Bastião #16

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aos jovens que, como nós, sonharam

edição 16 ano 2 2013

bastiao.net

trabalhadoras

desigualdade de gênero

charlie bugre

música, boemia e memórias

fernando gabeira as rugas e o brasil de


Q

uanto custa nascer mulher? Em nossa reportagem especial, uma grande soma de números prova que vivemos em uma sociedade extremamente machista e que, ainda por cima, acredita que muito evoluiu. A grande barreira é o machismo cultural, invisível, intrínseco ao pensamento mais “inocente”. Nesse contexto, é importante trazer à tona e não permitir que ele se disfarce. Mas onde se esconde nosso machismo? Essa reflexão é trabalhosa. Na Revista Bastião, admitimos humildemente, ele se escondeu na falta de senso crítico (ou de autocrítica). Vergonhosamente, são 16 edições sem sequer uma mulher entrevistada em nossa seção “Veja Bem”, por exemplo. Fato percebido, acreditem, apenas depois de 16 edições. Um ano e meio negligenciando pautas importantes, temas essenciais na construção de uma democracia real, pois só existe democracia verdadeira onde há igualdade de gênero. O Bastião é, sim, uma equipe de maioria masculina, mas seria esse fato uma boa desculpa? Que um NÃO alto e sonoro possa gritar na tua mente agora, leitor. Que a luta feminista não seja só das mulheres. Que as vozes femininas tenham destaque em todas as esferas e que os homens estejam junto, lutando em cada pequena batalha. Caras leitoras e caros leitores, esta edição é dedicada a um novo posicionamento, como Bastião que seremos da causa feminista. Sigamos!

Para ter a cabeça no lugar, às vezes é preciso perder alguns parafusos. É o que Nádia Alibio fez e faz pelo flickr.com/photos/mirabolante_nadia

Redação André Lacasi, Arthur Viana, Carlos Machado, Cíntia Warmling, Douglas Freitas, Gabriel Rizzo Hoewell, Gilberto Sena, Ingrid Haas Pilar, Luiza Müller e Sérgio Trentini Projeto gráfico e editoração Ana Elizabeth Soares e Ramiro Simch Revisão Lisiane Danieli

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Praça Júlio de Castilhos, 74/152 - Porto Alegre - RS - Brasil / (51) 3311.1025 / Janeiro de 2013

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Tiragem Mil exemplares Comercial (51) 8480.1360 / bastiao@bastiao.net

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Colaboradores Nádia Alibio, Felipe Baierle, Isadora Brandelli e Sayuri Kubo

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Relacionamento Ana Paula Neri e Samantha Diefenthaeler Fotografia André Lacasi e Maurício Pflug

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Capa Ramiro Simch Arte André Lacasi, Dante Roman, Paulo H. Lange e Ramiro Simch

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veja bem

DE BLAZER E CAMISA FLOREADA Há 50 anos na política, Fernando Gabeira reflete sobre a militância contra a ditadura e sobre as novas formas de se fazer política

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blazer escuro falhava miseravelmente ao tentar esconder o espírito de Fernando Gabeira, escancarado pela camisa floreada que vinha logo abaixo. Célebre por ter se declarado favorável à legalização da maconha, pelas posições em defesa do meio ambiente e das minorias, Gabeira é membro-fundador do Partido Verde, jornalista, escritor e ex-deputado federal pelo Rio de Janeiro. Já soma 50 anos de atividade política. Mas, antes de gozar dos benefícios e contradições da democracia, ele precisou lutar contra a ditadura dos militares: atuou no Movimento Revolucionário Oito de Outubro (MR8), participou de sequestros, foi alvejado por revólveres, preso, torturado e exilado. Viveu 10 anos longe do Brasil, passando por Chile, Itália e Suécia, onde estudou Antropologia. Na volta, após a Lei da Anistia, em 1979, seguiu lutando, através do jornalismo e da escrita, pelo fim do regime militar. Nosso encontro ocorreu em uma sala reservada do Aeroporto Internacional Salgado Filho. Gabeira estava em rápida passagem por Porto Alegre, vinha participar de um fórum que debatia a defesa dos animais e, poucas horas depois, embarcaria novamente para seguir divulgando seu recém-lançado livro Onde está tudo aquilo agora? – Minha vida na política. A obra, segundo ele, “é um balanço da minha vida na política, desde quando eu comecei a atuar no movimento estudantil. Eu conto os principais episódios que vivi, as principais situações do Brasil, as principais esperanças que nós tivemos e dou um balanço do que restou dessas esperanças. Então, o livro é, na verdade, uma avaliação de 50 anos de atividade política no Brasil.” Antes de conversar conosco, atende a telefonemas de diversas partes do Brasil. Pouco mais de 12 horas antes, falecera Oscar Niemeyer, e a morte – que parecia que nunca viria – ainda repercutia nas rádios. Queriam saber de Gabeira qual sua relação com o maior arquiteto brasileiro. O entrevistado se disse grato pelo apoio de Niemeyer à sua candidatura na prefeitura do Rio de Janeiro. Não negou, porém, as divergências políticas: “Eu tenho uma visão critica do comunismo e do que ele representou; ele se manteve fiel a essas ideias.”

Gabriel Rizzo Hoewell

entrevista Arthur Viana e Gabriel Rizzo Hoewel


No começo da sua carreira política, o senhor foi um importante militante de esquerda, em especial na luta contra a ditadura. Os próprios militantes, já na época, faziam uma autocrítica desse movimento. Como o senhor analisa os anos de luta contra os militares? Onde o movimento errou e acertou? Nós vivíamos sob o impacto da Guerra Fria. O mundo estava dividido entre o capitalismo e o socialismo, e nós fizemos uma opção pelo socialismo contra o capitalismo. Essa opção já foi um pouco romântica, porque o socialismo pelo qual nós estávamos lutando não se revelou exatamente o que a gente esperava quando nós fomos visitar e viver nos países onde ele existia: em Cuba, na Rússia, nos países do Leste Europeu, na Alemanha Oriental. Ficou bastante claro pra nós que o socialismo pelo qual lutávamos não era realmente o sistema que imaginávamos. O fato de nós termos optado por isso não significa grandes questões – porque você pode mudar em um certo momento, chegar a outra conclusão – mas, de qualquer maneira, foi um erro. O segundo erro que me pareceu grave foi ter optado pelo caminho armado. Nós não tínhamos condições de enfrentar a ditadura militar de uma forma eficaz, lutamos contra ela armados e acabamos involuntariamente contribuindo para que ela ficasse mais sólida e mais repressiva contra grupos que não atuavam com violência. A opção pelo socialismo e pela luta armada foram, naquele momento, erros históricos. O senhor chegou a dizer que se lutava contra a ditadura instalada; não se lutava por uma democracia, mas sim por uma ditadura do proletariado. O que eu disse na época e digo agora é que havia, entre os opositores da ditadura, gente que estava lutando pela democracia e gente que estava lutando pela ditadura do proletariado. O que é a ditadura do proletariado? Uma forma de governo que era proposta pelo Partido Comunista, especificamente pelo Lenin. Dizia-se que nós íamos partir para o socialismo, através da ditadura do proletariado íamos eliminar a exploração do homem pelo homem e chegaríamos ao comunismo. Então, essa forma, a “ditadura do proletariado”, é uma ditadura. Portanto, o que eu digo é que estávamos lutando, dentro dos conceitos da formulação da nossa política, por uma ditadura do proletariado. Isso estava presente em todos os programas políticos que tínhamos.

quarta página

Na campanha de 1986, o senhor fez algo diferente do que se via normalmente na militância política, com a passeata “Fala mulher”, que coloriu as ruas com flores, e o “Abraço à Lagoa”. É possível que a forma de se fazer a militância política hoje esteja equivocada e acabe afastando as pessoas em vez de atraí-las? Eu acredito. Os partidos políticos atraíram pessoas muito oportunistas e não formulam mais muito sobre a vida do País, o futuro, o horizonte. Eles ficaram muito presos aos seus programinhas, aos empregos que disfrutam, ao pequeno poder que também disfrutam. Quando nós fundamos o Partido Verde, já discutíamos muito se o partido político era um instrumento. A gente achava que o partido politico

já estava esgotado como instrumento, mas não tínhamos achado outro ainda. Daí a gente ter feito o Partido Verde como uma tentativa de ser um partido diferente de todos os outros, mas que pudesse apresentar uma proposta para o futuro, para a sociedade. Com o tempo, a gente percebeu que o próprio Partido Verde ficou um pouco velho. Ele, de certa maneira, ficou parecido com os outros. Hoje, eu continuo olhando para sociedade para ver quais são as formas de organização que podem suprir esta lacuna que os partidos deixaram. E, olhando a sociedade, observando como eles se comportam, eu acho que talvez essa lacuna não seja preenchida por um novo partido. As formas de organização que se deram a partir das novas tecnologias, dos novos meios tecnológicos, mostram que a rede hoje é um instrumento muito mais eficaz de organização do que o próprio partido. É possível, através da rede, você trocar informações, trocar ideias, chegar a conclusões interessantes e inclusive programar ações.

“A liberação da maconha só é possível com uma reforma da polícia também”

Como, no sistema político que temos hoje no Brasil, que envolve diversas alianças entre diversas siglas, um partido menor chegaria ao poder? Olha, eu acho difícil. Eu sempre achei que é muito difícil você chegar sozinho e é também extremamente difícil chegar com os outros. Chegar sozinho é difícil porque você não colhe os votos necessários; chegar com os outros é problemático porque você tem que dividir o poder, você tem que lotear o governo entre os partidos aliados. A fórmula que eu encontrei no Rio de Janeiro, em 2008 [para prefeito] e 2010 [para governador], para disputar foi a seguinte: “Olha, nós vamos disputar as eleições com um pequeno partido, os outros partidos apoiam, mas nós não vamos ratear o governo. Nós vamos colocar no governo pessoas competentes da sociedade e só aceitaremos a presença de políticos dentro do governo se eles forem capazes e honestos e estiverem preparados especificamente para aquele lugar que eles ocupam.” Foi a maneira que eu achei para contornar esse problema. Sem alianças, você não chega ao governo; com alianças, você chega desfigurado. A única forma é chegar ao governo de uma maneira tal que você pré-estabeleça que não vai ratear. O senhor sempre é referência quando o debate é a maconha. Hoje, testemunhamos a movimentação no Uruguai em prol da legalização. Qual a sua opinião atualmente: a legalização da maconha no Brasil seria um avanço ou um retrocesso? Este tema nós começamos a discutir no Brasil em 1996, mais ou menos. Eu estava vindo da Europa com a posição de lutar pela legalização e o governo decidiu, naquele momento, que precisava renovar a lei – não legalizar, mas atualizar a lei no Brasil. Então ele chamou a mim e estimulou que fizéssemos um grande debate nacional sobre o tema. E fizemos isso – eu defendendo a liberação. Mas com o tempo eu percebi que discutir só liberar ou não é muito limitado. Você tem uma série de argumentos pró, uma série de argumentos contra. Eu já conhecia os argumentos contra, meus


Gabriel Rizzo Hoewell

“A rede hoje é um instrumento muito mais eficaz de organização do que o próprio partido”

companheiros conheciam os argumentos a favor, mas o que mais me interessa hoje é exatamente saber como é possível realizar isso. Alguns países que legalizaram, como a Holanda e a Inglaterra (em certas áreas), fizeram com a orientação da própria polícia. A polícia na Inglaterra orientou a liberar onde há muitos imigrantes jamaicanos e um consumo grande de maconha porque ela dizia o seguinte: ”Cada pessoa que eu prendo com um baseado eu tenho que fazer quatro horas de processo, então é muito tempo pra nós, nós temos coisas mais importantes para fazer.” Então foi a polícia que orientou. Também na Holanda eu pude observar, nos coffeeshops, onde se fuma, que lá é proibido você entrar de chapéu. Porque eles estão filmando, tudo é filmado. Então a ideia que a gente tem da Holanda, de que liberou geral, não

é bem assim. Talvez a ideia mais próxima seja de que é um controle mais sofisticado. Então a minha posição é a de que a liberação só é possível com uma reforma da polícia também. A polícia no Brasil hoje é incapaz de reprimir porque é cooptada pelo tráfico. Anteontem mesmo prenderam 60 PMs [policiais militares] de Caxias [Duque de Caxias, no Rio de Janeiro] que estavam envolvidos com tráfico de drogas. Sessenta! Praticamente quase todos do batalhão, né!? Então ela não tem condições de reprimir e não tem condições de liberar, porque também os efeitos colaterais têm que ser tratados. Portanto, é preciso uma reforma da polícia. A gente tem que ter uma polícia melhor preparada, melhor paga, melhor treinada, para que realmente a gente possa pensar nisso.


especial

Mulher: mão de obra barata

As brasileiras ganham menos e trabalham mais, são mais capacitadas e ocupam os piores cargos, dividem-se entre emprego e tarefas domésticas e chegam a trabalhar 30 horas a mais que os homens. texto e reportagem Luiza Müller

Maria acorda todos os dias, religiosamente, às 5h30min. Pega o ônibus das 6h e o trem das 6h25min. Bate o ponto às 7h15min. Maria é daquele tipo de gente que rasga na cara o sorriso para desviar a lágrima que insiste em destacar o som do choro e a cor do rosto. Na suada carteira de trabalho, Maria tem a assinatura do chefe, a ocupação: “auxiliar de limpeza”; o salário: “setecentos reais”; e 12h de trabalho. Só não tem registrada a casa, o marido e os dois filhos que possue para cuidar. “Maria, Maria...”, dizia a mãe, “quem traz no corpo o marca do ser mulher, mascara a dor com a alegria”. “Eu sei...”, responde ela ao conselho. “Mas é preciso ter força, raça... É preciso ter gana sempre!”, relflete,um tanto cansada, a mulata de 29 anos. “É preciso ter graça e sonho também, filha. Aliás, quem possue na pele essa marca, possue a estranha mania de ter fé na vida.” Essa Maria não existe, mas já foi inspiração para muita gente. Já foi musa de música e agora é personagem de reportagem. Não só essa Maria, mas todas as outras que, passo a passo, buscam a gana, a graça, a força e o sonho para ocupar o seu espaço como profissionais no Brasil machista de nossos tempos.


Desigualdades combinadas

Manufatura e Construção (28%); Ciência (38%); e Agricultura (41%) (dados do relatório Education at Glance, da OCDE - Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico). Beatrix Ramos Rizzo, de 55 anos, é uma das que marca presença nas áreas de dominação masculina. Natural de Santa Catarina, Beatriz começou a trabalhar aos 18 anos no escritório de engenharia do pai, como office boy. Mais tarde, estudou e se formou em arquitetura. “Minha maior conquista é gostar do que faço e dominar minha profissão, mas existem muitas barreiras nessa área. Como mulher, preciso me impor para ser respeitada. Trabalho com um monte de homens em obras (pedreiros, eletricistas, trabalhadores de obra em geral). Quando discuto com eles, muitas vezes, o cliente prefere acreditar nos homens”, conta Beatrix. Tais dados deixaram o Brasil atrás de 79 países em um ranking de 146 nações elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). O Índice de Desigualdade de Gênero (IDG) leva em consideração, além do mercado de trabalho, indicadores como a saúde reprodutiva e capacitação profissional. Ele é utilizado como um dos indicadores que influenciam o cálculo do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Dessa maneira, o Brasil revela-se um país pouco democrático em termos de gênero, ficando atrás dos latinos Chile, Argentina, Peru, México e Venezuela e até dos árabes, como Líbia, Líbano e Kuwait. Sayuri Kubo

“Muitos ainda questionam reverter estas profundas desigualdades. Nossa Secretaria não é um adorno, nem um compensatório”, dispara Márcia Santana, secretária de Políticas Públicas para Mulheres do Rio Grande do Sul, a respeito da condição feminina e suas demandas. Filha de pai metalúrgico sindicalista e mãe dona de casa, Márcia viveu a movimentação social desde os primeiros anos de vida, assistindo ao trabalho do pai. Entretanto, foi cedo também que a menina observou a divisão natural das tarefas dos homens e mulheres a sua volta, e o tempo mostrou-a as demandas feministas pelas quais valia lutar. “Sempre tive interesse pelas questões sociais em geral. Mas, eventualmente, acabava no colo das mulheres”, explica ela a respeito de sua trajetória. Essa luta, que tem sido de muitas mulheres ao longo do tempo, ocorre desde a primeira greve de costureiras, em São Paulo, no início do século passado, e caminha a passos pequenos, porém bem postos, na sociedade brasileira. Apesar da condição de gênero mostrar-seuma questão aparentemente secundária, o campo profissional é o quepermanece mais carente de reformulações culturais. A aproximação feminina no universo profissional nunca significou uma redivisão de tarefas e papéis entre homens e mulheres. Mesmo no campo das atividades remuneradas, o papel de “cuidadora” manteve-se e representa 34% da mão de obra feminina (o chamado “setor de serviços sociais”, como educação, saúde, serviços domésticos, etc.). Para explicar essa naturalização do que seria o “papel da mulher” é necessário buscar as razões culturais enraizadas em nossa educação. Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2009 mostram que 24% das meninas de cinco a nove anos de idade dedicam em média seis de suas horas semanais ao trabalho doméstico da própria casa. Tal número cai para 14,6% no caso dos meninos, que dedicam cinco horas. Fatores culturais, passados de geração em geração, que delimitam as diferenças de gênero e fazem com que 90% das mulheres adultas realize tarefas domésticas, sendo que apenas 50% dos homens o fazem, de acordo com a mesma pesquisa.

Jornada que só mulher aguenta Para a maioria das mulheres casadas e/ou chefes de família, a equação “Trabalho=vida” é o mais verdadeiro cálculo. Ainda segundo dados da PNAD, as mulheres gastam, em média, 26,6 horas por semana em afazeres domésticos, contra 10,5 para o público masculino. Além disso, quanto mais filhos na família, maior o tempo despendido pela mulher nas tarefas da casa. Já no caso do homens, há, inclusive, uma redução: quando o homem não tem filhos, dedica cerca de 11,7 horas ao trabalho e, quando tem, o tempo cai para 10 horas. Ou seja, somando-se a “jornada doméstica” às 40 horas de trabalho fora de casa, a mulher pode atingir

Sayuri Kubo

Diploma, a conquista feminina Entretanto, outro fenômeno vai na contramão deste eterno estigma imposto às meninas. Hoje, elas são maioria no mundo acadêmico e se apresentam como a mão de obra mais qualificada.No ano de 2010, por exemplo, 63% do total de títulos acadêmicos de nível superior foram concedidos a mulheres no Brasil. Marli Bianchi Erthal, 45 anos, mãe e avó, obteve seu primeiro diploma aos 35 anos, quando se graduou em Biologia. Atualmente, a filha de pedreiro e de dona de casa, cursa a segunda faculdade, e explica que criou as duas filhas para seguir um caminho profissional de maneira independente. “Mas para a mulher o trabalho e o estudo são sempre mais difíceis, especialmente quando se tem filhos”, conclui. “Sempre nos preocupamos se estão bem, se não estamos negligenciando seus cuidados. Hoje, minhas filhas estão criadas e posso me dedicar mais aos meus estudos. Entretanto, vejo o mesmo dilema na Lívia [sua filha mais velha], que está com dois pequenos”, conta a avó da Laura e do Francisco. Mesmo com suas conquistas acadêmicas, a renda de uma mulher com diploma universitário é, em média, 61% menor que a de um homem com o mesmo grau de instrução. Como se não bastasse, o Censo Demográfico mais recente, realizado em 2010, revela que o rendimento médio mensal dos homens com carteira assinada foi de R$ 1.392, enquanto o das mulheres foi cerca de 30% abaixo disso, atingindo R$ 983. Além disso, elas são minoria nos setores de Engenharia,

Anair Pereira Nunes nasceu no interior do estado. Aos 18 anos teve o primeiro filho. Seu primeiro emprego de carteira assinada foi aos 31 anos, no ramo da limpeza. "Resolvi trabalhar fora apenas depois de criar meus três filhos", explica ela. Hoje, Anair tem 62 anos e trabalha como vendedora no centro da capital. "Eu vejo bastante gente, converso. Gosto do meu emprego", completa ela.

Tâmara Cerpa tem 15 anos e passa por sua primeira experiência de trabalho. Nos últimos 10 dias tem cuidado da banca da mãe, artesã chilena. "Cresci vendo minha mãe trabalhar na Andradas e brincando na praça", conta ela, que complementa: "Mas pretendo seguir os passos de meus irmãos e fazer faculdade de Ciências Sociais".


inecreditáveis 70 horas de trabalho semanais. Para encarar uma jornada dessa magnitude, a mulher brasileira necessita de programas governamentais que a amparem e aliviem sua “carga de trabalho cultural”. Em entrevista, no ano de 2010, Rosane Silva, secretária nacional da Mulher Trabalhadora da Central Única dos Trabalhadores (CUT), declara que: “Em nenhum momento as creches que nós temos no país foram pensadas como um direito das crianças e um direito das mulheres, como algo feito para tirar um peso das nossas costas. Isso nunca foi pensado como um direito nosso. Tanto que hoje, o pouco que se tem de creche no Brasil são creches para as mulheres que estão no trabalho formal. Uma das nossas lutas são as creches nas áreas rurais. Não tem nada de creche nas áreas rurais. E muitas mulheres acabam, às vezes, levando seus filhos para a roça porque não têm com quem deixá-los.” Rosane Beatriz Köhn, xará da secretária e mãe de dois filhos já criados, conta que, desde pequena, trabalhava com os pais na roça. “Sou natural de Santa Cruz. Meus pais nunca fizeram distinção entre os dois filhos homens e as quatro filhas mulheres. Todos sempre tivemos de acompanhá-los e ajudar na lida com os bichos e as plantações.” Essa e outras reivindicações, como as lavanderias coletivas (que aliviariam parte do trabalho doméstico feminino) são pautas que permanecem exclusivamente nas mãos das mulheres, tanto dentro dos sindicatos, como no poder público. “Se as mulheres não estão na mesa de negociação, é o primeiro tema que sai da pauta. É considerado o menos importante”, considera Rosane Silva, que completa: “Na visão dos homens, o mais importante é: garantir participação nos lucros, garantir aumento salarial... e as questões de condições de trabalho e até mesmo de cláusulas sociais são consideradas menos importantes.” Rosane Köhn parou seus estudos na quarta série do primário. Nos anos 1980 passou a trabalhar na metalurgia, ambiente tradicionalmente masculino. “Foram sete anos de trabalho. Lá conheci meu marido. Quando casamos, fui demitida, eles não deixavam haver casais entre a equipe”, conta Rosane, que em seguida, conseguiu um novo emprego. No entanto, não demorou muito para que ela mesma se demitisse – estava grávida. Naquele momento, a vontade de cuidar do filho foi mais importante do que a condição financeira. “Minha prioridade passou a ser meus filhos. Sofria muito em ter de deixá-los com desconhecidos na escolinha ou sozinhos”, lembra.

Sayuri Kubo

Aisha Padilha da Silva é vendedora e sonha cursar Hotelaria, mas lembra: "Quem entra no ramo de vendas, dificilmente sai depois". A menina de 21 anos mora com a mãe e a irmã e explica que, como chega muito tarde em casa, quem cuida das tarefas da casa são as duas. "Quando chego, já está tudo pronto", brinca ela.

tema foi: “Mulheres, poder e decisão”. Hoje, a população feminina representa mais da metade do eleitorado. Além disso, já são quase 50% da população economicamente ativa do país. Contudo, não estão nem em 20% dos altos cargos no Parlamento, governos municipais e estaduais, secretarias do primeiro escalão do Poder Executivo, Judiciário, sindicatos e até nas reitorias. Nas últimas eleições presidenciais, as candidatas ficaram apenas com 12,9% das cadeiras nas Assembleias Legislativas, 8,5% na Câmara dos Deputados, 9,8% no Senado e 7,4% dos governos de estado. No entanto, esse quadro de maioria masculina não é exclusividade das terras tupiniquins. No mundo todo, apenas 35 países (19% do total) contam com mulheres no Parlamento. Ademais, outras 152 nações (81% do total) não possuem uma mulher sequer em seus Parlamentos, de acordo com a União Interparlamentar (IPU). Em termos de gênero, o Brasil é um país de contradições – local onde uma menina estuda e trabalha mais que os meninos e, ao mesmo tempo, é menos valorizada tanto em oportunidades profissionais, quanto em salários. Além dos fatores históricos, o fator de maior influência nessa realidade é o cultural. “A igualdade de oportunidades para homens e mulheres é um princípio essencial da democracia. Gostaria muito que os pais e as mães de meninas olhassem hoje nos olhos delas e lhes dissessem: ‘Sim, a mulher pode!’”, declarou a terceira mulher mais poderosa do mundo, segundo a revista Forbes, e também presidenta do Brasil, Dilma Rousseff, em seu discurso de posse.

Em 2009, um levantamento feito com 89.075 empresas privadas brasileiras (feito pela Catho Online) apontou que as mulheres ocupavam apenas 21,4% dos cargos de chefia. O mesmo quadro apresenta-se em outras esferas, como a sindical e os cargos de livre nomeação e exoneração do Poder Executivo. Basicamente, quanto mais alto o cargo, menor o percentual de mulheres. “A grande questão é que essa é uma luta apenas feminina. Para que mulheres ocupem determinados locais, alguns homens precisam sair, eninguém quer perder o seu espaço”, considera Márcia Santada, da Secretaria de Políticas Públicas para Mulheres. Hoje, o sistema de cotas femininas nos partidos políticos está em vigor. Entretanto, assim como em outras esferas, os fatores culturais são decisivos. “A rotina de uma mulher influencia muito. Um homem, quando se torna candidato às eleições, tem a possibilidade de se dedicar exclusivamente à sua camapanha. A mulher, na maioria dos casos, irá colocar a família a frente de seus compromissos políticos”, reflete a secretária. É o que mostram os números levantados pelo último relatório do Observatório Brasil da Igualdade de Gênero, cujo

Sayuri Kubo

No poder, somos a minoria

Taís Silveira é professora. Com apenas 19 anos de vida, já se vão dois de profissão. "Fiz magistério no colégio e agora curso o terceiro semestre de Pedagogia. Sou apaixonada pelo meu trabalho", conta. Quem passa pelo centro durante as férias escolares também pode ver a professora divulgando planos de empréstimos na rua. "Para ganhar um dinheiro extra", explica.


No sábado à noite, as pessoas no cruzamento da Lima e Silva com a República atingem o máximo da sua capacidade em ignorar o mundo. Nem notam o mendigo com saco preto catar latinhas ao mesmo tempo em que canta, aparentemente apaixonado. Embriagado de cachaça, ele mete o olhar vago bem no fundo da cara dela, que só ele, ao menos ali, enxerga de verdade. E canta com a língua enrolada, “olha, da primeira vez que eu estive aqui, foi em busca de carinho, eu precisava de alguém...”. Perto da meia-noite o tráfego aumenta. O cruzamento da Lima e Silva com a República recebe em torno de 25 carros por minuto e as pessoas a pé, nesse tempo, passam de 80. Gente que atrai todo tipo de trambiqueiros. Pela bagatela de cinco reais, dá pra comprar um isqueiro com lanterna embutida que projeta o símbolo do Grêmio ou do Inter; DVDs piratas de filmes ainda em cartaz nos cinemas; CDs com raridades da história da música; pulseiras, brincos, anéis e colares; ou, em alguns casos, sustentar os pais de crianças pedintes. Um careca sentado com um amigo na mesa do Pinguim, tradicional bar da Cidade Baixa, fala ao telefone sem perceber a menina de no máximo 12 anos que se aproxima. Cabelo encaracolado preto, olhos castanhos, calças velhas, olhar diligente, ela entrega um papelzinho por pessoa. “Pedir é melhor que roubar...”, lê-se. Depois de distribuir o material, passa novamente entre as mesas e recolhe a féria. São algumas moedinhas apenas. Mas multiplique o valor por oito irmãos e calcule o lucro do negócio. Ainda mais que eles vêm de ônibus do Morro Santa Tereza e passam por baixo da roleta − gasto zero com transporte. O careca segue no telefone: “Me espera acordada, vou passar aí lá pelas 3h30”, sorri malicioso. Enquanto isso, a criança faz o trabalho. Fala apenas o necessário, permanece transparente. Para e conta as moedas conquistadas no bar. Ninguém a vê até que derruba cinco centavos. Olha pro chão, desconsolada. Perdeu a moeda. Pequenas rugas aparecem pouco a pouco no queixinho. Chorando alto ela começa a chamar atenção. De joelhos, no chão, a criança sozinha muda o clima da noite. O bar silencia contemplativo naquele trecho. O pânico de perder uma única moeda dá a dimensão da menina, como escrito no papel: “... preciso ajudar minha família”.

A cidade que se revela invisível Texto Felipe Baierle Desenho P.H. Lange


cifrada

Todo astronauta que se preze Não deixa por menos Traz uma gravata de Marte Uma camisa de Vênus Cachorro que late não morde Enquanto está latindo Eu costumo ficar acordado Quando não estou dormindo Depois que eu como Perco o apetite Duvide ou não acredite texto e reportagem Giberto Sena Eu sou apenas um sujeito normal

UM SUJEITO NORMAL Se as ruas de Porto Alegre falassem, reclamariam de terem sido usadas demais por Charlie Bugre: músico, poeta e, especialmente, boêmio. Ou agradeceriam a eterna companhia. texto e reportagem Arthur Viana e Gabriel Rizzo Hoewell

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elevador sobe ao sexto andar com uma rapidez de embrulhar o estômago. Caminhamos até o quarto 617 do Hospital Ernesto Dornelles, em Porto Alegre. Sobre o leito, Carlos Roberto Pezzi de Almeida se apresenta com surpreendente empolgação, quase se levantando. Prazer, Carlos – ou Charlie, que nem cantor de rock americano. Não era no hospital que esperávamos encontrar Charlie. Poderia ter sido tocando clássicos do blues pelos bares da Rua Duque de Caxias. Poderia ter sido rodeado por bugios


no sítio onde vive, em Viamão. Poderia ter sido no palco do Auditório Araújo Viana, se chegássemos 30 anos antes. Mas Charlie sumiu algumas vezes, e, em um mês de procuras, reviravoltas se deram na mesma proporção em que elas ocorreram nos 60 anos de vida daquele homem. O futuro, com o qual Carlinhos parece nunca ter se preocupado muito, quis que o encontrássemos tomando soro na veia e 10 quilos abaixo de seu peso ideal. Com pele, cabelos e olhos escuros – combinação que lhe rendeu o sobrenome Bugre –, ele contrasta com a brancura do local. Charlie, ali, sentado na cama, nós em volta, em pé, com gravador à mão. Olhávamos aquele personagem folclórico das ruas portoalegrenses com certa admiração. Apesar da fraqueza física, Charlie não demonstrava fragilidade. “Eu vou sair dessa, daí a gente se pecha no bar.” Em quatro décadas, Charlie movimentou o cenário cultural e boêmio porto-alegrense: compôs inúmeras músicas – calcula sessenta entre as melhores: trinta em inglês, trinta em português –, formou três bandas (Auge Perplexo, Star Rats e Funeral), organizou festivais. Foi um dos precursores do Auditório Araújo Viana, organizando mensalmente o evento Fenasom, que reunia diversas bandas da cidade para apresentações no local. A primeira edição do festival foi em 1972, mas a falta de patrocínio fez a ideia durar não mais que alguns anos. “Fazíamos sem patrocínio, não dava lucro, dava até prejuízo, mas era mais para desenvolver o trabalho.” Apesar de sempre envolvido com música, Charlie diz que nunca tirou dela o seu sustento. O motivo da movimentação, segundo ele, era o “amor à camiseta”: “Valeu pela tentação de se fazer alguma coisa”, conta. A voz rouca de Bugre segue relembrando causos da trajetória daquele que já foi chamado de “Bob Dylan portoalegrense” − o que, para ele, é uma grande bobagem: “Não precisa copiar ninguém, tem tanta coisa pra se criar no mundo.” A memória hesita, é verdade, mas lembra bem das dificuldades que os artistas independentes passavam nas décadas pré-internet, quando, em busca de divulgação, viam-se obrigados a assinar contratos com gravadoras. Carlinhos nunca se interessou em seguir esse caminho; achava que assim perderia sua autonomia: as músicas não devem ser feitas para serem vendidas. “Geralmente, quando se entra na gravadora, o cara não manda mais na música, quem manda são eles, que querem o que vende”. Hoje, para ele, a situação está facilitada, pois “é possível se autopatrocinar” e divulgar os trabalhos na rede. Nunca ter assinado com alguma gravadora pode justificar o fato de os trabalhos de Charlie Bugre serem pouco conhecidos. Mas, para aqueles que vagavam pela noite porto-alegrense em décadas passadas, as músicas inteligentes de Charlie não serão tão facilmente esquecidas. Quem nos revela isso é Rosângela Antunes, a Dadá, amiga de Carlinhos. Hoje, ela ajuda o cantor no dia a dia − nesta ocasião, contrabandeando uma latinha de Coca-Cola para dentro do quarto do hospital. Enquanto Bugre burla as ordens médicas e toma pequenos goles de Coca − “esse é meu vício” −, Rosângela conta que “ele fazia a noite”: “Nós nos reuníamos na Praça da Matriz − uma multidão − para

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ouvir ele cantar.” Silencioso, o enfermeiro interrompe a nossa conversa. Entra no quarto, seringa à mão. Direto no braço. Charlie nem vê, segue relembrando os velhos amigos. Já se foram 40 anos de boemia; 40 anos de composições que iniciaram em sua sala no extinto Banco da Província, onde trabalhou quando jovem. Quando o patrão saía, “escrevia suas coisas” e mirabolava ideias para montar conjuntos. Em dois anos, o banco se fundiu e Charlie aproveitou o verão para sair e viajar. Não nascera para aquilo, “tinha que fazer as coisas direitinho” e ele “nunca foi assim, correto”. Até casou, mas sempre viveu na boemia. Quando largou a vida burocrática, foi ser músico e enfrentar o preconceito de não ser “dotor”, mas artista, algo quase pejorativo, comenta.

A filosofia do Bugre A memória que falha é capaz de lembrar quase todas as letras. “Música a gente esquece muitas, mas aí a gente faz outras”, conta. Um novo projeto, iniciado por um grupo de amigos músicos, pretende gravar as grandes canções de Charlie Bugre. Na cabeça de artista do artista, a megalomania parece simples: “Eu queria gravar com um coro, uma orquestra de câmara e, claro, uma banda furiosa." Lucro não quer mais − e parece nunca ter almejado −, apenas deseja divulgar seu trabalho. A música só lhe deu gorjetas, tocava em bares e ganhava cervejas − “prato de comida, ninguém dá; já um trago, todos dão”. Também não se queixa por não ter enchido o bolso de reais: “Nunca soube usar dinheiro mesmo. Bêbado bota tudo fora... Da música só ganhei amigos”. Charlie jamais imaginou chegar aos 60 anos e, dos anos de abuso, seja do álcool, das drogas ou da sorte, ele não mostra arrependimento: achou assim o combustível para sua genialidade. Entre as letras que versam dos mais diversos assuntos, uma das mais conhecidas é Tempos de Viena, que traz músicos clássicos para o “cachaçal do Bom Fim”: “Chopin toma um chopp/ Isso não vai mal/ Paganini paga a Brahma/ E o Brahms bebe cana/ E todo mundo dança uma valsa de Strauss/ Na Central”, sonhou Charlie. Mas o Bugre já falou de assunto sério também, afinal, cresceu na década de 1970 e fez rock em tempos de ditadura. Compôs Danação: “Ontem vi a gente do povo precisando de pão/ Ontem vi a gente do povo tratada como cão [...]/ Fizeram tanta gente ficar em desespero total/ Mas que danação/ Da nação”. Mas não deu nada, não foi preso nem suicidado. “Sinal que eu não era muito importante.” Além de Bob Dylan, também o chamaram de Belchior. Talvez as semelhanças estejam mais no bigode − ainda que os longos fios do cearense sejam incomparáveis − e, por isso, Charlie prefere a alcunha, dada por ele mesmo, de Bempior. Já o chamaram também de Raul Seixas, uma das influências declaradas de Charlie: para o cantor, as músicas precisam de um motivo filosófico, e não apenas falar de amor − e isso Raul fazia como ninguém. Bugre tem especial carinho por esses malditos, como Raulzito. Se identifica. Mas, ao contrário do que se espera, não se vê Maluco Beleza: se intitula Sujeito Normal; no máximo, Maluco Pobreza.



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