Foca em Sampa Domésticas Fascículo 01
junho/2013
FRB
Editorial É com grande prazer que apresentamos a primeira edição do Foca em Sampa - Domésticas. Aqui, você descobrirá um pouco mais sobre a vida das mulheres que trabalham em lares da cidade de São Paulo e, ainda tirará todas as suas dúvidas sobre a Lei das Domésticas. Para esta edição, acompanhamos como é o dia a dia de Sandra, que você pode ler na crônica da última página. Contamos, também, como é a vida das domésticas longe da casa de suas patroas. Sim, por mais que muitas vezes esqueçamos, elas também tem as suas casas. Atenção: não deixe de conferir os serviços oferecidos não só para domésticas, mas também para patrões.
Doméstica na rede! Sites oferecem vagas de emprego e curso
Saiba o que muda com a nova lei das domésticas
Crônica: conheça a rotina de Sandra
Boa leitura, Os editores .
Expediente Editores: Evelyn Moreto Kethylin Pinheiro Sara Loup Agradecimentos: Angelita Santos, Ducinelma de Oliveira, Sandra, Maria de Lourdes Borges Massuia e Felipe Porto Orientação: Renata Carraro
Descubra como é a vida de uma doméstica fora do seu trabalho
Uma doméstica que está há 45 anos no mercado conta um pouco de sua rotina
Maria, Maria
Aos 60 anos de idade e 45 de profissão, Maria de Lourdes conta a sua trajetória de vida em um dia de patroa
do de Maria faleceu, e ela, teve que voltar às ruas. Ou melhor, aos lares. “Tive que batalhar de novo. Recomecei fazendo faxinas diariamente, como diarista”, conta. De casa em casa, sentiu na pele as dificuldades do mercado. Não teve a mesma sorte de tempos atrás, quando
A patroa e amiga Denise, da Editora QD processo complicado devido ao seu nível de escolaridade. Maria abandonou os estudos na 7ª série. Ainda assim, teve sorte, e graças à experiência que teve na casa de Dona Idinha, entrou na Janela, uma confecção de cortinas. Lá, prestou serviço de passadeira por pouco tempo. Ganhou um presente: no dia de seu aniversário, 18 de abril, deu a luz a Cláudio, seu filho, e resolveu dedicar-se inteiramente à maternidade. Infelizmente, quando Cláudio completou o mari-
foi registrada por Dona Idinha. Pensando nos benefícios de ter a carteira assinada, voltou ao mercado empresarial, na Editora QD, onde atua como faxineira há quase 10 anos. Todos os dias, sai de sua casa, na Freguesia do Ó, e, como muitas de suas colegas de profissão, encaram o transporte público. Adora sentar-se na janela e observar a cidade. “Mas pra ser bem sincera prefiro ver tudo o que acontece pela televisão. Gosto de São Paulo, mas esse trânsito!” .
E ela nem atravessa a cidade: de carro, demoraria apenas 20 minutos. No ônibus e metrô, gasta cerca de 1h30, para chegar à Barra Funda. “O bom é que aqui na Freguesia do Ó tenho acesso fácil ao transporte. O que não gosto mesmo é do perigo, e o pior, muita gente cuidando da vida dos outros” pondera, aos risos, lembrando-se de vizinhos fofoqueiros. Aos finais de semana, adivinhe o que Maria faz? Trabalha. Atua como diarista, aos sábados, na casa Amauri Moreira, senhor por quem Maria tem grande apreço e respeito. “Ele e sua família são muito queridos. Sempre me presenteiam em datas especiais como Natal e Dia das Mães” Ah, os seus domingos são quase livres: além de ir à casa do seu irmão – seu lugar preferido em toda a cidade de São Paulo! – cuida do seu lar e deixa, também, a sua casa em ordem. Percebo que esta, não é apenas a sua profissão, mas a sua vocação. E suas palavras, muito pouco proferidas entre mulheres, confirmam o que senti desde o início da nossa conversa: “eu adoro fazer faxina”.
Foto: Arquivo Pessoal
tivo maior. Conheço algumas domésticas que sofreram com suas patroas. Comigo, graças a Deus, nunca aconteceu”. Ela não passou por isso no trabalho, mas dentro da própria casa. Seu pai não aceitava que ela fosse doméstica e a obrigou a procurar outro serviço, um
Foto: Arquivo Pessoal
Em um dos seus raros dias de folga, a paulista Maria de Lourdes Borges Massuia trocou rodos e vassouras por um bate papo para esta reportagem. Hoje, é o seu dia de patroa. Aos 45 anos de profissão as boas recordações que tem das casas por onde passou ofuscam o possível cansaço. Foi aos 15 anos que, a convite de uma amiga de sua mãe começou a trabalhar. A função? Empregada doméstica. Na época, o seu salário era cerca de R$ 600. Na casa de Dona Idinha, Maria era registrada. “A família era muito boa comigo, sempre fui paga corretamente. Fiquei lá por nove anos”, lembra, confidenciando uma das muitas histórias vividas com aquela família. “Quando comecei a trabalhar com Dona Idinha, eu e a filha dela tínhamos a mesma idade e ficamos amigas. Um dia eu estava limpando a casa quando ela me chamou para fumar escondido da mãe dentro do banheiro. Eu não sabia como fumar e engasguei. A Dona Idinha entrou no banheiro e começou a bater na filha, dizendo que não era para me ensinar esse tipo de coisa. Depois desse dia, nunca mais coloquei nenhum cigarro na boca”. Quando perguntada sobre o preconceito que a classe doméstica sofre, Maria concorda. “Somos humilhadas por aqueles que têm um emprego melhor ou um poder aquisi-
Por Evelyn Moreto
“Somos humilhadas por aqueles que têm um emprego melhor ou um poder aquisitivo maior. Conheço algumas domésticas que sofreram com suas patroas. Comigo, graças a Deus, nunca aconteceu”.
Pronta para descansar depois de um longo dia
Maria indica! Se tivesse que acompanhar um amigo em um passeio pela cidade de São Paulo, para onde iria? Confira o roteiro da doméstica.
Restaurante: qualquer pizzaria. São Paulo tem tantas boas! Parque: Villa-Lobos Praça: Praça da Árvore Avenida: Paulista Feira: Feirinha da madrugada Igreja: Igreja da Matriz (Freguesia do Ó) Shopping: Shopping West Plaza Teatro: Teatro Municipal de São Paulo Museu: Museu de Arte Moderna Brechó: nas Perdizes eles são bem luxuosos!
Depois do expediente
Serviços online ajudam os profissionais domésticos e seus patrões a se enquadrarem à nova lei em apenas um clique
Ao sair da casa das patroas, o que elas fazem? Para onde vão? Descubra como é a vida das empregadas fora do trabalho Por Evelyn Moreto
Angelita curte seus netos
cado, conta com a ajuda de seus guntando quando ela se encontra filhos Danilo e Denis para cuidar com as amigas e para onde vai. da casa. “Eles se revezam. Se um Além de frequentemente enconestá limpando o banheiro, o outro trar com elas no ônibus, nos dias tira pó e passa pano, lava a louça... de folga, frequentam as casas umas Mas sempre sobra alguma coisa das outras para colocar as fofocas pra mim, né?”. Ela, que sai de sua em dia. Segundo Angelita, o assuncasa todos os dias às seis da manhã to mais comentado entre elas nos e só retorna depois de 14 horas, últimos tempos foi a aprovação da aproveita a “folga da noite” para PEC das domésticas e o impacto cuidar melhor que teve da casa, fazendo “Eles se revezam. Se no seu os serviços que dia a um está limpando o os filhos não dia. “Na c o n s e - g u e m , banheiro, o outro tira m i n h a como passar pó e passa pano, lava r o t i n a , roupa. Tempo n a d a a louça... Mas sempre para o lazer ela mudou. sobra alguma coisa também sempre M a s arranja. Novcom alpra mim, né?”. eleira de cargumas teirinha, apesar amigas, de não conseguir deitar no sofá e tiveram patroas que mudaram o assistir, ela liga a TV e ouve a voz jeito de tratar, mesmo, sabe? Parece da personagens, independente de que perdeu a amizade de uma hora onde esteja: na cozinha, no ban- para outra. Para mim, foi uma heiro, no tanque... “Como não dá grande conquista, um passo muito pra ver porque estou sempre fa- grande mesmo. Se cumprirem as zendo alguma outra coisa, pas- leis, será ótimo” avalia, já se dessando roupa, limpando o quarto, pedindo, porque hoje é sábado, dia deixo a tv bem alta e vou ouvindo. de passear. Quando não sei o que acontece, pergunto para as minhas amigas tudo o que aconteceu” conta. Aposto que você está se per-
Do cadastro de currículos à prestação de serviços, a internet traz um leque de opções quando se fala em auxiliar o trabalhador doméstico
Foto: Arquivo Pessoal
Imagine-se saindo bem cedo de sua casa. Muitas vezes, antes mesmo de o Sol nascer. Sua família está em casa, ainda dormindo. E, para não deixá-los na mão, você já deixa a mesa do café da manhã posta. Depois de pegar duas ou até três conduções, finalmente chega ao trabalho. Mais uma vez, coloca a mesa do café: mas agora, para outra família. Pode parecer inimaginável, mas essa é a rotina de muitas mulheres no Brasil. Elas deixam filhos e maridos à sua espera enquanto cuidam de uma outra casa. Sim, para terem uma renda, privam-se de alguns momentos do seu dia a dia, que para pessoas com outras profissões, pode parecer surreal. Tudo para servirem à outras pessoas. Se elas se importam com isso? Bom, tire suas próprias conclusões. Para fazer esta reportagem, perguntamos à dez empregadas do lar se a rotina agitada as impediam de ficar com a sua família, sair com seus amigos e cuidarem de sua casa. Apenas três responderam que sim. A grande maioria, diz que “dá um jeitinho, acha uma brechinha na semana”. A empregada Angelita destacase das demais: há 16 anos no mer-
A internet tem aproxi- com eles pelo Facebook. Mas é possível administrar todas mado as pessoas e feito com não sabia que existia um lu- as rotinas trabalhistas do emque muitas atividades sejam gar para procurar emprego pregado doméstico com carteiexecutadas de dentro da pró- de doméstica, agora que eu ra assinada. Alguns serviços pria casa. Antes, era preciso ir sei,quando precisar vou en- voltados para o empregadores até ao banco para realizar algu- trar e me cadastrar” decla- são pagos e variam de preço, ma transferência ou pagamen- ra a doméstica Dussinelma mas podem poupar tempo. Já tos. Hoje, tudo está a um clique. de Oliveira. para os domésticos, existe uma Sabe-se que para muitas grande variedade de ser“(...) não sabia que viços online gratuitos. Os domésticas o tão famoso boca a boca sempre sistemas costumam ofereexistia um lugar para deu uma ajuda na hora cer um passo a passo simde conseguir um empre- procurar emprego de ples e fácil de seguir. Além go. O que muitas não da disponibilidade de disabem, é que a internet doméstica, agora que eu versos cursos online para também não fica para os profissionais do lar, os trás: empresas de recru- sei,quando precisar vou empregadores também tamento específicas em podem se beneficiar do uso entrar e me cadastrar” áreas relacionadas ao lar da tecnologia, com a ajuda têm se utilizado a rede da internet, controlar o paUma das páginas que gamento de salários, o ponto, para cadastrar os currículos de domésticas, babás, caseiros e auxiliam as domésticas e os encargos e benefícios aos emoutras atividades relacionadas empregadores é o Pagga Do- pregados domésticos pode ser ao lar. E, além de disponibili- mésticos. Com ele, o emprega- mais fácil e trazer menos prozar vagas para estes profissio- dor pode realizar os pagamen- blemas futuros. nais, o site apresenta diversos tos das domésticas a partir cursos para as domésticas, de um boleto gerado, o qual entre os quais muitos são de inclui todos os direitos que a graça e alguns, pagos. Todos doméstica tem. Outra ferraeles, em sua maioria, mos- menta on-line para auxiliar o tram novos métodos de orga- empregador a seguir a nova nização e limpeza, com novos lei é o WebHome, criado para produtos e até formas mais que os patrões gerencie os seus simples de executar algu- funcionários. Já no portal Domas atividades do cotidiano. méstica Legal, encontra-se A doméstica Dussinelma de serviços de Departamento De Oliveira, que costuma estar Pessoal e Consultoria Jurídisempre conectada, desco- ca para os patrões domésticos, nhecia. “Eu entro na internet auxiliando os empregadores a para falar com minha famí- cumprirem suas obrigações. lia que mora no Paraná, falo Por meio de uma assinatura,
Empregados domésticos passam a ter os mesmos direitos dos trabalhadores de outras atividades
Regras da nova lei das domésticas garantem pagamento do FGTS, INSS, vale-transporte e horas extras Por Kethylin Pinheiro
A PEC (Proposta de Emenda à Constituição) das Domésticas, lei que muda os benefícios desses trabalhadores, entrou em vigor no dia 3 de abril. Com a medida, patrões e trabalhadores vêm tentando reconstruir as suas relações. Agora, a tendência é de que quase tudo seja diferente. Segundo dados da Organização Internacional do trabalho (OIT), existem nos Brasil 7,2 milhões de trabalhadores nessa classe. Com a aprova-
ros, caseiros, porteiros, governantas, cuidadores de idosos, mordomos e cozinheiros têm apoio legal para buscar os mesmos direitos dos demais trabalhadores. De acordo com a nova lei, a carteira de trabalho dos empregados que estão registrados atualmente não deverá mudar, apenas é aconselhável manter um livro ponto ou caderno, com anotação da hora de entrada e saída do empregado. Ultrapassadas 8 horas diárias ou 44 horas semanais, “Mudança no ser pagas horas excomportamento deveram tras. O Congresso ainda estudas domésticas da projeto de lei que estabelecom seus patrões”ce uma jornada mais flexível para cuidadores de idosos e ção da lei pelo Congresso Na- babás. Esses profissionais coscional, deixa de existir uma tumam fazer jornadas de 12 certa cumplicidade que fazia horas, com descanso de 24. trabalhadores aceitar horas Após a entrada em vigor, a extras sem queixas nem re- nova legislação também traz muneração, em troca de uma efeitos colaterais. Agências suposta garantia do emprego. que atuam na intermediação A partir de agora babás, fa- de patrões e empregados doxineiros, jardineiros, copei- mésticos apontam queda drás-
tica nas contratações efetivas. Por outro lado, o número de currículos enviados por interessados em trabalhar cresceu de forma acentuada, assim como a procura por diaristas. Felipe Porto, advogado trabalhista, pai de três filhos, conta com doméstica e babá para ajudar na rotina da casa. Na condição de especialista, ele recomenda o uso do livro-ponto. Ironicamente, revela que não pretende registrar em um caderno a jornada das funcionárias, pois considera a medida “antipática”. É visível a profundidade da transformação provocada pela recém aprovada Lei das Domésticas nas relações entre patrões e empregados em casa. E, assim como nos lares, muitas mudanças se desenham também na contratação dos profissionais de outras atividades.
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De lar em lar Um novo dia surge na cidade de São Paulo. O sol ainda está tímido, parece dormir, mas ela já se levantou da cama. Faz o café para o marido, mestre de obras, que também sai cedinho. Evita fazer barulho com as panelas para deixar Flávio, o mais velho, dormir mais tranquilo. O moço chega em casa às cinco da manhã. É segurança e só dorme de dia. Rafaela é a caçula, estuda no período da tarde. Sandra diz que ela só come, dorme, estuda e fica na internet, mas pelo menos estuda. Despede-se do marido que trabalha próximo de casa e vai para ponto de ônibus. Depois de dez minutos, já são seis e quarenta da manhã e ela avista o “Correio”, ônibus que ela pega para trabalhar todos os dias. O destino é o Alto da Lapa, numa casa chique, com gente ainda mais chique. Sandra só começa às oito. Porém, sempre chega um pouco mais cedo. Precisa colocar o uniforme, já são quatro anos nessa casa. Sabe os costumes e as manias de cada um. Depois de trocada, ela já vai lavando a louça da última noite. Rapidamente faz o café, pois as nove, o patrão já está de pé. Quando ele acorda, é Sandra pra lá, Sandra pra cá... Se estiver de bom humor, toma o café com pão francês. Se não, apenas o café. A patroa só acorda às dez.
toma café com a mesa posta, e para dois: ela está grávida de seis meses. A patroa acorda e é aquela animação. Com a gravidez, só fala na criança: muitas ligações, preparações para o chá bebê. Nesse dia, até a Sandra não vai trabalhar. Ela será convidada, já que é considerada da família. A casa é grande, e mesmo com duas pessoas, sempre tem coisa para limpar. Nem poeira ela deixa passar. A patroa é boa e tem mania de limpeza. Então, tudo deve estar impecável. A cozinha é a primeira a ficar limpa. Sandra faz de tudo, até cozinha. Desde que entrou na casa, a patroa gostou da comida, e faz questão de comê-la quase todos os dias. É um lava aqui, esquenta lá, pica alho acolá. Uma correria! Limpa a as salas, os vidros das janelas, tira poeira, lava os banheiros e vai passear com Lolita, a cachorrinha da casa. Depois do passeio, está na hora de terminar o almoço, antes que a patroa apareça com aquela barriga de duas almas famintas. Muita gente pensa que a vida de Sandra é fácil. Mas tem que ser guerreira, tem que ter força e muito bom humor pra espantar a canseira que dá no fim do dia Agora, tem muita guerreira Enquanto isso, Sandra var- feliz. Os direitos chegaram, re, coloca a roupa pra lavar e enfim, a nova lei veio para prepara a mesa: a patroa só dar valor à mulher traba-
Por Sara Loup
lhadora, que acorda cedo, arruma sua casa inteira e com muito capricho arruma também a do senhor. Depois de espantar tanta sujeira, Sandra termina o dia. Rapidinho se troca, pois não vê a hora de ir pra casa descansar. Ah, ainda falta o ônibus, mas depois de tanta coisa feita, o transporte não é nada. Ela vê o sol indo embora e espera ansiosa chegar em casa para ver seus filhos e conversar sobre como foi o dia. Fica um pouco com seu amor, Francisco, que depois de fazer tanta massa também precisa do aconchego do lar.