A CONSTRUÇÃO DA EXTENSÃO POPULAR NA UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA: UM PANORAMA HISTÓRICO
ARAÚJO, Isabelle Maria Mendes de Acadêmica da Universidade Federal da Paraíba - Brasil
ARAÚJO NETO, Raimundo Acadêmico da Faculdade Santa Emília de Rodat - Brasil
BARBOSA, Iara Borges Acadêmica da Universidade Federal da Paraíba - Brasil
BRANDÃO, Ana Priscila S. Acadêmica da Universidade Federal da Paraíba - Brasil
BRASIL, Evi Clayton de Lima Acadêmico da Universidade Federal da Paraíba - Brasil
BRITO, Vilton Késsio F. Acadêmico da Universidade Federal da Paraíba - Brasil
CARVALHO, Cleidiane Araújo de Acadêmica da Universidade Federal da Paraíba - Brasil
CUNHA, Naja Elizangela Queiroz Acadêmica da Universidade Federal da Paraíba - Brasil
FERREIRA, Jéssica Thayse Valeriano de Sousa Acadêmica da Universidade Federal da Paraíba - Brasil
LEITE, Francisco Douglas Cabral Acadêmico da Universidade Federal da Paraíba - Brasil
PEREIRA, Rebecca Cabral de Figueirêdo Gomes Acadêmica da Universidade Federal da Paraíba - Brasil
ROCHA, Felipe Ximenes Muricy da Acadêmico da Universidade Federal da Paraíba - Brasil
RODRIGUES, Carol Cardoso Acadêmica da Universidade Federal da Paraíba - Brasil
SILVA, Tassyane Gonçalves Acadêmica da Universidade Federal da Paraíba - Brasil
RESUMO A perspectiva de Extensão, e este próprio termo, deve-se ao surgimento das Universidades Populares na Europa que objetivavam se estender à população, disseminando o conhecimento acadêmico para o povo. No debate do compromisso da universidade com a sociedade destacam-se o Congresso Universitário do México (1908) e o Encontro de Estudantes de Córdoba (1918). No Brasil, os Movimentos de Educação de Base e as Comunidades Eclesiais de Base, a União Nacional dos Estudantes, com seus Centros Populares de Cultura (1961) e as sistematizações feitas por Paulo Freire, contribuindo para o surgimento da Educação Popular, influenciam o desenvolvimento de práticas extensionistas de caráter popular. A partir da década de 60, na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), surgem práticas diferenciadas de Extensão com algumas características relacionadas a ações do que atualmente se entende como Extensão Popular nesta universidade. Dentre as características estão: a Educação Popular, a construção de uma nova ética cultural, orientada por valores como trabalho, justiça e solidariedade, e a luta por outra hegemonia social, pautada nestes princípios. Este artigo objetiva construir um panorama histórico do desenvolvimento da Extensão Popular na UFPB a partir do surgimento e fundamentação de algumas de suas práticas em projetos desta universidade. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, realizada através de uma técnica de triangulação entre método Histórico e método de História Oral. Tem-se para coleta de dados, respectivamente: investigação de documentos históricos e entrevista semi-estruturada, focalizada, com perguntas norteadoras. Os entrevistados foram selecionados por sua presença e atuação no desenvolvimento da Extensão Popular na UFPB. As representações encontradas são retornadas quando em concordância lógica. Dentre os resultados encontrados, tem-se os seguintes momentos históricos: até a década de 70, da Extensão Não-Institucional e das Atividades Assistenciais, caracterizada por ações voluntárias de um lado e por rotinas de assistência e projetos assistencialistas de outro – daí identificam-se dois eixos de atuação que mantinham diálogo entre si, o daqueles considerados subversivos, em caráter voluntário e individual, e o assistencial, composto pelas rotinas institucionais e pelos planos do governo militar; de 1979 a 1993, da Formação de Grupos de Ação Comunitária, em continuidade ao primeiro eixo, incorporando princípios da Educação Popular e de interdisciplinaridade, em conexão a movimentos sociais; de 1993 a 1999, da Institucionalização da Extensão, com o surgimento da figura dos Projetos de Extensão e das políticas de incentivo e fomento; de 1999 a 2005, da Construção da Concepção de Extensão Popular, a partir da formação do Grupo de Pesquisa em Extensão Popular, com a teorização sobre a Extensão Popular, a criação da Articulação Nacional de Extensão Universitária e o fortalecimento dos Estágios de Vivência; a partir de 2005, da Construção do Movimento de Extensão Popular, com a criação da Articulação Nacional de Extensão Popular, a consolidação de diversos conceitos e o diálogo entre os projetos de extensão popular. A construção deste panorama é entendida de forma processual e identifica-se que o desenvolvimento da Extensão Popular dá-se de forma dialógica e voltada ao exercício da práxis. Palavras-chave: Extensão Popular; Educação Popular; Extensão Universitária
INTRODUÇÃO
A perspectiva de Extensão, e este próprio termo, deve-se ao surgimento das Universidades Populares na Europa, com o objetivo de fazer com que as universidades se estendessem à população para disseminar os conhecimentos técnicos produzidos na Academia para o povo. Surge na Idade Médica, assim como os movimentos sociais, de resistência à opressão feudal e de luta contra dominação que se estabelecia pelo capitalismo nascente. Em Portugal realizava-se a Extensão a partir dos conventos e casas de misericórdia, dando a esta um caráter filantrópico e de tratamento da pobreza que se associa à instituição universitária com a criação das grandes universidades pela Igreja. O termo propriamente dito Extensão Universitária é encontrado pela primeira vez nas ações desenvolvidas pela Universidade de Cambridge, Inglaterra. Neste contexto, surgem também a Extensão Rural e a Extensão Universitária Geral nos Estados Unidos da América, com caráter prestador de serviços à sociedade e a grupos econômicos. São encaradas como oportunidades de testar e praticar o conhecimento e as técnicas produzidas na academia, assim como trazer recursos para a universidade e financiar novas pesquisas. Têm-se aí a Extensão Universitária como uma política institucional, indispensável para o caráter universitário. Neste debate do contato essencial entre universidade e sociedade ressaltase o Congresso Universitário do México, em 1908, e sobretudo o Encontro de Estudantes de Córdoba, em 1918, que afirmam pela primeira vez a necessidade do compromisso social da Universidade e da divulgação de sua produção para os povos. Tinha-se um caráter combativo, crítico das instituições e contrário às ditaduras nacional e ao imperialismo internacional. Contudo, eram reivindicações que hierarquizavam o conhecimento e assumiam um caráter assistencial. No Brasil a Extensão Universitária se incorpora gradualmente a partir de cada uma destas perspectivas, não separadas pelo tempo, mas em contemporaneidade, confrontando-se a partir das ações de movimentos populares e das propostas de grupos políticos em oposição às políticas de Estado e grupos capitalistas. A Universidade do Brasil, primeira universidade e base para construção das demais, a Extensão figura institucionalmente para a propagação e defesa dos interesses na nação, servindo ao Estado. As duas primeiras Leis de Diretrizes e Bases da Educação, em 1934 e 1961, reduzem a Extensão a serviços prestados à população e a cursos de extensão, respectivamente. A criação da União Nacional dos Estudantes em 1938 e suas Declaração da Bahia e Carta do Paraná (1961) resgatam o ideal de Córdoba, combatendo estas perspectivas e criando os Centros Populares de Cultura, exercitando, junto
a outros movimentos populares, o que vinha se defendendo como o ideal de Popular. Estas pressões culminam, ainda, com a lei que cria o princípio da indissociabilidade ente Ensino, Pesquisa e Extensão em 1968. Contudo, este preceito não se consolidando na prática. O país encontra-se no período da ditadura militar. Nesta conjuntura, os Movimentos de Educação de Base e as Comunidades Eclesiais de Base influenciam o desenvolvimento de práticas extensionistas de caráter popular e, com as sistematizações feitas por Paulo Freire, entre outros, contribuem para o surgimento da Educação Popular. Na época, a Extensão com objetivo emancipador desenvolvia-se informalmente, em ações pontuais e voluntárias de pessoas pertencentes à comunidade acadêmica, sobretudo nos movimentos citados. Na década de 70, neste período de ditadura, são criados os projetos Rondon, CRUTAC e Mauá, com um intuito maior de promoção do controle social, mas dando espaço a grupos que, dando continuidade a sua inserção nas comunidades e aliando-se a outros movimentos produzem críticas sólidas a estes projetos e partem para a construção de outras iniciativas, de origem libertária e contra-hegemônica. Todas estas práticas extensionistas vão se desenvolvendo até 1985, quando foi criada a Comissão Nacional para a Reformulação da Educação Superior, em que se verificou a fragilidade do conceito de Extensão Universitária no país e, assim, iniciou-se um processo de fortalecimento desta atividade acadêmica, culminando em 1987 com a formação do Fórum Nacional de Pró-Reitores de Extensão. Constroem-se, então, políticas públicas de fomento a esta prática, com perspectivas de eminência progressista. Todavia, pelo conflito entre diversos interesses, individuais sobrepondo-se aos coletivos, e, em destaque, pelas pressões da abertura neoliberal pelas quais o país passava, as propostas avançadas de Extensão Universitária se enfraquecem e, carentes de financiamento, perdem-se entre atividades de arrecadação de fundos para outros projetos de minimização de danos à população carente. Desenvolve-se daí outra noção Extensão, focada no tratamento dos excluídos e em propostas basais de inclusão da massa pobre da sociedade, como formas de resistência ou de generosidade. Restringe-se então, com fortes conseqüências até os dias de hoje, o entusiasmo pela transformação social vislumbrada a partir da Extensão e da construção de uma nova universidade. Porém, alguns focos de efervescência se conservam e expandem, desencadeando práticas diferenciadas de Extensão, lutando em busca desta transformação. Estas, apresentam características relacionadas ao que atualmente se entende como Extensão Popular. Dentre estas características estão: a Educação Popular, a construção de uma nova ética cultural, orientada por valores como trabalho, justiça e solidariedade, e a luta por outra hegemonia social, pautada nestes princípios.
A Universidade Federal da Paraíba é um destes locais, acumulando algumas experiências populares de Extensão.
OBJETIVO GERAL Construir um panorama histórico da Extensão Popular na UFPB a partir do surgimento e da fundamentação de algumas de suas práticas em projetos desta universidade.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS - Resgatar momentos históricos que resignificaram a extensão na UFPB e culminaram em características atuais da Extensão Popular na mesma. - Identificar as primeiras práticas de Educação Popular como fundamento da Extensão Universitária na UFPB.
METODOLOGIA Trata-se de uma pesquisa qualitativa, realizada através de uma técnica de triangulação entre método Histórico e método de História Oral. Tem-se para coleta de dados, respectivamente, as técnicas: investigação de documentos históricos e entrevista semi-estruturada, focalizada, com perguntas norteadoras. A primeira, que ocorre em documentos históricos e trabalhos científicos da Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários da Universidade Federal da Paraíba (PRAC/UFPB), da Editora Universitária da UFPB e em outros meios de divulgação, entre livros, revistas, jornais, boletins, compilados e publicações diversas, produzidas no âmbito da Extensão Universitária e da Educação Popular, dá suporte a análises de coerência cronológica e factual, servindo também para o exame crítico das representações que surgem a partir dos relatos vividos, presenciados e historiados nas falas dos entrevistados. As entrevistas servirão para resgate de elementos históricos que ficaram concentrados na memória pessoas que se constituíram referências no processo de construção prática, política e ideal dos fatos que fundamentaram e constituíram as práticas de Extensão Popular na universidade. Servirão também de elos para o encadeamento lógico dos acontecimentos e das afirmações. Serão de natureza semi-estruturada e focalizada, com auxílio de gravador, sendo suas perguntas de caráter norteador. Foram selecionados, como citado, 20
entrevistados cuja escuta foi considerada de extrema importância para compreensão da história e das práticas atuais de Extensão Popular, a citar: prof. Dr. Eymar Mourão Vasconcelos, Emmanuel Falcão, prof. Dr. José de Melo Neto, prof.ª Dr.ª Glaucia de Luna, prof. Dr. Genaro Ieno, Dr. Francisco Xavier, prof. Dr.ª Iolanda Carvalho de Oliveira, prof. Ms. Patrícia Serpa, prof. Dr. Wilton Padilha, prof. Dr. Ivan Targino, prof. Vinícius Ximenes, prof. Dr. Hermano José Falcone, prof. Dr. Lindemberg Medeiros de Araújo, prof. Dr. Alder Júlio Calado, prof.ª Ms. Rossana Serrano, prof.ª Ms. Marísia Oliveira, prof. Ms. Dailton Lacerda, Pedro Cruz, prof. Ms. Socorro Trindade e prof. Dilma Lucena. A seleção destes indivíduos foi realizada entre as mais diversas áreas e funções da universidade, funcionários técnico-administrativos, professores e estudantes, participantes de grupos políticos institucionais, movimentos sociais, organizações estudantis e partidos, e, ainda, nomes na construção do conhecimento em Extensão Universitária e Educação Popular. Isto possibilita a investigação por diversos ângulos, refletindo-se de forma dialética e dialógica as significações atribuídas e diminuindo as possibilidades de distorção da realidade. As representações encontradas são retornadas quando em concordância lógica, procedendo à busca das razões quando houver discordância entre variáveis dentre os fatos encontrados, através dos demais elementos contidos nas entrevistas, em nova rodada de entrevistas, direcionadas a este fim, e nos documentos históricos de suporte. Para entrevista base, utilizou-se um questionário com perguntas norteadoras realizadas em profundidade, a citar: “Fale um pouco de sua vivência e suas experiências em extensão na UFPB, e nesse contexto, como você visualiza o desenvolvimento da Extensão Popular na universidade.” “Seu projeto ou sua prática de extensão na UFPB já iniciou com práticas de Educação Popular?” “Caso não, como foi a inserção da Educação Popular em suas práticas?” “Como você percebe a inserção da Educação Popular no seu projeto ou suas práticas de extensão?” “O que motivou o desenvolvimento do seu projeto ou de suas práticas de Extensão Popular?” “Que fatores serviram de referência e influenciaram o desenvolvimento do seu projeto ou de suas práticas de Extensão Popular?” “O que motivou desenvolver a Educação Popular em seu projeto ou suas práticas de extensão?” “Que fatores serviram de referência e influenciaram as práticas de Educação Popular em seu projeto ou em suas práticas de extensão?” “Qual era a conjuntura da comunidade quando do início do seu projeto ou de suas práticas de Extensão Popular?” “Você poderia citar quais linhas teóricas, princípios e práticas que enxerga em seu projeto ou prática de extensão?” “Que fatos históricos enxerga como importantes para uma resignificação da Extensão na UFPB?” “Neste contexto, que fatores externos à UFPB influenciaram o desenvolvimento da Extensão Popular na universidade e que motivaram ou dispararam mudanças na mesma ou nos projetos?” “Se você pudesse dividir o desenvolvimento da Extensão Popular na UFPB em momentos históricos, como retrataria essas fases?”
A abordagem é realizada através da identificação de variáveis nos registros documentais e das entrevistas, as quais são agrupadas em categorias, constituindo os resultados desta pesquisa e delineando os momentos históricos, os quais serão delimitados por marcos históricos importantes para a resignificação das atividades extensionistas na universidade e integram a Extensão Popular na UFPB, fundamentando a mesma.
RESULTADOS
No período pré 64, em que tiveram início os governos militares, podemos destacar na Paraíba a Campanha de Educação Popular da Paraíba (CEPLAR), instituído pelo governo estatual e sustentado por figuras particulares pertencentes às igrejas católica e protestante, juntamente com alguma entidades colaboradoras. Participavam estudantes da Universidade Federal da Paraíba participantes do Juventude Universitária Católica (JUC), desenvolvendo trabalhos de círculos de cultura e teatro popular antes mesmo das atividades de Paulo Freire em 1963 na cidade de Angicos-RN. Um embrião extensionista popular aí se constituída, em atividades institucionalmente descoladas, fatos que perdura até os ano de 1993, com a regularização de atividades de projetos de Extensão Universitária na UFPB. Com a repressão militar, muitos trabalhos de educação popular se perderam, sendo consideradas comunistas e subversivas pelo regime. Contudo, alguns continuaram desenvolvendo-se de forma não oficial e mesmo de resistência, por indivíduos das Juventude Operária Católica (JOC), Juventude Estudantil Católica (JEC) e JUC, da Ação Popular (AP), do PCB e outros indivíduos e grupos participantes do Movimento de Educação de Base (MEB) e do que veio a ser chamado de Movimento de Cultura Popular (MCP), do qual Paulo Freire era um dos integrantes. Nesta mesma época a UNE desenvolvia atividades nos CPCs com semelhança e interseção à construção da Educação Popular a partir desta conjuntura social e política. Outros grupos na UFPB se entusiasmavam com o contato com as massas oprimidas e com a aplicação de seu conhecimento universitário, encontrando campo em atividades com fitoterápicos e assistência à saúde, essa última sendo a única atividade institucional de Extensão, unicamente pelo seu contato com a sociedade, ainda com características assistencialistas. Destaca-se neste período as atividades do Centro Rural Universitário de Treinamento e Ação Comunitária (CRUTAC), em que atividades de estágios eram desenvolvidas no meio rural, próxima às classes populares, de caráter interdisciplinar e multiprofissional. O Internato Médico na época ocorria no próprio CRUTAC, sendo uma experiência rica e um choque de realidades para
os estagiários. Recebeu-se financiamento próprio, como pelos recursos de convênio com a FioCruz. A partir do final da década de 70 uma explosão de grupos de núcleos passa a ocorrer, com estímulos da Reitoria, que havia passado por mudança de gestão. São criados os Núcleos de Pesquisa e Extensão da Pró-Reitoria de Assuntos Comunitários (PRAC): Núcleo de Pesquisas Populares (NUPPO), Núcleo de Documentação da Cultura (NUDOC), Núcleo de Teatro Universitário (NTU) e Núcleo de Arte Contemporânea (NAC). Houve um extenso resgate da cultura popular da Paraíba e atividades culturais que geraram um grande impacto acadêmico. Em 1982 surge o Setor de Movimentos Populares (SEAMPO), um grupo ligado ao Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, por professores que fizeram questão de não se oficializar, evitando hierarquia e repressões por parte do Governo e da Reitoria. Também, nesta década desenvolvem-se atividades de Educação Popular nos Campi de Cajazeiras e Campina Grande. Na saúde, em 1979, surge o Estágio Rural Integrado (ERI), fruto de um trabalho de monografia acadêmico, que seguiu tradições do CRUTAC e tornouse multiprofissional algum tempo depois, cumprindo um importante papel de integração entre os cursos do Centro de Ciências da Saúde e tendo repercussões importantes para o movimento estudantil. A nível nacional vários movimentos transformadores se aglutinavam, gerando a Luta pela Terra, a Reforma Sanitária, o Partido dos Trabalhadores (PT), a Central Única dos Trabalhadores (CUT), as Executivas de Curso Estudantil, inicialmente a Federação dos Estudantes de Agronomia (FEAB) e a Direção Executiva Nacional dos Estudantes de Medicina (DENEM) – estudantes que participaram das construções da Luta pela Terra e Reforma Sanitária. Nesta década de 80 encorpa-se a luta pela redemocratização do país, culminando na quebra do Regime Militar, nas Diretas Já, na Constituição de 1988 e na Criação do Sistema Único de Saúde (SUS), dentre alguns acontecimentos importantes. Neste sentido que, tendo em vista a grande avaliação nacional da educação superior, a formalização da fragilidade das atividades de Extensão nas universidades e do significado deste próprio termo, surge em 1987 o Fórum Nacional de Pró-Reitores de Extensão da Universidade Públicas Brasileiras (FORPROEX), formulando uma concepção progressista de Extensão Universitária e aglutinando diversas intencionalidades de transformação social a partir da Universidade. Ainda nos anos 80, grupos estudantis se mobilizam para desenvolver atividades libertárias e emancipatórias, partindo de sua vontade de constituir grupos e desenvolver atividades diferenciadas junto a comunidades, com compromisso social. Então que na expansão de núcleos, de ações e do envolvimento com comunidades surgem em os NACs, Núcleos de Ação Comunitária, de Campina Grande e João Pessoa, em períodos diferentes e sem guardar nenhum diálogo aparente entre si. O NAC-CG pelo início da década, o
NAC-JP desenvolvendo-se em 1987, mesmo ano em que iniciam as atividades dos Estágios de Vivência em Comunidades (EVC). Estes dois últimos desenvolvem trabalhos que vão influencia definitivamente a Extensão na UFPB, pela sua perspectiva popular e pelo seu método, galgado na prática e repassado a projetos posteriores. Formam-se as primeiras atividades de visitas sistemáticas a casas, pelos estudantes do NAC, o embrião da Metodologia de Mobilização Individual e Coletiva (MET-MOCI) pelo EVC. Desenvolve-se por estes grupos a inserção na realidade, a parceria com os movimentos populares, a intervenção radical na estrutura social com o povo e o estudo e aplicação da Educação Popular. Continuando no fim de 80s, vários estudantes formados retornam à UFPB como professores, envolvendo-se com a política universitária, constituindo núcleos como o Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva (NESC), que existe até hoje, o Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (CERESAT), que futuramente compõe a Fundação Interuniversitária de Estudos e Pesquisas sobre o Trabalho (UNITRABALHO), o Grupo Interdisciplinar de Plantas Medicinais (GIPLAN), entre outros, apoiando ações extensionistas na universidade e coordenando futuramente projetos de Extensão. Os estudantes do NAC, inicialmente da área de saúde, aglutinam-se com estudantes de diferentes cursos e grupos políticos, organizando o Movimento Catuipe, de onde se formaram muitas personalidades políticas locais, regionais e nacionais, que se elege para o DCE UFPB, influenciando expressivamente a política universitária. Estes diversos grupos, organizados em fins da década 80, confluem politicamente para eleger a Reitoria do ano de 1992, em que muitas transformações ocorreram. A Extensão Universitária foi regularizada, surgiu a figura dos Projetos de Extensão, fixou-se nova normas para os Núcleos de Pesquisa e Extensão e produziu-se várias outras resoluções que institucionalizaram as práticas extensionistas. Nesta época o maior programa de bolsas de Extensão do país era o da UFPB, vários recursos foram destinados ao desenvolvimento do compromisso social da universidade, um amplo processo de avaliação e produção conceitual desencadeou-se. Eram realizados encontros de Extensão na universidade e semanas acadêmicas nos Centros. Construiu-se uma revista científica de Extensão, meios e incentivos à produção e divulgação do conhecimento em Extensão Universitária. A equipe que compunha cargos da Reitoria e dava suporte a esta gestão eram formada por diversas pessoas que há algum tempo atrás desenvolviam ações populares informalmente. Respondendo à influencia nacional, o FORPROEXT tem neste período por presidente exatamente o Pró-Reitor da UFPB. Muitos conceitos e políticas que eram defendidas nesta universidade foram defendidos no Fórum, e nos anos de 1993 e 1994 surgiu o PROEXTE, primeiro programa nacional que incentivou e fomentou a Extensão Universitária no país. Por iniciativa da PRAC UFPB e do
Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) teve início o Programa Nacional de Educação da Reforma Agrária (PRONERA), em 1997, trazendo para a Universidade os movimentos populares do campo. Os teóricos da Extensão na Paraíba passam a subsidiar as discussões do FORPROEXT. Um dos membros do NAC tem participação fundamental na criação do Programa de Saúde da Família (PSF), o modelo de Atenção Básica em Saúde no país, tendo sua essência similar aos trabalhos iniciais desenvolvidos pelo NAC na favela dos Ipês em João Pessoa. Na década de 90 são criados os projetos que fundamentam definitivamente a prática da Extensão Popular na UFPB. Ainda em 1990 surge o Programa Interdisciplinar de Ação Comunitária (PIAC) a partir de experiências do EVC, em 1993 o Fisioterapia na Comunidade, que depois conflui com as práticas em 1997 do Projeto Grotão, que sofre influência das atividades do NAC e dispara a construção de vários outros projetos embasados pela Educação Popular na UFPB. Já nos anos 2000, constrói-se o Projeto Valentina, primeiro que surge já nesta perspectiva e no modelo do Projeto Grotão, agora PESPASF, passando algumas transformações e se tornando o Projeto Saruê. Outros projetos como SabuComu, Pró-Enf, PEPAST e Para Além da Psicologia, na área da saúde, formam-se e associam-se ao próprio PESPASF. Outros projetos como o Estágio Nacional de Extensão em Comunidades (ENEC), surgem dentro do PIAC e os projetos Núcleo de Extensão Popular Flor de Mandacarú (NEP) e a Incubadora de Empreendimentos Solidários Populares (INCUBES) surgem por influência do mesmo e de outras atividades da PRAC. Mais recentemente, o Projeto Práticas Integrais da Nutrição na Atenção Básica em Saúde (PINAB) e o Projeto Saruê surgiram por influência do Projeto Grotão e do PIAC. Nestes anos o extensionismo popular se propaga pelo país em grandes com o fortalecimento dos Estágios de Vivência em Comunidade, que em 2004 passam a se chamar de Jornada de Extensão Universitária (JORNEXU). São articuladas pelo movimento estudantil e pessoas do país inteiro vêm à Paraíba participar de espaços formativos e de inserção na realidade, divididos tradicionalmente em pré-vivência, com leitura de textos, debates e reflexões; a vivência, sendo dias em que se participa de todas as atividades da comunidade de inserção, desde alimentares ao trabalho e ao sono; e a pós-vivência, de avaliação do conhecimento, das experiências e dos sentimentos e de sistematização deste conhecimento. Todavia, o termo Extensão Popular ainda não é usado ao longo da década de 90. O termo popular vai se consolidando ao longo da história da UFPB e ganha força na década de 80, seguindo uma série de estudos e produção de trabalhos já nos anos 2000 que abordam significação. Procede-se também a uma série de estudos sobre Extensão, sua essência e sua trajetória histórica. Estes aparentes dois espaços diálogo da Extensão, desde o NAC e o EVC
e depois PEPASF e PIAC, travam pouco diálogo até fins dos anos 90. Um contato pontual realizou-se pelo ano de 1988, quando integrantes destes dois grupos encontram-se no projeto Rondon. Cada um adquire peculiaridades, PEPASF partindo do relacionamento com as famílias para a aproximação com os movimentos populares, enquanto PIAC trabalha na via oposta. Contudo, ambos com princípios libertadores, buscando a autonomia dos indivíduos, trabalhando micro e macropolítica, praticando Educação Popular e produzindo transformação na realidade. O diálogo existente entre estes grupos ocorre basicamente através das Executivas de Curso, o chamado movimento estudantil de área, sobretudo pela DENEM. Estudantes de Medicina organizavam EVCs pelo movimento de área e presenciavam ou participavam das atividades do Projeto Grotão. Foi só 1999, com a criação do Grupo de Pesquisa em Extensão Popular (EXTELAR) que esse diálogo freqüente se tornou real. Ligado ao Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da UFPB, o programa aglutina representantes dos diversos setores praticantes de Extensão fundamentada pela Educação Popular e outros novos, fomentando a teorização sobre o que seria a Extensão Popular e oferecendo oportunidades de qualificação nos cursos stricto sensu do PPGE. A linha de pesquisa focada era exatamente Educação Popular. E pelo nome do EXTELAR que surge o batismo da Extensão Popular, por uma praticidade em falar este nome ao invés de “Extensão Orientada pela Educação Popular”. Simplesmente Extensão Popular. Mas carregando, devido ao EXTELAR, uma série de significações e sentido. Entretanto, no início dos anos 2000 ainda não se utilizava este termo. Apenas depois de muita produção e experiência nos projetos começa surgir uma crítica a denominação apenas “Universitária”. Constituía-se um bojo de muitas tendências políticas, ideais e intencionalidades distintas, desde o ideal capitalista, prestador de serviços, ao assistencialista, o inclusor e o emancipador. Algumas experiências nacionais trabalharam a possibilidade de celebração entre todas as tendências, como a Articulação (ou Ação) Nacional de Extensão Universitária (ANEXU), surgindo no primeiro Congresso Brasileiro de Extensão Universitária (CBEU), em 2001, tendo a Paraíba como expressivo núcleo articulador. Era organizada por extensionistas de todo o país e pelo movimento estudantil de área. Ganhou alguma repercussão, mas não conseguia fechar idéias ou posicionamentos. Não havia uma identidade neste espaço. Assim, várias críticas foram ganhando expressão, culminando com a sua falência no Congresso Iberoamericano de Extensão Universitário do Rio de Janeiro. Houve ainda a tentativa de criar uma Articulação Latinoamericana de Extensão Universitária, dando destaque à articulação entre os brasileiros e uruguaios que estavam no congresso e participando das discussões. Porém, uma relação ainda muito frágil e faltando-se organização naquele momento. Duas semanas depois, em dezembro de 2005, ocorre em Brasília o Seminário Nacional de Educação Popular, em que se consolidam várias críticas
aos espaços opressore e elitistas da Extensão, a exemplo do Iberoamericano, e diversas experiências e opiniões sobre como fazer uma Extensão Universitária diferenciada. Então que surge a Articulação Nacional de Extensão Popular, seguindo a lógica do EXTELAR. Deste ponto em diante a Extensão Popular passa ter um movimento nacional de respaldo e fomento, encontros com alguma freqüência e personificação de uma luta. Os projetos começam a denominar-se gradualmente Extensão Popular e a participar dos espaços de um movimento nacional que vai se construindo. Tem-se, demais, um espaço permanente de diálogo entre os projetos e vão se constituindo possibilidades e perspectivas de unidade na luta por uma transformação real da universidade e da sociedade.
CONCLUSÃO
Em relação ao desenvolvimento da Extensão Popular na UFPB, pode-se construir um panorama histórico, tendo os seguintes momentos históricos: Da Extensão Não-Institucional e das Atividades Assistenciais, até década de 70, caracterizada por ações voluntárias de um lado e por rotinas de assistência e projetos assistencialistas de outro – daí identificam-se dois eixos de atuação que mantinham diálogo entre si, o daqueles considerados subversivos, em caráter voluntário e individual, e o assistencial, composto pelas rotinas institucionais e pelos planos do governo militar. Da Formação de Grupos de Ação Comunitária, de 1979 a 1993, com a criação dos Núcleos de Pesquisa e Extensão e do ERI, em continuidade ao primeiro eixo, incorporando princípios da Educação Popular e de interdisciplinaridade, em conexão a movimentos sociais, como o Estudantil, o de Reforma Sanitária, o de Luta pela Terra e o de criação do Fórum de Pró-Reitores de Extensão. Da Institucionalização da Extensão, de 1993 a 1999, com o surgimento da figura dos Projetos de Extensão e das políticas de incentivo e fomento à Extensão Universitária, de 1999 a 2005, da Construção da Concepção de Extensão Popular, a partir da formação do Grupo de Pesquisa em Extensão Popular, com a teorização sobre a Extensão Popular, a criação da Articulação Nacional de Extensão Universitária e o fortalecimento dos Estágios de Vivência; Da Construção do Movimento de Extensão Popular, a partir de 2005, com a criação da Articulação Nacional de Extensão Popular, a consolidação de diversos conceitos e o diálogo entre os projetos de extensão popular.
REFERÊNCIAS
Neto, José F. M. Extensão Popular. João Pessoa: Editora Universitária UFPB, 2006. Neto, José F. M. Educação popular: enunciados teóricos. João Pessoa: Editora da Universidade Federal da Paraíba, 2004. 1 v. Neto, José F. M. Extensão universitária, autogestão e educação popular. João Pessoa: Editora da Universidade Federal da Paraíba, 2004. Neto, José F. M. Extensão universitária: diálogos populares. João Pessoa: Editora da Universidade Federal da Paraíba, 2002. Poerner, Artur J. O Poder Jovem. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1979. Nogueira, Maria das D. P. Extensão Universitária: diretrizes conceituais e políticas. Belo Horizonte: PROEX/UFMG, 2000. Vasconcelos, Eymard M. Educação Popular e a atenção à saúde da família. São Paulo: Hucitec, 1999. Freire, Paulo. Pedagogia do oprimido. 11ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982. Freire, Paulo. Extensão ou Comunicação? 4a ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979. Marconi, Marina de A.; Lakatos, Eva M. Metodologia científica. São Paulo: Editora Atlas, 2004. Lakatos, Eva M.; Marconi, Marina de A. Metodologia do trabalho científico. 5a ed. São Paulo: Atlas, 2001. Minayo, Maria C. de S. (org.); Deslandes, Suely F.; Gomes, Romeu. Pesquisa social, teoria método e criatividade. Petrópolis: Vozes, 2007.