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Joedyr Goçalves Bellas

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LiteraAmigos

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Joedyr Goçalves Bellas São Gonçalo/RJ

U m D i a Co m o O ut ro Q ua l q ue r

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A luz acesa.

Tenho alguns anos e não me canso de olhar pela janela.

A cidade está calma, com jeito de segunda-feira, jeito de fossa, de curar a ressaca, de esquecer o amor que um dia acabou de me esquecer.

Não me importo.

Os amores são assim mesmo. Vêm e vão. Parece porta de saloon, do velho oeste, onde se bebia uísque sem gelo e na marra. As portas que não paravam de se movimentar, não se contentavam em ficar fechadas ou abertas, as dançarinas dançando mostravam as pernas e eu olho a cidade daqui de cima.

Já pensei em me atirar daqui.

Me tirem daqui, não me deixem aqui sozinho, não é que eu tenha medo da solidão, mas às vezes a solidão precisa de um par para bailar, não basta uma dose de uísque ou um cigarro nos lábios, precisa-se de um corpo, como aquela placa na obra, precisa-se de empregados.

Eu não preciso de nada.

As pessoas vão passando calmamente, não consigo distinguir nenhum rosto, nenhuma forma, a vista já está precisada de óculos, mas os óculos embaçam a minha vista e, de qualquer maneira, eu não consigo enxergar nada mesmo.

Ontem, eu entrei numa rua e esta rua se chamava Rua Esquerda. Achei engraçado o nome, mas não ri, não disse nada, nem fiz pouco caso do nome. Todas as ruas, como as pessoas, precisam de um nome, de uma identidade, meu

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pai vivia me chamando de Joca, sabendo que meu nome não era Joca, e sim João Carlos.

Minha mulher me chama, me chama, me chama, de Joquinha.

Acho engraçado, não gosto, mas deixo pra lá, não sou de briga nem de confusão, e, além do mais, o nome não é tão importante assim.

Ou é?

Eu me lembrei, agora, de um filme que eu vi há muito tempo, não sei se foi um filme ou se foi um sonho meu, mas os dragões saltavam fumaça pelas ventas e a minha avó vivia dizendo que mulher que tem cabelo na venta é boa de briga, gosta de um barraco, gosta de colocar a mão na cintura e esculhambar o interlocutor. E, no filme ou no sonho, a mulher chamava o sujeito de Zequinha e esbravejava que Zequinha não valia nada, era um traste, um troço, e que Zequinha nem nome era. Não se impôe como José, quer o que da vida?

E eu pensava na minha mulher que só me chama porque chama de Joquinha.

Mas hoje é segunda-feira, é dia de colocar um disco na vitrola, fechar a janela, deixar a cidade pra lá e nem tentar sair da fossa.

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