Benicio Dias: a arte de pintar com a luz Rita de Cássia Barbosa de Araújo Historiadora e pesquisadora da Fundação Joaquim Nabuco
O Arquivo Benicio Dias no Acervo da Fundação Joaquim Nabuco Cruz do Patrão Benicio Dias Recife, Pernambuco, 1939
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enicio Tavares Whatley Dias nasceu no Recife, em 8 de novembro de 1914. Após seu falecimento, em 7 de março de 1976, em cumprimento a um desejo manifesto em vida, a família fez doação ao então Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais do conjunto documental produzido e reunido por esse fotógrafo e professor da Escola de Belas Artes do Recife. O Arquivo é formado por 2.392 documentos, entre fotografias (1.432 unidades); negativos em nitrato, em acetato, em vidro, com e sem cópia em papel (760 unidades); documentos bibliográficos e textuais. Esses últimos resumem-se praticamente a recortes de jornais que trazem matérias ilustradas sobre a fabulosa travessia Recife-Bahia realizada por Benicio Dias, Antenor Avelar e José Falcão, com a iole Moema, em novembro de 1932.1 Feito de grande repercussão nacional, um periódico publicado no Rio de Janeiro, cujo título e data não estão identificados, noticiava: Deste hontem encontra-se em nossa capital o jovem Benicio Tavares, um dos tripulantes da yole que fez a travessia Recife-Bahia, acontecimento sem dúvida dos mais arrojados, tanto mais que o citado raid foi exclusivamente realizado com estímulo e melhor mostra do valor do homem do norte.2
A família de Benicio Dias parecia ser dada às práticas esportivas, o que revelaria partilhar um estilo de vida burguês citadino e moderno, estimulado e cultivado entre membros das elites brasileiras principalmente a partir das primeiras 7
décadas do século XX. Além dos esportes náuticos, há fotografias que mostram seu irmão Alfredo Whatley Dias fazendo verdadeiras proezas em um tronco de coqueiro, daqueles bem esguios ainda hoje existentes ao longo do litoral nordestino. Desenvolver essa destreza significava manter um intenso e íntimo convívio com a vida praiana, em si mesma uma conquista da sociedade urbana moderna.3 Além das fotografias autorais de Benicio Dias, que abrangem o período de 1930 a 1950, outros fotógrafos estão presentes no conjunto, a exemplo de Constantino Barza, J. J. de Oliveira e F. du Bocage. Encontram-se também reproduções fotográficas de documentos e obras de arte, como litografias de F. H. Carls, retratando a paisagem urbana e o cotidiano do Recife na segunda metade do século XIX; pinturas de Teles Junior, em que predominam paisagens rurais e urbanas de Pernambuco na virada do século XIX para o século XX; pinturas de Elezier Xavier, desenhos de Hélio Feijó. Diante dessas constatações, cabe-nos indagar: a presença dessas fotografias de autoria de outros fotógrafos e das cópias documentais no conjunto arquivístico seria revelador de certo gosto pelo colecionismo cultivado por Benicio Dias? Ou resultaria dos serviços prestados como fotógrafo a órgãos de governo, a exemplo da Diretoria de Estatística, Propaganda e Turismo (Dept), vinculada à Prefeitura do Recife? Criada em março de 1939, durante a administração de Antônio de Novaes Filho, em consonância com os princípios do Estado Novo de dar agilidade, tecnicidade e racionalidade à máquina estatal — mas também,
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Cruz do Patrão Francisco du Bocage Recife, Pernambuco, 1912. Coleção Benicio Dias
tornemos claro, de produzir informações e de exercer o controle sobre os conteúdos, os meios e as formas de expressões da população em geral —, a Dept visava, entre outros objetivos, produzir, acumular e divulgar dados estatísticos sobre a cidade, como também estimular o desenvolvimento do turismo e produzir, acumular e tornar acessível aos “amigos do Recife” um significativo acervo histórico-documental sobre a capital pernambucana. Para tal objetivo, muito contribuíram os periódicos Arquivos e Boletim da Cidade e do Porto do Recife, ambos contendo, além dos artigos e das informações estatísticas, fotografias, desenhos e gravuras. Nas palavras elogiosas do prefeito Novaes Filho à Diretoria de Estatística, Propaganda e Turismo: Os amigos da cidade, aquêles que se interessam por todas as coisas ligadas à sua vida, ao seu passado, ao seu presente, ao muito que se têm realizado, dito e escrito sobre o Recife, já encontrarão na Dept um documentário formidável. O velho e o novo Recife desfilam aos nossos olhos com enternecedor encanto. A Praça da República, antigo Campo das Princesas, lá está documentada, desde o famoso Palácio de Friburgo, de Nassau, a que o vulgo denominou de Palácio das Torres, até aos dias atuais. Todas as fases estão bem retratadas. As coleções de fotografias de várias épocas, de prédios, trechos da cidade, tipos populares, tudo se acha cuidadosamente catalogado. Gráficos, telas, painéis, desenhos, retratos, enfim, várias formas de ver-se e reverse o Recife, são encontradas na Dept.4
As reproduções documentais e as imagens predominantemente retratadas nesses exemplares fotográficos produzidos por outrem, guardadas por Benicio Dias, são registros da memória iconográfica sobre o Recife, temporalmente situados entre 1870 e 1950. Postos lado a lado, levam-nos a perceber que havia uma circulação de imagens alusivas à capital pernambucana, como também a constatar que um mesmo motivo, uma mesma paisagem, certos monumentos ou edificações — públicas, na maioria das vezes —, um mesmo enquadramento de determinado artefato urbano e arquitetônico do Recife eram desenhados ou fotografados recorrentemente, em diferentes momentos da sua história. Possibilita-nos pensar que, consciente ou inconscientemente, faziam parte da cons-
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Ponte Buarque de Macedo, bairros do Recife e de Santo Antônio Autoria não determinada, 1905. Coleção Benicio Dias
trução de uma memória social sobre o Recife — carregada de um conjunto de significados e valores expressos em registros iconográficos — que se pretendia afirmar, difundir e legar ao futuro, em defesa de interesses e projetos próprios aos grupos que a elaboravam e a veiculavam. O próprio interventor federal em Pernambuco, Agamenon Magalhães, deixava clara a intenção do governo de formar um acervo contendo registros documentais sobre a cidade, principalmente registros imagéticos que representassem “valores positivos de evocação, de estudo e se [tornassem] propriedade de toda a cidade que ali poderá se rever nas suas fases de luta e progresso”.5 O fato de essas imagens estarem presentes no acervo documental reunido por Benicio Dias sugere também que o fotógrafo as utilizasse em seus estudos comparativos sobre modos distintos de fotografar, considerando conceitos, técnicas e equipamentos, com o objetivo de marcar uma diferença, firmar uma identidade própria, sempre interessado em produzir uma fotografia contemporânea, artística, moderna. Ainda que se tratasse de um “marco paisagístico” 6 há muito estabelecido e representado à exaustão, o fotógrafo deveria dar ao registro a sua interpretação pessoal. Fotografar o “mesmo”, porém com um olhar moderno, artístico, contemporâneo. Mas, talvez, estivesse ele imbuído, a par das demais
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Ponte Buarque de Macedo e Ponte Sete de Setembro Litogravura de F. H. Carls. Coleção Benicio Dias
motivações e interesses anteriormente aventados, do desejo de mostrar a permanência e perenidade de certos aspectos físicos e feições da cidade, responsáveis por lhe conservar o caráter e por manter renovado o seu mistério. Ou senão, estivesse em busca de atestar e de demonstrar, por meio da documentação colecionada, as mudanças ocorridas em aspectos e recortes da paisagem urbana ao longo dos anos, na sua vida social e cotidiana, nos usos e significados atribuídos a certos lugares, elementos naturais ou edificados, a exemplo de trechos do rio Capibaribe, dos cais, das pontes e de suas margens. Há, entretanto, em meio aos papéis que formam o Arquivo em apreço, um documento firmado pelo próprio Benicio Dias, destinado ao então diretor do Museu do Açúcar, Fernando da Cruz Gouvêa, em 27 de maio de 1963, no qual registra a entrega de 80 negativos fotográficos escolhidos, numerados e com as respectivas legendas anotadas uma a uma. Aos selecionados, Benicio Dias acrescentou mais dois negativos. Todas as imagens, em consonância com os propósitos do Museu, tinham relação estreita com a sociedade que se edificara com base na economia açucareira voltada para a exportação, desde os mais remotos dias de implantação do sistema colonial no Brasil: o estivador Nascimento e outros anônimos trabalhadores do porto, o carregamento das sacas de açúcar nas
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alvarengas, as barcaças alcançando o mar; o Cais do Apolo; engenhos de açúcar com seus canaviais, capelas, casas-grandes, casas de purgar, carros de boi, escritórios; as usinas Salgado e Central de Barreiros; vendedores de caldo de cana e de rapadura. As fotografias que integram o Arquivo Benicio Dias procedem, desse modo, da doação de mais de 2.000 imagens feita pela família, em 26 de maio de 1976, e dos 82 negativos fotográficos provenientes do Museu do Açúcar, quando de sua incorporação, em 1977, ao patrimônio público cultural do Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais, atual Fundação Joaquim Nabuco.
A grande arte da imagem Em 1944, por iniciativa da Diretoria de Estatística, Propaganda e Turismo, foi realizado o Primeiro Salão de Arte Fotográfica do Recife. O objetivo da mostra era reunir um número expressivo de boas obras de arte fotográfica sobre a capital pernambucana e também educar o gosto do público, “despertando-lhe o interesse pela técnica e pela arte fotográfica”. Trinta e quatro fotógrafos entre amadores e profissionais concorreram ao Salão. No total, foram inscritas cento e oitenta e duas fotografias. A comissão julgadora, formada por Evaldo Coutinho, Souza Barros, Phil Schefer, Manoel Bandeira (o artista plástico) e José Césio Regueira Costa, concedeu o Prêmio Cidade do Recife, destinado especialmente à melhor fotografia que fixasse aspectos sobre paisagem, tipos e costumes do Recife, a Benicio Tavares Whatley Dias, por sua obra Beco do Marroquim. O resultado para as demais divisões apontou: Primeiro Prêmio à fotografia Procissão, por Benicio Dias; o Segundo Prêmio, a Vaqueiro, de autoria de Lula Cardoso Ayres, e o Terceiro Prêmio, à fotografia Esquecidas Sentinelas do Forte do Buraco, por Roberto Diniz Santos. Além desses, Benicio Dias conquistou menções honrosas com as fotografias Jararaca, mestre embolador, e Retrato de Dom Gerardo Martins.7 Em entrevista à Folha da Manhã, em 17 de janeiro de 1945, Benicio Dias foi provocado a opinar sobre a existência ou não de uma arte fotográfica. Inseria-se, assim, no acalorado debate existente à época nas grandes cidades brasileiras, principalmente no meio do foto-cine clubismo.8 A discussão remetia
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à história da fotografia no século XIX, quando se lhe era conferido o valor de um documento histórico ou científico inquestionável, quando se lhe atribuía o estatuto da verdade, de reprodução fiel do objeto fixado por meio mecânico e da técnica. Levava a refletir também sobre a antiga prática pictorialista, em que se intervinha no negativo e na fotografia com o intuito de conceder-lhe um caráter artístico. Entre os anos 1930 e 1950, no entanto, a fotografia buscava reinventar-se e se afirmar como uma nova linguagem artística, abstrata, interpretativa, em que a emoção, o sentimento e a subjetividade daquele que fotografava eram os protagonistas da “grande arte da imagem”. Nas palavras do vencedor do Primeiro Salão de Arte Fotográfica do Recife: O fotógrafo “pinta com a luz”. A maneira como a controla num diafragma, como permite que atravesse o cristal dos elementos, de que tipo de lente, despojada em regiões do espectro ou intensificada em outras, sobre que tipo de emoção a projeta e, enfim, como desenrola a meada longuíssima do processo fotográfico completo, tudo isso pertence ao artesanato da fotografia. Ao fotógrafo-artista ou à arte fotográfica, porque não sei como separá-los, caberá servir-se dêsses elementos para dizer com a imagem que conseguir sua reação diante de determinado assunto, pois, no instante curtíssimo ou na exposição demorada, conjurou todos os seus conhecimentos e toda a sua sensibilidade, toda a poesia e toda a emoção de que é capaz. Sòmente em tais casos terá conseguido transmitir ao sentimento dos outros a sua experiência emocional, indo além do mero documentário ou do ùnicamente recordativo, até a grande arte da imagem realizada e que, em série, formará a montagem, que, uma vez apreciada, fará o milagre da transmissão e jamais será esquecida. Essa, a arte fotográfica legítima e honesta.9
Perseguia-se a arte fotográfica. Entendia-se que bons equipamentos e o domínio da técnica fotográfica podiam fornecer reproduções fiéis, nítidas e bem enquadradas do objeto a ser fixado: paisagens, ambientes, tipos, costumes. A composição de uma foto artística, no entanto, pedia mais: expressava o gosto artístico, a inteligência e a capacidade intuitiva daquele que fotografava, assim como o sentimento e o estado de espírito de que estava possuído no momento da tomada da foto. E mais: deveria impactar de tal forma aquele que sobre ela
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depositasse o olhar, a ponto de tornar-se inesquecível. Como disse Benicio Dias, o grande vencedor do Salão de 1944, uma foto artística era aquela que captava o caráter do motivo fotografado, “o seu conteúdo, o que ele tem de misterioso, de poético, cuja existência é apenas uma intuição para a maioria. O artista é justamente aquele que sabe ver e fixar o imponderável.”10 O processo de redefinição do lugar e do estatuto da fotografia e do aparecimento de uma arte fotográfica moderna no Recife, entre os anos 1930 e 1950, pode ser estudado por meio de um representativo conjunto fotográfico do qual fazem parte os arquivos e as coleções de Benicio Dias, Alexandre Berzin, Juventino Gomes (Juju), Lula Cardoso Ayres, dentre outros, que se encontram preservados e acessíveis à consulta no acervo histórico da Coordenação Geral de Estudos da História Brasileira (Cehibra), da Fundação Joaquim Nabuco, órgão do Ministério da Educação. Fotógrafos cujas produções artísticas e documentais escaparam à destruição humana e que, hoje, salvaguardadas, são partes do patrimônio histórico, artístico e cultural brasileiro, capazes, desse modo, de vir a restabelecer uma relação dinâmica e viva com a cultura, a ciência e a sociedade.
Entre duas cidades: o Recife da juventude e dos primeiros anos de maturidade de Benicio Dias Durante as décadas abordadas neste trabalho, Benicio Dias e o letão Alexandre Berzin eram reconhecidos como os fotógrafos que mais produziam documentação sobre o Recife, além de serem considerados os expoentes de um grupo responsável por só então fazer emergir o caráter, a poesia, a emoção e o romance da cidade, de suas paisagens e de sua gente. Ambos registravam o Recife para compor o acervo da Diretoria de Estatística, Propaganda e Turismo, para a qual trabalhavam. Produziam, no entanto, uma “Documentação sem a forma rígida da reprodução, mas com um profundo sentido interpretativo”, conforme destacava matéria publicada no Jornal do Commercio, em 1941: [...] O céu da cidade, a linha tortuosa dos arrecifes, as barcaças e lanchas, as massas luzidias das mangueiras do arrabalde, bem como a vivacidade e a inteli-
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Ponte Buarque de Macedo Benicio Dias Recife, Pernambuco, ca. 1940
gência dos tipos populares, certo mistério de velhas ruas do bairro de São José, tudo isso aparece nas fotografias desses artistas com o seu verdadeiro sentido, com um destaque em certas linhas, em certos preto e branco de modo a revelar um significado mais real, mais íntimo, que é o próprio caráter do motivo, quer se trate de uma paisagem ou de um tipo.11
O Recife retratado por Benicio Dias, preservado no acervo da Fundação Joaquim Nabuco, corresponde àquele compreendido entre as décadas de 1930 e 1950. Não apenas o Recife: todas as demais fotografias de sua autoria, incluindo as das históricas cidades de Olinda e de Igarassu; as da ilha de Itamaracá, antiga capitania; e as cidades de Canhotinho e Garanhuns, no Agreste, com a sua arte popular em cerâmica só assim reconhecida na década de 1950, e as tradicionais feiras livres de gado e de alimentos, dentre tantos outros percursos e registros, possuem este recorte temporal. Período de um Brasil em processo de modernização que o conduziu definitivamente à industrialização e o transformou em
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Casebres Autoria não determinada Recife, Pernambuco, ca. 1930. Coleção Benicio Dias
uma sociedade marcadamente urbana; como definitivo foi o deslocamento do centro hegemônico do País para o Rio de Janeiro e, principalmente, para São Paulo, selando a perda de espaço político e econômico da ainda chamada Região Norte no conjunto da Federação. Região territorialmente definida, que passou a atender crescentemente, a partir de então, pelo nome de Nordeste — em si mesma uma construção simbólica cuja base se encontra nesse processo histórico iniciado nos distantes anos 1820, 1830, que findou por deslocar o centro hegemônico do País para o Centro-Sul. A partir de então, 1930, agravaram-se as desigualdades regionais no Brasil.12 Ainda que econômica e politicamente enfraquecido em relação ao conjunto da Federação, Pernambuco vivia, entre o final do século XIX e as primeiras décadas do século XX, um processo de modernização de sua economia advindo fundamentalmente do surgimento das usinas de açúcar instaladas na Zona da Mata. Processo reforçado pela reforma do porto marítimo do Recife, escoadouro de produtos agrícolas para exportação, como o açúcar e o algodão; assim também pela reformulação do bairro homônimo, seguindo a concepção haussmaniana de reforma urbana, original e modelarmente aplicada a Paris. As usinas provocaram pouco a pouco a ruína dos engenhos de açúcar tradicionais — deixaram de “fogo morto” os banguês. E com eles se foram os senhores de engenhos patriarcais e
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o complexo formado pelas imponentes casas-grandes, pelas capelas e senzalas. A decadência das oligarquias tradicionais do Norte Agrário correspondeu à ascensão de outra classe social dominante de base urbana: a dos agroexportadores e industriais. Entretanto, certos elementos estruturadores da sociedade permaneceram inalterados no meio rural, como a estrutura de poder, a concentração fundiária, a sobrevivência de formas de relação de trabalho pré-capitalistas e o baixo nível de renda de sua população. A modernização no campo teve repercussão imediata na capital pernambucana do Recife, cuja população passou de um total de 116.671 em 1872, para 238.843 habitantes em 1920. A cidade concentrou as operações financeiras e as fábricas que serviam à economia açucareira, como as de cal, sacaria e veículos, além daquelas voltadas para a produção de bens de consumo primários, a exemplo das fábricas de cigarro, tecidos, bebidas e alimentos. Esse movimento dinâmico na economia e na divisão de trabalho fez surgir e consolidar uma classe média urbana, sedenta de oportunidades, de espaços e de reconhecimento na organização social, na vida política e no mundo do trabalho. Foi essencial também para a ampliação e o fortalecimento da emergente classe trabalhadora urbana livre e assalariada, formada pelos operários das fábricas, das gráficas, trabalhadores do porto, das ferrovias e dos transportes urbanos, empregados no comércio e funcionários públicos dos escalões inferiores; além dos artífices e artesãos, empregados domésticos, feirantes, diaristas. Mas a estrutura e a dinâmica da economia urbana recifense mostraram-se insuficientes para absorver todos os milhares de braços que, em ondas sucessivas, chegavam à capital. Fugidas das secas ou expulsas das terras das usinas e dos engenhos, levas e levas de migrantes “severinos”, vindas de diversas partes do Nordeste, aportavam no Recife, “a derradeira ave-maria do rosário” de que fala João Cabral de Melo Neto. Destituídos de posse, analfabetos a maioria, e sem laços de família e de compadrio aos quais pudessem recorrer, esses indivíduos ou essas famílias acomodavam a si e aos pouquíssimos pertences como bem podiam: nos interiores das casas de família servindo de empregados domésticos ou arriscando a vida na informalidade das ruas, como fez o comunista Gregório Bezerra; nos porões das casas de comércio e nos fundos das padarias, como restou ao “moleque Ricardo” e a seus novos amigos da cidade, amigos de infortúnios, de luta, de esperança e de Carnaval. Ajeitavam-se nos casebres que
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subiam os morros que circundam a zona norte da cidade do Recife; improvisavam suas vidas nos mocambos que dia e noite apareciam fincados nos alagados: “Todos atraídos por esta terra de promissão, vindo se aninhar naquele ninho de lama, construídos pelos rios e onde brota o maravilhoso ciclo do caranguejo”, nas palavras definitivas de Josué de Castro.13 Imigrantes pobres e esfomeados que chegavam aos montões, assustando as elites e a classe média e preocupando os governantes pela potencial ameaça que acreditavam representar à organização social e à ordem pública constituída. A década de 1920 em Pernambuco e no Recife, em particular, assinala movimentos e mudanças significativas no âmbito da política, da educação, da arte e da cultura: o Tenentismo, a fundação do Partido Comunista Brasileiro, o surgimento da Escola Nova; os melhoramentos urbanos implementados durante o governo de Sérgio Loreto — requalificação do porto, construções de pontes e de diversos prédios públicos, urbanização dos bairros do Derby e de Boa Viagem, dotando o Recife de um balneário moderno e elegante, a criação do Departamento de Saúde Pública e Assistência Social, por meio do qual se buscou sanear e higienizar a cidade, iniciando uma campanha oficial contra os mocambos. Na área das artes e da cultura, de norte a sul do País, acirravam-se os ânimos e os debates entre os partidários de diferentes visões e conceitos sobre a cultura, a arte e o patrimônio histórico-cultural, cujo pano de fundo era a necessidade de definir uma nova identidade nacional para o Brasil, bem como suas vertentes regionais e locais: a Semana de Arte Moderna e o Movimento Regionalista no Nordeste — modernista, a seu modo tradicionalista, como o definia seu principal ideólogo e líder, o sociólogo e antropólogo Gilberto Freyre —, a criação da Inspetoria Estadual dos Monumentos Nacionais em Pernambuco, do Museu Histórico e do Museu de Arte Antiga de Pernambuco. Revia-se o conceito de patrimônio histórico-cultural, a partir do qual alguns poucos — artistas, intelectuais e técnicos, gestores públicos, políticos e governantes — decidiam, em boa medida, sobre o que deveria ser lembrado, preservado e transmitido às futuras gerações ou, do contrário, sobre o que não possuía valor histórico, artístico ou arquitetônico e, por essa razão, poderia ou deveria ser esquecido, destruído intencionalmente ou ser largado às intempéries do tempo e ao maltrato humano.14 O Estado Novo, vigente entre 1937 e 1945, acentuou o processo de modernização em curso no País, por via da industrialização e da urbanização, conduzindo-o
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Av. Saturnino de Brito Benicio Dias Recife, Pernambuco, ca. 1940
de forma centralizada, autoritária, elitista e sob o ideal da integração nacional, do nacionalismo e da cooperação entre o capital e o trabalho. Recife, a terceira maior cidade do Brasil e a capital regional do Nordeste, em 1940, contava com uma população de 347.359 habitantes. A morfologia urbana da cidade modificava-se, passando da forma tentacular consolidada na segunda metade do século XIX para a da mancha urbana na década de 1950.15 O crescimento dos subúrbios e a interligação entre os bairros eram um dos fatores que explicavam a alteração assistida na forma de ocupação do território da cidade, mas a causa principal residia no notório aumento da prática histórica de roubar terras aos manguezais, soterrando -os, e na ocupação crescente dos morros da zona norte da capital, expandindo-se já para os morros mais ao sul. O redesenho da forma urbana, com a ocupação contínua da massa territorial, significava a perda do secular equilíbrio existente entre natureza e área urbana ocupada, trazendo, entre as consequências, mudanças na configuração física dos subúrbios recifenses e nas imagens e memórias construídas sobre cada uma dessas localidades em particular.16 A cidade do Recife começava a inchar. Os mocambos se alastravam por todo o tecido urbano, podendo ser vistos inclusive nas áreas mais urbanizadas. Eram
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45.581 em 1939; contra os 16.347 existentes em 1913. A visão dos mocambos como algo perigoso, infecto e antiestético exacerbou-se nesse período. Erradicá-los tornou-se um dos objetivos centrais da interventoria de Agamenon Magalhães, para o êxito do qual criou a Liga Social Contra o Mocambo. Visando contrapor-se à expansão dos mocambos e fortalecer a política de erradicação desse tipo de moradia, Agamenon Magalhães concebeu o projeto de edificação de casas populares destinadas ao operariado urbano, feitas em alvenaria, saneadas, salubres e ajardinadas. Surgiram as vilas operárias das Lavadeiras, das Costureiras, dos Comerciários, entre outras. Para as autoridades do Estado Novo, a cidade precisava modernizar-se, tanto em suas formas físicas e no traçado de suas vias, como também no estilo de vida, nos comportamentos e padrões de convivência entre os cidadãos. Por modernização entendia-se então sanear, higienizar e embelezar, pessoas e coisas. Uma das primeiras medidas de Agamenon Magalhães, por intermédio do prefeito do Recife, Antônio de Novaes Filho, foi a de instituir uma comissão para formular um plano de remodelação para a cidade do Recife. Urgia criar o “novo Recife”, conforme expressão à época. Dotar a cidade de uma nova face, que materializasse e transmitisse a ideia de progresso e a perspectiva de um grandioso futuro para Pernambuco. Nessa linha de raciocínio, a construção do novo Recife, limpo, asseado, bonito e arejado, exigia por contrapartida a destruição de tudo que se lhe opusesse e que representasse a noção de atraso, decrepitude, acanhamento, provincianismo, antiestético e insalubridade. Para os entusiastas do progresso, governantes e técnicos urbanistas, o Recife que trazia sinais do antigo sistema colonial e que cheirava a açúcar, fazendo lembrar a velha sociedade patriarcal escravista dos senhores de engenho, esse Recife deveria ser morto. Morto, mutilado, “pregado à cruz das novas avenidas”, na imagem poética de Joaquim Cardozo. A expressão maior da vontade política do Estado Novo de construir uma nova imagem para o Recife e de deixar inscrita a sua marca para a posteridade foi a realização da reforma urbanística do bairro de Santo Antônio. Ruas desqualificadas por tortuosas e congestionadas, becos considerados infectos, casinholas modestas, sobrados decrépitos que diziam servir de pardieiros e abrigar prostitu-
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Ponte Buarque de Macedo, construção do edifício da Secretaria da Fazenda Benicio Dias Recife, Pernambuco, ca. 1940
tas, como também o pátio e a igreja do Paraíso, edificada no século XVII, deveriam desaparecer da paisagem. Iniciada no final da década de 1930, a reforma de Santo Antônio resultou da reelaboração de diversos planos urbanísticos para aquela área da cidade, cujo princípio de ocupação data da época da presença holandesa em Pernambuco: o Plano de Reforma do Bairro de Santo Antônio, do engenheiro Domingos Ferreira (1927); os do arquiteto Nestor de Figueiredo, intitulado Plano de Reformulação e Extensão da Cidade do Recife (1930; 1932); o Plano para o Bairro de Santo Antônio e o Plano de Expansão da Cidade, de Atílio Corrêa Lima (1936). Em 1938, foi aprovada a proposta de intervenção urbanística feita pela Comissão do Plano da Cidade, o chamado Plano Definitivo de Reforma do Bairro de Santo Antônio, que incorporou posteriormente as sugestões do urbanista Ulhoa Cintra (1943), “de caráter eminentemente viário.”17
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No relatório Seis Anos de Administração Municipal, datado de 1945, e em matéria jornalística publicada na Folha da Manhã, pertencente ao interventor Agamenon Magalhães, o prefeito do Recife Novaes Filho exaltava os feitos do Estado Novo na cidade: Trabalhei e construí. A nova fisionomia da cidade que já se vai definindo em traços nítidos, a planificação urbana do Recife a cujos trabalhos presidi dandolhes características, uniformidade e organização, os novos rumos administrativos introduzidos e fixados, são o testemunho do que afirmo. / O trabalho é fruto do regimen de trabalho e acção administrativa que o Estado Novo, em bôa hora, veio inaugurar para a salvação do paiz [...] em cujo governo nenhum problema fica sem solução e nenhum serviço soffre retardamento.18
As obras de reconstrução do bairro, coexistentes com a massa de ruínas e escombros e os vazios deixados pelas demolições, tiveram início com a abertura da Avenida 10 de Novembro, atual Avenida Guararapes, e a reformulação da Praça da Independência. No entanto, como sentenciou o jornalista e historiador Mário Melo, “nem sempre construir significa progresso. Às vezes o progresso está na destruição.”19 E assim o foi. Do silêncio das pedras, nasceram largas avenidas, pontes de concreto armado e arranha-céus: Avenida 10 de Novembro e Avenida Dantas Barreto, que só veio a ser concluída em 1973, a ponte Duarte Coelho e os corredores de edifícios modernos que as ladeiam. Perto dali, alinhados ao Capibaribe, estavam o Grande Hotel, inaugurado com muito luxo e muita pompa em 1938, e o edifício da Secretaria da Fazenda. Mas, para além das motivações de ordem política (construir uma imagem moderna e progressista para o Recife, condizente com a posição de terceira cidade do País e de capital regional do Nordeste), técnica (circulação), estética (embelezamento) e higienista (saneamento), a arquiteta urbanista Rosane Picollo Loretto salienta, em sua análise, o interesse do governo do Estado, da Prefeitura do Recife e instituições a ela ligadas de promover a reconstrução daquela área visando à valorização do solo; ocasião em que invoca Agamenon Magalhães: “quanto mais acelerado fôr o ritmo das construções e maior fôr o seu volume, mais dinheiro, mais riqueza e mais prosperidade serão distribuídos...”. Após afirmar que a “nova tipologia edilícia, os novos arruamentos do bairro de Santo
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Obras públicas Benicio Dias Recife, Pernambuco, ca.1940
Antônio e a abertura da Avenida Guararapes, assim como os novos usos desses edifícios atraíram investimentos para essas áreas da cidade”, Rosane Loretto conclui que “foi destruída a Igreja do Paraíso, não pela necessidade de abertura da avenida ou pelo perfilamento das novas vias, mas pelo desejo de potencializar a rentabilidade do solo que estava sendo criado, com um acréscimo à área do lote de maior preço dessa localidade.” 20 Benicio Dias fotografou paciente e cuidadosamente os passos que iam sendo dados para a execução da reforma do bairro de Santo Antônio. Registrou a vida dos moradores transcorrendo no vulgar dos dias — como a dos meninos brincando, despreocupados, no Beco do Marroquim — e a paisagem há séculos adormecida naqueles sobrados, nas casas térreas, nos becos e nas vielas do bairro, no hospital, no pátio e na igreja do Paraíso. Capturou os inquietantes vazios deixados pelas demolições de tantos e diversos artefatos urbanos e arquitetônicos. Não deixou escapar aos olhos os gritantes contrastes que surgiram na paisagem recifense, objetivados nos diferentes estilos arquitetônicos e padrões urbanísticos que caracterizavam os tempos coloniais e os tempos modernos de então. Deixou testemunhos visuais do progresso que se acreditava haver, enfim, aportado na capital regional do Nordeste: a abertura de largas avenidas e o cal-
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çamento de largos e ruas, a construção da ponte Duarte Coelho e de edifícios modernos e verticalizados, a criação e reformulação de parques e jardins, inclusive nos bairros residenciais. Fotografou as edificações destinadas a abrigar os modernos serviços públicos criados e geridos pelo estado e município, como também as casas operárias higiênicas. Não documentou, porém, a vida de miséria dos “homens caranguejos” nem as ações governamentais de derrubada dos mocambos. Esses aparecem distanciados nas fotos, mais ao fundo, parecendo haver integrado desde sempre a paisagem anfíbia do Recife, como a qualificou Josué de Castro. Fotografar, por sinal, nesses tempos de autoritarismo e repressão, não era um ato corriqueiro e banal. Assim como tantas outras práticas, tantos comportamentos e diversas formas de expressão, ficou sujeito à rigorosa vigilância e ao rígido controle policiais: “Tornou-se comum a prisão de turistas que ousavam fotografar locais proibidos, tidos como ambientes ‘feios e sem higiene’, registrando o lado da cidade que ainda não fora ‘regenerado’.”21 Benicio Dias fotografava o que seus olhos assistiam, não apenas com o sentido de documentar o processo de destruição de uma área densamente ocupada da cidade e prenhe de impressões do passado e da história do Recife, mas registrando também, em contraposição, a construção de um modelo de cidade considerado manifestação do progresso material e do moderno. Ele fotografou buscando extrair o sentido profundo daquelas mudanças, procurando captar e transmitir, por meio da imagem fotográfica, as relações que a cidade estabelecia com o que nela havia de sobrevivências do passado e de sinais do futuro, nas formas físicas, nos estilos de vida e nas relações de convivência mantidas entre grupos e classes sociais e no modo como a população se relacionava com os espaços públicos da cidade. Coexistência entre tempos históricos materializados no espaço urbano, tensões entre o tradicional e o moderno que, no entanto, eram partes de um mesmo processo, de uma mesma história. Uma relação que se tem mostrado difícil ao longo dos tempos e com a qual a cidade do Recife — ou melhor, as suas elites — ainda não aprendeu a lidar de forma positiva, pois que continua a destruir os fragmentos do passado, inscritos em seu patrimônio paisagístico, arquitetônico e cultural, sob a vã argumentação de se estar a construir o futuro. Permanecem presas ao conceito anacrônico, e de resultados duvidosos quando não comprovadamente desastrosos, de que o novo unicamente se alcança com a destruição do velho.
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“Decifra-me ou te devoro” ou o caráter do Recife Benicio Dias viveu intensamente o estado de tensão entre o velho e o novo, o tradicional e o moderno que caracterizou o processo de modernização em Pernambuco, entre as décadas de 1920 e 1950. Seus tempos de infância, juventude e os primeiros anos de maturidade, período compreendido entre 1914 a 1944, ano em que se consagrou como o grande vencedor do Primeiro Salão de Arte Fotográfica do Recife, passaram-se entre a dissolução de uma sociedade secularmente estruturada sobre uma base agrária e escravista e o surgimento e expansão de uma sociedade urbana industrial capitalista. Tanto ele como seus contemporâneos experimentaram intimamente o torvelinho de mudanças que se fazia notar principalmente nas grandes capitais brasileiras. As percepções e os sentimentos sobre o que viam e viviam eram múltiplos, diversos e muitas vezes antagônicos. Não havia consenso entre os que assistiam a um só tempo ao espetáculo do passado que ruía à força da picareta e se desfazia em pó e à cena do futuro monumental de concreto armado que se erguia dos escombros. Em Minha terra, Manuel Bandeira recria em linguagem poética o dilema que parecia afligir os recifenses naquele período: Saí menino de minha terra. Passei trinta anos longe dela. De vez em quando me diziam: Sua terra está completamente mudada, Tem avenidas, arranha-céus. É hoje uma bonita cidade! Meu coração ficava pequenino. Revi afinal o meu Recife. Está de fato completamente mudado. Tem avenidas, arranha-céus. É hoje uma bonita cidade. Diabo leve quem pôs bonita a minha terra!22
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Para muitos, as mudanças generalizadas e vertiginosas experimentadas principalmente na capital — causadas pela decomposição do complexo rural, pela emergência de novas forças sociais e políticas, pelo crescimento do número de mocambos seguido de uma campanha institucionalizada para destruí-los e eliminá-los da paisagem do Recife, pela construção das vilas habitacionais23, pelo fim dos subúrbios e pelo início do processo de verticalização da cidade —, eram vividas com uma enorme sensação de perda, de estranhamento e de nostalgia. Vivenciadas no plano afetivo, fizeram nascer um sentimento de saudade do passado que, longe de ser um traço subjetivo, era um fenômeno social, experimentado e mesmo cultivado por muitos, traduzido em crônicas, narrativas históricas, poesias, livros de memórias, ensaios sociológicos e em imagens simbólicas sobre a capital: Recife Antigo, Recife Velho, Recife Pitoresco.24 O Recife da Rua da União, o “Recife morto, Recife bom, Recife brasileiro como a casa de meu avô”, evocado por Manuel Bandeira em 1925. Um Recife perdido nas brumas do tempo e nas nuvens da memória, idílico e imaginariamente identificado como sendo o do passado colonial, embora em termos objetivos não correspondesse àquela temporalidade, situando-se quase sempre na passagem do século XIX ao XX. Um Recife distante, morto, que chegava ao poeta encantadoramente trazido pelas asas da Cotovia:
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Margem da Estrada de Ferro do São Francisco, atual área do Cabanga Autoria não determinada Recife, Pernambuco, entre 1905 e 1915. Coleção Benicio Dias
[...] Voei ao Recife, e dos longe Das distâncias, aonde alcança Só a asa da cotovia, — Do mais remoto e perempto Dos teus dias de criança Te trouxe a extinta esperança. Trouxe a perdida alegria.25
Esse mundo em dissolução, do qual Recife era lugar central, que se buscava reconstruir na memória, tinha seus símbolos e suas imagens cuidadosamente escolhidos e veiculados. Em longa, porém, emblemática narrativa, José Lins do Rego recordava os dias de juventude passados em convívio com Gilberto Freyre, naqueles anos de 1930 e 1940, e revelava estar em curso, entre um determinado círculo de intelectuais e artistas, um processo de reeducação sentimental e cultural do olhar. No correr daqueles dias, aprendia-se a ver um novo Brasil: Fizemos passeios pelos velhos sítios à margem do Capibaribe, ao Poço da Panela. Fomos juntos a Igarassu numa bela manhã, com os cajueiros da estrada chei-
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rando. As casas e as árvores, as igrejas, as velhas ruas esburacadas, as pobres freiras com os pés nos chinelos, o Convento de Santo Antônio com o seu tristonho claustro, tudo vinha para elle como as coisas mais bellas deste mundo. O poeta, o grande poeta, arregalava os olhos, escancarava os ouvidos, para sentir de bem perto o seu Brasil que lhe parecia, em tantas coisas, tão original, tão próprio, tão cheio de suggestões, e que para mim era como se fosse do vulgar quotidiano. As casas velhas, os sobrados, os frontões humildes, as biqueiras, os portões arruinados, tudo lhe parecia de uma humanidade que estremecia com febre. Fui vendo que havia o Brasil, que havia uma grandeza brasileira, com raízes sólidas, plantada pelo lusitano que tanto se desprezava. O retorno do nativo era como o de um noivo que viesse mesmo para se casar com a terra e que se quisesse integrar inteiramente nella. Eu pensava que tudo aquillo lhe devesse repugnar; tudo lhe deveria ser desagradável, a elle que estivera nas civilizações mais requintadas. E pelo contrário. O Pernambuco que Gilberto Freyre queria para sua paixão, para os seus regalos, para a sua ternura, era o Pernambuco que ninguém via, o subterrâneo, o íntimo, o que dera os senhores de engenho fidalgos, os padres rebellados, os bispos trágicos e o povo capaz de expulsar os hollandeses e fazer o carnaval mais alegre do mundo. O povo simples das revoluções liberaes e o povo camaradeiro dos bumba-meu-boi e o povo triste dos maracatus.26
O caráter, a identidade, o intangível, o imponderável que caracterizava um povo, uma nação, uma região, para os que compartilhavam do ideário desse grupo reunido em torno de Gilberto Freyre, estava salvaguardado nessas reminiscências do passado colonial português e no cotidiano do povo simples do campo e da cidade. Seus símbolos, ícones e expressões eletivos, por meio dos quais se buscava construir a memória de um passado perdido e pelo qual se tinha afeto — sem com isso eliminar motivações de outra ordem —, eram as ruas estreitas de magros sobrados com seus velhos telhados, gradis e janelas; os becos tortuosos com suas sombras amigas e de intenso convívio entre a vizinhança; as igrejas coloniais e os lampiões; as árvores frondosas e maternais dos sítios dos subúrbios e das áreas rurais remanescentes na cidade; os mocambos romanceados e placidamente repousados sobre a lama. A lista se completava com as imagens dos trabalhadores braçais negros e mestiços que cheiravam a açúcar, ocupados em carregar e descarregar as alvarengas que chegavam e partiam nos velhos cais do Apolo e de Santa Rita; com a gente simples do povo e com os “tipos populares”, criação de uma cidade provinciana em transfor-
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Rio Capibaribe, Av. Martins de Barros, edifício da Secretaria da Fazenda Benicio Dias Recife, Pernambuco, ca. 1945
mação. Os comerciantes pobres das feiras livres das cidades interioranas, com suas vestes, seus gestuais e suas expressões corporais de longínquas memórias; os vendedores ambulantes, as lavadeiras de roupa, a gente simples que pulava o frevo e brincava o maracatu. O Recife moderno que se edificava por sobre os ossos da sociedade patriarcal, expressão da emoção e da ordem autoritária do Estado Novo, marca da ascensão da nova classe social dominante que tinha por base o capital industrial-financeiro, também possuía o seu repertório de símbolos e representações próprios, muitos dos quais construídos em contraposição aos que estavam associados à antiga ordem social. Avenidas e automóveis, pontes e arranha-céus, iluminação elétrica e ruas pavimentadas, parques e jardins, porto e navios modernos, fábricas, operários, máquinas e chaminés, casas operárias higiênicas, serviços, prédios e instituições públicos modernos, gente elegante caminhando apressada nas ruas, praticando esportes e se divertindo à beira -mar; essas eram algumas das imagens e representações simbólicas em torno das quais se construíam as narrativas e os discursos favoráveis à nova ordem política, econômica e social veiculadas durante o Estado Novo. No entanto, como disse o historiador Raimundo Arrais,
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Aquela movimentação toda, rasgando avenidas, abrindo parques, promovendo vacinação em massa, introduzindo bondes elétricos e automóveis, alterando o ritmo da vida da cidade, não chegou, contudo, a alimentar uma arte e uma literatura urbana capaz de assimilar, do ponto de suas realizações estéticas, ou sequer em suas intenções programáticas, as vibrações do mundo industrial. A força do modernismo recifense irrompeu da tradição, ou foi tragado por ela, ou manteve com ela alguma ligação de compromisso, fazendo predominar aquela forte tensão entre o moderno e o tradicional.27
É possível que a sociedade urbana industrial, nessa fase de implantação em Pernambuco, tenha produzido e reunido mais informações sobre os indivíduos e as instituições com fins de controle social e repressão, mais documentos técnicos e administrativos, como relatórios, estatísticas, plantas arquitetônicas e industriais, do que uma arte e uma estética próprias. Mas esse levantamento e a análise, importante de serem realizados, estão fora do alcance do presente trabalho.
A moderna arte fotográfica de Benicio Dias Nesse Pernambuco polarizado, tensionado entre o tradicional e o moderno, que caracterizou as décadas de 1920 a 1950, onde se situava Benicio Dias? Sua produção fotográfica retrata os vários tempos de um mesmo Recife vivendo as contradições da história: o novo que surgia se alimentando do velho que fenecia. Nesta cidade de contrastes e gritantes contradições, para onde pendia o seu coração? Quais emoções o guiavam no momento de realizar uma fotografia? Que sentimentos o dominavam quando se punha a fotografar um elemento ou um marco paisagístico que simbolizava o antigo ou os resquícios de uma tradição? E de igual modo, qual a sensação predominante diante de um ícone ou símbolo do progresso a ser capturado por suas lentes e exposto à apreciação? As fotografias silenciam. Sem o auxílio do verbo, que nos forneça pistas sobre sua personalidade e sua identificação com esse ou aquele ideário social e estético, como decifrá-lo então? Há documentos que registram o posicionamento de Benicio Dias em relação à destruição da Igreja dos Martírios — que se concretizou em 1973, durante a
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administração de Augusto Lucena — para a execução das obras de continuação da Avenida Dantas Barreto, no bairro de São José: Não é possível que, justamente quando a Unesco vai voltar suas vistas para São Luís do Maranhão e para Alcântara, preservando grandes trechos e áreas dessas cidades, os recifenses, filhos da “Guia de Cegos e Mãe da Cultura”, não consigam fazer fluir as duas mãos do tráfego de uma avenida que, em vez de levar de eito, venha a abraçar, numa solução indicada, moderníssima e consagrada em várias partes, a Igreja do Senhor Bom Jesus dos Martírios e seus vizinhos sobrados, onde se encosta e que a complementam.28
Mas o contexto histórico, a noção de patrimônio cultural e o envolvimento de intelectuais, artistas, gestores, técnicos e instituições, quanto à proposta e às obras de reforma do bairro de São José, eram bastante diferentes daqueles verificados para as intervenções, igualmente drásticas, que ocorreram no traçado e nas edificações do bairro de Santo Antônio entre 1930 e 1950. Não seria prudente transpor, mecanicamente, a opinião do fotógrafo sobre a destruição dos Martírios para aquele cenário de destruição do patrimônio cultural ocorrido nas décadas de 1920 a 1950. O fotógrafo Benicio Dias pintava com a luz, fosse uma representação do novo ou do antigo, fosse um tipo humano ou uma paisagem do Nordeste. Ao registrar fragmentos da realidade social e histórica de que era parte, legou às gerações futuras a possibilidade de construir memórias — diversas, múltiplas e mesmo antagônicas memórias; e de reescrever a História. Para ele, a sua missão como fotógrafo só se completaria se a imagem produzida estabelecesse uma relação de troca com o Outro. A sua arte fotográfica se realizaria plenamente apenas se capaz de transmitir à coletividade o imponderável que acreditava existir em todas as coisas. Sua arte fotográfica moderna, feita de luz, de sombras e emoção, continua viva. Atualiza-se permanentemente e extrai novos sentidos ao ser posta em contato com o mundo das relações sociais, com outros tempos históricos e com o porvir. Este livro o prova.
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Notas
1 MEDEIROS, Ruth (Org.). Arquivos & coleções fotográficas da Fundação Joaquim Nabuco. Recife: Fundaj, Ed. Massangana, 1995. p. 31-36. 2 ARQUIVO Benicio Dias, 1870-1950. Acervo Fundação Joaquim Nabuco, Recife. 3 Sobre o processo de urbanização das praias e entorno, de ressignificação e de valorização desses espaços que passaram a ser vistos também como um território para a prática do lazer, diversão e contemplação, ver ARAÚJO, Rita de Cássia Barbosa de. As praias e os dias: história social das praias do Recife e de Olinda. Recife: Fundação de Cultura Cidade do Recife, 2007. 4 NOVAES FILHO, Antônio de. O serviço de que o Recife precisava. Boletim da Cidade e do Porto do Recife, Recife, n. 3, p. 110-111, jan./mar. 1942. Além de divulgar dados estatísticos sobre a cidade do Recife, essas revistas diziam estar interessadas em despertar, no pernambucano e especialmente no recifense, o gosto por sua cidade, estimulando-o a conhecer a sua história, a sua 32
arte e a sua cultura. Com vasta documentação sobre o Recife, traziam fotografias autorais de Benicio Dias, Alexandre Berzin, Francisco Rebello; e desenhos saídos das mãos de H. Fernandes, Hélio Feijó, Augusto Rodrigues, José Noberto, dentre outros. 5 FOTOTECA da DEPT. Folha da Manhã, Recife, 17 jun. 1942, citado por MARROQUIM, Dirceu Salviano Marques. Onde dormem os tipos populares? (Recife, 1939-1943). Anais do Museu Histórico Nacional, Rio de Janeiro, v. 46, p. 125-139, 2014. 6 Conceito operacional criado pela arquiteta Fátima Campello em seu estudo sobre os cartões-postais alusivos à cidade de Maceió, entre 1903 e 1934, “que vincula um sítio, um determinado lugar, a um modo específico de vê-lo. Esse modo específico o torna facilmente reconhecível porque associa esse lugar a uma determinada construção do campo fotográfico. E buscamos apoiá-lo com um segundo conceito operacional, o de ponto privilegiado de observação do fotógrafo”. CAMPELLO, Fátima. Cartões postais: a construção coletiva
da imagem de Maceió –1903-1934. Maceió: Imprensa Oficial Graciliano Ramos; Cepal, 2011. p. 257. 7 PRIMEIRO Salão de Arte Fotográfica do Recife. Arquivos, Recife, n. 1-2, p. 437-438, 1945-1951. Agradeço a Fernando Ponce de Leon a indicação de leitura deste artigo. 8 A discussão sobre o estatuto da fotografia, com ênfase no debate sobre a existência ou não de uma arte fotográfica e na constituição de um campo artístico para a fotografia e o cinema, contextualizada na cidade do Recife por volta da década de 1950, encontra-se em BRUCE, Fabiana. Caminhando numa cidade de luz e sombras: a fotografia moderna no Recife na década de 1950. Recife: Fundaj, Ed. Massangana, 2013. 9 PRIMEIRO Salão de Arte Fotográfica do Recife. Arquivos. Recife, n. 1-2, p. 438, 19451951. 10 FOLHA da Manhã. Vespertina. Recife, 17 jan. 1945, primeira página. in: Arquivo Alexandre Berzin. Acervo Fundação Joaquim Nabuco citado por BRUCE, Fabiana. Caminhando numa cidade de luz e sombras: a fotografia moderna no Recife na década de 1950. Recife: Fundaj, Ed. Massangana, 2013. p. 142. 11 OS FOTÓGRAFOS do Recife. Jornal do Commercio, Recife, 3 out. 1941, p. 3. In: Arquivo Alexandre Berzin. Acervo Fundação Joaquim Nabuco, citado também por BRUCE, Fabiana. Caminhando numa cidade de luz e sombras: a fotografia moderna no Recife na década de 1950. Recife: Fundaj, Ed. Massangana, 2013. p. 141. 12 Sobre a temática, FREYRE, Gilberto. Manifesto Regionalista. Organização e
apresentação de Fátima Quintas. Prefácio de Antônio Dimas. 7 ed. rev. aum. Recife: Fundaj, Ed. Massangana, 1996; MELLO, José Antônio Gonsalves de. Por uma história do Império vista do Nordeste. Estudos Universitários, Recife, v. 6, n. 1, p. 1-9, jan./mar. 1966; EISENBERG, Peter L. Modernização sem mudança: a indústria açucareira em Pernambuco, 1840-1910. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977; OLIVEIRA, Francisco de. Elegia para uma re(li)gião. 2 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977; CONGRESSO AGRÍCOLA DO RECIFE, 1878, Recife. Trabalhos. Introdução de Gadiel Perruci. Recife: Cepe, 1978; PERRUCI, Gadiel. A República das usinas: um estudo de história social e econômica do Nordeste, 1889-1930. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978; SILVEIRA, Rosa Maria Godoy. O regionalismo nordestino: existência e consciência da desigualdade regional. São Paulo: Moderna, 1984; GUIMARÃES NETO, Leonardo. Introdução à formação econômica do Nordeste. Recife: Fundaj, Ed. Massangana, 1989; MELLO, Evaldo Cabral de. O fim das casas-grandes. In: NOVAES, Fernando A. (Coord.). História da vida privada: Império. São Paulo: Companhia das Letras, 1997; ALBUQUERQUE JUNIOR, Durval Muniz de. A invenção do Nordeste e outras artes. Recife: Fundaj, Ed. Massangana; São Paulo: Cortez, 1999. 13 BEZERRA, Gregório Lourenço. Memórias (Primeira Parte: 1900-1945). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979; e Memórias (Segunda Parte: 1946-1969). Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1980; REGO, José Lins do. O moleque Ricardo. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1987. (Ficção Completa, v. 1). CASTRO, Josué. Homens e caranguejos. São Paulo: Brasiliense, 1967.
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14 AZEVEDO, Neroaldo Pontes de. Modernismo e regionalismo (os anos 20 em Pernambuco). João Pessoa: Secretaria de Educação e Cultura da Paraíba, 1984; BARROS, M. A. Souza. A década de 1920 em Pernambuco: uma interpretação. 2. ed. Recife: Fundação de Cultura Cidade do Recife, 1985; OUTTES, Joel. O Recife: a gênese do urbanismo 1927-1943. Recife: Fundaj, Ed. Massangana, 1997; REZENDE, Antônio Paulo. (Des)Encantos modernos: histórias da cidade do Recife na década de XX. Recife: Fundarpe, 1997; PONTUAL, Virgínia. Uma cidade e dois prefeitos: narrativas do Recife nas décadas de 1930 a 1950. Recife: Ed. Universitária da UFPE, 2001; ARRAIS, Raimundo. A capital da saudade: destruição e reconstrução do Recife em Freyre, Bandeira, Cardozo e Austragésilo. Recife: Edições Bagaço, 2006; LORETTO, Rosane Piccolo. Paraíso e Martírios: histórias de destruição dos artefatos urbanos e arquitetônicos no Recife. Recife: Ed. Universitária da UFPE, 2008; CANTARELLI, Rodrigo. Contra a conspiração da ignorância com a maldade: a Inspetoria Estadual dos Monumentos Nacionais e o Museu Histórico e de Arte Antiga do Estado de Pernambuco. Recife: Fundaj, Ed. Massangana, 2014. 15 Sobre as mudanças na morfologia do Recife entre a segunda metade do século XIX e a segunda metade do século XX, bem como para uma reflexão sobre a “crise do saber urbanístico” a partir do estudo comparativo entre duas gestões municipais emblemáticas, a exemplo das de Novaes Filho (19371945) e Pelópidas Silveira (1955-1959), ver PONTUAL, Virgínia. Uma cidade e dois prefeitos: narrativas do Recife nas décadas de 1930 a 1950. Recife: Ed. Universitária da UFPE, 2001. 34
16 Sobre os subúrbios do Recife, ver COSTA, F. A. Pereira da. Os arredores do Recife. Recife: Fundação de Cultura Cidade do Recife, 1981; SETTE, Mário. Arruar: história pitoresca do Recife antigo. 3. ed. Recife: Secretaria de Educação e Cultura, 1978. 17 LORETTO, Rosane Piccolo. Paraíso e Martírios: histórias de destruição dos artefatos urbanos e arquitetônicos no Recife. Recife: Ed. Universitária da UFPE, 2008. p. 104. 18 Citado por LORETTO, op. cit., p. 113. 19 Citado por LORETTO, op. cit., p. 108. Diz ainda a mesma arquiteta urbanista, “[...] com a realização dessas obras, foram destruídos aproximadamente 50.000 m², entre sobrados, casas térreas e outros tipos de edificações no bairro de Santo Antônio.” p. 113. 20 Ibidem, p. 125; 129, respectivamente. 21 ALMEIDA, Maria das Graças Andrade Ataíde de. A construção da verdade autoritária. São Paulo: Humanitas; FFLCH, USP, 2001. p. 134. 22 Bandeira, Manuel. Minha terra. Poema escrito em 1948, que rememora o Recife que o poeta vira ao visitar a cidade em 1929. In: FONSECA, Edson Nery da. O Recife de Manuel Bandeira. Recife: Pool Editorial, 1986. p. 43. 23 PONTUAL, Virgínia. Uma cidade e dois prefeitos: narrativas do Recife nas décadas de 1930 a 1950. Recife: Ed. Universitária da UFPE, 2001. p. 34. 24 ARRAIS, Raimundo. A capital da saudade: destruição e reconstrução do Recife em Freyre, Bandeira, Cardozo e Austragésilo. Recife: Edições Bagaço, 2006. p. 15.
25 Bandeira, Manuel. Cotovia. In: FONSECA, Edson Nery da. O Recife de Manuel Bandeira. Recife: Pool Editorial, 1986. p. 44. 26 REGO, José Lins do. Prefácio. In: FREYRE, Gilberto. Região e tradição. 2. ed. Rio de Janeiro, 1941. p. 10-11. Em outra passagem do Prefácio, afirmou: “Conheci Gilberto Freyre em 1923. Foi numa tarde de Recife, do nosso querido Recife, que nos
encontramos, e de lá prá cá a minha vida foi outra, foram outras as minhas preocupações, outros os meus planos, as minhas leituras, os meus entusiasmos. Pode parecer um romance, mas foi tudo da realidade.” p. 9. 27 ARRAIS, Raimundo. op. cit. p. 33-34. 28 Matéria publicada na revista Casa & Jardim, em 1969, citado por LORETTO, op. cit., p. 225.
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