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Luís Amorim
Luís Amorim Oeiras, Portugal
Excelentíssimo,
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Estou a dirigir-me a si, prezado senhor Tipo para lhe dar conta do que se tem passado nos últimos anos por aqui, na minha terra, por sua causa e do seu, estou em crer, bom nome. Bem consciente eu próprio me identifico quanto ao grau de culpabilidade seu para a ocorrência de tais factos, o qual não deverá ser mais do que nulo, esteja completamente descansado. No entanto, devido à gravidade inerente, não posso deixar passar esta oportunidade de a si, respeitosamente, me dirigir com a exposição em modo desta carta para lhe dar a saber o que efectivamente se tem passado nesta curiosa, por vezes deveras estranha terra, estou convicto que deste modo a irá apelidar. Sem mais demoras, vou directo ao assunto que, já o referi, envolve o seu bom nome, o qual passa pela sua invocação em quase todos os diálogos que as pessoas têm entre si. Ou seja, para que perceba melhor, pois acredito que ao ler estas linhas já estará deveras surpreendido com a minha descrição, vou apresentar o problema que vem ocorrendo desde há demasiado tempo por uma diferente abordagem. Com efeito, o seu nome aparece nas frases ditas por diversas vezes, muitas para ser verdadeiro ou até mesmo em demasia para lhe dar a conhecer a minha avaliação da inacreditável situação. No início, muitas pessoas ficaram incrédulas com o que estava a acontecer para depois, deixarem de ligar, pelo que não houve quem tomasse a nobre iniciativa de algo fazer para colocar um ético fim a tudo isto. Considero que a linguagem deve ter regras e algum bom senso, daí ter resolvido ser eu, por única iniciativa, a minha, de a si me dirigir. Como dizia há pouco, o seu nome aparece demasiadas vezes em cada frase proferida, relembro a demasia no meu humilde avaliar, aparecendo dito nome no início e fim das frases, com pontuais aparições pelo meio. Funciona nome seu como directo complemento em cada frase, quando não
Ca r t a a o s en h o r T i po
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há certeza da ocorrência desse, repito, complemento, em termos horários ou mesmo de factuais evidências, ou ainda de termos outros que não importará referir por aqui. Mas seu honrado bom nome igualmente surge quando existe total certeza que o complemento directo da frase, de facto, ocorreu com precisão, daí supor a minha pessoa, que terá forçosamente de lá estar, mesmo que o interlocutor não o queira ouvir. Outra referência que fiz, a do nome seu estar presente no começo da frase, suponho que em ocasiões algumas será para lançamento da própria sentença, outras será por ausência de inspiração para dar início à frase em questão. Por fim, quando o nome do meu prezado interlocutor, ainda que nesta fase apenas por escrito, surge pelo meio do diálogo e da expressão ou plural correspondente, significa à perspectiva minha que será para funcionar como de vírgulas substituto. Nunca foi hábito na linguagem citar a palavra «Vírgula», pois apenas se escrevia o seu correspondente símbolo e o resto da frase prosseguia. Agora não, o seu nome é mesmo dito como de vírgula substituto, bem an tecipando eu como neste instante o meu prezado interlocutor estará no registo facial de estupefacção. Ora nem será para menos pois, como uma frase pode ter imensas vírgulas, está bom de perceber o número de vezes adicional que o seu bom nome, reforço eu, aparece num diálogo. Uma conversa de poucos minutos entre duas pessoas, conter poderá centenas de referências ao seu nome, o que manifestamente me parece e, a si em particular estou de crer será igual, um perfeito exagero, pelas imperfeições que isso complementa no linguajar vigente. Chego mesmo a temer pelo futuro da nossa sociedade pois quando se escreve como se fala e discursa, o seu honrado bom nome estará a inundar também a escrita em todos os planos. Na imprensa televisiva, jornalistas conferimos que não resistem a chamá-lo a si para as frases que vão debitando sem grande inspiração, o que sempre considerei normal na tal social comunicação, mas agora com demasiadas repetições de um só nome, precisamente o seu. Antecipo as suas reacções na leitura de carta minha e, de crer estou, que concordará da visão minha que fazer algo em prol da erradicação deste fenómeno, urgente se torna no agora. Pois bem, também é objecto desta carta propor-lhe em especial, a participação sua num plano estratégico, elaborado em comum com a minha pessoa, e su-
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portado no imperativo desígnio de combater este singular e triste fenómeno que atinge a população nestas paragens, merecedoras, sem dúvida, de discursos mais elaborados, sem repetições de palavras e sobretudo, sem invocar quase a cada segundo, o seu bom nome. Estou pois ao seu dispor para termos uma longa e proveitosa conversa, obviamente sem recorrermos ao tal nome, o seu, porque iguais ao resto da população não somos nem, felizmente, estou de crer, sofremos de tal epidemia, se assim a poderei designar, para com ela, a tal conversa que lhe estou a propor em alerta social o antes quanto, em conjunto trabalharmos na tal estratégia que vise erradicar a citada epidemia, repito, se assim a poderei chamar. Desde já fico a aguardar por notícias suas no sentido de agendarmos a urgente reunião porque quanto mais tempo passar, é convicção minha, esforço a mais necessário será para bem solucionar o problema.
Despeço-me de si neste instante, enviando-lhe os meus mais calorosos e respeitosos cumprimentos.
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