Continente Docs #54 - Frevo

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Hans Mantteuffel

Arquivo público/Foto: Carol Araújo

O pesquisador Evandro Rabello encontrou o primeiro registro do vocábulo frevo na imprensa (detalhe)

100 anos de frevo O frevo não nasceu do dia para a noite. Como qualquer manifestação cultural, surgiu num processo, nas ruas do Recife, quando os capoeiras saíam à frente das bandas militares, que tocavam dobrados. O malabarismo dos dançarinos foi se estilizando no passo e a música se acelerando, até assumir as características do frevo-de-rua. Isso da segunda metade do século 19 até as primeiras do século 20, quando o gênero musical se impôs definitivamente como um dos elementos formadores mesmo da identidade dos pernambucanos. Hoje isto é História. Na realidade, há exatos 100 anos, o Jornal Pequeno, do Recife, publicava pela primeira vez na imprensa a palavra frevo – corruptela de fervo, do verbo ferver. O fato foi assinalado pelo pesquisador Evandro Rabello, que passara anos debruçado sobre o tema nas bibliotecas e no Arquivo Público de Pernambuco, usando os intervalos do horário do almoço para se abraçar com as edições empoeiradas dos jornais locais e de antigas publicações dos clubes carnavalescos. O dia 9 de Feve-

reiro – o da publicação daquela notícia no Jornal Pequeno, em 1907, com o primeiro registro impresso do vocábulo – instituiu-se simbolicamente como marco da celebração do centenário do frevo. A Continente Documento se incorpora agora às comemorações pela data simbólica, consciente de que falar de frevo é falar de Pernambuco. Esta edição prezou pela variedade de perspectivas sobre o tema. Entre os colaboradores deste número, contamos com o historiador Leonardo Dantas, que elaborou uma pequena história do frevo; o jornalista José Teles, mostrando as discussões entre os que, no processo de desenvolvimento musical do frevo, assumiram posturas inovadoras, trazendo elementos externos e de outras tradições, contra os que preferiam conservar a pureza original da música. Para tornar mais instigante a leitura, trazemos matérias que abordam o frevo de forma mais específica: as suas relações com a música erudita, a maneira com que foi representado nas artes plásticas e a forma que o frevo toma na dança – o passo.

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CRÉDITOS

Continente Nº 54 – Recife – PE, fevereiro / 2007

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Companhia Editora de Pernambuco – CEPE

Presidente: Flávio Chaves

O Frevo – óleo sobre tela (1945) – Lula Cardoso Ayres

Diretor de Gestão: Bráulio Mendonça Meneses Diretor Industrial: Reginaldo Bezerra Duarte Conselho Editorial Presidente: Flávio Chaves Conselheiros: César Leal, Edson Nery da Fonseca, Francisco Bandeira de Mello, Francisco Brennand, Joaquim de Arruda Falcão, José Paulo Cavalcanti Filho, Leonardo Dantas Silva, Manuel Correia de Andrade, Marcos Vinicios Vilaça, Marcus Accioly Diretores: Homero Fonseca e Marco Polo Editores: Eduardo Cesar Maia e Mariana Oliveira Editor de Arte: Luiz Arrais Diagramação: Jaíne Cintra e Hallina Beltrão Ilustrador: Zenival Edição de Imagens: Nélio Chiappetta Revisão: Maria Helena Pôrto Estagiários: Diego Dubard, Monique Cabral e Talita Corrêa Gestor de Marketing e publicidade: Calazans Neto Gestor Gráfico: Sílvio Mafra Gestor Comercial: Paulo de Tárcio Equipe de Produção: Ana Cláudia Alencar, Débora Lobo, Eliseu Barbosa, Elizabete Correia, Joselma Firmino, Júlio Gonçalves, Lígia Régis, Roberto Bandeira, Sílvio Mafra e Vívian Pires Continente Documento é uma publicação mensal da Companhia Editora de Pernambuco Circulação, assinaturas, redação, publicidade, administração e correspondência: Rua Coelho Leite, 530 – Santo Amaro – Recife/PE CEP 50100-1140, de 2ª a 6ª das 8h às 17h30 Fone: 0800 81 1201 – Ligação gratuita Assinaturas: 0800 81 1201/3217.2581 E-mail: assinaturas@continentemulticultural.com.br Redação: fone:3217.2533 / fax: 3222.4130 E-mail: redacao@continentemulticultural.com.br Informações: informacoes@continentemulticultural.com.br Publicações: publicacoes@continentemulticultural.com.br Tiragem: 10.000 Impressão: CEPE Todos os direitos reservados. Copyright © 2000 Companhia Editora de Pernambuco ISSN 1518-5095 Apoio: Governo do Estado de Pernambuco Os textos assinados são de responsabilidade dos autores e não refletem, necessariamente, a opinião da revista

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Fotos: Reprodução


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42 Cronologia

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38 Letras do frevo

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26 Ensaiando o passo

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19 Frevos sinfônicos

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15 Decantando o frevo

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Leonardo Dantas Silva

31 A folia nas artes

O frevo, originado dos capoeiras e dos dobrados militares, ainda no século 19, teve o seu primeiro registro na imprensa em 9 de fevereiro de 1907

Um século de frevo!

10 Inovações na música

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07 Um século de frevo!

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Sumário Ao lado, O Carnaval: o frevo é nosso – óleo sobre eucatex (1987) – Bajado. Acima, LP de frevo com sucessos de Capiba

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O Carnaval – guache – Lula Cardoso Ayres (década de 50)

Foto: Daniela Nader/Ag. Aurora

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SUMÁRIO

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de 1907, que assim anunciava o repertório do Clube Empalhadores do Feitosa: “Empalhadores do Feitosa – Em sua sede que se acha com uma ornamentação belíssima, fez ontem esse apreciado clube o seu ensaio geral, saindo após em uma bonita passeata, a fim de buscar o seu estandarte que se acha em casa do Sr. Alfredo Bezerra, sócio emérito do referido clube. O seu repertório é o seguinte: Marchas – “Priminha”, “Empalhadores”, “Delícias, Amorosa”, O Frevo, “O Sol”, “Dois Pensamentos e Luiz do Monte”, “José de Lyra”, “Imprensa e Honorários”; Ária – “José da Luz”; Tango – “Pimentão”. Agradecemos o convite que nos foi enviado para o 2º dia de carnaval” (grifo nosso). Outro registro do vocábulo, “atribuído” ao cronista Paula Judeu (Oswaldo da Silva Almeida), surgiria no mesmo Jornal Pequeno, em 12 de fevereiro de 1908, na coluna “Carnaval”, assinada por aquele jornalista, sob o pseudônimo “Pierrot”. No ano seguinte, em sua edição de 22 de fevereiro de 1909, o mesmo Jornal Pequeno traz na sua primeira página interessante gravura com a frase “Olha o Frevo!”, anunciando os festejos carnavalescos daquele ano. Pereira da Costa, em seu Vocabulário Pernambucano (1976), assim observa: “O termo frevo vulgaríssimo entre nós apareceu pelo carnaval de 1909: “Olha o Frevo!”; era a frase de entusiasmo que se ouvia no delírio

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“Eta frevo, bom danado! Eta povo, animado! Quando o frevo começa Parece que o mundo vai se acabar! Quem cai no passo não quer mais parar”

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Os versos deste antigo sucesso carnavalesco, composto pela dupla Luiz Bandeira e Ernani Seve, nos convidam a novamente viver a alegria do frevo e a gostosa confusão do frevedouro que volta a tomar conta das ruas do Recife e de Olinda. Tal estado singular de euforia que toma conta do pernambucano quando da aproximação do Carnaval, é por todos assinalado desde o final da segunda metade do século 19, conforme se depreende de narrativas como as de Theotonio Freire nas páginas do seu Passionário, romance publicado no Recife em 1897. Não há o que discutir, nisso estão concordes todos os pesquisadores, foi no Recife que o frevo – dança e música – surgiu, criou raízes, consolidou-se nos fins do século 19 e início do século 20, e hoje continua em permanente evolução musical e coreográfica. O primeiro registro do vocábulo frevo na imprensa do Recife foi revelado pelo pesquisador Evandro Rabello, no Diario de Pernambuco de 11 de fevereiro de 1990, ao citar a edição do Jornal Pequeno (Recife), sábado de carnaval 9 de fevereiro

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da confusão e apertões do povo unido, compacto, ou em marcha acompanhando os clubes.” Na verdade, o vocábulo frevo já fazia parte do linguajar das ruas, da fala do povo, como lembra o escritor Hermógenes Viana (1890 – 1977), em depoimento publicado na contracapa do disco Capiba – 25 anos de frevo (1960). Rememorava, então, os ensaios do Clube Cara Dura, com o seu famoso teatro João Minhoca, instalado em cima de um carro puxado por parelhas de cavalos. O carro principal era seguido de outros carros, um deles levando a banda do Zé Pereira, a arrastar pelas ruas da Boa Vista vibrantes multidões de foliões. O Cara Dura, clube carnavalesco formado por oficiais do Exército, integrantes dos batalhões 14 e 40, era a coqueluche das noites dos sábados que antecediam ao carnaval. Segundo o nosso informante, ao burburinho formado pela turba que o seguia dava-se a denominação de frevedouro. O vocábulo frevo significa, ainda nos nossos dias, confusão, movimentação desusada, agitação popular. Co-

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mo música carnavalesca e dança coletiva, porém, o frevo e suas variantes aparecem com freqüência no noticiário da imprensa do Recife: “O apertão do frevo, nesse descomunal amplexo de toda uma multidão que desliza, se cola, se encontra, se roça, se entrechoca, se agarra” (Jornal do Recife nº 65, 1916). “O frevo que mais consola,/ O que mais nos arrebata,/ É o frevo que se rebola/ Ao lado de uma mulata” (Diario de Pernambuco nº 66, 1916). “Os rapazes souberam arranjar uma orquestra tão boazinha, que vem dar uma vida extrapiramidal ao rebuliço do frevo” (O Estado de Pernambuco nº. 48, 1914). “O clube levará em um dos seus carros uma pipa do saboroso binho berde para distribuir com o pessoal da frevança” (Jornal Pequeno nº 39, 1917). “Do mundo a gente se esquece/ Pinta a manta, pinta o bode,/ E se o frevar recrudesce/ Mais a gente se sacode”. (Diario de Pernambuco nº. 66, 1916).

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O primeiro registro do vocábulo frevo na imprensa do Recife, na edição do Jornal Pequeno (Recife), de 9 de fevereiro de 1907

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da confusão e apertões do povo unido, compacto, ou em marcha acompanhando os clubes.” Na verdade, o vocábulo frevo já fazia parte do linguajar das ruas, da fala do povo, como lembra o escritor Hermógenes Viana (1890 – 1977), em depoimento publicado na contracapa do disco Capiba – 25 anos de frevo (1960). Rememorava, então, os ensaios do Clube Cara Dura, com o seu famoso teatro João Minhoca, instalado em cima de um carro puxado por parelhas de cavalos. O carro principal era seguido de outros carros, um deles levando a banda do Zé Pereira, a arrastar pelas ruas da Boa Vista vibrantes multidões de foliões. O Cara Dura, clube carnavalesco formado por oficiais do Exército, integrantes dos batalhões 14 e 40, era a coqueluche das noites dos sábados que antecediam ao carnaval. Segundo o nosso informante, ao burburinho formado pela turba que o seguia dava-se a denominação de frevedouro. O vocábulo frevo significa, ainda nos nossos dias, confusão, movimentação desusada, agitação popular. Co-

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mo música carnavalesca e dança coletiva, porém, o frevo e suas variantes aparecem com freqüência no noticiário da imprensa do Recife: “O apertão do frevo, nesse descomunal amplexo de toda uma multidão que desliza, se cola, se encontra, se roça, se entrechoca, se agarra” (Jornal do Recife nº 65, 1916). “O frevo que mais consola,/ O que mais nos arrebata,/ É o frevo que se rebola/ Ao lado de uma mulata” (Diario de Pernambuco nº 66, 1916). “Os rapazes souberam arranjar uma orquestra tão boazinha, que vem dar uma vida extrapiramidal ao rebuliço do frevo” (O Estado de Pernambuco nº. 48, 1914). “O clube levará em um dos seus carros uma pipa do saboroso binho berde para distribuir com o pessoal da frevança” (Jornal Pequeno nº 39, 1917). “Do mundo a gente se esquece/ Pinta a manta, pinta o bode,/ E se o frevar recrudesce/ Mais a gente se sacode”. (Diario de Pernambuco nº. 66, 1916).

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O primeiro registro do vocábulo frevo na imprensa do Recife, na edição do Jornal Pequeno (Recife), de 9 de fevereiro de 1907

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38 Letras do frevo

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26 Ensaiando o passo

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Leonardo Dantas Silva

31 A folia nas artes

O frevo, originado dos capoeiras e dos dobrados militares, ainda no século 19, teve o seu primeiro registro na imprensa em 9 de fevereiro de 1907

Um século de frevo!

10 Inovações na música

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07 Um século de frevo!

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Sumário Ao lado, O Carnaval: o frevo é nosso – óleo sobre eucatex (1987) – Bajado. Acima, LP de frevo com sucessos de Capiba

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O Carnaval – guache – Lula Cardoso Ayres (década de 50)

Foto: Daniela Nader/Ag. Aurora

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de 1907, que assim anunciava o repertório do Clube Empalhadores do Feitosa: “Empalhadores do Feitosa – Em sua sede que se acha com uma ornamentação belíssima, fez ontem esse apreciado clube o seu ensaio geral, saindo após em uma bonita passeata, a fim de buscar o seu estandarte que se acha em casa do Sr. Alfredo Bezerra, sócio emérito do referido clube. O seu repertório é o seguinte: Marchas – “Priminha”, “Empalhadores”, “Delícias, Amorosa”, O Frevo, “O Sol”, “Dois Pensamentos e Luiz do Monte”, “José de Lyra”, “Imprensa e Honorários”; Ária – “José da Luz”; Tango – “Pimentão”. Agradecemos o convite que nos foi enviado para o 2º dia de carnaval” (grifo nosso). Outro registro do vocábulo, “atribuído” ao cronista Paula Judeu (Oswaldo da Silva Almeida), surgiria no mesmo Jornal Pequeno, em 12 de fevereiro de 1908, na coluna “Carnaval”, assinada por aquele jornalista, sob o pseudônimo “Pierrot”. No ano seguinte, em sua edição de 22 de fevereiro de 1909, o mesmo Jornal Pequeno traz na sua primeira página interessante gravura com a frase “Olha o Frevo!”, anunciando os festejos carnavalescos daquele ano. Pereira da Costa, em seu Vocabulário Pernambucano (1976), assim observa: “O termo frevo vulgaríssimo entre nós apareceu pelo carnaval de 1909: “Olha o Frevo!”; era a frase de entusiasmo que se ouvia no delírio

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“Eta frevo, bom danado! Eta povo, animado! Quando o frevo começa Parece que o mundo vai se acabar! Quem cai no passo não quer mais parar”

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Os versos deste antigo sucesso carnavalesco, composto pela dupla Luiz Bandeira e Ernani Seve, nos convidam a novamente viver a alegria do frevo e a gostosa confusão do frevedouro que volta a tomar conta das ruas do Recife e de Olinda. Tal estado singular de euforia que toma conta do pernambucano quando da aproximação do Carnaval, é por todos assinalado desde o final da segunda metade do século 19, conforme se depreende de narrativas como as de Theotonio Freire nas páginas do seu Passionário, romance publicado no Recife em 1897. Não há o que discutir, nisso estão concordes todos os pesquisadores, foi no Recife que o frevo – dança e música – surgiu, criou raízes, consolidou-se nos fins do século 19 e início do século 20, e hoje continua em permanente evolução musical e coreográfica. O primeiro registro do vocábulo frevo na imprensa do Recife foi revelado pelo pesquisador Evandro Rabello, no Diario de Pernambuco de 11 de fevereiro de 1990, ao citar a edição do Jornal Pequeno (Recife), sábado de carnaval 9 de fevereiro

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O frevo, originado dos capoeiras e dos dobrados militares, ainda no século 19, teve o seu primeiro registro na imprensa em 9 de fevereiro de 1907

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26 Ensaiando o passo 19 Frevos sinfônicos

Um século de frevo!

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15 Decantando o frevo 10 Inovações na música

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07 Um século de frevo!

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Sumário

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Ao lado, O Carnaval: o frevo é nosso – óleo sobre eucatex (1987) – Bajado. Acima, LP de frevo com sucessos de Capiba

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O Carnaval – guache – Lula Cardoso Ayres (década de 50)

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Os versos deste antigo sucesso carnavalesco, composto pela dupla Luiz Bandeira e Ernani Seve, nos convidam a novamente viver a alegria do frevo e a gostosa confusão do frevedouro que volta a tomar conta das ruas do Recife e de Olinda. Tal estado singular de euforia que toma conta do pernambucano quando da aproximação do Carnaval, é por todos assinalado desde o final da segunda metade do século 19, conforme se depreende de narrativas como as de Theotonio Freire nas páginas do seu Passionário, romance publicado no Recife em 1897. Não há o que discutir, nisso estão concordes todos os pesquisadores, foi no Recife que o frevo – dança e música – surgiu, criou raízes, consolidou-se nos fins do século 19 e início do século 20, e hoje continua em permanente evolução musical e coreográfica. O primeiro registro do vocábulo frevo na imprensa do Recife foi revelado pelo pesquisador Evandro Rabello, no Diario de Pernambuco de 11 de fevereiro de 1990, ao citar a edição do Jornal Pequeno (Recife), sábado de carnaval 9 de fevereiro

de 1907, que assim anunciava o repertório do Clube Empalhadores do Feitosa: “Empalhadores do Feitosa – Em sua sede que se acha com uma ornamentação belíssima, fez ontem esse apreciado clube o seu ensaio geral, saindo após em uma bonita passeata, a fim de buscar o seu estandarte que se acha em casa do Sr. Alfredo Bezerra, sócio emérito do referido clube. O seu repertório é o seguinte: Marchas – “Priminha”, “Empalhadores”, “Delícias, Amorosa”, O Frevo, “O Sol”, “Dois Pensamentos e Luiz do Monte”, “José de Lyra”, “Imprensa e Honorários”; Ária – “José da Luz”; Tango – “Pimentão”. Agradecemos o convite que nos foi enviado para o 2º dia de carnaval” (grifo nosso). Outro registro do vocábulo, “atribuído” ao cronista Paula Judeu (Oswaldo da Silva Almeida), surgiria no mesmo Jornal Pequeno, em 12 de fevereiro de 1908, na coluna “Carnaval”, assinada por aquele jornalista, sob o pseudônimo “Pierrot”. No ano seguinte, em sua edição de 22 de fevereiro de 1909, o mesmo Jornal Pequeno traz na sua primeira página interessante gravura com a frase “Olha o Frevo!”, anunciando os festejos carnavalescos daquele ano. Pereira da Costa, em seu Vocabulário Pernambucano (1976), assim observa: “O termo frevo vulgaríssimo entre nós apareceu pelo carnaval de 1909: “Olha o Frevo!”; era a frase de entusiasmo que se ouvia no delírio

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“Eta frevo, bom danado! Eta povo, animado! Quando o frevo começa Parece que o mundo vai se acabar! Quem cai no passo não quer mais parar”

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mo música carnavalesca e dança coletiva, porém, o frevo e suas variantes aparecem com freqüência no noticiário da imprensa do Recife: “O apertão do frevo, nesse descomunal amplexo de toda uma multidão que desliza, se cola, se encontra, se roça, se entrechoca, se agarra” (Jornal do Recife nº 65, 1916). “O frevo que mais consola,/ O que mais nos arrebata,/ É o frevo que se rebola/ Ao lado de uma mulata” (Diario de Pernambuco nº 66, 1916). “Os rapazes souberam arranjar uma orquestra tão boazinha, que vem dar uma vida extrapiramidal ao rebuliço do frevo” (O Estado de Pernambuco nº. 48, 1914). “O clube levará em um dos seus carros uma pipa do saboroso binho berde para distribuir com o pessoal da frevança” (Jornal Pequeno nº 39, 1917). “Do mundo a gente se esquece/ Pinta a manta, pinta o bode,/ E se o frevar recrudesce/ Mais a gente se sacode”. (Diario de Pernambuco nº. 66, 1916).

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O primeiro registro do vocábulo frevo na imprensa do Recife, na edição do Jornal Pequeno (Recife), de 9 de fevereiro de 1907

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da confusão e apertões do povo unido, compacto, ou em marcha acompanhando os clubes.” Na verdade, o vocábulo frevo já fazia parte do linguajar das ruas, da fala do povo, como lembra o escritor Hermógenes Viana (1890 – 1977), em depoimento publicado na contracapa do disco Capiba – 25 anos de frevo (1960). Rememorava, então, os ensaios do Clube Cara Dura, com o seu famoso teatro João Minhoca, instalado em cima de um carro puxado por parelhas de cavalos. O carro principal era seguido de outros carros, um deles levando a banda do Zé Pereira, a arrastar pelas ruas da Boa Vista vibrantes multidões de foliões. O Cara Dura, clube carnavalesco formado por oficiais do Exército, integrantes dos batalhões 14 e 40, era a coqueluche das noites dos sábados que antecediam ao carnaval. Segundo o nosso informante, ao burburinho formado pela turba que o seguia dava-se a denominação de frevedouro. O vocábulo frevo significa, ainda nos nossos dias, confusão, movimentação desusada, agitação popular. Co-

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Passista da década de 40 – Foto de Lula Cardoso Ayres – Reprodução

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O vocábulo, como bem registrou Evandro Rabello, apareceu pela primeira vez na imprensa em 9 de fevereiro de 1907. O seu centenário está sendo comemorado por toda parte, mas, como dança e marcha carnavalesca a animar o nosso carnaval, o frevo pernambucano já reinava em nossas ruas, movimentando as massas e animando os cordões das agremiações, desde o final do século 19. O Frevo, palavra exótica Tudo que é bom diz, exprime É inigualável, sublime, Termo raro, bom que dói... Vale por um dicionário, Traduz delírio, festança, Tudo salta, tudo dança, Tudo come, tudo rói...

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O escritor Rodolfo Garcia, em seu Dicionário de Brasileirismos – Peculiaridades Pernambucanas, transcrevendo o nº 32 do jornal A Província, Recife, 1913, assim registra:

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estimular fisicamente o público – a ponto de muitos acharem que o frevo nem deveria ter letra; quando este passou a ser cantado, o próprio gênero tornouse um de seus temas centrais. Por sua vez, o frevode-bloco, caracterizado pelo andamento mais lento e pela maior duração das notas, transmite estados afetivos melancólicos, em geral associados à nostalgia. De um lado a ação, de outro a paixão. Na verdade, essas modalidades exigem competências distintas. Enquanto a música instrumental requer do compositor um amplo domínio sobretudo dos aspectos mais ligados à sonoridade, tais como as escalas melódicas, harmonia, timbre dos instrumentos etc., a habilidade do compositor de canções consiste basicamente em criar relações de compatibilidade entre letra e melodia. Para isso, não precisa saber ler uma partitura ou mesmo tocar um instrumento (isso, aliás, é raro entre os cancionistas – que o digam Lamartine Babo e Braguinha, recentemente falecido, para ficarmos apenas nesses dois exemplos). Sua condição de falante da língua lhe basta. Afinal, a canção nada mais é do que uma extensão da fala, sublimada. As entoações, por sua vez, são melodias naturais que produzimos quando falamos e descartamos logo em seguida. Capturar e preservar uma fala significativa, eis a missão do cancionista. A fala coloquial é responsável por ampliar as possibilidades expressivas dos gêneros. Se assim não fosse, estes ficariam reduzidos a simples estereótipos. Numa canção, percebemos a presença da fala na melodia que é ampliada para acomodar uma frase mais longa, nas expressões de chamamento (“vem

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Leonardo Dantas Silva é historiador e escritor

Embora associado à liberdade e à euforia, o frevo impõe dificuldades e exige responsabilidades. É um paradoxo feito música. Concebido para a multidão, sua coreografia é individual. Canto popular, não raro exige uma perícia vocal que desestimula o cantor diletante. Emblema sonoro de brasilidade, poucas vezes transpôs as fronteiras do seu Estado de origem. Por tudo isso, os mais pessimistas dizem ser um gênero destinado à solidão e ao desaparecimento, cuja sobrevida só é ainda assegurada graças à sazonalidade carnavalesca, para a qual todo ano é convocado a desabrochar, como inflorescência cada vez mais rara. Para início de conversa, reproduzo aqui um trecho do depoimento de Guerra Peixe, incluído no livro Do Frevo ao Manguebeat, de José Teles: “Antes de mais nada o compositor de frevo tem de ser músico. Tem que entender de orquestração”. As palavras do eminente maestro, ainda que válidas para o frevo de rua, exclusivamente instrumental, não podem ser aplicadas às modalidades cantadas, o frevo-canção e o frevo-de-bloco. O depoimento embute um preconceito e uma confusão. Em primeiro lugar, por deixar implícito que apenas apenas a sonoridade elaborada do frevo instrumental seria digna de apreciação, desprezando assim a espontaneidade do frevo cantado. Além disso, contribui para ocultar as semelhanças e diferenças entre as modalidade de frevo, que se refletem não apenas na expressão (instrumental e cantado), mas também no seu conteúdo e função. Assim é que o frevo-de-rua e o frevo-canção, ao investirem na reiteração de temas melódicos, destinam-se sobretudo a

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talvez”, “Mundo novo”). Foi o disco mais elogiado de Robertinho do Recife, mas não causou polêmica em sua cidade natal. Provavelmente, os conservadores continuavam ouvindo os frevos antigos, como se o mundo não houvesse sofrido mudanças drásticas, desde que a Rozenblit popularizou o frevo em todo Nordeste, a partir do LP 25 Anos de Frevo, que consiste na regravação de frevos-canção, vários deles compostos nos anos 30. Mais comentado foi o projeto Asas da América, idealizado por Carlos Fernando, autor de quase todo o repertório do disco, lançado em 1980, pela CBS (atual Sony BMG). O LP foi uma lufada de ar fresco num gênero que se restringia cada vez aos valores do passado (não por acaso, “Valores do Passado”, de Edgar Moraes, teve uma releitura do grupo As Frenéticas neste disco). Ao contrário do frevo baiano, atrelado aos trios elétricos, o frevo novo de Carlos Fernando usava as ferramentas do frevo, com temática moderna, e melodias leves e pop, interpretadas por alguns dos maiores nomes da MPB da época, Chico Buarque, Caetano Veloso, Elba Ramalho, Alceu Valença, e promoveu o encontro único de Jackson Pandeiro e Gilberto Gil. Foi uma tentativa elogiada, que se repetiu, com menos impacto em outros álbuns, porém fez amigos, mas não influenciou muitas pessoas. O maior hit deste estilo moderno de frevo, aconteceu em 1985,

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Promotora do Carnaval, que não funciona” (Carlos Fernando), “Foi maravilhoso que Caetano tenha mandado de Londres um frevo-canção como ‘Chuva, suor e cerveja’, que muito toquei e orquestrei no carnaval (Nelson Ferreira).” A opinião discordante, ma non troppo, foi do irascível Capiba: “Não existe frevo baiano”. E não há, em absoluto, novidade no frevo. O frevo, que se faz hoje, fazia-se no começo do século. Não existe diferença e, sim, prestígio de cantor”. Enfrentando o conservadorismo que vigorava em Pernambuco nos anos 70, quando o carnaval estava recolhido aos clubes e as agremiações desfilando na passarela oficial da Dantas Barreto, jovens como Flaviola, Germano Gladstone e Marcelo Montenegro, entre outros, plugavam o frevo e o cantavam com linha melódica de forte sabor pop. Flaviola fez isto no seu único LP, gravado com o Alegre Bando do Sol, em 1976. O Limousine 99(Gladstone, Salatiel José, Rogério Gutenberg e Ozires Diniz) lançou, pela Rozenblit, o compacto duplo com “De sangue quente” e outro frevo “Sopa de gelo” (e mais dois sambas), o disco mais vendido o carnaval pernambucano de 1973. “De sangue

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quente”, vencendo três festivais do gênero, inclusive o instituído pela prefeitura. Os versos chegavam a ser revolucionários para a temática à qual o frevo acostumara-se: “Não me importa que a vida/se acabe pra mim amanhã/é carnaval eu vou deixar/ meu rock de lado/vou curtir meu frevo apressado/ debaixo do meu sol dourado/nos braços de quem deus mandar”. Marcelo Montenegro e o Tejucupapo Bando lançaram mais dois frevos diferentes, pela Rozenblit, num compacto simples: “Frevo torto” e “Velho frevinho”. Sem a força da Rozenblit, o frevo passou a perder popularidade. Um fenômeno paradoxal, já que continuava sendo a principal música do carnaval pernambucano. As rádios, no entanto, não se preocupavam em tocar as poucas novidades ainda lançadas pela gravadora da Estrada dos Remédios. O frevo tornava-se uma música de músicos, composto por nomes como Hermeto Pascoal (“Frevo em Maceió”), Egberto Gismonti (“Frevo”), Tom Jobim e Vinicius de Moraes (“Frevo”). Mas foi Robertinho do Recife, em 1978, que radicalizou, com o álbum Robertinho no Passo, realizado quase que em parceria com Hermeto Pascoal – dissonâncias, compassos quebrados, guitarras e teclado eletrônico como instrumento solista, num repertório formado por clássicos do gênero (“Come e dorme”, “Vassourinhas”), e inéditas (“Nem um

Caetano Veloso compôs frevos que foram sucessos nacionais, como “Atrás do Trio Elétrico” e “Samba, Suor e Cerveja”

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Hermeto Pascoal emprestou sua versatilidade ao frevo

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por aí. A cada carnaval ele compunha mais um frevo eletrificado, e o tornava sucesso nacional, algo que o frevo pernambucano só conseguiu poucas vezes. Vieram “Chuva, suor e cerveja”, “Um frevo novo”, “Cara a cara”, e com eles a polêmica em Pernambuco. Existe frevo baiano, ou não? Quem tentou responder a pergunta foi o jornal carioca O Globo que, na edição de 22 de fevereiro de 1974, reuniu, no Recife, alguns dos nomes mais conhecidos e atuantes da música pernambucana para discutir o assunto: Nelson Ferreira, Capiba, Alceu Valença, Germano Gladstone (da banda Limousine 99), Mário Griz, Fernando Filizola (violeiro e cantor do Quinteto Violado) e Carlos Fernando. Curiosamente, todos, sem exceção, fugiram à polêmica, e a maioria culpou o conservadorismo do frevo pernambucano pelo sucesso que estava sendo obtido pelo congênere feito por baianos: “O frevo é o mesmo, o problema é a embalagem” (Alceu Valença), “A polêmica em cima do frevo baiano ou pernambucano foi criada não pelos baianos e, sim, pela decadência da criatividade dos compositores tradicionais de frevo de Pernambuco, aliada à Empresa Municipal de Turismo, à Empetur e à Comissão

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Sergio Fernando Campanella de Oliveira Os paradoxos e complexidades das formas assumidas pelo frevo

Decantando o frevo

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O maestro Spok, um importante renovador do frevo

“Há a lamentar, na execução dessa marcha, hoje em dia, o andamento rápido e os floreios de saxofones da segunda parte, coisa improvisada, por certo virtuose do sax e logo aperfeiçoada por outra. É uma desfiguração lamentável, que responde pelo aceleramento incômodo do andamento.” A crítica foi pinçada do clássico estudo de Valdemar de Oliveira Frevo, Capoeira e Passo, e refere-se à “Marcha n° 1 de Vassourinhas”. O “certo virtuose do sax” trata-se de Felinho (Félix Lins de Albuquerque, 1895/ 1980), autor de uma heresia: improviso de sax em Vassourinhas, heresia que costumava cometer nos bailes em que tocava com a orquestra do maestro Nelson Ferreira, registrada em disco, 1956, em um 78rpm com selo Mocambo, da gravadora pernambucana Rozenblit. Foi uma ousadia tão marcante que daí em diante tornou-se impensável “Vassourinhas” sem o impagável floreio de sax na segunda parte. Valdemar de Oliveira, bem como outros compositores e admiradores do frevo, queriamno refratário a mudanças. Pelo menos mudanças drásticas, que mexessem no andamento: “O frevo-de-rua, em Pernambuco, vem evoluindo naturalmente. Será erro introduzir nele valores novos, que o povo refugará, com a mais absoluta certeza... No dia em que lhe meterem ingredientes de bossa-nova, de iê-iê-iê, de bop e quejandos, por mais ricos e importantes que sejam, perderá o grau de concentração de que precisa para atiçar a chama do passo”, continua Oliveira (na obra citada). Novidade somente as do tipo apresentadas por Nelson Ferreira no frevo-de-rua “Gostosão”, ou “Come e dorme”.

José Teles Conservadores x inovadores: pelejas na história do frevo

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Antonio Nóbrega passou a empregar passos do frevo como modelo para uma dança clássica nacional

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com Banho de cheiro, lançado por Elba Ramalho, e entoado em coro por cerca de 500 mil pessoas no Rock in Rio I. Em anos mais recentes J.Michiles almejou chegar ao povo com um frevo popular e pop, gravado por Alceu Valença. No século 21, o frevo voltou a respirar sem o uso de aparelhos. Com trabalhos de Antônio Nóbrega, Silvério Pessoa e a Spok Frevo Orquestra. De certa forma conservador, Nóbrega primeiro passou a empregar passos do frevo como modelo para uma dança clássica nacional, depois, além de incentivador da orquestra de Spok, com quem tem gravado e se apresentado, inovou com o violino como instrumento solo de frevo, e ainda gravou dois discos inteiramente dedicados ao gênero. Silvério Pessoa deu um mergulho no repertório carnavalesco do seu inspirador Jackson do Pandeiro, e mandou ver o CD Micróbio do Frevo, um trabalho com loops, programações, um frevo do futuro, com um pé lá no passado. Já o maestro Spok descobriu o ovo de Colombo. Tirou pura e simplesmente o frevo da quadradice da fidelidade à partitura original. Sem cair no jazz, a Spok Frevo Orquestra vem recebendo elogios por onde passa (já tocou até na China), inserindo liberdade entre colcheias, quiálteras, fazendo ver que o frevo não precisa necessariamente acabar na ponta do pé, tem lugar também para a cabeça.

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José Teles é jornalista.

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Valdemar de Oliveira e outros compositores e admiradores do frevo o queriam refratário a mudanças

O que diria Valdemar de Oliveira dos “floreios” que tornaram famosa, país afora, a orquestra do Maestro Spok – floreios não apenas do sax, mas de todos os instrumentos, entre os quais uma guitarra elétrica? Teóricos do frevo (no caso de Valdemar de Oliveira, também compositor) mal aceitavam o frevo-canção ou o frevo-de-bloco (que preferem chamar de marcha-canção ou marcha-de-bloco). Ruy Duarte (autor de outro antológico estudo, A História Social do Frevo) considera uma deturpação o frevo cantado. E o próprio Capiba (Lourenço da Fonseca Barbosa), o mais famoso autor de frevos-canção não via com bons olhos certas liberdades tomadas por novos autores. O caruaruense Carlos Fernando, autor de Banho de Cheiro(gravado por Elba Ramalho), o frevo comercialmente mais bem-sucedido até hoje, conta que se atreveu a mostrar algumas das suas composições a Capiba que, depois de escutá-las, sentenciou: “Pra mim isto é rock”. Estruturalmente, o primeiro frevo moderno, com arranjos e orquestração que foge do figurino adotado pelos maestros pernambucanos é “Frevo

rasgado”, de Gilberto Gil e Bruno Ferreira, que abre o disco tropicalista do baiano (1968); quem assina o arranjo é o maestro Rogério Duprat. “Frevo rasgado” não suscitou discussões entre os puristas do frevo, até porque o ano em que foi lançado foi de tantas viradas de mesas, e não apenas na música popular, que deve ter passado despercebido. No ano seguinte, porém, um outro frevo, composto por Caetano Veloso, chamaria mais a atenção. “Atrás do trio elétrico” deflagrou uma “guerra” entre os cultuadores do, digamos, frevo de raiz, e os que o queriam com a cara dos novos tempos. “Atrás do trio elétrico” era um frevo acelerado, sem orquestra, uma guitarra distorcida (empunha por Lanny Gordin) emoldurava a engenhosa melodia. A rigor, com exceção da letra inventiva, nem era assim tão revolucionário. Apenas seguia o molde baiano, tocado pelos até então pouco conhecidos trios elétricos nas ruas de Salvador durante o carnaval (foi essa música, aliás, que detonou a folia baiana nacionalmente, passo inicial para o que ela é hoje). O problema foi que Caetano Veloso não ficou

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“Há a lamentar, na execução dessa marcha, hoje em dia, o andamento rápido e os floreios de saxofones da segunda parte, coisa improvisada, por certo virtuose do sax e logo aperfeiçoada por outra. É uma desfiguração lamentável, que responde pelo aceleramento incômodo do andamento.” A crítica foi pinçada do clássico estudo de Valdemar de Oliveira Frevo, Capoeira e Passo, e refere-se à “Marcha n° 1 de Vassourinhas”. O “certo virtuose do sax” trata-se de Felinho (Félix Lins de Albuquerque, 1895/ 1980), autor de uma heresia: improviso de sax em Vassourinhas, heresia que costumava cometer nos bailes em que tocava com a orquestra do maestro Nelson Ferreira, registrada em disco, 1956, em um 78rpm com selo Mocambo, da gravadora pernambucana Rozenblit. Foi uma ousadia tão marcante que daí em diante tornou-se impensável “Vassourinhas” sem o impagável floreio de sax na segunda parte. Valdemar de Oliveira, bem como outros compositores e admiradores do frevo, queriamno refratário a mudanças. Pelo menos mudanças drásticas, que mexessem no andamento: “O frevo-de-rua, em Pernambuco, vem evoluindo naturalmente. Será erro introduzir nele valores novos, que o povo refugará, com a mais absoluta certeza... No dia em que lhe meterem ingredientes de bossa-nova, de iê-iê-iê, de bop e quejandos, por mais ricos e importantes que sejam, perderá o grau de concentração de que precisa para atiçar a chama do passo”, continua Oliveira (na obra citada). Novidade somente as do tipo apresentadas por Nelson Ferreira no frevo-de-rua “Gostosão”, ou “Come e dorme”.

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O maestro Spok, um importante renovador do frevo

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José Teles

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Conservadores x inovadores: pelejas na história do frevo

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Sergio Fernando Campanella de Oliveira

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Os paradoxos e complexidades das formas assumidas pelo frevo

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Hans Mantteuffel

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Arquivo de família/Reprodução Alexandre Belém/JC Imagem

Valdemar de Oliveira e outros compositores e admiradores do frevo o queriam refratário a mudanças

O que diria Valdemar de Oliveira dos “floreios” que tornaram famosa, país afora, a orquestra do Maestro Spok – floreios não apenas do sax, mas de todos os instrumentos, entre os quais uma guitarra elétrica? Teóricos do frevo (no caso de Valdemar de Oliveira, também compositor) mal aceitavam o frevo-canção ou o frevo-de-bloco (que preferem chamar de marcha-canção ou marcha-de-bloco). Ruy Duarte (autor de outro antológico estudo, A História Social do Frevo) considera uma deturpação o frevo cantado. E o próprio Capiba (Lourenço da Fonseca Barbosa), o mais famoso autor de frevos-canção não via com bons olhos certas liberdades tomadas por novos autores. O caruaruense Carlos Fernando, autor de Banho de Cheiro(gravado por Elba Ramalho), o frevo comercialmente mais bem-sucedido até hoje, conta que se atreveu a mostrar algumas das suas composições a Capiba que, depois de escutá-las, sentenciou: “Pra mim isto é rock”. Estruturalmente, o primeiro frevo moderno, com arranjos e orquestração que foge do figurino adotado pelos maestros pernambucanos é “Frevo

rasgado”, de Gilberto Gil e Bruno Ferreira, que abre o disco tropicalista do baiano (1968); quem assina o arranjo é o maestro Rogério Duprat. “Frevo rasgado” não suscitou discussões entre os puristas do frevo, até porque o ano em que foi lançado foi de tantas viradas de mesas, e não apenas na música popular, que deve ter passado despercebido. No ano seguinte, porém, um outro frevo, composto por Caetano Veloso, chamaria mais a atenção. “Atrás do trio elétrico” deflagrou uma “guerra” entre os cultuadores do, digamos, frevo de raiz, e os que o queriam com a cara dos novos tempos. “Atrás do trio elétrico” era um frevo acelerado, sem orquestra, uma guitarra distorcida (empunha por Lanny Gordin) emoldurava a engenhosa melodia. A rigor, com exceção da letra inventiva, nem era assim tão revolucionário. Apenas seguia o molde baiano, tocado pelos até então pouco conhecidos trios elétricos nas ruas de Salvador durante o carnaval (foi essa música, aliás, que detonou a folia baiana nacionalmente, passo inicial para o que ela é hoje). O problema foi que Caetano Veloso não ficou

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com Banho de cheiro, lançado por Elba Ramalho, e entoado em coro por cerca de 500 mil pessoas no Rock in Rio I. Em anos mais recentes J.Michiles almejou chegar ao povo com um frevo popular e pop, gravado por Alceu Valença. No século 21, o frevo voltou a respirar sem o uso de aparelhos. Com trabalhos de Antônio Nóbrega, Silvério Pessoa e a Spok Frevo Orquestra. De certa forma conservador, Nóbrega primeiro passou a empregar passos do frevo como modelo para uma dança clássica nacional, depois, além de incentivador da orquestra de Spok, com quem tem gravado e se apresentado, inovou com o violino como instrumento solo de frevo, e ainda gravou dois discos inteiramente dedicados ao gênero. Silvério Pessoa deu um mergulho no repertório carnavalesco do seu inspirador Jackson do Pandeiro, e mandou ver o CD Micróbio do Frevo, um trabalho com loops, programações, um frevo do futuro, com um pé lá no passado. Já o maestro Spok descobriu o ovo de Colombo. Tirou pura e simplesmente o frevo da quadradice da fidelidade à partitura original. Sem cair no jazz, a Spok Frevo Orquestra vem recebendo elogios por onde passa (já tocou até na China), inserindo liberdade entre colcheias, quiálteras, fazendo ver que o frevo não precisa necessariamente acabar na ponta do pé, tem lugar também para a cabeça.

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Antonio Nóbrega passou a empregar passos do frevo como modelo para uma dança clássica nacional

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Leonardo Dantas Silva é historiador e escritor

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Passista da década de 40 – Foto de Lula Cardoso Ayres – Reprodução

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O vocábulo, como bem registrou Evandro Rabello, apareceu pela primeira vez na imprensa em 9 de fevereiro de 1907. O seu centenário está sendo comemorado por toda parte, mas, como dança e marcha carnavalesca a animar o nosso carnaval, o frevo pernambucano já reinava em nossas ruas, movimentando as massas e animando os cordões das agremiações, desde o final do século 19.

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estimular fisicamente o público – a ponto de muitos acharem que o frevo nem deveria ter letra; quando este passou a ser cantado, o próprio gênero tornouse um de seus temas centrais. Por sua vez, o frevode-bloco, caracterizado pelo andamento mais lento e pela maior duração das notas, transmite estados afetivos melancólicos, em geral associados à nostalgia. De um lado a ação, de outro a paixão. Na verdade, essas modalidades exigem competências distintas. Enquanto a música instrumental requer do compositor um amplo domínio sobretudo dos aspectos mais ligados à sonoridade, tais como as escalas melódicas, harmonia, timbre dos instrumentos etc., a habilidade do compositor de canções consiste basicamente em criar relações de compatibilidade entre letra e melodia. Para isso, não precisa saber ler uma partitura ou mesmo tocar um instrumento (isso, aliás, é raro entre os cancionistas – que o digam Lamartine Babo e Braguinha, recentemente falecido, para ficarmos apenas nesses dois exemplos). Sua condição de falante da língua lhe basta. Afinal, a canção nada mais é do que uma extensão da fala, sublimada. As entoações, por sua vez, são melodias naturais que produzimos quando falamos e descartamos logo em seguida. Capturar e preservar uma fala significativa, eis a missão do cancionista. A fala coloquial é responsável por ampliar as possibilidades expressivas dos gêneros. Se assim não fosse, estes ficariam reduzidos a simples estereótipos. Numa canção, percebemos a presença da fala na melodia que é ampliada para acomodar uma frase mais longa, nas expressões de chamamento (“vem

O Frevo, palavra exótica Tudo que é bom diz, exprime É inigualável, sublime, Termo raro, bom que dói... Vale por um dicionário, Traduz delírio, festança, Tudo salta, tudo dança, Tudo come, tudo rói... O escritor Rodolfo Garcia, em seu Dicionário de Brasileirismos – Peculiaridades Pernambucanas, transcrevendo o nº 32 do jornal A Província, Recife, 1913, assim registra:

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Embora associado à liberdade e à euforia, o frevo impõe dificuldades e exige responsabilidades. É um paradoxo feito música. Concebido para a multidão, sua coreografia é individual. Canto popular, não raro exige uma perícia vocal que desestimula o cantor diletante. Emblema sonoro de brasilidade, poucas vezes transpôs as fronteiras do seu Estado de origem. Por tudo isso, os mais pessimistas dizem ser um gênero destinado à solidão e ao desaparecimento, cuja sobrevida só é ainda assegurada graças à sazonalidade carnavalesca, para a qual todo ano é convocado a desabrochar, como inflorescência cada vez mais rara. Para início de conversa, reproduzo aqui um trecho do depoimento de Guerra Peixe, incluído no livro Do Frevo ao Manguebeat, de José Teles: “Antes de mais nada o compositor de frevo tem de ser músico. Tem que entender de orquestração”. As palavras do eminente maestro, ainda que válidas para o frevo de rua, exclusivamente instrumental, não podem ser aplicadas às modalidades cantadas, o frevo-canção e o frevo-de-bloco. O depoimento embute um preconceito e uma confusão. Em primeiro lugar, por deixar implícito que apenas apenas a sonoridade elaborada do frevo instrumental seria digna de apreciação, desprezando assim a espontaneidade do frevo cantado. Além disso, contribui para ocultar as semelhanças e diferenças entre as modalidade de frevo, que se refletem não apenas na expressão (instrumental e cantado), mas também no seu conteúdo e função. Assim é que o frevo-de-rua e o frevo-canção, ao investirem na reiteração de temas melódicos, destinam-se sobretudo a

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Hermeto Pascoal emprestou sua versatilidade ao frevo

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Promotora do Carnaval, que não funciona” (Carlos Fernando), “Foi maravilhoso que Caetano tenha mandado de Londres um frevo-canção como ‘Chuva, suor e cerveja’, que muito toquei e orquestrei no carnaval (Nelson Ferreira).” A opinião discordante, ma non troppo, foi do irascível Capiba: “Não existe frevo baiano”. E não há, em absoluto, novidade no frevo. O frevo, que se faz hoje, fazia-se no começo do século. Não existe diferença e, sim, prestígio de cantor”. Enfrentando o conservadorismo que vigorava em Pernambuco nos anos 70, quando o carnaval estava recolhido aos clubes e as agremiações desfilando na passarela oficial da Dantas Barreto, jovens como Flaviola, Germano Gladstone e Marcelo Montenegro, entre outros, plugavam o frevo e o cantavam com linha melódica de forte sabor pop. Flaviola fez isto no seu único LP, gravado com o Alegre Bando do Sol, em 1976. O Limousine 99(Gladstone, Salatiel José, Rogério Gutenberg e Ozires Diniz) lançou, pela Rozenblit, o compacto duplo com “De sangue quente” e outro frevo “Sopa de gelo” (e mais dois sambas), o disco mais vendido o carnaval pernambucano de 1973. “De sangue

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por aí. A cada carnaval ele compunha mais um frevo eletrificado, e o tornava sucesso nacional, algo que o frevo pernambucano só conseguiu poucas vezes. Vieram “Chuva, suor e cerveja”, “Um frevo novo”, “Cara a cara”, e com eles a polêmica em Pernambuco. Existe frevo baiano, ou não? Quem tentou responder a pergunta foi o jornal carioca O Globo que, na edição de 22 de fevereiro de 1974, reuniu, no Recife, alguns dos nomes mais conhecidos e atuantes da música pernambucana para discutir o assunto: Nelson Ferreira, Capiba, Alceu Valença, Germano Gladstone (da banda Limousine 99), Mário Griz, Fernando Filizola (violeiro e cantor do Quinteto Violado) e Carlos Fernando. Curiosamente, todos, sem exceção, fugiram à polêmica, e a maioria culpou o conservadorismo do frevo pernambucano pelo sucesso que estava sendo obtido pelo congênere feito por baianos: “O frevo é o mesmo, o problema é a embalagem” (Alceu Valença), “A polêmica em cima do frevo baiano ou pernambucano foi criada não pelos baianos e, sim, pela decadência da criatividade dos compositores tradicionais de frevo de Pernambuco, aliada à Empresa Municipal de Turismo, à Empetur e à Comissão

talvez”, “Mundo novo”). Foi o disco mais elogiado de Robertinho do Recife, mas não causou polêmica em sua cidade natal. Provavelmente, os conservadores continuavam ouvindo os frevos antigos, como se o mundo não houvesse sofrido mudanças drásticas, desde que a Rozenblit popularizou o frevo em todo Nordeste, a partir do LP 25 Anos de Frevo, que consiste na regravação de frevos-canção, vários deles compostos nos anos 30. Mais comentado foi o projeto Asas da América, idealizado por Carlos Fernando, autor de quase todo o repertório do disco, lançado em 1980, pela CBS (atual Sony BMG). O LP foi uma lufada de ar fresco num gênero que se restringia cada vez aos valores do passado (não por acaso, “Valores do Passado”, de Edgar Moraes, teve uma releitura do grupo As Frenéticas neste disco). Ao contrário do frevo baiano, atrelado aos trios elétricos, o frevo novo de Carlos Fernando usava as ferramentas do frevo, com temática moderna, e melodias leves e pop, interpretadas por alguns dos maiores nomes da MPB da época, Chico Buarque, Caetano Veloso, Elba Ramalho, Alceu Valença, e promoveu o encontro único de Jackson Pandeiro e Gilberto Gil. Foi uma tentativa elogiada, que se repetiu, com menos impacto em outros álbuns, porém fez amigos, mas não influenciou muitas pessoas. O maior hit deste estilo moderno de frevo, aconteceu em 1985,

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Caetano Veloso compôs frevos que foram sucessos nacionais, como “Atrás do Trio Elétrico” e “Samba, Suor e Cerveja”

quente”, vencendo três festivais do gênero, inclusive o instituído pela prefeitura. Os versos chegavam a ser revolucionários para a temática à qual o frevo acostumara-se: “Não me importa que a vida/se acabe pra mim amanhã/é carnaval eu vou deixar/ meu rock de lado/vou curtir meu frevo apressado/ debaixo do meu sol dourado/nos braços de quem deus mandar”. Marcelo Montenegro e o Tejucupapo Bando lançaram mais dois frevos diferentes, pela Rozenblit, num compacto simples: “Frevo torto” e “Velho frevinho”. Sem a força da Rozenblit, o frevo passou a perder popularidade. Um fenômeno paradoxal, já que continuava sendo a principal música do carnaval pernambucano. As rádios, no entanto, não se preocupavam em tocar as poucas novidades ainda lançadas pela gravadora da Estrada dos Remédios. O frevo tornava-se uma música de músicos, composto por nomes como Hermeto Pascoal (“Frevo em Maceió”), Egberto Gismonti (“Frevo”), Tom Jobim e Vinicius de Moraes (“Frevo”). Mas foi Robertinho do Recife, em 1978, que radicalizou, com o álbum Robertinho no Passo, realizado quase que em parceria com Hermeto Pascoal – dissonâncias, compassos quebrados, guitarras e teclado eletrônico como instrumento solista, num repertório formado por clássicos do gênero (“Come e dorme”, “Vassourinhas”), e inéditas (“Nem um

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O vocábulo, como bem registrou Evandro Rabello, apareceu pela primeira vez na imprensa em 9 de fevereiro de 1907. O seu centenário está sendo comemorado por toda parte, mas, como dança e marcha carnavalesca a animar o nosso carnaval, o frevo pernambucano já reinava em nossas ruas, movimentando as massas e animando os cordões das agremiações, desde o final do século 19.

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estimular fisicamente o público – a ponto de muitos acharem que o frevo nem deveria ter letra; quando este passou a ser cantado, o próprio gênero tornouse um de seus temas centrais. Por sua vez, o frevode-bloco, caracterizado pelo andamento mais lento e pela maior duração das notas, transmite estados afetivos melancólicos, em geral associados à nostalgia. De um lado a ação, de outro a paixão. Na verdade, essas modalidades exigem competências distintas. Enquanto a música instrumental requer do compositor um amplo domínio sobretudo dos aspectos mais ligados à sonoridade, tais como as escalas melódicas, harmonia, timbre dos instrumentos etc., a habilidade do compositor de canções consiste basicamente em criar relações de compatibilidade entre letra e melodia. Para isso, não precisa saber ler uma partitura ou mesmo tocar um instrumento (isso, aliás, é raro entre os cancionistas – que o digam Lamartine Babo e Braguinha, recentemente falecido, para ficarmos apenas nesses dois exemplos). Sua condição de falante da língua lhe basta. Afinal, a canção nada mais é do que uma extensão da fala, sublimada. As entoações, por sua vez, são melodias naturais que produzimos quando falamos e descartamos logo em seguida. Capturar e preservar uma fala significativa, eis a missão do cancionista. A fala coloquial é responsável por ampliar as possibilidades expressivas dos gêneros. Se assim não fosse, estes ficariam reduzidos a simples estereótipos. Numa canção, percebemos a presença da fala na melodia que é ampliada para acomodar uma frase mais longa, nas expressões de chamamento (“vem

O Frevo, palavra exótica Tudo que é bom diz, exprime É inigualável, sublime, Termo raro, bom que dói... Vale por um dicionário, Traduz delírio, festança, Tudo salta, tudo dança, Tudo come, tudo rói... O escritor Rodolfo Garcia, em seu Dicionário de Brasileirismos – Peculiaridades Pernambucanas, transcrevendo o nº 32 do jornal A Província, Recife, 1913, assim registra:

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Embora associado à liberdade e à euforia, o frevo impõe dificuldades e exige responsabilidades. É um paradoxo feito música. Concebido para a multidão, sua coreografia é individual. Canto popular, não raro exige uma perícia vocal que desestimula o cantor diletante. Emblema sonoro de brasilidade, poucas vezes transpôs as fronteiras do seu Estado de origem. Por tudo isso, os mais pessimistas dizem ser um gênero destinado à solidão e ao desaparecimento, cuja sobrevida só é ainda assegurada graças à sazonalidade carnavalesca, para a qual todo ano é convocado a desabrochar, como inflorescência cada vez mais rara. Para início de conversa, reproduzo aqui um trecho do depoimento de Guerra Peixe, incluído no livro Do Frevo ao Manguebeat, de José Teles: “Antes de mais nada o compositor de frevo tem de ser músico. Tem que entender de orquestração”. As palavras do eminente maestro, ainda que válidas para o frevo de rua, exclusivamente instrumental, não podem ser aplicadas às modalidades cantadas, o frevo-canção e o frevo-de-bloco. O depoimento embute um preconceito e uma confusão. Em primeiro lugar, por deixar implícito que apenas apenas a sonoridade elaborada do frevo instrumental seria digna de apreciação, desprezando assim a espontaneidade do frevo cantado. Além disso, contribui para ocultar as semelhanças e diferenças entre as modalidade de frevo, que se refletem não apenas na expressão (instrumental e cantado), mas também no seu conteúdo e função. Assim é que o frevo-de-rua e o frevo-canção, ao investirem na reiteração de temas melódicos, destinam-se sobretudo a

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Hermeto Pascoal emprestou sua versatilidade ao frevo

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Promotora do Carnaval, que não funciona” (Carlos Fernando), “Foi maravilhoso que Caetano tenha mandado de Londres um frevo-canção como ‘Chuva, suor e cerveja’, que muito toquei e orquestrei no carnaval (Nelson Ferreira).” A opinião discordante, ma non troppo, foi do irascível Capiba: “Não existe frevo baiano”. E não há, em absoluto, novidade no frevo. O frevo, que se faz hoje, fazia-se no começo do século. Não existe diferença e, sim, prestígio de cantor”. Enfrentando o conservadorismo que vigorava em Pernambuco nos anos 70, quando o carnaval estava recolhido aos clubes e as agremiações desfilando na passarela oficial da Dantas Barreto, jovens como Flaviola, Germano Gladstone e Marcelo Montenegro, entre outros, plugavam o frevo e o cantavam com linha melódica de forte sabor pop. Flaviola fez isto no seu único LP, gravado com o Alegre Bando do Sol, em 1976. O Limousine 99(Gladstone, Salatiel José, Rogério Gutenberg e Ozires Diniz) lançou, pela Rozenblit, o compacto duplo com “De sangue quente” e outro frevo “Sopa de gelo” (e mais dois sambas), o disco mais vendido o carnaval pernambucano de 1973. “De sangue

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por aí. A cada carnaval ele compunha mais um frevo eletrificado, e o tornava sucesso nacional, algo que o frevo pernambucano só conseguiu poucas vezes. Vieram “Chuva, suor e cerveja”, “Um frevo novo”, “Cara a cara”, e com eles a polêmica em Pernambuco. Existe frevo baiano, ou não? Quem tentou responder a pergunta foi o jornal carioca O Globo que, na edição de 22 de fevereiro de 1974, reuniu, no Recife, alguns dos nomes mais conhecidos e atuantes da música pernambucana para discutir o assunto: Nelson Ferreira, Capiba, Alceu Valença, Germano Gladstone (da banda Limousine 99), Mário Griz, Fernando Filizola (violeiro e cantor do Quinteto Violado) e Carlos Fernando. Curiosamente, todos, sem exceção, fugiram à polêmica, e a maioria culpou o conservadorismo do frevo pernambucano pelo sucesso que estava sendo obtido pelo congênere feito por baianos: “O frevo é o mesmo, o problema é a embalagem” (Alceu Valença), “A polêmica em cima do frevo baiano ou pernambucano foi criada não pelos baianos e, sim, pela decadência da criatividade dos compositores tradicionais de frevo de Pernambuco, aliada à Empresa Municipal de Turismo, à Empetur e à Comissão

talvez”, “Mundo novo”). Foi o disco mais elogiado de Robertinho do Recife, mas não causou polêmica em sua cidade natal. Provavelmente, os conservadores continuavam ouvindo os frevos antigos, como se o mundo não houvesse sofrido mudanças drásticas, desde que a Rozenblit popularizou o frevo em todo Nordeste, a partir do LP 25 Anos de Frevo, que consiste na regravação de frevos-canção, vários deles compostos nos anos 30. Mais comentado foi o projeto Asas da América, idealizado por Carlos Fernando, autor de quase todo o repertório do disco, lançado em 1980, pela CBS (atual Sony BMG). O LP foi uma lufada de ar fresco num gênero que se restringia cada vez aos valores do passado (não por acaso, “Valores do Passado”, de Edgar Moraes, teve uma releitura do grupo As Frenéticas neste disco). Ao contrário do frevo baiano, atrelado aos trios elétricos, o frevo novo de Carlos Fernando usava as ferramentas do frevo, com temática moderna, e melodias leves e pop, interpretadas por alguns dos maiores nomes da MPB da época, Chico Buarque, Caetano Veloso, Elba Ramalho, Alceu Valença, e promoveu o encontro único de Jackson Pandeiro e Gilberto Gil. Foi uma tentativa elogiada, que se repetiu, com menos impacto em outros álbuns, porém fez amigos, mas não influenciou muitas pessoas. O maior hit deste estilo moderno de frevo, aconteceu em 1985,

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Caetano Veloso compôs frevos que foram sucessos nacionais, como “Atrás do Trio Elétrico” e “Samba, Suor e Cerveja”

quente”, vencendo três festivais do gênero, inclusive o instituído pela prefeitura. Os versos chegavam a ser revolucionários para a temática à qual o frevo acostumara-se: “Não me importa que a vida/se acabe pra mim amanhã/é carnaval eu vou deixar/ meu rock de lado/vou curtir meu frevo apressado/ debaixo do meu sol dourado/nos braços de quem deus mandar”. Marcelo Montenegro e o Tejucupapo Bando lançaram mais dois frevos diferentes, pela Rozenblit, num compacto simples: “Frevo torto” e “Velho frevinho”. Sem a força da Rozenblit, o frevo passou a perder popularidade. Um fenômeno paradoxal, já que continuava sendo a principal música do carnaval pernambucano. As rádios, no entanto, não se preocupavam em tocar as poucas novidades ainda lançadas pela gravadora da Estrada dos Remédios. O frevo tornava-se uma música de músicos, composto por nomes como Hermeto Pascoal (“Frevo em Maceió”), Egberto Gismonti (“Frevo”), Tom Jobim e Vinicius de Moraes (“Frevo”). Mas foi Robertinho do Recife, em 1978, que radicalizou, com o álbum Robertinho no Passo, realizado quase que em parceria com Hermeto Pascoal – dissonâncias, compassos quebrados, guitarras e teclado eletrônico como instrumento solista, num repertório formado por clássicos do gênero (“Come e dorme”, “Vassourinhas”), e inéditas (“Nem um

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“Há a lamentar, na execução dessa marcha, hoje em dia, o andamento rápido e os floreios de saxofones da segunda parte, coisa improvisada, por certo virtuose do sax e logo aperfeiçoada por outra. É uma desfiguração lamentável, que responde pelo aceleramento incômodo do andamento.” A crítica foi pinçada do clássico estudo de Valdemar de Oliveira Frevo, Capoeira e Passo, e refere-se à “Marcha n° 1 de Vassourinhas”. O “certo virtuose do sax” trata-se de Felinho (Félix Lins de Albuquerque, 1895/ 1980), autor de uma heresia: improviso de sax em Vassourinhas, heresia que costumava cometer nos bailes em que tocava com a orquestra do maestro Nelson Ferreira, registrada em disco, 1956, em um 78rpm com selo Mocambo, da gravadora pernambucana Rozenblit. Foi uma ousadia tão marcante que daí em diante tornou-se impensável “Vassourinhas” sem o impagável floreio de sax na segunda parte. Valdemar de Oliveira, bem como outros compositores e admiradores do frevo, queriamno refratário a mudanças. Pelo menos mudanças drásticas, que mexessem no andamento: “O frevo-de-rua, em Pernambuco, vem evoluindo naturalmente. Será erro introduzir nele valores novos, que o povo refugará, com a mais absoluta certeza... No dia em que lhe meterem ingredientes de bossa-nova, de iê-iê-iê, de bop e quejandos, por mais ricos e importantes que sejam, perderá o grau de concentração de que precisa para atiçar a chama do passo”, continua Oliveira (na obra citada). Novidade somente as do tipo apresentadas por Nelson Ferreira no frevo-de-rua “Gostosão”, ou “Come e dorme”.

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O maestro Spok, um importante renovador do frevo

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Conservadores x inovadores: pelejas na história do frevo

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Os paradoxos e complexidades das formas assumidas pelo frevo

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Arquivo de família/Reprodução Alexandre Belém/JC Imagem

Valdemar de Oliveira e outros compositores e admiradores do frevo o queriam refratário a mudanças

O que diria Valdemar de Oliveira dos “floreios” que tornaram famosa, país afora, a orquestra do Maestro Spok – floreios não apenas do sax, mas de todos os instrumentos, entre os quais uma guitarra elétrica? Teóricos do frevo (no caso de Valdemar de Oliveira, também compositor) mal aceitavam o frevo-canção ou o frevo-de-bloco (que preferem chamar de marcha-canção ou marcha-de-bloco). Ruy Duarte (autor de outro antológico estudo, A História Social do Frevo) considera uma deturpação o frevo cantado. E o próprio Capiba (Lourenço da Fonseca Barbosa), o mais famoso autor de frevos-canção não via com bons olhos certas liberdades tomadas por novos autores. O caruaruense Carlos Fernando, autor de Banho de Cheiro(gravado por Elba Ramalho), o frevo comercialmente mais bem-sucedido até hoje, conta que se atreveu a mostrar algumas das suas composições a Capiba que, depois de escutá-las, sentenciou: “Pra mim isto é rock”. Estruturalmente, o primeiro frevo moderno, com arranjos e orquestração que foge do figurino adotado pelos maestros pernambucanos é “Frevo

rasgado”, de Gilberto Gil e Bruno Ferreira, que abre o disco tropicalista do baiano (1968); quem assina o arranjo é o maestro Rogério Duprat. “Frevo rasgado” não suscitou discussões entre os puristas do frevo, até porque o ano em que foi lançado foi de tantas viradas de mesas, e não apenas na música popular, que deve ter passado despercebido. No ano seguinte, porém, um outro frevo, composto por Caetano Veloso, chamaria mais a atenção. “Atrás do trio elétrico” deflagrou uma “guerra” entre os cultuadores do, digamos, frevo de raiz, e os que o queriam com a cara dos novos tempos. “Atrás do trio elétrico” era um frevo acelerado, sem orquestra, uma guitarra distorcida (empunha por Lanny Gordin) emoldurava a engenhosa melodia. A rigor, com exceção da letra inventiva, nem era assim tão revolucionário. Apenas seguia o molde baiano, tocado pelos até então pouco conhecidos trios elétricos nas ruas de Salvador durante o carnaval (foi essa música, aliás, que detonou a folia baiana nacionalmente, passo inicial para o que ela é hoje). O problema foi que Caetano Veloso não ficou

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com Banho de cheiro, lançado por Elba Ramalho, e entoado em coro por cerca de 500 mil pessoas no Rock in Rio I. Em anos mais recentes J.Michiles almejou chegar ao povo com um frevo popular e pop, gravado por Alceu Valença. No século 21, o frevo voltou a respirar sem o uso de aparelhos. Com trabalhos de Antônio Nóbrega, Silvério Pessoa e a Spok Frevo Orquestra. De certa forma conservador, Nóbrega primeiro passou a empregar passos do frevo como modelo para uma dança clássica nacional, depois, além de incentivador da orquestra de Spok, com quem tem gravado e se apresentado, inovou com o violino como instrumento solo de frevo, e ainda gravou dois discos inteiramente dedicados ao gênero. Silvério Pessoa deu um mergulho no repertório carnavalesco do seu inspirador Jackson do Pandeiro, e mandou ver o CD Micróbio do Frevo, um trabalho com loops, programações, um frevo do futuro, com um pé lá no passado. Já o maestro Spok descobriu o ovo de Colombo. Tirou pura e simplesmente o frevo da quadradice da fidelidade à partitura original. Sem cair no jazz, a Spok Frevo Orquestra vem recebendo elogios por onde passa (já tocou até na China), inserindo liberdade entre colcheias, quiálteras, fazendo ver que o frevo não precisa necessariamente acabar na ponta do pé, tem lugar também para a cabeça.

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Antonio Nóbrega passou a empregar passos do frevo como modelo para uma dança clássica nacional

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O que diria Valdemar de Oliveira dos “floreios” que tornaram famosa, país afora, a orquestra do Maestro Spok – floreios não apenas do sax, mas de todos os instrumentos, entre os quais uma guitarra elétrica? Teóricos do frevo (no caso de Valdemar de Oliveira, também compositor) mal aceitavam o frevo-canção ou o frevo-de-bloco (que preferem chamar de marcha-canção ou marcha-de-bloco). Ruy Duarte (autor de outro antológico estudo, A História Social do Frevo) considera uma deturpação o frevo cantado. E o próprio Capiba (Lourenço da Fonseca Barbosa), o mais famoso autor de frevos-canção não via com bons olhos certas liberdades tomadas por novos autores. O caruaruense Carlos Fernando, autor de Banho de Cheiro(gravado por Elba Ramalho), o frevo comercialmente mais bem-sucedido até hoje, conta que se atreveu a mostrar algumas das suas composições a Capiba que, depois de escutá-las, sentenciou: “Pra mim isto é rock”. Estruturalmente, o primeiro frevo moderno, com arranjos e orquestração que foge do figurino adotado pelos maestros pernambucanos é “Frevo

rasgado”, de Gilberto Gil e Bruno Ferreira, que abre o disco tropicalista do baiano (1968); quem assina o arranjo é o maestro Rogério Duprat. “Frevo rasgado” não suscitou discussões entre os puristas do frevo, até porque o ano em que foi lançado foi de tantas viradas de mesas, e não apenas na música popular, que deve ter passado despercebido. No ano seguinte, porém, um outro frevo, composto por Caetano Veloso, chamaria mais a atenção. “Atrás do trio elétrico” deflagrou uma “guerra” entre os cultuadores do, digamos, frevo de raiz, e os que o queriam com a cara dos novos tempos. “Atrás do trio elétrico” era um frevo acelerado, sem orquestra, uma guitarra distorcida (empunha por Lanny Gordin) emoldurava a engenhosa melodia. A rigor, com exceção da letra inventiva, nem era assim tão revolucionário. Apenas seguia o molde baiano, tocado pelos até então pouco conhecidos trios elétricos nas ruas de Salvador durante o carnaval (foi essa música, aliás, que detonou a folia baiana nacionalmente, passo inicial para o que ela é hoje). O problema foi que Caetano Veloso não ficou

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O vocábulo, como bem registrou Evandro Rabello, apareceu pela primeira vez na imprensa em 9 de fevereiro de 1907. O seu centenário está sendo comemorado por toda parte, mas, como dança e marcha carnavalesca a animar o nosso carnaval, o frevo pernambucano já reinava em nossas ruas, movimentando as massas e animando os cordões das agremiações, desde o final do século 19. O Frevo, palavra exótica Tudo que é bom diz, exprime É inigualável, sublime, Termo raro, bom que dói... Vale por um dicionário, Traduz delírio, festança, Tudo salta, tudo dança, Tudo come, tudo rói...

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O escritor Rodolfo Garcia, em seu Dicionário de Brasileirismos – Peculiaridades Pernambucanas, transcrevendo o nº 32 do jornal A Província, Recife, 1913, assim registra:

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estimular fisicamente o público – a ponto de muitos acharem que o frevo nem deveria ter letra; quando este passou a ser cantado, o próprio gênero tornouse um de seus temas centrais. Por sua vez, o frevode-bloco, caracterizado pelo andamento mais lento e pela maior duração das notas, transmite estados afetivos melancólicos, em geral associados à nostalgia. De um lado a ação, de outro a paixão. Na verdade, essas modalidades exigem competências distintas. Enquanto a música instrumental requer do compositor um amplo domínio sobretudo dos aspectos mais ligados à sonoridade, tais como as escalas melódicas, harmonia, timbre dos instrumentos etc., a habilidade do compositor de canções consiste basicamente em criar relações de compatibilidade entre letra e melodia. Para isso, não precisa saber ler uma partitura ou mesmo tocar um instrumento (isso, aliás, é raro entre os cancionistas – que o digam Lamartine Babo e Braguinha, recentemente falecido, para ficarmos apenas nesses dois exemplos). Sua condição de falante da língua lhe basta. Afinal, a canção nada mais é do que uma extensão da fala, sublimada. As entoações, por sua vez, são melodias naturais que produzimos quando falamos e descartamos logo em seguida. Capturar e preservar uma fala significativa, eis a missão do cancionista. A fala coloquial é responsável por ampliar as possibilidades expressivas dos gêneros. Se assim não fosse, estes ficariam reduzidos a simples estereótipos. Numa canção, percebemos a presença da fala na melodia que é ampliada para acomodar uma frase mais longa, nas expressões de chamamento (“vem

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Leonardo Dantas Silva é historiador e escritor

Embora associado à liberdade e à euforia, o frevo impõe dificuldades e exige responsabilidades. É um paradoxo feito música. Concebido para a multidão, sua coreografia é individual. Canto popular, não raro exige uma perícia vocal que desestimula o cantor diletante. Emblema sonoro de brasilidade, poucas vezes transpôs as fronteiras do seu Estado de origem. Por tudo isso, os mais pessimistas dizem ser um gênero destinado à solidão e ao desaparecimento, cuja sobrevida só é ainda assegurada graças à sazonalidade carnavalesca, para a qual todo ano é convocado a desabrochar, como inflorescência cada vez mais rara. Para início de conversa, reproduzo aqui um trecho do depoimento de Guerra Peixe, incluído no livro Do Frevo ao Manguebeat, de José Teles: “Antes de mais nada o compositor de frevo tem de ser músico. Tem que entender de orquestração”. As palavras do eminente maestro, ainda que válidas para o frevo de rua, exclusivamente instrumental, não podem ser aplicadas às modalidades cantadas, o frevo-canção e o frevo-de-bloco. O depoimento embute um preconceito e uma confusão. Em primeiro lugar, por deixar implícito que apenas apenas a sonoridade elaborada do frevo instrumental seria digna de apreciação, desprezando assim a espontaneidade do frevo cantado. Além disso, contribui para ocultar as semelhanças e diferenças entre as modalidade de frevo, que se refletem não apenas na expressão (instrumental e cantado), mas também no seu conteúdo e função. Assim é que o frevo-de-rua e o frevo-canção, ao investirem na reiteração de temas melódicos, destinam-se sobretudo a

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talvez”, “Mundo novo”). Foi o disco mais elogiado de Robertinho do Recife, mas não causou polêmica em sua cidade natal. Provavelmente, os conservadores continuavam ouvindo os frevos antigos, como se o mundo não houvesse sofrido mudanças drásticas, desde que a Rozenblit popularizou o frevo em todo Nordeste, a partir do LP 25 Anos de Frevo, que consiste na regravação de frevos-canção, vários deles compostos nos anos 30. Mais comentado foi o projeto Asas da América, idealizado por Carlos Fernando, autor de quase todo o repertório do disco, lançado em 1980, pela CBS (atual Sony BMG). O LP foi uma lufada de ar fresco num gênero que se restringia cada vez aos valores do passado (não por acaso, “Valores do Passado”, de Edgar Moraes, teve uma releitura do grupo As Frenéticas neste disco). Ao contrário do frevo baiano, atrelado aos trios elétricos, o frevo novo de Carlos Fernando usava as ferramentas do frevo, com temática moderna, e melodias leves e pop, interpretadas por alguns dos maiores nomes da MPB da época, Chico Buarque, Caetano Veloso, Elba Ramalho, Alceu Valença, e promoveu o encontro único de Jackson Pandeiro e Gilberto Gil. Foi uma tentativa elogiada, que se repetiu, com menos impacto em outros álbuns, porém fez amigos, mas não influenciou muitas pessoas. O maior hit deste estilo moderno de frevo, aconteceu em 1985,

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Promotora do Carnaval, que não funciona” (Carlos Fernando), “Foi maravilhoso que Caetano tenha mandado de Londres um frevo-canção como ‘Chuva, suor e cerveja’, que muito toquei e orquestrei no carnaval (Nelson Ferreira).” A opinião discordante, ma non troppo, foi do irascível Capiba: “Não existe frevo baiano”. E não há, em absoluto, novidade no frevo. O frevo, que se faz hoje, fazia-se no começo do século. Não existe diferença e, sim, prestígio de cantor”. Enfrentando o conservadorismo que vigorava em Pernambuco nos anos 70, quando o carnaval estava recolhido aos clubes e as agremiações desfilando na passarela oficial da Dantas Barreto, jovens como Flaviola, Germano Gladstone e Marcelo Montenegro, entre outros, plugavam o frevo e o cantavam com linha melódica de forte sabor pop. Flaviola fez isto no seu único LP, gravado com o Alegre Bando do Sol, em 1976. O Limousine 99(Gladstone, Salatiel José, Rogério Gutenberg e Ozires Diniz) lançou, pela Rozenblit, o compacto duplo com “De sangue quente” e outro frevo “Sopa de gelo” (e mais dois sambas), o disco mais vendido o carnaval pernambucano de 1973. “De sangue

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quente”, vencendo três festivais do gênero, inclusive o instituído pela prefeitura. Os versos chegavam a ser revolucionários para a temática à qual o frevo acostumara-se: “Não me importa que a vida/se acabe pra mim amanhã/é carnaval eu vou deixar/ meu rock de lado/vou curtir meu frevo apressado/ debaixo do meu sol dourado/nos braços de quem deus mandar”. Marcelo Montenegro e o Tejucupapo Bando lançaram mais dois frevos diferentes, pela Rozenblit, num compacto simples: “Frevo torto” e “Velho frevinho”. Sem a força da Rozenblit, o frevo passou a perder popularidade. Um fenômeno paradoxal, já que continuava sendo a principal música do carnaval pernambucano. As rádios, no entanto, não se preocupavam em tocar as poucas novidades ainda lançadas pela gravadora da Estrada dos Remédios. O frevo tornava-se uma música de músicos, composto por nomes como Hermeto Pascoal (“Frevo em Maceió”), Egberto Gismonti (“Frevo”), Tom Jobim e Vinicius de Moraes (“Frevo”). Mas foi Robertinho do Recife, em 1978, que radicalizou, com o álbum Robertinho no Passo, realizado quase que em parceria com Hermeto Pascoal – dissonâncias, compassos quebrados, guitarras e teclado eletrônico como instrumento solista, num repertório formado por clássicos do gênero (“Come e dorme”, “Vassourinhas”), e inéditas (“Nem um

Caetano Veloso compôs frevos que foram sucessos nacionais, como “Atrás do Trio Elétrico” e “Samba, Suor e Cerveja”

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Hermeto Pascoal emprestou sua versatilidade ao frevo

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por aí. A cada carnaval ele compunha mais um frevo eletrificado, e o tornava sucesso nacional, algo que o frevo pernambucano só conseguiu poucas vezes. Vieram “Chuva, suor e cerveja”, “Um frevo novo”, “Cara a cara”, e com eles a polêmica em Pernambuco. Existe frevo baiano, ou não? Quem tentou responder a pergunta foi o jornal carioca O Globo que, na edição de 22 de fevereiro de 1974, reuniu, no Recife, alguns dos nomes mais conhecidos e atuantes da música pernambucana para discutir o assunto: Nelson Ferreira, Capiba, Alceu Valença, Germano Gladstone (da banda Limousine 99), Mário Griz, Fernando Filizola (violeiro e cantor do Quinteto Violado) e Carlos Fernando. Curiosamente, todos, sem exceção, fugiram à polêmica, e a maioria culpou o conservadorismo do frevo pernambucano pelo sucesso que estava sendo obtido pelo congênere feito por baianos: “O frevo é o mesmo, o problema é a embalagem” (Alceu Valença), “A polêmica em cima do frevo baiano ou pernambucano foi criada não pelos baianos e, sim, pela decadência da criatividade dos compositores tradicionais de frevo de Pernambuco, aliada à Empresa Municipal de Turismo, à Empetur e à Comissão

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comigo” etc.), nas interjeições (“olha!”), na direção assumida pela melodia (na fala, a entoação ascendente indica interrogação ou supensão do pensamento, enquanto a direção descendente indica afirmação ou conclusão). Voltemos ao nosso tema. Se no frevo-de-rua o desafio dos compositores era encontrar o equivalente sonoro para a gestualidade corporal dos dançarinos, em sua modalidade cantada a tarefa consiste em ajustar o ritmo veloz, repleto de assimetrias à gestualidade entoativa da fala. Grande parte do encanto dos frevos cantados se deve ao desajuste entre o comprimento da frase melódica e a letra. São essas “imperfeições”, expressas nas acelerações imprevistas em certos trechos da composição, que favorecem o aparecimento das sincopas características do gênero, tão apreciadas quanto surpreendentes. É aí também que a fala se revela, produzindo o efeito de situações locutivas reais. Vejamos a propósito o refrão de “Bom demais”, de J.Michiles, gravada por Alceu Valença no CD Estação da Luz, 1999. No trecho que corresponde ao convite para a dança (“Menina, vamos nessa que esse frevo é bom demais”), há uma súbita elipse entre vamos e nessa que subverte o padrão métrico da composição. Em “Oh Bela”, de Capiba, no trecho “porém poderia ser mais bela/ se ela tivesse meu amor”, a frase melódica é estendida para acomodar os acentos naturais da frase verbal mais longa. E a lista não pára aqui. Por estar mais diretamente associada à efusão do carnaval, a vertente eufórica, baseada na velocidade, nas recorrências melódicas, e na exaltação

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24 Continente Documento Capiba, o seu nome se confunde com a história do próprio frevo

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Maestro Duda incursionou na música clássica sem mudar sua linguagem nem recorrer a técnicas nas quais não ficasse à vontade

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Capiba, Nelson Ferreira, Guerra Peixe e o pianista Heitor Alimonda

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escolheu para o quinto e último movimento do IV Ciclo nordestino, op. 43 (1977), para piano, dedicado ao escritor Leonardo Dantas. O movimento acabou adquirindo vida independente do Ciclo e recebeu gravações isoladas e um arranjo do próprio compositor para violão solo. Marlos Nobre diz que a peça é uma reminiscência muito viva de sua infância: “Nascido na rua São João, bairro de São José, eu ouvia as agremiações do carnaval em minha porta. Pulava e dançava o frevo e este ritmo marcou fundamentalmente minha mente de compositor. O meu Frevo para piano é, portanto, uma explosão deste ritmo fundamental, buliçoso, enérgico e ao mesmo tempo nostálgico. Nele, a tonalidade de ré menor é característica desse tom de nostalgia misturada com euforia e impulso rítmico. A forma da peça é de um ‘rondó’ com um final esfuziante”. Arthur Barbosa Neto (1965), compositor e arranjador cearense radicado no Rio Grande do Sul, recorreu ao frevo em algumas obras. A mais divulgada delas é o Frevo (1997), para orquestra de cordas, mas também há a presença do ritmo em parte do segundo movimento de sua Sinfonia Brasileira (2005) e no início do musical infantil Ari Areia, um Grãozinho Apaixonado (2003). “Como gosto de ousar, também compus um tango em que no meio dele há uma fuga que fica no limbo entre o tango e o frevo, dando para ver bem as similaridades que podem ter os dois ritmos, apesar de tão longe culturalmente um do outro”, fala Arthur sobre Recuerdos nº 1 (1999), que utiliza o tema da Sinfonia Brasileira e explora semelhanças entre os gêneros pernambucano e portenho. Ele ainda promete escrever mais frevos. “Estou seguro de que mais inspirações deste ritmo tão contagiante virão”. O baiano Wellington Gomes (1960) deu leituras mais arrojadas ao orquestral Frevinho (1995) e ao singelo Tambores, ondas e frevo (2002), para flauta e clarineta. Já Ademir Araújo (1944), mais conhecido como Maestro Formiga, e Maestro Duda (1935) incursionaram na música clássica sem mudar sua linguagem nem recorrer a técnicas nas quais não ficassem à vontade. Compuseram, dessa forma, peças populares em roupagem sinfônica. Para sentir como seria o contrário – uma peça sinfônica que bebesse do frevo – basta comparar com o de Cláudio Santoro ou o de Marlos Nobre. Em 2005 aconteceu a estréia de Uma visão nordestina, do Maestro Duda, que se encerrava com um frevo. Em dezembro último, o compositor foi o laureado do IX Virtuosi. Dentre os frevos orquestrais apresentados, o destaque foi para o último movimento do Concertino para viola, orquestra de cordas e percussão, chamado “Lito no Frevo”, uma homenagem ao solista Rafael Altino. Também foram tocadas “Lucinha no frevo”, para a sugestiva formação de quinteto de metais, e as peças sinfônicas Suíte pernambucana de bolso (cujo ritmo

os menos leigos, que não há transposições ou modulações numa música modal. O frevo foge a esse modalismo por conta de sua herança européia mais recente – comparado com as raízes ibéricas mais petrificadas dos gêneros interioranos – e de preservar as harmonias e instrumentação austro-germânicas, onde os metais são marca registrada. Daí que já era tempo de se fazer um levantamento da presença do frevo na música clássica. Dos grandes nomes da história da música nacional, é curioso antecipar que Villa-Lobos (1887–1959) – o mais prolífico criador musical do século 20 no mundo (vale grifar) e cujas amostras mais visíveis de material popular estão nas Bachianas e nos Choros – nunca tenha escrito sequer um movimento ou um trecho de qualquer peça em ritmo de frevo, até onde alcançou esta pesquisa. Não foi o caso do amazonense Cláudio Santoro (1919 – 1989), que deixou um belíssimo Frevo para piano (1953), de sua fase mais nacionalista, orquestrado quase três décadas mais tarde e agora lançado em CD pela Sinfônica do Estado de São Paulo. Nem o de Mozart Camargo Guarnieri (1907 – 1993), que confiou a temas em forma de frevo a abertura do terceiro movimento do Concerto para piano e orquestra nº 2 (1946) e do Concertino para piano e orquestra de câmara (1961), embora quase toda incorporação de motivos populares em Guarnieri seja feita de forma muito pessoal e isso deixe os respectivos temas com pouca cara de frevo. César Guerra Peixe (1914 – 1993), fluminense de Petrópolis, encontrou um novo rumo para a música clássica brasileira em sua estadia de quase três anos em Pernambuco. Não ficou imune ao frevo. Os quatro movimentos da Suíte sinfônica nº 2 – Pernambucana (1955) foram uma síntese orquestral dessa passagem pelo Estado: maracatu, dança de caboclinhos, aboiado e frevo. Nas obras para piano coube a ele o privilégio de ser o ritmo motor do movimento final de três peças: a Suíte nº 2 – Nordestina para piano (1954) e as Sonatas nº 1 (1950) e 2 (1967). A pianista japonesa Midori Maeshiro em breve estreará um CD com obras para piano de Guerra Peixe, patrocinado pela Academia Brasileira de Música, que inclui as duas sonatas. A contar pelas últimas peças citadas, a vivacidade do frevo prova ser ideal para desfechos. Inclusive é muito apropriada à estrutura clássica de concertos (rápido-lento-vivo). Marlos Nobre seguiu a linha e o

Experimente tocar uma polca ou uma marcha em andamento molto vivace, puxado por uma percussão frenética; inclua síncopes além do normal na melodia e na harmonia e contemple saxofones e trompetes com floreios em alguns trechos. Com essas indicações você vai acabar criando um frevo-de-rua, mas vai faltar uma coisa. Algo que podemos tentar definir tomando emprestado um termo de Roland Barthes, em seu célebre ensaio A Câmara Clara (sobre teoria de estética da fotografia): o punctum, o que lhe desperta o afeto, que, no âmbito desta matéria, só pode existir em um frevo de verdade. Se aceitar uma sugestão, faça isso com a polca Trisch-Trasch de Johann Strauss Jr. . Da primeira vez, execute mecanicamente como ensinado acima; da segunda, experimente botar o coração e perceba o que os pernambucanos sentimos. O Nordeste é fonte fecunda e notória de matériaprima musical, principalmente pela variedade de manifestações culturais e por ser a única região das Américas que possui uma música modal – assentada numa escala de notas caracterizada e base harmônica fixa. Isso quer dizer, observem os mais leigos, que a música nordestina rural é tão reconhecível (associando uma melodia a seu lugar de origem) quanto a judaica, a chinesa, a balinesa ou a cigana; e, percebam

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Carlos Eduardo Amaral Aos poucos, ritmo centenário contagia as salas de concerto com a mesma alegria que inflama passistas e foliões

Frevos sinfônicos

Camargo Guarnieri confiou a temas em forma de frevo a abertura do terceiro movimento do Concerto para piano e orquestra nº 2 (1946) e do Concertino para piano e orquestra de câmara (1961)

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recifolindense fecha a peça de quatro movimentos), teatro, com orquestra sinfônica, foi muito rica. Não é Música para metais II e Nino, o pernambuquinho – este, somente o fato de ter uma orquestra sinfônica, mas é o originalmente, um frevo de rua. tratamento que se deu – ensaios e trabalhos exaustivos A pianista Ana Lúcia Altino Garcia, dedicanda de para uma realização de qualidade”. “Lucinha no frevo”, ressaltou a importância da valoTal abordagem do frevo desperta uma reflexão rização de um compositor popular dentro do festival: antiga e pertinente não só a esse uso dele dentro do “Sempre considerei o frevo como uma música prin- universo erudito, mas do uso da música popular em cipalmente virtuosa e infelizmente muito mal tocada. geral: em que medida, dentro das obras listadas aqui, Então essa experiência de fazer o frevo dentro do pode-se dizer que estamos ouvindo meros arranjos sinfônicos de frevo ou peças sinfônicas genuínas que Arthur Barbosa Neto, utilizam temas e células rítmicas do frevo? Porque na compositor e arranjador cearense primeira hipótese, a obra poderia ter sido concebida na instrumentação convencional, poupando a música sinfônica de não ganhar nada, fornecendo roupagem de luxo a peças de apelo mais direto. É o caso de o ouvinte ter uma boa educação musical para discernir se o compositor digeriu os elementos populares e refinou a própria linguagem ou se produziu uma música afetada e de agrado popularesco. Para a discussão ficar aberta e não desviar o rumo deste artigo, pode-se contra-argumentar que: 1. outros gêneros populares, particularmente europeus, integraram-se à música sinfônica sem se descaracterizar, como a valsa e a polca; 2. que um Guerra Peixe, em suas pesquisas, sentenciou com toda a autoridade que tinha: “No frevo instrumental, a composição nasce pronta para fanfarra ou banda, pois em princípio o compositor sempre executa um instrumento e é músico de boa qualificação. Talvez seja o

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Os compositores Camargo Guarnieri e Guerra Peixe

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Sergio Fernando Campanella de Oliveira é pesquisador

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outro gênero difícil de ser cantado – basta lembrar aqui o caso de “Brasileirinho”, de Valdir Azevedo e letra de Pereira Costa). Isso não ocorre com o frevo-de-bloco, cuja solenidade melancólica, como já dissemos, traduz-se sonoramente na lentidão do andamento. Nesse caso, as paixões relacionadas à perda ou à distância do objeto amado, tradicionalmente marcadas pela subjetividade, são cantadas coletivamente, em composições como “Valores do passado”, “Frevo da saudade” e outras. Euforia solitária e a tristeza compartilhada. No frevo cantado, tudo se inverte. Como no rito do carnaval.

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de personagens, lugares e do próprio gênero (“Bom demais”, “Roda e avisa”, “Voltei, Recife”, “Oh, que frevo bom” etc.), acabou prevalecendo nacionalmente sobre a vertente lenta, passional, do frevo-de-bloco – não obstante o estrondoso sucesso alcançado por “Evocação n1”, de Nelson Ferreira, em 1957 . E aqui talvez resida o maior paradoxo do gênero. O frevo-canção, muito rápido, dificilmente pode ser cantado em conjunto sem prejuízo da inteligibilidade da letra. Às vezes nem os refrãos escapam. Tente, por exemplo, repetir o trecho “..... o bê-a- bá dos teus olhos/morena bonita da boca do rio...”de “Banho de cheiro”, de Carlos Fernando, na mesma velocidade da versão gravada por Elba Ramalho. A frase final, em melodia descendente, tende a tornarse incompreensível, desfazendo-se em pura substância sonora (o mesmo, aliás, se dá com o chorinho,

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para as salas de concerto, mas por que os compositores do movimento deixaram de fora o frevo? Uma resposta pode ser o foco que deram à música rural/modal, supervalorizando-a em detrimento de outras vertentes. Um dos expoentes do movimento, o compositor, violinista e maestro Cussy de Almeida, arrepende-se dessa ênfase, julgando-a hoje errônea e limitadora. “Estava mais para o modelo da revolução cultural chinesa”, diz, acrescentando que a proposta do movimento como um todo era diferente do discurso defendido por Mário de Andrade. “O nacionalismo proposto por Mário de Andrade não é do tipo xenófobo como o pretenso movimento armorial. Mário defendia uma estética nacional a partir das origens, sem limitações harmônicas ou instrumentais, o que aliás norteou o trabalho de Villa-Lobos e também da Orquestra .” Segundo ele, o frevo não recebeu atenção do movimento, porque “Ao apelidar a música nordestina rural de ‘armorial’, a ‘única verdadeiramente brasileira’, seria um contrasenso incluir um ritmo de origem negra com instrumentos de metal e harmonias modernas condizentes com a juventude do seu tempo”. De fato, Mário de Andrade em seu Ensaio sobre a música brasileira (1928) dizia que uma arte nacional está instilada no inconsciente do povo: “O artista tem só que dar pros elementos já existentes uma transposição erudita que faça da música popular, música artística, isto é: imediatamente desinteressada”. Ele

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Alceu Valença gravou o sucesso “Bom Demais” de J. Michiles

caso único no mundo da música popular assim imaginada e escrita”; e 3. que o frevo de pau e corda é essencialmente camerístico, admitindo violinos, contrabaixos, clarones, flautas, flautim etc. Por sinal, todas as peças neste texto remetem ao frevo de rua, a variante mais difundida, mas justo o pau e corda, que embala os blocos mais seresteiros, não é contemplado pelos compositores. Clóvis Pereira (1932), arranjador sinfônico do “Hino do Vassourinhas” (1909, de Matias Rocha e Joana Batista), foi comemorado no Virtuosi em 2005. Ele, a bem da verdade, tem suas peças orquestrais executadas desde a década de 1970 e começou a escrever cerca de 20 anos antes, mas também compôs frevos de rua e escreve arranjos de músicas de outros compositores e intérpretes pernambucanos, a exemplo de Antônio Nóbrega. Só estava devendo um frevo à música erudita pernambucana, o que foi compensado em 2004 no Concertino em sol maior para violoncelo e orquestra de cordas, dedicado a Antonio Meneses. Finalmente se escutou uma “ferveção” sinfônica do compositor caruaruense – de passagem, dentro do terceiro movimento. Outro friso. Capiba (1904 – 1997) é de longe o compositor de frevos mais lembrado, porém em sua face erudita – resgatada em anos mais recentes – não constam peças que adotassem o gênero que o consagrou, somente amostras atonais ou armoriais. Por sinal, o armorial se valeu dos gêneros nordestinos e trouxe seu substrato

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teatro, com orquestra sinfônica, foi muito rica. Não é somente o fato de ter uma orquestra sinfônica, mas é o tratamento que se deu – ensaios e trabalhos exaustivos para uma realização de qualidade”. Tal abordagem do frevo desperta uma reflexão antiga e pertinente não só a esse uso dele dentro do universo erudito, mas do uso da música popular em geral: em que medida, dentro das obras listadas aqui, pode-se dizer que estamos ouvindo meros arranjos sinfônicos de frevo ou peças sinfônicas genuínas que utilizam temas e células rítmicas do frevo? Porque na primeira hipótese, a obra poderia ter sido concebida na instrumentação convencional, poupando a música sinfônica de não ganhar nada, fornecendo roupagem de luxo a peças de apelo mais direto. É o caso de o ouvinte ter uma boa educação musical para discernir se o compositor digeriu os elementos populares e refinou a própria linguagem ou se produziu uma música afetada e de agrado popularesco. Para a discussão ficar aberta e não desviar o rumo deste artigo, pode-se contra-argumentar que: 1. outros gêneros populares, particularmente europeus, integraram-se à música sinfônica sem se descaracterizar, como a valsa e a polca; 2. que um Guerra Peixe, em suas pesquisas, sentenciou com toda a autoridade que tinha: “No frevo instrumental, a composição nasce pronta para fanfarra ou banda, pois em princípio o compositor sempre executa um instrumento e é músico de boa qualificação. Talvez seja o

Carlos Eduardo Amaral Aos poucos, ritmo centenário contagia as salas de concerto com a mesma alegria que inflama passistas e foliões

Frevos sinfônicos

Camargo Guarnieri confiou a temas em forma de frevo a abertura do terceiro movimento do Concerto para piano e orquestra nº 2 (1946) e do Concertino para piano e orquestra de câmara (1961)

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Arthur Barbosa Neto, compositor e arranjador cearense

recifolindense fecha a peça de quatro movimentos), Música para metais II e Nino, o pernambuquinho – este, originalmente, um frevo de rua. A pianista Ana Lúcia Altino Garcia, dedicanda de “Lucinha no frevo”, ressaltou a importância da valorização de um compositor popular dentro do festival: “Sempre considerei o frevo como uma música principalmente virtuosa e infelizmente muito mal tocada. Então essa experiência de fazer o frevo dentro do

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Os compositores Camargo Guarnieri e Guerra Peixe

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outro gênero difícil de ser cantado – basta lembrar aqui o caso de “Brasileirinho”, de Valdir Azevedo e letra de Pereira Costa). Isso não ocorre com o frevo-de-bloco, cuja solenidade melancólica, como já dissemos, traduz-se sonoramente na lentidão do andamento. Nesse caso, as paixões relacionadas à perda ou à distância do objeto amado, tradicionalmente marcadas pela subjetividade, são cantadas coletivamente, em composições como “Valores do passado”, “Frevo da saudade” e outras. Euforia solitária e a tristeza compartilhada. No frevo cantado, tudo se inverte. Como no rito do carnaval.

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Sergio Fernando Campanella de Oliveira é pesquisador

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Alceu Valença gravou o sucesso “Bom Demais” de J. Michiles

de personagens, lugares e do próprio gênero (“Bom demais”, “Roda e avisa”, “Voltei, Recife”, “Oh, que frevo bom” etc.), acabou prevalecendo nacionalmente sobre a vertente lenta, passional, do frevo-de-bloco – não obstante o estrondoso sucesso alcançado por “Evocação n1”, de Nelson Ferreira, em 1957 . E aqui talvez resida o maior paradoxo do gênero. O frevo-canção, muito rápido, dificilmente pode ser cantado em conjunto sem prejuízo da inteligibilidade da letra. Às vezes nem os refrãos escapam. Tente, por exemplo, repetir o trecho “..... o bê-a- bá dos teus olhos/morena bonita da boca do rio...”de “Banho de cheiro”, de Carlos Fernando, na mesma velocidade da versão gravada por Elba Ramalho. A frase final, em melodia descendente, tende a tornarse incompreensível, desfazendo-se em pura substância sonora (o mesmo, aliás, se dá com o chorinho,

para as salas de concerto, mas por que os compositores do movimento deixaram de fora o frevo? Uma resposta pode ser o foco que deram à música rural/modal, supervalorizando-a em detrimento de outras vertentes. Um dos expoentes do movimento, o compositor, violinista e maestro Cussy de Almeida, arrepende-se dessa ênfase, julgando-a hoje errônea e limitadora. “Estava mais para o modelo da revolução cultural chinesa”, diz, acrescentando que a proposta do movimento como um todo era diferente do discurso defendido por Mário de Andrade. “O nacionalismo proposto por Mário de Andrade não é do tipo xenófobo como o pretenso movimento armorial. Mário defendia uma estética nacional a partir das origens, sem limitações harmônicas ou instrumentais, o que aliás norteou o trabalho de Villa-Lobos e também da Orquestra .” Segundo ele, o frevo não recebeu atenção do movimento, porque “Ao apelidar a música nordestina rural de ‘armorial’, a ‘única verdadeiramente brasileira’, seria um contrasenso incluir um ritmo de origem negra com instrumentos de metal e harmonias modernas condizentes com a juventude do seu tempo”. De fato, Mário de Andrade em seu Ensaio sobre a música brasileira (1928) dizia que uma arte nacional está instilada no inconsciente do povo: “O artista tem só que dar pros elementos já existentes uma transposição erudita que faça da música popular, música artística, isto é: imediatamente desinteressada”. Ele

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caso único no mundo da música popular assim imaginada e escrita”; e 3. que o frevo de pau e corda é essencialmente camerístico, admitindo violinos, contrabaixos, clarones, flautas, flautim etc. Por sinal, todas as peças neste texto remetem ao frevo de rua, a variante mais difundida, mas justo o pau e corda, que embala os blocos mais seresteiros, não é contemplado pelos compositores. Clóvis Pereira (1932), arranjador sinfônico do “Hino do Vassourinhas” (1909, de Matias Rocha e Joana Batista), foi comemorado no Virtuosi em 2005. Ele, a bem da verdade, tem suas peças orquestrais executadas desde a década de 1970 e começou a escrever cerca de 20 anos antes, mas também compôs frevos de rua e escreve arranjos de músicas de outros compositores e intérpretes pernambucanos, a exemplo de Antônio Nóbrega. Só estava devendo um frevo à música erudita pernambucana, o que foi compensado em 2004 no Concertino em sol maior para violoncelo e orquestra de cordas, dedicado a Antonio Meneses. Finalmente se escutou uma “ferveção” sinfônica do compositor caruaruense – de passagem, dentro do terceiro movimento. Outro friso. Capiba (1904 – 1997) é de longe o compositor de frevos mais lembrado, porém em sua face erudita – resgatada em anos mais recentes – não constam peças que adotassem o gênero que o consagrou, somente amostras atonais ou armoriais. Por sinal, o armorial se valeu dos gêneros nordestinos e trouxe seu substrato

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comigo” etc.), nas interjeições (“olha!”), na direção assumida pela melodia (na fala, a entoação ascendente indica interrogação ou supensão do pensamento, enquanto a direção descendente indica afirmação ou conclusão). Voltemos ao nosso tema. Se no frevo-de-rua o desafio dos compositores era encontrar o equivalente sonoro para a gestualidade corporal dos dançarinos, em sua modalidade cantada a tarefa consiste em ajustar o ritmo veloz, repleto de assimetrias à gestualidade entoativa da fala. Grande parte do encanto dos frevos cantados se deve ao desajuste entre o comprimento da frase melódica e a letra. São essas “imperfeições”, expressas nas acelerações imprevistas em certos trechos da composição, que favorecem o aparecimento das sincopas características do gênero, tão apreciadas quanto surpreendentes. É aí também que a fala se revela, produzindo o efeito de situações locutivas reais. Vejamos a propósito o refrão de “Bom demais”, de J.Michiles, gravada por Alceu Valença no CD Estação da Luz, 1999. No trecho que corresponde ao convite para a dança (“Menina, vamos nessa que esse frevo é bom demais”), há uma súbita elipse entre vamos e nessa que subverte o padrão métrico da composição. Em “Oh Bela”, de Capiba, no trecho “porém poderia ser mais bela/ se ela tivesse meu amor”, a frase melódica é estendida para acomodar os acentos naturais da frase verbal mais longa. E a lista não pára aqui. Por estar mais diretamente associada à efusão do carnaval, a vertente eufórica, baseada na velocidade, nas recorrências melódicas, e na exaltação

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Capiba, o seu nome se confunde com a história do próprio frevo

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Maestro Duda incursionou na música clássica sem mudar sua linguagem nem recorrer a técnicas nas quais não ficasse à vontade

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Experimente tocar uma polca ou uma marcha em andamento molto vivace, puxado por uma percussão frenética; inclua síncopes além do normal na melodia e na harmonia e contemple saxofones e trompetes com floreios em alguns trechos. Com essas indicações você vai acabar criando um frevo-de-rua, mas vai faltar uma coisa. Algo que podemos tentar definir tomando emprestado um termo de Roland Barthes, em seu célebre ensaio A Câmara Clara (sobre teoria de estética da fotografia): o punctum, o que lhe desperta o afeto, que, no âmbito desta matéria, só pode existir em um frevo de verdade. Se aceitar uma sugestão, faça isso com a polca Trisch-Trasch de Johann Strauss Jr. . Da primeira vez, execute mecanicamente como ensinado acima; da segunda, experimente botar o coração e perceba o que os pernambucanos sentimos. O Nordeste é fonte fecunda e notória de matériaprima musical, principalmente pela variedade de manifestações culturais e por ser a única região das Américas que possui uma música modal – assentada numa escala de notas caracterizada e base harmônica fixa. Isso quer dizer, observem os mais leigos, que a música nordestina rural é tão reconhecível (associando uma melodia a seu lugar de origem) quanto a judaica, a chinesa, a balinesa ou a cigana; e, percebam

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escolheu para o quinto e último movimento do IV Ciclo nordestino, op. 43 (1977), para piano, dedicado ao escritor Leonardo Dantas. O movimento acabou adquirindo vida independente do Ciclo e recebeu gravações isoladas e um arranjo do próprio compositor para violão solo. Marlos Nobre diz que a peça é uma reminiscência muito viva de sua infância: “Nascido na rua São João, bairro de São José, eu ouvia as agremiações do carnaval em minha porta. Pulava e dançava o frevo e este ritmo marcou fundamentalmente minha mente de compositor. O meu Frevo para piano é, portanto, uma explosão deste ritmo fundamental, buliçoso, enérgico e ao mesmo tempo nostálgico. Nele, a tonalidade de ré menor é característica desse tom de nostalgia misturada com euforia e impulso rítmico. A forma da peça é de um ‘rondó’ com um final esfuziante”. Arthur Barbosa Neto (1965), compositor e arranjador cearense radicado no Rio Grande do Sul, recorreu ao frevo em algumas obras. A mais divulgada delas é o Frevo (1997), para orquestra de cordas, mas também há a presença do ritmo em parte do segundo movimento de sua Sinfonia Brasileira (2005) e no início do musical infantil Ari Areia, um Grãozinho Apaixonado (2003). “Como gosto de ousar, também compus um tango em que no meio dele há uma fuga que fica no limbo entre o tango e o frevo, dando para ver bem as similaridades que podem ter os dois ritmos, apesar de tão longe culturalmente um do outro”, fala Arthur sobre Recuerdos nº 1 (1999), que utiliza o tema da Sinfonia Brasileira e explora semelhanças entre os gêneros pernambucano e portenho. Ele ainda promete escrever mais frevos. “Estou seguro de que mais inspirações deste ritmo tão contagiante virão”. O baiano Wellington Gomes (1960) deu leituras mais arrojadas ao orquestral Frevinho (1995) e ao singelo Tambores, ondas e frevo (2002), para flauta e clarineta. Já Ademir Araújo (1944), mais conhecido como Maestro Formiga, e Maestro Duda (1935) incursionaram na música clássica sem mudar sua linguagem nem recorrer a técnicas nas quais não ficassem à vontade. Compuseram, dessa forma, peças populares em roupagem sinfônica. Para sentir como seria o contrário – uma peça sinfônica que bebesse do frevo – basta comparar com o de Cláudio Santoro ou o de Marlos Nobre. Em 2005 aconteceu a estréia de Uma visão nordestina, do Maestro Duda, que se encerrava com um frevo. Em dezembro último, o compositor foi o laureado do IX Virtuosi. Dentre os frevos orquestrais apresentados, o destaque foi para o último movimento do Concertino para viola, orquestra de cordas e percussão, chamado “Lito no Frevo”, uma homenagem ao solista Rafael Altino. Também foram tocadas “Lucinha no frevo”, para a sugestiva formação de quinteto de metais, e as peças sinfônicas Suíte pernambucana de bolso (cujo ritmo

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Capiba, Nelson Ferreira, Guerra Peixe e o pianista Heitor Alimonda

os menos leigos, que não há transposições ou modulações numa música modal. O frevo foge a esse modalismo por conta de sua herança européia mais recente – comparado com as raízes ibéricas mais petrificadas dos gêneros interioranos – e de preservar as harmonias e instrumentação austro-germânicas, onde os metais são marca registrada. Daí que já era tempo de se fazer um levantamento da presença do frevo na música clássica. Dos grandes nomes da história da música nacional, é curioso antecipar que Villa-Lobos (1887–1959) – o mais prolífico criador musical do século 20 no mundo (vale grifar) e cujas amostras mais visíveis de material popular estão nas Bachianas e nos Choros – nunca tenha escrito sequer um movimento ou um trecho de qualquer peça em ritmo de frevo, até onde alcançou esta pesquisa. Não foi o caso do amazonense Cláudio Santoro (1919 – 1989), que deixou um belíssimo Frevo para piano (1953), de sua fase mais nacionalista, orquestrado quase três décadas mais tarde e agora lançado em CD pela Sinfônica do Estado de São Paulo. Nem o de Mozart Camargo Guarnieri (1907 – 1993), que confiou a temas em forma de frevo a abertura do terceiro movimento do Concerto para piano e orquestra nº 2 (1946) e do Concertino para piano e orquestra de câmara (1961), embora quase toda incorporação de motivos populares em Guarnieri seja feita de forma muito pessoal e isso deixe os respectivos temas com pouca cara de frevo. César Guerra Peixe (1914 – 1993), fluminense de Petrópolis, encontrou um novo rumo para a música clássica brasileira em sua estadia de quase três anos em Pernambuco. Não ficou imune ao frevo. Os quatro movimentos da Suíte sinfônica nº 2 – Pernambucana (1955) foram uma síntese orquestral dessa passagem pelo Estado: maracatu, dança de caboclinhos, aboiado e frevo. Nas obras para piano coube a ele o privilégio de ser o ritmo motor do movimento final de três peças: a Suíte nº 2 – Nordestina para piano (1954) e as Sonatas nº 1 (1950) e 2 (1967). A pianista japonesa Midori Maeshiro em breve estreará um CD com obras para piano de Guerra Peixe, patrocinado pela Academia Brasileira de Música, que inclui as duas sonatas. A contar pelas últimas peças citadas, a vivacidade do frevo prova ser ideal para desfechos. Inclusive é muito apropriada à estrutura clássica de concertos (rápido-lento-vivo). Marlos Nobre seguiu a linha e o

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comigo” etc.), nas interjeições (“olha!”), na direção assumida pela melodia (na fala, a entoação ascendente indica interrogação ou supensão do pensamento, enquanto a direção descendente indica afirmação ou conclusão). Voltemos ao nosso tema. Se no frevo-de-rua o desafio dos compositores era encontrar o equivalente sonoro para a gestualidade corporal dos dançarinos, em sua modalidade cantada a tarefa consiste em ajustar o ritmo veloz, repleto de assimetrias à gestualidade entoativa da fala. Grande parte do encanto dos frevos cantados se deve ao desajuste entre o comprimento da frase melódica e a letra. São essas “imperfeições”, expressas nas acelerações imprevistas em certos trechos da composição, que favorecem o aparecimento das sincopas características do gênero, tão apreciadas quanto surpreendentes. É aí também que a fala se revela, produzindo o efeito de situações locutivas reais. Vejamos a propósito o refrão de “Bom demais”, de J.Michiles, gravada por Alceu Valença no CD Estação da Luz, 1999. No trecho que corresponde ao convite para a dança (“Menina, vamos nessa que esse frevo é bom demais”), há uma súbita elipse entre vamos e nessa que subverte o padrão métrico da composição. Em “Oh Bela”, de Capiba, no trecho “porém poderia ser mais bela/ se ela tivesse meu amor”, a frase melódica é estendida para acomodar os acentos naturais da frase verbal mais longa. E a lista não pára aqui. Por estar mais diretamente associada à efusão do carnaval, a vertente eufórica, baseada na velocidade, nas recorrências melódicas, e na exaltação

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Capiba, o seu nome se confunde com a história do próprio frevo

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Experimente tocar uma polca ou uma marcha em andamento molto vivace, puxado por uma percussão frenética; inclua síncopes além do normal na melodia e na harmonia e contemple saxofones e trompetes com floreios em alguns trechos. Com essas indicações você vai acabar criando um frevo-de-rua, mas vai faltar uma coisa. Algo que podemos tentar definir tomando emprestado um termo de Roland Barthes, em seu célebre ensaio A Câmara Clara (sobre teoria de estética da fotografia): o punctum, o que lhe desperta o afeto, que, no âmbito desta matéria, só pode existir em um frevo de verdade. Se aceitar uma sugestão, faça isso com a polca Trisch-Trasch de Johann Strauss Jr. . Da primeira vez, execute mecanicamente como ensinado acima; da segunda, experimente botar o coração e perceba o que os pernambucanos sentimos. O Nordeste é fonte fecunda e notória de matériaprima musical, principalmente pela variedade de manifestações culturais e por ser a única região das Américas que possui uma música modal – assentada numa escala de notas caracterizada e base harmônica fixa. Isso quer dizer, observem os mais leigos, que a música nordestina rural é tão reconhecível (associando uma melodia a seu lugar de origem) quanto a judaica, a chinesa, a balinesa ou a cigana; e, percebam

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escolheu para o quinto e último movimento do IV Ciclo nordestino, op. 43 (1977), para piano, dedicado ao escritor Leonardo Dantas. O movimento acabou adquirindo vida independente do Ciclo e recebeu gravações isoladas e um arranjo do próprio compositor para violão solo. Marlos Nobre diz que a peça é uma reminiscência muito viva de sua infância: “Nascido na rua São João, bairro de São José, eu ouvia as agremiações do carnaval em minha porta. Pulava e dançava o frevo e este ritmo marcou fundamentalmente minha mente de compositor. O meu Frevo para piano é, portanto, uma explosão deste ritmo fundamental, buliçoso, enérgico e ao mesmo tempo nostálgico. Nele, a tonalidade de ré menor é característica desse tom de nostalgia misturada com euforia e impulso rítmico. A forma da peça é de um ‘rondó’ com um final esfuziante”. Arthur Barbosa Neto (1965), compositor e arranjador cearense radicado no Rio Grande do Sul, recorreu ao frevo em algumas obras. A mais divulgada delas é o Frevo (1997), para orquestra de cordas, mas também há a presença do ritmo em parte do segundo movimento de sua Sinfonia Brasileira (2005) e no início do musical infantil Ari Areia, um Grãozinho Apaixonado (2003). “Como gosto de ousar, também compus um tango em que no meio dele há uma fuga que fica no limbo entre o tango e o frevo, dando para ver bem as similaridades que podem ter os dois ritmos, apesar de tão longe culturalmente um do outro”, fala Arthur sobre Recuerdos nº 1 (1999), que utiliza o tema da Sinfonia Brasileira e explora semelhanças entre os gêneros pernambucano e portenho. Ele ainda promete escrever mais frevos. “Estou seguro de que mais inspirações deste ritmo tão contagiante virão”. O baiano Wellington Gomes (1960) deu leituras mais arrojadas ao orquestral Frevinho (1995) e ao singelo Tambores, ondas e frevo (2002), para flauta e clarineta. Já Ademir Araújo (1944), mais conhecido como Maestro Formiga, e Maestro Duda (1935) incursionaram na música clássica sem mudar sua linguagem nem recorrer a técnicas nas quais não ficassem à vontade. Compuseram, dessa forma, peças populares em roupagem sinfônica. Para sentir como seria o contrário – uma peça sinfônica que bebesse do frevo – basta comparar com o de Cláudio Santoro ou o de Marlos Nobre. Em 2005 aconteceu a estréia de Uma visão nordestina, do Maestro Duda, que se encerrava com um frevo. Em dezembro último, o compositor foi o laureado do IX Virtuosi. Dentre os frevos orquestrais apresentados, o destaque foi para o último movimento do Concertino para viola, orquestra de cordas e percussão, chamado “Lito no Frevo”, uma homenagem ao solista Rafael Altino. Também foram tocadas “Lucinha no frevo”, para a sugestiva formação de quinteto de metais, e as peças sinfônicas Suíte pernambucana de bolso (cujo ritmo

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Capiba, Nelson Ferreira, Guerra Peixe e o pianista Heitor Alimonda

os menos leigos, que não há transposições ou modulações numa música modal. O frevo foge a esse modalismo por conta de sua herança européia mais recente – comparado com as raízes ibéricas mais petrificadas dos gêneros interioranos – e de preservar as harmonias e instrumentação austro-germânicas, onde os metais são marca registrada. Daí que já era tempo de se fazer um levantamento da presença do frevo na música clássica. Dos grandes nomes da história da música nacional, é curioso antecipar que Villa-Lobos (1887–1959) – o mais prolífico criador musical do século 20 no mundo (vale grifar) e cujas amostras mais visíveis de material popular estão nas Bachianas e nos Choros – nunca tenha escrito sequer um movimento ou um trecho de qualquer peça em ritmo de frevo, até onde alcançou esta pesquisa. Não foi o caso do amazonense Cláudio Santoro (1919 – 1989), que deixou um belíssimo Frevo para piano (1953), de sua fase mais nacionalista, orquestrado quase três décadas mais tarde e agora lançado em CD pela Sinfônica do Estado de São Paulo. Nem o de Mozart Camargo Guarnieri (1907 – 1993), que confiou a temas em forma de frevo a abertura do terceiro movimento do Concerto para piano e orquestra nº 2 (1946) e do Concertino para piano e orquestra de câmara (1961), embora quase toda incorporação de motivos populares em Guarnieri seja feita de forma muito pessoal e isso deixe os respectivos temas com pouca cara de frevo. César Guerra Peixe (1914 – 1993), fluminense de Petrópolis, encontrou um novo rumo para a música clássica brasileira em sua estadia de quase três anos em Pernambuco. Não ficou imune ao frevo. Os quatro movimentos da Suíte sinfônica nº 2 – Pernambucana (1955) foram uma síntese orquestral dessa passagem pelo Estado: maracatu, dança de caboclinhos, aboiado e frevo. Nas obras para piano coube a ele o privilégio de ser o ritmo motor do movimento final de três peças: a Suíte nº 2 – Nordestina para piano (1954) e as Sonatas nº 1 (1950) e 2 (1967). A pianista japonesa Midori Maeshiro em breve estreará um CD com obras para piano de Guerra Peixe, patrocinado pela Academia Brasileira de Música, que inclui as duas sonatas. A contar pelas últimas peças citadas, a vivacidade do frevo prova ser ideal para desfechos. Inclusive é muito apropriada à estrutura clássica de concertos (rápido-lento-vivo). Marlos Nobre seguiu a linha e o

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teatro, com orquestra sinfônica, foi muito rica. Não é somente o fato de ter uma orquestra sinfônica, mas é o tratamento que se deu – ensaios e trabalhos exaustivos para uma realização de qualidade”. Tal abordagem do frevo desperta uma reflexão antiga e pertinente não só a esse uso dele dentro do universo erudito, mas do uso da música popular em geral: em que medida, dentro das obras listadas aqui, pode-se dizer que estamos ouvindo meros arranjos sinfônicos de frevo ou peças sinfônicas genuínas que utilizam temas e células rítmicas do frevo? Porque na primeira hipótese, a obra poderia ter sido concebida na instrumentação convencional, poupando a música sinfônica de não ganhar nada, fornecendo roupagem de luxo a peças de apelo mais direto. É o caso de o ouvinte ter uma boa educação musical para discernir se o compositor digeriu os elementos populares e refinou a própria linguagem ou se produziu uma música afetada e de agrado popularesco. Para a discussão ficar aberta e não desviar o rumo deste artigo, pode-se contra-argumentar que: 1. outros gêneros populares, particularmente europeus, integraram-se à música sinfônica sem se descaracterizar, como a valsa e a polca; 2. que um Guerra Peixe, em suas pesquisas, sentenciou com toda a autoridade que tinha: “No frevo instrumental, a composição nasce pronta para fanfarra ou banda, pois em princípio o compositor sempre executa um instrumento e é músico de boa qualificação. Talvez seja o

Carlos Eduardo Amaral Aos poucos, ritmo centenário contagia as salas de concerto com a mesma alegria que inflama passistas e foliões

Frevos sinfônicos

Camargo Guarnieri confiou a temas em forma de frevo a abertura do terceiro movimento do Concerto para piano e orquestra nº 2 (1946) e do Concertino para piano e orquestra de câmara (1961)

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Arthur Barbosa Neto, compositor e arranjador cearense

recifolindense fecha a peça de quatro movimentos), Música para metais II e Nino, o pernambuquinho – este, originalmente, um frevo de rua. A pianista Ana Lúcia Altino Garcia, dedicanda de “Lucinha no frevo”, ressaltou a importância da valorização de um compositor popular dentro do festival: “Sempre considerei o frevo como uma música principalmente virtuosa e infelizmente muito mal tocada. Então essa experiência de fazer o frevo dentro do

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Os compositores Camargo Guarnieri e Guerra Peixe

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outro gênero difícil de ser cantado – basta lembrar aqui o caso de “Brasileirinho”, de Valdir Azevedo e letra de Pereira Costa). Isso não ocorre com o frevo-de-bloco, cuja solenidade melancólica, como já dissemos, traduz-se sonoramente na lentidão do andamento. Nesse caso, as paixões relacionadas à perda ou à distância do objeto amado, tradicionalmente marcadas pela subjetividade, são cantadas coletivamente, em composições como “Valores do passado”, “Frevo da saudade” e outras. Euforia solitária e a tristeza compartilhada. No frevo cantado, tudo se inverte. Como no rito do carnaval.

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Sergio Fernando Campanella de Oliveira é pesquisador

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Alceu Valença gravou o sucesso “Bom Demais” de J. Michiles

de personagens, lugares e do próprio gênero (“Bom demais”, “Roda e avisa”, “Voltei, Recife”, “Oh, que frevo bom” etc.), acabou prevalecendo nacionalmente sobre a vertente lenta, passional, do frevo-de-bloco – não obstante o estrondoso sucesso alcançado por “Evocação n1”, de Nelson Ferreira, em 1957 . E aqui talvez resida o maior paradoxo do gênero. O frevo-canção, muito rápido, dificilmente pode ser cantado em conjunto sem prejuízo da inteligibilidade da letra. Às vezes nem os refrãos escapam. Tente, por exemplo, repetir o trecho “..... o bê-a- bá dos teus olhos/morena bonita da boca do rio...”de “Banho de cheiro”, de Carlos Fernando, na mesma velocidade da versão gravada por Elba Ramalho. A frase final, em melodia descendente, tende a tornarse incompreensível, desfazendo-se em pura substância sonora (o mesmo, aliás, se dá com o chorinho,

para as salas de concerto, mas por que os compositores do movimento deixaram de fora o frevo? Uma resposta pode ser o foco que deram à música rural/modal, supervalorizando-a em detrimento de outras vertentes. Um dos expoentes do movimento, o compositor, violinista e maestro Cussy de Almeida, arrepende-se dessa ênfase, julgando-a hoje errônea e limitadora. “Estava mais para o modelo da revolução cultural chinesa”, diz, acrescentando que a proposta do movimento como um todo era diferente do discurso defendido por Mário de Andrade. “O nacionalismo proposto por Mário de Andrade não é do tipo xenófobo como o pretenso movimento armorial. Mário defendia uma estética nacional a partir das origens, sem limitações harmônicas ou instrumentais, o que aliás norteou o trabalho de Villa-Lobos e também da Orquestra .” Segundo ele, o frevo não recebeu atenção do movimento, porque “Ao apelidar a música nordestina rural de ‘armorial’, a ‘única verdadeiramente brasileira’, seria um contrasenso incluir um ritmo de origem negra com instrumentos de metal e harmonias modernas condizentes com a juventude do seu tempo”. De fato, Mário de Andrade em seu Ensaio sobre a música brasileira (1928) dizia que uma arte nacional está instilada no inconsciente do povo: “O artista tem só que dar pros elementos já existentes uma transposição erudita que faça da música popular, música artística, isto é: imediatamente desinteressada”. Ele

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caso único no mundo da música popular assim imaginada e escrita”; e 3. que o frevo de pau e corda é essencialmente camerístico, admitindo violinos, contrabaixos, clarones, flautas, flautim etc. Por sinal, todas as peças neste texto remetem ao frevo de rua, a variante mais difundida, mas justo o pau e corda, que embala os blocos mais seresteiros, não é contemplado pelos compositores. Clóvis Pereira (1932), arranjador sinfônico do “Hino do Vassourinhas” (1909, de Matias Rocha e Joana Batista), foi comemorado no Virtuosi em 2005. Ele, a bem da verdade, tem suas peças orquestrais executadas desde a década de 1970 e começou a escrever cerca de 20 anos antes, mas também compôs frevos de rua e escreve arranjos de músicas de outros compositores e intérpretes pernambucanos, a exemplo de Antônio Nóbrega. Só estava devendo um frevo à música erudita pernambucana, o que foi compensado em 2004 no Concertino em sol maior para violoncelo e orquestra de cordas, dedicado a Antonio Meneses. Finalmente se escutou uma “ferveção” sinfônica do compositor caruaruense – de passagem, dentro do terceiro movimento. Outro friso. Capiba (1904 – 1997) é de longe o compositor de frevos mais lembrado, porém em sua face erudita – resgatada em anos mais recentes – não constam peças que adotassem o gênero que o consagrou, somente amostras atonais ou armoriais. Por sinal, o armorial se valeu dos gêneros nordestinos e trouxe seu substrato

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Carlos Eduardo Amaral Aos poucos, ritmo centenário contagia as salas de concerto com a mesma alegria que inflama passistas e foliões

Frevos sinfônicos

Camargo Guarnieri confiou a temas em forma de frevo a abertura do terceiro movimento do Concerto para piano e orquestra nº 2 (1946) e do Concertino para piano e orquestra de câmara (1961)

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recifolindense fecha a peça de quatro movimentos), teatro, com orquestra sinfônica, foi muito rica. Não é Música para metais II e Nino, o pernambuquinho – este, somente o fato de ter uma orquestra sinfônica, mas é o originalmente, um frevo de rua. tratamento que se deu – ensaios e trabalhos exaustivos A pianista Ana Lúcia Altino Garcia, dedicanda de para uma realização de qualidade”. “Lucinha no frevo”, ressaltou a importância da valoTal abordagem do frevo desperta uma reflexão rização de um compositor popular dentro do festival: antiga e pertinente não só a esse uso dele dentro do “Sempre considerei o frevo como uma música prin- universo erudito, mas do uso da música popular em cipalmente virtuosa e infelizmente muito mal tocada. geral: em que medida, dentro das obras listadas aqui, Então essa experiência de fazer o frevo dentro do pode-se dizer que estamos ouvindo meros arranjos sinfônicos de frevo ou peças sinfônicas genuínas que Arthur Barbosa Neto, utilizam temas e células rítmicas do frevo? Porque na compositor e arranjador cearense primeira hipótese, a obra poderia ter sido concebida na instrumentação convencional, poupando a música sinfônica de não ganhar nada, fornecendo roupagem de luxo a peças de apelo mais direto. É o caso de o ouvinte ter uma boa educação musical para discernir se o compositor digeriu os elementos populares e refinou a própria linguagem ou se produziu uma música afetada e de agrado popularesco. Para a discussão ficar aberta e não desviar o rumo deste artigo, pode-se contra-argumentar que: 1. outros gêneros populares, particularmente europeus, integraram-se à música sinfônica sem se descaracterizar, como a valsa e a polca; 2. que um Guerra Peixe, em suas pesquisas, sentenciou com toda a autoridade que tinha: “No frevo instrumental, a composição nasce pronta para fanfarra ou banda, pois em princípio o compositor sempre executa um instrumento e é músico de boa qualificação. Talvez seja o

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outro gênero difícil de ser cantado – basta lembrar aqui o caso de “Brasileirinho”, de Valdir Azevedo e letra de Pereira Costa). Isso não ocorre com o frevo-de-bloco, cuja solenidade melancólica, como já dissemos, traduz-se sonoramente na lentidão do andamento. Nesse caso, as paixões relacionadas à perda ou à distância do objeto amado, tradicionalmente marcadas pela subjetividade, são cantadas coletivamente, em composições como “Valores do passado”, “Frevo da saudade” e outras. Euforia solitária e a tristeza compartilhada. No frevo cantado, tudo se inverte. Como no rito do carnaval.

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de personagens, lugares e do próprio gênero (“Bom demais”, “Roda e avisa”, “Voltei, Recife”, “Oh, que frevo bom” etc.), acabou prevalecendo nacionalmente sobre a vertente lenta, passional, do frevo-de-bloco – não obstante o estrondoso sucesso alcançado por “Evocação n1”, de Nelson Ferreira, em 1957 . E aqui talvez resida o maior paradoxo do gênero. O frevo-canção, muito rápido, dificilmente pode ser cantado em conjunto sem prejuízo da inteligibilidade da letra. Às vezes nem os refrãos escapam. Tente, por exemplo, repetir o trecho “..... o bê-a- bá dos teus olhos/morena bonita da boca do rio...”de “Banho de cheiro”, de Carlos Fernando, na mesma velocidade da versão gravada por Elba Ramalho. A frase final, em melodia descendente, tende a tornarse incompreensível, desfazendo-se em pura substância sonora (o mesmo, aliás, se dá com o chorinho,

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para as salas de concerto, mas por que os compositores do movimento deixaram de fora o frevo? Uma resposta pode ser o foco que deram à música rural/modal, supervalorizando-a em detrimento de outras vertentes. Um dos expoentes do movimento, o compositor, violinista e maestro Cussy de Almeida, arrepende-se dessa ênfase, julgando-a hoje errônea e limitadora. “Estava mais para o modelo da revolução cultural chinesa”, diz, acrescentando que a proposta do movimento como um todo era diferente do discurso defendido por Mário de Andrade. “O nacionalismo proposto por Mário de Andrade não é do tipo xenófobo como o pretenso movimento armorial. Mário defendia uma estética nacional a partir das origens, sem limitações harmônicas ou instrumentais, o que aliás norteou o trabalho de Villa-Lobos e também da Orquestra .” Segundo ele, o frevo não recebeu atenção do movimento, porque “Ao apelidar a música nordestina rural de ‘armorial’, a ‘única verdadeiramente brasileira’, seria um contrasenso incluir um ritmo de origem negra com instrumentos de metal e harmonias modernas condizentes com a juventude do seu tempo”. De fato, Mário de Andrade em seu Ensaio sobre a música brasileira (1928) dizia que uma arte nacional está instilada no inconsciente do povo: “O artista tem só que dar pros elementos já existentes uma transposição erudita que faça da música popular, música artística, isto é: imediatamente desinteressada”. Ele

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Alceu Valença gravou o sucesso “Bom Demais” de J. Michiles

caso único no mundo da música popular assim imaginada e escrita”; e 3. que o frevo de pau e corda é essencialmente camerístico, admitindo violinos, contrabaixos, clarones, flautas, flautim etc. Por sinal, todas as peças neste texto remetem ao frevo de rua, a variante mais difundida, mas justo o pau e corda, que embala os blocos mais seresteiros, não é contemplado pelos compositores. Clóvis Pereira (1932), arranjador sinfônico do “Hino do Vassourinhas” (1909, de Matias Rocha e Joana Batista), foi comemorado no Virtuosi em 2005. Ele, a bem da verdade, tem suas peças orquestrais executadas desde a década de 1970 e começou a escrever cerca de 20 anos antes, mas também compôs frevos de rua e escreve arranjos de músicas de outros compositores e intérpretes pernambucanos, a exemplo de Antônio Nóbrega. Só estava devendo um frevo à música erudita pernambucana, o que foi compensado em 2004 no Concertino em sol maior para violoncelo e orquestra de cordas, dedicado a Antonio Meneses. Finalmente se escutou uma “ferveção” sinfônica do compositor caruaruense – de passagem, dentro do terceiro movimento. Outro friso. Capiba (1904 – 1997) é de longe o compositor de frevos mais lembrado, porém em sua face erudita – resgatada em anos mais recentes – não constam peças que adotassem o gênero que o consagrou, somente amostras atonais ou armoriais. Por sinal, o armorial se valeu dos gêneros nordestinos e trouxe seu substrato

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comigo” etc.), nas interjeições (“olha!”), na direção assumida pela melodia (na fala, a entoação ascendente indica interrogação ou supensão do pensamento, enquanto a direção descendente indica afirmação ou conclusão). Voltemos ao nosso tema. Se no frevo-de-rua o desafio dos compositores era encontrar o equivalente sonoro para a gestualidade corporal dos dançarinos, em sua modalidade cantada a tarefa consiste em ajustar o ritmo veloz, repleto de assimetrias à gestualidade entoativa da fala. Grande parte do encanto dos frevos cantados se deve ao desajuste entre o comprimento da frase melódica e a letra. São essas “imperfeições”, expressas nas acelerações imprevistas em certos trechos da composição, que favorecem o aparecimento das sincopas características do gênero, tão apreciadas quanto surpreendentes. É aí também que a fala se revela, produzindo o efeito de situações locutivas reais. Vejamos a propósito o refrão de “Bom demais”, de J.Michiles, gravada por Alceu Valença no CD Estação da Luz, 1999. No trecho que corresponde ao convite para a dança (“Menina, vamos nessa que esse frevo é bom demais”), há uma súbita elipse entre vamos e nessa que subverte o padrão métrico da composição. Em “Oh Bela”, de Capiba, no trecho “porém poderia ser mais bela/ se ela tivesse meu amor”, a frase melódica é estendida para acomodar os acentos naturais da frase verbal mais longa. E a lista não pára aqui. Por estar mais diretamente associada à efusão do carnaval, a vertente eufórica, baseada na velocidade, nas recorrências melódicas, e na exaltação

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24 Continente Documento Capiba, o seu nome se confunde com a história do próprio frevo

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Maestro Duda incursionou na música clássica sem mudar sua linguagem nem recorrer a técnicas nas quais não ficasse à vontade

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Capiba, Nelson Ferreira, Guerra Peixe e o pianista Heitor Alimonda

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escolheu para o quinto e último movimento do IV Ciclo nordestino, op. 43 (1977), para piano, dedicado ao escritor Leonardo Dantas. O movimento acabou adquirindo vida independente do Ciclo e recebeu gravações isoladas e um arranjo do próprio compositor para violão solo. Marlos Nobre diz que a peça é uma reminiscência muito viva de sua infância: “Nascido na rua São João, bairro de São José, eu ouvia as agremiações do carnaval em minha porta. Pulava e dançava o frevo e este ritmo marcou fundamentalmente minha mente de compositor. O meu Frevo para piano é, portanto, uma explosão deste ritmo fundamental, buliçoso, enérgico e ao mesmo tempo nostálgico. Nele, a tonalidade de ré menor é característica desse tom de nostalgia misturada com euforia e impulso rítmico. A forma da peça é de um ‘rondó’ com um final esfuziante”. Arthur Barbosa Neto (1965), compositor e arranjador cearense radicado no Rio Grande do Sul, recorreu ao frevo em algumas obras. A mais divulgada delas é o Frevo (1997), para orquestra de cordas, mas também há a presença do ritmo em parte do segundo movimento de sua Sinfonia Brasileira (2005) e no início do musical infantil Ari Areia, um Grãozinho Apaixonado (2003). “Como gosto de ousar, também compus um tango em que no meio dele há uma fuga que fica no limbo entre o tango e o frevo, dando para ver bem as similaridades que podem ter os dois ritmos, apesar de tão longe culturalmente um do outro”, fala Arthur sobre Recuerdos nº 1 (1999), que utiliza o tema da Sinfonia Brasileira e explora semelhanças entre os gêneros pernambucano e portenho. Ele ainda promete escrever mais frevos. “Estou seguro de que mais inspirações deste ritmo tão contagiante virão”. O baiano Wellington Gomes (1960) deu leituras mais arrojadas ao orquestral Frevinho (1995) e ao singelo Tambores, ondas e frevo (2002), para flauta e clarineta. Já Ademir Araújo (1944), mais conhecido como Maestro Formiga, e Maestro Duda (1935) incursionaram na música clássica sem mudar sua linguagem nem recorrer a técnicas nas quais não ficassem à vontade. Compuseram, dessa forma, peças populares em roupagem sinfônica. Para sentir como seria o contrário – uma peça sinfônica que bebesse do frevo – basta comparar com o de Cláudio Santoro ou o de Marlos Nobre. Em 2005 aconteceu a estréia de Uma visão nordestina, do Maestro Duda, que se encerrava com um frevo. Em dezembro último, o compositor foi o laureado do IX Virtuosi. Dentre os frevos orquestrais apresentados, o destaque foi para o último movimento do Concertino para viola, orquestra de cordas e percussão, chamado “Lito no Frevo”, uma homenagem ao solista Rafael Altino. Também foram tocadas “Lucinha no frevo”, para a sugestiva formação de quinteto de metais, e as peças sinfônicas Suíte pernambucana de bolso (cujo ritmo

os menos leigos, que não há transposições ou modulações numa música modal. O frevo foge a esse modalismo por conta de sua herança européia mais recente – comparado com as raízes ibéricas mais petrificadas dos gêneros interioranos – e de preservar as harmonias e instrumentação austro-germânicas, onde os metais são marca registrada. Daí que já era tempo de se fazer um levantamento da presença do frevo na música clássica. Dos grandes nomes da história da música nacional, é curioso antecipar que Villa-Lobos (1887–1959) – o mais prolífico criador musical do século 20 no mundo (vale grifar) e cujas amostras mais visíveis de material popular estão nas Bachianas e nos Choros – nunca tenha escrito sequer um movimento ou um trecho de qualquer peça em ritmo de frevo, até onde alcançou esta pesquisa. Não foi o caso do amazonense Cláudio Santoro (1919 – 1989), que deixou um belíssimo Frevo para piano (1953), de sua fase mais nacionalista, orquestrado quase três décadas mais tarde e agora lançado em CD pela Sinfônica do Estado de São Paulo. Nem o de Mozart Camargo Guarnieri (1907 – 1993), que confiou a temas em forma de frevo a abertura do terceiro movimento do Concerto para piano e orquestra nº 2 (1946) e do Concertino para piano e orquestra de câmara (1961), embora quase toda incorporação de motivos populares em Guarnieri seja feita de forma muito pessoal e isso deixe os respectivos temas com pouca cara de frevo. César Guerra Peixe (1914 – 1993), fluminense de Petrópolis, encontrou um novo rumo para a música clássica brasileira em sua estadia de quase três anos em Pernambuco. Não ficou imune ao frevo. Os quatro movimentos da Suíte sinfônica nº 2 – Pernambucana (1955) foram uma síntese orquestral dessa passagem pelo Estado: maracatu, dança de caboclinhos, aboiado e frevo. Nas obras para piano coube a ele o privilégio de ser o ritmo motor do movimento final de três peças: a Suíte nº 2 – Nordestina para piano (1954) e as Sonatas nº 1 (1950) e 2 (1967). A pianista japonesa Midori Maeshiro em breve estreará um CD com obras para piano de Guerra Peixe, patrocinado pela Academia Brasileira de Música, que inclui as duas sonatas. A contar pelas últimas peças citadas, a vivacidade do frevo prova ser ideal para desfechos. Inclusive é muito apropriada à estrutura clássica de concertos (rápido-lento-vivo). Marlos Nobre seguiu a linha e o

Experimente tocar uma polca ou uma marcha em andamento molto vivace, puxado por uma percussão frenética; inclua síncopes além do normal na melodia e na harmonia e contemple saxofones e trompetes com floreios em alguns trechos. Com essas indicações você vai acabar criando um frevo-de-rua, mas vai faltar uma coisa. Algo que podemos tentar definir tomando emprestado um termo de Roland Barthes, em seu célebre ensaio A Câmara Clara (sobre teoria de estética da fotografia): o punctum, o que lhe desperta o afeto, que, no âmbito desta matéria, só pode existir em um frevo de verdade. Se aceitar uma sugestão, faça isso com a polca Trisch-Trasch de Johann Strauss Jr. . Da primeira vez, execute mecanicamente como ensinado acima; da segunda, experimente botar o coração e perceba o que os pernambucanos sentimos. O Nordeste é fonte fecunda e notória de matériaprima musical, principalmente pela variedade de manifestações culturais e por ser a única região das Américas que possui uma música modal – assentada numa escala de notas caracterizada e base harmônica fixa. Isso quer dizer, observem os mais leigos, que a música nordestina rural é tão reconhecível (associando uma melodia a seu lugar de origem) quanto a judaica, a chinesa, a balinesa ou a cigana; e, percebam

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Carlos Eduardo Amaral é jornalista.

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também foi, durante muito tempo, uma das escolas mais presentes entre aqueles que queriam resgatar as manifestações culturais construtoras de uma identidade local. Não poderia ser diferente: o frevo é muito nosso. E nasceu, não por acaso, com as vanguardas e as transformações industriais dos centros urbanos, entre o final do século 19 e o início do 20, ganhando força a partir do final dos anos 40, quando voltou a fazer parte, de fato, da grande festa pernambucana. Foi justamente nessa época que se destacou, no Recife, a produção de um dos maiores nomes das artes plásticas do Estado, e do país: o artista plástico modernista Lula Cardoso Ayres (1910 – 1987), que também travou com o Carnaval uma relação fundamental. Primeiro com o do Rio de Janeiro, cidade onde morou muitos anos, e, em seguida, com o do Recife, sua terra natal, cuja festa foi exaustivamente retratada por ele em suas telas modernistas ou mesmo nas suas fotografias, igualmente importantes.

advertia que era preciso aceitar todas as manifestações musicais do território brasileiro, étnicas ou não, e contrapontuava, lembrando que não era possível a orquestração ou a harmonia assumirem uma forma nacional, porque esta é contida nos ritmos e melodias autóctones. O meio-termo indicado para os compositores, portanto, era aspirar a uma música universal assimilando as formas folclóricas no subconsciente e materializá-las em obras de maior alcance sem explorá-las exoticamente. Cussy de Almeida assinala que, dentro de uma ótica etnológica, a influência africana é certa na dança do frevo (Guerra Peixe defendia uma origem gitanoeslava dos passos, a qual nunca comprovou através de um estudo) bem como a formação instrumental e a evolução harmônica que incrementaram a composição popular no geral ao longo do século 20, imprimindo uma síncope mais ousada ao frevo. “O improviso já existente nos anos 20 e 30 voltou ser moda (vide Spok e sua orquestra) e a dança ficou mais rica e mais criativa, com os breques, paradinhas, e passos também improvisados ao som de acordes e melodias enriquecidos por harmonias contemporâneas”. Esses são os ingredientes do caldeirão musical que fervilha nas ruas do Grande Recife. De qualquer forma, se alguém pegar o Perpetuum mobile de Strauss Jr., perceberá os elementos que foram apontados lá no primeiro parágrafo. Se tal ligação for redescoberta e sensibilizar os arranjadores de frevo, não será nenhuma fantasia ouvir o rei das valsas e polcas nas ladeiras de Olinda ou no Galo da Madrugada. E o público, sem saber, ir no embalo de “Sob raios e trovões”, da “Polca húngara” ou da “Polca da champanhe”.

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proximidade tão estreita com a terra do Carnaval e seu povo, Bajado tenha sido um dos mais (senão o mais) importantes artistas plásticos relacionados ao gênero pernambucano. E conseguiu ser muito autêntico por isso, em suas milhares de simpáticas pinturas que reiteram constantemente uma declaração de amor ao Carnaval local – às vezes até com frases na própria tela. Foi ele quem criou, inclusive, estandartes para troças famosas (Elefante, Vassourinhas etc.), como registra o frevo-canção “Bicho Maluco” Beleza, de Alceu Valença. “Ele era muito carnavalesco. Brincava carnaval de verdade. Nem sei como ele agüentava. Brincou até uns 75 anos. Saía de casa e só aparecia depois do (Bacalhau do) Batata”, conta uma das filhas de Bajado, Gizelda Pereira Amâncio, no catálogo do 6º Olinda Arte em Toda Parte, evento que homenageou o artista, em 2006, pelos 10 anos de sua morte. Se, por um lado, a arte naïf tem sido tão cara à história do frevo, em particular pela autêntica contribuição de Bajado, por outro, a arte moderna

Carnaval em Olinda – óleo sobre eucatex (1980) – Bajado Passistas – óleo sobre tela (1950) – Lula Cardoso Ayres

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Foto: álbum de família

Fotos: Daniela Nader/Agência Aurora

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sistema de oposições entre quadril/pernas/tronco e braços/tronco/cabeça. Dançar o frevo é articular esses complexos sistemas de movimento com criatividade na ligação de um sistema para o outro e inspirando-se nas variações complexas da música.

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sentar sobre os calcanhares) e a estabilização do corpo. Com a base da coluna levemente curvada, a repercussão orgânica do corpo é curvar também o topo da coluna, deixando a cabeça levemente para baixo, criando um arco nas costas que varia de acordo com cada corpo, mas que nos ajuda a entender porque muitos passistas (principalmente os chamados passistas de rua ou passistas tradicionais) dançam olhando para si mesmos – é uma tendência de conforto para o próprio corpo. Essa movimentação da cabeça é menos observada na capoeira, pois, por tratar-se de uma luta ou um jogo, o olhar do capoerista não deve desviar do oponente. Já para o passista, a posição da cabeça é uma opção que varia de acordo com a relação que queira criar com sua platéia. Contagiado pela marcação dos dobrados e marchas mais acelerados, pois a música do frevo também estava sendo gestada nas ruas, o passista, ao articular os movimentos nessa marcação, aumentou a velocidade dos movimentos e transformou as informações da capoeira. A aceleração e os saltos proporcionam a ativação de uma energia mais frenética que a da capoeira. Um novo jogo é então estabelecido. O jogo da dança do frevo em que o passista testa o limite do seu equilíbrio e agilidade de diversas maneiras. Seja trocando as posições das pernas sem sair do eixo, seja transferindo o centro do corpo de um ponto a outro alcançando posições impensáveis, seja curvando todo o corpo para frente e para trás (alternando ponta de pé e calcanhar), seja desafiando a gravidade com saltos – em posições nem sempre geométricas, seja suspendendo seu peso a ponto de se apoiar ou até andar sobre o peito dos pés (como no movimento “bailarina”), ou articulando, ao mesmo tempo, um

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Breve história do movimento Apesar da comemoração oficial da existência do frevo utilizar a data de 1907 – quando pela primeira vez foi publicado esse termo para denominar a nova forma de brincar o carnaval – tanto a dança quanto a música frevo são desenvolvidas durante a segunda metade do século 19, nas festas e eventos públicos do Recife. Como exemplo desse processo, podemos citar o conto de Luiz de Guimarães Jr. , publicado em 1871, que descreve um personagem popular em festa local: “Morava em Olinda; nas redondezas de 40 léguas não se começava um samba sem ele chegar – ‘Ferva o samba minha gente! Entra na roda Teto! – Dançava como um corisco e pulava como um macaco! Corta jaca, Teto! O passo da tesoura! O caranguejo!”. Esse trecho contém muitos dos elementos do frevo: o uso do termo ferver – que dará origem ao nome frevo; a descrição da dança como algo de tônus violento e saltitante e os nomes dos movimentos, que eram batizados e se tornavam recorrentes. Dançar frevo, no cotidiano era chamado “fazer o passo” e é isso que dá nome à dança do frevo, batizada como passo. Assim, o dançarino do frevo passou a ser chamado passista. Na década de 1950, o frevo era a grande sensação do carnaval pernambucano. Maestros como Antônio Bandeira, Capiba e Levino Ferreira se dedicavam ao ritmo, criando grandes composições. Época também em que as rádios locais como a Rádio Clube e a Rádio Tamandaré tinham suas próprias orquestras de frevo e promoviam concursos de passo. Esses concursos, dedicados a decidir o melhor passista do ano, davam destaque aos dançarinos do frevo e visibilidade a essa dança. Os

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capoeira-angola com a forma de dançar de passistas nos permite fazer várias conexões entre muitos movimentos e, principalmente, com as formas de criar alavancas com as pernas, para se deslocar com movimentos rasteiros e encontrar apoio para se elevar. Alguns dos movimentos do frevo, quando executados lentamente, são praticamente idênticos a movimentos da capoeira, como a ginga, os movimentos de negativa, o rabo-de-arraia, a queda de quatro. Elementos advindos do jogo, como as mudanças abruptas para surpreender o oponente, a descontração do corpo que parece estar apenas brincando, quando está prestes a dar um chute violento, e as variações de ginga, que no frevo ganham o nome de mugangas, também podem ser ligados a características do frevo. Além disso, os movimentos rasteiros da capoeira fortalecem a musculatura interna das pernas, trabalham a flexão total de joelhos e a extensão total dos artelhos (pertinentes à batata da perna), músculos e tendões, cuja força e flexibilidade são indispensáveis para conseguir executar muitos dos passos de frevo. No entanto, mais do que preparação para o frevo, a capoeira pode ser vista como o tipo de lógica de organização do corpo que permite a criação do frevo. Um corpo forte, flexível, educado na prontidão e na malícia (no sentido que tem na capoeira de leve ironia, de disfarçada distração para atrair o oponente a emboscadas). Um detalhe importante na dança do frevo que ganha variações com o desenrolar do século 20 é a posição da coluna. Na prática da capoeira-angola, a coluna lombar gira levemente para frente, o que permite uma maior liberdade de articulação da coxa em posições variadas, um certo relaxamento do quadril na execução de movimentos rasteiros (ensinado pela expressão de

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do pintor Euclides Francisco Amâncio, mais conhecido como Bajado (1916 – 1996). Também como o frevo, o matuto de Maraial (PE) descobriu no Sítio Histórico o seu lugar, de onde pôde, encostado na janela de sua casa na rua do Amparo, buscar inspiração para suas obras, quase sempre pinturas em óleo sobre eucatex que reverenciam personagens do Carnaval, cujo pano de fundo costumam ser as troças de frevo. Foi assim que Bajado conseguiu imprimir um estilo original, valendo-se de um aprendizado próprio, uma ingenuidade e uma despretensão que o caracterizou como um grande artista naïf, tão popular quanto as suas criações. Talvez por ter se transformado em “um artista de Olinda”, como assinava nas telas, ou seja, por ter uma

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Ao longo desses 100 anos de história, o frevo esteve tão presente nas telas quanto nas ruas. A representação do ritmo nas artes plásticas sempre funcionou, em grande parte, como uma espécie de espelho da própria manifestação – figurativa, colorida e, sobretudo, espontânea. Assim é até hoje. Desenhos, pinturas, esculturas, gravuras e outros suportes aparecem aos montes, quando o tema é carnavalesco, muitas vezes dialogando com a estética do artesanato. No entanto, só alguns grandes artistas conseguiram imortalizar, com maestria, a arte fervorosa de passistas, blocos e orquestras. Alguns deles, inclusive, se tornaram consagrados a partir do ritmo que nasceu no asfalto recifense, mas encontrou sua casa nas ladeiras de Olinda. É o caso

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Olívia Mindêlo Entre a arte naïf e a moderna

A folia nas artes

O frevo é bom – óleo sobre eucatex (1972) – Bajado

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Para grande parte dos foliões, hoje em dia, esse é o frevo que se dança no carnaval. No entanto, enquanto dança, esse é apenas um pedacinho de uma imensidão de movimentos, dinâmicas, trejeitos e subjetividade que constituem o frevo. Pois o frevo, dança, é uma arte de complexos movimentos e composições coreográficas – improvisadas ou não – que reaviva no corpo a ebulição, o prazer, a explosão, a criatividade corporal individual, a partir de um repertório de movimentos coletivizados. Esse frevo, que tem como símbolo a sombrinha colorida, emerge no meio da multidão do carnaval, abrindo rodas para assistir à evolução dos passistas, ou como parte do desfile dos blocos carnavalescos. Mas é uma dança que, assim como a música do frevo, tem vida própria como uma arte corporal que cada vez mais se especializa e se multiplica em diferentes formas de expressão.

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principais passistas dessa época eram Doca da Ilha do Leite, Egídio Ferreira, Coruja, Marise, Farinha Ruim, Sete Flechas, Pinico de Afogados e Nascimento do Passo. Imagino que o destaque dado aos passistas e o estímulo do concurso tornaram a dança do frevo cada vez mais especializada, com movimentos novos e novas conexões surgindo a cada ano e sendo rapidamente incorporados pelos praticantes da dança. Lembrando dessa época, fica difícil imaginar como o frevo perdeu importância nas décadas seguintes. Acredita-se que o fim dos estúdios ao vivo das rádios, a ditadura e o programa habitacional que conduziu a população para COHABs, moradias populares construídas longe do centro da cidade, foram alguns fatores que ajudaram a diminuir a força popular do frevo. Tanto que, em 1971, dos 100 clubesde-rua que existiam em 1900, apenas oito restavam, como conta Valdemar de Oliveira no seu Frevo, Capoeira e Passo. É nessa época que Nascimento do Passo volta de Manaus (sua cidade natal), onde passou três anos, com a idéia de lutar pela divulgação do frevo. Em 1973, funda a Escola de Frevo Nascimento do Passo, sem sede, que se instalava pelas ruas e clubes da região metropolitana, ensinando o passo e pregando a prática do frevo durante todo o ano. Esse é um momento de apuro da dança que passa a ter uma técnica de aprendizado e execução nomeada e reconhecida. Outro momento importante na estrutura da dança do frevo é a criação do Balé Popular do Recife, em

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1979. Grupo profissional de dança, o Balé Popular do Recife (BPR) catalogou e criou uma versão para palco de diversas danças populares, incluindo o frevo. O BPR teve como principal mestre de frevo Nascimento do Passo, no entanto, sua abordagem do frevo – que tinha como principal interesse dialogar com o cenário de dança cênica, teatral – implementa diversas diferenças não só no nome dado aos passos, mas na posição das pernas, da coluna, na relação que o dançarino deve estabelecer com o público e no incremento de células coreografadas (não improvisadas) e de desenhos coreográficos para conjuntos sincrônicos de bailarinos. Essas duas escolas constroem, em paralelo, visões sobre o frevo, didáticas de transmissão e de execução e influenciam diversos grupos de dança que, a partir de meados da década de 80, se multiplicam pela cidade. O enfoque de cada grupo, seus bailarinos e alunos fazem variar a relação com a música, a dedicação ou não aos passos mais acrobáticos, o investimento na criatividade e improvisação, a velocidade da dança, a inserção de movimentos de outras danças e técnicas corporais. Esses diálogos retornam às ruas, nas festas carnavalescas e eventos de frevo, na alimentação contínua de uma dinâmica cultural que atravessa as fronteiras formais da arte e do cotidiano. Enfim, a dança do frevo é cada vez mais um substantivo plural.

Sombras do frevo – foto de Alexandre Berzin (1950)

Que dança é essa... O frevo é uma dança complexa e singular no panorama das criações brasileiras. No frevo, pouco se vê do movimento tipicamente afro-brasileiro – ondulado, sensual ou tipicamente indígena – com pisadas arrastadas, ou tipicamente europeu – danças de salão, dança clássica. O frevo hibridiza essas informações, criando um novo produto que só o olhar apurado pode encontrar conexões entre essas culturas do movimento. Alguns estudiosos, citados genericamente por Guerra-Peixe, quiseram encontrar origem eslava para a dança do frevo, sem conseguir indicar por onde danças russas teriam alcançado as pessoas do Recife no século 19 e início do século 20. Arrisco-me a inserir essa teoria na histórica tendência das elites recifenses de tentar criar um carnaval à moda européia e também na

Valéria Vicente é jornalista, bailarina, coreógrafa e coordenadora do Acervo RecorDança.

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contínua relação colonial que só pode reconhecer arte, beleza e sofisticação nos padrões europeus. Já na década de 1960, Waldemar de Oliveira apresentou, de forma inconteste, a relação do frevo com a capoeira. Ao que sublinho acrescentando – uma relação com a cultura corporal africana, como o afoxé, o maracatu e tantas outras danças categorizadas como afro-brasileiras, e com os movimentos urbanos das populações recém-libertas do regime escravista, que trazem no corpo a memória e a vivência da violência. A movimentação do frevo deriva diretamente da lógica de movimentação corporal da capoeira que era praticada no Recife no início do século 20. Nessa época, a capoeira, que provavelmente tem mais semelhança com o que hoje conhecemos como capoeiraangola, era proibida por lei. A comparação da prática da

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Alguns saltinhos e pequenos chutes acompanhando a marcação binária da percussão de uma orquestra de frevo são suficientes para dançar o frevo. Para o folião, a “técnica” consiste em deixar a música ativar a vontade de mexer o corpo, soltar o peso do jeito que der, desequilibrando-se e encontrando apoio nos corpos ao redor, também em movimento. Nesse sentido, pode-se até dizer que o frevo é uma dança que se dança junto, trocando pequenos ou grandes empurrões, enquanto o cortejo se desloca por ruas e ladeiras, cantando músicas, batendo palmas, num frevedouro (como se dizia no começo do século 20) atrás da orquestra. No entanto, desse empurraempurra, o olhar atento vai descobrindo pequenas variações: pessoas tocam a ponta dos pés e o calcanhar no chão, agacham-se, saltam um pouco mais alto. São os passos do frevo, movimentos que provocam calor, alegria, pulsação cardíaca.

A dança do frevo pelo olhar de uma dançarina Valéria Vicente

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do pintor Euclides Francisco Amâncio, mais conhecido como Bajado (1916 – 1996). Também como o frevo, o matuto de Maraial (PE) descobriu no Sítio Histórico o seu lugar, de onde pôde, encostado na janela de sua casa na rua do Amparo, buscar inspiração para suas obras, quase sempre pinturas em óleo sobre eucatex que reverenciam personagens do Carnaval, cujo pano de fundo costumam ser as troças de frevo. Foi assim que Bajado conseguiu imprimir um estilo original, valendo-se de um aprendizado próprio, uma ingenuidade e uma despretensão que o caracterizou como um grande artista naïf, tão popular quanto as suas criações. Talvez por ter se transformado em “um artista de Olinda”, como assinava nas telas, ou seja, por ter uma

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Ao longo desses 100 anos de história, o frevo esteve tão presente nas telas quanto nas ruas. A representação do ritmo nas artes plásticas sempre funcionou, em grande parte, como uma espécie de espelho da própria manifestação – figurativa, colorida e, sobretudo, espontânea. Assim é até hoje. Desenhos, pinturas, esculturas, gravuras e outros suportes aparecem aos montes, quando o tema é carnavalesco, muitas vezes dialogando com a estética do artesanato. No entanto, só alguns grandes artistas conseguiram imortalizar, com maestria, a arte fervorosa de passistas, blocos e orquestras. Alguns deles, inclusive, se tornaram consagrados a partir do ritmo que nasceu no asfalto recifense, mas encontrou sua casa nas ladeiras de Olinda. É o caso

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Olívia Mindêlo

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O frevo é bom – óleo sobre eucatex (1972) – Bajado

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Para grande parte dos foliões, hoje em dia, esse é o frevo que se dança no carnaval. No entanto, enquanto dança, esse é apenas um pedacinho de uma imensidão de movimentos, dinâmicas, trejeitos e subjetividade que constituem o frevo. Pois o frevo, dança, é uma arte de complexos movimentos e composições coreográficas – improvisadas ou não – que reaviva no corpo a ebulição, o prazer, a explosão, a criatividade corporal individual, a partir de um repertório de movimentos coletivizados. Esse frevo, que tem como símbolo a sombrinha colorida, emerge no meio da multidão do carnaval, abrindo rodas para assistir à evolução dos passistas, ou como parte do desfile dos blocos carnavalescos. Mas é uma dança que, assim como a música do frevo, tem vida própria como uma arte corporal que cada vez mais se especializa e se multiplica em diferentes formas de expressão.

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A folia nas artes

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Alguns saltinhos e pequenos chutes acompanhando a marcação binária da percussão de uma orquestra de frevo são suficientes para dançar o frevo. Para o folião, a “técnica” consiste em deixar a música ativar a vontade de mexer o corpo, soltar o peso do jeito que der, desequilibrando-se e encontrando apoio nos corpos ao redor, também em movimento. Nesse sentido, pode-se até dizer que o frevo é uma dança que se dança junto, trocando pequenos ou grandes empurrões, enquanto o cortejo se desloca por ruas e ladeiras, cantando músicas, batendo palmas, num frevedouro (como se dizia no começo do século 20) atrás da orquestra. No entanto, desse empurraempurra, o olhar atento vai descobrindo pequenas variações: pessoas tocam a ponta dos pés e o calcanhar no chão, agacham-se, saltam um pouco mais alto. São os passos do frevo, movimentos que provocam calor, alegria, pulsação cardíaca.

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Entre a arte naïf e a moderna

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Fotos: Hans Mantteuffel

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A dança do frevo pelo olhar de uma dançarina Valéria Vicente

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Que dança é essa... O frevo é uma dança complexa e singular no panorama das criações brasileiras. No frevo, pouco se vê do movimento tipicamente afro-brasileiro – ondulado, sensual ou tipicamente indígena – com pisadas arrastadas, ou tipicamente europeu – danças de salão, dança clássica. O frevo hibridiza essas informações, criando um novo produto que só o olhar apurado pode encontrar conexões entre essas culturas do movimento. Alguns estudiosos, citados genericamente por Guerra-Peixe, quiseram encontrar origem eslava para a dança do frevo, sem conseguir indicar por onde danças russas teriam alcançado as pessoas do Recife no século 19 e início do século 20. Arrisco-me a inserir essa teoria na histórica tendência das elites recifenses de tentar criar um carnaval à moda européia e também na

contínua relação colonial que só pode reconhecer arte, beleza e sofisticação nos padrões europeus. Já na década de 1960, Waldemar de Oliveira apresentou, de forma inconteste, a relação do frevo com a capoeira. Ao que sublinho acrescentando – uma relação com a cultura corporal africana, como o afoxé, o maracatu e tantas outras danças categorizadas como afro-brasileiras, e com os movimentos urbanos das populações recém-libertas do regime escravista, que trazem no corpo a memória e a vivência da violência. A movimentação do frevo deriva diretamente da lógica de movimentação corporal da capoeira que era praticada no Recife no início do século 20. Nessa época, a capoeira, que provavelmente tem mais semelhança com o que hoje conhecemos como capoeiraangola, era proibida por lei. A comparação da prática da

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Valéria Vicente é jornalista, bailarina, coreógrafa e coordenadora do Acervo RecorDança.

Sombras do frevo – foto de Alexandre Berzin (1950)

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Hans Mantteuffel

1979. Grupo profissional de dança, o Balé Popular do Recife (BPR) catalogou e criou uma versão para palco de diversas danças populares, incluindo o frevo. O BPR teve como principal mestre de frevo Nascimento do Passo, no entanto, sua abordagem do frevo – que tinha como principal interesse dialogar com o cenário de dança cênica, teatral – implementa diversas diferenças não só no nome dado aos passos, mas na posição das pernas, da coluna, na relação que o dançarino deve estabelecer com o público e no incremento de células coreografadas (não improvisadas) e de desenhos coreográficos para conjuntos sincrônicos de bailarinos. Essas duas escolas constroem, em paralelo, visões sobre o frevo, didáticas de transmissão e de execução e influenciam diversos grupos de dança que, a partir de meados da década de 80, se multiplicam pela cidade. O enfoque de cada grupo, seus bailarinos e alunos fazem variar a relação com a música, a dedicação ou não aos passos mais acrobáticos, o investimento na criatividade e improvisação, a velocidade da dança, a inserção de movimentos de outras danças e técnicas corporais. Esses diálogos retornam às ruas, nas festas carnavalescas e eventos de frevo, na alimentação contínua de uma dinâmica cultural que atravessa as fronteiras formais da arte e do cotidiano. Enfim, a dança do frevo é cada vez mais um substantivo plural.

Reprodução

principais passistas dessa época eram Doca da Ilha do Leite, Egídio Ferreira, Coruja, Marise, Farinha Ruim, Sete Flechas, Pinico de Afogados e Nascimento do Passo. Imagino que o destaque dado aos passistas e o estímulo do concurso tornaram a dança do frevo cada vez mais especializada, com movimentos novos e novas conexões surgindo a cada ano e sendo rapidamente incorporados pelos praticantes da dança. Lembrando dessa época, fica difícil imaginar como o frevo perdeu importância nas décadas seguintes. Acredita-se que o fim dos estúdios ao vivo das rádios, a ditadura e o programa habitacional que conduziu a população para COHABs, moradias populares construídas longe do centro da cidade, foram alguns fatores que ajudaram a diminuir a força popular do frevo. Tanto que, em 1971, dos 100 clubesde-rua que existiam em 1900, apenas oito restavam, como conta Valdemar de Oliveira no seu Frevo, Capoeira e Passo. É nessa época que Nascimento do Passo volta de Manaus (sua cidade natal), onde passou três anos, com a idéia de lutar pela divulgação do frevo. Em 1973, funda a Escola de Frevo Nascimento do Passo, sem sede, que se instalava pelas ruas e clubes da região metropolitana, ensinando o passo e pregando a prática do frevo durante todo o ano. Esse é um momento de apuro da dança que passa a ter uma técnica de aprendizado e execução nomeada e reconhecida. Outro momento importante na estrutura da dança do frevo é a criação do Balé Popular do Recife, em

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proximidade tão estreita com a terra do Carnaval e seu povo, Bajado tenha sido um dos mais (senão o mais) importantes artistas plásticos relacionados ao gênero pernambucano. E conseguiu ser muito autêntico por isso, em suas milhares de simpáticas pinturas que reiteram constantemente uma declaração de amor ao Carnaval local – às vezes até com frases na própria tela. Foi ele quem criou, inclusive, estandartes para troças famosas (Elefante, Vassourinhas etc.), como registra o frevo-canção “Bicho Maluco” Beleza, de Alceu Valença. “Ele era muito carnavalesco. Brincava carnaval de verdade. Nem sei como ele agüentava. Brincou até uns 75 anos. Saía de casa e só aparecia depois do (Bacalhau do) Batata”, conta uma das filhas de Bajado, Gizelda Pereira Amâncio, no catálogo do 6º Olinda Arte em Toda Parte, evento que homenageou o artista, em 2006, pelos 10 anos de sua morte. Se, por um lado, a arte naïf tem sido tão cara à história do frevo, em particular pela autêntica contribuição de Bajado, por outro, a arte moderna

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também foi, durante muito tempo, uma das escolas mais presentes entre aqueles que queriam resgatar as manifestações culturais construtoras de uma identidade local. Não poderia ser diferente: o frevo é muito nosso. E nasceu, não por acaso, com as vanguardas e as transformações industriais dos centros urbanos, entre o final do século 19 e o início do 20, ganhando força a partir do final dos anos 40, quando voltou a fazer parte, de fato, da grande festa pernambucana. Foi justamente nessa época que se destacou, no Recife, a produção de um dos maiores nomes das artes plásticas do Estado, e do país: o artista plástico modernista Lula Cardoso Ayres (1910 – 1987), que também travou com o Carnaval uma relação fundamental. Primeiro com o do Rio de Janeiro, cidade onde morou muitos anos, e, em seguida, com o do Recife, sua terra natal, cuja festa foi exaustivamente retratada por ele em suas telas modernistas ou mesmo nas suas fotografias, igualmente importantes.

Carlos Eduardo Amaral é jornalista.

advertia que era preciso aceitar todas as manifestações musicais do território brasileiro, étnicas ou não, e contrapontuava, lembrando que não era possível a orquestração ou a harmonia assumirem uma forma nacional, porque esta é contida nos ritmos e melodias autóctones. O meio-termo indicado para os compositores, portanto, era aspirar a uma música universal assimilando as formas folclóricas no subconsciente e materializá-las em obras de maior alcance sem explorá-las exoticamente. Cussy de Almeida assinala que, dentro de uma ótica etnológica, a influência africana é certa na dança do frevo (Guerra Peixe defendia uma origem gitanoeslava dos passos, a qual nunca comprovou através de um estudo) bem como a formação instrumental e a evolução harmônica que incrementaram a composição popular no geral ao longo do século 20, imprimindo uma síncope mais ousada ao frevo. “O improviso já existente nos anos 20 e 30 voltou ser moda (vide Spok e sua orquestra) e a dança ficou mais rica e mais criativa, com os breques, paradinhas, e passos também improvisados ao som de acordes e melodias enriquecidos por harmonias contemporâneas”. Esses são os ingredientes do caldeirão musical que fervilha nas ruas do Grande Recife. De qualquer forma, se alguém pegar o Perpetuum mobile de Strauss Jr., perceberá os elementos que foram apontados lá no primeiro parágrafo. Se tal ligação for redescoberta e sensibilizar os arranjadores de frevo, não será nenhuma fantasia ouvir o rei das valsas e polcas nas ladeiras de Olinda ou no Galo da Madrugada. E o público, sem saber, ir no embalo de “Sob raios e trovões”, da “Polca húngara” ou da “Polca da champanhe”.

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Carnaval em Olinda – óleo sobre eucatex (1980) – Bajado

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Passistas – óleo sobre tela (1950) – Lula Cardoso Ayres

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sistema de oposições entre quadril/pernas/tronco e braços/tronco/cabeça. Dançar o frevo é articular esses complexos sistemas de movimento com criatividade na ligação de um sistema para o outro e inspirando-se nas variações complexas da música.

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Fotos: Hans Mantteuffel

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Breve história do movimento Apesar da comemoração oficial da existência do frevo utilizar a data de 1907 – quando pela primeira vez foi publicado esse termo para denominar a nova forma de brincar o carnaval – tanto a dança quanto a música frevo são desenvolvidas durante a segunda metade do século 19, nas festas e eventos públicos do Recife. Como exemplo desse processo, podemos citar o conto de Luiz de Guimarães Jr. , publicado em 1871, que descreve um personagem popular em festa local: “Morava em Olinda; nas redondezas de 40 léguas não se começava um samba sem ele chegar – ‘Ferva o samba minha gente! Entra na roda Teto! – Dançava como um corisco e pulava como um macaco! Corta jaca, Teto! O passo da tesoura! O caranguejo!”. Esse trecho contém muitos dos elementos do frevo: o uso do termo ferver – que dará origem ao nome frevo; a descrição da dança como algo de tônus violento e saltitante e os nomes dos movimentos, que eram batizados e se tornavam recorrentes. Dançar frevo, no cotidiano era chamado “fazer o passo” e é isso que dá nome à dança do frevo, batizada como passo. Assim, o dançarino do frevo passou a ser chamado passista. Na década de 1950, o frevo era a grande sensação do carnaval pernambucano. Maestros como Antônio Bandeira, Capiba e Levino Ferreira se dedicavam ao ritmo, criando grandes composições. Época também em que as rádios locais como a Rádio Clube e a Rádio Tamandaré tinham suas próprias orquestras de frevo e promoviam concursos de passo. Esses concursos, dedicados a decidir o melhor passista do ano, davam destaque aos dançarinos do frevo e visibilidade a essa dança. Os

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nos permite fazer várias conexões entre muitos movimentos e, principalmente, com as formas de criar alavancas com as pernas, para se deslocar com movimentos rasteiros e encontrar apoio para se elevar. Alguns dos movimentos do frevo, quando executados lentamente, são praticamente idênticos a movimentos da capoeira, como a ginga, os movimentos de negativa, o rabo-de-arraia, a queda de quatro. Elementos advindos do jogo, como as mudanças abruptas para surpreender o oponente, a descontração do corpo que parece estar apenas brincando, quando está prestes a dar um chute violento, e as variações de ginga, que no frevo ganham o nome de mugangas, também podem ser ligados a características do frevo. Além disso, os movimentos rasteiros da capoeira fortalecem a musculatura interna das pernas, trabalham a flexão total de joelhos e a extensão total dos artelhos (pertinentes à batata da perna), músculos e tendões, cuja força e flexibilidade são indispensáveis para conseguir executar muitos dos passos de frevo. No entanto, mais do que preparação para o frevo, a capoeira pode ser vista como o tipo de lógica de organização do corpo que permite a criação do frevo. Um corpo forte, flexível, educado na prontidão e na malícia (no sentido que tem na capoeira de leve ironia, de disfarçada distração para atrair o oponente a emboscadas). Um detalhe importante na dança do frevo que ganha variações com o desenrolar do século 20 é a posição da coluna. Na prática da capoeira-angola, a coluna lombar gira levemente para frente, o que permite uma maior liberdade de articulação da coxa em posições variadas, um certo relaxamento do quadril na execução de movimentos rasteiros (ensinado pela expressão de

sentar sobre os calcanhares) e a estabilização do corpo. Com a base da coluna levemente curvada, a repercussão orgânica do corpo é curvar também o topo da coluna, deixando a cabeça levemente para baixo, criando um arco nas costas que varia de acordo com cada corpo, mas que nos ajuda a entender porque muitos passistas (principalmente os chamados passistas de rua ou passistas tradicionais) dançam olhando para si mesmos – é uma tendência de conforto para o próprio corpo. Essa movimentação da cabeça é menos observada na capoeira, pois, por tratar-se de uma luta ou um jogo, o olhar do capoerista não deve desviar do oponente. Já para o passista, a posição da cabeça é uma opção que varia de acordo com a relação que queira criar com sua platéia. Contagiado pela marcação dos dobrados e marchas mais acelerados, pois a música do frevo também estava sendo gestada nas ruas, o passista, ao articular os movimentos nessa marcação, aumentou a velocidade dos movimentos e transformou as informações da capoeira. A aceleração e os saltos proporcionam a ativação de uma energia mais frenética que a da capoeira. Um novo jogo é então estabelecido. O jogo da dança do frevo em que o passista testa o limite do seu equilíbrio e agilidade de diversas maneiras. Seja trocando as posições das pernas sem sair do eixo, seja transferindo o centro do corpo de um ponto a outro alcançando posições impensáveis, seja curvando todo o corpo para frente e para trás (alternando ponta de pé e calcanhar), seja desafiando a gravidade com saltos – em posições nem sempre geométricas, seja suspendendo seu peso a ponto de se apoiar ou até andar sobre o peito dos pés (como no movimento “bailarina”), ou articulando, ao mesmo tempo, um

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capoeira-angola com a forma de dançar de passistas

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proximidade tão estreita com a terra do Carnaval e seu povo, Bajado tenha sido um dos mais (senão o mais) importantes artistas plásticos relacionados ao gênero pernambucano. E conseguiu ser muito autêntico por isso, em suas milhares de simpáticas pinturas que reiteram constantemente uma declaração de amor ao Carnaval local – às vezes até com frases na própria tela. Foi ele quem criou, inclusive, estandartes para troças famosas (Elefante, Vassourinhas etc.), como registra o frevo-canção “Bicho Maluco” Beleza, de Alceu Valença. “Ele era muito carnavalesco. Brincava carnaval de verdade. Nem sei como ele agüentava. Brincou até uns 75 anos. Saía de casa e só aparecia depois do (Bacalhau do) Batata”, conta uma das filhas de Bajado, Gizelda Pereira Amâncio, no catálogo do 6º Olinda Arte em Toda Parte, evento que homenageou o artista, em 2006, pelos 10 anos de sua morte. Se, por um lado, a arte naïf tem sido tão cara à história do frevo, em particular pela autêntica contribuição de Bajado, por outro, a arte moderna

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também foi, durante muito tempo, uma das escolas mais presentes entre aqueles que queriam resgatar as manifestações culturais construtoras de uma identidade local. Não poderia ser diferente: o frevo é muito nosso. E nasceu, não por acaso, com as vanguardas e as transformações industriais dos centros urbanos, entre o final do século 19 e o início do 20, ganhando força a partir do final dos anos 40, quando voltou a fazer parte, de fato, da grande festa pernambucana. Foi justamente nessa época que se destacou, no Recife, a produção de um dos maiores nomes das artes plásticas do Estado, e do país: o artista plástico modernista Lula Cardoso Ayres (1910 – 1987), que também travou com o Carnaval uma relação fundamental. Primeiro com o do Rio de Janeiro, cidade onde morou muitos anos, e, em seguida, com o do Recife, sua terra natal, cuja festa foi exaustivamente retratada por ele em suas telas modernistas ou mesmo nas suas fotografias, igualmente importantes.

Carlos Eduardo Amaral é jornalista.

advertia que era preciso aceitar todas as manifestações musicais do território brasileiro, étnicas ou não, e contrapontuava, lembrando que não era possível a orquestração ou a harmonia assumirem uma forma nacional, porque esta é contida nos ritmos e melodias autóctones. O meio-termo indicado para os compositores, portanto, era aspirar a uma música universal assimilando as formas folclóricas no subconsciente e materializá-las em obras de maior alcance sem explorá-las exoticamente. Cussy de Almeida assinala que, dentro de uma ótica etnológica, a influência africana é certa na dança do frevo (Guerra Peixe defendia uma origem gitanoeslava dos passos, a qual nunca comprovou através de um estudo) bem como a formação instrumental e a evolução harmônica que incrementaram a composição popular no geral ao longo do século 20, imprimindo uma síncope mais ousada ao frevo. “O improviso já existente nos anos 20 e 30 voltou ser moda (vide Spok e sua orquestra) e a dança ficou mais rica e mais criativa, com os breques, paradinhas, e passos também improvisados ao som de acordes e melodias enriquecidos por harmonias contemporâneas”. Esses são os ingredientes do caldeirão musical que fervilha nas ruas do Grande Recife. De qualquer forma, se alguém pegar o Perpetuum mobile de Strauss Jr., perceberá os elementos que foram apontados lá no primeiro parágrafo. Se tal ligação for redescoberta e sensibilizar os arranjadores de frevo, não será nenhuma fantasia ouvir o rei das valsas e polcas nas ladeiras de Olinda ou no Galo da Madrugada. E o público, sem saber, ir no embalo de “Sob raios e trovões”, da “Polca húngara” ou da “Polca da champanhe”.

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Carnaval em Olinda – óleo sobre eucatex (1980) – Bajado

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Passistas – óleo sobre tela (1950) – Lula Cardoso Ayres

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sistema de oposições entre quadril/pernas/tronco e braços/tronco/cabeça. Dançar o frevo é articular esses complexos sistemas de movimento com criatividade na ligação de um sistema para o outro e inspirando-se nas variações complexas da música.

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Breve história do movimento Apesar da comemoração oficial da existência do frevo utilizar a data de 1907 – quando pela primeira vez foi publicado esse termo para denominar a nova forma de brincar o carnaval – tanto a dança quanto a música frevo são desenvolvidas durante a segunda metade do século 19, nas festas e eventos públicos do Recife. Como exemplo desse processo, podemos citar o conto de Luiz de Guimarães Jr. , publicado em 1871, que descreve um personagem popular em festa local: “Morava em Olinda; nas redondezas de 40 léguas não se começava um samba sem ele chegar – ‘Ferva o samba minha gente! Entra na roda Teto! – Dançava como um corisco e pulava como um macaco! Corta jaca, Teto! O passo da tesoura! O caranguejo!”. Esse trecho contém muitos dos elementos do frevo: o uso do termo ferver – que dará origem ao nome frevo; a descrição da dança como algo de tônus violento e saltitante e os nomes dos movimentos, que eram batizados e se tornavam recorrentes. Dançar frevo, no cotidiano era chamado “fazer o passo” e é isso que dá nome à dança do frevo, batizada como passo. Assim, o dançarino do frevo passou a ser chamado passista. Na década de 1950, o frevo era a grande sensação do carnaval pernambucano. Maestros como Antônio Bandeira, Capiba e Levino Ferreira se dedicavam ao ritmo, criando grandes composições. Época também em que as rádios locais como a Rádio Clube e a Rádio Tamandaré tinham suas próprias orquestras de frevo e promoviam concursos de passo. Esses concursos, dedicados a decidir o melhor passista do ano, davam destaque aos dançarinos do frevo e visibilidade a essa dança. Os

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nos permite fazer várias conexões entre muitos movimentos e, principalmente, com as formas de criar alavancas com as pernas, para se deslocar com movimentos rasteiros e encontrar apoio para se elevar. Alguns dos movimentos do frevo, quando executados lentamente, são praticamente idênticos a movimentos da capoeira, como a ginga, os movimentos de negativa, o rabo-de-arraia, a queda de quatro. Elementos advindos do jogo, como as mudanças abruptas para surpreender o oponente, a descontração do corpo que parece estar apenas brincando, quando está prestes a dar um chute violento, e as variações de ginga, que no frevo ganham o nome de mugangas, também podem ser ligados a características do frevo. Além disso, os movimentos rasteiros da capoeira fortalecem a musculatura interna das pernas, trabalham a flexão total de joelhos e a extensão total dos artelhos (pertinentes à batata da perna), músculos e tendões, cuja força e flexibilidade são indispensáveis para conseguir executar muitos dos passos de frevo. No entanto, mais do que preparação para o frevo, a capoeira pode ser vista como o tipo de lógica de organização do corpo que permite a criação do frevo. Um corpo forte, flexível, educado na prontidão e na malícia (no sentido que tem na capoeira de leve ironia, de disfarçada distração para atrair o oponente a emboscadas). Um detalhe importante na dança do frevo que ganha variações com o desenrolar do século 20 é a posição da coluna. Na prática da capoeira-angola, a coluna lombar gira levemente para frente, o que permite uma maior liberdade de articulação da coxa em posições variadas, um certo relaxamento do quadril na execução de movimentos rasteiros (ensinado pela expressão de

sentar sobre os calcanhares) e a estabilização do corpo. Com a base da coluna levemente curvada, a repercussão orgânica do corpo é curvar também o topo da coluna, deixando a cabeça levemente para baixo, criando um arco nas costas que varia de acordo com cada corpo, mas que nos ajuda a entender porque muitos passistas (principalmente os chamados passistas de rua ou passistas tradicionais) dançam olhando para si mesmos – é uma tendência de conforto para o próprio corpo. Essa movimentação da cabeça é menos observada na capoeira, pois, por tratar-se de uma luta ou um jogo, o olhar do capoerista não deve desviar do oponente. Já para o passista, a posição da cabeça é uma opção que varia de acordo com a relação que queira criar com sua platéia. Contagiado pela marcação dos dobrados e marchas mais acelerados, pois a música do frevo também estava sendo gestada nas ruas, o passista, ao articular os movimentos nessa marcação, aumentou a velocidade dos movimentos e transformou as informações da capoeira. A aceleração e os saltos proporcionam a ativação de uma energia mais frenética que a da capoeira. Um novo jogo é então estabelecido. O jogo da dança do frevo em que o passista testa o limite do seu equilíbrio e agilidade de diversas maneiras. Seja trocando as posições das pernas sem sair do eixo, seja transferindo o centro do corpo de um ponto a outro alcançando posições impensáveis, seja curvando todo o corpo para frente e para trás (alternando ponta de pé e calcanhar), seja desafiando a gravidade com saltos – em posições nem sempre geométricas, seja suspendendo seu peso a ponto de se apoiar ou até andar sobre o peito dos pés (como no movimento “bailarina”), ou articulando, ao mesmo tempo, um

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capoeira-angola com a forma de dançar de passistas

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do pintor Euclides Francisco Amâncio, mais conhecido como Bajado (1916 – 1996). Também como o frevo, o matuto de Maraial (PE) descobriu no Sítio Histórico o seu lugar, de onde pôde, encostado na janela de sua casa na rua do Amparo, buscar inspiração para suas obras, quase sempre pinturas em óleo sobre eucatex que reverenciam personagens do Carnaval, cujo pano de fundo costumam ser as troças de frevo. Foi assim que Bajado conseguiu imprimir um estilo original, valendo-se de um aprendizado próprio, uma ingenuidade e uma despretensão que o caracterizou como um grande artista naïf, tão popular quanto as suas criações. Talvez por ter se transformado em “um artista de Olinda”, como assinava nas telas, ou seja, por ter uma

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Ao longo desses 100 anos de história, o frevo esteve tão presente nas telas quanto nas ruas. A representação do ritmo nas artes plásticas sempre funcionou, em grande parte, como uma espécie de espelho da própria manifestação – figurativa, colorida e, sobretudo, espontânea. Assim é até hoje. Desenhos, pinturas, esculturas, gravuras e outros suportes aparecem aos montes, quando o tema é carnavalesco, muitas vezes dialogando com a estética do artesanato. No entanto, só alguns grandes artistas conseguiram imortalizar, com maestria, a arte fervorosa de passistas, blocos e orquestras. Alguns deles, inclusive, se tornaram consagrados a partir do ritmo que nasceu no asfalto recifense, mas encontrou sua casa nas ladeiras de Olinda. É o caso

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O frevo é bom – óleo sobre eucatex (1972) – Bajado

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Para grande parte dos foliões, hoje em dia, esse é o frevo que se dança no carnaval. No entanto, enquanto dança, esse é apenas um pedacinho de uma imensidão de movimentos, dinâmicas, trejeitos e subjetividade que constituem o frevo. Pois o frevo, dança, é uma arte de complexos movimentos e composições coreográficas – improvisadas ou não – que reaviva no corpo a ebulição, o prazer, a explosão, a criatividade corporal individual, a partir de um repertório de movimentos coletivizados. Esse frevo, que tem como símbolo a sombrinha colorida, emerge no meio da multidão do carnaval, abrindo rodas para assistir à evolução dos passistas, ou como parte do desfile dos blocos carnavalescos. Mas é uma dança que, assim como a música do frevo, tem vida própria como uma arte corporal que cada vez mais se especializa e se multiplica em diferentes formas de expressão.

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Alguns saltinhos e pequenos chutes acompanhando a marcação binária da percussão de uma orquestra de frevo são suficientes para dançar o frevo. Para o folião, a “técnica” consiste em deixar a música ativar a vontade de mexer o corpo, soltar o peso do jeito que der, desequilibrando-se e encontrando apoio nos corpos ao redor, também em movimento. Nesse sentido, pode-se até dizer que o frevo é uma dança que se dança junto, trocando pequenos ou grandes empurrões, enquanto o cortejo se desloca por ruas e ladeiras, cantando músicas, batendo palmas, num frevedouro (como se dizia no começo do século 20) atrás da orquestra. No entanto, desse empurraempurra, o olhar atento vai descobrindo pequenas variações: pessoas tocam a ponta dos pés e o calcanhar no chão, agacham-se, saltam um pouco mais alto. São os passos do frevo, movimentos que provocam calor, alegria, pulsação cardíaca.

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Fotos: Hans Mantteuffel

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A dança do frevo pelo olhar de uma dançarina Valéria Vicente

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Que dança é essa... O frevo é uma dança complexa e singular no panorama das criações brasileiras. No frevo, pouco se vê do movimento tipicamente afro-brasileiro – ondulado, sensual ou tipicamente indígena – com pisadas arrastadas, ou tipicamente europeu – danças de salão, dança clássica. O frevo hibridiza essas informações, criando um novo produto que só o olhar apurado pode encontrar conexões entre essas culturas do movimento. Alguns estudiosos, citados genericamente por Guerra-Peixe, quiseram encontrar origem eslava para a dança do frevo, sem conseguir indicar por onde danças russas teriam alcançado as pessoas do Recife no século 19 e início do século 20. Arrisco-me a inserir essa teoria na histórica tendência das elites recifenses de tentar criar um carnaval à moda européia e também na

contínua relação colonial que só pode reconhecer arte, beleza e sofisticação nos padrões europeus. Já na década de 1960, Waldemar de Oliveira apresentou, de forma inconteste, a relação do frevo com a capoeira. Ao que sublinho acrescentando – uma relação com a cultura corporal africana, como o afoxé, o maracatu e tantas outras danças categorizadas como afro-brasileiras, e com os movimentos urbanos das populações recém-libertas do regime escravista, que trazem no corpo a memória e a vivência da violência. A movimentação do frevo deriva diretamente da lógica de movimentação corporal da capoeira que era praticada no Recife no início do século 20. Nessa época, a capoeira, que provavelmente tem mais semelhança com o que hoje conhecemos como capoeiraangola, era proibida por lei. A comparação da prática da

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Valéria Vicente é jornalista, bailarina, coreógrafa e coordenadora do Acervo RecorDança.

Sombras do frevo – foto de Alexandre Berzin (1950)

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1979. Grupo profissional de dança, o Balé Popular do Recife (BPR) catalogou e criou uma versão para palco de diversas danças populares, incluindo o frevo. O BPR teve como principal mestre de frevo Nascimento do Passo, no entanto, sua abordagem do frevo – que tinha como principal interesse dialogar com o cenário de dança cênica, teatral – implementa diversas diferenças não só no nome dado aos passos, mas na posição das pernas, da coluna, na relação que o dançarino deve estabelecer com o público e no incremento de células coreografadas (não improvisadas) e de desenhos coreográficos para conjuntos sincrônicos de bailarinos. Essas duas escolas constroem, em paralelo, visões sobre o frevo, didáticas de transmissão e de execução e influenciam diversos grupos de dança que, a partir de meados da década de 80, se multiplicam pela cidade. O enfoque de cada grupo, seus bailarinos e alunos fazem variar a relação com a música, a dedicação ou não aos passos mais acrobáticos, o investimento na criatividade e improvisação, a velocidade da dança, a inserção de movimentos de outras danças e técnicas corporais. Esses diálogos retornam às ruas, nas festas carnavalescas e eventos de frevo, na alimentação contínua de uma dinâmica cultural que atravessa as fronteiras formais da arte e do cotidiano. Enfim, a dança do frevo é cada vez mais um substantivo plural.

Reprodução

principais passistas dessa época eram Doca da Ilha do Leite, Egídio Ferreira, Coruja, Marise, Farinha Ruim, Sete Flechas, Pinico de Afogados e Nascimento do Passo. Imagino que o destaque dado aos passistas e o estímulo do concurso tornaram a dança do frevo cada vez mais especializada, com movimentos novos e novas conexões surgindo a cada ano e sendo rapidamente incorporados pelos praticantes da dança. Lembrando dessa época, fica difícil imaginar como o frevo perdeu importância nas décadas seguintes. Acredita-se que o fim dos estúdios ao vivo das rádios, a ditadura e o programa habitacional que conduziu a população para COHABs, moradias populares construídas longe do centro da cidade, foram alguns fatores que ajudaram a diminuir a força popular do frevo. Tanto que, em 1971, dos 100 clubesde-rua que existiam em 1900, apenas oito restavam, como conta Valdemar de Oliveira no seu Frevo, Capoeira e Passo. É nessa época que Nascimento do Passo volta de Manaus (sua cidade natal), onde passou três anos, com a idéia de lutar pela divulgação do frevo. Em 1973, funda a Escola de Frevo Nascimento do Passo, sem sede, que se instalava pelas ruas e clubes da região metropolitana, ensinando o passo e pregando a prática do frevo durante todo o ano. Esse é um momento de apuro da dança que passa a ter uma técnica de aprendizado e execução nomeada e reconhecida. Outro momento importante na estrutura da dança do frevo é a criação do Balé Popular do Recife, em

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do pintor Euclides Francisco Amâncio, mais conhecido como Bajado (1916 – 1996). Também como o frevo, o matuto de Maraial (PE) descobriu no Sítio Histórico o seu lugar, de onde pôde, encostado na janela de sua casa na rua do Amparo, buscar inspiração para suas obras, quase sempre pinturas em óleo sobre eucatex que reverenciam personagens do Carnaval, cujo pano de fundo costumam ser as troças de frevo. Foi assim que Bajado conseguiu imprimir um estilo original, valendo-se de um aprendizado próprio, uma ingenuidade e uma despretensão que o caracterizou como um grande artista naïf, tão popular quanto as suas criações. Talvez por ter se transformado em “um artista de Olinda”, como assinava nas telas, ou seja, por ter uma

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Ao longo desses 100 anos de história, o frevo esteve tão presente nas telas quanto nas ruas. A representação do ritmo nas artes plásticas sempre funcionou, em grande parte, como uma espécie de espelho da própria manifestação – figurativa, colorida e, sobretudo, espontânea. Assim é até hoje. Desenhos, pinturas, esculturas, gravuras e outros suportes aparecem aos montes, quando o tema é carnavalesco, muitas vezes dialogando com a estética do artesanato. No entanto, só alguns grandes artistas conseguiram imortalizar, com maestria, a arte fervorosa de passistas, blocos e orquestras. Alguns deles, inclusive, se tornaram consagrados a partir do ritmo que nasceu no asfalto recifense, mas encontrou sua casa nas ladeiras de Olinda. É o caso

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O frevo é bom – óleo sobre eucatex (1972) – Bajado

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Para grande parte dos foliões, hoje em dia, esse é o frevo que se dança no carnaval. No entanto, enquanto dança, esse é apenas um pedacinho de uma imensidão de movimentos, dinâmicas, trejeitos e subjetividade que constituem o frevo. Pois o frevo, dança, é uma arte de complexos movimentos e composições coreográficas – improvisadas ou não – que reaviva no corpo a ebulição, o prazer, a explosão, a criatividade corporal individual, a partir de um repertório de movimentos coletivizados. Esse frevo, que tem como símbolo a sombrinha colorida, emerge no meio da multidão do carnaval, abrindo rodas para assistir à evolução dos passistas, ou como parte do desfile dos blocos carnavalescos. Mas é uma dança que, assim como a música do frevo, tem vida própria como uma arte corporal que cada vez mais se especializa e se multiplica em diferentes formas de expressão.

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1979. Grupo profissional de dança, o Balé Popular do Recife (BPR) catalogou e criou uma versão para palco de diversas danças populares, incluindo o frevo. O BPR teve como principal mestre de frevo Nascimento do Passo, no entanto, sua abordagem do frevo – que tinha como principal interesse dialogar com o cenário de dança cênica, teatral – implementa diversas diferenças não só no nome dado aos passos, mas na posição das pernas, da coluna, na relação que o dançarino deve estabelecer com o público e no incremento de células coreografadas (não improvisadas) e de desenhos coreográficos para conjuntos sincrônicos de bailarinos. Essas duas escolas constroem, em paralelo, visões sobre o frevo, didáticas de transmissão e de execução e influenciam diversos grupos de dança que, a partir de meados da década de 80, se multiplicam pela cidade. O enfoque de cada grupo, seus bailarinos e alunos fazem variar a relação com a música, a dedicação ou não aos passos mais acrobáticos, o investimento na criatividade e improvisação, a velocidade da dança, a inserção de movimentos de outras danças e técnicas corporais. Esses diálogos retornam às ruas, nas festas carnavalescas e eventos de frevo, na alimentação contínua de uma dinâmica cultural que atravessa as fronteiras formais da arte e do cotidiano. Enfim, a dança do frevo é cada vez mais um substantivo plural.

Sombras do frevo – foto de Alexandre Berzin (1950)

Que dança é essa... O frevo é uma dança complexa e singular no panorama das criações brasileiras. No frevo, pouco se vê do movimento tipicamente afro-brasileiro – ondulado, sensual ou tipicamente indígena – com pisadas arrastadas, ou tipicamente europeu – danças de salão, dança clássica. O frevo hibridiza essas informações, criando um novo produto que só o olhar apurado pode encontrar conexões entre essas culturas do movimento. Alguns estudiosos, citados genericamente por Guerra-Peixe, quiseram encontrar origem eslava para a dança do frevo, sem conseguir indicar por onde danças russas teriam alcançado as pessoas do Recife no século 19 e início do século 20. Arrisco-me a inserir essa teoria na histórica tendência das elites recifenses de tentar criar um carnaval à moda européia e também na

Valéria Vicente é jornalista, bailarina, coreógrafa e coordenadora do Acervo RecorDança.

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contínua relação colonial que só pode reconhecer arte, beleza e sofisticação nos padrões europeus. Já na década de 1960, Waldemar de Oliveira apresentou, de forma inconteste, a relação do frevo com a capoeira. Ao que sublinho acrescentando – uma relação com a cultura corporal africana, como o afoxé, o maracatu e tantas outras danças categorizadas como afro-brasileiras, e com os movimentos urbanos das populações recém-libertas do regime escravista, que trazem no corpo a memória e a vivência da violência. A movimentação do frevo deriva diretamente da lógica de movimentação corporal da capoeira que era praticada no Recife no início do século 20. Nessa época, a capoeira, que provavelmente tem mais semelhança com o que hoje conhecemos como capoeiraangola, era proibida por lei. A comparação da prática da

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Alguns saltinhos e pequenos chutes acompanhando a marcação binária da percussão de uma orquestra de frevo são suficientes para dançar o frevo. Para o folião, a “técnica” consiste em deixar a música ativar a vontade de mexer o corpo, soltar o peso do jeito que der, desequilibrando-se e encontrando apoio nos corpos ao redor, também em movimento. Nesse sentido, pode-se até dizer que o frevo é uma dança que se dança junto, trocando pequenos ou grandes empurrões, enquanto o cortejo se desloca por ruas e ladeiras, cantando músicas, batendo palmas, num frevedouro (como se dizia no começo do século 20) atrás da orquestra. No entanto, desse empurraempurra, o olhar atento vai descobrindo pequenas variações: pessoas tocam a ponta dos pés e o calcanhar no chão, agacham-se, saltam um pouco mais alto. São os passos do frevo, movimentos que provocam calor, alegria, pulsação cardíaca.

A dança do frevo pelo olhar de uma dançarina Valéria Vicente

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Carlos Eduardo Amaral é jornalista.

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também foi, durante muito tempo, uma das escolas mais presentes entre aqueles que queriam resgatar as manifestações culturais construtoras de uma identidade local. Não poderia ser diferente: o frevo é muito nosso. E nasceu, não por acaso, com as vanguardas e as transformações industriais dos centros urbanos, entre o final do século 19 e o início do 20, ganhando força a partir do final dos anos 40, quando voltou a fazer parte, de fato, da grande festa pernambucana. Foi justamente nessa época que se destacou, no Recife, a produção de um dos maiores nomes das artes plásticas do Estado, e do país: o artista plástico modernista Lula Cardoso Ayres (1910 – 1987), que também travou com o Carnaval uma relação fundamental. Primeiro com o do Rio de Janeiro, cidade onde morou muitos anos, e, em seguida, com o do Recife, sua terra natal, cuja festa foi exaustivamente retratada por ele em suas telas modernistas ou mesmo nas suas fotografias, igualmente importantes.

advertia que era preciso aceitar todas as manifestações musicais do território brasileiro, étnicas ou não, e contrapontuava, lembrando que não era possível a orquestração ou a harmonia assumirem uma forma nacional, porque esta é contida nos ritmos e melodias autóctones. O meio-termo indicado para os compositores, portanto, era aspirar a uma música universal assimilando as formas folclóricas no subconsciente e materializá-las em obras de maior alcance sem explorá-las exoticamente. Cussy de Almeida assinala que, dentro de uma ótica etnológica, a influência africana é certa na dança do frevo (Guerra Peixe defendia uma origem gitanoeslava dos passos, a qual nunca comprovou através de um estudo) bem como a formação instrumental e a evolução harmônica que incrementaram a composição popular no geral ao longo do século 20, imprimindo uma síncope mais ousada ao frevo. “O improviso já existente nos anos 20 e 30 voltou ser moda (vide Spok e sua orquestra) e a dança ficou mais rica e mais criativa, com os breques, paradinhas, e passos também improvisados ao som de acordes e melodias enriquecidos por harmonias contemporâneas”. Esses são os ingredientes do caldeirão musical que fervilha nas ruas do Grande Recife. De qualquer forma, se alguém pegar o Perpetuum mobile de Strauss Jr., perceberá os elementos que foram apontados lá no primeiro parágrafo. Se tal ligação for redescoberta e sensibilizar os arranjadores de frevo, não será nenhuma fantasia ouvir o rei das valsas e polcas nas ladeiras de Olinda ou no Galo da Madrugada. E o público, sem saber, ir no embalo de “Sob raios e trovões”, da “Polca húngara” ou da “Polca da champanhe”.

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proximidade tão estreita com a terra do Carnaval e seu povo, Bajado tenha sido um dos mais (senão o mais) importantes artistas plásticos relacionados ao gênero pernambucano. E conseguiu ser muito autêntico por isso, em suas milhares de simpáticas pinturas que reiteram constantemente uma declaração de amor ao Carnaval local – às vezes até com frases na própria tela. Foi ele quem criou, inclusive, estandartes para troças famosas (Elefante, Vassourinhas etc.), como registra o frevo-canção “Bicho Maluco” Beleza, de Alceu Valença. “Ele era muito carnavalesco. Brincava carnaval de verdade. Nem sei como ele agüentava. Brincou até uns 75 anos. Saía de casa e só aparecia depois do (Bacalhau do) Batata”, conta uma das filhas de Bajado, Gizelda Pereira Amâncio, no catálogo do 6º Olinda Arte em Toda Parte, evento que homenageou o artista, em 2006, pelos 10 anos de sua morte. Se, por um lado, a arte naïf tem sido tão cara à história do frevo, em particular pela autêntica contribuição de Bajado, por outro, a arte moderna

Carnaval em Olinda – óleo sobre eucatex (1980) – Bajado Passistas – óleo sobre tela (1950) – Lula Cardoso Ayres

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sistema de oposições entre quadril/pernas/tronco e braços/tronco/cabeça. Dançar o frevo é articular esses complexos sistemas de movimento com criatividade na ligação de um sistema para o outro e inspirando-se nas variações complexas da música.

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sentar sobre os calcanhares) e a estabilização do corpo. Com a base da coluna levemente curvada, a repercussão orgânica do corpo é curvar também o topo da coluna, deixando a cabeça levemente para baixo, criando um arco nas costas que varia de acordo com cada corpo, mas que nos ajuda a entender porque muitos passistas (principalmente os chamados passistas de rua ou passistas tradicionais) dançam olhando para si mesmos – é uma tendência de conforto para o próprio corpo. Essa movimentação da cabeça é menos observada na capoeira, pois, por tratar-se de uma luta ou um jogo, o olhar do capoerista não deve desviar do oponente. Já para o passista, a posição da cabeça é uma opção que varia de acordo com a relação que queira criar com sua platéia. Contagiado pela marcação dos dobrados e marchas mais acelerados, pois a música do frevo também estava sendo gestada nas ruas, o passista, ao articular os movimentos nessa marcação, aumentou a velocidade dos movimentos e transformou as informações da capoeira. A aceleração e os saltos proporcionam a ativação de uma energia mais frenética que a da capoeira. Um novo jogo é então estabelecido. O jogo da dança do frevo em que o passista testa o limite do seu equilíbrio e agilidade de diversas maneiras. Seja trocando as posições das pernas sem sair do eixo, seja transferindo o centro do corpo de um ponto a outro alcançando posições impensáveis, seja curvando todo o corpo para frente e para trás (alternando ponta de pé e calcanhar), seja desafiando a gravidade com saltos – em posições nem sempre geométricas, seja suspendendo seu peso a ponto de se apoiar ou até andar sobre o peito dos pés (como no movimento “bailarina”), ou articulando, ao mesmo tempo, um

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Breve história do movimento Apesar da comemoração oficial da existência do frevo utilizar a data de 1907 – quando pela primeira vez foi publicado esse termo para denominar a nova forma de brincar o carnaval – tanto a dança quanto a música frevo são desenvolvidas durante a segunda metade do século 19, nas festas e eventos públicos do Recife. Como exemplo desse processo, podemos citar o conto de Luiz de Guimarães Jr. , publicado em 1871, que descreve um personagem popular em festa local: “Morava em Olinda; nas redondezas de 40 léguas não se começava um samba sem ele chegar – ‘Ferva o samba minha gente! Entra na roda Teto! – Dançava como um corisco e pulava como um macaco! Corta jaca, Teto! O passo da tesoura! O caranguejo!”. Esse trecho contém muitos dos elementos do frevo: o uso do termo ferver – que dará origem ao nome frevo; a descrição da dança como algo de tônus violento e saltitante e os nomes dos movimentos, que eram batizados e se tornavam recorrentes. Dançar frevo, no cotidiano era chamado “fazer o passo” e é isso que dá nome à dança do frevo, batizada como passo. Assim, o dançarino do frevo passou a ser chamado passista. Na década de 1950, o frevo era a grande sensação do carnaval pernambucano. Maestros como Antônio Bandeira, Capiba e Levino Ferreira se dedicavam ao ritmo, criando grandes composições. Época também em que as rádios locais como a Rádio Clube e a Rádio Tamandaré tinham suas próprias orquestras de frevo e promoviam concursos de passo. Esses concursos, dedicados a decidir o melhor passista do ano, davam destaque aos dançarinos do frevo e visibilidade a essa dança. Os

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capoeira-angola com a forma de dançar de passistas nos permite fazer várias conexões entre muitos movimentos e, principalmente, com as formas de criar alavancas com as pernas, para se deslocar com movimentos rasteiros e encontrar apoio para se elevar. Alguns dos movimentos do frevo, quando executados lentamente, são praticamente idênticos a movimentos da capoeira, como a ginga, os movimentos de negativa, o rabo-de-arraia, a queda de quatro. Elementos advindos do jogo, como as mudanças abruptas para surpreender o oponente, a descontração do corpo que parece estar apenas brincando, quando está prestes a dar um chute violento, e as variações de ginga, que no frevo ganham o nome de mugangas, também podem ser ligados a características do frevo. Além disso, os movimentos rasteiros da capoeira fortalecem a musculatura interna das pernas, trabalham a flexão total de joelhos e a extensão total dos artelhos (pertinentes à batata da perna), músculos e tendões, cuja força e flexibilidade são indispensáveis para conseguir executar muitos dos passos de frevo. No entanto, mais do que preparação para o frevo, a capoeira pode ser vista como o tipo de lógica de organização do corpo que permite a criação do frevo. Um corpo forte, flexível, educado na prontidão e na malícia (no sentido que tem na capoeira de leve ironia, de disfarçada distração para atrair o oponente a emboscadas). Um detalhe importante na dança do frevo que ganha variações com o desenrolar do século 20 é a posição da coluna. Na prática da capoeira-angola, a coluna lombar gira levemente para frente, o que permite uma maior liberdade de articulação da coxa em posições variadas, um certo relaxamento do quadril na execução de movimentos rasteiros (ensinado pela expressão de

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Olívia Mindêlo é jornalista.

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obra em homenagem ao frevo. Trata-se de uma escultura feita em bronze, com cerca de três toneladas e mais de 7 metros de altura. O Monumento ao Frevo, encomendado pela Prefeitura do Recife para ser colocado num canteiro em frente ao Aeroporto Internacional dos Guararapes Gilberto Freyre, na Avenida Mascarenhas de Moraes, no Recife, onde se encontra desde então. Na obra, mais uma vez a figura dos passistas é ressaltada. São três deles, sendo um com sombrinha, aglomerados, como na obra de Lula Cardoso Ayres. Corbiniano Lins (1924), também pernambucano, é outro que, nas suas esculturas de alumínio ou serigrafias, reverenciou com competência a cultura popular pernambucana, inclusive o frevo. Mas sua homenagem ao ritmo não é tão conhecida, visto que as figuras femininas e as manifestações afro-brasileiras se tornaram mais evidentes em seu trabalho. “Eu não sou tão carnavalesco quanto o meu pai, mas eu gosto do frevo e do folclore, de um modo geral”, confessa Corbiniano. O pouco que fez pelo frevo, no entanto, é interessante. Possui, por sinal, duas peças ainda desconhecidas em seu ateliê. Também representou o frevo de forma peculiar o pintor Luis Soares, o modernista Vicente do Rego Monteiro, o xilogravurista Jota Borges, o pintor modernista Augusto Rodrigues e o japonês radicado no Brasil, Flávio Shiró. Cinza ou colorido, pintura ou escultura, simples ou elaborado, modernista ou naïf, todos têm sido responsáveis por ajudar a eternizar esse ritmo tão pictórico e plástico por natureza.

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brasileira. Aí está um campo fértil para a análise lingüística no âmbito dos estudos sobre a mudança social, incluindo relações de poder e dominação, objeto da instigante área da análise crítica do discurso. Exemplos famosos são “O Teu Cabelo Não Nega” (Irmãos Valença), que reproduz sem muita sutileza o discurso racista (“mas como a cor não pega, mulata, mulata eu quero teu amor”) ou ainda “Cala a boca, menino” (Capiba), que aborda o grave problema da violência contra a mulher. Há a crônica de costumes: “Menina de hoje não quer fantasia/ só vai à escola pra fazer folia [...]/ de calça comprida, cigarro e boné/ já fez seu programa, vou dizer o que é/ dar o braço ao seu playboy, entrar no Lunik/ ir lá detrás da lua fazer piquenique” (Manuel Gilberto), registro de hábitos femininos considerados avançados para a época, final dos anos 50, no contexto da corrida espacial, da Guerra Fria e da invasão cultural norte-americana, tudo isso presente na canção. O lingüista e compositor Luiz Tatit assinala que “a canção sempre foi uma dimensão potencializada da fala”, ou seja, “cantar é também dizer algo, só que de um modo especial”. E o frevo-canção incorpora a

Uma das obras mais famosas de Lula Cardoso Ayres para o ritmo genuíno chama-se O Frevo, um óleo sobre tela de 1945. Colorida, mas com paleta muito mais sóbria do que a de Bajado, a pintura evidencia o alvoroço de pernas e cabeças de passistas brincando na rua. Mesmo com a clara influência de vanguardas européias, a tela nos traz ao olhar um traço de um brasileiro tão preocupado com o seu povo quanto um Cândido Portinari ou uma Tarsila do Amaral, por exemplo. Portanto, o seu recorte sobre o frevo reflete sua admiração e seu respeito pelas manifestações populares como um todo. O maracatu, o bumba-meu-boi e o cavalo-marinho também permeiam a sua produção. Para Lula Cardoso Ayres Filho, responsável pelo acervo do pai, foi no frevo, e no Carnaval, que o pintor “teve todas as condições de exercitar a riqueza e o movimento das cores no seu trabalho, trazendo para as telas a dinâmica dos passistas, entrelaçando braços e pernas, luzes e sombras”. Não é por acaso que o artista assinou diversos projetos de decoração

dos bailes carnavalescos de clube da cidade, em especial o Clube Internacional do Recife e o Iate Clube do Recife. Foi também o primeiro a decorar, com planejamento, o Carnaval de rua da capital, em meados do século 20, na gestão do então prefeito José do Rego Maciel. Os seus croquis e desenhos para essas festas, quase sempre marcados pelo traço figurativo geométrico, assim como seus trabalhos de ode ao frevo, encontram-se expostos atualmente no Instituto Lula Cardoso Ayres, em Jaboatão dos Guararapes, onde está guardado o seu acervo. Alguns deles serão utilizados pelo arquiteto Carlos Augusto Lira na decoração do carnaval do Recife deste ano, que homenageia o pintor, coincidentemente no centenário do frevo, que promete fazer desta uma das festas de momo mais belas dos últimos anos. Do papel à forma – Outro nome de fundamental importância para as artes plásticas nesse sentido é o do pernambucano Abelardo da Hora. Como Lula,

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lirismo dos antigos.” (Diario de Pernambuco, 20/01/99). Tal discurso adotado pela imprensa revela o desconhecimento sobre a dinâmica da evolução do frevo-de-bloco, sobretudo a partir dos anos 90, quando surge grande número de agremiações, muitas registrando sua produção em CD e protagonizando momentos de celebração em diversos eventos no Carnaval e ao longo do ano inteiro. O frevo-canção é originalmente marcado pela vinculação às primeiras agremiações carnavalescas do Recife: os clubes de alegorias e críticas e os clubes pedestres. Inicialmente conhecido como marcha pernambucana, a partir dos anos 30 foi gravado por cantores consagrados nacionalmente, a exemplo de Francisco Alves, Mário Reis, Carlos Galhardo, Araci de Almeida, além de Expedito Baracho e Claudionor Germano. Sobre as letras, sua feição narrativa e descritiva as aproxima de um gênero literário muitas vezes considerado menor, mas de reconhecida importância para nossa cultura: a crônica. De fato, há inúmeros exemplos de breves relatos da vida

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Encontro de blocos no Recife Antigo

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Chaves); “Vitória-Régia (...)/ És o poema, o tema e a lira / E a flor que inspira nosso carnaval” (Romero Amorim/Getúlio Cavalcanti); “Vem conhecer o que é harmonia (...) / O Inocentes apresenta um lindo panorama de folião” (Luiz de França). O tempo empregado é o presente, e muitos exemplos caracterizam a função conativa (ou apelativa) da linguagem, a ação verbal orientada ao destinatário na forma de uma exortação, chamamento ou evocação: “Acorda que chegou a hora /vamos cair na folia” (João Santiago); “Vem, vem, vem folião/ vem que o Recife te espera”(José Moraes); “Não deixem Batutas morrer” (Álvaro Alvim). Trata-se de suscitar uma nova leitura sobre esse gênero às vezes estigmatizado como algo exclusivo de foliões mais velhos, visão distorcida que reproduz o etarismo (preconceito contra pessoas de idade avançada). A respeito do lirismo dos blocos, já se afirmou, inclusive, por absurdo que pareça, que ele seria o “culpado” por uma suposta estagnação do frevo, tal como se publicou em 1999: “[...] dá pra arriscar mais um motivo que explica a falta de inovação do frevo. Os novos frevistas herdaram o

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música como valiosos traços de nossa identidade. O bloco não é apenas uma “manifestação propositadamente passadista”, como já se disse por aí, mas um espaço de convivência humana marcado pela arte e pela defesa de uma tradição que, reinaugurada a partir dos anos 70 pelo Bloco da Saudade, renova-se a cada carnaval, agregando muitos jovens e crianças. Uma olhada mais atenta às letras revela não apenas a saudade antecipada, nas marchas-regresso, quando se aproxima a quarta-feira; ou a saudade de uma época passada, como em “Evocação nº 1” (Nelson Ferreira) e “Relembrando o Passado” (João Santiago), dos anos 50, então já extinta grande parte dos blocos da primeira geração. Há mesmo um discurso pautado pelo intuito de enaltecer e exaltar valores. O frevo-de-bloco tem se constituído, assim, como grande propaganda, enfocando a cidade, o carnaval ou as próprias agremiações. Com base no discurso persuasivo, busca-se a adesão do ouvinte/leitor, com o emprego de substantivos, adjetivos e verbos que ressaltam qualidades: “O Cordas e Retalhos (...) reúne foliões, espalha alegria/ evoluindo com graça e harmonia” (Airton, Leila e Eliane 11:20 AM

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sempre teve uma proximidade grande com o Modernismo, estética que influencia até hoje suas gravuras, murais e, sobretudo, esculturas. Como Bajado, é muito carnavalesco. Seu irmão é ninguém menos do que o cantor Claudionor Germano. Temperos, portanto, que batem diretamente na sua produção, cuja obra gira em torno do tripé figura feminina, problemática social e manifestações populares. “Minha família sempre foi foliã e muito ligada à cultura do povo nordestino, que eu retrato até hoje”, diz o escultor, que ainda arrisca um passo de frevo, aos 82 anos. A ligação se refletiu, primeiramente, na década de 60, quando desenvolveu Danças Brasileiras de Carnaval, série de 15 desenhos em bico-de-pena sobre papel. Para cada trabalho, um ritmo: tem samba, maracatu, caboclinho e frevo, que também retratam passistas em movimento. Um traço fino e geométrico, quase cubista. O trabalho foi exposto, inicialmente, em 1967, na Galeria Mirante das Artes, em São Paulo, e hoje se encontra na casa do artista, no bairro da Boa Vista. Em 1975, desenhou o projeto de um mural de danças populares que nunca saiu do papel, mas foi 30 anos depois, em 2005, que Abelardo concluiu sua maior

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Letras do frevo

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Somente duas vertentes do frevo admitem a palavra cantada Júlio Vila Nova

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No passo das comemorações pelo centenário de registro da palavra frevo, são válidas iniciativas de análise para a compreensão dos significados dessa música que “faz demais a gente se distinguir” (João Santiago, “Sabe lá o que é isso”). Reconhecidas a altíssima qualidade e riqueza rítmica, harmônica e melódica, ressaltamos também a importância de suas letras. À parte o frevo-de-rua, instrumental, contagiante, que atravessa ondas de revigoramento criativo, nos sopros geniais de um Edson Rodrigues ou de um Spok, tratamos das duas vertentes do frevo que admitem a palavra cantada (frevo-de-bloco e frevo-canção) para buscar entender, afinal, o que dizem as letras. O frevo-de-bloco surge com um interessante dado sociológico: o início da efetiva participação da mulher (sobretudo da classe média) na folia de rua do

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Recife, nos “blocos mistos”, começo do século 20. A tendência atual, porém, é a de se adotar a denominação “blocos carnavalescos líricos”, inscrita pela primeira vez num flabelo (cartaz abre-alas) pelo Cordas e Retalhos, a partir de 2001. Resultado de influências como o pastoril e ranchos de Reis, além da música dos saraus promovidos pelas famílias dos bairros centrais do Recife, o frevo-de-bloco definiuse pelo caráter sentimental, lírico. Daí a pertinência do nome, bem a propósito de uma necessária releitura desse gênero, freqüentemente abordado na imprensa como monocórdio, baseado apenas no tema da saudade. Amílcar Bezerra e Lucas Victor, no livro Evoluções! Histórias de Bloco e de Saudade, observam que “saudade, carnaval e identidade são inseparáveis”, importantes para se compreender os blocos e sua

Monumento ao Frevo – escultura em bronze (2005) – Abelardo da Hora

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Chaves); “Vitória-Régia (...)/ És o poema, o tema e a lira / E a flor que inspira nosso carnaval” (Romero Amorim/Getúlio Cavalcanti); “Vem conhecer o que é harmonia (...) / O Inocentes apresenta um lindo panorama de folião” (Luiz de França). O tempo empregado é o presente, e muitos exemplos caracterizam a função conativa (ou apelativa) da linguagem, a ação verbal orientada ao destinatário na forma de uma exortação, chamamento ou evocação: “Acorda que chegou a hora /vamos cair na folia” (João Santiago); “Vem, vem, vem folião/ vem que o Recife te espera”(José Moraes); “Não deixem Batutas morrer” (Álvaro Alvim). Trata-se de suscitar uma nova leitura sobre esse gênero às vezes estigmatizado como algo exclusivo de foliões mais velhos, visão distorcida que reproduz o etarismo (preconceito contra pessoas de idade avançada). A respeito do lirismo dos blocos, já se afirmou, inclusive, por absurdo que pareça, que ele seria o “culpado” por uma suposta estagnação do frevo, tal como se publicou em 1999: “[...] dá pra arriscar mais um motivo que explica a falta de inovação do frevo. Os novos frevistas herdaram o

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música como valiosos traços de nossa identidade. O bloco não é apenas uma “manifestação propositadamente passadista”, como já se disse por aí, mas um espaço de convivência humana marcado pela arte e pela defesa de uma tradição que, reinaugurada a partir dos anos 70 pelo Bloco da Saudade, renova-se a cada carnaval, agregando muitos jovens e crianças. Uma olhada mais atenta às letras revela não apenas a saudade antecipada, nas marchas-regresso, quando se aproxima a quarta-feira; ou a saudade de uma época passada, como em “Evocação nº 1” (Nelson Ferreira) e “Relembrando o Passado” (João Santiago), dos anos 50, então já extinta grande parte dos blocos da primeira geração. Há mesmo um discurso pautado pelo intuito de enaltecer e exaltar valores. O frevo-de-bloco tem se constituído, assim, como grande propaganda, enfocando a cidade, o carnaval ou as próprias agremiações. Com base no discurso persuasivo, busca-se a adesão do ouvinte/leitor, com o emprego de substantivos, adjetivos e verbos que ressaltam qualidades: “O Cordas e Retalhos (...) reúne foliões, espalha alegria/ evoluindo com graça e harmonia” (Airton, Leila e Eliane 11:20 AM

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Letras do frevo No passo das comemorações pelo centenário de registro da palavra frevo, são válidas iniciativas de análise para a compreensão dos significados dessa música que “faz demais a gente se distinguir” (João Santiago, “Sabe lá o que é isso”). Reconhecidas a altíssima qualidade e riqueza rítmica, harmônica e melódica, ressaltamos também a importância de suas letras. À parte o frevo-de-rua, instrumental, contagiante, que atravessa ondas de revigoramento criativo, nos sopros geniais de um Edson Rodrigues ou de um Spok, tratamos das duas vertentes do frevo que admitem a palavra cantada (frevo-de-bloco e frevo-canção) para buscar entender, afinal, o que dizem as letras. O frevo-de-bloco surge com um interessante dado sociológico: o início da efetiva participação da mulher (sobretudo da classe média) na folia de rua do

Recife, nos “blocos mistos”, começo do século 20. A tendência atual, porém, é a de se adotar a denominação “blocos carnavalescos líricos”, inscrita pela primeira vez num flabelo (cartaz abre-alas) pelo Cordas e Retalhos, a partir de 2001. Resultado de influências como o pastoril e ranchos de Reis, além da música dos saraus promovidos pelas famílias dos bairros centrais do Recife, o frevo-de-bloco definiuse pelo caráter sentimental, lírico. Daí a pertinência do nome, bem a propósito de uma necessária releitura desse gênero, freqüentemente abordado na imprensa como monocórdio, baseado apenas no tema da saudade. Amílcar Bezerra e Lucas Victor, no livro Evoluções! Histórias de Bloco e de Saudade, observam que “saudade, carnaval e identidade são inseparáveis”, importantes para se compreender os blocos e sua

Monumento ao Frevo – escultura em bronze (2005) – Abelardo da Hora

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Somente duas vertentes do frevo admitem a palavra cantada Júlio Vila Nova

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sempre teve uma proximidade grande com o Modernismo, estética que influencia até hoje suas gravuras, murais e, sobretudo, esculturas. Como Bajado, é muito carnavalesco. Seu irmão é ninguém menos do que o cantor Claudionor Germano. Temperos, portanto, que batem diretamente na sua produção, cuja obra gira em torno do tripé figura feminina, problemática social e manifestações populares. “Minha família sempre foi foliã e muito ligada à cultura do povo nordestino, que eu retrato até hoje”, diz o escultor, que ainda arrisca um passo de frevo, aos 82 anos. A ligação se refletiu, primeiramente, na década de 60, quando desenvolveu Danças Brasileiras de Carnaval, série de 15 desenhos em bico-de-pena sobre papel. Para cada trabalho, um ritmo: tem samba, maracatu, caboclinho e frevo, que também retratam passistas em movimento. Um traço fino e geométrico, quase cubista. O trabalho foi exposto, inicialmente, em 1967, na Galeria Mirante das Artes, em São Paulo, e hoje se encontra na casa do artista, no bairro da Boa Vista. Em 1975, desenhou o projeto de um mural de danças populares que nunca saiu do papel, mas foi 30 anos depois, em 2005, que Abelardo concluiu sua maior


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lirismo dos antigos.” (Diario de Pernambuco, 20/01/99). Tal discurso adotado pela imprensa revela o desconhecimento sobre a dinâmica da evolução do frevo-de-bloco, sobretudo a partir dos anos 90, quando surge grande número de agremiações, muitas registrando sua produção em CD e protagonizando momentos de celebração em diversos eventos no Carnaval e ao longo do ano inteiro. O frevo-canção é originalmente marcado pela vinculação às primeiras agremiações carnavalescas do Recife: os clubes de alegorias e críticas e os clubes pedestres. Inicialmente conhecido como marcha pernambucana, a partir dos anos 30 foi gravado por cantores consagrados nacionalmente, a exemplo de Francisco Alves, Mário Reis, Carlos Galhardo, Araci de Almeida, além de Expedito Baracho e Claudionor Germano. Sobre as letras, sua feição narrativa e descritiva as aproxima de um gênero literário muitas vezes considerado menor, mas de reconhecida importância para nossa cultura: a crônica. De fato, há inúmeros exemplos de breves relatos da vida

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Uma das obras mais famosas de Lula Cardoso Ayres para o ritmo genuíno chama-se O Frevo, um óleo sobre tela de 1945. Colorida, mas com paleta muito mais sóbria do que a de Bajado, a pintura evidencia o alvoroço de pernas e cabeças de passistas brincando na rua. Mesmo com a clara influência de vanguardas européias, a tela nos traz ao olhar um traço de um brasileiro tão preocupado com o seu povo quanto um Cândido Portinari ou uma Tarsila do Amaral, por exemplo. Portanto, o seu recorte sobre o frevo reflete sua admiração e seu respeito pelas manifestações populares como um todo. O maracatu, o bumba-meu-boi e o cavalo-marinho também permeiam a sua produção. Para Lula Cardoso Ayres Filho, responsável pelo acervo do pai, foi no frevo, e no Carnaval, que o pintor “teve todas as condições de exercitar a riqueza e o movimento das cores no seu trabalho, trazendo para as telas a dinâmica dos passistas, entrelaçando braços e pernas, luzes e sombras”. Não é por acaso que o artista assinou diversos projetos de decoração

brasileira. Aí está um campo fértil para a análise lingüística no âmbito dos estudos sobre a mudança social, incluindo relações de poder e dominação, objeto da instigante área da análise crítica do discurso. Exemplos famosos são “O Teu Cabelo Não Nega” (Irmãos Valença), que reproduz sem muita sutileza o discurso racista (“mas como a cor não pega, mulata, mulata eu quero teu amor”) ou ainda “Cala a boca, menino” (Capiba), que aborda o grave problema da violência contra a mulher. Há a crônica de costumes: “Menina de hoje não quer fantasia/ só vai à escola pra fazer folia [...]/ de calça comprida, cigarro e boné/ já fez seu programa, vou dizer o que é/ dar o braço ao seu playboy, entrar no Lunik/ ir lá detrás da lua fazer piquenique” (Manuel Gilberto), registro de hábitos femininos considerados avançados para a época, final dos anos 50, no contexto da corrida espacial, da Guerra Fria e da invasão cultural norte-americana, tudo isso presente na canção. O lingüista e compositor Luiz Tatit assinala que “a canção sempre foi uma dimensão potencializada da fala”, ou seja, “cantar é também dizer algo, só que de um modo especial”. E o frevo-canção incorpora a

dos bailes carnavalescos de clube da cidade, em especial o Clube Internacional do Recife e o Iate Clube do Recife. Foi também o primeiro a decorar, com planejamento, o Carnaval de rua da capital, em meados do século 20, na gestão do então prefeito José do Rego Maciel. Os seus croquis e desenhos para essas festas, quase sempre marcados pelo traço figurativo geométrico, assim como seus trabalhos de ode ao frevo, encontram-se expostos atualmente no Instituto Lula Cardoso Ayres, em Jaboatão dos Guararapes, onde está guardado o seu acervo. Alguns deles serão utilizados pelo arquiteto Carlos Augusto Lira na decoração do carnaval do Recife deste ano, que homenageia o pintor, coincidentemente no centenário do frevo, que promete fazer desta uma das festas de momo mais belas dos últimos anos. Do papel à forma – Outro nome de fundamental importância para as artes plásticas nesse sentido é o do pernambucano Abelardo da Hora. Como Lula,

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obra em homenagem ao frevo. Trata-se de uma escultura feita em bronze, com cerca de três toneladas e mais de 7 metros de altura. O Monumento ao Frevo, encomendado pela Prefeitura do Recife para ser colocado num canteiro em frente ao Aeroporto Internacional dos Guararapes Gilberto Freyre, na Avenida Mascarenhas de Moraes, no Recife, onde se encontra desde então. Na obra, mais uma vez a figura dos passistas é ressaltada. São três deles, sendo um com sombrinha, aglomerados, como na obra de Lula Cardoso Ayres. Corbiniano Lins (1924), também pernambucano, é outro que, nas suas esculturas de alumínio ou serigrafias, reverenciou com competência a cultura popular pernambucana, inclusive o frevo. Mas sua homenagem ao ritmo não é tão conhecida, visto que as figuras femininas e as manifestações afro-brasileiras se tornaram mais evidentes em seu trabalho. “Eu não sou tão carnavalesco quanto o meu pai, mas eu gosto do frevo e do folclore, de um modo geral”, confessa Corbiniano. O pouco que fez pelo frevo, no entanto, é interessante. Possui, por sinal, duas peças ainda desconhecidas em seu ateliê. Também representou o frevo de forma peculiar o pintor Luis Soares, o modernista Vicente do Rego Monteiro, o xilogravurista Jota Borges, o pintor modernista Augusto Rodrigues e o japonês radicado no Brasil, Flávio Shiró. Cinza ou colorido, pintura ou escultura, simples ou elaborado, modernista ou naïf, todos têm sido responsáveis por ajudar a eternizar esse ritmo tão pictórico e plástico por natureza. frevo 2.qxd


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Uma das obras mais famosas de Lula Cardoso Ayres para o ritmo genuíno chama-se O Frevo, um óleo sobre tela de 1945. Colorida, mas com paleta muito mais sóbria do que a de Bajado, a pintura evidencia o alvoroço de pernas e cabeças de passistas brincando na rua. Mesmo com a clara influência de vanguardas européias, a tela nos traz ao olhar um traço de um brasileiro tão preocupado com o seu povo quanto um Cândido Portinari ou uma Tarsila do Amaral, por exemplo. Portanto, o seu recorte sobre o frevo reflete sua admiração e seu respeito pelas manifestações populares como um todo. O maracatu, o bumba-meu-boi e o cavalo-marinho também permeiam a sua produção. Para Lula Cardoso Ayres Filho, responsável pelo acervo do pai, foi no frevo, e no Carnaval, que o pintor “teve todas as condições de exercitar a riqueza e o movimento das cores no seu trabalho, trazendo para as telas a dinâmica dos passistas, entrelaçando braços e pernas, luzes e sombras”. Não é por acaso que o artista assinou diversos projetos de decoração

brasileira. Aí está um campo fértil para a análise lingüística no âmbito dos estudos sobre a mudança social, incluindo relações de poder e dominação, objeto da instigante área da análise crítica do discurso. Exemplos famosos são “O Teu Cabelo Não Nega” (Irmãos Valença), que reproduz sem muita sutileza o discurso racista (“mas como a cor não pega, mulata, mulata eu quero teu amor”) ou ainda “Cala a boca, menino” (Capiba), que aborda o grave problema da violência contra a mulher. Há a crônica de costumes: “Menina de hoje não quer fantasia/ só vai à escola pra fazer folia [...]/ de calça comprida, cigarro e boné/ já fez seu programa, vou dizer o que é/ dar o braço ao seu playboy, entrar no Lunik/ ir lá detrás da lua fazer piquenique” (Manuel Gilberto), registro de hábitos femininos considerados avançados para a época, final dos anos 50, no contexto da corrida espacial, da Guerra Fria e da invasão cultural norte-americana, tudo isso presente na canção. O lingüista e compositor Luiz Tatit assinala que “a canção sempre foi uma dimensão potencializada da fala”, ou seja, “cantar é também dizer algo, só que de um modo especial”. E o frevo-canção incorpora a

dos bailes carnavalescos de clube da cidade, em especial o Clube Internacional do Recife e o Iate Clube do Recife. Foi também o primeiro a decorar, com planejamento, o Carnaval de rua da capital, em meados do século 20, na gestão do então prefeito José do Rego Maciel. Os seus croquis e desenhos para essas festas, quase sempre marcados pelo traço figurativo geométrico, assim como seus trabalhos de ode ao frevo, encontram-se expostos atualmente no Instituto Lula Cardoso Ayres, em Jaboatão dos Guararapes, onde está guardado o seu acervo. Alguns deles serão utilizados pelo arquiteto Carlos Augusto Lira na decoração do carnaval do Recife deste ano, que homenageia o pintor, coincidentemente no centenário do frevo, que promete fazer desta uma das festas de momo mais belas dos últimos anos. Do papel à forma – Outro nome de fundamental importância para as artes plásticas nesse sentido é o do pernambucano Abelardo da Hora. Como Lula,

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obra em homenagem ao frevo. Trata-se de uma escultura feita em bronze, com cerca de três toneladas e mais de 7 metros de altura. O Monumento ao Frevo, encomendado pela Prefeitura do Recife para ser colocado num canteiro em frente ao Aeroporto Internacional dos Guararapes Gilberto Freyre, na Avenida Mascarenhas de Moraes, no Recife, onde se encontra desde então. Na obra, mais uma vez a figura dos passistas é ressaltada. São três deles, sendo um com sombrinha, aglomerados, como na obra de Lula Cardoso Ayres. Corbiniano Lins (1924), também pernambucano, é outro que, nas suas esculturas de alumínio ou serigrafias, reverenciou com competência a cultura popular pernambucana, inclusive o frevo. Mas sua homenagem ao ritmo não é tão conhecida, visto que as figuras femininas e as manifestações afro-brasileiras se tornaram mais evidentes em seu trabalho. “Eu não sou tão carnavalesco quanto o meu pai, mas eu gosto do frevo e do folclore, de um modo geral”, confessa Corbiniano. O pouco que fez pelo frevo, no entanto, é interessante. Possui, por sinal, duas peças ainda desconhecidas em seu ateliê. Também representou o frevo de forma peculiar o pintor Luis Soares, o modernista Vicente do Rego Monteiro, o xilogravurista Jota Borges, o pintor modernista Augusto Rodrigues e o japonês radicado no Brasil, Flávio Shiró. Cinza ou colorido, pintura ou escultura, simples ou elaborado, modernista ou naïf, todos têm sido responsáveis por ajudar a eternizar esse ritmo tão pictórico e plástico por natureza. frevo 2.qxd


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música como valiosos traços de nossa identidade. O bloco não é apenas uma “manifestação propositadamente passadista”, como já se disse por aí, mas um espaço de convivência humana marcado pela arte e pela defesa de uma tradição que, reinaugurada a partir dos anos 70 pelo Bloco da Saudade, renova-se a cada carnaval, agregando muitos jovens e crianças. Uma olhada mais atenta às letras revela não apenas a saudade antecipada, nas marchas-regresso, quando se aproxima a quarta-feira; ou a saudade de uma época passada, como em “Evocação nº 1” (Nelson Ferreira) e “Relembrando o Passado” (João Santiago), dos anos 50, então já extinta grande parte dos blocos da primeira geração. Há mesmo um discurso pautado pelo intuito de enaltecer e exaltar valores. O frevo-de-bloco tem se constituído, assim, como grande propaganda, enfocando a cidade, o carnaval ou as próprias agremiações. Com base no discurso persuasivo, busca-se a adesão do ouvinte/leitor, com o emprego de substantivos, adjetivos e verbos que ressaltam qualidades: “O Cordas e Retalhos (...) reúne foliões, espalha alegria/ evoluindo com graça e harmonia” (Airton, Leila e Eliane 11:20 AM

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Letras do frevo No passo das comemorações pelo centenário de registro da palavra frevo, são válidas iniciativas de análise para a compreensão dos significados dessa música que “faz demais a gente se distinguir” (João Santiago, “Sabe lá o que é isso”). Reconhecidas a altíssima qualidade e riqueza rítmica, harmônica e melódica, ressaltamos também a importância de suas letras. À parte o frevo-de-rua, instrumental, contagiante, que atravessa ondas de revigoramento criativo, nos sopros geniais de um Edson Rodrigues ou de um Spok, tratamos das duas vertentes do frevo que admitem a palavra cantada (frevo-de-bloco e frevo-canção) para buscar entender, afinal, o que dizem as letras. O frevo-de-bloco surge com um interessante dado sociológico: o início da efetiva participação da mulher (sobretudo da classe média) na folia de rua do

Recife, nos “blocos mistos”, começo do século 20. A tendência atual, porém, é a de se adotar a denominação “blocos carnavalescos líricos”, inscrita pela primeira vez num flabelo (cartaz abre-alas) pelo Cordas e Retalhos, a partir de 2001. Resultado de influências como o pastoril e ranchos de Reis, além da música dos saraus promovidos pelas famílias dos bairros centrais do Recife, o frevo-de-bloco definiuse pelo caráter sentimental, lírico. Daí a pertinência do nome, bem a propósito de uma necessária releitura desse gênero, freqüentemente abordado na imprensa como monocórdio, baseado apenas no tema da saudade. Amílcar Bezerra e Lucas Victor, no livro Evoluções! Histórias de Bloco e de Saudade, observam que “saudade, carnaval e identidade são inseparáveis”, importantes para se compreender os blocos e sua

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sempre teve uma proximidade grande com o Modernismo, estética que influencia até hoje suas gravuras, murais e, sobretudo, esculturas. Como Bajado, é muito carnavalesco. Seu irmão é ninguém menos do que o cantor Claudionor Germano. Temperos, portanto, que batem diretamente na sua produção, cuja obra gira em torno do tripé figura feminina, problemática social e manifestações populares. “Minha família sempre foi foliã e muito ligada à cultura do povo nordestino, que eu retrato até hoje”, diz o escultor, que ainda arrisca um passo de frevo, aos 82 anos. A ligação se refletiu, primeiramente, na década de 60, quando desenvolveu Danças Brasileiras de Carnaval, série de 15 desenhos em bico-de-pena sobre papel. Para cada trabalho, um ritmo: tem samba, maracatu, caboclinho e frevo, que também retratam passistas em movimento. Um traço fino e geométrico, quase cubista. O trabalho foi exposto, inicialmente, em 1967, na Galeria Mirante das Artes, em São Paulo, e hoje se encontra na casa do artista, no bairro da Boa Vista. Em 1975, desenhou o projeto de um mural de danças populares que nunca saiu do papel, mas foi 30 anos depois, em 2005, que Abelardo concluiu sua maior


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Claudionor Germano, a exemplo de Francisco Alves, Mário Reis e Araci de Almeida, gravou vários frevos-canção

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Chaves); “Vitória-Régia (...)/ És o poema, o tema e a lira / E a flor que inspira nosso carnaval” (Romero Amorim/Getúlio Cavalcanti); “Vem conhecer o que é harmonia (...) / O Inocentes apresenta um lindo panorama de folião” (Luiz de França). O tempo empregado é o presente, e muitos exemplos caracterizam a função conativa (ou apelativa) da linguagem, a ação verbal orientada ao destinatário na forma de uma exortação, chamamento ou evocação: “Acorda que chegou a hora /vamos cair na folia” (João Santiago); “Vem, vem, vem folião/ vem que o Recife te espera”(José Moraes); “Não deixem Batutas morrer” (Álvaro Alvim). Trata-se de suscitar uma nova leitura sobre esse gênero às vezes estigmatizado como algo exclusivo de foliões mais velhos, visão distorcida que reproduz o etarismo (preconceito contra pessoas de idade avançada). A respeito do lirismo dos blocos, já se afirmou, inclusive, por absurdo que pareça, que ele seria o “culpado” por uma suposta estagnação do frevo, tal como se publicou em 1999: “[...] dá pra arriscar mais um motivo que explica a falta de inovação do frevo. Os novos frevistas herdaram o

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música como valiosos traços de nossa identidade. O bloco não é apenas uma “manifestação propositadamente passadista”, como já se disse por aí, mas um espaço de convivência humana marcado pela arte e pela defesa de uma tradição que, reinaugurada a partir dos anos 70 pelo Bloco da Saudade, renova-se a cada carnaval, agregando muitos jovens e crianças. Uma olhada mais atenta às letras revela não apenas a saudade antecipada, nas marchas-regresso, quando se aproxima a quarta-feira; ou a saudade de uma época passada, como em “Evocação nº 1” (Nelson Ferreira) e “Relembrando o Passado” (João Santiago), dos anos 50, então já extinta grande parte dos blocos da primeira geração. Há mesmo um discurso pautado pelo intuito de enaltecer e exaltar valores. O frevo-de-bloco tem se constituído, assim, como grande propaganda, enfocando a cidade, o carnaval ou as próprias agremiações. Com base no discurso persuasivo, busca-se a adesão do ouvinte/leitor, com o emprego de substantivos, adjetivos e verbos que ressaltam qualidades: “O Cordas e Retalhos (...) reúne foliões, espalha alegria/ evoluindo com graça e harmonia” (Airton, Leila e Eliane 11:20 AM

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sempre teve uma proximidade grande com o Modernismo, estética que influencia até hoje suas gravuras, murais e, sobretudo, esculturas. Como Bajado, é muito carnavalesco. Seu irmão é ninguém menos do que o cantor Claudionor Germano. Temperos, portanto, que batem diretamente na sua produção, cuja obra gira em torno do tripé figura feminina, problemática social e manifestações populares. “Minha família sempre foi foliã e muito ligada à cultura do povo nordestino, que eu retrato até hoje”, diz o escultor, que ainda arrisca um passo de frevo, aos 82 anos. A ligação se refletiu, primeiramente, na década de 60, quando desenvolveu Danças Brasileiras de Carnaval, série de 15 desenhos em bico-de-pena sobre papel. Para cada trabalho, um ritmo: tem samba, maracatu, caboclinho e frevo, que também retratam passistas em movimento. Um traço fino e geométrico, quase cubista. O trabalho foi exposto, inicialmente, em 1967, na Galeria Mirante das Artes, em São Paulo, e hoje se encontra na casa do artista, no bairro da Boa Vista. Em 1975, desenhou o projeto de um mural de danças populares que nunca saiu do papel, mas foi 30 anos depois, em 2005, que Abelardo concluiu sua maior

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Letras do frevo

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Somente duas vertentes do frevo admitem a palavra cantada Júlio Vila Nova

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No passo das comemorações pelo centenário de registro da palavra frevo, são válidas iniciativas de análise para a compreensão dos significados dessa música que “faz demais a gente se distinguir” (João Santiago, “Sabe lá o que é isso”). Reconhecidas a altíssima qualidade e riqueza rítmica, harmônica e melódica, ressaltamos também a importância de suas letras. À parte o frevo-de-rua, instrumental, contagiante, que atravessa ondas de revigoramento criativo, nos sopros geniais de um Edson Rodrigues ou de um Spok, tratamos das duas vertentes do frevo que admitem a palavra cantada (frevo-de-bloco e frevo-canção) para buscar entender, afinal, o que dizem as letras. O frevo-de-bloco surge com um interessante dado sociológico: o início da efetiva participação da mulher (sobretudo da classe média) na folia de rua do

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Recife, nos “blocos mistos”, começo do século 20. A tendência atual, porém, é a de se adotar a denominação “blocos carnavalescos líricos”, inscrita pela primeira vez num flabelo (cartaz abre-alas) pelo Cordas e Retalhos, a partir de 2001. Resultado de influências como o pastoril e ranchos de Reis, além da música dos saraus promovidos pelas famílias dos bairros centrais do Recife, o frevo-de-bloco definiuse pelo caráter sentimental, lírico. Daí a pertinência do nome, bem a propósito de uma necessária releitura desse gênero, freqüentemente abordado na imprensa como monocórdio, baseado apenas no tema da saudade. Amílcar Bezerra e Lucas Victor, no livro Evoluções! Histórias de Bloco e de Saudade, observam que “saudade, carnaval e identidade são inseparáveis”, importantes para se compreender os blocos e sua

Monumento ao Frevo – escultura em bronze (2005) – Abelardo da Hora

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Olívia Mindêlo é jornalista.

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obra em homenagem ao frevo. Trata-se de uma escultura feita em bronze, com cerca de três toneladas e mais de 7 metros de altura. O Monumento ao Frevo, encomendado pela Prefeitura do Recife para ser colocado num canteiro em frente ao Aeroporto Internacional dos Guararapes Gilberto Freyre, na Avenida Mascarenhas de Moraes, no Recife, onde se encontra desde então. Na obra, mais uma vez a figura dos passistas é ressaltada. São três deles, sendo um com sombrinha, aglomerados, como na obra de Lula Cardoso Ayres. Corbiniano Lins (1924), também pernambucano, é outro que, nas suas esculturas de alumínio ou serigrafias, reverenciou com competência a cultura popular pernambucana, inclusive o frevo. Mas sua homenagem ao ritmo não é tão conhecida, visto que as figuras femininas e as manifestações afro-brasileiras se tornaram mais evidentes em seu trabalho. “Eu não sou tão carnavalesco quanto o meu pai, mas eu gosto do frevo e do folclore, de um modo geral”, confessa Corbiniano. O pouco que fez pelo frevo, no entanto, é interessante. Possui, por sinal, duas peças ainda desconhecidas em seu ateliê. Também representou o frevo de forma peculiar o pintor Luis Soares, o modernista Vicente do Rego Monteiro, o xilogravurista Jota Borges, o pintor modernista Augusto Rodrigues e o japonês radicado no Brasil, Flávio Shiró. Cinza ou colorido, pintura ou escultura, simples ou elaborado, modernista ou naïf, todos têm sido responsáveis por ajudar a eternizar esse ritmo tão pictórico e plástico por natureza.

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brasileira. Aí está um campo fértil para a análise lingüística no âmbito dos estudos sobre a mudança social, incluindo relações de poder e dominação, objeto da instigante área da análise crítica do discurso. Exemplos famosos são “O Teu Cabelo Não Nega” (Irmãos Valença), que reproduz sem muita sutileza o discurso racista (“mas como a cor não pega, mulata, mulata eu quero teu amor”) ou ainda “Cala a boca, menino” (Capiba), que aborda o grave problema da violência contra a mulher. Há a crônica de costumes: “Menina de hoje não quer fantasia/ só vai à escola pra fazer folia [...]/ de calça comprida, cigarro e boné/ já fez seu programa, vou dizer o que é/ dar o braço ao seu playboy, entrar no Lunik/ ir lá detrás da lua fazer piquenique” (Manuel Gilberto), registro de hábitos femininos considerados avançados para a época, final dos anos 50, no contexto da corrida espacial, da Guerra Fria e da invasão cultural norte-americana, tudo isso presente na canção. O lingüista e compositor Luiz Tatit assinala que “a canção sempre foi uma dimensão potencializada da fala”, ou seja, “cantar é também dizer algo, só que de um modo especial”. E o frevo-canção incorpora a

Uma das obras mais famosas de Lula Cardoso Ayres para o ritmo genuíno chama-se O Frevo, um óleo sobre tela de 1945. Colorida, mas com paleta muito mais sóbria do que a de Bajado, a pintura evidencia o alvoroço de pernas e cabeças de passistas brincando na rua. Mesmo com a clara influência de vanguardas européias, a tela nos traz ao olhar um traço de um brasileiro tão preocupado com o seu povo quanto um Cândido Portinari ou uma Tarsila do Amaral, por exemplo. Portanto, o seu recorte sobre o frevo reflete sua admiração e seu respeito pelas manifestações populares como um todo. O maracatu, o bumba-meu-boi e o cavalo-marinho também permeiam a sua produção. Para Lula Cardoso Ayres Filho, responsável pelo acervo do pai, foi no frevo, e no Carnaval, que o pintor “teve todas as condições de exercitar a riqueza e o movimento das cores no seu trabalho, trazendo para as telas a dinâmica dos passistas, entrelaçando braços e pernas, luzes e sombras”. Não é por acaso que o artista assinou diversos projetos de decoração

dos bailes carnavalescos de clube da cidade, em especial o Clube Internacional do Recife e o Iate Clube do Recife. Foi também o primeiro a decorar, com planejamento, o Carnaval de rua da capital, em meados do século 20, na gestão do então prefeito José do Rego Maciel. Os seus croquis e desenhos para essas festas, quase sempre marcados pelo traço figurativo geométrico, assim como seus trabalhos de ode ao frevo, encontram-se expostos atualmente no Instituto Lula Cardoso Ayres, em Jaboatão dos Guararapes, onde está guardado o seu acervo. Alguns deles serão utilizados pelo arquiteto Carlos Augusto Lira na decoração do carnaval do Recife deste ano, que homenageia o pintor, coincidentemente no centenário do frevo, que promete fazer desta uma das festas de momo mais belas dos últimos anos. Do papel à forma – Outro nome de fundamental importância para as artes plásticas nesse sentido é o do pernambucano Abelardo da Hora. Como Lula,

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lirismo dos antigos.” (Diario de Pernambuco, 20/01/99). Tal discurso adotado pela imprensa revela o desconhecimento sobre a dinâmica da evolução do frevo-de-bloco, sobretudo a partir dos anos 90, quando surge grande número de agremiações, muitas registrando sua produção em CD e protagonizando momentos de celebração em diversos eventos no Carnaval e ao longo do ano inteiro. O frevo-canção é originalmente marcado pela vinculação às primeiras agremiações carnavalescas do Recife: os clubes de alegorias e críticas e os clubes pedestres. Inicialmente conhecido como marcha pernambucana, a partir dos anos 30 foi gravado por cantores consagrados nacionalmente, a exemplo de Francisco Alves, Mário Reis, Carlos Galhardo, Araci de Almeida, além de Expedito Baracho e Claudionor Germano. Sobre as letras, sua feição narrativa e descritiva as aproxima de um gênero literário muitas vezes considerado menor, mas de reconhecida importância para nossa cultura: a crônica. De fato, há inúmeros exemplos de breves relatos da vida

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Encontro de blocos no Recife Antigo

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Júlio Vila Nova, autor de Panorama de Folião: o Carnaval de Pernambuco na Voz dos Blocos Líricos (FCCR 2007) é professor, mestre em Lingüística pela UFPE e presidente do Bloco Carnavalesco Lírico Cordas e Retalhos – juliovilanova@ig.com.br

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registradas, ao longo do século 20, “a voz do malandro, a voz do romântico, a voz do traído, a voz do embevecido, a voz do folião”. Por isso, a canção tem se constituído como poderoso propagador de idéias, valiosa fonte para o reconhecimento de nossa identidade. Talvez o que ainda falte seja um trabalho mais consistente sobre esse rico material, para o estudo da língua em ação, no discurso, considerado como prática social. Afinal, ao longo de um século a canção definiu seu status como área de significativa importância para a compreensão da sociedade e da cultura brasileiras e por isso merece ser estudada com mais atenção, seja no âmbito do ensino fundamental e médio, seja nas escolas de artes, letras e ciências sociais, em nossas universidades.

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voz do povo traduzindo em melodias expressões como “E é ruim?” (1958), “Qual é o pó?” (1959), “Mesmo que queijo” (1962), “Olha o dedinho” (1963), de Sebastião Lopes. Nos anos 70, são enfocados temas de alcance nacional (Gildo Branco, “Passei no Vestibular”) ou apenas local, como o fiasco da implosão de uma ponte no bairro da Torre, amplamente divulgado na imprensa: “Eu vi, você também, todo mundo viu/ A bomba estourou, mas a ponte não caiu/[...] / e a galera na beira do rio/ mandava o japonês pra ver a ponte que não caiu” (Mário Griz). Mais recentemente, a crítica contra as mazelas da corrupção (bem mais antigas que o frevo) aparece em “toma lá o seu, dá pra cá o meu/ vamos rachar direito pra não haver confusão.” (Dozinho, “Bloco do Mensalão”), lançada em 2006 por Expedito Baracho. Tatit lembra que o aprimoramento das técnicas de registro fonográfico permitiu o estabelecimento da canção como “uma outra forma de falar dos mesmos assuntos do dia-a-dia, com uma única diferença: as coisas ditas poderiam ser reditas quase do mesmo jeito e até conservadas para a posteridade”, sendo O Bloco da Saudade, na Praça Dezessete, em 1976

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1969 – O maior sucesso do carnaval daquele ano foi um frevo, porém composto por um baiano, e que tinha como principal instrumento não palhetas e sopros, mas uma guitarra, pilotada por um adolescente de 19 anos, Lanny Gordin. Intitulava-se “Atrás do trio elétrico”, e provocou discussões acaloradas no Recife.

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1976 – No dia 21 de dezembro, falece, no Hospital Português, no Recife, o compositor e maestro Nelson Ferreira.

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1997 – No dia 31 de dezembro de 1997, falece Lourenço da Fonseca Barbosa, Capiba.

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1980 – Carlos Fernando lança o primeiro álbum da série Asas da América, que injeta sangue

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Anos 60 – O sucesso dos LPs gravados por Claudionor Germano e o fortalecimento do carnaval de clube fizeram com que predominasse daí em diante, no carnaval pernambucano, o frevo-canção. Basta dar uma olhada no catálogo da Rozenblit para se constatar que eles suplantaram em número o mais complexo frevode-rua. Dozinho, Sebastião Lopes, José Menezes, os consagrados Nelson Ferreira e Capiba, Genival Macedo, J.Michiles, Aldemar Paiva, Osvaldo Santiago, os Irmãos Valença, Luis “Boquinha” de França, foram muitos os compositores de frevo-canção. Multiplicaram-se os intérpretes: Gil Gomes, Voleide Dantas, Nerize Paiva, Mêves Gama, Expedito Baracho e muito mais gente boa. A

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Germano e a orquestra de Nelson Ferreira, Rozenblit passou a lançar anualmente a série Carnaval Começa com C de Capiba, e O que Faltou Recife Capital do Frevo, com músicas que fariam a e Você Pediu, a primeira, obviamente, com trilha do carnaval de cada ano. músicas de Capiba, e a segunda com frevoscanção de Nelson Ferreira.

surgiram outras agremiações semelhantes, que, no dorme”, de Nelson Ferreira. O lado B traz “Boneentanto, nunca conseguiram maior destaque na ca”, frevo-canção de José Menezes e Aldemar folia carioca. O frevo autêntico, direto do Recife, Paiva, na voz de Claudionor Germano, que daí em aportou na então capital do país em 1951, quando diante se tornaria o intérprete por excelência do O Vassourinhas, o verdadeiro, do bairro do São frevo. Em 1955, a Fábrica de Discos Rozenblit José, num navio do Lóide, viajou para a Guanaba- estaria funcionando na Estrada dos Remédios. ra. Foi uma viagem de importância fundamental, não para o carnaval carioca, mas para o baiano. O 1956 – Gravação, com selo Mocambo, da navio que levava o Vassourinhas deu uma parada Rozenblit, o frevo “Vassourinhas”, com a orquestra em Salvador, e fez uma apresentação especial para de Nelson Ferreira, célebre pelas variações, em sax os soteropolitanos. A orquestra de 65 músicos, alto, de Felinho (Félix Lins de Albuquerque, Bonito dirigidos pelo tenente João Cícero, e o bloco com 1895 – Recife 1980). Uma ousadia que provocou todo mundo fantasiado empolgaram os baianos de polêmica. tal forma, que a exibição por pouco não se transforma em tragédia. Os integrantes do Vassourinhas 1957 – O frevo-canção “Evocação” de Nelson foram obrigados a interromper o desfile e procurar Ferreira, com a Orquestra dirigida pelo compositor e abrigo no Palácio do Governo. O Vassourinhas con- interpretado pelo coral do Bloco Carnavalesco Batinuaria sua viagem para o Rio, mas deixaria a se- tutas de São José, consagrou-se como o primeiro mente do frevo plantada na capital da Bahia. No frevo feito e gravado em Pernambuco a fazer sucescarnaval daquele ano, Dodô e Osmar passaram a so nacional. Não apenas isso, foi a música mais cantocar frevos pernambucanos na sua velha fubica Ford tada do carnaval daquele ano em todo o país. 29, embrião dos futuros trios elétricos. “Vassourinhas” era o ponto alto deste repertório, tocado com 1959 – Com o objetivo de homenagear Capiguitarra baiana, violão elétrico e um triolim. Moraes ba, que completava 25 anos de frevo (contados a Moreira, em 1980, lembrou o fato em um dos seus partir de “É de amargar”), Claudionor Germano grandes sucessos “Vassourinha elétrica”: Varre, varre, gravou uma compilação das composições mais Vassourinhas/Varreu um dia as ruas da Bahia/Frevo, conhecidas de Lourenço da Fonseca Barbosa. No chuva de frevo e sombrinhas/Metais em brasa, brasa, mesmo ano, o mesmo Claudionor Germano grabrasa, que ardia...Abriu alas e caminhos/pra depois varia outra coletânea O que Eu Fiz e Você Gostou, passar/o trio de Armandinho, Dodô e Osmar”. com composições de Nelson Ferreira (várias com parceiros). Com um competente trabalho de divul1953 – José Rozenblit decide gravar o primeiro gação, estes dois álbuns fariam com que o frevo se 78rpm de frevo em Pernambuco, no estúdio da tornasse a música do carnaval nordestino. Rádio Clube (mas ainda prensado no Rio, na SinEstratégia reforçada no ano seguinte com mais ter). O lado A trouxe o frevo-de-rua “Come e duas outras compilações, ambas com Claudionor

Carol Araújo

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Cronologia do frevo

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1909 – Matias da Rocha teria composto a “Marcha n°1 de Vassourinhas”, do Club Carnavalesco Vassourinha, nascido em 1889. Esta marcha, mais conhecida como “Vassourinha”, tornou-se com o passar dos anos o hino não-oficial do carnaval pernambucano. Matias da Rocha deu parceria à sua mulher, Joana Baptista.

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1923 – Ano do primeiro frevo gravado “Borboleta não é ave”, de Nelson Ferreira e J.Borges Diniz, composta em 1922 para o Bloco da Concórdia. Foi lançado em disco da Casa Edison, pelo Grupo do Pimentel e vocal de Bahiano (Manuel Pedro dos Santos).

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Diario de Pernambuco com “É de amargar”. A marcha-canção seria gravada em dezembro daquele ano por Mário Reis e Os Diabos do Céu, em discos RCA Victor. Foi também em 1934 que, pela primeira vez, um frevo composto por uma mulher participaria de um concurso carnavalesco. Trata-se de “Vem, meu benzinho” de Argentina Maciel (1888/1970), que mereceu uma ótima biografia do Padre Jaime Diniz. 1951 – Desde 1934, o frevo passou a habitar a cidade do Rio de Janeiro. Naquele ano foi fundado, por pernambucanos, o Clube Carnavalesco Mixto Vassourinhas, na Saúde, no rastro do qual

Abaixo, foto de Pierre Verger (1947)

Reprodução

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1930 – Lourenço da Fonseca Barbosa, já conhecido como Capiba, aprovado num concurso do Banco do Brasil, passa a morar no Recife, onde logo se entrosa com os músicos e boêmios da cidade.

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novo no frevo pernambucano e é cantado (no dia 2 de fevereiro), que ia fazer uma particinacionalmente nas vozes de estrelas como pação histórica como convidado de Nóbrega. Caetano Veloso, Gilberto Gil, Amelinha, Geraldo Com o nome de Spok frevo Orquestra ela passaria Azevedo e Jackson do Pandeiro. a renovar o frevo, participando de eventos importantes como o TIM Festival, contribuindo para 1985 – Em pleno Rock in Rio, o frevo “Banho de o frevo se tornar uma música do ano todo, não cheiro” (Carlos Fernando) é cantado por uma apenas de carnaval. multidão estimada em mais de 600 mil pessoas. Um recorde para o frevo.

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1997 – É formada a orquestra do jovem maestro Spok para tocar no bloco Na Pancada do Ganzá, criado por Antonio Nóbrega, na avenida Boa Viagem, enfrentando os blocos de trio de axé music. O bloco, no entanto, não sai como estava previsto, pela morte prematura de Chico Science

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1932 – O maior sucesso do carnaval brasileiro neste ano foi a marchinha “O teu cabelo não nega”, assinada por Lamartine Babo. Recusada por Francisco Alves, o ídolo do rádio na época, a marcha foi gravada por Castro Barbosa. No rótulo do 78rpm lia-se um “motivo do Norte arr. Lamartine Babo”. Com exceção da antológica introdução e a modificação na letra, a música havia sido composta pelas irmãos pernambucanos João e Raul Valença, e enviada à RCA Victor para ser gravada para o carnaval pernambucano. Os irmãos Valença acionaram a gravadora e ganharam o direito à parceria da música que tinham feito em 1929, e era bem conhecida no Recife.

2006 – Pela primeira vez, o frevo chega à China, levado pela Spokfrevo Orquestra. Alceu Valença, um mestre do frevo cantado, leva uma multidão ao Bairro do Recife (calculada em 140 mil pessoas) para a gravação de um DVD; foi a maior frevança fora de época já acontecida no Recife, comandada por um único artista popular (José Teles).

1934 – Capiba (Surubim, 1904/Recife 1997) ganha o concurso carnavalesco promovido pelo

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1923 – Ano do primeiro frevo gravado “Borboleta não é ave”, de Nelson Ferreira e J.Borges Diniz, composta em 1922 para o Bloco da 1951 – Desde 1934, o frevo passou a habitar a Concórdia. Foi lançado em disco da Casa Edison, cidade do Rio de Janeiro. Naquele ano foi fundapelo Grupo do Pimentel e vocal de Bahiano do, por pernambucanos, o Clube Carnavalesco (Manuel Pedro dos Santos). Mixto Vassourinhas, na Saúde, no rastro do qual

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novo no frevo pernambucano e é cantado nacionalmente nas vozes de estrelas como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Amelinha, Geraldo Azevedo e Jackson do Pandeiro.

(no dia 2 de fevereiro), que ia fazer uma participação histórica como convidado de Nóbrega. Com o nome de Spok frevo Orquestra ela passaria a renovar o frevo, participando de eventos importantes como o TIM Festival, contribuindo para 1985 – Em pleno Rock in Rio, o frevo “Banho de o frevo se tornar uma música do ano todo, não cheiro” (Carlos Fernando) é cantado por uma apenas de carnaval. multidão estimada em mais de 600 mil pessoas. Um recorde para o frevo. 2006 – Pela primeira vez, o frevo chega à China, levado pela Spokfrevo Orquestra. 1997 – É formada a orquestra do jovem Alceu Valença, um mestre do frevo cantado, maestro Spok para tocar no bloco Na Pancada do leva uma multidão ao Bairro do Recife (calculada Ganzá, criado por Antonio Nóbrega, na avenida em 140 mil pessoas) para a gravação de um DVD; Boa Viagem, enfrentando os blocos de trio de axé foi a maior frevança fora de época já acontecida no music. O bloco, no entanto, não sai como estava Recife, comandada por um único artista popular previsto, pela morte prematura de Chico Science (José Teles).

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Diario de Pernambuco com “É de amargar”. A marcha-canção seria gravada em dezembro daquele ano por Mário Reis e Os Diabos do Céu, em discos RCA Victor. Foi também em 1934 que, pela primeira vez, um frevo composto por uma mulher participaria de um concurso carnavalesco. Trata-se de “Vem, meu benzinho” de Argentina Maciel (1888/1970), que mereceu uma ótima biografia do Padre Jaime Diniz.

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1932 – O maior sucesso do carnaval brasileiro neste ano foi a marchinha “O teu cabelo não nega”, assinada por Lamartine Babo. Recusada por Francisco Alves, o ídolo do rádio na época, a marcha foi gravada por Castro Barbosa. No rótulo do 78rpm lia-se um “motivo do Norte arr. Lamartine Babo”. Com exceção da antológica introdução e a modificação na letra, a música havia sido composta pelas irmãos pernambucanos João e Raul Valença, e enviada à RCA Victor para ser gravada para o carnaval pernambucano. Os irmãos Valença acionaram a gravadora e ganharam o direito à parceria da música que tinham feito em 1929, e era bem conhecida no Recife. 1934 – Capiba (Surubim, 1904/Recife 1997) ganha o concurso carnavalesco promovido pelo

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Júlio Vila Nova, autor de Panorama de Folião: o Carnaval de Pernambuco na Voz dos Blocos Líricos (FCCR 2007) é professor, mestre em Lingüística pela UFPE e presidente do Bloco Carnavalesco Lírico Cordas e Retalhos – juliovilanova@ig.com.br

registradas, ao longo do século 20, “a voz do malandro, a voz do romântico, a voz do traído, a voz do embevecido, a voz do folião”. Por isso, a canção tem se constituído como poderoso propagador de idéias, valiosa fonte para o reconhecimento de nossa identidade. Talvez o que ainda falte seja um trabalho mais consistente sobre esse rico material, para o estudo da língua em ação, no discurso, considerado como prática social. Afinal, ao longo de um século a canção definiu seu status como área de significativa importância para a compreensão da sociedade e da cultura brasileiras e por isso merece ser estudada com mais atenção, seja no âmbito do ensino fundamental e médio, seja nas escolas de artes, letras e ciências sociais, em nossas universidades.

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voz do povo traduzindo em melodias expressões como “E é ruim?” (1958), “Qual é o pó?” (1959), “Mesmo que queijo” (1962), “Olha o dedinho” (1963), de Sebastião Lopes. Nos anos 70, são enfocados temas de alcance nacional (Gildo Branco, “Passei no Vestibular”) ou apenas local, como o fiasco da implosão de uma ponte no bairro da Torre, amplamente divulgado na imprensa: “Eu vi, você também, todo mundo viu/ A bomba estourou, mas a ponte não caiu/[...] / e a galera na beira do rio/ mandava o japonês pra ver a ponte que não caiu” (Mário Griz). Mais recentemente, a crítica contra as mazelas da corrupção (bem mais antigas que o frevo) aparece em “toma lá o seu, dá pra cá o meu/ vamos rachar direito pra não haver confusão.” (Dozinho, “Bloco do Mensalão”), lançada em 2006 por Expedito Baracho. Tatit lembra que o aprimoramento das técnicas de registro fonográfico permitiu o estabelecimento da canção como “uma outra forma de falar dos mesmos assuntos do dia-a-dia, com uma única diferença: as coisas ditas poderiam ser reditas quase do mesmo jeito e até conservadas para a posteridade”, sendo

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O Bloco da Saudade, na Praça Dezessete, em 1976

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1959 – Com o objetivo de homenagear Capiba, que completava 25 anos de frevo (contados a partir de “É de amargar”), Claudionor Germano gravou uma compilação das composições mais conhecidas de Lourenço da Fonseca Barbosa. No mesmo ano, o mesmo Claudionor Germano gravaria outra coletânea O que Eu Fiz e Você Gostou, com composições de Nelson Ferreira (várias com parceiros). Com um competente trabalho de divul1953 – José Rozenblit decide gravar o primeiro gação, estes dois álbuns fariam com que o frevo se 78rpm de frevo em Pernambuco, no estúdio da tornasse a música do carnaval nordestino. Rádio Clube (mas ainda prensado no Rio, na SinEstratégia reforçada no ano seguinte com mais ter). O lado A trouxe o frevo-de-rua “Come e duas outras compilações, ambas com Claudionor

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1957 – O frevo-canção “Evocação” de Nelson Ferreira, com a Orquestra dirigida pelo compositor e interpretado pelo coral do Bloco Carnavalesco Batutas de São José, consagrou-se como o primeiro frevo feito e gravado em Pernambuco a fazer sucesso nacional. Não apenas isso, foi a música mais cantada do carnaval daquele ano em todo o país.

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1956 – Gravação, com selo Mocambo, da Rozenblit, o frevo “Vassourinhas”, com a orquestra de Nelson Ferreira, célebre pelas variações, em sax alto, de Felinho (Félix Lins de Albuquerque, Bonito 1895 – Recife 1980). Uma ousadia que provocou polêmica.

Germano e a orquestra de Nelson Ferreira, Rozenblit passou a lançar anualmente a série Carnaval Começa com C de Capiba, e O que Faltou Recife Capital do Frevo, com músicas que fariam a e Você Pediu, a primeira, obviamente, com trilha do carnaval de cada ano. músicas de Capiba, e a segunda com frevoscanção de Nelson Ferreira. 1969 – O maior sucesso do carnaval daquele ano foi um frevo, porém composto por um Anos 60 – O sucesso dos LPs gravados por baiano, e que tinha como principal instrumento Claudionor Germano e o fortalecimento do não palhetas e sopros, mas uma guitarra, pilotada carnaval de clube fizeram com que predominasse por um adolescente de 19 anos, Lanny Gordin. daí em diante, no carnaval pernambucano, o Intitulava-se “Atrás do trio elétrico”, e provocou frevo-canção. Basta dar uma olhada no catálogo discussões acaloradas no Recife. da Rozenblit para se constatar que eles suplantaram em número o mais complexo frevo1976 – No dia 21 de dezembro, falece, no de-rua. Dozinho, Sebastião Lopes, José Menezes, Hospital Português, no Recife, o compositor e os consagrados Nelson Ferreira e Capiba, maestro Nelson Ferreira. Genival Macedo, J.Michiles, Aldemar Paiva, Osvaldo Santiago, os Irmãos Valença, Luis “Boqui1997 – No dia 31 de dezembro de 1997, nha” de França, foram muitos os compositores de falece Lourenço da Fonseca Barbosa, Capiba. frevo-canção. Multiplicaram-se os intérpretes: Gil Gomes, Voleide Dantas, Nerize Paiva, Mêves Ga1980 – Carlos Fernando lança o primeiro ma, Expedito Baracho e muito mais gente boa. A álbum da série Asas da América, que injeta sangue

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dorme”, de Nelson Ferreira. O lado B traz “Boneca”, frevo-canção de José Menezes e Aldemar Paiva, na voz de Claudionor Germano, que daí em diante se tornaria o intérprete por excelência do frevo. Em 1955, a Fábrica de Discos Rozenblit estaria funcionando na Estrada dos Remédios.

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surgiram outras agremiações semelhantes, que, no entanto, nunca conseguiram maior destaque na folia carioca. O frevo autêntico, direto do Recife, aportou na então capital do país em 1951, quando O Vassourinhas, o verdadeiro, do bairro do São José, num navio do Lóide, viajou para a Guanabara. Foi uma viagem de importância fundamental, não para o carnaval carioca, mas para o baiano. O navio que levava o Vassourinhas deu uma parada em Salvador, e fez uma apresentação especial para os soteropolitanos. A orquestra de 65 músicos, dirigidos pelo tenente João Cícero, e o bloco com todo mundo fantasiado empolgaram os baianos de tal forma, que a exibição por pouco não se transforma em tragédia. Os integrantes do Vassourinhas foram obrigados a interromper o desfile e procurar abrigo no Palácio do Governo. O Vassourinhas continuaria sua viagem para o Rio, mas deixaria a semente do frevo plantada na capital da Bahia. No carnaval daquele ano, Dodô e Osmar passaram a tocar frevos pernambucanos na sua velha fubica Ford 29, embrião dos futuros trios elétricos. “Vassourinhas” era o ponto alto deste repertório, tocado com guitarra baiana, violão elétrico e um triolim. Moraes Moreira, em 1980, lembrou o fato em um dos seus grandes sucessos “Vassourinha elétrica”: Varre, varre, Vassourinhas/Varreu um dia as ruas da Bahia/Frevo, chuva de frevo e sombrinhas/Metais em brasa, brasa, brasa, que ardia...Abriu alas e caminhos/pra depois passar/o trio de Armandinho, Dodô e Osmar”.

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Júlio Vila Nova, autor de Panorama de Folião: o Carnaval de Pernambuco na Voz dos Blocos Líricos (FCCR 2007) é professor, mestre em Lingüística pela UFPE e presidente do Bloco Carnavalesco Lírico Cordas e Retalhos – juliovilanova@ig.com.br

registradas, ao longo do século 20, “a voz do malandro, a voz do romântico, a voz do traído, a voz do embevecido, a voz do folião”. Por isso, a canção tem se constituído como poderoso propagador de idéias, valiosa fonte para o reconhecimento de nossa identidade. Talvez o que ainda falte seja um trabalho mais consistente sobre esse rico material, para o estudo da língua em ação, no discurso, considerado como prática social. Afinal, ao longo de um século a canção definiu seu status como área de significativa importância para a compreensão da sociedade e da cultura brasileiras e por isso merece ser estudada com mais atenção, seja no âmbito do ensino fundamental e médio, seja nas escolas de artes, letras e ciências sociais, em nossas universidades.

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voz do povo traduzindo em melodias expressões como “E é ruim?” (1958), “Qual é o pó?” (1959), “Mesmo que queijo” (1962), “Olha o dedinho” (1963), de Sebastião Lopes. Nos anos 70, são enfocados temas de alcance nacional (Gildo Branco, “Passei no Vestibular”) ou apenas local, como o fiasco da implosão de uma ponte no bairro da Torre, amplamente divulgado na imprensa: “Eu vi, você também, todo mundo viu/ A bomba estourou, mas a ponte não caiu/[...] / e a galera na beira do rio/ mandava o japonês pra ver a ponte que não caiu” (Mário Griz). Mais recentemente, a crítica contra as mazelas da corrupção (bem mais antigas que o frevo) aparece em “toma lá o seu, dá pra cá o meu/ vamos rachar direito pra não haver confusão.” (Dozinho, “Bloco do Mensalão”), lançada em 2006 por Expedito Baracho. Tatit lembra que o aprimoramento das técnicas de registro fonográfico permitiu o estabelecimento da canção como “uma outra forma de falar dos mesmos assuntos do dia-a-dia, com uma única diferença: as coisas ditas poderiam ser reditas quase do mesmo jeito e até conservadas para a posteridade”, sendo

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O Bloco da Saudade, na Praça Dezessete, em 1976

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1959 – Com o objetivo de homenagear Capiba, que completava 25 anos de frevo (contados a partir de “É de amargar”), Claudionor Germano gravou uma compilação das composições mais conhecidas de Lourenço da Fonseca Barbosa. No mesmo ano, o mesmo Claudionor Germano gravaria outra coletânea O que Eu Fiz e Você Gostou, com composições de Nelson Ferreira (várias com parceiros). Com um competente trabalho de divul1953 – José Rozenblit decide gravar o primeiro gação, estes dois álbuns fariam com que o frevo se 78rpm de frevo em Pernambuco, no estúdio da tornasse a música do carnaval nordestino. Rádio Clube (mas ainda prensado no Rio, na SinEstratégia reforçada no ano seguinte com mais ter). O lado A trouxe o frevo-de-rua “Come e duas outras compilações, ambas com Claudionor

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1957 – O frevo-canção “Evocação” de Nelson Ferreira, com a Orquestra dirigida pelo compositor e interpretado pelo coral do Bloco Carnavalesco Batutas de São José, consagrou-se como o primeiro frevo feito e gravado em Pernambuco a fazer sucesso nacional. Não apenas isso, foi a música mais cantada do carnaval daquele ano em todo o país.

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1956 – Gravação, com selo Mocambo, da Rozenblit, o frevo “Vassourinhas”, com a orquestra de Nelson Ferreira, célebre pelas variações, em sax alto, de Felinho (Félix Lins de Albuquerque, Bonito 1895 – Recife 1980). Uma ousadia que provocou polêmica.

Germano e a orquestra de Nelson Ferreira, Rozenblit passou a lançar anualmente a série Carnaval Começa com C de Capiba, e O que Faltou Recife Capital do Frevo, com músicas que fariam a e Você Pediu, a primeira, obviamente, com trilha do carnaval de cada ano. músicas de Capiba, e a segunda com frevoscanção de Nelson Ferreira. 1969 – O maior sucesso do carnaval daquele ano foi um frevo, porém composto por um Anos 60 – O sucesso dos LPs gravados por baiano, e que tinha como principal instrumento Claudionor Germano e o fortalecimento do não palhetas e sopros, mas uma guitarra, pilotada carnaval de clube fizeram com que predominasse por um adolescente de 19 anos, Lanny Gordin. daí em diante, no carnaval pernambucano, o Intitulava-se “Atrás do trio elétrico”, e provocou frevo-canção. Basta dar uma olhada no catálogo discussões acaloradas no Recife. da Rozenblit para se constatar que eles suplantaram em número o mais complexo frevo1976 – No dia 21 de dezembro, falece, no de-rua. Dozinho, Sebastião Lopes, José Menezes, Hospital Português, no Recife, o compositor e os consagrados Nelson Ferreira e Capiba, maestro Nelson Ferreira. Genival Macedo, J.Michiles, Aldemar Paiva, Osvaldo Santiago, os Irmãos Valença, Luis “Boqui1997 – No dia 31 de dezembro de 1997, nha” de França, foram muitos os compositores de falece Lourenço da Fonseca Barbosa, Capiba. frevo-canção. Multiplicaram-se os intérpretes: Gil Gomes, Voleide Dantas, Nerize Paiva, Mêves Ga1980 – Carlos Fernando lança o primeiro ma, Expedito Baracho e muito mais gente boa. A álbum da série Asas da América, que injeta sangue

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dorme”, de Nelson Ferreira. O lado B traz “Boneca”, frevo-canção de José Menezes e Aldemar Paiva, na voz de Claudionor Germano, que daí em diante se tornaria o intérprete por excelência do frevo. Em 1955, a Fábrica de Discos Rozenblit estaria funcionando na Estrada dos Remédios.

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surgiram outras agremiações semelhantes, que, no entanto, nunca conseguiram maior destaque na folia carioca. O frevo autêntico, direto do Recife, aportou na então capital do país em 1951, quando O Vassourinhas, o verdadeiro, do bairro do São José, num navio do Lóide, viajou para a Guanabara. Foi uma viagem de importância fundamental, não para o carnaval carioca, mas para o baiano. O navio que levava o Vassourinhas deu uma parada em Salvador, e fez uma apresentação especial para os soteropolitanos. A orquestra de 65 músicos, dirigidos pelo tenente João Cícero, e o bloco com todo mundo fantasiado empolgaram os baianos de tal forma, que a exibição por pouco não se transforma em tragédia. Os integrantes do Vassourinhas foram obrigados a interromper o desfile e procurar abrigo no Palácio do Governo. O Vassourinhas continuaria sua viagem para o Rio, mas deixaria a semente do frevo plantada na capital da Bahia. No carnaval daquele ano, Dodô e Osmar passaram a tocar frevos pernambucanos na sua velha fubica Ford 29, embrião dos futuros trios elétricos. “Vassourinhas” era o ponto alto deste repertório, tocado com guitarra baiana, violão elétrico e um triolim. Moraes Moreira, em 1980, lembrou o fato em um dos seus grandes sucessos “Vassourinha elétrica”: Varre, varre, Vassourinhas/Varreu um dia as ruas da Bahia/Frevo, chuva de frevo e sombrinhas/Metais em brasa, brasa, brasa, que ardia...Abriu alas e caminhos/pra depois passar/o trio de Armandinho, Dodô e Osmar”.

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1909 – Matias da Rocha teria composto a “Marcha n°1 de Vassourinhas”, do Club Carnavalesco Vassourinha, nascido em 1889. Esta marcha, mais conhecida como “Vassourinha”, tornou-se com o passar dos anos o hino não-oficial do carnaval pernambucano. Matias da Rocha deu parceria à sua mulher, Joana Baptista.

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1923 – Ano do primeiro frevo gravado “Borboleta não é ave”, de Nelson Ferreira e J.Borges Diniz, composta em 1922 para o Bloco da 1951 – Desde 1934, o frevo passou a habitar a Concórdia. Foi lançado em disco da Casa Edison, cidade do Rio de Janeiro. Naquele ano foi fundapelo Grupo do Pimentel e vocal de Bahiano do, por pernambucanos, o Clube Carnavalesco (Manuel Pedro dos Santos). Mixto Vassourinhas, na Saúde, no rastro do qual

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novo no frevo pernambucano e é cantado nacionalmente nas vozes de estrelas como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Amelinha, Geraldo Azevedo e Jackson do Pandeiro.

(no dia 2 de fevereiro), que ia fazer uma participação histórica como convidado de Nóbrega. Com o nome de Spok frevo Orquestra ela passaria a renovar o frevo, participando de eventos importantes como o TIM Festival, contribuindo para 1985 – Em pleno Rock in Rio, o frevo “Banho de o frevo se tornar uma música do ano todo, não cheiro” (Carlos Fernando) é cantado por uma apenas de carnaval. multidão estimada em mais de 600 mil pessoas. Um recorde para o frevo. 2006 – Pela primeira vez, o frevo chega à China, levado pela Spokfrevo Orquestra. 1997 – É formada a orquestra do jovem Alceu Valença, um mestre do frevo cantado, maestro Spok para tocar no bloco Na Pancada do leva uma multidão ao Bairro do Recife (calculada Ganzá, criado por Antonio Nóbrega, na avenida em 140 mil pessoas) para a gravação de um DVD; Boa Viagem, enfrentando os blocos de trio de axé foi a maior frevança fora de época já acontecida no music. O bloco, no entanto, não sai como estava Recife, comandada por um único artista popular previsto, pela morte prematura de Chico Science (José Teles).

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1930 – Lourenço da Fonseca Barbosa, já conhecido como Capiba, aprovado num concurso do Banco do Brasil, passa a morar no Recife, onde logo se entrosa com os músicos e boêmios da cidade.

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Diario de Pernambuco com “É de amargar”. A marcha-canção seria gravada em dezembro daquele ano por Mário Reis e Os Diabos do Céu, em discos RCA Victor. Foi também em 1934 que, pela primeira vez, um frevo composto por uma mulher participaria de um concurso carnavalesco. Trata-se de “Vem, meu benzinho” de Argentina Maciel (1888/1970), que mereceu uma ótima biografia do Padre Jaime Diniz.

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1932 – O maior sucesso do carnaval brasileiro neste ano foi a marchinha “O teu cabelo não nega”, assinada por Lamartine Babo. Recusada por Francisco Alves, o ídolo do rádio na época, a marcha foi gravada por Castro Barbosa. No rótulo do 78rpm lia-se um “motivo do Norte arr. Lamartine Babo”. Com exceção da antológica introdução e a modificação na letra, a música havia sido composta pelas irmãos pernambucanos João e Raul Valença, e enviada à RCA Victor para ser gravada para o carnaval pernambucano. Os irmãos Valença acionaram a gravadora e ganharam o direito à parceria da música que tinham feito em 1929, e era bem conhecida no Recife. 1934 – Capiba (Surubim, 1904/Recife 1997) ganha o concurso carnavalesco promovido pelo

Abaixo, foto de Pierre Verger (1947)

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Júlio Vila Nova, autor de Panorama de Folião: o Carnaval de Pernambuco na Voz dos Blocos Líricos (FCCR 2007) é professor, mestre em Lingüística pela UFPE e presidente do Bloco Carnavalesco Lírico Cordas e Retalhos – juliovilanova@ig.com.br

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registradas, ao longo do século 20, “a voz do malandro, a voz do romântico, a voz do traído, a voz do embevecido, a voz do folião”. Por isso, a canção tem se constituído como poderoso propagador de idéias, valiosa fonte para o reconhecimento de nossa identidade. Talvez o que ainda falte seja um trabalho mais consistente sobre esse rico material, para o estudo da língua em ação, no discurso, considerado como prática social. Afinal, ao longo de um século a canção definiu seu status como área de significativa importância para a compreensão da sociedade e da cultura brasileiras e por isso merece ser estudada com mais atenção, seja no âmbito do ensino fundamental e médio, seja nas escolas de artes, letras e ciências sociais, em nossas universidades.

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voz do povo traduzindo em melodias expressões como “E é ruim?” (1958), “Qual é o pó?” (1959), “Mesmo que queijo” (1962), “Olha o dedinho” (1963), de Sebastião Lopes. Nos anos 70, são enfocados temas de alcance nacional (Gildo Branco, “Passei no Vestibular”) ou apenas local, como o fiasco da implosão de uma ponte no bairro da Torre, amplamente divulgado na imprensa: “Eu vi, você também, todo mundo viu/ A bomba estourou, mas a ponte não caiu/[...] / e a galera na beira do rio/ mandava o japonês pra ver a ponte que não caiu” (Mário Griz). Mais recentemente, a crítica contra as mazelas da corrupção (bem mais antigas que o frevo) aparece em “toma lá o seu, dá pra cá o meu/ vamos rachar direito pra não haver confusão.” (Dozinho, “Bloco do Mensalão”), lançada em 2006 por Expedito Baracho. Tatit lembra que o aprimoramento das técnicas de registro fonográfico permitiu o estabelecimento da canção como “uma outra forma de falar dos mesmos assuntos do dia-a-dia, com uma única diferença: as coisas ditas poderiam ser reditas quase do mesmo jeito e até conservadas para a posteridade”, sendo O Bloco da Saudade, na Praça Dezessete, em 1976

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1969 – O maior sucesso do carnaval daquele ano foi um frevo, porém composto por um baiano, e que tinha como principal instrumento não palhetas e sopros, mas uma guitarra, pilotada por um adolescente de 19 anos, Lanny Gordin. Intitulava-se “Atrás do trio elétrico”, e provocou discussões acaloradas no Recife.

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1976 – No dia 21 de dezembro, falece, no Hospital Português, no Recife, o compositor e maestro Nelson Ferreira.

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1997 – No dia 31 de dezembro de 1997, falece Lourenço da Fonseca Barbosa, Capiba.

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1980 – Carlos Fernando lança o primeiro álbum da série Asas da América, que injeta sangue

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Anos 60 – O sucesso dos LPs gravados por Claudionor Germano e o fortalecimento do carnaval de clube fizeram com que predominasse daí em diante, no carnaval pernambucano, o frevo-canção. Basta dar uma olhada no catálogo da Rozenblit para se constatar que eles suplantaram em número o mais complexo frevode-rua. Dozinho, Sebastião Lopes, José Menezes, os consagrados Nelson Ferreira e Capiba, Genival Macedo, J.Michiles, Aldemar Paiva, Osvaldo Santiago, os Irmãos Valença, Luis “Boquinha” de França, foram muitos os compositores de frevo-canção. Multiplicaram-se os intérpretes: Gil Gomes, Voleide Dantas, Nerize Paiva, Mêves Gama, Expedito Baracho e muito mais gente boa. A

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Germano e a orquestra de Nelson Ferreira, Rozenblit passou a lançar anualmente a série Carnaval Começa com C de Capiba, e O que Faltou Recife Capital do Frevo, com músicas que fariam a e Você Pediu, a primeira, obviamente, com trilha do carnaval de cada ano. músicas de Capiba, e a segunda com frevoscanção de Nelson Ferreira.

surgiram outras agremiações semelhantes, que, no dorme”, de Nelson Ferreira. O lado B traz “Boneentanto, nunca conseguiram maior destaque na ca”, frevo-canção de José Menezes e Aldemar folia carioca. O frevo autêntico, direto do Recife, Paiva, na voz de Claudionor Germano, que daí em aportou na então capital do país em 1951, quando diante se tornaria o intérprete por excelência do O Vassourinhas, o verdadeiro, do bairro do São frevo. Em 1955, a Fábrica de Discos Rozenblit José, num navio do Lóide, viajou para a Guanaba- estaria funcionando na Estrada dos Remédios. ra. Foi uma viagem de importância fundamental, não para o carnaval carioca, mas para o baiano. O 1956 – Gravação, com selo Mocambo, da navio que levava o Vassourinhas deu uma parada Rozenblit, o frevo “Vassourinhas”, com a orquestra em Salvador, e fez uma apresentação especial para de Nelson Ferreira, célebre pelas variações, em sax os soteropolitanos. A orquestra de 65 músicos, alto, de Felinho (Félix Lins de Albuquerque, Bonito dirigidos pelo tenente João Cícero, e o bloco com 1895 – Recife 1980). Uma ousadia que provocou todo mundo fantasiado empolgaram os baianos de polêmica. tal forma, que a exibição por pouco não se transforma em tragédia. Os integrantes do Vassourinhas 1957 – O frevo-canção “Evocação” de Nelson foram obrigados a interromper o desfile e procurar Ferreira, com a Orquestra dirigida pelo compositor e abrigo no Palácio do Governo. O Vassourinhas con- interpretado pelo coral do Bloco Carnavalesco Batinuaria sua viagem para o Rio, mas deixaria a se- tutas de São José, consagrou-se como o primeiro mente do frevo plantada na capital da Bahia. No frevo feito e gravado em Pernambuco a fazer sucescarnaval daquele ano, Dodô e Osmar passaram a so nacional. Não apenas isso, foi a música mais cantocar frevos pernambucanos na sua velha fubica Ford tada do carnaval daquele ano em todo o país. 29, embrião dos futuros trios elétricos. “Vassourinhas” era o ponto alto deste repertório, tocado com 1959 – Com o objetivo de homenagear Capiguitarra baiana, violão elétrico e um triolim. Moraes ba, que completava 25 anos de frevo (contados a Moreira, em 1980, lembrou o fato em um dos seus partir de “É de amargar”), Claudionor Germano grandes sucessos “Vassourinha elétrica”: Varre, varre, gravou uma compilação das composições mais Vassourinhas/Varreu um dia as ruas da Bahia/Frevo, conhecidas de Lourenço da Fonseca Barbosa. No chuva de frevo e sombrinhas/Metais em brasa, brasa, mesmo ano, o mesmo Claudionor Germano grabrasa, que ardia...Abriu alas e caminhos/pra depois varia outra coletânea O que Eu Fiz e Você Gostou, passar/o trio de Armandinho, Dodô e Osmar”. com composições de Nelson Ferreira (várias com parceiros). Com um competente trabalho de divul1953 – José Rozenblit decide gravar o primeiro gação, estes dois álbuns fariam com que o frevo se 78rpm de frevo em Pernambuco, no estúdio da tornasse a música do carnaval nordestino. Rádio Clube (mas ainda prensado no Rio, na SinEstratégia reforçada no ano seguinte com mais ter). O lado A trouxe o frevo-de-rua “Come e duas outras compilações, ambas com Claudionor

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Cronologia do frevo

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1909 – Matias da Rocha teria composto a “Marcha n°1 de Vassourinhas”, do Club Carnavalesco Vassourinha, nascido em 1889. Esta marcha, mais conhecida como “Vassourinha”, tornou-se com o passar dos anos o hino não-oficial do carnaval pernambucano. Matias da Rocha deu parceria à sua mulher, Joana Baptista.

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1923 – Ano do primeiro frevo gravado “Borboleta não é ave”, de Nelson Ferreira e J.Borges Diniz, composta em 1922 para o Bloco da Concórdia. Foi lançado em disco da Casa Edison, pelo Grupo do Pimentel e vocal de Bahiano (Manuel Pedro dos Santos).

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Diario de Pernambuco com “É de amargar”. A marcha-canção seria gravada em dezembro daquele ano por Mário Reis e Os Diabos do Céu, em discos RCA Victor. Foi também em 1934 que, pela primeira vez, um frevo composto por uma mulher participaria de um concurso carnavalesco. Trata-se de “Vem, meu benzinho” de Argentina Maciel (1888/1970), que mereceu uma ótima biografia do Padre Jaime Diniz. 1951 – Desde 1934, o frevo passou a habitar a cidade do Rio de Janeiro. Naquele ano foi fundado, por pernambucanos, o Clube Carnavalesco Mixto Vassourinhas, na Saúde, no rastro do qual

Abaixo, foto de Pierre Verger (1947)

Reprodução

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1930 – Lourenço da Fonseca Barbosa, já conhecido como Capiba, aprovado num concurso do Banco do Brasil, passa a morar no Recife, onde logo se entrosa com os músicos e boêmios da cidade.

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novo no frevo pernambucano e é cantado (no dia 2 de fevereiro), que ia fazer uma particinacionalmente nas vozes de estrelas como pação histórica como convidado de Nóbrega. Caetano Veloso, Gilberto Gil, Amelinha, Geraldo Com o nome de Spok frevo Orquestra ela passaria Azevedo e Jackson do Pandeiro. a renovar o frevo, participando de eventos importantes como o TIM Festival, contribuindo para 1985 – Em pleno Rock in Rio, o frevo “Banho de o frevo se tornar uma música do ano todo, não cheiro” (Carlos Fernando) é cantado por uma apenas de carnaval. multidão estimada em mais de 600 mil pessoas. Um recorde para o frevo.

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1997 – É formada a orquestra do jovem maestro Spok para tocar no bloco Na Pancada do Ganzá, criado por Antonio Nóbrega, na avenida Boa Viagem, enfrentando os blocos de trio de axé music. O bloco, no entanto, não sai como estava previsto, pela morte prematura de Chico Science

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1932 – O maior sucesso do carnaval brasileiro neste ano foi a marchinha “O teu cabelo não nega”, assinada por Lamartine Babo. Recusada por Francisco Alves, o ídolo do rádio na época, a marcha foi gravada por Castro Barbosa. No rótulo do 78rpm lia-se um “motivo do Norte arr. Lamartine Babo”. Com exceção da antológica introdução e a modificação na letra, a música havia sido composta pelas irmãos pernambucanos João e Raul Valença, e enviada à RCA Victor para ser gravada para o carnaval pernambucano. Os irmãos Valença acionaram a gravadora e ganharam o direito à parceria da música que tinham feito em 1929, e era bem conhecida no Recife.

2006 – Pela primeira vez, o frevo chega à China, levado pela Spokfrevo Orquestra. Alceu Valença, um mestre do frevo cantado, leva uma multidão ao Bairro do Recife (calculada em 140 mil pessoas) para a gravação de um DVD; foi a maior frevança fora de época já acontecida no Recife, comandada por um único artista popular (José Teles).

1934 – Capiba (Surubim, 1904/Recife 1997) ganha o concurso carnavalesco promovido pelo

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