No contexto urbano, a luta indígena é por igualdade de direitos

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www.arquisp.org.br | 28 de outubro a 3 de novembro de 2015

| Reportagem | 11

No contexto urbano, a luta indígena é por igualdade de direitos Educação, saúde e demarcação de terras indígenas foram destacados em seminário realizado na quarta-feira, 21, em São Paulo Renata Moraes

jornalismorenata@gmail.com

No Brasil, a população indígena é de 896,9 mil pessoas, de 305 etnias, com 274 línguas ou dialetos diferentes, segundo dados do Censo de 2010, realizado pelo IBGE. Somente no Estado de São Paulo, há 41.794 indígenas, e no município de São Paulo são 12.977, na cidade com a 4ª maior população indígena do País, sendo que 60% desta vive em situação precária. Desse total na capital paulista, 11 mil estão em contexto urbano e mais de mil em aldeias. Ainda hoje, os povos indígenas lutam pela igualdade de seus direitos e por políticas públicas, sobretudo pela demarcação dos seus territórios. Na quartafeira, 21, a Defensoria Pública da União (DPU), em conjunto com o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), promoveu um seminário com o tema “Povos indígenas em contexto urbano: por uma sociedade do bem viver”, em seu auditório, na Consolação. O evento reuniu especialistas, defensores públicos e representantes indígenas que refletiram sobre a situação social das comunidades indígenas, os problemas jurídicos e os principais desafios urbanos atuais. A história da migração indígena para as grandes cidades foi apresentada pela antropóloga e professora da PUC-SP, Lúcia Helena Rangel, com o tema “Pertencimento: Aldeia e Cidade”. Segundo a Antropóloga, o fluxo migratório dos indígenas para São Paulo no passado recente se deu devido a conflitos com fazendeiros, questões de saúde e trabalho em diferentes regiões do País. O Estado de São Paulo possui dois

Fotos: Luciney Martins/O SÃO PAULO

conselhos dos povos indígenas: um municipal e um estadual, mas na opinião de Benedito Prezia, assessor do CIMI e coordenador da Pastoral Indigenista da Arquidiocese de São Paulo, esses conselhos não funcionam. “Em São Paulo podemos mapear as prefeituras que têm um trabalho mais consistente. São poucas. Para as outras, índio é folclore”, afirmou. Segundo Roberto Antônio Liebgott, coordenador regional do CIMI-Sul, ainda existem muitas dificuldades para garantir os direitos indigenistas, sobretudo nos âmbitos dos três poderes. Ele acredita que a PEC 215, que prevê que as demarcações das terras indígenas saiam do Poder Executivo e passem a ser de responsabilidade do Legislativo, pode paralisar as demarcações de terras. A Irmã Michael Mary Nolan, assessora jurídica do CIMI, lembrou que “na área criminal, o povo indígena é invisível. Existe uma ausência na identificação da etnia e da língua materna desse povo no processo penal”, lamentou.

Por educação, saúde e moradia

No seminário, representantes das aldeias Guarani Mnyá, Pankararú, Kaimbé e Potyguara apresentaram seus anseios em temas como educação, saúde e moradia. “O índio precisa de um pedaço de terra para sentir o nosso chão e as energias da terra”, expressou Alaíde Pereira Xavier, da etnia Pankararé, que há dez anos luta pela criação de um espaço de referência em Osasco (SP), onde vive. Aparecida Ana, da aldeia Pankakaru, pontuou que apesar da lei nº 11.645/2008 tornar obrigatório o ensino da história e da cultura indígena no ensino público, o indígena ainda é retratado nos livros didáticos com estereótipos e preconceitos. “Se é ensinado para a criança que o indígena é um ser atrasado, ela não vai ter a capacidade para entender a situação dele na sociedade atual. Quando falam que somos de um jeito que não somos, isso também é violência”, afirmou, destacando, ainda, ser necessário capacitar

A cacique Alaide Pereira, da etnia Pankararé, luta pela criação de um espaço de referência

os docentes para que possam ensinar a importância de reconhecer os indígenas como pilares na formação brasileira e como sujeitos da história. “Eu não escolhi estar em São Paulo. A necessidade de tratamento médico contínuo me fez estar aqui”, expressou Égina Gonçalves, da etnia Kaimbé, que deixou sua aldeia em Euclides da Cunha (BA), para buscar atendimento médico especializado em São Paulo. “Em algumas aldeias existem Unidades básicas de Saúde (UBS), porém só tratam de doenças comuns. Quando o problema é mais grave ou crônico, ai temos que sair de nossas aldeias. Lutamos para que a sociedade

entenda que os indígenas precisam de uma saúde diferenciada”, enfatizou, comentando, ainda, que a mortalidade infantil, as doenças respiratórias, o câncer, a malária e a desnutrição são ainda os maiores problemas de saúde da população indígena. Os serviços de saúde são garantidos aos povos indígenas por meio do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena. A coordenação e gestão deste cabe à Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), ligada ao Ministério da Saúde. Estados e municípios podem atuar de forma complementar no custeio e execução das ações do Subsistema.

8ª Retomada Indígena reforça busca por garantias de saúde Também debatendo sobre os direitos dos indígenas, especialmente sobre as questões de saúde, aconteceu entre os dias 21 a 23, na PUC-SP, a 8ª edição da Retomada Indígena, promovida pelo Programa Pindorama da Universidade e o Museu da Cultura, com o apoio do CIMI, Pastoral Indigenista e Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos. Um dos participantes da atividade foi o médico indigenista Marcos Schaper, da Unifesp, que coordena o projeto de Saúde Indígena da SPDM- Associação Paulista para o Desenvolvimento da

Medicina Unifesp, que em parceria com a Sesai, possui um convênio que oferece tratamento diferenciado aos indígenas nas aldeias. Doutor Marcos contou aos participantes a sua experiência no trabalho com os indígenas desde 1999, quando iniciou o Projeto Xingu. Para ele, além de um tratamento diferenciado nas aldeias, é necessário trabalhar a prevenção de doenças e promover campanhas de saúde, e também criar um projeto voltado para os indígenas que vivem fora das aldeias.

“Para trabalhar nas aldeias é essencial que se conheça a realidade dos indígena. Os profissionais não indígenas têm mais dificuldade pois não conhecem a nossa realidade”, expressou Jibran Xokleng, formado em Serviço Social e também atua no programa da SPDM/ Unifesp.

Programa Pindorama

Criado em 2001, numa parceria entre a PUC-SP e a Pastoral Indigenista, o Programa Pindorama visa a inclusão de indígenas no ensino superior, por

meio de 12 bolsas de estudos oferecidas anualmente na pontifícia universidade, àqueles que são aprovados no vestibular e comprovam ser de etnia indígena. Em 14 anos de existência, passaram pelo Programa 165 alunos, dos quais 67 se formaram na PUC-SP e sete concluíram o curso sem a bolsa de estudo ou em outra universidade. Atualmente, a iniciativa contempla 20 jovens, sendo dez moças e dez rapazes, conforme informou Benedito Prezia, coordenador do Programa Pindorama. (RM)


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