A Humanização dos Pets - MDB 5ª edição

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Ano I - nº 5 nov/dez 2013 - distribuição gratuita facebook.com/revistamundodosbichos

A Humanização

dos Pets

Os animais de estimação fazem parte da história do homem. Mas o homem pode fazer a história deles desaparecer

Bioluminescência Entenda como alguns animais produzem e emitem luz

Música

Abelhas

As diversas funções do canto das aves

Você acha que a sociedade dos humanos é organizada? facebook.com/RevistaMundodosBichos

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EDITORIAL Artigo

OS BEAGLES Edição bimestral - ANO I - Nº 5 nov/dez 2013 Tiragem: 10 mil exemplares Distribuição gratuita

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E OS OUTROS

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as últimas semanas, o país se sensibilizou com o caso da invasão ao Instituto Royal, em São Roque. Com a suspeita de que animais eram vítimas de maus-tratos no local, manifestantes invadiram o instituto e retiraram cerca de 200 cães da raça beagle que eram utilizados em experimentos laboratoriais. Apesar da comoção geral das pessoas, o assunto não é tão simples como parece, e a questão do respeito à vida dos bichos levanta discussões espinhosas, que envolvem coisas como a prática de rodeios, o consumo de carne animal e mesmo a criação inadequada dos pets. Por sinal, esse é o tema da nossa matéria de capa: Até que ponto o ser humano pode moldar o padrão de vida dos bichos para atender a interesses pessoais? Seja em que contexto for, a MDB se posiciona contra qualquer atitude que resulte em maus-tratos animais ou em risco ao meio ambiente. Isso é mais que um ponto de vista, é uma jornada que enfrentamos diariamente para divulgar informações e incentivar ações ecologicamente responsáveis. Nós esperamos que a MDB, nas mãos de pessoas conscientes, possa tornar melhor a vida de todos os animais, sejam eles racionais, irracionais, beagles ou sem raça definida. Boa leitura! Dacyo Cavalcante editor

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# Hashtag leitores

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RECHEIO A todos os responsáveis pela Revista, parabéns. Como não sou de ler qualquer coisa, acabei pegando, entre muitas que estavam ao meu alcance em lugar público. Daí me deparei com esse grande meio de informação de animais e cultura em geral. Valeu a vocês todos aí.

Mario de Vilhena Lombardi

Galera, PARABENZAAASSOO pela revista. Com o perdão da palavra, mas ta DO #@!&*%$+=)! Conteúdo, diagramação, layout e as ilustrações então nem se fala! Da gosto de ver coisa boa na nossa cidade! Abraços Poytaranos!

Hugo Pires

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BIOLUMINESCÊNCIA

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CÃES

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SAÚDE

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PÁSSAROS

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FELINOS

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CULTURA

Como é produzido o brilho natural de algumas espécies Proibição do corte de orelha e rabo Os benefícios da doação de sangue animal Os tipos, as funções e a beleza do seu canto A personalidade deles reflete a dos humanos Projeto redescobre a história paulista por meio de uma aventura

EXPEDIENTE DIRETOR EXECUTIVO - Marcelo de Almeida "Quén"- marceloquen@revistamundodosbichos.com.br DIRETOR ADMINISTRATIVO - Diogo Oliveira - diogo@revistamundodosbichos.com.br EDITOR - Dacyo Cavalcante - dacyo@revistamundodosbichos.com.br JORNALISTA RESPONSÁVEL - Fabiana Assis Mtb 55169 REPORTAGEM - Sarah Teodoro / Vitor Haddad / Pedro Junqueira / Maria Eduarda Senna DESIGN EDITORIAL - Marcelo Quén / Mayara Julia Laurindo ILUSTRAÇÃO - Mayara Julia Laurindo GERENTE DE CONTAS - Julia Marchezi - comercial@revistamundodosbichos.com.br ANALISTA DE REDES SOCIAIS - Vitor Haddad - vitor@revistamundodosbichos.com.br LOGÍSTICA - Raphael Trolese ARTICULISTAS - Kdu Oliveira - Maurício Fregonesi COLUNISTA SOCIAL - Simone Dib CONSULTORES Jaquelini Fiochi - Médica Veterinária / Vagner José Mendonça - Biólogo / Heitor Francischini - Biólogo /revistamundodosbichos

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INSETOS

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IPÊ

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DIÁRIO

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MUNDO

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A organização social das abelhas Instituto articula ciência, saber popular e visão de negócios

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18I CAPA

A intimidade com os pets precisa de limites?

Imagens de uma viagem de bicicleta pela América Latina Notícias do planeta animal TODA EDIÇÃO 36 Artigo 37Crônica 38Bichos curiosos 39Click

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edúaS BIOLOGIA

Fenômeno da bioluminescência ocorre nas profundidades oceânicas e na superfície da terra TextoSarah Teodoro DesignMayara Laurindo

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lâmpada incandescente foi inventada somente no final do século XIX, mas muitas espécies já tinham seus próprios meios para produzir luz há muito tempo, por meio de um processo chamado bioluminescência. Esse fenômeno natural é bastante conhecido e ocorre em diversos grupos de organismos, de bactérias e fungos até espécies mais complexas como os insetos. Apesar de os vaga-lumes serem os mais lembrados, a grande maioria das espécies bioluminescentes vive no oceano: de todos os organismos conhecidos por serem luminosos, cerca de 80% são espécies provenientes do mar. Em termos gerais, a biolumi6

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nescência ocorre quando parte da energia das reações bioquímicas do organismo é liberada na forma de luz, e não de calor. Apesar de muitos animais utilizarem a luz que emitem da mesma forma que o homem usa lanternas ou holofotes, a maneira como essa luminosidade surge é bem diferente daquela produzida nos aparelhos elétricos. Nas lâmpadas tradicionais, por exemplo, um filamento (geralmente de tungstênio) esquenta e emite luz, que é produzida por meio da incandescência. Os animais luminosos, por outro lado, emitem sua luz por um processo denominado luminescência, no qual compostos químicos se misturam para produzir o brilho.

Luz Antiga A emissão de luz por seres vivos sempre despertou o interesse da humanidade, tendo sido estudada por naturalistas e filósofos desde os tempos de Aristóteles, por volta de 350 a.C. Registros mostram que a luminescência e a incandescência são estudadas há pelo menos 2.500 anos. Muitas vezes, os cientistas conseguiam entender de que forma determinada espécie produzia luz, mas não era possível descrever o processo com exatidão, já que animais distintos empregam substâncias diferentes para a realização do fenômeno.


NAS PROFUNDEZAS DO OCEANO Charles Darwin, considerado o pai da teoria da evolução, foi um dos primeiros cientistas modernos a documentar o processo. Em seu diário, o naturalista registrou que, enquanto olhava o mar com distração, percebeu inúmeros pontos que deixavam uma cor levemente leitosa no rastro do navio. Darwin não sabia, mas estava observando minúsculos organismos marinhos, conhecidos como dinoflagelados. Quando presentes em grandes quantidades, esses micro-organismos podem iluminar as águas mais escuras, podendo ser vistos até mesmo em imagens de satélites. As profundezas do oceano abrigam inúmeras espécies bioluminescentes: estima-se que cerca de 90% dos habitantes dessas zonas possuam algum tipo de bioluminescência. Isso faz com que qualquer movimento brusco na água produza luz, chamando atenção para uma possível presa ou predador (acredita-se que essa seja a razão pela qual os organismos dessas zonas extremas permaneçam imóveis a maior parte do tempo). Além de avisar possíveis predadores, a bioluminescência também serve para o reconhecimento de

parceiros sexuais (imagine a dificuldade de encontrar um representante da mesma espécie na escuridão absoluta!), atração de presas, camuflagem, etc. O peixe-lanterna (Symbolophorus barnardi) vive em águas profundas e possui o que os cientistas chamam de fotóforos. Esses órgãos contêm bactérias simbiontes produtoras de luz, usadas para iluminar e encontrar as presas ou para reconhecer uma fêmea em ambientes de eterna escuridão (lugares tão profundos que a luz natural não chega nunca).

LUZ SOBRE A TERRA No ambiente terrestre, a forma mais conhecida de bioluminescência é o vaga-lume. Esses insetos possuem órgãos fosforescentes na parte de baixo de seus segmentos abdominais, responsáveis pelas emissões de luz. Nos vaga-lumes, o pisca-pisca é utilizado principalmente para chamar a atenção da parceira: o macho emite sua luz avisando que se aproxima, enquanto que a fêmea, pousada em determinado local, emite a sua luz avisando onde se encontra.

Luciferinas A conversão de energia química em luz ocorre principalmente devido a moléculas denominadas luciferinas. É nelas que ocorrerão as reações de bioluminescência, estimuladas por uma enzima chamada luciferase. O nome das moléculas vem do latim Lucifer, que não tem a ver com demônio, e sim com o significado original “que ilumina”.

O peixe-lanterna vive em águas profundas e possui o que os cientistas chamam de fotóforos

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Artigo

BIOLOGIA

Os cupinzeiros luminosos quebram a escuridão das noites em um dos fenômenos mais bonitos da natureza, que se torna cada vez mais raro

A larvas da espécie Pyrearinus termitilluminans, encontrada no Brasil, produz um fenômeno conhecido como cupinzeiros luminosos. Essas larvas ocupam túneis na superfície do cupinzeiro, mas sem contato direto com as vias utilizadas pelos cupins. Durante a noite, através de “janelas” voltadas para fora, elas exibem seu corpo brilhante, atraindo insetos voadores – seu alimento preferido. A relação é benéfica tanto para o vaga-lume, que tem comida em abundância, quanto para os cupins, que facilmente são atraídos para a região do cupinzeiro. Porém, esses grandes mosaicos de pisca-pisca parecem estar com os dias contados. A devastação causada principalmente pelo cultivo da soja tem tornado o efeito luminoso cada vez mais raro. Hoje em dia, ele pode ser visto apenas no Parque Nacional das Emas, no sul de Goiás. O plantio da soja, aliado ao uso de pesticidas e ao aumento da iluminação artificial das cidades, são os principais responsáveis pelo desaparecimento dos vaga-lumes. Existem também espécies bioluminescentes de fungos que se alimentam de madeira podre, criando um curioso fenômeno de brilho 8

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noturno, difícil de ser visto. De modo geral, as espécies de fungos bioluminescentes ocorrem em ambientes de florestas úmidas, mas também são encontrados com frequência em florestas temperadas. Porém, dentre todos os organismos bioluminescentes, os fungos são os menos conhecidos: ainda não se sabe ao certo o mecanismo das reações químicas associadas a esse processo, e nem por que ele ocorre. Alguns estudiosos afirmam que essa emissão de luz poderia auxiliar na dispersão dos esporos (as estruturas reprodutivas dos fungos); outros acreditam que a luz emitida poderia atrair predadores de animais que se alimentam de fungos; e ainda há os que afirmam que a bioluminescência seria apenas um subproduto resultante da digestão da lignina, substância que forma a base da madeira.

BIOMARCADORES Apesar dos poucos estudos em relação às espécies bioluminescentes, as enzimas da bioluminescência têm sido grandes aliadas da ciência, larga-

mente utilizadas por pesquisadores como sinalizadores de doenças ou estruturas específicas. As luciferases já são poderosas ferramentas, auxiliando em diagnósticos na localização de células causadoras de doenças e até mesmo na descoberta de novos remédios. Combinadas com outras moléculas, essas estruturas funcionam como biomarcadores luminosos. Seria como se um observador, monitorando uma estrada congestionada, conseguisse detectar apenas os carros que contivessem motoristas do sexo masculino, ou somente aqueles com a documentação atrasada, ou os vestidos de amarelo, e assim por diante. Pode-se, por exemplo, marcar uma praga de planta para entender como ela age em determinado cultivo. O uso dos biomarcadores luminosos aumenta o entendimento de como os organismos funcionam, que caminhos as substâncias fazem dentro do corpo e se determinada técnica funciona. Para a indústria farmacêutica, a bioluminescência pode ser um mercado de bilhões de dólares. Para a natureza, ela é uma importantíssima arma ecológica, resultante de milhões de anos de adaptação.


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Artigo

CÃES

Mutilações estéticas em cães, como o corte de rabo, agora proibidas por lei

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oodles, pitbulls, rottweilers, boxers, dobermanns. São muitas as raças de cães que costumam ter orelhas e caudas cortadas por motivos estéticos. Mas a aparência desses animais deve mudar em breve. Desde junho deste ano, a amputação de cauda (caudectomia) por motivos estéticos está proibida pelo CFMV (Conselho Federal de Medicina Veterinária). A prática, agora, é considerada mutilação e o veterinário que a realizar pode sofrer processo ético e perder o registro profissional. A caudectomia foi a última das mutilações proibidas. Desde 2008, a conchectomia (corte das orelhas), a cordectomia (retirada das cordas vocais) e a onicectomia (extração das unhas de gatos) são vetadas. As 10

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TextoFabiana Assis DesignMayara Laurindo

pode causar infecção e até levar à morte do animal”, alerta. Embora a caudectomia tenha sido proibida, sua procura em clínicas veterinárias ainda é muito grande. Ferreira acredita que isso irá mudar com o tempo. “Foi assim com o corte de orelhas, que era muito comum nos pitbulls. Mas hoje já é comum ver pitbulls com O dono tem que gostar orelhas grandes. Tudo vai do seu animal como ele é, depender de os profissionais cumprirem a lei e os criacom as suas características dores perceberem que essa mudança é para o bem dos da clínica Prontovet, receia que a animais”, afirma o veterinário. “A partir de agora, com a proibição da resolução do CFMV tende a trazer prática nas clínicas, o corte da cauda benefícios. Como é uma cirurgia espasse a ser feito pelos próprios cria- tética, não é necessária. O dono tem dores, que não são fiscalizados pelo que gostar do seu animal como ele é, CFMV. “O procedimento mal feito com as suas características.” cirurgias são permitidas apenas em casos de necessidade terapêutica, como tumores ou lacerações. A decisão do CFMV impede que muitos animais sofram uma cirurgia desnecessária, mas também pode desencadear riscos. O médico veterinário Tiago de Lima Melo Ferreira,


SAÚDE

Artigo

S

ão vários os procedimentos em benefício da saúde humana que também são utilizados para o tratamento de animais. Um deles é a transfusão de sangue. Segundo a médica veterinária Jaqueline Ferreira Santos, da Clínica Veterinária AMA, a transfusão é uma ferramenta bastante usada para o tratamento de cães e, embora mais dificilmente, também de gatos e animais de grande porte, como equinos e bovinos. Em animais silvestres, a prática é dificultada por falta de doadores disponíveis. O método é indicado em casos de perda de sangue aguda, como acidentes e hemorragias, e em problemas que prejudicam a reposição das células do sangue ou que aumentam a hemólise (retirada das células de circulação), como doenças renais, anemias autoimunes, neoplasias, trombocitopenias. Quem vai determinar se o cão precisa de transfusão de sangue ou não é o veterinário. Jaqueline explica que cerca de 7% do peso do cachorro corresponde a seu volume sanguíneo. Desse total, pode-se coletar até 25%. Um cão que pesa 30 kg, por exemplo, tem 2,1 litros de sangue e pode doar até 525 ml. Em gatos, cerca de 4% do peso é atribuído ao volume sanguíneo. Portanto, um gato de 5 kg poderia doar 50 ml de sangue. O animal pode se tornar um doador regular, contanto que haja um intervalo de três meses entre cada doação. Na coleta de sangue dos cães, emprega-se a mesma bolsa utilizada para os humanos. No caso dos gatos, devido ao pequeno volume sanguíneo, são empregadas seringas especiais. Quanto menor o bicho, mais difícil é a coleta. “É mais trabalhoso conter o animal e também há mais dificuldade de coletar o volume de sangue necessário para a transfusão”, explica Jaqueline. Por isso, costuma-se sedar o indivíduo para a retirada do sangue, que é feita principalmente do pescoço, na veia jugular. A transfusão pode ter efeitos colaterais ao receptor, como reação alérgica ou anafilática, febre, reação hemolítica e outras complicações, como transmissão de doenças desconhecidas não detectadas no doador. Já para o animal que doa, não há contraindicações. “Se a quantidade ideal de retirada for respeitada, logo o bicho se recupera e o sangue perdido é reposto”, afirma a veterinária. Boa parte das clínicas costuma criar seu próprio "banco de sangue" ou realizar coletas apenas quando necessário. Para isso, empregam pets que são “clientes” e cuja saúde é comprovada. Mesmo assim, os animais são submetidos a exames para atestar que estão aptos a se tornar doadores.

TIPO SANGUÍNEO Assim como os humanos, os animais também têm tipos sanguíneos. No caso dos cães, os tipos são DEA 1,1; DEA 1,2 e DEA 7. Existem outros tipos, mas eles ainda não estão totalmente definidos. Os gatos têm sangue do tipo A (o mais comum, responsável por 95% dos indivíduos), do tipo B (geralmente encontrado em gatos de raça pura) e do tipo AB (muito raro). A tipificação sanguínea em animais, no entanto, é pouco realizada, já que se costuma realizar um procedimento chamado “reação cruzada”, que torna as transfusões mais seguras.

REQUISITOS PARA DOAÇÃO DE SANGUE

CÃES - Idade entre 1 e 8 anos - Peso mínimo de 27 kg

GATOS - Idade entre 2 a 5 anos - Peso mínimo de 5 kg

Nos dois casos, os animais não devem ter recebido sangue em transfusão. Além disso, precisam estar saudáveis, com a vacinação e vermifugação em dia e se alimentando bem. No caso das fêmeas, o ideal é que sejam castradas.

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AVES

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Artigo


O Brasil é um dos países de maior biodiversidade de pássaros do planeta. Entre as características desses animais, seu canto representa uma arma ecológica altamente especializada e fascinante TextoPedro Junqueira DesignMayara Laurindo

N

ão foi à toa que Gonçalves Dias, em seu poema Canção do Exílio, disse “Minha terra tem palmeiras, / Onde canta o sábia; / As aves que aqui gorjeiam, / Não gorjeiam como lá”. O Brasil possui mais de 1.830 espécies de pássaros, e os cantos de alguns deles são uma das maravilhas naturais que podem ser encontradas no país. Além de encantador e relaxante, o som produzido pelas aves tem uma série de funções ecológicas. Assim como em todas as espécies animais que produzem algum tipo de vocalização, os sons emitidos pelas aves servem como meio de comunicação entre indivíduos da mesma espécie e mesmo entre espécies distintas. Segundo o biólogo Eduardo Alexandrino, especialista em ornitologia (estudo das aves), as diferentes vocalizações dos pássaros podem ser divididas em 3 tipos: Grito de alarme (alarm call), Chamado em grupo (folck call) e Canto (song).

VOCALIZAÇÕES DOS PÁSSAROS Grito de alarme

Várias espécies têm a capacidade de emitir sons não melódicos, mas sim verdadeiros ruídos, com o objetivo de avisar as demais aves do local sobre algum perigo próximo.

Chamado em grupo

Algumas espécies que vivem em bandos, constantemente emitem pequenos chamados durante seus voos, como no caso dos patos. Um dos propósitos é manter o grupo unido.

Canto

Na maioria das espécies, é utilizado durante o período reprodutivo, no qual os machos demarcam seus territórios e atraem as fêmeas para a cópula. Dentro de uma mesma espécie, podem existir cantos distintos emitidos em diferentes horas do dia (por exemplo, canto noturno e canto diurno).

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AVES

O ornitólogo João Henrique Barbosa relata que a capacidade de cantar é própria de um grande grupo de aves com maior desenvolvimento da musculatura ao redor da siringe (órgão responsável pela produção de sons nas aves, assim como as cordas vocais nos humanos). Essa musculatura mais desenvolvida permite a essas aves modular o som, gerando uma melodia que o homem reconhece como canto. O dado mais interessante, de acordo com o especialista, é que cada pássaro produz o seu próprio som, com características únicas. Essas diferenças, porém, são imperceptíveis ao ouvido humano.

OS CANTOS DO BRASIL Diante da enorme diversidade de aves naturais do território brasileiro, o canto de algumas delas chama a atenção pela sua beleza e por aspectos culturais. O Bem-te-vi, pássaro encontrado em A AVE MAIS POP DO ROCK toda a América do Sul, foi nomeado popularmente no Brasil com base no seu O Merlo-preto, mais conhecicanto, que se assemelha à frase “bem te vi”. No endo como Blackbird, é um tanto, essa mesma ave é pássaro nativo da Europa conhecida em Portugal caracterizado por um canto pelo nome de Grandeaflautado grave, melodioso e vakiskadi, porque a culriado, que muitas vezes termina com tura local interpreta sons menos puros e um pouco arranhados. o som emitido como Seu canto pode ser escutado no final da mú“kiskadi”. Além sica Blackbird da banda The Beatles. A letra da dela, o Pichororé, o música fala sobre conflitos sociais e direitos civis João-corta-pau, o Ui na América, e faz uma metáfora da mulher ne-pi e o Saci também têm nomes baseados gra com o Merlo-Preto. Você pode escutar o na sua vocalização. canto de diferentes aves também no site Fascinante também www.portalpassarinho.com/cantos.php é o canto do Tico-tico, que se diferencia nos períodos do dia e da noite. 14

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Sua música noturna é caracterizada pelo prolongamento e acentuação das últimas notas, o que diverge da sua produção diurna mais suave, que a população de Minas Gerais interpreta como “Bom dia, seo Chico”. O Gaturamo-verdadeiro, por sua vez, é um grande imitador, e pode plagiar os sons de até 16 espécies diferentes. De todos os pássaros brasileiros, aquele que produz a música considerada mais bela é o Uirapuru-Verdadeiro. Seu canto é forte e curto quando o animal pretende dominar o território, e é longo e melodioso quando ele quer atrair suas parceiras para o acasalamento. A vocalização dura de 10 a 15 minutos ao amanhecer e ao anoitecer, e só ocorre durante 15 ou 20 dias do ano, uma vez que o pássaro só canta no período de acasalamento. Além dele, há muitas outras espécies com cantos admirados no Brasil e no exterior, como o Azulão, que emite uma música intensa e melodiosa, e a Araponga, com seu timbre metálico.

O HOMEM VEM AÍ... Mas nem tudo são encantos quando o assunto são as aves do Brasil. Apesar da enorme diversidade de espécies encontradas por aqui, muitas delas enfrentam sérias ameaças de extinção. A principal causa é a destruição dos habitats pelo desmatamento e fragmentação das florestas nativas. Todas as espécies de pássaros necessitam de um espaço adequado para sua sobrevivência, e a fragmentação dos remanescentes florestais dificulta sua reprodução natural. Com a falta de comunicação entre os remanescentes, acaba ocorrendo cruzamentos entre indivíduos de uma mesma família, o que facilita a proliferação de doenças genéticas e amplia ainda mais os riscos de extinção. Outra grande ameaça é a caça


ilegal e o tráfico de espécies nativas. Seja por conta das suas belas penas ou da variedade de cantos, as aves brasileiras são alvo de grandes quadrilhas de traficantes de animais silvestres. Com o aumento do tráfico, a população das espécies diminui drasticamente, inclusive porque muitos animais não conseguem chegar vivos aos seus destinos. O combate ao tráfico de animais silvestres é fundamental, mesmo por parte de quem aprecia o canto de aves domesticadas, já que boa parte dos pássaros vítimas do tráfico deixam de cantar quando são retirados do seu habitat e mantidos em cativeiro. No fim das contas, faz mais sentido afirmar o inverso do ditado popular: “Mais valem dois pássaros voando do que um na mão”.

VOCÊ SABIÁ? Um dos maiores ornitologistas do mundo, o dinamarquês Johan Dalgas Frisch, era apaixonado pelas aves brasileiras e foi o primeiro homem a gravar o canto delas em um LP em 1962. Esse LP recebeu o nome Cantos de Aves do Brasil e chegou a vender mais de um milhão de cópias. O sucesso foi tamanho que João Goulart, presidente brasileiro, chegou a presentear o líder de Estado norte-americano John Kennedy com um exemplar. As aves brasileiras também são lembradas na música Passaredo, parceria de Chico Buarque e Francis Hime, e em muitas outras obras.

NÃO É ESSA A LEMBRANÇA QUE VOCÊ QUER DO SEU Cachorro.

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FELINOS

Focinho de um

A personalidade dos felinos pode ser influenciada pela dos criadores TextoMaria Eduarda Senna DesignMayara Laurindo

O

convívio dos humanos com os gatos comprova que eles são animais desenhados biologicamente para ser fofinhos, brincalhões e carinhosos, certo? Errado. Como todo felino, o gato é um predador altamente especializado, com instintos superdesenvolvidos e uma fisiologia adaptada ao ambiente selvagem. Entretanto, uma vez submetidos ao contato com os humanos, muita coisa mudou na sua vida. Na natureza, raramente os felinos vivem em grupos. Por isso, quando os gatos são trazidos para uma casa (que eles entendem como seu novo grupo), pode haver modificações no seu comportamento, sobretudo em decorrência da rotina e das características dos criadores. Considerando que a maioria dos gatos de estimação não tem raça definida, um dos fatores que delimitam sua personalidade é o ambiente em que eles vivem, o que é chamado de “determinismo de meio”. Uma casa em que a relação da família está em equilíbrio é um ambiente adequado para o animal. Um espaço que apresenta muitas brigas ou barulho, por outro lado, costuma ser bastante problemático. Como a audição dos felinos é bem mais aguça16 16 facebook.com/RevistaMundodosBichos

da que a dos humanos, o ruído de reformas, bater de portas, marteladas e mesmo conversas em voz alta podem desencadear estresse ou até doenças graves, como a depressão. Quando o espaço residencial se encontra em harmonia, o gato se sente confiante para exibir seu temperamento natural, para se aproximar mais dos criadores e, ao mesmo tempo, exercer sua independência. Por isso, para viver bem com um bichano, é preciso viver bem com todos os membros da casa, em um ambiente que ofereça tranquilidade e segurança para todos.


cara do outro

EXCESSO DE LIBERDADE Outro problema no convívio com os gatos decorre da falta de cuidados dos criadores, o que pode deixar o animal mais agressivo ou mesmo ocasionar sua fuga. Embora os felinos necessitem de espaço, de passar um tempo sozinhos e de ser independentes, o criador não deve confundir liberdade com abandono. Ainda se costuma acreditar que o gato é um animal autossuficiente, que não requer preocupações, afeto ou proteção. A partir do momento em que retirou o felino do seu ha-

bitat natural, o homem se tornou o responsável pela vida que ele leva e por todas as demandas do animal. E isso inclui tanto a oportunidade para sair e explorar novos territórios quanto um lar afetuoso onde viver, com cuidados veterinários, brincadeiras e afagos. Talvez esse seja o grande desafio dos cuidadores – conciliar a independência dos bichanos com sua carência de cuidados. Supridas essas necessidades fundamentais, o criador pode finalmente desfrutar de uma saudável convivência com essa ilustre companhia peluda. facebook.com/RevistaMundodosBichos

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CAPA

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HUMANO, DEMASIADO HUMANO Os bichos permitiram ao homem conquistar o padrão de vida que ele tem hoje. O problema é que o homem está impondo essa mesma vida a eles TextoVitor Haddad DesignMayara Laurindo

C

omo qualquer criança normal, os pais de Jorge não o deixam comer ração para cães. Como qualquer criança comum, Jorge tem seu próprio quarto, mas de vez em quando dorme na cama dos pais. Assim como qualquer criança privilegiada, Jorge passa horas brincando, frequenta a creche e passeia com os pais diariamente. O curioso é que Jorge não é uma criança, mas um cachorro. “Nós procuramos oferecer ao Jorge o máximo de carinho, atenção e conforto”, comenta Wilma Shoenberg, criadora do Golden Retriever de 10 meses. Entre carícias afetuosas e derretimentos de mãe coruja, a empresária conclui “Afinal, ele é o filho que não tivemos”. O núcleo familiar de Wilma está longe de ser incomum. Casos como o seu se tornam cada dia mais frequentes, e revelam uma relação entre o homem e os pets que desafia qualquer outro tipo de interação ecológica encontrada na natureza. As incertezas e controvérsias que envolvem esse relacionamento complexo só não são maiores do que a história comum compartilhada entre o homem e seus animais de estimação.

UM POUCO DE HISTÓRIA Aquele que é considerado “o melhor amigo do homem” é também o mais antigo. O cachorro foi o primeiro animal a integrar as comunidades humanas e a desempenhar funções importantes den-

tro delas, em um contato que teve início há aproximadamente 15.000 anos. Mas os gatos não ficam para trás. Embora a associação entre humanos e felinos pareça condenada ao fracasso (em decorrência do temperamento de predador solitário e dos hábitos de vida noturna dos gatos), esse relacionamento baseado na cumplicidade e na independência é um dos mais longos da história, cujos primeiros registros datam de 9.500 anos atrás. De acordo com a bióloga Valéria Zukauskas, membro da Sociedade Brasileira de Etologia (ciência que estuda o comportamento animal), os bichos sempre estiveram presentes na vida do ser humano de alguma forma. No início, apenas como alimento. “Segundo alguns historiadores, os primeiros que deram início ao processo de aproximação com os animais foram as mulheres, que capturavam pequenos primatas para brincar, carregando-os nos ombros. Com o tempo, o homem percebeu que outras espécies poderiam ajudá-lo, como por exemplo os lobos, na captura de pequenas presas; os cavalos, no auxílio do trabalho pesado; e os gatos, que poderiam manter os roedores longe dos alimentos armazenados.” Essa longa parceria entre homens e bichos teve início como um contrato de cooperação mútua. O acordo era simples: os animais desempenhavam funções nos espaços domésticos e eram recompensados com alimento, abrigo e proteção. O passar do tempo, porém, transformou radicalmente a natureza

desse intercâmbio. “Com a modernização, mas principalmente com o crescimento das cidades, o homem aproximou cada vez mais esses animais do seu convívio”, explica Valéria. Nos dias de hoje, o contato do homem com seus bichos tem um caráter predominantemente emocional, e o companheirismo e o afeto são as moedas de troca nessa interação. A partir do momento em que a tônica do relacionamento saiu do plano material para o sentimental, a presença dos animais de estimação se intensificou e se pulverizou por todas as regiões do planeta, e deu origem a uma era sem precedentes na natureza, marcada pela humanização dos bichos.

O MELHOR AMIGO DO HOMEM A célebre frase “O cão é o melhor amigo do homem” foi proferida pela primeira vez em 1870, durante o julgamento pela morte do cachorro Old Drum. Suspeitando que o animal matava suas ovelhas, um dono de terras encomendou a morte de Old Drum, e foi processado pelo criador do cão. O advogado George Vest (que mais tarde se tornaria senador dos Estados Unidos) fez um discurso tocante, que arrancou lágrimas dos jurados e ganhou a causa para o dono do cachorro. Em 2000, a história inspirou o filme The Trial of Old Drum, traduzido para o português como Meu Amigo Drum.

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CAPA

HUMANIZAÇÃO O estreitamento entre o homem e seus animais de estimação cresce exponencialmente e em escala mundial. O aumento dessa convivência e da intimidade contribui para que os pets deixem de ser vistos como bichos e passem a ser encarados como versões humanas de quatro patas, com as mesmas necessidades, receios e expectativas do homem. Onde antes havia uma noção de pertença e utilidade, agora existe uma noção de parentesco e similaridade. A própria palavra pet traz essa ambiguidade na sua raiz. Derivada do gaélico escocês (língua que os celtas levaram à Escócia), seu significado original é impreciso. Os primeiros usos do termo de que se tem registro datam do século XVI, com o sentido tanto de “animal de estimação favorito” quanto de “crian20

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ça mimada”, revelando como esses bichos são queridos e amados pelo homem, e como isso pode lançar sobre eles uma imagem humanizada. O biólogo Carlos Eduardo Dias, analista do comportamento e pesquisador do Laboratório de Análise Biocomportamental da USP, afirma que esse fenômeno decorre da capacidade humana de interpretar os sentimentos dos outros seres e se colocar no seu lugar. “Isso só é possível porque, segundo a linha etológica, somos passíveis de criar relações empáticas com os pets. Uma relação empática entre humanos se estabelece ainda na primeira infância, quando aprendemos a nos colocar no lugar do outro”, explica Dias, e acrescenta: “Quando estabelecemos esses processos empáticos com os pets, não é incomum que os cuidadores apresentem comportamentos que antropomor-

fizem seus companheiros animais”. Sim, muitos criadores passam a enxergar seus pets e a tratá-los como seres humanos. E isso não costuma ser nada bom para eles. Quando se espera que os animais se alimentem, se vistam, se divirtam e se relacionem da mesma forma que os humanos, o que se está impondo é que eles deixem de ser bichos. Talvez levados pelo princípio da empatia, os criadores costumam “adivinhar” o que seus pets desejam com base nas suas preferências pessoais, e não nas características do animal. Um exemplo disso é o hábito de oferecer doces aos gatos, pela suposição de que, assim como os humanos, eles apreciem o sabor adocicado. Na verdade, os felinos não têm papilas gustativas para doce, e nem conhecem o sabor açucarado que fascina a maioria das pessoas. Os bichanos recebem com


MERCADO ANIMAL O mercado pet é um dos que mais cresce no mundo, fenômeno que levou ao surgimento de uma infinidade de serviços focados nos bichos. Hoje, eles podem passear com petwalkers, dormir com uma petsitter, se hospedar em hotéis, se acasalar em motéis e ficar internados em hospitais. Existem creches, agências matrimoniais, seguros de vida, salões de beleza, spas, hotéis fazenda e até uma companhia aérea dedicada exclusivamente a passageiros de quatro patas.

tanto prazer esses alimentos simplesmente porque se divertem com a sua textura, não com o seu sabor. Outro engano bastante comum é acreditar que os cães desejam uma relação de igualdade com seus criadores, uma vez que esse é um direito básico do ser humano. O que os cachorros buscam é o oposto disso. Se fosse possível fazer uma votação entre os cães para que eles decidissem seu regime social, e as opções fossem a democracia ou a ditadura, tudo indica que os cães votariam na ditadura. Isso porque eles são animais com uma necessidade instintiva de seguir ordens, de obedecer a um líder, e nem tanto de serem donos dos seus próprios focinhos. Quando uma pessoa adota um cachorro, todos os membros da casa se tornam a família do animal (ou seja, sua matilha). Se o criador não estabelece um relacionamento hie-

rárquico, o cão entende que aquela pessoa não ocupa a função de chefe do grupo, e vai buscar esse papel em outro integrante da família. Se ninguém mais demonstrar essa figura de autoridade, o próprio animal tenta se impor como líder, o que pode ser altamente frustrante caso ele não seja um líder nato, e motivar sua desobediência, agressividade ou doenças como o estresse. No entanto, o impacto mais devastador que o homem inflige aos animais não decorre da falta de autoridade no relacionamento, mas justamente do seu excesso, quando a imposição dos padrões humanos afeta até mesmo a genética dos bichos. Além de desencadear problemas emocionais, comportamentais e físicos, a humanização dos pets pode culminar em consequências desastrosas, como a extinção de algumas raças. facebook.com/RevistaMundodosBichos

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CAPA

DOG SHOW (DE HORRORES) Não por acaso, a ideia de criador está associada ao conceito de deus. Como seus “criadores”, os homens moldam os pets à sua imagem e semelhança, transformam seu comportamento, mudam seus hábitos alimentares e chegam a extremos de definir como sua anatomia deve ser. O capítulo mais sombrio da história dos pets teve início em meados do século XIX, quando os animais de estimação passaram a ser sinônimos de status, e eram ostentados na sociedade como símbolos de luxo e poder. Nesse momento o cão, o maior beneficiário da intimidade humana e também a maior vítima dos seus exageros, passou a ser valorizado prioritariamente pela sua aparência, de acordo com padrões artificiais de beleza ou exotismo. Surgiam então os Dog Shows, eventos glamurosos que submetiam os animais a diferentes tipos de provas e celebravam sua adaptação a normas estéticas instituídas. Esses festivais surgiram na década de 1830. A partir de então, o número de raças caninas tem aumentado a uma velocidade descomunal. Se no início de 1800 havia cerca de 20 raças distintas, hoje existem mais de 400 raças de cães, um salto de 20 vezes em um período de 2 séculos. Além de acelerar vertiginosamente o ritmo da natureza, as consequências dessas transformações nem sempre são previsíveis, naturais ou desejáveis. Em alguns casos, elas podem ser fatais. Felipe Rudge mora na Inglaterra há 8 anos. Quando resolveu presentear a filha com um cachorro, Felipe escolheu uma das raças mais populares no país, a Cavalier King Charles Spaniel. Afetuoso e obediente, o filhote, batizado de Johnny, inundou o lar de alegria. Até que tudo mudou quando ele foi diagnosticado com siringomielia, uma doença na qual o cérebro não cabe direito na cavidade craniana. A compressão do cérebro resulta em danos neurológicos, musculares e uma intensa dor de cabeça, que já foi relatada como uma das do22

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res mais extremas que um ser vivo pode sentir. Há casos de tanta dor que o animal precisa ser sacrificado. Os cavalier spaniels foram moldados pelo homem para ter focinhos

COITO INTERROMPIDO Devido às modificações anatômicas sofridas pelos buldogues, eles não conseguem cruzar sem o auxílio humano. Como os machos da espécie são pesados e têm as patas curtas, eles não conseguem se apoiar direito sobre a fêmea e copular. Por isso, os criadores utilizam 2 métodos para assegurar a reprodução dos bichos. 1 - O primeiro é a inseminação artificial, que custa caro e nem sempre é eficaz. 2 - O segundo é menos "científico", e requer a cooperação de 3 pessoas. Uma delas segura a fêmea, outra segura o macho e a terceira agita o pênis do animal dentro da vagina da fêmea. O processo é repetido dentro de 24 horas para aumentar as chances de sucesso da “cópula”.

curtos e olhos grandes, de modo que parecessem mais amorosos. O encolhimento do focinho, porém, levou à redução da caixa craniana, que ficou apertada para o tamanho do cérebro, ocasionando a doença neurológica. Johnny ainda viveu 2 anos de intenso sofrimento antes de ser eutanasiado. Casos de siringomielia em cavalier spaniels são discutidos no documentário Pedigree Dogs Exposed (Cães de Pedigree Expostos), da BBC, que investiga as transformações que os homens impõem aos cães em nome da estética e do pedigree. A manipulação da anatomia animal é feita por meio da seleção de atributos desejados e do cruzamento dos indivíduos que os possuem. Para reforçar os traços escolhidos e garantir a “pureza” do pedigree, alguns criadores recorrem ao cruzamento entre animais da mesma família (mãe com filho, irmão com irmã, avô com neta), procedimento denominado endogamia. O problema desse método é que, embora fortaleça aspectos positivos da raça, ele também agrava as fraquezas genéticas dos indivíduos. Se uma fêmea tem a predisposição para desenvolver catarata, por

exemplo, é provável que seus filhotes apresentem a mesma tendência. O cruzamento entre mãe e filho, nesse caso, faz com que a informação genética da catarata se “reafirme” e seja intensificada nos descendentes. Se esse filhote for cruzado com um parente, o traço “catarata” assume mais força, e assim por diante, levando ao fortalecimento de atributos selecionados pelos criadores, mas também de problemas inesperados. Além de todo o sofrimento causado aos animais, a obsessão pela aparência em detrimento da qualidade de vida pode levar ao declínio e à extinção de diferentes raças, caso os indivíduos não sejam mais aptos a se reproduzir. Pode parecer um exagero, mas algo parecido já acontece hoje em dia. O documentário britânico revela que o buldogue, em decorrência das modificações anatômicas que sofreu, se tornou incapaz de cruzar sem assistência humana (veja o box ao lado). Por essas e outras razões, algumas pessoas acreditam que os animais estariam muito melhor sem a companhia humana. Para outras, apesar da tirania dos padrões artificiais impostos, o contato entre homens e bichos tem muitos efeitos benéficos.

Segundo as teorias da evolução mais aceitas, o homem e o macaco evoluíram de um ancestral comum, por meio de um processo que levou milhares de anos. Nos dias de hoje, o homem impõe transformações a várias raças de cães, acelerando o ritmo da natureza e a levando a caminhos que ninguém sabe onde vai dar.

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CAPA

HORMÔNIO DO AMOR

ASPECTOS POSITIVOS Segundo a bióloga Valéria Zukauskas, há várias contribuições dos bichos para a saúde humana. “Hoje temos cães, gatos e cavalos terapeutas, animais frequentando asilos, hospitais, ajudando pacientes em fase terminal. É comprovado que uma pessoa que está convalescendo e mantém contato com seu animal de estimação tem uma melhora mais rápida. Acariciar um cão baixa a pressão sanguínea; o som do ronronar de um gato, por ser em baixa frequência, também tem contribuído para o bem-estar do homem. Os cães-guia

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A ocitocina é conhecida como o Hormônio do Amor. Presente no organismo dos homens e das mulheres, sua função básica é favorecer o parto, a amamentação e estreitar os laços afetivos entre mãe e filho. No homem, o hormônio contribui para um comportamento mais amável e generoso. A ocitocina pode ser sintetizada em laboratório e vendida em farmácias. Mas a melhor maneira de desfrutar os benefícios do Hormônio do Amor é por meio do contato com seres queridos, sejam eles humanos ou bichos

são um exemplo indiscutível de ajuda ao ser humano.” De acordo com Carlos Eduardo Dias, os pets auxiliam na sociabilização dos criadores e são capazes de diminuir os efeitos da ansiedade. “Por isso, não é raro ouvir sobre petterapia para ajudar crianças e adultos em problemas no desenvolvimento social ou quadros depressivos.” Isso tudo porque, entre outros fatores, o contato com os pets libera no organismo humano um hormônio chamado ocitocina, também conhecido como o “hormônio do amor”. Descarregado no corpo da mãe durante o parto e compartilhado com

o organismo do bebê, esse hormônio é o agente bioquímico responsável pelo sentimento de amor, que faz com que a mãe tenha um forte instinto de proteção ao filho e a criança desenvolva o apego à figura materna. As vantagens dessa interação não favorecem apenas os humanos. Cientistas da Universidade de Medicina Veterinária de Viena concluíram que os laços que os cães estabelecem com seus criadores são comparáveis à ligação existente entre as crianças e seus pais, que se fundamenta no princípio do “efeito de base segura”. O efeito de base segura é a sensação de confiança e conforto que a criança experimenta quando está perto dos seus pais, e que lhe permite interagir melhor com o ambiente. De acordo com o estudo, essa “zona de segurança”, que os filhos encontram ao redor dos seus genitores, é bastante similar ao que os cachorros sentem diante da presença dos criadores, o que revela que os sentimentos de afeto e vinculação que o homem tem pelos seus pets podem ser recíprocos. É importante frisar que a pesquisa não incentiva ninguém a tratar os animais como crianças humanas. O que se diz é que os cachorros sentem-se seguros, protegidos e confortáveis diante dos seus tutores por meio de processos neurológicos semelhantes aos que ocorrem em crianças na companhia de seus pais. Já se sabe que os pets estão entranhados na história da civilização hu-


mana, e que a relação entre homens e bichos é marcado por aspectos negativos e positivos. Resta descobrir, entretanto, qual é a razão dessa intimidade que aparenta não ter limites. Por que, afinal, seres humanos e bichos se conectam de maneira cada vez mais complexa e profunda?

WHY, DOG? WHY? Uma das possíveis explicações para a crescente aproximação entre o homem e os bichos é a diminuição do contato entre as pessoas. Ironicamente, as novas possibilidades do mundo sem fronteiras têm reduzido a convivência entre os seres humanos. O ritmo acelerado da vida moderna, a falta de tempo e o caos dos centros urbanos tornam o homem cada vez menos sociável. Nesse contexto de insuficiência generalizada (de tempo, espaço, paciência, contato), o animal de estimação se mostrou o companheiro ideal. O convívio com os pets é muito menos complicado do que com os outros seres humanos. Os bichos não brigam quando o companheiro chega atrasado, não criticam suas preferências, nem sequer se incomodam se o companheiro tem mau

hálito. A despeito de tudo isso, eles demonstram afeto incondicional e uma capacidade de compreensão humanamente improvável. Relacionar-se com um bicho de estimação não implica sobrecarga emocional. Não é preciso discussões, argumentações, promessas, desculpas. Os bichos são tão descomplicados que um gesto tão simples quanto um afago parece solucionar todos os problemas do seu universo. Basta uma carícia do criador para que o animal permaneça indefinidamente ali, entregue aos cuidados do parceiro. No que depender dos bichos, de fato, eles continuarão para sempre ali, disponíveis aos seus amigos humanos. Pelo menos é o que os criadores gostam de pensar. Mas talvez isso não seja possível.

FUTURO Até quando, afinal, vai durar a relação do homem com seus animais de estimação? Essa é uma pergunta que ninguém pode responder. No entanto, se o tipo de interação entre homens e pets não mudar, o tempo vai ser curto. Os moldes da humanização e as condições de vida impostas aos ani-

mais são em muitos aspectos insustentáveis, e comprometem não apenas seu bem-estar, mas seu próprio desenvolvimento evolutivo. Para ter um relacionamento longo e harmonioso com os pets, o homem deve aceitá-los como bichos, e não tentar consertar a natureza de acordo com as suas próprias expectativas. As necessidades dos animais não são negociáveis e não podem ser atendidas pelos padrões ou pelas conveniências do homem. Esse é o princípio fundamental que o ser humano precisa obedecer se quiser tornar mais longo e mais prazeroso seu relacionamento com os animais de estimação. Os pets são vestidos, alimentados, massageados, operados, transportados, vigiados, sacrificados, entretidos, embelezados, medicados, enterrados e amados como se fossem gente, mas não recebem o mesmo benefício quando o assunto é o respeito às suas demandas básicas. Se os bichos puderem viver simplesmente de acordo com sua própria natureza, haverá menor identidade com o homem, menor pureza nos pedigrees e menos glamour nos Dog Shows. Mas certamente haverá mais caudas abanando por aí.

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CULTURA

S

em pressa de chegar, mas também sem um segundo a perder, trilhando a mesma estrada do grande escritor e refazendo um caminho de fatos e memórias, Lucas Garcia Nunes optou pela aventura em seus estudos. Inspirado nas pesquisas do poeta Mário de Andrade, que retratou os Patrimônios Culturais do interior paulista, Lucas refez o percurso que começava na cidade de Araraquara, passando por Porto Feliz, Itu, Sorocaba, São Roque, Atibaia e Bom Jesus dos Perdões, totalizando cerca de 470 quilômetros que o estudante percorre de bicicleta. Mais do que poeta, Mário de Andrade foi também musicólogo, crítico de arte, fotógrafo, etnógrafo e historiador. Por isso, de modo a documentar o patrimônio cultural do Brasil, o escritor percorreu as estradas do interior de São Paulo registrando cidades que considerava Bens Culturais Nacionais. Motivado por essa trajetória, Lucas, que estuda Produção

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Cultural na UFF (Universidade Federal Fluminense-Niterói), reuniu informações para seu Trabalho de Conclusão de Curso e tomou a bicicleta como veículo de deslocamento e de interação socioambiental, elementos centrais do projeto. “A bicicleta é peça fundamental, pois permite uma leitura do tempo/espaço com outra reflexão sobre os levantamentos propostos há 76 anos e sobre as mudanças que aconteceram nesses lugares”, afirma. Lucas pretende lançar um livro-guia, um curta e iniciar um novo projeto em 2014 voltado para cicloturistas.


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edúaS INSETOS

Sociedade

Abelhas são organizadas, disciplinadas e se comunicam bem para garantir sobrevivência

ideal

O

s insetos sociais, como as abelhas, vespas, formigas e cupins, são um verdadeiro exemplo de organização. Entre eles destacam-se as abelhas que, unidas e disciplinadas, fazem funcionar uma engrenagem perfeita, necessária para a sobrevivência de cada uma delas e da espécie. Algumas colmeias podem reunir até 300 mil indivíduos divididos em castas: rainha, operárias e zangões, cada qual com sua função determinada. Um apaixonado pelas abelhas, o coordenador do Centro de Estudos de Insetos Sociais do Instituto de Biociências da Unesp Rio Claro, Osmar Malaspina, diz que uma colônia 28

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de abelhas é uma empresa eficiente, onde todos sabem suas funções, a comunicação é feita com exatidão e quem não tem função é excluído. A vida na colmeia é comandada pela rainha. Só ela se reproduz. O restante das abelhas, chamadas de operárias, é responsável por encontrar pólen, produzir mel, cuidar das larvas e garantir a manutenção da colônia. De acordo com o professor Malaspina, a ciência ainda não descobriu o que determina quais larvas, entre as milhares que nascem todos os dias, são escolhidas para se tornar rainha. Para que essa transformação ocorra, as larvas selecionadas são alimentadas com geleia real, enquanto

TextoFabiana Assis DesignMayara Laurindo

AMIGAS DE MESA As abelhas contribuem para a alimentação dos humanos não apenas com a produção de mel. Elas são importantes para diversas culturas agrícolas. Aproximadamente 90% das plantas frutíferas contam com os serviços de polinização das abelhas para a produção de frutos e, assim, a reprodução da espécie.


as operárias são alimentadas com mel e pólen. “Esse processo tem que ser feito em até 72 horas após o nascimento. Estudos comprovaram que, durante esse período, a alimentação especial dispara um mecanismo genético que faz com que essas abelhas fiquem maiores, percam a capacidade de ferroar e ganhem a aptidão de fecundação”, explica. A rainha sai apenas uma vez da colmeia, com o objetivo de fazer o voo nupcial. Ela voa a uma altura de 15 metros e libera um feromônio sexual que atrai os machos a uma distância de até quatro quilômetros. Durante o voo, é fecundada por vários zangões, não sem brigas e até algumas mortes entre eles, e armazena os espermatozoides para o resto de sua vida. Os zangões morrem logo após a cópula. Após a fecundação, a rainha volta para a colmeia e nunca mais sai. Durante toda a sua vida, que dura cerca de um ano, ela coloca em torno de mil ovos todos os dias. O feromônio produzido pela rainha mantém seu status na colônia, inibindo o desenvolvimento de ovários nas operárias, mas quando a quantidade de ovos que ela produz começa a diminuir, as abelhas sentem que é hora de escolher uma rainha nova e matam a antiga, deixando de alimentá-la ou atacando-a e estraçalhando-a.

UMA POR TODAS E TODAS POR UMA A organização primorosa é o segredo da sobrevivência da colmeia. Nela, todas as abelhas exercem suas funções para manter a vida na colônia. Malaspina diz que, no caso das abelhas, o organismo é toda a colônia, porque as operárias não podem viver sem a rainha e vice-versa. “Todos funcionam como uma coisa só. Se não houver interação, o bicho não vive”, diz. Um bom exemplo dessa interação é o esforço conjunto para manter a temperatura ideal dentro da colmeia. As abelhas vivem a uma temperatura entre 28 e 32ºC. Quando esquenta demais, elas providenciam um “arcondicionado natural”, aumentando

a quantidade de água dentro da colmeia e LADRAS E sincronizando o baSOLITÁRIAS ter das asas para resfriar o local. Já quanExistem mais de 20 mil espécies do a temperatura cai de abelhas e nem todas vivem em demais, elas se junconsideradas tam para gerar calor. sociedade (aliás, as espécies pilhadoras ou O instinto de sosociais são minoria, e cleptobióticas, isto é, brevivência também representam apenas saqueiam os ninhos de é responsável pela outras espécies para roubar matança de zangões mel, pólen e até cera. Para se quando a população defender dessas “ladras”, de abelhas começa 5% do total). cada espécie desenvolveu a ficar maior do que Algumas abelhas são solimecanismos próprios o alimento produzitárias e nem chegam a conhede defesa. do pode sustentar. cer suas mães que, ao ovipositar, O crescimento dedeixam junto uma bolota de polén para masiado da colmeia garantir o alimento do futuro filho e A espécie Jataí também faz com que vão embora sem esperar pelo (Tetragonisca ela se divida, levando seu nascimento. Outras angustula) conta com a rainha e várias opeabelhas são abelhas-soldados para exercer rárias a abandoná-la a segurança da colmeia. Outras para formar uma espécies, por sua vez, preparam nova colônia, deiarmadilhas com bolas de cera xando para trás uma nova rainha.

COMUNICAÇÃO COM DANÇA

e própolis para prender as saqueadoras.

O processo de comunicação das abelhas é tão interessante que rendeu ao austríaco Karl von Frisch o prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia de 1973 por decifrá-lo. Esses insetos se comunicam principalmente por meio de processos químicos – em sua maior parte, cheiros, como os feromônios. “Para cada comportamento, existe uma molécula que é liberada”, explica Malaspina. O cheiro permite que elas entendam o momento de trocar a rainha e identificar um indivíduo invasor. Após ferroarem um animal ou pessoa, por exemplo, é liberado um odor para alertar as outras abelhas sobre uma situação de perigo. Para o pesquisador, um dos meios de comunicação mais fascinantes da abelha é a dança que ela faz para contar a suas companheiras onde encontrou pólen. “Ao voltar para a colônia, ela começa a ‘requebrar’ fazendo voltas em forma de oito várias vezes”, conta. A dança representa exatamente o ângulo entre a colmeia, a árvore com pólen e o sol, criando um mapa a ser seguido pelas outras. facebook.com/RevistaMundodosBichos

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IPE INICIATIVAS

Unindo saberes em prol da conservação ambiental TextoPedro Junqueira DesignMayara Laurindo

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omeado em homenagem a uma das árvores mais belas da flora brasileira, o IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas – tem obtido grande destaque no panorama das ONGs voltadas às questões ambientais. Fruto de um trabalho de conservação ambiental iniciado pelo casal Carlos e Suzana Pádua, o IPÊ foi fundado em 1992, com a missão de desenvolver e disseminar modelos inovadores de conservação da biodiversidade. Seu projeto inicial se dedicou à conservação do Mico-Leão-Preto, no Pontal do Paranapanema. Hoje, após mais de 20 anos, o IPÊ está presente em três biomas diferentes (Mata Atlântica, Pantanal e Amazônia), e conta com cerca de 100 profissionais trabalhando em mais de 40 projetos espalhados pelo país. 30

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O grande diferencial do IPÊ consiste na união entre a pesquisa científica, o saber popular e a visão de negócios para promover a sustentabilidade. Desse modo, o instituto desenvolve ações integradas às populações locais, que incluem pesquisa de espécies ameaçadas, educação ambiental, restauração de habitats, conservação da paisagem, influência em políticas públicas e estabelecimento de alternativas sustentáveis para a melhoria de vida das comunidades. Outra preocupação é compartilhar o conhecimento produzido em seus projetos. Para isso, o IPÊ promove o ensino e a produção científica por meio de cursos livres e de especialização. Em 1996, foi criado o Centro Brasileiro de Biologia da Conservação (CBBC), que conta com cursos de curta duração e de pós-graduação.

Em 2006, surgiu a Escas – Escola Superior de Conservação Ambiental e Sustentabilidade –, que oferece mestrado e visa a formar profissionais voltados aos negócios sustentáveis. E em 2012, teve início o MBA em Gestão de Negócios Socioambientais, com apoio do CEATS/USP (Centro de Empreendedorismo Social e Administração em Terceiro Setor). Com estratégias abrangentes e atuação diversificada, o instituto está consolidado como uma das maiores ONGs ambientais do Brasil, e recebeu do Ministério da Justiça o título de Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP). Segundo Suzana Pádua, presidente do IPÊ, o instituto pretende contribuir cada vez mais para que o Brasil consiga aliar o desenvolvimento social ao am-


PRESENÇA EM 3 BIOMAS 1

Na Mata Atlântica, os projetos desenvolvidos pelo instituto giram em torno da conservação dos remanescentes florestais, restauração de áreas degradadas e proteção ao Mico-Leão-Preto e Mico-Leão-da-CaraPreta, espécies ameaçadas de extinção.

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Dentro do bioma Amazônico, o instituto mantém diversas parcerias com atores sociais e instituições, e os projetos têm como objetivo buscar o desenvolvimento regional e populacional sem prejudicar os recursos naturais. É nesse bioma que o instituto desenvolve o projeto Iaras, que se dedica à conservação do Peixe-Boi Amazônico.

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No Pantanal, o trabalho está focado na preservação do Tatu-Canastra, com o projeto Tatu-Canastra, e na preservação da Anta, com o programa Anta Pantanal da Iniciativa Nacional da Conservação da Anta Brasileira (INCAB).

biental: “O IPÊ sempre teve sonhos grandes. Utopia é o primeiro passo rumo a algo ousado, inovador e que transforme realidades. O IPÊ sonha em colaborar para reduzir a perda da biodiversidade brasileira. Sonha em ajudar a formar uma massa crítica de pensadores e empreendedores que ousem caminhos novos na busca de soluções para problemas socioambientais. Sonha em introduzir conceitos de sustentabilidade em meios que normalmente desconhecem essas ideias. Esses são alguns dos princípios que movem a instituição”, afirma Suzana.

CONEXÃO COM A VIDA Uma das maiores conquistas do IPÊ está no Pontal do Paranapanema, o maior corredor ecológico já plantado no Brasil em reflorestamento. Com mais de 700 hectares e 1,4 milhão de árvores, ele une 2 unidades de conservação, a Estação Ecológica Mico-Leão-Preto e o Parque Estadual Morro do Diabo, que são as únicas unidades de conservação de Mata Atlântica do interior de São Paulo. Esse corredor pode mudar as chances de conservação de muitas espécies, como a Onça-Pintada e o Mico-Leão-Preto, já que cria uma via de conexão entre grandes áreas verdes e possibilita a locomoção segura entre as matas.

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DIÁRIO

Diário

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DE BICICLETA

e um lado, o Oceano Pacífico. Do outro, as fronteiras com Brasil, Colômbia, Equador, Bolívia e Chile. O Peru é uma nação fascinante, constituída por histórias totalmente incomuns, como a do nosso aventureiro, que redescobre a cultura e a essência da América Latina. Nas semanas 45, 46 e 47, Beto relata as belezas naturais e a hospitalidade desse território incrível. Tente não perder o roteiro da viagem, porque o fôlego certamente você já perdeu.

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29 de outubro de 2013 O mais legal é a mudança brusca de temperatura desse diário, porque e começamos lá no frio das alturas r calo no o, baix em i terminamos aqu [...]. agal mat sufocante desse Seguimos rumo a um lugar muito o esperado, muito especial, chamad o tud te fren pra Amazônia, e daí sinme eu o baix muda. Aqui em

to em outro país. Tudo totalmente diferente, as pessoas, as paisagens, o o barulho das estradas e, é claro, o, clima. La em cima foi maravilhos cada paisagem inacreditável que eu vi por ali, mas já estava precisando de mudança. Precisava sentir esse calor insuportável que aquece os corações e facilita os sorrisos. DIÁRIO

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MUNDO

BEA GLES Desde o dia 12 de outubro, manifestantes realizavam um protesto em frente ao Instituto Royal, em São Roque, alegando que animais eram vítimas de maus-tratos durante testes realizados em laboratório. Após 6 dias de manifestação, um grupo de aproximadamente 100 pessoas derrubou os portões do instituto e retirou do local cerca de 200 cães da raça beagle.

De um lado, manifestantes acusaram o instituto de falta de transparência e ética, e registraram um boletim de ocorrência contra maus-tratos aos animais. De outro, pesquisadores afirmaram que o caso foi um ato de terrorismo, e registraram boletim de ocorrência por furto qualificado. O caso culminou no fechamento do instituto e na abertura de uma polêmica que ainda está longe do fim.

ONDE ESTÁ O ALLIGATOR http://goo.gl/FWe6vzM

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Na cidade de Apopka, localizada na Flórida (sul dos Estados Unidos), um alligator (Jacaré-americano) de quase 2 metros invadiu as ruas da cidade e obstruiu a entrada de um mercado. O animal parou em frente a uma das portas automáticas, que ficavam abrindo e fechando de acordo com seus movimentos. Funcionários da loja trancaram as portas e chamaram a polícia, mas o bicho resolveu ir embora por conta própria.


ABOMINÁVEL HOMEM DAS NEVES Sim, ele existiu. Pelo menos é o que diz o geneticista Bryan Sykes, professor da Universidade de Oxford. Mas, para o triunfo dos céticos, o pesquisador afirma que o “Pé Grande” era na verdade uma espécie de urso ancestral, provavelmente parente dos ursos polares. Analisando o material celular de animais encontrados no Butão e no Himalaia, considerados como exemplares do “Pé Grande”, a equipe de Sykes afirma ter identificado um padrão genético idêntico ao de um antigo urso polar. Realmente, um banho de água fria nos entusiastas.

QUAL O SOM DA RAPOSA? O último viral do universo das músicas renderia uma matéria para a MDB. What does the fox say? (“O que a raposa diz?”) é um clipe criado para divulgar a terceira temporada do programa dos irmãos Ylvis. Os noruegueses Bård Ylvisåker e Vegard Ylvisåker são humoristas e apresentadores do programa i kveld med Ylvis (Hoje à noite com Ylvis), sucesso na Noruega. O vídeo, que foi elogiado pelos jornais Washington Post e The Guardian, tem mais de 185 milhões de visualizações no Youtube.

Se você ainda não conhece (o que é praticamente impossível), vale a pena conferir: http://goo.gl/OVngf8

E respondendo à pergunta, o som da raposa se chama regougo, e pode variar de uma espécie de latido até uma mistura bizarra entre grito e uivo: http://goo.gl/kCEbk7

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ARTIGO

Somos todos Beagles? por Kdu Oliveira

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ecentemente, assistimos à invasão ao Instituto Royal em São Roque. Determinados a salvar a vida dos fofos cãezinhos, manifestantes adeptos da causa do não uso de animais para testes em laboratório se engajaram numa empreitada contra a indústria. Mas qual indústria? Os manifestantes, ou invasores, deram não um tiro no pé, mas no coração. Por conta disso o Ministério Público, que já estava investigando o Instituto, perdeu as possíveis provas para de fato criminalizar o instituto por maus-tratos aos queridos beagles. Mas vamos a outras questões. Fiz uma grande investigação bibliográfica, conversei com vários amigos e amigas cientistas que usam animais para pesquisas de medicamentos e, de fato, tive que engolir que ainda não é possível (cientificamente, já que estamos falando de ciência) não usar os animais para testar uma infinidade de medicamentos e cosméticos. Não irei soletrar tais argumentos (científicos),

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pois eles me convenceram. Nosso país de todas as formas clama por justiças, sejam elas humanas ou animais. Vou ter que admitir e arcar com as críticas de que a culpa, ou responsabilidade, não é do Instituto Royal ou de qualquer outro laboratório que faça uso de animais para testes farmacêuticos ou cosméticos. A culpa é nossa! Consumo, consumismo e alienação. Nossos lindos beagles estavam lá a favor da indústria que mais rende divisas no planeta. A beleza é a moeda mais valiosa em tempos de desordem social. Parece que pintar os olhos, encher-se de cosméticos e tintas púrpuras nos valem de saúde e esconderijo para o tamanho vazio que já não suportamos. Desculpem, mas de nada adianta salvar beagles e usar o top do top creme daquela marca famosa. Se vamos protestar, invadir e destruir, precisamos ao menos pensar nas contradições. Meu “partido político” se chama humanização, e também posso incluir aqui o tema – humanizar o tratamento dos animais que são

usados para testes em laboratório. Agora, se decidirmos nos comover com os animais, então que sejamos justos com todos eles. Ratinhos lindos e branquinhos, porquinhos recém-nascidos, bezerros saltitantes de felicidade por sentirem as forças de suas patas e até os pintinhos amarelinhos são lindos de doer. Sim, eles também são animais. Sou a favor de protestos, participo deles e apoio veementemente os que lutam pela causa animal. Mas, se olharmos o fenômeno de maneira mais complexa e atenta, poderemos ver de forma nua e crua que nós, humanos, viramos carne de consumo das grandes indústrias, que enxergam nos beagles e nos homens meros produtos, ora de consumo, ora de capital. Aplausos aos manifestantes e vaias aos consumistas.

Kdu Oliveira é Psicólogo e Psicanalista. Escreve para a MDB desde quando ela ainda era um embrião.


CRÔNICA

Assim é a vida, animal por Maurício Fregonesi Falleiros

É

noite, sala da casa. Num canto, um móvel com um aquário em cima. Dentro do aquário, um peixe, desses dourados. O gato se aproxima em silêncio, coloca a pata dentro da água, vagarosamente, até quase encostar no peixe, que está imóvel. E então dá um cutucão nele: – Ou, peixe, acorda aí! – Eu não estou dormindo. – Ótimo. Preciso falar com você. – Agora não, passa outra hora. – É sério, preciso mesmo te contar um negócio. – Não tô a fim, volta amanhã. – Mas essa você tem que ouvir. Ontem eu dei um rolê com uma gataiada da rua. Nós nos encontramos na esquina, depois fomos pro... – Espera lá. Você saiu com uns gatos da rua? Você malemá põe as patas no quintal. Larga de ser mentiroso. – Mentiroso, não. Para o seu governo, eu saio todo dia, passo a noite inteira fora. É que o nenezão aí já está dormindo essa hora. – Não se esqueça que eu durmo de olho aberto. Não perco um lan-

ce, meu caro. – Acho melhor consultar um veterinário, você deve estar cego. Eu não passo uma noite dentro de casa. – Porcaria nenhuma! Você fica o dia todo se lambendo naquela sua caminha toda frufruzinha. Você nunca viu a cor da rua, papudão. Agora dá licença, que eu tenho mais o que fazer. O peixe vira de costas para o gato, que fica possesso: – Papudão uma ova! Quem você pensa que é pra falar isso na minha cara? Você não sabe da missa a metade, meu camarada. Eu vou direto pra rua, encontro minha galera, quebro tudo e... Ei, eu tô falando com você, não se finge de surdo, não, só porque você não tem orelha. Olha pra mim quando eu estiver falando com você, ok? Tudo em vão. O peixe está dormindo há tempos. O gato coloca a pata na água mais uma vez, para acordá-lo. O peixe morde a pata do gato, mas morde pra deixar a marca do dente. E ainda com o gordinho da pata do felino na boca, fala:

– Vai dormir, mentiroso! Um humano entra na sala. É o dono do peixe, marido da dona do gato. Ao ver a cena, ele não tem dúvida: o bichano está tentando comer o seu peixe. – Larga ele, desgraçado! O gato paralisa, arregala os olhos e continua com a pata dentro do aquário. O homem pega o felino pelo couro. – Eu já falei pra largar ele, inútil! Ah, se eu não gostasse tanto da sua dona... Mas isso não vai ficar barato, não. Hoje você dorme lá fora. Enquanto é levado para o quintal, o gato olha para o peixe e diz, em pânico: – Me ajuda, me ajuda... O peixe responde, já se ajeitando numa pedra: – Aproveita e vai dar mais um rolê com a sua gataiada...

Maurício Fregonesi é publicitário. Cria contos, crônicas e propagandas. Aqui, ele anuncia apenas seu talento. facebook.com/RevistaMundodosBichos

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CURIOSOS

PORCO

DO MAR

Na escuridão das águas profundas, animal vive em locais inalcançáveis aos olhos do homem

Acredita-se que os porcos do mar estejam espalhados por diversas partes do planeta, revirando o fundo dos oceanos em regiões que variam de 1.000 a 6.000 metros de profundidade.

A

s profundezas do oceano são ambientes com características extremas, normalmente habitadas por raros organismos vivos. Também, com seres bizarros como o porco do mar (Scotoplanes globosa) rondando à solta, é normal que pouquíssimos bichos queiram viver na região. Além do aspecto de geleia mutante alienígena, muito pouco se conhece a respeito dos porcos do mar. Sabe-se que eles pertencem à família dos pepinos do mar (Holothuroidea) e são seres detritívoros, que se alimentam de restos de plantas ou animais mortos que caem da superfície do oceano. 38

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E AÍ, BICHO, QUAL É? Além da aparência adorável, o próximo bicho curioso também é um habitante dos oceanos. Dessa vez a MDB foi fundo para encontrar uma espécie do nível das esquisitices já mostradas. Prende a respiração aí, que na próxima revista você descobre quem é a figura.

Se você teve essa dúvida, não, não é possível fazer torresmo a partir do porco do mar. Ele tem esse nome por causa da sua cor rosada e das perninhas gordas e curtas. Na verdade, essas "pernas" são estruturas ocas que o bicho enche de água e utiliza para se locomover no fundo do oceano e levar alimentos à boca. Com cerca de 12 cm de comprimento, eles cabem direitinho na palma da sua mão. O duro é ter coragem de acariciar o bichinho.


CLICK

Jaraguá Fashion Pet

Juninho Anelli e Amy Winehouse

Cleusa e Dú

Alicia

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