Magazine (capa) - Fazer arte é iludir o espectador/Ruma

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BELÉM, SÁBADO, 9 DE MARÇO DE 2013

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Fazer arte é ‘‘iludir’’ o espectador Rui Mário de Albuquerque, o Ruma, abre hoje a exposição ‘‘Cenaculum’’. E aqui fala sobre o que, para ele, significa fazer arte.

O

artista plástico paraense Ruma, gosta de dizer que o mais encantador das artes visuais é capacidade de iludir o espectador com as técnicas, a fim de nele despertar percepções e sensações. “Na pintura de superfície plana, você pode criar uma profundidade, um volume... É como se eu criasse uma janela para algo que não existe, mas que parece muito real”, diz Ruma, hoje com 57 anos de idade, sobre o seu trabalho com a mais nova exposição “Cenaculum”, na Elf Galeria. A curadoria da mostra, que abre neste sábado (9), é de Armando Queiroz. Em doze pinturas feitas em técnica mista sobre tela, Ruma faz uma representação de cada um dos discípulos que estiveram na última ceia de Cristo. O título da exposição é um derivado da palavra latina cena, que significa “jantar”, e a galeria será o local onde se pretende partilhar a cultura e a arte. Rui Mário de Albuquerque, sem ter ainda descoberto sua veia artística, prestou vestibular para Engenharia Elétrica. Ingressou na faculdade, não se identificou com o curso e logo mudou o caminho para cursar Arquitetura e foi, então que Ruma, durante as aulas de Desenho e Plástica, entrou em sintonia com a arte. “Comecei a fazer pequenos trabalhos. Alguns amigos da área me chamaram para fazer uma exposição coletiva na antiga Casa do Artista, na Avenida Nazaré. Entre as pessoas que figuravam por lá, estava Geraldo Teixeira”, conta Ruma. A partir daí, o artista começou sua trajetória nas artes plásticas. Fez pós-graduação em marketing pela FGV, cursou a Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio de Janeiro. Participa desde 1979 de salões e coletivas no Brasil e no exterior, com exposições em Portugal e na Alemanha. Hoje, Ruma traz a releitura de uma cena que talvez tenha sido a maior de toda a história. Na mostra, lâminas simulam as pranchas de madeira usadas na produção dos barcos de pesca - uma alusão à atividade mais comum dos discípulos - ornadas com texturas e letras decorativas das embarcações amazônicas e fazem uma composição estética com signos e símbolos que representam a característica dos discípulos: Pedro, André, João, Mateus, Bartolomeu, Tiago Maior, Tiago Menor, Simão, Judas Tadeu, Filipe, Tomé e Judas Iscariotes. Esbanjando bom humor, Ruma conversou com o MAGAZINE sobre o trabalho. Qual pessoa teve mais influencia na sua atividade? Sem dúvida, os mestres do Parque Lage que me deram aulas, como o Daniel Senise. A Beatriz Milhazes me influenciou em termos a técnica que eu hoje uso e chamo de transfer, por pintar sobre uma superfície plástica e depois

transferir para tela. Inegável que também somos influenciados pelos trabalhos dos colegas daqui, como o Geraldo Teixeira e Acácio Sobral, principalmente na sua maneira de como pensar a cultura. Conte sobre a participação em salões. Eu participo desde a década de 1980. Participei do 1º Arte Pará, foi muito bom ser aprovado, mas ser reprovado em salões como esse também é bom porque eles mostram o caminho para seu sucesso. Eu fui reprovado, já levei porrada (risos) e fiquei tão intrigado com isso que fui estudar, buscar mais conteúdos. Ele enquanto reprovador nos colocou para pensar sobre o que estávamos fazendo para que nós pudéssemos ver o que faltou e propor algo mais interessante. Na carreira, aonde você deseja chegar? Eu cheguei aqui e isso é muito importante. Chegar ao único lugar em Belém que tem possibilidade do mercado organizado, pois o mercado em Belém é muito incipiente. Porém, vejo que a Galeria Elf é a única que dá suporte para eu fazer

‘‘

Na pintura de superfície plana se pode criar uma profundidade, um volume... É como se eu criasse uma janelaparaalgo que não existe.

o meu trabalho de artista. Enquanto eu pinto, eles fazem a divulgação com o propósito de atingir a venda. Diferente das galerias instituicionais. O que falta no mercado? Estamos tendo um boom de construção civil, o preço dos imóveis está tão alto que as pessoas que o compram não estão comprando a nossa arte. Veja só, uma construtora da cidade vai apresentar um novo edifício e os arquitetos que montam os espaços esquecem ou não conhecem a existência de uma produção local, então eles não chamam os artistas para colocar suas obras. É muito raro ver. Nas decorações de interiores, eles não se lembram das paredes ou colocam reproduções horrorosas. Não é porque não queremos, mas nós não somos chamados. Eu acho que eles podiam estar fomentando essa produção e aquecer esse mercado. No exterior o clima é mais propício à produção artística? Há lugares diferentes de outros lugares. Portugal, por exemplo, passa por momento econômico não muito bom. Os

portugueses não estão mais a gastar (imita o sotaque português). Então é melhor a gente ficar por aqui mesmo. Mas é bom viajar e perceber que lá fora as pessoas são muito mais sensíveis para perceber a sua arte. Como surgiu a ideia para a exposição “Cenaculum”? A Elf Galeria me pediu 14 obras. O tema era livre. Eu me determinei a fazer essa exposição e quando fico muito envolvido com a história, começo a sonhar. Houve um dia em que eu não sei se eu estava acordado ou dormindo (risos), lembrei-me de uma coroa de espinhos que estava no cartaz de apresentação do recital “Paixão”, onde o Coral Vozes da Amazônia cantou sob a regência de Maria Antonia Jiménez. Eu sou cantor também, tenho registro vocal barítono (risos). Fiquei pensando qual significado aquilo teria e o que de Cristo tinha haver com os 14 que a galeria queria. Pensei nos dozes apóstolos, pesquisei e vi que além deles havia Matias e Paulo, mas eu decidi manter os dozes que participaram da ceia para ficar mais fechado o tema. Você é religioso? Eu sou cristão e católico, mas não sou muito frequentador da igreja. A minha aproximação maior foi com o coral, acho até que aquela coroa de espinhos do cartaz estava me chamando para fazer um trabalho apostólico (risos). Foi difícil? Estou fazendo esse trabalho há mais ou menos quatro meses, em dezembro do ano passado foi a parte teórica, pesquisa, escolha do tema. Eu tive que ler muito pra fazer as pinturas, pois sabia o pouco que a maioria das pessoas sabem. O novo testamento foi escrito em aramaico ou grego, depois traduzido para várias línguas, e dependendo da boa ou má tradução, muita coisa foi se perdendo. Então, muitas coisas que estão escritas são vagas e não é possível ter muita certeza do que está escrito. Que tipo de reflexão sugere “Cenaculum”? Ninguém imaginavam que um maluco como eu faria um trabalho praticamente religioso. Espero que não sugira uma reflexão muito religiosa, mas acho que a mensagem cristã de que você precisa dividir me agradar mais. Outra reflexão seria a de voltar mais o olhar para a nossa região.

Serviço Hoje, abertura da exposição Cenaculum, de Ruma, na Elf Galeria (Gov José Malcher, Passagem Bolonha, 60) A exposição poderá ser visitada de 11 a 30 de março, das 10h às 19h, de segunda a sexta e aos sábados, de 10h às 14h, exceto feriados.

RAY NONATO/O LIBERAL

OLIBERAL

Ruma diante de uma das peças da exposição “Cenaculum’’


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