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para fins de promoção na carreira docente de Professor Associado IV para Professor Titular
Memorial apresentado à Universidade Federal de Pernambuco, como parte integrante dos requisitos para a promoção na carreira acadêmica para a Classe de Professor Titular, Processo no 23076.108388/2021-78, descrevendo de forma circunstanciada as atividades relevantes de ensino, pesquisa, extensão, gestão acadêmica e produção profissional, conforme a Resolução no 03/2014, do Conselho Universitário, aprovada em 10 de junho de 2014.
Leonardo Augusto Gómez Castillo, Ph.D Recife, fevereiro de 2022O processo de Promoção para a classe E, de Professor Titular da Universidade Federal de Pernambuco, consta de duas etapas. A primeira etapa avalia as atividades de ensino, produção acadêmica, extensão, capacitação e gestão acadêmica dos últimos dois anos do docente, e a segunda etapa envolve a elaboração e apresentação de um memorial acadêmico, de acordo com o estabelecido na Resolução 03/2014, de 10 de junho de 2014, do Conselho Universitário da UFPE.
Como bem escreveu o professor Ney Dantas, do Departamento de Arquitetura, o memorial acadêmico é um documento circunstancial que tenta responder a uma demanda institucional: retrospectiva de um percurso acadêmico apresentado para a promoção na carreira docente. Não é um documento estabelecido para avaliar produção acadêmica já que instâncias anteriores realizaram esta tarefa na primeira etapa do processo, mas para mostrar, do ponto de vista do docente, um momento de reflexão sobre a jornada de ensino, pesquisa e extensão de acordo com uma narrativa que brota da memória, revelando o percurso de uma vida acadêmica e profissional, não se limitando apenas à descrição de fatos acontecidos no passado, mas evidenciando possíveis percursos futuros almejados pelo relator.
No decorrer das próximas páginas o leitor irá se deparar com uma série de elementos recorrentes que tentam dar uma coerência e estilo peculiar à narrativa aqui proposta.
Em primeiro lugar os eventos são relatados com base na lógica da teoria dos setênios proposta por Rudolff Steiner, permitindo compreender com mais facilidade a condição cíclica da vida, somando novos desafios ao longo que a narrativa se desenrola no espaço e no tempo.
Assim, diversos períodos de sete anos estruturam a minha jornada, como os sete anos que passei morando no Japão entre 1997 e 2004, ou meu primeiro setênio de atividades acadêmicas na UFPE entre 2005 e 2012, que culmina com a realização de meu pós-doutorado na Holanda. Já o período compreendido entre 2012 a 2019 aparece na história como os “anos dourados” das minhas atividades de ensino, pesquisa e extensão.
No final de 2019 veio a pandemia de Covid-19, um momento de pausa e de reflexão para a humanidade. Acredito firmemente que 2022 será o início de mais um setênio na minha história.
Por outro lado, outro elemento recorrente no texto é a relação centro-periferia, que foi inspirada pelas ideias de Gui Bonsiepe sobre inovação e desenvolvimento. Assim, a periferia é definida como aquela região geográfica onde, por conta de diversos fatores de cunho político, econômico social e cultural, o desenvolvimento ainda não chegou na sua plenitude.
A periferia torna-se o pano de fundo, para relatar alguns dos fatos da minha jornada. Foi na periferia que testemunhei boa parte das minhas vivências e das minhas histórias que sedimentaram um olhar particular sobre a vida, sobre o design e sobre o mundo.
Alerto também que, pelas características intrínsecas da área de design, há ao longo do texto uma invasão de palavras no idioma inglês, resultado de um longo processo de colonização da língua portuguesa. Por mais que tentei minimizar ao máximo o uso do inglês, foi inevitável fugir de muitos termos, a começar pela própria palavra design
Igualmente, é possível que o leitor se depare com um forte sotaque espanhol. Assim como textos escritos em outros idiomas como italiano ou japonês. São pequenas anedotas que decidi manter sem tradução para realçar sua mensagem, que muitas vezes, como acontece com aquelas novelas e seriados mexicanos que passam na televisão aberta, ao ser traduzidas ao português perdem o sentido daquilo que se queria expressar na versão original.
Ao longo da escrita deste memorial utilizo fatos, eventos, locais e datas, para destacar a ideia central da história aqui apresentada. Os encontros, as interações e muitas vezes as disputas com as pessoas o que tornaram esta jornada uma experiência única e enriquecedora digna de ser narrada. São muitas as pessoas aqui lembradas, mas com certeza esse número não se compara com as que deixei de citar, não por esquecimento mas por falta de espaço e tempo suficiente para decantar o relato. Peço desde já minhas mais sinceras desculpas.
Da mesma maneira, fazendo um balanço no final da maratona de duas semanas percebo que muitos fatos ficaram do lado de fora. Experiências de ensino, cursos de extensão, palestras, congressos, projetos de pesquisa, participação em bancas de concurso, viagens e demais anedotas que fazem parte da minha jornada, ficam guardadas numa espécie de cápsula do tempo contendo diários de bordo e álbuns fotográficos, para quem sabe num futuro próximo, editar mais uma nova versão, um lado “B” deste memorial.
Portanto, o exercício de elaborar o presente memorial foi um processo de reflexões e recordações dos momentos que vão desde a escolha do curso de graduação em Design de Produto, da titulação em Mestre e Doutor, passando pela aprovação no concurso de professor adjunto de ensino da UFPE no ano de 2005, onde a cada dia vivido, aconteceram experiências recompensadoras na sala de aula, no laboratório de pesquisa, na cantina, nos corredores; experiências cotidianas como a de observar meus alunos (graduandos, mestrandos, orientandos e jovens pesquisadores de iniciação científica), vivenciar a alegria da descoberta e experimentar a compreensão do conhecimento.
Quero aproveitar este espaço para agradecer desde o mais profundo do meu coração aos meus pais, por toda uma vida de empenho, sacrifícios e dedicação para que eu pudesse alcançar me sonho de ser um designer.
2019-2021
Vice-chefia do Departamento de Design da UFPE
2012-2016
Coordenador da Pós-graduação em Design, UFPE
2016
Vice-coordenador da rede LeNSin Brasil
2011-2012
Pós-doutorado em Design na TUDelft, Holanda,
2010
Bolsista de Produtividade em Pesquisado CNPq
2008
Líder do Grupo de Pesquisa em Inovação, Design e Sustentabilidade
2007-2011
Coordenação do Curso de Graduação em Design, UFPE
2005
Professor da UFPE
2001-2004
Doutorado Universidade de Kyoto, Japão
2000
Curso na United Nations University, Tokyo
1999-2001
Mestrado em Arquitetura Kyoto University
1997-1999
Pesquisador em design de interação Kyoto Institute of Technology
1988-1994
Designer de Produto Universidad Nacional de Colombia
13 Artigos Periódicosem
Qualis
8 Orientações de PIBIC
96
Disciplinas Ministradas
86 na graduação
10 na pós-graduação
Bancas
52 de TCC 172+
53 de Mestrado
23 de Doutorado
44 de Qualificação
Leonardo Castillo é designer formado pela Universidad Nacional de Colombia (1994). Tem ampla experiência no desenvolvimento de produtos e serviços, com ênfase nos aspectos de inovação, design e sustentabilidade. No Japão, trabalhou como pesquisador em design de interação no Kyoto Institute of Technology (1997-1999). Culminou seus estudos de mestrado (2001) e doutorado em Design (2004) na Escola de Estudos Humanos e Ambientais da Universidade de Kyoto, Japão.
Após trabalhar como estagiário na United Nations University veio para o Brasil para atuar como consultor na área de inovação em design para diversas organizações. Leonardo já participou em projetos junto à Positivo, Nokia, Ministério da Educação, Coca-Cola, Fiat e Neoenergia.
Realizou pós-doutorado em Design e Inovação para a Sustentabilidade na universidade de TU.Delft, na Holanda (2011-2012). Atualmente reside em Recife e atua como professor e pesquisador do Departamento de Design da Universidade Federal de Pernambuco, UFPE.
É bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq - Nível 2. Líder do Grupo de Pesquisa em Inovação, Design e Sustentabilidade que tem como foco de pesquisa o estudo das interrelações do design para a sustentabilidade, design de serviços e o design de artefatos digitais. Membro ativo da rede LeNSin.
Bancas de Concurso Orientações de TCC 50+
8 Projetos e Cursos de Extensão
33
Teses & Dissertações
31 Mestrado, 2 Doutorado
11 Livros & Capítulos de Livro
2 Registros de Patente
16
70+
Projetos de Pesquisa financiados por instituições de fomento (CAPES, CNPq, FACEPE, FADE, ERASMUS+, FAPESP)
Trabalhos completos publicados em anais de congressos
Abordagens de DfS para a BoP 50
Estratégias de inovação para a BoP 51
Requerimentos de projeto para a BoP 52
Proposta metodológica ......................................................................52
Um novo setênio de volta para casa .................................................................54
Os anos dourados do NEXUS 59
Sistema de Artefatos Habitacionais de Apoio, Resgate ou Abrigo 61 Indicadores de Inovação Social ...............................................................67
Roadmap da conectividade 68 ..................................................................
Design Driven Innovation para economia criativa ........................................................71
Parque Capibaribe o caminho das capivaras 72 .........................................................
S.PSS in the context of Distributed Economies 78
Experiências de ensino em Design 85
Inquietações sobre o processo criativo ................................................................86 o ensino da sustentabilidade na periferia 90 ...........................................................................
Diálogos de cooperação South to South 96
Ensino de Moda: uma ciranda de todas as artes 97
Projetão: o ensino do processo de inovação 101
Aprendendo a ensinar de forma remota .................................................................106
Reflexão Final 111
Pelos caminhos da sustentabilidade 112
Referências 117
Jarred
Aos mestres da minha jornada, minha gratidão por ter me ensinado o caminhoSpool UX Design, USA Daniel Baheta UNICEF, Tanzania Aguinaldo dos Santos Pesquisador em DfS UFPR Cindy Kotala, LeNSin Network Finlandia Akiko Murakata, Kyoto University, Japão Vandana Shiba Activist, India Mario Perniola Universita di Roma Carlo Vezzoli Polimilano, Italia Galit Aviman Hebrew University of Jerusalem Derrick Dekerckhove McLuhan Institute Canada Aaron Marcus UX Designer, USA Amanda Gorman Poet, USA J.C.Diehl, TU Delft, Holland
Colômbia: o realismo mágico da periferia
Gostaria de começar este memorial na primeira metade da década de noventa, época na qual eu era estudante do Curso de Diseño Industrial da Universidad Nacional de Colombia. Era o ano de 1992 e, deixando de lado as exuberantes histórias de narcos, conhecidos chefes do narcotráfico, e do conflito armado das FARC que inundam o catálogo da Netflix e de outros serviços de streaming sobre o meu país e, de certa forma, sobre boa parte dos demais países do continente descrito por Eduardo Galeano no livro Las Venas Abiertas de América Latina, acredito que meus anos de faculdade foram fortemente marcados por dias conturbados e um ambiente de desesperança para os jovens que, como eu, estavam prestes a se formar como designers de produto num país da periferia.
Koyaanisqatsi
Life Out of Balance, do diretor Godfrey Reggio, 1982.
Como se isso não fosse o suficiente, durante boa parte da minha vida de faculdade, nos círculos acadêmicos, não se falava de outra coisa que do declínio do modernismo, e da consequente crise ambiental e social gerada pela aceleração exponencial da produção em massa vivenciada pela sociedade após o término da II Guerra Mundial. O final dos anos 70, como bem nos alertou Rachel Carson, já mostrava os primeiros sinais de esgotamento dos ecossistemas naturais e da deterioração do frágil tecido social do nosso planeta, os quais se tornaram centro das discussões da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, Rio 92.
Era o começo do meu terceiro setênio de vida, e foi quando a música clássica, o teatro e o cinema se transformaram numa válvula de escape que me permitiu amenizar o peso daqueles dias cinzentos, e se tornaram na minha referência e fonte de inspiração. Tornei-me assíduo frequentador da Cinemateca Distrital, um popular teatro no centro de Bogotá (equivalente ao Cinema da Fundação de Recife), dedicado à difusão de filmes de diretores “alternativos” daquela época como Paolo Pasolini, Peter Greenaway, Alan Parker, Federico Fellini, Stanley Kubrick, Win Wenders, Martin Scorsese, dentre outros.
Numa dessas apresentações da Cinemateca, tive o privilégio de assistir a uma exclusiva apresentação do filme Koyaanisqatsi, do diretor Godfrey Reggio. Um documentário de impressionantes imagens que mostrava, de forma quase apocalíptica, a colisão de dois mundos distintos: a vida moderna e o meio ambiente. Através de um jogo de imagens em câmera lenta ou espaçados lapsos de tempo, as cenas do filme apresentavam nossa relação pouco harmônica com a natureza. Daí o nome, Koyaanisqatsi que, na língua Hopi, significa “vida em desequilíbrio”, “vida louca”, “vida tumultuada”, uma alusão à evolução da sociedade até os dias de hoje. Devo admitir que o filme de Reggio deixou uma marca, uma inquietação, que anos depois viria a influenciar várias das minhas escolhas ao longo da minha jornada.
Lembro-me de que, por aquela época, encontrava-me desenvolvendo meu Trabalho de Conclusão de Curso, e tive contato pela primeira vez com quem se tornaria um dos grandes mentores da minha jornada: professor Ezio Manzini. Seu livro Artefactos, ganhador do Compasso d’Oro de 1991, acabara de ser publicado na versão em espanhol e se tornara uma das primeiras aquisições da minha biblioteca de livros de design.
Ao ler aquelas páginas, fui encontrando novas luzes de esperança para as muitas inquietações e angústias que surgiram ao longo do meu curso de design, visto que, naquele momento, para mim, não fazia muito sentido me tornar um diseñador industrial, um criador de produtos num país da periferia, onde sequer havia uma indústria propriamente dita.
Cito aqui um dos parágrafos que mais chamou a minha atenção daquele livro insipirador e que de alguma forma contribuiu para consolidar as bases conceituais do meu TCC. O “Jardim dos Objetos” de Manzini ecoa até os dias de hoje na minha memória como um mantra, uma espécie de manifesto do que poderíamos chamar de design para a sustentabilidade.
Intentemos imaginar estos artefactos no como máquinas cuyo principal objetivo es la automatización total y el mínimo mantenimiento, sino como las plantas de nuestro jardín. Intentemos imaginar objetos que sean bellos y útiles como un árbol frutal: objetos que duren y que tengan una vida propia. Objetos que, como un árbol se quieran por como son y por lo que hacen. Objetos que nos presten un servicio y que nos exijan cuidado. Seguir estas indicaciones implica un giro radical dentro de las tradicionales expectativas de cara al producto. Implica una inversión de tendencias em la relación entre sujeto y objeto, e implica una nueva sensibilidad ecológica: prestar atención a los objetos puede ser una manera de prestar atención a otro “objeto” mas grande: nuestro Planeta.
Ezio Manzini, 1992.
Madrid: Celeste Ediciones,1992.
Proposta de Cafeteira para Restaurantes
Trabalho de Conclusão de Curso
Universidade
Nacional da Colômbia 1994
Proposta de Mobiliário Infantil
Curso de Design de Produto Universidade Nacional da Colômbia
Luminária para Leitura
Curso de Design de Produto Universidade Nacional da Colômbia
Óculos Terapêuticos
Curso de Design de Produto Universidade Nacional da Colômbia
Amostra de alguns dos projetos desenvolvidos ao longo do meu curso de design de produto. Universidad Nacional.
Acima: Mobiliário infantil.
Centro: Luminária para leitura. Abaixo: Óculos terapêuticos.
Colômbia: 1989-1994.
Diploma de Graduação em Design de Produto Universidad Nacional.
Colômbia, 1994.
desenvolvimento sustentável, do design verde, do eco-design, começou a chamar a atenção de vários setores da sociedade. O “verde” se tornou a temática de moda da época e poderia afirmar que, logo depois da minha formatura como designer, no ano de 1994, o universo poderia ter conspirado para que eu desse início à minha jornada acadêmica nessa área. Porém, a vida dá muitas voltas e, assim como Santiago, protagonista do Alquimista, conhecido livro de Paulo Coelho, foi preciso iniciar uma jornada por outros caminhos do design para que, tempo mais tarde, eu pudesse encontrar no design para a sustentabilidade o meu tesouro.
Imagem do Verso do Diploma de Graduação.
Sempre achei mais interessante essa cara do diploma.
Acontece que, com o surgimento e po pularização do computador, abria-se um mundo de possibilidades de criação e desenvolvimento para o design.
Tratava-se de uma transição para o mundo digital que na época poucas pessoas conseguiam en tender, mas que basicamente dava a oportunidade de desbravar e se apropriar de um novo campo do conhe cimento para o qual nós, designers de for mação, tínhamos uma vantagem competi tiva, mesmo que naquele momento tal vantagem não fosse evidente para nin guém, nem mesmo para os designers: a do
profundo conhecimento e domínio de técnicas e ferramentas utilizadas para o entendimento das necessidades e dores do usuário. Algo que, com o passar dos anos, viria a ser conhecido como Design Centrado no Usuário e Design Thinking e que, a meu ver, são duas caras da mesma moeda.
Eu, particularmente só vim a entender essa ideia quando comecei a trabalhar como designer em Wayra Colômbia, uma empresa de software que me contratou para “dar
sivo público da época, os early adopters daquela maravilha tecnológica chamada de computador pessoal, que transformaria as nossas vidas e que mudaria radicalmente a forma de fazermos design.
Por volta de 1992, chegaram ao mercado os primeiros computadores com interface gráfica. Aos poucos, precisei aprender a mexer com as primeiras versões de programas de ilustração como o Corel Draw e o Photo Paint, de editoração como o Aldus
PageMaker e QuarkXPress ou de programação como Visual Basic e Macromedia Director.
Mesmo quando fui monitor do Laboratório de Computación Gráfica, na faculdade, dificilmente eu teria acesso aqueles programas que, como muitas instituições da época, ainda se vangloriava de editorar seus textos numa IBM Wheelwriter 35 séries II, sigilosamente guardada a sete chaves numa sala do departamento de expressão gráfica da minha universidade.
diversos títulos de software educativo que eram vendidos naqueles quadrados de plástico de 3 ½ polegadas chamados de floppy disks, os quais eram embalados numa bela caixa de papelão criada por mim (sim, também era designer de embalagens!), para serem vendidas como pão recém saído do forno nas exclusivas lojas de computadores da época.
Minha saída da periferia
Meu trabalho como designer de interfaces foi evoluindo de forma acelerada. Deixei de ser um “maquiador de interfaces” para me converter em diretor de design. Meu trabalho em Wayra consistia em juntar uma série de ideias para criar, junto com uma equipe de engenheiros da computação, de especialistas em pedagogia e de marketing,
O contato com esse novo mundo despertou em mim a vontade de querer me aprofundar verdadeiramente na temática de Design de Interface. No entanto, num país da periferia como Colômbia, era pouco provável que fossem ofertados cursos de especialização no tema ou áreas afins, até porque os conceitos de Design de Interação e Design de Experiência, hoje mais conhecidos como UI / UX Design, nem existiam naquela época. Assim, a única alternativa era a de pensar em fazer mestrado em alguma escola de design de vanguarda fora da periferia, de preferência num país do Centro, que ousasse oferecer esse tipo de curso no seu currículo. Lembro de ter seguido o conselho do professor Pablo Abril, meu orientador de TCC na Universidade Nacional, e fui procurar novas possibilidades de estudo mundo afora. Assim, comecei a mandar cartas para várias escolas de design, como o Royal College of Arts, solicitando informações
Fotografia, University of Delaware, 1996
Designer de Produto Universidad National Colombia, 1994
Professor da UFPE, Recife, Brazil desde 2005
Consultor de Design, Porto Alegre, Brazil 2004
sobre os cursos em tecnologias multimídia que recém começavam a ser ofertados nos seus currículos.
Nessa época, uma carta levava algumas semanas para alcançar seu destino, e caso a solicitação fosse atendida, um catálogo impresso com as informações do curso chegaria de volta pelos correios depois de fazer uma longa viagem no porão de um navio transcontinental.
Os japoneses sempre foram mais rápidos. Era o ano de 1996 e eu acabara de sair de uma reunião de trabalho quando recebi um telefonema do Consulado do Japão me convidando para participar de um edital de seleção para ir trabalhar como pesquisador no laboratório de pesquisa do Instituto de Tecnologia de Kyoto. Naquele momento, foi difícil rejeitar aquela oferta. No final de contas, eu sentia que minhas possibilidades de crescimento profissional como designer de interação começavam a se esgo -
Pós Doutorado
TU Delft, Holanda 2011-2012
tar. Assim, sem pensá-lo duas vezes, fiz minhas malas e fui morar do outro lado do mundo, literalmente.
Para um jovem designer recém formado sair da periferia com o objetivo de ir trabalhar num país do centro localizado do outro lado do mundo não é uma tarefa simples. Eu precisei me preparar para essa nova realidade e fui morar seis meses nos Estados Unidos com o objetivo de aperfeiçoar meu inglês. Apresento aqui uma prova da minha ingenuidade, pois acreditava que falar inglês seria suficiente para me virar no Japão. Enfim, prefiro pensar nesse momento da minha vida como um período de descompressão, onde consegui aproveitar o tempo para fazer um curso de fotografia na Universidade de Delaware, enquanto preparava minha cabeça e meu inglês, para ir morar do outro lado do mundo.
M.S.C and Ph.D Kyoto University, 2004
Pontos Chaves da minha jornada acadêmica.
1987 - 2022.
São necessários coragem e determinação para se adaptar a uma nova realidade de vida, a uma nova língua e a uns costumes que nunca antes tinha pensado que poderiam existir. Fora daquela imagem mística do Japão imperial dos Shoguns e Samurais imortalizados nos filmes de Akira Kurozawa, o Japão daquele período era, por assim dizer, o centro do mundo. Uma sociedade pós-moderna, onde tudo parecia acontecer antes, desde as vanguardas da moda como os Pleats Please, conhecidas peças de roupa de Issey Miyake e o minimalismo das lojas da Muji e das roupas da Uniqlo, até a “revolução dos gadgets” como o Game Boy da Nintendo, o Mini Disk da Sony, o Tamagotchi da Bandai ou o Aibo, robô mascote, também da Sony, que aos poucos tornariamse parte do cotidiano da vida dos jovens do mundo todo.
Sede da reunião do Protocolo de Kyoto International Conference Center mais conhecido como “Casa de Ultraman”. Kyoto,1997.
Em 1997 foi agraciado com uma bolsa do Governo Japonês para fazer pesquisa na área de Interface Design no Kyoto Institute of Technology, KIT. De acordo com a hierarquia japonesa, eu acabara de me tornar um Kenkyusei, isto é, um Research Student, mas a palavra me soava mais como um trocadilho: “que que eu sei”. Piadas à parte, durante um período de dois anos, ao mesmo tempo que me aprofundava nos estudos de língua japonesa, trabalharia junto com uma equipe de pesquisadores vindos de todos os cantos do mundo, desenvolvendo interfaces para uma conhecida empresa multinacional, famosa pelos seus novos gadgets, como os aparelhos de som portáteis e câmeras digitais, sob a liderança do amigo e professor Keiichi Sato, hoje docente do Illinois Institute of Technology, IIT, sede da “Nova Bauhaus” na cidade de Chicago.
Meu trabalho no KIT era caracterizado por um ambiente aberto e cosmopolita, onde tive a oportunidade de compartilhar uma xícara de café e trocar ideias com alguns dos pioneiros da área de Design de Interação como Alan Kay, Jacob Nielsen, Alan Cooper, Derrick Kerckhove e o próprio Donald Norman, um contador de histórias sensacional.
que se tornou um divisor de águas na minha jornada.
Ultraman, Popular superheroi Japonês dos anos 80.
Por essas coincidências da vida, nesse mesmo ano acontecia em Kyoto um evento
Num prédio de arquitetura brutalista mais conhecido pelos moradores da cidade como “a casa de ultraman”, representantes de 192 países discutiam acaloradamente o destino do nosso planeta e de suas emissões de gases de efeito estufa. A assinatura do Protocolo de Kyoto, em dezembro de 1997, era o primeiro passo dos governos na implementação efetiva da Agenda 21. Os olhos do mundo estavam todos voltados para aquela pequena cidade, e pela primeira vez na vida senti o que significava estar do outro lado da periferia.
Após dois anos de estar morando e trabalhando na cidade de Kyoto, meu contrato com o KIT e consequentemente meu visto de permanência estavam prestes a caducar. Meu retorno para Colômbia era iminente, a menos que aparecesse uma oportunidade para eu ficar morando no Japão.
Influenciado pelos sábios conselhos dos meus amigos, pelo espírito de ativismo ambiental da época e pelo sentimento que deixará a reunião do Protocolo de Kyoto, senti que podia ser um bom momento para revisitar minhas ideias sobre sustentabili -
dade e enxergá-las sob um novo ponto de vista. Foi quando, em 1999, surgiu a oportunidade de estudar numa universidade japonesa, um giro de 180 graus na minha jornada que daria início à minha vida acadêmica. Na primavera daquele ano, começava a cursar o mestrado sob orientação da minha querida mentora e guerreira, Akiko Murakata, professora da recém inaugurada Escola de Estudos Humanos e Ambientais da Universidade de Kyoto.
Kyoto,1998.
Na entrada do Heian Jingu, Templo da religião Shintoista.PAPANEK, Victor, The green imperative: Ecology and ethics in design and architecture. London: Thames & Hudson, 1995.
O novo ambiente universitário da Kyodai (Universidade de Kyoto em Japonês) abriu um mundo de possibilidades à minha formação. No início do curso tive bastante dificuldade de acompanhar as aulas na língua japonesa, mas de certa maneira, isso foi compensado pela possibilidade de conversar pessoalmente com vários dos autores dos livros que debatíamos em sala de aula. Foi assim que conheci autores como o professor Ezio Manzini, a quem encontrei finalmente no Ecodesign 99 em Tokyo, ou a Fritjof Capra, que fora realizar uma palestra num evento organizado na minha cidade.
Junto com isso, o acesso aos textos mais recentes dos protagonistas dos debates contemporâneos da área eram facilmente encontrados no impressionante acervo de mais de sete milhões de volumes da biblioteca central da universidade. Acredito que esse seja um dos vários motivos pelos quais a Universidade de Kyoto é catalogada como uma das vinte melhores do mundo.
Por aquelas ironias da vida, meu francês e meu inglês melhoraram consideravelmente com a leitura de McLuhan, Lyotard, Eco, Derrida, Foucault, Baudrillard, Flusser e Barthes, dentre outros.
Porém foi a leitura de Victor Papanek a que definiu um novo rumo na minha jornada. Foi nas ideias encontradas no seu livro The Green Imperative onde consegui enxergar de forma mais clara a relação entre o de -
sign e a sustentabilidade, o que me remetia inevitavelmente às minhas origens como designer e definia os futuros passos da minha jornada acadêmica.
Minha dissertação intitulada “The Use of Bamboo in Architecture: A Comparative Analysis of the Use of Bamboo in Japanese and Colombian Domestic Architecture”, facilitou a conexão com minhas origens de design de produto, permitindo-me enxergar sob uma nova ótica como se dá nossa relação com os artefatos que projetamos e com os diversos contextos culturais nos quais esses artefatos se encontram inseridos.
O trabalho consistia em fazer uma análise do uso do bambu na arquitetura doméstica japonesa e colombiana. Num primeiro momento foi realizada uma descrição das características do bambu, das espécies utilizadas na arquitetura e das condições climáticas e geográficas dos países estudados. Na sequência, foi realizada uma análise do ponto de vista histórico sobre o como os povos estudados foram adotando
Dissertação de Mestrado The Use of Bamboo in Architecture: A Comparative Analysis of the Use of Bamboo in Japanese and Colombian Domestic Architecture. Kyoto, 2001.
Mc. Donough W. & M. Braungart. Cradle to Cradle: Remaking the Way We Make Things.
New York: North Point Press, 2002.
o bambu nas construções domésticas, abrindo uma luz sobre as motivações estéticas e funcionais que deram origem aos estilos arquitetônicos selecionados na pesquisa. Finalmente o estudo apresenta, de forma comparativa, uma análise dos diversos usos da planta nas paredes, aberturas, pisos, telhados e tetos da arquitetura doméstica vernacular.
Fiz a defesa da minha dissertação em janeiro de 2001, porém, minha jornada como pesquisador na área da sustentabilidade apenas estava começando.
Como acontece muitas vezes com um trabalho de mestrado, após a defesa da dissertação ficou evidente a necessidade de dar continuidade a minha vida acadêmica.
Devo reconhecer que um trabalho de pesquisa de doutorado é, em essência, um trabalho árduo e solitário. Ficar perdido é a coisa mais fácil de acontecer e, na maioria das vezes, torna-se uma etapa necessária na construção de uma tese. Entretanto, existem momentos que marcam para sempre a jornada de um doutorando.
Como esquecer da emoção de apresentar meu primeiro artigo científico num congresso internacional, o ERCP 2002 - The European Roundtable of Cleaner Production, na bela cidade de Cork, na Irlanda, onde também conheci o professor Michael Braungart, precursor do movimento Cradle to Cradle Design.
Comecei a ter plena consciência de que o mundo, e particularmente o design, precisavam de pesquisas que ajudassem a entender melhor como poderíamos implementar a transição para uma sociedade mais sustentável, onde os impactos ao meio ambiente e a degradação do tecido social fossem repensados desde uma nova concepção de projeto. Foi quando decidi continuar meus estudos, e decidi aplicar para uma vaga no Programa de Doutorado em Estudos Humanos e Ambientais na mesma escola que tinha me acolhido a dois anos atrás.
Tampouco esqueço daquele frio na barriga do meu primeiro dia de aula como estagiário docente (Teaching Assistant) quando precisei dar aula para uma turma de sessenta alunos sob o olhar inquisitivo da minha orientadora. Ainda nos dias de hoje lembro da cara dos japoneses e japonesas, estudantes do curso de Cross Cultural Studies, que pacientemente escutavam minha fala sobre cultura.
Porém, talvez o momento mais marcante da minha jornada foi quando conheci a professora Carla Pasa, uma incrível gaúcha, de semblante inquieto e profundos olhos verdes; a cor de olhos mais intensa que eu já vi na vida. Ela conseguiu conquistar meu coração e tornar-se-ia minha amiga e companheira de jornada; minha luz nos meus
vários momentos de angústia, desde minha época de doutorado até os dias de hoje.
Ao mesmo tempo que começava a dar forma a minha pesquisa, percebi que era necessário um detournement.
Com o intuito de me aprofundar nas temáticas da sustentabilidade, me inscrevi no programa de Environmental Institutions and
Shiva ou o ativista e editor da revista Resurgence, Satish Kumar, quem com muito entusiasmo me apresentou a obra de Schumacher, autor do seminal livro “Small is Beautiful: a study of economics as if people mattered”
Sede da Universidade das Nações Unidas. Tokyo, 2002.
Na minha tese intitulada “Reconsidering Vernacular Japanese Architecture for Sus tainable Ecological Design”, buscava fazer uma conexão entre arquitetura e design a partir da análise da arquitetura japonesa, que teve uma influência significativa na definição dos fundamentos do movimento moderno que por muito tempo foram di fundidos como um mantra nas salas de aula dos cursos de design e arquitetura ao redor do mundo. Porém, na minha pesqui sa, eu buscava discutir a arquitetura e, até certo ponto, o design, sob um ponto de vista diferente; a perspectiva do design para a sustentabilidade. A minha hipótese era que, tanto na sua essência física, na sua estética e na sua lógica construtiva subja cente, a arquitetura vernacular possuía uma série de princípios e ensinamentos que poderiam ser “abduzidos” na formula ção de diretrizes para o design de moradias sustentáveis.
O estudo começa discutindo as questões que deram origem ao conceito de desenvolvimento sustentável, explicando como a Agenda 21 proporcionou um quadro abrangente para a implementação da sustentabilidade na indústria da construção civil, e como a eco-eficiência tornou-se o principal princípio norteador na formulação do design daquela época. Porém, utilizando exemplos práticos da arquitetura e do design industrial, a pesquisa demonstra que o interesse das empresas pela adoção de práticas eco-eficientes, foi, e continua sendo, uma escolha errada que, apesar de Gómez Leonardo, Reconsidering Vernacular Japanese Architecture for Sustainable Ecological Design Tese de doutorado Kyoto, 2004.
ajudar a projetar imagem ”verde”, a ecoeficiência se torna pouco sustentável numa perspectiva de longo prazo.
Como alternativa, o estudo propõe uma minuciosa leitura e releitura dos princípios construtivos que regem a arquitetura vernacular japonesa, bem como diretrizes que podem ser aplicadas no design para a sustentabilidade.
A análise leva em conta a revisão desses princípios desde uma perspectiva mais atual que inclui a re-interpretação das formas e do uso de materiais, assim como os processos utilizados, e suas implicações na construção no contexto urbano contemporâneo. Para ilustrar esse processo, a pesquisa introduz o trabalho de arquitetos como Shigeru Ban, e do casal Ushida e Findlay,
Versão em Japonês do meu Diploma de Doutorado, Kyoto University. Kyoto, 2004.
pioneiros dessa nova abordagem que redefiniram os conceitos de moradia, utilizando materiais industriais como papelão e madeira compensada, e aplicando formas arquitetônicas e técnicas construtivas que se mostraram mais resilientes com os princípios de sustentabilidade.
Após muitas idas e vindas e longas horas de trabalho na frente do computador turbinadas com cafeína e macarrão instantâneo, consegui, em janeiro de 2004, apresentar ao mundo minha singela contribuição para o avanço do conhecimento no campo do design para a sustentabilidade. A defesa da minha tese marcava a culminação de um intenso setênio de vida no Japão e a minha volta para a periferia, onde uma nova jornada me aguardava de volta ao outro lado do mundo, desta vez no Brasil.
Centro esquerda: Trabalhando no meu laboratório.
Centro direita: De volta para a periferia
Abaixo: Convite de casamento.
Kyoto, 2004.
Do período de doutorado lembro de forma muito especial do filósofo italiano Mario Perniola. Ele e sua esposa faziam pós-doutorado na Universidade de Kyoto e, por essas coincidências do destino, tive a oportunidade de ser intérprete e “mentor” de cultura japonesa do casal durante o tempo que eles estiveram morando no Japão. Minhas longas horas de conversa com Mario solidificaram as bases de uma amizade duradoura que transcenderia as fronteiras do espaço e do tempo. Porém, naquele momento, eu mal sabia que após várias idas e vindas, nossos caminhos voltariam a se encontrar anos à frente na periferia da periferia, a caminho de Vicência, Pernambuco, para assistir à apresentação de um dos seus livros para uma agitada turma de jovens estudantes da língua italiana, como ele bem registrou nas suas memórias:
In quel viaggio in auto verso Vicência c’era un altro amico Léo Augusto Gómez Castillo. Lo conobbi in Giappone tredici anni fa, dove stava terminando il dottorato ricerca in design dopo un soggiorno di sette anni. Léo mi ha subito impressionato per almeno tre cose: per la sua mimica, per la sua calma e per il suo spirito surrealista. La morfologia della mimica distingue sei emozioni primarie: felicità, sorpresa, paura, rabbia, disgusto, tristezza. Mai ho visto sul volto di Léo qualcuna di queste espressioni.
Trovo che la sua mimica non sia classificabile: è come un misto di ironia, di saggezza e di adattamento alla realtà del mondo: un po’ un misto di buddhismo giapponese e di surrealismo colombiano. Quando lo invitai a cena a casa mia con una comune amica ebrea che studiava la danza butō (ho la sua tesi e a Roma ho visto alcuni spettacoli che mi hanno molto coinvolto: dovevo fare qualcosa con una loro compagnia, ma anche questo rientra nei progetti che sono rimasti tali) mi venne in mente questa idea: se quest’uomo saprà di essere decapitato domani, resterà indifferente.
Mi dispiace non aver potuto accettare un invito in Colombia: questo è un paese in cui il surrealismo ha avuto una grande importanza; Enrique Graum, Jim Amaral, Ned Truss per esempio sono artisti visuali di forte impatto. Dopo il Giappone perciò continuammo a scriverci. Poi fu negli USA ad Atlanta, in Brasile a Porto Alegre, in Olanda a Delft e infine anche lui lo trovo a Recife, anche lui a Casa Forte in un bell’appartamento con un figlio cui ha dato un nome che suona bene anche in giapponese: Enzo.
Ultimamente ha avuto anche una bambina e sua moglie Carla è una persona fine con cui m’intendo perfettamente. Li ho ospitati a Roma qualche anno fa e li ho rivisti nella primavera del 2016. Ora è professore all’UFPE de direttore di un gruppo di ricerca su innovazione, design e sostenibilità.
Mario Perniola, 2016
Em 2004, Após passar alguns meses de descompressão nos Estados Unidos, o destino e o coração me trouxeram para o sul do Brasil. Foi um período um tanto traumático de (re)adaptação a um novo contexto cultural totalmente distinto ao que recém acabara de deixar para trás. A história parecia se repetir. Durante quase o período de um ano precisei aprender a lidar com uma nova língua, a me moldar aos novos hábitos e costumes do povo gaúcho e à nova vida conjugal.
Primeiras atividades após minha chegada no Brasil.
Acima: Certificado de curso de extensão em Gastronomia Gaúcha.
Abaixo: Cartaz da aula inaugural da disciplina de Eco-design.
Lajeado, RS, 2004
Ao mesmo tempo que trabalhava como consultor de design de pequenas e médias empresas da região do Vale de Taquari, RS, ministrava aulas de Projeto de Produto e Gestão do Design nos cursos de Design das reconhecidas universidades gaúchasULBRA e UniRitter. Essa experiência docente me ajudaria a definir os próximos passos da minha jornada acadêmica.
Depois de um longo período de sucateamento da educação pública superior no Brasil, as universidades federais voltavam a abrir suas portas para receber novos doutores. Por essa época começaram a aparecer oportunidades de fazer concurso na UFPR em Curitiba, na UFSC em Florianópolis e até na ESDI no Rio de Janeiro, mas foi Recife que nos escolheu. Digo isso porque foi na UFPE onde encontramos aberto, ao mesmo tempo, um concurso na área de administração para Carla e outro na área de design de produto para mim.
Era o “alinhamento perfeito das estrelas”, bastava somente sermos aprovados em primeiro lugar.
Em julho de 2005, viemos pela primeira vez na vida a Recife para participar dos Concursos Públicos de Provas e Títulos nas nossas respectivas áreas.
Carla, obviamente, passou em primeiro lugar no concurso dela e a nossa vinda definitiva para a capital do frevo dependia exclusivamente de mim. Me senti como aquele jogador de futebol que está prestes a cobrar aquele pênalti aos quarenta e quatro minutos do segundo tempo, na final do campeonato.
Após uma greve geral de três meses das instituições de Ensino Superior, IES assinei o Termo de Posse de Professor Adjunto em 5 de dezembro desse mesmo ano. Assim, iniciava oficialmente minha carreira como docente da UFPE.
Jardim Interno do Centro de Artes e Comunicação, Cidade Universitária UFPE. Recife, 2006.
Uma das coisas que mais me surpreendeu ao chegar na UFPE foi o espírito jovem da minha nova casa, o Departamento de Design, ou dDesign, como preferimos chamálo. Foi recebido por parte dos funcionários e professores do departamento, que se mostraram muito pacientes e receptivos com todas as minhas dúvidas e dificuldades de adaptação a meu novo modo de vida de funcionário público. Minha gratidão aos meus colegas por me acolher tão calorosamente.
No meio dessa animação toda, faço aqui um parêntese para registrar como foi meu primeiro dia de trabalho na UFPE. Naquele dia, o então Chefe do Departamento, o professor Hans Waechter, encomendou o mim e aos professores Silvio Campello e Clylton Galamba a tarefa de recuperar o “Iraque”, um espaço abandonado de nosso departamento que tinha se tornado o depósito oficial de lixo, cadeiras quebradas, e computadores obsoletos de nosso Centro. O local tinha sido apelidado de “Iraque” dada suas semelhanças com aquele país do Meio Oriente que por esses dias testemunhava um período de guerra e desolação.
No final da jornada, dificilmente esqueço a cara de Carla quando voltei para casa empoeirado dos pés à cabeça e com as roupas sujas e rasgadas.
Anos depois, o Iraque se tornaria sede do Programa de Pós-graduação em Design e do NEXUS, meu laboratório de pesquisa em design, inovação e sustentabilidade.
Logo depois do meu primeiro dia de trabalho, me aproximei de Silvio, que também acabara de concluir seu doutorado em Reading, na Inglaterra, e assim como como eu, compartilhava das mesmas inquietações em relação à pós-graduação e à pesquisa.
Lembro que dividíamos uma pequena sala num canto escondido no Centro de Artes e Comunicação, onde passávamos longas horas conversando sobre a vida, acompanhadas de café e bolo de rolo.
Fiquei muito animado com a proposta Político Pedagógica do curso que Silvio me apresentara pacientemente nas nossas animadas conversas sobre ensino de design. Tratava-se de uma proposta extremamente inovadora que, a meu ver, colocava o curso de Graduação em Design na vanguarda para encarar os desafios contemporâneos da sociedade.
Já nessa época, a proposta pedagógica do curso abria mão das disciplinas centradas em conteúdos. Em contrapartida, adotava o conceito de sala de aula invertida, de comunidade de prática e de aprendizado baseado em desafios (Problem Based Learning), o que permitia trabalhar desde uma
nova perspectiva de aprendizagem assuntos contemporâneos ao design como, a sustentabilidade, as questões de gênero e de inclusão de pessoas ou o impacto das novas tecnologias da informação e comunicação na sociedade, conferindo aos estudantes uma maior liberdade de escolha dos assuntos almejados para sua formação como designers.
Em 2006, houve eleição para coordenador e a chapa formada por Silvio e eu foi eleita para assumir a coordenação do Curso de Design por um período de dois anos, ele como coordenador e eu como vice,.
A flexibilidade do currículo do Curso de Design me permitiu também dar início às atividades de ensino no campo de design para a sustentabilidade. Porém, no novo ambiente da UFPE ainda não sentia que estava pronto para dar aula sozinho. Tirando proveito dessa flexibilidade do currículo, adotei a estratégia de fazer parcerias com vários colegas do dDesign.
Assim, comecei a lecionar a disciplina de Design e Meio Ambiente em parceria com o professor Hans Waechter. Agradeço a generosidade de Hans e esse seu jeito calmo e amável de lidar com as pessoas, e que fizeram com que eu me sentisse em casa.
Da mesma forma, e depois de muitos anos de ter me formado na faculdade, voltei literalmente a “botar mão na massa”. Junto com o professor Cloves Parísio, ofertamos a disciplina de Princípios Básicos da Mode -
Exercícios das minhas primeiras disciplinas no dDesign. Recife, 2006-2008.
lagem. A cálida acolhida de Cloves no seu ateliê de Práticas de Modelagem, ajudou a me entrosar com os alunos do curso. Nossa parceria duraria vários anos anos e renderia animadas conversas nas longas horas de trabalho na marcenaria e no ateliê, até o dia em que Cloves se aposentou, deixando um vazio que até hoje, nosso curso não conseguiu preencher.
Lembro também da minha parceria com a professora Oriana Duarte para ministrar a disciplina de Design e Entorno Urbano em 2007. Tratava-se de uma disciplina que se propunha a problematizar a cidade utilizando ferramentas e métodos de design. Os encontros semanais aconteciam quase sempre fora da sala de aula, onde junto com os alunos fazíamos uma imersão em diversos pontos da cidade, para identificar possíveis desafios e pontos de intervenção para o design. Para mim, essa disciplina significou uma forma alternativa de conhecer a cidade do Recife, percorrendo ruas, mercados públicos, praças, e locais que dificilmente aparecem nos populares guias turísticos da cidade. Despertou também minha grande admiração por Oriana, por suas conversas, por essa alma de artista e por esse espírito de vanguarda que não tem papas na língua para nos alertar do que está por vir e para dizer a verdade nua e crua, doa a quem doer.
Outra grande motivação foi a possibilidade de poder iniciar meu trabalho de pesquisa científica no programa de Pós-graduação em Design, o PPG Design, que recém tinha começado a ofertar um dos primeiros Cursos de Mestrado em Design do Brasil. Em 2007, passei a atuar como professor colaborador do PPG Design, dando início aos trabalhos de orientador de mestrado com a supervisão da pesquisa intitulada “A Eco-efetividade do design: Proposição e aplicação de uma ferramenta de análise em sistemas de produtos+serviços, PSS, da aluna Adriana de Azevedo Costa, hoje professora do Curso de Design do IFPE.
O trabalho marcava o início da minha busca pela formulação de uma metodologia de projeto com foco no desenvolvimento de Product Service Systems ou PSS como são conhecidos na literatura da área.
Como toda pesquisa, precisava do apoio de recursos humanos e financeiros para poder começar a produzir os primeiros frutos. Como muitas das coisas que acontecem dentro do universo da pesquisa acadêmica, precisamos passar por um período de aprendizado para entender melhor o funcionamento dos diversos aspectos que envolvem a vida de um pesquisador. As práticas de um programa de pós-graduação, a lógica dos órgãos de fomento, o
Profa. Oriana Duarte dando aula para os alunos do CAC. Cidade Universitária UFPE,. Recife, 2016.
Recife, 2007.
funcionamento dos grupos de pesquisa e a formação de parcerias e redes de pesquisa, são só alguns dos aspectos desse aprendizado que nos permitem entender nosso papel e nossas possibilidades de atuação perante a ciência.
Para um marinheiro de primeira viagem como eu, não era muito fácil captar recursos para financiamento de pesquisa. No final das contas, não possuía um currículo com experiência suficiente que demonstrasse minha capacidade como pesquisador. Da mesma forma, era difícil acumular experiência de pesquisa sem ter à disposição um mínimo de recursos humanos e financeiros. Era literalmente um problema do tipo: o que vem primeiro o ovo ou a galinha?
NORMAN, Donald A. The Psychology of Everyday Things.
Boston: Basic Books, 1988.
Levei um tempo para entender essa lógica e depois de várias tentativas consegui aprovar pelo CNPq, meu primeiro projeto de pesquisa.
O projeto tinha como objetivo explorar o potencial de uso do gesso, um material extremamente abundante no estado de Pernambuco, como matéria prima para a fabricação de mobiliário para moradia de interesse social.
Com isso vieram as primeiras alunas do programa de Bolsas de Iniciação Científica, Nyany Cardim de Carvalho, Mabel Gomes Guimarães e Tarciana Andrade. Sou muito
grato a elas. O espírito guerreiro dessas meninas me mostrou o quanto apaixonante é fazer pesquisa.
Para encerrar com chave de ouro o ano de 2007, tive uma das maiores alegrias da vida. No mês de outubro nascera Enzo, meu primeiro filho. Começava assim um novo capítulo na minha jornada: a maravilhosa experiência de ser pai.
Saindo da Inércia
O ano de 2008 prometia fortes emoções. Carla e eu mal começávamos a nos adaptar à nova vida de pais de primeira viagem, quando assumi a coordenação do Curso de Graduação em Design da UFPE depois de ter ficado dois anos como vice-coordenador.
Da mesma maneira, e utilizando a mesma lógica da graduação, comecei a ministrar aulas na pós, na disciplina de Fundamentos em Design Tecnologia e Cultura, junto com o professor Clylton Galamba. Com Clylton a aula se transformava num espaço para debater as diversas questões que circundam o universo do design. Abordávamos temas da sustentabilidade, da tecnologia, da ética e da história do design à luz de autores como Rafael Cardoso, Edward Tenner, André Lemos, John Naisbitt, e Donald Norman, entre outros.
As horas passavam voando enquanto escutávamos as apaixonadas histórias contadas
Enzo, meu primeiro filho.por Clylton. Um dos seus temas favoritos era o determinismo tecnológico, ou seja a crença de que a tecnologia, ou o desenvolvimento tecnológico é o principal agente de mudança social. Será?
Mais do que professor, sentia-me um aluno no meio daquelas animadas conversas.
Por volta de mês de abril de 2008, logo de proferir uma palestra para os alunos do Curso de Administração da UFPE, fui convidado pelo professor Alexandro Gomes, do Centro de Informática, para colaborar num projeto de extensão financiado pelo Ministério da Educação e a Prefeitura do Recife que buscava transformar a sala de aula das escolas públicas mediante o uso da tecnologia.
Primeiros sketches do projeto Lampejo Exploração de possíveis alternativas para o sistema de projeção multimídia. Recife, 2008.
Rendering 3D da primeira versão do Projeto Lampejo.
Recife, 2008.
A proposta me remetia à época na qual fui pesquisador em Design de Interação do KIT, a uma década atrás, no Japão. Meu papel era o de coordenar, junto com o professor Alex, uma equipe de pesquisadores provenientes dos cursos de design, de ciências da computação e de engenharia da computação para desenvolver uma plataforma tecnológica de baixo custo combinando funcionalidades de display de telas com capacidade de processamento multi mídia, conectividade e integração para trabalho colaborativo.
Imagine projetar um artefato como esse numa época em que o acesso a internet, o trabalho remoto e colaborativo e uso de linguagens multimídia eram privilégio de alguns poucos no Brasil.
Conseguimos encarar o projeto como uma grande oportunidade para utilizar métodos e ferramentas de design que nos permitissem entender a jornada do público alvo do projeto, os professores e professoras de ensino fundamental das escolas públicas do país.
Foi também um momento para brincar com “novas” tecnologias como o bluetooth, projeção de LED, e impressão 3D, que eram uma novidade por aqui na periferia. Gostaria de citar um exemplo para contextualizar os desafios de um projeto como esse na época: os serviços de impressão 3D eram desconhecidos aqui em Recife, e para encomendar a impressão de uma peça era preciso encaminhar os ar -
Construção e Validação de diversos protótipos Projeto Lampejo.
Recife, 2008.
Professoras da escola pública testando um dos primeiros protótipos do Lampejo.
Recife, 2008.
Produção de artesanal de jovens do Projeto Coletivo.
Recife, 2008.
quivos para uma empresa localizada na cidade de Campinas. Após uma semana recebíamos de volta pelos correios nosso modelo que fora impresso num tempo recorde de 72 horas, pela “modesta” soma de vinte mil reais.
Após oito meses de intenso trabalho, em dezembro desse ano conseguimos apresentar em Brasília o “Lampejo’, nome do nosso protótipo de projetor multimídia. Posteriormente, um grupo de pesquisa do sul do país deu continuidade ao projeto e algum tempo depois uma versão mais completa do protótipo chegou a ser testada em diversas escolas públicas do Brasil.
Anos mais tarde tive o privilégio de testar um desses protótipos numa pequena escola da cidade de Vitória de Santo Antão, Pernambuco, quando fui ministrar uma oficina sobre impressão 3D para jovens infratores da Funase.
Extensão: conectando academia e sociedade
Por essa mesma época, e logo depois de termos entregue o relatório final do projeto
Lampejo, foi chamado pelo Centro de Estudos Avançados do Recife, CESAR, para participar como consultor na área de design para a sustentabilidade. Foi quando conheci o brilhante Luciano Meira, professor do departamento de psicologia e empreendedor do Porto Digital do Recife na área de jogos digitais e gamificação na aprendizagem.
Luciano e eu tivemos o privilégio de participar, junto com uma equipe de pesquisadores do CÉSAR, de vários projetos. Dentre eles destaco o Projeto Coletivo Coca-Cola que visava a construção de um programa de formação profissional cujo o objetivo era o de capacitar jovens de comunidades de baixo poder aquisitivo, com idades en -
tre 17 e 25 anos, como agentes transformadores da comunidade que por sua vez, pudessem capacitar outros jovens para o ingresso no mercado de varejo. O programa tinha 2 meses de duração e os participantes com bom desempenho foram encaminhados às entrevistas de empregos com grupos parceiros da conhecida empresa de refrigerantes.
Outro projeto que vem à minha memória foi o do PC Verde, financiado pela empresa de computadores Positivo. O objetivo principal deste projeto foi reunir estudos diversificados e consistentes sobre tecnologias e tendências dos “produtos verdes” no mercado de PCs, criando cenários amplos para o desenvolvimento de soluções a curto, médio e longo prazo, e proporcionando
Pegada Ecológica de um PC. Projeto PC Verde. Recife, 2008.
ações para a Positivo se posicionar como uma grande empresa com preocupações ambientais e foco na adequação à legislação brasileira.
Pela primeira vez senti que algumas das ideias debatidas na minha tese chamavam a atenção de uma indústria de grande porte da periferia. Contudo, costumo dizer que o mais importante de poder participar de um projeto como esse não é o projeto como tal, mas a interação e entrosamento com as pessoas que fazem parte da equipe.
No projeto do PC Verde, além de colaborar novamente com Luciano, tive também a honra de trabalhar ao lado da professora de direito Liana Cirne Lins, hoje vereadora da cidade do Recife, com quem aprendi, em primeira mão e em longas horas de conversa, os diversos aspectos sobre a Política Nacional de Resíduos Sólidos.
Outro projeto interessante que desenvolvimos nessa época foi o projeto intitulado "Box.it: development of artifact using open source technologies and DIY strategies”. A proposta, financiada pela Nokia através do programa PDTI da Softex, tinha como objetivo o desenvolvimento de artefatos de tecnologias abertas do tipo (open source) e que pudessem ser construidos pelos próprios usuários fazendo uso dos princípios de fabricação “faça você mesmo” (do it yourself, ou DIY).
Exemplo de História em Quadrinhos criada para mostrar a jornada do usuário utilizando o artefato proposto no projeto Box.it.
Recife, 2008.
Ao longo do projeto, professores e estudantes participaram das atividades de imersão, tentando descobrir e entender melhor o dia a dia dos usuários de baixa renda em relação ao uso de tecnologias da informação e comunicação para resolver situações do cotidiano. Logo depois de intensas horas de imersão, nossos designers conseguiram criar uma série de narrativas, representadas através de histórias em quadrinhos, com as principais descobertas.
A ferramenta de storytelling foi utilizada como uma forma eficaz de comunicação entre os participantes do projeto.
Colhendo os primeiros frutos
Em 2008 iniciei uma parceria com Ney Dantas, professor do Departamento de Arquitetura da UFPE. Ney tornar-se-ia meu grande amigo e companheiro de jornada, com quem tive o privilégio de compartilhar vários interesses comuns de pesquisa, numa parceria que dura até os dias de hoje.
Por aqueles dias decidimos formalizar a criação do grupo de pesquisa em Design, Inovação e Sustentabilidade no Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq. Assim, iniciamos diversas pesquisas, que no final de 2010 já começavam a dar seus primeiros frutos.
Foi um intenso período de publicação de trabalhos em eventos nacionais e interna cionais organizados em torno da sustenta bilidade. Dentre eles destaco o 1 Internati onal Symposium on Sustainable Design, ISSD 2007; o I Congresso Brasileiro em Gestão do Ciclo de Vida, 2008; o 8º Con gresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvol vimento em Design, P&D 2008; o XXVIII Encontro Nacional de Engenharia da Pro dução, ENEGEP 2008; o XI Simpósio de Administração da Produção, Logística e Operações Internacionais, SIMPOI 2008; o XVII Simpósio de Engenharia de Produção; o 5 Congresso Internacional de Pesquisa em Design, 2009; e o 2 International Symposium on Sustainable Design, 2009.
Inclusive, no 8º Congresso P&D de 2008, nosso artigo intitulado “Desenvolvimento de Alternativas Sustentáveis Para Habitação de Baixa Renda”, foi premiado como um dos melhores do evento, ganhando o direito de publicação no volume 18, n. 2 da prestigiosa revista Estudos em Design.
Por sua vez, em 2010, os Trabalhos de Conclusão de Curso intitulados “Proposta para Banheiro da Moradia Popular” da aluna Tarciana Andrade, e “Sistema de Iluminação para Áreas Externas”, de Felipe Arruda, ambos sob minha orientação, foram escolhidos para fazer parte da exposição de projetos acadêmicos da III Bienal Brasileira de Design, em Curitiba em 2010.
HART, STUART. Capitalism at the Crossroads: The Unlimited Business Opportunities in Solving the World's Most Difficult Problems.
New Jersey: Prentice Hall, 2005.
Em meados de 2010 e recebíamos em Recife ao professor Stuart Hart, que viera palestrar sobre seu mais recente livro, “O Capitalismo na Encruzilhada”.
Hart argumentava que durante boa parte dos últimos quarenta anos, a maioria das empresas ignorou o potencial de consumo das camadas menos favorecidas da população.
O atendimento das necessidades das pessoas da assim chamada base da pirâmide social BoP, (Base of the Pyramid), tinha, até então, um desenvolvimento marginal, e na maioria dos casos nem sequer foi considerada como pauta prioritária da agenda das empresas. Tampouco fazia parte do universo do design.
Porém, graças ao protagonismo adquirido pelos BRICS — Bloco de países de economias emergentes formado pelo Brasil, India Rússia, China e África do Sul, esse cenário começou a mudar gradativamente a partir de 2005, e as empresas começaram a procurar oportunidades de expansão de negócios nessas regiões, devido ao crescente aumento do consumo e do poder de compra das pessoas das classes que compõem a BoP, especialmente nas economias emergentes (Hart, 2006).
Nosso grupo de pesquisa já tinha acumulado uma boa experiência na compreensão dos processos de criação e inovação. Por
outro lado, nossa participação em vários projetos focados nos usuários de baixa renda, nos fornecia um panorama mais claro sobre o papel do design na identificação de problemas e desenvolvimento de soluções para essa camada da população.
Foi quando decidi submeter uma proposta para o edital de Bolsas de Produtividade em Pesquisa do CNPq com o objetivo de estudar e definir diretrizes para o desenvolvimento de produtos para a base da pirâmide.
Com base na revisão bibliográfica e de estudos de caso, pretendia-se dar resposta às seguintes hipóteses de trabalho: O que significa desenvolver um produto sustentável para a base da pirâmide? Que tipo de estratégias de design deveriam ser adotadas para esse tipo de projeto? Qual era o perfil desses novos produtos ou serviços?
Respostas a essas perguntas facilitariam a definição de diretrizes e requerimentos de projeto, além disso, permitiriam identificar um conjunto de ferramentas e métodos que pudessem ser aplicados no desenvolvimento de soluções apropriadas para o contexto da base da pirâmide.
Após um ano de pesquisa, nosso primeiro relatório sobre o estado da arte identificou várias propostas metodológicas relacionadas ao tema, porém, todas elas continuavam sendo estruturadas nos padrões das metodologias clássicas de design.
As questões centrais relacionadas ao processo de desenvolvimento de soluções para
a BoP continuavam abertas nos debates sobre o tema. Isso se tornou um incentivo para dar continuidade à proposta, já que abria um espaço para sugerir novas abordagens metodológicas aplicáveis na formulação de propostas que permitissem a sistematização do processo de design de PSS, que continuava ainda inexplorado dentro da temática de PSS.
Cabe destacar que os resultados parciais dessa pesquisa foram amplamente descritos no trabalho intitulado “Inovação em Design para a Base da Pirâmide” publicado nos anais do 8 Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design, 2010, deixando claro que a inserção da sustentabilidade tornava-se imperativa para o desenvolvimento de produtos e serviços para a base da pirâmide, e apelando para a necessidade de definir novas abordagens para que designers e empresas pudessem fornecer novas idéias sobre o que poderia vir a ser aquilo que Victor Papanek denominara de design para o mundo real.
Um pós-doc no meio do caminho
Comecei a me aproximar de grupos de pesquisa que estivessem trabalhando com a temática de design para a sustentabilidade e que tivessem como foco os usuários de baixa renda. Foi quando no começo de 2011 descobri o trabalho dos professores Han Brezet e J.C Diehl da Faculty of Industrial Design Engineering na Delft University
of Technology , universidade holandesa mais conhecida como TU Delft.
Iniciamos uma intensa troca de e-mails que resultou num convite para fazer junto com eles um estágio pós doutoral. Assim, em junho desse ano, decidi me juntar o grupo de Design for Sustainability, DfS, liderado pelo professor Brezet, para dar continuidade à pesquisa intitulada “Desenvolvimento de produtos e serviços para a base da pirâmide social: uma proposta de metodologia de design”, que acabara de ser aprovada no edital de Pós Doutorado no Exterior do CNPq.
Fui muito bem recebido pela equipe holandesa, e não levou muito tempo para me entrosar com o grupo de pesquisadores que diariamente frequentavam o laboratório de DfS. Foi um ano de intensas conversas com os professores Brezet, Marc Tosul e Kandachar. Todos eles entendiam muito bem do tema, e recém tinham publicado o livro intitulado, Design for sustainability: A step-by-step approach editado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, PNUMA em 2009 e que servira como base para a minha pesquisa.
Mas seria com o professor J.C Diehl, mais conhecido como “J.C” com quem passaria longas horas conversando sobre o tema, acompanhadas com um cremoso chocolate quente servido naqueles dispensadores de bebidas que se encontravam espalhados pelos corredores do prédio da Escola de Design Engineering.
J. C. & Marcel Crul Design for Sustainability: A Step-by step Approach. PNUMA, 2009.
Frameworks de Design para a Sustentabilidade
De acordo com seu nível de mudança na dimensão social ou tecnológica.
Anos mais tarde, JC e eu voltaríamos a trabalhar novamente juntos num projeto da rede LeNS, sobre desenvolvimento PSS para economias distribuídas.
Na minha proposta, realizamos uma classificação das principais abordagens de DfS de acordo com o potencial para desencadear mudanças incrementais ou radicais em termos tecnológicos e sócio-culturais. Na figura acima, cada abordagem de DfS encontra-se posicionada numa matriz de dois eixos que representam a mudança tecnológica (eixo X) e a mudança sóciocultural (eixo Y), de acordo com o consumo de recursos naturais e energia da mesma. Por exemplo, se o produto da mudan -
ça tecnológica (T) e da mudança sóciocultural (C) implica uma redução de 90% ou mais no uso desses recursos, a abordagem pode ser considerada como sustentável. A hipérbole resultante, representada numa linha azul, representa o limite de sustentabilidade, e cada abordagem de DfS é localizada acima ou abaixo dessa curva de acordo com a condição do limite da sustentabilidade.
Conforme a figura, pode-se afirmar que as abordagens de Benchmarking e Eco-design ficam aquém dos requisitos de sustentabilidade, enquanto que abordagens como Cradle to Cradle Design podem ser consideradas alternativas sustentáveis no longo prazo. Já o Benchmarking e Eco-design, apesar de serem positivos em termos de impacto ambiental e social, não desenca -
deiam necessariamente uma mudança nos hábitos de consumo dos usuários, e dependem também de elevados fluxos de materiais e energia ao longo do seu ciclo de vida. Por outro lado, o Cradle to Cradle (Mc Donought & Braungart, 2002), apesar de ser uma abordagem sustentável, exige consideráveis esforços de pesquisa e desenvolvimento para produzir novas tecnologias, materiais e produtos que possam, no fim do ciclo de vida, circular em sistemas de ciclo fechado, reduzindo drasticamente o impacto ambiental sobre o ecossistema.
Por outro lado, na dimensão socio-cultural da inovação, abordagens tais como, Comunidades Criativas (Manzini, 2007), propõem novas formas de organização social que estão fora da lógica que impera nos sistemas de produção e consumo tradicionais, criando novos estilos de vida sustentáveis que não necessariamente dependem de avanços tecnológicos. Estas iniciativas surgem a partir de pequenos empreendimentos comunitários que geralmente estão organizadas em rede e apresentam um potencial para o desenvolvimento de projetos para a BoP porque permitem o acesso a produtos e serviços através de novos modelos de negócios e propostas de interação entre os membros de uma comunidade.
Nesse contexto, novas propostas de sistemas de Produto+Serviço (PSS) por exemplo, podem gerar mudanças nas duas dimensões da inovação, o que facilita o desenvolvimento sócio-econômico através da
ruptura dos modelos tradicionais de consumo individual de produtos, para um estágio de satisfação de necessidades baseado no consumo de serviços (Tukker & Tischner, 2004). Além disso, os PSS são formas de construção social que catalisam a participação dos interessados na geração do valor coletivo (Morelli, 2006).
Na sequência, conseguimos definir estratégias de inovação para a BoP. A ideia era poder dar resposta à seguinte pergunta: Como é possível traduzir o conceito de inovação para o contexto da base da pirâmide?
Para começar, sabíamos que as soluções para o BoP precisam implementar inovações de ruptura. Isso significa não só aplicar novas tecnologias mas também introduzir novos significados em propostas que permitam que uma grande parte da população, com menos poder aquisitivo, possa satisfazer suas necessidades mais básicas.
Pode-se afirmar que qualquer proposta de design para a BoP é o resultado da combinação de tecnologias (novas ou existentes) e significados (completamente novos ou familiares) os quais são apresentados aos usuários dentro de determinado contexto. Nessa perspectiva é possível gerar uma matriz com três abordagens estratégicas para a inovação. Essas abordagens são:
Framework para o desenvolvimento de propostas para a BoP.
inovação incremental, inovação evolucionária e inovação radical.
As soluções para a BoP precisam ser simples e funcionais. Porém, para produzir esse tipo de proposta, é imperativo que a equipe de projeto tenha uma compreensão aprofundada do contexto dos usuários de baixa renda. Para desenvolver propostas adequadas a esse contexto, se faz necessária a concepção novas metodologias e ferramentas de design que permitam entender melhor as complexas dinâmicas sociais, e as necessidades e motivações (explícitas e tácitas) dos usuários (Diehl, 2009).
A fim de entender como podem ser definidos os requisitos de projeto e parâmetros de design para a BoP, foi realizada uma pesquisa bibliográfica com estudos de caso significativos que foram projetados para esse contexto.
Seguidamente, através de uma análise qualitativa, foi possível fazer o levantamento dos requisitos que foram levados em consideração pela equipe de desenvolvimento durante a execução de cada um dos projetos contemplados. Depois de analisar as informações, foi possível agrupar os diferentes requisitos em quatro clusters, os quais formam a base do que seria uma abordagem integral de design para projetos da BoP.
Levando em consideração uma abordagem integral de design, formulamos a seguinte proposta metodológica que pode ser usada no desenvolvimento e implementação de produtos e serviços para a BoP dentro do contexto das economias emergentes.
Trata-se de uma abordagem iterativa baseada numa estrutura de análise, síntese e avaliação onde as especificações do projeto derivam a partir da compreensão do problema, gerando vários conceitos de design, os quais devem ser prototipados, testados e avaliados de forma que permitam fazer a melhor escolha.
O processo compreende cinco etapas iterativas, bem como uma lista das ferramentas necessárias para orientar cada fase, desde a definição e compreensão do problema até a entrega de uma solução robusta e testada.
Contrário às metodologias tradicionais que iniciam o processo com a aplicação de estudos de mercado ou de estudos de viabilidade econômica, nossa proposta sugere começar pela aplicação de técnicas de cunho qualitativo para coletar dados sobre o contexto do usuário que permita a com -
preensão das complexas dinâmicas entre usuários, artefatos e contexto. Porém, sabese que para chegar a um nível profundo de conhecimento do problema no contexto da BoP, o processo pode demandar tempo e recursos que na maioria das vezes são limitados. Tais barreiras exigem a adaptação e uso de métodos ágeis, visto que o objetivo, na perspectiva do design, é a coleta de informações que facilitem a tomada de decisão, e não a formulação de elaboradas teorias sociológicas.
Ferramentas e etapas da Proposta metodológica para o desenvolvimento de produtos e serviços para a BoP.
A criação de soluções significativas para o contexto BoP requer uma abordagem sistemática formulada a partir da definição de estratégias de inovação incremental, evolutiva ou radical que contemple não só a introdução de novas tecnologias, mas que também sugira novas propostas semânticas para os usuários. No final das contas, busca-se a possibilidade de desencadear novos comportamentos e hábitos de consumo mais sustentável. Por exemplo, uma alternativa para atingir esse objetivo seria explorando novas maneiras de satisfazer as necessidades do usuário através do desenvolvimento de sistemas de produto-serviço. os PSS tem o potencial de incentivar mudanças sócio-culturais de longo prazo, facilitando o processo de desenvolvimento sócio-econômico, a partir da oferta de serviços. Tal proposta permite que, ao invés da posse individual e consumo de bens, os usuários possam satisfazer suas necessidades por meio de novas propostas de PSS baseadas em baixo consumo de recursos e energia.
A co-criação tornou-se um elemento fundamental para o desenvolvimento de propostas para a BoP. Essa abordagem desenvolve novos vínculos entre empresas e usuários. Ajuda também a transformar o dia a dia dos usuários, tornando-os mais confidentes e autônomos para encarar e propor soluções aos novos desafios. Nesse processo o design torna-se uma poderosa ferramenta pedagógica que ajuda a definir o significado de soluções desejáveis para
os usuários, tecnicamente factíveis, economicamente viáveis e sustentáveis para o planeta.
Os resultados do meu pós-doutorado foram amplamente divulgados em diversos eventos internacionais, dentre os quais destaco a conferência Northern World Mandate 2012, organizada pela rede Cumulus na bela cidade de Helsinki, na Finlândia.
Na ocasião foi apresentado o artigo intitulado Design Considerations for Base of the Pyramid (BoP) Projects que, depois de um ano de trabalho, apresentava os principais achados da minha pesquisa sobre design para a BoP. Gosto de destacar esse evento porque consegui, pela primeira vez na vida, conhecer pessoalmente a monumental obra do arquiteto e designer Alvar Aalto; visitar as instalações da Iittala, renomada empresa finlandesa de cerâmicas e vasos de vidro; e por me reencontrar com Ezio Manzini para degustarmos um café e conversarmos um pouco sobre a vida no belo Pavillion da conferência.
Segundo a Antroposofia, escola de pensamento criada por Rudolf Steiner, a vida das pessoas é dividida em setênios. A cada período de sete anos que passa, podemos compreender com mais facilidade a condição cíclica da vida, somando mais conhecimentos e buscando novos desafios. Assim, segundo Steiner, ficamos melhor pre -
parados para a imersão na vida, com profundidade, maturidade e espiritualidade.
Nosso retorno para Recife, na metade de 2012, foi marcado por muitas emoções que davam início ao meu sexto setênio de vida. Por um lado, ficava a tristeza de deixar para trás a Holanda, esse belo país que nos deu uma calorosa acolhida e nos ensinou a desfrutar de cada minuto que temos, porque da mesma forma que a cada hora muda o clima daquele país, a vida é um fluxo contínuo de eventos que precisam ser vividos intensamente.
Por outro lado, estávamos de volta a casa, felizes de reencontrar amigos e colegas após um ano de ausência. Várias coisas tinham mudado no dDesign. O antigo Iraque, aquele espaço onde tive meu primeiro dia de trabalho na UFPE, tinha se tornado a sede dos laboratórios da pós-graduação e do curso de Doutorado em Design, o primeiro na área a ser ofertado em uma universidade federal.
Mal tinha começado a me adaptar de volta à rotina da universidade quando fui desafiado por meus colegas para algo que jamais tinha passado pela minha cabeça: assumir a Coordenação do Programa de Pós-graduação em Design. Confesso que na hora fui tomado por surpresa e somente após algumas noites mal dormidas e dias de intensas conversas com Carla, decidi aceitar junto com Ney, meu vice, o desafio de ser o novo coordenador do programa, marcando
dessa forma no começo de 2013, um novo setênio na minha jornada.
Ao mesmo tempo que assumi a coordenação do PPG Design, cargo que ocuparia por um período de quatro anos de vida acadêmica, comecei a lecionar, em parceria com Ney, a disciplina de Metodologia do Design na pós de design.
Da mesma forma na graduação, assumi a disciplina de Design de Produtos Sustentáveis e comecei a incorporar uma nova dinâmica de ensino dentro da sala de aula, fruto da minha vivência e aprendizado na TU Delft e que apresentarei mais adiante, quando fale sobre minhas experiências de ensino vivenciadas ao longo da minha jornada.
Aproveito também para fazer um novo parêntese e registrar outra grande alegria que marcou o início do meu sexto setênio.
No mês de outubro nascera Rafaella, minha filha caçula, que veio ao mundo com a missão de iluminar nosso caminho e tornar mais leve a nossa existência.
Rafaella, minha filha caçula.
Recife, 2013.
Delft, 2012.
Para o NEXUS, nosso grupo de pesquisa em Inovação, Design e Sustentabilidade, o setênio que iniciava em 2013 representou um período de muita atividade. Isso permitiu consolidar nossas propostas de ensino, pesquisa e extensão com uma intensidade que não tínhamos vivenciado em anos anteriores. Nossas atividades de pesquisa tinham como foco investigar novas metodologias, ferramentas e processos de inovação na área de design que pudessem ser aplicados na concepção e desenvolvimento de novos produtos e/ ou serviços tendo como foco o equilíbrio entre as três dimensões da sustentabilidade.
Café da Sustentabilidade.
Recife, 2013.
Todo aquele trabalho teve início com o Café da Sustentabilidade, uma série de seminários informais que organizávamos para debater, com alunos e professores, diversos temas contemporâneos enquanto degustávamos deliciosas xícaras de chocolate quente preparadas por Mabel Guimarães, agora minha orientanda de mestrado. Dentre as temáticas propostas nos seminários estavam a Indústria 4.0, a biomimética, a prototipagem rápida e impressão 3D, a fabricação digital, o design paramétrico e a inovação guiada pelo design (Design Driven Innovation).
Tempo depois, algumas dessas temáticas deram origem a vários projetos de pesquisa e de extensão mediante a captação de re -
cursos humanos e financeiros que nos permitiram conduzir várias dessas iniciativas de acordo com os quatro níveis de atuação que nos propusemos a trabalhar: Redesign de produtos existentes; Design de Novos Produtos; Design de Sistemas de Produtos-Serviços, ou PSS; e Desenvolvimento de Cenários para inovação social.
Os resultados desses projetos permitiu também a formação de uma rede de laboratórios de pesquisa na região Norte-Nordeste do Brasil, onde temáticas semelhantes começaram a ser estudadas. Por exemplo na UFC, na UFRN e na UFPB existem desdobramentos das pesquisas dentro do campo do design paramétrico e a prototipagem rápida para o desenvolvimento de
soluções para moradia e conforto ambiental regional.
Da mesma forma os resultados do trabalho foram amplamente discutidos nos diversos artigos, livros dissertações e teses produzidas pelos membros do NEXUS ao longo desses anos e nos permitiram consolidar o alinhamento entre as temáticas propostas com o DNA do nosso grupo de pesquisa, isto é com a inovação, o design e a sustentabilidade.
A continuação, apresento de forma breve alguns desses projetos desenvolvidos ao longo do meu sexto setênio e que, do meu ponto de vista, fornecem uma visão abrangente para o registro deste memorial.
Esta proposta, submetida ao Edital Universal do CNPq, dava continuidade aos estudos sobre biomimética aplicada ao design, realizados pelo nosso grupo de pesquisa, trazendo contribuições de aplicação desse conhecimento para o desenvolvimento de de novos produtos e serviços sustentáveis na área de moradia.
O projeto SAHARA, Sistema de Artefatos Habitacionais de Apoio, Resgate e Abrigo, buscava o desenvolvimento de uma proposta que atendesse as necessidades de acomodação de pessoas dentro de novos contextos contemporâneos.
O projeto visava o design de soluções temporárias de moradia de fácil construção e transporte, que permitissem abrigar um grande volume de pessoas em situação de calamidade como, catástrofes ambientais, campos de refugiados, realocação de comunidades, ou em cenários de acomodação turística complementar para frequentadores de mega eventos como olimpíadas, copa do mundo, carnaval, etc.
Ao longo das diversas etapas de desenvolvimento do projeto foi possível observar os hábitos, a percepção e o comportamento dos usuários junto a novas propostas de moradia, levando em consideração a experiência do usuário, a qualidade percebida do artefato, o conforto e segurança da proposta e seu impacto ambiental.
Ao mesmo tempo, foi possível testar por meio da construção de diversos protótipos, a performance de materiais e tecnologias
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61 \ Logomarca do Projeto SAHARA. Recife, 2013.
Estudos volumétricos para definição da forma do artefato habitacional do Projeto SAHARA.
Recife, 2013-2015.
Primeiros protótipos do sistema de artefatos habitacionais do projeto SAHARA. Recife, 2013-2015.
Renderings para visualização da distribuição e detalhamento do espaço interno do sistema de artefatos habitacionais do projeto SAHARA.
Acima: Vista interna do artefato.
Centro: Vista interna da cozinha.
Abaixo: Vista do cômodo superior.
Recife, 2013-2015.
Maquete de apresentação do Projeto SAHARA Escala 1:5.
Recife, 2014
construtivas diversas que permitissem o desenvolvimento de um sistema leve e de montagem rápida. No desenvolvimento do projeto foram incorporados também os conceitos de design paramétrico, prototipagem rápida e fabricação digital. Tais
conceitos permitiram executar ciclos mais rápidos de iteração e tomada de decisão ao longo do processo de inovação.
Como resultado, o artefato habitacional proposto promove uma evolução dos sistemas de habitação oferecidos para curto e médio prazo, introduzindo duas inovações importantes. A primeira inovação tem como foco um artefato que modifica os atributos do conceito tradicional de “casa”, e a forma como ela é percebida e utilizada pelos usuários.
Para isso, foram testadas novas soluções formais introduzindo o uso de módulos de montagem rápida e simples, elaborados com materiais leves, sistemas de geração de energia off-grid e peças desmontáveis e reutilizáveis após o período de utilização.
A proposta gerou o registro de patente no INPI sob o título “Sistema Habitacional para Cenários Contemporâneos de Moradia” (número BR1020120315530).
A segunda inovação tem a ver com o modelo de negócios proposto. O SAHARA está pautado na oferta de um Sistema de Produto-Serviço, PSS (Product-Service System). Nesse modelo não é oferecida a POSSE do artefato, somente seu USO. Por exemplo, uma família pode alugar o artefato por um determinado período de tempo.
A empresa se responsabiliza pela montagem e manutenção do mesmo ao longo do tempo de duração do contrato. Após o término desse período, o sistema é desmontado e encaminhado para manuten -
ção, ficando pronto para um próximo aluguel. Assim, dentro da lógica de PSS, busca-se promover o uso compartilhado de um mesmo artefato por diferentes usuários de segmentos e necessidade distintos (desastres naturais, grandes eventos, segunda habitação, etc., reduzindo consideravelmente o impacto ambiental gerado pelo descarte de materiais característico de outras soluções de moradia temporária disponíveis no mercado.
Dessa forma, acreditamos que a proposta ajuda a repensar a maneira como são definidas as políticas públicas para situações de desastre no Brasil, propondo uma forma preventiva mais eficaz de gerenciamento desse tipo de situações por parte de governos e prefeituras, onde por exemplo, uma rede de prefeituras poderiam gerenciar o estoque de um conjunto de artefatos e se preparar para uma eventual emergência, encurtando dessa forma, o tempo de realocação de famílias caso se apresente alguma calamidade. Em um curto espaço de tempo os artefatos estariam montados e disponíveis para o uso por parte das famílias afetadas.
Nossa participação neste projeto se deu a partir de uma parceria com o Grupo Interdisciplinar de Pesquisas em Sustentabilidade, GIPES na elaboração de uma proposta para o Edital CNPq de Ciências Sociais
Aplicadas. Nosso interesse na temática da Inovação Social abria uma nova frente de trabalho, tomando como ponto de partida várias das problemáticas debatidas sob a ótica do desenvolvimento sustentável que até então não encontraram uma resposta satisfatória dentro dos diversos grupos da sociedade.
Nesta pesquisa, tentamos compreender melhor como empresas, comunidades e sociedades se organizam para atender as demandas ambientais, sociais e de mercado. Esse tipo de estudos organizacionais é conhecido na academia como pesquisa em Inovação Social. Essa abordagem considera todos os aspectos relacionados com a dimensão econômica da sustentabilidade, considerada aqui como inovação tecnológica, de processo ou de produto, assim como da dimensão social e ambiental, considerando como princípio a indissociabilidade das dimensões.
Considera-se que o conceito de inovação, dentro de uma abordagem dominante, é entendido como um modelo descritivo do capitalismo avançado, na qual prevalece o crescimento econômico sob a ótica do capital. Bava (2004) afirma que metodologias que buscam esse modelo de crescimento submetem as sociedades a uma combinação perversa da aceleração do processo de capital com o aumento do desemprego, da pobreza, da desigualdade, da exclusão social, com a exploração sem limites dos recursos naturais.
Forças de mudança envolvidas no roadmap de conectividade.
Recife, 2013.
Diante disso, a inovação social surge como uma tentativa contra hegemônicas, de superação da sociedade, a partir de movimentos preocupados com as problemáticas sociais, criando-se um novo paradigma embasado em iniciativas que geram novas formas de organização social e oferecem novos instrumentos para o desenho de uma nova sociedade (FARFUS; ROCHA, 2007; BAVA, 2004). Deste modo, torna-se um desafio ao mesmo tempo em que desponta a relevância em se definir indicadores de inovação social para o contexto do desenvolvimento sustentável, portanto, propõese o seguinte problema de pesquisa: Como mensurar a inovação social?.
Desde finais da década de 90 já tínhamos uma compreensão de como as tecnologias da informação e comunicação, as TICs, transformariam nossas vidas para sempre e mudariam radicalmente a forma de fazermos design. Porém, por aquelas coisas que aparentemente só acontecem na periferia, foi só em 2013 que uma grande montadora de veículos nos convidou para pensar diversas formas de levar a conectividade até o carro. A princípio parecia um desafio simples. No entanto, um olhar mais aguçado revelou o quanto a empresa precisaria fazer para se atualizar nas questões de conectividade.
Fui convidado a fazer parte de uma equipe de pesquisadores liderada por Eduardo Peixoto, Presidente do Centro de Estudos Avançado do Recife, CESAR para encarar o desafio, dando início a uma jornada homérica de pouco mais de seis meses por diferentes cidades do Brasil. Nessa jornada buscávamos entender os diversos pontos de vista sobre conectividade no carro.
Começamos nossa aproximação ao problema entrevistando motoristas em cinco capitais do país. Conduzimos uma maratona de grupos focais com funcionários da empresa e realizamos vários workshops de criação com diversos grupos de especialistas no tema, para delinear a estratégia a ser adotada pela montadora.
Como resultado foram criados possíveis usos dessas tecnologias dentro de vários cenários futuros, os quais foram construídos utilizando forecasting, uma técnica de design utilizada na prospecção de cenários futuros. Junto com esses cenários foi construído um roadmap com todas as instruções e requerimentos para a implementação de tecnologias de informação e comunicação dentro do carro, que permitiriam que os usuários pudessem usufruir das tecnologias de conectividade durante uma viagem, seja escutando sua playlist favorita, pedindo ao assistente de voz o caminho mais rápido para chegar ao destino, ou recebendo uma notificação sobre um agendamento da próxima revisão e troca de óleo na oficina mais próxima.
Todas essas tecnologias estão disponíveis hoje na palma da mão. Porém naquela época eram um sonho de consumo dos motoristas que desejavam viagens mais confortáveis e seguras, com o suporte da tecnologia.
Entrevista com motorista. Projeto Roadmap da Conectividade, Porto Alegre, 2013.
Possíveis cenários para definição do roadmap de conectividade.
Recife, 2013.
Posse do Carro
Cidade Inteligente
Cidade Piora antes de Melhorar
Durante meu estágio pós-doutoral na Holanda, conheci o trabalho sobre Design Driven Innovation de Roberto Verganti, diretor do laboratório de LEAdership, Design, and Innovation da escola de negócios do Politécnico de Milano.
Naquele momento, as ideias propostas por Verganti caíram como uma luva para nossa pesquisa sobre inovação que recém começáramos a desenvolver junto com minha orientanda de mestrado, Gabriela Martins, sobre desenvolvimento de territórios inovativos.
A proposta de Verganti ajudou a consolidar nosso entendimento sobre processos de inovação em Design. Tais conceitos foram aplicados no projeto de pesquisa intitulado Design Driven Innovation para Economia Criativa, que fora submetido ao Edital CNPq/SEC/MinC com o objetivo de identificar a existência, ou não, de processos de inovação de significado nas práticas das empresas incubadas no recém formado Cluster de Economia Criativa do Recife.
O Portomídia, iniciativa promovida pelo Porto Digital visava o fomento das indústrias criativas (design, jogos, cinema, vídeo, animação, multimídia, fotografia e música) da cidade do Recife que pudessem contribuir com a melhoria da qualidade dos produtos e serviços de empresas que fazem uso intensivo das Tecnologias da Informa -
ção e Comunicação desse ecossistema de inovação.
Nesse contexto, nossa proposta focava no desenvolvimento de cenários prospectivos que pudessem viabilizar a criação de produtos/serviços/sistemas inovadores. Igualmente, o projeto tinha como diretriz, o desenvolvimento de uma rede de conexões e relacionamentos multidisciplinares, entre os atores chave do ecossistema do Porto Digital, isto é, uma rede de intérpretes que pudesse dialogar de forma continua compartilhando conhecimentos capazes de quebrar paradigmas, e incentivar o surgimento de inovações radicais ou incrementais de significado.
Dito de outra forma, a proposta almejava fornecer um entendimento sobre como o Portomídia poderia desenvolver um ambiente para a incubação de ideias com significados radicais no seu conglomerado de empresas e startups. Assim, a compreensão do potencial das Indústrias de Economia Criativa poderia ser aliado ao do design como transformador, como meio para fomentar novas propostas de produtos ou serviços para o Arranjo Produtivo Local de Pernambuco.
Como resultado deste trabalho sobre Design Driven Innovation, foram produzidas três dissertações sob minha orientação. Os trabalhos de Gabriella de Oliveira Martins, “Inovação e sustentabilidade: proposta de análise para o desenvolvimento de territórios inovativos aplicado ao APL de confec -
ções do Agreste”; André Oliveira Arruda, “Design aplicado a cenários prospectivos urbanos: Recife 2037”; Tarciana Araújo Brito de Andrade, antiga bolsista PIBIC e orientanda de TCC. “Estratégia de signifi cado para economia criativa: estudo de caso no Portomídia Recife”, geraram no grupo um profundo conhecimento dos processos de inovação dentro de contextos como os do Porto Mídia ou do APL de moda do Agreste Pernambuco.
MONTEIRO C. et all.
Parque Capibaribe A Reinvenção do Recife Cidade Parque.
Recife, 2019.
Em 2014, Circe Monteiro, professora do Programa de Arquitetura e Urbanismo da UFPE, coordenava um audacioso projeto pensado para a melhoria da qualidade de vida da cidade do Recife. O projeto Parque Capibaribe pretendia revolucionar a forma como as pessoas vivem o Recife ao conec tá-las com as águas do rio Capibaribe, principal rio que percorre a capital pernambucana, resgatando a bacia hidrográfica como espinha dorsal da cidade através de áreas de lazer, descanso e bem estar.
O projeto previa um sistema de parques integrados ao longo de 15km em cada margem do rio Capibaribe, no Recife, de transformações nas bordas do principal curso d’água da cidade. A iniciativa,, foi desenvolvida por meio de um convênio inovador entre a Prefeitura do Recife, através da Secretaria de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente do Recife, e o
INCITI, rede de pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
A convite de Circe, me envolvi nas pesquisas do Parque Capibaribe para colaborar no desenvolvimento de propostas de mobiliário urbano para os diversos espaços planejados do projeto. Junto com uma equipe de jovens e talentosos designers, dentre os quais destaco Caroline Lima, André Morais e Gabriella Martins, realizamos uma série de workshops que contaram com a colaboração dos moradores da cidade na criação e prototipação de possíveis ideias de mobiliário para o parque.
Nossa inquietação era a respeito de como incorporar os conceitos design paramétrico e fabricação digital na produção de peças de mobiliário que pudessem ser construídas utilizando os conceitos de “faça você mesmo” (do it yourself)
Por exemplo, num dos workshops foi desenvolvido um protótipo de um mobiliário conceitual, aplicando princípios da ergonomia e utilizando software de design paramétrico (Grasshopper). Na ocasião foi construída uma estrutura tridimensional em acrílico que representa o conceito de um mobiliário que, segundo a preferência do
usuário, permite múltiplas formas de utilização - sentado, deitado e encostado.
Da mesma forma, num outro workshop, os participantes construíram a peça de mobiliário intitulada “rede”, que buscava inspiração no universo dos pescadores da cidade. Nesta oficina convidamos também seu "Nego", um experiente pescador, morador do bairro de Brasília Teimosa, para nos ensinar as técnicas de tramas de rede de pescar.
Dessa maneira, foram geradas diversas possibilidades de mobiliário alinhadas com as cinco premissas do projeto, percorrer,
Proposta de intervenção urbana e estudos de mobiliário para o projeto Parque Capibaribe. Recife, 2015.
Oficinas de fabricação de mobiliário urbano do projeto Parque Capibaribe.
Acima: construção de um protótipo utilizando acrílico e cortadora a laser
Abaixo, seu “Nego” ensinando técnicas as técnicas de tramas de rede de pescar
Recife, 2015.
atravessar, chegar, abraçar e ativar. Visando dar destaque a tais premissas, a equipe projetou uma série de peças tentando juntar os atributos formais e funcionais levando em consideração a história e a cultura e a biodiversidade evidenciada ao longo do percurso do rio das capivaras.
Configuração das redes de economias centralizadas, descentralizadas e distribuídas definidas no projeto LeNSin.
Recife, 2017.
S.PSS in the context of
Em 2016 iniciamos nossa participação na rede LeNSin, The Learning Network on Sustainability International, a convite do professor Aguinaldo dos Santos da UFPR. O projeto do mesmo nome e liderado por Carlo Vezzoli, reconhecido professor de design do Politécnico de Milão, tinha como objetivo fomentar o desenvolvimento colaborativo, em plataforma aberta, de conteúdos didáticos na área de Design para a Sustentabilidade, em particular do design de Sistemas Produto+Serviço aplicados no contexto das Economias Distribuídas.
O projeto, financiado pelo Programa Erasmus+ Capacity Building in Higher Education, convocou a participação de uma rede de 15 universidades incluindo o Politécnico de Milão (Itália), Aalto University (Finlândia), TU Delft (Holanda), Brunel University (Reino Unido), Srishti University (Índia), Indian Institute of Technology (Índia), Tsinghua University (China), Cape
Península University of Technology (Africa do Sul), Universidades Autônoma de México e Universidad del Valle de México (México). No Brasil, a proposta contou com a participação da UFPR e da UFPE como instituições coordenadoras.
O projeto buscava entender como Sistemas Produto+Serviço, PSS poderiam ser aplicados no contexto das Economias Distribuídas em cinco áreas estratégicas a saber: Distributed Renewable Energy, (DRE); Distributed production of Information (DI); Distributed production of Software (DS) Distributed production of (hardware) Products (DP); e Distributed Design (DS). Cada uma dessas áreas foi acolhida por uma equipe de pesquisadores, para propor métodos e ferramentas, bem como de melhores práticas de ensino.
Dessa forma, o projeto LeNSin buscava contribuir com a formação de uma rede mundial de instituições de ensino superior para que os currículos dos cursos de design estivessem sempre atualizados e equiparados, em termos de conhecimento e conteúdo, sobre as melhores práticas e abor -
dagens em sistemas de produtos e serviços sustentáveis. Como benefícios da construção desta rede estava também a qualificação de uma nova geração de designers com vistas a treiná-los para encarar as pro blemáticas locais e globais em torno da sustentabilidade.
Foi nesse período que estreitei meus laços com o professor Aguinaldo dos Santos, brilhante pesquisador da UFPR e referência para nossa área de design para sustentabi lidade que, com o passar do tempo, con verteu-se em grande amigo e parceiro de caminhada pelo mundo.
Durante as atividades programadas do pro jeto LeNSin, tivemos a oportunidade de viajar a remotos locais e visitar culturas diversas enquanto tentávamos intercambiar nossos conhecimentos com os demais par ceiros da rede. São tantas histórias vividas juntos que talvez precisaria de um capítulo
aparte para conta-las, mas há um episódio em particular que chama minha atenção nesses tempos de terraplanismo.
Classificação e exemplos das tipologias de Economia Distribuída contempladas no projeto LeNSin.
Recife, 2016.
Prof. Aguinaldo dos Santos em Olinda durante a realização do 1 Curso Piloto da UFPE do Projeto LeNSin.
Olinda, 2017.
Apresentação final dos projetos do Curso Piloto da Universidade de Hunan.
Projeto LeNSin.
China, 2018.
Depois de passar duas semanas na cidade de Changsha, no interior do interior da China, ministrando um curso piloto sobre PSS na Universidade de Hunan, para o projeto LeNSin, eu e Aguinaldo comprovamos de uma forma um tanto acidental, que a terra é redonda. Na última segundafeira do mês de janeiro na China, cada um de nós voltou para casa por um caminho diferente. Aguinaldo retornaria de trem para Pequim e dali voaria para Paris onde
pegaria sua conexão para São Paulo. Eu por minha vez, após uma escala de um dia em Hong Kong, pegaria um avião para Dallas de onde retornaria em um voo direto, também para São Paulo. Curiosamente, quando cheguei em Guarulhos, após passar por aquele tedioso processo de imigração, e como se tivéssemos combinado local e hora, ali estava Aguinaldo!, na fila do embarque doméstico. Nossa grande
Almoço com os participantes do Curso Piloto da Universidade de Hunan.
Projeto LeNSin.
China, 2018.
a interação com outras culturas e conhe cimentos que fez desta a experiência de ensino, pesquisa e extensão que melhor elucida o exercício dessa tríade universitária de maior relevância na minha carreira.
Trabalhar pessoalmente ao lado do profes -
A intensa agenda de trabalho proposta no projeto LeNSin incluía uma série de atividades nos formatos de ensino, pesquisa e extensão que resultaram num frugal intercâmbio com integrantes das mais de quinze universidades parceiras do projeto.
Prof. Carlo Vezzoli ministrando uma aula no Curso Piloto da UAM.
Projeto LeNSin
Cidade de Mexico, 2017.
Encontro com a Profa. Brenda Garcia Parra, Alejando Ramirez e Aguinaldo dos Santos. Curso Piloto da UAM. Projeto LeNSin.
Cidade de Mexico, 2017.
Série de Livros
Design para a Sustentabilidade produzidos pela rede LeNS Brasil.
Curitiba, Editora Insight 2018-2020.
A agenda do LeNSin previa diversas atividades que seriam realizadas ao longo dos três anos previstos para o projeto, e que incluíam a realização de duas rodadas de cursos piloto em cada uma das universidades parceiras. Dessa forma, eu e Aguinaldo, coordenadores do projeto em nível Brasil, além de sermos responsáveis por organizar os cursos piloto brasileiros na cidades de Recife e Curitiba, participaríamos também dos cursos que seriam organizados por nossos parceiros na China e no México. Na próxima seção, falarei um pouco mais em detalhe sobre a experiência de realizar o primeiro curso piloto da rede aqui em Recife.
O projeto previa também a realização de dois seminários internacionais. Reunia professores, pesquisadores e representantes de empresas, para discutir como adotar
práticas de sustentabilidade nas empresas. No Brasil, no ano de 2016 organizamos, junto com Aguinaldo o 1st International Seminar on Sustainable Product Service Systems and Distributed Economies S.PSS&DE, na cidade de Curitiba. O evento contou com a participação de empresários e funcionários de empresas do ecossistema de empreendedorismo local.
Finalmente, para o encerramento do projeto foi proposta a realização da The LeNS World Distributed Conference - Designing Sustainability for All, um evento pioneiro em formato totalmente virtual, algo inimaginável para o ano de 2019, que reunia num mesmo “espaço e tempo” todos os parceiros da rede. Imagine conectar em um mesmo horário colegas da cidade do México, Recife, Milão, Changsha, Cidade do Cabo e Beijing. Enquanto os mexicanos
paravam para ir dormir.
Na ocasião, tive a honra de ser Keynote Speaker do evento, ao lado de reconhecidos pesquisadores da área como o professor Xiaobo Lu, Decano da Academy Arts & Design, Tsinghua University e do professor Walter R. Stahel, fundador do Product-Life Institute, um dos pioneiros e defensores do conceito de Circular Economy.
A experiência acumulada ao longo dos três anos de duração do projeto foi registrada em uma série de livros que foram disponibilizados gratuitamente para a comunidade acadêmica sob licença Creative Commons, e que junto com uma série de materiais pedagógicos, apresentações e estudos de caso, se encontram disponíveis para down-
lens-international.org). A Rede LenS Brasil publicou quatro livros. Destes fiz parte como co-autor de capítulos em dois deles: Sistema Produto-Serviço Sustentável: Fundamentos (2018) e, Desenvolvimento Sustentável: Dimensão social (2019).
Da mesma forma, a Rede LeNSin publicou em 2021 pela editora Springer International o livro Designing Sustainability for All: The Design of Sustainable Product-Service Systems Applied to Distributed Economies do qual participei como co-autor de três capítulos.
Participantes do Curso Piloto da UFPR. Projeto LeNSin.
Curitiba, 2018.
Vezzoli, Parra e Kohtala. Eds. Designing Sustainability for All: The Design of S.PSS applied to Distributed Economies.
London: Springer, 2021.
Juntando as diversas experiências sobre as práticas de ensino de design ao longo da minha jornada acadêmica, comecei a fazer uma série de reflexões sobre como poderíamos preparar nossos alunos de design para encarar e ajudar a resolver os complexos desafios enfrentados pela sociedade, que foram sintetizados nas ODS da ONU. Que tipo de talentos precisaríamos identificar e que tipo de habilidades e competências precisaríamos desenvolver nesses alunos para que possam dar conta dos problemas contemporâneos do mundo? Mais ainda, como podemos desenvolver diretrizes para elaborar uma proposta pedagógica de um curso de design voltado para o futuro?
Para tentar achar respostas para essas perguntas, apresento a continuação uma série de relatos sobre minhas experiências de ensino ao longo desses dezessete anos de história acadêmica.
Experimentos com Gesso para tornar o material flutuante como bolhas de sabão.
Disciplina de Operações Morfológicas.
Recife, 2008.
Nesta primeira experiência de ensino de design realizada no final de 2008, uma inquietação sobre a capacidade inventiva e a produção de alunos de arquitetura e design era tema frequente de conversa entre os professores do curso. Alguns professores estavam insatisfeitos com o reduzido grau de inovação e a pequena quantidade de alternativas que eram levantadas a partir da apresentação de um determinado tema de projeto.
Nesse momento, junto com Ney Dantas, nos propusemos a conduzir uma série de experimentos em torno do processo de
criação. Nossa principal hipótese era de que a existência de uma rígida hierarquia e linearidade das atividades estabelecidas nos métodos tradicionais de ensino causava uma restrição à criação e desenvolvimento de soluções inovadoras.
Para entender e propor soluções para esta inquietação, decidimos ofertar de forma conjunta uma disciplina experimental para os alunos de arquitetura e design, aproveitando a flexibilidade do currículo do curso de design.
A ideia de imaginar uma forma de gerenciar o processo de criação em design, algo que batizamos de CPM — Creation Process Management, começou a ser construído de
forma experimental ao longo dos três se mestres disciplinares.
No primeiro semestre reafirmou-se a im portância do FAZER e da vivência com a MATÉRIA no processo de criação. Contan do com a colaboração de Luciano Peres, professor e químico especialista em gesso do ITEPE, foram conduzidos diversos expe rimentos em laboratório para compreender, dentro das nossas possibilidades, os limites do material. Surgiram possibilidades como gesso semi flexível, gesso flutuante, gesso para blindagem, gesso com memória. Apesar do surgimento de propostas inovadoras, os alunos tiveram muita dificuldade de colocar a “mão na massa”. A importância de SENTIR e CONSTRUIR no processo de criação apareceram claramente como processos estruturadores.
No segundo semestre a disciplina procurou construir pontes entre o fazer e o pensar, para isso a ênfase saiu da matéria para um produto, não um objeto isolado mas um sistema. O desafio foi desenvolver propostas de mobiliário urbano para a orla da Praia de Boa Viagem, o cartão postal da cidade do Recife. Depois de diversas vivências na praia, como andar pela calçada de olhos vendados e construir maquetes conceituais com areia, os alunos conseguiram alcançar um SABER sensorial e quebraram o gelo entre a mente e a matéria, permitindo-lhes fazer uma reflexão mais aprofundada sobre o que SIGNIFICAVA a idéia de mobiliário urbano para aquele contexto.
As propostas criavam espaços específicos e multi-programáticos. Assim a articulação entre a praia e os edifícios, o calçadão e a areia poderiam ser utilizados também como brinquedos, áreas de contemplação e descanso, apoio para prática de ginástica ou meditação. Ao final do semestre estava claro para os professores que juntamente com os processos de SENTIR E CONSTRUIR se agregaram os de SABER e SIGNIFICAR.
A constatação, no semestre anterior, de que o processo de significar restringia a liberdade de criação e inovação limitando a produção de alternativas extraordinárias,
Construção de Maquetes Conceituais na praia de Boa Viagem.Disciplina de Operações Morfológicas Recife, 2008.
Propostas de Mobiliário Urbano para a praia de Boa Vigem. Disciplina de Operações Morfológicas.
Recife, 2008.
forneceu bases para a proposta no terceiro e último semestre.
A disciplina deu ênfase às explorações formais. Resolvemos propor um desafio onde os alunos, por simples afinidade, deveriam escolher uma forma qualquer da natureza e explorá-la ao seu limite. Houve uma grande perplexidade inicial com os alunos, muitos travaram. A ideia de explorar uma forma sem atribuir um significado pareceu completamente sem sentido. Não se sabia por onde começar, que forma escolher, como sentir ou o que construir. Mesmo esta liberdade com poucos limites parecia aterradora.
Aos poucos os alunos começaram a explorar a forma das cascas de semente, texturas, animais etc. e a partir da segunda metade do semestre as coisas começaram a ficar mais claras. Os professores compre
enderam como a participação e o autoconhecimento do CRIADOR e da CRIATURA eram importantes neste desafio.
Instruímos os alunos a procurar entender o que a “criatura” queria, para assim estabelecer um diálogo com ela. Os processos de VISUALIZAR e de PRECISAR a forma ajudaram muito no estabelecimento deste diálogo. Ao final os alunos perguntaram às formas o que elas queriam ser e muitos produtos inovadores surgiram, como telefones celulares para deficientes visuais, bancos aranhas e travesseiros.
Desta terceira experiência percebemos que cada criador tem um tempo e uma forma diferente de se aproximar do problema. Isso nos levou a levantar uma hipótese, ainda por ser testada, que o processo de criação pode ser iniciado com ênfase em
designer pode procurar SIGNIFICAR, pode iniciar VISUALIZANDO, ou procurando SABER sobre aquela necessidade SENTIDA de criar algo.
Esta jornada de três semestres de disciplina e mais um ano de reflexão sobre os caminhos da criação nos levaram à elaboração inicial de um diagrama para gerenciamento dos processos de criação –CPM. À esquerda do diagrama estão os processos ditos “racionais “- sentir, saber e significar e à direita os processos “intuitivos” –visualizar, precisar e construir. Da mesma forma CRIADOR e CRIATURA também foram incluídos como sub-processos da Criação.
Este diagrama apresenta de forma didática processos que consideramos chave para a criação nos campos de arquitetura e design. Ele mostra como estes processos se inter-relacionam e como formam um sistema coeso que, através de cada módulo podem se ligar a outros processos formando estruturas diferenciadas. (por isso cada criação é única).
Anos mais tarde, as experiências realizadas para entender o processo de criação foram fundamentais na condução das oficinas de criação de propostas de mobiliário urbano para o Projeto do Parque Capibaribe, descrito anteriormente.
Este diagrama, gostaríamos de enfatizar, é uma representação bidimensional de um fenômeno mais complexo, que é tridimensional. Da mesma forma que os planetas, acreditamos que os processos da criação se
Diagrama do dos Processos de Criação. Disciplina de Operações Morfológicas.
Recife, 2009
Proposta de Travesseiro. Disciplina de Operações Morfológicas.
Recife, 2009
Prof. Carlo Vezzoli ministrando aula durante o 1 Curso Piloto da UFPE Projeto LeNSin.
Recife, 2017.
o ensino da sustentabilidade na
No Brasil, iniciativas em direção à sustentabilidade são parte da agenda de redes de pesquisa como a LeNS Brasil, da qual faço parte há mais de uma década. Tais iniciativas buscam discutir nosso papel como educadores e pesquisadores em um processo de aprendizagem social.
Nosso desafio é abrir um diálogo permanente que nos ajude a encontrar novas formas de aprender e compartilhar conhecimento, vislumbrando a aplicação de novos modelos e paradigmas de design que nos ajudem a superar nosso estilo de vida insustentável.
Dessa forma, em 2015, recebemos com grande interesse o convite do professor Carlo Vezzoli, do Politécnico de Milano, para participar do Projeto LeNSin.
Dentro das atividades do projeto, estava prevista a realização de um curso piloto em cada uma das universidades parceiras.
Assim, em junho de 2017, num período pós São João de muita chuva, que provocou falta de energia no campus, alagou a cidade, e em seguida foi tomada por uma greve dos motoristas de transporte público foi realizado o 1o Curso Piloto do projeto LeNSin no Centro de Ciências Sociais Aplicadas, da da UFPE.
O curso que foi oferecido para toda a comunidade acadêmica com o propósito de desenvolver propostas de Sustainable Product-Service Systems, S.PSS, para o Cluster de Moda de Pernambuco e chamou a atenção de graduandos, mestrandos, doutorandos e professores de várias instituições de Pernambuco, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná e também do Pará.
Ao longo de duas semanas, o curso foi lecionado em parceria com o prof. Carlo
Vezzoli (Politécnico de Milão), Elisa Baquetti (Politécnico de Milão), Liu Xian (Tsinghua University, China), Xia Nan (Tsinghua University, China) Edurne Batista (Universidade del Mar del Plata, Argentina), Mariana Osório (Universidad del Rio de la Plata, Argentina) Aguinaldo dos Santos (UFPR), Rita Engler (UEMG), Priscilla Lepre (UFAL), Viviane Nunes (UFU), Liliane Chaves (UFF), Carla Pasa (UFPE) e eu, e suportado por vários estudantes de mestrado, iniciação científica, e doutorado dos cursos de Administração e Design da UFPE.
O método adotado para o curso foi estruturado em módulos flexíveis, personalizados para as necessidades específicas e contexto do curso piloto (perfil dos participantes, restrições de tempo, desafio proposto, empresas envolvidas, etc).
Cada módulo foi proposto em torno de uma quest, uma missão que os participan -
tes precisavam completar e apresentar em formato de pitch no final do dia. Na sequência, alunos e professores discutiam e validavam os principais conceitos por meio de um processo de mentoria.
Os módulos definidos para o curso foram:
Introdução ao S.PSS e DE, projeto de sistema para sustentabilidade, aula de campo, exploração de oportunidades, projeto de conceito e detalhamento do sistema.
A jornada começou com a introdução dos conceitos de S.PSS e Economia Distribuída e a proposição do desafio de design. Em seguida, uma excursão de campo foi organizada ao Cluster de Moda do Agreste Pernambucano nas cidades de Toritama e Caruaru, interior de Pernambuco, para coletar dados e dar aos participantes a oportunidade de "experimentar" algumas das questões descritas no desafio apresentado em sala de aula.
Participantes do Curso Piloto da UFPE aplicando a ferramenta de SWOT.
Projeto LeNSin. Recife, 2017.
Projeto
No módulo de Design de Sistemas para Sustentabilidade, os alunos confrontaram insights coletados durante a aula de campo com critérios de sustentabilidade utilizando ferramentas como o Sustainable Design Oriented Toolkit, (SDO). Além disso, estudos de caso foram apresentados por professores participantes da LeNSin Brasil.
sanato desenvolvidos a partir de sobras de jeans.
Conceitos de PSS elaborados pelos participantes do Curso
Piloto da UFPE
Projeto LeNSin.
Recife, 2017.
Nessa época, os alunos foram divididos em grupos para escolher os temas que iriam desenvolver para o desafio de design. Dois grupos estavam interessados em desenvolver alternativas S.PSS para a lavanderia de jeans, outro grupo se interessou por alternativas para a fabricação de calças, e um grupo se concentrou em propostas de arte -
Durante o módulo Explorando Oportunidades de Inovação, surgiram os primeiros conceitos de PSS. O processo foi apoiado por sessões de criatividade usando ferramentas como Tomorrow Headlines (manchetes de amanhã), Bodystorming e Brainwriting de ideias. Na sequência, para o módulo Design conceito do sistema, os alunos apresentaram e validaram ideias iniciais com professores e representantes do cluster de moda do agreste.
No módulo Detalhamento do Sistema, os alunos utilizaram ferramentas como prototipagem de PSS e Projeto de Serviço. Nessa
Representação das etapas propostas durante o Curso Piloto da UFPE. Projeto LeNSin. Recife, 2017.
fase, eles precisavam transformar todas as ideias em um conceito de design coerente e criativo utilizando ferramentas de animação e vídeo e protótipos, acompanhados de uma apresentação em formato de elevator pitch
As apresentações finais e informações detalhadas sobre cada um dos conceitos S.PSS encontram-se disponíveis na plataforma LeNSin em www.lens-international.org.
A primeira proposta, a Mamute Laundry, trata-se uma plataforma de conhecimento de código aberto, onde microempreendedores tem a possibilidade de criar, protóti -
pos e produzir coleções de jeans de forma eco- eficiente e em pequena escala.
Já a proposta da Lavato, consiste num conceito de S.PSS que busca transformar o lodo resultante do processo de lavagem das calças jeans em tijolos para construção de calçadas.
O VIP, outro dos conceitos de PSS, propõe a criação de um espaço colaborativo para a produção de moda socio-ética, promovendo assim o empoderamento dos trabalhadores, principalmente mulheres do distrito da moda.
Finalmente, Mulheres de Argila propôe um projeto social para ajudar mulheres de baixa renda da comunidade do Alto do Moura ( localizada a 200 Km do Recife), e arredores a se tornarem economicamente ativas na região, produzindo peças de arte sanato a partir das sobras de tecido do processo de Fabricação de calças jeans.
A realização deste Primeiro Curso Piloto deixou várias lições aprendidas sobre o desafio de ensinar um curso sobre design para a sustentabilidade na periferia dentre as quais destacamos as seguintes:
Em primeiro lugar, a mistura de alunos de diferentes disciplinas de conhecimento mostrou-se bastante eficaz no processo de aprendizagem. Junto com isso, a participa ção de docentes de outras universidades resultou num prolífico processo de discus são de ideias sobre como replicar o ensino de design.
Numa proposta de sala de aula invertida, entrar em contato direto com o problema através de uma visita ao local, apesar das restrições de tempo, deve ser considerado um elemento essencial num curso piloto, visto que melhora o processo criativo e resulta em um processo mais empático. Além disso, esse estudo de campo acelera o vínculo entre os membros da equipe, resultando em uma boa atmosfera para a parte prática do curso.
Apresentação de um dos grupos participantes dos Diálogos South to South coordenados pelo prof. Mariano Ramires. Rede LeNSin. Recife, 2019.
Cartaz de divulgação do evento Diálogos South to South promovidos pela Rede LeNSin Recife, 2019
Costumo dizer que os resultados do projeto LeNSin foram, e continuam sendo incríveis. Além do intercâmbio de conhecimentos, a rede de parceiros que se formou em todos os continentes é o mais gratificante. Em função disso, o professor Mariano Ramirez pesquisador da University of New South Wales, Sydney, Austrália, e coordenador da Rede LeNSin Oceania veio a Recife para uma curta estadia no ano de 2019, nos brindando com uma série de palestras e atividades de extensão.
O evento chamado Diálogos South to South discutiu como o design e a inovação podem contribuir para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU. A proposta tinha como objetivo fomentar as relações de colaboração entre instituições da Austrália e da América La-
tina, compartilhando conhecimentos e dutos, serviços e sistemas sustentáveis com impactos positivos à sociedade, à economia e ao meio ambiente.
Na proposta foram apresentadas duas oficinas para os alunos e professores do dDesign. A primeira oficina intitulada de “Mudança para o comportamento sustentável” explorou estratégias de eco-design para comportamento de consumo responsável.
Enquanto que a segunda “Design e os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável” trabalhou junto com os participantes, soluções criativas no contexto dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
O interessante desta experiência foi ver como temáticas comuns ao design, podem ser trabalhadas desde perspectivas diferentes, mas complementares. O olhar sobre a sustentabilidade, compartilhado pelo professor Mariano desencadeou uma rica troca de conhecimentos e práticas de ensino que evidenciaram divergências e pontos de vista em comuns da nossa atividade acadêmica e profissional. Assim, esse olhar desde periferias diferentes deu início a uma
conversa que ainda não terminou, os diálogos South to South.
Os Diálogos South to South, definiram uma série de futuras atividades de cooperação internacional entre instituições parceiras, com vistas a elaboração de projetos conjuntos, materiais didáticos, publicações, intercâmbios internacionais e supervisão de trabalhos de pós-graduação. O projeto foi temporariamente suspenso por conta da pandemia de COVID 19, mas aos poucos começamos a retomar as atividades propostas na agenda.
Ensino de Moda: uma ciranda de todas as artes
Em todos esses anos que moro em Recife, uma das coisas que me chama muito a atenção é o dinamismo da cena da moda na capital pernambucana. Lembra um pouco de Harajuku, o agitado distrito da moda japonesa localizado em pleno cora -
Participantes do evento Diálogos South to South promovidos pela Rede LeNSin. Recife, 2019.
Reportagem sobre desfile de moda dos alunos do curso de design da UFPE na Fenearte.
Recife, 2019.
ção de Tokyo. Ao igual que na capital nipônica, aqui em Recife, em qualquer época do ano é possível participar de eventos e desfiles de moda, assim como visitar as coloridas lojas de moda autoral espalhadas pelos quatro cantos da cidade.
Talvez seja esse um dos motivos pelos quais, muitos dos alunos do Curso de Design se interessam por essa área. Da mesma forma, vários dos meus orientandos de mestrado e doutorado, que trabalham com design de moda a muito tempo, ingressam no mestrado com o interesse de realizar pesquisas na área de moda tendo como foco a criação e produção de moda sustentável.
Aproveitando, mais uma vez, as vantagens do currículo do Curso de Design, algumas das orientandas da área de moda como Mabel Guimarães, ex-bolsista Pibic, Victoria Fernandez, Gabriela Lyra, e mais recentemente o aluno Paulo Medeiros, aproveitaram para realizar seu estágio docência numa proposta de disciplina que lhes permitisse aplicar todo o conhecimento e a experiência profissional.
A disciplina intitulada de Indústria da Moda, Produção e Consumo é ofertada para os alunos do curso através de uma proposta que busca estudar a cadeia produtiva da moda, desde a pesquisa de tendências até a costura final, trabalhando de forma colaborativa para chegar a um resultado único e muito interessante, como na última vez que a disciplina foi ofertada,
antes da pandemia, em junho de 2019, que culminou com a apresentação de um desfile de moda na Fenearte, uma das mais importantes feiras de artesanato da região Nordeste.
Nessa ocasião, foram apresentados ao público uma coleção de 16 conjuntos de pecas inspirados na "Ciranda de todas as artes", tema da feira. Para a elaboração das peças, queríamos deixar os alunos e alunas livres para criar o que quisessem, com qualquer tecido, qualquer cor, qualquer ideia. E o tema da ciranda casou perfeitamente, porque a diversidade da coleção representou muito bem a pluralidade da ciranda.
Gosto de citar este exemplo porque condensa toda uma série de experiências sobre como conectar academia e mercado de uma forma quase natural, permitindo que os alunos ganhem um aprendizado que não é encontrado nos livros de design.
Aliado à minha trilha pelos caminhos da sustentabilidade, a inovação sempre esteve presente nas minhas atividades. Para co meçar, compartilho com Bonsiepe a ideia de trocar a palavra criatividade, fortemente associada ao fazer design, pelo termo de inovação.
O conceito de inovação tem sido debatido ao longo dos últimos oitenta anos de histó ria. Começando pelas primeiras ideias so bre empreendedorismo propostas por Jo seph Schumpeter, passando pela publica ção de uma das referências mais citadas na área, o Manual de Oslo, até a consolida ção do conceito nos estudos de Peter Drucker, a temática ainda não se esgotou, motivo pelo que é difícil chegar a um con senso sobre seu significado. Em design gosto da ideia de entender a inovação como um processo de busca de soluções para um determinado público que tem o potencial de ser transformado em um modelo de negócio viável, factível e sustentável.
Por volta de 2015, a convite do meu colega e amigo, o professor André Neves também do departamento de design, fui participar de um experimento de ensino revolucionário. Tratava-se de uma “disciplina” de projeto oferecida pela dupla formada por Cristiano Araújo e Geber Ramalho, brilhantes professores do Centro de Informática da UFPE.
Mentores da disciplina de Projetão, Guilherme Ranoya, Cristiano Araújo, Luciano Meira, José Cavalcanti, Leonardo Castillo, Geber Cardenas e Silvio de Paula.
Recife Antigo, 2019.
na, juntava alunos e professores de diversos cursos da UFPE, como engenharia de software, ciência da computação, psicologia, design e engenharia biomédica, para conjuntamente propor diversas maneiras de resolver os problemas da vida real.
Divididos em grupos de 12 e 16 integrantes, os alunos de diversos cursos de graduação da UFPE escolhem uma demanda real da sociedade, como as contempladas dentro dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da ONU, e desenvolvem soluções inovadoras. Não é só o desenvolvi\ \ 101 \
Reunião dos alunos da disciplina de projetão com os mentores para discutir detalhes do projeto. Centro de Informática da UFPE.
Recife, 2018.
o produto final, como um aplicativo ou o protótipo de um artefato (daí minha conversa inicial sobre inovação).
Para escolher o problema, objeto do trabalho, os alunos precisam observar o local em que ele está inserido, seja uma escola, hospital ou praça; entender quem são as pessoas que estão ali; quais suas dores e desejos; e qual o problema e o impedimento para que o desejo seja atendido.
Semanalmente, os universitários são desafiados a resolverem uma quest, um desafio com uma série de perguntas relacionadas ao problema-tema escolhido. onde eles precisam mostrar se as decisões que estão tomando são coerentes, justificando, por exemplo, se o problema escolhido é relevante.
Os professores, que no contexto Projetão são denominados mentores, contribuem na construção das propostas, cada um sob sua ótica. Assim, a ciência da programação e a engenharia de softwares ficam, obviamente, com questões ligadas à programação. O design é incumbido de entender a jornada do usuário e de propor soluções que possam resolver os problemas de forma criativa e eficaz. A psicologia, ajuda a embasar a escuta do outro, a identificar demandas e desejos dos usuários assim como e compreender melhor o comportamento das pessoas. A engenharia biomédica, a química e a administração de empresas, incorporadas recentemente, vieram para incluir a diversidade de olhares.
O Projetão não prevê ensinar conceitos de administração, de programação, de psico -
logia ou de design e sim, desencadear nos alunos o processo criativo de descoberta de problemas e proposição de soluções inovadoras.
A disciplina se estende para fora da sala de aula. Dentro da própria universidade os alunos começam a usar as demais disciplinas para se aprofundar no problema. É uma mudança considerável na forma de ensinar porque as coisas podem fazer mais sentido a partir da resolução de problemas. Isso muda radicalmente o comportamento dos estudantes
Embora a disciplina não tenha pretensão de criar empreendedores, este foi um de seus “efeitos colaterais”. Os projetos finais são apresentados numa jornada denominada de Demo Day no Porto Digital, no Recife, considerado um dos principais par -
ques tecnológicos do Brasil. Nesse dia, as propostas são apresentadas para grupos de empreendedores e investidores de startups sediadas no Porto Digital.
Foi o caso da In Loco, startup unicórnio do nordeste que teve o embrião concebido na disciplina de Projetão. Quando cursaram a disciplina, os alunos fundadores da In Loco desenvolveram um aplicativo para shoppings com navegação para espaços internos (uma espécie de GPS), jogos e ofertas especiais para os consumidores que tivessem o app instalado. André Ferraz, sócio fundador da empresa, conta que o produto exigia uma solução de navegação que funcionasse em locais fechados. “Descobrimos que essa tecnologia ainda não existia e decidimos criar a nossa própria geolocalização indoor. Fizemos muita pesquisa
\ \ 103 \ Alunos da disciplina de projetão fazendo uma demonstração do projeto de Guarda Volumes para Praia, “Guardaqui”. Recife, 2018.
Alunos e professores da disciplina de Projetão preparando as apresentações para o Demo Day.
Recife, 2017.
acadêmica e prototipações. Após algumas semanas, conseguimos criar um protótipo interessante que tinha um bom raio de precisão. A primeira versão da nossa tecno logia só utilizava os sinais da rede Wi-Fi”, acrescenta Ferraz, “surgiu ali uma oportu nidade para desenvolver o primeiro modelo de negócio. Sem a disciplina Projetão provavelmente, a In Loco e a nossa história empreendedora não existiriam.”
O Projetão já chamou a atenção do Ministério da Educação e fomos convidados para replicar o modelo de projetão nos Institutos Federais do país. Assim, em dezembro de 2019, junto com o professor Cristiano Araújo, da engenharia da computação, visitamos três institutos de Minas Gerais com o intuito de rodar um curso piloto nesses locais.
Parte do “sucesso” da disciplina vem da o sistema” e derrubar o -
zada onde cada curso só olha para seus próprios interesses. A interdisciplinaridade nos oferece a possibilidade de criar empatia com estudantes e professores das outras áreas do conhecimento, dando ao aluno a possibilidade de entender o que é o trabalho do outro, do engenheiro, do psicólogo, do designer.
Palestra sobre perspectivas do design contemporâneo. Simpósio de Design Sustentavel 2021.
Curitiba, 2021.
É muito provável que em 2020 ninguém esperasse uma mudança radical dos nossos hábitos por conta da pandemia de Covid -19. Após os primeiros meses de isolamento total, percebemos que a vida precisava continuar de alguma forma, e para nós, professores e pesquisadores foi necessário encarar de vez o desafio de aprender a trabalhar de forma retoma.
Não imaginava que o aprendizado do projeto LeNSin já nos tinha ensinado o caminho. A organização da primeira conferência distribuída, The LeNS World Distributed Conference em abril de 2019, representou, para todos os participantes da rede, um grande aprendizado coletivo sobre as possibilidades da chamada “presencialidade remota”, na qual, chineses, italianos, brasileiros, mexicanos e sul africanos nos conectávamos simultaneamente para compartilhar e debater ideias sobre variados assuntos da sustentabilidade.
Em meados de 2020 decidi encarar a pandemia como uma grande oportunidade de aprendizado.
Assim, fui um dos primeiros a ofertar disciplinas em modo remoto na graduação e pós-graduação em design da UFPE, explorando e aprendendo a usar diversas ferramentas como Zoom, Meet, Slack, Miro, Trello, Discord e Strateegia, dentre outras.
Uma das primeiras disciplinas que meus colegas e eu adaptamos para o modo remoto foi a disciplina de Projetão, que depois de três semestres contínuos de aulas on-line, continua demonstrando as vantagens da presencialidade remota.
Os alunos conseguem realizar todas as quests aplicando ferramentas digitais de design como netnografia, jornada do usuário, sondas culturais. Conseguem também construir protótipos utilizando ferramentas como Figma e Miro. Da mesma forma, a comunicação e o trabalho de grupo é mediado por aplicativos e plataformas diversas como Discord, Trello ou Slack. Já para
\ \ 107 \
as demonstrações dos projetos e apresentações do Demo Day utilizamos o Wonder.me, uma plataforma que simula os espaços de uma conferência, assim como acontecia no ambiente físico, antes da pandemia.
Da mesma forma, e seguindo aquele formato do Café da Sustentabilidade, evento que organizávamos antes da pandemia no nosso laboratório de pesquisa, decidi, para minha disciplina de pós-graduação Fun -
damentos em Design de Artefatos Digitais, organizar encontros síncronos, convidando pesquisadores de todo o Brasil para falar sobre diversas formas de fazer pesquisa qualitativa em design. Após cada sessão, dávamos continuidade ao debate na plataforma strateegia.digital, onde os alunos discutiam e comentavam cada uma das questões chaves que foram levantadas durante o momento síncrono com o pesquisador convidado.
Apresentação sobre Netnografia para os alunos da disciplina de Métodos de Pesquisa Qualitativa em Design Recife, 2021.
Apresentação das ODS durante o Curso de Emprendimientos Sociales en Brazil. Recife, 2021.
Apresentação da empresa Nguzu para a disciplina de Projetão
Recife, 2021.
Teve também outro momento daqueles que deixa o professor vibrando de emoção. Foi a atividade de extensão realizada em 2021 intitulada “Emprendimientos Sociales en Brazil” que atendeu a um chamado da Diretoria de Relações Internacionais, DRI, e representou a UFPE em uma proposta de internacionalização, que teve como público-alvo participantes vinculados à instituições parceiras da ANDIFES – Associação Nacional dos Diretores das Instituições Federais de Ensino Superior, no México, Argentina, Colômbia, Chile, San Tomé e Príncipe e várias universidades brasileiras.
O curso lecionado em português e espanhol foi um momento de troca cultural e de conhecimentos técnicos muito proveitosos, onde a comunicação dos participantes foi mediada pelas mesmas ferramentas utilizadas em outras dinâmicas.
Em resumo, nesses quase dois anos de pandemia foram mais de quatro mil horas conectado à internet, participando dos mais variados eventos e aulas
cluindo palestras, cursos, aulas, conferencias, bancas, seminários, colóquios, reuniões e debates. Fazendo uma “conta de padaria” seria o equivalente às horas que um piloto faria por ano voando todos os dias, ida e volta, na rota Recife - São Paulo.
Essa imersão no ambiente digital nos fez questionar quais seriam as possibilidades para o futuro da educação em design. Talvez um dos grandes aprendizados foi o fato de saber que o ambiente FIGITAL, ou seja, a fusão do ambiente físico e do ambiente digital, se apresenta como uma excelente oportunidade que precisa ser debatida de forma mais ampla para entender qual é o impacto, os benefícios e os desafios desse novo mundo de possibilidades que se abriu como uma caixa de pandora no meio da nossa jornada. Professor, seu microfone está desligado!
Dediquei todos esses anos ao trabalho de ensino-pesquisa-extensão com uma missão: o compromisso de formar novas gerações de designers que utilizem os aprendizados sobre inovação e sustentabilidade para transformar o mundo num lugar melhor para todas e todos os que habitamos esse planeta. Daqui pra frente não será diferente. A minha missão continua sendo a de plantar sementes para que haja um futuro promissor para as próximas gerações.
O ano de 2022 iniciou com a esperança de que estamos próximos do fim da pandemia de COVID-19. No nível pessoal, o ano em curso simboliza o começo de um novo setênio e a retomada de algumas metas, sonhos e desejos que ficaram engavetados nesses dois anos de reflexão.
Um desses sonhos é a realização de outro pós-doutorado que deve ocorrer para fortalecer as parceira já iniciada internacionalmente com a rede LeNSin. A Itália deve ser o destino e o tema do Design para Inovação Social deve estar em pauta nesse projeto de pesquisa.
Da mesma forma, aparecem no radar novas iniciativas de internacionalização, como a possibilidade de participar da chamada de um edital da Fundación Carolina e o Grupo Tordesillas, ou por que não um novo projeto Erasmus+ Capacity Building, os quais irão permitir experimentar novas formas de ensino e aprendizado nas disciplinas que leciono na UFPE.
O envolvimento com novas propostas de ensino seguem em pauta, como por exemplo, as iniciativas institucionais de internacionalização e de ensino a distância, as quais devem trazer novos desafios e oportunidades de crescimento profissional.
Da mesma maneira, perspectivas para o envolvimento com atividades administrativas também se delineiam no cenário futuro, apesar de já ter ocupado os cargos de coordenador da graduação e da pós-graduação, e de ter sido vice-chefe do depar -
tamento de design, o que abona ao meu currículo um pouco mais de dez anos de experiência como gestor.
O exercício de escrever sobre esta jornada “pelos caminhos da sustentabilidade” me fez aflorar muitos sentimentos. Ao tentar evocar o passado para escrever esta história, ficou evidente que o caminho que trilhamos é feito de desafios e conquistas que nos trazem alegrias e tristezas, conflitos e debates que vão nos moldando como profissionais e pessoas.
O caminho não é linear. Por vezes se torna tortuoso, íngreme, calmo ou com solavancos, mostrando-nos que a vida não é uma linha reta e sim uma espiral (ou talvez um labirinto?). Nessa espiral, a cada ciclo que iniciamos, a vida nos desafia, nos anima ou nos desanima, trazendo e levando pessoas, com as que trilharemos lado a lado as novas histórias dessa jornada, em ciclos que se encerram e que se renovam, como na natureza, sábia, serena, completa.
Minha longa caminhada, com seus ciclos e setênios, me trouxe hoje até aqui, como postulante ao cargo de professor titular do Departamento de Design.
Encerro esse memorial com um trecho do poema The Hill We Climb, de Amanda Gorman, que dedico às gerações presentes e futuras de designers da UFPE.
In this truth, in this faith we trust, for while we have our eyes on the future, history has its eyes on us.
This is the era of just redemption. We feared at its inception. We did not feel prepared to be the heirs of such a terrifying hour.
But within it we found the power to author a new chapter, to offer hope and laughter to ourselves.
So, while once we asked, how could we possibly prevail over catastrophe, now we assert, how could catastrophe possibly prevail over us?
We will not march back to what was, but move to what shall be: a world that is bruised but whole, benevolent but bold, fierce and free.
We will not be turned around or interrupted by intimidation because we know our inaction and inertia will be the inheritance of the next generation, become the future. Our blunders become their burdens.
But one thing is certain.
If we merge mercy with might, and might with right, then love becomes our legacy and change our children’s birthright.
So let us leave behind a world better than the one we were left.
Amanda Gorman, 2021De esquerda à direita:
Natal Anacleto Chicca Junior.
Priscila Ramalho Lepre
Adriana de Azevedo Costa
Lucídio Cardoso Leão Júnior
Gabriela de Medeiros Boeira
Susiane Michelle dos Santos
Lia Alcântara Rodrigues
Gabriela Lyra Teixeira
Maria Gabriela Cavalcanti de Castro
Tarciana Araújo Brito de Andrade
Victoria Fernandez
Gabriella Maria de Oliveira Martins
Rafael Rattes Lima Rocha de Aguiar
André Oliveira Arruda
Flávia Wanderley Pereira de Lira
Lorena Gomes Torres de Oliveira
Mabel Gomes Guimaraes
Alice Tavares Figuereido
João Paulo Fonseca de Menezes
Caroline Fernanda de Paula Lima
Laura Maria Abdon Fernandes
Viviane Magalhães Galindo
Sarah Caroline Mazeu Branco
Cibele Oliveira de Albuquerque
João Cézar Cavalcanti Rocha
Paulo Fonseca Medeiros Filho
Maria Eduarda Macêdo Freire
José Carlos Porto Arcoverde Jr.
Isadora Carolina Crespo Pereira
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Grupo de Pesquisa em Inovação, Design e Sustentabilidade