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Diego Binotto

Diego Binotto

O eterno retorno do mesmo

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Sabe, hoje me sinto particularmente admirado por estar vivo Eu ando, respiro, falo, faço coisas ou não as faço Independentemente de minha vontade Ao menos daquilo que usualmente (e erroneamente) Se concebe como vontade Algo de ideal, de abstrato e egóico Artificial, e posterior ao verdadeiro querer Estar admirado com a vida compreende outras formas de interpretar o mundo Quando a própria realidade deixa de ser aquilo que espero dela E passa a ser o que ela realmente é Há um poeta multifacetado Que se julga irmão das pedras Agora, sentado e rodeado por flores amarelas E pelo vai e vem de pessoas que não vão além de onde querem ir Percebo o grau de parentesco que há entre esse poeta e uma pedra no seu jardim Laço sanguíneo por sinal Que anima cada molécula do cosmo Eis que se apresenta a vida E por ela eu muito me admiro Pois a vida é, independentemente da minha vontade Não sou eu que defino conscientemente e egoisticamente o que é a vida Ou mesmo quem eu sou Pois a vida a mim não se detém! Ela flui, me arrasta consigo Ela acontece, e me faz acontecer Não existo por mim mesmo E sim passo a existir quando estou imbuído de vida Dela partilho, assim como uma fera Um oceano, ou mesmo uma pedra Até mesmo o transeunte que me pede as horas Ou fala tolices sobre o clima O fato é que a vida operou nesse momento

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Conjurando uma série de acontecimentos Que me trouxeram aquele ser a mim E preparando toda uma nova série de acontecimentos a partir de então Como nau sem leme Soprada pelo vento do acaso Eis quem sou! Sem identidade, orgulho, ou convenção Um pequeno mundo, com sua órbita própria Gravitando em redor de outros até formar um derradeiro universo Admirador da vida Da vida de uma pedra Ou do que a vida nela operou Admirador de caminhar, respirar, tossir e espirrar Enfim, de toda frivolidade que compõe a vida Como uma orquestra, ou mesmo uma paisagem Que se vê em perspectiva Que se ouve no uníssono e totalidade Mas que é formada por minúsculas e diligentes partes Um homem, sentado e rodeado por flores amarelas Uma história de vida que se passou E que o fez ali estar E que o fez não querer estar noutro lugar senão ali, naquela hora Eis a vida Eis o eterno retorno E mais, o eterno retorno do mesmo Quando se constata que toda frivolidade Seja ela boa ou ruim Não deixa de ser mera frivolidade E ocorre para nos favorecer Pois não importa o quão penosa seja a forma de vida que escolhemos O fato é que a vida, ela própria Nunca vai deixar de acontecer Mesmo que eu não queira mais nada E não faça mais nada pela vida Mesmo assim ela vai acontecer Mesmo assim existirão as flores amarelas E o banco onde me sentei e escrevi frases sem sentido Bobagens sem cabimento Apenas por sentir o querer e perceber que estou vivo E ter sensibilidade suficiente para me admirar disto tudo.

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