AEscolaLegal Educação - Tecnologia - Sustentabilidade e Cultura Sistêmica

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Musicalização - Abrindo portas para uma educação musical

Governança econômica - Uma pedagogia da economia

Fórum econômico mundial - Davos se prepara para ajudar a lançar uma nova década

USP cria centro de pesquisa na área de inteligência artificial

Educação, pedagogia, psicologia, nutrição e saúde.

N º 03 | A B R2020

Educação um direito de todos - um dever do Estado.

EDUCAÇÃO 4.0 E A SOCIEDADE BIT.

PAG. 22

MOMENTO DE AÇÃO GLOBAL. PAG. 5

RACISMO, INFÂNCIA E ESCOLA.

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O PEDAGOGO E SUAS TECNOLOGIAS DIGITAIS. PAG. 8

EDUCAÇÃO 4.0 O BRASIL ESTÁ PRONTO PARA O FUTURO?

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A relação entre famíliaescola e o impacto no desenvolvimento do aluno

Uma década de estatística na USP São Carlos: curso ganha destaque na era da ciência de dados

O que podem fazer arquitetas e arquitetos pela sua cidade?

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Fronteiras da Biologia Hightech



Æscola Legal | Nº03 | Abr 2020

Expediente – Æscola Legal nº 3 – março de 2020 Publisher – Diretor de Redação: Volmer Silva do Rêgo – Jornalista responsável MTB 16640-85/SP – ABI 2264/SP – MS 11714 ORCID: 0000-0002-6064-3791 volmersr@aescolalegal.com.br Arte: Alescio Vieira - alescio@gmail.com

Colaboram nesta edição: Miguel Angelo L Nicolelis – Dr. Pesquisador Bioengenharia Médica Duke Univesity (USA) Marcelo Gleiser – Físico Astrônomo – Dr. profº. Darthmouth College – Hannover (USA) Ladislaw Dowbor – Economista – Dr. Professor (PUC/SP) – Conselheiro ONU Paulo Feldman – Economista – Dr. Professor (USP) Daniel Vecchio Alves – Pedagogo – Dr. Professor - USP Ana Carolina B.A. Farias - Mestra em Sociologia /USP – Professora Ens. Médio SESP Denise Casatti – ICMC/USP Gabriela Bidin – ICMC/USP Paulo Tiné – Professor Dr. Música – UNIFESP Paolo Colosso – Arquiteto - Br Cidades - Dr. Filosofia - Professor (UFSC) Pesquisador USP Viviane Flores – Pedagoga - Diretora educacional da Rede Marista de Colégios (RMC) Jorge Abrahão - Coordenador Geral da Rede Nossa São Paulo Hernane Rosas – Ms. Nutricionista\USP – Presidente do Sindinutrisp Adriana Cruz - Redação - Jornal da USP

Conselho Administrativo: Eusiel Rego - MS Arte USP – Toronto – Ca. Jeasir Rego – MS Arte/Educação - UESC/SC Rita J Leria Aires – Psicóloga/Mediadora de Conflitos – PUC/SP

Conselho Editorial: Alberto Carlos Almeida – Cientista político Alfredo Attié Jr. - Advogado – Pres. APD Fabiano Trigo Romagnol – Prof. Literatura Portuguesa\Brasileira – Sec. Est. de Educação Jorge Tateishi - Jornalista Moacir Bueno Arruda - Biólogo Valeria Sanchez - Psicanalista

Æscola Legal Contatos: E-mails - revista@aescolalegal.com.br – redacao@aescolalegal.com.br - Mob: (11) 9 4216-5757 Site - www.aescolalegal.com.br

APOIAMOS:

Æscola Legal é um esforço coletivo de profissionais interessados em resgatar princípios básicos da Educação e traduzir informações sobre o universo multi e transdisciplinar que a envolve. Os artigos aqui expostos refletem a opinião destes profissonais, baseada em seus estudos e pesquisas e estão, no mais das vezes, intrinsecamente relacionados aos conceitos expendidos por este periódico.

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ÍNDICE 05 ODS DO MILÊNIO - ONU/UNESCO Da Redação AEL 06 EDUCAÇÃO ODS NÚMERO 4 Da Redação AEL 08 O PEDAGOGO E SUAS TECNOLOGIAS DIGITAIS Daniel Vecchio Alves 19 EDUCAÇÃO DIGITAL, GOVERNOS ANALÓGICOS Genivaldo Monteiro e Jaqueline Quaresemin 22 A EDUCAÇÃO 4.0 E A SOCIEDADE BIT Marisa Batista 28 EDUCAÇÃO 4.0 - O BRASIL ESTÁ PRONTO PARA O FUTURO? Da Redação AEL 32 A RELAÇÃO ENTRE FAMÍLIA-ESCOLA E O IMPACTO NO DESENVOLVIMENTO DO ALUNO Viviane Flores 33 RACISMO, INFÂNCIA E ESCOLA: A QUEM SERVE ESTE DEBATE? Ana Carolina B. A. Farias

44 MAPA DA DESIGUALDADE DE SÃO PAULO - CAPITAL (2019) BR São Paulo (Jorge Abrahão) 45 FÓRUM ECONÔMICO MUNDIAL - DAVOS SE PREPARA PARA AJUDAR A LANÇAR UMA NOVA DÉCADA Assessoria de Imprensa Pavel Osipyants - Zurich Insurance Group 47 UMA DÉCADA DE ESTATÍSTICA NA USP SÃO CARLOS: CURSO GANHA DESTAQUE NA ERA DA CIÊNCIA DE DADOS Denise Casatti 49 MAIS RÁPIDO DO QUE UMA BALA Yuri Vasconcelos 51 USP LIDERA FORÇA-TAREFA PARA DESCOBRIR AS CONEXÕES ENTRE AS ESPÉCIES ASCOM USP (Denise Casatti) 53 FRONTEIRAS DA BIOLOGIA HIGHTECH Miguel Nicolelis - Duke University/USA 55 MUSICALIZAÇÃO - ABRINDO PORTAS PARA UMA EDUCAÇÃO MUSICAL Jeasir S. Rego

37 IPCA (ÍNDICE DE PREÇOS AO CONSUMIDOR AMPLO). VOCÊ SABE O QUE É INFLAÇÃO? Da Redação AEL

58 BIG BANDS NOS CÉUS EDUCAÇÃO MUSICAL UM FORTE ACRÉSCIMO COGNITIVO Paulo Tiné

38 GOVERNANÇA ECONÔMICA UMA PEDAGÓGICA DA ECONOMIA Ladslaw Dowbor

60 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE AS FILOSOFIAS DA EDUCAÇÃO MUSICAL ESTÉTICA E PRAXIAL Jeasir S. Rego

41 BRASIL PRECISA DE EMPREENDEDORES E A ESCOLA PODE AJUDAR MUITO Paulo Feldmann

63 O ENSINO E DESENVOLVIMENTO DO DESENHO ATRAVÉS DA ARTE VISTO POR UMA PERSPECTIVA PEDAGÓGICA SÓCIO CONSTRUTIVA Simone Garcia 66 O QUE PODEM FAZER ARQUITETAS E ARQUITETOS PELA SUA CIDADE? Paolo Colosso 68 USP CRIA CENTRO DE PESQUISA NA ÁREA DE INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL Adriana Cruz 69 UNIPERMACULTURA - CURSOS DE PERMACULTURA/EAD Da Redação AEL 70 ESTRATÉGIAS ANTIBULLYNG PARA O AMBIENTE ESCOLAR Loriane Frick, Maria Menin, Luciene Tognetta, Cristina Del Barrio 72 SESSÃO LIVROS/LITERATURA Da redação AEL 74 OS PROFESSORES E OS ESTUDANTES Professor anônimo português 75 PIB CRESCE 1,1% EM 2019 FECHA O ANO EM R$ 7,3 TRILHÕES Da redação AEL

43 DÉCADA INTERNACIONAL DE AFRODESCENDENTES Da Redação AEL Im

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ODS DO M ILÊ NIO – ONU/ UNESCO

MOMENTO DE AÇÃO GLOBAL PARA AS PESSOAS E O PLANETA

O

ano de 2015 apresentou uma oportunidade histórica e sem precedentes para reunir os países e a população global e decidir sobre novos caminhos, melhorando a vida das pessoas em todos os lugares.

ACOMPANHE - Relatório Especial sobre os Direitos da Criança e o Meio Ambiente - baixe no seguinte e n d e r e ç o : h t t p s : / / u n d o c s . o r g / A/ H R C / 37/ 58

Essas decisões determinarão o curso global de ação p ara aca ba r co m a p o b rez a, p ro m o ve r a p ro s p e r i da de e o bem-estar para todos, proteger o meio ambiente e enfrentar as mudanças climáticas. Em 2015, os países tiveram a oportunidade de adotar a nova agenda de desenvolvimento sustentável e chegar a um acordo global sobre a mudança climática. As ações tomadas em 2015 resultaram nos novos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) , que se b aseia m no s o ito O b j eti v o s d e D es en v o l v i m e nt o do Milênio (ODM). As Nações Unidas trabalharam junto aos governos, sociedade civil e outros parceiros para aprov eitar o impuls o g e rad o p e l o s O D M e l e var à f r e n t e u m a age nd a d e de s en v o l v i m en to p ó s - 2015 amb i c i o s a . A Revista AEscola Legal está seriamente engajada no Objetivo 4. Assegurar a educação inclusiva e equitativa e de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da v ida para to d as e to d o s .

Acesse:

https://nacoesunidas.org/pos2015/

LEIA - Cartilha dos Direitos da Criança ao Meio Ambiente – baixe o PDF completo: w w w . a e s c o l a l e g a l . c o m . b r / a s s e t s / p d f / o d s _ c a r tilha .pdf

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EDUC AÇ ÃO ODS NÚMERO 4 para complementar o produto interno bruto (PIB) destas sociedades. 4.1 Até 2030, garantir que todas as meninas e meninos completem o ensino primário e secundário livre, equitativo e de qualidade, que conduza a resultados de a p r e n d i za g e m r e l e v a n t e s e efica zes.

Objetivo 4. A ssegurar a educação inclusiva e equitativa e de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todas e todos AEscolaLegal apoia e está comprometida com este projeto ambicioso,

mas

per feitamente

exequível

da

ONU

pela

construção do um mundo melhor para todos, mais humano, com mais justiça social e respeito pelos direitos humanos e o desenvolvimento harmonioso com meio ambiente.

O

s ODS e metas são integrados e indivisíveis, de natureza global e universalmente aplicáveis, tendo em conta as d ife rentes rea lida des , c ap ac i d ad e s e níveis de desenvolvimento nacionais e respeitando as políticas e prioridades nacionais. As metas são definidas como aspiracionais e globais, com cada governo definindo suas próprias metas nacionais, guiados pelo nível global de ambição, mas levando em conta as circunstâncias nacionais. Cada governo também vai decidir como essas metas aspiracionais e globa is devem ser i nc o rp o rad as no s processos, políticas e estratégias nacionais de planejamento. É importante reconhecer o vínculo entre o desenvolvimento sustentável e outros processos relevantes em curso nos campos econômico, social e ambiental. 56. Ao decidir so bre e s s e s O b j e ti vo s e metas, reconhecemos que cada país enfrenta desafios específicos para alcançar o desenvolvimento

sustentável, e ressaltamos os desafios especiais que enfrentam. Indicadores estão sendo desenvolvidos para ajudar neste trabalho. Dados desagregados de qualidade, acessíveis, atualizados e confiáveis serão necessários para ajudar na medição do progresso e para garantir que ninguém seja deixado para trás. Esses dados são a chave para a tomada de decisões. D ad o s e i n f o r m a ç õ e s d i s p o n í v e i s e m mecanismos de comunicação devem ser usados sempre que possível. Concordamos em intensificar nossos esforços para reforçar as capacidades estatísticas nos países em desenvolvimento, particularmente os países africanos, no Brasil e nos países menos desenvolvidos, os países em desenvolvimento sem litoral, os pequenos Estados insulares em desenvolvimento e os países de renda média. Estamos comprometidos em desenvolver medidas mais amplas de progresso

4.2 Até 2030, garantir que todos as m e n i n a s e m e n i n o s t e n h a m a cesso a um desenvolvimento de qualidade na primeira infância, cuidados e educação pré-escolar, de modo que eles estejam prontos para o ensino primário. 4.3 Até 2030, assegurar a igualdade de acesso para todos os homens e mulheres à educação técnica, profissional e superior de qualidade, a preços acessíveis, incluindo universidade. 4.4 Até 2030, aumentar substancialmente o número de jovens e adultos que tenham habilidades relevantes, inclusive competências técnicas e profissionais, para emprego, trabalho decente e empreendedorismo. 4.5 Até 2030, eliminar as disparidades de gênero na educação e garantir a igualdade de acesso a todos os níveis de educação e formação profissional para os mais vulneráveis, incluindo as pessoas com deficiência, povos indígenas e as crianças em situação de vulnerabilidade. 4.6 Até 2030, garantir que todos os jovens e uma substancial proporção dos a d u l t o s , h o m e n s e m u l h e r es est eja m alfabetizados e tenham adquirido o conhecimento básico de matemática. 4.7 Até 2030, garantir que todos os alunos adquiram conhecimentos e habilidades necessárias para promover o desenvolvimento sustentável, inclusive, entre outros, por meio da educação para o desenvolvimento sustentável e e s t i l o s d e v i d a s u s t e n t á v e i s , direit os


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“A escola , não só no Brasil, mas no mundo, ainda está preparando os alunos para e m p r e g o s d o sé cu lo 20, como se estivesse parada no tempo. Precisamos preparar os jovens para um mundo que está mudando muito rápido“ Foto de National Canc er Institute do Unsplash

humanos, igualdade de gênero, promoção de uma cultura de paz e não violência, cidadania global e valorização da diversidade cultural e da contribuição da cultura para o desenvolvimento sustentável. 4 .a Co nstruir e melho rar i ns tal aç õ e s físicas para educação, apropriadas para crianças e sensíveis às deficiências e ao gênero, e que proporcionem ambientes de aprendizagem seguros e não violentos, inclusivos e eficazes para todos. 4.b Até 2020, substancialmente ampliar globalmente o número de bolsas de estudo para os países em desenvolvimento, em particular os países menos desenvolvidos, pequenos Estados insulares em desenvolvimento e os países africanos, para o ensino superior, incluindo programas de formação profissional, de tecnologia da informação e da comunicação, t é c n ic o s, de engenha ri a e p ro g ram as científicos em países desenvolvidos e outros países em desenvolvimento. 4.c Até 2030, substancialmente aumentar o contingente de professores qualificados, inclusive por meio da cooperação internacional para a formação de professores, nos países em desenvolvimento, especialmente os países menos desenvolvidos e pequenos Estados insulares em desenvolvimento. A POSIÇÃO DO MEC – http://portal.mec.

gov.br/component/tags/tag/50121 Ministério da Educação e Cultura em reunião junto a empresários do setor educacional ligados ao atual governador do estado de São Paulo e do setor educacional sinalizam na direção de recursos e incentivos para área privada. A presidente do Instituto Ayrton Sena, Viviane Senna, alertou para a necessidade de mudança na educação. “A indústria 4.0, que não é só indústria, é todo um cenário de mudança em diversas áreas, traz de novo esse fantasma que as s us ta a h u m a n i d a d e d e t e m p o s e m tempos, quando há grandes saltos de mudança. Setores e profissões inteiros desapareceram no passado durante esses saltos. E o que importa ho j e é ana l i s a r a v e l o c i d a d e c o m q u e isso acontece, assim como qual será o papel da escola na preparação dessas no vas g e r a ç õ e s . A e s c o l a , n ã o s ó n o Brasil, mas no mundo, ainda está preparando os alunos para empregos do século 20, como se estivesse parada no tempo. Precisamos preparar os jovens para um mundo que está mudando muito rápido.” Entretanto, esta situação ainda não é uma realidade para as escolas públicas do estado ou do país, a d e s p e i to da p u b l i c i d a d e d o M E C . Na realidade, existe um barreira criada a partir dos decretos recentes dos úl ti m o s gov e r n o s – q u e v ã o d e s d e o congelamento de gastos nas áreas

críticas públicas como Educação, Saúde, Transporte e Infraestrutura e, mais recente ainda, a cessão das transferências da obrigatoriedade p o r l e i – d e c r e t o a s s i n a d o pelo a t ua l presidente - que prevê o repasse da União para os estados da verba da Educação pública, deixando para cada ente federativo o ônus de cuidar da questão da forma que for p o s s í v e l ( n a L e i d e r e s p o n s a bilida de fiscal havia o compromisso de que 18% do orçamento da União fosse destinado à Educação pública, mas os estados devem investir 25% e os municípios também 25%). E m n ú m e r o s i s s o s i g n i f i c a US$ 4.318 (mas a média da OCDE é de US$ 9. 317, 00 p o r a l u n o ) , o u s e j a, o B ra sil não estava nem na metade, embora os gráficos* mostrem uma acentuado crescimento nos investimentos comparativamente aos primeiros anos da década de 2000. Este fato indica que empresas de capital privado poderão assumir grande parte dos projetos de educação vindouros, deixando a educação na m ã o d o m e r c a d o q u e t e m , dent re a s suas prioridades – a mais importante – lucrar com seu negócio. http:// educacaoconectada.mec.gov.br/ *gráficos - Fonte: https://www. politize.com.br/quanto-governoi n v e s t e -s a u d e -e d u c a c a o /

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O PEDAGOGO E SUAS TECNOLOGIAS DIGITAIS Foto de digitalleraningmagazine-Elets

Resumo: Diante da busca de um modelo especializado e colaborativo do papel do pedagogo nas escolas, como pensá-lo hoje, no contexto das novas TIC ( Tecnologias da Informação e Comunicação)? Quais são as melhores tecnologias digitais para utilizar em suas tarefas e como utilizá-las com vista a integrar e, também, especializar os seus trabalhos de coordenação, super visão e orientação pedagógicas? Tais são as questões nor teadoras deste presente ar tigo. Não pretendemos dar aqui uma resposta acabada para cada uma das questões, mas apenas suscitar ref lexões acerca da integração das tecnologias nas funções do pedagogo, tendo em vista repensar e atualizar suas práticas no ambiente escolar. Sendo assim, nos atentaremos às possibilidades de desenvolvimento das ações do pedagogo a par tir do uso de tecnologias digitais, especialmente a par tir do uso dos Sistemas de Gestão (SIG) que potencializa suas tarefas, pois implica em novas formas de comunicar e perceber o espaço escolar de modo a orientar um trabalho pedagógico sempre em busca das estratégias de formação e aprendizagem mais adequadas a cada contexto.

Palavras - chave: Pedagogo. Educação e Tecnologia. Sis temas de Ges t ão.

1. A ORGANIZAÇÃO ESCOLAR POR MEIO DAS TIC

A

s escolas, constituídas por equipes de gestão escolar e gestão pedagógica, reúnem diversos elementos organizacionais, que são chave para um bom funcionamento da instituição. A esc ola é pr o fissio na l e p o l i ti c am e nte

uma organização complexa (Ferreira, 2017), que necessita ser analisada atendendo à sua estratificação e estruturação institucional com vista a um melhor entendimento dos seus processos de trabalho. Neste capítulo, com o intuito de analisarmos a atuação do corpo de pedagogos de escolas nacionais, recorremos inicialmente aos modelos

de estruturas organizacionais propostos por Mintzberg (1995). Na sua abordagem, Mintzberg estruturou as organizações gerais em cinco estruturas principais: o vértice estratégico, a linha hierárquica, o c e n t r o o p e r a c i o n a l , a t e c n oest rut ura e o pessoal de apoio. Segundo o mesmo autor, tais estruturas estão interligadas e relacionadas por dois tipos de fluxo: o de informação e o de


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p rocesso s de decisã o . C ab e re s s al tar que ambos os fluxos são muito importantes para a estruturação organiza cio nal e func i o nal d a e s c o l a, influenciando diretamente as áreas funcionais relacionadas com a gestão, como a comunicação e a organização da instituição educadora. Nesse sentido, tanto no plano administrativo quanto no pedagógico, as tecnologias de informação e comunicação podem ser tomadas como um importante instrumento a serviço da educação, sendo o pedagogo o profissional que tem o papel preponderante na integração ed uc a tiv a da s TIC no e s p aç o e s c o l ar. Embora a mudança implique no esforço conjunto de toda uma comunidade, segundo Piedade e Pedro (2014, p. 112), “o papel dos líderes escolares é imprescindível [para tal mudança]. Os líderes escolares serão os responsáveis pela identificação e definição de estratégias de mudança que serão necessárias nos seus contextos educativos para que qualquer mudança de práticas se instale”. Nesse sentido, o pedagogo precisa cuidar dos elementos principais da organização e da gestão do processo de ensino oferecido pela escola: do planejamento escolar e pedagógico, da organização que sinaliza recursos para a realização do que foi planejado, da coordenação que desenvolve e orienta recursos humanos e equipes de trabalho, e da avaliação que consiste no acompanhamento, na orientação e na comprovação do rendimento do trabalho realizado. É preciso defender a autonomia e a liderança da ação pedagógica, principalmente com base na “liderança transformacional” (Piedade, 2017), em que o pedagogo se dispõe a refletir sobre o desempenho dos professores e demais agentes escolares, propondo melhoramentos. Portanto, o pedagogo, enquanto líder “transformacional” deve ser aquele profissional “capaz de projetar o coletivo para o futuro, levando-o

a realizar uma ação com vista a alcançar um objetivo comum que está p ara al é m d o s o b j e t i v o s e i n t e r e s s e s particulares de cada indivíduo que faz parte desse coletivo” (Santos, 2018, p. 35). Por isso, recomenda-se que os pedagogos se envolvam nos programas de desenvolvimento profissional dos seus professores e, ainda, que procurem constituir nas suas escolas equipes de professores com potencial para promover estratégias de ap re nd i z a g e m e l i d e r a r a i n t e g r a ç ã o das tecnologias durante as aulas. P ara o c ump r i m e n t o e f e t i v o d e t o d a s e s s as m e t a s , t e r í a m o s q u e p a r t i r d e o utra re al i d a d e e s t r u t u r a l q u e n ã o a que encontramos na atual situação escolar do Brasil, cujas escolas públicas são compostas, em sua maioria, por poucos profissionais habilitados, acumulando em apenas um age nte ( c o o r d e n a d o s , s u p e r v i s o r e o ri e ntado r p e d a g ó g i c o s ) a s t a r e f a s de todas as habilitações do pedagogo. Ne s te q ua d r o d e d e s e s t r u t u r a ç ã o d a prática do pedagogo nas escolas, to rna- s e f u n d a m e n t a l a u t i l i za ç ã o d e sistemas de informação gerencial que oferecem relatórios-padrão e reúnem e q ui p am en t o s , p e s s o a s e p r o g r a m a s com o objetivo de facilitar e de otimizar os resultados, auxiliando no processo de planejamento das atividades e de organização do espaço escolar. No geral, a implementação de tecnologia digital para o aprimoramento da organização escolar apresenta um quadro de benefícios e vantagens que visa a eficiência, produtividade e qualidade dos serviços prestados. Ao longo deste capítulo, perceberemos o quanto as várias versões do SIG (Sistema Integrado de Gestão ou Sistema de Informação Gerencial), são importantes para uma organização, não só escolar, mas tam b é m pe d a g ó g i c a d a s i n s t i t u i ç õ e s de ensino. Se bem implementados, tais sistemas trazem excelência na qualidade do trabalho escolar, com melhoria no acesso a informações e serviços educacionais prestados.

1 Para saber mais sobre o programa Currículo+, acesse http://curriculomais.educacao.sp.gov.br/.

Antes de tudo, é preciso ressaltar que, na maior parte dos programas de informatização educacional das escolas públicas, não se registram muitos movimentos de apoio e estímulo ao envolvimento e responsabilização dos gestores pedagógicos pelo processo de integração das TIC nas escolas. Isso pode ser confirmado pelo fato do programa Currículo+ (2014) da Secretaria de Educação do Estado d e S ã o P a u l o ( S E E / S P ) , p o r exemplo, focar no uso das TIC apenas por docentes e discentes. Tal iniciativa visa incentivar a utilização da t e c n o l o g i a c o m o r e c u r s o p eda gógico articulado ao currículo escolar e s t a d u a l d e S ã o P a u l o , p a r a inspira r práticas docentes inovadoras, não fazendo qualquer alusão aos gestores pedagógicos, que, por sua vez, devem auxiliar os professores na construção de todo processo de aprendizagem. O mesmo foco ocorre no ambiente virtual de formação da mesma secretaria, cujas atividades estão concentradas nos cursos da Escola de Formação de Professores (EFAP). Todavia, em muitas escolas, a utilização dos meios digitais na gestão tem constituído um dos pilares para a organização pedagógica da i n s t i t u i ç ã o . A r a p i d e z n a s opera ções administrativas, por exemplo, na velocidade do preenchimento das plataformas digitais como os S i s t e m a s In t e g r a d o s d e G e s t ã o (SI G ), t o r n a m m a i s e f i c a z a g e r e n cia de um local ou uma equipe de trabalho: “As plataformas electrónicas na medida em que se revestem de precisões e detalhes, estatísticas significativas e prazos inadiáveis, preenchem os factos de credibilidade [...], criando um mecanismo de sugestão ao utilizador das plataformas [...]” (Meira, 2017, p. 79). A partir desses e outros dados, as plataformas digitais podem proporcionar aos pedagogos a possibilidade de pensar novas formas e novas perspectivas de realizar suas tarefas, aumentando exponencialmente as capacidades

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de cálculo e de registro. Mas, a gest ão pedagó gica ef e tuad a p o r m e i o das TIC, tende a individualizar-se e reduzir-se aos níveis superiores da gestão, dependendo cada vez mais das in t e rvençõ es técnicas d e um núm e ro restrito de profissionais que controlam os dados da plataforma, limitando a c olab oraçã o entr e o s d e m ai s age nte s na organização do processo de ensino. Em muitos casos os agentes educacionais são beneficiados com o funcionamento de um bom sistema, mas perdem efeito porque, facilitando as tarefas, a tecnologia pode tornar tais agentes meros sujeitos distantes das tomadas de decisão que afetam seus próprios ofícios. Logo, frente às medidas de m od e rniza ção peda g ó gi c a e m m ui tas escolas, ao mesmo tempo em que at en d em uma necess i d ad e , ac e ntuam o problema do distanciamento dos agentes educacionais das questões que são comuns a toda comunidade escolar, como os processos avaliativos e o gerenciamento dos espaços educativos. A ação gestora dos pedagogos, portanto, por meio de tecnologias digitais, pode “adquirir uma crescente centralidade no processo decisório, acabando, muitas vezes, por delimitar os termos nos quais as decisões acabam por ser t om ada s, impo ndo a q ue m d e c i d e ( o u d e c id i ndo po r eles) e ao s uti l i z ad o re s das plataformas as suas próprias definições da realidade” (Meira, 2017, p . 82).

Por isso , o ca so da mo d e rni z aç ão d a gestão pedagógica dos pedagogos não depende da qualidade ou da quantidade de tecnologia utilizada, mas do papel que ela exerce na intercomunicação entre esses e outros profissionais. Os mecanismos digitais de gestão só serão eficazes na medida em que “encontram num sistema de relações humanas os meios adequados que lhes permitam tirar partido das potencialidades técnicas [...]. Assim, mais que plataformas electrónicas que funcionam, existem actores organizacionais que as fazem funcionar” (Meira, 2017, p. 95). Sendo assim, o mau uso das plataformas digitais de gestão pedagógica, bem

como a ambiguidade na leitura dos dados destas provenientes, podem af e tar nã o s ó o t r a b a l h o p e d a g ó g i c o dos pedagogos, como também o trab al ho d o c e n t e .

p e r m i t e u m a g e s t ã o m a i s eficient e e inovadora, ou seja, as potencialidades informáticas aprimoram as dinâmicas d e c o m u n i c a ç ã o i n t e r n a e ext erna da escola.

Esse processo demonstra o problema decorrente do uso não colaborativo das TIC, implicando na “incapacidade p ara e s p el h a r a d i l u i ç ã o d o p r o c e s s o decisório num conjunto de intervenções decisórias através das variadas operações técnicas enquanto actos de microgestão quotidianos” ( M e i ra, 2 017, p . 102) . N e s s e s e n t i d o , o gestor pedagógico não deve se apropriar das decisões que devem ser to m ad as d e n t r o d a e s c o l a , v i s t o q u e , no contexto escolar, são os processos colaborativos de organização, planejamento e ação que dão base para que os exercícios de formação e de aprendizagem sejam de fato p ro m o vi d o s .

A partir do redimensionamento do e s p a ç o e s c o l a r d e v i d o a t a i s a va nços tecnológicos e científicos, os gestores pedagógicos também ganham novos p e r f i s e n o v a s a t r i b u i ç õ e s , pa ssa ndo “a reorganizar o contexto escolar como criar parcerias, romper com a forma bancária do ensinar e aprender, mudar [...] a prática pedagógica” (Gomes, 2017, p. 157). Ao explorar as potencialidades das TIC no seu cotidiano, a escola abre-se a novas experiências, vivenciando uma comunicação partilhada que gera alta troca de informações com outros espaços de conhecimento: “Essa abertura à articulação com diferentes espaços potencializa a gestão escolar e p r o v o c a m u d a n ç a s s u b s t ancia is no interior da instituição, ao ponto da aprendizagem e a gestão participativa poderem se desenvolver em um processo colaborativo com os setores internos e externos da comunidade escolar” (Almeida e Rubim, 2007, p. 1) .

C o m o ráp i d o a v a n ç o d a t e c n o l o g i a e o crescente valor das informações, as instituições de ensino se viram pressionadas a adotar meios que possibilitassem o melhor gerenciamento dessas informações. Mas, como afirma Piedade (2017, p. 76), “é efetivamente ao nível da comunicação com as estruturas de gestão, com alunos e com encarregados de educação que os p ro f e s s o r e s t e n d e m a u s a r m e n o s a s tecnologias”. O mesmo também se verifica ao nível da comunicação e ntre agen t e s e d u c a t i v o s , e m q u e h á uma utilização limitada de tecnologia, fator cujas consequências iremos considerar como um dos objetos d e s te tó p i c o d e e s t u d o . O recurso a uma rede interna, por outro lado, pode intensificar a comunicação entre órgãos, cargos e secretarias, envolvendo mais diretamente diretor, pedagogos, professores, secretários, alunos e pais nos processos da educação. Além disso, a rede interna, quando ligada à Internet, amplia as pontes escolares, ligando-a, institucionalmente, a outras escolas, bem como a outras secretarias municipais e estaduais de educação. Portanto, o acesso à informação, armazenamento e processamento em tempo real

A contemporaneidade digital exige c a d a v e z m a i s u m a c o m u n i ca çã o em t e m p o r e a l e d e r e a ç ã o i n s t a nt â nea . Por isso, os desafios gerenciais da escola demandam por uma ferramenta que possibilite o acompanhamento da r e a l i d a d e e s c o l a r t a m b é m em t empo real. Isso credibiliza e facilita a execução de ações educacionais, cobrindo as funcionalidades mais básicas como o cadastro de alunos, controle de fluxo (matrículas, transferências, evasão), geração de documentos (declarações, histórico escolar, diário de classe), cadastramento de professores e funcionários, até suas funcionalidades mais complexas e qualitativas como o p l a n e j a m e n t o e o d e s e n v olviment o pedagógico. Logo, existe uma necessidade e m e r g e n t e d e a v a n ç a r c a d a vez ma is nos processos de organização escolar e d e a p r i m o r a m e n t o t e c n o lógico por meio de ferramentas específicas de gestão de pessoas e processos,


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visando o trabalho colaborativo, à partilha de documentos, o uso de plataformas e de ferramentas digitais em geral. Existem tecnologias no âm b it o da gestã o de i nf o rm aç ão q ue faz em o trata mento e a o rgani z aç ão de todos esses dados. São ferramentas de organização de informação (acesso e partilha), mas que também exercem influência na área mais qualitativa da educação, como averiguaremos p ost e rio r mente. Por meio da adoção e da utilização de tecnologias digitais, portanto, as estruturas escolares têm ao seu d ispor um mais fácil e ráp i d o ac e s s o à documentação e à informação, prevendo com isso uma melhoria tanto da administração quanto da gestão pedagógica dos pedagogos. Com o auxílio de alguns exemplos, veremos a seguir que o recurso à rede de intranet e internet assume-se como um instrumento valioso de troca de informações e de construção dos espaços escolares, constituindo-se

em ferramenta de caráter interdisciplinar que proporciona uma nova abordagem e organização do trabalho do pedagogo.

2. O USO COLABORATIVO DAS TIC NA G E S TÃ O PEDAGÓGICA 2.1 . FORMAÇÃO E ENSINO COM T E C N O L O G I A S D I G I TA I S : O PEDAGOGO 2.0 A g e s tão pe d a g ó g i c a d o s p e d a g o g o s tem assumido um papel de crescente relevo, sendo considerada uma das bases para que a mudança dos sistemas educativos e das organizações escolares se torne melhor e mais eficaz. Com a relevância d as TI C e m d i v e r s a s á r e a s , e m q u e a e s c o l a não é e x c e ç ã o , i m p o r t a s a b e r especificamente a partir daqui quais são as melhores ferramentas tecnológicas na área da gestão pedagógica praticada pelos p e d ag o gos .

Frente a esse interesse, os programas de informatização da escola pública proposta pelas secretarias de educação do Brasil não têm dado o devido respaldo, dirigindo ações somente em âmbito docente e discente². A exemplo dessa tendência, em 2007, o Governo Federal cria o ProInfo (Programa Nacional de T e c n o l o g i a E d u c a c i o n a l ) e m pa rceria com as secretarias estaduais e municipais de educação, que teve como proposta introduzir as TIC no c o n t e x t o d a s s a l a s d e a u l a de escola pública. Desde então foram construídos laboratórios de informática na maioria das escolas de todos os Estados brasileiros, com o i n t u i t o d e f o r m a r c i d a d ã o s crít icos e incluídos digitalmente no mundo. E m c o n t r a p a r t i d a , a t é 2010 , “ a pena s 2% dos profissionais que atuavam como coordenadores pedagógicos p a s s a r a m p o r f o r m a ç õ e s s o bre o uso das Novas Tecnologias” (Szabo, 2013, p. 3). Diante dessa falha técnica na

² Exemplos dessa distanciação tecnológica na parte gestora também ocorre em outros países, como em Portugal, onde “os diretores escolares, por exemplo, até apresentam um grau de proficiência e um índice de utilização das TD favoráveis, nas várias dimensões da sua atividade profissional. Contudo, a utilização de formas de comunicação com recurso às novas tecnologias, como forma privilegiada de contacto entre os vários agentes educativos (pais, professores, alunos e órgão de gestão), apresenta um score médio relativamente reduzido e que, consequentemente, se entende por favorável estimular” (Piedade e Pedro, 2014, p. 125). ³ Ver http://portal.mec.gov.br/proinfo/proinfo para mais informações. 4 Apesar de, nas tecnologias existentes, haver certa ênfase na gestão administrativa em detrimento da gestão pedagógica, sendo aquela mais permeável ao predomínio da lógica centralista, veremos que o SIG também permite uma maior capacidade de estruturação do campo da ação do pedagogo.

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Por meio das TIC , os coordenadores e superviso re s p o d e m utilizar f e r r a m e n t a s e s p e c í f icas para suas funções , como as plataformas de gestão de alunos, de atividades, de faltas, e de avaliações . Assim, com relatórios e dados de análise computadoriz a d o s , o g e s to r p e dagógico pode participar efetivamente na produtividade dos professores e estudantes , verificando o cumprimento de prazos e de metas, e se há algum funcionário sobrecarregado.

trazem novos desafios para todo o contexto escolar e em particular para as atividades desenvolvidas pelos pedagogos, proporcionando um conjunto de possibilidades organizativas e orientacionais que ainda não foram exploradas de modo significativo. Essa iniciativa visa, sobretudo, provocar novas pesquisas relativas à formação de professores e à elaboração do planejamento p e d ag ó gic o d e m o d o a r e v e r o p a p e l do pe dag o g o c o m a c l a r a c o ns c i ê n c i a de valorizar esse profissional da educação e sua atuação num ambiente escolar renovado e promissor.

formação dos pedagogos e que se reflete na formação dos docentes, seria de suma importância rever os processos formativos desenvolvidos nas licenciaturas e na área da pedagogia, de modo a considerar a informatização do ensino o caminho m ais efetiv o pa ra r o m p e r p arad i g m as e criar novas oportunidades de aprendizagem, uma vez que a tecnologia está cada vez mais presente e m n o s s o c o t i d i a n o .

Atualmente são diversas as plataformas de gestão que podem f ac i l i tar e p o t e n c i a l i za r a e l a b o r a ç ã o das práticas gerenciais e pedagógicas da escola, possibilitando um arquivamento e um processamento de dados mais eficiente, bem como um planejamento de ensino mais interativo e construtivo. A informatização da gestão pedagógica em específico permite que um coordenador pedagógico, por exemplo, maneje de forma rápida, organizada e produtiva os importantes relatórios que possibilitam aos pedagogos um conhecimento da o rgani z aç ã o e d o n í v e l d e q u a l i d a d e d o s re s ul t a d o s e s c o l a r e s , a o m e s m o te m p o e m q u e f u n c i o n a c o m o p o n t o de partida para a reflexão e a discussão da educação no seio da c o m uni d a d e e s c o l a r , t e n d o e m v i s t a à promoção do desenvolvimento da ap re nd i z a g e m .

Logo, os profissionais da educação d e ve m r ev er e lev ar o s p ro g ram as d e formação continuada a sério, de modo a se familiarizar gradativamente às ferramentas tecnológicas das diferentes áreas, bem como aos domínios diversos da gestão p e d agó gica. A pa rtir d e s s a p e rc e p ç ão identifica-se a necessidade de mudanças na forma de manuseamento e no foco da inserção da tecnologia no setor público da educação. Além disso, percebe-se a demanda por ferramentas digitais que permitam e não limitem o aperfeiço amento do s p ro c e s s o s d e en sin o o ferecido à p o p ul aç ão .

P o r m e i o d a s T IC , o s c o o r d e n a d o r e s e supervisores podem utilizar ferramentas específicas para suas funções, como as plataformas de gestão de alunos, de atividades, de faltas, e de avaliações. Assim, com relatórios e dados de análise computadorizados, o gestor pedagógico pode participar efetivamente na produtividade dos professores e estudantes, verificando o cumprimento de prazos e de metas, e se há algum funcionário sobrecarregado. Com um rápido relatório em mãos, o coordenador pedagógico pode estabelecer

As tecnologias digitais, ademais,

estratégias mais imediatas e as s e rti va s , d e a c o r d o c o m o s p e r f i s e

as habilidades de cada profissional d a e s c o l a , d i r e c i o n a n d o a s t a ref a s e definindo prioridades de acordo com os dados fornecidos por um bom sistema de gerenciamento. P o r t a n t o , o u s o d a t e c n o l ogia digit a l mais apropriada não é só para melhorar a produtividade educacional, aumentando a aprendizagem e a motivação dos alunos, mas também se reflete na satisfação e na formação d o s p r o f e s s o r e s . E x i s t e , n o ent a nt o, p o u c o i n v e s t i m e n t o e m i n vest iga çã o na área dos líderes tecnológicos, que através dos seus órgãos de gestão, podem reforçar o processo de aprendizagem por meio de uma utilização mais qualitativa das TIC em suas tarefas. O trabalho pedagógico informatizado designa toda forma de organização com intenção educativa que utiliza dispositivos tecnológicos seja ele pertencente aos recursos tradicionais como a televisão e o vídeo ou inovador c o m o a r e d e d e i n t e r n e t e a pa relhos móveis. Com o advento do uso desses dispositivos pela sociedade, é preciso que grande parte dos profissionais da educação (diretores, pedagogos e professores) ultrapasse as dificuldades em explorar pedagogicamente as TIC. Tal ruptura pode fazer da escola do início do século XXI um modelo de gestão com caráter democrático e participativo, no qual o assessoramento pedagógico com tecnologias passa a ser um compromisso a ser assumido por todos os agentes que integram o processo de aprendizagem. Em outras palavras, as TIC podem promover a liderança e o compartilhamento de ideias e de instrumentos que, “sendo utilizados no âmbito de uma visão estratégica, podem implicar ainda u m a m u d a n ç a d o p a r a d i g ma , ou pelo m e n o s d o d i s c u r s o . P o d e m , t a mbém, instituir uma escola [...] que se a p r o x i m a d o m u n d o , [ . . . ] p orque t em i n c o r p o r a d o o g e n e i n f o r má t ico que marca o código genético do nosso t e m p o ” ( S a n t o s , 2018, p . 67 ). 2. 2. O T R A B A LHO P EDAG ÓGICO V IA S I S T E M A I N T E G R A D O D E G E S TÃ O


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( SI G) A gestão pedagógica procede de diversas maneiras conforme a concepção que se tem dela e os objetivos que se acredita ter a ed uc a ção par a a so ci e d ad e . Um a d as concepções do trabalho do pedagogo, como explicitado por Rangel (2007), é a gestão participativa ou colaborativa organizada nas três habilitações essenciais do pedagogo: a coordenação, a supervisão e a orien ta ção pedagó gic as . Es s e ti p o d e gestão busca objetivos em comum entre a direção e toda a equipe de profissionais de uma escola. As d e c isõ es sã o to madas c o l e ti vam e nte e cada membr o da equi p e , ap e s ar d e visar um pr o jeto pedag ó gi c o c o m um , deve se responsabilizar com diferentes competências diante das d e c isõ es to madas. Embora haja gestão pedagógica p art ic ipativa em mui to s c as o s , ai nd a assim é necessária a diferenciação de competências e a presença de uma c oordena ção , uma sup e rvi s ão e um a orientação pedagógicas eficientes. Para tanto, tecnologias podem ser implementadas para atingir tais propósitos que, comumente, são colocados em oposição: a especialização e o trabalho c olab orativo . E is o d e s af i o d e p e ns ar o trabalho do pedagogo de modo atento e equilibrado, desenvolvido adequadamente com ferramentas in ovado ras.

usem o mesmo ambiente virtual para agirem colaborativa e simultaneamente, ou em momentos diferentes, utilizando as mesmas i nf o rm aç õ e s p a r a e l a b o r a r p l a n o s d e aç ão e p ro j e t o s e d u c a c i o n a i s .

de gestão empresarial adaptado para o ambiente escolar. Nossa atenção recai sobre o SIG pelo fato de que essa ferramenta tem sido mais utilizada nas escolas brasileiras por diretores, pedagogos e professores.

A contemporaneidade digital exige cada vez mais comunicação em tempo real e com uma reação instantânea, por isso o aprimoramento nos últimos anos do Sistema Integrado de Gestão Escolar (SIG), que abrange funcionalidades tanto administrativas (como enturmação, controle de faltas e d i ári o e s c o l a r ) q u a n t o p e d a g ó g i c a s (como mapa de desempenho docente e discente, cadastro de projetos, aulas de reforço etc). Trata-se, sobretudo, da oportunidade de obter, via TIC, um olhar mais minucioso sobre o contexto escolar e, consequentemente, para a implementação de um trabalho pedagógico que atenda as necessidades e defasagens das i ns ti tui ç õ e s :

No geral, tal sistema integrado de gestão possui a potencialidade de melhorar a percepção dos gestores, pois serve de instrumento que auxilia na organização das instituições, proporcionando um movimento de reorganização das normas e das regras advindas das secretarias de educação, visto que o sistema evidencia problemas internos e não somente as metas administrativas e avaliativas estipuladas pelas secretarias. O efeito desse sistema de rede para a gestão escolar e pedagógica é a realização de uma gestão local e compartilhada, que instaura uma nova perspectiva no sistema de ensino.

O Sistema Integrado de Gestão ( Ente rp ri s e R e s o u r c e P l a n n i n g - E RP ) tornou-se uma ferramenta comum no meio escolar privado e que tem trazido resultados significativos às organizações escolares, possibilitando a integração das informações numa b as e úni c a d e d a d o s e a g e r a ç ã o d e relatórios em todos os níveis profissionais e escolares da organização, utilizando o cruzamento digital de dados (Cavalcante et al., 2016, p. 2).

Apesar desse sistema virtual de gestão abranger ações tanto voltadas para a gestão escolar (administrativa) q u a n t o p a r a a g e s t ã o p e d a g ógica (de ensino), a parte pedagógica do s i s t e m a g e r a l m e n t e a i n d a n ã o é bem desenvolvida ou mesmo muito utilizada, mas já abre um leque de possibilidades para analisar mais aprofundadamente os dados de desempenho e rendimento dos estudantes, entre outros aspectos voltados para o processo de a p r e n d i za g e m ( L i m a , 2017) .

Quanto à adequação tecnológica para o cumprimento desse desafio que, na maioria das vezes é responsabilizado a um único profissional, não temos d úvida s em a fir ma r q ue o s trab al ho s colaborativos desenvolvidos em rede (intranet ou internet) incluem mecanismos de comunicação que permitem às pessoas ver, ouvir e en viar ar quiv o s, víde o s e m e ns ag e ns com mais rapidez. Como observado em tópico anterior, é por meio da informatização da comunicação escolar que os trabalhos pedagógicos mais complexos e colaborativos podem começar a ser realizados, visto que o compartilhamento da mesma

C o m b as e n e s s e c o n t e x t o t é c n i c o d o trabalho escolar, apresentamos algumas dessas ferramentas de Open S o ur c e ( c om o o S c h o o l t o o l , S i s L AM E e S I GA - EPC T ) v o l t a d a s t a n t o à g e s t ã o e s c o l ar q u a n t o à g e s t ã o p e d a g ó g i c a , tendo o objetivo de identificar as características mais adequadas dessa ferramenta para estruturar o trabalho do pedagogo de forma simultaneamente especializada e colaborativa. Cabe ressaltar que o SIG não é um sistema de gestão de aprendizagem, ou seja, não é um L e arni ng M a n a g e m e n t S y s t e m ( L M S ) , como o Moodle, embora compartilhem

A partir dos problemas diagnosticados pelos próprios órgãos reguladores de ensino, perceberemos que os gestores s e a p r o v e i t a m d o r e c e n t e s i st ema de forma não qualitativa e não colaborativa, usando-o apenas para obter um diagnóstico quantitativo da escola, deixando de lado as microt r a n s f o r m a ç õ e s , o u s e j a , a ba ndona a chance de propor ações específicas e estratégias pedagógicas que visam assegurar a qualidade e a equidade do sistema integrado de gestão pedagógica. Essa forma superficial de utilização do SIG, que foca nos aspectos administrativos em detrimento do pedagógico, evidencia

p lat afo rma o u do me s m o s i s te m a d e trabalho garante que os profissionais

alguns conjuntos de recursos, como o l i vro d e n o t a s , m a s s i m u m s i s t e m a

a hipótese de que o pedagogo se p r e o c u p a m a i s c o m a o r g a n iza çã o da

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escola, deixando à deriva os docentes e se u s pr o cesso s de e ns i no . Soma-se a isso o fato de muitas metas e objetivos educacionais serem insistentemente impostos pelas secretarias de educação, eliminando a poss ibilidade de um us o autô no m o dessa ferramenta. Talvez por isso, até h oje , não se tenha um us o e f e ti vo d o SIG pela gestão pedagógica das instituições educacionais, já que, “por m ais que a esco la sai b a q uai s s ão as dificuldades de aprendizagem dos discentes e as necessidades de m e lh o r ia s na a uto no m i a d a g e s tão d a própria escola, seu foco principal é m an t er o s r esultado s ” ( L i m a, 2 0 1 7 , p . 3). Por outro lado, o SIG é um instrumento d ivers ificado , que inc o rp o ra tanto as normas e as regras educacionais vigentes quanto serve de apoio qualitativo ao trabalho pedagógico, p art ic ular mente pa ra a e f e ti vaç ão d e um processo educacional que vise elevar a aprendizagem dos estudantes. N e sse caso , o pró pr i o us o d o S I G te m sid o repensa do a pa rti r d a e s traté gi a de recentralização das decisões e ações pedagógicas locais em detrimento do monitoramento do rendimento do corpo discente (Lima 2017). Em o utr as pa l avras , p ara um a reutilização qualitativa do SIG é preciso deslocar o foco do rendimento escolar dos estudantes e recentralizar seu interesse na construção colaborativa dos espaços e das competências educativas, para que, por consequência, o foco recaia na q ualidade de ensino . Tomando conhecimento das tendências e das necessidades de uso do SIG na gestão pedagógica praticada pelos pedagogos, veremos, a partir d aq ui, qual é a ver sã o d e s s e s i s te m a mais adequada para o cumprimento efetivo das tarefas do gestor pedagógico. A demarcação dessa adequação requer certo cuidado, visto que a escolha de um sistema ruim,

com poucas operações, pode fazer com que o uso do sistema caia em desuso nas instituições. Dentre as versões do SIG, selecionamos algumas daquelas que possuem potenciais para o desenvolvimento das tarefas de todas as habilitações do pedagogo. O SisLAME, por exemplo, criado em 2004 pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), é um sistema estruturado em rede com dados e elementos sobre aspectos d e te rm i n a d o s d o p r o c e s s o e d u c a t i v o e da gestão escolar. A criação desse sistema se deu a partir, principalmente, da proposta de c o e xi s tê n c i a d e f u n c i o n a l i d a d e s q u e atendem igualmente as dimensões pedagógicas e administrativas das e s c o l as . Segundo o portal virtual desse s i s te m a d a U F JF , o S i s L AM E t e m p o r objetivo facilitar a participação do gestor em todas as atividades relacionadas à organização escolar, permitindo o desenvolvimento de tarefas que vão do cadastramento ao acompanhamento pedagógico do trabalho docente. O Portal ainda permite o gerenciamento de todas as informações lançadas no sistema, fazendo seus utilizadores interagirem de maneira compartilhada e mais p ró xi m a c o m o s d a d o s e d u c a c i o n a i s da escola. É claro que as funcionalidades ainda são poucas frente à diversidade dos LMS e frente aos problemas pedagógicos enfrentados no cotidiano escolar, m e s m o as s i m t a l f e r r a m e n t a j á p o d e ser considerada um instrumento de apoio ao trabalho dos profissionais d a e d uc aç ã o , p o i s p e r m i t e a o m e n o s o p e d ag o g o t o m a r d e c i s õ e s p o r m e i o das informações extraídas da base unificada da rede, o que lhe possibilita definir políticas e estratégias específicas de ação, principalmente em relação às defasagens dos estudantes e à educação especial, e emitir relatórios que dão suporte a d i ve rs as a ç õ e s p e d a g ó g i c a s .

5 Acessar https://portalsislame.caedufjf.net/portalsislame/portal.jsf para mais informações. 6 Para acessar informações sobre essa empresa acesse o endereço http://www.schooltool.com/about-us/our-team. 7 Acessar interface em https://sigaedu.ifba.edu.br:8181/sigaept-edu-web-v1/pages/inicio.jsf.

Com esse e outros exemplos tecnológicos percebemos o quanto o uso de um sistema de gestão escolar pode ser inovador para a organização e o desenvolvimento do trabalho pedagógico das instituições de ensino, tendo em vista uma maior agilidade e par ticipação nas ati v i d a d e s a serem promovidas. O sistema Schooltool, por sua vez, criado ainda na segunda metade da década de 1990 pela Mindex Technologies de Nova Iorque, permite acesso virtual às funcionalidades programadas. Além das funcionalidades quantitativas, há inúmeras ferramentas qualitativas como o sistema de intervenção que possui como colaboradores os pais, os alunos e os professores, permitindo a criação colaborativa de metas educacionais para os estudantes. Dentre outras funções diferenciadas, o sis tem a a inda per m ite gerencia r os contatos entre diretores, pedagogos, p r o f e s s o r e s , a l u n o s e f a m i lia res. Já o SIGA-EPCT (Sistema Integrado de Gestão Acadêmica da Educação P r o f i s s i o n a l C i e n t í f i c a e T e cnológica ) c o r r e s p o n d e a u m s i s t e m a cria do em 2010 pelo Ministérios da Educação do Brasil, cujo principal foco está em atender as necessidades gerenciais d o s In s t i t u t o s F e d e r a i s d e E duca çã o, sendo para isso inteiramente desenvolvido em rede: Trata-se de um sistema de código aberto e colaborativo, onde as


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Instituições Federais de todo o Brasil contribuem com o mesmo, além de receber apoio do Ministério da Educação do Brasil (MEC), através da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (SETEC). O SIGA-EPCT foi desenvolvido para atender todo o processo de gestão escolar de uma instituição federal de ensino. Neste caso o projeto foi dividido em dois s i st em as: o SIGA- E DU re sp o n sáv e l p e la aut oma tizaç ão de todas as ativ id ad e s de cunho pedagógico e o SIGA-ADM que atua nos procedimentos administrativos das instituições (Cavalcante et al., 2016, p. 160). Quanto às funcionalidades oferecidas, é importante ressaltar o fato de o SIGA-EPCT ser dividido em dois outros subsistemas que visa atender as atividades administrativas e pedagógicas das instituições escolares cadastradas. Quanto ao SIGAEDU, trata-se de um sistema que conta com interfaces em que são especificados a estrutura organizacional e os ambientes de aprendizagem de uma instituição. Há, por exemplo, módulos voltados exclusivamente aos procedimentos pedagógicos que envolvem a construção do período letivo, a realização da matrícula, dos registros acadêmicos e dos registros de diários de classe. Nesses módulos, o sistema permite reelaborar detalhadamente os períodos letivos, as grades horárias, as propostas curriculares, as propostas avaliativas, entre outros re c u rs o s. Dentre várias opções, destacamos a operação de “Manutenção de matrizes curriculares”, em que se propõe manter “informações a respeito de elem e nto s curricula re s d e um c urs o , gerenciando pré-requisitos e co-requisitos para cada eixo da matriz d e u m curso ” ( SIGA-E PC T, 2 0 1 0 , p . 4 ) . Tendo acesso a essas e outras informações do sistema, todos os integrantes da equipe escolar poderão melhor se inteirar e colaborar na construção das práticas p e d agó gico - administ rati vas .

pode ser inovador para a organização e o desenvolvimento do trabalho pedagógico das instituições de ensino, tendo em vista uma maior agilidade e participação nas atividades a serem promovidas. Portanto, esta investigação conclui que o contínuo aprimoramento do sistema de gestão escolar (SIG), desde que siga avançando no aprimoramento das operações pedagógicas, é uma ferramenta que pode ser aproveitada p ara ate n d e r p a r t e d a s e x p e c t a t i v a s e d as ne c e s s i d a d e s t e c n o l ó g i c a s d o s p e d ag o gos . Não podemos abandonar a possibilidade de tratamento dos dados proporcionados por tais sistemas, que possibilita ao utilizador múltiplas perspectivas de análise e de elaboração de relatórios para os diferentes setores ou funções pedagógicas. Em relação ao uso do SIG na atuação do coordenador pedagógico, por exemplo, destaca-se de imediato a evolução tecnológica na ati vi d a d e d e c o n t r o l e d o s d i á r i o s e ntre g ue s p e l o s p r o f e s s o r e s : “ N e s t e c as o anal i s a v a -s e a n o t a d o a l u n o d e acordo com o diário do professor para depois incluir a nota de cada disciplina, aluno por aluno. Tal processo era realizado todo bimestre, sendo impresso e entregue aos responsáveis pelos alunos” (Cavalcante et al., 2016, p. 162). O extenso material, anteriormente produzido e revisto manualmente, era um processo lento que demandava muito tempo da coordenação, mas atualmente essa tarefa é facilitada com os procedimentos digitais de acesso e controle dos dados.

exemplos

Além disso, no que tange às práticas colaborativas de acompanhamento da supervisão pedagógica, há operações digitais que podem agilizar a discussão sobre o desempenho de professores e estudantes em reuniões pedagógicas, de modo a propor estratégias para melhorar o processo de aprendizagem. Tais oportunidades d e l e i tura e a n á l i s e p o d e m f a v o r e c e r os agentes pedagógicos na realização de um planejamento de iniciativas mais assertivas e fundamentadas, que

t e c n ol ó gico s per cebe m o s o q uanto o u so d e um sistema de g e s tão e s c o l ar

re al m e nte a j a m c o m b a s e n a s c a u s a s d o b ai xo d e s e m p e n h o e s c o l a r .

Com

esse

e

outros

Tais possibilidades de análise qualitativa de dados evidenciam que, embora o SIG apresente uma estrutura básica que possa auxiliar a compreender o planejamento, as m e t a s e o d e s e m p e n h o d o s docent es e dos discentes, os pedagogos parecem ainda não reconhecer essa tecnologia como fonte de informação e ferramenta de análise do desempenho pedagógico. As tecnologias ainda permanecem distantes do contexto educacional brasileiro, sendo subutilizada em relação às necessidades dos pedagogos e, consequentemente, em relação à qualidade do trabalho d e s e n v o l v i d o p e l o s d o c e n t es. 2 . 3 . O O R I E N TA D O R P E D A G Ó G I C O COMO MEDIADOR DE NOVAS T ECNO LO G I A S É mais do que evidente que em muitos países o professor não é dotado de preparo suficiente para um bom manuseio do aparato tecnológico. Apesar da vulgaridade com que se exalta a utilização das novas tecnologias em sala de aula, a realidade demonstra a clara i n e x p r e s s i v i d a d e q u e e s s a exa lt a çã o tem nas práticas educativas das escolas. Isso só significa que a modernidade tecnológica por si só ainda não garantiu nada: Na França, durante os anos oitenta, q u a n t i a s c o n s i d e r á v e i s f o r am ga st a s p a r a e q u i p a r a s e s c o l a s e f orma r os professores. Apesar de diversas experiências positivas sustentadas pelo entusiasmo de alguns professores, o resultado global é deveras decepcionante. [...]. O governo escolheu material da pior qualidade, perpetuamente defeituoso, fracamente interativo, pouco adequado aos usos pedagógicos ( L é v y , 2004, p . 5) . A pressão social levou muitas escolas públicas, como na França, a inserir u m l a b o r a t ó r i o d e i n f o r m á t ica como um apêndice de sua estrutura, um diferencial a mais para atrair novos e c o n v e n c e r v e l h o s a l u n o s . A propost a curricular das escolas, no entanto, não se beneficiava dessa inserção:

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“Mesmo nas escolas pedagogicamente mais avançadas, raras são as tentativas de interação e de realização de propostas interdisciplinares que envolvessem eficazmente as atividades d e in fo rmá tica rea li z ad as no c o l é gi o ” (Ken ski, 2 0 0 5 , p. 7 4 ) . Só a par tir de um trab al ho p l ane j ad o , organizado e mediado colaborativamente pelo orientador pedagógico, visando o auxílio dos demais gestores e por meio da form açã o co ntinua d a d o s d o c e nte s , é que as TIC serão efetivamente incorporadas no projeto político pedagógico das escolas. As atividades promovidas isoladamente “mostram q ue a esco la não tem i nc o rp o rad o no seu cotidiano as mídias como maneira de fomentar a educação ou como est ratégia par a fav o re c e r, e nri q ue c e r e t orna r o pr o cesso d e ap re nd i z age m significativo” (Gomes, 2017, p. 155). Portanto, o significado do trabalho da orientaçã o pedagó g i c a f ac e às no vas tecnologias é de suma importância, visto que “deve apresentar o seu conhecimento mediante ao uso tecnológico, propiciando assim, conjuntamente com os educadores, estratégias de ensino e aprendizagem mais eficazes por meio das mídias” (O liveir a, 2016, p. 24 ) . Parti nd o d e s s a constatação, a direção e a coordenação da escola devem oferecer a infraestrutura, enquanto a orientação p e d agó gica dev e garanti r a f o rm aç ão p e rmanente e o est í m ul o p ara q ue o p rofesso r utilize co l ab o rati vam e nte a internet em sua prática, pois “essas ferra menta s amplia m , ante s d e tud o , a oportunidade de conhecer o trabalho do outro e aprimorar o próprio t rabalho ” ( D e To ni, 2 0 1 3 , p . 6 0 ) .

proposta de aprendizagem com tecnologias ao desenvolvimento profissional dos seus professores. As ferramentas tecnológicas que os orientadores podem utilizar são as re d e s , os s i s t e m a s d e g e s t ã o e s c o l a r como o SIG, os sistemas de gestão de aprendizagem como o LMS, ou os s o f tw are s d e p r o d u t i v i d a d e c o m o o s processadores de texto, programas curriculares virtuais, entre outros. I nd e p e nd e n t e d o t i p o d e t e c n o l o g i a , o importante é que as ferramentas sejam exploradas como apoio didático-pedagógico à prática de ensino dos professores. Por isso, o desafio máximo dos orientadores pedagógicos está em auxiliar os p ro f e s s o r e s , m e d i a n t e u m e s p a ç o d e formação, na utilização de ferramentas curriculares próprias de cada disciplina, melhorando, assim, o aprendizado dos cursos oferecidos ao s e s tu d a n t e s . Considerando que vivemos numa é p o c a ma r c a d a p e l o i m e d i a t i s m o d o online, o orientador pedagógico deve e s ti m ul a r m a i s o u s o d e f e r r a m e n t a s síncronas de comunicação como chats e redes, de modo a estimular mais as atividades colaborativas entre profissionais da educação e estudantes. Cabe assinalar ainda que espaços virtuais assíncronos, como o e-mail, também podem ser utilizados para requerer respostas mais elaboradas e menos espontâneas sobre determinados assuntos que e xi ge m u m o l h a r a p r o f u n d a d o .

Se bem utilizada, “a s TI C p o s s i b i l i tam uma diversificação de atividades propostas, possibilitando mudanças metodológicas ao criar novos cenários que facilitam a aprendizagem [...]” (Santos, 2018, p. 68). Desse modo, c om as tecno lo gias d e ap re nd i z age m ,

Sendo assim, a criação de espaços de i nte raç ã o a s s í n c r o n o s ( c o m o f ó r u n s , wikis e blogs) favorece a discussão ap ro f und a d a d e t e m a s e a p r o d u ç ã o coletiva de conhecimento, não deixando de suscitar um ensino baseado em trocas de informação, com seus desafios críticos e reflexivos. Há também, nesse tipo de ferramenta pedagógica, a possibilidade de utilização de outros instrumentos que

temos a possibilidade de deixarmos de ser meros consumidores de informações e conteúdos para ocupar o patamar de produtores e distribuidores. Eis o que os orientadores pedagógicos devem perceber, agregando e motivando essa

favorecem mais a comunicação ap ro f und a d a e a p a r t i l h a s i s t e m á t i c a de conteúdos, como fóruns de discussão e plataformas de gestão de conteúdos LMS, a exemplo do Moodle (Modular Object-Oriented Dynamic Learning Environment), as quais

poderão ter impacto na diferenciação de métodos de ensino através da planificação e do desenvolvimento de aulas em formatos digitais. Na verdade, o uso da plataforma Moodle, muito difundido no meio e s c o l a r i n t e r n a c i o n a l , é a inda pouco explorado pelas instituições escolares b r a s i l e i r a s . D e s e n v o l v i d a por Ma rt in Dougiamas em 2002, na Austrália, essa ferramenta visa a oferta de cursos não presenciais auxiliados p e l a r e d e m u n d i a l d e c o mput a dores. Em função do fácil manuseio e controle das ações desenvolvidas pelos utilizadores, tal sistema vem sendo explorado pelas escolas de vários países. Esse fato ganha mais importância em função de ser um ambiente gratuito e disponível na w e b . O M o o d l e f o i d e s e n v olvido com base em princípios pedagógicos, p o s s i b i l i t a n d o a p a r t i c i p a çã o de uma grande comunidade de utilizadores que contribui para a melhoria do ambiente com a exposição de notas explicativas, abertura de debates e t r o c a d e t e x t o s , p o r e x e m plo. O Moodle é reconhecido como uma ferramenta para produzir cursos e páginas pedagogicamente mais complexas por meio da web 2.0, facilitando a comunicação (síncrona ou assíncrona) e permitindo a gerência, a organização e a partilha dos conteúdos e dos materiais de a p o i o à s a u l a s p o r p a r t e de t odos os utilizadores. Nesse sentido, podemos afirmar que esse sistema marca efetivamente a aplicação de um novo paradigma de ensino e aprendizagem por meio das TIC, fundamentado numa filosofia pedagógica construtivista segundo a qual o conhecimento é construído colaborativamente. Para Alves e Brito (1998, p. 39), essas s ã o a s v a n t a g e n s d o M o o dle, pois se utilizado adequadamente para o ensino, proporcionam “o aumento da motivação dos alunos; maior facilidade na produção e distribuição d e c o n t e ú d o s ; p a r t i l h a d e cont eúdos entre instituições; gestão total do ambiente virtual de aprendizagem; r e a l i za ç ã o d e a v a l i a ç õ e s de a lunos; e suporte tecnológico para a


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TABELA 1 – AS FERRAMENTAS TECNOLÓGICAS DOS PEDAGOGOS T IC / Ha b ilit a ç ã o

Co o rd en a d o r P ed a g ó g i co

S upe r vi s o r P e da g ó g i co

S c ho o l to o l

Schooltool

Si stem a s d e Ge st ão

SisLAME

S i s L AM E

E s co la r (SI G)

S I GA - EP C T

S IG A-E P C T

S ED

SED

Si stem a s d e Ge st ão d e Apr end iza ge m (L MS )

-

O r i e n t a do r P e da g óg ic o

-

Moodle

Moodle

Chamilo

Chamilo

TelEduc

TelEduc

eLML

eLML

Am a d e u s

Am a d e u s

- Softwares executores de

- Softwares de transcrição

reunião (Google Reunião, Zoom)

automática (Google Speech

- Softwares de análise de dados

Transcription)

Bl o g s

e estatísticas (Knime, Open

- Softwares capturadores de

Wikis

So ftwa re s e We b

Refine)

imagens de operações com-

Chats

s o f twa re s

- Softwares produtores de lista

putacionais em EAD (Snagit)

Of f i c e

(Trello e Excel)

-Softwares de análise de dados

Google Doc

- Softwares de relatório (Canvas,

e estatísticas (Knime, Open

P r e zi

Dashgoo, Google Data Studio)

Refine)

- Softwares de comunicação

-Softwares de relatório (Canvas,

(Skype e Whatsapp)

Dashgoo, Google Data Studio)

8 Obter mais informações em: moodle.org 9 Sobre a ferramenta Google Docs acesse: google.com/docs

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disponibilização de conteúdos de acordo com o modelo pedagógico e design institucio nal; [...]”. Além de r edes e siste m as d e ge s tão , os orientadores pedagógicos ainda t êm a po ssibilidade d e m o ti var o us o de softwares de produtividade em geral, que é um tipo de tecnologia mais básico que pode proporcionar inúm er o s benefício s às atividade s de orie n ta ção e, co nseq ue nte m e nte , ao trabalho docente. Os programas prod uto r es de tex to , d e i m ag e ns , d e t rad uçõ es e de so m p o d e m s e rvi r e m várias situaçõ es de ens i no . O Go o gl e Docs, por exemplo, pode se tornar uma exímia ferramenta para o desenvolvimento da produção textual colaborativa nas aulas de redação, provocando uma aula de escrita mais e xperi menta l. Por outro lado, experiências mostram que atividades didáticas podem ser t ão m o nó to nas co m o u s e m us o d as novas tecnologias apresentadas na tabela acima. Nesse sentido, para um a bo a utiliza ção das TI C , é p re c i s o de uma orientação pedagógica que não apenas se dirija às mídias, mas que também seja capaz de encaminhar transformações na unidade escolar, modificando e inovando as ações e os espaços educativos. Desse modo, o

o ri e ntad o r p e d a g ó g i c o t e m o d e s a f i o de perceber as dimensões mais significativas da atuação e da f o rm aç ão d o s d o c e n t e s , t e n d o a s T IC como instrumentos usados em diferentes perspectivas para a construção de diversas técnicas de ap re nd i z a g e m . De qualquer forma, aprender por meio do auxílio das novas tecnologias significa proporcionar outra forma de ad q ui ri r i n f o r m a ç ã o , d e s e n c a d e a n d o uma nova organização do trabalho pedagógico. Assim, a relação pedagogo-professor-estudante pode ser profundamente alterada pelo uso das tecnologias, bem como a resolução de problemas, a realização de projetos, e a coleta e analise de dados sobre um determinado assunto. Dentre tantas opções, a tecnologia deve estar presente sempre de forma crítica na escola. Os recursos digitais devem ser aliados às práticas de ensino e aprendizagem, bem como ao projeto pedagógico da instituição e d uc ac i o n a l . C o n t u d o , u s a r o u n ã o a te c no l o g i a n a g e s t ã o d a e d u c a ç ã o j á não é mais tema de debate. A questão ago ra é s a b e r q u a l é a m e l h o r f o r m a de usufruir desses recursos para melhor gerenciar uma instituição escolar. Mas, para isso, todos

p r e c i s a m t e r p o s s i b i l i d a d e e vont a de d e a c e s s o à s T IC , o q u e n e m sempre c o n d i z c o m a r e a l i d a d e e s c ola r. Em síntese, o pedagogo precisa ter consciência de que a prática da gestão p e d a g ó g i c a n ã o s e r á s u b s t i t uída por tecnologias, ao contrário, as t e c n o l o g i a s e x i s t e m p a r a melhora r e ampliar o seu campo de atuação para além da prática tradicional de gerenciamento do ensino: “Não são as tecnologias que vão revolucionar o e n s i n o e , p o r e x t e n s ã o , a educa çã o c o m o u m t o d o . M a s a m a n eira como esta tecnologia é utilizada para a mediação entre [pedagogos,] p r o f e s s o r e s , a l u n o s e a i n f orma çã o” ( K e n s k i , 2008, p . 9) . C o m b a se nesse princípio, as tecnologias como instrumentos de informação e comunicação são elementos que p o d e m e d e v e m a u x i l i a r a dina miza r as ações educativas dos pedagogos, implicando em novas formas de comunicar e perceber o espaço escolar, orientando um trabalho pedagógico sempre em busca das estratégias de formação e de aprendizagem mais adequadas a cada contexto escolar.

Daniel Vecchio Alves Dr. Pedagogia - UNICAMP

Referências - ALMEIDA, M. E. B. de; RUBIM, L. O papel do gestor no processo de incorporação das TIC na escola. Em: Anais do XXIII Simpósio Brasileiro e V Congresso Luso-Brasileiro e I Colóquio Ibero-Americano de Política e Administração da Educação. Porto Alegre, 2007, pp. 1-16. - ALVES, L.; BRITO, M. Ambiente Moodle como apoio ao ensino presencial. Em: Actas do 12º Congresso Internacional da Associação Brasileira de Educação a Distância: Sociedade Tecnológica - de Prometeu a Fausto. Rio de Janeiro-RJ, 1998. - DE TONI, M. S. O papel do coordenador pedagógico e o uso das tecnologias no planejamento dos professores da REME. In: Diálogos Educacionais, Campo Grande, MS, 4 (2), 2013, pp. 50-69. - SIGA-EPCT. Processo de Implantação, Concepção, Diretrizes, Cronograma e Instrumento de Avaliação. Brasília: CONIF, Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica, 2010. - CAVALCANTE, K. de S.; OLIVEIRA, L. R. P. de, OLIVEIRA, I. S. M. de; SOUSA, M. S. de. Análise de Softwares de Gestão Escolar Open Source para uma Escola Privada do Ensino Básico. Nuevas Ideas en Informática Educativa, Santiago, v. 12, 2016, pp. 157-166. - FERREIRA, L. M. F. As tecnologias de informação e comunicação nos processos de trabalho da escola: gestão, estruturas intermédias e professores. Tese de Doutoramento em Ciências da Educação da Universidade Nova de Lisboa, 2017. - GOMES, M. A. V. Mediação do coordenador pedagógico na formação continuada: foco nas tecnologias de linguagens audiovisuais. Saberes Docentes em Ação, v. 3, n. 1, 2017, pp. 151-164. - LÉVY, P. As tecnologias da inteligência. Trad. Carlos Irineu da Costa. São Paulo: Editora 34, 2004. - Kenski, V. (2008). Novos processos de interação e comunicação no ensino mediadas pela tecnologia. Cadernos de pedagogia universitária, n. 7, pp. 7-22. - Kenski, V. (2005). Das salas de aula aos ambientes virtuais de aprendizagem. In: Relatório de Pesquisa. Anais do 12º Congresso ABED, Florianópolis, pp. 71-80 - LIMA, C. Uso das TDIC na gestão escolar: o caso do sistema SisLAME. Revista de Estudios e Investigación en Psicología y Educación, v. extra, n. 13, 2017, pp. 1-4. - MEIRA, M. do V. F. A Burocracia Electrónica: Um Estudo sobre as Plataformas Electrónicas na Administração Escolar. Tese de Doutoramento em Ciências da Educação Especialidade em Organização e Administração Escola do Instituto de Educação da Universidade do Minho, 2017. - MINTZBERG, H. Criando organizações eficazes: estruturas em cinco configurações. Trad. Cyro Bernardes. São Paulo: Atlas, 1995. - OLIVEIRA, R. G. O papel do coordenador pedagógico na mediação das novas tecnologias na prática pedagógica. Monografia do Programa de Pós Graduação em Coordenação Pedagógica da Universidade Federal do Maranhão. São Luís-MA, 2016. - PIEDADE, J. Os diretores escolares e a integração das tecnologias nas escolas: análise da proficiência, utilização das tecnologias e relação com as práticas dos professores. Tese de Doutoramento em Educação na especialidade de Tecnologias de Informação e Comunicação na Educação da Universidade de Lisboa, 2017. - PIEDADE, J.; PEDRO, N. Tecnologias digitais na gestão escolar: Práticas, proficiência e necessidades de formação dos diretores escolares em Portugal. Revista Portuguesa de Educação, v. 27, n. 2, 2014, pp. 109-133. - RANGEL, M. A supervisão educacional em perspectiva histórica: da função à profissão pela mediação da idéia. Em: Ferreira, N. S. C. (org.). Supervisão educacional para uma escola de qualidade: da formação à ação. 6ª ed. São Paulo: Cortez, 2007, pp. 69-96. - SANTOS, J. R. L. dos. As TIC na escola pública portuguesa e a sua relação com as lideranças. Doutoramento em Educação Especialidade de Liderança Educacional da Universidade Aberta de Lisboa, 2018. - SZABO, K. Atuação do coordenador pedagógico: formação de professores, narrativas digitais, tecnologia e currículo. In: Anais do XI Encontro entre Pesquisadores do PPG em Educação da PUCSP, 2013, pp. 1-11.


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EDUCAÇÃO DIGITAL , GOVERNOS ANALÓGICOS NOTAS SOBRE O PAPEL DO PROFESSOR NO PROCESSO DE UMA EDUCAÇÃO CADA VEZ MAIS DIGITAL

E

m n e n h um m o m e n to d e g r a n d e s t r a ns f o r m a çõ e s te cnológ ic as a e duc aç ão foi t ão a fe t ada como no século X X I. Desde a invenç ão da escr it a até o surgimento dos comput adores , a educ aç ão sempre foi v is t a co m o c a m p o i n d i s s o c i á v e l e a f e t a d a p e l a s n o v i d a d e s te cnológ ic as de c a da ép o c a . A s sim , à me dida que t ais mudanç as inf luenciam a c ul t ura , a v ida s o cial , a a t i v i dade econômic a e polític a, as escolas s ão solicit adas a repens ar suas concepções pedagógic as. Os professores, como aqueles que se encontram no c ampo nev rálgico do binômio aluno -s aber, s ão chama dos a re conduzir e rep ens ar suas prá t ic as e concei tos sobre o conhecimento, a aprendiz agem, a sociedade e a cultura. Na tent ati va de atender às exigências da forma ç ão e acompanhar às trans for mações de c ada contex to tecnológico, prof issionais da educação atravessam divers as dif iculdades , comprometendo, na maioria das vezes , diferentes dimensões de sua v ida e atuaç ão. O argumento aqui defendido de que as transformaç õ e s t e c n o l ó g i c a s p r o d u ze m a l t e r a ç õ e s n o s p r e s s u p o s to s e p is te m o l ó g i co s , s o c ia is , co g n i t i v o s , c ul t ur a is e

econômicos da educ aç ão, considera à docência como uma das áreas pr i v ilegiadas de análise sobre a prof undidade e ex tens ão da inf luência da técnic a na contemporaneidade. Par tindo de t ais considerações , o presente tex to apresent a algumas obser vações em torno da atual condição da docên cia frente às consequências relativas às mudanças tecnológic as em cur so. O c aráter breve dess a exposiç ão é result ado do seu modes to propósito – mas , não menos impor t ante: lançar alguns elementos para a ref lexão e debate sobre a relaç ão atual entre a docência e as trans for mações tecnológicas. O mesmo, vale dizer, constitui-se como fragmento d e u m a p e s q u is a m u i to m a is a m p l a , d e s e n v o l v i da a t ua l mente pelos seus respec ti vos autores. Os dados do es tudo abaixo realiz ado pela parcer ia CE T IC. br (Centro Regional de Es tudos para o Desenvol v imento da S o cie da de da Infor maç ão) , NI C .br (Núcle o de Infor maç ão e Co o r d e n a ç ã o d o Po n to B R ) e CG I . b r (Co m i t ê G e s to r da Internet do Brasil), di v ulgados em julho de 2019, mos tram o quanto o tema do uso e inserç ão das tecnologias na docên cia poderá nos ser v ir, inicialmente, como um ter mômetro desse impac to.

Fon t e: CGI.BR /N IC.BR , C en tr o R eg i o n a l d e E s tu d o s p a r a o D es en v o l v i m en to d a S o c i ed a d e d a I n f o r m a çã o (C e t i c. b r )

Realizado desde 2005, a amostra do estudo de 2018 entrevistou 11.142 alunos do 5º e 9º ano do Ensino Médio e 2º ano do Ensino Médio, mais 1.807 professores de Língua Portuguesa e Matemática, além de quase 2.500 Coordenadores pedagógicos, Diretores e/ou Responsáveis do escolas urbanas e rurais.

Analisando os dados acima, obser va-se que tanto às ins tituições públicas como às par ticulares se aproximam no percent ual quanto ao uso ou aces so indi v idual dos docentes aos recursos tecnológicos, sinalizando para um grande envolvimento dos prof issionais da educação com as tecnologias. A ex tens ão de suas jor nadas de trabalho

p ara além da e sp aço e s colar (a ‘ in di v idualiz aç ão ’ da pro f iss ão docente) , diferente de outras prof issões (coleti v iz a das) , cons tituem uma das razões da dedic aç ão e envol v im en to p e s s o al de s s e s prof is sionais na c ul t ura dig i t al p ara realiz aç ão de ati v idades di ver s as como pesquis a didátic a, planejamento de aulas, concepções de aprendizagem,

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20

Æscola Legal | Nº03 | Abr 2020 atualiz aç ão científ ic a, entre outros. Os dados do gráf ico, referente ao processo de ‘ indi v idual ização ’ do trabalho docente através do uso das Tecnologias da Infor maç ão e Comunic aç ão ( T ICs) , t al como denomina mos , t ambém mos tra que os prof issionais das ins tituições escolares públicas (92%) fazem uso ‘solit ário ’ das TICs , sem o auxí lio ou a presenç a dos demais prof issionais da ins ti tuiç ão que atuam. Ainda sobre os dados do gráf ico, obser va-se que 75% (média en t re e s cola públic a e pr i v a da) dos profe s s ore s u t iliz am “ v ídeos ou tutor iais online ” como plat afor mas e fontes de pesquis a e aprendizagem. Tal percentual indic a, segundo a hipótese defendida nesse tex to, que, c ada vez mais , a formação docente ou a atualização dos seus saberes se encon tram em progressi vo v ínculo. A o a f i r m a r- s e c o m o e l e m e n t o i n q u e s t i o n á v e l d a n o v a condiç ão do s aber docente, a cul t ura digi t al e as T IC s se inscrevem no elenco dos temas caros ao debate atual sobre

conhecimento e aprendiz agem que, inf luenciados pelas transformações tecnológicas, ressignif icam as atividades cogni t i vas e didát ic as des s a prof is s ão. Ou seja , o pro ce s s o de acomp anhar t udo que é pro duzido, e s cr i to e ge r a d o p e la re v o lu ç ã o e m c ur s o, p õ e e m um p a t a ma r mais ‘ tenso ’ o his tór ico e tradicional ato de ensinar. Não há mais a sens aç ão de seguranç a garantida do professor ser a pr incipal fonte do conhecimento. Is to é ótimo, e n t re t an to, c aus a ansie da de, que dian te de t al ‘c r is e ’, para os envol v idos no processo, é apenas uma das con sequências das trans for mações tecnológic as. Esse cenár io cogniti vo avoluma, c ada vez mais , os req u i s i t o s e a t r i b u t o s d a p r o f i s s ã o. O q u e a n t e s e r a u m c ampo concebido de um ponto de v is t a ‘es t ático ’ (ministrar aulas, preencher cadernetas, realizar avaliação etc.), hoje amplia o elenco das ati v idades que compõe o seu metiê. A ssim, a “ formaç ão continuada ” e a “c apacit aç ão ” se af irmam como verbetes recorrentes no dicionário pedagógico das sociedades tecnológic as , t al como pode ser v is to no gráf ico que segue:

a for maç ão docente. A começ ar pelo própr io conceito de

Fon t e: CGI.BR /N IC.BR , C en t ro R egion a l d e E s tu d o s p a r a o D es en v o l v i m en to d a S o c i ed a d e d a I n f o r m a ç ã o ( C eti c . b r ) , j u l h o d e 2019

Os dados acima mos tram que professores e professoras se equi valem na busca por formação através do uso de tecno logias. Há, entret anto, predominância nas faixas acima de 3 0 anos , com maior percentual nos que se encontram com 4 6 anos e mais , e signif ic ati vo dentre os prof issionais de ins tituições par ticulares. Diante des te result ado mos trado no es tudo, duas s ão as hipóteses aqui relacionadas: a pr i meira, refere -se ao fato de que, nas ins tituições públic as , os supor tes e a es trutura para o uso de tecnologias digit ais sempre foram secundar iz adas ou concebidas como ‘mero ’ ins tr umentos da ati v idade docente; a segunda, de c aráter pedagógico, es t á v inculada à ‘ indi v idualiz aç ão ’ e intensi f ic aç ão do trabalho dos prof issionais da educ aç ão dess as ins t i t uiçõ e s , ent reg ue s às suas própr ias condiçõ e s ( indi v iduais) de trabalho.

O gráf ico mos tra ainda que professores das ins tituições pr i vadas (26%) continuam inves tindo mais em for maç ão em TICs do que professores da rede pública (24%), no comparati vo com o ano anter ior. A lém do que já fora observado acima, possi velmente, t al fato deva -se ao enor me grau de competiti v idade nas escolas pr i vadas , diferente das públicas, com avaliações de alto desempenho, muitas vezes , com v is t as ao mar keting no ‘merc ado da educ a ção ’. Diante da desproporção entre as ins tituições públic as e par ticulares , c abe indagar : qual tem sido o papel dos governos mais recentemente? Uma breve verif icação nas ações dos gover nos Temer e Bolsonaro pode trazer uma luz para ref letir sobre t al ques t ão. Com a cr iaç ão das Diretr izes para uma Polític a Nacional d e I n o v a ç ã o e Te c n o l o g i a E d u c a c i o n a l ( 2 0 17-2 0 21) -


Æscola Legal | Nº03 | Abr 2020

ht tp: //w w w.consed.org.br/media/download/5adf 3c4 e10120.pdf ,

sequência de uma pesquisa mais ampla, mas é possível

no gover no Temer, é possí vel obser var uma v is ão mais

obser var que à medida que os anos avançam as concepções

ampliada sobre tecnologia no seu conteúdo, porém, bas-

retrocedem. O Programa em ques t ão ter mina por reduzir

tante relacionadas às atividades administrativas das

a relaç ão ent re te cnolog ias e e duc aç ão a uma concepç ão

ins tituições. A menç ão sobre a ‘cultura digit al ’ impr ime

unic amente ins tr ument al. Des te modo, e considerando as

a o d o c u m e n to u m a a t ua l i da d e d e co n ce p ç ã o s o b r e o

o b s e r v a çõ e s a n t e r i o r e s , n e g l i ge n c i a o a t u a l e s t á g i o t e c-

fenômeno tecnológico contemporâneo. Entretanto,

nológico, sua enor me relevância e inf luência educ acional

embora sinalize uma concepç ão ampliada do papel da

para além de sua dimens ão ins tr ument al. A inda que enfa -

te cnolog ia na prát ic a e duc at i va , t ais Dire t r ize s ( idem)

tize a impor t ância das tecnologias na ges t ão e, sobretudo,

avanç am, na teor ia e na prátic a, em favor da superaç ão

na docência , es vazia o signi f ic ado epis temológico, social,

sobre as dif iculdades e crises do trabalho docente diante

cogniti vo e pedagógico contido na atual relaç ão entre tec-

das e x igências p e dagóg ic as de cor rente s das t rans for-

nologia e educ aç ão.

mações ad v indas das tecnologias digit ais. Deixa, assim, uma enor me lacuna que, até o momento, não tem sido

Recentemente o Governo Federal lançou o Programa Ciência

preenchida pelo atual gover no.

na Escola (PCE ) com aç ão conjunt a de quatro Minis tér ios: C i ê n c i a , Te c n o l o g i a , I n o v a çõ e s e Co m u n i c a çõ e s ( M C T I C ) ,

Já o gover no Bolsonaro, através do Programa Educ aç ão

Ed u c a ç ã o ( M E C ) , Co n s e lh o Na c i o n a l d e D e s e n v o l v i m e n to

Conec tada (2017-2024), ao centralizar o foco na atividade

C i e n t í f i c o e Te c n o l ó g i c o ( C N P q ) e C o o r d e n a ç ã o d e

d o ce n te , a p re s e n t a co m o p r in c ip a l m e t a a a m p lia ç ã o

A per feiçoamento de Pessoal de Ní vel Superior (Capes), que

do acesso à inter net , t al como se encontra no tex to do

busc a aprimorar o ensino de ciências nas escolas de ensino

Programa: “A Educação Conec tada é o nome do Programa

básico. A pes ar das propos t as , de efeti vo não há qualquer

de Inovaç ão propos t a pelo Minis tér io da Educ aç ão para

mudança para os prof issionais da educação que, imersos na

ace lerar a incor p oraç ão de te cnolog ia e inov aç ão nas

cultura digit al, além da ausência de ações e de propos t as

escolas públicas brasileiras por meio de uma ofer t a bal -

condizentes ao conte x to cul tural, social e tecnológico em

anceada de conexão à internet , conteúdos educ acionais

que v i vem e trabalham, ainda têm que lidar com o acir ra -

digit ais e for maç ão de professores (MEC , 2018).”

mento da ‘cr iminaliz aç ão ’ de sua prof iss ão, dos cor tes sub sequentes e abusi vos dos recur sos para educação e do con -

Não c abe aqui (o espaço é cur to) uma análise aprof un -

sequente e progressivo desmonte do seu espaço de atuação:

d a d a d o r e f e r i d o P r o g r a m a , e e s p e r a m o s f a zê - l a n a

a escola, pr incipalmente a públic a.

Genivaldo Monteiro Professor de Filosofia da Educação na UEPB-CH e doutorando do Programa de Pós-Graduação em Educação da FEUSP.

Jacqueline Quaresemin Historiadora, Mestre em Sociologia UFRGS e Professora de Opinião Pública na Pós-Graduação da FESPSP.

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A EDUCAÇÃO 4.0 E A SOCIEDADE BIT Macrossistema do mundo trazendo crises consideráveis nos microssistemas de saúde, financeiro, educacional e em todo o bem-estar do Ecossistema planetário que al te ram c om p o r t a m e n t o s , a t i t u d e s e padrões nas pessoas, segundo o p s i c ó l o go U r i e Br o n f e n b r e n n e r .

A

Geopolítica atual não identifica o progresso sem crescimento económico. Por outro lado, o pico evolucional nas ciências e nas tecnologias faz-nos chegar a quarta revolução industrial. Intitulada I n d úst ria 4 .0 desenv o l ve f ác i l ac e s s o à conectividade, à informação com armazenamento de dados e às ferramentas virtuais na incerteza do tempo-espaço que em frações de segundos se transformam. As tecnologias habilitadoras não conseguem dar conta de todos os acontecimentos simultâneos de informação. Esse processo rápido altera ânimos e comportamentos às organizações, inclusive à escola que sofre com o estado de tensão const ante. As operações financeiras são vu ln eráv eis, eletró nic as , não uti l i z am o papel moeda, além de serem volumosas e trilhonárias. Na instabilidade do novo ano que abala a estrutura social e monetária do planeta está o novo coronavírus 2019nCoV co m sur to o rig i nári o na c i d ad e chinesa de Wuhan, que interfere no

O mundo hoje é interdependente com economias regidas pela dinâmica dos países e informações voláteis, as i m ag e ns g a n h a m e s p a ç o n o d i a -a -d i a e todos tornam-se cada vez mais competitivos. Por outro lado, as conectividades provocam cidadãos planetários dependentes uns dos o utro s . E q u e m n ã o e s t á i n t e r l i g a d o s e nte - s e ex c l u í d o d o m u n d o e d e s u a f l ui d e z . A língua global, a linguagem cibernética e suas abreviações que se espalham pelo mundo através da Internet com códigos emocionais (emoticons) traz dependência do Homem diante das tecnologias na complexidade de assimilação dos valores, de tolerância e de interculturalidade. Nesse processo re ve l a- s e à S o c i e d a d e d a In f o r m a ç ã o que é quantitativa, fomentando a

tempo real. Hoje através do Messenger, Hangouts, WhatsApp, Twitter dentre outros possibilitam às pessoas de receberem mensagens até dos famosos e das celebridades. Estabelecer a Educação 4.0 é fundamental na Sociedade da Informação que influi na formação da Sociedade Bit, termo criado pelo premiado jornalista português Reginaldo Rodrigues de Almeida em 2004. A escola enquanto organização, r e s p o n d e à s d e m a n d a s e n ua nces do c e n á r i o d e s t a s o c i e d a d e g l oba liza da e desigual já que toda informação deve ser transformada em conhecimento. As novas representações simbólicas com os seus novos códigos orientados por dígitos binários 0 e 1 que fazem parte do dia-a-dia é sintetizado por Reginaldo Almeida (2004, p. 11) « c o m o o Bi n á r i o d a In f o r m a çã o e da Tecnologia, o Binómio da Informação e da Tecnologia, a Bilateral da Informação e da Tecnologia, a Bagagem da Informação e da T e c n o l o g i a , a Ba t e r i a d a In forma çã o e da Tecnologia». 1 . A N OVA E R A , A E D U C AÇ ÃO 4.0 E

Sociedade Bit. Ademais, a própria linguagem utilizada pela geração de Polegarzinha como define Michel Serres em 2013 «jovens e crianças q ue e nvi a m m e n s a g e n s v e l o ze s c o m os polegares nos telemóveis» muda a relação com o mundo e a faculdade de atenção dessa geração prendem-se p o r p o uc o s s e g u n d o s .

O S DI R EI TO S HUM A NO S

Durante muitos anos, o homem usava meios convencionais para comunicar como o telefone, as correspondências e o te l é gr a f o . H o j e f o r a m c r i a d o s o s ICQ’s que são os comunicadores i ns tantâne o s t a m b é m c o n h e c i d o s d e mensageiros. Esses aplicativos enviam e recebem mensagens em

Contudo, a internacionalização de empresas na fixação de multinacionais e m d i v e r s o s p a í s e s t r o u x e à t ona os apátridas que representam uma miscigenação cultural em uma expansão nunca dantes vista. O mundo dissemina as riquezas da diversidade cultural. De qualquer

O anúncio de uma nova era com a inserção em massa dos cobots - robôs colaborativos que interagem com humanos num mesmo espaço - traz um avanço à integração de técnicas e divisão de tarefas entre homens e máquinas nas indústrias.


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ponto do planeta consegue-se vislumbrar a multiculturalidade e a pluralidade de cores, cheiros, sabores, opiniões, costumes, etnias e c re n ç a s. No ato de ensinar é necessário aprender na diversidade, na c u riosida de do s temas , nas q ue s tõ e s ou dilemas que se tornam objeto in ve stigativo na s salas d e aul as e no s espaços públicos. Aprendemos e ensinamos com todas as coisas e pessoas o tempo inteiro. As metodologias ativas são usadas nas resoluções de problemas, com soluç õ es sustentá vei s e hum ani tári as no reconhecimento e olhares para o outro instituindo-se a ética planetária e postulados coletivos construídos em c olab oraçã o . As tragédias das Guerras Mundiais d e n u ncia da s no Mo vi m e nto M o d e rno através das artes expressam dor e compaixão aos genocídios, às intolerâncias e aos nacionalismos regados de debilidades humanas. Milhares de atos de repúdios, consternações e pesares surgiram com movimentos civis e sociais. Os Governos proclamaram em 1948 a Declaração dos Direitos Humanos construída coletivamente em resposta aos massacres humanos - promulgada em 1948 reitera a liberdade e a justiça. A população mundial quer a igualdade d e dir eito s entre to d o s /as ap e s ar d a pluralidade cultural como único subterfúgio de garantir a paz entre os p ovos. A cosmovisão futurista engloba literatura, música, cinema, teorias, as tribos juvenis e os vídeos-clipes musicais. As indústrias ganham em produtividade, personalização e customização de produtos e procuram cooperar com a conservação ambiental reduzindo gastos de produção e desenvolvendo ações de re sp onsabilidade so ci al . A s p e s s o as e as organizações rendem-se e usam as tecnologias das empresas Apple, Alphabet, Microsoft, Facebook e Am az o n. N asc em implementaç õ e s d e m e d i d as d e se gurança e legisl aç õ e s uni ve rs ai s de proteções de dados com a Cyber

Foto de Florian Olivo o n Unsplash

security. Movimentos artísticos e literários destacam-se rompendo velhos paradigmas como o Cyberpunkmovimento futurista relacionado com o cyberspace derivado da palavra cibernética. Hoje os laços sociais e s tão f o r t a l e c i d o s a t r a v é s d a s R e d e s Sociais na febre informática ‘posto, logo, existo’ justificando-se a disseminação das selfies e performances individuais construtoras de personalidades e i d e nti d ad e s d o s s u j e i t o s .

dentárias, mamárias e outros implantes que causam Autoconstrução ou Autodestruição. Hábitos alimentares baseados em fast food, a conectividade em tempo real entre pessoas de diferentes espaços do globo, a insensibilidade humana questionada nos medias, a substituição dos governos pelos desmandos das multinacionais e o próprio capitalismo perverso é enxovalhado pela literatura que ele próprio criou.

O fascínio das imagens, games dos cyborgues e ações misturam humanos com máquinas. Princípios éticos e d i l e m as d u e l a m e m e s f e r a s d o b e m e do mal. O debate expande-se em longa metragens como: Metropólis (1927), Blade Runner (1982), Inteligência Artificial (2001), Matrix (1999), Minority Report (2002) e Ex- M ac hi n a ( 2014) d e n t r e o u t r o s q u e retratam o mundo dos sonhos nas telas dos cinemas e no mundo virtual. Formam-se redes e estruturas de rac i o c í ni o s e m d i v e r s a s á r e a s d e s d e a religião até os modelos matemáticos de redenção. Enxergamos nós mesmos em realidades virtuais que por vezes causa-nos desconfortos e c o nf l i to s i n t e r n o s .

Na Sociedade Bit o mundo das imagens e interações possuem ferramentas imprescindíveis ao conhecimento. A sinfonia do Universo é e x p l o r a d a c o m a T e o r i a da s Corda s e suas fórmulas disseminadas com precisão na série televisiva The Big Bang Theory com James Joseph P a r s o n s o n d e a F í s i c a é e n sina da de uma forma divertida com piadas de excelência que leva o telespectador a refletir e absorver os conceitos. As imagens, as músicas e os ritmos f a ze m p a r t e d o s a p a r a t o s i nt era t ivos p a r a o s j o v e n s e a s c r i a n ç a s, dent re elas o YouTube, plataforma conectiva d e c o m p a r t i l h a m e n t o d e v ídeos com sede em San Bruno nos Estados Unidos. A Netflix provedora global de filmes e séries de televisão por streaming sediada no território nortea m e r i c a n o e m L o s G a t o s p ossui ma is d e 200 m i l h õ e s d e a s s i n a n t es.

Recentes pesquisas divulgam características da nova era consumista em utilização desenfreada de próteses

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É necessário misturar culturas através das interações e intercâmbios culturais que podem começar na escola não apenas na semana das Nações, já que o mundo por excelência está emaranhado. O hibridismo cultural nunca foi pacífico e como toda a relação de poder demanda várias posições e conflitos. A globalização aqueceu a mobilidade entre todos os países. Ruturas se fazem necessárias e novos olhares às problemáticas, às fenomenologias e às relações sociais devem urgir no cenário de emergências que determinam a repercussão e construção dos sujeitos que integram as e sco la s e que v ali d am a Ed uc aç ão atual. Esse cenário informatizado refém hoje das Redes Sociais circunscrevem escolhas e o empenho em p olítica s públicas . Os medias «meios de comunicação social» denunciam violações aos direitos humanos fundamentais como a desigua ldade de gêne ro s , s o c i ai s e de raça. Cria-se um coro coletivo com m archa s e pr o testo s i nvo c ad o ras d e igualdade de direitos nas diversas franjas sociais em torno do acesso às oportunidades democráticas e participativas, com efeito é nesta corrente que está a organização esc olar . No entanto, o fenômeno globalizante

é irreversível. Com o advento desta Nova Era o mundo passou a ser integrado em uma cultura planetária. As novas tecnologias precursoras deste momento corroboram à interação multicultural - via de transformação rebanhando os excluídos - quando a desigualdade de classe cresce vertiginosamente. A pobreza é auferida pela não alimentação constante e digna das p o p ul aç õ es e a e r r a d i c a ç ã o d a f o m e no mundo é uma das metas das Nações Unidas nos objetivos do desenvolvimento sustentável à ag e nd a 2 0 30. Por outro lado, a espionagem de informações, a competição tecnológica e a fragmentação dos produtos pelas empresas transnacionais contribuíram nas aç õ e s d e u m a r e d e p r o t e t i v a l i g a d a à Cyber-Segurança. Compreende-se que essa globalização e suas múltiplas facetas influenciam todo o sistema educativo mundial, reproduzindo exclusões, xenofobias e desigualdades, assim como numa contradição insanável traz uma globalização cultural que é rica, nobre e d i ve rs a. Atina-se que a escola que quer cumprir o seu papel com boa qualidade de ensino deve estabelecer em seu ambiente a justiça social na

dimensão pedagógica incluindo oportunidades digitais enquanto g a r a n t i a d e : i g u a l d a d e d e c ondições, no respeito às diferenças e ao bem c o m u m , n a p a r t i c i p a ç ã o d e mocrá t ica e no respeito aos direitos humanos sustentados pela ética do comprometimento de elevação social.

“ É ne ces s ário misturar culturas através das interações e intercâmbios culturais que podem começar na escola não ap enas na semana das Nações, já que o mundo por excelência está emaranhado. O hibridismo cultural nunca foi pacífico e como toda a relação de p o d e r d e m a n d a v á ri a s p o s i ç õ e s e c o n f l i to s .“ A justiça e a inclusão social estabelecem-se na sociedade cosmopolita com vozes, cores e culturas entrelaçadas. Essa sociedade que se expande com as grandes navegações abrange o mundo do trabalho. No desenvolvimento pedagógico devemos formar seres com competências e capacidades c r i a t i v a s e p r o a c t i v a s p a r a comba t er a proliferação das desigualdades sociais. A justa distribuição de tratamentos opera no direito de ter direitos com a cidadania do mundo, c o n h e c i d a c o m o c o s m o p o l i ta . Aq u e l e q u e m m a n d a t e m o dever de garantir na dimensão pedagógica a emancipação e a participação de t o d o s n a c o n s t r u ç ã o d a e s c ola dest a Nova Era influindo em sua qualidade. Corrobora-se na perspetiva de Thomas Popkewitz que o cosmopolitismo inclui a ação, a participação, as ciências e as tecnologias enquanto emancipação humana na formação de pessoas que sejam razoáveis e atuem na sociedade c i v i l . Na pesquisa realizada na educação comparada entre Brasil e Portugal na tese de doutoramento que corre a termos intitulada O cidadão do mundo

Foto de NESA by Makers on Unsplash

e a organização ética da escola demonstra segundo a bibliografia


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existente e os estudos empíricos realizados em escolas eficazes integradas na Educação 4.0 que essas possuem uma liderança proactiva, professores comprometidos com a mudança da nova era, espaços democráticos de atuação e projetos autónomos e empreendedores dos alun os e pro fesso r es . 2. PROJETO GESTOR NA ÉTICA DA ED UC AÇÃO 4.0 A gestão da Escola Estadual Professor Ant ón io Jo sé Leite lo c al i z ad a na Zo na N ort e da Cida de de S ão Paul o - B ras i l possui um projeto gestor humanista do qual a investigadora participou durante seis anos que emancipa vidas e com eço u a ser des e nvo l vi d o no ano de 2008. Apesar da alteração no q uadro de gesto res p o r d uas ve z e s , a filosofia do trabalho continua a ser desenvolvida. Muitas escolas periféricas do Brasil estão em locais violentos com atuação do tráfico de drogas. Os alunos dessa escola não respeitavam os horários, eram resistentes às solicitações, desanimados, agressivos, não colaboravam com as aulas e o funcionamento da escola era irregular e a dir eto r a r ecém-em p o s s ad a f o rm a uma equipa e convence os encarregados de educação, professores e outros parceiros institucionais de suas responsabilidades civis para elevarem a qualidade do ensino ofertado e as condições locais. As modificações c om eçam a a co ntece r. Identifica-se na pesquisa que ocorreram movimentações sociais resultantes de ações democráticas, tecnológicas e participativas que possibilitam na escola a coesão social. Evidencia-se com os resultados colhidos agregação de valores e a re est rutur açã o física e m d o i s p ré d i o s do estabelecimento. Os índices do desenvolvimento educacional aum e nta ram ( SA RESP / S A EB / ENEM ) e os aluno s:

re s p o ns ab i l i d a d e s s o c i a i s ; - indicativos de chefes(as) e empreendedores responsáveis e re s p e i táv e i s ; - m e m b ros d e i m p o r t a n t e s e m p r e s a s e o rgani z a ç õ e s .

na s ala de aula res ult am em Nota 1 0 ! ( … ) O

O premiado ex-aluno Marcello Farias, p ub l i c i tár i o , p r o f e s s o r e m e s t r e p e l a Universidade São Caetano do Sul atinge um alto patamar académico distante da realidade de muitos al uno s d a s e s c o l a s p ú b l i c a s e n a r r a :

Uma das linguagens utilizadas pela gestão escolar são as expressões artísticas direcionando os alunos à proatividade. O palco da escola foi remodelado e equipado, iluminação de última geração, cortinas eletrónicas, instrumentos musicais. Acontecem apresentações do r e n o m a d o P r o j e t o Jo v e m E m Cena . O microfone é dos alunos e fazem ecoar s u a s v o ze s ! As s a l a s d e a u l a s cont a m com 35 a 45 alunos, profissionais estão comprometidos com a organização e o projeto gestor baseia-se na humanização, empolgação e solidariedade incluindo os diferentes num movimento de elevação social. A n a r r a t i v a e o d e p o i m e n t o do a luno Carlos Daniel que hoje conhece 14 países, empresário e informático demonstram que a escola recebia alunos provenientes de outras organizações com históricos de i n d i s c i p l i n a e o a c o l h i m e n t o, diá logo e o a m o r t r a n s f o r m a m v i d a s:

(…) Uma escola que fornecia atividades extracurriculares. Fornecia curso de idiomas, curso de teatro, uma escola que fornecia todo

um

amparo

social

para

aquela

comunidade escolar. [Era] voltada para o desenvolvimento pessoal e profissional do aluno. (…) Essa escola foi transformadora na minha vida eu saí do José Leite e fui o primeiro colocado no vestibular de uma Instituição em São Paulo chamada Faculdade Oswaldo Cruz. Consegui bolsa por isso, me formei e me pós-graduei atualmente faço mestrado e sigo no ramo Académico (…). Hoje so u Co n cu rs ado no Cent ro Paula Sous a (…), dou aula em Pós-Graduação em Universidade e no SENAI.

No final do ano passado eu

p ar ti ci p e i de um realit y s how na B and [Rede Bandeirantes] sobre empreendedorismo e publicidade e eu fui vencedor. E eu posso

Brasil enfrenta um dos piores índices de avaliação no Ensino Fundamental, mas é possível mudar esse quadro, veja só esse exemplo [Apresentadora Madeleine Alves, 2012, int roit o].

garantir que tudo o que eu desenvolvi [no programa] eu aprendi na escola: a falar, a

(…)Ouvi dos meus professores que eu era uma

p ô r as mi nhas ideias em prát ic a, t rabalhar

pessoa inteligente que eu teria um futuro

em equipa então eu sou muito grato!

brilhante mas eu tinha que deixar o meu

(Mar ce l l o F arias , ex-aluno, s et embro/2019).

problema disciplinar que era muitas vezes ‘bagunç a’, muit a c onv ers a na s a la e s emp re tive esses problemas e acabava não dando

O embelezamento e funcionalidade da escola, a eleição do Grémio Estudantil, a Associação de Pais e M e s tre s At i v a e o C o n s e l h o d e E s c o l a Democrático definiam prioridades, criaram o regimento, escolheram membros da Equipa Gestora e optaram por compras de equipamentos das NTIC’s. Esses parceiros trouxeram virtuosismo à e s c o l a ref e r e n c i a d o s n a R e p o r t a g e m da TV-Cultura sobre a escola em 0 1 /1 2 /2 0 1 2:

t ant a at enç ão para realment e os es tu d os e quando entrei nesta escola eu tive sim alguns problemas como eu já havia tido e mas, com a paciência e com o trabalho psicológico que t ev e a [diret ora] c omigo eu ac red ito q u e eu consegui desenvolver bastante e me tornar outra pessoa acreditando que eu poderia ser s im alguém na v ida e poderia t er u m fu tu ro. Como eu vim de uma comunidade e nunca tive muita esperança de um futuro (…) eu nunca tive muita vontade de estudar e de ser alguém eu não tinha muitos espelhos na minha f rent e para is t o. E quando eu c on h ec i a [diretora] depois de muitas idas à sala dela

Valorizar

dividir

e muita conversa a gente acabou se tornando

- ingressam em universidades inclusive est rangeiras; - p art icipam em ativi s m o s p o l í ti c o s e

responsabilidades com os alunos, dessa

amigos e não era só o relacionamento de

forma as escolas públicas podem ter bom

diret or e aluno, mas de amigos … eu p erc eb i

desempenho nas avaliações oficiais e no

o carinho que ela tinha por mim e queria que

am b ienta is; sujeitos

vestibular. O Jornal da Cultura edição de

eu fosse alguém na vida! Depois de três anos

sábado mostra que respeito e criatividade

es t udando nes t a es c ola ent rei n a fac u ld ad e

de

direitos

com

os

professores

e

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( … ) m e f orm e i e p a ra a mi n h a fo r matu r a e u fui na e s cola e p rocu re i p e l a [d i r e to r a] p o r um só objetivo de agradecê-la e por quão importante ela foi nesta caminhada. Eu lembro que a gente conversou bastante e ela ficou muito feliz! (Carlos Daniel Soares J úni o r - I rla n d a - Du b lin / se te mb r o , 2016).

Um dos projetos gestores im plementa do s nesta e s c o l a al é m d o Projeto Jo vem Em Cena f o i o Pro j e to Fala Sério. A equipa gestora reunia-se uma vez por semana com todos os alunos em todos os períodos no anfiteatro. A diretora trabalhava a sensibilização, elevação sociocultural, a motivação, autoestima e o senso de responsabilidade com sociodramas. Os alunos interagiam e falavam dos conflitos, dos problemas, das informações da comunidade, d e b at i a m pequena s c urta- m e trage ns no empoderamento e na conscientização das crianças e jovens a respeito da mundividência. Nikholas Magalhães, líder e influenciador de vidas, exerce a responsabilidade social co m o grupo de e s c ute i ro s no Rio de Janeiro e graduando de Enfermagem na Universidade Estácio d e Sá na rra:

organizado, planeado, seguro e disciplinado é reconhecidamente humano. Nesta escola todos possuem responsabilidades, tolerância e valores regulados na ética, longe dos m al f e i to res t r a f i c a n t e s e d a s d r o g a s . Es s e s s ão i n s u m o s i n d i s p e n s á v e i s n a formação (in) alienavelmente humana. Impulsionar, democratizar e incentivar ações culturais garantem a veiculação da liberdade de expressão no equipamento educacional. Henrique Paulino, notável informático, formado na Faculdade de Informática e Administração Paulista e excelente f i l ho , i rm ã o e c h e f e d e f a m í l i a :

melhor [no atendimento] e melhora dos alunos e eu pas s ei dois anos f ora em 2 0 0 9 e 2010 e quando eu voltei no 8º ano notei tudo diferente tínhamos trabalho muitas coisas que f azia c om que f ôs s emos para fren te ( . . ) centrados nos estudos, motivados para fazer aquilo (…) c omec ei a f azer c urs o téc n ic o n o SENAI foi o estudo da escola que me fez passar entre os melhores eu tinha pessoas que estudavam em escolas particulares e em escolas de renome em lugares nobres da Cidade, mas a es c ola da Zona Norte, ali n a Vila Amália no extremo Norte, no meio da Comunidade f ez c om que eu c heg as s e até o Técnico. Chegasse no meio daquelas pessoas importantes, daquelas pessoas que tinham

Eu estudei na Escola Estadual António José

muit os es t udos . F oi a f é que a dir etora, q u e

l e i te d a 4ª s érie do Ens ino F undament al at é

os prof es s ores t inham e os es t ud os tin h am,

o 3º ano do Ensino Médio na conclusão do

a dedicação de todos com os estudos e

Ensino Médio e eu me sinto privilegiado neste

quando eu pensei em desistir por conta de

p e r í o d o n o c olégio. F oi not ório t odo mundo

horários a escola não deixou e a escola

viu a progressão que a escola teve, a

esteve comigo e me deu total apoio e suporte

visibilidade. Com muita disciplina, ética,

e foi muito importante para mim. Vi que

se gu r an ça. O aluno s ent ia-s e s eguro dent ro

t inham pes s oas ali para me ajud ar ( Mayara

da escola reduzindo o uso de drogas é comum

Rodrigues , ex-aluna, out ubro, 2017 ) .

vermos isso. Aproximou o aluno do desporto, da cultura fez projeto. Autorizou o uso de teatro e de cinema dentro da escola. Uma gestão excelente de todos nós e todos que ti ve r am co m a gent e nes t a c aminhada nes t e

A diretora tinha um programa no Anfiteatro chamado Fala Sério, os p roblemas da esco la o u al gum avi s o que ela pudesse explicar para todo mundo, isto era muito bom porque aproximava os alunos deixava que os alun os falassem so br e a e s c o l a. Te ve um Fala Sério que ela falou sobre uma música do Chico Buarque de Holanda chamada Cálice que ela conseguiu transpassar para todo o mundo o que as p e sso a s na D itadura p as s avam , o que acontecia naquela época a repressão e a falta de liberdade de expressão e isso foi muito bom porque pôde mostrar aos alunos da escola o quão bom era ter essa liberdade que a gente tem hoje em dia e por mais que ela fosse rígida ela deixava muito claro que os alunos poderiam ser bem ativos, era uma escola que tinha muitos projetos… (Nikholas Magalhães – Ex-aluno, out ub ro / 2 0 1 7 )

Foram mudanças que foram feitas para

período, todas as pessoas de bem só tem elogios e coisas boas, sempre muito presente. (…)

Agradeço

tudo

o

que

a

escola

proporcionou (Henrique Paulino, ex-aluno, se te mb r o d e 2016).

O grupo gesto r br asi l e i ro d e m o ns tra

A e s c o l a cu m p r e s u a m i s s ã o q u a n d o insere cidadãos no mundo com visibilidade, confiança, autoestima, satisfação e bem-estar. Os desafios são lançados dia-a-dia e a responsabilização é transferida aos alunos. As mudanças organizacionais são necessárias à emancipação dos al uno s – a l b a t r o ze s d a E d u c a ç ã o . As interações sociais, as expressões artísticas e o diálogo são estimulados como forma primeira de garantir a construção do conhecimento com experiências cotidianas. A aluna vi to ri o s a M a y a r a R o d r i g u e s f o r m a d a em Gestão Financeira pela Faculdade Anhanguera em 2019 retrata o grau de tolerância, confiança e responsabilidade, além do compromisso desenvolvido em

a parceria, a justiça e a coesão social. Est u d ar num a mbiente d i g no , l i m p o ,

alcançar o mais alto patamar num m und o d e p o d e r e s d e s i g u a i s :

Outro contexto diferenciador nesta escola foi aprimorá-los no p o s i c i o n a m e n t o d e e s c o l h a do bem e do mal. O Grêmio Estudantil elo entre todos os stakeholders possui ativismo enquanto organismo político, participação democrática, interação e a reivindicação dos direitos, liberdades e garantias dos estudantes. A agremiação teve importância na vida do Ex-aluno hoje integrante da Polícia Militar de Elite do Estado de São Paulo - exemplo de discernimento h u m a n o , r e s p o n s a b i l i d a d e , ca rá t er e determinação: F oi de grandes s ís s ima import ância a min h a pas s agem nes t a es c ola onde eu de s tac o d ois pont os : o primeiro f oi a minha pa rtic ip aç ão no G rêmio Es t udant il is t o me aju d ou mu ito porque na époc a eu era muit o t ím id o. E is s o me ajudou a lidar melhor com o público, fazer novas amizades me soltar mais conversar mais. Inclusive foi na gestão da diretora (…) que tivemos muita chance de fazer gincanas, festas, encontros e isto foi muito agregador para a minha vida. O segundo ponto importantíssimo foi no moment o que eu lev ei ao c onhec i men to d os meus prof es s ores que eu t inha ess a von tad e de em ser Policial Militar eles trouxeram para mim livros, resumos e matérias que serviu


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c o m o b a s e d e e s t u d os e e u co n se gu i p r e star

eu faço isto por amor! (Willian H. Costa,

grémio - um papel muito próximo da direção

o concurso em 2014 (…) e passei sem maiores

j u n h o / 2019).

e de acompanhar essas ações. Foram muitas

dificuldades tomando posse em 2015 e desde então eu sou soldado da Polícia Militar do E st a do d e S ã o P a u lo. Uma p r o fi ssão q u e e u sempre admirei, sempre quis não me vejo fa z end o ou t ra cois a e u amo o q u e e u faço . A m ensage m q u e e u d e ix o é q u e n ão é o l o cal que faz a p e s s oa , p a ra q u e m n ão co n h e ce a E sc o l a E s t a d u a l P rof e s so r A n tó n i o Jo sé Le i te fi c a si t u a d a n u m a re gião p e r i fé r i ca, fi ca n a Zona Norte de São Paulo, um local de altíssima criminalidade e mesmo assim eu não me corrompi eu não me deixei corromper ingressei na Carreira da Polícia Militar e hoje essa mesma criminalidade que assolava a região ali da escola eu combato em outros l o c a i s, m a s e u com b a t o n ão me co r r o mp i e não faço parte desta criminalidade (...) Para mim não existe essa de eu não tive oportunidade eu não tive chance. Eu quis, eu

ações pedagógicas positivas e em contacto

A liderança escolar como estratégia deve ser usada para atingir objetivos, mas não é um fim em si mesma, delega poderes e a coesão social é sinonimo de unidade na coletividade. A cultura escolar é impregnada de sentidos: formal e informal. Na narrativa preciosa de Ewerton Fernandes (2019) identifica-se que ele enquanto ser ontogénico convence-se da importância daquela escola em sua c o ns ti tuiç ã o h u m a n a p o s s u i n d o d o i s olhares: de aluno (processo adquirido) e funcionário (processo doado) concluindo que é preciso sair da zona d e c o nf or t o e d e f i n i r u m a t i v i s m o d e « q ue m s a b e f a z a h o r a e n ã o e s p e r a ac o nte c er » .

consegui e eu conquistei. Hoje eu sou Policial

c om out ros alunos da époc a t odo mu n d o s ó t em elogios para f alar s obre e s en tem falta. A escola tinha teatro O Jovem Em Cena referência na Cidade e na Região [com] atuação dos alunos através no Grémio. Depois que eu terminei a escola em 2011 teve um concurso do Governo do Estado para Agente Escolar do qual eu prestei e passei. M inha 1ª opç ão f oi o Jos é L eit e ( … ) . E u p u d e ver

a

outra

visão

[da

direção]

administrativamente. Temos boa recordação como lembramos da escola e todo o c onhec iment o e bas e no âmbit o p rofis s ion al eu adquiri na época da escola do Ensino M édio e do F undament al. H oje, es s e an o em 2019 t erminei o Ens ino Superior e h oje s ou formado em Publicidade e Propaganda também (Ewerton Fernandes, ex-aluno, s et embro/2019).

Militar eu combato a criminalidade e eu

Aos poucos passámos a perceber as mudanças

de fe nd o p e s s oa s q u e e u n e m co n h e ço . Mas,

q u e a e scola t ev e. Eu f ui v ic e-pres ident e do

Marisa Batista Doutoranda no CEIED, Instituto de Educação, Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias - Lisboa - Portugal marisa.investigadora@yahoo.com

Referências Bibliográficas - Amaral, A. (2010). Etnografia e pesquisa em cibercultura: limites e insuficiências metodológicas. Revista USP, (86), 122-135. - Batista, M. (2017) A gestão no espaço escolar: Como atingir uma pedagogia de excelência? Saarbrücken-Alemanha: Novas Edições Académicas. - Batista, M. (2018). A educação multicultural e cosmopolita, In Lopes, R. P., Pires, M. V., Castanheira, M. L. P., Silva, E. M., Santos, G., Mesquita, C., & Vaz, P. M. F. (2018). III Encontro Internacional de Formação na Docência (INCTE): livro de atas, 70-77. Bragança, Portugal: Instituto Politécnico de Bragança (ISBN: 978-972-745-241-5). - Batista, M. (2018) O COSMOPOLITISMO NO SÉCULO XXI E A ORGANIZAÇÃO ÉTICA ESCOLAR. POLÍTICA E GESTÃO DA EDUCAÇÃO IBERO-AMERICANA: TENDÊNCIAS E DESAFIOS, 117. - Batista, M. (2019). O gestor escolar e a coesão social na escola, In Mesquita, C., Lopes, R. P., Silva, E. M., Santos, G., Patrício, R., & Castanheira, L. (2019). IV Encontro Internacional de Formação na Docência (INCTE): livro de atas, 113-124. Bragança, Portugal: Instituto Politécnico de Bragança (ISBN: 978-972-745-259-0). -Bauman, Z. (2001). Modernidade líquida (P. Dentzien, tradução). Rio de Janeiro: Jorge Zahar. - Benavente, A. (2004). O pacto educativo para o futuro: um instrumento estratégico para o desenvolvimento educativo em Portugal. Revista Iberoamericana de educación, 34(1), 69-108, - Brasil, O. N. U. (2017). Organização das Nações Unidas. Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Disponível em: http://www. itamaraty.gov.br. - Bronfenbrenner, U. (2011). Bioecologia do desenvolvimento humano: tornando os seres humanos mais humanos. Porto Alegre: Artmed Editora. - Candau, V. M. F. (2012). Direito à educação, diversidade e educação em direitos humanos. Educação & Sociedade, 33(120), 715-726. - Costa, W.: depoimento[outubro/2019]. Entrevista concedida a Marisa Batista. São Paulo. Brasil. - de Almeida, R. R. (2004). Sociedade bit: Da sociedade da informação à sociedade do conhecimento. Quid Juris. - Estêvão, C. A. V. (2006). Educação, justiça e direitos humanos. Educação e Pesquisa, 32(1), 85-101. - Farias, M.: depoimento[outubro/2019]. Entrevista concedida a Marisa Batista. São Paulo. Brasil. - Fernandes, E.: depoimento[outubro/2019]. Entrevista concedida a Marisa Batista. São Paulo. Brasil. - Goodson, I. (2007). Currículo, narrativa e o futuro social. Revista Brasileira de Educação, 12(35), 241-252. Acedido em: http://www.scielo.br/pdf/rbedu/v12n35/a05v1235. - Humanos, D. U. D. D. (2015). Declaração Universal dos Direitos Humanos. Acedido em: http://www.educacao.mppr.mp.br/arquivos/File/dwnld/educacao_basica/educacao%20infantil/legislacao/declaracao_universal_de_direitos_humanos.pdf - Jornal da Cultura. TV Cultura (Produtor Executivo Fernando Carvalho). (2012, programa de 01/12/2012 – Apresentadora Madeleine Freire). Reportagem na E.E. Prof. António José Leite. A jornalista Andresa Boni esteve na escola para entrevistar colaboradores da escola considerada exemplo de educação de qualidade para o Brasil. [Fundação Padre Anchieta] São Paulo -Brasil. - Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=sf7Y0Tboa5s - Lück, H. (2017). Gestão educacional: uma questão paradigmática. Editora Vozes Limitada. - Magalhães, N.: depoimento[outubro/2017]. Entrevista concedida a Marisa Batista. São Paulo – Brasil. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=y-qIc-ONPpc - Marion Young, I. (2006). Representação política, identidade e minorias. Lua Nova, (67) - Paulino, H.: depoimento[setembro/2016]. Entrevista concedida a Marisa Batista. São Paulo – Brasil. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=y-qIc-ONPpc - Popkewitz, T. (2011). Cosmopolitismo, o Cidadão e os Processos de Abjeção: os duplos gestos da pedagogia. Cadernos de Educação, (38). - Rodrigues, M.: depoimento [outubro/2017]. Entrevista concedida a Marisa Batista. São Paulo – Brasil. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=y-qIc-ONPpc - Serres, M. (2013). Polegarzinha. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil. - Soares Júnior, C.D.: depoimento[setembro/2016]. Entrevista concedida a Marisa Batista. São Paulo – Brasil. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=y-qIc-ONPpc

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EDUCAÇÃO 4.0 O BRASIL ESTÁ PRONTO PARA O FUTURO? PESQUISAS RECENTES MOSTR AM DADOS QUE CONFIRMAM , MAIS UMA VEZ , A DESIGUALDADE ENTRE BR ANCOS E NEGROS NO BR ASIL - POLÍTICA , CRIME , ESCOL A , TR ABALHO E RENDA . O PAÍS SEGUE DIVIDIDO E ATR ASADO PELO RECISMO E POR PRECONCEITOS SECUL ARES.

O

Brasil es tá reconhecidamente entre os dez países mais desiguais do planeta, e uma das dimensões ou razões para ess a desigualdade é racial. A maior par te dos dados ness a matér ia s ão das pesqui sas PNAD (Pesquisa Nacional por A mos tra de Domicí lios) realiz adas pelo IBGE (Ins tituto Brasileiro de Geograf ia e E s t at ís t ic a) de c ampos di ver sos como t rabalho, renda , educ aç ão, cr ime e par ticipaç ão polític a. O racismo é um c âncer que pre cis a ur gentemente ser vencido no p aís , es t a e uma conclus ão básic a a qual chegou o pesquis a dor Jessé de Souza, escancarada em seu li v ro polêmico A Elite do atraso – da escravidão à Lava Jato. A ssista o vídeo em: ht tps: // w w w.youtube.com / watch? v = 9 x g Ghy nmTms Já o Anuário Brasileiro de Segurança Pública analisou 5. 89 6 bolet ins de ocor rência de mor tes decor ren t e s d e i n t e r v e n çõ e s p o l i c i a i s e n t r e 2 015 e 2 016 . I s s o represent a 78% do universo das mor tes no período.

EDUCAÇÃO E ECONOMIA: A t axa de analfabetismo é mais que o dobro entre pretos e pardos (9,9 %) do que entre brancos (4 , 2%) , de acordo com a PNAD Contínua de 2016 (um bloco especial das pesquisas feit as pelo IBGE ). Es t as t axas se manti veram com

Da Redação - A EL Ao de s cont ar as v í t imas cuja infor maç ão de raç a /cor não e s t a v a d i s p o n í v e l , o r e l a t ó r i o i d e n t i f i co u q u e 76 , 2 % d a s vítimas de atuação da polícia são negras, ou seja 7,6 pessoas em c ada dez ass assinadas s ão negras ou pardas. ( N o t a d o e d i t o r. : o s i t e d o F ó r u m N a c i o n a l d e Segurança Pública, de onde estes dados foram colhidos , es tranhamente es teve fora do ar até es t a dat a.) Outra pesquis a feit a pelo IBGE apont a que o desemprego é maior entre nordestinos, mulheres e negros. O instituto infor mou ainda que, no terceiro tr imes tre de 2018 , o número de des alent ados somou 4 ,78 milhões de pessoas. Des alent ados s ão aquelas pessoas que desis tiram de pro curar trabalho ou emprego, e pararam t ambém de es tudar por razões diversas, mas pode -se imaginar que o cus to para quem não tem renda é alto para procurar emprego e manter os es tudos.

ligeiras variações a par tir de 2018 e 2019 onde se constatram reveses nas projeções e no apor te de recur sos por par te da União que cor tou o orç amento da Educ aç ão e at acou pro gramas que es t avam dando cer to desde o Pátria Educadora! A inda que publiquem matér ias que dizem que o o número de negros e pardos lriundos das escolas públicas aumentou


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na educação superior, não há evidências que isso signif ique melhor ias efeti vas e duradouras , dado que a maior par te des te contingente es t á matriculada em faculdade pri vadas cujos objetivos, enquanto empresas, diferem da verdadeira f unç ão da educ aç ão e das necessidades do país.

No F ór um inter nacional de Davos , pesquis as e análises feit as por ins titutos especializ ados da Europa mos tram as tendências do f u turo para o trabalho. Os relatór ios mos traram que es t as serão as 9 6 prof issões do f uturo, segundo o F ór um Econômico Mundial.

Q uan do s e fala no ace s s o ao ensino sup er ior, a cois a s e complic a mais ainda: de acordo com a PN A D Contínua de 2017, a porcent agem de brancos com 25 anos ou mais que te m e nsin o sup e r io r co m p l e to é d e 2 2 ,9 % . É ma is q u e o dobro da porcent agem de pre tos e p ardos com diploma: 9, 3%. Já a média de anos de es tudo para pessoas de 15 anos ou mais é de 8 ,7 anos para pretos e pardos e de 10, 3 anos para brancos. Ou seja, as diferenças estão sendo retratadas de forma clara nos estudos e pesquisas feitas pelo instituto, e c aberia aos governos dos es t ados , municípios e da União a apresent aç ão de polític as públic as c apazes de rever ter e equilibrar es t as números. Educ aç ão é juma ques t ão es tra tégica – tratá-la ideologicamente, par tidariamente ou como ques t ão de merc ado é empur rar o país para o os tracismo, para a lat a de lixo da his tór ia.

O relatór io “ Jobs of Tomor row : Mapping Oppor tunit y in the New Economy ” (ht tps: // w w w.wefor um.org /repor t s / jobs- of-tomorrow-mapping- oppor tunit y-in -the -neweconomy) af irma que prof issões emergentes podem criar até 1,7 milhão de novas opor tunidades de emprego em 2020. 1,7 milhões dees t as novas opor tunidades possivelmente assim coloc ados: 35% na A mér ic a do Nor te, 31% na Europa, 28% na Á sia e 6% res t antes para serem distribuídos entre Áfria e América do Sul. O mesmo relatório analis a e infor ma que até 202 2, devem ser cr iados 6 ,1 milhões de empregos. Quais as chances de o Brasil entrar def initivamente nes te território de riquezas se considerar mos os atuais quadros de Educ aç ão Públic a (e mesmo a educ aç ão pr i vada) e das condições do nosso merc ado de trabalho? Ele o fará pela por t a da f rente, pela por t a dos f undos ou tent ará entrar por uma janela?

O Brasil não pode aspirar entrar no clube seleto dos países ricos e desenvol v idos , OCDE, OMC , Conselho de Seguranç a Mundial etc, se não resol ver es t a ques t ão primária – é uma condiç ão sine qua non. Deixar de fora do merc ado produ tivo e da economia produt yiva uma população (mais de 50% da populaç ão é cons tituída de pardos e pretos – IBGE* *) e co n o m i c a m e n te a t i v a e f o r te q u e co n t r ib u i r ia e n o r m e mente para a geraç ão de r iquez a e sua jus t a dis tr ibuiç ão é uma sandice sem precedentes , calcada em preconceitos de raç a e cor da pele, e obv iamente um dos mais impor t antes moti vos , senão o mais noci vo deles , para a noss a condiç ão atual de mero fornecedor de alimentos para os países ricos.

Habilidades digitais e humanas para o futuro do trabalho s ão o foco. Eis uma lis t a das 10 principais habilidades: 1. Mar keting Digit al - 2. Mídia S ocial - 3. Adminis traç ão de negócios - 4 . A lfabetiz aç ão Digit al - 5. Publicidade 6. Mar keting de Produto - 7 Vídeo - 8 . Design Gráf ico - 9. Lideranç a - 10. Escr it a E todas estas prof issões estão irremediavelmente ligadas às T ICs.

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ht t ps: //e xame. abr il.com.br/c ar reira /e s t as - s ao - as - 9 6 - pro f issoes- do -f uturo -segundo - o -for um - economico - mundial / A grande ques tão é: A Educ aç ão públic a, not adamente volt ada para as classes menos favorecidas , é cus teada pelos impos tos recolhidos pela União, não é por tanto, gratuita! Ainda que se encontre nes te uni ver so um padrão, às vezes até super ior ao ensino oferecido pelas ins tituições pr i vadas , ela es t á sendo pau latinamente defenes trada em relaç ão aos recur sos materi ais e humanos que lhes dever iam ser des tinados. Isso signif ica, em resumo, que mais de 90% da população brasileira es t ará despreprarada para exercer as prof isões do f uturo, dado que é notór io o desmonte das es tr uturas educ acio nais nos di ver sos ní veis – da escola básic a a super ior, aos centros de doutoramente, pós doutoramento e pesquisa da uni ver sidades públic as sejam, elas federais , es t aduais ou municipais que cont am com es tes recur sos recolhidos dos impos tos pelos municípios , es t ados e da união. O IBGE sis tematiz a todas ess as infor mações , monitorando e v e n t ua is a l te r a çõ e s n a D i v i s ã o Po l í t i co - A d m i n is t r a t i v a , através de atualiz ações anuais e realizou mais uma atual ização na lista de subdivisões municipais do país. A s tabelas com essas informações estão disponíveis no Por tal do IBGE. A Di v is ão Ter r itor ial Brasileira det alha a es tr utura ter r ito r ial do país , enumerando as Macror regiões , Unidades da F ederaç ão, Mesoregiões , Microrregiões e Municípios , além de suas subdi v isões internas , os dis tritos e subdis tritos ou re g iõ e s a dminis t r a t i v as . O I B G E sis te m a t iz a to da s e s s a s informações , monitorando eventuais alterações na Di v isão Político -Administrativa, através de atualizações anuais. (*2) No levant amento referente a 2018 , a es tr utura ter r itor ial brasileira tinha 5. 56 8 municípios , mantendo es t a quanti dade desde 2013. Somam -se a esses municípios um dis trito fe deral ( B rasí lia) e um dis t r i to e s t a dual em Per nambuco ( F e r n a n d o d e N o r o n h a) . J á a s s u b d i v i s õ e s t o t a l i z a v a m 10. 49 6 dis tr itos municipais e 6 8 3 subdis tr itos ou regiões a dminis t ra t i v as municip ais . Cont udo, a t ualmente o IB G E refez c álculos e suas pesquis as e relatór ios indic am 5570 municípios! (*3) A má notícia é que dos municipíos brasileiros , es tima -se que menos de 5% tenham recur sos suf icientes para manter os níveis de Educação necessários e suf icientes. Outra situaç ão bas t ante comple xa, resul t ante das recentes modi f i c a çõ e s qu e o a t ua l minis té r io da Eco n o mia f e z , a l é m d o co r t e e d o co n ge l a m e n t o d e i n v e s t i m e n t o s p o r 2 0 a n o s em áreas pr ior it ar iamente sociais como S aúde e Educ aç ão públic as já feit as no gover no Temer, e que vai deter iorar ainda mais o quadro sofrível da educação pública brasileira, porque atinge diretamente os recursos e suas fontes para a Educ aç ão é o f im anunciado do Fundeb - Fundo de Manutenç ão e Desenvol v imento da Educ aç ão B ásic a e de Valor iz aç ão dos Prof issionais da Educ aç ão - (ht tp: // w w w. f utura.org.br/ f undeb - o - que - e - e - para - que -ser ve / ). S ó e m 2 0 18 , R $ 15 7 b i l h õ e s f o r a m d e s t i n a d o s p a r a a

educ aç ão públic a através do Fundeb. Mas em dezembro de 2020, o atual modelo se ex tingue. Foi vetada a estimati va de recur so ex tra de R$ 1, 5 bilhão para o programa. C abe aqui um e sp aço p ara uma pe quena dig re s s ão de c unh o ‘ ma te má t i co ’ e d e p e s quis a: A l e i o rç a m e n t á r ia prev iu despes as da ordem de R$ 3 , 5 tr ilhões em 2018 – Quanto será ent ão que o Brasil ar rec adou de impos tos? S egundo o própr io gover no a ar rec adaç ão chegou a R$ 1, 242 tr ilhão em 2018 . (ht tp://w w w.brasil.gov.br/economia- e- emprego/2018/01/ saiba- quanto - o -pais-arrecadou- em-impostos-no -ano pass ado ) *5

A E DUC AÇ ÃO SE GUN D O A CONST I T U IÇ ÃO FEDER AL DE 1988 (*4) Eis aqui um grande marco para a his tór ia do Brasil e da E d u c a ç ã o B r a s i l e i r a . Em 5 d e o u t u b r o d e 19 8 8 , s o b a presidência de Sarney, foi promulgada a até ent ão, Car t a M a g n a d o p a ís , Co n s t i t u i ç ã o F e d e r a l d e 19 8 8 (C F/ 8 8) . Com a queda do Regime Milit ar, o país em processo de redemocratização e uma nova Cons tituição promulgada, a educação ganhou seu devido destaque como um direito social. É o que es t á dispos to no A r t . 6º da CF/198 8: A r t . 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, a alimen tação, o trabalho, a moradia , o transpor te, o lazer, a segu rança , a previdência social, a proteção à ma ternidade e à infância , a as sis tência aos desamparados , na forma des ta Cons tituição. Redação dada pela Emenda Cons titucional nº 9 0 , de 2015 . (BR A SIL , Cons tituição F ederal, 1988) Além do acima mencionado, Ar t. 6º da Cons tituição F ederal de 198 8 , o c apitulo abrangido pelos ar tigos 205 a 214 da mesma, trouxe a ideia da educ aç ão como um comple xo de direi tos de to dos , e de vere s do E s t a do e da famí lia a serem promov idos e incenti vados por toda a sociedade: A r t . 205 . A educação, direito de todos e dever do Es tado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o e xercício da cidadania e sua qualif ica ção para o trabalho. (BR A SIL , Cons tituição F ederal, 1988) Ressurgiu t ambém a ideia de uma lei contendo o Plano Nacional de Educ aç ão, e uma di v is ão de competências p r e v i s t a n o A r t . 2 2 , i n c i s o X X I V (Co n s t i t u i ç ã o F e d e r a l de 198 8) na qual “c abe pr i vati vamente à União legislar sobre as diretr izes e bases da educ aç ão nacional e con cor rentemente a ela, aos Es t ados e ao Dis tr ito F ederal, l e g i s l a r s o b r e a e d u c a ç ã o ”. Po r o u t r o l a d o, o a r t . 211 prevê um regime de colaboraç ão entre os entes da fed eraç ão de modo a assegurar a uni ver s alizaç ão do ensino obr igatór io. F ic a ent ão à União f inanciar ins t i t uições públic as bem c o m o r e d i s t r i b u i r e s u p l e m e n t a r, a f i m d e g a r a n t i r p a drõ e s m í n im o s d e q ua li da d e d o e nsin o e i g ua l da d e


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na opor tunidade de ensino, dando assistência aos Es t ados e Dis tr ito F ederal técnic a e f inanceiramente, e aos Municípios , que f ic aram respons áveis pela atuaç ão preferencial à educ aç ão infantil e f undament al. Entre os pontos pr incipais relati vos a educ aç ão, elenc a d o s na C F d e 19 8 8 , p o d e m o s c i t ar o a ce s s o a o e nsin o público obrigatório e gratuito pass a a ser direito público subjetivo, o que impor t a responsabilidade da autoridade públic a c aso o mesmo não seja oferecido ou seja ir regu lar a sua ofer t a (CF, 198 8 , A r t . 20 8 , 1º e 2 º ) , a obr igaç ão da União a inves tir anualmente na educação, um mínimo de 18% da receit a result ante de impos tos , bem como um mínimo de 25% aos es t ados e municípios; a f ixaç ão de conteúdos mínimos ao ensino f undament al em âmbi to nacional (CF, 1988, A r t. 210); a educação como um direito de todos , dever do es t ado e da famí lia, devendo ainda cont ar com a colaboraç ão de toda a sociedade (CF, 198 8 , Ar t. 205); a atuação dos municípios no ensino fundamen t al e na educ aç ão infantil; o ensino de 1º grau pass a a denominar-se ensino fundament al e o ensino de 2 º grau, ensino médio. De tudo isso aqui apresent ado algumas dúvidas, incer te zas e também cer tezas surgem, mas, ao que tudo indica a que mais incomoda é imaginar que o país , seguramente, entrará numa rot a descendente em relaç ão à Educ aç ão Pública a par tir dos cor tes que vem sendo feitos, compro metendo ainda mais e efeti vamente a qualidade (que já es t ava c aindo), os necess ários e imprenscindí veis investimentos na es tr uturaç ão do parque tecnólgico – informatização - que deveria acompanhar o seu desenvolv im ento, a v ida de milhões de jovens e cr ianç as , de famí lias

e da c ategor ia prof issional dos professores , indo na contra mão da his tór ia. Des t a forma, o que f ic a para 2020? O Brasil possui quase 12 milhões de analfabetos e mais da met ade dos adultos entre 2 5 e 6 4 a n o s n ã o co n c l u í r a m o Ensin o M é d i o. S ã o q ua s e dois milhõ e s de cr ianç as e jovens de 4 a 17 anos fora da escola e 6 , 8 milhões de cr ianç as de 0 a 3 anos sem vaga em creche. Esse cenár io cr ítico é f r uto de anos de desc aso, em um país que nunca colocou a Educação entre as prioridades da agenda polític a nacional. Esse é o legado que f ic a para 2020 e que o novo gover no tem a obr igaç ão de modif ic ar. Para A less andra Got ti f undadora e presidente - execu ti va do Ins tituto A r ticule. Ad vogada e Doutora em Direito Constitucional pela PUC /SP. Consultora da Unesco e Conselho Nacional de Educ aç ão, em entrev is t a a uma rev is t a, disse: “ o s d e s a f i o s s ã o m u i to s , a t é p o r q u e s ã o v á r i o s o s p r o b lemas da Educ aç ão e não é possí vel abordá - los de uma só vez ness a entrev is t a. A brangem a equit ati va uni ver s aliz a ç ão do acesso, da Educ aç ão Infantil ao Ensino Médio, tran si t an do p e lo direi to à apren diz agem e a garan t ia de p erm a n ê n c i a e s c o l a r. D i ze m r e s p e i t o à r e g u l a m e n t a ç ã o d o Sis tema Nacional de Educ aç ão, t ão necess ár ia para a ar ticulação e colaboração entre os entes federativos, à discussão do f inanciamento da Educ aç ão B ásic a (o prazo de v igência do Fundeb expira -se em 2020) , a for maç ão e atrati v idade da c ar reira de professor. E faz par te t ambém da agenda da educação a melhoria da infraes trutura das redes de ensino, já que, em pleno século X XI, 14 , 3% das escolas não possuem energia elétr ic a, esgoto, água e banheiro dentro do prédio e 55, 2% não possuem bibliotec a ou s ala de leitura! ” (*6)

Fontes: (*1) https://exame.abril.com.br/carreira/estas-sao-as-96-profissoes-do-futuro-segundo-o-forum-economico-mundial/ (*2) https://mundogeo.com/2019/02/04/ibge-atualiza-lista-de-municipios-e-distritos-do-brasil/ (*3) https://cidades.ibge.gov.br/brasil (*4) https://presrepublica.jusbrasil.com.br/legislacao/188546065/constituicao-federal-constituicao-da-republica-federativa-do-brasil-1988 (*5) http://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2017-12/orcamento-de-2018-e-aprovado-com-previsao-de-gastos-de-r-357-trilhoes (*6) https://novaescola.org.br/conteudo/15432/os-desafios-da-educacao-brasileira-em-2019-linhas-e-cores (**) https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/21206-ibge-mostra-as-cores-da-desigualdade https://www.todospelaeducacao.org.br/ https://articule.org.br/ https://www.todospelaeducacao.org.br/

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A RELAÇÃO ENTRE FAMÍLIA-ESCOLA E O IMPACTO NO DESENVOLVIMENTO DO ALUNO e n t r e f a m í l i a e e s c o l a . E s s a presença deve ser constante desde a Educação Infantil, passando pelo Ensino Fundamental e chegando ao Ensino Médio - quando o adolescente apresenta outras necessidades de acompanhamento.

A

família é o nosso primeiro laço social, ocupando um lugar especial na vida de qualquer indivíduo, exercendo influência significativa desde o nascimento. É ela que oferece o primeiro am b iente de so cia liz aç ão d a c ri anç a, onde ela cresce segundo padrões, comportamentos e influências culturais particulares. Dessa forma, é p e rcebida co mo um s i s te m a s o c i al responsável pela transmissão de valores, crenças, ideias e significados q ue estão presentes nas s o c i e d ad e s . A escola também cumpre um lugar primordial para o ser humano. É nela que o indivíduo dará início à socialização com outras pessoas, que extrapola o círculo familiar. Nesse contexto, a escola surge como uma instituição que ajuda a moldar a constituição do aluno e, por consequência, influencia diretamente na evolução da sociedade e da h u m anidade. Assim, a fa mília e a e s c o l a c um p re m dois papéis que se complementam no contexto da educação. O envolvimento de ambas afeta diretamente o desempenho escolar e a qualidade das relações que o aluno mantém c om a esco la. No entanto , ai nd a s ão m uit os o s desa fio s enc o ntrad o s p ara essa a pr o xima ção , o q ue p o d e e s tar ligado intrinsecamente às divisões de responsabilidades de cada instituição, questão crucial para sustentar uma vida esco lar fav o ráv e l . Existe a expectativa de que a escola se responsabilize pelo que a família não daria conta, que é a função acadêmica. Porém, há uma camada compartilhada, que diz respeito à formação do

sujeito. Então acredito que aquilo q ue a e s co l a p r o c u r a d e s e n v o l v e r d o ponto de vista de conduta, de valores precisa ser compartilhado. O mais adequado é que esses dois campos andem paralelamente e construam parcerias, possibilitando cada vez m ai s o d e s e n v o l v i m e n t o e m t o d o s o s aspectos, especialmente no que diz re s p e i to à v i d a e s t u d a n t i l . Muitas vezes, é na escola que a criança expressa determinados comportamentos, alguns, inclusive, que não são percebidos em casa. Nesses momentos é possível o b s e rvar , p o r e x e m p l o , a h a b i l i d a d e d e ne g o c i a ç ã o e o r e s p e i t o , e o u t r a s q ue s tõ e s q u e v ê m à t o n a q u a n d o e l a está em grupo. Além da dimensão formativa, situações como essa precisam ser trabalhadas dentro da e s c o l a, a s s i m c o n s e g u i m o s p e r c e b e r quando é preciso amparar e dar acolhimento a uma necessidade do aluno, que muitas vezes não é i d e nti f i c a d a p e l a f a m í l i a . É também nesse momento que o professor se coloca como um orientador, oferecendo, além de conhecimento, conselhos, limites e regras, abrangendo a totalidade do indivíduo. Neste ponto, a família pode se fazer presente no sentido de auxiliar no atendimento à criança, trazendo a experiência familiar e podendo dialogar sobre o melhor caminho a s e g ui r. As s i m , a e d u c a ç ã o , d e f o r m a m ai s am p l a , é u m a r e s p o n s a b i l i d a d e conjunta, que se complementa e se to rna m a i s e f i c a z c o m a p a r t i c i p a ç ã o d e am b as e m p a r c e r i a . Para q ue e s s a p a r c e r i a s e j a f l u i d a , é desejável proximidade e integração

Muitas famílias acreditam que no período da adolescência é possível se afastar da escola, dando mais autonomia aos filhos. Isso pode ser entendido por muitas famílias como sinônimo de afastamento do cotidiano escolar e da presença física n a e s c o l a . N o e n t a n t o , é i mport a nt e ressaltar que a mãe, o pai ou o r e s p o n s á v e l s ã o s e m p r e b em-vindos e d e v e m e s t a r p r e s e n t e s , nã o só em reuniões ou festas do calendário letivo. É importante se aproximar dos pais, conscientizá-los por meio de momentos formativos, afinal são em momentos como este que comunicamos o trabalho que está sendo feito. D e s t a f o r m a , é p o s s í v e l q u e t oda s a s partes tenham voz e ajam dentro dos s e u s l i m i t e s , r e s p e i t a n d o o luga r do outro. No cotidiano da vida escolar, vão revelando crenças, valores e c o s t u m e s . A c r i a n ç a p a s s a a receber influência de ambas as instituições e a influenciá-las também. Assim, é f u n d a m e n t a l q u e a e s c o l a e a f a mília se alinhem às necessidades do aluno, colocando estes como foco principal. Sabemos que existem desafios a serem enfrentados, mas quando o b i n ô m i o f a m í l i a -e s c o l a e s t á a linha do e m t o r n o d e u m m e s m o o bjet ivo, os la ç os s e for ta lec em . As s im , a brem-se n o v o s h o r i zo n t e s e p o s s i b i lida des de melhora no desempenho acadêmico e social do aluno e da atuação na escola p a r a o p o r t u n i za r e s s e r e s u lt a do.

Viviane Flores Diretora educacional da Rede Marista de Colégios (RMC) www.colegiosmaristas.com.br


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RACISMO, INFÂNCIA E ESCOLA: A QUEM SERVE ESTE DEBATE? Desenho dado de presente. De acordo com uma criança esta sou eu (mesmo não sendo loira). Segundo a criança, “loira eu fico muito mais bonita”.Folha A4, caneta hidrocor e lápis de cor, 2014*.

S

ou professora da rede es t adual de S ão Paulo desde 20 07 da disciplina de Sociologia e passei por vários segmentos na área da educação (professora de Ensino f undament al e médio, o trabalhei com adolescentes na Fundação Casa, como formadora de profe s s ore s e coordenadore s na Dir. de Ensino de Osasco, e atualmente como for madora de ge s tore s e s cola re s e e duc a c ionais em um prog rama de alcance nacional que visa melhorias na e d u c a ç ã o d e di v e r s o s m uni c í p io s pelo Brasil). A temática racismo me chamou a

a t e n ç ã o e m 2 010 q u a n d o t r a b a l h e i com assessor ia pedagógic a e for ma ç ão de professora de creches e EMEIs em Os asco. A par tir des te momento percebi que as cr ianç as negras rece biam um tratamento diferenciado das professoras, sobretudo quando envolvia o trato com os cabelos c re sp o s (que e ram p e n tea do s sis te mática e dolorosamente nos f inais da tarde, antes da mãe chegar para busc ar). Todas as cr ianç as (branc as e n e g r a s) p a s s a r a m p o r e s t e r i t u a l , porém, as negras sem dú v ida sofriam mui to mais com a e xper iência , pois , de acordo com as normas padrões das

professoras e da cultura escolar, crianç as negras de c abelo crespo deveriam se enquadrar nas nor mas da branqui tude. A inda que as professoras , coordenadoras não falassem sobre isso comigo de maneira explicita isso e s t a v a da d o n e s t e s m o m e n to s e e m t an to s o u t ro s . Eu , e n quan to mulh e r, professora e pesquisadora branca t ambém só f ui atent ar a isso uma vez qu e m e u o lhar foi re f ina d o p ara t al , pois , nunc a sof r i es se t ipo de agres s ão na minha v ida pessoal. Por isso é impor t ante um ref inamento do olhar (que pass a por um letramento racial). Par tindo des te cenário, desenvolvi uma disser t aç ão de mes trado conclu ída n o a n o d e 2016 n a Fa c ul da d e d e Educação da USP dentro de uma escola públic a na cidade de S ão Paulo, com cr ianç as de 4 e 5 anos. Busquei com preender como as cr ianç as lidam com o racismo e utilizei os desenhos como ar tefatos culturais para aproximar d e s t a r e a l i d a d e. Pa r a t a n t o, r e a l i ze i um trabalho de obser vação que durou 18 meses, cujo alguns result ados compar tilho nes te mater ial.

1 Letramento racial refere-se a um termo semelhante ao letramento na alfabetização. Profissionais da educação teriam maior sensibilidade e empatia para lidar com as diferenças no que tange as questões étnico raciais caso conheçam e se apropriem dos debates raciais que estão acontecendo na contemporaneidade. A partir daí será possível identificar e pensar sobre nossas atitudes racistas (e naturalizadas) do dia a dia e parar de reproduzir isso com as crianças e com seus pares.

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“As conversas sobre os cabelos com as meninas se toraram tão im p ortantes para pensar e escrever sobre a questão é tn i c o -r a c i a l q u e n ã o poderiam passar “em branco”, mereceram um capítulo inteiro para que a que st ão fos se p roblematizada de modo mais aprofundado. “

F o to d e E y e f o r E b o n y d o Un s p l a s h

Desenvolvimento - A nalis ar as repre sentações sobre negros e negras encontradas em desenhos elaborados por crianças da educação infantil, pode indic ar que di ver sos elementos fundamentais para o debate étnico racial, este para além das minhas expec t ati vas , ex trapolavam as barrei ras das representações gráf icas – apontando para outros caminhos como o que diz respeito à relação entre as crianças, as quais exibem pontos de vista e maneiras de compreender e express ar o que é ser negro e negra, que transpõem os traçados deixados sobre papel; de como os cabelos p o s s u e m u m a r e p r e s e n t a ç ã o i m p o rt ante dentro e fora dos traç ados grá f icos; e como a atuaç ão da escola e da professora da turma (que era uma pro fessora negra e ati va dentro do mov i mento negro) pesquisada andavam em dissonância, quando o assunto tratava de ques tões étnico - raciais. A temática dos cabelos foi uma das questões fundamentais, sobretudo p ara as m e ninas . Tan to nas image ns gráf icas, quanto na relação entre elas, nas br inc adeiras com seus pares e na relação com adultas e adultos do e sp aço. E s te elemento nos mos t rava com nitidez que seria um dos mais impor t antes ícones no entendimento acerc a do que as cr ianç as compreen diam sobre ques tões étnico -raciais, estando em muitos momentos no centro das discussões e das obser va -

ções

do

trabalho

de

campo.

Outra questão importante que aparece de maneira constante é o não preenchimento da cor da pele nos desenhos colet ados. Isso pode inferir que para as cr ianç as não é necess á rio pint ar a cor da pele em seus dese n h o s , p o r a c r e d i t a r e m q u e a co r j á está ali subentendida – o branco – pois o próprio papel branco já é o pre enchimento da cor da pele nos dese nhos de uma sociedade que se bran queia socialmente. Es te debate sobre a suposta neutralidade do branco está presente nos estudos sobre branqui t ude (como já ci t ado acima) , e que se referem, essencialmente, ao imens o p e s o s ocial implíci to de que brancos não per tencem a alguma raça, mas são o padrão a ser seguido. Os desenhos estão em conjugação com as histórias contadas pelas crianç as ao realizá - los , por t anto, obser vei em diversas vezes as mesmas não dando impor t ância a pint ar a cor da pele, ou quando quer iam fazê - lo, uti liz avam o famoso “ lápis cor de pele ” para o preenchimento. A cor da pele e o c abelo revelam -se como elemen tos signif ic ati vos ao toc ante da pesquis a.192 desenhos foram colet ados dos quais 92 trazem a temática c abelos lisos e apenas 3 contém pre enchimento da cor da pele em mar rom. Es tes números indic am que

não s ão apenas coincidências quando as cr ianç as fazem, major it ar iamente, traçados de cabelos lisos em seus desenhos ou não preenchem a cor de pele. A s conver s as sobre os c abelos com as meninas se toraram t ão impor t antes para pensar e escrever sobre a questão étnico -racial que não poderiam passar “em branco ”, mereceram um c apítulo inteiro para que a ques t ão fosse pro b l e ma t iz a da d e m o d o ma is a p rof un d a d o. O s d e s e n h o s , c o m p r e e n d i d o s como ar tefatos culturais, indicaram de maneira incisi va como as represent a ções de negras e negros ainda merecem mais atenç ão sejam em posteriores pesquisas ou com o olhar a ten to de profe s s oras e profe s s ore s em suas práticas cotidianas, sendo necessário sua inclusão nas escolas de e duc aç ão infant il p ara s erem pens a das de maneira trans versal e cotidiana. A penas se elei t a pau t a pr ior i t ár ia podemos come ç ar a pens ar em superar o caráter racista de tão import ante ins tituiç ão. Em b o r a m u i to s p e n s e m q u e d is c u t ir questões étnico-raciais no Brasil es teja superado (de v ido à per sis tên cia do mito da democracia racial na a t u a l i d a d e) , r e a l i z a r u m a p e s q u i s a cuja proposta investigativa esteve No cot idiano e s colar mais amplo, ou seja, no res t ante do cor po docente e discente, o diretor e f uncionár ios da


Æscola Legal | Nº03 | Abr 2020 centrada nas crianças de 4 e 5 evidenciou que questões étnico-raciais não se cons tituíram como temá tica relevante e generalizada na E M E I p e s q u i s a d a: s e j a n a s r e l a ç õ e s entre elas, ou ainda na obser vação sobre o que elas desenham. Modif icar esse quadro atual, no Brasil, to r n a - s e in d is p e ns á v e l p e l o r a c is m o estrutural com o qual convivemos diar iamente. Nes te trabalho di ver s as questões se entrelaçam, e algumas delas ganharam des t aque pela for ma em que aparecem ao longo des t a disser t aç ão. De for ma mais ev idenciada cit amos três , a s aber, o racismo ins ti tucional, o qual se ref lete nas repre sentações dos desenhos das crianças; o modo como o cabelo crespo das cr ianç as negras s ão compreendi dos dentro e fora da turma pesquisada e a maneira como a Lei 10.639\ 20 03 foi, ou não, efeti vada dentro da EMEI. A s que s tõ e s co l o c a das n e s te e s t u d o remetem, por t anto, ao tr ipé (patr iarc a l , r a c i s t a e c a p i t a l i s t a) , n o q u a l nossa sociedade foi fundada e cuja ordem atual es t á assent ada. Numa tentativa de subver ter esta ordem essencialmente desigual, ao longo da pesquis a, f iliei - me às lógic as que busc am a contes t aç ão e supera ção de tais estruturas. A s crianças foram ou v idas como informantes legítimas, a par tir das quais seria possível

“Não é justo, nem tampouco eficaz, que a responsabilidade dessas mudanças profundas de p endam unicamente da ação de docentes conscientes e engajados na luta antirracista.“ identif ic ar como a socializ aç ão infan til acontece dentro de uma sociedade racista, patriarcal e capitalista. A s crianças, sujeitos que of icialmente não es t ão inseridas no sis tema capit alista de maneira rígida (por não produzirem) , além de es t arem sob cuidados cons t antes - na maior ia das vezes de mulheres , sejam elas mães e no c aso do ambiente escolar de profes soras mulheres e especif ic amente da tur ma pesquis ada professoras negras. A s p r á t i c a s p e d a gó g i c a s a f r o ce n t r a das realizadas pela professora da turma obser vada se constituem em uma pedagogia antirracis ta que no contex to da EMEI é t ambém solit ár ia, uma vez que, apenas ela e a professora do período da manhã es t avam atent as e comprometidas com a efeti vaç ão da L e i 10 . 6 3 9 / 0 3 n o c o t i d i a n o e s c o l a r. Desta maneira, ela não trabalha

apenas em datas especiais dedicadas ao combate ao racismo (como por e xemplo o 20 de Novembro – D ia da Consciência Negra), e sim em todos os dias , inclusi ve levando sua bibliotec a par ticular para dentro da s ala. A f igura de professora heroína, se por um lado, mos tra o quanto iniciati vas simples e individuais podem questionar/modi f ic ar dinâmic as f undadas em preconcei tos at áv icos , por outro, denota que a lei não é efetiva, pois não se tornou (ainda) norma, diretriz geral na e s cola inteira . Por is s o, é imp ort ante que noss a análise não se limite ap enas a um tom celebra t i vo de s s as in i c ia t i v a s c r ia t i v a s e t r a ns f o r m a d o r a s d e p o u co s p r o f e s s o r e s , p o i s , n o f im das cont as , t al v iés respons abiliza únic a e indi v idualmente os professo res no combate ao racismo no âmbito e s c o l a r, t a n t o n o q u e s e r e f e r e a o s conteúdos e também a socialização de cr ianç as negras e branc as. Ora, se a escola se cons tituiu his tor ic amente como uma ins tituição racis t a e na qual apenas a epis temologia eurocêntr ic a era e é valorizada, cabe também à escola combater o racismo ins titucio nal e contr ibuir ati vamente na for ma ção de cidadãos. Não é justo, nem tampouco ef ic az , que a respons abilidade dessas mudanças profundas dependam unic amente da aç ão de docentes conscientes e engajados na lut a antirracis t a. F o to d e b r u c e m a r s d o Un s p l a s h

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Æscola Legal | Nº03 | Abr 2020 EMEI pesquis ada e não encontramos indícios de efeti vaç ão da propos t a da referida lei. Neste sentido, no contexto da não aplicação da lei 1 0 . 6 3 9 \ 2 0 0 3 n a u n i d a d e e s c o l a r, m e s m o i n i c i a t i v a s i s o l a d a s co m o d a professora pesquis ada s ão prejudic a das. O racismo ins titucional prejudic a iniciativas individuais, pois estas acabam tornando -se “ilhas ” antirracist as numa ins tituiç ão racis t a. Como o exemplo de uma menina negra que foi de c abelo solto para a escola e passou por uma situaç ão cons tran ge d o r a: a p ó s co n s e g u i r o re s p e i to a seus cabelos crespos, dentro da turma, a menina (ao pis ar para fora da s ala) foi hostilizada por funcionárias e pelas outras crianças. A ssim, es t a “ ilha ” que se faz presente na tur ma da s ala pes quisada, tende a submergir aos poucos, desaparecendo eventualmente, pois , a falt a de apoio e incen ti vo por par te da ges t ão escolar tende a gerar desânimo e frustração ou mesmo um cer to isolamento no que se refere à relaç ão da professora com o res t ante do corpo docente porque, na m a i o r i a d a s v e ze s , e l a é v i s t a co m o uma das “professoras chat as ”, que só falam do mesmo assunto. Vale ress al t ar que esse aspec to nada mais é do que outro sintoma de que o problema do racismo não é v is to como um pro blema coleti vo o qual dever ia interess a r a t o d a c o m u n i d a d e e s c o l a r. Considerando que at ualmente e x is te far to mater ial que auxiliam os prof issi o n a is da e d u c a ç ã o n o p ro ce s s o d e seu próprio letramento racial e indicam variadas estratégias para a efet i vaç ão da Lei 10.6 39, concluímos que não é por falt a de supor te peda gógico ou acesso à conteúdos concernentes à África e ao afro -brasileiro. No âmbito da escola inves tigada, cons t a t amos que a omiss ão dos ges tores da EMEI foi a pr incipal c aus a para que a temát ic a ét nico - racial fos se esc amo teada naquela comunidade escolar. No tocante à infância esse estudo t ambém des vendou cer t as for mas de compreender o mundo a par tir de uma supos t a neutralidade que, por muit as vezes , paut am t anto a ideia de infân cia pura , que não e s t á cone c t ada ao que acontece na sociedade, quanto para perceber que o racismo

ins t i t ucional p o de imp a c t ar e con di cionar a vida social desde muito cedo. Impondo lugares a serem ocupados hierarquicamente por crianças e adultos, negros e brancos. Mesmo assim, as cr ianç as busc am, no seu dia a dia, saídas para compreender tal realidade, transgridem e reagem de diversas maneiras quando o mundo oferece espelhos nos quais muit as não conse guem se en xergar. A par tir do uso de cer tos termos, de compor tamentos que apont am para padrões es téticos únicos que aprisionam e violentam cr ianç as cujos processos de subjeti v i dade a par tir de uma auto -imagem des valorizada considerada errada, falhada s ão impac t ados de modo v io lento e cr uel desde a pr imeira infân cia. Embora atualmente poss amos ver movimentações em coletivos de mulheres negras que têm promov ido desloc amentos no toc ante à compre ens ão do que é ser mulher negra no Brasil, o c aso da EMEI analis ada é um indício de que t al compreens ão ainda não per pass a as diferentes es feras e setores sociais brasileiros a ponto de atingir as meninas da referida escola. Dentre di ver sos desenhos colet ados e conver sas com as crianças foi possível compreender que ainda não existe uma representatividade da f igura negra que seja satisfatória para meninos e meninas de 4 e 5 anos. Es te trabalho que valor iz a a obser vaç ão, o olhar e os relatos das cr ianç as como informantes legítimos para tecer o panorama de como as ques tões étni co -raciais estão sendo tratadas dentro da ins tituiç ão educ acional, revela que para além de boas prátic as exercidas por docentes como a professora supracit ada, elas não devem ser isoladas da ins tituição, pois não consolidam, a Lei 10 . 6 3 9 \ 2 0 0 3 n a p r i m e i r a e t a p a d a educ aç ão básic a, falhando, por t anto, na superaç ão do racismo brasileiro. Co n s i d e r a ç õ e s f i n a i s - D i a n t e d e s t e cenár io, é impor t ante parar mos para p ens ar a quais a tore s s o ciais dent ro

“No âmbito da escola investigada, constatamos que a omissão dos gestores da EMEI foi a princip al caus a para que a temática étnico-racial fosse escamoteada n a q u e l a co m u n idade escolar.“ da escola interessam pensar sobre ques tões étnico raciais? Professoras e professores negros (apenas) necess a riamente precisam dar conta desta temátic a de maneira isolada? Qual é a parcela de corresponsabilidade de pessoas brancas (sobretudo que es tão a frente da gestão escolar e em espaços for mati vos) de coloc arem em paut a es t a temátic a dentro das s alas de aula, nos espaços for mati vos junto a professoras e professores e na abord a g e m c o m a c o m u n i d a d e e s c o l a r? Para além de uma educ aç ão inclusi va é preciso pensar em uma educação antirracis t a, pois , es te é um problema de toda a sociedade: de quem pratic a e de quem sofre o racismo. Minha experiência (como professora, ges tora e f o r m a d o r a d e ge s t o r e s e s c o l a r e s) que es t a ainda é uma temátic a ex tre mamente invisibilizada , de menor impor tância ou que só interessa a quem sofre com isso. A pesquisa cit ada nes te ar tigo foi realiz ada entre os anos de 2013 e 2014 , uma época em que hav ia um outro contex to político no âmbito municipal, estadual e federal. O cenário político atual indica uma intenção de deslegitimar o debate étnico-racial, porém, como houve avanços até o presente momento, retroceder t al vez não seja uma opç ão v iável.

Ana Carolina B.A. Farias Mestra em Sociologia pela USP. Professora do Ens. médio da Rd Pública de SP. anacarolsa@gmail.com


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IPCA

(ÍNDICE DE PREÇOS AO CONSUMIDOR AMPLO)

VOCÊ SABE O QUE É INFLAÇÃO? EDUCAÇÃO E ECONOMIA

N

o dicionário de etimologia – que explica como se formam as p a l a v r a s (d e r i v a ç ã o, j u s t a posiç ão, etc) e de onde vêm (or igens la t inas , g re gas , persas, árabes, orientais, e t c) o t e r m o i n f l a ç ã o v e m d e i n c h a r, i n f l a r, e n t r e outras definições. E no dicionário comum, aquele que diz o que c ada palav ra significa, inf lação é, em s e n t i d o e c o n ô m i c o , p o rtanto o que impor ta aqui e agora, o desequilíbrio carac terizado pela alta de p r e ço s e p e l a d e s v a l o r i z a ç ã o da m o e da – o cor ren do ao mesmo tempo. Ela se calcula a par tir dos dados e result antes de pesquis as co mp ar a t i v a s f e i t as em períodos específ icos sobre as variações que os

preços dos produtos de consumo sofrem em função de fatores que, em tese, fogem do controle humano. Em seguida se faz uma análise do valor e da c apacidade da moeda corrente – nosso c aso o Real – de comprar aqueles produtos – com a mesma quantidade de dinheiro (a moeda) o consumidor continua comprando a mesma quantidade de deter minado produto? Eis o fator índice de var iaç ão de preços (I V P). A base para a escolha dos produtos e ser viços que vão compor a cesta de consumo do IPC A - e que terão seus preços monitorados para o c álculo do índice - é a Pesquis a de O rç amen tos Familiare s ( P O F ) . É e la que apura os i tens mais consumidos pela populaç ão e quanto do rendimento familiar é gas to em c a da um de le s . “ Ent ão, a quele s i tens q u e tê m ma is p e s o n o o rç a m e n to da s f a m í lia s v ã o e n t r a r com mais força no cálculo da inf lação” diz Gus t avo V it ti, para comp or o ín dice IP C A que mensura a ele v aç ão dos c us tos das famí lias que ganham de um a 4 0 s alár ios , desde 198 0. Des t a for ma, conv ido o leitor a ler com atenç ão es t a t abela e ver quais s ão os produtos que ele consome com regular i dade e que es t ão presentes na lis t a de suas necessidades ,

de seu dia-a- dia. O entendimento é básico – se não e s t á na lis t a nã o tem con t role de pre ços , e p or t an to, sua var iaç ão não impac t a os c álculos do índice. F eijão e a r r oz , p o r e xe m p l o , n ã o e s t ã o n a l i s t a , p o d e m s e r a s s i m co n s i d e r a d o s v i l õ e s e c a u s a r r o m b o s n o o r ç a mento das famí lias , as sim como c ar ne s (e xce to p i c a n h a e c u p i m) e o v o s , p ã e s e l e i t e , a ç ú c a r, c a f é , m a c a r r ã o co m u m , e n e n h u m j o r n a l v a i co m e n t a r (o u s e j a , s e m p r e d i r ã o q u e a i n f l a ç ã o e s t á c o n t r o l a d a) . A ques tão é: com base em quais cr itér ios de realidade, necessários e suf icientes, este conjunto de fatores e produtos entrou na composição desta cesta, e se ele ref lete, verdadeiramente, a condição de vida de grande par te da população brasileira e seus hábitos reais de consumo de acordo com seus ganhos mens ais , mas que vê seu poder de compras diminuindo cada vez mais, sem que haja a reposição efetiva destes. Fonte: IBGE - ht tps:// w w w.youtube.com/ watch? v =LYokQ7iTsI0&fea ture = youtu.be

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GOVERNANÇA ECONÔMICA UMA PEDAGOGIA DA ECONOMIA POR UMA ECONOMIA A SERVIÇO DO BEM COMUM

O

mundo está mudando rapidamente, estamos evoluindo para um novo sist e ma de o r ganizaç ão e c o nô m i c a e social. O que se torna evidente, é a busca de novos caminhos. O Papa Francisco chamou uma reunião mundial para março 2020, na linha da Economia de Francisco*¹, visando uma economia que volte a nos servir . Jun t ar am- se já A ma rtya S e m , J o s e p h Stiglitz, Mohammad Yunus, Jeffrey Sac h s, Ka te Ra wo rth e o utro s no m e s de primeira linha mundial. Em setembro, 181 das maiores corporações mundiais, Amazon, Johnson&Johnson, Apple e outros gigantes, firmaram um pacto de mudança de rumos, com o c om pr o misso de pa s s ar a re s p e i tar o meio-ambiente, o interesse dos trabalhadores e das comunidades e assim por diante. Em outubro 130 bancos de grande porte assinaram um compromisso semelhante em seis eixos, basicamente visando servir a economia real. A OCDE está elaborando um primeiro pacto, o BEPS (Base Erosion and Profit Shifting), que permita ter algumas regras de jogo básicas na economia m un dial. A busca de no vo s c am i nho s é hoje geral. Como escreve Paulo K liass , há um cheir o d e m ud anç a no ar.

razoavelmente distribuído, asseguraria 3700 dólares por mês por família de quatro pessoas, e q ui val e n t e s a 15 m i l r e a i s . O Br a s i l esta precisamente nesta média mundial, não há nenhuma razão econômica para não assegurarmos uma vida digna e confortável para todos. Nosso problema não é de capacidade de produção, e sim de s ab e r o q u e p r o d u zi m o s , p a r a q u e m , e com que impactos ambientais. O grand e d e s a f i o é o d a g o v e r n a n ç a d o s i s te m a.

O “Norte” é relativamente claro. B usc amo s uma eco n o m i a q ue s e j a a serviço do bem comum, o que implica que seja economicamente viável, mas também socialmente justa e ambientalmente sustentável. Este triplo objetivo define um novo equilíbrio e uma outra forma de organizaçã o . O pro b l e m a não é o d e falta de recursos. No mundo se produz anualmente 85 trilhões de bens e serviços por ano, o que,

O mundo que enfrentamos se caracteriza por crescente e dramática d e s i g ual d a d e , c o m 1% d e t e n d o m a i s riqueza do que os 99% seguintes, e 26 famílias com mais do que a metade mais pobre da população, 3,8 bilhões de pessoas. No Brasil 6 famílias ac um ul ar a m m a i s r i q u e za d o q u e o s 105 milhões na base da pirâmide. A desigualdade atingiu níveis eticamente, politicamente e economicamente insustentáveis. Os

206 bilionáros do Brasil têm um patrimônio de 1,2 trilhão de reais em 2019, isso que representam 0,00001% da população. São essencialmente manejadores de bancos, fundos, p a r t i c i p a ç õ e s , h o l d i n g s f i n a nceira s e outras formas de acumulação financeira, contam-se nos dedos os que efetivamente produzem algo. A desigualdade está explodindo no m u n d o , e p a r t i c u l a r m e n t e no B ra sil. No plano ambiental, a mudança climática, a liquidação da vida nos mares e em terra – perdemos 52% dos vertebrados em apenas 40 anos – a perda de cobertura florestal, a c o n t a m i n a ç ã o q u í m i c a g e n era liza da , a poluição da água doce, a inundação dos plásticos e tantos outros p r o c e s s o s d e s t r u t i v o s e s t ã o leva ndo a uma catástrofe ambiental generalizada. E não se trata de futuro distante, está acontecendo. A destruição da Amazônia em curso representa um aspecto apenas do drama global.


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“ Te m o s , a s s i m , d e enfrentar o duplo desafio da redução da desigualdade, portanto de uma democratização da economia, e da redução do ritmo de destruição da base natural da nossa sobrevivência, evoluindo para uma economia circular sustentável. “ Temos, assim, de enfrentar o duplo d e safio da r eduçã o d a d e s i g ual d ad e , p ort a nto de uma de m o c rati z aç ão d a ec ono mia , e da reduç ão d o ri tm o d e d e st ruiçã o da ba se natural d a no s s a sobrevivência, evoluindo para uma economia circular sustentável. O nosso Titanic planetário tem esses d ois i ceber gs pela f re nte , m as q ue m está pilotando o navio são alegres banqueiros, bêbados de dinheiro, gritando “Greed is Good”, como vimos em Wall Street. Até eles, aparentemente, estã o ac o rd and o . Sab e mo s o que deve s e r f e i to : o s 1 7 objetivos do desenvolvimento su st e ntáv el ( Agenda 2 0 3 0 ) o d e f i ne m claramente. Temos os recursos financeiros: apenas nos paraísos fisc ais , o s 20 tr ilhõ es d e d ó l are s q ue re su lta m de evasão f i s c al , c o rrup ç ão e lavagem de dinhei ro , re p re s e ntam 200 vezes os 100 bilhões que na Conferência de 2015 em Paris se decidiu alocar para as políticas ambientais. Temos grande riqueza de informações sobre cada problema do p lan eta , o s dr amas es tão l o c al i z ad o s e q ua ntifica do s. E tem o s tam b é m as tecnologias que hoje permitem transitarmos para outras matrizes de transporte, de energia, e dos próprios processos produtivos. Não é, p ort a nto , po r falta de m e i o s q ue no s afundamos, e sim pelas deformações p olít icas de co mo ge ri m o s as no s s as ec ono mia s. A quest ão c e ntral é um a questão de poder. No poder estão justamente os grupos que estão gerando o s pro blemas .

Assim, o desafio está no próprio processo decisório, em como definimos, regulamos e orientamos o uso dos nossos recursos. A economia te m d e vo l t a r a s e r v i r o b e m c o m u m . Não se trata de elencar as nossas desgraças, mas de nos concentrarmos nos desafios organizacionais, de governança, que permitam resgatar os rumos, de parar de destruir o p l ane ta em p r o v e i t o d e u m a m i n o r i a que acumula capitais improdutivos. A mudança de rumos, ou resgate do mínimo necessário, pode ser d e s e nhad a e m a l g u n s p o n t o s c h a v e :

1) Democracia econômica: trata-se de resgatar a governança corporativa, sistemas transparentes de informação, e de gerar maior equilíbrio entre o Estado, as corporações e as organizações da sociedade civil. Não haverá d e m o c rac i a p o l í t i c a s e m d e m o c r a c i a econômica. A desigualdade, a partir de um certo nível, torna as s o c i e d ad a d e s i n g o v e r n á v e i s . 2) Democracia participativa: os processos decisórios sobre como definimos as nossas opções, como priorizamos o uso dos nossos recursos, não podem depender ap e nas d e u m v o t o a c a d a d o i s o u a cada quatro anos. Com sistemas adequados de informação, gestão descentralizada e ampla participação da sociedade civil organizada precisamos alcançar um outro nível de racionalidaded na organização econômica e social. As novas tecnologias abrem imensos potenciais q ue s e tra t a d e e x p l o r a r . 3) Taxação dos fluxos financeiros: essencial para assegurar a informação sobre os capitais especulativos, e para que os recursos financeiros sirvam para financiar tanto a redução da desigualde como para estimular processos produtivos sustentáveis. Na re al i da d e o s s i s t e m a s t r i b u t á r i o s no seu conjunto devem servir ao maior equilíbrio distributivo e à p ro d uti vid a d e m a i o r d o s r e c u r s o s . A política tributária constitui uma das principais ferramentas de resgate dos e q ui l í b ri o s . 4) Renda básica universal: no quadro

de uma visão geral de que algumas coisas não podem faltar a ninguém, uma forma simples e direta, em p a r t i c u l a r c o m a s t é c n i c a s moderna s de transferência, é assegurar um mínimo para cada família. Não se trata de custos, pois a dinamização do consumo simples na base da sociedade dinamiza a economia, restabelecendo o equilíbrio o r ç a m e n t á r i o , c o m o s e v i u no B ra sil e em outros países. 5) Políticas sociais de acesso universal, público e gratuito: o acesso à saúde, educação, cultura, segurança, habitação e outros itens básicos de sobrevivência devem fazer parte das prioridades absolutas. Não se trata de custos, e sim de investimentos nas pessoas, que dinamizam a produtividade e liberam recursos das famílias para outras formas de consumo. O acesso aos b e n s p ú b l i c o s d e c o n s u m o colet ivo é tão essencial como o dinheiro no bolso. 6) Desenvolvimento local integrado: somos populações hoje essencialmente urbanizadas, e o essencial das políticas que asseguram o bem-estar da comunidade e o manejo sustentável dos recursos naturais deve ter raízes em cada município, construindo assim o equilíbrio econômico, social e ambiental na própria base da

“A economia tem de voltar a ser vir o bem comum. Não se trata de elencar as nossas desgraças, mas de nos concentrarmos nos desafios organizacionais , de governança, que permitam resgatar os rumos, de parar de destruir o planeta em proveito de uma minoria que acumula capitais improdutivos. “

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Æscola Legal | Nº03 | Abr 2020 sociedade. O Brasil, com 5.570 municípios, não pode ficar esperando d e c isõ es de nív el mi ni s te ri al , e o nd e fu n c io nam, as po líti c as p úb l i c as s ão fort e mente descentr al i z ad as . 7) Sistemas financeiros como serviço público: o dinheiro que manejam os sistemas financeiros tem origem nas nossas poupanças e impostos, constituem recursos do público, e neste sentido devem responder às necessidades do desenvolvimento sustentável. Bancos públicos, bancos comunitários, cooperativas de crédito e outras soluções, como moedas virtuais diversificadas, são essenciais para que as nossas opções tenham os recursos correspondentes. Os atravessadores financeiros e comerciais paralizam o desenvolvimento, como estamos ve n d o no Brasil no s úl ti m o s 5 ano s . 8) Economia do conhecimento: o conhecimento hoje constitui o principal fator de produção. Sendo imaterial, e indefinidamente reproduzível, podemos gerar uma sociedade não só devidamente informada, mas com acesso universal e gratuito aos avanços tecnológicos mais avançados. Temos de rever o conjunto das políticas de patentes, copyrights, royalties de diversos tipos que travam desnecessariamente o acesso a o s a vanço s. O c o nhe c i m e nto é um fator de produção cujo uso, contrariamente aos bens materiais, n ão reduze o esto que . 9) Democratização dos meios de comunicação: os recentes avanços do populismo de direita e a erosão dos processos democráticos mostram a que ponto o oligopólio dos meios

de comunicação gera deformações insustentáveis, climas de acerbamento de divisões e aprofundamento de ódios e preconceitos. Uma sociedade informada é absolutamente essencial para o próprio funcionamento de uma economia a serviço do bem comum. Tanto a i n d ú s t r i a d e f a k e -n e w s c o m o o fake-jornalismo da grande mídia comercial têm de dar lugar à informação aberta e diversificada. 10) Pedagogia da economia: a economia consiste essencialmente em regras do jogo pactuadas pela sociedade ou impostas por grupos de interesse. A democracia econômica d e p e nd e v i t a l m e n t e d a c o m p r e e n s ã o genralizada dos mecanismos e das regras. Os currículos obscuros e falsamente científicos têm de ser substituídos por ferramentas de

análise do mundo econômico real, de maneira a formar gestores competentes de uma economia v o l t a d a p a r a o b e m c o m u m. Os pontos acima constituem eixos de mudança para uma outra economia, m a s n ã o p a r t i m o s d o ze r o . I númera s e x p e r i ê n c i a s p e l o m u n d o a fora , com bancos ou sistemas produtivos organizados em cooperativas, dinâmicas de colaboração como a Wikipédia, publicações e pesquisas com acesso aberto, iniciativas de economia solidária, já constituem um acervo sobre o qual podemos construir o novo. O espírito geral é de que nesta pequena espaço-nave terra, todos somos, de uma forma ou outra, tripulantes, ainda que alguns s e j u l g u e m p a s s a g e i r o s d e luxo.

Ladslaw Dowbor Formado em Economia Política pela Universidade de Lausanne, Suiça - Doutor em Ciências Econômicas pela Escola Central de Planejamento e Estatística de Varsóvia, Polônia (1976). Professor titular no departamento de pós-graduação da PUC/São Paulo, nas áreas de economia e administração. Consultor das Nações Unidas, governos, municípios, e Senac. Conselheiro na Fundação Abrinq, Instituto Polis e outras instituições. www. dowbor.org *¹ https://ecofranbr.org/ Economia de Francisco - Assista online pelo Canal da TV Puc : - 18 de novembro – abertura e mesas: https://www.youtube.com/watch?v=z6A0MEG-xi8&t=2646s - 19 de novembro – mesas da manhã: https://www.youtube.com/watch?v=F5G5zjcbETg&t=1657s


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BRASIL PRECISA DE

EMPREENDEDORES

E A ESCOLA PODE AJUDAR MUITO principalmente educar e capacitar essa imensa massa de brasileiros desvalidos , para que poss am ter e admin is trar o seu próprio empreendimento.

A penas para incorporar o contingente de jovens que vai entrar no merc ado de trabalho nos próximos cinco anos s erá n e ce s s ár io gerar 6 0 milh õ e s de novos empregos. E isso acontecerá em um momento em que a grande maioria das empres as es t ará preocupada em reduzir custos e eliminar mão- de- obra. Uma forma inteligente para se resolver esse dilema é es timular a c apacidade empreendedora do brasileiro dando lhe condições de cr iar e manter o seu própr io negócio, ev it ando que ele vá tentar se colocar como empregado nas grandes ou médias empresas. Mas, para isso, muit a cois a precis a mudar no mundo das p e quenas e micro em pres as e no mundo da Educ aç ão. A começ ar pelo fato de que hoje nada menos que 75% dos novos empreen dimentos brasileiros sucumbem em menos de cinco anos. Algo errado está acontecendo com o universo d e 7, 8 m ilh õ e s d e m i c ro e p e q u e na s e m p re s a s q u e s ã o 9 9,1% d o tot a l d e empres as regis tradas no Brasil. Pois , apesar delas gerarem 53 milhões d e e m p r e go s , s ã o r e s p o n s á v e i s p o r apenas 27 % do nosso Produto Interno

Br uto (PIB). Esse índice é um dos mais baixos do mundo. Na grande maior ia dos países elas têm uma par ticipaç ão muito maior e, na It ália e na Espanha, por exemplo, respondem por mais de 6 0 % dos respec ti vos PIBs. Mesmo na A mér ic a L atina a média é de 35% . S e olharmos para sua par ticipação nas n o s s as e x p o r t a çõ e s o s núm e ro s s ã o ainda piores: enquanto na Itália as micro e p e quenas empre s as re sp on dem por 43% destas expor tações, no Brasil elas são responsáveis por apenas 1, 2% . O momento econômico no Brasil é muito ruim: o desemprego atinge mais 12 m i l h õ e s d e p e s s o a s , e s e co n s i d erar mos os que já nem emprego pro curam mais e os que trabalham por cont a própr ia, mas de for ma absolu tamente precária, chegamos a 4 4 milhões de pessoas. Alguém ainda acredita que seria possível gerar empregos para todos esses excluídos que queremos incorporar à nossa eco n omia? A s aída e s t á e m de s e nvo l ve r o e m p r e e n d e d o r i s m o. I s s o s i g n i f i c a eliminar a burocracia, facilitar o acesso ao crédito, reduzir taxas de juros, mas,

Nosso ensino médio precis a ser ade quado aos novos tempos e considerar que hoje é mui to raro o prof is sional que pode dispensar conhecimentos de ges tão ou de adminis tração de empre s as. Ent ão, por que não incluímos no currículo mínimo do ensino médio disciplinas que deem ao jovem uma formação básica em assuntos como contabilidade, es tudos de mercado, ges t ão de RH , conceitos de lideranç a e empreendedor ismo? Nossos jovens deveriam sair do colegial estimulados a criar suas próprias empres as e já tendo adquir ido os conceitos m í n i m o s p a r a t a l . I s s o é co m u m e m vários países europeus como Itália, Grécia e Espanha. Essa formação s er ia ú t il não ap enas p ara e s t imular o sent ido empreendedor dos jovens , co m o t amb é m o s c ap a c i t ar ia a t rab alhar como adminis tradores , se es se fo r o s e u de s ejo n o f u t uro, t an to na grande como na pequena empres a. Segundo o SEBR AE* tem divulgado já há a lg um te m p o a p r in c ip a l ra z ã o p a r a a a l t a m o r t a li da d e da p e q u e n a empresa brasileira é justamente a m á ge s t ã o e o d e s c o n h e c i m e n t o d o e m p r e s á r i o e m r e l a ç ã o a co m o u m a empre s a de ve s er a dminis t rada . S ão conhecimentos muito básicos para quem estudou administração como f luxo de caixa, cont abilidade de cus tos , es tudos de merc ado e outros , mas que precisam ser obtidos por quem v ai c uidar de empre s as . Como os países mais avançados resolveram es t a ques t ão? Coloc ando es tes temas no curriculum do ensino médio. O u s e ja , o j o v e m a n te s d e e n t r a r n a Uni ve r sida d e, já ap re e n d e co n ce i to s de empreendedor ismo e ges t ão.

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“...a crise é mundial e decorre em grande parte dos avanços tecnológicos que eliminam necessidade de mão-de-obra como os robôs, as impressoras 3D e o uso intenso da inteligência artificial. Essas tecnologias tornam o ser humano desnecessário em inúmeras atividades. Esta é uma razão importantíssima para que o jovem na faixa dos 15 aos 20 anos passe a adquirir conhecimentos profissionais básicos...”

O fato é que não apenas o Brasil atravess a uma cr ise sér ia em relaç ão ao mundo do trabalho: a crise é m u n d i a l e d e co r r e e m g r a n d e p a r t e dos avanços tecnológicos que eliminam necessidade de mão de obra com o os rob ôs , as impre s s oras 3 D e o u s o i n t e n s o d a i n t e l i gê n c i a a r t i f i c ia l . E s s a s t e c n o l o g ia s to r n a m o s e r humano de sne ce s s ár io em inúmeras a t i v i da d e s . E s t a é u m a r a z ã o i m p o rt antíssima para que o jovem na faixa d o s 15 a o s 20 a n o s p a s s e a a d q uir ir conhe cimentos prof is sionais b ásicos

que o habilitem a poder trabalhar quando for ao mercado de trabalho que es t ará c ada vez mais res tr iti vo. O desconhecimento de técnicas de ges t ão de empres as e a falt a de apoio às pequenas e micro empresas são c a u s a s i m p o r t a n te s p e l a s q ua is te m aument ado mui to o número de trab alhadores precários em nosso país. O que acontece é que muitas das pessoas que perderam seus empregos nes tes últimos 4 anos de recess ão ou c re s c im e n to p í f io o p t a ra m p o r t ra b alhar cone c t ados aos A pps . É o c as o dos motoristas de UBER , entregadores de comida e t antos outros que ac abam engross ando a mass a de tra b a lh a d o re s p re c á r i o s e m n o s s o p a ís que já atinge a c as a dos 3 0 milhões de pessoas. Poder iam ter opt ado p o r e m p re e n d e r, m a s p a r a is s o p re cisariam ter os conhecimentos básicos e claro, ser ia impor t ante que exis tissem es t ímulos e incent i vos para que a pessoas se sentissem es timuladas a abr ir uma nova empres a.

no dia do Professor foram anunciados os nomes dos vencedores do Prêmio N o b e l d e Eco n o m ia e o in te re s s a n te é que os 3 vencedores s ão economist as que pesquis aram a relação entre a educ aç ão das cr ianç as e a superaç ão d a p o b r e z a e m p a ís e s co m o Q u ê n i a e Í n d ia . A co m p a n h a r a m a s c r ia n ç a s p o r m a i s d e 2 0 a n o s e co n f i r m a r a m o que todos desconf iavam mas ainda nunca havia sido comprovado por uma pesquis a empír ic a: quanto o melhor o ní vel de escolar idade e aprendiz ado das cr ianç as melhores opor tunidades de trabalho elas encontraram. Essa cons t at aç ão tem muito a ver com es te n o s s o a r t i go p o i s a n o s s a p r o p o s t a é que através do ensino adequado d a s t é c n i c a s b á s i c a s d e ge s t ã o e d e empreendedor ismo iremos conseguir fazer com que nosso país passe a ser um impor t ante prot agonis t a mundial na área de pequenas e micro empre sas. A economia brasileira es t á es t agn a d a h á p e l o m e n o s 5 a n o s . Vá r i a s medidas tem sido tent adas , mas não sur tiram efeito. Não seria a hora de se apostar na força da pequena empresa?

No último mês de Outubro, justamente

Paulo Feldmann - Doutor e Professor da Faculdade de Economia da USP. Foi presidente do Conselho da Pequena Empresa da Fecomércio SP. paulo.feldmann@fia.com.br *https://www.portaldoempreendedor.gov.br/parceiros/sebrae

QUER E MPREE NDER?

F

aça de forma segura. Realize um teste para entender suas vocações e se conhecer melhor https://testevocacionalgratis.com.br/como-fazer-teste-vocacional/

Mas, antes de se lançar como empreendedor organize bem as suas ideias – faça um mapa mental do que quer, onde conseguir, por onde caminhar, com quem caminhar, como e quanto investir, onde conseguir investimentos e outras dúvidas que surgem e que requerem respostas c oe re ntes par a seu e m p re e nd i m e nto . C o nve rs e c o m q u e m p o d e t e a j u d a r . Acesse neste link um software que pode te ajudar muito aqui: h t t p s: // freemind.br .s o f to ni c .c o m /

Rita de J. Leria Aires - Psicoterapeuta Individual\Casal e Família – Mediadora de Conflitos – CRP 06-6399/SP – Cel.: (11) 9 4891 3910 – Rua Augusto Tolle, 767 – Cj 202- Santana/SP http://ritaairespsicologasp.wordpress.com


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A CAMPANHA

R

eafirmando o compromisso de implementação da Década Internacional de Afrodescendentes, ( h t t p s : // w w w . d e c a d a - a f r o - o n u . o r g / ) o S i s t e m a ONU Brasil lançou no Mês da Consciência Negra de 2017, a c ampanha nacional “ V idas Negras ”.

Acesse:

A iniciativa busca ampliar, junto à sociedade, gestores públicos, sistema de Justiça, setor privado e movimentos sociais, a visibilidade do problema da violência contra a juventude negra no

“ Q uando o gênero, a raç a , a et nia , a clas se, a religião ou crenç a, o s t atus de migraç ão ou outros moti vos de

país. O objetivo é chamar atenção e sensibilizar para os impactos do racismo na res tr iç ão da cidadania de pessoas negras , inf luenciando atore s e s t ratég icos na produç ão e apoio de ações de enf rent amento da discr iminaç ão e v iolência.

NÃO PERMITA QUE O RACISMO DEIXE A JUVENTUDE NEGRA PARA TRÁS

h t t p s : // v i d a s n e g r a s . n a c o e s u n i d a s .o r g /

Para ter aceso aos documentos da UNICEF sobre a condição das mulheres e d a s m e n i n a s n e g ra s n o B ra s i l a c e s s e : h t t p s : //d e c a da - a f ro - o n u .o r g /d o c um e n t s . sh t m l

discr iminaç ão se encontram e se cr uz am, cr iam intr in c a das re de s de pr i v aç ão, de ne gaç ão de direi tos , que impedem, minam e opr imem. Nes t a dinâmic a sórdida, muit as mulheres e meninas af rodescendentes s ão mais p r o f u n da m e n t e a f e t a da s . P r e c i s a m o s t o m a r m e d i da s urgentes para pôr f i m a ess as injus tiç as...”

No Brasil, sete em cada dez pessoas assassinadas são negras. Na faixa etária de 15 a 29 anos, são cinco vidas perdidas para a violência a cada duas horas. De 2005 a 2015, enquanto a taxa de homicídios por 10 0 mil habit antes teve queda de 12% para os não -negros, entre os negros houve aumento de 18,2%. A letalidade das pessoas negras vem aument ando e is to exige polític as com foco na superaç ão das desigualdades raciais. S e g u n d o d a d o s d i v u l g a d o s p e l o U N I C E F e m 2 0 14 : ( h t t p s : //s e c u r e . u n i c e f. o r g . b r/c a m p a n h a s / i h a -2 014 / ) , d e cada mil adolescentes brasileiros, quatro vão ser assass i n a d o s a n t e s d e c o m p l e t a r 19 a n o s . S e n a d a f o r f e i t o , serão 4 3 mil brasileiros entre os 12 e os 18 anos mor tos de 2015 a 2021, três vezes mais negros do que brancos.

Da redação de Æscola Legal

ELA CRIOU O EMPREGUEAFRO PARA CAPTAR VAGAS PARA NEGROS E “MUDAR O SISTEMA”

A

Empregueafro é uma consultoria de recur sos humanos exclusiva para o público negro. A demanda surgiu há cerca de seis anos, quando as empresas referências dos mais diversos mercados começaram a perceber seus quadros internos e perceberam a necessidade de incluir negros, homossexuais , transexuais e pessoas com def iciência, entre outros gr upos sociais minor it ár ios e minor iz ados. - ht tps: // w w w.geledes.org.br/ela - cr iou - o - empregueaf ro - para - c apt ar-vagas- para - negros- e - mudar- o -sis tema / - ht tps: // w w w.uol.com.br/uni ver s a /noticias /redac ao/ 2020/01/0 6 /ela - cr iou - o - empregueaf ro - para - c apt ar- vagas - para - negros- e - mudar- o -sis tema.htm

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M APA DA DESIGUALDADE DE SÃO PAULO - C APITAL (2019) Aces se a ve r s ã o digit al com to dos os da dos a qui: h t t p: // w w w. a e s c o l a l e g a l . c o m . b r/m a p a d e s Mais do que conhecer a sua cidade, seus distritos e bairros, os locais onde você vive, estuda, trabalha e se diverte, importa procurar entender as razões, os motivos históricos, políticos, psicossociais e econômicos que conduziram a maior cidade da América do Sul a estas condições, e, fundamentalmente, pensar em como se integrar de forma coerente com forças progressistas e democráticas para resolvê-las.

P

ublicado desde 2012, o trabalho consiste no levantamento d e um a s é ri e d e i nd i c ad o re s d e c a d a um dos 96 distritos da capital, em 32 subprefeituras*¹

(que em teoria têm o papel de receber pedidos e reclamações da população, solucionar os problemas apontados; preocupam-se com a educação, saúde e cultura de cada região, tentando sempre promover atividades para a população. Além disso, elas cuidam da manutenção do sistema viário, da rede de drenagem, limpeza urbana, vigilância sanitária e epidemiológica, entre outros papéis que transformam, a cada dia, essas regiões da cidade e m loca is mais hum ani z ad o s e c he i o s d e vi d a) , d e m o d o qu e s e po ssa co mpa rar d ad o s e ve ri f i c ar o s l o c a i s m a i s desprovidos de serviços e equipamentos públicos. Em muitos casos, a enorme distância entre o melhor e o pior indicador – que determina o “Desigualtômetro” que aparece nas páginas de cada tema – dá uma boa dimensão dos desafios que precisam ser superados. O mapa utiliza fontes públicas e oficiais - Contribui para a e labo raçã o de po l í ti c as p úb l i c as q ue vi s am a r e d u ç ã o das D E S IGUALD AD E S - Tra z d ad o s s o b re o s 9 6 d i s t r i t o s da capital - Auxilia a gestão e o planejamento municipal Preenche uma lacuna na difusão de informações - Aborda 53 indicadores nas várias áreas da administração pública - Identifica prioridades e necessidades da população em seus distritos - Amplia o conhecimento sobre os territórios da cidade. A Partir dos seguintes indicadores sociais: População - Meio Ambiente - Segurança Viária - Direitos Humanos - Habitação - Saúde - Educação Cult ur a - E spo rte - Trab al ho e R e nd a. É, p o r tant o , u m a ferramenta indispensável para entender, planejar e resolver a s questõ es d a c i d ad e .C ad a um d o s 9 6 di s t r i t o s da ca pital é um peque no “m uní c i p i o ” - o m ai s p o p u l o s o Cam po Limpo , co m 6 0 7 m i l e 1 0 5 hab i tante s , s e g u i d o d e

VOCÊ PRECISA CONHECER. PARTICIPE. A CIDADE É SUA! Capela do Socorro com 594 mil e 300 habitantes. Os dois, isoladamente, são maiores do que muitas cidades médias d o e s t a d o ( d a s 645 c i d a d e s c o n h e c i d a s , a p e n as dez sã o maiores do que os 2 maiores distritos da capital*²). O m e n o s p o p u l o s o é o d i s t r i t o d e P a r e l h e i r o s c o m 139 mil e 441 h a b i t a n t e s .

Jorge Abrahão – Rede Nossa São Paulo - Coordenador Geral https://www.nossasaopaulo.org.br/2019/10/16/mapa-da-desigualdade-2019-sera-apresentado-em-novembro/ *¹ https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/subprefeituras/subprefeituras/dados_demograficos/index.php?p=12758 *² https://www.ibge.gov.br/cidades-e-estados/sp.html


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FÓRUM ECONÔM ICO MUNDI AL

DAVOS SE PREPAR A PAR A A JUDAR A L A NÇ AR UM A NOVA DÉC ADA

O

fundador e presidente executivo do Fórum Econômico Mundial convocou todos os participantes e parceiros do fórum a se comprometerem a alcançar as emissões líquidas de carbono zero no mais tardar em 2050. Em carta en viada po r Klaus Sc hw ab d e s tac a o tom urgente da reunião deste ano, que visa implementar medidas concretas para um mundo coeso e sustentável. A mudança ocorre quando os stakeholders do Fórum im plementa m uma s é ri e d e m e d i d as para promover as agendas sociais e ambientais Para mais informações, visit e www.wefo rum.o rg. Davos-Klosters, Suíça, 20 de janeiro de 2020 - O fundador e presidente executivo do Fórum Econômico Mundial, escreveu uma carta (veja abaixo) a todos os participantes e parceiros do fórum, pedindo-lhes p ara enfr entar a que s tão urg e nte d a m u d a n ç a c l i m á t i c a , comprometendo-se a zero com emissões de carbono até o mais tardar em 2050. O movimento acontece dias antes do início da Reunião Anual do Fórum Econômico Mundial 2020, que se reúne sob o tema Stakeholders por um Mundo Coeso e Sustentável. Na carta, Schwab disse: “A oportunidade e a necessidade de empresas e investidores mostrarem liderança em mudanças climáticas são mais eminentes do que nunca.” Ele acrescentou que o compromisso de enfrentar a questão urgente das mudanças climáticas também está alinhado com o imperativo dos st akeho lder s do Ma ni f e s to d e D avo s 2020 ( https:// www.w e f o rum . o rg /the davos-manifesto/manifesto),

documento divulgado pelo Fórum em dezembro, descrevendo o novo conceito de capitalismo na era moderna. O ano de 2020 marca o quinto aniversário do Acordo de Paris (https://www.politize.com.br/acordode-paris/ ) sobre as mudanças climáticas. No entanto, os anos anteriores foram marcados pelo baixo desempenho nos níveis governamental e empresarial na implementação de políticas de descarbonização. A s o l i c i taç ã o d e S c h w a b c o n s t i t u i r á u m elemento-chave para discussões entre cada setor e grupo comunitário na Reunião Anual, com a esperança de dar impulso aos esforços contínuos dos líderes governamentais, empresariais e financeiros no início d e s ta d é ca d a c r í t i c a . Espera-se que várias iniciativas sejam l anç ad as o u a v a n c e m n e s t a s e m a n a :

1. Relatório ESG: Um desafio comum para empresas que buscam agir sobre o clima é a falta de um padrão de medição aceito globalmente. A comunidade internacional de negócios, com 140 participantes, se reúne nesta semana para revisar e adotar propostas que possam levar a questão climática para um outro p atam ar. 2 . A l i a nça Ne t -Z e r o A s s e t Owners: Uma coalizão de investidores institucionais com quase US $ 4 tri l hõ e s s o b g e s t ã o s e c o m p r o m e t e u a mudar suas carteiras para emissões líquidas zero até 2050. Os p arti c i p an t e s d a a l i a n ç a s ã o a l g u m a s das maiores seguradoras e fundos de pensão do mundo. A aliança fará uma atualização das suas atividades durante uma coletiva de imprensa em

“O relatório também observa que, entre os governos, apesar de 121 terem declarado uma ambição de atingir a meta em 2050, apenas sete até agora desenvolveram a e strutu ra p o lític a necessária para que isso acontecesse.“ Davos. 3. Plataforma possível de missão: uma parceria público-privada destinada a ajudar indústrias que dependem fortemente de c o m b u s t í v e i s f ó s s e i s - c o m o a via çã o, marítimo, caminhões, produtos químicos e ferro e aço - a fazer a transição para um futuro líquido zero. Os diretores executivos dessas indústrias se reunirão em Davos para discutir as intervenções de tecnologia, financiamento e políticas necessárias para uma transição de baixo carbono. 4. 1t.org: (https://www.1t.org/) Enquanto a batalha contra as mudanças climáticas só pode ser vencida a partir de mudanças sistêmicas nos setores financeiro, industrial e de energia, é possível obter apoio vital no esforço de reduzir os níveis de gases de efeito estufa na a t m o s f e r a c o m a a d o ç ã o d e soluções baseadas na natureza. Para apoiar isso, uma nova plataforma, 1t.org, será lançada para coordenar e ampliar os esforços para plantar ou restaurar 1 trilhão de árvores até o final da d é c a d a .

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A Reunião Anual do Fórum Econômico Mundial 2020 ocorre de 21 a 24 de j a n e i r o e m D a v o s -K l o s t e r s , na Suíça . A reunião reúne cerca de 3.000 líderes globais da política, governo, sociedade c i v i l , a c a d e m i a , a r t e s e c u l t u ra , a lém da mídia. Os participantes se concentrarão na definição de novos modelos para a construção de s o c i e d a d e s s u s t e n t á v e i s e i nclusiva s em um mundo plurilateral.

A CARTA

Foto de Evangeline Shaw do Unsplash

De acordo com o Net Zero Challenge,um relatório publicado p e lo Fó r um E co nô mi c o M und i al e s te mês, 7.000 empresas no mundo agora divulgam voluntariamente dados relacionados ao clima. No entanto, destes, apenas uma pequena maioria adotou metas baseadas na ciência que visam combater as mudanças climáticas. O relatório também observa que, entre os governos, apesar de 121 ter em d e c l arad o um a am b ição de a tingir a m e ta e m 2 0 5 0 , apenas sete até agora desenvolveram a estrutura política necessária para que isso acontecesse. Embora o p rogresso a té o mo m e nto te nha s i d o inegavelmente insuficiente, o relatório também constatou que vários CEOs agora veem a ação climática como uma oportunidade. As notícias do setor privado até o momento parecem apoiar isso, com vários anúncios feitos na semana passada, incluindo: A Blackrock, a maior administradora de ativos do mundo, anunciou uma nova estratégia q ue c o lo ca o clima n o c e ntro d e s ua estratégia de investimentos, com

planos para, entre outras coisas, encerrar investimentos com alto risco relacionado à sustentabilidade. A M i c ro s of t r e v e l o u u m a a m b i ç ã o d e atingir emissões líquidas zero até 2 0 3 0 e c o mp e n s a r t o d a s a s e m i s s õ e s q ue p ro d u zi u e m t o d a a s u a h i s t ó r i a até 2050. A Nestlé anunciou que i nve s ti rá ma i s d e U S $ 2 b i l h õ e s e m uma mudança para embalagens sustentáveis de qualidade na sua l i nha al i me n t a r . “A i nd a é mu i t o c e d o p a r a f a l a r s o b r e p o nto s d e i n f l e x ã o , m a s 2020 t r o u x e consigo uma mudança perceptível no momento em que as empresas re c o nhe c e m q u e a s u a c o n t i n u i d a d e a longo prazo depende delas tomarem ações coletivas e decisivas sobre o c l i m a. A pr i o r i d a d e d a Re u n i ã o An u a l é transformar essa energia em um movimento, não apenas dos que adotam precocemente essa estratégia, mas de toda a comunidade empresarial”, disse Dominic W aughray , d i r e t o r a d m i n i s t r a t i v o d o Fó rum Ec o n ô m i c o M u n d i a l .

O F ó r u m E c o n ô m i c o M u n d i a l pede a t o d o s o s p a r t i c i p a n t e s d e Da vos que estabeleçam uma meta climática l í q u i d a ze r o · A m u d a n ç a c l imá t ica é um tópico importante em Davos 2020. · Os l í d e r e s d e a l g u m a s d a s ma iores empresas do mundo estarão lá. · O anfitrião da Reunião Anual convida todos a estabelecer a meta de 2050 de emissões líquidas zero. Todas as e m p r e s a s q u e v e m p a r a D a v os f ora m convidadas a se comprometerem a a t i n g i r e m i s s õ e s l í q u i d a s d e ca rbono zero até 2050 ou antes. Em uma carta enviada aos líderes da empresa a caminho da cúpula na Suíça, Klaus Schwab, fundador e presidente executivo do fórum, e os chefes do Bank of America e da Royal DSM, dizem que a reunião deste ano é uma oportunidade perfeita para mostrar liderança na mudança climática. Enquanto o mundo continua a aquecer, as emissões de gases de efeito estufa continuam a aumentar em 1,5% ao ano, enquanto devem cair d e 3 a 6% a o a n o e n t r e a g o r a e 2030, para limitar o aquecimento global a 1,5-2 ° C, segundo ao Painel Intergovernamental de Mudanças C l i m á t i c a s . A a ç ã o c l i m á t i c a será um tema-chave da reunião deste ano, com o título de uma sessão colocando o desafio sem rodeios.

Assessoria de Imprensa Pavel Osipyants - Zurich Insurance Group - para AEscolaLegal


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UMA DÉCADA DE ESTATÍSTICA NA USP SÃO CARLOS: CURSO GANHA DESTAQUE NA ERA DA CIÊNCIA DE DADOS Cri a d o p a r a su p rir a cre sce nte d e m a n d a d o m e rc a d o d e tr a b a lh o p o r e s t atí s ticos , o B a ch a re l a d o e m E s t atí s tic a d o I CM C co m p let a 10 a n os e m s into n i a co m re ce nte s m u d a n ç a s n a á re a; e n co ntro co m e m o r ati vo se r á re a liz a d o n os d i a s 25 e 26 d e o utu b ro

c o bi ç a do s pe l o m e r c a do de t ra ba lho.

Acho que a beleza da estatística é que seu alcance é ilimitado, assim como a maioria das ciências. Mas, para mim, tem um significado especial: estatística é sobre a incerteza que governa a natureza. Pode ser usada para pedir uma pizza ou modelar o preço de uma ação no mercado”. É assim que Helton Graziadei define o significado da estatística, uma área com a qual teve contato ao ingressar na primeira turma do c u rso de Bachar elado e m Es tatí s ti c a,

fez com que os departamentos de e s tatí s ti ca n o m u n d o r e f o r m u l a s s e m a estrutura dos cursos de graduação, incluindo conhecimentos mais sólidos em programação e inteligência arti f i c i al . É m u i t o i m p o r t a n t e o IC M C ter sido pioneiro no Brasil a fazer essa modificação no curso”. Helton se refere à alteração na grade curricular do curso oferecido pelo Instituto. A partir do ano que vem, serão adicionadas disciplinas específicas a fim de preparar os alunos para os

oferecido pelo Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) d a U S P, em S ão Car l o s , d e s d e 2 0 0 9. Diferentemente da maioria de seus c ole ga s de turma , q ue e s tão atuand o em empresas nos mais diversos ramos de atividades, Helton optou por seguir carreira acadêmica: completou o mestrado no Instituto de Matemática e Estatística (IME) da USP, onde, agora, faz doutorado. Nesses dez anos, ele viu acontecer mudanças relevantes no campo da estatística: “ A área se reno va co ns tante m e nte e quem não se atualiza corre o risco

d e s af i o s d a e r a d a c i ê n c i a d e d a d o s . A m ud an ç a i m p a c t o u a t é o n o m e d o curso, que, a partir de 2020, passará a se chamar Bacharelado em Estatística e Ciência de Dados. A reformulação e s tá e m s i n t o n i a c o m o n o v o c e n á r i o te c no l ó g i c o , q u e e s t á m o d i f i c a n d o a f o rm a c o m o n ó s n o s r e l a c i o n a m e n t o uns com os outros e com o mundo a nosso redor. Nos últimos anos, c ad a s e r h u m a n o c o m u m d i s p o s i t i v o móvel em mãos se tornou um produtor de dados, os quais são gerados em velocidade, volume e variedade cada vez maiores. Não é à toa que, hoje, aqueles que sabem

de perder a dinâmica da profissão. O surgimento da ciência de dados

e xtrai r c on h e c i m e n t o s ú t e i s a p a r t i r desses dados tenham se tornado tão

Já em 2009, o grupo de professores do ICMC que escreveu o projeto político-pedagógico do Bacharelado em Estatística vislumbrava que as instituições de ensino superior não d a v a m c o n t a d e f o r m a r a qua nt ida de necessária de profissionais para atuar nesse campo. “A crescente p r o c u r a p o r e s t a t í s t i c o s n o merca do de trabalho em diversas áreas, tais como indústrias, instituições financeiras, empresas de pesquisa de mercado, instituições governamentais e de pesquisa relacionadas à saúde humana, agricultura e pecuária, entre outras, foi a principal motivação para a proposta de criação de um curso d e Ba c h a r e l a d o e m E s t a t í s tica ” , lê-se no projeto. Depois de 10 anos, a d e m a n d a s ó a u m e n t o u e a t endência é que continue a crescer nos próximos anos. “Em 2009, essencialmente eram as grandes instituições que tinham banco de dados de seus clientes e baseavam suas decisões nas análises estatísticas desses dados. Hoje, mesmo as pequenas empresas dispõem de dados sobre seus produtos e públicos com os q u a i s s e r e l a c i o n a e b u s c a m a na lisá los para tomada de decisões”, diz Mariana Cúri, uma das professoras que contribuiu para a criação do c u r s o d e E s t a t í s t i c a n o IC MC. “As grandes massas de dados disponíveis hoje requerem profissionais preparados para analisar e interpretar informações presentes em problemas de diferentes naturezas. Nesse cenário, as melhores soluções costumam surgir a partir da cooperação entre estatísticos e p r o f i s s i o n a i s d a á r e a d e c omput a çã o e isso justifica as mudanças

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c u rricula res”, diz a pro f e s s o ra C i b e l e Russo, que atualmente coordena o c u rso de Estatística d o I C M C . “A s s i m , a p ropo sta é ter um p ro f i s s i o nal q ue d om ine ta nto as técni c as e s tatí s ti c as quanto algoritmos eficientes e eficazes, considerando custos computacionais e diversas outras variáveis, para extrair de forma ótima as informações dos dados”, completa a professora. Cibele usa um exemplo do cotidiano para explicar o p apel do esta tísti c o : “S e vo c ê e s tá cozinhando, é comum pegar uma colher para experimentar a comida. Estatisticamente, o que você está fazendo? Ora, está retirando uma amostra e, a partir dessa pequena quantidade de alimento, vai conseguir inferir se toda a comida da panela está boa ou não”. Usando ferramentas est at í stica s, o pr o fis s i o nal c o ns e g ue , a partir de uma a m o s tra, e xtrap o l ar os resultados obtidos a toda a p op ulaçã o . Amadurecimento – “Se olhar para m im 10 ano s a trás e o q ue s o u ho j e , considerando o que evoluí como ser humano, o que aprendi, o que amadureci, todas as dificuldades e também as voltas por cima, verá o q uanto isso tudo imp ac to u na m i nha vida. S e nã o fo sse tod a e s s a hi s tó ri a, eu não seria quem sou, não faria o que faço, não teria o que tenho. Então, o que mudou? Mudou tudo para melhor”. É assim que José Fernandes de Almeida Junior resume o significado de sua trajetória no ICMC. Hoje, ele atua como estatístico na empresa Cred-System Administradora de Cartões de Crédito. Assim como o curso mudou a vida de José, os alunos e suas diversas demandas também ajudaram a lapidar o próprio curso. Ao longo desses 10 anos, o ICMC formou um total de 75 alunos estatísticos e, hoje, 173 estudantes estão matriculados no curso. Nesse tempo, diversos acontecimentos contribuíram para o aprimoramento do projeto colocado em prática em 2009. Entre os principais marcos dessa trajetória está a criação, em 2013, do Programa Interinstitucional de PósGraduação em Estatística, resultado de uma união de esforços entre o

ICMC e o Departamento de Estatística da Universidade Federal de São Carlos ( UF S C ar) . Os p r o j e t o s d e m e s t r a n d o s e doutorandos contribuíram para f o rtal e c e r o s g r u p o s d e p e s q u i s a e m e s tatí s ti c a d a s d u a s i n s t i t u i ç õ e s . Dois anos depois, no dia 5 de dezembro de 2015, aconteceu a primeira edição do Encontro de Experiências em Estágios e Projetos. A iniciativa, criada para propiciar o compartilhamento de informações sobre estágios e projetos, entre alunos e ex-alunos do c urs o , p a s s o u a s e c h a m a r E n c o n t r o de Experiências em Estatística. Este ano, em comemoração aos 10 anos do Bacharelado, haverá uma edição especial do evento, nos dias 25 e 26 de outubro, no auditório Fernão Stella de Rodrigues Germano (sala 6-001) do ICMC. Para participar, b as ta s e i n s c r e v e r e p a g a r a t a x a d e inscrição por meio deste link: icmc. us p . b r/e / 0f d d 1. Ou t r o f a t o m a r c a n t e dessa história foi a realização da Semana da Estatística em 2016. A iniciativa já era tradicional na UFSCar e estava em sua sexta edição, mas foi apenas em 2016 que a comissão organizadora do evento, composta apenas por estudantes, resolveu convidar os alunos do ICMC para p arti c i p ar . R e s u l t a d o : d e s d e e n t ã o , a S e m ana d a E s t a t í s t i c a é r e a l i za d a e m conjunto pelos estudantes da UFSCar e do ICMC. No ano seguinte, em 2017, foi lançada a primeira chamada do Núcleo de Estatística Aplicada (NEA). Desde 2009, a semente do Núcleo constava no projeto do curso, no entanto,

para germinar, era preciso contar com estudantes e pesquisadores p r o n t o s p a r a t r a b a l h a r e m projet os. O cenário se concretizou em 2017, quando o NEA passou a desenvolver soluções estatísticas para problemas apresentados por empresas, fundações, indústrias, instituições de maneira geral, do setor público ou privado, assim como de pesquisadores ou pessoas físicas. “Nosso objetivo é levar problemas reais da sociedade para que nossos alunos possam resolvêlos, sob a orientação do professor, interagindo com o pesquisador e usando a metodologia estatística adequada a cada caso”, explica a professora Mariana Cúri. O ano de 2017 t a m b é m m a r c o u o i n í cio do uso de uma metodologia alternativa de ensino e aprendizagem em algumas d i s c i p l i n a s d o c u r s o d e E s t a t íst ica : o Problem Based Learning (PBL). Com o método, professores trouxeram p a r a a s a l a d e a u l a c a s o s rea is a fim de que os estudantes debatessem e i n v e s t i g a s s e m p o s s í v e i s s o luções. P o r ú l t i m o , e m 2018, o c u r so pa ssou a oferecer uma ênfase em ciência de dados. Com o crescimento da demanda por uma formação específica, o ICMC decidiu ampliar o escopo do curso e adicionar mais disciplinas de programação – a b a r c a n d o o e n s i n o d a l i n gua gem de programação Phyton e de técnicas de aprendizado de máquina, por exemplo. Resultado: a partir de 2020, o s a l u n o s q u e i n g r e s s a r e m no curso se tonarão Bacharéis em Estatística e Ciência de Dados.

www.icmc.usp.br/e/ac6b3

Denise Casatti – Assessoria de Comunicação do ICMC/USP Mais informações: VI Encontro de Experiências em Estatística do ICMC: icmc.usp.br/e/0fdd1 Site do curso de Estatística do ICMC: www.icmc.usp.br/graduacao/estatistica-bacharelado Leia mais sobre a área de ciência de dados: https://www.icmc.usp.br/noticias/4525-faltam-profissionais-no-mercado-usp-oferece-curso-emestatistica-e-ciencia-de-dados


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CIÊNCIA E TECNOLOGIA | ENGENHARIA AERONÁUTICA

MAIS RÁPIDO DO QUE UMA BALA Pesquisadores brasileiros desenvolvem veículo aéreo que se deslocará em velocidade hiper sônica

Modelo de laboratório do vant 14X (foto: Léo Ramos Chaves)

S

e tudo correr como planejado, a Força Aérea Brasileira (FAB) realizará dentro de dois anos, no máximo (graças aos incentivos e recursos destinados pelo governo até 2015), o ensaio em vôo do primeiro m ot or aero ná utico hi p e rs ô ni c o f e i to no país. O teste integra um projeto mais amplo cujo objetivo é dominar o ciclo de desenvolvimento de ve íc u lo s hipersô nico s , q ue vo am , no mínimo, a cinco vezes a velocidade do som, ou Mach 5. Mach é uma unidade de medida de velocidade correspondente a cerca de 1.200 quilômetros por hora (km/h). O programa é coordenado pelo Instituto d e Estudo s A vançado s ( I EA v) , um d o s centros de pesquisa do Departamento d e Ciência e Tecno lo g i a A e ro e s p ac i al (DCTA) da FAB, em parceria com a empresa Orbital Engenharia, ambos d e São Jo sé do s Ca m p o s ( S P ) . Além do motor hipersônico, o projeto Propulsão Hipersônica 14-X (PropHiper), iniciado em 2006, prevê a construção de um veículo aéreo não tripulado (vant), onde o motor será instalado. Batizado de 14-X, em homenagem ao 14-Bis,

o vant empregará o conceito de waverider, no qual uma onda de choque gerada abaixo dele, em razão de sua alta velocidade, lhe fornece sustentação. É como se, durante o vôo, o veículo “surfasse” na o nd a i n d u zi d a p o r e l e . “Ainda não há aeronaves hipersônicas em operação rotineira no mundo. Essa tecnologia simboliza o estado da arte mesmo para países como Estados Unidos, Rússia e China”, informa o coronel Lester de Abreu Faria, engenheiro eletrônico e diretor do IEAv. “Todos buscam esse conhecimento e, apesar do longo tempo de desenvolvimento, não estamos muito atrás d o s l í d e r e s m u n d i a i s . ” De acordo com Israel Rêgo, engenheiro espacial e gerente do projeto PropHiper, o motor hipersônico em desenvolvimento no país, do tipo scramjet (supersonic combustion ramjet), também poderá ser empregado como segundo ou terceiro estágio de propulsão de foguetes – e s s e s ve í c u l o s e s p a c i a i s s ã o d o t a d o s de vários estágios (ou motores), acionados sucessivamente ao longo

VANT 14-X Comprimento 4 m Envergadura 1 , 2 m Peso cerca de 750 kg Velocidade 12.000 km/h Altitude de voo 30.000m a 40.000m d o v o o . N o p r i m e i r o e n s a i o, previst o para 2020, o motor scramjet será instalado em um foguete de sondagem d o In s t i t u t o d e Ae r o n á u t i c a e E spa ço (IAE), unidade do DCTA voltada ao desenvolvimento de tecnologias para o s e t o r a e r o e s p a c i a l . O p r ojet o t eve a p o i o d a F AP E S P . Já o veículo aéreo hipersônico i n t e g r a d o a o m o t o r s c r a m j et poderá ser usado como avião de passageiros ou para fins militares. Em 2018, Rússia e China testaram com sucesso os mísseis hipersônicos Avangard e Xingkong-2, respectivamente. Nos Estados Unidos, a Lockheed Martin está construindo um veículo h i p e r s ô n i c o p a r a v o o a M a ch 6. Desde o início do projeto, já foram investidos R$ 53 milhões no 14-X, programado para voar a Mach

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B a t i z a d o d e 1 4 -X , em homenagem ao 14-B is , o vant empregará o conce ito d e wave ri d e r, no qual uma onda de choque gerada abaixo dele, em razão de sua alta velocidade, lhe fornece sustentação. É como se, durante o voo, o veículo “surfasse” na onda induzida por ele.

10 (12 mil km/h) (infográfico). “Metade do tempo do programa destinou-se à capacitação de pessoal e à implantação da infraestrutura laboratorial, com destaque para o t únel de cho que hipe rs ô ni c o T3 o nde são feitos os ensaios aerodinâmicos*, c ont a Rêgo . “O gran d e s al to ag o ra é ‘sair’ do laboratório e operacionalizar em voo as tecnologias do waverider e do mo tor.” Alguns desafios, no entanto, ainda precisam ser superados. O primeiro é a finalização do scramjet. Assim como os motores de jatos comerciais, o scramjet usa o ar da atmosfera para a queima do combustível. No entanto,

ao contrário dos motores dos aviões, o do 14-X não tem partes móveis, como compressores e turbinas. “Na combustão supersônica, o ar capturado deve ser desacelerado, pressurizado e aquecido antes de entrar na câmara de combustão, onde é injetado o combustível. E isso depende da perfeita g e o m e tri a d o m o t o r ” , d i z R ê g o . Outra dificuldade do projeto é fazer com que o veículo resista ao atrito gerado pelo voo à velocidade hipersônica. “As partes que sofrem maior aquecimento por fricção com o ar devem ser feitas de materiais resistentes a altas temperaturas,

Projeto - Investigação experimental preliminar em combustão supersônica (nº 04/00525-7); Modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular; Pesquisador responsável Paulo Gilberto de Paula Toro (IEAv); Investimento R$ 2.206.289,32. *Pesquisa FAPESP nº135 https://revistapesquisa.fapesp.br/2019/01/10/mais-rapido-do-que-uma-bala/ Especial para a revista AEscola Legal

e n q u a n t o a s m a i s f r i a s d e v em ser de aço ou alumínio aeronáutico”, explica o coronel Marco Antônio Sala Minucci, engenheiro aeronáutico e consultor de h i p e r s ô n i c a d o p r o j e t o 14-X. Por fim, é preciso fazer a perfeita i n t e g r a ç ã o e n t r e o m o t o r e o veículo hipersônico, já que o arrasto (força contrária ao deslocamento) no voo hipersônico é muito alto. “A parte frontal do veículo deve funcionar como entrada de ar [no motor], produzindo sua compressão, enquanto a parte traseira deve operar como uma tubeira, transformando a alta temperatura e a pressão da câmara de combustão supersônica em empuxo. Assim, o motor e o veículo tornam-se indistinguíveis, atingindo velocidades de voo extremamente a l t a s ” , c o n t a Is r a e l Rê g o .


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BIOLOGIA – CIÊNCIA/VIDA

USP LIDERA FORÇA-TAREFA PARA DESCOBRIR AS CONEXÕES ENTRE AS ESPÉCIES D o is p rofe s so re s d a U S P se u n ir a m a p e sq u is a d o re s b r a s i le iros e e s tr a n g e iros p a r a co n s tr u ir u m n ovo m o d o d e co m p re e n d e r a te i a d a v i d a; e s tu d o p o d e r á p reve r co n se q u ê n ci a s d e d e s a s tre s e co ló g icos co m o o q u e e s t á o co rre n d o n o N o rd e s te d o B r a s i l . aves, os corais e os demais animais que habitam as áreas contaminadas do litoral do Nordeste ao longo de muitos anos. Ora, eles poderiam utilizar as mesmas ferramentas empregadas no estudo sobre morcegos e plantas. Assim, seriam c a p a ze s d e p r e v e r a s c o n s equência s que o óleo traria à teia da vida nordestina, incluindo aí os seres humanos.

O

que leva um grupo de pesquisadores das instituições mais qualificadas d o planeta a se unire m p ara e s tud ar morcegos e suas relações com plantas? As descobertas desses cientistas – à primeira vista, sem muita importância – ganharam as páginas de uma das revistas mais relevantes do mundo nas áreas de ecologia e evolução, a Nature Ecology & Evolutio n *¹. Para compreender o trabalho dessa forç a - tar efa da ciênc i a, f o rm ad a p o r d ois pro fesso r es da US P e m ai s o i to pesquisadores, três brasileiros e cinco estrangeiros, basta esquecer os morcegos e as plantas (temporariamente), e pensar no desastre ecológico que está ocorrendo agora no lito r al do N o rd e s te . H o j e , é impossível calcular as consequências que o óleo pode trazer ao ecossistema d a região . No enta nto , o i m p ac to d a contaminação poderia ser calculado se ho uv esse um ba nc o d e d ad o s c o m informações sobre os animais que vivem no lo ca l bem c o m o as re l aç õ e s que são estabelecidas entre as diferentes espécies. Foram dados d e sse tipo , nesse cas o m o s trand o as

“As ferramentas computacionais e matemáticas que desenvolvemos para estudar as relações entre os morcegos e as plantas podem ser aplicadas a qualquer outro ecossistema”, completa o professor Francisco Rodrigues, do Instituto de Ciências M ate m áti c a e d e C o m p u t a ç ã o ( IC M C ) d a US P , e m S ã o C a r l o s .

Uma teia com muitas camadas – “Com efeito, um dos aspectos inovadores do trabalho é analisar a miríade de relações entre espécies de morcegos e plantas com ferramentas computacionais, mais ou menos como quem estuda as múltiplas conexões entre pessoas num aplicativo de rede social”, escreve o jornalista José Reinaldo Lopes no artigo Morcegos são cruciais para a saúde dos ecossistemas em que vivem. Publicado pela Folha de S. Paulo dia 3 de novembro, o artigo destaca como f u n c i o n a a t e i a q u e u n e 73 espécies de morcegos e 439 espécies de plantas, estudadas pela equipe de pesquisadores de que Mello e Ro d r i g u e s f a ze m p a r t e . * ² O jornalista conta que os pesquisadores usaram dados coletados em campo sobre a dieta dos bichos para montar as várias camadas de redes de interação: “Uma dessas camadas corresponde às mais de 900 interações morcego-planta em que há frugivoria (consumo de frutas); outra e q u i v a l e a 301 i n t e r a ç õ e s em que há consumo de néctar; e assim por diante.” Para relatar esses processos, os pesquisadores consideram, ainda, a história evolutiva, o grau de parentesco e a distribuição geográfica das diferentes espécies.

Então, imagine se esses cientistas tivessem à disposição dados sobre as tartarugas-marinhas, os peixes, as

“O mapeamento multicamadas que r e s u l t o u d e s s e e s f o r ç o m o s t ra , ent re o u t r a s c o i s a s , q u a i s a s e s pécies que

i nte raç õ e s e n t r e m o r c e g o s e p l a n t a s re g i s trada s a o l o n g o d e 70 a n o s p o r c e nte nas d e n a t u r a l i s t a s , q u e d e r a m origem ao estudo Compreendendo as regras de montagem de uma rede multicamadas continental (Insights on the assembly rules of a continentew i d e m ul t i l a y e r n e t w o r k ) . “No s s o es t u d o m o s t r a q u e é p o s s í v e l anal i s ar co m o a e x t i n ç ã o d e e s p é c i e s de animais e plantas afeta o equilíbrio de um ecossistema, alterando a biodiversidade em diversas regiões do planeta”, explica o professor Marco Mello, do Instituto de Biociências da USP, que liderou a f o rç a- tare f a d o e s t u d o .

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Æscola Legal | Nº03 | Abr 2020 funcionam como as figuras mais “populares” da “rede social” ecológica – m ais o u meno s co mo o s uj e i to c o m milhares de amigos ou seguidores cuja conta conecta as pessoas mais disparatadas entre si”, escreve Lopes. Nesse caso, vale lembrar que os m orcego s mais po pu l are s s ão o s q ue estão no centro da rede. “Isso significa que os animais dessa espécie se alimentam de uma variedade maior de frutos e propagam uma maior diversidade de sementes pelo ecossistema. Se essa espécie é ext in ta, a feta rá ma i s o to d o , p o rq ue esses animais têm u m a f unç ão m ai s relevante na manutenção do ecossistema. Por isso, é fundamental d e t e rmina r quem são e s s as e s p é c i e s porque elas podem levar à extinção de outras”, conta o professor Fran c isco Ro drigues . “C o m a anál i s e dessas redes complexas multicamadas, o que estamos mostrando é como as conexões entre as espécies são fo rm ad as , c o m o s ão as estruturas dessas redes e qual impacto pode ter a extinção de algumas espécies”, adiciona Rodrigues. Ele foi um dos responsáveis por desenvolver as soluções matemáticas e c omputa cio nais qu e p o s s i b i l i tam a análise de redes multicamadas juntamente com a pesquisadora iraniana Nastaran Lotfi. Vinda da Universidade de Zanjan, Irã, Nastaran foi aluna visitante de doutorado no ICMC, sob orientação de Rodrigues, e hoje é pós-doutoranda na Universidade Federal de Pernambuco. Já os doutorandos Rafael Pinheiro, da Universidade Federal de Minas Gerais, e Gabriel Félix, da Unicamp, desenvolveram novos métodos para entender a estrutura de cada camada das redes. Segundo Rodrigues, a análise de redes multicamadas é bastante nova e os primeiros estudos começaram a ser produzidos há cerca de seis anos. No ano passado, o professor lançou um livro sobre o assunto em parceria com mais três

pesquisadores intitulado An Introduction to Multiplex Networks: Basic Formalism and Structural P ro p e rti es . U m c a m i nh o co m m u i t a s r e de s – “ A ciência das redes complexas tem mais de 300 anos, mas foi em 2016 que nosso grupo de pesquisa, hoje na USP, publicou um dos primeiros e s tud o s n a á r e a d a e c o l o g i a l e v a n d o em conta múltiplas camadas de redes”, destaca Mello. A equipe de cientistas lideradas pelo professor têm na bagagem várias pesquisas anteriores publicadas ao longo dos últimos dez anos. Para chegar este ano às páginas de uma das revistas científicas mais importantes do mundo nas áreas de ecologia e evolução, a Nature Ecology & Evolution, foram necessários três anos de pesquisa. O início dessa trajetória está registrado em uma i m ag e m da t a d a d e 2016, q u a n d o s e i s pesquisadores que estavam na Conferência Internacional de Pesquisa sobre Morcegos (International Bat Research Conference), em Durban, na Áfric a do Sul, for a m a lm o ç a r junt os e se propuseram a construir um projeto. Ao longo do caminho, mais quatro cientistas se uniram ao g rup o . Nessa época, já fazia cerca de sete anos que Mello havia pedido autorização para usar o banco de dados on-line criado pela pesquisadora Cullen Geiselman, do C e ntro d e C o n s e r v a ç ã o d e M o r c e g o s de Austin, nos Estados Unidos. Ao longo desse tempo, o pesquisador b ras i l e i ro e s u a e q u i p e r e f i n a r a m a s informações disponibilizadas por Geiselman e adicionaram estudos brasileiros. Esses dados, que compreendem cerca de 70 anos de trabalhos de campo feitos por centenas de pesquisadores na região, f o ram uti l i za d o s n o a r t i g o p u b l i c a d a na Nature Ecology & Evolution. “Começamos estudando conjuntos de organismos de diferentes espécies

(isto é, comunidades) e hoje analisamos também sistemas no sentido estrito, formados por interações entre esses organismos (isto é, redes). Entender essas regras é crucial para compreendermos a arquitetura da biodiversidade, melhorarmos a produtividade de sistemas agroflorestais e controlarmos doenças emergentes, entre muitas outras aplicações”, escreve Mello na introdução da sua tese de livre-docência apresentada em agosto deste ano à USP. No texto, o professor faz uma síntese do caminho que percorreu ao longo de suas descobertas científicas. Um c a m i n h o q u e é s i m i l a r a o percorrido por tantos outros pesquisadores na extensa e gratificante jornada da c i ê n c i a : “ E m u m a f l o r e s t a , ou mesmo e m u m a l a v o u r a o u j a r d i m urba no, o que começa com um par de organismos escalona para múltiplos pares, chegando ao nível das respectivas populações. E delas, ao nível de todo o ecossistema. Isso é q u e o p o e t i c a m e n t e c h a m amos de ‘a teia da vida’. O mais incrível é que diferentes cientistas ao redor do mundo, ao longo de séculos e perpassando diferentes gerações, encontraram padrões muito interessantes nessa teia. Ou seja, coisas que se repetem regularmente, d e s d e a f o r m a d e p a r t e s d ela a t é os processos que geram essas formas. É extremamente empolgante tentar entender o que mantém unidos esses emaranhados de organismos e interações, também conhecidos como sistemas complexos.” Para finalizar, Rodrigues destaca que os sistemas complexos são estudados n o IC M C t a n t o n o c a m p o d a ecologia como em medicina, epidemiologia, ciências sociais e economia. Em todas essas áreas, os pesquisadores buscam entender, por exemplo, como os neurônios estão organizados no cérebro ou como as doenças se p r o p a g a m e m n o s s a s o c i e da de.

Denise Casatti – Assessoria de Comunicação do ICMC/USP para AEscola Legal *¹ https://www.nature.com/natecolevol/ *² https://www1.folha.uol.com.br/colunas/reinaldojoselopes/2019/11/morcegos-sao-cruciais-para-a-saude-dos-ecossistemas-em-que-vivem.shtml


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FRONTEIRAS DA BIOLOGIA HIGHTECH Pesquis as conduzidas p elo Neurocientit s a Miguel A ngelo L . Nicolelis chefe do depar tamento de Bioengenharia me dica D uke Univesit y indicam que os cérebros dos macacos são sincronizados enquanto colab oram para exe cutar uma tarefa motora . O s níveis de sincronicidade no cór tex motor são influenciados p ela proximidade e status social .

Fot o da tela do c omputador medindo as ondas c erebrais dos mac ac os duante os testes. (cedida)

D

URHAM, N.C. - Embora seu o bjetivo e funç ão ai nd a s e j am amplamente desconhecidos, alguns neurocientistas acreditam que os neurônios-espelho no cérebro sejam centrais para a maneira como os seres humanos se relacionam. Deficiências nos neurônios-espelho também podem desempenhar um papel no autismo e em outros distúrbios que afe t am a s habilidade s s o c i ai s . Os cientistas mostraram anteriormente que, quando um animal observa outro executando uma tarefa motora, como buscar comida, os neurônios-espelho no córtex motor do cérebro do observador começam a disparar como se o observador também estivesse procurando comida. Uma nova pesquisa da Duke publicada

em 29 de março na revista Scientific R e p o rts s u g e r e q u e o e s p e l h a m e n t o em macacos também é influenciado por fatores sociais, como proximidade com outros animais, hierarquia social e competição por alimentos. A equipe da Duke descobriu que, quando pares de macacos interagiam durante uma tarefa social, os cérebros dos dois animais mostravam episódios de alta sincronização, nos quais grupos de neurônios no córtex motor de cada animal tendiam a disparar ao mesmo tempo. Esse fenômeno é conhecido como sincronização cortical e ntre o s c é r e b r o s . “ Ac r e d i t a m o s q u e nosso estudo tem o potencial de abrir um novo campo de investigação completo na neurociência moderna, demonstrando que mesmo as funções mais simples do córtex motor, como a criação de movimentos corporais, são

fortemente influenciadas pelo tipo de relacionamento social entre os animais participantes”, disse o autor sênior Miguel Nicolelis, MD, Ph.D. Anteriormente, os neurocientistas haviam limitado seus estudos a registrar a atividade cerebral em u m a n i m a l p o r v e z. O q u e t orna essa pesquisa única, disse Nicolelis, é que a equipe da Duke criou um sistema sem fio multicanal para registrar a atividade elétrica de centenas de neurônios nos córtices motores de dois macacos simultaneamente, enquanto i n t e r a g i a m n o m e s m o e s p a ço. “ D u r a n t e d é c a d a s , o s p e s quisa dores s u s p e i t a r a m q u e a s i n c r o n ia cort ica l pode desempenhar um papel nas funções perceptivas e cognitivas”, disse Daofen Chen, Ph.D., do

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Os cientistas mostraram anteriormente que, quando um animal observa outro executando uma tarefa motora, como buscar comida, os neurônios-espelho no córtex motor do cérebro do obser vador começam a disp arar com o se o obse r vador também estivesse procurando comida. Foto de Chromatograph do Unsplash

Instituto Nacional de Distúrbios N e u roló gico s e D erram e ( NI ND S ) , um dos financiadores da pesquisa. “ Este estudo introduziu um novo paradigma e abre as po r tas pa ra a c o m pre e ns ão de uma nova dimensão social da função dos circuitos cerebrais p or t rá s dessa sincr o ni a “. Durante uma tarefa, um macaco, c h am a do pa ssageir o , e s tava s e ntad o em u ma cadeira de ro d as e l e trô ni c a programada para receber uma recompensa do outro lado da sala, uma uva fresca. Um segundo macaco, o observador, também estava na sala assistindo a trajetória do primeiro macaco em direção à recompensa. A at ivida de elétrica no c ó rte x m o to r do cérebro de cada macaco foi re gistrada simultane am e nte . Uma análise mostrou que, quando o passageiro viajava pela sala sob o olhar atento do observador, grupos de neurônios em seus córtices motores mostravam ep isódio s de sincro ni z aç ão .

c o nvi nc e n t e , d i s s e r a m e l e s , f o i q u e o ICS poderia prever outro parâmetro social chave - a classificação d o s m ac a c o s n a c o l ô n i a . D urante a s t a r e f a s e m q u e o m a c a c o mais dominante da colônia estava viajando em direção à recompensa sob a observação de um animal de classificação inferior, a magnitude do ICS crescia constantemente à medida que o passageiro se aproximava do observador. A sincronização atingiu o pico quando os animais estavam a cerca de um metro de distância - perto o suficiente para que um pudesse esticar um braço para arrum ar o o u t r o , o u a t a c a r . Mas quando um macaco de baixo e s c al ão f o i o p a s s a g e i r o e o m a c a c o dominante estava observando, o ICS não aumentou à medida que os macacos se aproximaram, sugerindo que a classificação social desempenha um papel na s i nc ro ni z a ç ã o c e r e b r a l .

Os pesquisadores descobriram que esses episódios de sincronização cortical entre os cérebros (ICS) poderiam prever a localização da cadeira de rodas do passageiro na sala, bem como sua velocidade. A atividade cerebral também poderia prever a p roximidade do s a ni m ai s , b e m c o m o a proximidade do passageiro com

Os pesquisadores acreditam que e p i s ó d i o s d e IC S f o r a m g e r a d o s p e l a ativação simultânea de neurôniosespelho no cérebro do passageiro e do observador. Eles propõem correlações semelhantes entre a sincronia cerebral e a interação social, q ue tam bé m p o d e m o c o r r e r d u r a n t e as interações sociais humanas. As descobertas podem levar a novos

a recompensa. A descoberta mais

diagnósticos ou tratamentos para

condições em que o espelhamento neuronal pode não seguir padrões típicos, como sugerido no autismo, disseram eles. Medir o ICS em h u m a n o s t a m b é m p o d e r e v ela r quã o bem os grupos trabalham juntos e até que tipos de treinamento melhoram a sincronia cerebral e o trabalho em equipe. “Usando uma versão não invasiva dessa abordagem, podemos quantificar o quão bem atletas profissionais, músicos ou dançarinos estão trabalhando juntos ou se uma audiência está envolvida no que está vendo, ouvindo ou imaginando”, disse Nicolelis. “Isso pode ser valioso para qualquer tarefa social que exija a sincronização de muitos indivíduos para melhorar a coesão social”. Nicolelis planeja explorar a sincronia cerebral em pessoas através de ensaios futuros na Duke usando ressonância magnética funcional e capas de eletrodos. Além de Nicolelis, os autores do estudo incluíram Po-He Tseng, Sankaranarayani Rajangam, Gary L e h e w e M i k h a i l A. L e b e d e v. A pesquisa foi apoiada pela Fundação Hartwell, NINDS (R01NS073952) e pelo Instituto Nacional de Saúde Mental (DP1MH099903), ambos parte dos In s t i t u t o s N a c i o n a i s d e S a úde.

• Nicolelis Laboratory Webpage - https://bme.duke.edu/faculty/miguel-nicolelis • Esta pesquisa: Interbrain cortical synchronization encodes multiple aspects of social interactions in monkey pairs., pode ser lida na íntegra (em inglês) no endereço eletrônico da Revista Nature: https://www.nature.com/articles/s41598-018-22679-x


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MUSICALIZAÇÃO

ABR INDO PORTA S PAR A UM A EDUC AÇ ÃO MUSIC AL

Foto de Arseny Togulev do Unsplash

O

momento espontâneo, oportunizado geralmente pelo educador, no qual a criança se depara com uma folha de papel em branco e uma dúzia de lápis ou giz de cera coloridos, resulta, normalmente, nas chamadas “garatujas” – um emaranhado de rabiscos coloridos ou m ono cro má tico s q ue , no m í ni m o , d e m onstr a a o educa d o r a p e rc e p ç ão do espaço, do material, cores e gestos aind a ‘desengo nçado s ’ d a c ri anç a ao exper imentar tal at i vi d ad e . Est e ensa io não pre te nd e anal i s ar o s impulsos neurológicos e cognitivos do processo de formação e construção dos sujeitos, mas de propor um paralelo com atividades em que a visão, o campo visual perceptivo do esp aço ( fo lha de pap e l ) e d as c o re s , ceda lugar a outro sentido, o da

aud i ç ão , e m c o n j u n t o c o m o g e s t u a l na manipulação de materiais sonoros, o u i ns tru m e n t o s m u s i c a i s . A musicalização infantil, atividade músico-pedagógica organizada para que a criança, entre outras experiências sonoro-musicais, manipule instrumentos sonoros, m us i c ai s o u n ã o , t a m b é m r e s u l t a n o que podemos chamar de “garatujas s o no ras ” e n ã o r a r o , m u s i c a i s . Ai n d a q ue c o m g e s t o s d e s c o n e x o s , p o u c a s noções espaciais, sem sentidos formais e continuidade discursiva, tal atividade pretende enfatizar a e s c uta at i v a , a a t e n ç ã o a o s s o n s q u e ela mesma, a criança, produz, as suas c arac te rís t i c a s e p r o p r i e d a d e s . Em qualquer destas atividades citadas, a manipulação do material disponível

com a intenção de construção de uma prática cada vez mais consciente (prática pedagógica), tem fundamento em concepções teórico-metodológicas c o m f o c o n o s p r o c e s s o s d e educa çã o dos sentidos, possível pela integração do sujeito, pela ação organizada como um princípio básico, pela interação c o m s e u m e i o f í s i c o e s o c i al. Sã o os métodos ativos2, onde criança tem voz ativa e participa intensamente d a c o n s t r u ç ã o d e s e u c o n heciment o, sendo centro da atividade, favorecendo a sua produção, para construir uma compreensão da arte como cultura, do artista como ser social e de si mesmo como produtores e apreciadores. Na perspectiva de Keith Swanwick (2003) o aprendizado musical só é possível se há na manipulação dos

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A musicalização que tem como base a experimentação sonora, Performance - a manipulação d e i n s t r u m e n to s e objetos que produzam sons , e que se faça de forma lúdica, exploratória, tem como elemento, não único, mas também central, o brincar. m at e ria is so no ro s, i nte nc i o nal i d ad e , imprimindo caráter expressivo, atribuindo valor e dando forma ao material, fator preponderante para a existência do discurso. Assim, Swanwick apresenta um modelo para a compreensão da experiência musical, aprendizagem das modalidades e desenvolvimento dos processos psicológicos, também conhecido como parâmetros de Composição, Apre ciaçã o e Per fo rm anc e – C ( L ) A ( S ) P – que permitem e facilitam o acesso dos alunos à experiência musical. A sigla, em inglês, faz referência a três atividades principais da música, a letra “C”, de Composition, propõe ênfase à capacidade c riat iva do educa ndo , a l e tra “A ”, d e Audition se refere ao cuidado com a audição, prezando pelo caráter crítico deste sentido, a letra “P” de Performa nce, pr o põe a p e rf o rm anc e responsável e comprometida. No que se refere às iniciais “L” e “S”, respectivamente, Literatura e Skill (esta compreendida como habilidades, ou seja, técnica instrumental), o autor as considera material de su p or te à s o utras cate go ri as . Deste modo, a musicalização que tem como base a experimentação sonora, Performance – a manipulação de instrumentos e objetos que produzam sons, e que se faça de forma lúdica, exploratória, tem como elemento, não único, mas também central, o brincar. A brincadeira séria, o u seja , co m f i ns p e d ag ó gi c o s , p lan ejada e ar ticula d a ao s c o nc e i to s fundantes da música, como jogos

musicais, brincadeiras de roda com c anti gas , o u t o c a d a s , c o n f i g u r a m u m universo sonoro de invenções, que p o d e m vi r a r C o m p o s i ç õ e s .

Suas percepções, suas críticas, incluindo os conflitos do grupo são explicitados e resolvidos sob a mediação do educador.

Nos estágios iniciais, o objetivo deve ser brincar, explorar, descobrir possibilidades expressivas dos sons e sua organização, e não dominar técnicas complexas de composição, o que poderia resultar em um esvaziamento do seu po te n c ial ed u ca t i vo . N a s a u l a s , m u i t a s oportunidades para compor podem surgir a p a r t i r d a e x p er i m e n t a çã o q u e demanda ouvir, selecionar, rejeitar e controlar o material sonoro (FRANÇA; S WA NWI CK , 2 0 0 2 , p . 1 0 )

Reconhecer que as ‘garatujas sonoras’ são resultado musical do trabalho criativo coletivo dos alunos, sob a mediação do educador, exige uma mudança de perspectiva, um novo paradigma, que embora colida com os princípios tradicionais da música tonal, vai ao encontro de uma nova estética musical, que chamada de contemporânea, música concreta, e l e t r o a c ú s t i c a , a l e a t ó r i a , e nfim, seja qual for o rótulo, utiliza-se de qualquer

A re inc i dê nc i a de s t e br inc a r di r igi do , pedagógico, é importante para a fixação dos jogos, brincadeiras, e todas as atividades estão voltadas para que os conceitos musicais sejam incorporados; para que se dê o p ro c e s s o d e a s s i m i l a ç ã o 3. Na construção de sujeitos capazes de apreciar o objeto artístico de forma consciente e crítica é que as práticas de Audição se apresentam de forma sistemática, (o que não quer dizer enfadonha). As crianças são estimuladas a ouvir e comentar s o b re o qu e e l a s m e s m a s p r o d u ze m .

As crianças são estimuladas a ouvir e comentar sobre o que elas mesmas produze m . S u a s p e r ce p çõ e s , suas crític as , incluindo os conflitos do grupo são explicit a d o s e r e so lv i d o s sob a me diação do educador.

Foto de William Rec inos do Unsplash


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objeto sonoro como som musical, p assív el de o rganicid ad e . Se os conceitos da música tradicional (sistema tonal) podem ser abordados através das práticas de composição de est é t i ca co ntempo r âne a, o nd e to d o s os sons podem ser musicais, portanto passíveis de organização e dotados de significação visando a formação de u m discurso co er ente , s uas re l aç õ e s com as técnicas tradicionais de composição são apenas primárias, embrionárias para lograr um conhecimento mínimo dos mesmos conceitos fundantes da música tonal, que invariavelmente ainda é a música q ue s e o uv e, canta e f az .

A musicalização se mostra eficaz e oportuna em diversos aspectos que vão desde o musical até o social. A continuidade do processo de musicalização deve ser uma meta, sem a qual a experiência musical se esvazia e torna-se sem sentido, perdendo-se no tempo. Foto de Irina Murz a do Unsplash

A musicalização se mostra eficaz e oportuna em diversos aspectos que vão desde o musical até o social. A continuidade do processo de musicalização deve ser uma meta, sem a qual a experiência musical se esvazia e torna-se sem sentido, perdendo-se no tempo. O caráter cumulativo deste aprendizado aponta sempre para novos caminhos e trilhálos implica em decisões, cabendo o olhar crítico, investigativo e p ropo sitivo do educ ad o r.

Jeasir S. Rego - Músico, Bacharel pela ULM-SP, licenciado e Mestre em Música pela UDESC, Educador e Pesquisador em Educação Musical. 2- Para saber mais: História das ideias pedagógicas no Brasil - Coleção Memória da Educação. Dermeval Saviani. Ed.4. Editora Autores Associados, 2007. 472 páginas 3- A Assimilação é o processo pelo qual a criança torna sua alguma informação, relacionando-se com o objeto de conhecimento para retirar dele informações que irá reter em função de uma organização mental. Para saber mais leia: MUNARI, Alberto. Jean Piaget. Tradução e organização: Daniele Saheb. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, Editora Massangana, 2010. (Coleção Educadores). Livros recomendados - A Linguagem e o Pensamento na Criança. Trad. Manuel Campos. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1959. - O Nascimento da Inteligência na Criança. Trad. Alvaro Cabral. Rio de Janeiro: Zahar, 1970. - Aprendizagem e Conhecimento. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1979. - História das ideias pedagógicas no Brasil - Coleção Memória da Educação. Dermeval Saviani. Ed.4. Ed. Autores Associados, 2007.. REFERÊNCIAS FRANÇA, C. C.; SWANWICK, K. Composição, apreciação e performance na educação musical: teoria, pesquisa e prática. In: Em Pauta, v. 13, n. 21, dezembro/2002. SWANWICK. K. Ensinando música musicalmente. São Paulo: Moderna, 2003. Trad. Alda Oliveira e Cristina Tourinho.

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BIG BA NDS NOS CÉUS EDUC AÇ ÃO MUSIC AL - UM FORT E ACRÉSCI MO COGNIT I VO

F o to d e Peter O k wa r a d o Un s p l a s h

P

ra quem não sabe, Big Band é um tipo de conjunto musical que foi criado pelo jazz naquela que veio a ser conhecida como a Era do swing, período histórico que compreende mais ou menos a d é c ada de 1 9 3 0 no s EUA .

Portanto, somente em um período mais recente que o termo Big Band se firmou, possivelmente por tentar trazer mais precisão e, de certa forma, se ligar a apreciação da música instrumental pura, com muito e s p a ç o p a r a i m p r o v i s a ç ã o (um t ra ço característico do jazz) e se desvincular d o s b a i l e s p o i s , a f i n a l , m u i t a s dessa orquestras trabalhavam como bandas de baile. É por isso que modernamente a s Ba n d a s M a n t i q u e i r a , S pock Frevo Or q u e s t r a , S o u n d S c a p e , N a G a vet a , e muitas outras se autodenominam p o r Bi g Ba n d s .

Uma das Big Bands mais importantes do Brasil foi a Orquestra Tabajara, cuja a fundação remonta à 1938. Nesse p on t o há uma cur io s i d ad e , tal ve z um

com a figura do Band Leader (neste caso, Severino Araújo), seu repertório e ra b as ta n t e b r a s i l e i r o . V a l e l e m b r a r que as primeiras gravações da orquestra traziam os clássicos ‘Espinha de Bacalhau’, um choro do p ró p ri o Se v e r i n o e , p o s s i v e l m e n t e , a p ri m e i ra g r a v a ç ã o d e ‘ V a s s o u r i n h a s ’ , o frevo mais conhecido do Brasil. Assim, quando as gravações musicais no Brasil se expandem, com o surgimento dos Long Plays e, ao mesmo tempo, com a expansão dos programas de rádio brasileiros, através da Rádio Nacional, percebe-se que o formato Orquestra (Big Band ) teve lugar permanente como tipo de entretenimento. É interessante comparar, por exemplo, com o caso argentino que em seu principal gênero de música popular teve nas orquestras típicas seu principal veículo, normalmente formada por bandoneon e cordas arcadas (violinos, violas,

traço característico de nossa cultura: em bo ra a Ta ba ja ra s e gui s s e q uas e a rigor a formação americana, inclusive

violoncelos e contrabaixos) fazendo q ue q ue a s Bi g Ba n d s s e d e d i c a s s e m e xc l us i va m e n t e a o j a zz.

In t e g r a d o s d e P ú b l i c a ) , C É Us (Cent ro de Educação Unificadas), e da e x p a n s ã o d a s u n i v e r s i d a d e s federa is

Uma Big Band envolve os naipes de saxofones, metais (trompetes e trombones) e a chamada cozinha, mais especificamente seção rítmico – harmônica (piano, baixo, bateria e guitarra). Muito embora norteamericana, sua presença no Brasil n ão t arda ria a a pa re c e r. Po ré m , s ua p rim eir a deno mina ç ão não f o i us ad a em língua inglesa, e por aqui foi simplesmente chamada de Orquestra.

No Brasil, de uma forma geral, parece que alguns avanços ocorreram em governos progressistas e depois, à duras penas, se mantêm como espaço p a r a p o l í t i c a s c u l t u r a i s d e s t ina da s à população mais vulnerável ou para a produção acadêmico-científica. Os exemplos dos CIEPs (Centros


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De outra maneira, acredito que a aquisição do domínio da le itu ra e e scrit a musical ocidental não deixa de trazer u m e n o r m e a c r é scimo cognitivo, não necessariamente àqueles dotados de m u ito t a l e nto m a s , exatamente, àqueles com maiores dificuldades na intuição. que, alguns casos ocorreram em estados que sequer tinham tais universidades e, por outro, tinha propostas estratégicas como a da UNILA, das Universidades Rurais, etc. O que pareceu singular no primeiro projeto, idealizada pelo ex-docente da USP Henrique Autran Dourado, en t ão direto r da Esco l a M uni c i p al d e Música de SP, de Educação Musical para os CÉUs, em sua primeira gestão, foi a presença das Big Bands, ou seja, dessa formação singular dentro de t ais u nidades que, c o m o s e s ab e , s e localizam em regiões afastadas do c en t ro da cidade, e te m p o r o b j e ti vo atender como forma de educação complementar para a população dessas regiões a promoção de espaços e eventos de cultura, esporte e lazer. Percebe-se, nesse movimento que o primeiro espaço educacional em termos de política públicas para a formação musical, do ponto de vista da música popular, se dá de uma forma enviesada tendo na Big Band uma espécie de paralelo popular da Orquestra Sinfônica na música c l ás s i c a.

e oral. Parece que o que o idealizador tinha em mente era o modelo de conservatórios norte-americanos onde há departamentos de jazz ao l ad o d o s c l á s s i c o s . T a i s p a r a d i g m a s , é bem verdade, não deixaram de e s tar no h o r i zo n t e d o p r i m e i r o c u r s o superior de música popular da América Latina, o da UNICAMP. Entretanto, as primeiras turmas desse curso já começaram a discutir e se polarizar e ntre “b ra zu c a s ” e j a zzi s t a s . Por outro lado não existe no Brasil algo sistemático no sentido de um material pedagógico para as Big Bands como nos EUA, até porque lá as Big B and s f aze m p a r t e d o e n s i n o m é d i o , trazendo uma demanda enorme de publicações para a formação p o r ní ve l d e d i f i c u l d a d e . O que se nota é, também, a valorização do conhecimento da leitura musical como uma espécie de capital cultural. Ou seja, a música popular que se permite é aquela minimamente vinculada com a escrita o que, de fato, o universo das Big Bands traz, ainda que, aliada à improvisação e a convenções de acompanhamento como as cifras de violão também us ad as p a r a o p i a n o . De outra maneira, acredito que a aquisição do domínio da leitura e escrita musical ocidental não deixa de trazer um enorme acréscimo cognitivo, não necessariamente àqueles dotados de muito talento mas, exatamente, àq ue l e s c o m m a i o r e s d i f i c u l d a d e s n a intuição. A racionalização de padrões de execução, aliado às convenções de estilos musicais parece ser a grande contribuição ao fazer musical dos seres humanos “normais”. Talvez até por isso o entendimento racional possa até banalizar o fato quando passa de misterioso para s e r c l as s i f i c a d o e , a o m e s m o t e m p o ,

usado como critério de valor como se a música escrita tivesse maior valor do que a intuitiva. No Brasil é fato que as bandas militares e civis preenchiam esse lugar e as Big Bands, então, já no contexto do século XIX trariam uma prática mais atual. O fato é que, findada a gestão progressista, a Big Band apareceu de outras formas como nas escolas s u p e r i o r e s d e m ú s i c a e n o s projet os G u r i e G u r i S a n t a M a r c e l i n a . Nesses casos, já não se trata de uma Big Band em cada polo (que reúne os CÉUs e outras unidades) mas, sim, de uma Big Band central na qual alguns alunos seletos dos diferentes polos se juntam para realizar a temporada. Além disso, houve a sensibilidade de que somente essa formação não faria jus a uma realidade complexa como a da música popular e houve também espaço, no caso do Guri Santa Marcelina, para um grupo de Choro, dentro de uma perspectiva instrumental mais aberta, sem um instrumental fixo, ainda que o gênero possa ter criado a formação do chamado Regional. Aparentemente, se pensarmos no contexto sóciocultural onde muitos polos se inserem, constata-se um abismo entre o que se propõe e a realidade instaurada. Claro que, de certa forma, o que se pretende é transformar essa realidade, e escutar as comunidades é fundamental. Um dado, para ilustrar, é que o samba e o c h o r o h á m u i t o d e i x a r am de ser gêneros ligados às comunidades da p e r i f e r i a , o q u e e r a c a r a c t e r íst ico do Rio de Janeiro na primeira metade do século XX, mas sofreu uma espécie de ‘restrição territorial’ e passou a ser cultuado em guetos musicais mais específicos, ao mesmo tempo em que foi sendo substituídos por outras m a n i f e s t a ç õ e s d e c u l t u r a d e ma ssa .

Esse pensamento traz no seu bojo o fat o de que o a gen te q ue l e g i ti m a a música popular foi, em primeiro lugar, o músico de formação clássica. Desse modo a sua visão se dá a par tir de um ti p o d e m ús i c a que se legitimou na história pela originalidade e singularidade mas, t am bém se co lo co u c o m o um c ó d i g o m ist o entre a cultur a m ús i c a e s c ri ta

Paulo Tiné Dr. Profº Musicólogo - UNIFESP - Trabalha com Big Bands há quase 30 anos.

Para ouvir Espinha de Bacalhau de Severino de Araújo: https://youtu.be/fryPISqGOYM

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ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE AS FILOSOFIAS DA EDUCAÇÃO MUSICAL ESTÉTICA E PRAXIAL musical que evidencia os valores e x t r í n s e c o s d a a t i v i d a d e musica l

O

que O ensino de música nas esco la s da r e d e d e e ns i no d e nível fundamental, assim c om o a educaçã o em g e ral , re g ul ad o p or leis e o utro s doc um e nto s l e gai s , apre sentam a spectos q ue p o d e m s e r identificados com as perspectivas filosóficas de uma é p o c a, d e um a o u várias tendências pedagógicas, ideológicas ou de políticas públicas para a educação de artes. A pesquisa “Perspectivas curriculares brasileiras oficiais para a educação musical nas escolas públicas do ensino fundamental”, realizada por Fernandes (2004), em todos os estados e nas capitais mais representativas de cada região do B rasi l, a lém do D istri to F e d e ral , te ve p or finalidade anali s ar as p ro p o s tas c u rricular es de educ aç ão m us i c al d e cada uma das unidades federativas. O relatório parcial (junho de 1998), no que se refere à análise das considerações filosóficas dos documentos, aponta para uma predominância de fundamentos filosóficos vinculados a argumentos intrínsecos – onde os valores da ed uc açã o musica l e s tão c o nti d o s no valor da própria música, enquanto uma minoria (20%) apresentou argumentos extrínsecos onde a educação musical está fundamentada em fi ns não musica i s , e s i m s o c i ai s e u t ilit ár io s.

J ea s i r R eg o - M s M ú s i c a U D E S C

A ab o rd a g e m f i l o s ó f i c a e m e d u c a ç ã o musical que enfatiza os valores intrínsecos da atividade musical é discutida por Fernandes (2004), que utiliza referências de Temmerman* para situar as questões filosóficas da educação musical. Tal abordagem, que enfatiza os valores intrínsecos da e xp e ri ê nc i a m u s i c a l [...] se refere à educação musical como educação estética e está baseada na promoção da música por ela mesma, não requerendo justificativa externa, ou seja, os valores da educação musical estão contidos no valor próprio da música. Vários autores defendem que a meta da educação musical é o desenvolvimento da consciência e da sensibilidade estética, que incui a p e rc e p ç ão e a r e s p o s t a à s q u a l i d a d es expressivas da música. Essa filosofia vai além da simples aquisição de conhecimentos sobre música e da habilidade de execução de peças. Ela inclui a completa imersão na música, suas combinações sonoras, forma e desenvolvimento, tratando da função única da música “como um significante modo simbólico disponível aos indivíduos, para se expressarem simbolicamente, o que não pode ser representado pela linguagem verbal”. (TEMMEERMAN, apud FERNANDES, 2004, p.83). Já a abordagem filosófica em educação

[...] é referida pela literatura como utilitária e funcional, referencial ou social e está fundamentada na p r o m o çã o d a m ú s i c n a e d u ca çã o c om fins não musicais, ou seja, na educação por valores instrumentais e não estéticos... a literatura aponta cinsco funções utilitárias na música: 1) desenvolvimento emocional; 2) universalidade da música como um meio para a comunicação social; 3) i n t en çã o m o r a l e p r o m o çã o d e d ire çã o m o r a l p a r a a co n d u t a d i á r i a ; 4) va lor disciplinar; 5) valor espiritual. ( F ERN A N D ES, 2 0 0 4 , p . 8 3 ) As abordagens intrínseca e extrínseca das filosofias da educação musical, aqui entendidas e nomeadas como Educação Musical Estética por Bennet Reimer, e Educação Musical Praxial, por David Eliot, apresentam fundamentos definidos a partir de vários teóricos da psicologia, da linguística, da sociologia, da filosofia e outros campos do conhecimento. Além disso, esses autores investigam cientificamente a natureza da experiência em música, estudo este q u e s e r v i r á c o m o b a s e p a r a a defesa d e c a d a u m a d e s u a s p e r s pect iva s e suas aplicações no campo pedagógico Reimer justifica a necessidade de uma Filosofia da Educação Musical (FEM) que “deve ser uma demonstração sistemática da natureza e do valor da educação. De acordo com essa premissa, esta demonstração deve vir de uma investigação da natureza e do valor da música”. (REIMER, 1970, p.1). Compreender esses valores e a natureza da experiência musical é um fator preponderante para que profissionais apresentem para a sociedade como um todo a i m p o r t â n c i a d a e d u c a ç ã o musica l. As t e o r i a s e s t é t i c a s s ã o a mpla ment e discutidas por Reimer, que aponta


Æscola Legal | Nº03 | Abr 2020 referências e explica porque adota c ada uma delas. São c o ns i d e rad as as correntes denominadas Absolutismo, Referencialismo, Formalismo e Expressionismo estético. Para que tenhamos uma perspectiva inicial destas teorias, Reimer apresenta cada u m a dela s: a) O Absolutismo julga que para en t e nder o significa d o d o f az e r arte (e da obra de arte) é necessário atentar para as qualidades internas do criar e do pensamento criativo (artístico). Em música devem-se perceber os sons, melodia, ritmo, harmonia, tons, textura, dinâmica, forma e atentar para o resultado deles, como agem sobre o ser h u m ano . b) O Referencialismo propõe outra leitura. De acordo com esta perspectiva, o significado e os valores da obra de arte e do fazer arte existem fora do ser criativo. Para se entender o significado da arte é necessário mergulhar no mundo das ideias, emoções, eventos; a arte se refere ao ser em um mundo fora da obra de art e . c) O Formalismo concentra-se exclusivamente nas qualidades intrínsecas da obra de arte. Nega a existência e o valor de significado extrínseco (extra-artístico) e valor ou, pelo menos, nega que o mundo exterior contribua com algo de im portância pa ra a o b ra d e arte e a experiência dela. As influências culturais do artista podem ser reconhecidas, mas são insignificantes ou se cundár ia s. Reimer defende uma postura Absolutista-Expressionista, considerando esta vertente c “mais adequada para a educação das massas numa sociedade democrática” (REIMER, 1989, p.27). O que distingue o t rabalho co m ar te d e vári as o utras experiências é o seu caráter subjetivo; portanto sempre haverá respostas subjetivas para estas questões. O sen t ir estético , co m o p arte d o s e r, é especialmente difícil de oralizar. N e st e sentido , educ ar m us i c al m e nte é educar esteticamente e isso intenta tornar mais hábeis para a experiência musical, artística. É uma educação

d o s s e nti d o s . A questão central da proposta filosófica de Reimer é como a educação musical pode ser também uma educação estética. A audição como parte inexorável da criação deve ser encorajada e sensibilizada pela performance, pela composição e, também, pela improvisação. Reimer considera duas categorias de experiência com música, estética e musicais e não estéticas e não musicais, podendo ser funcional, referencial ou acontecer em nível té c ni c o c r í t i c o . F u n c i o n a l é a q u e s e refere ao caráter utilitário da experiência estética, ou seja, o uso prático, terapêutico, moral, religioso, moral, político, comercial, entre outros, da arte. Referencial é a que não foca a experiência musical em si, apenas aponta esse tipo de experiência. O nível técnico-crítico difere das experiências referenciais por seu caráter pré-estético e faz alusão aos aspectos técnicos da obra, portanto uma preocupação com a obra em si, seus elementos intrínsecos f o rm ai s . Quando se coloca lado a lado a aud i ç ão , p e r f o r m a n c e , c o m p o s i ç ã o e i m p ro vi s a ç ã o , p a r e c e f i c a r c l a r a a q u i a correspondência dos conceitos de valores extrínsecos e intrínsecos cidatos por Fernandes (2004) e a preocupação com essas duas d i m e ns õ e s d a e x p e r i ê n c i a m u s i c a l , a estética e a prática. Reimer faz referencia a dois pontos de vista muito característicos do pensamento de James Mursell1 - que foi uma re f e re nc ia i m p o r t a n t e p a r a o e s t u d o de diversos aspectos da área de educação musical nos Estados Unidos da América – que ilustram sua p re o c up a ç ã o e s t é t i c a : [...] em filosofia, a noção da essência da música é de vida interior, e na psicologia a noção é de crescimento musical. Essas duas ideias, presentes em todos os escritos, estão intimamente ligados ao ensino da música (considerando seus desvios ocasionais), devendo-se compreender suas interrelações na plenitude das suas m uitas im p l i ca çõ es . Em ce r t o s en t i d o , o conceito é simples e elegante: toda música é caracterizada por uma

essência relativa à sua estrutura, o p o d er d e s en t i - l a d e fo r m a i n t e lige n t e e o crescimento musical é o processo g r a d u a l p e l o q u a l a es t r u t u ra mu s ica l pode ser mais plenamente experimentada. (REIMER, 1991, p.130). D a v i d E l l i o t t d e c e r t a f o r m a se opõe ao pensamento de Reimer em termos f i l o s ó f i c o s p a r a a e d u c a ç ã o musica l. No entanto, este autor também apresenta preocupações semelhantes às de Reimer ao defender a educação musical a partir da filosofia Praxial. Esta propõe como foco do processo de ensino e aprendizagem, uma abordagem ampla e reflexiva, baseada nos seguintes fundamentos: a) os trabalhos musicais nos levam a diversos propósitos; b) a ‘inteligência musical’ envolve muitos tipos de pensamentos e conhecimentos que e s t ã o e s t r e i t a m e n t e r e l a c i ona dos; c) o significado da música na vida do ser h u m a n o p o d e e x p l i c a r -s e em t ermos de muitos valores importantes. Do ponto de vista cultural, a música é “essencialmente um modo de ouvir os sons poderosamente moldados sobre metáforas impostas por nossas perspectivas e experiências psicofisiológicas” (ELLIOTT, 1990, p . 13) . Para Elliott o caráter multidimensional d a m ú s i c a e x p l i c a a e s s ê n cia de sua filosofia, que traz um conceito multidimensional da música e do produto musical, da inteligência musical, dos valores musicais na vida do ser humano e os múltiplos enfoques para se chegar a estes valores. Sua proposta central é a que o fazer música de qualquer classe, gênero, estilo, seja o cerne de todo c u r r í c u l o d e e n s i n o d e m ú sica . Dentro desse conceito de multidimensionalidade de Elliott, não há como não considerar o da multiculturalidade, onde encontramos preocupações com a diversidade cultural: A diversidade de atividades musicais no mundo exclui-se da dedução de universalidade partindo da estética ocidental, da musicologia e Etnomusicologia descritivas. Estas disciplinas tendem a restringir-se na música como uma história limitada a

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Æscola Legal | Nº03 | Abr 2020 obj et os e prá tic a; so ns c o n ge lado s e m notações e gravações; valores metafísicos fixos e acomodados em um conjunto de obras; técnicas de execução s i st ematizadas; peç a s analisadas c o m metáforas acadêmicas, formas e fórmulas. São precisamente estas concepções que se opõem, na sua aplicação, à música de todos os tempos e de todos os lugares. ( E L L I O TT, 1 9 9 0 , P .12) A despeito dos conflitantes conceitos acerca de multiculturalismo2 e do próprio conceito do que é multicultural Elliott apresenta uma preocupação etnológica ao considerar as várias manifestações espontâneas da música em diversos povos. Sua ênfase aponta para o único ponto de universalidade da música, que é o simples fato de fazê-la, e todos os povos a fazem, independente de época, função, credo e localização geográfica. Com este conceito questiona os padrões e valores da tradição europeia, considerado preconceituosamente como música séria que despreza as práticas musicais que fogem a seus padrões, rotulando-as de música p rim itiv a. As dimensões estética e praxial são multidimensionais por apresentar cada uma delas grande complexidade de desdobramentos que vão do filosófico, psicológico, ao prático, social, e não parecem ser fragmentáveis. “Todas as formas de fazer musical envolvem uma forma m ult idimensio na l de p e ns ar” ( El l i o tt, 1995, 0.33). Não se pode separá-las sem o risco eminente de um discurso

vaz i o , s e m l a s t r o , o u d e u m a p r á t i c a inconsistente, sem a consciência de sua contextualização. A discussão sobre a experiência estética e a praxial considera primordial a multidimensionalide da música no que se refere à “dimensão externa ao homem, seu sentido social, contextual, cultural, formal e estilístico e sua dimensão interna, qual seja, seu sentido emocional, afetivo, sentimental, cognitivo, criativo” (Lazzarin, 2004, p.30). Em vários momentos encontramos tanto Reimer quanto Elliott referindo-se a tais questões em suas argumentações filosóficas. A multidimensionalidade que cada filosofia compreende de uma forma própria, tem sido uma maneira de aprender e dominar a complexidade da experiência musical, mais que a tentativa de compreendê-la. Também te m , c o ntu d o , a j u d a d o a fr a g m e n t á - l a , um a v e z q u e e x i s t e u m a h i e r a r q u i a , o u seja, sempre uma dimensão é privilegiada em detrimento das outras. (LAZZARIN, 2004, p.30). O ato d e c a n t a r , c o m p o r o u i n v e n t a r canções, improvisar, tal qual fazem os repentistas nordestinos, por exemplo, atividades musicais espontâneas e de natureza independente da teoria ou da musicologia, do ensino e de uma metodologia científica, reúne essas d i m e ns õ e s . As s i m , t a m b é m , d e o u t r o lado, atividades como arranjo ou regência, numa perspectiva convencional, que dependem de um conhecimento prévio de uma

estrutura de linguagem préestabelecida, ou a própria audição, também são expressões dessas dimensões. Em ambas as filosofias as d i f e r e n t e s d i m e n s õ e s d a e xperiência m u s i c a l s ã o c o n s i d e r a d a s de gra nde importância e muito produtivas. Se ndo a s s i m , a e duc a ç ã o e s t ét ica , ou o f o c o n a a u d i ç ã o , a p r e c i a çã o, é t ã o importante quanto o fazer música, tocar um instrumento, compor uma obra. Q u a n d o n ó s s a b em o s co m o fa ze r a lgo de forma competente e proficiente, nosso conhecimento não é manifestado verbalmente, mas praticamente. Durante a contínua ação de cantar e tocar instrumentos nosso conhecimento m u s i ca l e s t á n a s n o s s a s a çõ e s ; n os s os p e n s a m e n t o s m u s i ca i s e s t ã o e m n os s o fa ze r m u s i ca l . ( EL L IO T T , 1 9 95, p .56) . A reflexão sobre esses conceitos filosóficos discutidos por Reimer e Elliott a respeito da educação musical, pode trazer contribuições substanciais p a r a a f u n d a m e n t a ç ã o d e currículos para o ensino de música na escola brasileira. Na segunda parte deste artigo, que será publicado aqui em breve, será apresentada uma breve discussão sobre documentos legais q u e t r a t a m d e a s p e c t o s d a educa çã o musical no Brasil e suas possíveis correlações com os fundamentos d e s t e s d o i s r e f e r e n c i a i s t e óricos.

Jeasir S. Rego

Ms Música e Educação UESC Professor do SESC Florianópolis

1-James Mursell escreveu extensivamente sobre educação musical e o uso da música na sala de aula. Ele enfatizou o papel do aluno na aprendizagem e a importância da motivação intrínseca. Dentre vários escritos, o livro Music In American Schools. New York, NY: Silver Burdett Co. serviu de base para muitos educadores musicais norte-americanos. 2-O multiculturalismo, de uma maneira geral, vem sendo utilizado para definir uma visão de mundo que respeita a diversidade de modos de vida de cada uma das sociedades em suas características próprias, seus valores éticos e sua identidade cultural (...) Nas duas ‘filosofias’, música se torna uma forma de conhecimento do outro, tendo como premissa o caráter ético de respeito a todas as práticas musicais. (Lazzarin, 2204, p114). REFERÊNCIAS ELLIOTT, D.J. 1990. El papel de la música y de la experiência musical em la sociedade moderna: hacia uma filosofia global de la educación musical. In. Gaiza, V.H. Ed. Nuevas Perspectivas de la Educación Musical. Buenos Aires: Guadalupe. FERNANDES, J.N. Normatização, estrutura e organização do ensino de música nas escolas de educação básica do Brasil: LDBEN/96, PCN e currículos oficiais em questão. Revista da ABEM, v. 10, 75-78, mar.2004. LAZZARIN, L.F. Uma compreensão da experiência com música através da crítica de duas ‘filosofias’ da educação musical. Fac. De Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2004. REIMER, B. Music Education Philosophy and Psychooogy after Mursell. In Basic concepts in music education. University Press Colorado, 1991, v.II.


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O ENSINO E DESENVOLVIMENTO DO DESENHO ATRAVÉS DA ARTE VISTO POR UMA PERSPECTIVA PEDAGÓGICA SÓCIO CONSTRUTIVISTA

V

a m o s f a l a r d e d e s e n h o? N ã o daquele dos grandes ar tist as que vão de Michelangelo, Pic asso, Tar sila ou um outro que você se recorda. Vamos falar da produç ão e do ensino de desenho nas escolas e você já deve es t ar ques tionando o por quê e qual a impor tância desse assunto para a educação. Para começar, vamos r e co r d a r : co m o f o r a m a s s u a s a u l a s de A r te? Como foram as ati v idades de desenho? Provavelmente não se lem brará do nome dos seus profes sores de A r te e ainda , re cordará das a t i v i dades como des enho li v re, “desenhe suas fér ias ” e das garatujas. Que você n ã o t i n h a , o u a té t i n h a t a l e n to p a r a desenhar, mas que era uma ati v idade sem impor t ância para se dedic ar a ela ou foi enc arada como um pass atempo na infância . É necessário discutir esses conceitos que es t ão enraiz ados na escola e na n o s s a c ul t ura . A in da h oje a c re di t am que é pr imordial ter t alento para desenhar e que o ensino do desenho não passa de momentos livres de expressão, sem necessitar de uma p r o p o s t a o u p r o ce d i m e n to p a r a s e u desenvol v imento. Por isso, esse tex to tem a propos t a de quebrar esses pre co n ce i to s , o u p e l o m e n o s , ins t igá - l o a busc ar conhecer as novas teor ias e prátic as no que diz respeito ao ensino do desenho na escola. Será um resumo dos meus relatos de prátic as de 2010

Fo to d e A a r o n Bu r d en d o U n s p l a s h

a 2017, anos em que es ti ve na s ala de aula, como ar te educadora da Rede Municip al de Educ aç ão da C idade de S ão Paulo. E de 2018 a 2019, como forma dora de profe s s ore s , no c ar go de c o o r d e n a d o r a d o p o l o UA B / U n i C E U. Não há a pretensão de instruir e passar métodos de ensino do desenho, muito menos de oferecer receitas, a intenção é di v idir, compar t ilhar, cr iar debates sobre esse assunto que ainda parece como “ t abu ” para os professores. Pa r a f a l a r d e d e s e n h o é n e c e s s á r i o compreender o processo da legitima ç ã o d o e n s i n o d e A r t e. S o m e n t e e m 1996 ela passou a ser obrigatória como disciplina nas escolas, deixando de ser, mais uma atividade como prescre v ia a LDB 4 691. A ntes disso, se ensin av a nas aulas de Educ aç ão A r t ís t ic a: cor te e costura, tricô, decoração e etc - e essas aulas destinava-se ao público feminino. Mesmo após a con quis t a, o ensino de A r te ainda é v is to por alg umas ges tões escolares como decoração de fes t as temáticas , passa tempo, atividade de relaxamento após as aulas “mais pes adas ”. Nesse c alde irão de más opções , o desenho é v is to como entretenimento: “quem ac abou a p r o v a p o d e d e s e n h a r u m p o u c o ”, “ hoje na úl t ima aula poderão de s en har ” ou ainda como se escuta “ tô muito c ans ado para planejar uma ati v idade, darei desenho li v re.”

Após essa breve contex tualização, vamos pensar agora, na evolução do currículo da Rede Municipal de Educação da cidade de São Paulo. Desde 20 09, ele passou por vários e s t á g i o s a t é c h e g a r e m 2 0 17 n o Cu r r í c u l o d a C i d a d e . O q u e i m p o r t a é entender que o cur r ículo é f lexí vel, m o d u l a r, a d a p t á v e l , a r e a l i d a d e d o aluno e da comunidade são levados em conta nos planejamentos pedagógicos. Es t a inserido no conceito da Educação Integral que não é a escola em tempo integral, mas, se refere no aluno como um ser humano complexo, com direitos d e a p re n diz age m , ins e r id o na s o c ie dade e que possui várias inteligências. Dess a forma, o currículo faz par te das propos t as interacionis t as e sócio con s t r u t i v is t as , en xer gan do no aluno, o cr iador da própr ia aprendiz agem. Ao compreender essas propost a s , e n s i n a r d e s e n h o n ã o p o d e co n tinuar sendo nos moldes da educação tradicional. Prefiro propor o “Desenvolvimento do Desenho Culti vado ”, que logo será explic ado. E as propos t as para o ensino de ar te no Cur r ículo da Cidade, s ão trans for ma doras , interdisciplinares , com conteú dos e s ab ere s própr ios , dialoga com as necessidades da sociedade conte mp orân ea: A r te - Ensin o -S o cie da de. A A r te produz conhe cimento at ravé s de cinco áreas: Ar tes Visuais, Ar tes Cênic as , Danç a, Músic a e Literatura cada uma delas utiliza suas linguagens, elementos , ins tr umentos própr ios , os quais podem se unir para desenvol ver uma n ov a pro duç ã o ar t ís t ic a , o qual chamamos de Linguagens Hí br idas. Compreendendo isso, por que a A r te ainda é ensinada de forma tão rudiment ar e ultrapass ada? A nalis ando ess as mudanças também temos algumas respos tas para esse problema: má formaç ão de professores , a falt a de for ma ção continuada e específ ica, a falt a de especialis t as para c ada área, falt a de professores de A r te já que muitos s ão

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ar tis t as e “ fogem ” da c arreira no magi s t é r i o, e n t r e o u t r o s . Co m o u m p r o fessor do Ensino Fundament al I , ped agogo ou de A r te que não possui uma for maç ão específ ic a em ar tes v isuais e m u i to m e n o s e m d e s e n h o, p o d e r á desenvolver atividades enriqueced o r a s e q u e s t i o n a d o r a s? S e n e m a o m e n o s h á u m a f o r m a ç ã o co n t í n ua à e l e s? C o m o u m e s p e c i a l i s t a p o d e r á desenvol ver A r te para as sér ies inici ais com uma aula semanal? Sendo que é ness a idade que inicia o desenvol v i mento cr iador e ar tís tico. S ão di ver sos problemas que de for ma geral, o Brasil enfrenta quando o as sun to é a Educ a ç ã o, os ap on t a dos s ã o v is to s in l o co n a s e s co la s p úb li c as e algumas par ticulares da cidade de S ão Paulo na região noroes te. E o result ado s ão cr ianç as sem es tímulo, auto estima para as aulas de ar te, sem uma v is ão e conhecimento sobre a cultura brasileira, sem criativida d e, c r i té r io s d e anális e a r t ís t ic a e c u l t u r a l e s e m co n h e c i m e n t o b á s i co sobre Ar te em geral. Prevalece o preconceito entre os alunos e pro fessores: para ser “bom nas ar tes é necess ár io ter t alento e s aber us ar as mãos para produzir coisas bonitas, danç as com passos codif ic ados e decorados , tocar um ins trumento...” e por aí vai. São poucos os professo res que desenvol vem ati v idades com f luiç ão de s aberes , o que é v is to, s ão t r a b a l h o s i n d i v i d ua i s e p o n t ua i s e m algumas escolas independente da ges t ão escolar. Dentro desse cenár io, foc aremos nesse momento no ensino do desenho. Ao pens ar na linguagem, sabe -se que é uma das mais antigas do mundo. A nte s da fala , os homens da Pr é - E s c r i t a s e co m u n i c a v a m a t r a v é s de ges tos , do cor po e do desenho. A s pinturas nas cavernas, principalmente as de A lt amira na Espanha e L asc aux na Franç a , s ão mui to mais que mãos espalmadas e desenhos rupestres. Nelas sabe-se do desenvolvimento de ins t r um e n to s e ma te r iais p ic tó r i cos, da relação ritualística entre o Homem, a Representação e os espaços da c averna. Nada foi por ac aso, hou ve um apr imoramento, desenvol v imento das técnic as e há hipótese que até a f igura do “ar tis t a ” foi cr iada naquele per íodo.

O de s enho é uma ling uagem que ul t rap as s ou s é c ulos e a t ra ve s s a tempos históricos, fazendo-nos pensar e t alvez concluir, que o homem sempre desenhou, consequentemente as cr ianç as t ambém apes ar de não exis tirem regis tros. Longe de ser rabiscos ou pass atempos , o desenho da criança merece ser estudado, e valeremos da professora doutora Rosa Iavelberg, quem pesquisou e criou mé todos p ara o de s envol v imento do d e s e n h o c ul t i v a d o. O d e s e n h o c ul t i vado subs titui o desenho espont âneo da escola renovada. Ele é inf luenciado pela cultura, “mantém seu epicent ro n a c r ia n ç a , s u j e i to c r ia d o r i n f o rmado, que produz como prot agonis t a de seus desenhos ” (I AV ELBERG , 20 0 6 , p. 12). Precis a entender a dinâmic a do ato de desenhar por ser uma aç ão cr i -

aç ão, imaginaç ão, percepç ão e sen sibilidade. Através dele, os pro fessores podem usuf r uir de meios para outras áreas do conhecimento. Para isso, tem alguns procedimen tos necess ár ios para o ensino, os quais serão expos tos. Vamos pens ar e apresent ar em propos t as de aula v iáveis e adapt áveis para a realidade escolar, seja ela qual for. E delas , o desejo é que se cr iam muit as outras , porque o conhecimento é v i vo e se trans for ma.

ativa. O desenho nessa ação é criat i vo, um o bje to simb ó lico e c ul t ural , expressivo, construtivo, individualizado e inf luenciado pela cultura. E ainda , de acordo com Ros a ( 20 0 6) , é possível ensinar a desenhar para todas as pessoas, desde que tenham uma or ient aç ão didátic a adequada.

também será desenvolvido, muitas vezes em um contex to his tór ico. Mas i n d e p e n d e n t e d e u m t e m a , é i m p o rtante que haja muita apreciação de i m a ge n s , o b r a s , f o t o g r a f i a s , m í d i a s , f ilmes entre outros, para que a criança c r ie um re p e r tó r io p ró p r io e sig ni f i cativo, fugindo dos desenhos estere ot ip a d o s . Há b l o qu e io s c r ia t i v o s e estagnação da prática no momento me que as crianças “são expostas a u m e xce s s o d e i m a ge n s v i s ua is p e l a mídia, sem trabalho orientador de leitura e desenvolvimento de percurso de criação pessoal.” (IAVELBERG, 20 06, p. 57 ). É impor t ante respei t ar o rep er tório trazido pelo aluno, utilizálo, dialogar porém não aceit á - lo sem ques tionamento:

Para haver o desenvolvimento de forma integral, precisa entender e co m p r e e n d e r a s f a s e s co g n i t i v a s d a criança, os contex tos educativos e sociais , respei t ando os proces sos de c ada fase: t anto para es timular e não d e i x a r e s t a g n a r. “A a p r e n d i z a g e m , por tanto, afeta o desenvolvimento do desenho e é or ient ada por conteú dos de diferentes âmbitos (cogniti vo, f ísico, afeti vo) que se ar ticulam desde os desenhos pré - simbólicos iniciais .” (I AV EL B ERG , 20 0 6 , p. 12). O de s enho faz par te do caminho simbólico de c ada indi v íduo, faz par te da poétic a e marc a pessoal, inser indo numa di versidade cultural. Por isso é impor t ante aceit ar as diferenç as , ensinar a di versidade, não moldando e enquadrando em estilos porque assim, cumpre t ambém com os propósitos da educ a ç ão integral por ser didátic as inclusi vas e democrátic as.

Primeiro, todas as propostas estão f undament adas na propos t a tr iangu lar de A na Mae B ar bos a, onde a ar te é ensinada através de três eixos que dia l o ga m e n t re si: o f a ze r, o co n te xt u a l i z a r e o a p r e c i a r. S e g u i n d o e s s a abordagem, o desenho cultivado

Partir e/ou considerar o repertório de obras e conceitos que os estudantes trazem não significa perpetuar incondicionalmente qualquer tipo de produção e repertório – isso não seria dialógico. Ao professor cabe convidar o estudante a repensar, refazer, refletir, retomar sua produção e repertório e abrir as possibilidades de diálogo a partir de outros referenciais e leituras (...). (MARQUES, BRAZIL, 2014, p. 122).

VAMOS PENSAR NO DESENHO NA SALA DE AULA?

O desenho cultivado se transforma, é in f lue n c ia do, é p ro du to da c ul t ura em que o aluno es t á inser ido. Ent ão, serão apresent adas as fases es tipula das pela Ros a Iavelberg :

De fato, o desenho é uma linguagem que se trans for ma, se desenvol ve a par tir da integraç ão da cogniç ão,

1 – A ç ã o: o s d e s e n h o s s ã o p r é - s i m bólicos e progressi vamente se tornam


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s í m b o l o s . É a f a s e d a AÇ ÃO, p o r q u e p a r a a c r ia n ç a , d e s e n h a r é r a b i s c a r, explorar movimentos, planos, agir numa super f ície. Ela produz para ser v is to, o ato cr iador é o ges to que aos poucos é coordenado com o olhar e com o cor po todo. 2 – Imaginaç ão I: esses traços progressi vamente se trans formam em símbolos: casa, bola, sóis etc. Para a cr ianç a, desenhar é represen tar os objetos visíveis, e são feitos de forma separada, desar ticulada e jus t ap os t a . É a fas e da IM AG IN AÇ ÃO 1. 3 – Imaginaç ão II: é o momento do d e s e nh o dia l o ga r e re p re s e n t ar narra t i v as . O de s e nh o tor na - s e image m nar rati va, e nele há uma his tór ia. É a fase IMAGINAÇ ÃO II, a criança desenha o que quiser, imaginar, objetos reais e ir reais. 4 – A propr iaç ão: é quando a criança deseja e se apropria do simbo lismo ex terno e social, nesse momento a mediaç ão didátic a na escola ou em o u t r o s e s p a ço s é m u i t o i m p o r t a n t e.

S ã o n e ce s s á r ias p rá t ic as e sp e c í f ic as e guiadas para não bloquear a cr iati vidade e es timular uma produç ão con sciente inf luenciada por uma estétic a ins tigante. Nor malmente é a fase das cr ianç as do ensino f undament al, e elas s ão bombardeadas por padrões adultos. Para que o desenvol v imento do desenho cultivado continue, é n e c e s s á r i o e x t i n g u i r a b o r d a ge n s d a li v re express ão, ref letir e pratic ar técnic as como for mas de pens ar e habili dades. 5 – Proposição: é a apropriação do desenho como ling uagem e x pres siva, funcional e cultural, e a criança se en xergar como um produtor cultural. Há três exemplos de ações que auxil iam no desenvol v imento do desenho c u l t i v a d o: d e s e n h a r co m f r e q u ê n c i a e muito; obser var os desenhos de

outros alunos e de ar tis t as; exercícios com desenho de imaginação, memória e de o b s e r v a ç ã o (o u t ro s de s e nh o s e d o m u n d o f í s i c o) . P a r t i n d o d e s s a s dinâmicas e conceitos será expos ta uma prática e os result ados das aulas , q u e s ã o p r o d u çõ e s d o s a l u n o s . El a s p ar te m do p r in c ípio e m de s envol ver e lem en tos g rá f icos e de comp osiç ã o d o d e s e n h o, s ó q u e f u g i n d o da p r o pos t a te ór ic a e t radicional das aulas de A r te. A p ro p o s t a é ofe re ce r a o alun o uma folha com apenas 4 pontos pretos. Deve orientá-lo a criar algo com a linha utiliz ando, ligando os 4 pontos , p o d e n d o s e q u i s e r, d e s e n h a r u m ce n á r i o o u s o m e n t e p i n t a r o f u n d o. Pode também apresentar apenas linhas ou mesclar os dois elementos.

Simone Garcia - Doutoranda no Instituto de Artes da UNESP - SP - simonecristinag@gmail.com

PROPOSTAS PARA DESENHO CULTIVADO O assunto é amplo e oferece di ver s as ref lexões , longe de f inalizar ou concluir, a ideia é discutir e repensar no desenho da criança e no seu ensino. A compreensão do desenho cultivado só oferece maior reper tório e ações para os professores na aplic aç ão de propos t as ar tís ti c as . Com or ient açõ e s cor re t as , vê - s e que é p os sí vel que todos consigam dominar o ato de desenhar. Dessa for ma, c abe a escola, aos professores e pais , o desen volv imento integral do desenho cultivado, sempre dia logando e interagindo com a cultura e sua diver sidade.

Referências Bibliográficas BIRCH, Helen. Desenhar: truques, técnicas e recursos para a inspiração visual. S.Paulo: Gustavo Gili, 2015. DEWEY, John. Arte como Experiência. São Paulo: Martins Fontes, 2010. GOMPERTZ, W. Pense como um artista... e tenha uma vida mais criativa e produtiva. Zahar, Rio de Janeiro: 2015. IAVELBERG, R. O desenho Cultivado da Criança. 1 ed. São Paulo: Zouk, 2006. JENNE, Peter. Como desenhar de forma errada. 1ª ed. – São Paulo: Gustavo Gilli, 2014. ______. Um olhar criativo. 1ª ed. – São Paulo: Gustavo Gilli, 2015. SÃO PAULO (SP). Secretaria municipal de educação. Currículo da Cidade: ensino fundamental componente curricular: Arte. São Paulo: SME, 2017, p.10 – 26, p. 63-71.

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O QUE PODE M FA ZER ARQUIT ETA S E ARQUIT ETOS PEL A SUA CIDADE?

O

ano Para pensarmos as possibilidades de atuação de arquitetas e arquitetos, é preciso lidar com uma realidade: metade da população brasileira já construiu ou fez alguma reforma, mas só 15% dessas pessoas utilizaram serviços de arquitetura. Essa mesma pesquisa registrou, ainda, que 70% das entrevistadas disseram que t e riam inter esse em c o ntratar e s s e ti p o d e s e rvi ç o . A q uestã o que se deve f o rm ul ar é a s e g ui nte : arqu i t e t o s foram formados para atender somente às demandas restritas às camadas de alta renda? Se olharmos ao nosso redor, é essa a impressão, pois os profissionais c onsider ado s bem-s uc e d i d o s s ão o s q ue p ro j e tam c a s a s em bairros condomínios de luxo, decoram lojas de grife ou, os que estavam no lugar certo e emplacaram c om o ar tistas, ideal i z am grand e s m us e us e e s tá d i o s . O fato de, atualmente, o campo de atuação estar em gran de par te r esumi d o a s ati s f az e r s up e rf i c i al i d a d e s d o c onsumo e do po der, c ap ri c ho s d e um a e l i te e c on ô m i c a e de g o ver na ntes pouc o re s p o ns áve i s ( o b ras d e s s a s s ã o sem pre muito dispe nd i o s as ) , não s i g ni f i c a q ue n ã o h a j a u m c ampo imenso d e p o s s i b i l i d ad e s e o p o rtuni d a d e s . Nas boas universidades, públicas e privadas, jovens são fo r ma do s par a c o m p re e nd e r e i nte rvi r na re a l i d a d e urbana. E os que se propuserem a enfrentar grandes t are fas, per ceber ão o s d e s af i o s c o l o c ad o s a nó s . Atualmente, mais de 6 milhões de famílias ainda não possuem um lar ou moram em condições precárias. Há 35 milhões de pessoas sem acesso a redes de abastecimento d e água e 1 0 0 milhõ e s – q uas e m e tad e d a p o p u l a ç ã o – não tem acesso a redes de coleta e tratamento de esgoto. Est es bens e dir eito s , ne g ad o s a g rand e s p arc e l a s , s ã o o

Arquitetos foram formados para atender somente às demandas restritas às camadas de alta renda? b á s i c o d o b á s i c o . T a i s n ú m e r o s s ã o g r i t a n t e s e most ra m e m q u e m e d i d a , n o Br a s i l d e m u i t a g e n t e , a civiliza çã o convive com a barbárie. Por meio do que denominamos de “Assessorias Técnicas”, ou então “Assistência Técnica para Habitação Social”(ATHIS), q u e i n c l u s i v e é u m d i r e i t o p r e v i s t o n a l e i 11.888/2008, arquitetas e arquitetos já trabalham para atender a e s s a s n e c e s s i d a d e s u r g e n t e s e r e v e r t e r t a l q u a dro. Esses arquitetos propõem melhorias e reformas de baixo custo, constroem casas na forma de mutirões autogeridos e pressionam as prefeituras a executar obras viárias e de equipamentos comunitários de interesse coletivo. Isso se dá através de laboratórios universitários, institutos, ONGS, escritórios populares, cooperativas junto a movimentos sociais e mesmo em administrações públicas mais compromissadas com o avanço do todo social. Arquitetas e arquitetos comprometidos com nosso futuro em comum são aqueles c a p a ze s d e a t u a r j u n t o a e s s a s n e c e s s i d a d e s rea is. Há outras questões que impactam diretamente nosso cotidiano urbano, nas quais arquitetos – que são também urbanistas – tem um papel f u n d a m e n t a l , e m b o r a n ã o p o s s a m r e s o l v e r s ozinhos. Um primeiro é a mobilidade urbana. Atualmente, os espaços urbanos são pensados majoritariamente para os automóveis – em termos de infraestruturas


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e investimentos--, mas esses não são responsáveis pelos deslocamentos da maioria da população. Essas mesmas cidades pensadas por carros são espraiadas, c om lo nga s dista nci as e ntre áre as c e ntrai s e p e r i f e r i a s . N ão po r a caso , em g rand e s c i d ad e s c o m o s ão P a u l o , ¼ d a po pula ção per de 4 ho ras p o r d i a e m d e s l o c am e n t o s . Isso resulta em um mês do ano; é uma parte da vida p e rdida no trânsito . É urg e nte p e ns ar um o utro m o d e l o de mobilidade que não seja pensado para os carros, mas priorize – em termos de espaços e investimentos públicos -- um transporte coletivo eficiente, acessível, com matriz energética limpa e integrado a outras formas de “mobilidade ativa” para pequenas d ist ância s ( isto é, a b i c i c l e ta, o c am i nhar e tc ) . A segunda questão , l i gad a ao ante ri o r, é a d e g r a d a ç ã o ambiental. Em nossas cidades, há quilômetros de rios poluídos e milhões de pessoas sem água potável; a poluição do ar se mantem em níveis preocupantes há décadas. Resíduos acumulam-se em áreas indevidas e os ônus desses desastres recaem de modo desigual sobre as populações. Temos legislações ambientais avançadas que são desconsideradas quando se trata de favorecer setores econômicos de importância política. Mas as gerações re c entes já tem mo s trad o um a s e ns i b i l i d ad e e c ol ó g i c a e atenção para o tema; arquitetos-urbanistas tem condições de trabalhar junto de outros setores organizados para construir saídas que envolvam o poder público, mas t am bém ex perimento s q ue p o s s am s e r p o p ul ari za d o s – c om o o s da agr o ecol o g i a e d a p e rm ac ul tura urb a n a . N a escala do edifício, já há tecnologias de baixo custo no re u so de á gua , siste m as d e m ai o r e f i c i ê nc i a e ner g é t i c a , t é c n ica s co nstr utivas c o m m ate ri ai s re no váve i s e t c . Uma terceira questão é a invisibilidade das periferias, majoritariamente negras. Por carregarem estigmas diversos, são as áreas onde há uma violência institucional indiscriminada, que mata grande parte de nossos jovens e c erceia o futuro d e tanto s o utro s , p o i s não s e o f e r e c e oportunidades a esses. Tais áreas, carecem políticas de educação, cultura, saúde. Isso porque as periferias são ignoradas em termos de investimentos públicos e não podemos mais esperar a boa vontade de uma figu ra sa lv ado ra, o u s e j a, é ne c e s s ári o um a p arti c i p a ç ã o direta da população – e arquitetos-urbanistas estão in c lu ído s a í – no co ntro l e s o b re o nd e , q uanto e q u a n d o o dinheiro público será investido. As periferias já são áreas com vida urbana e cultural diversa, quando tais oportunidades sã o d ad as , o s re s ul tad o s s ão p al pá v e i s . Muitas vezes tais questões passam desapercebidas e, outras tantas, são consideradas normais por governantes e por parte da sociedade. Diante de todas essas, arquitetos-urbanistas terão de saber aglutinar forças,

reunir outros setores da sociedade e propor saídas p a c t u a d a s , q u e e x i g e m e s f o r ç o s c o l e t i v o s . N u m mundo onde se valoriza por demais a “inciativa individual”, esquecemos como se pensa coletivamente, mas as questões mais importantes de nosso tempo exigem essa inteligência e envolvimento. É preciso retomar a aposta na possibilidade de transformações sociais efetivas através de ações coletivas. E afirmar alto e e m b o m t o m q u e o n a t u r a l i za d o é i n a c e i t á v el. Como se percebe, a atuação de arquitetos-urbanistas não d i z r e s p e i t o a i n t e r v i r a p e n a s n o “ a m b i e n t e c onst ruído” , mas também e sobretudo nas práticas, crenças e valorações da sociedade urbana; pra falar filosoficamente, é preciso ter a coragem de propor outras formas de subjetivação e outros modos de viver juntos. Isso porque é próprio de nossa cultura mercantil hegemônica os anseios pelo “exclusivo e diferenciado”, a vontade difusa de distinção social, a reiteração de hierarquias injustificadas e estigmas históricos, que se traduzem n a s c i d a d e s f e i t a s d e m u r o s , c a t r a c a s , c a m a rot es VI P e o u t r o s e s p a ç o s q u e s ó a c e s s a m q u e m p o d e pa ga r. Nã o podemos ter medo de dizer que esse é um quadro em que a arquitetura e urbanismo estão rebaixados, submetidos a v a l o r e s q u e n ã o s ã o o s s e u s . E m v e z d i s s o , a rquit et a s e a r q u i t e t o s p r e c i s a r ã o c u l t i v a r o d e s e j o d e u ma cida de a b e r t a , f e i t a p a r a t o d o s e , m a i s , f e i t a p o r t o d as e t odos. Uma cidade onde as pessoas sejam reconhecidas e v a l o r i za d a s p e l o s i m p l e s f a t o d e s e r g e n t e . É também tarefa nossa perceber que as cidades podem ser o espaço de uma sociedade efetivamente democrática, melhor para todas e todos. Pela maior proximidade entre governantes e cidadãos, as cidades podem ser lugar da participação mais direta da população na formulação e acompanhamento de investimentos e políticas públicas. Por sua própria configuração socio-espacial e sua formação histórica, as cidades r e ú n e m p e s s o a s , c o n c e n t r a m s e r v i ç o s e i n f r a est rut ura s f u n d a m e n t a i s e , p o r t a n t o , d e t é m o s r e c u r s o s ma t eria is e humanos necessários para construção de formas de vida que sejam socialmente justas, economicamente d i n â m i c a s e a m b i e n t a l m e n t e s u s t e n t á v e i s . É um gra nde desafio, um desafio geracional, mas é próprio da juventude não se contentar com pouco. Estas proposições podem parecer utópicas, mas projetar é um exercício de ampliar as fronteiras do possível. E vale r e p e t i r , a j u v e n t u d e é j u s t a m e n t e a q u e l a q u e a inda nã o s e c o n t e n t o u c o m o q u e e s t á d a d o . Já t e m o s na hist ória de nossa disciplina e também em nossa sociedade, forças vivas que são movidas pelo desejo de construir aqui e agora o que se deseja para o futuro.

Paolo Colosso Arquiteto-urbanista, bacharel em Filosofia pela Unicamp, Mestre e Doutor em Filosofia pela USP. Atualmente, é professor de Teoria e História da Arquitetura e Urbanismo na Universidade Federal de Santa Catarina(UFSC), pesquisador no Instituto de Estudos Avançados da USP e compõe a coordenação do Projeto BrCidades – por uma nova agenda para as cidades do Brasil.

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USP CR IA CE N T RO DE PESQUISA NA ÁRE A DE IN T EL IGÊ NCI A ARTIFICI AL

I l u s tr a ç ã o : F r eep i k v i a A g ên c i a F a p e s p

A

USP irá contar com um novo centro dedicado para o desenvolvimento de estudos na área de inteligência artificial. O projeto, que nasceu a partir de uma proposta elaborada pela Pró-Reitoria de Pesquisa (PRP), foi selecionado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e pela empresa IBM e receberá recursos da ordem de US$ 1 milhão anuais durante um período máximo de d e z ano s. Investime nto – C o m f i nanc i am e nto d e a t é 10 anos, IBM e FAPESP re s e rvarão , c ad a um a, até U S $ 500 mil anualmente para implementar o projeto, que contará c om av alia çõ es peri ó d i c as d as ati vi d ad e s . J á a U S P , p o r sua vez, investirá em instalações físicas, laboratórios,

estratégias de transferência da tecnologia para a sociedade. Também estão previstos estudos sobre as implicações socioeconômicas da inteligência artificial n a s o c i e d a d e , c o n t r i b u i n d o p a r a d e b a t e s q u e envolva m q u e s t õ e s s o b r e é t i c a , r e l a ç ã o , p r i v a c i d a d e e t ra ba lho.

professores, técnicos e administradores para gerir o centro. O projeto foi desenvolvido para abarcar aplicações de inteligência artificial em eixos de pesquisa envolvendo aprendizado de máquina, processamento de linguagem natural, recursos naturais (óleo e gás), agronegó cio , meio am b i e nte , f i nanç as e s aúd e .

sistemas digitais inteligentes (com recursos de inteligência artificial ou aprendizado de máquina) sobre políticas de saúde, medicina de precisão, cidades inteligentes, sistemas econômico-financeiros, ética e sociedade, mobilidade, modelagem molecular, planejamento de fármacos, energias renováveis, avaliação de dados gerais (incluindo dados científicos), entre outros. A PRP investiu, n e s s e p r o g r a m a , r e c u r s o s d a o r d e m d e R $ 1, 5 milhã o.

Mais de 60 pesquisadores de 14 unidades da USP estarão envolvidos no projeto, que será coordenado pelo professor da Escola Politécnica (Poli), Fabio Gagliardi Cozman. O início d as atividades está p re vi s to p ara o p ri nc í p i o d e 2020. “Este é um ponto de partida para criarmos um grande centro na área de inteligência artificial. Estamos no mundo do conhecimento, das grandes informações, dos grandes dados, do qual a Universidade não pode ficar de fora”, afirma o pró-reitor de Pesquisa, Sylvio Roberto Accioly Canuto. O novo núcleo deverá desenvolver pesquisas básicas e aplicadas, além de

Canuto explica que a proposta apresentada à Fapesp e à IBM t e v e o r i g e m e m u m p r o j e t o d e s e n v o l v i d o no â mbit o da PRP. Em outubro do ano passado, a Pró-Reitoria lançou u m e d i t a l p a r a o f i n a n c i a m e n t o d e p e s q u i s a s r ea liza da s por unidades, museus e institutos especializados relacionadas a essa área, que recebeu 112 inscrições. Foram selecionados 43 trabalhos que fazem uso de

“A USP se insere fortemente nessa área que é fundamental e e s t r a t é g i c a p a r a o f u t u r o d e q u a l q u e r p a í s . P a ra nossa surpresa, o número de projetos inscritos no edital foi m u i t o s u p e r i o r a o e s p e r a d o , o q u e d e m o n s t r a o gra nde p o t e n c i a l d a U n i v e r s i d a d e ” , c o m e m o r a o p r ó -reit or.

Adriana Cruz Redação do Jornal da USP para AEscola Legal


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UNIPER M ACULT UR A CUR SOS DE PER M ACULT UR A / E AD

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USPConceitualmente, hoje em dia a permacultura é considerada uma ciência holística, de cunho socioambiental, que congrega o saber científico de algumas áreas (Arquitetura, Ecologia, Agricultura, entre outras) com a cultura tradicional popular e visa, c laro, a no ssa perm anê nc i a c o m o e s p é c i e na Te r r a . Surgiu nos idos de 1970, na Austrália, a partir de investigações e estudos de professores e alunos de Biologia/Ecologia que se opunham ao modelo capitalista de produção agrícola industrial, e pretende atualizar e manter sistemas de escala humana ambientalmente sustentáveis, socialmente justos e financeiramente viáveis, sem explorar mão-de-obra ou destruir o meio

ambiente, em respeito ao planeta e a todas as formas de vida. A Universidade de Permacultura deixa de ser privada e passa a ser uma comunidade de pesquisa e a p r e n d i za g e m p ú b l i c a e g r a t u i t a . Qu e r s e r n o s so a luno? Os nossos cursos estão sendo oferecidos gratuitamente. G r a ç a s a o s p r o f e s s o r e s , e q u i p e t é c n i c a e n o s s os a lunos estamos realizando o sonho inicial de democratizar o acesso a Permacultura de maneira técnica e científica, p a r a t o d a s a s p e s s o a s e g r u p o s s o c i a i s . E n t r e na nossa p l a t a f o r m a e v e j a q u a l c u r s o v o c ê q u e r f a ze r . Clique na opção de fazer a matrícula e faça tudo online e automático. Informações:contato@unipermacultura.com.br A ce s s e : h t t p s : / / w w w . u n i p e r m a c u l t u r a . c o m . b r /

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EST R AT ÉGIA S A N TIBULLY ING PAR A O A MBIEN T E ESCOL AR

T o d a a a ten ç ã o n a s es c o l a s é n e ce s s á r i a

R E SUMO: Es t a pesquis a v is a analis ar es tratégias antibul l y ing , no ambiente escolar, propos t as por pesquis adores brasileiros e espanhóis. Trata-se de um estudo descritivo e exploratór io, de c aráter qualit ati vo, e que teve como pro ce dim en to m e to do lóg ico a p e s quis a bib liog rá f ic a . A li teratura analis ada foi compos t a por teses e disser t ações brasileiras , public adas de 20 0 0 a 2012, e ar tigos public a dos de 20 0 0 a 2013 nos dois países. A literatura brasileira enfatizou ações de infor maç ão, sensibiliz aç ão, cr iaç ão de re g r a s e c a p a c i t a ç ã o p rof is sio na l , e a li te r a t ur a e sp a n hola des t acou ações de melhor ia das relações inter pessoais, desenvolvimento emocional e autoestima, ensino de valores sociomorais , c apacit aç ão docente e das famí lias. Os result ados apont am para uma sér ie de ações , as quais podem ser inser idas num plano antibull y ing a ser desen vol v ido cotidianamente, contr ibuindo para uma mudanç a d o co m p o r t a m e n t o d e s r e s p e i t o s o e p a r a a co n s t r u ç ã o d e r e l a ç õ e s i n t e r p e s s o a i s , n o a m b i e n t e e s c o l a r, m a i s solidár ias , jus t as , cooperati vas e respeitos as , proporcio nando, assim, mais do que informações sobre o fenômeno. PA L AV R A S - C H AV E : B u l l y i n g . I n t e r v e n ç ã o p e d a g ó g i c a . V iolência. Escola.

mul tic aus ais ( AV ILÉ S M A R T INE Z , 2013; DEL B A R R IO; VA N DER MEULEN , 2016) , superando a v is ão simplis t a de que o fenômeno surge por carac terísticas de alvos e autores, que direcionava, assim, as es tratégias de inter venção somente p a r a a d í a d e a u t o r- a l v o. N ã o a p e n a s a s c a r a c t e r ís t i c a s in d i v i d ua is d e c a da s u je i to, co nsi d e r a da s co m o f a to re s de r isco/ v ulnerabilidade, inf luenciam no surgimento e na manu tenç ão de t ais ag re s s õ e s , mas , s obre t udo, a v is ão que o outro, no c aso o gr upo, tem sobre o sujeito que o tor na diferente, e as c arac ter ís tic as das relações que os sujei tos mantêm , uns com os ou t ros , naquele momento (S A L M I VA L L I; PEE T S , 2010 ; SU L L I VA N; C L ER Y; SU L L I VA N , 20 05). Autores de bull y ing fazem escolhas sutis de suas v ítimas por vê -las como diferentes e vulneráveis (DEL BARRIO; VAN DER MEULEN , 2016). No bull y ing há t ambém um terceiro per sonagem além daquele que intimida e o que recebe a intimidaç ão: o público que assis te, que nos per mite con f ir mar a propens ão de poder e per tencimento ao gr upo. Es te terceiro, por suas reações, enaltece ou diminui a con s agraç ão do autor que busc a o reconhecimento e t ambém inf luencia demasiadamente a vítima, que se vale da necessidade de per tencimento para situar-se nes t a condiç ão.

INTRODUÇÃO O f e n ô m e n o b u l l y i n g é co n ce i t ua d o co m o u m co n j u n to de ações agres si vas , intencionais e nor malmente repeti t i v a s , m a n t i d a s a o l o n go d o t e m p o e o c o r r i d a s n u m a r e l a ç ã o d e s i g u a l d e p o d e r, p r a t i c a d o p o r u m a o u m a i s pessoas , c aus ando danos f ísicos ou morais (DEL B A RRIO et al., 20 05; OLWEUS , 19 9 9, 2013). Trat a -se de um tipo de relação, um vínculo mantido no tempo, normalmente entre sujeitos que interagem muit as vezes, sendo que cada nova interaç ão é inf luenciada pela anter ior e pelas expec t ati vas de novas interações (DEL B A RRIO; M A R T ÍN; A LMEIDA ; B A RRIOS , 20 03). A literatura científ ica esclarece que o bull y ing tem fatores

I s to p o s t o, é p r e c i s o l e m b r a r q u e p e s q u i s a s a t ua i s , n o Brasil, concordam com a c arac ter ís tic a da par idade para e xplic ar os problemas e xis tentes . A miúde, is to signi f ic a q u e h á b ull y in g e n t re s u je i to s c u jo p e s o da a u to r i da d e ins titucionalizada seja igual – entre alunos e alunos, entre professores e professores, e assim para outros segmentos ( TOG NE T TA ; AV IL É S; ROS Á R IO, 2014; TOG NE T TA ; V INH A ; AV I L É S M A R T I N E Z , 2014) . Em b o r a , p e l a s c a r a c te r ís t i c a s indic adas por Ol weus (19 9 9; 2013) , compreenda -se que o bull y ing poss a ocor rer em qualquer direç ão, como entre alunos ou entre alunos e professores , chefes e subordi nados , no Brasil, us a -se a express ão assédio moral para esse tipo de v iolência, ou seja, quando ela envol ve uma


Æscola Legal | Nº03 | Abr 2020 autor idade ins tituída. Pe s quis as têm e v idenciado que o bull y ing t ambém e s t á relacionado à busca do autor por status social, poder e per tencimento no grupo (DEL BARRIO et al., 20 05; J U N O V E N ; G A LVA N , 2 0 0 8 ; R O L A N D, 2 010 ; S A L M I VA L L I , 2 010 ; S A L M I VA L L I; PEE T S , 2 010) , a l é m d e s e r u m p r o b l e m a m o r a l , v i s t o q u e v a l o r e s co m o r e s p e i t o , j u s t i ç a e igualdade es t ão ausentes nes t as ações (MENE SINI et al., 2 0 0 3; O R T E G A ; S Á N C H E Z ; M E N E S I N I , 2 0 02 ; TO G N E T TA , 2011; TOGNE T TA ; AV ILÉ S M A R T INE Z ; ROS Á RIO, 2014). Pelo expos to, as es tratégias antibullying no ambiente escolar devem ser direcionadas sobre o gr upo e, pr inci palmente, sobre a qualidade das relações que se es t abel ecem no inter ior des te, indo além de ações que incidem apenas nos alvos, autores e testemunhas de bullying ( N AY LO R ; CO W I E , 19 9 9 ; S A L M I VA L L I , 2010 ; S A L M I VA L L I; PEE T S , 2 010 ; D EL B A R R I O, 2 013; D EL B A R R I O ; VA N D ER MEULEN , 2017 ) , promovendo uma educ aç ão mais ampla, t anto em valores morais (MENIN , 20 02; VA N DER MEULEN; GR A NIZO; DEL B A RRIO, 2010) , como em relaç ão aos senti mentos ( TOGNE T TA , 20 03). No Brasil, foi aprovada a Lei nº. 13.185 (BR A SIL , 2015) , a q ua l ins t i t ui q u e to d o s o s e s t a b e l e c im e n to s d e e nsin o, públicos ou privados, devem desenvolver medidas de diagnose, prevenção e contenção do fenômeno, indicando co m o o bje t i vo s de s te p rog rama a p ro m o ç ã o da c ida da nia, da empatia, do respeito aos outros. A Lei nº. 13.6 63 (BR A SIL , 2018) incor porou o propos to na lei anter ior à Lei de Dire t r ize s e B as e s da Educ aç ão Nacional (L DB) , indi cando a obrigatoriedade de promoção de medidas de con scientiz aç ão, prevenç ão e combate às diferentes for mas de v iolência, especialmente o bull y ing , no âmbito escolar. Pe s quis as têm en fa t iz a do que o bull y ing não é “ br inc a deira de idade ”, e sim, uma v iolência que é um fato nas escolas; um problema que afet a for temente toda a comu nidade escolar (AV ILÉS M A R TINE Z , 2013; DEL BA RRIO; VA N DER MEULEN, 2017; DEFENSOR DEL PUEBLO, 2007; FISCHER , 2010; MENE SINI et al., 20 03; TOGNE T TA ; ROS Á RIO, 2013). Embora o bull y ing não seja o único problema das escolas , e s t u d o s co m p r o v a m s u a f r e q u ê n c i a n e s t e s a m b i e n t e s . No Brasil, por exemplo, a Pesquis a Nacional de S aúde do Escolar - PENSE de 2015, revelou que 7, 2% de uma amos tra d e 10 2 . 0 7 2 a l u n o s m a t r i c u l a d o s n o 9 º a n o d o E n s i n o Fundamental no ano de 2015, em escolas públicas e privadas de todo o país, se sentiram humilhados por provocações, e 19,8% desta amostra af irmou ter intimidado ou caçoado de algum de seus colegas (IBGE, 2016). Outro es tudo nacional foi desenvolvido pelo Centro de Empreendedorismo Social e Administração em Terceiro Setor (CE ATS) e pela Fundação Ins tituto de Adminis tração (FIA), com 5168 alunos do 5º ao

8 º ano do Ensino Fundament al, das cinco regiões do país. Nesse es tudo, obser vou -se que cerc a de 20 % dos par tici pantes af ir maram que presenciam f requentemente atos de v iolência na escola e 10,1% dos es tudantes indic aram que veem algum colega sendo mal trat ado todos os dias (FISCHER , 2010). Na Espanha, dados de um es tudo nacional (DEFENSOR DEL PUEB LO, 20 07 ) , realiz ado com 3 0 0 0 e s t udante s de e du c ación secundar ia obr igatór ia, com idades entre 12 e 16 anos , ev idenciaram que 27% desses es tudantes se consid eravam al vos de insultos e 26 ,6% al vos de apelidos ofen si vos. Insultos e apelidos humilhantes foram obser vados p o r ce rc a d e 9 0 % d o s a l un o s p a r t i c ip a n te s . A p e s q uis a também mos trou índices de quem se reconhece como autor dos diferentes tipos de bull y ing : 32,7% af ir mou ter ignorado algum colega; 29, 2% ter coloc ado apelidos ofen si vos e 32, 4% reconheceu ter insult ado algum colega com f requência. Considerando a complexidade do fenômeno, sua frequên cia nas escolas e as legislações exis tentes , faz-se urgente pens ar sobre inter venções. A ssim, o presente ar tigo tem co m o o bje t i v o a na lis a r a s e s t r a té g ia s a n t ib ull y in g p a r a prevenção e contenção do fenômeno, no ambiente escolar, tendo como base as indic ações da literatura brasileira e espanhola, public adas entre 20 0 0 e 2013. Tal referencial pode contr ibuir para a cr iaç ão de novos projetos antibul l y ing nas escolas ou até mesmo de polític as públic as em ní ve l na c io nal e na c a p a c i t a ç ã o d o ce n te. Para is s o, nas discussões , após apresent aç ão das diferentes c ategor ias de es tratégias de inter venções , faz-se uma retomada das m e s m a s , e x p l i c i t a n d o - s e co m o o r g a n i z á - l a s n u m p l a n o antibullying. Buscou-se t ambém as contribuições dos pesquis adores espanhóis , pois o país tem uma trajetór ia de es tudos sobre a temátic a iniciada na déc ada de 9 0, além de apresent ar muit as es tratégias antibull y ing que se f un dament am em açõe s ligadas à Educ aç ão em Valore s , ao es tímulo à melhor ia da conv i vência e do clima das rela ções inter pessoais na escola. A e s co l h a p e l a s p r o d u çõ e s d e s s e s d o i s p a ís e s s e j u s t i f ic a pela diferenç a entre o tempo de reconhecimento do problema em ques t ão. S abe -se que a Espanha há déc adas r e co n h e ce a i m p o r t â n c ia d e u m a co n v i v ê n c ia d e q ua l i dade entre todos nas escolas e vem desenvol vendo pro gramas t anto de combate e prevenç ão ao bull y ing como volt ados a outras for mas de v iolência, tendo uma lei para promoç ão da conv i vência há mais de 10 anos (DEFENSOR DEL PUEBLO, 20 07; DEL B A RRIO; VA N DER MEULEN , 2017 ). N o B rasil , o re co nh e c im e n to da g ra v ida de e f re quê n c ia de c asos de bull y ing e tomadas de prov idência legais em relação a esse problema são recentes (BR A SIL , 2015; 2018).

Acesso ao artigo completo: https://periodicos.fclar.unesp.br/iberoamericana/article/view/12380 FRICK, Loriane Trombini.; MENIN, Maria Suzana De Stefano.; TOGNETTA, Luciene Regina Paulino.; DEL BARRIO, Cristina. Estratégias antibullying para o ambiente escolar. Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 14, n. 3, p. 1152-1181, jul./set., 2019. e-ISSN: 1982-5587. DOI: 10.21723/riaee.v14i3.12380. Aut. para a Revista AEscola Legal

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SESSÃO LIVROS\LITERATURA LITERATURA - OS CAMINHOS DAS LETRAS QUE LEVAM E TRAZEM À VIDA!

LEIA LIVROS A ERA DO CAPITAL IMPRODUTIVO A Era do Capit al Improduti vo não é um li v ro para economis t as , e sim para todos nós entender mos o que de economia nos interess a. Porque se trat a do nosso trab alho, do nosso dinheiro, do nosso planet a. Caso não tenha not ado, o sis tema es t á des andando. E não há volt a para um pass ado que alguns vêm como mais seguro e confor t ável. Ao apresent ar de maneira muito transparente os nossos des af ios , e as pr incipais trans for mações que o mundo es t á sof rendo nos últimos anos , es te li v ro é essencialmente uma fer rament a. Traduzido para a língua ingles a, espanhola e polones a, e é uma das mais impor t antes contr ibuições ao es tudo da Economia de nosso tempo, segundo Noam Chomsk y do MI T (Mass asshusset s Ins titute of Technolog y - US A .) Escrito pelo Professor e Economis ta L adslaw Dowbor es tá disponível nas livrarias, mas t ambém no blog ht tp: //dow bor.org , gratuito na íntegra online, e você pode assis tir um v íde o de 10 minu tos re fe re n te a c a da um dos 15 c ap í t ul os e m h t t p: //do w b or. o r g / 2 018 / 0 8 /c u r s o - p e d a go g i a - d a - e co n o m i a - co m - l a d i s l a u - d o w b o r- i n s t i t u t o - p a u l o freire -2018 -15 -aulas.html/ no quadro do programa Pedagogia da Economia que desen vol vemos com o Ins tituto Paulo Freire. E se quiser organiz ar um mini - cur so em tor no dos 15 c apítulos , es t á tudo online e gratuito, e muit as comunidades já o fazem. S e quiser consulte riccardo.padula1976@gmail.com, de uma comunidade no Rio de Janeiro que ac abou de realiz ar o cur so na sua região. A ideia básic a é que é possí vel, sim, as pessoas entenderem o que es t á acontecendo, e região. A ideia básic a é que é pos sí vel, sim, as pessoas entenderem o que es t á acontecendo, e reassumirem o controle das suas v idas.

OS SETE SABERES NECESSÁRIOS À EDUCAÇÃO DO FUTURO Edgar Mor in (pdf gratuito) Diante dos problemas complexos que as sociedades contemporâneas hoje enf ren t am, apenas es tudos de c aráter inter- poli - transdisciplinar poder iam result ar em análises s atis fatór ias de t ais complexidades: “Af inal, de que ser v ir iam todos os s aberes parciais senão para for mar uma conf iguraç ão que responda a noss as expec t ati vas , nossos desejos , noss as inter rogações cogniti vas? ” ht tps: // w w w.skoob.com.br/ li v ro/pdf/os-sete -s aberes- necess ar ios- para - a - educ a / li v ro:17169/edic ao:353529


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FUNDAMENTOS E PRÁTICAS TRANSFORMATIVAS EM MEDIAÇÃO DE CONFLITOS Ins tituto T HEM: w w w.ins titutothem.com.br “ Há pouco mais de 20 anos , os M A SCs – Métodos adequados de soluç ão de conf litos vêm conquis t ando legitimidade e ampliando sua aplic aç ão junto as diferentes ins ti tuições que integram nosso sis tema de jus tiç a e à populaç ão em geral. Gos t ar ia de realç ar a c apacidade des t a equipe! ” ( Vania Cur y Iazbek)

MANUAL GERAL DO DESEMPREGADO – NA ERA DA GLOBALIZAÇÃO Volmer Sil va do Rêgo Uma abordagem sociológica e bem (mal) humorada da condução da coisa pública, de 150 0 até ontem, a crise e o porquê do desemprego ser t ão ‘natualizado ’ no Brasil ... ht tps: // w w w.amazon.com.br/M A NUA L- GER A L- DESEMPREG A DO Globaliza%C 3% A7%C 3% A 3o -Terceiriza%C 3% A7%C 3% A 3o - ebook /dp/ B 0 0W TGB 0YS

DESPOLUINDO SOBRE TRILHOS José Manoel F er reira Gonç al ves A impor t ância dos trens no desenvol v imento do país , levant a uma ques t ão: Por que es t amos t ão atras ados? Es t amos presos aos automóveis? ht tps: // w w w. amazon.com.br/ Despoluindo -Tr ilhos- Manoel - F er reira Gon%C 3% A7al ves /dp/859153210 4

MINIMAIS Hamilton Far ias (Cont ato: 55 11 98 867-714 6) da coleção POTL ATCH pelo reencantamento do mundo Editorial Casa do omaguás No dizer de Nell y Novaes Coelho “minúsculas bolhas poétic as que eter niz am a v is ão f ugaz de um momento especial, de um pens amento ou de um olhar de s abedor ia, que, num relance c apt a o essencial do v is to ou pens ado.”

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OS PROFESSORES e os Estudantes

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chei por muito tempo que ia s e r p r o f e s s o r. T i n h a p e n s a d o em li v ros a v ida inteira, era - me imperiosa a dedicação a aprender e não guardava dúvidas acerca da impor t ância de ensinar. Lembrava - me de alguns professores como se fossem família ou amores proibidos . T i ve uma profe s s ora t ão b oni t a e simpátic a que me ser v iu de padrão de felicidade absolut a ao menos entre os meus treze e os quinze anos de idade, quando es tudante. A escola, como mundo completo, podia ser esse lugar per feito de liberda d e in te l e c t ua l , d e lib e rda d e sup e r i o r, o n d e c a d a i n d i v í d u o s e v o t a a encontrar o seu mais genuíno, honesto, caminho. Os professores s ão quem ainda pode, por delic ado e p re c io s o of íc io, to r nar- s e o c aminh o das pedras na porc ar ia do mundo em que o mundo se tem v indo a tor nar e cuidar dos es tudantes. Nunca tive exatamente de ensinar ninguém. Or ientei uns cur sos breves , a mui to cus to, e tento e xplic ar umas clarividências ao cão que tenho há umas semanas. Sinto-me sempre mais afetivo do que efetivo na pass a ge m d o te s te m u n h o. Q u e r o m u i to que o Freud, o meu c ão, entenda que es t abeleço regras para que tenhamos u m a v i d a m e l h o r, m a s n ã o s u p o r t o a tristeza dele quando lhe ralho ou o fecho meia hora na marquise. Sei per feitamente que não tenho pedagog ia , nã o e s t u de i didá t ic a , nã o s o u senão um tipo intuitivo e atabalhoado, um es tudante. Mas sei, e disso não tenho dú v ida, que há quem s aiba transmitir conhecimentos e que transmi tir conhecimentos é como cr iar de novo aquele que os recebe. Os alunos nascem diante dos professo res, uma e outra vez. Surgem de dentro de si mesmos a par tir do entusiasmo e das palav ras dos professores que os transformam em melhores versões. De alunos a estudantes. Quantas

ve ze s m e s en t i o u t ro dep ois de uma aula b r ilhan te. Punha - m e a c aminh o de casa como se tivesses crescido um p alm o in te iro duran te c in que n t a m i n u t o s . Co m o s e f o s s e m u i t o m a i s ge n t e . C h e i o d e u m o r g u l h o co m o v ido por haver tantos assuntos incríveis para se discutir e por merecer que alguém os discutisse comigo. Hou ve um dia, numa aula de his tór ia do sétimo ano, em que falámos das estátuas da Roma antiga. Respondi à profe s s ora , uma gorduchinha to da contente e que me dei x av a contente t ambém, que eram os olhos que indu ziam a sens aç ão de v ida às f iguras de pedra. A senhora regozijou. Disse que eu es t ava muito cer to. Iluminei-me todo, não por ter sido o estudante mais rápido a descor tinar aquela soluç ão, m a s p o r q u e t í n h a m o s v is to im a ge ns das estátuas mais deslumbrantes d o m un d o e e u e s t a v a e s m a ga d o d e beleza. Quando me elogiou a resposta, a minha profe s sora contente apenas me premiou a marav ilha que era , na verdade, a capacidade de induzir maravilha que ela própria tinha. Estávamos, naquela sala de aula, não todos os alunos, mas ao menos nós os dois, felizes. Prof undamente felizes. Ta l v e z e s t a s c o i s a s s ó t e n h a m u m a im p o r t â n c ia n o s t á lg i c a d o te m p o da meninice, mas é verdade que quando estive em Florença me doíam os olhos diante das es t átuas que v ira em reproduções no sétimo ano da escola. E o meu coração galopava como se tivesse a cumprir uma sedução antiga, um amor que começ ara muito antiga mente, se não inteiramente criado por uma professora, sem dúvida que potenciado e acarinhado por u m a p r o f e s s o r a . To d o o a m o r q u e nos oferecem ou potenciam é a mais precios a dádi va possí vel. Dá - m e is to a go r a p o r qu e m e a n d o a convencer de que temos um gover no que odeia o seu próprio povo. E porque me p are ce que p er s eg uir e tomar os

Professor anônimo português – residente no Brasil Professor de nacionalidade e língiua portuguesa, anônimo e que vive no Brasil há 28 anos.

Os alunos nascem diante dos professores, uma e outra vez. Surgem de dentro de si mesmos a partir do entusiasmo e das palavras dos professores que os transformam em melhores versões. professores como má gente é des truir a noss a própr ia c as a. Os professores são ex tensões óbvias dos pais, dos encarregados pela educação de algum miú d o, e mas s a c rá - l o s é co m o p e dir que nã o s ejam c ap aze s de c uidar da maravilha que é a meninice dos nossos miúdos, que é pior do que nos arrancarem telhas da casa, é pior do que perder a c a s a , é p i o r d o q u e co m e r a p e n a s sopa todos os dias. Es tudantes s ão os f ilhos dos nossos ir mãos. Es tragar os nossos pequenos é o f im d o m u n d o. E s t r a g a r o s p r o f e s s o r e s , e a s e s co l a s , q u e s ã o f u n d a m e n t a i s p ara me lhorarem os nos s os miúdos , é o f im do mundo. Nas escolas reside a esperança toda de que, um dia, o mundo seja um condomínio de gente bem for mada , apazig uada com a sua condiç ão mor t al mas es forç ada p ara s e t r a n s ce n d e r n o a l c a n ce d a f e l i c i dade. E a felicidade, disso já s abemos todos , não é indi v idual. É obr igator i amente uma conquis t a para um cole t i v o . P o r q u e s oz i n h o s p o r n a t u r e z a andam os des tituídos de afeto. A s e s c o l a s n ã o p o d e m s e r t r a n s f o rmadas em lugares de guer ra. Os pro fe s s ore s nã o p o dem s er re duzidos a b u r o c r a t a s e n ã o s ã o e l á s t i co s . N ã o é in di f e re n te e nsina r v in te o u t r in t a pessoas ao mesmo tempo. Os alunos não podem abdic ar da marav ilha nem do entusiasmo do conhecimento. E um p aís que for ma os s eus cidadãos e depois os expor ta sem piedade e por qualquer preço é um país que enlouqueceu. Um país que não se ocupa com a delicada tarefa de educar, não ser ve para nada. Es t á a suicidarse. Odeia e se odeia.


Æscola Legal | Nº03 | Abr 2020

PIB cresce 1,1% em 2019 fecha o ano em R$ 7,3 trilhões e apresentaram variação positiva foram: I n f o r m a ç ã o e c o m u n i c a ç ã o (4 ,1%) , Atividades imobiliárias avançou (2,3%), Co m é r c i o (1, 8 %) , O u t r a s a t i v i d a d e s de ser v iços (1, 3%) , Ati v idades f inan ceiras, de seguros e ser viços relacio nados (1,0 %) e Transpor te, armazen agem e correio (0, 2%). A atividade de Administração, defesa, saúde e educação públicas e seguridade social (0,0%) se manteve estagnada*(²) no ano, o que ref lete de fato uma retração ainda não medida (e que pode ser transformada em def lação), promovido pelos cor tes dos governos central e estaduais em nome da austeridade e da gestão.

E

m 2019, o PIB te ve cre s cimento de 1,1% em relação ao ano ante r i o r. E s te p e q u e n o c re s c im e n to resultou da expansão de 1,1% do Valor Adicionado a preços básicos e da alta de 1,5% no volume dos Impostos sobre Produtos líquidos de Subsídios. O resultado do Valor Adicionado neste tipo de co mp a ra ç ã o re f l e t iu o d e s e m p e nh o das três ati v idades que o compõem: Agropecuária (1,3%), Indústria (0,5%) e Ser viços (1,3%). Ou seja, os preços dos produtos taxados f icaram mais elevados para o consumidor final. O PIB per capita variou 0,3% em termos reais, alcançando R$ 3 4.533 em 2019. A taxa de investimento em 2019 foi de 15,4% do PIB, acima do obser vado em 2018 (15,2%). Já a taxa de poupança foi de 12,2% (ante 12,4% em 2018). Frente ao 3 º tr imes tre, na sér ie com ajus te s azonal, o PIB te ve al t a de 0 , 5% no 4º trimestre de 2019. A Indústria e os Ser viços apresentaram variação positiva de 0,2% e 0,6%, respec tivamente, enquanto a Agropecuária recuou (- 0,4%). Em decorrência des te crescimento, que é pífio, o PIB per capita*(¹) alcançou R$ 3 4. 533, (em valores correntes) em 2019, um avanço (em termos reais) de 0,3% em relação a 2018. Esta parece ser uma conta de soma zero ou

negativa, dado que os aumentos do dito c re s c im e n to foram re ve r t idos p e l os considerados para a análise. A var iaç ão em volume do Valor Adicionado da Agropecuária no ano de 2019 (1, 3%) decorreu do desempenho positivo tanto da agricultura quanto da pecuária, com des t aque para o milho (23,6%), algodão (39,8%), laranja (5,6%) e feijão (2, 2%). Na Indús tria (0,5%), o des t aque positi vo foi o desempenho das atividades em Eletricidade e gás, á g u a , e sgo t o , a t i v i d a d e s d e ge s t ã o de resíduos , que cresceram 1,9% em relação a 2018. Já o destaque negativo foi das Indús trias E x trativas (minera ção – e por que água não está aqui já grande par te dela também é ex traída do solo?) que sofreram queda de 1,1%. A Co ns t r uç ã o c re s ce u 1, 6% n o an o, s e n d o s e u p r im e iro re sul t a d o p o si tivo após cinco anos consecutivos de queda. As Indústrias de Transformação, por sua vez, apresentaram estabilidade (0 ,1%). O resul t ado foi inf luenciado, principalmente, pelo crescimento, em volume, do Valor Adicionado da fabricação de produtos de metal, de produtos alimentícios, de bebidas e produtos derivados do petróleo.

En t re o s co m p o n e n te s da d e ma n da interna, houve avanço do Consumo das Famílias (1,8%) e da FBCF (2,2%), segundo result ado positivo após uma sequên cia de 4 anos negativos. O Consumo do Governo teve variação negativa (- 0,4%). No setor ex terno, as E xpor t ações de Bens e Ser viços caíram 2,5%, enquanto as Importações de Bens e Ser viços avançaram 1,1%. Ou seja, o país comprou mais do que vendeu, logo a balança de comércio permanece desfavorável*( ³), e na soma geral dos dados e números a v e r da d e é q u e o p a ís s ó c re s ce u miseráveis 0,2% em 2019. Ent ão vamos às ques tões que importam: quanto destes valores vai para a Educação pública no país? Quanto irá para o sistema de saúde pública! Quanto será destinado às obras de infraestrutura? E para a Cultura, ou para as Forças Armadas e*(4). Os dados, contudo do por tal da transparência não condizem com os números anunciados pelo IBGE. E, em complemento: se com a alta taxa de desempregados e desalentados – os desinteressados que não procuram mais emprego no mercado de trabalho - chegamos a esta quantia, o que significam estes números? Maior desemprego mais dinheiro? Quem es t á ganhando com isso e quem está sofrendo? Não é preciso ser especialista no assunto para saber das respostas. *(5) Da Redação - AEscolaLegal

As atividades que compõem os Ser viços

*(¹) O que é pib per capita e como é medido? https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/bibliotecacatalogo?view=detalhes&id=72121 Para quem sabe ler tabela de dados: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-detalhe-de midia.html?view=mediaibge&catid=2102&id=3574 *(²) Teto de gastos: https://www.politize.com.br/teto-de-gastos-publicos-infografico/ Teto de gastos: - https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2016/12/13/pec-que-congela-gastos-do-governo-por-20-anos-e-aprovada-em-votacao-final.htm Teto de gastos: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-38270520 *(³) Balança de Comércio Favorável: https://www.educamaisbrasil.com.br/enem/matematica/balanca-comercial *(4) – Orçamento da União – 2019 : http://www.portaltransparencia.gov.br/orcamento?ano=2019 *(5) Coisa de especialista: https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2020/03/04/pib-2019-ibge.htm IBGE Fonte: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/27006-pib-cresce-1-1-em-2019-e-fecha-o-ano-em-r-7-3-trilhoes

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