EssĂŞncia
Luana Dourado Luanna Lins
Diretor administrativo: Marcelo Alves Ishii Conselho Editorial: Agenor Sarraf Pacheco (UFPA) - Ana Pizarro (Universidade Santiago/Chile) - Carlos André Alexandre de Melo (UFAC) - Elder Andrade de Paula (UFAC) - Francemilda Lopes do Nascimento (UFAC) - Francielle Maria Modesto Mendes (UFAC) - Francisco Bento da Silva (UFAC) - Francisco de Moura Pinheiro (UFAC) - Gerson Rodrigues de Albuquerque (UFAC) - Hélio Rodrigues da Rocha (UNIR) - Hideraldo Lima da Costa (UFAM) - João Carlos de Souza Ribeiro (UFAC) - Jones Dari Goettert (UFGD) - Leopoldo Bernucci (Universidade da Califórnia) Livia Reis (UFF) - Luís Balkar Sá Peixoto Pinheiro (UFAM) - Marcela Orellana (Universidade Santiago/Chile) - Marcello Messina (UFAC) - Marcia Paraquett (UFBA) Maria Antonieta Antonacci (PUC/SP) - Maria Chavarria (Universidad San Marcos) - Maria Cristina Lobregat (IFAC) - Maria Nazaré Cavalcante de Souza (UFAC) - Miguel Nenevé (UNIR) - Raquel Alves Ishii (UFAC) - Sérgio Roberto Gomes Souza (UFAC) - Sidney da Silva Lobato (UNIFAP) - Tânia Mara Rezende Machado (UFAC)
Luanna Lins Fotografias Luana Dourado Texto Luana Dourado e Luanna Lins Projeto gráfico Luanna Lins Capa Jhillian Albuquerque Talita Oliveira Revisão
Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Central da UFAC _____________________________________________________________________________ D739e Dourado, Luana, 1998 Essência / Luana Dourado e Luanna Lins; Orientação de: Talita da Silva Oliveira. Rio Branco: Nepan, 2019.
16 f.: il.; 21 cm.
ISBN 978-85-68914-64-9 E-book. 1. Sexualidade feminina. 2. Feminismo. 3. Corpo. I. Lins, Luanna. II. Oliveira, Talita da Silva (orientadora.). II. Título. CDD: 070.4 ______________________________________________________________________________ Bibliotecária: Nádia Batista Vieira CRB-11º/882.
Agradecimentos Talita Oliveira Marcelo Ishii Marina Bylaardt Juliana Farhat Netty Franรงa Inayme Lobo
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A sexualidade é a expressão do desejo sexual. E a expressão do desejo sexual feminino na sociedade pra mim é oprimida. Sexualidade feminina é extremamente oprimida, extremamente censurada. Pouco expressa, ou quando expressa é expressa em forma de fetiche pro homem, ou mesmo fetichizada quando não é esse o objetivo.
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SEXUALIDADE FEMININA
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O PRIMEIRO TOQUE
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O primeiro toque, a culpa, o tal do pecado e o exorcismo A primeira vez que eu me toquei? É um segredo, porque bem, eu era cristã na época, ou achava que era, e é meio que pecado né? Então fica sendo um segredo que eu vou contar só pra você que vai ler esse livro, mas é segredo viu. Eu não sabia como fazia, foi meio que sem querer, eu acho, eu era criança, devia ter oito anos, brincava de boneca ainda, e eu tinha um ursinho, você vai rir ao final da história do ursinho, mas ele é importante. Era um macaquinho, eu gostava de dormir com ele entre meus joelhos porque nunca gostei da sensação de joelho batendo no joelho, e sempre gostei de dormir de conchinha. Ai nessa noite o focinho do macaquinho enquanto eu me mexia para dormir deu um negócio lá, que eu nem sabia que existia. E foi um negocinho gostoso e ai eu continuei me mexendo, e eu descobri que tinha um lugar que se o focinho do macaquinho ficasse era mais gostoso e eu lembro que meu corpo mexia inconscientemente porque era uma sensação muito boa e eu não parei até que minhas pernas começaram a tremer e eu senti todo o meu corpo dormente e pareceu que eu sai do meu corpo, para uma menina de oito anos foi louco, coisa de outro mundo e ai eu senti a calcinha molhada e pensei “se eu fiz xixi, foi o xixi mais doido do mundo”. Hoje em dia eu sei que não foi xixi, claro. Depois eu chorei, chorei e chorei até dormir porque aquilo devia ser algum tipo de pecado e Deus ia me punir e eu chorei mais. Só que na outra noite eu quis de novo, por que vamos ser sinceras, é bom. Mas eu não tinha coragem de eu mesma me tocar, era sempre de calcinha, com a roupinha de dormir e a fricção com o macaquinho. Até que chegou o dia que eu não aguentei, achei que ia direto pro inferno e que no juízo final Deus ia mostrar tudo aquilo em um telão e todo mundo ia rir de mim. Eu tinha que acabar com aquilo, e ai entra o bendito, no caso e na situação, maldito macaquinho. Minha mãe tinha saído de casa com a minha irmã, peguei a bíblia, peguei umas velas, o macaquinho e fui ao quintal.
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Eu ia exorcizar o macaquinho, estava decidido e aí Deus iria me perdoar. Acendi as velas, coloquei o macaco no meio, abri a bíblia em Mateus 5:30 “E, se tua mão direita te fizer pecar, corta-a e atira-a para longe de ti; pois te é melhor que um dos teus membros se perca do que todo o teu corpo seja lançado no inferno”, li isso umas três vezes, rezei um pai nosso, pedi perdão a Deus, disse que aquilo jamais iria acontecer. Ai gente, pode rir, e eu com meus oito anos de idade chorando desesperada com medo de ir ao inferno taquei o fogo no macaquinho, estava lá em Mateus, “atira-a para longe”, mas eu tinha medo de atirar e o macaco voltar. Do fogo ele não ia voltar, pelo menos não voltou até agora. Se voltasse a gente podia bater um papo bem legal, porque o macaquinho foi bem mais eficiente que muita gente que veio depois quando eu tinha a idade adequada para essas coisas, mas voltando ao assunto. Depois disso eu sentia vontade, mas lembrava das promessas e do exorcismo do macaco e do tal do telão do juízo final. Fui me tocar de novo aos 10 anos, com a mão mesmo, mas com um medo, era só no clitóris, porque vai que o dedo escorrega e ai eu perco a virgindade! A cabeça de uma menina criança criada nesse sistema patriarcal sofria. Eu não fazia ideia que virgindade é uma criação social. Era bom, claro que era, com 10 anos eu já lia bastante, estudava, pesquisava, fui descobrindo as coisas. Eu não gostava de pornô, até hoje em dia não gosto, achava violento, sujo, parecia que as mulheres estavam sofrendo, eu descobri as fanfics que são histórias escritas por fãs onde diferente dos livros impressos tudo é liberado, e aí pronto, não parei mais.
E espero nunca parar, porque se tocar é maravilhoso, se conhecer enquanto mulher, sentir sua intimidade, sentir seu corpo, se conhecer é libertador e é revolucionário.
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Já pensou que louco? Para os caras é só uma punheta depois da escola, mas para uma menina, pelo menos para mim, era uma revolução acontecendo no meu corpo, eu tomando conta de mim, sem nem saber direito que estava fazendo aquilo. E é aqui onde nós mulheres devemos deixar nosso legado para meninas que estão descobrindo e conhecendo seus corpos e suas sexualidades, informar, porque eu tenho certeza que eu não fui a única que começou com um ursinho, que chorou porque era “pecado”. Masturbação feminina é algo que deve sim ser debatido com garotas para que todas possam entender seus corpos, aprender seus limites, se descobrirem.
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A RELAÇÃO COM O CORPO
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Sexualidade nunca foi um tema presente no meu vínculo familiar, nem mesmo entre minhas irmãs. Eu tive durante muitos anos muita dificuldade em falar sobre o assunto, hoje em dia sou mais aberta, mas antes não conseguia dizer a palavra “sexo” ou “transar”. Não saíam da minha boca. Agora tenho um diálogo aberto com meu corpo, para trabalhar com ele a aceitação, pois já tive muitos problemas, agora o conheço bem, embora tenha dificuldades em me relacionar sexualmente com outras pessoas, acho meu toque mais natural para mim, até o prefiro do que o de outra pessoa. Sexualidade feminina pra mim é a relação da mulher com o sexo. Como ela se vê e se sente, como ela usa esse aspecto a seu favor. O contato com seu próprio corpo, as descobertas que faz ao se conhecer e saber o que seu corpo quer. E a mulher que compreende a sua sexualidade muda completamente, a autoestima, a imagem corporal que ela tem dela mesma. Ajuda ela a compreender sua orientação sexual. A sociedade não sabe lidar com a mulher. Principalmente quando a mulher é bem resolvida com sua sexualidade. É um tabu ainda para muitos vê-las conversando sobre sexo e suas vontades. O certo é falar mesmo, debater e envolver outras mulheres, para que a sociedade pare de ver isso como “safadeza ou falta de vergonha na cara”. Porque ninguém reclama dos machos que andam por aí exibindo o falo.
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SOBRE NÓS Luana Dourado e Luanna Lins são estudantes do curso de jornalismo da Universidade Federal do Acre - Ufac que amam utilizar da escrita e da fotografia para se expressarem. No meio de tanto texto quadrado, conseguem encontrar meios de falar sobre aquilo que defendem e acreditam, independente de como. Gostam de ouvir e apoiar mulheres, contar suas histórias e aprender um pouco mais com cada uma delas.
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