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Editorial

Por Heitor Rocha

Depois do mal-estar provocado pelos absurdos ditos e realizados pelo inquilino do Palácio do Planalto e do ônus por ter participado da conspiração para destituir Dilma Rousseff, em 2016, e eleger o capitão, em 2028 inclusive com o espetáculo, divulgado ilegalmente por Moro, do depoimento de Palocci e o seu “pacto de sangue” com Lula durante a campanha, parece que o processo de busca de credibilidade da grande mídia apresentou uma pausa. No momento da apreciação pelo Congresso Nacional do veto do presidente aos reajustes dos servidores públicos, a demonização do funcionalismo foi descarada com o argumento do problema de caixa e arrecadação do governo federal, sem sequer ventilar possibilidades como a taxação das grandes fortunas, como acontece nos países capitalistas mais desenvolvidos, ou a tributação do agronegócio, que não paga nenhum centavo de imposto e ainda recebe mais de 120 bilhões por ano (mais e 10 vezes o que é destinado para a agricultura familiar), para produzir e mandar de forma completamente desonerada os lucros para o exterior, haja vista que são multinacionais quase todas as corporações do setor.

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Ao mesmo tempo em que acusou de “um crime contra o país” a derrubada pelo Senado do congelamento por dois anos dos salários dos servidores, sem passar pelo Congresso, Guedes quer transferir cerca de R$ 400 bilhões dos lucros cambiais do Banco Central para abater parte da dívida pública, o que favoreceria os bancos privados, que detêm grande parte desses títulos. É o mesmo tipo de artimanha utilizada pela TV Globo, em campanha aberta pelo congelamento dos gastos dos servidores. Na mesma perspectiva de perversidade ‘liberal’, o cinismo de Guedes chegou até a contrariar as expectativas populista eleitorais de Bolsonaro que descartou a intenção do ‘Posto Ipiranga’ no chamado programa Renda Brasil: “Não posso tirar dos pobres para dar para paupérrimos”.

No caso do orçamento é revoltante o descaso com os setores da saúde e educação na previsão da alocação dos recursos públicos. Tudo indica que será mantida a situação expressa pela orçamento de 2019, segundo a ONG Contas Abertas, com o setor da Defesa (8,3 bilhões de reais) engolindo mais de 852 milhões de reais do que o que foi investido na Saúde e na Educação, o que pode ser ampliado diante do compromisso de Bolsonaro de garantir primazia orçamentária para os militares em 2021.

Assim, além de não conseguir resultados econômicos satisfatórios, o governo Bolsonaro também não cuida da saúde e da vida dos brasileiros, pois gastou até agora apenas 54% de todos os créditos extraordinários lançados para financiar as medidas de combate ao novo coronavírus, segundo relatório divulgado pela Instituiçã o Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado que acompanha as contas públicas.

Outro setor em que se afunda o desgoverno atual é o do meio ambiente, não só por não considerar a importância da área, mais também pelo prejuízo econômico que acarreta para as exportações do país. O ministro Ricardo Salles está desaparecido e o vice-presidente Mourão faz ouvido de mercador enquando a Amazônia continua batendo recordes desmatamento e queimadas. Neste contexto, é absurda a diminuição das multas de crimes contra o meio ambiente na Amazônia e essa reduçã o ocorre mesmo onde cresce o desmatamento. Levantamento inédito da Agência Pública descobriu que, na Amazônia Legal, a cada dez municípios onde o Ibama multou menos em 2019, cerca de oito tiveram aumento no desmatamento no período.

A postura de Ricardo Salles de conspirar contra o meio ambiente e reprimir os fiscais do IBAMA que combatem o desmatamento e as queimadas, ficou evidente na auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU) sobre as contas do Ministério do Meio Ambiente ao revelar que a pasta utilizou apenas 13% dos recursos para mudança climática e 14% para preservaçã o e uso sustentável da biodiversidade em 2019.

Desta maneira, a responsabilidade do governo federal é patente na destruiçã o da Floresta Amazônica, devido à fragilidade da fiscalizaçã o, ao relaxamento das exigências de proteçã o e no combate às ameaças à populaçã o indígena, com a consequente reduçã o de investimentos externos.

Philip Martin Fearnside, um dos cientistas contemplados com o Prêmio Nobel da Paz concedido ao Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), em 2007, e pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), lamenta que, além do desmonte da política ambiental no governo de Jair Bolsonaro, seja o discurso do próprio presidente que “encoraja o desmate”.

Heitor Costa Lima da Rocha, Editor Geral da Revista Jornalismo e Cidadania, é professor do Departamento de Comunicação Social e do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco – UFPE.

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