Revista Educaional N.06

Page 1

Entrevista | RIZA ARAÚJO e luciene roza | Página 06

A LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL: POSSIBILIDADES E LIMITES PARA A CONSTRUÇÃO DE RELAÇÕES DEMOCRÁTICAS NA GESTÃO DE UMA ESCOLA MARISTA | Página 07

Mudanças no Ensino Médio Brasileiro: Expectativas e contribuições da Juventude Marista | Página 13



Revista Educ@cional | BrasĂ­lia | Ano 03 | v.06 | jun.2011


EXPEDIENTE A Revista Educacional é uma publicação da Gerência Educacional da Província Marista Brasil Centro-Norte – UBEE-UNBEC. Provincial e Diretor-Presidente: Ir. Wellington Mousinho de Medeiros Vice-Provincial e Vice-Presidente: Ir. José Wagner Cruz Superintendente Socioeducacional: Dilma Alves Gerente Educacional: Jaqueline de Jesus Coordenadora Pedagógica: Maria Ireneuda Nogueira Coordenador Administrativo: Arthur Gomes Neto Assessoria SEAC / SETE Provinciais: Ir. Eduardo D’Amorim Analistas Educacionais: Carla Floriana Martins Ireneuda Nogueira Mariana Vasconcelos Thiago Araújo Organização: Carla Floriana Martins Diagramação: Fernando Souza


EDITORIAL Em sua 6ª Edição, a Revista Educacional traz entrevista e artigos com temáticas bem atuais e relevantes para estudo de toda a comunidade educativa. Relações democráticas na Escola é o tema do artigo da Educadora Ana Cristina Moreira Rodrigues dos Santos, do Colégio Marista São Luís (PE), que disserta sobre a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e sua relação com a cultura de participação coletiva nas escolas. A autora aponta caminhos legais e éticos para a construção de uma gestão democrática, construída com liberdade, justiça, e autonomia. O artigo “Mudanças no Ensino Médio Brasileiro: expectativas e contribuições da Juventude Marista”, da educadora Eva Rozental, traz uma pesquisa exploratória com a opinião de doze jovens a respeito dos seus papéis como agentes transformadores do Ensino Médio, na escola e sociedade. Essa pesquisa expõe ainda os anseios da juventude em participar plenamente do processo de aprendizagem, como sujeitos de direito. As educadoras Rizza Araújo, Assessora Pedagógica do Colégio Marista do Araçagy (MA), e Luciene Roza, Coordenadora de Pastoral do Colégio Marista de Varginha (MG), nos revelam a importância do Encontro de Vice-Diretores Educacionais/ Assessores Pedagógicos e Coordenadores de Pastoral, que este ano trouxe como temática “Com Maria, dialogamos em torno da mesma mesa - a escola que temos e a escola que queremos fazer acontecer”. Que os assuntos abordados possam inquietar-nos para reais mudanças de nossas práticas e relações. Boa leitura! Thiago Araújo Analista de Tecnologia Educacional

Revista Educ@cional | Brasília | Ano 03 | v.06. | jun.2011


6

ENTREVISTA | Rizza Araujo e Luciene Roza Além de ser o mês de Maria, maio também foi o mês do Encontro dos Vice-Diretores(as) Educacionais/ Assessores(as) Pedagógicos(as) e Coordenadores(as) de Pastoral de 2011 da Província Marista Brasil CentroNorte. O encontro teve como tema: Com Maria, dialogamos em torno da mesma mesa a escola que temos e a escola que queremos fazer acontecer. Para a entrevista da edição de junho, convidamos a Assessora Pedagógica Rizza Araújo, do Colégio Marista do Araçagy e a Coordenadora de Pastoral do Colégio Marista de Varginha, Luciene Roza, que nos falarão sobre sua vivência durante o encontro. Revista Educ@cional: Como foi, para você, a experiência de participação no evento? Rizza Araújo: O encontro “Promovendo o diálogo e a unidade” foi uma experiência única! Senti-me feliz em participar desse momento que foi sonhado, idealizado, organizado e construído com tanto carinho e dedicação, inspirado na Missão e nos ensinamentos de Champagnat. Luciene Roza: Participar do evento foi uma experiência significativa. Implica que saiamos da nossa realidade para conhecer a realidade das outras unidades que, assim como nós, estão a serviço da Igreja e do anúncio do evangelho. Vale ressaltar que estes encontros reavivam as nossas forças e possibilitam o aprimoramento das atividades. É imprescindível dizer que as mudanças na Província têm acontecido a passos rápidos e consistentes. Isso demonstra que há uma preocupação em acompanhar a realidade contemporânea. RE.Como você percebe a articulação pastoral pedagógica antes e depois do Encontro? RA: Em nossa unidade sempre procuramos vivenciar essa articulação, esse clima institucional pastoral pedagógico, porém o encontro nos trouxe inúmeros momentos de troca sobre essas práticas, nos fez refletir e perceber o quanto precisamos andar e crescer para que não cometamos os mesmos erros. A articulação entre VDE e Coordenação de Pastoral é um casamento!

coordenador de Pastoral, Ir. Luís André e pela gerente educacional, Jaqueline de Jesus. A possibilidade de construção e socialização dos trabalhos em grupo, permitindo a partilha de vivências de cada unidade e os momentos de espiritualidade. Sinto-me renovada, energizada e muito feliz por ser responsável em carregar essas sementinhas e plantá-las nos corações de cada educador de nossa unidade. LR: Destaco as oficinas. Cada oficina tratou sobre um aspecto a ser melhorado em nossas unidades. Percebo que só o fato dos temas serem abordados já auxilia para a transformação da prática. RE: Após o evento, foi conduzido algum momento com os grupos locais para socialização e encaminhamentos, quais? RA: Coordenações (Reunião), educadores (no encontro de 4ª- feira), também acontecerá no encerramento do semestre dia 30/06, e na chegada da nova coordenação de pastoral em agosto. LR: Nos reunimos na Equipe Técnica para essa socialização. Percebemos os temas abordados foram uma consonância com a Assembleia de Diretores e isso auxilia na fundamentação da nossa prática. Percebo que o próprio estudo do Projeto Educativo Marista implica uma mudança de atuação de toda a comunidade educativa.

LR: Antes já havia uma boa articulação que após o encontro foi reafirmada e fortalecida. RE.Quais foram os pontos mais significativos do encontro e quais suas perspectivas para continuidade dos trabalhos iniciados? RA: Todas as reflexões levantadas pela superintendente socioeducacional, Dilma Alves, pelo superintendente de Organismos Provinciais, Ir. Humberto Gondim, pelo

Rizza Araujo

Luciene Roza Revista Educ@cional | Brasília | Ano 03 | v.06 | jun.2011


7

A LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL: POSSIBILIDADES E LIMITES PARA A CONSTRUÇÃO DE RELAÇÕES DEMOCRÁTICAS NA GESTÃO DE UMA ESCOLA MARISTA

Ana Cristina Moreira Rodrigues dos Santos

Pedagoga, coordenadora pedagógica do Colégio Marista São Luís – Recife e técnica educacional da Gerência de Serviços de Avaliação e Pesquisa da Secretaria de Educação, Esporte e Lazer da Prefeitura do Recife. Curso de Especialização em Gestão Pedagógica - PUC - Paraná.

RESUMO A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional traz em seu bojo pressupostos legais que apontam para a democratização da gestão escolar, ampliando os espaços de participação coletiva. Buscar, no texto da LDBEN, os aspectos geradores de possibilidades ou limites para a construção de relações democráticas na gestão de uma escola marista é o objetivo deste artigo. Para sua elaboração, procedeu-se a uma pesquisa qualitativa cujo campo conceitual foi constituído por uma análise documental e pela observação/escuta no espaço-tempo do Colégio Marista São Luís – Recife. A pesquisa realizada revela que a escola em estudo embasa a construção da sua proposta político-pedagógico-pastoral na perspectiva do atendimento ao que preceitua o texto legal em direção a uma gestão com ênfase na participação, corresponsabilidade e democratização das relações. Ao mesmo tempo, descortina as contradições existentes entre o que é explicitado na proposta e o que acontece, algumas vezes, nesta escola, mostrando a caminhada feita pelo Colégio Marista São Luís – Recife (avanços e retrocessos) na concretização de uma gestão participativa/democratizante. Palavras-chave: LDBEN, gestão democrática, educação, escola

pautado nos princípios democráticos e que atenda 1 INTRODUÇÃO Por ser a educação uma área cuja normatização e execução se faz a partir de disposições legais, reveste-se de suma importância, para todos aqueles e aquelas que atuam em escola, conhecer a legislação que regula a organização e o funcionamento dos sistemas de ensino, mediante uma leitura crítica dos seus dispositivos em sentido literal e em seu espírito (legislação a serviço da humanização, da cidadania, da convivência e das relações democráticas). Ao considerar a escola espaço de construção e vivência de relações democráticas em que se garanta a participação consciente e responsável de cada um dos sujeitos envolvidos, faz-se necessário buscar, no texto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) - Lei 9394/96, como lei maior da educação brasileira, os aspectos que darão amparo legal para que essa participação ocorra de fato e de direito. Esta pesquisa, que tem como tema a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – possibilidades e limites para a construção de relações democráticas na gestão de uma escola marista, sinaliza, portanto, a contribuição para que, cada vez mais, a escola possa ser o locus privilegiado em que se desenvolva um trabalho coletivo e participante, Revista Educ@cional | Brasília | Ano 03 | v.06 | jun.2011

de forma mais efetiva as necessidades concretas da realidade sociocultural-cristã e aponte para um futuro que represente um novo patamar em relação à prevalência do neoliberalismo vigente nas relações econômicas consumistas, acumuladoras de riqueza e de alto poder excludente (antidemocrático, anticristão, desumanizante). Desse modo, o problema de pesquisa aqui proposto é como as orientações legais presentes no texto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional possibilitam ou limitam a construção de relações democráticas na gestão de uma escola marista. Nessa perspectiva, o objetivo - buscar, no texto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, os aspectos geradores de possibilidades ou limites para a construção de relações democráticas na gestão de uma escola marista - explicita uma análise da LDBEN; o estabelecimento de um contraponto entre o texto legal, textos de autores diversos e a proposta político-pedagógico-pastoral do Colégio Marista São Luís - Recife; a identificação dos aspectos presentes na Lei que apontam para as possibilidades e os limites na direção da construção de relações democráticas na gestão de uma escola marista; a reflexão crítica sobre esses aspectos na tentativa de ampliar as possibilidades detectadas e minimizar os limites identificados; a


8

indicação de experiências de ações institucionalizadas que demonstrem a existência de relações horizontais/ democratizantes e de relações verticalizadas/autoritárias no cotidiano escolar marista e, por último, o confronto entre as práticas pedagógico-educativas vividas e as desejadas. Trata-se de uma pesquisa qualitativa cujo campo de estudo foi constituído pela análise documental, observação e escuta no espaço-tempo de uma escola marista. Inicialmente foi realizada uma pesquisa bibliográfica, buscando conhecer o próprio texto da Lei a fim de identificar os artigos que sinalizam para a construção de relações democráticas na escola e textos de autores diversos que fazem uma leitura crítica da Lei, apontando os avanços presentes no texto legal e na conquista de relações que vieram mudar a face da escola, instalando um novo modo de a escola ser e de fazer educação. Em seguida, o foco foi a análise da proposta político-pedagógico-pastoral que sintetiza de acordo com Veiga (1995) a organização do trabalho pedagógico que é construído e vivenciado continuamente por todos que têm relação com o processo educativo. Essa análise foi realizada com o intuito de descobrir, em seu bojo, elementos/aspectos que concretizem a democratização das relações no cotidiano escolar. Ao mesmo tempo em que se fez a análise documental, procedeu-se à observação das ações e relações estabelecidas entre os diversos atores/sujeitos (gestores, coordenadores, professores, pais e estudantes), bem como à escuta das falas, questionamentos e sentimentos expressos por cada um deles, no sentido de se perceberem as aproximações e/ou distanciamentos entre as práticas educativas apresentadas nos textos legais e aquelas efetivamente vivenciadas. Buscou-se, assim, de forma crítica, descortinar os mitos, ler linhas e entrelinhas, confrontar o proclamado e o realizado, o discurso e a prática instaurados em uma escola marista após a promulgação da LDBEN – Lei 9394/96, em 20 de dezembro de 1996.

2 CARACTERIZANDO A ESCOLA – CAMPO DE INVESTIGAÇÃO O Colégio Marista São Luís é escola confessional católica e parte integrante da Província do Brasil Centro-Norte. Fundada pelos Irmãos Maristas, no dia 06 de fevereiro de 1911, educa crianças, adolescentes e jovens segundo os princípios evangélicos e o carisma do seu fundador, São Marcelino Champagnat. Prima pela educação integral, desenvolvendo, em seus estudantes, o conhecimento, a sensibilidade estética, a corporeidade, a afetividade, a dimensão comunitária e social, a formação nos valores humanos e cristãos, a consciência ecoplanetária, a espiritualidade, articulando e harmonizando as dimensões da FÉ, da CULTURA e da VIDA. Atende cerca de 2.400 (dois mil e quatrocentos) estudantes distribuídos na Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio. Tem seu corpo docente e técnico constituído por 187 (cento e oitenta e sete) educadores que realizam seu trabalho com competência e compromisso, integrados à missão de “formar bons cristãos e virtuosos cidadãos” (São Marcelino Champagnat). Como escola marista, quer ser espaço-tempo de evangelização; de investigação, de produção de conhecimentos, de amplas e contínuas aprendizagens; de criação, de múltiplas descobertas, de pesquisa, de curiosidade e de prazer pelo novo; de aprendizado político e ético; de construção de projetos de vida; de formação continuada dos profissionais da educação; de avaliação contínua; de gestão democrática, partilhada e compartilhada, no sentido de “promover a participação, a corresponsabilidade, o diálogo e a sinergia na tomada de decisões para planejar/significar/concretizar/avaliar o conjunto de políticas e práticas adotadas, num processo desenvolvido pela, na e para a comunidade educativa” (UMBRASIL, 2010, p. 71). 3 REVISITANDO OS TEXTOS LEGAIS NA BUSCA DE ELEMENTOS DEFINIDORES DE UMA GESTÃO DEMOCRÁTICA EM UMA ESCOLA MARISTA Revista Educ@cional | Brasília | Ano 03 | v.06 | jun.2011


9

3.1 LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL: Possibilidades e limites na construção de uma gestão democrática

escolares ou equivalentes. Artigo 15 – Os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares públicas de educação básica que os integram progressivos graus de autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira, observando as normas gerais de direito financeiro público.

O início da caminhada para a construção de relações democráticas na escola remonta à oportunidade concedida pelos princípios explicitados Os artigos e incisos constitutivos da LDBEN na Constituição de 1988 e referendados pela LDBEN, são explicitados para mostrar que o texto legal avança Lei 9394 de 20 de dezembro de 1996 que estabelece, na perspectiva de desencadear, nos sistemas de ensino, em alguns de seus títulos, capítulos, artigos, incisos, um movimento a partir do qual se efetive a superação parágrafos, os seguintes dispositivos legais: das estruturas verticalizadas/autoritárias na direção da TÍTULO II – DOS PRINCÍPIOS E consolidação de relações horizontalizadas/democráticas FINS DA EDUCAÇÃO NACIONAL em que a participação de todos os envolvidos nos Artigo 3º - O ensino será ministrado processos de ensino e aprendizagem seja garantia de um com base nos seguintes princípios: […] novo modelo de escola e de educação. VIII – gestão democrática do ensino É importante salientar que o aspecto público, na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino. democrático de que trata este artigo não se restringe à […] TÍTULO IV – DA ORGANIZAÇÃO questão de eleição para a escolha da equipe gestora, mas DA EDUCAÇÃO NACIONAL vai além disso, referindo--se, entre outros elementos, à Artigo 12 – Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas forma de gestão; à participação das diferentes instâncias comuns e as do seu sistema de da comunidade educativa no planejar, concretizar, ensino, terão a incumbência de: I – elaborar e executar sua proposta avaliar as ações e práticas necessárias ao cumprimento pedagógica; da função social da escola; ao processo de tomada de [...] VII – informar os pais e responsáveis decisão. sobre a frequência e o rendimento dos Para Silva (1998, p.27 - 28), uma primeira alunos, bem como sobre a execução análise da Lei permite perceber um fato inédito na de sua proposta pedagógica. Artigo 13 – Os docentes incumbir- legislação brasileira: se-ão de: I – participar da elaboração da proposta pedagógica do estabelecimento de ensino; II – elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo a proposta pedagógica do estabelecimento de ensino; […] VI – colaborar com as atividades de articulação da escola com as famílias e a comunidade. Artigo 14 – Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: I – participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola; II – participação da comunidade escolar e local em conselhos

Revista Educ@cional | Brasília | Ano 03 | v.06 | jun.2011

O estabelecimento de ensino e os docentes são incluídos no Título IV, referente à Organização da Educação Nacional […]. Ao contrário das leis anteriores, que valorizavam as instâncias burocráticas, tamanho destaque significa o reconhecimento da escola como locus privilegiado da educação e um crédito de confiança na competência técnica e política dos profissionais que nela atuam.

Ainda em sua análise, Silva (1998, p.27 - 28) afirma que “outro fato digno de realce é o número de vezes que a expressão ‘proposta ou projeto pedagógico’ aparece”. E continua: Os

estabelecimentos

elaboram,


10

executam e informam os pais e responsáveis sobre a execução da proposta pedagógica. Os docentes participam da elaboração e implementam um plano de trabalho que concretiza a proposta pedagógica. E, finalmente, um dos princípios da gestão democrática, a ser considerado pelos sistemas de ensino, é a participação dos profissionais na elaboração do projeto pedagógico. O respeito ao projeto da escola, definido como princípio, supõe que as instâncias superiores adotem posturas de coordenação de seus sistemas e de apoio e incentivo às escolas, abandonando práticas autoritárias (SILVA, 1998, p.27 - 28).

É a partir dessas prerrogativas que se ampliam as tentativas de tornar a esfera escolar um espaço democrático no qual todos os atores, professores, funcionários, alunos e comunidade possam contribuir e do qual possam participar ativamente, sendo através desse espaço que a escola poderá construir sua autonomia. Ao mesmo tempo, entende-se que essas possibilidades de participação concedidas pela Lei 9394/96 são passíveis de algumas críticas e questionamentos por serem ainda vagas na própria legislação. Isto é o que nos diz Mendonça (2000, p.416), quando afirma que: As referências à autonomia escolar nas legislações e normas dos sistemas de ensino são feitas de maneira vaga. De modo geral, enunciam a autonomia como um valor, mas não estabelecem mecanismos concretos para sua conquista efetiva.

Entende-se que, ao se referir à educação/ ao ensino/à escola pública, a LDBEN, como lei maior que determina a organização e o funcionamento dos diversos sistemas de ensino, não exclui as escolas pertencentes ao sistema privado de ensino. Nenhuma escola será gerida isoladamente, segundo normas próprias, e nem tampouco poderá, ao construir sua proposta político-pedagógico-pastoral, contradizê-la em sua forma e, sobretudo, em seu espírito.

Toda e qualquer escola, mesmo considerando sua autonomia, está subordinada a leis, decretos, resoluções e pareceres oriundos das diversas instâncias colegiadas, quer sejam o Ministério da Educação, o Conselho Nacional de Educação, os Conselhos Estaduais e Municipais de Educação e/ou Secretarias de Educação Estaduais e Municipais. No entanto, não basta que a Constituição de 1988 e a LDBEN de 1996 tenham composto o cenário jurídico e legal para que a gestão democrática da escola se torne realidade. É preciso bem mais que isso. É preciso que os atores educativos conquistem o espaço de construção de relações verdadeiramente democratizantes na vivência diária do cotidiano escolar, quebrando as esferas fechadas das estruturas autoritárias do sistema e as barreiras do pensamento de alguns, acostumados à ação centralizadora e às rotinas autoritárias. É preciso que se busque o consenso, que reivindica a igualdade nos processos decisórios, e este só pode ocorrer em relações dialógicas e num trabalho pedagógico centrado na crítica reflexiva que possibilite a existência de espaço-tempo para desencadear momentos de reflexão individuais e coletivos. É preciso que a escola, enquanto locus fundamental para o desenvolvimento das habilidades cognitivas e núcleo sistematizador do conhecimento e da cultura, faça o que lhe cabe, empreendendo um enfrentamento, com base no debate e na ação educativa. Nesse sentido, uma proposta políticopedagógico-pastoral, construída com a participação de todos, considerando a existência de outros organismos colegiados, tais como Conselho Pedagógico, Conselhos de Classe, Grêmio Estudantil, Conselho de Pais tem importância fundamental na implementação desse modelo de escola na nova sociedade do conhecimento, balizada por valores éticos de inclusão social e de saberes. Para Veiga (1998, p.13): O projeto pedagógico, portanto, ao se constituir em processo participativo de decisões, preocupa-se em instaurar uma forma de organização do trabalho pedagógico que desvele os conflitos e as contradições, Revista Educ@cional | Brasília | Ano 03 | v.06 | jun.2011


11

rompendo com a rotina do mundo pessoal e racionalizado da burocracia e permitindo relações horizontais no interior da escola.

Ao tecer o pano de fundo, por meio das bases e preceitos legais, dá-se início à construção do cenário, no qual os sistemas de ensino definem sua estrutura de organização e funcionamento. 3.2 PROPOSTA POLÍTICO-PEDAGÓGICOPASTORAL DO COLÉGIO MARISTA SÃO LUÍS RECIFE: Avanços e retrocessos na implementação e vivência de uma gestão democrática Pretende-se, a partir da análise da proposta político-pedagógico-pastoral1 do Colégio Marista São Luís - Recife2, apresentar o diagnóstico da sua caminhada, pós-LDBEN, por meio do qual se tentará dar conta das mudanças implementadas internamente para garantir a institucionalização do que está posto no texto da Lei na perspectiva de materialização de algumas propostas de democratização das relações que devem ser estabelecidas em toda e qualquer escola. Na tessitura desta análise, proceder-se-á, em primeiro lugar, a citações de partes constitutivas da proposta político-pedagógico-pastoral alusivas a aspectos que apontam na direção da instauração e da consolidação de uma gestão democrática. Em seguida, buscar-se-á estabelecer um confronto entre os pontos explicitados e as práticas vividas, efetivamente, no dia a dia da escola. Ao iniciar a referida análise, percebe-se, na parte relativa à apresentação, menção ao movimento coletivo instaurado, no interior da escola, para sua elaboração: […] a proposta político-pedagógica do Colégio Marista São Luís, construída e sistematizada a partir do diagnóstico institucional da atual estrutura e funcionamento escolar e subsidiada a partir da elaboração 1 Proposta Político-Pedagógico-Pastoral - PPPP (Atualmente, à sigla PPP foi inserido o termo Pastoral, passando a ter esta denominação). 2 Colégio Marista São Luís – Recife - CMSL Revista Educ@cional | Brasília | Ano 03 | v.06 | jun.2011

coletiva de marcos referenciais: situacional, doutrinal e operativo. (PPP, CMSL, 1999, p.1, grifo nosso).

Ao longo desse documento, encontramse outros elementos que vão ratificar a preocupação em fazer com que a escola seja espaço de relações democratizantes, atendendo, assim, aos artigos da Lei 9394/96 já citados, em momento anterior, neste artigo. Vejamos: “O espírito de família traduz-se pelo trato simples e dialogante, pela acolhida carinhosa e participativa de todos os membros da comunidade educativa” (PPP, CMSL, 1999, p.4). “[…] uma pedagogia em que o educando, artífice de seu próprio crescimento, assume-se como protagonista, envolvendo-se ativamente no processo educativo pessoal e de grupo” ( ibidem, p.5). “A missão Marista de educar exige a ação conjunta de todos que, de uma ou de outra maneira, estão nela envolvidos: os educandos, as famílias, os docentes, os serviços pedagógicos, os agentes de pastoral, os irmãos maristas, os diretores, os auxiliares de serviços gerais, a mantenedora e os ex-alunos” (ibidem, p.6). “[…] que a escola envolva os pais em ambiente fraterno e acolhedor que inspire confiança e mobilize a consciência dos direitos e deveres. Para isso, o clima da escola deverá ser afetivo e dialogante, participativo, motivador e prazeroso, possibilitando ao aluno desenvolver o senso crítico, a compreensão do universo circundante, o exercício da cidadania e uma maior leitura da vida” ( ibidem, p.142). “Um espaço onde seja possível a integração horizontal e vertical da comunidade educativa, através do relacionamento integrado e respeitoso” ( ibidem, p.142). “Nossa escola […] será audaciosa, democrática, autônoma e cristã, como possibilidade de construção de uma escola cidadã” (ibidem, p.142). “Uma organização com espaço para a participação e o diálogo, valorizando todas as pessoas, cujas decisões sejam compartilhadas e assumidas por todos. Uma organização, na qual os conflitos sejam tratados de modo produtivo e administrados com equilíbrio” ( ibidem, p.143).


12

“A estrutura e a organização, marcadas profundamente pelo sentido de democracia, nas quais o respeito aos valores universais seja o tom preferencial das relações sociais, expresso na aceitação às diferenças individuais e sociais. Uma dinâmica que permita críticas, aberta ao diálogo, em que a hierarquia não seja impedimento à construção de relações democráticas e à valorização de cada profissional” ( ibidem, p.143).

Para a efetivação de uma escola participativa e com espírito democrático, é necessário o desenvolvimento de uma cultura institucional impulsionadora de relações saudáveis, capazes de constituírem um espaço-tempo em que as pessoas sintam-se imbricadas no processo, comprometendo-se com os objetivos comuns da comunidade educativa. No tocante ao tipo de relacionamento que se quer, a escola assim se expressou: “Um relacionamento que priorize a humanização, entendida como a valorização da afetividade, da humildade e da solidariedade […]” (PPP, CMSL, p.143). “A base das relações interpessoais seja pautada na confiança, na cooperação e no respeito mútuo, tendo o diálogo com o tom preferencial das interações e a marca do espírito de família, atuando como a esteira de integração entre os diversos setores da comunidade” ( ibidem, p.143). “A democratização das relações seja vivida no exercício contínuo de trocas interpessoais; na ocupação de lugares; espaços, voz e vez, na revisão permanente de atitudes, condutas, formas de expressar a agressividade; na convivência fraterna que afasta o medo da competitividade e constrói parcerias. A busca de uma escola integrada e participativa, com hierarquias respeitadas, sem que haja lugar para o autoritarismo. Relação de pessoas que permitam uma avaliação contínua da própria caminhada como a estratégia de crescimento recíproco de seus integrantes” ( ibidem, p.143 e 144).

Urge, portanto, trabalhar para que a escola seja efetivamente lugar de construção de um espaço em que as relações entre as pessoas possam ser respeitosas,

éticas, imbuídas de afetividade, transparência, fraternidade e compromisso como caminhos para a instauração de uma convivência harmoniosa, equilibrada e feliz. Em relação ao tipo de direção e serviços técnicos que se deseja, tem-se: “Devem ser elementos de apoio ao processo educativo, que busquem a democracia no exercício de suas funções, respeitando direitos e valorizando os profissionais que fazem parte da comunidade educativa” (PPP, CMSL, p.145). “Sua ação deve pautar-se na firmeza, abertura, democracia e articulação de condições que promovam o crescimento, estimulando novos projetos e ações que concorram para a consolidação da qualidade do ensino” (ibidem, p.145). “O trabalho desenvolvido tenha como meta a integração entre todos os segmentos da comunidade educativa” (ibidem, p.145).

Tais assertivas reforçam a ideia de que, cada vez mais, a direção e os serviços técnico-pedagógicos precisam estar atentos ao processo de formação pessoal e profissional de todos os educadores, assessorandoos na reflexão sobre a prática desenvolvida e no encaminhamento de novas ações, em um movimento permanente de AÇÃO-REFLEXÃO-AÇÃO. Quanto à natureza da relação que se quer assegurar com as famílias, a escola se posicionou de maneira enfática, percebendo a importância e a necessidade da integração escola/família: Uma relação amistosa, de corresponsabilidade, na qual a família seja integrada à comunidade escolar, presente na caminhada de seus filhos, consciente de seus deveres, aberta ao diálogo, verdadeira na relação interpessoal, parceira na construção das ações do processo educativo. (PPP, CMSL, p.145).

Nesse sentido, buscar-se-á estabelecer com as famílias parcerias para que o processo educativo desenvolvido, na escola, seja pautado na troca, na confiança e no respeito mútuos, gerando um clima de Revista Educ@cional | Brasília | Ano 03 | v.06 | jun.2011


13

acolhida e de diálogo permanente, em que cada uma se sinta parte da Comunidade Educativa Marista e coautora na formação de cidadãos atuantes, solidários, conscientes, verdadeiros e participativos. Constata-se que a escola em estudo embasa a construção da sua proposta político--pedagógicopastoral na perspectiva do atendimento ao que preceitua a LDBEN em direção a uma gestão, com ênfase na participação, corresponsabilidade e democratização das relações. Ao olhar e escutar o cotidiano escolar, percebem-se ações e práticas que concretizam o que está posto na LDBEN e que é ratificado na proposta político-pedagógicopastoral. Vale destacar a existência de algumas instâncias de gestão, tais como: • o Conselho de Pais, criado na escola, ainda, nos anos 1970, como organismo de escuta e de aconselhamento junto à direção. Em sua atuação, procura fazer a mediação entre as famílias e a gestão escolar, estimulando a participação da comunidade na construção coletiva da proposta político-pedagógico-pastoral e a vivência, no espaço escolar, do “espírito de família”; • o Conselho Pedagógico constituído pela direção e corpo técnico-pedagógico como instância deliberativa e decisória com a função de pensar a escola e os processos nela desenvolvidos. As reuniões do conselho são realizadas quinzenalmente e delas participam, além da direção, os coordenadores pedagógicos e de serviços. Como espaço plural, esses momentos contribuem para aprofundar o debate entre os pares, possibilitam o desvelamento das diferenças, contradições e divergências - próprias de um grupo formado por pessoas com características singulares - e, para a partir delas, construir a unidade necessária à organização e funcionamento pedagógicos; • os Conselhos de Classe como espaços em que os professores podem dizer Revista Educ@cional | Brasília | Ano 03 | v.06 | jun.2011

sua palavra, fazer suas proposições, constituindo-se numa real avaliação do desempenho dos estudantes, mas também da escola, e em especial deles próprios, procurando levantar problemas, propor soluções e planejar atividades que superem as dificuldades e se comprometam com uma educação de qualidade. Nesta direção, reconhecemos a necessidade urgente de oportunizar a participação dos estudantes como garantia na conquista do direito democrático de opinar, argumentar, defender suas ideias e pontos de vista; • os encontros escola/família em que o diálogo é canal de interação e crescimento mútuo, possibilitando aos pais um maior conhecimento da proposta político-pedagógico-pastoral, a avaliação do trabalho desenvolvido, pela escola, bem como assegurando a troca de informações sobre os estudantes; • o grupo de líderes de turma que representam os estudantes, sendo esta sua voz junto à direção e aos núcleos de apoio pedagógico. Como protagonistas no cenário educativo marista, estes adolescentes e jovens ampliam seus espaços de participação no planejamento, concretização e avaliação das atividades escolares.

Além dessas instâncias que caracterizam uma gestão voltada aos processos democráticos e participativos, vivenciam-se, na escola, relações pautadas no respeito, no diálogo, na escuta a fim de que as decisões tomadas não sejam apenas da equipe gestora, mas possam ser partilhadas por todos os segmentos que compõem a comunidade educativa. Institui-se um movimento em que as famílias dos estudantes são vistas como corresponsáveis pelo processo educacional de seus filhos e filhas. Sistematicamente, por meio dos atendimentos formais e/ ou informais, são possibilitadas trocas que vão auxiliar, tanto a escola como a família, no acompanhamento a cada criança, adolescente e jovem.


14

Ao mesmo tempo em que se constatam essas práticas, encontram-se outras que caminham na direção oposta, distanciando-se daquilo que é essência e que se constitui como um dos pilares da gestão educativa marista. Fala-se em gestão participativa, democrática, compartilhada, em que todos são autores da proposta pedagógico-educativa, mas se restringem os momentos de participação e decisão colegiada. Defende-se uma relação pedagógica pautada no diálogo, na transparência, em que o estudante seja sujeito do processo de construção do conhecimento, mas se vivem relações, muitas vezes, autoritárias nas quais o professor atua como detentor do conhecimento e não como mediador do processo de aprendizagem. Explicita-se uma avaliação libertadora, formativa, emancipadora, mas se vivencia um sistema avaliativo que, em alguns momentos, privilegia o quantitativo em detrimento do qualitativo, o produto ao invés do processo. Percebem-se, portanto, contradições entre o que é explicitado na proposta político-pedagógicopastoral como intenção para a construção de uma escola que venha a refletir os pressupostos legais e o que acontece, algumas vezes, nessa mesma escola. No entanto, nesse contexto, leva-se em conta que contradições e ambiguidades são parte inerente de qualquer processo e serão elas que farão a escola avançar na tentativa de superá-las e assegurar a concretude de cada um dos princípios inscritos no seu projeto educativo. Tais fatos provocam uma reflexão sobre algumas das razões possíveis que fazem com que os sujeitos do processo se afastem, durante a vivência da proposta político-pedagógico-pastoral, das diretrizes, metas e princípios estabelecidos em seu bojo. Por isso, é urgente e necessário que a comunidade educativa possa pensar sobre essas causas, buscando caminhos para que, cada vez mais, a proposta políticopedagógico- pastoral se consolide como documento norteador de todas as ações realizadas na e pela escola. Face ao exposto, fica evidente a caminhada feita pelo Colégio Marista São Luís -Recife na direção de uma gestão participativa/democratizante. Caminhada de inúmeros acertos, avanços e possibilidades e,

também, de alguns limites na tentativa de assegurar voz e vez a todos e todas que compõem a comunidade educativa. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Falar em gestão democrática implica necessariamente falar em democracia, entendida como caminho para a construção da liberdade, da justiça, da ética e da autonomia do ser humano, da escola, da sociedade; como possibilidade que não acontece subitamente, por decreto, por concessão de uma autoridade que se autointitula democrática, ou apenas porque a sociedade deixa de ser capitalista, neoliberal. Ao contrário, a democracia de que falamos é um processo. Não um processo imposto, mas uma conquista conjunta, coletiva - que exige respeito, diálogo, amorosidade entre todos que participam dessa caminhada. É luta na defesa de uma organização na qual os sujeitos tenham igualdade e liberdade de participação em todos os processos decisórios que dizem respeito à sua própria vida, quer sejam eles vinculados ao poder do Estado quer a processos interativos cotidianos vividos em casa, na escola, no bairro, no sindicato etc, enfim, no compartilhamento de responsabilidades, na articulação de interesses, na transparência das ações, na mobilização e no compromisso social, no controle coletivo. Pensar a democracia, na escola, é pensar que ela só será real e efetiva se puder contar com a participação da comunidade, no sentido de fazer parte, inserir-se, participar, discutir, refletir e interferir como sujeito naquele espaço por meio da democratização do poder pedagógico e educativo para que todos - estudantes, famílias, professores, funcionários, coordenadores pedagógicos, gestores possam se vincular a um planejamento participativo, aceitando as tensões e contradições presentes em todo esforço coletivo, na busca permanente de uma escola verdadeiramente democrática. Pensar a democracia, na escola, é, portanto, fazer com que a gestão democrática se realize concretamente na prática do cotidiano escolar, pois “só participa efetivamente quem efetivamente exerce a Revista Educ@cional | Brasília | Ano 03 | v.06 | jun.2011


15

democracia” (ANTUNES, 2002, p.98). Considerando as análises feitas, tanto no texto legal quanto na proposta político- -pedagógicopastoral, e as observações, as escutas e as vivências das práticas desenvolvidas, no cotidiano da escola marista, podemos perceber que a LDBEN vem ratificar e ampliar o que se procurava viver no interior da escola quanto à forma de gestão. Ratificar e ampliar porque outros documentos - que orientam sobre o funcionamento das escolas maristas e definem as diretrizes e os princípios da educação desta instituição, publicados anteriormente à LDBEN, tais como Guia das Escolas para uso nas casas dos Pequenos Irmãos de Maria (1853) e Constituições e estatutos do Instituto dos Irmãos Maristas (1986) - já apontavam para a necessidade de uma escola que fosse gerida participativamente e orientavam para uma forma de educar que se diferenciava pela presença, pelo espírito de família, pela simplicidade, pelo amor ao trabalho e pelo agir à maneira de Maria, constituindo-se como categorias fundantes de uma educação e de uma escola democráticas. É claro que, como lei maior que regulamenta e dá diretrizes à educação nacional, a LDBEN contribui para a consolidação de uma gestão partilhada, horizontal, democrática, abrindo, cada vez mais, caminhos de decisão colegiada. No entanto, temos claro que não bastam os pressupostos legais para que as mudanças aconteçam e se consolidem. Fazem-se necessários o movimento, o desejo, a força do coletivo da escola para que essas mudanças se tornem reais e sejam incorporadas por todos. Como espaço dinâmico onde atuam pessoas com características diversas, a escola está sujeita a avanços e retrocessos em sua forma de gestão. O movimento que se constrói no seu interior será responsável por maneiras mais autoritárias e decisões mais individualizadas ou por modos de fazer mais democratizantes e decisões mais compartilhadas. É nessa perspectiva que a escola e, particularmente, o Colégio Marista São Luís - Recife precisa desenvolver seu processo de gestão: como Revista Educ@cional | Brasília | Ano 03 | v.06 | jun.2011

canal de participação e de aprendizado para o jogo democrático; como contribuição efetiva para a reflexão e a ação cidadã; como necessidade para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária; enfim, como fonte permanente de humanização. REFERÊNCIAS ANTUNES, A. Aceita um conselho? – como organizar o colegiado escolar. São Paulo: Cortez/ Instituto Paulo Freire, 2002. (Guia da Escola Cidadã, v.8). BRASIL. Ministério da Educação. Lei 9.394/96. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília: MEC, 1997. COLÉGIO MARISTA SÃO LUÍS. Proposta PolíticoPedagógica. Recife: CMSL, 1998. MENDONÇA, E. F. A regra e o jogo: democracia e patrimonialismo na Educação Brasileira. Campinas: FE/UNICAMP, 2000. PARO, V. H. Escritos sobre educação. São Paulo: Xamã, 2001. SAVIANI, D. A nova lei da educação: trajetória, limites e perspectivas. Campinas, SP: Autores Associados, 1997. (Coleção Educação Contemporânea). SILVA, E. B. (Org.). A Educação Básica PósLDBEN. São Paulo: Pioneira, 1998. UNIÃO MARISTA DO BRASIL. Projeto Educativo do Brasil Marista: nosso jeito de conceber a Educação Básica. Brasília: UMBRASIL, 2010. VEIGA, I. P. A. (Org.). Escola: espaço do projeto político-pedagógico. Campinas, SP: Papirus, 1998. ______. Projeto Político-Pedagógico da Escola: uma construção coletiva. In: Projeto Político-Pedagógico da Escola: uma construção possível. Campinas, SP: Papirus, 1995. (p.11- 35). (Coleção Magistério: Formação e Trabalho Pedagógico).


16

Mudanças no Ensino Médio Brasileiro: Expectativas e contribuições da Juventude Marista Eva Rozental de Brito Lemos

Coordenadora Pedagógica do Colégio Marista, Mestre em Psicologia Cognitiva (UFPE), Especialista em Psicopedagogia (UNICAP/CEPAI) RESUMO O presente trabalho desenvolveu-se como uma pesquisa exploratória acerca da visão e participação da juventude Marista, enquanto estudantes do Ensino Médio, nas mudanças ocorridas neste nível de ensino. O objetivo principal da pesquisa foi discutir o papel que os jovens Maristas percebem desempenhar no processo de mudanças desta última etapa da Educação Básica brasileira. A concepção de juventude assumida é do Jovem enquanto sujeito de direitos. Um questionário foi aplicado a doze alunos do Ensino Médio de um Colégio Marista, onde foram exploradas suas expectativas, compreensão do tema e contribuições. A análise apontou que os jovens percebem um diferencial em “Ser Marista”, aprendendo a discutir, refletir e respeitar o mundo em que vivem. Além disso, se percebem como fazendo parte das mudanças no Ensino Médio à medida que discutem sobre o tema e ressaltam suas opiniões. O Colégio Marista é visto como trabalhando em prol de se adequar as mudanças. A análise dos questionários possibilitou a reflexão de inúmeras contribuições que os Jovens tem a oferecer para a melhoria do Ensino/Aprendizagem. Contribuições estas que devem ser consideradas pelos gestores a fim de promover uma educação de qualidade que atinja, efetivamente, os educandos. Assim, a pesquisa indica que a opinião dos jovens, sua articulação e suas ações dentro da escola devem ser consideradas como capazes de promover mudanças significativas, de jovens cidadãos, sujeitos de direitos. Palavras-chave: Juventude Marista, mudanças no Ensino Médio, Jovens Cidadãos.

1 INTRODUÇÃO Este artigo promove uma reflexão acerca do papel da juventude nas mudanças das Políticas e do Sistema Educacional Brasileiro, especificamente no Ensino Médio. As considerações deste estudo pretendem discutir e evidenciar o tema, abrindo espaço para futuras pesquisas. É trazido e questionado o papel da juventude nas mudanças que estão ocorrendo no Ensino Médio, refletindo sobre a participação e a escuta dos jovens, que fazem parte diretamente do processo de Ensino. As discussões aqui apresentadas direcionam-se a Juventude Marista interrogando a participação desses jovens, especificamente. Esta pesquisa poderá ajudar os gestores a perceberem a importância da juventude no processo de mudança e de qualificação do ensino, possibilitando um olhar e um espaço a estes atores. O objetivo principal da pesquisa é, portanto, discutir, a partir da percepção do jovem estudante Marista, o papel que a Juventude Marista desempenha no processo de mudanças no Ensino Médio. Assim, busca-se compreender as ideias e concepções que o Jovem tem acerca deste nível de ensino; das mudanças

que estão ocorrendo; da inserção do ENEM como uma possibilidade e perspectiva de transformação no Ensino em geral, e em particular no Ensino Médio. Além disto, objetiva-se identificar e discutir a participação dos jovens, alunos Marista, neste cenário. Os dados para análise foram obtidos através da aplicação de um questionário realizado com doze alunos do Ensino Médio de um Colégio Marista 2 JUVENTUDE Neste trabalho estão sendo assumidas algumas concepções a respeito da juventude, essenciais para puder compreender o questionamento da participação dos jovens nas políticas e mudanças implementadas no Ensino Médio. Assim, está sendo deixada de lado a visão de juventude como uma faixa etária com problemas ou distúrbios e assumido a condição de juventude como “sujeitos de direitos” (Conselho Nacional de Juventude, 2006, p.1 ) e por que não sujeitos com direitos e deveres (cidadãos), capazes de interagir com os adultos em prol de mudanças substanciais para a própria juventude. Juventude é concebida ainda, considerando Revista Educ@cional | Brasília | Ano 03 | v.06 | jun.2011


17

o Conselho Nacional de Juventude (2006), como uma condição social onde se encontram os sujeitos na faixa etária entre 15 e 29 anos. Embora o termo esteja sendo trazido no singular assume-se também o parâmetro de diversidade que permeia os sujeitos e os grupos. Nesse sentido, os sujeitos desta pesquisa são formados por jovens, sujeitos de direito, que tem entre quinze e dezoito anos e cuja voz deve ser ouvida, sua autonomia respeitada e suas opiniões levadas em consideração. Vale destacar que coexistem diferentes concepções sobre a juventude que merecem ser relatadas, pois permeiam as políticas e ações envolvidas nesta faixa etária. Abramo (2005) discutiu quatro abordagens que segundo a autora foram sistematizadas por Dina Krauskopf: 1. A primeira diz respeito a juventude como um período preparatório, que tem como centro a Educação, formando e capacitando o jovem para o mundo adulto, concebendo esta fase como uma transição entre a infância e a vida adulta; 2. em seguida tem-se a ideia de juventude como uma etapa problemática que estigmatiza os jovens e faz com que se elaborem políticas e ações com pretensão a diminuição de tais dificuldades e contenção de eventuais problemas oriundos desta idade; 3. o jovem também pode ser visto como ator do seu desenvolvimento, onde suas contribuições ganham um papel importante e fundamental. Esta concepção é discutida a partir do momento que se corre o risco de enfatizar apenas as contribuições dos jovens em detrimento de suas demandas, deixando as demandas como metas secundárias; 4. a quarta concepção refere-se a juventude como cidadã e sujeito das políticas, considerando o jovem como sujeito de direitos. Na concepção de Juventude cidadã, sujeito das políticas, é que se pode considerar esta etapa de vida como algo singular, assim como é também singular, por exemplo, a infância. Esta concepção traz tanto as contribuições quanto as participações dos jovens Revista Educ@cional | Brasília | Ano 03 | v.06 | jun.2011

como algo importante, lidando com as especificidades, próprias desta fase. Vale salientar que esta abordagem coexiste com as outras ...Em certas situações coexistem em ações distintas desenvolvidas pelos mesmos atores; em outras, configuram posições em torno das quais atores diferentes disputam. Também é preciso dizer que, muitas vezes, o sentido da formulação das ações não corresponde exatamente ao sentido da ação (Abramo, 2005, pág.04).

São nessas reflexões e coexistência de diferentes abordagens que se discute bastante no Brasil políticas e mudanças acerca do processo de Ensino/ aprendizagem para os jovens no Ensino Médio. A questão que se coloca é como fazer essas políticas de/para/com os jovens (Garcia e Abramovay, 2002). Ultrapassar o ‘para’ e vivenciar políticas com/de jovens é inevitavelmente fazer com que a juventude participe de discussões, encontros e elaborações de propostas. Enfim, é conhecer e compreender seus dilemas, suas dificuldades e seus anseios. (Fávero, Spósito, Carrano e Novaes, 2007). 2.1 Proposta Marista de Educação São Marcelino Champagnat, educador e fundador do Instituto dos Irmãos Maristas, compreendeu e ensinou a seus seguidores que a educação deve ser um processo integral, não se baseando apenas em instruir mas numa formação da pessoa humana como um todo. Sua meta e, portanto, o objetivo Marista, é “formar bons cristãos e virtuosos cidadãos” (Instituto Marista, 2003), baseando-se no amor ao próximo. Champagnat compreendia que educar é uma obra de amor e que para ser bem feita o educador precisaria antes de qualquer coisa amar, além de ‘amar a todos igualmente’. Destaca-se também na obra Marista a intervenção de Maria como modelo de educadora. É nesse contexto que o educador Marista assume a simplicidade, o afeto, o carinho nas relações pessoais como uma marca e um jeito de ser marista.


18

A pedagogia Marista consolida-se como uma pedagogia da presença, da humildade, da modéstia, enfatizando o espírito de família e oferecendo como proposta à comunidade educativa uma harmonia entre fé, cultura e vida. O Projeto Educativo do Brasil Marista (2010) destaca que a ação marista além de apresentar um aspecto de evangelização apresenta também um outro de diálogo entre fé, cultura e vida. Nesse contexto, o Projeto apresenta e refleti um caminho para o espaçotempo na educação marista, defendendo o direito das crianças e jovens, enquanto busca novas propostas para educar e evangelizar. A concepção de sujeito é a de um ser singular, que se relaciona com o mundo e com os saberes de uma forma ímpar. Assim, a juventude é reconhecida, enquanto são reconhecidos também a infância, o adulto, enfim a especificidade de cada fase da vida humana. “Ciente de que em cada escola, sala de aula e grupo convive uma multiplicidade de crianças e infâncias, adolescentes e adolescências, jovens e juventudes, adultos e modos de vida adulta, o educador marista deve promover o diálogo e possibilitar a inclusão de todas e todos, reconhecendo-os como sujeitos de direitos” (pág. 57)

3 ENSINO MÉDIO De acordo com a Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional (LDB Lei No. 9394/1996) o Ensino Médio é uma etapa (final) da educação básica. Como última etapa da escolarização básica visa o desenvolvimento do educando, capacitando-o para o exercício da cidadania e consequentemente, instrumentalizando-o para o trabalho e outras etapas de estudos (artigo 22). A LDB trouxe para o Ensino Médio a universalização e democratização, garantindo sua oferta pelo estado, já que até então só o Ensino Fundamental era ofertado obrigatória e gratuitamente. Entretanto, vale destacar, que a LDB também trouxe, ou melhor, provocou uma possibilidade de interpretação que transformou o Ensino Médio

em uma etapa mais acadêmica, diferenciando-o de uma Educação Profissional. Este processo criou um dualismo através do Decreto 2.208/97, que mesmo tendo sido revogado, parece ter deixado uma concepção muito forte dessa dualidade na sociedade e nas políticas educacionais (Reestruturação e Expansão do Ensino Médio no Brasil, 2008). Vale ressaltar que a LDB traz no artigo 35, inciso III, que uma das atribuições específicas do Ensino Médio é “o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico”. Os desafios do Ensino Médio se localizam no movimento de fazer sentido. Deve-se destacar bastante que o movimento que aponta a LDB é de um Ensino Médio que seja significativo para o educando. Mas, onde está o educando? Em que lugar o jovem é colocado nas escolas de Ensino Médio? O que se precisa para atingir um movimento ativo dos jovens como sujeitos nas escolas? O texto da Reestruturação e expansão do Ensino Médio no Brasil elaborado pelo GT Interministerial, instituído pela portaria nº. 1189 de 05 de dezembro de 2007 e a portaria nº. 386 de 25 de março de 2008, traz a proposta de dois modelos de Ensino Médio que se diferenciam por ser um com a formação profissional e outro sem esta e se igualam na proposta de serem as duas integrais, entrelaçando ciência, cultura e trabalho. O fato, como bem determina o Ministério da Educação (on line) é que “o Ensino Médio será reformulado...” e que a proposta de um Ensino Médio integral é romper com a ideia de uma mera passagem para o ensino superior e estabelecer como significado desta fase a inserção dos sujeitos na vida econômica e produtiva. O texto da Reestruturação e expansão do Ensino Médio no Brasil também aponta, sem fornecer maiores esclarecimentos, sobre a necessidade de dialogar com os jovens e de considerar suas expectativas em relação a escola. Corsetti & Garcia (2005) discutiram o lugar que os jovens ocupam na escola e o lugar que a escola ocupa na vida dos jovens e apontaram que de fato são necessárias mudanças no Ensino Médio, na Revista Educ@cional | Brasília | Ano 03 | v.06 | jun.2011


19

política pública e educacional, para que a escola possa contemplar as expectativas dos jovens. É neste sentido que os autores assumem que só com transformações se poderá ultrapassar a concepção de transitoriedade, de juventude como algo que não é, porque virá a ser. Esta reformulação poderá criar uma nova perspectiva do espaço escolar com uma gestão capaz de ouvir e dialogar com os jovens como sujeitos.

apontam apenas e, portanto, só serviria para avaliar, o desempenho de cada pessoa que faz a prova. Assim, o Enem é feito com afinco por pessoas que queiram ir para a universidade, o que segundo a autora, é uma minoria.

3.1 Enem

O projeto Jovens Agentes pelo Direito à Educação (JADE) foi realizado em cinco escolas estaduais de São Paulo e teve como objetivo elaborar diretrizes para políticas públicas de Educação no Ensino Médio, tendo sido seu relatório final construído com o Tema Que Ensino Médio Queremos? Pesquisa quantitativa e grupos de diálogo sobre ensino médio (Corti & Souza, 2009). Este é um dos documentos que dar possibilidade de vislumbrar a opinião dos jovens (paulistas) e suas possibilidades de participação em discussões e reflexões junto a outros sujeitos, já que o projeto desenvolveu Grupos de diálogos com estudantes, professores e pessoas de diferentes segmentos da Comunidade. O relatório de Corti & Souza (2009) apontou o momento de diálogo como proporcionador de uma melhor percepção aos tópicos discutidos e dando condições dos sujeitos participantes problematizarem todos os assuntos tratados. Ressalta-se, portanto, a participação concreta dos jovens na construção das diretrizes relatadas ao final do relatório com uma proposta de definição clara dos objetivos, articulação com as universidades, gestão pedagógica, pesquisa e expansão.

O Enem (Exame Nacional de Ensino Médio) aparece no cenário brasileiro como possibilidade de reestruturar o processo avaliativo do Ensino Médio e dos vestibulares, enquanto processos seletivos de entrada nas Universidades (INEP, on line). É apresentado como fazendo parte da reestruturação necessária ao Ensino Médio e sua utilização vislumbra uma forma de seleção única para a entrada dos educandos nas Universidades Públicas. Assim, de acordo com o Ministério da Educação “... A proposta tem como principais objetivos democratizar as oportunidades de acesso às vagas federais de ensino superior, possibilitar a mobilidade acadêmica e induzir a reestruturação dos currículos do ensino médio” (INEP/Enem, on line). Enquanto processo seletivo o Enem é aplicado ao final do último ano do Ensino Médio e avalia as áreas de Ciências da Natureza e suas Tecnologias, Ciências Humanas e suas Tecnologias, Linguagens, Redação, Códigos e suas Tecnologias e Matemática e suas Tecnologias. No ano de 2009 o Enem foi feito por aproximadamente 2,6 milhões de pessoas, de acordo com os dados do INEP. Como as universidades possuem autonomia, podem optar entre utilizar ou não o Enem, e caso optem em utilizar escolhem entre quatro formas de utilização: usando-o como fase única; como primeira fase; combinado com o vestibular da instituição; como fase única para as vagas remanescentes do vestibular. A partir dessa proposta, implementada através do Enem e de sua aplicação, alguns questionamentos são feitos e discutidos sobre a eficácia deste instrumento e sua proposta como avaliação de escolas e ensinos. Laboissière (2010) destaca que os dados do Enem Revista Educ@cional | Brasília | Ano 03 | v.06 | jun.2011

3.2 Participação e expectativas da juventude nas mudanças do Ensino Médio brasileiro

4 METODOLOGIA Os dados da presente pesquisa foram obtidos através da aplicação de um questionário realizado com doze alunos do Ensino Médio do Colégio Marista São Luís, situado na cidade do Recife. Os alunos tinham entre quinze e dezoito anos e foram indicados pelo coordenador, sendo quatro alunos de cada ano do Ensino Médio. Portanto, responderam o questionário quatro alunos do primeiro ano do Ensino Médio, quatro


20

do segundo ano e quatro do terceiro ano. Os estudantes foram convidados a participarem da pesquisa, sendo apresentado a cada um deles o objetivo da mesma. Cada aluno respondeu individualmente o questionário, sendo orientados a não dialogarem com os outros sobre suas respostas. O roteiro do questionário foi elaborado considerando o objetivo do estudo e a fundamentação teórica discutida. A presente pesquisa apresenta-se como uma pesquisa qualitativa exploratória, ou seja, em sua dimensão qualitativa este estudo promove uma reflexão e discussão das respostas dos alunos(questionários) como fonte direta dos dados. Em sua dimensão exploratória este estudo constitui-se como um estudo preliminar com o propósito de uma maior familiarização com o fenômeno estudado e uma maior caracterização do objetivo geral, aumentando o conhecimento sobre o problema de pesquisa, a fim de suscitar estudos posteriores. 5 ANÁLISE E DISCUSSÃO As opiniões trazidas pelos jovens, no presente trabalho, demonstram a convivência de diferentes concepções acerca da juventude, como bem discutiu Abramo (2005). Em especial são relatadas as ideias de juventude como período preparatório, do jovem como ator do desenvolvimento e da juventude cidadã. Sendo assim, os Jovens Maristas refletem em suas respostas o período em que estão vivendo, sua idade, seus estudos, como um período de formação para a vida adulta “Época de criar responsabilidade, de se preocupar com o futuro e a escolha da universidade” (Questionário, sujeito 5) por outro lado está refletida também a concepção da importância de sua participação, intervenção e ação, como cidadão capaz de contribuir para o crescimento da própria juventude. Ainda se tem na reflexão dos Jovens Maristas, trazidas nos questionários, a ideia de cidadania, direitos e deveres e singularidades desta faixa etária “... Acredito que faço parte das mudanças (no ensino) porque falo, participo e sou escutado. Tenho o dever de lutar para que o mundo melhore e que nós alunos possamos ter nossos direitos garantidos...”

(Questionário, sujeito 8). É cercado dessas concepções que o jovem dessa pesquisa vivencia o “ser aluno Marista” e como tal age e interage com seus pares, seu mundo e seu desenvolvimento. Assim, permeado pela concepção de São Marcelino Champagnat, de amor, presença e espírito de família, o Jovem Marista vive, convive e aprende. Essa vivência Marista foi amplamente refletida na pesquisa, sendo trazida fortemente nos questionários. Desta forma, ao destacar o que é ser aluno marista os jovens ressaltaram... Saber utilizar os aprendizados e vivências da escola na vida como um todo (sujeito 1); É saber respeitar o próximo e não discriminar ninguém, pois cada um tem a sua beleza (sujeito 2); É vivenciar a filosofia de Champagnat, aprender a ajudar o próximo (sujeito 4); É fazer parte de uma grande família que vai estar do seu lado (sujeito 5); É ter consciência social e aprender valores que não se aprende em qualquer lugar (sujeito 10); Ser aluno MARISTA é ter voz, é ser respeitado e ter que respeitar os outros(sujeito 8). Questionários.

Embora, tenham sido marcantes os depoimentos sobre ‘Ser aluno Marista’ houve um dos sujeitos da pesquisa que apontou como indiferente este fato. Entretanto, o que se sobressai é a vivência de um jeito diferente de ser (o jeito Marista) e a forte evidencia de que o Colégio Marista assume e vivencia a proposta de que Educar é muito mais do que instruir, passar conhecimentos e conteúdos. Assim, a proposta Marista parece acompanhar a concepção de juventude como sujeito de direito na medida em que a escuta, o apoio e as discussões fazem parte de seus princípios e vivências na escola. O Jovem Marista traz a ideia do Ensino Médio como uma fase muito importante, de conclusão, de síntese, o que condiz com a proposta da LDB. Nos questionários respondidos foi destacado um maior nível de aprofundamento, no Ensino Médio, com uma cobrança muito alta, exigindo muita dedicação e estudos. A análise dos questionários ainda demonstrou, Revista Educ@cional | Brasília | Ano 03 | v.06 | jun.2011


21

com ênfase, que existe a ideia de Ensino Médio como sendo uma fase preparatória para o vestibular, sendo trazido também e consequentemente a preparação para “realizar o ENEM”, esta perspectiva parece enaltecer a concepção de juventude como transitoriedade. Como bem já foi destacado no artigo 35, inciso III, da LDB, a formação ética, o desenvolvimento do pensamento critico e da autonomia é uma das atribuições do Ensino Médio. Esta atribuição é enfatizada pelo aluno quando se reporta ao Ensino Médio da Escola Marista que possui o diferencial de uma formação integral A filosofia Marista, que não apenas forma uma base intelectual, mas forma uma pessoa preparada para enfrentar a vida (sujeito 6); a extracurricularidade que propicia uma formação integral do aluno, diferentemente de outras instituições que unicamente prezam pela parcela acadêmica do estudante (sujeito 1). Questionários

Além destes aspectos os estudantes da presente pesquisa foram questionados se acreditavam desempenhar, no seu colégio ou a nível nacional algum papel no processo de mudança, relacionado ao Ensino Médio. Suas respostas apontam para a ideia de que participam direta ou indiretamente das transformações que ocorrem, embora alguns acreditem que sua participação ocorra apenas em nível local. Acredito que todo aluno de ensino médio desempenha um papel importante nessas mudanças, afinal é a partir de nossos questionamentos e resultados que essas mudanças são elaboradas e aplicadas nos anos seguintes (sujeito 1); Sim. Acredito que faço parte das mudanças (no ensino) porque falo, participo e sou escutado. Tenho o dever de lutar para que o mundo melhore e que nós -alunos- possamos ter nossos direitos garantidos e que as coisas não sejam arbitrárias. Faço, como líder, um pouco aqui para um pouco chegar a nível nacional (sujeito 8); No colégio sim, este está sempre se ajustando para com as necessidades dos alunos, mas a nível nacional não acredito (sujeito 3). Questionários.

Revista Educ@cional | Brasília | Ano 03 | v.06 | jun.2011

Em relação ao Enem os Jovens Maristas, nesta pesquisa, percebem-o como uma boa proposta, que abre possibilidades de mudanças no Ensino Médio, embora destaquem que melhorias precisam ser realizadas para que seja possível que o Enem atinja, de fato, seus objetivos: “Enem é uma ótima iniciativa para reformular a estrutura do ensino médio, que estava contendo alguns conceitos inaplicáveis no cotidiano, o Enem porém ainda precisa de melhoras na organização e sobretudo na divisão das provas (tempo, quantidade de questões, etc.)” (sujeito 6). Com estas avaliações acerca do Enem e suas expectativas os sujeitos deste estudo trazem a necessidade de reformulação do Ensino (Médio), destacando que conteúdos sem sentidos, desvinculados do mundo em que se vive, um ensino que privilegia a memória e o decorar em detrimento de uma aprendizagem significativa é o que está ocorrendo no processo de Ensino/aprendizagem: “...minha expectativa de mudanças é que os alunos passem a decorar menos as coisas e entender mais...”(sujeito 6). Dessa forma, em relação as mudanças, neste nível de ensino, que vem ocorrendo no colégio onde a pesquisa foi desenvolvida, os alunos destacam um esforço para que o processo de Ensino/aprendizagem faça sentido e atinja os educandos. Várias ações foram apontadas como direcionadas à reformulação: matérias mais integradas; utilização de recursos como data show; aulas mais contextualizadas; maiores exigências por parte dos professores e da escola. Por outro lado apontam a necessidade de mudanças consistentes e duradouras que promovam uma mudança geral no nível de Ensino. Neste sentido, vale a pena abordar as expectativas apontadas pois estas se traduzem em contribuições efetivas para as reformulações necessárias. Na presente pesquisa pode-se observar que os Jovens Maristas tem uma proposta acerca do que deveria ser o Ensino Médio. A partir da pergunta “Que Ensino Médio você gostaria de ter?” este estudo teve respostas que condizem com algumas propostas de reformulações citadas pelo Ministério da Educação. Por outro lado, os jovens apontam caminhos que podem ser melhores estudados e aprimorados.


22

Algumas respostas podem exemplificar tais expectativas : “Um ensino Médio menos corrido, com aulas mais dinâmicas”(sujeito 2) cuja reflexão traz a necessidade de uma revisão na metodologia vivenciada e também no conteúdo programático que pode estar provocando a necessidade de “correr” com os assuntos; “Um ensino mais objetivo” (sujeito 1); “... falta no Ensino Médio brasileiro a oportunidade para as pessoas se autoconhecerem...” (sujeito 3). Essas reflexões apontam para expectativas de uma maior integração entre o Ensino e o mundo, além de direcionar a necessidade de construção de aprendizagens significativas. Os dados da pesquisa de Corti & Souza(2009) que destacam o dialogo com os jovens como algo fundamental, reafirmam a proposta da atual pesquisa ao considerar fundamental a participação da Juventude na construção de políticas educacionais e de reformulação do ensino, num movimento de inserção das opiniões dos sujeitos que vivem diretamente o processo de aprendizagem. 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS Levar em consideração o que os jovens pensam, suas opiniões e inquietudes a respeito do Ensino Médio é fazer com que a Juventude participe plenamente do processo de aprendizagem, como sujeitos de direito. Vale destacar que, como bem refleti Cunha (2009), cabe ao gestor escolar promover um ambiente saudável para que todos os sujeitos que fazem parte da comunidade educativa possam se integrar e participar do processo, agindo como cidadãos capazes de atuarem de forma crítica. O presente trabalho pôde apontar que existe uma diferença fundamental em desenvolver políticas para os jovens, em detrimento de desenvolvê-las de/ para/com os jovens. A ideia de transitoriedade da juventude, sendo esta uma fase de preparação é bastante discernida na sociedade, embora haja um discurso de Juventude Cidadã. Reafirma-se que a proposta de Educação integral, concebida por Marcelino Champagnat, fundador do Instituto Marista é mais do que atual, é

desejada. Ressalta-se também que a formação Marista é singular, num movimento onde atuam diversas dimensões: cognitiva, religiosa, esportiva e artísticacultural. Os jovens assumem tal formação através do cuidado com ele mesmo, com o outro e com o mundo em que vive. Este estudo oportunizou perceber que a reformulação do Ensino Médio é algo que está acontecendo e que é desejado pelos Jovens. O Jovem Marista, sujeito desta pesquisa, percebe sua participação neste processo de mudanças e demonstra está envolvido com ele. Suas respostas apontam conhecimento das transformações pelas quais o Ensino Médio vem passando e trazem sugestões para melhoria desta fase. Vislumbrar um Ensino de qualidade para o Jovem Marista, é ter a oportunidade de vivenciar aprendizagens significativas, de ser cidadão no mundo em que vive, não no amanhã mas no hoje. É no processo que o ser humano se constitui, como bem ressalta Paulo freire (1996, p.90) “A alegria não chega apenas no encontro do achado, mas faz parte do processo da busca. E ensinar e aprender não pode dar-se fora da procura, fora da boniteza e da alegria.” REFERÊNCIAS ABRAMO, Helena Wendel. O uso das noções de adolescência e juventude no contexto brasileiro. In FREITAS, M. V. de. Juventude e adolescência no Brasil: referências conceituais. São Paulo: Ação Educativa, 2005. BRASIL, LDB. Lei 9394/96 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Disponível em < www. planalto.gov.br >. Acesso em: 22 de Julho de 2010. BRASIL. Ministério da Educação. <http://portal.mec. gov.br/index.php?option=com_content&view=article &id=13318&Itemid=310 > Acesso em: 20/07/2010 BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Secretaria de assuntos estratégicos da Presidência da República. Reestruturação e Expansão do Ensino Médio no Brasil (GT Interministerial instituído pela portaria nº. 1189 de 05 de dezembro de 2007 e a portaria nº. 386 de 25 de março de 2008) Brasília: 2008. 22p. Revista Educ@cional | Brasília | Ano 03 | v.06 | jun.2011


23

CORSETTI, Berenice; GARCIA, Elisete Enir Bernardi. O lugar da escola na vida dos jovens e o lugar dos jovens na vida da escola. Universidade do Vale do Rio dos Sinos, 2005. CORTI, Ana Paula; SOUZA, Raquel. Que ensino médio queremos? Pesquisa quantitativa e grupos de diálogo sobre ensino médio. São Paulo: Ação Educativa, 2009. 102 p. CUNHA, Marciano de Almeida (2009) Interfaces entre gestão de pessoas e gestão pedagógica: bases para a atuação estratégica do gestor educacional . Curso de Especialização em Gestão Pedagógica, módulo 3, Gestão de pessoas 1- aula 1 FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. Saberes necessários à Prática Educativa.São Paulo: Paz e Terra, 1996. 92 p. GARCIA, Mary Castro; ABRAMOVAY, Mirim (Orgs). Por um novo paradigma de fazer política de/para/ com a juventude. Revista Brasileira de Estudos da População, São Paulo, 2002, v. 19, p. 143-176. INEP. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Enem poderá induzir mudanças no ensino médio . < http://www.inep.gov. br/imprensa/noticias/enem/news99_29.htm. > Acesso em: 20/07/2010 INEP/ENEM. Sobre o Enem< http://www.enem.inep. gov.br/enem.php > Acesso em: 20/07/2010 INSTITUTO MARISTA. Missão Educativa Marista: um projeto para o nosso tempo. São Paulo: Simar, 2003. LABOISSIÈRE, Paula. ENEM não serve para avaliar qualidade de escola. Agência Brasil. 2010 NAZZARI, Rosana Katia; SILVA, Jose Otacílio da; LAZZAROTTO, Elizabeth Maria & IWAKE, Shiguero.O impacto das políticas de gestão educacional no capital social da juventude. In: Seminário Nacional Estado e Políticas Sociais no Brasil, 2003, Cascavel. Anais Seminário Nacional Estado e Políticas Sociais no Brasil. Cascavel : Edunioeste, 2003. v. I. p. 1-15. FÁVERO, Osmar; SPÓSITO, Marília Pontes; CARRANO, Paulo; NOVAES, Regina Reys (Orgs). Juventude e Contemporaneidade. Brasília : UNESCO, MEC, ANPEd, 2007. 284 p. – (Coleção Educação para Todos; 16). Politica

nacional

de

juventudes:

Revista Educ@cional | Brasília | Ano 03 | v.06 | jun.2011

diretrizes

e

perspectivas. Jovens como sujeitos de direitos. Conselho Nacional de Juventude, 2006. Projeto Educativo do Brasil Marista: nosso jeito de conceber a Educação Básica/ União Marista do Brasil. – Brasília: UMBRASIL, 2010. 132p


EDUC@CIONAL ONLINE

www.marista.edu.br/complexidade

www.marista.edu.br/bibliotecas

www.marista.edu.br/labin

www.marista.edu.br/ensinomedio

www.marista.edu.br/ensinoreligioso

www.marista.edu.br/intercambio

www.marista.edu.br/seac

www.radiotribos.com.br


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.