ao longo do período. Então requeremos essa comissão para a nossa categoria e para o nosso mandato. >> LEIA MAIS NA PÁGINA SEGUINTE >>


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ENTREVISTA EXCLUSIVA: SARGENTO SOARES

“Temos que pensar o mandato parlamentar como uma ferramenta, um instrumento” O Praça – Qual vai ser a relação do deputado Soares com o governo do Estado e com a Secretaria de Segurança Pública de Defesa do Cidadão? Deputado Soares – Nos elegemos pelo PDT que no primeiro turno tinha candidato próprio. No segundo turno, o PDT e eu, inclusive, apoiamos o governador Luiz Henrique da Silveira. O PDT vai participar do governo preenchendo cargos de primeiro escalão. O que temos conversado é que nós vamos defender o que é justo, vamos nos basear numa carta programa que foi debatida com o governador entre o primeiro e segundo turno. Aquela carta é a nossa base: contra as privatizações, a favor do fortalecimento das instituições e serviços públicos (saúde, educação e segurança) e investimento na educação em tempo integral. Essa é a nossa bandeira. Não temos nenhuma intenção em fazer oposição, mas é certo que não vamos assinar embaixo de tudo que vir do Palácio, vamos querer debater com os setores interessados, os setores da classe trabalhadora que vão ser atingidos por essas medidas. A participação do PDT no governo não é um apoio incondicional. O Praça – Seu mandato faz parte da base de apoio ao governador na Assembléia? Deputado Soares – Foi usado isso durante a campanha. Mas o nosso compromisso é com os trabalhadores, com os praças da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros, com os trabalhadores do serviço público estadual, com a sociedade e com o meio ambiente. Nossos compromissos são prioritariamente esses. Vamos nos dirigir a esses setores sempre

que aparecer um projeto que possa os atingir e prejudicar. E sendo prejudicial para a maioria dos trabalhadores, para o conjunto da sociedade e para o meio ambiente nós vamos nos posicionar contra. O Praça – Como vai ser feita a montagem do gabinete? Deputado Soares – A discussão está sendo feita com o intuito de organizar um gabinete que funcione, que tenha racionalidade, lógica e eficácia permanente, que funcione em todos os seus aspectos desde o recebimento da demanda até o encaminhamento da deman-

da, assim como toda análise dos projetos em debate na Assembléia Legislativa, toda análise das relações do governo que precisam ser fiscalizadas. Nosso desafio é ter uma participação parecida para cada regional, nós temos um mandato que é estadual. Nosso mandato não é regionalizado, ele é estadualizado. Temos que ter uma participação parelha no Estado inteiro. Não adianta concentrar todo mundo dentro do gabinete, até porque o espaço físico é pequeno e deixar a base sem um mecanismo de ligação com o gabi-

nete, uma representação. Ou seja, os praças não podem ficar em sua região sem saber o que está acontecendo no gabinete, e nem o mandato ficar na Capital sem saber o que está acontecendo em cada região do Estado. Precisamos nos estruturar para em cada momento saber o que está acontecendo em cada região do Estado, e fazer o meio de campo. Esse é o desafio, é complexo porque a estrutura é limitada diante das necessidades, até porque recebemos votos nas 293 cidades catarinenses. Sendo um mandato estadualizado, teremos que nos virar para garantir que não vamos deixar descoberta nenhuma região do Estado. Todo mundo que participar do mandato vai ter que ter essa consciência porque são 293 cidades e precisamos ter uma resposta em cada local, em cada momento. O Praça – Qual a importância dessa experiência parlamentar? Deputado Soares – É fundamental saber que o deputado não vai resolver os principais problemas que nós temos, e a gente falou isso em todos os lugares que visitamos durante a campanha. Quem pode resolver isso é a classe organizada, a categoria nas questões específicas e a classe pelo interesse geral da sociedade. Nós temos que nos manter unidos e ampliar nossa capacidade organizativa. Há muito para avançar ainda, e é isso que vai ser a diferença. Toda vez que tiver um projeto importante na Assembléia Legislativa nós temos que estar lá, temos que lotar a assembléia. Um deputado sozinho esperneando não resolve o problema, vai ser um voto sozinho que vai ser até

ridicularizado pela maioria. O desafio do mandato é manter esse clima de mobilização permanente ou possibilidade de mobilização sempre que necessário, tirando isso vai dar errado. Se considerar que ‘agora nós elegemos um deputado, ele vai lá e resolve nosso problema, acerta com o governador e nós podemos nos desmobilizar’, se pensar dessa forma vai dar errado. Necessariamente vai dar errado, não tem jeito de dar certo se pensar dessa forma, que o deputado vai resolver. Quem resolve, o motor da história são os trabalhadores organizados. O parlamento é para assinar a ata, botar no papel aquilo que já está decidido na sociedade, o que vai para o papel é aquilo que a correlação de forças da sociedade permite. É claro que muitas vezes a correlação de forças da sociedade quer uma coisa e as manobras no interior do poder Legislativo conseguem burlar a vontade da maioria. Por isso que essa maioria, além de organizada, tem que estar atenta para o que está acontecendo e conhecer o teor de cada medida, cada projeto, cada emenda, isso tudo faz parte do processo organizativo. O mandato é uma ferramenta, um instrumento, não passa disso. Se pensar o mandato e o parlamentar como um objetivo em si e a solução dos problemas, vai dar errado. Temos que pensar o mandato e o parlamentar tão somente como uma ferramenta e um instrumento. Vamos tocar a mesma luta, pelo mesmo caminho e pelo mesmo método. O que mudou é que agora temos uma ferramenta a mais, que é o mandato de deputado estadual.

DENÚNCIA No Presídio de Xanxerê, policiais trabalham em condições desumanas. Em baixo da guarita de guarda, fica um cubículo usado como alojamento de cerca de 2m2, que cabem duas pessoas no máximo e serve para dormir e fazer as refeições. Para entrar no "Cafofo do Bin", os policias tem que praticamente se rastejar. Em contrapartida, na cela, os presidiários tem até ventilador. As fotos foram tiradas de um celular de um policial.

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VITÓRIAS

APRASC já conquista quatro itens da pauta de reivindicações enviada aos candidatos Após sua reeleição, governador LHS já começou a cumprir promessas. Mas ainda falta muito

O que falta para o governador cumprir SALÁRIO – Incorporar todos os abonos, no total de R$ 390 em fevereiro de 2007. – Parcelar em duas vezes, em março e abril de 2007, o que faltar para o cumprimento integral da Lei 254. Só isso proporcionará definitivamente, justiça salarial na caserna. – Criar, ainda nos dois primeiros anos do próximo mandato, uma indenização, a ser incorporada no salário dos servidores da segurança, a título de periculosidade e insalubridade. PROMOÇÕES

Ainda como candidato a reeleição, Luiz Henrique entrega projeto que beneficia praças reformados

Desde a assembléia de 17 de outubro, quando a APRASC organizou uma sabatina com os candidatos a governador, os praças já foram vitoriosos em quatro reivindicações encaminhadas através de carta aos postulantes do Centro Administrativo. Conquistaram, em primeiro lugar, a unificação do contracheque e o Curso de Aperfeiçoamento de Sargentos (CAS). Recentemente, foi sancionado o Projeto de Lei Complementar 56/06 que beneficia sargentos e subtenentes da reserva julgados incapaz de acordo com a lei – por terem sofrido acidente durante o trabalho ou moléstia profissional. Eles receberão proventos recalculados com base nos vencimentos correspondentes ao grau hierárquico imediato ao que possuía na ativa. Esta lei complementar corrige uma injustiça da Lei 333, que altera a aposentadoria dos subtenentes, e foi produzida para atingir diretamente 99 subtenentes e sargentos excluídos. Além desses três itens, já foi para a Assembléia Legislativa o projeto de lei complementar que transfere vagas do quadro de praças combatentes para o quadro especial de cabos e terceiros-sargentos da Polícia e do Corpo de Bombeiros Militar. O denominado PLC 62/2006 prevê 380 vagas para policias e 150 vagas para bombeiros, entre cabos e terceiros-sargentos, totalizando 530 vagas de praO Praça - dezembro 2006

ças para 2007. Assinado pelo governador Pinho Moreira, o projeto surgiu da iniciativa do presidente da APRASC e do deputado estadual eleito Amauri Soares, quando eles escreveram e publicaram a carta de reivindicações aos candidatos ao governo do Estado. A carta pedia “promoções como medida emergencial”. A intervenção direta do governador reeleito Luiz Henrique da Silveira foi fundamental para concluir a negociação, que contou ainda com o empenho do chefe da Casa Militar, coronel João Luiz Botelho, e o apoio do comandante-geral da PM, coronel Edson Souza. De acordo com o presidente da APRASC, cabo Manoel João da Costa, as lideranças dos praças não esperam surpresas durante a tramitação do projeto de lei complementar na Assembléia e o texto pode ser aprovado na íntegra. Para o presidente, o projeto praticamente elimina a discriminação com relação às promoções dos praças mais antigos, que há muitos anos não eram promovidos. “A Lei 13.330/2005 e mais esse projeto vem para somar. Não vai resolver integralmente o problema de promoções, mas vai amenizar a defasagem”, afirma. Com a reeleição do governador Luiz Henrique da Silveira, ele já começou a cumprir as promessas depois do estrondoso apoio dos praças na assembléia de 17 de outubro. Mas ainda falta muito.

– Iniciar imediatamente o processo de seleção para a realização do Curso de Acesso ao Quadro de Oficiais Auxiliares (QOA).

PLANO DE CARREIRA – Garantir que todas as vagas de terceiros-sargentos e de cabos sejam preenchidas durante o ano de 2007, iniciando os cursos já no mês de março. Havia o compromisso de terem sido iniciados os cursos já em 2006, mas – por razões inexplicáveis de segunda instância de governo – tudo ficou parado. O Plano de Carreira, que é uma importante conquista ainda não se tornou uma realidade perceptível para a maioria dos praças. TERCEIRA ANISTIA – Cancelar imediatamente todas as punições motivadas por perseguição em razão de participação e organização de atividades da APRASC, independente do motivo alegado para a punição. A partir de mecanismos técnicos manipulados de má-fé, a anistia anterior foi cumprida parcialmente. – Arquivar todos os inquéritos policiais militares (IPM) e processos administrativos disciplinares (PAD) motivados por perseguição e que ainda estão em curso. – Revogar o atual Regulamento Disciplinar, substituindo-o por um Código e Ética e Disciplina, que elimine a prisão e detenção na esfera administrativa, que se volte para as necessidades da população e não seja uma peça a serviço do autoritarismo, da arrogância e da prepotência dos superiores sobre os subordinados. DEFESA DAS INSTITUIÇÕES – Somos contrários à instituição do soldado temporário. Isso é a precarização da Polícia Militar. A APRASC defende que, ao invés de se contratar 1.500 soldados temporários, se contratem mais 500 policiais militares efetivos e se fortaleça o quadro de servidores civis da Polícia Militar. O próprio Ministério Público do Trabalhou enviou recomendação à Secretaria de Segurança Pública determinando que o Estado realize concurso público para suprir as vagas necessárias na PM, como alternativa à contratação dos soldados temporários. – Somos contrários à criação da guarda penitenciária, que deixará ainda mais vulnerável o sistema prisional. – Defendemos o fortalecimento das instituições, medidas efetivas para a integração das polícias civil e militar, que contemplem de forma igual as duas instituições. A Polícia Militar não pode continuar sendo considerada como auxiliar da Polícia Civil, como acontece na prática na maioria das pequenas cidades. É preciso mais investimento do governo do Estado e do governo Federal para a segurança pública, pois as prefeituras não têm obrigação de sustentar instituições estaduais, – A Polícia Militar deve reorganizar sua estrutura, capacitar seu pessoal para proceder o Termo Circunstanciado, como prevê e Lei 9.099. Isso é medida possível hoje, pois o que defendemos é a polícia de ciclo completo, mudança necessária na Constituição Federal. 7


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ESPECIAL

A Polícia Militar de Santa Catarina não tem dados estatísticos sobre os casos de suicídio ou tentativa de auto-extermínio entre os militares do Estado, muito menos um estudo aprofundado sobre o que pode levar um policial a se matar. Mas a percepção do secretário-geral da APRASC, sargento Edson Fortuna, é que o número de suicídios tem aumentado ao longo do tempo entre os praças policiais militares do Estado. “Esse tipo de fato tem acontecido com freqüência entre o nosso grupo”, atesta o diretor da APRASC, que além de policial militar é graduando em Serviço Social na Universidade Federal de Santa Catarina. A opinião do sargento Fortuna, apesar de não ser apoiada em dados científicos, pode ser embasada com a pesquisa acadêmica realizada pela policial militar Geralda Eloisa Gonçalves Nogueira desenvolvida para sua dissertação de mestrado intitulada “Análise de tentativas de auto-extermínio entre policiais militares: um estudo em saúde mental e trabalho” para o Departamento de Psicologia da Universidade Federal de Minas Gerais, possivelmente o único trabalho no Brasil sobre o assunto. A pesquisadora estudou o “que leva policiais militares a tentarem se matar” e “as possíveis relações desse ato com seu contexto profissional” e chegou a conclusões perturbadoras. Primeiro e mais importante: fatos traumáticos acontecidos em circunstâncias de trabalho permitem indicar que a atividade profissional pode desempenhar papel importante no desencadeamento de quadros de transtornos psíquicos “tendo relevância inclusive nas tentativas de suicídio”. É preciso destacar, no entanto, que, de acordo com a autora, embora os principais determinantes do adoecimento do trabalhador sejam sociais, a expressão do sofrimento é singular. A militar também citou outros pesquisadores que indicam que essa categoria é com freqüência considerada como tendo altas taxas de suicídio “maiores do que as da população em geral”, tanto entre militares das Forças Armadas como das policiais estaduais. A realidade também confirma a tese. Somente esse ano, tem-se notícia que um soldado de Xanxerê e outro de Florianópolis foram vítimas de suicídio. Segundo a pesquisadora, foi possível identificar a “predominância da graduação de soldados” e os militares com “vivência de dificuldades financeiras” como os dois grupos com mais problemas de saúde mental no trabalho, a partir de dados obtidos em pesquisa de campo em hospital psiquiátrico. As informações levantadas também indicam os dois diagnósticos mais freqüentes entre os policiais militares. Primeiro, os de transtornos mentais e de comportamento gerados pelo uso abusivo de bebida alcoólica e, segundo, os transtornos de humor, mais especificamente a depressão. Com base nes-

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O Grito, Edvard Munch (1893)

Suicídio de policiais militares: entre a omissão e a realidade

É preciso reconhecer o suicídio como um problema presente ses dados, a autora afirma que a associação entre risco para o suicídio e o transtorno de humor, especialmente depressão acompanhada de alcoolismo, é significativa, e sugere que “não é possível prevenir o suicídio nessas instituições sem abordar os problemas de depressão e de uso de álcool”. Em entrevista para a revista Caros Amigos, o ex-presidente da APRASC e deputado estadual eleito, sargento Amauri Soares, resumiu bem a situação: “Nós somos uma categoria sem direitos. Só em 1988 conseguimos o direito de votar e ser votado, depois de 170 anos de existência da PM. O soldado não tem vida social, ele trabalha na festa, quando todos se divertem, e tira folga quando não há ninguém na rua. O soldado vive em solidão. Talvez por isso tenha tanto caso de alcoolismo, depressão, suicídio. Não é querer justificar, mas é uma vida difícil. Enfrentar a morte, todos os dias, e em solidão.” História militar - A segunda conclusão importante apontada pela pesquisadora é que a especificidade do trabalho militar é parte importante da deterioração da saúde desse trabalhador. As tarefas impostas aos policiais militares em seu trabalho os obrigam a lidar com a violência urbana em suas diversas formas de expressão, “tudo isso deve ser feito sob pressão”, expõe a autora, acrescentando que “essas condições tornam alto o grau de imprevisibilidade do trabalho operacional e significativa a carga psíquica envolvida”. Acrescente-se a isso as peculiaridades históricas das instituições militares, as concepções de hierarquia e disciplina

e suas conseqüentes punições e castigos. O trabalho da pesquisadora é paradigmático porque Minas Gerais foi palco do movimento conhecido como “revolta dos praças”, em junho de 1997, que se estendeu para outras instituições do Brasil, conforme relatado pela própria autora. Na ocasião os militares se insurgiram por melhorias salariais e pela revogação do Regulamento Disciplinar da PMMG, que vigorou até 18 de junho 2002, quando entrou em vigor o código de ética. A pesquisadora, através de uma citação, aponta algumas características da PM mineira oriundas da tradição militar: “desconfiança”, “conservadorismo”, “postura e atitudes autoritárias” e a “dissimulação”. Ainda citando outro autor, a estudiosa revela um comportamento padrão: “a PMMG seria uma instituição fechada, com estilo gerencial autocrata, com pouco espaço para a criatividade, cujo ambiente de trabalho não valoriza, através de benefícios, o desenvolvimento humano e profissional e onde as relações de trabalho seriam caracterizadas pela utilização do poder para anular oposições e dominar subordinados”. Na Polícia Militar de Minas Gerais, o transtorno mental é uma das cinco principais causas de reforma, informa a pesquisadora. O auto-extermínio é um tema controverso e muitas vezes omitido, principalmente na PMSC, que tem dificuldade em registrar essas ocorrências internas devido, em primeiro lugar, a falta de estrutura para levantar os dados e, em segundo lugar, ao constrangimento da instituição em não poder oferecer um tratamento para os casos. O meio militar oferece ainda mais obstáculos por ser tradicionalmente um ambiente afoito a transparência, evocando sempre o fantasma da “segurança” para omitir informação. Solução - O sargento Fortuna acredita que o grande problema em Santa Catarina é não haver acompanhamento e estudos sobre os casos, o que facilitaria a resolução das doenças e poderia melhorar a estrutura de tratamento. Ele propõe a criação de um grupo interdisciplinar – formado por psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais – em cada órgão da Polícia Militar. A policial militarpesquisadora Eloisa propõe dar voz ao trabalhador, assim “é possível tomar conhecimento de desgastes e outras perdas no campo afetivo ou social que dificilmente poderiam ser identificadas a partir de outras abordagens”. Segundo ela, a Organização Mundial da Saúde sugere a adoção de uma série medidas para a prevenção de suicídio como, por exemplo, o “afastamento da atividade operacional dos envolvidos em ocorrências com mortos e feridos e o encaminhamento e acompanhamento de policiais militares com problemas emocionais”. Outra ação de importante valor é reconhecer que suicídio ou tentativa de auto-extermínio entre policiais militares é um problema concreto.

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