"êxodo", por carlos gomes

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êxodo, Carlos Gomes cantos I, II e III I éramos doze cavalos não éramos trote, voo tampouco essa dança, esse viajar matreiro uma mais tenra, cheia de dentes nas bocas nós corremos nos campos cinzas no despertar das sensações que ficam não podemos levar nossas saudades nas bolsas nem nas caixas cabem animais de estimação o que se há de ver? perguntam os mais mortos guardar espírito no peito é o que sugere o corpo esse vento bailando esparso nas ruas descalçadas quem canta espalha a estória que não vemos e esse sibilar do tempo, santos de milagres nenhuns será a lua que range absoluta a música das entranhas? animais não, animais não sangrando incólume dentro de nossas almas a fome, palavra encarada na escuridão e as ossadas que nos esperam estão todas por algum até parece que caem sem desejar barrar a passagem dos andarilhos


II seguíamos bem longe dos portos ainda uma vontade imensa de sonhar como iluminação que revela outra atmosfera mais alguma coisa de força que não cremos intuímos que passos preencham gotas de alegria naquele riacho, naquela telha, naquele céu estrelado também não cabem amores adornos cabe apenas essa garra obscurecida por nossas vistas os vivos, não por isso esse silêncio de terra o uivo dos animais noturnos soa como música se não vemos é como se ninguém houvesse contado quem negará a música silenciosa, a música silenciosa? dos homens, dos meninos, das mulheres que peste é essa que acossa as nossas cabeças? um pouco antes da alma, na carne que não é carne não é música silenciosa, é peçonha que assombra por algum motivo à beira da estrada dos cavalos ou deus, dos cavalos ou deus que não trotam em lamentar sertão


III éramos doze cavalos seguíamos bem longe dos portos não éramos trote, voo tampouco ainda uma vontade imensa de sonhar essa dança, esse viajar matreiro como iluminação que revela outra atmosfera uma mais tenra, cheia de dentes nas bocas mais alguma coisa de força que não cremos nós corremos nos campos cinzas intuímos que passos preencham gotas de alegria no despertar das sensações que ficam naquele riacho, naquela telha, naquele céu estrelado não podemos levar nossas saudades nas bolsas também não cabem amores adornos nem nas caixas cabem animais de estimação cabe apenas essa garra obscurecida por nossas vistas o que se há de ver? perguntam os mais mortos os vivos, não guardar espírito no peito é o que sugere o corpo por isso esse silêncio de terra esse vento bailando esparso nas ruas descalçadas o uivo dos animais noturnos soa como música quem canta espalha a estória que não vemos se não vemos é como se ninguém houvesse contado e esse sibilar do tempo, santos de milagres nenhuns quem negará a música silenciosa, a música silenciosa? será a lua que range absoluta a música das entranhas?


dos homens, dos meninos, das mulheres animais não, animais não que peste é essa que acossa as nossas cabeças? sangrando incólume dentro de nossas almas um pouco antes da alma, na carne que não é carne a fome, palavra encarada na escuridão não é música silenciosa, é peçonha que assombra e as ossadas que nos esperam estão todas por algum por algum motivo à beira da estrada até parece que caem sem desejar barrar a passagem dos cavalos ou deus, dos cavalos ou deus dos andarilhos que não trotam em lamentar sertão


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