A Cozinha Dele - Casa e Comida - fevereiro-2011

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ao ponto | a cozinha dele

Supergourmet

coleção de sais, livros de culinária e ingredientes importados

Chef sem amarras

O empresário Geraldo Mattar detesta seguir receitas. Para ele, gostoso mesmo é substituir ingredientes, fazer adaptações e criar seus próprios pratos reportagem Raquel Temistocles + fotos Ricardo Corrêa + produção Viviane Gonçalves

Q

uem não gosta de comer não é meu amigo”, diz o empresário Geraldo Mattar, de 37 anos. Porque este paulistano adora comer – e muito bem. Formado em engenharia e administração, Mattar está à frente de uma indústria de contraceptivos, mas tem na culinária a sua verdadeira paixão. A inspiração vem de longe, dos avós libaneses: “Sempre gostei de ficar na cozinha. Ajudava minha avó a enrolar charutinhos e a fazer quibes”, conta. O empresário, no entanto, não ficou restrito à tradição árabe. Desde que se divorciou e passou a morar sozinho numa casa de vila, há cinco anos, ele começou a se dedicar mais às panelas e a estudar sofisticadas e modernas técnicas culinárias. “Estava comendo uma vez no restaurante Maní e experimentei um cordeiro que estava derretendo. Quando soube que a carne tinha sido cozida a vácuo, resolvi pesquisar para entender a técnica de sous vide”, diz ele. Nesta técnica, a carne é embalada a vácuo num saco apropriado e cozida na água, numa temperatura baixa e constante. Mattar se inscreveu num curso sobre o tema com o chef Laurent Suaudeau e correu para comprar os utensílios necessários. A partir daí, fez mais uma porção de aulas para apurar seus dotes e sua cozinha se transformou em um laboratório.

Laboratório caseiro

Geraldo Mattar em sua cozinha: acessórios ultramodernos e caixa de som dos anos 50 74 * casa e comida

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Bar cheio

Garrafas de vodca, uísque e outras bebidas preenchem a estante da sala

O lado cientista do empresário não para nos apetrechos culinários. Mattar gosta de fazer testes: troca ingredientes, adiciona outros a seu gosto e inventa sua própria receita. O foie gras é um dos seus objetos de estudo preferidos. Ele já fez crème brûlée de foie gras, terrine de foie gras e foie gras com peixe, entre outras variações do fígado. “Você não pode deixar de fazer um prato porque não tem um ingrediente específico. Tem de substituir. A criação é isso”, prega. Não que falte algum ingrediente na casa desse mestre-cuca. As prateleiras e a bancada da cozinha, adaptada à sua altura de 1,90 m, são repletas de especiarias e con-

dimentos especiais que ele traz de viagens, como uma caixa cheia de sais gourmet do mundo todo. A variedade de bebidas também impressiona: atrás da porta de entrada, há uma pequena adega embutida na parede. Na sala, uma estante com nichos de diversos tamanhos, inspirada numa biblioteca que ele viu em Nova York, abriga dezenas de garrafas. “Gosto de beber malte e ouvir Jimmy Smith [músico de jazz norte-americano] enquanto cozinho”, diz. Para a alegria dos amigos do empresário, todo esse dom culinário não fica escondido. Duas vezes por semana, um grupo bom se reúne em sua casa para o que eles cha-

mam de VVV: Voz e Viola na Vila. “Tenho um primo que toca violão e um amigo que canta. Aí, eu vou cozinhando, uns amigos trazem vinhos e outros me ajudam a montar os pratos.” E a sobremesa? “Sobremesa, eu não faço. Não gosto, porque tem de seguir muito a receita, caso contrário, não dá certo.” Talento e know-how para tanto ele tem, mas Mattar não cogita virar um profissional do fogão e abrir um restaurante. “Comecei a cozinhar por diversão, para os amigos. Se você abrir um restaurante, acaba fazendo a comida para ter lucro, começa a economizar na matéria-prima e aí eu não gosto.” Sorte da turma do VVV.

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Cozinha com estilo

Temperos e apetrechos culinários não faltam na casa. O desenho é o detalhe de um grafite na parede da cozinha, feito por um amigo. No garrafão, as rolhas lembram as noites de violão e comilança

Perfil gastronômico especialidade da casa Comida francesa é minha grande paixão. a primeira receita Penne com molho de limão-siciliano. Comi num restaurante, fiz uma pesquisa na internet, juntei três ou quatro receitas e montei a minha própria. ingredientes indispensáveis Canela, tomilho, limão, cardamomo e zimbro. ingrediente vetado Nenhum. Cada ingrediente combina com um tipo de comida e não posso deixar nenhum de lado. restaurantes preferidos Mocotó e Pomodori. confesso que amo... Os torresminhos do restaurante Mocotó. comida inesquecível da infância Qualquer prato árabe. mania de chef Só cozinho ouvindo jazz e bebendo algo, como malte. xodós Termocirculador e máquina de vácuo [a dupla possibilita o cozimento das carnes a uma temperatura baixa e constante, o que deixa as fibras mais macias]. sonho de consumo Um Thermomix [um superprocessador de alimentos]. Mas não tem espaço na minha casa para mais um trambolho.

Rótulos bem guardados

A adega, feita com módulos de madeira que se encaixam, fica atrás da porta de entrada da casa casa e comida * 77

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magret de canard ao molho rossini (receita de geraldo mattar)

rendimento serve 2 pessoas tempo de preparo 1 h + 3 h para a marinada + 12 h para o glace de carne Ingredientes

glace de carne

O glace de carne é um caldo de carne concentrado. Pode ser comprado pronto ou, se você for disposto como Geraldo, siga a receita a abaixo. Ingredientes 2 kg de costela de boi com os ossos; 1 kg de ossobuco; 1 garrafa de vinho tinto (cabernet sauvignon) 3 cenouras; 2 cebolas; 1 salsão (somente os talos); 2 alhos-porós (sem as folhas); 1 bouquet garni; 5 l de água fria; pimenta-do-reino a gosto; pimenta síria a gosto. Modo de fazer 1 Separe as carnes dos ossos. 2 Coloque os ossos no forno por mais ou menos 1 hora, até ficarem bem tostados, virando na metade do tempo. 3 Corte as carnes em cubinhos, tempere-as com pimenta-do-reino e pimenta síria e frite-as numa panela grande. 4 Adicione a garrafa inteira de vinho sobre a carne e espere evaporar quase todo o líquido. 5 Acrescente os 5 l de água fria e junte os ossos na mesma panela. Vá retirando com uma peneira fina toda a gordura que subir, por 1 ou 2 horas. 6 Adicione as cenouras, as cebolas, o salsão, os

Modo de fazer

magret de pato

magret de pato

1 magret de pato;

1 Triture o zimbro e o cardamomo em um almofariz.

2 cápsulas de

2 Com uma faca afiada, faça cortes na gordura do

cardamomo (só as sementes); 10 sementes de zimbro; pimenta-do-reino; sal a gosto.

magret, formando um quadriculado. 3 Tempere os dois lados do magret com sal, pimenta e a mistura de zimbro e cardamomo e deixe-o nessa marinada seca por pelo menos 3 horas, na geladeira. 4 Esquente muito bem uma frigideira e coloque o magret com a gordura para baixo. Frite o pato em

espuma de

sua própria gordura até ficar bem caramelizado, por

mandioquinha

mais ou menos 3 minutos. Vire e deixe por mais 3

200 g de

minutos. Reserve.

mandioquinha

espuma de mandioquinha

cozida;

1 Doure a mandioquinha na manteiga.

300 ml de creme de

2 Acrescente o creme de leite, as sementes de baunilha

leite fresco; 50 ml de caldo de legumes; 50 g de manteiga; sementes de 2 favas de baunilha; 1/2 tubo de wassabi;

e o wassabi e mexa por 5 minutos em fogo baixo. 3 Retire do fogo e bata tudo com um mixer até obter um creme bem homogêneo. 4 Dissolva o agar-agar no caldo de legumes, em fogo médio. Deixe ferver por 3 vezes, tirando do fogo após cada fervura. 5 Com um mixer, misture o agar-agar com o creme e

3 g de agar-agar;

coloque num sifão thermo ou gourmet* para fazer

5 g de sal.

a espuma. Se não tiver sifão, não use o agar-agar e

molho

sirva o creme de mandioquinha como um purê.

20 g de trufas

molho

negras;

1 Coloque o vinho do Porto numa panelinha e leve

25 g de foie gras; 150 ml de vinho do Porto;

ao fogo até reduzir a um terço. Adicione o glace de carne e deixe dar a primeira fervura. 2 Pique bem as trufas negras, misture com o foie gras

150 ml de glace de

e adicione ao molho, com o fogo apagado. Tempere

carne (ver receita

com sal a gosto. Reserve.

à esq.).

montagem 1 Fatie o magret em diagonal, despeje o molho por cima e sirva com a espuma de mandioquinha.

alhos-porós e o bouquet garni ao caldo. Deixe cozinhar por 8 horas, em fogo bem baixo. 7 Coe o caldo. Leve o líquido ao fogo novamente e reduza o caldo a 700 ml. Essa redução é o glace de

* Os sifões gourmet e thermo são feitos para suportar mais pressão e calor. Já o sifão comum, utilizado para fazer chantilly, não pode receber líquidos quentes, portanto não é recomendável neste caso.

carne. Você pode congelar o que não for utilizar imediatamente. Dura cerca de 2 meses no freezer. 78 * casa e comida

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Altos aparatos

Para conseguir a textura de espuma, o empresรกrio coloca o creme de mandioquinha num sifรฃo especial

Lรก vem o pato

Mattar tempera o magret e frita a carne em sua prรณpria gordura. O peito deve ficar mal passado

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