Legenda v.2 n.1 (2015)

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vol. 2 | n° 1 | 2015


ÍNDICE

6 Editorial 8 HQs 8 André Ducci 15 Laura Athayde 22 Junior Cândido 26 Ingrid Naomi (Ass.: Laura Maria) 28 Edgar Franco (ilustração) Gian Danton (texto) 35 Ana Schirmer 38 Luciano Irrthum

46 ARTISTAs EM DESTAQUE 46 Guilherme Balbi 52 Jarlan Felix (Ass.: Jajá Felix) 56 Heitor Vilela

63 DOSSIÊS TEMÁTICOS 63 Precisão e Emoção distintas nos traços: Ilustrações

realistas por Maurício Fortunato e Bec Winnel Alice de Faria e Isabel D´Angelis 76 Os movimentos e a dança nos quadrinhos de Regina Kotaka e a obra Thought of You de Ryanwoodart Anna Laura Fernandes e Jéssica Kurosawa 90 A arte de ilustrar de Marcelo Xavier: percepção por trás das ilustrações Auxiliadora Fernandes e Denisia Ribeiro

104 O Menino Maluquinho: construção de uma linguagem

nostálgica com base no papel do design Cíntia Figueiredo, Hemili Neves e Pâmela Miranda 117 Reconhecimento global com Iain Macarthur: Diversidade e influências do Mangá com Thiago Rojas, Cláudio Seto e Julio Shimamoto Ana Paula Lima e Bianca Dias 136 A modernidade com Spatzeid: Maurício de Sousa e as Histórias em Quadrões Gabrielle Maciel, Júlia Magalhães e Karoline Santos 148 A visão ludo-política: colagem anatômica com o brasileiro Diego Max e nova-iorquino Anthony Freda. Jéssica Marroques Colagens: A janela de esquina do meu primo, por Daniel Bueno Júlia Ribeiro, Marina Mintz e Rafaella Rêda 180 Ilustradora Esther Azevedo e modernidade ofusca o brilho da infância: ser criança não significa ter infância Érica Pereira, Érika de Oliveira e Laura Pereira 192 Significação com Alê Abreu: Ilustração com foco no filme “O Menino e o Mundo” Aline Silva 208 Livros didáticos infantis: ilustrações e o olhar da criança Giovana Simplício

226 Entrevistas 225 Letícia Pusti 229 Mariamma Fonseca 233 Daniel Bueno

235 Notícias 235 Seminário Design da Imagem 2016 236 FIQ 2015


MISSÃO

LEGENDA QUADRINHOS Revista Brasileira de Pesquisa e Divulgação dos quadrinhos. Legenda Quadrinhos é uma publicação semestral do NIQ Núcleo de Ilustrações e Quadrinhos da Escola de Design da UEMG. ISSN 2447-2638 Publicação Online

Divulgar artigos que abordem temas relacionados as ilustrações e histórias em quadrinhos correlatos aos vários nomes de quadrinistas nacionais, anônimos e consagrados que passaram a publicar suas produções autorais. Legenda Quadrinhos é uma revista interdisciplinar, criada com o objetivo de dinamizar a pesquisa, a produção e a divulgação dos quadrinhos, bem como contribuir com a documentação histórica e o estudo de novas técnicas de produção de imagens. Sentados lado a lado, quadrinistas e designers gráficos, debateram e contemplaram, pela primeira vez no espaço acadêmico, as possibilidades e os resultados da aproximação entre estas duas áreas do conhecimento humano, sempre com o intuito de promover vocações e estimular processos criativos, permitindo que estudantes de graduação e de pós-graduação também possam enviar artigos que abordem sobre estes diversos talentos artísticos brasileiros presentes no mercado nacional e/ou com sucesso no exterior. Em especial, busca publicar a produção dos alunos de graduação. A revista recebe artigos e resenhas em fluxo contínuo e funciona apenas no formato digital. Além do dossiê temático que permite aprofundar em áreas específicas. As submissões dos textos devem estar em sintonia com a Missão da Revista.


EDITORIAL

Editorial:

Eliane Meire Soares Raslan

Coordenador do Centro de Imagem: Rosemary Portugal

Prof. Dra. Eliane Raslan ED-UEMG

Coordenador do NIQ:

Eliane Meire Soares Raslan

Conselho Editorial Científico:

“Não devemos ter medo de inventar seja o que for. Tudo o que existe em nós existe também na natureza, pois fazemos parte dela.”

Ana Kelma Cunha Gallas (UFPI) Edgar Silveira Franco (UFG) Gazy Andraus (FIG – UNIMESP) Nílbio Thé (UNIFOR) Janie Kiszewski Pacheco (UFRGS e ESPM)

Paulo Picasso

Consideramos de enorme importância registrarmos a história desta Revista. E nada melhor que a própria Revista Legenda para divulgar a história de sua trajetória. Idealizada no início dos anos 90 pelos alunos da Escola de Design Vitor Piedade Garcia e Wenderson Sobreira, sob orientação do professor Silvestre Rondon Curvo, a revista Legenda Quadrinhos, foi criada com o objetivo de dinamizar a pesquisa, a produção e a divulgação dos quadrinhos, bem como contribuir com a documentação histórica e o estudo de novas técnicas de produção de imagens. Por intermédio da revista, a Escola de Design da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG) reuniu em torno de si mais que talentos. Sentados lado a lado, quadrinistas e designers gráficos, debateram e contemplaram, pela primeira vez no espaço acadêmico, as possibilidades e os resultados da aproximação entre estas duas áreas do conhecimento humano, sempre com o intuito de promover vocações e estimular processos criativos. Graças a esse esforço coletivo e o comprometimento da equipe, vários nomes dos quadrinhos nacionais, anônimos e consagrados, passaram a publicar suas produções autorais. Dentre eles destacam-se três nomes que sintetizam, por meio de seus trabalhos a proposta desse projeto gráfico, são eles: Marcelo Lelis (1ª capa), Luciano Irrthum (2ª capa) e Mozart Couto (3ª capa). Embora de breve duração, de 1995 a 1997, a Legenda Quadrinhos, fruto do esforço de seus idealizadores, permanece ainda ativa na lembrança dos que participaram direta ou indiretamente de seu desenvolvimento. Enquanto campo experimental favorável ao aprendizado dos alunos propiciou o despertar para outras potencialidades criativas. E ainda hoje, por intermédio de seus registros, documentos de grande potencial informativo e processual, é capaz de auxiliar no fomento de novos estudos e produções tanto para o campo do design gráfico quanto para pesquisa dos quadrinhos em Minas. (Fonte: Texto TCC: SILVA, I. G. Legenda Quadrinhos: Design, Informação e Memória. ED, UEMG, 2010). No ano de 2012, a professora, pesquisadora e doutora Eliane Meire Soares Raslan reativa os trabalhos do NIQ – Núcleo de Ilustrações e Quadrinhos no Centro de Estudos em Design da Imagem da ED - Escola de Design da UEMG. Como coordenadora do NIQ, retoma as atividades da Revista Legenda Quadrinhos em 2014. O objetivo da revista é divulgar quadrinistas brasileiros ou trabalhos com parcerias brasileiras. A Revista Legenda Quadrinhos passa a receber novos trabalhos e a publicar novas edições a partir do ano de 2015. A revista retorna com uma novidade, agora como uma revista periódica, com duas publicações por ano, passa a receber trabalhos de estudantes, pesquisadores, professores e artistas em formato de resenhas, além dos artigos e dossiês temáticos de cunho científico. Os trabalhos são inéditos e expandem o conhecimento para diversas áreas com interesses comuns pela Ilustração e Quadrinhos.

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Conselho Gráfico:

Mariana Misk – LDG ED/UEMG Silvestre Rondon – ED/UEMG

Projeto Gráfico: Beatriz Pawlow; Rafael Rallo Neste volume 2, nº 1, do primeiro semestre do ano de 2015, tivemos os artigos de dossiê Temático abordando os diversos modos de desenhar com destaque no mundo infantil. A criatividade com xilografia, massa plástica, colagem, objetos e fotografias com técnicas de modelar, montar e deformar tiveram destaques em diversas áreas nos mais variados países, inclusive, trabalhos realizados por brasileiros. O tema serve como guia de informação e orientação para estudantes, artistas e profissionais que interessam em conhecer um pouco mais sobre as diversas técnicas artísticas utilizadas por artistas brasileiros.

Produção: Ana Beatriz de Lima; Kaique d’Paula Capa:

Luciano Irrthum

Apoio:

Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica e Tecnológica. Edital 07/2014 PIBIC / UEMG / FAPEMIG

Data de publicação:

23.12.2015 ISSN 2447-2638 – Publicação Online - V. 2. N. 1 Primeiro semestre de 2015

Artigos e Resenhas: Fluxo contínuo Dossiê Temático: Os diversos modos

de desenhar: destaque no mundo infantil. Criatividade com xilografia, massa plástica, colagem, objetos e fotografias com técnicas de modelar, montar e deformar.

Da esquerda para direita: Rodrigo Gonçalves, Vitor Garcia e Wenderson Sobreira (idealizadores do NIQ) e Luciano Irrthum. Alunos responsáveis pelo desenvolvimento do Projeto gráfico Legenda Quadrinhos e das atividades do Núcleo entre 1994-1999. Fonte: Acervo pessoal de Vitor Garcia.

A Revista Legenda Quadrinhos é uma publicação sem fins lucrativos do NIQ - Núcleo de Ilustrações e Quadrinhos do Centro de Estudos em Imagem da Escola de Design / UEMG. Periódico com duas publicações anuais de artigos científicos, como também, ilustrações e histórias em quadrinhos produzido por brasileiros. As opiniões emitidas e imagens são de inteira responsabilidade de seus autores. Os direitos de todas as imagens pertencem aos respectivos Ilustradores e/ou quadrinistas de cada seção. O conteúdo dos artigos publicados é de inteira responsabilidade dos seus autores. Contato: Av. Antônio Carlos, 7545. 7º andar - sala 53, Bairro São Luís. Belo Horizonte. MG. Brasil. Cep: 31270-010. (55) (31) 3439-6517. E-mail: <legenda-niq@hotmail.com>; Link: <https://revistalegenda.wordpress.com/>


André Ducci

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Laura ATHAYDE


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ARTISTAS

Guilherme Balbi é ilustrador, professor e quadrinista mineiro. Formado em Artes Visuais com especialização em desenho e fotografia, ministra aulas na Escola Técnica Casa dos Quadrinhos em Belo Horizonte. Já desenhou para grandes editoras americanas como IDW, Dark Horse e DC Comics. Sempre quis um universo pra chamar de seu e acabou criando as maluquices do JackPot, quase impossíveis de serem desenhadas.

guilherme

balbi 47




JARLAN

FELIX

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HEITOR

VILELA

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Precisão e Emoção distintas nos traços: Ilustrações realistas por Maurício Fortunato e Bec Winnel Alice Novato Silva de Faria1 Isabel D´Angelis2 Resumo Éterea, hiperealista e suave, a ilustradora Bec Winnel traz à suas obras o retrato de sonhos perdidos. Maurício Fortunato na mesma linha, porém melancólico traduz em suas obras uma outra realidade, porém tão precisa quanto Winnel. Ela desenha rostos de mulheres que carregam as marcas do tempo não como indicação de idade, mas como expressão de sentimentos e realidade. Em um vulto de tridimensionalidade esses semblantes adquirem através de materiais como giz pastel e aquarela, as facetas de alguém que parece estar mais próximo do observador que o próprio papel. Por meio desse viés foi feita uma análise embasada nesse acervo imagético proposto pela ilustradora australiana, questionando-se principalmente a leitura que pode ser extraída de suas obras. Já Fortunato exprime o sofrimento dos homens, mulheres e crianças por meio do nivelamento social no qual estes se encontram. Com um enfoque direcionado à imaterialidade dos sonhos e a essência da busca pelo passado, também abordando a improtância dos olhos e a presença da morte, foram selecionados autores como Deyan Sudjic e Donald Norman para questionar a linguagem passada por Bec Winnel e Mauricio Fortunato em seus desenhos. Norman vai apontar em seu livro três níveis de leitura dos objetos que cercam o ser humano. Já Sudjic vai falar principalmente de como nos relacionamos com esse objetos. Além desses, ainda será colocado outro autor: André Borges. Este, vai dizer em seu artigo que ao analisar-se um objeto de estudo, é passível de se apontar que possui tanto a essência quanto o signo. E a partir da coletânea desses três autores unida ao acervo dos dois ilustradores, será feita uma análise e interpretação da origem dessa precisão e emoção tão evidente em suas obras. Palavras-chave Hiperealismo; Semiótica; Design. Introdução Muito se tem discutido sobre a relação entre o ser humano e os produtos que ele consome. Percebe-se cada vez mais que a absorção de informações não é proporcional Estudante, Design de Produto manhã, UEMG, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Este trabalho foi orientado pelos professores Eliane Meire Soares Raslan e André Borges da ED/UEMG E-mail: alicefaria@gmail.com 2 Estudante, Design de Produto manhã, UEMG, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. E-mail: beldangelis@hotmail.com 1

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 3, n. 1, p. 65 – 77, 1º semestre/2016. ISSN 2447-2638. Texto recebido: 20.05.2015. Texto aprovado: 10.10.2015. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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ao volume das mesmas. Em pouco tempo a sociedade passou a ler de tudo, desde

utilizá-lo. Por fim, tem-se o nível reflexivo, que é o nivel em são trabalhados os signos,

política a educação ambiental. Porém, essa mesma sociedade mantém-se superficial

a mensagem e a cultura atribuidos ao produto.

mediante a amplitude de conteúdos que o mundo oferece hoje. É nesse contexto que surgem propostas como a de Bec Winnel. Voltada para

enquanto signo e enquanto essência. A primeira explica que “(...) o conceito se expressa

diversas linhas de inspiração, o retrô é um desses vieses onde a artista trabalha não

pela linguagem que faz referências às coisas (objetos), mas não está necessariamente

somente a volta ao passado, como também traça a essência do que ficou perdido e não

como essência das coisas” (BORGES, 2011, p.46). Já a segunda classificação diz que

alcançou as relações atuais.

essência é “qualquer resposta à pergunta: o que? (...) a resposta à pergunta “o que?” não

Sobre isso, é importante definir que: [...] podemos defender o retrô partindo de que ele não “recorta” diretamente o passado como os objetos de antiguidades, bem como não produz objetos com imitação íntegra do passado como a réplica, ou ainda, não insere objetos produzidos no passado dentro do contexto atual como o estilo vintage. Se não fosse pela criatividade e originalidade por parte de seu criador, o retrô não seria tudo o que é ou pode vir a ser. Ele parte de uma releitura do passado, do uso de elementos da história em paralelo à nossa própria realidade, resultando em um recurso que gera um olhar mais crítico e um questionamento sobre o que vivenciamos. (ROHENKOHL, 2011, p. 6).

Objetiva-se com esse artigo compreender como o retrô transforma a concepção do antigo, de ultrapassado para tendência. Sobretudo, evidenciando itens no acervo de Winnel que tangenciam esse retorno ao clássico. Além disso, serão relacionados os textos de Norman, Sudjic e Borges, a esse contraponto de épocas. Deyan Sudjic (2001), autor de “A Linguagem das Coisas”, discute os mecanismos que seduzem a pessoa a comprar determinado produto e como alguns objetos são tão simbólicos a ponto de tornaram arquétipos, ou seja, tornarem a referência na mente dos indivíduos de como deve ser determinado objeto. Donald Norman (2008), por sua vez, analiza em seu livro “Design Emocional – Por que adoramos (ou detestamos) os objetos do dia-a-dia”, os objetos através de três níveis.3 O primeiro, chamado de nível visceral, está relacionado ao instinto e aos julgamentos praticamente automáticos ou pré-programados, sendo portanto o primeiro contato entre produto e usuário. O segundo, que é o nível comportamental, está ligado à função e à usabilidade do objeto, isto é, se a função atribuída a ele é satisfatótria ao

enunciou simplesmente a essência da coisa, mas sua essência necessária ou sua substância e pode ser assumida como sua definição” (ABBAGNANO, 2007 apud BORGES, 2011, p. 45). Dessa forma, o conceito é a substância que dá forma ao produto. Passado e Presente conversam Entre pentenados da belle époque, laços do rococó e arabescos do barroco é possível se perceber o passado comunicando algo nos desenhos de Bec Winnel. Em sua totalidade, quase todas as suas ilustrações trazem uma referência clássica. No livro A linguagem das coisas, de Deyan Sudjic é retratada exatamente a beleza de outras eras. Para o autor, “Os bens que conversamos durante décadas podem ser considerados espelhos de nossas experiências da passagem do tempo.” (SUDJIC, 2001, p. 18) Um dos detalhes mais evidentes em suas obras é como o pretérito toma uma forma desconhecida. Em meio a névoas criadas pelo esfumaçado do giz pastel, o passado parece um mistério, um sonho, ou o mistério dos sonhos. Qual sonho? Provavelmente esse pelo qual todos anceiam, o sonho de retornar a outro tempo, outra era. Sudjic (2001)vai dizer que: As marcas da vivência já pareceram acrescentar autoridade a um objeto, como aquelas Nikons pretas surradas que os fotógrafos de guerra da era do Vietnã carregavam pelos campos de extermínio do sudeste asiático [...] o pesado corpo de metal aparecendo onde a tinta preta estava lascada. (SUDJIC, 2001, p. 18)

A partir desse trecho é possível entender que para aquele período não era

Fonte: Revista Cliche. Três níveis de design. Disponível em: http://www.revistacliche.com.br/2013/09/os-tres-niveis-de-design-parte-1-o-design-visceral/. Acesso em: 20 junho 2015. Site: http://www.becwinnel.com/. Acesso em: 27 de maio de 2015.

necessário ter uma Nikon que priorizava a estética. O uso e a duração desse objeto são

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 3, n. 1, p. 65 – 77, 1º semestre/2016. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Finalmente, André Borges foca no conceito do produto e suas características

o que o diferencia dos produtos da atualidade. Em sumo, o ideal de beleza de outras

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eras não parecia estar na exteriorização do objeto, e sim nas marcas de aprendizado que este possuía. Figuras 01-03: Trabalhos por Bec Winnel

Fonte: Site Oficial Bec Winnel, 2012

2011

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Esse olhar que parece tão “desgastado” pelo tempo como a Nikon, é outra peça chave nas obras da artista. Ela cria esse ponto focal para que ele não se aborte em meio a névoa pastel (fig. 01-02). É como que em uma relação direta com Sudjic (2001), Winnel não quisesse que o olhar se perdesse como os produtos que já não se relacionam mais com as pessoas.

Fonte: Site Oficial Maurício Fortunato Araújo 5

Sudjic (2001) vai apontar os produtos de hoje como um botox de tudo aquilo que já foi criado. Como se não houvessem mais descobertas a serem feitas, apenas a plástica em cima do que já existe. Ele diz: “A atração de um produto é criada e vendida

Sobre isso Winnel diz: Eu gosto de criar rostos detalhados, belos retratos de mulheres, muitas vezes acompanhados por elementos da natureza e itens de eras passadas, com temas que se desvanece ou fora do fundo, como se eles estivessem quase lá ou falando com você de um lugar distante. (WINNEL, B. 2015)

O trabalho de Fortunato segue esse mesmo viés abrangendo o sofrimento

diretamente ligado ao realismo. (fig. 03-06). A veracidade e autenticidade estão no físico dessas pessoas ilustradas. O artista afirma capturar “o físico que muitas vezes é 5

perdido em nossas vidas cotidianas”. Figuras 04-05: Trabalhos por Maurício Fortunato Araújo

na base de um olhar que não sobrevive ao contato físico [...] O desejo fenece muito antes que o objeto envelheça.” (SUDJIC, 2001, p. 18). Assim, a ilustradora vai desvelar a beleza clássica em suntuosidade e delicadeza, trazendo a imagem de alguém tão real quanto o que reflete frente ao espelho. A mensagem que Winnel quer passar pode ser uma linha congruente entre Sudjic (2001), como também vai contrapor essa ideia mostrando que o objeto pode ser admirado sem que feneça. E, ao contrário do que o autor diz, é o olhar que mantem vivo esse objeto. Nos trabalhos de ambos os artistas, Maurício Fortunato Araújo e Bec Winnel, percebemos os traços próprios, sendo Maurício com traços fortes e Bec traços leves e delicados. Cada um com seu olhar próprio para o realismo, retratam indivíduos em

Fonte: Site Oficial Bec Winnel Disponível em: <http://www.becwinnel.com/> Acesso em: 20 junho 2015.

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5 Fonte: Blog Oficial Maurício Fortunato Araújo. Disponível em: < http://mauriciodesenhosrealistas.blogspot.com.br/> Acesso em: 22 junho 2015.

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 3, n. 1, p. 65 – 77, 1º semestre/2016. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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modo de vida e comportamentos distintos. Ambos remetem o sofrimento, mas com angústias distintas. Maurício está mais para o ser humano sofrido em uma vida difícil, Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 3, n. 1, p. 65 – 77, 1º semestre/2016. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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quanto as questões econômicas e sociais, enquanto Bec retrata expressões tristes no olhar de mulheres comuns, sejam elas famosas ou não.

Um exemplo disso, são as figuras a seguir. Elas denotam feições e detalhes como sardas e verrugas, não deixando de lado a minuciosidade das pequenas linhas seguidas pelas olheiras ou mesmo as sombras que acompanham os rostos. As texturas

Os sonhos de giz

dos materiais também induzem a essas respostas do corpo. Figuras 06-07: Trabalhos por Bec Winnel:

Por décadas o sonho foi estudado por muitos cientistas, psicanalistas e até mesmo curiosos. De muitas definições empregadas, Freud foi o que melhor explicou esse processo automático gerado por nossas cognições. Porém, sonhar nunca deixou de ser uma realidade abstrata e muitas vezes, esquecida. Podemos definir o sonho segundo Freud (1915), “como algo que existe para proporcionar paz a mente. ” O sonho e todas as suas incógnitas é uma das ferramentas mais recorrentes do desenho de Bec Winnel, assim como a vertente retrô. A artista trabalha com o giz pastel no intuito de criar uma nebulosidade capaz de despertar a atenção para aquele rosto. Aquela mulher desenhada se torna o centro, exaltada por um olhar que não deixa seu observador perde-la. Donald Norman (2008) retrata em seu livro Design Emocional, como nos relacionamos com nossos produtos do dia a dia. Ele fala que fazemos uma leitura em três níveis para defini-los como produtos de bom funcionamento. Esses níveis são o visceral, o comportamental e o reflexivo. De uma forma geral, a ilustradora perpassa tanto o visceral quanto o reflexivo. O nível comportamental não se enquadra no objeto de estudo em questão por tratar-se de uma análise feita a partir de desenhos. A reação visceral é a resposta do nosso corpo para o objeto estudado. Sobre isso Tonetto e Campelo (2011) vão dizer: Norman (2004) afirma que estudar design visceral é bastante simples, pois geralmente basta colocar as pessoas em frente ao produto e aguardar pelas reações de aproximação ou rejeição em relação a ele. Trabalhar com design visceral é compreender as respostas emocionais automáticas. (TONETTO, L., CAMPELO, F., 2011, p. 136)

Winnel vai trabalhar o visceral transferindo, principalmente, o hiperealismo a seus desenhos. Com o lápis ela vai delinear marcas de expressão que evidenciam não somente rugas ou sardas, como também detalhes precisos de traços que muitas vezes façam despercebidos.

Fonte: Site Oficial Bec Winnel, 2015.

Fonte: Site Oficial Bec Winnel, 2011. 6

Em uma leitura reflexiva Norman (2008) já aponta que “A atratividade é visceral, mas a beleza percebida é reflexiva, pois se trata de um conceito que vem da experiência e da reflexão. Música descompassada e arte popularmente descrita no senso comum como “feia” podem ser extremamente gratificantes em termos emocionais para dados tipos de usuários.” Nos moldes de Winnel, o design reflexivo é despertado pela imaginação e a abstração. Ela costuma brincar com referências de animais e objetos desconhecidos, de forma a criar novos mundos para essas mulheres. Provavelmente, o uso dessa técnica tem relação com o passado. Eras que não tivemos contato (a não ser pela história) mas que nos conduzem a conhece-las e desvenda-las. Ao trabalhar com a temática dos sonhos de giz, a artista busca tanto aguçar o nível visceral propondo detalhes e texturas que instigam o observador, como também induz este, a imaginar esse mundo do papel. Em seu site, um autor desconhecido descreve a sensação que tem ao estar de frente as obras de Winnel: O trabalho de Winnel é delicado e de outro mundo, e parece beirar o imaterial. Sua aparência emerge da superfície como um estado de sonho: parece macio, lembrando pelúcia, e aparentemente à beira de dissolver no ar. (DESCONHECIDO, 2015, SITE BEC WINNEL)

_________________________ Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 3, n. 1, p. 65 – 77, 1º semestre/2016. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Fonte: Site Oficial Bec Winnel Disponível em: <http://www.becwinnel.com/> Acesso em: 20 junho 2015.

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7:idem

Figuras 08-09: Trabalhos por Bec Winnel: Figuras 10-11: Trabalhos por Bec Winnel:

Fonte: Site Oficial Bec Winnel, 2011. Figuras 12-15: Trabalhos por Maurício Fortunato Araújo:

Fonte: Site Oficial Bec Winnel, 2015.

Fonte: Site Oficial Bec Winnel, 2011.

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O enigma por trás do olhar Uma das características mais marcantes do indivíduo é o olhar, considerado por muitos a janela da alma. Esse destaque para os olhos é muito explorado por Winnel em suas obras. Sejam eles de súplica ou misteriosos, ao deixar o côncavo dos olhos marcado por maquiagem. O foco nos olhos se relaciona à temática do sonho discutida anteriormente uma vez que o foco em um ponto torna seu redor desfocado e embaçado, o que auxilia na criação da névoa entorna da figura e assim o aspecto de sonho. Sobre o olhar, Deyan Sudjic (2001) escreve: “A atração de um produto é criada e vendida na base de um olhar que não sobrevive ao contato físico [...] O desejo fenece muito antes que o objeto envelheça.” Ou seja, o produto pode ser bonito, mas não funcional. Dessa forma o visual do objeto pode deixar de ser sedutor no momento que o usuário testa sua funcionalidade. Com base nessa afirmação, Sudjic (2001), é possível observar que, Winnel trabalha no desenho para que esse olhar não se perca como os produtos que não se relacionam mais com as pessoas. O olhar em suas obras nos cativa antes mesmo de sumir entre a névoa de pastel. _________________________ Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 3, n. 1, p. 65 – 77, 1º semestre/2016. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Bec Winnel trás em suas obras figuras mórbidamente pálidas e muitas vezes com olhares de dor e súplica. A névoa citada anteriormente não representa somente os sonhos, mas também a morte, uma vez que o esfumaçado pode significar o desconhecido, mostrando assim que a morte é algo desconhecido e que ao mesmo tempo pode ser um sonho. Além disso, por vezes, a artista desenhou caveiras, que estão intimamente ligadas à representação da morte. Com base nessa interpretação, se relacionam os níveis visceral e reflexivo de Norman (2008), que estão ligados ao instintivo e aos signos, respectivamente. Pode-se utilizar o primeiro nível para explicar as características intuitívas relativas a morte como o medo da própria morte e o desconhecimento o que vem depois e o nível reflexivo para justificar a comparação feita entre morte, névoa e sonho. Os olhares, trabalhados por Sudjic (2001), que prendem o observador e o puxam para a obra podem ser também uma súplica para esse indivíduo não desviar o olhar, já Fonte: Site Oficial Maurício Fortunato Araújo.

De acordo com o blog de Maurício Fortunato Araújo6: Traduzir a imagem que eu observo para o desenho feito a lápis e em grafite, eu tenho preferência em fazer desenhos de pessoas que trás uma grande mensagem, ou no olhar, na expressão facial, ou até mesmo com a quantidade de detalhes que a foto transmite. Durante boa parte da minha vida achei que o artista tinha que mudar a consciência das pessoas e fazer da sua obra um instrumento dessa mudança. Hoje acho que, antes de fazer arte com esta ou aquela finalidade, você tem que fazer a arte de fato, e mostrar que nem tudo começou por um acaso, e que no passado houve sim um grande significado. (BLOG Maurício Fortunato Araújo)

A morte ao olhar de Winnel:

A temática da morte é considerada um tabu por muitas pessoas uma vez que trata-se de um tópico intimo e sensível. Winnel busca dessa forma abordar esse tópico muitas veses de forma velada e discreta, mas às vezes de forma aberta e clara. Mesmo não sendo tratada explicitamente em suas obras, tanto Norman (2008) quanto Sudjic (2001), trazem elementos importantes para entender a aproximação da artista com a morte.

que isso faria a personagem da obra ser puxada para a névoa para o desconhecido, para a morte. Rostos em essência e signo

A diferenciação entre o conceito de essência e signo de objetos de estudo são

essenciais na compreensão do trabalho de Bec Winnel. Sobre isso MEYEREWICZ (2011) vai dizer: Ao tecer relações entre as concepções de conceito e o design, a ênfase será o design de produtos, uma vez que tomamos como referência o livro de Baxter – Projeto de produto. No entanto, minhas reflexões e observações podem também se relacionar a outras formas de design. (MEYEREWICZ, André B., 2011)

Dessa forma, o estudo do conceito pode ser diretamente relacionado às obras

de Winnel, principalmente aos objetos por ela pintados. Sobre tais objetos, Winnel diz: Gosto de criar retratos delicados, suaves e detalhadas das mulheres. Através de meus retratos, espero contribuir para a sociedade com belas e positivas imagens das mulheres, com a esperança de nos lembrar que as mulheres são bonitas, amorosas e misteriosas criaturas com uma quantidade abundante de carinho para oferecer. Minha arte é uma celebração visual da feminilidade e da liberdade de auto-expressão, também uma expressão da minha viagem através de feminilidade. (WINNEL, 2015, Site Bec Winnel)

Ao estudar o conceito de Winnel, é possivel analizá-lo de duas formas diversas. 6

Primeiramente do signo como essência. Borges relata que:

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 3, n. 1, p. 65 – 77, 1º semestre/2016. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 3, n. 1, p. 65 – 77, 1º semestre/2016. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

Fonte: Site Oficial Maurício Fortunato Araújo. Disponível em: <http://mauriciodesenhosrealistas.blogspot.com.br/> Acesso em: 26 junho 2015.

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Fonte: Bec Winnel (site), 2012.

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Ao imaginar ou ver uma cadeira, pode-se fazer a pergunta: qual o conceito da cadeira? Nessa primeira abordagem podemos pensar que há uma essência necessária, uma substância que faz esse objeto ser uma cadeira. Há uma essência que essa cadeira não pode não possuir, pois essa essência, independente de qualquer outra coisa, faz desse objeto uma cadeira. (BORGES, 2011, p.48)

Analisando as obras sob a visão do conceito como essência, percebe-se que o rosto feminino pintado por Winnel pode ser essência a partir do momento que apresenta os elementos básicos de um rosto. Nos trabalhos de Maurício Fortunato essa análise pode ser feita partindo da compreensão dos signos presentes na força e dramaticidade que seus desenhos, em geral, apresentam. Em segundo lugar, tem-se o conceito como signo. Sobre ele André Borges diz: [...] o conceito está na mente, no conhecimento, e este faz referências às coisas. Se há uma imagem [...] em nossa mente, se há uma ideia em nossa mente, mesmo que em cada mente a imagem seja diferente, a palavra cadeira, assim como sua imagem, evocam e representam o objeto. (BORGES, 2011, p.48)

Partindo da visão apresentada, entende-se a obra de Winnel como signo quando se engloba aos trabalhos da artista os padrões de beleza presentes em seus desenhos. O signo depende do conhecimento de cada um, criando assim diversas possibilidades de rostos femininos. Os padrões são criados no momento que essas possibilidades são eliminadas para dar espaço a uma única possibilidade. Assim como Bec Winnel, o ilustrador Fortunato vai criar rostos que transcendem os signos e trazem a essência de uma realidade que é passível do entendimento de todos. Ele cria semblantes de pessoas comuns que muitas vezes poderiam passar despercebidas. Ela cria semblantes de mulheres lindas, que apesar de não se perderem nos olhares em geral, deixam ocultos seus temores. E o que eles tem em comum é a busca diligente do que há por trás desses vultos nomeados de rostos. No universo das artes diz-se que artistas que possuem obras com rostos muito parecidos um com os outros possuem a Same Face Syndrome ou “síndrome do mesmo rosto”. Winnel pinta várias vezes as mesmas mulheres, alterando somente a maquiagem dos olhos ou os enfeites dos cabelos. Dessa forma, há uma contradição entre a fala da artista e suas obras, já que Bec Winnel (2015) diz que sua arte “é uma celebração visual da feminilidade e da liberdade de auto-expressão”, subentendendo-se que busca mostrar as mulheres como seres únicos e livres de padrões. Padrões esses que também relacionam-se aos padrões de beleza presentes na mídia e na sociedade como um todo. Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 3, n. 1, p. 65 – 77, 1º semestre/2016. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Considerações Finais

Bec Winnel é sem dúvida uma exímia artista. As obras analisadas trazem somente uma parcela do que pode ser pesquisado, cabendo assim muitas outras interpretações. Mas certamente a técnica dessa artista é um destaque importante pois, sem ela, tudo que foi trabalhado sobre o efeito esfumaçado do pastel e o destaque para os olhos não existiria. Mauricio Fortunato também apresenta um trabalho muito voltado as áreas sociais, dando ênfase no quão real e próximo do ser humano está a realidade das pessoas mais humildes. Suas ilustrações são importantes até mesmo como fator de aproximação entre as segmentadas camadas sociais. Para muitas pessoas ilustrações são apenas decorações ou uma representação de uma cena. De fato, muitas vezes o desenho é feito de forma tão inoscente que o próprio artista não percebe os significados contidos nele. A análise desses desenhos é o que torna a imagem diferente de pessoa para pessoa, permitindo diferentes interpretações dependendo da bagagem cultural e de informações de cada um. Dessa forma a visão crítica trabalhada nesse artigo torna-se imprescindível para o entendimento de uma figura, preferivelmente buscando relacionar autores e demais textos afim de embasar e justificar pontos de vistas e afirmações.

Referências: NORMAN, Donald A. Design Emocional ou por que adoramos ou detestamos os objetos do dia-a-dia. Rio de Janeiro, Rocco, 2008. MEYEREWICZ, André B. O Conceito: Concepções, Pensamentos e Reflexões, Revista Transverso, v. 2, p. 38-51, 2011

ROHENKOHL, A. Design retrô: um desafio da contemporaneidade em reconhecimento ao passado. Unoesc & Ciência – ACSA, Joaçaba, v. 2, n. 2, p. 147153, jul./dez. 2011. SUDJIC, Deyan. A Linguagem Das Coisas. São Paulo, Editora Intrínseca, 2001.

TONETTO, L.; CAMPELO, F. Design Emocional: conceitos, abordagens e perspectivas de pesquisa. Strategic Design Research Journal, vol. 4, n. 3, set.- dez. 2011.

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 3, n. 1, p. 65 – 77, 1º semestre/2016. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Os movimentos e a dança nos quadrinhos de Regina Kotaka e a obra Thought of You de Ryanwoodart

Histórias clássicas do ballet que normalmente são contadas através de espetáculos ao vivo, agora puderam ganhar vida dentro dos livros. A ilustradora transmite em seus desenhos

Anna Laura Scarabelli Fernandes1 Jéssica Akemi Akutagawa Kurosawa Resumo Expandido O artigo busca o componente semântico do Spätizeit: secundariedade. Relacionamos aos quadrinhos, com o clássico Giselle, ilustrado pela bailarina Regina Kotaka e a obra Thought of you, de Ryanwoodart. Os trabalhos consistem nas adaptações de experiências e na exposição da obra figurativa em animação experimental 2D, que aborda a complexidade dos relacionamentos íntimos. Sua relação com a secundariedade existe pelo fato de ter sido utilizado alguns elementos presentes no passado para a criação da obra. A história da dança é um paralelo entre a utilização da dança ao longo da história com a forma que foram utilizadas nos trabalhos, como composições coreográficas ao longo dos anos e paralelamente a forma como foi utilizada na ilustração. Palavras chaves

os movimentos de ballet, breves narrações, cenários e entre outros recursos que para o leitor pode facilitar o entendimento da trama. Já o autor da obra Thought of You3 (segunda ilustração escolhida para ser abordada no trabalho) é Ryan Woodart, nascido no ano de 1972, em Salt Lake City, Utah, USA. Atualmente atua como animador, artista de história em quadrinhos (storyboard artist), professor e diretor de animações. Já trabalhou em empresas como Pixar Animation Studios, Marvel entertainment, Fox films, Riot Games, Universal, Warner Bros, Sony Pictures, Walt Disney Studios e TV Globo. Os trabalhos de “storyboard” e/ou animações de Ryan ficaram conhecidos após atuar em filmes como Homem Aranha, Homem de Ferro, Capitão América, Os Vingadores ou Cowboys e Aliens. É casado e tem três filhas. Percebemos que sua relação com a família influencia diretamente em seus trabalhos, por citar constantemente sua esposa e filhas em suas entrevistas, além de referenciá-las em seus trabalhos pessoais. Figura 01- Ilustração feita por Ryan de suas filhas.

Dança e movimento; Regina Kotaka e Ryanwoodart; Secundariedade.

Introdução A brasileira Regina Kotaka2, nasceu em Curitiba, onde foi formada pela Escola de Danças do Teatro Guaíra e graduada em Licenciatura e Bacharelado em Dança pela Faculdade de Artes do Paraná. Começou a sua carreira profissional no próprio teatro Guaíra, depois foi contratada como solista pelo Freiburgstatheater na Alemanha e no ano de 1984 integrou a Companhia Nacional de Bailados em Lisboa. A bailarina após uma lesão nas pernas precisou ficar, por um período de dois anos, afastadas das suas atividades na dança. Com isso aproveitou o tempo livre e o seu talento com os desenhos para produzir um livro em quadrinhos com base em histórias clássicas dentro do ballet como, por exemplo, “Giselle” que foi a inspiração do seu primeiro livro. Estudante, Design de Ambientes manhã, UEMG, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Este trabalho foi orientado pelos professores Eliane Meire Soares Raslan e André Borges da ED/UEMG. E-mail: annalaurascarabelli@gmail.com; jaakurosawa@gmail.com 2 Fonte: Blog de Regina Kotaka. Disponível em: <https://www.blogger.com/profile/11750305498213338021> Acesso em: 20 agosto 2015. 1

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 78 – 91, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. Texto recebido: 29.05.2015. Texto aprovado: 10.10.2015. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

Fonte: Instagran Ryanwoodart 3

Fonte: Vídeo: The making of - Thought of You. Cambell Christensen. USA: 2011. 707min.

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Analisando as redes sociais do autor Ryan, como Facebook, Twitter, Intagran, Vimeo e Youtube4, é possível perceber que ele é um homem atarefado, com muitos trabalhos, mas que procura sempre encontrar um equilíbrio entre trabalho e vida pessoal. Gosta de praticar esportes, em especial ciclismo e surf, e tem sua profissão, não como um fardo em sua vida, mas um prazer. Além disso, se considera um artista e sente-se responsável por transmitir algo para a sociedade através de seus talentos e conhecimentos. Dançando com Regina Kotaka e Ryanwoodart

também com as múltiplas ambientações que podem mudar de acordo com o lugar onde se passa a trama. Incentivada pela mãe, que se dispôs a comprar uma mesa gráfica para que ela pudesse desenhar diretamente no computador, o livro “Giselle” tem 2000 exemplares bancados pela própria autora, que acredita ser uma contribuição de todas as suas experiências dentro do longo período em que esteve em contato com a dança. Um trabalho que estreitará as relações entre o público em geral que já tenha admiração pela dança ou que deseja explorar essa área, tendo acesso a um material mais lúdico e de fácil compreensão. As crianças se encantarão com as cores e as alusões ao mágico e romântico mundo do balé. Os adolescentes se identificarão com a opção pelo estilo do mangá, autenticamente moderno. Já os adultos se encantarão com a complexidade artística deste material pedagógico, homenagem a uma história de amor que sobreviveu ao tempo e à maldição das Wilis. (ZINEBRASIL)7

De acordo com o site ZineBrasil5, a obra “Balés Ilustrados: Giselle” por Regina Kotaka apresenta uma nova proposta de apreciar as histórias clássicas do ballet. Este primeiro

Figura 02: Página da História em Quadrinhos Balés Ilustrados

livro da série se trata de uma história de amor entre uma jovem camponesa, Giselle, e um príncipe na qual se apaixonam, mas que ao longo da história encontram problemas para se manterem juntos, obra original é de “Théophile Gautier, encenado pela primeira vez na Ópera de Paris, em 1841, com coreografia de Jean Coralli e Jules Perrot”. Motivada a continuar com a dança mesmo após a lesão que a afastou por um tempo da profissão de dançarina, ela decidiu unir o seu conhecimento profissional com o talento que já trazia da arte. No começo, ela desenhava pequenas sequências de movimentos do ballet apenas para estampar frente de camisetas, e foi a partir disso que surgiu a ideia de fazer quadrinhos só que passado para o papel, como a própria fala de Kotaka em uma entrevista para a TV Paraná “(...) de repente numa camiseta pra você ter uma história inteira você precisaria ter pelo menos umas 122 camisetas.”6 decidindo então escrever o seu próprio livro. Utilizando as mesmas técnicas do mangá para desenvolver os seus personagens, a ilustradora tenta dar a eles emoções, expressões que muitas vezes, podem não ser tão bem transmitidas ou percebidas pelo público durante uma apresentação ao vivo. Os quadrinhos ainda trazem os mesmos movimentos inspirados ao de uma coreografia, além de poder contar

Fonte: Twitter Disponível em: <https://twitter.com/ryanwoodwardart>, Intagran Disponível em: <https://instagram.com/kindusername/>, Vimeo. Disponível em: < https://vimeo.com/woodward > e Youtube. Disponível em: < https://www.youtube.com/user/RyanWoodwardart > Acesso em: 10 outubro 2014. 5 Fonte: ZineBrasil. Bailarina lança quadrinhos do clássico Giselle. Disponível em: <https://zinebrasil.wordpress.com/2013/03/06/bailarina-lanca-hq/> Acesso em: 06 março 2013. 6 Fonte: G1. Bailarina impedida de dançar lança livro com clássicos em quadrinhos. Disponível em: <http://g1.globo.com/pr/parana/noticia/2013/03/bailarina-impedida-de-dancar-lanca-livro-com-classicos-emquadrinhos.html> Acesso em: 20/08/2015 4

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Fonte: Por Regina Kotaka, p. 23. Fonte: ZineBrasil. Bailarina lança quadrinhos do clássico Giselle. Disponível em: <https://zinebrasil.wordpress.com/2013/03/06/bailarina-lanca-hq/> Acesso em: 06 março 2013.

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O mundo inteiro está se movendo e eu estou parado

A obra thought of you é um trabalho pessoal de Ryanwoodart. O que nos levou a

Acordei e desejei estar morto Com uma dor na minha cabeça Fiquei imóvel na cama A noite está aqui e o dia se foi E deixe o mundo girar loucamente

escolher tal tipo de obra foi o fato de o autor se sentir livre para projetar sem as limitações pré-determinadas de um cliente. Ao ser entrevistado pelo Blog “Character Design8”, Ryan responde à pergunta sobre quais seriam suas obras preferidas da seguinte maneira: “Probably

Pensei em você e onde você foi E o mundo gira loucamente... (MY LITTLE SECRETS)10

the ones that I do for myself and not for a particular production. I guess it’s because I feel free to draw and design without the limitations of pre-determined characters. I just draw what feels right”. (Provavelmente as que eu faço para mim e não para uma produção particular. Acho isso porque eu me sinto livre para desenhar e projetar sem as limitações de caráter prédeterminados. Eu simplesmente desenho o que sinto que é certo). Dessa forma, escolhendo uma obra em que o autor foi livre para criar e se expressar, temos a possibilidade de analisá-la a partir de características, pensamentos e referências do autor, ampliando assim nossa capacidade de interpretação e crítica da tal. O processo de criação da obra se deu em uma fase da vida do autor onde este se encontrava com uma considerável estabilidade profissional, tinha um ótimo networking, e uma carreira promissora e segura no futuro, entretanto, nutria o desejo e a necessidade de criar algo diferente e único. Ryanwoodart estava voltando de LA, onde tinha passado algumas semanas desenvolvendo um trabalho como storyboard. Se sentia extremamente cansado por tantas tarefas e por ter ficado um longo período longe de casa. Dessa forma, sentou-se na poltrona do avião e ouvindo uma música, cuja sua tradução do inglês para o português é9:

pensar nas rotações da terra, e como independente do que fazemos a terra continuará a girar. Pensando nisso, recordações de certos momentos que ele passou na vida, com sua esposa, filhas ou amigos começaram a vir em sua mente, o fazendo perceber que os nossos pensamentos poderiam “auxiliar nessa rotação da terra”, no sentido de que essas lembranças de pessoas que amamos e momentos bons que passamos nos ajudam a criar uma base sólida para vida, e que independentemente do girar do mundo, estaremos firmados nessa base sólida construída através desses pensamentos. Uma das frases que nos chamaram atenção de Ryanwoodart é uma dita na introdução do documentário que relata a criação da obra aqui abordada: “É uma daquelas coisas, quando alguém pergunta a um artista porque ele decidiu ser um artista, existe uma fera criativa interior que te consome e que pessoalmente, me leva ao ponto de ser miserável se eu não deixa-lo ir para fora e fazer alguma coisa”11. E a citada “fera interior” começou a incomodá-lo, fazendo-o sentir a obrigação de

Título: “O mundo gira loucamente” Acordei e desejei estar morto Com uma dor na minha cabeça Fiquei imóvel na cama Pensei em você e onde você foi E deixe o mundo girar loucamente

transmitir todos esses questionamentos, pensamentos e conclusões de alguma forma para as

Tudo o que eu disse que faria Como deixar o novo mundo em folha E ter tempo para você Eu só me perdi e dormi madrugada a dentro E o mundo gira loucamente

estava presente em sua vida de diferentes maneiras, ele ama assistir apresentações de dança

Eu deixei o dia passar Eu sempre digo adeus Eu observo as estrelas do peitoril da minha janela Fonte: Character Design. The Interview. Disponível em: < http://ryan-woodward-interview.blogspot.com.br/> Acesso em: 29 maio 2015 9 Fonte: Caderno Virtual. Animado. 29.09.2011. Disponível em: <https://cadernovirtual.wordpress.com/page/18/> Acesso em: 20 junho 2015.

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Dessa forma, o autor relata que começou ao se conectar com a letra da canção, e a

pessoas. Dessa forma começou a indagar como expressar tantos sentimentos? E chegou à conclusão que deveria ilustrar uma coreografia que sintetizasse essas ideias, pois a dança contemporânea, sua esposa era bailarina e suas filhas estavam constantemente dançando. Entretanto, como poderia representar movimentos de dança considerando que ele não era um bailarino? Para solucionar esse problema, apresentou a ideia para a coreografa Kari Wakamatsu que se interessou muito pela proposta e começou a trabalhar com ele nesse Fonte: Blog My Little Secrets. 02.02.2011. Tradução da música tocada no vídio Thought of You - by Ryan Woodward http://mylittlesecretsbyjj.blogspot.com.br/2011/02/traducao-da-musica-tocada-no-vidio.html 11 Fonte: Vídeo: The making of - Thought of You. Cambell Christensen. USA: 2011. 707min.

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projeto, eles realizaram uma audição, encolheram alguns bailarinos e coreografaram a canção que o inspirou. Através dessa coreografia Ryan conseguiu realizar seus desenhos e criar uma maravilhosa obra denominada “Thought of you”, que se consiste em uma exposição de obras figurativas e animação experimental 2d, abordando a complexidade dos relacionamentos íntimos. Buscamos a história da dança para em seguida tratarmos a dança nos trabalhos de Regina Kotaka e Ryanwoodart. Para que fosse possível analisar a obra de maneira completa, percebemos a necessidade de entender o que é de fato a dança, e onde ela se encaixa na sociedade humana para posteriormente entender a influência desse tipo de representação artística e o motivo dos autores tê-la escolhido para representar e transmitir sua mensagem. Dessa forma, propomos aqui analisar a evolução da dança ao longo dos tempos, e como ela nos serve de referência se relacionada com a ideia de Spatzäit sugerida por Walter Moser (1999). Percebe-se que a dança é uma das mais antigas formas artísticas da existência humana, ela sempre acompanhou o homem em suas manifestações: A dança, na verdade, acompanha o homem desde sua aparição e em sua organização social. Foram diversas as formas pelas quais esta atividade se manifestava no homem, ele dançava como meio de comunicação, acasalamento, interação de grupos, relações etc. A dança é a arte mais antiga que se conhece, dela surgiram as chamadas representações teatrais, as formas de entretenimento coletivo e não se tem notícia de um povo, por mais primitivo que seja, que não saiba dançar. (AMARAL, 2009, p.01).

Pode-se averiguar tais informações pois:

[...] aparece registrada nos mais antigos testemunhos gráficos da pré-história, documento que datam da última época glaciar, dez a quinze anos antes da nossa era e podem ser observados nas cavernas pré-históricas do Levante espanhol – Alpera (Valência) e Cogull (Lérida) – e são semelhantes a outros documentos pré-históricos relativos à Dança encontrados na África do Sul (Rodésia e Orange) e na França (Solutrais e Dourdogne). Tais pinturas rupestres levam-nos a crer que o homem primitivo executava danças coletivas nas quais predominavam os movimentos convulsivos e desordenados [...] (RIBAS, 1959, p.26).

Dessa forma, a dança em seus primórdios foi utilizava para a sobrevivência, dançavase para a natureza em busca de mais alimentos, água e também em forma de agradecimento. Além disso, foi também vastamente utilizada como forma de rituais religiosos. Entretanto,

com o surgimento do cristianismo, a dança sofreu forte repressão pela igreja, sendo considerada uma prática pagã, mas continuou sendo praticada em comemorações festivas. No século XIII, com o aparecimento do cristianismo, a igreja condenou completamente a dança, apontando-a como uma manifestação pagã. Assim, a dança percorreu outro caminho, perdeu o sentido religioso e passou a ser dança de comemorações festivas, simplesmente. Apareceram as danças camponesas e todo o Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 78 – 91, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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tipo de dança para festejar os eventos comemorativos do ser humano, como casamento, colheita, ganhos, enfim, mas o sentido era outro. Mantevese, porém, o comunal e o participante, não havia ainda espectadores. (AMARAL, 2009, p.01)

No mesmo período citado anteriormente em que a dança sofre um retrocesso e passa a ser utilizada como forma de comemorar festividades, as classes começam a se dividir. Neste mesmo período, as mudanças ficaram mais evidentes e logo ocorreram as divisões baseadas na classe social. Os Aristocratas deixaram de dançar as danças dos pobres. O crescimento de elaboradas regras de etiquetas palacianas e os ideais de amor cortesão fizeram com que a nobreza sentisse que as danças rudes e vigorosas dos camponeses eram inconvenientes, grosseiras e vulgares, para serem dançadas por eles. (AMARAL, 2009, p.02)

Então a dança começa a adquirir um aspecto social e tornando-se mais complexa, passa a ter estudos específicos feitos por pessoas e grupos organizados sendo conhecida como balé. Até então a dança era algo improvisado, só a partir do Renascimento passa de atividade lúdica, de divertimento, para uma forma mais disciplinada, surgindo repertórios de movimentos estilizados. O século XVII é considerado o grande século do balé, saindo dos salões e transferindo-se para os palcos, provocando mudanças na maneira de se apresentar surgindo, assim, os espetáculos de dança. É nessa parte da história que o ballet toma todos os olhares, complicando a Dança de domínio do povo para ser uma Dança de domínio de quem poderia se manter dela, escapando dos cortesãos “amadores” para agora tornar-se a ocupação de profissionais como o rei Luís XIII; o ballet subiria às cenas mais elevadas do teatro mudando a sua ótica e transformando a sua técnica. Os movimentos dos braços, dos joelhos, os tempos saltados e batidos e logo depois as figuras de elevação, passarão a não ser vistos do alto como na pantomima, mas de frente, horizontal como uma Dança espetáculo. Temos então algumas vezes uma estreita união entre a pantomima e a Dança, o equilíbrio entre representações e passos virtuosismo, mas que dão certo encanto a estes ballets. (DINIZ, 2009, p.09)

E na segunda metade do século XIX mais uma vez a dança sofre uma revolução.

Proposta por Isadora Duncan que provoca uma imensa renovação com uma dança mais livre, mais solta e ligada à vida real. É o nascimento da dança moderna, uma negação da formalidade do balé, onde bailarinos trabalham mais livres, porém não rompem completamente com a estrutura do balé clássico. Os movimentos corporais são muito mais explorados, existe um grande estudo das possibilidades motoras do corpo humano. “Para Isadora a dança deveria acontecer a partir de movimentos naturais do ser humano, obedecer às leis da natureza à espontaneidade e aos sentimentos. (QUADROS, 2012, p.01) Abaixo, nas figuras de 03 à 05, a obra Thought of you.

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Fig.03-05: Ilustrações utilizadas na composição da obra “Thought of you”

Anos mais tarde, especificamente por volta de 1950, surgiu a dança contemporânea, entendida como uma nova forma de pensar a dança e propondo a quebra do virtuosismo, da ideia de espetáculo. Tal tipo de dança questiona o corpo do artista, o espaço, o enquadramento cênico e a posição do espectador. Além disso, uma característica importante da dança Fonte: Site oficial – Ryanwoodart Figura 06: Página da História em Quadrinhos Balés Ilustrados

contemporânea é indagar algo, implicitamente ou não, ao público. Secundariedade com Walter Moser: dançando e ilustrando a modernidade Segundo Moser (1999), a secundariedade se dá quando uma produção cultural é concebida através de dados pré-existentes: Aqui, “secundariedade” será utilizada, sobretudo, para designar um modo de produção cultural que trabalha a partir de um pré-construido cultural, a partir de materiais previamente dados, que já tem um estatuto cultural – não se trata, pois, de “matérias primeiras” pré-culturais – e que podem ser submetidas a toda espécie de transformação. (MOSER, 1999, p.41)

Analisando então os fatos mais marcantes dentro da história da dança, é possível

perceber que a tal sempre foi utilizada como forma de expressão, seja para cultuar os deuses, comemorar festividades, expressar a rigidez, a ciência e o desenvolvimento de técnicas, mostrar movimentos naturais do ser humano ou propor pensamentos e indagações. Em resumo, a dança sempre comunicou algo ou transmitiu uma mensagem. É uma forma adequada de trazer para o corpo os sentimentos interiorizados, e transmitir esses sentimentos a outros. Dessa forma, pode-se perceber o motivo de Ryanwoodart ter escolhido a dança para transmitir seu pensamento e ideologia sobre a complexidade das relações humanas nos dias atuais. E pode-se observar também o motivo de Kotaka ter escolhido continuar se expressando através da dança, apesar de não poder usar seu corpo, escolheu dançar com seus traços. Essa foi a melhor, dentre outras formas de expressão, para transmitir tantos sentimentos. No caso de Ryan, utilizar uma dança para representar a canção que tanto o incomodou, que despertou pensamentos e conclusões em sua mente e o inspirou a criar algo para transmitir todas as suas ideias, foi uma sábia escolha. E no caso de Kotaka, utilizar os quadrinhos para expressar os movimentos que ela estava impedida de realizar, e simultaneamente representar uma história que vem sendo encenada pelo mundo afora a mais Fonte: Por Regina Kotaka, p. 116. Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 78 – 91, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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de 170 anos, dando a possibilidade de deixar a história em si melhor compreendida por sua

fotográficas evoluíram, surgindo assim as filmadoras, e como teria melhor maneira de

narração, e sem perder o encanto da “explosão” de sentimentos garantida pela dança.

registrar uma composição coreográfica do que filmando; cada movimento, inteiramente

Entretanto, a ideia de ilustrar a dança não foi tão inovadora quando parece, pois, desde

registrado. Entretanto, o interessante, foi o fato de o autor da obra Thought of You ter

os primórdios, já podemos considerar a existência de exemplos de primatas que registravam

conseguido ir além do simples registro da dança. Enquanto a maioria se preocupa em executar

através de pinturas rupestres danças que eram utilizadas em rituais de acasalamento, por

os movimentos utilizando o ser humano para suas representações, Ryan resolve dançar

exemplo, a mais antiga imagem da dança, datada de 8300 a.C., encontrada em pinturas de

utilizando riscos ou desenhos. Não se percebe nem mesmo a tridimensionalidade, se tem

uma caverna na província de Lérida, na Espanha, mostra nove mulheres em torno de um

apenas os simples movimentos inacabados e perfeitamente ilustrados. E mesmo Ryan não

homem despido, indicando ritual de fertilidade.

manifestando o interesse de mostrar a face ou semblante dos bailarinos representados, o sentimento deles foi expresso através do desenho, dispensando uma leitura facial para se

Figura 06: Primeiro registro histórico da dança

entender a obra. E analisando essa forma de registrar uma composição coreográfica proposta por Ryanwoodart e Kotaka percebemos mais uma vez a secundariedade presente: Se, tal como Benjamin apresenta aqui para o barroco, o artista considera e trata os destroços do passado não como um obstáculo à sua criação, mas, ao contrário, como um recurso indispensável, e se empenha de fato na sua reutilização como material, falaremos então de uma produção secundária. (MOSER, 1999, p. 40)

Fonte: Revista Galileu, 2002.

Tal pintura chama atenção pois, não deixa de ser uma forma de representar os relacionamentos afetivos, entretanto, em um contexto e tempo diferente. “É secundário um fenômeno que se repete de maneira mais fraca e muitas vezes deformada, tardio no tempo em relação a um primeiro aparecimento.” (MOSER, 1999, p.40) Percebemos então, que as obras tanto de Ryanwoodart quanto de Regina Kotaka são perfeitos exemplos de secundariedade, considerando que os autores se apropriaram de elementos que já eram utilizados dês de o inicio da nossa civilização e que ao longo do tempo foi evoluindo. Assim as obras representam uma composição coreográfica de dança contemporânea, mas que está com uma vasta influência de movimentos oriundos do Ballet clássico. Ryanwoodart em sua obra também aborda, ou transmite uma mensagem de um problema vivido pela sociedade atual.

Através dessa citação, percebemos que, o que os dois autores tanto de Thought of You quanto de Giselle fizeram foi: consideraram o passado como um recurso indispensável, se utilizando da dança como forma de expressão, e dos registros desenvolvidos ao longo de toda a história, se empenhando para que com a reutilização de todos esses materiais fosse possível a criação de uma produção cultural que fizesse sentido para as mentes contemporâneas. Spätzait é um termo, de origem alemã, escolhido como referencial para discursar sobre o adjetivo “tardio”, utilizado no contexto de historiografia cultural. Começarei por associá-lo a um substantivo que já atingiu o estatuto de um conceito historiográfico: Spätzait. O fato de emprega-lo na sua versão alemã pode indicar que são sobretudo historiadores de língua alemã que se serviram dele, mas mostra também meu embaraço de tradutor. Como traduzir Spätzait? “Época tardia” não é corrente, “tempo da decadência” é restritivo demais, “o tempo que chega tarde” literal demais. Trabalharemos, pois, com o termo alemão como a sigla de alguma coisa que resta precisar. (MOSER, 1999, p. 33)

O autor decidiu “recorrer a um certo número de ocorrências do termo Spätzeit, e

Além disso, também é interessante perceber que ao longo da história a dança foi

analisar essas ocorrências atentamente” (MOSER, 1999, p.33). E para que fosse possível

evoluindo, e junto com ela as formas de registra-la. Tem-se diversos registros (como já

desenvolver o artigo em questão, ele decidiu “reagrupar as ocorrências, segundo um número

mencionado anteriormente) de pinturas rupestres, contanto histórias e mostrando como eram

limitado de componentes semânticos que as atravessam, e cuja interação parece ser

suas danças, depois os desenhos foram se aperfeiçoando, quadros e pinturas surgiram, até

constitutiva do termo” (MOSER, 1999, p.33). Dessa forma, os conceitos abordados foram: a

chegarmos às fotografias, que tentavam pegar todos os movimentos. Então as máquinas Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 78 – 91, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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perda de energia, a decadência, a saturação cultural, a secundariedade e a posteridade.

transformou em uma ilustradora, e o outro, um ilustrador que aproveitou da expressão e do

Considerando que segundo Marques:

sentimentalismo dentro da dança para desenvolver as suas ideias.

O significado de uma palavra é constituído de componentes semânticos mínimos, relativamente constantes, que, em seu conjunto, definem um conceito, distinguem conceitos entre si e estabelecem relações conceituais entre as palavras, no plano da substância e da forma do conteúdo. (MARQUES, 2003, p. 71).

Walter Moser diz o seguinte após expor os 5 componentes semânticos em seu texto:

(...) Cada um dos cinco componentes que distingui apresenta uma problemática e um imaginário próprios, que podemos observar em todos os tipos de situações da história cultural. Seu tratamento isolado é relativamente conhecido, por exemplo, o desenvolvimento exclusivo do componente “decadência” leva ao pensamento da decadência. Para poder falar da situação particular do Spätzeit, entretanto, é preciso a co-presença e, mais ainda, a cooperação dos cinco componentes. (MOSER, 1999, p.47).

Concluímos que, de fato, os cinco componentes são propostos para serem trabalhados

juntos. Entretanto, uma abordagem nos interessou com relação ao componente denominado de Secundariedade: Se, tal como Benjamin apresenta aqui para o barroco, o artista considera e trata os destroços do passado não como um obstáculo à sua criação, mas, ao contrário, como um recurso indispensável, e se empenha de fato na sua reutilização como material, falaremos então de uma produção secundária. (MOSER, 1999, p.40)

Dessa forma, decidimos no seguinte texto abordar a relação da Secundariedade com a

construção da obra de Ryanwoodart, Thought of you e com a obra de Regina com o clássico Giselle. Isso porque a secundariedade é o elemento que mais se associa ao tema aqui

Referências bibliográficas BRANDÃO, Carlos. Modernidade qua sera tamen: Modernism quae sera tamen, p.215, Dissertação – Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2005.

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MOSER, Walter. Spätzeit. In: MIRANDA, Wander Melo (Org.). Narrativas da modernidade. Belo Horizonte: Autêntica, 1999

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proposto, e considerando que o próprio autor, Walter Moser, reconhece a utilização desses componentes separadamente, apesar de afirmar que dessa forma não será trabalhado o Spätzeit de maneira plena, me arrisco em abordar a Secundariedade na análise da ilustração proposta. Considerações Finais Para o desenvolvimento do artigo buscamos ampliar visões e selecionamos dois exemplos de pessoas com caminhos opostos, mas que enxergaram uma integração das duas artes, transitando “entre o universo efêmero da dança e a magia das ilustrações”12 como a melhor maneira de se expressar e transmitir as suas mensagens. Uma bailarina profissional que como alternativa para continuar seguindo com a dança recorreu aos desenhos e se 12

Fonte: Giselle 1. Acesso em: 20.08.2015 <https://www.youtube.com/watch?v=ywIbURqvw6U>

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Introdução A arte de ilustrar de Marcelo Xavier: percepção por trás das ilustrações Fernandes1

Auxiliadora Maria Denisia Alves Ribeiro Resumo expandido

Este trabalho teve como objetivo contribuir para o estudo e pesquisa das ilustrações a partir de massinha para modelar do ilustrador e autor de livros infanto-juvenil Marcelo Xavier. Fazendo uso de massa plástica colorida para modelar, criar e ilustrar seus livros Xavier aguça a percepção visual através de suas ilustrações ricas em detalhes. A universalidade das ilustrações de Marcelo Xavier está presente na técnica de modelar com massinhas coloridas recorrendo a um passado que nos remete ao barro e a argila, expandindo à modernidade da fotografia que é usado para registro final dos seus cenários. Com seu gênero inusitado e sua arte de ilustrar diferenciada de todas conhecidas até hoje, cria suas ilustrações e cenários tridimensionais para imagens em fotografias que tem caráter além de ilustrativo; também caráter narrativo. A imagem narrativa que XAVIER sugere é possuída de uma imantação de magia e encantamento para crianças e adultos. Essa imantação que agrada e estimula a memória visual das crianças esta sempre presente nas formas, cores e luz pela visão de XAVIER. Narrativa e ilustração caminham juntos. O artista apresenta e valoriza o ardor nacionalista, com personagens, objetos, cores, uma autêntica ilustração mineira e brasileira. Além de pesquisas nas suas obras, enfatizando o livro “O dia a dia de Dada”, foram também coletadas informações com crianças que fizeram oficinas de massinhas o que foi possível observar como se dá a leitura visual infantil. Palavras-chave: Ilustração; Marcelo Xavier; percepção; universalismo.

Estudantes de Artes Visuais Licenciatura da Escola de Design UEMG - Universidade do Estado de Minas Gerais, Escola de Design, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Trabalho orientado pelos professores Eliane Meire Soares Raslan e André Borges da ED/UEMG. E-mail: <cicifernandez@gmail.com>; <denisaaribeiro@gmail.com>. 1

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 92 – 105, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. Texto recebido: 13.05.2015. Texto aprovado: 09.08.2015. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Este estudo busca compreender a relação das imagens em livros infantis, abranger informações e dados a respeito da ilustração, os aspectos cognitivos, psicológicos, pedagógicos e emocionais que provoca nas crianças e a percepção às imagens de ilustração de Marcelo Xavier2. Para tanto se fez necessário elaborar a análise de ilustrações de livros de Marcelo Xavier, ganhadores de vários prêmios: O dia a dia de Dadá – “Prêmio Luís Jardim – O melhor livro de imagens”, de 1987, concedido pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil; Tem de tudo nesta rua – Prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte) Melhor Livro Infantil 1990; Asa de Papel – Prêmio Jabuti Melhor Ilustrador 1994; Prêmio Ofélia Fontes o Melhor para Crianças pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil; Prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte) Originalidade em Literatura Infanto-Juvenil; eleito um dos dez melhores livros de imagens do Brasil pela IFLA (International Federation of Library Associations), em 2013; Construindo um sonho – prêmio de Melhor livro de Imagem pela Associação Brasileira de Escritores; Prêmio Adolfo Aizen – Livro sem texto – UBE – 1997; Festas – Melhor Livro Informativo – 2000, Prêmio concedido pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil; Prêmio Jabuti – 2001, Melhor Ilustração Infantil ou Juvenil, concedido pela Câmara Brasileira do Livro; Indicação ao Prêmio TIM de melhor capa de CD – “Oiapok Xuí” – Grupo Uakiti, em parceria com o fotógrafo Sylvio Coutinho – 2006. Prêmios estes altamente respeitáveis, que servem de padrão e referência para o público brasileiro e de direcionamento a essas análises. Em livros e em outros meios de aplicação de ilustrações o exercício da arte de narrar e descrever por meio de belas imagens forma um elo sólido e autêntico entre o ilustrador e o leitor. Entendemos que seja uma condição para que o ilustrador seja um artista. A ilustração possui sua própria linguagem e sintaxe, mas acima de tudo porque trabalha com o público de psicologia própria. Na arte dos grandes mestres, Marcelo Xavier se posiciona onde há um encontro daquilo que não é, mas passa a ser. Uma espécie de animismo visual, que é a essência Fonte: site Marcelo Xavier. Disponível em: <http://www.marceloxavier.art.br/mx/> Acesso em: 20 junho 2015.

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da arte de ilustrar. Aquilo que o artista vê, em outras palavras, seu mundo tangível, será

plástica, montados em pequenos cenários e fotografados.

sempre básico e o fundamental para sua criação. O ilustrador não ignora a natural

infância modelando com barro no interior de Minas Gerais, é responsável por toda a sua

aparição daquilo que ele não esta vendo. Pode-se então concluir que o trajeto criativo se

influência artística mineira dos seus personagens e cenários. As ilustrações de Xavier

origina no ver, para, logo a seguir, chegar ao não visto. A gênese da criação no ver se

proporcionam a quem a ver, momentos prazerosos de despretensiosa atenção de

justifica pelo fato de que a realidade é sempre muito mais imaginosa que a criação. A

observação e fruição estética; através do olhar aprende-se formas e cores em sua

preocupação com a imagem, com a configuração gráfica de um livro, não deve apenas

ocupação espacial, a matéria plástica usada em sua forma de apresentação, seus modos

ser entendida como recurso estetizante apoiado em questões mercadológicas ou na

de expressar sentimentos ou apresentar lugares, situações e idéias. Experimenta-se a

utilização maneirista e superficial da computação gráfica. A imagem de um livro no

criatividade e pensamentos dos seus livros, apesar da restrição aos textos escritos,

psiquismo de uma criança pode se estender por toda a vida adulta, tornando-se um

quando também não há. A capacidade de contar histórias através dos personagens,

indissipável vestígio na memória. A imagem é muito mais pregnante do que qualquer

lugares e cenários moldados através apenas da ilustração de massinhas encanta todos

palavra. Portanto, diante desse quadro, os ilustradores e projetistas gráficos tem uma

com seu modo de estender-se às coisas da vida, ou melhor, as coisas como são vividas

grande responsabilidade: criar não apenas a memória e o passado visual de seus leitores,

pelo seu modo simples e de conteúdos tão intensos. Exemplo: as ilustrações do “ O dia-

mas acima de tudo formar e educar o olhar.

a-dia de Dada”, 1988 que estreou com seu primeiro livro para crianças.

A qualidade da arte da ilustração começou quando muitos ilustradores

A volta ao passado na sua

Fig. 01: Ilustração “O dia a dia de Dadá”, por Marcelo Xavier

possuíram um modo de representar e interpretar textos através de imagens que se identificam com o aspecto codificado e previsível das ilustrações. De uma maneira desigual, eles se aventuraram a desenvolveram suas carreiras ilustrando os gêneros literários para crianças e jovens usando soluções gráficas com seus próprios estilos. A fidelidade ao real e necessidade do encantamento se passa entre uma região fronteiriça e movediça entre os objetos e a transmutação dos mesmos para universos imaginários. A fotografia quando surge torna-se um hiper-realismo para a arte de ilustrar, transferindo a linguagem (foto) para outra (ilustração), o ensaio fotográfico na ilustração reproduz a impossibilidade do factível, do ilusionismo verdadeiro, prestidigitação dos objetos, em outras palavras, a ausência da figuração do inexcrutável tão próprio da obra do artista da ilustração e de outros que representam o real e maravilhoso modo indivisível. A foto expressa uma realidade direta, desenvolve e estimula os aspectos narrativos e subjetivos de uma configuração conclusiva e contundente que possui. A narrativa fica circunscrita ao factual. A história da ilustração vem sendo, há um tempo, motivo de imagens inaugurais e narrativas pela presença única da ilustração. Marcelo Xavier nos convida para histórias e cenários criados por ele com ilustrações tridimensionais feita com massa plástica colorida. O trabalho com ilustração tridimensional, que desenvolve desde 1986, é uma síntese de tudo isso: personagens e objetos de cena são moldados em massa

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Fonte: Capa do livro O dia a dia de Dada, 1987

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O livro de imagens (fig. 01) tem ilustrações criadas por Marcelo Xavier, com

Fig.03-04: Ilustração Marcelo Xavier

fotografia de Gustavo Campos e de Waldir Lau. Recebeu o “Prêmio Luís Jardim – O melhor livro de imagens”, de 1987, concedido pela

Fundação Nacional do Livro

Infantil e Juvenil; selecionado para o programa “Fome de Livro”, da Fundação da Biblioteca Nacional; selecionado para o PNBE 2005; selecionado para o Salão Capixaba – ES/2005; obra indicada ao Prêmio Jabuti Melhor Produção Editorial de Obra em Coleção 1988. Nos trabalhos de Xavier observa-se o universalismo do autor e ilustrador, através da exploração dos arquétipos e das mais remotas tradições mineiras. O sentido de sua ilustração ultrapassa os interesses locais de seu país e passa a interessar o mundo todo ou parte dele. A cena do café da manhã da personagem Dadá representa uma cena típica com características do cenário mineiro: as louças sobre a mesa, o café, o bolo e a presença reunida em volta da mesa dos personagens da vida cotidiana de Dadá; Dadázinha e o gato (fig. 02). Essa reunião matinal e suas características representa toda a brasilidade e mineiridade presentes nas famílias mineira o que o torna universal. Fig.02: Ilustração “Dadázinha e o Gato”, por Marcelo Xavier.

Fonte: Livro O dia a dia de Dadá, 1988. Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 92 – 105, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Fonte: Livro, O dia a dia de Dadá Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 92 – 105, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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O trabalho de ilustrações de Marcelo Xavier possibilita um encontro de sua

adolescência em Belo Horizonte. O ponto agora é o final dos anos 70. Divido um ateliê

arte enquanto individualizada e única transpondo para o universalismo comparando com

com o amigo Mário Vale. Começamos uma conversa sobre arte, na saída da faculdade,

os pensamentos do filosofo e escritor Walter Benjamin. (1936). Para o autor “as

que nunca teve fim. Nessa época, os ateliês mais alternativos, na zona Sul de BH, se

técnicas de reprodução das obras de arte, provoca a queda da aura, promovem a

escondiam nos barracões de fundo de casas. Eram os porões de nossas inconfidências.

liquidação de elementos tradicionais da herança cultural; esse processo contém o germe

Lá fora, as botas da ditadura ameaçavam pisar nossos pescoços e suas tesouras, cortar

positivo possibilitando o encontro com a arte individualizada e única.”A Obra de Arte

nossas asas. Dos portõezinhos para dentro, a gaiola se abria e voávamos. Visitávamos a

na Era de sua Reprodutibilidade Técnica). A citação de BENJAMIN está presente

arte de todos os tempos, investigávamos a estética e criávamos. Ainda, Xavier afirma

claramente na entrevista de Marcelo Xavier:

que eram cenários, figurinos e adereços para espetáculos de teatro, música, dança e

Sempre tive uma queda por matérias insólitas, que se encontram fora das muralhas da nobreza. Lápis de cor, papel, massa de modelar, isopor, caneta Bic, spray. Gosto de sua disponibilidade, de seu despojamento, de sua despretensão. Procuro tê-los por perto como lição de simplicidade e como lembrança de que a permanência eterna, seja do que for, é uma ilusão”. (MARCELO XAVIER)3

A disparidade que ocorre quando se diz a liquidação de elementos tradicionais

da herança cultural se tange quando ao mesmo tempo rompe com a arte “aura”, mas ao mesmo tempo engrandece, enobrece quando Xavier insiste na permanência da lição de simplicidade e lembrança eterna como elemento tradicional de sua herança cultural. Xavier ainda completa: “Num belo dia de 1986, uma bola de massinha caiu do céu e me atingiu em cheio. Misturei-me a ela e saímos rolando pelo mundo das histórias infantis, das ilustrações tridimensionais e exposições. Essa bola cresceu e, hoje, rola pelo Brasil em oficinas de modelagem e, fora do país, nas traduções de alguns títulos em inglês, espanhol e japonês”. Essa “bola” que cresceu rolando pelo Brasil e fora do país exemplifica o universalismo presente nas ilustrações de Xavier que conquistou o mundo.

carnaval. Peças gráficas, programação visual e ambientações. A cidade me fascina. A possibilidade de intervir em seu corpo é instigante”. Uma análise mais atenta das ilustrações e dos cenários criados por XAVIER traz à tona o cuidado do ilustrador em não só mostrar os personagens da cena brasileira, mineira e também regionalista do Brasil mas também como evidenciar o fascínio, fantasia, cores e imaginação exercido por sua criação. Nas imagens que compõe o cenário de suas ilustrações percebe-se a presença de elementos que marcam seu “traço” (sua modelagem), as formas e cores. Observa-se a presença quase constante de cores vivas e contrastantes e um predomínio do amarelo, verde e azul que fazem referência ao Brasil e as cores da bandeira brasileira vistas pelo olhar do ilustrador. Ocorre uma interação entre os personagens, folclore, fantasia, cores e ao mesmo tempo com o realismo. Vale notar também que essa conexão se dá através da ilustração de situações com conexão direta com o tema abordado no livro. Um ou mais personagens em ação, objetos postos em relação num lugar em acontecimento: essas são as condições essenciais para colocar histórias em andamento.

Os panoramas anunciam uma revolução no relacionamento da arte com a técnica e são, ao mesmo tempo, a expressão de um novo sentimento de vida. O morador da cidade, cuja supremacia política sobre o morador do campo tantas vezes se manifesta ao longo do século, tenta trazer o campo para a cidade. Nos panoramas, a cidade se abre em paisagem, como mais tarde ela o fará, de maneira ainda mais sutil. (BENJAMIN, 1991)

Fig:05 Ilustração de Marcelo Xavier

No posfácio do trabalho “Caderno de Desenhos” de Marcelo ele nos conta uma

trajetória que nos faz refletir sobre o sentimento da vida, um paralelo entre o interior e a cidade, o panorama visual de ambas: “Vamos entrar nesta história com o filme pela metade. Já se foi a infância em Vitória, as férias na cidade natal, Ipanema, em Minas e a Fonte: Site Marcelo Xavier. Disponível em: http://www.marceloxavier.art.br/mx/ Acesso em: 12/05/2015

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Fonte: Livro Truques coloridos, 1993

A composição dos elementos da ilustração numa configuração espaço-temporal confere narrativa à imagem. Nos livros de XAVIER a imagem é a condutora principal da narrativa, nem sempre acompanhada de textos escritos. Apesar de mais aberta em suas formas de leituras, a narrativa visual; nesse caso, é trabalhada também a partir da ferramenta verbal, semelhante a um roteiro, que organiza as seqüências de idéias imagéticas a partir de noções consensuais ou de bom senso, tornando possível várias leituras e compreensões. O ilustrador é ao mesmo tempo autor, e uma característica específica desse trabalho é a possibilidade que artista tem de criar uma história a partir de coisas que ele gosta de desenhar e modelar. A atitude fundamental e principal do criador de ilustrações é adotar o texto, narrativa ou história (sem texto) que será contada, desenvolver uma empatia e afinidades, aprendendo o máximo de seus possíveis, tornando-os visíveis e capazes de criar mais visibilidade, acolhendo a imaginação do leitor e contribuindo com o prazer de ver. XAVIER nas suas escolhas que faz para ilustrador demonstra usar empatia, afinidades entre seus conceitos, sentimentos, experiências e emoções. Suas narrativas visuais fabulosas e fantasiosas por vezes escapam ao realismo, mas ao mesmo tempo buscam ou criam uma percepção impregnadas de elementos culturais nas suas imagens Fonte: Livro Tem de tudo nessa rua, 1990.

Fig.06 Ilustração de Marcelo Xavier

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visuais. São ilustrações com vida, cores, fantasias e belezas que formam as imagens dos livros de Xavier. As imagens, assim como as histórias, nos informam. Aristóteles sugeriu que todo processo de pensamento requeria imagens. “Ora, no que concerne á alma humana pensante, as imagens tomam o lugar das percepções diretas; e, quando a alma afirma ou

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nega que essas imagens são boas ou más, ela igualmente as evita ou persegue. Portanto

cima do livro “O dia-a-dia de Dada” de Marcelo Xavier. Foi proposta a realização da

a alma nunca pensa sem uma imagem mental”. Uma linguagem feita de imagens,

oficina em três etapas: 1-Interpretação da história, 2- Produção de texto de cada cena, 3-

traduzidas em palavras e de palavras traduzidas em imagens é um meio das quais se

Reprodução de uma das cenas da história, feito por massinhas.

tenta abarcar e compreender a própria existência humana. As imagens que formam o

Os comentários foram os mais variados possíveis: “Não consigo fazer isso, já faz

mundo são símbolos, sinais, mensagens e alegorias, ou talvez, a presença que

muito tempo que não mexo com massinha. Sabia fazer isso quando era menor”, Milena,

complementa os desejos humanos, as experiências, questionamentos e remorsos.

10 anos. “Nós não somos artistas né? Mas estamos nos saindo muito bem”, Marcos, 9

Qualquer que seja o caso, as imagens, assim como as palavras, são a matéria do que

anos. “Foi difícil, mas criativo”, Carolina, 9 anos. “Esse autor; o Marcelo Xavier é

somos feitos. Qualquer imagem (ilustração) admite tradução em uma linguagem

muito criativo, ele gosta do que faz, pois dá muito trabalho fazer isso tudo” Pedro, 9

compreensível, revelando ao espectador (leitor) aquilo que podemos chamar de

anos.

narrativa da imagem tão evidente nas ilustrações dos trabalhos de XAVIER.

Fig:07-10: Oficina de massinha

A escrita que os antigos sumérios acreditavam poder ler nas pegadas dos pássaros sobre a lama do rio Eufrates exemplifica o quanto a imagem pode ser traduzida em palavras. Formalmente, as narrativas existem no tempo, e as imagens, no espaço. A forma em suas representações, é aquilo que ela é em nos: apenas um artifício para comunicar idéias, sensações, uma vasta. Poesia. Toda imagem é um mundo, um retrato cujo modelo apareceu em uma visão sublime, banhada de luz, facultada por voz interior, posta a nu por um elo celestial que aponta no passado de uma vida inteira. Para as próprias fontes de expressão. (TROELSEN, 2009)

Nossas imagens mais antigas são simples linhas e cores borradas. Antes das figuras de antílopes e de mamutes, de homens a correr e de mulheres férteis, riscaram traços ou estampas das palmas das mãos nas paredes das cavernas para assinalar a presença humana, para preencher um espaço vazio, para comunicar uma memória ou um aviso, para ser humanos pela primeira vez. Por “mais antigas”, querendo dizer “mais novas”; aquilo que foi visto pela primeira vez, no alvorecer mais remoto das memórias, as imagens surgiram para nossos ancestrais puras e portentosas, incontaminadas pelo hábito ou pela experiência, livre da vigilância da crítica. Ou, talvez, não completamente livres, como sugeriu Duarte e Cardeal (2015): Quando o rubor de um sol nascente caiu pela primeira vez. No verde e no dourado do Éden, nosso pai Adão sentou-se sob a Árvore, e com um graveto, riscou na argila; E o primeiro e tosco desenho que o mundo viu foi um júbilo. Para o coração vigoroso desse homem. Até o Diabo cochichar, por trás da folhagem: É bonito, mas será arte? (DUARTE e CARDEAL, 2015)

Outra pesquisa para análise utilizada nas ilustrações de Marcelo Xavier foi uma oficina de modelagem realizada com crianças da Escola Municipal Professor Cláudio Brandão com idade de 09 e 10 anos, na data do dia 10 de junho de 2015, trabalhado em Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 92 – 105, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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As ilustrações de M XAVIER tem como função tornar perceptíveis os objetos, os personagens, as cenas e a história. Essas ilustrações possuem um universo de formas e cores que deve ser preservado. As tecnologias contemporâneas de produção de imagem não possuem, por seu próprio caráter, fontes culturais definidas. Em função da massificação permissiva e mercantil dos objetos visuais, e mesmo da arte, que pode ser feita de “qualquer coisa” e, na verdade por um alguém qualquer, nossos olhos se afogam em um caos visual. M.XAVIER extravasa suas ilustrações para o universalismo presente em todas as suas obras. O cuidado que ele tem em analisar a estética infantil alimenta a fantasia da infância ou acorda a criança que esta dentro de cada leitor. M XAVIER é um artista plástico ,escritor, autor e ilustrador que faz com que a imagem dialogue com clareza, justeza e precisão. Há um cuidado com a infância e fantasia. Ocupa um espaço que faz da fantasia um lugar na infância tornando-o Fonte: Foto/Sonia Petteson /junho 2015 Escola Municipal Profº Cláudio Brandão

Considerações Finais Na relação entre a ilustração de M XAVIER e a história esta clara a coerência das imagens seja por interação com texto ou apenas a narrativa ilustrativa. XAVIER busca elementos impregnados de cultura e vivência, pessoalidade, personalidade e imaginação. É fácil se encantar com suas ilustrações tridimensionais, o ilustrador é ao mesmo tempo autor, e uma característica específica do seu trabalho é a possibilidade que este artista tem de criar histórias a partir do que ele gosta que é modelar. Sua extraordinária tridimensionalidade expressiva, ajudam-no a contar visualmente de forma convincente suas narrativas. Estendendo mais esse conceito, percebe-se que o domínio de sua tridimensionalidade é básico no ato de contar histórias, e que não há dúvidas à necessidade desse domínio. As narrativas caminham melhor num espaço tridimensional do que num espaço conceitual. O singular nacional de M XAVIER se localiza na sua visão subjetiva que o ilustrador tem de si mesmo e da sociedade na qual esta inserido. A presença da cor, da luz, a etnia do povo, a natureza, cultura, os mitos e crendices brasileiras compõe o cenário mineiro. A nacionalidade cultural de Marcelo Xavier esta presente além das ilustrações multi-coloridas, mas também no tom pessoal dado pelo ilustrador a essa cor. Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 92 – 105, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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O Menino Maluquinho: construção de uma linguagem nostálgica com base no papel do design

Cartazista, jornalista, teatrólogo, chargista, caricaturista, escritor e ilustrador, tudo isso em uma só pessoa: Ziraldo Alves Pinto (junção do nome de sua mãe Zizinha

Cíntia Maria Santana Figueiredo,1 Hemili Luize Neves2 Pâmela Carine de Sousa Miranda3

e de seu pai Geraldo), nascido em 24 de outubro de 1932, em Caratinga, Minas Gerais. O contato com os livros veio através de seu pai que trazia aos montes de um internato em que tomava conta. Desde pequeno ler e desenhar eram suas paixões, sua mãe sempre deixava que ele desenhasse nas paredes e até gostava de exibi-los para as pessoas, não é atoa que com apenas seis anos de idade (1939), seu primeiro desenho

Resumo Expandido

foi publicado no jornal A Folha de Minas.4 Fig.01: Ziraldo.

Fig.04: A Turma do Pererê.

Este artigo identifica a importância de uma ilustração infantil na construção de uma base referencial para reviver momentos de uma vida. O estudo aborda a história literária de Ziraldo em sua obra O Menino Maluquinho e destaca a necessidade humana de reviver acontecimentos do passado no presente. Essa relevância temporal está atualmente expressa no estilo de vida da população e nos bens de consumo, que são baseados em tendências de um passado recente e provam que o papel do design para fundamentar produtos de qualidade e direcionados é necessário. A escolha dessa obra brasileira para o artigo visa evidenciar nossa cultura artística e demonstrar como a linguagem ilustrativa, pode contribuir para compreensão de uma sociedade tão multicultural como a nossa. A busca por uma ligação com o passado pode ser refletida nos produtos de design, que se destacam por suprir uma necessidade humana de nostalgia por aquilo que viveu e visa manter presente um pouco de sua história pessoal. Tendo em vista esse elo temporal entre o passado e presente, podemos destacar, portanto, que a existência da personagem de Ziraldo e o design são partes consideráveis de uma construção pessoal referente às tendências como o Vintage o Retro Style. Palavras-chave: Ziraldo; Literatura infantil; Design; Nostalgia.

Fonte: Jornal do Brasil, outubro de 2011.5

Fonte: Biografias e Coisas, outubro de 2012.6

Ziraldo iniciou sua carreira profissional nos anos 50 em jornais e revistas de Ziraldo, o ilustrador

Estudante do curso de Design de Produto noite da Escola de Design da UEMG Universidade do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil. Este trabalho foi orientado pelos professores Eliane Meire Soares Raslan e André Borges da ED/UEMG. E- mail: cintia.figueiredo17@gmail.com 2 E- mail: hemililuize@yahoo.com.br 3 E- mail: pamelasousa.miranda@gmail.com 1

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 106 – 118, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. Texto recebido: 20.05.2015. Texto aprovado: 10.10.2015. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

destaque no país. Trabalhou em jornais como Jornal do Brasil, O Cruzeiro, Folha de Minas e em revistas expressivas como Visão, Flairplay e A Cigana. Em todas as COLÉGIO WEB. 80 anos de Ziraldo. Disponível em: <http://www.colegioweb.com.br/ziraldocuriosidades/80-anos-de-ziraldo.html> Acesso em: 19 junho 2015.

4

Fonte: JORNAL DO BRASIL. Os 79 anos de mestre Ziraldo. Disponível em:< http://www.jb.com.br/anna-ramalho/noticias/2011/10/25/os-79-anos-de-mestre-ziraldo/> Acesso em: 19 junho 2015. 5

Fonte: BIOGRAFIAS E COISAS.COM. A Turma do Pererê. Disponível em: <http://desmanipulador.blogspot.com.br/2012/10/a-turma-do-pererepersonagens.html> Acesso em: 19 junho 2015. 6

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 106 – 118, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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instituições privadas citadas anteriormente, Ziraldo possuiu trabalhos publicados. No

A partir de 1968 tem trabalhos publicados em países estrangeiros como

decorrer dos anos a visibilidade do seu talento foi sendo reconhecida e seus

França, Inglaterra e Estados Unidos. Foi o primeiro artista latino a ser convidado para

personagens foram se destacando. Entre eles os quadrinhos para adultos, The

desenhar o cartaz da Unicef, desenhou também no Canecão (Rio de Janeiro) um mural

Supermãe e Mineirinho – o Comequieto.

para a inauguração da casa de show em uma parede de mais de cento e oitenta metros,

Na década de 1960 ele publicou a primeira revistinha em quadrinhos feita por um só autor/ilustrador, A Turma do Pererê, que segundo Ziraldo fazia parte do desejo

ilustração que foi reproduzida por várias revistas do mundo. Revistas como Playboy e GQ utilizam alguns de seus desenhos como capa.

de um Brasil novo. A revista era de cunho nacionalista e que teve seu fim em 1964 por causa da ditadura militar. Durante esse período ele, junto com outros humoristas fundou o jornal O Pasquim e depois de decretado o AI 5 foi preso e levado para o forte de Copacabana.7 Fig.02: Ilustração de Ziraldo - A Supermãe.

Fig.05: Parede do Canecão.

Fig.06: O Menino Maluquinho.

Fig.03: Ilustração de Ziraldo - Flicts.

Fonte: Site da UFRJ, janeiro de 2015.10

Fonte: Site Colégio Web, outubro de 2012.11

A sua verdadeira paixão é escrever para crianças, gosta do cuidado e do zelo em que ele prepara um livro infantil, segundo ele é o público em que a resposta vem de imediato, as crianças são sinceras e ficam encantadas com a oportunidade de poder Fonte: Site Adorocinema, maio de 2013.8

conversar com o próprio autor. Seguindo essa linha, podemos citar como livros mais

Fonte: Site Os Colunáveis, maio de 2015.9

conhecidos: Flicts, O Planeta Lilás e o que mais vai nos interessar nesse momento, O Menino Maluquinho, que foi e ainda é um grande sucesso. Transformado em tirinhas, filme, série, e até em ópera infantil, Ziraldo atribui seu sucesso pelo fato dele se

SARAIVA CONTEUDO. Entrevista com Ziraldo. Disponível <https://www.youtube.com/watch?v=dPOwdsu4K_o > Acesso em: 19 junho 2015.

7

em:

Fonte: ADOROCINEMA. Exclusivo - Diler Trindade prepara novo filme do menino maluquinho: Personagem criado por Ziraldo já foi adaptado duas vezes para o cinema. Disponível em: <http://www.adorocinema.com/noticias/filmes/noticia-102906/> Acesso em: 19 junho 2015. 8

Fonte: OS COLUNÁVEIS. O Dia em que morreu Flicts. Disponível em: http://oscolunaveis.com.br/vida/dani-cruz/o-dia-em-que-morreu-flicts/> Acesso em: 17 julho 2015. 9

<

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colocar no lugar da criança e pelo livro não dizer como uma criança deve ser. Fonte: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO. UFRJ cria laboratório público para restaurar mural de Ziraldo no antigo Canecão: Histórico e estado do painel. Disponível em: <http://www.ufrj.br/mostraNoticia.php?noticia=15350_UFRJ-cria-laboratorio-publico-para-restaurarmural-de-Ziraldo-no-antigo-Canecao.html> Acesso em: 19 junho 2015. 10

COLÉGIO WEB. 80 anos de Ziraldo. Disponível em: <http://www.colegioweb.com.br/ziraldocuriosidades/80-anos-de-ziraldo.html> Acesso em: 19 junho 2015.

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As técnicas de Ziraldo Um dos processos de trabalho de Ziraldo foi comentado recentemente em uma entrevista cedida para um portal de notícias online, onde ele afirma que quando vai escrever um livro, a história vem primeiro, o desenho vai surgindo espontaneamente. Quando faço um desenho para cartum, por exemplo, desenho primeiro a lápis. Nunca fiz direto à tinta. Eu me preocupo com o layout do espaço, com a expressão da figura. Os meus bonecos se movem anatomicamente. Quando ele está indignado, está indignado com o corpo inteiro (ZIRALDO apud MASSUELA, 2015).

As ilustrações iniciais do O Menino Maluquinho foram feitas em quinze dias, o texto em um mês, o desenho foi praticamente montado: primeiro ele fazia uma parte a mão e depois passava para o computador, desde a primeira vez que O Menino Maluquinho foi desenhado ele já tinha aquele rosto, pois é a única forma que Ziraldo

Fonte: Site Editora Melhoramentos, junho de 2015.13

sabe desenhar menino.Tudo o que ele cria é para narrar uma história, nada é um desenho

por si só.

Ziraldo

afirma

também

que

desenhar é

muito mais

fácil

que

do

escrever.12 Fig.07: Capa Menino

Premiações e relações: o Menino Maluquinho14   

do livro, O Maluquinho.

 

1969: Ganhou o Oscar Internacional do Humor no 32° Salão de Caricaturas de Bruxelas. Merghantealler, prêmio máximo da imprensa livre da América Latina, recebido em Caracas, Venezuela. Tem trabalhos selecionados para fazer parte do acervo do Museu da Caricatura de Basiléia, na Suíça. 1980: Prêmio Jabuti da Câmara Brasileira do Livro, São Paulo. 2004: Ziraldo ganhou, com o livro Flicts, o prêmio internacional Hans Christian Andersen. O inicio da criação de uma das mais marcante e famosa obra literária brasileira

começou no tempo de vigência do Pasquim, um famoso jornal presente na fase ditatorial do nosso país. No ano de 1980, em uma palestra de Ziraldo, surgiu a intenção de criar algo que idealizasse o que seria oposto da relação de convivo entre os pais e filhos da década de 80. Naquela época o autor buscou expressar o quão era

PORTAL UAI. Ziraldo conta como “O Menino Maluquinho. <https://www.youtube.com/watch?v=Vh-GzqaEg1Q> Acesso em: 19 junho 2015.

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Disponível

em:

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 106 – 118, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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13 Fonte: EDITORA MELHORAMENTOS. O Menino Maluquinho. Disponível em:< http://editoramelhoramentos.com.br/v2/titulos/o-menino-maluquinho/> Acesso em: 17 julho 2015. 14 ZIRALDO Site educacional. O Menino Maluquinho On-Line. Disponível em: <http://www.ziraldo.com.br/> Acesso em: 19 junho 2015.

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distante a relação entre gerações e o dito popular que os filhos não compreendiam

de conforto quando recordamos algo do passado recriando as situações desagradáveis

seus pais, uma vez que o próprio Ziraldo mantinha uma boa relação com seus filhos.15

da vida, mas que transforma sombras em risos.17 Fig.08: Ilustração I, O Menino Maluquinho.

Uma das moças presentes gostou do que falei e me sugeriu: ‘Por que você não escreve um livro sobre este tema?’. Argumentei que não era teórico do assunto e que estava apenas dando a minha opinião, [...]. Fiquei com essa ideia de um menino que, por ser feliz, compreendido e amado, criado com carinhos na infância, sem ser sacaneado e chateado pelos pais, tinha grande chance de virar um cara legal. Essa era a proposta que defendia para a criação das crianças e era a ideia que queria para o livro (ZIRALDO apud BRANT, 2015).

Com a criação dessa personagem, rapidamente o livro conquistou diversas gerações, com um peculiar humor, expressão, vestimenta e carisma, O Menino Maluquinho, foi se tornando um ícone literário. Víamos nas histórias um menino que era a alegria da casa, criativo, inteligente, liderava a garotada, era sábio e um grande amigo. Fazia versinhos, canções, uma criança pura e livre das amarras sociais. O traje do Menino maluquinho era diferente das crianças comuns, o que destacava sua personalidade tão marcante era o uso de uma panela na cabeça, paletó e sapatos de seu pai. Ziraldo construiu cada parte do menino maluquinho de forma especial, desde seu nome até a ilustração que daria vida a personagem.16 Se eu botar Renato, o menino chamado Pedro não vai se identificar e viceversa. Melhor não pôr nome nenhum. E aí, de repente, veio vindo a ideia. Era uma vez um menino maluquinho… Ah, Menino Maluquinho é bom porque é pequeno, tem uma coisa de ternura, já que o sufixo -inho, tem essa coisa carinhosa. E maluco não é maluquinho. [...] É uma coisa bem espontânea. Foi surgindo aquela cara, um menino muito cabeçudo em relação ao corpo. E para a capa, como ele era maluquinho – na caricatura, o maluco é o Napoleão Bonaparte –, então fiz um Napoleãozinho com a panelinha na cabeça e a mão dentro do peito. As ilustrações demoraram cerca de 15 dias para serem finalizadas (ZIRALDO apud BRANT, 2015).

Um menino maluquinho que vivia em um mundo maluquinho que encanta crianças e adultos, que nos faz pensar e relembrar a infância. Trazendo uma sensação

Fonte: Site educacional Ziraldo, junho de 2015.

Quando nos lembramos do passado temos a certeza de que as situações que passamos agradáveis ou não, já passaram e algumas vezes as situações desagradáveis que passamos quando lembradas no presente se tornam motivo de relembrar com humor essas situações inusitadas. O que traz certo conforto, pois aquele momento já foi vivido e revela as saudades do tempo que passou. O menino maluquinho era um menino carismático querido por todos, cheio de namoradas e sentimentos, sua personalidade se destacava em suas brincadeiras que restituía a alegria para com ela contagiar a todos. Fig.09: Ilustração II, O Menino Maluquinho.

Fig.10: Ilustração III, O Menino Maluquinho.

BRANT, Ana Clara. Criador do Menino Maluquinho, Ziraldo relembra momentos de sua trajetória. Portal Uai - Divirta-se. Disponível em: <http://divirta-se.uai.com.br/app/noticia/arte-elivros/2014/10/19/noticia_arte_e_livros,160543/criador-do-menino-maluquinho-ziraldo-relembramomentos-de-sua-trajeto.shtml> Acesso em: 19 junho 2015. 15

BRETAS, Angela. Simplesmente Ziraldo... Disponível em: <http://www.casadobruxo.com.br/poesia/a/angelab47.htm > Acesso em: 19 junho 2015. COLÉGIO WEB. 80 anos de Ziraldo. Disponível em: <http://www.colegioweb.com.br/ziraldo-curiosidades/80anos-de-ziraldo.html> Acesso em: 19 junho 2015.

ZIRALDO Site educacional. O Menino Maluquinho <http://www.ziraldo.com.br/> Acesso em: 19 junho 2015.

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 106 – 118, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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On-Line.

Disponível

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Michaelis (2015)18 a palavra retro é o mesmo que “no tempo passado”, quanto a style, termo originado da língua inglesa, seria o mesmo que “estilo” quando traduzida para a língua portuguesa. Vintage significa algo clássico, antigo e de excelente qualidade. Trata-se de um estilo de vida que recupera os estilos dos anos 1920, 1930, 1940, 1950 e 1960, e aplica em vestuário, calçado, mobiliário e peças decorativas (SIGNIFICADOS, 2015).

O evidente crescimento dessas duas tendências reflete uma necessidade humana de nostalgia e justificativa para as frustrações do presente, ao mesmo Fonte: Site educacional Ziraldo, junho de 2015.

Fonte: Site educacional Ziraldo, junho de 2015.

As ilustrações do livro descrevem bem as histórias e invenções de uma criança

momento, em que se deseja conservar suas experiências ao longo dos anos. Um exemplo disso é a personagem de Ziraldo, O Menino Maluquinho, que em suas histórias representa a dualidade de viver no presente e aspirar ao futuro. Quando se

As ilustrações nos levam a relembrar é saborear

desloca essa interpretação para o seu leitor, temos o evidente desejo de retroceder ao

novamente o sabor da infância. A obra foi reproduzida para o cinema, televisão e

passado, mesmo vivendo no presente. Seria como recordar partes da infância, de

teatro e é destaque em algumas campanhas governamentais.

relembrar as idealizações da adolescência espelhadas em seus ídolos e perceber como

pura, arteira e maluquinha.

a transição para a vida adulta ocasionou variações das quais foram planejadas ou não. O design e sua linguagem temporal com o menino maluquinho

Outra forma de se conectar a estas décadas atrás além da forma ilustrativa, seria por via do design, os produtos de consumo são verdadeiras fontes históricas do

Em nossa sociedade a relação temporal do passado com o presente, possui um

tempo para o ser humano.

nítido dialogo entre os valores culturais e expressão individual de cada pessoa.

Esse sentimento de saudade é um dos motivadores para essa presença tão

Quando observamos a transição dos estilos e movimentos de cada década,

significativa dos estilos de Retro Style e Vintage em nossa sociedade atual. Entretanto,

percebemos algumas distinções nos bens de consumo para o ser humano.

deve-se lembrar de quais são os princípios do design, antes de analisar sua

Essa variação no modo de vida é refletida nos produtos e serviços, uma vez que estes servem de parâmetro para análises comportamentais e psicológicas de cada

representação nesse dialogo nostálgico do passado com o presente. Para Lipovestsky (2009):

indivíduo ou grupos sociais. Uma característica invoga atualmente são os estilos:

O design, com efeito, desde a Bauhaus, opõe-se frontalmente ao espírito de moda, aos jogos gratuitos do decorativo, do Kitsch, da estética supérflua. Hostil por princípio aos elementos acrescentados, às ornamentações superficiais, o design estrito busca essencialmente a melhoria funcional dos produtos; trata-se de conhecer configurações formais econômicas definidas antes de tudo por sua “riqueza semântica ou semiológica”. Idealmente, o design não se atribui a tarefa de conceber objetos agradáveis ao olho, mas a de encontrar soluções racionais e funcionais. (LIPOVESTSKY, 2009, p. 193).

Retro Style e Vintage. Ambos são maneiras de se viver e agir com base em princípios de um passado recente ao que vivemos. Para entendermos melhor essas duas atitudes e sua importância para a semiótica e o design, devemos antes conhecer seus conceitos. Retro Style pode ser explicado como um estilo derivado de tendências e costumes do passado. Essa expressão provém do significado individual das duas palavras, assim, de acordo com

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MICHAELIS Dicionários. Retro. Disponível <http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portuguesportugues&palavra=retro> Acesso em: 19 junho 2015. 18

em:

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 106 – 118, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Tendo como base essa pequena introdução ao design, podemos a seguir,

Os objetos são nossa maneira de medir a passagem de nossas vidas. São o que usamos para nos definir, para sinalizar quem somos, e o que não somos. Ora são as joias que assumem esse papel, ora são os móveis que usamos em nossas casas, ou os objetos pessoais que carregamos conosco, ou as roupas que usamos.

abordar como os produtos são referenciais de tempo para sociedade. Ao suprir uma demanda, perante uma necessidade do ser humano, alguns produtos de design estão sendo questionados diariamente sobre sua qualidade, valor e durabilidade em relação

E o design passou a ser a linguagem com que se molda esses objetos e confecciona as mensagens que eles carregam. O papel dos designers mais sofisticados, hoje, tanto é ser contadores de histórias, fazer um design que fale de uma forma que transmita essas mensagens, quanto resolver problemas formais e funcionais. Os designers manipulam essa linguagem com mais ou menos habilidade ou encanto, para transmitir o tipo de história que meu MacKook cochichou no meu ouvido em Heathrow (SUDJIC, 2010, p. 21).

a semelhantes produtos do passado. Os bens que conservamos durante décadas podem ser considerados espelhos de nossas experiências da passagem de tempo. Agora, nossa relação com os novos bens parece muito mais vazia. A atração de um produto é criada e vendida na base de um olhar que não sobrevive ao contato físico. A atração se esvai tão depressa que a paixão acaba quase tão logo a venda é realizada. O desejo fenece muito antes que o objeto envelheça. O desenho industrial começa a aparecer uma forma de cirurgia plástica, algo como uma injeção de botox na testa, suprimindo rugas de expressão para criar uma breve ilusão de beleza. (SUDJIC, 2010, p. 18).

livro O Menino Maluquinho de Ziraldo, demonstra o quão importante é a relação

Anteriormente, os produtos eram a representação fiel das características

temporal para o ser humano. Esses dois meios de conexão, são relevantes para a

prometidas pelas marcas, porém, ao logo dos anos o enfraquecimento desse discurso foi reforçado pela obsolescência programada muito reduzida e os avanços tecnológicos que surpreendem os consumidores por suas atualizações imediatas,

Essa conexão nostálgica dos bens de consumo com o design e a ilustração do

construção de uma história e expressão individual de nossa sociedade. Consideraçãos Finais

quase anteriores aos lançamentos dos modelos, cujo uso é dito essencial para o cotidiano de cada pessoa. Esse pensamento é reforçado por Sudjic, quando o autor explica o ciclo de vida, dos bens de consumo ao decorrer dos anos. Muitas categorias de produtos foram não só transformadas e sim completamente eliminadas. Vivemos um período que, como as extinções dos grandes dinossauros, exterminou os bichos que rodavam a paisagem da primeira era industrial. E no rastro das extinções o processo evolutivo se acelerou tão violentamente que fugiu ao controle. Aqueles objetos industriais que sobreviveram têm um ciclo de vida medido em meses, não mais em décadas. Cada nova geração é surpreendida tão depressa que nunca dá tempo de desenvolver uma relação entre dono e objeto. Só alguns desses objetos inúteis reingressam no ciclo econômico, como parte da curiosa ecologia do colecionismo (SUDJIC, 2010, p. 21).

Essa leitura sobre o papel dos produtos atuais reflete diretamente no posicionamento de consumo e estilo de vida das pessoas, seja pelo Retro Style, o Vintage ou o colecionismo. O relevante em questão é manter viva a memória de experiências passadas e buscar a qualidade dos produtos de design que eram tão

A linguagem gráfica de Ziraldo mudou conceitualmente a forma de concepção dos livros infantis no Brasil. Esse fato teve início no lançamento da obra A Turma do Pererê e cada vez mais se solidificou nas suas ilustrações seguintes. Seu estilo próprio possui como base o nacionalismo cultural e aborda temas como a reforma agrária, ecologia e as aspirações de vida de cada brasileiro.19 Em O Menino Maluquinho pode-se notar nitidamente os riscos pessoais de Ziraldo, seu traço é ligeiro e uma personagem que se expressa anatomicamente de acordo com sua situação emocional. As figuras em preto e branco e as linhas a lápis observadas nas ilustrações do livro denotam a importância da personagem em se relacionar com seu público, pois se assemelha aos desenhos que fazemos quando crianças, cujos traços são simples e denotam sentimentos. É por esse e outros motivos citados anteriormente nesse artigo, que O Menino Maluquinho se tornou uma parte fundamental na história nacional por suas ilustrações e sua narrativa social.

valorizadas anteriormente. O valor cultural e temporal da relação entre os bens de consumo e cada indivíduo, possui grande expressividade em nossa sociedade e é a

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base para se entender o porquê destes estilos se manifestarem.

DIEL, Eliane de Oliveira. História em Quadrinhos – Uma Poderosa Ferramenta Pedagógica. Portal Educação. Disponível em: < http://www.portaleducacao.com.br/educacao/artigos/19466/historias-emquadrinhos-uma-poderosa-ferramenta-pedagogica#!1> Acesso em: 15 agosto 2015.

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 106 – 118, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Referências Bibliográficas

Reconhecimento global com Iain Macarthur: Diversidade e influências do Mangá com Thiago Rojas, Cláudio Seto e Julio Shimamoto

LIPOVETSKY, Gilles. O império do efêmero: a moda e seu destino nas sociedades modernas. São Paulo: Companhia de Bolso, 2009. 347 p. MASSUELA, Amanda. Os homens são destino de Ziraldo. Revista Cult, Portal UOL. Disponível em: <http://revistacult.uol.com.br/home/2013/08/os-homens-sao-destinode-ziraldo/> Acesso em: 20 maio 2015. SUDJIC, Deyan. A linguagem das coisas. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2010. 223 p.

Ana Paula Lima 1 Bianca Gabriel Dias Resumo Expandido Este artigo faz uma análise sobre algumas influências ornamentais em traços de histórias em quadrinhos brasileiras, com os trabalhos de Thiago Rojas, Cláudio Seto e Julio Shimamoto. Ao mesmo tempo trouxemos o ilustrador Iain Macarthur, da Inglaterra, com seu reconhecimento internacional, para abordamos a modernidade. Buscamos o texto Spätzeit de Moser para relacionarmos as obras desses artistas. Tem por objetivo analisar as obras dos ilustradores e relacioná-la com os dois textos. A secundariedade cultural está presente nos trabalhos desses artistas que vivem em meio a um cenário de saturação cultural e que buscam na cultura japonesa inspirações para suas produções artísticas. Abordamos no artigo o estilo de ilustração conhecido como mangá, que surgiu no Japão, e relacionamos à modernidade e a questão do Spätzeit. Discorremos sobre como esse jeito japonês de desenhar influenciou tais artistas fazendo-os pertencer ao Spätzeit e como devido a esse fato, mesmo que atuais como as obras de Iain Macarthur, tais artistas não podem ser classificados como modernos. Palavras chave HQ; Ilustração; moderno; Spätzeit Introdução O artigo apresenta uma análise dos textos Spätzeit e Moderno. Expõe uma reflexão sobre os termos e seus variantes e procura aplicar tais conhecimentos na obra do ilustrador Iain Macarthur e ao mesmo tempo analisando a linguagem das HQs – Histórias em Quadrinhos dos brasileiros Thiago Rojas, Cláudio Seto e Julio Shimamoto. Apresenta os artistas, seus trabalhos e técnicas utilizadas. Faz uma análise e releitura das obras com uma reflexão em cima do spätzeit, ou seja, uma abordagem do tempo atual, moderno e contemporaneidade. Atualmente, temos diversos artistas influenciados pelos traços ornamentais e caem no gosto do mercado global. Estudantes do curso de Design de Ambiente Manhã da UEMG - Universidade do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Trabalho orientado pelos professores Eliane Meire Soares Raslan e André Borges da ED/UEMG. E-mail: apaslima6@gmail.com; E-mail: biancagdias@gmail.com.

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Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 106 – 118, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 119 – 137, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. Texto recebido: 20.05.2015. Texto aprovado: 10.05.2015. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Cláudio Seto Takeguma2 foi o artista precursor do mangá no Brasil. Nascido em

Além de desenhista, Seto foi jornalista, cartunista, agitador cultural em Curitiba e assessor da Associação Brasileira de Designers e Ilustradores de Manga (ABRADEMI). Seu trabalho foi inspirado por artistas japoneses como Esamu Tezuka entre outros. A

Guaiçara, São Paulo, manteve sempre muito contato com a cultura japonesa e com os mangás.

cultura japonesa como um todo, a shibari, arte japonesa dedicada ao bondage e outros artistas

Era descendente de uma família de samurais tendo ido para o Japão aos nove anos de idade.

também influenciaram Seto. Ao longo do tempo, seu trabalho ganhou um estilo mais

Mas foi no Brasil, na década de 60, na editora Edrel que sua carreira começou com grandes

cartunesco sendo publicadas caricaturas e tiras de quadrinhos em jornais como Tribuna do

títulos como “O Samurai”, “Ninja – O Samurai Mágico e Ídolo Juvenil- Flavo”.

Paraná, O Estado do Paraná e Correio de Notícias.

Artistas e técnicas:

O Samurai de Curitiba como é conhecido, faleceu em 16 de novembro de 2008.

Trabalhou também com títulos de humor e infantis, mas se destacou com histórias de samurais os quais abordavam temas adultos como incesto e violência. Ainda na Edrel

Seguindo o estilo e recebendo influencias de Seto e outros artistas, Thiago Rojas (fig.

enfrentou muitos problemas com a censura do Regime Militar por conta dos quadrinhos

02) aborda no site Artecuriforme5 algumas curiosidades sobre a popularidade do mangá no

eróticos publicados pela editora, é nesse momento que Seto cria a Maria Erótica.

Brasil. Esse estilo japonês de desenhar é bastante presente e apreciado no Brasil, uma vez que

Tal personagem será revivida e ganhará revista própria (fig.02) na década de 70

nesse país residem e já residiram descendentes importantes de japoneses ligados à arte, como

quando Seto agora como editor, se muda para Curitiba e começa a participar da editora

Seto, que através da HQ começaram a influenciar gráfica, narrativa e tematicamente seus

Grafipar. Nesse momento outros personagens também são revividos e criados como “Super

trabalhos e divulgando-os espalhou a paixão por mangás por todo o país.

Pinóquio” e “Katy Apache”. Abaixo a HQ (fig. 01) ilustra o trabalho do artista na sua

Fig.03: HQ Thiago Rojas

essência, ao lado, a revista Maria Erótica aonde Seto experimentou outros traços além do mangá. Fig.01: HQ por Cláudio Seto Takeguma

Fig.02: HQ Maria Erótica por Cláudio Seto Takeguma

Fonte: Portfólio Digital Thiago Rojas 6 Fonte: Lambiek3

Fonte: Contraversão4

Fonte: Secretaria da Educação. Arte: Claudio Seto. Disponível em: <http://www.arte.seed.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=257> Acesso em: 25 junho 2015. 3 https://www.lambiek.net/artists/s/seto_claudio.htm 2

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https://www.lambiek.net/artists/s/seto_claudio.htm Fonte: Site Artecuriforme. Thiago Rojas. Curiosidades e Informações. 22.11.2011. <http://artecuriforme.blogspot.com.br/2011/11/manga-conheca-mais-dessa-arte.html>; <http://trartdesign.blogspot.com.br/> 6 Fonte: Portfólio Digital Thiago Rojas. http://trartdesign.blogspot.com.br/2014/11/pag-de-quadrinhosmanga.html 4 5

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Thiago Rojas é desenhista e escritor, de Santo André, São Paulo. Segundo o artista, desenha desde os sete anos e incentivado pela mãe, ganhava lápis, tintas e massas de modelar o que o ajudou a desenvolver sua criatividade. Mais tarde, fez cursos, se formou e começou a trabalhar profissionalmente na área desde 2006. É fundador de uma marca de camisas direcionada para gamers que querem exclusividade. As estampas são únicas e desenvolvidas pelo artista. Em seu trabalho utiliza traços orientais (mangás) mas a toda a criação é sua. Utiliza nanquim, aguada, lápis 6B, lapiseira e photoshop para colorização digital. Trabalha também com óleo sobre tela. Já Julio Shimamoto (fig. 03-04) 7 nasceu em Borborema (interior de São Paulo) possui descendência japonesa e ganhou os primeiros gibis dos pais aos cinco anos. Ficou encantado e começou a rabiscar os desenhos imitando o que tinha visto. Acompanhava as tiras do jornal Estadão que o pai comprava: Mutt&Jeff. Trocava gibis com os coleguinhas na escola e chegou a colecioná-los quando criança. Fig.03-04: HQ e Ilustração por Julio Shimamoto

Fonte: Site oficial de Julio Shimamoto 8

Sua paixão por HQs ajudou a pavimentar a trajetória do horror em histórias em quadrinhos no Brasil. Hoje, a inovação em técnicas de ilustração desenvolvidas por ele inspira jovens talentos e impressiona. Entre as novas técnicas estão: um compasso duplo, tinta-da-

7

Fonte: Site oficial Julio Shimamoto. http://www.julioshimamoto.com.br/

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Fonte: Site oficial Julio Shimamoto. Disponível em: <http://www.julioshimamoto.com.br/: Acesso em: 20 maio 2015. 8

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china com pincéis, imitação de xilogravura utilizando tinta negra sobre azulejo e trabalhada

Formado em 2008 pela faculdade Swindon com uma licenciatura em HND Ilustração,

com estiletes ou raspando o fumo de vela sobre o azulejo; bico de pena com tinta látex branca

descreve seu trabalho como surreal e único. É influenciado por muitos artistas e ilustradores

em cartolina negra; papel recortado e colorido com ecolines; tinta látex branca sobre bexiga

como Alphonse Mucha, Gustav Klimt, Lucian Freud, David Lee Choong entre outros. Sua

vermelha esticada e copiada em fotocópia depois de distorcida; canetas hidrográficas; tintas

inspiração vem também a partir de desenhos de arte e expressões faciais das pessoas, além de

lates e corantes sobre o papel de jornal ou de revista entre outras.

diferentes formas de padrões orgânicos e formas ornamentais.

É conhecido por seus trabalhos no gênero de terror, seu primeiro emprego como

Já participou de diversas exposições, enquanto frequentava a faculdade Swindon

desenhista foi na empresa multinacional “Sears, Roebuck & Co.” (Lojas Sears). Estreou

expôs para os alunos de Ilustração e Design Gráfico. Expôs também na D/AD New Blood

profissionalmente desenhador de BD em 1959 pela Editora Continental/Outubro, onde

Exhibition no Earl’s Court em Londres e uma também em uma exposição sozinho pela

desenhou a primeira história do Capitão 7. Recebeu influências de Jayme Cortez, desenhador

internet no Phone Booth Gallery.

português que emigrou para o Brasil onde veio a ser reconhecido como um dos maiores autores da BD brasileira. Criou a pedido de Maurício de Souza, em 1963 as tiras da personagem Fidêncio, o Gaúcho, para o Suplemento Infanto-Juvenil do jornal Folha de São Paulo. Entre 1961 e 1964

Seu trabalho é conhecido pela abundância de detalhes que quase hipnotizam. Utiliza principalmente lápis, aquarelas e caneta de nanquim.

Cria a partir de rostos de algum

estranho na rua. As pessoas desconhecidas são transformadas em faces surreais. Faz uma releitura sobre os rostos e suas formas usuais através de formas geométricas e efeitos.

Shimanato foi um dos responsáveis pelo movimento de nacionalização dos quadrinhos, ao lado de outras figuras famosas no meio artístico.

Fig.05: Ilustração Explodindo Rosto, novembro 2014

Fig.06: Rosto trabalhado, novembro 2012

Dedicou um tempo a publicidade e na década de 80 voltou aos quadrinhos para várias editoras desenhando e escrevendo HQs de terror, artes marciais e HQs eróticas. É considerado o maior desenhador brasileiro de HQ vivo no Brasil. Em 2008 ilustrou o livro BANZAI! História da Imigração Japonesa no Brasil para as comemorações do Centenário de Imigração Japonesa. Publicou Samurai em 2009, coletânea de historias sobre samurais, ninjas entre outros artistas marciais e Quadrinhos para telefone celular da Operadora Oi. Entre outros trabalhos. Acredita ter sido influenciado no começo por Sid Shores que desenhava Capitão América, e mais tarde cowboys, nos anos 50. Depois vieram outras influências como José Luiz Salinas, Will Eisner, Hugo Pratt e Austin Brigss. Ainda hoje acreditam receber influências de desenhistas marginais, fanzineiros,

Fonte: Site Oficial Iain Macarthur 9

quadrinhos undergound em geral. Além disso, o cinema exerce influencia no trabalho de Shima, como O Último Samurai. Referente ao artista Iain Macarthur, ele nasceu em Swindon, Inglaterra, se tornou fanático por arte assistindo a desenhos animados e histórias em quadrinhos. Logo aos oito anos de idade já sabia que queria trabalhar com desenhos. O primeiro livro em quadrinhos criado por ele foi a partir da série Batman e desde então esse é obcecado por arte e tem a sorte de trabalhar com o que ama, unindo a sua paixão às técnicas e bastante profissionalismo. Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 119 – 137, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Além das obras próprias que é o que mais gosta de fazer, também desenha para camisas, impressões, cartazes, arte de álbum, logotipos, branding e ilustração editorial. Já trabalhou para grandes empresas como Nike e MTV. Tais artistas trazem em comum a paixão pelas HQs desde criança. Prova de como a cultura japonesa influenciou a vida de todos esses artistas e deu rumo para a vida profissional desses como desenhistas. Suas obras mostram claramente inspirações vindas da cultura 9

Fonte: Site oficial Iain Macarthur. http://www.iainmacarthur.com/

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japonesa principalmente dos mangás. Traços, temas e técnicas inspiradas nesse estilo de

e talvez supersaturado desses objetos, e de fragmentos de objetos que os ancestrais e os

desenhar tão popular no Japão. A descendência japonesa de Seto e Shima é outro ponto em

antecessores legaram aos descentes.”.

comum e aliada a permanência deles no Brasil, foi de extrema importância e enriquecimento para que a disseminação da cultura de mangas tomasse uma amplitude maior. Seto destaca-se ainda como sendo o precursor dos mangás no Brasil e em1984 foi criada a Associação Brasileira de Desenhista de Manga e Ilustrações, fatos que fortalecem a cultura japonesa de desenhar no Brasil que influenciaram e continuam a influenciar as novas gerações de desenhistas na atualidade prova disso é o desenhista Thiago Rojas. Dessa forma, a cultura japonesa exerce um papel de grande influencia e é bastante popular não só no Brasil, mas por todo o mundo. O trabalho de Iain Macarthur é prova disso. Inglês que se tornou fanático por quadrinhos também na infância, busca inspiração nesse

Mas tal saturação cultural pode ser percebida de forma positiva pelo artista que verá “a plenitude que o envolve como uma fonte inesgotável” de criação. Desse modo, “A densidade de materiais culturais que o envolve pode então ser vista como uma riqueza que lhe é oferecida, e que ele pode aproveitar enquanto criador.” Moser (1999, p.39). Já a Secundariedade da produção artística e cultural aparece no artigo também como um dos traços do Spätzeit onde Moser (1999, p.40) fala que o “artista considera e trata os destroços do passado não como um obstáculo à sua criação, mas, ao contrário, como um recurso indispensável, e se empenha de fato na reutilização como material...”. Moser ainda afirma (1999, p.43) “sobre a secundariedade, parece-me importante

estilo japonês de desenhar. Seus traços, cores, movimentos e desenhos encantam pessoas de

lembrar que ela comporta em geral uma teoria da criação”. Ela nos sugere e permite pensar

todo o mundo fazendo-o ser reconhecido globalmente.

uma continuação da produção artística cultural, mesmo em situação de energia declinante e

Tais artistas exemplificam a grande diversidade dos mangás por todo o mundo. Em cada país e em cada época, esse modo japonês de desenhar ganha formas e temas diferentes, fazendo surgir não apenas HQs diferenciadas, mas desenhos, artes e trabalhos refletindo a cultura japonesa através dos desenhos e encantando a todos.

mesmo, e, sobretudo, em situação de saturação cultural. “É verdade que o Spätzeit amortece o etos da modernidade, mas ele tem em vista a continuação da produção artística e cultural, não a catástrofe final” Moser (1999, p.39). Assim, o autor conclui (1999, p.43) “A questão é saber se uma cultura, ou um momento da história cultural, torna essa dimensão de sua (re) produção explícita ou não”. Se

Spätzeit com Iain Macarthur, Thiago Rojas, Cláudio Seto e Julio Shimamoto

ela a reconhece e a íntegra na compreensão que tem de si mesma. Dessa forma, Iain Macarthur, Thiago Rojas, Claudio Seto e Julio Simamoto por um

Tomando como base a análise do artigo Spätzeit, de Walter Moser (1999), é possível

olhar semiótico baseado no artigo de Moser, se encontraram em um tempo de saturação

ler as obras de Iain Macarthur, Thiago Rojas, Claudio Seto e Julio Shimamoto sob uma

cultural e que buscarão referências no passado, nas suas ancestralidades japonesas (Seto e

perspectiva semiótica bastante interessante, para tanto, analisaremos primeiramente o artigo

Simamoto), no mangá em si e na cultura japonesa como um todo. A produção cultural de tais

de Moser.

artistas resulta em uma arte secundária, não explícita, mas que recebe fortes influências do

No artigo, Moser busca pela conceituação do termo Spätzeit referente à “modernidade tardia”. Para isso, o autor seleciona alguns componentes semânticos inscritos no termo: a perda de energia, a decadência, a saturação cultural, a secundariedade e a posteridade.

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jeito japonês de desenhar. Assim, Seto e Shimamoto, se tornaram dentro de um cenário saturado, fonte de inspiração para novos artistas produzirem como Thiago Rojas. O mangá aparece em meio a

Dentre eles, a saturação cultural e a secundariedade são os componentes semânticos

um mundo saturado culturalmente, mas consegue se destacar e ganhar visibilidade mundial

que mais se adéquam como base para análise das obras dos ilustradores citados. Sendo assim,

através do trabalho de artistas como Iain Macarthur que se inspira nos traços ornamentais para

aprofundaremos um pouco mais nessas duas ideias trabalhadas por Moser.

produzir seus trabalhos.

Segundo Moser (1999, p.44) “A condição do Spätzeit inclui a vida num mundo

O mangá aparece também claramente como uma fonte de inspiração para todos os

culturalmente pleno, cheio dos restos de épocas que o precederam.” Assim, “o presente é

artistas citados. Tais desenhistas conseguem reproduzir suas artes com suas peculiaridades,

percebido como uma descarga das culturas do passado” onde “o espaço cultural está saturado

mantendo em comum a condição atual de viverem em um mundo saturado, mas nem por isso

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deixam de produzir. Suas produções não são algo novo que rompem com o passado, a

culto às origens; a modernidade é transitória e a arte terá esse caráter, além do caráter de

influência do passado é clara em suas obras o que justifica a permanecia dos trabalhos de tais

eterno e imutável.

artistas Spätzeit.

Pode se ter a leitura de que a modernidade é uma crise e pode ser dividida em duas

Levando em consideraçao o texto Que Significa “moderno” de João Barrento (2011),

grandes vertentes: a razão e o sujeito. Em relação ao sujeito, esse buscava a liberdade

podemos entender que moderno nos dias atuais é de dificil conceituação, sem dizer que o

individual, a possibilidade de experimentar, enquanto vivenciavam um momento racional e

termo é comumente confundido com modernismo sendo perigoso tal confusão. Para

pretencioso. Era necessário uma reformulação e redefinição do conceito do que é

entendermos o significado de moderno, e seus derivados, é necessário fazer uma construção

modernidade, e era preciso uma relação de conformidade entre o sujeito e a razão. No estado

de diversas áreas, onde entenderá sua evolução tanto semântica, quanto histórica.

era nítido a separação entre os poderosos e burguesia versus o povo, e houve portanto uma

Para tal construção, é necessario ter entendimento da história como um todo e seus

regressão. Ao pararem para refletir e propor mudanças no aspecto presente, essa modernidade

acontecimentos, que levaram tal “nomealogia” ser criada, moldada e alterada. Cada fase da história conta-nos um capítulo importantíssimo acerca da relação entre o moderno e a arte. Na Idade Média, os pensadores e artistas não possuíam a obsessão pela modernidade e

industrial, tem um grande alavanco e assim traçam o destino do século seguinte: o século XX.

queriam esquecer, de certa forma, o mundo passado. Dessa forma apostaram a fase no

Este segue seu rumo bastante focado na arte e nesse ponto se assemelha ao século anterior,

teólogico. Já a Idade Moderna de contra-ponto a Idade Média, apostam no mundo e no ser

porém deixam um pouco de lado o pensamento de “vida moderna” e que tudo tem que ser

humano (homem). E assim segue no mundo tanto da arte e cultura, como na escrita e nos

novo.

diversos ramos que se constitui uma população: cada época traduz na comunidade seus novos interesses e suas modernidades. Entre essas eras e estilismos, surge as ditas “modernidades programáticas”, onde a ideia de modernismo é vista como algo revolucionário e como uma evolução. Esses são

No século XIX, a modernidade estava conectada com autenticidade, onde a tecnologia e a sociedade eram os condicionantes do destino das nações, porém eram combatidos pelos mesmos. Já no século seguinte, surgem os movimentos de vanguarda que pretendiam e almejavam revolucionar, nos mais diferentes campos da organização social.

diversos movimentos e processos, que em sincronia com a vasta gama de conteúdos arrastam

Nesse conseguinte século, há a pretensão de reviver o modernismo dinâmico e

para si um movimento artístico que estão em sincronia com o tempo. Estes movimentos

dialético do século passado. Porém o momento na arte, já absorvia-se dessa retórica onde

baseam-se no nada e pontuaram o que é visto como moderno nos dias atuais.

havia a contradição entre social e humano, de forma elitista e faziam contraponto à retórica

Outro viés importante sobre os diversos modernismos surgidos nesse período, é a tensão criativa que fulmina disso tudo. O choque que as diferentes, e algumas opostas,

tida como negativa, que nascera de um processo cheio de contadições. Nesse século, haverão as mais amplas críticas em relação ao processo histórico e estético da dita modernidade.

vertentes propõem facilita a produtividade e a criatividade das pessoas, unindo-se dois

No auge das correntes de pensamento-estéticas positivistas e realistas, surgem os

mundos o social e o artístico. Dessa união, segundo escrita por Kant em sua obra Crítica do

prematuros da modernidade, que debatem e se rebelam em relação do belo versus bom,

Julgamento (1790), ocorre a afirmação da autonomia estética e a tornou indivisível do

presente na sociedade burguesa. Dessa forma, pela primeira vez houve a relação entre

conceito de autonomia.

indústria e mundo urbano, que se aproximam pelo fato de reconhecerem que o estético e o

Desse momento em diante, surge a ideia de “tradição do moderno”, que esgota-se

social andam sempre juntos, e assim esses dois chegam ao consenso do novo “realismo”.

rapidamente e cai no termo “tradição-traição”. A qual diz respeito que a modernidade se torna

O termo moderno agora, pela primeira vez, faz mençao à uma transformação social, de

tradicional ou tem-se a ideia de que tudo é novo e está sempre em busca do novo, entram num

consciência e renovação. A modernidade dos burgueses, é reflexo da falha em relação à

ciclo de retorno e reúso.

grande revolução moderna da política, a qual não vingou. As que se sobressairão, tanto no

Estamos num momento de divergências, há uma tensão entre a busca pelo novo e o Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 119 – 137, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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tenta unir os homens, o ambiente e a indústria. A modernização, principalmente a parte

séculos XIX e XX, serão as das linguagens poéticas e artísticas. Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 119 – 137, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Segundo o texto, conclui-se que o moderno está relacionado ao tempo e não ao lugar,

acordo com sua visão interior e seu sentimento, sem a necessidade de querer romper alguma

o universalismo, onde absorve ou anula o espaço da arte, caracteriza as obras modernas. O

estética imposta à sociedade. Ele inclusive valoriza os movimentos passados e os utiliza como

sentido da obra está em suas figuras e discurso atemporais e de uma eternidade que não tem

inspiração e referência. “O que os artistas propõem é justamente esta falta de limites. Não há

vínculos espaciais. Já o modernismo, é visto como obsoleto pela população atual e é tido

mais clareza quanto às fronteiras do campo artístico. Tudo é possível.” (p. 12)

como história por muitos, ou até mesmo rejeito e chega inclusive a ser ironizado. E o pós-

Os artistas hoje em dia têm uma liberdade muito maior do que possuíam antigamente,

modernismo é algo sempre presente, “uma cultura do radical em extensão” onde sempre irá

e propõe cada vez mais formas e jeitos de arte. Estão presentes no mundo os mais diversos

contrapor o que era tido como um modernismo e se tornou ultrapassado.

tipos estéticos e manifestações artísticas, e a arte torna-se cada vez mais complexa. Podendo

Pós-modernismo é o nome aplicado às mudanças ocorridas nas ciências, nas artes e nas sociedades avançadas desde 1950, quando, por convenção, se encerra o modernismo (1900-1950). Ele nasce com a arquitetura e a computação nos anos 60, cresce ao entrar pela filosofia, durante os anos 70, como crítica da cultura ocidental. E amadurece hoje, alastrando-se na moda, no cinema, na música e no cotidiano programado pela tecnociência (ciência + tecnologia invadindo o cotidiano com desde alimentos processados até microcomputadores) sem que ninguém saiba se é decadência ou renascimento cultural. (SANTOS, 1986. p.7-8)

O pós-modernismo não está presente apenas na área das artes, mas também em todos

os níveis da sociedade, como é colocado por Santos (1986). Graças ao pós-modernismo e a necessidade de procurar por novas soluções, hoje o artista tem diversos materiais e meios para tornar sua arte fiel ao que pretende, há total liberdade para a criação. Analisando um outro artigo, A arte visual no mundo contemporâneo, de Nelcí Andreatta Kunzler (2005), é possível compreender de maneira mais clara sobre a contemporaneidade. Primeiramente, necessitamos saber que obras de arte são criadas sob o olhar do artista, esse que está inserido em uma sociedade e, portanto, deve-se considerar seu contexto social, político e econômico. Pois esses contextos irão influenciar diretamente na sua arte e criações. A cultura do artista, irá influenciar na “construção de sua obra e, por consequência na compreensão do espectador” (KUNZLER, 2005). Ele irá retratar em suas obras aspectos e a realidade vivida por eles e àqueles a sua volta, tornando-o uma pessoa comum como seu espectador. As relações artista-espectador são diariamente criadas e estabelecidas. “Após a revolução industrial, no século XVIII e a microeletrônica no século XX, essas relações se intensificam muito.” (p. 34) Sem mencionar que a globalização tem expandido o campo do artista, ela além de tomar maiores parâmetros também terá características externas do convívio diário de quem a faz. Por isso é necessário entender o meio onde o artista vive e se encontra, para ter uma visão mais completa da obra. Nos dias atuais é muito complicado definir as obras propostas, hoje o artista cria de Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 119 – 137, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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ser comparada a complexidade do ser humano, como se a arte estivesse cada vez mais próximo do nosso interior e constituição. Esse múltiplo de coisas que é a arte atual nos guia para cada vez maior aceitação ao diferente e diverso. Sem dizer que a obra toma novas amplitudes e perspectivas vistas do olhar da diversidade. A arte contemporânea é democrática e nos faz refletir sobre temas e assuntos que às vezes não fazem parte da nossa realidade, ela é fragmentada e engloba coisas do cotidiano e do que é excluído da sociedade, por exemplo. Releitura das obras: mangás Tomando como base a análise dos textos apresentados, trouxemos alguns trabalhos de Iain Macarthur, Thiago Rojas, Cláudio Seto e Julio Shimamoto, sob uma outra perspectiva e com uma visão ampliada, além de nos proporcionar uma leitura de suas obras de forma mais interessante. O estilo artístico que aqui será trabalhado, o mangá, surgiu no Japão e teve essa designação no fim do século XVIII. O estilo trata-se de histórias em quadrinhos e para sua leitura adota-se uma ordem inversa a leitura ocidental, é feita a leitura da direita para a esquerda. Eles possuem também algumas características marcantes como a combinação gráfica de uma personagem em quadrinhos com uma imagem realista, esses mesmos personagens tem olhos grandes e quando pretende-se expressar supresa ou movimento utilizase numerosas linhas paralelas. Como foi possível perceber, os desenhistas brasileiros seguem essa linha estilístca, porém podem ser muito bem comparados ao artista inglês Iain Macarthur. Os quatro têm como principal característica em comum o desenho feito com predominância das cores preto e branco, assim como traços marcantes, cada qual com suas técnicas e particularidades. Porém, as ilustrações que trabalharemos são coloridos, mas que em nada altera a leitura de Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 119 – 137, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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perceber como a expressão do personagem condiz com sua história e toda a sua postura, captada em um momento de luta. As obras do Julio são em sua maioria em preto e branco, mas que contém bastante contraste, tanto de cor e tanto de luminosidade. Isso decorre na exaltação da força de expressão das personagens e na imagem é possível perceber essa característica, as cores escuras no lugar certo e a combinação correta das cores nos faz perceber os sentimentos do samurai. Um dos maiores desenhistas do estilo, Cláudio Seto apresentou aos brasileiros os tão famosos desenhos japoneses. Ao voltar do Japão após viver a infância lá, o ilustrador iniciou seus desenhos de quadrinhos utilizando de técnicas japonesas e até mesmo temáticas próprias de lá, como é o caso de um dos seus primeiros trabalhos Ninja – O samurai mágico. Este se inspirou em Osamu Tezuka e Sanpei Shirato, grandes ilustradores japoneses que na área dos

suas obras e nem omite suas características. Os artistas brasileiros tendencionam para o mundo das histórias em quadrinhos e em sua maioria tiveram inspirações japonesas, enquanto o mais novo artista e inglês Iain, tem inspiração de diversos países e culturas. Fig.07: Ilustração Ken no MICHI, Outubro 2012

mangás fizeram nome, e eles tiveram grande influência nas obras de Seto. As obras de Seto são marcadas pelos personagens em ações e com expressões fortes e de raiva, em sua maioria. Algumas técnicas e temáticas comuns do estilo de mangá, como a ação bem expressada, olhar marcante, erotismo e apelo sexual, e entre outras são presenciadas

Fig.08: Ilustração Ninja – O samurai mágico, 1968

nas obras do mangaká. Na obra acima, é possível perceber a expressão de ódio e raiva da personagem principal. O olhar compenetrante revela muito sobre a temática da história, os olhos regados a olheiras e com a sobrancelha curvada que indicam um desejo de vingança desse personagem

Fonte: Site Oficial Julio Shimamoto 10

Fonte: Site Contraversão 11

O artista Julio Shimamoto, descendente de japoneses, é um dos percursores do estilo artístico japonês no Brasil e utiliza de histórias e técnicas nipônicas para suas ilustrações. Sua inspiração vêm da história e de sua ancestralidade. O artista será, por nós, classificado no ramo do Spatzeit, e mesmo se visto na época em que assendiu, ele não poderia ser classificado como moderno, pois ele não criou algo totalmente novo, mesmo sendo algo pouco visto e disseminado no mercado literário e gráfico brasileiro, ele utiliza de técnicas antigas que surgiram em outro país há séculos atrás. Segundo a imagem a ser analisada, que é a capa de um mangá, que conta a história e aventuras de um samurai, um guerreiro e que é necessário ter grande doses de coragem, sentimentos de esperança e de força para que seus objetivos sejam alcançados. É possível 10 11

Fonte: Site Oficial Julio Shimamoto. http://www.julioshimamoto.com.br/ Fonte: Site Contraversão. http://www.contraversao.com/

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ilustardo e é reforçado com o fundo vermelho (que também pode ser interpretado como temor). Os ninjas em tamanho menores na obra, expressam esse movimento constante que costuma aparecer nos mangás e reforçam a ideia do tema da história. Por se tratar de um ninja que busca por vinganças pessoais, as ilustrações e os mangás do querido Cláudio, podem ser classificados como da área do Spatzeit. Classificá-lo como moderno seria um erro, dado o fato de que ele buscou referências já existentes no passado. A maneira japonesa de fazer histórias em quadrinhos é muito antiga e o ilustrador foi apenas o norteador dela na cultura brasileira, sem desmerecer seu trabalho é claro. Porém pode ser classificado como atual e contemporâneo, lembrado o fato de que foi um dos primeiros artistas a fazer mangás eróticos no país e apoiar a

liberdade sexual

feminina nos anos 70, em sintonia com as revoluções artistico-culturais que aconteciam pelo país como o Tropicália. Na obra em análise (fig. 09), é possível perceber o caráter antagônico onde o lobo Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 119 – 137, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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desenhado é colocado em destaque e é representado como líder. Comumente caracterizado

consegue criar sua identidade em meio a uma saturação cultural existente a sua volta.

como vilão, na ilustração ele vai além. O lobo não representa apenas o mau, é também insano e motivo de glorificação. As cores podem deixar essa leitura mais clara, onde o ambiente

Fig.10: Ilustração Faire Haron, Julho 2010

contém cores mais escuras e com grande contraste, ele se destaca pelo tecido vermelho (que em algumas interpretações tem caráter de nobreza e importância). A lua, mesmo que num plano atrás da personagem, a ilumina de forma que proporciona sua identificação completa, e é até possível perceber sua expressão. Fig.09: Ilustração Power of Warrior, 2014

Fonte: Site Oficial Iain Macarthur 13

Esse ato de criar em meio a um cenário saturado culturalmente, leva-o a fazer parte de uma secundariedade da produção artística de forma positiva onde mesmo pertencendo a uma Fonte: Site Trart Design 12

O uso de um ícone das histórias infantis em conjunto com um dragão e até menção à lenda da união entre o lobo e a lua, pode afirmar o fato dele não ser moderno e sim, atual. Por estarmos cercados por essa tendência, onde há a junção de diversas histórias e referências, a arte contemporânea recicla inspirações antigas e as reúsa com um certo grau de releitura. Sem esquecer de mencionar que a técnica utilizada é mais moderna que o desenho manual, pois utiliza-se meios eletrônicos. O artista em relação às histórias em quadrinhos reverbera em seu processo artístico diversas influências e, muitas possíveis pelo fator globalização no qual ele está inserido. Algumas dessas influências os artistas antes citados. Analisando a ilustração abaixo (fig.10), feita pelo ilustrador para a capa do albúm da banda Faire Heron, é possível identificar traços do passado. Dessa forma, tal obra se insere na condição do Spätzeit o qual inclui a vida num mundo cheio dos restos de épocas passadas. Dessa forma, Iain usa esse espaço cultural saturado como fonte de inspiração para sua criação, Fonte: Site Portfólio Digital Thiago Rojas. Disponível em: <http://trartdesign.blogspot.com.br/>. Acesso em: 26 maio 2015.

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época de saturação, é capaz de criar e dar continuidade à sua produção. Mas acaba muitas vezes, fazendo uma reprodução de algo já existente. Traços étnicos lembram desenhos feitos por tribos, as cores fortes e as formas orgânicas se encaixam perfeitamente ao estilo de música eletrônica da banda para a qual a ilustração foi feita. É possível ver traços da vanguarda psicodélica pela surrealidade da imagem, exagero no experimentalismo das formas no grafismo, onde o próprio nome da banda torna-se confuso e de lenta leitura para compreensão. São as inspirações que agregam valor ao trabalho do artista, servem como referência, ele é capaz de aproveitar o que a cultura saturada o oferece, mas ao mesmo tempo, tornam seu trabalho como algo secundário e comum. Uma junção de téncicas, formas, desenhos, já existentes, é o que torna sua criação secundária. Dessa forma, classificá-lo como moderno não seria o mais apropriado, uma vez que o artista utilizando-se de téncicas e inpirações passadas, as reproduz quase explicitamente. Não há criação de nada novo, nem mesmo o rompimento com o passado ou a causa de espanto nas pessoas com sua obra, no sentindo de romper com padrões. Características não presentes na Fonte: Site oficial Iain Macarthur. Disponível em: <http://www.iainmacarthur.com/> Acesso em: 27 outubro 2015.

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Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 119 – 137, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 119 – 137, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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obra de Iain que assim, não pode ser classificado como um artista moderno. Dessa maneira, analisando sua obra e tomando sua criação e existência na atualidade, pode-se concluir que se não moderno, a obra de Iain é atual, contemporâneo. Sua criação é

atualizadas com técnicas do presente e ganham um ar de atualidade. E que na verdade não passam de releituras sem o propósito de rompimento do moderno e dessa forma, acabam sendo apenas atuais, contemporâneas.

diáloga e faz parte do presente, desse mundo efêmero onde os ouvintes da banda Fair Heron,

Foi possível entender também que o movimento contemporâneo não pretende fazer

se entorpecem com a música desfrutando de uma sensação lúdica de transcendência a qual os

rompimentos estéticos, os artistas apenas querem seguir seus instintos e criam em torno do

levam a um mundo místico representado pelo chifre de unicórnio ilustrado na cabeça da moça

que vivenciam ou vinvenciaram.

desenhada. Iain com essa representação consegue criar um ar lúdico baseado em inspirações passadas o que comprova a sua presença no spätzeit. Mas, tais técnicas da ilustração não são

Referências Bibliográficas

novidade na atualidade e nem rompem com nada, chegam a ser admiradas ou na maioria das

BARRENTO, João. Que significa “moderno”?. 2011. Disponível em:<http://pt.scribd.com/doc/75222445/Joao-Barrento-O-que-significa-moderno#scribd> Acesso em: 20 junho 2015.

vezes não é nem compreendida, mas em alguns momentos podem até passar como despercebidas pelo grande número de trabalhos semelhantes existentes. Sendo assim, talvez o mais correto, seria classificá-lo como contemporâneo, no sentido de pertencer ao tempo atual. Seu trabalho é contemporâneo, mas não novo, o que o exclui da modernidade discutida aqui. Portanto, fica evidente a contemporaneidade da obra de Iain Macarthur e sua atualidade como marca.

FEATHERSTONE, Mike. Moderno e pós-moderno: Definições e interpretações sociológicas. In: Sociologia – problemas e práticas, Lisboa, n. 8, p. 93-105, 1990. KUNZLER, Nelcí Andreatta. Arte visual no mundo contemporâneo. Rio Grande do Sul: 2005. SANTOS, Boaventura de Souza. A crítica da razão indolente: Contra o desperdício da experiência. São Paulo: Editora Cortez, 2002.

Considerações Finais O desenvolvimento desse artigo propiciou adquirir conhecimentos sobre os termos spätzeit, moderno e contemporâneo, entender seus significados e aplicações. Além de ampliar o repertório de informações e trazer certa confiança para se poder analisar as obras dos artistas escolhidos. Poder relacioná-los com a forma milenar de ilustração japonesa, os mangás, trouxeram grande prazer e aprendizado. Através de um olhar amplo, adquirido pela experiência dos textos, foi possível observar o trabalho do ilustrador de forma totalmente nova. A mudança de olhar veio de forma positiva uma vez que ampliou nossa percepção em relação não só a como o passado está presente no mundo atual, mas como ele está a nossa volta, muito mais que imaginamos. Da mesma forma, agora é mais fácil perceber que vivemos em um mundo com muita informação, muitas obras e trabalhos, mas que, apesar da quantidade, raramente rompem com uma tradição ou fazem algo extraordinário a ponto de se oporem a alguma coisa muito direfente e serem consideradas modernas. Na maioria das vezes, o que se vê é uma retomada de valores e tradições que são Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 119 – 137, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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A modernidade com Spatzeid: Maurício de Sousa e as Histórias em Quadrões Gabrielle Fernandes Maciel1 Júlia Mafra Magalhães Karoline Santos Resumo Expandido

Paulo (antiga Folha da Tarde) primeiro como copidesque, que consiste em deixar os textos mais jornalísticos, e depois como repórter policial. Não contente com a carreira decidiu, no final da década de 50, apresentar a sua tirinha e "conseguiu convencer um editor da Folha da Tarde a publicar uma tirinha na qual aparecia um menino chamando Franjinha e seu cachorro Bidu."

O ilustrador infantil, Mauricio de Sousa, ao longo da sua vida traz algumas referências e vividas experiências que o fez se transformar num grande sucesso com suas histórias em quadrinhos que encanta crianças e adultos. Buscamos o livro "História em Quadrões", publicado em 2001, para fazermos uma releitura de artes passadas criadas no presente com o Spätzeid, forma de se ver o mundo atual sem perder de vista o passado. No livro de Maurício de Sousa, foi inserida uma serie de novas interpretações de diferentes obras consagradas de diversos períodos e países com os personagens da turma da Mônica. O ilustrador faz uma composição a partir do que já existe, desfruta de um novo olhar aprimorado nos personagens atuais da Turma da Mônica.

estúdio em Mogi das Cruzes. No começo visitava redações e jornais para apresentar

Palavras chave: Intertextualidade; Maurício de Sousa; Spatzeid; Releitura.

seu material e logo suas tirinhas do Bidu foram publicadas na revista "Zaz Traz" até

Introdução Maurício de Sousa nasceu em Santa Isabel, interior de São Paulo, no dia vinte e sete de outubro de 1935. Apesar de ser natural de Santa Isabel passou parte de sua infância em Mogi das Cruzes. Filho de poetas, cresceu em um ambiente artísticos que herda da sua família. Sua vó Dita também foi uma grande contadora de histórias o que serviu de inspiração para o autor logo no começo da carreira, de acordo com Thais Verdoline2, "ainda criança, Maurício desenhava as histórias de "vó" Dita em tiras e apresentava-as em cineminha improvisado de caixote e vela". Desde muito cedo tinha paixão por desenhar e passou a desenvolver seus primeiros traços enquanto ainda estava na escola, apenas como uma brincadeira com os amigos, o que o levou a mais tarde, ilustrar cartazes e pôsteres para comerciantes da região. Estudantes do curso de Design de Ambiente Manhã da Escola de Design UEMG - Universidade do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Artigo orientado pelos profs. Eliane Meire Soares Raslan e André Borges da ED/UEMG. E-mail: <bibifernandesmaciel@hotmail.com> 2 Fonte: Thais Helena Affonso Verdoline. Maurício de Sousa e suas Personagens. 2º capítulo. Tede Mackenzie. Disponível em: <http://tede.mackenzie.com.br/tde_arquivos/8/TDE-2007-11-25T124201Z364/Publico/Thais%20Helena%20Affonso%20Verdolini2.pdf> Acesso em: 23 junho 2015. 1

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 138 – 149, 1º semestre/2016. ISSN 2447-2638. Texto recebido: 25.05.2015. Texto aprovado: 09.08.2015. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Aos 19 anos se mudou para São Paulo e passou a trabalhar para a Folha de S.

Portanto ao contrário do que muitos pensam seu primeiro personagem não foi a Mônica, e sim Bidu que era inspirado em seu cão de infância Cuíca da raça Schnauzer, tanto que sua cor nas primeiras edições era cinza. Franjinha veio logo depois como seu dono e o segundo personagem criado por ele, seguido pelo resto da turma: Cebolinha, Piteco, Chico Bento, Penadinho, Horácio e Raposão. O sucesso foi tanto que decidiu largar tudo em São Paulo e montar o próprio

que ganhou o título da própria revistinha. Verdoline3, afirma que hoje o personagem Bidu atua tanto como ator principal ou coadjuvante. Além disso, também é o símbolo da empresa de Maurício, a Maurício de Sousa Produções. "Para os estudiosos das HQ, a consolidação de Maurício de Sousa deu- se efetivamente devido ao merchandising, ou seja, pela utilização de seus personagens em produtos comerciais". As associações dos personagens com os produtos, por exemplo, da massa de tomate da Cica, produtos de higiene Kimberly-Clark e entre outras já possuem porcentagens significativas no faturamento da empresa. Além dos licenciamentos e das publicações atualmente a empresa já conta com um parque temático, filmes (cinegibi 1 ao 7), livros, brinquedos, discos, CD-ROMs e jogos eletrônicos da turma. Desde 1963, Maurício de Sousa e seus personagens tem feito à alegria de muitos leitores de histórias em quadrinhos. Ainda, de acordo com o site Vida Mais Livre4, o ilustrador conseguiu atingir um público muito além do infantil e fez com que sua obra fosse admirada por crianças e adultos de todo o Brasil.

Fonte: Idem Fonte: Site Vida Mais Livre. O desenhista Maurício de Sousa fala sobre a criação de personagens com deficiências. 14.06.2012. Disponível em: <http://www.vidamaislivre.com.br/especiais/materia.php?id=5328&/o_desenhista_mauricio_de_sousa _fala_sobre_a_criacao_de_personagens_com_deficiencias> Acesso em: 23 junho 2015.

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A arte, atualmente, está muito ligada a educação das crianças . Através dela a criança desenvolve a sua “capacidade de sentir, de observar, de conscientizar, de

pois apesar das semelhanças entre as obras originais, é possível ver as características do autor, como o uso dos personagens da Turma da Mônica.

expressar, de criticar e refletir”(Bitencourt,2009, p. 29)5. Em um de seus projetos, o

Releitura no sentido do Fazer Artístico significa fazer a obra de novo acrescentando ou retirando informações. Não é cópia. Reler uma obra subentende adquirir conhecimento sobre o artista e a contextualização histórica. É uma nova visão do mundo, suas críticas, sua linguagem e suas experiências sobre a obra escolhida. (RANGEL, 1999, p.18)

livro História em Quadrões, Maurício fez releituras de grandes nomes da arte, como Leonardo da Vinci, Vincent Van Gogh e Cândido Portinari. Com o intuito de aproximar seu público, principalmente o infantil da história da arte, o ilustrador substitui os personagens retratados pelos nossos coleguinhas da turma da Mônica. Releitura: Spätzeid e as Histórias em Quadrões com a Turma da Mônica Em uma visita ao MASP - Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand6, Mauricio de Sousa parou para observar uma das suas obras favoritas de Renoir, a Rosa e Azul. Ficou tão inspirado que passou a pesquisar o material e a técnica utilizada nas pinturas dos artistas famosos, e, assim reinterpretar com os seus personagens. Foram catorze anos pesquisando, para que em 2001 o livro fosse publicado.

Mauricio escolheu as obras mais famosas para atrair a atenção do público. As

releituras foram confeccionadas utilizando acrílico sobre tela e foram em exposição em diversos lugares. A proposta do livro foi que houvesse uma maior interação das crianças com a arte e os artistas famosos de outras épocas. Sendo assim, foi explorado além da personificação dos quadros, textos lúdicos sobre a situação representada nos quadros e que também tinham a mesma intenção dada aos quadros de inter-relação com os personagens da Turma. Essa relação fornecida ajuda na fixação da criança e deixa o aprendizado mais leve e os quadros mais fáceis de serem interpretados. Segundo o autor, seu desejo é que "com esse trabalho o nosso público, principalmente as crianças, aproximem-se da história dos grandes mestres da pintura, conhecendo suas vidas, suas obras e tendo o seu momento lúdico com as nossas releituras". Apesar de usar até mesmo as técnicas dos artistas originais, as obras de Maurício de Sousa possuem suas próprias características. Suas obras são releituras,

Para criar uma releitura, é necessário entender a obra lida. Exemplificando, é preciso buscar informações sobre o autor, o contexto em que a obra está inserida, as técnicas utilizadas. "Procurei verificar detalhes das pinturas, como a utilização de tintas, o jeito das pinceladas, a iluminação, tudo com muito cuidado" (SOUSA, 2010). São inúmeras obras criadas por Maurício de Sousa, todas elas com certos vínculos com a original. Com a tentativa de aproximar as crianças da arte, ele gera uma intertextualidade entre a original e a recriada. Os artistas do pós-modernismo geralmente não têm o intuito de criar novas técnicas, um novo traço e nada que seja inovador. Os artistas, desfrutam daquilo que já existe, seja uma obra preexistente ou a ideia relacionada a ela, e apenas aprimoram aquilo que consideram necessário para caracterizar seu trabalho artístico. Segundo Walter Moser (1999) "... o artista trata e considera os destroços do passado não como um obstáculo à sua criação, mas, ao contrário, como um recurso indispensável, e se empenha de fato na sua reutilização como material" (p. 40). O ilustrador brasileiro Mauricio de Sousa ao realizar seu trabalho deixa nítida a relação e identificação de semelhanças entre as releituras e as obras originais. A proximidade entre as pinturas é estratégica, no caso de Maurício de Sousa, é uma facilitadora para a compreensão e análise das obras, principalmente para o público infantil. Portanto iremos trabalhar ao longo do texto a secundariedade que "será utilizada, sobretudo, para designar um modo de produção cultural que trabalha a partir de um pré-construído cultural, a partir de materiais previamente dados, que já tem um estatuto cultural." (MOSER, 1999, p. 41) O quarto pintado (fig. 01) pelo holandês Vincent Van Gogh foi um dos maiores artistas do pós-impressionismo, e sua obra "O quarto", traz até hoje inúmeras

Disponível em: < http://www.bib.unesc.net/biblioteca/sumario/00003E/00003ED8.pdf>. Acesso em: 01 julho 2015. 6 Disponível em: <www.masp.art.br/> Acesso em: 23 junho 2015. 5

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interpretações. Alguns interpretes acreditam que o artista esperava por alguém, visto que os elementos do quarto eram todos duplicados, como exemplo, havia duas Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 138 – 149, 1º semestre/2016. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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cadeiras e dois travesseiros. Sabe-se que Van Gogh era muito solitário, o que torna

Fig.02: O Quarto de Chico Bento - 1992

ainda mais pertinente a hipótese do desejo por uma companhia. Mas o próprio artista ao escrever para seu irmão, esclarece sua intenção sobre a obra. "Desta vez é simplesmente um dormitório; só que a cor deve predominar aqui, transmitindo, com a sua simplificação, um estilo maior às coisas, para sugerir o repouso ou o sono. Em resumo, a presença do quadro deve acalmar a cabeça, ou melhor, a imaginação. As paredes são de um violeta pálido. O chão é de quadros vermelhos. A madeira da cama e das cadeiras é de um amarelo de manteiga fresca; o lençol e os travesseiros, limão verde muito claro. A colcha é vermelha escarlate. O lavatório, alaranjado; a cuba, azul. As portas são lilases. E isso é tudo - nada mais neste quarto com as persianas fechadas. O quadrado dos móveis deve insistir na expressão de repouso inquebrantável. Os retratos na parede, um espelho, uma garrafa e algumas roupas. A moldura - como não há branco no quadro - será branca". (GOGH, Vincent Van) Fig.01: O Quarto de Vicent Van Gogh em Artes 1888 Fonte: SOUSA (2010), p. 387

De acordo com o site Aula de Arte8 a ilustração 01 retrata o próprio quarto do autor,Vincent Van Gogh. As sombras foram eliminadas e as cores modeladas através da tinta espessa. A perspectiva conduz o olhar para dentro

do quarto e a

janela,entreaberta,atrai a curiosidades do observador. A ideia de tranquilidade tão desejada pelo artista é destoada por ele mesmo. A perspectiva distorcida, as cores muito vivas parecem não condizer com a proposta de um quarto em que se possa repousar. Essa grande possibilidade de interpretação faz com que vários artistas releiam grandes obras. O ilustrador Maurício de Sousa (fig. 02) criou uma de suas intertextualidades relacionadas a vários artistas, tal como Vincent Van Gogh. Mantendo uma técnica semelhante com a de Monet, visto que acreditava ser uma Disponível em: <https://books.google.com.br/books?id=XpAVU9NzBGUC&pg=PA39&lpg=PA39&dq=Maur%C3% ADcio+de+Sousa.+Acr%C3%ADlica+sobre+tela.+%22O+quarto+do+Chico+Bento%22+%E2%80%9 3+1992&source=bl&ots=7iLYT0FVhS&sig=ZbPXt9N6uo9Ink3Y0PDpwl3R_oI&hl=ptBR&sa=X&ei=FRyLVZPxJ4KjNv3ZrvgE&ved=0CB4Q6AEwAA#v=onepage&q=Maur%C3%ADcio %20de%20Sousa.%20Acr%C3%ADlica%20sobre%20tela.%20%22O%20quarto%20do%20Chico%20 Bento%22%20%E2%80%93%201992&f=false> Acesso em: 22 junho 2015. 8 Fonte: Aula de Arte: História da Arte - Van Gogh. Disponível em: <http://www.auladearte.com.br/historia_da_arte/van_gogh2.htm#axzz3e12cOap1> Acesso em: 22 junho 2015. 7

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A pintura barroca se desenvolveu durante o século XII. Esse estilo é marcado

técnica criada por ele, em que colocava algodões em uma caneta para poder espalhar a tinta, produziu todos os seus quadrões. Um deles é O Quarto do Chico Bento.

principalmente por contrastes de claro-escuro, pelo realismo, pela composição em

É perceptível a relação entre os quadros. Maurício mantém todos os elementos

diagonal, características que estão fortemente presentes na obra. Há uma certa ironia

criados por Van Gogh, referentes à sua disposição, forma e grande proximidade com

em Velásquez ao retratar pessoas que não eram socialmente tão reconhecidas e que

as cores. Ele reutiliza as ideias do quadro original, pois mesmo sendo bastante

foram colocadas no mesmo nível que os reis da Espanha, acredita-se que o pintor

intertextuais é possível diferenciá-las entre si.

queria passar a mensagem que "toda gente nasce igual independentemente de tudo o

Na releitura, a presença de alguns ícones relacionados ao personagem Chico Bento, faz com que seja inteligível a identificação do quarto. Se Van Gogh usou o seu

mais, uma ideia deveras arriscada numa Espanha ainda imperial, mas também opulenta, mística, fradesca, beata, em pleno século XVII" (NABAIS, 2011)9.

autorretrato, Maurício usou um autorretrato do Chico Bento e também uma imagem

Sendo óleo sobre tela, figura 03 abaixo, na pintura criada por Valásquez,

da sua namorada, Rosinha. Além disso, o chapéu e a roupa do personagem

enquanto na figura 04, sendo acrílica sobre tela, criada por Maurício de Sousa, esta

encontram-se no ambiente, tudo isto contribui para a sua caracterização.

segunda, o brasileiro soube brincar com a tela "As Meninas" (Fig.04), substituindo a

O quadro abaixo faz uma relação entre a obra original e a releitura.

corte pela turma da Mônica. Como Velásquez, ele se auto retratou na obra sendo o pintor. A Mônica ficou no lugar da princesa, e seus pais no lugar dos Reis da

Vincent Van Gogh Técnica

Óleo sobre a tela72x90 cm

Maurício de Sousa Acrílica sobre a tela92x112

corte. Na releitura, "As Meninas da Turma", os quadros ao fundo também são de

cm

Maurício.

Ano da criação

1888

Quadros do Ambiente

Auto-retrato e reprodução da paisagem Chico Bento, Rosinha e uma

Piso Hipóteses

Espanha. Magali, Cebolinha, Rosinha, Bidu e Anjinho, ficaram como o restante da

1992

de "Árvore Balançando ao Vento"

casa

Simula madeira

Simula madeira

Fig.03: As Meninas, por Velásquez - 1156/57

de A disposição dos elementos sugere a A disposição dos elementos

interpretação das obras

espera de alguém. Seu amigo, Paul sugere a espera de alguém. Gauguin, seu irmão Theo, ou um amor Seu amigo, Zé Lelé, seu de sua vida

primo Zeca, ou seu amor Rosinha.

Abaixo outras comparações. A tela "As Meninas" (Fig.03) de Velásquez com dimensões de 318 x 276cm, é uma obra realista barroca de 1656 que retrata a Corte de Felipe IV. As pessoas representadas na cena são: a filha do rei da Espanha, a menina central que é herdeira direta do trono; o próprio Velásquez, que está segurando uma

Fig.04: As Meninas da Turma, por Maurício de Sousa - 1993

palheta; os reis da Espanha, Felipe IV e sua esposa Mariana de Áustria, que estão refletidos no espelho ao fundo e algumas pessoas que são menos marcantes da corte.

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Disponível em: <http://tv.up.pt/uploads/attachment/file/317/A_Arte_do_Retrato_As_Meninas_de_Velasquez.pdf>,. Acesso em: 01 julho 2015

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poder constituir uma reflexão do autor sobre a perenidade da arte." (Fundação Galouste Gulbenkian) Já Maurício, brinca com a releitura colocando justamente o integrante da turma que morre de medo da água para brincar com ela. "Não foi nada fácil convencer o Cascão a posar para esse quadro. Ele não queria de jeito nenhum chegar perto da água com sabão. Mas depois que o Cebolinha mostrou o quanto é divertido brincar de bolhinhas de sabão, o Cascão concordou em enfrentar o desafio." (SOUSA, 2010) Fig.05: Bolas de Sabão, por Manet - 1867

Fonte: SOUSA (2010), p. 1910

A obra de Édouard Manet (Fig.03) com dimensões de 100,5x81,4cm, retrata um jovem filho da esposa do pintor, que foi retratado em várias outras telas por muitos anos. Foi pintada na França no ano de 1867, uma época que a crítica era severa com Manet e suas pinturas eram consideradas afrontas àqueles que não aceitavam muito bem a sua arte moderna e seu estilo livre com pinceladas que não seguiam as convenções acadêmicas.11 As Bolas de Sabão (Fig.5) do pai do modernismo sugere que ele "cria a sua expressão autônoma e impõe a partir do motivo uma afirmação da sua percepção sensorial, da sua subjetividade. Não é de excluir, também, a hipótese de o quadro

Disponível em: <https://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=1&cad=rja&uact=8&ved= 0CB4QFjAA&url=http%3A%2F%2Ftv.up.pt%2Fuploads%2Fattachment%2Ffile%2F317%2FA_Arte _do_Retrato_As_Meninas_de_Velasquez.pdf&ei=nCeLVbymBIK0-AGhoCQAQ&usg=AFQjCNHy48Mzgh5mOonmFAsZTn8YitlLgQ&bvm=bv.96339352,d.cWw>. Acesso em: 24 junho 2015> 11 Disponível em: <http://ruidiasnovastec.blogspot.com.br/2009/03/vanitas-as-bolas-de-sabao-demanet.html > . Acesso em: 28 junho 2015 10

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Fig.06: Cascão e as bolas de Sabão

As releituras do Mauricio de Souza encaixam perfeitamente com a teoria do spätzeid. Baseia-se em técnicas e ideias utilizadas pelas obras originais, reinterpretam de maneira diferente e valorizam seu trabalho. Não necessariamente é algo negativo, mas percebe-se que não há algo totalmente novo nos dias atuais. De maneira a aproximar e facilitar o entendimento infantil sobre a história e os grandes artistas do passado percebemos que as releituras foram positivas sobre o ponto de vista da educação. A relação das obras de arte, alguns considerados patrimônios da humanidade, com os personagens da Turma da Mônica, que é algo comum na realidade de crianças, jovens e até adultos, aproximaram a interação e o contato desses públicos com os grandes ícones da arte.

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MOZDZENSKI, Leonardo; VAZ, Ana; SILVA, Maria da Conceição. Da obra‐prima ao pastiche: multimodalidade e intericonicidade nos ‘Quadrões’ de Maurício de Sousa. Recife: Anais Eletrônicos, 2008. Disponível em: <https://www.ufpe.br/nehte/simposio2008/anais/Leonardo-Mozdzenski-e-AnaVaz.pdf>. Acesso em: 14 de junho de 2015.

Fonte: SOUSA (2010), p. 27

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Considerações Finais

RANGEL, Valeska Bernardo. Releitura não é cópia: refletindo uma das possibilidades do fazer artístico. Florianópolis: Revista Nupeart, p. 1-30, Dezembro,1999. Disponível em: <http://www.revistas.udesc.br/index.php/nupeart/article/view/2534/1895>. Acesso em: 27 de maio de 2015.

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SOUSA, Maurício de. Histórias em Quadrões com a Turma da Mônica. São Paulo: Globo, 2010

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 138 – 149, 1º semestre/2016. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Disponível em: <https://books.google.com.br/books?id=XpAVU9NzBGUC&pg=PA27&lpg=PA27&dq=casc%C3%A 3o+e+as+bolas+de+sab%C3%A3o&source=bl&ots=7iLYXYH1kU&sig=8mXZBo5D11KMeAc8Geo 3x0kZdYk&hl=ptBR&sa=X&ei=ZaWQVc2lG8meNvG2v3g&ved=0CB4Q6AEwAA#v=onepage&q=casc%C3%A3o% 20e%20as%20bolas%20de%20sab%C3%A3o&f=false>. Acesso em: 28 junho 2015.>

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NABAIS, João-Maria. A arte do Retrato n'As Meninas de Velásquez. Revista da Faculdade de Letras. Ciências e Técnicas do Patrimônio. Porto, 1 série, v- VI, pp. 363-389, 2007.

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A visão ludo-política: colagem anatômica com o brasileiro Diego Max e novaiorquino Anthony Freda. Jéssica Parreiras Marroques1 Ludo-política: arte com Diego Max e Anthony Freda Resumo Expandido

Fig.01: Diego Max

Fig.01: Anthony Freda

Pretende-se com este artigo, sob a perspectiva da ilustração, analisar e mostrar as relações existentes da ação ludo-política nas obras de nova-iorquino Anthony Freda e o brasileiro Diego Max. Este artigo buscar explanar a relação entre o lúdico e as ilustrações do artista relacionando a análise de cor e da estruturação das obras do

Fonte: Diego Max2

artista. Também se encontra presente a análise de quatro ilustrações que frente a essa investigação, tomou-se como sustentação à opinião de alguns autores, os quais abordam o assunto com propriedade, para afirmar as questões aqui mencionadas, sendo assim, foram acolhidas diversas vertentes e o uso de obras associando-as com o texto primordial intitulado “Paris, século XIX” de Walter Benjamin e outras leituras secundárias como o fragmento da literatura de Zygmunt Bauman e ainda a relação do trabalho de Anthony Freda com outros artistas ilustradores como Pawel Kuczynski e Banksy que dialogam com temas parecidos com os trabalhos de Freda e as colagens anatômicas de Diego Max sugerindo que olhemos para o nosso modo de vida, tanto

Fonte: Anthony Freda3

Diego Max é paulistiano e tem como profissão as ocupações de ilustrador, músico e Designer, seu aprendizado foi autoditada e tem como referência para seu trabalho a relação com o surrealismo e dadaísmo. O artista utiliza do universo contemporâneo como o uso da tecnologia com relação steampunk para criar suas obras. A técnica utilizada por Max em seu trabalho como ilustrador é colagem e colagem digital com acabamento e finalização em algum software de edição de imagens. Seu trabalho, assim como o de Freda, possui uma abordagem lúdica e com referências à sociedade atual. Fig. 01-06: Trabalhos de Diego Max

nas questões políticas como sociais. Este trabalho discorre acerca de questionamentos sobre a atualidade e relevância das temáticas com as quais Anthony Freda trabalha dentre a sua importância como crítico político e social através de recursos artísticos, principalmente da ilustração e a sua visão sobre a contemporaneidade. Palavras-chave Arte de ilustrar; Diego Max e Anthony Freda; Política e comportamento. Estudante de Artes Visuais Licenciatura da Escola de Design UEMG - Universidade do Estado de Minas Gerais, Escola de Design, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Trabalho orientado pelos professores Eliane Meire Soares Raslan e André Borges da ED/UEMG. E-mail: jpmarroques@gmail.com 1

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 150 – 165, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. Texto recebido: 25.05.2015. Texto aprovado: 09.08.2015. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

Fonte: Diego Max. <http://diegomaxxx.wix.com/portifolio>; https://twitter.com/diego_maxxx/> Acesso em: 29 junho 2015. 3 Fonte: Anthony Freda. Disponível em: <www.anthonyfreda.com/> Acesso em: 20 junho 2015. 2

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 150 – 165, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638 <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Fonte: Site Oficial e twitter de Diego Max4

Anthony Freda (fig. 07-15)5 é ilustrador, escultor e designer norte americano com formação em bacharelado em belas artes com especialidade em ilustração pela Pratt Institute, em Nova York. Anthony já teve diversas publicações em revistas como New York Times, Rolling Stone, Time, The New Yorker, Esquire e Business Week. Para criar suas ilustrações o autor utiliza objetos antigos e encontrados como livros envelhecidos, pedaços de metal, madeiras, sucatas, desenhos ou pinturas antigas com as quais o autor realiza uma mistura de trabalhos manuais e depois as manipula digitalmente. Seus trabalhos incluem temas como guerra, poder, consumo, sociedade e questões da política americana. Abaixo trabalhos de Anthony Freda. Fig.07: Cogumelo

Fig.08: Revista

Fig.09: O Coelho

Fig.10: EUA

Fig. 11: O jogo

Disponível em: <http://diegomaxxx.wix.com/portifolio>; <https://twitter.com/diego_maxxx>. Acesso em: 20 junho 2015. 5 Fonte: Anthony Freda <www.anthonyfreda.com/> Acesso em: 20 junho 2015. 4

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cores fortes, predominantes e misturadas dão um tom lúdico ao trabalho do artista, que apesar de abordar temas tão tensos, consegue uma sutileza cômica e ironia em suas obras. Ainda assim o uso das cores se torna visível à qualquer público, tendo em vista que “tamanha a expressividade das cores que ela se torna um transmissor de idéias, tão poderoso que ultrapassa fronteiras espaciais e temporais. Não tem barreiras Fig.12: Kid

Fig.13: Juice

Fig.14: Fries

Fig.15: Kill

Fig.16: O Poder

nacionais e sua mensagem pode ser compreendida até por analfabetos” (FREITAS, 2007, p. 01). O artista ainda utiliza de cores cromáticas quentes como vermelho, laranja, amarelo e cromáticas frias como azul, verde e roxo e cores acromáticas como o contraste ente o uso do preto e do branco junto com cores cromáticas. Freitas explana que: As sensações visuais que têm apenas a dimensão da luminosidade são chamadas de acromáticas. Incluem-se todas as tonalidades entre o branco e o preto, quer dizer, o cinzaclaro, o cinza e o cinza-escuro, formando a chamada escala acromática. Já as sensações visuais compostas por todas as cores do espectro solar, são denominadas cromáticas (FREITAS, 2007, p. 03).

Fonte: Anthony Freda6

O termo “Ludo-política” aqui citado faz referência à forma como o autor aborda as temáticas em seu trabalho. “Ludo” é o radical da palavra “lúdico”, que de acordo com o Dicionário Aurélio Básico da Língua Portuguesa significa: adj. Que faz referência a jogos ou brinquedos: brincadeiras lúdicas. Que tem o divertimento acima de qualquer outro propósito. Que faz alguma coisa simplesmente pelo prazer em fazê-la. Sinônimos: Diversão, jogos, sátira, entretenimento, distração, ironia (AURÉLIO, 2015, p. XX).

O trabalho de Antony Freda costuma usar em seu trabalho a pesença de cores

A forma como Anthony Freda ilustra, junto com a questão lúdica e o uso das cores, também abrange a sua arte para um lado infantil, como o uso de personagens da

literatura infantil, palhaços, brinquedos, desenhos infantis e outras formas para retratar o “brincar” em seu trabaho. De acordo com Benjamin (1984): Se as crianças devem transformar-se em homens completos, então não podemos esconder delas nada que seja humano. (...) O fato que os pequeninos riem de tudo, mesmo dos reversos da vida, é consequência de uma esplendida expansão de uma alegria que irradia sobre tudo, até sobre as zonas mais sombrias e tristes. Pequenos atentados terroristas maravilhosamente executados, com príncipes que se despedaçam, mas que voltam a se recompor; incêndios que irrompem automaticamente em grandes lojas, invasões e assaltos. Bonecas-vítimas que podem ser assassinadas de diversas formas e seus correspondentes assassinos (...)” (BENJAMIN, 1984, p. 65).

e tons dominantes e exagerados, o que causam diversas sensações. Freitas aborda o 7

efeito que o uso das cores gera em uma imagem em seu artigo intitulado como “Psicodinâmica das cores em comunicação”: As cores enfim, têm a capacidade de liberar um leque de possibilidades criativas na imaginação do homem, agindo não só sobre quem admirará a imagem, mas também sobre quem a produz. Sobre o observador que recebe a comunicação visual, a cor exerce três ações: a de impressionar a retina, a de provocar uma reação e a de construir uma linguagem própria comunicando uma idéia, tendo valor de símbolo e capacidade. (FREITAS, 2007, p. 01).

Assim como Freitas explana, percebos que as cores nas obras de Freda são te extrema importância para a construção, principalmente de uma linguagem. O uso de Fonte: Anthony Freda. Disponível em: <www.anthonyfreda.com/> Acesso em: 20 junho 2015. 7 FREITAS, Ana Karina Miranda de. Psicodinâmica das cores em comunicação Disponível em: <http://www.iar.unicamp.br/lab/luz/ld/Cor/psicodinamica_das _cores_em_comunicacao.pdf>. Acesso em 12 de maio de 2015. 6

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Diante desta afirmativa conseguimos notar o lado não somente sátirico, mas também lúdico acerca das obras de Anthony Freda, a relação com infância, a brincadeira e os aspectos políticos (fig. 07-15). Nesta obra, intitulada como “O Jogo” (fig. 11) notamos a presença de um palhaço praticando um jogo de baralho em que as cartas do vencedor 8 são marcadas por bombas. Percebemos que há um tom de ironia pela existência do palhaço, uma alegoria do circo cuja função é gerar risos além de outro ponto a ser notado que é a 8

O ás é na maiorias dos jogos de baralho, a carta de maior valor. Autoria.

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existência de um jogo para além da brincadeira de cartas, mas para a questão do

nacional dos Estados Unidos da América e um dos símbolos nacionais mais famosos

vencedor. Pelas cartas que um personagem tem em mãos percebemos que ele será o

do mundo.

vencedor e que as mesmas cartas retratam o poder de quem possui mais armas, ou

A imagem que segue abaixo (Uncle Sam) foi utilizada em 1917 por James

maior poderio bélico. A ilustração também faz uma sátira ao jogo de poder que os

Flagg, a pedido das Forças Armadas dos Estados Unidos da América como uma

Estados com maior armamento fazem em relação a sua utilização principalmente

jogada de marketing para o recrutamento de soldados para a Primeira Guerra

como forma de dominação para com outros países. De acordo com Benjamin (1986):

Mundial. A imagem reside nos dias de hoje como uma crítica ao governo americano e

o estilo do terrorismo revolucionário, para o qual o Estado é um fim em si mesmo. Assim como Napoleão reconheceu bem pouco a natureza funcional do Estado enquanto instrumento de dominação da classe burguesa, tampouco os arquitetos. daquela época reconheceram a natureza funcional do ferro, com o qual o princípio construtivo principia a sua dominação na arquitetura.(BENJAMIN, 1986, p.31).

Assim como Benjamin explana, o Estado usa do seu poder para dominação

devido ao imenso poder que possui, tanto de controlar a vida das pessoas, quanto à morte delas. Notamos esse pode e a relação de não seriedade com ele em um filme de Stanley Kubrick com o nome “Dr. Strangelove or: How I Learned to Stop Worrying and Love the Bomb” que teve como tradução brasileira “Dr. Fantástico”, datado de 9

1964. A obra narra a história de uma possível Terceira Guerra Mundial gerada pela loucura e poder tanto do Estado como de seu exército durante a Guerra Fria. Ainda relacionado à imagem e ao filme podemos notar que apesar de ser um tema da atualidade na temática de Freda, Kubrick já apresentava uma imagem histórica à insanidade do poderio bélico e as questões armamentistas. Hobsbawn reflete em seu livro “A Era dos Extremos” que “os historiadores vão ficar intrigados com a aparente insanidade dessa explosão de febre militar, a retórica apocalíptica e o muitas vezes bizarro comportamento intencional de governos americanos.” (HOBSBAWN, p. 224). Mas o que notamos é que em ambas as épocas (passado e futuro) essa realidade ainda é existente. Nesta obra de Freda (fig.17), notamos uma imagem violenta com a representação de um braço utilizando vestimenta da bandeira dos Estados Unidos da América e um dedo de parafuso (broca) indicando para uma

guerras em que o país é participante. Benjamin descorre que “por qualquer que seja o efeito de uma determinada causa, ela só se transforma em violência, no sentido forte do termo, quando interfere em relações éticas” (BENJAMIN, 1986, p.160). O autor explana nesta afirmativa, assim como a ilustração de Freda, sobre a violência em relações éticas. Vale ressaltar que isso diz respeito ao que é anti-ético ou seja, que não respeite ou viole a cidadania, os direitos humanos - como o direito à vida, dentre outros. A obra de Freda (fig. 18-19) também retrata da inferioridade do sujeito perante o Estado, principalmente pelos Estados Unidos da América e o seu poderio tanto político, como bélico. Nesta ilustração de Freda percebemos uma alusão à obra literária “The Wonderful Wizard of Oz” traduzida como “O Mágico de OZ” de L. Frank Baum11 com a presença de um dos personagens, O Homem de Lata. De acordo com o livro o personagem encontra Dorothy12e vai com ela em busca do Mágico para adquirir um coração para si, pois ele acredita que só assim será capaz de amar novamente. Freda também utiliza de personagens ao fundo da sua ilustração em forma de pessoas humanas que parece se identificar com o homem de lata. Há ainda a presença de uma mão vinda de outro plano, superior dando óleo13 ao personagem. O Homem de Lata é também uma representação do trabalhador da revolução industrial e dos seus efeitos humanísticos. Na obra literária o personagem indaga “Poderá um homem sem coração ter

pessoa. Esta imagem faz referência à imagem do Tio Sam10 que é a personificação

alma?” E é essa a relação que Freda faz em sua ilustração referindo ao Homem de

Fonte: Filme. Dr. Strangelove. Diretor Kubrick. EUA: 1964. 103 min. 10 Origem do Tio Sam: O Símbolo dos Estados Unidos. Disponível em: <http://www.culturamix.com/cultura/curiosidades/origem-do-tio-sam-o-simbolo-dos-estados-unidos>. Acesso em 12 de maio de 2015.

BAUM , L. Frank. O Mágico de Oz. Disponível em <http://www.zahar.com.br/livro/om%C3%A1gico-de-oz-edi%C3%A7%C3%A3o-comentada-e-ilustrada>. Acesso em 12 de maio de 2015. 12 Protagonista da obra literária O Mágico de Oz. 13 Na obra literária O Mágico de Oz o Homem de Ferro de alimenta de óleo.

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ao excesso de recrutamento para o seu exército, as mortes dos soldados e as diverças

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Lata como o operário fabril e o dementador14como o patrão. Benjamin aborda em seu

de largura. De acordo com historiadores, para conceber tal monumento foi necessário

texto “Paris, capital do século XIX” que “Os saint-simonianos15 previram a evolução

o uso da mão de obra de milhões de pessoas, principalmente de escravos que

econômica mundial, mas não a luta de classes. Participaram nos empreendimentos

trabalhavam até a exaustão e recrutas como mão-de-obra.

industriais e comerciais por volta de meados do século, mas nada fizeram nas

Fig.18: Uncle Sam

Fig.19: Obras

Fig.20: O Mágico de Oz

Fig.21: Muralha

questões concernentes ao proletariado” (BENJAMIN, 1986, p.36). Sendo assim, percebemos que historicamente o trabalhador proletariado vem sendo deixado de lado, assim como suas reivindicações, as explorações e outras questões. O operário na obra de Freda representa um indivíduo sem alma e sem coração, princípios básicos para se ser humano. Desta forma, a sua vida de explorado e a forma como é visto pelos burgueses o desumaniza. O amor, para o Homem de Lata é a única saída cabível para voltar a se humanizar. Segundo BAUMAN, em sua obra “Amor Líquido”: E assim é numa cultura consumista como a nossa, que favorece o produto pronto para uso imediato, o prazer passageiro, a satisfação instantânea, resultados que não exigem esforços prolongados, receitas testadas, garantias de seguro total e devolução do dinheiro. A promessa de aprender a arte de amar é a oferta (falsa, enganosa, mas que se deseja ardentemente que seja verdadeira) de construir a “experiência amorosa à semelhança de outras mercadorias, que fascinam e seduzem e exibindo todas essas características e prometem desejo sem ansiedade, esforço sem suor e resultado sem esforço. Sem humildade e coragem não há amor. Essas duas qualidades são exigidas, em escalas enormes e contínuas, quando se ingressa numa terra inexplorada e não-mapeada. É a esse o território que o amor conduz ao se instalar entre dois ou mais seres humanos (BAUMAN, 2004).

Fonte: DC Walkabout17

algo, como a sua forma de desumanização pela falta da alma/coração. A imagem abaixo faz uma representação da Muralha da China ou Grande Muralha (fig. 21) com ícones de diversas empresas tecnológicas anexadas a ela, como Facebook, Google, eBay, Youtube, dentre outras. A Muralha da China é um monumento considerado uma das sete maravilhas do mundo antigo, sua construção teve inicio no ano 220 A.C. e 16

sua conclusão ocorreu somente no século XVI, na dinastia Ming e possui aproximadamente 8.851,8 quilômetros de extensão, 7,5 metros de altura e 3,75 metros 14 Na obra Harry Potter de J.K. Rowling o dementador é uma criatura das trevas, considerada uma das mais repulsivas que habitam o mundo. Os dementadores se alimentam da felicidade humana e, portanto provocam depressão e desespero em qualquer um que esteja próximo deles. 15 Seguidores do Conde de Saint-Simon, pensador do socialismo cristão. 16 As sete maravilhas do mundo antigo são uma famosa lista de majestosas obras artísticas e arquitetônicas erguidas durante a antiguidade.

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Fonte: Zahar19

Fonte: Anthony Freda20

A obra de Anthony Freda também faz uma representação da China em sua atualidade com a produção tecnológica e principalmente de equipamentos eletroeletrônicos. Esse exesso se produção nesse país em específico se da pelo baixo custo de produção e mão de obra. Segundo o professor do Instituto Brasileiro de Mercados de Capitais (Ibmec) Gilberto Braga alguns dos motivos desse fator beneficiário em vista mercadológica para a produção barata é que: Eles produzem em escala muito maior, o que determina diferentes mixes de produtos e de despesas. As leis trabalhistas também são menos rígidas, o que determina um custo de mão de obra mais baixo e não têm a mesma carga tributária elevada sobre a produção e o lucro como no Brasil 21.

Desta forma, é possível fazer um link entre a necessidade do homem moderno ou Homem de Lata com essa busca tanto pelo amor como forma de suprir a falta de

Fonte: Anthony Freda18

No trabalho de Diego Max existe a presença de questões políticas, sociais, econômicas e tecnológicas, podemos ver isso em suas obras (fig. 22-24). Em sua primeira ilustração abaixo (fig. 22) percebemos o vazio do homem moderno, que vive a procura de se completar, a procura do amor, de um coração figurativo ou do ser/se tornar humano em uma sociedade que o vê como marionete, que o controla e manipula de diferentes formas, assim como a relação de Freda e o Homem de Lata. Fonte: DC Walkabout. Disponível em:< http://dcwalkabout.com/blog/uncle-sam-i-want-you-for-usarmy-1917/>. Acesso em 1 de julho de 2015 18 Fonte: Anthony Freda. Disponível em: <www.anthonyfreda.com/> Acesso em: 20 junho 2015. 19 BAUM , L. Frank. O Mágico de Oz. Disponível em <http://www.zahar.com.br/livro/om%C3%A1gico-de-oz-edi%C3%A7%C3%A3o-comentada-e-ilustrada>. Acesso em 12 de maio de 2015. 20 Fonte: Anthony Freda. Disponível em: <www.anthonyfreda.com/> Acesso em: 20 junho 2015. 21 BRAGA, Gilberto. Entenda porque os Chineses Cobram Tão Mais Barato. Disponível em: < http://economia.terra.com.br/operacoes-cambiais/pessoa-fisica/entenda-por-que-os-sites-chinesescobram-tao-mais barato,560cd31a327c1410VgnVCM20000099cceb0aRCRD.html> Acesso em 13 de jun de 2015. 17

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Nas demais ilustrações (fig. 23-24) o artista abordas questões existentes no cotidiano tecnológico do homem moderno, como o uso da câmera digital a vitrola radiofônica, ambas anexadas em partes do corpo humano, o que pode fazer relação com a mecanização do homem e com o conceito de homem máquina, que não só se apropria das parafernálias hi-tec, mas que se torna parte dela, quase fisicamente. Fig 22-24. Trabalhos de Diego max

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carreiras promissoras desaparecem de uma hora para outra, softwares caríssimos se tornam obsoletos e são substituídos por outros em pouco tempo (FORBES, 2010).

Com isso, notamos a fragilidade pela qual os objetos passam e a fantasmagoria que logo se tornam. Compramos um computador e em menos de um ano somos induzidos a troca-lo por um melhor. Temos um celular de marca x e em alguns meses queremos troca-lo por outro de uma nova marca e com mais funcionalidades. Um e-mail chega, é respondido e sem seguida esquecido. Assistimos Fonte: Blckdmnds22

Temos no trabalho de Diego Max (fig. 22-24), um modo moderno de ilustrar. Nem Frank Frazetta, nem Charles Burns ou Robert McGinnis. Hoje, o assunto no BLCKDMNDS é um ilustrador brasileiro que vem tendo seu excepcional trabalho reconhecido recentemente. Diego Max é autodidata e vive de música, design e ilustração. Morador icônico de São Paulo, toca seu projeto musical – out track records – em alguns bares da capital e leva sua arte para os pôsteres que anunciam as apresentações. Talvez agora, depois de dar uma olhada mais a fundo em seu trabalho, você seja capaz de identificar alguns deles perdidos pela capital. Assim, como grandes nomes da ilustração nacional, como Walter Tierno, Rafael Grampá e Bá & Moon, Diego tem um estilo jovem e inovador com o qual atraiu olhares para suas obras. Resultado disso é capa última edição da Revista da Cultura, que traz um de seus trabalhos em ilustração. É o Brasil mostrando um pouco mais dos seus talentos. Nem só de samba – bom – vivem as terras tupiniquins. (BLCKDMNDS)23

Podemos refletir em um olhar para o que essas mídias representam. Nesse

mundo que o Bauman define como “Modernidade Líquida”, notamos a fluidez da informação e da presença do indivíduo. Forbes24 discorre que: Para Zygmunt Bauman, estamos presenciando a acelerada “liquefação” das estruturas e instituições sociais. A modernidade anterior, “sólida” regida por laços estáveis e estruturas sociais verticalizadas, dá lugar a uma modernidade “líquida”, onde as estruturas e os laços sociais não conseguem se manter por muito tempo; são fluidos, instáveis, mais efêmeros e menos duradouros. Nessa sociedade, nada permanece, nada é certo ou definitivo: pessoas de destaque são relegadas ao anonimato, novidades se tornam velhas e descartáveis, grandes empresas e corporações vão à falência ou são engolidas por outras mais poderosas, BLCKMNDS. Leave a Comment. Diego Max e os rumos da Ilustração no Brasil. 15.01.2014. Disponível em: <http://www.blckdmnds.com/tag/artistas-brasileiros/page/2/> Acesso em: 10 maio 2015. 23 BLCKMNDS. Leave a Comment. Diego Max e os rumos da Ilustração no Brasil. 15.01.2014. <http://www.blckdmnds.com/tag/artistas-brasileiros/page/2/> Acesso em: 10 maio 2015. 24 FORBES, Jorge. Modernidade líquida de Bauman e Internet. Dispo nível em: <http://www.espacocuidar.com.br/psicologia/artigos/modernidade-liquida-de-bauman-e-internet> Acesso em: 12 maio 2015. 22

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a um vídeo no YouTube e em algumas semanas ele já se tornou obsoleto, fora de moda. Abrimos a Timeline e observamos um mar de informações de sujeitos conhecidos ou desconhecidos, de uma imagem ou de um reflexo escolhido por cada um, lemos superficialmente a uma notificação, volátil, que acaba se tornando uma fantasmagoria. Benjamin diz que a indústria de diversões “inaugura uma fantasmagoria a que o homem se entrega para se distrair. A indústria de diversões facilita isso, elevando-o ao nível da mercadoria. O sujeito se entrega às suas manipulações, desfrutando a sua própria alienação e a dos outro.” (BENJAMIN, 1986, p.37). A indústria da diversão ou entretenimento facilita o meio da informação ao mesmo tem em que a deixa mais superficial, branda e mercadológica. Forbes explana que: Bauman acredita que, ante a fragilidade dos relacionamentos, as pessoas estão privilegiando a quantidade ao invés da qualidade. Assim, multiplicam-se e acumulam-se relacionamentos, buscando-se a salvação nas redes, “cuja vantagem sobre os laços fortes e apertados é tornarem igualmente fácil conectar-se e desconectar-se”, como no Orkut. Há muitas vantagens, entre elas, que no mundo todo, protestos têm sido organizados através da Internet, reunindo milhares de pessoas. Um exemplo é a Petição pró-células-tronco embrionárias, assinada por mais de 100 mil internautas. Acreditamos que a tecnologia pode ser boa ou ruim, o que vai definir será o uso feito dela. (FORBES, 2010).

Desta forma notamos que tanto no trabalho de Bauman, Benjamim e Freda seus temas são extremamente atuais para a nossa modernidade e realidade social. Buscando o artista Diego Max o mesmo também é identificável com os demais autores aqui citados, principalmente com Benjamin. A relação de Max com o autor é da aproximação do ser humano com a tecnologia, principalmente de equipamentos e recursos de entretenimento, de tal forma, que um se torna pertencente do outro de maneira que o mercado se apropria disso para a fomentação da indústria da distração. Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 150 – 165, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638 <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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A partir disso o sujeito se entrega a essas manipulações tornando-se um fantasma de Considerações Finais

si mesmo e de sua própria alienação.

Com isso podemos afirmar que Anthony Freda e Diego Max se relacionam, apresar de viverem em contextos diferentes, de forma sililar tendo em vista

Artistas Relacionados com Anthony Freda e Diego Max

principalmente à questão ludo-política, suas temáticas e abordages, mas diferem em

Outros dois artistas que fazem um trabalho relacionado ao de Anthony Freda e Diego Max são: Pawel Kuczynsk (Polônia) e Banksy (Inglaterra). Em ambos os artistas percemos uma preocupação política em suas obras, sempre com temas relacionados ao poder, ao exército, a figuras políticas, questões sociais e etc. Nas imagens abaixo podemos notar essa semelhança visualmente no trabalho dos dois artistas. Fig.17: Paz

Fig.18: Paz

Fig.19: Facebook

Fig.20: Rede Social

relação à referência estrutural em relação aos temas principalmente em questões de vicência como é o caso da política bélica presente fortemente em Anthony Freda (EUA) e de política social, também presente em Freda, mas abordada com maior ênfase em Diego Max (BRA). Referências Bibliográficas AURELIO, O mini dicionário da língua portuguesa. 4a edição revista e ampliada do mini dicionário Aurélio. 7a impressão – Rio de Janeiro, 2002.

_________. Modernidade Líquida. Tradução: Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Zahar, 2003. 258p. BAUMAN, Zygmunt. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2004.

Fonte: Banksy25

Fonte: Anthony Freda26

Fonte: Pawel Kuczynski27

Diante destas ilustrações aqui citatas e dentre tantas outras destes artistas, percebemos que ambos trabalham questões de crítica política e social através de recursos artísticos, principalmente da ilustração e a visão sobre a contemporaneidade. A diferença nos trabalhos de Diego Max e Anthony Freda está na questão da abordagem. Diego Max sugere a guerra e violência, enquanto Anthony Freda deixa evidente nestes pontos. Entendemos que nete caso tem mais haver com o fato dos EUA ter vivenciado a guerra com muito mais proximidade que os brasileiros, logo as

BENJAMIN, Walter. Crítica da Violência: Crítica do Poder. In: Documentos de Cultura, Documentos de Barbárie. Trad. Willi Bolle. São Paulo: Cultrix-Edusp, 1986. _________. Paris, Capital do século XIX. In: KOTHE, F. (org). Walter Benjamin. São Paulo: Ática, 1991. _________. Velhos Brinquedos. In: Reflexões: a criança, o brinquedo, a educação. São Paulo: Summus, 1984, p. 65.

HOBSBAWN, Eric. A era dos extremos: o breve século XX. 1941-1991. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 90.

SEABRA, Mário. Jogos de Cartas. São Paulo: Abril, 1978.

influencias diretas não ocorreram com Diego Max.

25 KUCZYNSKI, Pawel. Disponível em: <http://www.pawelkuczynski.com/index.php/> Acesso em 12 de maio de 2015. 26 Fonte: Anthony Freda. Disponível em: <www.anthonyfreda.com/> Acesso em: 20 junho 2015. 27 KUCZYNSKI, Pawel. Disponível em: <http://www.pawelkuczynski.com/index.php/> Acesso em 12 de maio de 2015.

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 150 – 165, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638 <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Colagens: A janela de esquina do meu primo, por Daniel Bueno Ribeiro1

Júlia Barros Marina Araujo Mintz Rafaella Santos Rêda Resumo expandido Buscamos o mundo complexo abordado por Rafael Cardoso e o Design emocional para analisarmos os objetos do dia-a-dia com Donald Norman. Entendem que nos objetos estão contidos inúmeros significados, cuja interpretação envolve a personalidade de quem os observa e utiliza. Dentro desse pensamento, vamos retratar os trabalhos de Daniel Bueno com as ilustrações do livro de E.T.A. Hoffmann, A janela de esquina do meu primo. Também, buscamos os trabalhos de colagem dos artistas brasileiros Bárbara Scarambone e Mário de Alencar, que estão cheia de fatos sociais, políticos e econômicos para contribuir com análise. Palavras-chave Ilustração; Semiótica; Daniel Bueno Os ilustradores: Daniel Bueno, Bárbara Scarambone e Mário de Alencar Nascido em São Paulo, em 1974, e formado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo em 2001, Daniel Bueno atua no mercado como ilustrador, quadrinista e artista gráfico. É possível perceber em seus trabalhos muitos contornos geométricos, texturas, colagens e uma brincadeira com a fantasia e o grotesco. Atualmente, ele contribui com várias revistas, jornais e editoras de livros, tais como Folha de São Paulo, Cosac Naify, Companhia das Letras e Revista da Livraria Cultura. Um de seus trabalhos foi a ilustração do livro de E. T. A. Hoffmann, A janela de esquina do meu primo. Com ele, ganhou diversos prêmios, como o Prêmio Bologna Ragazzi (2011) e o Prêmio FNLIJ Monteiro Lobato (2011), além de ser selecionado para o 3x3 Annual, o Society Estudantes do curso de Design de Produto Manhã da Escola de Design UEMG - Universidade do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Artigo orientado pelos professores André Borges e Eliane Meire Soares Raslan da ED/UEMG. E-mail: <marinaamintz@gmail.com>. 1

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 166 – 181, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. Texto recebido: 20.05.2015. Texto aprovado: 10.05.2015. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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of Illustrators Annual, o 200 Best Illustrators Worldwide, entre outros. Como recebeu diversos prêmios, por esse e por outros trabalhos, de várias partes do mundo, ele é um profissional reconhecido em diferentes países. Bárbara Scarambone é uma ilustradora surrealista. Nasceu em Brasília, em 1987, mas vive atualmente em São Paulo. Ela trabalha com a colagem à mão, com a técnica cut & paste. Essa técnica utiliza somente tesouras, cola, revistas vintages, jornais e livros. Seu trabalho é considerado surrealista. Já Mário de Alencar é um curitibano que se denomina artista de mídia mista, que trabalha com as técnicas de colagem, aquarela, gravuras, entalhes, arte sequencial, entre outras. O livro: A janela de esquina do meu primo Escrito por Ernst Theodor Amadeus Wilhelm Hoffmann (1776-1822), o livro A janela de esquina do meu primo tem teor autobiográfico. O escritor foi acometido por uma doença degenerativa que o deixou na cadeira de rodas, impedindo-o de sair de casa, mas, mesmo com esta dificuldade, ainda conseguia escrever. Seu único contato com o mundo exterior era a sua janela, da qual era possível observar a praça Gendarmenmarkt, em Berlim, na Alemanha, onde acontecia uma feira de alimentos. O autor é um dos precursores do realismo e a história é bem marcada por descrições e percepções sobre a sociedade de Berlim do século XIX. A história do livro envolve dois personagens, o “Eu” e o “Primo”, este paralítico e impossibilitado de sair de casa. Os dois passam o dia observando o movimento da feira pela janela, divagando e criando histórias sobre as pessoas que passam. Devido ao fato dessas histórias serem desenvolvidas a partir das primeiras impressões dos primos, é percebida a semelhança com o design no nível visceral, explicado por Norman (2008), no qual os aspectos físicos - aparência, toque e som - dominam as reações do público no primeiro contato com o objeto, neste caso os utilizados pelas pessoas da feira, transmitindo significados e fazendo com que a mente associe tudo que é visto a fatos já conhecidos. É importante ressaltar que o livro não é voltado para o público infantil. É destinado ao público infanto-juvenil e adultos. A técnica de colagem dá, portanto, um ar mais maduro e deixa a ilustração mais interessante para o público ao qual se destina. Para estimular o público, Daniel Bueno utiliza referências de outros artistas, como Pieter Bruegel (1525-1569), um dos mais representativos pintores flamengos de sua época, que tinha grande apreço por representar o Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 166 – 181, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638 <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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espaço urbano com todo o seu movimento e grande quantidade de pessoas. Além dele, também

Fig. 01: Colagem por Mário de Alencar

Fig. 02: Colagem por Bárbara Scarambone

é possível perceber relação com o trabalho de George Grosz (1893-1959), conhecido por suas caricaturas selvagens. Por fim, com o uso de fotografias de revistas antigas, como a Vanity Fair dos anos 20 e 30, o ilustrador traz um ar de contemporaneidade sem deixar de marcar a imagem com a época em que foi escrito o livro de E.T.A. Hoffmann. Uma imagem nunca é neutra, uma vez que traz em si uma carga de significados, podendo ser percebida por meio de todas as referências que o ilustrador traz para o trabalho, além de ser constituída de uma variedade de elementos, que é o que parece deleitar e prender a atenção do ser humano por motivos psicológicos profundos (CARDOSO, 2012). As ilustrações e reflexões semióticas As colagens dos artistas brasileiros Mário de Alencar (fig. 01) e Bárbara Scarambone (fig. 02), mostradas abaixo, assim como as colagens de Daniel Bueno apresentadas posteriormente, evidenciam características da época em que foram feitas. Assim como Bueno,

Fonte: Lounge2

a colagem de Mário de Alencar retrata o contexto de outro período, com Mao Tse-Tung e a Guerra do Vietnam, de maneira atual. Todas estas ilustrações utilizam fragmentos ou pessoas inteiras em conjunto com recortes de paisagens, tecidos, fotos e outras ilustrações de diversas épocas, transformando em um trabalho contemporâneo. As inversões e desvios de valores são abordadas de forma imagética nas colagens e nos possibilita releitura, comparando com a atualidade.

Fonte: Simplistanapista3

Hoffmann, como um escritor realista, traz para o seu trabalho a percepção do lugar da mulher na sociedade de Berlim do século XIX, além das opiniões masculinas sobre o assunto, explorando os dois lados da questão. A imagem abaixo representa um bom exemplo de tal percepção.

Fonte: Obvius – As colagens e aquarelas de Mário de Alencar. Disponível em: <http://lounge.obviousmag.org/aleatoriedades/2014/03/as-colagens-e-aquarelas-de-mario-de-alencar.html> Acesso em: 25 junho 2015. 3 Fonte: Simplistanapista. Daniel Bonfim. Colagens surrealistas pelas mãos da brasileira Bárbara Scarambone. 14.02.2014. Disponível em: <http://www.simplistanapista.com/category/arte/page/6/> Acesso em: 25 junho 2015. 2

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"(...) faz alguns minutos que me chamam a atenção aquelas altas e rígidas plumas brancas que se sobressaem em meio à densa multidão. Finalmente a figura desponta bem rente à bomba hidráulica: uma mulher alta e esbelta de aparência nada desprezível - está trajando um casaco rosado de pura seda, novinho em folha -, o chapéu é da última moda, adornado com um véu em renda delicada, luvas brancas de seda" (HOFFMANN, 2010, p.39)

Fig. 03: Ilustração de Daniel Bueno

A imagem retrata uma mulher bem vestida, o que leva a pensar que ela seja de uma camada social alta, devido à dissonância entre o vestuário usado por ela e o das outras pessoas que também frequentam a feira. A constatação, demonstrada no livro, de que pessoas de classes altas frequentam a feira leva os primos a iniciarem uma discussão sobre as opiniões divergentes que existiam na sociedade de Berlim da época, a respeito de quais lugares as mulheres bem nascidas deveriam frequentar. Lembrando que a mulher do século XIX era submissa, considerada inferior ao homem, seus direitos eram restritos e sofriam com constantes preconceitos. As vestes da mulher, mostradas na imagem em questão, são importantes para distinguila e para especular sobre a sua classe social e seu estilo de vida, se relacionando ao design reflexivo, tratado por Norman (2008). Esse nível de design diz respeito à imagem que o produto carrega, podendo ser de poder, de riqueza, como a senhora na ilustração, e quando pessoas observam os objetos carregados por outras, como o uso de roupas adequadas para cada ocasião, elas estão atentas à imagem reflexiva. Na ilustração que representa toda a feira (fig. 09) podemos perceber que essa mulher é a uma das poucas personagens que tem todo o rosto voltado para a frente, sem cortes, e portanto, presume-se que o ilustrador fez tal escolha a fim de representar o destaque que ela ganha na feira, além do tom desafiador que ela adquire, por ir contra a convenção de que mulheres ricas não frequentam a feira, olhando diretamente para o observador. A imagem também evidencia uma desigualdade social, através das cores usadas: a mulher supostamente rica é retratada em cores mais vivas e diferentes, trajando um vestido feito de tecido ricamente bordado, enquanto a criada, logo atrás, é retratada em cores mais soturnas, mais simples e chamando menos atenção. A escolha das fotos pelo ilustrador para representar cada camada social também é Fonte: Livro A janela de esquina do meu primo, p. 344

simbólica. A mulher em trajes elegantes tem um rosto mais confiante, enquanto a criada e uma das vendedoras da feira têm rostos mais jovens, ingênuos, ou bem mais velhos e cansados, como a vendedora no plano de fundo.

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Disponível em: <http://buenozine.com.br/A-janela-de-esquina-do-meu-primo>. Acessso em: 25 jun 2015.

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Fig. 04: Ilustração de Daniel Bueno, p. 49.

que é uma briga, pois as feições bravas e a linguagem corporal se relacionam com imagens conhecidas previamente. A escolha das fotos de senhoras com expressão séria ajuda a criar um clima hostil entre as personagens, que estão em posição de confronto, de frente uma para a outra. A técnica usada para representar as barracas nessa região dá a sensação de desorganização devido a sobreposição, o que serve de complemento ao texto e cria a sensação de tumulto. Fig. 05: Ilustração de Daniel Bueno, p. 14-15.

Fonte: Livro A janela de esquina do meu primo 5 “Olhe, olhe, primo, surgiu um tumulto lá junto à igreja. Duas verdureiras entraram em áspero conflito provavelmente por causa da indefectível questão do Meum e Teuem e, com os punhos fincados nas ancas, parecem se recobrir de finas expressões” (HOFFMANN, 2010, p.48)

A imagem acima retrata a briga entre duas comerciantes da feira. Nesse momento

Fonte: Livro A janela de esquina do meu primo 6

Hoffmann (2010) descreve a situação envolvendo muito barulho, bagunça, tumulto e confronto

e os objetos espalhados no canto esquerdo da cena. As projeções das frutas e legumes

"(...) está vendo aquela mulher vestida com roupas excêntricas e com o vassoureiro, vai desempenhando rapidamente tarefas domésticas diferentes daquelas relacionadas à nutrição do corpo? (...) Elas está usando um lenço claro, cor de limão siciliano, como um turbante enrolado em torno da cabeça à moda francesa; o seu rosto, tanto quanto toda sua figura, indica claramente uma francesa. Provavelmente uma remanescente da última guerra que veio para cá tirar proveito da situação." (HOFFMANN, 2010, p. 17)

espalhados no entorno colaboram para construir a atmosfera explosiva narrada no livro. A

Nesse momento da história, os primos observam uma mulher que se desloca ao longo

entre as pessoas. A imagem representa bem o momento: é possível reconhecer que existe um movimento entre as personagens, tanto pela proximidade entre elas como pela quantidade de elementos na imagem, tais como as barracas próximas e sobrepostas, o número de personagens

posição dos membros também ajuda a construir essa percepção, pois as mulheres estão com os braços levantados na direção uma da outra e, segundo Cardoso (2012), as aparências dos objetos, no caso as mulheres, nos remetem a vivências ou hábitos, por isso consegue-se entender 5

Disponível em: <http://buenozine.com.br/A-janela-de-esquina-do-meu-primo>. Acesso em: 25 jun 2015.

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da feira e exerce várias atividades. Essa mulher tem vestes detalhadas e por isso se destaca na multidão, além de ser uma das poucas mulheres sozinhas, diferente da maior parte das pessoas que frequentam a feira. Além de se destacar pela excentricidade do estilo de roupas, a 6

Disponível em: <http://buenozine.com.br/A-janela-de-esquina-do-meu-primo>. Acesso em: 25 jun 2015.

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observação da cena leva os espectadores a criar uma história que justifique a presença desta

Fig. 06: Children's Games (1560), de Pieter Bruegel7

figura feminina particular na feira. Em vista disso, eles a identificam como uma estrangeira, simplesmente pelo modo de vestir. O olhar concentrado que ela tem nas atividades que realiza colabora para criar a imagem de uma mulher ocupada, atenta ao que está fazendo. Além do olhar, também é possível perceber um posicionamento diferente do corpo, com o corpo voltado para um lado enquanto o braço e o rosto se voltam para o lado oposto, dando a ideia de movimento, que condiz com a quantidade de tarefas que ela realiza na feira. Os primos usam o recurso da memória para fazer associações e criar uma história a respeito da mulher, utilizando como base as emoções próprias de cada um, criando uma percepção única (CARDOSO, 2012). Além disso, a personagem de classe social indefinida, apesar de aparentar pertencer a uma classe mais elevada, chama a atenção por frequentar a feira sozinha, a fim de cumprir suas tarefas. O fato de a personagem não ter nenhum acompanhante é, também, motivo para divagações dos primos. Cria-se a ideia de uma pessoa refugiada da guerra que não tem família ou amigos no local. A descrição traz, mais uma vez, um assunto contemporâneo para a época, quando fala sobre os imigrantes da guerra. A dimensão material da situação da mulher, ou seja,

Fig. 07-08: Recortes da obra Children's Games (1560), de Pieter Bruegel

a constatação de que ela está sozinha, tem também uma dimensão imaterial, que é o motivo pelo qual ela se encontra sozinha, fato que os primos atribuem ao acontecimento da guerra (CARDOSO, 2012). Esse recorte da praça é especialmente tumultuado, com muitas sobreposições. Existe um grande número de barracas concentrados nesse ponto e a maneira como as personagens são representadas dá a ideia de que uma foto foi espontânea: pessoas cobertas pelo topo das barracas, umas pessoas na frente das outras e muitas realizando tarefas ao mesmo tempo. Esse

Fonte: Geopolicraticus8

tipo de representação, como se fosse uma fotografia tirada de surpresa, é uma releitura da pintura realista, que traz a ideia de mostrar a cena da maneira como ela aconteceu, sem maquiála. Usar referências da pintura realista foi uma maneira interessante de estabelecer comunicação com o texto de Hoffmann, que faz parte do movimento do Realismo da literatura.

Esta obra de Pieter Bruegel ilustra a grande semelhança entre a praça, de Daniel Bueno, no livro e o trabalho de Bruegel, que foi utilizado como referência para a criação das ilustrações. A grande praça com várias histórias se desenrolando pode ser vista de longe, como um todo, ou fazer recortes, para ver os detalhes e entender a brincadeira de cada grupo de crianças. A

Disponível em: <https://acvoice.files.wordpress.com/2013/01/bruegel_play.jpg>. Acesso em: 25 jun 2015. Disponível em: <https://geopolicraticus.files.wordpress.com/2011/11/breugel-games.jpg>; <http://blog.oup.com/wp- content/uploads/2014/02/knucklecrop.jpg>. Acesso em: 20 junho 2015. 7

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pintura mostra crianças, ao contrário da praça de Bueno, que mostra adultos. A representação

foram dispostas ajudam a construir todo o movimento e os ruídos que acontecem na cena.

de juventude, na obra de Bruegel, é carregada de uma seriedade adulta, enquanto a ilustração

Existem aglomerações de personagens em alguns pontos enquanto os prédios recortados são

apresenta de uma forma mais brincalhona, principalmente devido à técnica de colagem. O teor

sobrepostos, o que colabora para criar uma atmosfera de movimento. Além disso, é possível

adulto da história combina com as ilustrações, já que estas se apresentam com mais leveza e

perceber a maneira como as personagens são diferentes umas das outras não só pelo rosto, mas

dinamismo. A técnica de colagem digital sendo utilizada para representar uma cena de 1822

pelo corpo, pelos trajes e pelos trejeitos, sendo possível até especular a respeito de sua classe

faz com que ela se pareça contemporânea, apresentando o contraste entre o velho e o novo,

social e seus gostos, o que compõe a cena de maneira a criar a sensação de diversidade. No

assim como na comparação entre as ilustrações de Bueno e as obras de Bruegel.

decorrer da história, Hoffmann descreve minuciosamente seus personagens e a imagem (fig.

Fig. 09: Ilustração de Daniel Bueno

09), colocada ao final do livro, complementa o enredo e possibilita a visualização dessas personagens. Berlim, capital e maior cidade da Alemanha, já iniciava seu processo de industrialização na época em que foi escrito o livro. O grande número de pessoas e o movimento que elas traziam para a cidade podem ter sido influência para as percepções contidas no livro e, por consequência, a maneira pela qual a imagem foi desenvolvida. É possível perceber o paralelo entre a ilustração do livro e a foto da praça tirada de local próximo da janela do apartamento do escritor. A semelhança entre as imagens (fig. 09 e fig. 10) é demonstrada tanto na disposição dos elementos no espaço, quanto no movimento e no fluxo de pessoas. Fig. 10: Foto da praça de Gendarmenmarkt, no século XIX

Fonte: Livro A janela de esquina do meu primo, p. 54-559

“Toda a feira parecia uma única massa humana, bem concentrada, de forma que se poderia pensar que uma maçã atirada do alto jamais conseguiria chegar ao chão.”

Fonte: Site vwin Org10

(HOFFMANN, 2010, p. 13) A imagem foi feita por meio da técnica de colagem digital e sua construção foi feita de forma a complementar a história do livro. A maneira como os prédios, as pessoas e as barracas 9

Disponível em: <http://buenozine.com.br/A-janela-de-esquina-do-meu-primo>. Acesso em: 25 jun 2015.

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Durante a história narrada no livro, ocorre um movimento de aproximação e distanciamento das cenas que se passam na praça, bem demonstrado na solução de imagem que Disponível em: <http://www.vwmin.org/o-homem-de-areia-eta-hoffmann-1776-1822.html>. Acesso em: 25 jun 2015. 10

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o ilustrador deu ao livro, com uma grande ilustração que contém várias cenas. Isso se relaciona ao fato de que, mesmo dentro de uma grande concentração de pessoas, como acontece na feira, cada pessoa está vivendo a própria história, podendo ou não se relacionar à de outra pessoa. Ao longo do livro alguns recortes da ilustração da feira, vista de longe, são colocados em destaque e mostram qual é a cena que as personagens observam naquele instante. Isso demonstra a grande sintonia entre as ilustrações e o texto do livro. Hoffmann, como um escritor realista, se ateve aos pequenos detalhes e Daniel Bueno se ateve a essa descrição minuciosa de trajes e trejeitos para a construção da imagem, algo que, de fato, não poderia ser desconsiderado. Outro aspecto a ser considerado é a escolha de cores. Hoffmann foi um escritor admirado em sua época, mas quando acometido pela doença isolou-se da sociedade em seu

Considerações finais Através da técnica da colagem, muito utilizada nas ilustrações contemporâneas, é possível expor críticas sociais, demonstrar insatisfações e apresentar costumes da uma época, podendo ou não ser a atual. Os ilustradores expostos ao longo do artigo, Daniel Bueno, Mário de Alencar e Bárbara Scarambone, utilizam desta técnica, além de outras, para produzir seus trabalhos. No livro de E.T.A. Hoffmann, as ilustrações de Bueno tiveram um importante papel para demonstrar os fatos descritos pelo autor, retratando-os fielmente, além de expor as críticas relatadas. Logo, este artigo é um meio de apresentar alguns trabalhos destes artistas e, consequentemente, exemplos de mensagens que podem ser passadas com a colagem.

apartamento, o que fez com que fossem criadas histórias sombrias sobre o seu estado. O escritor era retratado como uma personagem de histórias de terror, o que colaborou para a escolha de tons soturnos da imagem do livro. Toda a feira é coberta por tonalidades que remetem a essa percepção que a população tinha do escritor e que o escritor tinha da população. Além dessa relação que confere uma visão sombria à cena, os tons escuros e pastéis também se relacionam com os tons de uma fotografia antiga, o que colabora para a percepção de uma velha Berlim, contextualizando-a bem com o momento em que o livro foi escrito. As fotos utilizadas para retratar os rostos das personagens também ajudam a compor uma cena do século XIX. Elas são extraídas de revistas antigas, como a Vanity Fair dos anos 20, mas mesmo sendo de aproximadamente um século depois da descrição da praça, as fotos são compatíveis com o momento e ajudam a compor a imagem de forma a complementar o texto. Os primos, que observam a praça pela janela, fazem pequenos recortes de uma realidade e criam histórias sobre as pessoas que passam a sua frente. A forma como o rosto é recortado nas ilustrações, demonstra esse recorte na vida delas, bem como, o movimento, por estarem sempre de lado, como se estivessem caminhando. Da mesma forma que os primos tem apenas a sua percepção da história, a imagem representa apenas um lado do que acontece, um lado dos rostos, sem representar a totalidade do momento. O processo de ilustração acompanha o processo de descrição do texto: a cena é construída juntando-se os recortes da realidade.

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Referências bibliográficas BUENO, Daniel. About Daniel Bueno. Disponível em: <http://buenozine.com.br/AboutDANIEL-BUENO>. Acesso em: 27 maio 2015. CARDOSO, Rafael. Design para um mundo complexo. São Paulo: Cosac Naify, 2012. HOFFMANN, E.T.A.; MAZZARI, M. V.. A janela de esquina de meu primo. São Paulo: Cosac Naify, 2010. NORMAN, Donald A. Design emocional: por que adoramos (ou detestamos) os objetos do dia-a-dia. Rio de Janeiro: Rocco, 2008.

ANEXO Entrevista com Daniel Bueno - Qual foi o processo usado para a criação da ilustração do livro? De onde veio a inspiração?

Daniel: O texto marca um caminho do escritor em direção ao realismo. Na história, dois

primos que observam um mercado de Berlin de uma janela divagam sobre o modo de enxergar e interpretar o que é visto. Aparecem descrições dos trejeitos, roupas e o comportamento dos habitantes da Berlin de 1822, que transitam pelo mercado da Gendarmenmarkt. A janela da história seria a de um apartamento onde o escritor morou, situado sobre um bar que frequentava, numa esquina. É a primeira vez que o texto foi publicado em português, deste que foi o último Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 166 – 181, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638 <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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trabalho concluído de Hoffmann, falecido naquele mesmo ano. O texto é, portanto, bastante descritivo e atento aos costumes e trejeitos das pessoas, e isso influenciou bastante a ilustração. A primeira coisa que fiz foi anotar tudo o que era mencionado na história, todas as descrições. Logo no início do processo ficou claro que a solução mais adequada seria ser fiel a essas especificações, pois elas não são gratuitas. O prazo para realizar o trabalho era curto. Comecei a achar arriscado me perder em várias ilustrações trabalhosas, pensando separadamente em cada uma, e procurei encontrar uma solução única para todas elas. Algo como uma ideia só para todas as imagens. Já havia feito algo parecido para uma revista argentina e resolvi repetir o recurso: fazer uma única ilustração que poderia ser subdividida em várias outras. Essa solução ficou ainda mais interessante quando percebi que ela estabelecia uma relação direta com o conteúdo da história: nela há um movimento de distanciamento e aproximação do que é observado que me levou a resolver as ilustrações em um único e grande desenho do mercado, que traz todas as situações do texto. Em alguns momentos temos uma visão à distancia, e em outros “recortes” dessa imagem, com ênfase nos detalhes. O texto do Festival de Bolonha, que conferiu menção honrosa ao livro, menciona Max Ernst como inspiração. É uma referência bonita, mas confesso que não pensei diretamente nele (apesar de ter um pôster dele aqui ao meu lado). Quando idealizei essa grande ilustração de uma situação urbana cheio de pessoas e detalhes lembrei de Brueghel, por exemplo. Depois de pesquisar o vestuário, arquitetura e outros aspectos daquela Berlim de 1822, fiz um rascunho para pensar na composição e distribuição de tudo isso na ilustração. Subdividi aquela que seria a imagem total em vários quadros com o tamanho da página do livro, pra pensar nos diferentes enquadramentos. O bonito é que cada recorte poderia ser numa escala, mostrando esse movimento do olhar. Depois desse estudo fiz algumas ilustrações com colagens de teste, experimentando as possibilidades do estilo. Depois de aprovadas, parti para a finalização. O resultado final foi uma ilustração de tamanho 1,2 x 0,9 m. Dentro do livro os designers Maria Carolina Sampaio e Paulo Chagas idealizaram também um flip book, que também brinca com a movimentação do olhar. A colagem foi totalmente digital, misturando os elementos pesquisados com fotos de revistas antigas.

mais adulto à ilustração. Dentro da minha experiência com a técnica da colagem também tinha facilidade para imaginar um cenário sóbrio, com texturas de peças antigas, com toques de expressionismo e o tom de certo modo carregado de um George Grosz (a composição e o modo como foram dispostas as edificações também foram inspiradas nele). Pesquisei também a obra do Hoffmann, as características do “grotesco” (que marcaram o conjunto de sua obra), seu apreço pela caricatura (ele também desenhava bem), e achei que o estilo ia de encontro a esse conjunto de referências. Com o tempo curto, decidi também que a colagem não seria manual, mas digital. Fui estabelecendo estratégias para dar conta do serviço dentro do prazo e com qualidade. - As fotos usadas para compor a ilustração foram tiradas de onde? Gostaríamos de saber se elas são de pessoas de Berlim da época em que se passa a história do livro.

Daniel: O processo de criação envolveu pesquisa de costumes, arquitetura e vestuário da

Berlin de 1822. Para tanto recorri à biblioteca do Instituto Goethe. Sendo assim, boa parte desses elementos na ilustração correspondem à época da história. Já os rostos das pessoas tirei de revistas antigas do começo do século passado, como a Vanity Fair das décadas de 20 e 30. São fotografias de qualidade, bonitas, e gosto da luz e sombra desses rostos. Acabaram tendo um padrão comum, contribuindo para a definição do estilo da ilustração. E por serem antigas ficaram bem integradas aos outros elementos. Muitos desses rostos são de pessoas famosas, mas o modo como recorto os contornos transforma bastante a feição dos personagens, eles viram “outras pessoas”.

- O que você quis transmitir com a técnica de colagem?

Daniel: A colagem é a minha técnica mais habitual, uso ela desde o começo da minha carreira.

Podemos dizer que ela foi fundamental para definir o meu estilo – do modo como ele é mais conhecido. Ou seja, foi com certa naturalidade que imaginei que as ilustrações seriam feitas nessa técnica. Além do mais, havia pouco tempo apara fazer o trabalho e como o processo de criação envolvia uma pesquisa de diversos elementos de livros e revistas, achei interessante aproveitá-los diretamente: selecionar, recortar e mesclar todos eles numa composição. Outro aspecto importante era atentar para o fato do livro não ser infantil. Sendo assim houve desde o início o estudo de soluções que fossem adequadas para o público infanto-juvenil e adulto. Nesse sentido foi oportuno explorar fotos recortadas para os rostos. Isso deu um tom Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 166 – 181, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638 <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 166 – 181, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638 <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Ilustradora Esther Azevedo e modernidade ofusca o brilho da infância: ser criança não significa ter infância

Sou ilustradora, formada em Artes Visuais pela UFMG. Desde criança, gostava de desenhar todas as coisas que encontrava no quintal, meu universo particular.A partir daí, descobri na ilustração uma grande oportunidade para dialogar com as crianças que, como eu, estão sempre atentas às delicadezas do mundo.Neste livro, ailustradora usou lápis, papel, caneta, aquarela, tesoura e cola.Pela Baobá, ilustrei O guarda-roupa de Maria. Um livro que trabalha com a vaidade das meninas instigando-as a questionarem o exagero deste comportamento. Os impasses de Maria diante de seu colorido guarda-roupa são revelados nas belas ilustrações. Tanto o projeto gráfico como o texto foram preparados para agradar aos leitores iniciantes e provocar o desejo pela leitura.(EDITORA BAOBÁ) 2

Érica Flavia dos Santos Pereira1 Érika Yukie Terayama de Oliveira Laura Massote Pereira

Bom dia! Com licença, vocês conhecem a Clarice?É essa mesma, uma magrelinha de cabelos com cachos, mas cachos não como os das bananas, cachos como os das uvas, se uvas fossem cabelo.Então, vocês a conhecem?Não? Pois irão conhecê-la um pouquinho agora. Ela está bem ali, escondidinha atrás daquele abajur enorme, no canto da sala. Olhem lá! (EDITORA FINO TRAÇO)3

Resumo Expandido O presente trabalho tem objetivo em abortar o tema infância por meio de uma ilustração da artista Esther de Azevedo. Durante o trabalho serão apresentados temas que influenciam a criança na modernidade. É importante salientar que foi feito um breve histórico de como a criança foi vista pelos adultos com o passar das décadas. A ilustração escolhida pelo grupo apresenta momentos relacionados com a infância, pode-se observar que a ilustração apresenta crianças em espaços aberto se interagindo e brincando nas ruas sem se preocupar com a violência e usando sua criatividade para se divertir. Porém a realidade vivida pela sociedade atualmente é bastante divergente da apresentada acima. Hoje em dia, as crianças, principalmente de cidades grandes, ficam em casa jogando videogames ou nos computadores, tal realidade mostra que os centros urbanos trouxeram consigo não apenas modernidades, mas sim violência e a segregação.Essa realidade expõe que a interação com outras crianças foi-se perdendo com o passar dos anos e o constante isolamento social foi adquirindo casa vez mais espaço na sociedade. O termo Spätzeit está presente na narrativa trazendo a melancolia das memórias da infância.

Abaixo, na figura 01 temos a ilustradora abordada neste artigo, Esther Azevedo. Na figura um, apenas com informativo, um dos trabalhos da artista, o livro Guarda-roupa de Maria. Já, na terceira figura, temos o livro “É Burrice Clarice?”, que vamos analisar. Fig. 01: Foto da ilustradora Por Esther Azevedo

Fig. 02 Capa do Livro o Guarda-roupa Fig. 03: Capa do livro É burrice Clarice de Maria, por Esther Azevedo por Esther Azevedo

Palavras-chave Ilustração; Infância;Memória e Modernidade; Spatzeit; Fonte: Banco de Imagens do Google4

Introdução Esther Azevedo (figura 1) é formada em artes visuais pela UFMG. Dentre suas obras, estão ilustrações de dois livros infantis da Editora Baobá “O Guarda Roupa de Maria” e da Editora Fino Traço com a obra É Burrice, Clarice?. Além deles já ilustrou vários textos da Revista Ícone, e publicou quatro livros independentes que misturam escritos, fotografias e ilustrações. Estudantes de Design de Ambientes Tarde da Escola de Design UEMG. Trabalho orientado pelos professores Eliane Meire Soares Raslan e André Borges da ED/UEMG. E-mail: herica.flavia@gmail.com; erikayto@gmail.com; lauramassote@gmail.com. 1

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 3, n. 1, p. 182 – 193, 1º semestre/2016. ISSN 2447-2638. Texto recebido: 29.05.2015. Texto aprovado: 09.08.2015. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Fonte: Editora Baobá5

Fonte: Editora Fino Traço6

Fonte: Editora Baobá: literatura infantil e juvenil. Disponível em: <http://www.editorabaoba.com.br/#!estherazevedo/c8bj> Acesso em: 20 junho 2015. 3 Fonte: Editora Fino Traço. Disponível em: http://www.finotracoeditora.com.br/livros/OL4285/9788580541380/e-burrice-clarice.html> Acesso em: 20 junho 2015. 4 Fonte: Banco de Imagens do Google. Disponível em: <https://www.google.com.br/search?q=foto+da+ilustradora+Esther+Azevedo&rlz=1C1SAVA_enBR576BR577 &espv=2&biw=1680&bih=949&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ei=IRSVVdn8NcqaNq60tcgE&ved=0CAYQ_ AUoAQ#imgrc=sZTc9AqEsLjWXM%3A > Acesso em: 20 junho 2015. 5 Fonte: Editora Baobá: literatura infantil e juvenil. Disponível em: <http://www.editorabaoba.com.br/#!estherazevedo/c8bj> Acesso em: 20 junho 2015. 6 Fonte: Editora Fino Traço. Disponível em: http://www.finotracoeditora.com.br/livros/OL4285/9788580541380/e-burrice-clarice.html> Acesso em: 20 junho 2015. 2

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Uma característica marcante das imagens que Esther Azevedo produz, está nos efeitos de colagem. Muitas de suas obras incluem a associação de colagens com escritos, ilustrações e fotografias, podendo ser até mesmo todas essas variações em uma mesma imagem. Ela

Fonte: Editora Fino Traço7

Segundo Esther,

procura tocar no nosso universo lúdico, ativar nossa livre percepção e interpretação sobre as coisas que ela quer dizer, fazendo com que o público dialogue com sua obra e seus propósitos, naturalmente. Esther toca com profundidade nossas memórias e faz questionamentos acerca do que éramos e o que somos em pontos diferentes de nossa vida social. É uma constante reflexão questionadora sobre a vida.

Desde criança, gostava de desenhar todas as coisas que encontrava no quintal, meu universo particular.A partir daí, descobri na ilustração uma grande oportunidade para dialogar com as crianças que, como eu, estão sempre atentas às delicadezas do mundo.(Entrevista realizada por Érika Yukie).

A ilustração (figura 04) traz memórias particulares da ilustradora. Por relatos de Esther, a colagem feita nessa ilustração é composta por desenhos de lembranças de sua infância. E há símbolos de sua memória em todos os detalhes, como por exemplo, desenhos de fotografias antigas da família; as três crianças que brincam juntas (ela e seus dois irmãos) e a criança com um animal em sua cabeça que é o desenho de uma fotografia do seu sobrinho

Ilustração

quando mais novo. Há também imagens de objetos que estão em sua lembrança, e que são

No livro infantil ilustrado por Esther Azevedo “É Burrice, Clarice?”, da Editora Fino

ainda mais particulares, como elementos de sua antiga casa, com a qual morou toda sua

Traço, a ilustradora expõe suas características de espaços abertos; livres, ressaltando o contato

infância – a Goiabeira, a grade do portão. Além de estampas que simulam forros de mesa

com a natureza, somado a utilização de colagens e sobreposição de imagens. A ilustração escolhida para representar sua expressão (figura 4), esta no livro “É Burrice, Clarice:” Fig. 04: Página interna do livro É burrice Clarice

antigos e até mesmo outros formatos de grade. A doçura da ilustração está na pureza da infância, que é capaz de criar valores e marcar momentos que podem parecer simples ou corriqueiros. A particular interação com o mundo que uma criança é capaz de fazer está em vivenciar com a intensidade da descoberta cada momento, está na liberdade do “sentir”. A ilustração traduz uma infância feliz, crianças que sentem o mundo através da brincadeira, da descoberta, do contato, do sorriso. E essa mesma ilustração traz a nostalgia de um tempo que é leve, em um presente que se tornou distante dessa simplicidade de criança. Por consequência, o encantamento inicial da doçura é seguido de grande saudosismo diante de tantas mudanças vindas com o tempo. Contextualização da criança em diferentes décadas: Modernidade A vida social do ser humano e de toda a sociedade foi sofrendo um processo de transformação ao longo do tempo, sejam por motivos econômicos ou sociais. Desde sempre o Fonte: Editora Fino Traço. Disponível em: http://www.finotracoeditora.com.br/livros/OL4285/9788580541380/e-burrice-clarice.html> Acesso em: 20 junho 2015. 7

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ser humano percebeu que viver em comunidade trazia maiores garantias de sobrevivência a

O pensamento apresentado por Rousseau mostra certa preocupação com a forma que a

todos. Ao longo desse processo e dos agrupamentos sociais, surgiram comportamentos e

criança é criada e em qual meio essa está inserida. Pois, as formas de criação refletem em sua

ideologias que simultaneamente foram traduzidas em manifestações culturais. A cultura

personalidade futura, ou seja, uma criança criada pelos pais com violência provavelmente essa

condicionou o aparecimento das artes, a linguagem, dos costumes, das leis, das religiões, as

terá uma tendência maior a seguir o caminho semelhante à de sua criação. Desde já, o filósofo

concepções e tudo que integra uma cultura e identifica uma sociedade. De acordo com as

apresenta uma visão de que as formas de criação de uma criança geram consequências não

autoras Hélita Carla Teixeira e Maria Neli Volpinido Centro Universitário UNIFAFIBE –

apenas em uma família, mas sim em toda uma sociedade.

SP 8 , o ser humano nasceu para aprender novos conhecimentos, descobrir e garantir sua

O contexto atual observa-se que com a inserção da mulher no mercado do trabalho

sobrevivência e a interação na sociedade como um ser crítico, dotado de identidade, com

ocasionou um rearranjo familiar. As famílias, nos séculos passados eram presenciadas por um

desejos que são descobertos durante o processo de desenvolvimento.

pai soberano e incontestável e todos os integrantes das famílias eram apenas seres

Diante desse quadro social apresentado, a fase da infância assume um importante

subordinados a ele. Segundo os autores Fatima Itsue Watanabe Simões10, professora Adjunta

papel na vida o ser humano em toda sociedade, devido ao fato de essa estar ligada diretamente

da Universidade Paulista, Campus Assis-SPe Francisco Hashimoto, professor livre docente do

com o desenvolvimento, aprendizado e concepção do mundo. Entretanto, no decorrer da

Programa de Pós-Graduação em Psicologia da FCL/UNESP-Assis afirmam:

história da humanidade a criança era vista como um ser inferior, segundo o pesquisador

Com os novos arranjos familiares e as novas configurações nas relaçõoentre casais é tal que muitos questionam sobre a evolução da família e as repercussões sobre as novas formas de parentalidade e do significado da maternidade. As parentalidades diversificam-se com o aparecimento de novas estruturas familiares, novos laços afetivos e outras reconstituições familiares.” (Fátima Itsue Watanabe Simões e Francisco Hashimoto)11

francês Philippe Ariès, (1981), a criança era vista como um adulto em miniatura nos séculos XIV, XV e XVI, e o tratamento dado a ela era igual ao dos adultos, pois logo se misturavam com os mais velhos.Com o passar dos anos foi surgindo dos adultos com as crianças o termo denominado para Philippe Ariès, de “paparigação”. Para ele a criança, nos seus primeiros anos de nascimento, era vista como um animal de estimação, na qual os adultos brincavam e se divertiam. Quando a criança passava a adquirir mais maturidade era comum na época essa viver com outras famílias e logo serem substituídas por outras. Nos primórdios do XVII começou a se dar atenção à fase da infância, o filósofo Rousseau explicou em seu livro Emílio, ou Da Educação que o ser humano é feliz e bom e que a maneira como é cuidado na primeira infância9 pode produzir a crueldade e o infortúnio. O mais perigoso intervalo da vida humana é o que vai do nascimento até a idade de doze anos. É o tempo em que germinam os erros e os vícios, sem que tenhamos ainda algum instrumento para destruí-los.E, quando chega o instrumento, as raízes são tão profundas, que já não é tempo de arrancá-las (ROUSSEAU, 2004, p. 96).

TEIXEIRA, Hélita Carla; VOLPINI, Maria Neli. A importância do brincar no contexto da educação infantil: creche e pré-escola. São Paulo: Centro Universitário UNIFAFIBE – Bebedouro, 76 p. Disponível em: <http://unifafibe.com.br/revistasonline/arquivos/cadernodeeducacao/sumario/31/04042014074001.pdf>. Acessado em 04 de junho de 2015. 9 MARTIM, Mauricio Rebelo; DALBOSCO, Claudio. Filosofia e Educação: Rousseau e a primeira infância. São Paulo: UNICAMP, 2012, Volume 4, Número 2. Disponível em: <https://www.fe.unicamp.br/revistas/ged/rfe/article/view/3188>. Acesso em: 04 junho 2015. 8

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Dentre as mudanças ocorridas, podem observar que hoje algumas famílias há uma

preocupação significativa em estudar os filhos, seja pagar uma escola particular ou uma universidade. Tal ação faz com que os filhos fiquem por mais tempo dependentes e permaneçam mais na casa com seus pais. Esses fatores geram certo“comodismo” por parte dos jovens já que esses têm preocupações tardias para seguir seu próprio caminho sem a ajuda dos pais. É importante salientar que a presença do papel maternal era constante antigamente na criação dos filhos, contudo hoje devido sua inserção no mercado esse papel de educar e ensinar os filhos passam para as escolas e creches.

SIMÕES, Fátima Itsue Watanabe; HASHIMOTO, Francisco. Mulher, mercado de trabalho e as configurações familiares do século XX. Minas Gerais: UFVJM – Brasil Revista Vozes dos Vales: Publicações Acadêmicas Nº. 02, Ano I , 10/2012. Disponível em: <http://site.ufvjm.edu.br/revistamultidisciplinar/files/2011/09/Mulhermercado-de-trabalho-e-as-configura%C3%A7%C3%B5es-familiares-do-s%C3%A9culo-XX_fatima.pdf >. Acesso em 06 de junho de 2015. 11 Fonte: Revista Vozes dos Vales: Publicações Acadêmicas. Disponível em: <http://site.ufvjm.edu.br/revistamultidisciplinar/files/2011/09/Mulher-mercado-de-trabalho-e-as configura%C3%A7%C3%B5es-familiares-do-s%C3%A9culo-XX_fatima.pdf >. Acesso em: 06 junho 2015. 10

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Dentre as várias mudanças ocorridas com o passar das gerações em relação a comportamentos sobre infância12 e família, a que mais se relaciona com a ilustração de Esther

no cotidiano da vida dos filhos faz com que se agrave um grande problema mundial, a obesidade infantil.

de Azevedo são as brincadeiras que eram realizadas antigamente. Amarelinha, esconde-

São muitos os fatores que contribuíram para esse isolamento das crianças atualmente.

esconde rouba bandeira, soltar pipa, pular corta, pega-pega são exemplos de algumas

É comum observarmos crianças, desde muito pequenas, com uma rotina bastante atribulada,

brincadeiras que antes eram frequentes na vida cotidiana da criança é que hoje em dia nas

tomada por diversas tarefas e compromissos. Muitas vezes porque os pais trabalham o dia

cidades foram praticamente esquecidas. As brincadeiras que antes eram realizadas nos

todo e precisam manter os filhos ocupados, outras pelo fato de que hoje em dia é cobrado,

quintais das casas ou nas ruas cada vez mais cederam espaços para os ambientes internos das

desde muito cedo, maiores atividades e conhecimentos.

casas e os aparelhos eletrônicos, como por exemplo, vídeos games e televisões, ganharam e

Ah, eu acho que as outras crianças que não fazem, por exemplo, não fazem inglês estão um pouco em desvantagem né, que se elas quiserem viajar pro exterior para fazer uma faculdade, uma coisa assim, elas não vão ter a base pra falar. (Depoimento de Ana Lívia, 11 anos, no documentário A Invenção da Infância).

chamaram mais atenção das crianças do que de fato estar e interagir com outras crianças. A interação com meio externo e com outras crianças é uma questão que deve ser ressaltada, pois é algo que proporciona uma vida sadia, as brincadeiras trazem uma visão mais madura em relação ao crescimento e as fases futuras do desenvolvimento da criança. Um exemplo de tal realidade é uma comparação entre os jogos realizados nas ruas e os jogos realizados através dos vídeos games. As brincadeiras nas ruas têm uma importância muito além do divertimento, essas proporcionam uma competição saudável, no qual as crianças não pensavam que errar ou se não vencer fosse motivo de fracasso, mas sim motivo de aceitar a derrota como um aprendizado e companheirismo e de sempre buscar tentar novamente. Hoje é observado um cenário bastante divergente do apresentado acima, as novas formas de divertimentos das crianças, os vídeos games, encarram a competição com algo que se não vencer é bom o suficiente. Grandes partes da maioria dos jogos usam a violência física como uma forma de disputa para saber quais o combatente é melhor e mais digno de vencer. Tais

Além disso, entra a influência tecnológica no universo infantil. Há relatos de que crianças de 6 anos lidam muito melhor com a tecnologia do que muitos adultos por aí. Um

exemplo disso é que antes muitos de nós para aprender a lidar com computadores precisávamos de cursos, as crianças de hoje muitas vezes aprendem sozinhas. Mas ao mesmo tempo em que as crianças de hoje possuem um raciocínio maior que crianças de gerações anteriores, essa mesma tecnologia traz gerações de crianças mais retraídas e menos criativas. As crianças ficam sozinhas brincando com seus tabletes, computadores e smartphones, sem contato com outras crianças. Um exemplo disso é um recreio escolar em que as crianças estão sentadas uma ao lado da outra, em silêncio, cada uma com o seu smartphone. Também são preocupantes as doenças devido ao uso exagerado dos objetos digitais, a obesidade pela falta de atividade física, o cyberbullying e a pedofilia.

comportamentos geram a individualidade, a criança passa a encarrar o indivíduo não mais

A tecnologia parece estar minando o desenvolvimento das crianças nesses relacionamentos fundamentais nesta fase de vida. Tem havido aumento grande no narcisismo e declínio na empatia entre os jovens. Embora não podemos atribuir uma relação direta com a tecnologia, é nítido que o surgimento de novas mídias e o maior alcance junto à cultura popular trouxeram prejuízos”, relata Jim Taylor. 13

como seu companheiro, mas sim como algo com que ela deva competir. Essa análise dos tipos de brincadeiras realizadas não está ligada apenas em relação aos aspectos psicológicos, mas também com as questões físicas. Antigamente, as brincadeiras nas

Abaixo (fig. 05), a idade média de crianças que usam as redes sociais em cada país.

ruas ofereciam as crianças uma atividade física significativa, hoje muitas delas ficam apenas

Figura 05: cronograma de acesso as redes sociais de cada país

em suas casas assistindo televisão ou jogando vídeos games e acabam sendo levadas a seguir um estilo de vida sedentária. Esses fatores somados ao fato de muitos pais não estão presentes MOTTA, Xênia Fróes da; Silva, Renato. Um olhar possível sobre a infância. Revista Eletrônica do Instituto de Humanidades. Unigranrio, 2011, página 36. Disponível em: <http://publicacoes.unigranrio.com.br/index.php/reihm/article/viewFile/1579/888>. Acesso em: 06 junho 2015.

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Fonte: Disponível em: <http://www.desenvolvimentodobebe.com.br/criancas-refens-da-tecnologia/> Acesso em: 6 junho 2015. 13

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maturidade quando encara a vida com a mesma seriedade que uma criança encara uma brincadeira”. (Frederich Nietzsche)15 Quando uma criança está brincando, algo de muito especial está acontecendo. A palavra brincar é latina e vem da palavra vinculum (laço, vínculo). É triste o fato desse direito tornar uma luta, e pior ainda, uma luta da própria criança que não quer ser apenas criança, quer ter e viver a infância. A criança precisa de muito pouco para brincar. De tempo, de Fonte: Trend Micro14

Quando a criança está entretida com seus joguinhos e internet, ela não quer saber o que acontece ao seu redor, sendo indiferente aos assuntos da casa e dos lugares em que frequenta. É de suma importância a criança conviver e brincar com outras crianças, desenvolve estratégias de improviso, envolve maior improvisação e é mais criativo. O brincar também permite que a criança tome certa distância daquilo que a faz sofrer, possibilitando lhe explorar, reviver e elaborar situações que muitas vezes são difíceis de enfrentar. No caso das grandes capitais, a brincadeira de criança como era antigamente ainda é mais rara de se ver. A distância dos lugares nessas cidades junto ao trânsito que na maioria dos dias são caóticos influencia diretamente na perda do tempo precioso que todos enfrentamos atualmente, e isso junto aos afazeres das crianças e dos pais, quase não se sobra tempo para as brincadeiras. O fato também do elevado índice de violência acaba privando as brincadeiras nas ruas e também em outras áreas externas. É perigoso deixar as crianças desacompanhadas, e a falta de tempo dos pais de levar e ficar com seus filhos em praças e locais abertos contribui para que a brincadeira das crianças seja cada vez mais ligada à tecnologia.

parceiros e da permissão do adulto, porque o resto, ela inventa. A partir das análises feitas da ilustração apresentada é percebido que existe uma diferença considerável da infância antigamente comparada com a infância de hoje. Como foi falado anteriormente as formas de divertimento e de brincadeiras de antigamente era marcada pela coletividade e interação entre as crianças. Entretanto essa realidade foi se transformando e passou a adquirir e transmitir as crianças mais a individualidade e a solidão, criando uma barreira de isolamento social entre elas. Diante desse quadro é notável que muitos indivíduos, que viveram na infância passada, afirmam que “não se brinca mais como antigamente” ou que “no meu tempo era bem melhor”. Esses relatos mostram que existem por grande parte das pessoas de encontrar uma maneira de relatar o passado glorioso que viveu em seu tempo e acabam, portanto, desmerecendo as novas formas de estilos de vida no presente. O texto Spätzeit é uma releitura do passado glorioso, Walter Moser (2001) afirma que as pessoas chegaram tarde e estão em um mundo diminuído e desprovido de energia criadora. Durante a narrativa do texto Spätzeit o autor explica que o mundo que vivemos no presente esta diminuído, pois cada vez mais o ser humano se torna um ser incapaz de realizar ações heroicas e gloriosas. Ou seja, vivem apenas a sombra das grandezas dos povos passados. O trecho abaixo retirado do texto expõe a ideia de releitura do passado:

A brincadeira é uma necessidade básica para as crianças, não tem que ser como os

Aqueles que chegam tarde são prejudicados, encontram-se num mundo diminuído, esgotado e são desprovidos de energia criadora. Eles devem se contentar com aquilo que sobrou, ajustar-se ao potencial reduzido que lhes oferece sua época, prontos para sonhar com nostalgia e pesar com grandezas heroicas do passado. (MOSER, 2001, p.37)

adultos que esperam a semana inteira pelo final de semana para ter lazer. Trabalho de criança é brincar, tem que ser todo dia e é um trabalho muito sério. “O homem chega à sua

Esse ponto vista de Moser (2001) se enquadra na realidade presenciada na infância

atualmente, pois é notado que existe uma diferença significativa da criança de antigamente Fonte: Disponível em: http://tecnologia.uol.com.br/ultimas-noticias/redacao/2011/10/25/com-media-de-9anos-brasileiros-sao-os-mais-jovens-no-mundo-a-entrar-nas-redes-sociais.jhtm Acesso em 6 de junho de 2015

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Ver: MOSER (2001).

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com criança atual, como foi exposto anteriormente as crianças no passado traziam consigo

vítimas das maldades que circulam pelo mundo. Como citado no texto no Moser para aqueles

mais disposição e companheirismo. Sua fonte de criatividade era constante e sempre exercida

que chegam depois o que resta é apenas a melancolia e a releitura dos atos heroicos do

devido ao fato de ter sido um meio pela qual as crianças necessitavam para se divertirem, e

passado.

por isso era constante a inovação de novas formas de brincar e de criarem diversos tipos de jogos. Porém, as crianças pertencentes ao mundo moderno não se preocupam em inovar nas

Referências bibliográficas:

brincadeiras, pois a tecnologia, como uma facilitadora, já coloca os jogos no mercado, prontos apenas para serem montados e jogados, sem a necessidade de impulsionar e estimular a criatividade da criança. É observado na ilustração que representa crianças se divertindo e interagindo no meio externo que esse tipo de atitude, ação e sentimento de estar com outras pessoas e crianças foi se perdendo com o passar dos anos. Como citado do texto de Moser a perda de energia é a diminuição e o enfraquecimento do ser humano, pois com o passar do tempo o mundo está em declínio e constante perde de saberes.

MOSER, Walter; MIRANDA, Wander. Narrativas da Modernidade. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2001.

SIMÕES, Fatima Itsue Watanabe; HASHIMOTO, Francisco. Mulher, mercado de trabalho e as configurações familiares do século XX. Minas Gerais: UFVJM – Brasil Revista Vozes dos Vales: Publicações Acadêmicas Nº. 02, Ano I, 10/2012. Disponível em: <http://site.ufvjm.edu.br/revistamultidisciplinar/files/2011/09/Mulher-mercado-de-trabalho-eas-configura%C3%A7%C3%B5es-familiares-do-s%C3%A9culo-XX_fatima.pdf >. Acesso em: 06 junho 2015

Considerações Finais Portanto, o presente artigo teve o como objetivo expor o trabalho da ilustradora Esther de Azevedo, percebe que a ilustração parece ser colagens feitas no papel, essa é uma técnica que a ilustradora utilizou para aproximar-se e dialogar com as crianças e tornando assim a ilustração atrativa e divertida com o uso de cores vivas que despertam alegria. Além disso, Esther baseia suas obras em fotografias vividas pela sua infância e pelas infâncias de seus familiares. A ilustração escolhida possui características de espaços abertos com contado com a natureza, como por exemplo, jardins e quintais. Esse tipo de ação de brincar em lugares abertos e interagir com o meio externo e com outras crianças, como mostrada na ilustração está se esvaindo com o passar do tempo. A modernidade trouxe grandes benefícios para a humanidade, uma delas foi a constante inovação e surgimento de tecnologias que proporcionaram ao homem facilidade e agilidade. Entretanto, a modernidade gerou uma grande barreira de isolamento social entre as pessoas, devido ao fato de que a grande maioria dos indivíduos não sabem colocar limite no uso na tecnologia. Tal ação afeta principalmente as crianças, pois essas ainda estão em processo de formação de opinião e amadurecimento, e por isso são ingênuas e acabam sendo Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 3, n. 1, p. 182 – 193, 1º semestre/2016. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 3, n. 1, p. 182 – 193, 1º semestre/2016. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Significação com Alê Abreu: Ilustração com foco no filme “O Menino e o Mundo”

com a área. Aos 13 anos participou de um curso de desenho animado no MIS – Museu da Imagem e do Som, em São Paulo. Alê3 afirma que essa foi uma experiência

Aline Aparecida Silva1

fantástica onde aprendeu a ter novos olhares e ganhou influência de alguns autores e animações. As principais influências foram a animação “Os mestres do tempo”,

Resumo O presente artigo tem por objetivo a análise do processo de significação de uma obra, com foco na ilustração de Alê Abreu, mais especificamente sua ilustração para a animação “O menino e o mundo”, no sentido de estudar os significados que a ilustração pode tomar a partir das suas diversas vertentes. Não se pretende dar prováveis significados à animação ou à ilustração através de suas características, mas sim induzir a construção de um pensamento sobre os significados que essas podem ter.

longa-metragem francês lançado em 1982, e “Planeta Selvagem”, longa lançado em 1973 numa parceria entre a Tchecoslováquia e França. Ambos os filmes abordam novos planetas e formas de vida, e de acordo com Alê esses filmes lhe mostraram que existia outras formas de animação, menos comerciais, a partir dai quis criar nessa mesma área. Também se pode citar a influência literária, mais presente no momento atual, que abrange as áreas da filosofia e história.

Palavras-chave

Formado em Comunicação Social nos anos 90, realizou curtas como “Sírius”,

Alê Abreu; Animação; Ilustração; Significação; Valorização; O tipo de ilustração com Alê Abreu: produto e signficado A animação está presente desde a infância, na vida da maioria das pessoas que cresceram com um aparelho televisor em casa. Desde muito cedo a influência das animações é muito grande na vida das pessoas, mas será que o contrário também não pode acontecer, as pessoas serem influência sobre a animação? Entendo, que, por influência da animação, não no seu sentido de produção, mas no seu sentido de ser interpretada, como alguém interpreta o que vê. Nesse caso não poderiam diversos fatores influenciar o jeito de ver a obra? Ou apenas a obra em si nos influencia? Essas são questões que dentre outras movem o estudo apresentado nesse artigo.

O artista tratado neste artigo, Alê Abreu2, é um pintor, desenhista,

ilustrador e diretor de animações brasileiro, nascido em São Paulo em 1971. Hoje com 44 anos, exibe em seu currículo diversas obras e premiações. De acordo com ele, seu interesse pela arte não pode ser marcado por nenhuma data, Alê sente que a arte sempre foi presente em sua vida, mas ele destaca seu primeiro contato profissional Estudante de Graduação, Design de Produto noite, Universidade do Estado de Minas Gerias – UEMG, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Trabalho orientado pelos professores Eliane Meire Soares Raslan e André Borges. E-mail: aline.apren@gmail.com 2 Fonte: Site oficial de Alê Abreu. Disponível em: <www.aleabreu.com.br/> Acesso em: 25 junho 2015. 1

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 194 – 209, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. Texto recebido: 20.05.2015. Texto aprovado: 10.05.2015. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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em 1993, e “Espantalho” em 1998 e também animações para publicidade, mas não somente. Ilustrou as premiadas latas de leite da Nestlé, fez inúmeras ilustrações para revistas, jornais e livros e trabalha como artista plástico. Ganhou diversos prêmios que destacam sua produção audiovisual desde seus primeiros trabalhos.4 Ainda, de acordo com Alê, o tema que mais o atrai é o universo infantil, não apenas sobre seus personagens que comumente são crianças, mas a filosofia da infância que na fase adulta ainda pode se encontrar presente. A abordagem desse tema não se vê apenas nas suas animações, mas também nas suas ilustrações, desenhos e quadros, e não necessariamente na abordagem dos seus personagens, mas até mesmo nos seus traços e técnicas. As obras autônomas de Alê tendem ao abstracionismo, seus traços comumente podem ser comparados aos de uma criança, assim como sua composição que não respeita cores ou proporcionalidades. Na sua ilustração feita para fins comerciais pode-se encontrar uma maior presença da composição associada ao real, mesmo que muitas vezes suas técnicas ainda sugiram um desenho feito por uma criança. Abaixo, o exposto acima é exemplificado por meio de quatro imagens. As figuras 1 e 3 representam as obras autônomas do artista, nelas é possível ver o efeito das cores, do traço, da composição e da desproporcionalidade. Já nas imagens 2 e 4, Fonte: Blog do artista Alê Abreu. Disponível em: <aleabreublog.blogspot.com> Acesso em: 25 junho 2015. 4 Fonte: Blog do artista Alê Abreu. Biografia. Disponível em: <aleabreublog.blogspot.com/p/biografia.html> Acesso em: 25 junho 2015. 3

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 194 – 209, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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há uma maior aproximação com a realidade, mesmo que ainda bastante distorcida,

aspectos comercias”, e depois ainda completa que seria esse tipo de vertente que

esses são exemplos de sua ilustração comercial.

gostaria de seguir.

Fig. 01: Povoado, acrílico sobre tela, 40x30cm, 2013

Fig. 02: Imagem piloto da animação Vivi Viravento

A partir do testemunho acima podemos perceber que a ilustração, e no caso também a animação, pode ser tratada como produto, com todo o valor comercial que neste geralmente encontramos. Mais claramente, podemos inferir do termo ilustração comercial aquela que é pensada com objetivos de venda, de atrair um consumidor, também de trazer uma maior facilidade de identificação à ideia a ser passada. Na maioria das vezes um cliente que busca um ilustrador, ele comumente está querendo passar alguma ideia para seu público e pretende reforçá-la com a ilustração, desse modo o cliente já chega com um briefing (um resumo do que quer) já pronto

Fig. 03 Caderno, estudo em caneta hidrográfica

Fig. 04 Ilustração para o livro "Rei do Manacá", de André Moura, da editora Jujuba

para a realização da obra. Essa prática deixa o artista bastante limitado, ele consegue se expressar, mas não de forma total como pode ser notado nas quatro primeiras imagens deste artigo. Na ilustração autônoma, colocada como autoral por Alê, a interpretação nos leva a considerá-la como um tipo de vertente que deixa o artista mais livre, sem precisar seguir tendências ou analisar públicos com o objetivo da obra ser vendida.7 Valor e visão da animação: “O menino e o mundo”:

Fonte: Jujuba Editora5

Temos aqui a ilustração como produto na figura 02. No tópico acima, foram abordados dois termos para diferenciar dois tipos de ilustração: a ilustração autônoma e a comercial. Esses termos foram extraídos de palavras ditas pelo próprio Alê Abreu, que numa entrevista à Fundação Bunge6, contando da influência que as animações “Os mestres do Tempo” e “Planeta Perdido” (assunto já comentado acima) tiveram no seu trabalho, que comentou “esses dois filmes me mostraram que existe um outro caminho de se fazer animação que era essa animação autoral, menos preocupada com

dirigida e produzida visualmente por Alê Abreu, cuja estreia aconteceu em 2014. O filme foi produzido pela empresa de animação do próprio Alê Abreu, a Filme de Papel, com apoio e patrocínio de diversas fontes brasileiras. O filme conta a história de um menino que morava no campo com os pais de forma bastante simples, até que um dia o pai sai de casa para conseguir um emprego na cidade e não volta mais. A saudade do menino é perceptível e por isso ele sai de casa determinado a achar o pai. Vai a mesma estação de trem onde havia visto o pai ir, porém é levado pelo vento. O menino então passa por diversos lugares e vai

5

Fonte: Jujuba Editora. Disponível em: <www.jujubaeditora.com.br> Acesso em: 01 julho 2015. Entrevista com Alê Abreu. Fundação Bunge. Brasil: 2014. 11 minutos. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=Fw1XYkgfj8Q>. Acesso em junho de 2015.

7

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O objeto principal de estudo do artigo é a animação “O Menino e o Mundo”,

E11 Alê Abreu. Brasil em mente. Brasil: 2015. 18 minutos. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=Q6UsJExmClk>. Acesso em junho de 2015.

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conhecendo o mundo. Enquanto o garoto conhece as coisas a sua maneira, o diretor

most beautiful images we've ever seen" (Porque é repleto de algumas das imagens

faz uma crítica social ao capitalismo de forma marcante.

mais belas que já vimos) que o júri anunciou o prêmio especial para “O Menino e o

O longa-metragem surgiu de outro projeto que se denominava “Canto Latino”,

Mundo”.

que seria um anima-doc (documentário com animação) que abordaria diversos temas

O sucesso não parou por aí, na França a animação participou do 38º Festival

acerca da história da construção da América Latina. Foram feitas diversas pesquisas

do Filme de Animação de Annecy, conquistando o Prêmio Cristal de longa-metragem

por Alê Abreu, então no meio das anotações o artista descobre um menino que havia

e o Prêmio do Público, saindo ainda com a descrição feita pelo festival “uma

desenhado e logo o chama de Cuca. De acordo com Alê “O desenho se destacava dos

ilustração dos problemas do mundo moderno pelos olhos de uma criança". Em

demais pela simplificação extrema dos traços, e parecia acenar para mim. Mais do que

Portugal, no Festival de Cinema de Animação de Lisboa, o filme recebeu o Grande

o próprio personagem, o desejo daquela ideia de desenho, gestual e muito simples, foi

Prêmio Monstra 2014 de melhor longa-metragem, e além do prêmio principal,

crescendo e sobrepondo-se ao projeto de Canto Latino”. Dessa forma o cineasta

também levou o prêmio de Melhor Trilha Sonora e Prêmio do Público.

começou a trabalhar no filme, também incorporando as pesquisas feitas para o anima-

Fig. 05-06: Cena do filme "O Menino e o Mundo"

doc “Cantos Latinos”, daí nasceu um filme de estética simples e grande conteúdo cultural e social. A ilustração desse filme foi toda feita por Alê; como antes mencionado, ela cresceu na ideia de um desenho simples e gestual, o que muito é importante para o longa por este não apresentar falas, apenas sons, músicas e a imagem. Foram usadas diversas técnicas como a colagem, a utilização de giz, lápis de cor, grafite e diversos outros elementos para a construção da imagem da história. Desenhos de traçado simples que muito fazem lembrar desenhos de uma criança, o que muito está presente também no restante de seus trabalhos, misturados a expressões com traços mais certeiros e estilizados com uma presença maior de softwares de fácil percepção, estão presentes na animação.8 Abaixo (fig. 05-06), seguem duas imagens do filme que mostram de maneira clara as técnicas mistas empregadas no filme. Na primeira figura com mais predominância para o desenho manual e na segunda, maior ilustração digital. Referente ao valor do produto, o longa de animação “O Menino e o Mundo”9, teve reconhecimento internacional. Foi pela primeira vez estreado em Ottawa, no Canadá, no Ottawa International Animation Festival (Festival Internacional de Animação de Ottawa). E com a seguinte frase "Because it was full of some of the 8

Entrevista com Alê Abreu, animador e criador do filme "O Menino e o Mundo". Espaço Mix. Brasil: 2014. 4 minutos. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=aP_YBVroIeY>. Acesso em junho de 2015. 9 Fonte: Vídeo de animação: O Menino e o Mundo. ABREU, Alê. Brasil: 2014. 120 minutos Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 194 – 209, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Fonte: Blog do artista Alê Abreu 10 Fonte: Blog do artista Alê Abreu. Disponível em: <http://aleabreublog.blogspot.com.br/p/biografia.html> Acesso em: 01 julho 2015. 10

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 194 – 209, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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brasileira está se tornando popular apenas nos dias atuais, em que é mais comum ver Estes são só alguns exemplos dos diversos prêmios alcançados pelo filme, que

grandes produções, tanto relacionadas ao conteúdo quanto ao estilo.

foi premiado tanto nacionalmente quanto internacionalmente. O sucesso foi tamanho

Mesmo com desenvolvimento tardio da produção, é difícil encontrar alguém

que diversas mídias apontaram a animação para concorrer ao Oscar (prêmio

que possuiu televisão em casa na infância que não assistisse algum desenho animado.

americano de cinema), prêmio que pode ser considerado um dos mais famosos do

A importação de peças da indústria cinematográfica sempre foi considerável, tanto de

mundo na área cinematográfica, porém a animação não foi selecionada para a

animações quanto de filmes. Por esse motivo houve muita influência estrangeira,

concorrência. Em um site, durante a minha pesquisa para obter mais informações

principalmente

sobre o filme, encontrei o seguinte comentário de um leitor “Lindo! Ouvi dizer que

consequentemente nossa visão sobre esta.

estadunidense,

na

nossa

experiência

com

a

animação

e

ele tem chances de concorrer ao Oscar, então resolvi assistir. Fiquei impressionada

Com as mídias apinhadas de animações voltadas ao público infantil, com

com o que vi. Belíssimo. Uma pena que a Disney e a Pixar compram o Oscar todos os

certos padrões de estilo, padrões de conteúdo e temática, não é difícil quando se fala

anos, e não deixam ninguém levar pelas suas obras. Premiação muito injusta”. O visto

em animação associarmos às nossas experiências. Então é certamente possível uma

comentário se tornou pertinente à discussão no memento em que mostrou a razão da

pessoa ao lembrar-se de animação, lembrar-se de traços mais realistas, mesmo que

escolha do filme para assistir pelo leitor.11

expressando um universo fictício, seja de desenho manual ou digital, de temática

A premiação de peças cinematográficas é uma boa iniciativa, visto que isso

voltada ao humor, de conteúdo voltado ao público infantil, entre outros padrões que

pode dar impulso à produção e dar abertura a novas vertentes na área. Porém, talvez,

são passados pela vivência. Como disse Rafael Cardoso (2012) “Toda vez que

não se torne algo ruim, que faz com que as pessoas creditem mais valor à obra pelo

olhamos para um artefato, associamos a ele uma série de valores e juízos ligados à

seu prêmio e não pelo seu conteúdo? Isso não faz com que a obra se torne um

nossa história, individual e coletiva”. Já, a visão de “O Menino e o Mundo”, o longa tem diferenças perceptíveis das

produto, que como tantos outros são avaliados pela sua marca em detrimento da sua funcionalidade, e no caso conteúdo?

animações populares atualmente no país, pelo conteúdo, mas principalmente pela

Referente ao olhar atual, desde seu início com os curtas sobre o personagem

técnica usada. Para uma análise mais clara, farei uma comparação entre o filme aqui

Mickey (1928) e O Gato Félix (1930), sempre foram desenvolvidas com

tratado e uma animação dos estúdios Disney em parceria com os estúdios da Pixar,

predominância de conteúdo que atraísse o público adulto, mas também o infantil.

ambos estadunidenses, denominada “Wall-e”. A temática entre os dois filmes tem um

Com grande influência da famosa produtora Disney que tinha um conteúdo mais

mínimo de semelhança, os dois filmes abordam problemas sociais relacionados ao

infantil, as animações em sua maioria foram sempre voltadas para esse contexto, e até

capitalismo, e foram lançados com apenas cinco anos de diferença, o que mostra uma

nos dias atuais se vê essa predominância no ocidente.

equidade de pensamentos devido à vivência na mesma época. Quanto ao estilo

No Brasil a produção de animações tardou um pouco mais a se tornar popular.

estético este muito se contrasta. Abaixo são apresentadas duas imagens, a primeira do

A primeira animação brasileira foi Sinfonia Amazônica de 1953 e a animação para

longa “Wall-e”, e a segunda do filme em discussão “O Menino e o Mundo”. O

produção cinematográfica não obteve muito progresso a partir dai. A animação

ambiente se assemelha, visto que é os dois possuem grande volume de lixo, porém a diferença é perceptível.12

11

ABREU, Alê. Imprensa. Disponível em: <http://omeninoeomundo.blogspot.com.br/p/release.html> Acesso em junho de 2015. ABREU, Alê. Ilustração. Disponível em: <http://aleabreublog.blogspot.com.br/search/label/ilustra%C3%A7%C3%A3o> Acesso em junho de 2015. Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 194 – 209, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Comunicação e Cultura. III Jornadas Doutorais: ciências da comunicação & Estudos culturais. Universidade do Minho. Disponível em: <http://www.lasics.uminho.pt/ojs/index.php/cecs_ebooks/article/viewFile/1962/1886> Acesso em: 20 junho 2015. 12

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Na primeira imagem apresentada nesse tópico, a preocupação com fazer uma imagem que pareça o mais real possível é clara. Já na imagem do filme “O menino e o

A primeira imagem traz uma ideia de maior qualidade de imagem, o que

mundo”, a preocupação da imagem acontece, porém não no sentido de esta se tornar o

consequentemente nos faz pensar em mais trabalho para fazer o filme, e quanto maior

mais real possível, mas no sentido de se adequar ao conteúdo que o autor quer

o trabalho maior seria qualidade do filme em geral, mais bem feito seria,

mostrar.

principalmente em detrimento ao longa “O Menino e o Mundo”. Mesmo sabendo do

Se mostrássemos as duas imagens para uma pessoa que não tem repertório muito grande acerca de animação e artes visuais em geral, e não conhece os presentes

ditado popular “Não julgue um livro pela capa” é isso que acaba acontecendo e não só com livros.

longas-metragens, e perguntássemos se ela tivesse a escolha de assistir a qualquer um dos dois filmes, qual ela escolheria, por minha vivência e fatos acerca da repercussão

A visualidade como estímulo de pensamentos

da animação no país eu diria que provavelmente a pessoa teria escolhido o filme da primeira imagem, “Wall-e”.

“As aparências características dos objetos nos remetem a vivências, hábitos e

Fig. 07: Cena do filme “Wall-e”, dos estúdios da Disney e Pixar

até pessoas que associamos ao contexto em que estamos acostumados a deparar com eles”, frase de Rafael Cardoso (2012) que caracteriza o estudo desse tópico. Como acima já apresentado, no Brasil, temos certa bagagem cultural quanto à animação bastante influenciada pelo estrangeiro. O que também envolve a imagem da produção e seu conteúdo. Porém se analisarmos apenas em separado o filme, sem as diversas influências de outras produções, o resultado pode ser diferente. Fig. 09: Cena do filme "O Menino e o Mundo"

Fig. 08: Cena do filme "O Menino e o Mundo", de Alê Abreu

Blog do artista Alê Abreu 14

Fonte: Banco

de dados de imagens Google 13

Fonte: Banco de dados de imagens Google. Disponível em: <https://www.google.com.br/search?q=Cena+do+filme+%E2%80%9CWall-

e&rlz=1C1SAVA_enBR576BR577&es_sm=93&tbm=isch&tbo=u&source=univ&sa=X&ei=uGmeVe y_JoaYNvjdg7AK&ved=0CB0QsAQ&biw=1680&bih=949 > Acesso em: 01 julho 2015. 14 Fonte: Blog do artista Alê Abreu. Disponível em: <http://aleabreublog.blogspot.com.br/p/biografia.html> Acesso em: 01 julho 2015.

Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 194 – 209, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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É um filme de animação... E conta a história de um menino que busca o seu pai, ele vê o pai dele partir, e muito emocionado ele arruma a mala e coloca a foto da família. Então ele parte para o mundo em busca do pai dele. À medida que ele vai circulando por esse mundo, ele vai descobrindo... primeiro ele está ali no quintal dele, um menino brincando, depois as denúncias ali naquele quintal e à medida que ele vai viajando esse quintal vai se abrindo pro mundo e a gente vai mostrando umas facetas às vezes não tão bonitas desse mundo, sempre a partir do olhar de uma criança, ou seja, é um filme que o tempo todo eu me coloquei muito próximo desse personagem, o personagem é que nos conduziu ao ponto de vista desse mundo. (Alê Abreu)

Essa foi a resposta dada por Alê Abreu quando foi pedido que ele falasse um pouco sobre o filme “O Menino e o Mundo” numa entrevista. Para começar a analisar uma obra sem presença de influências que nós mesmos já trazemos de nossas experiências, é bom saber o ponto de vista do autor e o que ele quis mostrar. Para uma análise com foco mais específico, peguemos a imagem acima, que é uma das cenas do filme “O Menino e o Mundo”. A imagem mostra o menino, personagem principal do filme, em meio a uma favela à noite. Pode-se perceber que a cena é formada de elementos de ilustração que remetem ao desenho de uma criança, como o aspecto torto das escadas, os traços tremidos de alguns postes e antenas, a textura que lembra um desenho feito a lápis de cor, entre outros elementos. Ao mesmo tempo a imagem mostra recortes de figuras mais reais, mais voltadas à fotografia. Considerando a declaração de Alê, mais especificamente sua afirmação que nos diz que o filme foi produzido a partir do olhar de uma criança, junto com as características visíveis da imagem acima apresentada, algumas conclusões podem ser tiradas. Não é difícil identificar o desenho de uma criança a partir dos seus traços, cores e materiais, por isso também não fica difícil compará-lo à imagem de “O Menino e o Mundo”, tais desenhos feitos pelas crianças representam as suas visões de mundo, e como o artista declarou, o filme tenta passar o ponto de vista de uma criança, nesse sentido nenhuma escolha melhor do que o estilo de ilustração escolhido. Quanto ás partes mais ligadas a recortes, com aparência mais real, é bom lembrar-se da fala em que Alê expõe que mostra no longa facetas às vezes não tão bonitas desse mundo. Quando pensamos em crianças, logo associamos à pureza, à inocência e outros adjetivos nesse meio. Como a criança representa tais características, os desenhos representam as mesmas, visto que mostram a visão Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 194 – 209, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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infantil. Por essa razão, o realismo cumpre bem o papel de contrastar com a ilustração representante do mundo da criança, tendo significado contrário. A ilustração fala: significação como comércio e a visão das crianças Rafael Cardoso (2012) diz “As formas falam, sim, se apenas soubermos ouvir suas vozes”. Um exemplo bastante simples para confirmar tal afirmativa e melhor explicá-la seria uma obra de arte que, por exemplo, toma forma numa escultura. Num museu tal obra estaria sob os diversos olhares e pensamentos dos visitantes, os quais não hesitariam em afirmar que a obra possui um significado que o autor quis passar. Essa visão não é rara no campo da arte, porém também não é universal, no sentido de abranger todas as vertentes. A ilustração muitas vezes não é vista como meio que tem algo a dizer, principalmente a ilustração comercial, é vista apenas como a representação de algo. Explicando melhor com um exemplo, um desenho de um hambúrguer numa embalagem de uma lanchonete fast food, poderia ser apenas um ornamento ou um investimento de marketing aos olhos da maioria de seus consumidores e que não necessita de grandes análises, o que muito acontece na realidade. Tendemos a não considerar com valor, tal que cabe uma análise mais aprofundada, produtos do dia-a-dia. Estamos numa sociedade regida pela produção cada vez maior e igual consumo, onde esse desenvolvimento tem cada vez tem mais importância, mas paradoxalmente cada vez menos importância é dada aos artefatos produzidos, o sentido deles acaba se perdendo. Novamente citando Rafael Cardoso (2012) “Mal comparando, somos parecidos com uma imensa gráfica que imprime livros sem parar, mas onde poucos sabem ler e a maioria dos funcionários nega a existência da leitura”. No longa-metragem “O Menino e o Mundo” é possível extrair diversos elementos de sua análise visual, como apresentado no tópico anterior. Se pegarmos uma animação mais conhecida pelo público em geral, por exemplo, uma animação clássica dos estúdios Disney como “Cinderela”, esta também terá uma análise que pode ser feita por trás de suas ilustrações, porém será que o público percebe isso, ou mesmo os mais envolvidos com a área? Ou será que pensam que foi só um elemento Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 194 – 209, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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necessário para comportar o conteúdo, a história, como uma garrafa que é necessária

como mencionado no item “8. A visão de ‘O Menino e o Mundo’”. Analisando o

para guardar água? Ambos, o filme e a garrafa, expressam mais que sua mais aparente

filme agora sob essas três repartições, a fabricação diz-se da origem do filme, no caso

função. Depende então de nós, primeiramente, saber a existência desse sentido que

um filme brasileiro, dirigido por Alê Abreu, o nome do diretor não era tão conhecido

existe em todas as coisas produzidas, e, posteriormente, saber ouvir para descobrir

antes do lançamento da animação, então sua repercussão sobre as pessoas pouco

esse sentido.

causa influência, porém o fato de ser um filme brasileiro, já causa certo impacto. Os

Voltando ao exemplo da ilustração do hambúrguer na embalagem de um fast

filmes brasileiros, principalmente animações, como já explicado, não têm muito

food, a mesma poderia ser tratada com descaso, com a premissa de que aquilo nada

tempo de história, mas mesmo assim alguns padrões já foram estabelecidos, como o

mais é que um ornamento ou investimento de marketing, como antes citado, mas se a

fato de a animação não ser tão grande qualidade, tanto imagética quanto de conteúdo,

mesma imagem fosse colocada num museu, a visão sobre ela poderia ser totalmente

e essa ideia repercute nos novos trabalhos, tanto quanto no filme em questão.

contrária. Daí vem a questão, será que realmente sabemos analisar o sentido de uma

Quanto à distribuição, pode-se destacar repercussão dos prêmios como falado

peça, ou somos influenciados pelo ambiente, pela fabricação, pela cultura e tantos

no tópico “6. O Valor”. Assim como a leitora citada no tópico, que decidiu assistir ao

outros fatores? A resposta não é difícil, sim, na maioria das vezes isso acontece. E

filme porque este tinha chances de conseguir um prêmio, não é difícil deduzir que

será que o filme tratado aqui em questão “O Menino e o Mundo”, também não foi

muitas outras pessoas também só assistiram influenciadas pela premiação que o filme

analisado por diversas pessoas com base em tantas influências, e talvez até mesmo

recebera, ou mesmo por uma crítica ou comentário informais que receberam.

por mim?

O consumo já sugere algo mais pessoal, como o filme chegou à pessoa, em

Considerando primeiramente como foco o comércio, dizendo por comércio a

que situação, com que objetivo, os sentimentos que foram sentidos no contexto, entre

abrangência desde a produção até o consumo numa sociedade capitalista, podemos

outros fatores. A partir dai o puro comércio já se alia com a psicologia. As pessoas

dividir em três partes, as quais geralmente tendem a ser divididas na sociedade

são diferentes, suas opiniões e emoções relacionadas a determinado assunto mudam

industrial, o comércio, são elas a fabricação, a distribuição e o consumo. Da

de acordo com a cultura, idade, experiências, vivências, relacionamentos, entre outros

fabricação diz-se sobre da autoria e a origem do artefato, quanto à distribuição, o

diversos fatores, por isso uma análise simplória como esta não pode definir

mercado e a venda, e sobre o consumo, a compra e o uso.

significados totais de uma obra, mas pode induzir a visão sobre eles.

Se for considerado um livro, cujo autor é muito famoso por outras obras já

Analisando a obra em si, quatro vertentes podem sair dessa análise, são elas, a

publicadas, não é difícil alguém ir a procura de um exemplar apenas por causa do

materialidade, o ambiente, os usuários e o tempo. Quando se diz materialidade, quero

escritor, e, antes de ler, já dar um significado especial para aquela obra, aí falamos da

dizer a forma, a estrutura, a configuração da obra, no caso do filme estudado no artigo

fabricação. O mesmo livro pode atrair outra pessoa que não conhecia o autor, mas viu

sua configuração baseia-se na animação e esta na ilustração e no som. Não é difícil

na capa que o livro está entre os mais vendidos da lista de um prestigiado jornal, o

reconhecer uma animação, e isso não muda no presente estudo, a materialidade estuda

que também a fez dar um significado diferente àquela obra de quando primeiro a viu,

a captação de uma peça, o seu reconhecimento, apenas pela sua estrutura.

e neste exemplo está a distribuição. Uma terceira pessoa recebe este livro de presente

O ambiente se refere ao entorno, ao contexto em que a obra se encontra. Como

de sua mãe numa data importante, logo o significado do livro irá se associar ao lado

por exemplo o filme “O Menino e o Mundo” tem um sentido quando exibido num

emocional, exemplificando o consumo.

grande festival internacional de cinema, mas tem outro quando exibido no cinema de

As três partes dizem respeito apenas sobre o aspecto superficial de uma obra, o

uma cidade pequena brasileira.

que muitas vezes já é o suficiente para alguém criar todo um significado sobre algo, Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 194 – 209, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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A definição de usuários não se distancia muito da descrição do “consumo” no tópico anterior, quando falo em usuários me refiro a pessoas, e quando se fala em

saber distinguir um desenho animado de uma foto, e todo o resto criado vem dessas pequenas experiências.

pessoas raramente o aspecto psicológico não está presente. Com o foco na obra, ou no

O que torna fascinante o olhar de uma criança no contexto desse artigo é que

caso, no usuário da obra, seja o leitor, o observador, ou qualquer outro tipo de

para uma análise mais exata deste tipo, ter um olhar mais infantil muito acrescenta,

interator, sua análise se dá através desta relação. Como exemplo tomemos o filme “O

porém esse é um tema para um próximo artigo.

Menino e o Mundo”, numa situação ele está sendo assistido por crianças da fase préescolar em uma instituição de ensino, numa outra, está sendo assistido por alunos de

Considerações Finais

pós-graduação da área social, nessas duas situações aparecem possíveis públicos, mas com diferentes visões da mesma obra. A vivência, a experiência, a idade, entre outros

A partir do estudo feito nesse artigo, algumas constatações podem ser feitas,

fatores bastante evidentes, explica a diferença de uso da mesma obra, e, portanto, a

uma das mais importantes é o conhecimento de que tudo aqui escrito advém de

diferença de significado que adquire.

algumas referências abaixo citadas, mas principalmente de experiências e crenças

O tempo é uma vertente com grande presença, mas muitas vezes não pensado

minhas; nenhuma pesquisa formal foi feita, pois o objetivo do artigo era apenas

na execução de um trabalho. O tempo com relação à significação de obras mostra que

suscitar o pensamento crítico. Então para mim a ilustração pode ter um significado,

ao mudar do contexto, do ambiente, dos usuários, da cultura, das experiências com o

mas para você este não necessariamente será o mesmo, o que não significa que está

passar dos anos o significado de uma peça também muda. A animação que está sendo

errado.

comentada agora, assistida por várias pessoas, sendo glorificada com diversos

Outro ponto que foi enfatizado foi o que se pode chamar de valor agregado, o

prêmios, pode no futuro estar numa sala de aula, sendo apresentada a diversos alunos,

valor que cada peça tem para determinada pessoa, o que também deve ser visto com

com o discurso de um professor que a critica de forma a contrariar tudo o que cremos

olhar crítico, para um julgamento mais livre de influências externas.

agora. No projeto de uma ilustração, ou mesmo de uma animação, pouco se pensa no

Quanto ao filme “O Menino e o Mundo” este é um perfeito exemplo de tudo

futuro a não ser que esse seja pertinente ao tema, as obras são construídas apenas

que pode estar envolvido no seu significado, como a obra em si pode significar menos

visando o público atual, por de certa forma, ser algo sazonal.

do que sua influência exterior em diversos casos.

A visão das crianças: algo que muito é fascinante à discussão é a visão das crianças sobre o mundo e sobre as coisas. Quando uma criança brinca, um graveto se

Referências Bibliográficas

transforma numa espada, uma caixa se transforma numa nave, uma espiga de milho se transforma em boneca. Não precisa ter as características exatas, não precisa parecer real, apenas precisa-se acreditar que é real; essa é uma das particularidades que o filme “O Menino e o Mundo” mostra em sua imagem e conteúdo.

CARDOSO, Rafael. A vida e a fala das formas: significação como processo dinâmico. In: CARDOSO, Rafael. Design para um mundo complexo. Cosac Naify, 2012. p. 99-168.

Essa mesma característica das crianças também influencia na sua visão do significado das coisas. A imaginação de uma criança vai além de influências culturais, experiências e outros fatores já falados, pois seu conhecimento ainda é pouco, o que as deixa ver as coisas de maneira mais pura, qualquer coisa pode ser qualquer coisa. O mais importante na mente de uma criança é a definição da peça, como, por exemplo, Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 194 – 209, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Livros didáticos infantis: ilustrações e o olhar da criança Giovana Costa Simplício1 Resumo Expandido

elementos mais importantes do design gráfico.2 Em jornais revistas e livros, e especialmente na literatura infanto juvenil (se tornando como principal muitas vezes o papel mais importante do texto), a ilustração tem se tornado comum, aparecendo também em anúncios publicitários e propagandas. As ilustrações independentes de texto também são citadas, muitas vezes sendo utilizadas como informação principal.

O artigo em questão busca a análise do ponto de vista da criança sobre as ilustrações de livros didáticos infantis, fazendo uma abordagem crítica sobre o processo de significação da forma de comunicação de temas educativos através do desenho. Trouxemos os trabalhos de Anna Anjos que retrata o afrotropicalismo tendo como referencia a África e o Tropicalismo Brasileiro nos permitindo tratar a cultura representada na imagem. Tem como principal exemplo o ilustrador Lufe da Rede Pitágoras de Ensino, e seus métodos de ilustração. Nisso, é apontado a limitação do ilustrador na área da educação infantil, quanto a forma utilizada de comunicação com a criança. Através de sua experiência de mais de 20 anos no mercado podemos ver um parâmetro de comparação com processos utilizados no início de sua carreira até os dias atuais, e a influência em seus trabalhos. O livro Design Emocional de Donald Norman também é apontado, sendo direcionado ao meio ilustrativo, tendo como foco o nível visceral na análise dos trabalhos de Lufe. A fácil interpretação nos trabalhos, a ausência de um nível reflexivo maior nas mensagens que cada imagem analisada do artigo, mostra como exemplo da sua metodologia de abordagem traz a conexão com o nível visceral de Donald. A necessidade que o nível visceral tem no mundo acadêmico, em meio às ilustrações direcionadas ao público infantil/adolescente mostra que sua aplicação não se limita só ao design, mas tanto no meio publicitário e o mercado de produtos ligados ao público infantil.

Ainda, de acordo com Andrea Castagni (2010)3, como exemplo, pode-se citar seria os

Palavras-chave

cognitiva que a imagem tem como importância, colocaremos como referência a

Infantil; ilustração e ilustrador; livros didáticos e o design.

livros sem texto, não tão incomuns em quadrinhos ou livros infantis. A princípio, a diferença entre a ilustração das histórias em quadrinhos é não haver descrição, necessariamente com uma narrativa sequencial, mas na síntese ou caracterização de conceitos, situações, ações ou, até mesmo determinadas pessoas, como é o caso da caricatura. “Com a inserção do design gráfico no mercado, as ilustrações se misturam com ícones, mascotes, logotipos e layouts, aumentando o campo de atuação do ilustrador e redefinindo as fronteiras da ilustração”. (p. 7) O uso da ilustração no meio acadêmico: ilustrações culturais com Anna Anjo É inegável o papel da imagem em ilustrações de livros didáticos como papel principal. Ela funciona como ferramenta pedagógica de facilitação e fixação dos conceitos coerentes no conteúdo verbal. Para a melhor compreensão dessa função Teoria da Aprendizagem Significativa, de Ausubel. Em análise da teoria, Marco Antônio Moreira (2006): A aprendizagem significativa é aquela em que o significado do novo conhecimento é adquirido, atribuído, construído, por meio da interação com algum conhecimento prévio, especificamente relevante, existente na estrutura cognitiva do aprendiz. Interação é a palavra-chave: interação entre conhecimentos novos e conhecimentos prévios. (MOREIRA, 2006, p. 16)

Introdução Ilustração é uma imagem pictórica utilizada para acompanhar, explicar, interpretar, acrescentar informação, sintetizar ou até simplesmente decorar um texto. Embora o termo seja usado frequentemente para se referir a desenhos, pinturas ou colagens, uma fotografia também é uma ilustração. Além disso, a ilustração é um dos Estudantes do curso de Design de Produto manhã da Escola de Design da Universidade do Estado de Minas Geras, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Trabalho orientado pelos professores Eliane Meire Soares Raslan e André Borges da ED/UEMG. E-mail: giovana2323@yahoo.com.br

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Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 210 – 225, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. Texto recebido: 25.05.2015. Texto aprovado: 09.08.2015. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Apesar de se referir especificadamente a livros didáticos de História, sua

preocupação pode ser estendida para parâmetros mais gerais. O livro didático já era classificado por Osman Lins (1977) como uma “Disneylândia pedagógica” ainda na Fonte: Góes, Lúcia Pimentel. Olhar de descoberta. Mercuryo, 1996. Fonte: CASTAGNI, Andrea. Ilustração digital e animação, 2010. Disponível em: <http://portaldoprofessor.mec.gov.br/storage/materiais/0000015331.pdf>. Acesso em: 20 de julho de 2015.

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segunda metade da década de 70. Os processos gráficos ao passar dos anos passaram por um processo de “simplificação” do seu conteúdo, na qual sua comunicação escrita – cognitivamente mais complexa, difícil, mas imprescindível à formação intelectualfoi substituída pela comunicação visual de forma sistemática. Nesse processo então pôde-se perceber que a informação é perdida, obtêm-se a comunicação como desvanecida, e por consequência põem-se cada vez mais nos ombros de professores e dos próprios alunos a responsabilidade de interpretar, compreender e aprender o

momento em que o aluno fará uma leitura geral da ilustração, deixando fluir as relações que estabelece entre o que está vendo e as outras imagens. (Bittencourt, 2006, pp. 86, 87)

Dentro desse contexto educacional, buscamos o trabalho de Anna Anjos para abordar a cultura nas ilustrações. Seja para adultos ou crianças, a presença constante nas ilustrações do modo de vida brasileira é marcante em seus trabalhos. Figura 01-03: Ilustrações de Anna Anjos

conteúdo presente nos livros. É inegável o papel da imagem, dentro do livro didático, como ferramenta pedagógica de facilitação e fixação dos conceitos correntes no conteúdo verbal. Para compreender essa função cognitiva que a imagem pode assumir, tomemos como referência a Teoria da Aprendizagem Significativa, de Ausubel. Em análise da teoria, Marco Antônio Moreira nos coloca: A aprendizagem significativa é aquela em que o significado do novo conhecimento é adquirido, atribuído, construído, por meio da interação com algum conhecimento prévio, especificamente relevante, existente na estrutura cognitiva do aprendiz. Interação é a palavra-chave: interação entre conhecimentos novos e conhecimentos prévios. (Moreira, 2006, p. 16)

Basicamente, para uma melhor compreensão do novo conhecimento – aquele que se quer ensinar—é necessário relacioná-lo ao universo de coisas que o indivíduo já conhece. Ao relacionarmos o novo conhecimento a um ou vários aspectos do conhecimento prévio do aluno, estamos criando pontes que facilitam a compreensão do conhecimento novo. Ora, ao lembrarmos que, no processo de desenvolvimento da criança, a percepção das imagens e a associação delas a um sistema de signos é anterior, senão condição, para o desenvolvimento da linguagem escrita, pode-se tomar então que, de maneira geral, a imagem tenha uma tendência a ser mais ágil e facilmente apreendida (em termos cognitivos) do que a linguagem escrita. Sendo assim, é possível que a imagem possa assumir um papel de subscritor para um novo conhecimento verbalizado. Tal processo pode ser visto nas sugestões de exercícios de uso pedagógico da imagem nos livros didáticos em aulas de História, expostos por Bittencourt: [...] para introduzir o aluno na leitura de imagens dos livros didáticos, é importante inicialmente buscar separar a ilustração do texto, isolando-o para iniciar uma observação “impressionista”, sem interferências iniciais da interpretação do professor ou das legendas escritas. Trata-se do Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 210 – 225, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Fonte: Site da artista Anna Anjos 4

A arte-ilustradora Anna Anjos atua nos mercados publicitário, editorial e moda (vestuário). Com um estilo original, Anna faz prevalecer sua ousadia artística, inventiva e irreverente. Misturando formas estilizadas, ela extrai elementos do ludismo para incorporá-los em sua realidade de criação, fazendo-nos entrar num espaço original, em que as cores brincam com as formas. Essa alquimia de criação nos mostra uma produção bastante especial: personagens puros, que refletem uma ingenuidade em seus corpos, mas que revelam a firmeza de suas personalidades e de suas emoções, através dos seus traços bem definidos, brindando-nos com a gênese de um estilo que faz de Anna Anjos uma artista marcante, já com sua patente dentro do nosso universo artístico contemporâneo. 5 Figura 04: Ilustrações de Anna Anjos

Fonte: Site da artista Anna Anjos 5

De acordo com o site Portal de Entretenimento e Canna Club6: Site da artista Anna Anjos. Disponível em:< http://annaanjos.prosite.com/>; Acesso em: 26 junho 2015. 5 Fonte: Site da artista Anna Anjos. Disponível em:< http://annaanjos.prosite.com/> Acesso em: 26 junho 2015. 4

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Vi no Canna Club- A paulistana Anna Anjos, de 25 anos, graduada pela Belas Artes de São Paulo, criou um mundo lúdico denominado "Afrotropicalismo", como referência à Africa e ao Tropicalismo. Numa criação ousada e irreverente, com personagens alegres e coloridos. O Universo Afrotropical e seus personagens foram, em grande parte, criados através de suas referências visuais, sobre influência da música do movimento Tropicalista brasileiro, na cultura brasileira (nordestina e indígena) e na cultura africana.

A ilustração e suas limitações na educação

De acordo com Etson Delegá (2012), a fragmentação da informação – em padrões visuais que lembram a organização de informação do meio digital – pressupõe que a criança seja capaz de fazer as associações entre os diversos “pedaços de informação” dispostos na página. Mesmo para uma criança plenamente adaptada à era digital, esse ainda é um processo mental complexo e difícil. Neste caso, a

Luiz Fernando Silva da Cunha8, profissionalmente conhecido como Lufe, é ilustrador de livros didáticos para editoras e assessorias de comunicação. Atualmente trabalha na área de publicidade, possuindo experiência como chargista em jornais, caricaturas e histórias em quadrinhos. Formado em Comunicação Visual pela antiga FUMA (Fundação Mineira de Artes Aleijadinho) hoje trabalha para a Rede Pitágoras de Ensino, em livros didáticos infantis. De acordo com Lufe, uma das limitações presentes na profissão quando voltada para o meio didático, é a não permissão de interação com a criança por meio da ilustração ligada a fantasia. A ausência de personagens inanimados como forma de interação com o leitor possibilita uma aprendizagem menos fantasiosa, e mais direta com o aluno. Parâmetros de comparação no processo de criação

fragmentação não só deixa de cumprir seu papel como forma lúdica de orientação do texto, como – pela digressão visual na leitura – acaba dificultando a compreensão. Além disso, a composição de página predominantemente visual demanda, normalmente, uma sintetização do texto escrito, na qual muitas vezes informação é perdida. Numa primeira leitura (especialmente sob o ponto de vista do adulto, ou mesmo da criança um pouco mais velha), a informação que se perde pode parecer irrelevante, mas para a criança que lê e que não tem a mesma carga de conhecimento prévio, as lacunas podem fazer falta na compreensão do conteúdo. Novamente, nos voltamos à teoria da aprendizagem significativa de Ausubel: sem o conhecimento prévio adequado (que nesse caso, se resume à capacidade intelectual de fazer as devidas associações entre as várias partes do conteúdo fragmentado) o projeto gráfico pode parecer amigável à criança, mas ela não consegue fazer as conexões necessárias para compreender o conteúdo como um todo, e o conhecimento a ser aprendido se dispersa, torna-se confuso. 7

Antes da fotografia, a ilustração era uma das únicas formas de registro seja um local, pessoa ou ser vivo. Grandes artistas faziam de suas obras desenhos de observação com técnicas presentes na época como a têmpera, o bico de pena, a tinta a óleo, aquarela e o guache. Como apontado por Andrea Castagni (2010), um momento apontado como divisor de águas na ilustração é a invenção de Gutemberg. Com a impressão de livros em série, criou-se uma demanda que exigia um profissional que ilustrasse esses textos. A partir disso, era pedido como exigência um modo de trabalho diferente do artístico, pois as ilustrações deveriam ser confeccionadas dentro dos padrões exigidos pela imprensa, que em seu primórdio, limitava as possibilidades de materiais e cores do artista. Talvez naquele momento a profissão do ilustrador tenha se definido. Os ilustradores tinham como intenção enfeitar textos ou primeiras publicações da imprensa assim como livros e folhetos. Antes de Leonardo da Vinci e Gutemberg há relatos destas ilustrações em representações fantásticas do corpo humano tendo seus desenhos como maiores percussores da área médica. Além da abordagem em

Fonte: Site Portal de Entretenimento. Disponível em: <http://portalentretenimento.blogspot.com.br/2014/10/brasileira-cria-ilustracoes.html> Canna Club <http://canna-club.blogspot.com.br/2014/10/brasileira-cria-ilustracoes.html >Acesso em: 26 junho 2015. 7 Fonte: Camargo, Luís. "Ilustração do livro infantil." (1995). O que é qualidade em ilustração no livro infantil e juvenil: com a palavra o ilustrador. Difusão Cultural do Livro, 2008. 6

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cima da anatomia, as ilustrações tiveram sua participação na área infantil tanto em anúncios publicitários, como em conto de fadas. Fonte: Recolhimento de dados através de entrevista com o ilustrador

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Sua maior popularidade esteve presente na década de 70 até o final da década

garantia de armazenamento e fidelidade na impressão de cores. No mercado

de 80, tendo grande popularidade entre ilustradores na inovação de materiais como a

atualmente existem diversos programas de edição e modelagem de imagens. Adobe

tinta acrílica e aerógrafa. Houve uma inovação também em técnicas e estilos podendo

Photoshop, Corel Painter, ArtRage (pagos) ou mesmo GIMP e Sumopaint (gratuitos)

ser agregados ao processo ilustrativo. Abaixo, figura 05 exemplos de materiais.

oferecem arte bitmap e bidimensional.

Figura 05: Materiais utilizados em ilustrações tradicionais

Independente da arte trabalhada ou seu processo de criação dentre diversos

Figura 06: Mesa Digitalizadora

recursos que podem ser utilizados, há um contexto que deve ser observado no processo inicial de briefing em que o material a ser produzido seja o reflexo do que foi pedido. Lufe relata que seu processo de criação consiste nas fases entre o trabalho tradicional e os recursos mais atuais, como o uso de programas facilitadores sendo o uso do Photoshop responsáveis pelo resultado final. É importante citar que o maior

Fonte: Bancos de Imagens do Google9

A arte da ilustração quando explorada de forma tradicional tem sua utilização com canetas nanquim ou bico de pena, no processo de finalização. O material também é bom no realce de iluminação do desenho e firmeza ao traço. As ilustrações começaram a se tornar digitais a partir então da década de 90

realismo dado aos trabalhos por meio de aplicativos e softwares dão ao trabalho vida para uma comunicação entre leitor e o processo didático de aprendizagem. 10 Figura 07: Ilustração feita a lápis Recepção e supermercado

Figura 08: Gibi para Indústria Figura 09-10: Ilustrações de

com a chegada de novos softwares e materiais que foram sendo desenvolvidos especificadamente para este fim, tendo seu meio digital popularizado e uma criação de imagens mais profissionais e especializadas através do uso do computador e seus recursos que chegavam ao Brasil. Na área da criação digital, trocam-se canetas nanquim e bico de pena, por canetas digitalizadoras. Canetinhas e tintas guache são substituídos por vetores e

Fonte: Ilustrações de Lufe, Livro Didático11

bitmaps. Os materiais usados neste processo são o computador, o scanner, mouse, tablet ou mesa digitalizadora. Na figura 06 temos uma mesa digitalizadora – conhecida também como tablete – é um dispositivo periférico que repassa toda a ilustração feita em sua superfície aos softwares próprios para a edição de trabalhos

ilustrativos. Além de

todos os recursos mencionados, é imprescindível a utilização de softwares que capacitem a edição dos trabalhos e a criação de imagens ilustrativas. Um monitor e computador que possuam um bom desempenho também é necessário para que haja Disponível em: <https://www.google.com.br/search?q=Materiais+utilizados+em+ilustra%C3%A7%C3%B5es+tradicio ais&rlz=1C1SAVA_enBR576BR577&es_sm=122&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ei=P1NVdGXOcbDggTA0oLQCg&ved=0CAcQ_AUoAQ&biw=1680&bih=949#tbm=isch&q=Materiais+ut ilizados+em+ilustra%C3%A7%C3%B5es+tradicionais+mesa+digitalizadora>. Acesso em: 26 junho 2015.

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Com Lufe, o processo de criação inicia-se entre a caneta e o papel, com esboços que mais tarde são passados para o computador, passando pelo processo de então vetorização por meio de Photoshop. A imagem vetorial utiliza-se de vetores matemáticos gerados a partir de descrições geométricas de formas. A utilização desse recurso permite a criação de arquivos mais leves podendo ser aumentados em tamanhos suficientes para impressão em outdoors. É importante lembrar que pouco se falava sobre as mesas digitalizadoras na década de 90. Com o tempo as produções em computação foram ficando acessíveis a todos de forma que atualmente quase todos os profissionais ilustradores do mercado utilizam-se deste recurso. 10

Fonte: Delegá, E., O Papel da Imagem no Livro Didático Astington, J. W., et al. “A linguagem da mente: seu papel no ensino e na aprendizagem.” Educação e desenvolvimento humano 7 (2000): 489510. 11 Fonte: Acervo pessoal do ilustrador Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 210 – 225, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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No trabalho de Annna Anjos (fig. 11-12) percebemos a presença da referência do surrealismo, como por exemplo Salvador Dali, e com forte influência da música. A música atua em seus trabalhos como forma de ditar aquilo que será transmitido em um trabalho. A vibração das cores vem de acordo com o ritmo vibrante adquirido através da música. Sua base busca referências sobre tudo que é possível, tanto viagens, palestras, eventos, mas tendo como principal foco as viagens da artista. Buscando as ideias de Donald Norman (2008), nós seres humanos somos resultado de três níveis de design, podendo ser classificados como nível visceral, comportamental e reflexivo. O nível comportamental é que controla a maior parte das nossas atividades do dia-a-dia e suas ações podem ser influenciadas pelo nível superior (reflexivo) e influenciar o inferior (visceral). É o que permite, por exemplo, que você não gaste todo o seu cérebro enquanto dirige seu carro; você pode dirigir, pensar nas tarefas do dia e cantarolar músicas graças a ele. Os profissionais altamente treinados usam bastante esse nível, que não é consciente. Assim, os dedos de um pianista experiente praticamente se mexem sozinhos enquanto ele pode refletir sobre a música que está tocando. Figura 11-12: Ilustrações de Anna Anjos

Fonte: Site da artista Anna Anjos 12

Já o nível reflexivo é o que permite que a gente aprenda, use as experiências e raciocine sobre as decisões que tomamos, além de comunicá-las a outros. É o nível mais vulnerável às influências externas como a cultura, a experiência, o grau de instrução e as diferenças individuais, podendo, inclusive, anular os outros. Isso explica porque alguns de nós conseguem sentir prazer com situações de medo (esportes radicais) e desdenham abertamente o que é visceral, comum, com forte apelo popular. O nível visceral possui uma estrutura que é biologicamente projetada para ampliar as chances de sobrevivência e fundamenta o comportamento afetivo. Esse 12 Site da artista Anna Anjos. Disponível em:< http://annaanjos.prosite.com/> Acesso em: 26 junho 2015.

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nível é incapaz de raciocínio; é uma programação genética que desencadeia afeto

e os fundamentos do Design Emocional de Norman (2008), realizou pesquisas com as

positivo para situações e objetos que oferecem alimento, calor ou proteção, tipo

três fases de desenvolvimento das crianças. Verificando aspectos ligados ao Design

lugares aquecidos e bem iluminados, sabores e odores doces, cores alegres, matizes

Emocional, como: atração, simbolismo, interação positiva, motivação, funções

saturados, sons tranquilizadores, melodias simples, carícias, rostos simétricos e

indicativas e valor de aprendizado/conteúdo, foi possível listar algumas características

sorridentes, objetos lisos e arredondados, sons e formas sensuais. Em contrapartida,

que podem potencializar a ligação emocional das crianças com artefato educativo,

há condições pré-determinadas que favorecem o afeto negativo automático: alturas,

relacionando-se claramente com as teorias acima descritas, como pode ser verificado

sons altos ou estridentes, luzes fortes, calor ou frio extremos, escuridão, ambiente

na tabela:

denso ou atravancado, multidões, cheiros de podridão, alimentos ou corpos em decomposição, sabores amargos, objetos pontiagudos ou assimétricos, corpos

Tab. 2 – Relação entre a Teoria da Atividade, teoria da aprendizagem por descoberta e Design Emocional:

deformados, etc.13 De acordo com Donald Norman, quando achamos algo “bonitinho”, esse julgamento vem diretamente do nível visceral. No mundo do designer, a expressão “bonitinha” normalmente é como sinal de reprovação, podendo servir como resposta a um sinal de não atração imediata. O nível visceral está presente em produtos fabricados para consumo, como em anúncios publicitários, no artesanato e em produtos fabricados para a indústria infantil, roupas e o mobiliário que reflete alguns princípios viscerais, com cores primárias, alegres e saturadas. Por mais que tais criações não sejam obras de arte, acabam sendo atrativas e prazerosas de se ver. Nos desenhos de Lufe, abordaremos o nível visceral, que são responsáveis por nossos julgamentos automáticos ou pré-programados sobre a ilustração, podendo ser considerados como opiniões rápidas. Para Norman (2008), as nossas emoções mudam a maneira como pensamos, e servem como guias constantes para o comportamento apropriado, pois são complexas condições do organismo que envolvem variações no corpo, impactam na saúde, na criatividade e na resolução de problemas. Desenvolver produtos que minimizem frustrações e efeitos negativos na capacidade cognitiva dos indivíduos é uma das abordagens do design emocional. Com isto, as ilustrações de Lufe seguem a mesma linha na qual não produzem efeitos negativos e oferecem simpatia ao leitor. Rodrigues (2010), baseada na relação entre a teoria de aprendizagem significativa de Bruner (1969), aprendizagem por descoberta de Ausubel et al (1980) Fonte: Os três níveis do design, parte 1: O design visceral. Reveista clichê. Disponível em: <http://www.revistacliche.com.br/2013/09/os-tres-niveis-de-design-parte-1-o-design-visceral/> 13

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Fonte: Rodrigues (2010)

É importante frisar que a teoria da atividade é colocada por Leontiev (1978), como o princípio do desenvolvimento infantil em que as relações com o mundo Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 210 – 225, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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material e social fundem-se para as crianças, separando-se mais tarde para a formação do que ele designa como “linhas de desenvolvimento”. De acordo com o autor, na ontogênese essas transições se expressam em fases: a fase com predominância da atividade objetiva, fases de desenvolvimento de relações com as pessoas e com a sociedade e que estão presentes no trabalho de Anna Anjos. São essas transições que caracterizam os motivos em cada uma das fases, e são esses motivos que representam os “nós” para a formação da personalidade. Portanto, a amarração desses “nós” representa um processo de relação indivíduo objeto que é expresso de formas diferentes em estágios de desenvolvimento diferentes. Considerações finais

LIMA, Yone Soares de. A ilustração na produção literária: São Paulo--década de vinte. Vol. 33. Instituto de Estudos Brasileiros-USP, 1985. MOREIRA, M. A & MASINI, E. F. S. Aprendizagem Significativa: a teoria de David Ausubel. São Paulo: Moraes Editora, 1982. Centauro, 2ª. Ed., 2006. MOSER, Walter, Spatzeit. In: MIRANDA, Vander. Narrativas da modernidade. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2001 NORMAN, Donald A. Design emocional: por que adoramos (ou detestamos) os objetos do dia-a-dia. Rio de Janeiro: Rocco, 2008. RODRIGUES, L. Relações entre o Design Emocional e as Teorias de Aprendizagem: Uma contribuição para o processo de desenvolvimento de brinquedos educativos infantis. 20 10. 120 f. Monografia não publicada (graduação) – Universidade Fede ral de Pernambuco. CAA. Graduação em Design, 2010. RODRIGUES, Laís Helena Gouveia. Relação Entre o Design Emocional e a Teoria da Atividade: ferramentas para o estudo sobre a interação da criança com o brinquedo. In: Liinc em Revista, Rio de Janeiro, p. 56, 30 de out. 2014.

As abordagens feitas no artigo buscaram mostrar que no ofício do trabalho do ilustrador, não se trata apenas do processo de criação do papel aos detalhes finais, mas de algo mais amplo que envolve o uso apropriado de uma metodologia certa de trabalho com ênfase no estudo psicológico da criança e na importância da ilustração em sua formação. Diferentemente de ilustrações que abordam toda uma perspectiva semiótica, Lufe aborda o nível visceral de forma clara para a fácil visualização do público infantil, através da necessidade no campo acadêmico para crianças. Anna Anjos trabalha questões culturais brasileiras em suas ilustrações. A limitação na formação do público infantil também é de suma importância, visto que é um dos primeiros contatos que esta alcança com o mundo no ambiente escolar. Tudo deve compreender para uma boa formação do indivíduo, podendo ser abordado no design emocional. Referências bibliográficas BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Livros Didáticos Entre Textos e Imagens. In: O Saber Histórico na Sala de Aula. 11 Ed. São Paulo: Contexto, 2006. BRUNER, J. Uma nova teoria de aprendizagem. Rio de Janeiro: Bloch Editoras S/A, 1969 COELHO, Nelly Novaes. Literatura infantil. teoria, análise, método. São Paulo. Moderna, 2006. FARIA, Maria Alice. Como usar a literatura infantil na sala de aula. Editora Contexto, 2008. LEONTIEV, A. N. O desenvolvimento do psiquismo. 2ª Ed. São Paulo: Centauro, 2004. Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 210 – 225, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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Revista Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, vol. 2, n. 1, p. 210 – 225, 1º semestre/2015. ISSN 2447-2638. <https://legendaniquemg.wordpress.com/>

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ENTREVISTA Também acho que é importante criar uma rotina para ter disciplina. Quem tiver uma página no facebook, blog etc. deve ter um ritmo de postagens (independente de desa. Isso é o que chama público para apreciar seu trabalho. Como foi o apoio de sua família ao longo de sua carreira? PUSTI: Sempre fui estimulada a desenhar, mas creio que minha família não imaginava que eu fosse trabalhar com isso. Quando decidi que de fato queria seguir na área de ilustração e quadrinhos só recebi apoio! Inclusive já levei puxão de orelha de familiares quando eles me viram desanimada. REVISTA LEGENDA:

O que você tem a dizer sobre a valorização do mercado de quadrinhos? PUSTI: Ainda tem muito a crescer, mas vejo um futuro promissor. Então as pessoas se dedicarem a produzir quadrinhos e a consumir quadrinhos nacionais só tende a trazer benefícios. Espero que o mercado siga em crescimento e que cada vez mais leitores consumam histórias ilustradas. REVISTA LEGENDA:

LETÍCIA PUSTI

é estudante de Artes Visuais na UFRGS, ilustradora e criadora da página Another Art Book, onde publica tiras relacionadas ao cotidiano.Também produz tirinhas semanais para a página Graduação da Depressão, onde retrata o lado cômico (ou depressivo) da vida universitária.

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O que te levou a se interessar pelo trabalho que tem hoje? PUSTI: Sempre gostei de desenhar e contar histórias. Mas a dificuldade que eu tinha em desenhar quando era mais nova me fez tentar contar histórias através do jornalismo. Somente após ler quadrinhos nacionais, conhecer artistas nacionais e começar a frequentar convenções é que aceitei que podia trabalhar com quadrinhos, ilustração e contar histórias através de imagens. E a partir disso comecei a desenvolver meu desenho e alguns trabalhos. REVISTA LEGENDA:

REVISTA LEGENDA: Quais foram as maiores dificuldade por que passou? PUSTI: A maior dificuldade que eu tive foi causada pela mim mesma. Me pressionar de uma forma não sadia, desanimar com a falta de resultados. Mas isso faz parte da vida artística, saber superar essas fases é importante. REVISTA LEGENDA: Quais dicas você têm para ilustradores que buscam se tornar quadrinistas? PUSTI: Acho que ler bastante, participar de convenções e praticar é muito importante. Isso é essencial para manter um portfólio atualizado. Prestar atenção em dicas que outros artistas costumam dar em palestras pode ajudar muito (como foi no meu caso)...

REVISTA LEGENDA: Qual técnica você utiliza? PUSTI: Atualmente aquarelo bastante e também estou tentando melhorar minhas técnicas de desenho digital (que é a técnica que uso nas minhas tirinhas). REVISTA LEGENDA: Conte sobre uma de suas obras favoritas e a técnica que usou nela. PUSTI: Gosto muito de desenhar animais. Acho que gosto de todos os que desenhei e todos os recentes são aquarelados. Foram feitos em caráter de estudo e acho que por isso gosto tanto deles. Gosto também da tirinha “Trevosa”, que publiquei em minha página após meses sem produzir material. E essa tirinha fez sucesso, me trouxe oportunidades e me fez abrir os olhos para a importância de estar ativa. Ela foi feita digitalmente.

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Pรกgina Facebook: https://www.facebook.com/anotherartbook/ ENTREVISTA INDIVIDUAL Realizada por e-mail por: Kaique Marcos de Paula Fernandes e-mail: legenda-niq@hotmail.com Membro da equipe Legenda Quadrinhos Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil Data da entrevista: 31de agosto de 2015, 16:25

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ENTREVISTA

MARIAMMA FONSECA SANTANA

REVISTA LEGENDA: O que te levou a se interessar pelo trabalho que tem hoje? SANTANA: Sempre gostei de desenhar. Lembro de fazer um mickey na 5º série pra responder uma pergunta da professora de artes sobre “desenhe o seu sonho”. Meu sonho era desenhar na disney. Ela não acreditou que fui eu quem tinha feito. Me deu zero. Mas eu sempre desenhava. Inclusive as paredes do meu quarto. Vim para BH (sou de Eunápolis - BA) e quando fui prestar vestibular tinha uma pressão no ar que dizia “faça algo que te dê dinheiro.” Aquela pressão que acontece com todos adolescentes e que não deveria existir, porque somos muito novos pra decidir “o que queroemos ser”. Após me formar em jornalismo me senti um peixe fora d’Água. O curso me trouxe novos aprendizados mas trabalhar com desenho sempre martelava em minha cabeça. Com o Lady’s Comics e conhecendo trabalhos incríveis eu tive a certeza. Então larguei o jornalismo e tô aqui tentando viver do que gosto.

Quais foram as maiores dificuldade por que passou? SANTANA: Imagino que me atualizar. As vezes me achava velha pra tentar algo novo do zero. Mas em dois anos de estudo foi o suficiente pra poder ficar por dentro do que o mercado espera de um ilustrador e claro, aprender técnicas novas. Porque até então tudo que as pessoas desenham parece incrível, mas daí você enxerga que metade é criatividade, mas a outra metade é técnica.

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Quais dicas você têm para ilustradores que buscam se tornar quadrinistas? SANTANA: Para ser quadrinista você primeiro tem que ter uma história interessante. E acredito que essa história venha do seu dia a dia, da sua infância. Contar uma história que tenha propriedade e intimidade em falar. Depois é desenhar e soltar isso na internet! Graças a internet muitos quadrinistas tem conseguido publicar suas histórias (inclusive impressa).

REVISTA LEGENDA:

Como foi o apoio de sua família ao longo de sua carreira? SANTANA: Meus pais sempre me apoiaram. Vim de uma família de artistas. Meu pai é músico e trabalha com cultura há muito tempo, minha mãe pinta maravilhosamente bem. Eu cresci em um abiente de artistas, minha casa (literalmente) recebe os artistas. Meus pais coordenam um ponto de cultura e o andar de

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baixo da minha casa é um teatro e tem aulas de artes, teatro, violão, capoeira e roda de leitura. Lá consegui montar uma gibiteca. Então...melhor apoio impossível! (risos) O que você tem a dizer sobre a valorização do mercado de quadrinhos? SANTANA: O clichê “Quadrinho é coisa de criança” tem mudado muito. As escolas tem percebido o potêncial dos quadrinhos, assim como os jornais. Assim como outra mídia as histórias em quadrinhos deixaram de ser associado apenas a super-heróis e a Turma da Mônica, pra dar lugar a uma narrativa única. O gênero quadrinhos é uma linguagem autônoma e que pode ser explorada de diversas formas. Felizmente o crescente número de eventos também tem colaborado com essa valorização, bem como a internet, por meio de plataformas de financiamento coletivo que tem dado um boom nas publicações independentes. Acredito que estamos em uma época de boa valorização das histórias em quadrinhos.

REVISTA LEGENDA:

Conte sobre uma de suas obras favoritas e a técnica que usou nela. SANTANA: Eu curto muito dois trabalhos digitais (útero e da gordinha no campo). Na do útero, não tem muito mistério. Eu adoro desenhar flores, e quando recebi de um tio fotos de algumas flores de seu terreno eu fui me inspirando. A da gordinha eu usei muito a questão das cores combinadas e pensava em massa de tinta. Imaginar que você está manipulando a massa de tinta mesmo no digital deixa a pintura digital com mais cara de pintura de verdade (risos). Duas coisas que aprendi em aula.

REVISTA LEGENDA:

ENTREVISTA INDIVIDUAL Realizada por e-mail por: Kaique Marcos de Paula Fernandes e-mail: legenda-niq@hotmail.com Membro da equipe Legenda Quadrinhos. Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil Data da entrevista: 21 de setembro de 2015, 16:00 230

Já nos desenhos feitos manualmente em acrílica eu curto muito a da menina na janela com o pássaro. Porque ela simplesmente nasceu. Fui fazendo, sem nenhum rascunho, e a medida que fui desenhando eu fui pensando sua composição. Eu curto muito fazer esses desenhos sem pensar, pelo simples fato de experimentar. Eu ouvi uma vez em uma oficina com o ilustrador espanhol Javier Zaballa que essa coisa de ficar planejando e guiando o olhar de quem vê a imagem é muito “fascista”. E o é...por que as vezes fazemos algo que agradamos nosso olhar e não necessariamente ele está na proporção áurea, por exemplo. É importante você saber as técnicas e tudo mais, mas é apenas para depois você poder desconstruí-la (risos). Porque é importante você “construir para desconstruir.” E isso funciona bem na imagem. 231


ENTREVISTA

DANIEL BUENo

REVISTA LEGENDA: Qual foi o processo usado para a criação da ilustração do livro? De onde veio a inspiração? DANIEL: O texto marca um caminho do escritor em direção ao realismo. Na história, dois primos que observam um mercado de Berlin de uma janela divagam sobre o modo de enxergar e interpretar o que é visto. Aparecem descrições dos trejeitos, roupas e o comportamento dos habitantes da Berlin de 1822, que transitam pelo mercado da Gendarmenmarkt. A janela da história seria a de um apartamento onde o escritor morou, situado sobre um bar que frequentava, numa esquina. É a primeira vez que o texto foi publicado em português, deste que foi o último trabalho concluído de Hoffmann, falecido naquele mesmo ano.

O texto é, portanto, bastante descritivo e atento aos costumes e trejeitos das pessoas, e isso influenciou bastante a ilustração. A primeira coisa que fiz foi anotar tudo o que era mencionado na história, todas as descrições. Logo no início do processo ficou claro que a solução mais adequada seria ser fiel a essas especificações, pois elas não são gratuitas. O prazo para realizar o trabalho era curto. Comecei a achar arriscado me perder em várias ilustrações trabalhosas, pensando separadamente em cada uma, e procurei encontrar uma solução única para todas elas. Algo como uma ideia só para todas as imagens. Já havia feito algo parecido para uma revista argentina e resolvi repetir o recurso: fazer uma única ilustração que poderia ser subdividida em várias outras.

Ilustração do Livro A janela de esquina do meu primo, p. 54-55. Disponível em: <http://buenozine.com.br/A-janela-de-esquina-do-meu-primo> 232

Essa solução ficou ainda mais interessante quando percebi que ela estabelecia uma relação direta com o conteúdo da história: nela há um movimento de distanciamento e aproximação do que é observado que me levou a resolver as ilustrações em um único e grande desenho do mercado, que traz todas as situações do texto. Em alguns momentos temos uma visão à distância, e em outros “recortes” dessa imagem, com ênfase nos detalhes. O texto do Festival de Bolonha, que conferiu menção honrosa ao livro, menciona Max Ernst como inspiração. É uma referência bonita, mas confesso que não pensei diretamente nele (apesar de ter um pôster dele aqui ao meu lado). Quando idealizei essa grande ilustração de uma situação urbana cheio de pessoas e detalhes lembrei de Brueghel, por exemplo. 233


Depois de pesquisar o vestuário, arquitetura e outros aspectos daquela Berlim de 1822, fiz um rascunho para pensar na composição e distribuição de tudo isso na ilustração. Subdividi aquela que seria a imagem total em vários quadros com o tamanho da página do livro, pra pensar nos diferentes enquadramentos. O bonito é que cada recorte poderia ser numa escala, mostrando esse movimento do olhar. Depois desse estudo fiz algumas ilustrações com colagens de teste, experimentando as possibilidades do estilo. Depois de aprovadas, parti para a finalização. O resultado final foi uma ilustração de tamanho 1,2 x 0,9 m. Dentro do livro os designers Maria Carolina Sampaio e Paulo Chagas idealizaram também um flip book, que também brinca com a movimentação do olhar. A colagem foi totalmente digital, misturando os elementos pesquisados com fotos de revistas antigas. REVISTA LEGENDA:

O que você quis transmitir com a técnica

de colagem? DANIEL: A colagem é a minha técnica mais habitual, uso ela desde o começo da minha carreira. Podemos dizer que ela foi fundamental para definir o meu estilo – do modo como ele é mais conhecido. Ou seja, foi com certa naturalidade que imaginei que as ilustrações seriam feitas nessa técnica. Além do mais, havia pouco tempo apara fazer o trabalho e como o processo de criação envolvia uma pesquisa de diversos elementos de livros e revistas, achei interessante aproveitálos diretamente: selecionar, recortar e mesclar todos eles numa composição. Outro aspecto importante era atentar para o fato do livro não ser infantil. Sendo assim houve desde o início o estudo de soluções que fossem adequadas para o público infantojuvenil e adulto. Nesse sentido foi oportuno explorar fotos recortadas para os rostos. Isso deu um tom mais adulto à ilustração. Dentro da minha experiência com a técnica da colagem também tinha facilidade para imaginar um cenário sóbrio, com texturas de peças antigas, com toques de expressionismo e o tom de certo modo carregado de um George Grosz (a composição e o modo como foram dispostas as edificações também foram inspiradas nele). Pesquisei também a obra do Hoffmann, as características do “grotesco” (que marcaram o conjunto de sua obra), seu apreço pela caricatura (ele também desenhava bem), e achei que o estilo ia de encontro a esse conjunto de referências.

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Com o tempo curto, decidi também que a colagem não seria manual, mas digital. Fui estabelecendo estratégias para dar conta do serviço dentro do prazo e com qualidade. REVISTA LEGENDA: As fotos usadas para compor a ilustração foram tiradas de onde? Gostaríamos de saber se elas são de pessoas de Berlim da época em que se passa a história do livro. DANIEL: O processo de criação envolveu pesquisa de costumes, arquitetura e vestuário da Berlin de 1822. Para tanto recorri à biblioteca do Instituto Goethe. Sendo assim, boa parte desses elementos na ilustração correspondem à época da história. Já os rostos das pessoas tirei de revistas antigas do começo do século passado, como a Vanity Fair das décadas de 20 e 30. São fotografias de qualidade, bonitas, e gosto da luz e sombra desses rostos. Acabaram tendo um padrão comum, contribuindo para a definição do estilo da ilustração. E por serem antigas ficaram bem integradas aos outros elementos. Muitos desses rostos são de pessoas famosas, mas o modo como recorto os contornos transforma bastante a feição dos personagens, eles viram “outras pessoas”. ENTREVISTA PESSOAL Face a face por: Júlia Barros Ribeiro Marina Araujo Mintz Rafaella Santos Rêda Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil Data da entrevista: 20 de Junho de 2015

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notícias

SEMINÁRIO DESIGN DA IMAGEM 2016

FESTIVAL INTERNACIONAL DE QUADRINHOS FIQ 2015 EVENTO BIENAL

EVENTO BIENAL

CENTRO DE ESTUDOS EM DESIGN DA IMAGEM ESCOLA DE DESIGN DA UEMG. BELO HORIZONTE, MG, BRASIL

site: fiqbh.com.br

CONFIRA A PROGRAMAÇÃO NO LINK DO EVENTO: <http://seminariodeimagemeduemg.blogspot.com.br/>

Programação 2014

Diversos núcleos de pesquisa existentes na Escola de Design foram organizados pelo Centro de Estudos em Design da Imagem, da ED/UEMG, para realização anual de um mesmo Seminário. O Seminário Design de Imagem: Convergência Visual ocorreu no dia 08 a 11 de Setembro de 2014. Para os interessados nos Anais (Resumos Expandidos), verificar neste mesmo site.

Programação 2012

O primeiro seminário organizado pelo Centro de Estudos em Design da Imagem ED/UEMG foi o Seminário de Quadrinhos: Pesquisa, Educação e Mercado no dia 04 e 05 de Junho de 2012. Para os interessados nos Anais (Artigos Completos), favor acessar o link: http:// seminariodequadrinhosniqeduemg.blogspot.com.br/p/ anais.html

ISBN: 978-85-62578-41-0 ISBN: 978-85-62578-22-9

Programação 2013

Diversos núcleos de pesquisa existentes na Escola de Design foram organizados pelo Centro de Estudos em Design da Imagem, da ED/UEMG, para realização anual de um mesmo Seminário.O Seminário Design de Imagem: Dialética do Design e suas Interfaces ocorreu no dia 03 a 06 de Junho de 2013. Para os interessados nos Anais (Resumos apresentados) e no E-book (Artigos Completos), verificar neste mesmo site.

ISBN: 978-85-62578-23-6 236

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