Daniel Lannes
COSTUMES
Capa: Auto-retrato vestido de noiva 2013-2014 Ă“leo sobre linho 190 x 127cm
Daniel Lannes
COSTUMES Curadoria e texto
Bernardo Mosqueira
3 de Setembro a 4 de Outubro 2014
COSTUMES
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Com a exposição Costumes, Daniel Lannes retoma e avança com um tipo de procedimento semelhante ao utilizado na série Safe Sex, de 2007. O processo criativo do conjunto que mostramos aqui, assim como o do grupo de trabalhos anterior, é fundamentado na criação de pinturas com intenso apreço formal e que apresentam cenas insólitas que narram perversões a normatividades. Se antes a referência formal era o pintor Albert Eckhout, agora as manchas de cor de John Singer Sargent e Edouard Manet foram base para o desenvolvimento da série. Ao interesse constante pela figura humana, somaram-se o olhar e a prática construtiva da abstração. Com um posicionamento que se aproxima ao do cronista, Lannes utiliza estratégias de humor pra falar da relação entre imagem e cultura: mais especificamente, trata da relação entre a produção cultural de imagens e a estrutura social dos gêneros, do prazer e da família. Dessa vez, Lannes se dedicou a uma pesquisa obsessiva sobre o vestuário e a indumentária feminina desenhada, produzida e utilizada entre o século XVIII e o começo do século XX. Nesse processo, voltou maior parte de sua investigação para livros de costura e referência estilística desse período. Algumas imagens lhe despertaram mais o interesse, e a razão pra isso, em geral, era a maneira peculiar pela qual a figura feminina era representada e, muitas vezes, por como esses croquis evidenciavam dados importantes da cultura, especialmente no que tangencia a divisão social entre os gêneros. Nessas imagens, as mulheres são absolutamente objetificadas apresentando gestos, poses e roupas deformantes que reverberam o desejo de alienação da subjetividade. Para assinalar isso, Daniel convidou homens (talvez seja importante dizer que quase todos heterossexuais e quase todos masculinos) para terem seus rostos retratados em pinturas que os apresentam vestindo as roupas e apresentando os gestos dos tais livros e revistas de croquis de costura. O humor gerado por ver um homem vestido de mulher deve nos fazer refletir sobre o que seria característico a esse papel de mulher que poderia tornar tão hilário um homem nesse lugar. Travestismo Fetichista é uma das classificações na Psicologia para fetiches sexuais e parafilias em que pelo menos um dos participantes do ato sexual utiliza pelo menos uma peça de roupa do gênero oposto com intensão de trazer para si algum símbolo característico do outro gênero, para viver, durante a atuação ritual, alguma situação de determinada maneira que lhe gera prazer narcísico. Uma das razões comuns para o travestismo de um indivíduo do sexo masculino com peças de roupa feminina é exatamente a vontade de objetificação desse individuo, e do subsequente apagamento do sujeito travestido. Parte do humor ao ver um homem vestido de mulher é pelo ridículo de alguém que ostenta a perda do poder. Com o mesmo posicionamento, Daniel produziu, ainda, uma série de trabalhos em que aponta criticamente pra características da estrutura familiar e em que prossegue sua pesquisa sobre o desejo. Criando cenas plenas em crueza e crueldade, Lannes afirma, ao retomar e avançar com a pesquisa de 2007, que há como construir um trabalho sério por estratégias de humor.
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With Costume, Daniel Lannes returns to and further develops a kind of procedure similar to that used in the 2007 Safe Sex series. The creative process of the group of works we show here, like that of the previous series, is based on the creation of paintings with intense formal appreciation, presenting unusual scenes that tell stories of the perversion of norms. While previous works looked to Albert Eckhout, it is now the smears of color of John Singer Sargent and Edouard Manet that form the basis of the painting technique. The artist’s longstanding interest in the human figure is combined with a constructivist eye and the practice of abstraction. In a manner akin to a columnist, Lannes uses humor to address the relation between image and culture: more specifically the relation between the cultural production of images and the social structure of genres, pleasure and the family. On this occasion, Lannes has obsessively researched female costume designed, produced and worn from the 18th century to the beginning of the 20th. In the course of these investigations he focused mainly on dressmaking manuals and style guides of the period. Some images struck him more and the reason for this, generally speaking, was the peculiar way in which the female figure was represented and, often, because of the way these sketches testified to important cultural features, especially those pertaining to social gender differences. In these images, the women are totally objectified, with gestures, poses and body-deforming clothing that reflect the desire to alienate subjectivity. To demonstrate this, Daniel invited men (it is perhaps important to add that almost of them were heterosexual men) to sit for portraits wearing this clothing and striking the same poses as those in the dressmaking pattern books and magazines. The comic effect of seeing a man dressed as a woman makes us wonder what feature of a woman’s role makes it so hilarious when a man assumes it. Fetishistic transvestitism is classified by psychologists for sexual fetishes and paraphilias in which at least one of the participants in the sex act uses at least one item of clothing of the opposite sex with the intention of providing themselves with some symbol characteristic of the other sex, in order to experience, during the ritual act, some situation in such a way as to generate narcissistic pleasure. One common reason for transvestitism in men is precisely the desire for objectification and the ensuing extinction of subjectivity. The humorousness of seeing a man dressed as a woman stems in part from the ridiculousness of someone being deprived of power. In the same vein, Lannes has also produced a series of works that critically examines the characteristic features of the family structure as part of his ongoing investigation into desire. Going back to his 2007 preoccupations and taking them further, Lannes creates raw scenes full of cruelty and shows that it is possible to use humor to produce serious work.
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Sem título 2014. Óleo sobre linho. 189 x 145cm DANIEL LANNES | 9
An Indian dressing an Italian Suit 2014. Ă“leo sobre lona. 210 x 160cm 10 | DANIEL LANNES
Rafael Alonso em Lady’s Visiting Toilette 2014. Óleo sobre linho. 150 x 100cm DANIEL LANNES | 11
Jonas Aisengart em Vestido de Veludo e Faille 2014. Ă“leo sobre linho. 185 x 135cm 12 | DANIEL LANNES
Bernardo Mosqueira vestindo Elegant Tailored Suit 2014. Ă“leo sobre linho. 185 x 130cm DANIEL LANNES | 13
À Francesa 2014. Óleo sobre linho. 185 x 135cm 14 | DANIEL LANNES
Virando sereia 2014. Ă“leo sobre linho. 155 x 80cm DANIEL LANNES | 15
Gustavo Saiani em Costume Promenade 2014. Ă“leo sobre linho. 190 x 145cm 16 | DANIEL LANNES
Ah...La Belle Époque 2013-2014. Óleo sobre linho 100 x 150 cm
Pag. 16/17 Família de Fuzileiros 2014. Óleo sobre linho 155 x 205cm DANIEL LANNES | 17
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Pensando Besteira 2014. Óleo sobre linho 35 x 35cm
Mulher com chapéu 2014. Óleo sobre linho 40 x 40cm 20 | DANIEL LANNES
Sem título 2014. Óleo sobre linho 65cm de diamêtro
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22 | CAROLINA PONTE
Pag. 22/23 Pra frente, Brasil 2014. Óleo sobre linho. 185 x 240cm
Centaura 2014. Óleo sobre linho 160 x 140cm
AGRADECIMENTOS Adelmo Lapa, Alessandro Sartore, Alexandre Mazza, Alvaro Seixas, Antonio Luiz Messeder Pereira, Beatriz Milhazes, Bernardo Mosqueira, Camila Santanioni, Carlos Alberto Messeder Pereira, Cecília Vaz, Chico Cunha, Clara Gerchman, Leonel Kaz, Claudio Valerio Teixeira, Cristina Canale, Daniela Labra, Emerson Gomes Nery, Esther Harrison, Fernanda Cordeiro Lannes, Rolf Behm, Geraldo Dompieri - In Memoriam, Marina Lamounier, João Magalhães, Jonas Aisengart, Jozias Benedito, Leonardo Ramadinha, Ligia Horta, Luiz Ernesto de Moraes, Fabiano Doyle, Marcelo Campos, Maria Lygia Carneiro Messeder, Patrizia D’Angelo, Paula Lannes Ozmen, Paulo Dompieri, Paulo Perazzo Lannes - In Memoriam, Rafael Alonso, Renato Slot Ranquine, Rogério Messeder Pereira, Ronald Cavaliere, Sedat Ozmen, Verônica Valle, Yolanda Cordeiro Barbosa e Equipe Luciana Caravello Arte Contemporânea. 24 | DANIEL LANNES
DANIEL LANNES Daniel Lannes nasceu em Niterói, em 1981. Vive e trabalha no Rio de Janeiro. É Mestre em Linguagens Visuais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2012) e Bacharel em Comunicação Social pela PUC-Rio (2006). Realizou em 2012 a exposição individual Dilúvio, na Luciana Caravello Arte Contemporânea. Em 2011, apresentou as exposições individuais República, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, e Só Lazer, na Galeria de Arte IBEU, no Rio de Janeiro. Em 2007, apresentou as exposições individuais Midnight Paintings, no Centro Cultural São Paulo, e SALE, na galeria Choque Cultural, São Paulo. Dentre as exposições coletivas destacam-se: Crer em Fantasmas, com curadoria de Marcelo Campos, Caixa Cultural, Brasília, 2013; GramáticaUrbana, com curadoria de Vanda Klabin, no Centro de Arte Hélio Oiticica, Rio de Janeiro 2012; Nouvelle Vague, com curadoria de Jacopo Crivelli Visconti, na galeria Laura Marsiaj Arte Contemporânea, Rio de Janeiro, 2009; Arquivo Geral, com curadoria de Fernando Cocchiarale, no Centro Cultural da Justiça Federal, Rio de Janeiro, 2009 e Painting’s Edge, RiverSide Museum of Art, Califórnia, EUA, 2008. Foi indicado à 10ª edição do Programa de Prêmios e Comissões da Cisneros-Fontanals Art Foundation (CIFO) em 2013 e selecionado para a Short List do livro 100 Painters of Tomorrow, da editora Thames & Hudson, 2013. Também foi contemplado com o Prêmio FUNARTE de Arte Contemporânea em 2012 e indicado ao Prêmio PIPA em 2011 e 2012. Ganhou o Prêmio Novíssimos do Salão de Arte IBEU, Rio de Janeiro em 2010 e recebeu bolsa de residência artística no The Idyllwild Arts Program Painting’s Edge, California, EUA, 2008, e bolsa de estudos de 1 ano na State University of New York / Fine Arts Department, em 2004. Possui obras em coleções públicas tais como: MAR (Museu de Arte do Rio de Janeiro), Instituto Figuereido Ferraz, Ribeirão Preto, Brasil; MAM RJ (Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro). Dentre as coleções particulares, destacam-se: Cleusa Garfinkel, São Paulo; Marcia e Luiz Chrysóstomo, Rio de Janeiro; Maria Cristina Burlamarqui, Rio de Janeiro; Vik Muniz, Rio de Janeiro; Mariano Marcondes Ferraz, Rio de Janeiro; Zeca Camargo, Rio de Janeiro; Roberto Muylaert, São Paulo.
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COSTUMES FICHA TÉCNICA Curadoria e texto: Bernardo Mosqueira Fotografias: Leonardo Ramadinha e Cecília Vaz Iluminação: Ronald Cavaliere Assessoria de imprensa: Ester Lima - Basica Comunicação Tradução: Paul Webb Design do catálogo: Bitty Nascimento Silva Pottier - C-Art Brasil Design do convite: Luana Aguiar Catálogo: impressão e acabamento: Barbero - Graphus
EQUIPE DA GALERIA LUCIANA CARAVELLO ARTE CONTEMPORÂNEA: Direção artística: Waldick Jatobá Vendas: Ronaldo Simões Vendas: America Cavaliere Produção: Julia Vaz Financeiro: Valeria de Araujo Teixeira Montador: Fabio Francisco de Paula Apoio: Francinato Araujo Pereira
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A história da galeria Luciana Caravello Arte Contemporânea, inaugurada em 2011, se mistura com o percurso profissional da marchand Luciana Caravello. Desde 1998, Luciana vem trabalhando com arte contemporânea, representando vários artistas visuais do Rio de Janeiro e outras regiões do Brasil, comprometidos com pesquisas sobre suportes variados. O espaço atual tem uma arquitetura privilegiada, adaptada para receber exposições de artistas consagrados e artistas emergentes, sempre mostrando o que há de melhor na arte contemporânea nacional. Assim, a galeria desenvolve uma programação consistente, cujo objetivo principal é destacar a constância da linguagem artística, evidenciando o contraste de trajetórias consolidadas com a ousadia e o frescor das experimentações mais de vanguarda.
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www.lucianacaravello.com.br