Pós em Revista N. 5

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ISSN 2176 7785

PÓS EM REVISTA Número 5 - 1/2012


Copyright©2012 by Núcleo de Publicações Acadêmicas do Centro Universitário Newton Paiva Número 5 1/2012

Pós em Revista / Belo Horizonte: Centro Universitário Newton Paiva, 2012. Disponível na Internet: < http://npa.newtonpaiva.br/pos/> n.1.Semestral ISSN 2176-7785 1. Periódicos. 2. Revista Científica. I. Centro Universitário Newton Paiva CDU 001.891

(Ficha catalográfica elaborada pelo Núcleo de Bibliotecas do Centro Universitário Newton Paiva) 2 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


COMITÊ EDITORIAL EDITORA GERAL Roberta Dias Rodrigues Rocha SECRETÁRIA Cláudia Aparecida Simões

ÁREA DE CONHECIMENTO- CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS Maria do Carmo Resende Teixeira Guerra Laurindo Souza de Deus Filho Fernando Ferreira Dias Filho Marcos Eugênio Vale leão Iremar Nunes Lima

ÁREA DE CONHECIMENTO- CIÊNCIAS HUMANAS Bruno Luciano de Paiva Silva

ÁREA DE CONHECIMENTO- CIÊNCIAS DA SAÚDE Sérgio Fernando de Oliveira Gomes Elias Borges do Nascimento Júnior Marta Marques Gontijo Aguiar Roberta Dias Rodrigues Rocha

ÁREA DE CONHECIMENTO- CIÊNCIAS DA ENGENHARIA Alexandre Souza Lopes


ESTRUTURA FORMAL DA INSTITUIÇÃO

PRESIDENTE DO GRUPO SPLICE Antônio Roberto Beldi

REITOR Luis Carlos de Souza Vieira

PRÓ-REITOR ACADÊMICO Sudário Papa Filho

SECRETÁRIA GERAL Dorian Gray Rodrigues Alves

Centro Universitário Newton Paiva Rua do Trevo, s/n - Bairro Caiçara - CEP 31230 010 Belo Horizonte - Minas Gerais - Brasil 4 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


EXPEDIENTE

APOIO TÉCNICO Núcleo de Publicações Acadêmicas do Centro Universitário Newton Paiva Cinthia Mara da Fonseca Pacheco Emerson Luiz de Castro Eustáquio Trindade Netto Juniele Rabêlo de Almeida Marialice Nogueira Emboava

EDITORA DE ARTE E PROJETO GRÁFICO Helô Costa - 127/MG DIAGRAMAÇÃO: Fillipe Gibram e Geisiane de Oliveira (estagiários da Central de Produção Jornalística da Newton Paiva - CPJ)

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APRESENTAÇÃO

A Coordenadoria de Pós-graduação, Pesquisa e Educação Corporativa tem o prazer de disponibilizar a Revista Eletrônica Pós em Revista para seus alunos, professores e comunidade acadêmica em geral.

Esta Revista pretende, por meio da mídia eletrônica, divulgar a produção acadêmica e científica do Centro Universitário Newton Paiva, bem como as colaborações que forem enviadas por pesquisadores e profissionais de outras instituições do Brasil e do exterior. Pretende, ainda, divulgar os estudos e as pesquisas desenvolvidas no âmbito de seus programas e ações.

O Conselho Editorial da Revista Eletrônica é composto por Coordenadores dos cursos de Pósgraduação e professores do Centro Universitário Newton Paiva e presidido pelo Coordenador Geral da Pós-graduação, Pesquisa e Educação Corporativa.

A Revista Eletrônica, publicada semestralmente, está aberta à participação da Comunidade Acadêmica da Instituição e às colaborações externas que contribuam para promover o debate de ideias e estimular a pesquisa acadêmica. Coordenador

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SUMÁRIO ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS GESTÃO EMPREENDEDORA PARA O MERCADO AUTOMOTIVO: uma apresentação do Sistema Total Ford de atendimento em concessionárias Deiziane C. Pereira, Elen C. R. S. Mariano, Gessica C. Moreira, Lucas C. Faria, Joice C. Reis, Rafaella M. A. Vimieiro, Eduardo B. Machado .............................................................................................................13 GESTÃO EMPREENDEDORA: um estudo de caso na Auto Mecânica Rômula Ltda. Adriana de Araújo, Amanda Pávilla, Arnaldo Ferreira, Kenia Cristina, Nathalia Miranda, Thaymon Soares, Helbert José de Góes, Laila Maria Hamdan Alvim ................................................................................................19 O VAREJO DE AUTOPEÇAS: uma busca da gestão empreendedora na Aja Diesel André Luís Pereira Vilela, Domingas Paulino de Almeida Francisco, Karina Batista Komine, Karine Nogueira de Barros Freitas, Larissa Lara Tavares, Maurício de Mello Rodrigues, Sibele Pinheiro do Nascimento, Eduardo Bomfim Machado........................................26 REVISTA AUTOCAR: fatores de sucesso e profissionais preparados para a competitividade no setor automotivo Aclízia Cristiane Fragoso, Daniella Barbosa Faglioni, Fernanda Almeida Silva, Gabriella Morena Correia Friche, Laíssa Ribas da Cruz, Taís de Fátima Lima Soares, Eduardo Bomfim Machado........................................................................................................33 DIREITO A CONSCIÊNCIA HISTÓRICA DA INCONFIDÊNCIA MINEIRA Mateus de Moura Ferreira...................................................................................................................................................................39 A APLICABILIDADE DA HERMENÊTICA PLURALISTA NA TUTELA DO PATRIMONIO CULTURAL Mateus de Moura Ferreira...................................................................................................................................................................43 DELINEAMENTOS SOBRE O CONCEITO DE CONSTITUIÇÃO: em busca de uma definição terminológica Márcio Eduardo da Silva Pedrosa Morais, Carolina Senra Nogueira da Silva.....................................................................................46 EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 66, DE 13 DE JULHO DE 2010: a nova concepção do divórcio e a permanência do instituto da separação Leandro Henrique Simões Goulart, Priscilla Chagas de Moura..........................................................................................................53 MARXISMO E RECONHECIMENTO:as críticas de Axel Honneth à noção de reconhecimento no pensamento de Karl Marx Márcio Eduardo da Silva Pedrosa Morais...........................................................................................................................................57 MEIO AMBIENTE DO TRABALHO: uma breve análise na história sobre a saúde do trabalhador Camila Cristina Azevedo Castro Teixeira, Emerson Luiz de Castro ....................................................................................................61 UMA INTRODUÇÃO AO INSTITUTO JURÍDICO INGLÊS DO TRUST Márcio Eduardo da Silva Pedrosa Morais............................................................................................................................................67


EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA O PERFIL PROFISSIONAL COMPETENTE DEMANDADO PELAS EMPRESAS DE RECRUTAMENTO E SELEÇÃO DE TRABALHADORES DE BELO HORIZONTE Corina Alves Farinha.............................................................................................................................................................................72 REPORTAGEM: um gênero de mil faces Raquel A. Soares Reis Franco..............................................................................................................................................................75 GESTÃO FINANCEIRA A MONITORAÇÃO DOS FATORES AMBIENTAIS E SEUS REFLEXOS NO AMBIENTE DE MARKETING DAS ORGANIZAÇÕES Aécio Antônio de Oliveira.....................................................................................................................................................................85 PROPOSTA DE UM MÉTODO DE EDUCAÇÃO FINANCEIRA: caminhos para o consumo racional e consciente Aécio Antônio de Oliveira, Rafael Alves Ribeiro, Thiago Galliac Rezende............................................................................................91 INFORMÁTICA CRIPTOGRAFIA DE DADOS NO MICROSOFT SQL SERVER 2008 R2 Rodolfo de Oliveira Martins, Iremar Nunes de Lima............................................................................................................................105 GESTÃO DO CONHECIMENTO: ECM e GED Juliana Costa Silva, Iremar Nunes de Lima ........................................................................................................................................112 OTIMIZADOR DE CONSULTAS EM BANCO DE DADOS Elisa Alvina de Moraes Arcanjo, Iremar Nunes de Lima.....................................................................................................................121 PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DE SOFTWARE DE ACORDO COM A NORMA ISO/IEC 15504 Marcelo Norte de Oliveira, Iremar Nunes de Lima..............................................................................................................................125 PSCOLOGIA ANTECIPAÇÕES FILOSÓFICAS DE UMA CIÊNCIA DO COMPORTAMENTO: Paul Rée e a ilusão do livre-arbítrio Marcus Vinícius Fonseca de Garcia...................................................................................................................................................132 AS RELAÇÕES DE TRABALHO COMO FERRAMENTAS PARA DETERMINAR UM SER SOCIAL Alice Vilela, Karina Rabbi, Lidnéia Leite, Luand Carolina, Tamiris Barcelos.......................................................................................137 PUBLICIDADE E PROPAGANDA AÇÃO DE GUERRILHA: uma análise do case SOS Fauna Elevador Daniela Lima, Flávia Crivellari.............................................................................................................................................................149 OS PROCESSOS CRIATIVOS DO RECEPTOR DISCUTIDOS A PARTIR DA PUBLICIDADE E DA POESIA: a produção de um clipe-poema por jovens do PEP Fernanda Carla de Castro..................................................................................................................................................................151 O PLANEJADOR. Algumas considerações práticas. Sônia A Martins Lazzarini....................................................................................................................................................................156


PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO EM AGÊNCIAS DE PROPAGANDA Asley Oliveira de Siqueira, Carla Jacqueline Gonçalves Costa, Patrick Simon Moreira de Oliveira....................................................162 SISTEMA DA INFORMAÇÃO GOOGLE HACKING Alex Sander de Oliveira Toledo, Dayene Ângela de Almeida...............................................................................................................168

METASPLOIT: um cenário de intrusão Alex Sander de Oliveira Toledo, Vinícius Augusto Celestino Souza PERÍCIA FORENSE COMPUTACIONAL: Análise de Malware em Forense computacional utilizando de sistema operacional GNU/ Linux Alex Sander de Oliveira Toledo, Robert de Souza .............................................................................................................................172 SOCIOLOGIA UM NOVO CONCEITO DE ENSINO RELIGIOSO: para uma formação integral do educando Bruno Luciano de Paiva Silva.............................................................................................................................................................182 TURISMO BELO HORIZONTE E OS MEGAEVENTOS ESPORTIVOS Marcella C. Amaral Scotti...................................................................................................................................................................189 SAÚDE ALTERNATIVAS AOS TESTES DE SEGURANÇA DE COSMÉTICOS EM ANIMAIS Sara Marques da Cruz, Lúcia Helena Angelis.....................................................................................................................................195 ANOREXÍGENOS: controle rígido ou proibição de seu uso? Amanda Pauliane Alves Moreira, Elias Borges do Nascimento Júnior...............................................................................................203 ATUAÇÃO DO ENFERMEIRO DA ATENÇÃO BÁSICA FRENTE AO CONTROLE DO CÂNCER UTERINO: revisão de literatura Camila Gomes de Paula, Luciene Barra Ribeiro, Maíra Cardoso Pereira, Tatiana Bedran................................................................213 A UTILIZAÇÃO DE ADALIMUMABE E ETANERCEPTE PARA ARTRITE REUMATÓIDE NO SUS: eficácia terapêutica ou pressão judicial? Mariana Ferreira Pinto Vianna Falconetti, Elias Borges do Nascimento Júnior...................................................................................219 CONFORMAÇÕES DO CICLOEXANO: um modelo de estudo no PcModel Anderson Hollerbach Klier.................................................................................................................................................................233 ELETROESTIMULAÇÃO NO TRATAMENTO DA INCONTINÊNCIA URINÁRIA DE ESFORÇO FEMININA: revisão de literatura Drielly Fernanda de Souza, Estela Vieira Santana, Keylla Marques de Araújo, Renata de Oliveira Cangussu...................................240 FARMÁCIAS COMUNITÁRIAS E O ATENDIMENTO AOS CASOS DE GRIPE: medicamentos de venda livre e o uso racional Natália Vasconcelos Silva de Brito, Elias Borges do Nascimento Júnior...........................................................................................246


ISOLAMENTO E IDENTIFICAÇÃO POR PCR ARDRA DE Lactobacillus spp. DE GRÃOS DE KEFIR CULTIVADOS EM LEITE OU ÁGUA AÇUCARADA Mário Abatemarco Jr, Marta M. Gontijo Aguiar, Álvaro Cantini Nunes, Elisabeth Neumann, Jacques Robert Nicoli..........................260 KLEBSIELLA PNEUMONIAE CARBAPENEMASE – KPC em Enterobacteriaceae: o desafio das bactérias multirresistentes Érica Ribeiro Cotrim, Roberta D. Rodrigues Rocha, Mônica de F. Ribeiro Ferreira ...........................................................................268 MANIFESTAÇÕES BUCAIS EM PACIENTES PORTADORES DE ARTRITE REUMATÓIDE Pâmela Oliveira Garcia, Sara Patrícia dos Santos, Santuza Maria Souza de Mendonça ...................................................................276 OS RISCOS DO USO E DO DESCARTE INADEQUADO DE MEDICAMENTOS VENCIDOS: método de análise alternativo para determinação de ácido salicílico em uma amostra de aspirina® vencida. Adriana Nascimento de Sousa, Eliane do Nascimento, Fernanda Boroni, Kyrlah Jerônimo..............................................................283 PADRONIZAÇÃO DOS DESENHOS UTILIZADOS NOS PROCESSOS DE BLISTAGEM Thais Reis Amaral, Linna Beathrice Oliveira Rodrigues, Gisele Assis Castro Goulart ........................................................................299 PESQUISA DE CONTAMINANTES NOS EFLUENTES DA LAGOA DA PAMPULHA: análise comparativa entre os anos de 2007 e 2011 Amanda Ferreira da Silva, Daniela Gonçalves Araújo, Izabella Branco Santos de Morais, Izabella Cristina da Silva, Márcia Santos Hoffman, Marcus Vinicius Vitoriano e Silva, Adriana Nascimento de Sousa.......................................................................................312 PROGRAMA DE CONTROLE DA ESQUISTOSSOME NO DISTRITO DE ANTUNES/MG: análise de dados registrados e avaliação das medidas adotadas Marilda Honória Duarte Costa, Roberta Dias Rodrigues Rocha.......................................................................................................319 TROMBOEMBOLISMO PULMONAR: aspectos gerais e aplicabilidade diagnóstica da dosagem sérica de D-dímero Débora Cristina de Oliveira Cunha, Roberta Dias Rodrigues Rocha.................................................................................................325 UTILIZAÇÃO MEDICINAL DO ÓLEO DE COPAÍBA: aspectos históricos e estudos atuais Aldemir Fernandes Lima, Jesiel Francisco de Jesus Fernandes Martins Lima...................................................................................332 Vírus Influenza A (H1 N1): abordagem revisional Aldemir Fernandes Lima, Jesiel Francisco Martins Lima.....................................................................................................................337


GESTÃO EMPREENDEDORA PARA O MERCADO AUTOMOTIVO: uma apresentação do Sistema Total Ford de atendimento em concessionárias Deiziane C. Pereira* Elen C. R. S. Mariano* Gessica C. Moreira* Lucas C. Faria* Joice C. Reis* Rafaella M. A. Vimieiro* Eduardo B. Machado**

RESUMO: Este artigo apresenta uma análise sobre o tema gestão empreendedora no setor automotivo. Para tanto, analisaram-se os temas abordados em livros e reportagens postadas em sites. Constatou-se que após as crises mundiais ocorridas a partir da década de 1990, a FORD perdeu grande parte do mercado. Para contribuir com a solução do problema, a empresa criou o Sistema Total Ford que possibilitou um atendimento mais rápido e de qualidade. Dentro de uma pesquisa qualitativa, elaborou-se um estudo de caso desse sistema gerencial de atendimento, procurando verificar se o mesmo representa um comportamento empreendedor da empresa. Como resultado da análise, conclui-se que o sistema de atendimento estão muito próximos de questões de empreendedorismo em sua essência. PALAVRAS-CHAVE: Setor automotivo, Ford, empreendedorismo, Sistema Total Ford.

1. INTRODUÇÃO

siderada a terceira melhor montadora do cenário automobilís-

O setor automotivo compreende, além dos automóveis de

tico mundial.

passeio e veículos comerciais leves, caminhões, ônibus e má-

Esse estudo avalia as técnicas gerenciais que permitem

quinas agrícolas. A indústria da mobilidade abrange todo o se-

implantar metas empreendedoras na organização, desta forma

tor envolvido de alguma forma na fabricação de veículos, sejam

foi analisado o Sistema Total Ford que tem como princípios bá-

eles automotores ou não, o que significa um amplo mercado de

sicos a satisfação do cliente e a retenção dos mesmos.

produtos. (DESIGN BRASIL, 2011)

Com base em pesquisas bibliográficas em que autores

Essa complexidade foi estruturada ao longo do século XX,

verificados foram Bernardi (2003), Oliveira (2008), Victor Mir-

sobretudo com a contribuição de Henry Ford que popularizou o

shawka (2004), Gates (1999), entre outros, agregou-se com

automóvel com a linha de produção e montagem que provoca-

pesquisas em sites e documentos da empresa sobre o siste-

ria uma revolução na sociedade mundial. (FORD, 2011)

ma. Buscou-se com isso uma constatação sobre a eficiência

Atualmente a FORD passou por algumas reestruturações

de uma empresa é referência do setor. Assim, pretendeu-se

e crises, segundo seu próprio site (FORD, 2011), mas cresceu

satisfazer a seguinte questão: o Sistema Total Ford é uma ferra-

e evoluiu lado a lado com a indústria automobilística lançando

menta alinhada com aspectos de uma gestão empreendedora?

modelos que marcaram a história. A análise da gestão empreendedora na empresa foi idealizada através do Sistema Total Ford desenvolvido no Brasil com base no conceito “Distribuidor 2000” da Ford alemã, aplicado em vários mercados e implantado como programa piloto em quatro Distribuidores brasilei-

2. OBJETIVOS OBJETIVO GERAL Avaliar se o Sistema Total Ford está alinhado com os preceitos de uma gestão empreendedora.

ros em 1997. Buscando novas soluções e aprimoramento dos processos, visando à melhoria dos padrões de qualidade e a

OBJETIVOS ESPECÍFICOS

satisfação. Após passar por algumas crises a empresa FORD

Pesquisar sobre a empresa Ford.

conseguiu a partir desse processo se restabelecer e hoje é con-

Levantar dados sobre contexto e seu desempenho

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no mercado.

ção de intra-empreendedorismo que contribui para que gerentes

Pesquisar o conteúdo de gestão empreendedora.

e colaboradores apresentem as mesmas características do que

Analisar o Sistema Total Ford sob as considerações da

sócios fundadores.

gestão empreendedora.

Oliveira (2008), afirma que a busca por novos resultados na realidade empresarial conduziu a uma abordagem mais compor-

3. METODOLOGIA

tamental, onde os esforços estiveram concentrados nos proces-

Sendo essa uma pesquisa descritiva de natureza qualitativa,

sos de mudança e na preparação dos profissionais. Ainda se-

a mesma se serviu de uma pesquisa bibliográfica, tanto eletrôni-

gundo o autor, cada vez mais as organizações apresentam uma

ca quanto física. Um comparativo de componentes conceituais

sustentação de metodologias, técnicas e processos, devidos

foi utilizado para uma análise entre a bibliografia de gestão, ges-

principalmente á necessidade de se ter uma administração base-

tão empreendedora, empreendedorismo e as demais informa-

ada nos indivíduos, já que estes representam o maior foco de co-

ções do Sistema Total Ford de atendimento a clientes.

nhecimento, informação, decisão, ação e avaliação da empresa.

Nesse estudo de caso foi concebido também um histórico

Isso também é percebido em Oliveira e Silva (2006) na sua

da empresa, como forma de favorecimento da compreensão da

fala sobre a Organização Empreendedora, como resultante de

sua situação e das demais informações relacionadas.

uma postura gerencial, um conjunto de sistemas e demais recursos alinhados com essa postura de mercado.

3. REFERENCIAL TEÓRICO

Para Mirshawka (2004), observar as características, as difi-

Parte-se para uma indicação inicial sobre o termo e as de-

culdades e preocupações do empreendedor em saber trabalhar

finições sobre o empreendedorismo, encontrada em Goulart e

com registros e controle de seu negócio, servem para manter e

Papa (2004), que condiciona esse tipo de atividade ou com-

conquistar novos clientes, pois eles são de fundamental impor-

portamento empresarial sob uma ótica de centros culturais, tais

tância para a organização. O autor, no entanto, cita a obrigação

como os Estados Unidos e a França que aprofundaram em pes-

de saber a real necessidade de um determinado gasto para a

quisas na área, gerando primeiros esse corpo de conhecimento

empresa e aprender a usar bem o seu tempo, pois ele deverá re-

utilizado atualmente no campo dos negócios.

pensar imediatamente na necessidade desse aumento de custos

Para autor Bernardi (2003), o empreendimento é abordado

ou dessa mudança para a plena satisfação do cliente. Baseando-

de forma dinâmica e estratégica, em seus princípios fundamen-

se nestas informações ele perceberá que o cliente está em busca

tais e vitais. Os atos de empreender e gerir uma empresa está

de um produto com qualidade e de um preço justo.

sempre sujeitos a riscos e incertezas. As complexidades do am-

O mercado está cada vez mais competitivo e segundo Mir-

biente empresarial pelas demandas e pelas mudanças geram

shawka (2004) para manter os clientes, o empreendedor criativo

profundos desafios e oportunidades.

tem que satisfazer os mesmos plenamente. Pessoas satisfeitas

Em Oliveira e Silva (2006) tem-se que o empresário tem a

dificilmente deixam o lugar onde obtiveram essa satisfação. O

responsabilidade de conhecer, enfrentar e superar, contingên-

empreendedor deve estar sempre um passo á frente de seu con-

cias de mercado constantemente em um procedimento sistema-

corrente em todos os sentidos, novidades, qualidades, serviços,

tizado como Administração Empreendedora, utilizando todas as

entre outros. E a cada dia os clientes estão sendo mais valori-

competências técnicas disponíveis, sobretudo a inovação como

zados dentro das organizações, todos os focos estão voltados

principal instrumento do chamado espírito empreendedor

para eles. Isso faz com que ocorra um relacionamento agradá-

É necessário sempre compreender os limites do empreendedorismo. Tanto pessoais, quando organizacionais. É necessário

vel entre ambas as partes. Eles querem comprar soluções para seus problemas e satisfação de suas necessidades.

que verifique o que há por trás dos resultados positivos, pois eles

Já segundo Gates (1999), os negócios mudam rapida-

propiciam à empresa condições competitivas favoráveis. Deve

mente e há necessidade que as empresas disponibilizem uma

haver um equilíbrio entre a gestão e o empreendimento, através

atenção mais personalizada aos clientes. Para isso as organi-

das ações tomadas de criação, crescimento, manutenção, expan-

zações precisam adotar internamente processos digitais para

são e mudanças de linhas de conduta. (GOULART; PAPA, 2004)

se adaptarem a um ambiente movido pelas necessidades dos

Para as características e funções pessoais do empreende-

clientes e pela concorrência. Esses processos digitais, segundo

dorismo, Robbins (2008) relata sobre a existência de um chama-

esse autor, além de trazerem solução para os problemas dos

do “espírito empreendedor” que alimenta uma atividade criativa

clientes proporcionam um alto desenvolvimento tecnológico e

e dinâmica de conduta empresarial, inclusive com uma orienta-

as empresas que investem nesse meio estão com a chave para

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o sucesso.

um déficit de 5 trilhões de dólares no mercado dos EUA. Para

O que sustenta essa necessidade de aprimoramento de

solucionar o problema o governo injetou dinheiro no mercado e

controle e rapidez nas decisões está relacionado com um espí-

o FED abaixou a taxa de juros. Quando houve essa redução de

rito empreendedor em gerar soluções melhores ou mais efica-

juros, o governo precisou captar dinheiro e investir no mercado

zes aos mercados consumidores. A organização em sustenta

imobiliário, oferecendo bônus hipotecários aos pobres. Com os

e prescinde da mudança, alinha-se com elementos do empre-

ataques terroristas em 2001 nos EUA, a crise se agravou e o

endedorismo e longevidade das empresas. (OLIVEIRA E SILVA,

FED aumentou as taxas de juros. As pessoas não pagaram suas

2006); (PINTO ET AL, 2007)

dividas aos bancos que chegaram à falência e algumas seguradoras de crédito entraram em colapso. A partir de 2006 a Ford anunciou um amplo plano de ca-

4 SETOR AUTOMOTIVO O setor automotivo envolve um amplo mercado de grande

pitalização e reestruturação de suas atividades que incluiria a

importância econômica no Brasil. Ele é representado pela An-

demissão de cerca de 44 mil colaboradores e o fechamento de

favea - Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Au-

16 fábricas nos Estados Unidos e Canadá confirmando que os

tomotores e inclui os fabricantes de autopeças e corresponde

problemas da Ford se concentravam no seu berço, a América

a 22% do PIB brasileiro. É um setor que responde direta ou in-

do Norte. Além disso, a empresa dispensou a ajuda governa-

diretamente pelo emprego de 1,3 milhões de pessoas. O Brasil

mental oferecida para suas concorrentes GM e Chrysler. O pro-

tem se destacado no setor automotivo graças ao mercado, a

cesso de capitalização deixou como herança um endividamento

competente produção, a sólida base de engenharia automoti-

próximo dos US$ 25 bilhões e para suprir este endividamento

va. O diferencial competitivo nesse setor ocupa uma posição

grifes como Austin Martin, Land Rover e Jaguar foram passadas

de destaque, pois concentra os maiores investimentos em tec-

adiante, sempre com o intuito de reforçar o caixa. A marca Volvo

nologia e capacitação de profissionais. O processo de design

teve o mesmo destino. Mais enxuta e livre das imposições do

automotivo tem se expandido e aprimorado de modo a atender

governo, a Ford pôde se aproximar rapidamente da GM.

as necessidades de um consumidor cada vez mais exigente.

No Brasil, a Ford, desde o início de suas operações em

Esse processo está ligado ao uso de veículos, a segurança, a

1967, nunca atingiu o primeiro lugar em vendas, competindo

sustentabilidade e a tecnologia. Há uma grande demanda por

diretamente com a GM em busca de sua consolidação em um

tecnologias e por soluções inovadoras que atendam os desafios

terceiro lugar geral. Para isso a Ford tem investido investido em

da mobilidade e da sustentabilidade.

tecnologia, inovação de modelos, aquisições e sistemas de qualidade, como aqui apresentado. (ANFAVEA, 2011)

5 A EVOLUÇÃO DA FORD E A CRISE ECONÔMICA No início do século XX, Henry Ford idealizava construir um

6 CONCORRENTES

meio de transporte fácil de usar e que o trabalhador americano

Concorrência é uma emulação entre comerciantes ou in-

pudesse pagar. Henry Ford não foi o inventor do carro, mas foi

dustriais, que tentam atrair os clientes por meio de, entre outras

um dos primeiros a aprimorar o invento e fazê-lo um produto mais

coisas, melhores preços e qualidade no produto e atendimen-

popular. Pensando em melhorar a locomoção das pessoas e fa-

to. A Fiat, Volkswagen, Chevrolet são algumas empresas que

cilitar o modo de se manusear os carros, Henry Ford idealizou o

competem incessantemente com a Ford. Elas possuem boa

modelo T e o esquema de linha de produção, que por sua vez foi

percepção de mercado, isso fez com que notassem o bom de-

a base para a diminuição do preço e a redução do tempo de pro-

sempenho que a empresa Ford conquistou com o seu Sistema

dução causando aumento dos ganhos. Em 1909 chegou ao Brasil

Total Ford. Dessa forma, as empresas concorrentes adaptaram

o Ford mais antigo de que se tem notícia. Com a primeira Guerra

e melhoraram o processo de acordo com sua organização, ge-

Mundial, paralisou-se a vinda de automóveis europeus para o Bra-

rando mais lucratividade e atraindo novos clientes. Percebendo

sil, aumentando a procura por carros dos EUA e, consequente-

a perda de clientes a Ford atualizou seus processos, como Box

mente, aumentando também o mercado da Ford no Brasil. A partir

Rápido Motorcraft (destinado ao atendimento de serviço cujo

dos anos 1990 a montadora passou por algumas reestruturações

tempo de execução seja igual ou inferior a 2 horas), Agenda

devido ao surgimento de crises que fizeram com que ela perdes-

Ford (agendamento de escolha do cliente do distribuidor, data

se uma grande parte de seu mercado mundial.

e hora de atendimento), Brand Service (desenvolvimento da co-

A partir de 1995 ocorreram algumas crises que mudaram

municação visual e dos processos de atendimento).

drasticamente a economia mundial. Uma dessas crises causou PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 15


7. O SISTEMA TOTAL FORD E SEU PROCESSO

tem) e e-mails semestrais, para relembrá-los de suas revisões e

Seu conceito básico é o foco no cliente, sempre buscando

promoções. Ao estabelecer este primeiro contato o cliente vai à

atender as crescentes necessidades dos mesmos, alinhando-

concessionária, onde, encontrará um atendimento personaliza-

se com a estratégia global adotada pela Ford que consiste em

do por meio de consultoria técnica. Um profissional qualificado

atingir a liderança na qualidade dos produtos e na dedicação

para essa função assume o papel de administrar todo o pro-

ao cliente. Após terem sido realizados pesquisas na Europa, os

cesso de atendimento, da chegada à entrega efetiva do veiculo.

clientes revelaram que o mau tratamento recebido no atendi-

O consultor técnico inspeciona o veiculo com objetivo de

mento, foi o principal motivo para deixarem de utilizar os serviços

identificar falhas visíveis, em seguida prepara um orçamento

das Oficinas dos Distribuidores. O principal motivo para o suces-

prévio e apresenta ao consumidor. Autorizada, a execução do

so do programa será o envolvimento dos principais dirigentes da

serviço será automaticamente enviada uma mensagem ao es-

empresa e as suas crenças, cujas atitudes deverão dar sinais

toque de peças, onde, o funcionário responsável pelo setor irá

evidentes do interesse pela qualidade da prestação de serviços

separar as peças necessárias. Continuando o atendimento, será

como fator de competitividade e sobrevivência.

apresentada ao cliente a equipe especializada e o serviço a ser

De acordo com Pinho (2009), Programa Nacional de Treina-

feito em seu veiculo, além de algumas cortesias da empresa

mento ABRADIF (Associação Brasileira dos Distribuidores Ford),

como: táxi, cafezinho para ambientação, conversa informal com

o Departamento de Serviço tem um papel decisivo para a satisfa-

o mesmo para deixá-lo familiarizado com a empresa. Seguindo

ção e fidelidade dos clientes á marca e a consequente rentabili-

o processo o consultor técnico ira iniciar a abertura da ordem de

dade do negócio. Esta importância comprova-se pelos seguintes

serviço documento que destacará o trabalho a ser executado,

fatos: os clientes compram, em média, um carro novo a cada 3

inclusive as observações do cliente. Finalizando a primeira fase

anos e meio. Contudo, o carro é levado a revisões de oito em oito

de atendimento o consultor técnico irá determinar para o clien-

meses. Desta forma, a cada contato de venda, correspondem cin-

te o tempo necessário para a finalização do trabalho e ambos,

co contatos de serviços com o cliente, sendo, responsável o De-

cliente e funcionário, irão agendar data e horário de entrega.

partamento de Serviços que determina a opinião do cliente sobre

Ao finalizar o trabalho a ordem de serviço é “fechada”, o

o distribuidor. Esta opinião afeta também o seu grau de satisfação

cliente efetua o pagamento e a nota fiscal é emitida. Antes da

e, em longo prazo, as suas intenções de compra. O outro fato é

entrega do veículo todo o serviço executado é explicado para

que o departamento de serviço bem gerido contribui de forma

o cliente e as peças substituídas são apresentadas. Dois dias

significativa para a rentabilidade do distribuidor.

após a entrega do veículo, funcionários do setor de qualidade do

O programa serviço total Ford oferece as seguintes vanta-

distribuidor entram em contato com o consumidor com o intuito

gens ao distribuidor: aumento do nível de satisfação, lealdade

de esclarecer dúvidas, receber elogios e solicitar nota, de 1 (um)

do cliente e melhor qualidade do serviço; aumento das vendas

à 10 (dez), para o atendimento. As reclamações e a nota forne-

de mão-de-obra, peças e acessórios; maior rentabilidade; au-

cida pelos clientes são de fundamental importância para que a

mento da produtividade e da eficiência da oficina; redução dos

equipe corrija suas falhas prevenindo reclamações e os elogios

retornos de serviço. E é possível proporcionar soluções simples

servem como estímulos para sempre melhorar.

aos clientes que os permite: efetuar o agendamento do atendi-

Com isso, percebe-se que anteriormente não deveria haver

mento, segundo sua conveniência; ser recepcionado de forma

um padrão mínimo ou sistematização da área de atendimento

pessoal e imediata; participar do processo de diagnóstico; evi-

a clientes de oficinas autorizadas. O Sistema Total Ford no seu

tar esperas tanto na chegada quanto na retirada do veiculo; ter

formato aqui apresentado sugere uma necessidade de agregar

conhecimento prévio do preço do reparo; ter o veículo reparado

valor a peças e serviços de assistência técnica, com acréscimos

corretamente na primeira vez; receber o veículo pronto no horá-

de agilidade, cortesia e padronização que podem também se-

rio combinado; obter explicação sobre os serviços realizados e

rem interpretadas como formas de aumentar o faturamento da

os custos envolvidos.

rede com pouco investimento ou imobilização de capital, escas-

Para que o sistema aconteça com aperfeiçoamento é ne-

sos em momentos de crise como o retratado.

cessário que haja alguns recursos facilitadores. No primeiro mo-

Assim, tem-se um diagrama na Figura 01 que representa

mento o cliente agenda o serviço, por meio do site da FORD

esse esforço gerencial de aumento de desempenho em meio

ou pelo atendimento telefônico da concessionária, assim o con-

a um cenário adverso, sugerindo assim uma associação como

sumidor fica ciente do distribuidor mais próximo. Os clientes já

conceitos de empreendedorismo.

fidelizados ao distribuidor recebem SMS (short message sys16 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


8. CONCLUSÃO

de cada funcionário, adequando-se ao ambiente de mercado.

Foi identificado que um ponto fraco da empresa era o mau

Considerando que o consumidor está cada vez mais exi-

atendimento realizado nas oficinas dos distribuidores, fazendo

gente, é necessário que os gestores verifiquem as constantes

com que a Ford perdesse significativamente seus clientes. Por

transformações de mercado e as ameaças que a FORD sofre

isso, uma das principais causas para o sucesso do programa

por meio dos seus concorrentes. Recomenda-se que haja sem-

foi o envolvimento dos principais dirigentes da empresa com o

pre uma pesquisa por parte da empresa com seus clientes para

processo de atendimento.

identificar quais atitudes necessitam de melhoria e quais são as

A empresa precisa estar ciente de suas ameaças (principal-

inovações necessárias a se implantar em seu sistema. Além dis-

mente de seus concorrentes que vem adaptando seu método

so, é necessário investir cada vez mais em tecnologia, em um

de atendimento) sabendo aproveitar as oportunidades que o

serviço eficaz de pós-atendimento, reuniões periódicas, avalia-

mercado lhe proporciona, obtendo produtos e serviços de qua-

ções e feedback contínuos.

lidade e confiança. Para que o Sistema Total Ford se mantenha como uma boa estratégia de atendimento, é necessário que a

Dessa forma ela estará se qualificando para atingir o lugar de melhor montadora do setor automotivo mundial.

empresa sustente um bom relacionamento com seus colaboradores, crie tecnologias gerando novas oportunidades de apren-

REFERÊNCIAS

dizagem para seus funcionários, avalie as necessidades e os

BERNARDI, Luis Antônio. Manual de empreendedorismo e gestão: fundamentos, estratégias e dinâmicas. São Paulo: Atlas, 2003. 314 p.

custos para um desenvolvimento de novos planos de pesquisa. É necessário que a Ford mantenha sempre uma visão ampla e inovadora, pois o mercado demanda produtos de qualidade, que possam satisfazer suas necessidades e desejos. A empresa precisa possuir sempre uma boa estratégia, implantando novos programas, aumentando a demanda (quando for possível) e atraindo novos clientes, dessa maneira, construindo relacionamentos lucrativos. É muito importante que os gestores divulguem a empresa, que mantenham uma estratégia de comunicação, não só com os clientes, mas com os funcionários

CARTA MAIOR: Os Estados Unidos e sua crise. [S.I.]. Disponível em: <http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar. cfm?materia_id=14882>. Acesso em: 10 out. 2011. Traduzido por FREITAS, Naila / Verso Tradutores, 2011. chave-na-estrategia-global-da-ford,665450,0.htm>. Acesso em: 10 out. 2011. DESIGN BRASIL: Setor automotivo. [SI]:. Disponível em: <http://www. designbrasil.org.br/setoresprodutivos/setor-automotivo?=Automotivo>. Acesso em: 16 out. 2011.

também, visando um bom atendimento. É recomendável que a Ford aprenda sobre os clientes, crie produtos e serviços sob medida para suas necessidades e que distribua serviços com eficiência. É importante verificar também quem são seus clientes potencialmente lucrativos, posicionar valor para o serviço de atendimento, verificar as características

Estadão: Brasil é peça-chave na estratégia global da Ford [S.I.]:– SILVA, Cleide, 2011. Disponível em: <http://www.estadao.com.br/noticias/ impresso,brasil-e-pecaFORD: Sobre a Ford: Apresenta a história da Ford. Disponível em: <http://www.ford.com.br/sobre_ford.asp>. Acesso em: 21 out. 2011

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GATES, Bill. Empresa na velocidade do pensamento: com um sistema nervoso digital. São Paulo: Companhia das letras, 1999. GOULART, Iris Barbosa; PAPA, Sudário Filho: Empreendedorismo e empreendedores, sugestões para a educação. Belo Horizonte: Editora Newton Paiva, 2004 MIRSHAWKA, Victor. Empreender é a solução. 2 ed. São Paulo: DVS Editora, 2004. 298 p. OLIVEIRA, Djalma de Pinho Rebouças de. Administração de processos: conceitos, metodologias e práticas. 3 ed. São Paulo: 7 letras, 2009. 314 p. OLIVEIRA, Jayr Figueiredo de; SILVA, Edison Aurélio da: Gestão organizacional, descobrindo a chave de sucesso para os negócios. São Paulo: Editora Saraiva, 2006. PINHO, Claudio. Programa nacional de treinamento Avançado ABRADIF (Associação Brasileira dos Distribuidores Ford): módulo básico, 2010. 57p. PINHO, Claudio. Programa nacional de treinamento Complementar ABRADIF (Associação Brasileira dos Distribuidores Ford): módulo complementar, 2009. 52p. PINTO, Éder Paschoal ET AL: Gestão empresarial, casos e conceitos de evolução organizacional. São Paulo: Editora Saraiva, 2007. ROBBINS, Stephen P.: Administração, mudanças e perspectivas. São Paulo: Editora Saraiva, 2008.

NOTAS DE RODAPÉ *Alunos de Administração de Empresas pelo Centro Universitário Newton Paiva. ** Mestre em Administração de Empresas e membro do corpo docente do Centro Universitário Newton Paiva.

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GESTÃO EMPREENDEDORA: um estudo de caso na Auto Mecânica Rômula Ltda. Adriana de Araújo, Amanda Pávilla Arnaldo Ferreira, Kenia Cristina Nathalia Miranda, Thaymon Soares1 Helbert José de Góes2 Laila Maria Hamdan Alvim3

RESUMO: O presente artigo apresenta o estudo da Gestão Empreendedora realizado na Auto Mecânica Rômulo Ltda. que visou solucionar de maneira eficaz os problemas identificados por meio de conceitos estudados no 4° período de Administração de Empresas do Centro Universitário Newton Paiva e de análise de organogramas, gráficos, planilhas e fluxogramas. A empresa em questão busca gerenciar eficientemente os recursos e pessoas para o bem-estar econômico e social da organização. Assim, um planejamento estratégico aparece como uma importante ferramenta de auxílio ao gestor e tem como objetivo definir o caminho a ser seguido pela organização na busca de sua meta. Para demonstrar a aplicação dessa estratégia de gestão, foi desenvolvido e proposto um plano de ação a ser implantado na empresa, que tem, hoje, vinte funcionários. PALAVRAS-CHAVE: Gestão Empreendedora; Plano de Ação; Atendimento; Planejamento Estratégico.

GESTÃO EMPREENDEDORA

tégias, estrutura, metas e planos de ação para aprimorar a ges-

Atualmente, organizações de diversos setores da economia

tão e aumentar o diferencial competitivo da empresa.

mundial têm-se deparado com um cenário cada vez mais competitivo e exigente. Surge, então, a necessidade de realizar

PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO

mudanças em políticas adotadas pelas empresas, visando

O planejamento estratégico é um processo gerencial con-

a sua reestruturação no mercado mutável e readaptação às

tínuo que visa tomar decisões, formular objetivos, metas e pro-

novas tendências e exigências de seus stakeholders4. Sobre o

gramas de ação para execução. Um plano estratégico oferece

tema, Bernardi comenta:

uma visão do futuro, porque sua elaboração aumenta a proba-

O desempenho e a competitividade de uma empresa estão

bilidade de a organização estar bem estruturada em relação ao

diretamente relacionados à gestão do empreendimento e às

mercado e suas mudanças. Por isso, embora não garanta o

pessoas envolvidas, quer sejam colaboradores, o empresário,

futuro desejado, o planejamento define objetivos, direciona os

no papel de gerente, quer sejam terceiros que venham a contri-

esforços e recursos e dá um rumo ao empreendimento, o que

buir para a empresa. (BERNARDI, 2003, p.139).

nada tem a ver com previsão ou com futuro garantido, até pela

A partir dessa real necessidade, um novo conceito é estudado e discutido por acadêmicos: a Gestão Empreendedo-

dinâmica, volatilidade e complexidade do contexto empresarial (BERNARDI, 2003. p. 102).

ra, que, ainda segundo Bernardi (2003, p.55), “resume-se em

Para Certo e Peter et al (2007), o planejamento estratégi-

estruturar-se de forma adaptativa e integrativa e enfatizar um

co permite à organização, entre outros processo, formalizar a

comportamento sistêmico, em vez de unicamente competitivo”.

sua intenção de atuação no mercado, favorecendo um alinha-

Gerenciar e empreender é lidar com constantes mudan-

mento entre todos os níveis hierárquicos de uma organização.

ças, riscos e complexidade das necessidades da empresa, o

Em um mercado competitivo, o planejamento é uma das ferra-

que exige do gestor posturas diferenciadas. É vital que, como

mentas utilizadas por um gestor em um processo contínuo de

grande responsável pela trajetória da empresa, o gestor em-

interação entre empresa e ambiente, permitindo que esta se

preendedor deve estar apto a lidar com situações que possam

oriente melhor em relação aos recursos e alcance os objetivos

impedir que os objetivos da organização não acompanhem

pelo estabelecimento de metas e prazos que demonstram sua

as transformações do mercado. Com a variedade de assun-

postura frente ao mercado e as mudanças necessárias a serem

tos, áreas, atividades e funções existentes na gestão de uma

realizadas em relação ao seu posicionamento.

empresa, torna-se primordial a interação entre objetivos, estra-

Abordando a aplicabilidade desses vários conceitos, de-

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senvolveu-se um projeto junto à empresa Auto Mecânica Rômulo Ltda, que trabalha com reparação de veículos automotores. O projeto consiste em um estudo analítico da empresa e seus stakeholders para obtenção de informações com as quais se torna possível o estabelecimento de uma meta operacional voltada para princípios de uma gestão empreendedora. SETOR AUTOMOBILÍSTICO Segundo as informações disponíveis no site Correio de Uberlândia5, o mercado brasileiro de automóveis, nos últimos dois anos, experimentou um crescimento surpreendente a despeito até dos temidos efeitos da crise financeira global de 2008. Por esta razão, o ano de 2011 é visto por muitos como o início da adequação. Não que o mercado não vá crescer, mas não deve ter números tão dilatados quanto 2010. Nesse ano, o aumento de vendas aproximou-se de 10% sobre 2009. Já 2011, deve registrar um crescimento de 5,2% sobre 2010, segundo as projeções da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (ANFAVEA - 2010). Um índice elogiável para os executivos do setor. “Crescer acima do PIB, que deve aumentar em 4,5%, é algo bastante saudável. Em nenhum outro país, a in-

1. DESCRIÇÃO DA EMPRESA

dústria vai crescer nessas projeções”, afirmou para este veículo

a) Razão Social: Auto Mecânica Rômulo Ltda.

de comunicação Rogério Cesar de Souza, economista chefe do

b) Nome fantasia: AMR

Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial – IEDI.

c) Ramo de atividade: reparação de veículos automotores

Esses dados são fundamentais para que as empresas possamse projetar no mercado de acordo com a exigência atual.

d) Endereço completo: Rua Leopoldino de Oliveira, nº 481, Bom Jesus, Belo Horizonte – MG e) Número de funcionários: 20 (vinte)

A EMPRESA A Auto Mecânica Rômulo Ltda. é uma organização formal

f) Faturamento anual: não foi informado g) Logomarca: AMR – Auto Mecânica Rômulo

de modelo paternalista, fundada em 16 de outubro de 1990, pelo Sr. José Rômulo da Silva, atual diretor, e recebeu o nome

2. DIAGNÓSTICO DA EMPRESA

fantasia de AMR. Possui sede própria e está situada na região

Inicialmente, para estudo, foram realizadas entrevistas in-

noroeste de Belo Horizonte, em uma rua de fácil acesso, com

formais com o empresário e seus gestores principais, que permi-

espaço de 1200 m². É uma empresa de pequeno porte de So-

tiram a percepção da redução do faturamento da empresa e da

ciedade Limitada, com o objetivo de fazer a reparação de veí-

insatisfação dos clientes. Utilizando roteiros semiestruturados,

culos automotores (lanternagem, pintura e mecânica em geral),

buscou-se conhecer a empresa e suas áreas funcionais, para

especialmente, cooperativas de táxis, seguradoras, associações

depois, ampliar por sobre a dinâmica e o desempenho dessa

e veículos particulares.

organização. Depois, alguns funcionários foram selecionados

Atualmente a organização é composta de 15 colaborado-

para entrevistas de verificação da informação prestada pelo em-

res na manutenção, 4 colaboradores na gerência e 1 diretor, que

presário e seus gestores, mas sem identificação e sem registro

se mantém desde sua fundação. A estrutura organizacional da

formal de respostas que pudessem comprometer o clima orga-

empresa Auto Mecânica Rômulo Ltda é composta por uma dire-

nizacional. Ainda assim, alguns clientes que estavam em um

toria, duas assessorias, três gerências, sendo divididas em ad-

momento de transação com a empresa, em sua sala de espera,

ministrativa/RH, financeira, e de manutenção conforme mostra o

foram sondados para nova verificação de questões levantadas.

organograma a seguir.

Para esses dois casos, o roteiro utilizado foram as respostas do empresário e seus gestores principais. A empresa não apresenta uma boa comunicação com seus

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clientes, pois eles não sabem a quem recorrer para solicitar um

bem como seus efeitos sobre a qualidade dos produtos ofereci-

atendimento, para resolver os problemas e até mesmo para fi-

dos pela empresa. (MIRSHAWKA, 2004).

nalizar o serviço solicitado. Nos dias atuais, o empreendedor

Os problemas encontrados na Auto Mecânica Rômulo Ltda

deveria investir o máximo nos relacionamentos com os clientes,

foram evidenciados no diagrama abaixo e, por meio dele, desen-

buscar informações, saber reconhecer um bom cliente, dar su-

volveu-se um plano de ação e estabeleceram-se as ações neces-

porte e segurança ao serviço solicitado. Conhecer o cliente e

sárias para atingir a meta e as pessoas envolvidas no processo.

oferecer um ótimo serviço significam garantia de sobrevivência para os negócios. Conforme Victor Mirshawka (2004), o objetivo primordial de quem quer a sobrevivência do seu negócio é não

perder nunca bons clientes.

O faturamento da empresa não foi revelado, no entanto,

houve redução considerável no último ano, o que justifica o can-

celamento do parcelamento para que os pagamentos à vista

aumentem o fluxo de caixa em curto prazo. As facilidades de pagamento oferecidas já não são mais as mesmas, e todos os pagamentos são apenas à vista. Os funcionários destacam o receio de demissão em função de algumas despensas recentes resultantes da ociosidade e da redução do número de clientes, outro motivo que, de certa for-

Especificamente, os problemas anotados são:

ma, afasta os atuais e impede a captação de novos.

a) Comunicação Empresarial: falta de feedback, falta de

Apesar de o número de clientes entrevistados ter sido baixo, amostragem não probalística, notou-se uma insatisfação

atendimento inicial, ausência de comunicação entre setores, falta no controle de pós-venda.

na maioria deles. Todos reclamaram que, pouco antes ou logo

b) Planejamento e controle de processos: falta de plane-

após o fim da garantia do serviço, o carro volta a apresentar os

jamento de compras, falta de controle dos serviços prestados,

mesmos problemas. Já no caso dos serviços de pintura e lan-

falta de recursos tecnológicos.

ternagem, a insatisfação ocorre imediatamente após a entrega

c) Análise e gestão de processos: falta de profissionalismo

do veículo. Assim, o cliente precisa dispor de tempo novamente

nos processos administrativos, retrabalho, falta de padronização

para voltar à oficina e ficar sem o carro outra vez por mais dias,

dos procedimentos, processos e rotinas informais.

até a revisão dos serviços. A oficina não tem um setor de aten-

d) Análise de custos: cargos desnecessários devido à es-

dimento e satisfação dos clientes, não existindo o trabalho de

trutura familiar da empresa, gastos com retrabalho de serviços

pós-venda tão importante nos dias atuais.

mal feitos, altos gastos com água e luz e um elevado número de

Acredita-se que, com isso, os custos com retrabalho acon-

clientes inativos.

teçam e estejam prejudicando o faturamento anual da empresa. O retrabalho, muitas vezes, pode não incidir custos com mate-

3 PLANO DE AÇÃO

rial, mas o gasto da hora do funcionário deve ser contabilizado,

Como se trata de uma empresa de prestação de servi-

pois este deixa de realizar outro serviço referente ao carro de

ços, o primeiro passo a ser dado para melhorias na qualidade

outro novo cliente. Por isso, definiu-se a meta estratégia de dimi-

dos serviços prestados é oferecer cursos de capacitação e/ou

nuir os gastos da empresa em 10% com retrabalhos em função

atualização para cada funcionário. Modernizar equipamentos e

da falta de controle de qualidade. Em seguida, evidenciaram-se

ferramentas também é fundamental para aprimorar a qualidade

os problemas que a organização apresenta e sua contribuição

de todo serviço prestado garantindo a satisfação dos clientes

para o impedimento do alcance dela.

e fazendo com este voltem a utilizar os serviços da empresa e

A ferramenta utilizada para controlar e apresentar o diag-

ainda a indicá-la para seu networking.

nóstico é o Diagrama Causa e Efeito que evidencia os proble-

Os problemas e as possíveis soluções propostas para Auto

mas e suas respectivas áreas. O diagrama, também conhecido

Mecânica Rômulo Ltda. estão discriminados no plano de ação

como Diagrama de Ishikawa (Espinha de Peixe), é uma ferra-

que se define como “documento que estabelece as práticas, os

menta gráfica que permite estruturar hierarquicamente as cau-

recursos, os métodos, os responsáveis, a prioridade e a sequ-

sas de determinado problema ou oportunidade de melhoria,

ência das atividades operacionais da organização”6. Esse plano

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denomina-se Plano de Ação 5W2H e o nome é devido à primeira

ações passem a ser executadas. Esse plano de ação foi elabo-

letra das palavras inglesas: What (O quê), Who (Quem), When

rado pelos alunos pesquisadores e apresentado aos gestores

(Quando), Where (Onde), Why (Por quê), How (Como), How

como resultado direto de recomendações para a organização

Much (Quanto custa). Após serem definidas todas as etapas, o

estudada. O quadro seguinte exemplifica o 5W2H da empresa

plano deve ficar em local visível por toda a equipe para que as

Auto Mecânica Rômulo Ltda.

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4. Implementação do projeto

diferenciado no seu segmento, diminuindo os 10% de prejuízo

Como a organização nunca tenha realizado ou organizado

definidos pela meta estratégica.

um planejamento estratégico, optou-se, inicialmente, pela utili-

A partir desse momento, com a execução das novas me-

zação do plano de ação proposto que é parte integrante de um

didas propostas, será possível desenvolver um trabalho que

planejamento integrado. Essa opção foi proposta ao empresá-

gere satisfação para clientes e funcionários, atingindo o obje-

rio, devido a sua descrença nessa ferramenta por convicções

tivo da Organização.

próprias. Entende-se que, se houver uma adesão ao plano de ação, bem como verificação para seus resultados frente aos

REFERÊNCIAS

principais problemas abordados, abre-se caminho para futuras

ANFAVEA: Anuário 2010. Disponível em <www.anfavea.com.br> . Aceso em 12-09-2011.

abordagens mais consistentes e complexas. As atividades citadas no plano de ação necessitam de ordenação. A técnica utilizada para ordenar tais atividades denomina-se Diagrama de Barra ou Diagrama de Gantt de processos e rotinas informais. O Diagrama de Gantt é um gráfico usado para ilustrar o avanço das diferentes etapas de um projeto. Os intervalos de tempo representam o início e o fim de cada fase, eles aparecem em barras coloridas sobre o eixo horizontal do gráfico. (PRADO, 204). Em seguida, apresenta-se o Diagrama de Gantt com as atividades ordenadas.

BERNARDI, Luiz Antonio. Manual de empreendedorismo e gestão. São Paulo: Atlas 2003. CERTO, Samuel C. ; PETER, J.P.; et al. Administração estratégica, planejamento e implantação de estratégias. 3 ed. São Paulo: Pearson, 2010. MIRSHAWKA, Victor. Empreender é a solução. 2 ed. São Paulo: DVS Editora, 2004. PRADO, Darci Santos do. Planejamento e Controle de Projetos. 6 ed. Nova Lima: INDG, 2004. 284 p.

CONCLUSÃO Um dos maiores desafios de uma organização é identificar a necessidade de mudar e/ou adaptar sua gestão às exigências do mercado e, para isso, é necessário que a empresa possua gestores empreendedores que sejam capazes de identificar e aproveitar oportunidades a favor do desenvolvimento organizacional.

SISNEMA.Disponível em:<shttp://sisnema.com.br/Materias/idmat015891.htm > Acesso em 19 out. 2011. CORREIO DE UBELÂNDIA. Disponível em:<http://www.correiodeuberlandia.com.br/veiculos/setor-automotivo-brasileiro-deve-crescerem-2011/ > Acesso em 21 out. 2011.

A empresa Auto Mecânica Rômulo Ltda possui um grande potencial de crescimento, mas precisa rever seus processos para adaptação ao mercado, pois se sabe que o fato de observar e avaliar as oportunidades que surgem é fundamental no momento de fazer a diferença dentro das organizações. Diante das possibilidades, cabe às pessoas saber aproveitá-las da melhor forma possível

DICIONÁRIO DO MARKETING. Disponível em:<http://www.portaldomarketing.com.br/Dicionario_de_Marketing/P.htm> Acesso em: 23 out. 2011.

NOTAS DE RODAPÉ 1 Alunos do quarto período do curso de Administração de Empresas

e no momento oportuno. Ter a percepção de saber o momento propício para se adequar às novas mudanças, verificando qual deve ser o foco do negócio para se atingirem as metas faz com que a organização esteja sempre ativa no mundo dos negócios. Este estudo de caso teve por objetivo desenvolver e aplicar conceitos à organização analisada, apresentando novas diretri-

2 Professor Tutor 3 Professora Orientadora 4 Qualquer pessoa ou entidade que afeta ou é afetada pelas atividades de uma empresa.

zes a serem seguidas, acompanhando as constantes mudanças de Mercado que auxiliarão no cumprimento da meta traçada. Para que a Auto Mecânica Rômulo Ltda consiga consolidar o plano de ação proposto, é primordial que todos os funcionários estejam envolvidos com as novas mudanças sugeridas. É necessário que todos estejam de acordo com a política a ser

5<http://www.correiodeuberlandia.com.br/veiculos/setor-automotivobrasileiro-deve-crescer-em-2011/ > Acesso em 21 out. 2011. 6< http :// www . portaldomarketing . com . br /D icionario _ de _ Marketing/P.htm > Acesso em: 23 out. 2011.

adotada pela empresa, pois, se não estiverem totalmente comprometidos, a organização não atingirá o principal objetivo, que é ser considerada como uma empresa que presta um serviço PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 25


O VAREJO DE AUTOPEÇAS: uma busca da gestão empreendedora na Aja Diesel André Luís Pereira Vilela1 Domingas Paulino de Almeida Francisco Karina Batista Komine Karine Nogueira de Barros Freitas Larissa Lara Tavares Mauricio de Mello Rodrigues Sibele Pinheiro do Nascimento Eduardo Bomfim Machado2

RESUMO: O presente artigo é consequência do estudo de caso realizado na AJA Diesel, uma empresa de pequeno porte do ramo peças automotivas. Por meio de pesquisas realizadas acerca do tema central, Gestão Empreendedora, objetivos foram traçados a fim de se chegar a um resultado satisfatório sobre a atual capacidade da empresa em continuar sua trajetória empreendedora verificada quando da sua inauguração, bem como potenciais propostas que solucionem as deficiências encontradas. Dessa forma, procurou-se resolver a questão norteadora sobre quais seriam as potencialidades e deficiências da AJA Diesel em sua gestão que estariam relacionadas com uma orientação de intra empreendedorismo? Os resultados encontrados estão apresentados ao final na seção de recomendações, após a apresentação dessa organizações suas características. PALAVRAS-CHAVE: empreendedorismo; gestão empreendedora; intra empreendedorismo.

INTRODUÇÃO

vender aos antigos clientes são, por exemplo, comprar peças

Para SINDIPEÇAS, (2011b) o varejo de peças automotivas

importadas que tenham um preço melhor que as peças nacio-

para a linha pesada tem tido uma grande demanda, porém, de

nais, vender itens de outras marcas, abrir filiais em locais que

um ano para o outro, a quantidade de caminhões fabricados e

possam atender melhor aos clientes e melhorar o atendimento

licenciados tem sofrido grande variação, o que trouxe bastante

e agilidade na entrega.

insegurança aos mercados que dependem deste crescimen-

Tal contexto e movimentações do setor foram úteis para

to. Para conseguir resistir a essa instabilidade, as empresas

pesquisa e análise da empresa AJA Diesel em sua trajetória de

distribuidoras de peças, que vendem por atacado, passaram

fundação e manutenção em um mercado que requer dinamismo.

a vender suas mercadorias diretamente aos frotistas, fábricas, oficinas e empresas de caminhões e ônibus, ou seja, ocupando

MERCADO NACIONAL DO SETOR DE AUTOPEÇAS

o mercado e prejudicando as vendas dos varejistas.

Quanto ao mercado de autopeças, especificamente, ob-

Essa situação está, cada vez mais, se generalizando e fa-

serva-se uma movimentação competitiva direcionando, a partir

zendo com que o atacado satisfaça os clientes com preços mui-

de 1980, uma redução da sua produção e investimentos, não

to mais atrativos, pois, pelo fato dos fabricantes de peças não

conseguindo, assim, competir com as importações que come-

venderem seus produtos diretamente ao varejo, fica complicado

çavam a aumentar.

disputar com os preços do atacado, que acaba conquistando

Dessa forma, na década de 1990, grande parte das em-

os clientes que compram em maior quantidade, deixando aos

presas brasileiras desse sub setor passou a ser controlada por

varejistas a menor parcela do mercado. De um modo geral, os

companhias estrangeiras, o que proporcionou às indústrias

negócios da maioria dos varejistas ganharam em volume de ven-

uma nova e moderna estrutura, ganhando status internacional

das, mas o faturamento diminuiu, pois passaram a fazer muitas

e exportando seus produtos para todos os continentes. Quan-

vendas de peças de pequeno valor. (ANFAVEA, 2011)

to às montadoras, observou-se uma abertura econômica que

Assim o SINDIPEÇAS, 2011a indica algumas soluções que

impeliu a um novo patamar de competitividade e inovação, se

o varejo encontrou para tentar recuperar o prejuízo e voltar a

aproveitando também dessa nova estrutura de fornecimento.

26 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


(ABIPEÇAS, 2011)

sarial da organização em função com o tema. Em uma aborda-

Ainda pelo site da ABIPEÇAS, 2011, nos anos 2000, a indústria de autopeças continuou a expandir, havendo um aumento

gem qualitativa, definiu-se por conveniência um único objeto de estudo, que é a própria organização apresentada. (YIN, 2000)

na rentabilidade média, faturamento, investimentos e número de

Para essa construção foram utilizadas pesquisas bibliográfi-

colaboradores, porém, o setor ainda possui três grandes obs-

cas e pesquisas de campo, com métodos de entrevista e obser-

táculos: manter o volume de exportação, estimular a demanda

vação direta. Para a consecução do primeiro objetivo específico,

doméstica e aguardar acordos comerciais do MERCOSUL com

além de uma pesquisa bibliografia eletrônica junto a base de

outros blocos econômicos.

dados da ANFAVEA, procurou-se identificar variáveis de desem-

Segundo pesquisa publicada, em outubro de 2011, pelo Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores – SINDIPEÇAS tem-se que:

penho acerca dos fornecedores e concorrentes diretos dessa organização. As entrevistas utilizadas foram organizadas e sistematiza-

No acumulado dos oito meses de 2011, em relação ao

das através de roteiros semi-estruturados que foram obtidos a

mesmo período de 2010, o faturamento real avançou

partir da bibliografia de empreendedorismo e de temas associa-

11,1%. Na comparação entre agosto e julho, a expansão

dos a clientes, concorrentes e fornecedores.

foi de 4,9%. Ainda de acordo com os dados da pesquisa, em agosto, o faturamento foi distribuído entre vendas

EMPREENDEDORISMO

para montadoras, que ficaram com 69,3%; exportações,

Depois de uma caracterização do que venha a ser empre-

13,2%; mercado de reposição, 12,0%; e vendas entre

endedorismo apresentada por Goulart e Papa, (2004), parte-se

empresas do setor, com 5,5%. (SINDIPEÇAS, 2011a)

para uma percepção mais acurada do que venha a ser uma capacidade empreendedora. Essa constatação vem sido analisa-

Esse é o contexto em que se insere a organização, na sua

da como algo relacionado à criação de novas riquezas, ideias

busca pela manutenção de uma posição competitiva, ou ainda,

ou à capacidade de gerir o próprio empreendimento, através,

um eventual crescimento do seu porte, acompanhando os nú-

principalmente de 11 tipos de características gerenciais apre-

meros desse setor.

sentadas por Oliveira e Silva (2006). Segundo os autores supracitados, a capacidade empreendedora é uma abordagem à administração que define como

OBJETIVOS

pode ser executada uma exploração de oportunidades, independentemente dos recursos que se tem à mão.

OBJETIVO GERAL Analisar o atual cenário da empresa AJA Diesel em um es-

O empreendedor é aquele que, inicia algo novo, que vê o

tudo de caso como forma de sustentar um direcionamento que

que ninguém vê. É aquele que sai da área do sonho, do dese-

amplie suas ações para gestão empreendedora.

jo, e parte para a ação. Um empreendedor é uma pessoa que imagina, desenvolve e realiza visões, e acima de tudo, é um realizador que produz novas idéias através da congruência entre

OBJETIVOS ESPECÍFICOS Avaliar a situação atual do mercado em que a empresa está inserida.

criatividade e imaginação. Segundo Bierley e Muzika (2001, p. XIII), os empreendedores são:

Pesquisar junto aos funcionários e gestores, quais são as

Indivíduos que organizam, operam e assumem os ris-

principais características da empresa, focando nos pontos for-

cos associados com um empreendimento que criaram,

tes e fracos.

visando à concretização de uma oportunidade que eles

Construir um estudo de caso caracterizando a atual gestão da empresa.

e outros identificaram. O processo empreendedor é dirigido à realização do valor associado com as oportuni-

Buscar soluções para que a empresa tenha um melhor fun-

dades de negócios.

cionamento interno, refletindo, positivamente, no âmbito externo. Corroborando com essa orientação, Oliveira e Silva (2006) METODOLOGIA

apresentam 11 características de um empreendedor, que po-

Como se trata de um estudo de caso elaborado para uma

dem ser verificadas em maior ou menor grau em líderes, gesto-

abordagem do tema Gestão Empreendedora, o presente artigo

res ou empresários, ou ainda, se verificar um arranjo da maioria

procurará de maneira descritiva apresentar a realidade empre-

delas presentes nas atitudes e habilidades desses indivíduos.

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Segundo Bernardi (2003), liderar e empreender são “lidar com a mudança e a inovação, portanto com o risco, e gerenciar

promover os principais objetivos das organizações independe da alteração que vier a ocorrer.

é lidar com a complexidade, o que exige do empreendedor pos-

Há algumas práticas de gestão empreendedora que as

turas diferenciadas, por vezes conflitantes, como faces diferen-

organizações devem buscar e tentar introduzi-las em seu coti-

tes de uma mesma moeda.”

diano. Conforme Drucker (2010) as práticas são por meio da

Para esse autor, o empreendedor tem como característica

avaliação do ambiente e externo a procura de oportunidades,

básica o espírito criativo e pesquisador, pois tem uma visão do

ouvir os colaboradores de maneira que se alcancem os objeti-

futuro, está constantemente buscando soluções e métodos de

vos propostos e gerar o objetivo empreendedor em toda organi-

inovação de seu produto ou serviço sempre com o intuito de zação. Além de basear-se na política de remuneração variável, satisfazer as necessidades das pessoas.

na gestão de conhecimentos, na cultura da inovação, na tecno-

Contudo, é necessário para o “espírito” empreendedor de

logia da informação (TI), na liderança com cultura de execução,

modo estratégico, segundo Drucker (1998); Robbins (2008),

na gestão por competências, no planejamento estratégico e no

que exista diferenciais, como, “inovação é a função específica

intra empreendedorismo.3

do empreendedorismo, seja em um negócio existente, em uma

A gestão empreendedora é encontrada em todos os seg-

instituição pública de serviços”. De modo que as inovações es-

mentos, e em todos os setores, mas ela só existe se agir de

tejam presentes em todos os processos e áreas da empresa

forma que a organização consiga contagiar todos seus integran-

criando novos recursos.

tes para que ocorra o desenvolvimento da mesma, vindo a se

Toda organização existe para alcançar objetivos sendo

diferenciar diante do mercado e da concorrência.

esses diretos ou não, e para isto é necessário uma “linha de comando padrão” (STONER; FREEMAN, 1999), no que a hierarquia se deve iniciar de cima para baixo, ou seja, começando do

DESCRIÇÃO DA EMPRESA HISTÓRICO

escalão mais alto ao mais baixo, de modo que se envolvam di-

A AJA Diesel Comércio de Peças e Acessórios Ltda. é uma

retamente para com a realização dos mesmos. E segundo Chia-

pequena empresa privada. Foi fundada em 16 de abril de 2009,

venato (2004) linha significa a autoridade de comando e de ação

pelos sócios, Aline Nogueira de Barros Freitas e Alziro Paula de

que decorre da posição hierárquica ocupada, o que confirma a

Freitas e está localizada em Jardim Gramacho – Duque de Ca-

participação, pois insere na ação.

xias, que fica aproximadamente a 3 Km do centro de Duque de

Tanto Robbins (2008), quanto Oliveira e Silva (2006) apre-

Caxias/RJ.

sentam matizes de organizações que se estruturam a partir de

Os sócios, em busca de condições trabalhistas melhores,

determinadas diretrizes e operações. Assim, desde organiza-

aproveitaram seu vasto conhecimento no mercado e o sonho de

ções consideradas, por exemplo, Burocráticas, Coercitivas, Uti-

se tornarem empreendedores, disponibilizaram os recursos que

litárias, ou Normativas, tem-se um registro histórico da evolução

possuíam e arrecadaram fundos para o processo de iniciação

do dinamismo das estruturas funcionais em torno de ganhos

da AJA Diesel buscando atender aos clientes com seriedade e

de competitivos, de acordo com condicionantes externos, tanto

competência, de maneira ágil, reduzindo ao máximo o tempo de

oportunidades, quanto ameaças.

espera pelo produto, por meio do atendimento eficiente e em um

Em se associando procedimentos de deliberação e empo-

ambiente agradável.

werment de funcionários, observa-se um alinhamento entre essa

A visão do empreendedor tem de ser voltada ao mercado,

postura organizacional com temas de intra empreendorismo in-

analisando três ângulos distintos: O consumidor, o concorren-

dicados por Bernardi (2003), o que recai sobre o entendimento

te e o fornecedor. Saber o perfil da clientela que deseja atingir,

que empresas assim classificadas tendem a ser mais ágeis do

quais suas necessidades, que produtos esperam receber.

que empresas com estruturas mais rígidas como as verificadas no passado.

A) MISSÃO

Assim, as empresas podem buscar processos dinâmicos

Atender ao cliente com seriedade e competência, de maneira

que surgem a partir dos seguintes princípios “planejamento or-

ágil, reduzindo ao máximo o tempo de espera pelo produto, por

ganização, liderança (e outros processos de gestão de pesso-

meio de um atendimento eficiente e em um ambiente agradável.

as), execução e controle” (Maximiano, 2009). De modo que consigam se adaptar às diversas mudanças do ambiente atual, em seu cenário e demanda, a partir de práticas e condutas que irão

B) VISÃO Reconhecimento do grupo perante o setor automotivo, sen-

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do um referencial em qualidade, competência no atendimento e

Situada numa Rodovia com fluxo intenso de veículos, princi-

no segmento de pequena empresa baseada na ética, profissio-

palmente por ônibus e caminhões, onde existem vários condo-

nalismo e responsabilidade social, agregando valor ao cliente.

mínios, com várias empresas de transportes de cargas, o que facilita seu acesso e também por localizar-se dentro de um posto de gasolina, onde existe uma rotatividade grande de pessoas no

C) DADOS DA EMPRESA Razão Social: AJA Diesel Comércio de Peças e Acessórios Ltda.

local, tornando-se estrategicamente bem posicionada. A empresa dispõe de uma sócia-gerente, um sócio, uma

Nome Fantasia: AJA Diesel.

auxiliar de escritório, um vendedor de balcão, um motorista de

CNPJ: 10.800.687/0001-01.

automóvel e um motociclista.

Inscrição Estadual: 78.738.502.

Dessa estrutura física e em se considerando a localização,

Endereço: Rod. Washington Luiz, 1616 – Jardim Gramacho.

existem oportunidades a serem observadas pelo fluxo de usuá-

Duque de Caxias - Rio de Janeiro.

rios e pelo mercado local a ser explorado com serviços de entre-

CEP: 25085-009.

ga e reposição de estoques de oficinas. Porém, dessa estrutura

Telefone/Fax: (21) 2775-0143.

percebe-se uma limitação operacional pelo tamanho e comple-

Endereço Eletrônico: ajadiesel@ig.com.br

xidade que podem determinar um porte empresarial reduzido. Outro fator a ser considerado é a similaridade de ofertas existentes nesse mercado que acarreta uma rivalidade entre as empre-

D) LOGOTIPO

sas desse setor em função da padronização de peças advinda da indústria, direcionando assim, uma necessidade constante de busca de custos operacionais menores e tentativas de diferenciação via serviços agregados. O que de certa forma constitui um desafio empresarial que, ora se vê pressionado em desagregar valor de operações onerosas, e ora oferecer atividades aos seus clientes que geram custos adicionais ao orçamento empresarial.

E) DEFINIÇÕES DO NEGÓCIO A atividade da AJA Diesel é o varejo de peças e acessórios para ônibus e caminhões de diversos portes, sendo seu

REFERÊNCIAS COMERCIAIS

público alvo, empresas prestadoras de serviços e oficinas me-

Os produtos da AJA Diesel são fornecidos, principalmen-

cânicas que realizam consertos e manutenção preventiva, assim

te, por CBA Diesel Comercial Automotiva Ltda., Comdip Comer-

desempenhando o serviço para os clientes finais, ou seja, os

cial Distribuidora de Peças Ltda., Rochester Auto Importadora

proprietários dos veículos.

S.A., Zanelli Diesel Distribuidor de Peças Ltda., Sama Autopeças

Abaixo será apresentado o Desenho da estrutura Organizacional da empresa AJA Diesel:

Distribuidora Automotiva S.A e Junta Lima Indústria e Comércio de Auto Peças Ltda. e tem como principais clientes, Fort Blind Comércio de Peças e Manutenção Ltda., Hortigil Hortifruti S/A, Unigranrio Universidade do Grande Rio, Rodo Jumbo Transportes Rodoviários Ltda. e MTD Transportes Ltda., destacando-se perante a Mirostar Distribuidora e Comercio de Peças Auto., Ramar de Caxias Comercio Varejista de Auto Peças Ltda., Multimarcas Peças Diesel Ltda., e Petro Parts Peças e Serviços Diesel Ltda., seus principais concorrentes. PROBLEMÁTICA A AJA Diesel em seu segundo ano de atividade, enfren-

DIAGNÓSTICO DA EMPRESA

ta problemas pertinentes às organizações que se consolidam

A AJA Diesel apresenta um estabelecimento com 160m²,

após sua abertura, passando pelo período crítico de abertura

uma estrutura com recepção com balcão para atendimento ao cliente, uma sala para o caixa, uma sala para a gerência, e o restante do espaço para o estoque.

e início de atividades. As bases empreendedoras de criação e concepção do negócio, bem como escolha de local, fornecedores e demais

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 29


questões comerciais, parecem agora serem insuficientes para

prometida pela baixa qualidade das informações gerenciais e

sustentar a consolidação e o crescimento da organização.

do seu controle, o que demonstra que a empresa necessita de

Novas demandas gerenciais, conflitos internos e aprimoramento de know how demanda evolução de uma mentalidade em-

novas diretrizes nesse sentido para continuar sua trajetória empresarial de consolidação.

preendedora. Mas que ao mesmo tempo impulsione a organização para um futuro empresarial consistente, sem contrariar sua essência original que comprovou sua eficácia no momento adequado.

CONCLUSÃO O presente artigo foi consequência do estudo realizado na

Portanto, percebe-se a necessidade de uma verificação:

AJA Diesel Ltda., uma empresa do ramo peças automotivas. Foi

existem componentes dentro do cenário empresarial da AJA

feita uma análise e que constatou alguns problemas em rela-

Diesel que sustentem e direcionem uma necessidade ampliação

ção às bases do empreendedorismo evidenciado no histórico

de suas ações para uma estão empreendedora?

e discurso dos seus sócios com o seu ambiente interno e externo. E por meio de pesquisas realizadas acerca do tema central,

EMPREENDEDORISMO NA AJA DIESEL

Gestão Empreendedora, os objetivos traçados foram atingidos

Pode-se observar que a empresa AJA Diesel, possui inter-

direcionando a seção seguinte desse artigo com temas para

namente algumas características empreendedoras, relatadas

uma futura intervenção na capacidade de gerar eficiência em

pelos seus sócios, dentre elas ressalta-se o sendo se oportuni-

sua gestão, a fim de se chegar a um resultado de consolidação

dade e o espírito criativo dos gestores, que deixaram de sonhar

da empresa em seu mercado.

e partiram para a realização do sonho.

A empresa dentro de uma nova perspectiva, com iniciativas

Mediante suas novas ideias, desenvolveram uma capacidade

empreendedoras redirecionadas para novas áreas da adminis-

para gerir o próprio negócio, assumiram os riscos disponíveis e se

tração e controle. O que possibilita contornar as dificuldades e

responsabilizaram de forma criativa pela inovação para levar o ne-

obstáculos encontrados na trajetória, e levar a frente seu sonho,

gócio adiante. Desde então, a empresa vem adquirindo a confiança

agora embasado em planejamentos e pesquisas, tornando-se

e satisfação dos clientes devido ao melhor atendimento e propor-

diferenciada de seus concorrentes, mostranto-se mais compe-

cionando qualidade dos produtos e ambiente organizacional.

titiva e inovadora.

Ainda obteve-se uma postura positiva em relação aos ges-

Os limites dessa pesquisa residem na dificuldade de obten-

tores em colocar sua ideia original em prática, mesmo não sen-

ção de dados sobre o real potencial de mercado da região indi-

do portadores de grandes recursos, mas de conhecimentos, ex-

cada, cabendo aqui ressalvas quanto a fala dos gestores que foi

periencias e técnicas administrativas, principalmente do próprio

utilizada como ponto de partida para essa verificação.

segmento (varejo de peças automotivas).

Outro limite está relacionado com o número de funcionários

A empresa, apesar de possuir algumas atitudes empreen-

que participaram diretamente da coleta de dados interna e da

dedoras, ainda apresenta deficiências internas e externas, as

não consulta dos principais clientes citados, sobre o desempe-

quais influenciam negativamente no crescimento da mesma.

nho da empresa, o que poderia contrapor a uma fala mais dire-

Uma agilidade necessária para atender a clientes que per-

cionada dos gestores em omissão de algum fato mais crítico.

dem negócios enquanto reparam seus veículos pressiona não

Contudo, percebe-se uma abertura para empresas desse setor

as bases de empreendedorismo da empresa e sua força idea-

e com porte análogos ao da AJA Diesel que possam ser pesquisa-

lizadora, mas acarretam numa desorganização operacional ve-

das para efeitiva veirificação da sua condição intra empreendedora.

rificada basicamente num controle decentralizado entre RH, comercial e financeiro. São sistemas de informação independentes que perdem sua eficiência ao serem coordenados.

RECOMENDAÇÕES FINAIS Após as análises dos dados encontrados, tanto na biblio-

Em se verificando uma agilidade maior de concorrentes lo-

grafia, quanto os apresentados pela organização, indica-se que

cais que possam oferecer os mesmos produtos, em um tempo

novos procedimentos administrativos podem ser implementados

de resposta menor e com custos menores de processamento

como forma direta de reforço a uma atitude intra empreendedora.

de pedidos e entrega, pode-se considerar que a empresa sofre

Treinamento de funcionários para a melhor qualidade no

uma ameaça diretamente relacionada com sua principal defici-

atendimento, e padronização na execução de tarefas, assim

ência gerencial.

como desenvolvimento de planos de carreira e bonificação para

A qualidade da gestão empreendedora até aqui verificada na empresa e na explanação dos seus sócios está sendo com-

proporcionar motivação ao funcionário. Investir em inovações tecnológicas, visto que o software

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não comporta mais as operações realizadas na loja. Incentivar o fluxo de informação sobre novas oportunidades de negócio entre os funcionários de vendas e compras. Manter reuniões sistematizadas com o intuito de troca de experiências e informações do setor. Premiar funcionários com novos projetos e ideias viáveis de novos negócios para a empresa. A AJA Diesel ainda está proposta a seguir a as seguintes orientações ditas por Chiavenato (2004) que segundo ele são três objetivos que a organização tem de seguir: Conhecer suas operações e avaliar seus pontos fortes e fracos. Para tanto, deve documentar os passos e praticas dos processos de trabalho, definir medidas de desempenho e diagnosticar suas fragilidades. Localizar e conhecer os concorrentes ou organizações líderes do mercado, para poder diferenciar as habilidades, conhecendo seus pontos fortes e fracos e compará-los com seus próprios pontos fortes e fracos. Incorporar o melhor do melhor, adotando os pontos fortes dos concorrentes e, se possível, excedendo-os e ultrapassando-os. Considerando as condições oferecidas pela empresa, foi proposto um projeto de iniciativas empreendedoras visando uma ampliação da sua condição empreendedora e consequentemente atingir melhores condições para competir em sua área de atuação, sobretudo com outras empresas do mesmo porte, na fatia de mercado em que são competitivas. Para preparar o projeto de iniciativas foram-se pesquisadas técnicas gerenciais que permitem implantar metas empreendedoras na organização. Então foi realizado um estudo interno na empresa para conhecer o processo total de produção, sua estrutura, histórico e condições de mercado e também externo para potencializar o alcance de um melhor resultado por meio de estudos em bibliografias sobre o tema central, a fim de basear a pesquisa. REFERÊNCIAS ABIPEÇAS: Associação brasileira da indústria de autopeças: Seção Economia..http://www.sindipecas.org.br/paginas_NETCDM/modelo_detalhe_generico.asp?subtit=&ID_CANAL=17&id=36283 Acessado em 01/11/2011 às 15:32. ANFAVEA: As peças de uma engrenagem. Disponível em: <http:// www.anfavea.com.br/50anos/72.pdf>. Acesso em: 21 out. 2011 às 22:13. BERNARDI, Luiz Antonio. Manual de empreendedorismo e gestão: fundamentos, estratégias e dinâmicas. São Paulo: Atlas 2003. 314p. BIRLEY, Sui; MUZIKA, Daniel F. Dominando os desafios do empreendedor. São Paulo: Makron Books. 2001. 334p.

CHIAVENATO, Idalberto. Empreendedorismo: dando asas ao espírito empreendedor: empreendedorismo e viabilização de novas empresas, um guia compreensivo para iniciar e tocar seu próprio negócio. 3.ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009. xiv, 281p. CHIAVENATO, Idalberto. Introdução à teoria geral da administração. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. 634 p. 7.ed. DRUCKER, Peter Ferdinand. A profissão de administrador. São Paulo: Pioneira, 1998 187 p. DRUCKER, Peter Ferdinand. Inovação e espírito empreendedor (entrepreneurship): prática e princípios. São Paulo: Cengage Learning, 2010. xviii, 378 p. GOULART, Iris Barbosa; PAPA, Sudário Filho: Empreendedorismo e empreendedores, sugestões para a educação. Belo Horizonte: Editora Newton Paiva, 2004. MAXIMIANO, Antonio César Amaru: Introdução à administração. São Paulo: Atlas, 2009. 404 p. 7. ed. OLHAR FINANCEIRO: Gestão: Empreendedorismo. Disponível em: <http://www.olharfinanceiro.com.br/apostilas/empreendedorismo_ apostila.pdf>. Acesso em 18 out. 2011. OLIVEIRA, Jayr Figueiredo de; SILVA, Edison Aurélio da: Gestão organizacional, descobrindo uma chave de sucesso para os negócios. São Paulo: Editora Saraiva, 2006. ROBBINS, Stephen P.: Administração: mudanças e perspectivas. São Paulo: Editora Saraiva. 2008. SEBRAE MG - Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de Minas Gerais. Disponível em: < http://www.sebraemg.com.br >. Acesso em: 22 set. 2011. SINDIPEÇAS: Pista escorregadia, o varejo de peças para a linha pesada sofre com os avanços e os recuos que têm caracterizado os negócios na área. Disponível em: <http://www.sincopecas.org.br/ materias/?COD=1106>. Acesso em: 08 out. 2011a. às 09:15.

_____________:

Relatório da Pesquisa Conjuntural. 2 ed. 2011. Disponível em: <http://www.sindipecas.org.br/arquivos/RPCOUT2011. pdf>. Acesso em: 22 out. 2011b. às 09:22. STONER, James A. F.; FREEMAN, R. Edward. Administração. Rio de Janeiro: Prentice Hall do Brasil, 1999 533 p. 5ª ed.

NOTAS DE RODAPÉ 1 Autores: alunos do curso de Administração de Empresas no Centro Universitário Newton Paiva. Endereço eletrônico: adm.newton2010@ hotmail.com.

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2 Mestre e professor, leciona a disciplina Analise e Gestão de Processos para o Curso de Administração de Empresas. 3 Termo criado por Gifford Pinchot na década de 80 e relaciona-se com o comportamento empreendedor voltado para dentro das organizações, o que gera inovações e agregação de valor em serviços e produtos,

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REVISTA AUTOCAR: fatores de sucesso e profissionais preparados para a competitividade no setor automotivo Aclízia Cristiane Fragoso1 Daniella Barbosa Faglioni Fernanda Almeida Silva Gabriella Morena Correia Friche Laíssa Ribas da Cruz Taís de Fátima Lima Soares Eduardo Bomfim Machado2

RESUMO: Dentro de uma verificação de oportunidade de mercado e de visão empreendedora o presente artigo busca descrever uma organização do setor automotivo que se especializou na divulgação de informações relativas a esse setor. Seu planejamento de marketing, informações, oportunidades e riscos, com foco principal no setor de Recursos Humanos e na competência em reconhecer e manter os melhores profissionais em conteúdo editorial do mercado mineiro. Indica-se que a política empreendedora da revista Autocar foi retratada, assim como sua situação atual, além de suas estratégias delineadas e seus sistemas administrativos que contribuem para que os objetivos da organização sejam alcançados. A motivação dessa pesquisa está relacionada com a questão: a Revista Autocar sendo uma publicação do setor automotivo possui um gerenciamento alinhado com uma gestão empreendedora? Palavras-chave: Autocar, mercado automotivo, empreendedorismo.

a trazer empresas do setor automobilístico para MG e

INTRODUÇÃO O Brasil se mantém na quarta posição de vendas de automóveis e registra 7% no volume comercializado. Segundo a AN-

ampliando sobremaneira o mercado automotivo em todo o estado. (REVISTA AUTOMOTIVO, 2011)

VFAVEA (2011), o país registrou 3.183.923 veículos produzidos no ano de 2009, enquanto em 2010 somou 3.646.133 unidades.

Acompanhando essa movimentação para novas praças

Segundo a Revista Automotivo (2011), Belo Horizonte

produtivas, a pioneira no mercado, a revista Autocar é a única

tornou-se um dos maiores centros financeiros do Brasil, carac-

em Minas Gerais que aborda temas relacionados à indústria

terizado pela predominância do setor terciário em sua econo-

automotiva, apresentando os lançamentos do mercado. A Re-

mia. Mais de 80% da economia do município se concentra na

vista Autocar busca se destacar no mercado passando para o

prestação de serviços, com destaque para o comércio, servi-

consumidor as mais atualizadas informações do meio automo-

ços financeiros, entre outros. Empresas renomadas no setor

bilistico, diante disso a empresa parece associar o desenvol-

automobilístico favoreceram o mercado estabelecendo gran-

vimento, inovação e ao aproveitamento de oportunidades em

des pólos industriais que foram líderes na produção e vendas

negócios. Já que compete diretamente com grandes publica-

a partir dos anos 1970 no país e expandindo o segmento em

ções em nível nacional, tais como Autosport e Quatro Rodas,

Minas Gerais.

além de fazer frente a estruturas editoriais competitivas como

Segundo a Revista Automotivo (2011), o movimento de ex-

é o caso da Vrumm do Estado de Minas (Diários Associados)

pansão da indústria passou por uma busca por novas áreas

A empresa se insere no ramo editorial e se destaca pela

industriais fora do Estado de São Paulo, o que direcionou al-

qualidade, informações relevantes, preço acessível e possui

gumas empresas em considerar, ora acesso a matéria prima,

completa tabela de preços que apresenta os melhores mode-

ora acesso a exportações como alternativas à concentração e

los para se comprar em cada categoria de veículos. A atual

saturação do setor produtivo em São Paulo.

equipe da revista é composta por 4 profissionais qualificados

A entrada em operação da montadora de veículos e

com curso superior concluído ou em andamento. Além de te-

seu gradativo aumento de produção foi extremamente

rem cursos técnicos de acordo com cada função.

importante para a consolidação do segmento de bens

O presente artigo busca descrever a organização e seu

de capital e de bens de consumo duráveis, ajudando

planejamento de marketing, identificar informações, oportuni-

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 33


dades e riscos, com foco principal no setor de Recursos Hu-

EMBASAMENTO TEÓRICO

manos e na competência em reconhecer e manter os melhores

As definições sobre empreendedorismo remetem a uma

profissionais em conteúdo editorial do mercado mineiro.

construção de conhecimento por sobre atividades de abertura

Assim, a execução do artigo apresenta uma oportunidade de

e exploração de oportunidades de negócios em qualquer am-

aprofundamento no assunto proposto, permitindo um maior conhe-

plitude e complexidade. Mais precisamente, observa-se um viés

cimento no contexto automotivo e empreendedor. Procurando evi-

europeu e anglicano direcionando esse corpo de conhecimento

denciar se as condições encontradas dentro da estrutura funcional

desde sua origem, mesmo que haja atividades empresariais em

da Revista estão alinhadas com uma gestão empreendedora.

um contexto histórico e global. (GOULART; PAPA, 2004)

2 - CONTEXTO DE MERCADO

empreendedora é um evento tanto cultural e psicológico, como

Segundo Drucker (1994), o aparecimento da economia A indústria automobilística é um dos setores da economia

econômico ou tecnológico. Inovação e espírito empreendedor

no qual a competição é mais acirrada e as mudanças na estru-

são necessários na sociedade tanto quanto na economia; por-

tura das empresas ocorrem com maior freqüência (CANGÜE et

que eles não constituem “algo radical”, mas “um passo de cada

al, 2007). Segundo Anfavea (2011) o Brasil que se mantém na

vez” focando as oportunidades e necessidades específicas.

quarta posição de vendas de automóveis e registra 7% no volu-

Seguindo ainda a ideia do autor, o que se precisa é de uma

me comercializado, como mostra a FIG. 1, tem-se uma apresen-

sociedade empreendedora, na qual a inovação e o empreende-

tação da distribuição de vendas por estado.

dorismo sejam normais, estáveis e contínuos. Exatamente como a administração se tornou o órgão específico de todas as instituições contemporâneas, a inovação e o empreendedorismo se tornarão uma atividade vital, permanente e integral em nossas organizações, nossa economia, nossa sociedade. Com isso, Oliveira e Silva (2006, p. 118), apresentam fontes de oportunidade para inovação que devem ser sistematizadas pelas organizações que queiram optar por um modelo de administração voltada para o empreendedorismo. São eles: (i) da ocorrência de um fato inesperado; (ii) da incongruência dos fatos; (iii) da necessidade de inovação; (iv) das mudanças estruturais econômicas; (v) das mudanças demográficas; (vi) das mudanças de percepção, disposição e significado e (vii) do co-

Vários fatores criam um interessante mercado potencial para

nhecimento novo.

a venda de automotores no país: o aumento da renda dos brasilei-

Para Mirshawka (2004); Goulart e Papa (2004) os empreende-

ros, a forte expansão do crédito e a maior confiança dos consumi-

dores são aquelas pessoas que, recebendo a mesma informação

dores, com a elevação do nível de emprego. “Existem 18 milhões

que muitos outros indivíduos, enxergam coisas que estes últimos

de famílias no Brasil que têm condições de pagar 20% de entrada

não conseguem vislumbrar. Além de que as empresas e os profis-

e assumir prestações do financiamento de um carro de R$ 25 mil,

sionais precisam desenvolver regularmente seus potenciais criati-

fabricado entre 2005 e 2010.” (ISHIKAWA, 2011)

vos para superar obstáculos e sobreviver no mercado. Mirshawka

Com esses números citados acima, o Brasil consolidou-se

ainda relata que os profissionais que desejam ser empreendedores

na posição de quarto maior mercado de veículos do mundo (atrás

necessitam praticar o pensamento sistêmico, utilizar cada vez mais

de China, Estados Unidos e Japão), atraindo cada vez mais a aten-

a criatividade e estar atentos à nova maneira de fazer negócios

ção de fabricantes de todo o planeta. Por isso, os modelos importa-

fundamentando-se na crescente velocidade da informação.

dos vão alcançar sem dificuldades 20% dos emplacamentos, che-

São consideradas características de um empreendedor

gando perto de 700 mil veículos estrangeiros novos negociados em

segundo Oliveira e Silva (2006 pgs. 119-120): (i) capacidade

2011, contra 630 mil em 2010. (ANFAVEA, 2011)

de assumir riscos; (ii) senso de oportunidade; (iii) liderança;

Tais números corroboram com uma configuração de com-

(iv) flexibilidade; (v) persistência; (vi) visão global; (vii) atualiza-

petitividade e dinamismo de mercado, configurando uma ne-

ção; (viii) organização; (ix) organização; (x) inovação; (xi) cria-

cessidade de, ao mesmo tempo, apresentação de qualidade e

tividade; (xii) objetivos definidos. Em maior ou menor grau, um

dinamismo por parte das organizações que atuam nesse setor.

empreendedor, ou gestor empreendedor possuiria a maioria

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dessas características acima relacionadas.

sistemas de contratação funcional alinhados com diferenciais

Na atualidade, muitos jovens ainda entram na universidade

pessoais, sobretudo os relacionados com liderança e espírito

acreditando que a obtenção de um diploma é um passaporte

de equipe. Para esse autor esses dois componentes básicos

seguro para conseguir um bom emprego. Além do diploma, os

seriam pressupostos de desempenho superior para tais empre-

profissionais devem também ser ensinados a terem competên-

sas que ao mesmo tempo, poderiam alinhar desempenho com

cias próprias para criar oportunidades no mercado, podendo

resultados superiores.

abrir seu próprio negocio e tornando um empreendedor.

Um

Segundo Campos (1996) e Motta (2001) é essencial à orga-

bom empreendedor precisa de autoconhecimento, estar predis-

nização obter líderes na alta administração, sendo estes compro-

posto ao risco, conseguir um bom preparo intelectual, tornar-se

metidos, participantes ativos nos processos e que tenham fé. A

pesquisador dos assuntos do seu negócio e ter sempre uma

focalização da emoção, do entusiasmo e do conhecimento de to-

atitude positiva. Não seria consistente existir um empreendedor

dos os funcionários nos temas estabelecidos é um exercício vital

bem-sucedido que cultive atitude pessimista e destrutiva. Para

para a organização. A partir do aperfeiçoamento contínuo e gra-

uma empresa sobreviver no século XXI, ela deve se mover con-

dativo de todos os envolvidos é que os resultados serão atingidos

tinuamente para não serem alcançada pelos concorrentes, mas

por intermédio da atuação criativa e dedicada dos colaboradores.

ela precisa se mover em direção do cliente, buscando sempre

Esse tipo de comportamento pessoal frente aos desafios de

novas formas de satisfazê-lo. Manter os clientes felizes é a me-

uma organização cria campo de entendimento e apropriação das

lhor defesa contra a concorrência, pois eles ficam leais e com-

atividades empreendedoras pelos próprios gerentes contratados

pram mais. (ENDEAVOR, 2010)

e demais colaboradores dessas organizações. Tal alinhamento

Ainda dentro da ótica da Endeavor (2010), o passo mais importante para começar um planejamento é colocar em prática

de postura e desempenho funcional dá-se o nome de intra empreendedorismo. (GOULART; PAPA, 2004); (ENDEAVOR, 2010)

as prioridades consideradas de maior importância na empresa. Empreendedores deveriam ter conhecimento e uma análise de

METODOLOGIA

mercado em que deseja atuar. É imprescindível um bom plano

Sendo uma pesquisa qualitativa de caráter descritivo, ini-

de negócio que permite ao empreendedor atender adequada-

ciou-se com o uso de pesquisas bibliográficas que direcionaram

mente as necessidades das pessoas que trabalham na empresa

os conceitos acerca de gestão empreendedora.

para que o negócio seja bem sucedido. As empresas devem

Os métodos utilizados constituíram-se de uma abordagem

manter um relacionamento bem estabelecido com seus clientes

organizada e precisa para se obter bons resultados no desenvol-

para saber as suas necessidades e desejos. São os relaciona-

vimento do artigo. Uma pesquisa de campo foi realizada através

mentos que permitem ao empreendedor estabelecer as estraté-

de entrevistas sistematizadas com o responsável e editor-chefe

gias para classificar seus clientes bons e conquistar novos.

da revista Autocar, Sr. Carlos Eduardo Ribeiro da Silva, durante

Mirshawka (2004) relata que empreender com êxito reduz as

as duas primeiras semanas de outubro de 2011. O procedimen-

possibilidades de fracasso de um negócio. Apresentando para

to escolhido possibilitou descrever as estratégias da organiza-

tanto soluções importantes, como técnicas de atendimento ao

ção para manter-se competitiva no setor automobilístico.

cliente e meios de se relacionar com ele, ensinando o empreen-

Após essa coleta de dados, cujos principais aspectos e de-

dedor a lidar com as pessoas. Assim, os funcionários devem es-

mais informações foram levantadas, passou-se para uma orga-

tar sempre atentos e preparados para atender os clientes, pois

nização de informação e análise dos conteúdos obtidos.

dependendo do seu atendimento ele pode afastá-los da empresa ou contribuir para seu sucesso com um bom atendimento, atraindo cada vez mais clientes.

A REVISTA A revista Autocar foi fundada em 1992, pelo jornalista Carlos

Para Pinto et al (2007), existem relações entre formatos

Eduardo Ribeiro da Silva, nascido em Belo Horizonte/MG. Aos

de gestão que estimulem a participação direta dos funcioná-

42 anos de idade, o editor-chefe vem se destacando profissio-

rios nas soluções aos clientes, para isso contrapartidas de

nalmente por ser especializado na área e por aperfeiçoar seus

liderança e empowerment são apresentadas como forma de

conhecimentos e habilidades neste setor. Conta com profissio-

sustentar esse modelo de desempenho.

nais da área de comunicação, tais como diretores, jornalistas,

Na fala de Robbins (2008) e Araújo (2001), percebe-se uma

redatores, consultores técnicos, designers, fotógrafos e editores,

necessidade de associação entre a busca por posições com-

sendo que a maioria destes está na organização desde sua fun-

petitivas e qualidade geral de trabalho através de processos e

dação. A revista é distribuída pela Zero KM Empreendimentos,

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 35


e é responsável, também, pelo site www.autocarbrasil.com.br.

que em áreas diferentes, sabendo atuar em funções diferenciadas

Em todas as suas edições é possível acompanhar testes

com uma mesma qualidade em todas elas. Sendo uma estrutura

e os mais recentes lançamentos da indústria automotiva com

considerada “enxuta” como se pode verificar na Figura 02, a Revis-

textos informativos e fotos, além de tabelas de preços de veícu-

ta Autocar, dentro das suas opções de estruturação do seu corpo

los novos e seminovos. Vendida em bancas em todo o Brasil e

funcional, verificou uma pressão por resultados rápidos, com qua-

em todas as drogarias Araújo da capital mineira, com a tiragem

lidade e com menores custos operacionais. Afastando assim, de

mensal de 10 mil exemplares no preço de venda R$ 5,90. Sendo

estruturas mais complexas e com vários cargos e funções.

que 65%, em média, dos exemplares são distribuídos em planos de marketing para o público anunciante como concessionárias, agências de publicidade de todo Brasil, agências multimarcas e assessoria de imprensa por meio da ferramenta mailing. A revista conta com parceiros, como o Jornal Balcão, que é um jornal que tem como principal objetivo ser um jornal de classificados, busca sempre levar ao consumidor mineiro o maior número de oportunidades em negócios da capital. Atualmente é o maior jornal de classificados do Brasil. O jornal possui os cadernos Carro Novo e Moto Nova que mencionam e apoiam a

Muito dessa opção de estruturação também é sustentada pelo

Revista Autocar em suas edições. A TV Balcão transmite o Pro-

formato de negócios que gerou a Revista Autocar como uma unida-

grama Autocar, que é produzido pela equipe de redação da re-

de de negócio com certa autonomia dentro da estrutura empresa-

vista Autocar, que apresenta todas as novidades e lançamentos

rial do Jornal Balcão, que fornece subsídios e demais recursos para

da indústria automotiva nacional e mundial.

a manutenção da revista, tais como: contabilidade, departamento

O CarroNovo é um suplemento do Jornal Balcão, bi-sema-

jurídico, serviços gerias entre outros, deixando assim a área estra-

nal, com tiragem de 30 mil exemplares, circula toda quinta-feira

tégica de criação e desenvolvimento de produtos a cargo dessa

e aos domingos. Com um diferencial o caderno de veículo fica

estrutura funcional reduzida mas muito bem qualificada.

à disposição do leitor todos os dias da semana nas bancas

Por isso, a revista Autocar busca manter seus colabora-

e nos pontos alternativos de venda. O CarroNovo tem como

dores bem treinados, já que são que eles que melhoram e

termômetro o grande número de empresas concessionárias e

aperfeiçoam o processo de produção, além de possuir um am-

montadoras anunciando seus produtos.

biente de trabalho agradável e bem estruturado com recursos

O caderno MotoNova também é um suplemento do Jornal

modernos e tecnologia avançada. Os benefícios, promoções,

Balcão, que traz noticiário completo sobre o mercado de motos.

oportunidades, investimento na qualidade de vida e a políti-

No Brasil é o único caderno especializado no mercado das motoci-

ca da organização de sempre motivar e incentivar tem surtido

cletas, circula toda quinta e todos os domingos. Em Belo Horizonte

efeito para a permanência dos colaboradores na organização.

tem ocupado lugar em destaque tornando-se uma ferramenta de trabalho para as concessionárias e agências multimarcas.

Para um melhor desempenho da revista no mercado, o jornalista responsável pela elaboração e edição aperfeiçoa seus

Os clientes potenciais da revista Autocar são homens (80%) e

conhecimentos participando de seminários e eventos das di-

mulheres (20%), entre idades de 18 a 50 anos e voltada para a clas-

versas montadoras nos lançamentos de seus modelos auto-

se média e classe média alta. Suas maiores concorrentes são as re-

motivos nacionais e importados, como o Salão do Automóvel e

vistas: Quatro Rodas, Auto Esporte, Carro Magazine, Carro Hoje e

Salão Internacional do Automóvel, e dos lançamentos de novas

Oficina Mecânica, que abordam temas relacionados a automóveis

versões e configurações de motor.

e derivados da indústria automotiva. Para otimizar a competitivida-

O clima organizacional e relações de trabalho são compos-

de, criando condições favoráveis de modo a tirar melhor proveito

tos de conhecimento, habilidade e cooperação dos profissio-

possível no mercado, a revista Autocar tem como estratégia ofere-

nais para executarem seus trabalhos eficientemente, atender ao

cer aos seus clientes qualidade e inovação.

cliente interno e externo, relacionar-se com colegas e chefia, alcançar resultados e adaptar-se à cultura organizacional vigente.

O QUADRO FUNCIONAL Partindo-se de um pressuposto que é importante para um profissional que deseja ter sucesso na organização, que ele se qualifi-

OS DESAFIOS Segundo Campos (1996), grandes erros são cometidos

36 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


quando se estabelecem metas sobre meios e não sobre seus fins. O problema surge quando o resultado de um processo é indesejável ou quando a meta não é alcançada.

preparados para competitividade no setor. Empresas e demais veículos de comunicação podem se servir desse estudo de caso para um comparativo de desempe-

Um problema identificado na Autocar foi falta de recruta-

nho da sua área de criação e de sua área comercial, pois como

mento externo para representantes, ou seja, contratar novos

visto, existem necessidades e oportunidades distintas nessas

postos na área das vendas que tenham como características

duas áreas estratégicas para organizações desse setor.

buscar experiências e habilidades não presentes na empresa.

Os limites dessa pesquisa estão relacionados como a singu-

As contratações poderiam aumentar as vendas de anúncios nas

laridade do modelo representado pela Revista Autocar. Seriam

edições mensais, evitando possíveis atrasos nas publicações

poucas organizações que poderiam efetivamente se enquadrar

que ocorrem quando o mercado automobilístico esta desaque-

ou se equipara nesse formato apresentado. Os métodos de

cido, podendo não atingir as vendas suficientes para cobrir os

pesquisa, em uma nova oportunidade, poderiam ser ampliados

custos de produção neste período.

para novas entrevistas e estudos de clima organizacional junto

Por esta oscilação do mercado, a revista não apresenta as-

com os outros três funcionários.

sinatura mensal, pois encontra dificuldades para manter um bom

Com tudo o que foi pesquisado e descrito neste artigo, con-

desempenho de vendas. Uma das sugestões apresentadas se-

clui-se que para uma organização ser bem sucedida é de suma

ria a contratação de um profissional especializado em Marketing

importância que seus funcionários detenham de conhecimentos

habilitado para acompanhar as constantes mudanças dentro e

específicos. Porém, é primordial que eles procurem se qualificar

fora da organização, sendo a última fundamental porque é fora

de forma a conseguir atuar no setor automotivo com o mesmo

da organização é que estão os clientes mais interessados no

empenho que o de sua especialização.

conteúdo da revista. As contratações necessárias proporcionariam uma melhora e um aumento nas vendas dos anúncios, assim a empresa poderia atingir melhores resultados tanto na produção da revista quanto no faturamento, podendo colocar em prática as assinaturas mensais para seus clientes. Para se alcançar os resultados esperados, seria de extrema importância fazer uma seleção de candidatos, que possuem os requisitos mínimos para ocupar os cargos.

REFERÊNCIAS ARAÚJO, L. C. G. Tecnologias de Gestão Organizacional. 1 ed. São Paulo: Atlas, 2001. ANFAVEA: Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores.- Anuário da indústria automobilística brasileira, 2011. Disponível em <http://www.anfavea.com.br/ anuario.html>.Acesso em 2 out. 2011.

Assim, percebe-se que existem limites para uma atuação em um mercado tão dinâmico com uma estrutura, que embora muito qualificada, possui restrições operacionais relacionadas com a área comercial. Se por um lado existe competência e senso de oportunidade para evidenciar uma gestão empreendedora, por outro existe ainda problemas a serem solucionados para consecução de resultados mais satisfatórios. CONSIDERAÇÕES FINAIS Pretendeu-se, nesse trabalho, proporcionar de forma objetiva informações voltadas para o setor automobilístico realizando estudos abrangentes de contexto de mercado, sobre gestão empreendedora e identificando, através de pesquisas de campo elaboradas para os profissionais responsáveis toda uma configuração interna da estrutura atual da Revista Autocar. O estudo do caso possibilitou a identificação de um problema na organização, decorrente do departamento de Recursos Humanos. A sugestão para que possibilite a resolução do problema foi a implantação de uma nova seleção e recrutamento externo para que a organização possua fatores e profissionais

CANGÜE, Feliciano José Ricardo; GODEFROID, Leonardo B.; SILVA, Eduardo. Análise atual do setor automobilístico nacional. Revista Científica Symposium. v. 2, n. 1, (2004). Lavras: Instituto Adventista de Ensino de Minas Gerais, 2004. CAMPOS, Vicente Falconi. Gerenciamento pelas diretrizes: o que todo membro da alta administração precisa saber para entrar no terceiro milênio. Belo Horizonte: Fundação Chistiano Ottoni, 1996. DRUCKER, Peter F. Inovação e espírito empreendedor: prática e princípios. 4 ed. São Paulo: Pioneira, 1986. ENDEAVOR, Instituto Empreendedor: Crie seu negócio de alto impacto, livro do empreendedor. São Paulo, 2010. GOULART, Iris Barbosa; PAPA, Sudário Filho: Empreendedorismo e empreendedores, sugestões para a educação. Belo Horizonte: Editora Newton Paiva, 2004. ISHIKAWA, Marcio. Setor automotivo investirá R$ 26 bi no Brasil até 2017. Disponível em < http://quatrorodas.abril.com.br/noticias/ fabricantes-setor-automotivo-investira-r-26-bi-brasil-2017-marcio-ishika-

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wa-299149_p.shtm>. Acesso em 2 out. 2011. MIRSHAWKA, Victor. Empreender é a solução. 2. ed. São Paulo: DVS Editora, 2004. 298 p. MOTTA, Paulo Roberto: Transformação Organizacional: a teoria e a prática de inovar. 4 ed. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2001. PINTO, Éder Paschoal et al: Gestão empresarial, casos e conceitos de evolução organizacional. São Paulo: Editora Saraiva. 2007. REVISTA AUTOCAR. Disponível em < http://www.autocarbrasil.com.br/ >. Acesso em 30 set. 2011. REVISTA AUTOMOTIVO. Disponível <http://www.revistaautomotivo. com.br/ servicos/distribuidores-3.asp>. Acesso em 2 out. 2011. ROBBINS, Stephen P.: Administração, mudanças e perspectivas. São Paulo: Editora Saraiva, 2008.

NOTAS DE RODAPÉ 1 Alunas do curso de Administração do Centro Universitário Newton Paiva. 2 Mestre em Administração de Empresas. Professor do Centro Universitário Newton Paiva dos cursos de Administração de Empresas. Marketing e EaD MBA.

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A CONSCIÊNCIA HISTÓRICA DA INCONFIDÊNCIA MINEIRA Mateus de Moura Ferreira1

RESUMO: O texto tem como propósito abordar alguns tópicos sobre o movimento inconfidente deflagrado nas Minas Gerais no ultimo quarto do século XVIII. A tradição oral foi o primeiro veiculo de propagação da Inconfidência Mineira, tal instrumento definiu alguns mitos que posteriormente foram incorporados pelos intelectuais do Republicanismo que construíram a imagem de Tiradentes como um mártir cívico associado a elementos religiosos de forte apelo popular, os efeitos desta associação ainda estão presentes no imaginário popular. PALAVRAS CHAVE: Inconfidência Mineira – Tiradentes - República – mito

1 – Introdução

e diamantes foram descobertas por desbravadores paulistas

O estudo dos conflitos que ocorrerão no Brasil colonial, em

na região no final do século XVII levando a região das Minas a

especial nas Minas Gerais, invariavelmente abordará o conhe-

um rápido desenvolvimento urbano e cultural durante o século

cido movimento Inconfidente ocorrido no final do século XVIII,

posterior5.

onde a elite da capitania contestou a opressão econômica perpetuada pela Metrópole portuguesa.

A Vila Rica de Ouro Preto6, encravada na região da Serra o Espinhaço, aos pés do Pico do Itacolomi, rodeada por pe-

O movimento Inconfidente foi deflagrado por ilustres re-

quenos vilarejos mineradores que hoje vivem a decadência do

presentantes da sociedade colonial das Minas, detentores de

tempo, era o centro efervescência cultural, política e econômica

lavras mineiras, fazendas com vasta escravaria e títulos públi-

da capitania de Minas Gerais. Nesta comarca, reuniam-se as

cos como Tomas António Gonzaga, Claudio Manuel da Costa

principais lideranças administrativas e religiosas da Capitania,

e Alvarenga Peixoto, mas, o movimento também contou com a

o conhecimento letrado oriundo da Universidade de Coimbra

participação de membros não tão abastados que permeados

em Portugal desfilava pelas vielas apertadas e úmidas do lu-

por ideais progressistas se imortalizaram na história do país,

gar a sombra de igrejas barrocas e casarões setecentistas, um

entre estes, a figura emblemática de herói nacional conferida a

seleto7 grupo de homens influentes articulava um processo de

Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes.

ruptura com os desmandos da Metrópole Portuguesa, ilumi-

O mítico herói brasileiro, defensor da liberdade e opressão já foi objeto de inúmeras análises historiográficas de riquíssi-

nados pela Revolução Americana que ecoou seus gritos nas terras tupiniquins.

mo valor cultural2, isso mostra o valor atribuído ao personagem

Os autos da devassa relacionam como alguns dos princi-

central da Inconfidência Mineira no imaginário brasileiro, princi-

pais integrantes do movimento: Tomas Antonio Gonzaga, Iná-

palmente após o fim do período monárquico.

cio José de Alvarenga Peixoto, Luis Vaz de Toledo Piza, José

A análise da consciência histórica que a figura de Tira-

Álvares Maciel, Francisco Antônio de Oliveira Lopes, João da

dentes legou ao imaginário nacional é fruto de uma política de

Costa Rodrigues, José Resende Costa( pai e filho), Domingos

simbologismo e misticismo, perpetuada pelos republicanos no

Abreu de Oliveira, Padre José da Silva Rolim, Manuel Rodri-

fim do século XIX onde a necessidade de heróis nacionais se

gues Costa, Cônego Luís Vieira e Joaquim José da Silva Xavier,

mostrava latente na construção da identidade nacional.

o Tiradentes8.

3

Desde então, a Inconfidência Mineira é considerada o mar-

Diante das dificuldades que o regime colonial trazia a ca-

co inicial do processo de independência do Brasil Colonial que

pitania, cada vez mais a insatisfação com os desmandos da

culminou4 no 7 de setembro de 1822. Analisar este movimento

coroa lançava seus efeitos pelos rincões da terra, altos tributos,

sob o prisma do discurso perpetuado pelos seus interpretes

a eminência da derrama9, imposições arbitrárias da cúpula ad-

extemporâneos na construção de uma identidade nacional é o

ministrativa, argumentos que os inconfidentes acreditavam mo-

objeto deste artigo.

ver o espírito da população a sua causa, deflagrando o apoio popular na concretização da revolta.

2 – Tópicos sobre a inconfidência mineira

Acasos do destino impossibilitaram a ocorrência da Revo-

A capitania de Minas Gerais foi durante o século XVIII o

lução, como em um ato religioso que futuramente seria com-

grande triunfo da coroa portuguesa, imensas jazidas de ouro

parado ao feito, traidores delataram o movimento insurgente

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da capitania, rapidamente, o aparelho burocrata lançou sobre os revoltosos sua ira, o cárcere, a tortura e o fim de um sonho libertador sucumbia nas masmorras do Antigo Regime

Diante disso, surge a figura de Joaquim José da Silva

Xavier, por peculiaridades que o destino impõe aos mártires, o alferes Tiradentes foi e será sempre o incógnito homem oriundo da comarca de Rio das Mortes, descendente de uma família tradicional da região, versado nas ciências naturais e ofícios médicos, feroz combatente da trupe maléfica do “Montanha”

e seus ajudantes.(...)Assim, tragicamente e com sangue, terminou a “comédia”, no mesmo ano que assistiu à decapitação do Bourbon; e mal se passara uma geração, a Árvore da Liberdade e da Independência, regada pelo sangue do republicano Tiradentes, cresceu e espalhou seus ramos sobre o País.”( Burton, Richard Francis. Viagem do Rio de Janeiro a Morro Velho. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Ed. USP, 1976. p.293)

que saqueava os viajantes da Estrada Real na altura da Serra da Mantiqueira, projetista de aquedutos no Rio de Janeiro, fre-

“...tinha 15 anos quando lhe noticiaram morar na

qüentador de tabernas e outros ambientes hostis a sociedade

Rua da Alfândega uma preta de nome Jacinta, que contava perto de 120 anos.Conversando com ela, que se achava no mais perfeito juízo, ela contou que morava na rua dos Ciganos( atual Constituição) quando se deu a execução de Tiradentes e que vira desfilar o préstito de volta da Igreja da Lampadosa; que o mártir levava uma alva, tinha no pescoço uma corda e nas mãos um crucifixo. Que se lembra como se fosse hoje (disse ela) que o cortejo parara à porta de sua casa, onde um frade lhe pedira um copo com água para dar ao condenado, no que ela foi buscar a água que o condenado bebeu com sofreguidão; que Tiradentes tinha o andar vacilante e uma fisionomia que causava dó, que ela então acompanhará o préstito até a forca, que ficava mais ou menos no ponto em que hoje se acha o Arquivo Nacional.”( Lima, Hermeto. Em que lugar foi enforcado Tiradentes? Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 21 de abril de 1937, p.6)

colonial, idealizador da liberdade ou mesmo um autentico republicano engajado.

O Alferes10, este homem singelo e peculiar, foi um

grande articulador do movimento separatista, a sua habilidade médica lhe concedia um livre transito na comunidade mineira, difundir as idéias debatidas pelo círculo literato em Vila Rica era sua missão, regimentar novos entusiastas para o movimento se tornava rotina, o alferes desenvolvia um papel crucial na trama e seus algozes não iriam deixar isso passar despercebido11.

A terrível sentença imposta ao revolucionário,foi um

dos elementos apropriados pelas futuras gerações na construção do mito martirizado do alferes, a tradição inoculou seu suplício no cárcere e a altivez perante a morte12 como ingredientes da memória nacional. Enforcado e esquartejado, o homem rústico das Minas Gerais ingressa no panteão da história como o herói da contestação do julgo dominador, liberdade ainda que tardia seria a tônica no século XIX. 3 - Tiradentes e a Republica: a construção do mito

Observa-se nas passagens supra citadas a tópica recorren-

Alguns dos primeiros escritos sobre a Inconfidência Mineira

te no século XIX sobre a Inconfidência Mineira e principalmente a

e o suplício de Tiradentes encontrados no fim do século XIX as-

memória relativa a morte do alferes, apesar de escrito no século

sim tratam do tema:

XX em pleno Estado Novo, a citação remete a lembranças do

“O heróico dentista, calmo e grave, foi levado, envergando a túnica dos condenados da prisão(...) acompanhado por dois padres e guardado por 100 baionetas. Continuou sua adoração da Trindade e da Encarnação até chegar ao cadafalso. Ali, ofereceu ao carrasco seu relógio de ouro. Suas últimas palavras, depois de repetir, com o confessor, o Credo de Atanásio, foram: “Cumpri minhas palavras, morro pela liberdade”. A gloriosa confissão foi abafada por um rufar de tambores e soar de cornetas. Às 11 horas, foi enforcado até a morte, decapitado e esquartejado, por um carrasco negro

autor oriundas do início do período republicano, momento em que o imaginário passa viver com intensidade a história da Revolução das Minas. Deve-se ressaltar que o fim do período monárquico e o início do republicanismo foi um momento de afirmação do positivismo lógico obre o antigo regime, assim, relembrar as figuras que combateram a retórica absolutista foi um exercício primordial da elite acampada no poder que se inaugurava. O historiador americano Kenneth Maxwell na sua “Devassa da Devassa” assim diz:

“O heróico dentista, calmo e grave, foi levado, envergando a túnica dos condenados da prisão(...) acompanhado por dois padres e guardado por

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100 baionetas. Continuou sua adoração da Trindade e da Encarnação até chegar ao cadafalso. Ali, ofereceu ao carrasco seu relógio de ouro. Suas últimas palavras, depois de repetir, com o confessor, o Credo de Atanásio, foram: “Cumpri minhas palavras, morro pela liberdade”. A gloriosa confissão foi abafada por um rufar de tambores e soar de cornetas. Às 11 horas, foi enforcado até a morte, decapitado e esquartejado, por um carrasco negro e seus ajudantes.(...)Assim, tragicamente e com sangue, terminou a “comédia”, no mesmo ano que assistiu à decapitação do Bourbon; e mal se passara uma geração, a Árvore da Liberdade e da Independência, regada pelo sangue do republicano Tiradentes, cresceu e espalhou seus ramos sobre o País.( Burton, Richard Francis. Viagem do Rio de Janeiro a Morro Velho. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Ed. USP, 1976. p.293)

do alferes passa a ser exaltada por meios oficias, uma tradição nacional tem início, estátuas, quadros, ruas, avenidas, praças, parques, medalhas são alguns dos instrumentos de propagação da memória da Inconfidência, principalmente de Tiradentes. Sabiamente, os artistas republicanos apelaram a tradição cristã do povo, criaram um Cristo cívico através de Tiradentes16, assim, a consciência histórica segue a tradição instituída nas representações artísticas do final do século XVIX refletida até hoje, um exemplo é a Medalha da Inconfidência concedida pelo Governo do Estado de Minas Gerais no dia 21 de abril, data da morte do alferes as pessoas de destaque na execução dos valores cívicos. 4- Conclusão O estudo da Inconfidência Mineira ainda carece de muita atenção, alguns pontos obscuros na biografia dos integrantes do movimento bem como no planejamento do levante são mistérios clamando pela elucidação, ocorre que a fascinação deste

movimento colonial, um folhetim de intrigas novelescas e atua-

Nas três passagens acima, escritas em contextos históricos

ções heróicas constitui boa parte da memória cívica nacional.

diferentes, a figura do alferes e os pressupostos axiológicos da

O alferes Tiradentes, herói republicano, Cristo cívico, mártir da

Inconfidência se adéquam ao discurso dominante de cada épo-

liberdade nada mais é que uma figura humana, com medo e

ca na qual foram reproduzidas; eis um indÍcio de como a ma-

paixões; construir a identidade de um homem distante das idea-

nipulação da memória pode se adequar a horizontes distintos.

lizações heróicas que a consciência histórica nós legou através

A figura do alferes cercada de mistérios e heroísmo seduziu

da tradição é um desafio aos pesquisadores contemporâneos;

os artistas do final do século XIX, podemos citar Aurélio de Fi-

talvez assim, pode-se conhecer melhor quais os fatores que

gueiredo, Décio Villares, Pedro Américo, Eduardo de Sá e José

impulsionaram a construção da nação brasileira.

Walsht ; todos eles construíram imagens que se adequaram as 13

necessidades, a criação e o enraizamento dos mitos políticos

REFERÊNCIAS

que têm nas manifestações artísticas um elo de prospecção e

Burton, Richard Francis. Viagem do Rio de Janeiro a Morro Velho. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Ed. USP, 1976. p.293.

afirmação; as representações da Inconfidência e principalmente de Tiradentes trazem a tona a idéia de liberdade, coragem, abnegação, sacrifício, patriotismo — são parte integrante das experiências sociais, culturais e políticas da sociedade brasileira, desde o século XVIII14. A figura republicana do mártir mineiro bem como a tradição que se instituía nestas imagens, refletia os anseios populares e elitistas de então, no limiar do século XX, permeado por idéias positivistas, surgia a construção de uma memória nacional através da representação romântica de seus personagens. A inconfidência estava viva na memória popular, mas ainda era um tema árduo para a elite culta do Segundo Reinado, pois o proclamador da independência era neto de D. Maria I, a rainha alvo dos rebelados inconfidentes15, o Brasil durante boa parte do século XVIX foi governando pela família Bragança, daí a dificuldade em encontrar estudos consistentes neste período sobre o acontecimento mineiro. Com a queda da monarquia a figura

Carvalho, Jóse Murilo de. A formação das almas: o imaginário da República no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2011. Fonseca, Thaís Nívea de Lima e Fonseca. A Inconfidência Mineira e Tiradentes vistos pela Imprensa: a vitalização dos mitos (1930-1960). Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 22, nº 44, pp. 439-462, 2002. Junior, Augusto de Lima. História da Inconfidência de Minas Gerais. Belo Horizonte: Itatiaia, 1996. Lima, Hermeto. Em que lugar foi enforcado Tiradentes? Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 21 de abril de 1937, p.6 Luiz Carlos Villalta / Maria Efigênia Lage de Resende.História das Minas Setecentistas. vol 2. Belo Horizonte: Autêntica Editora / Companhia do Tempo, 2007. Maxwell, Kenneth. A devassa da devassa: A inconfidência Mineira: Bra-

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 41


sil-Portugal - 1750-1808. São Paulo: Paz e Terra S/A, 2002. Vasconcelos, Diogo. História Média de Minas Gerais. Belo Horizonte, Itatiaia, 1974. História antiga de Minas Gerais. Belo Horizonte, Itatiaia, 1974.

NOTAS DE RODAPÉ 1. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Newton Paiva. 2. “A formação das almas” (José Murilo de Carvalho), “Viagem do Rio de Janeiro a Morro Velho” (Richard Burton), “História da Conjuração Mineira” (Joaquim Norberto de Sousa Silva), “Arena contra Tiradentes” ( Augusto Boal e Gianfrancesco Guarnieri) entre outros.

po esquartejado e suas partes expostas nas vias de acesso à capitania e naqueles lugares por ele mais frequentado. (Maxwell, 2005, p. 221) 12. A tranqüila dignidade com que Tiradentes enfrentou a morte foi um dos poucos momentos heróicos do fracasso sombrio. (Maxwell, 2005, p. 222) 13. (Carvalho, 2011) 14. (Fonseca, 2002, p.441) 15. (Carvalho, 2011, p. 59) 16. (Carvalho, 2011, p. 67)

3. Se a Inconfidência Mineira tem sido elemento de suporte a uma determinada construção historiográfica e a projetos e posicionamentos políticos desde as últimas décadas do século XIX, Tiradentes desponta como seu símbolo, síntese das idéias das quais o movimento seria o precursor, no Brasil.Ele se tornou, talvez, o personagem mais popular da história nacional, adquirindo contornos heróicos e status de mito político. (Fonseca, 2002, p.440) 4. Será que realmente a Independência do Brasil ocorreu em 1822, analisar por exemplo o judiciário brasileiro após este período nos leva a crer que não, uma vez que instâncias superiores da Justiça ainda se encontravam alojadas em Portugal. Os marcos historiográficos de rupturas como o 7 de setembro podem conter contradições como a supra citada. 5. (Vasconcelos, 1974) 6. Vila Rica, a opulenta cidade do ouro negro fica a cerca de 15 dias de caravana de mulas da sede do vice-reinado, Rio de Janeiro. A estrada para a zona montanhosa brasileira, atravessando densa floresta tropical e contornando escarpas vertiginosamente altas, era perigosa e espetacular. (Maxwell, 2005, p. 108) 7. Os autos da Devassa, instrumento judicial que condenou os Inconfidentes, traz a relação dos participantes deste movimento, mas, deve-se indagar afinal se houve mais integrantes no movimento uma vez que a parcialidade foi a tônica deste processo judicial. 8. (Junior, 1996) 9. A Derrama consistia na cobrança do que faltava para completa o mínimo de cem arrobas de ouro anuais devidos a coroa. (Junior, 1996, p. 80) 10. Em Vila Rica, no Rio de Janeiro, no Tijuco e nas ondas dos matos, estava sempre Joaquim José a praticar o ofício de médico e dentista, aprendendo com os velhos profissionais, dos quais se fazia amigo por seu temperamento prestativo e amável. (Junior, 1996, p. 68) 11. A sentença condenou Tiradentes à forca, a ter a cabeça cortada e exibida sobre uma alta estaca, no centro de Vila Rica e mais, a ter o cor-

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A APLICABILIDADE DA HERMENÊTICA PLURALISTA NA TUTELA DO PATRIMONIO CULTURAL Mateus de Moura Ferreira1

RESUMO: O presente texto tem como propósito esculpir algumas considerações sobre a efetividade do Estado Democrático de Direito através da aplicação de uma Hermenêutica Pluralista proposta pelo jurista Peter Haberle na efetivação da tutela do patrimônio cultural, para isso, foi proposto um programa de alfabetização cultural da população bem como a integração da esfera privada e pública na salvaguarda da Constituição. PALAVRAS CHAVE: Hermenêutica Pluralista – Estado Democrático de Direito – Patrimônio Cultural – Alfabetização Cultural

A Constituição Federal de 1988 trouxe ao ordenamento ju-

PETER HÄBERLE na sua obra, ‘Hermenêutica Constitucional.

rídico pátrio, inúmeras inovações de ordem teórica e moral; sob

A sociedade aberta dos interpretes da Constituição: contri-

os auspícios do paradigma Democrático, incorporamos as nos-

buição para a interpretação pluralista e “procedimental’ da

sas práticas cotidianas à valoração do agir a partir dos Direitos

Constituição”, onde o autor teoriza a adoção de uma interpre-

Fundamentais ali insculpidos.

tação Constitucional adequada a uma sociedade pluralista, tal

O constituinte sabiamente inseriu no diploma Constitucio-

contribuição alienígena se mostra perfeitamente adequada à

nal, a tutela jurídica dos bens culturais buscando de forma plu-

sociedade brasileira, uma vez que está possui uma diversidade

ralista2 proteger tanto o bens materiais quanto os bens imate-

de manifestações culturais, reflexo do seu caráter miscigenado.

riais, assim, ocasionou, a preservação de todos os elementos

A visão proposta pelo autor reconhece que a guarda pre-

ligados a cultura de um povo, sendo este sucedâneo, expres-

cípua da Constituição pertence ao Supremo Tribunal Federal5,

são singular de Direitos e Deveres. Logo, cabe aos interpretes

mas inova ao dispor que aquele que vive a Lei

legais dispor sobre o alcance normativo do artigo 216 da Lei Magna.

maior é o seu melhor intérprete, assim, a hermenêutica dos tribunais deve se aliar a aquela produzida pela sociedade,

Ocorre que esta visão pluralista do constituinte, necessita

construindo assim, um autentico sistema democrático.6

de uma revisitação na Hermenêutica Constitucional aplicada

A tese proposta é a democratização da hermenêutica

no cotidiano forense do país, pois, ver a Constituição apenas

constitucional, isso é, a superação da interpretação jurídica

como um pedaço de papel recheado de normas e preceitos,

de uma sociedade fechada, onde apenas aqueles que detém

não garante a efetividade da mesma, bem como, condicionar a

um vinculo corporativo ou político a realizam7, seriam estes in-

sua interpretação e aplicação a longínquas Cortes Constitucio-

terpretes, o Judiciário com seu aparato técnico e o Legislativo

nais e a ilusão de justiça que paira no seio do senso comum da

como participante do devido processo legislativo; a idéia cen-

sociedade, não é o que se espera da efetividade constitucional.

tra, é caminhar para a hermenêutica constitucional produzida

A idéia que o intérprete da Constituição deve ter na con-

pela sociedade aberta, ou como o mesmo a chama, pluralista.

juntura atual, é ver a questão hermenêutica a partir do prisma

Assevera HÄBERLE:

jurídico e político, para que assim, a sociedade seja levada a

“Propõe-se, pois, a seguinte tese: no processo e inter-

participar da construção interpretativa da normatividade e de

pretação constitucional estão potencialmente vincula-

sua aplicação, se esta máxima3 aqui corroborada, for aplicada

dos todos os órgãos estatais, todas as potências pú-

a tutela dos bens culturais, toda a identidade democrática e

blicas, todos s cidadãos e grupos, não sendo possível

participativa que o atual paradigma4 que vivemos sustenta, se

estabelecer um elenco cerrado ou fixado com numerus

concretizará facilmente aos olhos da população no que tange

clausus de intérpretes da Constituição.”8

a proteção dos bens culturais, tornando a Sociedade, principal aliada do Estado na tutela Cultural.

A interpretação da Constituição deve obedecer a critérios

Para que os anseios acima propostos sejam efetivados,

abertos na medida em que a sociedade for mais pluralista9, tra-

faz- se necessária a aplicação de uma nova Hermenêutica

zendo isto para o cotidiano brasileiro, observamos a perfeita

Constitucional, para isso, usaremos a teoria elaborada por

adequação teórica proposta por HABERLE a nossa realidade,

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uma vez que o Brasil é tido como país da miscigenação, refletida

constitucional, pressupõe que a mesma dispõe de um conhe-

esta nos traços físicos de seu povo e manifestações culturais, o

cimento prévio do objeto a ser interpretado, para isso, faz-se

pluralismo aqui presente leva a necessidade de uma hermenêu-

necessária a idéia de uma alfabetização cultural como método

tica constitucional vinculada a esta sociedade aberta, adequada

de fomento e proteção dos bens culturais, possível e necessária

a sua realidade social e principalmente, garantista da participa-

nos liames do paradigma de Estado Democrático de Direito.

ção popular.

A alfabetização cultural14 deve ser entendida como a

Adequar a proposta de HÄBERLE , ao paradigma Demo-

disposição oferecida pelo Estado a sociedade, de meios instru-

crático proposto na Constituição, é trazer a sociedade a partici-

mentais básicos, para que esta possa efetuar distinções, emitir

par de sua efetivação, trazendo os Direitos Fundamentais ardu-

juízos e realizar preferências15 em âmbito cultural, com o intuito

amente conquistados e ali preservados a integrarem o cotidiano

de adquirir bagagem teórica suficiente a realizar a Hermenêutica

da política perpetuada pelo Estado.

Constitucional pretendida por HÄBERLE.

10

Os bens Culturais estão presentes na realidade viva da co-

Trata-se de aforismo pedagógico concretizado através

munidade, é esta quem atribui à valoração pertinente a determi-

de políticas de Estado, realizadas pela União em parceria com

nados objetos pra que estes passem a ser reconhecidos como

Estados e Municípios, a fim de que se possa atingir a sociedade

elementos integradores da Cultura, a sociedade é o elo entre

como um todo.

o bem a ser valorado como Cultural e futuramente tutelado e

Proporcionar meios de integração entre comunidades

a garantia oferecida pelo Direito a ele, propor um método de

de diferentes etnias, facilitar o acesso das populações carentes

interpretação, onde esta sociedade age de forma essencial, é

a Internet, ao ensino superior, realizar programas de fomento

trazer as práticas cotidianas o bojo de Direitos Fundamentais

cultural em Escolas da rede pública e privada, incentivar o de-

preservados na Constituição, acarretando nas políticas de tutela

senvolvimento tecnológico e artístico tanto dos jovens e adultos

dos bens culturais, maior garantia e eficácia.

quanto dos idosos, facilitar a aquisição de livros, artigos musi-

Importante comentário a respeito, JOSÉ RENATO NALINI traz:

cais, obras de arte, produtos artesanais, são apenas algumas das opções a disposição do Estado a fim de promover a alfabe-

“A democratização da interpretação constitucional, ou a sua adaptação á sociedade pluralista e aberta, vem ao

tização cultural de seu povo.

Ao permitir o acesso equânime da população aos bens

encontro da necessidade de cada cidadão intervir no

culturais, o Estado proporciona a sociedade, os meios neces-

sistema de defesa do meio ambiente.”11

sários para a sua alfabetização cultural, daí em diante, a cons-

trução de uma hermenêutica constitucional adequada a tutela

Continua o jurista: “Não foi apenas ao Poder Público, mas também à co-

dos bens culturais, irá se traduzir na concretização do princípio Democrático insculpido na Constituição de 1988.

letividade, o coletivo da cidadania, que o constituinte cometeu o dever de defesa e preservação do ambiente,

REFERÊNCIAS

para as presentes e futuras gerações. Assim, todos tam-

BASTOS, Celso Ribeiro e Martins, Ives Gandra. Comentários a Constituição Federal de 1988.Promulgada em 5 de outubro de 1988. 8º volume, arts. 193 a 232. São Paulo: Saraiva, 2000.

bém são chamados a essa missão de extrair da Constituição os efeitos concretos de seus comandos.”12 Desta forma, aquele que vive a norma, acaba por interpretá-la, trazendo seus conceitos e valores a concretude do processo hermenêutico, o integrante desta coletividade citada pelo autor, passa a atuar como protetor e defensor do ambiente,preservando-o para as gerações vindouras. O legislador constitucional ao inserir na sua obra a proteção ao Patrimônio Cultural Nacional,13 atribui a sociedade o dever precípuo de salvaguardar aqueles bens que constituem a sua memória e identidade, e ao Estado, o dever de realizar programas visando a sua proteção e difusão. A possibilidade de a sociedade realizar uma hermenêutica

HÄBERLE, Peter. Hermenêutica Constitucional. A sociedade aberta aos intérpretes da Constituição: Contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental” da constituição. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1997. KANT, Immanuel. Fundamentação da Metafísica dos Costumes. São Paulo: Martin Claret, 2002. MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente: Doutrina, Prática, Jurisprudência, Glossário. 2ªed. ver. atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001. MIRANDA, Marcos Paulo Souza. Tutela do Patrimônio Cultural Bra-

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sileiro, Doutrina-Jurisprudência-Legislação. Belo Horizonte: Del Rey, 2006. MOREIRA, Ana Maria. A Tutela do Patrimônio Cultural sob o enfoque do Direito Ambiental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.

14. A democracia procedimentalista no Estado Democrático de Direito se manifesta na estruturação de processos que ofereçam aos cidadãos possibilidades efetivas de aprendizado da democracia, de participação nos processos decisórios, de exercício do controle crítico nas divergências de opinião e da produção inputs políticos democráticos. (Soares, 2008, p. 233)

NALINI, José Renato. Ética Ambiental. Campinas: Millennium, 2001.

15. (Nalini, 2001, p. 176)

SOARES, Mario Lúcio Quintão. Teoria do Estado: novos paradigmas e face da globalização. 3ªed. São Paulo: Atlas, 2008.

NOTAS DE RODAPÉ 1. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Newton Paiva. 2. O conceito de Pluralismo é uma vez mais democrático. Há um traço democrático na admissão de todas as manifestações culturais. (Nalini, 2001, p. 175) 3. Máxima é o princípio subjetivo do querer; o princípio objetivo – que serviria subjetivamente de princípio prático a todos os seres racionais, caso a razão sempre tivesse todo o poder sobre a faculdade de desejar – é a lei prática. (Kant, 2002) 4. Paradigma do Estado Democrático de Direito. 5. (Nalini, 2001, p. 19) 6. A interpretação judicial é importante, mas não é, nem deve ser a única leitura da Constituição. Cidadãos e grupos de interesse, órgãos estatais, organizações não governamentais, além da opinião pública, são forças produtivas de interpretação. Atuam, ao menos, como pré-interpretes (Vorinterpreten) do complexo normativo constitucional. (Nalini, 2001, p. 20) 7. (Häberle, 1997, p. 12) 8. (Häberle, 1997, p. 13) 9. ibidem 10. Häberle inclusive propõe um catálogo sistemático dos intérpretes constitucionais, para isso, ver: Peter Häberle, Hermenêutica Constitucional, 1997, p. 20/23. 11. (Nalini, 2001, p. 20) 12. ibidem 13. O Patrimônio nacional cultural abrange as diversas formas de manifestações culturais, é dizer, a dança, a literatura, a música, a arte, as esculturas, os objetos de alta significância, o teatro, entre outros...os bens de natureza material e imaterial, como as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados as manifestações artísticos culturais, os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico,artístico, arqueológico, ecológico e científico (Celso Ribeiro Bastos, 2000, p. 773) PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 45


DELINEAMENTOS SOBRE O CONCEITO DE CONSTITUIÇÃO: em busca de uma definição terminológica Márcio Eduardo da Silva Pedrosa Morais1 Carolina Senra Nogueira da Silva2

RESUMO: Tem-se como objetivo, por intermédio do presente artigo, discorrer sobre o conceito de Constituição, apresentando conceitos antigos e modernos em relação ao tema, entendendo-se por Modernidade como o período histórico contemporâneo, o qual tem como uma de suas características no campo jurídico a égide do Estado Democrático de Direito. Nesse sentido, insta salientar a dificuldade conceitual para se chegar a um conceito unívoco de Constituição, variando o mesmo ao longo do pensamento jurídico. Deste modo, passando-se do constitucionalismo antigo ao constitucionalismo moderno, tal estudo deter-se-á na análise do conceito de Constituição ao longo da história do constitucionalismo, atendo-se à Constituição antiga, à Constituição medieval e à Constituição moderna. PALAVRAS-CHAVES: Constitucionalismo; Constituição; Evolução histórica.

1 INTRODUÇÃO

ideias sustentarão o movimento revolucionário francês de 1789,

O Constitucionalismo pode ser definido como um movi-

culminando na elaboração da Declaração de Direitos do Homem

mento histórico que ensejou o início da criação de constituições

e do Cidadão de 1789, a qual traz em seu artigo 16 que: “Toda so-

como mecanismos para a frenagem dos poderes arbitrários do

ciedade na qual não está assegurada a garantia dos direitos nem

Estado, sendo comum afirmar que o Constitucionalismo surgiu

determinada a separação dos poderes não tem Constituição”.

com a Revolução Francesa de 1789, afirmação que na verdade

Neste sentido, diversas definições existem para o termo

não procede, tendo em vista o fato de já existir na Antiguidade

“Constituição”, tendo sido durante um longo período um desafio

clássica documentos que visavam limitar o poder político, como

para a doutrina do Direito Constitucional apresentar uma defini-

o Estado teocrático dos hebreus, o qual era regido pela “Lei do

ção unânime para o mesmo, o que pode-se afirmar não ter ocor-

Senhor”, podendo ser considerado tal Estado a primeira apari-

rido devido à citada diversidade conceitual e tendo em vista es-

ção do constitucionalismo.

tar a Constituição atrelada às características de uma sociedade.

Também em 1215 com a Magna Charta Libertatum, os

A palavra constituição conforme define os dicionários da lín-

ingleses impuseram ao Rei João Sem Terra limites formais ao

gua portuguesa3, significa, de maneira ampla, o ato de constituir,

arbítrio estatal, garantindo aos súditos direitos e liberdades indi-

de organizar, de estabelecer. Desta forma, cabe salientar que

viduais. É também importante citar a Petition of Rights de 1628,

a noção que se tem hoje de Constituição enquanto lei funda-

por intermédio da qual os ingleses conseguiram impor ao Rei

mental nasceu, com suas devidas limitações, em Atenas, com

Carlos I o respeito a seus direitos seculares.

a ideia de configurar, legitimar e limitar o poder. Não obstante,

O pacto ou contrato social medieval pode ser também con-

é a mudança do Estado Absolutista para o Estado Liberal que

siderado um antecedente do movimento do Constitucionalismo.

consolida a ideia de Constituição que se tem hodiernamente.

Por esse pacto, o povo se sujeitava ao poder do soberano en-

Nestes termos, é preciso entender essa passagem do Estado

quanto este governasse com justiça, tendo Deus como observa-

Absolutista para o Estado Liberal e depois para o Estado Social

dor e árbitro do cumprimento do contrato.

para assim chegar ao Estado Democrático de Direito, para que

Todavia, o iluminismo, também chamado de movimento

se possa compreender a temática proposta.

iluminista, ou também Idade das Luzes, é, sem dúvida, o grande marco das teorias do Constitucionalismo, principalmente por intermédio dos textos de Montesquieu, Rousseau, Voltaire e Di-

2 AS TRANSFORMAÇÕES DO ESTADO MODERNO

derot, os quais pregavam a felicidade e o respeito a direitos ine-

Antes de se definir Constituição na esfera do ordenamen-

rentes à condição humana, os quais não poderiam ser desrespei-

to jurídico, cabe um resgate histórico da transição do Estado

tados pelos soberanos, como também pelos próprios pares. Tais

Nacional, o qual surgiu a partir dos séculos XV e XVI, com a

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autoridade dos monarcas. Durante o Estado Absolutista o rei

os direitos individuais, mas também sociais e políticos) passa-

era detentor de um poder único e concentrado (Portugal foi o

ram a ser contemplados, surgindo o modelo de Estado Demo-

primeiro Estado Absolutista a se formar), exercendo este poder

crático de Direito.

de maneira ilimitada. Com essa concentração de poder exercida

O Estado Democrático de Direito caracteriza-se por esta-

apenas por um homem (o soberano), os direitos e liberdades

belecer a participação da população na esfera pública, o poder

individuais eram renegados, inexistentes.

vem do povo e para o povo, havendo um vínculo deste com

Insta salientar que, pensadores como Thomas Hobbes

o processo decisório. Este modelo procedimental de Estado

(1588 - 1679) e Nicolau Maquiavel (1469 – 1527) foram respon-

também se caracteriza por aspectos sociais, promovendo jus-

sáveis por consolidar a noção de Estado Absolutista, com a ideia

tiça social, como também liberais, sobre as égides do capitalis-

de que o homem celebra um contrato, transferindo seus direitos

mo. Deste modo, as Constituições de vários países passaram a

ao ser artificial (o Estado) com poder visível que seria capaz de

consagrar esses ideais democráticos, o Estado, assim como os

proteger e defender os demais. Essas ideias se mantiveram até

cidadãos, passaram a ser submetidos à lei, lei esta fruto da deli-

o século XVII, quando então os ideais de John Locke (1632 –

beração popular, como salientado. Ainda, conforme a participa-

1704) mudariam a concepção de Estado, reformulando-a.

ção popular, Peter Häberle (1997) argumenta e defende o direito

Deste modo, surge o Estado Liberal através da doutrina do

do povo em participar da interpretação do Direito, das normas

liberalismo político sustentada por Locke, por intermédio da qual

interpretativas, por intermédio da ideia da sociedade aberta dos

o pensador defendia a tese de que o povo não deveria abrir mão

intérpretes da Constituição.

de seus direitos, apenas de parte deles. Assim, para Locke, o Estado havia nascido para proteger a vida, a liberdade e a propriedade dos indivíduos, desta feita, o Estado não pode sufocar

3 AS CONCEPÇÕES TERMINOLÓGICAS DE “CONSTITUIÇÃO” AO LONGO DO PENSAMENTO JURÍDICO

as liberdades individuais. Assim, notar-se-á que o indivíduo está

A concepção moderna de Constituição surgiu com os te-

no centro das ideias e dos objetivos do Estado; os governos,

óricos iluministas com a divisão dos poderes do Estado, sua

que são formados por homens escolhidos através de votos que

limitação e as declarações dos direitos e garantias individuais

representam os cidadãos, são responsáveis por defenderem

dos cidadãos. A Constituição, assim, tem o objetivo de organizar

os interesses desses indivíduos, protegendo sua propriedade,

e estruturar politicamente o Estado, contemplando a divisão dos

privacidade, liberdade, segurança e sua vida, surgindo, ainda,

poderes do Estado e a preservação dos direitos dos cidadãos.

a ideia de divisão dos poderes (Legislativo, Judiciário e Execu-

Um dos conceitos mais elementares de Constituição é o chama-

tivo) com os ideais de Montesquieu (1689 – 1755). Com essa

do conceito histórico-universal, cuja formulação foi apresentada

liberdade total, opondo-se ao controle do Estado Absolutista, a

no ano de 1892 por Ferdinand Lassalle quando o mesmo salien-

exploração das relações de trabalho foi um problema marcante

tou que todos os países possuem, e terão de possuí-la sempre,

do Estado Liberal, tendo em vista não haver a intervenção estatal

uma Constituição real e efetiva, sendo errado pensar a Constitui-

na vida privada. Assim, aos poucos o Estado Liberal entrou em

ção como uma prerrogativa dos tempos modernos. (LASSALLE,

declínio com diversos problemas sociais e econômicos, surgin-

2001). Para apresentar a definição, Lassalle (2001) distinguia a

do, assim, a necessidade de repensar o Estado e sua atuação.

chamada Constituição escrita (consubstanciada em um texto, a

Foi ao final da Primeira Guerra Mundial, que novos princí-

“folha de papel” de Lassalle) da Constituição real. Nesse sen-

pios ganharam força moldando o Estado, quando se tornou um

tido, a constituição folha de papel, aqui usando a definição de

Estado “com cunho social”, intervindo na vida econômica e so-

Lassalle4, deve ser reflexo da Constituição real, tendo esta suas

cial dos indivíduos, regulando a vida privada de seus cidadãos,

raízes nos fatores reais de poder, sob pena de se não o sendo

tornando-se, assim, um Estado com características paternalis-

não ser reflexo da sociedade, positivando utopias, ilegitimida-

tas. Não obstante, direitos democráticos não foram contempla-

des. De acordo com Lassalle (2001):

dos neste Estado que intervinha de maneira excessiva na esfera

Onde a Constituição escrita não corresponde à real,

privada dos indivíduos e não conferia aos seus cidadãos partici-

estoura inevitavelmente um conflito que não há ma-

pação democrática no processo político.

neira de evitar e no qual, passado algum tempo, mais

Deste modo, o declínio do Estado Social foi inevitável, por-

cedo ou mais tarde, a Constituição escrita, a folha de

que princípios como a participação democrática do povo no pro-

papel, terá necessariamente de sucumbir perante o

cesso político, garantias e direitos fundamentais (consolidados

empuxo da Constituição real, das verdadeiras forças

com a Declaração dos Direitos Humanos de 1948, abrangendo

vigentes no país. (LASSALLE, 2001, p. 63).

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mente as constituições medievais eclesiásticas), até ao ConstiAssim, Ferdinand Lassalle (1825 -1864) é o responsável por

tucionalismo moderno. Ainda de acordo com Cunha, “o Direito

dar à Constituição uma concepção sociológica, ao entender que

Constitucional terá tido como uma das suas funções fundadoras

a Constituição formal, escrita, não pode ser considerada uma

a de substituir o Direito Natural, considerando falido ou em vias

Constituição, devendo estar em harmonia com os fatores sociais

de falência [...] quer na sua versão clássica, quer na moderna,

de poder, sob pena de, não o sendo, ser apenas “uma folha

ou jusnaturalista”. (CUNHA, 2007, p. 61). Assim, é de se pensar

de papel”, necessitando-se, dessa forma, considerar a realida-

que, do mesmo modo que se afirma serem os Direitos Humanos

de sociológica e econômica de uma sociedade influenciando o

a linguagem atualizada do Direito Natural, “o Direito Constitucio-

sistema normativo.

nal seria hoje um dos seus ramos de eleição positivadora, uma

Hans Kelsen (1881 – 1973), o jurista de Viena, e Konrad Hes-

nova fronteira ou uma nova barricada do grande Direito Justo –

se (1919 – 2005) são conhecidos por darem à Constituição uma

que, como é óbvio, deve ser preocupação de todos os ramos do

concepção jurídica. Para Kelsen, com concepção mais rígida do

Direito [...]” (CUNHA, 2007, p. 61). Mais sua vez, Paulo Ferreira

que Hesse, a Constituição é uma norma pura, puro dever-ser,

da Cunha (2007) salienta que:

tendo uma superioridade jurídica, sem fundamentações socioló-

[...] uma das divisões mais úteis e com mais profundo

gicas, políticas ou filosóficas. Para Konrad Hesse, a Constituição

sentido no plano histórico, é aquela que divide as consti-

deve procurar obter ordem e conformação conforme a realidade

tuições em dois tempos, sucessivos (embora possa ha-

social e política, a Constituição possui, assim, força normativa,

ver resíduos de épocas mais antigas em épocas novas,

não sendo autônoma à realidade.

e, eventualmente, revivalismos, ou então antecipações:

Outra importante concepção conferida à Constituição é a

a) o tempo pré-revolucionário e pré-liberal das constitui-

concepção política, a qual é defendida expressivamente por Carl

ções que se dizem tradicionais, históricas ou naturais;

Schmitt (1888 – 1985), com a distinção entre Constituição e Lei

b) e o tempo pós-revolucionário e liberal e pós-liberal

Constitucional, com sua teoria material oposta à teoria normativa

das constituições codificadas, que se dizem do cons-

de Kelsen. Para Schmitt, a Constituição é o reflexo das vontades

titucionalismo moderno, e voluntário (até “voluntarista”).

populares, sua essência não pode ficar limitada à norma. As-

(CUNHA, 2007, p. 97).

sim, é através da compreensão dos paradigmas de Estado, bem como as concepções de Constituição, que possibilita a análise

O primeiro grupo de constituições (natural, histórica, tradi-

da formação da Constituição tal como se tem hoje. Moderna-

cional, a qual é esparsa, não compilada, geralmente), durante

mente, Celso Ribeiro Bastos salienta que:

muito tempo, não foi objeto de interesse por parte da doutrina,

Da mesma forma que se fala da constituição de um or-

preocupando-se a mesma com o segundo grupo (moderna, co-

ganismo vivo, pode-se referir a uma determinada cons-

dificada, voluntarista, a qual é sistemática, pensada para ser um

tituição de um ordenamento jurídico, reportando-se

corpus autônomo). Somente com o constitucionalismo moderno

ao seu esquema fundamental, à sua ossatura mínima,

ter-se-á uma tríade fundante da Constituição estruturada em: 1)

determinados pelo conjunto de suas principais institui-

um texto sagrado, codificado, ao qual os norte-americanos no-

ções. (BASTOS, 1994, p. 26).

meiam como sacred instrument; 2) no princípio da separação de poderes, na visão clássica de Barão de Montesquieu (Legislati-

Por sua vez, em relação à definição do termo “Constituição”, Paulo Ferreira da Cunha (2007) salienta que:

vo, Executivo e Judiciário); e 3) direitos do homem ou fundamentais com consagração constitucional expressa. (CUNHA, 2007).

[...] Constituição é palavra que nasce nas línguas latinas,

Insta salientar que esses traços característicos do constitucio-

tendo como antecedente o vocábulo latino constitutio,

nalismo moderno se acham presentes no texto da Declaração

que em Cícero acaba por encontrar uma influência se-

dos Direitos do Homem e do Cidadão francesa do século XVIII.

mântica com outros significantes tendentes para o mes-

No mesmo sentido, de acordo com Antonio-Carlos Pereira

mo significado, então: tais como res publica e status.

Menaut (2006) pode-se definir Constituição como “limite do po-

Correspondendo ao grego politeia. E que alguns tradu-

der, por meio do Direito, assegurando uma esfera de direitos e

zem por “república”. (CUNHA, 2007, p. 60).

liberdades para o cidadão. Quando isso não ocorre não se pode falar de uma verdadeira Constituição, como previa o artigo 16 da

Cunha salienta que a expressão “Constituição” aparece ain-

Declaração francesa de 1789”. (PEREIRA MENAUT, 2006, p. 20,

da incipientemente e para designar coisas diversas (nomeada-

tradução nossa5). Neste sentido, a ideia de Constituição é dis-

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tinta da ideia de “constituir”, tal jogo de palavras recorda que as

Esse sistema de organização grego, especificamente no

constituições não são pontos de partida que fundam, originam

que se refere à forma de governo, ou seja, o que caracterizava a

ou “constituem”, em sentido literal, uma sociedade, uma ordem

forma política grega, era a forma democrática (ancorada no bi-

jurídica, uma comunidade política. As constituições possuem

nômio demokratía-isonomía), significado a forma democrática:

uma capacidade limitada de constituir, constituem somente o

primazia da assembléia de todos os cidadãos atenienses para a

sistema político e não todo e nem em todos os casos.

tomada de decisões de importância coletiva; direito de palavra

Buscando uma definição de Constituição, Maurizio Fiora-

e de proposta a todos os cidadãos dentro da assembleia, indis-

vanti (2007) distingue a “Constituição dos antigos” (referindo-se

tintamente; extração por sorte dos cargos públicos; alternância

como “antigos” os povos gregos e romanos) da “Constituição

anual de governos; obrigação aos ocupantes de cargos públi-

dos modernos”. Neste sentido, Fioravanti afirma que o mundo

cos de prestarem contas anualmente.

antigo, como qualquer outra época histórica, teve historicamen-

Neste contexto de crise e reestruturação, de balanço e va-

te determinado seu próprio modo de expressar uma certa ordem

loração dos tempos democráticos, toma corpo o uso do con-

política, ou seja, sua própria doutrina política, tendo essa dou-

ceito de politéia, que os modernos traduzem por Constituição.

trina seu momento mais importante com as figuras de Platão

Apesar das críticas dirigidas em relação à referida tradução,

(428-347 a.C.) e de Aristóteles (384-323 a.C).

principalmente em relação ao fato de a expressão possuir sig-

Os séculos quinto e quarto antes da Era Cristã abrangeram

nificados diversos na língua grega, significando o conjunto dos

uma época de instabilidade no mundo antigo, época marcada

cidadãos de um lado, de outro a organização política, Fiora-

por discórdias e particularismos locais. Nesse sentido, Fioravan-

vanti salienta que:

ti (2007) salienta que:

[...] politéia não é mais do que o instrumento conceitual

Para os contemporâneos, em concreto, trata-se de um

de que serve o pensamento político do século IV para

tempo de decadência política provocada, sobretudo,

nuclear seu problema fundamental: a busca de uma for-

pela transformação da cidade – a polis – de lugar de

ma de governo adequada ao presente, tal que reforce a

exercício dos direitos políticos de cidadania, de reco-

unidade da polis, ameaçada e em crise desde diferen-

nhecimento coletivo de um pertencimento político co-

tes frentes. (FIORAVANTI, 2007, p. 19, tradução nossa7).

mum, a lugar caracterizado preferencialmente pela economia e pelo intercâmbio, de maneira particular em

Para Platão, a boa Constituição política (politéia) não pode

relação com o, cada vez mais, intenso tráfico comercial

jamais se originar dos vencedores, como também não pode ter

e marítimo. A mercantilização da polis produz também,

origem violenta, devendo ser a Constituição dos antepassados

com freqüência de maneira violenta, um crescente con-

(a patrios politéia), uma Constituição que seja pluralista, que se

flito entre pobres e ricos, no que os primeiros reivindicam

origine da progressiva formação de uma pluralidade de forças e

formas cada vez mais amplas de assistência pública e

de tendências, tendo suas origens nos antepassados.

os segundos lutam para impedir que ao problema da

Estas ideias de Platão foram retomadas por seu discípulo

indigência se responda com medidas radicais, com o

Aristóteles, o qual fortaleceu o mito da “Constituição dos padres”

confisco e redistribuição das terras. (FIORAVANTI, 2007,

platônica, a Constituição originária, a qual teria por finalidade dar

p. 15-16, tradução nossa ).

uma resposta adequada aos problemas do presente, salvando a

6

unidade da polis, sendo um fundamento constitucional. Assim: A essa instabilidade social dá-se a nome de stásis. Ao

Agora mais do que nunca, em Aristóteles a politéia não

conceito de stásis contrapõe-se o conceito de eunomía, o bem

é somente um instrumento conceitual para usar em sen-

coletivo, a ordem da coletividade, valor positivo almejado pelos

tido descritivo e de classificação: aspira, pelo contrário,

antigos através da busca por um governo ideal, a melhor de go-

a prescrever um futuro político dotado de constituição.

verno possível para manter unida e assim desenvolver a comu-

O que se quer para o futuro é uma política que possa

nidade política. Neste sentido, os antigos não almejavam sua

ser traduzida em politéia, em regime constitucional esta-

soberania, menos ainda um Estado; os mesmos se referiam ba-

velmente fundado. (FIORAVANTI, 2007, p. 22, tradução

sicamente a um sistema de organização e de controle dos diver-

nossa8).

sos componentes da sociedade historicamente situada, construído para dar eficácia às ações coletivas e para que houvesse um pacífico reconhecimento do comum pertencimento político.

Aristóteles, antes de reivindicar a Constituição dos antepassados, reivindica a necessidade de se extirpar os males que

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desestabilizavam a unidade da polis: a mercantilização da vida

modernos irá se preocupar com a separação de poderes e com

pública, a divisão e conflito entre pobres e ricos, como salienta-

a instituição de direitos e garantias fundamentais. Os mesmos

do. Neste sentido, Aristóteles considerava todas as formas de

pensaram a Constituição como uma exigência a satisfazer como

governo potencialmente justas: a monarquia, a aristocracia e a

um ideal ético e político a se perseguir, um grande projeto de

democracia; o que poderia ocorrer, sendo inaceitável para o Es-

conciliação social e política. Por isto, ainda, é correto dizer que

tagirita9, era a degeneração dessas formas, transformando-se a

o principal inimigo da Constituição dos antigos é o tirano, sobre-

monarquia em tirania, a aristocracia em oligarquia e a democra-

tudo porque tal é aquele que divide a comunidade, dividindo-a,

cia em demagogia. Assim, contra tais perigos, “a primeira tarefa

rompendo o equilíbrio, se esquecendo da Constituição dos pa-

é a de revalorizar e relançar o significado propriamente político,

dres. (FIORAVANTI, 2007).

e inclusive ético, da convivência civil” (FIORAVANTI, 2007, p. 23,

Doutrinariamente sustenta-se que, durante o período me-

tradução nossa ).o que não é somente o tráfico de riquezas ou

dieval, ancorado numa concepção teocrática de poder, há o

a mera coincidência de interesses econômicos, mas “sobretudo

desaparecimento da necessidade de uma lei fundamental, ha-

projeto de aperfeiçoamento moral, ademais de material: daqui

vendo o eclipse da Constituição, afirmação essa rechaçada por

que a obra aristotélica recorra continuamente ao grande tema da

Fioravanti, para quem houve efetivamente uma Constituição me-

virtude, da cidadania ativa”. (FIORAVANTI, 2007, p. 23, tradução

dieval, diferente da Constituição dos antigos como também da

nossa11).

Constituição dos modernos, Constituição essa com característi-

10

Nestes termos, com esta defesa de Aristóteles e de Platão:

cas próprias de uma era que durou mais de dez séculos, deste

a necessidade de se instituir uma Constituição, ou seja, um fruto

modo, uma era na qual não houve somente uma forma típica do

de uma composição paritária dos interesses presentes na so-

exercício do poder.

ciedade, contrapondo-se a um regime instituído pela força, de

Dentre as formas de poder, há que se salientar principal-

modo violento, começa a tomar forma a chamada Constituição

mente os poderes imperiais, os poderes dos senhores feudais

dos antigos, à qual também os romanos prestarão contribuições

e, principalmente, o poder eclesiástico. A característica comum

à sua estruturação e gênese. Assim, pode-se afirmar que na

destes centros de poder era a não-existência de nenhuma pre-

Grécia antiga, especificamente em Atenas, está presente o pri-

tensão totalizadora de poder entre os bens, ordens, desenvol-

meiro precedente de uma ideia que perseguirá todo e qualquer

vendo-se a vida econômica, patrimonial e social fora de previ-

modelo de uma Constituição moderna, ou seja, uma forma de

são normativa estatal, mas sim a força normativa e primária dos

se configurar, limitar e legitimar o poder, ou seja, um governo

costumes.

de leis e não de homens, apontando o poder de uma estrutura objetiva e não da vontade de homens.

Já no que se refere às funções da Constituição moderna, Francis Hamom, Michel Troper e Georges Burdeau (2005) afir-

Por sua vez, os romanos elaboraram e defenderam o con-

mam que a mesma possui funções jurídicas e funções políticas.

ceito de Constituição Mista, a qual se traduz em uma teoria dos

Ou seja, a Constituição deve, além de trazer os elementos es-

cargos (magistraturas) e no equilíbrio dos poderes, tendo sido

truturantes do Estado, fornecer os elementos essenciais à con-

Marco Tulio Cícero (106-43 a.C) um de seus primeiros e prin-

cretização dos direitos fundamentais. Deste modo, num Estado

cipais defensores. Para Cícero toda a ordem estatal deve se

Constitucional os direitos fundamentais são positivados no texto

resumir na res publica (coisa do povo), sendo esse povo não

constitucional, como acontece no Brasil contemporâneo, o qual

uma multidão de indivíduos agregados a um território, mas sim o

possui um documento constitucional que institui um Estado De-

conjunto de indivíduos reunidos sob um consenso sobre aquilo

mocrático de Direito, modelo inclusivo de Estado, que não privi-

que consideram de direito e com interesses comuns.

legia nenhum projeto de vida em detrimento a outro, prevalecen-

Neste sentido, uma res publica forte somente pode se es-

do o governo das leis sobre o arbítrio dos homens, ao mesmo

truturar sob um fundamento pacífico e consensual, não podendo

tempo em que se reconhecem e garantem as liberdades dos

estar a mesma sustentada por um governo tirânico ou aristo-

cidadãos. Em relação a tal ideia, Agustín Ricoy Saldaña (2001)

crático. Para Cícero, a res publica necessita de uma particular

salienta que:

forma de união, à qual o mesmo denomina “forma mista e mo-

[...] um Estado de Direito não se dá por geração espon-

derada”, sendo esta forma evocada com a palavra constitutio

tânea nem depende somente da vontade ou decisão

como também frequentemente com a expressão status civitatis.

de algum ator político em particular. Sua construção é

Com isso, deflui-se que os antigos não haviam pensado a

um processo que abrange a todos os atores políticos

Constituição como uma norma, norma que durante os tempos

relevantes e à cidadania, e não se esgota na edificação

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de um sistema jurídico ou constitucional. (SALDAÑA in ZEPEDA, 2001, p. 7, tradução nossa12).

Modernamente, Antonio-Carlos Pereira Menaut (2006) define Constituição como “limite do poder, por meio do Direito, assegurando uma esfera de direitos e liberdades para o cidadão.

Assim, o Estado de Direito se realiza e se expressa na norma

Quando isso não ocorre não se pode falar de uma verdadeira

legal, como também na edificação e no funcionamento efetivo

Constituição, como dizia o famoso artigo 16 da Declaração fran-

das instituições, assim como na cultura e nas práticas políticas

cesa de 1789”. (MENAUT, 2006, p. 20, tradução nossa13). Neste

dos atores, (SALDAÑA in ZEPEDA, 2001), sendo a Constituição

sentido, a ideia de Constituição é distinta da ideia de “consti-

o lócus das garantias e direitos fundamentais do sujeito.

tuir”, tal jogo de palavras recorda que as Constituições não são pontos de partida que fundam, originam ou “constituem”, em

4 CONCLUSÃO

sentido literal, uma sociedade, uma ordem jurídica, uma comuni-

Como cediço, o Direito Constitucional ocupa-se do estudo

dade política, assim as Constituições possuem uma capacidade

sistemático das normas integrantes da Constituição do Estado,

limitada de constituir, constituem somente o sistema político e

principalmente de suas normas estruturantes: como a forma de

não todo e nem em todos os casos.

governo, o sistema político, a forma de Estado, os direitos fundamentais, a organização dos poderes estatais, a separação de

REFERÊNCIAS

poderes. O fundamento ideológico do surgimento das Constitui-

ARANGO, Rodolfo. El concepto de derechos sociales fundamentales. Bogotá: Legis, 2005.

ções é o pensamento liberal dos filósofos iluministas dos séculos XVII e XVIII, como Rousseau, Montesquieu e Locke, sendo as Constituições atuais inspiradas pelas Constituições dos séculos XVII e XVIII, fruto das revoluções de então: Revolução Inglesa, Revolução Francesa e Revolução Norte-Americana. Costuma-se também apresentar como antepassado da Constituição a Magna Charta Libertatum, documento imposto pelos nobres ao Rei João Sem Terra em 1215 na Inglaterra, como também a Petition of Rights de 1628, imposta ao rei inglês Carlos I. Assim, a Constituição como documento maior de um ordenamento jurídico pode ser apresentada por diversas concep-

BASTOS, Celso Ribeiro. Dicionário de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 1994. BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 20 ed. São Paulo: Malheiros, 2008. BONAVIDES, Paulo; ANDRADE, Paes de. História constitucional do Brasil. 3. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991. BRASIL. Constituição (1988) Constituição da república federativa do Brasil. 29. ed. São Paulo: Atlas, 2008.

ções: política, jurídica e sociológica. A concepção política foi apresentada por Carl Schmitt na sua obra Teoria de la constitución, para quem a Constituição é a decisão política fundamental, apresentando o autor uma diferenciação entre Constituição e leis constitucionais. Assim, a Constituição disporia sobre as

CUNHA, Paulo Ferreira da. Direito constitucional geral: uma perspectiva luso-brasileira. São Paulo: Método, 2007. FIORAVANTI, Maurizio. Constitución: de la antiguedad a nuestros días. Madrid: Trotta, 2007.

normas fundamentais, enquanto que as demais normas contidas em seu texto seriam leis constitucionais. Já a concepção jurídica foi apresentada pelo jurista de Viena, Hans Kelsen, em sua obra Teoria pura do direito, para quem a Constituição é o vértice, topo, de todo o ordenamento jurídico de um Estado, devendo as leis inferiores guardar consonância com a mesma, sob pena de serem declaradas inconstitucionais.

HAMON, Francis; TROPER, Michel; BURDEAU, Georges. Direito constitucional. 27. ed. Barueri: Manole, 2005. HÄBERLE, Peter. Hermenêutica constitucional: a sociedade aberta dos intérpretes da constitução: contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental” da constituição. Porto Alegre: Sergio Antônio Fabris, 1997.

Assim, a Constituição tem como sustentáculo lógico-jurídico a norma hipotética fundamental. Por sua vez, a concepção sociológica, apresenta por Ferdinand Lassalle na obra O que é uma constituição, traz que a verdadeira Constituição é decorrente da soma dos fatores reais de

LASSALLE, Ferdinand. A essência da constituição. 6. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2001. MIRANDA, Jorge. Teoria do estado e da constituição. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

poder, não passando a Constituição escrita de uma mera “folha de papel”, podendo a mesma ser rasgada a qualquer momento, caso a mesma fira os fatores reais de poder.

NOGUEIRA ALCALÁ, Humberto. Teoría y dogmática de los derechos fundamentales. Cidade do México: UNAM, 2003.

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PEREIRA MENAUT, Antonio-Carlos. Lecciones de teoría constitucional. Madrid: Colex, 2006. PIMENTA, Marcelo Vicente de Alkmim. Teoria da constituição. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. RODRÍGUEZ ZEPEDA, Jesús. Estado de derecho y democracia. Cidade do México: Instituto Federal Electoral, 2001. SLAIBI FILHO, Nagib. Direito Constitucional. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009.

de manera particular en relación con el cada vez más intenso tráfico comercial y marítimo. La mercantilización de la polis produce también, con frecuencia de manera violenta, un creciente conflicto entre pobres y ricos, en el que los primeros reivindican formas cada vez más amplias de asistencia pública y los segundos luchan por impedir que al problema de la indigencia se responda con medidas radicales, con la confiscación y redistribución de las tierras. (FIORAVANTI, 2007, p. 15-16). 7 [...] politéia no es más que el instrumento conceptual del que se sirve el pensamiento político del siglo IV para enuclear su problema fundamental: la búsqueda de una forma de gobierno adecuada al presente, tal que refuerce la unidad de la polis, amenazada y en crisis desde distintos frentes. (FIORAVANTI, 2007, p. 19).

NOTAS DE RODAPÉ 1 Especialista em Ciências Criminais pela Universidade Gama Filho/RJ. Mestre e Doutorando em Teoria do Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas. Professor no Curso de Direito da Faculdade Asa de Brumadinho/MG, da Faculdade de Pará de Minas/MG e da Faculdade de Direito da Universidade de Itaúna. Advogado.

8 Ahora más que nunca, en Aristóteles la politéia no es solo un instrumento conceptual para usar en sentido descriptivo y de clasificación: aspira por el contrario a prescribir un futuro político dotado de constitución. Lo que se quiere para el futuro es una política que pueda traducirse en politéia, en régimen constitucional establemente fundado. (FIORAVANTI, 2007, p. 22).

2 Graduada em Relações Internacionais pela Universidade de Itaúna. Mestre em Relações Internacionais pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Discente do Curso de Direito da Faculdade de Direito da Universidade de Itaúna.

9 Alcunha de Aristóteles, tendo em vista ter o mesmo nascido na cidade de Estagira na Macedônia.

3 O Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa traz a seguinte definição para o verbete “Constituição”: “Constituição: (do latim constitutione): s. f. 1. Ato de constituir, de estabelecer, de firmar. 2. Modo pelo qual se constitui uma coisa, um ser vivo, um grupo de pessoas; organização, formação. 3. Lei fundamental e suprema dum Estado, que contém normas respeitantes à formação dos poderes públicos, forma de governo, distribuição de competências, direitos e deveres dos cidadãos, etc.; carta constitucional, carta magna. 4. Conjunto de normas reguladas de uma instituição, corporação, etc.; estatuto. 5. Biotip. O conjunto das características anatômicas, funcionais, reacionais e psíquicas que marcam um indivíduo.” (FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário Aurélio da língua portuguesa. 2. ed. rev. ampl. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986). 4 Concepção apresentada por Ferdinand Lassalle em conferência pronunciada diante de um agrupamento de cidadãos de Berlim em abril de 1862.

10 [...] la primera tarea es la de revalorizar y relanzar el significado propiamente político, e incluso ético, de la convivencia civil. (FIORAVANTI, 2007, p. 23). 11 [...] sobre todo proyecto de perfeccionamiento moral, además de material: de aquí que la obra aristotélica recurra continuamente al gran tema de la virtud, de la ciudadanía activa. (FIORAVANTI, 2007, p. 23). 12 “[...] un Estado de derecho no se da por generación espontánea ni depende sólo de la voluntad o decisión de algún actor político en particular. Su construcción es un proceso que involucra a todos los actores políticos relevantes y a la ciudadanía, y no se agota en la edificación de un sistema jurídico o constitucional.” (SALDAÑA in ZEPEDA, 2001, p. 7). 13 “[...] límite del poder, por medio del Derecho, asegurando una esfera de derechos y libertades para el ciudadano. Cuando esto no se da no puede hablarse de verdadera Constitución, como decía el famoso artículo 16 de la Declaración francesa de 1789.” (PEREIRA MENAUT, 2006, p. 20).

5 “[...] límite del poder, por medio del Derecho, asegurando una esfera de derechos y libertades para el ciudadano. Cuando esto no se da no puede hablarse de verdadera Constitución, como decía el famoso artículo 16 de la Declaración francesa de 1789.” (PEREIRA MENAUT, 2006, p. 20). 6 Para los contemporáneos, en concreto, se trata de un tiempo de decadencia política provocada, sobre todo, por la transformación de la ciudad – la polis – de lugar de ejercicio de los derechos políticos de ciudadanía, de reconocimiento colectivo de una pertenencia política común, a lugar caracterizado preferentemente por la economía y el intercambio,

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EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 66, DE 13 DE JULHO DE 2010:

A Nova Concepção do Divórcio e a Permanência do Instituto da Separação Leandro Henrique Simões Goulart1 Priscilla Chagas de Moura2

RESUMO: Com as constantes mudanças da sociedade, as concepções do casamento e da sua dissolução mudaram substancialmente. Dessa forma, o Direto, através da Emenda Constitucional n.66, procurou adequar-se aos novos conceitos, eliminando os requisitos Constitucionais para concessão do divórcio. Todavia, a referida emenda não fez, em seu texto, qualquer menção quanto a uma possível revogação dos artigos infraconstitucionais que disciplinam o tema. Assim, discute-se quanto a possibilidade do Poder Judiciário não mais aplicar o instituto da separação judicial, como se o mesmo não mais existisse no ordenamento jurídico brasileiro, impossibilitando dos interessados de escolherem qual o instituto, se da separação ou do divórcio, melhor lhe convém. PALAVRAS CHAVES: Divórcio; Separação Judicial; Emenda Constitucional n. 66; Revogação; Legislação Infraconstitucional.

Ao tempo do Brasil Império o matrimônio era regulado pela

influência da Igreja, embora ainda presente.

Igreja Católica, sua celebração, suas nulidades e sua dissolução.

A Igreja Católica por muito tempo impôs seus princípios ao

À época, a dissolução somente se dava com a morte de

Estado, governando o Brasil conforme lhe convinha, contudo,

um dos cônjuges, consagrando o casamento como eterno

em 1890, deu-se a promulgação da República, o que acarretou

(“até que a morte os separe”).

a separação entre Estado e Igreja, que agora constituíam dois

Neste período, o matrimônio era permitido apenas aos nubentes católicos, não havendo a possibilidade de noivos não

entes distintos, mas, sendo ainda nítida a forte influência desta e suas marcas deixadas na sociedade.

católicos se casarem sem violarem suas convicções religiosas.

Entretanto, apesar desta separação, a indissolubilidade do

Somente a partir do ano de 1861, com o advento da Lei de

casamento foi mantida, afinal, como era de fácil percepção, a

11 de setembro de 1861 regulamentada pelo Decreto de 17 de

legislação brasileira ainda era contaminada pelos elementos

abril de 1863, que ficou instituído o matrimônio entre não católicos.

religiosos e pela forte interferência da Igreja. Ademais, essa in-

Assim, passou a existir no Brasil três modalidades de casa-

dissolubilidade também interessava ao Estado, que procurava

mento reconhecido pela legislação vigente: o casamento católi-

conservar a família, considerada como a base da sociedade e,

co, o casamento misto e o casamento entre não católicos; o que

sobretudo pelo caráter patrimonialista conferido ao matrimônio.

representou uma imensa evolução perante uma sociedade que

E foi sob o prisma de um Estado Laico que o termo divórcio

era regida pelos princípios e normas impostos pela Igreja Católica.

ou desquite, como era usado à época, embora bastante dife-

O casamento católico era celebrado entre nubentes exclu-

rente do conceito atual, surgiu na legislação brasileira, tendo o

sivamente católicos e seguia as normas do Concílio de Trento3

Decreto nº 181 de 1890, em seu capítulo IX, disposto sobre o

de 1563 e das Constituições do Arcebispado da Bahia. O ca-

divórcio consensual e o divórcio litigioso.

samento misto, como o próprio nome sugere, era constituído

Entretanto, o divórcio disciplinado pelo Decreto nº 181 /

entre noivos católicos e não católicos, sendo disciplinado pelo

90 rompia a sociedade conjugal, mas não dissolvia o vinculo

Direito Canônico. E o casamento dos não católicos, por sua

do casamento4.

vez, permitia a união de pessoas de crenças diferentes, obedecendo aos preceitos das respectivas religiões.

Foi a Lei 6.515, promulgada em 26 de dezembro de 1977, que regulava os casos de dissolução da sociedade conjugal e

O casamento civil propriamente dito somente foi instituído

do casamento, seus efeitos e respectivos processos, e dava

no Brasil no século XVIII, na vigência do governo provisório do

outras providências, que efetivamente instituiu o divórcio no

Marechal Deodoro da Fonseca, através do Decreto nº 181, de

Brasil de forma a deixá-lo mais próximo do conceito atual, ten-

24 de janeiro de 1890, que promulgou a Lei sobre casamento,

do sido, entretanto, impostos requisitos prévios para se obter

composta por 125 artigos, quando já não era tão marcante a

sua concessão.

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Assim, para se obter a dissolução do casamento pelo insti-

gue.” (BRASIL, 1942)

tuto do divórcio se fazia necessário prévia separação judicial, a

O ato que põe fim a vigência de uma Lei ou, melhor dizendo

qual punha fim aos deveres de coabitação, fidelidade recíproca

torna esta sem efeito denomina-se revogação, podendo ser total

e ao regime matrimonial de bens, como se o casamento já fosse

(ab-rogação) ou parcial (derrogação) quando torna sem efeito

dissolvido, mas impossibilitando aos separados judicialmente

apenas uma parte da Lei.

de constituir novo matrimonio. Desta feita, a conversão da separação judicial em divórcio, à época, somente poderia ser requerida em juízo após decorrido

O diploma legal acima aludido traz, também, nos parágrafos do supracitado artigo as hipóteses em que o instituto da revogação será admitido, sendo estes:

mais de um ano da sentença que julgara procedente o pedi-

Art. 2° Não se destinando à vigência temporária, a lei terá

do de separação judicial ou da decisão que concedera medida

vigor até que outra a modifique ou revogue.

cautelar correspondente.

§1° A lei posterior revoga a anterior quando expressa-

Vinte e cinco anos depois, com o advento do “novo” Códi-

mente o declare, quando seja com ela incompatível ou

go de Civil (de 2002), não houve grandes mudanças quanto ao

quando regule inteiramente a matéria de que tratava a

tempo necessário para a conversão da separação em divórcio,

lei anterior.

sendo, apenas, reconhecido o direito de se requer o divórcio

§2° A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou es-

direito, desde que comprovado em vias judiciais a separação de

peciais a par das já existentes, não revoga nem modifica

fato do ex-casal pelo interregno de no mínimo dois anos.

a lei anterior.

Em tempo de acompanhar as constantes mudanças da so-

§3° Salvo disposições em contrário, a lei revogada não

ciedade, que a muito já não tratava o matrimônio e o divórcio

se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência.

com o mesmo rigor mantido pelo ordenamento jurídico brasilei-

(BRASIL, 1942)

ro, foi promulgado em 13 de julho de 2010 a Emenda Constitucional n. 66, composta por apenas um único artigo, o qual promoveu a alteração do parágrafo 6° do artigo 226 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, abolindo o arcaico requisito de prévia separação judicial pelo decurso de mais de um ano e/ou a exigência de separação de fato por mais de dois anos para então, haver a concessão do divórcio. Contudo, a referida Emenda do Divórcio, não fez menção expressa quanto a revogação dos demais artigos infraconstitucionais do Código Civil e da Lei 6.515/77, que disciplinam o instituto da separação judicial, mesmo porque os efeitos produzidos por cada instituto, seja do divórcio ou da separação, são diferentes, cabendo aos cônjuges a escolha entre um ou outro, e não ao Poder Judiciário impor aquele que julgar oportuno ou conveniente, já que, como dito, ainda existe previsão legal que ampara ambas as possibilidades. Nesse sentido, torna-se imprescindível traçar um paralelo entre a Emenda e em como se dá a revogação de Lei no Brasil: uma Lei passa a existir tão logo se reste publicada, evidentemente, respeitada sua vacatio legis, se for o caso. Entretanto, são raras as Leis que estabelecem um lapso temporal de vigência, sendo, em sua maioria, de validade indeterminada. Dessa forma, a vigência de uma Lei se estende até que uma Lei posterior venha a aboli-la ou substituí-la, o que se encontra devidamente disciplinado no artigo 2° da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro: “Art. 2° Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revo-

Assim, em regra, a revogação deve ser expressa, tendo, inclusive, a Lei Complementar n. 95 de 1998, cuidado do assunto, a título de orientação ao legislador, a fim de remediar uma situação de insegurança, dispondo em seu artigo 9° que: “A cláusula de revogação deverá enumerar, expressamente, as leis ou disposições legais revogadas.” (BRASIL, 1998). Dessa forma, encontra-se vedada a revogação genérica, o que não acontece, entretanto, com a tácita, que permanece nos casos de incompatibilidade da nova Lei com a antiga, face que o ordenamento jurídico não pode abrigar contradições ou dupla orientação dentro de uma mesma matéria. Corroborando com o esposado e retomando o tema analisado, tem-se que os artigos infraconstitucionais do Código Civil e da Lei 6.515 de 1977 que disciplinam a separação de direito (judicial e extrajudicial) permanecem, portanto, munidos de sua validade formal e material, estando aptos a produzirem todos os efeitos a eles inerentes, uma vez que a Emenda Constitucional n. 66 de 2010 não fez, em seu texto, menção alguma a revogação dos mesmos, e no mais, esses, não abrigam qualquer contradição ou dupla orientação dentro de uma mesma matéria, não sendo, assim, o caso de revogação tácita. Ademais, cabe evidenciar que essas Leis Infraconstitucionais ao instituírem que a sociedade conjugal termina com a separação ou com o divórcio (este, por sua vez, dissolvendo definitivamente o casamento), conferem direito material aos côn-

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juges de optarem por um ou outro instituto, sem, contudo, em nada confrontar o texto constitucional emendado, que, por sua vez, somente permite a dissolução imediata do casamento pelo divórcio, sem a necessidade do preenchimento de requisitos prévios, anteriormente exigidos. Desta feita, não poderá o Judiciário impor ao cidadão o uso de um ou de outro instituto, uma vez que ambos, tendo por base a Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro, se encontram aptos a produzirem os diferentes efeitos inerente a cada um. Todavia, em uma projeção mais ampla, essa discussão nos remete ainda a outra questão, qual seja, o limite da discricionariedade do Poder o Judiciário; em que se entende que a discricionariedade não deve jamais ser confundida com arbitrariedade. Deste modo, não cabe ao Poder Judiciário pugnar pela inaplicabilidade de tais institutos, face que o legislador não os revogou, tendo em tais um instrumento facultativo àqueles que desejem apenas a dissolução da sociedade conjugal, sem a extinção do casamento. Ademais, cabe, ainda, enfatizar que em muitos países de formação católica, assim, como o Brasil, tais institutos, da separação e do divórcio, aparecem como modalidade alternativa, podendo o cidadão optar pelo que melhor lhe convir. Na França e em Portugal, por exemplo, as causas da separação são as mesmas do divórcio, podendo as partes, livremente, optar por qualquer dos dois institutos, ressalvando ainda nas respectivas legislações a possibilidade de posterior conversão da separação em divórcio. No mais, em uma sociedade pluralista como a brasileira, não há razões para se abolir do ordenamento o instituto da separação, que pode ser utilizado como instrumento facultativo, para aqueles que desejem apenas a dissolução da sociedade conjugal, sem a extinção do casamento. É certo, porém, que

comprovada separação de fato por mais de 2 (dois) anos. Diário Oficial [da] República federativa do Brasil, Brasília, em 13 de julho de 2010. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/ emc/emc66.htm>. Acesso em 02 de maio de 2011. ______. Lei nº 6.515, de 26 de dezembro de 1977. Regula os casos de dissolução da sociedade conjugal e do casamento, seus efeitos e respectivos processos, e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, em 26 de dezembro de 1977; 156º da Independência e 89º da República. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6515.htm>. Acesso em 02 de maio de 2011. ______. Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis, conforme determina o parágrafo único do art. 59 da Constituição Federal, e estabelece normas para a consolidação dos atos normativos que menciona. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 26 de fevereiro de 1998; 177º da Independência e 110º da República. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp95.htm>. Acesso em 02 de maio de 2011. ______. Lei n° 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 10 de janeiro de 2002; 181o da Independência e 114o da República. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em 02 de maio de 2011. CARVALHO, Dimas Messias de. Divórcio: Judicial e Administrativo de Acordo com a Emenda Constitucional 66/2010 e a Lei 11.698/2008 (Guarda Compartilhada). Belo Horizonte: Del Rey, 2010. DIAS, Maria Berenice. Divórcio Já!: Comentários à Emenda Constitucional 66, de 13 de julho de 2010. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. ______. Manual de Direito das Famílias. 5ª edição revista, atualizada e ampliada - 2ª tiragem. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.

não haverá mais espaço, diante da possibilidade de divórcio imediato, para discussão de culpa entre os cônjuges ou análise de lapso temporal, o que, entretanto, não significa dizer que o instituto da separação tenha sido revogado. REFERÊNCIAS BRASIL. Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942. Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Rio de Janeiro, 4 de setembro de 1942, 121° da Independência e 54o da República. Disponível em <http://www.planalto. gov.br/ccivil/Decreto-Lei/Del4657.htm>. Acesso em 02 de maio de 2011. ______. Emenda Constitucional nº 66, de 13 de julho de 2010. Dá nova redação ao §6º do art. 226 da Constituição Federal, que dispõe sobre a dissolubilidade do casamento civil pelo divórcio, suprimindo o requisito de prévia separação judicial por mais de 1 (um) ano ou de

DIMOULIS, Dimitri. Manual de Introdução ao Estudo do Direito. 3ª edição revisada, atualizada e ampliada. São Paulo: editora Revista dos Tribunais, 2010. MADALENO, Rolf. Curso de Direito de Família. 2ª edição revisada e atualizada, inclusive com a lei da guarda compartilhada (Lei nº 11.698, de 13 de julho de 2008). Rio de Janeiro: Forense, 2008. NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. 32ª edição revisada e atualizada de acordo com o Código Civil, Lei n° 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2010. PORTAL SÃO FRANCISCO. Concílio de Trento. Disponível em <http:// www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/contra-reforma/concilio-de-trento. php>. Acesso em 29 de dezembro de 2010.

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SOARES, Oscar de Macedo. O Casamento Civil: Decreto n. 181 de 2 de janeiro de 1890 – Comentado por Oscar de Macedo Soares. 4ª edição. Rio de Janeiro: Livraria Garnier, 1908.

NOTAS DE RODAPÉ 1 Mestrando em Processo Civil, Especialita em Processo Civil, Professor do Centro Universitário Newton Paiva das Disciplinas Processo Civil (Cautelares e Procedimentos Especiais), Teoria Geral do Processo e Professor Orientador do Centro de Exercícios Jurídicos (CEJU). 2 Graduanda do 9º período do curso de Direito da Faculdade de Cienências Socias Aplicadas - Centro Universitário Newton Paiva. 3 O 19º Concílio Ecumênico da Igreja, mais conhecido como Concílio de Trento foi convocado pelo Papa Paulo III com a bula Laetare Jerusalem em 19 de novembro de 1544 e foi aberto em 13 de dezembro de 1545, com a finalidade de condenar os erros em matéria de fé, reprimir os abusos, reconstituir da unidade da Igreja, estabelecer a cruzada contra os turcos, e estreitar a união da Igreja. O Concílio reuniu na cidade de Trento, no Tirol italiano os teólogos mais famosos da época, que elaboraram vários decretos, que mais tarde formam analisados por bispos em sessões privadas. Assim, o Concílio de Trento, também chamado de Concílio da ContraReforma, condenou a doutrina protestante, proibiu a intervenção dos príncipes nos negócios eclesiásticos e a acumulação de benefícios. Definiu o pecado original e declarou, como texto bíblico autêntico, a tradução de São Jerônimo, denominada “Vulgata”. Manteve os sete sacramentos, o celibato clerical e a indissolubilidade do matrimônio, o culto dos santos e das relíquias, a doutrina do purgatório e as indulgências e recomendou a criação de escolas para a preparação dos que quisessem ingressar no clero. Com diversas interrupções, o concílio terminou em 1563, sendo o mais longo da história da Igreja. Portugal, e conseqüentemente o Brasil que ainda era sua colônia, Espanha, Polônia e os Estados italianos formam os primeiros países a aceitarem, incondicionalmente, as normas e dogmas tridentinas. (PORTAL SÃO FRANCISCO. Concílio de Trento. Disponível em <http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/contra-reforma/ concilio-de-trento.php>. Acesso em 29 de dezembro de 2010.) 4 Art.88. – O divorcio não dissolve o vinculo conjugal, mas autoriza a separação indefinida dos corpos e faz cessar o regime dos bens, como se o casamento fosse dissolvido. (SOARES, Oscar de Macedo. O Casamento Civil: Decreto n. 181 de 2 de janeiro de 1890 – Comentado por Oscar de Macedo Soares. 4ª edição. Rio de Janeiro: Livraria Garnier, 1908, página 101.)

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MARXISMO E RECONHECIMENTO: as críticas de Axel Honneth à noção de reconhecimento no pensamento de Karl Marx Márcio Eduardo da Silva Pedrosa Morais1

RESUMO: Tem-se por objetivo, por intermédio do presente artigo, discorrer sobre a concepção de reconhecimento no pensamento de Karl Marx (1818-1883) como também apresentar as críticas direcionadas por Axel Honneth à concepção marxista de reconhecimento. Deste modo, inicialmente será abordada sucintamente a teoria da luta por reconhecimento de Axel Honneth para depois serem apresentadas as características do reconhecimento no pensamento de Karl Marx como também as referidas críticas direcionadas por Honneth à noção marxista de reconhecimento. PALAVRAS-CHAVE: Dialética; Luta de classes; Marxismo.; Reconhecimento; Trabalho.

1 INTRODUÇÃO

a dimensão das relações de reconhecimento do amor, que es-

A questão do reconhecimento tem sido debatida, atualmen-

tão sustentadas estruturalmente na dimensão da natureza afetiva

te, por diversos teóricos da Teoria do Direito, salientando, ape-

e dependente da personalidade humana, encontrando Honneth

sar disto que, o debate foi travado por pensadores anteriores à

seus primeiros elementos de sua teoria na categoria da Depen-

contemporaneidade, como Hegel e Karl Marx.

dência Absoluta de Winnicott. De acordo com Saavedra (2006):

Neste sentido, tem-se, modernamente, em Axel Honneth um

Honneth pretende, portanto, demonstrar que o tipo de

dos teóricos contemporâneos que se preocupam com a referida

reconhecimento característico das sociedades tradicio-

temática, a qual foi debatida, principalmente, em sua obra A luta

nais é aquele ancorado na concepção de status: em

por reconhecimento: a gramática moral dos conflitos sociais,

sociedades desse tipo um sujeito só consegue obter re-

Axel Honneth (2009) utiliza-se da reconstrução das ideias de

conhecimento jurídico quando ele é reconhecido como

Mead e do jovem Hegel para delimitar o pano de fundo teórico

membro ativo da comunidade e apenas em função da

sobre o qual irá desenvolver a sua teoria da sociedade. Assim,

posição que ele ocupar nesta sociedade. Honneth re-

de acordo com Giovani Agostini Saavedra (2006):

conhece transição para modernidade uma espécie de

A interpretação que Honneth faz da teoria destes au-

mudança estrutural na base da sociedade, à qual cor-

tores deixa claro que uma teoria da sociedade como

responde também uma mudança estrutural nas relações

aquela que Honneth pretende desenvolver deve partir

de reconhecimento: ao sistema jurídico não é mais per-

do princípio que as relações de reconhecimento con-

mitido atribuir exceções e privilégios às pessoas da so-

têm pretensões normativas na sua estrutura, que pos-

ciedade em função do seu status. Pelo contrário o siste-

sibilitam o esclarecimento da mudança social. (SAAVE-

ma jurídico deve combater estes privilégios e exceções.

DRA, 2006, p. 18).

O direito então deve ser geral o suficiente para levar em consideração todos interesses de todos os participantes

Assim, nos capítulos 5 e 6 de A Luta por reconhecimento

da comunidade. A partir desta constatação, a análise do

encontra-se de forma explícita uma explicação sistemática da

direito que Honneth procura desenvolver consiste basi-

teoria da sociedade de Honneth. Nos referidos capítulos Honne-

camente em explicitar o novo caráter, a nova forma do

th explica como, no seu entendimento, surge e está constituída

reconhecimento jurídico que surgiu na modernidade.

a estrutura tripartida das relações de reconhecimento. Todavia,

(SAAVEDRA, 2006, p. 20).

Honneth não objetiva apresentá-la de forma puramente teórica, objetivando conferir à mesma plausibilidade, para isso o mesmo

Honneth objetiva mostrar que, junto com o surgimento de

irá comparar suas afirmações com os estudos empíricos e psi-

uma moral ou de uma sociedade pós-tradicional, houve também

canalíticos de Donald W. Winnicott.

uma separação da função do direito e daquela do juízo de valor

Nestes termos, primeiramente, Honneth objetiva apresentar

(Wertschätzung). Na teoria de Ihering e na tradição pós-kant de

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diferenciação de duas formas de Respeito (Achtung), principal-

mente experimentar-se a si mesmo como um indivíduo a que

mente com base na pesquisa de Darwalls, pode-se encontrar

pertencem de maneira positiva determinadas capacidades,

elementos para determinar a diferença entre direito e juízo de

mas também se conceber como uma pessoa em condições

valor. (SAAVEDRA, 2006).

de satisfazer as carências de um parceiro concreto da intera-

Assim, para o direito a pergunta central é: como a proprie-

ção. (HONNETH, 2009).

dade constitutiva das pessoas de direito deve ser definida; no

É nesse sentido que Marx interpreta o capitalismo, segun-

caso do juízo de valor: como se pode desenvolver um sistema

do Honneth, como monopólio dos meios de produção por uma

de valor que está em condições de medir o valor das proprie-

única classe social, a burguesa, a qual, com isso, é responsável

dades características de cada pessoa (Honneth, 2003: 183 ss.).

por uma ordem social que destrói necessariamente as relações

Deste modo, os sujeitos de direito necessitam estar em condi-

de reconhecimento entre os homens mediadas pelo trabalho,

ções de se desenvolver sua autonomia, para que possam de-

já que separa os meios de produção de quem realmente pro-

cidir racionalmente sobre questões morais. Todavia, essas são

duz, impedindo os trabalhadores de controlar sua própria ativi-

apenas algumas questões basilares trazidas por Honneth na sua

dade. O conflito social resultante deste contexto deve então ser

obra, o que não será aprofundado aqui, tendo em vista o fato

entendido como uma luta por reconhecimento, é o que pensa

de ser outro o objetivo do presente artigo: o reconhecimento e

Marx voltando-se para a dialética do senhor e o escravo, e ao

a crítica de Axel Honneth à noção de reconhecimento no pensa-

conceber os confrontos sociais de sua época como uma luta

mento de Karl Marx.

dos trabalhadores oprimidos em busca do restabelecimento das relações de reconhecimento, uma luta moral, portanto.

2 CONSIDERAÇÕES DE AXEL HONNEHT À

Para Honneth, o jovem Marx se inspira no modelo de con-

NOÇÃO DE RECONHECIMENTO NO PENSAMENTO MARXISTA

flito da Fenomenologia hegeliana, porque cria um conceito an-

Axel Honneth identifica em Marx pelo menos três momentos

tropológico de trabalho no qual está inserido a noção de reco-

em que a idéia de uma luta por reconhecimento se faz presente.

nhecimento intersubjetivo e autorealização pessoal, pois pela

1) nos Manuscritos parisienses; 2) nos escritos sobre a teoria eco-

produção própria o homem não só se realiza a si mesmo como

nômica como O Capital, e no Marx maduro; 3) através dos seus

também antecipa o outro como co-sujeito carente, ou seja, reco-

escritos históricos como o Dezoito Brumário de Luís Bonaparte.

nhece-o afetivamente como parceiro de interação. Se a atividade

De acordo com Honneth, Marx não teve contato com a Real-

capitalista impede a realização no trabalho, impede também as

philosophie, mas sim com a Fenomenologia, o que marca para

possibilidades de relações de reconhecimento recíproco, o que

Honneth um ponto decisivo na compreensão que aquele terá da

justifica moralmente a busca pela restauração dessas relações.

tese hegeliana. Neste sentido, Honneth (2009) afirma que:

Honneth acredita que o jovem Marx, para construir essa pri-

Marx [...] retoma nos Manuscritos parisienses a ideia de

meira formulação da teoria da luta de classes, precisou usufruir de

uma luta por reconhecimento somente na versão estrei-

elementos da antropologia romântica da expressão, do conceito

ta que havia assumido na dialética do senhor e o escra-

feuerbachiano de amor e da economia política inglesa, o que já

vo; com isso, porém, ele sucumbiu, já no começo de

aponta para os inúmeros aspectos problemáticos que essa formu-

sua obra, à tendência problemática de reduzir o espec-

lação terá, além da pesada carga de especulação filosófico-histó-

tro das exigências do reconhecimento à dimensão da

rica contida nela. Nesse modelo de uma “estética da produção”,

auto-realização no trabalho. (HONNETH, 2009, p. 230).

o conflito social se daria única e exclusivamente pela restauração das relações recíprocas de reconhecimento na esfera do trabalho.

Para Marx o próprio ato do trabalho, compreendido de forma

Mas Marx passa a adotar logo outra concepção de traba-

normativa, traz em si uma carga de reconhecimento intersubjetivo.

lho, de acordo com Honneth, pois abandona suas premissas

Na produção de um objeto, o sujeito experiencia-se como indiví-

especulativas ao mesmo tempo em que admite que dimensionar

duo dotado de capacidades positivas, já que produtoras, além

o reconhecimento exclusivamente na esfera do trabalho signifi-

de conceber-se como sujeito que possui qualidades pelas quais

cava tornar unilaterais as relações de reconhecimento entre os

um outro parceiro de interação satisfaz suas carências. Na auto-

homens. Assim ele pode redefinir seu conceito de conflito, mas

realização do trabalho as pessoas reconhecem a si e aos outros.

isso ele o faz estreitando ainda mais sua teoria moral. Segundo

Marx fala da “dupla afirmação” que um sujeito experimen-

Honneth, [...] na análise do capital, ele [Marx] faz com que a lei

ta em relação a si mesmo e a um outro por intermédio do

de movimento do embate entre as diversas classes seja deter-

trabalho: no espelho do objeto produzido, ele pode não so-

minada, de acordo com seu novo quadro conceitual, pelo anta-

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gonismo de interesses econômicos. (HONNETH, 2009, p. 235).

relações de reconhecimento, que realmente atravessam as rei-

Isso introduz aspectos do pensamento utilitarista na filoso-

vindicações dos grupos. Sem essa preocupação os conflitos

fia social de Marx, pois significa o abandono da tese hegeliana

não podem gozar de uma carga normativa que os justifiquem

da luta por reconhecimento em favor de um modelo tradicional

além de suas pretensões, pois permanecem relativas às exigên-

de luta por auto-afirmação. A concepção de conflito moral que

cias dos grupos ou classes envolvidas.

emergia contra a extinção das relações de reconhecimento recí-

Desse modo, Marx, na visão de Honneth, guarda em si duas

proco, agora dá lugar ao conflito originado pela concorrência de

concepções de conflito: a do princípio de que eles são condicio-

interesses econômicos.

nados exclusivamente por interesses econômicos, e a de que

Na obra O Capital Marx desenvolve a crítica da economia

eles se originam em razão da busca relativista de objetivos de

política atinando apenas para o modo como a luta social dos

auto-realização; “entre os dois modelos de conflito que se cho-

trabalhadores deve se organizar em vista da autonomização do

cam assim em sua obra madura, a abordagem utilitarista dos

capital, de acordo com os interesses “objetivos” específicos da

escritos de teoria econômica e a abordagem expressivista. [...],

classe proletária. O que causa, para ele, a relativa “cegueira”

o próprio Marx não pôde mais criar, em lugar algum, um vínculo

em relação à luta pela ampliação das pretensões jurídicas do

sistemático” (HONNETH, 2009, p. 239).

proletariado. Liberdade e igualdade nunca puderam passar para

Dessa forma ele acredita que Marx tenha compreendido a

Marx, de idéias burguesas serventes ao modo de produção ca-

luta de classes apenas como justificada com termos como “dig-

pitalista, o que tornava injustificável, em absoluto, uma luta por

nidade” e “honra”, no entanto, sem apontar para as diversas for-

reconhecimento jurídico (SAAVEDRA, 2009).

mas possíveis de reconhecimento e suas ampliações históricas.

Honneth enxerga que Marx passou por um outro momento

Resumidamente, pode-se definir a dialética hegeliana como: su-

no qual redefiniu o conceito de conflito (ou, de certa forma, inte-

cessivamente: momento da afirmação, o momento da negação

ração). Trata-se das obras maduras em que analisa não a teoria

e o momento da negação da negação. Por sua vez, pode-se

econômica, mas a teoria histórica e política. Neste momento sua

definir a dialética marxista como: extinção do que é negado e

concepção de conflito social deixa abarcar formas de vida cultu-

sua substituição por algo novo (comunismo). não há um ciclo

ralmente partilhadas de diferentes grupos sociais, e examina toda

que se renova como em Hegel, mas sim um momento que deve

possível influência sobre o modo como grupos oprimidos enxer-

ser o momento final: a ascensão do comunismo.

gam sua própria condição e partem para a resistência política. Contrariamente aos seus escritos econômicos, Marx tem

3 CONCLUSÃO

que mudar o seu foco explicativo, tendo em vista que os confli-

A questão do reconhecimento é, sem dúvida, uma das mais

tos sociais emergentes de diferentes formas de vida claramente

importantes e interessantes tarefas da Filosofia do Direito con-

não buscam meramente a persecução de simples interesses,

temporânea, principalmente levando-se em consideração a rea-

mas são dependentes das convicções axiológicas próprias de

lidade da sociedade atual, a qual possui elementos e indivíduos

cada grupo, mantenedoras de sua identidade. Honneth acredita

que objetivam seu reconhecimento e o merecem também, sim-

que este modelo de conflito, tido como “expressivista”, está con-

plesmente pelo fato de estarem engajados em uma sociedade

tido nos estudos históricos sobre o Dezoito de Brumário e sobre

pluralista. Deste modo, Axel Honneth elabora uma teoria inte-

as lutas de classes na França.

ressante e plausível, ancorada nas ideias de Mead e do jovem

O termo expressivista deve-se ao fato de Marx interpretar

Hegel, passando-se também por outros teóricos.

a luta de classes agora, em total oposição aos seus escritos

Ao se analisar a questão do reconhecimento em Karl Marx,

teóricos sobre o capitalismo, como uma cisão ética. A luta so-

Honneth percebe algumas fragilidades no pensamento marxista,

cial se dá, por este modelo, de forma dramatúrgica entre grupos

o qual se baseia em uma visão econômica do reconhecimento:

possuidores de valores distintos e assume a forma de confronto

ou seja, para Honneth, Marx visualizou o reconhecimento em

por auto-realização coletiva; nesse caso, não haveria propria-

apenas um prisma, o que fragilizou seu pensamento. Ou seja,

mente exigências morais capazes de serem garantidas por uma

Honneth acredita que Marx tenha compreendido a luta de clas-

resolução social, mas antes uma etapa daquela eterna luta entre

ses apenas como justificada com termos como “dignidade” e

valores incongruentes a priori.

“honra”, no entanto, sem apontar para as diversas formas pos-

Este paradigma, para Honneth, pode se aproximar do da luta por reconhecimento de Hegel, mas não se preocupa em

síveis de reconhecimento e suas ampliações históricas, o que limita a visão reconhecimento.

descrever quais os conteúdos morais, relativos à estrutura das PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 59


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BERLIN, Isaiah. Karl Marx: sua vida, seu meio e sua obra. São Paulo: Siciliano, 1978. BRASIL. Manual de redação da presidência da república. 2. ed. Brasília: Presidência da República, 2002. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário Aurélio da língua portuguesa. 2. ed. rev. ampl. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986. FRIEDRICH, Carl J. Uma introdução à teoria política. Rio de Janeiro: Zahar, 1970. HONNETH, Axel. Luta por reconhecimento: a gramática moral dos conflitos sociais. 2. ed. São Paulo: 34, 2009. MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Manifesto do partido comunista. 11. ed. Petrópolis: Vozes, 2001. MARX, Karl. Manuscritos econômico-filosóficos. São Paulo: Martin Claret, 2002. NAVES, Márcio Bilharinho. Marx: ciência e revolução. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2008. PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS. Pró-Reitoria de Graduação. Sistema de Bibliotecas. Padrão PUC Minas de normalização: normas da ABNT para apresentação de artigos de periódicos científicos. Belo Horizonte, 2010. Disponível em <http://www.pucminas.br/ biblioteca/>. Acesso em: 12 dez. 2010. data de acesso. SAAVEDRA, Giovani Agostini. Hermenêutica constitucional, democracia e reconhecimento: desafios da teoria da constituição contemporânea. Revista Brasileira de Direito Constitucional – RBDC, n. 7, v.1 - jan./jun. 2006.

NOTAS DE RODAPÉ 1 Professor universitário nos cursos de Direito da Faculdade Asa, Faculdade de Pará de Minas e Universidade de Itaúna. Especialista em Ciências Criminais, mestre e doutorando em Teoria do Direito na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Pesquisador da Universidade de Itaúna (CNPQ). Advogado.

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MEIO AMBIENTE DO TRABALHO: UMA BREVE ANÁLISE NA HISTÓRIA SOBRE A SAÚDE DO TRABALHADOR Camila Cristina Azevedo Castro Teixeira1 Emerson Luiz de Castro ²

RESUMO: Com o surgimento da necessidade de maior desenvolvimento por parte das comunidades, tendo em vista, entre outros aspectos, o crescimento populacional, o aumento da produção trouxe uma nova perspectiva no que tange o antigo modelo de subsistência existente. Devido à maior procura de bens e produtos houve grande crescimento da mão de obra empregada e por se tratar o trabalho de uma relação jurídica com o passar do tempo surgem conflitos e com eles a necessidade expressa de atenção e regulamentação. Desta forma, é possível verificar que nossa história caminha para a criação de medidas protetivas que visam tornar o meio ambiente laboral mais seguro, visando o bem-estar, a segurança e a saúde do trabalhador. PALAVRAS-CHAVE: Ambiente de trabalho; Acidentes de trabalho; Direito do Trabalho; Relações Trabal

1. Introdução

aumento na produtividade e crescente desenvolvimento industrial.

As referências quanto á segurança e saúde do trabalhador

Temos como primeiro ato que desencadeia o desenvolvi-

existem desde os tempos mais remotos, quando o homem come-

mento industrial do homem, a atividade desenvolvida por ele de

çou a se organizar socialmente e descobriu a necessidade de pro-

confeccionar armas para a caça e defesa pessoal; posterior-

curar novos caminhos rumo ao desenvolvimento. Quando outrora

mente temos a descoberta da produção dos metais como ferro

vingavam as antigas civilizações, não vislumbrava o trabalhador

e aço e em seguida temos o desenvolvimento da extração por

do mínimo necessário de proteção, tendo em vista a forte idéia

si só, para um cultivo mais elaborado para fins de subsistência.

de dominação e subjugação existente nas grandes civilizações.

Tem-se também um crescimento na prática do cultivo de vege-

Pouco se registrou sobre o tema, mas o que se têm nos

tais e o início da criação de animais.

escritos antigos já demonstra uma rotina de trabalhos pesados

Com estas e outras descobertas, precisava-se de trabalha-

e aviltantes que eram aferidos a escravos e pessoas de baixa

dores para dar fomento a tais atividades e por ser o trabalho

classe social.

imputado ás classes subalternas, esta se viu prejudicada devido aos abusos, pois o trabalho que lhe era conferido era pesado

2. DOS PRIMÓRDIOS

e muitas vezes perigoso, não restando para aquele quesofria o

É sabido que foi por interesse notadamente próprio que o

infortúnio laboral qualquer tipo de amparo.

homem se ingressou no que hoje denominamos trabalho e é

O objetivo primitivo do homem se prestava apenas no que

certo que o homem sempre trabalhou, tendo em vista suas ne-

tange a posse nas atividades de caça e cultivo, porém já nesta

cessidades pessoais e coletivas.

época, é possível observar um contínuo crescimento das popu-

Com o crescimento das comunidades, pouco se falava so-

lações, que já não se bastavam com as técnicas ainda rudimen-

bre a saúde e a segurança do trabalhador, que com o surgi-

tares existentes, sendo necessário que o homem se lançasse

mento das diferentes classes sociais, nem era considerado um

em um plano superior de desenvolvimento e procurasse novas

ser humano. As diferenças sociais levaram a percepção de uma

formas para suprir suas necessidades e anseios.

figura com mais poder e de outra com menos poder, uma figura subjugadora e outra subjugada, um dominador e um dominado.

4. Das lutas tribais Como a evolução é um acontecimento inevitável em nossa

3. Surgimento das atividades industriais:

sociedade, que se fez, se faz e ainda muito se fará com o passar

ausência de amparo ao trabalhador

dos séculos; a idéia de domínio passou a arraigar a mentalida-

Observando a linha de evolução, temos com o desenvolvi-

de dos homens e lutas tribais passaram não mais a significar

mento da sociedade, tanto histórico, intelectual e econômico um

pequenas guerras, mas sim ideais de sobrevivência e suprema-

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 61


cia daqueles que buscavam maiores espaços territoriais, terras

dentes de trabalho.

mais férteis e materiais de subsistência. Do simples extermínio de uma sociedade inimiga, passou

6. Idade Média

a entender o homem a funcionalidade da escravidão. Então a

No período da Idade Média, temos a servidão como um

sociedade vencedora subjuga a sociedade perdedora para que

marco evolutivo nesta sistemática, posto que o servo encontra-

esta trabalhe e produza riquezas em prol da sociedade que a

va-se em um patamar entre os escravos e o homem livre. Tais

dominou. A prática escravagista passou a se mostrar eficiente,

figuras intermediárias que exerciam a atividade laboral da época

além de barata, e posteriormente passou a ser vista como um

possuíam titularidade para realizar relações jurídicas (como por

mercado de trabalho lucrativo.

exemplo, o casamento), porém as restrições que tais “trabalha-

Como o trabalho era considerado uma atividade vil, a qual

dores” sofriam ainda eram muito severas.

se aplicava as classes subalternas, as atividades mais pesadas

A servidão é o modelo constitutivo das sociedades feudais

e perigosas passaram a ser praticadas pelos escravos adquiri-

e se pautavam nas relações que inicialmente existiam entre os

dos nas guerras. Assim sendo, por ser o escravo considerado

colonos e os proprietários das terras. Os servos eram trabalha-

uma coisa/objeto, estes poderiam ser mortos ou mutilados por

dores rurais que trabalhavam na terra do senhor feudal á quem

seus donos e desta forma, na ocorrência de infortúnios devido a

deviam lealdade e subordinação em troca de proteção e permis-

um acidente de trabalho não havia nada que os amparasse ou

são para usar a terra para sua subsistência e moradia.

punisse seu amo, tornando-se o infortúnio resultante do trabalho

A economia feudal possuía base agrária e por este fato a

uma eventualidade corriqueira, sem que se fale em punição no

terra, denominada feudo, era considerado o bem de maior va-

tocante dos abusos cometidos pelos patrões.

lor. Outras atividades econômicas também passaram a se de-

Têm-se referências, em escritos históricos, como as obser-

senvolver, porém a agricultura era a atividade mais importante.

vações clínicas de Hipócrates (460-375 a.C.), grande médico da

A exploração servil dava fomento a tais atividades ao mesmo

antiguidade, sobre deformações físicas, enfermidades e seqüe-

tempo que o servo se via preso á terra, obrigado a obedecer

las provenientes da prática abusiva, que levava o escravo a se

cegamente o senhor feudal proprietário do feudo.

esforçar ao máximo devido às exigências dos seus donos.

Ainda nesta época o trabalho era considerado aviltante e,

Deve-se ressaltar que não só os escravos viviam as mar-

portanto, os nobres, clérigos e senhores feudais não trabalha-

gens do risco proveniente da atividade laboral, mas também

vam, deixando toda a produção por conta dos servos, que traba-

aqueles que provinham das camadas mais baixas da sociedade

lhavam por longos períodos sem descanso, pagavam impostos

se subjugavam ao mando de um patrão abusivo, que não se

e ainda tinham que entregar a maior parte de sua produção para

obrigava a prestar qualquer tipo de proteção na ocorrência de

o senhor feudal ao qual servia.

infortúnios e doenças adquiridas em razão da atividade laboral exercida pelo trabalhador.

O descaso para com estes trabalhadores também cominava em desastrosas conseqüências para tal classe hipossuficiente, tendo em vista que na ocorrência de infortúnios laborais os

5. A “Lex Acquilia” no Direito Romano

mesmo não se viam amparados por qualquer mecanismo, bem

Remontando-se ao grande arcabouço de nosso direito, o

como se observa ao se tratar dos escravos.

Direito Romano, verifica-se que também nessa sociedade o trabalhador não era digno de amparo, por se tratarem de pessoas de classes baixas e escravos.

7. A Revolução Industrial Sensíveis mudanças se verificaram nas relações de

Porém, com o surgimento da Lex Acquilia vislumbra-se uma

trabalho,com o surgimento de máquinas que vieram a substituir

pequena mudança neste modelo, onde se têm o início da pro-

a tecnologia escrava, quando o trabalho passou a ser assalaria-

teção contra o infortúnio laboral. Menciona ainda esta lei, sobre

do e o trabalhador passou a ser visto como um consumidor em

a morte de escravos alheios e casos de assistência á doenças

potencial da nova indústria que veio a insurgir dando forma ao

ocasionadas pelo trabalho. No âmbito da doença profissional

desenvolvimento procurado pelo homem.

o Direito Romano foi limitado, não se interessando muito pela regulamentação da mesma. Posteriormente muitos povos, após os Romanos, aproveitaram tais idéias, bem como o conceito de culpa imputado pelos Romanos na concepção da responsabilidade aplicada aos aci-

O conceito de trabalho então tornou-se outro. Não se considerava vil a atividade laboral e a dignidade do trabalhador, com o início da nova Era Social instaurada pela Revolução Industrial, passou a ser importante. Neste momento da história, o Estado ficou encarregado de

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prestar auxílio e garantir o bem-estar da coletividade, criando

A desumana organização do trabalho até então empregada,

desta forma, se necessário, limitações aos interesses pessoais,

resultou na eclosão de rebeliões da classe trabalhadora, fartos

para a proteção dos fracos, até então desamparados.

dos abusos que há séculos sofriam.

Assim sendo, com o sentido social atribuído ao trabalho,

Relatos de lutas para a libertação e melhores condições de

foram criadas regras de interrelacionamento, onde a vertente

trabalho para o empregado surgiram em todo o mundo, notada-

protetiva do trabalhador começou a tomar forma.

mente na Inglaterra, Alemanha e França.

A Revolução Francesa trouxe a esse momento histórico uma série de novos conceitos e a supressão de várias injustiças

9. O reconhecimento da responsabilidade

sociais que assolavam os trabalhadores. Porém, mesmo com

sobre a saúde do trabalhador

todo este avanço, ainda se encontrava o trabalhador em péssi-

Temos que os acidentes e doenças do trabalho tinham

mas condições.

como principal fundamento a responsabilização do emprega-

Com a evolução da Revolução Industrial, temos o surgi-

dor. Como uma tentativa de regulamentar tal situação, tendo

mento de máquinas mais modernas que vieram a substituir as

em vista a insatisfação dos trabalhadores, foram criadas teorias

pesadas e perigosas máquinas rudimentares. Mas mesmo as-

com o escopo de efetivar o amparo ao trabalhador vítima do

sim, os riscos de acidentes eram grandes, tendo em vista que

sinistro laborativo.

nada se falava em cursos de aperfeiçoamento e treinamento no

Como regra herdada do Direito Romano, temos a Teoria da

manuseio das novas máquinas. Sem mencionar que as novas

Responsabilidade Extracontratual. Tal teoria versa que o dano

máquinas, bem como as antigas, não contavam com métodos

imputado ao empregador ocasionado ao empregado, mesmo

ou dispositivos de segurança.

que não haja a intenção, deve ser reparado. Para tanto, como

Nesta época, mesmo com os vários avanços no âmbito

era responsabilidade do empregador assegurar a segurança de

da percepção da necessidade de proteção ao trabalhador no

seus empregados, bem como o bom desempenho das máqui-

exercício de sua atividade laborativa, o trabalho ainda era muito

nas e instrumentos de trabalho, nada mais justo que na ocor-

mais exigente do que atualmente, sendo que não existia uma

rência do infortúnio laboral que este repare o dano causado ao

legislação que regulamentava a carga horária, descanso nas

empregado.

jornadas de trabalho, o trabalho do menor e de mulheres, bem

Nesta teoria, cabia ao empregado a comprovação da cul-

como as condições do ambiente de trabalho e a periculosidade.

pa do empregador para o resultado infortunístico, desta forma

As condições as quais eram submetidos os trabalhadores eram

verificou-se uma insuficiência quanto á prática, pois sendo o em-

subumanas e o que mais se somava a este dantesco quadro

pregado lado hipossuficiente da relação trabalhista o mesmo se

social era o indigno salário e deploráveis moradias imputadas a

deparava com a dificuldade de tal comprovação no Judiciário.

esta classe hipossuficiente.

Afastava-se então, os acidentes devidos ao caso fortuito e de

É certo que as condições acima mencionadas aumentavam o risco dos sinistros laborais e com a grande incidência de tais

força maior, bem como desconhecia-se as causas que resultavam no acidente.

acidentes, bem como de doenças profissionais, surgiu a neces-

Em contrapartida, surgiu a Teoria da Responsabilidade Con-

sidade efetiva a qual não se podia mais ignorar de criar regula-

tratual, a qual parte do pressuposto que não deve o empregado

mentações que visavam efetivamente a resolução de tais impas-

demonstrar a culpa do empregador, pois os atos que causaram

ses entre o empregado e o empregador quando da ocorrência

dano resultaram tão somente da atividade laboral exercida pelo

do acidente de trabalho ou da doença profissional.

empregado.

O acidente do trabalho e a doença profissional, embora se-

Logo, o substrato de tal teoria deve ao fato de que está pre-

jam sucedâneas do longo trajeto do homem em busca do de-

visto no contrato de trabalho que é dever do empregador zelar

senvolvimento em todas suas vertentes, é contemporâneo da

pela segurança de seu empregado, desta forma a culpa do em-

Revolução Industrial e de sua evolução, com o progressivo uso

pregador resta presumida.

de máquinas no processo industrial.

Com a inversão do onusprobandi, caberia ao empregador provar que os atos lesivos resultaram por culpa do empregado, caso fortuito ou força maior ou em razão de terceiros.

8. Reações dos trabalhadores: Rebeliões Na chamada Era Industrial, temos com o desenvolvimento

Existem críticas sobre tal teoria, com o argumento de que

da maquinaria a subjugação dos trabalhadores a lamentáveis

ao estabelecer uma cláusula de exoneração do empregador no

condições.

contrato de trabalho, inepta ficaria tal teoria. Também critica-se PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 63


o fato de que não pode se falar da presunção de cláusula tácita

profissional, a obrigação que recai sobre o empregador, pois o

de responsabilização aceita pelo empregador ou que mesmo

mesmo ao criar um ambiente de trabalho rodeado por máquinas

havendo a inversão do ônus da prova cabe provar o empregado

e objetos laborais por si só já cria um risco propenso a ocasionar

os danos ocorridos em fatos fortuitos. Permeia também a crítica

acidentes.

de que a aderência a tal teoria abre lacuna para que emprega-

Logo, constitui o risco profissional os acidentes inevitáveis

dos estipulem com empregadores a renúncia de reparação nos

inerentes a qualquer empresa, e assim sendo, deve o emprega-

casos de acidente de trabalho, bem como que se o empregador

dor que obtém o benefício através desse organismo que criou,

conseguir comprovar que agiu com diligência em relação a se-

suportar o ônus do risco proporcionado, tendo em vista que o aci-

gurança de seu empregado, este se veria eximido da responsa-

dente passou a ser uma fato previsível em razão do risco criado

bilidade de indenizar o trabalhador.

pela empresa ao inserir o trabalhador no meio ambiente laboral. E

Surgiu então a Teoria do Caso Fortuito, onde se estende

assim, ficou esclarecido então que o trabalho comporta perigos.

a responsabilidade do empregador aos casos fortuitos. Funda-

Foi através da Teoria do Risco profissional que os empresá-

menta esta teoria na convicção de que aquele que obtém de

rios perceberam a necessidade de cercear seus objetos (máqui-

outrem vantagem provinda de seu trabalho tem o dever de zelar

nas e ferramentas) com medidas de segurança e cursos de pro-

por sua segurança porquanto este lhe preste utilidade. Logo o

fissionalização para seus empregados visando evitar agressões

patrão que se beneficia das utilidades oriundas do trabalho de

físicas e psicológicas ocasionadas em razão do sinistro laboral.

seu empregado deve assumir os riscos que este corre no exer-

É interessante que o dano causado passou de um evento oca-

cício de sua profissão.

sionado pela máquina ou objeto de trabalho para ser um fato da

Na Teoria da Responsabilidade Objetiva ou Teoria do Risco

empresa que, portanto, deve ser ressarcido.

Criado, temos que o empregador responde pelos danos pro-

Como o risco é inerente á todo tipo de trabalho, temos

vocados pela coisa, abandonando-se o elemento subjetivo da

dentro desta teoria a distinção entre riscos específicos e riscos

culpa. Desta forma o elemento que se leva em consideração

genéricos; os riscos genéricos são aqueles que todos os traba-

é material, objetivo; ou seja, recai responsabilização sobre o

lhadores estão sujeitos, já os riscos específicos figuram apenas

empregador não porque o mesmo agiu de forma a não a pro-

para aqueles que estão em contato com determinada indústria.

porcionar segurança ao seu empregado, mas sim pelo fato de

Na Teoria do Risco da Autoridade, temos que a idéia do

que suas coisas/objetos (maquinários, ferramentas, etc.) provo-

risco profissional ainda é o fundamento da responsabilização do

caram o dano.

empregador, porém nesta nova teoria, o empregador não res-

Esta é uma teoria que avançou mais que as outras, pois im-

ponderá pelo fato de ter inserido o empregado em um contexto

põe sobre o proprietário/empresário as conseqüências do caso

(meio ambiente laboral) que por si só representa o risco; a nova

fortuito, porém afasta as hipóteses de acidentes e doenças pro-

idéia é que o fato do empregador ser a autoridade dirigente,

fissionais em que não há a intervenção dos objetos de produção

detentor dos direitos e deveres de organizar a empresa já o im-

do empregador.

puta a obrigação de indenizar a vítima do acidente de trabalho.

Também sem levar em consideração o elemento culpa, te-

Entende-se como autoridade a hierarquia do empregador, o

mos a Teoria do Risco Profissional ou Teoria do Risco Econômi-

vínculo de subordinação que exerce sobre o empregado e sua

co Industrial. Temos com as novas regras de Direito do Trabalho

relação de dependência.

a idéia de que o dano conseqüente do acidente de trabalho de-

Logo, tal teoria não imputa responsabilidade em razão do

veria submeter-se as leis e regulamentos de caráter acidentário

perigo representado pelo exercício da profissão, mas sim pelo

e não mais seriam indenizadas proporcionalmente as lesões

fato de que a autoridade que recebe o lucro não poderá se exi-

sofridas. Desta forma, tal teoria enveredou-se para o seguro so-

mir dos danos causados. Pressupõe tal teoria que onde houver

cial obrigatório, visando a proteção do trabalhador contra danos

autoridade deverá haver responsabilidade, temos que a fonte do

garantida pelo Estado.

risco, neste caso, é a existência da autoridade.

Bem como a Teoria do Caso Fortuito a Teoria do Risco Pro-

Neste contexto existem correntes doutrinárias que enten-

fissional impõe ao empregador a responsabilidade de indenizar

dem a responsabilidade do patrão quando a atividade laboral,

aquele que lhe confere benefício em razão de seu trabalho na

além da que começa e termina no seu ambiente de trabalho, se

ocorrência do sinistro laboral. A diferença entre ambas teorias

estende para fora do mesmo, como é caso dos representantes

supracitadas não passa de simples extensão de conceitos.

comerciais, trabalhadores á domicílio e até mesmo nos casos de

Ficou então estabelecido por meio da definição do risco

acidentes sofridos no caminho ou no retorno do trabalho.

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Também representando um grande avanço, temos a Teoria

Temos ainda como destaque no âmbito jus trabalhista ain-

da Responsabilidade Social, a qual baseia-se diferentemente

da em desenvolvimento, a encíclica Rerum Novarunde 15 de

das demais teorias na responsabilidade coletiva e não individu-

maio de 1891, escrita pelo Papa Leão XIII. Tal encíclica debatia

al. Portanto é dever da sociedade prestar auxílio aos vitimados,

sobre as condições das classes trabalhadores e sobre questões

pois é a sociedade como um todo que se beneficia com as ri-

da Revolução Industrial, entre outras relações importantes. Foi

quezas geradas pelo trabalhador em prol de seu país.

dado a tal encíclica o enfoque na Justiça Social da época que

Denominada de Teoria de Solidariedade Social, Teoria de

viria a complementar outros trabalhos do Papa Leão III.

Socialização do Risco ou Teoria da Seguridade Social, a Teoria

A encíclica Rerum Novarum defendia o direito dos trabalha-

da Responsabilidade Social leva a idéia de que os infortúnios

dores de formarem sindicatos, a melhor distribuição de riquezas

laborais serão amparados através do seguro social.

e a intervenção do Estado em prol dos mais pobres, fez críticas

Como é possível entender, temos que muitos avanços fo-

á falta de princípios e valores éticos na sociedade, sobre a situ-

ram surgindo com o passar do tempo na ceara trabalhista tendo

ação desumana que os trabalhadores se encontravam em razão

em vista que o acidente de trabalho e a doença profissional são

do liberalismo descontrolado, e a corrupção dos costumes cris-

considerados fatos sociais e para tanto devem ser regulamenta-

tãos, ainda fomenta as vantagens que trariam as associações

dos pela legislação.

de previdência dos trabalhadores, entre outras considerações;

A medida que a sociedade foi se desenvolvendo novas regras surgiram, estando o acidente de trabalho vislumbrando

por tais motivos sua grande importância no assunto em questão e a denominação de “Doutrina Social da Igreja”.

cada vez mais a necessidade de regulamentação e ganhando,

É certo que com esse trabalho o Papa Leão III veio a influen-

desta forma, amplitude nas discussões para a progressão do

ciar uma nova relação entre a igreja e a sociedade do século

bem-estar social, já considerado dever do Estado para com a

XIX, onde a Igreja passava a propor soluções para os problemas

sociedade. Assim sendo surgiram, as teorias supracitadas, bem

sociais da época á luz do Cristianismo, bem como anunciava

como a necessidade da conceituação dos termos acatados pela

princípios sobre as injustiças sociais, inserindo-se cada vez mais

nova legislação.

junto ao Estado em um movimento que visava construir uma nova forma de pensamento de que tendia a proteger o próprio

10. O surgimento da proteção ao trabalhador

Estado e a própria Igreja das rebeliões e pensamentos contrá-

Pouco a pouco a postura em relação a desídia em que eram

rios, que estavam se disseminando com a insatisfação das clas-

tratados os trabalhadores cedeu lugar a uma nova postura do Estado, que visava manter um equilíbrio econômico e social.

ses oprimidas. O liberalismo Estatal passou a ser contestado tendo em

Em 1802 surgiu na Inglaterra a Lei de Saúde e Moral dos

vista a política construída por Marx e Engles, o Socialismo. Im-

Aprendizes (Moral and Health Act), também chamada de Pe-

portantes nomes surgiram defendendo essa nova política e em

elsAct, devido ao manufatureiro e membro do Parlamento In-

decadência o Estado Capitalista não viu outra saída a não ser

glês Robert Peels, entendida como a primeira lei de proteção

efetivamente cuidar do bem estar social de toda a sociedade,

aos trabalhadores que regulamentou a limitação de 12 horas de

principalmente voltar suas políticas para o lado hipossuficiente

trabalho, bem como a vedação de trabalho noturno e a obrigato-

da sociedade, entre a qual está inserida a classe trabalhadora.

riedade de se lavar a fábrica duas vezes por ano e proporcionar ventilação no ambiente de trabalho.

Desde então o processo de consolidação da necessidade de implementação de medidas de proteção ao trabalhador se

Posteriormente temos com Robert Owen, considerado pai

viu em constante evolução, chegando aos moldes atuais que

da Legislação do Trabalho, a iniciativa de idéias inovadoras e

ainda assim precisam de atualização e aperfeiçoamento, mas

atuação decisiva em idéias difundidas em seu livro “A New View

que denota uma conquista e uma grande vitória dos trabalhado-

of Society” (em tradução “Uma Nova Visão da Sociedade).

res outrora oprimidos e marginalizados.

No ano de 1833 temos o Factory Act, conhecido como a primeira legislação que denotou eficiência no que se refere a

11. O meio ambiente do trabalho

proteção do trabalhador durante o exercício de seu ofício. Tal le-

É certo que no que tange os acidentes de trabalho e as

gislação postulou idade mínima de 9 anos para o trabalho, bem

doenças adquiridas por trabalhadores em decorrência de seu

como vedação de menores de 18 anos para o trabalho noturno e

oficio muito se devem as condições do meio ambiente laboral o

regulamentou um limite diário de trabalho, qual seja de 12 horas

qual se inseria o trabalhador.

diárias e 69 horas semanais.

As medidas protetivas foram surgindo a medida que voltouPÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 65


se a preocupação á moral e a saúde do trabalhador e desta forma, tais observações evoluíram de plano, tornado-se movimentos e tais movimentos ganharam espaço no contexto social chegando a uma dimensão que exigia providências e não mais se sustentaria do jeito que se encontrava. Voltando um pouco na história, foram com os trabalhos de

lho> . Acesso em 10/2011. Florêncio, Gilbert Ronald Lopes. Novo Dicionário Jurídico. Editora de Direito. 2ª Edição. São Paulo, 2005. Godinho,Mauricio Delgado. Curso de Direito Do Trabalho. 8ª Edição. São Paulo: Editora LTR, 2009.

Bernadino Ramazzini, considerado fundador da Medicina do Trabalho, que se iniciou a sistematização das enfermidades do trabalho. Com o mérito de pioneirismo na questão, Ramazzini, fez importantes registros sobre os ambientes no qual o trabalhador exercia sua atividade; em seus relatos diz ter experimentado de vômitos e dores de cabeça em virtude dos odores de alguns ambientes de trabalho. Assim sendo, com as diversas pesquisas e movimentos

Santos, Gilson Pereira. Direito Ambiental do Trabalho. Editora RTM Ltda. 1ª Edição. Belo Horizonte, 2010.

NOTAS DE RODAPÉ 1 Estudante do 7º período de Direito da Faculdade de Direito Promove. ² Advogado, Mestre em Direito, Professor, Coordenador do curso de Direito do Centro Universitário Newton Paiva.

chegou-se a conclusão que sem dúvida é o organismo do trabalho, ou seja, o meio ambiente laboral, também entendido como o contexto pelo qual está envolto o trabalhador o causador do evento danoso na órbita do trabalho e, desta forma passou o Estado a se ver obrigado a tomar providências para se manter. Conclusão É indubitável que não é possível impedir a ocorrência dos sinistros laborais, e, desta forma, por se engajarem no conceito de fatos sociais, deve-se estabelecer regras para que tais situações danosas sejam regulamentadas e portanto obedecidas pelos empregadores, que durante muitos séculos passaram ilesos quanto aos abusos cometidos contra seus empregados. Como todo tipo de trabalho comporta perigos, nossa história caminha para a criação de medidas protetivas que visam tornar o meio ambiente laboral mais seguro, visando o bem-estar, a segurança e a saúde do trabalhador. Significativos avanços vão surgindo com o passar do tempo visando reparar da melhor forma possível os danos causados em virtude do acidente de trabalho e desta forma, vem trabalhando os profissionais que atuam na ceara do Direito Trabalhista para que as regulamentações já existentes sejam postas em práticas e obedecidas pelo empregador em face ao lado ainda hipossuficiente da relação trabalhista, o empregado. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Brandão, Cládio.Acidente do Trabalho e Responsabilidade Civil do Empregador.Editora LTr. 3ª Edição. São Paulo, 2009. Costa, Hertz Jacinto. Manual de Acidente de Trabalho. Juruá Editora. 4ª Edição. Curitiba, 2009. Espinosa, Ricardo. Evolução histórica da lei sobre acidente de trabalho. Revista Consultor Jurídico, 13 de junho de 2008. Disponível em: < http:// www.conjur.com.br/2008-jun13/evolucao_historica_lei_acidente_traba-

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UMA INTRODUÇÃO AO INSTITUTO JURÍDICO INGLÊS DO TRUST Márcio Eduardo da Silva Pedrosa Morais

RESUMO: Tem-se como objetivo, por intermédio do presente trabalho, discorrer sobre o instituto jurídico inglês do trust, instituto este que possui origem e base histórica, sendo um dos sustentáculos da equity. Assim, o trabalho abordará inicialmente o conceito, características e estrutura do trust. Após a apresentação do conceito, características e estrutura, passar-se-á à exposição da origem, desenvolvimento histórico, natureza jurídica e tipos de trust no direito inglês. É de se salientar que o artigo não abordará a estrutura básica do sistema jurídico inglês de modo amplo, mas ater-se-á ao instituto do trust. PALAVRAS-CHAVE: Direito inglês; Equity; Propriedade; Trust.

das Cortes Reais. Por isso, o desenvolvimento dessa INTRODUÇÃO

competência só se realizou gradativamente e sempre

Ao se iniciar os estudos de um ordenamento jurídico de ori-

permanecendo, na medida do possível, no âmbito das

gem romano-germânica, uma das primeiras características apre-

normas processuais antigas. Os juízes só ampliaram sua

sentadas ao estudioso refere-se à divisão do Direito em público e

competência caso a caso (super casum, on the case); e

privado. No que se refere ao Direito inglês essa divisão não exis-

fizeram-no, principalmente, considerando que a conduta

te; tendo, porém, o mesmo como uma de suas características

do réu apresentava um aspecto quase delitual e permi-

marcantes a distinção entre common law e equity. René David

tindo que o autor, com base nisso, agisse por meio da

(2006), discorrendo sobre o direito inglês, afirma que:

regra processual relativamente satisfatória prevista pela

O direito inglês é o direito aplicado na Inglaterra e no País

common law quando um delito particular, o de trespass

de Gales. Não é o direito dos países de língua inglesa

era alegado. (DAVID, 2006, p. 5).

ou de Commonwealth nem o do Reino Unido ou da GrãBretanha. Os direitos de Commonwealth às vezes são

No século XV as jurisdições locais e senhoriais deixaram

próximos do direito inglês, mas, em outros casos, po-

de ter importância, passando as Cortes Reais, a partir de en-

dem ser bastante diferentes. O direito da Irlanda do Nor-

tão, a possuir competência universal no direito inglês. Todavia,

te e o da Ilha de Man são bastante próximos do direito

até a metade do século XIX, as mesmas eram jurisdições de

inglês, mas o da Escócia é muito diverso, como também

exceção, tendo em vista o fato de que, em primeiro lugar, era

o é o das ilhas anglo-normandas. (DAVID, 2006, p. VII).

necessário conseguir que essas Cortes admitissem sua competência para que, após tal declaração, fossem submetidos a

Em comparação ao sistema romano-germânico, não há na Inglaterra, códigos como os encontrados nos ordenamentos jurídicos de países desse sistema, sustentando os ingleses uma

elas o julgamento do mérito dos litígios. Ainda em relação à origem do direito inglês, Mario G. Losano (1978) traz que:

concepção de direito essencialmente jurisprudencial, ligada ao

Antes do século XI, no território britânico coexistiam nor-

contencioso. O direito inglês, o qual foi elaborado pelas Cortes

mas de origem germânica, ligadas ainda ao domínio dina-

Reais, “[...] apresenta-se aos ingleses como o conjunto das regras

marquês sobre a parte oriental da ilha, e normas de direito

processuais e materiais que essas Cortes consolidaram e aplica-

romano e canônico, introduzidas no momento da cristia-

ram tendo em vista a solução dos litígios.” (DAVID, 2006, p. 3).

nização (664 d.C) e que permaneceriam em vigor até aos

A passagem de um direito feudal para um direito regido

nossos dias para as matérias matrimonial e sucessória. A

pelas Cortes Reais na Inglaterra não se deu sem atritos. Nesse

estes direitos e aos heterogêneos usos locais em vigor

sentido, René David (2006) salienta que:

nos vários estados das duas principais ilhas britânicas

Os senhores feudais, que haviam assumido, em seus

sobrepõe-se em 1066 o direito introduzido na conquista

domínios, a administração da justiça e que arrecadavam

normanda. Este direito unificado é chamado “direito co-

seus ganhos, opuseram-se à extensão da competência

mum”, ou seja, Common Law. (LOSANO, 1978, p. 118).

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A equity, por sua vez, é um conjunto de soluções outorgadas

quais a manterão em benefício de um ou mais de uma pessoa (os

pela jurisdição ao Chanceler, principalmente nos séculos XV e

beneficiários ou cestuis que trust, os quais podem incluir o trustee(s)

XVI, para sanar a insuficiência e os defeitos da common law, com-

ou o doador) […].” (OXFORD, 2003, p. 509-510, tradução nossa ).

pletando e revendo tal sistema, de acordo com a necessidade de

Insta salientar que é difícil para o jurista estudioso e prático

se temperar o rigor da common law. É importante salientar que o

de outros sistemas jurídicos o entendimento do trust. Nesses

Chanceler, ao intervir, não criava novas regras jurídicas, apenas

termos, René David (2002) afirma que:

respeitava a equidade (equity follows the law). (DAVID, 2002).

Na realidade, o trust, como a maior parte dos conceitos e

Guido Fernando Silva Soares (2000) salienta que “a primeira

instituições do direito inglês, explica-se unicamente pela

acepção de common law, é de ‘direito comum’, ou seja, aquele

História. Segundo a common law, o trustee não é um

nascido das sentenças judiciais dos Tribunais de Westminster,

simples administrador dos bens constitutivos em trust.

cortes essas instituídas pelo Rei e a ele subordinadas diretamen-

É, bem pelo contrário, o proprietário dos bens constitu-

te [...]” (SOARES, 2000, p. 32), o que fez com que os direitos

ídos em trust. Administra, por conseguinte, esses bens

costumeiros e particulares de cada tribo dos povos primitivos da

como quer, pode dispor deles a seu modo, não tem

Inglaterra fossem suprimidos.

contas a prestar a ninguém. (DAVID, 2002, p. 398).

Dentre os institutos jurídicos particulares mais importantes do sistema jurídico inglês podem-se citar a agency (representação),

O trust, na maioria dos casos, nasce de um ato expresso de

e o trust. Esses institutos são representativos e ajudam a distinguir

vontade, seja de um só indivíduo ou de um grupo, o qual será

e caracterizar famílias e sistemas jurídicos, imprimindo-lhes um

chamado de settlor of the trust (criador, doador ou testador),

aspecto particular. (MORINEAU, 2004). O trust, nesses termos,

neste caso (testador) quando o trust se estabelecer por inter-

além de originalmente inglês, é uma das instituições típicas mais

médio de um testamento. No que se refere à sua estipulação, o

importantes desse direito (especificamente da equity), não existin-

trust pode surgir ope legis, ou seja, por força de lei, ou de uma

do instituto idêntico em nenhum outro sistema jurídico.

decisão judicial, como também de livre e espontânea vontade

Instituição de grande generalidade e flexibilidade, tão flexível

do settlor of the trust, podendo o trust recair sobre bens móveis e

como o instituto do contrato, o trust tem no antigo direito romano

imóveis, como também sobre bens incorpóreos, como é o caso

algumas instituições com características semelhantes, porém,

dos direitos autorais. (MORINEAU, 2004).

como salientado, não idênticas a ele, como é o caso do usus,

De acordo com a common law a limitação ao direito de proprie-

do usufructus, do fideicomissum e da bonorum possessio. As

dade do trustee não é jurídica, mas sim de ordem moral, ou seja, o

semelhanças dos referidos institutos com o trust são muitas,

administrador do trust (trustee) deve administrar o bem como um

porém, o trust possui características peculiares que fazem do

“pai de família”, seguindo os ditames de sua consciência, devendo

mesmo um instituto original, autêntico.

transferir os lucros, o capital, em dado momento, às pessoas designadas pelo constituinte do trust (settlor of the trust). Assim, segundo

1 Características e estrutura do trust

a common law, o cestui que trust não possui direito algum, não

Ressalta René David (2002) em sua obra Os Grandes Siste-

possui nenhuma ação para fazer valer seus direitos. (DAVID, 2002).

mas do Direito Contemporâneo, que “a noção de trust, desco-

Nesse sentido, René David (2006) salienta que:

nhecida dos direitos romano-germânicos, é uma noção funda-

A common law, sistema de direito formalista e incomple-

mental do direito inglês e a criação mais importante da equity.”

to, não dava valor jurídico ao trust. Se um pai de família

(DAVID, 2002, p. 397). Basicamente o trust apóia-se no seguinte

S (o settlor), preocupado com os interesses de sua fi-

esquema: uma pessoa, aquele que constitui o trust, chamada

lha, transferia os bens a uma pessoa de confiança T (o

de settlor of the trust, determina que um ou vários bens serão

trustee) para evitar que o marido desta os dissipasse,

administrados por um ou vários trustees, no interesse de uma

realizava-se de fato uma transferência de propriedade

ou várias pessoas, as chamadas cestuis que trust. Ressaltando

de S a T, mas o compromisso assumido pelo trustee

DAVID (2002) que o referido acordo é bastante comum na Ingla-

de entregar a renda desses bens à filha do disponente

terra, tendo várias finalidades: “a proteção dos incapazes, da

e, mais tarde, retransferir-lhe a proprieddade dos bens

mulher casada [...].” (DAVID, 2002, p. 398).

(quando o marido viesse a falecer) não era válido, juri-

Consultando o verbete “trust” no Oxford Dictionary of Law

dicamente, pois as jurisdições da common law, em re-

(2003), encontra-se: “Trust (substantivo) 1. Um acordo no qual um

gra geral, não sancionavam os contratos. Portanto, T só

doador transfere a propriedade a um ou mais de um trustees, os

estava obrigado, por sua consciência, a respeitar seu

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compromisso. (DAVID, 2006, p. 102-103).

A frase “ad opus” foi utilizada no latim vulgar para significar “em seu nome”, mais adiante, ad opus passou ao francês

Diante de tal carência da common law, o Chanceler foi soli-

antigo como al oes, ues, para se converter, finalmente no

citado a intervir quando o trustee não agia conforme a confiança

termo inglês use. Na época de Guilherme o Conquistador,

que lhe fora depositada, não explorando os bens em favor do

no seu famoso Domesday Book, encontram-se as expres-

cestui que trust. Deste modo, o Chanceler deu ao trustee a or-

sões ad opus regis, para descrever o recebimento da pos-

dem de respeitar o estipulado no ato constitutivo do trust, sob

se de terras feita por um funcionário real em nome do rei.

ameaça de sofrer uma sanção: ser o trustee “mandado para a

(MORINEAU, 2004, p. 108, tradução nossa ).

prisão”. (DAVID, 2006, p. 103). No caso de alienação de um bem constituído em trust, René

Posteriormente, o termo se generalizou, designando tam-

David (2002) explica que o trust intervirá duplamente para tornar

bém outros casos de representação, aqueles nos quais alguém

efetivo um princípio de sub-rogação, real ou pessoal:

faz algo ou possui algo em nome de outra pessoa. O use me-

Se o trustee alienou a título oneroso os bens constituí-

dieval era usado, principalmente, para a transmissão da terra,

dos em trust, o que recebe em contrapartida é sub-roga-

sendo muito comum a estipulação do uso por um vassalo em

do a esses bens; o trustee será, de futuro, considerado

favor de outras pessoas, para que as mesmas se utilizassem da

como trustee das somas provenientes da sua venda, ou

terra, entregando os frutos a uma terceira pessoa (ou mesmo

dos bens adquiridos com o produto dessa venda. Em

ao vassalo instituidor do uso), podendo-se também estabelecer

segundo lugar, se o terceiro adquirente dos bens os ad-

a destinação da terra para após a morte do vassalo, a qual era

quiriu a título gratuito ou se é um adquirente de má-fé

muitas vezes direcionada aos filhos, principalmente ao filho mais

(ele sabia ou devia saber que o trustee não devia, se-

velho, como também a instituições religiosas.

gundo o ato constitutivo do trust, dispor dos bens como

Era comum também a instituição do uso de terras em con-

o fez), esta circunstância não impede que a propriedade

fiança (in trust) em favor de alguém para que este as transmitisse

dos bens passe para o adquirente; mas considerar-se-á

aos herdeiros do instituidor após sua morte.

que o adquirente, tornado proprietário legal (at law) dos

O use foi utilizado com certeza frequência durante os sécu-

bens, é ao mesmo tempo o trustee e deve, por sua vez,

los XIII e XIV, porém não era reconhecido pelos tribunais reais da

explorá-los no interesse dos beneficiários do trust. (DA-

common law. Deste modo, caso o trustee não cumprisse o es-

VID, 2002, p. 400).

tipulado, não restava recurso jurídico algum ao cestui que trust perante os tribunais da common law, devendo o mesmo recorrer

Assim, conclui-se que o trust é uma relação jurídica de ca-

à jurisdição da equity, perante o Tribunal da Chancelaria. Sobre

ráter fiduciário (ou seja, é uma relação estabelecida tendo como

a abrangência do use na Inglaterra durante os séculos XIV e XV,

base a confiança e a boa-fé), referindo-se à propriedade, pelo

Marta Morineau (2004) traz que:

qual o trustee adquire o título respectivo, ainda que o tenha em

Acredita-se que nos finais do século XIV e com toda se-

favor de outro, gerando assim uma obrigação para o proprietário

gurança para o século XV, a jurisdição de equity com re-

(trustee) em relação ao beneficiário, ou seja, o trustee possui a

lação ao use tornou-se perfeitamente definida, e que ao

obrigação de entregar ao cestui que trust (beneficiário), os frutos

tempo das Guerras das Duas Rosas (1455-1485), quase

da propriedade administrada, gozando do direito de realizar atos

toda a terra da Inglaterra estava amparada pelos títulos

de administração e de disposição sobre os bens do trust, não

de use. (MORINEAU, 2004, p. 110, tradução nossa ).

possuindo, contudo, o uso, nem o gozo da coisa, como também o direito de a destruir materialmente.

Mario G. Losano (1978) traz que nas origens a prática era usada para evitar os encargos fiscais impostos pelos senhores

2 Desenvolvimento histórico do trust

feudais no momento do falecimento do proprietário do bem.

O trust é um instituto muito antigo, descendendo de uma

Assim, instituído o use, o bem era confiado a um ente, com a

instituição medieval chamada use. Primeiramente, é fundamen-

obrigação de deter a sua propriedade em benefício de pessoas

tal ressaltar que o use medieval não deriva, como se parece,

definidas, estas vinham assim a gozar os seus frutos sem fica-

do termo latino usus, mas sim de outra palavra, também latina,

rem sujeitos a impostos reais.

opus. Marta Morineau (2004) explicando a origem e o significado da palavra opus, traz que:

Deste modo, em 1535, o rei Henrique VIII instituiu uma lei, o Statute of Uses, com o objetivo de limitar tal prática, lei essa que

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alcançou, de certo modo, o objetivo desejado, especialmente

presso subdivide-se em trust executado e trust não-executado

por ter introduzido reformas que simplificaram as regras da com-

(aquele que está por executar). O trust executado é aquele no

mon law relativas à transmissão da terra. (MORINEAU, 2004).

qual o criador (settlor of the trust) estabelece seus termos de modo definitivo no ato de criação. O trust não executado é aque-

3 Natureza jurídica e tipos de trusts

le no qual os direitos concedidos aos beneficiários estão subor-

Marta Morineau (2004) cita Maitland para explicar a natureza

dinados a um ato adicional que deverá um terceiro realizar.

jurídica do trust, assim:

Em relação à natureza das obrigações do trustee, o trust

Para explicar a natureza jurídica do trust, este autor assi-

pode se classificar em trust simples (simple trust) ou em trust es-

nala que em primeiro lugar há que determinar a natureza

pecial (special trust). No trust simples o trustee tem a obrigação

do direito do beneficiário. Para fazê-lo, começa se refe-

somente de custodiar os bens objetos do trust, não devendo

rindo à dicotomia do direito privado, que pode conferir

realizar nenhuma outra conduta, por isso, nesse caso, o trustee

faculdades de duas classes, in rem ou in personam.

será denominado trustee passivo (passive trustee), ou um trus-

(MORINEAU, 2004, p. 112, tradução nossa ).

tee custódio (custodian trustee). No trust especial, o trustee tem outras obrigações, além de

Nesse sentido, afirma-se que o direito do cestui que trust pos-

guardar, custodiar os bens sob sua responsabilidade, como por

sui elementos de ambas as classes, ou seja, possui algo de real e

exemplo, vender alguma coisa e, logo, com o produto da venda,

algo de pessoal, salientando não ser fácil situar o direito do cestui

pagar as dívidas do instituidor (settlor of the trust). (MORINEAU,

que trust em um código de tradição jurídica europeia, tendo em

2004). O trust especial subdivide-se em administrativo (ministerial o

vista o fato de ter que decidir se o local adequado é no capítulo

instrumental trust) e discricionário (discretionary trust). No primeiro

relativo aos bens ou no relativo às obrigações. Todavia, analisando

caso, trust administrativo, o trustee pode ser qualquer pessoa, que

a história do trust, é de se salientar que o direito do cestui que trust

deverá cumprir os encargos estabelecidos no trust, por exemplo,

possui caráter pessoal, tendo em vista o fato de ser oponível a uma

repartir bens específicos, entre beneficiários selecionados. No trust

pessoa, sujeito passivo determinado, ou seja, ao trustee.

discrionário, o trustee possui uma maior liberdade de ação, no que

No que se refere aos tipos de trust, o mesmo pode se agru-

se refere ao cumprimento de suas obrigações. Como exemplo,

par em diferentes classes. Um primeiro critério de classificação

pode se tratar de um trust no qual o trustee deva destinar os fun-

do trust refere-se ao seu modo de criação, o qual pode ser criado

dos necessários para cumprir com os fins de favorecimento que

por uma pessoa ou por um grupo de pessoas voluntariamente,

lhe pareça conveniente, devendo ser o trustee, nesse caso, pessoa

como instituído por força de lei. No primeiro caso há o chamado

capacitada, prudente e sensata. (MORINEAU, 2004).

voluntary trust (trust voluntário); no segundo caso tem-se o im-

Em relação aos beneficiados, o trust pode ser público ou pri-

puted trust (trust imputado, presumido ou atribuído). O voluntary

vado. No trust público os beneficiários são um grupo maior de

trust subdivide-se também em trust expresso e trust implícito,

pessoas, geralmente pessoas indeterminadas, sendo instituído,

sendo difícil diferenciar na prática as duas subespécies. Marta

geralmente, para fins caritativos. No trust privado os beneficiários

Morineau (2004), de tal dificuldade, afirma que:

são pessoas determinadas. Em relação ao trust privado, Mario G.

[...], em torno desta subdivisão, a possibilidade de dife-

Losano (1978) afirma que o proprietário deverá instituí-lo de modo

renciar, na prática, os trusts expressos, dos implícitos,

inequívoco, respeitando a regra das três certezas: “certeza das

segundo opinião de Maitland, é quase impossível. Este

palavras que ordenam que se tenha um determinado compor-

autor sustenta que como não é necessário utilizar pala-

tamento, certeza do objecto de que se transfere a propriedade;

vras especiais para a criação de um trust, a distinção que

certeza dos beneficiários”. (LOSANO, 1978, p. 131).

nos ocupa não é muito clara e se limitaria tão somente

A doutrina também traz uma outra classe de trust, dividindo-

a uma maior ou menor precisão gramatical. Acrescenta,

a em trust lícito e ilícito, sendo de ressaltar que nenhum ato é

que para complicar as coisas, alguns tratadistas equipa-

válido ou exigível caso transgrida o ordenamento jurídico. O trust

ram o trust implícito com o trust criado pela lei de forma

lícito é aquele que surge em acordo com a lei, e ilícito aquele que

direta. (MORINEAU, 2004, p. 119, tradução nossa ).

surge contrariando a lei, sendo inválido deste modo.

O trust expresso é aquele oriundo de um ato expresso de

Conclusão

vontade, ato esse que pode se manifestar em um contrato, tes-

Como visto, o trust é um importante instituto do sistema ju-

tamento ou até mesmo por uma simples declaração. O trust ex-

rídico inglês, especificamente da equity, tendo origem e desen-

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volvimento histórico e possuindo largo uso no ordenamento jurídico da Inglaterra. Ainda que haja institutos jurídicos parecidos ao trust em outros ordenamentos jurídicos, o mesmo mantém sua originalidade, ou seja, há institutos parecidos em outros sistemas jurídicos, porém os mesmos não possuem características e efeitos idênticos aos do trust.

São Paulo: Martins Fontes, 2002. LOSANO, Mario G. Os grandes sistemas jurídicos. Lisboa: Presença/ Martins Fontes, 1979. MARKY, Thomas. Curso elementar de direito romano. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 1995.

Estruturalmente o trust baseia-se na estipulação por parte de uma pessoa ou mais de uma pessoa (o settlor of the trust) para que um bem ou mais de um bem seja administrado por uma pessoa (trustee) em benefício de outrem (o chamado cestui que truste). Para a common law, o trustee possui apenas uma obrigação moral em face do cestui que trust, já para a equity há sim sanção em face ao descumprimento do trust, havendo também a obrigação de o adquirente do bem instituído em trust respeitá-lo: caso haja o trustee alienado o bem a título oneroso, quem o receber será sub-rogado ao bem, porém o trustee será considerado trustee das somas provenientes da sua venda. Caso o terceiro adquirente o tenha adquirido gratuitamente, ou de má-fé (caso saiba ou deva saber que o trustee não devia dispor dos bens conforme o fez), a propriedade dos bens passará para o adquirente, mas o mesmo será o proprietário legal (at law) e, ao mesmo tempo, o trustee, explorando os bens em proveito dos cestuis que trust. No que se refere à sua natureza jurídica (in rem ou in personam), Maitland, citado por Marta Morineau (2004), defende que o direito do cestui que trust possui elementos de ambas as

MORINEAU, Marta. Una introducción al common law. Ciudad de México: Universidad Nacional Autónoma de México, 2004. OXFORD dictionary of law. 5rd ed. Oxford: Oxford University Press, 2003. RADBRUCH, Gustav. O espírito do direito inglês e a jurisprudência anglo-americana. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. SOARES, Guido Fernando Silva. Common law: introdução ao direito dos EUA. 2. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.

NOTAS DE RODAPÉ 1. Especialista em Ciências Criminais pela Universidade Gama Filho/RJ. Mestre e Doutorando em Teoria do Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas. Professor no Curso de Direito da Faculdade Asa de Brumadinho/MG, da Faculdade de Pará de Minas/MG e da Faculdade de Direito da Universidade de Itaúna. Advogado. 2. De acordo com José Carlos Moreira Alves (2004), o usus (uso) “é direito real, intransferível, concedido a alguém (o usuário) para a utilização de coisa alheia inconsumível, sem alteração de sua substância ou de sua destinação econômico-social”. (ALVES, 2004, p. 338).

classes (real e pessoal), porém, analisando a história do trust, defende que o direito do cestui que trust possui caráter pessoal, tendo em vista o fato de ser oponível a uma pessoa (sujeito passivo determinado), ou seja, ao trustee. Assim, concluindo com as ideias de René David (2006), na prática, o trust não é uma instituição simples como em sua origem, tendo sido elaboradas numerosas regras técnicas, determinado, nos dias atuais, a conduta a ser esperada do trustee e as condições em que as Cortes aceitarão intervir. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, José Carlos Moreira. Direito romano: volume 1: história do direito romano; instituições do direito romano: parte geral; parte especial: direito das coisas. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. ALVES, José Carlos Moreira. Direito romano: volume 2: instituições de direito romano; parte especial: direito das obrigações: direito de família: direito das sucessões. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. DAVID, René. O direito inglês. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2006.

3. “O usufruto é um direito real, inalienável e limitado no tempo, que atribui ao seu titular as faculdades de uso e fruição de coisa alheia inconsumível, permanecendo inalterada a sua substância e destinação econômico-social.” (ALVES, 2004, p. 333). 4. De acordo com José Carlos Moreira Alves (2004), “o fideicomisso é disposição de última vontade pela qual o disponente determina a outrem (o fiduciário), que irá receber, mortis causa, bens deixados por aquele, que realize, dentro dos limites dessa aquisição, uma prestação em favor de terceiro (o fideicomissário).” (ALVES, 2005, p. 477). 5. “A bonorum possessio era, como o nome indicava, a posse dos bens hereditários, deferida pelo pretor. Sua instituição se deve à mesma necessidade prática que orientava o pretor na instituição desse instituto como preliminar da rei vindicatio.” (MARKY,1995, p. 178). 6. Trust. n. 1. An arrangement in which a settlor transfers property to one or more trustees, who will hold it for the benefit of one or more persons (the beneficiaries or cestuis que trust, who may include the trustee(s) or the settlor) […]. (OXFORD, 2003, p. 509-510).

DAVID, René. Os grandes sistemas do direito contemporâneo. 4. ed. PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 71


A SOCIEDADE INDUSTRIAL X SOCIEDADE PÓS-INDUSTRIAL:

Pela ótica da obra de Domenico de Masi. Emerson Luiz Xavier Pereira1 RESUMO: A sociedade atual atravessa uma quebra de paradigma. A transformação da sociedade industrial, que revolucionou a produção em larga escala, e trouxe consigo o surgimento das classes trabalhadoras, não proprietárias dos meios de produção, que exercia trabalhos mecanizados, repetitivos e que a afastou das atividades intelectuais e culturais, deu espaço a uma sociedade onde o controle da informação é que prepondera. O acesso a esta informação é quase em tempo real, e a sociedade está se individualizando, transformando as relações inter pessoais cada vez mais virtual, através dos computadores e dos dispositivos móveis. A super mídia predomina. E impõe cada vez mais o que a sociedade consome e influencia na mesma proporção a formação da opinião pública. Surge a sociedade pós-industrial. O desenvolvimento deste artigo é baseado na obra A Sociedade Pós-Industrial do sociólogo italiano Domenico de Masi.

PALAVRAS-CHAVE: Sociedade Industrial; Sociedade Pós-Industrial; Meios de produção; quebra de paradigma; Capitalismo.

A Revolução Industrial marcou uma fase da história que ima-

meios de produção se tornam cada vez mais ricos, e o pobre

ginávamos que dificilmente seria superada: a sociedade indus-

cada vez mais oprimido e explorado; e divisão do trabalho, que

trial. Este período da história humana, tivemos dificuldade de as-

tornou o operários cada vez mais limitado, pobre e dependente,

similar no passado e temos dificuldade de assimilar no presente.

enquanto seu patrão cresce cada vez mais.

Analisada por uma escala do tempo, como é curta a existência do homem moderno desde o surgimento da raça humana. Embora, entre todas as fases por que passou o homem,

Se fez necessário apontar as características que diferem o período anterior e posterior , da fase industrial. Entre algumas delas podemos citar:

a sociedade industrial tenha sido a mais curta, é a que mais

Concentração de massas;

revolucionou a história humana. Ela é o resultado do surgi-

Predomínio numérico de trabalhadores da indústria;

mento da imprensa, da pólvora, do avanço da ciência, e de

Descobertas científicas aplicadas em prol do pro-

várias inovações que contribuem para uma avanço em relação

cesso produtivo;

a época rural.

Divisão social do trabalho;

Traz intrínseco uma crítica aos pensadores gregos, que

Separação entre lugar que se vive e trabalha;

muito se preocupou com o discurso e pouco se preocupou

Aumento da produção de massa e aumento exagerado

com a utilidade prática das coisas e das descobertas científi-

do consumo.

cas. Assim como os romanos. Com o surgimento da sociedade industrial e dos produtos

Estas são as características que mais se destacam em

manufaturados, surge a divisão do trabalho, a divisão da socie-

muitas que surgem com o processo de produção em larga es-

dade em classes bem definidas, onde o trabalhador passa a

cala. Com o aumento da “sociedade de massa”, a produção e

trazer consigo o mecanicismo, a falta de exigência de raciocínio

o consumo em larga escala. Mudanças latentes que emergem

nas tarefas do dia a dia e a alienação do resultado final do seu

com a busca cada vez maior por bens de consumo.

trabalho. O trabalhador adquiriu um ofício e perdeu as qualidades intelectuais.

Entre elas apontamos o ingresso da sociedade de massa na gestão da coisa pública e na gestão do poder. As mulheres

As conseqüências sociais da indústria para a estrutura de

ganham destaque no contexto social; o conceito de cidadania

classe é enfatizada na obra “A Riqueza das Nações”, de Adam

torna-se mais abrangente; a tecnologia tirando a mão de obra

Smith. Tocqueville, 70 anos mais tarde, apontará assim como

pesada dos homens, evitando-lhes a fadiga física, entre outras.

Smith, os pontos desfavoráveis do avanço industrial, associa-

Ainda, é enfatizado para o fato de que este período da história

do ao acúmulo de capital. Para ele, as maiores falhas são: o

é marcado de forma equivocada por uma deterioração intelectual.

grande acúmulo de capital, onde os mais ricos, e donos dos

Na lição de Domenico,

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...não é absolutamente verdade que na sociedade de

período era os direitos individuais. O Estado deveria interferir o

massa seja possível manipular os indivíduos, indefesos

mínimo possível na vida das pessoas. Praticamente as disputas

diante do super poder da mídia, pois cada indivíduo lê e

estavam entre proletariado e classe burguesa. É o período dos

seleciona todas as mensagens que recebe de fora, atra-

chamados direitos de primeira geração.

vés do filtro-censura constituído pelos grupos primários de referência”. Brason (apud DOMENICO, 1999, p. 22)

Na sociedade pós industrial, o Estado tem uma preocupação maior com os problemas coletivos, são os chamados direitos sociais, ou de segunda geração. Atualmente, o Estado trata

Fazendo um paralelo com a sociedade atual, culpa-se mui-

também do direitos difusos ou de terceira geração. O Estado

tas vezes o analfabetismo político justificado pelo super poder

tem uma autonomia maior. É um ente de direitos e deveres. E

da mídia.

tem por vezes interesses que diferem tanto do povo, quanto das

Mas acreditamos que, não podemos creditar toda

alienação política e cultural apenas aos veículos de comunica-

classe dominantes.

ção em massa. Aquele indivíduo que busca a informação em

Hoje o povo, mesmo as aqueles que venham das cama-

mais de uma fonte, que não se acomoda, que se interessa com

das inferiores da sociedade, podem ter acesso à participação as

o futuro de onde vive, de seu país e de seu mundo, se inquieta

eleições de cargos eletivos. E tem direito universal do sufrágio.

e vai buscar nos livros, nos autores, a realidade que lhe cerca.

No início da sociedade industrial o sufrágio não abrange toda

A sociedade industrial sucede a sociedade rural, que dominou os feudos de idade média até o surgimento da idade moderno e revolução industrial. Esta última com seu processo

a parcela da sociedade. O conceito de cidadania não era tão abrangente quanto hoje. Nas palavras de Grassi:

de mecanização do processo produtivo, de divisão do trabalho.

Nos anos 70, o Estado assistencialista deveria institucio-

Agora vemos a sociedade industrial sendo superada pela so-

nalizar e diluir os conflito, deveria fazer satisfazer de for-

ciedade pós-industrial, onde impera o domínio da tecnologia,

ma coletiva (e portanto, mais eficiente) a uma parte de

a informatização, a logística, globalização.

necessidade básicas dos cidadãos pobres, deveria tor-

Na primeira, quem detinha as grandes propriedades, era que

nar previsíveis e programáveis os fluxos de trabalho.......

ditava as regras do jogo; era quem dominava. Na segunda, era

mas isto acabou lançando o estado numa crise intola-

quem detinha os meios de produção, os donos das indústrias

rável, inchou de modo desmedido os gastos públicos,

(classe burguesa), era os detentores do poder e a classe domi-

minou o processo de acumulação, provocando uma es-

nante da época. A terceira (sociedade pós-industrial) é dominada

cassez dos capitais necessários para os investimentos

por quem detém a informação, quem esta à frente nas pesquisas

produtivos e incentivando desse modo o desemprego,

científicas, nas novas técnicas de produção, etc.

desmotivou os trabalhadores a trabalhar e a buscar uma

Interessante salientar que a sociedade pós industrial se diferencia da sociedade rural e da industrial sem contudo, haver

formação profissonal......” (DOMENICO,19--, p. 81-83, grifo nosso).

datas específicas onde inicia e termina cada um dos períodos. É um processo gradual. E entendemos que embora as trans-

Isto mostrou a dificuldade de se manter um Estado assis-

formações, contextos, avanços tecnológicos, de cada época

tencialista, que podemos chamar até de paternalista; que queira

seja diferente, percebemos que as disputas se assemelham

suprir todas as demandas do povo, pois isto se mostrou total-

muito. Continua havendo as distinções entre classes, disputas

mente incompatível com o capitalismo. Para que o capitalismo

por maior participação nas decisões, luta por igualdades, etc.

flua é necessário que haja uma demanda acentuada de produto.

Na sociedade pós industrial surge um terceiro ente, na dis-

Apenas assim se torna interessante (e lucrativa) o binômio “pro-

puta pelas decisões: O Estado. O Estado, como entre persona-

cura x oferta”, pilares do capitalismo. Parafraseando o estadista

lizado, autônomo como o conhecemos hoje, praticamente não

inglês Winston Churchill, O Capitalismo é o pior modelo econô-

existia na época medieval. Era uma sociedade rural, dominada

mico, depois de todos os outros.

por grandes feudos, e o Estado que surgia (poder centralizado

Na sociedade pós-industrial é difícil detectar quem é a classe

nas mãos do rei), era praticamente para defender os interesses

explorada ou exploradora, já que uma mesma categoria pode se

do rei e da nobreza.

enquadrar dentro dos dois contextos, como esclarece Domenico:

Na época da revolução industrial, surge o Estado autôno-

....sabemos que na sociedade pós-industrial vigora uma

mo, como forma de representação do interesse do povo. Mas

divisão transnacional do trabalho e do poder; sabemos

era um Estado mínimo, onde a bandeira que se erguia naquele

que nos próprios sujeitos (em termos individuais ou co-

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letivos) podem conviver papéis hegemônicos em uma determinada esfera e papéis subalternos em uma esfera diferente; sabemos que ao contrário do que Marx teorizou para a sociedade industrial, na sociedade pósindustrial não existe um sujeito antagônico privilegiado, tampouco existe um conflito preponderante a ponto de absorver todos os outros; sabemos que alguns tipos de conflitos (por exemplo o feminista, o ecológico, o antinuclear) não se referem aos indivíduos em termos de lugar por eles ocupados nas relações de produção. Mas em termos de outros fatores como o sexo, a atitude em relação à natureza. Etc. (DOMENICO, 19--, p. 83) A sociedade pós industrial, deu forma a fantasmas sociais, difíceis de se imaginar em outros tempos. Direitos difusos, empresas “.com” (que só existem virtualmente), A onisciência e onipresença criada pela internet, tecnologia da informação, e avanço do dispositivos de comunicação móveis,

criou-se um

gigantesco “big-brother” que nos tirou parte da liberdade, da individualidade e da privacidade. O aperto de mão e o bom dia foram trocados por mensagens de sms e scraps nas redes sociais. Encontro em família se transformou em marcar hora para acessar as redes social. Bem vindos a sociedade pós-industrial. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS SMITH, Adam. Riqueza das nações - investigação sobre sua natureza e suas causas. 1983 2 v. (Os Economistas), Editora Abril Cultural. DE MASI, Domenico. A sociedade pós-industrial, 1999, Editora SENAC. DE MASI, Domenico. O Futuro do Trabalho - fadiga e ócio na sociedade pós-industrial; tradução de Yadyr A. Figueiredo. 2001, Editora José Olympio.

NOTAS DE RODAPÉ 1 Aluno do 8º Período de Direito do Centro Universitário Newton Paiva – Estagiário da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional – DIAFI – Divisão de Assuntos Fiscais – Autor de 2 artigos publicados na 4º Edição da Revista Eletrônica da Pós Graduação da Newton Paiva.

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O PERFIL PROFISSIONAL COMPETENTE DEMANDADO PELAS EMPRESAS DE RECRUTAMENTO E SELEÇÃO DE TRABALHADORES DE BELO HORIZONTE Corina Alves Farinha1

RESUMO: O artigo trata do modelo de inserção de candidatos às vagas oferecidas no mundo do trabalho formal. Investiga o conceito de competência praticado nas empresas de recrutamento e seleção de trabalhadores de Belo Horizonte. Analisa o desafio enfrentado pelas agências de emprego quanto à interpretação das diferentes concepções de competência manifestadas no discurso empresarial. Isto possibilita o entendimento da construção do perfil profissional demandando pelas empresas contratantes. PALAVRAS-CHAVE: competência, recrutamento e seleção, perfil profissional.

Introdução

Frente a essa mudança, impõe-se o desafio da construção

O conceito de competência é polissêmico, por ser essa

de novos referenciais para a avaliação dos trabalhadores no

concepção estudada por distintas áreas do conhecimento, gera

âmbito do processo de recrutamento e seleção, que é freqüen-

inúmeros vieses e interpretações, tanto no âmbito acadêmico

temente terceirizado e realizado por empresas específicas.

quanto no organizacional. Em termos gerais, a competência en-

Porém, no Brasil, segundo Dutra (2004), as empresas têm

globa três requisitos básicos: saberes construídos ao longo da

revelado dificuldades quanto ao entendimento do conceito de

existência, com implicações na vida profissional e as atitudes do

competência, devido às diferentes maneiras de compreensão

trabalhador em face das inúmeras situações de trabalho.

do termo e às formas de sua articulação pelos responsáveis

Desde os anos 1980 devido à globalização da economia,

das organizações. Observa o autor que, em relação ao tema,

ao desenvolvimento científico e tecnológico, entre outros ele-

coexistem nas organizações discursos carregados de moder-

mentos, que acirraram a competitividade e a complexidade na

nidade, aliados a posturas tradicionais típicas do modelo de

produção que tendeu a adotar modelo flexível, o mundo do tra-

produção rígido. Há o entendimento de que se trata de um mo-

balho passou a exigir um perfil profissional com determinadas

dismo, que não atende às necessidades das organizações.

competências para a ocupação das vagas.

Os autores Fleury & Fleury (2004), embasados em outras

Em decorrência desses fatores os serviços de recrutamen-

pesquisas, observam a tendência à utilização do conceito de

to e seleção priorizam a avaliação das capacidades individuais

competência pelos profissionais de recursos humanos como

dos candidatos, sob o enfoque da competência. As entrevistas

algo que pode ser medido e quantificado. À semelhança dos

e dinâmicas de grupo, entre outras técnicas, objetivam a análi-

padrões e resultados obtidos por meio do treinamento, a com-

se da compreensão do processo de trabalho, criatividade, pen-

petência é concebida como um conjunto de conhecimentos,

samento crítico, comunicação, autonomia e responsabilidade

habilidades e atitudes, ligado ao desempenho do trabalhador,

dos trabalhadores.

referindo-se, portanto, à tarefa ou ao conjunto de tarefas pres-

Esse contexto, segundo Zarifian (2001), apontou para a

critas em um cargo.

ruptura com os procedimentos tayloristas centrados no controle

A revisão teórica permite constatar, sob perspectivas di-

das tarefas, bem como a intenção de avaliar os trabalhadores

ferenciadas, os autores franceses Zarifian (2001, 2003, 2005),

em termos de entendimento do processo produtivo e iniciativa,

Le Boterf (2003, 2006), Dadoy (2004), Ropé & Tanguy (2002),

aspectos que já faziam parte dos saberes de alguns trabalha-

Stroobants (2002), e os brasileiros Fleury & Fleury (2004), Dutra

dores, porém eram desconsiderados pelos administradores. Os

(2004) e Ruas (2005) são unânimes em afirmar que os entendi-

encarregados de produção na época, no relato de Zarifian (2001,

mentos sobre o conceito de competência são diferenciados na

p.23), “almejavam avaliar as competências pessoais de cada as-

academia e nas empresas, particularizando-se em função de

salariado, independentemente do posto de trabalho ocupado”.

características como: cultura organizacional, ramo de atuação,

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porte da empresa, tecnologia adotada e relação estabelecida

de produção flexível em substituição à abordagem categoriza-

com o mercado, com os clientes e os trabalhadores.

dora e homogeneizadora do modelo taylorista-fordista (ZARI-

Dessa forma, o trabalhador avaliado como competente em

FIAN, 2001).

uma empresa poderá não o ser sob a avaliação de outra, mes-

Portanto, é nesse período que surge a tendência a adoção

mo porque a competência é situacional. Frente ao exposto, in-

do conceito de competência no processo de recrutamento e se-

daga-se: Qual é o perfil profissional demandado pelas empresas

leção de trabalhadores. Cabe ressaltar, que sob essa ótica, a

contratantes uma vez que o conceito de competência permite

competência é uma demanda do patrão e provém de uma trans-

interpretações diferenciadas? Qual o perfil profissional deman-

formação nos julgamentos avaliativos dos trabalhadores pela

dando pelas empresas de recrutamento e seleção de trabalha-

direção e pelos responsáveis pelas práticas de gerenciamento

dores de Belo Horizonte?

dos trabalhadores. Por outro lado, entende-se como um ganho para o trabalhador o expressar de sua autonomia e iniciativa, de

A Competência

seus conhecimentos em situações diferenciadas, em oposição à

Os estudos em torno da construção do conceito de com-

passividade solicitada pelo modelo taylorista-fordista.

petência iniciaram-se em 1980 na França e no Brasil, em 1990.

Zarifian (2001) ao realizar o Estado da Arte do tema na

A fase atual desses estudos circunscreve-se à divulgação e à

França construiu o conceito de competência combinando três

aplicação desse conceito na gestão de pessoas no âmbito das

abordagens:

organizações e na academia os estudos. O tema não é um modismo; pelo contrário, seu registro é

[...] a competência é a tomada de iniciativa e o assumir a responsabilidade do indivíduo diante de situações pro-

bem antigo. De acordo com Isambert-Jamati (2002), a palavra

fissionais com as quais se depara.

competência no fim da Idade Média era associada à linguagem

[...] a competência é um entendimento prático das si-

jurídica. Na atualidade, o conceito de competência vai além

tuações, que se apóia em conhecimentos adquiridos

desse enfoque, entrando no campo da Psicologia, da Educação

e os transforma, à medida que a diversidade das situ-

e da Sociologia. Envolve basicamente três modalidades de sa-

ações aumenta.

beres: o saber em termos de conhecimentos, o saber-fazer e o

[...] a competência é a faculdade de mobilizar redes de

saber-ser. A competência está intimamente relacionada à ação,

atores em torno das mesmas situações, de fazer com

ao movimento e ao empreendimento. Seu reconhecimento de-

que esses atores compartilhem as implicações de suas

pende do olhar do outro.

ações, de assumir áreas de co-responsabilidade (ZARI-

Em meados da década de 1980, Zarifian (2001), sociólogo

FIAN, 2001, p. 68-74).

francês, especialista em gestão pesquisou empresas moveleiras que buscavam alternativas para sair da crise no setor. Para isso

Nesse entendimento, a competência diz respeito à especi-

elas passaram a atender demandas específicas de seus clientes

ficidade do indivíduo, sua originalidade, sua trajetória de vida,

empenhando-se na melhoria da qualidade e diversificação dos

abrangendo sua experiência profissional, suas capacidades e

produtos, adotando a produção flexível, com máquinas e ferra-

potencialidades. Dessa maneira, são valorizados o saber es-

mentas de controle numérico digital. Foi nesse contexto que os

colarizado, o saber-fazer, a experiência e o saber-ser (denomi-

problemas relacionados à qualidade, prazos, variedade, capaci-

nado também de saber comportamental e competência social

dade de iniciativa, resolução de problemas e outros passaram a

sobretudo em termos de comportamentos e atitudes) e ainda

ser vistos “como qualidades que os trabalhadores precisariam

sua capacidade de antecipar-se aos problemas e não apenas

demonstrar em ruptura com os procedimentos tayloristas-fordis-

solucioná-los, evidenciando movimento, participação, mobiliza-

tas”, salienta Zarifian (2001,p.22)-. Todavia, tais elementos, con-

ção (ZARIFIAN, 2001).

tinua o mesmo autor, “já estavam presentes nos trabalhadores,

Porém o saber-ser informa Zarifian (2001), é uma denomi-

mas [...] não eram reconhecidos e formalizados e, por isso, não

nação imprópria para o enfoque das atitudes e dos comporta-

apareciam”. Logo, “a mudança não se deve a uma descoberta

mentos gerados pela competência. Explica o autor que o saber-

repentina da humanidade dos trabalhadores, mas à percepção

ser refere-se à personalidade profunda e estável do indivíduo, a

de uma mudança nas condições de produção do setor” (ZARI-

seus traços de personalidade e aptidões consideradas inatas,

FIAN, 2001, p.22).

passíveis de serem verificadas por meio de testes de personali-

Dessa forma, Competência foi a denominação atribuída à

dade. Nesse contexto, o trabalhador é avaliado em sua totalida-

nova forma de avaliação dos trabalhadores, adotada no modelo

de, em seu “ser”. No entanto, a abordagem que enfatiza o com-

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portamento e as atitudes diz respeito à “competência social”, diz

em todos os níveis de contratações, a demanda dos emprega-

Zarifian (2001, p.146), pois a avaliação recai “na maneira como

dores por trabalhadores adaptáveis e capazes de se inserir em

um indivíduo apreende seu ambiente em situação, a maneira

grupos de trabalho é evidenciada. Ela ressalta no período 1976-

como se comporta”. O que se busca com essa abordagem é

1978, com a experiência francesa de “mobilização e inserção

uma visão parcial e manifesta do indivíduo. O comportamento

profissional de jovens sem qualificação, os saberes sociais apa-

é adquirido e pode evoluir, razão pela qual a avaliação se dá

receram explicitamente”, sugerindo que esses comportamentos

em determinado momento. Não é o ser que se procura apreen-

“apresentam mais problemas que os saberes técnicos, que se

der, mas o seu modelo de conduta, diante de dado ambiente.

tornaram mais abundantes e mais baratos”. Por outro lado, os

O conceito de atitude sustenta o conceito de comportamento.

saberes comportamentais, na visão de Dadoy (2004), não são

A atitude traduz o que sustenta e estabiliza o comportamento;

concebidos como parte integrante da formação profissional, não

é manifestada individualmente; é social por ser produzida em

sendo balizados por uma instituição oficial como a escola.

meio sócio-cultural específico e por denotar certa maneira de

Já Le Boterf (2006) explica: a competência é subjetiva, e,

posicionamento do indivíduo nas relações sociais. A atitude se

por si só, é invisível. Dessa forma, não é diretamente acessível,

traduz, portanto, no comportamento.

logo, sua validação depende dos conceitos, da metodologia

No Brasil, Fleury & Fleury (2004, p.30) observam que a com-

empregada, dos atores implicados e dos pontos de vista adota-

petência é “[...] um saber agir responsável e reconhecido, que

dos. A competência está sempre ligada ao mecanismo de medi-

implica mobilizar, integrar, transferir conhecimentos, recursos

da que lhe é aplicado e depende sempre do olhar que sobre ela

e habilidades que agreguem valor econômico à organização e

recai. O que é avaliado não é a competência em si, mas aquilo

valor social ao indivíduo”. Reportando-se a esse conceito de

que se designa por competência, por meio do mecanismo de

competência individual, Dutra (2004) acrescenta que o conceito

avaliação (instrumentos, regras, instâncias). O trabalhador, para

deve ser aplicado a instrumentos de gestão que possibilitem às

ser reconhecido como competente, o é em relação a alguma

pessoas perceberem o que lhes agrega sua relação com a or-

coisa, e esse parâmetro estabelece uma prescrição, um modelo,

ganização. Assim, a competência é atribuída a vários atores: a

um limite para ser competente.

empresa dispõe de um conjunto de competências que lhe são

Esclarece ainda Le Boterf (2006) que a limitação existe no

próprias, decorrentes da “gênese e do processo de desenvolvi-

nível de saber alcançado pela profissão do indivíduo, numa épo-

mento da organização e são concretizadas em seu patrimônio

ca determinada, ou seja, a competência depende do olhar do

de conhecimentos, que estabelece as vantagens competitivas

outro, e, portanto, a competência é situacional.

da organização no contexto em que se insere” (DUTRA, 2004, p.14). As pessoas, por sua vez, dispõem de um conjunto de competências aproveitadas ou não pela organização.

O entendimento de competência de Tomasi (2004) aborda o indivíduo [...] um indivíduo que, produzido nas relações sociais nas

No entanto, para Dadoy (2004, p.124), os empregadores

quais se encontra inserido, insiste em guardar suas dife-

sempre valorizaram a competência comportamental referente

renças em relação aos outros [...] e isso não significa, o

aos saberes relacionais (saber-ser):

estabelecimento de um dualismo entre ele e o coletivo,

[...] esses saberes, na realidade, sempre fizeram parte

mas, diferente disso, o diálogo (TOMASI,2004, p.11).

das qualidades esperadas pelos empregadores, mas essa exigência parecia tão natural que não havia neces-

Porém, no âmbito organizacional, Stroobants (2002) ana-

sidade de explicitá-la em um período em que os saberes

lisa que o conceito de competência se refere à modificação do

técnicos eram ainda bastante raros no mercado de tra-

perfil do trabalhador, cujo vocabulário é renovado, com termos

balho e era, então, a primeira preocupação dos empre-

relativos a saberes e competências. Por sua vez, Ropé & Tanguy

gadores (DADOY,2004, p.124).

(2002), indicam que tal conceito é ligado a um conjunto de conhecimentos, qualidades e capacidades relacionadas ao ofício.

Dadoy (2004) observa que as características pessoais dos

Salienta Dadoy (2004) que a assimilação do conceito de

trabalhadores sempre foram alvo de análise, com vistas a evitar

competência ocorreu em diferentes contextos, sendo aplica-

problemas de relacionamento e conflitos existentes no ambiente

do a objetos distintos dos originais, sem que houvesse, por

de trabalho, relacionados à personalidade do trabalhador, res-

parte dos empregadores, sindicatos e educadores da área

saltando de modo especial o modelo comportamental submisso,

profissional uma reflexão mais aprofundada sobre suas diver-

controlado pela gerência taylorista-fordista. Segundo a autora,

sas definições e utilizações.

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de das pessoas na organização. A competência nas empresas: o trabalhador competente

A adoção dos princípios de gestão por competência pelos

As pesquisas de Zarifian (2005) indicam que a competência,

dirigentes das empresas pressupõe o reconhecimento de um tra-

no meio empresarial, está ligada ao uso de dois tipos de instru-

balhador autônomo, em equipe e em rede e implica o desenvolvi-

mentos: a construção de referenciais e a realização de entrevistas

mento da competência do trabalhador na organização e o desen-

com o empregado por seu superior hierárquico, visando a avaliar

volvimento da competência sobre a organização (DUTRA, 2004).

se o profissional está exercendo ou não, as competências reque-

Nesse modelo, a simples regulação da organização do

ridas. A construção de referenciais, segundo o autor, é feita por

trabalho torna-se desnecessária; a relação passiva, submissa

meio de listas de competências centradas no saber-ser, objeti-

do trabalhador com a empresa (gerência taylorista-fordista) ten-

vando indicar, de maneira prescritiva, aquilo que os assalariados

de à mudança, e o trabalhador, conforme explica Zarifian (2001,

devem saber fazer e dizer, numa dada situação de trabalho.

p.138), “pode se tornar ator explícito da evolução da organiza-

Contudo, essa construção assemelha-se àquela dos refe-

ção”. A competência sobre a organização, por sua vez, é aos

renciais do trabalho taylorista, centrados na prescrição de tare-

poucos desenvolvida, à medida que o trabalhador executa pro-

fas. Nesse contexto, o trabalhador dito competente será aquele

jetos de trabalho. Zarifian (2001) constata a hesitação dos diri-

que, ao desenvolver seu trabalho, detém as competências atitu-

gentes das empresas em desenvolver essa competência sobre

dinais e comportamentais prescritas no referencial.

a organização, sobretudo na base da pirâmide hierárquica, na

Por outro lado, Le Boterf (2006) propõe que os métodos de avaliação da competência de um profissional aplicados nas or-

qual a relação de poder, submissão/controle estabelece a prática gerencial taylorista-fordista.

ganizações analisem a prática a que o trabalhador recorre para

Por outro lado, Dutra (2004) ressalta haver dificuldades na

interpretar as prescrições de determinado trabalho. Uma prática

compreensão do conceito de competência e nas formas de sua

não corresponde, item a item, a uma prescrição. Se assim fosse,

articulação pelos responsáveis pelas empresas, pois coexistem

a prática seria reduzida a uma simples execução de orientações

nas organizações discursos carregados de modernidade, alia-

e de normas. Nesse sentido, o alvo da avaliação não é o conjun-

dos à manutenção de posturas tradicionais, típicas do modelo

to de competências do trabalhador, pois estas, por si sós, são

de produção rígido. De tal forma, que o modelo da competência

invisíveis, mas aquilo que o mecanismo da avaliação designa

é entendido como inadequado para trabalhar as necessidades

como competências.

das organizações e considerado um modismo. Reportando-se

Todavia, para Stroobants (2002), o reconhecimento da com-

ao atual modelo de gestão de pessoas adotado pelas organiza-

petência do trabalhador e de sua capacidade se dá pelo aspec-

ções, Fleury & Fleury (2004, p.27) concluem “gerenciar por um

to cognitivo do trabalho que é executado.

modelo de competências implica somente uma mudança buro-

Le Boterf (2003) observa que o profissional reconhecida-

crática nos procedimentos para seleção dos indivíduos”.

mente competente é aquele que sabe agir com competência,

Nas organizações o trabalho a ser realizado passou do

mobilizando recursos provenientes da formação pessoal, bio-

controle à tendência à autonomia exigindo responsabilidade,

grafia e socialização, formação educacional e experiência profis-

comprometimento, iniciativa capacidade de comunicação e

sional. As competências são produzidas por meio de recursos e

desenvolvimento do pensamento crítico do profissional. Tais

convertem-se em atividades e condutas profissionais adaptadas

características quando mobilizadas em situação do trabalho e

a contextos específicos. O saber agir é distinto do saber-fazer,

avaliadas pelos recrutadores e gestores são consideradas com-

que é um conjunto de experiências e habilidades.

petências e diz-se que o trabalhador é competente. Essa ten-

Nas pesquisas desenvolvidas por Le Boterf (2003), foi cons-

dência gerou mudanças no processo de recrutamento e seleção

tatada a existência de contradições entre o discurso oficial dos

de trabalhadores, até então centrado nos princípios do cargo e

dirigentes de empresas e a realidade de sua gestão. Embora a

da pessoa certa para o cargo certo.

maioria dos dirigentes julgue a contribuição dos trabalhadores fator importante para um satisfatório desempenho organizacio-

A competência e o processo de recrutamento

nal, muitos ainda consideram preponderantes os fatores mate-

e seleção de trabalhadores

riais e financeiros. São poucos os investimentos na implantação

A profissão qualificada é uma unidade central no processo

de políticas que estimulem o desenvolvimento das competên-

de trabalho. Desde as últimas décadas do século XX, tem-se

cias e, embora muitos os considerem prioritários, apenas uma

verificado a tendência à busca por trabalhadores não apenas

minoria harmoniza sua política com o discurso sobre a priorida-

qualificados, mas competentes. A qualificação compreende os

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saberes relativos à profissão, adquiridos no ambiente escolar e

como esperado. Para Fernandez-Araóz2 (1999), “é impossível

no organizacional, por meio da experiência. A competência, por

transformar o processo de contratação de uma pessoa em uma

sua vez, é a mobilização dos saberes formais, informais e so-

ciência”, ou seja, o processo de contratação de pessoas não

ciais, construídos ao longo da vida, abrangendo inclusive as ati-

tem um resultado exato, não se configura em um estudo siste-

tudes individuais, em face das inúmeras situações de trabalho.

matizado. Então, embora se recorra a uma série de práticas que

Com a adoção do conceito de competência pelo mundo do

busquem lógica e previsibilidade no processo de contratação, o

trabalho tanto na França, no Brasil, e, atualmente, outros países,

sucesso continua indefinido, conforme sugere o índice de 30% a

as práticas de recrutamento e seleção tornaram-se mais rigoro-

50% de demissão ou renúncia na admissão de executivos.

sas. Um dos primeiros aspectos foi a exigência de maior nível

Se Taylor(1967) buscava “o que fazer” e “uma melhor ma-

de escolaridade e para isso os diplomas deveriam atestar ins-

neira” de fazer as tarefas, delineando o cargo, as características

trução mínima, ou seja, escrita, leitura e compreensão de textos,

pessoais avaliadas no processo de recrutamento e seleção de

elaboração e entendimento de cálculos. Em suma passou-se a

trabalhadores configuravam um perfil obediente e disciplinado.

analisar em profundidade conhecimentos e disciplina comporta-

O trabalhador, confinado a um cargo isolado e submetido aos

mental do trabalhador. Os selecionadores passaram a comparar

controles administrativos, às regras, às imposições e à hierar-

os indivíduos em situações reais de trabalho, a sua competência

quia, era impedido de atuar como pessoa “detentora de qualida-

efetiva em relação às expectativas da empresa.

des contextualizadas em situação de trabalho, tais como curiosi-

Por lado analisando a história do processo de recrutamento e

dade, rigor, reatividade”, como aponta Le Boterf, (2003, p.124).

seleção de trabalhadores encontra-se em Villela (2008), o marco

Notadamente, era requerido o gesto do trabalhador, seus

de um modelo primitivo de recrutamento e seleção foi encontrado

movimentos em tempos e tarefas pré-estabelecidas. O importante

na China, na dinastia Han, no ano 207 a.C. O Imperador, usan-

era recrutar mão-de-obra, e essa “mão” precisava fazer executar,

do da premissa ‘dividir para reinar’, dividiu o território chinês em

tanto no chão de fábrica quanto no escritório. Porém, a ‘mão’,

províncias, geridas por funcionários do poder central. Para ocupar

ou seja, o trabalhador deveria ser dócil, com perfil semelhante ao

os cargos referentes a tarefas e atividades de cobrança e arre-

demandado pelo Imperador chinês. Para assegurar a eficiência,

cadação de impostos, administração de recursos, entre outras,

o trabalhador seria treinado, tornando-se um ‘animal’ valioso, res-

instituiu a seleção de candidatos por meio de concurso público,

trito ao posto de trabalho, adequado para o trabalho repetitivo.

baseado no mérito, no apadrinhamento e na indicação, criando uma longa e detalhada descrição da função de servidor público. A conclamação do Imperador chinês Wu Di

Braverman (1987), citando os princípios da administração científica de Taylor3(1967) para a seleção científica de mão-de-

fornece indí-

obra, observa que estava centrado na condição física do tra-

cios dos princípios que envolviam aquelas práticas de recruta-

balhador, valorizando o perfil de profissional submisso (tipo do

mento e seleção, de certa forma, presentes na atualidade:

boi). A seleção constava de “apanhar um entre os tipos comuns

Queremos heróis! Trabalhos excepcionais exigem homens

que são especialmente apropriados para esse tipo de trabalho”.

excepcionais. Um cavalo indócil pode vir a tornar-se um animal

Quanto às práticas da seleção científica, cabe aludir a regra in-

valioso. Um homem que é objeto de ódio pode mais tarde realizar

flexível estipulada por Taylor:

grandes obras. O que acontece com o cavalo intratável passa-

[...] conversar e tratar com um candidato de cada vez,

se também com o homem arrogante: é apenas uma questão de

visto que cada operário tem suas capacidades e limi-

treinamento. Nós, desse modo, ordenamos aos funcionários dis-

tações especiais, e visto que não estamos tratando

tritais que procurem homens de talento brilhante e excepcional

com homens em massas, mas tentando desenvolver

para se transformarem em nossos generais, nossos ministros e

cada indivíduo ao seu mais alto estado de eficiência e

nossos emissários aos Estados distantes (MORTON,1986, p. 75).

prosperidade(BRAVERMAN,1987, P.96).

O discurso revela que o mercado demanda, como hoje, os melhores trabalhadores, porque o trabalho a realizar é excepcio-

Portanto, para assegurar o princípio do candidato apropria-

nal e, para isso, há um modelo de trabalhador: um herói, valioso

do ao tipo de trabalho, o entrevistador recorria à prática da entre-

pela docilidade; não sendo, é uma questão de treinamento. To-

vista individual, na avaliação das características do trabalhador.

davia, segundo o autor, os registros arqueológicos mostram que

Nas últimas décadas despontou a valorização das pessoas

tal conclamação e os esforços dos funcionários distritais, embo-

no âmbito organizacional. Frente a isso o cargo elemento cen-

ra estabelecessem um método de recrutamento e seleção, não

tral do processo de recrutamento e seleção vem sofrendo altera-

foi suficiente. As contratações foram poucas e não funcionaram

ções, passando o foco das tarefas para as pessoas, priorizando

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o ocupante do cargo, a pessoa designada para desempenhá-lo.

os dados coletados aparecem sob a forma de transcrições de

O incentivo, a motivação e a capacidade de interação das pes-

entrevistas, anotações de campo, dentre outras formas indi-

soas, relacionados à sua participação em decisões na execução

cadas por Godoy (1995 a), visando à análise do ambiente de

das tarefas, são características essenciais (TOLEDO, 1992).

maneira holística, como um processo. A estratégia de estudo

Em vista disso, à prática da entrevista individual são acres-

de caso abordada por Yin (2005) abrange técnica de coleta de

centados testes de personalidade entre outros que buscam

dados e abordagens específicas para sua análise, além de per-

desvendar o intelecto e a personalidade do candidato, por meio

mitir a variação de estudo de casos múltiplos, quando envolve

da análise de suas reações, comparadas a dados catalogados.

dois ou mais sujeitos, duas ou mais instituições. Neste trabalho,

Todavia, tais testes apresentam empecilhos, como tempo, custo

são avaliadas oito empresas prestadoras de serviços de recru-

e necessidade de psicólogos para aplicação. Foi adotado um

tamento e seleção de trabalhadores. Além disso, o estudo de

questionário de personalidade, de prática mais simplificada, que

múltiplos casos pode ser usado para propiciar generalizações

consiste em uma série de perguntas em torno de situações práti-

amplas, baseadas em evidências desses estudos, como indica

cas de vida. Também os saberes escolarizados e outros saberes

Godoy (1995b).

adquiridos na trajetória profissional do indivíduo, são igualmen-

O ramo de recrutamento e seleção de trabalhadores em

te aspectos destacados e exigidos do trabalhador, por meio de

Belo Horizonte, de acordo com o Sistema TeleListas conta com

prova de conhecimentos específicos e apresentação de diplo-

137 prestadores de serviços. A escolha dos casos se deu por

mas (ALMEIDA, 2004).

meio dos seguintes critérios: tempo mínimo de dez anos de

Por outro lado, sob enfoque estratégico o recrutamento e a

atuação no mercado, abrangência nacional e seleção de can-

seleção, busca conciliar os interesses empresariais e individuais.

didatos para todos os níveis, ramos de atuação e porte orga-

Para tanto busca um profissional participativo e fornecedor de

nizacional. Tal escolha se justifica no fato de que no Brasil, a

conhecimentos (ALBUQUERQUE,1987). Nesse contexto, Dutra

temática competência, no meio acadêmico e organizacional,

(2004) acrescenta o conceito espaço ocupacional (conjunto de

passou a ser enfatizada a partir da década de 1990, conforme

atribuições e responsabilidades de uma pessoa que ocupa deter-

os autores Tomasi (2004), Fleury & Fleury (2004), Dutra (2004) e

minada posição). Todavia, o processo de recrutamento e seleção

Ruas (2005). Portanto, a abordagem do tema é, de certa forma,

de trabalhadores, apesar do caráter estratégico, mantém os prin-

recente, e os estudos empíricos voltados para a área de recru-

cípios assentados no cargo e na pessoa certa para o cargo muito

tamento e seleção, efetivados junto aos prestadores de serviços

embora exista a valorização do conhecimento, da experiência e

na área, se encontram em fase inicial e apresentam uma série de

dos instrumentos de avaliação baseados em entrevistas, provas e

lacunas, apontadas pelos pesquisadores.

testes como salientam Dutra (2004) e Almeida ( 2004).

O primeiro critério para escolha das empresas que compo-

Confrontando o objetivo do recrutamento e seleção de traba-

riam o estudo foi o tempo de atuação das empresas prestadoras

lhadores frente aos estudos referendados, cabe ressaltar o pro-

de serviço de recrutamento e seleção, na cidade de Belo Hori-

cesso não deve ser reduzido a uma vaga a ser preenchida, a um

zonte, há pelo menos dez anos. De acordo com dados online

cargo a ser exercido. Porém, como enfatizam os autores pesqui-

do SEBRAE4, 56% das empresas fundadas nos mais diferentes

sados a seleção deve ter o critério base que é a pessoa se identi-

ramos de atuação não chegam a sobreviver por cinco anos. Esse

ficar e ser identificada com a cultura da organização e que possa

fato denota a importância do tempo de permanência do estabele-

agregar valor a ambas. Assim, deve ser evitada a seleção de um

cimento no mercado, como elemento de sua maturidade em sua

profissional considerado ideal por suas habilidades para ocupar

área de atuação. Optou-se, portanto, por empresas prestadoras

um cargo, mas, com pouca “aderência aos valores preconizados

dos citados serviços, que tivessem iniciado suas atividades antes

pela cultura” salientam Dutra (2004), Almeida (2004).

de 1996, uma vez que esta pesquisa teve início no ano de 2006. Partiu-se do pressuposto de que esse tempo, teria sido suficiente

Competência – o entendimento do conceito

para que os serviços de recrutamento e seleção vivenciassem as

nas empresas pesquisadas

transformações no mundo do trabalho e a inserção da temática

Metodologicamente, esta investigação se distingue por um

da competência entre seus critérios de seleção de trabalhadores.

estudo qualitativo de múltiplos casos. A pesquisa qualitativa, se-

Tal escolha constituiu elemento relevante para a análise dos da-

gundo Godoy (1995 a, p.62), caracteriza-se por “ter o ambien-

dos, por se relacionar ao contexto de mudanças no mundo do

te natural como fonte direta de dados e o pesquisador como

trabalho reportadas pelos entrevistados.

instrumento fundamental”. Além disso, na pesquisa qualitativa,

O segundo critério de escolha objetivou evitar um entendi-

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mento particularizado, regionalizado, setorizado, funcional do

fere à gestão de competências como modismos passageiros:

conceito de competência praticada nos serviços de recrutamen-

“teorias que aparecem por momentos e que são adotadas pelo

to e seleção, de forma a possibilitar o entendimento mais amplo

mundo do trabalho”:

possível do conceito. Assim, considerando que a competência

Hoje tem uma metodologia: as empresas estão tentando

é individual, portanto, demandada em todos os níveis organiza-

trabalhar com gestão por competências. Cada hora muda. An-

cionais (TOMASI, 2004), buscou-se a participação na pesquisa,

tes, você tinha gestão por objetivos; hoje é gestão por compe-

de empresas prestadoras de serviço que selecionassem profis-

tências. Quando se trabalha com empresa, dá para não se pen-

sionais para os mais diferentes níveis e cargos, bem como, com

sar em objetivo? (R&S7)

atuação em organizações de diversos portes.

Gestão por competências são teorias que aparecem por

Os dados da pesquisa foram obtidos por meio de entrevista

momentos, e acho que esta é mais uma delas, e ela sistematiza

individual, semi-estruturada com os responsáveis pelo proces-

uma forma de funcionar. E quando falamos de metodologia, eu

so de recrutamento e seleção indicados pelas empresas esco-

me lembro que aprendi uma vez: você tem de ter uma metodo-

lhidas num total de oito, abordando os tópicos registrados em

logia, não importa qual. Se você não tem, você não tem história,

roteiro previamente elaborado, com base no referencial teórico

você perde as coisas. (R&S7)

estudado. Durante as entrevistas, foi solicitado aos responden-

Assim, R&S7 associa o modelo de competências a uma

tes que apresentassem fatos e opiniões pessoais, a partir das

moda passageira, uma imposição metodológica, em consonân-

perguntas abertas formuladas. As falas dos entrevistados foram

cia com o entendimento de Le Boterf (2003), Ruas (2005), Fleury

gravadas, o que garantiu a fidedignidade das respostas e facili-

& Fleury (2004) e Dutra (2004) de que o conceito de compe-

tou sua posterior análise e categorização.

tência não passa de mero aspecto burocrático no processo de

Assim, foi possível constatar que, na empresa R&S2, há a

recrutamento e seleção de trabalhadores.

concepção de competência “[...] como algo que pode ser de-

Em síntese, pode-se constatar nos serviços de R&S o en-

senvolvido; junta-se a isso a habilidade que é algo já adquirido

tendimento de competência como saberes mobilizados em face

e a educação; e por último, você põe em prática esses elemen-

de uma situação, alinhando-se com a visão dos citados autores.

tos.”

Foi possível ainda evidenciar que o pessoal incumbido do

Para o representante da empresa R&S1 “[...]competências

R&S de trabalhadores, ao intermediar o processo, influencia e é

são essas habilidades que nós temos, que a empresa precisa, que

influenciado pelas demandas das empresas. No primeiro caso,

eu apresento. A empresa pediu uma série de habilidades, uma sé-

é essa uma oportunidade para que busquem introduzir uma vi-

rie de competências. Essas competências é que vou avaliar.”

são inovadora, voltada para a valorização do desenvolvimento

Na visão da entrevistada R&S5, a competência compreende

do perfil autônomo e empreendedor do trabalhador, abrindo es-

[...]as habilidades que uma pessoa utiliza, suas habilidades interpessoais; são as características das pessoas, que se percebem em toda a vida, tanto na parte interpessoal, quanto no trabalho, em qualquer ambiente. Há três anos começou a se falar em competência. Hoje, eles valorizam muito esta parte interpessoal, lidar com pessoas. (R&S5)

paço para o desenvolvimento de competências, em consonância com a abordagem de Zarifian (2001). Tal percepção pôde ser identificada no representante da Empresa R&S8, cuja base do entendimento da competência, segundo declarou, “provém de cursos, de livros [...], no curso de pós-graduação.” Segundo R&S8, [...]as empresas, quando elas nos passam as competências para a gente avaliar os profissionais, muitas de-

O representante da Empresa R&S8 assim expressa sua percepção:

las já dividem essas competências em comportamento ideal para o cargo, conhecimento ideal e experiência

Pelo conceito que eu pratico disso, [...] a pessoa tem co-

necessária de vivência ideal [...] R&S8

nhecimentos, habilidades e atitudes ou comportamentos frente

[...] as empresas que não têm um RH estruturado, e a

a uma determinada situação. Envolve todos esses. O comporta-

maioria não tem [... ], aí a gente tem de atuar como um

mento, então, está incluído dentro de uma competência... R&S8

consultor, orientando esses empresários pra começar a

Esses juízos revelam o entendimento do conceito de com-

falar sobre competência, mas de uma forma mais téc-

petência ligada à habilidade, em consonância com os estudos

nica, de uma forma que ele compreenda a importância

de Fleury & Fleury (2004).

[...], pois numa descrição de perfil, às vezes, a pessoa

A entrevistada representante da R&S7, por sua vez, se re-

tem muita dificuldade de fazer a descrição de perfil,

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 81


identificar o que realmente precisa na empresa [...] e

Na verdade, esses aspectos hoje demandados sempre in-

tudo isso depende do momento em que a empresa

tegraram as características pessoais do trabalhador. Em face de

pode desenvolver os profissionais, ou num momento em

uma realidade que parece pedir um novo perfil de trabalhador,

que ela precisa de uma pessoa pronta (R&S8).

Dadoy (2004) e Tomasi (2004) afirmam que o atual mundo do trabalho precisa apenas reconhecer no profissional as qualida-

O conceito de competência da representante da empresa R&S3, por sua vez, alinha-se com a visão da Escola Americana,

des já existentes, mas até então não valorizadas nem avaliadas. Segundo Tomasi (2004, p.12)

conforme material fornecido pela entrevistada5 sobre a aborda-

[...] os trabalhadores, individualmente ou em pequenos

gem comportamental (behaviorismo cognitivista).

grupos, sempre reclamaram um conceito de competên-

Em resumo, o conceito de competência, no âmbito dos ser-

cia que, no entendimento deles, fizesse justiça às suas

viços de R&S, é definido, em alguns casos, tomando por base

capacidades, aos seus conhecimentos, aos seus sabe-

aquilo que a empresa contratante entende como competência e,

res, que não os homogeneizasse em face das deman-

como tal, o conceito pode vir ligado aos princípios tradicionais

das dos postos de trabalho (TOMASI, 2004, P.12).

do cargo e da pessoa certa para o cargo certo. Observou-se a tendência à adoção do modelo de competências que analisa

De fato, um trabalhador qualificado, ocupando seu posto de

o candidato quanto à mobilização dos saberes escolarizados,

trabalho e fazendo jus a determinado salário, sempre percebeu

experienciais e atitudinais.

diferenças em termos de desempenho, conhecimento, capaci-

Esse entendimento de competência, atrelado à rigidez do

dade, em relação aos demais. Portanto, sempre foi desejo dos

cargo, choca-se com premissas básicas do conceito de com-

trabalhadores serem valorizados, avaliados em virtude dessas

petência, quais sejam, a autonomia e a responsabilidade, em

diferenças. Nas convenções coletivas, os patrões mantinham a

face de uma situação de evento. Isso configura mudanças bu-

concepção de trabalhador vinculada ao modelo do posto, cargo

rocráticas nos procedimentos de seleção de pessoas, como

e saberes, sem levar em consideração as qualidades do traba-

afirmam Fleury & Fleury (2004) e Dutra (2004), ou seja, refere-

lhador, “elementos que o distingue e que hoje, reconhecidamen-

se à atribuição de roupagem nova a velhos conceitos. Logo, a

te, agrega valor à produção.” Por essa razão não mudavam a

pesquisa evidenciou o uso de práticas renovadas no processo

forma de negociação coletiva.

de recrutamento e seleção; práticas que buscam capacidades,

Nessa ótica, diferentemente de Zarifian (2001, 2003), que as-

qualidades do trabalhador, mas sustentadas em velhos princí-

socia a competência à ruptura do modelo de produção taylorista-

pios. Essa exigência gera a necessidade de novos referenciais

fordista e à demanda do patrão, compreende-se que a passa-

para a avaliação do trabalhador.

gem do modelo de avaliação do trabalhador, da qualificação para

Constatou-se nas entrevistas, por meio da exposição do

a competência, é uma demanda do trabalhador, num contexto

candidato a uma situação problema, que o processo de recruta-

neo-taylorista, caracterizado pela renovação, pelo abrandamento

mento e seleção de trabalhadores na atualidade recorre ao con-

e não pela ruptura6 com o modelo taylorista-fordista, em face da

ceito de competência, o qual engloba três saberes (acadêmico,

inserção heterogênea do modelo de produção flexível.

experiencial e atitudinal). O saber escolarizado, atualizado e mobilizado é fundamental. A trajetória profissional é de responsa-

Considerações finais

bilidade do trabalhador, sendo preferencialmente marcada por

Este estudo buscou compreender o conceito de competên-

curtos períodos de tempo na função ou na empresa. O saber

cia praticado nos serviços de recrutamento e seleção de traba-

experiencial, por sua vez, diz respeito ao saber-fazer. O saber

lhadores em Belo Horizonte frente à demanda por profissionais

atitudinal, igualmente relevante, sempre foi demandado, porém,

competentes. Para isso foram entrevistados oito representantes

no passado, de maneira menos explícita; na atualidade, é con-

de agências de emprego. As empresas escolhidas deveriam es-

siderado essencial, já que o desenvolvimento organizacional

tar operando há mais de cinco anos.

pressupõe o desenvolvimento das pessoas.

A revisão teórica confrontada à pesquisa de campo possi-

Evidenciou-se também que, ao avaliar os saberes preconi-

bilitou concluir que o perfil profissional competente compreende

zados pela qualificação, além dos saberes atitudinais, os servi-

a mobilização de saberes escolarizados acrescido de experi-

ços de R&S atendem aos ditames atuais do mundo do trabalho;

ências pessoais que contribuam para a vida profissional e dos

contudo, não se verificou o rompimento com o princípio do car-

aspectos atitudinais, estes considerados difíceis de serem ava-

go, estabelecido no modelo de produção taylorista-fordista.

liados, uma vez que dizem respeito à subjetividade do indivíduo.

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A análise e interpretação dos dados permitiram constatar que o processo de recrutamento e seleção, na atualidade,

mento e seleção tornam-se consultores, alertando as empresas quanto à conveniência dessa abordagem.

renovou-se, devido às transformações na sociedade em nível

De modo geral, observou-se que o discurso dos entrevis-

mundial, afetando o mundo do trabalho. Na análise das falas

tados denota o não-rompimento com o modelo tradicional de

dos entrevistados, constatou-se que a qualificação, (verificada

gerenciamento de trabalhadores. Muito embora esteja presente

por meio do Curriculum Vitae), é insuficiente para captar as ca-

no processo seletivo o conceito de competência, os serviços de

pacidades do trabalhador atualmente avaliadas, razão pela qual

recrutamento e seleção e as empresas contratantes mantêm o

é adotado o modelo da competência. Os dados revelaram a as-

princípio do cargo e da pessoa certa para o cargo certo acres-

sociação da competência com o cargo (prescrição de tarefas)

cido fortemente pelo componente da cultura organizacional.

disponibilizado pela empresa contratante; o cargo, por sua vez,

Assim, a dimensão das atitudes manifestadas nos comporta-

na moderna concepção de carreira, não é mais visto como uma

mentos confere significado e valor ao trabalho humano de tal

posição estável e de ocupação duradoura. A carreira é hoje as-

forma que o saber-ser é essencial no processo de recrutamento

sociada a experiências diversificadas e de curtos períodos em

e seleção de trabalhadores.

um cargo, muitas vezes, em diversas empresas, e tais elementos indicam a capacidade de mudança, adaptação e flexibilida-

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

de do trabalhador.

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As práticas dos serviços de R&S, para identificarem as demandas dos empresários, centram-se inicialmente na visita à empresa, na observação do ambiente e na conversa informal com os trabalhadores e o superior hierárquico, com vistas a identificar a cultura organizacional e a construção do perfil profissional de-

ALMEIDA, Walnice. Captação e seleção de talentos: repensando a teoria e a prática. São Paulo: Atlas, 2004.

mandado. A captação dos candidatos é feita por meio da publicação de anúncios em jornais, ou em sítios eletrônicos corporativos dos prestadores de serviços de recrutamento e seleção. A análise do candidato, com vistas a considerá-lo com perfil competente engloba entrevistas, testes de conhecimento e inventários, visando a identificar os saberes relativos à profissão, à experiência e às características pessoais ligadas ao exercício do cargo. Assim, muito embora os entrevistados tenham se referido à competência e recorrido a práticas que visam a atestá-la e reconhecê-la no candidato, o entendimento do conceito de competência ainda se vincula aos princípios do cargo e da escolha da pessoa certa para o cargo certo. Os aspectos da cultura da organização e do candidato são pontos relevantes observados no cruzamento entre o perfil demandado pelas empresas contratantes e o perfil ofertado pelos candidatos às vagas a serem preenchidas. Quanto à análise do perfil profissional competente, de forma generalizada, os serviços de R&S participantes da pesquisa avaliam os saberes adquiridos na trajetória escolar e profissional

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dos candidatos às vagas. Para isso, recorrem à entrevista e dinâmica de grupo, a exposição de situações-problema visando à análise do saber comportamental do candidato. Alguns serviços de recrutamento e seleção recorrem a um conceito de competência originado de estudos acadêmicos e do entendimento das empresas contratantes quanto às competências desejadas. Pôde-se constatar que há empresas contratantes que não fazem

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3 TAYLOR, Frederick Winslow. The principles of scientific management. New York, 1967.] 4 SERVIÇO BRASILEIRO DE APOIO ÀS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS – SEBRAE, 2004. Disponível em :< www.sebrae.com.br >. Acesso em 02/04/2006. 5 David McCleland, no artigo publicado em 1973, intitulado “Testar competências no lugar de inteligências”, afirma haver melhores preditores de desempenho futuro do que os tradicionais testes de inteligência e aptidões. McCleland viu no behaviorismo cognitivista, o foco principal da análise das competências, como o comportamento observável. 6 Na fase de coleta de dados desta investigação, foram visitadas duas indústrias uma do ramo automobilístico e outra de tecido. Em ambas coexistem o modelo taylorista-fordista e a produção flexível. Constatou-se a presença, no mesmo espaço físico, de alta tecnologia, robotização e informatização da produção e, de equipamentos e procedimentos tipicamente tayloristas-fordistas. A novidade é o rodízio dos trabalhadores nas tarefas, funções para aprendizagem e melhor qualidade de vida no ambiente fabril.

TOMASI, A . Da qualificação à competência: pensando o século XXI. Campinas, SP: Papirus, 2004 VILELLA, Túlio in <www.educacão.uol.com.br/historia/ult690u59.jtm> Acesso em 10/07/2008. YIN, R. K. Estudo de caso: planejamento e métodos. Tradução de Daniel Grassi. 3. Ed. Porto Alegre: Bookman, 2005. ZARIFIAN, P. Objetivo Competência: por uma nova lógica. São Paulo: Atlas, 2001. _________. O modelo da competência: trajetória histórica, desafios atuais e propostas. Tradução de Eric Roland René Heneaul. São Paulo : Editora Senac, 2003. _________.Les conflits temporels et les divergences stratégiques à l’épreuve de la gestion par les compétences. Communication pour lê congrès de l’AGRH 2005. Disponível < http://www.philippe.zarifian/ page127> acesso em 20/03/2007.

NOTAS DE RODAPÉ 1 Mestre em Educação Tecnológica, especialista em Metodologia do Ensino Superior e Educação Tecnológica, Bacharel em Administração de Empresas, Docente na Escola de Educação Profissional Newton Paiva e na Faculdade de Tecnologia do SENAI – FATEC BH 2 Possui mais de 30 anos de experiência na área de headhunting; foi eleito pela Revista Business Week, de 25/03/2008, o 13o em uma lista de 50 caça-talentos mais influentes do mundo. Trabalha numa prestadora de serviços de recrutamento e seleção com sede em Zurique, Suíça, fundada em 1964, atuante em 37 países.

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REPORTAGEM: um gênero de mil faces Raquel A. Soares Reis Franco 1

As palavras me antecedem e ultrapassam, elas me tentam e modificam (...) (Clarice Lispector, 1971). RESUMO: Este artigo insere-se no campo Semiolinguística e objetiva analisar a reportagem intitulada Sistema de Formação Não Ferirá Autonomia, publicada no site do Ministério da Educação, no dia 11 de novembro, de autoria de Letícia Tancredi. Na primeira parte do texto, sintetizamos a reportagem em análise. Na segunda parte, apresentamos, sucintamente, a discussão em torno da Semiolinguística. Na terceira parte, realizamos a análise da reportagem à luz da Semiolinguística e por último, apontamos algumas considerações em que se evidenciam a importância desta perspectiva teórica para o exame dos mais diversos textos relacionados a uma situação discursiva, e, especialmente, do discurso midiático. PALAVRAS-CHAVE: Análise do Discurso; Análise Semiolinguística; Gênero Reportagem.

1. INTRODUÇÃO

Não se trata apenas de analisar a reportagem e sim exami-

Vive-se uma conjuntura histórica permeada por cenários

nar a enunciação2 como um correlato de certa posição sócio-his-

complexos, especialmente no que concerne às transforma-

tórica. Desta forma, objetiva-se observar neste texto um conjunto

ções no mundo do trabalho. Entre os processos sociais e as

de enunciados3 que constituem narrativas acerca da necessida-

polêmicas contemporâneas destacam-se, atualmente, aquelas

de de oferecer uma formação continuada aos docentes.

envolvendo a problemática da formação docente. Deste modo,

A análise do discurso (AD) segundo Maingueneau (1997)

o texto analisado não pode ser entendido fora da conjuntura

exige uma “leitura verdadeira”. E o analista do discurso tem

histórica, cultural e discursiva. O cenário político no qual se lo-

um papel importante que é de contribuir para a hermenêutica4

caliza a reportagem é marcado por dispersões e continuidades,

contemporânea. Sendo o desafio crucial da AD é de construir

mas especialmente pela recorrência do discurso de formação

interpretações, sem jamais neutralizá-las, seja através de uma

do professor.

minúcia qualquer de um discurso sobre o discurso, seja no

A reportagem trata do Sistema Nacional Público de For-

espaço lógico estabilizado compreensão universal. Opta-se,

mação de Professores. Teve como objetivo, principal, divulgar

neste texto, por uma análise semiolinguística da reportagem:

acerca da minuta de decreto que esteve aberta à consulta pú-

Sistema de formação não ferirá autonomia (anexo I); apon-

blica até 24 de novembro de 2008. Segundo Tancredi, jornalista

tando as características do gênero, a tipologia, os aspectos

do Ministério da Educação (MEC), a sondagem se justifica na

sintáticos e semânticos, os sujeitos/ instâncias, o espaço das

tentativa de superação, “do

estratégias da instância de produção, as estratégias de capta-

formato de ‘balcão’ no repasse de recursos extras às insti-

ção, as estratégias de credibilidade, a estrutura da reportagem e a finalidade do ato de comunicação.

tuições de educação superior. E, também, pela possibilidade de envio sugestões para o aperfeiçoamento do texto. Os discursos são práticas que formam sistematicamente os objetos de que falam, como afirma Foucault apud Maingueneau (1997).

2- ANÁLISE SEMIOLINGÜÍSTICA DO DISCURSO Charaudeau (2005), ao justificar o aspecto semiolinguístico da análise do discurso, aponta-nos alguns aspectos va-

Um conjunto de regras anônimas, históricas, sempre

lorizados por esta perspectiva teórica, quais sejam: dimen-

determinadas no tempo e no espaço que definiram em

são cognitiva, que pressupõe a percepção e a categorização

uma época dada, e para uma área social, econômica,

do mundo; uma dimensão social e psicossocial, que abran-

geográfica ou linguística dada, as condições de exer-

ge o valor de troca dos signos e valores de influências dos

cício da função enunciativa. (FOUCAULT apud MAIN-

fatos da linguagem e uma dimensão semiótica, que, num

GUENEAU, 1997, p.14).

sentido amplo, relaciona a construção dos sentidos com a construção das formas, ou seja, como se realiza a semantiPÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 85


e, não raro, esse processo registra suas marcas em um

zação das formas e como se faz a semiotização do sentido.

texto, materialização possível de um ato de linguagem.

Conforme Sobreira (2005), a escolha da palavra semiolin-

(MORATO, 2009, p.1).

güística explica-se pelo fato que semio-, de “semiosis”, evoca o fato de que a construção dos sentidos e sua configuração se fazem através de uma relação forma sentido (em diferentes

Evidencia-se, então, que a semiolinguística toma o sujeito

sistemas semiológicos). Assim sendo, a teoria postula que a

como responsável por uma intenção de influenciar alguém, uma

semiotização do mundo obedece a dois processos: O primeiro

forma de ação que se manifesta pelo uso da linguagem na me-

é o processo de transformação, que transforma um “mundo a

dida em que intencionalidade e persuasão são traços presentes

significar” em “mundo significado”, sob a atitude de um sujeito

na atividade discursiva do sujeito que se constitui como comu-

falante. O segundo é o processo de transação, que torna este

nicante.

“mundo significado” um objeto de troca, na interação com outro

O sujeito comunicante (Eu c) mobiliza na encenação

sujeito, tomado como destinatário deste objeto.

do dizer, as intenções que ajudam a construir hipóteses

Percebe-se, então, que este duplo processo de semiotiza-

de saber sobre o interactante que é posto como sujeito

ção é o fundamento do contrato de comunicação que é a con-

interpretante (Tu i). Uma vez mobilizado esse mecanis-

dição para que os parceiros de um ato de linguagem se com-

mo, uma mise en scène permite ao sujeito comunicante

preendam minimamente e possam interagir na construção do

converter-se em sujeito enunciador. Há uma passagem,

sentido, que é a meta essencial de qualquer ato de comunica-

portanto, do fazer para o dizer, ou do simplesmente di-

ção.

zer para o efetivo enunciar. Do mesmo modo, o sujeito Para Sobreira (2005), “o contrato de comunicação tem

destinatário, representado pelo TU d é o resultado da

como base o quadro situacional controlado pelo processo de

conversão de um sujeito interpretante em um ser situado

transação. Ele está intimamente relacionado com o princípio

em um universo de interação discursiva. Também esse

de alteridade, que constitui o fundamento do aspecto contratu-

receptor do discurso procede na passagem de um fazer

al do ato de comunicação” na medida em que implica o reco-

para um receber o enunciado. (MORATO, 2009, p.3).

nhecimento e uma legitimação recíproca entre os parceiros. Já o princípio da pertinência confirma o aspecto contratual, pois

Nota-se pelo exposto que o ato de linguagem é comanda-

“envolve o reconhecimento do universo de referência, ou seja,

do por “circunstâncias sociais, sendo os parceiros do ato co-

o compartilhamento dos saberes implicados do ato de lingua-

municativo definidos por uma identidade, psicológica ou social,

gem. Assim, para o estabelecimento do contrato de comunica-

constituindo-se como sujeito Enunciador e Destinatário, seres

ção, é indispensável precisar alguns critérios de construção do

de natureza discursiva, comandados pelo sujeito Comunicante

texto”(SOBREIRA, 2005).

e Interpretante”.

Na mesma direção de Sobreira, Morato (2009) afirma que a Análise Semiolinguística do Discurso metaforiza a coletividade

3- ANÁLISES SEMIOLINGUÍSTICA DA REPORTAGEM

social como um teatro no qual são encenadas, pela linguagem e na linguagem, as mais diversas relações intersubjetivas. Nesta

3.1- GÊNERO

perspectiva, a sociedade é marcada pela presença de campos

Segundo Marcushi (2005), gêneros textuais, são fenômenos

enunciativos nos quais ocorrem representações, de cunho lin-

históricos, profundamente vinculados à vida cultural e social.

guageiro e discursivo, dos papéis sociais exercidos pelos par-

Fruto de trabalho coletivo. Os gêneros contribuem para ordenar

ceiros da comunicação.

estabilizar as atividades comunicativas do dia-a-dia. São enti-

O discurso se relaciona com a encenação de um ato de

dades sócio-discursivas e formas de ação social incontornáveis

linguagem, o qual vem a ser uma espécie de represen-

em qualquer situação comunicativa. Quanto ao surgimento dos

tação cenográfica de um dizer social, de um pronuncia-

gêneros, o autor os separa em três fases. Primeiro: povos de

mento contextualizado por fatores de ordem psicosso-

cultura essencialmente oral que pouco desenvolveram os gêne-

cial e linguageira: um jogo cênico discursivo amparado

ros. Segundo: após a invenção da escrita alfabética por volta do

pelo circuito do fazer psicossocial, que é o lugar situ-

século VII A.C, multiplicaram- se os gêneros, surgindo os típicos

acional da enunciação, e o circuito da organização do

da escrita. E por último: a expansão dos gêneros com a expan-

dizer, o lugar do discurso. O discurso, por esse prisma,

são do florescimento cultural da imprensa. Em síntese, gêneros

é o lugar onde o sujeito encena uma dada significação

textuais são uma expressão como uma noção propositalmente

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vaga para referir os textos materializados que encontramos em

Diante destas categorias, faz-se necessário conceituar o tipo em

nossa vida diária e que apresentam características sócio-comu-

questão:

nicativas definidas por conteúdos, propriedades funcionais, esti-

Este texto de enunciado textual tem um verbo de mu-

lo e composição características.

dança no passado, um circunstancial de tempo e lugar.

Embora, Bakhtin não tenha teorizado sobre os gêneros

Por sua referência temporal e local, este enunciado é

textuais, muito contribuiu para o campo. As principais caracte-

designado como enunciado indicativo de ação. (MAR-

rísticas bakhtinianas de gênero são: tipo relativamente estável

CUSHI, 2005, p. 28).

5

de enunciados presentes em cada esfera de troca; possui uma forma de composição, num plano composicional, distingue-se

Ao conceituar a tipologia, verifica-se que este gênero tem

pelo conteúdo temático e pelo estilo; trata-se de entidades es-

traços de outros tipos textuais. Isto significa que este texto con-

colhidas tendo em vista as esferas de necessidade temática, o

tém elementos do tipo descritivo e do dissertativo.

conjunto dos participantes e a vontade enunciativa ou intenção do locutor.(Cf. KOCH, 2002).

3.3- ASPECTOS SINTÁTICOS

Em concordância com Koch (2002), Bazerman (2006, p.

A reportagem, em questão, é um texto constituído de um

29) afirma que os gêneros textuais são “formas de comunica-

texto verbal (título e texto). Trabalha com enfoque a interpretação

ção reconhecíveis e autoreforçadoras”. Este mesmo autor pro-

e converte fatos em assunto. É caracterizada por períodos sim-

põe vários instrumentos conceituais e analíticos para o exame

ples e compostos. Na composição dos períodos compostos há

do trabalho realizado pelo texto na sociedade: fornece os meios

vários elementos linguísticos coesivos. Faz uso do padrão culto

para identificar as condições sob as quais esse trabalho se

da língua portuguesa.

realiza, possibilita observar a regularidade com que os textos executam tarefas reconhecidamente similares, e para ver como

3.4- ASPECTOS SEMÂNTICOS

certas profissões situações e organizações sociais podem estar

A peça analisada embora não se caracterize pelo aspecto

associadas a um número limitado de tipos de textos; apresenta

polissêmico, apresenta um estereótipo, isto é, unidade sintáti-

métodos para analisar como produção, circulação e uso orde-

ca já consagrada pelo uso, o que chamamos de frases clichê.

nados desses textos constituem, em parte, a própria atividade e

Observa-se um estereótipo na seguinte frase da reportagem:

organização dos grupos sociais.

“Pretende superar o formato de “balcão” no repasse de

Enquanto gênero textual, o termo reportagem, segundo o

recursos extras às instituições de educação superior.” Es-

dicionário Aurélio Eletrônico, tem a sua origem do francês re-

tereótipos são, portanto, fórmulas que, consagradas pelo uso,

portage. E, significa atividade jornalística que compreende a co-

funcionam como verdades absolutas, impedindo, assim, qual-

bertura de um acontecimento, a análise e a preparação do texto

quer questionamento do interlocutor.

final a ser entregue à redação. Pela origem da palavra e pelo

Muitas vezes, esses textos familiares sofrem alterações,

significado da mesma, corrobora-se com Bazerman (2006, p.21)

causando por isso estranheza. O resultado do emprego dessa

quando diz que “Temos gêneros [no caso reportagem] altamen-

estratégia discursiva não poderia ser outro: chamam ainda mais

te tipificados, de documentos e estruturas sociais altamente ti-

a atenção. Outro aspecto semântico observado na reportagem é

pificadas nas quais esses documentos criam fatos sociais que

uso da figura de linguagem: “O modelo não fere a autonomia

afetam as ações, direitos e deveres das pessoas.”

das universidades...” O emprego da prosopopeia/ personifi-

Compreender, então, o funcionamento dos gêneros repor-

cação torna mais expressivo e, portanto, mais atraente, o que

tagem favorece no diagnóstico e na redefinição de sistemas de

faz com que seja usado de forma marcante no texto jornalístico.

atividades comunicativas em uma tentativa de determinar se um texto é utilizado em certos momentos, é redundante ou enganoso.

3.5- SUJEITOS/ INSTÂNCIAS Para Charaudeau (2001), um enunciado qualquer seria de fato produzido e lido por duas pessoas, que são, segundo o Eucomunicante e o Tu-interpretante. Entretanto, quando o enun-

3.2- TIPOLOGIA TEXTUAL O gênero reportagem se increve no tipo textual narrativo. De

ciador fala a alguém, ele tem em mente a figura do destinatário

acordo, com Marcushi (2005), tipo textual é um conjunto de tra-

daquela mensagem. Essa “pessoa hipotética” seria o Tu-des-

ços que forma uma sequencia e não um texto e suas categorias

tinatário – que é a imagem idealizada pelo Eu-comunicante de

são: narração, argumentação, exposição, descrição, injunção.

seu enunciatário. Por outro lado, o Eu-comunicante procura

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passar para o Tu-interpretante uma imagem de si mesmo, que poderá ser ou não aceita pelo Tu-interpretante. Essa imagem é denominada Eu-enunciador, que também é uma figura hipoté-

- Texto: exposição do fato apresentado no título, apresentando provas que justifiquem o título. - Assinatura: apresentação do nome do autor.

tica na enunciação. Sendo assim, essas figuras presentes na enunciação são as instâncias de produção: - Eu- comunicante e Tu-interpretante – pessoas reais, são o produtor e o destinatário do enunciado; · - Eu-enunciador e Tu-destinatário – imagens que o enunciador idealiza de si mesmo e de seu enunciatário ao produzir

3.9- FINALIDADES DO ATO DE COMUNICAÇÃO O Ministério da Educação objetiva que a sociedade tenha acesso a minuta do decreto e que enviem sugestões de aperfeiçoamento ao texto. Desta forma, a reportagem foi o meio utilizado para este fim.

o enunciado. No texto, em questão, a instância de produção é a jornalista

4- CONSIDERAÇÕES FINAIS

Letícia Tancredi e a instância de recepção é o leitor. A situação

A semiolinguística mostra-se como um importante instru-

de comunicação é monologal e o canal utilizado é o gráfico. Em

mental teórico para o exame dos mais diversos textos relacio-

função da situação de comunicação e do meio utilizado para a

nados a uma situação discursiva, e, especialmente, do discurso

divulgação do texto- a internet será considerada a instância (de

midiático, conforme revelam as páginas anteriores. Analisar dis-

produção e de recepção).

cursivamente a reportagem possibilita-nos refletir sobre os dis-

6

cursos que envolvem a questão da formação docente no Brasil. 3.6- ESTRATÉGIAS DE CAPTAÇÃO

Além disto, permite evidenciar que “(...) o discurso ultrapassa

No contrato de comunicação midiática, a instância de pro-

os códigos de manifestação linguageira na medida em que é

dução procura atingir o maior número de leitores; buscando

o lugar da encenação da significação, sendo que pode utilizar,

despertar neles o desejo de se informar. Outro aspecto de cap-

conforme seus fins, um ou vários códigos semiológicos”. (CHA-

tação diz respeito aos fatos pelo qual a instância de produção

RAUDEAU, 2001, p. 25). “Nesse sentido, comunicar, informar,

lida; isto faz com que a instância de recepção se interessa sobre

tudo é escolha.” (CHARAUDEAU, 2007, p. 39).

a temática.

A análise discursiva feita abrange fenômenos da linguagem sob dois aspectos: um externo e outro interno ao universo da

3.7- ESTRATÉGIAS DE CREDIBILIDADE

linguagem. De um lado, a lógica das ações e influências sociais;

Segundo Coura Sobrinho (2003), a credibilidade remete à

de outro, a construção do sentido da linguagem e a construção

possibilidade de comprovação de que o informante está dizen-

dos textos. Assim, encontramo-nos num cruzamento de situa-

do a verdade. Assim, na peça em questão, o sujeito informante

ções que, em conjunto, nos leva a uma dimensão psicosocio-

fornece alguns procedimentos para aferir a autenticidade das

linguageira do discurso, vinculada à construção do processo de

informações:

semiotização do mundo.

- Local pelo qual o texto é veiculado: Portal do Ministério da Educação;

5- REFERÊNCIAS

- Opinião do ministro da educação sobre o sistema de formação de professores e o seu depoimento; - A reportagem foi concebida a partir de um pronunciamento do Ministro da Educação em um Seminário de formação de professores e estágio, no âmbito do Fórum Brasileiro de PróReitores de Graduação (FORGRAD); - Disponibilização de um e-mail para o envio das propostas ao Conselho Técnico Científico da Educação Básica da CAPES. 3.8- ESTRUTURA DA REPORTAGEM A reportagem, de modo geral, tem uma estrutura própria.

BAZERMAN, Charles. Gêneros Textuais, Tipificação e Interação. São Paulo: Cortez, 2006. COURA SOBRINHO, Jerônimo. Análise do discurso em perspectivas. Belo Horizonte: Faculdade de Letras da UFMG, 2003. KOCH, Ingedore Villaça. Desvendando os segredos do texto. São Paulo: Contexto, 2002. CHARAUDEAU, Patrick. Uma Teoria dos Sujeitos da Linguagem. In: MARI, H. et al.(orgs.). Análise do Discurso: Fundamentos e Práticas. Belo Horizonte:NAD/FALE/UFMG, 2001.

Assim, a reportagem em questão não foge a regra. -Título: frase curta por meio da qual se apresenta ao interlocutor um fato ou uma situação.

____________. MAINGUENEAU, Dominique. Dicionário de Análise do Discurso. Tradução Fabiana Komesu (et al.) São Paulo: Contexto, 2004.

88 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


“O modelo não fere a autonomia das universidades, até por____________. Uma análise semiolinguística do texto e do discurso. in:Da língua ao discurso: reflexões para o ensino. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário eletrônico Aurélio da língua portuguesa. Versão 5. 11ª ed. Curitiba: Positivo Informática Ltda., 2004. FIORIN. José Luiz. Introdução ao pensamento de Bakhtin. São Paulo: Editora Ática,2006. LISPECTOR, C. Os desastres de Sofia. In: Felicidade Clandestina. Rio de Janeiro:Rocco, 1998.

que a adesão é voluntária. O objetivo é disciplinar o acesso aos recursos adicionais para a formação de professores”, destacou Haddad. O ministro citou o exemplo dos repasses do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) vinculado aos Planos de Ações Articuladas (PAR) dos estados e municípios. “Ao atrelar o recebimento de recursos extras aos planos anuais, multidimensionais, baseados em diagnósticos da educação de cada localidade, principalmente as de menor IDEB, as oportunidades estão sendo equalizadas”. Na visão de Haddad, com a formação do magistério não poderia ser diferente, já que é a primeira vez que a União aporta recursos para esse setor, nesse patamar. Segundo ele, a cria-

MAINGUENEAU, Dominique. Novas Tendências em Análise do Discurso. Campinas:Pontes e Editora da UNICAMP, 1997. _____________. Análise de textos de Comunicação. São Paulo: Cortez, 2008.

ção do sistema nacional se tornou possível graças à alteração na lei da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), que passou a ser responsável pela formação de professores, e à própria instituição do Plano de Desenvolvimento daEducação (PDE).

MARCUSCHI, Luiz Antônio. Gêneros Textuais & Ensino. Rio de Janeiro:Lucerna,2005. MORATO, Ilson Ferreira. Homem, Acadêmico, Poeta e Pastor: Uma Análise Semiolinguística da Constituição dos Sujeitos na Obra de Cláudio Manoel da Costa. Disponível em: http://www.ichs.ufop.br/memorial/trab/ l8_3.pdf. Acessado em: 12 dez.2011.

“O que tem que ficar claro é a não-obrigatoriedade da participação das instituições no sistema. As universidades que desejam fazer parte, sejam federais ou estaduais, devem aderir e terão liberdade para forjar seus planos de formação”, ressaltou o ministro. Com a implantação do sistema, o MEC pretende garantir um padrão de qualidade para os cursos de formação e adaptar os currículos desses cursos à realidade da sala de aula.

SOBREIRA, Francisco de Assis Moura. Uma Análise Semiolinguística do Discurso Poético. Disponível em: www.filologia.org.br/viiifelin/43.htm. Acessado em: 12 dez.2011. TANCREDI, Letícia. Sistema de formação não ferirá autonomia. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_ content&task=view&id=11601. Acessado em 18 de novembro de 2008.

A meta é estimular o ingresso e a permanência na carreira do magistério, aumentar o número de professores com formação superior em instituição pública e equalizar as oportunidades de formação em todo o país. A minuta do decreto que vai instituir o sistema está aberta a consulta pública. Até 24 de novembro, a sociedade tem acesso ao documento, no portal do Ministério da Educação, e

ANEXO I

pode enviar sugestões de aperfeiçoamento do texto para o endereço eletrônico: formacao.magisterio@capes.gov.br Este

Sistema de formação não ferirá autonomia

endereço de e-mail está protegido contra spam bots, pelo que

11/11/2008 16h42min: 15

o Javascript terá de estar ativado para poder visualizar o endereço de email. As propostas serão examinadas pelo Conselho

O decreto que institui o Sistema Nacional Público de Formação de Professores, aberto a consulta pública até 24 de no-

Técnico-Científicoda Educação Básica da Capes, que pode dar nova redação à minuta.

vembro, pretende superar o formato de “balcão” no repasse de recursos extras às instituições de educação superior. Critérios

Letícia Tancredi

baseados no regime de colaboração nortearão a distribuição

11/11/08

dos recursos às universidades que aderirem ao sistema. A expli-

Disponível

em:

http://portal.mec.gov.br/index.

cação foi dada pelo ministro da Educação, Fernando Haddad,

php?option=com_content&task=view&id=11601 Acessado em

nesta terça-feira, 11, no seminário sobre formação de professo-

18 de novembro de 2008.

res e estágio, no âmbito do Fórum Brasileiro de Pró-Reitores de Graduação (FORGRAD). PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 89


NOTAS DE RODAPÉ 1. Professora Adjunta I do Centro Universitário Newton Paiva, mestre em Educação Tecnológica pelo CEFET-MG e doutoranda em Educação pela FAE/UFMG. 2. A enunciação constitui o pivô da relação entre a língua e o mundo: por um lado, permite representar fatos no enunciado, mas, por outro, constitui por si mesma um fato, um acontecimento único definido no tempo e no espaço. Faz-se geralmente referência à definição de Benveniste, que toma a enunciação como “a colocação em funcionamento da língua por um ato individual de utilização”, que o autor opõe a enunciado, o ato distinguindo-se de seu produto. (CHARAUDEAU e MAINGUENEAU, 2006, p. 193). 3. Para Maingueneau (2008) enunciado é a marca verbal do acontecimento que é a enunciação. É uma unidade elementar da comunicação verbal, uma sequencia dotada de sentido e sintaticamente completa. 4. De acordo com o dicionário Aurélio Eletrônico, hermenêutica significa: Interpretação do sentido das palavras; arte de interpretar leis. 5. Bakhtin interessava-se menos pela propriedade formal dos gêneros do que as maneiras como eles se constituíam. (FIORIN, 2006). 6. Para Machado (2001) indica parceiros da comunicação que estão fisicamente falando – in absentia. Entram então nesse caso: todos os textos escritos (cartas, editoriais, livros...) ou impressos (publicidade, desenhos...) assim como também a comunicação via televisão ou internet (excetuando-se o caso bem específico, nesta última dos chats).

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A MONITORAÇÃO DOS FATORES AMBIENTAIS E SEUS REFLEXOS NO AMBIENTE DE MARKETING DAS ORGANIZAÇÕES Aécio Antônio de Oliveira1

RESUMO: Faz-se neste paper uma leitura das premissas que envolvem o contexto sócio econômico ambiental nas organizações, amparadas por conceitos e elementos de estudo que impulsionam as empresas à constante busca pela informação. A monitoração ambiental tem sido tema de discussão no cenário empresarial, particularmente no ambiente de marketing das organizações, entretanto, ainda pouco empregada e difundida frente à realidade organizacional. Os agentes de mudança compreendidos na proposta de monitoração ambiental são classificados como fatores determinantes do processo decisório. Contudo, cabe externar a sua importância e o reflexo desses elementos gestores frente ao processo de mudança, bem como, sua relevância para tomada de decisão nas organizações. PALAVRAS-CHAVE: Monitoração Ambiental; Mudança; Ambiente Organizacional.

Introdução

e direcionamentos apreciados como tendenciosos. Um plane-

A palavra monitoração vem ganhando cada vez mais espa-

jamento estratégico propõe perguntas básicas e, como pre-

ço no ambiente corporativo que envolve organizações de toda

missa, faz-se necessário saber o que a empresa está fazendo

natureza, sejam públicas ou privadas. Essas organizações in-

neste momento, o que está acontecendo no ambiente que a

vestem em ferramentas de gestão e se orientam para o mer-

empresa se insere e, o que ela deveria estar fazendo, ou seja,

cado, amparadas por uma constante demanda de informação

para onde está se movendo.

e, em especial, de idéias que levantam questões atualizadas sobre o atual cenário competitivo composto por fortes fatores socioeconômicos.

Hooley; Saunders & Piercy (2005, p. 69), abordam sobre o ambiente mutável dos mercados, no qual, descrevem: O principal candidato é uma mudança na natureza

A conscientização sobre os efeitos originados pelos fatores

da mudança: de uma mudança contínua (embora in-

que regem o ambiente em que o marketing opera está sempre

cremental) para uma mudança descontínua, (porque)

mudando, tornando de suma importância para a construção de

quando a mudança descontínua torna imprevisíveis

uma sólida estratégia a constante monitoração dos atores que

as exigências dos clientes, a alavancagem estratégica

alimentam esse círculo gestor de informação.

muda de eficiência para flexibilidade e capacidade de

Uma das mais claras definições de monitoração ambiental

reação – e para investimentos que capacitem a empre-

2

é descrita por Lester e Waters (apud CHOO, 1995, p. 85) ao

sa a pressentir precocemente uma mudança não pre-

afirmarem que é “um processo gerencial que utiliza de informa-

vista e, assim, preparar uma resposta inovadora com

ções ambientais na tomada de decisão”. Este processo com-

mais rapidez.

preende três atividades: a) a coleta de informações a respeito do ambiente externo da organização;

Desse modo, a monitoração ambiental tem sido destacada e apontada na literatura acadêmica como elemento indispen-

b) a análise e interpretação desta informação e,

sável para qualquer tipo de processo de gestão no ambiente

c) a utilização desta inteligência analisada no processo de-

mercadológico das organizações, especialmente, para a ela-

cisório estratégico.

boração da estratégia empresarial. (HENRIQUE, 2004).

Presentemente, o verbo mudar tem se tornado elemento

A celeridade como surge uma ocorrência ambiental, seja

de estudo e análise contínua nas organizações, o que implica

está divisora ou multiplicadora, muitas vezes, decorrente de

muitas vezes em tomadas de decisão movidas por influências

especulações no macro ambiente de negócios, pode represen-

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 91


tar um incremento ou uma desaceleração no cenário compe-

micro ambientais. Desse modo, o micro ambiente consiste de

titivo que circulam as empresas, independente do setor ou da

forças próximas à empresa, em que, afetam sua capacidade de

natureza de sua atividade, desencadeando assim, uma reação

atender seus clientes, ou seja, são seus parceiros, fornecedores,

multiplicadora de ruídos que refletem e impactam nas atividades

concorrentes, intermediários e os públicos. Já o macro ambien-

comerciais e produtivas. Assim sendo, uma leitura antecipada

te consiste em forças sociais maiores, atualmente inseridas em

desses fatores ambientais, amparada por uma constante moni-

um contexto universal de negócios. São forças que afetam todo

toração ambiental nos negócios, pode se tornar uma importante

o composto macro ambiental em torno da organização. Essas

ferramenta de gestão, bem como de aprendizagem organizacio-

forças podem ser danosas e prejudiciais ao ambiente de negó-

nal para o direcionamento correto das informações e, por con-

cios da empresa se mal monitoradas e assistidas. Forças estas,

seguinte, para tomada de decisão.

representadas pelo ambiente econômico, natural, tecnológico, político, demográfico e cultural.

Os fatores ambientais na área de marketing das empresas Os fatores ambientais, em especial os macro ambientais,

Identificação das principais variáveis ambientais

que atuam como forças externas ao marketing são atores que

Entre as forças ambientais apresentadas e já descritas, nem

representam e afetam a capacidade financeira, comercial e pro-

todas podem, em dado momento, afetar uma organização. O

dutiva das organizações. No entanto, essas variáveis internas

primeiro passo nesse tipo de análise consiste na identificação

são controláveis e administradas considerando às mudanças no

das principais variáveis ambientais e seus respectivos indica-

cenário socioeconômico. O ambiente de marketing oferece tan-

dores, como o nível de inflação (política econômica), a renda

to oportunidades como ameaças, e as empresas consideradas

discricionária (economia), as inovações (tecnologia), a popula-

inovadoras sabem que é fundamental para a sobrevivência a ob-

ção economicamente ativa (demografia), a estabilidade interna

servação e adaptação as constantes mudanças nesse ambiente

(política), a participação social (cultura) e outras mais, que irão

de negócios.

impactar de forma positiva ou negativamente a organização.

Os profissionais de marketing atuante nessas organizações

(TAVARES, 2005).

são pessoas responsáveis por esta monitoração, que envolve

Na identificação de variáveis ambientais, a organização

informação e identificação de elementos de mudança que circu-

pode categorizá-las segundo quatro dimensões: complexidade,

lam no arcabouço externo das variáveis ambientais.

velocidade, duração e incerteza. Conforme Tavares (2005), es-

Na visão analítica desse processo, é importante destacar o trabalho em foco, atentando-se para o conjunto de variáveis externas e internas: não controláveis e controláveis.

sas dimensões apresentam as seguintes características: Complexidade: corresponde ao conjunto de variáveis que, em dado momento, simultaneamente, influencia positiva ou ne-

A figura a seguir descreve de forma sintetizada o macro e o

gativamente a vida de uma organização e que se expressa de

micro ambiente dessas variáveis, considerando a empresa e o

maneira diferente segundo as características de cada uma des-

composto de marketing.

sas organizações. Em razão da impossibilidade de captar todas as variáveis que influenciam sua vida, teremos que ser, de certa forma, arbitrários, tentando relacionar aquelas que são consideradas mais significativas. Velocidade: corresponde à intensidade de alteração nos indicadores de determinada variável que compõem o ambiente da organização. É diferente de setor para setor, de organização para organização. Por exemplo, as inovações tecnológicas que ocorrem no setor de eletro-eletrônicos ou de informática são muito mais rápidas dos que as que ocorrem no setor de construção civil ou mesmo no setor alimentício; Duração: é o período de tempo que uma variável interfere, positiva ou negativamente, na vida de uma organização. Quando se identificam mudanças lentas, mas duradouras, identificam-se uma tendência. Quando se identificam mudanças rápidas, mas

O ambiente de marketing é cercado por forças macro e

de curta duração, identificam-se modismos. A busca de energé-

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ticos alternativos ou a busca espiritual caracterizada pela “Nova

rem alinhadas com a arquitetura funcional, considerando os ativos

Era” podem ser classificadas como tendência, enquanto o com-

e recursos que regem esta sinfonia conhecida como mercado. As

portamento dos yuppies pode ser considerado como moda;

empresas consideradas inovadoras se posicionam e trabalham in-

Incerteza: é o grau de previsibilidade das forças ambientais,

tensivamente a proposta de criação de valor. Contudo, para con-

que podem ser baixa, média ou alta. As ocorrências demográfi-

duzir harmoniosamente e com eficácia este arcabouço de variáveis

cas, tais como pirâmide etária, taxa de natalidade e mortalidade,

externas e internas que move as empresas na direção correta do

esperança de vida entre outras, podem ser previstas com grau

mercado, a monitoração ambiental tornou-se valiosa ferramenta de

razoavelmente maior de segurança do que as ocorrências eco-

leitura composta de ativos gestores de previsibilidade.

nômicas ou tecnológicas. Relativamente, os níveis inflacionários

Afirma Churchill & Peter (2005, p. 20) que, “para a gestão

podem ser avaliados como de baixa previsibilidade. Na década

estratégica poder lidar com um ambiente de marketing em

de 1990 era quase impossível arriscar estimativas por períodos

constante mudança, é necessário que ela se torne cada vez

superiores há dois meses.

mais voltada para o mercado.”.

De acordo com Churchill & Peter (2000, p. 26) análise am-

Atualmente, as empresas em todo o mundo operam e con-

biental é, “a prática de rastrear as mudanças externas que po-

duzem seus negócios em um cenário de descrédito para alguns

dem afetar o mercado, incluindo demanda por bens e serviços.

e credibilidade para outros, movidas por uma avalanche de in-

Embora, todo gerente a frente dos negócios precisa obser-

formações de natureza macro e micro ambiental que envolve

var o ambiente externo da organização, os profissionais de ma-

esse contexto organizacional. Os reflexos desses organismos

rketing são orientados para ampliar a proposta de monitoração

que conduzem o ritmo do mercado para as empresas e por sua

por meio da inteligência de marketing e a pesquisa, amparados

vez, se tornam referencia para a maioria delas, pode representar

por uma avalanche de informações que envolvem a proximidade

a todo o momento, oportunas e positivas mudanças, ou mesmo,

com os acionistas, clientes internos, os stakeholders e seu ativo

limitações em decorrência de certas ameaças.

mais valioso, o consumidor.

Portanto, a análise do mercado é premissa básica para os

De acordo como o conceito estendido de pesquisa, a American Marketing Association

– AMA (2009), define pesquisa de

profissionais de marketing. Parafraseando Churchill & Peter (2005, p. 30), “uma análise dos mercados nos quais a empresa

marketing como, a função que liga o consumidor, o cliente e o

opera, ou deseja operar, pode servir para colocar em foco as

público ao profissional de marketing por meio de informações.

oportunidades e as ameaças enfrentadas pela empresa.”.

Uma breve descrição sobre os tipos de pesquisa usados

Segundo Tavares (2005), essa análise não pode se res-

para levantar informações envolve os objetivos organizacionais

tringir apenas a eventos ou a questões ambientais isoladas. As

e sua metas. A coleta de dados demanda um modelo de ope-

conexões e amarrações que podem ser estudadas, precisam

ração de natureza estatística ou interpretativa, apontados como

ser consideradas para permitir sua inter-relação e resultar daí o

qualitativos e/ou quantitativos. Considerando que, os tipos de

posicionamento organizacional em face do acentuado número

pesquisa podem entendidos como: bibliográfica; exploratória;

de oportunidades e ameaças. A tarefa de cada organização é

descritiva; experimental e explicativa.

identificar, classificar e avaliar as forças ambientais que a afetam

Ainda sobre pesquisa, Cervo (2007, p. 60) corrobora acres-

ou podem afetar, positiva ou negativamente os negócios.

centando que, “o interesse e a curiosidade do homem pelo saber

As empresas regidas e/ou administradas por empreende-

levam-no a investigar a realidade sob os mais diversificados as-

dores ousados e, que consideram a monitoração ambiental uma

pectos e dimensões.”.

ferramenta gestora de informações, sofrem menos com os im-

encomendam es-

pactos das inconstâncias comportamentais do macro ambiente

tudos formais de marketing sobre problemas e oportunidades

de negócios. Logo, percebe-se que a proposta de integração

específicas”. (KOTLER e KELLER, 2006, p. 98).

interdepartamental pode ser difundida com mais abrangência e

Muitas vezes, “os gerentes de marketing

que a verticalização vem perdendo força, ou seja, o tradicional Reflexos das variáveis ambientais nas organizações

organograma top-down cede espaço para gestores com visão

Por volta do ano 500 a.C., o filósofo grego Heráclito ob-

horizontalizada, no qual, promove a empresa ao diálogo aberto

servou que, “não se pode pisar duas vezes o mesmo rio, já que as águas continuam constantemente rolando”.

com os seus colaboradores. Contudo, são mudanças orgânicas, arrojadas e inovadoras,

(MORGAN, 2007, p. 239).

se considerarmos que, “[...] os teóricos da administração clás-

Assim, as organizações procuram constantemente se mante-

sica deram relativamente pouca atenção ao ambiente. Trataram

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 93


a organização como um sistema mecânico “fechado” se preocupando apenas com os princípios de planejamento interno.”. (MORGAN, 2007, p. 49).

Neste mercado aberto e em intensa expansão, que passa a atrair consumidores, intermediários e forma novas parcerias, as

Presentemente, muitas empresas já fomentam seus negó-

organizacionais aderem às novas tendências e modismos advin-

cios apostando em seus talentos e em sua administração moni-

dos do continente asiático, como Kaizen, Kaiban, 5´s, downsi-

torada, particularmente, amparadas por princípios que reforçam

zing, reengenharia entre outros. Em sua maioria, estes modelos

o reconhecimento da importância do ambiente. As organiza-

de gestão chegavam com a proposta de mudança, crescimento

ções modernas podem ser vistas e consideradas como siste-

e inovação. Logo, seguindo tendências corporativas, invadem o

mas abertos, também conhecidos como orgânicos.

cenário organizacional as certificações ISO. Hoje, percebe-se uma forte tendência organizacional no

A monitoração e seus agentes de mudança

que tange a era da informação, e a palavra de ordem é “ciência

A competição está mudando não só o mercado, mas a ati-

da informação”, pois as empresas estão inseridas em um am-

tude e a forma de agir do perfil empreendedor. A economia inter-

biente de muita informação e rápida evolução para as pessoas

nacionalizada significa que a concorrência pode estar do outro

e processos.

lado da cidade ou do outro lado do mundo. Ou seja, tão distante e tão próximo ao mesmo tempo. Robbins (2005, p. 422) acrescenta que:

Até o final da década de 1990, as redes varejistas de música Wherehouse Entertainement e Tower Records eram empresas com rápido crescimento e alta lucratividade nos Estados Unidos. Os jovens corriam para as megalojas atrás de uma grande variedade de títulos e de preços competitivos. Mas, o mercado mudou, e essas redes sofreram as conseqüências. A prática de baixar músicas pela internet, de forma legal ou ilegal, reduziu drasticamente o volume de vendas de CDs. A concorrência de empresas eletrônicas como a Amazon.com e de outras redes que passaram a comercializar esses produtos, como a Wal-Mart e a Target, roubou mais uma fatia de seu mercado. Em janeiro de 2003, a Wherehouse foi à falência. No ano seguinte, foi a vez da Tower.

Portanto, faz-se necessário perguntar: quem é o responsável pela administração das atividades de monitoração ambiental dentro das organizações? A resposta mais próxima pode ser: os agentes de mudança. Então quem são os agentes de mudança. Eles podem ser os executivos, o escopo diretivo e/ou conselheiros, os funcionários da organização, os consultores externos e o mais valioso de todo este composto organizacional, o cliente. A atividade de monitoramento ativo do mercado pode iniciar dentro da própria empresa ou fora dela, estabelecendo uma conexão entre o conhecimento gerado e o processo de tomada de decisão. Entretanto os executivos devem antever possíveis conflitos movidos por dificuldades de coordenar e distribuir informações orientadas à decisão estratégica. Na proposta de monitoração do ambiente, os agentes próximos a necessidade organizacional de mudança precisam ainda, ter uma visão periférica e lógica, pois a velocidade em que a informação se concretiza pode demandar muitas vezes um super esforço para um advento inesperado. Esse monitoramento ativo e participante pode ser particularmente importante em ambientes turbulentos, caracterizados por uma hipercompetitividade3,

As tendências sociais também se modificam. Em comparação com 15 anos atrás, pode-se elencar uma dezena ou uma

no qual, eventos inesperados e dados descontínuos podem se tornar decisivos.

centena de tendências e modismos que alteraram à dinâmica dos negócios e do mercado.

No

Conclusão

final dos anos 1980 as organizações trabalhavam a

Administrar a mudança organizacional requer por parte dos

proposta de relacionamentos desestruturados e a especializa-

executivos e todos os agentes de mudança envolvidos, que a

ção focava-se no produto. As informações eram processadas

leitura dos fatores ambientais e todos os elementos de natureza

e centralizadas, além de pouco difundidas. Nos anos 1990, a

controláveis e não controláveis acerca da organização, se apro-

quebra de fronteiras e a globalização adentram ao ambiente de

fundem primeiramente no sentido de compreender a dinâmica

negócios da empresa, movendo as organizações a um busca

holística que abriga os fatores sociais e econômicos.

incessante por informação, considerando que os esforços passavam a ser direcionados para as vendas, em outras palavras,

Entretanto, uma boa análise de cenários ambientais e particularmente antecipados, requer e demanda um montante de

para o volume de vendas. 94 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


esforços interdepartamentais que mobilizam o escopo da alta e média gerência da organização. No sentido de concentrar esses esforços buscando identificar e mitigar possíveis ocorrências macro ambientais, uma análise mais completa pode demandar ainda, um longo período de tempo, tornado difuso o foco do problema apontado, ou até mesmo, gerando um volu-

egy. Londres, British Library, Research and Development Department. apud Chun Wei Choo in: Information management for the intelligent organization: the art of scanning the environment. Medford, Information Today. MORGAN, Gareth. Imagens da Organização, primeira edição. São Paulo, Atlas, 2007. 389p.

me de informações difícil de processar no timing da solução do problema, afetando assim, o processo decisório. Um agente de mudanças, além de somar atributos de competência estratégica, técnica e gerencial, precisa ser habilidoso para reconhecer o que é efetivamente crítico em um contexto específico, desenvolvendo assim, sua capacidade de leitura

ROBBINS, Stephen P., Comportamento organizacional. 11ª edição, São Paulo. Pearson Prentice Hall, 2005. 450p. RODRIGUES, Alziro César Morais. A inovação estratégica no contexto das universidades: Artigo científico: Faculdade de Administração, contabilidade e economia da PUC. RS.

para cenários futuros, considerando sempre a importância da monitoração das variáveis ambientais. Contudo, tem ainda que se considerar, que as mudanças podem soprar fortemente na direção contrária do posicionamento escolhido pela empresa e, a tomada de decisão pode demorar, ou mesmo não acontecer como esperado. Logo, administrar envolve as coisas acontecerem e não somente realizar análises. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMA Americam Marketing Association (AMA). Endereço eletrônico disponível em: <http://www.marketingpower.com/_layouts/Dictionary. aspx?dLetter=B>. Acesso em 02 de setembro de 2011. CERVO, Amado L.; BERBIAN, Pedro A. e DA SILVA, Roberto. Metodologia científica. 6ª edição, São Paulo, Pearson Prentice Hall, 2007. 162p. CHURCHILL, Gilbert. A. e PETER J. Paul. Marketing: os clientes. São Paulo, Saraiva, 2000. 592p.

TAVARES, Mauro Calixta. Gestão Estratégica. 2ª edição, São Paulo, Editora Atlas, 2005, 440p.

NOTAS DE RODAPÉ 1 Formado em Administração de Empresas. Pós-Graduado em Gestão Estratégica de Negócios. Mestre em Administração. Coordenador da Unidade de Educação a Distância – EaD do Centro Universitário Newton Paiva e Professor pesquisador conteudista do CAED – Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG/UAB/CAPES. 2 LESTER, R.; J. Waters. Environmental scanning and business strategy. Citado por CHOO no artigo: Proposta de um modelo de monitoração ambiental. Henrique, L. C. Junqueira – FDC. 3 Professor Alziro César de Morais Rodrigues. PUCRS

criando valor para

CHOO, Chun Wei. Information management for the intelligent organizacion: the art of scanning the environment. Me-

dford, Information Today, 1995.

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PROPOSTA DE UM MÉTODO DE EDUCAÇÃO FINANCEIRA: caminhos para o consumo racional e consciente Aécio Antônio de Oliveira1 Rafael Alves Ribeiro2 Thiago Galliac Rezende3

RESUMO: O artigo aponta a relevância da educação financeira neste início de século XXI, alertando sobre os desafios a serem enfrentados na gestão das finanças pessoais devido às mudanças na política econômica e multiplicação do crédito. Esta pesquisa envolveu o arcabouço teórico relacionado às finanças pessoais e educação financeira na elaboração de um método que foi dividido em cinco etapas: sensibilização, diagnóstico, informação, formação e orientação. Com isso, obteve-se um conjunto de técnicas e processos capazes de despertar no indivíduo o interesse pelo tema das finanças pessoais e desenvolver conhecimentos, bem como habilidades práticas que lhe permitam consumir de forma racional e consciente. PALAVRAS-CHAVE: Educação Financeira. Finanças Pessoais. Sensibilização.

Introdução

Os principais motivos deste despreparo e da dificuldade

Desde a década de 1990, o Brasil passa por um período

das pessoas na gestão de suas finanças são: o aumento da

de estabilidade macroeconômica, com a inflação, aparente-

complexidade do mercado financeiro devido ao aumento da

mente, controlada. Nota-se a expansão da renda e do crédito

oferta de produtos financeiros e a utilização de meios eletrô-

disponível no mercado, do qual as pessoas se utilizam para o

nicos na realização das transações; a ausência da educação

consumo devido à facilidade na obtenção dos financiamentos.

financeira no currículo do ensino médio e o consumo de bens

(CONEF, 2011)

supérfluos sem a preocupação com a vida futura. (REMUND,

Dentre as pessoas alçadas à condição de consumidores

2010; MAINARDES, 2010)

há aquelas que têm maiores noções sobre juros, preços e

Não obstante, a incerteza quanto ao futuro do sistema de

dinheiro e, logo, passaram a buscar as melhores alternativas

previdência público aliada ao aumento da expectativa de vida e

para investir e gastar. Entretanto, existem também aqueles que

à estabilização da economia aumentou a responsabilidade das

não dominam tais conhecimentos e assim levam uma vida fi-

decisões financeiras do indivíduo e o impacto destas em seu

nanceira desequilibrada, comprometendo sua renda com endi-

futuro. Logo, educar financeiramente os indivíduos por meio de

vidamento excessivo em um país com uma das maiores taxas

uma metodologia de educação financeira pessoal apresenta-

de juros do mundo. (MEKELBURG, 2010).

se como questão de primeira ordem na promoção do bem es-

Tal situação fica clara em histórias de pessoas que apesar de possuírem uma renda elevada ostentam um padrão de

tar financeiro das famílias e no desenvolvimento dos mercados dentro de uma lógica de consumo sustentável.

vida sustentado pelo endividamento excessivo, enquanto, em

Em face ao tema, propõe-se neste artigo uma discussão

contrapartida, trabalhadores assalariados conseguem manter

crítica acerca do problema que consiste em ajudar as pessoas

o orçamento familiar em ordem e, até poupar parte de seus

a consumir de forma mais racional e consciente por meio de

rendimentos para o futuro.

um método de educação financeira desenhado para orientação

Contudo, o aumento da renda dos trabalhadores e a ofer-

das finanças pessoais.

ta abundante de crédito são um convite ao consumo que leva

Para tal, foi realizada uma pesquisa exploratória devido à

cada vez mais pessoas a assumirem uma posição devedora

escassez de trabalhos ou informações mais precisas a respeito

na balança das trocas intertemporais4. Ficou mais fácil viver o

dos temas: finanças pessoais e educação financeira. Isso torna

agora para pagar depois, enquanto o incentivo ao consumo

o presente estudo exploratório de grande relevância, já que se

avança sobre uma população despreparada para dimensionar

trata de uma contribuição institucional para futuras pesquisas

o volume adequado do comprometimento do seu orçamento.

e debates.

96 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


Método de educação financeira pessoal

conceitos e riscos, de maneira que, com informação e

Um método é composto por um conjunto de técnicas e pro-

recomendação claras, possam desenvolver as habilida-

cessos que, organizados de forma sistemática e lógica, formam

des e a confiança necessárias para tomarem decisões

um caminho que permite atingir determinado objetivo (FERREIRA,

fundamentadas e com segurança, melhorando o seu

1999). No desenvolvimento do método proposto neste trabalho

bem-estar financeiro. (OCDE, 2005 p. 4)

parte-se de uma abordagem dedutiva, clarificando primeiro o objetivo a ser atingido pelo método para em sequência determinar

Observa-se que na definição dada estão contidos, de uma

quais as técnicas e processos mais adequados para este fim. Uma

forma geral, os objetivos delineados anteriormente. Tal fato é um

vez que a ênfase da metodologia é colocada sobre indivíduo deve-

indício de que a adoção deste processo e das técnicas que dele

se então adotar técnicas e processos que considerem suas neces-

advém pode ser adequada às necessidades da metodologia

sidades, possibilidades, interesses e realizações.

proposta. Diante do exposto, torna-se necessário aprofundar-se

Tendo como base a problemática proposta, infere-se o ob-

na temática da educação financeira.

jetivo geral com vistas a auxiliar o indivíduo a consumir de forma

De acordo com Remund (2010) a definição primária de edu-

mais racional e consciente por meio da orientação das finanças

cação financeira diz respeito à competência do indivíduo em

pessoais. Partindo-se dessa premissa, determina-se então, os

gerenciar seu dinheiro. Embora, o termo educação financeira

objetivos específicos divididos em cognitivos, afetivos e ativos a

não fosse utilizado à época, a ideia data do início do século XX

partir da concepção de Sossai (1974, p. 439), de que “o homem

quando as primeiras iniciativas e pesquisas sobre a educação

primeiramente conhece, depois aceita e por fim age”.

do consumidor foram realizadas nos Estados Unidos.

De acordo com Sant´Anna et. al., (1998) os objetivos cog-

Embasado em revisão bibliográfica de obras publicadas

nitivos estão relacionados com os conhecimentos e habilida-

nos EUA desde 2000, Remund (2010) afirma que os conceitos

des intelectuais do indivíduo, aplicados em relação às finanças

de educação financeira podem ser categorizados em cinco áre-

pessoais. O objetivo cognitivo desta metodologia de educação

as principais de acordo com o enfoque: no conhecimento de

financeira consiste em o indivíduo desenvolver conhecimentos e

conceitos financeiros; na habilidade em aplicar conceitos finan-

habilidades que lhe permitam compreender, relacionar, compa-

ceiros; na aptidão em administrar as finanças pessoais; na habi-

rar e interpretar informações e dados sobre as finanças pessoais

lidade em realizar decisões financeiras adequadas; no planeja-

e o mercado financeiro.

mento eficaz para as futuras necessidades financeiras.

Corrobora Sossai (1974, p. 440), ao acrescentar que “os

Ao analisar os cinco grupos citados verifica-se que todos

objetivos afetivos referem-se ao grau de aceitação ou de inter-

eles remetem a algum dos objetivos propostos neste método.

nalização de um conceito, comportamento ou fato” e se tradu-

Desta forma é possível afirmar que a educação financeira é ade-

zem pelo fato da pessoa perceber a importância de se educar

quada aos propósitos desta metodologia, ainda que não exista

financeiramente, identificar os riscos do descontrole financeiro

consenso quanto à sua definição conforme afirmam Remund

para seu futuro e desenvolver condutas duradouras e condizen-

(2010) e Huston (2010). Contudo, ainda que a educação financeira possa propor-

tes com a aceitação destes conceitos. A última categoria de objetivos específicos são os objetivos

cionar a melhoria do bem-estar financeiro pessoal não é pos-

ativos, compostos por atividades ou práticas que serão adota-

sível afirmar a priori que o indivíduo deseje participar deste

das pelo sujeito. No âmbito deste método estas atividades e

processo, realizando mudanças em seus hábitos financeiros

práticas se resumem em construir o plano financeiro pessoal,

e também em seu estilo de vida.

utilizar ferramentas de controle e acompanhamento das finanças

Consequentemente, o método de educação financeira pessoal deve partir de uma etapa de sensibilização do indivíduo

e também consumir de forma consciente. Após a definição dos objetivos parte-se para a seleção dos

para a importância do tema. Esta etapa está diretamente rela-

processos e técnicas adequados para a consecução destes

cionada com o cumprimento dos objetivos afetivos do método,

sendo a escolha apropriada das ferramentas uma condição sine

pois envolve o grau de aceitação e a internalização dos con-

qua non para o sucesso do método. A principal ferramenta que

ceitos, comportamentos e fatos relativos à educação financeira.

trata das finanças pessoais, bem como a educação financeira,

A sensibilização tem como objetivo fazer com que as pesso-

5

as aumentem o nível de interesse sobre certos temas ou ques-

pode ser definida como: [...] um processo em que os indivíduos melhoram a

tões. Para este fim é necessário que o processo de educação

sua compreensão sobre os produtos financeiros, seus

financeira tenha significado para o indivíduo, utilizando suas

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 97


emoções e desejos e apresentando valores extremamente úteis

financeira é possível identificar em qual das cinco fases de mu-

e relevantes. […]” (DEWEY 1979, apud COUTO, 2003 p. 3).

dança o sujeito se encontra. Estas fases foram descritas por Pro-

Deve-se demonstrar para o sujeito que ele está inserido

chaska, Diclemente e Norcross (1983) e são denominadas: pré-

em uma realidade na qual as decisões financeiras acontecem

contemplação, contemplação, preparação, ação e manutenção.

a todo o momento e que impactam diretamente sua qualidade

Na fase de pré-contemplação o indivíduo possui uma grande

de vida e seu futuro. Mais do que despertar questões sobre o

resistência em entender, reconhecer ou modificar o problema. É

cotidiano financeiro, a sensibilização do indivíduo deve suscitar

comumente descrita em indivíduos que gastam seu dinheiro sem

neste a consciência de que ao se educar financeiramente torna-

controle, que acreditam que não tem nenhum problema ou que

se possível a construção de novas realidades rumo à realização

podem parar com aquilo a qualquer momento. Uma característica

de suas metas e do bem-estar financeiro

fundamental dos indivíduos em pré-contemplação é que eles não

Para ilustrar a abordagem da sensibilização pode-se partir

pretendem mudar seu comportamento em um futuro próximo.

de uma situação hipotética na qual objetivo seja modificar hábi-

Os indivíduos em fase de contemplação conseguem iden-

tos financeiros de uma pessoa, propondo a redução de seu gas-

tificar que possuem um problema e até consideram enfrentá-lo.

to diário com itens supérfluos. É comum o discurso de que se

Entretanto, esse enfrentamento nunca acontece. Devido à falta

deve controlar melhor o dinheiro ou guardar dinheiro para pou-

de ação nunca conseguem gerenciar ou poupar seu dinheiro da

par. Mas essas afirmações de forma isolada dificilmente sensi-

forma correta. Prochaska (1983) menciona que é como saber

bilizam o ouvinte. Isso porque as duas principais perguntas não

para onde quer ir, mas ainda sem estar preparado para ir até lá.

foram respondidas: Por que controlar melhor o meu dinheiro?

Já na fase de preparação, o indivíduo identifica seu proble-

Como faço para conseguir isso? Tais questões podem ser respondidas informando à pessoa

ma e tenta modificar seu comportamento para melhorar, mas a tentativa não é bem sucedida ou persistente.

que o gasto excessivo do dinheiro está associado à sua escas-

Muitas pessoas iniciam a reeducação para controle de suas fi-

sez futura. Ao direcionarmos o olhar do indivíduo para o futuro

nanças pessoais, mas rapidamente voltam aos hábitos antigos. Da

pode-se demonstrar que a ausência de uma reserva financeira

mesma forma, sempre se observa pessoas que conseguem juntar

pode acarretar problemas financeiros, pois torna o indivíduo vul-

um dinheiro por certo tempo, mas rapidamente interrompem o pro-

nerável a imprevistos como a perda de emprego, problemas de

cesso e gastam em minutos o dinheiro que poupado em um longo

saúde e à deterioração do cenário econômico.

período. Ou seja, o indivíduo está preparado para a mudança, faz

Neste caso foi criada uma relação direta entre conceitos de

algumas tentativas, mas não consegue fazê-las de forma efetiva.

educação financeira e a realidade do sujeito, vinculando a im-

Quando um indivíduo identifica seu problema, considera

portância de se poupar no presente para garantir uma situação

enfrentá-lo e faz uma tentativa bem sucedida, ou seja, realmente

tranquila no futuro.

modifica seu comportamento, dizemos que essa pessoa encon-

Durante o processo de sensibilização é possível também

tra-se em fase de ação. Na fase de ação, tomam-se decisões e

determinar qual a melhor forma de comunicação a ser adota-

modifica-se o comportamento. Por isso, algumas pessoas con-

da. Existem pessoas que preferem ouvir, outras aprendem por

seguem facilmente iniciar a aprendizagem financeira pessoal e

meios visuais enquanto existem indivíduos que preferem ativida-

introduzir em sua vida e nas pessoas que estão em sua volta.

de práticas. (KERKMANN, 1998). A adoção da forma adequada

A fase de manutenção caracteriza-se pela persistência da

de comunicação permite potencializar a interação e o envolvi-

mudança e pelo esforço em evitar recaídas. A partir do momen-

mento do sujeito com o processo como um todo.

to em que as boas práticas em relação às finanças pessoais

Entretanto apenas a etapa de sensibilização não é suficiente

tornaram-se um hábito cristalizado, dizemos que se chegou à

para fazer que o sujeito mude seu comportamento. Cada pessoa

fase de manutenção quando a pessoa exibe um padrão de com-

possui um diferente nível de sensibilidade que corresponde à “ca-

portamento financeiro estável

pacidade para responder ao meio ambiente social e cultural e como

Em cada uma das fases descritas são exibidas caracte-

uma qualidade única e pessoal quanto à percepção, significado e

rísticas distintas (QUADRO 1). E, portanto, identificar em qual

reação.” (TABA, 1974 apud SANT´ANNA, 1998 p. 94).

delas o sujeito se encontra é importante para a compreensão

Utilizando-se as informações obtidas pela interação e ob-

dos motivos que impedem a mudança para um comportamen-

servação do indivíduo durante a sensibilização inicia-se em se-

to financeiro adequado. Segundo Higson e Wilson (1995, apud

guida a etapa de diagnóstico. De acordo com a sensibilidade

MAINARDES et al, 2010, p. 60) “grande parte das pessoas não

em relação à relevância das finanças pessoais e da educação

consegue elaborar um planejamento financeiro pessoal devido

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a dificuldades no reconhecimento de suas dificuldades e de seus pontos fortes”.

Entretanto, as finanças pessoais não englobam apenas

cio do método.

fatores comportamentais. A gestão das finanças de acordo com

Utiliza-se o balanço patrimonial para elaboração de um

Assaf Neto (2010, p. 8) envolve uma “realidade operacional prá-

demonstrativo que evidencie os ativos e passivos do indivíduo

tica da gestão financeira [...]”. Estes aspectos operacionais são

sendo possível então determinar o patrimônio líquido que cor-

a materialização do comportamento por meio de decisões finan-

responde à riqueza líquida, ou seja, quais são realmente os ati-

ceiras que influenciam diretamente, o patrimônio e o fluxo de

vos após a liquidação de todos os passivos. Não há um balanço

caixa da pessoa e assim podem ser observados por meio das

patrimonial padrão, pois cada indivíduo possui diferentes contas

demonstrações financeiras.

de passivos e ativos, o (QUADRO 2) apresenta uma sugestão

Desta forma propõe-se a realização do diagnóstico ope-

para a elaboração do demonstrativo. (GRÜSSNER, 2007)

racional com base no balanço patrimonial e do fluxo de caixa

O balanço patrimonial também serve como referência para

pessoal. Deve-se contar com participação ativa do indivíduo no

verificar a evolução patrimonial ao longo do tempo, sendo re-

diagnóstico para que este compreenda como utilizar estes de-

comendada a sua elaboração ao menos uma vez ao ano (HAL-

monstrativos para o controle e acompanhamento das finanças,

FELD, 2006). Uma forma comum de avaliação do balanço é a

em linha com os objetivos específicos ativos declarados no iní-

utilização de índices.

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 99


O índice de liquidez corrente avalia a capacidade de pagamento do indivíduo, sendo considerado adequado quando apre-

sentar um valor superior a um, ou seja, quando o ativo circulante for superior ao passivo circulante. A fórmula para cálculo é:

Halfeld (2006) propõe o índice de cobertura de despesas

sete, representando que os ativos serão suficientes para pagar

que representa a capacidade do ativo em financiar as despe-

as despesas mensais por sete meses caso a pessoa perca o

sas mensais. O autor sugere que este índice deve ser superior a

emprego, por exemplo. A fórmula para o cálculo é:

O quociente entre passivo exigível e o ativo total denomina-se índi-

dívidas. Considerando as altas taxas de juros do país é recomendável

ce de endividamento e determina quanto do ativo está financiado por

um índice próximo de zero. O índice é calculado da seguinte maneira:

turos fluxos de caixa. (ASSAF NETO, 2010; CHING; MARQUES; Almeja-se sempre um patrimônio líquido positivo, ou seja,

PRADO, 2010).

que os ativos sejam maiores que o passivo e que as relações

Gava (2004, apud GRÜSSNER, 2007 p. 33) afirma que “um

entre passivo e ativo apresentem os melhores índices possíveis.

fluxo de caixa pessoal deve conter três componentes básicos:

Caso identifique-se situação contrária deve-se determinar qual

renda, consumo e poupança”. É importante a inclusão da pou-

o fato gerador e adotar ações para equilibrar ativos e passivos

pança, pois a partir deste item é que o indivíduo acumula os re-

Neste sentido a elaboração do fluxo de caixa surge como ferramenta que relaciona as entradas e saídas de recursos

cursos necessários para atingir seu bem estar financeiro e deixa de depender exclusivamente de sua renda.

monetários das finanças em determinado intervalo de tempo e

A capacidade de poupança do indivíduo é determinada pela

pode auxiliar na identificação do motivo das alterações do pa-

diferença entre receitas e despesas. Quanto maior for a diferen-

trimônio líquido. Por meio do fluxo de caixa é possível também

ça maior será a capacidade de poupança. Se esta relação for

avaliar a liquidez ao longo do tempo, a qualidade das decisões

negativa significa que se está gastando mais do que se ganha

financeiras, a capacidade de pagamento e também prever fu-

e, portanto, não é possível formar poupança. É possível calcular

o índice de poupança por meio da seguinte fórmula:

É importante ressaltar, que ao elaborar o fluxo de caixa sejam

As receitas são compostas por todos os rendimentos rece-

levadas em consideração todas as despesas, mesmo, as de pe-

bidos como salários, aluguéis e dividendos. Normalmente são

queno valor, pois valores que individualmente parecem insignifican-

provenientes da atividade profissional da pessoa e de itens do

tes podem somar significativas quantias ao longo do tempo.

ativo como ações e imóveis.

Vale analisar também, os componentes do fluxo de caixa

Existem duas categorias de despesas. No âmbito das finan-

para determinar como os itens classificados para despesa es-

ças pessoais as despesas fixas são em geral as contas costu-

tão impactando a receita. Um parâmetro que pode ser adotado

meiras e necessárias pagas regularmente cujos valores variam

é a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) realizada pelo

pouco como água, luz e aluguel. As despesas variáveis consis-

IBGE que demonstra distribuição das despesas de consumo

tem nas demais despesas cujo valor varia mensalmente.

das famílias brasileiras (TABELA 1).

100 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


A pesquisa representa uma média de toda população brasi-

é preciso sempre considerar que os dados da pesquisa tratam

leira e pode ser utilizada como base para detectar despesas que

de uma média e desta forma pessoas com renda diferenciada

estejam impactando de forma desproporcional o orçamento do

podem ter padrões de distribuição distintos sem que isto confi-

indivíduo e, portanto, merecem uma atenção especial. Contudo,

gure a inadequação das despesas.

O fluxo de caixa permite verificar ainda se as despesas são

Sugere-se que as informações referentes aos pontos fortes e

superiores, iguais ou inferiores as despesas. Caso as despesas

fracos sejam retiradas dos diagnósticos financeiro e comportamen-

sejam superiores é necessário reduzir os gastos, eliminando os

tal realizados na segunda etapa deste método. Os dados referen-

supérfluos ou então aumentar as receitas para evitar a redução

tes às ameaças e oportunidades podem ser obtidos da análise de

da capacidade de pagamento e o endividamento. Estas ações

fatores externos relacionados ao mercado e ao ambiente no qual o

também devem ser adotadas quando as despesas se igualam

indivíduo está inserido como: estrutura familiar; solidez do empre-

às receitas até que seja alcançado o equilíbrio financeiro e resta-

gador; possibilidades de ascensão profissional; etc.

belecida a capacidade de poupança.

Deve-se então procurar potencializar as forças, eliminar as

Uma vez que as despesas sejam inferiores às despesas será

fraquezas, maximizar as oportunidades e minimizar as ameaças.

possível utilizar esta diferença para quitar dívidas ou então efetuar

Estas ações devem ser a base para a declaração da missão con-

aplicações financeiras. Esta decisão pode ser realizada com base

tida no planejamento financeiro. Na missão devem estar contidos

nos índices de endividamento e de cobertura de despesas.

não somente ações, mas também objetivos e princípios que vão

Quanto à periodicidade da elaboração do fluxo de caixa

servir de guia para a gestão de finanças pessoais. Um exemplo de

sugere-se atualizá-lo ao menos uma vez na semana e também

declaração de missão seria: controlar a relação entre as receitas e

realizar a previsão dos fluxos de caixa dos próximos meses para

despesas para aumentar a capacidade de poupança possibilitan-

desta forma preparar-se com antecedência, evitando que des-

do o investimento em um fundo de previdência.

pesas elevadas sejam realizadas em momentos em que a receita não seja suficiente.

Outro procedimento importante é determinar uma visão, que representa uma situação futura que se almeja alcançar

Realizado o diagnóstico financeiro e o diagnóstico comportamental faz-se então a síntese dos dados obtidos por meio da matriz SWOT pessoal, da qual obteremos subsídios para a to6

mada de decisões e elaboração do plano financeiro pessoal.

como, por exemplo: atingir a independência financeira, adquirir a casa própria ou poder dedicar-se à filantropia. Para que o planejamento estratégico pessoal flua naturalmente é preciso discernir e compreender bem a missão e a

A escolha da análise SWOT ocorreu por tratar-se de uma

visão e transformar tudo isso em ações. usar a missão para

ferramenta lógica, simples e eficiente. (REAL, 2006). Sua utili-

facilitar a compreensão das necessidades financeiras pesso-

zação permite combinar a análise ambiental (oportunidades e

ais, descobrindo onde se deve concentrar esforços, fazendo

ameaças) e a análise interna (pontos fortes e pontos fracos),

com que este novo modelo de educação financeira pessoal

identificando as vantagens estratégicas que poderão ser apro-

proporcione o alcance da visão declarada.

veitadas pelo indivíduo no seu plano financeiro pessoal.

Para melhor organizar e refletir sobre quais ações que

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 101


serão realizadas no cumprimento da missão pode se uti-

para emergências. Em sequência aplicam-se os recursos

lizar uma adaptação do modelo proposto por Chieffe e

disponíveis para o alcance dos objetivos traçados e por fim

Rakes (1999) que adota uma sequência lógica em que pri-

pode-se cuidar da transferência e manutenção do patrimô-

meiro se cuida do gerenciamento do dinheiro e planeja-se

nio construído.

Este modelo exemplificado no QUADRO 3 é de simples apli-

bem como suas consequências. (CONEF, 2010).

cação e engloba todos os aspectos da gestão das finanças pes-

Uma vez que o conjunto de informações citado é amplo,

soais, podendo ser preenchido pelo indivíduo de acordo com

é interessante organizá-lo em áreas de conteúdo para facilitar

suas necessidades.

sua compreensão. De acordo com Huston (2010) são quatro as

Realizado o diagnóstico, a análise SWOT e o plano financeiro pessoal, parte-se para a intervenção com base nos três

áreas que devem ser abordadas no processo de educação financeira:

níveis de atuação da educação financeira: formação, informação

1)Dinheiro: Conceitos sobre o valor do dinheiro no tempo,

e orientação. (Comitê Nacional de Educação Financeira – CO-

inflação, conceitos de contabilidade financeira pessoal e a rela-

NEF, 2010)

ção entre o dinheiro e o ciclo de vida pessoal.

Ao formar e informar o indivíduo pretende-se que este ad-

2)Crédito: Conhecimentos sobre as diversas linhas de cré-

quira autonomia e independência na tomada de decisões finan-

dito disponíveis no mercado e o uso adequado de cada uma

ceiras, realizando escolhas conscientes de acordo com os ob-

delas.

jetivos financeiros pessoais identificados nas etapas anteriores da metodologia. A formação é um processo que objetiva a capacitação do

Investimentos: Conhecimento sobre os produtos de investimento disponíveis no mercado, os riscos e taxas inerentes a cada um deles.

sujeito, promovendo habilidades e conhecimentos necessários

Proteção de Patrimônio: Engloba produtos de seguridade

para a compreensão das informações pertinentes ao tema das

(vida e patrimônio) e também estratégias de gerenciamento de

finanças pessoais. Objetiva-se preencher as lacunas de conhe-

risco de aplicações financeiras. Envolve também informações

cimento que impedem ou dificultam a compreensão e aplicação

sobre direitos do consumidor e do investidor.

dos conceitos financeiros como, por exemplo: juros compostos,

Em síntese, a etapa de formação e informação oferece

tipos de receitas e despesas, utilização da calculadora e planilha

ao sujeito o conhecimento do mercado financeiro e das ferra-

eletrônica, ferramentas de controle das finanças, etc.

mentas existentes que este poderá utilizar para atingir os seus

Concluída a etapa de formação é possível então realizar a

objetivos pessoais.

etapa de informação uma vez o sujeito possuirá os conhecimen-

A última etapa é realizada ao prover orientação sobre assun-

tos e habilidades adequadas para a compreensão dos temas

tos e produtos financeiros, relacionados com a realidade do indiví-

abordados. A informação no contexto desta metodologia con-

duo, para que este possa utilizar a informação recebida da melhor

siste em fornecer ao indivíduo fatos, dados e conhecimentos

forma. A necessidade da orientação ocorre, pois existem diversas

específicos a respeito de oportunidades e escolhas financeiras,

questões subjetivas que afetam a racionalidade do indivíduo ao re-

102 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


alizar o seu planejamento financeiro como (CONEF, 2010): - limitação quanto à visão de cenário e à quantificação de riscos; - inconsistência das ações correntes e dos objetivos de longo prazo; - influências culturais e psicológicas no comportamento individual. Estas questões quando identificadas, devem ser foco das intervenções de orientação auxiliando o indivíduo a superar suas limitações e atingir seus objetivos financeiros. Considerações finais Ao longo deste trabalho foi desenvolvido um método de educação financeira composto de cinco fases: sensibilização, diagnóstico, informação e formação e orientação. Nestas fases estão contemplados todos os objetivos cognitivos, afetivos e ativos propostos. Por meio do arcabouço teórico consolidou-se um conjun-

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to de conhecimentos e práticas relevantes para a promoção do bem-estar financeiro dos indivíduos por meio da educação financeira. No entanto, este não é um trabalho conclusivo. É sugestivo verificar de forma prática os impactos da aplicação deste método como ferramenta para auxiliar as pessoas a consumir de forma mais racional e consciente por meio da orientação das finanças pessoais. Finalmente, observou-se que a educação financeira requer que o indivíduo reflita sobre diversos aspectos de sua vida como, a estrutura familiar, o trabalho e seus desejos e aspirações para o futuro. Espera-se então, que esta reflexão seja o ponto de partida para semear a construção de novas atitudes e princípios, em particular, fomentar a educação financeira junto a sociedade e suas estratificações sociais, desde a sensibilização até o estágio de orientação, para que ocorra, em um futuro muito próximo, o consumo consciente. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ASSAF NETO, Alexandre. Finanças Corporativas e Valor. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2010. 760 p. ACCIOLY, Isalva. A prática da educação financeira. 2005. Disponível em: < http://www.conpet.gov.br/artigos/artigo.php?segmento=&id_artigo=10 >. Acesso em: 21 set 2011. ANDER-EGG, Ezequiel. Introducción a las técnicas de investigación social: para trabajadores sociales. 7 ed. Buenos Aires:Humanitas, 1978.

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NOTAS DE RODAPÉ 1 Graduado em Administração de Empresas. Pós-Graduado em Gestão Estratégica de Negócios. Mestre em Administração. Coordenador da Unidade de Educação a Distância – EaD do Centro Universitário Newton Paiva e Professor pesquisador conteudista do CAED – Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG/UAB/CAPES. Áreas de conhecimento: Administrativa; Comercial e Financeira. 2 Tecnólogo em Gestão Financeira pelo Centro Universitário Newton Paiva. Área de conhecimento: Financeira e Administrativa. 3 Tecnólogo em Gestão Financeira pelo Centro Universitário Newton Paiva. Área de conhecimento: Financeira e Administrativa. 4 De acordo com a Giannetti (2005) em sua Teoria das Trocas Intertemporais , sempre quase abre mão de alguma coisa no presente em prol de alguma coisa no futuro, assume-se uma posição credora. E toda vez que se abre mão de alguma coisa no futuro para desfrutar de alguma coisa no presente, assume-se uma posição devedor 5 Sine qua noné uma expressão em Latim que significa: sem o qual não pode ser. Refere-se a uma ação, condição ou algo indispensável e essencial. 6 SWOT – Strengths, Weakness, Opportunities and Threats. Traduzido para o português: É uma matriz que avalia as forças e fraquezas no ambiente interno e as ameaças e oportunidades no ambiente externo a organização.

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CRIPTOGRAFIA DE DADOS NO MICROSOFT SQL SERVER 2008 R2 RODOLFO DE OLIVEIRA MARTINS1 IREMAR NUNES DE LIMA2

RESUMO: Este artigo analisa os principais processos de criptografia de dados no Microsoft SQL Server 2008 R2, tanto no nível de banco de dados quanto no nível de objetos, além de apresentar instruções para se criptografar e decifrar informações neste Sistema Gerenciador de Banco de Dados. PALAVRAS-CHAVE: Banco de Dados, Segurança, Criptografia, Microsoft SQL Server 2008.

1 INTRODUÇÃO

apto a identificar se a mensagem recebida sofreu alteração du-

Desde que homem passou a estabelecer comunicação com

rante o processo de transmissão;

seus pares, ele sentiu a necessidade, em alguns momentos, de

- Autenticação do remetente: o destinatário deverá ser

garantir que as suas mensagens chegassem apenas ao destino

capaz de identificar o remetente e certificar-se de que foi ele

que realmente se fizesse necessário. Ao longo dos anos isso fi-

mesmo quem enviou a mensagem;

cou cada vez mais evidente, principalmente em tempos de guerras, onde os inimigos jamais poderiam interceptar informações transmitidas entre pontos estratégicos.

- Irretratabilidade do emissor: o emissor não poderá negar a autoria da mensagem. A criptografia em bancos de dados pode ser realizada em

Chegou-se, então, à era da tecnologia da informação. Cada

todo o banco ou em nível de objetos, tais como tabelas e co-

vez mais dados são armazenados em bancos e são utilizados

lunas. Isto será mostrado nas seções seguintes deste artigo e,

para tomadas de decisões estratégias. Diante disto, as corpo-

além disso, será analisada a criptografia de dados numa instân-

rações sentem cada vez mais necessidade de proteger suas

cia Microsoft SQL Server 2008 R2.

informações e garantir que as mesmas não caiam em mãos erradas. A preocupação não se limita apenas ao lado externo das empresas: ela também diz respeito ao intercâmbio entre os seus

2 CRIPTOGRAFIA NO MICROSOFT SQL SERVER 2008 R2 2.1 HISTÓRICO

membros, ou seja, não seria nada confortável que funcionários

No SQL Server, nem sempre foi possível utilizar criptografia,

de uma companhia, por exemplo, soubessem quanto ganham

como pode ser verificado neste breve histórico levantado por

seus colegas de trabalho.

COLES e LANDRUM (2009):

Para garantir a segurança de informações armazenadas em

SQL Server 2000: tanto nesta versão quanto nas versões

sistemas de bancos de dados, um grande aliado é a criptografia

anteriores, não havia funcionalidades de criptografia de dados.

de dados. Criptografar uma informação significar torná-la oculta

O usuário devia criar suas próprias sp’s (stored procedures).

por meio do uso de algoritmos, garantindo que a mesma so-

Porém nem sempre se tinha certeza se estas sp’s funcionariam

mente poderá ser recuperada por quem detiver uma chave de

de acordo com os processos do servidor.

decodificação. A chave deve ser utilizada tanto ao se criptografar quanto ao se decifrar a informação.

SQL Server 2005: devido a vários escândalos ocorridos no mercado financeiro do início da década de 2000, houve ne-

Segundo MELO (2009), a criptografia possui quatro objetivos principais:

cessidade de criar mecanismos de se proteger e confidenciar informações armazenadas em grandes centros de bases de da-

- Confidencialidade da mensagem: uma mensagem crip-

dos. Como resposta a este problema, a Microsoft incluiu no SQL

tografada somente poderá ser interpretada (extraída) por um

Server 2005 ferramentas de criptografia de dados em nível de

destinatário autorizado. Além disto, informações sobre os dados

colunas. Dentro desta funcionalidade, destacam-se as seguin-

criptografados não podem ser obtidos, uma vez que facilita a

tes características:

utilização de técnicas de decodificação por parte de interceptadores não autorizados;

- Suporte a criptografia de colunas por meio do uso de chaves simétricas e frases de acesso;

- Integridade da mensagem: o destinatário deverá estar

- Acesso a uma variedade de algoritmos simétricos e as-

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 105


simétricos; - Capacidade de se criar e gerenciar chaves; e

sos, utiliza-se a Hierarquia de Chave Criptográfica. Esta hierarquia apresenta a seguinte estruturação:

- Capacidade de se criar chaves assimétricas e certificados

Na raiz da árvore de criptografia encontra-se o Windows

auto-assinados, além se conseguir instalar chaves e certificados

Data Protection API (DPAPI), o qual assegura a hierar-

externos.

quia de chaves na máquina e protege a Chave Mestre

SQL Server 2008: com a disseminação do uso de criptografia

de Serviço (SMK) no servidor de banco de dados. A SMK

em bancos de dados, surgiram novas demandas, tais como arma-

protege a Chave Mestre da Base de Dados (DMK), que é

zenar as chaves separadamente do banco e permitir que aplica-

armazenada no nível de base de dados do usuário, que

ções fizessem uso da criptografia sem ter que realizar alterações

por sua vez oferece proteção aos certificados e às chaves

em seu código fonte. Esta versão do SQL Server contornou estes

assimétricas. Estas então protegem as chaves simétricas,

problemas e adicionou as seguintes funcionalidades aos proces-

as quais protegem os dados. (HSUEH, 2008, p. 2).

sos de criptografia: Criptografia Transparente de Dados (TDE): quando o banco

A Hierarquia de Chave Criptográfica permite ao servidor abrir

é criptografado (incluindo-se aí os arquivos de log e o tempdb) de

chaves e decodificar os dados automaticamente, independente do

forma transparente;

nível ser de objeto ou de base de dados. Porém, deve-se ter em

Gerenciamento Extensível de Chaves (EKM): permite que o

mente que quando a criptografia ocorrer em nível de objeto, todas

gerenciamento das chaves de criptografias possa ser realizado em

as chaves a partir da DMK podem ser protegidas por uma senha

dispositivos externos, conhecidos como hardwares de módulo se-

ao invés de um nova chave. Este procedimento força o usuário a

guro; e

digitar uma senha para acessar os dados, quebrando a corrente

Gerador de números randômicos criptografados.

de decifração. A Figura 1 mostra um esquema de funcionamento desta hie-

2.2 HIERARQUIA DE CHAVE CRIPTOGRÁFICA O Microsoft SQL Server permite criptografar dados em dois níveis: base de dados e objeto (coluna e tabela). Em ambos os ca-

rarquia. As linhas com seta indicam os processos de criptografia, sendo as pontilhadas exemplos de TDE (Criptografia Transparente de Dados), que será abordada mais à frente.

106 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


2.3 CRIPTOGRAFIA SIMÉTRICA

método mais rápido, esta criptografia não é tão segura, uma

De acordo com COLES e LANDRUM (2009), existem, ba-

vez que permite a terceiros poderem ter acesso à chave uti-

sicamente, dois tipos de criptografia: simétrica e assimétrica.

lizada e decifrarem a informação protegida. Tanto o emissor

A criptografia simétrica utiliza uma mesma chave para ci-

quanto o receptor devem deter a chave simétrica.

frar e decifrar as informações. Apesar de ser tratada como um

As chaves simétricas precisam ser protegidas por uma cha-

-- ABERTURA DA CHAVE SIMÉTRICA PROTEGIDA PELO

ve assimétrica ou por um certificado. A instrução a seguir mostra

CERTIFICADO

como criar um certificado, seguido da criação da chave simétri-

USE AdventureWorks

ca que o mesmo irá proteger:

GO

-- CRIAÇÃO DO CERTIFICADO

OPEN SYMMETRIC KEY ‘Chave Simétrica’

USE MASTER

DECRYPTION BY CERTIFICATE ‘Certificado Simétrico’

GO

GO

CREATE CERTIFICATE TDE_CERTIFICADO

-- CRIAÇÃO DA TABELA Costumers_2

WITH SUBJECT = ‘Certificado Simétrico’

-- APENAS O CAMPO Phone SERÁ CRIPTOGRAFADO

GO

SELECT TOP 2

-- CRIAÇÃO DA CHAVE SIMÉTRICA PROTEGIDA PELO

CustomerID,

CERTIFICADO

ENCRYPTBYKEY(KEY_GUID(‘Chave Simétrica’), Phone)

CREATE SYMMETRIC KEY ‘Chave Simétrica’

INTO Costumers_2

WITH ALGORITHM = AES_128

FROM

ENCRYPTION BY CERTIFICATE ‘Certificado Simétrico’

Customers

GO

GO -- FECHAMENTO DA CHAVE SIMÉTRICA

Para criptografar os dados, é necessário ativar a chave criada. Para ilustrar este processo de criptografia, será utilizado

CLOSE SYMMETRIC KEY ‘Chave Simétrica’ GO

o banco de dados padrão do SQL Server chamado ‘AdventureWorks’. Dentro deste banco existe uma tabela chamada Cus-

A partir a instrução acima, foi criada a tabela ‘Customers_2’,

tomers, que será tomada para ser parcialmente criptografada. A

onde apenas os dados da coluna ‘Phone’ foram criptografados.

seguir encontram-se as instruções para chamar a chave simétri-

Realizando-se uma consulta nesta tabela, têm-se os dados des-

ca, criptografar os dados e fechar a chave:

ta coluna embaralhados, conforme figura 3:

Para decifrar os dados criptografados, utiliza-se basicamen-

USE AdventureWorks

te o mesmo processo de criptografia, ou seja, abre-se a chave

GO

simétrica, efetua-se a decifração e fecha-se a chave, conforme

OPEN SYMMETRIC KEY ‘Chave Simétrica’

pode ser observado na instrução a seguir:

DECRYPTION BY CERTIFICATE ‘Certificado Simétrico’

-- ABERTURA DA CHAVE SIMÉTRICA PROTEGIDA PELO

GO

CERTIFICADO

-- DECIFRAÇÃO DOS DADOS PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 107


SELECT

GO

CustomerID,

-- FECHAMENTO DA CHAVE SIMÉTRICA

DECRYPTBYKEY(‘Chave Simétrica’), Phone) AS Phone_

CLOSE SYMMETRIC KEY ‘Chave Simétrica’

Decifrado,

GO

Phone

O resultado da consulta acima é o campo ‘Phone_De-

FROM

cifrado’ exibido da forma original, conforme figura 4:

Costumers_2

2.4 CRIPTOGRAFIA ASSIMÉTRICA

somente de pessoas autorizadas a acessar a informação em

Outro tipo de criptografia bastante utilizada é a assimétrica.

seu estado original. Ambas as chaves são conectadas mate-

Nela são utilizadas duas chaves, sendo uma para criptografar e

maticamente, o que permite que uma decodifique o que a ou-

a outra para decifrar. A primeira é de domínio público, ou seja,

tra codificou. Este processo é mais lento do que a criptografia

ela é divulgada para qualquer pessoa que deseja criptografar

simétrica por utilizar um algoritmo mais complexo.

a informação. Já a segunda é privada e deve estar em poder

De acordo com COLES e LANDRUM (2009), para se criar

SQL Server 2008 (apenas nas versões Enterprise e Developer) é

uma chave assimétrica, existem vários programas conhecidos

a Criptografia Transparente de Dados. Este método de seguran-

como SKN (Strong-Name Key). Estes programas criam, ao mes-

ça permite criptografar o banco de dados sem que seja neces-

mo tempo, a chave pública e a chave privada que integram a

sário implementar modificações estruturais no banco de dados

chave assimétrica. Com a chave pública, é permitido criptografar

e/ou nas aplicações que o referenciam

os dados, porém somente com a chave privada os mesmos po-

O grande objetivo deste tipo de criptografia é garantir que

dem ser decifrados. As instruções de comando para criptografar

os arquivos físicos do SQL Server (arquivos de dados – .mdf –,

os dados são as mesmas demonstradas no tópico sobre chaves

de log transacional – .log – e de backup – .bak) estejam prote-

simétricas, diferenciando-se apenas no momento da decifração,

gidos, ou seja, se alguém não autorizado conseguir acesso a

onde deve ser referenciada a chave privada de uso exclusivo.

estes arquivos e tentá-los atachar em outro servidor, não conse-

Ainda segundo COLES e LANDRUM (2009), é interessante

guirá restaurar o seu conteúdo.

mencionar que, como as chaves pública e privada são interliga-

COLES e LANDRUM (2009) ressaltam que a TDE atua entre

das matematicamente, é possível, em caso de perda da primei-

a área de buffer e a área de armazenamento físico de dados.

ra, recuperá-la a partir da segunda. Porém, por uma questão de

Quando ocorre uma requisição de páginas de dados armazena-

segurança, não é possível efetuar o processo inverso, ou seja,

das fisicamente, ela passa através da TDE e é decifrada antes

recuperar a chave privada a partir da chave pública. Daí a ne-

de ser entregue na área de buffer. Este posicionamento é que

cessidade de se guardar com muito cuidado a chave privada.

permite ao TDE ser operado de forma invisível para o cliente (daí o conceito de transparência).

2.5 CRIPTOGRAFIA TRANSPARENTE DE DADOS (TDE – TRANSPARENT DATA ENCRYPTION) Um conceito muito interessante introduzido no Microsoft

Além de criptografar o banco de dados designado, COLEDGE (2009) destaca que a TDE pode também criptografar o tempdb, fazendo com que todos os dados que passarem por este

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banco sejam criptografados/decifrados, para todos os bancos

compreende a seguinte instrução:

alocados em uma mesma instância. Desta forma, pode ocorrer

USE AdventureWorks

queda na performance de bancos não criptografados que fazem

GO

uso do tempdb baseado em TDE.

CREATE DATABASE ENCRYPTION KEY

O processo de utilização da criptografia transparente de da-

WITH ALGORITHM = AES_128

dos passa por algumas etapas que serão descritas a partir de

ENCRYPTION BY SERVER CERTIFICATE TDE_CERTIFI-

agora.

CADO

A primeira etapa é a criação de uma chave master de banco

GO

(DMK – Database Master Key). Esta chave visa proteger os certificados do servidor que, por sua vez, garante proteção à chave

Na instrução acima, foi utilizado o algoritmo AES_128 (AES

de criptografia do banco (DEK – Database Encryption Key). A

com chave de 128 bits). Porém podem ser utilizados outros ti-

instrução de criação da DMK é a seguinte:

pos. Agora, basta ativar a criptografia no banco designado, da seguinte forma:

USE MASTER G

O

ALTER DATABASE [AdventureWorks]

CREATE MASTER KEY ENCRYPTION BY PASSWORD =

SET ENCRYPTION ON

‘senha’

GO

GO Em seguida, deve ser criado o certificado que, como já

A partir deste momento, o banco entra em processo de

foi dito, protegerá a DEK:

criptografia, o que restringe algumas ações tais como modifi-

USE MASTER

car os arquivos físicos e desatachar o banco. Para acompanhar

G

O

o status deste processo, o SQL Server dispõe de um consulta

CREATE CERTIFICATE TDE_CERTIFICADO

dinâmica de gerenciamento (DMV) chamada sys.dm_database_

WITH SUBJECT = ‘Certificado TDE’

encryption_keys. Esta consulta pode ser chamada da seguinte

GO

forma: SELECT

Neste momento, torna-se necessário realizar o backup do

DB_NAME(DATABASE_ID) AS NOME_BANCO,

certificado fora do servidor. Isto é muito importante quando for

DATABASE_ID AS ID_BANCO,

necessário restaurar o banco de dados a partir de um backup ou

CASE ENCRYPTION_STATE

quando se desejar atachar o banco em outro servidor. O backup

WHEN

do certificado pode ser assim realizado:

Presente’

0

THEN

‘Sem

Chave

de

Criptografia

USE MASTER

WHEN 1 THEN ‘Descriptografado’

GO

WHEN 2 THEN ‘Criptografia em Progresso’

BACKUP CERTIFICATE TDE_CERTIFICADO

WHEN 3 THEN ‘Criptografado’

TO FILE ‘C:\BACKUPS\TDE_CERTIFICADO.cer’

WHEN 4 THEN ‘Alteração de Chave em Pro-

WITH PRIVATE KEY

gresso’

(

WHEN 5 THEN ‘Descriptografia em Processo’

FILE

=

‘C:\BACKUPS\TDE_CERTIFICADO.

END AS STATUS_CRIPTOGRAFIA,

pvk’,

KEY_ALGORITHM + ‘_’ + KEY_LENGTH AS ALGOROTI-

ENCRYPTION BY PASSWORD ‘senha_privada’

MO,

)

PERCENT_COMPLETE AS PERENCENTUAL_COMPLE-

GO

TO FROM

Agora, tendo o backup sido realizado, muda-se o foco para

sys.dm_database_encryption_keys

o banco que será criptografado (neste caso será utilizado nova-

GO

mente o banco de exemplo do SQL Server chamado AdventureWorks), procedendo-se à criação da chave de criptografia do banco (usada para criptografias baseadas em TDE). Esta etapa

A execução da consulta acima resulta nas seguintes informações:

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 109


Finalmente, é necessário observar algo realmente importante. Quando for preciso restaurar um backup de um banco criptografado, deve-se garantir que o certificado que protege a DEK esteja ativo no servidor de destino. Caso contrário, ocorrerá falha durante o processo de restauração. Para ativar o certificado, deve-se proceder da seguinte forma: -- CRIAR A DMK USE MASTER

É de fácil implementação, pois não necessita reconfigurar o servidor; É conveniente no que diz respeito à transparência, uma vez que dispensa configurações nas aplicações clientes; e Permite criptografar qualquer tipo de dado. Em contrapartida, COLES e LANDRUM (2009) também apontam algumas desvantagens, a saber: Quando pequenas quantidades de dados precisarem ser

GO

criptografadas, isto deve ser repensado, pois para cada pro-

CREATE MASTER KEY ENCRYPTION BY PASSWORD =

cesso de criptografia, ocorre um incremento na CPU de 3 a 5%.

‘senha’

Se o servidor é muito requisitado, este incremento pode afetar

GO

consideravelmente a performance; e

-- RESTAURAR O CERTIFICADO

A TDE não é recomendada quando se deseja limitar ape-

CREATE CERTIFICATE TDE_CERTIFICADO

nas partes do banco de dados. Neste caso, aconselha-se crip-

FROM FILE = ‘C:\BACKUPS\TDE_CERTIFICADO.cer’

tografar apenas os objetos necessários (tabelas e/ou colunas)

WITH PRIVATE KEY

e não o banco como um todo.

(

FILE = ‘C:\BACKUPS\TDE_CERTIFICADO.

ENCRYPTION BY PASSWORD ‘senha_priva-

tada no SQL Server 2008, foi mencionado que se pode utilizar um módulo externo para gerenciamento de chaves. Este mó-

da’

2.6 GERENCIAMENTO EXTENSÍVEL DE CHAVES Durante a abordagem sobre a hierarquia de chaves ado-

pvk’,

)

GO

dulo é conhecido como EKM (Extensible Key Management) e é fornecido por terceiros. Para que um módulo EKM funcione corretamente, ele deve atender a dois requisitos básicos: ser

De acordo com COLES e LANDRUM (2009), a criptografia apresenta como principais vantagens:

Este artigo não tem como objetivo apresentar instruções de como configurar módulos EKM (uma vez que existem vários no

um aparelho dedicado à criptografia e dispor de uma biblioteca DLL em conformidade com a Microsoft.

serem armazenadas e gerenciadas fora do servidor, garantindo segurança e proteção às mesmas; e

mercado e cada um tem suas particularidades) e, sim, demons-

O módulo EMK é dedicado à criptografia, o que faz com as

trar esta funcionalidade que se torna imprescindível no quesi-

tarefas do servidor referentes à criptografia e decifração existen-

to segurança. Porém, devem-se ser observados dois aspectos

tes no servidor SQL sejam transferidas para o módulo, propor-

muito importantes e benéficos a respeito destes módulos:

cionando auto ganho de performance na instância SQL.

Como se trata de um hardware externo, as chaves passam a

Apesar de todos os benefícios já citados, o módulo EKM

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apresenta uma limitação: apenas dados limitados a 8.000 bytes podem ser criptografados, uma vez que há restrição de comunicação entre o hardware do módulo e o servidor SQL Server. 3.0 CONCLUSÃO A criptografia é uma grande aliada quando se pensa em proteção a informações armazenadas em bancos de dados. Sua utilização deve ser bem avaliada, uma vez que o processo de criptografar/decifrar os dados afetam consideravelmente o servidor SQL Server. Se isto ocorrer, a adoção de um módulo EKM pode ser uma boa solução. Porém, independente do tipo de criptografia a ser adotada (assimétrica, simétrica ou transparente), deve-se ter em mente que é essencial implementar um eficaz controle de gerenciamento de chaves, de modo que as mesmas estejam disponíveis apenas para aqueles que devem ter acesso aos dados. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CARSTARPHEN, Sylvester; SIMMONS, Ken. Pro SQL Server 2008 Administration. United States of America: Apress, 2008. 568 p. COLEDGE, Rod. SQL Server 2008 – Administration in Action. Greenwick: Manning Publications Co., 2009. 442 p. COLES, Michael; LANDRUM, Rodney. Expert SQL Server 2008 Encryption. United States of America: Apress, 2009. 303 p. HSUEH, Sung. Criptografia de Base de Dados no SQL Server 2008 Enterprise Edition. Disponível em: <www.microsoft.com.br/... SQL/SQL_SQL/SQLServer2008_Encriptacao_Base_Dados_SQL_Server_2008_Enterprise_Edition-BRZ.doc> Acesso em: 27 abril 2011 MELO, Heberton. Criptografia de Dados no SQL Server. SQL Magazine 76. São Paulo. n. 76. p.85-105, set. 2008.

NOTAS DE RODAPÉ 1 Especialista em Bancos de Dados e Business Intelligence (rodolfoom@yahoo.com.br) 2 DBA, Mestre em informática e professor do Centro Universitário Newton Paiva (iremar.prof@uol.com.br)

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GESTÃO DO CONHECIMENTO: ECM e GED JULIANA COSTA SILVA 1 jcs.julianacostasilva@gmail.com

IREMAR NUNES DE LIMA iremar.prof@uol.com.br

2

RESUMO: O presente trabalho aborda a gestão do conhecimento e gestão da informação. É discutido como a segurança dos dados é tratada nos mesmos e como influenciam nos processos organizacionais. Uma comparação entre dois sistemas de gestão de conteúdo é exposta para exemplificar a importância de realizar uma análise consistente ao se implantar um projeto de gerenciamento de conteúdo em uma organização. PALAVRAS-CHAVE: Gestão do conhecimento, Gestão da informação, ECM, GED.

1 INTRODUÇÃO

como para a melhoria no repasse das informações

Ao longo dos anos a humanidade vem sofrendo diversas

na organização.

transformações. A sociedade encontra-se numa fase que muitos chamam de “era da informação”. Mas o que é a informação?

Com o aumento no uso de computadores pelas organi-

Segundo o dicionário Aurélio3 informação é: “conheci-

zações, o número de dados gerados pelas mesmas vem au-

mento amplo e bem fundamentado, resultante da análise e combinação de vários informes. Será que tudo o que

mentando significativamente e seu armazenamento, na maioria

temos disponível em nossas diversas fontes, como a Internet,

do com que se tenham processos ineficientes. É necessário

são realmente informações? Se analisarmos as notícias que

organizar estes dados e analisar quais realmente são úteis e

são veiculadas diariamente, podemos notar que grande parte

cogentes à empresa.

daquilo que ouvimos ou lemos, não são informações e sim especulações sem fundamentos. As informações quando agregadas geraram o que se chama de conhecimento. Segundo Santos e Cueto (2010), pode-

das vezes, é realizado de forma dispersa e sem controle fazen-

O conhecimento pode ser considerado o mais importante dos ativos intangíveis e por isso deve ser valorizado. É preciso utilizar nas organizações uma gestão que permita produzi-lo e disseminá-lo para todos os envolvidos nos processos.

se dizer que o conhecimento é criado por meio da interação

Neste âmbito surge a gestão do conhecimento, que pode

entre o conhecimento tácito - advindo da formação cultural e

ser definida como uma filosofia de compartilhamento, que bus-

social - e o conhecimento explícito - advindo da informação for-

ca utilizar a informação organizacional de forma otimizada e

mal e acreditada como fidedigna.

centralizada, permitindo gerar um conhecimento consistente.

O conhecimento torna-se mais importante e significativo a

Segundo Tomael (2008), o processo de gestão do conhe-

cada dia. Segundo Santos e Cueto (2010, Apud HADDAD E

cimento inicia-se pela necessidade em obter a informação e

DRAXLER, 2002, p. 4), a cultura das empresas está mudando:

termina com uso desta informação e este processo está sendo

Nas três últimas décadas, foram geradas mais infor-

reconhecido como essencial dentro das organizações.

mações do que nos últimos cinco milênios. Este fato

Para organizar e atribuir velocidade, aos sistemas de ges-

tem mudado muitos paradigmas, como os ativos in-

tão do conhecimento, ferramentas tecnológicas devem ser uti-

tangíveis das empresas e a valorização do conheci-

lizadas pelas empresas.

mento coletivo ou capital intelectual. Nesse sentido,

Desta maneira o objetivo do desenvolvimento deste artigo

torna-se necessária uma gestão do conhecimento

é identificar as necessidades das organizações que as leve a

deste capital intelectual produzido e desenvolvido

utilizar o gerenciamento do conhecimento; mostrar a relevância

na organização ao longo dos anos. Haverá benefí-

das ferramentas de Gerenciamento Eletrônico de Documentos

cio tanto para o processo de ensino-aprendizagem,

(GED) e Enterprise Content Management (ECM) na gestão das informações organizacionais e esclarecer a importância de se

112 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


utilizar empresas especializadas ao implantar o gerenciamento

informações durante todo ciclo de vida de um documento.

do conhecimento e as ferramentas de gestão documental. Para

Estas tecnologias têm como fundamento fazer com que a

exemplificar serão apresentadas as ferramentas ECM Oracle e

informação seja obtida de forma consistente, otimizada e rápida

Microsoft SharePoint.

pelo usuário. Elas possibilitam gerenciar informação estruturada

O restante do artigo está estruturado em cinco seções, sendo elas: A seção 2 engloba a conceituação dos sistemas

e não estruturada como papel, e-mail, documentos, web sites e multimídia de uma organização.

de gerenciamento do conhecimento; A seção 3 abrange o

Grande parte das empresas que não possuem uma destas

tratamento da segurança no Oracle ECM Suite e no Microsoft

tecnologias implantadas podem enfrentar problemas como du-

SharePoint, descrevendo os modos de autenticação, os objetos

plicação de conteúdo e baixo índice de reaproveitamento dos

relacionados à segurança e o tratamento dos mesmos; a seção

mesmos, dificuldade no controle de acesso e segurança do con-

4 apresenta uma análise comparativa relacionando o sistema

teúdo, armazenamento e controle de versões.

de gerenciamento de conteúdo da Oracle com o pertencente à

Os sistemas de gerenciamento de conteúdo e documentos

Microsoft; a seção 5 expõe alguns cases de organizações que

compartilham o conteúdo por toda a empresa, utilizando um re-

utilizaram as tecnologias descritas anteriormente para estruturar

positório centralizado. O que elimina a redundância e automatiza

a gestão de seus conteúdos; e por último, a seção 6 que apre-

os processos.

senta a conclusão do trabalho.

Estes sistemas também facilitam o controle documental no domínio legislativo, ou seja, permitem atender especificamente as

2 SISTEMAS DE GERENCIAMENTO DO CONHECIMENTO

leis que regem cada espécie documental, como, como por exem-

Segundo Santos e Cueto (2010, p. 431) os sistemas de ge-

plo, tempo legal de guarda de um documento. Eles permitem criar

renciamento do conhecimento são:

controle de ciclos de vida capazes de automatizar todo processo

sistemas de informação que facilitam a aprendizagem

ao qual o conteúdo passará na organização, facilitando assim as

organizacional e a criação de conhecimentos. Utilizam

possíveis auditorias venham a sofrer. A falta destes controles mui-

uma diversidade de Tecnologia de Informação para co-

tas vezes causa transtornos às empresas, pois elas dificultam o

letar e editar informações, avaliar seu valor, disseminá-

gerenciamento de quais documentos realmente são necessários,

las dentro da organização e aplicá-las como conheci-

quais não precisam mais ser armazenados. Ao parametrizar os

mento dos processos de uma empresa.

sistemas é possível criar regras que controlem o período de armazenamento de cada conteúdo, assim as perdas documentais são

Para obter um gerenciamento de conhecimento em uma or-

mínimas, ao contrário dos métodos padrões, e diminuirá o risco

ganização o primeiro passo é identificar o conhecimento neces-

de em uma auditoria deparar com o inconveniente de precisar de

sário para realização de cada atividade. Após este mapeamento

um documento que não mais possui armazenado.

é possível traçar uma estratégia do conhecimento, a partir de

É um desafio para as organizações realizar um projeto de

uma análise sobre os conhecimentos já adquiridos pela empre-

gestão documental bem sucedido, pois é necessário fazer uma

sa, mas não documentados e o conhecimento necessário à re-

análise de vários aspectos, como: qual resultado a empresa pre-

alização do negócio.

tende obter com a implantação, quais benefícios poderá trazer

Segundo Baldam, Valle e Cavalcanti (2002, p.30, Apud

à organização, se haverá lucros com produtividade, se haverá

STRASSMANN4, 2000), de acordo com estudos realizados 50%

otimização no tempo dos processos ou se ocorrerá redução dos

dos conhecimentos necessários para o sucesso de uma orga-

custos alavancando um ganho financeiro.

nização encontram-se na sua forma explícita (documentados ou

A implantação do projeto requer muita atenção e não pode

não), dentro da própria organização, outros 25% são encontra-

ser feito simplesmente porque está na moda. Neste cenário sur-

dos no formato explícito fora da organização e 25% são conhe-

ge uma figura muito significativa denominada consultor. Ele é o

cimentos tácitos de seus colaboradores.

responsável por utilizar boas práticas de mercado nas etapas de

Para alcançar o gerenciamento do conhecimento é necessária

desenvolvimento. Muitos projetos são fadados ao fracasso por

a realização da gestão do conhecimento explícito, que como dito

não terem sido bem estruturados e analisados especificamente

anteriormente representa mais da metade do conhecimento da or-

para a organização.

ganização. Para contribuir com esta gestão muitas empresas têm

Algumas empresas se iludem ao pensar que se compra-

utilizado duas tecnologias específicas para este fim: GED e ECM.

rem o melhor software do mercado, seu projeto ocorrerá com

Com estas tecnologias podemos armazenar, localizar e recuperar

sucesso. Não se preocupam em contratar uma empresa expe-

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 113


riente para realizar a implantação. Fazem um alto investimento

SEGURANÇA NOS SISTEMAS DE GERENCIAMENTO DE CONTEÚDO

na compra do produto sem ter capacitação para consolidar o

O controle da segurança da informação em uma organiza-

que era necessário no projeto. Desta forma, após prejuízo de

ção é um fator de grande complexidade. Ele engloba vários as-

tempo e dinheiro, procuram um consultor que precisa estruturar

pectos, como: razões políticas, a cultura organizacional, impo-

o projeto mal sucedido e utilizar a ferramenta adquirida, que

sições legais e a maneira como os envolvidos nos processos

talvez nem seja a mais indicada para aquela empresa, para

de manipulação destas informações lidam com os mesmos.

tentar solucionar o problema gerado.

Os sistemas de gerenciamento de conteúdo, como Mi-

Os projetos de ECM e GED mudam a forma com que as

crosoft SharePoint e Oracle ECM Suite, podem ser utilizados

pessoas trabalham. Pois as tarefas que muitas vezes eram rea-

para auxiliar as organizações nesta árdua tarefa. Adequando

lizadas manualmente, passam a ser controladas por ferramenta

os processos de gerenciamento de conteúdo com as normas

informatizadas, definidas a partir da análise das necessidades

políticas e legais, parametrizando os sistemas conforme as ne-

empresariais. Ocorre uma mudança cultural na organização.

cessidades dos envolvidos, permitindo que cada organização

É necessário que seja pensado em um treinamento para os

englobe suas características no modo ao qual o sistema irá

setores envolvidos neste novo sistema empresarial. Segundo

atuar. Segundo Meireles (2010), as empresas perceberam a

Bassi (2008, p. 20), “O treinamento vai quebrar as resistências

importância da gestão do conhecimento para melhorar o seu

culturais dos usuários. Deve-se tratar do envolvimento das

desempenho e os responsáveis pela segurança corporativa

pessoas desde o início para evitar na hora da implantação a

precisam fazer uso deste conhecimento para aprimorar a se-

resistência.”

gurança empresarial.

Diversos aspectos empresariais são afetados pela agrega-

Estes sistemas precisam estar alinhados com as necessi-

ção da gestão do conhecimento e tecnologias de gestão docu-

dades da organização. Devem ser parametrizados para aten-

mental. Utilizar estas formas de gerenciamento é um desafio que

der aos requisitos específicos de cada área que os utilizam.

demanda tempo e conhecimento específico. Se implantados cor-

Para isso é necessário criar regras de controle de acesso,

retamente poderão trazer muitos benefícios à organização.

como: grupos de permissões definidos, limites que determi-

Cada vez mais empresas têm buscado estes gerencia-

nem o que os usuários podem realizar no conteúdo que pos-

mentos para implantá-los em sua cultura empresarial. Estas

suem permissões e como este conteúdo será tratado, e como

novas metodologias gerenciais terão grande influência nas

as ações realizadas nos mesmos podem ser auditadas.

companhias e cada vez mais impactará a cultura empresarial. Utilizá-las da maneira mais consistente é uma tarefa que vem amadurecendo cada dia mais.

Segurança no Microsoft SharePoint O Microsoft SharePoint é um sistema utilizado para realizar

Muitas empresas sofrem com a falta de controle sobre o

a gestão de conhecimento das organizações, pertencente à

conhecimento e conteúdo organizacional. Enfrentam constantes

Microsoft, que permite realizar o controle do ciclo de vida dos

problemas como perdas de documentos, duplicação de mate-

conteúdos empresariais. Segundo Beltrame, Santos e Maçada

riais, falta de controle de versões. Às vezes precisa consultar um

(2006), o Microsoft Sharepoint possui uma base de dados de

documento, para isso dependem do setor de arquivos, que mui-

documentos, chamada de site, que permite a comunicação e

tas vezes estão localizados em outro prédio. Logo o arquivista,

colaboração entre membros e equipes e coordenação de pro-

em meio a todo o acervo documental tem que procurar pelo con-

cessos de negócio da organização.

teúdo especificado, trabalho este que pode demorar diversas

A segurança no Microsoft SharePoint é um quesito funda-

horas e mesmo dias. Após a localização é necessário ir a uma

mental que deve possuir um planejamento e uma estruturação

copiadora, fazer uma cópia do documento, voltar o original para

bem definidos ao ser implantado em uma organização. O que

o arquivo e levar a cópia via malote até o solicitante. O que pode

irá permitir que o conteúdo disponibilizado apenas seja aces-

comprometer a segurança do conteúdo. Neste âmbito a utiliza-

sado pelos usuários que possuírem as devidas permissões.

ção de sistemas de gerenciamento de conteúdo nas mesmas

Segundo a Microsoft5 (2010), o controle dos acessos no

pode ser de grande utilidade. Estes sistemas manterão o con-

Microsoft SharePoint pode ser realizado a partir de permissões

teúdo em um repositório centralizado, onde todos os envolvidos

dadas aos seguintes níveis do conjunto de sites: site, biblioteca

que necessitarem acessá-lo e obtiverem as devidas permissões

ou lista, pasta e documento ou item. Como pode ser verificado

sobre o mesmo, podem consultá-lo de seu próprio computador,

na FIG. 1:

simplificando todo processo descrito anteriormente. 114 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


Onde, segundo a empresa:

- Objeto Protegível - é o objeto ao qual o usuário ou o grupo

- Permissões - são as responsáveis por conceder ao usuário a capacidade de executar ações específicas.

receberá a permissão de acesso. O controle de acesso por usuário individual deve ser reali-

- Níveis de permissão - são conjuntos de permissões que per-

zado apenas em situações muito específicas, pois, segundo a

mitem aos usuários executar um conjunto de tarefas relacionadas.

Microsoft, se sua utilização não for equilibrada o gerenciamento

- Grupo do SharePoint - é um grupo de usuários que são

de permissões se tornará mais trabalhoso e o sistema poderá

definidos no nível de conjunto de sites para facilitar o gerenciamento de permissões. A cada grupo do SharePoint é atribuído um nível de permissão padrão.

ficar mais lento. O Microsoft Sharepoint, por padrão, tem alguns grupos e níveis de permissão definidos, como pode ser visto na tabela

- Usuário - é uma pessoa com uma conta de usuário de qualquer provedor de autenticação com suporte no aplicativo Web.

1, mas caso a organização necessite outros grupos e níveis de permissão personalizados podem ser criados.

Os níveis de permissão podem ser definidos como:

alterar o layout das páginas do site usando o navegador ou o

- Somente exibição - inclui permissões que permitem aos

Microsoft SharePoint Designer.

usuários exibir páginas, itens de lista e documentos. - Leitura - Inclui permissões que permitem aos usuários exibir itens nas páginas do site.

- Controle total - Inclui todas as permissões. A correta definição dos aspectos de segurança e permissões de acesso no sistema Microsoft SharePoint é um fator

- Contribuição - Inclui permissões que permitem aos usuá-

determinante para o sucesso do mesmo na organização, pois

rios adicionar ou alterar itens nas páginas do site ou em listas e

assegurará que, pelo que depender das definições tecnológi-

bibliotecas de documentos.

cas, o conteúdo apenas será disponibilizado aos usuários que

- Design - Inclui permissões que permitem aos usuários

previamente foram definidos como autorizados a utilizá-lo.

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 115


Segurança no Oracle ECM Suite

de controlar todo ciclo de vida de um conteúdo empresarial,

O Oracle ECM Suite, assim como o Microsoft SharePoint,

conforme é exibido na FIG. 2:

é um sistema de gerenciamento de conteúdo. Ele é capaz

Primeiramente temos a criação do conteúdo (em meio eletrônico ou físico) e a captura do mesmo, para ser tratado pelo

nistração de usuários, criação de grupos de segurança e implementação de roles e contas.

sistema. Em seguida o conteúdo é armazenado no repositório.

Segundo a Oracle6 o seu sistema de gerenciamento de con-

Ao ser gravado é criada a primeira versão do documento. Após

teúdo é projetado para quatro tipos de usuários: consumidores,

este processo cada vez que o conteúdo for alterado é criada

colaboradores, administradores e sub-administradores. Onde

uma nova versão do mesmo. Para facilitar a recuperação deste

eles podem ser definidos como:

conteúdo é realizada uma indexação, onde informações sobre o mesmo são passadas por quem o armazenou. Após este processo é realizado o gerenciamento deste conteúdo, definindo, por exemplo, como será o seu fluxo. Em seguida é realizado um filtro neste conteúdo onde se define quem poderá acessá-lo, em quais condições, para que seja distribuído com segurança. Após esta etapa o conteúdo é publicado para que o restante da organização possa realizar pesquisas, visualizar e re-

- Consumidores: Os usuários que apenas precisa localizar, visualizar e imprimir arquivos. - Colaboradores: Os usuários que precisam criar e revisar arquivos. - Sub-administradores: Os administradores que supervisionam um subconjunto de uma instância. - Administradores: Os administradores que supervisionam uma instância inteira.

cuperar estes documentos. Quando a organização não necessitar

Os documentos aos serem armazenados no sistema são

mais que este conteúdo esteja disponível mais para toda organi-

classificados como pertencentes aos grupos de segurança, que

zação é realizada a retenção do mesmo, onde ele é classificado

só podem ser acessados por usuários que receberam privilé-

como retido, para fins legais, históricos, etc. Caso este conteúdo

gios para este fim. Cada grupo de segurança tem vinculado a

não necessite ser retido ele então é excluído ao fim do ciclo.

ele roles responsáveis pelas concessões que serão dadas aos

A segurança neste sistema é realizada a partir da admi-

usuários, conforme pode ser visto na FIG. 3:

116 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


Onde temos as seguintes definições para as permissões:

mesmos que podem influenciar na escolha de uma solução em

R – Permissão de leitura de conteúdos no grupo de segurança.

uma organização que tenha a necessidade de utilizar uma ferra-

RW – Permissão de leitura e escrita concedida ao usuário.

menta do gênero.

RWD – Permissão de leitura, escrita e exclusão em determinado grupo.

O Oracle ECM Suite é uma solução de gestão de conteúdo direcionada para empresas de médio e grande porte, pois exige

RWDA – Permissão de leitura, escrita, exclusão e administração de metadados no sistema.

um alto investimento para sua implantação. Segundo a Gartner (2010), o Oracle ECM Suite é uma suíte

Um usuário pode ter permissões distintas em grupos de

madura, bem integrada e que permite aos seus clientes apro-

segurança diferentes, adequando os acessos às necessida-

veitar a infraestrutura Oracle já existente no negócio, reduzindo

des do negócio.

o custo total de implantação. Tornando-o desta forma um forte

Os responsáveis pela implantação do sistema devem tratar

concorrente no mercado de ECM. Ele possui uma integração

a segurança como um fator de extrema importância para o su-

muito importante com o BPM Oracle, o que permite a criação de

cesso do projeto na organização. Qualquer falha implementada

workflows extremamente complexos e eficazes.

poderá causar problemas na credibilidade do sistema e trazer sérios problemas para a empresa que o utilizará.

Alguns problemas apontados pela Gartner (2010), é o fato de a Oracle está apenas começando a implementar o conceito de WEB 2.0 em seus produtos da suíte ECM, sendo que os recursos apesar de promissores ainda são imaturos.

ANÁLISE COMPARATIVA: MICROSOFT

Algumas reclamações constantes dos usuários do Oracle

SHAREPOINT E ORACLE ECM SUITE A implantação de um sistema para gerenciamento de conte-

ECM Suite diz respeito à linguagem técnica utilizada em suas

údo deve ser cautelosa, a fim de garantir que todas as necessi-

funcionalidades e interface do sistema, que por não ser amigá-

dades sejam supridas com sucesso. Para isso é importante que

vel causa uma aversão por parte dos operadores, forçando às

os profissionais não acreditem que se comprarem uma solução

organizações a implantar uma nova camada na aplicação, que

reconhecida no mercado alcançarão êxito nesta empreitada. É

integrada ao sistema da Oracle, torna-o mais simples para o

preciso que busquem apoio de organizações especializadas no

usuário final.

assunto, para que desta forma consigam encontrar as ferramen-

O Microsoft Sharepoint é uma solução muito interessante do

tas que melhor atendam as suas necessidades e que definem

ponto de vista de adaptação dos usuários, pois em sua maioria

como deverá ocorrer a implantação, utilizando um projeto bem

já estão acostumados a operar os sistemas da Microsoft.

estruturado, realizado a partir da análise da organização. A seguir será demonstrada uma análise comparativa entre os sistemas Microsoft Sharepoint e Oracle ECM Suite, a partir 7

Segundo a Gartner (2010), o Microsoft Sharepoint é um produto muito bem sucedido e com alto grau de penetração no mercado.

dos dados fornecidos pela Gartner , em seu Magic Quadrant

Um problema do sistema é que algumas empresas que

for Enterprise Content Management, conforme pode ser visto na

possuíam o Sharepoint em versões mais antigas têm encontra-

FIG. 4, com o objetivo de apontar algumas características dos

do problemas para migrar para a versão 2010, principalmente no

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 117


caso de implementações personalizadas, embora vários parcei-

so, a capacidade de gerenciamento de fluxos de trabalho neste

ros da Microsoft ofereçam ferramentas de migração. Além dis-

sistema é limitada. (GARTNER, 2010).

Estas características diferenciadas não obrigam as organi-

Segundo a revista Document Management (2010), o coope-

zações a abrir mão das funcionalidades que o sistema da outra

rativismo no Paraná é considerado um dos mais organizados e

empresa poderia lhe oferecer. Segundo a Oracle (2008), mui-

desenvolvidos do Brasil.

tas organizações têm optado por utilizar o Sharepoint como um

Algumas destas cooperativas implantaram sistema de ges-

aplicativo front-end, realizando uma interface para a entrada de

tão de processos gerenciais e também o Sistema de Gestão de

conteúdos no sistema e utilizando o Oracle ECM Suite como o

Qualidade, ISO 9001. Durante a implantação destes sistemas,

motor do sistema, que irá realizar o controle dos fluxos e o arma-

sentiram a necessidade de organizar o otimizar a gestão de seus

zenamento do conteúdo nos repositórios.

documentos, para atender os requisitos da norma, utilizando um

Saber analisar claramente o que é aplicável a cada situação é o que determinará o sucesso ou o fracasso em um projeto de ECM.

software que facilitasse o controle de seus processos. Como exemplo pode-se referenciar a Cooperativa Agroindustrial Lar, que, em 2002, a partir da necessidade de encontrar

CASES DE SUCESSO

um software que se adequasse ao seu segmento, buscou no

Diversas empresas ao redor do mundo já se atentaram para

mercado que oferecesse um sistema que atendesse às deman-

a importância de realizar o controle de seus conteúdos e infor-

das da companhia.

mações organizacionais. Implantaram em sua estrutura tecnoló-

Segundo Document Management (apud Marshall 2010), no

gica os conceitos de gestão de conhecimento e suas ferramen-

início a empresa adquiriu uma ferramenta, mas passou por di-

tas, trazendo assim diversos benefícios para a empresa. A seguir

versos problemas na utilização do sistema que era complexo,

serão exibidos alguns cases de sucesso destas organizações.

sendo que os usuários encontravam dificuldade de navegar até mesmo nas telas mais simples do sistema.

ECM na Agroindústria

A empresa possuía diversas filiais, sendo que algumas delas

Um sistema de gestão documental foi desenvolvido pela

se localizavam em outro país, havendo a necessidade de comuni-

empresa Digitaldoc8 para atender as necessidades do coope-

cação de dados e troca de documentos entre elas, o que este sis-

rativismo agroindustrial.

tema não permitia, por não possibilitar a integração com a intranet.

118 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


Segundo Document Management (apud Leonhart 2010), a

em papel fosse praticamente eliminada, os processos decisó-

Cooperativa Lar precisava de um software leve, iterativo, com in-

rios e atividades operacionais foram agilizados, conseguiram

terface amigável, estável, que desse suporte aos processos de

uma rápida adaptação dos usuários, sem a necessidade de rea-

qualidade e que disponibilizasse constantes aperfeiçoamentos. A

lizar altos investimentos em treinamentos, os fluxos empresariais

empresa Digitaldoc foi escolhida para desenvolver este projeto.

foram otimizados, diminuindo o tempo gasto nos projetos. A im-

A partir desta parceria um sistema foi desenvolvido para integrar as necessidades do negócio e permitiu o acesso dos

plantação do sistema atingiu os objetivos estabelecidos durante a análise e tornou-se um case de sucesso para a organização.

diversos usuários das filiais através da internet. Segundo Document Management (apud Marshall 2010), a

CONCLUSÃO

implantação do sistema desenvolvido pela Ditaldoc os proces-

As organizações estão cada vez mais preocupadas com a

sos decisórios tornaram-se mais ágeis, o tempo gasto com pro-

maneira que suas informações são manipuladas. Elas percebe-

cura de documentos foi reduzido, preveniu-se os possíveis cus-

ram a importância de gerenciar o conhecimento, este que está

tos gerados pela utilização de documentos obsoletos, evitou-se

sendo considerado o mais importante dos bens intangíveis.

a recriação de informações já existentes, diminuindo assim os

As empresas podem ser beneficiadas ao utilizar o geren-

gastos gerados por retrabalho, possibilitou o registro do capi-

ciamento do conhecimento e ferramentas GED e ECM em sua

tal intelectual e permitiu a disseminação do conhecimento entre

estrutura de trabalho. A busca por estas tecnologias tem aumen-

as diversas áreas e processos. Tornando-se uma ferramenta de

tado, sendo utilizadas em diversas situações.

grande utilidade no dia-a-dia da organização.

Apesar das tecnologias estarem evoluindo cada dia mais, as organizações necessitam desenvolver uma maturidade empre-

ECM na análise de crédito

sarial, pois mesmo com todos os mecanismos de segurança e

O Banco BMG, devido à evolução do mercado de crédito,

gerenciamento da informação, se os envolvidos na utilização dos

oriunda do bom momento econômico que o Brasil estava pas-

mesmos não contribuírem respeitando as normas impostas, utili-

sando em 2007, começou a enfrentar uma grande concorrência

zando os sistemas da forma adequada e se lembrando de que a

gerada pelas instituições financeiras que ofereciam a seus clien-

informação produzida na organização tem como objetivo o bom

tes novos produtos e serviços.

aproveitamento organizacional e não apenas pessoal, não haverá

Então seus profissionais sentiram uma necessidade de

tecnologia suficiente que garanta o sucesso dos mesmos.

encontrar uma solução que permitisse expandir seus negócios de forma segura, ágil e confiável. Eles pretendiam minimizar a

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

quantidade de papel que circulava na organização, integrar os

ALVES, Francisco Arnoudo. Gestão de Conhecimento: uma ferramenta de apoio ao exercício da função de Controle Externo. Disponível em: <http://www.tce.ce.gov.br/sitetce/arq/RevistaControle/2006/19_ARTIGO_ARNOUDO.pdf> Acesso em 24.mar.2011.

diversos tipos documentais, originados de várias mídias e tecnologias, realizar a integração de seus sistemas que continham informações e garantir que as análises de crédito seriam analisadas no tempo determinado. Analisando estas necessidades concluíram que uma solu-

BALDAM, Roquemar; VALLE, Rogerio; CAVALCANTI, Marcos. GED: gerenciamento eletrônico de documentos. São Paulo: Érica, 2002.

ção de ECM seria o que melhor atenderia a empresa. A partir desta decisão optaram por utilizar o sistema CONVERGE® ECM Solution9, pois já utilizavam a solução CONVERGE® em diversas outras aplicações no Banco BMG. Este fator simplificaria a implantação, além de possibilitar que seus usuários se adaptas-

BELL, Toby et al. Magic Quadrant for Enterprise Content Management. Disponível em: <http://www.docusource.com/pdfs/Hyland-Magic-2010.pdf> Acesso em 05.nov.2011.

sem mais facilmente à tecnologia, pois já estavam habituados a utilizar outros sistemas da solução. Realizaram um levantamento dos fluxos e particularidades existentes no Banco, com uma empresa especializada em ECM/ GED e um projeto que atendesse a estas necessidades foi realizado. Desta forma conseguiram que a circulação de documentos

Cardoso, Vinícius. Gestão de Conhecimento. Disponível em: <http://www.de9.ime.eb.br/~intec/Gestao%20Conhecimento/GestaoConhecimento_IME_VCC_01092005.pdf> Acesso em 24.mar.2011. ECM na agroindústria. Document Management. São Paulo, v. 4, n. 16, p. 40, fev. 2010. GESTÃO eletrônica de documentos e processos na análise de cré-

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dito direto ao consumidor. Disponível em: <http://www.smlinfo.com.br/NewSite/Admin/Content/cases/16. pdf?r=106 > Acesso em 05.nov.2011. MEIRELES, Nino Ricardo de Menezes. Gestão do Conhecimento na Segurança Corporativa. Disponível em: <http://www.prevenirperdas.com.br/portal/index.php?option=com_co ntent&view=article&id=44:gestao-do-conhecimento-na-segurancacorporativa&catid=18:prevencao-a-fraudes&Itemid=7>Acesso em 08.set.2011. ROSINI, Alessandro Marco; PALMISANO, Angelo. Administração de sistemas de informação e a gestão do conhecimento. São Paulo: Thomson, 2003. SANTOS, Consuelo Hascaska dos; CUETO, Suzana. Gestão de Conhecimento. Disponível em: <http://www.isulpar.edu.br/publicacoes/CONSUELO_HASCASKA_SUZANA_CUETO.pdf> Acesso em 24.mar.2011. SCIARRA, Eduardo. Cooperativismo: a ponte entre a pobreza e a prosperidade. Disponível em: < http://www.parana-on­line.com.br/colunistas/3/75912/?postagem=CO OPERATIVISMO+A+PONTE+ENTRE+A+POBREZA+E+A+PROSPE RIDADE > Acesso em 05.nov.2011. Terra, José Cláudio Cyrineu. Gestão do Conhecimento: aspectos conceituais e estudo exploratório sobre as práticas de empresas brasileiras. Disponível em: <http://74.125.155.132/scholar?q=cache:qGXpgViGtagJ:scholar.google.com/+gest%C3%A3o+do+conhecimento&hl=pt-BR&as_sdt=0> Acesso em 24.mar.2011.

NOTAS DE RODAPÉ 1 Graduando do curso de Sistemas de Informação do Centro Universitário Newton Paiva. 2 Professor do Centro Universitário Newton Paiva. 3 http://universitario.educacional.com.br/dicionarioaurelio/ 4 Strassmann, Paul. Fishing for Data. 2000. 5 http://technet.microsoft.com/pt-br/library/cc262939.aspx 6 http://download.oracle.com/docs 7 http://www.gartner.com/technology/home.jsp 8 Digitaldoc é o nome do principal produto fornecido pela empresa Anix Sistemas Ltda, mas confome infomado na página web da mesma (http://www.digitaldoc.com.br/empresa) este nome foi designado para identifica-la no mercado. 9 http://www.lasersystems.com.br/ecm.html

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OTIMIZADOR DE CONSULTAS EM BANCO DE DADOS ESTUDO DE CASO: MICROSOFT SQL SERVER 2008 R2 ELISA ALVINA DE MORAES ARCANJO 1 IREMAR NUNES DE LIMA 2

RESUMO: Os bancos de dados armazenam diferentes tipos de informações e são acessados constantemente de diversas formas. Uma consulta SQL quando é solicitada ao banco de dados é tratada pelo SGBD, que, ao encontrar o melhor caminho, mostra o resultado das informações descritas no comando. A busca pelo melhor desempenho e retorno rápido dos comandos requer o estudo de técnicas de otimização. O tratamento que o SGBD realiza na execução de consultas em busca de otimização segue por duas linhas diferenciadas: otimização heurística e otimização baseada em custos. Sendo a primeira feita por regras e a segunda baseada em estatística. O presente trabalho tem como objetivo mostrar as duas formas de otimização de um SGBD e descrever qual a otimização padrão utilizada pelo SQL Server 2008 R2. PALAVRAS-CHAVE: Banco de Dados, Otimização, SQL Server 2008 R2.

1 INTRODUÇÃO

informações disponíveis que, talvez, o programador não tenha

Os bancos de dados armazenam diferentes tipos de infor-

acesso, como, por exemplo, os efeitos e quais os índices da

mações e são acessados constantemente de diversas formas,

tabela ou do banco que influenciam no comando e os planos

como, por exemplo, um acesso para consultar certos registros,

de execução já existentes. Assim, este artigo descreve, nos

solicitado por algum software ou mesmo por um DBA (Adminis-

próximos tópicos, como a otimização de consultas é tratadas

trador de Banco de Dados), ou o acesso ao banco para realizar

pelos SGBDs, descreve as técnicas de otimizações heurísticas

alguma alteração em um registro ou a inserção de novos dados.

e baseadas em custos e como funciona a otimização de con-

Seja para consultar, inserir ou alterar, dentre outros coman-

sultas no SQL Server 2008.

dos, o acesso aos dados e a resposta dos comandos deve

O restante deste trabalho está organizado da seguinte for-

ser rápido, contundente com o que está armazenado e com o

ma: na seção 2 é descrito o funcionamento dos otimizadores dos

que foi solicitado. A busca pelo melhor desempenho e retorno

SGBDs e as técnicas de otimização, como a Heurística e base-

rápido dos comandos requer o estudo do termo otimização, o

adas em Custos; na seção 3 é apresentado o funcionamento do

qual consiste, segundo TOMIO (2006), em escolher boas estra-

otimizador do SQL Server 2008 e, na seção 4 a conclusão.

tégias para o processamento de consultas ou comandos com os objetivos de diminuir o acesso ao disco e a quantidade de

2 OTIMIZAÇÃO DE CONSULTAS DOS SGBDS

memória utilizada. Assim, para certo comando, existe um tipo

Uma consulta SQL quando é solicitada ao banco de dados

de otimização, mas a que será detalhada neste artigo é a otimi-

é tratada pelo SGBD, que ao encontrar o melhor caminho, mos-

zação de consultas SQL (Structured Query Language).

tra o resultado das informações descritas no comando. Este

Segundo BOSCATTO e DAMINELLO (2004, p. 3) “a otimi-

tratamento feito pelo SGBD, também conhecido como proces-

zação da consulta apresenta tanto um desafio como uma opor-

samento de consultas, pesquisa uma expressão equivalente ao

tunidade”, pois a otimização feita pelo programador ou por um

comando SQL com o objetivo de otimizar o tempo de execução

otimizador de banco de dados torna-se um desafio devido ao

da consulta. Para exemplificar a otimização de consultas consi-

grande número de relacionamentos existentes em um banco e

dere o seguinte comando:

a diversidade de estruturas de dados existentes no SGBD. A

SELECT c.nome

oportunidade acontece pelo simples fato de que otimizar con-

FROM clientes c, endereco e

sultas é possível e viável, seja ela como for, feita pelo progra-

WHERE c.codend = e.codend AND e.cidade=

mador humano, pelo DBA ou pelo próprio otimizador do banco.

“BELO HORIZONTE”;

Porém, diante deste contexto, pode ser que o otimizador do banco consiga melhor desempenho ao executar uma con-

O processamento normal deste comando primeiramente

sulta do que se a otimização for feita pelo programador huma-

realizará o produto cartesiano das tabelas clientes e ende-

no (BOSCATTO, 2004 et all), pois o otimizador do banco possui

reço e depois verificará a satisfação das condições. Então,

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 121


somente depois do resultado gerado pelo produto cartesiano

representação interna e a mais utilizada é a árvore de sintaxe

e do tratamento das condições é que a projeção da coluna

abstrata ou árvore de consulta (figura 1). Esta árvore repre-

nome da tabela clientes será feita. Este processamento ain-

senta a consulta na linguagem de consulta de sistema. Ou

da não é o mais rápido. Utilizando as técnicas de otimização

seja, o comando é separado em blocos e níveis para que o

dos SGBDs, o processamento seria feito da seguinte forma:

SGBD avalie qual o melhor caminho da árvore a ser percorri-

primeiramente as condições WHERE seriam validadas e dos

do. Considere o comando a seguir e verifique a montagem de

resultados obtidos, a coluna nome seria projetada.

sua árvore de consulta:

Conforme descrito por TOMIO (2006), em geral os passos seguidos por um otimizador de consultas são:

SELECT cliente.nome FROM cliente, categoria WHERE categoria.nome = “VIP” AND cliente.codcat = categoria.codcat

- Representação interna: a consulta é transformada numa

A árvore da figura 01 representa como um SGBD inter-

10) AND (cliente.nome OR cliente.idade < 30). Assim, diante

preta uma consulta SQL. No primeiro nível da árvore estão os

das diferentes formas, o SGBD deve escolher a melhor ex-

campos que deverão ser retornados pela consulta; no segun-

pressão e eliminar as demais do processo de execução de

do nível, realiza-se o produto cartesiano de categoria e cliente

uma consulta SQL.

de acordo com a condição especificada (a chave estrangeira

Medição de custo: as expressões são consideradas

codcat de cliente deve ser igual à chave primária codcat de

como uma série de operações e para cada operação o SGBD

categoria). No terceiro nível é realizada a filtragem das cate-

avalia os procedimentos necessários para a implementação

gorias que possuem o nome VIP. Sempre ao final da árvore,

da operação e assim, calcula qual o custo da operação;

nas pontas, também chamadas de folhas, encontramos as tabelas selecionadas no comando. Expressão equivalente: a representação interna é convertida para uma expressão equivalente com o intuito de re-

Informações do catálogo do sistema: o SGBD verifica as informações referentes ao estado do banco de dados, como por exemplo, os índices referentes à consulta inicial, as tabelas relacionadas e suas cardinalidades.

presentar, de maneira mais eficiente, a consulta original. Ou

Planos de consulta: com as informações do catálogo e a

seja, um mesmo comando pode ser representado de diferen-

medição dos custos, o otimizador gera os planos de consulta

tes maneiras, mas gerará o mesmo resultado. Porém, cabe

e em seguida, escolhe o melhor entre eles, ou seja, o de me-

ao SGBD escolher a expressão que melhor representa e que

lhor desempenho (menor custo).

tenha a melhor performance do que o comando original. Por

O tratamento que o SGBD realiza na execução de consul-

exemplo, a condição WHERE cliente.nome = “JOAO” OR

tas em busca de otimização pode ser feito de duas maneiras:

(cliente.idade > 10 AND cliente.idade < 30) também pode

otimização heurística e otimização baseada em custos. Estas

ser descrita como WHERE (cliente.nome OR cliente.idade >

técnicas serão descritas nos próximos tópicos.

122 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


2.1 OTIMIZAÇÃO HEURÍSTICA

muitas tabelas e os relacionamentos forem descritos na forma

Na otimização heurística, segundo TOMIO (2006), algumas regras são aplicadas para melhorar o desempenho da execução e da transformação das consultas em diversas expressões equivalentes. As regras são:

de produto cartesiano, mesmo seguindo as regras, a otimização heurística gerará um resultado, talvez, mais demorado. A otimização baseada em custos depende de atualizações periódicas de índices, tuplas, cardinalidade das tabelas e cha-

Executar operações de SELEÇÃO e PROJEÇÃO primeiramente;

ves, e isto necessita de um tratamento por parte de um DBA ou um desenvolvedor, que devem criar funções que façam tal atu-

A JUNÇÃO só deve ser realizada depois da SELEÇÃO e PROJEÇÃO;

alização ou eles mesmos façam tal tratamento. Se estes dados não estiverem de acordo com a realidade do banco podem ge-

Somente os atributos solicitados para o resultado da con-

rar resultados que não sejam os melhores. Porém, se as funções

sulta e os que realmente são necessários em consultas subse-

que armazenam as informações dos índices, chaves, tuplas e

qüentes é que devem ser projetados;

cardinalidade estão atualizadas, a otimização em custos se tor-

Evitar geração de múltiplas tabelas intermediárias;

na bastante vantajosa, uma vez que sua prioridade é eliminação

Pesquisar as subexpressões comuns e processá-las so-

de custos, garantindo ótima performance e resultados rápidos.

mente uma vez; A utilização dessas regras heurísticas influencia no plano de

3 O OTIMIZADOR DE CONSULTAS DO SQL SERVER 2008 R2

execução da consulta, pois uma ordem de execução das ope-

Conforme o site da MSDN (Microsoft Developer Network)

rações é determinada e também quais os recursos serão utiliza-

ao executar um comando SELECT em um banco de dados,

dos no plano, por exemplo, os índices.

o comando não informa qual o caminho o banco deve seguir para gerar o resultado no menor tempo e performance possível.

2.2 OTIMIZAÇÃO BASEADA EM CUSTOS

Assim, todo SGBD possui em sua estrutura um otimizador de

A otimização baseada em custos é gerada a partir de fun-

consulta que é responsável por avaliar a instrução a partir do

ções estatísticas dos SGBDs. Estas funções armazenam infor-

comando, do esquema e das estatísticas do banco gerando o

mações referentes ao número de tuplas, aos índices, as chaves

melhor plano de execução.

e a cardinalidade das tabelas. As estatísticas da distribuição dos

O SQL Server 2008 R2 possui em sua estrutura um otimiza-

dados nas colunas das tabelas e que são usadas para estimar

dor de consultas que é baseado em custos. Ou seja, cada plano

os custos, também consideram o uso de CPU e I/O e o tamanho

de execução possui um custo referente aos recursos que utiliza,

das tabelas utilizadas.

como CPU e I/O, e o otimizador é responsável por analisar e

Porém, como este tipo de otimização é baseado em estatísticas e pode gerar um resultado que talvez não seja o melhor. Isto acontece devido ao SGBD utilizar informações armazenadas que talvez estejam desatualizadas. Assim, é necessário que as funções que armazenam as informações das tuplas, índices, chaves e cardinalidade sejam atualizadas periodicamente. Não

escolher o plano mais eficiente, de menor custo e que retorne o resultado da forma mais rápida. O processamento de uma consulta no SQL Server 2008 R2, segundo o site MSDN, segue alguns passos: Análise do comando SELECT e separação do mesmo em palavras-chave, expressões, operadores e identificadores.

é viável realizar a atualização todas as vezes que acontece al-

Criação da árvore de consulta do comando.

guma alteração no banco, pois isto implica em alto custo, mas

Análise dos diferentes modos de percorrer a árvore em

atualizando periodicamente, o SGBD manterá valores próximos

busca melhor resultado esperado pelo comando original. Neste

aos reais.

passo, a cada análise, a árvore de consulta é atualizada e sua versão final é chamada de plano de execução.

2.3 A ESCOLHA DO SGBD

Execução do plano de consulta.

Os SGBDs que optam pela otimização heurística, estão em

Retorno dos resultados ao usuário.

busca de um resultado bem mais confiável do que o resultado

Assim, o otimizador do SQL Server 2008 R2 utiliza a otimi-

da otimização baseada em custos, pois a otimização heurística

zação baseada em custos. Ele realiza otimização em tabelas lo-

segue um padrão de avaliação e execução de uma consulta e

cais, particionadas, distribuídas e em diversos servidores, mas

este padrão ajuda no desempenho e resultado das informações

os passos descritos anteriormente para otimizar uma consulta

do comando original, enquanto que a otimização em custos é

são os mesmos realizados indiferente da arquitetura do banco

baseada em estatísticas. Mas, se a consulta fizer referência a

e das tabelas.

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 123


4 CONCLUSÃO Uma consulta quando é solicitada a um banco de dados não especifica qual a ordem e as etapas de sua execução. Tal tarefa é de responsabilidade do otimizador de consulta, existente em todo SGBD. Existem dois tipos de otimização de consulta: heurística e baseada em custos. A heurística possui passos a seguir para gerar um plano de execução eficiente, como, por exemplo, SE-

CALUMBY, Rodrigo Tripodi. Otimização Heurística de Consultas. Universidade Estadual de Campinas, 2010. Disponível em: http://www. ic.unicamp.br/~tripodi/mc526/slides/aula12-otimizacao_de_consultas_ heuristica.pdf. Acesso em: 27 de Maio de 2011. MSDN – Microsoft Developer Network. Processamento de instruções SQL – SQL Server 2008 R2. Disponível em: http://msdn.microsoft.com/ pt-br/library/ms190623.aspx. Acesso em: 07 de Junho de 2011.

LEÇÃO e PROJEÇÃO são os primeiros passos desta otimização. A otimização baseada em custos baseia-se em estatísticas

NOTAS DE RODAPÉ

geradas a partir de funções que armazenam informações so-

1 Especialista em Banco de Dados e Business Intelligence (elisaarcanjo@ hotmail.com).

bre índices e chaves, cardinalidade das tabelas e as tuplas do banco para gerar o plano de execução que gere menor custo e resultado mais rápido. O SQL Server 2008 R2 utiliza em seu otimizador a otimiza-

2 DBA, mestre em informática e professor do Centro Universitário Newton Paiva (iremar.prof@uol.com.br).

ção baseada em custos e também possui seus próprios passos na execução de um comando SELECT. Assim, todo SGBD possui em sua estrutura um otimizador de consultas, mas cada banco de dados pode escolher qual estratégia de otimização: heurística ou baseada em custos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BOSCATTO, Ronaldo; DAMINELLO, Marcelo Rosalem. Otimização de Consultas SQL. Instituto Municipal de Ensino Superior de São Caetano do Sul, 2004. Acesso em 27 de Nov. de 2010. NOBRE, Wendell. Otimização de Consultas em Banco de Dados Centralizados. Disponível em: http://docs.google.com/ viewer?a=v&q=cache:4oBqBvQGb-0J:labdist.dimap.ufrn.br/files/3Ma. ppt+otimizador+de+consultas+sgbd Acesso em: 22 de Nov. de 2010. Otimização do Desempenho com o SQL Server 2008. Disponível em: http://fabadas.wordpress.com/dba-banco-de-dados/sql-server/otimizacao-do-desempenho-com-o-sql-server-2008/. Acesso em: 22 de Nov. de 2010. TOMIO, Thiago; CAIO, Renato; TSUYOSHI, Arlindo. Banco de Dados – Álgebra Relacional, Processamento e Otimização de Consultas. Faculdade de Tecnologia de São Paulo – FATEC-SP, 2006. Disponível em:http://www.shammas.eng.br/acad/sitesalunos0606/to/otimi.htm. Acesso em: 22 em Nov. de 2010. Processamento e Otimização de Consultas. Disponível em: http://homepages.dcc.ufmg.br/~laender/material/ibd-parte7.pdf. Acesso em: 04 de Maio de 2011. MACHADO, Javam C.. Otimização de Consultas Relacionais. Universidade Federal do Ceará, 1998. Disponível em: http://www.lia.ufc. br/~javam/Bd_avancado/otimizacao-consulta.pdf. Acesso em: 05 de Maio de 2011.

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PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DE SOFTWARE DE ACORDO COM A NORMA ISO/IEC 15504 MARCELO NORTE DE OLIVEIRA 1 marcelonorte.ti@gmail.com IREMAR NUNES DE LIMA 2 iremar.prof@uol.com.br

RESUMO: Este artigo trata da norma ISO IEC 15504, especificamente da seção que trata da engenharia de software. São discutidos os motivos do surgimento das normas de qualidade e como elas podem contribuir para a organização atingir os seus objetivos. São identificados também, diversos parâmetros que podem nortear as organizações de Tecnologia da Informação que desejam otimizar seus processos de desenvolvimento software baseados na norma ISSO IEC 15504. PALAVRAS-CHAVE: Norma ISO/IEC 15504, Desenvolvimento de Software, Spice, Qualidade de Software.

INTRODUÇÃO

eficientes para construção de softwares, como linguagens de

A ISO/IEC 15504, também conhecida como Spice, é um

programação, ambientes integrados de desenvolvimento, entre

modelo que possui como foco a melhoria dos processos de de-

outros, mas o software construído, apesar da qualidade da fer-

senvolvimento de software e a determinação da capacidade de

ramenta, ainda apresenta sérios problemas.

processos de uma organização (FELIPE, 2006). A sua existência se justificou em função de estudos que comprovaram que

NORMAS E METODOLOGIAS PARA A QUALIDADE DE SOFTWARE

a grande maioria dos projetos de software não atendem aos

del Integration em 2002 e a ISO/IEC – International Organization

Rezende, em sua obra Engenharia de Software e Sistemas de Informação, cita que a expressão crise do software começou a ser utilizada na década de 60, e referese a um conjunto de problemas recorrentes enfrentados no processo de desenvolvimento de software. Coloca ainda que é uma enorme variedade de problemas que caracterizam esse período. Vasconcelos, Rouiller, Machado e Medeiros caracterizam os problemas típicos da crise do software da como sendo previsão pobre, baixa qualidade, alto custo de manutenção e duplicação de esforços. Rincon acrescenta ainda o fato de os softwares não atenderem aos objetivos colimados. Ainda segundo esses autores, reconhecida a crise do software, foi pro-

for Standardization / International Electrotechnical Commission

posto que o seu desenvolvimento deixasse de ser puramente

(ISO, 2009) que publicou as normas ISO/IEC 15504 e ISO/IEC

artesanal e passasse a ser baseado em princípios de Engenha-

12207 nos anos 90.

ria, seguindo um enfoque estruturado e metódico. O termo En-

objetivos traçados (RINCON, 2009). Em contrapartida à grande importância que o software tem tido no cenário mundial, Rincon afirma que, de acordo com esses estudos, isso é decorrente da falta de processos adequados nas organizações em que eles são desenvolvidos. Ainda segundo Rincon, desde o final das décadas de 80, modelos de maturidade de software estão sendo criados ou vem evoluindo em todo mundo justamente para mudar essa realidade. Daí surgiram modelos como o do SEI – Software Engineering Institute que publicou o SW-CMM – Capability Maturity Model for Software em 1987 e o CMMI – Capability Maturity Mo-

Nosso foco de interesse é a norma ISO/IEC 15504 que foi

genharia de Software se refere ao desenvolvimento de software

desenvolvida para ser utilizada por organizações envolvidas em

usando princípios de engenharia de modo a produzir software

planejar, gerenciar, monitorar, controlar e melhorar a aquisição,

de qualidade, de forma eficaz e dentro de custos aceitáveis

fornecimento, desenvolvimento, operação, evolução e suporte

(VASCONCELOS, ROUILLER, MACHADO, MEDEIROS, 2006).

de software (MAIARA, 2009).

Diante do exposto, a demanda por qualidade de software

O estudo do tema justifica-se pela crescente importância

tem motivado o desenvolvimento de modelos para a qualidade

do software para a economia mundial. A ciência da computa-

deste produto que é largamente determinada pela qualidade

ção levou tempo para desenvolver ferramentas extremamente

dos processos utilizados para o desenvolvimento (IAHN, 1999).

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 125


Sabendo-se que grande parte do problema dos softwares não

da Software Engineering Institute (SEI), em cooperação com

atenderem efetivamente ao objetivo a que se proponham foi

a indústria e governo americanos. Sua arquitetura é composta

atribuído ao processo de desenvolvimento de software caótico,

basicamente pela definição de um conjunto de áreas de pro-

sendo assim identificou-se uma clara necessidade de estudar e

cesso, organizadas em duas representações diferentes: uma

aplicar processos de qualidade de software para que os projetos

como um modelo por estágio, semelhante ao SW-CMM, e outra

tenham mais chances de sucesso (RINCON, 2009).

como um modelo contínuo semelhante à ISO/IEC 15504 (VAS-

Hoje no mercado existem diversas normas em voga, entre

CONCELOS, ROUILLER, MACHADO, MEDEIROS, 2006).

elas se destacam, por exemplo as normas ISO 9000 para su-

A norma ISO/IEC 15504 surgiu em 1993 através do proje-

porte ao desenvolvimento de software, que retiramos da obra

to SPICE que foi um trabalho conjunto da ISO/IEC-International

Introdução à engenharia de software e à qualidade de software

Organization for Standardization/International Electrotechnical

de Vasconcelos, Rouiller, Machado e Medeiros:

Commission (VASCONCELOS, ROUILLER, MACHADO, MEDEI-

- Norma ISO/IEC 9126 (NBR 13596): Define as características de qualidade de software que devem estar presentes em todos os produtos (Funcionalidade, Confiabilidade, Eficiência, Usabilidade, Manutenibilidade e Portabilidade). - Norma ISO/IEC 12119: Estabelece os requisitos de qualidade para pacotes de software. - Norma ISO/IEC 14598-5: Define um processo de avaliação da qualidade de produto de software. - Norma ISO/IEC 12207: Define um processo de ciclo de vida de software. - Norma ISO/IEC 9000-3: Apresenta diretrizes para a aplica-

ROS, 2006). Objetivo era obter um consenso através da análise dos diversos métodos de avaliação do processo de software. A norma ISO15504, cuja versão completa foi publicada entre 2003 e 2006, atualmente representa um padrão internacional que estabelece um framework para construção de processos de avaliação e melhoria do processo de software (VASCONCELOS, ROUILLER, MACHADO, MEDEIROS, 2006). Nove documentos, alguns de caráter informativo, outros normativo, compõem a ISO15504, são eles: ISO15504-2, ISO15504-3, ISO 15504-9, ISO15504-1, ISO15504-4, ISO15504-5, ISO15504-6, ISO15504-7 e ISO15504-8.

ção da ISO 9001 por organizações que desenvolvem software ao desenvolvimento, fornecimento e manutenção de software. - Norma ISO15504: Aprovada como norma em 2003 é focada na avaliação de processos organizacionais.

3 PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DE SOFTWARE A ISO15504-2 define um modelo de referência de processo e um modelo de capacitação do processo que pode compor a

Um outro modelo de qualidade, retirado da mesma obra,

base para a definição e avaliação de um processo de software

é o CMMI, cuja sigla representa as iniciais de Capability Ma-

(VASCONCELOS, ROUILLER, MACHADO, MEDEIROS, 2006).

turity Model Integration e nomeia tanto um projeto, quanto os

Este modelo de referência possui uma abordagem bidimensio-

modelos resultantes deste projeto. O CMMI é uma iniciativa

nal, conforme pode ser vista abaixo:

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Vasconcelos, Rouiller, Machado e Medeiros distinguem

a primeira dimensão como auxiliar para que os engenheiros defi-

que gerencia algum tipo de projeto ou processo dentro do ciclo de vida do software;

nam os processos necessários em uma ODS (Organização de De-

5. Organização (ORG-Organization): são processos que esta-

senvolvimento de Software), e sua adequação à ISO15504. A se-

belecem as finalidades dos processos de desenvolvimento e da

gunda dimensão, similar ao CMM, e segundo os mesmos autores,

organização, do produto, e dos recursos, que, quando utilizados

tem por objetivo determinar a capacidade do processo da ODS,

por projetos na organização, realizarão as metas do negócio.

avaliando-o através de um conjunto de atributos pré-estabelecidos.

O processo que será abordado é a engenharia, mas a título de

De acordo com o Technical Report ISO/IEC TR 15504-2, são

esclarecimento as ISO15504-3 e ISO15504-4 servem como guias

cinco grupos de processos definidos pela ISO 15504-2:

para avaliação de processo. Determinam procedimentos para: a

1. Fornecedor-Cliente (CUS-Custormer-Supplier): são os pro-

definição das entradas da avaliação, a determinação das respon-

cessos que de alguma forma impactam diretamente o cliente: den-

sabilidades, a especificação do processo propriamente dito da

tre eles o suporte para desenvolvimento e transações de software

avaliação e os resultados que devem ser guardados (VASCONCE-

para o cliente, fornecimento de operações corretas e uso do produ-

LOS, ROUILLER, MACHADO, MEDEIROS, 2006). Do artigo Introdução à engenharia de software e à qualidade

to de software ou serviço; 2. Engenharia (ENG-Engineering): esta categoria agrupa os

de software de Vasconcelos, Rouiller, Machado e Medeiros retira-

processos que especificam, implementam e mantêm o produto de

mos a figura abaixo que apresenta a estrutura básica do modelo de

software, sua relação com o sistema e a documentação do cliente;

avaliação da ISO15504-5 e seu relacionamento com a ISO15504-2.

3. Suporte (SUP-Support): São processos que podem ser em-

Este modelo de avaliação expande o modelo de referência adicio-

pregados em algum dos outros processos e em vários pontos no

nando a definição e uso de indicadores de avaliação. Os indica-

ciclo de vida do software objetivando dar suporte a eles;

dores de avaliação são definidos para que os assessores possam

4. Gerenciamento (MAN-Management): são processos que contêm práticas gerenciais que podem ser utilizadas por alguém

julgar o desempenho e capacidade de um processo implementado (VASCONCELOS, ROUILLER, MACHADO, MEDEIROS, 2006).

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A ISO15504-5 detalha os processos (primeira dimensão do

planejada e rastreada. Há elementos na organização que reco-

modelo de referência da ISO15504-2) associando a eles algumas

nhecem que uma ação deveria ter sido realizada, e é consenso

práticas básicas. Artefatos e atributos são sugeridos e associados

geral que esta ação é realizada quando exigida. É possível iden-

às práticas básicas com o intuito de estabelecer sua realização

tificar produtos do trabalho realizado através do processo, e isto

(VASCONCELOS, ROUILLER, MACHADO, MEDEIROS, 2006).

comprova que o propósito foi alcançado.

A parte do documento ISO/IEC TR 15504 que trata dos pro-

- Nível 2 – Gerenciado. O processo planejado e rastreado

cessos de engenharia de software traz um conjunto de processos

entrega produtos que atendem a padrões e exigências, de acor-

universais que são fundamentais para uma boa engenharia de sof-

do com procedimentos especificados. A primeira distinção do

tware e abrange as melhores práticas, ela provê um modelo de refe-

nível realizado é que a realização do um processo agora entrega

rencia que pode ser usado em outras partes da ISO/IEC TR 15504.

produtos que atendem exigências de qualidade dentro de pra-

A seção da ISO/IEC 15504 que traz um modelo de referência

zos e necessidades de recursos definidos.

para processos e capacidade de processos define um modelo

- Nível 3 – Estabelecido. O processo é realizado e geren-

de referencia de processos de software e capacidade de pro-

ciado usando um processo definido baseado nos bons princí-

cessos que fornece a base do processo de avaliação de softwa-

pios da engenharia de software. Implementações individuais do

re. Esse modelo de referência define em alto nível os objetivos

processo são de uso aprovado, versões adaptadas de um pa-

que são fundamentais para uma boa engenharia de software.

drão, processos documentados para alcançar os resultados. Os

De acordo com a ISO/IEC 15504, as definições de alto ní-

recursos necessários para estabelecer a definição de processo

vel descrevem os objetivos que devem ser alcançados e como

também são colocados. A primeira distinção do nível gerenciado

alcançá-los. Este modelo de referencia pode ser aplicado a

é que o processo do nível estabelecido usa um processo defini-

qualquer empresa desenvolvedora de software que deseja es-

do que é capaz de obter o resultado pretendido.

tabelecer uma melhoria em seus processos de aquisição, for-

- Nível 4 – Previsível. O processo definido é colocado em

necimento, desenvolvimento, operação, evolução e suporte de

prática consistentemente dentro de limites de controle defini-

software. O modelo concebido não presume uma organização

dos para alcançar os objetivos colimados. Medições detalha-

com características estruturais particulares, filosofia gerencial,

das da execução são coletadas e analisadas. Isto conduz a um

modelo de ciclo de vida de software, tecnologia ou metodologia

entendimento quantitativo da capacidade do processo e uma

de desenvolvimento de software. A arquitetura deste modelo de

melhoria da habilidade de predizer e gerenciar a execução que

referencia organiza os processos para auxiliar a organização a

é quantitativamente gerenciada. A qualidade dos produtos é

entendê-los e utilizá-los para uma melhoria continua do geren-

quantitativamente conhecida. A primeira distinção entre o pro-

ciamento dos processos de software. Por processo de avalia-

cesso estabelecido é que o processo definido é agora executa-

ção de software, um assessor utiliza um modelo mais detalhado

do consistentemente dentro de limites definidos para alcançar o

compatível com este modelo de referencia da ISO/IEC, conten-

resultado pretendido.

do um conjunto abrangente de indicadores de performance e

- Nível 5: Otimizado. A realização de um processo é otimiza-

capacidade de processos para fazer juízo das condições dos

da para encontrar atuais e futuras necessidades do negócio, e o

processos da organização.

resultado do processo é repetitivamente voltado para os objeti-

O documento da ISO/IEC TR 15504 define que um nível de

vos do negócio. A eficácia do processo e eficiência do objetivo

capacidade é caracterizado por um conjunto de atributos que

são quantitativamente estabelecidas, baseadas nos objetivos da

trabalham juntos para prover um maior aprimoramento da ca-

organização. Monitoramento continuo de processos contra es-

pacidade de realizar um processo. Cada nível prove um maior

ses objetivos é obtido através de um feedback quantitativo e o

aprimoramento de capacidade de realização de um processo.

melhoramento é alçando através da análise dos resultados. Oti-

Os níveis constituem um meio racional de progredir através da

mizar um processo envolve a condução de idéias e tecnologias

melhoria da capacidade de execução de qualquer processo.

inovadoras e tornar processos não efetivos em produtores de

São seis os níveis de capacidade no modelo de referencia:

resultados alcançando seus objetivos. A primeira distinção entre

- Nivel 0: Incompleto. Há falha geral no atendimento do pro-

o nível otimizado e o previsível é a definição e padronização de

pósito do processo. Há poucos ou nenhum produto de trabalho

processos agora dinamicamente modificados e adaptados para

facilmente identificável ou saídas do processo.

encontrar os objetivos atuais e futuros do negócio.

- Nivel 1: Realizado. O propósito do processo é geralmente

O item 5.1.2 da ISO/IEC TR 15504-2 tem como título Engi-

alcançado, ainda que a sua realização não seja rigorosamente

neering process category (ENG), que podemos traduzir como

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“Categoria de processo de software (ENG)”.

será desenvolvida para atender a prioridade de implementação

De acordo com esse documento, a categoria de processo

nos requisitos do sistema que serão aprovados e atualizados

de software consistem em processos que especificam direta-

quando necessário. A solução proposta e seus relacionamentos

mente, implementa ou mantém o produto de software, sua re-

serão comunicados a todas as partes afetadas.

lação com o sistema e documentação do cliente. Em circunstâncias onde o sistema é composto totalmente de software, a

ENG 1.2 PROCESSO DE ANÁLISE DE REQUERIMENTOS DE SOFTWARE

engenharia de processos conforma somente com a construção

É um componente do processo ENG 1, seu propósito é es-

e manutenção de tal software. Os processos e suas respectivas

tabelecer os requisitos dos componentes de um sistema. Como

descrições retirados do item 5.1.2 da ISO/IEC TR 15504-2 que

resultado de uma implementação de sucesso, os requisitos alo-

pertencem a categoria de engenharia de software são:

cados para os componentes do sistema e suas interfaces serão

- ENG.1 Processo de desenvolvimento

definidos de forma a atender as necessidades dos clientes, eles

- ENG.1.1 Análise de requerimentos de sistema e de-

serão analisados e corrigidos, os que forem passíveis de tes-

senho de processo

tes serão desenvolvidos. O impacto dos requisitos de software

- ENG.1.2 Processo de análise de requerimentos de

no ambiente operacional serão estudados. Uma estratégia de

software

lançamento de versões será desenvolvida observando-se uma

- ENG.1.3 Processo de projeto de software

prioridade de implementação dos requisitos de software que se-

- ENG.1.4 Processo de construção de software

rão atualizados se necessário. Será estabelecida uma coerência

- ENG.1.5 Processo de integração de software

entre os requisitos de sistema e o desenho dos requisitos de

- ENG.1.6 Processo de teste de software

software que serão comunicados às partes afetadas.

- ENG.1.7 Processo de Integração de sistema e testes - ENG.2 Processo de manutenção de sistema e sof-

ENG 1.3 PROCESSO DE DESENHO DE SOFTWARE Componente do processo ENG 1, seu propósito é definir

tware 5.1.2.1

um desenho de software que implementa os requisitos e possa A

seguir,

será

analisado

brevemente,cada

um

ser testado. Como resultado de implementação de sucesso, um

destes processos.

desenho da arquitetura será desenvolvido, ele descreve a maior

ENG.1 PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO (PROCESSO BÁSICO)

parte dos componentes de software que serão implementados.

O propósito do processo de desenvolvimento é transformar

Uma interface interna e externa de cada componente de softwa-

um conjunto de requerimentos em um produto de software fun-

re será definida, e um desenho detalhado que descreve as uni-

cional ou sistema baseado em software que vai de encontro às

dades que podem ser construídas e testadas do software será

necessidades dos clientes como resultado da implementação

criado. Será estabelecida uma coerência entre os requisitos e os

de sucesso de um processo. Um produto intermediário de tra-

projetos de software.

balho será desenvolvido, e ao final do processo deve ficar comprovado de que os requisitos foram atendidos. Para isso, uma

ENG 1.4 PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DE SOFTWARE

consistência será estabelecida entre os requisitos e o projeto,

Componente do processo ENG 1, seu propósito é produzir

o que evidenciará que o produto final atendeu os requisitos. O

as unidade de software executável e verificar se elas refletem

produto final será instalado no ambiente operacional do cliente

corretamente o projeto do software. Como resultado de uma

e aceito por ele.

implementação de sucesso, um critério de verificação será definido para todas unidades confrontando com seus requisitos.

ENG 1.1 Análise de requerimento de sistemas e desenho de

Uma coerência será estabelecida entre o projeto de software e

processo são componentes do processo ENG 1 (Processo de

os componentes produzidos. Será realizado o confrontamento

desenvolvimento), seu propósito é estabelecer os requerimentos

das unidades de software serão com seus projetos.

funcionais e não funcionais do sistema e sua arquitetura identificando quais requerimentos precisam ser alocados para quais

ENG 1.5 PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE SOFTWARE

elementos do sistema e quais versões. Como resultado de uma

É parte do processo ENG 1, seu objetivo é combinar as uni-

implementação de sucesso, a solução será proposta para aten-

dade de software, produzindo integração dos itens de software

der as necessidades dos clientes e irá identificar os principais

e verificar se as unidades de software integradas refletem corre-

elementos do sistema. A estratégia de lançamento de versão

tamente o projeto de software. Uma integração de sucesso pro-

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duz uma estratégia de integração que será desenvolvida para

ção. O objetivo é modificar e/ou retirar sistemas e/ou software

as unidades de software de forma coerente com o plano de ver-

preservando a integridade das operações da organização. Uma

sões. Critérios de verificação dos itens de software que assegura

implementação de sucesso deste processo resulta na criação

a observância dos requisitos de software serão desenvolvidos e

de uma estratégia de administração da modificação, migração

o resultado dos testes de integração serão armazenados. Uma

e retirada de componentes do sistema de acordo com o plano

coerência deve estar estabelecida entre os requisitos e os itens

de versões. O impacto nas interfaces e operações nos sistemas

de software. Uma estratégia de regressão será desenvolvida para

existentes será definido. Especificações, design de documentos

reverificação dos itens de software que deverão ser modificados.

e estratégias de teste serão atualizados. Os componentes modificados do sistema serão desenvolvidos associados aos testes

ENG 1.6 PROCESSO DE TESTE DE SOFTWARE

que demonstram que requisitos de sistema não foram compro-

Componente do processo ENG 1, tem o propósito de testar

metidos. Os sistemas e softwares do cliente serão atualizados

o software integrado produzindo um produto que irá satisfazer

no ambiente do cliente. E a pedido deste, softwares e sistemas

os requisitos de software. Uma implementação de sucesso des-

serão retirados de uso de maneira controlada que minimize os

te processo gera um critério de aceitação para o software inte-

distúrbios causados aos clientes.

grado que será desenvolvido de forma que se verifique a observância dos requisitos de software. Os resultados de testes serão

CONCLUSÃO

armazenados e uma estratégia de regressão será desenvolvida

A ISO/IEC 15504 veio contribuir para o melhoramento dos

para retestar, de acordo com as demandas, os itens de software

processos de desenvolvimento de software que sofria pela fal-

que forem refeitos.

ta de padrões de controle que proporcionasse um produto final que atendesse com êxito as expectativas dos clientes. Como

ENG 1.7 PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE SOFTWARE E TESTES

vimos, a ISO IEC 15504 não é a única metodologia disponível

Componente do processo ENG 1, seu propósito é integrar

no mercado, cabe então a organização interessada em otimizar

os componentes de software com outros componentes, como

seus processos a escolha da norma que melhor atende as suas

operações manuais ou hardware, produzindo um sistema com-

aspirações. É interessante notar a abrangência dos grupos de

pleto que vai satisfazer as expectativas dos clientes expressas

processos da ISO IEC 15504 que trazem opções que vão desde

em requisitos de sistema. Os recursos alocados para a integra-

a engenharia de software propriamente dita e seus processos

ção de sistema inclui alguém familiar com o componente de

de gerenciamento até orientação ao cliente e gestão dos produ-

software. Uma implementação de sucesso deste processo pro-

tos instalados no cliente na forma de alterações e inclusões de

duz uma estratégia de integração que será desenvolvida para

programas e operações, passando pelo suporte ao cliente e ge-

construir as unidades agregadas de acordo com a estratégia de

renciamento de projetos de software e ciclo de vida de software.

liberação de versão. Será criado um critério de aceitação para

A possibilidade de a empresa adotar a uma parte específica da

cada agregação para verificar a conformidade com os requisitos

ISO IEC 15504 a torna bastante dinâmica. Por exemplo, a seção

de sistema (funcionais, não funcionais, operações e manuten-

que trata da Engenharia de Software pode ser aplicada espe-

ção) alocados para as unidades e uma validação que completa

cificamente na padronização e otimização de seus processos

o conjunto de componentes entregáveis. O resultado dos testes

correlatos. Uma outra vantagem é a integração dos grupos de

serão armazenados e uma estratégia de regressão será criada

processos, pois a engenharia de software integra-se ao suporte

para retestar as agregações no sistema integrado para as mu-

que está alinhado ao gerenciamento de processos organizacio-

danças em componentes que forem realizadas. Os testes de

nais que visam o incremento do resultado dos clientes. Dessa

regressão serão realizados sempre que necessário.

forma, a ISO IEC 15504 é abrangente, e cabe a cada organização avaliar seu procedimentos internos e definir onde aplicá-la.

ENG 2 PROCESSO DE MANUTENÇÃO DE SISTEMA E SOFTWARE (PROCESSO BÁSICO) Seu propósito é administrar a modificação, migração e retirada de componentes do sistema (como software, hardware, operações manuais e rede se existir) em resposta a pedidos do cliente. A origem dos pedidos poderia ser a descoberta de um problema ou a necessidade de uma melhoria ou adapta-

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS RINCON, André Mesquita. Qualidade de Software. Disponível em: <http://www.clebertoledo.com.br/blogs/tecnologia/administracao/files/files/ Qualidade_de_Software.pdf>. Acessado em: 17 de ago.. 2011 às 19:30. CANCIAN, Maiara Heil. Uma proposta de guia de referencia para

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provedores de software como um serviço. <http://www.das.ufsc. br/~maiara/files/dissert_maiara.pdf>. Acessado em: 20 de ago. 2011 às 15:00. FELIPE, Pabro Fernando. C.M.M.I. e Spice: Um estudo comparativo na abordagem da engenharia de requisitos. <www.cin.ufpe. br/~pmr/qualidade/Monografia.pdf>. Acessado em: em: 20 de ago. 2011 às 15:00. VASCONCELOS, Marcos Lins de; ROUILLER, Ana Cristina; MACHADO, Cristina Angela Filipak; MEDEIROS, Tereza Maria Maciel. Introdução à engenharia de software e à qualidade de software. Disponível em: <http://www.cin.ufpe.br/~if720/downloads/Mod.01.MPS_Engenhar ia&QualidadeSoftware_V.28.09.06.pdf>. Acessado em: 02 set. 2011 às 21:40h. IAHN, Anísio. Avaliação de processos de software utilizando a norma ISO/IEC 15504. Disponível em: <http://campeche.inf.furb.br/ tccs/1999-I/1999-1anisioiahnvf.pdf>. Acessado em: 02 set. 2011 às 21:40h. REZENDE, Alcides Denis. Engenharia de Software e Sistemas de Informação. Disponível em: <http://books.google.com.br/books?hl=ptBR&lr=&id=rtBvl_L-1mcC&oi=fnd&pg=PT23&dq=crise+do+softwar e&ots=9ybo_I0sWm&sig=SlWGinaJjdYbiILS0XAR93S7QzM#v=onepa ge&q=crise%20do%20software&f=false>. Acessado em: 14 set. 2011 às 20:30h. ISO/IEC. Information tecnology – Software process assessment – Part 2: A reference model for processes and processes capabality. Disponível em: < http://pt.scribd.com/doc/39130258/Iso-Iec-Tr-15504-2 >. Acessado em: 05 de out. 2011 às 19:30h.

NOTAS DE RODAPÉ 1 Graduando do curso de Sistemas de Informação do Centro Universitário Newton Paiva. 2 Professor do Centro Universitário Newton Paiva.

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ANTECIPAÇÕES FILOSÓFICAS DE UMA CIÊNCIA DO COMPORTAMENTO: Paul Rée e a ilusão do livre-arbítrio Marcus Vinícius Fonseca de Garcia1

RESUMO: Em um livro publicado em 1885, chamado A Ilusão do Livre Arbítrio: suas causas e suas conseqüências, o filósofo alemão Paul Rée aborda noções rudimentares semelhantes ao que posteriormente veio a ser compreendido no behaviorismo radical como controle de estímulos. Surpreende a maneira como o filósofo trata questões como filogenia e ontogenia de modo extremamente compatível com o tratamento dado por Skinner às mesmas. Tal coincidência fornece contexto para que situemos historicamente a emergência do behaviorismo radical como uma explicação do comportamento à qual anteriormente já se intuía a respeito de modos mais avançados do que se costuma supor. O achado sugere a importância de nos atermos a produções filosóficas atuais que possam se mostrar antecipações, ainda rudimentares, de futuros avanços científicos. PALAVRAS-CHAVE: Behaviorismo radical; Determinismo; Livre-arbítrio; Filosofia; Controle de estímulos

Paul Rée (1849-1901) é um autor cuja obra é muito pouco

dra, um animal, um ser humano, poderiam passar de seu es-

conhecida pelo grande público. Mesmo entre estudiosos da fi-

tado atual para outro, mas que, para tanto, a “causa suficien-

losofia, tem sido citado, na maioria das vezes, apenas devido

te” dessa modificação deveria primeiro estar presente (RÉE,

à relação de amizade que manteve, durante alguns anos, com

1885/2004, p. 355). Uma pedra, por exemplo, poderia voar pelo

o célebre filósofo Friedrich Nietzsche. No entanto, encontram-

ar, ou se desintegrar em pó ou rolar pelo chão, caso alguma

se na obra de Rée inúmeros trechos que talvez nos permitam

força atuasse sobre ela. Rée afirma, então, que “a situação não

caracterizá-lo como um dos grandes pensadores do século

seria diferente no caso de um animal” (RÉE, 1885/2004, p. 355).

XIX. Será abordada no presente artigo uma alegoria proposta

Rée nos dirá que “o jumento que agora está parado entre dois

por Rée no primeiro capítulo de seu livro Die Illusion der Willens-

montes de feno pode, no momento seguinte, virar para a es-

freihei: ihre ursachen und ihre folgen (1885) – A Ilusão do Livre

querda ou para a direita, ou pode saltar para o ar ou colocar a

Arbítrio: suas causas e suas conseqüências. Trata-se da ale-

cabeça entre as pernas” (RÉE, 1885/2004, p. 355). No trecho a

goria de um jumento diante de dois montes de feno, um à sua

seguir, alega que, para que pudéssemos entender o compor-

esquerda e um à sua direita. Com base nesse exemplo, o qual

tamento do jumento, deveríamos retomar os estados anteriores

à primeira vista pode parecer simplório, Rée argumenta sobre

de seu organismo:

noções muito semelhantes àquilo que veio a se tornar conhe-

Vamos supor que o jumento virou-se para o monte à

cido, na Análise do Comportamento, como controle de estímu-

sua direita. Este virar-se pressupõe que certos múscu-

los, abordando também a causalidade múltipla, o eu iniciador e

los foram contraídos. A causa dessa contração muscu-

os processos de filogenia e ontogenia. Faz também analogias

lar é a excitação dos nervos que levam a eles. A causa

interessantes entre os possíveis comportamentos do jumento

dessa excitação dos nervos é um estado do cérebro.

em seu exemplo e o comportamento humano. As obras aqui

Este estava em um estado de decisão. Mas como o

citadas encontram-se na coleção Gesammelte Werke, que re-

cérebro veio a estar nessa condição? Vamos traçar

úne as principais obras de Rée escritas no período entre 1875

um pouco mais anteriormente os estados do jumento.

e 1885.

(RÉE, 1885/2004, p. 355)

Segundo Rée, afirmar que a vontade é livre significa dizer “que ela não está sujeita à lei da causalidade. Nesse caso, todo

É curioso notar como Rée utiliza aspas de um modo muito

ato de vontade seria um começo absoluto e não um elo: não seria

semelhante a como Skinner o fazia, para salientar a noção de

o efeito de causas anteriores” (RÉE, 1885/2004, p. 355). Afirmar

que não se trataria de um ato de vontade indeterminado do

que a vontade não é livre, por outro lado, significaria “dizer que ela

jumento, produzido por um sujeito iniciador, mas de um agir

está sujeita à lei da causalidade” (RÉE, 1885/2004, p. 355).

necessário, dadas as condições antecedentes:

Rée prossegue afirmando que qualquer objeto, uma pe-

Alguns momentos antes de ele se virar, seu cérebro

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ainda não estava constituído de modo a produzir a cau-

veis críticas quanto às comparações feitas anteriormente entre o

sa suficiente para a excitação dos nervos em questão

comportamento de organismos vivos e o movimento de objetos

e para a contração dos músculos; pois, caso contrário,

inanimados. Parece advertir, assim, quanto à improcedência de

o movimento teria ocorrido. O jumento ainda não tinha

possíveis acusações de que sua proposta de compreensão do

“decidido” se virar. (RÉE, 1885/2004, p. 356)

comportamento dos organismos vivos não levaria em conta as

Rée faz então um questionamento sobre quais seriam as

peculiaridades desses organismos.

causas responsáveis pela modificação ocorrida no organismo

Há uma diferença entre o jumento e a pedra, e reside no

do jumento no momento em que ele se comporta:

fato de que o jumento se move porque quer se mover,

[...] seu cérebro deve ter se tornado, nesse meio tempo,

enquanto a pedra se move porque é movida. Não nega-

constituído de modo a provocar a excitação dos nervos

mos essa diferença. Há, afinal, um bom número de ou-

e o movimento dos músculos. A partir disso, o cérebro

tras diferenças entre o jumento e a pedra. Não pretende-

sofreu alguma mudança. A que causas deve essa mu-

mos, por qualquer meio, provar que essa dissimilaridade

dança ser atribuída? (RÉE, 1885/2004, p. 356)

não exista. Não afirmamos que o jumento é uma pedra, mas apenas que cada movimento e cada ato de vonta-

Ao responder ao questionamento levantado, Rée propõe

de do jumento têm causas, assim como o movimento da

que a “sensação de fome” e a “idéia do monte de feno à direita”

pedra. O jumento se move porque quer se mover. Mas

conjuntamente afetariam o cérebro do jumento. Torna-se clara

que ele queira se mover em um determinado momento

a possível analogia entre o que Rée chama de “sensação de

e numa direção específica é causalmente determinado.

fome” e o estado de privação do jumento. Percebe-se a dificul-

(RÉE, 1885/2004, p. 356)

dade enfrentada por Rée ao tentar abordar o comportamento como relação em fins do séc. XIX. O internalismo está presente

Rée atribuirá as causas do comportamento do jumento às

no texto, talvez devido a toda a tradição internalista que pautava

suas relações pregressas com o ambiente, em sua história de

os modos como a questão vinha sendo tratada na filosofia e nas

vida, bem como às relações de seus ancestrais com o ambiente,

ciências em geral. O que ele chama de “idéia do monte de feno

num processo de causalidade múltipla. Antes disso, no entanto,

à direita” é tratado no trecho abaixo como “impressão a partir do

volta a defender a noção de que há relações causais neces-

exterior”. Nesse caso, torna-se clara a possível analogia entre a

sárias entre o comportamento de organismos vivos e contextos

noção de “impressão a partir do exterior” e o conceito de estí-

antecedentes, afirmando ser ilógica, portanto, a concepção do

mulo na Análise do Comportamento. Mais uma vez, Rée utiliza

comportamento como manifestação alheia à lei da causalidade:

aspas para salientar sua crítica à noção de eu iniciador:

Poderia ser que não houvesse causa suficiente para o que-

[A mudança deve ser atribuída] à efetividade de uma im-

rer se virar do jumento – que ele simplesmente quisesse se

pressão que, a partir do exterior, despertou uma sensação

virar? Seu ato de vontade seria, então, um início absoluto.

que surgiu internamente (por exemplo, a sensação da

Uma suposição dessa natureza é contrariada pela experi-

fome e a idéia do monte de feno à direita), por conjunta-

ência e pela validade universal da lei da causalidade. Pela

mente afetarem o cérebro, modificando o modo como ele

experiência, uma vez que a observação nos ensina que,

é constituído, de modo tal que agora ele produz a causa

para todo ato de vontade, algumas causas foram os fatores

suficiente para a excitação dos nervos e a contração dos

determinantes. Pela validade universal da lei da causalida-

músculos. O jumento agora “quer” virar para a direita; ele

de, uma vez que, afinal, nada acontece em qualquer lugar

agora vira para a direita. (RÉE, 1885/2004, p. 356)

do mundo sem uma causa suficiente. Por que, então, de todas as coisas, um ato de vontade de um jumento deveria

No trecho a seguir, utilizando agora mais especificamente a

vir a existir sem uma causa? Além disso, o estado do que-

palavra alemã “reizes”, que significa estímulo, Rée propõe que

rer, o qual imediatamente precede a excitação dos nervos

o comportamento do jumento é o resultado da relação entre o

motores, não é diferente, em princípio, de outros estados

ambiente e o jumento: “O voltar-se para o monte de feno à di-

– como a antipatia, a preguiça ou o cansaço. Alguém acre-

reita é o resultado do modo como o cérebro do jumento e o es-

ditaria que todos estes estados existem sem uma causa?

tímulo estão constituídos em um determinado momento” (RÉE,

E, se não se acredita nisso, por que se consideraria que

1885/2004, p. 356).

apenas o estado do querer deveria ocorrer sem uma causa

Ao prosseguir em sua análise, Rée se defende de possí-

suficiente? (RÉE, 1885/2004, p. 357)

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 133


Ainda que chegue a utilizar em seu texto a palavra alemã

o ato de vontade do jumento não é causalmente determinado

“Seele”, que significa alma, Rée faz menção a uma noção bem

é sustentada não só por quem está de fora; o próprio jumen-

semelhante à noção presente em Skinner (1974, p. 119) de orga-

to, tivesse ele o dom do raciocínio, a compartilharia” (RÉE,

nismo modificado por uma história de relações com o ambiente.

1885/2004, p. 358). Percebe-se aqui que o autor faz uma sutil

Deve ser ressaltado que era comum, na época de Rée, que auto-

comparação entre o comportamento do jumento e o compor-

res utilizassem a palavra alma ao abordar fenômenos subjetivos.

tamento humano. Rée parece antecipar em alguns anos as

Rée propõe um experimento fictício: se fosse possível reverter-

afirmações de Freud, autor mais citado por Skinner, a respei-

mos a constituição de um organismo, de modo que ele viesse a

to da inconsciência de muitas das inúmeras determinantes do

estar constituído exatamente do modo como estava constituído

comportamento humano. Parece antecipar também Skinner,

antes, e o expuséssemos a um mesmo contexto ao qual ele hou-

quando ressalta, mesmo que de modo ainda rudimentar, a im-

vesse sido anteriormente exposto, esse organismo responderia

portância da noção de controle de estímulos. Cabe aqui aventar

necessariamente do mesmo modo como havia respondido an-

sobre uma possível influência mútua entre os escritos de Rée e a

teriormente a esse contexto. Será compreensível que se aponte

produção filosófica de Nietzsche, autor em cuja obra podem se

aqui que Rée parece recorrer a um determinismo ontológico ou

encontrar observações análogas a teorizações freudianas, fato

fundacionista, incompatível com a perspectiva do pragmatismo,

assumido pelo próprio Freud (1925/1977, p. 76) em seu estudo

e, consequentemente, também com a do behaviorismo radical.

autobiográfico; p. ex., recalque e a formação do superego em

Tal observação, no entanto, não parece ofuscar as demais si-

Nietzsche (1887/2009, p. 43).

milaridades entre trechos de sua obra e noções advindas das

Rée nos diz a respeito do jumento:

contribuições de Skinner. Dittrich (2009), por exemplo, aborda

As causas de seu ato de vontade o iludiriam também,

de modo crítico possíveis contribuições de um posicionamento

uma vez que em parte elas não se tornam conscientes,

determinista sob os enfoques epistemológico e empírico para a

e em parte passam através da consciência fugazmente,

Análise do Comportamento. Rée prossegue:

como um relâmpago. Se, por exemplo, o fator decisivo

O monte de feno não entra em contato visível com o

foi que ele estava mais próximo por um triz do monte

cérebro, mas age à distância. [...] Suponhamos que

de feno à direita, ou que este tinha um cheiro um pou-

possamos ver como uma imagem se destaca do monte

quinho melhor, como deveria o jumento notar algo tão

de feno e, percorrendo um trajeto visível através do ar,

trivial, algo que tão totalmente falha em se impor sobre

invade o cérebro do jumento, e como ela produz nele

sua consciência? (RÉE, 1885/2004, p. 358)

uma mudança em consequência da qual certos nervos e músculos se movem. Suponhamos que possamos re-

De modo muito semelhante a como Skinner aborda as dife-

petir esse experimento muitas vezes de forma arbitrária,

renças entre espécies e as possibilidades e impossibilidades de

que, se voltássemos a alma do jumento para o estado

indivíduos de diferentes espécies se engajarem em comporta-

precedente ao seu virar-se e deixássemos exatamente a

mentos específicos, Rée afirma a impossibilidade de, por exem-

mesma impressão agir sobre ele, devêssemos observar

plo, ele próprio vir a voar, prosseguindo com a argumentação

sempre o mesmo resultado. Então consideraríamos o

sobre como podemos nos sentir livres, ainda que nosso com-

virar à direita do jumento como necessário. Viríamos a

portamento seja determinado:

perceber que o cérebro, constituído como estava na-

Em certo sentido, é claro, o jumento está certo em pen-

quele momento, tinha que reagir a tal impressão preci-

sar: “eu poderia ter me virado para a esquerda.” Seu

samente dessa maneira. [...] Na ausência deste experi-

estado no momento, sua posição relativa ao monte de

mento, tem-se a impressão de que o ato de vontade do

feno ou sua constituição precisavam meramente ter sido

jumento não foi causalmente determinado. Nós apenas

um pouco diferentes, e ele realmente teria virado para

não o vemos sendo causalmente determinado, e, con-

a esquerda. A afirmação “eu poderia ter agido de outra

seqüentemente, acreditamos que tal determinação não

forma” é, portanto, verdadeira neste sentido: virar para a

tem lugar. O ato de vontade, diz-se, é a causa do virar-

esquerda é um dos movimentos possíveis para mim (em

se, mas não é, ele mesmo, determinado; diz-se que é

contraste, por exemplo, com o movimento de voar); ele

um início absoluto. (RÉE, 1885/2004, p. 357)

se encontra dentro da esfera de minhas possibilidades. (RÉE, 1885/2004, p. 358)

Após tais considerações, Rée afirma que “a opinião de que 134 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


Os processos de filogenia e ontogenia são devidamente

que a punição é aplicada a eles, para que o medo dessa

abordados por Rée, que os caracteriza como determinantes de

punição se torne um motivo para que o próprio agente e

todo e qualquer comportamento do jumento. Por fim, o autor men-

todos os demais evitem tais ações no futuro. [...] Na ver-

ciona alguns exemplos de comportamentos que Skinner, muitas

dade, mesmo quando o sofrimento advém não de uma

décadas mais tarde, classificará como respondentes e operantes:

má ação, mas simplesmente ocorre depois dela (p. ex.,

Se refletimos sobre a vida inteira do jumento sub specie

quando alguém que agiu mal, em seguida, é morto por

necessitatis [sob a luz da necessidade], chegamos ao

uma telha que cai), o hábito de demandar por retaliação

seguinte resultado. O jumento veio ao mundo com de-

por ações más faz com que as pessoas considerem

terminadas propriedades da mente e do corpo, a heran-

essa mera sucessão de eventos como um processo

ça de seus ancestrais. Desde o dia de seu nascimento,

causal, e elas dizem: “o Senhor, cujos caminhos são

impressões – dos companheiros com quem se divertiu

maravilhosos, infligiu esse sofrimento ao homem mau

ou se esforçou, sua alimentação, o clima – agiram sobre

como punição”. [...] Na verdade, não se deve punir por-

essas propriedades. Esses dois fatores, sua constitui-

que uma má ação foi cometida, mas para que uma má

ção inata e o modo como esta foi formada através das

ação não venha a ser cometida. (RÉE, 1877/2004, pp.

impressões ao longo de sua vida, são a causa de todas

155-157)

as suas sensações, idéias e humores, e de todos os seus movimentos, mesmo os mais triviais. Se, por exem-

Um pequeno aforismo de Rée talvez seja emblemático

plo, ele ergue sua orelha esquerda e não a direita, isso

quanto à similaridade entre seu modo de pensar e o daqueles

é determinado por causas cujo histórico de desenvol-

que posteriormente vieram a ser chamados de behavioristas:

vimento poderia ser traçado ad infinitum, e do mesmo

“Através do ensino, muda-se o nosso comportamento, não o

modo quando ele fica de pé, vacilante, entre os dois

nosso caráter” (RÉE, 1875/2004, p. 68). A definição de Rée do

montes de feno. (RÉE, 1885/2004, p. 358)

que seria caráter aproxima-se também do que seria uma definição analítico-comportamental: “A situação com relação ao cará-

Com relação às consequências de comportamentos e à

ter de uma pessoa não é diferente daquela com relação a suas

influência que poderiam exercer sobre sua ocorrência ou não-

ações individuais” (RÉE, 1885/2004, p. 375). Em vários trechos,

ocorrência futura, encontramos em outros escritos de Rée inú-

de modo semelhante a como Skinner o faz em Beyond Freedom

meras referências. Em uma delas, em um capítulo chamado Der

and Dignity [O Mito da Liberdade], Rée aborda a questão do

Ursprung der Straf und des Gerechtigkeitsgefühls: über Abs-

possível questionamento dos méritos e culpas dos indivíduos

chreckung und Vergeltung (1877) – A Origem da Punição e do

quando se descrevem os motivos de seus comportamentos:

Senso de Justiça: sobre a dissuasão e a retaliação, Rée chega

“Atribui-se mérito ou culpa para um caráter tanto quanto para

inclusive a mencionar o fato de que a simples proximidade tem-

ações, embora sejam efeitos. [...] Todo caráter, as intenções e

poral entre um comportamento e um evento subsequente po-

ações são efeitos. Não se pode atribuir culpa ou mérito a efeitos”

deria afetar esse comportamento e levar pessoas a atribuírem a

(RÉE, 1885/2004, p. 375).

ocorrência desse evento subsequente a um processo causal, o

Trazemos abaixo um trecho de Skinner que exemplifica a si-

que talvez nos permita apontar uma similaridade com a descri-

milaridade entre sua concepção acerca do comportamento hu-

ção analítico-comportamental do fenômeno denominado com-

mano e as idéias defendidas por Paul Rée em fins do século XIX: Do ponto de vista pré-científico (e o termo não é ne-

portamento supersticioso: Quando somos punidos quando crianças, isso ocorre

cessariamente pejorativo), o comportamento de uma

obviamente não como uma retaliação ao nosso mau

pessoa é, até certo ponto, uma realização pessoal. O in-

comportamento, mas para prevenir que este volte a

divíduo é livre para discutir, decidir e agir, possivelmente

ocorrer. Ainda nos é dito: “você está sendo punido por-

de forma original, podendo ser reconhecido pelos seus

que você fez isso”. A partir da infância, vamos tendo a

sucessos e responsabilizado pelos seus fracassos. Do

impressão de que a punição é uma retaliação. [...] Atos

ponto de vista científico (e o termo não é necessaria-

que são necessários não podem estar sujeitos tanto à

mente honroso), o comportamento de uma pessoa é

atribuição de responsabilidade quanto à retaliação pelo

determinado por uma herança genética reconstituível

que ocorreu. Ao contrário, é precisamente porque são

a partir da história da evolução das espécies, e pelas

necessários, isto é, determinados por certos motivos,

circunstâncias ambientais às quais esteve exposta. Ne-

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nhuma dessas visões pode ser provada, mas, no âmago da investigação científica, as evidências pendem em favor da segunda. À medida que aprendemos mais sobre os efeitos do ambiente, menos razão temos para atribuir qualquer parcela do comportamento humano a um agente controlador autônomo. (SKINNER, 1971/1983, p. 79) Assim como podem ser encontradas antecipações de avanços científicos na obra de Paul Rée, é possível que, nos dias atuais, existam também pensadores cujas teorizações constituam noções ainda rudimentares sobre temas muito relevantes que venham a ser futuramente mais bem investigados e cientificamente descritos. Desse modo, é importante que estejamos atentos a descrições filosóficas que possam apontar para novas possibilidades de investigação científica. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DITTRICH, A. Uma defesa do determinismo no behaviorismo radical. In: WIELENSKA, R. C. (org.). Sobre o comportamento e cognição – vol. 23: desafios, soluções e questionamentos. Santo André: ESETec, 2009. cap. 4, p.65-72. FREUD, S. Um estudo autobiográfico, inibições, sintomas e ansiedade, a questão da análise leiga e outros trabalhos – vol. XX. Rio de Janeiro: Imago, 1977. NIETZSCHE, F. W. Genealogia da moral: uma polêmica. São Paulo: Companhia das Letras, 2009. RÉE, P. Gesammelte werke (1875-1885). Hubert Treiber (org.). Berlim: de Gruyter, 2004. SKINNER, B.F. O mito da liberdade. São Paulo: Summus, 1983. SKINNER, B. F. Sobre o behaviorismo. São Paulo: Cultrix, 1974.

NOTAS DE RODAPÉ 1

Psicólogo Clínico, aluno do Curso de Pós-Graduação

em Análise do Comportamento Aplicada do Centro Universitário Newton Paiva

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AS RELAÇÕES DE TRABALHO COMO FERRAMENTAS PARA DETERMINAR UM SER SOCIAL 1

Alice Vilela, Karina Rabbi, Lidnéia Leite, Luand Carolina, Tamiris Barcelos2

RESUMO: Este artigo tem por objetivo descrever um breve estudo sobre as relações de trabalho e sua influência no ser humano, tendo, especificamente, como referência o filme “A árvore da vida” no qual são discutidos os aspectos das relações de trabalho sobre o sujeito. As análises feitas neste artigo visam a contribuir para a constituição do indivíduo como um ser social, fundamentando-se nos conceitos de poder e liderança. Observa-se, ainda, como tais relações de trabalho, podem acarretar problemas na vida do trabalhador levando-o, por exemplo, ao uso de drogas. PALAVRAS-CHAVE: Relações de trabalho; Poder; Liderança.

Introdução

conseqüências do trabalho concreto, produtores de valores-

De acordo com Fontana (2000), o homem se constitui ao lon-

de-uso, mas são ao mesmo tempo decorrências do tra-

go da história. É ser um ser histórico-cultural, que vai construindo

balho abstrato, criador de valor. No sistema capitalista, a

sua subjetividade a partir de relações com outros seres humanos.

mercadoria assume papel principal, passa a ter vida própria,

Assim, começa a reconhecer a si mesmo, através das relações

mantém relações entre si e com os homens. A mercadoria

e experiências que constitui com si próprio e juntamente com o

passa a ser o centro e todas as outras coisas giram ao seu

outro. A pré-modernidade sempre esteve ligada à compreensão

redor, inclusive o homem. Pode-se dizer então, que há aí

do mundo fundamentada na tradição cultural, na religião ou na

o fetichismo da mercadoria. Tudo se torna dependente da

superstição em geral. Desta forma, conhecer era sinônimo de ser

mercadoria. Segundo Mácario (2002) o trabalho do homem,

capaz de lidar com técnicas primitivas da reprodução do viver. A

por exemplo, só se torna útil se o produto do seu trabalho

ordem social era sedimentada na valorização da cultura local.

possuir algum valor de troca. Antigamente as relações so-

No filme “A árvore da vida”, observa-se a relação entre pais

ciais da produção eram baseadas na dependência pessoal.

e filho de uma família comum da década de 1950. O diretor retra-

Atualmente após o surgimento do capitalismo, essas relações

ta essa relação social, ao longo dos séculos, através da óptica3

passaram a ser estritamente comerciais, mas interdependentes

da teoria cosmológica do “Big Bang” até o fim dos tempos, tra-

entre si, fazendo parte da divisão social do trabalho. Isso tudo nos

zendo um rico conjunto de imagens sobre o nascimento da vida

leva a ver o que é o sistema em que vivemos, no qual o processo

na terra, em uma viagem pela história da vida e seus mistérios.

de produção domina o homem, pois muitas vezes não nos damos

Com o advento da modernidade discorre o processo de urbanização da sociedade, além do surgimento das grandes cidades

conta disso. Neste mundo extremamente capitalista, o consumismo e o apego aos bens materiais é o que predomina.

e, naturalmente, da reconstrução da comunidade pré-moderna. O que antes era a comunidade social da “proximidade espacial e

Aspectos Conceituais

temporal” passa a ser espaço público como contraponto ao priva-

Segundo Macário (2002) o trabalho constitui as ferramentas

do. Na modernidade, os espaços se tornam maiores, e o sujeito

fundamentais que determinam um ser social4, ou seja, o ato de

perde o contato direto com as fontes de informação, gerando uma

trabalho media a relação do homem com a natureza, na qual

sensação de insegurança, que passa a ser cada vez mais cons-

este passa a ser responsável por sua produção e também por

tante e coloca cada indivíduo diante da necessidade de ter que

sua subjetividade. Deste modo, “é pelo trabalho que, do ponto

assumir e aceitar riscos para poder existir em sociedade.

de vista ontológico5, o homem estabelece a mediação com o

Karl Marx apropriou-se do conceito de fetichismo e uti-

meio natural e consigo mesmo. Ele é, portanto, o ato de edifica-

lizou na definição dos produtos do trabalho na sociedade

ção da nova esfera do ser: o ser social.” (MACÁRIO, 2002, p. 72).

moderna, que são as mercadorias. Sendo assim, as mer-

Segundo o roteiro “A árvore da vida”, percebe-se a figura

cadorias surgem como objetos que têm um duplo caráter,

do pai, exigindo uma forma de educação muito rígida. Diante

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 137


disso, pode-se dizer de um caráter educativo do âmbito social,

com o do trabalho que executava e que perdera. Este momento

ou seja, constituído pela sociedade, na qual se espera sempre

de perda, o fizera reflexionar sobre a forma que lidava com seus

que o outro siga um padrão de educação e de exigências cada

filhos, e se aproximar do seu filho mais velho numa conversa que

vez mais exacerbadas em um ideal de ser.

expõe como teria sido exigente e rígido para com ele. Percebe-

Desde modo, o próprio ato de objetivação posto pelo tra-

se que ao ser destituído de sua posição e poder, este sujeito é

balho é também educativo. Em uma cultura, o ato de educar, se

tomado pela angústia e frustração, na qual cria um buraco entre

entende em colocar o patrimônio a disposição dos sujeitos que

a ilusão de supor em ser um sujeito importante e a realidade de

nela se inserem, de forma que possam atuar na ambiência social

ser um sujeito comum, de sentimentos, afeto e impotente como

como pessoas livres.

qualquer outro ser humano.

Segundo Alban (1998) o processo de urbanização precede o

De acordo com Chiavenato (2000), a liderança é acentuada

desenvolvimento industrial e o capitalismo, este se inicia com a re-

como uma influência interpessoal, na qual uma pessoa age no

volução agrícola. Então o homem deixa de ser nômade, e a criação

sentido de alterar ou provocar o comportamento de outra pes-

de um excedente alimentar faz com que o processo de civilização

soa de maneira intencional, exercida em uma dada situação e

urbana aconteça. Em meados do século XI, ocorre à decadência

dirigida pelo processo de comunicação humana para consecu-

do Império Romano, o que permite o aparecimento de um sistema

ção de um ou mais objetivos específicos.

comercial, este gera o desenvolvimento do capitalismo mercantil,

Ainda, segundo Chiavenato (2000) a liderança autocrática é

não se configurou apenas como mero reflexo da industrialização,

aquela em que o líder fixa diretrizes, determina providências para execução de tarefas, determina a tarefa que cada um deve executar e o líder é dominador e “pessoal” nos elogios.

pois as cidades começaram a crescer o que gerou grande dificul-

Na ausência desse pai, os filhos e a mãe conseguiam libertar seus

dade em seu próprio crescimento e funcionamento. Ou seja, os

desejos e sentimentos, fazendo um laço de amor entre eles. O pai

números de influência mútua entre pessoas e absorção produti-

enquanto líder não oferecia espaço para que os outros pudessem

vas tiveram um crescimento elevado ao da própria cidade.

falar ou expressar suas vontades e desejos.

que será articulado por grandes cidades e estados. Alban (1998) pontua que o avanço da urbanização industrial

Relacionando a questão da urbanização industrial, pode-se

Sendo assim, um momento experienciado pela perda de

pensar no filme Árvore da Vida, uma vez que o mesmo acom-

tantos supostos ideais, e de tantos ganhos, como o de aperce-

panha a vida de uma família do Texas durante a década de 50,

ber que se encontra no mesmo patamar que os outros sujeitos,

onde o genitor da família trabalha em uma indústria, e, nessa

e que também está abaixo de um poder maior que todos e que

época as pessoas que trabalhavam em indústrias, eram consi-

sem explicações se tira aquilo que mais supõe ser e ter, como

deradas recursos de produção, ao lado dos recursos organiza-

o emprego e a vida de pessoas queridas, é o que aproxima o

cionais, como máquinas, equipamentos e capital. Assim para

sujeito do outro e o constitui para e com o outro.

o pai o trabalho lhe conforma poder e status. Contudo gerava efeitos negativos na sua vida pessoal.

O trabalho possibilita ao sujeito respeito perante a sociedade e a família, pois culturalmente, o homem bem sucedido é

Para Markert (2002), o trabalho está ligado à necessida-

aquele que trabalha e se torna um ser que produz socialmente,

de, à organização instrumental da cooperação dos homens,

tanto que a música nos anos 50, não era vista como profissão

embora vise ao mesmo tempo, para os homens associados, à

e, portanto, não podia ser considerada como algo que viesse

razão social da sua aceitação à produção alienante, que cau-

a sustentar uma família ou até mesmo de se ter uma posição

sa riqueza e pobreza, o progresso da indústria e a mais-valia

diante da sociedade como forma de produção.

o termo utilizado por Marx.

Na época em que o filme é retratado, é visível como a relação

Quando o trabalhador perde seu emprego percebe que ele

do homem sem o trabalho o destitui como um ser social e líder da

perde também o lugar em que se posicionava perante a sociedade

família. No entanto, esta relação de poder que o trabalho oferta

e a família. Esta perda leva o sujeito a refletir sobre aspectos rela-

para o homem diante da sociedade e da família, passa a perder

cionados à sua identidade profissional, assim como sua relação fa-

o valor a partir do momento em que este homem deixa de ser

miliar, na qual ele enquanto patriarcal é o referencial aos membros

alguém que produz. Sendo este um aspecto interessante para ser

familiares, por suprir o sustento financeiro e psicológico. Porém,

analisado, uma vez que o homem perde a liberdade ao ser aliena-

quando ocorre esta perda profissional, ocorre também a perda

do da produção do trabalho e a condição de ser um sujeito livre.

deste referencial patriarcal, superior, dotado de saber e poder. O líder da instituição familiar possuía uma postura parecida

Diante disso, nota-se que o homem se realiza através do trabalho, mas que também é certo que, existe uma dicotomia

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na relação do homem e do trabalho, ao se pensar que, ao se

te com o outro.

ter trabalho, o ser humano reclama por muito trabalhar e por se sentir escravo em alguns momentos do próprio trabalho. Mas, por outro lado, também se reclama quando não se tem um trabalho, se sentindo incapaz fracassado por não poder produzir e ser útil para si, para a família e a sociedade. Esta ambivalência é inerente ao ser humano e independente de qual seja sua profissão ou ocupação. A humanidade sempre irá deparar com a angústia, a falta de respostas para certas situações como a perda, inclusive a de um trabalho que, culturalmente diz da pessoa que o exerce e o produz socialmente. Conforme Pichon-Rivière (1994), toda situação de mudança gera ansiedade, devido aos medos básicos de ataque e perda implícitos nas relações, podendo se tornar ruídos na comunicação quando não explicitados. Sustentar um desejo, seja ele qual for, exige muito esforço para se manter. A atualidade que é emplacada pelo capitalismo, na qual as ofertas são inúmeras e diversos objetos surgem para tamponar esta falta que é inerente do ser humano e que muitas vias acabam levando o homem à decadência. O imediatismo e

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a competitividade social levam o ser humano a buscar alternativas para sanar o insuportável como um fracasso no mercado de trabalho e também o fracasso familiar. Considerações Finais O ser social é constituído através do seu trabalho, ou seja, através de seu reconhecimento e mediação na sociedade. Dian-

MALICK, Terrence. O filme “A árvore da vida”. 2011. Disponível em <cinema.uol.com.br/.../o-filme-a-arvore-da-vida-de-terrence-malick-c> acesso 20 de setembro de 2011. MARKERT, Werner Ludwig. Trabalho, universidade, comunicação e sensibilidade: Aspectos teórico-metodológico para um conceito dialético de competência. Trabalho Critica. Florianópolis, nº 03, p. 29 a 46 de 2002.

te disso, as formas de constituição de ser como ferramenta de trabalho foi se modificando a cada época e assim, criando novos meios de sobrevivência e relação cada vez mais diversas. No caminhar da vida e no ponto de parada da construção de um ser social, que tem como função a releitura do mapa e das

RIBEIRO, Erivane Rocha. Concepções de tecnologia na formação e na práxis do técnico óptico. 2008.136p. Dissertação, Belo Horizonte, 2008. SILVA, Raimundo Paulino. Concepção de Ser Social em Paulo Freire. Natal/RN, p. 9 a 40 de 2004.

formas de retomar novos caminhos, o papel dos “sociomentores” é aproximar as esferas de uma sociedade, que se aventuraram em caminhos improdutivos para a construção de laços sociais positivos, de um porto seguro, de onde eles possam traçar rotas conscientes para retomada da aventura de viver como sujeito social de fato e de direito. As pessoas não socializam por si só. Esse papel é do meio social que cada sujeito é inserido, que nas interrupções de nossa odisséia valorizam o recomeço, certos de que cada passageiro possui um ponto de partida e de chegada diferente e pessoal. Finalizando, o homem é reconhecido como um ser histórico – cultural. Quando uma criança nasce cria um vínculo com outras pessoas, entrando na vida social e partir daí vai constituindo seu papel social, com variantes significados. No qual, o homem começa a reconhecer a si próprio, através do outro, através das

GROSSI, Fernando Teixeira. Intervenção. In: BAHIA, et al. Psicóticos e adolescentes: porque se drogam tanto? Belo Horizonte, CMT, 2000.p.2032.

NOTAS DE RODAPÉ 1. Este artigo foi elaborado a partir do trabalho “Ler imagem”, focado no filme “A árvore da vida”, (dirigido por Tenence Malick nos EUA- Estados Unidos da América e estreado no Brasil em 23 de junho de 2011), sob orientação da Professora Erivane Rocha Ribeiro. 2. Alunas do 9º período do Curso de Psicologia do Centro Universitário Newton Paiva.

relações e experiências que constitui com si mesmo e juntamenPÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 139


3. Quando o termo óptico estiver relacionado ao fato de ver, deve-se usar óptica (relativo à visão) e não ótica (relativo à audição). (RIBEIRO, 2008, p. 29). 4. Ser Social é qualquer ente vivo ou a essência de alguém que pertence ou vive em sociedade. (Silva, 2004,p. 15). 5.Ontologia é um ramo da filosofia que lida com a natureza e a organização do ser. (Macário, 2002, p. 60).

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AÇÃO DE GUERRILHA: uma análise do case SOS Fauna Elevador 1 Daniela Lima2 Flávia Crivellari3

RESUMO: Este artigo continua as discussões produzidas para o trabalho de conclusão de curso de publicidade e propaganda. Buscou-se entender como o público da geração Y, nascidos a partir dos anos 80, avalia as ações do marketing de guerrilha e, sobretudo o impacto exercido sobre eles. O estudo utilizou três tipos de pesquisa: bibliográfica, documental e exploratória, essa última, através de sessão de grupo focal. Foi analisada a campanha da ONG SOS Fauna, que fez uso de uma ferramenta do marketing de guerrilha, com o objetivo de sensibilizar a sociedade quanto ao tráfico de animais no país. O estudo demonstra que ações diferenciadas junto ao público podem surtir efeito positivo, entretanto, deve-se ter o respaldo jurídico e o bom senso da agência para não correr o risco de denegrir a imagem da marca.

PALAVRAS-CHAVE: Marketing de Guerrilha; Marketing; Publicidade e Propaganda; Mídia Alternativa; Propaganda de Guerrilha.

1 INTRODUÇÃO

riscos pelos quais essa ação perpassava.

A infinidade de ideias que podem materializar-se através

Nas próximas seções, pretende-se discutir algumas defi-

das mídias alternativas e da proporção de seu alcance permi-

nições que envolvem a terminologia marketing de guerrilha e

te mais liberdade aos publicitários para criar ações inusitadas.

propaganda de guerrilha.

Apesar do termo - marketing e ou propaganda de guerrilha não ser recente, a atividade está sendo desenvolvida mais freqüen-

2 MARKETING E PROPAGANDA

temente, como aponta Castro (2007), ao dizer que elementos

A controvérsia existente na definição dos termos marketing

não convencionais passaram a ser usufruídos por aqueles que

e propaganda não é incipiente. Ao longo de seu uso, e mes-

trabalham a comunicação.

mo a partir do surgimento do marketing, sob a ótica america-

Em um cenário provido das tecnologias de informação,

na, que data de 1900 a 1910, Bartels (1970, apud LOUREIRO,

que a todo instante altera a relação do consumidor com as

2009, p. 3) constata que esse período pode ser tratado como o

marcas, em um contexto mais colaborativo, resolveu-se enten-

início das primeiras discussões do marketing como um campo

der e pesquisar como o público jovem, especificamente aquele

de estudo. Loureiro (2009) cita autores como Borden (1975),

constituinte à geração Y, avalia as ações do marketing de guer-

McCarthy (1960) e Kotler (1986) que instalaram na literatura ex-

rilha e, sobretudo, o impacto que elas exercem sobre eles.

pressões e teorias que ainda hoje, são conhecidas e postas

Esta análise utilizou o grupo focal com pessoas compatí-

em prática.

veis ao perfil da geração Y, e ajudou “a identificar tendências, o

Sant’Anna (2011) refere-se a essa expressão como uma

foco, desvendar problemas, buscar a agenda oculta do proble-

atividade de forma mais abrangente, envolvendo, sobretudo,

ma” (DUARTE; BARROS, 2010, p. 180). Além disso, foram rea-

processos e ações.

lizadas duas entrevistas em profundidade, que segundo Duarte

Diversos autores tentaram traduzir a palavra “marke-

(2010), explora um assunto a partir da busca de informações,

ting”, mas encontrar um único termo em português

percepções e experiências de informantes.

para atender ao que ele se propõe, é muito difícil.

Uma das entrevistas serviu para conhecer os aspectos que

Marketing é uma expressão anglo-saxônica derivada

constituíram a ação intitulada SOS Fauna Elevador, com An-

do latim mercari, que significa comércio – ou o ato de

dré Felix, diretor de atendimento da agência Media Contacts

mercar, de comercializar, ou ainda, transacionar. Al-

de São Paulo, quem esclareceu várias informações quanto ao

guns autores traduzem como mercado; outros, como

desenvolvimento da ação. Por se tratar de uma ação que pode-

mercadologia (LUPETTI, 2007, p. 6)

ria recair às sanções legais, já que envolvia consumidores sem uma prévia autorização, a segunda entrevista foi realizada com

Apesar das diferenças entre os autores ao conferirem um

uma advogada, que descreveu sob o ponto de vista jurídico os

conceito para o marketing, percebe-se um viés correlato res-

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ponsável pela proximidade entre eles, de que o marketing é uma

tipologias, dentre as quais se optou em destacar somente duas.

atividade abrangente, envolvida com o público e o mercado.

A propaganda institucional e a comercial.

Como não é foco deste estudo discutir os múltiplos concei-

A propaganda comercial é descrita por Sant’anna, Rocha

tos do termo, será pontuado algumas tipologias do marketing

Júnior e Garcia (2011, p. 121) como aquela “que paga espaços

encontradas na literatura, como forma de esclarecer a variabi-

ou tempo para se expressar [...] de uma forma ou de outra, visa

lidade da aplicação do termo a outras palavras. O destaque

promover vendas”. Esses “espaços” e o “tempo”, citados pelos

será de áreas mais específicas no marketing, como acontece

autores, se referem, respectivamente, às mídias em canal im-

com o marketing interno, o organizacional, o de guerra e o buzz

presso ou eletrônico, utilizados pelos anunciantes como forma

marketing.

de estimular e alavancar as vendas. Esse tipo de propaganda

O marketing interno refere-se a todas as atividades nas em-

atinge basicamente o público que irá consumir o produto, já que

presas que reúnem informações relevantes aos funcionários, a

direciona a mensagem exclusivamente a ele, excluindo-se as-

fim de motivá-los e informá-los. Meira e Oliveira (2004) conside-

sim, o pessoal interno da empresa, a se considerar os parceiros

ram o termo sinônimo do endomarketing, já que este considera

e fornecedores. Lupetti (2007) acrescenta que a propaganda co-

aquelas “[...] ações voltadas para o público interno da empresa,

mercial é utilizada nos lançamentos de produtos e na divulgação

com o fim de promover entre os seus funcionários e departa-

de eventos, tornando a marca desejada e sugerindo a ação de

mento aqueles valores destinados a servir o cliente”, pelo enten-

compra por parte do consumidor

dimento de Bekin (1995, apud ANGELONI, 2010, P. 72).

Com a propaganda institucional, pretende-se mais do que

O marketing organizacional é voltado ao público externo, ou

aumentar as vendas e os lucros, “[...] criar uma imagem de per-

seja, a elaborar estratégias que visem construir uma imagem,

sonalidade corporativa para o público em geral e gerar o máxi-

um conceito por parte dos consumidores/clientes, com relação

mo de imagens favoráveis para os mais variados stakeholders”

à empresa. Kotler (1997) cita ainda o marketing institucional

(SHIMP, 2009, p. 265). Nesse sentido, esse tipo de propaganda

como seu sinônimo.

busca sempre o reconhecimento do consumidor de forma geral,

O marketing de guerra é um termo muito semelhante ao

ou seja, além de estimular à venda, envolve estratégias que irão

tema deste estudo, devido à proximidade do significado das pa-

trabalhar a imagem da empresa frente aos diferentes públicos –

lavras “guerra” e “guerrilha”, tal qual, pode induzir ao erro sobre

externo e interno, o que afetará na forma como cada um deles

o entendimento real de cada um. A diferença existente está no

percebe e caracteriza a empresa ou produto divulgado.

foco dessas estratégias. Enquanto o marketing de guerrilha foca

Lupetti (2007) esclarece que um dos principais instrumentos

no público-alvo, o “marketing de guerra é o termo dado ao con-

para atingir o objetivo de marketing de qualquer organização, é

junto de estratégias adaptadas dos campos de batalha para a

a propaganda. Ressalta-se que existem outros, como promoção

utilização no combate ou defesa nas empresas com relação a

de vendas, venda pessoal, merchandising, etc. Mas, pode-se

seus concorrentes”, segundo Serrano (2011).

entender que a comunicação faz parte do composto de marke-

Outra tipologia encontrada é o buzz marketing, a qual os profissionais de marketing usam uma abordagem para que o

ting e independente da nomenclatura utilizada, a propaganda está inserida na comunicação, com suas diversas tipologias.

consumidor faça testemunho da marca. Segundo Keller e Machado (2006, p. 176) “O buzz marketing funciona bem quando a

3 FERRAMENTAS DO MARKETING DE GUERRILHA

mensagem de marketing parece originar-se de uma forma inde-

Guerrilla marketing é uma expressão de origem norte-ame-

pendente, e não da marca”. Os autores querem dizer com isso,

ricana, mencionada pela primeira vez em meados da década

que se cria um “falatório”, gerando comentários sobre o produto

de 80, por Jay Conrad Levinson, considerado o “pai do marke-

e conseqüentemente, capitalizando para a marca.

ting de guerrilha”, como apresenta Ucella (2009). Esse termo,

A propaganda, às vezes, pode ser confundida com o marke-

traduzido como marketing de guerrilha, surge em um contexto

ting, no entanto, possui as suas particularidades. Sob a perspectiva

onde a publicidade na década de 70, não mais eficiente quanto

de seu papel, no desempenho de sua função atrelada às atividades

nos anos anteriores, causava a desconfiança do consumidor em

do marketing, Dantas (2009) designa a propaganda como uma va-

relação à oferta dos produtos. A Guerra do Vietnã entre os Esta-

riável do composto de marketing, tendo entre seus objetivos princi-

dos Unidos da América e o Vietnã, ocorrida em 1959 até 1975,

pais aumentar a participação no mercado de uma marca/produto e

originou o termo “guerrilha”, onde colocou o Vietnã reconhecido

estimular as vendas, sem, no entanto, promovê-las.

por ser o estrategista da guerra, apesar de possuir instrumentos

Não diferente do marketing, a propaganda também possui

de defesa inferiores aos do inimigo. Ucella (2009) aponta que

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mesmo com poucos armamentos pode-se vencer uma guerra.

ou, portanto, rever suas necessidades e comporta-

Atrelado então, à palavra marketing, resultou-se o marketing de

mentos (JÚNIOR; AMORIM, 2010, p. 4)

guerrilha, estratégia que utiliza de meios e ações inusitados a fim de alcançar um resultado satisfatório. Levinson (2010) descreve

Dorrian e Lucas (2009, apud DANTAS p. 9) utilizam dois

que o marketing de guerrilha está em “atingir as metas conven-

adjetivos que justificam apontar essa variável do marketing de

cionais, tais como lucros e alegria, com métodos não conven-

guerrilha como um elemento que faz uso da criatividade, metá-

cionais, como investir energia em vez de dinheiro.” (LEVINSON,

foras, ilusões, comparações, quando “as empresas optam por

2010, tradução nossa).

colocar em prática campanhas mais imaginativas e originais,

Ao adaptar os conceitos e práticas da guerrilha bélica para

com vistas a gerar mais visibilidade para seus produtos”. Sorrell

os negócios, Levinson (2010) demonstra que pequenas empre-

(2005, apud DANTAS, 2009, p. 10) acrescenta ainda que “o de-

sas podem adotar táticas alternativas de marketing para sobrevi-

safio mais importante é continuar diferenciando produtos de um

ver nos mercados atuais ou mesmo competir com concorrentes

modo muito mais potente, criativo e construtivo.”

maiores. O marketing de guerrilha nasceu, portanto, como um

Nesse contexto, percebe-se a existência de uma tendência

“arsenal de conceitos, proposições e idéias de como sobrevi-

a utilizar como sinônimos os termos de marketing de guerrilha

ver e vencer num mercado totalmente desigual” (RODRIGUES,

ou propaganda de guerrilha. O que precisa ser entendido é o

2010, apud CAVALCANTE, 2003, p. 49).

modo de fazer este tipo de ação, como tal é uma das formas

Segundo Rodrigues (2010, apud Cavalcanti, 2003), as em-

utilizadas pelo marketing que exclui as outras modalidades do

presas remodelam suas estratégias, em busca de visibilidade e

marketing mix: o composto de preço, produto e distribuição

posicionamento no mercado, considerando a melhor vantagem

(praça). A propaganda de guerrilha está no ato de “comunicar

custo versus benefício, já que os recursos financeiros, principal-

de modo diferente, captando a atenção do público de maneira

mente as das micros e pequenas empresas, são insuficientes

pouco comum, porém com meios surpreendentemente adequa-

para o investimento nos meios tradicionais. A base da utilização

dos ao produto ou serviço anunciado” (DORRIAN; LUCAS, 2006

de outros formatos midiáticos está em inovar através da criativi-

apud DANTAS, 2009, p. 9). Portanto, a propaganda é um instru-

dade, com soluções inusitadas e surpreendentes, que possam

mento ou ferramenta do quarto “p” de promoção. Em referência às ações que se utilizam de meios não tra-

gerar resultados. Diante dessas considerações, o marketing de guerrilha

dicionais para a transmissão de uma mensagem, idéia ou um

pode ser caracterizado como uma estratégia que se utiliza de

conceito, encontra-se a variabilidade dos termos existentes em

meios não convencionais sem, no entanto, excluir as mídias tra-

se referir a tais atividades, não havendo, portanto, um termo es-

dicionais como jornais, revistas, televisão e rádio, para a obten-

pecífico e único que as defina.

ção de resultado e a promoção da mídia espontânea, invisível

Ucella (2009), Santos e Athayde (2008) estão entre os autores que discutem as ferramentas mais utilizadas pelo marke-

ou buzz marketing. O surgimento da propaganda de guerrilha é apontado por

ting de guerrilha: o marketing de emboscada, também conhe-

Júnior e Amorim (2010), com origem do teatro de guerrilha na

cido como ambush marketing, a arte urbana, o astroturfing, os

década de 60, como um elemento das artes cênicas do teatro

eventos e patrocínios, o marketing invisível, a performance, o PR

de vanguarda pós-dramático interativo, que tinha como espaço

Stunt, o culture jamming, o happening e a land art ou arte da

físico a rua. Os artistas faziam suas performances geralmente

terra. O marketing de emboscada é uma ação com origem na dé-

em feiras ou eventos públicos. Na modernidade, surgem variações de termos, um

cada de 80, quando nos Jogos Olímpicos, a Kodak se aproveita

deles denominado de Teatro de Guerrilha, que inspi-

dessa estratégia. Ela faz a transmissão dos jogos e apóia o time

rará no nome e na execução da propaganda de guer-

dos Estados Unidos, sendo que a patrocinadora oficial do even-

rilha. Um fazer desenvolvido e observado nas ruas,

to, era a Fuji, sua principal concorrente (UCELLA, 2009). Discute-

nas praças, enfim, no espaço por onde circulam as

se a sua legalidade, uma vez que as empresas oficialmente pa-

pessoas. Vai-se até elas para que a provocação da

trocinadoras consideram-se prejudicadas pelo alto investimento

idéia, geralmente feita por performers, ganhe forma.

realizado, devido a perda da exclusividade de apoio e referência

A sociedade é tanto com a propaganda quanto com

do evento, com justificativas que apelam para a falta de ética

o teatro de guerrilha, provocada a repensar seus con-

dos concorrentes da marca patrocinadora.

ceitos, encontrar respostas às perguntas sugeridas e/

A arte urbana não é somente utilizada para fins mercadológi-

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cos, ao repensar a procedência desse tipo de ação, por artistas

para divulgar um conceito, uma idéia ou marca, em função de

de bairros, que através do grafite, esculturas, aplicações, insta-

promover a interação da “mídia humana” com o público.

lações e cartazes, difundem uma expressão, um talento “que se

A ferramenta PR Stunt está ligada ao papel que os profis-

relaciona com as cidades e a vida nos grandes centros”, como

sionais de relações públicas possuem com a imprensa, por isso

afirmado por Coutinho (2011). Ucella (2009) apresenta essas

as iniciais “PR”, provindas do inglês publics relations stunt, sen-

formas de expressão utilizadas na arte urbana, ação também

do stunt, entendido como golpe, truque, proeza, façanha, como

chamada de marketing de rua ou intervenções urbanas, como

consta no blogdeguerrilha. Essa ferramenta inclui profissionais

citam Santos e Athayde (2008, p. 4).

de relações públicas e de publicidade, que, aliados irão apli-

O astroturfing, como define o Guerrilhapédia, é um termo

car o PR stunt. Por isso, os publicitários ficam encarregados de

que surge da alusão à marca de grama sintética AstroTurf utili-

formular a estratégia da ação, criar e buscar desenvolver algo

zada nos Estados Unidos, quando num jogo de palavras, o se-

inusitado.

nador norte-americano Lloyd Bentsen utiliza a expressão gras-

O primeiro autor a conceituar o culture jamming, na década

sroots para se referir a movimentos espontâneos de um grupo.

de 90, foi Dery (2003). Jam refere-se à “prática ilegal de inter-

Dessa forma, o astroturfing começa a ser utilizado para designar

romper transmissões de rádio ou conversas entre locutores ca-

uma ação “que pareça ser popular para que as outras pesso-

nastrões com arrotos, obscenidades e outras provocações sem

as sejam influenciadas a comprarem a idéia, mas na verdade

graça” (DERY, 2003, apud ROSAS, 2003). Para Dery (2003), o

a ação é de uma empresa que se mascara por trás. Uma ação

jamming vai além de uma ferramenta de expressão e representa

sem “raízes” e que parece real, mas não é. Daí a “grama artifi-

a própria cultura dos grupos que desenvolvem essas atividades

cial”, conforme mencionado no Blog de Guerrilha (2011).

como forma de questionar o sistema econômico e político.

Eventos e patrocínios fazem parte das estratégias de guer-

O Happening é um termo criado por Krapow (1969)4, que sob

rilha que para Santos e Athayde (2008), são exemplos de mídias

a influência do minimalismo, esteve paralelamente ligado ao mo-

tradicionais utilizadas pelo marketing de guerrilha. Os eventos

vimento hippie nos anos 60, característico do movimento da con-

são promovidos pelas empresas com o intuito de criar na mente

tracultura, “período rico em experimentações cênicas e de multi-

das pessoas, sentimentos e sensações no público participan-

linguagem” (ROCHA, 2006, p. 23). Acontecimento é a tradução

te, na tentativa de “traduzir na ação o posicionamento da mar-

literal do termo, que segue a mesma proposta da performance,

ca” (SANTOS e ATHAYDE, 2008, p. 4). Não diferente disso, os

pela forma de expressão, o ambiente por onde perpassa a ação

patrocínios possuem esse mesmo objetivo, mas nesse caso, a

e a ferramenta por qual ambas atividades geralmente utilizam - o

empresa investe financeiramente ou com a cessão de seus pro-

próprio corpo. É uma expressão que não tende a se preocupar

dutos/serviços, em eventos que a empresa considera propício

com a estética, como resultado final, o que devido a isso, não é

associar sua marca.

considerado como arte por alguns artistas. O processo se sus-

O marketing invisível é realizado a partir de um planejamen-

tenta por uma base mais ritualística, “o que faz com que o próprio

to bem estruturado, geralmente utilizado no lançamento de pro-

atuante eventualmente não tenha consciência de sua participação

dutos, no sentido de se prever e conhecer a reação do target,

em uma atividade artística” (ROCHA, 2006, p. 22).

segundo Ucella (2009). Essa estratégia permite que uma idéia

A land art - arte da terra, como o próprio nome diz, se

seja repassada entre as pessoas, sem que elas estejam cientes

relaciona às obras que transformam um espaço natural, utili-

da exposição da mensagem e da persuasão a qual estão sub-

zando o ambiente como suporte e ferramenta. Surgiu a partir

metidos, como afirmam Santos e Athayde (2008), ao falar dos

da contraposição de vários artistas europeus e americanos

benefícios sobre essa ferramenta.

da década de 60, ao minimalismo que compunha as obras

A performance é algo que está inerente ao homem, a partir

da época e também devido ao “interesse pelas causas am-

do momento em que ele estabelece uma relação com o tempo

bientais, como ponderado no Guerrilhapedia. O autor, dessa

e o espaço, através de uma caminhada, pausa, expressões di-

forma, cria as obras a partir do que lhe é sugestivo, inspira-

versas. Isso é citado por Júnior e Amorim (2010) de forma de-

dor, sem a preocupação na exatidão. O resultado das obras,

talhada e profunda, usando a semiótica e a arte para a descri-

muitas vezes, é mais subjetivo, gerando reflexões, onde a

ção de tal linguagem, como consideram os autores. De forma

mensagem é transmitida pela obra em si, ou seja, pela ima-

mais objetiva, encontra-se no blog de guerrilha a tradução dessa

gem que é construída. A land art é percebida como uma obra

ação como sendo geralmente executadas nas ruas, em lugar

que rompeu com museus e galerias, devido à dimensão dos

aberto ao público, onde os performers usam do próprio corpo

projetos, que nem sempre, são efetivados.

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Diante dessas considerações, percebe-se que essa gera-

4 A GERAÇÃO Y O estudo do comportamento do consumidor é um dos pas-

ção possui características únicas que os difere de outros grupos

sos na pesquisa e análise de marketing que contribui para o

que compõem a sociedade, o que altera a forma de se comu-

desenvolvimento de estratégias mais eficazes para alcançar e/

nicar com eles. Ao perceber aspectos como dinamicidade, in-

ou convencer um público-alvo. Ao desenvolver ações de guerri-

teração, liberdade, tecnologia, pode se inferir que as ações de

lha, esse estudo também se faz necessário, já que as diversas

guerrilha podem funcionar como meios para causar uma apro-

forças que atuam no comportamento do consumidor podem ser

ximação com esse público, como na opinião de Zenga (2011).

compreendidas levando-se em conta a importância dos códigos

Dessa forma, estudar e delinear os meios que serão mais

de percepção para o desenvolvimento da atenção, do desejo e

propícios a alcançar e chamar a atenção desse público, poderá

da satisfação do cliente.

configurar em alternativas mais assertivas e eficazes para estimu-

Gade (1998, p. 25) relata que os fatores que influenciam as

lar esses indivíduos à ação desejada pelo anunciante/agência.

decisões de consumo são pessoais, culturais, sociais e psicológicos. Por isso, todo consumidor observa de maneira particular

5 CONTEXTUALIZAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS COLETADOS

tudo o que está em sua volta e sempre analisa quando o interes-

O estudo contou com duas entrevistas em profundidade.

sa, o que por outro lado, deixa passar desapercebido quando

A primeira, com o diretor de atendimento da agência Media

não o interessa.

Contacts de São Paulo, responsável pela criação da campanha

Serrano (2010) considera que a geração Y são as pessoas

“SOS Fauna Elevador”, para conhecer os aspectos que constitu-

que nasceram entre os anos 1980 e 2000, ou seja, jovens com a

íram a ação. A segunda entrevista foi com uma advogada, para

faixa-etária entre 11 e 31 anos de idade. Os jovens que a consti-

verificar o ponto de vista jurídico.

tuem são impulsivos e estão em busca constante por inovação,

A Media Contacts atua no Brasil desde o ano 2000. É uma

tendo dentre os valores que a permeiam a velocidade, liberdade,

agência que faz parte do grupo Havas Digital que opera em mais

o consumo, a individualidade e a tecnologia, características que

de 42 países do mundo. Foi ela a agência responsável pela cria-

se adequam ao próprio período – pós moderno, como afirma a

ção da ação que durou um dia, no mês de abril de 2011, em três

pesquisa Bridge Research (2010, apud LIGABUE, 2010).

prédios comerciais da região de São Paulo. A ideia de prender

São apontadas por Soares (2007), três características prin-

as pessoas em elevadores surgiu a partir da causa defendida

cipais dessa geração: “estão continuamente ligados, falam sua

pelo cliente, SOS Fauna - órgão de defesa da fauna e flora bra-

própria língua e são influenciados por seus pares”. Ou seja, as

sileira. Há mais de vinte anos a organização luta no combate

maneiras e preferências do grupo de convívio interferem em

ao tráfico de animais silvestres, “promovendo a recolocação de

suas opções e estilo de vida, como também partilha- se de seus

indivíduos das espécies vítimas do comércio ilegal à natureza”

próprios valores com o grupo, em constante interação e muta-

(SOS FAUNA, 2011). É uma organização não-governamental,

ção. O autor diz que o marketing identifica alguns problemas a

sem fins lucrativos, localizada em Juquitiba, no Vale do Ribeira,

respeito daqueles que compõem essa geração. Esses, por sua

região sul do Estado de São Paulo.

vez, caracterizam-se pela complexidade e dificuldade de con-

Segundo André Felix, a “campanha foi colaborativa entre to-

centrarem-se, por se aborrecerem com facilidade e estarem em

dos os parceiros da agência”, sem custo para o anunciante. Um

todos os lugares, pelo uso da internet, que modifica a relação de

grande problema identificado e sofrido pela SOS Fauna é a falta

distância e espaço.

de sensibilidade das pessoas com relação ao tráfico de animais

Por outro lado, Ligabue (2010) volta à análise do perfil dessa geração à educação e enumera várias características desses

no país e, principalmente, à consciência delas. A solução encontrada pela agência é descrita na passagem a seguir.

jovens, quanto a seus hábitos, comportamentos, perspectivas

Para mostrar de uma forma não-esperada a crueldade

de vida e valores. Se resumem por serem criativos, por se ade-

que esses animais são submetidos, desde o momento

quarem ao ambiente e aceitar as mudanças com facilidade, pela

em que são retirados de seu habitat natural, para passar

desenvoltura crítica e questionadora que os impulsiona a procu-

a viver como prisioneiros durante anos. Para isso, nós

rar e ansiar por respostas. São pessoas que valorizam muito a

usamos elevadores de prédios comerciais. As pessoas

interação e por viverem num cenário multifacetado, conseguem

entravam normalmente e de repente o elevador parava,

desenvolver mais de uma atividade ao mesmo tempo, caracteri-

assustando e prendendo todos. Alguns segundos de-

zando, como cita Honorato (2010, apud LIGABUE, 2010) a “era

pois, o elevador voltava ao normal. Quando saiam, as

dos indivíduos multitarefas”.

pessoas recebiam um flyer com uma mensagem de PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 145


consciência: “É assustador ser enjaulado por alguns se-

era o objetivo.

gundos. Imagine por uma vida toda. Denuncie o abuse

Do ponto de vista jurídico houve várias ponderações da es-

de animais. SOS Fauna (THEADSONTHETABLE, 2011,

pecialista. Ela recomenda que as agências, ao trabalhar este

tradução nossa).

tipo de ação, devem pesquisar junto aos organismos que regem a propaganda e até mesmo as leis do código civil. Os riscos pe-

A ação repercutiu na mídia por meio de noticiários dos ca-

los quais a agência e o anunciante estão sujeitos, ao utilizarem

nais CNN, TNT, Warner Channel, VHI, Sony e Jornal do SBT que

meios não convencionais para a transmissão da mensagem são

espontaneamente promoveram a campanha, ampliando seu al-

de grande relevância, pois ao desconsiderar essas questões,

cance. O vídeo que demonstra a ação sendo desenvolvida este-

tanto a agência, quanto o cliente e o próprio veículo poderão

ve entre as mais comentadas no mundo, nas categorias de or-

sofrer com problemas na justiça. Ela relata sua perspectiva ao

ganizações sem-fins lucrativos e ativismo. Cresceu-se em 520%

esclarecer os riscos pelos quais a agência e os anunciantes es-

o número de voluntários interessados em apoiar a causa durante

tavam sujeitos, como em descrição a seguir.

a campanha, além do número de visitas ao site, ter mais que dobrado, se comparado à média de acessos do início do ano.

Em detida análise da campanha SOS Fauna no Elevador, segundo a especialista, percebe-se que a ação de prender as

Para cumprir o objetivo do estudo, foi feito a discussão atra-

pessoas no elevador pode configurar o crime de seqüestro e

vés da modalidade foccus group. O grupo focal contou com

cárcere privado, previsto no artigo 148 do código penal, assim

participantes de ambos os gêneros, sendo 80% do sexo femi-

como asseverou o advogado Jair Jaloreto, na reportagem do

nino e 20% do sexo masculino. Fazem parte das classes B e C,

Jornal do SBT. Acrescente-se que o crime poderia ser inclusive

entre a faixa-etária de 17 e 29 anos. Todos cursam faculdade

qualificado, caso houvesse grave sofrimento a alguém, ou por

e são solteiros, considerando que 60% deles trabalham e 40%

haver pessoas menores de 18 anos (§ 1º, IV e § 2º, art. 148, do

não trabalham, sendo totalmente dependente de seus pais ou

Código Penal).

responsáveis.

Ela pondera que a ação poderia violar o direito fundamental

A ação foi apresentada aos participantes através de fotos e

à liberdade de locomoção previsto no art. 5º, XV da Constituição

vídeos que continham cenas gravadas das imagens no interior

Federal, haja vista que os indivíduos foram privados do ato de ir

e na saída do elevador. O dispositivo parava de funcionar por

e vir durante um lapso de tempo, ainda que ínfimo. Poder-se-ia

alguns segundos, com portas fechadas e sem energia. Interna-

cogitar de alguém preso no elevador, se sentir mal ou desmaiar,

mente câmeras foram colocadas para captar as reações dos

fato que resultaria na responsabilização tanto do cliente/anun-

participantes. Repentinamente as portas se abrem; voluntários e

ciante quanto da agência pelos danos causados.

simpatizantes da causa distribuem o material informativo fazen-

Por fim, consta no Código Brasileiro de Auto-Regulamenta-

do uma analogia de como elas se sentiram e como se sentem

ção Publicitária (Capítulo II, seção 9) que a publicidade que faça

os animais presos.

uso da imagem de qualquer pessoa sem a sua respectiva auto-

A discussão do grupo focal foi extremamente rica. Basica-

rização, é ilícita. Ao que parece, no caso vertente, as pessoas

mente todos os entrevistados foram emocionalmente atingidos

presas no elevador não autorizaram formalmente a divulgação

pela campanha SOS Fauna no Elevador. Classificaram a cam-

de suas imagens, o que poderia ensejar uma lide nesse sentido.

panha como criativa, emocional, bem planejada e impactante.

Porém, essa opinião é vista com bastante receio e gera diversas

Afirmaram que a busca pela qualidade de vida dos animais, o

controvérsias.

combate da venda ilegal, são causas que deveriam ser levan-

O diretor André Felix

revelou os cuidados dos quais a

tadas sempre. Alguns relataram que isso ocorre com muita

agência asseverou ter adotado no momento da ação, como por

freqüência em países desenvolvidos, mas aqui é relegada ao

exemplo, uma equipe paramédica no local. Além disso, a ação

segundo plano. A intervenção feita no elevador, é oportuna, pois

não gerou ação judicial a que a especialista jurídica colocou.

faz com que as pessoas sintam na própria pele o que sente um

Esta intervenção tem as características ao que é conceitua-

animal preso, na visão de todos eles. Alguns relataram que pro-

do nas ações de happening, “que faz com que o próprio atuante

vavelmente sentir-se-iam assustados ou com medo, mas se a

eventualmente não tenha consciência de sua participação em

ação fosse rápida, como visto nas imagens, o levaria a refletir

uma atividade” (ROCHA, 2006, p. 22). A estética não é fator que

sobre o assunto. Entretanto, houve considerações com relação

se incorpora a essa atividade, podendo referir-se ao que foi de-

à diversidade de temperamentos das pessoas, ou seja, poderia

senvolvido na ação do elevador. Não houve nenhum preparo no

ocorrer de alguém não gostar da ação; mesmo entendendo qual

ambiente, somente a instalação das câmeras.

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6 CONCLUSÃO Esse estudo teve como proposta entender a percepção do consumidor frente às estratégias de comunicação que foge do tradicional e corriqueiro, que caracterizam uma modalidade específica da área, o marketing de guerrilha. Ao analisar esta intervenção foi preciso colocar em discussão a respeito das leis que algumas atividades podem infringir. Nessa linha de pensamento, constatou-se que no art. 31 do Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária, restringe-se a prática do marketing de emboscada, sem, no entanto, desconsiderar as outras práticas de guerrilha, que se vêem regidas na totalidade do Código, já que este não confere nenhuma obser-

CASTRO, Pablo Pamplona. Marketing de guerrilha: Incorporação das mídias radicais no mercado. Disponível em: http://pt.scribd.com/ doc/6696338/Marketing-de-guerrilha-Incorporacao-das-midias-radicaisno-mercado. Acesso em: 16 jul 2011. CAVALCANTE, Francisco. Faça marketing de guerrilha: soluções criativas, baratas e eficazes para o sucesso da pequena empresa. Belém: Labor, 2003. 167 p. CONAR. Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária. Disponível em: <http://www.conar.org.br/> Acesso em: 2 nov 2011. CONTACTS, Media. Soluções em Marketing. Disponível em: <http:// www.mediacon tacts.com.br/mc-brasil.php> Acesso em: 19 set 2011.

vação em específico às outras estratégias. Dessa forma, desenvolver ações que possam corroborar em erro legal, parte da atitude e bom senso da agência e do anunciante, que irão optar pelo que será mais conveniente à marca vinculada à ação. A repercussão, prevista em toda atividade de guerrilha, divulga a marca e pode causar polêmicas positivas

COUTINHO, Flávio. Arte Urbana. Disponível em: <http://cultura.culturamix.com/arte /arte-urbana > Acesso em: 22 out 2011. CULTURAL. Itaú Enciclopédias.Happening. Disponível em: <http://www. itaucultural. org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index_> Acesso em: 15 jun 2011

entre o público, mas por outro lado, além de estar contra o que determina o Código, corre-se o risco de difamar e enfraquecer a marca. Ao considerar a proximidade que o público pertencente à geração Y possui frente àquilo que se mostra novo, inusitado, diferente, pode-se considerar uma estreita relação entre eles, uma vez que as características e o próprio conceito de guerrilha encontram-se arraigados no perfil da geração Y, como evidenciado por Zenga (2011). O resultado da análise do grupo focal reforça ainda essa afirmativa caracterizando a ação com os seguintes adjetivos:

DANTAS, Edmundo Brandão. A propaganda de guerrilha: uma nova alternativa para posicionar marcas. 2009. Disponível em: <www.bocc.ubi. pt/pag/dantas-edmundo-a-propaganda-de-guerrilha.pdf> Acesso em: 15 jun. 2011. DERY, Mark. Culture Jamming: Hacking, Slashing and Sniping in the Empire of Signs. Disponível em: <http://project.cyberpunk.ru/idb/culture_jamming.html> Acesso em: 11 nov 2011. DUARTE, Jorge. Entrevista em profundidade. In: DUARTE, Jorge; BARROS, Antônio.( Org.) Métodos e Técnicas de Pesquisa em Comunicação. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2010. Cap. 4. 62-93

criativa, bem planejada, bem executada, arriscada e impactante. Diante dessas considerações, pode inferir que os espaços para aplicar as mensagens, ampliaram o limiar das mídias e conseqüentemente as possibilidades de interação com o público. Exige-se atitude ética e bom senso, tanto dos profissionais que criam a estratégia de comunicação, como os anunciantes e veículos, que podem correr o risco de infringir as leis determinadas no CBAP. Além de impactar negativamente a marca ligada à ação, pela ousadia que define esse tipo de anúncio. Contudo, num cenário provido de tecnologias que estabelecem mais vínculo, contato e ações diferenciadas com o consumidor, prevê-se que as ações de guerrilha significam uma alternativa útil no campo das comunicações. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANGELONI, Maria Terezinha. Comunicação nas Organizações da era do Conhecimento. São Paulo: Atlas, 2010. 167 p.

DUARTE, Jorge; BARROS, Antônio. Métodos e Técnicas de Pesquisa em Comunicação. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2010. 380 p. FAUNA, SOS. Órgão de defesa da fauna e flora brasileira. Disponível em: < http://www.sosfauna.org/> Acesso em: 11 ago 2011. FAUNA, SOS. Stuck in the elevator. Disponível em: <http://www.theadsonthetable. com/sos-fauna/landing/> Acesso em: 11 ago 2011. GADE, Christiane. Psicologia do Consumidor e da Propaganda. São Paulo: ed. rev. e ampl. São Paulo: EPU, 1998. 269p. GARCIA, Nélson Jahr. Propaganda: Ideologia e Manipulação. Disponível em: <http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/manipulação> Acesso em 2 Set 2011. GUERRILHA, Blog. Portal de pesquisas. Disponível em: <http://www. blogdeguerrilha.com.br/wiki/> Acesso em: 13 ago 2011. HERNANDEZ, Thomas. Marketing de Guerrilha e Intervenção Urba-

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 147


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NOTAS DE RODAPÉ 1.Artigo produzido a partir do trabalho de conclusão de curso – modalidade monografia – orientado pela professora Sônia A. Martins Lazzarini, do curso de Publicidade e Propaganda do Centro Universitário Newton Paiva, segundo semestre de 2011. 2. Bacharel em publicidade e propaganda, danydancels@gmail.com 3.Bacharel em publicidade e propaganda, flaviacrivellari@hotmail.com 4.Disponível:http://infinitudepostuma.blogspot.com/2010/05/<acesso em 12 dez 2011>

PAMPLONA, de Castro Pablo. Marketing de Guerrilha: incorporação das mídias radicais no mercado. Disponível em: <http://blogdeguerrilha. com.br/wiki/Marketing_de_guerrilha> Acesso em: 11 mai 2011. PR STUNT. Disponível em: <http://www.blogdeguerrilha.com.br/wiki/index.php5? title=PR_Stunt. Acesso em 11 set 2011> ROCHA, Polyanna. Intervenção Performática Contra-Institucional como guerrilha estética. Disponível em: <http://www.vis.ida.unb.br/posgraduacao/Acesso em: 11 nov 2011. ROSAS, Ricardo. Assalto a Mídia. Disponível em: <http://prod.midiaindependente.org/pt/blue//2003/03/248962.shtml > Acesso em: 15 set 2011. SANT’ANNA, Armando. Propaganda: teoria, técnica e prática. 8 ed. São Paulo; Cengage, 2011. 438 p.

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OS PROCESSOS CRIATIVOS DO RECEPTOR DISCUTIDOS A PARTIR DA PUBLICIDADE E DA POESIA: a produção de um clipe-poema por jovens do PEP Fernanda Carla de Castro1

RESUMO: Este artigo discute a recepção aos textos midiáticos, apoiando-se em uma proposta pedagógica desenvolvida com os alunos de Rádio e TV do Programa de Educação Profissional (PEP) da Newton Paiva. Em 2011, os alunos conheceram poemas que se referiam ao consumo desmedido da sociedade atual e produziram clipes com uma releitura dos textos. A intenção era que refletissem como os versos, apoiando-se em recursos da publicidade, satirizavam esse consumismo e estimulavam uma crítica do receptor. Outro objetivo era que os alunos produzissem o clipe, explorando como as críticas dos poemas poderiam ser transportadas para o audiovisual. O artigo analisa os resultados da atividade e a necessidade de se debater, na prática docente, a criatividade do receptor. PALAVRAS-CHAVE: Recepção; Mídia; Publicidade; Poesia; Juventude.

Os alunos do curso de Rádio e TV do Programa de Edu-

quisas de mestrado e doutorado concluídas entre os anos de

cação Profissional (PEP) da Newton Paiva têm bastante fa-

1999 e 2006, tratando de juventudes e mídias, nos cursos de

miliaridade com os meios de comunicação. A maioria deles

Educação, Ciências Sociais e Serviço Social (CASTRO, 2010,

acompanha programas televisivos e radiofônicos, acessa com

p.16). De acordo com Setton, os trabalhos têm um “tom mora-

regularidade a internet, possui e-mail, participa de redes so-

lista e missionário”, prevalecendo a ideia que:

ciais virtuais, tem facilidade de baixar músicas ou editar vídeos.

Os adolescentes ou jovens bem como o mundo adulto

Possivelmente essa familiaridade com as “velhas” e com as

deve ser alertado para os riscos de uma socialização

“novas” mídias, característica dos nascidos nos anos 1990, foi

pelas mídias. A capacidade de gestão dos processos

determinante para a escolha do curso técnico em Rádio e TV.

criativos de um sujeito receptor é pouco desenvolvida,

Embora tenham uma grande desenvoltura com os

dando-se ênfase no caráter, se não manipulador, pelo

meios, esses alunos, que pertencem à chamada “Geração Z”,

menos, determinante da cultura das mídias no universo

também apresentam uma postura bastante dicotômica em re-

jovem. Neste sentido, aconselhamos uma postura que

lação ao poder de influência desses meios de comunicação

consiga desenvolver novos olhares sobre as diferentes

sobre os jovens e a sociedade de uma maneira geral. Durante

possibilidades de usos dos recursos e conteúdos pos-

as discussões em sala de aula, no decorrer da disciplina In-

sibilitados pela cultura midiática (SETTON, 2009, p.77,

trodução à Produção de Áudio, observou-se uma polarização

grifos da autora).

entre apocalípticos e integrados (ECO, 1970), com uma grande vantagem para os primeiros. Ou seja: quando estimulados

Diante desse panorama, foi necessário pensar em pro-

a pensar de que forma os textos midiáticos são recebidos a

postas pedagógicas que relativizassem esse poder maléfico

maioria dos alunos de Rádio e TV destaca que não há uma lei-

da mídia na vida cotidiana. Em uma delas, o ponto de partida

tura crítica. As mensagens da mídia, consideradas por muitos

foi a apresentação, aos alunos do PEP, de estudos que não

alunos manipuladoras, são nocivas ao receptor: cumprem um

tomam o receptor como um sujeito passivo, mas como capaz

papel alienante já que ele não consegue decodificar o que está

de ressignificar os discursos que recebe da mídia. Recorreu-se,

nas entrelinhas do texto.

especialmente, às reflexões sobre recepção que foram dese-

A tendência de tomar o receptor como uma vítima da

nhadas com a emergência dos estudos culturais (HALL, 2003)

manipulação dos meios é recorrente até mesmo nos meios

até o surgimento da noção de mediação, formulada por Martín-

acadêmicos, conforme constatou a socióloga Maria da Graça

Barbero (1997; 2002), dando conta de que uma informação

Jacintho Setton, ao analisar algumas características das pes-

não chega a um receptor com um sentido pronto, construído,

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 149


mas esse processo é mediado pelo contexto cultural em que

meios de comunicação, a sensação que fica é que agora per-

ele ocorre. Porque considera que o consumidor desenvolve uma

cebem que o receptor lança mão de uma série de mecanismos

série de táticas de resistência e brechas para subverter os pro-

que podem fazê-lo discordar ou questionar os discursos midiáti-

dutos que recebe, as contribuições de Michel de Certeau (1994)

cos, e não somente absorvê-los de forma passiva.

também foram apresentadas aos alunos. Em seguida, foi promovida uma discussão sobre o texto Mil e uma utilidades: a contribuição da poesia, no qual o pesquisador Marcos Fabrício Lopes da Silva (2008) discorre sobre poemas que, utilizando elementos da publicidade, criticam as marcas como “as únicas entidades capazes de promover a felicidade e o bem-estar do indivíduo”. Valendo-se dos versos de Reclame (Chacal, 1979), Eu, etiqueta (Carlos Drummond de An-

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CASTRO, Fernanda Carla de. O jovem de periferia nos quadros de Regina Casé: um estudo de representação e recepção. 2010. Disponível em < http://www.bibliotecadigital.ufmg.br/dspace/handle/1843/BUDB8C5SQR>. Acessado em 01/12/2011. CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: artes de fazer. Tradução Ephraim Ferreiras Alves. Petrópolis: Vozes, 1994.

drade, 1984), A felicidade bate à sua porta (Sebastião Nunes, 1995) e Cárcere Sabor Felicidade (Bruno Brum, 2004), o autor considera que os poetas [...] denunciam de maneira irônica e satírica os abusos cometidos pela atividade publicitária que propaga de maneira sedutora os sonhos de consumo sem dimensionar o quanto faz despertar os pesadelos da carência do consumidor. [...] Acredito que o conteúdo revelador destes poemas pode contribuir para a formação qualificada de publicitários e de “consumidores conscientes” (SILVA, 2008, destaques do autor) Para incrementar a atividade pedagógica, além dos poemas sugeridos por Silva, foi incluído também Desfotografia (Michel Melamed, 2005). Embora não faça uma relação direta com a publicidade, os versos do poeta carioca foram incluídos na proposta pedagógica por se acreditar que seu conteúdo também

ECO, Umberto. Apocalípticos e integrados. São Paulo: Perspectiva, 1970 HALL, Stuart. HALL, Stuart. Da diáspora: identidades e mediações culturais (Org. Liv Sovik; Trad. Adelaine La Guardia Resende et all). Belo Horizonte: Editora UFMG; Brasília: Representação da UNESCO no Brasil, 2003 MARTÍN-BARBERO, Jesús. Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia. Rio de Janeiro: Editora UFRJ,1997 __________________, Jesús. América Latina e os anos recentes: o estudo da recepção em comunicação social. In: SOUSA, Mauro Wilton de (Org.). Sujeito, o lado oculto do receptor. 2.ed. São Paulo: Brasiliense, 2002, p.39-68. MELAMED, Michel. Regurgitofagia. Rio de Janeiro: Objetiva, 2005. SETTON, Maria da Graça Jacintho. Juventude, mídias e TIC. In.: Spósito, Marília Pontes. O estado da arte sobre juventude na pós-graduação brasileira: Educação, Ciências Sociais e Serviço Social (1999-2006). Belo Horizonte: Ed. Argumentum. 2009. P.63-86.

levaria a uma rica discussão sobre a fotografia digital e a busca frenética pelo registro do momento em contraposição à fruição. Depois de um amplo debate sobre as críticas que os poetas faziam ao consumo desmedido da sociedade contemporânea e os elementos da publicidade utilizados para satirizar esse comportamento, a sequência final da atividade pedagógica consistiu em transportar os poemas para a linguagem audiovisual. Foi proposto, então, que os alunos do PEP, reunidos em grupos, fizessem uma releitura dos versos, divulgando-os por meio de um clipe. O resultado final foi bastante interessante e cumpriu o objetivo prévio da atividade: quando estimulados a recontarem os versos por meio de imagens e sons, os alunos conseguiram

SILVA, Marcos Fabrício Lopes. Mil e uma utilidades: a contribuição da poesia. 2008. Disponível em <http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/mil_e_uma_ utilidades_a_contribuicao_da_poesia>. Acessado em 01/12/2011

NOTAS DE RODAPÉ 1 Mestre em Educação pela UFMG e bacharel em Comunicação Social (habilitação em Jornalismo) pela PUC-Minas. Trabalhou por 12 anos no Centro de Documentação da TV Globo Minas, possui experiência em pesquisa, arquivo, memória, acompanhamento de pauta e produção de programas televisivos. Atua como professora no curso de Rádio e da TV da Escola de Educação Profissional Newton Paiva.

tratar das temáticas de forma criativa e crítica. Em alguns trabalhos, os jovens do PEP se colocaram como protagonistas e retrataram de que forma lidam com os apelos da publicidade e que táticas (CERTEAU, 1994) utilizam para ressignificar os discursos veiculados pelas propagandas. Se a maioria dos jovens iniciou o semestre com uma visão apocalíptica dos 150 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


O PLANEJADOR. Algumas considerações práticas.1 Sônia A Martins Lazzarini2

RESUMO: O planejamento de comunicação ganha várias concepções no mundo corporativo, mas nas agências de propaganda deve ser aquele departamento que mantem um profundo relacionamento com os consumidores. Neste artigo apresento como o planejamento de contas foi concebido, quando surgiu como disciplina no Brasil, descrevo as características e atribuições do planner. Além disso, demonstro que a essência da conexão com o consumidor vai além de fazer pesquisa. PALAVRAS-CHAVE: Consumidor; Planner; Planejamento de Comunicação; Agência de Propaganda.

INTRODUÇÃO

necessário fazer um resgaste de como foi “inventado”. Segun-

Atualmente grande parte das empresas tem se dedicado de

do consta no livreto publicado pelo Account Planning Group do

forma exclusiva para entender seu consumidor na tentativa de

Reino Unido, foi em 1965 que o “conceito inicial foi inventado

gerar insight no negócio. A globalização veio exercer influências

pelo falecido Stanley Pollitt” (D’Souza, 1986, p. 1, tradução da

transformadoras nestes indivíduos e na forma de tratá-los. Neste

autora). Na visão de Politt, oriundo do atendimento, com mais

sentido a estratégia de marketing certamente deve ser revista pe-

dados disponíveis para a agência, o gerente de contas não

riodicamente, como defende Jones (2003). Dentro da estratégia

usava as informações como deveria. Além disso, o pessoal

de marketing está a estratégia da marca, que envolve o estabele-

da pesquisa não se envolvia efetivamente no processo. Nesse

cimento de objetivos para uma campanha publicitária.

vácuo, surge a figura do planner para trabalhar como um par-

É neste contexto que insere o planejador. Ele basicamente usa de toda e qualquer informação do consumidor, de forma

ceiro do atendimento e criação. Já o ex- presidente do APG-UK Baskin (2001) afirma que;

a acolhê-los como parceiros no processo de desenvolvimento

“[...] em 1964, Stephen King, insatisfeito com o fun-

da campanha (STEEL, 2001) a fim de estabelecer a estratégia

cionamento de ambos; os meios de comunicação e

e inspirar as idéias criativas. A estratégia da marca tem que re-

departamentos de marketing dentro de sua agência;

presentar uma simbiose entre a equipe inspiradora da agência,

desenvolveu um novo sistema de trabalho que concen-

a realidade do cliente e a opinião dos consumidores.

trou-se na combinação de pesquisas de consumo e

E tudo isso combinado significa descobrir uma solução estratégica para o problema do anunciante, sempre com o olhar

insights para criar mais publicidade eficaz e criativa.” (BASKIN, 2001, p.2, tradução da autora)

no consumidor ou usuário da marca. O planejador, para envolver e mobilizar o consumidor pode

Portanto, o planejamento como disciplina é uma invenção

fazer uso da pesquisa, mas deve deixar de lado seus próprios

tipicamente britânica. Teve larga influência e está presente sob

preconceitos ou mesmo convenção, conforme sugere Steel

diversas formas em agências de vários países. No entanto, “a

(2001). Isso provavelmente pode ser difícil, mas é um exercício

disciplina do planejamento [...] foi um produto da tecnologia da

contínuo para este profissional, ou seja “[...] olhar para a mesma

propaganda. Ao contrário de muitas outras invenções [...], não

informação e ver algo diferente não tem preço” (STEEL, 2001, p.

foi inventado para tornar mais fácil a vida das agências” (RAY-

55). Como tal, o planejamento é algo bastante dinâmico.

NEY, 2006, p.8). Na verdade, as agências que contam com

Com este artigo procurou-se entender um pouco mais so-

esta equipe, aumenta o custo operacional e tempo desprendi-

bre este ator no cenário publicitário, bem como a sua matéria

do no processo; além de ainda, produzir discussão muitas das

prima de trabalho; consumidor.

vezes polêmica, em torno das soluções encontradas. Segundo Staveley e O’Malley (2002) a disciplina dissemi-

PLANEJAMENTO COMO DISCIPLINA

nou para o mundo, foi repetida nos Estados Unidos, conser-

Para uma melhor compreensão do papel e trabalho do pla-

vando grande parte de seus aspectos mais essenciais. Nos

nejador de comunicação nas agências de propaganda torna-se

Estados Unidos a agência pioneira foi a Chiat/Day, do Grupo

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 151


Omnicom. Jay Chiat citado por Staveley e O’Malley (2002) pro-

Ele acreditava que a execução, tanto quanto a estratégia criati-

curou entender porque o Reino Unido produzia propaganda

va, ajudava a criar uma “relação” de marca com seus usuários

bem melhor que os Estados Unidos, e chegou à conclusão que

(STEEL, 2001, p. 34).

uma das diferenças estava no planejamento de contas.

No Brasil o peso da criação passou a ser grande no pro-

Daí o Reino Unido ser conhecido como o país que produz

cesso. Na perspectiva de Corrêa (2000) a sensibilidade criativa

os melhores planejadores do mundo. Steel (2001) também tem

sobrepunha-se à lógica mercadológica e aos resultados das

uma explicação para este fato. O autor aponta que o motivo que

pesquisas. Isso sinaliza que a especialização e o trabalho de

leva os britânicos a se tornarem os melhores pensadores estra-

valorização do planejamento ainda não conseguia se impor.

tégicos é o contraste do sistema escolar britânico comparado

Em 1979 é fundado o Account Planning do Reino Unido –

a outros países. O sistema desse país tende a recompensar e

APG-UK na tentativa de discutir o papel do planejador e o plane-

estimular abordagens e debates dos acadêmicos sobre um pro-

jamento no contexto da comunicação. A partir daí vieram outros

blema, explorando bem além da resposta final.

grupos em todo o mundo, como da Argentina, Austrália, Bélgica,

Na prática, a diferença de planejamento do Reino Unido e

Suécia e tantos outros.

dos Estados Unidos está no papel que a propaganda exerce

A figura do planejador veio a aparecer formalmente nas

na cultura da população. Segundo Rayney (2006) enquanto no

agências brasileiras na década de 80. “Neste contexto, os planos

Reino Unido as pessoas geralmente apreciam e aprovam a pro-

eram desenvolvidos pelo triângulo planejamento, atendimento e

paganda, nos Estados Unidos ela é considerada invasora e um

criação, que criava as bases para o pensamento estratégico de

insulto à inteligência.

comunicação, apoiado nos dados das pesquisas de consumer

Na publicidade americana predomina a convicção de que

insights” (CORRÊA, 2000, p. 163). Observa-se nesta época que

existem dois tipos de propaganda, a criativa e a que vende

nas agências de pequeno porte, o profissional de atendimento

(RAYNEY 2006, p.9). Talvez deva ser por conta disso que o mo-

exercia o trabalho do planejamento. Provavelmente isso pode

delo brasileiro herdado da disciplina foi dos Estados Unidos.

estar acontecendo nos dias atuais; haja vista a ponderação de

Não encontram-se registros históricos ou documentação es-

Ribeiro e Eustachio (2003, p. 133) “[...] só mude se não estiver

pecífica do período do uso da técnica de planejamento da propa-

obtendo soluções concretas para os problemas de negócios

ganda no Brasil (EMERICH, 1990, p. 158). Sabe-se que as gran-

que a agência se propôs a enfrentar”.

des empresas aqui instaladas na década de 30; como General

Emerich (1990) também assinala que este período consoli-

Motors, Esso, Shell, dentre outras; eram atendidas por agências

dou as agências como um negócio empresarial onde o plane-

locais ou filiais de alguma multinacional, provavelmente contava

jamento foi o fio condutor de todo o processo de comunicação.

com um algum profissional responsável pelo planejamento.

Um dos nomes pioneiros nesta área foi o Júlio Ribeiro, da Talent,

Nos anos 40 e 50 as grandes empresas utilizavam as agências como uma extensão do departamento de marketing. Nesse

que por muitos anos a sua agência não aderiu ao processo de internacionalização.

período a concorrência era caracterizada por um baixo nível de

Somente depois de longos anos, um grupo de planejadores

oferta de produtos ou serviços, não se levava em conta os an-

“interessados em trocar idéias e buscar a valorização do planeja-

seios e as expectativas do mercado e o foco era nas vendas.

mento como disciplina”3, surge no Brasil o primeiro Grupo de Pla-

Uma nova geração de profissionais da propaganda surgiu

nejamento em São Paulo, no ano de 2002. A entidade foi pioneira

com a instalação da Escola de Propaganda do Museu de Arte

e inspirada nos moldes dos Account Planning do Reino Unido e

de São Paulo, atualmente a ESPM – Escola Superior de Propa-

dos Estados Unidos. Nos Estados Unidos o grupo foi instituído for-

ganda e Marketing, primeira escola de propaganda do Brasil.

malmente em 1995, conforme apontam Staveley e O’Malley (2002).

Segundo Emerich (1990) nesta ocasião emergiriam futuros e brilhantes especialistas em planejamento. A revolução criativa mundial é encabeçada por William (Bill) Bernbach nos anos 60, que já levava em conta o ponto de vista

Por conta da dimensão geográfica, o Brasil adotou o sistema de grupos de estudos para promover a disciplina, por região. No Rio Grande do Sul o grupo surgiu em 2005, em Minas Gerais foi lançado em 2009 e adotou o nome de Clube de Planejamento.

do consumidor. Isso é constatado por Steel (2001) ao afirmar

Atualmente o interesse e a introdução da disciplina sinalizam

que para Bernbach a execução de uma propaganda era mais

uma maior preocupação sobre as novas maneiras de pensar a pro-

que um veículo para carregar a mensagem de um produto ou

paganda. Neste sentido gera uma resposta mais rica aos proble-

marca; era, de certa forma, a mensagem em si, e seu objetivo ia

mas do anunciante, pois a agência a desenvolve um novo olhar

mais além do que conseguir captar a atenção do consumidor.

do consumidor, com soluções criativase resultados para a marca.

152 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


PENSAMENTO INOVADOR NAS AGÊNCIAS DE PROPAGANDA

nejador é querer receber crédito por essas idéias.

A nova geração de planejadores, provavelmente ingressou

a segunda habilidade é passar mais tempo ouvindo do que

na área por uma decisão racional. Além das incontáveis universi-

falando: o planejador deve exercitar em ser um bom ouvinte,

dades disponíveis, atualmente os cursos de comunicação social

pois segundo o autor a freqüência com que as pessoas tem e

não têm tanto o foco na formação de criativos para a criação. Ou

expressam boas idéias sem nem se dar conta, pode ser usufru-

pelo menos se espera isso.

ídas para o seu trabalho.

Muito além de aprender a ler dados de pesquisa, o plane-

o terceiro atributo é a capacidade camaleônica: o plane-

jador deve ser um indivíduo contemporâneo. Ribeiro (2000, p.

jador funciona como um intérprete para as três áreas, criação,

117) afirma que ser “contemporânea é a pessoa que está ligada

clientes e consumidores. O planejador deve entender o suficien-

on-line a seu próprio tempo”. E nas palavras dele, o valor dessas

te para descobrir uma forma de fazer as três partes se comuni-

pessoas é diretamente proporcional à sua capacidade de fazer

carem entre si.

acontecer as coisas. Ressalta-se que este autor, como pionei-

Esse é o caminho que deve ser trilhado pelo planner, eter-

ro da disciplina no Brasil, não menospreza o enfoque científico

no aprendiz. Schmetterer (2003) sugere que o “autêntico pla-

dado ao planejamento de comunicação.

nejador” (destaque do autor) é aquele que se dedica a tentar

Rayney ( 2002, p. 22) defende que o “Planejamento de comunicação nos dias de hoje não significa necessariamente encontrar novas respostas nem mesmo fazer descobertas. O importante é formular novas perguntas”.

entender as conexões entre a marca e as necessidades empresariais e entre a marca e o consumidor. Para Staveley e O’Malley (2002) se estamos na era da informação, os negócios se tornam negócios do conhecimento.

Disso pode-se extrair um princípio relevante em todo pla-

“Se o aumento da quantidade de informação não levar

nejamento, que segundo Ribeiro (2000) as perguntas são mais

à “paralisação pela análise”, então será preciso ter um

importantes do que as respostas; para ele são conseqüência

quadro de pessoal experiente para decidir qual, dentre

natural de perguntas bem formuladas.

todas as opções possíveis, é a melhor para adotar. O

Entretanto Schmetterer (2003, p. 215) pondera que a res-

planejamento de contas é o primeiro exemplo de uma

posta passa pela psicologia. E fazer as perguntas certas é ape-

disciplina completa que reconhece a necessidade de

nas metade do processo estratégico. O profissional de planeja-

criar esse novo tipo de pessoa no campo da publicida-

mento precisa gerar perspectivas originais, afrontar convenções

de.” (STAVELEY e O’MALLEY, 2002, p. 64)

e criar rupturas assentadas. Apesar de Sant’anna (2002) ter uma abordagem mais ad-

Do ponto de vista destes autores, o planner é a figura que

ministrativa deste profissional, o autor concorda que isso exige

melhor representará esta era dos negócios do conhecimento.

esforço e persistência por parte dos técnicos de planejamento.

Por outro o ambiente da agência tem que ser propício, as idéias

Para ele a tarefa daquele especializado em planejamentos, que

devem influir livremente, as informações devem ser compartilha-

introduz mudanças,

das e ter um trabalho de equipe coesa e, sobretudo, ter disciplina

“[...] é reconhecer os obstáculos inevitáveis, providen-

com foco no resultado para a empresa cliente e o consumidor.

ciar as maneiras de superá-los em seu planejamento e ver a organização que executa o plano é estruturada no

O CONSUMIDOR: MATÉRIA PRIMA DO PLANEJAMENTO

sentido de capitalizar as oportunidades para cuja obten-

Cada vez mais a empresa anunciante espera da agência

ção o plano é elaborado.” (SANT’ANNA, 2002, p. 102).

de propaganda (de comunicação) “uma parceria nos esforços que conduzem à venda final [...], aproveitar as oportunidades

Dentre os vários atributos e habilidades essenciais que o

criadas pelo mundo digital, etc”. (GRACIOSO, 2008, p.79). Em

planejador deve ter, Steel (2001, p. 51) destacam três importan-

contrapartida Bullmore (2003, p.75) pondera que “Aumentar

tes, a saber:

vendas não é função direta da publicidade. Sua função direta é

o primeiro é uma mistura de modéstia com humildade: a contribuição do trabalho do planner é produzir uma comuni-

conseguir mudanças de atitudes e comportamentos – que, por hipótese, aumentarão as vendas”.

cação que estimule e faça as pessoas a terem visto ou ouvido

Se a propaganda é uma das ferramentas utilizadas pela or-

a mensagem. Neste sentido, pode ocorrer de algum fragmen-

ganização para atingir seus objetivos, logo, o planejamento de

to de informações da estratégia sugerida pelo planejador ser

comunicação deve ser uma extensão do planejamento merca-

a idéia criativa da campanha. O erro fatal para qualquer pla-

dológico do anunciante.

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 151


A clareza do que se quer com esse plano é premissa básica

pode até ser com pesquisa, desde que se utilizem os princípios

para o sucesso do anunciante. Mas o ponto crucial para qual-

da simplicidade, do bom senso e também da criatividade, que

quer plano de comunicação e para o posicionamento da marca

devem estar em funcionamento em todos os estágios da pes-

é o conhecimento profundo das características do público-alvo

quisa, recomenda Steel (2001).

(CORRÊA, 2006). Entretanto, não se pode limitar a informações

Já Lance e Woll (2006, p. 37) defendem a pesquisa como

econômicas e demográficas, por mais importantes que sejam,

“[...] a única forma de se manter em compasso com seus clientes

esta imprecisão da definição do público torna o trabalho mais

[..] e sentir o mais seguro possível de que você está movimen-

difícil e sem foco.

tando na direção de satisfazer aos seus desejos e necessidades”.

Portanto, o começo de toda comunicação é conhecer o con-

Paradoxalmente Steel (2001) acredita que pesquisas sejam

sumidor, seja ele chamado sr. Target (MARTINS, 2003), clientes

incapazes de transmitir o que na verdade pensam ou sentem os

e prospects (DANTAS, 2009) ou simplesmente público-alvo

consumidores. Mas no caso de fazê-las, o autor aconselha ter o

(CORRÊA, 2006). Este conhecimento possibilitará o planejador

cuidado e habilidade de afastar os entrevistados de si mesmos

a desenvolver uma estratégia tanto na busca criativa quanto no

para contribuírem criativamente e revelarem as aspectos real-

planejamento de mídia, junto com toda a equipe da agência.

mente importante que se procura.

Mas Lance e Woll (2006) afirmam

É incontestável que, para o planejador a única e a principal

“[...] Está mais difícil do que nunca conseguir ser nota-

perspectiva é a dos consumidores, a matéria prima do planeja-

do no meio da multidão. Os públicos mais jovens estão

mento. Neste sentido Troiano citado por Limeira (2008) afirma

cansados de tudo. Quando mais você entender para

“[...] as marcas são o mais importante e permanente ati-

quem exatamente está falando, maiores as suas chan-

vo de uma empresa. Mas a marca não pertence, de fato,

ces de atingir esse público com uma propaganda efi-

a ela à empresa. Pertence ao consumidor. Aliás, marcas

caz.” (LANCE e WOLL, 2006, p.37)

só adquirem vida quando entram em contato com os consumidores no mercado.” (LIMEIRA, 2008, p. 124)

Com o momento vivido de fragmentação de mídia, pulverização de verbas da empresa anunciante, construir e manter

De acordo com tal perspectiva, falar com os consumidores

uma marca forte é algo que exige do planner um inegável en-

exige diferentes níveis de conteúdo e de contexto, de utilização

tendimento do que precisa ser relevante ao contexto no qual o

de conceitos de diversas áreas, como economia e psicologia,

consumidor acessa a informação.

que se tornam essenciais para o estudo do comportamento do

Lance e Woll (2006) recomendam que a única forma de en-

indivíduo como consumidor. Como bem afirma Jones (2003)

tender o consumidor é como ele vive, o que deseja, o que com-

com conhecimento do alvo, pode-se medir como a publicidade

pra, como consome mídia e entende a mensagem, é participar

os atingirá, essencialmente o trabalho do planner é apontar a

da vida dele. Mas como conhecer o consumidor de uma forma

direção certa ao pessoal de criação, reduzindo o risco de “[...]

que ninguém mais da agência entende? Os autores sugerem, li-

perfurar poços secos e desperdiçar tempo e talento, algo que

vre-se de miopia de cidade grande, penetre no coração do país,

está em franca escassez e que deve ser sempre alimentado e

vá às lojas e converse com as pessoas nos corredores. Somen-

protegido” (JONES, 2003, p. 173)

te desta maneira o planner estará apto a servir de tradutor entre a pesquisa, o cliente, o pessoal da conta e a equipe de criação e todos estejam na mesma sintonia em termos de como falar com o todo poderoso consumidor. A esta característica Steel (2006, p. 53) acrescenta que ao planner “[...] tem de haver algo de certa forma esquisito neles”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Ainda persiste em algumas agências, uma visão intelectualizada da figura do planner, muito por conta de como é descrito na literatura de modo geral; como o detentor da informação, o intelectual de ideias próprias e por aí vai.

Ele explica que os melhores planejadores têm uma visão sutil

Talvez o maior mérito do planejamento seja o de derrubar

que os arrasta para lugares e interesses estranhos que os tor-

barreiras entre os departamentos da agência, ao apropriar-se

nam ainda mais sutis. Em outras palavras, o planejador é aquele

de inúmeras ferramentas, porém de uma forma integradora e

que tem o objetivo de “penetrar na cabeça de uma pessoa e

produtiva. A sua contribuição é valiosa na construção de marcas

descobrir o que está pensando para encontrar a melhor forma

e nos resultados da agência.

de influenciá-la” (STEEL, 2001, p. 5). Descobrir a maneira como os consumidores sentem e agem

Embora esta discussão permita uma percepção sobre o trabalho do planner, faz-se necessário ainda detalhamentos es-

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pecíficos do seu trabalho. A pesquisa acadêmica neste campo tem recebido pouca atenção nos últimos anos. As existentes referem-se à carreira deste profissional, feitas pelas próprias entidades de classe, sem uma cientificidade do processo da construção do planejamento de comunicação dentro das agências. O maior aprendizado é entender que a cada instante algo novo surge e com isso uma forma inusitada de falar com o consumidor. E este profissional não perde o bonde da história, se a publicidade chega todos os dias na nossa casa, que chegue de uma maneira que não falhe em fazer as conexões necessárias com o consumidor, a grande matéria prima do planejador e o

LIMEIRA, Tânia Maria Vidigal. Comportamento do consumidor brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2008. 379 p. MARTINS, Zeca. Propaganda é isso aí!: um guia para novos anunciantes e futuros publicitários. São Paulo: Atlas, 2003. 278 p. RAYNEY, Annie Rothwell. O contexto do planejamento. In: COOPER, Alan (Org.). Tradução Beatriz Sidou, Gil Pinheiro, Tânia Marques. Como planejar a propaganda. São Paulo: Talento – GP-Grupo de Planejamento, 2006. Cap. 1 7-23. RIBEIRO, Júlio. Planejamento estratégico: a arte de perguntar. In: PREDEDON, José (Org.) Propaganda: profissionais ensinam como se faz. São Paulo: Atlas, 2000. Cap. 5 115 – 131.

seu grande trunfo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BASKIN, Merry. What is Account Planning?(and what do account planners do exactly?) United Kingdom: Account Planning – APG-UK, 2001. 9 p. BULLMORE, Jeremy. O processo de criação na publicidade. In: JONES, John Philip (Org.). A publicidade como negócio. São Paulo: Nobel, 2003. Cap. 4 67-77. CORRÊA, Roberto. Comunicação integrada de marketing. Um visão global. São Paulo: Saraiva, 2006. 266 p. CORRÊA, Roberto. O novo papel do atendimento nas agências de propaganda. In: PREDEDON, José ( Org.) Propaganda: profissionais ensinam como se faz. São Paulo: Atlas, 2000. Cap. 8 159 – 179. DANTAS, Edmundo Brandão. Gerenciamento de contas. Uma abordagem aplicada a agências de comunicação publicitária. São Paulo: Atlas, 2009. 215 p. D’SOUZA, Sev. What Is Account Planning? United Kingdon: Account Planning – APG-UK, 1986 . 6 p. EMERICH, Hélcio. Planejamento: um processo de permanente redefinição. In: CASTELO BRANCO, Renato; MARTENSEN, Rodolfo Lima; REIS, Fernando.(Coord.) História da propaganda no Brasil. São Paulo: T.A Queiroz, 1990 ( Coleção Coroa Vermelha. Estudos Brasileiros; V.21). 158-162 p. GRACIOSO, Francisco (Org.) As novas arenas da comunicação com o mercado. São Paulo: Atlas, 2008. 182 p.

RIBEIRO, Júlio; EUSTACHIO, José. Entenda propaganda. 101 perguntas e respostas sobre como usar o poder da propaganda para gerar negócios. São Paulo: Senac, 2003. 203p. SANT’ANNA, Armando. Propaganda. Teoria. Técnica. Prática. 7 ed. São Paulo: Pioneira Thomson, 2002. 469 p. SCHMETTERER, Bob. Salto. Uma revolução em estratégia criativa nos negócios. Tradução Okky de Souza. São Paulo: Cultrix, 2003. 253 p. STAVELEY, Nicholas; O’MALLEY, Damian. Planejamento de contas. A óptica britânica. A óptica americana. In: JONES, John Philip (Org.). A publicidade como negócio. São Paulo: Nobel, 2003. Cap. 3 51 – 66. STEEL, Jon. A arte do planejamento: verdades, mentiras e propaganda. Rio de Janeiro: Elsevier, 2006. 275p.

NOTAS DE RODAPÉ 1 Trabalho apresentado no GP Publicidade – Epistemologia e Linguagem, XI Encontro dos Grupos de Pesquisa em Comunicação, evento componente do XXXIV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação Recife – PE – 2 a 6 de setembro de 2011. 2 Publicitária, Relações Públicas, mestre em Marketing, com foco em comportamento do consumidor, docente dos cursos de Publicidade e Propaganda e Gestão Comercial do Centro Universitário Newton Paiva – Belo Horizonte – MG. E-mail: soniamartins.prof@newtonpaiva.br 3 Disponível http://grupodeplanejamento.com.br/_2010/quem-somos <acesso 26 jun 2011>

JONES, John Philip(Org.). A publicidade como negócio. São Paulo: Nobel, 2003. 512 p. LANCE, Steve; WOLL, Jeff. O livro azul da propaganda. 52 ideias que podem fazer uma grande diferença. Tradução de Lenke Peres. Rio de Janeiro: Elsevier Campus, 2006. 233 p.

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PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO EM AGÊNCIAS DE PROPAGANDA DE PEQUENO PORTE1 Asley Oliveira de Siqueira2 Carla Jacqueline Gonçalves Costa3 Patrick Simon Moreira de Oliveira4

RESUMO: O presente artigo visa apresentar as características e funções atribuídas pela literatura acadêmica ao profissional de planejamento em agências de comunicação, contrapondo-se com exemplos de agências de pequeno porte que não possuem tal figura especificamente. O estudo reforça a importância de planejar com eficácia a comunicação publicitária e por isso destaca que independente do tamanho do escritório, o planejamento acontece, com a presença de um profissional dedicado à apenas essa função ou não. PALAVRAS - CHAVE: Agência de publicidade; Agências de pequeno porte; Planejamento; Planner.

INTRODUÇÃO

Não é objetivo desse trabalho superestimar a participação

Atualmente o mercado mineiro de comunicação conta com

de agências de pequeno porte dentro do cenário da publicida-

a presença dos mais diversos tipos e modelos de agência de

de atual, mas sim demonstrar que o planejamento, assim como

propaganda. Independente do porte do escritório de comuni-

as demais áreas de comunicação, pode e deve ser praticado

cação uma área faz-se sempre necessário; o planejamento. En-

por todas as agências, independente de seu porte e de ter pro-

tre suas várias funções que serão discutidas por Amaral (2004),

fissionais únicos para isso ou não.

ele resume atribuindo ao planejamento a responsabilidade de desenvolver uma propaganda mais eficaz e segmentada.

1 Características e Funções do Planner

A partir desta premissa, este artigo pretende identificar

As mudanças no hábito de consumo, o crescente aumen-

as características e funções do planner e como essa função

to da concorrência e principalmente a evolução dos meios e

pode ser desenvolvida em uma agência de pequeno porte.

formas de comunicação, acarretam em mudanças no perfil e

Tal preocupação justifica-se, pois não são todas as agências

nas funções de todo e qualquer publicitário. Isso quer dizer

que possuem esta importante função na figura do planejador.

uma constante busca em entender profundamente o consu-

Segundo Zamboni (2009, p. 36) “[...] as pequenas e peque-

midor para todos que estão no processo de comunicação de

níssimas agências têm dificuldades naturais para contratar um

uma marca. Conceitualmente, o profissional de planejamento

planejador já que suas estruturas normalmente são compac-

é quem deve trabalhar em termos de reações de atitude do

tas.” Portanto, o planejamento nesse caso geralmente é de-

consumidor dentro de uma agência.

senvolvido por outro profissional, que pode ou não dispor de

Após o surgimento da função na década de 60, “a pesquisa

características ou conhecimento necessário para exercer esta

e a voz do consumidor passaram a ser ferramentas imprescin-

função com qualidade.

díveis para um bom plano de comunicação” (AMARAL, 2004).

Neste sentido, entender e descrever como ocorre o plane-

Hoje, a evolução tecnológica e o “bombardeio” de tendências

jamento estratégico de comunicação nas pequenas agências e

ou pseudo tendências tornaram essas ferramentas mais com-

se são realmente capazes de desenvolver tal função de modo

plexas. Por isso, conhecer o consumidor é condição sine qua

assertivo tona-se vital para o negócio. Após a conceituação

nom para o planejador, conforme assegura Lupetti (2003).

do porte de agência, será utilizado como exemplo o estudo de caso com duas agências de pequeno porte do mercado mi-

Assim, o papel do planejador nesse contexto, segundo Steel (2006) é de

neiro. Este método foi usado, pois, “[...] contribui para a com-

“[...] acolher os consumidores como parceiros no pro-

preensão dos fenômenos sociais complexos, sejam individuais,

cesso de desenvolvimento da propaganda, usar todo

organizacionais, sociais ou políticos”, conforme observa Duarte

tipo de informação fornecida por eles em cada estágio

(2009, p.234).

do processo para alimentar e algumas vezes até ins-

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pirar as idéias criativas e balizar, até mesmo validar, as campanhas que resultassem disso”. (STEEL, 2006, p.6) Partindo para um conceito mais organizacional da função do planner, Sant’anna, (2002, p. 102) afirma que “planejar é reconhecer os obstáculos inevitáveis, providenciar as maneiras

O terceiro e último atributo “é a capacidade camaleônica: o planejador funciona como um intérprete para as três áreas, criação, clientes e consumidores.” O planejador deve entender o suficiente para descobrir uma forma de fazer as três partes se comunicarem entre si”. (STEEL 2001, p.51).

de superá-los em seu planejamento e ver se a organização que executa o plano é estruturada no sentido de capitalizar as opor-

Os vários olhares e opiniões em torno da figura do plane-

tunidades para cuja obtenção o plano é elaborado”. Por outro

jamento denotam a multiplicidade de características e funções

lado, Amaral (2004, p. 13) considera este profissional de extrema

atribuídas ao profissional, o que faz dele uma figura destacada

importância, ao afirmar “Me parece que o planejador tem um

e importante em todas as fases de um projeto de comunicação.

papel político no ambiente interno da agência, agindo como me-

Então, independente da visão conceitual conferida ao planner,

diador entre a Criação e o Atendimento”.

entende-se que ele é peça chave para o sucesso de uma cam-

Segundo Jones (2002) apud Amaral (2004) o Account Plan-

panha ou marca.

ning Group, entidade representante da classe, define a função do planejador como um guia que facilita o processo de produ-

2 Porte de Agência e Anunciante

zir soluções criativas e eficientes no mercado visando a aplica-

Para Miranda (2011) a área de planejamento que antes era

ção sagaz de conhecimento ou conhecimento de consumidor/

responsável pela pesquisa, na década de 60, agora apresenta

mercado. Segundo a APG, “o principal trabalho do planejador é

grande crescimento técnico e visão sistêmica, incorporando

entender o consumidor e a marca e, destes, retirar um insight-

novas ferramentas de trabalho, para que a partir delas pudesse

chave para a comunicação e/ou sua solução”.

chegar aos resultados mensuráveis. Com essa visão o planeja-

Já a American Association of Advertising Agencies, define o

dor passa a não somente realizar técnicas de pesquisa, mas a

planejador de conta como a figura que é essencialmente, o con-

compreender o consumidor, apresentando soluções adequadas.

tato primário da equipe de contas com o mundo exterior (JONES,

O planejamento é uma área relativamente nova e não tradi-

2002 apud Amaral (2004). Ou seja, é a pessoa que, por seu know

cional, se comparada com outros ramos da publicidade, como

how e expertise de todas as informações pertinentes, têm a ca-

atendimento, criação e mídia, por exemplo. Pode-se inferir que

pacidade de focar no consumidor em todas as decisões de publi-

não é só pela estrutura das agências que não se vê um profissio-

cidade. Isso exige muita persistência e esforço por parte do pro-

nal especificamente de planejamento. Isso pode ser constatado

fissional de planejamento do ponto de vista de Sant’anna (2002).

em matéria recente na revista Exame, que segundo a repórter de

Contudo, é possível estabelecer algumas características co-

carreira Lam (2011), “o mercado está carente de profissionais

muns relativas à personalidade do profissional que desenvolve

experientes na área”.

o planejamento e por consequência podem ajudar no desempe-

O grande número de agências de propaganda ou de co-

nho das funções do planner. Segundo Steel (2001) essas carac-

municação existentes possibilita a variação dos mais diferentes

terísticas são divididas em três habilidades essenciais:

portes de empreendimento. Segundo Sampaio (2003, p. 61)

“Mistura de modéstia com humildade: a contribuição do

“existem desde empresas com poucos empregados e reduzidas

trabalho do planner é produzir uma comunicação que

instalações até grandes organizações multinacionais, presentes

estimule e faça as pessoas a terem visto ou ouvido a

em muitos países, empregando milhares de pessoas [...]”.

mensagem. Neste sentido, pode ocorrer de algum frag-

Contudo, através de alguns critérios é possível estabelecer di-

mento de informações da estratégia sugerida pelo pla-

ferenças entre o variado porte das agências. Um dos autores que

nejador ser a idéia criativa da campanha. O erro fatal

apresenta padrões gerais que podem ajudar a distinguir agências

para qualquer planejador é querer receber crédito por

de pequeno, médio e grande porte é Sampaio (2003, p. 63). Na sua

essas idéias.

concepção as agências podem ser assim classificadas.

A segunda habilidade “é passar mais tempo ouvindo do

“A agência pequena normalmente tem uma Direção-

que falando: o planejador deve exercitar em ser um bom

Geral e quatro departamentos básicos: Atendimento/

ouvinte, pois segundo o autor a freqüência com que as

Planejamento, Criação/Produção, Mídia e Administra-

pessoas têm e expressam boas idéias sem nem se dar

ção/Finanças.

conta, pode ser usufruídas para o seu trabalho.”

A agência média normalmente tem os mesmos quatro

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 157


departamentos básicos sob a Direção-Geral, mas conta

Portanto, se tais empresas existem e conseguem sobreviver

com mais quatro subdepartamentos. Pesquisa (ligada

no mercado é porque, além de possuírem uma estrutura que

ao Atendimento/Planejamento), Estúdio e Produção (su-

torna possível a prática da boa publicidade, existem anunciantes

bordinados à Criação) e Tráfego (em linha com a Admi-

que fazem uso de seus serviços.

nistração).

Dessa forma, os clientes ou anunciantes têm importante

A agência grande, normalmente funciona com as quatro

participação na diversidade de agências de todos os portes.

grandes áreas básicas subordinadas à Presidência ou a

Uma vez que geralmente o nível do anunciante requer um nível

Gerência-Geral do escritório (quando existe mais de uma

similar de agência, conforme atesta Sampaio (2003).

unidade operacional) subdividido nos diversos departa-

“Não há dúvida que existe uma relação direta entre o

mentos das áreas básicas mais departamentos ou nú-

tamanho da conta e da agência. [...] Porque a própria

cleos de Relações Públicas, Promoção e Merchandising,

disponibilidade financeira (a agência costuma até ante-

Assessoria de Imprensa, etc”. (SAMPAIO, 2003, p. 63).

cipar pagamentos e assume a co-responsabilidade pelos gastos assumidos) tem influência sobre a operação”.

Baseado no ponto de vista desse autor percebe-se que,

(SAMPAIO, 2003, p. 122).

independente do tamanho da agência espera-se que ela comporte pelo menos algumas áreas consideradas como básicas.

Ademais, de acordo com Sampaio (2003) grandes contas exi-

São elas; atendimento, planejamento, criação, produção e mí-

gem uma maior qualificação da agência, com investimento em al-

dia, além de um departamento financeiro comum a qualquer

gumas áreas como pesquisa e produção que não são comumente

empresa. Já para Corrêa (2008) os setores imprescindíveis são

encontrados em agências menores. Por fim, esse autor (2003, p.

gerência, administração, finanças, atendimento, criação, mídia,

123) conclui que, “[...] o tamanho da verba do anunciante deve cor-

produção e tráfego. Embora sejam atividades similares, a defini-

responder ao tamanho da agência que o atende.”

ção de um padrão varia de autor pra autor.

Mantendo essa relação direta e proporcional entre o tama-

Entretanto, a estrutura exigida para abrigar esse grande núme-

nho de cliente e agência é compreensível que os mais diversos

ro de setores acaba por impossibilitar a existência de departamen-

portes de escritórios de comunicação existam devido à variação

tos específicos com tantas variedades de funções em agências

infindável de empresas. Nesse sentido Sampaio (2003) reco-

menores. Sant’anna, Rocha Júnior e Garcia (2011, p. 302) ponde-

menda aos anunciantes procurarem agências de porte similar.

ram, “Cada uma dessas funções, em teoria, é exercida por algum

Logo, é preciso a compreensão de alguns critérios para conse-

profissional. Em modelos extremamente enxutos de agências, às

guir distinguir e classificar, mesmo sem um padrão universal-

vezes, várias funções são exercidas por apenas um profissional.”

mente aceito, os múltiplos anunciantes.

Em geral, segundo Corrêa (2008, p. 16) “[...] em pequenas agências os donos costumam exercer mais de uma função.”

Para melhor entendimento desta relação Sampaio (2003) diferencia os anunciantes da seguinte forma.

Não obstante, agências que possuem um menor número de

“Quanto ao tamanho, há os pequenos, médios e gran-

profissionais são mais predispostas a acúmulo de funções em

des. Quanto à estrutura, há os simples e os sofisticados.

algumas situações para que o processo de comunicação exista

Quanto ao tipo, há os que usam propaganda “porque

de forma plena. E o fato de possuírem uma estrutura menos in-

sempre usamos”, os que utilizam “porque dá certo”, os

tegrada não desqualifica seu trabalho.

que a empregam para cumprir determinado objetivo e

“Não significa que as agências com estruturas menores

os que a colocam a serviço do conjunto de sua estraté-

e mais simples não têm condições de realizar trabalhos

gia empresarial”. (SAMPAIO, 2003, p. 51).

de bom nível profissional, uma vez que tanto os serviços de apoio como os opcionais podem ser adquiridos de outras empresas no mercado”. (CORREA, 2008, p. 16)

Sampaio (2003) explica que quanto ao tamanho é relativo ao volume de investimento empregado ou verba publicitária. Quan-

Além de empresas terceirizadas ou fornecedores que são

to à estrutura refere-se a quem é o responsável pela propaganda

utilizados de modo a completar os serviços de uma agência

na empresa. Estruturas básicas têm a aprovação e discussão

que não dispõe desses setores internamente, segundo Sampaio

vinculada apenas ao diretor ou presidente, que não é especí-

(2003) é comum em agências pequenas os contatos com free-

fico para a função. Já estruturas mais complexas possuem um

lancers, profissionais autônomos contratados para atuar em um

departamento de comunicação específico para cuidar dessa

projeto ou por tempo específico.

área na empresa. Com relação aos tipos, essa é relativa ao

158 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


grau de utilização de propaganda pelo cliente. Sendo assim,

planejadores tendem a ser os seus próprios donos,

existem os que fazem porque “sempre fizemos” que podem

porque são, antes de tudo, empreendedores. São pla-

estar colhendo bons resultados, mas não possui plena consci-

nejadores. Começaram fazendo isso com as próprias

ência de todo o potencial da propaganda. Os que fazem “por-

carreiras e podem perfeitamente fazer o meso para os

que dá certo”, que embora parecidos com o anterior possuam

seus clientes”. (ZAMBONI, 2009, p. 36)

mais conforto em relação aos resultados obtidos e potenciais. Os que fazem mediante um objetivo claro a se cumprir, como

Zamboni (2009) vai mais longe e mantém a posição não se

promover uma oferta, lançar um produto, diferenciar-se de seu

atendo apenas às agências de publicidade, “o planejamento

concorrente, entre outros. E por fim, aqueles que agregam às

está no DNA da empresa e, nas pequenas organizações, está

suas atividades empresariais, estruturas publicitárias fixas, que

no DNA do dono”. Portanto, para ele o planejamento é uma

podem ter diversos tamanhos, desde um profissional respon-

filosofia de trabalho, um processo que deve ser compartilhado

sável pela comunicação da empresa até complexos departa-

e não burocratizado. Sampaio (2003, p. 26) pondera que a “[...] propaganda

mentos de propaganda. Assim, com tanta variedade e tipos de anunciante e de

pode ser definida como a manipulação planejada da comuni-

agência, cabe à empresa escolher uma agência compatível

cação”; mas acredita não ser possível que a comunicação seja

com seu perfil. E isso “[...] não significa contratar a maior, a

desenvolvida sem algum tipo de planejamento. Logo, essa é

mais famosa, a mais criativa. Significa ter critérios para buscar

uma função vital na constituição de uma agência de propa-

a agência adequada” (SANT’ANNA, ROCHA JÚNIOR E GAR-

ganda. Se a função não existe especificamente, ela poderá ser

CIA, 2011, p. 327). Neste contexto, contas menores podem ser

desenvolvida por outro profissional. Assim sendo, deve existir

mais bem atendidas em agências de pequeno porte.

no ambiente de uma pequena agência as atribuições relativas ao planejamento de comunicação, bem como a preocupação

3 Planejamento em uma Agência de Pequeno Porte

da utilização assertiva da verba disponível para o bom resulta-

É possível encontrar agências de propaganda que não

do do cliente. Geralmente essa noção de planejamento exis-

dispõem de todos os profissionais basicamente exigidos, con-

te, mesmo que não concentrada sobre a responsabilidade de

forme descrito pela literatura, mas que mesmo assim podem

apenas um publicitário.

atender com qualidade a seus clientes. Nesse formato, como

Para exemplificar tal situação será apresentado um com-

apresentado por Sampaio (2003) é comum que alguns profis-

parativo entre duas agências de pequeno porte com modus

sionais acumulem funções dentro da agência. Essas múltiplas

operandi similar. Considerou-se agência de pequeno porte

atividades geralmente ocorrem em agências de pequeno por-

“[...] aquela que tem basicamente as três áreas essenciais do

te, por conta das características operacionais.

negócio; atendimento-planejamento, criação e mídia; com al-

Neste cenário pode ser comum que algumas áreas sejam mais dificilmente encontradas do que outras. Área específica,

guns profissionais, e mesmo um único, em cada área.” (SAMPAIO, 2003, p. 55).

como o planejamento, é um bom exemplo de departamento

As agências são a Fonte31 Comunicação e Design e a Fi-

pouco encontrado em agências pequenas. É o que afirma o

xar Propaganda, com sede em Belo Horizonte. Ambas conser-

presidente do Grupo de Planejamento de São Paulo, em entre-

vam semelhanças que as condicionam a um mesmo padrão

vista à Cenp em Revista.

mediante as características apontadas conforme demonstra 1

“[...] as pequenas e pequeníssimas agências têm di-

a seguir.

ficuldades naturais para contratar um planejador, pe-

Ambas as empresas apresentam um quadro de funcioná-

las suas estruturas compactas. Nestas, os melhores

rios enxutos e por isso acabam por desenvolver múltiplas fun-

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 159


ções. É o que acontece na Fonte31, conforme

Já a disposição de funcionários na agência Fixar Propagan-

Quadro 2:

da acontece conforme a seguir:

Ao analisar alguns aspectos das duas agências, destacam-

se como, por exemplo, o grau de importância dado a Direção

de Arte e ao Atendimento. Entende-se que são fundamentais

a campanha e provavelmente até criar as peças de comunicação

no processo e estão presentes nas duas agências. Entretanto,

será percorrido por pouquíssimos gaps, evitando o risco de ruído

é interessante observar que conforme cita Zamboni (2009), ge-

existente que ocorre na transmissão de dados de campanha.

ralmente são os donos da agência que desenvolvem o planeja-

Entretanto, a atribulações que envolvem áreas complexas

mento, isso porque, a própria experiência adquirida por ele no

como o planejamento, requerem tempo e esforço suficiente de

processo de criação da empresa já lhe confere “olhar as coisas

um profissional para este fim. Por isso, para que um publicitário

por ângulos diferentes” (ZAMBONI, 2009, P.37). No caso das

consiga conciliar outras áreas com o planejamento de campa-

agências citadas, ambos os donos estão a mais de 10 anos

nhas é necessário grande dedicação, que em muitas vezes im-

dedicados a boa prática da publicidade.

pede que ele mantenha uma carga horária de trabalho normal.

Aponta-se que o planejamento é desenvolvido nessas

É o que acontece nas duas agências pesquisadas. Embora os

agências de modo instintivo, talvez até empírico, com base em

demais funcionários variem entre seis a oito horas diárias de

experiências pregressas e provavelmente no nível de repertório

trabalho, os proprietários, que somam ao planejamento outras

dos profissionais envolvidos. Contudo, como não existe um de-

funções da agência, entre elas as administrativas e financeiras,

partamento burocratizado para a prática do planejamento, am-

dedicam mais de 10 horas às múltiplas atividades.

bas as agências utilizam da convergência de opiniões de toda a

Portanto, ao analisar estas agências pode ser que se

equipe (já que são muito pequenas) sobre o cliente e sua marca.

encontrem outras que trabalhem da mesma forma, onde o

Busca-se com esse procedimento, um fazer pensar com trocas

planejamento seja uma tarefa multidisciplinar, logo comparti-

para chegar a melhor e mais provável estratégia de retorno do

lhado com todos. Observa-se que algumas situações devem

anunciante. Acredita-se que é uma maneira de todos os inte-

ser favorecidas e outras abdicadas para que a agência, como

grantes da agência estarem envolvidos no projeto e poderem

prestadora de serviço que é, possa oferecer ao seu cliente

participar da discussão das alternativas de comunicação, cada

uma comunicação eficiente, embasada em estudos de pes-

um com o repertório pertinente a sua área de atuação. Dessa

quisa, melhor distribuição da verba publicitária e um atendi-

forma trabalha-se com diferentes perspectivas que se espera

mento qualificado. Assim sendo, o modo de se planejar uma

convergir em uma única plataforma, a comunicação 360º.

campanha em uma agência pequena não pode ser desmere-

Outro fator favorável relatado pelas agências estudadas sobre

cido em comparação com agências de grande e médio porte.

o planner habituado a outras funções, diz respeito à diminuição do fluxo de “transportadores” de mensagens. Isso porque, por se tra-

CONSIDERAÇÕES FINAIS

tar de um profissional que desempenha mais de uma função, dimi-

É possível perceber com este estudo que não existe um mo-

nui-se o número de intermediários que a informação deve percorrer

delo ideal de agência de propaganda, a partir do seu porte, da

ao sair do anunciante até chegar ao produto final a ser entregue. O

estrutura física, do número de funcionários e etc. O que existe é

canal entre quem vai atender o cliente, redigir o briefing, planejar

uma pluralidade dos mais variados tipos de escritórios de co-

160 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


municação. Dessa forma, não se deve falar sobre a melhor ou a pior, mas sim diferentes agências que se adaptam e prestam serviços de melhor suporte para diferentes clientes. A mesma diversidade que existe em relação às agências, existe também relativa aos anunciantes. Por isso, é função das empresas dispostas a anunciar buscar uma agência que seja compatível com seus interesses e com sua estrutura. Se não há um padrão ideal de agência, não é possível também definir um padrão exato de profissionais para que cada escritório consiga realizar de forma satisfatória os objetivos de comunicação do cliente. Por conseguinte, o planejamento, eixo

de.pt/2007/09/14/a-vida-de-um-planner/.>. Acesso em: 21 de outubro 2011. MIRANDA, Adriana. Disponível em: <http://www.minasmarca.com/aevolucao-da-funcao-do-profissional-de-planejamento-nas-agencias-de-comunicacao>. Acesso em: 21 de outubro 2011. SAMPAIO, Rafael. Propaganda de A a Z. Como Usar a propaganda para construir marcas e empresas de sucesso. 2 ed. Rio de Janeiro: Campus, 1999. 384 p. SANT’ANNA, Armando. Propaganda. Teoria. Técnica. Prática. 7 ed. São Paulo: Pioneira Thomson, 2002. 469 p.

temático desse estudo, não depende fundamentalmente de apenas um profissional com essa formação. Foi possível perceber quão importante é a área de planejamento dentro do contexto publicitário, a importância da “atitude planejamento” dentro de qualquer agência que, às vezes, pode suplantar a figura do profissional. Ou seja, mais do que ter as

SANT’ANNA, Armando; ROCHA JÚNIOR, Ismael; GARCIA, Luiz Fernando Dabul. Propaganda: teoria, técnica e prática. 8.ed. rev. e ampl. São Paulo: Pioneira, 2011. xviii, 437 p.

STEEL, Jon. A arte do planejamento: verdades, mentiras e propaganda. Rio de Janeiro: Campus, Elsevier, 2006. 275p.

funções de planner , fica evidenciada a necessidade vital de planejar a comunicação integrada, de sua concepção até a execução. Portanto, é preciso que as agências, independente do seu tamanho, experiencie essa função em qualquer projeto para que possa buscar uma comunicação mais assertiva. É importante lembrar que as duas agências trabalham o planejamento no âmago de todos os seus projetos, considerando

ZAMBONI, Ulisses. Planejamento da comunicação não é privilégio de grande agência. Cenp em Revista – Ano 5 – Nº 19 – junho 2009 – 34 -39

NOTAS DE RODAPÉ 1 Artigo produzido como trabalho da Disciplina Planejamento e Estratégia de Campanha, do curso de Publicidade e Propaganda, do Centro Universitário Newton Paiva, no 2º semestre de 2011

suas características em relação à estrutura profissional. Logo, ambas parecem estar conscientes das necessidades e desafios

2 Aluno do sétimo período do curso de Publicidade e Propagan-

que uma agência pequena deve superar para atender bem aos

da – e-mail: asleysiq_7@hotmail.com

seus consumidores e continuar viva nesse concorrido mercado. 3 Aluna do sétimo período do curso de Publicidade e PropaganREFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

da – e-mail: carlacosta.cria@hotmail.com

AMARAL, Ricardo Gomes do Filho. O papel do Planejamento de Comunicação e o contexto brasileiro. 2004 – EAESP/FG CORRÊA, Roberto.Planejamento de propaganda. 10.ed. rev. e ampl. São Paulo: Global, 2008. 281p.

4 Aluno do sétimo período do curso de Publicidade e Propaganda – e-mail: patricksimon12@gmail.com

DUARTE, Márcia Yukiko Matsuuchi. Estudo de caso. In: DUARTE, Jorge; BARROS (Org.) Métodos e técnicas de pesquisa em comunicação. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2009. Cap 14 p.215-235 LAM, Camila. EXAME - Agências de publicidade buscam profissionais de planejamento. 2011. Disponível em: <http://exame.abril. com.br/carreira/galerias/profissoes-em-alta/agencias-de-publicidadebuscam-profissionais-de-planejamento>. Acesso em: 21 de outubro 2011. LUPETTI, Marcélia. Administração em publicidade. A verdadeira alma do negócio. São Paulo: Thomson, 2003. 218p. MEIO E PUBLICIDADE. Disponível em: http://www.meiosepublicidaPÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 161


GOOGLE HACKING Alex Sander de Oliveira Toledo1 Dayene Ângela de Almeida2

RESUMO: O presente trabalho apresenta os recursos que o Google oferece no que diz respeito à coleta de informações. Estes recursos servirão de referência aos usuários web quanto à segurança, na espera de bloquear formas de vazamento de informações. PALAVRAS-CHAVE: Informações, Segurança, Google Hacking.

1 Introdução

rosa ferramenta para busca de informações de todos os tipos.

Existem ferramentas que são de grande valor e na maioria

O uso malicioso pode ser feito através de uma pirataria

das vezes não damos tanta importância pela sua aparência,

informatizada, Google Hacking, que utiliza o Google para en-

normalmente por apresentarem ser o que qualificamos como

contrar falhas de segurança em configurações, sites e códi-

simples. E por muitas das vezes o “simples” aspecto na internet

gos de computador.

pode ser um grande problema de segurança.

A arte do Google Hacking utiliza o Google para localizar

A segurança na internet é um tema critico nos dias atu-

informações confidenciais ou para encontrar vulnerabilidade

ais. A cada dia surgem diversas formas de testes para evitar

que podem ser exploradas, podendo ser uma grande ameaça.

invasões e ataques às informações das organizações e em

Segundo Pinheiro (2010), o que explica essas ameaças é a uti-

sistemas pessoais o que ajuda evitar os prejuízos financeiros,

lização do agente de busca para catalogar paginas, ao mesmo

perdas de informações confidenciais ou importantes. Por isso

tempo em que aumenta de forma considerável o numero de

a segurança da informação protege e mantem as informações

respostas da ferramenta, traz o problema de muitas vezes ca-

sigilosas. (PELTIER, 2001).

talogar mais do que os administradores de paginas gostariam,

A internet pode esconder intenções maliciosas e deixar enganar pela inocência visual. Isto sugere que qualquer coisa que

porque os muitos servidores estão conectados a Internet. 2 Falhas Reconhecidas

não está visível não pode trazer insegurança, como é o caso

O motor de busca Google, é fácil de usar (figura 1), encon-

da visão da maioria dos usuários quanto ao serviço de busca:

trado em www.google.com,oferece benefícios óbvios para

Google. Segundo Felipini (2008), o Google é um dos servi-

qualquer tipo de internauta: leigos ou maliciosos. E para uso

ços de busca mais utilizado na internet, parecendo ser inofen-

malicioso usa- se a técnica de Google Hacking.

sivo. Por de traz da aparência simples ele esconde uma pode-

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A barra (campo) de pesquisa permite ao usuário digitar um

filetype:txt coração. Os tipos de arquivos mais comuns são:

termo de pesquisa ou uma palavra como, por exemplo, “jornal”

Adobe Flash (.swf);

e teremos muitas opções disponíveis. Porem o Google não ofe-

Adobe Portable Document Format (.pdf);

rece apenas esse campo, há vários campos como, por exemplo,

Adobe PostScript (.ps);

“Ferramentas de Idiomas” que permite ao usuário definir opções

Autodesk Design Web Format (.dwf);

diferentes de idiomas e outros campos que podem ser de gran-

Google Earth (.kml, .kmz);

de ajuda.

GPS eXchange Format (.gpx);

O Google usa operadores booleanos para restringir suas

Hancom Hanword (.hwp);

pesquisas. Segundo Aamato (2005) os operadores booleanos

HTML (.htm, .html, other file extensions);

são palavras que informam ao sistema como combinar os ter-

Microsoft Excel (.xls, .xlsx);

mos de sua pesquisa. São eles: AND, OR, NOT, respectivamen-

Microsoft PowerPoint (.ppt, .pptx);

te, E, Ou e NÃO. Ao fornecermos uma lista de termos de busca,

Microsoft Word (.doc, .docx);

o Google automaticamente tenta encontrar todas as palavras

OpenOffice presentation (.odp);

em uma lista, tornando o operador booleano AND redundante.

OpenOffice spreadsheet (.ods);

O Google é fácil de ser usado, não há necessidade de des-

OpenOffice text (.odt);

crever a sua funcionalidade básica. Em vez disso, vamos co-

Rich Text Format (.rtf, .wri);

nhecer os operadores disponíveis:

Scalable Vector Graphics (.svg);

a)O sinal de mais (+) é usado com uma maneira de substituir um valor booleano AND. Mas o Google usa o sinal de mais

Text (.txt, .text, other file extensions), incluindo o código fonte em linguagem de programação comum:

(+) de uma forma diferente. Usa para forçar uma busca por uma

Basic source code (.bas);

palavra muito comum.

C/C++ source code (.c, .cc, .cpp, .cxx, .h, .hpp);

b)O sinal de menos (-) para excluir um termo de uma bus-

C# source code (.cs);

ca. Lembrando que não pode haver espaço de um sinal com a

Java source code (.java);

busca, porque pode produzir resultados diferentes.

Perl source code (.pl);

c)As aspas duplas (“ “), ou busca mista pode envolver am-

Python source code (.py);

bas as frases e termos individuais. Exemplos: “Microsoft Office”,

Wireless Markup Language (.wml, .wap);

o que resultara apenas o que inclui a frase.

XML (.xml);

d)Um ponto (.) serve como um único caractere. e)Um asterisco (*), ou curinga, diz ao Google para tentar

c)Link: o Google pesquisa dentro de um hyperlink para uma busca. Exemplo: link: www.apple.com/iphone.

tratar o (*) como um espaço reservado para qualquer termo des-

d)Cache: exibe a versão de uma pagina web quando o

conhecido e depois encontrar os melhores resultados. O Google

Google busca no site. A URL do site deve ser fornecida após

permite o uso de operadores para ajudar a filtrar as pesquisas e

os dois pontos. Exemplo: cache:www.newtonpaiva.br. Este é o

o uso avançado do mesmo é muito simples.

cache do Google de http://www.newtonpaiva.br/.

f)Operador: SEARCH_TERM. Palavra chave. Alguns operadores podem ser usados como uma consulta independente. Dessa forma, muitas informações “apuradas” podem ser encontradas, basta saber o que procurar. O ainda ar-

e)Intitle: para pesquisar um termo no titulo de um documento. Exemplo: intitle:index.of. mp3 Fernando e Sorocaba. f)Inurl: para pesquisar somente dentro da URL (endereço web) de um documento. Exemplo: inurl:musica.

mazena no “cache” uma versão de paginas e arquivos, de modo que mesmo corrigindo o problema no servidor, os dados podem

3 Como Realizar

ainda estar expostos. Alguns tipos de ataques que podem ser

Como foi mostrado no tópico anterior existem operadores

feitos através do Google:

simples que ajudam a revirar ou incrementar a busca. É essa

a)Site: encontra as paginas da Web em um site ou domínio especifico. Exemplo: site: sistemas de informação newtonpaiva. br. O resultado mostra sobre o curso de Sistemas de Informação no site da Newton Paiva.

simplicidade, junto ao poder dos resultados, que transformam o Google em uma ideia tão sensacional. O hacking utiliza a Barra de Ferramenta do Google ou Google Toolbar que é instalado no browser por meio de um executável, a

b)Filetype: operador instrui o Google a pesquisar somente

descobrir informações, descobrir sobre o assunto ou identidades

dentro do texto de um determinado tipo de arquivo. Exemplo:

de pessoas e quebra barreiras de segurança usando uma pesqui-

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 163


sa no Google inocente e sem malicia, como dissimulação.

paginas Web da Microsoft, empresas sem administradores de

O Google é apenas um instrumento utilizado para explorar

segurança ou pequenas lojas online também podem causar sua

falhas do sistema operacional, do planejamento de TI ou do

própria falência, com um auxilio mínimo dos Hackings utilizado-

próprio administrador de sistemas, então o que mostra que ele

res do Google.

não tem responsabilidade direta sobre a vulnerabilidade. Com

Um hacker procura uma informação pelo termo:

ajuda do FrontPage, o software de manufatura e editoração de

Inurl:”ordes.txt”

O resultado é brilhante (figura 2), são arquivos de mais de

senhas de validação de compras.

2MB, reproduzindo bancos de dados com inúmeras informa-

Já usando:

ções como numero de cartão de credito, endereço, telefone e

inurl:”auth_user_file.txt”

164 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


Com esse comando, é fácil encontrar arquivos (figura 3) contendo listas de usuários, senhas e diretórios de login.

Equivale a entrar no mundo dos servidores desprotegi-

A combinação: Index of /admin

dos (figura 4).

dos e colocados no ar em um dia por equipes apresentadas.

A expressão:

E uma busca rápida retorna nada mais do que 3600 resulta-

inurl:”form_results.txt”

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 165


Encontramos vários sites expostos (figura 5). Alguns mostram nomes, números de telefone e endereço de email dos seus visitantes. Tudo o que vimos mostra o grande poder do Google e como é fácil descobrir dados e informações. Para ficar ainda

ferência de Arquivos) totalmente aberto e cheio de informações. Como já foi dito não podemos esquecer que a culpa dessas vulnerabilidades não são do Google. Ele é apenas um instrumento utilizado para explorar falhas do sistema operacional, do planejamento de TI ou próprio administrador de sistemas.

mais claro o uso dessas operações através do Google veja o

Então pra proteger as informações temos que manter os

exemplo: imagine que um hacker invada um site que possua

dados fora da Web. Mesmo inserindo dados temporários, exis-

uma media quantidade de visitantes, consegue invadir uma con-

tem grandes chances de esquecê-los ou que um Web Crawler,

ta de administrador. Com a senha de administrador qualquer um

que é usado para manter uma base de dados atualizados, pode

pode fazer um upload de arquivos executáveis, escondendo-os

encontrá-los.

as arvores e diretórios, sem definir links definidos. E se o ver-

O melhor é usar formas mais seguras de compartilhamento

dadeiro administrador não tiver o costume de olhar sua pagina

de dados sensíveis como, por exemplo, SSH / SCP4, os dados são

não notará a inclusão de links com códigos maliciosos. Ainda

cifrados durante a transferência, protege o usuário de invasões na

há muitas vulnerabilidades que podem e são explorados. Basta

rede evitando roubos de pacotes, senhas e dados diversos.

ter um hacker, um usuário ou servidor, e um browser rodando no Google. Segundo SOUSA e ROCHA (2010) algumas grandes em-

Usar as técnicas descritas nos tópicos acima pode ajudar a verificar o seu próprio site para informações sensíveis, dados ou arquivos vulneráveis.

presas de tecnologia como o Google, por exemplo, investem no

Pode-se usar o Firewall como um sistema de controle aos

desenvolvimento dos seus próprios SGBDs baseado na ideia

acessos às redes de computadores que tem como objetivo per-

NoSQL3 que ativa o processo de distribuição de arquivos ou

mitir que somente pessoas autorizadas conectem a uma rede

bancos de dados usando funções de mapeamento e redução.

local ou privada de uma instituição, tornando uma excelente fer-

E o Google desde 2004 investe, no Big Table, um banco de da-

ramenta de controle e uso da rede e da Internet, independendo

dos proprietário, desenvolvido para suprir as necessidades de

do tipo de computador, seja doméstico e ou de servidor.

armazenamento, totalmente baseado na filosofia de alto desempenho, escalabilidade e disponibilidade.

Segundo Alecrim (2004) um Firewall pode ser definido como uma barreira de proteção, que controla o tráfego de dados entre

Portanto não podemos esquecer que nada que estiver on-

seu computador e a Internet (ou entre a rede onde seu computa-

line, mesmo que esteja escondido em varias camadas de sub-

dor está instalado e a Internet). Automaticamente o usuário terá

diretórios, passa despercebido pelo Google. Segundo Gomes

como realizar transmissão e ou recebimento de dados autoriza-

(2009) mesmo bancos ocultos por trás de proxy ou firewalls mal

dos e o funcionamento terá variação de acordo com o sistema e

configurados podem ser encontrados, já que permitem que uma

ou de como foi elaborado o programa. E uma rede com informa-

base de dados receba tentativas de requisição de todas as par-

ções criptografadas em casos de transações de dados importan-

tes, sem restrição de IP, equivale a tornar o servidor de domínio

tes podem também ajudar a proteger de ataques inesperados.

publico. Ao haver duvida com relação à localização do endere-

Fazer backup é importante para a segurança da informa-

ço, basta o hacker utilizar ferramentas simples como o “tracert”,

ção. E pode ate mesmo fazer uma copia off-line dos dados mais

uma ferramenta de redes do Windows que funciona em linha de

importantes. Mas não adianta retornar com uma copia do ba-

comando, semelhante do “traceroute” do UNIX.

ckup se a vulnerabilidade explorada na invasão não for sanada. Tem também o Google webmaster que é uma ferramenta

4 Como Prevenir

desenvolvida pelo Google que proporciona aos usuários a ob-

O sistema de busca do Google funciona bem demais, tudo

tenção de dados sobre rastreamento, indexação e tráfego de

que estiver on-line, mesmo que esteja escondido em varias cama-

pesquisa e receber notificações sobre problemas no seu site.

das de subdiretórios, não passa despercebido pelo Google. Os

Todo o processo é simples e pode ser realizado através dos

hackers que se utilizam do Google ou de outros mecanismos de

passos descritos na página: http://www.google.com/support/

busca à procura de informações pessoais estão em busca de do-

webmasters/bin/answer.py?answer=164734.Como

cumentos do Word, bancos de dados, todas essas modalidades

pessoas capazes de explorar falhas na segurança das informa-

de arquivos possuem algum tipo de informação relevante para en-

ções, a melhor prevenção contra vazamento é evitar vulnerabili-

contrar, por exemplo, planilhas de Excel, associando-as aos ter-

dade, por isso o webmaster é uma ferramenta importante.

mos cartão, crédito e despesas ou um FTP (Protocolo de Trans-

existem

Portanto prevenir as informações contra problemas nada

166 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


mais é que agir contra agentes capazes de explorar falhas de segurança, evitando a vulnerabilidade das informações e dados. 5 Conclusão A internet por si é uma ferramenta valiosa que nos ajuda a interagir com diversos ambientes, e o Google é um serviço on-line e software que hospeda e desenvolve uma series de serviços e produtos baseados na internet. O Google pode ser usado por usuários maliciosos a fim de atacar suas informações e pode ser utilizado para proteger as mesmas através de medidas simples de segurança e constante vigilância. A utilização de operadores para catalogar páginas ao mesmo tempo em que aumenta, de forma ainda mais ampla, o numero de respostas do Google surpreende muitos administradores por perceberem que seus dados e informações não foram configurados de forma segura. E o Google Hacking encontra arquivos sigilosos ao fazer a busca através de operadores, expondo servidores na base de dados do Google na primeira

google-como-ferramenta-hacker-%96-parte-1-google-hacking.html> . Acesso: 16 set 2011. LONG, Johnny. Google Hacking. Mini Guide. Disponível em: < http:// www.informit.com/articles/article.aspx?p=170880 >.Acesso 19 set 2011. MUTHU, Sudar. Operadores Avançados Google. Como utilizar o Google com eficiência. Disponível em: < http://hackerproject.webnode.com. br/tutoriais/operadores%20avan%C3%A7ados%20google/ >. Acesso: 16 set 2011 Portal 5S Tecnologia. Gerenciamento estratégico de segurança da informação. Disponível em: < http://www.ietec.com.br/site/techoje/categoria/detalhe_artigo/261 >. Acesso em: 15 set 2011. RAMOS, Robson. O que é Google Hacking? O que o Google faz e você não sabe!. Disponível em: <http://brainstormdeti.wordpress. com/2010/08/31/o-que-e-google-hacking-o-que-o-google-faz-e-vocenao-sabe/> . Acesso em: 16 set 2011.

NOTAS DE RODEPÉ 1 Coordenador e Professor do Curso de Bacharelado em Sistemas de Informação do Centro Universitário Newton Paiva

oportunidade, já que não são capazes de diferenciar o que é publico do que é privado/confidencial. Portanto o Google é indispensável quando se trata de buscas na web. E pode se concluir que Google Hacking ensina a descobrir, de forma discreta, segredos sobre a vulnerabilidade dos sites, como acessar bancos de dados, rastreamento de servidores, acessos a senhas secretas, etc., mas também nos ensina como se defender dos ataques digitais e evitá-los, ao

2 Graduanda em Bacharelado em Sistemas de Informação do Centro Universitário Newton Paiva 3 NoSQL (Not only SQL) surgiram da necessidade de escalar bancos de dados para o resolver os problemas das aplicações web que operam em larga escala. 4 Secure Shell (SSh) é um protocolo de rede. Secure Copy (SCP) transfere arquivos entre hosts locais ou remotos.

revelar as técnicas de ataques na rede. E mesmo você não sendo um hacker há certas vantagens em conhecer a existência de hacking no Google porque, por exemplo, você pode descobrir informações confidenciais sobre você ou sua empresa e com isso pode ainda se proteger de eventuais vulnerabilidades, o que ajuda na proteção contra as ameaças de hacks do Google. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AAMATO, Asclepios. Operadores lógicos booleanos. “AND”, ”OR” e ”NOt”. Disponível em:< http://www.asclepios.com.br/medico/content/ operadores-l%C3%B3gicos-booleanos-%E2%80%9Cand%E2%80%9D%E2%80%9Cor%E2%80%9D-e-%E2%80%9Cnot%E2%80%9D >. Acesso: 22 set 2011. ALECRIM, Emerson. Firewall: Conceito e Tipos. Disponível: <http:// www.inforwester.com/firewall.php> . Acesso: 03 Nov 2011. Felipini, Dailton. Top 10. Como alcançar o topo nos sites de busca. Disponível em: < http://www.e-commerce.org.br/sites_de_busca.php >. Acesso em: 15 set 2011. GRIS, Grupo de resposta a incidentes de segurança. Usando o Google como ferramenta hacker. Google Hacking. Disponível em: <http:// www.backtrack-linux.org/forums/tutoriais-e-howtos/26974-usando-oPÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 167


METASPLOIT: um cenário de intrusão Alex Sander de Oliveira Toledo1 Vinícius Augusto Celestino Souza2

RESUMO: Este trabalho apresenta uma análise dos principais aspectos relacionados à segurança da informação no que diz respeito à intrusão ou mecanismos para teste de penetração em um ambiente computadorizado, evidenciando as maneiras de como ocorre uma invasão via rede de computadores através do framework Metasploit. PALAVRAS-CHAVE: Segurança da Informação. Metasploit. Segurança. Redes de Computadores.

1INTRODUÇÃO

2 VISÃO GERAL DE SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO

A segurança da informação tornou-se uma área impres-

A tecnologia da informação cresce exponencialmente a

cindível dentro de todas as organizações, uma vez que a in-

cada ano, milhares de versões de software são lançadas cons-

formação é um dos bens de maior valor para uma empresa. A

tantemente, processadores, HD’s, memórias estão cada vez

segurança da informação, apesar de aparentar ser de respon-

mais potentes, com isso o poder de processamento de uma

sabilidade exclusiva do setor de tecnologia, é possível observar

máquina pode chegar a limites até então não imagináveis.

que ela é também, de responsabilidade de cada pessoa que faz parte de uma organização.

Logo os riscos envolvendo o sigilo e segurança da informação começa também a tomar outro curso. Quando mencionamos

Logo, para que isso ocorra é necessário que as normas pre-

o que é segurança da informação, logo pensamos em aspectos

sentes na política de segurança, sejam objetivas e claras, e que

somente de tecnologia, como hardware ou software, porém é im-

estejam difundidas dentro da cultura organizacional. Segundo Ca-

portante lembrar que o capital humano, ou seja, as pessoas tam-

ruso (1999, p.49) “a política de segurança é um contínuo proces-

bém têm uma parcela de responsabilidade na segurança dos ati-

so de revisão, que é válida para toda organização, implantadas

vos da informação em uma empresa, organização ou instituição.

como regras claras e objetivas e sustentada pela alta hierarquia”.

Uma das maneiras de se proteger os ativos organizacionais

E mesmo assim vemos que às vezes os profissionais ainda são

é definir e implantar logo de início uma boa política de segurança .

negligentes quando se fala em segurança da informação. Uma das ameaças que podem colocar em risco a seguran-

Segundo Caruso e Steffen (1999, p.102) política de segurança é:

ça da informação em uma organização é a intrusão. A intrusão é

“Um conjunto de diretrizes gerais destinadas a gover-

uma maneira que máquinas ou pessoas utilizam para invadir um

nar a proteção a ser dada a ativos da companhia. As

sistema ou uma rede de computadores para se apoderarem de

consequências de uma política de segurança imple-

informações de empresas, organizações e instituições. Logo, os

mentada corretamente podem ser resumidas em três

testes de intrusão são maneiras de se verificar previamente possí-

aspectos: Redução da probabilidade de ocorrência;

veis falhas em um sistema, a fim de que, depois de identificadas,

Redução dos danos provocados por eventuais ocor-

sejam corrigidas e monitoradas para que se possa manter a inte-

rências; criação de procedimentos para se recuperar

gridade, confiabilidade e disponibilidade do sistema.

de eventuais danos.”

Ao se realizar este tipo de teste, pretende-se verificar o quanto vulnerável está o sistema e assim adotar, de maneira efetiva, políticas para defesa contra invasores ou ameaças potenciais. Este artigo apresenta uma prática de utilização da ferramenta Metasploit como um modelo de intrusão e verificação de

3 VISÃO GERAL DO FRAMEWORK METASPLOIT O framework Metasploit é uma ferramenta que auxiliam profissionais e empresas na realização de teste de penetração em sistemas e redes.

falhas dentro de um sistema de informação, expondo suas ca-

O Metasploit é também um sistema open source desenvol-

racterísticas e aplicação na administração da segurança com-

vido e mantido pela empresa Rapid7 e outros desenvolvedores

putacional e na criação de teste de vulnerabilidade.

autônomos, que utiliza seu próprio banco de dados com deze-

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nas de possibilidades de testes de sistemas.

contras os ativos de TI e expõe as ameaças na segurança de

Conforme o site metasploit.com3, a ferramenta é líder em testes de penetração, e que, além disso, fornece informações sobre vulnerabilidade de segurança em várias plataformas, sistemas operacionais, servidores e assim contribuir para que os

dados ou infraestrutura; Administrador de TI e segurança de rede – Realiza teste de invasão dentro de sua própria rede; Engenharia de qualidade – Identifica vulnerabilidades em

desenvolvedores escrevam seus códigos com mais segurança.

sua aplicação, especialmente em recursos de terceiros;

3.1HISTÓRIA DO FRAMEWORK METASPLOIT

assim contribuir para segurança tanto no sistema de detecção

IDS/IPS – Ajuda a entender como funciona o Metasploit e Em um projeto que teve início em 2003, HD Moore4 que-

de intrusão (IDS) quanto sistema de prevenção de intrusão (IPS).

ria trazer para a comunidade open source uma ferramenta que fosse útil para realização de teste de segurança. A primeira ver-

4 CENÁRIO DE INTRUSÃO

são foi escrita na linguagem Perl Scripting e teve participação de

Para demonstrar um teste de vulnerabilidade de um siste-

mais dois desenvolvedores.

ma, foram utilizadas duas máquinas virtuais pertencentes a uma

Como a linguagem de programação possuía algumas limi-

mesma faixa de IP. A máquina utilizada para mostrar as vulnera-

tações, em 2005 foi dado o início de migração para a linguagem

bilidades é a Back Track (Sistema Operacional Linux), máquina

de programação Ruby, que é utilizada até hoje.

essa contendo o framework Metasploit, que é o responsável por

E foi então, que em 2009, a Rapid7, empresa de gestão de

viabilizar a demonstração de testes de penetração ou pen-test.

soluções em vulnerabilidade, adquiriu o framework Metasploit. E

De outro lado uma máquina também Linux chamada Metasploi-

que, conforme o site metasploit.com, a empresa hoje mantém a

table, que é uma máquina com algumas vulnerabilidades de

ferramenta em processo de desenvolvimento, principalmente para

portas e serviços já configurados, para permitir a realizações e

soluções comerciais e para profissionais de segurança em TI.

simulações de teste.

3.2 APLICAÇÕES DO FRAMEWORK METASPLOIT

4.1RELATOS DOS TESTES DE INTRUSÃO

O framework Metasploit possui diversas aplicações que são

Para visualizar algumas vulnerabilidades do sistema, foi utili-

úteis para tanto para empresas como para consultores ou CISO

zado um escaneamento através opção Quick Scan (OS detect).

(Chief Information Security Officer). Conforme o site metasploit.

Esta opção identifica o sistema operacional e suas possíveis vul-

com o Metasploit permite a verificação dos seguintes assuntos:

nerabilidades (figura 1).

Verificador de Penetração – Realiza testes de penetração

Neste caso, será utilizado um IP já conhecido para efetuar-

mos o teste (figura 2).

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 169


Após o escaneamento o Framework Metasploit será utiliza-

na máquina (figura 3). Note também que o próprio Framework

do para identificar qual o sistema está sendo utilizado na máqui-

mostra uma mensagem sugerindo os Exploits ou pontos que

na explorada, bem como todos os serviços que estão instalados

podem ser explorados naquele sistema (figura 4).

O próximo passo, utilizando o framework, através da varredu-

aberta- uma sessão direta com alguma porta (figura 5).

ra por portas, será feita uma penetração no sistema operacional e

O framework agora descobre uma vulnerabilidade através de um serviço disponível na máquina, que está sendo testada e

em seguida abrirá uma sessão com ela, através de um WebApp (figura 6).

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Então agora possuímos acesso direto a máquina e podemos acessar de qualquer lugar e explorar os seus recursos. CONCLUSÃO Os testes de penetração têm por finalidade verificar de maneira efetiva e preventiva as principais ameaças e pontos fracos de um sistema antes de ser implantado. Desta maneira, pretende-se minimizar os riscos e ameaças que o sistema pode sofrer. Ao tratarmos a informação como um bem de alto valor para a organização, é de grande importância que todo o ambiente computacional esteja seguro e que os pontos vulneráveis estejam identificados e tratados. O framework Metasploit visa melhorar e ajudar a manter a qualidade também na fabricação de software, permitindo que os sistemas possam ser testados e homologados antes de ir para o ambiente de produção. Por fim, ao ter esses cuidados, poderemos garantir maior disponibilidade do sistema, integridade das informações e confiança dos usuários. Além disso, ao expormos as vulnerabilidades de um sistema, estaremos defendendo todo o ambiente de produção, agregando confiabilidade ao produto e tomando medidas corretivas com antecedências. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CARUSO, Carlos A. A., STEFFEN, Flavio Deny. Segurança em Informática e de Informações. São Paulo. Senac/SP, 1999. METASPLOIT: consultas e serviços. 2011. Disponível em: <http://www. mestasploit.com>. Acesso em: 29 set. 2011 PEIXOTO, Mário C. P. Engenharia Social e Segurança da Informação na Gestão Corporativa. Rio de Janeiro: Brasport, 2006. SILVA, Pedro Tavares; CARVALHO, Hugo; TORRES, Catarina Botelho. Segurança dos Sistemas de Informação: Gestão Estratégica da Segurança Empresarial. Portugal. Centro Atlântico, 2003.

NOTAS DE RODAPÉ 1 Coordenador e Professor do Curso de Bacharelado em Sistemas de Informação do Centro Universitário Newton Paiva 2 Graduando em Bacharelado em Sistemas de Informação do Centro Universitário Newton Paiva 3 http://www.metasploit.com 4 O projeto de HD Moore (chefe de arquitetura e segurança da Rapid7) consistia em trazer para o campo computacional uma ferramenta eficaz para auxiliar os desenvolvedores e chefes de segurança efetuarem teste em seus software de maneira rápidas e com boas práticas. PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 171


PERÍCIA FORENSE COMPUTACIONAL: Análise de Malware em Forense computacional utilizando de sistema operacional GNU/Linux Alex Sander de Oliveira Toledo1 Robert de Souza2

RESUMO: O presente trabalho apresenta as boas práticas na coleta, restauração, identificação, preservação, documentação, análise dos dados periciais, apresentação de vestígios, evidências, provas digitais e interpretação aplicadas aos componentes físicos ou dados processados e/ou armazenados nas mídias computacionais, garantindo assim o valor jurídico das provas eletrônicas. PALAVRAS-CHAVE: Perícia forense computacional, Malware, Linux.

1 INTRODUÇÃO

“[...] Não há padrões internacionais para o tratamen-

Segundo Melo (2009), a informação é hoje um dos ativos

to de dados periciais, embora existam documentos

mais importantes das corporações, sendo de suma importân-

de boas práticas dedicados a classificar respostas a

cia que sua integridade seja mantida. Em um passado não

incidentes de segurança e um capítulo da ISO NBR

muito distante um servidor mal configurado representava ris-

IEC17799:2005 que endereça o assunto [ABNT].”

cos, mas estes eram confinados dentro dos limites da LAN da corporação.

É importante empregar boas práticas na coleta, restaura-

Com o advento da Internet estas fronteiras foram elimina-

ção, identificação, preservação, documentação, análise dos

das, facilitando muito a ocorrência de crimes eletrônicos, onde

dados periciais, apresentação de vestígios, evidências, provas

o criminoso e a vítima podem encontrar-se em localidades ge-

digitais e interpretação aplicadas aos componentes físicos ou

ográficas diferentes, até mesmo em países distintos. O cres-

dados processados e/ou armazenados nas mídias computa-

cimento do número de computadores interconectados (Inter-

cionais, garantindo assim o valor jurídico das provas eletrônicas

net) e o aumento de softwares com finalidades ilícitas de fácil

captadas no processo de perícia forense computacional.

utilização disponíveis na rede aumentaram significativamente o número de ataques.

Segundo Melo (2009), as principais fontes de dados periciais encontram-se nas estações de trabalho em ambiente

Ainda Segundo Melo (2009), por mais seguro que seja um

computacional distribuído, servidores, locais na internet, em lo-

Firewall ou um sistema de segurança, os sistemas operacionais

cal remoto na Internet, sistemas de informação, e equipamen-

estão sempre sujeitos a falhas ainda desconhecidas, por este

tos eletrônicos programáveis.

motivo sugere-se prudência ao afirmar que um sistema está imune a invasões ou invulneráveis.

Segundo Tanenbaum (2003), existe uma diferença notória entre Sistemas de Ambientes Computacional Distribuído e Sis-

As técnicas forenses são imprescindíveis para identificar

tema de Redes de Computadores, ou seja, não se pode con-

se um computador foi invadido, determinando de que forma

fundir uma unidade de controle (servidor) e vários dispositivos

foi alterado, estabelecendo critérios para preparar o ambiente

escravos com uma rede. Rede é uma visão conceitual aplicável

visando registrar os dados periciais, facilitar a identificação do

a um grande computador com terminais e/ou muitos micro-

invasor e amparar as medidas legais a serem tomadas para

computadores e impressoras conectados.

caso a resposta seja positiva, pois a invasão constitui crime eletrônico. O valor jurídico de provas eletrônicas manipuladas de forma incorreta, sem os padrões previstos e devidamente estabelecidos podem ser facilmente contestadas. Segundo Melo (2009, p. 1), não há padrões internacionais para o tratamento de dados periciais:

Um sistema computacional é considerado Distribuído quando a camada de rede não está implementada, ou seja, a interface de rede ativa pode-se comunicar diretamente com todos os demais computadores. Segundo Melo (2009), devido à evolução dos tipos de Malwares (softwares maliciosos) as soluções de seguranças devem sempre ser revistas, os fabricantes de Sistemas Operacionais e

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Softwares de Segurança sempre disponibilizam novas soluções. Caso um invasor utilize de técnicas clássicas, como armazenar, manter, e ou esconder ferramentas anti-forense durante sua ação em diretórios clássicos como /tmp, um perito pode facilmente localizar evidências atuando apenas com binários

para executar ações maliciosas em um computador. O Malware contém ameaças reais de vários tipos e propósitos.” (MELO, 2009, p.10). Segundo Brian, James e George (2003, p.194) a respeito dos Cavalos de Tróia:

compilados estaticamente, neste caso imagina-se que rootkits

“Os cavalos de troia são programas criados para contor-

baseados em técnicas arrojadas de LKM (Loadable Kernel Mo-

nar a segurança da sua máquina, mas disfarçados como

dule) não sejam utilizadas.

algo benigno. Assim como a criação grega, um cavalo de

Segundo Melo (2009, p. 67) em relação à técnicas mais arrojadas:

Tróia do computador não pode fazer nada sozinho, mas precisa contar com o usuário ajudando-o a cumprir seu

“Caso seja constatado o uso de técnicas mais arroja-

destino. Existe três usos principais da palavra troiano no

das, os dados levantados durante uma Live Análise são

linguajar moderno do computador:

facilmente contestadas. Somente durante a Post Mortem

Programa de cavalo de Tróia: um programa malicioso que

Análise, os resultados são realmente confiáveis, pois du-

se disfarça de uma coisa, mas contorna sua segurança em

rante a Live Analise possivelmente as chamadas ao sis-

segredo. Esse é o uso mais comum da palavra.

tema podem ser interceptadas.”

Código-fonte troiano: uma cópia do código-fonte do programa que foi modificada para conter alguma porta dos

Segundo Farmer e Venema (2007, p. 174-175), os passos para coleta de dados são:

fundos ou brecha na segurança. Binários troianos: Após uma invasão um atacante pode

“(...) O(s) computador(es) em questão deve(m) ser

substituir binários do sistema por versões que contêm pos-

colocado(s) off-line. Há alguns potenciais problemas

tar dos fundos ou que ocultam suas atividades.”

com isso, porque o sistema talvez espere estar on-line. Portanto, colocar a máquina off-line poderia destruir ves-

Segundo MELO (2009, p. 10), define-se Vírus:

tígios à medida que o sistema gera erros, repetidamente

“Programa que pode atuar como um binário indepen-

tenta novas conexões ou, em geral, altera seu estado.

dente ou alojar-se em um programa executável, tornan-

Alternativamente, você poderia tentar cortar a conexão

do-o um arquivo binário infectado. Em sua engenharia,

da máquina com o roteador e mantê-la em uma rede lo-

não é definido um vetor de transmissão automatizado.

cal, mas os serviços de DNS e serviços de rede e outros

Depende da execução do programa, do arquivo hospe-

sistemas na mesma área de rede ainda podem causar

deiro ou de um meio, como um cliente de correio, para

problemas.

que possa voltar a propagar e dar continuidade ao processo de infecção.”

À medida que você avança, é necessário monitorar tudo o que você digita ou faz. Em geral é uma situação do tipo “coletar

Segundo Melo (2009), o Worm é um tipo de Malware capaz

primeiro, analisar mais tarde”. Anote as configurações de har-

de se propagar automaticamente por meio de redes enviando

dware, software, sistemas e rede que estão definidas.”

copias de si mesmo para outros computadores, esta propaga-

O autor aponta estas considerações devido à divergência

ção está prevista em sua engenharia, e se dá por meio da explo-

de opiniões sobre o assunto, pois alguns peritos consideram o

ração de vulnerabilidades existentes ou falhas nas configurações

fato de desligar a máquina um grave erro, já que alguns invaso-

de softwares instalados nos computadores, criando um cenário

res podem utilizar de técnicas mais arrojadas e plantar bombas

em que não é necessário ser executado para se propagar, po-

para que caso a máquina seja retirada da rede ou desligada,

dendo propagar-se em qualquer tipo de sistema operacional.

executem comandos, e desta forma eliminem vários vestígios e destrua provas que seriam de grande valor no laudo pericial.

Ainda Segundo MELO (2009, p. 12) sobre Rootkits e Spywares: “Rootkit – Tipo de Malware muito arrojado, sua engenharia normalmente prevê a instalação de binários, mó-

2 IDENTIFICAÇÃO E DESCRIÇÃO DOS MALWARES

dulos, bibliotecas que disponibilizam os mais variados

“Malware pode ser definido como Malicious Software ou

recursos como: Backdoors, Cleanlogs, Keyloggers.

Software Malicioso, ou seja é um termo genérico que engloba

Usa técnicas para esconder processos e outras infor-

todos os tipos de programas especificamente desenvolvidos

mações inerentes ao mecanismo, o que dificulta sua

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 173


identificação, além de sua instalação se dar de forma

lhor estruturarmos o processo de investigação e análise de

automatizada.

Malwares, o dividiremos em cinco fases: Preservação e análi-

Normalmente são instalados logo após o comprometi-

se de dados voláteis, Análise de memória, Análise de discos,

mento de um computador por um invasor.

Análise estática de Malware e Análise dinâmica de Malware.

Spyware – Uma categoria muito peculiar de Malware, que usufrui as capacidades dos browsers em execu-

3.1 PRESERVAÇÃO E ANÁLISE DE DADOS VOLÁTEIS

tar aplicações. A maioria quase absoluta desse tipo

Segundo Farmer e Venema (2007), em uma análise post-

de Malware é escrita tendo como alvo sistemas Mi-

mortem, tem-se pouco tempo para coletar informações en-

crosoft.”

quanto a máquina comprometida permanece em execução, para uma coleta eficaz os autores utilizam a ferramenta grave-

Portanto estes Malwares colocam em risco os princípios básicos da segurança (integridade, disponibilidade e confia-

robber (ladrão de túmulos) do Coroner’s Toolkit, que é otimizada para este cenário.

bilidade) estas ameaças podem trazer diversos prejuízos às

A grave-robber captura informações voláteis sobre proces-

organizações, prejuízos não só financeiros, mas também de

sos e conexões de rede, atributos de arquivo como registros

perda parcial ou total de seus ativos da Tecnologia da Infor-

de data/hora de acesso, arquivos de configuração, log e outros

mação e Comunicação (TIC).

tipos de arquivos. O resultado é armazenando em um banco de dados que deve ser transferido para um sistema de análise.

3 DESCOBERTA DO MALWARE Quando é descoberto o Malware em um sistema, há muitas decisões e ações que devem ser tomadas. Para me-

Segundo MELO (2009, p. 36), quanto ao cuidado na execução das ferramentas de análise Live Forense: O conjunto de ferramentas selecionadas deve ser compilado estaticamente para compor o ferramental de Resposta de Incidente

Esta abordagem captura o estado volátil do processo, mas há desvantagens, se o kernel foi subvertido, as informações podem estar incompletas ou corrompidas.

ção para tratar combinações da RAM, espaço de troca, ROM, NVRAM e outros recursos de memória. O gerenciador de memória que executa no kernel, trata a alocação e desalocação da memória em um computador.

que deverá ser utado na Live Forense. A compilação da ferramenta

Segundo Melo (2009), a memória principal contém todo tipo

no modo estático a partir do código fonte gera um binário que não

de informação volátil, como informações de processos que es-

utiliza as bibliotecas dinâmicas do sistema. Adotando-se essa pre-

tejam em execução, dados que estão sendo manipulados e que,

caução o binário alojado em CDROM se torna imune a tentativas de

muitas vezes ainda não foram salvos em disco e informações no

inoculação de código por programas maliciosos.

sistema operacional.

3.2 ANÁLISE DE MEMÓRIA

RAM, destacando os arquivos /dev/kmem que têm as informa-

O autor ainda exemplifica a coleta de evidência da memória Segundo Farmer e Venema (2007), todos os sistemas operacionais modernos utilizam memória virtual como uma abstra-

ções de memória da área de kernel e /dev/mem, que é toda a memória da máquina:

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# /cdrom/dd if=/dev/mem | cdrom/nc <ip> <porta>

Esse método cria uma cópia idêntica bit a bit de cada

# /cdrom/dd if=/dev/kmem | cdrom/nc <ip> <porta>

sistema de arquivos, incluindo todas as meta-informa-

# /cdrom/dd if=/dev/rswap | cdrom/nc <ip> <porta>

ções e todas as informações que permanecem em um

# /cdrom/dd if=/dev/kcore | cdrom/nc <ip> <porta>

espaço não-alocado no fim dos arquivos, entre os arquivos, nos blocos de inode não-alocados e assim por

No exemplo acima o “#” informa que o usuário logado é o

diante. Isso em geral é feito com o comando dd.

root (super usuário do sistema), o “/cdrom” o diretório onde o

Um benefício importa dessa abordagem é que ela é

ferramental de resposta a incidente foi instalado para a utilização

neutra em relação ao sistema de arquivos. Por exemplo,

em “Live Forense”, o comando “dd if=/dev/mem | /cdrom/nc

a mesma técnica pode ser utilizada para copiar tanto

<ip> <porta> transfere uma imagem do conteúdo da memória

partições UNIX quanto partições Windows. A desvanta-

RAM, área de kernel, e swap para a máquina do perito através

gem é que os dados armazenados entre e fora das par-

do ip e da porta estipulada nos comandos citados.

tições não são analisados. Os fragmentos de comando a seguir lêem a primeira partição UNIX no primeiro disco. Linux

3.3 ANÁLISE DE DISCO Segundo Farmer e Venema (2007), há diversas maneiras de se duplicar as informações sobre o sistema de arquivos. Qual método

#dd if=/dev/hda1 bs=100k . . .

Freebsd #dd if=/dev/da0s1a bs=100k . . . Solaris

#dd if=/dev/dsk/c0t0d0s0 bs=100k . . .

estará disponível dependerá da situação, os dois autores já capturaram informações efetuando o login em uma máquina comprome-

3.4.3 COPIAR DISCO INTEIRO

tida, listando os arquivos para o terminal e registrando essa sessão

Segundo Farmer e Venema (2007), o resultado é uma cópia

com um programa emulador de terminal. Veremos a seguir alguns

idêntica bit a bit de todas as informações acessíveis no disco, in-

métodos para capturar estas informações.

cluindo o espaço de armazenamento antes e depois das partições de disco. Isso pode ser necessário quando há suspeitas de que os dados poderiam permanecer ocultos fora das partições de disco.

3.4 CÓPIA DE ARQUIVOS INDIVIDUAIS Segundo Farmer e Venema (2007), essa é a abordagem

Mais uma vez o “dd” é o comando ideal para realizar esta cópia.

menos precisa, porque só captura o conteúdo dos arquivos. Ne-

Este método possui limitações, ele não lerá os blocos de

nhuma meta-informação é capturada, exceto talvez o tamanho

disco que contém erros e que o hardware silenciosamente rema-

do arquivo. Todas as demais meta-informações são perdidas,

peou para os chamados blocos sobressalentes. Esse método

como posse do arquivo, datas/horas de acesso, permissões etc.

também não fornecerá acesso aos blocos sobressalentes não

Estas informações só não são perdidas quando salvas

utilizados, porque eles residem fora da área normalmente aces-

usando outro meio. Por exemplo, o utilitário grave-robber do

sível ao disco. Os fragmentos de comando a seguir lêem todos

Coroner’s Toolkit que copia os arquivos selecionados (como

os blocos acessíveis no primeiro disco:

arquivos de configuração e registros em log) depois de salvar

Linux

#dd if=/dev/hda bs=100k . . .

suas meta-informações em um arquivo chamado body.

Freebsd

#dd if=/dev/da0 bs=100k . . .

Solaris

#dd if=/dev/c0t0d0s2 bs=100k . . .

Ainda segundo Farmer e Venema (2007), a exatidão das in-

3.4.1BACKUP Ainda segundo Farmer e Venema (2007), dependendo do

formações capturadas aumenta na medida em que dependemos

software de backup utilizado, esse método preserva algumas

menos da integridade do sistema comprometido. Por exemplo,

meta-informações como posse, informações sobre links físicos

quando arquivos individuais são capturados enquanto ainda estão

e a última data/hora da modificação, mas não captura a data/

conectados à máquina da vítima, o aplicativo subvertido ou o sof-

hora do último acesso de leitura. Utilitários UNIX comumente

tware de kernel subvertido pode distorcer esse resultado. A subver-

utilizados são tar, cpio e dump. A desvantagem de fazer um ba-

são é muito menos provável quando utilizamos um procedimento

ckup é que o que você vê é tudo o que você obtém. Backups

de baixo nível de geração de imagens de disco, com a unidade de

não capturam as informações de arquivos excluídos

disco conectada a uma máquina confiável.

3.4.2 CÓPIA DE PARTIÇÕES DE DISCOS INDIVIDUAIS

3.5 ANÁLISE ESTÁTICA DE MALWARE

Segundo Farmer e Venema (2007, p. 55), a respeito da cópia de partições:

Segundo Farmer e Venema (2007, p. 120), sobre as técnicas de análise estática:

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 175


“[...] Desassemblagem de programa (converter um ar-

A primeira etapa consiste na coleta de evidências antes

quivo de programa em uma listagem de intrusões de

do desligamento do sistema da fonte elétrica, que tem

linguagem de máquina), descompilação de programa

por objetivo registrar o estado do sistema, e a segunda

(converter instruções de linguagem de máquina no códi-

etapa, após o desligamento.

go-fonte equivalente da linguagem de nível mais alto) e

A segunda etapa, pelo termo oriundo do inglês, Network

análise estática (examinar um programa sem realmente

Forensic, que consiste na coleta de análise de informa-

executá-lo)”

ções de atividade de rede, tanto do servidor em questão, como dos demais ativos de redes que tenham infor-

A desassemblagem de programa é um recurso padrão de

mações pertinentes.

todo programa depurador importante, entretanto ferramentas

E por último, a etapa em que todas as informações reu-

que descompilam programas em linguagem de alto nível como

nidas nas etapas anteriores são cruzadas com informa-

C só existem para ambientes limitados. A ameaça da engenharia

ções identificadas na análise das imagens de mídias

reversa também apresenta um problema para programadores

coletadas. Essa última fase é tecnicamente conhecida

de aplicativos Java.

como Post Mortem Analysis.

A preocupação com o furto de propriedade intelectual talvez

Tanto na Live Analysis, na Network Forensic como na

tenha muito a ver com essa disponibilidade limitada de descom-

Post Mortem Analysis, o objetivo é a coleta do máximo de

piladores.

evidências digitais. O termo Dado pericial digital (pode ser um vestígio, evidência ou mesmo se consolidar em

3.6 ANÁLISE DINÂMICA DE MALWARE Segundo Farmer e Venema (2007, p. 104), sobre os perigos da análise dinâmica: “Uma maneira de descobri o propósito de um programa

prova durante uma perícia) refere-se a toda e qualquer informação digital capaz de demonstrar que ocorreu um incidente de segurança ou mesmo um crime, dentro do contexto da Perícia Computacional.

desconhecido é simplesmente executá-lo e ver o que acontece. Há vários problemas potenciais com essa abor-

Segundo Farmer e Venema (2007), a sabedoria tradicional da

dagem. O programa poderia executar de uma maneira

computação forense, conta com métodos muito conservadores, ra-

confusa e destruir todas as informações na máquina [..]”

ramente nada além de desligar um computador e fazer uma cópia de disco. Caso seja necessário assegurar que os dados coletados

“Em vez de executar um programa desconhecido em uma

sejam otimizados para poderem ser aceitos em um tribunal e só

ambiente onde eles podem causar danos, é mais seguro exe-

conseguir capturar parte deles, então uma metodologia mais cau-

cutar esse programa em uma caixa de areia. O termo caixa de

telosa pode ser a melhor opção em alguns casos.

areia (sandbox) foi emprestado da balística, na qual as pessoas testam armas atirando em uma caixa de areia de modo que as

Ainda segundo Farmer e Venema (2007, p. 172), sobre as técnicas conservadoras:

balas não possam causar nenhum dano. Uma caixa de areia de

“Infelizmente, essas técnicas conservadoras não têm uma

software é um ambiente controlado para executar o software.”

grande quantidade de informações potencialmente úteis

Ainda segundo Farmer e Venema (2007), as caixas de

sobre a situação, como processos em execução e kernels,

areia podem ser implementadas de diversas maneiras, a

estado de rede, dados na RAM e muito mais. Somente um

abordagem mais simples é o de cordeiro sacrificial, uma má-

entendimento limitado pode surgir do exame de um disco

quina real, mas descartável, com acesso limitado à rede ou

morto. E, embora informações dinâmicas talvez sejam um

simplesmente sem acesso à rede.

pouco mais voláteis e, portanto suspeitas, quaisquer condenações com base em uma única série de leituras dos

4 COLETA DO MALWERE

dados também são suspeitas.[...]”

Segundo Melo (2009), um perito forense, ao iniciar uma perícia no sistema que teve uma segurança violada, busca evidências que

5 ANÁLISE DO ARQUIVO

caracterizem e possibilitem identificar como e o quanto a violação

Segundo Farmer e Venema (2007), pequenos programas

afetou as informações e o próprio Sistema Operacional. Ainda segundo MELO (2009, p. 33), a coleta de evidências pode ser dividida, de forma macro, em três etapas:

podem gerar muitos problemas, como observado abaixo, o código de um programa de backdoor recuperado após um ataque: scanf (“%s”, buffer);

176 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


if (strcmp(password, buffer)==0){

6 Laboratório

puts(“.”);

Um cenário de análise de servidor foi montado para exem-

setuid(0);

plificar a perícia forense computacional na busca por Malwares

setgid(0);

em servidores Linux, a ferramenta utilizada para a perícia é o

execl(“/bin/sh”,“sh”,(char *)0);

Sistema Operacional Back Track.

}

Conforme os autores mencionados neste trabalho, parto do

return (0);

princípio que todas as atividades para manter o sistema integro e com o mínimo possível de perda de dados voláteis tenham

Com exceção da chamada de função de comparação de

sido realizadas como: a decisão de remover o cabo de rede ou

string strcmp(), nenhuma chamada de função é testada quanto

não do servidor que sofreu a intrusão, se houve alguma interven-

a retornos de erro. Se uma operação falhar o programa simples-

ção por parte de outro profissional após a identificação do pro-

mente prossegue. Erro de leitura de entrada a partir de scanf(),

blema e se este realizou alguma atividade e quais, que a cópia

caso todas as operações falhem o programa termina silencio-

dos dados da memória tenham sido realizadas em local seguro

samente.

e fora da máquina periciada, que uma imagem bit a bit do disco tenha sido efetuada.

O chkrootkit é um detector de presença de de rootkits em

rootkits na máquina e atualmente é capaz de identificas mais de

sistemas baseados em Unix. O software utiliza cerca de nove ti-

60 tipos de ameaças diferentes como rootkits, worms, trojans,

pos de análise para detectar traços de atividade ou presença de

dentre outros.

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 177


Iniciando o chkrootkit o sistema informa os parâmetros que podem ser utilizados na detecção de Malwares.

Executando o chkrootkit ele checa o sistema em busca de Malwares e já exibe o resultado na tela informando se o arquivo

Neste ponto fazemos uma varredura em busca de Malwares alojados na máquina.

Com esta atividade conseguimos identificar a presença ou não do Malware no sistema operacional.

está ou não infectado.

178 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


O rkhunter é outra ferramenta de grande importância na detecção de rootkits no sistema, este avisa caso haja arquivos suspeitos no sistema.

Um dos parâmetros do rkhunter é o “--update”, que atualiza sua base de dados de Malwares. Sua execução se da através do comando “rkhunter --check”.

Os arquivos que contiverem a cor verde – not found e ok – estão normais. Já aqueles que forem marcados como “Warning” estão comprometidos e serão exibidos na cor vermelha, sendo assim deve-se proceder a remoção do rootkit. Antes de executar a remoção o Malware deve ser isolado em um dispositivo de armazenamento que seja externo ao disco da máquina comprometida, onde não possa mais gerar danos e possibilite uma análise posterior, talvez até mesmo sua execução em ambiente fechado e preparado para tal.

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 179


O Malware deve ser removido do sistema operacional e a vulnerabilidade que permitiu sua inserção deve ser tratada, para que esta falha não seja explorada novamente por um atacante.

O relatório final da execução e da análise do Malware fica registrada em /var/log/rkhunter.log. O Malware encontrado é um Backdoor que permite um

.echo “Iniciando via NETCAT da Backdoor”; .passthru (“nc –l –p 65321 –e /Bin/sh”); .echo “Backdoor Instalada!!!>;-)”;

acesso do atacante à máquina comprometida de forma rápida

.echo “Passaporte para sistema disponível!!! >;-)”;

sem a necessidade de realizar todos os passos para sua intru-

?>

são, este código mantém uma porta de comunicação aberta entre o atacante e a máquina comprometida.

7 CONCLUSÃO

Abaixo um trecho do código da Backdoor utilizada para o

A perícia forense computacional é um instrumento im-

acesso do atacante à máquina através de uma falha de segu-

prescindível para identificar se um sistema computacional foi

rança do PHP:

invadido, e de que forma foi alterado, estabelecendo critérios

<?php

para preparar o ambiente visando registrar os dados periciais,

.passthru(“date”);

facilitar a identificação do invasor e amparar as medidas legais

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a serem tomadas diante da intrusão. O valor jurídico de provas eletrônicas manipuladas de forma incorreta, sem os padrões previstos e devidamente estabelecidos pode ser facilmente contestado, e toda atividade do perito deve ser acompanhada por um ou mais profissionais da TIC da empresa que o contratou para a perícia, isso para assegurar a integridade não só da coleta dos dados, mas também para resguardar o perito, evitando assim que de perito torne-se réu. Enfim, a utilização de ferramentas que auxiliam e dão suporte à investigação é de suma importância, pois estas conseguem garimpar informações de forma eficaz e ágil, primando pela integridade e minimizando os riscos da perda de dados voláteis. A partir deste trabalho discutimos e demonstramos as técnicas e procedimentos da perícia forense computacional que auxiliam na análise de sistemas computacionais comprometidos, apontando as melhores práticas na atualidade e metodologias a serem aplicadas na descoberta, coleta e análise de Malwares. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS FARMER, Dan; VENEMA, Wietse. Perícia Forense Computacional: Teoria e prática aplicada. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007. MELO, Sandro. Computação Forense com Software Livre: Conceitos, técnicas, ferramentas e estudos de casos. 1. ed. Rio de Janeiro: Alta Books. 2009. TANENBAUM, Andrew S. Redes de Computadores. 4. ed. Campus (Elsevier), 2003. HATCH, Brian; B. LEE, James; KURTZ, George. Segurança contra Hackers Linux. 2. ed. São Paulo: Futura, 2003. FILHO, João Eriberto Mota. Forense computacional utilizando ferramentas GNU/Linux. Brasília: Serpro, 10 de Novembro de 2009. Palestra ministrada no CISL – Comitê Técnico de Implantação de Software livre, 10/11/2011. Forense computacional utilizando ferramentas GNU/ LINUX. Disponível em: http://streaming.serpro.gov.br/cisl/forense.html.

NOTAS DE RODAPÉ 1 Coordenador e Professor do Curso de Bacharelado em Sistemas de Informação do Centro Universitário Newton Paiva 2 Graduando em Bacharelado em Sistemas de Informação do Centro Universitário Newton Paiva

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Um novo conceito de Ensino Religioso: para uma formação integral do educando Bruno Luciano de Paiva Silva1

RESUMO: O artigo propõe a superação da concepção tradicional do Ensino Religioso por uma nova concepção. Por isso, dividimos o artigo em duas partes: 1) Apresentaremos a concepção tradicional do Ensino religioso e suas possíveis limitações; 2) Em seguida, propomos uma nova concepção de Ensino Religioso que visa à formação integral do educando. PALAVRAS-CHAVE: Ensino Religioso; Religiosidade; Ética; Cidadania.

INTRODUÇÃO

nos alunos, os valores predominantes da sociedade. Assim, o

A LDBEN (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacio-

Ensino Religioso era, antes de tudo, reacionário. O Ensino Reli-

nal) nº 9.394 traz o artigo 33 que assegura ao educando um

gioso, nesse período, justifica o poder estabelecido.

Ensino Religioso que respeita a sua diversidade cultural-religio-

O método de doutrina empregado revela o caráter im-

sa e, com efeito, um ensino sem proselitismo. Assim, cria-se

posto e disciplinador de toda a catequese, que visa a

um contexto próprio para construirmos e apresentarmos um

submissão, à conquista e à adesão dos respectivos

novo conceito de Ensino Religioso. O objetivo consiste, por-

grupos à fé católica. Os valores e expressões religiosas

tanto, em superar o conceito tradicional de Ensino Religioso

da cultura dos nativos e dos negros são considerados,

que, ao confundir-se com a catequese, propõe uma formação

muitas vezes, como empecilhos à propagação da ver-

parcial do educando. Desse modo, o artigo está dividido em

dadeira fé. (Figueiredo, 1995, p. 22-23)

dois momentos: a) no primeiro, apresentaremos a história, as características, as práticas pedagógicas e o modelo didático

A segunda fase, que vai de 1800 a 1964, é composta, se-

do Ensino Religioso tradicional; b) no segundo momento, mos-

gundo Figueiredo: da monarquia constitucional (1823 a 1889),

traremos a superação desse paradigma através de uma nova

da implantação do regime republicano (1890 a 1930), do perío-

ideia de Ensino Religioso que contém as dimensões religiosa,

do de transição (1930 a 1937), do Estado Novo (1937 a 1945) e

ética e política. Veremos que a nova ideia conduz a um novo

do terceiro período republicano (1946 a 1964).

paradigma didático. E, por último, mostraremos qual é o lugar do Ensino Religioso na LDB.

Na monarquia constitucional (1823 a 1889), o Ensino Religioso é reduzido ao ensino de religião oficial do império, ou seja, a religião Católica Apostólica Romana. Nesse período,

2. DO CONCEITO TRADICIONAL AO NOVO CONCEITO

como aponta Figueiredo, o Ensino Religioso é submetido ao

DE ENSINO RELIGIOSO: UMA MUDANÇA DE PARADIGMA.

sistema de protecionismo da Metrópole. O período de implantação do regime republicano (1891 a

2.1 O CONCEITO TRADICIONAL DE ENSINO RELIGIOSO: UM PARADIG-

1930) é um dos mais difíceis para o Ensino Religioso, pois a

MA A SUPERAR.

religião foi, para os republicanos, um dos principais obstáculos

O Ensino Religioso foi, frequentemente, confundido em

para a implementação do novo regime. Por isso, a constituição

toda a história da educação brasileira com catequese, ou seja,

republicana traz o dispositivo: “será leigo o ensino ministrado

como doutrina da fé do educando. Apresentaremos, assim, um

nos estabelecimentos oficiais de ensino”. No entanto, o Ensino

breve panorama histórico do Ensino Religioso no Brasil que,

Religioso permaneceu nos estabelecimentos escolares “mes-

por um lado, ajudará a entender o motivo da confusão sobre a

mo perante proclamada laicidade do ensino nos estabeleci-

natureza do Ensino Religioso e, por outro lado, ajudará a enten-

mentos oficiais, o Ensino Religioso esteve presente pelo zelo

der a dificuldade atual de mudarmos de paradigma.

de fidelidade dos princípios estabelecidos sob a orientação da

Na primeira fase, entre 1500 a 1800, o objetivo do Ensino Religioso, segundo Anísia Figueiredo (1995), era de introduzir,

Igreja Católica”. (Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso, 2004, P14)

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O Ensino Religioso é admitido, no período de transição entre (1930ª 1937), em caráter facultativo. A resistência ao Ensi-

linguagem utilizada pela comunidade eclesial. A linguagem reflete também símbolos da fé, isto é,

no Religioso se deve pelos teóricos da Escola Nova que eram

“a linguagem da comunidade eclesial reflete as razões de

contrários a implementação do Ensino Religioso nas escolas

ser de um grupo religioso, mantido com características próprias,

brasileiras. Esta resistência consiste no fato do ensino ser laico.

orientado pelas mesmas concepções religiosas.” (Figueiredo,

No Estado Novo (1937 a 1945) o Ensino Religioso perde o seu

1994, P.111).

caráter de obrigatoriedade. O terceiro período republicano (1946

As principais fontes encontram-se nas Sagradas Escrituras.

a 1964) é uma tentativa frustrada de introduzir e garantir o Ensino

Assim, o Ensino Religioso utiliza, por exemplo, em suas aulas,

Religioso na Escola. O Ensino Religioso é entendido como dever

orações e / ou textos bíblicos. A prática metodológica do Ensino

do Estado para com a liberdade do aluno.

Religioso é compartimentalizada, fragmentada, do corpo da Es-

A terceira fase é de 1954 a 1964. De 1964 a 1984 o Ensino

cola. Não é realizada de maneira interdisciplinar e nem é levado

Religioso passa a ser, no contexto do autoritarismo, obrigatório

em consideração o contexto em que o aluno se encontra inserido.

nas escolas. Mas, no ato da matrícula, cabe ao aluno o direito de optar pela frequência ou não.

O conjunto das características apontadas forma a identidade do Ensino Religioso tradicional. Esta identidade foi construída, ao

Por ser fruto de uma outorga, o dispositivo constitucio-

longo da história, sob o signo de violência e do fortalecimento

nal garante o Ensino Religioso no sistema escolar. Na

do “status quo”. Foi formado sob o signo de violência por que

prática, porém, continua a receber um tratamento que

não respeitou a adversidade cultural religiosa. Sempre impôs uma

o discrimina e dá origem a muitos desafios de natureza

determinada religião ou credo. Portanto, o Ensino Religioso co-

pedagógica e administrativa. Ainda que nesse período

meteu, frequentemente, violência simbólica contra o educando.

tenha sido iniciada a busca da sua identidade, não há

Além disso, a identidade foi construída também sob signo do for-

clareza quanto ao seu papel específico no ambiente es-

talecimento do “status quo”. O Ensino Religioso foi utilizado como

colar. Há, contudo, um grande esforço de prática peda-

instrumento ideológico da igreja e do Estado. Sempre justificou o

gógica em relação a esse conteúdo na escola. (Figuei-

poder estabelecido. Assim, o conceito tradicional do Ensino Reli-

redo, 1995, P12)

gioso teve sua identidade sob o signo de violência contra o educando e sob o signo do fortalecimento do “status quo”.

Os últimos anos (1986 a 1996) são marcados pela busca

As práticas pedagógicas do Ensino Religioso tradicional

de identidade, do espaço e da redefinição do papel do Ensino

não apresentam, segundo Madalena Fernandes (2000), cinco

Religioso na escola.

atitudes básicas do educador de Ensino Religioso: 1) atitude de

O breve panorama histórico do Ensino Religioso no Brasil, de 1500 a 1996 (data da publicação da LDB), mostra que o Ensino

missão; 2) atitude de busca e de presença; 3) atitude de diálogo; 4) atitude de compreensão e 5) atitude de encontro.

Religioso foi e continua sendo, frequentemente, confundido com

Toda comunidade em que o educador se encontra inserido

a catequese. Esse é um dos obstáculos que impede a mudança

atribui, a ele, a missão de formar educandos críticos e capazes

de paradigma. Apresentamos, a seguir, algumas das principais

de atuar de modo ativo na comunidade. Esta atitude de missão

características do conceito tradicional de Ensino Religioso.

não faz parte das práticas pedagógicas do professor de Ensino

O Ensino Religioso no decorrer da história assume algumas

Religioso tradicional, pois ele não leva em consideração o con-

características. O conjunto destas características constitui a

texto em que ele e a escola estão inseridos. Os professores que

identidade do conceito tradicional de Ensino Religioso. Desta-

orientam seu trabalho através do conceito tradicional de Ensino

caremos: a) finalidade; b) a quem se destina; c) aspectos de lin-

Religioso, não se abrem para o novo. Por isso, falta a eles a

guagem; d) algumas fontes; e) e pressupostos metodológicos.

atitude de busca e de presença: “abrir-se ao novo, porém, não

O Ensino Religioso como catequese tem a finalidade de

significa ministrar um Ensino Religioso superficial. Ao contrário,

promover a maturidade do educando na fé. Abre espaço para

é dar-lhe um suporte antropológico de maior profundidade...”

que o educando se aproxima de Deus. Portanto, a finalidade é

(Fernandes, 2000, P.41).

proporcionar uma formação cristã. Para quem é destinado esse

Outra atitude que falta ao professor de Ensino Religioso

Ensino Religioso? É destinado para crianças, jovens e adultos

tradicional é a atitude do diálogo. Diálogo não apenas com

que devem educar a sua fé. Devem explicar sua religiosidade e

os alunos, mas também com a realidade cultural e social que

o Ensino Religioso deve encontrar meios para isso.

os circundam. O Ensino Religioso com proselitismo não abre

A linguagem do Ensino Religioso como catequese reflete a

para a diversidade cultural e religiosa do aluno. Falta diálogo

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 183


nas práticas pedagógica do Ensino Religioso tradicional. A falta

cional é o aspecto

de presença e de diálogo desfavorece uma atitude de mútua

pedagógico. Segundo Viesser, no contexto de uma peda-

compreensão. O professor não compreende as possibilidades,

gogia compartimentalizada, fragmentada, a didática do Ensino

recursos e limitações dos alunos. Não compreende o contexto

Religioso também se reduzirá a um aglomerado de técnicas para

em que o jovem está inserido. Não existe nas práticas pedagó-

a sua prática. O epistemológico é outro determinante, apontado

gicas do Ensino Religioso encontro, mas desencontros com os

por Viesser, na didática do Ensino Religioso Tradicional, que se

educandos. Falta um esforço e um compromisso de conviver

encontra fundamentado na ideia da Ciência Moderna, ou seja,

entre si. Esta distância entre o professor e o aluno se tornou um

de uma Ciência fragmentada.

obstáculo para o verdadeiro encontro.

A escola com a finalidade de ensinar, pedagogicamente

O Ensino Religioso tem sido lecionado nas escolas sem uti-

fragmentada ainda mais o conhecimento dito científico

lidade de missão, de abertura ao novo, de diálogo, de compre-

e o resultado do ensino fica reduzido a conclusões, so-

ensão e de encontro com o educando. Esse conceito tradicional

luções e conceitos fixos, onde o processo didático das

de Ensino Religioso e suas práticas pedagógicas direcionam

inter-relações é desconhecido. (Viesser, 1994, p 26)

para um determinado paradigma didático. Veremos, em seguida, qual é o paradigma didático do Ensino Religioso tradicional.

O último determinante da prática do Ensino Religioso Tradi-

No livro “Paradigma didático para o Ensino Religioso”, Li-

cional é o aspecto estrutural. A prática do Ensino Religioso está

zete Carmem Viesser, mostra que a prática pedagógica é resul-

presente em três instituições: Religião, Escola e o Estado. Muitas

tado de uma determinada concepção teórica. Assim, o Ensino

das vezes, essas estruturas podem limitar a prática do Ensino

Religioso tradicional (concepção teórica) irá orientar a sua prá-

Religioso. O Estado pode fazer, por exemplo, do Ensino Religio-

tica em sala de aula. Desse modo, veremos: (a) como que a

so um mero instrumento de dominação ideológica.

ideia tradicional de Ensino Religioso determina a sua didática e

Mas qual a consequência desse paradigma didático do

(b) apresentaremos os quatro elementos determinantes, identi-

Ensino Religioso Tradicional para a formação do educando? A

ficados por Viesser, na didática do Ensino Religioso tradicional.

consequência é uma formação parcial do educando, se volta

O Ensino Religioso Tradicional se preocupa com a evange-

apenas para a fé do aluno e esquece as outras dimensões do

lização do educando. Com isso, ele encontra-se “desvinculado

ser humano: estética, ética, política, etc. Portanto, o Ensino Reli-

da realidade, dos interesses e da vida de um aluno historica-

gioso Tradicional não permite uma formação integral do educan-

mente situado” (Viesser,1994, P.16). Esta concepção teórica

do. Por isso, é preciso mudar de paradigma. É preciso um novo

orientará a prática do Ensino Religioso para a formação de um

conceito de Ensino Religioso.

aluno ideal. Assim, a ênfase recai na memorização.

Passaremos, agora, para o segundo momento, onde apre-

Viesser (1994), aponta em seu livro, para quatro elementos

sentaremos um novo conceito de Ensino Religioso. O novo con-

determinantes na didática do Ensino Religioso: 1) o cultural; 2) o

ceito apresenta diversas dimensões, um novo paradigma didáti-

pedagógico; 3) o epistemológico e 4) o estrutural.

co e um lugar na LDB / 96.

O elemento cultural, segundo Viesser, é herança da Era Moderna. Trata-se de uma cultura fragmentada. A consequên-

2.2 UM NOVO CONCEITO DE ENSINO RELIGIOSO: POR UMA FORMA-

cia disso é a supervalorização da Ciência como única forma de

ÇÃO INTEGRAL DO EDUCANDO.

conhecimento. Este determinante irá direcionar as práticas do Ensino Religioso Tradicional.

Vimos, no primeiro momento, a necessidade de superarmos o paradigma do Ensino Religioso Tradicional. É preciso cons-

Essa cultura fragmentada e mecanicista, que superva-

truir um novo conceito de Ensino Religioso que vise a formação

loriza o científico e sustenta o antropocentrismo, negli-

integral do educando. Por isso, apresentaremos, nesta parte,

gência a vida em relação, o fracionamento das diversas

os novos objetivos e características do Ensino Religioso. O que

ciências e influencia em todos os aspectos da vida. Isso

permitirá, consequentemente, construir uma identidade livre da

tudo é evidenciado na escola pela compartimentaliza-

violência e da manutenção do “status quo”. Por fim, indicaremos

ção estanque dos níveis e áreas de ensino, pela frag-

o novo papel do educador do Ensino Religioso. Em seu livro

mentação do conhecimento, pela estrutura, pelas rela-

“Ensino Religioso: Perspectiva Pedagógica”, Anísia Figueiredo

ções do poder. (Viesser, 1994, p .22).

aponta para o novo papel do Ensino Religioso nas escolas. a)Atuar como instância articuladora dos meios que pro-

Outro determinante da didática do Ensino Religioso Tradi-

porcionam às gerações do presente e do futuro as ra-

182 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


zões de ser e estar no mundo.

das possibilidades e limites dos jovens. Assumindo estas ati-

b)Fortalecer as predisposições naturais de cada ser hu-

tudes, o educador estará indo de encontro, não apenas com o

mano em perceber a vida como um dom gratuito e o

aluno, mas, com o sentido radical da vida.

mundo como um todo, onde pensa, sente, decide e age como alguém chamado e a realizar ai um projeto exis-

Passaremos, agora a apresentar algumas dimensões do Ensino Religioso que correspondem às dimensões do ser humano.

tencial. (Figueiredo, 1994, p. 114) 2.2.1 A DIMENSÃO RELIGIOSA DO ENSINO RELIGIOSO: Portanto, é objetivo do Ensino Religioso a for-

UMA ABERTURA À RELIGIOSIDADE

mação integral do educando. A formação integral, passa pelas

O objetivo do Ensino Religioso foi, durante muito tempo,

dimensões: da religiosidade, ética e política. Assim, podemos

a religião. Para Gruen(2004), existe equívoco conceitual entre

perceber novas características acerca de finalidade, a quem se

religiosidade, religião e fé. Apresentaremos, agora, a distinção

destina, linguagem, fontes e pressupostos metodológico.

entre esses conceitos-chave.

A finalidade do novo Ensino Religioso não é mais evange-

Para Max Scheler (apud GRUEN, 2004), a religiosidade é

lizar o educando, mas de educar a sua religiosidade. Cabe o

um elemento comum presente em todas as religiões. No entan-

Ensino Religioso criar condições para que o educando supe-

to, segundo Paul Tillich (apud GRUEN, 2004), esse enfoque não

re seus limites, na ultrapassagem da realidade imanente para

leva em consideração as motivações das pessoas. Assim, para

a realidade transcendental. Assim o novo Ensino Religioso se

Gruen(2004), seguindo as intuições desses importantes teóri-

destina as crianças, jovens e adultos que integram a escola. A

cos, a religiosidade é uma abertura humana ao sentido radical

linguagem adequada não é mais a da comunidade eclesial, mas

da vida.

do ambiente escolar. O novo Ensino Religioso possui um voca-

... chamamos religiosidade a disponibilidade dinâmica

bulário próprio que não se confunde com a catequese. A fonte é

de pessoas ao sentido fundamental de sua existência,

constituída de acordo com o novo conteúdo do Ensino Religio-

encarando como compromisso. (...) A religiosidade não

so, ou seja, o ser humano na sua totalidade, as dimensões do

é uma atitude entre muitas: ele é a raiz do conjunto das

real (social, econômica, política, cultural, etc.) e o transcende. O

dimensões de vida da pessoa, na medida em que as

novo Ensino Religioso não é entendido como uma prática meto-

integra, a religiosidade da coerência a um “projeto de

dologia desvinculada do projeto escolar. Ela é integrada a outras

vida” (Gruen, 2004, p 113)

áreas do saber que visam um trabalho interdisciplinar. Esse é o novo pressuposto metodológico.

Com isso, a religiosidade possa a ser uma das dimensões

A partir dos novos objetivos e características do Ensino Re-

fundamentais do novo Ensino Religioso.

ligioso podemos perceber a construção de uma nova identida-

A institucionalização da experiência do sagrado ou da re-

de para o Ensino Religioso: agora sob o signo do dialogo e da

ligiosidade constitui a religião. Ela é constituída dentro de um

abertura para o novo. Uma abertura para o saber e diversidade

contexto social e histórico. Criam-se símbolos, rituais e cultos,

religiosa do educando e uma orientação para as mudanças so-

para padronizar a religiosidade. Para Gruen, religiosidade e fé

ciais. Essa é a nova identidade do Ensino Religioso que caberá,

podem caminhar juntas. Segundo ele, a fé ilumina o novo senti-

aos educadores, lutar e assegurar esta conquista.

do da base do ser humano, isto é, “religiosidade não é substitu-

Vimos que falta ao professor do Ensino Religioso tradicio-

ída pela fé: é por ela iluminada, explicitada.

nal cinco atitudes básicas, apontadas por Fernandes, atitude de

O grupo social que vive essa atitude constitui uma comuni-

missão, de abertura para o novo, de dialogo, de compreensão

dade de fé”. (Gruen, 1995, p.76). Portanto, cabe ao Ensino Re-

e de encontro. O educador do novo Ensino Religioso assume,

ligioso educar para a religiosidade, isto é, criar condições reais

em sua prática pedagógica, esses desafios. Assume a missão

para que o educando possa se abrir ao sentido radical de sua

de ajudar os educandos da comunidade onde está inserido à

existência.

ingressarem na sociedade e na cultura. Abre-se ao novo, e para as novidades que as novas gerações trazem. Entende a impor-

2.2.2 A DIMENSÃO ÉTICA DO NOVO ENSINO RELIGIOSO: ENSINANDO

tância de se abrir para um dialogo fecundo e responsável com

VALORES.

o educando. Abre-se também para um dialogo com a realidade

No livro “Ensino Religioso nas fronteiras da Ética”, Amauri

social e cultural circundante da escola. Assim, o educador do

C. Ferreira(2002) afirma que a educação moral é de suma im-

Ensino Religioso poderá adotar uma atitude de compreensão

portância para a formação do educando. Por isso, é necessário

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proporcionar uma formação ética a partir do aprendizado dos

Viesser, um novo paradigma didático. Um paradigma didático

costumes, da diferença, da convivência e de quatro princípios

que supera a fragmentação e a compartimentalização do ensino

(da justiça, da não- violência, da solidariedade e da responsabi-

e que esteja em sintonia com o novo contexto cultural e social.

lidade). Assim, o agir dos educandos passa a pressupor a ética.

Assim, a didática do novo Ensino Religioso exige: a) uma trans-

Os costumes, valores e normas são construídos historica-

formação cultural: nova cosmovisão; b) e uma transformação

mente. É desse modo que se constitui o ethos. Assim, “ethos,

educacional: novo paradigma. Predomina, na cosmovisão mo-

como costume, articula-se às escolhas que o sujeito faz ao lon-

derna, uma concepção fragmentada da Educação e, com efeito,

go da vida”. (Ferreira, 2002, P. 32). Entre as escolhas encontra-

do Ensino Religioso. O ensino é entendido como compartimen-

se a diferença. Pautar a sua ação pelo respeito à diferença é um

talizado em disciplinas o que não realiza um trabalho interdisci-

costume importante para a formação dos educadores. Dessa

plinar. Por isso, é preciso uma transformação cultural, ou seja,

maneira, eles estarão preparados para aprender dois dos mais

é preciso buscar uma nova cosmovisão: a holística. Segundo

importantes pilares da educação do século XX, apresentados

Viesser, nesta cosmovisão tudo se interliga, inter-relaciona e in-

pela Unesco, o viver juntos e com os outros.

terdepende, pois é uma concepção sistêmica de vida. Assim,

Por fim, cabe ao educador de Ensino Religioso fornecer

encontram-se nesse paradigma as possibilidades de soluções

quatro princípios para que o educando possa pautar sua ação:

criativas para os problemas específicos que a atual era acumu-

princípio da justiça, da não-violência, da solidariedade e da res-

lar.

ponsabilidade. Ao se inspirar no ideal de ser justo, que consiste no respeito pelo outro que se iguala enquanto espécie, ao res-

Desse modo, o Ensino Religioso deixa de entender o consumo como:

peitar a não-violência, as diferenças, ao ser solidário com o outro

... uma máquina composta de um profusão de objetivos

sem esperar dele reciprocidade e ser responsável não apenas

distintos e passa a ser assumido como um todo harmo-

com a alteridade, mas crêem todo planeta, o educando estará

nioso e indivisível, numa rede de relações dinâmicas

agindo eticamente.

entre as partes e o todo e das partes entre si, onde está incluído o Ser Humano, vocacionando, portanto, passa

2.2.3 A DIMENSÃO POLÍTICA DO NOVO ENSINO RELIGIOSO:

comunhão. (Viesser,1994,p.36)

CONSTRUINDO À CIDADANIA Em seu livro “Ensino Religioso e formação do ser político”,

Não basta apenas uma transformação cultural, é preciso

Tarcizo G. Filho (1998) mostra que o homem é um animal políti-

também uma transformação educacional. O novo paradigma

co. A política é uma das suas inúmeras dimensões. Cabe, por-

educacional, que é influenciado pelo cosmovisão holística, bus-

tanto, ao novo Ensino Religioso educar para a construção da

ca superar o ensino fragmentado. Com isso, a nova didática do

cidadania.

Ensino Religioso propõe um trabalho interdisciplinar entre o En-

Educar para a cidadania é mostrar que a dimensão política

sino Religioso e as demais disciplinas escolares.

do homem não se reduz ao voto ou a defesa dos próprios inte-

A nova concepção da didática do Ensino Religioso afasta

resses. Educar para a cidadania é educar para a participação

ou desmitifica três regras: de competência, de eficácia e de se-

política ativa do educando na sua comunidade. Uma participa-

gurança. A regra de competência esconde relações de poder.

ção política voltada para as mudanças sociais. Assim, o Ensino

Ela determina como o professor deve saber, pensar e agir ao

Religioso cria condições para o educando se tornar um agente

fornecer um “Kit religioso”.

histórico capaz de transformação social.

Um ideário que tende por finalidade a unidade de um

... sem consciência política nada seria possível. Essa ta-

local de uma rede de estabelecimento, de uma escola,

refa cabe à educação. Torna-se urgente educar para a

acaba por silenciar o poder da didática, da prática de

cidadania, para ser possível vislumbrar o bem comum e

sala de sula e reforça a hegemonia de um grupo que

o exercício da participação. Cabe à educação o descor-

constrói “um currículo”, autentico “Kit religioso”, como

tinar horizontes, tendo em vista o bem comum, processo

verdade já feita e determinada que se instala no senso

de longe duração, mas possível. ( Filho, 1998, p. 106)

comum. (Viesser, 1994, p. 54).

O novo Ensino Religioso conduz o educando a conscientizar

Afasta também a regra da eficácia que, segundo Viesser, é

de sua dimensão política e a participação ativa na sua comunidade.

marcada pela atitude iluminista, isto é, o transcendente é algo

O novo conceito de Ensino Religioso exige, segundo Lizete

“de fora” que é trazida por aqueles que conhecem o Sagrado.

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E, por último, afaste a regra de segurança, que assegura um

go 33, foi do deputado Nelson Marchezan e consistia em retirar

professor “provável” – que tem a segurança do emprego, do

a expressão “sem ônus para os cofres públicos”. O segundo

conceito, dos objetivos e metodologia – e não um educador

projeto (nº 2.997/97) do deputado Mauricio Requião pretendia

“possível” – que aceita o desafio e a contingência radical da ex-

uma alteração abrangente do que do deputado Marchezan. O

periência pedagógica para o Transcendente.

terceiro projeto (nº 3.43/97) foi da própria iniciativa do Poder

Assim, a nova didática do Ensino Religioso será marcada,

Executivo, que após consultarem vários setores da sociedade,

segundo Viesser, pela alegria. A alegria, que passa a ser o tom

acrescentou mais uma modalidade de Ensino Religioso: o ecu-

didático do Ensino Religioso, é entendida como uma satisfação

mênico. O que somava com mais duas já existentes: confessio-

no encontro, no dialogo, na compreensão e no amor ao edu-

nal e interconfissional.

cando. Alegria de um Ensino Religioso voltado para a formação integral do educando.

Segundo Lourdes Caron (1998), os três projetos não receberam, na comissão de Educação da Câmara, emendas dentro

O novo Ensino Religioso, que traz consigo um novo para-

dos prazos regimentais. Assim coube o relator, o deputado Pe.

digma didático, tem mostrado sua importância para a formação

Roque Zimerman, após muitos estudos e ouvir todos os setores

do educando e para a construção de uma escola humanista e

interessados, elaborar um substitutivo de lei, nº 2.757, de Nelson

crítica. Assim, resta encontrar, no último momento do artigo, o

Marchezan. Ele levou em conta as demais propostas dos outros

lugar do novo Ensino Religioso na LDB/96.

dois projetos. Com isso, no mesmo ano, em julho de 1997, o Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, sanciona

2.2.4 O LUGAR DO ENSINO RELIGIOSO NA LDB/96:

a nova lei (nº 9.475) e publica-a no Diário Oficial com a seguinte

DEFININDO SUA NATUREZA

redação:

Apresentaremos, agora, o lugar que o Ensino Religioso ocu-

Artigo 33 – O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, é

pou na Constituição de 1988 e qual o lugar que ele passou a

parte integrante da formação básica do cidadão e cons-

ocupar na Constituição de 1996 e, posteriormente, o substitutivo

titui disciplina aos horários normais, das escolas públi-

para o artigo 33 da LDB/97.

cas de ensino fundamental, assegurando o respeito à

Em 1988, houve uma enorme mobilização popular para garantir o Ensino Religioso obrigatório. Alegaram que é um direito

diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo.

do educando e um dever do Estado. Assim, a Constituição de 1988 assegurou o Ensino Religioso nas escolas.

Todo o debate em torno do Ensino Religioso serviu para ten-

... passou a constar o artigo 210, parágrafo 1º, da Cons-

tar definir uma natureza para ele. Portanto, a natureza do Ensino

tituição da República Federativa do Brasil. Nesta Cons-

Religioso, de acordo com o substitutivo do art. 33, é de um ensi-

tituição recebeu, então, seguinte redação: “O Ensino

no sem proselitismo. Além disso, é um ensino que proporciona

Religioso, de matricula facultativa, constituirá disciplina

uma formação integral do educando e, sobretudo, que respeita

dos horários normais das escolas públicas de ensino

a sua diversidade cultural religiosa.

fundamental. (Caron, 1998, p. 15). 3. CONCLUSÃO O esforço de regulamentar o Ensino Religioso nas escolas,

O primeiro momento do artigo apresentou a história, as ca-

no período entre 1988 a 1996, se viu ameaçado, na LDB/96, com

racterísticas e as práticas pedagógicas do conceito tradicional

um acréscimo da expressão: “sem ônus

de Ensino Religioso. O Ensino Religioso tradicional, que ao lon-

para os cofres públicos”. A partir disso, iniciar um intenso

go da história se confundiu com catequese, conduz a um para-

debate sobre este dispositivo e, com efeito, sobre a natureza e

digma didático fragmentado. No segundo momento, mostramos

prática do Ensino Religioso nas escolas.

a importância de superar esse paradigma a partir de um novo

Após a LDB/96, o Ensino Religioso teve seu lugar amea-

conceito de Ensino Religioso. O novo conceito propõe novas

çado no ensino brasileiro. Tornou-se urgente alguma ação. No

dimensões: religioso-antropológica, ética e política. Essa dimen-

primeiro semestre de 1997, foram apresentados, na Câmara dos

são do novo conceito de Ensino Religioso visa a formação inte-

Deputados em Brasília, três projetos de lei sobre o Ensino Re-

gral do educando e conduz, consequentemente, para um novo

ligioso que tinha o intuito de modificar a expressão “sem ônus

paradigma didático. E, por último, mostramos o lugar do Ensino

para os cofres públicos”.

Religioso na LDB.

O primeiro projeto de lei (nº 2.757/97), para alterar o arti-

O novo conceito de Ensino Religioso tem provocado algu-

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mas questões. Uma delas é sobre a aplicação prática de um novo conceito de Ensino Religioso nas escolas brasileiras. Sabemos que o novo conceito encontra, na maioria das escolas, muita resistência. Entretanto, percebemos, em casos isolados, uma mudança de mentalidade. Assim, o Ensino Religioso cumpre a sua principal tarefa no ensino: a formação integral do educando. Esperamos que o presente artigo possa contribuir para a construção de novas práticas do Ensino Religioso, que auxilie para a formação integral do educando e que abra uma perspectiva sempre aberta para o novo. Sempre aberta para a expansão de novos e desconhecidos horizontes do saber! REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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PRETTO, Hermili. A Teologia tem algo a dizer - respeito do ser humano? São Paulo: Paulus, 2003. 107 p. São Paulo. Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso, Parâmetros Curriculares Nacionais. 2 ed. São Paulo: AM. 1997. SILVA, Valmor da. Ensino Religioso: educação centrada na vida. Subsídios para formação de professores. São Paulo: Paulus, 2004. 35 - 48 p. VELOSO, Dom Eurico dos Santos. Fundamentos Filosóficos dos Valores no Ensino Religioso. Petrópolis: Vozes, 2001. 92p. (Col. Subsídio Petrópolis). VIESSER, Lizete Carmem. Paradigma didático para o Ensino Religioso. Petrópolis: Vozes, 1994, 1994. 69p. (Col. ERE - série Fundamentos)

______________________ 1-Professor de Filosofia e de Sociologia do Centro Universitário Newton Paiva. Leciona também Ensino Religioso na Rede Municipal de Contagem. É graduado em Filosofia (PUC - MG), especialista em Filosofia (UFMG), em Ciências da Religião (ISTA) e é mestre em Filosofia na Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE). Contato: blphilos@ oi.com.br.

_________________________ O Ensino Religioso no Brasil: tendências, conquistas, perspectivas. Petrópolis: Vozes, 1996. 151 p. (Col. ERE - série Fundamentos). __________________________ Ensino Religioso: Perspectivas Pedagógicas. Petrópolis: Vozes, 1994. 126p. (Col, ERE. Série Fundamentos). FILHO, Tarcízio G. Ensino Religioso e a formação do ser político. Uma proposta para a consciência de cidadania, Petrópolis: Vozes, 1998, 125p. (Col. ERE - série fundamental). FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. Saberes necessários a prática educativa. São Paulo: Paz e Terra. 1996. 165p.

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BELO HORIZONTE E OS MEGAEVENTOS ESPORTIVOS Marcella C. Amaral Scotti.1

RESUMO: A partir do momento em que um país se torna sede de um megaevento esportivo, as cidades se transformam no centro das atenções. Neste sentido, a intenção desse artigo é discorrer sobre alguns temas relacionados às cidades e aos megaeventos, além de fazer uma pesquisa em busca de bibliografias que já estejam discutindo a realização dos megaeventos em Belo Horizonte ou até mesmo em outras cidades. Diante das informações apresentadas é imprescindível realizar um estudo sobre a interface entre impactos, legados, políticas urbanas e o direito à cidade, considerando-se a Região Metropolitana de Belo Horizonte. PALAVRAS-CHAVES: Cidades, Megaeventos, Belo Horizonte.

1. INTRODUÇÃO

acontece porque para abrigar um megaevento a cidade preci-

A partir do momento em que um país se torna sede de

sa contar com equipamentos como centros de convenções e

um megaevento esportivo, seja uma copa do mundo de

meios de hospedagem, além de uma adequada infraestrutura

futebol ou jogos olímpicos, as cidades se transformam por um

de transporte que permita a mobilidade dos participantes do

determinado período de tempo no centro das atenções em

evento. Tem-se que a produção dos impactos está intimamente

escala mundial. Esses eventos causam um grande impacto na

ligada com a própria conformação do legado, constituindo-se

dinamização e reestruturação das cidades, se tornando assim,

na fase de todo o processo que vai além da temporalidade dos

um agente poderoso de planejamento e mudanças no espaço

jogos e se solidifica como permanência tangível e intangível no

urbano (MASCARENHAS, 2008).

território. (RAEDER, 2008)

Segundo Raeder (2008) o ano de 2007 foi marcante na his-

Rolnik2 aponta que esse é um momento particular na vida

tória do país relacionado aos esportes em função de três acon-

urbana do Brasil e explica que no processo de globalização

tecimentos – a realização dos Jogos Pan-americanos na cida-

que estamos vivendo, existe um componente perverso uma vez

de do Rio de Janeiro, a vitória da candidatura do Brasil como

que ao derrubar barreiras, abre-se o território do planeta para

sede da Copa do Mundo de Futebol em 2014 e a apresenta-

que o capital financeiro avalie e decida aonde é melhor investir.

ção da candidatura do Rio de Janeiro aos Jogos Olímpicos de

Isto é, com o megaevento um investimento local toma uma es-

2016, sendo aceita posteriormente. Esta programação de even-

fera global. As cidades, para competir entre si com investimen-

tos torna imprescindível um estudo acerca do desenvolvimento

tos, passam a criar espaços internacionais que sejam atrativos.

urbano que ocorre em função desses eventos, bem como dos

Sendo assim, a agenda principal da política no Brasil é prepa-

impactos e legados resultantes.

rar a cidade para o negócio. Consequentemente, o direito à

Ainda de acordo com o autor citado acima, a realização dos

cidade está sendo violado e estão ocorrendo desapropriações

eventos vem sendo considerada uma das principais estratégias

sem o devido debate. A Copa passa a ser a oportunidade de

utilizadas pelas cidades em busca de atrair financiamentos e

realização de grandes obras, e esse é o aspecto perverso, pois

investimentos, o que acaba servindo para aquelas cidades que

o evento ganha legitimidade uma vez que o poder de quem

desejam se beneficiar e promover mudanças em termos urba-

decide se torna maior.

nísticos. Esses eventos podem ser das mais diversas naturezas,

Neste sentido, a intenção desse artigo é discorrer sobre al-

entretanto há um interesse especial nos eventos que geram uma

guns temas relacionados às cidades e aos megaeventos, tendo-se

repercussão internacional tendo-se em vista a grande divulgação

em vista a cidade de Belo Horizonte e região metropolitana, além

da imagem da cidade sede.

de fazer uma pesquisa em busca de bibliografias que já estejam

Os impactos que se dão em função do evento agregam problemas à urbanização dos municípios e podem gerar efei-

discutindo a realização dos megaeventos em Belo Horizonte ou até mesmo em outras cidades.

tos de natureza variada na vida social, tais como geração de emprego, de renda, de visibilidade para a cidade, de desapro-

2. AS CIDADES

priação de famílias, bem como de valorização de áreas. Isso

De acordo com Castells e Borja (1996) as cidades estão

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adquirindo cada vez mais um profundo protagonismo, seja no

diar os jogos olímpicos que causaria um impacto em seis áreas

aspecto político, econômico, social, cultural, assim como nos

urbanas.

meios de comunicação. Sendo assim, é possível denominar as

Essas teorias têm relação com o que Vainer (2003) acredi-

cidades como complexos atores sociais. Isso se torna mais cla-

ta que todo e qualquer projeto de cidade tem como base uma

ro uma vez que a cidade faz uma articulação entre as instituições

utopia, ou seja, um modelo ou ideal de cidade. De acordo com

públicas e a sociedade civil.

Vainer, a primeira e fundamental utopia urbana foi a utopia mé-

Observando o exemplo da América Latina, temos que os

dica ou higienista, que buscou a medicalização das cidades a

processos de democratização política e de descentralização do

fim de estabelecer uma ordem urbana na cidade da Revolução

Estado provocaram uma revalorização do papel das cidades e

Industrial, que apresentava muitos problemas. Posteriormente, a

dos governos locais, ao longo dos anos 80. Porém, de acordo

utopia sanitarista deu lugar à utopia modernista em que a cidade

com os autores “as limitações destes processos e os efeitos so-

é pensada como lugar da produção e da reprodução.

ciais das políticas de ajuste, acrescentadas às desigualdades

E por fim, a ditadura militar levou ao conceito técnico/tec-

e marginalidades herdadas, à debilidade da sustentação so-

nocrático do planejamento urbano. A utopia tecnocrática parte

ciocultural das cidades e aos graves déficits de infraestrutura e

do princípio de que os técnicos (planejadores) que possuem o

serviços públicos, atrasaram a emergência das cidades como

conhecimento e o saber especializado, têm a capacidade de

protagonistas, quadro que se alterou sobremaneira na década

elaborar diagnóstico e consequentemente propor soluções aos

de 90” (CASTELLS e BORJA, 1996, p.154).

problemas. A crise dessa utopia ocorreu simultaneamente ao

De um lado, a renovação da economia estimulou a execução

crescimento dos movimentos urbanos e ao fortalecimento de

de projetos urbanos em grande escala, além de dinamizar o setor

organizações populares. Porém, ao lado de cada luta específica

da construção civil; mas, por outro lado, alguns problemas de agra-

(por moradia, saneamento, transportes, entre outros) havia a luta

varam como o déficit da infraestrutura física e de comunicações, a

para democratizar a cidade, fazendo emergir a utopia da cidade

insuficiência de recursos públicos, incapacidade de atuação dos

democrática.

governos locais, fraca integração social e baixa cooperação entre as esferas públicas e privadas.

Juntamente a essa utopia e aproveitando o vazio deixado pela crise do modelo tecnocrático, surgiu um novo modelo, o

O crescimento da abertura econômica externa e o estabele-

da cidade-empresa ou cidade-mercadoria. A partir do final dos

cimento dos processos democráticos internos contribuíram tam-

anos 1980 e durante toda a década de 1990 ouviu-se falar que a

bém para multiplicar as demandas sociais e ampliar a sensação

cidade deve ser competitiva. Um documento do Banco Mundial

de crise nas cidades. Tal sensação era provocada pelos pro-

oferece uma ideia do que as cidades deveriam fazer: “competir

blemas urbanos como congestionamentos, falta de segurança

pelo investimento de capital, tecnologia e capacidade empresa-

e serviços básicos, entre outros. Por outro lado, as dinâmicas

rial; competir para atrair novas indústrias e negócios; ser com-

econômicas, sociais e políticas criaram condições para respos-

petitivas nos preços e qualidades dos serviços; e competir para

tas a esses problemas, como a aprovação de projetos de refor-

atrair mão-de-obra qualificada” (WORLD COMPETITIVE CITIES

ma política e financeiras em algumas cidades (México, Bogotá e

CONGRESS, 1998, p.2, apud VAINER, 2003, p.28). Isto é, a ci-

Buenos Aires), reformas na constituição brasileira, início de pla-

dade passa a ser pensada como uma empresa, atuando em um

nos estratégicos baseados na participação popular, a execução

mercado internacional que é bastante competitivo.

de grandes projetos urbanos, entre outros.

Nesse mesmo caminho, o artigo de Sanchéz (1999) sobre as

Em função de todos esses aspectos, as grandes cidades

políticas urbanas em renovação discute as mudanças nas políti-

da América Latina emergiram nos anos de 1990 como atores

cas urbanas pautadas nas ações que perseguem a promoção da

políticos e econômicos. Porém, de acordo com os autores, a

cidade. Neste sentido, o city marketing e os planos estratégicos

consolidação dessa nova função das cidades irá depender do

se apresentam como instrumentos importantes do que se chama

estímulo que for dado a grandes projetos de cidade que levem

de novo planejamento urbano que visa recuperar sua legitimida-

em consideração a participação dos agentes públicos e priva-

de quanto à intervenção pública na cidade.

dos e que, por sua vez alcancem o consenso público amplo.

O city marketing se constitui na orientação da política urba-

Alguns desse projetos passaram de uma proposta setorial

na ao atendimento das necessidades do consumidor (empre-

“para uma proposta global de desenvolvimento urbano pactua-

sário, turista e cidadão). Já o plano estratégico visa atuações

do” (CASTELLS e BORJA, 1996, p. 155). Como exemplo, temos

integradas em longo prazo, direcionadas à execução de gran-

a proposta da candidatura do Rio de Janeiro em 2004 para se-

des projetos que objetivam crescimento econômico e desenvol-

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vimento urbano.

relação de forças que visem um outro momento, ou o futuro.

Na visão da autora, tais planos estratégicos são uma forma

Sánchez comenta inclusive que o termo desenvolvimento tem

de obter consenso político para a execução de grandes proje-

sido muito utilizado nos discursos, como no caso do legado dos

tos, mas são vistos também como “fábricas de imagem”. Neste

megaeventos. No caso do direito à cidade, a autora entende

sentido, é construída uma “imagem de marca” para a cidade

esse aspecto como uma conquista a partir de enfrentamentos

com o objetivo de projetá-la no exterior e o marketing é utilizado

e de lutas sociais.

para promover seus produtos, como o turismo, a cultura e os serviços de ponta.

Sendo assim, a crítica aos megaeventos perpassa ao fato de que eles não estão sendo acompanhados de um projeto que

O artigo inicialmente situa as políticas de promoção das ci-

seja discutido pela sociedade civil, para que se alcance ganhos

dades no contexto da transformação dos objetivos e dos instru-

sociais nas metrópoles brasileiras que são muito desiguais. Em

mentos da política urbana; em um segundo momento Sanchéz

relação aos impactos que as intervenções relacionadas aos me-

discute o papel dos novos planos estratégicos assim como do

gaeventos causam em termos urbanos, Sánchez comenta que

“urbanismo-espetáculo”; e por fim a autora propõe uma aproxi-

esses impactos agravam as desigualdades nas cidades e aca-

mação ao tema da construção do consenso social.

bam não provocando melhorias na vida urbana de forma signifi-

Para encaminhar toda essa discussão, Sanchéz lança mão

cativa em locais que carecem de mais obras de infraestrutura e

dos casos de Barcelona e Curitiba, oferecendo exemplos para

de transportes. Este último segmento inclusive está sendo pla-

ilustrar, principalmente, como os meios de comunicação e as

nejado mais em função do bom andamento dos jogos de futebol

campanhas publicitárias criam um sentimento de “pertencimen-

e olímpicos, em detrimento da definição de uma infraestrutura

to” e até mesmo de participação por parte da população em geral

de transporte que beneficie e enfrente os problemas de mobili-

nessa transformação da cidade, quando na verdade o que se tem

dade metropolitana.

é uma “manobra” por parte dos gestores para obter a adesão da população e evitar qualquer tipo de manifestação contrária.

Para Whitaker4 o crescimento econômico é um processo em que o capital é reproduzido e consequentemente gera lucro, não significando desenvolvimento social. Essa confusão entre os dois

3. OS MEGAEVENTOS

termos – crescimento econômico x desenvolvimento – é a ma-

As discussões acerca da reestruturação do espaço e a re-

neira utilizada pelos megaeventos para legitimar e promover as

qualificação de áreas urbanas vêm se intensificando recentemen-

intervenções no território. Isso significa que se promete a geração

te em função do país se tornar, nos próximos anos, sede de dois

do desenvolvimento, quando na verdade gera-se um crescimento

grandes eventos esportivos. Neste sentido, torna-se imprescindí-

econômico cujo lucro é limitado aos proponentes do projeto.

vel compreender as rupturas, os conflitos e os impactos gerados

Portanto, esses grandes eventos estão gerando um tipo de

pelas grandes intervenções no território, sejam nos âmbitos terri-

mistura entre os conceitos de crescimento e desenvolvimento. O

toriais, sociais, econômicos, ambientais e políticos. Tais interven-

discurso se direciona a importância de receber eventos, ter jo-

ções são realizadas no intuito de adequar os espaços para os

gos de futebol, ter jogos olímpicos na cidade, uma vez que isso

fluxos que se darão em função desses eventos.

vai movimentar as atividades econômicas, gera um crescimento

Neste contexto, evidencia-se a necessidade de analisar a

da rede hoteleira, o que resulta em desenvolvimento. Instala-se,

conformação atual da gestão das cidades e os discursos que

portanto uma confusão porque esse cenário gera crescimento,

são gerados em função de tal cenário. O que se percebe é que

mas para setores específicos como o turismo.

por trás do conjunto de intervenções no território a serem realiza-

No XIV Encontro Nacional da Anpur realizado em maio de

das, há um discurso de que a intenção das mesmas é promover

2011 na cidade do Rio de Janeiro, vários artigos contemplaram

o bem estar social, porém os megaeventos são a verdadeira jus-

os impactos dos megaeventos nas cidades. O artigo de Pereira

tificativa para as intervenções. Sendo assim, reivindicações an-

(2011) intitulado “As políticas públicas nas favelas cariocas em

tigas da população agora têm a chance de se tornar realidade.

tempos de megaeventos esportivos na cidade” tem o objetivo

Nesse âmbito, Sánchez3 aponta a diferença de entendimen-

de compreender, analisar e sistematizar as ações recentes do

to entre o discurso oficial e o discurso das lutas sociais no que

poder público na cidade do Rio de Janeiro direcionadas para as

diz respeito à ideia de desenvolvimento e do direito à cidade.

favelas, tais como o Programa de Aceleração do Crescimento

Coloca-se que a noção de desenvolvimento é disputada, ou

– PAC, as Unidades de Policiamento Pacificadoras – UPPs, a

seja, quando se fala em processos sociais, territoriais e em pro-

ameaça de remoções em função dos megaeventos esportivos,

jetos, tem-se a ideia de um desenvolvimento de um estado de

a construção de muros e barreiras sonoras e, por fim o Progra-

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 191


ma Morar Carioca.

do Mundo / 2014 e Jogos Olímpicos / 2016”. No final do mês

O autor observa que a cidade vive um momento em que

de fevereiro ocorreu o I Workshop de Planejamento, evento que

várias políticas públicas (complementares e contraditórias) são

contou com a participação de pesquisadores do INCT Observa-

direcionadas para as favelas, o que envolve uma grande arti-

tório das Metrópoles envolvidos no projeto. O objetivo dessa pri-

culação e quantidade de recursos dos governos municipal, es-

meira oficina foi organizar o cronograma de pesquisa e “afinar”

tadual e federal. A questão norteadora do artigo propõe saber

o diálogo entre os participantes5.

quais seriam as possibilidades para a construção de um futuro

Ocorreu também no início do mês de abril deste ano o 2º

e de uma cidade mais justa para a maior parte da população e

(De)bate-bola6 com a finalidade de fomentar a discussão sobre

não somente para uma minoria, tendo-se em vista que a cidade

o outro lado da Copa de 2014 – quais as conseqüências das

do Rio de Janeiro se prepara para sediar os dois maiores mega-

grandes obras para as cidades-sede; quais direitos ficam em

eventos esportivos do planeta.

segundo plano em nome dos jogos; e quais interesses estão por

A autora Silva (2011) cujo trabalho é intitulado “Apropriação

trás desses eventos, entre outros.

social na política dos Jogos Pan-americanos” apresenta alguns

O 2º (De)bate-bola foi realizado na reitoria da UFPR e organi-

exemplos de equipamentos que foram construídos para receber os

zado pelo Observatório de Políticas Públicas do Paraná e nesta edi-

jogos, porém após os mesmo não se verificou um uso social dos

ção contou com o apoio do Programa de Pós-Graduação em Ge-

equipamentos, como o Estádio Olímpico João Havelange, adminis-

ografia da UFPR e do Observatório das Metrópoles / INCT / CNPQ.

trado por entidade privada e cujo entorno se encontra abandonado.

O grupo de pesquisa está estruturado em um núcleo nacio-

A problematização do trabalho gira em torno de quais seriam

nal que trata das macroquestões de análise (atuação dos minis-

os processos de apropriação social dos equipamentos esportivos

térios e organismos internacionais) e 12 núcleos dedicados a

na política dos jogos na cidade do Rio de Janeiro. Silva (2011) afir-

cada uma das cidades-sede. Os núcleos são divididos em gran-

ma que os benefícios foram poucos e que a maioria dos grandes

des áreas: infraestrutura, desenvolvimento econômico, direito à

empreendimentos não são socialmente apropriados.

cidade, moradia e dinâmica urbana e ambiental e, finalmente,

O artigo de Bienenstein (2011) com o tema “O espetáculo

governança urbana e metropolitana.

na cidade e a cidade no espetáculo: grandes projetos, megaeventos e outras histórias” aborda o fato de que atualmente há

4. BELO HORIZONTE E REGIÃO METROPOLITANA

uma grande produção de riqueza paralelamente à uma grande

A partir do século XVII, a maioria das velhas capitais da

produção de miséria e exclusão socioespacial, e a promoção

Europa foram sendo remodeladas por seus soberanos, objeti-

de espetáculos (os megaeventos são alguns deles) parecer ter

vando a sistematização do tecido urbano, inaugurando, assim,

assumido importância e centralidade nas discussões urbanas.

uma distribuição geométrica baseada nos princípios barrocos

Sendo assim, esse artigo visa refletir como esse processo está

de articulação do poder através do espaço, como aponta Ma-

ocorrendo recentemente nas cidades brasileiras, mas o objeto

galhães (1989). Como forma de ilustrar a ruptura entre o Império

de estudo é a cidade do Rio de Janeiro. O foco da discussão

e a nova República, seria preciso destruir o que antes existia,

versa sobre a construção da “Cidade Olímpica”; o autor resgata

como comenta Monte-Mór (1994), artifício materializado através

a trajetória desse processo, bem como as motivações, discursos

da mudança de capital em Minas Gerais. Além das funções pré-

e ações do universo de atores políticos e econômicos envolvidos

estabelecidas de cidade planejadamente moderna, implicando-

com a realização desses eventos. Nas suas considerações, o

a num espaço de representação urbana; ansiava-se, sobretudo,

autor afirma que essas iniciativas se enquadram nas tendências

a distribuição do poder como meio de promover um maior de-

que predominam na urbanização contemporânea, baseada na

senvolvimento do país, bem como no Estado.

chamada “democracia do capital”.

Em 1895, iniciou-se a construção da nova capital de mi-

Por fim, o artigo de Vainer (2011) com o título “Cidade de

nas. Inaugurada em 12 de dezembro de 1897 com o nome

exceção: reflexões a partir do Rio de Janeiro” e o artigo de

de Cidade de Minas, alterado novamente para Belo Horizonte

Oliveira (2011) “Força-de-lei: rupturas e realinhamentos ins-

em 1901 (Singer, 1968). Duas características estruturais são

titucionais na busca do “sonho olímpico” carioca” tratam do

marcantes no projeto da nova capital – a segregação espa-

tema das leis que tornam-se passíveis de desrespeito legal

cial que diferenciava os ricos (funcionários estaduais e co-

para que os megaeventos se realizem de maneira plena.

merciantes, entre outros) dos pobres (trabalhadores), através

Já o Observatório das Metrópoles iniciou em janeiro de 2011

da diferença de espaços planejados e não planejados, além

o projeto “Metropolização e Megaeventos: os impactos da Copa

da diferenciação de casas, conforme o status social de seu

192 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


morador; e a perspectiva da classificação dos espaços de acordo com suas funções, como exemplo de moradia, traba-

ciam a construção de novos meios de hospedagem. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

lho, comércio, lazer, entre outras (JULIÃO, 1996 apud MEDEI-

Diante das informações apresentadas é imprescindível re-

ROS, 2001). Então, foi a população trabalhadora, excluída do

alizar um estudo sobre a interface entre impactos, legados, po-

espaço central da cidade, que de fato determinou a produção

líticas urbanas e o direito à cidade, considerando-se a Região

da cidade (MONTE-MÓR, 1994). Nascia assim uma cidade

Metropolitana de Belo Horizonte. Direciona-se a discussão acer-

segregacionista, que proporcionava a discriminação social no

ca da ideia de como fazer valer o direito à cidade, que perpassa

espaço, uma vez que reservou a zona urbana para uma elite

pela organização daqueles que têm direito e da reavaliação das

e direcionou a população economicamente mais pobre para

estratégias de atuação. Assim, o megaevento teria uma legitimi-

a zona suburbana (HORTA, 1994).

dade caso vise a consolidação de um legado que seja cidadão,

Ao falarmos dos dias atuais, Belo Horizonte se torna muitas,

ou seja, aquele composto por bens que gerem as melhorias

pois o processo de periferização que esta desenvolve, tornou-se

urbanas e a redução das desigualdades sociais. Esse legado

um dos indicativos da reorganização espacial atual da cidade,

poderia direcionar as políticas urbanas no sentido de ampliar e

onde a segregação espacial ao mesmo tempo que afastou as

garantir os direitos dos cidadãos.

áreas periféricas, encurtou espaços para sua inserção em áreas bastante valorizadas atualmente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Para os próximos anos, a Região Metropolitana de Belo Horizonte deve enfrentar desafios de crescimento, organização, produção e gestão do espaço, de forma a reduzir as desigualdades socioespaciais, propondo soluções para a mobilidade metropolitana e a habitação, entre outras questões, tendo-se em vista inclusive desafio de se preparar para sediar um Megaevento como a Copa do Mundo de Futebol. Belo Horizonte e região metropolitana passa atualmente por um momento especial de transformações e da recente elaboração do Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado, aonde muitas dessas questões vem sendo discutidas. O município de Belo Horizonte possui o Comitê Executivo para a Copa do Mundo de 2014 que já elaborou um planejamento estratégico integrado para o evento e vem liderando os esforços para que as ações sejam efetivadas. A cidade conta também com o apoio da Belotur e da Secopa - Secretaria de Estado Extraordinária da Copa do Mundo. Em eventos recentes realizados em Belo Horizonte, fica claro o discurso de

Anais do XIV Encontro Nacional da Anpur realizado em maio de 2011 na cidade do Rio de Janeiro. CASTELLS, M., BORJA, J. As cidades como atores políticos. Novos Estudos nº 45, São Paulo, p.152-166, 1996. HORTA, Célio Augusto da Cunha. Belo Horizonte: a construção de um saber geográfico. Universidade Federal de Santa Catarina, 1994. Florianópolis. Dissertação de Mestrado em Geografia. 373p. MAGALHÃES, Beatriz de Almeida. Belo Horizonte: Um Espaço para a República. UFMG, 1989. MASCARENHAS, Gilmar. Megaeventos esportivos e urbanismo: contextos históricos e legado social. In: RODRIGUES, Rejane Penna, et. al (org.). Legados de Megaeventos Esportivos. Brasília: Ministério do Esporte, 2008. MEDEIROS, Regina (org.), José Márcio Barros...[et al.]. Permanências e mudanças em Belo Horizonte. Belo Horizonte: PUC Minas - Autentica, 2001.144p.

que as obras são para a cidade e seus cidadãos e não para a Copa, mas que o evento se torna um importante instrumento para “acelerar as coisas”. Dentre as obras a serem realizadas, as referentes ao Anel Rodoviário, Av. Pedro I e a que atingirá a Vila UFMG para a construção de uma alça de acesso ao Aeroporto da Pam-

MONTE-MÓR, Roberto Luís de Melo (coordenador). Belo Horizonte: Espaços e Tempos em Construção. Belo Horizonte: CEDEPLAR / PBH, 1994. 94p.:il – (Coleção BH 100 anos). RAEDER, Sávio. Desenvolvimento Urbano em Sedes de Megaeventos Esportivos. In:

pulha, já fazem parte de um conflito em relação ao reassentamento de famílias. Além disso, já existe uma lei em Belo Horizonte que se constitui numa exceção direcionada para a Copa devido ao fato de que se detectou que há uma carência de meios de hospedagem na cidade. Portanto, em 05 de julho do presente ano, por meio da Lei Orgânica Municipal nº 9952 criou-se em função da Copa de 2014 dispositivos que benefi-

SÁNCHEZ, Fernanda. Entrevista concedida aos organizadores do II Seminário PPLA: economia, sociedade e território. Disponível em < http:// www.coopere.net/ppla > Acesso em: 04 de ago. 2010. SANCHÉZ, Fernanda. Políticas urbanas em renovação: uma leitura crítica dos modelos emergentes. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais. n.1. maio/1999.p.115-132.

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SINGER, Paul Israel. Desenvolvimento Econômico e Evolução Urbana: Análise da Evolução Econômica de São Paulo, Blumenau, Porto Alegre, Belo Horizonte e Recife. São Paulo: Editora Nacional e Editora da USP, 1968.378p. VAINER, Carlos B. Utopias urbanas e o desafio democrático. Revista Paranaense de Desenvolvimento. Curitiba, 2003. WHITAKER, João. Entrevista concedida aos organizadores do II Seminário PPLA: economia, sociedade e território. Disponível em <http:// www.coopere.net/ppla> Acesso em: 04 de ago. 2010. Disponível em <http://terradedireitos.org.br/biblioteca/em-nome-dosmegaeventos-leis-e-direitos-ficam-no-banco-de-reserva/> Acesso em: 02 ago. 2011. Disponível em <http://mobilidadeurb.posterous.com/atualizacao-atrasada-ingresso-na-rede-do-obse> Acesso em: 02 ago. 2011. Disponível em <http://web.observatoriodasmetropoles.net/index. php?option=com_content&view=article&id=1585%3Aworkshop-deplanejamento-metropolizacao-e-megaeventos&catid=43%3Anoticias&It emid=88&lang=pt> Acesso em: 02 ago. 2011.

NOTAS DE RODAPÉ 1. Bacharel em Turismo, Mestre em Geografia, professora do Curso de Tecnologia em Gestão de Turismo do Centro Universitário Newton Paiva. 2. Palestra proferida durante o I Congresso Mineiro de Direito Urbanístico, dentro da temática “Impactos sociais dos Megaeventos”, em Belo Horizonte, outubro de 2010. 3. SÁNCHEZ, Fernanda. Entrevista concedida aos organizadores do II Seminário PPLA: economia, sociedade e território. Disponível em <http://www.coopere.net/ppla> Acesso em: 04 de ago. 2010. 4.WHITAKER, João. Entrevista concedida aos organizadores do II Seminário PPLA: economia, sociedade e território. Disponível em <http:// www.coopere.net/ppla> Acesso em: 04 de ago. 2010. 5.http://web.observatoriodasmetropoles.net/index.php?option=com_co ntent&view=article&id=1585%3Aworkshop-de-planejamento-metropolizacao-e-mega-ventos&catid=43%3Anoticias&Itemid=88&lang=pt 6.http://terradedireitos.org.br/biblioteca/em-nome-dos-megaeventosleis-e-direitos-ficam-no-banco-de-reserva/

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ALTERNATIVAS AOS TESTES DE SEGURANÇA DE COSMÉTICOS EM ANIMAIS Sara Marques da Cruz1 Lúcia Helena Angelis2

RESUMO: No cotidiano, podem-se utilizar vários cosméticos que ficam em contato direto com o corpo humano. Dessa forma, é possível ficar exposto em um só dia a uma série de substâncias químicas. Segundo a ANVISA, o produto cosmético deve ser seguro para o usuário nas condições normais ou previsíveis de uso. Para isso, uma série de testes toxicológicos é realizada. Até os dias atuais, as metodologias para determinar o perfil toxicológico dos cosméticos se baseiam em experimentos com animais. Porém, tais metodologias tem sido alvo de discussões a nível mundial, devido às questões éticas que envolvem os experimentos in vivo. Em 1959, foram publicados os princípios dos Três R’s (refine, replace e reduce) que repercutiram a favor da reavaliação da necessidade de testar produtos cosméticos em animais. Graças a esses princípios, existem inúmeras metodologias alternativas aos ensaios in vivo. PALAVRAS-CHAVE: Segurança de cosméticos; Toxicidade; Ética; Experimentação animal; Métodos alternativos.

INTRODUÇÃO

colocação do cosmético no mercado (CHORILLI et al.,2009).

Os produtos cosméticos são utilizados pelo homem

A avaliação de segurança dos cosméticos é um processo

desde épocas remotas. A princípio, a fonte de seus

que se destina a calcular ou estimar os riscos a um sistema-

ingredientes eram essencialmente plantas, animais e

alvo, levando em conta as características do agente a ser tes-

minerais. No entanto, o avanço da tecnologia resultou

tado, sendo ele o ingrediente ou o produto acabado. (BRASIL,

no desenvolvimento de novas substâncias para serem

2010; PAUWELS & ROGIERS, 2010).

incluídas na formulação de tais produtos” (CHORILLI et

Até os dias atuais, as metodologias para determinar os

al.,2009, p.1).

riscos ou o perfil toxicológico dos cosméticos se baseiam prin-

Segundo a RDC (Resolução da Diretoria Colegiada)

cipalmente em experimentos com animais. No entanto, estes

nº79/2000, “Cosméticos, Produtos de Higiene e Perfu-

testes têm sido alvo de críticas e discussão a nível mundial,

mes são preparações constituídas por substâncias na-

devido às questões éticas que envolvem os experimentos em

turais ou sintéticas, de uso externo nas diversas partes

animais. De acordo com o Artigo 8º da Declaração Universal

do corpo humano, pele, sistema capilar, unhas, lábios,

dos Direitos do Animal, a experimentação animal que implique

órgãos genitais externos, dentes e membranas muco-

um sofrimento físico é incompatível com os direitos do animal,

sas da cavidade oral, com o objetivo exclusivo ou prin-

mesmo se tratando de experimentações médicas, científicas,

cipal de limpá-los, perfumá-los, alterar sua aparência e/

comerciais ou qualquer outra forma (CHORILLI et al.,2009;

ou corrigir odores corporais e/ou protegê-los ou mantê-

PAUWELS & ROGIERS, 2010; CFMV, 2010).

los em bom estado” (BRASIL, 2010).

Russel e Burch afirmaram que a boa pesquisa com animais deve respeitar os princípios dos Três R’s: replacement, reduc-

Considerando, então, que é possível utilizar vários

tion e refinement, que significam respectivamente, substituição,

cosméticos no cotidiano e, que esses produtos estão em con-

redução e refinamento. No decorrer deste trabalho oprincípio

tato direto com o corpo humano, pode-se afirmar que é possível

dos Três R’s será abordado mais detalhadamente (GOLDEM-

ficar exposto num só dia a uma série de substâncias químicas

BERG, 2000).

de natureza e comportamento específicos (SANTOS, 2008).

Na União Européia, a maioria dos testes utilizados para

Devido a essa exposição, ao fato de que o produto cos-

a geração de dados toxicológicos de ingredientes e produtos

mético é de livre acesso ao consumidor e, partindo do pressu-

cosméticos dependia dos animais. No entanto, as alterações

posto de que estes produtos podem ser usados amplamente

recentes nas legislações estão conduzindo os pesquisadores

durante um longo período da vida, é extremamente necessário

a desenvolver e adotar métodos alternativos não-animais para

garantir a segurança dos mesmos. Assim sendo, os ensaios

garantir a segurança humana. Essas alterações fizeram com

para avaliação de segurança devem ser realizados antes da

que desde 2009 na Europa fossem proibidos os testes in vivo e

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 195


ainda, que não fossem admitidas matérias-primas ou produtos

pesquisa, o refinamento de técnicas (melhora na condução dos

acabados que tiveram sua segurança comprovada através de

estudos no sentido de reduzir o sofrimento animal) e a busca

testes em animais (WESTMORELAND & HOLMES, 2009).

de métodos alternativos que, por fim, substitua os testes in vivo

O objetivo deste trabalho foi descrever as principais meto-

(PETROIANU, 2010; CAZARIN et al., 2004).

dologias utilizadas para avaliação in vivo da segurança de cos-

Os três R’s repercutiram de forma muito positiva e foram

méticos e suas alternativas in vitro, com ênfase nas questões

incorporados pela Royal Commission of Ethics do Reino Unido e

éticas sobre experimentos em animais para fins científicos.

adotados pelo governo dos Estados Unidos para liberar verbas

Para o desenvolvimento deste trabalho, foi realizada uma revisão de literatura em artigos científicos e sites consagrados nacionais e internacionais que tratam do assunto.

que estimulassem os projetos de pesquisa em áreas biomédicas (PETROIANU, 2010). Muitas experiências têm ocorrido com animais de forma mal planejada e mal conduzida. A ausência de um

REVISÃO DE LITERATURA

protocolo de intenções e propósitos e a desistência da

SEGURANÇA DE PRODUTOS COSMÉTICOS E TOXICOLOGIA

pesquisa por mera curiosidade, não apenas constituem

O produto cosmético deve ser seguro para o usuário nas

uma atitude não ética, mas inclusive uma agressão que

condições normais ou razoavelmente previsíveis de uso. Além

leva ao sofrimento animal sem o menor retorno científi-

do conhecimento do nível de absorção cutânea, são necessá-

co. Um pesquisador que provoca choque, queimadu-

rias outras informações para o estudo dos riscos de ingredientes

ras, lesões na pele e outros procedimentos que causem

e produtos cosméticos (BRASIL, 2003).

dor sem finalidade justificável também não age com

A toxicologia é a ciência multidisciplinar que estuda a intera-

princípio ético. (REZENDE et al., 2008, p.237-342).

ção entre o organismo e um agente químico capaz de produzir respostas nocivas, levando ou não a morte ou mesmo comprometendo uma função orgânica (SANTOS, 2008).

“Muitas vezes o pesquisador utiliza agentes químicos e/ou físicos em que os animais devem permanecer paralisados, não

As principais reações adversas caracterizadas para ingre-

podendo escapar à dor e ao sofrimento” (PEREIRA et al., 1998).

dientes e produtos cosméticos são as do tipo irritativas, alergê-

Em meados de 1944, John H. Draize desenvolveu testes em

nicas e sistêmicas. A irritação é uma intolerância local, caracteri-

coelhos para avaliação da irritação ocular e dérmica induzida

zada por desconfortos de maior ou menor grau e de intensidade

por substâncias tópicas. Estes testes tornaram-se metodologias

variável, como ardor e coceira, podendo chegar até a corrosão

padrão pelas quais se avaliam a toxicidade de ingredientes e

do tecido. A alergia ou sensibilização pode ser uma reação de

produtos cosméticos. Porém, os testes de irritação ocular e dér-

efeito imediato (urticária ou de contato) ou tardio (hipersensibili-

mica de Draize levavam a resultados extremamente cruéis. No

dade). Já as reações de efeito sistêmico são consequências da

caso específico de produtos cosméticos, é bastante evidente a

absorção de qualquer ingrediente do produto para a corrente

pressão de grupos protetores do bem-estar animal no sentido

sanguínea através do trato gastrintestinal, trato respiratório, pele

de proibir a utilização de animais nos testes de segurança de

ou mucosas (BRASIL, 2003).

produtos e ingredientes. Eles preconizam ainda a substituição destes ensaios por alternativas que não utilizem animais (AAVS,

Experimentação Animal e Princípios Éticos

2010; COSTA, 2006; CRUZ, 2003; PINHEIRO, 2007; CI,2010).

Nos últimos anos, o comportamento social em relação aos

Visando se adequar aos princípios dos 3 R’s, diversas me-

animais modificou-se consideravelmente. A primeira manifesta-

todologias têm sido desenvolvidas e apresentadas internacio-

ção social que tentou doutrinar as pesquisas que provocam dor

nalmente. No entanto, para que as mesmas sejam utilizadas é

em animais vertebrados denominou-se Cruelty to Animals Act e

necessária a elaboração de protocolos de estudos que avaliem

foi redigida em 1876 (PETROIANU, 2010).

sua relevância e confiabilidade. Para isso, foram fundadas di-

Anos após esta manifestação, em 1959, Russel e Burch pu-

versas instituições responsáveis por desenvolver e validar novos

blicaram o livro The Principles of Humane Experimental Techni-

métodos e também regulamentar os testes alternativos para que

que, no qual afirmaram que a boa pesquisa em animais deve

o uso dos mesmos seja legalizado (CAZARIN et al., 2004).

respeitar os princípios dos 3 R’s. O programa dos 3 R’s é assim

Dentre estas instituições, cabe citar o ICCVAM, (Interagency

denominado devido as iniciais em inglês das palavras Reduc-

Coordinating Committe on the Validation of Alternative Metho-

tion, Refine, Replace (Reduzir, Refinar, Substituir) que significam,

ds), o ECVAM (European Centre for the Validation of Alternative

respectivamente, a redução do número de animais utilizados na

Methods), e o JaCVAM (Japanese Center for the Validation of Al-

196 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


ternative Methods), que promovem o desenvolvimento, a valida-

composto em animais também foi desenvolvido por Draize. Este

ção, a regulamentação e aceitação das metodologias (ALTTOX,

teste é utilizado para avaliar o potencial irritante da pele devi-

2010; CAZARIN et al., 2004).

do aos ingredientes cosméticos e estabelece parâmetros como

Diversos países, como os Estados Unidos e membros da

edema e eritema, como podem ser observados na TABELA 1.

União Européia já aprovaram a utilização de métodos alternati-

Tem-se questionado sobre a confiabilidade deste teste em rela-

vos no processo de registro de novas substâncias, assim como

ção ao seres humanos, pois tem sido demonstrado que a pele

a substituição de alguns métodos por outros que seguem a pro-

do coelho pode tanto subestimar algumas substâncias, como

posta dos 3 R’s (CAZARIN et al., 2004).

superestimar o potencial irritativo de outras (WESTMORELAND

Na Europa, ficou estabelecida na 7ª Emenda da Diretiva

& HOLMES, 2009; AAVS, 2010).

76/768/CEE, que regula a segurança de cosméticos, uma série

Este ensaio pode ser realizado em um único teste (Teste de

de pontos relativos à utilização de animais nos testes de segu-

Irritabilidade Dérmica Primária) ou repetido (Teste de Irritabilida-

rança, incluindo a proibição total de testes de produto acabado

de Dérmica Acumulativa). A metodologia preconiza a utilização

para cuidado pessoal em animais. Em março de 2009, todos

de coelhos albinos, com a pele tricotomizada. O teste é realiza-

esses testes foram proibidos na União Européia e também foi

do na pele intacta e na pele após abrasão. São utilizados, no

proibida a comercialização de produtos que contenham ingre-

mínimo, seis coelhos, com peso corpóreo acima de 2,0 Kg e a

dientes que tenham sido testados em animais (WESTMORE-

área utilizada é de aproximadamente 6,0 cm. A quantidade de

LAND & HOLMES, 2009).

substância-teste aplicada é de 0,5 mL. As áreas de aplicação são recobertas com gaze fixada com fita adesiva durante 24 horas. Após 24 e 72 horas são realizadas as leituras, verificando se

Principais Ensaios Biológicos

houve formação de eritema e/ou edema sobre as áreas (CHO-

TESTE DE IRRITABILIDADE DÉRMICA O teste padrão para avaliar a irritabilidade dérmica de um

TESTE IRRITABILIDADE OCULAR

RILLI et al.,2009; CI, 2010).

tratados com solução salina a 0,9%) 48 e 72 horas após a insti-

O teste de irritabilidade descrito por Draize tem como ob-

lação (CHORILLI et al.,2009; CI, 2010).

jetivo avaliar os efeitos das substâncias na conjuntiva, na íris e

A avaliação dos efeitos adversos após a exposição ao agen-

na córnea de olhos de coelhos albinos. Ele pode ser realizado

te irritante é realizada através de parâmetros como opacidade

com dosagem única para simular contato acidental (xampu, por

para análise da córnea; inflamação, congestão, edema, reação

exemplo) ou dosagens repetidas para simular o uso contínuo e

à luz, hemorragia e destruição maciça para análise da íris; e ver-

repetido de cosméticos para a área dos olhos como, por exem-

melhidão, quemose e outros parâmetros para análise da conjun-

plo, sombras, máscaras e delineadores (CHORILLI et al.,2009;

tiva. Esses efeitos e os valores de graduação para lesão ocular

SANTOS, 2008).

estão representados na TABELA 2. (AAVS, 2010; COSTA, 2006;

Para a realização do teste, geralmente, se utiliza no mínimo

CRUZ, 2003; PINHEIRO, 2007).

6 coelhos, os quais são colocados em uma estrutura que man-

A estrutura da córnea do olho de um coelho difere significa-

tém suas cabeças imobilizadas. Em seguida, 0,1 mL da subs-

tivamente da córnea do olho do ser humano. Os coelhos tam-

tância são instilados na conjuntiva do olho de cada animal. Os

bém produzem um volume menor de lágrimas do que o homem,

olhos não tratados servem como controle e são examinados nos

permitindo que os produtos aplicados nos olhos dos coelhos

tempos de uma hora, 24 horas (momento que se lava os olhos

permaneçam por mais tempo e cause maior irritação. Essa va-

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 197


riação não só faz do testeocular de Draize incerto, como tam-

(AAVS, 2010).

bém contribui para o imenso sofrimento causado aos animais

FOTOTOXICIDADE

nar se uma substância é capaz de provocar uma reação alérgi-

A fototoxicidade é uma reação aguda, que pode ser induzi-

ca. Porém, os especialistas afirmam que todas as substâncias,

da por um tratamento com uma substância química e concomi-

em maior ou menor grau, são capazes de provocar reações alér-

tante exposição à radiação ultravioleta ou visível. Essas reações

gicas (SANTOS, 2008).

são consequências de mecanismos imunológicos e geralmente são acompanhadas de hiperpigmentação e descamação.

Neste ensaio, múltiplas doses são aplicadas a fim de desencadear a reação. A metodologia consiste em aplicações tó-

A cobaia é o animal de escolha para o estudo da fototoxi-

picas da menor dose não irritante por um período de 3 semanas,

cidade. Este teste tem o intuito de pesquisar a capacidade do

chamada fase de indução. Após um período de repouso, reali-

material-teste de induzir uma resposta irritante da pele através

za-se a aplicação tópica da maior dose não irritante, chamada

da irradiação UV (CHORILLI et al.,2009; SANTOS, 2008).

de fase de desafio. As reações são graduadas segundo escala específica, com a finalidade de avaliar o potencial de sensibili-

TESTE DE SENSIBILIZAÇÃO CUTÂNEA

zação (CI, 2010).

A alergia é uma reação imunológica de sensibilização frente a uma determinada substância. Em algumas situações, as rea-

CITOTOXICIDADE

ções alérgicas podem acontecer logo no primeiro contato, po-

O ensaio de citotoxicidade define o potencial de degene-

dendo se tornar severas e pertinentes nas próximas exposições

ração ou morte celular provocado pelas substâncias presentes

(CHORILLI et al.,2009).

nas formulações cosméticas. Algumas substâncias, em certas

O teste de sensibilização cutânea é utilizado para determi-

quantidades podem provocar vômitos ou outros danos ao orga-

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nismo e até a morte. Este teste tem como objetivo avaliar e con-

dos normalmente como suspensão ou solução a 20% durante 4

trolar a toxicidadedos materiais constituintes dos cosméticos.

horas. Logo após, mede-se a opacidade e permeabilidade se-

O método mais utilizado para este fim é o teste da DL50, que

guida da avaliação histopatológica (ICCVAM, 2006a).

determina qual a dose do produto a ser testado será letal para 50% da população testada (CHORILLI et al.,2009). Neste teste, a segurança pode ser avaliada por inalação, ingestão ou injeção da substância (CI, 2010).

É bom ressaltar que este método já é validado pelas instituições ICCVAM, ECVAM e JaCVAM (ALTTOX, 2010). As diferenças entre o BCOP e o teste ocular de Draize estão relacionadas principalmente com as características anatômicas e fisiológicas do coelho, do bovino e do ser humano. Algumas características estão citadas abaixo (ICCVAM, 2006a):

Alternativas às Metodologias In Vivo BCOP – TESTE DE OPACIDADE E PERMEABILIDADE DA

• Presença de membrana nictante ou terceira pálpebra no coelho: esta membrana ajuda na remoção de substâncias irri-

CÓRNEA BOVINA O Teste de Opacidade e Permeabilidade da Córnea Bovina (Bovine Corneal Opacity and Permeability Assay- BCOP) foi

tantes e podem provocar diferenças na cinética de remoção de materiais estranhos.

desenvolvido para que pudessem ser utilizados os órgãos de

• Variação na espessura da córnea. A espessura da córnea

uma espécie que é rotineiramente abatida para fins alimentícios,

do boi é 0,8 mm enquanto a do ser humano mede 0,5 mm e a

visando substituir futuramente o teste de irritação ocular in vivo,

do coelho mede 0,37 mm.

ou ocular de Draize (ICCVAM, 2006a).

• Variação no número de camadas das células.

Este método avalia quantitativamente o potencial irritante de um produto ou uma substância química após aplicação sobre a

• Diferenças de sensibilidade entre coelho, ser humano e o bovino frentes às diversas substâncias a serem testadas.

córnea isolada do bovino. Ele avalia a capacidade de irritação/

Existem, também, algumas vantagens e desvantagens em

corrosão de uma substância através de dois parâmetros: a opa-

relação à metodologia in vitro para avaliação da irritabilidade

cidade da córnea e a permeabilidade de algumas substâncias

ocular. Uma desvantagem se refere à ausência de barreiras pro-

nesta estrutura. A opacidade da córnea é um efeito adverso ex-

tetoras (filme lacrimal, humor aquoso e pálpebras), que poderia

tremamente importante, pois é característico de algumas subs-

levar a resultado falso-positivo. E as vantagens são redução do

tâncias irritantes e tal efeito pode levar à perda da visão. Entre-

custo da análise e redução do tempo (ICCVAM, 2006a).

tanto, algumas substâncias são capazes de destruir o epitélio corneano sem produzir uma opacidade significativa. Avaliou-se,

HET-CAM – TESTE DA MEMBRANA CÓRIO-ALANTÓIDE DO

então, que alguns danos são causados pela penetração de

OVO DE GALINHA

substâncias na córnea, o que justifica a análise deste parâmetro (BRASIL, 2010; ICCVAM, 2006a).

O método HET-CAM (Hens Egg Test-Chorion Allantoic Membrane) foi desenvolvido por Luepke em 1995. Seu objetivo

O Teste de Opacidade e Permeabilidade da Córnea Bovi-

consiste em identificar e avaliar o potencial irritante de um pro-

na apresenta-se como um método quantitativo por ser capaz

duto ou substância química sobre a Membrana Cório-Alantóide

de expressar seu resultado numericamente para opacidade e

(CAM) do ovo embrionado da galinha, visando à redução do nú-

permeabilidade. A opacidade é determinada pela quantidade

mero de animais utilizados no teste de Draize e uma total subs-

de luz que atravessa a córnea através de um opacitômetro e

tituição desse teste no futuro (BRASIL, 2010; ICCVAM, 2006b;

a permeabilidade consiste na determinação da quantidade de

TRIDSKIN, 2010).

fluorosceína (corante indicador) que penetra nas camadas da

Foram feitas comparações da CAM com o olho do mamí-

córnea. As substâncias que induzem irritação/corrosão na cór-

fero e chegou-se a conclusão que esta se assemelha mais a

nea provocam desnaturação de proteínas, edemas e lesão nas

conjuntiva. Ambas as estruturas são membranas que contém

células. Para observar melhor estas reações e determinar o grau

um sistema vascular funcional. Por esta razão, os efeitos agu-

e a profundidade das lesões realiza-se, também, uma avaliação

dos induzidos por uma substância-teste sobre pequenos vasos

histopatológica da córnea (ICCVAM, 2006a).

sanguíneos e proteínas desta membrana se assemelham aos

A metodologia desse teste consiste na aplicação da substância ou produto sobre a córnea. As substâncias ou produtos

efeitos induzidos pela mesma substância-teste aplicada no olho de um coelho (ICCVAM, 2006b; TRIDSKIN, 2010).

líquidos e semi-sólidos geralmente são aplicados sem diluição

Os efeitos que podem ser observados na membrana cório-

durante 10 minutos, em seguida, a córnea é lavada e incubada

alantóide são hiperemia (aumento do fluxo sanguíneo), hemor-

em um meio de reação por duas horas. Os sólidos são aplica-

ragia (extravasamento de sangue dos vasos), lise (ruptura dos

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 199


vasos) e coagulação (presença de coágulos sanguíneos). Estes

tados entre 3 minutos e 4 horas no máximo, para classificação

efeitos, juntamente com outros parâmetros como tempo de de-

de grupos de embalagens. Por fim, é importante informar que

senvolvimento e severidade do efeito, são caracterizados como

o Corrositex é um ensaio já validado pelo ICCVAM e ECVAM

endpoints. Através da medida qualitativa destes, determina-se

(ALTTOX, 2010).

uma pontuação para cada endpoint (TRIDSKIN, 2010). O método HET-CAM tem o potencial de reduzir e refinar o

FOTOTOXICIDADE – 3T3 NRU PT

uso de animais nos testes de irritação ocular. As substâncias

A base desse teste, já validado pelo ECVAM, é a compara-

identificadas como corrosivas ou irritantes seriam excluídas dos

ção da citotoxicidade de produtos químicos quando testados

testes in vivo, o que reduziria o número de coelhos para o teste e

na presença (teste) e na ausência (controle) de uma dose não

pouparia o sofrimento dos mesmos (ICCVAM, 2006b).

citotóxica de luz UVA. A citotoxicidade é medida pela inibição da

Além disso, o HET-CAM reduz o tempo necessário para

captação do corante vital Vermelho Neutro pelas células fibro-

avaliar uma substância, quando comparado com o método in

blásticas de ratos denominadas 3T3 Balb/c, ou seja, determina

vivo. O teste de Draize geralmente é realizado por no mínimo

a dose que reduz o crescimento celular,após 24 horas de expo-

de um a três dias e pode ser prorrogada por até 21 dias. Já o

sição (BRASIL, 2010; IN VITRO CELLS, 2010; ALTTOX, 2010).

HET-CAM requer um período de incubação de nove dias de pré-

As células 3T3 são mantidas em cultura durante 24 horas

tratamento e, cerca de uma hora após aplicação da substância

para a formação de monocamadas. São pré-incubadas duas

teste para analisar os resultados (ICCVAM, 2006b).

placas por substância teste com oito concentrações diferentes

Apesar de não estarem formalmente aprovados, os resulta-

da substância durante uma hora. Em seguida, uma das placas

dos positivos do HET-CAM podem ser utilizados para fins de ro-

é exposta a uma dose não tóxica de UV, enquanto a outra placa

tulagem e classificação de substâncias irritantes oculares graves

é mantida no escuro para ser usada como controle. Em ambas

na União Européia (ALTTOX, 2010).

as placas, o meio de tratamento é depois substituído por meio de cultura e após 24 horas de incubação, a viabilidade celular é

CORROSITEX O ensaio Corrositex mede o potencial de uma substância causar corrosão da pele. O fundamento deste teste baseia-se

determinada pela incorporação do vermelho neutro. Um resultado positivo neste teste indica que a substância-teste é fototóxica (CHORILLI et al.,2009).

em um Sistema de Biobarreira que avalia a capacidade de uma

A redução da concentração de corante na captação de 24

substância de atravessá-la por difusão ou destruição. Em segui-

horas após o tratamento é utilizada como ponto final do ensaio.

da, esta penetração é detectada por um Sistema de Detecção

Encontra-se, então, o valor da IC50 (inhibitory concentration) que

Química que consiste na mudança de cor de uma base líquida

consiste na concentração da substância que reduz a viabilidade

frente a substâncias potencialmente corrosivas. Avalia-se, então,

celular de 50% do valor de células controle não tratadas (ALT-

o tempo requerido para que uma substância ou produto ultra-

TOX, 2010).

passe a biobarreira e produza mudanças visualmente detecta-

A fototoxicidade é definida como uma resposta tóxica de

das. De acordo com o tempo em que foi observado o resulta-

uma substância aplicada ao corpo que seja provocada ou au-

do, as substâncias são classificadas para fins de rotulagem e

mentada após exposição subseqüente à luz, ou que seja induzi-

embalagem de produtos corrosivos (ICCVAM, 2006c; IN VITRO

da pela irradiação da pele após administração sistêmica de uma

CELLS, 2010; IN VITRO INTERNATIONAL, 2010).

substância (ALTTOX, 2010).

O Corrositex também contribui para o princípio dos 3 R’s no que diz respeito à redução do número de animais e ao re-

CITOTOXICIDADE

finamento das técnicas. Dessa forma, ele é usado como parte

A citotoxicidade pode ser avaliada através de três métodos:

de uma estratégia de testes diferenciados para a corrosividade,

citotoxicidade pelo método MTT e citotoxicidade pelo método

pois os resultados positivos eliminam a necessidade de ensaios

vermelho neutro (NRU), já que as células viáveis não coram com

em animais e quando a necessidade de mais destes é determi-

estes corantes e citotoxicidade pela difusão em gel agarose

nada, apenas um animal é necessário para confirmar a corrosivi-

(BRASIL, 2010).

dade de um produto químico (ICCVAM, 2006c).

A citotoxicidade pelo MTT é avaliada com ajuda do um co-

A vantagem de se utilizar esse teste é a redução dos custos

rante vital, o MTT. Os parâmetros de avaliação observados são a

adicionais e do tempo. Ao contrário dos testes em animais que

porcentagem de morte celular e a IC50 que inibe 50% do cresci-

podem levar de 2 a 4 semanas, o Corrositex pode fornecer resul-

mento celular. Este teste não se aplica a produtos insolúveis em

196 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


água (BRASIL, 2010).

in vitro, algumas validadas e outras ainda em processo de vali-

Na citotoxicidade pelo método de Vermelho Neutro, utilizase uma cultura de células SIRC CCL 60 (derivadas da córnea de

dação, que poupam o animal das injúrias sofridas nos testes de segurança.

coelhos) ou outras, adicionadas do corante Vermelho Neutro ou

Existe uma tendência mundial não apenas para reduzir o

MTT. A captação do corante pelas células viáveis é quantificada

número de animais ou refinar as técnicas. Estes princípios são

por espectrofotometria, através de um leitor automático de mi-

apenas os primeiros passos para a principal meta que se deseja

croplacas. Este método pode ser utilizado para todo tipo de for-

alcançar: a substituição total das metodologias in vivo sempre

mulação, exceto aquelas que possuam propriedades fixadoras,

que possível. Para isso, é necessário que cada país reveja seus

como as formulações alcoólicas (BRASIL, 2010).

conceitos de ética sobre experimentação animal.

O teste de citotoxicidade pela difusão em gel de agarose

No Brasil, a maioria dos testes de segurança de cosméticos

é indicado para emulsões e géis com fase contínua aquosa. A

ainda são realizados baseados na metodologia de Draize, ape-

aplicação desses produtos na superfície de um gel agarose em

sar de algumas empresas já prestarem o serviço da realização

contato com as células do tecido conjuntivo de camundongo

das metodologias in vitro. Mas, cabe ressaltar a necessidade de

gera um halo. O diâmetro do halo corresponde a citotoxicidade

um país como o Brasil, que possui o terceiro lugar do mercado

do produto testado e a sua capacidade de se difundir no gel

mundial de cosméticos, se posicionar frente a esta tendência e,

agarose. Como indicador, utiliza-se um corante vital como o MTT

assim, continuar a produzir cosméticos de qualidade respeitan-

ou Vermelho Neutro (BRASIL, 2010).

do o bem-estar animal, pois o princípio do direito à vida também se aplica a eles.

TESTE DE SENSIBILIZAÇÃO DA PELE Para ensaios de sensibilização da pele, pode-se empregar o teste chamado RBC (Red Blood Cells System). Este ensaio permite quantificar e avaliar os efeitos adversos dos tensoativos empregados em xampus, sabonetes líquidos e produtos de higiene sobre a membrana plasmática das hemácias de carneiro e a conseqüente liberação da hemoglobina (hemólise) e ainda, o índice de desnaturação da hemoglobina, avaliado através de sua forma oxidada, ambos quantificados por espectrofotometria. A relação entre a hemólise e a oxidação da hemoglobina fornece um parâmetro de caracterização dos efeitos dessas substâncias in vitro (BRASIL, 2010). CONSIDERAÇÕES FINAIS

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A dor e o sofrimento animal provocados nos testes de segurança de ingredientes e produtos cosméticos ficaram facilmente perceptíveis. Grupos protetores do bem-estar animal e inclusive uma parcela da população se indignam com a crueldade das experiências desenvolvidas no biotério. Frente a este cenário, os setores que fazem uso das metodologias in vivo foram pressionados a desenvolver e validar métodos alternativos aos ensaios em animais, principalmente a indústria de cosméticos. Esta situação é totalmente justificável quando se questiona a real necessidade do sofrimento animal para satisfazer a vaidade do ser humano. O princípio dos 3 R’s foi de extrema importância na reavaliação da necessidade dos ensaios em animais, além de impulsionar pesquisas para o desenvolvimento das metodologias in vitro.

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Hoje, graças a estes princípios, existem inúmeras metodologias PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 201


CHORILLI, M.; TAMASCIA, P.; ROSSIM, C; SALGADO , H.R.N. Ensaios Biológicos para Avaliação de Segurança de Produtos Cosméticos. Revista de Ciências Farmacêuticas Básica e Aplicada, Araraquara, SP, v.30, n.1, p.19-30, 2009. Disponível em: < http://serv-bib.fcfar.unesp.br/seer/index. php/Cien_Farm/article/viewFile/869/768 >. Acesso em: 28 Ago. 2010. COSMETIC INGREDIENT - CI. Como substituir os animais nos testes de segurança de produtos cosméticos. Disponível em: <http://www.revistadecosmetologia.com/infoco_4.php>. Acesso em: 5 nov. 2010. COSTA, R.N. Estudo da Aplicabilidade do Ensaio de Quantificação de Proteínas Totais em Células SIRC na Avaliação do Potencial de Irritação Ocular de Xampus e Tensoativos. 2006. 60p. Tese (Mestrado em Saúde Pública) – Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca – Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, RJ, 2006. CRUZ, A.S. Teste de Citotoxicidade In Vitro Como Alternativa ao Teste ‘In Vivo’ de Draize na Avaliação de Produtos Cosméticos. 2003. 107p. Tese (Doutorado em Produção e Controle Farmacêuticos) – Faculdade de Ciências Farmacêuticas, Universidade de São Paulo-USP, São Paulo, SP, 2003. GOLDENBERG, S.; Aspectos Éticos da Pesquisa com Animais. Rev. Acta Cirúrgica Brasileira, São Paulo, SP, v. 15, n.4, Out./Nov./Dez. 2000. Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid =S0102-86502000000400001 > Acesso em: 3 Out. 2010. INTERAGENCY COORDINATING COMMITE ON THE VALIDATION ALTERNATIVE METHODS - ICCVAM. Introduction and Rationale for Proposed Use of In Vitro Test Methods to Identify Ocular Corrosives and Severe Irritants. BCOP. EUA, 2006a. Disponível em: <http://iccvam.niehs.nih.gov/methods/ ocutox/ivocutox/ocu_brd_bcop.htm>. Acesso em: 21 out. 2010. INTERAGENCY COORDINATING COMMITE ON THE VALIDATION ALTERNATIVE METHODS - ICCVAM. Introduction and Rationale for Proposed Use of In Vitro Test Methods to Identify Ocular Corrosives and Severe Irritants. HET-CAM. EUA, 2006b. Disponível em: <http://iccvam.niehs.nih.gov/methods/ocutox/ivocutox/ocu_brd_hetcam.htm>. Acesso em: 21 out. 2010.

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NOTAS DE RODAPÉ 1 Aluna do Curso de Farmácia do Centro Universitário Newton Paiva 2 Professora de Tecnologia Farmacêutica III do Centro Universitário Newton Paiva

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ANOREXÍGENOS: controle rígido ou proibição de seu uso? Amanda Pauliane Alves Moreira * Elias Borges do Nascimento Júnior **

RESUMO: A obesidade é considerada um problema de saúde pública que associada à comorbidades gera custos aos sistemas de saúde. O seu tratamento consiste em mudanças de estilo de vida, relacionados a hábitos alimentares e atividades físicas. O uso de medicamentos pode ser considerado, quando os resultados não são satisfatórios com as medidas não farmacológicas. O tratamento farmacológico com anorexígenos de ação central, por muito tempo foi visto como uma opção terapêutica duvidosa e sujeita a inúmeras críticas. Isso se deve ao uso abusivo e irracional que levou a necessidade de criação de medidas regulatórias com o intuito de aumentar o controle sobre os anorexígenos e atualmente passam por problemas regulatórios no que diz respeito à eficácia e segurança em longo prazo, motivando a decisão da ANVISA de retirada de três anorexígenos do mercado e manutenção da sibutramina com restrições. PALAVRAS- CHAVE: Obesidade; Anorexígenos; Uso irracional; Controle; Retirada.

INTRODUÇÃO

alimentares e exercícios físicos (MANCINI, HALPERN, 2006).

A obesidade é considerada um problema de saúde pública

Segundo Coutinho 2009, os anorexígenos são indicados jun-

mundial, por se tratar de uma doença crônica de genética com-

tamente com os hábitos saudáveis de vida, a pacientes que

plexa, associada a várias comorbidades e acompanhada de

apresentam índice de massa corporal (IMC) superior a 30 kg/

morbimortalidade principalmente por doenças cardiovascula-

m2, ou quando morbidades estão associadas ao sobrepeso

res (PINHEIRO, FREITAS, CORSO, 2004; REPETTO, RIZZOLLI,

(IMC acima de 25 kg/m2) e que não obtêm resultados satisfató-

BONATTO, 2002). O seu crescimento tem alcançado propor-

rios apenas com medidas não farmacológicas.

ções epidêmicas, e gerado altos custos para os sistemas de

No processo de indicação, devem ser consideradas ca-

saúde. No Brasil, o custo anual da obesidade e doenças liga-

racterísticas importantes dos anorexígenos, tais como: reações

das a ela, é de quase R$ 1,5 bilhão, valor que inclui internações,

adversas no sistema nervoso central, cardiovascular e elevado

consultas e medicamentos (LAMOUNIER, PARIZZI, 2007).

potencial para síndrome de abstinência, abuso, dependência e

A obesidade é resultante de fatores ambientais e genéti-

tolerância (BEHAR, 2002).

cos. Além desses fatores, a doença está relacionada a aspec-

Os anorexígenos que vinham sendo mais utilizados no Bra-

tos socioculturais, marcados pela idealização de magreza, em

sil eram: a anfepramona, femproporex, mazindol e sibutramina

que, principalmente as mulheres, almejam e contrariam as ne-

(CARNEIRO, JÚNIOR, ACURCIO, 2008). O uso desses medica-

cessidades nutricionais do corpo, buscando alternativas para

mentos sempre esteve envolvido com erros de prescrição, uso

perder peso (ALVES et al., 2009; BERNARDI, CICHERELO, VI-

irracional e abusivo, além de desvalorizar métodos convencio-

TOLO, 2005).

nais de tratamento, como as dietas hipocalóricas, exercícios fí-

Diante dessa situação, a busca por métodos mais rápidos

sicos e terapias comportamentais (MANCINI, HALPERN, 2002).

e “milagrosos”, na visão dos pacientes, é algo necessário e fun-

O Brasil sempre se destacou como um dos maiores con-

damental na busca do corpo magro (MELO, OLIVEIRA, 2011).

sumidores de medicamentos anfetamínicos, chegando a um

Entre esses métodos estão os fármacos anorexígenos, que

consumo de 23,6 toneladas anuais (MELO, OLIVEIRA, 2011).

inibem o apetite, causando sensação de saciedade, e conse-

Em relatório divulgado pela Junta Internacional de Fiscalização

quentemente contribuem para redução do peso (FLIER, FLIER,

de Entorpecentes (JIFE) em 2005, foi identificado além do uso

2009).

abusivo, erros relacionados à venda sem prescrições e o des-

O tratamento farmacológico deve ser baseado em um

vio das substâncias de locais de fiscalização (ANVISA, 2005).

diagnóstico médico que avalie profundamente o paciente

Com o consumo elevado dos anorexígenos, tornou-se

quanto ao tipo de obesidade, presença de doenças contraindi-

indispensável aprimoramento de ações de vigilância sanitária

cadas, possibilidade de desenvolvimento de efeitos adversos,

com o propósito de aperfeiçoar o controle e a fiscalização na

e que identifique mudanças impróprias relacionadas a hábitos

venda dessas substâncias que podem causar danos a saú-

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de, estabelecendo normas mais rigorosas para a prescrição

Diretrizes clínicas do tratamento da obesidade, nos sites da As-

mediando seu comércio, por meio de um acesso mais racional

sociação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome

(CARNEIRO, JÚNIOR, ACURCIO, 2008). A criação das medidas

Metabólica (ABESO), e outros artigos publicados em revista de

regulatórias possibilitou um acesso maior aos medicamentos

sites acadêmicos.

por via lícita, por meio das prescrições (MELO, OLIVEIRA, 2011). Além de problemas com uso irracional, recentemente os

OBESIDADE

anorexígenos foram questionados quanto à indicação clínica,

A obesidade é uma doença crônica, definida com base no

reavaliados por estudos sobre eficácia e segurança, com resul-

índice de massa corporal (IMC), que é obtido pela divisão da

tados satisfatórios de redução de peso em curto prazo e pouca

massa corporal (quilogramas – kg) pelo quadrado da estatura

manutenção por longo tempo, além do aparecimento de vários

(metros ao quadrado– m²). O sobrepeso ocorre em indivíduos

efeitos adversos graves que dificulta seu uso clínico (MANCINI,

que apresentam IMC entre 25,0kg/m² e 29,9kg/m². São conside-

HALPERN, 2002; NADVORNY, WANNMACHER, 2004; PAUM-

rados obesos os pacientes com IMC igual ou superior a 30,0kg/

GARTTEN, 2011).

m², na seguinte gradação: obesidade moderada entre 30,0kg/

Desta forma, o presente artigo tem como objetivos levantar

m² e 34,9kg/m²; obesidade severa entre 35,0kg/m² a 39,9kg/m²;

questionamentos sobre o aumento do controle na venda e pres-

e obesidade muito severa (mórbida) acima de 40,0kg/m² (FLIER,

crição com normas complementares, que restrinjam o uso dos

FLIER, 2009).

anorexígenos a pacientes com elevado grau de risco de obesidade, restringindo também a prescrição a médicos especia-

A prevalência da obesidade aumenta de forma rápida e

listas no assunto de modo a conter o uso danoso e irracional,

consideravelmente, atingindo 1,7 bilhão de indivíduos no mundo

considerando o uso contínuo somente se eles forem seguros

inteiro (ERLANGER, 2008; LI, CHEUNG, 2009). No Brasil, dados

e eficazes, assim como analisar a decisão da Agência Nacio-

mais recentes mostram que 12,5% dos homens e 16,9% das

nal de Vigilância Sanitária (ANVISA) de proibição do uso, com

mulheres de um total de 188 mil brasileiros de todas as idades,

manutenção apenas da sibutramina. Além disso, pretende-se

são considerados obesos (RADOMINSKI et al., 2010).

ressaltar as consequências do uso indiscriminado, reforçando a importância do uso racional desses medicamentos.

A obesidade pode acarretar inúmeras comorbidades, como: resistência a insulina, diabetes mellitus tipo 2, hipertensão arterial, doenças cardiovasculares, dislipidemia, doenças biliares,

MÉTODO

apneia do sono, osteoartrites e certos tipos de câncer. Além de

O método utilizado na pesquisa consistiu em uma revisão

complicações, a obesidade está associada a um aumento de

bibliográfica realizada em um período compreendido entre o

50 a 100% no risco de morte por todas as causas, principal-

mês de agosto e meados de setembro de 2011.

mente cardiovasculares, em relação aos indivíduos mais magros

Para a pesquisa foram utilizados os livros: Harrison Medici-

(FLIER, FLIER, 2009). A doença leva a morte de 2,5 milhões de

na Interna e Farmacologia Clínica da Lenita Wannmacher, dis-

indivíduos por ano no mundo todo. Nos Estados Unidos, é a se-

poníveis na biblioteca do Centro Universitário Newton Paiva, nas

gunda causa de morte, com 300.000 óbitos anuais (ERLANGER,

edições mais recentes. Os artigos utilizados foram localizados

2008; FLIER, FLIER, 2009).

em sites acadêmicos, como PUBMED e BIREME que incluiu as

Os gastos com a obesidade e suas complicações são bem

bases de dados LILACS, SCIELO e MEDLINE e utilizou-se como

elevados. No Brasil o custo anual é de quase R$ 1,5 bilhão. Des-

palavras chave: anorexígenos, anfetaminas, aspectos sociais,

se valor, 600 milhões são provenientes do governo via Sistema

obesidade, anorectics, obesity e sibutramine, respectivamente.

Único de Saúde, e representa 12% do orçamento gasto para

Após a leitura de seus resumos para verificar se contemplavam

tratar as doenças decorrentes da obesidade (LAMOUNIER, PA-

o tema abordado, foram selecionados 40 artigos, dos quais 23

RIZZI, 2007). Nos Estados Unidos, os gastos são bem mais rele-

foram incluídos neste trabalho.

vantes chegando a cerca de US$ 50 bilhões por ano (FELIPPE,

Também foram utilizadas, notícias, documentos, relatórios,

SANTOS, 2004).

regulamentações e portaria no site da ANVISA, Conselho Fede-

O crescimento global da obesidade, assim como o seu

ral de Farmácia (CFF), Conselho Federal de Medicina (CFM) e

desenvolvimento em um determinado indivíduo, é resultante de

outras entidades nacionais relacionadas à questão dos medica-

uma interação complexa entre fatores genéticos e ambientais

mentos.

(PINHEIRO, FREITAS, CORSO, 2004; TROMBETTA, 2003).

Outras pesquisas foram realizadas, buscando notícias e

A fisiopatologia da obesidade consiste num aporte calóri-

204 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


co maior que o gasto energético efetivo (CARNEIRO, JÚNIOR,

macológico sozinho mostra ser insuficiente em pacientes com

ACURCIO, 2008). O quadro de balanço energético positivo, ou

obesidade (IMC ≥ 30 kg/m²); ou sobrepeso (IMC≥ 25 kg/m²) na

ganho de peso está relacionado às mudanças no estilo de vida,

presença de comorbidades (COUTINHO, 2009).

caracterizadas por uma alimentação rica em gorduras, açúca-

Tanto o tratamento farmacológico quanto o não farmacoló-

res, alimentos industrializados e redução da atividade física,

gico, muitas das vezes, proporcionam modesta e gradual perda

configurando um ambiente marcado pelas sociedades contem-

de peso em torno de 5 a 10 %, portanto essa perda é capaz de

porâneas (WANDERLEY, FERREIRA, 2010).

reduzir de forma significativa às doenças ligadas à obesidade,

Segundo Popkin et al.(1993), citado por Wanderley e Ferrei-

(COUTINHO, 2009; NADVORNY, WANNMACHER, 2004) visto

ra (2010, p.187) as mudanças nos padrões de alimentação e ati-

que o objetivo do tratamento da obesidade não é apenas reduzir

vidade física,

o peso, mas, além disso, é prevenir ou atenuar a morbidade as-

“se correlacionam com mudanças econômicas,

sociais, demográficas e relacionadas à saúde decorrentes do

sociada ao excesso de peso (PAUMGARTTEN, 2011). Os medicamentos que já foram aprovados para o tratamento

processo de modernização mundial”. O consumo de alimentos industrializados também é de

da obesidade são: os anorexígenos derivados de anfetaminas;

grande responsabilidade das indústrias alimentícias, que inves-

e catecolaminérgicos anfepramona e femproporex; derivado tri-

tem cada vez mais em publicidade, marketing e propaganda,

cíclico mazindol e representante do grupo catecolaminérgico/

motivando a sociedade a adquirir seus produtos. As indústrias

serotoninérgico a sibutramina que de acordo com a RDC n° 52,

de consumo estimulam a venda dos alimentos através da mídia,

ainda se manterá no mercado (RADOMINSKY et

al., 2010).

ao mesmo tempo em que a mídia impõe à sociedade um padrão estético corporal a ser seguido (FELIPPE, SANTOS, 2004).

HISTÓRICO DE UTILIZAÇÃO DOS ANOREXÍGENOS

Todavia, em uma sociedade representada por obesos, a fal-

Os anorexígenos anfepramona, mazindol e femproporex

ta de vontade de muitos para se submeter aos ideais de magre-

foram os primeiros fármacos aprovados para o tratamento da

za é grande, entregando-se cada vez mais ao prazer compulsivo

obesidade, introduzidos no mercado mundial há cerca de 50

de comer. Do mesmo jeito, se encontra uma sociedade preo-

anos, tendo, portanto um longo histórico favorável de uso (MU-

cupada com o corpo e a aparência física associada ao magro,

RER, 2010). Já a sibutramina foi aprovada em 1998 pelo Food

caracterizada pela negação da ingestão de alimentos (ALVES

and Drug Administration (FDA), órgão norte-americano regula-

et al., 2009).

Conforme afirma Alves

et al., (2009, p.4) “na atualidade,

sobretudo na cultura ocidental, o conceito de beleza está associado à juventude, corpo magro e atrativo para as mulheres; e, corpo volumoso e musculoso para os homens”.

mentador de medicamentos, e registrada no Brasil em março de 2008, sendo o medicamento mais comercializado entre os demais emagrecedores (COUTINHO, 2009). O Brasil sempre esteve entre os principais países consumidores desses medicamentos, seguido dos Estados Unidos

Diante disso é normal que as pessoas queiram atingir esse

e Argentina. No período entre 2002 e 2004, o Brasil registrou

ideal de beleza, pois a rejeição da sociedade pelos obesos é

um consumo diário de 9,1 doses de anorexígenos por grupo de

bastante observada. Aqueles que não conseguem chegar a

mil habitantes, superando o consumo dos EUA (7,7 doses diá-

esse padrão corporal sofrem muito, ocorrendo, quase inevitavel-

rias definidas) e Argentina (6,7 doses diárias) por mil habitantes

mente, o desenvolvimento de transtornos alimentares, sentimen-

(UNODC, 2006).

tos de inferioridade, baixa autoestima, depressão, entre outras psicopatologias (ALVES, et

al., 2009).

Em relatório divulgado pela Junta Internacional de Fiscalização de Entorpecentes (JIFE) em 2005, foi relatado um aumento

Por razões estéticas e para melhorar a qualidade de vida, as

de 500% no consumo dos anorexígenos desde 1998. O relatório

pessoas buscam tratamentos de redução de peso. A estratégia

aborda também a venda ilícita dos medicamentos em farmácias

primária de redução de peso consiste em terapias comporta-

sem devida licença de funcionamento, onde a venda é realiza-

mentais, orientação dietoterápica e aumento de atividade física

da também pela internet, e sem prescrições médicas (ANVISA,

(LI, CHEUNG, 2009). As terapias comportamentais baseiam-se

2005).

em técnicas de ajuda, usadas para melhorar e reforçar os novos

Os anorexígenos são fármacos que atuam no sistema ner-

comportamentos alimentares e de atividade física (MANCINI,

voso central, suprimindo o apetite e, assim, reduzindo o peso.

HALPERN, 2006).

Deveriam ser indicados somente a pessoas com obesidade

Como auxiliares das medidas não farmacológicas, medi-

mórbida, porém o uso não se limita somente na condição clíni-

camentos também são indicados quando o tratamento não far-

ca. Os anorexígenos estão também relacionados ao uso instru-

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 205


mental e recreacional (MURER, 2010) como, por exemplo, em

com ação no sistema nervoso central ou no sistema endócrino.

mulheres que, pela insatisfação e preocupação com o corpo,

A resolução n° 1477, de 11 de julho de 1997, do Conselho

fazem uso de forma abusiva dos medicamentos por meio da

Federal de Medicina, veda aos médicos a prescrição simultânea

automedicação e até mesmo por indicação médica (MELO, OLI-

de anfetaminas com benzodiazepínicos, diuréticos, laxantes,

VEIRA, 2011); por caminhoneiros profissionais que procuram

hormônios ou extratos hormonais, substâncias simpatolíticas ou

reduzir o sono e o cansaço em percursos de longa distância

parassimpatolíticas. É ainda proibido a prescrição, dispensação

(NASCIMENTO, NASCIMENTO, SILVA, 2007); por estudantes

e aviamento desses medicamentos, seja em preparação sepa-

que querem permanecer alertas para estudarem muitas horas

rada ou na mesma preparação,

sem dormir, e atletas que utilizam como doping nos esportes. O uso para tais finalidades se explica pelos seus efeitos esti-

que contenham esse tipo de associação para o uso exclusivo do tratamento da obesidade (CFM, 1997).

mulantes capazes de deixar a pessoa ligada e mais disposta,

Conforme a RDC n°58, de 5 de setembro de 2007, da ANVI-

além de aumentar a capacidade física dando força para praticar

SA, os medicamentos podem ser dispensados para tratamento

esportes. (MURER, 2010).

igual ou inferior a 30 dias. As doses diárias máximas permiti-

A prescrição dos medicamentos para fins de emagrecimen-

das para finalidade exclusiva de tratamento da obesidade eram:

to há muito tempo foi percebida como uma prática comum entre

femproporex 50,0 mg/dia, anfepramona120,0 mg/dia e mazindol

os médicos brasileiros, apesar das tentativas legais visando coi-

3,0 mg/dia.

bir o uso (NAPPO et al.,1994). A prescrição é um ato legal apro-

Já a RDC nº25, de 1 de julho de 2010, determina a dose

vado pelas autoridades sanitárias, o problema envolvido com

diária máxima de sibutramina permitida de 15 mg, podendo ser

ela está nas irregularidades de preenchimento por parte dos

dispensada quantidade correspondente a, no máximo, 60 dias

prescritores, e dispensação pelos estabelecimentos farmacêu-

de tratamento (ANVISA, 2010)

ticos, contribuindo para o uso irracional (CARNEIRO, JÚNIOR, ACURCIO, 2008).

Outra medida implantada, com o propósito de fortalecer o controle no consumo e venda dos medicamentos foi a imple-

O consumo elevado e abusivo dos medicamentos emagre-

mentação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos

cedores levou a necessidade de efetivação de medidas regula-

Controlados (SNGPC), publicado na resolução RDC nº. 27, de

doras que possibilitam um maior controle sobre a venda e pro-

30 de março de 2007, que possibilitou a interligação de dados

porcionam o uso racional de tais substâncias, de modo a evitar

referentes ao transporte e comércio em toda a cadeia produtiva

o uso danoso que os anorexígenos podem causar (CARNEIRO,

da indústria ao consumidor final (ANVISA, 2007).

JÚNIOR, ACURCIO, 2008).

Em 2010, o SNGPC divulgou dados do número de pres-

De acordo com a Portaria N° 344 do Ministério da Saúde, de

crições dos anorexígenos, totalizando 4.416.790 prescrições,

12 de maio de 1998, os medicamentos anfepramona, fempro-

incluindo medicamentos industrializados e manipulados. Pode

porex e mazindol estão incluídos na lista, “B2”, de substâncias

ser visto uma redução no valor total das prescrições quando

psicotrópicas anorexígenas (BRASIL, 1998).

comparados com o ano de 2009, cujo número era de 4.909.208

A Resolução RDC n° 13 de 26 de março de 2010 da ANVISA

receitas. A redução maior ocorreu com a sibutramina, mesmo

foi alterada e mudou a substância sibutramina, que antes esta-

que ainda se destaque como a mais consumida (ANVISA<a>,

va presente na lista “C1” (outras substâncias sujeitas a controle

2011).

especial), para a lista “B2” (psicotrópicas), para que esta substância tenha um controle de venda mais rígido (ANVISA, 2010).

Mesmo considerando as melhorias já implantadas no processo de controle na venda dos anorexígenos os riscos “conti-

A notificação de receita ”B2” (ANEXO 1, p.22), carimbada e

nuam existindo” para os pacientes que ainda os utilizam. Eles

preenchida de forma legível pelo vendedor e paciente, é retida

podem provocar reações indesejáveis no sistema nervoso cen-

na farmácia ou drogaria no ato da compra. É importante ressal-

tral, cardiovascular e gastrintestinal. Além disso, eles possuem

tar que a receita é numerada e solicitada pelo médico à Vigilân-

um elevado potencial para abuso, dependência, tolerância e

cia Sanitária, que cabe conceder ou não a quantidade solicitada

abstinência (BEHAR, 2002).

(BRASIL, 1998).

Devido ao alto potencial para dependência e tolerância,

De acordo com a Resolução n°273, de 30 de agosto de

os anorexígenos não são recomendados para tratamentos que

1995, do Conselho Federal de Farmácia, é proibida a manipu-

ultrapassem 8 a 12 semanas (CARNEIRO, JÚNIOR, ACURCIO,

lação de fórmulas magistrais, que contenham, em sua formula-

2008). Apenas a sibutramina foi aprovada para uso prolongado

ção, anorexígenos associados entre si ou a outras substâncias

(>12meses), por ser considerada mais segura, sem potencial

206 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


para abuso e dependência (FLIER, FLIER, 2009). A utilização

naram a retirada dos anorexígenos anfepramona, femproporex

desses medicamentos por longo período poderia ser justificada,

e mazindol e passaram a ser questionados quanto à segurança

desde que fossem seguros e efetivos para o paciente que apre-

pulmonar e outros riscos. Os países europeus não utilizam es-

senta grau de risco elevado de obesidade, associada a outras

ses medicamentos desde 1999.

doenças, e que houvesse um acompanhamento médico regular que intervisse no modo de uso (MANCINI, HALPERN, 2006).

Já a sibutramina não apresenta histórico associado a anormalidades valvulares ou hipertensão pulmonar (LI, CHEUNG,

Atualmente, os anorexígenos têm sido questionados quanto

2009). Geralmente os efeitos adversos provocados por ela são

à efetividade em longo prazo. Até hoje, nenhum estudo clínico

mais brandos, mais tolerados e de duração menor, quando

controlado e randomizado, envolvendo um número grande de

comparado com os anorexígenos noradrenérgicos, nos quais

pacientes, demonstrou que eles produzem benefícios à saúde

incluem; dor de cabeça, boca seca, insônia e prisão de ventre.

por um longo período. Embora causem perda de peso maior

A preocupação maior com seu uso, está relacionado a risco car-

nas primeiras semanas de tratamento, em torno de 0,2 kg por

diovascular, que inclui aumento da pressão arterial e frequência

semana, a redução de peso atribuível aos anorexígenos é em

cardíaca, em que uma dose de 10 a 15 mg/dia, pode levar a um

geral modesta, e uma recuperação parcial de peso ocorre quan-

discreto aumento da pressão de 2 a 4 mmHg, e na frequência

do eles são usados por período superior a um ano. Além disso,

cardíaca de 4 a 6 bpm (FLIER, FLIER, 2009).

em quase todos os casos, a perda de peso alcançada com ini-

Diante suspeitas de riscos cardiovasculares, a Agência

bidores de apetite é revertida, quando o tratamento é interrom-

reguladora de medicamentos da Europa (EMA), sugeriu ao fa-

pido e não são mantidas mudanças nos hábitos alimentares e

bricante Abbot (EUA), um estudo a longo prazo em que fosse

atividade física. Assim a terapia poderia ser justificada, se hou-

avaliado o efeito da sibutramina, associada a dieta e atividades

vesse necessidade de perder peso em curto prazo, como por

físicas sobre a morbimortalidade cardiovascular (CATERSON et

exemplo, antes da cirurgia bariátrica (DOUGLAS, MUNRO, 1982;

al., 2010).

MANCINI, HALPERN, 2002; PAUMGARTTEN, 2011).

O estudo denominado de SCOUT (Sibutramine Cardiovas-

A sibutramina é a única que vem demonstrando benefí-

cular Outcomes), que teve duração de 6 anos, foi um estudo

cios em longo prazo. Associada à dieta, induz a uma perda

randomizado, duplo-cego controlado por placebo, envolvendo

de peso, em torno de 5 a 9% inicial até 12 meses, e manuten-

10.744 pacientes com sobrepeso ou obesidade, com história de

ção por no máximo 2 anos em uso do medicamento (FLIER,

doença cardiovascular, diabetes mellitus tipo 2 ou ambos. Antes

FLIER,2009). Também está relacionada com a melhora de

da fase duplo cego, randomizado, os pacientes foram submeti-

fatores de riscos bioquímicos como: glicose plasmática, he-

dos a um período de seis semanas de testes preliminares, sim-

moglobina glicada, triglicerídeos, colesterol total, lipoproteína

ples cego recebendo 10 mg de sibutramina por dia. A perda de

de baixa densidade (LDL), e lipoproteína de alta densidade

peso média com a sibutramina durante o período de 6 semanas

(HDL) (LI, CHEUNG, 2011).

foi de 2,6 kg, e após a randomização foi alcançada e mantida

Além da questionável efetividade, os anorexígenos podem

uma redução de peso em média de 1,7 kg adicionais aos 12 me-

não ser seguros e provocar vários efeitos adveros importantes,

ses. Após este período ambos os grupos, sibutramina e placebo

como insônia, ansiedade, euforia, depressão, tremor, dor de

tiveram um aumento limitado no peso, mas a perda de peso

cabeça, episódios psicóticos, convulsões, palpitações, taqui-

alcançada foi mantida em grande parte ao longo do estudo (du-

cardia, hipertensão, dor torácica, arritmias, e reações menos

ração média de 3,4 anos). A pressão arterial e frequência cardí-

intensas como boca seca, náusea, vômito, dor abdominal,

aca diminuíram nas 6 primeiras semanas de teste em ambos os

diarreia e constipação (BEHAR, 2002). Entre os anorexígenos,

grupos, com reduções maiores no grupo placebo que sibutra-

o mazindol e a sibutramina são os que apresentam menos efei-

mina (diferença média 1.2/1.4mmHg) e (2.2/3.7batimentos por

tos grave e menor potencial para abuso, por não apresenta-

minuto). O risco de um evento de desfecho primário, que incluiu

rem relação com anfetamina (FLIER, FLIER, 2009; NADVORNY,

infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral, ressuscitação

WANMACHER, 2004).

após parada cardíaca, e morte cardiovascular foi aumentada em

Casos de hipertensão pulmonar e valvopatias cardíacas já

16% no grupo sibutramina em comparação ao grupo placebo,

foram relatados com o uso de derivados anfetamínicos, como é

com incidência global de 11,4% e 10% nos dois grupos, res-

o caso da fenfluramina e dexfenfluramina que foram retiradas do

pectivamente. As taxas de infarto do miocárdio e AVC não fatais

mercado desde 1997(LI, CHEUNG, 2011). Segundo Nota Técni-

também foram aumentadas no grupo sibutramina com 4,1% e

ca ANVISA 2011, a partir desse achado, muitos países determi-

2,6% e 3,2% e 1,9% respectivamente, no grupo placebo. E com

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 207


relação a morte cardiovascular e ressuscitação após parada

cientes sem hipertensão e com hipertensão controlada o risco

cardíaca não foram observadas diferenças significativas entre

de efeitos adversos na pressão sanguínea também existe, po-

os grupos. O aumento no resultado primário de risco cardiovas-

rém o medicamento pode ser indicado desde que os pacientes

cular não fatal, ocorreu nos pacientes que havia a doença car-

sejam monitorados constantemente e avaliados 1 mês após o

diovascular, e nos pacientes com doença cardiovascular mais

início do tratamento (FLIER, FLIER, 2009).

diabetes tipo 2, mas não ocorreu nos pacientes diabéticos sem história de doença cardiovascular (JAMES et al ., 2010). Em janeiro de 2010 a EMA retirou a Sibutramina do mercado

PARECERES DA ANVISA E DE ENTIDADES MÉDICAS E FARMACÊUTICAS SOBRE OS ANOREXÍGENOS

europeu, devido aos resultados preliminares do estudo SCOUT

No dia 26 de outubro de 2010, a Câmara Técnica de Medi-

indicando riscos de eventos cardiovasculares graves, mas não

camentos (CATEME), se posicionou, por cancelar o registro dos

fatais. O Food and Drug Administration (FDA), manteve a sibu-

medicamentos contendo sibutramina, devido aos resultados do

tramina até a finalização do estudo SCOUT em setembro de

estudo SCOUT, e dos medicamentos anfepramona, fempro-

2010, e devido aos resultados demonstrando risco cardiovas-

porex e mazindol, por apresentarem baixo perfil de eficácia em

cular, no dia 8 de outubro de 2010 foi anunciado que a própria

longo prazo e o risco aumentado de consumo com o possível

empresa Abbot retiraria voluntariamente a sibutramina dos EUA.

cancelamento da sibutramina (ANVISA<a>, 2011).

(LI, CHEUNG, 2011). A mesma medida foi tomada pelo Canadá e Austrália (ANVISA<b>, 2011).

No dia 17 de fevereiro de 2011, a equipe técnica da ANVISA publicou a Nota Técnica sobre eficácia e segurança dos medi-

Pode-se concluir com o estudo SCOUT, que a sibutramina

camentos, que consta de estudos clínicos e meta-análises, e di-

pode aumentar a pressão arterial, frequência cardíaca ou ambos

vulgou os dados de notificação de reações adversas registradas

e provocar outros eventos cardiovasculares, devido aos seus

no Brasil com a utilização dos anorexígenos. Os dados podem

efeitos simpaticomiméticos, portanto não deve ser indicada a

ser vistos na Tabela 1 (ANVISA<a>,<b>, 2011).

pacientes com doenças cardíacas (JAMES, et al., 2010). Em pa-

Tabela 1- Dados de notificação de reações adversas no Brasil

De acordo com a Nota Técnica da ANVISA 2011, os estudos

peso perdido, além de mostrar pouca manutenção de redução

clínicos randomizados avaliando a eficácia dos medicamentos,

de peso em longo prazo. Em relação aos demais anorexígenos,

por períodos longos, maiores que um ano são poucos, mesmo

o femproporex, se destaca por não haver relato de estudos clí-

com a sibutramina que apesar de apresentar um maior número

nicos publicados, e não foram encontrados em nenhuma das

de estudos, os mesmos não demonstram melhora em desfe-

revisões e meta-análises avaliada.

chos de mortalidade e morbidade cardiovascular. A quantidade

No dia 23 de fevereiro de 2011, a ANVISA, realizou uma

média de redução de peso demonstrada nas meta-análises e

audiência pública envolvendo participantes que representam

estudos clínicos com a sibutramina é modesta, menor que 5kg,

classes médicas e farmacêuticas, para discutir sobre o pare-

e somente uma minoria de pacientes atinge pelo menos 10% de

cer da CATEME de retirar os anorexígenos, e apresentar a Nota

208 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


Técnica que contém dados técnico-científicos sobre a questão

sibutramina (ANVISA, 2011).

da eficácia e segurança dos medicamentos, a fim de justificar o motivo de não apresentarem mais relação a favor do seu uso

CONCLUSÃO

(ANVISA<a>, <b>, 2011).

A obesidade é considerada um grave problema de saúde

Segundo a Nota Técnica 2011, as reações adversas graves,

pública, por atingir bilhões de pessoas no mundo, de diferentes

o risco de tolerância, dependência e abstinência, além da au-

classes sociais, trazendo sérios riscos à saúde. Portanto, é fun-

sência de estudos clínicos com padrão de qualidade regulatório

damental que medidas eficientes sejam tomadas para conter a

que comprovem a eficácia e segurança em longo prazo, tornam

obesidade, como por exemplo: investimento em educação da

a relação risco/benefício desfavoráveis.

sociedade para melhoria dos hábitos alimentares e prática de

Durante o processo de audiências e discussões, entida-

atividades físicas; através de propagandas e programas educa-

des médicas e farmacêuticas propuseram medidas contrárias

tivos permanentes que objetivem esclarecer sobre a obesidade,

ao de proibição dos medicamentos no mercado. O parecer de

suas causas, consequências, meios de prevenção e tratamento.

todos, foi de que a ANVISA aumente o controle sobre a prescri-

É importante ressaltar que a culpa por ser obeso não é unica-

ção e a venda dos anorexígenos, através de uma fiscalização

mente da pessoa como muitas das vezes é atribuível pela so-

rigorosa, que venha complementar as normas mais atuais (RDC

ciedade, mas inclui responsabilidades governamentais. Diante o

N°58/2007 e RDC N°25/2010), garantindo o acesso aos pacien-

fato é importante que politicas públicas efetivas sejam direciona-

tes que apresentam obesidade de grau de risco elevado que

das para minimizar o atual número de pessoas obesas.

não perdem peso somente com medidas não farmacológicas (PHARMÁCIA BRASILEIRA, 2011).

A obesidade crônica por ser é uma doença de difícil controle, muitas das vezes pressupõe o emprego de medicamentos.

Com a reação, principalmente da classe médica, a proposta

Porém, o tratamento farmacológico deve sempre visar auxiliar o

da ANVISA de retirar os medicamentos, foi adiada por mais al-

processo de mudança de estilo de vida que inclui dietas e exer-

gum tempo, e após alguns meses marcados por debates e audi-

cícios físicos, que são as medidas mais saudáveis e essenciais

ências públicas, a decisão final foi tomada durante uma reunião

no controle e perda de peso. Identificar os fatores causais da

pública da Diretoria Colegiada da ANVISA no dia 04 de outubro

doença também é imprescindível para que possamos interferir

de 2011. Ficou decidido retirar do mercado em um prazo de 60

e mudá-los.

dias as substâncias anfepramona, femproporex e mazindol e

O tratamento farmacológico deve ser compartilhado com

manter a sibutramina respeitando algumas condições (ABESO,

profissionais da saúde, como médicos, que possam realizar o

2011).

diagnóstico correto, com indicação e prescrição precisa, acom-

No dia 6 de outubro de 2011, foi publicada a RDC N°52 da

panhamento regular, além de dispensação e cuidado farma-

ANVISA, que se dispõe sobre o cancelamento dos três anore-

cêutico, como estratégia bem fundamentada de orientação no

xígenos com manutenção da sibutramina, porém com novas

modo de uso, acompanhamento e registro de pacientes, de for-

restrições, visando aumentar ainda mais o controle sobre ela

ma a evitar o uso abusivo e irracional do medicamento.

(ANVISA, 2011).

Os anorexígenos anfetamínicos não deveriam ser reco-

De acordo com a RDC N°52, a prescrição virá acompanha-

mendados, e não justificaria criar novas normas na tentativa

da de um termo de responsabilidade do prescritor, (ANEXO 2

de aumentar mais o controle, já que os riscos que eles podem

,p.26) a ser preenchida em três vias, devendo ficar arquivadas

causar são verdades científicas bem documentadas. Para a si-

no prontuário do paciente, na farmácia dispensadora e uma via

butramina, medicamento até então parcialmente efetivo e único

mantida com o usuário. Os profissionais de saúde que prescre-

mantido, foi implementada uma nova resolução que mantém as

vem o medicamento, assim como as empresas detentoras do

mesmas restrições existentes, mas com um termo de responsa-

registro e farmácias de manipulação ou drogarias, deverão no-

bilidade que informa bem sobre todos os riscos, restrição do uso

tificar ao Sistema Nacional de Notificações da Vigilância Sanitá-

e tempo limitado, no intuito de aumentar mais o controle sobre

ria (NOTIVISA), qualquer reação adversa relacionada ao uso da

ela e evitar danos à saúde.

sibutramina. Além disso, as empresas que possuem o registro

Diante os riscos apresentados pelos anorexígenos, a de-

da sibutramina terão 60 dias para encaminharem à ANVISA um

cisão da ANVISA de proibição dos três anorexígenos é a mais

plano de farmacovigilância para minimização de riscos de uso

viável, e a manutenção da sibutramina por enquanto é tolerável

do medicamento. Com base nesse plano, a ANVISA analisará,

sob um controle mais rígido. Porém outras soluções devem ser

em 12 meses, a segurança de uso dos medicamentos a base de

tomadas para que a proibição não traga problemas como; a pro-

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dução dos medicamentos sem a devida licença e fiscalização da vigilância sanitária e a venda ilícita. Portanto, o investimento em pesquisas de novos medicamentos que sejam eficazes, seguros e acessíveis é fundamental, diante da opção limitada de medicamentos para emagrecer, com a sibutramina e orlistate. ANEXO 1- Notificação de receita B2

ANEXO 2- RDC n° 52 e termo de responsabilidade do prescritor para uso do medicamento contendo a substância sibutramina

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NOTAS DE RODAPÉ *Aluna do curso de Farmácia do Centro Universitário Newton Paiva **Professor do curso de Farmácia do Centro Universitário Newton Paiva

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ATUAÇÃO DO ENFERMEIRO DA ATENÇÃO BÁSICA FRENTE AO CONTROLE DO CÂNCER UTERINO: revisão de literatura Camila Gomes de Paula1 Luciene Barra Ribeiro2 Maíra Cardoso Pereira3 Tatiana Bedran4

RESUMO: A incidência de câncer de útero tem aumentado no Brasil, representando assim um sério problema de saúde pública. Como o seu controle depende de ações voltadas para promoção da saúde, prevenção à doença e qualidade de vida, o papel do enfermeiro da atenção básica é de suma importância para o controle desta doença. Este estudo se baseia em uma revisão de literatura descritiva e prospectiva com abordagem qualitativa, tendo como objetivo descrever o papel do enfermeiro na prevenção do câncer do colo do útero no âmbito da atenção básica. A busca por referências foi realizada em bases eletrônicas de dados e sites especializados da área. O enfermeiro é quem irá organizar a assistência na prevenção a esta neoplasia, criando medidas eficazes na abordagem à mulher, planos específicos que superem as dificuldades existentes, além de criar vínculos através do Programa Saúde da Família (PSF). PALAVRAS – CHAVES: Enfermagem. Papanicolau. Neoplasias. Atenção básica. INTRODUÇÃO

tipo de câncer mais comum, atingindo o primeiro lugar em al-

A incidência de câncer tem aumentado de maneira con-

guns países em desenvolvimento e o sexto lugar em países de-

siderável em todo o mundo, tornando-se, atualmente, um dos

senvolvidos (MARTINS; THULER; VALENTE, 2005; TROTTIER;

mais importantes problemas de saúde pública nos países de-

FRANCO, 2006).

senvolvidos e em desenvolvimento.

Ainda de acordo Trottier (2006), as baixas condições socioe-

O câncer é uma doença que se caracteriza pela perda do

conômicas, o início precoce da atividade sexual, a multiplicidade

controle da divisão celular e pela capacidade de invadir outras

de parceiros, o tabagismo, a higiene íntima inadequada e o uso

estruturas orgânicas. Os fatores causais podem agir em con-

prolongado de contraceptivos orais são os principais fatores de

junto ou em sequência para iniciar ou promover o processo de

risco para o câncer de colo de útero, sendo que o vírus do papi-

carcinogênese, progredindo quando todos os mecanismos do

loma humano (HPV) está presente em mais de 90% dos casos.

complexo sistema imunológico de reparação ou destruição ce-

A prevenção relacionada a este tipo de câncer pode ser rea-

lular falham (INSTITUTO NACIONAL DO CÂNCER - INCA, 2008;

lizada por intermédio do exame preventivo ginecológico, também

SILVA et al., 2008).

conhecido como Papanicolau. Este exame, se realizado correta-

O crescimento populacional, bem como seu envelhecimento, afetam de forma significativa a incidência do câncer no

mente e precocemente, permite reduzir em até 70% a mortalidade por esta doença (MARTINS; THULER; VALENTE, 2005).

mundo, já que o impacto global desta doença mais que dobrou

O controle do câncer de colo uterino depende de ações

em 30 anos. Esse impacto recai principalmente sobre os paí-

voltadas para a área de promoção à saúde, prevenção da do-

ses de médio e baixo desenvolvimento (BRASIL, 2009).

ença e qualidade de vida. O enfermeiro interfere nessas ações

De acordo com a Agência Internacional para Pesquisa em

realizando, dentre outras, visitas domiciliares e a consulta de

Câncer (IARC), o impacto global do câncer mais que dobrou

enfermagem de forma humanizada e integralizada, explicando

em 30 anos. Estimou-se que, no ano de 2008, ocorreriam cer-

cada procedimento ao longo do exame Papanicolau. Dessa for-

ca de 12 milhões de novos casos e sete milhões de óbitos. O

ma, contribui para o melhor atendimento à população feminina,

câncer de próstata, seguido por pulmão, estômago, cólon e

encaminhando adequadamente as mulheres que apresentam

reto são considerados os mais comuns no sexo masculino. No

alterações citológicas, além de divulgar informações à popu-

sexo feminino, prevalece o câncer de mama, seguido do colo

lação em relação aos fatores de risco, ações de prevenção e

do útero, cólon e reto, estômago e pulmão (BRASIL, 2009).

detecção precoce do câncer. Sendo assim, o objetivo dessas

O câncer do colo do útero, também conhecido como câncer cérvico-uterino, representa cerca de 15% dos tipos de câncer que acometem as mulheres, sendo considerado o segundo

ações visa diminuir os fatores de risco, diagnosticar e tratar precocemente a doença (SILVA et al., 2008). Estas ações abrangem todos os níveis de atenção à saú-

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de, mas é na atenção básica que se torna possível o maior al-

Além das bases de dados eletrônicos utilizadas, foram re-

cance das mesmas, devido ao maior contato dos profissionais

alizadas novas buscas por mais fontes em livros, periódicos,

da saúde com a comunidade. Dentro deste âmbito, o Programa

manuais e protocolos sobre o tema em questão no acervo

Saúde da Família (PSF) é um Programa do Sistema de Saúde

bibliotecário do Centro Universitário Newton Paiva e em sites

Brasileiro que tem como objetivo reorientar o modelo assisten-

específicos, como do Instituto Nacional do Câncer (INCA) e

cial, incluindo em sua prática a articulação entre a prevenção e

Ministério da Saúde.

a promoção da saúde, por meio da expansão e qualificação da

Para a seleção dos artigos, foram utilizados como critério

atenção primária, gerando assim, um cenário favorável à reorga-

de inclusão: artigos publicados entre os anos de 2004 a 2011;

nização do modo de rastreamento do câncer de colo do útero

escritos em língua portuguesa e inglesa, por serem as línguas de

(VALE et al., 2010; INCA, 2010; OLIVEIRA; SPIRI, 2006).

domínio das autoras, além dos artigos disponíveis para consulta

Dentro deste contexto, Parada et al., (2008) explicam que o

na íntegra.

enfermeiro exerce papel essencial dentro das equipes de PSF e

Foram excluídos artigos com datas inferiores a 2004, aque-

a sua conduta ao longo do atendimento pode ser um fator deter-

les escritos em outros idiomas que não fossem os citados acima

minante na assistência prestada.

e que não estivessem disponíveis na integra.

Considerando que o câncer de colo uterino está listado como

Nos bancos de dados pesquisados foram encontradas

um dos principais tipos de câncer que acomete as mulheres e

35 referências em português e cinco em inglês. Após seleção

que representa um sério problema de saúde pública no Brasil, é

dos textos disponíveis em formato completo, e que atendes-

merecida uma atenção especial por parte dos enfermeiros que

sem aos critérios de inclusão, obteve-se um total de 25 arti-

atuam na atenção básica. Esses profissionais estão engajados

gos em português e dois em inglês, sendo utilizados para a

em todas as ações relacionadas a essa neoplasia, e, por inter-

construção deste trabalho 14 artigos em português e um ar-

médio de ações educativas com a participação da comunidade,

tigo em inglês pela pertinência com o tema proposto. Destes

o conhecimento sobre a doença é transmitido, dúvidas sobre a

artigos, oito foram encontrados na base de dados SCIELO,

realização do exame são esclarecidas e a comunidade descobre

quatro na base de dados LILACS, um na Revista Brasileira de

o quão significativo é a realização desta prevenção.

Cancerologia e um na Revista de Saúde Coletiva. Além dos

Desta maneira este trabalho tem como objetivo descrever, por meio de uma revisão de literatura, o papel do enfermeiro na prevenção do câncer do colo do útero no âmbito da atenção básica.

artigos selecionados, foram utilizadas referências publicadas no site do INCA e Ministério da Saúde. Dessa forma, para a análise e síntese do material selecionado, seguiram-se os seguintes passos: escolha do tema; determinação dos objetivos; elaboração do plano de trabalho;

2 Percurso Metodológico

identificação e localização das fontes; obtenção e leitura crítica

Trata-se de uma pesquisa bibliográfica descritiva e prospec-

ou reflexiva do material; levantamento e análise da ideia principal

tiva com abordagem qualitativa, já que esta envolve conceitos

e dos dados significativos (GIL, 2010).

subjetivos e seus dados são agrupados a partir das descrições detalhadas de experiências (GIL, 2010).

3 Resultados e Discurssões

Este estudo se baseia em uma revisão de literatura que, de acordo com Gil (2010), é aquela pesquisa que é desenvolvida com base em material já elaborado, constituído por livros e artigos científicos.

3.1 O CÂNCER CÉRVICO-UTERINO O câncer é uma doença genética crônico-degenerativa, cujo processo tem início com um dano a um gen ou a um grupo de

O estudo foi realizado a partir de buscas de publicações

genes de uma célula e progride quando todos os mecanismos

pertinentes ao tema na Biblioteca Virtual da Saúde (BVS) em

do complexo sistema imunológico de reparação ou destruição

base eletrônica de dados, entre os anos de 2004 a 2011.

celular falham (INCA, 2008; SILVA et al., 2008).

As bases utilizadas foram: Literatura Latino-Americana e do Cari-

O câncer do colo do útero é caracterizado pela replicação

be em Ciências da Saúde (LILACS) e Scientific Eletronic Library

desordenada do epitélio de revestimento, comprometendo o te-

Online (SCIELO). Para a realização das buscas, foram utilizados

cido subjacente (estroma) e podendo invadir estruturas e órgãos

os descritores: Enfermagem, Papanicolau, Neoplasias e Aten-

contíguos ou à distância (Brasil, 2009). Há duas principais cate-

ção básica. A busca pelos artigos ocorreu no período de feve-

gorias de carcinomas invasores do colo do útero, na dependên-

reiro a junho de 2011.

cia da origem do epitélio comprometido: o carcinoma epider-

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móide, tipo mais incidente e que acomete o epitélio escamoso, e o adenocarcinoma, tipo mais raro e que acomete o epitélio

condição sócio-econômica mais baixa.

Além deles, o Ministério da Saúde (2011), também afir-

glandular. O câncer de colo de útero é uma doença crônica que

ma que o aumento no número de casos da doença tem sido

pode ocorrer a partir de mudanças intraepiteliais e, em um perí-

sentido a partir de 1960, coincidente com o aumento do uso de

odo médio de cinco a seis anos, se transformar num processo

contraceptivos orais, diminuição do uso de outros métodos de

invasor, que se não for detectado a tempo pode causar inúme-

barreira e avanço tecnológico dos métodos diagnósticos.

ros danos ao organismo (FERREIRA; OLIVEIRA, 2006). Com aproximadamente 500 mil novos casos por ano no mundo, o câncer do colo do útero está classificado como o se-

3.2 O EXAME PREVENTIVO

O exame preventivo é atualmente um dos mais efica-

gundo tipo de câncer mais comum entre as mulheres, perdendo

zes métodos de detecção precoce do câncer cérvico-uterino,

apenas para o câncer de mama. Este tipo de câncer é responsá-

por isso, sua realização de maneira sistemática é de suma im-

vel pela morte de 230 mil mulheres por ano no mundo, além de

portância para o controle desta neoplasia (BELO HORIZONTE,

apresentar uma média de 18.500 novos casos anuais no Brasil

2008).

(INCA, 2011).

Segundo Silva et al. (2010):

Como as principais alterações nas células do colo do útero

O exame preventivo foi descoberto por meio de estudos

são causadas pela infecção do vírus papiloma humano (HPV),

iniciados pelo Dr. George Nicolau em 1917, após anali-

vale destacar que sua prevalência na população em geral é alta:

sar alterações celulares das regiões da cérvix e vagina,

de cinco a 20% das mulheres sexualmente ativas mostram posi-

além de alterações apresentadas nas diferentes fases

tividade em testes moleculares (BRASIL, 2009).

do ciclo menstrual. Depois de vários estudos, o exame

O HPV é um vírus de transmissão frequentemente sexual,

preventivo passou a ser utilizado na década de 40, re-

capaz de provocar lesões de pele ou mucosas. Seu agente etio-

cebendo a denominação de exame de Papanicolau,

lógico é um vírus de DNA não cultivável do grupo papiloma vírus.

devido ao sistema de coloração utilizado, que consiste

Atualmente, são conhecidos, mais de 100 tipos diferentes des-

na coleta de material celular por meio de raspagem nas

ses vírus e cerca de 20 destes possuem tropismo pelo epitélio

regiões do fundo do saco vaginal, cervical e endocervi-

escamoso do trato genital inferior (colo, vulva, corpo do períneo, região perianal e anal) (PARADA et al., 2008).

cal (SILVA et al., 2010, p. 555).

A Secretaria Municipal de Saúde (BELO HORIZONTE, 2008),

No Brasil, existem cerca de seis milhões de mulheres entre

afirma que o HPV estabelece relações amplamente inofensivas

35 a 49 anos de idade, e que nunca realizaram o exame citopa-

com o organismo e a maioria das infecções passam desper-

tológico do colo do útero (Papanicolau), faixa etária onde mais

cebidas, pois são combatidas espontaneamente pelo sistema

ocorrem casos positivos de câncer do colo do útero. Como con-

imune, porém nem sempre os anticorpos são suficientemente

sequência surgem milhares de novas vítimas a cada ano. Isso

competentes para eliminar os vírus. Dessa maneira, o HPV pos-

ocorre na maioria das vezes em função da falta de informação

sui diversas formas de interagir com o organismo humano: na

da população acerca da importância da realização do exame

forma latente, a mulher não apresenta lesões clínicas. Assim, a

preventivo e por medo ou vergonha visto a exposição corporal.

única forma de diagnóstico é a molecular. Quando a infecção

A detecção precoce desta neoplasia ou das lesões precursoras

é subclínica, a mulher não apresenta lesões diagnosticáveis a

são muito importantes já que a cura pode chegar a 100% e na

olho nu, e o diagnóstico pode ser sugerido a partir da citopa-

maioria dos casos a detecção ocorre ainda em nível ambulato-

tologia, colposcopia ou histologia. Na forma clínica, existe uma

rial (BELO HORIZONTE, 2008).

lesão visível macroscopicamente, representada pelo condiloma

O exame é realizado no próprio Centro de Saúde pelo mé-

acuminado, com quase nenhuma potencialidade de progressão

dico ou enfermeiro treinado e apto para tal realização. Porém, é

para o câncer.

considerado, por muitas mulheres, um procedimento invasivo,

Trottier e Franco (2006) e Loureiro e Cruz (2008), afirmam

que gera medo, vergonha, ansiedade, desconforto e repulsa da

que entre os vários fatores de riscos para o aparecimento do

própria genitália, gerando prolongados adiamentos na procura

câncer do colo do útero, além da infecção pelo vírus papiloma

do serviço de saúde. Pensando nisso, é importante que o profis-

humano (HPV) como citado anteriormente, estão: o uso de con-

sional que realiza este exame, tenha uma postura técnica e ética

traceptivos orais, a precocidade referente ao início da vida se-

no sentindo de preservar a privacidade da cliente, posicioná-la

xual, a multidisciplidade de parceiros sexuais, o tabagismo e a

em uma posição confortável, além de ser capaz de explicar os

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 215


procedimentos realizados, observando sempre se a paciente compreendeu essas explicações (EDUARDO et al., 2007; LOUREIRO; CRUZ, 2008).

al. 2010; INCA, 2010; OLIVEIRA; SPIRI, 2006). O trabalho desenvolvido é multiprofissional: os profissionais inseridos neste programa articulam suas práticas e saberes no

Estima-se uma redução de até 80% na mortalidade por este

enfrentamento de cada situação identificada para propor solu-

câncer a partir do rastreamento de mulheres na faixa etária de 25

ções conjuntamente e intervir de maneira adequada, já que to-

a 65 anos para a realização do Papanicolau e para o tratamento

dos conhecem a problemática. O enfermeiro é um membro fun-

das lesões precursoras com alto potencial de malignidade ou

damental nesta equipe, planejando, gerenciando, coordenando

carcinoma in situ. Para tanto, é necessário garantir a organiza-

e avaliando as ações e os programas desenvolvidos nessas

ção, a integralidade, a qualidade do programa de rastreamento,

unidades. Juntamente com a equipe, decide as intervenções

bem como o tratamento das pacientes (BRASIL, 2009).

necessárias (OLIVEIRA; SPIRI, 2006; ROCHA; ARAÚJO, 2007).

3.3 A ATUAÇÃO DO ENFERMEIRO NA ATENÇÃO BÁSICA

afirmam que o enfermeiro é quem irá organizar a assistência

Loureiro e Cruz (2008), Beghini et al., (2008) e INCA (2010), A Atenção Básica à Saúde possui um papel estratégico no

desenvolvendo métodos estratégicos e criativos para a realiza-

controle do câncer no país, pois atua em várias dimensões da

ção do rastreamento das usuárias do Centro de Saúde, incen-

linha de cuidados para esta doença. Conforme a portaria que

tivando-as a realizarem o exame periódico, pois este é o fator

instituiu a Política Nacional de Atenção Oncológica (PNAO) a

primordial para o sucesso do programa relacionado ao câncer

Atenção Básica envolve “ações de caráter individual e coletivo,

cérvico-uterino.

voltadas para a promoção da saúde e prevenção do câncer,

Ainda de acordo com os autores, o enfermeiro também,

bem como ao diagnóstico precoce e apoio à terapêutica de tu-

deve expor cartazes que demonstrem as técnicas utilizadas

mores, aos cuidados paliativos e às ações clínicas para o segui-

nos exames; fornecer informações para o momento da coleta;

mento de doentes tratados” (BRASIL, 2009, p. 24).

criar espaços de privacidade durante a consulta; identificar e

A atuação do enfermeiro neste setor é focada na prevenção

treinar profissionais sensibilizados para convencer as mulheres

primária, pois este é o ponto primordial para o controle da neo-

que estão na sala de espera a realizarem o exame; incentivar

plasia em questão. Sendo assim, a Secretaria Municipal de Saú-

adoção de hábitos saudáveis como alimentações adequadas

de (BELO HORIZONTE, 2008), define prevenção primária, como

e exercícios físicos regulares. Além disso, deve contribuir para

sendo o ato de se evitar o aparecimento da doença por meio da

a educação da população a respeito do uso de preservativo e

intervenção no meio ambiente e em seus fatores de risco, como

identificá-lo como um dos principais instrumentos preventivo, já

o estímulo ao sexo seguro, correção das deficiências profissio-

que a infecção do HPV tem papel relevante no desenvolvimento

nais, diminuição à exposição ao tabaco e incentivos a realização

desta neoplasia, uma vez que o vírus está presente em 90% dos

do exame preventivo.

cânceres cervicais.

Esse tipo de prevenção tornou-se mais eficaz a partir do

Nesse contexto, percebe-se como a presença do profissio-

Programa Saúde da Família (PSF), que tem como objetivo reo-

nal enfermeiro inserido no PSF vem sendo resolutiva para a pre-

rientar o modelo assistencial mediante a implantação de equi-

venção e controle desta neoplasia e, quanto mais abrangente

pes multiprofissionais em unidades básicas de saúde. Diante

for o programa e mais atuante for o enfermeiro, melhor será o

disso, incluiu em sua prática métodos de prevenção e promoção

resultado dessas ações (LOUREIRO; CRUZ, 2008).

à saúde baseados na atenção primária, gerando assim um ce-

Neste sentido, torna-se imprescindível o adequado preparo

nário favorável à reorganização do controle a esta doença (VALE

da equipe de enfermagem para as demandas do cuidar des-

et al. 2010; INCA, 2010; OLIVEIRA; SPIRI, 2006).

ta clientela. O enfermeiro é um dos profissionais responsáveis

Além disso, este programa visa estabelecer vínculos entre

pelo processo educativo da comunidade, sendo de sua com-

as equipes de referências e as famílias por meio das visitas do-

petência divulgar informações a respeito dos fatores de riscos,

miciliares, objetivando uma maior resolubilidade da atenção, um

desenvolver ações de prevenção e detecção precoce, orientar

maior acompanhamento da saúde das mulheres, além de per-

modelos de comportamentos e hábitos saudáveis para a saúde

mitir uma maior sensibilização e compreensão quanto à realiza-

da mulher. Além disso, este também deve estar apto a detectar

ção periódica da citologia oncótica preventiva. No contexto do

situações de risco durante o acolhimento ou durante a consulta

rastreamento, isso possibilitaria a identificação e busca ativa das

ginecológica (BEGHINI et al., 2006; BELO HORIZONTE, 2008).

pacientes sob risco e sem controles, sendo o enfermeiro um dos

3.4 AÇÕES DO ENFERMEIRO RELACIONADAS

membros mais importantes na realização desta busca (VALE et

AO CÂNCER CÉRVICO-UTERINO

214 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


Eduardo et al., (2007) afirma que durante a consulta o enfermeiro deve realizar uma completa anamnese, preparar o cliente

qualidade de vida da mulher (PARADA et al., 2008; BEGHINI et al., 2006; BELO HORIZONTE, 2008).

para o exame, realizar a técnica da coleta propriamente dita, ser capaz de perceber intercorrências, observar a necessidades de

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

se realizar encaminhamentos e ao final da consulta enfatizar a

Pela caracterização das publicações analisadas percebe-se

importância do retorno em tempo adequado. Durante a realiza-

que o câncer do colo do útero é um problema de saúde pública

ção do exame é necessário criar um vínculo com o paciente para

e que mesmo existindo no Brasil um programa de rastreamento

que a consulta se torne mais humanizada e para que a cliente se

para realização do exame preventivo, este ainda não é totalmen-

sinta mais a vontade.

te eficaz. Dessa forma, destaca-se a permanente qualificação,

Dessa maneira, deve ser capaz de desenvolver ações volta-

responsabilidade e compromisso ético dos profissionais de en-

das para os indivíduos assintomáticos, buscando assim prevenir

fermagem, já que eles possuem um papel significativo dentro

o câncer conforme prevenção primária, ou seja, controlando a

das equipes de PSF. Somente o enfermeiro preparado pode ga-

exposição aos fatores de risco e realizar o rastreamento adequa-

rantir a prática e o compromisso desse programa, por meio da

do para detecção das lesões precursoras em fase inicial como

elaboração de planos específicos que superem as dificuldades

citado anteriormente. Mas, a mais importante de todas as ações,

existentes e criem novas estratégias para a captura do número

é a realização do diagnóstico precoce, que engloba medidas de

máximo de mulheres.

identificação de indivíduos sintomáticos com câncer em estágio

Destaca-se a importância da prevenção a esta neoplasia e

inicial. Dessa forma, o conjunto dessas ações é denominado

percebe-se que ela engloba todos os níveis de assistência, po-

detecção precoce e resulta na positividade do tratamento (PA-

rém é na assistência básica e especificamente no Programa de

RADA et al., 2008).

Saúde da Família que se executam as maiores ações de preven-

Ainda de acordo com Parada et al., (2008), o enfermeiro

ção ao câncer de colo do útero. Estas ações englobam deste o

também tem um papel relevante no acompanhamento de indi-

recrutamento das mulheres, passando pelas ações educativas,

víduos sob tratamento. As ações de cuidados paliativos devem

consultas de acordo com o protocolo até a realização do exame

ser inseridas também na atenção primária e envolvem um apoio

e seus devidos encaminhamentos em caso de complicações.

multidimensional (físico, espiritual, psicológico, social e afetivo)

Ao que se relaciona à prevenção do câncer cérvico-uterino,

aos indivíduos portadores desta neoplasia e seus familiares.

cabe aos enfermeiros mobilização, envolvimento e prática tan-

Dessa maneira, cabe a este profissional dar o suporte adequa-

to ao atendimento da clientela quanto na efetuação regular do

do e encaminhar a paciente e seus familiares para o núcleo de

exame preventivo conforme preconizado, lembrando-se sem-

psicologia quando necessário.

pre das ações educativas ao longo das consultas. Além disso,

Dessa forma, resumem-se as principais funções dos en-

o enfermeiro deve ser capaz de trabalhar em equipe e estar à

fermeiros da atenção básica relacionados ao câncer de colo

frente das discussões sobre as intervenções a serem realizadas.

uterino: conhecimento das ações de controle desta neoplasia;

Suas ideias devem ser expostas sempre em busca da melhora

planejamento e programação de ações de controle com prio-

da qualidade de vida da mulher e também da valorização e re-

rização dos critérios de risco; vulnerabilidade e desigualdade;

conhecimento de seu trabalho.

tomar condutas éticas de acordo com os protocolos existentes

Com essas ações o enfermeiro contribui de forma funda-

no que diz respeito à promoção, prevenção, rastreamento, diag-

mental para a melhoria dos indicadores de saúde e com o su-

nóstico, tratamento, reabilitação e cuidados paliativos; conhecer

cesso do programa de prevenção a esta neoplasia.

os hábitos de vida, valores culturais e religiosos da comunidade, para tornar o acolhimento mais humanizado; valorizar os dife-

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

rentes saberes e práticas na perspectiva de uma abordagem in-

BEGHINI, A. B. et al. Adesão das acadêmicas de enfermagem à prevenção do câncer ginecológico: da teoria à prática. Texto Contexto Enferm., v. 15, n. 4, p. 637 – 644, out./dez. 2006.

tegral e resolutiva, possibilitando a criação de vínculos com ética, compromisso e respeito; desenvolver atividades educativas sendo elas individuais e coletivas; realizar acompanhamento do estado de saúde das mulheres através das visitas domiciliares, e principalmente, ser capaz de trabalhar em equipe, integrando áreas de conhecimento e profissionais de diferentes formações, buscando dessa forma o atendimento integral e a melhora da

BELO HORIZONTE. Secretaria Municipal de Saúde. Prevenção e controle do câncer de colo do útero. Belo Horizonte, 2008. BRASIL. Ministério da Saúde. Estimativa 2010: incidência de câncer no Brasil. Rio de Janeiro: Instituto Nacional de Câncer, 2009.

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NOTAS DE RODAPÉ 1. Graduadas do Curso de Enfermagem, Centro Universitário Newton Paiva, 1º Sem.2011 2. Graduadas do Curso de Enfermagem, Centro Universitário Newton Paiva, 1º Sem.2011 3. Graduadas do Curso de Enfermagem, Centro Universitário Newton Paiva, 1º Sem.2011 4. Enfermeira. Mestre em Enfermagem pela UFMG. Especialista em Terapia Intensiva e Nefrologia. DOCENTE do Curso de Enfermagem do Centro Universitário Newton Paiva.

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A UTILIZAÇÃO DE ADALIMUMABE E ETANERCEPTE PARA ARTRITE REUMATÓIDE NO SUS: eficácia terapêutica ou pressão judicial? Mariana Ferreira Pinto Vianna Falconetti 1 Elias Borges do Nascimento Júnior 2

RESUMO: A Artrite Reumatóide é uma doença inflamatória, auto-imune, multissistêmica, crônica, de etiologia desconhecida, caracterizada por poliartrite periférica simétrica, que leva à deformidade e à destruição das articulações por erosão do osso e cartilagem. O objetivo deste artigo foi discutir a utilização e a interferência da judicialização na incorporação de Adalimumabe (ADA) e Etanercepte (ETP) para a Artrite Reumatóide no Sistema Único de Saúde através de uma revisão bibliográfica da utilização destes medicamentos para esta doença nos sites de busca Bireme e Pubmed e através dos dados da pesquisa realizada pelo Grupo de Pesquisa em Economia da Saúde da Universidade Federal de Minas Gerais em parceria com a Secretaria Estadual de Saúde de Minas Gerais. Foram analisados 14 estudos atestando a eficácia e segurança, 5 a segurança e 3 a efetividade desses medicamentos. Destes 22 estudos, 17 foram patrocinados pelas indústrias fabricantes e 5 financiados pelo Departamento de Ciência e Tecnologia. Ademais, das 4.386 ações contra a Secretaria Estadual de Saúde de Minas Gerais analisadas pelo Grupo de Pesquisa em Economia da Saúde da Universidade Federal de Minas Gerais, 5% (218) pleiteava-se ADA e em 2% (85) ETP para Artrite Reumatóide que se concentravam no ano de 2006. A atualização dos protocolos clínicos se faz necessária pela avaliação de novas tecnologias que apresentem sólidas evidências científicas de eficácia, segurança e efetividade, garantindo o uso racional desses medicamentos e possibilitando a melhor distribuição de recursos dentro da assistência farmacêutica. PALAVRAS-CHAVE: Artrite reumatóide; Judicialização da saúde; Adalimumabe; Etanercepte.

1 INTRODUÇÃO

adalimumabe (ADA). Os antimaláricos, a sulfasalazina e o MTX

A Artrite Reumatóide (AR) é uma doença inflamatória, auto-

são considerados Fármacos Anti-reumáticos Modificadores da

imune, multissistêmica, crônica, de etiologia desconhecida,

Doença (DMARD). Porém, recomenda-se seguir a estratégia de

caracterizada por poliartrite periférica simétrica, que leva à de-

tratamento escalonada de combinação de múltiplos medica-

formidade e à destruição das articulações por erosão do osso

mentos de diferentes classes. O escalonamento recomendado,

e cartilagem (ARNETT et al., 1988; ARNETT, 1997; LAURINDO

segundo a Portaria nº 66/2006 é:

et al., 2002; LIPSKY, 2009).

a) uso de um DMARD (antimalárico, sulfasalazina ou MTX);

A Portaria número 66 de 1º de novembro de 2006 do Mi-

b) uso de analgésicos e anti-inflamatórios não-esterói-

nistério da Saúde estabelece o protocolo clínico e as diretri-

des se necessário

zes terapêuticas para o tratamento da AR. Ela traz critérios de

enquanto aguarda efeito máximo dos DMARD;

diagnóstico e tratamento, racionaliza a dispensação dos me-

c) aumento de dose do DMARD;

dicamentos preconizados para o tratamento da doença, re-

d) troca de DMARD (usar MTX se este não havia sido

gulamenta suas indicações e seus esquemas terapêuticos e

utilizado anteriormente);

estabelece os mecanismos de acompanhamento de uso e de

e) uso de corticóide intra-articular se sintomas forem

avaliação de resultados, garantindo assim a prescrição segura

pauci-articulares;

e eficaz. Essa Portaria revoga aquela de número 865 de 2002

g) associação de DMARD;

(BRASIL, 2002; BRASIL, 2006 <a>).

h) uso de agentes anti-citocinas (BRASIL, 2006 <a>).

No Protocolo para AR estabelecido pelo Sistema único de Saúde (SUS) através da Portaria de nº 66/2006 os seguintes

O uso simultâneo de dois ou mais agentes de uma mes-

medicamentos são disponibilizados: antimaláricos (cloroqui-

ma classe está normalmente reservado aos DMARD. No caso

na e hidroxicloroquina), sulfasalazina, metotrexato (MTX), ci-

desse grupo de medicamentos, considera-se a necessidade

closporina, leflunomida, infliximabe (IFX), etanercepte (ETP) e

de aumento de dose e/ou troca de representante dos DMARD

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 219


somente após 4-6 semanas de tratamento para que se possa

Descrever e discutir como é realizada a incorporação de novas

observar uma resposta terapêutica. As combinações mais uti-

tecnologias pelo SUS neste contexto, relatar como foi realizada a

lizadas de DMARD são: sulfasalazina e antimaláricos; sulfasa-

incorporação dos medicamentos ADA e ETP na relação dos Medi-

lazina e MTX; antimaláricos, sulfasalazina e MTX; ciclosporina e

camentos de Alto Custo do Ministério da Saúde; levantar questio-

MTX; leflunomida e MTX; agentes anti-citocinas e MTX. Entretan-

namentos sobre a interferência da judicialização na incorporação

to, para os pacientes com contra-indicações para o uso de MTX,

de novas tecnologias nas políticas públicas de saúde.

são consideradas as seguintes combinações: antimaláricos e sulfasalazina; leflunomida e agentes anti-citocinas (BRASIL,

3 Metodologia

2006 <a>). Tem sido demonstrado que na ocorrência de falha

Foi realizada uma revisão bibliográfica da utilização desses

terapêutica de um dos três agentes anti-citocinas a troca por

medicamentos para a Artrite Reumatóide nos sites de busca Bi-

um outro não traz benefícios adicionais, uma vez que a resposta

reme e Pubmed utilizando as seguintes palavras-chave artrite

terapêutica se mantém insuficiente (DONAHUE et al., 2008).

reumatóide Adalimumabe e/ou artrite reumatóide Etanercepte,

Ademais, antes de se considerar o uso de agentes anti-ci-

no primeiro, e rheumatoid arthritis (artrite reumatóide) Adalimu-

tocinas em pacientes com doença ativa, apesar do uso do MTX,

mab e/ou rheumatoid arthritis (artrite reumatóide) Etanercept, no

o uso de terapias adjuntas como o uso de corticóides via intra-

segundo, tendo como critérios de inclusão textos completos de

articular deve ser considerada (BRASIL, 2006 <a>).

estudos randomizados e revisões.

A Portaria nº 66/2006 incorporou ao protocolo medicamen-

Foi conduzida também uma busca no Sistema de Legisla-

tos antes inexistentes naquele estabelecido pela Portaria nº

ção do Ministério da Saúde, Saúde Legis, das legislações que

865/2002, ETP e ADA, que surgiram recentemente no mercado

regulamentam a utilização de medicamentos para artrite reuma-

(BRASIL, 2006 <a>). Antes dessa incorporação muitos pacien-

tóide e a incorporação de novas tecnologias em saúde. A busca

tes pleiteavam esses medicamentos através de ações judiciais

foi feita pelo número e ano das portarias encontradas na secção

contra a SES/MG por serem de alto custo. Atualmente eles tam-

de “Novas tecnologias” do site do Ministério da Saúde.

bém são pleiteados para outras doenças como Espondilite Anquilosante, Artrite Psoriásica e Doença de Crohn.

Para a verificação da interferência da judicialização na incorporação de Adalimumabe e Etanercepte para a Artrite Reuma-

Os dados da pesquisa “Impacto das ações judiciais na po-

tóide no Sistema Único de Saúde foram utilizados dados levan-

lítica nacional de assistência farmacêutica: gestão da clínica e

tados no projeto desenvolvido pelo GPES/UFMG “Impacto das

medicalização da justiça” realizada pelo Grupo de Pesquisa em

ações judiciais na política nacional de assistência farmacêutica:

Economia da Saúde da Universidade Federal de Minas Gerais

gestão da clínica e medicalização da justiça”, desenvolvido em

(GPES/UFMG), desenvolvido em parceria com a Secretaria de

parceria com a SES/MG. Nessa coleta de dados, realizada du-

Estado de Saúde de Minas Gerais (SES/MG) demonstram a

rante o período de fevereiro a outubro de 2009, foram analisadas

importância da AR e da incorporação de novas tecnologias em

6.344 ações judiciais ativas movidas contra a SES/MG armaze-

saúde pública. Foram analisadas todas as ações movidas con-

nadas em um banco de dados utilizando o software Microsoft

tra o Estado de Minas Gerais de 29 de outubro de 2009 até 22 de

Office Access® e analisadas através do software Excel® 2007.

outubro de 2009 totalizando 6.344 ações, porém para esse arti-

Dessas 6.344 ações, foi retirada uma amostra de 4.386 ações

go foram analisadas 4.386 ações. Desse universo, 7% (303) das

para o presente artigo.

ações eram referentes aos pacientes portadores de AR, em 5% (218) dessas pleiteava-se Adalimumabe e em 2% (85) pleiteavase Etanercepte. Nesse contexto, cabe ao gestor estadual, amparado pela

4 Resultados e Discussão 4.1 INCORPORAÇÃO DOS MEDICAMENTOS ADALIMUMABE E ETANERCEPTE NO SUS

Comissão Estadual de Farmácia e Terapêutica, a definição de

4.1.1 DADOS DA PESQUISA REFERENTES AOS MEDICAMENTOS ADA-

qual dos medicamentos será disponibilizado na rede estadual

LIMUMABE E ETANERCEPTE

de serviços gerenciando gastos e adequando os programas de

Foram analisados os pedidos dos medicamentos ADA e ETP

saúde às necessidades da população (BRASIL, 2006 <a>, MI-

através de ações judiciais. O medicamento ADA foi pleiteado em

NAS GERAIS, 2009). Para tal, são necessários investimentos na

6% (280) das 4.386 ações contra a SES/MG e o medicamento

pesquisa para a incorporação de novas tecnologias.

ETP em 5% (235) dessas ações (GRÁFICO 1). Esses medicamentos são pleiteados para: Artrite Reumatóide em 58,8% (303)

2 OBJETIVOS

das ações, Espondilite Anquilosante em 20,58% (106), Psoríase

220 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


10,29% (53), Artrite Psoriásica em 6% (31), Artrite Reumatóide

ressaltando a importância do estudo da eficácia, segurança e

Juvenil em 1,94% (10), Espondiloartropatia em 1,17% (6), Do-

efetividade desses medicamentos para essa doença. Das 4.386

ença de Crohn em 0,78% (4), Espondilite Psoriásica em 0,19%

ações contra a SES/MG o medicamento ADA é pleiteado para

(1), Polimiosite Juvenil 0,19% (1) TABELA. A maioria das ações

AR em 5% (218) das ações e o medicamento ETP em 2% (85)

pleiteando ADA e ETP é para o tratamento da Artrite Reumatóide

(GRÁFICO 2).

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 221


Os pedidos desses medicamentos para AR se concentram

ta de conhecimento da sua inclusão no protocolo por parte do

nos anos anteriores à 2007. Em 2004, o medicamento ADA foi

médico, do advogado e/ou do juiz ou desembargador que de-

pleiteado em 2 ações e o ETP em 12 ações, já em 2005 o ADA foi

feriu tal pedido; em 2008, o ADA foi pleiteado em 10 ações e o

pleiteado em 66 ações e o ETP em 15 ações; em 2006 o número

ETP em 6 ações; e até agosto de 2009, o ADA foi pleiteado em

de ações pleiteando ADA atinge o máximo, com 92 ações e o

2 ações e o ETP não foi pleiteado (GRÁFICO 3). Tal cenário é

ETP foi pleiteado em 21 ações; em 2007 inicia-se o declínio das

justificado pelo fato desses medicamentos ainda não estarem

ações pleiteando ADA, foram 48 ações, para o medicamento

incluídos no Protocolo do Ministério da Saúde para AR, o que

ETP ainda não havia declínio, foram 29 ações, talvez pela fal-

ocorreu através da Portaria no 66/2006.

Em um estudo proposto por Romero em 2008, as artropa-

madamente, 1% da população, fossem tratados com ADA, ETP

tias, como a AR, foram responsáveis por 8,1% das ações no pe-

ou IFX seriam gastos R$ 98.766.724.373,58. Levando em consi-

ríodo de 2001 à 2005, sendo o terceiro grupo de doenças mais

deração dados do Sistema de Informações sobre Orçamentos

frequente nas ações judiciais. O primeiro grupo é o de pacientes

Públicos em Saúde (SIOPS) de 2004 que demonstram que se

com cânceres (16,3% das ações) e de pacientes com hepati-

gastou 85,7 bilhões de reais com ações e serviços públicos de

te C (9,0%). Em estudo proposto por Chieffi e Barata em 2009,

saúde (internação, diagnóstico, tratamento, cirurgias, ações de

os medicamentos ADA e ETP geraram mais de trinta processos

educação em saúde, vigilância sanitária e epidemiológica, entre

cada um. Esses dados reforçam a importância dos medica-

outras) financiadas com recursos próprios de municípios, esta-

mentos recentemente incluídos no protocolo e da AR em saúde

dos e União. Gastar-se-ia mais do que o inteiro orçamento com

pública e ressalta também a importância da existência de um

somente 1% da população para tratar uma doença (adaptado

protocolo atualizado para essa doença.

de FERRAZ;VIEIRA, 2009; SIOPS, 2004).

A incorporação desses medicamentos contribuiu para a

A incorporação desses medicamentos foi importante por per-

diminuição do número de ações referentes à eles, o que é de

mitir o melhor planejamento, porém, levantou questões como o

grande importância para a SES/MG, uma vez que foi possível

motivo dessa incorporação, assim como a maneira pela qual são

organizar melhor os gastos em saúde (GRÁFICO 3). Os pacien-

realizadas as incorporações de tecnologias em saúde no SUS.

tes passaram a ser atendidos pelo programa de medicamentos de alto custo através de um protocolo clínico permitindo o pla-

4.2 INCORPORAÇÃO DE MEDICAMENTOS NO SUS

nejamento dos gastos. O planejamento não ocorria quando os

Primeiramente, os medicamentos são registrados na Agên-

medicamentos eram pleiteados através de ações por não ser

cia de Vigilância Sanitária (ANVISA). Depois de registrados, não

possível prever a quantidade de pacientes que seriam atendidos

significa que os medicamentos serão automaticamente incorpo-

através de ações uma vez que a judicialização é um fenômeno

rados à lista do SUS. Para que isso venha a acontecer, precisam

oscilante. A importância da incorporação dentro de um protoco-

antes passar por um processo de avaliação, em que, além dos

lo é notável tendo-se em vista a seguinte estimativa realizada por

critérios de segurança e eficácia mensurados em condições ide-

Ferraz e Vieira: se todos os pacientes com AR no Brasil, aproxi-

ais de laboratório, serão considerados a efetividade e o custo-

222 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


efetividade do medicamento (BRASIL, 2009 <b>).

medicamentos de alto custo da Secretaria de Estado da Saúde

O Conselho de Ciência, Tecnologia e Inovação do Ministé-

do Paraná. Na avaliação custo-efetividade foram encontrados

rio da Saúde tem a atribuição de definir diretrizes e promover a

os seguintes custos por Quality-Adjusted Life-Years (QALY) R$

avaliação tecnológica visando a incorporação de novos produ-

511.633,00, R$ 437.486,00 e R$ 657.593,00 para ada, etP e IFX,

tos e processos pelos gestores, prestadores e profissionais dos

respectivamente. A relação custo-efetividade incremental por

serviços no âmbito do SUS. Dessa forma, foi criado o Grupo

QALY foi R$ 628.124,00, R$ 509.974,00 e R$ 965.927,00 para

Permanente de Trabalho de Avaliação de Tecnologias em Saúde

ada, etP e IFX, respectivamente. Os valores apresentados para

(GT ATS), com o objetivo de definir prioridades de estudos de

ETP e o ADA são próximos segundo as análises de sensibilidade

Avaliação de Tecnologias em Saúde de interesse para o SUS

realizada pelos pesquisadores. O impacto orçamentário semes-

(BRASIL, 2009 <b>).

tral no ano de 2008 dos medicamentos foram, para cada trata-

Este grupo, coordenado pelo Departamento de Ciência e

mento, MTX: R$ 138,00; ADA: R$ 22.550,00; ETP: R$ 27.931,00;

Tecnologia (DECIT) é constituído por representantes das Secreta-

e IFX: R$ 19.698,00. Dessa maneira, conclui-se que estes me-

rias de Atenção à Saúde, de Ciência, Tecnologia e Insumos Estra-

dicamentos devem continuar sendo disponibilizados pelo SUS,

tégicos (SCTIE), de Gestão do Trabalho e Educação em Saúde,

porém avaliando-se outras terapias mais custo-efetivas, como a

de Vigilância em Saúde e Executiva e pela ANVISA e Agência de

do MTX, antes de utilizar as anticitocinas para uma melhor alo-

Vigilância da Saúde Suplementar (BRASIL, 2009 <b>).

cação dos recursos (BRASIL, 2011).

O GT ATS utiliza três critérios básicos para eleição de tecno-

Outro projeto concluído foi “Implantação de centro multidis-

logias a serem avaliadas: a) aquelas em desenvolvimento ou em

ciplinar de dispensação de medicação de alto custo” desenvol-

fase de pré-registro na ANVISA; b) as incorporadas no sistema de

vido pela Secretaria de Saúde de São Paulo em que o objetivo

saúde, mas com necessidade de avaliação econômica ou com

foi a implantação o Centro Multidisciplinar de Dispensação de

necessidade de avaliação da efetividade em novas indicações; e

Medicação de Alto Custo com a proposição de algoritmos de

c) as registradas com pressão por incorporação. Esses critérios

indicação e de acompanhamento de pacientes para o uso de

têm como objetivo priorizar estudos que vão ao encontro das es-

medicamentos imunobiológicos. Foram criados 4 algoritmos

tratégias e necessidades do SUS (BRASIL, 2009 <b>).

de indicação de imunobiológicos para artrite reumatóide, artrite

No caso do ADA e ETP, a relevância e o impacto da incor-

reumatóide juvenil, artrite psoriásica e espondilite anquilosan-

poração dessas tecnologias no SUS e a existência de sólidas

te. O Centro Multidisciplinar é o local referência da Secretaria

evidências científicas preliminares de eficácia, segurança e efe-

de Saúde para atendimento dos processos administrativos da

tividade da tecnologia proposta, evidenciaram que havia neces-

mesma relacionados à Reumatologia na Cidade de São Pau-

sidade de avaliação dessas tecnologias (BRASIL, 2006 <b>).

lo, o que retrata a importância dos algoritmos em doenças que

Desta forma, o DECIT/ SCTIE requisitou a avaliação da utilização

possuem uma variedade de medicamentos disponíveis o trata-

do ADA e do ETP (BRASIL, 2011).

mento, como é o caso da AR, possibilitando o uso racional dos recursos no SUS (BRASIL, 2011).

4.2.1 AVALIAÇÕES DA UTILIZAÇÃO DE ADALIMUMABE E ETANERCEP-

Já no projeto “Agentes Biológicos no Tratamento da Artrite

TE PARA ARTRITE REUMATÓIDE NO SUS PATROCINADOS PELO DE-

Reumatóide no Sistema Único de Saúde (ABTAR-SUS)” desen-

PARTAMENTO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA

volvido pela Universidade de São Paulo em que o objetivo espe-

Para a avaliação da utilização de ADA e ETA para AR no

cífico foi estimar o impacto orçamentário-financeiro dos produ-

SUS foram encontrados 4 projetos financiados pelo DECIT de

tos ADA, ETP e IFX, usados na AR e relacionados no programa

ambos os medicamentos e 1 revisão sistemática em que foi

de dispensação de medicamentos de alto custo do Ministério

avaliado somente o medicamento ADA. Desses, 3 projetos e a

da Saúde do Brasil. Foi observado que é necessário tratar 10

revisão sistemática foram concluídos e 1 projeto está em anda-

pacientes com ADA para obter a resposta favorável de um pa-

mento. (BRASIL, 2011).

ciente, gastando-se R$560.972,50. Já para o ETP é necessário

Um dos projetos concluídos foi aquele intitulado “Avaliação

tratar 9 pacientes para obter o mesmo resultado com o gasto de

econômica e impacto orçamentário das anticitocinas adalimu-

R$ 657.193,68. O gasto anual com esses medicamentos para

mabe, etanercepte e infliximabe no tratamento da Artrite Reuma-

pacientes com AR no Hospital das Clinicas da Faculdade de

tóide” desenvolvido pela Universidade Federal do Paraná que

Medicina da Universidade de São Paulo foi de R$73.021,52 para

avaliou o custo-efetividade e o impacto orçamentário dos medi-

ETP, R$56.097,25 para ADA e R$45.359,04 para IFX, comparan-

camentos ADA, ETP e IFX no tratamento da AR no programa de

do com o MTX que foi de R$481,80. Esses dados mostram a

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 223


importância em seguir a estratégia de tratamento escalonada de

cia, segurança, efetividade e custo-efetividade de ADA e ETP.

medicamentos e de suas combinações, como recomendados

Dos 22 estudos analisados, 14 atestaram a eficácia e segurança

pela Portaria número 66 de 2006. Dessa forma, a utilização dos

desses medicamentos, 5 atestaram a segurança desses medi-

agentes anticitocinas em pacientes que realmente não tenham

camentos e 3 deles atestaram a efetividade. Entretanto, a maio-

outras opções evitando gastos demasiados com os menciona-

ria, 17, foi patrocinada pelas indústrias fabricantes e em 5 não

dos nesse estudo (NOBRE et al., 2007).

houve conflito de interesses (MORELAND et al., 1999; WEIN-

Na revisão sistemática “Adalimumabe no tratamento da

BLATT et al.,1999; BATHON et al., 2000; PINCUS et al. 2002;

artrite reumatóide” concluído em 2006 pelo Centro Cochrane

BLUMENAUER et al, 2003; VAN DE PUTTE et al., 2003; WEIN-

do Brasil o objetivo foi avaliar a efetividade e a segurança do

BLATT et al, 2003; HYRICH et al., 2004; KEYSTONE et al, 2004;

ADA isolado ou associado a outro DMARD no tratamento da AR.

VAN DE PUTTE et al., 2004; FARAHANI et al., 2005; GILES et

Nessa revisão concluiu-se que o ADA na dose de 20 ou 40 mg,

al., 2005; KOBELT et al., 2005; CHEN et al., 2006; HAMDI et al.,

administrado por via subcutânea, em pacientes com AR é efeti-

2006; QUAN et al., 2006; SCHIFF et al., 2006; WEINBLATT et al.,

vo levando em consideração o número de articulações edema-

2006; CHANG, GIRGIS, 2007; DONAHUE et al., 2008; SIZOVA,

ciadas ou dolorosas, a escala visual analógica de dor (EVA) de

2008; RUBBERT-ROTH; FINCKH, 2009; ANEXO A).

acordo com o próprio paciente, a avaliação física global avaliada

Primeiramente, foram analisados os sete estudos relaciona-

pelo médico e pelo paciente e a avaliação de qualidade de vida

dos na Portaria número 66 de 2006 (BRASIL, 2006 <a>). Dentre

(HAQ). Ademais, o ADA só deve ser prescrito após terem sido

eles, quatro tratavam da eficácia do ETP e três da eficácia do

esgotadas as outras opções terapêuticas como o uso isolado ou

ADA. Dos 4 estudos que tratavam da eficácia e segurança do

combinado das DMARD (MTX, leflunomida, cloroquina e sulfa-

ETP, 2 eram randomizados e duplo cego e 1 era randomizado,

salazina) devido ao alto custo, em torno de 36.000 reais anuais,

porém os 3 eram patrocinados ou apoiados pela indústria Im-

e a possível toxicidade ressaltando o que foi encontrado nos ou-

munex, fabricante do Enbrel® (Etanercepte), o quarto era uma

tros projetos. Além disso, concluíram que há necessidade de es-

revisão sistemática da Cochrane Canadá. Os 3 estudos que

tudos de maior tempo de observação para permitir constatações

tratavam da eficácia e segurança do ADA eram randomizados

sobre a segurança e a persistência dos efeitos terapêuticos e

e duplo cego patrocinados ou apoiados pela indústria Abbott,

que não existe ainda nenhum estudo comparando corticoeste-

fabricante do Humira® (Adalimumabe).

róides versus ADA (CENTRO COCHRANE DO BRASIL, 2006).

Já dos outros 15 estudos encontrados, que não foram utiliza-

Por fim, está em andamento o projeto “Avaliação da efetivi-

dos para a elaboração da Portaria número 66 de 2006, 7 avaliaram

dade e seguranca dos anticorpos monoclonais adalimumabe,

a eficácia e a segurança, 5 somente a segurança e 3 a efetividade.

etanercepte, infliximabe e rituximabe utilizados no tratamento da

Dos 7 estudos que avaliaram a eficácia e a segurança des-

artrite reumatóide, artrite psoriática e espondilite anquilosante,

ses medicamentos 2 eram randomizados e duplo cego e 1 era

Brasil e Minas Gerais” em desenvolvimento pela Universidade

randomizado que tratavam da eficácia e segurança do ADA e 4

Federal de Minas Gerais. O objetivo é avaliar a segurança e

eram revisões sistemáticas, das quais duas avaliaram a eficácia

a efetividade dos agentes anti-TNF – ADA, ETP e IFX e rituxi-

e segurança do ETP e do ADA, e uma somente do ADA e uma

mabe - em pacientes com artrite reumatóide, artrite psoriática

somente do ETP. Desses 7 estudos, 6 foram patrocinados pela

e espondilite anquilosante, por meio de revisão sistemática de

indústria farmacêutica e somente 1 não foi.

literatura e de estudos de coorte, retrospectiva para avaliação

Em relação a segurança de ADA e ETP foram encontrados

da segurança em nível nacional e prospectiva para avaliação da

5 estudos, dos quais 4 eram revisões sistemáticas (3 eram de

efetividade nas 4 maiores Gerências Regionais de Saúde (GRS)

ambos medicamentos e uma do ADA) e 1 era uma pesquisa

do Estado de Minas Gerais (BRASIL, 2011).

relacionando o utilizo de ADA com o desenvolvimento de tuberculose. Desses 5 estudos mencionados 2 foram patrocinados

4.2.2 EVIDÊNCIAS CIENTIFICAS DA UTILIZAÇÃO DE ADALIMUMABE E ETANERCEPTE PARA ARTRITE REUMATÓIDE Em relação à existência de sólidas evidências científicas preliminares que é um requisito para a incorporação de novas

pela indústria farmacêutica e 3 não foram. Considerando a efetividade, foram encontrados 3 estudos, todos patrocinados pela indústria farmacêutica, dos quais 2 eram revisões sistemáticas sobre a efetividade de ADA e ETP e 1 era um estudo custo-efetividade da utilização de ETP.

tecnologias, segundo a Portaria número 152 de 2006 (BRASIL,

No protocolo clínico para AR estabelecido pela Portaria nú-

2006 <b>), foram encontrados estudos comprovando a eficá-

mero 66 de 2006, esses medicamentos foram incluídos como

224 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


última linha de tratamento indo de acordo com as evidências

(DEANGELIS; FONTANAROSA, 2008). Além disso, grande parte

encontradas.

dos estudos realizados para comprovar a eficácia é financiada

Dentro da perspectiva de incorporação, nota-se que os medicamentos ADA e ETP podem ter sido incorporados devido a sua

pelo fabricante, o que pode trazer certo prejuízo à validade dos resultados.

eficácia terapêutica, segurança e custo-efetividade demonstradas

A fim de evitar a incorporação de tecnologias sem avalia-

através dos estudos analisados. Entretanto, é necessário senso

ção, o GT ATS coordenado pelo DECIT criou critérios para a elei-

crítico para a análise desses estudos que foram, na sua maioria,

ção de tecnologias a serem avaliadas (BRASIL, 2009 <a>). Já

patrocinados pela indústria e que são estudos de curta duração,

a SES/MG, através da sua Comissão Estadual de Farmácia e

aproximadamente 1 ano. Como a AR é uma doença crônica, não

Terapêutica, avalia os pedidos de inclusão, alteração ou exclu-

é possível prever por quanto tempo o medicamento será efetivo e

são de medicamentos da relação estadual, e para tal, prioriza a

também não é possível prever os efeitos da sua utilização a longo

avaliação das demandas judiciais ou sociais (MINAS GERAIS,

prazo. Para tal, seriam necessários 5 a 20 anos de estudos obser-

2009). A priorização da avaliação das tecnologias demandadas

vacionais para verificar os resultados dos estudos clínicos com

judicialmente é de grande importância para que essas tecno-

duração de 6 a 24 meses (PINCUS et al., 2002).

logias só sejam incorporadas se forem realmente mais custo-

Nos estudos ou revisões em que houve conflito de interes-

efetivas do que aquelas já existentes ou se atenderem um grupo

se, os resultados deverão ser analisados estatisticamente para

da população desassistido pelo protocolo evitando, assim, que

determinar se são realmente relevantes verificando o valor da

a pressão judicial se torne sinônimo de incorporação.

probabilidade da significância (valor de “p”), o número necessário para tratar (NNT) e o custo efetividade incremental por qua-

5 Considerações Finais

lity-adjusted life-years (QALYs) que é um indicador que avalia a

O direito à saúde é estabelecido pela Constituição Brasi-

efetividade determinando quantos anos de vida com qualidade

leira de 1988 sendo dever do Estado garantí-lo mediante políti-

foram ganhos com a utilização de uma determinada tecnologia.

cas socioeconômicas que visem a redução do risco de doença

As comparações feitas com as tecnologias existentes no

e de outros agravos, além do acesso universal e igualitário às

mercado são importantes e mais relevantes para a incorporação

ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

do que aquelas com o placebo porque para a incorporação de

As ações judiciais são um instrumento utilizado pela população

uma nova tecnologia, ela tem que ser melhor do que a existente

para a garantia do direito a saúde configurando o fenômeno da

no mercado para que haja uma justificativa para a sua incorpo-

judicialização da saúde no Brasil.

ração. Por outro lado, a comparação com o placebo é impor-

Entretanto, o grande número de ações judiciais pleiteando

tante para a determinação da eficácia, mas não para justificar a

medicamentos para doenças já contempladas com protocolos

incorporação.

clínicos do SUS, como a AR, desorganiza a distribuição de re-

Os resultados das pesquisas concluídas financiados pelo DECIT demonstraram que os medicamentos ADA e ETP devem

cursos para os diferentes setores de saúde, como o da assistência farmacêutica.

continuar sendo disponibilizados pelo SUS, porém somente

A fim de garantir o direito à assistência farmacêutica, a atu-

após terem sido esgotadas as outras opções terapêuticas ca-

alização dos protocolos clínicos se faz necessária. Para tanto, a

bendo ao médico seguir o escalonamento de tratamento para

avaliação de novas tecnologias que apresentem sólidas evidên-

AR proposto pelo SUS possibilitando uma melhor utilização dos

cias científicas de eficácia, segurança e efetividade deverá ser

recursos disponíveis (BRASIL, 2011). Através desses resultados

realizada pelo DECIT para a posterior incorporação. As avalia-

foi possível detectar que a incorporação de ADA e ETP foi váli-

ções deverão comparar as novas tecnologias com aquelas exis-

da em relação a eficácia, segurança e custo-efetividade desses,

tentes no mercado, uma vez que a incorporação só é justificada

ressaltando que devem ser utilizados como última opção tera-

se a nova tecnologia for melhor do que a existente.

pêutica. Ademais, foi interessante do ponto de vista do planeja-

A priorização da avaliação das tecnologias demandadas

mento dos gastos, o que é possível com a incorporação e que

judicialmente, como a realizada pela SES/MG através da Co-

não era possível quando ADA e ETP eram pedidos através de

missão Estadual de Farmácia e Terapêutica, é de grande im-

ações judiciais por se tratar de fenômeno imprevisível.

portância para que essas só sejam incorporadas se forem re-

No entanto, algumas vezes a incorporação de tecnologias

almente mais custo-efetivas do que aquelas já existentes ou se

é decidida sem avaliação adequada sobre eficácia, segurança

atenderem um grupo da população desassistido pelo protocolo,

e custo-efetividade em relação a outras tecnologias disponíveis

evitando, assim, que a pressão judicial se torne sinônimo de in-

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 225


corporação. Dentro da perspectiva de incorporação, foi observado que os medicamentos ADA e ETP podem ter sido incorporados devido a sua eficácia terapêutica, segurança e custo-efetividade demonstrados através dos estudos analisados. Ademais, os projetos financiados pelo DECIT demonstram que ADA e ETP devem ser prescritos somente após terem sido esgotadas as outras opções terapêuticas. O protocolo clínico para AR proposto pelo SUS, através da Portaria número 66 de 2006, traz medicamentos eficazes e seguros para o tratamento da AR. O protocolo deverá ser seguido

vembro de 2006. Revogar a Portaria SAS/MS no 865 de 05 de novembro de 2002 e aprova o Protocolo e Diretrizes Terapêuticas para Artrite Reumatóide. Brasília, DF, 1 nov. 2006. Disponível em <www.saude.gov. br>. Acesso em 25 jul. 2009 <a>. BRASIL, Ministério da Saúde. Profissional e Gestor. Base de dados gerencial do DECIT. Disponível em <http://pesquisasaude.saude.gov.br/ bdgdecit/>. Acesso em 20 jul. 2011. BRASIL, Ministério da Saúde. Profissional e Gestor. Novas Tecnologias. Disponível em http://pesquisasaude.saude.gov.br/bdgdecit/. Acesso em 20 jul. 2009 <b>.

verificando a real necessidade da utilização de ADA e ETP, garantindo o uso racional desses medicamentos e possibilitando a melhor distribuição de recursos dentro da assistência farmacêutica. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARNETT, F. C. Artrite Reumatóide. In: BENNETT, J. Claude; PLUM, Fred. Cecil: tratado de medicina interna. 20. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1997.cap. 258, p. 1539-1545. ARNETT F. C.; EDWORTHY S. M.; BLOCH D. A.; MCSHANE D. J.; FRIES J. F.; COOPER N.S. The American Rheumatism Association 1987 revised criteria for the classification of rheumatoid arthritis. Arthritis & Rheumatism, Atlanta, v. 31, no 2, p.315-324, 1988. Disponível em <http://www3.interscience.wiley.com/journal/112162911/ abstract?CRETRY=1&SRETRY=0>. Acesso em 15 ago. 2009. BATHON, J. M; MARTIN, R. W.; LEISCHMANN R. M. F.; TESSER, J. R.; SCHIFF,M. L. H.; KEYSTONE, E. C.; GENOVESE, M. C.; WASKO, M. C.; MORELAND, L.W.; WEAVER, A. L.; MARKENSON, J.; FINCK, B. A comparison of etanercept and methotrexate in patients with early rheumatoid arthritis. The New England Journal of Medicine, Waltham (MA), v. 343, n. 22, p.1586-1593, 30 nov. 2000. Disponível em <http://content. nejm.org/cgi/content/full/343/22/1586>. Acesso em 15 ago. 2009. BLUMENAUER, B. B. T. B.; CRANNEY, A.; BURLS, A.; COYLE, D.; HOCHBERG, M. C.; TUGWELL, P.; WELLS, G. A. Etanercept for the treatment of rheumatoid arthritis. Cochrane Database of Systematic Reviews, [S. I.], v. 3, 21 jul. 2003.Disponível em <http://mrw.interscience.wiley.com/cochrane/clsysrev/articles/ CD004525/frame.html. Acesso em 15 ago. 2009. BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria SAS/MS nº 865, de 05 de novembro de 2002. Aprova o Protocolo e Diretrizes Terapêuticas para Artrite Reumatóide. Brasília, DF, 5 nov. 2002. Disponível em <www.saude. gov.br>. Acesso em 25 jul. 2009. BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria n° 152/GM, de 20 de janeiro de 2006 .Institui o fluxo para incorporação de tecnologias no âmbito do Sistema Único de Saúde. Brasília, DF, 20 jan. 2006. Disponível em <www. saude.gov.br>. Acesso em 25 jul. 2009 <b>. BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria SAS/MS nº 66, de 01 de no-

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NOTAS DE RODAPÉ 1 Farmacêutica formada pelo Centro Universitário Newton Paiva e ex-integrante do Grupo de Pesquisa em Economia da Saúde da Universidade Federal de Minas Gerais. 2 Farmacêutico e professor de Farmacologia do Centro Universitário Newton Paiva.

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CONFORMAÇÕES DO CICLOEXANO: um modelo de estudo no PCMODEL Anderson Hollerbach Klier 1

RESUMO: O estudo molecular conformacional ainda é visto como um dos entraves para o entendimento de estabilidade molecular principalmente pelos estudantes de graduação que cursam disciplinas na área química. O software PcModel pode ser uma ferramenta bastante útil, quando aplicado na previsão e estimativa do cálculo de energia envolvendo as conformações mais e menos estáveis do cicloexano substituído, podendo ser aplicado em aulas práticas de química.

PALAVRAS-CHAVE: conformação, estabilidade, interação 1,3-diaxial

INTRODUÇÃO

Como molécula modelo para as simulações, o cicloexano,

A análise conformacional ou o estudo da estabilidade de

um hidrocarboneto da classe dos cicloalcanos, se mostra bas-

moléculas, normalmente é visto como conteúdo complicado e

tante adequado por possuir estrutura tridimensional como forma

de difícil compreensão principalmente pelo público discente, em

mais estável, além de três padrões de substituição, com duas

virtude de requerer uma visão ampla e espacial que envolve o

configurações para cada padrão de substituição e duas confor-

conhecimento pregresso referente a geometria espacial (MAR-

mações para cada configuração (SOLOMONS, 1996). Estrutu-

TINS, 2009). Com o intuito de desmitificar e facilitar o entendi-

ralmente o cicloexano possui fórmula molecular C6H12, com con-

mento do assunto, a disciplina de Química Farmacêutica do

formação mais estável do tipo cadeira, que segundo o padrão

curso de Farmácia do Centro Universitário Newton Paiva, inclui

de substituição dos átomos de hidrogênio por substituintes mais

em seu programa simulações no software PcModel. Estas simu-

volumosos, pode apresentar interações conhecidas como inte-

lações permitem que os alunos comprovem que certos valores

rações 1,3-diaxiais. Estas são interações oriundas principalmen-

teóricos de energia para alguns tipos de interações químicas

te de repulsões eletrônicas, que podem estabilizar uma determi-

podem ser estimados e visualizados com uma certa facilidade

nada conformação, quando seu valor é baixo, ou desestabilizar

dentro das matrizes de cálculo no ambiente virtual.

outra conformação quando seu valor for mais elevado, (figura 1).

Como parâmetro de estabilidade as interações 1,3-diaxiais

podem assumir duas conformações distintas, que serão mais

sempre existem entre substituintes em posição axial ligados

ou menos estáveis de acordo com o número de interações

em carbonos do cicloexano que reservam entre si, um padrão

1,3-diaxiais presentes, conforme representado na figura 2.

de posicionamento do tipo-1,3. Se considerarmos dois substi-

Dentre as possibilidades, as conformações com dois substi-

tuintes aleatórios A e B substituindo hidrogênios no cicloexano,

tuintes (A e B) em equatorial serão mais estáveis que confor-

estes podem estar ligados nas posições 1 e 2, 1 e 3 ou 1 e 4.

mações com um dos substituintes (A ou B) em axial, e estas

Cada um destes padrões de substituição pode assumir duas

mais estáveis que conformações com os dois substituintes (A

configurações, cis ou trans, e cada uma destas configurações

e B) em axial.

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As conformações características dos padrões de substituição

análogos em sua estrutura, dependerão da conformação do ciclo-

estrutural do cicloexano, possuem importância específica principal-

exano ou de seus análogos (BARREIRO, 2008). Como exemplos

mente em moléculas bioativas (BARREIRO, 2008). Estas moléculas

de fármacos que apresentam tal peculiaridade, podem ser citados;

quando possuem receptores biológicos são chamadas Fárma-

meperidina (1), fentanil (2), ciclofosfamida (3), gatifloxacino (4) e

cos específicos, e para tanto irão apresentar interações químicas

vardenafil (5), representados estruturalmente na figura 3 (BARREI-

fármaco-receptor, que para fármacos que possuam cicloexano ou

RO, 2008; FOYE, 1995; LEDNICER, 1998; LEDNICER, 2008).

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Objetivos

feitas entre os valores obtidos nas simulações computacionais

e os valores reais descritos na literatura (SOLOMONS, 1996;

Em função das peculiaridades estruturais já decritas,

bem como as implicações destas em possíveis atividades bio-

CLAYDEN, 2001).

lógicas, o presente trabalho objetivou simular a energia de diferentes substituintes no cicloexano, a fim de prever valores para

Resultados e discussão

possíveis interações 1,3-diaxiais existentes em conformações de

Como protótipo minimizamos a energia do cicloexano não

uma configuração específica do mesmo.

substituído a fim de obtermos a energia total da molécula, conforme figura 4. O valor de energia total do cicloexano não subs-

Material e Métodos

tituído foi de 6,551 Kcal/mol. Em termos estruturais, este valor

Como ferramenta virtual facilitadora do entendimento de

corresponde a todas as seis ligações C-C, doze ligações C-H e

estrutura conformacional, utilizamos o software PcModel 7.2 –

seis interações repulsivas

Serena software, nos laboratórios de informática do Campus

hidrogênio-hidrogênio, três acima do plano e três abaixo do

Silva Lobo do Centro Universitário Newton Paiva. Foram feitas

plano. Estas são consideradas de muito baixa energia, pois são

simulações das energias totais do cicloexano não substituído e

os menores substituintes possíveis para qualquer cadeia car-

do cicloexano mono e dissubstituido, a fim de compararmos os

bônica. Quando consideramos o cicloexano monossubstituído,

valores das possíveis interações 1,3-diaxiais existente em pos-

como metilcicloexano, podemos otimizar sua energia conforma-

síveis substituintes nas posições axiais. As comparações foram

cional , (figura 5).

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Aqui percebemos uma energia de 8,670 Kcal/mol para

mesmo metilcicloexano em sua conformação mais estável,

o metilcicloexano em sua conformação menos estável, ou

ou seja, o substituinte metil em equatorial, onde inexistem

seja, o substituinte metil em posição axial com duas inte-

interações do tipo 1,3-diaxiais, podemos um valor de ener-

rações repulsivas 1,3-diaxiais com os hidrogênios vizinhos

gia de 6,890 Kcal/mol, como é mostrado na figura 6.

também em axial. Já quando procedemos o cálculo para o

Considerando que em relação ao cicloexano não substituído

gia do metilcicloexano. Para tanto basta subtrairmos da energia

o metilcicloexano já conta com uma ligação C-C e duas ligações

da conformação menos estável (8,670 Kcal/mol) a energia da

C-H a mais em sua energia total, e considerando como des-

conformação mais estável (6,890 Kcal/mol), o que resulta numa

prezível os valores de energia das repulsões entre hidrogênios

diferença de energia de 1,78 Kcal/mol, que dividido pelo número

axiais, podemos estimar os valores das interações 1,3-diaxiais

de interações metil-hidrogênio, duas, nos fornece um valor de

entre grupos metil e hidrogênios na conformação de maior ener-

0,89 Kcal/mol de energia para a interação 1,3-diaxial metil-hi-

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drogênio. Tal valor obviamente é bastante próximo do valor real

químico, especialmente no campo da estereoquímica que tem

descrito na literatura, que é de 0,90 Kcal/mol, pois os softwares

se mostrado bastante árido para a grande maioria dos alunos

de simulação computacional são abastecidos com valores de

de graduação. A tabela 1, mostra alguns substituintes comuns

referência da literatura, entretanto, o que se chama atenção aqui

e suas simulações de energia para interações 1,3-diaxiais com

é a utilização prática destes softwares para comprovação de da-

o hidrogênio, obtidas no PcModel de modo análogo ao relatado

dos literários em experimentos que desmitifiquem o conteúdo

para o metilcicloexano.

A partir destes resultados, extrapolamos o cálculo para

ração entre dois grupos metila em configuração cis, em suas

derivados do cicloexano dissubstituídos, a fim de caracteri-

conformações mais estáveis equatorial-equatorial e menos

zarmos outras interações 1,3-diaxiais entre outros substituin-

estável, axial-axial, como representado abaixo.

tes diferentes do hidrogênio. Para tanto, iniciamos com inte-

Após as simulações de energia no PcModel foram obtidos

de maior energia e menor estabilidade, diaxial, existem duas in-

12,545 Kcal/mol para o conformero diaxial e 7,208 Kcal/mol para

terações 1,3-diaxiais metil-hidrogênio e uma interação 1,3-diaxial

o conformero diequatorial. Considerando que na conformação

metil-metil, temos a seguinte representação:

A fim de calcularmos o valor da interação A-B, metila-

diferença 1,78 Kcal/mol (0,89 Kcal/mol por interação previa-

metila, subtraímos da energia da conformação diaxial, 12,545

mente determinado), o que resulta num valor de 3,557 Kcal/

Kcal/mol, o valor da energia da conformação diequatorial

mol para a interação A-B, metila-metila. As simulações de

7,208 Kcal/mol, obtendo uma diferença de 5,337 Kcal/mol.

energia para a conformação mais estável diequatorial e me-

Como esta diferença inclui a interação desejada A-B e duas

nos estável diaxial para o 1,3-dimetilcicloexano, são apresen-

interações metila-hidrogênio, A-C e B-C, subtraímos desta

tadas nas figuras 7 e 8.

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Conclusão

no ensino dos conteúdos químicos envolvendo estereoquímica.

Após as simulações com o software PcModel foi possível observar que as mesmas são bastante próximas dos valores

Referências

reais em termos de energia, permitindo uma previsão bastante

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útil para valores energéticos de interações 1,3-diaxiais em substituintes no cicloexano. Interações estas que podem ser simuladas tanto para interações com o átomo de hidrogênio quanto interações com grupamentos mais volumosos. Além das simulações de energia, como ferramenta virtual o software facilita o entendimento das diferenças estruturais pertinentes a definição de configuração e conformação, o que o torna útil especialmente

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NOTAS DE RODAPÉ Docente dos cursos de Farmácia e Ciências Biológicas do Centro Universitário Newton Paiva 1

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ELETROESTIMULAÇÃO NO TRATAMENTO DA INCONTINÊNCIA URINÁRIA DE ESFORÇO FEMININA: revisão de literatura Drielly Fernanda de Souza1, Estela Vieira Santana1, Keylla Marques de Araújo1, Renata de Oliveira Cangussu2

RESUMO: A eletroestimulação transvaginal do assoalho pélvico (ETAP) é uma forma de tratamento conservador da incontinência urinária de esforço (IUE). No entanto discute-se se o uso deste recurso promove resultados benéficos. O objetivo desta revisão de literatura foi verificar se o uso da ETAP para tratamento de IUE em mulheres contribui para a melhora dos sintomas. Foram selecionados artigos científicos nas bases eletrônicas Medline, Lilacs e Scielo. Foram analisados 16 sobre o uso da ETAP isolada e comparando a outros recursos na IUE em mulheres. A maioria dos artigos demonstrou que a ETAP com frequência de 50Hz, promoveu efeitos benéficos na frequência de perdas urinárias, força muscular do assoalho pélvico (AP) e na qualidade de vida das mulheres tratadas com esse recurso.

PALAVRAS-CHAVE: eletroestimulação, incontinência urinaria de esforço, fisioterapia. INTRODUÇÃO

das mulheres incontinentes, sendo definida por queixa de per-

A incontinência urinária (IU) consiste em um problema de

da involuntária de urina após esforços, como espirro ou esfor-

saúde pública que pode atingir mulheres em qualquer período

ços físicos (BERNARD et al, 2010).

da vida. O risco de IU aumenta com a idade, podendo determinar

A IUE pode ocorrer por alterações anatômicas como a

uma série de consequências físicas, econômicas, psicológicas,

hipermobilidade do colo vesical, deficiência do mecanismo

emocionais, sexuais e sociais que poderão interferir de forma

esfincteriano e fraqueza da musculatura do AP . Segundo a So-

negativa na qualidade de vida dessas mulheres (BERQUO ET

ciedade Internacional de Continência (ICS), a IUE ocorre quando a

AL, 2009).

pressão intravesical excede a pressão uretral máxima na ausência

Estima-se que 200 milhões de pessoas no mundo apresen-

de contração do músculo detrusor (BERNARD ET AL, 2010).

tem algum tipo de IU, sendo que uma em cada quatro mulheres

Os fatores de risco para a IUE são idade, gravidez, parto,

com idade entre 30 a 59 anos já vivenciou algum episódio de

climatério, obesidade, alterações hormonais, traumas e cirur-

IU. Os dados sobre prevalência dessa doença são variáveis,

gias ginecológicas, como a histerectomia. A gravidez e o parto

mas estima-se que ela afeta aproximadamente 57% das mulhe-

são citados como os principais responsáveis por essa afecção

res com idade maior que 40 anos (GOMES et al, 2009). Somen-

(LIMA ET AL, 2007).

te um quarto dessas mulheres procura por um serviço médico

Existem diversas formas de tratamento para a IU. O trata-

por causa de seu problema urinário. Nos Estados Unidos, 13

mento conservador fisioterapêutico tem sido considerado uma

milhões de adultos são incontinentes e deste número, 85% são

opção relevante nos últimos tempos, utilizando recursos como

mulheres. O gasto anual desse país com a IU chega a 16 bi-

treinamento do assoalho pélvico (TAP), biofeedback, cones va-

lhões de dólares (SANTOS et al, 2009).

ginais, tratamento comportamental e ETAP (RETT ET AL, 2008).

Dados referentes à população brasileira, embora ainda in-

TAP são exercícios ativos para reforçar a resistência uretral

cipientes, apontam prevalência de mulheres com IU de 30 a

e melhorar os elementos de sustentação dos orgão pélvicos,

43%. Os sinais e sintomas mais comumente identificados entre

hipertrofiar as fibras musculares tipo II do diafragma urogenital

as mulheres com IU são urgência, polaciúria, noctúria, enurese

e pélvico (OLIVEIRA ET AL, 2007). Biofeedback é um monitora-

noturna, urge-incontinência e perda aos esforços. Esses sinais

mento por aparelho dos eventos fisiológicos que a paciente é

e sintomas são usados para nortear o diagnóstico e a interven-

incapaz de distinguir por si só, sendo empregado na IUE para

ção terapêutica nestas pacientes (FIGUEIREDO ET AL, 2008).

o reconhecimento da musculatura envolvida na contração e no

A IUE é o tipo mais prevalente de IU, encontrada em 49%

relaxamento do AP. Durante a sessão a paciente passa a obter

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informação visual do controle voluntário da musculatura reali-

resultando em diminuição significativa do número de perdas uri-

zando um programa de fortalecimento através do recrutamento

nárias e melhora na qualidade de vida (HERRMANN et al, 2003).

muscular (OLIVEIRA ET AL, 2007).

No entanto, seus resultados no tratamento da IUE ainda são

Cones vaginais é um conjunto de cones com mesmo formato

conflitantes. Essas diferenças podem ocorrer em função da utili-

e pesos diferentes. O princípio da técnica baseia-se no estímulo

zação de distintos critérios na avaliação diagnóstica da IUE, nos

do recrutamento do músculo pubococcigeo e no auxílio periférico

parâmetros definidos para a ETAP e nos métodos empregados

para reter o cone durante a execussão da técnica, aumentado

para a análise dos resultados (GOMES et al, 2009).

progressivamente o peso. É considerada uma técnica comple-

Por ser bastante utilizada na prática clínica como uma

mentar para consolidação dos resultados dos exercícios de forta-

das formas de tratamento para a IUE, há necessidade de in-

lecimento da musculatura pélvica (OLIVEIRA ET AL, 2007).

vestigar se o uso desse recurso, de forma isolada, auxilia na

Tratamento comportamental é um tratamento que consiste em

recuperação das pacientes.

mudanças de hábitos por parte do paciente através de orientações

O objetivo do presente estudo foi avaliar se o uso da eletro-

dadas pelo terapeuta sobre ritmo miccional (realização de interva-

estimulação, de forma isolada, para tratamento de IUE em mu-

los entre as micções), ingestão de líquidos, entre outros. As orien-

lheres contribui para a melhora dos sintomas.

tações são dadas baseadas em um registro feito pelo paciente no diário miccional. São registrados dados como volume urinado, número e horário de micções, quantidade de perda de urina e fatores desencadeantes associados (OLIVEIRA ET AL, 2007).

MÉTODOS Foi realizada uma revisão de literatura e as buscas foram feitas nas seguintes bases de dados eletrônicas: Medline (Na-

ETAP são estímulos elétricos emitidos em uma determinada

tional Library of Medicine), Lilacs ( Lieratura Latino Americana e

frequência de corrente visando a diminuição da urge-incontinên-

do Caribe em Ciências da Saúde) e Scielo (Scientific Eletronic

cia e também o aumento da força de contração do músculo ele-

Library Online). As palavras-chave foram eletroestimulação, in-

vador do ânus, evitando a IUE (OLIVEIRA ET AL, 2007).

continência urinaria de esforço e fisioterapia, buscadas isolada-

Em relação ao mecanismo de ação, a ETAP causa contração

mente ou cruzadas. Dessa busca foram encontrados 30 artigos

dos músculos do AP, aumentando o número das fibras muscula-

e escolhidos 22 artigos, os outros foram excluídos por não se

res de contração rápida, responsáveis pela continência em situ-

relacionarem com o tema. Dos 22 artigos analisados, 16 são

ações de estresse (BARROSO et al, 2003; GOMES ET AL, 2009).

estudos sobre a ETAP isolada e 6 comparada a outros recursos

Os valores dos parâmetros elétricos mais encontrados para

na IUE em mulheres. Foram incluídos artigos nos idiomas por-

a estimulação pélvica na IUE na literatura são: corrente elétrica

tuguês e inglês.

bifásica, frequência de 50Hz, duração do pulso de 700µs e intensidade da corrente entre 12 a 53mA, conforme a tolerabilidade

DISCUSSÃO

de cada mulher. Realização de duas sessões semanais, cada

Atualmente existe um interesse maior em terapias físicas para

uma com duração de 15 a 30 minutos num período variável de 4

o tratamento de IUE, o que não acontecia até a década de 1980,

a 12 semanas, porém esses parâmetros não estão bem estabe-

embora ela seja utilizada desde 1952. Esse interesse para o trata-

lecidos (BARROSO et al, 2003; HERRMANN et al, 2003; JEYA-

mento conservador pode ser devido à uma maior conscientização

SEELAN et al, 2000).

das mulheres e a redução dos custos e morbidade após cirurgia.

As contraindicações apresentadas pela ETAP são gravi-

Dentre essas terapias físicas, a ETAP tem demonstrado ser uma

dez, infecções vaginais, diminuição da percepção sensorial da

importante técnica e cada vez mais utilizada, devido aos benefí-

vagina, infecção urinária, arritmia cardíaca e menstruação. Os

cios proporcionados (HOLME ET AL, 2007; LLOYD ET AL, 2007).

efeitos colaterais descritos com a utilização da ETAP são raros,

Esses benefícios são advindos da contração do AP. De

destacam-se a dor, irritação vaginal e infecção urinária (SANTOS

acordo com LLOYD ET AL, 2007, GOMES ET AL, 2009 e BAR-

et al, 2009; HERRMANN et al, 2003).

ROSO ET AL, 2003 a ETAP ativa os aferentes do nervo pudendo,

A ETAP usada para tratamento da IUE é uma técnica econô-

que resulta na ativação de eferentes desse nervo, provocando a

mica em comparação ao custo da cirurgia ou o uso prolongado

contração da musculatura estriada periuretral e músculos estria-

de medicamentos anticolinérgicos, além disso, é minimamente

dos do AP, que provoca o aumento do número de fibras muscu-

invasiva, com efeitos colaterais desprezíveis e aceitos pela maio-

lares, com contração rápida, responsáveis pela continência em

ria das mulheres (HERRMANN et al, 2003).

situação de estresse.

A ETAP é utilizada há muitos anos para tratamento da IUE,

Isso fornece uma forma de exercício com o objetivo de me-

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lhorar o mecanismo de fechamento uretral e também, pode ser

duas vezes por semana por 20 minutos, durante dois meses

útil no ensino da contração muscular do AP de mulheres que

consecutivos. Nos resultados, 81,7% das mulheres apresenta-

não conseguem identificar ou apresentam fraqueza na contra-

ram cura ou melhora nos episódios de perdas urinárias, houve

ção voluntária desses músculos (LLOYD ET AL, 2007).

redução da mobilidade do colo vesical em 40,9% e 77,3% das

Segundo APPEL 1998, a ETAP com uma frequência mais alta (50Hz) é necessária para obter uma taxa de sucesso sig-

mulheres estavam satisfeitas com a ETAP. Já a pressão de perda aos esforços não apresentou alteração significativa.

nificativa na IUE, em torno de 50% das mulheres, embora esse

Resultados semelhantes foram obtidos por outros autores.

sucesso não signifique exatamente cura. JEYASSELAN ET AL,

BARROSO ET AL, 2003, em um estudo randomizado verificaram

2000 verificaram que a ETAP causa mudanças na força e na

o efeito da ETAP no tratamento da IU e avaliou a melhora clínica

resistência muscular e consequentemente diminuição na gravi-

seis meses após o término do tratamento. Participaram do estu-

dade da IU. Com a ETAP utilizando-se uma freqüência de 50Hz

do 36 mulheres no climatério com IUE (utilizado 50Hz), urgência

pode-se aumentar a força do músculo, a reação das fibras de

(20Hz) ou mista (20Hz), divididas em grupo experimental, com

contração rápida e a diminuição do número de perdas urinárias.

24 pacientes e grupo controle, com ETAP placebo com 12 pa-

BRUSBAKER ET AL, 1997, realizou um estudo randomiza-

cientes. As pacientes foram instruídas a usar o aparelho em casa

do com objetivo de determinar a eficácia objetiva e subjetiva

duas vezes por dia durante 20 minutos no período de 12 sema-

da ETAP para o tratamento de IU em mulheres. Participaram

nas. Na avaliação logo após o tratamento o grupo experimental

do estudo 121 mulheres com IU por hiperatividade do detrusor,

apresentou redução significativa do número de micções notur-

IUE e IU mista. A avaliação pré e pós-intervenção incluiu o teste

nas, episódios de urgência e de IU e aumento significativo da

urodinâmico para caracterização dos tipos de IU e diário mic-

capacidade vesical. Na reavaliação após seis meses, um terço

cional que avaliou a frequência de perda urinária. A amostra foi

das pacientes do grupo experimental necessitou de uma nova

dividida nos grupos I (experimental), com 61 pacientes e grupo

abordagem terapêutica.

II (controle­), com 60 pacientes. As sessões de ETAP eram re-

Como relatado no estudo de BARROSO ET AL, 2003, os re-

alizadas em domicílio duas vezes por dia por um período de

sultados conseguidos com a ETAP não se mantiveram em todas

dois meses, com frequência de 20Hz. Houve cura de 49% das

as mulheres após seis meses do tratamento e sugeriu a realiza-

pacientes com hiperatividade do detrusor do grupo I e em 6% no

ção de mais estudos que abordem os efeitos da ETAP em longo

grupo II. Não houve diferença estatisticamente significativa nas

prazo, visto que na literatura essa abordagem ainda é escassa.

pacientes com IUE em ambos os grupos.

ERIKSEN ET AL, 1989 relataram cura ou melhora em 68% das

No estudo realizado por LLOYD ET AL, 2007 concluiu-se que

mulheres tratadas com ETAP, mantendo-se a taxa de sucesso

o programa comportamental (TAP, biofeedback assistido, estraté-

de 56% dois anos após a terapia. APPEL, 1998 realizou um estu-

gias de controle de urina e de auto monitoramento com o diário

do com segmento de seis anos, demonstrando que apenas 40%

miccional) foi tão eficaz na redução do número de perdas uriná-

das mulheres apresentaram melhora permanente após a ETAP.

rias quanto o programa comportamental com adição da ETAP

No entanto, ressaltou que a associação de exercícios regulares

(20Hz) no tratamento da IUE, em comparação ao grupo controle.

do AP para fortalecer a musculatura perineal poderá interferir po-

Esses resultados podem ter sofrido influência da baixa fre-

sitivamente na manutenção dos resultados.

quência utilizada no tratamento, 20HZ, embora LLOYD ET AL,

Em um estudo realizado por NISSENKORN ET AL, 2004,

2007 e WALKDEN ET AL, 1991 relatem a utilização de uma fre-

com objetivo de avaliar a eficácia da ETAP em mulheres com

quência de 20Hz a 50Hz como ideal para o tratamento da IUE. A

IUE ou IU mista, foram selecionadas 23 mulheres, sendo 16 com

utilização de uma frequência mais alta poderia ter resultado em

IUE e 7 com IU mista. Foi utilizado o pad test como método de

melhora significativa da IUE, já que outros autores encontraram

avaliação. Utilizou-se ETAP com frequência de 50Hz nas pacien-

resultados positivos com uma frequência de 50Hz.

tes com IUE. Os resultados foram positivos, obtendo melhora

HERRMANN ET AL, 2003 em um estudo randomizado, ava-

em ambos os grupos, sendo que 9 pacientes com IUE ficaram

liaram 22 mulheres com IUE com o objetivo de verificar o efeito

totalmente curadas e 7 tiveram a quantidade de perda urinária

da ETAP. As pacientes tinham idade média de 49 anos e pari-

reduzida. Houve diminuição da frequência miccional, da urgên-

dade média de 2,2 partos. Foram usados na avaliação o estu-

cia e dos episódios de perda.

do urodinâmico, diário miccional, ultra-sonografia transperineal

MURAKAMI ET AL, 1997 realizaram um estudo para ava-

para avaliação da mobilidade do colo vesical e avaliação sub-

liar a eficácia da ETAP no tratamento da IUE. Foram estuda-

jetiva da satisfação com o tratamento. Foi aplicada ETAP 50Hz

das 35 mulheres com idade média de 63 anos, que foram

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divididas em grupo experimental e grupo controle. Essas mu-

musculatura do AP apresentou melhores resultados, mostrando

lheres foram avaliadas através do estudo urodinâmico, pad

uma tendência para ser o tratamento de escolha nesses grupos.

test e avaliação subjetiva através de relato das pacientes. Foi

CASTRO ET AL, 2009 em um estudo randomizado compa-

utilizada frequência de 50Hz durante 15 minutos por um perío-

rou o efeito da ETAP e da terapia com cones vaginais em mulhe-

do de quatro semanas. Observou-se, no grupo experimental,

res com IUE. Foram selecionadas 45 pacientes que foram divi-

melhora significativa no pad test, na pressão de fechamento

didas em dois grupos, grupo ETAP composto por 24 pacientes

uretral e também no relato das pacientes.

e grupo de terapia com cones vaginais com 21 pacientes. As

HOLME ET AL, 2007 em um estudo randomizado compara-

mulheres realizaram ETAP com frequência de 50Hz, duas vezes

ram os efeitos do TAP em 25 pacientes, ETAP em 25 pacientes

por semana durante 20 minutos, e cones vaginais duas vezes

e cones vaginais em 27 pacientes isoladamente e com nenhum

por semana durante 45 minutos, com o peso do cone variando

tratamento em mulheres com IUE (grupo controle com 30 parti-

de 20 a 100g. O período de tratamento foi de quatro meses. Os

cipantes). A ETAP 50Hz foi realizada durante 30 minutos diaria-

métodos de avaliação utilizados foram diário miccional, pad test

mente e com associação de contração voluntária do AP, por um

e questionário de qualidade de vida. Houve melhora significativa

período de seis meses. O tratamento era realizado em casa e

nos dois grupos em todos os parâmetros avaliados, no entanto,

os participantes encontravam com o fisioterapeuta uma vez por

não houve diferença entre os grupos.

mês. Foram avaliados em força muscular, quantidade de per-

A ETAP também influencia na melhora da qualidade de vida

da urinária e cura objetiva (menos de 2g de perda), através do

das mulheres com IUE, que provavelmente está relacionada

pad test, cura subjetiva através de relatos da paciente, adesão

com a diminuição dos episódios de perda urinária, como é de-

ao tratamento e atividade social. Em relação à força muscular,

monstrado no estudo de GOMES ET AL, 2009 cujo objetivo foi

perda urinária, cura objetiva, cura subjetiva e atividade social

avaliar o efeito da ETAP sobre a qualidade de vida de uma mu-

houve melhora nos três grupos em relação ao grupo controle,

lher com IUE. Após o tratamento houve melhora da qualidade de

no entanto, apenas no grupo de TAP houve melhora significati-

vida, além de melhora da força dos músculos do AP e redução

va quando comparado aos demais grupos. Nos resultados em

da frequência de perdas.

relação à adesão ao tratamento, o grupo TAP novamente apresentou resultados significativamente maiores que os demais

CONCLUSÃO

grupos, com 93%. Segundo os autores, esse resultado pode ter

Concluiu-se então, através dos estudos citados, que a ETAP

sido influenciado pelas dificuldades que as mulheres encontra-

utilizando-se uma frequência de 50Hz, melhora a força muscu-

ram na utilização da ETAP em casa e consequentemente uma

lar, a frequência de perdas urinárias, promove cura objetiva e

menor adesão ao tratamento, já que elas só se encontravam

subjetiva da IU, o que pode influenciar na melhora da qualidade

com o fisioterapeuta uma vez por mês.

de vida das mulheres. No entanto parece que o uso da ETAP em

GEIRSSON ET AL, 2009 em um estudo randomizado com-

adição ao TAP pode ser mais indicado, pois em alguns artigos,

pararam a eficácia do TAP com e sem ETAP no tratamento IUE.

os resultados do TAP foram melhores comparando-se à ETAP

Participaram do estudo 24 mulheres com idade entre 27 e 73

e proporcionou benefícios na manutenção dos resultados em

anos. As pacientes foram divididas em grupo 1 (TAP) e 2 (TAP e

longo prazo. Os benefícios da ETAP foram evidentes numa ava-

ETAP com frequência de 50HZ). O grupo foi significativamente

liação em curto prazo, já em longo prazo os efeitos ainda não

mais jovem. Ao final do estudo, ambos os grupos apresentaram

são bem esclarecidos. São necessários mais estudos com ETAP

aumento significativo da força muscular do AP e 70% de todas

isoladamente, com parâmetros semelhantes e comparando-se a

as mulheres tinham reduzido ou curado a IUE. No entanto, o

outros tratamentos para reforçar a eficácia desse recurso.

grupo 2 apresentou significativamente melhores resultados. BERNADES ET AL, 2000 realizou um estudo randomizado comparando a eficácia da ETAP e do TAP na IUE. Participaram do estudo 14 mulheres com idade entre 31 e 67 anos, que foram divididas em dois grupos, grupo ETAP e grupo TAP com sete mulheres em cada. As pacientes realizaram ETAP com frequência de 50Hz e os grupos foram tratados durante 10 dias consecutivos em ambulatório. Todas as pacientes obtiveram uma

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NOTAS DE RODAPÉ

Alunas do Curso de Fisioterapia do Centro Universitário Newton Paiva 1

2 Docente

do Curso de Fisioterapia do Centro Universitário Newton Paiva

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FARMÁCIAS COMUNITÁRIAS E O ATENDIMENTO AOS CASOS DE GRIPE: medicamentos de venda livre e o uso racional Natália Vasconcelos Silva de Brito* Elias Borges do Nascimento Júnior**

RESUMO: A gripe e o resfriado são infecções respiratórias agudas. Doenças de origem viral que acometem principalmente as vias aéreas superiores, podendo causar cefaléia, mialgia e febre. São diagnosticadas pelo quadro clínico e tratadas, basicamente, com medicamentos de venda livre. Os medicamentos de venda livre podem ser propagandeados para a população leiga por vários meios de comunicação, o que produz um aumento no consumo desses medicamentos e consequentemente o aumento do número de intoxicações por fármacos. O objetivo deste trabalho é mostrar a importância do papel do farmacêutico na orientação aos pacientes que fazem uso de medicamentos de venda livre para favorecer o uso racional desses fármacos, e também, a importância de propiciar treinamento adequado aos funcionários, para que estes também sejam fonte de informações corretas. PALAVRAS-CHAVE: Gripe; resfriado; medicamento de venda livre; uso racional de medicamentos; propaganda de medicamentos, indicação farmacêutica.

INTRODUÇÃO

espirros e coriza (CASTRO, 2008; FORLEO-NETO, et al., 2003;

As causas mais frequentes de infecções das vias aéreas

MASSUNARI, et al., 2004).

estão relacionadas à gripe e ao resfriado. Essas doenças têm

A gripe e o resfriado são diferenciados pelo quadro clínico. As

distribuição global, elevada transmissibilidade e possuem mar-

manifestações sistêmicas são mais intensas na gripe, tornando

cada sazonalidade. Podem ser causados por vários agentes

os sintomas de vias aéreas, sintomas que mais incomodam no

virais, por exemplo: Influenza, rinovírus, coronavirus, adeno-

resfriado, problemas secundários (PITREZ, P.; PITREZ, J., 2003).

vírus, entre outros (CASTRO, 2008; CAMPAGNA, et al., 2009; MASSUNARI, et al., 2009).

Essas doenças têm curso benigno, todavia, os idosos, crianças, indivíduos imunocomprometidos e portadores de do-

Segundo o Centers for Disease Control and Prevention

enças crônicas podem desenvolver complicações como pneu-

(CDC) 60 milhões de pessoas ficam gripadas ou resfriadas por

monias virais e bacterianas, além de descompensação de do-

ano nos Estados Unidos, e dessas, 25 milhões procuram aten-

enças pré-existentes que necessitem de internação hospitalar

dimento médico. Estima-se que, anualmente, cerca de 10% da

(CASTRO, 2008).

população mundial apresenta um episódio de Influenza (CASTRO, 2008; FORLEO-NETO, et al., 2003).

A gripe causa 25 milhões de consultas médicas anuais, centenas de milhares de internações e vários dias de trabalho

O principal agente etiológico da gripe é o vírus Influenza.

perdidos, o que gera um grande impacto econômico estimado

Esses vírus sofrem mutações sazonais facilmente, o que gera

em 12 bilhões de dólares anuais nos Estados Unidos (MASSU-

ausência de imunidade duradoura. O resfriado comum é cau-

NARI, et al., 2004).

sado principalmente pelo rinovírus (30 a 50%), que também

O tratamento da gripe e do resfriado consiste em minimizar

sofre mutações com facilidade. A existência de mais de 100

os sintomas, pois como é uma doença autolimitada, o próprio

sorotipos de rinovírus também dificulta a produção de vacinas

corpo pode destruir o vírus. Os medicamentos indicados nesse

eficazes (CASTRO, 2008; MASSUNARI, et al., 2004; FORLEO-

tratamento são chamados “medicamentos para o tratamento

NETO, et al., 2003).

sintomático da gripe”, já que o termo “antigripal” é utilizado

O quadro de sintomas mais frequente da gripe é febre,

para denominar medicamentos antivirais, que interferem na

calafrios, cefaleia, tosse seca, dor de garganta, congestão na-

multiplicação dos vírus como, por exemplo, os inibidores da

sal ou coriza, mialgia, anorexia e fadiga. Em adultos e crianças

neuraminidase, ou métodos de imunização, como as vacinas

saudáveis, a doença pode durar de uma a duas semanas. O

(MASSUNARI, et al., 2004).

resfriado causa dor e desconforto faríngeo, congestão nasal,

Existe uma grande variedade de medicamentos cuja pro-

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posta é aliviar os sintomas dessas doenças. As classes mais

DESENVOLVIMENTO

utilizadas são: descongestionantes de uso tópico ou sistêmico;

A GRIPE E O RESFRIADO

expectorantes/mucolíticos; antitussígenos; antipiréticos; medicamentos para cefaleia; vitaminas e outros (BRICKS, 1995).

A gripe e o resfriado fazem parte do grupo de Infecções Respiratórias Agudas (IRA) que são as principais causas de

Por ser uma doença comum na população, algumas pesso-

morbidade e mortalidade no mundo. A Organização Mundial de

as não procuram ajuda médica e instituem seu próprio tratamen-

Saúde (OMS) estima que as IRA causem quatro milhões de óbi-

to. Tratamentos estes feitos à base de medicamentos para alívio

tos por ano no mundo (FARHAT, et al., 2002).

dos sintomas. De fácil acesso, eles despertam nos pacientes/

Ambas apresentam curso benigno, na maioria das vezes.

clientes a falsa crença de que são totalmente seguros e não tra-

O próprio corpo é capaz de eliminar o vírus entre 3 e 10 dias. A

zem malefícios à saúde (BRICKS, 1995).

gripe tem duração média de uma a duas semanas, os resfriados

Por esse motivo, é necessário que o farmacêutico esteja preparado para intervir e orientar pacientes que procurem por esses medicamentos nas farmácias. O farmacêutico

de 7 a 10 dias, quando não há complicações (CASTRO, 2008; FORLEO-NETO et al., 2003).

deve realizar ações que favoreçam a utilização correta do fármaco.

grande número de pessoas infectadas causa várias consultas

Existe a dificuldade de o farmacêutico atender a todos os

mento e hospitalização em casos mais complicados, e indiretos

pacientes que chegam à farmácia, portanto ele deve contemplar

Mesmo sendo doenças comuns e de bom prognóstico, o médicas e um grande consumo de recursos diretos, com o tratacomo faltas no trabalho e na escola (CASTRO, 2008).

informações pertinentes aos casos de medicamentos de venda

Um entre dez adultos apresenta a infecção por ano. A inci-

livre nos treinamentos dos seus funcionários, sempre chamando

dência, relatada por clínicas, é de mais de 30% da população

sua atenção para que nos casos mais complicados procurem

pediátrica atendida, contudo a maior taxa de mortalidade ocorre

seu auxilio. Assim o farmacêutico estará, de fato, atuando em

em idosos, 10.000 a 40.000 óbitos nos EUA, em cada época

busca do uso racional destes medicamentos.

sazonal da doença (MASSUNARI, et al., 2004).

O objetivo deste trabalho é esclarecer a importância da inte-

Os grupos mais susceptíveis a complicações causadas por

ração e intervenção do farmacêutico com o paciente na farmácia

gripes e resfriados que levam a hospitalização e até óbito, são

comunitária, visando promover o uso racional dos medicamen-

idosos, portadores de doenças cardiopulmonares, indivíduos

tos indicados para tratamento sintomático da gripe como estra-

imunossuprimidos, gestantes, portadores de doenças metabóli-

tégia para minimizar intoxicações e efeitos adversos causados

cas e crianças de até um ano (FARHAT, et al., 2002). Esses grupos de risco são os que mais necessitam de in-

por esses fármacos.

ternação, sendo eles os que contam mais no número de óbitos MÉTODO

por gripes e resfriados no mundo, esses grupos de risco são

Pesquisa bibliográfica não sistemática utilizando a Bibliote-

os mais propensos a contrair infecções bacterianas, pneumonia viral e/ou bacteriana além do risco de descompensação de do-

ca Virtual em Saúde e o portal Capes. Os descritores utilizados na busca foram: gripe, resfriado

enças pré-existentes. Essas populações são normalmente alvo

comum, gripe humana, infecção respiratória aguda, tratamento

de políticas pró-imunização e de prevenção (CASTRO, 2008;

da gripe, medicamentos para gripe, prevenção da gripe, me-

FORLEO-NETO et al., 2003).

dicamentos de venda livre, transtorno menor, automedicação, propaganda de medicamentos, uso racional de medicamentos, indicação farmacêutica e prescrição farmacêutica.

INFLUENZA – O AGENTE CAUSADOR DA GRIPE O principal causador da gripe é o vírus Influenza. Ele per-

O critério de inclusão dos artigos foi: a disponibilidade do

tence à família Orthomyxoviridae. São vírus que possuem como

texto na íntegra, o tema principal (gripe e resfriado comum) e

material genético uma fita simples de RNA e são envelopados

os artigos que priorizavam discussões acerca do tratamento e

(CASTRO, 2008; FORLEO-NETO, et al., 2003).

prevenção de gripes e resfriados. Foram excluídos os artigos que abordavam as gripes suína e aviária como tema principal. Não houve critério de exclusão referente à utilização de apenas artigos científicos. Alguns textos de opinião e editoriais também foram selecionados para análise. Foram excluídos os artigos com conflito de interesse declarado.

Existem três sorotipos do vírus Influenza: A, B e C, sendo que apenas os sorotipos A e B causam doenças em humanos. Os vírus do sorotipo A também infectam outros animais, como porcos e aves (CASTRO, 2008; FORLEO-NETO, et al., 2003). O principal causador de epidemias e pandemias em humanos é o vírus do sorotipo A. Os vírus deste sorotipo apre-

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sentam maior variação que os outros sorotipos e são dividi-

1), a hemaglutinina (H) e a neuraminidase (N). No total, foram iden-

dos em subgrupos, essa divisão é realizada com base nas

tificados 15 hemaglutininas e 9 neuraminidases em várias espécies

diferenças das glicoproteínas da membrana viral (CASTRO,

animais, apenas três hemaglutininas (H1, H2 e H3) e duas neurami-

2008; FORLEO-NETO, et al., 2003).

nidases (N1 e N2) foram identificadas em vírus infectando humanos

Existem duas glicoproteínas marcadoras desse sorotipo (FIG.

(CASTRO, 2008; FORLEO-NETO, et al., 2003).

A imunidade contra esses vírus é gerada pela produção

RNA, assim inicia-se o processo de replicação do RNA viral e

de anticorpos específicos para essas proteínas de membra-

produção de proteínas virais (ALMEIDA, et al., 2009).

nas. O vírus Influenza tem alta capacidade de adaptação e

Após a replicação de RNA e a produção de novas proteí-

durante a fase de replicação podem ocorrer mutações nas

nas acontece a germinação dos novos vírus e a sua liberação,

principais proteínas de membrana H e N (FORLEO-NETO, et

intermeada pela proteína Neuraminidase que rompe a ligação

al., 2003).

entre os vírions recém-formados e o ácido siálico (ALMEIDA,

O vírus Influenza penetra nas células epiteliais colunares

et al., 2009).

que revestem o trato respiratório através da interação entre

O processo de reprodução dura de 1 a 4 dias (FIG. 2).

Hemaglutinina e o ácido siálico, receptor presente na célula

Após este período de incubação, os vírus se misturam no

hospedeira. Após a entrada do vírus o canal iônico M2 permi-

muco e estão prontos para serem espalhados (FORLEO-NE-

te a acidificação do núcleo viral para que haja a liberação do

TO et al., 2003).

As epidemias de Influenza são geradas pela ocorrência des-

nova epidemia de Influenza, principalmente durante o inverno,

sas pequenas mutações que produzem mudanças pontuais em

quando o ar está mais seco e o tempo frio faz com que as pes-

aminoácidos das glicoproteínas, principalmente na hemaglutini-

soas fiquem mais próximas e com o ambiente mais fechado,

na, essas pequenas mutações chamadas drifts tornam o vírus

o que facilita a disseminação e infecção pelo vírus (FORLEO-

resistente aos anticorpos produzidos por infecções prévias e/ou

NETO, et al., 2003).

vacinação (CASTRO, 2008; FORLEO-NETO, et al., 2003). Foi observado que a cada período de 1 a 3 anos surge uma

Existem mutações onde há uma maior variação no material genético dos vírus como, por exemplo, a substituição de um

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segmento completo do genoma viral que produz uma nova proteína de membrana, essas mutações são chamadas shifts e são

sintomas é de dois a três dias (CASTRO, 2008). Transmissão, contágio e sintomas de gripes e resfriados.

as causadoras das pandemias. Casos de pandemias são mais

A maneira como os vírus causadores de resfriados e gri-

irregulares, estima-se que elas ocorram a cada 30 ou 40 anos

pes contaminam as pessoas é basicamente a mesma. O doente

(FORLEO-NETO, et al., 2003).

transmite o vírus por aerossóis produzidos por espirros, tosses

Essas variações são geradas pela recombinação do mate-

e até pela fala. O potencial de transmissão é aumentado quan-

rial genético de vírus que infectam humanos e vírus que infectam

to mais fechado for o ambiente em que o doente se encontra.

outros animais, nesses casos um vírus que causaria doenças

(FORLEO-NETO et al., 2003; CASTRO, 2008; PITREZ, P.; PI-

apenas em animais torna-se capaz de infectar os humanos

TREZ, J., 2003).

(FORLEO-NETO, et al., 2003).

Outra forma de transmissão é o contato direto do indivíduo

Nos casos de grandes mutações, a maioria da população

sadio com secreções ou objetos contaminados, em que ocorre

não tem imunidade nenhuma contra esses novos vírus então, a

a auto-inoculação do vírus, ao levar a mão à boca ou coçar os

doença é disseminada rapidamente e dependendo da virulên-

olhos (CASTRO, 2008; PITREZ, P.; PITREZ, J., 2003).

cia da cepa pode causar milhões de mortes (CASTRO, 2008; FORLEO-NETO, et al., 2003).

O auge da capacidade de transmissão do vírus está compreendido entre 24 horas antes do início dos sintomas e até dois

A maior pandemia de gripe que se tem notícia ocorreu em

dias após o início do período sintomático.

Existe uma

1918 e foi chamada Gripe espanhola. A letalidade da doença foi

preocupação maior com a população de crianças doentes, pois

atribuída principalmente às infecções bacterianas que se insta-

já foi observado que elas transmitem o vírus por mais tempo que

laram na população já debilitada pela fome e pelas condições

os adultos (CASTRO, 2008; PITREZ, P.; PITREZ, J., 2003).

insalubres de vida (GÉRVAS, 2009).

Os sintomas de gripes e resfriados são parecidos. Os qua-

Outros casos recentes são a gripe aviária de 2005 e a gripe

dros sem complicações apresentam sinais e sintomas caracte-

suína de 2009 que causaram pânico na população mundial. A

rísticos, como, cefaleia, tosse seca, dor de garganta, conges-

previsão da OMS era que sete milhões de pessoas morreriam

tão nasal ou coriza, mialgia, anorexia e fadiga (CASTRO, 2008;

em decorrência da pandemia de gripe aviária, no entanto o nú-

FORLEO-NETO et al., 2003).

mero de óbitos foi bem menor, 262 (GÉRVAS, 2009).

A febre alta (entre 38 a 40ºC, com duração de um a três

Observando isso conclui-se que não se deve alarmar a po-

dias, pico nas primeiras 24 horas) é característica da gripe, já o

pulação com informações iniciais e tratar a gripe corretamente

resfriado pode apresentar um estado febril, ainda assim muito

com boa alimentação, repouso, reposição hídrica, boa higiene

menos intenso (CASTRO, 2008; FORLEO-NETO et al., 2003).

e, no caso de sintomas mais graves, buscar ajuda médica (GÉRVAS, 2009).

O resfriado tem quadros nasofaríngeos muito relevantes como: dor e desconforto faríngeo, congestão nasal, espirros e coriza, onde a secreção nasal pode se tornar espessa e até

RINOVÍRUS – PRINCIPAL CAUSADOR DOS RESFRIADOS Existem vários vírus capazes de causar o resfriado comum.

purulenta, o que não significa necessariamente contaminação bacteriana (CASTRO, 2008).

O parainfluenza, vírus sincicial respiratório, adenovírus e entero-

Esse quadro é causado principalmente pelas alterações in-

vírus são agentes causadores de resfriado comum. Juntos eles

flamatórias que a entrada dos vírus causa. Primeiramente esse

respondem por cerca de 20% dos casos de resfriados. Contudo,

processo inflamatório aumenta a permeabilidade dos vasos e

os quadros gerados por esses vírus têm uma variedade maior

isso gera a congestão nasal e a coriza, que no início tem aspecto

de sintomas e gravidade (CASTRO, 2008).

aquoso (CASTRO, 2008).

Os rinovírus pertencem à família Picornaviridae e são do

A reação inflamatória também compromete o funcionamen-

gênero Enterovírus. São os maiores causadores de resfriado

to do aparelho mucociliar gerando um acúmulo de muco nos

comum, respondem sozinhos por 30 a 50% dos casos. Existem

seios da face o que aumenta a viscosidade da coriza, podendo

três espécies de rinovírus que infectam humanos, HRV-A, HRV-B

ela adquirir aspecto purulento, sendo até confundida com sinu-

e HRV-C, e mais de 100 sorotipos foram identificados (CASTRO,

site bacteriana (CASTRO, 2008).

2008; FRY et al., 2011).

O acúmulo do muco nos seios da face e o comprometi-

O quadro de sintomas gerado pela infecção por rinovírus é

mento do aparelho mucociliar, que também compromete a tuba

geralmente o mesmo, baixa intensidade e restritos ao trato res-

auditiva, cria uma condição ideal para o aparecimento de infec-

piratório superior, o tempo de incubação até o aparecimento dos

ções bacterianas, sinusite e otite média aguda (CASTRO, 2008).

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DIAGNÓSTICO DE GRIPES E RESFRIADOS

sam ser modificadas, pois o vírus da gripe sofre mutações que

A identificação do vírus só é necessária em situações de

precisam ser atualizadas para que a vacina seja eficaz. Ela é

epidemias, pois as autoridades sanitárias podem utilizar infor-

composta basicamente por três cepas, duas do sorotipo A

mações sobre a área de aparecimento do vírus para melhor con-

(H1N1 e H3N2) e uma do sorotipo B (FARHAT et al., 2002; AL-

trole ou prevenção da epidemia. As técnicas de detecção são:

MEIDA et al., 2009).

cultura de swab com secreção nasal, testes imunoenzimáticos

A vacinação deve ocorrer sempre na época que precede

e a pesquisa do vírus com técnicas de biologia molecular (CAS-

o inverno. É aprovada para indivíduos acima de seis meses

TRO, 2008; PITREZ, P.; PITREZ, J., 2003).

de vida e no Brasil ela é gratuitamente distribuída para idosos,

Na prática, o diagnóstico da gripe é feito apenas com base

crianças, grávidas, portadores de doenças crônicas, indivíduos

no quadro clínico, porém, existe certa dificuldade em relação a

imunocomprometidos e profissionais da área da saúde (ALMEI-

esse diagnóstico. Os sintomas apresentados não são totalmen-

DA et al., 2009).

te específicos e a gripe e o resfriado podem ser confundidos

Alguns autores acreditam que a eficiência da vacina é ques-

com doenças bacterianas como, por exemplo, sinusite ou farin-

tionável, pois a proteção conferida por ela é bem limitada. Em

goamigdalite, essa dificuldade acaba gerando um excesso de

crianças e adolescentes sua efetividade é de apenas 33% e inútil

prescrições de antimicrobianos (PITREZ, P.; PITREZ, J., 2003).

em menores de dois anos e a eficácia em adultos e idosos não

A própria diferenciação entre gripe e resfriado é complicada.

é comprovada (GERVÁS, 2009; RIERA, 2009)

O que ajuda a distinguir uma doença da outra é a intensidade

Outra medida de prevenção é a higiene adequada. Lavar

de alguns sinais e sintomas. A mialgia, febre, e a prostração são

as mãos com água e sabão sempre que usar o banheiro, quan-

muito mais intensas na gripe. No resfriado, a coriza, dor de gar-

do chegar da rua e antes de se alimentar, ou usar álcool gel.

ganta e congestão nasal incomodam mais o doente (CASTRO,

Evitar levar as mãos ao nariz ou coçar os olhos, quando tossir,

2008; PITREZ, P.; PITREZ, J., 2003).

cobrir a boca (de preferencia com um lenço descartável), evitar

Algumas informações como a situação da circulação do ví-

contato próximo com doentes, e quando doente usar mascara

rus da gripe nas comunidades e informes sobre epidemias de

cirúrgica simples e evitar o contato com pessoas sadias para

gripe podem ajudar no diagnóstico (FORLEO-NETO et al., 2003).

não contaminá-las (CDC, 2011; ALMEIDA et al., 2009; RIERA, 2009, GERVÁS, 2009).

PREVENÇÃO E TERAPIA NÃO FARMACOLÓGICA PARA GRIPE E RESFRIADO

O CDC ainda recomenda que quando o indivíduo contrair gripe deve procurar o médico para ver a possibilidade de utilizar

O farmacêutico é parte importante da equipe multidisciplinar

um medicamento antiviral. Esse método, seja para tratamento

de atendimento a saúde, seu papel nesta equipe é informar o

ou prevenção, é duvidoso e não apresenta boa relação risco/

paciente e esclarecer qualquer dúvida que ele tenha quanto a

beneficio, pois reduz pouco os dias de doenças e frequente-

sua terapia que não é composta apenas de fármacos, medidas

mente causam efeitos adversos como vômitos e até alterações

não farmacológicas e de prevenção também fazem parte do tra-

neuropsiquiátricas (CDC, 2011; GERVÁS, 2009).

tamento para buscar e manter a saúde (GALATO, et al., 2009).

Os medicamentos utilizados neste caso são de dois tipos,

Pensando em um possível atendimento o farmacêutico

um bloqueador de canal iônico M2 (impede a liberação do RNA

deve ter o conhecimento das medidas não farmacológicas e de

viral), no entanto estes fármacos não são boa escolha, pois o

prevenção de gripes e resfriados para que possa orientar ade-

desenvolvimento de resistência a ele é comum, até um terço da

quadamente o paciente.

população tratada. Outro medicamento é o inibidor da neurami-

As maneiras de prevenção da gripe são simples. Segundo

nidase (necessária para liberação dos novos vírus) que podem

o CDC, a primeira providência é a vacinação. A vacina é uma

diminuir o tempo de doença, e consequentemente evitar com-

maneira de adquirir imunidade contra o vírus, assim quando o

plicações. Esses medicamentos são opções no tratamento de

organismo entra em contato ele já tem anticorpos para combater

pessoas com grande risco de complicações, porém, só podem

a doença (CDC, 2011).

ser usados se prescritos por um médico (CDC, 2011; ALMEIDA

No Brasil a vacinação é o principal método de profilaxia da

et al., 2009).

gripe e está relacionada com a diminuição dos casos de com-

As medidas não farmacológicas indicadas em casos de gripes

plicações como infecções bacterianas e pneumonias, principal-

e resfriados são: reposição hídrica, repouso e boa alimentação. Es-

mente em idosos (FARHAT, et al., 2002; ALMEIDA, et al.).

sas medidas ajudam no fortalecimento do corpo e do sistema imu-

Um inconveniente das vacinas é que todo ano elas preci-

nológico, que poderá destruir o vírus (CDC, 2011; GERVÁS, 2009).

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A febre pode ser combatida, juntamente com o tratamento farmacológico, utilizando compressas de água fria ou banhos frios, que favorece o aumento da velocidade de redução de temperatura corporal (WANNMACHER; FERREIRA, 2004)

acetilsalicílico relacionado a síndrome de Reye em crianças (USPDI, 2006; BRICKS, 2000). O trabalho do farmacêutico é realizar uma anamnese que possa identificar os casos que necessitem de atenção especia-

O farmacêutico deve sempre orientar sobre essas medidas

lizada. Para os casos que podem ser atendidos na farmácia ele

não farmacológicas, pois elas ajudam no fortalecimento do corpo

deve indicar o tratamento e orientar o paciente, para que este faça

e na recuperação, para que a doença seja menos grave e dure

o uso correto da medicação e também das medidas não farma-

menos tempo.

cológicas.

TRATAMENTO DE GRIPES E RESFRIADOS

for Responsible Self-medication (TESEMED), criado na Europa,

Através do programa Telematics in Community Pharmacies O que se trata da gripe são os sintomas, entretanto nem to-

foram publicados vários protocolos para atendimento de trans-

dos os indivíduos que apresentem sintomas da gripe podem ser

tornos menores, entre eles o de gripes e resfriados (FIG. 3). O

tratados sem antes se consultar com um médico. Alguns casos

protocolo original foi modificado para melhor entendimento das

são complicados e necessitam de atenção médica, principalmen-

informações.

te os idosos e as crianças.

Neste protocolo estão informações importantes que o farma-

Os medicamentos de venda livre (paracetamol, ácido ace-

cêutico deve conseguir durante a anamnese quando um indivíduo

tilsalicílico, ibuprofeno, entre outros) são seguros se utilizados

procura a farmácia para tratar da gripe ou resfriado. São detalhes

da maneira correta, contudo, a maioria deles não foi submetida

que podem garantir a utilização segura dos medicamentos sem

a estudos que comprovem sua eficácia e segurança em certas

maiores complicações.

populações, por exemplo, crianças (BRICKS, 1995).

Se o quadro clínico do indivíduo for considerado um mal me-

Muitos indivíduos necessitam de ajustes de doses, como ido-

nor, caracterizado com auxílio do protocolo, o farmacêutico deve

sos, crianças e portadores de doenças hepáticas ou renais ou o

indicar o tratamento necessário para melhorar os sintomas do in-

próprio medicamento pode ser capaz de causar efeitos indeseja-

divíduo. Cada caso é particular e merece atenção diferenciada.

dos, como a dipirona suspeita de causar agranulocitose e o ácido

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Tratamento farmacológico dos sintomas de gripes e resfriados – associações de fármacos e medicamentos de venda livre

no Brasil é a RDC nº 138 de 2003. Nesta resolução estão descritos todos os grupos de indicações terapêuticas que podem

O tratamento farmacológico da gripe consiste no uso de

ser vendidos sem prescrição, entre eles os anti-histamínicos,

medicamentos que diminuem os sintomas (febre, coriza, mial-

analgésicos, antipiréticos, e descongestionantes nasais, xa-

gia, cefaleia, entre outros). Existe uma classe de medicamen-

ropes mucolíticos, expectorantes e antissépticos bucais, que

tos para este fim que, normalmente, são associações entre fár-

são empregados no tratamento sintomático da gripe (ANVISA,

macos com atividades distintas, onde cada um age sobre um

2003b).

sintoma. Essas associações são reguladas pela RDC nº 40 de

Conhecer as características farmacológicas desses medi-

2003. As principais regras desta RDC estão resumidas em uma

camentos é importante para saber quais riscos os pacientes

tabela no Anexo A.

estão expostos quando utilizam o medicamento. Contra indica-

Também podem ser utilizados medicamentos contendo

ções, interações, reações adversas, dose e duração do trata-

um único fármaco, normalmente são analgésicos e antipiréti-

mento são informações básicas que devem ser informadas ao

cos cuja segurança foi considerada satisfatória. Esses medi-

paciente no momento da dispensação.

camentos são comercializados sem a obrigação da prescrição médica, ou seja, são de venda livre (BRICKS, 1995).

Alguns exemplos de riscos com medicamentos comumente utilizados para sintomas de gripes estão resumidos na Tabela 1.

A legislação que controla os medicamentos de venda livre

O paracetamol, fármaco considerado seguro, pode ser al-

causar riscos à saúde do usuário, contudo são seguros se usa-

tamente tóxico quando tomado em superdose (4 gramas ou 8

dos corretamente. O objetivo de existir medicamentos de venda

comprimidos de 500mg), concomitante ao uso de bebidas al-

livre parte do princípio que cada pessoa exerce um autocuidado

coólicas e inibidores enzimáticos ou em indivíduos com função

(International Pharmaceutical Federation – FIP, 1996).

hepática comprometida (SWEETMAN, 2007; USP-DI, 2006).

A automedicação é reconhecida pela OMS como parte do

A dipirona, largamente utilizada no Brasil, foi proibida em

autocuidado e quando realizada de maneira correta pode be-

vários países da Europa e nos EUA, pois nesses países eles

neficiar a saúde do individuo e reduzir custos para o governo

consideram que os efeitos adversos causados pela substância

(GALATO, et al., 2009).

(agranulocitose e outros) superam os seus benefícios (SWEETMAN, 2007; USP-DI, 2006).

O processo de autocuidado e a automedicação

No Brasil a dipirona ainda não foi retirada do comércio,

O autocuidado não se resume apenas a automedicação,

possivelmente porque não se constatou número relevante de

ações pró-saúde como a prática de exercícios físicos, a boa ali-

agranulocitose em nossa população que justifique a retirada de

mentação, o consumo moderado de álcool e o não consumo de

um medicamento de comprovada eficácia. Entretanto como a

cigarros e drogas ilícitas, também são partes do autocuidado e

agranulocitose é uma doença rara, mas perigosa o seu uso é

são incentivadas pelos governos, pois gera uma redução nos

desaconselhável em pacientes com dor moderada e que podem

custos de atendimento médico para a população (FIP, 1996).

fazer uso de outros medicamentos com efeitos adversos mais previsíveis e evitáveis (WANNMACHER, 2005). Concluímos que os medicamentos de venda livre podem

Com o passar dos anos as populações têm estado cada vez mais informadas, contudo, às vezes, não o suficiente para realizar a automedicação sem nenhuma orientação, é neste contex-

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to que entra o conceito de automedicação responsável. Segundo

A resolução que trata do controle da propaganda no Brasil

a Associação Brasileira de Indústrias Farmacêuticas (ABIFARMA)

é a RDC nº 96 de 2008 da ANVISA, que substitui a antiga RDC

cerca de 80 milhões de brasileiros já eram adeptos da automedica-

nº 102 de 2000, que era considerada uma tentativa frustrada

ção na década de 90 (BORTOLON et al., 2007).

de regular a propaganda de medicamentos. Alguns aspectos

Uma pesquisa sobre o perfil da automedicação no Brasil realizada no ano de 1997 revelou que 17,3% dos medica-

podem ter melhorado, contudo a nova regra ainda apresenta algumas falhas (NASCIMENTO, 2007).

mentos utilizados em automedicação são analgésicos, 7,1%

Inicialmente a frase obrigatória na RDC nº 102/00 para to-

descongestionantes nasais, 5,6% antiinflamatórios, 3,8% pre-

das as peças, “ao persistirem os sintomas o médico deverá

parados para tosse e resfriado e 4,0% anti-histamínicos de uso

ser consultado”, foi substituída por: “Esta substância é um me-

sistêmico (ARRAIS, et al., 1997).

dicamento. Seu uso pode trazer riscos. Procure o médico e o

Todos esses fármacos podem ser utilizados no tratamento

farmacêutico, leia a bula” (ANVISA, 2008).

sintomático da gripe e neste estudo representaram um total de

A frase da RDC 102/00 levava a entender que o médico era

37,8% de todos os medicamentos utilizados sem prescrição

uma parte supérflua no processo de medicação e incentivava o

médica na pesquisa.

consumo do medicamento (NASCIMENTO, 2007).

Do total de casos de intoxicação no Brasil 28% são into-

A frase da RDC 96/08 traz o alerta de que o uso do produto

xicações medicamentosas. Os campeões de eventos de in-

traz riscos, mesmo sendo de venda liberada, e inclui também a

toxicação são: benzodiazepínicos, antidepressivos, antiinfla-

figura do farmacêutico, como profissional apto a informar, além

matórios e os medicamentos para alívio sintomático da gripe.

de incentivar a leitura da bula.

Segundo a ANVISA o uso incorreto de medicamentos leva um

Uma obrigação importante que foi adicionada à nova legis-

paciente ao hospital com quadro de intoxicação a cada 20 se-

lação, referente aos medicamentos de venda isenta de prescri-

gundos (BORTOLON et al., 2007).

ção, obriga que algumas substâncias tenham uma advertência

O farmacêutico é o profissional apto a informar e orientar a automedicação para que ela seja de fato responsável, com o

específica vinculada a propaganda. Alguns exemplos podem ser observados na tabela do Anexo B (ANVISA, 2008).

medicamento certo, na dose certa, horário certo, pela via cer-

Outras regras para a propaganda de medicamentos em

ta, inclusive orientar o paciente a consultar um médico quando

geral e os de venda livre da RDC nº 96/08 estão resumidas

necessário (FIP, 1996).

na tabela do Anexo C, sendo que o artigo 26 trata apenas de

A propaganda como inimiga da automedicação responsável

medicamentos de venda livre.

Existe uma lacuna na relação entre farmacêutico e pacien-

Uma pesquisa analisou 100 peças publicitárias de medi-

te. Por várias vezes o farmacêutico não está disponível para

camentos quando a RDC nº 102/00 foi publicada. Dentre as

cumprir o papel de orientar e a população sequer requisita sua

peças, 12 eram de analgésicos, 12 medicamentos para gripe, 9

presença para sanar suas dúvidas e, além disso, existe um ini-

expectorantes ou antitussígenos, 6 antipiréticos, 3 desconges-

migo silencioso que compete contra a automedicação respon-

tionantes e 3 antiinflamatórios. Somando são 45 peças sobre

sável: as propagandas de medicamentos.

medicamentos que podem ser utilizados no tratamento dos

Os especialistas em marketing dizem que o objetivo da pro-

sintomas da gripe (NASCIMENTO, 2007).

paganda é aumentar o lucro da empresa. Pensando nesta ótica

O resultado da pesquisa mostra que todas as peças ana-

concluímos que o objetivo do marketing vai de encontro ao uso

lisadas apresentaram alguma irregularidade, fato este que

racional dos medicamentos (NASCIMENTO, 2007; 2010).

mostra o total desprezo das companhias farmacêuticas e das

O ponto crítico nesta situação é que um bem de saúde,

empresas de marketing pelas leis do país.

o medicamento, é reduzido a um bem de consumo, e o risco

Após a RDC 96/08 não foi realizada nenhuma pesquisa

existente está no fato de que as peças publicitárias enaltecem

deste tipo, e esse não é um dos objetivos deste trabalho, po-

os benefícios dos medicamentos e não citam os riscos e os

rém, podemos observar que algumas propagandas que estão

efeitos adversos que o medicamento pode causar. E ainda um

na mídia atualmente tem certa soberba e dão a entender que o

risco pela desinformação (SOYAMA, 2006).

medicamento é quase “mágico”. Alguns exemplos são (FIG. 4):

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As propagandas representadas na figura 4 (a) e (e) tra-

representam uma grande penalidade para as indústrias, compara-

zem como personagens de suas campanhas artistas de te-

do com os valores investidos nas campanhas. Foi constatado que

levisão, o que infringe o artigo 26, inciso III, da RDC nº96/08,

em um ano e meio de fiscalização pela ANVISA o valor das multas

que proíbe a utilização da figura de celebridades nas peças.

aplicadas não chegou nem ao valor de duas peças veiculadas na

A frase da antiga RDC 102/00 também não foi adaptada à

televisão em horário nobre (NASCIMENTO, 2007; 2010).

nova exigência.

A RDC 96/08 não especifica as multas que serão aplicadas,

A peça representada na figura 4 (d) mostra claramente a

mas tem que se levar em conta que a indústria farmacêutica investe

soberba das peças dizendo que o medicamento é santo. A pro-

de 15% a 20% do faturamento total com propaganda. Entre propa-

paganda da figura 4 (b) disfarçadamente sugere diagnóstico ao

gandas para o grande público e para profissionais que trabalham

perguntar se “é gripe”. Também em sua peça veiculada na tele-

com os medicamentos se gasta duas ou três vezes mais do que o

visão os atores espirram e tossem, ou seja, mostram sintomas

valor investido em pesquisa e inovações (SOYAMA, 2006).

de gripe e indicam seu medicamento para tratá-los.

Em todos os países existem uma ingênua e demasiada

A peça representada na figura 4 (c) traz a sugestão de diag-

crença da população no poder dos medicamentos e as empre-

nóstico e também emprega palavras, como, “tomou”, que mes-

sas de propaganda utilizam isso para estimular o consumo sem

mo não estando no imperativo, sugere que o medicamento é in-

orientação, e quanto maior esse consumo maior é o risco de

falível contra gripes e resfriados, indo contra o artigo 8, inciso VII.

intoxicações (ARRAIS, et al. 1997; LESSA; BOCHNER, 2008).

É possível observar também que nenhuma das peças in-

Segundo a OMS, 50% dos medicamentos são indicados, dis-

forma os efeitos adversos e contraindicações principais, logo,

pensados ou utilizados de maneira inadequada e esse fato pode

subentende-se que o medicamento não traz riscos.

gerar intoxicações e internações. De 15% a 20% do orçamento dos

As propagandas não têm o objetivo de informar, pois a população desinformada é mais facilmente manipulada com a ilusão de que a saúde pode ser comprada na farmácia (NASCIMENTO, 2007). Um problema remanescente da RDC 102/00 é que as peças publicitárias só são avaliadas após a veiculação para a grande

hospitais são gastos no tratamento de indivíduos que usaram produtos farmacêuticos de maneira incorreta (SOYAMA, 2006). Observamos então que a propaganda de medicamentos é um grande problema a ser superado, principalmente no caso dos medicamentos de venda livre, que inclui os medicamentos para alívio sintomático da gripe.

massa. No caso de informações erradas ou incompletas é com-

O interesse das indústrias farmacêuticas, empresas de

plicado modificar a visão da população que já foi exposta ao

marketing, varejistas, donos de farmácias e de distribuidoras,

anúncio. A RDC 96/08 já prevê que sejam criadas mensagens

atualmente, é, somente, a acumulação de capital. Este interes-

retificadoras dos anúncios que descumprirem as regras, porém

se não deveria nunca sobrepor os interesses da saúde pública

esta é uma medida paliativa (ANVISA, 2000; 2008).

(NASCIMENTO, 2010).

Durante a vigência da RDC 102/00 as multas aplicadas nos

O farmacêutico deve ser mais atuante para corrigir informa-

casos de desobediência às regras eram valores ínfimos que não

ções dos clientes que sejam erradas ou incompletas e garantir

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o uso correto dos medicamentos, utilizando a educação como

Devido à dificuldade de se consultar pelo serviço público de

instrumento, fornecendo treinamentos e reciclagens periódicas

saúde (filas enormes), o tempo de espera para conseguir uma

aos seus funcionários, para que eles também sejam fontes de

consulta (pode chegar até meses), e a falta de recurso da maio-

informações corretas, e sempre que necessário estar disponível

ria da população, que dificulta pagar uma consulta particular, é

para esclarecer qualquer dúvida.

mais fácil e barato o individuo se automedicar que procurar por um médico (AQUINO, 2008).

A consulta pública 01/10 do Conselho Federal de Farmácia (CFF)

Alguns países desenvolvidos já permitem que farmacêu-

O CFF, na busca de promover o uso racional dessas es-

ticos e até outros profissionais da saúde prescrevam medica-

pecialidades farmacêuticas de venda livre, lançou uma consulta

mentos, como é o caso do Reino Unido, desde 2003, Canadá,

pública em 2010. A consulta pública 01/10, que defende, princi-

Estados Unidos e Austrália (BONFIM, 2010).

palmente, que esses medicamentos passassem a ser vendidos somente se “prescritos” por farmacêuticos (CFF, 2010).

O que deve ser feito é uma discussão mais prolongada sobre o assunto e a iniciativa de lançar uma consulta pública é

A consulta pública propõe que o farmacêutico indique os

justamente para colher opiniões e assim melhorar a ideia inicial.

medicamentos para tratar transtornos menores e essa indica-

A consulta pública 01/10 foi encerrada em abril de 2010 e

ção fica condicionada a análise do quadro clínico do paciente e

até hoje não houve novidades sobre o assunto. As propostas

exclusão de possíveis doenças mais graves, pois estas neces-

dos que participaram e enviaram suas opiniões ainda devem es-

sitam de assistência médica. A indicação de medicamentos de

tar sendo avaliadas.

tarja vermelha, que exigem prescrição médica, continua vedada ao farmacêutico (CFF, 2010).

Em 2007 houve a criação do Comitê Nacional para a Promoção do Uso Racional de Medicamentos, por recomendação

Toda a farmácia que prestar este serviço deverá criar os

da OMS, cujo objetivo era desenvolver ações que propiciassem

Procedimentos Operacionais Padrão (POPS) para o atendimen-

esse uso racional. Entre as medidas propostas está a de ampliar

to e adicioná-lo ao manual de boas práticas da drogaria. Outra

o acesso da população à assistência farmacêutica, educar a po-

proposição é que esta atividade seja restrita ao farmacêutico,

pulação, aumentar o controle da venda dos medicamentos com

sendo vedada a sua prática por balconistas (CFF, 2010).

e sem prescrição, incentivar a terapia não medicamentosa, entre

O farmacêutico também deve registrar e guardar todos os

outras atividades (AQUINO, 2008).

dados do paciente e do medicamento indicado em um docu-

Podemos pensar, então, que as propostas apresentadas na

mento que será chamado Declaração de Serviço Farmacêutico

consulta pública 01/10 vêm a corroborar com os objetivos do Co-

(DSF). Este documento deverá ser disponibilizado também para

mitê Nacional para a Promoção do Uso Racional de Medicamen-

o paciente atendido (CFF, 2010).

tos e seria um avanço rumo ao uso racional de medicamentos.

É inviável armazenar todas as DSF em formato físico, seria

O maior controle sobre a venda de medicamentos isentos

necessário criar um sistema computadorizado que permitisse

de prescrição levaria o paciente a procurar pelo farmacêutico, e

esse armazenamento. Contudo programas de gerenciamento

quando procurado ele pode orientar a terapia não farmacológica

de dados tem um custo, que provavelmente os proprietários das

e medidas de prevenção de doenças, tornando o atendimento

farmácias preferem não ter.

um processo de educação. Se a utilização do medicamento for

Esta proposta privilegia a criação de serviços de atenção farmacêutica nas drogarias, pois ajudaria a estreitar os laços entre farmacêutico e paciente, e o banco de dados gerados pelas DSF ajudaria na confecção dos prontuários dos pacientes. Uma dificuldade seria a fiscalização do serviço. Existem

necessária o farmacêutico fornecerá todos os detalhes da terapia farmacológica minimizando os riscos para a saúde do paciente. O uso irracional de medicamentos não acontece somente com fármacos de venda livre. Existem outros pontos importantes a serem observados.

poucos fiscais e a grande maioria de colaboradores em droga-

Os profissionais da área médica que já detêm o poder de

rias são balconistas, e não farmacêuticos. Assim seria compli-

prescrever, às vezes, instituem terapias medicamentosas sem

cado garantir que somente o farmacêutico, prestasse o serviço.

necessidade. Existem também casos de medicamentos pres-

É complicado afirmar o que aconteceria, teoricamente, se o

critos para fins errados, com esquema posológico inadequado,

serviço funcionasse como descrito na proposta seria um grande

além de prescrições de medicamentos mais caros.

passo rumo ao uso racional de medicamentos e uma grande

Essas atitudes têm origem na falta de informação, de re-

ajuda no sistema de atenção básica, pois nem todos os cida-

ferências confiáveis e na falta de ética, através do lobby feito

dãos têm acesso fácil a um médico.

pelas indústrias farmacêuticas, que oferecem amostras grátis, PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 255


financiam congressos e cursos para os profissionais que prescreverem seus medicamentos (SOYAMA, 2006). A falta de informação de profissionais, deficiências técnicas para prescrever, questões relacionadas à educação da população e problemas relacionados à ética profissional merecem atenção em estudos e discussões para buscar o uso racional de

ANVISA (b). RDC n.º 138, de 29 de maio de 2003. Disponível em: < http://www.anvisa.gov.br/legis/resol/2003/rdc/138_03rdc.htm> Acesso em: 07 set. 2011 ANVISA. RDC n.º 102, de 30 de novembro de 2000. Disponível em: <http://www.anvisa.gov.br/legis/consolidada/resol_102_00rdc.pdf> Acesso em: 25 out. 2011

medicamentos no nosso país, estes tópicos não serão profundamente discutidos, pois não entram no escopo deste trabalho. CONSIDERAÇÕES FINAIS A gripe e o resfriado são doenças comuns que afetam milhares de pessoas e mesmo sendo autolimitadas são capazes de causar várias complicações e óbitos todos os anos. Por esta razão não podem ser negligenciadas. Essas doenças necessitam de atenção extra do farmacêutico por serem tratadas, principalmente, com medicamentos de venda livre. Esses medicamentos são promovidos em vários meios de comunicação para incentivar o consumo, mas quanto maior o consumo de medicamentos maior será o número de intoxicações causadas por eles. Qualquer setor onde o farmacêutico está inserido o objetivo do seu trabalho é garantir a saúde da população. Nas farmácias

ANVISA. RDC n.º 96, de 17 de dezembro de 2008. Disponível em: < http://www.anvisa.gov.br/propaganda/rdc/rdc_96_2008_consolidada. pdf> Acesso em: 25 out. 2011 ARRAIS, Paulo Sérgio D.; COELHO, Helena Lutéscia L.; BATISTA, Maria do Carmo D. S.; CARVALHO, Marisa L.; RIGHI, Roberto E.; ARNAU, Josep Maria. Perfil da automedicação no Brasil. Rev. Saúde Pública, São Paulo, v. 31, nº. 1, fev. 1997. Disponível em: <http://www.scielo.br/ scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-89101997000100010&lng=p t&nrm=iso>. Acesso em 18 set. 2011. BORTOLON, Paula Chagas; KARMIKOWSKY, Margô Gomes de Oliveira; ASSIS, Mônica de. Automedicação versus indicação farmacêutica: o profissional de farmácia na atenção primária à saúde do idoso. Rev. APS. nº 10, v. 2 p. 200 – 2009. Jul./dez 2007. Disponível em: <http:// www.ufjf.br/nates/files/2009/12/12automedicacao1.pdf> Acesso em: 07 set. 2011

comunitárias o farmacêutico tem que assumir a tarefa de orientar o paciente para colaborar com a diminuição dos casos de intoxicações por medicamentos, com o uso racional e com a busca pela saúde. Para assumir esta responsabilidade é necessário ter conhecimento científico sobre as doenças que ele venha a atender e ter compromisso com a reciclagem e o aprendizado, pois no campo da saúde surgem novidades todos os dias. Todo medicamento vendido na farmácia é de responsabilidade do farmacêutico e qualquer problema que esse medicamento vir a causar, por falta de informação, irá gerar penas e sanções ao responsável técnico. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, Flávia J.; BEREZIN, Eitan N; FARHAT, Calil K.; CINTRA, Otávio A.; STEIN, Renato T.; BURNS, Dennis A. R.; ARNS, Clóvis C.; LOMAR, André V.; TONIOLO NETO, João; MEDEIROS, Rita. Consenso para o Tratamento e Profilaxia da Influenza (Gripe) no Brasil. Sociedade brasileira de pediatria. 2009. Disponível em: <http://www.sbp.com.br/PDFs/ conseso_influenza.pdf> Acesso em: 05 out. 2011 ANVISA (a). RDC n.º 40, de 26 de fevereiro de 2003. Disponível em: <http://www.anvisa.gov.br/legis/resol/2003/rdc/40_03rdc.htm> Acesso em: 10 set. 2011

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ANEXO B: Tabela com os princípios ativos e advertências se-

site/UploadArq/HSE_URM_FEB_0804.pdf> Acesso em: 26 out. 2011. WANNMACHER, Lenita. Paracetamol versus Dipirona: como mensurar o risco? Organização Pan-americana de Saúde – OPAS. Uso Racional de Medicamentos: Temas Selecionados, vol. 2, nº5. Brasília, abr. 2005. 6p. Disponível em: < http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/ pdf/novo_paracetamol.pdf > Acesso em: 09 dez. 2011.

NOTAS DE RODAPÉ *Aluna do curso de Farmácia do Centro Universitário Newton Paiva **Professor do curso de Farmácia do Centro Universitário Newton Paiva ANEXOS ANEXO A: Tabela com as principais regras da RDC nº 40

gundo RDC nº 96

258 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


ANEXO C: Tabela com as novas regras de propaganda para

medicamentos no Brasil

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 259


Isolamento e identificação por PCR ARDRA de Lactobacillus spp. de grãos de kefir cultivados em leite ou água açucarada Mário Abatemarco Jr , Marta M. G. Aguiar2 Álvaro Cantini Nunes3 Elisabeth Neumann3 Jacques Robert Nicoli4

RESUMO:O Kefir é uma bebida obtida pela fermentação dos grãos de Kefir, que são semelhantes a pedaços de couve-flor, constituídos por espécies de bactérias do ácido lático, leveduras e exopolissacarídeo secretado por algumas espécies do gênero Lactobacillus. Foram isolados Lactobacillus spp de 3 amostras de grãos de Kefir cultivados em leite ou água açucarada. Após uma identificação preliminar, as bactérias com características morfofisiológicas típicas do gênero Lactobacillus foram submetidas a uma identificação em nível de espécie utilizando-se a PCR ARDRA. Esta técnica foi eficiente para identificar dezesseis, dos vinte microrganismos isolados, sendo todos esses da espécie L. casei. O perfil eletroforético dos quatro restantes parece ter sido fruto de uma combinação de perfis de duas espécies distintas de Lactobacillus. PALAVRAS CHAVE: Grãos de Kefir, Lactobacillus, PCR ARDRA

INTRODUÇÃO

Bifidobaterium sp e Streptococcus salivarius subsp thermo-

O Kefir é uma bebida fermentada, ácida e com baixo teor

philus (BRASIL, 2007). Embora originalmente os grãos fossem

alcoólico (LOPITZ-OTSOA, et al, 2006). Historicamente, os

cultivados apenas em leite pasteurizado, outros substratos têm

grãos de Kefir foram considerados um presente de Allah entre

sido utilizados como meio de cultivo, como solução aquosa de

os povos Muslim do norte das montanhas caucasianas da Rús-

açúcar mascavo na concentração de 3 a 10%, suco de frutas e

sia, onde tem sido consumida há milhares de anos. Somente

soro de leite (MIGUEL, 2009).

há dois séculos é que a bebida se difundiu por todo o mundo

A ingestão de Kefir tem sido recomendada em algumas de-

(LOPITZ-OTSOA, et al, 2006; SCHNEENDORF, et al, 2008). A

sordens metabólicas, hipertensão arterial sistêmica, doenças

palavra Kefir é derivada do termo turco “keif” que expressa à

cardíacas isquêmicas e alergias (SALOFF COSTE, 1996; FA-

sensação de bem estar após a ingestão da bebida. Os grãos

RWORTH, 1999; ST-ONGE, 2002; FARNWORTH, et al, 2006).

de Kefir, passados de geração em geração entre as tribos do

Os efeitos antibacteriano (ZACCONI, et al, 1995), imunológico

Cáucaso, eram considerados a riqueza da família. (LOPITZ-

(FURUKAWA, et al, 1991; THOUREUX e SCHMUCKER, 2001),

OTSOA, et al, 2006).

antitumoral (FURUKAWA, et al, 1990; NAGIRA, et al, 2003) e

A Instrução Normativa 46 do Ministério da Agricultura, Pe-

hipocolesterolêmico já foram demonstrados em vários estudos.

cuária e Abastecimento (MAPA) do Brasil, define Kefir como um

Os benefícios para a saúde humana demonstrados pela inges-

produto da fermentação do leite pasteurizado ou esterilizado

tão de Kefir permitem classificá-lo como probiótico definido

cuja fermentação se realiza com cultivos acido-lácticos elabo-

pela Organização Mundial de Saúde como “microrganismos vi-

rados com grãos de Kefir, Lactobacillus kefir, espécies dos

áveis, que quando administrados em quantidades adequadas,

gêneros Leuconostoc, Lactococcus e Acetobacter com pro-

conferem benefícios para a saúde do hospedeiro” (FAO/WHO,

dução de ácido láctico, etanol e dióxido de carbono. Os grãos

2001). Tal fato coloca este produto alimentar na categoria de

de Kefir são constituídos por leveduras fermentadoras de lacto-

“alimento funcional”.

se (Kluyveromyces marxianus) e leveduras não fermentadoras

Os grãos de Kefir são irregulares e gelatinosos, cuja matriz

de lactose (Saccharomyces omnisporus e Saccharomyces

é composta por proteínas e polissacarídeos que contém bacté-

cerevisae e Saccharomyces exiguus), Lactobacillus casei,

rias e leveduras as quais estão envolvidas no processo fermen-

260 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


tativo. O tamanho dos grãos é variável e a forma assemelha-se

Reaction). A amplificação dos genes de determinadas espé-

com pipoca ou couve-flor (MARSHALL, 1993). Durante a fer-

cies, oriundas de uma amostra proveniente de um ecossistema

mentação os grãos aumentam de peso e assim é obtida nova

complexo, como os grãos de Kefir, incluindo aquelas que ainda

biomassa que após ser coada do substrato pode ser reutilizada

não são cultiváveis, requer primers que complementem sequ-

para obtenção de nova bebida (GARROTE, et al, 2001).

ências altamente conservadas. Por outro lado, a diferenciação

A composição microbiológica dos grãos de Kefir é extre-

entre as espécies, a partir dessas sequências, requer que a

mamente complexa. É consenso entre muitos autores que a

região amplificada tenha regiões variáveis que são específicas

microbiota dominante é composta pelos gêneros Lactobacillus,

para cada espécie (KALRA et al., 2007).

Lactococcus, Leuconostoc, Acetobacter e Streptococcus e

Dentro dos operons do RNA ribossomal (rrn), a região in-

leveduras dos gêneros Kluyveromyces, Saccharomyces, Can-

tergênica 16S-23S, exibe um elevado grau de variação para a

dida e Torula (SCHNEENDORF e ANFITEATRO, 2004). A diver-

identificação de diferentes gêneros bacterianos (CHENOLL; MA-

sidade microbiológica pode variar em função da origem, condi-

CIÁN; AZNAR, 2003), incluindo os Lactobacillus (NOUR, 1998).

ções de cultivo e estocagem dos grãos (GARROTE, et al, 2001).

Atualmente, a maneira mais rápida de identificar os lacto-

Microrganismos do gênero Lactobacillus têm a forma de

bacilos, bem como as bactérias em geral, é o sequenciamento

bastonete ou cocos Gram positivos não móveis (ou raramente

parcial ou completo dos genes da subunidade 16S do RNAr (FE-

móveis) e não formadores de esporos cujo metabolismo é es-

LIS; DELLAGLIO, 2007), pois este possui uma série de regiões

tritamente fermentativo (STAMER, 1979; KANDLER, 1983; HOL-

altamente conservadas e oito domínios variáveis que, coletiva-

ZAPFEL e WOOD, 1995). São anaeróbios facultativos ou micro-

mente, identificam as espécies, mesmo diante da enorme diver-

aerófilos que produzem ácido lático como produto principal da

sidade bacteriana (KALRA et al., 2007).

fermentação da glicose (homofermentativos); mas há também

Apesar da rapidez e facilidade para identificação de Lacto-

representantes heterofermentativos, com produção de lactato,

bacillus por seqüenciamento, o custo para a operacionalização

além de CO2 e etanol em quantidades equimolares. De acordo

desta tecnologia é um fator limitante para muitos laboratórios.

com FELIS e DELLAGLIO (2007), o gênero é composto por 106

Como alternativa, encontra-se a PCR - ARDRA (Análise de Res-

espécies. Algumas são produtoras de kefirano, que pode ser de-

trição de DNA Ribossomal Amplificado), que apesar de ser mais

finido como um exopolissacarídeo parcialmente solúvel em água

trabalhosa é financeiramente mais econômica. Além disso, é

composto por unidades repetitivas de galactose e glicose, na

uma técnica de domínio no Laboratório de Genética Molecular

proporção de 1,1:0,9 (MICHELLI et al, 1999). L. kefiranofaciens,

de Protozoários Parasitas (LGMPP) no qual parte deste trabalho

principal produtor de kefirano, é capaz de produzir o exopolis-

foi desenvolvido.

sacarídeo sob diferentes condições de cultivo. TANIGUCHI e

Resumidamente, na técnica de PCR-ARDRA o DNA total do

TANAKA (2004) mostraram que houve um aumento na produção

microrganismo isolado é submetido a uma reação de polimeri-

de kefirano por L. kefiranofaciens na presença de condições

zação em cadeia na qual o produto (a região intergênica 16S-

de cultivo que mimetizam as ações de. Saccharomyces cerevi-

23S) é submetido a um tratamento com enzimas de restrição

sae em comparação ao cultivo da bactéria isoladamente. Este

e o resultado após eletroforese é comparado com o perfil de

achado é uma forte evidência da complexa relação simbiótica

digestão teórico característico para cada espécie de lactobacilo.

existente entre as bactérias e leveduras que fazem parte da mi-

Diante disso, este trabalho teve como objetivo isolar e identi-

crobiota dos grãos. Juntos, o kefirano, as leveduras e as bacté-

ficar molecularmente microrganismos isolados de grãos de kefir

rias constituem uma comunidade simbiótica responsável pelas

cultivados em água açucarada ou em leite.

propriedades do Kefir. A identificação de Lactobacillus em nível de espécie foi durante muito tempo realizada apenas com base em provas bio-

MATERIAIS E MÉTODOS REAGENTES:

químicas, fisiológicas e fenotípicas. Segundo FELIS e DELLA-

Açucar mascavo comercial, leite em pó desnatado (Molico,

GLIO (2007), a principal discrepância na taxonomia do gênero

Brasil), Cloreto de sódio (Vetec, Rio de Janeiro, Brasil), Peróxido

Lactobacillus é a falta de correlação entre a posição filogenética

de Hidrogênio 3% (v/v) (Vetec, Rio de Janeiro, Brasil), Ácido Clo-

e as propriedades metabólicas.

rídrico 1N (Vetec, Rio de Janeiro, Brasil), Hidróxido de Sódio 1N

Diante disso, a abordagem molecular permite que as bacté-

(Vetec, Rio de Janeiro, Brasil), Ágar De Man, Rogosa and Sharpe

rias possam ser identificadas a partir das sequências dos seus

(MRS) (Difco, USA) Ágar MRS (Merck, Alemanha), Glicerol (Nu-

genes, por meio da amplificação, via PCR (Polimerase Chain

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clear, São Paulo, Brasil), Caldo MRS (Difco, Detroit, MI, USA),

USA) e incubados por 18 horas em anaerobiose a temperatura

Kit Wizard Genomic System (Promega, Madison, E.U.A), Cloreto

ambiente. Este procedimento foi realizado duas vezes antes da

de lítio (Vetec, Rio de Janeiro, Brasil), Lisozima (Sigma-Aldrich,

extração do DNA total dos isolados.

E.U.A), Sulfato de sódio em tampão TE com RNAase (Promega, Madison, E.U.A), Agarose (Invitrogen, Espanha).

Extração de DNA total com Kit Wizard Genomic System Promega

Métodos: AMOSTRAS DE GRÃOS DE KEFIR DISPONÍVEIS PARA O ESTUDO

1º PASSO: OBTENÇÃO DAS CÉLULAS SEM PAREDE E SEM MEMBRANA De cada cultivo dos microrganismos que cresceram em

Para a realização deste trabalho foram utilizadas três amos-

caldo MRS, 5 mL foram centrifugados a 4.000 rpm, durante 10

tras de grãos de kefir. Cada uma recebeu um código, que se

minutos, à temperatura ambiente, para obtenção dos pellets. Os

relacionou com o seu local de origem. Assim, a amostra prove-

sobrenadantes foram descartados. Os pellets foram ressuspen-

niente de Salvador/BA recebeu o código KBA, a de Belo Hori-

sos em 5 mL de água mili Q estéril e centrifugados nas mesmas

zonte/MG KBH e finalmente a de Viçosa KVI.

condições citadas anteriormente para retirada dos resíduos do meio de cultura. Após descartar o sobrenadante, 1 mL de solu-

CULTIVO DOS GRÃOS DE KEFIR

ção de cloreto de lítio (5M) foi adicionado em cada tubo Falcon®

Os grãos de Kefir provenientes de Salvador e Belo Horizonte

de 15 mL. Após ressuspender cada pellet, os mesmos foram

foram cultivados em solução aquosa de açúcar mascavo co-

transferidos para tubos Eppendorf® de 1,5 mL, previamente

mercial na concentração de 5% (p/v) e os grãos de Viçosa/MG

identificados, e incubados sob agitação à temperatura de 37°C,

foram cultivados em leite desnatado Molico® reconstituído na

por uma hora, com finalidade de extrair proteínas associadas à

concentração de 10% (p/v). A troca do substrato era realizada a

parede bacteriana. Em seguida, os tubos foram centrifugados a

cada 24 h e sob temperatura ambiente.

14.000 rpm, durante 10 minutos, descartando-se o sobrenadante. Os pellets foram ressuspensos e lavados com 1 mL de água

ISOLAMENTO DE LACTOBACILLUS SPP. DE GRÃOS DE KEFIR

mili Q estéril, para retirar o excesso de sal. Após esta lavagem,

Dez gramas de grãos de Kefir provenientes das diferentes

os pellets foram ressuspensos em 1mL de tampão para proto-

formas de cultivo (leite ou açucar) foram acrescentadas em 90

plastos (50mM Tris HCl pH 8,0; 10mM EDTA; 10mg de lisozima

mL de solução salina estéril (NaCl 0,9%) e trituradas em homo-

mL-1) sendo este composto por 200mL de enzima e 800mL de

geneizador de tecidos (Ultra-Turrax, IKA T 10). Estas dispersões

tampão com RNAse, e incubados por uma hora, sob agitação

obtidas foram diluídas (diluição seriada decimal) em solução sa-

a 37ºC. Após os período de incubação foram centrifugados a

lina e plaqueadas pelo método de Spread Plate, em duplicata,

14.000 rpm, durante 10 minutos. O sobrenadante foi descartado

nas diluições 10-5, 10-6 e 10-7 utilizando como meio de cultura o

e os pellets congelados no freezer a -20ºC.

Ágar De Man, Rogosa and Sharpe (MRS) (Merck, Germany). O meio MRS foi preparado em soro de leite e teve o pH ajustado

2º PASSO: EXTRAÇÃO DO DNA

para 5,5, sendo adicionado de 200 ppm de cicloheximida para

Após o completo descongelamento de cada amostra em

inibição do crescimento de leveduras. As placas foram incuba-

temperatura ambiente, foi adicionado cerca de 300µL de tam-

das em câmara de anaerobiose (Forma Scientific Marietta, EUA)

pão de lise em cada tubo eppendorf contendo uma amostra e

contendo uma atmosfera de 85% N2, 10% H2 e 5% CO2, por 5 e 7

ressuspendido com auxílio de pipeta. Os tubos foram incubados

dias em temperatura ambiente.

em Shaker (Cientec, CT 412) a temperatura de 37ºC e numa

Após o período de incubação, foram isoladas colônias clas-

velocidade de 100 rpm por 10 minutos.

sificadas em diferentes morfotipos com base na cor, aspecto,

Decorrido o tempo de incubação, cada amostra foi transfe-

textura e tamanho das colônias. Estas foram repicadas através

rida para uma microcoluna, previamente identificada pelo códi-

de estrias simples em Ágar MRS modificado (Difco, USA) e incu-

go correspondente da amostra. Cada microcoluna foi encaixada

badas em anaerobiose (Forma Scientific Marietta, EUA) por 48

sobre um tubo de coleta e posteriormente foram centrifugadas

horas em temperatura ambiente para obtenção de cultura pura.

em microcentrífuga (Eppendorf, AG 22331) por 60 minutos para que todo o líquido descesse para os tubos. Em seguida, foram

IDENTIFICAÇÃO MOLECULAR DOS ISOLADOS DE LACTOBACILLUS SPP.

adicionadas 650µL da solução de lavagem e centrifugados por 10

Após o descongelamento das amostras, 50 µL da cultura

minutos a 14.000 rpm e, em seguida, descartado todo o líquido

foram repicados para 5 mL de caldo MRS (Difco, Detroit, MI,

descendente. Esta lavagem foi repetida por mais quatro vezes.

262 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


Após o procedimento de lavagem, as microcolunas foram

gel de agarose (1%) adicionado de 3µL de brometo de etídio,

transferidas para um tubo eppendorf novo de 1,5 mL, previa-

onde foi utilizado 100V, durante 60 minutos. No mesmo gel foi

mente identificado com o código da amostra correspondente, e

adicionado também o marcador de peso molecular de 1Kb. Ao

acrescentado de 60µL de água livre de nuclease na temperatura

término da corrida, o gel foi fotografado através de equipamento

de 65ºC para que houvesse eluição do DNA. Após dois minutos,

de fotodocumentação com luz ultravioleta.

a microcoluna foi centrifugada por 5 minutos na velocidade de 14.000 rpm para que todo o líquido descesse. Este líquido, con-

REAÇÃO DE POLIMERIZAÇÃO EM CADEIA (PCR)

tinha DNA e RNA cuja purificação foi realizada adicionando-se

Posteriormente, as amostras de DNA total foram submetidas

1µL de RNAse dentro de cada tubo. Após esta etapa, a visuali-

à reação de PCR, visando amplificar a região intergênica que co-

zação da extração do DNA foi realizada por eletroforese em gel

difica as sub-unidades ribossomais, 16S – 23S. Esta região do

de agarose.

DNA é bastante variável entre as espécies de microrganismos,

ELETROFORESE EM GEL DE AGAROSE

porém, bastante conservada em microrganismos da mesma

Com o objetivo de visualizar a quantidade de DNA total ex-

espécie, sendo então utilizada em pesquisas de identificação

traído na etapa anterior, as amostras foram submetidas à eletro-

microbiana, ao nível molecular. O Quadro 1 mostra as soluções

forese em gel de agarose, 5mL de cada amostra de DNA total

utilizadas na reação de PCR com suas respectivas quantidades.

extraído foi misturado a 3mL de tampão (glicerol adicionado de

Quadro 1: Soluções utilizadas na reação de PCR com suas

azul de bromofenol) e então encaminhados à eletroforese em

respectivas quantidades

Em seguida, os tubos Eppendorf, que continha às amos-

mostradas no Quadro 2.

tras, foram colocados dentro da máquina Termocicladora “MJ

Quadro 2: Condições da reação de PCR

Research”. As condições de cada etapa do ciclo da PCR são

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 263


Posteriormente, 5mL de cada produto de PCR foram mis-

ram digeridos com enzimas de restrição para a identificação

turados com 3mL do tampão glicerol com azul de bromofenol,

das espécies de Lactobacillus. As enzimas utilizadas foram:

e então submetidos à nova eletroforese em gel de agarose

Sph I, Nco I, Nhe I, Ssp I, Sfu I, Eco RV, Dra I, Vsp I, Eco RI,

(1,4%) adicionado de 3µL de brometo de etídio, onde foi uti-

Hinc II ou Hpa I e Hind III. Como algumas destas enzimas

lizado 100V, durante 45 minutos. Ao final da corrida, o gel foi

necessitam de BSA (albumina sérica bovina) para sua melhor

fotografado para visualização das regiões amplificadas.

atividade, foram preparadas duas misturas diferentes, mostradas no Quadro 3 e Quadro 4.

Digestão dos produtos de PCR 16S-23S

Quadro 3: MIX 1 – com BSA

Após a obtenção dos produtos de PCR, os mesmos fo-

Quadro 4: MIX 2 – sem BSA

por cinco e sete dias, respectivamente. Dentro de cada amostra, Após o preparo dos tubos, os mesmo foram mantidos à 37ºC, overnight, para que houvesse a reação de digestão en-

foram selecionadas apenas as colônias morfologicamente distintas, conforme é mostrado na Tabela 2.

zimática. Em seguida, 5mL de cada produto de digestão foram misturados com 3mL do tampão glicerol com azul de bromofe-

IDENTIFICAÇÃO PRESUNTIVA DOS MICRORGANISMOS ISOLADOS

nol, e então submetidos à eletroforese em gel de agarose (1,4%)

Vinte e um isolados foram submetidos à coloração de Gram

adicionado de 3µL de brometo de etídio, onde foi utilizado 100V,

e prova da catalase. De acordo com BERNANDEAU et al (2008),

durante 45 minutos. Os resultados foram fotografados e o perfil

as características fenotípico-fisiológicas sugestivas para o gêne-

de digestão de cada produto de PCR foi comparado com o perfil

ro Lactobacillus são bastonete ou cocobacilo Gram positivo e

de digestão característico de cada espécie de lactobacilo.

catalase negativo. Cada isolado recebeu um código composto por um número e uma letra. As Tabelas 3, 4 e 5 mostram o re-

RESULTADOS

sultado da coloração de Gram e prova da catalase dos isolados

ENUMERAÇÃO DE BAL

das três amostras com cinco e sete dias de incubação, bem

As contagens totais de bactérias do ácido lático (BAL) em

como o número de UFC de cada isolado por grama do grão.

ágar MRS após cinco e sete dias de incubação estão apresentadas na Tabela 1. Isolamento de microrganismos do ágar MRS Foram selecionadas do ágar MRS vinte e duas colônias isoladas. Desse total, nove e treze provêm do meio incubado

IDENTIFICAÇÃO MOLECULAR DOS ISOLADOS DO ÁGAR MRS O perfil eletroforético do produto de PCR dos espaçadores 16S-23 pode ser visualizado na Figura 1. Abaixo de cada perfil, encontra-se o código de identificação de cada isolado.

264 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


Os isolados foram tratados com doze enzimas de restrição

mostrou que 60 autores identificaram L. casei subsp. pseudo-

(ver metodologia) e o perfil eletroforético obtido foi comparado

plantarum (anteriormente denominado L. paracasei subsp. pa-

com um perfil de restrição teórico, a fim de identificá-los ao nível

racasei) de grãos de Kefir, sendo esta espécie a terceira mais

de espécie. Aqueles que apresentam três bandas (geralmente

citada dentro do gênero Lactobacillus. ZHOU et al (2009) mos-

entre 500 e 700 pb) pertencem ao gênero Lactobacillus. As Fi-

traram que dentro do grupo dos homofermentativos, L. casei foi

guras 2, 3, 4, 5 e 6 mostram os perfis de restrição obtidos pela

encontrado em maior proporção nos grãos de leite. SIMOVA et

digestão do produto de PCR dos isolados. A Tabela 6 apresenta

al (2002) identificaram L. casei sub. pseudoplantarum em três,

a identificação, em nível de espécie, de cada isolado á partir dos

das seis amostras de grãos estudados . Diante da predominân-

perfis de restrição dos espaçadores.

cia desta espécie em trabalhos prévios e devido ao fato de pou-

A Tabela 6 apresenta a identificação, em nível de espécie,

cos isolados terem sido selecionados para identificação mole-

de cada isolado do ágar MRS realizada através da comparação

cular (em função da baixa diversidade morfológica das colônias)

entre o perfil de restrição obtido e o perfil de restrição teórico

houve uma alta probabilidade dos isolados selecionados serem

para cada espécie do gênero Lactobacillus.

da espécie L. casei. Os perfis de digestão dos isolados 1G, 4G, 5G e 6G podem

DISCUSSÃO

ser fruto de uma combinação dos perfis de L. casei e L. acido-

ENUMERAÇÃO DE BAL

philus ou L. casei e L.hilgardii mostrando que não houve um

Comparando-se a contagem de BAL com cinco e sete dias

isolamento total do microrganismo. Isso pode ter ocorrido devi-

de incubação, pode-se perceber que há um discreto aumento

do a uma superposição das colônias de tais espécies no meio

no número de microrganismos quando as placas são incubadas

de cultura o que torna este achado mais uma evidência de uma

por mais tempo. Isso é uma evidência de que nos grãos de Kefir

tendência à co-agregação dos microrganismos dos grãos de

existem bactérias láticas com diferentes tempos de crescimento.

Kefir que pode ser explicada pela produção de exopolissacarí-

Tanto os grãos cultivados em água açucarada quanto os grãos

deos por algumas espécies presentes no grão, principalmente L.

cultivados em leite apresentaram contagens dentro dos limites

kefiranofaciens (MITSUE et al., 1999; YOKOI et al., 1990; TOBA

esperados para o Kefir. Foi encontrado 108 UFC/g de grão, nú-

et al.,1987). Assim, os microrganismos estariam tão intimamen-

mero semelhante ao encontrado por GARROTE et al (2001).

te interligados nos grãos que ao serem cultivados no meio de

Identificação presuntiva e molecular dos microrganismos isolados do ágar MRS

cultura, produziriam colônias indistinguíveis morfologicamente. OTTOGALLI et al. 1973; ANGULO et al. 1993; MARSHALL, 1993

Há um consenso na comunidade científica de que os méto-

isolaram L. acidophilus de grãos de Kefir e L.hilgardii foi citado

dos fenotípico-fisiológicos não são suficientes para permitir uma

por SCHWAN et al (2010) como membro da microbiota do Kefir

classificação acurada ao nível de espécie das bactérias do áci-

de água açucarada.

do lático (KLEIN et al., 1998; TANNOCK, 1999; SAARELA, 2000; OLIVEIRA et al., 2002). No entanto, o teste de Gram e a prova da

CONCLUSÃO

catalase são de inestimável valor para um screening inicial, uma

Os resultados obtidos neste estudo demonstram que a técni-

vez que o meio MRS não apresenta seletividade absoluta para

ca de identificação molecular foi eficiente para a identificação, em

Lactobacillus. Todos os microrganismos isolados apresentaram

nível de espécie, de dezesseis, dos vinte lactobacilos isolados dos

reação positiva ao Gram, forma de bastonete ou cocobacilo e

grãos de kefir. A técnica, ainda, permitiu a visualização de perfis de

reação negativa frente à prova da catalase.

restrição superpostos, o que sugere a presença de duas espécies

O número de bandas encontrado após eletroforese do produto

co-agregadas durante o processo de isolamento. A partir dessa

de PCR permite classificar o isolado em um dos três gêneros de

observação, será executado um reisolamento dos lactobacilos en-

BAL: Lactobacillus (3 bandas); Enterococcus (2 bandas); Strep-

volvidos e a confirmação da identidade dos mesmos.

tococcus (1 banda) devido às duplicações e inserções presentes

Deve-se ressaltar que este trabalho é apenas uma pequena

no espaçador interno transcrito (ITS 1) da região 16S-23S do RNA

parte de um projeto de pesquisa bem maior cujo objetivo geral é

ribossomal (NOUR, 1998; MAGALHÃES, et al, 2005). Todos os

conhecer a microbiota dos grãos Kefir cultivados em diferentes

microrganismos isolados apresentaram três bandas, sendo então

substratos. Para tanto, a análise de um número maior de amos-

pertencentes ao gênero Lactobacillus o que corrobora os resulta-

tras se faz necessária.

dos encontrados na identificação presuntiva. Uma revisão realizada por LOPITZ-OTSOA et al (2006), PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 265


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cal properties. Journal of Biotechnology, Amsterdam, v.84, p.197-215, 2000.

NOTAS DE RODAPÉ

SCHWAN, R.F MAGALHÃES, J.K. PEREIRA, G.V de M. DIAS, R.D. Microbial commununities and chemical changes during fermentation of sugary Brazilin kefir. Worl J Microbiol Biotechnol. 26, 1241-1250. 2010.

2

Farmacêutico graduado pelo Centro Universitário Newton Paiva. Professora do Centro Universitário Newton Paiva, doutora em Ciências Farmacêuticas/UFMG. Professores do Instituto de Ciências Biológicas/UFMG, doutores em Imunologia e Bioquímica/UFMG 3

SCHNEEDORF, J. M.; ANFITEATRO, D.; Quefir, um probiótico produzido por microorganismos encapsulados e inflamação, Tecmedd: São Paulo,2004.

Professor do Instituto de Ciências Biológicas/UFMG, doutor em Microbiologia/UFMG. 4

SCHNEEDORF, J. M.; PEREIRA, I.O.; .; FERRAZ, V.; Atividade antiinflamatória de carboidrato produzido por fermentação aquosa de grãos de quefir, Química Nova: v.31 n.7 São Paulo, 2008. STAMER, J.R. Food Technology, chapter The lactic acid bacteria: microbes of diversity, pp. 60-65 1979. ST-ONGE, M.P., FARNWORTH, E.R., SAVARD, T., CHABOT, D., MAFU, A., JONES, P.J. Kefir consumption does not alter plasma lipid levels or cholesterol fractional synthesis rates relative to milk in hyperlipidemic men: a randomized controlled trial. BMC Complement. Altern. Med. 2: 1–7, 2002. TANIGUCHI, M.; TANAKA, T. Clarification of interaction among microorganisms and development of co-culture system for production of useful substances. Adv Biochem Eng Biotechnil: 90 35-62 2004. TANNOCK, G.W. et al. Identification of Lactobacillus isolates from the gastrointestinal tract, silage, and yoghurt by 16S-23S rRNA gene intergenic spacer region sequence comparisons. Applied and Environmental Microbiology. Washington, v.65, n.9, p.4264-4267, 1999. THOREUX, K., SCHMUCKER, D.L. Kefir milk enhances intestinal immunity in young but not old rats. Journal of Nutrition, 131, 807–812, 2001. TOBA, T ARIHARA, K. ADACHI, S. Comparative study of polissacarides from kefir grains, an encapsulated homofermentative Lactobacillus species and Lactobacillus kefir. Mitchwissenschoft. 42, 565-568 YOKOI, H. WATONABE, T. FUJII, Y. TOBA, T. ADACHI, S. Isolation and characterization of polyssacharide-producing bacteria from kefir grains. J dairy Sci. 73, 1684-1689, 1990. ZACCONI, C., PARISI, M.G., SARRA, P.G., DALLAVALLE, P. Competitive exclusion of Salmonella kedougou in kefir fed chicks. Microbiol Aliments Nutrition, 12, 387–390, 1995. ZHOU, J. LIU, X. JIANG, H. DONG, M. Analysis of the microflora in Tibetan kefir grains using denaturing gradient gel electrophoresis. Food Microbiology, 26. 770-775, 2009.

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KLEBSIELLA PNEUMONIAE CARBAPENEMASE – KPC em Enterobacteriaceae: o desafio das bactérias multirresistentes Érica Ribeiro Cotrim1 Roberta D. Rodrigues Rocha2 Mônica de F. Ribeiro Ferreira2

RESUMO: A prática da antibioticoterapia, por vezes abusiva, propiciou o desenvolvimento de mecanismos de resistência bacteriana. Atualmente, várias bactérias apresentam habilidade de desenvolver mecanismos de resistência enzimáticos. Na família Enterobacteriaceae, a produção de Klebsiella pneumoniae carbapenemase (KPC), por K. pneumoniae, é um mecanismo emergente e de importância clínica. A KPC é uma enzima que confere resistência aos antimicrobianos carbapenêmicos, inativa penicilinas, cefalosporinas e monobactâmicos. Diante desse contexto, este artigo teve por objetivo realizar uma breve revisão bibliográfica e abordar questões relativas ao micro-organismo que vem desafiando o corpo clínico hospitalar, causando um número crescente de infecções e morte, afligindo profissionais de saúde em todo o mundo. PALAVRAS-CHAVE: Bactéria KPC; Infecções Hospitalares; Resistência Bacteriana; Detecção de KPC

1. INTRODUÇÃO

com grande capacidade de transferir seu material genético, e

Nas últimas décadas, tem-se observado a proliferação de

consequentemente, os genes de resistência (DEL PELOSO;

bactérias patogênicas, envolvendo uma variedade de doenças,

BARROS; SANTOS, 2010). Essa fácil disseminação dificulta

que apresentam resistência a múltiplos antibióticos, sendo,

o controle de epidemias, e preocupa os profissionais da área

portanto conhecidas como bactérias multirrestistentes.

de saúde, pois o tratamento destas infecções é extremamen-

Vários fatores estão envolvidos na disseminação desses

te difícil, elevando as altas taxas de mortalidade. Embora mais

patógenos multirresistentes, incluindo o uso abusivo de anti-

freqüente na Klebsiella pneumoniae, a KPC pode ser identifica-

bióticos, procedimentos invasivos (cirurgias, implantação de

da em outras bactérias, a saber: Enterobacter cloacae, Citro-

próteses médicas e outros) e a capacidade das bactérias de

bacter freundii, Salmonella spp., E. coli e Pseudomonas spp.

transmitir seu material genético com a informação de resistên-

(DIENSTMANN et al., 2010).

cia a antibióticos (DIENSTMANN et al., 2010; ENDIMIAMI et al., 2009; FONTANA et al., 2010).

Diante desse contexto, é de suma importância o conhecimento dos métodos e estratégias de identificação da KPC a

As bactérias em destaque, na atualidade, são as produto-

fim de limitar sua disseminação, contribuir para a redução dos

ras de uma enzima denominada carbapenemase, mais especi-

índices de morbidade e mortalidade ligados a diferentes doen-

ficamente a KPC, sigla de Klebsiella pneumoniae carbapene-

ças infecciosas. No entanto, a identificação fenotípica de KPC

mase, por terem sido encontradas inicialmente nessa bactéria.

entre os membros da família Enterobacteriaceae ainda é um

A KPC é uma enzima produzida por bactérias gram-ne-

processo difícil e as estratégias para a sua identificação devem

gativas (enterobactérias), que confere resistência aos antimi-

ser revistas e ajustadas (FISHER et

al., 2009).

crobianos carbapenêmicos: meropenen, ertapenen, imipenen,

Nesta perspectiva, considerando a importância do tema, o

além de inativar os agentes β-lactâmicos: cefalosporinas, pe-

objetivo desse estudo foi realizar uma breve revisão bibliográfi-

nicilinas e o aztreonam. Cabe aqui ressaltar que os carbape-

ca a respeito da bactéria produtora Klebsiella pneumoniae car-

nêmicos compreendem uma classe amplamente utilizada no

bapenemase e abordar questões relativas ao micro-organismo

tratamento de infecções envolvendo Enterobacteriaceae (HA-

que vem desafiando o corpo clínico hospitalar, causando um

NES et al., 2009; KITCHEL et al., 2009; LANDMAN et al., 2005;

númSero crescente de infecções e morte, afligindo profissio-

QUEENAN; BUSH, 2007).

nais de saúde em todo o mundo.

A KPC, mais freqüentemente encontrada em K. pneumoniae, tem um alto potencial de disseminação, é uma bactéria

2. METODOLOGIA

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O presente trabalho foi realizado através de uma revisão bibliográfica de artigos científicos consultados no site BIREME

ções de aminoácidos em algumas cepas (LANDMAN; BRATU; QUALE, 2009).

(Biblioteca Regional de Medicina), LILACS (Literatura Latinoamericana em Ciências da Saúde), SCIELO (Scientific Electronic

3.2 KLEBSIELLA PNEUMONIAE CARBAPENEMASES – ENZI-

Library Online), teses, dissertações e livros de microbiologia.

MA KPC As enzimas KPC foram detectadas pela primeira vez em Klebsiella pneumoniae na Carolina do Norte, Costa Leste dos

3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

Estados Unidos, em 1996, daí o nome recebido. Rapidamente

3.1 RESISTÊNCIA BACTERIANA Com a prática da antibioticoterapia os mecanismos de re-

disseminou por outras regiões e recentemente, tornaram-se uma

sistência tornaram-se comuns principalmente em ambientes

das preocupações emergentes quanto à saúde pública mundial

nosocomiais. Esses mecanismos incluem: alteração na permea-

(TSAKRIS et al., 2009). No Brasil, bactérias produtoras de carba-

bilidade da membrana celular, que impede a entrada do antibió-

penemases foram registradas pela primeira vez em 2005, mas

tico na célula, bombeamento do antibiótico para fora da mesma,

somente em 2011 elas passaram a causar surtos mais graves no

pelo mecanismo de efluxo; mutação genética que altera de algu-

país. Em 12 de janeiro de 2011, foi exibida uma nota no Distrito

ma forma o alvo do antibiótico e, conseqüentemente, não afeta o

Federal/Brasil, notificando 367 casos ocorridos entre 01 a 08 de

funcionamento da bactéria, bem como desenvolvimento da ca-

janeiro de 2011, com 26 óbitos. Do total de casos, 263 foram

pacidade de degradar ou de inativar o antibiótico (NIAID, 2010).

identificados nas unidades de terapia intensiva - UTI (SECRE-

De acordo com o critério de interpretação do Clinical and

TARIA DO ESTADO DE SAÚDE DO DISTRITO FEDERAL, 2011).

Laboratory Standards Institute (2009), a maioria das KPC isola-

Bactérias produtoras de enzimas carbapenemases - KPC

das não manifesta completa resistência aos carbapenêmicos,

são tipicamente resistentes a todos agentes -lactâmicos: cefa-

a saber: para imipenem e meropenem apresentam uma Con-

losporinas, penicilinas e o aztreonam. Os isolados que adqui-

centração Inibitória Mínima (CIM) de 2-8 µg/mL. No entanto, En-

rem a KPC normalmente são resistentes também a várias outras

dimiani et. al. (2009), relataram que a CIM de carbapenêmicos

classes de agentes antimicrobianos utilizados como opções de

foram elevadas para concentrações superiores a 64µg/mL em

tratamento (DIENSTMANN et al., 2010; FONTANA et al., 2010;

aproximadamente 20% das estirpes KPC detectadas nos EUA.

KITCHEL et al., 2009; LANDMAN et al., 2005; QUEENAN; BUSH,

A hipótese é que os valores de CIM mais elevados para

2007), limitando assim a escolha de antibióticos para o trata-

essa sub-população pode ser devido ao aumento dos níveis

mento de infecções graves (ENDIMIAMI et al., 2009).

de expressão da β-lactamase KPC capazes de hidrólisar o anel

O gene que codifica a enzima KPC, bla KPC, é plasmídeo

β-lactâmico, degradando assim o antibiótico (DIENSTMANN et

transmissível entre Enterobacteriaceae (MARSCHALL et al.,

al., 2010; HANES et al., 2009; MARTINS et al., 2010) ou devido a

2009; MARTINS et al., 2010). Por ser um gene localizado em um

redução de penetração dos antibióticos no espaço periplásmico

plasmídeo móvel, pode ser facilmente transferido entre bactérias

da bactéria (ENDIMIAMI et al., 2009).

da mesma espécie ou entre espécies diferentes (DEL PELOSO;

Com relação a esta última possibilidade, suspeita-se que

BARROS; SANTOS, 2010). Este gene já foi encontrado em várias

as três principais Proteínas de Membrana Externa (OMP) de Kle-

espécies de Enterobacteriaceae além de Acinetobacter e Pseu-

bsiella pneumoniae (OMP 35, OMP 36 e OMP 37) desempe-

domonas (BULIK et al., 2010; COLE et al., 2009; FONTANA et

nham um papel importante na suscetibilidade a antibióticos de

al., 2010; KITCHEL et al., 2009; MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2010;

β-lactâmicos, incluindo a carbapenêmicos (ENDIMIAMI et al.,

PAPP-WALLACE et al., 2010; ROBLEDO et al., 2010; TIBBETTS

2009).

et al., 2008; TSAKRIS et al., 2009; WOLTER et al., 2009). Até o

A alteração na produção de porina é um fator importante

momento, oito diferentes variantes KPC (KPC dois a nove) têm

para a resistência aos carbapenêmicos. É comum a perda de

sido identificados com diferença de uma ou duas substituições

OMP em bactérias KPC e essa perda pode levar a resistências a

de aminoácidos (ROBLEDO et al., 2010).

antibióticos. A falta da OMP35 na bactéria aumenta a resistência

Os pacientes mais vulneráveis a Klebsiella pneumoniae

à ceftazidima. Já a perda da OMP36 leva à redução da suscepti-

produtora de KPC são aqueles com comorbidades incluindo

bilidade à cefotaxima, cefamicinas e carbapenêmicos. O ertape-

pacientes transplantados, neutropênicos, em ventilação mecâ-

nem pode ser particularmente afetado pela perda concomitante

nica e aqueles em UTI, com longos períodos de internação que

de OMP35 e OMP36. A perda da porina tem sido correlacionada

apresentam risco aumentado de infecção ou colonização para

com o rompimento de OMP35 e OMP36 por inserções ou dele-

bactérias multirresistentes.

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 269


As cepas produtoras de KPC podem causar qualquer tipo

al. (2009) mostram também que NXL104 é um potente inibidor

de infecção sendo a evolução destas associadas a uma alta taxa

das enzimas KPC, com uma baixa CIM, restaurou a atividade

de mortalidade (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2010).

antimicrobiana de ceftazidima, ceftriaxona imipenem, piperacilina e contra as cepas de enterobactérias produtoras de KPC. A

3.3 ASPECTOS CLÍNICOS, TRANSMISSÃO,

combinação ceftazidime/NXL104 está atualmente em desenvol-

TRATAMENTO E PREVENÇÃO

vimento clínico e demonstrou um perfil de tolerância notável em

O paciente com infecção pela bactéria Klebsiella pneumo-

voluntários.

niae produtora de KPC apresenta sinais e sintomas como febre

Essas inovações visam reduzir a mortalidade causada por

ou hipotermia, taquicardia, piora do quadro respiratório e nos ca-

essas bactérias, mas enquanto o tratamento é um desafio, cabe

sos mais graves hipotensão, inchaço e até falência de múltiplos

então as medidas de profilaxia. Nesta perspectiva, é de grande

órgãos. Em relação ao sítio de infecção, a bactéria produtora

importância a antissepsia eficiente do ambiente, dos instrumen-

de KPC pode causar pneumonia associada à ventilação mecâ-

tos cirúrgicos e das mãos com o uso do álcool a 70%, funda-

nica, infecção do trato urinário, infecção de corrente sanguínea,

mentais para a contenção de surtos. Além disto, os pacientes

infecção de partes moles e outros tipos de infecção (OLIVEIRA,

contaminados permanecem isolados, até o controle da infecção.

2010). Fora do ambiente hospitalar, a bactéria não representa perigo. A forma de transmissão é basicamente por contato com secreção ou excreção de pacientes infectados ou colonizados.

3.4 DETECÇÃO LABORATORIAL DA KPC A identificação fenotípica da KPC e de outros mecanismos

As opções terapêuticas para o tratamento da Klebsiella

de resistência entre os membros da família Enterobacteriaceae

pneumoniae produtora de KPC são poucas. Pode ser usada

é ainda difícil (FISHER et al., 2009). Apesar dos avanços tecnoló-

a Polimixina B, Tigeciclina e até os aminoglicosídeos, porém,

gicos, ensaios que combinam alta sensibilidade e especificidade

confirmado pelo resultado da cultura e antibiograma, lembrando

na detecção destas enzimas não existem (TSAKRIS et al., 2009).

que a Tigeciclina não tem boa concentração urinária. Carbape-

As metodologias usadas para rastreamento de KPC são di-

nêmicos e polimixinas devem ser evitados como monoterapia

versificadas: focalização isoelétrica, disco-difusão, E-test, teste de

(HIRSCH; TAM, 2010; OLIVEIRA, 2010).

Hodge modificado, dentre outros. Pode-se ainda pesquisar o gene

Devido à limitada escolha de antibióticos para combater as

bla KPC por Reação em Cadeia da Polimerase (PCR). Existem sis-

bactérias multirresistentes, inúmeras grupos de pequisas tem

temas de automação, no entanto, podem não identificar com preci-

buscado novos antimicrobianos. No entanto, o número de no-

são os isolados KPC positivos (DIENSTMANN et al., 2010).

vos fármacos aprovados para comercialização vem diminuindo ao longo dos anos.

3.4.1.DISCO-DIFUSÃO

Recentemente, o ACHN-490 mostrou potente atividade in

Os critérios para interpretação de sensibilidade a carbape-

vitro contra Klebsiella pneumoniae, incluindo os KPC. ACHN-

nêmicos em Enterobacteriaceae, conforme indicação do Clinical

490 representa uma alternativa promissora para a tigeciclina e

and Laboratory Standards Institute - CLSI (2010), para métodos

colistina para o tratamento de cepas resistentes a quinolonas,

de Disco Difusão e determinação da Concentração Inibitória Mí-

combinações inibidores β-lactâmicos/β-lactamase, carbapenêmi-

nima (CIM) estão mostrados na TABELA 1.

cos e aminoglicosídeos (ENDIMIAMI et al., 2009). Stachyra et.

Esses resultados podem indicar isolados com produção

carbapenemase e esse fenótipo deve ser confirmado pelo mé-

de. Contudo, por apresentar esta alta sensibilidade pode ocor-

todo Hodge (PASTERAN et al., 2009).

rer resultados falso-positivos quando qualquer enzima com atividade carbapenemase estiver presente (PASTERAN et al.,

3.4.2 TESTE MODIFICADO DE HODGE É uma técnica de baixo custo e apresenta alta sensibilida-

2009, TSAKRIS et al., 2009). É um procedimento proposto para a confirmação da produção suspeita de enzima carbapenema-

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se, detectando a capacidade de hidrolisar a atividade dos car-

de se evitar resultados falsos negativos.

bapenêmicos nas células das bactérias analisadas. Este tes-

A CLSI (2010) preconiza para o teste modificado de Hodge

te pode confirmar a presença de carbapenemases, mas não

que seja inoculada uma cepa conhecida de Klebsiella pneu-

identifica especificamente a classe de enzimas (COLE et al.,

moniae carbapenemase positiva, outra carbapenemase nega-

2009).

tiva e a amostra teste. Isto para visualizar a deformação do halo

Segundo o CLSI (2010), o disco de imipenem não detecta a presença de carbapenemases no teste, por isso devem ser

em uma cepa de carbapenemase confirmada para comparar com a deformação do halo da amostra teste (FIGURA 1).

usados o disco de ertapenem ou o disco de meropenem, a fim

3.4.3 MEIO CHROMAGAR Um novo meio cromogênico, o CHROMagar KPC foi recentemente desenvolvido estando comercialmente disponível. Esse meio contém suplementos com agentes que inibem o crescimento de bactérias gram-negativas sensíveis a carbapenêmicos. Após a incubação de 24 horas a 37°C, as culturas Enterobacteriaceae resistente a carbapenêmicos, assumem cores diferentes de acordo com a especificidade das suas propriedades enzimáticas (FIGURA 2) (SAMRA et al., 2008).

CHROMagar é capaz de detectar de isolados KPC com altos

3.4.4. DISCO DE ÁCIDO BORÔNICO

níveis de resistência aos carbapenêmicos (CIM >16µg/mL), mas

Os ensaios com discos de ácidos borônico são considera-

é menos sensível para a detecção de isolados com baixos níveis

dos simples, altamente sensíveis e específicos para diferencia-

de resistência aos carbapenêmicos (CARRER; FORTNEAU; NOR-

ção de KPC e aplicáveis ao uso rotineiro em laboratórios de mi-

DMANN, 2010).

crobiologia clínica (HIRSCH; PASTERAN et al., 2009; TAM, 2010;

No entanto, mais estudos serão necessários para estabe-

TSAKRIS et al., 2009).

lecer a confiabilidade do novo meio CHROMAgar KPC e sua

De forma resumida, o diâmetro da zona inibidora de cresci-

aplicabilidade para a detecção de bactérias gram-negativas En-

mento em torno de um disco de β-lactâmico com ácido borônico

terobacteriaceae e outros agentes patogênicos, tais como Aci-

é comparado com a do disco correspondente β-lactâmico sem

netobacter baumannii e Pseudomonas aeruginosa (SAMRA et

ácido borônico. O teste é considerado positivo para a detecção

al., 2008), uma vez que, a avaliação até então, envolveu uma

de KPC, quando o diâmetro da zona inibidora de crescimento

pequena quantidade de amostras, sendo necessário mais estu-

em torno de um disco de β-lactâmico com ácido borônico é

dos para utilizar esse ensaio como método de detecção.

maior ou igual a cinco milímetros do que o disco que contém o substrato -lactâmico sozinho (FIGURA 3) (TSAKRIS et al., 2009).

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3.4.5 REAÇÃO EM CADEIA DA POLIMERASE - PCR O teste PCR é um método rápido e preciso de identificação bla KPC. É um método sensível e altamente específico, no entanto, a PCR exige equipamento e conhecimentos especializados em diagnóstico molecular e por isso, ainda não está disponível para utilização na rotina dos laboratórios de microbio-

instituições de saúde, devido a dificuldade de identificação, trata-

logia (COLE et al., 2011)

mento e consequentemente o alto índice de mortalidade.

3.4.6 AUTOMAÇÃO

é frear o uso abusivo de antibióticos. Assim, em 5 de maio de

Uma medida mais previsível para controlar a resistência Em um estudo realizado por Neil Woodford et al. (2010) foi

2011, o governo brasileiro deu um importante passo para res-

avaliado a sensibilidade e a especificidade de alguns sistemas

tringir o uso descontrolado desses medicamentos, ao editar a

automatizados em identificar produtores de carbapenemases.

resolução nº20, da ANVISA, que dispõe sobre prescrição, co-

Os sistemas testados foram BD Phoenix, MicroScan e Vitex 2

mercialização e embalagem de antibióticos. A nova resolução

que apresentaram os seguintes índices de desempenho: va-

mantém, também, as exigências previstas na Resolução RDC

lores de sensibilidade e especificidade de 100%;0% para BD

nº. 44/2010, quanto à apresentação, retenção e escrituração das

Phoenix, 82%;19% para MicroScan, e 74%;38% para a Vitek,

receitas contendo medicamentos antimicrobianos. O objetivo é

respectivamente (WOODFORD et al., 2010).

minimizar a elevação da resistência bacteriana no país. A fis-

A ineficiência de sistemas de teste de suscetibilidade auto-

calização pelas vigilâncias sanitárias locais quanto aos procedi-

matizado para detectar a resistência mediada KPC é observa-

mentos de exigência e retenção da receita nos estabelecimentos

do, especialmente se o ertapenem, que está determinado a ser

farmacêuticos deve continuar a ser realizada. Assim, no momen-

mais suscetível à atividade KPC, não for testado (FONTANA et

to, sugere-se a vigilância para o mecanismo de resistência KPC

al., 2010).

emergente no Brasil.

Os sistemas automáticos podem muitas vezes cometer er-

Quanto a identificação laboratorial destas bactérias, em

ros na identificação desses isolados como sensíveis aos car-

suma, a triagem fenotípica se dá preferencialmente por meio de

bapenêmicos, não identificando com precisão os isolados KPC

antibiograma com discos de cefalosporinas de terceira geração

(DIENSTMANN et al., 2010; LANDMAN; BRATU; QUALE, 2009).

(cefoperazona, cefotaxima, ceftazidima, ceftizoxima, ceftriaxo-

Desta forma, os laboratórios de microbiologia devem utilizar a

na) e carbapenêmicos (imipenem, meropenem e ertapenem),

automação apenas como uma tela inicial, seguido de confirma-

além do teste de Hodge modificado (DIENSTMANN et al., 2010).

ção com um método alternativo para diagnóstico de KPC (FI-

Apesar de existir o PCR, que é um método mais específico para

SHER et al., 2009).

detecção de KPC, sabe-se que ainda não é um processo rotineiramente aplicado nos laboratórios de microbiologias. Uma

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

inovação é a utilização de discos com acido borônico, apesar

Apesar de todo avanço da biologia molecular, da biotecno-

de necessitar mais estudos para obter confiabilidade, parece ser

logia e dos estudos de sequenciamento de genomas, a comuni-

um método sensível e específico para detecção de KPC O pa-

dade científica ainda não tem redes eficientes para acompanhar a

pel do farmacêutico analista clínico diante do problema atual da

ocorrência de bactérias multirresistentes. A resistência KPC ainda

bactéria KPC é de grande importância dentro de um laboratório

constitue uma ameaça para os pacientes hospitalizados e para as

de microbiologia. O bioquímico deve conhecer os fenótipos de

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resistência aos antibióticos mediante técnicas cabíveis e simples dentro de um laboratório, manter-se atualizado e com relacionamento constante com o corpo clínico hospitalar e com a Comitê de Controle de Infecção Hospitalar. Além disto, deve estabelecer programas de controle da qualidade, garantindo um resultado de exame confiável e rápido para diagnóstico do paciente. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Medidas para identificação, prevenção e controle de infecções relacionadas à assistência à saúde por microrganismos multirresistentes. NOTA TÉCNICA No 1/2010. 25 out 2010. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/ wps/wcm/connect/161dcf8044726d11972ad77d15359461/nota25-102010.pdf?MOD=AJPERES. Acesso em: 11 jan. 2011. ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC N° 44, de 26 de outubro de 2010. Ementa: Dispõe sobre o controle de medicamentos à base de substancias classificadas como antimicrobianos, de uso sob prescrição médica, isolados ou em associação e de outras providências. Diário oficial da união, Seção 1, N° 207, quinta-feira, 28 de outubro de 2010. Disponível em: http://www.in.gov.br. Acesso em: 15 fev. 2011. BULIK, C.C.; FAUNTLEROY, K.A.; JENKINS, S.G.; ABUALI, M.; LA BOMBARDI, V.J.; NICOLAU, D.P.; KUTI, J.L. Comparison of Meropenem MICs and Susceptibilities for Carbapenemase-Producing Klebsiella pneumoniae Isolates by Various Testing Methods. J. Clin. Microbiol. 48: 2402-2406. Mai. 2010. Disponível em: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/20484603. Acesso em: 14 mar. 2011. CARRER, A.; FORTINEAU, N.; NORDMANN, P. Use of ChromID Extended-Spectrum β-Lactamase Medium for Detecting CarbapenemaseProducing Enterobacteriaceae. Mar. 2010. J. Clin. Microbiol. 48: 1913-1914. Disponível em: http://jcm.asm.org/cgi/content/short/ JCM.02277-09v1. Acesso em: 14 fev. 2011. COLE, J.M.; SCHUETZ, A.N.; HILL, C.E.; NOLTE, F.S. Development and Evaluation of a Real-Time PCR Assay for Detection of Klebsiella pneumoniae Carbapenemase Genes. J. Clin. Microbiol. 47: 322-326. Fev. 2009. Disponível em: http://jcm.asm.org/cgi/content/short/47/2/322. Acesso em: 10 jan. 2011.

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NOTAS DE RODAPÉ Farmacêutica graduada pelo Centro Universitário Newton Paiva

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Docentes do curso de Farmácia do Centro Universitário Newton Paiva

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MANIFESTAÇÕES BUCAIS EM PACIENTES PORTADORES DE ARTRITE REUMATÓIDE Pâmela Oliveira Garcia1 Sara Patrícia dos Santos2 Santuza Maria Souza de Mendonça3

RESUMO: Este trabalho tem como objetivo conhecer, através de uma revisão de literatura, a relação entre artrite reumatóide (AR) e problemas bucais; identificar as alterações bucais freqüentes em pacientes com AR e estimar a abordagem odontológica apropriada para seus portadores. A AR é uma doença auto-imune, inflamatória, crônica e progressiva. Acomete a membrana sinovial das articulações e pode levar à destruição óssea e cartilaginosa. Contribui para aparecimento de problemas bucais relacionados ao acúmulo de placa bacteriana. Indivíduos com AR apresentam dores na articulação temporomandibular, inflamação e sangramento gengival. Estudos mostram relação bidirecional entre AR e periodontite. Percebe-se a importância da participação do cirurgiãodentista na equipe multidisciplinar que acompanha o portador da AR. PALAVRAS-CHAVE: Artrite Reumatóide; Doença Auto-Imune; Doenças Reumáticas; Manifestações Bucais; Periodontite.

1)INTRODUÇÃO

res que são mais freqüentes ou mais complexas, do ponto de

As doenças reumáticas são inflamações crônicas ou não

vista de morbidade e mortalidade. A Artrite Reumatóide (AR),

que atingem um ou mais componentes do sistema musculoes-

juntamente com as Espondilopatias, Vasculites, Lúpus Eritema-

quelético onde ocorrem alterações funcionais de causa não trau-

toso Sistêmico (LES), Esclerose Sistêmica (ES) e Síndrome de

mática (ANDRADE et al.,2008; ARIAS et al., 2010; BRAGA et al.,

Sjogren (SS) faz parte do grupo das DDTC.

2007; CARVALHO et al., 2009; CHAUD et al., 2003; CUNHA et al.,

Artrite reumatóide é um termo inespecífico que significa

2007; DETERT et al., 2007; FRANÇA et al., 2010; GUIDOLIN et

“inflamação das articulações” (MIGUEL et al., 2008; LITTLE et

al., 2005; LITTLE et al., 2009; MACHADO et al., 2005; MEDEIROS

al., 2009; CARVALHO et al., 2009; PINHEIRO et al., 2009). Para

et al., 2006; MIGUEL et al., 2008; PEREIRA et al., 2006; PINHE-

Cunha et al. (2007) e Carvalho et al. (2009) a AR constitui a prin-

RIO et al., 2009; PINHO et al., 2009; RAMOS et al., 2005; RIERA

cipal alteração articular degenerativa e é tida como uma doença

et al., 2006; SILVA et al., 2009; SOUZA, 2006; SCHENKEIN et al.,

auto-imune de etiologia desconhecida. Manifesta-se na forma

2003; TAUBAMAN et al., 2001; TIM et al., 2011; WALLIN et al.,

de uma poliartrite periférica e simétrica que leva à deformidade

2009). Afetam milhões de pessoas em todo mundo. No Brasil,

e destruição das articulações. Pode afetar ainda cotovelos, om-

situam-se como a terceira principal causa de incapacidade para

bros, pescoço, quadris, joelhos, tornozelos, pés e articulações

o trabalho, suplantada apenas pelas doenças psiquiátricas e

temporomandibulares, em virtude da erosão do osso e da car-

cardiovasculares. (MIGUEL et al., 2008). O termo doença reumá-

tilagem que pode acometer grandes e pequenas articulações,

tica pode designar um grupo de doenças que afeta articulações,

apresentando-se conjuntamente com manifestações sistêmi-

músculos e esqueleto, caracterizado por dores e restrições dos

cas (MIGUEL et al., 2008; LITTLE et al., 2009; CARVALHO et

movimentos (MIGUEL et al., 2008; LITTLE et al., 2009; CARVA-

al., 2009; CUNHA et al., 2007). AR afeta a qualidade de vida

LHO et al., 2009; PINHEIRO et al., 2009).

de seus os portadores diminuindo sua autonomia. Escovar os

Segundo Miguel et al. (2008), existem mais de 200 doenças

dentes é para a maioria, uma tarefa dolorosa, razão por que a

reumáticas, reconhecidas e classificadas pelo Colégio Ameri-

saúde bucal do paciente é geralmente renegada (CARVALHO

cano de Reumatologia, as quais acometem pessoas nas mais

et al., 2009). De acordo com Braga et al. (2007) e Carvalho et

variadas formas. Há doenças que acometem somente as arti-

al. (2009) a artrite e a periodontite apresentam similaridades

culações; outras envolvem apenas estruturas peculiares (mús-

em seus mecanismos patogênicos. A AR pode funcionar como

culos, ligamentos, bursas e tendões); e as doenças difusas do

um modulador para a resposta imune no periodonto do hos-

tecido conjuntivo (DDTC). As DDTC, previamente conhecidas

pedeiro, aumentando a suscetibilidade à doença periodontal

como “colagenoses”, são caracterizadas pelo envolvimento de

destrutiva (BALAJ et al., 2010; FUJIMURA et al., 2006; ISHI et

diferentes órgãos e sistemas, além das manifestações articula-

al., 2004; KOBAYASHI et al., 2007). Estudos indicam que a

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probabilidade dos pacientes com AR desenvolver sintomas na

população. Pode iniciar-se em qualquer idade, mas apresenta

ATM está correlacionada com a severidade e duração da do-

um pico entre os 35 e 55 anos com a relação mulher para ho-

ença sistêmica (CUNHA et al., 2009; LITTLE et al., 2009). Este

mem próxima a 9:1.

trabalho tem como objetivo conhecer, através de uma revisão

Embora a etiologia da AR permaneça desconhecida, vários

de literatura, a relação entre artrite reumatóide (AR) e problemas

estudos sugerem que fatores genéticos, ambientais, hormonais

bucais; identificar as alterações bucais freqüentes em pacientes

e infecciosos contribuam para a ocorrência e expressão da AR.

com AR e estimar a abordagem odontológica apropriada para

O componente genético é mais explicitamente demonstrado, a

seus portadores.

partir dos estudos epidemiológicos com irmãos de pacientes com AR. Os gêmeos monozigóticos apresentam uma taxa mais

2)METODOLOGIA

elevada de concordância para o AR (12 a 15%) que os dizigóti-

Procedeu-se à busca de artigos científicos nas bases de

cos ou não-gêmeos (2 a 5%). Estima-se que os fatores genéti-

dados bibliográficos Bireme, Lilacs, Pubmed/Medline, Scielo e

cos contribuam de 53 a 65% do risco para o desenvolvimento da

Cochrane. Os descritores utilizados para a busca dos artigos

AR (SANTIAGO; LITLE et al., 2009).

foram: artrite reumatóide; doença auto-imune; doenças Reumá-

Acredita-se que as doenças auto-imunes, como a AR, se-

ticas; manifestações bucais e periodontite. Todos os descritores

jam ocasionadas por alguma disfunção nos mecanismos de

foram consultados na listagem de Descritores em Ciências da

manutenção da tolerância imunológica (ANDRADE et al., 2009).

Saúde da Biblioteca Virtual de Saúde, disponível em http://decs.

As alterações quantitativas e funcionais das células T podem

bvs.br. Seus correspondentes em inglês e espanhol também

contribuir para desvios da auto-imunidade fisiológica e instala-

foram empregados, respeitando o(s) idioma(s) utilizado(s) nas

ção de processos auto-imunes patológicos (ANDRADE et al.,

bases de artigos selecionadas. Como critérios de inclusão dos

2009; CULSHAW et al., 2001; CRUVINEL et al., 2008; RIFAS et

artigos estão: 1) Artigos de revisão de literatura, pesquisa cientí-

al., 2010; RAHMAN et al., 2006; TENG et al., 2005).

fica ou casos clínicos que discutiam sobre manifestações bucais em pacientes portadores de Artrite Reumatóide; 2) Artigos locali-

3.2) AR E ALTERAÇÕES BUCAIS

zados nas bases bibliográficas Bireme, Lilacs, Pubmed/Medline,

A complicação mais significativa de corrente da AR no com-

Scielo e Cochrane com auxílio dos descritores citados; 3) Artigos

plexo buco-maxilo, é o envolvimento da ATM que é observado

publicados nos idiomas português, inglês ou espanhol; 4) Arti-

em torno de 45% a 75% dos pacientes. Os pacientes com AR

gos publicados nos últimos 10 anos, ou seja, entre 2001 e 2011;

podem queixar-se de dor pré-auricular bilateral, sensibilidade,

5) Artigos disponíveis on-line ou pelo Programa de Comutação

edema, rigidez e redução da mobilidade da ATM ou permanecer

Bibliográfica (COMUT). Os artigos que não atendessem aos cri-

assintomáticos. Podem ocorrer períodos de remissão e exarce-

térios de inclusão não foram lidos.

bação dos sintomas e sinais articulares da ATM, assim como acontece nas outras articulações envolvidas. Pode ocorrer an-

3)REVISÃO DE LITERATURA

quilose ou fibrose articular. Clinicamente, os pacientes podem

3.1) ARTRITE REUMATÓIDE (AR)

apresentar sensibilidade no colo lateral do côndilo, crepitação,

A AR causa inflamação na membrana sinovial articular e se

limitação da abertura de boca e sinais radiográficos de altera-

manifesta por calor, inchaço e dor. Tipicamente, afeta várias ar-

ções estruturais. Inicialmente, no exame radiográfico pode ser

ticulações ao longo do corpo e pode causar danos nas cartila-

obdervado o aumento de espaço articular. Essas alterações,

gens, ossos, tendões e ligamentos das articulações, sendo uma

posteriormente se tornam erosivas e podem envolver a fossa

enfermidade potencialmente grave e incapacitante (MIGUEL et

articular e ambos os côndilos (LITLLE et al., 2009). A probabili-

al., 200; LITTLE et al., 2009; CARVALHO et al., 2009). É uma

dade de os pacientes com AR desenvolverem sintomas na ATM

doença poliarticular inflamatória crônica, em que o envolvimento

está correlacionada à severidade e à duração da doença sistê-

extra-articular ou sistêmico não é negligenciável (PEREIRA et al.,

mica (MIGUEL et al., 2008; LITTLE et al., 2009; CARVALHO et al.,

2006; BRAGA et al., 2009; WALLIN et al., 2005).

2009; CUNHA et al., 2007).

Para Carvalho e Wallin et al., (2009) a carga genética pode

Uma consequência preocupante do comprometimento da

exercer papel importante no desenvolvimento da doença. De

ATM é o desenvolvimento de mordida aberta anterior, causada

acordo com Little et al., (2009) a AR apresenta uma distribuição

pela destruição da cabeça e perda da altura do côndilo. Essa re-

geográfica universal, acometendo indivíduos de todas as raças.

pentina retrognatia e mordida aberta anterior podem ser graves

Na população brasileira, a prevalência estimada é de 0,46% da

e têm sido consideradas causas de apnéia do sono obstrutiva

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(CARVALHO et al., 2009; LITLLE et al., 2009).

vidade da AR e seu tratamento pode associar-se a melhora em

Uma complicação adicional observada em portadores de

índices laboratoriais e clínicos da atividade da AR (ISHI et al.,

AR são graves estomatites, que aparecem após utilização de

2008; ORTIZ et al., 2009; PINHO et al., 2009). Há ainda evidência

medicamentos utilizados para controle da AR como penicilami-

de que o tratamento da AR com medicamentos que antagoni-

na, sais de ouro e agentes imunosupressores. O aparecimento

zam o fator de necrose tumoral (anti-TNF) pode ter efeitos bené-

dessas lesões pode indicar toxicidade do medicamento e deve

ficos na doença periodontal (ORTIZ et al., 2009).

ser prontamente comunicado o médico (LITLLE et al., 2009).

A suscetibilidade genética à ocorrência da doença periodon-

De acordo com Carvalho et al., (2009) os pacientes com

tal e sua associação com a gravidade da AR vem sendo cada

AR possuem dificuldade na execução da higiene bucal, devido

vez mais compreendida. Alguns alelos do locus HLA-DRB1,

a dificuldade motora dos membros superiores e pelo envolvi-

conhecidos como epítopos compartilhados, têm sido descritos

mento das a articulações temporomandibulares, que dificulta a

como marcadores genéticos desta doença e associados à sua

abertura da boca. Medidas alternativas como adaptadores de

maior gravidade. Associações entre a presença destes mesmos

escovas dentais, de fio dental e dentifrício devem ser adotadas

epítopos compartilhados e a gravidade da destruição óssea e

para tornar possível a higiene bucal desses indivíduos. Estes

ligamentar da DP também foram descritas (MAROTTE et al.,

adaptadores servem para superar dificuldades como a de pre-

2006).

ensão ou de levantar o braço.

Marotte et al. (2006) avaliaram 147 pacientes com AR e

A AR pode funcionar como um ativador para a resposta imu-

observaram que 56,5% também apresentavam DP. Não houve

ne no periodonto do hospedeiro, aumentando a suscetibilidade

associação entre a presença da DP e os índices clínicos ou la-

à doença periodontal destrutiva (Braga et al., 2007). As condi-

boratoriais de atividade da AR avaliados. Contudo, houve as-

ções reumatológicas, como da AR, também podem ser modifi-

sociação entre a presença de DP e maior destruição óssea em

cadoras do processo saúde-doença periodontal, uma vez que,

punhos e no tecido periodontal. Ainda, a presença de epítopos

em todas essas condições, observa-se uma importante desre-

compartilhados associou-se significativamente à destruição ós-

gulação do sistema imune (BRAGA et al., 2007; KOBAYASHI et

sea em punhos e periodontal (MAROTTE et al., 2006).

al., 2007; ISHI et al., 2004).

A Porphyromonas gingivalis é o principal agente etiológico

Ishi et al., (2004) conduziram um estudo com 39 paciente

da periodontite. Esta bactéria contém a enzima peptidil arginina

portadores de AR e 22 controles saudáveis e concluíram que os

deaminase, que permite a geração de peptídeos citrulinados.

pacientes com AR possuem menos dentes, maior prevalência

Em indivíduos geneticamente suscetíveis (carreadores dos epí-

de sítios com placa bacteriana e maior freqüência de sítios com

topos compartilhados) a presença destes peptídeos citrulinados

perda de inserção. Apesar da prevalência de placa bacteriana

pode levar à quebra da tolerância a antígenos citrulinados en-

ser maior no grupo de pacientes doentes a porcentagem de sí-

dógenos e resultar na produção de anticorpos anti-CCP e con-

tios com sangramento gengival deste grupo não foi estatistica-

tribuir para o desenvolvimento da AR. Além disto, esta bactéria

mente diferente da apresentada pelos controles saudáveis. Os

também expressa outras proteinases que podem participar des-

autores concluem sugerindo que há associação entre doença

te processo (SCHUTZ, 2011).

periodontal e AR.

De acordo com Braga et al., (2007) e Carvalho et al., (2009) existe uma condição de risco à AR baseada na exposição crôni-

3.3) MECANISMOS BIOLÓGICOS DA ASSOCIAÇÃO

ca ao lipopolissacarídeo que ocorre nas doenças periodontais.

ENTRE AR E PERIODONTITE

Nesse conceito, o lipopolissacarídeo de bactérias periodontopá-

A DP não apenas oferece risco à dentição, como também

ticas serviria como uma fonte de superantígenos ao hospedeiro,

apresenta efeitos sistêmicos e associa-se a uma maior preva-

podendo iniciar a cascata imunológica observada na AR. Por ou-

lência de diabetes mellitus, aterosclerose, infarto do miocárdio,

tro lado, a desregulação imunológica observada na AR, gerando

acidente vascular cerebral e segundo diferentes autores, AR.

o aumento de citocinas como a interleucina 1 (IL-1), o fator de

A presença de vias autoimunes comuns à DP e AR tem sido

necrose tumoral (TNF-α) e a IL-6, local e sistemicamente, fariam

descrita, que incluem ativação crônica de células inflamatórias,

com que pacientes com artrite reumatóide, na presença de pató-

produção de citocinas e ativação do complemento (ISHI et al.,

genos periodontais e um meio ambiente propício, desenvolvam

2008; ORTIZ et al., 2009; PINHO et al., 2009).

maior suscetibilidade à periodontite (GARCIA et al., 2006; KO-

Estudos que avaliaram a associação entre DP e a atividade

BAYASHI et al., 2007; YOSHIDA et al., 2001; ZHAO et al., 2010;

e gravidade da AR sugerem que a DP piora a atividade e a gra-

TAUBAMAN et al., 2001; BARKSBY et al., 2007; YAMAZAKI et al.,

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2001; UNKAI et al., 2008). Além disso, a hiperatividade neutrofí-

lógico para esses pacientes. Este protocolo possui como pontos

lica tem sido evidenciada em certas doenças crônicas e parece

relevantes programação de consultas curtas, manutenção do

justificar possíveis inter-relações entre algumas condições infla-

paciente em posição confortável, conecimento da medicação

matórias. Os neutrófilos são as células mais importantes nas ar-

utilizada e seus efeitos sistêmicos, identificação dos indivídu-

ticulações de pacientes com AR ativa e parecem desempenhar

os que necessitam de profilaxia antibiótica, em especial os que

uma importante função na periodontite. Evidenciou-se hiperati-

possuem próteses articulares, adequação das técnicas a serem

vidade de neutrófilos tanto na periodontite quanto na AR. Desta

utilizadas de acordo com as especificidades de cada pessoa e

forma, talvez uma doença possa funcionar como estímulo pré-

atenção a possíveis sinais e sintomas decorrentes de problemas

ativador para neutrófilos periféricos, fazendo que essas células

na ATM.

hajam de forma mais agressiva, quando recrutadas para atuar em outra doença (BRAGA et al., 2007; CRUVINEL et al., 2008).

CONCLUSÃO A condição de saúde bucal dos pacientes portadores de AR

3.4) TRATAMENTO ODONTOLÓGICO DO PACIENTE PORTADOR DE AR

requer atenção uma vez que apresentam manifestações e com-

O enfoque médico atual no manuseio dos pacientes com

plicações bucais específicas. Pode haver comprometimento da

AR baseia-se no seu diagnóstico precoce e no controle clínico

ATM com aparecimento de sintomatologia dolorosa, edema,

e laboratorial rigoroso da atividade inflamatória. Como a maioria

rigidez e limitação de abertura bucal. Uma conseqüência espe-

dos pacientes com AR, na sua fase inicial, não é atendida pelo

cialmente preocupante é o desenvolvimento de mordida aberta

reumatologista, o clínico geral tem um papel essencial no diag-

anterior. Outra complicação adicional observada em portadores

nóstico e tratamento dessa enfermidade (SANTIAGO, 2009).

de AR são graves estomatites, que aparecem após utilização

O tratamento médico apropriado para a AR é basicamente

de medicamentos utilizados para controle da AR e podem indi-

paliativo, pois não existe cura para a doença. Tem como objetivo

car toxicidade do medicamento. Os pacientes com AR possuem

reduzir a inflamação e o aumento de volume das articulações,

dificuldade na execução da higiene bucal, devido a dificulda-

aliviar a dor e a rigidez e, ainda, o restabelecimento da função.

de motora dos membros superiores e pelo envolvimento das a

Esses objetivos são alcançados com o programa básico de

articulações temporomandibulares, que dificulta a abertura da

tratamento, que consiste em educação do paciente, repouso,

boca. A literatura sugere que portadores de AR possuem menos

exercícios, fisioterapia e AAS (ácido acetilsalicílico) ou outros an-

dentes, maior prevalência de sítios com placa bacteriana e maior

tiinflamatórios não esterioidais (AINEs) (LITLLE et al., 2009).

freqüência de sítios com perda de inserção. Parece existir uma

Nos últimos anos, o metotrexato (MTX), em doses baixas,

associação positiva ente AR e doença periodontal. O tratamento

tem sido amplamente utilizado no tratamento de doenças Reu-

odontológico do paciente com AR deve contemplar as deman-

máticas, inclusive a AR, por suas propriedades imunomodulado-

das específicas apresentadas por esse grupo de pacientes, ten-

ras e poupadoras de corticóide. Entretanto, vários efeitos colate-

do como preocupação o restabelecimento da saúde bucal sem

rais são possíveis com o seu uso, requerendo atenção especial

perder de foco a condição sistêmica e utilização de medicamen-

do médico que o prescreve (GUIDOLIN et al., 2005).

tos para controle da doença

No tratamento de afecções reumáticas há a tendência de se utilizarem vários fármacos simultaneamente aumentando as-

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Como comentado anteriormente, uma complicação adicional observada em pacientes com AR são as estomatites graves, que aparecem depois do uso de medicamentos, como penicilamina, sais de ouro ou agentes imunossupressores. Isso pode indicar toxicidade do medicamento e deve ser comunicado ao médico. O tratamento para esse problema é paliativo e inclui uso de solução para bochecho, elixir de difenidramina ou emolientes tópicos tipo Orabase. Como os pacientes com AR apresentam envolvimento de múltiplas articulações com variados graus de dor e imobilidade, Little et al. (2009) propõem um protocolo de tratamento odonto-

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NOTAS DE RODAPÉ 1. Acadêmica do curso de Odontologia do Centro Universitário Newton Paiva, Minas Gerais – pamelagarcia22@hotmail.com. 2. Acadêmica do curso de Odontologia do Centro Universitário Newton Paiva, Minas Gerais – sarinhaodonto@yahoo.com. 3. Professora adjunta com regime de dedicação integral do Centro Universitário Newton Paiva, Mestre em Odontologia, área de concentração Clínica Odontológica, Universidade Federal de Minas Gerais – santuzam@yahoo.com.br.

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OS RISCOS DO USO E DO DESCARTE INADEQUADO DE MEDICAMENTOS VENCIDOS: método de análise alternativo para determinação de ácido salicílico em uma amostra de aspirina® vencida. Adriana Nascimento de Sousa1,2 Eliane do Nascimento2 Fernanda Boroni1,2 Kyrlah Jerônimo1,2

Resumo: Cresce no Brasil a discussão sobre qual destino dar aos medicamentos que não são usados pela população. Os usuários de medicamentos acabam fazendo o descarte destes de forma inadequada, os quais podem ter repercussões na saúde pública e ambiental. Neste trabalho, demonstrou-se que a Espectroscopia no ultravioleta-visível por derivadas, pode ser utilizada na determinação de ácido salicílico em comprimidos de ácido acetilsalicílico no produto comercial, Aspirina®. O método demonstrou ser de baixo custo, podendo ser uma alternativa viável em substituição à técnica farmacopéica. Com os resultados obtidos demonstrou-se que o medicamento fora do prazo de validade possui alterações na sua composição e para que não haja riscos no seu descarte o correto seria a devolução para o fabricante, através de postos de coleta públicos e particulares. Palavras- chave: Espectroscopia UV-vis derivativa, ácido acetilsalicílico, medicamentos vencidos.

INTRODUÇÃO

tos adversos à saúde, seja humana ou de outros organismos

Por desconhecimento ou falta de informação, grande par-

presentes nas águas, como os peixes.

te das pessoas acabam fazendo o descarte de medicamen-

Outro problema relacionado a medicamentos vencidos é o

tos de forma inadequada, e esse despreparo na questão do

uso destes por parte dos consumidores. Neste caso os danos

manejo de resíduos químicos farmacêuticos em muitos lugares

causados podem ser ainda mais graves com ocorrência de in-

do mundo leva a graves danos a natureza, os quais podem

toxicações, envenenamentos e até mesmo morte dos usuários

ter repercussões à saúde pública e ambiental (GIL, 2005). Um

(LAPORTE, 1989).

estudo feito pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas e Bio-

Da “farmácia doméstica” decorrem inúmeros casos de

químicas, Oswaldo Cruz, entrevistou 1.009 pessoas na cidade

medicamentos vencidos e de intoxicações medicamentosas

de São Paulo e mostrou que apenas 2,7% dos entrevistados já

(LAPORTE, 1989). Segundo os dados publicados pelo Siste-

haviam recebido alguma orientação sobre descarte de medica-

ma Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas, os me-

mentos vencidos. O levantamento constatou que 75,32% das

dicamentos ocupam a primeira posição entre os três principais

pessoas descartam a medicação no lixo doméstico e 6,34%

agentes causadores de intoxicações em seres humanos desde

jogam na pia ou no vaso sanitário. E mais, 92,5% nunca per-

1996, sendo que em 2007 foram responsáveis por 30,3% dos

guntaram sobre a forma correta de fazê-lo (FENAFAR, 2011).

casos registrados (SINITOX, 2009).

Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, entre

Para que os medicamentos tenham sua plena ação, eles

10 e 28 mil toneladas de medicamentos são jogadas fora pelos

devem estar em condições adequadas de uso e dentro dos

consumidores a cada ano. Esses medicamentos jogados no

prazos de validade. Estes aspectos são importantes para a efi-

lixo ou no esgoto podem poluir o solo e a água e trazer riscos

cácia do tratamento e segurança do usuário. Após expirar o

para o ambiente e para as pessoas. Os produtos químicos,

prazo de validade, os medicamentos vencidos devem ser inuti-

como os medicamentos podem reagir de forma violenta com

lizados e descartados, para evitar problemas relacionados com

outra substância química, inclusive o oxigênio do ar ou com

os medicamentos como: intoxicações; uso sem necessidade

a água, produzindo fenômenos físicos tais como calor, com-

ou sem indicação; falta de efetividade; reações adversas; entre

bustão, ou então produzindo substância tóxica. Segundo Bila

outros (LAPORTE, 1989).

(2003) a presença desses fármacos na água pode causar efei-

Neste contexto, a Farmácia Escola do Centro Universitário

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Newton Paiva (FENP) como dispensadora de medicamentos, se

ácido acetilsalicílico (AAS). A escolha deste produto se deve ao

preocupa com o impacto social e ambiental que o descarte ina-

fato de que o ácido acetilsalicílico é o analgésico mais consumi-

dequado de medicamentos vencidos ou não, podem ocasionar

do e vendido no mundo.

ao meio ambiente e à sociedade, além dos vários problemas

A principal impureza presente no AAS é o ácido salicílico

que o uso de medicamentos vencidos pode ocasionar aos usu-

(AS), que é um produto de degradação produzido pela hidróli-

ários. Por isto a FENP com o intuito de informar e conscientizar

se do ácido acetilsalicílico quando as condições de armazena-

os usuários sobre o problema do descarte inadequado e o uso

mento não são adequadas como, por exemplo, em presença

de medicamentos fora do prazo de validade, propõe à verifica-

de umidade, oxigênio atmosférico e luz, de acordo com o es-

ção de produto de degradação gerado em uma amostra vencida

quema 1 (ALLINGER, 1978; PAVIA, 1982).

de Aspirina® comprimidos efervescentes cujo princípio ativo é o

Para avaliar a pureza do AAS, é mais comum determinar a

letividade na separação do AS e AAS (FERREIRA, 2003).

presença de AS do que medir o AAS presente. Isto é recomen-

Na Espectroscopia derivativa obtêm-se o espectro funda-

dado na Farmacopéia Brasileira e na Farmacopeia Europeia, a

mental (de ordem zero) da substância em análise e em segui-

qual estabelece uma tolerância de 0,15% de AS em comprimi-

da o próprio espectrofotômetro produz o espectro de primeira

dos de AAS (EUROPEAN, 1997). O baixo limite tolerado deve-

e de segunda ordem (primeira e segunda derivada). O ponto

se à irritação que o AS causa nas paredes do estomago, muito

de anulação da primeira derivada (conhecido como zero cros-

maior que o AAS (ALLINGER, 1978).

sing) equivale ao comprimento de onda máximo do espectro

De acordo com a Farmacopeia Brasileira (2010), determi-

de ordem zero (normal). O comprimento de onda máximo no

na-se o teor de AS em comprimidos de AAS por uma análise

espectro de segunda derivada equivale ao comprimento de

comparativa da amostra e um padrão contendo o máximo de

onda máximo do espectro de ordem zero. Os 2 pontos de anu-

AS, que é permitido na amostra. Assim, neste trabalho, propõe-

lação do espectro de 2ª derivada equivalem aos comprimentos

se a aplicação de uma técnica de doseamento, do AS, alternati-

de absorção máximo e mínimo da 1ª derivada (Figura 1). Assim

va à técnica farmacopéica, por meio da Espectroscopia UV-vis

a quantidade do fármaco em uma amostra pode ser facilmente

derivativa. O uso desta técnica se justifica pelo impedimento

determinada medindo-se a altura do pico no espectro de pri-

de aplicação da Espectroscopia direta (ordem zero) devido à

meira ou segunda derivada e interpolando-o em uma curva de

presença de grupos cromóforos semelhantes que absorvem

calibração previamente preparada com o padrão do fármaco

no mesmo comprimento de onda e, portanto não mostram se-

(O’HAVER, 1979).

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minou o peso médio. Retirou uma quantidade de pó contendo PARTE EXPERIMENTAL

cerca de 250 mg de Aspirina, transferiu para balão volumétrico

DETERMINAÇÃO DE AS NO AAS DE ACORDO COM A FARMACOPEIA

de 50 mL e dissolveu em etanol. Filtrou a solução e retirou 1 mL

BRASILEIRA 5ª ED.:

do filtrado, transferiu para balão volumétrico de 25 mL e comple-

Pesou e pulverizou os comprimidos. Transferiu quantidade

tou com etanol.

de pó equivalente a 0,20 g de ácido acetilsalicílico para um balão volumétrico de 100 mL. Adicionou 4 mL de etanol e agitou. Diluiu

PREPARO DA SOLUÇÃO PADRÃO DE AS

para 100 mL com água resfriada, mantendo a temperatura infe-

Pesou cerca de 250 mg de AS padrão, diluiu em balão volu-

rior a 10 °C. Filtrou imediatamente e transferiu 50 mL do filtrado

métrico de 50 mL e completou com etanol. A partir da solução

para tubo de Nessler. Preparou a solução de ácido salicílico pa-

estoque, preparou a solução diluída de AS padrão na concentra-

drão a 0,01% (p/v). Transferiu 3 mL desta solução para um tubo

ção 0,2 mg/mL em etanol. Realizou o espectro de varredura da

de Nessler, adicionou 2 mL de etanol e água em quantidade su-

solução padrão de AS e obtiveram-se os espectros de UV-vis de

ficiente para 50 mL. Adicionou 1 mL de sulfato férrico amoniacal

ordem zero, 1ª derivada e 2ª derivada.

às soluções padrão e amostra. Comparar as duas soluções. A cor violeta produzida com a solução amostra não deve ser mais

Preparo da solução padrão de AAS

intensa que a obtida com a solução padrão.

Pesou cerca de 250 mg de AAS padrão, diluiu em balão volumétrico de 50 mL e completou com etanol. A partir da so-

PREPARO DA AMOSTRA DE ASPIRINA® COMPRIMIDO EFERVESCENTE

lução estoque, preparou a solução diluída de AAS padrão na

Pesou 20 comprimidos de Aspirina ® efervescentes e deter-

concentração de 0,2 mg/mL em etanol. Realizou o espectro de

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varredura da solução padrão de AAS e obtiveram-se os espec-

tendo o máximo de impureza que é permitido no AAS (cerca de

tros de UV-vis de ordem zero, 1ª derivada e 2ª derivada.

0,15 %) é comparado com a solução da amostra em análise. Pode-se observar na figura 2, que a amostra de Aspirina ven-

RESULTADOS E DISCUSSÕES

cida apresenta quantidade de AS superior ao permitido, pois a

A técnica farmacopéica para determinação do AS é uma

coloração desenvolvida na solução amostra foi muito superior à

técnica semi-quantitativa onde uma solução padrão de AS con-

* As soluções foram transferidas do tubo de Nessler para o béquer para melhorar a visualização do resultado na foto.

desenvolvida no padrão.

a semelhança de absorção dos dois compostos. O espectro padrão do AAS apresenta picos característicos em 210 nm e

Das soluções padrões diluídas de AS e AAS, foram obti-

em 235 nm. O espectro padrão do AS também apresenta os

dos os espectros de ordem zero, separadamente, e em se-

mesmos picos característicos em 210 nm, 235 nm e ainda um

guida eles foram sobrepostos (Figuras 3, 4 e 5) para mostrar

outro em 300 nm.

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Além dos espectros apresentados anteriormente, foi também obtido o espectro da mistura das soluções de AS e AAS

aos dois compostos (AS e AAS), confirmando a incapacidade da técnica em analisar as duas substâncias seletivamente.

(Figura 6), que revelou a presença de picos característicos

A figura 5 mostra que existe sobreposição de bandas de ab-

copia derivativa. A diferenciação do espectro de ordem zero

sorção do AS e AAS, impedindo que a Espectroscopia comum

não aumenta as informações do espectro original, mas leva a

(ordem zero) seja utilizada para determinação do AS em AAS. A

supressão das bandas largas, realça as bandas estreitas, e au-

sobreposição das bandas (overlapping) de transição eletrônica

menta a resolução de “ombro” para banda, etc., obedecendo,

ou de transferência de carga em um mesmo solvente é um dos

ainda, a Lei de Beer‑Lambert. Na sobreposição de espectros de

problemas da Espectroscopia nas regiões do UV-vis de misturas

derivadas dos componentes de uma mistura, podem-se indivi-

de substâncias com cromóforos semelhantes. Uma alternativa

dualizar melhor os constituintes e até eliminar a interferência de

eficiente é o uso da Espectroscopia de derivadas ou Espectros-

um componente sobre o outro.

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Nos espectros sobrepostos de 1ª e 2ª derivadas (Figuras

litando a determinação dos dois fármacos simultaneamente com

7 e 10, respectivamente) pode-se observar que em certos com-

eficácia pela Espectroscopia derivativa. São também mostrados

primentos de onda, apenas um dos fármacos absorve. Isto nos

os espectros individuais de 1ª e 2ª derivadas do AS e AAS nas

fornece informações com seletividade e especificidade, possibi-

figuras 8,9 e 11,12, respectivamente.

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Observa-se nas figuras 7 e 10 que, em certos comprimentos

cias (overlapping). Os espectrofotômetros que realizam varredura

de onda (λ), ocorre a anulação do espectro de um componen-

de espectro apresentam no software opções para obtenção da

te enquanto há absorção do outro. Deste modo, obtendo-se os

primeira até a quarta ou mais derivadas (SANTORO, 2005).

valores das amplitudes nos pontos de anulação (zero crossing),

O espectro de UV-vis da solução amostra, Aspirina compri-

é possível construir-se curvas de calibração, além de se eliminar

midos efervescentes, vencida a cerca de 1 ano, foi obtido nas

eletronicamente os erros sistemáticos provenientes de interferên-

mesmas condições dos padrões de AS e AAS e é mostrado na

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figura 13. Pode-se observar neste espectro semelhanças com

seja, neste espectro observa-se picos referentes ao AAS, mas

o espectro da mistura dos padrões de AS e AAS (Figura 6), ou

também revela a presença de picos referentes ao AS.

CONCLUSÃO

REFERÊNCIAS

Os resultados obtidos mostram que o método de análise

ALLINGER, N. L.; CAVA, M. P.; JONGH, D. G.; LEBEL, N. A.; STEVENS. Química Orgânic., Guanabara Dois, Rio de Janeiro, 2 ed., 961p, 1978.

por Espectroscopia no UV-vis (ordem zero) não é adequado para diferenciar AS e AAS, pois ocorre sobreposição das bandas de absorção nos mesmos comprimentos de onda, tornando este método não seletivo para as duas substancias. Já com a Espectroscopia derivativa é possível determinar a impureza AS, no AAS, pois quando se aplicam a 1ª e 2ª derivadas no espectro de ordem zero ocorre diferenciação dos espectros de AS e AAS tornando possível a determinação simultânea das duas substâncias na mesma análise. A metodologia proposta neste trabalho configura-se, assim, em alternativa extremamente vantajosa e viável para a solução de problemas espectrais de sobreposição de mais de um componente. A grande vantagem da utilização da Espectroscopia de derivadas está relacionada com a possibilidade de se minimizar os problemas com interferentes, sem complicados procedimentos de separação ou extração prévios, bem como não necessitar de padrões ultrapuros exigidos na CLAE, além da grande possibilidade da validação do método no doseamento simultâneo, aliada ao baixo preço. No entanto, para que os resultados obtidos neste trabalho possam ter aplicação quantitativa é necessário que seja feita a validação do método analítico. Assim, ficou demonstrado que o medicamento fora do prazo de validade possui alterações na sua composição, apresentando produtos de degradação, o que justifica a sua inutilização.

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E para não haver riscos no seu descarte, como por exemplo ser tomado por catadores caso não seja devidamente segregado, o correto seria a devolução para o fabricante, através da coleta por postos de saúdes ou estabelecimentos particulares.

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Farmacêuticos da Farmácia Universitária do Centro Universitário Newton Paiva. 2 Docentes do curso de Farmácia do Centro Universitário Newton Paiva. 1

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PADRONIZAÇÃO DOS DESENHOS UTILIZADOS NOS PROCESSOS DE BLISTAGEM

1

Thais Reis Amaral1 Linna Beathrice Oliveira Rodrigues1 Gisele Assis Castro Goulart2

RESUMO: a crescente competitividade do mercado, as alterações frequentes no custo de matérias-primas e materiais de embalagem, a imposição de restrições ambientais e as exigências da legislação exigem respostas rápidas das indústrias, melhor controle de sua produção e desenvolvimento de novas estratégias voltadas à otimização operacional dos processos industriais. Assim, o presente estudo aborda a otimização dos processos de embalagem primária e secundária em uma indústria farmacêutica por meio da padronização dos desenhos utilizados nos processos de blistagem. PALAVRAS-CHAVE: Indústria farmacêutica; Embalagem; Blister; Auto Cad®

INTRODUÇÃO

proteção, identificação/informação, acondicionamento, praticida-

A indústria farmacêutica brasileira vem passando por grandes

de e aceitabilidade para um produto durante seu armazenamento,

transformações desde a abertura do mercado no início da década

transporte, exposição, utilização ou administração; podendo ser

de 90. Investimentos foram feitos em novas unidades fabris, e com

primária ou secundária (AULTON, 2008; BRASIL, 2010).

o advento da lei de patentes, novos medicamentos foram introduzidos no mercado interno brasileiro (BARROS, 2005).

A embalagem primária consiste nos dispositivos de acondicionamento que formam a parte que contém diretamente o

Adicionalmente à crescente competitividade do mercado,

produto, tem como função conter e restringir qualquer risco

as alterações frequentes no custo de matérias-primas e ma-

químico, biológico, climático ou mecânico que possa causar

teriais de embalagem, a imposição de restrições ambientais,

ou conduzir à deterioração do produto. A embalagem contínua

e as exigências da legislação exigem respostas rápidas das

à embalagem primária é conhecida de embalagem secundá-

indústrias, melhor controle de sua produção e desenvolvimen-

ria, e proporciona proteção física adicional necessária para as-

to de novas estratégias voltadas à otimização operacional dos

segurar o armazenamento e o fornecimento de produtos com

processos industriais (LACERDA; ARAÚJO; MEDEIROS, 2004).

qualidade, permitindo que quantidades a granel possam ser

Há uma década a embalagem de produtos era geralmente

fracionadas em unidades individuais (AULTON, 2008).

considerada como a última prioridade para muitas empresas

Enquanto processo, a embalagem compreende todas

farmacêuticas, entretanto o papel da embalagem na vida de

as operações, incluindo o envase e a rotulagem pelas quais

uma preparação farmacêutica sofreu mudança. O elemento

o produto a granel, qualquer produto que tenha sofrido todas

marketing, através do qual os fornecedores podem diferenciar

as etapas de produção sem incluir o processo de embala-

seus produtos daqueles comercializados por seus competido-

gem, deve passar, a fim de tornar-se um produto terminado

res alia-se no novo conceito empregado para embalagem far-

(AULTON, 2008; BRASIL, 2010).

macêutica, representado pela tríade: segurança, conveniência e comodidade (RODRIGUES; FERRAZ, 2007).

Neste contexto, o papel da embalagem e da operação de acondicionamento, além de poder ser um atrativo do produto, é

Assim, a indústria de embalagem destaca-se como um

propiciar vida útil a todos os produtos farmacêuticos, pois entre

dos setores mais importantes do mundo. Muitas das exigências

o produtor e o consumidor existe um intervalo (espaço e tempo)

determinadas pelo mercado consumidor têm sido atendidas

durante o qual vários fatores podem proporcionar alterações in-

por alteração no conceito de embalagem, pois este segmento

desejáveis no produto. Assim, a embalagem adequada deve ser

representa um mercado global de US$ 500 bilhões, compreen-

econômica, uma vez que participa da rentabilidade do produto;

dendo cerca de 100.000 empresas e uma geração de 5 milhões

deve conceder apresentação aceitável, atrativa e prática de for-

de empregos (LAURENTIS, 2008).

ma que contribua ou eleve a aceitação e confiança no produto; e

A embalagem, enquanto material de acondicionamento, pode

deve principalmente conceder proteção contra possíveis riscos à

ser definida como um meio econônico de prover apresentação,

formulação (AULTON, 2008). É importante ressaltar que os pro-

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 299


dutos farmacêuticos exigem cuidados com embalagem diferen-

outros (AULTON, 2008).

tes de outros produtos, uma vez que qualquer falha pode resultar

Certamente existem outros aspectos importantes relacio-

em alterações significativas em suas propriedades originais, pro-

nados à função da embalagem farmacêutica. É sabido que os

vocando ineficácia no processo terapêutico, riscos à saúde ou até

produtos que mais causam intoxicação em crianças são os

mesmo a morte de um indivíduo (LAURENTIS, 2008).

medicamentos, seguido dos produtos domissanitários e das

Portanto, a proteção é o fator mais crítico na alteração da

plantas. Por este motivo as embalagens mais modernas têm

vida útil de um produto, uma vez que estão continuamente ex-

que ser seguras para ambientes com presença de crianças

postos a fatores mecânicos, climáticos ou ambiental, biológi-

(child resistant), assim como devem evidenciar a sua condição

cos e, químicos. Danos físicos ou mecânicos ocorrem devido

de inviolabilidade para o consumo (tamper resistant), além de

ao choque ou impacto, compressão com esmagamento de car-

atender aspectos regulatórios específicos (LAURENTIS, 2008).

tucho, vibrações durante o transporte, furos ou perfurações por objetos pontiagudos, dentre outros. Já os riscos climáticos ou

BLÍSTER

ambientais são decorrentes, por exemplo, de condições duran-

No início do século XIX os remédios eram armazenados em

te o armazenamento (umidade ou temperatura), exposição sob

vidros, aglomerados em algodão. Em 1963, a Interpack Hassia

lâmpadas de alta potência na vitrine de uma loja, contato do

lançou o primeiro produto em blíster para a pílula anticoncepcio-

produto com gases atmosféricos, contaminação por sólidos do

nal da Schering, a palavra blíster tem origem do inglês e significa

ar carreados pela atmosfera. Por outro lado, danos biológicos

bolha, sendo formado por uma cartela base (cartão, alumínio

abragem lacre ineficaz ao egresso de microrganismos, risco

ou plástico) onde o produto fica dentro de uma bolha (GARCIA,

de fraude e de adulterações decorrente do uso de embalagem

2001). Nos Estados Unidos, a utilização do blíster como forma

sem fechos de segurança. E, por último, riscos químicos são

de embalagem farmacêutica manteve um crescimento constan-

aqueles causados pela interação do produto com o material

te desde seu início, acompanhando o avanço da indústria farma-

de embalagem, tais trocas podem ser identificadas através de

cêutica. Em nossos mercados, o blíster (FIG. 1) ocupa o maior

alterações organolépticas, elevação da toxidade/irritabilidade,

segmento, seguido por frascos de plástico soprado, ampolas,

degradação, perda ou ganho de eficiência microbiana, entre

frascos e vidro (BERASAY, 2005; NASCIMENTO, 2006).

Assim, o sistema de blistagem de remédio é considerado o melhor processo de embalagem individual de comprimidos, já

mundo: 85% das formas sólidas na Europa são acondicionadas em blíster (RODRIGUES; FERRAZ, 2007).

que há máquinas automatizadas que asseguram a perfeita ade-

Outras vantagens do uso do blíster são: boa aparência,

quação de comprimidos e drágeas nas bolhas formadas sem a

facilidade de transporte (quando comparado a outros tipos de

intervenção humana direta (NASCIMENTO, 2006).

embalagem), confecção de cartelas associadas a calendário,

Adicionalmente à capacidade de oferecer aos pacientes

elevada hermeticidade e, possibilidade de impressão das in-

doses individualizadas, permitindo que eles assegurem que te-

formações (validade, lote e posologia, etc) diretamente na face

nham tomado o medicamento prescrito e que o restante das

metálica do blíster. Como vantagem no âmbito econômico, ob-

doses permaneçam na embalagem original e completamente

serva-se baixos volumes de estoque, facilidade para o paciente,

protegidos contra reações adversas externas, o blíster também

baixo índice de contaminação microbiológica, e diminuição dos

propicia a facilidade de manuseio e identificação de violação,

custos em transporte (NASCIMENTO, 2006).

tornando o seu emprego para formas farmacêuticas em todo o

Em princípio qualquer medicamento poderia ser apresenta-

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do como blíster. Porém, no mercado farmacêutico brasileiro são

Na blistadeira (FIG. 2), a bolha é moldada por processos

encontrados blíster com sólidos, especialmente comprimidos,

térmicos ou a frio. O processo de formação de bolhas dá-se

drágeas e cápsulas duras, ou moles (NICOLOSI, 2008).

por intermédio de um jato de ar, o qual é injetado na ferramenta superior. Instantes após dá-se um resfriamento através de circu-

PROCESSO DE BLISTAGEM

lação de água, evitando a deformação da bolha (RODRIGUES;

Todo o processo produtivo de um blíster é realizado num

FERRAZ, 2007).

complexo de máquinas automatizadas especiais, onde toda in-

A alimentação das bolhas formadas pode ser manual, pro-

tervenção humana é feita somente por meio de computadores,

cesso no qual o operador espalha o produto sobre as deforma-

evitando qualquer tipo de contaminação através do tato e do ar.

ções; automática, sendo realizada por meio de um prato vibra-

As máquinas e equipamentos são a base de todo o processo

tório ou escovas rotativas; ou semi-automática, onde o operador

produtivo, responsáveis pela qualidade técnica e pela capacita-

espalha o produto sobre um disco rotativo que executa um movi-

ção das indústrias farmacêuticas (NICOLOSI, 2008).

mento de rotação alimetando o blíster (FABRIMA, 2005).

O sistema de selagem é realizado depois que todo o medica-

MATERIAIS UTILIZADOS NOS PROCESSOS DE BLISTAGEM

mento estiver devidamente acomodado nas bolhas previamente

Encontram-se disponíveis no mercado diferentes tipos de

moldadas. Assim, o PVC e a folha de alumínio, já impressa com

materiais, que permitem acondicionar e proteger produtos diver-

os dados do produto, se posicionam sobre a estação de sela-

sos (NICOLOSI, 2008). Assim, é recomendável avaliar o tipo de

gem, formada por duas placas recartilhadas, sendo uma delas

resistência que o blíster deverá ter levando-se em conta as pon-

aquecidas, que se unem para codificar o blíster e selá-lo. Durante

derações referentes às espessuras e cor dos materiais a serem

este processo observa-se a bobina de filme de selagem, instala-

utilizados (GARCIA, 2001).

da geralmente, acima e à direita da estação de selagem tendo

Adicionalmente, deve-se também avaliar a transmissão dos

seu filme esticado através dos roletes de passagem. O filme de

gases, vapores, ou líquidos através de materiais de embalagem.

selagem passa juntamente com o filme de PVC formado entre as

A permeabilidade do vapor de água ou do oxigênio através do

placas planas, que são aquecidas para garantir uma selagem es-

material de embalagem pode constituir um problema se a forma

tanque e plana. A passagem do filme entre as estações ocorre

farmacêutica for sensível à hidrólise ou oxidação, comprometen-

através das pinças acionadas pneumaticamente e instaladas so-

do o prazo de validade do fármaco. A temperatura e umidade

bre um carrinho, que tem movimento retilíneo, executado através

são fatores importantes que influenciam a permeabilidade da

de polias acionadas pelo servomotor (FABRIMA, 2005).

embalagem ao oxigênio e a água. Um aumento da temperatura,

O corte é a etapa final da produção do blíster, onde um estampo de corte especial, a faca, é responsável por cortar o blís-

por exemplo, traduz-se em um aumento da permeabilidade dos gases (RODRIGUES; FERRAZ, 2007).

ter na dimensão projetada. Neste processo a parte superior se

Há disponível dois tipos básicos de embalagem em blíster

mantém fixa, e a inferior se desloca exercendo uma pressão na

para produtos farmacêuticos: em uma das variedades a cavida-

superior, executando-se o corte (FABRIMA, 2005).

de é construída em plástico termomoldável e o verso é formado

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 301


por um plástico ou uma combinação de plástico, papel e/ou alu-

abilidade do PVC ao oxigênio e à umidade. O revestimento é

mínio; em outra há alumínio em ambos os lados e sua cavidade

aplicado em um dos lados, que geralmente fica em contato com

é formada por alongamento a frio (PILCHIK, 2000).

o produto, e o outro lado constituirá o material de verso (NASCI-

O espectro dos materiais termomoldáveis disponíveis para

MENTO, 2006; NICOLOSI, 2008; RODRIGUES; FERRAZ, 2007).

uso é variado e responde às necessidades individuais das dife-

O Aclar-PCTFE é considerado excelente como barreira à

rentes formulações, dos princípios ativos e das apresentações a

umidade e gases, gerando um nível elevado de proteção con-

serem embaladas. Dentro desta gama de materiais, foram de-

tra o impacto. Suas embalagens possuem tamanho reduzido,

senvolvidos materiais com barreiras média e alta contra umida-

facilitando a logística de armazenamento e transporte. O ma-

de e os gases e, também, como proteção antiactínica contra os

terial permite inspeção e verificação dos conteúdos do pacote

efeitos da luz. As películas disponíveis no mercado vão desde

a qualquer hora, facilitando o controle em processo, já que a

as diferentes combinações de cloreto de poli-vinila (PVC) com

ausência de um comprimido pode ser identificada em um blíster

cloreto de poli-vinilideno (PVdC), para alcançar um resultado de

transparente. Porém, apresenta alto custo (NASCIMENTO, 2006;

barreira média, até os laminados de PVC com Aclar, para barrei-

NICOLOSI, 2008; RODRIGUES; FERRAZ, 2007).

ras altas (BERASAY, 2005).

Por último, o ALU-ALU é aplicado a fármacos especialmente

É importante ressaltar que os útimos anos têm mostrado uma

sensíveis à umidade, gases (principalmente o oxigênio) e luz, já

expanção significativa no uso de plásticos, tornando-se o mate-

que é o único material que oferece 100% de barreira à umidade,

rial de acondicionamento principal. Os plásticos empregados na

oxigênio e à luz. É constituído por duas folhas de alumínio, ou

atualidade encontram-se principalmente relacionados com as

seja, o filme de PVC é substituído por uma folha de alumínio

resinas termoplásticas. Os polímeros apresentam características

com uma liga especial constituída por nylon e PVC para me-

variadas, relativas ao tipo de material de constituição, ao seu grau

lhor selagem com o alumínio superior. Possui alta estabilidade

de qualidade, ao processo de fabricação e acabamento, e à di-

mecânica e dimensional, e excelente propriedade de barreira.

versidade de formatos e de propriedade físicas e químicas, todas

Para medicamentos que são embalados nesta estrutura é dis-

elas baseadas em critérios econômicos (AULTON, 2008).

pensável o sistema de aquecimento para formar a bolha, ou

Os quatro principais componentes da embalagem em blíster

seja, a formação ocorre em função de um dispositivo mecânico

termoformado são: o filme termoformável - que representa 80% a

que forma as cavidades (NASCIMENTO, 2006; NICOLOSI, 2008;

85% do blíster; o material do verso – que representa 15% a 20% do

RODRIGUES; FERRAZ, 2007).

peso total da embalagem; o revestimento para selagem a quente

Em busca da proteção do produto, a utilização do alumínio

e a tinta para impressão. O filme termomoldável corresponde ao

como material de fechamento de blíster é a melhor opção, já

componente da embalagem que recebe o produto em cavidades

que a transmissão da umidade, do oxigênio ou da luz ao longo

projetadas em baixo relevo (RODRIGUES; FERRAZ, 2007).

do tempo é mínima (BERASAY, 2005). Os alumínios utilizados

O primeiro e mais conhecido do público consumidor é o

devem ser isentos de microrganismos, possuírem resina termo-

PVC, apresenta alta resistência à dobra, boa resistência química

colante bem distribuída e serem especiais para selar com os

e baixa permeabilidade a óleos, gorduras e substâncias aromá-

tipos de materiais (NASCIMENTO, 2006; NICOLOSI, 2008; RO-

ticas. É o filme mais utilizado em blistagens farmacêuticas por ter

DRIGUES; FERRAZ, 2007).

custo reduzido e apresentar facilidade de formação e selagem, além de ser transparente. Porém, o PVC apresenta barreira limi-

PROCESSO DE BLISTAGEM

tada e baixa resistência ao impacto, características estas que

Todo o processo produtivo de um blíster é realizado num

devem ser ligadas à variação e espessura da parede da cavida-

complexo de máquinas automatizadas especiais, onde toda in-

de, à integridade da selagem e à formulação do produto. O uso

tervenção humana é feita somente por meio de computadores,

do PVC tem atraído muitas críticas devido à liberação de toxinas

evitando qualquer tipo de contaminação através do tato e do ar.

durante sua combustão (emissão de hidrocloretos e dioxinas al-

As máquinas e equipamentos são a base de todo o processo

tamente tóxicas) (NASCIMENTO, 2006; RODRIGUES; FERRAZ,

produtivo, responsáveis pela qualidade técnica e pela capacita-

2007; NICOLOSI, 2008).

ção das indústrias farmacêuticas (NICOLOSI, 2008).

Outro filme utilizado é o PVdC, que possui maior eficiência

Desta forma, são muitas as variáveis e os fatores que con-

como barreira à umidade e gases. Este material desempenha

tribuem para uma boa eficiência da máquina. Não há uma espe-

papel crítico nas embalagens em blíster com laminação ou re-

cificação sobre o tipo de equipamento que pode ou não ser uti-

vestimento sobre o PVC, reduzindo de 5 a 10 vezes a perme-

lizado na fabricação de embalagens, o importante é que sejam

302 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785


fabricados com estruturas especiais, que permitem fácil limpeza

gem permite a otimização dos processos de embalagem primá-

e completa sanitização, garantindo produtos idênticos lote a lote

ria e secundária, minimizando períodos não produtivos, e conse-

em forma, peso e qualidade (NICOLOSI, 2008).

quentemente elevando a produtividade, além de permitir que se

Então, para cada equipamento específico é importante ava-

trabalhe com estoques reduzidos, atendendo às novas deman-

liar o que a produção exigirá, dimensionando as máquinas para

das do mercado de medicamentos. Assim, o objetivo deste tra-

as necessidades de cada produção. Deve-se também observar

balho foi a padronização dos desenhos utilizados nos processos

fatores como segurança, rapidez de setup, flexibilidade, redu-

de blistagem em uma Indústria Farmacêutica em Belo Horizonte.

ção de rejeitos e interfaces amigáveis (GARCIA, 2001).

Para isso foram avaliadas todas as apresentações e ferramen-

Adicionalmente, os equipamentos precisam estar em bom

tas do processo de blistagem; uniformizadas as apresentações

estado de conservação, com manutenções preventivas execu-

e ferramentas viáveis; construídas ferramentas no Auto Cad® e

tadas em seu devido tempo. E, os operadores devem receber

implantadas as ferramentas padronizadas.

treinamentos em BPF e seguir todos os procedimentos padronizados (NICOLOSI, 2008; BRASIL, 2010).

MATERIAIS

No processo de blistagem é essencial que sejam selecionados bons materiais, bem como mão-de-obra qualificada. As

Auto Cad® (AUTODESK, 2010); blistadeira e suas ferramentas (Blisterflex®, FABRIMA, 2005, TAG – EQSO - 023).

máquinas e equipamentos são as bases de todo o processo produtivo, portanto devem ser modernas e validáveis; e passar por manutenção preventiva periódica (NICOLOSI, 2008). Outro ponto importante é a minimização do tempo gasto

MÉTODOS LEVANTAMENTO DAS FORMAS FARMACÊUTICAS FABRICADAS PELA INDÚSTRIA

em setup. Tal redução é importante por três razões: quando o

Foi realizado um levantamento de todas as formas farma-

custo de setup é elevado os lotes de fabricação tendem a ser

cêuticas fabricadas pela indústria em suas distintas apresenta-

grandes, maximizando o investimento em estoques; as técnicas

ções. Após a coleta destes dados foram avaliadas quais as mais

mais rápidas e simples de trocas de ferramentas diminuem as

comercializadas, que foram alvo deste trabalho.

possibilidades de erros nas regulagens dos equipamentos; e a

Com a distinção das apresentações com maior volume de

redução do tempo de setup resultará em aumento do tempo de

produção, nas quais também são necessárias várias cartelas para

operação do equipamento. Assim, é relevante a racionalização

completar o cartucho, foram observadas as ferramentas utilizadas

de cada ação das operações de setup por meio de eliminação

para o processo de blistagem. Através da avaliação das condições

de ajustes e operações, eliminando o processo de tentativa e

de todo o ferramental utilizado no processo (ferramental de forma-

erro, e utilizando regulagens, revisões periódicas, calibragem

ção de bolha superior e inferior, ferramental de selagem superior e

dos dispositivos de controle, manutenção preventiva do equi-

inferior, e ferramental de corte), foram excluídas as apresentações

pamento; além de treinamento e qualificação dos operadores

nas quais o ferramental estava completo e em condições excelen-

(FOGLIATTO; FAGUNDES, 2003).

tes de uso, já que o ferramental possui um custo elevado, não jus-

A disposição de recursos da produção em uma instalação

tificando sua substituição no presente momento.

(layout) também afeta diretamente os custos de produção e a produtividade. A disposição considera as dimensões dos recur-

4.2 UNIFORMIZAÇÃO DAS APRESENTAÇÕES E FERRAMENTAS

sos e as dimensões necessárias para operação, manutenção,

Com o ferramental das apresentações de estudo em mãos

abastecimento de produtos a processar e escoamento de pro-

foram elaboradas novas possibilidades de layout para o blíster

duros processados. Deve-se observar o fluxo de produção de

com maior número de comprimidos ou cápsulas por cartela. Du-

modo a evitar a formação de gargalos devido a arranjos que

rante o desenvolvimento dos novos layouts buscou-se a padro-

bloqueiem ou dificultem o fluxo dos produtos. Por meio da otimi-

nização do dimensional do blíster, com a finalidade de uniformi-

zação do layout de uma instalação é possível minimizar o tempo

zar o ferramental de corte utilizado no processo.

total de produção, melhorar o aproveitamento do espaço físico, reduzir o custo de materiais de limpeza, melhorar a segurança e o conforto dos colaboradores, e otimizar o processo de manufatura (TOMELIN; COLMENERO, 2010).

4.3 CONSTRUAÇÃO DAS FERRAMENTAS NO AUTO CAD® Com o auxílio dos colaboradores do setor de manutenção foram avaliados os novos layouts sugeridos e, em seguida,

A importância deste trabalho se justifica pelo fato de que a

pelo método de tentativa e erro, foram construídas as apresen-

padronização dos desenhos utilizados nos processos de blista-

tações mais adequadas na ferramenta Auto Cad®, respeitando

PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 303


os padrões necessários para construção de um blíster possível

com o ferramental incompleto ou em condições de uso que

de ser selado perfeitamente.

comprometam a qualidade do processo.

4.4 IMPLANTAÇÃO DAS FERRAMENTAS PADRONIZADAS

mãos, e disposição das bolhas nas cartelas atualmente utili-

Com o ferramental das apresentações de estudo em Para a implantação das ferramentas padronizadas foi ava-

zadas, foram elaboradas novas possibilidades de layout para

liado o retalho do blíster no layout proposto com a finalidade de

os blísteres com maior número de comprimidos ou cápsulas

contabilizar o material descartado e, posteriormente, seu custo

por cartela. Para o desenvolvimento deste novo layout ansiou-

final. Para contabilizar os materiais descartados foi calculada a

se por uma cartela com disposição regular das bolhas e parâ-

área do retalho e, em seguida, realizou-se uma comparação da

metros dimensionais exigidos, pelos fabricantes dos equipa-

área em questão com a área de retalho descartada pelo ferra-

mentos, que possibilitem uma perfeita selagem. Além disso,

mental, e a apresentação, utilizados até o momento.

foi relevante a padronização do dimensional do blíster a fim de

RESULTADOS E DISCUSSÃO APRESENTAÇÕES E FERRAMENTAS UNIFORMIZADAS Dentre as apresentações produzidas pela indústria foram selecionadas aquelas com maior demanda de produção, com cartuchos contendo mais de um blíster; e também aquelas

uniformizar o ferramental de corte utilizado no processo, reduzindo setups internos, perdas de material, tempo de máquina e tempo de operadores. As FIG 3 a 9 ilustram os desenhos das apresentações em estudo utilizadas no processo de blistagem.

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Como pode ser observado nas FIG 3 a 9, para produção de

ram elaboradas novas possibilidades de layout para o blíster

um cartucho completo são necessários a inclusão de mais de

com maior número de comprimidos ou cápsulas por cartela.

uma cartela do blíster para as apresentações em questão.

Para o desenvolvimento deste novo layout ansiou-se por uma

Portanto, a partir do proposto sugeriu-se reduzir o número

cartela com disposição regular das bolhas e parâmetros dimen-

de blíster por caixa de medicamento para otimizar o processo

sionais necessários. Além disso, foi relevante a padronização

de embalagem nas encartuxadeiras, uma vez que ao invés de

no dimensional do blíster, a fim de uniformizar o ferramental de

colocar duas cartelas ou mais no cartucho, o operador ou equi-

corte utilizado no processo, reduzindo setups internos, perdas

pamento colocaria apenas uma. E, concomitantemente, através

de material, tempo de máquina e tempo de operadores, e con-

da uniformidade das apresentações, ocorrerá redução no tempo

sequentemente otimizando o processo final.

necessário para substituição de ferramental e para regulagem do equipamento durante a troca na produção dos lotes.

As FIG. 10 a 16 ilustram os novos layouts propostos para as apresentações em estudo. Nelas pode-se observar que as cartelas apresentam maior número de bolhas e possuem dimensões pa-

5.2 FERRAMANTAS ELABORADAS NO AUTO CAD

®

dronizadas (115 x 70). Desta forma, é possível reduzir o número de

Com o auxílio de um colaborador da manutenção o melhor

cartelas por cartuchos, otimizando o processo de encartuchamento

desing para as cartelas foi elaborado no programa para dese-

na indústria. Adicionalmente, através da padronização do dimen-

nhos Auto Cad® através do método de tentativa e erro, uma vez

sional do blíster, houve uniformidade do ferramental de corte que

que alguns layouts sugeridos não estavam compatíveis com as

será utilizado durante o processo de blistagem, desta forma setups

distâncias que devem ser preservadas para se obter uma perfei-

internos serão facilitados e reduzidos durante a troca de produção

ta selagem no processo de blistagem.

de lotes, gerando ganho de tempo de operação da máquina. A

Com o ferramental das apresentações de estudo em mãos,

substituição dos demais ferramentais utilizados anteriormente para

e disposição das bolhas nas cartelas atualmente utilizadas, fo-

blistagem das apresentações em estudo não será um obstáculo

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para implantação dos novos layouts, uma vez que estes estavam

a substituição por ferramentais novos é uma necessidade, não ge-

desgastadas, decorrente de uso por tempo prolongado. Portanto,

rando gastos adicionais.

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IMPLANTAÇÃO DAS FERRAMENTAS PADRONIZADAS

por uma faca de 2 cortes, a sobra de material de embalagem

Após padronização das apresentações é relevante

será maior. Portanto, foi proposto avaliar a sobra de material

avaliar o custo do corte proposto para implantar as ferramentas

através do cálculo matemático de área., conforme ilustrado nas

padronizadas, uma vez que, ao substituir uma faca de 3 cortes

FIG 17 a 19.

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Por meio dos cálculos apresentados acima, pode-se

concluir que o gasto de retalho com o novo ferrametal de corte será de 519,6 mm2 superior ao corte do ferramental utilizado.

Porém, uma vez que nos setups de equipamentos os

gastos com material devido ao ajuste de máquina é relativamente alto, e a área de retalho (519,8 mm2) é muito pequena quando comparado à área total de uma bobina (4,1x 107 mm2), os gastos extras são insignificantes. Portanto, o desperdício do retalho do corte do ferramental proposto não é um obstáculo para a implantação dos novos desenhos padronizados.

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6. CONCLUSÃO Ao acompanhar o fluxo de materiais e matérias-primas no setor de embalagem pôde-se observa que a troca rápida de ferramentas pode ser uma alternativa para redução do tempo de preparação dos equipamentos. Assim, por meio de redução do tempo gasto em setup é possível diminuir o custo unitário de um produto, uma vez que ao minimizar períodos não produtivos do

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chão de fábrica obtém-se a otimização de um processo. Portanto, diante dos resultados apresentados pode-se concluir que a proposta da padronização dos desenhos utilizados no processo de blistagem é viável, promovendo uma otimização do processo através da utilização de um novo layout compatível com as exigências do processo, o qual não irá gerar gastos adicionais, e as perdas adicionais de material de embalagem são insignificantes frente ao ganho final. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Guias Relacionados à Garantia de Qualidade. Gerência Geral de Inspeção e Controle de Medicamentos e Produtos – GGIMP. Brasília, 2006.

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PESQUISA DE CONTAMINANTES NOS EFLUENTES DA LAGOA DA PAMPULHA:

análise comparativa entre os anos de 2007 e 2011 Amanda Ferreira da Silva1 Daniela Gonçalves Araújo1 Izabella Branco Santos de Morais1 Izabella Cristina da Silva1 Márcia Santos Hoffman1 Marcus Vinicius Vitoriano e Silva1 Adriana Nascimento de Sousa2

RESUMO: Belo Horizonte (BH) tem como uma de suas principais atrações turísticas, a Lagoa da Pampulha. Apesar de ser um patrimônio importante para a cidade, a lagoa vem sofrendo degradações ambientais devido ao aporte de esgotos domésticos e industriais que ali deságuam. A Prefeitura de BH realizou intervenções, com o propósito de recuperação e melhoria ambiental nesta região. Para constatar se estas ações foram eficazes, usou-se o índice de qualidade da água - IQA, para avaliar a qualidade da água nos períodos de 2007 e 2011. Os testes realizados foram: fosfato total, oxigênio dissolvido, pH, sólidos totais dissolvidos, turbidez e nitrogênio. Os resultados obtidos mostram que as ações da Prefeitura ainda não são totalmente eficazes, visto que parâmetros como fosfato total e oxigênio dissolvido estão piores que os do ano 2007. PALAVRAS-CHAVE: Contaminação da Lagoa da Pampulha, Qualidade da água, IQA.

INTRODUÇÃO

do em 1943. A orla da Lagoa da Pampulha concentra várias op-

A lagoa artificial da Pampulha foi construída no inicio de

ções de lazer, como o ginásio do Mineirinho, o Jardim Botânico, o

1938, quando o prefeito era Juscelino Kubitscheck (JK). A bacia

Jardim Zoológico, o Centro de Preparação Eqüestre da Lagoa e

da Pampulha compõe a Bacia do Rio das Velhas, que por sua

pistas para ciclismo e caminhada. É onde está também o Estádio

vez integra a Bacia do Rio São Francisco. A área da lagoa é

Governador Magalhães Pinto, o Mineirão (RUBENS, 2009).

de 97,91 km², dividida entre os municípios de Belo Horizonte e

Esse valioso patrimônio, no entanto, há décadas necessita de

Contagem. Ha 40 córregos que deságuam na lagoa dos quais

ações preservativas, devido à degradação ambiental sofrida pela

19 estão em Belo Horizonte e 21 em Contagem. O volume atual

lagoa. O mau cheiro e a sujeira, percebidos pelos visitantes, são

de água no lago é 10 milhões de m³ (RUBENS, 2009).

resultados de muitos anos de aporte de esgotos domésticos e in-

A Bacia da Pampulha é composta de 8 afluentes: os córregos Mergulhão, Tijuco, Ressaca, Sarandi, Água Funda, Braúna,

dustriais, resíduos sólidos e sedimentos carreados pelos córregos que compõem a rede fluviográfica da bacia (COUTINHO, 2004).

Olhos D’água e AABB. Os córregos Sarandi, Ressaca e Água

O esgoto doméstico contém substâncias que alimentam

Funda são os de maior importância, pois são responsáveis pelo

as algas e as bactérias presentes na água, principais responsá-

aporte de 75% do abastecimento da Lagoa (PREFEITURA DE

veis pelo processo de eutrofização (aumento excessivo de mi-

BELO HORIZONTE).

croorganismos que causam a diminuição do oxigênio da água).

Na época de sua construção, para compor o entorno, o

Os dejetos industriais contêm metais pesados, como zinco,

arquiteto Oscar Niemeyer projetou, a pedido de JK, um con-

cádmio e chumbo, nocivos à saúde humana (RUBENS, 2009).

junto arquitetônico que se tornou referência para a arquitetura

Dada a complexidade da atual situação ambiental da Bacia

moderna brasileira. Fazem parte do conjunto arquitetônico da

da Pampulha, a Prefeitura de Belo Horizonte tem realizado diver-

Pampulha a Igreja São Francisco de Assis, o Museu de Arte, a

sas ações para abrandar essa situação: dragagem parcial, retirada

Casa do Baile e o Iate Tênis Clube. Os jardins de Burle Marx e

de aguapés, educação ambiental, controle de vetores, monitora-

a pintura de Candido Portinari na Igreja de São Francisco com-

mento da qualidade das águas, pavimentação da ciclovia, cria-

pletam o projeto concebido para a lagoa (RUBENS, 2009).

ção de 11 rotatórias para melhorar o trânsito local, dentre outras.

O conjunto arquitetônico e urbanístico original foi inaugura-

Programas e ações como o Programa de Saneamento Ambiental

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(PROSAM), já concluído, e o Programa Pampulha (PROPAM),

e comparamos as mudanças ocorridas no período de 2007 e 2011.

em implantação com o apoio do Consórcio de Recuperação

Para isto, utilizamos o Índice de Qualidade da Água (IQA), sendo

da Bacia da Pampulha, evidenciam que o poder público, seja

analisados os seguintes parâmetros: fosfato total, oxigênio dissol-

na esfera estadual ou municipal, tem enviado esforços para

vido, pH, sólidos totais dissolvidos, turbidez e nitrogênio (amônia).

minimizar os problemas da Bacia. Esses programas propõem ações como despoluição, tratamento de fundos de vales de

OBJETIVOS

córregos afluentes, instalação de interceptores e de estação de

Realizar os testes requeridos para avaliar o Índice de Qua-

tratamento de esgotos. (PREFEITURA DE BELO HORIZONTE).

lidade da Água, da Lagoa da Pampulha, utilizando como parâ-

Em 1998 foram realizadas cinco operações de limpeza na

metros analíticos os testes de: fosfato total, oxigênio dissolvido,

Lagoa da Pampulha, aproveitando o rebaixamento do nível das

pH, sólidos totais dissolvidos, turbidez e nitrogênio (amônia).

águas para obras de recuperação no sistema de vazão e no

Comparar os resultados obtidos, em 2011, com os dados

corpo da barragem. Entre as mais de 200 toneladas de lixo

obtidos no ano de 2007, os quais também foram obtidos por

retiradas do local, foram encontrados objetos como pneus ve-

alunos do 7º período do curso de Farmácia do Centro Univer-

lhos, garrafas, animais mortos (vacas, cavalos e cachorros),

sitário Newton Paiva.

sofás, colchões e armários, carcaça de veículos e ainda dois revólveres. Atualmente, o processo de limpeza continua sendo realizado pela Gutierrez, em parceria com a Regional Pampulha (BELO HORIZONTE, PREFEITURA).

DESENVOLVIMENTO Procurou-se manter as mesmas condições do estudo realizado pelos alunos do 7º período do curso de Farmácia, do Centro

De acordo com a Secretaria Municipal de Meio Ambiente,

Universitário Newton Paiva, no ano de 2007, para que a compa-

o problema do esgoto industrial já está sendo resolvido, uma

ração desejada neste trabalho pudesse ser realizada. Os méto-

vez que todo o esgoto que sai das empresas de Contagem já

dos utilizados para as análises foram os parâmetros do IQA, que

cai na rede da Copasa (Companhia de Saneamento de Minas

avaliam a qualidade da água por meio de testes físico-químicos e

Gerais) ou é tratado antes de atingir os córregos enquanto o

microbiológicos. Os parâmetros do IQA foram analisados segundo

esgoto doméstico que vem das casas de Contagem. Até 2014, a

metodologia analítica descrita por Macedo (2005).

expectativa é de que 90% deste esgoto não caia mais na lagoa. Dessa forma, será possível iniciar o tratamento da água que está

Área de estudo

lá, como o combate às algas, que deixam o espelho d’água ver-

Para identificação de contaminantes na água da Lagoa

de, porém são estimados cinco anos para que a Lagoa da Pam-

da Pampulha foram coletadas amostras da água em oito

pulha consiga atingir um nível de contato direto, possibilitando

pontos, sendo eles: Córrego Água Funda, Córrego Braúnas,

inclusive a prática de natação (apud RUBENS, 2009).

Córrego AABB, Córrego Olhos D’Água, Córrego Sarandi, Cór-

Neste artigo apresentamos os resultados de testes analíticos utilizados para verificar a qualidade da água da Lagoa da Pampulha

rego Tijuca, Córrego Mergulhão e Vertedouro da Pampulha (FIGURA 1).

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As amostras coletas nos oito pontos citados anteriormente foram numeradas de 1 a 8 e o aspecto de cada uma pode ser observado na Figura 2. As amostras foram coletadas em frascos plásticos esterilizados e acondicionados sob refrigeração até o momento da análise.

Segundo, Ayer (2011), Brant (2011) e Zuba (2011) a repre-

Para a realização deste estudo foram analisados seis desses

sa da Pampulha e tributários, das nascentes dos cursos d’água

parâmetros, sendo eles: oxigênio dissolvido, pH, turbidez, sólidos

contribuintes para a represa até o seu barramento pertence, atu-

totais, fosfato total e nitrogênio amoniacal total. Os valores de refe-

almente, à Classe 3. Portanto, conforme o Conselho Nacional do

rência são descritos na resolução nº 357/2005 do CONAMA, para

Meio Ambiente (CONAMA), em sua resolução nº 357 de 17 de

água da classe 3, da qual a Lagoa da Pampulha, atualmente é

março de 2005, a Lagoa da Pampulha pode ser destinada:

pertencente.

a) ao abastecimento para consumo humano, após tratamento convencional ou avançado; b) à irrigação de culturas arbóreas, cerealíferas e forra-

RESULTADOS E DISCUSSÕES Os resultados obtidos foram representados em gráficos para

geiras;

facilitar o entendimento dos mesmos. Os gráficos com os resulta-

c) à pesca amadora;

dos obtidos para fosfato total, amônia, pH, turbidez, sólidos totais

d) à recreação de contato secundário; e

e oxigênio dissolvido no ano de 2011 foram comparados com os

e) à dessedentação de animais.

obtidos em 2007 e são mostrados a seguir. Nos gráficos observase o valor obtido em 2007, o valor obtido em 2011 e os valores de

Parâmetros analisados

referência para cada parâmetro, apresentados na tabela 1.

Os parâmetros que representam as características físico-

No trabalho realizado em 2007 pelos alunos do curso de Far-

químicas e biológicas da água foram estabelecidos pela Natio-

mácia do Centro Universitário Newton Paiva (SOUSA, GOMES,

nal Sanitation Foudantion (NSF) nos Estados Unidos, para o de-

2011), a Lagoa da Pampulha foi classificada como de classe 2.

senvolvimento de um índice que indicasse a qualidade da água

Atualmente, sabe-se que as águas da Pampulha não são de clas-

- Índice de Qualidade da Água (IQA). Com isso oito parâmetros

se 2, e sim de classe 3 (AYER, BRANT, ZUBA, 2011).

foram considerados mais representativos, sendo os testes físico-

Na Tabela 1 pode-se verificar a diferença entre os limites acei-

químicos e microbiológicos de: oxigênio dissolvido, coliformes

táveis para os testes utilizados neste estudo referentes à classe 2

fecais, pH, demanda bioquímica de oxigênio, nitrato, fosfato total,

e classe 3.

temperatura da água, turbidez e sólidos totais (ALMEIDA; FERREIRA, 2005).

TABELA 1- Padrões de qualidade da água para as classes 2 e 3.

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O gráfico que representa os resultados de Fosfato Total (Gráfico 1) permite constatar que apenas os pontos 2 (Córrego Braúnas) e 4 (Córrego AABB) amostrados em 2007, estão de acordo com o limite de aceitação máximo permitido (0,050mg/L P). Percebe-se que em 2011, houve um aumento significativo dos níveis de fosfato, acima do limite máximo de 0,075mg/L P permitido para classe 3, demonstrando redução da qualidade da água de 2007 para 2011.

A análise do Gráfico 2, que avalia o parâmetro Amônia, permite constatar que apenas a água coletada no Córrego Água Funda está limítrofe com o máximo de aceitação, de 2,0 mg/L, enquanto os demais pontos então dentro dos limites. Em 2011, todos os pontos coletados estão de acordo com o limite de aceitação de 5,6 mg/L, além disso, percebe-se uma redução dos níveis de amônia quando comparado com os resultados do ano de 2007.

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Os resultados do parâmetro de Oxigênio Dissolvido apresentados no Gráfico 3, revelam que houve uma diminuição significativa da concentração do oxigênio na água da Lagoa da Pampulha, quando comparamos os valores obtidos em 2011 com os de 2007. Em 2011 todos os pontos estão em desacordo com o limite estabelecido (mínimo 4mg/L O2). Enquanto que em 2007, todos os locais de coleta apresentaram concentrações superiores ao valor mínimo preconizado para classe 2, de 5mg/L O2. Estes resultados revelam uma piora significante na qualidade da água em 2011.

Para o parâmetro pH, as amostras apresentaram-se adequadas tanto no ano de 2007 quanto em 2011 (Gráfico 4), mantendo os valores entre 6,0 e 9,0. No Córrego AABB houve redução do pH, enquanto que no Córrego Mergulhão houve um aumento deste parâmetro, porém mantiveram-se dentro dos valores aceitáveis, quando comparados os anos de 2007 e 2011.

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O Gráfico 5 mostra que todas as amostras coletadas em 2007 e 2011, se encontraram dentro do limite de aceitação para o teste de Turbidez (máximo 100 UNT). Em 2007 os maiores valores ocorreram nos Córregos Olhos D’água e Tijuca. No entanto, os mesmos apresentaram diminuição no valor de turbidez em 2011, enquanto que nos Córregos Água Funda, Braúnas, e Mergulhão houve aumento da turbidez.

Os resultados apresentados no Gráfico 6 mostram que todos os pontos apresentam valores adequados, ou seja, inferior a 500 mg/L, para o parâmetro de sólidos totais dissolvidos tanto no ano 2007 quanto no ano de 2011. No entanto, os resultados atuais (2011) indicam aumento da concentração de sólidos dissolvidos, em relação a 2007, em quatro pontos de coleta (córregos Água Funda, Braúnas, Olhos D’Água e Mergulhão), e redução nos outros quatro pontos, sendo córregos AABB, Sarandi, Tijuca e Vertedouro.

CONCLUSÃO

comparar a qualidade da água com o ano de 2011 e verificar se

No ano de 2007 foram realizados testes físico-químicos para

as intervenções, propostas pela Prefeitura, realmente provocaram

avaliar a qualidade da água da Lagoa da Pampulha, utilizando-se

mudanças significativas.

amostras dos oito afluentes que deságuam na mesma. Deste pe-

De acordo com os Gráficos apresentados, pode-se concluir

ríodo até 2011 a Prefeitura de Belo Horizonte propôs intervenções

que as ações propostas pela Prefeitura ainda não estão sendo to-

para despoluição, como retirada de aguapés, tratamento de fundos

talmente eficazes, visto que parâmetros como o de fosfato total e

de vales de córregos afluentes, instalação de interceptores e de es-

oxigênio dissolvido se mostraram piores que os do ano 2007. En-

tação de tratamento de esgotos e educação ambiental, para recu-

tretanto, sabe-se que esse é o caminho para tentar a recuperação e

peração e melhoria ambiental deste patrimônio turístico da cidade.

preservação da fauna e flora da bacia da Pampulha, já que muitos

Neste artigo repetiram-se os mesmos testes realizados na

testes apresentaram melhoras significativas em determinados pon-

água da Lagoa da Pampulha no ano de 2007, com o objetivo de

tos de coleta, como o de pH no córrego AABB, turbidez nos cór-

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regos AABB, Olhos D’água, Sarandi e Vertedouro e sólidos totais dissolvidos nos córregos AABB, Sarandi, Tijuca e Vertedouro. Em relação aos níveis de amônia percebe-se uma melhora significativa na maioria dos pontos de coleta (Água Funda, Braúnas, Sarandi, Tijuca, Mergulhão e Vertedouro) quando comparados ao ano de 2007.

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Dessa forma, é perceptível que as ações desempenhadas pela Prefeitura têm demonstrado resultados positivos para alguns parâmetros. Porém estas ações devem ser intensificadas para que seja atingida a qualidade adequada da água, principalmente referente ao lançamento de esgotos domésticos e industriais, já que são as principais fontes responsáveis pela presença dos contaminantes ainda presentes na água da Lagoa da Pampulha. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, M.C; FERREIRA, E.C.F. Sistema de Cálculo da Qualidade da Água (SCQA). Estabelecimento das Equações do índice de Qualidade das Águas (IQA). 2005. Disponível em: http://aguas.igam.mg.gov.br/ aguas/downloads/SCQA_final.pdf>. Acesso em: 20 abr. 2011. AMBIENTE BRASIL. Avaliação da Qualidade da Água. Disponível em: <http://ambientes.ambientebrasil.com.br/agua/artigos_agua_doce/avaliacao_da_qualidade_da_agua.html>. Acesso em: 26 abr. 2011. AYER, F. Mais de R$ 200 milhões são enterrados na revitalização da Pampulha. Jornal Estado de Minas, Belo Horizonte, março de 2011. Disponível em: <http://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2011/03/22/ interna_gerais,216743/mais-de-r-200-milhoes-sao-enterrados-na-revitalizacao-da-pampulha.shtml>. Acesso em: 26 out. 2011. BRASIL, Decreto Federal n.º 24.643, de 10 de julho de 1934. Disponível em: <http://www.uniagua.org.br/public_html/website/default. asp?tp=3&pag=legislacao.htm>. Acesso em: 20 abr. 2011. BRANT, A.C. Audiência pública discute despoluição da Lagoa da Pampulha. Jornal Estado de Minas, Belo Horizonte, maio de 2011. Disponível em: < http://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2011/05/11/interna_gerais,226720/audiencia-publica-discute-despoluicao-da-lagoa-da-pampulha.shtml>. Acesso em: 26 out. 2011. COUTINHO, R. Lagoa da Pampulha: Pesquisa avalia contaminação por metais pesados. 2004. Disponível em:< http://revista.fapemig.br/materia. php?id=195>. Acesso em: 15 abr. 2011. COUTO, J.L.V. Limnologia. 2004. Disponível em: <http://www.ufrrj.br/institutos/it/de/acidentes/limno.htm>. Acesso em: 27 abr. 2011.

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1 Discentes do Curso de Farmácia do Centro Universitário Newton Paiva. 2 Docente do Curso de Farmácia do Centro Universitário Newton Paiva.

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PROGRAMA DE CONTROLE DA ESQUISTOSSOME NO DISTRITO DE ANTUNES/MG: análise de dados registrados e avaliação das medidas adotadas. Marilda Honória Duarte Costa1, Roberta Dias Rodrigues Rocha2

RESUMO: No distrito de Antunes/MG, através as medidas de controle preconizadas pelo Programa de Controle da Esquistossomose (PCE), que consistem no diagnóstico laboratorial e tratamento, foi constatado casos de esquistossomose na região. O objetivo do presente estudo foi avaliar a importância dessas medidas através da análise dos dados registrados no Diário de Coproscopia e Tratamento do PCE, entre 2007-2009. Após a realização dos exames coproscópicos todos pacientes com resultados positivos foram submetidos ao tratamento anti-parasitário. Observou- se nesse período, entre 2007-2009, que a prevalência da esquistossomose de 3,4% (62/1.821) reduziu para 2,2% (35/1.605) e de outras parasitoses de 10,7% (194/1821) reduziram para menos de 1% (14/1605). Diante desses resultados, foi possível constatar que o PCE produziu, no período avaliado, um resultado positivo. Contudo, é de fundamental importância a manutenção da vigilância epidemiológica, para que, se necessário, novas ações sejam promovidas. PALAVRAS-CHAVE: Programa de Controle de Esquistossomose; Antunes/MG; Exames croposcópicos; Parasitoses.

1. INTRODUÇÃO

Tal fato se deve a pedogênese, isto é, a produção de numerosos

O Schistosoma mansoni é um parasito trematódeo que

novos indivíduos por estágios larvais, fenômeno que ocorre no

infecta o homem e desencadeia a esquistossomose, doença

hospedeiro intermediário, o molusco (URQUHART et al., 1990).

que causa um importante índice de morbidade e mortalidade

O fator predisponente para contrair a infecção é o contato

no Brasil e no mundo. Como parasitose que afeta o homem,

com águas contaminadas por cercárias, forma evolutiva infec-

ocupa o segundo lugar em importância e repercussão sócio-

tante do parasito. Ambientes de água doce de pouca corrente-

econômica (WHO, 2011). É uma das doenças de maior pre-

za ou parada, utilizada para banhos, pescas, lavagem de roupa

valência entre aquelas veiculadas pela água. Nos países em

e louça, com presença de espécies suscetíveis de caramujos

desenvolvimento representa um dos principais riscos à saúde

pertencentes ao gênero Biomphalaria infectados pelo Schisto-

das populações rurais e das periferias das cidades.

soma mansoni constituem os locais adequados para se adqui-

Estima-se que cerca de duzentos milhões de pessoas

rir a esquistossomose (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2010).

residentes em áreas com risco de transmissão da esquistos-

Os sintomas da esquistossomose são inespecíficos, po-

somose estejam infectadas por Schistosoma mansoni, que é

dendo ser observados em outras doenças infecto-parasitárias,

encontrado em 54 países da África, Ásia e América do Sul. Nas

e incluem: diarréia, letargia e cansaço, dor ou desconforto ab-

Américas, registra-se, áreas endêmicas na Venezuela, nas ilhas

dominal e sangue nas fezes (WHO, 2011). A mortalidade por

do Caribe e no Brasil (WHO, 2011).

esquistossomose ocorre principalmente em sua forma hepato-

No Brasil, estima-se que aproximadamente 25 milhões de

esplênica, na fase crônica da doença. As manifestações clí-

pessoas que vivem nas zonas rurais e agricultáveis ou nas áreas

nicas nesse caso são decorrentes da hipertensão portal e as

periféricas de algumas cidades brasileiras, estejam expostas ao

principais complicações são a ascite e a formação de varizes

risco de contrair a doença, e que 2,5 a 6 milhões se encontram

gastroesofágicas, que ao se romperem resultam em hemorra-

infectadas. As áreas endêmicas e focais abrangem 19 Unida-

gias graves e, às vezes, fatais (PRATA, 1997). A hemorragia

des Federadas. No Estado de Minas Gerais ocorre de forma

digestiva é a maior ameaça à sobrevivência dos pacientes com

endêmica, predominantemente no Norte e Nordeste do Estado.

hipertensão portal por esquistossomose (WIDMAN et al., 2001).

Em relação ao parasito, o ponto crucial é que, enquanto um

Em 1975, a Superintendência de Campanhas de Saúde

ovo de nematódeo pode se desenvolver em apenas um adulto,

Pública (SUCAM) iniciou no Brasil, o Programa de Controle da

um ovo de trematódeo se desenvolve em centenas de adultos.

Esquistossomose (PCE), que direcionava suas atividades para

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o tratamento em massa dos infectados pelo S. mansoni (FAVRE

2.2 ÁREA DE ESTUDO

et al., 2001). A partir de 1980, instituiu-se como programa de

Antunes é um distrito do município de Igaratinga situado a

rotina no país e posteriormente, com a criação do Sistema Único

90km de Belo Horizonte, região Centro-Oeste de Minas Gerais.

de Saúde (SUS), as ações de controle da esquistossomose fo-

População de 3.577 habitantes, clima temperado, relevo monta-

ram descentralizadas para estados e municípios (PORTARIA Nº

nhoso, vegetação de cerrado. A principal atividade econômica é a

1.399, 1999). Desde então, a esquistossomose vem sendo alvo

produção de tijolos, altamente rentável para o distrito. A poluição

de programas de controle de ampla abrangência, que visam

da região é decorrente das cerâmicas, que emitem gás carbônico

principalmente reduzir sua prevalência (BRASIL, 1998). Para o

originado da queima de madeira utilizada na fabricação de tijolos.

controle da endemia, o Ministério da Saúde pactuou atividades

A região é banhada pelo Córrego das Areias, que é utilizado

mínimas, como a realização de inquéritos coproscópicos cen-

para pesca e lazer. A fonte de águas naturais é a nascente do

sitários com tratamento dos doentes e alimentação anual do

Ribeirão das Areias, origem da água consumida pela popula-

Sistema de Informação sobre o PCE (SISPCE), que devem ser

ção. O Ribeirão das Areias é poluído, em grande parte de sua

incorporadas na rotina de trabalho dos municípios (PORTARIA

extensão, pelo esgoto das casas da região, e ainda por lixo e

Nº 1.172, 2004).

animais mortos. Existem também na região algumas lagoas que

O PCE através da realização de suas atividades em Igara-

são utilizadas para fins recreativos.

tinga, distrito de Antunes/MG, constatou nessa região indivíduos

O distrito de Antunes fica às margens da BR 262. Não há

acometidos por esquistossomose e outras parasitoses. Como

áreas de assentamento e as pessoas que prestam serviço na pro-

parte do programa, após a identificação dos casos positivos,

dução de tijolos residem com suas famílias nos arredores e em

através do exame coproparasitológico, todos os pacientes com

condições precárias. Vivem em casebres, uma parcela sem rede

resultados positivos foram tratados. Considerando que até

de água e esgoto, sendo a água de consumo obtida de cisternas.

aquele momento nenhum trabalho havia sido realizado para se avaliar a importância do programa naquela região, concluiu-se ser pertinente realizar esse estudo.

2.2 COPROSCOPIA E TRATAMENTO Amostras de fezes da população do distrito, no ano de 2007

Ademais, o alto investimento necessário para o PCE impõe a

e posteriormente em 2009, foram coletadas para a realização do

realização de avaliação da efetividade, na perspectiva do custo,

exame coproparasitológico. Foram realizados 1.821 exames no

para demarcar as decisões futuras. Considerando este contexto,

ano de 2007 e 1.605 no ano de 2009.

o objetivo do presente trabalho foi avaliar dados epidemiológicos

Foi examinada uma lâmina de uma única amostra de fezes,

sobre população atendida: perfil da região, população atendida

pelo método de Kato-Katz (KATZ et al., 1972). Foi considerado

pelo exame de fezes e pelo tratamento, resultados obtidos pelo

positivo o indivíduo que apresentou ao menos um ovo de Schis-

programa no distrito de Antunes/MG, no período de 2007 – 2009.

tosoma mansoni. Os resultados dos exames foram entregues ao agente de

2. METODOLOGIA 2.1 CARACTERIZAÇÃO DO ESTUDO

saúde responsável, que se encarregou de levá-los pessoalmente aos residentes e agendar a consulta médica para tratamento

Esse estudo foi realizado através da análise dos dados re-

dos infectados. Foi disponibilizado, pela Secretaria Municipal de

gistrados no diário do Programa de Controle da Esquistossomo-

Saúde, o Praziquantel, medicamento recomendado pelo Minis-

se obtido na Secretaria Municipal de Saúde de Igaratinga/MG,

tério da Saúde para o tratamento da esquistossomose mansoni.

referentes às atividades desenvolvidas pelo programa na região no período de 2007-2009. As informações colhidas referem-se às variáveis: total de imóveis visitados; população atendida; ca-

3. RESULTADOS 3.1CARACTERÍSTICAS DOS DOMICÍLIOS

racterísticas dos domicílios; exames realizados; exames positi-

A coleta de dados sobre as características dos domicílios, no

vos para esquistossomose; exames positivos para outras para-

período 2007-2009, mostrou que a proporção de domicílios com

sitoses e número de pacientes tratados.

abastecimento de água por rede pública foi 76,77%, por poço

A Secretaria de Saúde do Município de Igaratinga/MG Os

23,14% e outros 0,1%. O tratamento de água por filtração foi de

dados coletados no Sistema de Informação de Igaratinga/MG

47,43%, por cloração 47,53%, fervura 0,19% e sem tratamento

obtiveram a licença por parte, respeitando os aspectos éticos a

4,84%. Em relação ao destino das fezes e da urina a presença de

serem considerados na pesquisa.

sistema de esgoto correspondeu a 80,83%, fossa 18,88% e céu aberto 0,29%. No que diz respeito ao destino do lixo, 85,87% era

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coletado, 14,04% queimado 0,1% acumulado a céu aberto. Já a

foi 80,3% (1.605/1.998), sendo que a meta era recolher 80% dos

energia elétrica foi observada em 99,81% dos domicílios atendidos.

coletores.

A pesquisa também revelou que os domicílios com ausência de abastecimento de água por rede pública, sem tratamento de água,

O envio de dados para a Gerência Regional de Saúde foi trimestral, para uma proposta de se enviar dados anuais.

rede de esgoto, energia elétrica e coleta seletiva de lixo estão localizados na comunidade rural da área de abrangência.

A proporção de indivíduos com resultados positivos para esquistossomose e que foram tratados foi de 100%, sendo que a meta era tratar 80% ou mais dos casos positivos.

3.2 ATIVIDADES DESENVOLVIDAS X META DO PCE Em relação às atividades executadas pelo programa observouse que foi realizado um inquérito coproscópico em 2007 e outro em

3.3 POPULAÇÃO ATENDIDA E RESULTADOS DOS EXAMES COPROPARASITOLÓGICOS

2009. A porcentagem da população atendida em 2007 foi 62,5%

A Tabela apresenta dados referentes às atividades desenvolvi-

(2.237/3.577) e em 2009 foi 55,8% (1.998/3.577). Nesse contexto, a

das, ao que se refere a número de imóveis visitados e de pessoas

meta do PCE era que se realizasse um inquérito a cada dois anos e

atendidas e a seguir os resultados dos exames coproparasitológi-

de se atender 80% ou mais da população.

cos.

A proporção de coletores recolhidos com amostras clínicas em relação aos distribuídos em 2007 foi 81,4% (1.821/2.237) e em 2009

Tabela – Dados da pesquisa do Programa de Controle da Esquistossomose do distrito de Antunes/MG. Brasil, 2007-2009.

ram, a saber: Ascaris lumbricoides, Ancilostomídeos, Taenia A Figura 1 apresenta de forma comparativa a positividade dos exames de fezes para esquistossomose e para outras parasitoses, no ano de 2007 e no ano de 2009. As outras espécies parasitárias identificadas pelo exame de fezes fo-

sp, Tricuris trichiura, Enterobius vermicularis, Strongyloides stercoralis e Hymenolepis nana. Figura 1- Número de resultados parasitológicos positivos no distrito de Antunes/MG- 2007-2009.

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como pesca (LIMA E COSTA et al., 1991), portanto deve ser alvo 3. DISCUSSÃO

de abordagens adequadas nos programas de controle, embora

A análise dos dados referentes às características dos domi-

modificar o comportamento humano seja um desafio para a saú-

cílios mostrou, no período avaliado, que a maioria da população não tinha o hábito de utilizar água das coleções hídricas para as

de pública (SANTANA et al., 1997).

Sobre a abrangência do programa, os dados coleta-

tarefas domésticas, como lavar roupa e vasilhas, provavelmente

dos revelaram que dos 3.577 habitantes de Antunes/MG, 2.237

devido aos investimentos com o fornecimento de água tratada.

foram atendidos pelo programa e 1.821 foram submetidos ao

Tal informação justificaria prevalência não tão expressiva de es-

exame coproscópico em 2007. Já em 2009, o programa atendeu

quistossomose e de outras parasitoses na população avaliada.

1.998 pessoas e realizou 1.605 exames. A análise dos dados

Em estudo realizado em Taquaraçu de Minas, Estado de Mi-

mostrou um aumento de 7,5% no número de imóveis visitados

nas Gerais (COURA-FILHO, 1998), foi também observada uma

em 2009, quando comparado ao ano de 2007. Por outro lado,

menor prevalência da esquistossomose nas residências abas-

houve uma queda de 12% no número de exames realizados na

tecidas com água potável intradomiciliar. Entretanto, apesar do

população atendida.

bom índice de casas com água potável no distrito de Antunes,

A análise das atividades realizadas pelo programa aponta o

a infra-estrutura em alguns locais ainda é precária. Desta forma,

cumprimento das normas preconizadas pelo Ministério da Saú-

não se pode afirmar que as condições favoráveis à transmissão

de para o controle da doença (QUININO et al., 2009). A única

da esquistossomose na área de abrangência deste estudo, es-

meta não cumprida, abranger 80% ou mais da população, foi

tejam totalmente controladas, uma vez que 19,17% dos domicí-

devido à barreira geográfica, distância compreendida entre a

lios ainda estão sem rede de esgoto e sem coleta de lixo.

unidade básica de saúde e os povoados da zona rural. Exis-

Sem tratamento do esgoto, as fezes dos indivíduos infecta-

tem rios que transbordam na época das chuvas e ruas que nem

dos tendem a alcançar as coleções hídricas, e na presença de

sempre estão em boas condições de tráfego. Tal fato dificulta o

moluscos do gênero Biomphalaria, fecha-se o ciclo de transmis-

acesso do agente de saúde à totalidade da área de abrangência

são da doença. Desta forma, para que os níveis de prevalência

do distrito.

permaneçam baixos, é muito importante o contínuo investimento em saneamento, além do tratamento dos doentes.

Considerando a questão dos períodos de chuva, numa pesquisa sobre a importância das inundações na expansão da es-

Antunes apresentou uma resposta positiva após a implanta-

quistossomose, concluiu-se que as enchentes propiciam condi-

ção do PCE, mas é uma área de risco em potencial, pois apre-

ções para a instalação de novos focos, favorecendo a expansão

senta fatores ambientais favoráveis à manutenção da esquistos-

da doença (RAMOS et al., 1970). Desta forma, devido a ocorrên-

somose. Observa-se que a falta de opção de lazer predispõe os

cias de inundações nessa área estudada, faz-se necessário o

moradores a possibilidade de infecção, momento em que estes

desenvolvimento de ações contínuas e adequadas à realidade do

em suas atividades recreativas entram em contato com as cole-

distrito, que possam viabilizar o atendimento dessa população.

ções hídricas da região.

Os inquéritos coproscópicos foram realizados dentro de

Nesse contexto, foi observado que na região metropolitana

dois anos, portanto, o prazo estipulado foi alcançado. No entan-

de Belo Horizonte, houve uma mudança no que diz respeito a

to, vale ressaltar que o sucesso do controle da esquistossomose

fatores de risco, onde o não fornecimento de água potável intra-

depende da efetividade e da coerência entre as ações realiza-

domiciliar deixou de ser o maior fator de risco, ganhando desta-

das, de forma a prevenir o restabelecimento do ciclo da doença

que o risco de contaminação pelo hábito de nadar em coleções

e a re-infecção dos indivíduos (FARIAS et al., 2007).

de água propícias a infecção, mesmo para aqueles que tinham água encanada intradomiciliar (COURA-FILHO, 1997).

A proporção de coletores recolhidos com amostras clínicas em relação aos distribuídos demonstra que a comunidade ade-

Outro desafio em relação às possibilidades de transmissão

riu ao programa. Outro aspecto relevante detectado por esse

da esquistossomose é o fato de algumas pessoas pensarem

estudo foi a total cobertura de tratamento. Assim como no muni-

que o único modo de se infectar com Schistosoma mansoni é

cípio das Correntes/PE (NETO et al., 2010), houve somente um

a permanência por longo tempo dentro do córrego ou lagoa,

caso com contra-indicações por se tratar de gestante em fase

não sabendo que também há risco de infecção o hábito de atra-

de aleitamento. Mas mesmo assim após esse período ela foi

vessar córrego, simplesmente pelo fato de molhar os pés (VAS-

devidamente medicada.

CONCELOS et al., 2009). A água está envolvida no lazer e em atividade ocupacional,

Exatamente todos os casos positivos foram tratados, o que foi uma medida de grande importância, evidenciado pela re-

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dução para 2,2% (35/1.605) de casos de esquistossomose em 2009 sendo 3,4% (62/1.821) em 2007. Cabe aqui ressaltar que o programa propiciou ainda a identificação e o tratamento de outras parasitoses. Em relação às outras parasitoses ficou evidente a expressiva redução de casos positivos de 10,7% (194/1.821)

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no ano de 2007 para menos de 1% (14/1.605) no ano de 2009. Entretanto, o que se observa é que as pessoas tratadas e curadas freqüentemente se re-infectam, sendo assim, como perspectiva de manutenção de baixos níveis de transmissão é fundamental que a população passe por um processo educativo para se previnir contra infecções e re-infecções. Desta forma, o distrito encontra-se na fase de vigilância do referido programa. A obtenção de uma vacina seria o ideal, uma vez que a doença apresenta grande morbidade relacionada às formas graves de esquistossomose. Neste sentido muitos estudos estão sendo realizados, entretanto, isto ainda não foi possível (KATZ, 1999). Para o futuro, as pesquisas em esquistossomose, na área

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aplicada, procurarão responder sobre métodos combinados de controle da transmissão (ANDRADE, 2002). Esse é o ideal a ser alcançado, pois visa interromper o ciclo evolutivo do parasito. Enquanto isso, o diagnóstico e o tratamento, componentes operacionais principais do programa, mostram ser eficazes para o controle parcial da endemia e morbidade da doença. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente estudo possibilitou divulgar as atividades de rotina do PCE no município de Antunes/MG, revelando que, no momento, o distrito encontra-se na fase de vigilância do referido programa. A análise dos dados da pesquisa mostra que a implementação do programa levou a uma queda na prevalência de infecção parasitária por esquistossomose e por outros parasitos na população atendida, e que aparentemente, a comunidade aderiu à proposta do programa. Em suma, foi possível observar que o PCE produziu, no período de 2007-2009, um resultado positivo, entretanto, é de fundamental importância a manutenção da vigilância epidemiológica, para que, se necessário, novas

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NOTAS DE RODAPÉ Bióloga, especialista em Análises Clínicas, Chefe de Seção de Vigilância Sanitária e Epidemiológica de Igaratinga/MG 1

2 Farmacêutica, docente do curso de Farmácia do Centro Universitário Newton Paiva

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TROMBOEMBOLISMO PULMONAR: aspectos gerais e aplicabilidade diagnóstica da dosagem sérica de D-dímero Débora Cristina de Oliveira Cunha1 Roberta Dias Rodrigues Rocha2

RESUMO: O tromboembolismo pulmonar (TEP) ocorre em conseqüência a trombos formados no sistema venoso profundo que se desprendem e obstruem artérias pulmonares ou um de seus ramos. A apresentação clínica é geralmente inespecífica, o que dificulta o diagnóstico clínico. Por ser comum e potencialmente fatal, o diagnóstico precoce e a instituição imediata da terapêutica são essenciais para a diminuição da morbidade e mortalidade do TEP, o que justifica a busca por testes laboratoriais que contribuam para sua exclusão ou confirmação. Diante desse contexto, o objetivo deste artigo é apresentar uma breve revisão da literatura sobre TEP, e, ainda, ressaltar a aplicabilidade da dosagem de dímero-d, produto da degradação da fibrina pela plasmina quando há formação do trombo. Diversos estudos têm demonstrado a aplicabilidade deste biomarcador na exclusão do diagnóstico desta entidade clínica. PALAVRAS - CHAVE: Tromboembolismo pulmonar; Diagnóstico laboratorial; Dímero-d.

INTRODUÇÃO

No contexto do diagnóstico laboratorial, a literatura registra

O tromboembolismo pulmonar (TEP) é a obstrução

que a dosagem de d-dímero plasmático tem sido extremamente

da artéria pulmonar ou um de seus ramos pela instalação de

útil em serviços de emergência, excluindo o diagnóstico de TEP. O

coágulos sanguíneos, geralmente oriundos da circulação veno-

d-dímero- plasmático é um produto de degradação, que tem rea-

sa sistêmica, que se deslocam de seu local de formação e se

ção cruzada com a fibrina e, quando dosado através do método

instalam na circulação pulmonar, reduzindo ou cessando com-

ELISA quantitativo, tem se mostrado altamente sensível (acima de

pletamente o fluxo de sangue para a área afetada. A trombose

99%) em casos de TEP (GUIDELINES ON DIAGNOSIS AND MA-

venosa profunda (TVP) é o evento básico e o TEP, a principal

NAGEMENT OF ACUTE PULMONARY EMBOLISM, 2000).

complicação aguda. Essas condições inter-relacionadas cons-

Considerando a importância dessa entidade clínica, o ob-

tituem o tromboembolismo venoso (TEV). A TVP é considerada

jetivo do presente estudo foi realizar uma breve revisão biblio-

a principal fonte de êmbolos para os pulmões, com risco de TEP

gráfica a respeito da TEP e ainda chamar a atenção para a do-

próximo dos 45% (GOLDHABER, 1998). Mais especificamente,

sagem do d-dímero. Desta forma, este artigo aborda questões

81% dos êmbolos pulmonares têm origem principalmente no

relativas ao TEP e a aplicabilidade da dosagem do d-dímero,

sistema venoso profundo dos membros inferiores, sendo as

considerando atualmente, um biomarcador de grande utilidade

veias ilíacas e femorais as que estão relacionadas com maior

na exclusão do TEP.

risco de TEP. Embora menos prevalentes, os êmbolos podem originar-se das veias renais, pélvicas, dos membros superiores e das cavidades cardíacas direitas (MORRELL, 1973).

2. METODOLOGIA O presente trabalho foi realizado através de uma revisão bi-

A ocorrência de TEP é uma situação clínica comum, de alta

bliográfica de artigos científicos consultados em bancos de dados

prevalência em faixas de idade mais avançadas e em ambiente

BIREME (Biblioteca Regional de Medicina), LILACS (Literatura Lati-

hospitalar. Suas manifestações clínicas podem ser inaparentes,

noamericana em Ciências da Saúde), SCIELO (Scientific Electronic

inespecíficas ou sugestivas. Pode ser um achado incidental,

Library Online), bem como dissertações e teses. Foram utilizadas as

uma complicação de alta morbidade ou levar a morte súbita.

seguintes palavras-chave: tromboembolismo pulmonar, d-dímero,

Não é uma condição de diagnóstico clínico, exigindo outros

diagnóstico laboratorial do tromboembolismo pulmonar, no primei-

métodos confirmatórios com recursos nem sempre disponíveis

ro e pulmonary thromboembolism, D-dimer, Laboratory diagnosis

nos lugares em que ocorrem. O diagnóstico correto e o trata-

of pulmonary thromboembolism bo segundo, tendo como critérios

mento imediato diminuem os índices de mortalidade. A terapia

de inclusão textos completos de estudos randomizados e revisões.

é realizada com anticoagulantes e trombolíticos, medicamentos que oferecem risco aos pacientes e exigem cuidados específicos (TERRA FILHO et al., 2010).

3. TROMBOEMBOLISMO PULMONAR 3.1 EPIDEMIOLOGIA Devido ao quadro clínico diversificado, com sinais e sinto-

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mas muitas vezes de difícil detecção, informações sobre a epide-

maior do que em brancos e, nesses, essa taxa é 50% maior do

miologia TEP é ainda uma questão que apresenta lacunas. Os da-

que em outras raças (asiáticos, índios americanos, etc.) ( HOR-

dos da literatura são provenientes de prontuários hospitalares, de

LANDER et al., 2003). Essas diferenças têm explicações em ge-

atestados de óbito e/ou de episódios ocorridos fora do ambiente

ral complexas e, às vezes, presuntivas, que incluem as influên-

hospitalar. Os casos não diagnosticados clinicamente não podem

cias ambientais, o estilo de vida, dietas e fatores genéticos.

ser detectados e, consequentemente, não são considerados. Portanto, a incidência real da TEP, está provavelmente subestimada.

3.2 FATORES DE RISCO

Os estudos sobre a epidemiologia de TEP no Brasil são es-

A fisiopatologia da trombose intravascular, descrita desde

cassos. Dados de autópsias, mostram que, nessas condições,

o século XIX por Rudolph Virchow, envolve três principais me-

a prevalência de TEP varia de 3,9% a 16,6% (AMARY et al., 1974;

canismos: estase venosa, dano local da parede vascular (endo-

MAFFEI et al., 1980; MENNA-BARRETO et al., 1994; YOO et al.,

telial) e hipercoagulabilidade (ou trombofilia) (VIRCHOW, 1856).

2004). Esses resultados são similares a estudos nos EUA, nos

A estase permitiria que fatores ativados da coagulação

quais a prevalência de TEP varia de 3,4% a 14,8%, enquanto

constantemente gerados na circulação sanguínea permaneces-

que na Ásia essa prevalência é menor, variando de 2,0% a 4,7%

sem concentrados e em contato continuado com o endotélio

(GILLUM, 1987; CHAU et al., 1991; CHAU et al., 1997; HORLAN-

vascular. Já o dano endotelial presumivelmente liberaria fatores

DER et al., 2003).

pró-coagulantes do subendotélio que, ao interagir com vias fi-

Entretanto, deve-se salientar que diversos estudos de autóp-

brinolíticas anormais (adquiridas ou herdadas), resultariam no

sias randomizados em hospitais, segundo os algoritmos de ma-

trombo vascular. Condições adquiridas ou herdadas podem, de

nejo de pacientes com TEP, mostram que a taxa de TEP sem sus-

forma independente ou combinada, interagir e causar um distúr-

peita clínica antes do óbito é ainda muito elevada — variando de

bio no delicado balanço da homeostase coagulatória, facilitando

67% a 91% - apesar da melhoria dos recursos diagnósticos e do

a trombose ao invés da manutenção da fluidez sanguínea. Nas

aumento dos conhecimentos sobre a doença. Essa taxa elevada

últimas décadas, uma ampla variedade de fatores de risco foram

de subdiagnóstico é provavelmente um marcante reflexo da alta

identificados, todos derivados de alguma forma dos mecanis-

mortalidade da TEP quando seu diagnóstico não é estabelecido

mos básicos descritos por Virchow, 1856.

e, portanto, ela não é tratada (KARWINSKI et al., 1989; GIUNTINI et al., 1995; MENNA-BARRETO et al., 1997; ALEM et al., 2004).

Em um estudo multicêntrico de 727 pacientes admitidos em unidades de emergência ou terapia intensiva, com o diagnóstico

A TEP aguda ocorre predominantemente em pacientes aci-

de TEP confirmado, os fatores de risco mais prevalentes associa-

ma da meia-idade (GILLUM, 1987; HORLANDER et al, 2003;

dos aos fenômenos tromboembólicos foram a idade superior a

YOO et al., 2003). Em um estudo na população geral, mostrou-

40 anos (93,4%), o repouso no leito superior a 72 horas (38,5%),

se que o aumento linear da incidência de TEP de acordo com

e a neoplasia (24,3%). Foram ainda relatados como fatores de

a idade ocorre aproximadamente até os 65 anos, havendo a

risco o tabagismo, a cirurgia abdominal ou pélvica, a insuficiência

seguir uma queda brusca nessa incidência, possivelmente devi-

cardíaca congestiva, TEV prévio, a fratura de membros inferiores

do à baixa acurácia de diagnóstico de TEP nos indivíduos mais

a 90 dias, o acidente vascular encefálico, o uso de estrogênio, a

idosos (GIUNTINI et al., 1995).

gravidez e o puerpério. Além destes, outros fatores que se desta-

Outros estudos mostraram que, entre pacientes com TEP

cam são aqueles que podem levar as trombofilias, tais como, as

diagnosticada em vida, mais da metade tinha entre 65 e 85 anos

deficiências de antitrombina III, a deficiência de proteína C e S, do

de idade, enquanto apenas 5% tinham menos de 24 anos (FER-

fator V de Leiden, a presença de protrombina mutante, a deficiên-

RARI et al., 1997, SILVERSTEIN et al., 1998.).

cia de plasminogênio, o anticorpo antifosfolípidio/anticardiolipina

Não há um consenso em relação à prevalência de TEP entre

e disfibrinogenemia (VOLSCHAN et al., 2009).

os sexos. Alguns autores relatam uma prevalência de TEP de 20-

A importância do devido reconhecimento dos fatores de ris-

30% maior entre homens, independentemente da raça e da ida-

co dessa doença está na possibilidade de prevenção (trombo-

de; outros relatam uma prevalência maior entre mulheres; e ou-

profilaxia), que é sabidamente mais fácil e menos dispendiosa

tros não observaram nenhuma diferença significativa (TALBOT,

do que diagnosticá-la ou tratá-la.

1972; ANDERSON et al., 1991; CARSON et al., 1992; CLAGETT et al., 1998; HEIT et al., 1999; STEIN et al., 1999.)

3.3 SINAIS, SINTOMAS E MANEJO CLÍNICO

Por razões ainda não esclarecidas, em negros, a taxa de

O diagnóstico do TEP é bastante difícil, uma vez que os si-

mortalidade por TEP, ajustada para a idade, é cerca de 50%

nais e sintomas são pouco específicos, o que causa demora na

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suspeita clínica. Não há um quadro clínico específico ou pa-

laxia é altamente eficaz e deve ser amplamente utilizada, tanto

tognomônico de TEP aguda. A suspeita baseia-se na presença

em pacientes clínicos como cirúrgicos, conforme os grupos de

de um quadro clínico compatível e na identificação de um ou

risco. A terapia é realizada com medicamentos que oferecem

mais fatores de risco. Na maioria de pacientes com suspeita

risco aos pacientes e exigem cuidados específicos, devido à

clínica de TEP aguda, essa não será confirmada (MINIATI et al.,

possibilidade de sangramentos.

1996; POULSEN et al, 2001).

A implementação de clínicas de anticoagulação multipro-

As repercussões fisiopatológicas e as manifestações ana-

fissional (médicos, farmacêuticos, enfermeiros) tem mostrado

tomopatológicas - de onde se originam os sintomas e os si-

melhor eficiência do ajuste terapêutico, tanto em relação a

nais - dependem das condições prévias do pulmão e da carga

níveis terapêuticos mais frequentes, quanto ao menor índice

embólica. Indivíduos jovens e sadios podem ter TEP primária

de sangramentos (CHIQUETTE et al., 1998; GARABEDIAN-

sem evidência clínica ostensiva, e indivíduos idosos e doentes

RUFFALO et al.,1985; WILT et al., 1995). Recomenda-se, se

podem ter sintomas e sinais de TEP mascarados por uma do-

houver disponibilidade, que os pacientes em uso crônico de

ença de base.

anticoagulantes sejam acompanhados em clínicas de antico-

Não obstante, uma suspeita clínica criteriosa baseia-se

agulação.

na prevalência das apresentações clínicas encontradas em várias séries de casos documentados de TEP. Segundo o

3.4 EXAMES DE APOIO AO DIAGNÓSTICO

estudo realizado por VOLSCHAN et al. (2009) as manifes-

Alguns dos exames complementares mais utilizados se-

tações clínicas mais comuns observadas em 727 pacientes

gundo a Diretriz de Embolia Pulmonar da Sociedade Brasileira

com o diagnóstico de TEP confirmado foram: dispnéia, pre-

de Cardiologia são: eletrocardiograma (ECG), radiografia de

sente em 78,4% dos pacientes, taquipnéia (65,3%), taqui-

tórax, gasometria arterial, dímero-d, marcadores de necrose

cardia (44%), dor torácica (42,6%) e tosse (21,3%). Já STEIN

miocárdica (creatinoquinase e troponina I), duplex-scan veno-

et al. (2004) em um estudo de revisão bibliográfica relatam

so, cintilografia pulmonar, ecocardiograma, ressonância mag-

que a prevalência global de TEP em pacientes que apre-

nética, tomografia computadorizada helicoidal e arteriografia

sentam suspeita clínica é baixa (25%), o que justifica a bus-

pulmonar. Exames séricos, como leucograma, enzimas cardía-

ca por exames menos invasivos e de baixo custo na abor-

cas e provas hepáticas, demonstraram alterações em percen-

dagem inicial destes pacientes. A investigação diagnóstica

tuais variáveis dependendo da série estudada e da gravidade

complementar aos achados clínicos pode ser de maior ou

da apresentação de TEP.

menor complexidade, dependendo das disponibilidades do local.

3.4. 1 DIAGNÓSTICO LABORATORIAL SOROLÓGICO DE DÍMERO-D.

O diagnóstico diferencial inclui aneurisma de aorta torá-

Nos últimos anos, a descoberta de uma série de biomarca-

cica, pericardite aguda, tamponamento cardíaco, pneumotó-

dores possibilitou aos laboratórios clínicos a avaliação eficiente

rax, pneumomediastino, tumores torácicos, exsudatos, fratura

do processo da coagulação in vivo. Entre estes biomarcado-

de arcos costais, neuralgia intercostal; insuficiência cardíaca

res, se destaca a pesquisa sorológica de dímeros-d.

congestiva descompensada, asma aguda, pneumonias, tuber-

Os dímeros-d (DD) constituem os menores fragmentos

culose pleuropulmonar e bronquiectasias (MINIATI et al., 1996).

dos produtos de degradação da fibrina (PDF) e são produzidos

Em síntese, a suspeita clínica criteriosa, baseada em sin-

através da ação da plasmina que lisa a ligação cruzada da fibri-

tomas e sinais compatíveis, presença ou ausência de fatores

na. O DD comporta-se como um biomarcador de ativação da

de risco e possibilidades de diagnósticos alternativos, permite

coagulação e da fibrinólise secundária, e está invariavelmente

estabelecer graus de probabilidades que auxiliam o médico no

e precocemente aumentado sempre que houver formação de

manejo inicial do paciente com suspeita de TEP aguda, pas-

coágulo de fibrina intravascular.

sando o diagnóstico de TEP possível para de TEP provável.

Quando ocorre um fenômeno tromboembólico ocorre a ati-

Pacientes de baixo risco devem ser tratados com heparina.

vação do sistema fibrinolítico, com aumento da concentração

Pacientes de alto risco requerem vigilância intensiva e uso de

sérica dos PDF, e, conseqüentemente de DD. Ele é detectado

trombolíticos em alguns casos. A longo prazo, os pacientes de-

uma hora após a formação do trombo e permanece elevado

vem receber anticoagulantes por no mínimo três meses, sendo

em média por sete dias. O mecanismo da formação de DD está

sua manutenção decidida pela presença de fatores de risco

demonstrado na FIGURA 1.

para a recorrência e a probabilidade de sangramento. A profiPÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 327


A pesquisa de dímero-d apresenta alta sensibilidade, mas

Para TEP, a variabilidade dos métodos foi semelhante, tam-

a sua especificidade é baixa; portanto, deve ser analisado com

bém com melhores resultados para ELISA, com sensibilidade

cautela, em conjunto com a avaliação de probabilidade clínica

0,95 (IC= 0,85 a 1,00) e razão de probabilidade negativa de 0,13

(BRITISH THORACIC SOCIETY STANDARDS OF CARE COM-

(IC= 0,03 a 0,58) e para ERQ com sensibilidade de 0,95 (IC=

MITTEE PULMONARY EMBOLISM GUIDELINE DEVELOPMENT

0,83 a 1,00) e razão de probabilidade negativa de 0,13 (IC= 0,02

GROUP, 2003). Além do evento tromboembólico, existem ou-

a 0,84). A razão de probabilidade positiva variou apenas entre

tras situações clínicas em que os valores de DD podem estar

1,5 e 2,5 para tais métodos.

aumentados, como na inflamação, em tumores malignos, nas

Para o ELISA semi-quantitativo, a sensibilidade foi de 0,89

infecções e septicemia, na pré-eclampsia, no trauma ou cirurgia

(IC= 0,81 a 0,98) para TVP e 0,93 (IC= 0,79 a 1,00) para TEP;

menos de três meses, na doença hepática e leucocitose (QUINN

para o método Látex quantitativo a sensibilidade foi de 0,85 (IC=

et al., 1999). Desta forma, estas situações podem contribuir para

0,74 a 0,95) para TVP e 0,89 (IC= 0,81 a 0,98) para TEP; para

obtenção de resultados falso-positivos.

látex semi-quantitativo, a sensibilidade foi de 0,79 (IC= 0,69 a

Há diferentes métodos para a realização do teste (enzyme

0,88) para TVP e 0,80 (IC= 0,65 a 0,94) para TEP; o método

linked immunosorbent assay- ELISA ou ELISA rápido quantitati-

whole-blood mostrou sensibilidade 0,87 (IC= 0,68 a 1,00) para

vo, semiquantitativo ou qualitativo; o enzyme linked fluorescent

TVP e 0,78 (IC= 0,64 a 0,92) para TEP.

assay (ELFA); aglutinação por látex quantitativo ou semiquanti-

As especificidades foram baixas em geral, evidenciando o

tativo ou aglutinação do sangue total), diferindo, entre eles, na

papel principal de determinação do d-dímero em excluir o diag-

sensibilidade, especificidade e razão de probabilidade, além da

nóstico de TEP e TVP.

variabilidade entre pacientes com suspeita de TVP ou TEP (SADOUK et al., 2000).

Em estudo realizado por DE PIANO (2007) a dosagem de dímero-d plasmático pelo método ELFA permitiu a exclusão de

STEIN et al., (2004) fizeram uma revisão sistemática

tromboembolismo pulmonar, com uma sensibilidade de 100%

da literatura para identificar os parâmetros de desempenho de

na amostra estudada. Esses achados se assemelham aos resul-

diferentes técnicas laboratoriais aplicadas a mensuração de

tados encontrados no estudo realizado por STEIN et al. (2004)

dímero-d no diagnóstico de TVP e TEP. Os pesquisadores sele-

que avaliaram o método ELISA clássico (padrão-ouro). Estas in-

cionaram os estudos prospectivos que compararam o D-Dímero

formações reforçam a aplicabilidade e a segurança destes tes-

com padrões-ouro de referência. Estudos com alta qualidade

tes em excluir o diagnóstico de TEP em caso de suspeita clínica.

metodológica foram incluídos em uma análise comparativa, en-

Numa revisão sistemática para a avaliação de estratégias

quanto estudos mais fracos foram incluídos apenas na análise

para o diagnóstico de TEP aguda em pacientes com baixa pro-

de sensibilidade.

babilidade clínica pré-teste, um teste negativo para dímero D

Os resultados para TVP mostraram que os métodos ELISA

(qualquer teste) esteve associado com uma probabilidade pós-

e ELISA rápido quantitativo (ERQ) lideraram em relação à sensi-

teste < 5%, não sendo necessários outros testes para se excluir

bilidade, com valores de 0,96 (95% intervalo de confiança [IC],

a embolia pulmonar (PIOPED, 1990; ROY et al., 2005) Já em pa-

0,91 a 1,00 e razão de probabilidade negativa: 0,12 (IC, 0,04 a

cientes com probabilidade clínica intermediária, para a exclusão

0,33) para ELISA e sensibilidade 0,96 (IC, 0,90 a 1,00) e razão

de TEP, só pode ser valorizado um teste quantitativo utilizando o

de probabilidade negativa de 0,09 (IC, 0,02 a 0,41) para ERQ.

dímero D pelo método ELISA (valor < 500 μg/L). Em pacientes

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com alta probabilidade clínica, outros testes serão necessários para se excluir esse diagnóstico com segurança. Nesses pacientes, se o teste for positivo, não acrescentará ajuda no diagnóstico, sendo que outros exames deverão ser realizados (BRITISH THORACIC SOCIETY STANDARDS OF CARE COMMITTEE PULMONARY EMBOLISM GUIDELINE DEVELOPMENT GROUP, 2003). Nestes casos, é prudente prosseguir a investigação com outros métodos como ultrassonografia com Doppler para TVP e/ ou angiotomografia pulmonar, arteriografia ou estudo inalação/ perfusão cintilográfico para TEP. Os estudos estabelecem as seguintes recomendações: O dímero D deve ser usado somente em pacientes após a avaliação da probabilidade clínica. O dímero D não deve ser usado em pacientes com alta probabilidade clínica. Um teste negativo exclui TEP em pacientes com baixa (qualquer método) ou intermediária (ELISA) probabilidade clínica, sem a necessidade de exames de imagem adicionais. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS A investigação diagnóstica de pacientes que apresentam sinais e sintomas de TEP é uma tarefa complexa e desafia os recursos clínicos e laboratoriais nas salas de emergência dos hospitais. Por ser potencialmente fatal, o diagnóstico precoce e a instituição imediata da terapêutica são essenciais para a diminuição da morbidade e mortalidade do TEP. Considerando as dificuldades da avaliação clínica, informações laboratoriais contribuem de forma importante no diagnóstico definitivo. Entre os métodos de diagnóstico laboratorial destaca-se a pesquisa dos níveis plasmáticos do dímero-d (DD). Nessa perspectiva, a literatura registra a necessidade de se combinar a determinação do dímero-d com a probabilidade clínica pré-teste antes de se

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prosseguir na investigação diagnóstica e a superioridade dos métodos ELISA e ELISA rápido quantitativo. Especialmente em pacientes com baixa probabilidade clínica de TEP, a dosagem de d-dímero apresenta grande utilidade clínica, uma vez que um resultado negativo praticamente exclui a possibilidade de TEP. Além disto, a técnica sorológica de ELISA aplicada à quantificação do DD possui custo relativamente baixo frente aos exames de imagem, o que justifica e reforça sua importância como técnica laboratorial. Cabe ressaltar que em situações de altíssima

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prevalência de TVP (calculadas pela probabilidade pré-teste) o d-dímero não pode ser utilizado como única ferramenta, uma vez que o teste é de pouca especificidade. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALEM C.E.; FABRO A.T.; CORRENTE J.E.; QUELUZ T.T. Clinicopathological findings in pulmonary thromboembolism: a 24-year autopsy study. Jornal Brasileiro de Pneumologia, Brasília, v. 30, n. 5, p. 426-432, 2004.

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NOTAS DE RODAPÉ 1 ­­­­­­­­­­­­­­­Farmacêutica Bioquímica, pós-graduada em Análises Clínicas, Assessora Científica na Conceito Diagnóstica. E-mail: deboracris85@hotmail.com 2 Farmacêutica Bioquímica, professora do curso de Farmácia do Centro Universitário Newton Paiva. E-mail: roberta.newtonpaiva@gmail.com

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UTILIZAÇÃO MEDICINAL DO ÓLEO DE COPAÍBA: aspectos históricos e estudos atuais Aldemir Fernandes Lima1 Jesiel Francisco de Jesus Fernandes Martins Lima2

RESUMO: Nessa revisão de literatura procuramos fazer uma síntese sobre a abordagem histórica, as pesquisas químicas e farmacológicas da Copaifera L., incluindo citações sobre os estudos e aplicações do óleo de copaíba. Para tanto, recorremos a uma vasta e diferenciada literatura que trata sobre a diversificada e rica flora brasileira e as suas aplicações. Durante o nosso estudo percebemos que existem muitos trabalhos e pesquisas divulgando achados sobre a utilização, propriedades dos componentes da copaibeira. Constatamos que há trabalhos relatando a utilização desse vegetal desde seu efeito secante, lubrificante, combutível e inseticida. Dentre toda essa gama de utilizações pelo povo das regiões aonde esse vegetal vem sendo utilizado chamou a nossa atenção para as citadas propriedades medicinais, como ação bactericida e bacteriostática. PALAVRAS CHAVES: Copaífera; Óleo de copaíba;Bactericida.

1. INTRODUÇÃO

gler (1844 – 1930) a subordem das Dicotiledôneas e família das

Existe uma grande quantidade de trabalhos sobre a

Leguminosas em que se encaixa a copaíba, no Brasil são en-

utilização medicinal do óleo de copaíba, baseado na cultura

contrados cinco gêneros JUDDS, et. Al., (1999), e que segundo

popular e em ensaios biológicos preliminares. Isso nos mos-

a farmacopéia Medicinalis são largamente utilizadas.

tra a amplitude de exemplares botânicos dispersos na diver-

Reino: Plantae

sificada e rica fauna brasileira, cuja identificação, catalogação

Classe: Pteridophytae

e estudos pormenorizados, sobre a sua composição química,

Ordem: Angiospermae

testes farmacológicos e possível eficácia terapêutica que pre-

Sub – Ordem: Dicotiledônea

cisam ser feitos.

Família: Leguminosease

Muita indagação tem sido feita sobre a utilização de

Sub – Família: Caesalpinoideae

produtos naturais já incorporados à cultura popular. Tais inda-

Gênero: Copaifera

gações têm sido feita com certa freqüência a cerca da eficácia

Espécies: C. offcinalis

dos extratos do óleo da copaíba. Portanto, resolvemos recor-

C. longsdorffii

rer à bibliografia sobre a utilização histórica, e demais estudos

C. multifulga

dos princípios ativos da copaibeira. Importante exemplar que

C. reticulata

faz parte da “farmácia popular” do caboclo e das populações

C. cearensis

silvícolas. Verificamos que há evidencias a serem estudadas e testadas sobre as atividades farmacológicas dos princípios

Historicamente a árvore da copaíba teve a origem do

ativas alcalóides da copaíba, como agentes antimicrobianos

seu nome derivado a partir da língua tupi: “Kaupa-iwa e Kau-

e mesmo bacteriostáticos. Testes químicos que comprovam a

paú”, o que significa “árvore que tem deposito de seiva” (Gran-

ação combustível do óleo da copaíba (uso em lamparinas) já

de Enciclopédia Larrousse Cultural, 1998).

foram devidamente comprovados.

Existem numerosos trabalhos relatando a importância

econômica e medicinal da copaíba. Segundo muitos autores e 2. DESENVOLVIMENTO

pesquisadores vários deles datam da época do descobrimen-

Conforme citado no Index Kewensis (1966) as copai-

to das terras sul americanas. Naquela época muitos botânicos

beiras são classificadas e distribuidas em 72 espécies já iden-

viajavam através dos continentes na busca de novidades para

tificadas, sendo que em terras brasileiras já foram encontradas

a medicina através da flora. Assim, há relatos de que os nativos

16 espécies (DUYER, 1951).

indígenas da mata atlântica brasileira já utilizavam a seiva da

Segundo o sistema de classificação do Dr. Adolf En-

copaíba como agente agregado à sua farmácia natural, como

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substância cicatrizante, antiinflamatório e corante para a pele e

Altura média: 25 a 40 metros

de seus adereços.

Diâmetro: até 4 metros

Tempo de vida: 200 a 400 anos

Os primeiros relatos sobre o uso da copaíba com fins

terapêuticos foram feitos por MarcGrave e Piso no século XVI

Tronco: áspero

(1628), que descreveram as características da copaíba (PISO et.

Cor: escura

Al., 1625).

Folhas: alternadas, pecioladas, penuladas

Frutos: apenas 1 semente ovóide colorida e envolvida

Em 1760 nos trabalhos divulgados por Jacquin ele des-

creveu a espécie de copaíba que dominou de Copaiva offici-

por arilo

nallis Jacq (JACQUIN, 1760).

Flores: pequenas

Presença de pétalas: apétalas

Segundo Hyne (1825) em seu trabalho ele identificou

oito novas espécies de copaíba em uma pesquisa botânica feita

Aparelho reprodutor: hermafrodita com panicolas axilares

conjuntamente Von Martius (Von Martius, 1870).

Tempo de floração e frutificação: a partir de 5 anos de

idade

No Brasil a copaíba é conhecida como copaíbeira ou

pau d’olio, sendo largamente encontrada na floresta da Amazô-

Período de floração: de outubro a julho

nia (norte), do Mato Grosso e Goiás (centro oeste), Santa Cata-

Período de Frutificação: junho a outubro

rina (sul) e Ceara (nordeste).

Varias espécies são encontradas também nos países

O extrato alcalóide da copaíba não é considerado como

andinos (Colômbia e Venezuela) e na África Ocidental (Con-

balsamo, já que não contêm na sua composição os compostos

go, Camarões, Guine e Angola) (WOOD et. Al., 1940; PERROT,

aromáticos como o acido benzóico. Quimicamente contem áci-

1944; LEITE, 1993).

dos resinosos e outros compostos voláteis o que o credencia

A copaíba é uma árvore que pode atingir tamanho en-

como sendo uma resina oleosa e com alto poder de secagem.

tre 25 e 40 metros de altura, até 4 metros de diâmetro e viver em

Seus princípios ativos são o ácido copaívico (C2OH32O34), a-

média 200 a 400 anos se dela não for extraído o óleo.

cubeno, b-cariofileno e a-humuleno. (ROBBERS et. Al., 1996).

Características morfológicas e anatômicas da copaibei-

Esse óleo resinoso é encontrado no sistema de canais se-

ra (BARTH, 1971):

cretores (xilema e floema) ao longo de toda a árvore (tronco,

Porte: árvore

galhos, ALENCAR, 1982).

Conforme o autor CARVALHO, (1994) os métodos de

melho e até a cor marrom, sendo os de coloração mais clara de

extração considerados agressivos causam a morte a árvore, en-

menor viscosidade e os mais escuros apresentando maior grau

quanto que na extração não agressiva permite “selar” o corte

de viscosidade (SILVA, 1911; MATOS, 1923).

ou incisão com argila, tornando a mesma árvore produtiva para coletas sucessivas.

Sobre o volume de óleo produzido por uma árvore

adulta, vários autores relatam a possibilidade de apenas um

Há relatos e evidências atuais sobre o grande interesse

das indústrias moveleiras pelo tronco da copaíba, já que após beneficiada esse tipo de madeira possui a superfície lisa, lustrosa e é resistente a ação de cupins e a umidade (CARVALHO, 1994).

exemplar de copaíba permitir “sangria” anual de 40 a 50 litros (SOUZA, 1977).

Para Rosa (1694) e Langgarrd (1872), conforme a cul-

tura popular dos mateiros e nativos da selva tropical o processo

O óleo resina da copaíba apresenta características es-

de coleta de óleo resina da copaíba deve obedecer todo um

pecificas como uma coloração com transição do amarelo, ver-

ritual místico como “a fase da lua (lua cheia e quarto minguan-

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te)”; para outros deve ser feita em noites de lua cheia e não olhar

protetor e cicatrizante, entre outras. O professor João Ernes-

diretamente para a árvore.

to de Carvalho, coordenador da Divisão de Farmacologia e

A descoberta sobre a ação farmacológica e medicinal

Toxicologia do CPQBA, realizou as culturas in vitro e recorda

dos alcalóides do óleo resinado da copaíba somente foi valo-

que uma das substâncias, (-)-hyrtiosal, foi a que apresentou

rizada com o fortalecimento e valorização da Fito- terapia, dos

atividade mais seletiva, sobre a linhagem do melanoma. “Se

Fitoterápicos e da medicina herbária (BERTONI, 1927).

precisasse escolher um dos compostos para dar seguimen-

Acosta (1792) relatou em seus artigos que foi Petros

Martius o primeiro a citar a utilização do óleo resinoso da copaíba em uma carta por ele enviada ao Papa Leão X, quando

to às experiências, com testes em animais, seria este”, afirma. (LIMA et. al., 2000; PAIVA et. al., 1998).

Conforme relatos de Pinheiro (1993); Barbonatti (1996);

fez menção às espécies de copaíbas encontradas nas Índias no

Costa et. al., (1996); Bandeira et. al., (1998), os estudos sobre

ano de 1534.

a ação farmacológica e medicinal dos componentes do óleo da

Com o advento da antibioticoterapia a partir da des-

copaíba separado da sua fração resinosa, vem sendo testados

coberta notável do Penicilium notatum, e conseqüentemente da

na área odontológica. Os principais estudos e bioensaios têm

Penicilina as ações e utilizações medicinais da copaíba ficaram

sido feitos sobre a ação e eficácia biológica do óleo da Copai-

um pouco esquecidas (GUDMAN; GILMAN, 1945).

fera multifuga, anexando-se como coadjuvante o hidróxido de

A Copaifera ssp faz parte da Relação Nacional de Plantas Medicinais de interesse do SUS (RENISUS), constituída de espé-

cálcio, para testar a suas propriedades bactericidas e bacteriostáticas sobre o Streptococcus mutans.

cies vegetais com potencial de avançar nas diversas fases das

Não houve cronista importante na História do Brasil que não

pesquisas e gerar produtos de grande interesse do Ministério

tenha se referido às virtudes do óleo de copaíba. Um dos primei-

da Saúde em nosso país.

ros foi Gabriel Soares de Sousa (c1540-c1592), que registrou em

Tudo indica que o uso deste óleo veio da observação do

sua obra “Tratado Descritivo do Brasil” a utilização do óleo pelos

comportamento de certos animais que, quando feridos, esfrega-

índios, incluindo-o entre aqueles provenientes “das árvores e er-

vam-se nos troncos das copaibeiras. Os índios o utilizavam prin-

vas da virtude”.

cipalmente como cicratizante e no umbigo de recém-nascidos

O padre Jesuíta José Acosta (c 1539-c1604) no seu livro

para evitar o mal-dos-sete-dias. Os guerreiros quando voltavam

“De Natura Novi Orbis”, traduzido em 1606 do latim para o fran-

de suas lutas untavam o corpo com o óleo da copaíba e se dei-

cês, e depois por José Maffeu para o português, que o intitulou

tavam sobre esteiras suspensas e aquecidas para curar eventu-

“História Natural e Moral das Índias”, assim se referiu ao óleo de

ais ferimentos.

copaíba:

Contudo, o interesse pelo óleo da copaíba continuou a

“O bálsamo é celebrado com razão por seu excelente odor,

se propagar através das indústrias de cosméticos, de vernizes e

e muito maior efeito para curar feridas, e outros diversos remé-

tintas desde o período de 1796 até 1996 (Anuário Estatístico do

dios para enfermidades, que nele se experimentam… nos tem-

Brasil, I.B.G.E., 1996).

pos antigos os índios apreciavam em muito o bálsamo, com ele

As propriedades medicinais da copaíba foram aprova-

das e registradas no Food and Drug Administration (FDA) do

os índios curavam suas feridas e que delas aprenderão os espanhóis.”

governo Americano em 1972. A partir daí vários pesquisadores

Segundo a química do Far-Manguinhos, Vera Cas-

passaram a estudar os efeitos farmacológicos e medicinais do

con “o óleo de copaíba é uma verdadeira farmácia natural”.

óleo das 5 espécies da copaíba existentes no Brasil, e que tem a sua composição química descrita na literatura. Os estudos preliminares se baseiam nos testes de irritabilidade e de sen-

3. CONCLUSÃO

Diante das evidencias relatadas nos artigos que tratam

sibilidade do óleo da copaíba testado em pacientes humanos

sobre a ação farmacológica e medicinal e industrial do óleo da

(FOOD CHEMICAL CODEX, 1972; KLIGMAN, 1966; BRASIL et.

copaíba percebemos que ainda há muitas controvérsias sobre a

Al., 1988; FERNANDES et. al., 1992).

sua real eficácia e propriedades.

Vários estudos e bioensaios já foram realizados so-

Há descrição química de vários de seus componentes dire-

bre as atividades antiinflamatórias, anti séptica, purgativa,

cionada a indústria, porém toda abordagem de tratados sobre a

ação cercaricida (Schitosoma mansoni), inseticida, afrodisía-

copaibeira deixam evidencias de que é necessária a comprova-

co, anti reumático, anti herpetico, anti brotropico, analgésico,

ção mais contundente sobre as reais propriedades, ação bacte-

anti neoplásico (in vitro no mieloma do camundongo) gastro-

riostática e bactericida do óleo da copaíba.

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BANDEIR, M. F. C. L.; Oliveira, M. R. B.; Pizzolitto, A. C.; Benatti Neto, C.; Jorge Neto, J; J. Bras. Clin. Estet. Odont. 1998, 3, 39. BANDEIRA, M. F. C. L.; Oliveira, M. R. B.; Benatti Neto, C.; Lia, R. C. C.; J. Bras. Clin. Estet. Odont. 1998, 3, 42. BANDEIR, M. F. C. L.; Oliveira, M. R. B.; Pizzolitto, A. C.; Benatti Neto, C.; J. Bras. Clin. Estet. Odont. 1998, 3, 47. Cunha, K. M. A; Silveira, E.R.; Rao, V. S.16o Simpósio de PlantasMedicinais do Brasil, Recife, Brasil, 2000.

NOTAS DE RODAPÉ 1 Professor de Ciências da Saúde da Universidade Federal de Minas Gerais 2 Professor Programa Educação Profissional Centro Universitário Newton Paiva Especialista em Análises Clínicas .

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Vírus Influenza A (H1 N1): abordagem revisional Aldemir Fernandes Lima1 Jesiel Francisco Martins Lima2

Resumo: Conforme constatamos em nossa pesquisa revisional de literatura o vírus da influenza possui o genoma do tipo RNA, com fita simples segmentada e com grande poder de mutação. De acordo com as normas para a classificação internacional, esse vírus está subdividido em subtipos Myxovirus influenza A, Myxovirus Influenza B e Myxovirus Influenza C. Devido à grande variedade de reservatório encontrados na natureza o vírus é capaz de induzir constantes mutações na seqüência dos aminoácidos que formam o seu genoma. Essa metologia facilita o reagrupamento dos aminoácidos que fazem parte do filamento genético viral, originando a partir daí muitas variantes de cepas (tipos). Na literatura consultada verificamos que os fármacos antivirais interferem e inibem a síntese das glicoproteínas de superfície do Vírion. Com esse estudo de revisão de literaturas procuramos organizar dados básicos sobre a formação estrutural de um vírus, sobre os principais sintomas da virose pelo M. influenza e o seu tratamento básico. E assim, chamar a atenção para sua epidemiologia. Palavras - chave: Influenza A (H1 N1); Vírus; Antivirais.

INTRODUÇÃO

GENERALIDADES EM VIROLOGIA

Diante deste contexto, este artigo tem como objetivo fazer

A influenza é uma doença infecto contagiosa de inci-

um estudo revisional da literatura que trata a respeito da infec-

dência aguda, de origem viral e que compromete o sistema

ção causada pelo vírus da Influenza A, subtipos H1 N1, levando-

respiratório.

se em conta o importante destaque epidemiológico que essa

O nome “influenza” teve a sua origem com base na cultura

virose assumiu no período entre 2008 – 2010 no mundo todo.

mitológica relacionada à influência dos astros em períodos da

E, assim procuramos ilustrar e recordar os aspectos morfoló-

transição verão / inverno e de grandes episódios por correntes

gicos e estruturais do Myxovirus influenza. Através da literatura

de ventos, que favorecem a disseminação de vários tipos de

consultada procuramos deixar bem evidente a formação das

germes e de doenças.

camadas lipoprotéicas que constituem um vírus, e sobre tudo a

Conforme a taxonomia biológica o vírus é um organismo

posição das lipoproteínas que são envolvidas em todo o pro-

com uma organização estrutural simples, já que é constituído

cesso infectante desse vírus.

basicamente por proteínas e ácidos nucléicos. Não há vírus

Procuramos também enfatizar e deixar ilustradas

constituído ao mesmo tempo por dois (2) tipos de genoma

as informações básicas sobre as características sintomáticas,

(DNA e RNA). Possuem propriedades de cristalização como

além de informações básicas sobre o principal medicamento

uma forma estratégica de preservação, quando está disperso

disponível e utilizado no tratamento da gripe A (H1N1).

no meio ambiente; é capaz de se auto-reproduzir, desde que se fixe em uma célula hospedeira, e tem grande poder de muta-

HISTÓRICO

ção. Basicamente o vírus possui um envoltório protéico (Cerne)

Há relatos de que a primeira epidemia de gripe tenha sido

circundando o genoma de ácido nucléico que recebe o nome

descrita por Hipócrates no ano 402 a.C., como sendo uma sín-

de Capsídio. Os conjuntos de Capsídios se transformam em

drome respiratória. Também, há na literatura outros relatos da

subprodutos do ciclo reprodutivo viral com a denominação de

ocorrência dessa doença na forma epidêmica no continente

Nucleocapsídio. As unidades estruturais básicas que formam

Asiático entre os séculos XVII e XVIII (1781-1830). Da mesma

o Capsídio são compostas por polipeptídios individuais. E as

forma houve o surto da gripe Espanhola entre os anos de 1918

unidades morfológicas virais isométricas são denominadas de

e 1919; a gripe Asiática entre os anos de 1957 e 1958, e a

Capsômeros, enquanto que Vírion é o nome dado à partícula

gripe de Hong Kong entre os anos de 1968 e 1969. Contempo-

viral completa: Vírion = capsídio + ácido nucleico + nucleo-

raneamente constatamos um surto de pandemia dessa grave

capsídio + capsômero (Figura 2)

virose entre os anos 2008 e 2010, e que colocou em estado de alerta os órgãos responsáveis pela saúde em todos os países do mundo (PAYUNGPORN, 2010).

CLASSIFICAÇÃO VIRAL De acordo com vários autores a classificação universal mais aceita para os vírus é fundamentada conforme as suas

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propriedades biológicas, físicas e químicas de interesse humano e veterinário (JAWETZ, 1974).

(JAWETZ, 1974; PAIVA, 2000; PAYUNGPORN, 2010). Agente Etiológico da Influenza A (H1 N1)

A classificação biológica mais antiga e aceita pela comu-

Essa gripe recebe uma nomenclatura científica conforme

nidade científica baseia-se na patologia das doenças sistêmi-

a cepas do vírus Influenza A, acrescido das siglas das prin-

cas e de órgãos específicos onde esse tipo de vírus possui

cipais glicoproteínas localizadas na superfície estrutural do

tropismo de infecção – vírus neurotrópicos, vírus respirató-

vírus (capsídio), cujas cepas já foram identificadas. A letras,

rios, vírus cutâneos, vírus de mucosas, vírus oftálmicos e vírus

H1 indica a glicoproteína hemaglutinina do tipo 1, enquanto

glandulares (JAWETZ, 1974).

que a letra N1 indica a glicoproteína neuraminidase do tipo 1.

Para separar os vírus em grupos de acordo com as pro-

(Figura 3).

priedades físico-químicas, o relatório do 1º. Comitê Interna-

O vírus causador da Influenza (gripe) que afeta os ver-

cional Sobre Nomenclatura dos Vírus (CINV) realizado em

tebrados é do tipo genômico RNA, com a fita simples, seg-

1971, refere-se aos vírus de importância humana, de animais

mentada e subdividida em três subtipos ou cepas Myxovirus

inferiores, de insetos, de vegetais e bactérias (bacteriófagos),

influenza A, Myxovirus influenza B e Myxovirus influenza C.

e que abrange as propriedades mais comuns para 43 grupos

Pertence à família taxonômica Orthomyxoviridae. As letras

de diferentes vírus. Ainda conforme o CINV-1971 para os ví-

maiúsculas “A”, “B” e “C” acrescentadas após o termo Myxo-

rus infectantes de vertebrados inclui-se: nome oficial do grupo

virus indicam as cidades onde as cepas foram isoladas e

viral, os subgrupos designados como gênero-tipo ou como

identificadas (Figura 1). Essas variantes do Myxovirus influen-

espécie-tipo, e o Criptograma. Conforme os estudos mais re-

za são formadas a partir de processos mutagênicos ocorridos

centes em virologia o Criptograma é um detalhamento das

nos segmentos genômicos virais, o que induz em importantes

estruturas características específicas dos vírus e de seu com-

alterações na seqüência inicial dos aminoácidos que formam

portamento diante de condições biológicas e físico-químicas

as várias camadas das glicoproteínas de superfície do Capsí-

– propriedades estruturais da partícula completa do Vírus,

dio. Isso ocorre em especial com as proteínas Hemaglutinina

como: cerne do ácido nucléico – DNA ou RNA; capsídio; nu-

(H) e a Neuraminidase (N). Sendo que a glicoproteína Hema-

cleocapsídio e capsômero; simetria do capsídio; presença ou

glutinina (H) antigênica é a responsável pela invasão viral na

não de invólucro do vírion; sensibilidade ao éter; número de

célula hospedeira parasitada (fixação – adsorção – injeção do

capsômeros; tamanho da partícula de vírus em nanômetros;

genoma do vírus). Já a Neuraminidase (N) é a glicoproteína

peso molecular do ácido nucléico; nº. de genes aproximados)

responsável pela lise celular e pela liberação de novos Vírions

de cada grupo. Os subgrupos dos vírus foram designados

a partir da população de células do hospedeiro inicialmente

como sendo gêneros, cada gênero-tipo denominado como

infectado (JAWETZ, 1974; PAYUNGPORN, 2010). (Figura 2).

família, e cada espécie-tipo citada como espécie. Já as espécies são registradas com os nomes vernaculares e latinizados

Figura 1 – Organograma taxonômico dos subtipos do vírus Myxovirus influenza

Devido à resposta imunogênica humana em casos de in-

(H) e Neuraminidases (N) de superfície. Essas alterações das

fecções primárias ou devido à ação vacinal preventiva irá de-

glicoproteinas de superfície do genoma do vírus devem-se ao

sencadear também variações antigênicas associadas à substi-

reagrupamento de espécies de vírus patogênicos interespecífi-

tuição total de um ou de ambos os filamentos genômicos virais

cos, como facilitador dessa recombinação, resultando em cepas

responsáveis pela síntese das glicoproteínas Hemaglutininas

virais infectantes mistas. Outro facilitador para a formação de

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cepas virais mistas são os diversos tipos de reservatórios ani-

de 1 até 9) (PAYUNGPORN, 2010; MANCINI, 2004; OMS, 2000).

mais vertebrados disponíveis na natureza. Então, o Myxovirus

(Figura 2)

influenza infectante suíno tem a glicoproteína Hemaglutinina (H)

Figura 2 – Esquema da localização das camadas estruturais

e Neuraminidase (N) de superfície reagrupadas em subespécies

onde se encontram as glicoprotéicas e o cerne (genoma) do Ví-

antigênicas interferentes H (subtipos de 1 até 15) e N (subtipos

rion - Myxovirus influenza A (H1N1).

Conforme pesquisas internacionais realizadas nas últimas

pesquisa do projeto Grupos Regionais de Observação da Gripe

décadas o vírus Myxovirus influenza apresenta altíssimas taxas de

(GROG), com o objetivo de coletar dados, analisá-los e fornecer

mutação, e consequentemente resulta na formação de novas ce-

informações, acerca da dispersão do vírus Myxovirus influenza

pas com cargas virais diferenciadas e dispersas nas comunidades

A no Brasil – Instituto Adolfo Lutz / SP (IAL), Fundação Osvaldo

de todo mundo (PAYUNGPORN, 2010; MANCINI, 2004).

Cruz / RJ (FIOCRUZ) e Instituto Evandro Chagas / Belém (IEC),

E para essa formalização cientificamente comprovada de que novas formas virais podem surgir, a Organização Mun-

ambos credenciados pela OMS desde 1995 (OMS, 2000; NETO, 2003; Rev. Soc. Bras. Med. Trop., 2003).

dial de Saúde (OMS) passou a credenciar e a delegar poderes de vigilância e pesquisa e qualificar vários Laboratórios Nacio-

Nomenclatura utilizada para vírus

nais sobre a Influenza em diversos países ao redor do mundo,

A maioria das espécies de vírus é designada com a primei-

atualmente são 80 países, credenciados para essa importante

ra letra do nome latino do hospedeiro (a = avis; b = box; h =

função, subdivididos e subordinados a quatro Centros de Refe-

homo; o = ovis; m = mus; s = suis) seguidas de um número

rências situados em Londres, Tóquio, Melboume e Atlanta. Com

que indica o tipo antigênico (JAWETZ, 1974).

essas referências as cepas virais colhidas e identificadas em

Utilizam-se quatro pares de símbolos representando cada

todo o mundo são catalogadas em um sistema oficial padroni-

par, duas propriedades: filamento da cadeia e tipo de ácido nuc-

zado pela OMS com base fundamentada nos seguintes critérios:

léico, percentagem da partícula viral e o peso molecular do ácido

1 - Tipo antigênico da nucleoproteína; 2 - Principal hospedeiro; 3

nucléico; forma da partícula e do nucleocapsídio, o tipo de hospe-

- Localizações geográficas (cidade, país); 4 - Números de cepas

deiro e o vetor do vírus (JAWETZ, 1974; NETO, 2003; OMS, 1998).

no Laboratório identificador; 5 - Ano de isolamento da cepa no Laboratório de referência. (JAWETZ, 1974; NETO, 2003). No Brasil existem três Laboratórios credenciados para a

Exemplo: A / Bayem / 07/95 A (H1 N1) Conforme os Laboratórios Brasileiros de Referência Internacional (LBRI – MS) citados anteriormente, no Brasil as cepas

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do Myxovirus influenza que são infectantes para os seres hu-

Como medida preventiva destaca-se o uso da vacino-

manos são rotuladas e identificadas conforme o código alfa

terapia. Entretanto, já estão disponíveis em todo o mundo os

numérico conforme os seguintes critérios:

fármacos antivirais preconizados mundialmente – Amantadina

A (H1 – N1)

e Rimantadina, como sendo os medicamentos de primeira geração, e o Oseltamivir e o Zanamivir como sendo os produ-

A (H2 – N2)

tos farmacológicos de segunda geração. Esses dois últimos já oficialmente licenciados pela Agência Nacional de Vigilância

A (H3 – N3)

Sanitária (ANVISA) em todo o território nacional desde 1993.

Manifestações clínicas e tratamento da Influenza A (H1 N1)

No mercado brasileiro já circula o medicamento de segunda

Conforme os fatores patognomônicos da Influenza os sin-

escolha que é direcionado para a Influenza.

tomas e sinais típicos para essa patologia são: febre (38ºC – 40

No esquema abaixo procuramos produzir e deixar clara a

ºC), calafrios, tosse, cefaléia, dor de garganta, coriza, anorexia

forma pela qual as indústrias farmacêuticas procuraram criar o

e fadiga muscular. A partir desse quadro clínico já instalado

nome “fantasia” para um dos fármacos de escolha utilizado no

poderão surgir complicações decorrentes de uma infecção

tratamento da Influenza A (H1N1).

secundária e até evoluir para o óbito (PROJETO VIGI GRIPE, 2001; GROG, 2010).

Esses fármacos antivirais são inibidores da proteína de superfície Neuraminidase do vírus M. Influenza. Conforme normas divulgadas pela ANVISA o produto Tamiflu (Figura 4) está disponível e licenciado em todo território nacional brasileiro desde o ano 2000 pelo Ministério da Saúde (GRUPO REGIONAL DE

Figura 4 – Origem do nome do fármaco usado no tratamento da gripe A (H1N1).

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OBSERVAÇÃO DA GRIPE, 2010; PROJETO VIGI GRIPE, 2001). CONCLUSÃO Com esse artigo de revisão de literatura sobre a Influenza A (H1N1), acreditamos ter reunido dados capazes de informar sobre as características fundamentais dessa virose que tem afligido a população em todo o planeta em períodos sazonais. E também poder contribuir para despertar nos profissionais da saúde o interesse para a epidemiologia desse tipo de doença durante todo o período do ano. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS GRUPO REGIONAL DE OBSERVAÇÃO DA GRIPE. Boletim GROG. Vol. 32: 1 – 6, 1998. http: / www. ministeriosaude.gov.br – Acesso em 28 / 09 / 2010. JAWETZ, Ermest; Melnick, Joseph L; Adelberg, Eduard A. Microbio-

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PROJETO VIGI GRIPE. Boletim Notícias Vigi Gripe. Vol. 2: 2 – 5, 2001.

NOTAS DE RODAPÉ 1 Bacharel, especialista em Ciências da Saúde e Educação (UFMG). Professor Universitário. 2 Biomédico, especialista em Análises Clínicas, professor do Centro Universitário Newton Paiva

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