Continente #62 - Joel Silveira

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DIÁRIO DE UMA VÍBORA Joel Silveira

O “remédio” que JK me deu

L

uziânia, pertinho de Brasília, fazenda de Juscelino Kubitschek, julho de 1976. Andamos uma tarde inteira pela sua propriedade, ele galhardamente montado num alazão, eu me sacolejando num jipe pessimamente dirigido. Voltei moído, os músculos maltratados. Desabei, um tanto arfante, numa das largas poltronas da varanda, à espera de retomar o fôlego e as forças. Vendo-me assim, amarfanhado e derreado, Juscelino falou: – Espere só um minuto que seu remédio já está vindo. Adolpho (Bloch) me preveniu e já tomei as providências. – Que remédio, presidente? Tenho horror a remédio. Não tomo sequer aspirina. Ele riu: – Ora, Joel, comigo você não precisa ter constrangimento. Tome seu remédio. E naquele instante exato surgia na varanda um bem-posto garçom, todo de branco, trazendo numa bandeja um balde de gelo, um copo de cristal e uma garrafa intacta de um soberbo uísque. Era o meu remédio. Que consumi até a última gota – antes e depois do jantar, horas a fio, noite adentro em conversa com JK, o qual, diga-se de passagem, naquele tempo todo não bebeu mais que dois copos d’água. Se tanto. •

Continente fevereiro 2006

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