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Formação de Professores

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Esportes

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Na história dos Irmãos Lassalistas, a formação dos Mestres (assim eram denominados na França do século XVII) sempre teve primazia. São João Batista de La Salle, nosso fundador, intuiu que as escolas cristãs teriam êxito na medida em que houvesse uma sólida formação intelectual dos professores. Tal foi a convicção do fundador que, inconformado com o despreparo dos professores que a ele se achegavam, reuniu os mesmos para morar junto com ele na esperança de formá-los de modo adequado. Para La Salle, era um crime o Irmão desconhecer o que se propunha a ensinar, ou ensinar de forma leviana aqueles que lhe foram confi ados.

A missão de educador era tida em tal importância para La Salle que, na Meditação 159 deste Santo, temos: “Quanto não vos deveis sentir honrados por a Igreja vos haver destinado a emprego tão santo e tão elevado com o de instruir as crian

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ças no conhecimento da religião e

do espírito do Cristianismo”. E, em outra passagem, o Fundador nos diz que, com o emprego que nos é designado, participamos da função de Apóstolos [...] “Tendes a vantagem de participar nas funções de

Capa do livro Guia das Escolas

Apóstolos, explicando todos os dias o catecismo aos vossos alunos e ensinando-lhes as máximas do Evangelho 19 ”[...].

Desde 1913, fundação do Colégio, muito antes dos Irmãos Lassalistas adquirirem a obra, em 1960, já havia importante convicção de que a formação dos professores era fundamental para alcançar êxito no ensino. É comum, por exemplo, encontrar nos relatos históricos passagens em que, antes de iniciar o ano letivo, os professores recebiam algum tipo de formação; muitas foram pregadas

pelo Bispo.

Escolas Cristãs mostra um aparato que emitia um sinal. Ao som desse sinal, os estudantes eram convidados a fazer determinada correção na leitura que faziam em voz alta.

Quando os Irmãos Lassalistas assumi

ram o então Colégio Arquidiocesano, 1960, trouxeram junto com eles todo o cabedal de

conhecimento oriundo Um fragmento do livro Guia das

do Santo Fundador e da

experiência na expansão

19 Meditação de La Salle nº 159,2.

dos Irmãos pelo mundo. expansão dos Irmãos pelo mundo. Eles sabiam que a formação dos Professores era capital para o bom andamento da unidade escolar. Assim, não tardaram em promover encontros formativos, palestras, reuniões, enfim, de pessoas e momentos de formação continuada.

Os Irmãos que aqui chegaram eram forjados no que havia de melhor na formação dos Irmãos. Eles já haviam cumprido com as etapas de formação para a Vida Religiosa e, indubitavelmente, conheciam a obra de La Salle. Dentre elas, o Guia das Escolas Cristãs; um verdadeiro manual para se ter êxito no ensino.

Desde os inícios, sempre houve preocupação com a formação continuada, portanto, em todos os momentos históricos, é possível observar encontros, reuniões, celebrações festivas, celebrações eucarísticas... Que fortaleciam, ampliavam e consolidavam as boas relações entre os colaboradores, além de levar formação para que estes pudessem dar o melhor àqueles que nos são confiados.

A formação permanente dos colaboradores Lassalistas passa necessariamente pelo conhecimento de São João Batista de La Salle. Nesse sentido, diversos Irmãos se empenham e se empenharam ao longo da história para fazer com que todos tivéssemos conhecimento da vida e da obra de São João Batista de La Salle:

Irmão Edgar Hengmüler, Irmão Henrique Justo, Irmão Albino Afonso, Irmão Albano Constâncio. Dentre eles, o Irmão Israel José Nery, que contribuiu enormemente para a confecção deste

livro, merece destaque. E não apenas por ter contribuído com esta obra, mas, como ele pertencia à antiga Província de São Paulo, naturalmente a sua produção intelectual favoreceu aqueles que, como nós, faziam parte desta região administrativa; por isso o destaque.

Em todas as etapas históricas em que pude ter acesso, verifiquei que existe uma constância na formação dos colaboradores Lassalistas. De um lado se insiste na qualificação profissional e, de outro, na formação humana. A ideia é de que ambas as dimensões caminhem juntas, de forma harmônica, para o benefício do estudante.

A formação acadêmica ou profissional é parte integrante da formação dos colaboradores. Assim, além das exigências quanto à capacitação do colaborador, a Rede La Salle fomenta, investe e coloca à disposição diversos meios para que este venha a enriquecer-se e, indiretamente, enriquecer os estudantes. Todavia, a formação acadêmica ficaria claudicante se o colaborador não obtivesse uma sólida formação humana.

Pensando na formação humana, o colaborador tem acesso a dinâmicas, conteúdos, momentos e pessoas que podem auxiliá-lo nesse sentido. Em especial no início de todo ano letivo, em todas as unidades Lassalistas, trabalha-se com questões relativas ao desenvolvimento humano. Além disso, quiçá o mais importante, as unidades da Rede La Salle dedicam-se para que exista um clima propício às boas relações humanas. Cultiva-se em nosso meio

A Gazeta de Botucatu, nº 2.131/2001

Celebração festiva referente ao Dia do Professor.

uma cultura organizacional com enfoque no desenvolvimento humano e cristão.

Para que a unidade educativa Lassalista consiga perseverar com um bom clima

organizacional, a nossa cultura precisa ser conhecida e assimilada. Todo colaborador

deve saber que a nossa missão é formar cristã e integralmente aqueles que nos são confi ados mediante ações educativas de excelência. Para tal, há que se conhecer os princípios que nos orientam, a saber:

Arquivo histórico do Colégio

Um pequeno livro escrito pelo Irmão Israel José Nery que trata da Pedagogia de La Salle, 1976. Assim como outros livros e documentos, ele era utilizado na formação dos professores.

Inspiração e vivência cristã; Fé, fraternidade e serviço; Escola em pastoral; Solidariedade; Participação e diálogo; Ética, cuidado e zelo; Gestão eficaz e eficiente; Sustentabilidade; Inovação pedagógica; Inovação; Inclusão e respeito à diversidade; Cidadania; Serviço educativo a pobres; Formação continuada; Excelência; Família; Competência; Subsidiariedade; Avaliação contínua; Dimensão vocacional; Comunidade.

Nos idos de 2000, 40 professores participaram do II EPEL (Encontro Provincial de Educadores Lassalistas). O primeiro, todavia, não me foi possível descobrir quando foi realizado. Nesses encontros, os colaboradores se reuniam com outros tantos das

diversas obras Lassalistas e trocavam experiências, tinham momentos de formação humana e cristã, eram instruídos por renomados educadores e também se divertiam. Todavia, com a junção das províncias e a concentração das formações, esse espaço de diálogo e formação foi se perdendo e hoje não temos mais.

Outras vias foram criadas para que as mantidas pudessem continuar levando o que há de melhor aos colaboradores no que tange à boa formação. Hoje contamos com formação por intermédio da Universidade La Salle, o Google também faz parte da formação de todos, as editoras FTD e COC, a We are La Salle, enfim, trata-se de uma série de parceiros, dinâmicas e conteúdos para que tenhamos o melhor a oferecer para a boa formação dos nossos colaboradores.

Como é sabido no campo educacional, a unidade escolar é uma entidade viva. Impossível é a pretensão de visualizar todos os eventos que vão se desenrolar ao longo do ano. Assim, uma vez por mês, os colaboradores se reúnem para formação e para calibrar a educação oferecida. Além disso, momentos como reunião com as famílias, Conselho de Classe, entrega de resultados trimestrais, enfim, são momentos que também agregam e qualificam o serviço prestado.

Mantendo a tradição impregnada nos ensinamentos de São João Batista de La Salle, continuamos a levar educação de qualidade sobretudo aos mais necessitados pois, a pensar do tempo ido, não deixou de ser relevante para nós as palavras de La Salle

Arquivo do Colégio

Colaboradores em momento de formação antes do início das aulas de 2020.

Arquivo histórico do Colégio

Momento de formação e descontração antes do início do ano letivo de 2020.

quando diz: “Vós, a quem Deus chamou a emprego que obriga a trabalhar na salvação das almas, deveis preparar-vos, através de longa prática, a vos tornar dignos de tão santa profissão, e a produzir nele muito fruto” 20 .

Contribuição do Professor de Literatura, Bahige Fadel.

Minha vida no La Salle começou quando o La Salle chegou a Botucatu, em 1960. Eu já era aluno da escola. Foi estranho, no começo. Aqueles irmãos vestidos de batina preta e um ‘babador’ branco no pescoço. O primeiro Irmão que entrou em minha sala de aula era o Irmão Geraldo. Apresentouse como professor de matemática. A gente não gostou. Queríamos que continuasse o professor Pedro Torres. E, na minha classe, ele continuou mesmo. O irmão Geraldo ficou na classe dos internos. Sim, naquele tempo, havia internato na escola.

Sou da primeira turma do Curso Científico da escola. Mas não terminei o Científico no La Salle. A família teve sérios problemas financeiros. Por isso, fui para a escola pública. Aliás, os problemas financeiros da família fizeram com que eu desistisse do sonho de ser médico. Escolhi, então, ser professor, pois o curso de Letras, que era em meio período apenas, me permitia continuar trabalhando. Já era radialista. Eu não era formado ainda quando comecei a ministrar aulas. Em 1968, fui ser professor na escola SENAC de Botucatu. No ano seguinte, pedi emprego no La Salle. O diretor era o Irmão Filipe, que tinha sido meu professor de história, no ginasial. Aproveitei meus cinco minutos de fama, ao participar de um programa na TV Tupi – CIDADE CONTRA CIDADE – em que as cidades competiam em várias tarefas. Fui como poeta. Eu era jovem ainda, e consegui vencer o poeta de Taubaté. No dia seguinte, fui pedir aula ao Irmão Filipe. Bingo! Fui contratado na hora.

Comecei fazendo tudo em minha área. Era professor de inglês e português. Em português, não dividia com ninguém. Ministrava gramática, literatura, redação e interpretação de texto. Alguns anos depois, desisti do inglês.

20 Meditação de La Salle 7,1.

Tive consciência de que havia professores melhores que eu para dar aula. Dediquei-me, então, ao português. Apenas nessa última fase de La Salle é que fiquei apenas com literatura. No começo não foi fácil. Fui aprendendo aos poucos. Aprendi com colegas e com os alunos, principalmente. O La Salle tem alunos diferenciados e exigentes. Lembro-me bem de que me avisaram, na época, para tomar cuidado com os alunos do La Salle, pois eles exigiam demais dos professores. Preocupei-me, mas não temi. Isso serviu para que eu me aperfeiçoasse a cada dia. Comecei a perceber melhor as necessidades e as dificuldades dos alunos. Ao mesmo tempo, aperfeiçoei o hábito de estudar e de pesquisar. Hábito que mantenho até hoje. Quando digo aos meus alunos que estudo todos os dias, eles estranham. Por quê? O senhor já não sabe tudo? Boa ocasião para dizer a eles que estudar sempre é uma forma de respeitá- -los. Quanto mais eu me preparo, mais estou dizendo que respeito os meus alunos.

E há outro aspecto ainda. Ser professor não é apenas ter bom conteúdo e saber passá-lo para os alunos. A educação é dinâmica. Se o professor parar no conhecimento adquirido, correrá o risco de transformar-se em museu. Costumo dizer aos meus alunos que o professor ensina mais pelo exemplo que dá do que pelo conteúdo que transmite. O aluno estranha: então não é preciso ter conteúdo? E eu explico para eles: que exemplo ele estará dando, se não tiver um bom conteúdo? Mas isso não basta. O professor deve ter muito mais do que o conteúdo de sua matéria. E o aluno do La Salle exige esse algo mais do professor.

Antes, o Colégio La Salle era um prédio muito menor do que é hoje. Foi modernizando-se aos poucos. Ficou grande, bonito e moderno, mas manteve a sua tradicional fachada. A escola cresceu com a cidade. Adaptou-se às características de Botucatu, para melhor atender à população. É por isso que o La Salle é tão respeitado. Nessa escola, formaram-se grandes cabeças e grandes pessoas. Sim, grandes pessoas, pois para o La Salle não é suficiente lapidar o conhecimento do aluno. É necessário – mais do que necessário – lapidar a sua formação ética, a sua formação como cidadão, como integrante de uma sociedade complexa, que exige de cada um muito

mais do que o conhecimento técnico e científico. E é nesse aspecto que o La Salle se aprimorou. Na formação de um cidadão integral, apto técnica, moral e eticamente para enfrentar a realidade presente e contribuir para a formação de uma sociedade mais solidária.

É nessa escola – Colégio La Salle – que eu aprendi a ser educador. Muito mais do que um professor. É que um professor ensina aquilo que sabe, já o educador ensina o que ele é. Para saber algo, basta estudar um tempo; para ser o que é, é necessário muito mais tempo.

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