Revista Inventa_06

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PUBLICAÇÃO IEME COMUNICAÇÃO distribuição dirigida e gratuita

Curitiba/PR

_NÚMERO 06 mar/abr_2010

_revistainventa.com.br




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EDITORIAL Começamos esta edição com a arte de Apo Fousek, livre como um pássaro. Livre como o personagem de Guilherme Caldas e Olavo Rocha que, em mais uma edição, nos diverte preso em seu pesadelo. Livre como a fotonovela de Benett, que chega em sua terceira parte. Livre como a opinião dos nossos colunistas e como a arte em rua que dia após dia é mais reconhecida como arte. Começamos 2010 comemorando nosso primeiro aniversário, lançando a sétima edição e agradecendo a todos que fazem parte deste nosso começo: colaboradores, colunistas, parceiros, anunciantes e, claro, você, leitor. Começamos este segundo ano com maior tiragem, com novos pontos de distribuição e com ainda mais vontade de nos comunicar com você. Boa leitura e até a próxima!

ILUSTRAÇÃO CAPA_ APO FOUSEK

EXPEDIENTE // INVENTA // EDIÇÃO PARANÁ // MARÇO_ABRIL 2010 // NÚMERO 06

A revista Inventa é uma publicação de caráter informativo com circulação gratuita e dirigida. Todos os direitos reservados. EDITADA POR

IEME Comunicação_ iemecomunicacao.com.br IEME _ Integração em Marketing, Comunicação e Vendas Ltda. Rua Heitor Stockler de França, 356 _ 1o andar _ Centro Cívico _ Curitiba _ PR // Tel.: (41) 3253-0553 // CNPJ 05664381/0001-27

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Taís Mainardes_ tais@iemecomunicacao.com.br Marília Bobato_ marilia@iemecomunicacao.com.br Bruno Reis_ ieme5@iemecomunicacao.com.br Diana Axelrud_ ieme7@iemecomunicacao.com.br Eduardo Santana_ ieme8@iemecomunicacao.com.br Flávia Ferreira_ flavia@iemecomunicacao.com.br Ivo Stankiewicz_ ieme4@iemecomunicacao.com.br Isadora Hofstaetter_ isa@iemecomunicacao.com.br Samantha Fontoura_ ieme9@iemecomunicacao.com.br Geísa Borrelli, Jéssica Amaral, Lays Cristine e Mariana Hillbrecht Ana Amaral_ ana@iemecomunicacao.com.br IEME_ comercial@iemecomunicacao.com.br Evelyn Bittencourt Almeida_ comercial2@iemecomunicacao.com.br Benett, Bia Moraes, Julio Sampaio, Leonardo Jianotti e Luiz Carlos Heller de Pauli

PROJETO GRÁFICO E FINALIZAÇÃO ILUSTRAÇÃO FOTOGRAFIA REVISÃO IMPRESSÃO E ACABAMENTO

D-lab_ dlab.com.br Diego The Kid_ diegothekid.com.br Prata Gelatina_ pratagelatina.com.br Mariana Leodoro_ marianaleodoro@yahoo.com.br Gigapress_ gigapress.com.br

CRÍTICAS _ inventa@iemecomunicacao.com.br RELEASES E SUGESTÕES DE PAUTA _ redacao@iemecomunicacao.com.br ASSINATURAS E EDIÇÕES ANTERIORES _ inventa@iemecomunicacao.com.br Os artigos assinados são de exclusiva responsabilidade dos autores e não refletem a opinião desta revista.

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ÍNDICE

09

_QUADRINHO

18

pgn_

_15 MINUTOS APO FOUSEK

16

38-39

18

40-41

20

42-43

22

44-45

_CLIMA: O TEMPO EM

POESIA E ESTÉTICA

_PRISIONEIROS

24-29

_ARTE ESSENCIALMENTE SUBVERSIVA

11-15 36 _RÁPIDAS

pgn_

32-35

_MIRAMUNDO

_ANALÓGICO DIGITAL

_DOA-SE

_UM PESCADOR NOS BASTIDORES

_AGENDA CULTURAL FCC

_O MISTÉRIO DA PIN-UP ESCARLATE - PARTE 03

24-29 46-47 _ENTREVISTA

_ARTIGOS

MARCOS JORGE

32-35

pgn_

30-31 48-50 _CLÁSSICA CURITIBA

_COLUNAS



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COLABORADORES

Eclética, curiosa, perfeccionista, especial. SABRINA SCHWAB é designer de formação e fotógrafa de coração. E tem uma história legal. Pensava que seria dentista quando crescesse e, inclusive, chegou a cursar a faculdade de Odontologia. Não toda. Mudou pra Desenho Industrial - Projeto de Produto e depois pra Programação Visual. Curitibana, atualmente vive em São Paulo e trabalha em um bureau de estamparia muito bacana. Sorte a deles! Aqui, em sua estreia como colaboradora na Inventa, seu olhar ilustra a matéria sobre grafite das páginas 32 a 35.

FABIANE BENTO, ou melhor, CHIQ! é jornalista graduada e cartunista na prática. Descobriu a Inventa via twitter, seguindo Benett e começando, assim, sua comunicação com a gente. Colaboradora fixa dos jornais Folha de S. Paulo e Diário de Pernambuco, com publicações em mais de 29 revistas e jornais, diz que começou com o cartoon sem nunca tomar esta decisão. “Tudo foi acontecendo assim, do além”, completa a responsável por ilustrar a matéria Doa-se nas páginas 38 e 39. + CHIQSLAND.COM

+ REVESDEMAVIE.WORDPRESS.COM

De fala calma e muito segura de suas palavras, a psicóloga MARILIZ VARGAS acredita no NÃO como uma eficaz ferramenta para dias melhores. Lançou recentemente o livro A Sabedoria do Não, onde defende que uma vida repleta de “SINS” pode ser muito mais negativa do que muitos pensam. Formada pela UFPR, trabalha com psicoterapia há mais de 20 anos e ministra cursos e palestras sobre o aprimoramento humano. Nesta edição da Inventa, divide um pouco de sua opinião com o artigo da página 46. + ROSEANIGRA.COM.BR

Casada com o também fotógrafo Humberto Michaltchuk, GUADALUPE PRESAS está com a Inventa desde a primeira edição, ou melhor, desde a zero. Ela e o marido são proprietários da Prata Gelatina Fotografia & Ateliê. Entre um click e outro, eventos e acompanhamento de entrevistas para a revista, Guadalupe exibe sua barriguinha de mãe de primeira viagem. O nome mexicano, dado pelos pais argentinos, foi uma homenagem à padroeira do México, Nossa Senhora de Guadalupe, e em agradecimento à lua de mel inesquecível que tiveram. + PRATAGELATINA.COM.BR

“Produtor cultural, profissional de marketing, metido a dirigir audiovisual, casado com a Carol, agregador das redes sociais, ligado ao mundo”. Este é o perfil de RODRIGO FORNOS no twitter. Em 140 caracteres não foi possível acrescentar que já integrou o staff de relações públicas do ex-presidente FHC e trabalhou no gabinete do prefeito Beto Richa. E nem que é nascido em Santos (SP), mas está em Curitiba desde 2003. Veio para atuar na produção do filme Cafundó, de Paulo Betti e Clóvis Bueno, e ficou. No ACT - Ateliê de Criação Teatral, de Luis Melo e Nena Inoue, e na Sutil Companhia de Teatro, de Felipe Hirsch, Guilherme Weber e Erica Migon, estudou e se aprofundou em produção. Já atuou também como produtor executivo e hoje, na Fita Crepe Filmes, dirige e produz vídeos institucionais e documentários. Nesta edição da Inventa, fala do que gosta e do que sabe na página 47. + TWITTER.COM/RODRIGOFORNOS

CRISTINA PAGNONCELLI gosta mesmo é de sujar as mãos e se divertir desenhando, pintando, recortando e colando. Nasceu em Pato Branco, fez faculdade na PUCPR, em Curitiba, e atualmente reside em Barcelona, onde cursa uma pós-graduação em Ilustração Criativa e trabalha como freelancer. Inquieta, a designer e ilustradora afirma que adora viajar e conhecer novos lugares, culturas e pessoas. Acredita que cada nova experiência traz ainda mais inspiração para seus trabalhos. Alguém duvida?

+ DESFIGURE.COM


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_QUADRINHO Guilherme Caldas e Olavo Rocha | Candyland

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_PONTOS DE DISTRIBUIÇÃO

_CARTAS SUA OPINIÃO É SEMPRE MUITO BEM-VINDA _ inventa@iemecomunicacao.com.br

CURITIBA

CTBA

_ARAD Rua Vicente Machado, 664 – Centro _CLUBE DE CRIAÇÃO DO PARANÁ (CCPR) Rua Mateus Leme, 4700 – Parque São Lourenço _DESMOBILIA Rua Vicente Machado, 878 – Batel _D-LAB Rua Rio de Janeiro, 1271 – Água Verde _FORNERIA BELLUNA Rua Teixeira Coelho, 255 – Batel _GALERIA LÚDICA Rua Inácio Lustosa, 367 – São Francisco _GARAGE Rua Jaime Reis, 278 – São Francisco _HACIENDA CAFÉ Al. Prudente de Moraes, 1283 – Centro _IEME COMUNICAÇÃO Rua Heitor Stockler de França, 356 – 1o andar – Centro Cívico _ITIBAN COMICS Av. Silva Jardim, 845 – Rebouças _JACOBINA BAR E RESTAURANTE Rua Almirante Tamandaré, 1365 – Alto da XV _LÓTUS Rua Estados Unidos, 1067 – Bacacheri _MUSEU GUIDO VIARO Rua XV de Novembro, 1348 – Centro _ORIGINAL BETO BATATA Rua Professor Brandão, 678 – Alto da XV _PIOLA Al. Dom Pedro II, 105 – Batel _PAÇO DA LIBERDADE SESC PARANÁ Praça Generoso Marques, 189 – Centro _PRESTINARIA Rua Euclides da Cunha, 699C – Bigorrilho _REALEJO CULINÁRIA ACÚSTICA Rua Cel. Dulcídio, 1860 – Água Verde _SANTILLANA LOUNGE BAR Av. República Argentina, 1649 – Água Verde _TIENDA Rua Fernando Simas, 27 – Praça Espanha – Batel

“Ler Inventa é maravilhoso. Relê-la torna-se ainda mais. Esperar a próxima edição é uma certeza de receber algo muito bom”.

“Adorei, tá linda! Principalmente a entrevista com o Alexandre Herchcovitch!” @kah_fernandes via twitter

Marina Mendes dos Santos – pedagoga

“Belo projeto gráfico, textos com conteúdo e uma agradável surpresa em ver que a revista é de Curitiba. Parabéns a toda equipe!”.

“Fiquei muito curioso com o trabalho de Cai Guo-Qiang (matéria publicada na Inventa_05 / página 28) e gostaria de saber como faço para entrar em contato com ele”. Mauro Lopes

João Marcos Pereira – empresário

“Adoramos a entrevista com o Alexandre Herchcovitch!”. Mariana e Fabíola – estudantes

“Benett realmente usa e abusa da sua criatividade na Inventa. Assim como ele, o pessoal da Candyland também. Muito legal esta revista abrir espaço para os curitibanos e a equipe daqui, afinal de contas, temos ótimos profissionais que merecem destaque”. Juliana B. Alves – jornalista

“Parabéns pelo blog! Notícias legais, rápidas de ler e gostosas de acompanhar!”.

Mauro, começamos nosso contato com ele através do próprio site caiguoqiang.com. Na verdade, precisamos traduzir os textos para Mandarim na primeira conversa, e depois trocamos alguns e-mails em inglês com a equipe dele.

“Parabéns pelo último número de vocês. Impressiona a evolução da revista - da proposta ao design e texto. @rafaelurban via twitter

“Parabéns pelo belo resultado em que a Inventa se transformou. Acompanho o blog com frequência e sempre encontro algo interessante”. Mahani Siqueira – jornalista

Marcela

PORTO ALEGRE

POA

_ALLEY
STORE Rua Amélia Telles, 578 – Bela Vista _ATELIER ELISA LISOT Rua Silveiro, 437, Salas 202 e 204 – Menino Deus _COMETA DESIGN Rua Gen. Bento Martins, 562 – Centro _PÓ DE ESTRELA Rua Alberto Torres, 228 – Cidade Baixa

SÃO PAULO

SP RJ

“A nova edição está impecável. Parabéns. A ilustração da capa… perfeita!” @oreinstein via twitter

_DESMOBILIA Rua Mateus Grou, 401 – Pinheiros _LIVRARIA POP Rua Dr. Virgílio de Carvalho Pinto, 297 – Pinheiros

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RIO DE JANEIRO

SUA OPINIÃO PODE VALER UM BRINDE EXCLUSIVO DA INVENTA! COMUNIQUE-SE COM A GENTE: inventa@iemecomunicacao.com.br

_La Cucaracha Bazar e Galeria Rua Teixeira de Mello 31, Loja H – Ipanema

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* Em razão de espaço ou compreensão, seu e-mail pode ser resumido, editado ou não publicado. _CARTAS


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RÁPIDAS

imagem_divulgação

GÂNGSTER EM NOVA YORK

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Em declaração ao jornal Folha de S. Paulo, William Ken-

nedy disse: “acho que todos estamos jogando todo o tempo”. É com este espírito que o jornalista de 85 anos escreve e descreve um retrato da América no início do século XX no livro O Grande Jogo de Billy Phelan publicação de 1978 - lançado recentemente no Brasil pela Cosac Naify. Parte de uma coletânea de sete livros, O Grande Jogo de Billy Phelan parece saído de um filme repleto de gângsters e chefões. Pôquer, boliche e turfe são os vícios do personagem que cai em desgraça por não aceitar servir como informante na investigação do sequestro de Charlie Boy McCall, filho de um dos mandantes da política e dos jogos da região. Com a “ajuda” de um jornalista que o idolatra, Phelan vai buscar sua recolocação nas mesas de apostas. A linguagem direta do autor torna a narrativa ambientada em Albany, capital de Nova York, uma aula de história sobre os anos 30, momentos pós-grande depressão. Outro texto da coletânea, que se convencionou chamar de Ciclo Albany, Ironweed, recebeu o prêmio Pulitzer de literatura em 1984 e está na lista dos próximos a serem publicados pela Cosac Naify. (IH)

NÃO GRALHA QUE O SAMBA VEM AÍ

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Um passo pra cá, outro pra lá. Rápido. O samba do Paraná não pode esperar. Vem vindo, vem. O passo sincopado deixa o olhar a esperar um samba do Paraná.

O samba da Inventa é um pouco como o samba do nosso estado. Ou melhor, como a percepção do samba daqui. Afinal, quem já ouviu o samba das araucárias? Um concurso inédito começou a selecionar as melhores melodias entoadas no Paraná. O Samba do Compositor Paranaense recebe inscrições até o início de novembro. Sete sambas serão selecionados todos os meses e, no último domingo de cada um, as músicas irão compor o evento Samba do Compositor Paranaense na Casa Latino-Americana do Paraná (CASLA). As composições serão executadas pelo grupo Paraná Poeta, criado especialmente para o projeto e que conta com músicos renomados do samba e do choro paranaense, como Daniel Miranda, Felipe Cubas, Julião Boêmio, Léo Fé, Ricardo Salmazo, Vinicius Chamorro e Xandi da Cuíca. O vencedor do mês ganha o direito de gravar a sua música em um CD a ser lançado em 2011. (FF e BR)

+ COSACNAIFY.COM.BR

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imagem_ Divulgação Museu Oscar Niemeyer

DIÁRIO DA ÁGUA Pintores românticos do século XIX, o

tempo, as paisagens e as memórias do que viveu servem como pano de fundo para a produção da artista plástica e printmaker finlandesa Eeva – Liisa Isomaa (1956), cujo trabalho está em exposição, pela primeira vez no Brasil, até começo de julho, no Museu Oscar Niemeyer (MON). Com uma linguagem própria inovadora e premiada em bienais internacionais, Eeva imprime, a partir de bases fotográficas, imagens em finos tecidos que, utilizados como suporte, conferem leveza, transparência e delicadeza aos trabalhos. Também utiliza outros suportes na impressão de suas obras de conteúdo gráfico, como acrílicos e placas de metal. Tudo com um toque único que permite que a artista traduza o que acredita ser a paisagem: uma “imagem interna atravessando o limite entre o sonho e a realidade”. (TM) + MUSEUOSCARNIEMEYER.ORG.BR _RÁPIDAS


RÁPIDAS

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MARC CHAGALL NO MASP

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Não é preciso entender muito de arte para saber da importância do pintor russo Marc Chagall. O

artista, que passou por guerras, revoluções, fugas e exílios, baseia a maioria de suas obras na atribulada biografia que possui. As peças de Chagall são admiradas em todo o mundo e chegam ao Museu de Arte Moderna de São Paulo (MASP) com a exposição O Mundo Mágico de Marc Chagall, com 178 gravuras do pintor. Muito da exposição faz parte de três séries de pinturas: As Fábulas de La Fontaine (1920); A Bíblia (1930); e Dafne e Cloé (1950). A série primeira foi produzida em metal, assim como a segunda, que levou quase dez anos para ficar pronta. Isso porque Chagall fez diversas incursões à Palestina para se inspirar. Já a série Dafne e Cloé, a preferida de Chagall, é uma litogravura em pedra. Os visitantes podem conferir no MASP as obras do artista até 28 de março. (DA)

ARANHA NO PESCOÇO É JOIA

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Uma enorme aranha, com oito enormes patas, envolvida em sua teia, descansa no pescoço de uma mocinha. Filme de terror? Que nada... isso é lite-

ralmente joia. É difícil de acreditar, mas a designer de moda Caroline Hanel conseguiu a proeza de transformar esse feioso bichinho em arte, ao criar um colar, feito de prata, pingentes de diamante e, pasmem, fios de teia de aranha! Tudo começou quando Caroline ouviu por aí que o fio da teia de aranha é mais resistente que aço. Decidida a apresentar um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) diferente e ousado, ela não pensou duas vezes e utilizou o material como matéria-prima.

Porém, tão numerosas quanto as patas de uma aranha foram as dificuldades enfrentadas pela designer. Onde encontrar o material? Como manipulá-lo? Como inseri-lo na joia? Até atingir o resultado, passou quase um ano e meio cheio de descrença e tentativas de amigos e professores de que ela desistisse. Caroline não se deixou abalar, conseguiu montar o projeto e foi aprovada com muitos elogios pela banca examinadora. A repercussão do produto está sendo maior do que o esperado. Tanto leigos quanto conhecedores da área estão se interessando pela maneira como Caroline manuseou os fios e pelo belo resultado final. Para o futuro, a moça pretende continuar na área de design de joias. Qual será o próximo material que ela vai usar? (DA) _RÁPIDAS


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A SONORIDADE DOS METAIS DE FRANCISCO LÓPEZ

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Quem visitar o Museo Nacional Reina Sofia, em Madrid, irá encontrar muito mais do que quadros e

esculturas. Entre 13 de janeiro e 29 de março, os visitantes poderão apreciar a arte em forma de música, que soará pelos corredores do grande centro de arte. Trata-se da exposição Sin Título #223, criada pelo espanhol Francisco López, uma das referências da música experimental. López, que tem mais de 25 anos de carreira, criou esse projeto para uma parte específica e inusitada do museu: um dos corredores metálicos, localizado na Planta 4 do edifício. Este ambiente ficará quase integralmente no escuro para que os visitantes possam ouvir com maior concentração a peça de oito minutos de duração criada pelo artista. A grande quantidade de metal que há no corredor é um atributo que torna a experiência sonora ainda mais interessante.

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FOR KIDS OF ALL AGES: 1 TO 100

Eles inventaram em 2006. Ainda não estão comercializando no Brasil - mas esperam que muito em breve. As fofas Chalkboard Tees, da grife americana Class Atire, podem ser compradas em diversas lojas em todo o mundo e também via internet, com entrega, aí, sim, para nosso país tropical. Com as opções maçã, gravata, borboleta, cidade e coração, as camisetas estão disponíveis em algumas cores e acompanham giz para que cada um possa personalizar a sua como e quando bem entender. Uma “roupa-lousa” que não é apenas para crianças, como nos disse Chris, o moço simpático da foto que veste sua criação ao lado da sócia e futura esposa Jinyen. (TM) + THECHALKBOARDTEE.COM

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A música de Francisco López é conhecida no cenário internacional pela capacidade de atingir a parcela espiritual e a sensorial das pessoas. Suas criações já foram utilizadas por mais de 150 companhias de discos em todo o mundo. (DA)

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MINIVAN DA TRANSFORMAÇÃO

O Museu de Arte Moderna de Nova York, MoMa, promove, pela primeira vez nos Estados Unidos, uma instalação da artista chinesa Yin Xiuzhen. Collective Subconscious é, basicamente, uma minivan dividida e alargada. Coberto por roupas emprestadas de amigos, familiares e desconhecidos, o automóvel fica apoiado em várias pequenas rodinhas. Mas a obra não para por aí: é possível entrar na minivan transformada, sentar-se e escutar Beijing Beijing, música pop muito conhecida na China. Yin frequentemente utiliza elementos do cotidiano para compor suas obras - já usou até fuselagens de avião. De acordo com depoimentos da artista, as roupas utilizadas na decoração da minivan são capazes de evocar a memória e preservar a experiência. A instalação reflete a rápida mudança ocorrida na China, tanto no aspecto social como no ambiente. A minivan utilizada por Yin servia de táxi antes da posse de carros pequenos tornarem-se comum por lá. (SF) + MOMA.ORG


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RÁPIDAS

/12 9 MOONWALK

Há nove meses, ele se foi. Mesmo tempo que voltou às paradas de sucesso e virou, mais uma vez, notícia frequente na mídia. De lá pra cá, muitos flashmobs, muitas ações, especiais, especiais e mais especiais. As homenagens ainda não pararam e pelo visto não devem parar, afinal de contas, se Elvis não morreu, Michael Jackson também não morrerá. Uma delas, bastante simples, atrai, dia após dia, mais homenagens. O site Eternal Moonwalk é, como o nome mesmo diz, um eterno Moonwalk. Com participação de pessoas do mundo inteiro, o site está praticamente dando uma volta ao redor do planeta com moonwalks dos mais diversos estilos, formatos, adaptações e participantes. Do Brasil, na busca do site, são mais de 1.000 vídeos. Destes, apenas cinco constam ser de Curitiba. Em oito horas, o site percorreu mais de 5km com os mais divertidos filminhos. Destaque para os cachorros acrobatas, os bebês animados, os moonwalks nas filas de banco e salas de espera de hospitais, e as superproduções para prestar mais uma das muitas homenagens para Michael Jackson. (TM)

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+ ETERNALMOONWALK.COM

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AS FRASES ESTÃO FORA DE MODA, MAS AS ILUSTRAÇÕES...

MEDALHA DE BRONZE

/12 11 As roupas espaciais e as ideias na estratosfera. Reuni-

dos em uma oficina especial de trabalho em metal a altíssimas temperaturas, 11 designers se divertiram à toa na elaboração da mostra The Nature of Copies, que segue até abril em Eindhoven, expoente holandesa no design e finalista ao título de Capital Mundial de Design em 2012.

Entre os argonautas, um brasileiro chamado Bruno Carvalho criando daguerreótipo brilhantes em bronze. Outro trabalho de destaque foram frutas e vegetais de cera cortados e reelaborados antes de serem fundidos com o metal incandescente. Enfim, os designers realmente se divertiram livremente. (BR)

Pop, ilustração, camisetas. Iscas deliciosas para o universo da marca Alguns Tormen-

tos, que acaba de lançar a minicoleção Alguns Tormentos Apresenta.... Buscando disseminar novos talentos pelos corpinhos urbanos, as peças convidam talentos da ilustração para criar estampas e, para começar com o pé direito, as primeiras camisetas levam o traço do alagoano Herbert Loureiro, conhecido como Herbie. O rapaz de 21 anos (completos em 13 de fevereiro) foi convidado inicialmente para ilustrar camisetas comuns, como as outras vendidas pela Alguns Tormentos. “Acabou que foi rolando, rolando e minhas ilustras foram direcionadas para iniciar uma coleção específica da linha Premium” - esta de tiragem limitada, conceito ecológico (a malha é feita com PET) e qualidade superior na malha e nas tintas. Feliz por poder mostrar seu trabalho, Herbie conta que quando senta para desenhar, procura contar algo. “Às vezes, é só uma cena ou um personagem ou até mesmo uma história inteira em um só desenho”. Peças da minicoleção Alguns Tormentos Apresenta... podem ser encontradas em diversas cidades brasileiras. Em Curitiba, na Galeria Lúdica. (IH)

+ ALGUNSTORMENTOS.COM

_RÁPIDAS


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JOIAS DA COROA A união do natural brasileiro com a pomposa e artificial família real resultou em uma das coleções de maior sucesso da Francesca Romana Diana. A

coleção Lelli usa reproduções esmaltadas com pinturas da princesa Maria Gabriela de Orléans e Bragança, mais conhecida pelo apelido artístico que deu nome à coleção. Tudo dentro da ideia de valorização do Brasil, que tem pautado a vida e a obra da designer Francesca Romana, que começou recentemente a assinar com seu nome completo. Desde sua primeira viagem ao nosso país tropical, encantouse. Aos 28 anos, saiu de Roma com 70kg de equipamentos na bagagem para começar no Brasil a fabricar suas próprias joias até que, na década de 90, abriu sua primeira loja. Não parou desde então, sendo uma das responsáveis pela valorização das pedras brasileiras na fabricação de joias e semijoias e por buscar sempre novos materiais para valorizar ainda mais suas peças. Não apenas esta, mas algumas das novas coleções da marca utilizam material fotográfico como matériaprima: a impressão da fotografia é feita sobre uma gelatina

fotossensível que grava a imagem, e é inserida na peça com acabamento em resina, proporcionando um visual extremamente agradável. Simplificando: é a arte da arte em arte. Independente do material fotográfico utilizado, as pinturas em óleo de Lelli caíram realmente bem nas mãos de Francesca. Suas obras parecem retratar um Brasil natural perdido, com palmeiras e pássaros saídos de poemas de Gonçalves Dias. Uma tranquilidade que não tinha razão de não estar nas fabulosas pulseiras e brincos da coleção. (BR e TM)


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CLIMA: O TEMPO EM POESIA E ESTÉTICA por_MARILIA BOBATO imagem_DIVULGAÇÃO

O tempo deixou de ser simplesmente o tempo, cheiro de feno seco e botas de borracha molhadas. O

talou um microfone no glacial Vernagtferner, nos Alpes austríacos, que fica a mais de 3 mil metros de altitude. Ele utiliza o som para mostrar o ruído do riacho que se formou por causa do derretimento do gelo. Já o uzbeque Alexander Nikolayev e o inglês Simon Faithfull adentraram o território da cordilheira do Hindukush e encontraram na Antártida inóspitos desertos de gelo. Na linha oposta, o espanhol Eugenio Ampudia e o americano Reynold Reynolds, em seus trabalhos, veem o mundo sucumbir num mar de chamas.

Com a curadoria de Alfons Hug, que já esteve à frente por duas vezes da Bienal de São Paulo, a mostra Tempestade vem com o pensamento de que as mudanças climáticas, sejam elas causadas pelo homem ou pela natureza, sempre vêm acompanhadas de mudanças culturais. Daí a justificativa para a exposição, que mostra como as mudanças climáticas saíram do universo científico para o dia a dia das pessoas, provocando mudanças culturais e comportamentais.

Mas se o clima inspira a arte, ao longo da história o homem tenta provar: não poderia a arte inspirar o clima? Hug lembra que foi assim com o culto ao sol pelos Incas, o deus da chuva e dos ventos dos Astecas e de muitos outros povos. Certamente darão mais resultados do que as discussões mundiais que se arrastam de Copenhagen a Davos, num mar de hipocrisia, sem resultado algum.

tempo se transformou. Hoje se chama clima, uma entidade física, anônima e amedrontadora que, a qualquer momento, é capaz de deflagrar uma catástrofe com simples gotas de água que caem do céu. Agora uma exposição que chega a Curitiba, em março, promete tirar o assunto da boca de especialistas e apresentar a reflexão que a arte tem a respeito.

Quem for ver as obras no Museu da Gravura de Curitiba irá se deparar com 11 artistas, de oito países, que retratam os fenômenos que correm do Polo Sul ao Polo Norte. Serão diversas videoinstalações estruturadas a partir dos quatro elementos - fogo, água, ar e terra. O artista alemão Kalle Laar, por exemplo, ins-

+ EXPOSIÇÃO TEMPESTADE Período: de 11/03 a 04/04 Local: Museu da Gravura Cidade de Curitiba - Solar do Barão - Rua Pres. Carlos Cavalcanti, 533 Curadoria Geral: Alfons Hug Curadoria Nacional: Alberto Saraiva Realização: Instituto Paranaense de Arte, Goethe Institut, Oi e Fundação Cultural de Curitiba Entrada Franca


Tempere seus sentidos tambem nos almocos de fim de semana


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Cell 33 E2 Section (1), Pollsmoor Maximum Security Prison, 2004 (cortesia de Mikhael Subotzky e Goodman Gallery).

PRISIONEIROS por_BRUNO REIS foto_MIKHAEL SUBOTZKY

Não aparece no recente filme Invictus sobre Nelson Mandela, mas uma das frases do líder é capaz da fazer refletir por alguns segundos - especialmente nós, brasileiros. “Uma nação não deveria ser julgada pela maneira como trata seus altos cidadãos, mas como julga o mais baixo deles”. Clint Eastwood decidiu mostrar em seu filme não o lado trágico e desumano dos prisioneiros do Apartheid sul-africano. Mostrou a superação e o perdão. O que não é motivo para que os prisioneiros continuem a viver em condições sub-humanas. A África do Sul tem um dos maiores números de presos do mundo. Com uma população quatro vezes menor que a do Brasil, possui praticamente o mesmo número de detentos. São 157 mil em prisões que deveriam abrigar no máximo 113 mil. Na maioria das vezes,

quem fica entre quatro cantos é tratado como cachorro, com banhos em lavadoras industriais e brigas com os cães da polícia, mais bem tratados que eles mesmos. A vontade de revelar esta história fez com que o fotógrafo Mikhael Subotzky passasse algum tempo por trás das grades, registrando os momentos íntimos e inusitados dos detentos. Um projeto final de graduação que ganhou proporções internacionais e está disponível em seu site para uma exposição virtual. Die Vier Hoeke significa Entre Quatro Cantos. É o nome da mostra. Além das imagens, Mikhael fez uma série de oficinas para ensinar fotografia a quem fotografava. Sabia que ninguém melhor que os próprios presos para divulgar seu próprio ponto de vista. + IMAGESBY.COM


www.aImec.com.br | www.centroeuropeu.com.br Rua BrIgadeIro Franco, 1700, Centro, CurItIba - ParaNĂ


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MIRAMUNDO por_BRUNO REIS imagem_DIVULGAÇÃO

Miran nasceu para o mundo em 1947 - e já no porto de saída, em Paranaguá - , ele que é o principal item de exportação do design brasileiro. Mas não foram

os convites para trabalhar no The New York Times e em outras tantas partes do planeta que o fizeram mudar de ideia. Na verdade, foi mesmo o Miran que acabou mudando a ideia do mundo. Não, não iria sair. Iria continuar em Curitiba e daqui acabaria por conquistar o mundo. Aliás, a última conquista aconteceu há muito pouco, em terras do oeste. A conceituada revista chinesa New Graphic dedicou a Oswaldo Miranda 22 páginas com seus fabulosos trabalhos gráficos e um texto em kanji que nos seria incompreensível não fosse o fato da obra do paranaense falar por ela mesma. A impressão que fica para o leitor do oeste é que se Miran tivesse inventado um alfabeto, o exímio tipógrafo certamente teria desbancado o kanji no quesito sofisticação.

Capa da edição dupla da Gráfica # 70-71.

A viagem de Paranaguá para a China não foi obra de assessoria de imprensa vendendo pauta. Quem sempre falou por Miran foi sua obra, já que o tímido parnanguara nunca foi de ocupar muitas páginas na mídia com palavras suas. Desde o início da fama, com o impecável trabalho gráfico do suplemento A Raposa, do Diário do Paraná, o artista (sim, artista Miran) manteve a humildade e a inteligência que o permitiram compartilhar o sucesso com as artes gráficas do Brasil. Depois de uma exposição internacional de arte tipográfica, em Curitiba, Miran transformou o catálogo na revista brasileira de maior repercussão internacional. A Gráfica tornou-se a única publicação não européia da maior editora de livros de design do mundo, a Rotavision. Virou uma via de mão dupla, como vitrine para o exterior dos artistas gráficos brasileiros e também como uma maneira de divulgar no país o que se estava fazendo pelo mundo. Neste início de 2010, a revista comemora 27 anos com a publicação da edição dupla #70-71. + REVISTAGRAFICA.COM.BR


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ANALÓGICO DIGITAL por_IVO STANKIEWICZ lomografia_CANDYLAND

Quem pensava que a fotografia analógica estaria com os dias contados depois da popula-

rização das câmeras digitais estava redondamente enganado. E a Lomografia está aí para provar isso.

Em todo o mundo já são inúmeros seguidores da técnica inventada por dois jovens vienenses no início da década de 90. Os dois compraram uma câmera soviética LOMO LC-A, de 1982, em uma loja de antiguidades e, ao revelarem as películas, ficaram maravilhados com o resultado diferente e belíssimo das fotos. As cores extremamente saturadas, às vezes até erradas, e os objetos distorcidos: acidentes felizes, característicos da técnica. Com a invenção da Lomografia, começou também a lomomania. Pouco tempo depois, nascia em Viena, a Sociedade Lomográfica Internacional - Lomography - com o objetivo de difundir a Lomografia ao redor do planeta e, junto com ela, as 10 regras de ouro (ver Box). Foram milhares de workshops, exposições e festas para conquistar o objetivo. O sucesso rendeu. Em 2000, a Supersampler foi a primeira câmera produzida pela sociedade. A partir daquele momento, as novas criações não pararam de surgir, dando assim várias opções de lentes, obturadores e filmes. Em 2001, a primeira loja foi inaugurada, também em Viena. No ano de 2009, outras foram abertas em Nova York, Londres e no Rio de Janeiro. E, apesar da declaração da Lomography em uma convenção realizada ano passado, na Alemanha, de que o futuro é analógico, a marca cresce rapidamente graças à era digital: afinal de contas, com apenas quatro lojas até o momento, a lomomania sobrevive com as vendas de câmeras e bolsas estilizadas via internet, enviadas para todo o globo.

Mas a volta dos analógicos não para por aí. Visto o grande sucesso internacional da Lomografia, surge uma recente notícia de que a Polaroid será ressuscitada, agora com um nome diferente por questão de direitos autorais. As principais características continuarão as mesmas: fotos reveladas em 60 segundos, cores borradas, borda branca e o cheiro químico presente na fotografia. Na loja-galeria (foto ao lado) da Lomografia na capital carioca, uma das atrações é a “lomowall”. São mais de 300 fotos do Brasil feitas por seguidores da Lomografia do mundo inteiro. A responsável pela Lomography no Brasil, Filipa Richter Bocchi, confirma que a loja no Rio de Janeiro foi muito bem recebida pelo público brasileiro. “Além de ser muito bonita, é um grande sucesso, pois no Brasil temos uma comunidade lomográfica muito grande”. Diz também que o fato de ter uma loja com o padrão internacional da Lomography facilitou muito a vida dos interessados na arte. “Antes, as máquinas só poderiam ser adquiridas via web. Como elas vinham da Áustria, o consumidor tinha que pagar altas taxas para importar o produto para o Brasil. Hoje, temos não só máquinas para venda, mas também AS 10 REGRAS DE para serem experimentadas nos OURO DA LOMOGRAFIA workshops que oferecemos”. Mas a “lomowall” carioca não é tão novidade assim. Em 2007, a Candyland promoveu uma em Curitiba. Foram quase dois meses de exposição no Lucca Cafés Especiais, e a parede contou com 460 imagens (fotos do Brasil e também de outros lugares), algumas das quais, inclusive, estão nesta página. + LOMOGRAPHY.COM.BR + LOMOS.COM.BR + LOMO.CANDYLAND.COM.BR

1. Leve sua Lomo sempre com você. 2. Use quando quiser - dia ou noite. 3. A Lomografia não interfere na sua vida, faz parte dela. 4. Fotografe sem olhar no visor. 5. Aproxime-se o máximo possível do objeto lomográfico desejado. 6. Não pense. 7. Seja rápido. 8. Você não precisa saber antecipadamente o que fotografou. 9. Nem depois. 10. Não se preocupe com as regras.


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ENTREVISTA

_Marcos Jorge

Ao longo da mesa quadrada, sentamos todos. Marcos Jorge na ponta, sem mostrar desconforto algum com a sabatina inédita que a Inventa inventou para esta edição que marca nosso primeiro ano. Decidimos entrevistar um dos maiores diretores de cinema do Brasil, que ajudou a dar um pouco de licor Trevisan para espectadores em todo o país. O filme Estômago foi sucesso de crítica e um dos filmes brasileiros mais premiados no exterior. Um marco notável para um filme de baixo orçamento.

EVENT CINEA por_MARÍLIA BOBATO e BRUNO REIS colaboração_Rodrigo Fornos e Elisandro DalcIn fotos_GUADALUPE PRESAS

As meias azuis listradas apareciam com as pernas cruzadas. Marcos estava confortável. Do outro lado, caderno e lápis. Dois gravadores e dois novos colaboradores. Rodrigo Fornos é um produtor cultural envolvido com teatro e ator ativo das discussões sobre cinema no Paraná. Ao seu lado, Elisandro Dalcin, cinéfilo e fotógrafo, ávido pelas respostas às perguntas mais complicadas boladas na noite anterior. Marcos Jorge é curitibano. Morou mais de dez anos na Itália e quando voltou à cidade trazia uma bagagem cultural e profissional pesada. Por isso, não demorou muito para começar a ganhar destaque. Filmou dois curtas - que juntos levaram mais de 40 prêmios - antes de filmar dois longas-metragens. O segundo rodado foi o primeiro a ser lançado. Estômago lhe deu a fama e o caminho de tijolos amarelos que o levou a Los Angeles em projetos para o mercado americano. O maior deles, Marcos deixou na lata. Não revelou nem aos jornalistas que tiveram a seguinte conversa com este destaque do cinema nacional, que logo se declara: eventualmente, cineasta.


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TUAL(MENTE) ASTA


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INVENTA - PARA QUE O CINEMA? Marcos Jorge É tão difícil isso. Cinema é um sonho que nós sonhamos juntos. Lá no passado, os homens se sentavam à beira das fogueiras e sempre tinha alguém que contava histórias e fazia os outros homens sonharem. De certa forma, acho que o cinema é o nosso jeito de fazer isso. Coincidentemente, o projetor de cinema é uma coisa que pega fogo. Sentamos em volta dessa fogueira e alguém, no caso o diretor ou o ator, nos conta uma história e a gente sonha com eles. E esse sonho nos propicia viver outras vidas - que não somente a nossa. Viver é muito limitado, não podemos estar em vários lugares ao mesmo tempo. Por isso, a imersão no cinema é fundamental. E se você faz as pessoas sonharem, você se saiu bem como cineasta. IVT - QUANDO VOCÊ DECIDIU SER DIRETOR? MJ Decidi que ia dirigir quando tinha 17 anos e fui morar na Itália durante um ano. Me formei no Ensino Médio no CEFET (hoje UTFPR - Universidade Tecnológica Federal do Paraná) como Técnico Eletrônico. Na época, minha cabeça era bastante eclética. Fui líder estudantil e já tinha visto que a tecnologia não era tanto a minha tese, muito embora eu fosse um excelente aluno. Por isso mesmo, ganhei uma bolsa de estudos para fazer um intercâmbio cultural na Itália. Quando cheguei, resolvi procurar emprego em uma companhia teatral e fiz de tudo como assistente de diretor. Nos espetáculos, tinha vídeo projetado e percebi uma coisa muito interessante ali no vídeo. Aos 18 anos, voltei para o Brasil e comecei a fazer teatro. Queria ter experiência de ator e foi interessante para perceber que não era a minha praia. Voltei-me completamente para a questão de câmera. Com a experiência teatral e a experiência audiovisual, já estava solidificado na minha cabeça o desejo de fazer cinema. De lá pra cá, tudo o que fiz foi montado nessa dimensão. RODRIGO FORNOS - HOJE VOCÊ SE CONSIDERA UM DIRETOR DE PUBLICIDADE NO CINEMA OU UM DIRETOR DE CINEMA NA PUBLICIDADE? MJ Me considero um diretor. Nitidamente. Sempre estive muito desconfortável com a legenda cineasta. Quando você começa a trabalhar em cinema, começa a ser cineasta e eu sempre coloco muito entre parênteses esta palavra. Você começa com coisas pequenas, mais curtasmetragens. E no começo me parecia muito altissonante ser chamado de cineasta. Para mim, cineastas sempre foram os grandes, como o (Federico) Fellini.

Um diretor é que nem um encanador, é que nem um jornalista, é que nem médico. É alguém que tem certas competências profissionais e as exerce profissionalmente. Às vezes, o diretor faz arte, então, neste caso, ele é um cineasta, um artista. Outras vezes, o diretor faz comércio. Ele vive de seu trabalho, assim como um arquiteto, que às vezes faz uma casa do jeito que o cliente quer e às vezes faz uma obra de arte. Sempre fui muito orgulhoso da minha competência como diretor. Eu sou diretor, diretor de filmes. E por quê? Porque sou alguém que sabe decupar, que sabe dirigir atores, me preparei para isso. Eventualmente, sou um cineasta. RF - FIZ ESSA PERGUNTA, NA VERDADE, PELO CONFLITO DE LINGUAGEM. COMO É O TRABALHO COMERCIAL? MJ Quando trabalho com comercial, em geral tenho dois clientes: um cliente que paga a conta e a agência. Frequentemente, o diretor é chamado a contribuir criativamente neste processo. Não tanto na elaboração do conceito, que é uma coisa muito técnica e é competência explícita da agência de publicidade, mas para contribuir na elaboração do roteiro. Cada caso é um caso. Às vezes, o roteiro vem muito bem elaborado, com storyboards, e às vezes vem mais vago. Prefiro quando vem bem fechado. Paradoxalmente. Um cara que faz cinema diria “não prefiro quando o roteiro é genérico”, mas, pra mim, não é verdade. Acredito que a competência do diretor é fazer o melhor dentro da ideia do cliente. Mas eu não faço alguns tipos de campanha. Publicidade que não acredito, não faço. Roteiros que considero preconceituosos, por exemplo, não faço. IVT - COMO É O PROCESSO DE DIREÇÃO DE UM FILME? MJ Direção é muito artesanal, não existe direção industrial, você nunca faz filmes em linhas de montagem. Por mais que um estúdio gigante em Hollywood pareça ter uma linha de montagem de filmes, na verdade nada é linha de montagem. Esta semana (a entrevista foi realizada no dia 10 de fevereiro) estive em uma conferência via telefone com alguns executivos de uma produtora ligada à Fox nos Estados Unidos e estamos começando a conversar em cima de um projeto deles que eventualmente vou poder fazer. Os caras me sabatinaram sobre o projeto. E você percebe que não tem nada de industrial nisso. Cada projeto é um projeto, é tratado como uma unicidade. Não existe “vamos fazer 10 filmes num ano e vamos fazer todos iguais”. No cinema, nunca é assim, não é como um carro. Então, o processo é sempre artesanal. Senão todos os filmes das grandes produtoras fariam sucesso e não é o que acontece.

“Mas Curitiba não se aplica a gostar porque é como um parente, é parte de mim e eu sou parte dela”. ENTREVISTA_Marcos Jorge


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IVT - VOCÊ MOROU NA ITÁLIA POR MAIS DE DEZ ANOS, ONDE ESTUDOU E TRABALHOU COM CINEMA. EM QUE NÍVEIS SE DÁ ESSA INFLUÊNCIA? MJ Com 18 anos, voltei para o Brasil. Me formei em jornalismo e nesse período de curso ia muito para a Europa. Juntava minhas economias e ia. Viajava de carona, passava frio e, às vezes, até fome. Ficava dois, três meses sem grana alguma. Era um esforço individual, trabalhando, ganhando uma graninha e seguindo grupos criativos. Eu fui assistente de vários grupos criativos importantes de Milão até que amadureci o fato de estudar cinema em Roma. Quando acabei a universidade aqui, fiz um teste e ganhei uma bolsa para estudar cinema em Roma. Comecei a trabalhar imediatamente depois de terminar o curso. Como falava várias línguas, inglês, francês, além do português e italiano, era um assistente requisitado pelas produções internacionais. Depois de algum tempo como assistente de direção, houve um momento em que estava difícil encontrar trabalho, e me disseram: “trabalho para diretor, a gente não tem, mas para montador, temos. Quer ser montador?”. Fiquei mais dois anos como montador de documentários, especialmente documentários para a televisão italiana. É uma experiência fundamental. Saber montar é essencial para dirigir, saber decupar uma cena. Depois de cinco anos em Roma, me mudei para Milão e lá comecei a escrever institucionais para empresas, dirigir vídeos institucionais, minhas videoinstalações que fazia desde os anos 90, e comecei na publicidade. IVT - VOCÊ GOSTA DE CURITIBA? MJ A gente não sabe se gosta, né? Curitiba faz parte de quem nasce aqui. Eu não escolhi Curitiba, de certa forma não sei se a palavra gostar se aplica. Nunca me faça essa pergunta porque eu adoro Roma, por exemplo, adoro o Rio, gosto muito de algumas cidades. Estou em amores com Los Angeles agora. Mas Curitiba não se aplica a gostar porque é como um parente, é parte de mim e eu sou parte dela.

RF - CURITIBA TEM ESSE PODER. UM GRANDE EXEMPLO DISSO É O DIRETOR DE TEATRO FELIPE HIRSCH, QUE TEM UMA RELAÇÃO DE AMOR COM CURITIBA. ELE MORA EM SÃO PAULO, MAS FICA UM TEMPO AQUI, TRAZ AS PEÇAS DELE TAMBÉM. É UM CARIOCA QUE SE APAIXONOU PELA CIDADE. VIROU UMA RELAÇÃO DE AMOR. MJ Acho mais fácil dizer isso sendo um estrangeiro. Eu tenho relações dessas com algumas cidades. Roma é uma cidade adorável, uma das cidades onde imagino morar depois dos 65 anos. Se eu chegar bem aos 65, meu ideal seria passar uma parte do ano em Roma e uma parte no Brasil. Mas é uma cidade também detestável por diversos fatores. Sou apaixonado por Roma e lá o detestável fica pequeno perto do fascínio que a cidade exerce sobre mim. IVT - ESTÔMAGO TRAZ MUITA REFERÊNCIA DE CURITIBA, MAS EM MOMENTO ALGUM SE FALA QUE O FILME SE PASSA NA CIDADE. FOI PROPOSITAL? MJ Em Estômago, a proposta era fazer uma cidade metafórica do sul do Brasil. Mas tem também uma outra sacada: o filme é uma fábula. Um herói que chega na cidade com uma mão na frente e a outra atrás, e a gente acompanha a trajetória. É uma forma clássica, um épico, de certa forma. Esse tom fabular exigia que eu deixasse a cidade mais vaga. E eu sabia que quanto mais realista eu fosse, mais sucesso teria na linguagem do filme. Então, essa combinação de tom fabular e filmagem muito realista, atuação realista, coisas realistas acontecendo, fizeram uma mistura que funcionou. E era a proposta do filme. É a cidade do western, quando o herói chega na cidade. É uma cidade de qualquer maneira mítica. É o Brasil.

ELISANDRO DALCIN HÁ UM CINEMA CARACTERÍSTICO DE CURITIBA? MJ Cinema de Curitiba, acho tão esquisito. Filmes não têm nacionalidade, de certa forma. Faço cinema brasileiro porque o faço no Brasil. Mas o que me interessa são as histórias universais, que todo mundo possa entender. Todo mundo consegue entender a história do cara que cozinhando vai ganhando poder. Sexo, poder e comida são coisas universais. Por isso, Estômago fez tanto sucesso lá fora, mas para um público aqui da cidade dá pra ver várias referências. Se você olhar bem, vai ver um ônibus de Curitiba. O próprio licor que a Iria (personagem do filme) toma na casa noturna se chama Trevisan. Uma homenagem ao Dalton. Ninguém vê, o rótulo está virado, mas o licor é Trevisan. IVT - O FILME É MESMO UMA COMÉDIA? MJ Bom, diria que é uma comédia dramática salpicada de humor negro. Ou é um drama cômico salpicado de humor negro. É uma mistura, comédia e drama. Para alguns públicos é mais comédia, para outros é mais drama. Quando você vai ver todas as piadas, todas as sutilezas do filme, todas as piadas que estão no diálogo, ele tem um forte tom de comédia. Para um estrangeiro que vê o filme legendado ou mesmo dublado, parte dessas piadas se perdem, mas o sarcasmo todo mundo percebe.


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“Sexo, poder e comida são assuntos universais”. IVT - MUITO DO QUE SE PERDE NA TRADUÇÃO DE ESTÔMAGO É NA LINGUAGEM, EM ESPECIAL DOS PALAVRÕES... MJ Palavrões existem em qualquer língua, né? Todas as línguas fazem muito uso do palavrão. Os americanos na cadeia ou o pessoal de web usam muito. Os italianos usam muito maldizer, são muito boca suja. Na verdade, desconfie de uma língua que não tenha muitos palavrões porque significa que a língua de certa forma é meio lavadinha. Língua tem que ser uma coisa suja, movimentada. O palavrão, de certa forma, me preocupava. Quando acabei de montar o filme, falei “esse é o filme brasileiro com mais palavrões dos últimos trinta anos”. Aliás, depois das pornochanchadas, virou tabu falar palavrão no cinema. IVT - SAINDO DE UM FILME COMO ESTÔMAGO PARA UM FILME QUE VOCÊ RODOU ANTES E IRÁ ESTREAR DEPOIS. COMO ESTÁ A CRÍTICA DE “CORPOS CELESTES” NOS FESTIVAIS EM QUE PARTICIPOU? MJ É uma história muito complicada. Corpos Celestes é um filme que rodei antes, totalmente diferente. Então é difícil até julgar. Ele esteve em Gramado por um compromisso que nós tínhamos com a Secretaria e mandamos para Goiânia, onde ele venceu quatro prêmios. O filme já acumulou cinco prêmios e ainda não foi lançado. Tem críticas boas e críticas ruins. Tem críticos que realmente entenderam o fim do filme, porque ele não é de fácil compreensão. Mas ainda não há uma massa crítica, ela vai se criar no minuto em que ele for lançado. Aliás, nós pretendemos lançá-lo neste ano, estamos atrás do patrocínio.

ED - APESAR DE AINDA NÃO TER SIDO LANÇADO, ACOMPANHEI BASTANTE ALGUNS TRECHOS DO FILME NA PRIMEIRA MONTAGEM. EU MORAVA COM A PESSOA QUE ESTAVA CUIDANDO DO SOM DELE. ALGUMAS CENAS SÃO BASTANTE COMPLEXAS. LEMBRO DE UMA SAÍDA DE CÂMERA... MJ É uma câmera linda. Uma das imagens mais bonitas do filme, um plano-sequência enorme feito com uma grua mecânica. Operei a câmera no filme e foi um movimento muito difícil de fazer. Mas foi algo justificado. Eu também odeio filmes em que a linguagem se sobrepõe à narração. Hitchcock se arrependeu de ter feito Festim Diabólico em plano-sequência. O movimento de câmera tem que ser justificado, senão vira uma coisa além da cena. O centro de toda cena é o ator - se tem atores, claro, porque tem cenas que não tem ator. Não gosto da arrogância de diretores que tentam estabelecer a sua mão em cima das coisas. É o ator que dita a cena, a ação que dita a cena. Primeiro você observa os atores, como eles se movem, como eles te orientam na ação. Depois você estabelece a câmera, que tem que ser invisível. IVT - O QUE O ESPECTADOR BRASILEIRO ESPERA DO CINEMA? MJ Acho que, primeiro, não ser subestimado. Hoje, o público de cinema procura diversão, um cinema de entretenimento, mas você não precisa dar coisas idiotas para ele. Você pode dar coisas inteligentes. Está figurando no Brasil a ideia de que só comédia dá certo. E talvez isso seja verdade no período específico de lançamento do Se Eu Fosse Você 2, e Lula - O Filho do Brasil.

Talvez o filme Lula tenha tido seu relativo fracasso por vários fatores. Com certeza, o lançamento nas férias não foi um fator que ajudou o filme. No entanto, ajudou muito o Se Eu Fosse Você. As pessoas estão na praia e vão ao cinema para relaxar. Infelizmente, isso é a nota do cinema internacional hoje. As pessoas vão ao cinema para ter um cinema circo. Quando categorizo o cinema circo, filmes de grande produção, filmes que Hollywood anda fazendo, não há nenhum desprezo. Circo é uma forma de arte, interessantíssimo, ancestral. Quando chamo o cinema circo, quero dizer: as pessoas vão ao cinema como antigamente as pessoas iam ao circo: para se divertirem. Às vezes, o circo também é chato. Mas, por outro lado, ninguém vai ao circo toda semana. As pessoas também não vão ao cinema toda semana. Quando as pessoas pagam caro pelo ingresso, elas querem diversão e não arte. Fica a opção do DVD, que está morrendo em função da pirataria e do download que não remunera a produtora que fez o filme, remunera o criminoso. A pirataria via download está matando o cinema. RF - CARLOS SORIN FALOU UM POUCO SOBRE ISSO QUANDO ESTEVE EM CURITIBA RECENTEMENTE. DISSE QUE NO MUNDO EXISTEM PEQUENOS PÚBLICOS PARA PEQUENOS FILMES. NÃO HÁ MAIS OS GRANDES PÚBLICOS. AGORA EU PERGUNTO ISSO PRA VOCÊ, MARCOS. VOCÊ QUER O GRANDE OU O PEQUENO PÚBLICO? MJ Nesse sentido, eu sou bastante ansioso. Gosto muito de experimentar coisas novas, contar minhas histórias e eventualmente procurar meu público, pessoas que estejam interessadas naquele assunto no mundo inteiro. Ao mesmo tempo, me agrada muito conversar com milhões de pessoas. É por isso que estou me aproximando de Los Angeles. No momento, estou começando a trabalhar em alguns projetos para o mercado americano. ENTREVISTA_Marcos Jorge


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IVT - E O PÚBLICO DO CINEMA PIRATA? MJ Este é um momento absurdo. Extremamente preocupante para o cinema porque os filmes só se pagam hoje internacionalmente se você, além do filme, agrega outras fontes de renda para o produto cinema. Os filmes que se pagam são os que especialmente geram outros produtos. Licenciamento de personagem, produtos... Especialmente os filmes de animação têm isso, né? Os estúdios conseguem remuneração hoje fundamentalmente no merchandising e no licenciamento de produtos. Então, o DVD hoje está falido no mercado internacional. Praticamente só se pagam no cinema internacional filmes que fazem muito sucesso. Vamos falar de Avatar... não dá para avaliar o que vai acontecer, mas é obvio que cria um novo parâmetro. Mas é circo e mais circo ainda, porque você vai em 3D, imersão total, 250 milhões de dólares para fazer aquilo. Se um estúdio gasta 250 milhões de dólares em um filme, mais 150 milhões de divulgação, vejam a conta desses caras. Porque o ingresso final não é todo para o produtor, né? Tem o exibidor, o distribuidor, então é complicado. Para onde vai o cinema brasileiro? Ele está nessa maré. O cinema no Brasil, como em todo o mundo, com exceção dos Estados Unidos, é uma atividade subsidiada pelo Estado. Então, é relativo dizer o que é fracasso em termos de sucesso. O espectador não é a única medida de um filme. Mas, se você pensar bem, essa questão do grande sucesso da comédia no cinema brasileiro é um grande perigo porque só existem filmes comerciais. E se esses filmes autorais forem tão pequenos e cada vez mais inviáveis? Porque justamente se estabeleceu a métrica de que sucesso só acontece com filme comercial. É perigosíssimo isso para o cinema brasileiro. IVT - COMO É SUA RELAÇÃO COM O PÚBLICO, O TELESPECTADOR? MJ Na primeira projeção de Estômago para o público, já não sabia mais o que era o filme. Já tinha visto centenas de vezes e acabei perdendo a noção do que era o filme. A primeira exibição foi no Rio de Janeiro. A sala estava lotada e foi uma das sensações mais lindas que eu já tive na vida: a sensação de ter o público nas mãos. Parece que você tem um monte de fios saindo das mãos e cada fio está ligado a uma pessoa na plateia. Você vai tirando os fios aos poucos. Agora você dá uma risadinha, agora você vai se emocionar. É uma coisa muito de onipotência. No bom sentido do diretor. Nessa posição, o filme funcionou incrivelmente. Quando o público assistiu ao Estômago, foi matador, o cinema veio abaixo. Aliás, quanto mais gente tem na sala, mais impactante fica o filme.

IVT - VOCÊ QUER DIRIGIR ATÉ QUANDO? MJ É tão difícil dizer isso. Dirigir é uma profissão tão contraditória. Não sei se outras profissões têm essa mesma relação. Eu nunca fiz mais nada além disso. O set cinematográfico é um dos lugares onde me sinto mais à vontade, é a concentração da vida. É como se você colocasse um monte de vida juntas e, ao longo de num dia de filmagem, ou às vezes em uma semana, ou em dois meses de filmagem, todos os problemas da vida e todos os prazeres e belezas da vida aparecessem. Durante um dia de filmagem, a gente chega a ter, ao mesmo tempo, a dor mais profunda e a felicidade mais plena. Quando se filma, você tem que estar sempre correndo atrás do tempo. Frequentemente, o dia de trabalho vale vários milhares de reais, dezenas de milhares de reais, centenas de milhares de reais. Você está manobrando aquilo e tem que fazer e conciliar várias coisas e pessoas. É um trabalho ao mesmo tempo fascinante e incrível, e extremamente angustiante. Essa profissão é angustiante, no entanto é maravilhosa. Também é uma profissão que exige grande energia física. Quando estou filmando, me sinto a ponta de um vértice de um diamante. Sinto que atrás de mim há uma pirâmide de pessoas, de desejos, de coisas. É como se naquele momento, na frente do monitor ou dentro do visor, eu tivesse um monte de gente atrás de mim dizendo o que eu preciso fazer. Mais do que dizendo, querendo que eu faça uma coisa que é a ânsia, o desejo dessas pessoas. Isso gera muita responsabilidade. No caso de estar filmando teu filme é pior ainda porque a cara pra bater é tua. Mas é fascinante ao mesmo tempo. É uma cadeira muito pouco confortável para se sentar e ao mesmo tempo muito, muito bacana.


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CLÁSSICA CURITIBA por_EDUARDO SANTANA ilustração_Cristina Pagnoncelli

Em breve, um novo busto irá se juntar aos pássaros no Bosque do Papa. No ano em que o romântico pianista e compositor polonês Fréderic Chopin completaria 200 anos de vida, uma série de homenagens ao músico está programada em todo o mundo. E não poderia ser diferente. Nascido no vilarejo Zelazowa Wola, em 1819, e criado na Varsóvia, Chopin formou seu caráter musical convivendo abertamente entre a nobreza e a burguesia polonesa. Fez aulas de piano desde os seis anos de idade e aos oito já compunha pequenas peças musicais e se apresentava em público. Cedo, a genialidade do compositor e pianista dava suas amostras. Permaneceu na Varsóvia estudando música e se dedicando ao piano até os 20 anos, quando, após uma rápida passagem por Viena, na Áustria, acabou em Paris, onde aflorou sua percepção como compositor.

Na capital francesa, conviveu com pessoas interessantes, aprimorou sua técnica e se firmou como um dos grandes músicos da época. Em meio a grandes amores, viagens pelo continente europeu e uma insistente tuberculose, Chopin compôs centenas de peças, em sua maioria para o piano, sempre bebendo na fonte popular da música polaca, com sua incomparável técnica. Linhas harmônicas perfeitas, românticas e delicadas, que transmitiam de maneira natural os mais variados sentimentos humanos. Habilidades que o comparam a outros gênios, como Mozart e Beethoven. “As composições de Chopin têm características marcantes. São muito melódicas, românticas, agradáveis e, mesmo não sendo compostas para voz, eram perfeitamente cantáveis”, diz Helma Haller, maestrina e regente do Coro da

Camerata Antiqua de Curitiba. Chopin nunca batizou suas composições. Apenas as numerava. Não se sabe se era por organização ou se preferia que os ouvintes formassem suas percepções em relação às melodias. Op. 10, nº 12 (Estudo Revolucionário), Op. 64, nº 1 (Valsa Minuto) e Op. 35 (Marcha Fúnebre). “Suas composições para o piano influenciaram muita gente. No século passado e até hoje, alunos de piano em todo o mundo aprendem a tocar Chopin. Então, sua técnica e suas melodias naturalmente atingiram as pessoas envolvidas com música clássica”, completa Helma. O compositor polaco morreu em Paris, aos 39 anos. Mas seu legado eternizou-se e atravessou fronteiras inimagináveis até mesmo para Chopin. Foi além do Oceano Atlântico.


31 qualquer cidade do país. Mas a relação dos curitibanos com as composições eruditas é muito mais íntima e pessoal do que podemos imaginar. Cada nota disparada por uma orquestra nos chega de maneira diferente, fazendo parecer tudo muito familiar. Esta intimidade com a música clássica se deve por um simples fato: Curitiba tem e sempre teve uma tradição com este gênero. “O interesse do curitibano por música clássica é muito grande. A procura pelas apresentações é grande e o público é sempre bom. Com certeza podemos perceber esta relação um pouco mais íntima. Conseguimos ver nos olhos das pessoas durante as apresentações. Desde os mais entendidos no assunto até as pessoas mais humildes se emocionam, buscam e perguntam sobre o assunto e outras apresentações”, argumenta Helma. O jornalista Ulisses Iarochinski, presidente do Instituto de Cultura e Arte de Curitiba, polaco de coração e profundo conhecedor da história da música clássica aqui no primeiro planalto paranaense, afirma que tudo começou no século XIX, com Brasílio Itiberê da Cunha, advogado, diplomata e músico. “Ele iniciou essa história quando começou a compor peças para coral e câmara, além de suas composições no piano, como A Sertaneja, de 1869. Foi assim que começou tudo”, diz Iarochinski.

INTIMIDADE HISTÓRICA

Não por acaso, as primeiras homenagens aos 200 anos de Chopin aconteceram aqui em Curitiba, cidade que tem íntima relação com a Polônia. Durante a Oficina de Música, que ininterruptamente há 28 anos vem ditando a trilha sonora da capital paranaense, diversos concertos festejando a vasta obra do autor foram ouvidos pela cidade. O que se via nessas apresentações era um público interessado, atencioso e fiel às notas clássicas. Pessoas que acompanhavam cada acorde de maneira íntima e emocionada. Muitas delas sequer haviam escutado uma peça de Chopin. Outras conheciam profundamente a obra do músico. Mas ao assistir a um concerto erudito, a certeza que se tem é de que este gênero musical atinge de igual maneira a tudo. E a todos. Ao observar a naturalidade do público diante da imponência e magia da música clássica, poderíamos concluir que esta é uma reação normal, que se observa em

Ainda no século XIX, a imigração alemã se iniciava no Paraná e, com ela, o gosto pela música clássica. “Esses imigrantes vinham de cidades já formadas, eram cidadãos com acesso à cultura, educação e tecnologias da época. Com eles vieram muitos instrumentos e o conhecimento de música”, destaca o jornalista.

polacos veio a dança, que logo tomou boa parte da cidade. Ainda mais música era ouvida em Curitiba”, reflete Iarochinski. Com os primeiros descendentes nascidos no Brasil, a cultura da música clássica continuou a se manifestar. Em seguida, o público em geral passava a tomar gosto pela música clássica, passando a paixão de geração em geração. No anos 60 e 70, grandes músicos e maestros fomentaram a música erudita na capital paranaense. É o caso do maestro Roberto de Regina, um dos fundadores da Camerata Antiqua de Curitiba, em 1974, e do o Maestro Gaya, que disseminou de vez o gênero na cidade. Para Helma Haller, que entrou para o coro da Camerata em 1980, Curitiba sempre teve público na música clássica. Seja para assistir, seja para participar das orquestras e coros da cidade. “As apresentações estão sempre cheias e, cada vez mais, o público jovem se interessa por música, inclusive para aprender a tocar um instrumento. O processo é contínuo e sempre tem gente procurando”, afirma. Um bom exemplo da força do gênero em Curitiba é o Coro Feminino Collegium Cantorum, grupo independente fundado há dez anos pela própria Helma. São cerca de 30 pessoas, entre músicos e cantores profissionais que, voluntariamente, encontram-se para ensaiar, aprimorar-se e reciclar suas técnicas. A ideia deu tão certo que o conjunto já teve projetos patrocinados por empresas como Petrobras e Banco do Brasil, e está preparando um segundo álbum.

Com o passar dos anos, os alemães começaram a participar mais ativamente do cotidiano da cidade. Fundaram diversos clubes e até um time de futebol, o Coritiba Foot Ball Club. Aos poucos, as tradições e as músicas foram assimiladas pela cidade. Clubes como o Concórdia e o Rio Branco promoviam saraus praticamente todas as semanas. Estava, então, incorporada no coração da cidade a música contemporânea.

“Curitiba é uma cidade que tem grande tradição na música erudita. Além disso, somos uma verdadeira fábrica de talentos. Inúmeros músicos saem da nossa cidade para estudar nas principais escolas de música do mundo, ou participar de orquestras famosas. Nossas orquestras daqui se apresentam o ano inteiro, como a Camerata Antiqua, a Orquestra à Base de Corda, a Orquestra à Base de Sopro, o Coro da Camerata e a Orquestra Filarmônica da UFPR. Curitiba é uma cidade de música clássica”, completa Iarochinski.

Mas assim como na história da música clássica, foi necessário um polonês para fugir das pautas serenas e começar a digitar emoção nas teclas do piano. Os imigrantes da Polônia que aqui desembarcaram trouxeram mais uma bagagem cultural. “Além do gosto pela música, com os

Iarochinski tem razão. Mas, como tudo por aqui leva um certo tempo para ser elogiado ou assumido, a cena de música clássica curitibana segue seu caminho singelo, de maneira discreta, como o novo busto no Bosque do Papa, porém com poder de alcance que só a história pode explicar.


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ARTE ESSENCIALM GRAFITE É ARTE? E Q Na capital paulista, o muro grafitado da Avenida Sumaré.


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ENTE SUBVERSIVA QUEM SE IMPORTA? por_bruno reis fotos_sabrina schwab

Durou uma noite inteira. O tempo necessário para erguer os andaimes até o terceiro andar e traçar o grafite mais audacioso já feito em Londres. Como sem-

pre, alguns olheiros ficaram de fora para evitar que a identidade de Banksy fosse revelada com uma eventual prisão. Sem problemas. O trabalho foi concluído. A segunda-feira amanheceu com um enorme comentário ao lado de diversas câmeras de segurança: One Nation Under CCTV - algo como “uma nação sob circuito fechado de televisão”.

Muito das polêmicas sobre a arte urbana está resumido nesta ação de Banksy, um dos grafiteiros mais famosos do mundo. Até que ponto essas intervenções artísticas urbanas podem ir? Não seria um crime invadir e pintar um espaço privado? O grafite é uma forma de arte? Uma série de perguntas parece assombrar essas manifestações subversivas aos olhos do público. Mas a pergunta que na realidade pauta praticamente todos esses artistas de rua é mais próxima de: quem se importa com todas essas perguntas?


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BAND-AID URBANO O que eu faço é colocar um band-aid nas feridas da cidade”. Nas ruas há mais de 15 anos, Zezão criou sua fama quando decidiu marcar locais sujos e degradados. Fugiu das avenidas principais, dos muros e paredes brancas e da ânsia pela visibilidade, que aflinge a maioria dos grafiteiros iniciantes, para se dedicar aos espaços que até então ficavam no limbo, esquecidos. “O grafite muitas vezes atua em conjunto com a arquitetura da cidade para evidenciar alguma coisa”, completa o artista. “Eu evidencio que a sujeira é mais embaixo, não é a arte de rua que suja, ela ilustra a cidade”.

É o caso de Banksy, que durante anos ilustrou e criou até alguns pontos turísticos em Londres. É o caso do próprio Zezão, que começou a pintar córregos, bueiros e até mesmo o subterrâneo da cidade, de onde podemos apenas ver as fotos que tira. Para ele, o grafite que faz é também uma forma de democratizar o acesso à arte, já que fica nas regiões mais pobres da cidade. “Quando eu era mais jovem, a vontade era deixar a arte em evidência para que todos pudessem vê-la, mas agora prefiro deixar a arte evidenciar algumas coisas da cidade”, reflete Zezão. O artista do subterrâneo começou a vida como motoboy, salário de R$ 600 e muita ideologia na hora de fazer grafite, o que até então era apenas um hobby subversivo. Hoje, Zezão faz palestras em todo o mundo, mostra sua arte e, após uma longa batalha pessoal, consegue viver do que produz. Recentemente, expôs no MASP

O CHOQUE

A polêmica surgiu no Brasil com mais força depois que uma galeria em São Paulo começou a comercializar as obras de alguns artistas que até então trabalhavam exclusivamente nas ruas. A proposta era mesmo chocar e fazer diferente. Os preços não ficam escondidos, estão sempre ao lado das obras, e a cada exposição a galeria se veste de acordo com o artista que está expondo. Essa comercialização da arte feita pelas mesmas mãos dos pintores da cidade acabou ofendendo alguns dos patrulheiros ideológicos da arte urbana, como Zezão era no começo. A Choque Cultural surgiu fazendo exatamente o que seu nome prega. Durante uma entrevista para o site de uma grande revista, Baixo Ribeiro, o dono da Choque, evitou falar que comercializam grafite, apesar da insistência do entrevistador. A bandeira que exibiu foi a de ser uma galeria para jovens - os protagonistas de uma verdadeira revolução artística; a

com outros quatro artistas uma mostra do que faz, com fotos e instalações. Mas como a polêmica sempre rondou tudo o que é relacionado ao grafite, uma série de novas perguntas surgiram. “A arte urbana só faz sentido se está na rua” era um dos protestos que podia ser lido na parede liberada para a intervenção dos visitantes. Então, será que a arte que está nos museus é mesmo arte urbana? Para Stephan Doitschinoff, que também participou da exposição no MASP, o problema nessa história é o rótulo. Ele concorda que a arte urbana só faz sentido se está nas ruas, mas não entende por que alguns pensam que os artistas que trabalham no concreto da cidade não podem fazer arte para galerias e museus. “São coisas diferentes, continuamos nas ruas, mas também pintamos em telas agora”, completa. Stephan, assim como Zezão, nunca abandonou as ruas. Aliás, Stephan leva a intervenção artística no coração. Passou um bom tempo em comunidades quilombolas na Bahia, onde produziu murais. Antes, já havia pintado uma pequena igreja na cidade de Lençóis, no Maranhão, sempre no ritmo nômade e despreocupado. “O importante é a arte e não o rótulo” ou “A ideologia não pode ser uma prisão para o potencial incrível da arte” parecem resumir a conversa que a Inventa teve com o artista durante a pausa de um trabalho que teria ainda de terminar para enviar a Nova York.

mudança da arte pela mudança do público e não pela mudança do artista em si. Assim, da mesma maneira que as vanguardas modernistas chocaram o padrão da época, a arte jovem, com influência no grafite e também em outros ícones pop e modernos, como a televisão e a internet, começa a mudar um pouco o panorama visto da ponte dos paradigmas. Stephan acredita que o balanço é positivo. “É bom divulgar a arte urbana para mostrar que o que fazemos não é nenhum tipo de crime”, comenta, alertando que a truculência da polícia é o maior perigo para quem decide praticar essa arte subversiva. “No aniversário da cidade de São Paulo, neste ano, um amigo meu estava concluindo um mural lindo quando foi preso. Era um presente pra cidade”, completa. Como praticamente todos os artistas que começaram na rua, Stephan já teve pro-

blemas com a polícia. Zezão também, e o próprio Banksy chegou a ser preso quando ainda não era famoso (ele não revela quando nem onde para não comprometer a imagem). Ao contrário do que se pensa, o que os levou às galerias não foi o perigo das ruas. “Simplesmente faltava um espaço para esse novo tipo de arte”, sentencia Baixo Ribeiro, que abriu a galeria motivado pelo filho, que não encontrava um local adequado para repercutir a arte que produzia. “Nem todo grafiteiro é artista, mas os que são precisam mostrar o que fazem para evoluir”, continua Baixo, explicando que a proposta da Choque é revelar esses talentos ao mesmo tempo em que cria um mercado consumidor de um tipo de arte que até então não estava ao alcance do consumidor - em especial dos jovens consumidores, que não precisam se sentir mal pelas obras com preços de cinco dígitos porque há opções para todos os bolsos. “É uma escadinha”, conclui Baixo.


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SAÍDA PELA GIFT SHOP

Alguns stencils nas paredes de Sundance anunciavam que Banksy estava por ali, durante o festival de 2010. Mas apenas alguns dias depois foi divulgado que seria lançado no Library Theatre o primeiro documentário do britânico. Exit Through The Gift Shop é uma parceria de Banksy com um cineasta francês, e marca a primeira aparição do artista de rua naturalmente com a voz alterada e na penumbra, o que levanta suspeitas de que o próprio estava em uma das 446 cadeiras da sala de projeção. O argumento para a produção é que a efêmera arte de rua precisa ser documentada, seja em filme, fotografias ou revista...

DUAS VISÕES

Um dos grandes talentos do grafite nacional acabou fazendo sucesso em Nova York enquanto ainda era completamente desconhecido no Brasil. Na falta de um espaço para divulgar sua arte, os irmãos Otávio e Gustavo Pandolfo, OSGEMEOS, foram para fora. “É preciso dar condições para que os artistas evoluam, e acho que isso está começando a mudar agora”, diz Baixo Ribeiro. No Brasil, os dois encontraram pouco respaldo e apreciação. Durante o tempo que passaram em Curitiba, no fim de 2008, fizeram algumas paredes pela cidade. Mais tarde, elas foram apagadas

O beco da Vila Madalena, em São Paulo, virou uma exposição a céu aberto e recebe dia após dia mais visitantes.

ou até pixadas por outros artistas de rua. Quem passa por elas não sabe quem as fez e muitas vezes nem mesmo nota. A discussão aberta pela Choque tem o mérito de colocar a arte urbana em evidência, ainda que em tom controverso. As grandes questões que polemizam o grafite parecem ter uma raiz apenas: o caráter subversivo da arte de rua. Durante muito tempo, este parece ter sido um grande limitador à evolução e disseminação dessa arte. De um lado foi o público que não a admirava por ser algo, digamos, fora da lei e, por outro, os próprios artistas por questões

ideológicas relutaram em sair das ruas para usar novas linguagens e materiais. Por isso, Zezão levou um tempo para começar a apostar em sua arte. Por isso, Stephan indigna-se quando diz que o rótulo é uma das piores coisas para a cultura. Por isso, OSGEMEOS tiveram de ir para fora do país para poderem se desenvolver artisticamente. Na verdade, os artistas estavam coerentes com eles mesmos. Continuam na subversão. Existe algo que perturbe mais a ordem do que o que eles vêm fazendo?


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15 MINUTOS _APO FOUSEK

por_BRUNO REIS foto_Fabiano Lokinho

Discreto. Durante a meia hora em que esperamos por Apo Fousek no café da Livraria Cultura, no Conjunto Nacional, em São Paulo, ele ficou numa cadeira um pouco distante. Nos encontramos na fila para pegar um pão de queijo, e foi com a conversa que seguiu que pudemos descobrir que realmente Apo Fousek é livre como um pássaro, como diz o seu site “que em brevE será reformulado com um novo e inédito conceito”, logo ele emenda. Apo cultiva o desejo de mudar o mundo. Para tanto, começou mudando primeiro a si mesmo. Buscou refúgio num local isolado no litoral paulista. Abandonou o skate e o celular, e começa a viver da forma que o próprio nome sugere: Apoena é indígena e significa “aquele que enxerga longe”, como ele mesmo nos explicou nesta entrevista exclusiva. INVENTA - VOCÊ COMEÇOU A DESENHAR COM TRÊS ANOS DE IDADE E DESDE ENTÃO NUNCA PAROU. COMO FOI A TRAJETÓRIA ENTRE O APO INICIAL E O ATUAL? APO FOUSEK Um elemento que sempre se manteve presente foi o desenho e o raciocínio por meio do desenho, que influencia muito na maneira de pensar. É tudo na minha vida. Nunca parei de desenhar, assim, simples, no papel mesmo. Quanto à minha arte, a maior mudança foi quando me mudei para um local isolado no litoral. Ficou mais colorida, um pouco como eu fazia quando era novo. IVT - PARA QUAL MARCA OU EMPRESA VOCÊ NUNCA CRIOU E GOSTARIA DE CRIAR? AF Gostaria muito de criar para a Patagônia, para a Vans e, naturalmente, para a Apple. Acho que essas são marcas que realmente marcam as pessoas. Já tive muitas ideias, mas nenhuma oportunidade de apresentá-las. Hoje em dia, eu tenho a oportunidade de trabalhar com a Volcom, que acompanhei desde o começo. IVT - QUAIS FORAM AS INFLUÊNCIAS MAIS DECISIVAS PARA O TRAÇO DA SUA ARTE? AF Hoje, parece ser uma obrigação na arte você ter referências ou influências. Eu procuro separar isso. Minhas referências não têm uma ligação tão forte com a arte, mesmo porque elas têm mais a ver com a minha personalidade e com o meu dia a dia. Minha vida acaba influenciando mais a minha arte. Ainda assim, algumas das minhas maiores referências: Tito Rosenberg, um dos maiores aventureiros do Brasil; Carlos Motta, que é um grande designer; Alexandre Wollner, um ícone; e o capitão Paul Watson, um grande ativista e que tenho como ídolo.

IVT - MÚSICA. VOCÊ ESCUTA EM SÃO PAULO O MESMO QUE ESCUTA EM SEU ATELIÊ NO LITORAL? AF Escuto música desde a hora em que acordo até a hora em que vou dormir. Crio com música. Ela está sempre presente, é uma ligação muito forte que tenho desde moleque, quando comecei a tocar piano. Depois, vieram as bandas do skate. Quem anda de skate está sempre ligado na música. Parece que é intrínseca à coisa... Ah, e sim, escuto a mesma coisa nos dois lugares. IVT - E O QUE CRIA POR LÁ É O MESMO QUE CRIA NA CIDADE? AF Minha arte começou a mudar bastante quando me mandei pro litoral. Sempre a natureza em primeiro lugar, sempre. No urbano, tinha o skate, mas, sinceramente, não tenho mais ligação alguma com isso, com São Paulo. É uma cidade que me deixa muito estressado, mas é um mal necessário porque ela acabou me influenciando. Gosto de vir pra cá, fazer essa loucura, só pra depois voltar pro meio do mato e criar. IVT - POUCAS FORAM AS SUPERFÍCIES QUE AINDA NÃO VIRAM UM TRAÇO SEU. DE PRANCHAS DE SURF AOS SHAPES DE SKATE. SUA ARTE PASSA SEMPRE UMA MESMA MENSAGEM OU CADA OBRA É ÚNICA? AF Minha última exposição, Some Things, buscou não ter uma mensagem específica. Quis deixar as pessoas livres para absorverem toda a energia que eu próprio havia absorvido na natureza. Eu sei que deixar aberto é muito positivo, mas eu tenho enraizada em mim esta questão de ter que passar uma mensagem. Estou atualmente tentando ser mais ativista ecologicamente com minha arte, mas sem ser chato ou massante. Quero que as pessoas entendam, acima de tudo, pra depois pensarem o que quiserem. IVT - SEM CELULAR. MAIS UMA MOSTRA DE QUE ESTÁ CONSTANTEMENTE ENTRE O URBANO E O NATURAL. MAS O E-MAIL NÃO DEIXOU DE USAR... AF Ah, o e-mail, sempre. Do celular, abdiquei há dois anos porque não queria ser sempre achado. Eu venho tentando administrar isso agora, ainda que esteja cada vez mais complicado. As pessoas estão muito viciadas em certas coisas que não precisam. Eu realmente estou tentando me livrar dessas coisas, levar uma vida mais simples em todos os sentidos, ficar apenas com o essencial. Aliás, não ter o celular deixa tudo mais simples, mesmo. Se eu marco com alguém, tenho certeza que a pessoa vai aparecer, como nosso encontro hoje. Não tem como ligar desmarcando...

15 MINUTOS_Apo Fousek



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DOA-SE

OLYMPUS ACCURA ZOOM XB 70. MODELO DE ALTO DESEMPENHO COM DESIGN ÚNICO, IDEAL PARA FOTÓGRAFOS EXIGENTES, PROFISSIONAIS OU AMADORES, QUE FAZEM DA FOTOGRAFIA DE 35MM UMA ARTE DE GRANDE ESTILO, E QUE NÃO SE IMPORTAM EM NÃO PAGAR NADA POR ISSO. por_ISADORA HOFSTAETTER

ilustração_CHIQ!

Téo procura máquinas fotográficas. Por onde vai - de feiras de antiguidades a postos de gasolina - cede cinco minutinhos do passeio

para vasculhar modelos antigos, opções descartáveis, filtros e lentes diferenciadas. A paixão pela câmera é antiga. O novo é a busca pelo lado tosco do equipamento. Quer, na verdade, instrumentos para brincar de fazer Lomografia. Além dos sites de lojas especializadas, percebeu que se buscasse em grupos online também poderia ter sucesso. A quarta máquina fotográfica tosca que adquiriu ganhou de Ana Maria. “Era esse mesmo o nome dela? Só lembro que tinha Maria no nome”. Téo nunca a viu, não sabe seu sobrenome e, para piorar, quando foi buscar seu “presente”, esqueceu de anotar o endereço completo. Só sabia o nome da rua. Dentre os 11 prédios da pequena travessa, um deles deveria ser o de Mara. Ou Marcela. De portaria em portaria, encontrou o que procurava no penúltimo portão: um envelope com seu nome. Era a máquina.

Nem Mara, nem Marcela, nem Ana Maria. A máquina fotográfica chegou às mãos de Téo por conta da ideia mirabolante de Deron Beal, um norteamericano de Tucson, no Arizona. Em 2003, Deron era colaborador de uma empresa de reciclagem e enviou um e-mail para 30, 40 amigos, ofertando coisas que não poderiam ser recicladas, que seriam jogadas no lixo. Surge o Freecycle, uma comunidade de pessoas

ofertando e procurando coisas que não são mais úteis para seus donos. “Estimase que por dia mais de 500 toneladas de produtos estejam fora do lixo por causa disso”, conta André Ruiz, um dos moderadores do Freecycle Curitiba, que conta com 787 usuários. São cerca de 10 ofertas/procuras por dia, mas a brincadeira é muito maior. O Freecycle está presente em 86 países e seus membros somam milhões de pessoas.


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André faz parte da comunidade há dois anos. Inscreveu-se apenas como membro e, depois de um tempo, voluntariou-se para ser moderador. “Todas as mensagens enviadas pelos usuários passam pela aprovação de um moderador antes de irem para a lista. As mensagens não são alteradas, mas podem eventualmente ser rejeitadas se, por exemplo, ofertarem drogas e medicamentos, armas ou qualquer outro item proibido”, conta. Deron - o criador - não conseguiu listar tudo que poderia ser proibido. Cada comunidade local gera seu próprio rol de regras de acordo com as práticas mais comuns e que mostraram não ser eficazes. Em Curitiba, André diz que a comunidade é tranquila, porém, procura mais do

que oferece. “Talvez seja uma questão cultural, ou talvez seja o fato de que doamos pouco e isso faz com que a relação entre procura e oferta fique maior do que eu imagino que seja lá fora. Pessoas chegam a pedir TVs, sofás, notebooks, videogames e outras coisas que raramente alguém doaria, mas ofereceria para algum conhecido ou parente antes de colocar na lista”. Marisa não pensou nisso. Artesã, 46 anos, casada e mãe de um filho, comprou sua Olympus Accura Zoom XB 70 há mais de 15 anos, se não falha a memória. Foram aniversários, viagens, Natais. De uma viagem de trem para Morretes é a última foto. No sacolejo do trem, Marisa - sim, este é seu nome verdadeiro - proficiou

Nada de graça Em Belo Horizonte, uma loja inteiramente gratuita fechou por falta de movimento. A Loja Grátis e Espaço de Convivência BH oferecia roupas, acessórios e o que mais alguém doasse, sem custo algum. A iniciativa fechou

as portas e explica que o motivo foi o pouco movimento, as poucas propostas e também o pouco envolvimento das pessoas. Porém, outras ações ganham seu lugar. O Espaço Ystilingue (www.ystilingue.tk), também da capital mineira, parece - via online - ir muito bem. A ideia é praticamente a mesma, talvez um pouco mais política e voltada para um público mais cool.

“na nossa próxima viagem, as fotos serão com uma digital”. E foi daí para a caixa de guardados. A Olympus só voltou à ativa no dia 6 de janeiro de 2010, nas mãos de Téo. As fotos tiradas ainda estão no rolo de filme, sem revelar. “Eu sou apegada aos objetos, mas não no sentido de guardar porque tem valor sentimental e sim porque sou contra o desperdício. Doar a máquina foi uma maneira de dar algo para quem realmente queria aquele objeto. Penso que se a pessoa se dá ao trabalho de ir até a sua casa buscar, naturalmente aquilo vai ter algum uso ou no mínimo a fará feliz”. Marisa está certa. O fotógrafo tem um sorriso no rosto cada vez que fala sobre a experiência de receber algo de uma pessoa que nunca viu...

Em Curitiba, o ativismo do desapego está nas feiras de troca. Em escolas, cafés, garagens, dos três aos 80 anos de idade, todos são convidados a trocar suas “tralhas” por algo que interesse mais. Também é moda por aqui reciclar peças das vovós para deixar o vintage com cara de contemporâneo - atitude que gosto e pratico em doses homeopáticas.

Mas eis a pergunta que fica: as pessoas estão realmente deixando de comprar porque trocaram, ganharam ou acharam algo? Acho que não. E daí todo o ativismo passa a ser apenas uma diversão ecologicamente correta - tenho que concordar - mas sem muito fundamento.


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UM PESCADOR NOS BASTIDORES por_Flávia Ferreira fotos_ACERVO E Guadalupe Presas

Esposito, primeiro sonoplasta do Teatro de Comédia do Paraná, na peça A Megera Domável, em 1964.

Preservação e memória. Miguel Esposito é ele próprio um centro cultural. Aos 66 anos,

guarda na ponta da língua histórias singulares dos mais de 40 anos que viveu dentro de um dos maiores complexos artístico-culturais da América Latina. Esta história de amor teve início com os devaneios de adolescente quando era o primeiro aluno de teatro do nosso Guaíra. Daqui foi para o Rio de Janeiro aprender nos teatros da cidade e na Rádio Nacional, mas percebeu que lá definitivamente não era sua praia. Voltou e logo notou que não existiam muitos técnicos de teatro. E como gostava de ver a preparação dos artistas, acabou se apaixonando pelos bastidores.

Corta para 1990. Miguel Esposito recebe Menção Honrosa por seu trabalho como contrarregra na premiação do Troféu Gralha Azul. Em 97, Gralha Azul na categoria de Melhor Técnico do ano. Em 2004, a Medalha Comemorativa dos 50 anos do Guairinha, uma homenagem única, concedida pelo Centro Cultural do Teatro Guaíra por sua maestria como técnico e dedicação ao teatro paranaense. Volta. Miguel vive cada canto do teatro que ajudou a criar. Cheio de histórias e lembranças, é cuidadoso para não citar nomes. Lembra que a primeira vez que tomou um champagne francês foi em 1954, na inauguração do Guairinha. Relembra

com graça a época da ditadura. “Uma vez censuraram a palavra urinol, que no espetáculo seguinte foi substituída por penico”, diverte-se. Nostálgico, ensina que a chapelaria do teatro já foi re-al-men-te um espaço para guardar os grandes chapéus de espectadores e espectadoras. Insight. Algumas dicas de quem praticamente já se sentou em todas as cadeiras do teatro: é melhor ver um balé russo do segundo ou terceiro balcão do que na plateia, e assistir a um show da Rita Lee na primeira fila é um crime. “Por conta da acústica”, emenda. Mas para a diversão de fato, não há dinheiro que compre ingresso. Durante uma peça em que um bailarino francês


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Segundo funcionário mais antigo do teatro, tem mais de 10 mil fichas com anotações e histórias do Guaíra.

se suicidava com um punhal, Miguel pediu para o contrarregra recolher a roupa e a espada e deixar apenas o punhal para o grand finale. No entanto, quando olhou para o palco, o artista, por falta do punhal, estava se suicidando com a espada. Corta. Miguel é simplesmente o segundo funcionário mais antigo do teatro. É do tempo do esforço físico, das manivelas para abrir as cortinas. “Hoje se pode escolher a velocidade de abertura delas com um simples botão”, afirma. De ator a técnico, faz até alguns bicos como psicólogo das meninas do teatro, dando conselhos e ouvindo suas histórias com os namorados. É querido por todos,

saudado com respeito e alegria por aqueles que passam por ele. Para ele, todas as plaquinhas nas paredes do teatro têm uma história pessoal. Mostrando a sua própria, de honra, diz que não sente orgulho pelos seus prêmios. “Se entrar mais uma placa na minha casa, tenho que sair. Não cabe mais nenhuma”, diz. Orgulho para ele, na verdade, está em fazer parte da história do teatro. “Acompanhar a evolução e ver isso aqui crescer é a minha maior recompensa”. Daqui a quatro anos, irá se aposentar. Pretende pegar sua varinha e ir pescar, mas diz que já sente saudades. Não

imagina deixar de participar da vida dos espetáculos. Tem a ideia de criar um grupo de teatro. Acostumado desde pequeno a fazer anotações do seu dia a dia, as mais de 10 mil fichas com anotações e histórias do Guaíra ainda têm destino incerto. Sobre a possibilidade de este arquivo pessoal se transformar em livro, Miguel Espósito, com a paciência de um pescador, responde apenas que já está pensando no assunto.

“Se entrar mais uma placa na minha casa, tenho que sair. Não cabe mais nenhuma!”.


CDIGITAL.COM.BR FCCDIGI42 L.COM.BR FCCDIGITAL.COM. R FCCDIGITAL.COM.BR FCDIGITAL.COM.BR FCCDIGITAL. AGENDA CULTURAL

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O PALCO DA NOVELA CURITIBANA Tudo começou com um antigo casarão construído em 1902. Ao

ser doado para a Prefeitura de Curitiba, em 1992, tornou-se um espaço cultural que desde então tem valorizado os artistas paranaenses diante dos espectadores que ocupam o teatro, preparados para ver a arte acontecer diante de seus olhos. Este é o Novelas Curitibanas, que abriga as mais diversas vertentes teatrais da cidade e tem fundamental importância como palco de novidades para experimentos de elencos locais. Os espetáculos do Novela têm como foco o público adulto. Confira algumas das atrações do Teatro Novelas Curitibanas:

// O RAPAZ E A RAPARIGA - Peça de pessoa, prego e pelúcia Data: de quinta a domingo, até 14 de março Horário: 20h Local: Teatro Novelas Curitibanas - Rua Carlos Cavalcanti, 1222 Ingresso: R$ 10 e R$ 5 a meia entrada

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// ELIZAVETA BAM Data: de quinta a domingo, de 15 de abril a 16 de maio Horário: 20h Local: Teatro Novelas Curitibanas - Rua Carlos Cavalcanti, 1222 Ingresso: R$ 10 e R$ 5 a meia entrada

O LADO B

Há mais de 20 anos, domingo é dia de música caipira em Curitiba. Violeiros, cantores, duplas e conjuntos de música caipira se reúnem no Teatro Universitário de Curitiba (TUC) para participar da Canja de Viola. Este espetáculo conta com a participação de gente do povo, que canta o que há de mais espontâneo e demonstra com muita qualidade o que é comunicação popular. A Canja de Viola permite que, uma vez por semana, anônimos subam ao palco e deem um show de música caipira. E quem sai ganhando é o público. Mas o TUC também é palco para a apresentação de diversas bandas de garagem. A programação do teatro pode ser acompanhada no site da Fundação. // CANJA DE VIOLA Data: 11 e 14 de abril Horário: das 15h às 18h Local: TUC - Trav. Nestor de Castro, 0 Ingresso: R$ 1

AS OFICINAS DE CRIATIVIDADE

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Crianças, adultos, vovôs: todos podem participar das oficinas e dos cursos de artesanato oferecidos pelo Centro de Criatividade de Curitiba. Este espaço, dedicado à criação e à educação artística, possui uma grande área, com biblioteca e outras instalações. São mais de dez oficinas oferecidas ao público, que vão desde música até pintura, passando por cerâmica e encadernação. Tem oficina para todos os gostos, dons, idades e disponibilidades de horário. Confira as oportunidades no site da Fundação ou pelo telefone (41) 3313-7192.

DESENHANDO AS NOVAS LETRAS DA CIDADE

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O Brasil é um país sem muita tradição em leitura. Mas, se depender da Fundação Cultural de Curitiba, esta situ-

ação pode começar a mudar, já que estão abertas ao público mais de 15 oficinas gratuitas de literatura. Entre as oficinas, os assuntos tratados são bem diversos e vão desde o estudo da estrutura textual até a criação poética. Há oficinas que abordam temas mais gerais e as que ensinam sobre um estilo específico. Como adicional, todas contarão com professores conceituados na área. O público infantil também tem espaço garantido com a Oficina de Literatura Paranaense. Já os grandinhos, maiores de 18 anos, podem contar com diversas opções de oficinas. Confira abaixo algumas das oportunidades para o público adulto, que estão listadas na íntegra no site: // DRAMATURGIA II - Sátiras e Dramas, Tragédias e Épicos Ministrante: Paulo Afonso Castro Data: início em 4 de março, com encontros às quintas-feiras, quinzenalmente Horário: das 19h às 23h Local: Palacete Wolf - Praça Garibaldi, 7 // JORNALISMO CULTURAL E CRÍTICA LITERÁRIA - Teoria e Crítica Literária: Uma Introdução Ministrante: Otto Leopoldo Winck Data: início em 3 de março, com encontros às quartas-feiras, quinzenalmente Horário: das 18h às 23h Local: Palacete Wolf - Praça Garibaldi, 7 // LITERATURA INFANTO-JUVENIL - O Fascínio Pelas Palavras na Literatura Infanto-Juvenil Ministrante: Glória Kirinus Data: início em 2 de março, com encontros às terças-feiras, quinzenalmente Horário: das 19h às 23h Local: Palacete Wolf - Praça Garibaldi, 7 PUBLIEDITORIAL_FCC

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A BRASILEIRA MÚSICA POPULAR

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Nosso Som é um show inteiro de composições próprias da

Orquestra à Base de Corda, de Curitiba. Com o melhor da música brasileira e há mais de dez anos explorando e pesquisando a MPB, o grupo é composto por instrumentos como o violino, o bandolim, o cavaquinho, o piano e a percussão. Juntos, resultam em uma sonoridade diferente, mas com a harmonia em uníssono. O repertório de Nosso Som é formado por composições de integrantes e ex-integrantes do grupo que, ao longo de mais de uma década, vêm honrando a música popular em Curitiba. Uma das melodias interpretadas será Ritmos Brasileiros, do violonista e integrante da orquestra há nove anos, João Egashira. Mas o agito não para aí. Outra apresentação vai animar os amantes da MPB. A Pandeirada de Vina Lacerda, Marcos Suzano e Caíto Marcondes será nos dias 9 e 10 de abril. Vina é um dos mais conceituados pandeiristas do país e seu talento promete não deixar ninguém parado. Confira a programação:

CAMARATA ANTIQUA DE CURITIBA INICIA TEMPORADA

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A beleza do coro e a suavidade da orquestra formam a Camerata Antiqua de Curitiba, que desde 1974 se dedica ao melhor

da música clássica. Nos dias 12 e 13 de março, um concerto, que contará com a narração da atriz Letícia Sabetella, abre a temporada de apresentações da Camerata. Outras seguem até o início de maio para quem não puder ver a abertura. Se você gosta de acordes suaves e clássicos, não perca este destaque! // CONCERTO DE ABERTURA – Camerata Antiqua de Curitiba Data: 12 e 13 de março Horário: 20h (dia 12) e 18h30 (dia 13) Local: Capela Santa Maria - Rua Conselheiro Laurindo, 273 Ingresso: R$ 10 e R$ 5 a meia entrada, mais 1kg de alimento não perecível // MÚSICA ANTIGA - Camerata Antiqua de Curitiba interpreta Bach e Haydn Data: 9 e 10 de abril Horário: 20h (sexta-feira) e 18h30 (sábado) Local: Capela Santa Maria - Rua Conselheiro Laurindo, 273 Ingresso: R$ 10 e R$ 5 a meia entrada, mais 1kg de alimento não perecível

// SHOW NOSSO SOM - Orquestra à Base de Corda Data: 11 e 17 de abril Horário: 11h e 17h (domingo); 20h (sábado) Local: domingo no Teatro Londrina - Rua Dr. Claudino dos Santos , 79; sábado no Teatro do Paiol - Praça Guido Viaro Ingresso: R$ 10 e R$ 5 a meia entrada É obrigatória a doação de 1kg de alimento não perecível

// O CORO DA CAMERATA CONVIDA - Camerata Antiqua de Curitiba com o regente convidado Fernando Swiech Data: 30 de abril e 1º de maio Horário: 20h (sexta-feira) e 18h30 (sábado) Local: Capela Santa Maria - Rua Conselheiro Laurindo, 273 Ingresso: R$ 10 e R$ 5 a meia entrada, mais 1kg de alimento não perecível

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DIVERSÃO PARA TODAS AS IDADES

Quem diz que revista em quadrinho é coisa de criança está muito enganado. Prova disso é o público fiel da Gibiteca de Curitiba, composto por

// PANDEIRADA - Com Vina Lacerda, Marcos Suzano e Caíto Marcondes Data: 9 e 10 de abril Horário: 21h Local: Teatro do Paiol - Praça Guido Viaro

pessoas de todas as idades. Um dos motivos do grande público é o completo acervo que a instituição possui: são mais de 25 mil títulos de todos os gêneros de HQs. A Fundação Cultural de Curitiba é responsável pela política cultural Além de empréstimos e consultas, a no município. Ela atua na formação, promoção e na democratização Gibiteca oferece outras atividades, como do acesso, atendendo artistas, produtores e a população como um oficinas de criação, palestras, expositodo. Participa diretamente de mais de 1.700 eventos, atingindo um ções e encontros de RPG. Profissionais público estimado em 3 milhões de espectadores anualmente. nacionais conceituados no ramo dos quadrinhos já estiveram na Gibiteca de Curitiba, como Laerte, Angeli e Glauco. Responsável por administrar e programar diversos espaços culturais Fundada em 1982 como a primeira Gibide Curitiba, a Fundação também leva oficinas e espetáculos para os 75 teca do Brasil, está hoje situada no Centro bairros da capital paranaense. Através de oferta múltipla e pluralista Cultural Solar do Barão. Com seu apoio à de bens e serviços culturais, e da inter-relação entre os diversos níveis cultura, já lançou no mercado vários arde desenvolvimento da sociedade, ela promove a ampla participação tistas paranaenses, que hoje fazem sucesso dos habitantes na vida artística e cultural da cidade, levando ainda Brasil afora. Para quem se interessa pela mais que apenas arte e cultura para os curitibanos. linguagem, a Gibiteca oferece diversas oficinas ao longo do ano.

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FOTONOVELA_ Benett


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_Mariliz Vargas

_Diego The Kid

ARTIGOS

A IMPORTÂNCIA DO NÃO EM NOSSAS VIDAS

Muito se fala da habilidade em dizer não, mas pouco ainda foi abordado sobre a dificuldade que temos em recebê-lo. Por

isso, desenvolvi a sabedoria do não, que tem por objetivo ajudar as pessoas a encararem as negativas que recebem de uma forma mais positiva. É a arte de transformar o não em sim, e conseguir com isto uma boa dose de transformação e fortalecimento interior. Os nãos invadem nossas vidas como surpresas desagradáveis, e a sua incômoda presença nos obriga a angariar recursos internos muitas vezes adormecidos. Ela exige uma mudança de curso, exige criatividade, humildade e paciência. Por isso, o não é um grande aliado no amadurecimento de todos nós, em qualquer tempo e idade. Encarar o não desta forma muda a sua fama de vilão da história e redime esta importante força da natureza, colocando-a em seu devido lugar, que é o de colaboradora

insuperável do crescimento humano. Além disso, colocar o não em seu devido lugar permite que toda a educação seja encarada de outra maneira, dando especial ênfase ao fortalecimento interior como medida de desenvolvimento individual e social.

Devido à ênfase no desenvolvimento tecnológico, vivemos um tempo em que se fomentam facilidades em todos os níveis de atuação. No que se refere ao desenvolvimento humano, este excesso ameaça dilapidar as gerações mais novas e privilegiadas. O exagero no sim está sendo tomado como sinônimo de amor e tem contaminado a relação entre pais e filhos, principalmente. A resultante deste processo é a criação de uma sociedade cada vez mais intolerante, em que a violência encontra caminho aberto para se manifestar em suas mais variadas formas. Por isso, chamo a atenção para a sabedoria do não como um auxiliar

capaz de direcionar a vida de todos nós para o melhor possível. É preciso que a consciência desperte para as verdadeiras forças que regem a vida, e que este conhecimento seja colocado de uma forma simples e acessível a toda a população. Estamos ainda engatinhando no que se refere à compreensão da mente humana e às melhores formas de desenvolver suas capacidades. Muitos erros foram cometidos, e estes equívocos são sentidos hoje na forma de grandes tragédias sociais. Precisamos nos voltar para a importância de conhecer cada vez mais profundamente o funcionamento do ser humano para que estes enganos sejam corrigidos e outros tantos evitados. É a esta meta que se dedica o livro A Sabedoria do Não, de levar a todos os que buscam no seu dia a dia viver da melhor forma possível, aprender com os ensinamentos que a vida apresenta, e encontrar dentro de si condições de força, saúde e felicidade.


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_Rodrigo Fornos

e Kid

go Th

_Die

“A vida é uma história contada por um idiota, cheia de som e fúria, significando nada.”

Shakespeare

Shakespeare definiu muitíssimo bem o que são nossas vidas. E o teatro mostra, com intensidade brutal, tudo o que queremos e tudo o que somos. O teatro é a arte onde tudo é possível e, melhor, mostrado bem na frente dos nossos narizes. Março é o mês do teatro no Brasil, especialmente nesta cidade infestada de atores, diretores, técnicos nas artes cênicas, produtores. Acontece o 19º Festival de Curitiba, até pouco tempo conhecido como Festival de Teatro. E o grande lance desta que é a maior mostra de teatro do país, e me parece que da América do Sul, inclusive, é a quantidade e a profusão de formas distintas de nos contar um pouco dessas nossas vidas. É gente que vem de toda parte do país e alguns até de fora. É dividido assim: Mostra Oficial, com peças de grande porte, do tipo atores profissionais e produções maiores e ainda para estrear; o Fringe, com suas exatas 368 peças amadoras e profissionais também. Do Fringe, por exemplo, o multiartista Alexandre Nero foi catapultado para o Rio de Janeiro para trabalhar numa novela e virar, como a maioria gosta de dizer, global. E tem ainda peças de stand up comedy, cursos, palestras e oficinas, ou seja, as mais diversas manifestações culturais dos mais variados gêneros. Mas, enfim, qual o objetivo desse festival que atrai tanta gente e lota os teatros e espaços espalhados por Curitiba? Primeiro é dar visibilidade ao teatro pouco frequentado durante o resto do ano, com exceção para algumas peças onde aqueles “globais” estão no elenco. E quando falo em teatro me refiro ao conjunto que o representa, ou seja, peça, autores, diretores, atores, cenógrafos, iluminadores, cenotécnicos. Essa visibilidade é dada através da mídia que,

até por falta de assunto, vai buscar uma boa pauta para preencher as tão vazias sessões de cultura em seus veículos. Mas e o tão respeitável público? Onde ele está, afinal, quando não temos mais o festival? Grande pergunta com resposta certeira: em casa, assistindo a sua televisãozinha sem gastar aquela grana que vai servir para muita coisa senão o verdadeiro sentido do teatro que é o entretenimento. Uma das grandes lutas da classe teatral é a tal da formação de plateia. Como se faz isso? Ingresso barato e boa divulgação, em princípio. Por que shows de música, do sertanejo ao clássico, lotam os mesmos teatros e espaços? A pergunta é apenas para análise, uma vez que estamos falando de teatro - quem sabe podemos pensar sobre isso numa outra oportunidade. Voltando ao teatro, podemos dizer que não é tão difícil contar essas histórias, cheias de som e fúria, e que nos tocam como qualquer outra arte. Mas, por que no teatro é diferente? Onde estão as pessoas para assistir às peças que são produzidas ao longo de um ano inteiro e estão em cartaz nos mais diversos espaços? Talvez devesse haver uma campanha do tipo “vá ao teatro!”. Ou então devessem existir peças que nos tirassem, definitivamente, da frente de nossas TVs. Mas para isso é necessário algo que faça a diferença. Algo que nos faça sentir aquele arrepio que uma boa música nos produz. Algo que nos toque tão profundamente que passamos a entender como é bom ir ao teatro para ver e ouvir um bom texto. E olha, cá entre nós, isso tem em Curitiba o ano todo. Para todos os gostos. Voltando ao Festival, posso acrescentar que, com tudo o que ele oferece, a movimentação econômica gerada na cidade com hotéis cheios, restaurantes mais frequentados e bares lotados, ganhamos

todos. Mais: a reciclagem oferecida aos profissionais ligados às artes cênicas é genial. São pessoas que nunca se encontraram e que falam a mesma língua. Gente se conhecendo a todo instante. O teatro realizado no Brasil está em Curitiba para que todos possamos ver o que e como o país faz esse teatro. Tem também o interessante Movimento dos Sem-Ingresso. São alunos da FAP, a Faculdade de Artes do Paraná, que ficam na frente do QG do Festival aguardando doações. E sempre tem gente - na maioria as próprias produções - que doa ingressos, possibilitando o acesso a quem vive dessa arte. Outra questão. Sempre tem aquela pergunta famosa que é fundamental para a escolha do que assistir: “será que é boa essa peça?”. Como descobrir? O boca a boca desse Festival é tão eficaz quanto as matérias dos jornais. Ficar atento a tudo o que sai e aos meios que informam o evento é imprescindível. Felipe Hirsch, maior e mais genial diretor de teatro na atualidade, é impecável na arte de entreter com sabedoria, inteligência e estética. A peça Não Sobre O Amor, que ele dirige, tem Prêmio Shell e mais um prêmio que é considerado a Copa do Mundo dos iluminadores, com o brilhante trabalho de Beto Bruel. Dou este exemplo para mostrar que esse time, prata da casa, curitibano, estará disponível para quem quiser. E tantos outros times que podem nos brindar com a beleza que é o teatro. Teremos, sim, o que há de melhor no país. Informe-se no site festivaldecuritiba.com. br. Garanto que, pelo menos enquanto você estiver sentado em sua poltrona e olhando para aquela caixa preta, você e sua imaginação serão levados a mundos nunca explorados. Afinal, essa é a magia do teatro. _ARTIGOS


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COLUNAS

_Bia Moraes

POR FAVOR, FIQUEM ONDE ESTÃO Ícones não podem ser reais. Não lhes permitam, deuses, ter uma vida banal. Encontrar com

um ídolo da sua infância logo ali na esquina é o tipo de coisa que não pode dar certo. Universos que colidem - falha na Matrix. Estou em uma loja no centro da cidade procurando chapéu panamá. Sim, é uma loja de chapéus - muitos deles - e de cacarecos de todo tipo, cintos, pulseiras, anéis que brilham muito, bolsinhas cafonas. Então, ela vem me atender, e crash! Memórias de criança/ adolescente na Curitiba dos anos 60/70 emergem diante do rosto familiar. Linda Saparolli. Nossa Hebe. Ana Maria Braga d’antanhos. A mulher que está na tevê desde, sei lá - praticamente desde que nasci, ou pelo menos desde que acordei para o planeta comunicação. Criança, estou sentadinha na frente de uma TV, e Linda também está ali, mas do outro lado do mundo. Linda habitava o mundo mágico. Criatura do planeta tevê. Dando receitas, mostrando desfiles, levando modelos para o estúdio, falando de moda, entrevistando gente. E mais. Linda era linda - pelo menos para mim. Tinha cabelo pigmalião (o corte moderno da época: minha mãe usava, era o penteado de mulher que trabalhava fora e não das donas de casa). Usava pantalonas show, cintos incríveis, vestidos em tecido muito sintético com

cortes muito bacanas. Unhas, cílios postiços, laquê, e eu, do meu sofá, podia até sentir o perfume da Linda. Então, Linda me aparece, assim, vendendo chapéu. – Qual tamanho? Respondo o quê? Nada, pois estou fixada na maquiagem exagerada, na sombra cor-de-rosa mais rosa do mundo que invade pálpebras e se espalha até as sobrancelhas, no rímel grosso, no perfume! Linda cheira a perfume de flores guardado na cômoda do quarto da casa com janela. Linda envelheceu. Ela tem rugas e não sorri muito. Mas ali na minha frente, o mesmo cabelo, o cabelão louro claro, e o mesmo fixador, toneladas dele. Uma vida minha em frente à TV - e a vida dela dentro da minha TV. Uma imagem e, de repente, sem aviso, Linda materializa-se, vira gente. Como assim? Não poderia, Linda, você ser de verdade, existir dona de uma loja de cacarecos no centro. Fui embora sem comprar o chapéu. Esse encontro me deu a certeza de que certos personagens jamais deveriam sair da cabeça da gente. Eles não podem sair do cinema, nem da TV, nem dos livros ou das fotos de revistas. Essa transmutação contraria alguma lei não escrita: uma lógica da era moderna, criada por deuses

_Diego The Kid

Jornalista, blogueadora e futura escritora. moraesbia@hotmail.com

da beleza e dos sonhos. Personagens devem continuar pairando em imagens acima da realidade. Eu não quero Big Brother, nem reality shows; não quero detalhes da vida rasteira/real/banal de gente que mora em outro patamar da minha consciência. Um dia, vi Dalton Trevisan muito de perto. Tomava café num lugar simples, um lugar sem charme algum. Tipo do lugar onde ele jamais encontraria inspiração para nenhum de seus contos. Lugar onde o Vampiro não iria, enfim. No meio da tarde. Horário bobo, comum, vazio. Foi o dia em que ele deixou de ser o Vampiro de Curitiba e passou a ser gente. Não falei com ele, assim como não falaria com Linda se pudesse escolher. Cumprimentar, sorrir, me apresentar? – Oi, você é o Dalton, não é? Sou jornalista, tua fã tipo assim desde que nasci, li e reli tudo que você escreveu, meu pai colecionava teus livros, tua literatura me influencia desde que comecei a escrever e... Não. Comprei minha garrafa de água. Dei mais uma olhadinha na mesa de canto onde ele engolia devagar o cafezinho. Soprava na xícara. Tive certeza de que era ele mesmo com sua jaquetinha, o boné e os óculos, percebi que ninguém mais naquela lanchonete sabia quem ele era, e fui embora.


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_Leonardo Jianoti

_Luiz Carlos Heller de Pauli

Economista. Consultor da STCP Engenharia de Projetos na área de Estudos Estratégicos, Políticas de Desenvolvimento e Cooperação Internacional para investimentos florestais sustentáveis. leojianoti@gmail.com

SOLUCIONÁTICA o único ser humano capaz de parar no ar como um beija-flor. Impressionante como a sabedoria popular é capaz de derrubar sem dó nem piedade os jargões modernos, pós-modernos e neosurrealistas. Em janeiro deste ano, ficamos estarrecidos com a tragédia no Haiti. Não bastasse a gravidade do desastre natural, o país já estava aterrorizado por uma crise social sem perspectivas. Pobre e sem condições de alavancar seu desenvolvimento, o Haiti precisa agora consertar o avião destroçado em pleno voo. Voo este que era de péssima qualidade e repleto de turbulências. Tarefa difícil? Melhor definir como desafiadora, no sentido mais populacional e coletivo da palavra. Todos concordam que a reconstrução e recuperação da rotina nacional dependerá de muita ajuda externa para que a população haitiana retome sua vida. Porém, e se sempre existem ‘poréns’, a cooperação internacional tem limites e precisa planejar a saída do ciclo vicioso em que o país se encontra. O Haiti não pode viver eternamente da ajuda das nações mais “favorecidas” e, para isso, precisa reestruturar sua economia, capacitar a população e utilizar a ajuda externa de maneira inteligente para daqui há x anos não precisar mais dela. A crise haitiana, já antes do terremoto, possuía sintomas sociais advindos de uma crise econômica. Incapaz de gerar riquezas internamente e ser independente em termos econômicos, o Haiti é considerado por muitos um exemplo de como o capitalismo pode ser cruel e injusto. E, numa época onde tudo é culpa do capitalismo sanguinário e maquiavélico, esse discurso ecoa aos quatro cantos.

Assistimos a toda essa situação em dois lugares e sob óticas muito diferentes. Enquanto um de nós está em Tampa, Flórida, completamente rodeado pela cultura capitalista e dentro do país símbolo desse modelo econômico, outro está em Curitiba, Paraná, no sul do país considerado a maior promessa capitalista do hemisfério sul e que vem fazendo a lição de casa segundo as cartilhas capitalistas. Em ambos os lugares, a pergunta é por que esse mesmo capitalismo não favoreceu o Haiti. Por que ainda EUA e Brasil lutam por inclusão social? Culpa do modelo econômico? Dizer que sim seria o mesmo que assumir que a solução seria extinguir o modelo. E alguns ainda dizem que a volta do socialismo ou comunismo seria a saída - sendo que esses modelos foram igualmente malsucedidos. Mas, enfim, qual seria a forma de encontrar uma solução no capitalismo? Existe algum modelo substituto? Cremos que não. A substituição de algo só é recomendada quando esse algo não presta mais ao seu objetivo. E não se pode afirmar que o capitalismo foi incapaz de gerar benefícios e bem-estar social. Mas deve-se assumir que o modelo ainda necessita de melhorias do ponto de vista da inclusão social e do empoderamento econômico de algumas nações, como, por exemplo, o Haiti. Tragédias como essa possuem aspectos naturais e econômicos que devem ser tratados de maneira especial e diferenciada.

dos interesses da sociedade e com isso se reestabeleça a identidade nacional e se fortaleça o nome do país no exterior. O modelo não pode ser culpado pelas suas falhas. O grande problema está na forma como é aplicado em diferentes culturas, sociedades e estruturas econômicas. Saber adaptar e aplicar o modelo econômico muitas vezes é mais importante e gera um resultado melhor do que seguir à risca seus princípios. É aquela velha história, o que é bom para um muitas vezes não é bom para o outro. Aí, cabe aos governantes saber a melhor maneira de administrar e fomentar suas economias e, como retorno, propiciar bem-estar e investimentos para sua sociedade. Prova-se, assim, mais uma vez, que o mundo deve olhar mais para seus filhos necessitados antes das tragédias acontecerem. Afinal, reconstruir é muito mais difícil, dolorido e caro do que construir.

Uma ideia inteligente aventada recentemente foi a eliminação das tarifas sobre os produtos haitianos por parte dos países mais desenvolvidos. Com isso, o país teria o acesso ao mercado externo facilitado e a economia seria reaquecida. Além disso, aproveitará-se o momento para que, na medida em que a reconstrução do Haiti avançar, tudo o que tiver a ver com identidade nacional, cultura e o próprio orgulho nacional, seja utilizado em prol

_Diego The Kid

“Não me venha com a problemática que eu te dou a solucionática”. Grande Dadá Maravilha,

Economista e especialista em Finanças. Analista financeiro e gerente de serviços aos clientes da sede em Tampa (EUA) da Mach Inc. clearing europeia especializada em hubbing solutions e interconectivity. luizchpauli@gmail.com

_COLUNAS


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COLUNAS

_Julio Sampaio

Diretor da Resultado Consultoria e vice-presidente da ADVB-PR, autor do livro O Espírito do Dinheiro e mestre em Organizações e Desenvolvimento. juliosampaio@consultoriaresultado.com.br

DIFÍCIL É SER DESAPEGADO Os mortos do desabamento de Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, os desabrigados das chuvas no norte do Paraná e em

o The

_Dieg

Kid

todo o país neste início de ano, a tragédia do Haiti e o exemplo de Zilda Arns tocam a sensibilidade de todos nós, nos estimulando a querer participar, de alguma forma, da minimização do sofrimento de suas vítimas. É um dos melhores lados do ser humano, o de ser capaz, pela compaixão, de compartilhar o sofrimento de outras pessoas, ainda que apenas parcialmente. No caso do Haiti, as doações recebidas ultrapassaram rapidamente o que foi arrecadado em tragédias como o tsunami e o furacão Katrina.

Quando doamos, nos sentimos bem conosco. A sensação é de que fizemos a nossa parte e de que somos melhores como pessoas. Dentre os que praticam doações materiais, há diferentes motivações. Há os que doam pela compaixão; pelo simples prazer de ser útil; os que buscam amenizar algum sentimento de culpa; por vaidade; por segundas intenções (inclusive de promoção pessoal); e até os que doam, acreditando que Deus fará retornar multiplicado, como se doar fosse uma espécie de investimento. O ato de doar deve ser valorizado, sobretudo aquele regular, que não se limita aos momentos de tragédia, e que vem acompanhado de um propósito de transformação do mundo em que vivemos. Ele possui um grande poder de transformação e, segundo o filósofo Rogério Hetmanek, ninguém é tão pobre que não tenha o que doar ou tão rico que não tenha o que receber. Vale para as pessoas e para as empresas.

Além disso, seja qual for o agente motivador, ao doar, estamos combatendo uma das maiores limitações de nossa espécie, o apego. Ele está diretamente associado ao egoísmo e, em maior ou menor grau, todos o possuímos. Ao doar dinheiro ou bens materiais, combatemos o apego material, tão evidente em nossa sociedade. Há, no entanto, outras formas de apego, talvez menos evidentes. Elas estão presentes em nosso íntimo e nas nossas atitudes. Representam as prisões que criamos para nós mesmos e que impedem que sejamos mais livres e mais felizes. Elas vão muito além do apego material e costumam ser mais difíceis de serem combatidas. É o caso do apego ao passado, ou mesmo ao futuro, que dificulta o desfrutar do presente, e que nos leva a sofrer pelo que já passou ou pelo que ainda virá. Há quem seja apegado à preocupação, substituindo uma pela outra. Há o apego às pessoas, sejam amores, filhos ou amigos, que costuma gerar o efeito contrário, o de afastamento. O que dizer do apego às posições, aos títulos tão efêmeros, aos reconhecimentos exteriores? Costumamos ainda ser apegados aos nossos próprios pontos de vista e às nossas experiências, como se elas fossem reveladoras de verdades absolutas. Somos apegados à nossa cultura, aos pequenos hábitos, e é difícil mudar um pouco que seja, em qualquer destes campos. Combater o excesso destes diferentes tipos de apego não é fácil. No entanto, é necessário, se quisermos ser melhores do que somos. Eles não devem ser eliminados, mas equilibrados, pois também contribuem para dar sabor à vida. Alguns serão mais fáceis e outros mais difíceis de serem harmonizados. Em todos os casos, será necessário algum tipo de esforço. Reflexão e conscientização ajudam, mas não bastam. Com tudo isso, fica a reflexão. Doar é bom, é importante e, para a maioria de nós, é até fácil. Difícil é ser desapegado.

_COLUNAS



Um ano. Sete edições. E um montão de conteúdo. _revistainventa.com.br


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