Revista Eletrônica do Grupo de Pesquisa Jornalismo e Contemporaneidade - PPGCOM/UFPE | 1 Jornalismo Revista Eletrônica do Grupo de Pesquisa Jornalismo e Contemporaneidade | PPGCOM/UFPE | ISSN 2526-2440 | e cidadania nº 31 | Julho e Agosto de 2019
JORNALISMO E CIDADANIA
Expediente
Editor Geral | Heitor Rocha professor PPGCOM/UFPE
Editor Executivo | Ivo Henrique Dantas doutorando PPGCOM/UFPE
Editor Internacional | Marcos Costa Lima
Pós-Graduação em Ciência Política/UFPE
Revisão | Laís Ferreira / Bruno Marinho
Mestre em Comunicação / Mestrando em Comunica;áo
Articulistas |
PROSA REAL
Alexandre Zarate Maciel
Doutor em Comunicação
MÍDIA ALTERNATIVA
Xenya Bucchioni
Doutora PPGCOM/UFPE
NO BALANÇO DA REDE
Ivo Henrique Dantas doutorando PPGCOM/UFPE
JORNALISMO E POLÍTICA
Laís Ferreira
Mestre em Comunicação
JORNALISMO AMBIENTAL
Robério Daniel da Silva Coutinho mestre em Comunicação UFPE
JORNALISMO INDEPENDENTE
Karolina Calado doutoranda PPGCOM/UFPE
MÍDIA FORA DO ARMÁRIO
Rui Caeiro
Doutorando em Comunicação
MUDE O CANAL
Ticianne Perdigão doutoranda PPGCOM/UFPE
COMUNICAÇÃO NA WEB
Ana Célia de Sá
Doutoranda em Comunicação UFPE
NA TELA DA TV
Mariana Banja
Mestre em Comunicação
Alunos Voluntários | Lucyanna Maria de Souza Melo
Nathália Carvalho Advíncula
Matheus Henrique dos Santos Ramos
Colaboradores |
Alfredo Vizeu Professor PPGCOM - UFPE
Túlio Velho Barreto Fundação Joaquim Nabuco
Gustavo Ferreira da Costa Lima Pós-Graduação em Sociologia/UFPB
Anabela Gradim Universidade da Beira Interior - Portugal
Ada Cristina Machado Silveira Professora da Universidade Federal de Santa Maria – UFSM
Antonio Jucá Filho Pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco – FUNDAJ
Auríbio Farias Conceição Professor do Departamento de Letras e Humanidades – DLH/ UEPB
Leonardo Souza Ramos
Professor do Departamento de Relações Internacionais da PUC –Minas Gerais e coordenador do Grupo de Pesquisa sobre Potências Médias (GPPM)
Rubens Pinto Lyra
Professor do Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos, Cidadania e Políticas Públicas da UFPB
Editorial
Prosa Real
Comunicação na Web
Opinião | Pedro de Souza
Opinião | Pedro Bocayuva
Opinião | Flávia Rabelo e Rafaella Prata
Opinião | Jean Fuentes Opinião | Alexandre Gomes et al.
|Marcos Costa Lima
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Índice
Opinião
Opinião
Opinião |Rubens Pinto Lyra Opinião
Pinheiro | 3 | 4 | 6 | 8 | 10 | 12 | 14 | 16 | 18 | 20 | 22 | 24 Acesse: facebook.com/ Jornalismoecidadania | issuu.com/revistajornalismoecidadania
|Robério Coutinho
|Samuel
Por Heitor Rocha
Orepugnante deboche demonstrado pela presidência da República em relação à gravidade dos crimes de desmatamento e queimada da floresta amazônica agride à consciência nacional e internacional de forma bárbara, o que foi especialmente agravado pelo cinismo da acusação de que o problema seria causado pelas ONG’s ambientalistas ressentidas com a suspensão do repasse de recursos pela Alemanha e Noruega devido à omissão do governo brasileiro em relação à sua responsabilidade de coibir os atentados ao meio ambiente. Questionado por um repórter se teria provas que respaldassem a acusação, o mandatário máximo do País, sem demonstrar nenhum receio de ser denunciado por calúnia – falsa atribuição de comportamento criminoso tipificada no Código Penal -, confessou que estava só conversando.... água! Ou seja, estava com conversa fiada.
Antes da ridícula postura diplomática de fazer figuração para os milicianos e fanáticos que compõem os seu grupos de bajuladores com uma retórica adolescente de lançar desaforos a chefes de governo, desdenhando a importância dos recursos para preservação da floresta amazônica ao considerar que eles seriam melhor empregados para combater o desmatamento em seus países, o presidente já havia anunciado a disposição de usar esses recursos para indenizar o grileiros que invadiram terras indígenas, desmataram e realizaram queimadas, evidenciando a intenção de premiar essas ações ilegais. Atitudes como essa comprovam que o governo brasileiro estimulou e incentivou as ações criminosas contra a floresta amazônica.
Assim, não se pode deixar de considerar que as tardias medidas de combate ao desmatamento e as queimadas, como a convocação das forças armadas, que deveriam ter sido tomadas desde o primeiro momento, são consequência do “puxão de orelha” que o presidente levou dos exportadores nacionas diante das ameaças de retaliação econômica dos países da União Europeia em relação aos produtos brasileiros, inclusive com a possibilidade de suspensão do acordo econômico com o Mercosul. Afinal, os exportadores do agronegócio, em grande parte integrado por grandes corporações multinacionais, constituem o setor mais privilegiado da economia nacional – isento da cobrança de impostos e ainda contemplado com dez vezes mais recursos públicos do que a agricultura fa-
miliar -, comprovando que o modelo agrário-exportador implantado em 1.500 continua sendo considerado prioritário pelo governo.
Diante de tantas manifestações, não só de descaso com a preservação do meio ambiente, mas sobretudo de desmonte da estrutura dos órgãos de fiscalização e combate ao desmatamento e às queimadas, bem como de desdém pela preservação das nações indígenas e pela importância da demarcação de suas reservas, o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) manifestou solidariedade aos povos originais do Brasil pela mentira e agressão perpetrada pelo presidente ao afirmar que a demarcação de terras indígenas atentaria contra o interesse e a soberania nacional. Observou o CIMI que a Constituição Federal do Brasil desmente a afirmação do presidente ao estabelecer, no artigo 20, que as terras indígenas são bens do Estado brasileiro.
Nos últimos dias, no mesmo momento em que o recorde de focos de queimadas na Amazônia foi notícia e estarreceu a opinião pública mundial, o Instituto Socioambiental (ISA) acusou o Senado Federal de aprovar a Medida Provisória 881/2019, incentivando ainda mais essa devastação. Segundo o ISA, a MP altera a legislação ambiental para facilitar o desmatamento. O texto da MP 881/2019, que já tinha sido aprovado pela Câmara dos Deputados, segue agora para sanção presidencial.
O número especial “Passion Amazonie” do jornal francês “Le 1” reuniu, em julho de 2019, artigos, entrevistas e reportagens sobre a importância da floresta e de sua biodiversidade para a vida na terra. Nesta edição foi destacado que o mundo sabia que a Amazônia corria riscos sérios ameaçada pelo capitalismo predador que nega o aquecimento global porque quer explorar, numa visão de curto prazo, todos os recursos do planeta ainda que ameaçando a própria vida humana e de todas as espécies.
Heitor Costa Lima da Rocha, Editor Geral da Revista Jornalismo e Cidadania, é professor do Departamento de Comunicação Social e do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco – UFPE.
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Editorial
Prosa Real
Livro-reportagem, jornalismo e contexto
Por Alexandre Zarate Maciel
Contrato de comunicação do livroreportagem valoriza a contextualização
Levando em conta o contrato de comunicação, o jornalista escritor de livros-reportagem ambiciona oferecer uma interpretação mais aprofundada da realidade do que os textos fragmentados dos jornais e meios eletrônicos. Sempre com a honrosa exceção, na imprensa diária, das grandes reportagens e especiais. A contraposição ao factual que o livro-reportagem traz ao cenário do jornalismo, já que se propõe a constituir um relato mais perene e duradouro sobre o contemporâneo, foi objeto de reflexão por parte de alguns jornalistas escritores entrevistados pelo autor desta coluna (MACIEL, 2018). Os leitores de jornal sentem-se um tanto órfãos da complexidade da narrativa jornalística, na opinião do jornalista e escritor Lira Neto, biógrafo de Getúlio Vargas, Maísa e padre Cícero. A prova seria que, quando “os jornais desistiram da reportagem de uma vez por todas, por vários motivos, inclusive econômicos, mas também da convicção de que o leitor não tem mais atenção para as narrativas de fôlego”, os periódicos se tornam mais irrelevantes, compactos. Por outro lado, segundo o escritor, percebe-se “um crescente interesse pelas obras de jornalistas que migram da página do jornal para o livro”. Para ele, o fato de vários livros-reportagem brasileiros liderarem constantemente a lista de mais vendidos demonstra que “há uma necessidade que as pessoas alimentam e não é mais suprida pelo jornalismo cotidiano, que é a contextualização”. Por outro lado, buscar constantemente a narrativa de uma megarreportagem, que “abarque o máximo de visões”, deve ser “paradigma de narrativa ideal” para o autor de livros-reportagem hoje, na ótica do repórter e escritor Leonencio Nossa, que desvendou a Guerrilha do Araguaia no livro “Mata!”. Ele questiona até mesmo o
que os jornais diários costumam destacar como “grande reportagem”. Muitas vezes esses textos reúnem depoimentos de “duas, três, no máximo cinco pessoas”, mas sem um trabalho de documentação intenso, ou uma análise mais aprofundada dos acontecimentos de forma multiangular. Nesse sentido, Leonencio Nossa crê no potencial do livro-reportagem de “alimentar o jornalismo, ainda mais nesse momento de questionamentos tão duros e direcionamentos tão questionáveis”.
Armadilhas da apuração no livro-reportagem: diante do contraditório
Para um biógrafo como Ruy Castro, que interpretou as vidas de Carmem Miranda, Nelson Rodrigues e Garrincha, a fonte que dá uma informação errada normalmente não faz isso por
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Divulgação
má-fé, conforme afirmou em entrevista ao autor desta coluna. “Essa informação não é tão importante para a pessoa para que ela invente para ficar bem; isso não existe. Informou errado porque não pensou direito. O informante não é obrigado a ter aquele rigor que você tem.” A responsabilidade pela apuração das contradições, portanto, é sempre do escritor. Daí o grande dilema e a necessidade da maior atenção possível aos detalhes. Enquanto estava apurando a vida de Carmen Miranda, Ruy Castro foi apresentado a uma senhora, moradora do bairro da Urca, que dizia ter sido vizinha da cantora. “‘Eu queria contar para o senhor o casamento da Carmen aqui na igrejinha da Urca, em 1940. Muito bonita, igreja, assim... assado..., os padrinhos, a roupa das madrinhas, o bufê, a música, o padre, limusines saindo, chegando’. Falou durante uma hora.” Com toda delicadeza, Ruy Castro agradeceu pelo depoimento, tomou nota de tudo, mas teve que informar à senhora que ela estava equivocada. Mesmo assim, só depois de colher toda a informação, que acabou lhe sendo útil em certo aspecto. “Dona fulana, muito obrigado, só tem um pequeno problema: a Carmen não se casou em 1940, não se casou no Rio, não se casou na Urca, não se casou na igrejinha, ela nem se casou. A senhora me descreveu o casamento da Aurora Miranda.” Na opinião da jornalista e escritora Adriana Carranca, que escreveu o livro-reportagem infantil “Malala-a menina que queria ir para a escola”, é preciso sempre retornar aos mesmos entrevistados e fazer as mesmas perguntas novamente: “Para ver se ela se contradiz ou se às vezes a pessoa mesma refaz a resposta. Porque na cabeça dela, às vezes, tem uma resposta, e depois ela fala: ‘Poxa, eu respondi aquilo, mas na verdade eu acho...’ E ela mesma refaz, repensa”.
Planejamento do livro-reportagem exige disciplina e visão da obra
Mesmo com um espaço bem maior para desenvolver a reportagem do que em qualquer veículo de imprensa, a angústia de que é preciso mais continua perseguindo mesmo os jornalistas escritores de livros-reportagem veteranos e calejados, como Zuenir Ventura, autor de “1968: o ano que não terminou”, como confessou em entrevista ao autor desta coluna: “Se dependesse da minha vontade, o livro sobre 1968 teria 500 páginas. Mas, ao mesmo tempo, a gente aprende que tem que escrever pouco, que tem que economizar, até em respeito ao leitor”. Ao escrever uma obra, Zuenir Ventura sente saudades da experiência da redação de ter alguém por per -
to que, ao final do expediente, inexoravelmente “puxava a folha, acabou”. Mesmo assim, em sua opinião, tudo é uma questão de muita disciplina pessoal. Quando se sente capacitado para começar a escrever os seus livros, Caco Barcellos prepara todo um cenário em seu apartamento para diminuir suas angústias no processo. Durante a entrevista, mostrou um quarto onde instalou cadeira, mesa e computador ao lado de uma cama, para que não dormisse sobre a tela nos momentos de exaustão, durante as madrugadas em que escrevia. Bastava jogar o corpo sobre a cama ao lado. “Eu sou um alucinado por disciplina. Então minhas paredes aqui ficam todas tomadas: capítulo 1... capítulo 2... Daí eu tenho aqueles volumes todos de papel, as fitas já transcodificadas. Volto o áudio, fico ouvindo para ter a linguagem.” Na própria narrativa do livro Rota 66, Caco Barcellos relata com minúcias como montou um complexo banco de dados para comprovar que a polícia paulista estava matando jovens inocentes, o que acabou servindo de base para toda a sua narrativa investigativa. Os números eram tão impressionantes que o repórter precisou detalhar, no texto, todo o seu processo para chegar às conclusões, um sinal de honestidade com o leitor.
Referências:
MACIEL, Alexandre Zarate. Narradores do contemporâneo: jornalistas escritores e o livroreportagem no Brasil. Recife, 2018. Tese (Doutorado em Comunicação)-Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Disponível em: https:// repositorio.ufpe.br/bitstream/123456789/29836/1/ TESE%20Alexandre%20Zarate%20Maciel.pdf
Elaborada pelo professor doutor do curso de Jornalismo da UFMA, campus de Imperatriz, Alexandre Zarate Maciel, a coluna Prosa Real traz, todos os meses, uma perspectiva dos estudos acadêmicos sobre a área do livro-reportagem e também um olhar sobre o mercado editorial para esse tipo de produto, os principais autores, títulos e a visão do leitor.
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Comunicação na Web
Jornalismo, Sociedade e Internet
Por Ana Célia de Sá
O jornalismo e a conjuntura da convergência midiática na web
Aconjuntura da convergência midiática alterou os modos de produção, apresentação e circulação de conteúdos jornalísticos na web, unindo antigas e novas formas de atuação e suportes. No cenário atual, ganham destaque aspectos como interatividade, participação, horizontalidade e multimidialidade, em um contexto de atuação conjunta e integrada entre os meios. Para Barbosa (2013), esta união resulta em um “continuum” multimídia de cariz dinâmico.
Na conceituação de Jenkins (2009), a convergência vai além da inovação tecnológica. Ela abrange questões culturais, sociais e mercadológicas, que conectam plataformas diversas para a
formatação de produtos multimidiáticos híbridos; aumentam o número de agentes produtores de conteúdo, numa quebra hierárquica da tradicional relação entre emissor e receptor; promovem a circulação multidirecional da informação, em um modelo de “muitos para muitos”; e dão maior autonomia ao público, também capaz de elaborar produtos informativos mediante o uso de equipamentos digitais e softwares de gravação, edição e publicação na web.
Estimula-se, assim, a cultura participativa, compreendida como a interação entre produtores e consumidores de mídia no processo de produção e circulação de conteúdos, com níveis diferentes de intervenção, para atender a interesses coletivos (JENKINS; GREEN; FORD, 2014). Vale ressaltar que a cultura participativa é anterior à internet, mas ganhou novo fôlego e amplitude graças aos recursos técnicos, destacadamente a digitalização, e humanos do ciberespaço. Além disso, ela ainda se encontra em estágio evolutivo quanto à sua aplicação na vida cotidiana dos
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cidadãos, tendo obtido bons resultados em plataformas de mídias sociais, focadas em relações sociais dinâmicas e horizontais, a exemplo de Facebook, Twitter, Instagram e YouTube.
Nesta perspectiva, é possível abordar a convergência jornalística. Salaverría, García Avilés e Masip (2010 apud BARBOSA, 2013) a definem como um processo multidimensional, que ecoa nos campos tecnológico, empresarial, profissional e editorial dos meios de comunicação, integrando ferramentas, espaços, métodos de trabalho e linguagens antes separados. Desta forma, torna-se possível a elaboração de conteúdos jornalísticos para distribuição em plataformas múltiplas, com o uso de linguagens próprias de cada mídia.
O hiperlink tem papel fundamental nesta evolução. Por meio dele, é possível conectar camadas textuais de diferentes naturezas, como textos escritos, vídeos, áudios, imagens e infográficos, com os objetivos de expandir e qualificar conteúdo multimídia, além de abrir rotas de acesso aos produtos individualizadas pelo público, a partir do universo informativo estabelecido pelo produtor principal. Esta articulação traduz-se, assim, em personalização, um dos motes do ambiente digital conectado. Muda-se, ainda, o entendimento sobre o espaço, tornado ilimitado em plano virtual, e o tempo, baseado não mais na cronologia histórica dos modelos analógicos, mas na mixagem temporal possibilitada pela leitura associativa, isto é, não linear.
Outro fator relevante para o desenvolvimento da convergência no webjornalismo é a digitalização, a qual facilitou a organização, o armazenamento e a recuperação de dados no ciberespaço. Ela viabilizou o trânsito de conteúdos entre mídias distintas e a associação de linguagens e formatos, de maneira rápida e sem perda de qualidade dos materiais originais. “Na prática, isto elimina etapas do padrão analógico (por exemplo, o processo de revelação da fotografia analógica), acelera processos, facilita o tratamento dos materiais jornalísticos, dá condições para uso destes materiais em redes de computadores e torna, de um modo geral, o produto jornalístico com mais qualidade técnica de resolução e transmissão” (FRANCISCATO; TORRES; SANTOS, 2010, p. 87).
Ferrari (2012, p. 7) também discorre sobre esta temática: “Com a mídia eletrônica, as informações diferenciam-se de outros meios tradicionais como, por exemplo, a impressão ou a transmissão por ondas eletromagnéticas. Ela perde sua característica unívoca, de relação um para um, para transformar-se em dado com múltiplos
significados e leituras”.
Ao unir plataformas e linguagens, a convergência aplicada ao jornalismo on-line também integrou o trabalho nas redações e tornou o jornalista multiplataforma e multitarefa, o que trouxe o bônus do crescimento profissional e da busca por uma formação mais completa e o ônus da sobrecarga de atividades. Cabe uma reflexão sobre os rumos da profissão, historicamente conectada ao contexto técnico, social, cultural e político no qual está inserida. Em tempos convergentes, é primordial aproximar o jornalismo, a tecnologia digital e a ação humana para manter a boa qualidade do trabalho.
Referências:
BARBOSA, Suzana. Jornalismo convergente e continuum multimídia na quinta geração do jornalismo nas redes digitais. IN: CANAVILHAS, João (Org.). Notícias e Mobilidade: o jornalismo na era dos dispositivos móveis. Covilhã: LabCom, 2013. [e-book]. Disponível em: <http://www.labcom-ifp. ubi.pt/ficheiros/20130404-201301_joaocanavilha_ noticiasmobilidade.pdf>. Acesso em: 25 dez. 2017.
FERRARI, Pollyana. A web somos nós. IN: FERRARI, Pollyana (Org.). Hipertexto, Hipermídia: as novas ferramentas da comunicação digital. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2012.
FRANCISCATO, Carlos Eduardo; TORRES, Dijna Andrade; SANTOS, Getúlio Cajé dos. Tecnologia e desenvolvimento na produção jornalística. IN: SCHWINGEL, Carla; ZANOTTI, Carlos A. (Orgs.). Produção e Colaboração no Jornalismo Digital. Florianópolis: Insular, 2010.
JENKINS, Henry. Cultura da Convergência. Tradução de Susana Alexandria. 2. ed. São Paulo: Aleph, 2009.
JENKINS, Henry; GREEN, Joshua; FORD, Sam. Cultura da Conexão: criando valor e significado por meio da mídia propagável. Tradução de Patricia Arnaud. São Paulo: Aleph, 2014.
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Ana Célia de Sá é jornalista e doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco (PPGCOM-UFPE).
Opinião
Confiscação de riqueza e genocídio nas Américas
Por Pedro de Souza
Se somarmos os assassinatos urbanos e rurais, cometidos por civis, policiais e militares, aos suicídios, à população encarcerada, às mortes por intoxicação de drogas, às mortes por aborto mal sucedido e por doenças controláveis em países de renda média equivalente, e às mortes consequentes da expulsão dos médicos cubanos, chegaremos anualmente, no Brasil, a números dignos de um verdadeiro genocídio. Segundo Jeffrey Sachs, da Universidade de Columbia, as mortes provocadas pelo bloqueio americano à Venezuela devem estar próximas das 50 mil pessoas, o que é uma migalha perto do que passa no Brasil. E se a esses números somarmos os mortos na guerra das drogas no México, na guerrilha na Colômbia, no Haiti etc., a que conclusão podemos chegar? O que se está passando nas Américas?
Os empresários que colaboraram com os fascistas na Europa antes da segunda guerra mundial estavam apenas continuando a fazer negócios, e em alguns casos se apoderando dos negócios e bens dos judeus. Quando digo bens me refiro aos móveis e imóveis, e logo mais aos dentes de ouro, por exemplo, que transitavam pela Suíça para países neutros, como Portugal, em troca de mantimentos e minérios. A colaboração desses industriais e banqueiros com o nazismo não foi algo que aconteceu de um dia para o outro, foi paulatino, e quando acordaram não tiveram mais oportunidade de parar, sem se expor às represálias do regime.
A discussão em torno do termo “genocídio” é, a meu ver, dispensável, pois “assassinato em massa” já é suficientemente eloquente, apesar de a maioria das vítimas nas Américas serem negros ou indígenas, tal com as vítimas da segunda guerra mundial eram na grande maioria judeus (além, nos dois casos, dos homossexuais, dos ciganos e dos internados em sanatórios psiquiátricos). O termo “genocídio” tem, no entanto, um peso especial, por se basear em critério de raça, enquanto os assassinatos de hoje se baseiam sobretudo em critérios de pobreza, e é também mais forte porque remete a uma outra ideia: a ideia de algo sistemático, decidido de uma vez para sempre, enquanto o assassinato em massa remeteria a situações variadas, descentralizadas, episódicas. E, no entanto, não só o resultado é o mesmo, como existe nas Américas uma continuidade histórica nas políticas de extermínio.
Temos ouvido que as potências econômicas do nosso tempo enveredaram pela destruição da ordem
constitucional dos países da América Latina a fim de controlar as suas riquezas. É certamente verdade que existe a vontade de se apoderar das riquezas desses países, mas não tenho muito claro que para isso fosse necessário destruir a ordem constitucional desses mesmos países. Tanto mais que já não existe oposição por parte dos empresários nacionais, que atualmente ou investem em desmatamento e gado, ou em especulação, pondo o dinheiro a salvo em paraísos fiscais. Em consequência basta privatizar para desnacionalizar. Na realidade a nova ordem jurídica mundial baseada na justiça americana e no dólar, não é apenas uma arma destinada a se apoderar de bens de certos países (embora tenha uma componente financeira forte); ela visa destruir também a ordem jurídica desses países, ou seja, tem uma componente cultural.
Para além da cobiça dos negócios, há uma segunda componente nessas políticas: concentrar o poder na população branca, do norte ao sul, eliminando em massa as populações negras e indígenas. Claro que no Brasil isso é mais difícil dada a miscigenação secular, mas no caso não se trataria tanto de critérios genéticos, mas de critérios econômicos e culturais.
Citar casos da volta do racismo ostentatório no Brasil contemporâneo é inútil, basta lembrar a iniciativa do governador do Rio de Janeiro, metralhando de um helicóptero a população favelada de Angra dos Reis, ou o assassinato de dois cidadãos negros no Rio de Janeiro, um que se dirigia com a família a uma festa, o outro que tentou salvá-lo, ambos desarmados. Foram alvejados com 80 tiros por militares, que sequer responderam perante a justiça. Ou ainda o assassinato por esclarecer de Marielle Franco, cujo mandante permanece envolto em mistério mais ou menos denso. Ou finalmente as “balas perdidas” matando crianças nas favelas na indiferença geral.
Dois outros fenômenos chamam a minha atenção recentemente. O primeiro é a perseguição às religiões africanas por parte das igrejas evangélicas, de origem e comportamento “anglo-saxão”. O outro caso, em sentido inverso, é o da “República de Curitiba” com suas ramificações em Santa Catarina, onde imperava a delegada responsável pela morte do reitor Cancellier. Aliás, o proprietário do famoso clube de tiro de Florianópolis, a que estão ligados vários elementos das catacumbas do regime, se diz descendente do Duque de Caxias, o militar que participou da cilada que massacrou os “Lanceiros Negros”, uma vez feita a
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paz na Guerra Farroupilha. Assinada a paz, passavam a ser inúteis e poderiam constituir um perigo. Foram assassinados covardemente umas centenas de combatentes, previamente desarmados.
Eu desconheço quem inventou esse termo de “República de Curitiba”, nem se é usado apenas em tom jocoso ou se tem alguma substância, mas me lembra dos Sulistas que nos EUA até hoje brandem aquela bandeira, um caso raro de reivindicação orgulhosa de uma derrota. Será que Curitiba pretenderia ser a capital da apologia do genocídio, da distribuição generalizada das armas, do convite ao crime por parte das autoridades, do convite ao trabalho infantil, por parte de um presidente que já deixou claro que não gosta de pobres (presumivelmente nem mesmo daqueles que votaram por ele, ou seja, que é apenas o presidente dos remediados e ricos)? O silêncio das elites paranaenses é ensurdecedor. Não sabemos o que se passa em Curitiba, para lá da presença do presidente Lula, encarcerado. No Brasil, temos cerca de 700 000 cidadãos encarcerados em prisões, obviamente a maioria deles negros, ou não brancos. Quanto ao número de assassinados por ano, os números variam e o Ministério da Justiça confessa-se incapaz de indicar um número fiável. No Rio de Janeiro, em 2017, esse número vai de 4.923 (SNISP) a 6.749 (ISP). O número total de assassinados no Brasil não deve andar longe dos 100 mil por ano, fazendo-o um dos países mais perigosos e ferozes do mundo.
Frente àquilo a que estamos assistindo na fronteira dos EUA com o México, não posso também deixar de recordar que aquelas terras do sul dos EUA eram, até há poucos mais de 150 anos, terras mexicanas e que a população local foi exilada ou massacrada à ponta da baioneta e das boiadas dos grandes criadores de gado americanos, como acontece ainda a oeste do Brasil, num arco que vai do Rio Grande do Sul ao sul do Pará. O tempo não é algo linear.
Ou seja, a política de genocídio da população negra e indígena nas Américas não é de ontem e está sendo reativada. Com a eleição de Trump, Bolsonaro e outros, em países de menor peso, com base em manipulações jurídicas e fraudes nas redes sociais, essas políticas visando o genocídio, nascidas no século XIX, ganharam novo alento. Quantas constituições não foram já rasgadas para permitir a expansão do “WASP” (“White Anglo-Saxon Protestant”)? Alexandria OcasioCortez, pré-candidata à eleição presidencial americana, suscitou escândalo nos EUA recentemente quando se referiu aos campos onde estão detidos os emigrantes clandestinos como “campos de concentração”.
Note-se que fenômeno semelhante se constata na Europa democrática, com dezenas de milhares de emigrantes mortos por afogamento no Mediterrâneo, a ponto que se começa a falar de levar diante do Tribunal Penal Internacional (de que o Brasil participa, por
enquanto) alguns dos responsáveis pelas políticas de emigração dos vários países e da União Europeia. E as perspectivas futuras por todo o mundo não podem ser piores, em função do aquecimento global, de que a população dos países pobres como o Bangladesh será a principal vítima. É claro que estamos entrando num período de emigração em massa de populações fugindo da água, do calor, da desertificação, da fome e da sede, em direção a países menos atingidos. E da sua eliminação sistemática. No Brasil a questão é um pouco diferente, pois não podemos distinguir claramente brancos de populações de outras origens. Não se podem construir muros com facilidade, mas a tradição é a mesma desde o início da colonização. E, como se sabe, uma das razões que levaram à abertura das fronteiras no século XIX para os emigrantes europeus, foi o receio entre as elites de uma revolta dos escravos ou ex-escravos, que constituíam a maioria esmagadora da população brasileira. Vargas suspendeu essa política. Porém não podemos deixar de considerar que, atingindo números (conservadores) como 100 mil assassinados por ano, e 700 mil encarcerados, não necessitamos de somar estatísticas referentes a muitos anos para chegar a números comparáveis aos das vítimas do nazismo durante a segunda guerra mundial. Ou seja, ao genocídio.
Nesse sentido, os juristas, políticos e demais figuras da vida pública que apoiaram o golpe, a destituição de Dilma Rousseff, e a prisão de Lula, e agora reagem indignados com os atentados à legalidade perpetrados por Moro, Dallagnol, Witzel etc., estão desempenhando o papel dos empresários que elegeram e sustentaram o nazismo, até se dar conta daquilo em que o nazismo consistia. Agarrar-se à constituição pode fazer bonito, mas não chega. É preciso que fique claro, no entanto, que o objetivo do inimigo interno e externo não é apenas o lucro e sim o genocídio, e será por esses crimes que os seus colaboradores civis e militares, de pijama ou não, serão julgados pela História, por mais preguiçosa que ela seja.
Claro que o objetivo do capital sempre foi o lucro, e economia e sociedade estão organizadas para isso. Mas não só. Faz parte da sua essência não o dividir com quem o produz, e sobretudo quem possa contrapor à ideologia do lucro e da moral privativa, outra concepção do mundo. Para isso eles têm o genocídio.
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Pedro de Souza é Editor, pesquisador e exsuperintendente executivo do Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento.
Opinião
A democratização é um valor universal
Por Pedro Cláudio Cunca Bocayuva
Afrase de Carlos Nelson Coutinho que serve de título a esta reflexão atualizou uma frase de Enrico Berlinguer, um herdeiro de Antonio Gramsci que afirmou que “a democracia é um valor universal”. Resgatando o sentido histórico desta frase e relacionando com o ciclo de lutas democráticas contra a ditadura, o pensador político Carlos Nelson Coutinho criticou os limites liberais da defesa da democracia. O tradutor de Gramsci e um dos seus mais importantes intérpretes conseguiu sintetizar, num artigo clássico, tendo por título a frase de Berlinguer, indicou a necessidade de uma via de transformação democrática que articulasse democracia representativa e democracia direta.
Desta forma, este grande intelectual e professor da UFRJ, com amplo reconhecimento internacional, refletiu sobre a bases para a renovação do socialismo na contemporaneidade, a sua complexidade e a necessidade de repensar os sujeitos, a vontade coletiva e guerra de posição na luta pela hegemonia no final do
século XX e no início do século XXI. Carlos Nelson acabou realizando uma consolidação e tradução política da proposta de Gramsci de afirmar a grande política, de construção e transformação na direção de uma sociedade com capacidade de se governar. De Gramsci e Carlos Nelson, podemos ler sobre a necessidade de uma teoria da política no sentido da filosofia da práxis, lento a experiência da resistência, antifascista, da problemática democrática, das questões regionais do desenvolvimento e da articulação dos temas da indústria, da escola, da cultura e da vida moderna, na Itália e nas sociedades capitalistas marcadas por forte presença de aparelhos privados de hegemonia que robustecem o domínio de classe e sua reprodução como poder.
Antonio Gramsci já tinha colocado o tema da “revolução passiva” para superar o americanismo e o fordismo, combater o fascismo, romper com a fórmula russa e formar um novo bloco histórico a partir da convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte. Esse perí -
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odo democrático em Gramsci virou um horizonte de luta por democratização como projeto em Carlos Nelson, que seria gestado na unidade na diversidade para combater a ditadura e o capitalismo no Brasil, através de uma “guerra de posição”, onde os desafios de ampliação democrática são meio e fim da socialização do conhecimento, da riqueza e do poder político.
A articulação de uma vontade coletiva nacional e popular seria decisiva para romper com o autoritarismo e a barbárie da sociedade brasileira. O projeto político pedagógico de Paulo Freire, a nova escola de Darcy Ribeiro, os novos movimentos sociais e os partidos e organizações de massa com base classista dariam a esta novidade o contorno de uma frente única. Nela a busca de um modo de governar sustentado por esta unificação de plataformas e sujeitos coletivos, a partir dos quais se constituiria o “novíssimo príncipe”, poderia gerar uma cultura democrática reafirmada nos trabalhos de Marilena Chauí, em especial com Cultura e Democracia.
As repressões e as transformações geradas pela financeirização, virtualização, precariedade e violência no Brasil atual se alimentaram de uma voracidade sem limites, de uma vontade de poder de tipo oligárquico e monopolista, de uma dependência brutal em face do poder transnacional de ETNs e do poder imperial dos EUA e, em parte, de processos internos de “transformismo”.
Mas o país avançou, o ser social se metamorfoseou através da emergência de novas subjetividades coletivas femininas, negras, juvenis, indígenas, faveladas, ambientalistas, lgbts, marcadas pela diversidade de sujeitos corporificados em causas, identidades e territórios com força cultural e social ligada aos avanços em modos de governar, lutas de ocupação de lugares, novos programas e projetos públicos de reconhecimento e redistribuição. O processo de luta molecular se intensificou e entre pressões internas e externas, brechas se abriram e a conjuntura internacional guinou para a guerra difusa, a corrida armamentista, o racismo, a violência, o medo, a manipulação e o abuso judicial e midiático que acabaram alimentando e liberando forças de destruição.
Entre o “melhorismo”, o reformismo fraco e a necessidade de um reformismo forte, a extrema direita, os militares, as oligarquias, o centro-liberal amedrontado, os monopólios, as forças jurídico-repressivas formaram um bloco contrário de direita, que retomou a ini -
ciativa e, em 2016, abre o processo formal que resultou neste ciclo político em que vivemos.
Por um de seus curiosos feitos o destino é super ardiloso e nos faz perpetuar inseguranças. Por isso, o resgate de Antonio Gramsci na chave interpretativa do reformismo forte (ele falava em reformismo-revolucionário) da consciência histórica de Carlos Nelson é super atual. Para superar o quadro regressivo imposto pelas forças dominantes truculentas e regressistas que rasgam a Constituição no atual governo. Consideramos decisivo manter este caminho de luta de democratização como processo contra a apartação social, espacial e racial. Temos de valorizar esta tradução da via democrática da hegemonia com pluralismo e diversidade, que coloca a necessidade de unificação de lutas, plataformas e projetos de solidariedade e unidade na diversidade.
Na realidade não realizamos mais do que alguns passos na perspectiva intelectual e moral de transformarmos a nossa formação social na direção da justiça social e ambiental. Cabe buscar esta relação entre a centralidade do social e a centralidade da democracia, a partir da defesa das causas e conquistas democráticas que transformam a vida, como é o caso da luta pela educação pública e gratuita para todas e todos em todos os níveis, única condição para se ter um projeto de pais que tenha sustentação na vontade popular construída sobre um senso comum marcado pelos ideais de liberdade, igualdade e justiça social tendo por base uma visão de mundo que tenha sustentação na distribuição de conhecimento e não na proliferação das armas que geram a indústria da morte, do genocídio social e racista que atinge os descartados, subalternos e precários que são descartados no quadro de privação e dor que enlutam este povo que sempre articulou seu sonho utópico com o corpo que canta e dança suas aspirações e ideais de dignidade.
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Pedro Cláudio Cunca Bocayuva é Coordenador do PPDH do Núcleo de Políticas Públicas em Direitos Humanos da UFRJ.
Opinião
O uso pedagógico de celulares na escola para promoção de DH
Por Flávia Rabelo Beghini e Rafaella Prata Rabello
Percebemos um clamor da massa excluída das (TDIC´s). Entende-se por (TDIC´s) toda a tecnologia usada para tratar a informação oriunda dos diversos meios de comunicação. Tais tecnologias que antes não faziam parte do nosso cotidiano, hoje, encontram um público que nasceu consumindo informação, via tecnologias digitais. Nesse rol de ferramentas, temos: o hardware e software de computadores, redes de internet e computadores, telefones móveis, smarts TVs, com ênfase a todo tipo de software, inclusive aplicativos de redes sociais ou não, necessários para inserção no mundo da informação, hoje, maior parte digitalizado.
Nesse sentido, uma proposta que resulta na junção entre direitos, educação, tecnologia e meio ambiente parece bastante pertinente e atual. “a) O papel das tecnologias digitais de informação e de comunicação na elaboração de conteúdos de ensino e na modificação das dinâmicas em sala de aula e no ambiente escolar. b) O papel da linguagem e dos conhecimentos em ciências humanas, ciências da natureza e linguagens e códigos nas práticas sociais. c) A possibilidade de promoção dos direitos humanos fundamentais concomitantemente com os conteúdos escolares nas salas do ensino médio, por meio do trabalho com temas transversais como “sustentabilidade”. d) A utilização do aparelho celular nas aulas de língua portuguesa do ensino médio. Para tanto propõe-se o trabalho com temas relacionados à sustentabilidade na produção de “documentários.” (PIMENTA, 2016, p. 47-48)
Tal proposta, apesar de direcionada para professores de língua portuguesa, poderá ser utilizada de forma interdisciplinar e transversal por diversos atores e por diversas áreas do conhecimento. Tal ideia, além de ajudar na construção de um cenário positivo de direitos, principalmente os com ênfase na fraternidade, constrói uma prática que nos deixa em sintonia com a realidade do aprendiz, suas expectativas, seu meio e, principalmente, suas necessidades.
Com relação a isso, a escola precisa se tor -
nar um local onde o projeto de ensino possa fomentar e estimular práticas multiletradas, ou seja, o textual estará integrado ao visual, ao áudio, ao espacial e ao comportamental, trazendo ressignificação e ampliando a ideia de letramento.
Pimenta (2006) elabora a ideia de um letramento para cidadania, ou seja, um letramento crítico capaz de empoderar os sujeitos para uma visão própria e interpretativa dos fatos. Essa proposta visa a inspiração de textos que deslumbrem uma ação social transformadora, atendendo ao bem comum e aos direitos dos cidadãos, fortalecendo a solidariedade. Na prática, o aluno se torna capaz de ser um produtor de conteúdos a partir de uma proposta do professor, envolvendo, inclusive, o uso de celulares para este fim. O celular pode ser considerado uma linguagem nativa do aluno, pois desperta interesse e traz para educação apoio para se alcançar metas educacionais ampliadas.
O momento de criação dos vídeos documentários ou outras opções de utilização deste recurso poderá promover momentos de liberdade de criação, além de propiciar curiosidade sobre os temas que serão abordados de forma interessada pelo aluno. Em algumas situações, temas como ética, direitos autorais, responsabilidade social e responsabilidade com o uso das imagens poderão surgir no decorrer do trabalho, dando ao professor a oportunidade de debater esses assuntos, às vezes, renegados dentro do ambiente escolar.
O projeto sobre documentários feitos por alunos de seus celulares acaba por despertar nos alunos várias facetas, entre elas a curiosidade intelectual. Daí uma gama de possibilidades se abre. Uma delas é a socialização de conceitos, que antes eram vistos como algo inacessível é traduzido para uma linguagem popular e divulgado para toda comunidade. Nesse sentido, projetos que tratem sobre o ecossistema do município poderão ser explorados, primeiramente, a partir de materiais já disponíveis. Dentre esses materiais estão: textos, reportagens, vídeos e vivências observa -
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das dentro da comunidade.
Em nível mais amplo, a UNESCO sempre apoiou a discussão sobre as políticas de comunicação e sobre como as novas tecnologias de comunicação poderiam ser utilizadas para gerar desenvolvimento. O uso de celulares na escola pode ser amparado por manuais elaborados pela UNESCO, bem como pelas metas do programa Educação Para Todos (EPT) que aponta os desafios a serem enfrentados tendo em vista o respaldo para o uso de tecnologia, visando alcançar-se a meta.
Mas, não podemos ser ingênuos e não perceber os limites e obstáculos que estas possibilidades trazem no mesmo pacote. Neste sentido Lévy (1999, p. 10) nos alerta: “Meu otimismo, contudo, não promete que a Internet resolverá, em um passe de mágica, todos os problemas culturais e sociais do planeta. Consiste apenas em reconhecer dois fatos. Em primeiro lugar, que o crescimento do ciberespaço resulta de um movimento internacional de jovens ávidos para experimentar, coletivamente, formas de comunicação diferentes daquelas que as mídias clássicas nos propõem. Em segundo lugar, que estamos vivendo a abertura de um novo espaço de comunicação, e cabe apenas a nós explorar as potencialidades mais positivas deste espaço nos planos econômico, político, cultural e humano”.
No entanto, é preciso tomar cuidado para que seu uso não se torne um desserviço, ou seja, ciência do senso comum. Para isso, o professor deverá conduzir o trabalho do início ao fim, chamando a atenção para todos os pontos que possa desvirtuar a potencialidade do trabalho.
Mas, como já foi dito, o uso pedagógico das tecnologias é restrito, inclusive, no meio onde ela é de ampla difusão, como nas classes mais ricas. Assim, não podemos esquecer que, apesar das tecnologias fazerem parte deste mundo, não estão ao alcance de todos, devido ao seu alto custo.
Silveira (2001) nos traz a problematização e reflete sobre as alterações nos contextos econômicos, sociais e culturais com o uso das tecnologias. Para o autor, o futuro é o hoje, ou seja, está acontecendo. Ele também reflete sobre questões relacionadas a exclusão digital que abre as discussões do uso das novas tecnologias na educação como um campo fértil para pesquisas e questionamentos.
Referências:
DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS, ONU, 1948.
DIRETRIZES UNESCO. Disponível em: http://www. bibl.ita.br/UNESCO-Diretrizes.pdf Acesso em: 01 de ago. de 2019.
EDUCAÇÃO
PARA TODOS.
Disponível em: http://www.unesco.org/new/pt/ brasilia/about-this-office/single-view/news/mobile_ learning_week_a_revolution_for_inclusive_better_ ed/
Acesso em: 01 de ago. de 2019
PIMENTA, Viviane Raposo. Utilização das Tecnologias digitais na Informática e Comunicação (TDIC) na Educação Básica – possiblidades de promoção dos direitos humanos- meio ambiente em foco. In: Brochado Mariah, GOMES, Marcella F de M., Lipovetsky, Nathália. (Orgs). Educação para Direitos Humanos – Diálogos possíveis entre a pedagogia e o direito v. II. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2006.
PNEDH – Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2007.
SILVEIRA, S. A. Exclusão Digital: A Miséria na Era da Informação. 2001. 1ª Edição. Editora Fundação Perseu Abramo.
SOUZA, Isabela. (2017), Politize! As três gerações dos direitos humanos, 11 de jul. 2017 https://www. politize.com.br/tres-geracoes-dos-direitos-humanos/ Acesso em: em 30 de maio de 2019
UNESCO, Audiência Pública, Brasília, 22 dez. 2000
Flávia Rabelo Beghini é Pedagoga e Graduanda em Ciências da Religião pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).
Rafaella Prata Rabello é Jornalista, Licenciada em Letras e Doutoranda em Comunicação pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
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Opinião
Impactos e mudanças no ensino superior em Pernambuco
Por Jean De Mulder Fuentes
Apartir do ano 2005, a interiorização do ensino superior das universidades federais públicas passa a fazer parte de uma política pública que antes quase não existia, integrando a sociedade de alto conhecimento com as principais cidades das mesorregiões de Pernambuco: Vitoria de Santo Antão e Caruaru, na zona da mata e zona do agreste; Salgueiro e Serra Talhada, na zona do Sertão; e Petrolina, na zona do Vale de São Francisco. A decisão do governo federal responde a uma política da educação superior para a inclusão e o desenvolvimento das cidades do interior, antes quase circunscrita a cidades litorâneas. O objetivo é dispor da possibilidade de cursar o ensino superior aos jovens que antes não podiam frequentar este nível de ensino, seja por condições econômicas e sociais, seja por questões geográficas.
Ao observar os cursos de graduação e pós-graduação dos cursos oferecidos, se verifica que os setores mais beneficiados são principalmente o setor agropecuário, têxtil, arquitetura, design, área da saúde e engenharias, o que se traduz no aumento dos índices de vendas de produtos para consumo local e em outros estados. Estes cursos trazem uma nova dinâmica social e econômica a estas cidades, como fica demonstrado pelo melhoramento de todos os indicadores sociais e econômicos das duas
cidades pesquisadas até então (IBGE - Índices sociais e econômicos de Pernambuco).
O governo estadual de Pernambuco, através do documento “Estratégias de CT&I para Pernambuco”, explicita uma política preocupada em agir desde o local ao global e as universidades e sua interiorização têm um papel importante nessa ótica de planejamento (“Estratégias de Ciência, Tecnologia e Inovação para Pernambuco” - Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação do Governo do Estado de Pernambuco, 2017). O documento tem um entendimento alargado de “inovação” que permite à pesquisa ter um alcance que inicialmente não parecia ter. Nele está escrito que as universidades do interior do Estado ainda necessitam de consolidação, no sentido de ampliar seu potencial de preencher lacunas existentes, oportunizar o desenvolvimento de talentos, além de irradiar esse potencial para os entornos próximos e expandidos das regiões onde se encontram. Esses são impactos qualitativos que precisam ser mais bem observados na finalização da pesquisa, em complementação com aqueles já apontados.
Considerando a importância da pesquisa como meio de auxiliar o planejamento das questões sociais e econômicas, mais especificamente em relação à influência das citadas cidades nas quatro
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interioranas do Estado. No ano 2006 a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) começa in locus uma etapa de interiorização da universidade pública, como estratégia de desenvolvimento regional do Estado de Pernambuco por meio da abertura de dois campi nas cidades médias de Vitória de Santo Antão e Caruaru. A criação da Universidade do Vale do São Francisco (UNIVASF), com sede em Petrolina, e o Instituto Federal de Sertão de Pernambuco, na cidade de Salgueiro (oferecendo carreiras superiores de graduação e pós-graduação) trouxeram impactos nestas cidades e cidades vizinhas.
Existem interessantes estudos de casos do impacto das universidades e da educação superior nas cidades médias, principalmente na Europa, em menor grau, nos Estados Unidos, em alguns países da América Latina e algumas cidades do Brasil (Corrêa, 2000; Amorim Filho, 2001; Castelo Branco, 2006; Sposito, 2007).
De fato, o ensino superior, e as universidades em particular, são reconhecidas não apenas como uma instituição que oferece educação e pesquisa (suas duas missões básicas e tradicionais), mas também como uma entidade que desempenha um papel fundamental no desenvolvimento econômico do território em que está estabelecida. As evidências mostram que esses impactos são muito positivos e envolvem desenvolvimento econômico e social e evolução cultural.
A presença de uma universidade gera dois tipos de impactos no território em que se baseia: direto e indireto, que, por sua vez, podem ser impactos mensuráveis ou não. O primeiro pode ser de curto ou longo prazo. De todos eles, apenas os efeitos diretos mensuráveis no curto prazo são avaliados. No que diz respeito aos impactos indiretos, deve salientar-se que nem todos são facilmente quantificáveis ou não são na mesma medida. Nas imediações da Universidade, geram-se gastos que afetam direta e indiretamente o consumo, a produção de bens e serviços (efeitos na renda regional, estrutura produtiva, etc.), a demanda local, o mercado de trabalho e a mobilidade, e o desenvolvimento de infraestruturas de bens e serviços (médicos, transportes, alojamento, etc.), mensuráveis em termos monetários e de emprego.
Há outros que são tão importantes ou mais importantes que os anteriores, embora sejam difíceis de quantificar (quando não impossíveis, pelo menos, com metodologias tradicionais) e ainda menos com caráter imediato. Referimo-nos ao conjunto de impactos socioculturais e de compromisso com a sociedade: maior oferta e demanda de serviços culturais, efeitos demográficos, educacionais, políticos (aumento da participação cidadã como resultado
de uma maior cultura política), social (imagem da região), bem como a capacidade de atração de indústrias tecnológicas em busca de graduados e colaboração científica e técnica com os departamentos universitários.
A Universidade é, portanto, reconhecida não apenas como uma instituição que oferece educação e pesquisa (suas duas missões básicas e tradicionais), mas também como uma entidade que desempenha um papel fundamental no desenvolvimento econômico do território em que está estabelecida. As evidências mostram que esses impactos são muito positivos e envolvem desenvolvimento econômico e social e evolução cultural.
No que diz respeito aos efeitos diretos, deve salientar que nem todos são facilmente quantificáveis ou não são na mesma medida. Nas imediações da Universidade, geram-se gastos que afetam direta e indiretamente o consumo, a produção de bens e serviços (impactos na renda regional, estrutura produtiva), a demanda local, o mercado de trabalho e a mobilidade, ao desenvolvimento de infraestruturas de bens e serviços (médicos, transportes, alojamento), mensuráveis em termos monetários e de emprego.
Em suma, a comunidade universitária e seus graduados, altamente qualificados, geram valores sociais, promovem o desenvolvimento cultural e empresarial onde vivem, trabalham e se integram. Além disso, o potencial de atrair professores e estudantes visitantes de outras regiões e de outros países torna as universidades públicas não apenas um setor de exportação da educação, mas contribui para a internacionalização e expansão do território como um todo. Tudo isso gera um impacto econômico e social evidente, como mostram os índices e taxas nas estatísticas no Estado de Pernambuco. Os índices melhoram, mais há muito por fazer nos desafios que a sociedade global impõe.
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Jean De Mulder Fuentes é Doutor em Ciência Política pela Universidade Federal de Pernambuco(UFPE).
Opinião
A “Rerum Novarum” e o nosso tempo
Por Alexandre José Gomes de Sá, Claudia Maria da Silva Cruz e Cláudio Pereira do Nascimento
Em nosso tempo (a hodiernidade) vicejam o desemprego e o subemprego (só no Brasil atual supõe-se que haja milhões de desempregados). Conforme estudo do IBGE (2019) deste ano, “a taxa de desemprego no Brasil ficou em 12,4% no trimestre encerrado em fevereiro, atingindo 13,1 milhões de pessoas. A fome ainda persiste e/ou aumentou (no interior profundo ou nos rincões mais distantes do nosso país e também nas nossas metrópoles de norte a sul, de leste a oeste). Diga-se, a fome não é um “privilégio” brasileiro, também afeta parte considerável do mundo desenvolvido, em desenvolvimento (ou emergente) e principalmente os ainda considerados países “subdesenvolvidos”.
Estima-se que cerca de 10% da humanidade sofra com a fome todos os dias, aproximadamente 821 milhões de pessoas (com mais ênfase nos continentes africano, asiático e na América Latina). As desigualdades sociais e a absurda concentração de renda reinam, tendo sido geradas pelo Capitalismo (em todas as suas tétricas fases históricas: a Mercantilista, a Industrial e a Financeira, a atual). E ainda se registra trabalho escravo (sim, há escravismo em pleno século XXI, no Brasil e fora do nosso país) e o trabalho em condições análogas ao trabalho escravo (um mero eufemismo para o escravismo hoje). Somam-se a essas mazelas do passado e do presente, a exploração do trabalho infantil e feminino (inclusive de mulheres grávidas) expostas a condições insalubres de trabalho. Realidades essas impostas e praticadas por algumas das empresas e marcas mais famosas do mundo. Só para ficar num exemplo: a grife espanhola de roupas Zara (e/ou outras, fabricantes de diversos tipos de produtos, como tênis, materiais esportivos, etc...) foi acusada, em 2011, de comercializar mercadorias oriundas do trabalho escravizado.
São evidentes a baixa remuneração dos trabalhadores e o altíssimo lucro dos empresários em detrimento desses trabalhadores, que gradativamente recebem salários mais “baixos”, posto que há uma contínua e crescente precarização do poder aquisitivo dos mesmos. E os interesses conflitantes entre empresários e empregados (o “eterno” ou metamorfoseado no tempo, “conflito de classes”, tão bem explicado por Karl Marx e Friedrich Engels, entre outros pensadores) ainda são identificados atualmente. Portanto, é concreta a situação de pobreza ou de pobreza extrema (de miséria) em que vive grande parte dos trabalhadores informais brasileiros (e também nos países emergentes e nos “subdesenvolvidos”). E também é precária a condição dos trabalhadores formalizados, que, mesmo numa hipotética situação “melhor” em relação aos informais, têm uma baixa qualificação, já que a educação, geralmente pública, que lhes foi oferecida não os preparou nem para a vida e muito menos ainda para o trabalho).
Todos esses seres humanos residindo, em sua maioria, precariamente nas periferias (nas favelas e/ou comunidades carentes), desprovidas de quase tudo que se possa imaginar para se ter uma vida, de fato e de direito, digna. Faltam tramento de saúde adequado, segurança, educação de qualidade, saneamento básico, iluminação pública, ruas e avenidas calçadas ou asfaltadas, moradias seguras e confortáveis para criarem seus filhos. Hoje, estão muito latentes sérios problemas sociais, econômicos, políticos e de relações de trabalho, entre outros – seja nos meios rurais ou nos ambientes urbanos – “semelhantes” aos que perturbaram o Papa Leão XIII no final do século XIX, há 128 anos. Ao ponto do mesmo, em 15 de maio de 1891, divulgar aquele que, já a sua época, foi considerado um dos mais relevantes documentos da história da Igreja Católica Romana: a Encíclica
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“Rerum Novarum”, em português, “Das Coisas Novas”, carta que se transformou ao longo dos tempos num norte para a condução dos princípios da DSC (Doutrina Social Católica) e/ou ASC (Ação Social Católica). De acordo com Villatore (2017, p. 71), a Rerum Novarum, “(...) inspirada nos princípios de justiça comutativa, caridade, justiça social, combate a restrição das liberdades individuais, mostrou uma postura definida (...) para que se obtenha a tão almejada ‘solidariedade social’”. Por que então algumas das “Questões Sociais” do nosso tempo ainda são tão “similares” às “Questões Sociais pretéritas” denunciadas pelo Papa Leão XIII? Por quê se o tempo não é estático e as sociedades “mudam”, “transformam-se” ou passam por “alterações” cada vez mais céleres? Respondemos: no “museu” das mazelas sociais criadas pelo Capitalismo (o mais nocivo modelo de produção perpetrado à humanidade, de todos os já experimentados), a “exposição”, em essência, é sempre a mesma, ou seja, são “peças” ou “relíquias” de nomes bem conhecidos e desconfortantes às nossas audições (já supracitados), que nos foi (e continua sendo) legado e onerado pelo Capitalismo, o desemprego, a fome, o trabalho escravo (e análogo), etc...
O Capitalismo, esse modelo de produção quase que “onipresente” e “onipotente” e que hoje não tem, de fato, mais condições e tampouco intenções (por parte dos “poderosos” que o comandam) de proporcionar benesses à humanidade, já é um “senhor de quase 500 anos”. Nesse caso, o que fazermos com esse mal que já tem cinco séculos de história e vicissitudes? Respondemos mais uma vez: Com base na tradução para o português do nome em latim “Novarum” (“Novo”) – separado aqui com pertinência do nome (“Rerum”) – pensamos que é preciso buscar por um modelo de produção totalmente “novo”, diferente em tudo do desacreditado Capitalismo. Uma alternativa que almeje simetrias sociais, econômicas, políticas, culturais, ambientais e tudo que for necessário para uma convivência equilibrada e com alteridade da humanidade em seu todo.
Referências
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Brasil tem 13,1 milhões de desempregados até fevereiro, revela IBGE. Disponível em:< https://www. em.com.br/app/noticia/economia/2019/03/29/ internas_economia,1042184/brasil-tem-13-1milhoes-de-desempregados-ate-fevereiro-revelaibge.shtml> Acesso: 01 maio. de 2019.
Justiça decide que Zara é responsável por trabalho escravo flagrado em 2011. Disponível em:< https:// oglobo.globo.com/economia/justica-decide-quezara-responsavel-por-trabalho-escravo-flagradoem-2011-22070129>. Acesso: 04 maio de 2019.
Mais de 800 milhões de pessoas ainda passam fome no mundo, estima FAO. Disponível em: <http://www.agricultura.gov.br/noticias/Mais-de800-milhoes-de-pessoas-ainda-passam-fome-nomundo-estima-FAO>. Acesso: 04 maio de 2019.
VILLATORE, M. A.; A ENCÍCLICA “RERUM NOVARUM” E SUA IMPORTÂNCIA EM RELAÇÃO À ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Disponível em: <https://juslaboris.tst.jus.br/ bitstream/handle/20.500.12178/106891/2017_ villatore_marco_enciclica_rerum_novarum. pdf?sequence=1&isAllowed=y> Acesso: 01 maio de 2019.
Alexandre José Gomes de Sá é doutorando em Ciências da Religião pela Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP) e Mestre em Economia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). E-mail: alex40economia@gmail.com.
Claudia Maria da Silva Cruz é doutoranda em Ciências da Religião pela UNICAP e Mestre em Antropologia pela UFPE. E-mail: claucruz44@ outlook.com.
Cláudio Pereira do Nascimento é doutorando em Ciências da Religião pela UNICAP e Mestre em Economia pela UFPE. E-mail: phdclaudionascimento@ hotmail.com.
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Opinião
Um mundo que se destrói
Por Marcos Costa Lima
“E a floresta somos nós”.
Povos das Florestas.
Introdução - O filósofo Guy Debord (1) tem uma expressão forte em seu livro que fala sobre “a negação da vida que se tornou visível”. Mais a frente, ele cita outro filósofo, Feurbach, que, no mesmo diapasão, diz que em seu tempo “a ilusão é sagrada, e a verdade é profana”.
Um outro filósofo francês, nosso contemporâneo, argumenta em sentido convergente, ao nos alertar que as imensas transformações em curso no nosso planeta estão ligadas, por um lado à velocidade de seus efeitos e à sua dimensão global.” O que nós chamamos de big data é característico dessa imensa transformação, tal como o consumismo planetário, que conduz a liquidar todas as formas de saber (saber viver, saber fazer, saber conceituar).
Para Bernard Stiegler (2), todo esse processo leva a uma hiperproletarização, cuja tendência é ampliar as desigualdades econômicas e produzir impossibilidades criativas, e a um controle automático generalizado, que geraria uma insolvência estrutural e um aumento vertiginoso da entropia, já sinalizada por muitos outros cientistas, se não superarmos esse processo de proletarização generalizado (3) a que o capitalismo industrial nos conduziu por 250 anos, com todas as sinergias de destruição massiva, rápida e planetária. O seu efeito de destruição da natureza, chamado de Antropoceno, na verdade é um impasse, pois é um processo derivado de uma dupla crença, seja na infinitude dos recursos naturais, seja na capacidade do conhecimento científico e tecnológico vir em nosso favor.
Felizmente, desde a Filosofia das Ciências, da Sociologia, da Ciência Política, da Ecologia, têm surgido pensadores apontando para a necessidade de construir novas alternativas e mesmo de aprofundar e discutir novos paradigmas. Contudo, as evidências empíricas desses processos desagregadores estão, por exemplo, no crescimento dos gastos mundiais em armamentos. Em 2018, o mundo gastou
1,8 trilhão de dólares em defesa, o maior valor destinado a esta questão desde o fim da Guerra Fria, segundo informe anual publicado pelo SIPRI, famoso Instituto Internacional de Investigação para a Paz de Estocolmo (www. sipri.org, acessado em 30/04/2019).
O último relatório apontou que os gastos dos EUA e de seus aliados da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) representam mais da metade do valor total mundial. Washington, o primeiro da lista dos países que investem mais recursos no âmbito militar, destina quase a mesma quantidade à indústria da guerra que as oito seguintes nações juntas. A Arábia Saudita, outro importante aliado estratégico dos Estados Unidos, ocupa o terceiro lugar desse ranking, ficando um posto atrás da China e um à frente da Índia.
Segundo Michael Maloof, ex-analista de políticas de segurança do Pentágono, “grande parte desse gasto, particularmente nos casos da Arábia Saudita e da Índia, se justificam por suas razões políticas”, uma vez que Deli e Riad pretendem “ganhar favores” de Washington, comprando armas estadunidenses, com a esperança de, em troca, obter concessões em outras áreas do seu interesse. Mas, em relação à pressão relacionada aos gastos militares que os Estados Unidos exercem sobre seus aliados da OTAN, Maloof afirma que a questão tem menos a ver com a segurança da aliança e muito mais com o desejo de ajudar a indústria de defesa estadunidense a “se manter à frente” dos seus concorrentes, e a contratar mais pessoas”, o que segundo ele, reflete, uma “clara dimensão econômica”.
Vemos que a grande crise contemporânea pode ser localizada em diversos setores, que vão do incremento da militarização à crise econômica; do aquecimento global ao aumento das desigualdades; do questionamento à democracia às questões de segurança alimentar; da revolução 4.0 ao crescimento do desemprego. Mas o objetivo deste artigo está em um componente da crise, também grave, que é o desmatamento global, com fortes evidências aqui apresentadas para o caso brasileiro, com
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destaque para a região amazônica.
Desmatamento - Os dados do levantamento realizado Global Forest Watch, de 2018, e atualizados pela Universidade de Maryland, nos Estados Unidos, mostram um complexo retrato do desmatamento em áreas densas de florestas tropicais – da Amazônia, na América do Sul, à África e Indonésia. A maior preocupação apontada pelo relatório diz respeito à destruição continuada das florestas primárias, como são chamadas as áreas com as árvores mais antigas e que não são fruto de replantio. Cerca de 12 milhões de hectares de florestas tropicais desapareceram em 2018, o equivalente a 30 campos de futebol por minuto. Só no Brasil, foram desmatados 1,3 milhões de hectares de florestas - é o país que mais perdeu árvores no ano passado. O aumento da degradação ambiental tem feito com que florestas tropicais não consigam mais contrabalançar as emissões de carbono. Apesar de armazenarem grandes quantidades de carbono, as perdas têm sido maiores do que os ganhos. As florestas tropicais estão emitindo 861 milhões de toneladas de carbono e só conseguem absorver 436 milhões, o que representa cerca de 425 milhões de toneladas líquidas de carbono na atmosfera.
No Brasil, uma estimativa produzida pelo Programa Monitoramento de Áreas Protegidas do ISA (Instituto Sócio-Ambiental), com base em dados preliminares do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), apontou que o desmatamento nas Terras Indígenas (TIs) da Amazônia brasileira cresceu 32%, em comparação entre agosto de 2016 e julho de 2017. A situação é mais crítica no centro e sudoeste do Pará, onde estão as três áreas mais desmatadas no período. A TI Cachoeira Seca acumulou 1.625 hectares de florestas destruídas; a TI Ituna-Itatá, 1.349 hectares; e a TI Kayapó, 891 hectares. Juntas, elas responderam por 38% de todo o desmatamento nesse tipo de área protegida na Amazônia. O desmatamento é resultado da invasão de madeireiros, grileiros e da falta de fiscalização. O estado do Pará é “campeão” de desmatamento.
O presidente Bolsonaro, no mês de abril desse ano, afirmou que pretende explorar os recursos naturais da Amazônia em parceria com os Estados Unidos. Ao longo da entrevista também se mostrou contrário à demarcação de terras indígenas ao tratá-las como obstáculo para exploração econômica da floresta. Disse ainda: “Quero explorar a região Amazô -
nica em parceria com os EUA”. A grave notícia vem reforçada por um dos membros da família do presidente, senador Flávio Bolsonaro, que lançou e elaborou projeto de lei para acabar com reservas de áreas nativas em propriedades rurais.
Não há espaço aqui para explicitar o que representa, não apenas para o Brasil, mas para o mundo, a destruição da floresta Amazônica. Os cientistas não param de nos alertar que os seres humanos estão destruindo 15 bilhões de árvores por ano, enquanto o aparecimento de novas árvores e o reflorestamento é de somente 5 bilhões de unidades. Ou seja, o Planeta está perdendo 10 bilhões de árvores por ano e pode eliminar todo o estoque de 3 trilhões de árvores em 300 anos.
Notas:
1 - Debord, Guy, A Sociedade do Espetáculo. Rio de Janeiro: Editora Contraponto, 2003, p.9.
2 – Stiegler, Bernard, Automatisation et néguentropie. In: Multitudes 2015/3 (n° 60), p. 137- 146.
3 – O ano de 2015 será lembrado como o primeiro ano da série histórica no qual a riqueza de 1% da população mundial alcançou a metade do valor total de ativos. Ou seja: 1% da população mundial, aqueles que têm um patrimônio avaliado em 760.000 dólares (2,96 milhões de reais), possuem tanto dinheiro líquido e investido quanto o 99% restante da população mundial. Essa enorme disparidade entre privilegiados e o resto da Humanidade continua aumentando desde o início da Grande Recessão, em 2008 -
4 - Stengers, Isabelle. Au temps dês catastrophes. Paris: La Découverte, 2009. Latour, Bruno; Oú atterir, Paris: La Découverte; 2017. Moore, Jason. Anthropocene or Capitalocene? Nature, History, and the Crisis of Capitalism. Binghamton University: Kairós, 2016. Gerhard Dilger et al. Descolonizar o Imaginário. Elefante Editora, 2016.
Marcos Costa Lima é professor do Programa de PósGraduação em Ciência Política da Universidade Federal de Pernambuco.
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Jornalismo ambiental
Do flagelo da seca à abundância: o conceito do semiárido próspero
Por Robério Coutinho
Acrise ambiental e climática demanda uma tensão em especial sobre a racionalidade e o agir das populações residentes em áreas do bioma da Caatinga, este caracterizado pelo clima semiárido e altas temperaturas, independente dos efeitos das mudanças do clima sobre o ecossistema e da ampliação de consequências sobre os flagelados socioeconômicos da seca secular. O bioma só existe no Brasil e engloba grande faixa territorial de todos os estados do Nordeste do país e de Minas Gerais. Portanto, afeta milhões de vidas humanas e não-humanas, apesar da resiliência natural da flora e fauna local, o que se justifica como um caso interessante para análise.
De início, assim como no restante do mundo, observa-se a racionalidade do afastamento do homem à sua dimensão natural (tema do artigo da edição anterior da revista). E, como visto, a desnaturalização humana provoca no homem uma distinção entre realidade e imaginário. Nesta cultura, o sertanejo significa e valida a miséria ou abundância da colheita (e as consequências socioeconômicas inerentes) proveniente da natureza (chuva-seca) como sendo uma questão ligada ao sagrado (coisa de fé; de castigo e benção), esvaziando a capacidade humana de crítica para reconhecer as características naturais e de buscar respostas. Naturaliza-se, assim, a problematização sobre o flagelo da seca e ainda se neutraliza pública e politicamente as possi-
bilidades de encontrar, ou tentar, potencialidades reais. A abstração da natureza pelo homem na constituição de sua consciência, da sua racionalidade para a problematização e para a tomada de decisões sobre o assunto, pode explicar parte do porquê esses eventos acontecem com populações inteiras do Sertão. As potencialidades bioeconômicas da Caatinga, mesmo secularmente sendo usadas por comunidades tradicionais para fins alimentício e medicinal, são invisíveis enquanto um meio sustentável e significativo para o conjunto das sociedades desta região e para os seus gestores públicos.
Na verdade, quando observado por outro paradigma, através do reconhecimento da dimensão natural do homem e sua interconexão com o clima e o bioma, ao invés de flagelo da seca, o semiárido e o ecossistema caatingueiro são caracterizados por abundância. Para perceber isso, faz-se necessário superar a hegemônica racionalidade social centrada só na água disponível, coisa que a região tem pouca se for para usá-la em culturas agropecuárias que desconsideram as características naturais do semiárido: seco e quente – propriedades naturais estas que, quando levadas em conta os efeitos da mudança do clima, tendem a ficar com temperaturas ainda mais elevadas e seco.
A mudança climática provocada pelo homem tensiona, portanto, a cultura sertaneja em direção à sua
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condição natural, à sua conexão vinculante e crucial com seu bioma e seu clima. Provoca uma racionalidade diferente daquela secularmente naturalizada a partir da significação pelo sagrado. Assim, ao invés de flagelo da seca, pode-se encontrar abundância após a problematização em busca de respostas públicas e políticas justamente a partir das características naturais do semiárido e as riquezas inerentes da Caatinga.
Após crítica à racionalidade tradicional, constata-se a falta de lógica na aposta em um modelo de desenvolvimento calcado na água. E, assim, a necessidade de mudança por um modelo onde a água se soma ao bioma e ao clima local. Este trinômio pode transformar o flagelo em abundância, como conceitua a Rede Nacional de Pesquisa em Mudanças Climática e Soberania Energética, Alimentar e Hídrica no Bioma Caatinga (Ecolume), ao propor “uma quebra de paradigma para a região do semiárido brasileiro. Através de tecnologias que garantem a segurança hídrica, alimentar e energética dos habitantes integrados nessa região” (2019).
A “abundância”, por sua vez, não vem da seca, mas bioeconomicamente através do plantio da vegetação caatingueira, resiliente à seca e ao calor, para fins alimentar, farmacológico e outros, até mesmo hídrico e no clima. As mudanças climáticas não só trazem vulnerabilidades, como podem trazer oportunidades (LARCEDA & NOBRE, 2019). É isso que o conceito ecolumiano de abundância evidencia, oriundo inclusive a partir do clima semiárido, o qual foi o problema secular do sertanejo. A irradiação solar em excesso, por sua vez, se transformada em energia através de painéis fotovoltaicos, pode ser usada em uma agricultura de modelo sustentável. A energia solar é colocada aqui como o elemento norteador, posto que é tratada como o eixo estruturante para as “seguranças hídrica, energética e alimentar no Nordeste Semiárido frente às mudanças climáticas” (LARCEDA & NOBRE, 2019, p. 1).
Na conceitualização do Ecolume sobre Caatinga Próspera (abundância), a qual é estruturada através de etapas concomitantes e sinérgicas, então classificadas de “Primado pelo desenvolvimento sustentável do Semiárido”, a reconfiguração da produção de alimento na região, a partir das plantas nativas e já adaptadas à pouca água e ao calor, estimulará o reflorestamento da Caatinga, e, mediante à formação de cadeias produtivas bioeconômicas, a exemplo do umbu, propiciará a participação das comunidades e do setor político. Com o aumento da cobertura vegetal, reduz-se os intervalos de seca no solo, melhora-se o ciclo hidrológico e também contribui na regulação do microclima local. E o sol ainda passa a ser gerador de energia com baixo custo para o replantio da Caatinga, oportuniza o beneficiamento das plantas para fins bioeconômicos, além de possibilitar a venda da energia excedente, caso o mercado doméstico de energia solar seja regulamenta-
do em lei.
Do conceito à prática. O Ecolume já tem algumas iniciativas em processo de prototipagem no Sertão de Pernambuco. O primeiro sistema agrovoltáico do estado e do Brasil já está em fase avançada para o início da operação. O fato recebeu notoriedade pública através do Jornal do Commercio por meio de uma matéria com a manchete “Projeto inovador leva energia, água e comida ao Sertão” (2018), frisando que o Protótipo criado pela rede tem apoio do CNPq com o mote de “plantar água, comer caatinga e irrigar com o sol”.
O Ecolume estimula uma cultura de abundância no bioma Caatinga. Esta racionalidade tem sintonia com vários dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), das Nações Unidos (ONU), contidos nas metas para transformação do mundo até 2030. Das 17 metas, o conceito ecolumiano abarca 12 delas, a começar pela erradicação da pobreza (situação já presente há séculos no Sertão do NE por conta do flagelo da seca e dessa infeliz racionalidade). Mas também através das metas 2 (produção agrícola sustentável), 4 (educação de qualidade), 7 (energia limpa e acessível), 9 (inovação), 10 (redução de desigualdade), 11 (comunidades-cidades sustentáveis), 12 (consumo e produção responsáveis), 13 (ação contra as mudanças climáticas), 14 (vida na água), 16 (vida terrestre) e 17 (formação de parcerias e implantação).
Referências
ECOLUME. Conceito Ecolume. Disponível em: https://www.ecolumeoficial.org/. Acesso em: 25 de jul 2019;
JORNAL DO COMMERCIO. Projeto inovador leva energia, água e comida ao Sertão. Recife. 7 de ago. 2018;
LACERDA, F.F., NOBRE, P. O Conceito Ecolume do Nordeste Prospero: contribuição para a publicação Sistemas Resilientes para o Nordeste. 2019.
Esta coluna apresenta abordagens críticas e interdisciplinares mensais relativas à produção da representação jornalística da realidade social sobre as temáticas socioambientais e a sua influência na constituição do sentido social sobre a questão. É escrita pelo jornalista Robério Coutinho, Mestre em Comunicação pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e autor de livros sobre a temática.
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Opinião
Proto-fascismo: o que tem a ver conosco?
Por Rubens Pinto Lyra
Aanálise das teses defendidas pelos proto-fascistas na Europa, influenciadas pelo nazismo, mas, sobretudo, pelo fascismo italiano, são de grande importância para entendermos as suas semelhanças com as ideias abraçadas pela extrema-direita brasileira. O proto-fascismo apresenta distintas fisionomias, todas, contudo, aparentadas com o fascismo, mas, diferentemente deste, não apresenta uma teoria homogênea, não tendo caráter totalitário. Também não tem objetivos de expansão territorial (essa também uma característica do nazismo) e de perseguição a raças consideradas inferiores. Nem dispõe de um partido de massas, enquadrado sob rígida disciplina e adestrado para promover ataques a adversários.
Mas vamos às semelhanças. Do ponto de vista da prática política, conforme assinala o grande pensador e romancista italiano Umberto Ecco, o proto-fascismo “trocou a violência aberta, característica dos seguidores de Hitler e Mussolini, por uma retórica agressiva”. Inseparável, tanto uma quanto outra, do carisma do líder.
A ideologia sob análise associa essa retórica (exemplo, a promessa do atual presidente militar de “fuzilar os petralhas”) com a ação no âmbito institucional, jogando com essa dubiedade com objetivo de manter a fidelidade de seus militantes e, ao mesmo tempo, assegurar apoio político para governar.
Portanto, em vez de atuar com a violência explícita, os proto-fascistas de diferentes perfis optam por praticar micro-violências cujos efeitos são danosos às suas vítimas (v.g., o affaire Marielle e as ameaças que conduziram Jean Wyllys ao exílio). Operam através do marketing religioso e político onde manipulam os desejos e as carências de incautos.
No Brasil, a extrema-direita manipulou os resultados das eleições através das chamadas fake news, utilizando, tudo leva a crer, recursos milionários. Ela não dispu -
nha, como Gobbels na Alemanha, da máquina estatal para divulgar inverdades, mas utilizou o mesmo método do dirigente nazista e dos fascistas: a propagação massiva de mentiras, difamando o seu adversário, Fernando Haddad, para, com sua repetição exaustiva, terminar por fazê-las passar por verdadeira.
O campo religioso fundamentalista (evangélico, judeu ou islâmico, conforme o caso) é extraído, conforme lembra Raimundo de Lima, em monografia de sua autoria, de “um gozo sádico do mal-estar entre as pessoas, semeando a confusão entre elas, fazendo da contradição e do paroxismo um empreendimento de efeitos hipnóticos”. Essa é a característica maior do governo Bolsonaro, dilacerado, permanentemente, pelo antagonismo entre o seu componente “olavista” e o núcleo militar. A ideologia proto-fascista odeia os movimentos pluralistas na política, na cultura, nas artes e na literatura. O proto-fascista “clássico” é conservador dos valores tradicionais, do ideário militar e do machismo. Constata-se sua semelhança com o proto-fascismo tupiniquim, no qual avulta a defesa enfática da família, da religião e da propriedade privada.
No Estado totalitário fascista não havia lugar para as liberdades individuais e de livre expressão do pensamento. No Brasil elas continuam em vigor, mas os proto-fascistas tupiniquins estão em campanha permanente para liquidá-las nas escolas públicas, notadamente com a proposta de Escola sem Partido e com práticas policialescas, como a gravação de aulas de professores dotados de visão crítica, visando denunciá-los.
A ideologia proto-fascista não é associada, como no nazismo e no fascismo, a um partido político ou embasada em um texto supostamente científico, como é o caso do nazismo cuja Bíblia era Mein Kanft. Seu traço característico é a colagem de idéias sem consistência ou a retórica agressiva ou sedutora. Tal como ocorre, hoje, no Brasil.
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O discurso proto-fascista exalta o culto à tradição e a recusa ao pluralismo, ainda que, no segundo caso, nem sempre de forma explícita. Difunde a impressão de estar sendo perseguido, promovendo o militarismo e armando a população. É precisamente o caso de Bolsonaro. Este sempre afirmou que a facada de que foi vítima teria sido resultante de um complot da esquerda, apesar de o laudo pericial acatado pelo juiz que apreciou o caso confirmar a insanidade do seu agressor. Enquanto isso, pretende, com seus projetos de lei, ampliar consideravelmente o acesso de armas à população.
Talvez a atitude mais representativa do proto-fascismo seja a intolerância e a perseguição aos diferentes, nos modos de ser, agir e pensar. Tende sempre a desqualificar os que não se adequam à sua camisa-de-força ideológica. São agenciadores das intrigas, das fofocas inventadas para prejudicar supostos adversários e desafetos. É assim também no Brasil onde a extrema direita pretende deter o monopólio do patriotismo, sendo os seus adversários genericamente qualificados de “comunistas” e inimigos da Pátria.
experiência brasileira também se assemelha à italiana na exaltação do Exército (v.g. a instalação de escolas militares em todos os Estados da Federação) e na identificação dessa instituição com valores conservadores como o patriotismo, a honra e a disciplina. Uma forma de blindar o líder carismático e seu governo nos regimes nazi-fascistas, como também no Brasil, é pretender que ele tenha sido escolhido por Deus.
Na Itália, até a Igreja Católica alimentou essa ideologia. Logo após a assinatura do Tratado de Latrão, o Papa Pio VI comentou, referindo-se a Mussolini: “Nós também fomos favorecidos, com aquele que a Providência Divina colocou em nosso caminho”. E de várias partes do país, repercutindo a fala do Sumo Pontífice, dizia-se: “Este é o homem da Providência”. Em sendo assim, o líder carismático passa a ser considerado um “mito”, ou um super-homem. Com efeito, não poucas vezes as massas, no curso da história, sentindo-se desamparadas, submetida à recessão econômica, à insegurança individual e à descrença em suas lideranças políticas, sentiram a necessidade de criar um herói e atribuir-lhe qualidades sobre-humanas.
Não obstante, o fascismo e o populismo de extrema-direita, na sua modalidade proto-fascista, necessita aproximar esses pretensos semi-deuses do homem comum. O Duce, em 1922, se misturava com o povo e dava tapinha nas costas em pessoas humildes, ajudava um ferreiro dizendo que tinha sido sua profissão e que gostava do trabalho manual, tendo inveja daqueles que o realizavam. Aparecia entre os segadores, usando somente um par de calças velhas, com seu torso desnudo brilhando à luz do sol. Com isso, sua popularidade dava um salto à frente.
Idêntica estratégia adota o salvador da pátria brasileiro. É flagrado em trajes caseiros, comendo sanduíche de leite condensado, indo descontar um cheque em caixa eletrônico, ou parando, de repente, a sua comitiva para cumprimentar pessoas humildes, seus apoiadores.
Citando mais uma vez Umberto Ecco, “o proto-fascismo pode voltar sobre o mais inocente dos disfarces. O nosso dever é pô-lo a nu e apontar quaisquer novas ocorrências, todos os dias, em todas as partes do mundo. Liberdade e libertação são tarefas infinitas”. Todos os que prezam os direitos da cidadania devem agir, diuturnamente, como militantes da democracia. Somente dessa forma poder-se-á afastar o horizonte sombrio que aparece como uma possibilidade histórica, ameaçando o futuro da nação e deixando os brasileiros desesperançosos com a perspectiva de uma distopia.
Rubens Pinto Lyra é Doutor em
Público e Ciência Política e Professor Emérito da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). E-mail: rubelyra@uol. com.br
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Direito
A
Opinião
A Política Externa Brasileira e os primeiros cem dias de Bolsonaro (2)
Por Samuel Pinheiro Guimarães
OBrasil é uma economia subdesenvolvida, caracterizada por extraordinárias disparidades de renda e de riqueza; pelo atraso relativo de seu parque industrial; pela grande penetração das megaempresas multinacionais; pela reduzida diversificação de seu comércio exterior; por um setor financeiro superdimensionado; pelo mercado subdesenvolvido de capitais; pelo pequeno conhecimento dos recursos naturais; pelo fraco dinamismo tecnológico.
Muitas das características da economia brasileira são compartilhadas, em maior ou menor grau, pelos Estados vizinhos da América do Sul. Este é um continente subdesenvolvido, com enorme concentração de renda, exportador de produtos primários e importador de produtos industriais, com enormes disparidades sociais. As características atuais da economia brasileira decorrem da longa permanência e da evolução histórica do regime da escravidão; da grande propriedade agrícola senhorial; dos vínculos das classes hegemônicas internas (e de suas elites dirigentes) com os sucessivos impérios; com a aceitação das elites dirigentes da ideologia do sistema colonial sobre o que deve ser a “correta” divisão internacional do trabalho; da ideologia e da prática conservadora da Igreja Católica e de suas políticas de superioridade racial e de gênero e de obscurantismo científico.
Esses fatores históricos foram se transformando ao longo do tempo e assumindo novas formas, mas permanecem até hoje, em novo contexto internacional, em que se verifica e age a política externa. Essa situação de subdesenvolvimento é agravada pelas tentativas permanentes de Estados desenvolvidos e do Império Americano de imporem políticas econômicas de natureza conservadora, como têm sido as advogadas pelos defensores dos princípios do Consenso de Washington (1989) e as “propostas” de política econômica dele derivadas. Essas “propostas” defendem que o Brasil deve ter uma política econômica de total integração no comércio e no sistema financeiro mundial, com a abolição de qualquer barreira ao comércio (acordos de livre comércio etc.), de liberdade total para os fluxos de capital; de total liberdade para investimentos estrangeiros; de equilíbrio fiscal absoluto; de redução do Estado ao mínimo, como se estas tivessem sido as políticas que teriam levado os Estados, hoje desenvolvidos, a seu estágio de desenvolvimento atual ou que eles as praticassem no momento atual.
O denominado “tripé macroeconômico” é a âncora do subdesenvolvimento brasileiro, ao impor limitações
ao desenvolvimento e mesmo ao crescimento econômico. O principal objetivo da política externa quanto à promoção do desenvolvimento econômico deve ser a negativa (hábil) de participar de qualquer acordo que limite as possibilidades de ação econômica do Estado em prol do desenvolvimento e a ação para limitar os efeitos dos acordos restritivos de que o Brasil já participa. Exemplos de situações restritivas do chamado policyspace são os acordos de livre comércio (sempre desiguais) com países altamente desenvolvidos; os acordos de promoção e proteção de investimentos estrangeiros; a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e seus códigos etc.
O segundo objetivo econômico da política externa deve ser a diversificação da pauta exportadora do Brasil em termos de produtos e de mercados de destino, assim como a diversificação de sua pauta de fornecedores, em termos de empréstimos, de investimento de capital e de transferência (e absorção) de tecnologia. Esse objetivo é essencial para evitar os efeitos da flutuação especulativa dos preços de produtos primários, enfrentar o surgimento de concorrentes, de substitutos etc. e as pressões políticas a que estão sujeitos países que tem suas relações externas concentradas em poucos produtos e parceiros.
O objetivo nacional de reduzir as injustiças sociais deve receber o apoio da política externa pela defesa de políticas sociais inclusivas, patrocinadas por organismos das Nações Unidas, pela condenação, na Assembleia Geral da ONU, de práticas discriminatórias contra minorias, de defesa do não uso político dos direitos humanos, pelos direitos dos imigrantes e dos refugiados. O objetivo de reduzir as injustiças sociais não deve, em nenhum momento, levar a julgamentos unilaterais pelo Brasil dessas injustiças em outros países que, muitas vezes como o Brasil, lutam contra elas com pequeno êxito. O princípio da autodeterminação e o de não intervenção devem guiar sempre a política externa brasileira no que diz respeito a situações de injustiças sociais e de direitos humanos em terceiros Estados, tema muitas vezes manipulado pelos interesses das grandes potências e do Império Americano. Assim, o Brasil deve rejeitar e condenar a aplicação de sanções unilaterais de grandes potências contra Estados subdesenvolvidos a pretexto de corrigir situações humanitárias, mas que, às vezes, as agravam e levam a justificar “intervenções humanitárias”, justamente das potências e do império que provocam aquelas crises humanitárias.
O objetivo nacional de defender a soberania deve ser
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procurado em duas esferas de ação da política externa. A primeira esfera é a de ação nos organismos internacionais, a começar pelas Nações Unidas e por seu Conselho de Segurança, que detêm o monopólio da força na esfera internacional e que, somente ele, pode autorizar o uso de qualquer medida de força (embargos, sanções, força etc.) contra qualquer Estado que não seja membro permanente do Conselho. Sanções unilaterais são, por definição, ilegais, como as aplicadas à Venezuela.
As dimensões de território, de população, de economia e de seu potencial, de seus problemas internos, fazem com que seja de extremo interesse a participação do Brasil como membro permanente do Conselho de Segurança para defender seus interesses e para impedir ações contra sua soberania. A reforma da Carta da ONU, para permitir a ampliação do Conselho, depende do voto de 129 membros (2/3 dos 194 membros) e da aprovação dos cinco membros permanentes atuais. Esse resultado depende de uma ação permanente e presença política do Brasil em todos os Estados para obter seu apoio. Essa presença brasileira será de extrema importância para obter apoio para as teses e as propostas apresentadas pelo Brasil nas discussões em conferências e reuniões internacionais, regionais, multilaterais ou temáticas (clima, floresta, etc.).
A segunda esfera de defesa da soberania é a construção de uma capacidade de defesa dissuasória de qualquer agressão; do desenvolvimento de uma indústria bélica autônoma; do desenvolvimento de uma doutrina estratégica de caráter brasileiro; do aperfeiçoamento, da diversificação e da “nacionalização” dos centros de treinamento de oficiais, do adestramento da tropa para combate de resistência a qualquer invasão. Essas políticas são de longo prazo, dependem de permanência para ter êxito e não podem estar sujeitas a flutuações anuais de constrangimento orçamentário que se revelaram, no passado, a forma política mais eficaz de “matá-las”.
Os quatro objetivos da política externa têm de ser alcançados em um ambiente internacional dominado pelo Império Americano, pelas grandes potências dele auxiliares, e pela luta entre o Império e seus dois Adversários, a República Popular da China e a República Federativa Russa. Ademais, essa disputa se verifica em um momento em que o Império Americano empreende uma verdadeira política de “reorganização” em grande escala do sistema internacional que criou após a Segunda Guerra Mundial e em que se verificam fenômenos transnacionais, como estagnação econômica, degradação do meio ambiente, transformação tecnológica na economia civil e na guerra, a “financeirização” das economias mundial e nacionais, as ações de organizações criminosas internacionais, as migrações em grande escala.
Nesse quadro, se torna de grande importância a aproximação e a cooperação do Brasil com os Estados que participam das negociações de acordos internacionais para enfrentar esses desafios e que têm interesses semelhantes, a começar pelos Estados da América do Sul e os Estados
subdesenvolvidos em geral, inclusive para evitar que os custos de políticas “imaginadas” para enfrentar questões “transnacionais” venham a recair sobre os países periféricos, subdesenvolvidos, mais frágeis e com menos recursos, grupo em que se encontra o Brasil.
O alinhamento da política externa brasileira, seja com os objetivos do Império Americano, seja com os objetivos dos Estados Adversários do Império, será extremamente prejudicial ao Brasil. As relações do Brasil com a China e a Rússia, Estados que o Governo dos Estados Unidos classifica como “malignos” e “inimigos”, devem ser cautelosas, mas diversificadas e firmes assim como com Estados como o Irã, classificados de “rebeldes” e “párias”.
A política externa executada pelo governo de Jair Bolsonaro contraria todos os princípios que devem orientar a política externa brasileira para que esta possa contribuir para alcançar os objetivos nacionais, isto é, da maioria do povo brasileiro, de democracia, desenvolvimento, justiça social e soberania. Assim, o alinhamento declarado, ostensivo, unilateral e sem reciprocidade da política externa brasileira com os Estados Unidos, com Israel e governos de ultradireita não só não obtém o reconhecimento americano, que despreza os subservientes, como desmoraliza o Brasil como interlocutor face aos demais Estados. Por outro lado, as declarações de ultradireita do Governo Bolsonaro sobre certos temas provocam o repúdio de governos de direita, como os do Chile e da Argentina, como até de lideres de extrema direita, como Marine Le Pen, na França.
As declarações do presidente Jair Messias Bolsonaro, do deputado Eduardo Bolsonaro, do embaixador Ernesto Araújo, ministro das Relações Exteriores, e de ministros como Paulo Guedes, revelam desconhecimento e uma visão simplista da política internacional e dos objetivos que devem orientar a política exterior brasileira para reduzir as vulnerabilidades do país e defender seus interesses de curto, médio e longo prazo. As contradições internas que geram e o ridículo das declarações torna cada vez mais ineficaz a ação externa e cada vez maior o desprestígio do Governo do Brasil no mundo. Parece que a realidade não consegue se impor às visões de fundo religioso e de Cruzada que imbuem a alma e inebriam o cérebro desses personagens.
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Samuel Pinheiro Guimarães foi secretário geral do Itamaraty (2003-2009) e ministro de Assuntos Estratégicos (2009-2010).