CARTA AO LEITOR
A
s crises que nos assustaram nos últimos meses — a provocada por mudanças climáticas
abruptas no mundo e no Brasil; a financeira, desencadeada pelos Estados Unidos; e a da saúde, marcada pela gripe A (H1N1), entre outras — pedem reflexão. Neste cenário, cabe indagar: afinal, que mundo queremos? Mudanças climáticas – um dos temas desta edição – poderão ser muito mais devastadoras para a humanidade do que a crise financeira e exigirão de todos nós outros comportamentos e hábitos. Outro exemplo sempre perturbador é o aumento das emissões de gás carbônico em todo o planeta. “Terra verde” e “Tempo e tempestades”, duas reportagens da editoria de meio ambiente do número 2 da revista Sem Fronteiras, foram especialmente elaboradas neste contexto. Sem Fronteiras também procurou melhor compreender as engrenagens da mega crise financeira em reportagem assinada pelo jornalista Carlos Drummond. Complementam-na trechos de uma entrevista com o economista Eduardo Giannetti e um artigo assinado pela secretária Lygia Pupatto sobre economia do conhecimento. Uma discussão sobre economia, crenças e comportamentos envereda pelos caminhos da filosofia e da ética. Afinal, por que a economia, que nasceu da filosofia moral, ao invés de libertar o ser humano, o aprisiona e o enreda cada vez mais? E, por falar em filosofia, onde estão os filósofos da ciência? O matemático Adonnai Sant’Anna comenta esta questão. Engrandecem ainda esta edição com seu pensamento e resultado do seu trabalho o geólogo João José Bigarella, o jurista Edson Fachin, o historiador Luiz Carlos Ribeiro e o ficcionista Jair Ferreira dos Santos. Resultados de pesquisas e projetos apoiados pelo Fundo Paraná, que destina até 2% da receita tributária estadual para a ciência e a tecnologia, em várias outras áreas do conhecimento, fazem o contraponto com as últimas crises e apontam alguns caminhos possíveis. Boa leitura.
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Carta ao leitor
4
EntrEvista LUiz EDSON FACHiN
“(Re)descobrindo uma nação”
8
PErfil JOãO JOSé BiGARELLA
Moderno “sábio enciclopédico”
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Ensaio JAiR FERREiRA DOS SANTOS
O Pós-Moderno e a “Árvore da Vida” CiÊnCia
Onde estão os filósofos da ciência?
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Professor do Departamento de Matemática da UFPR, ADONAi S. SANT’ANNA faz uma reflexão sobre o papel do filósofo da ciência de hoje e de antes
18
Outros olhares em 2009 Ano internacional da Astronomia coincide com o 400° aniversário das primeiras observações feitas por Galileu Galilei
28
CaPa
As engrenagens da crise Nessa reportagem, o jornalista CARLOS DRUMMOND analisa os principais fatores desencadeantes da crise econômica, entre os quais o aumento sem precedentes do consumo nos Estados Unidos. Complementam a reportagem trechos de uma entrevista do economista e filósofo EDUARDO GIANNETTI e um artigo da Secretária de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, LYGIA PUPATTO, sobre a economia do conhecimento.
tECnoloGia E inovaÇÃo
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Procuram-se engenheiros Universidade de São Paulo calcula que as obras do PAC precisariam de 280 mil engenheiros em quatro anos
52
Parcerias de resultados instituições de ensino superior são fundamentais na solução de problemas regionais
58
Pesca duplamente generosa Universidade Sem Fronteiras vai ensinar pescadores a curtirem o couro de peixes
MEio aMBiEntE
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Terra verde O que o Paraná está fazendo para tornar a produção de alimentos menos agressiva ao meio ambiente
72
Tempo e tempestades Aquecimento global sinaliza para um quadro de chuvas mais intensas e enchentes, mas será que estamos preparados para enfrentá-las?
HUManiDaDEs
80
Futebol, razões e sentimentos Pesquisador do Núcleo de Estudos Futebol e Sociedade do Departamento de História da UFPR, LUiz CARLOS RiBEiRO fala de alienação/paixão versus consciência/razão
88
Violência gratuita Pesquisas buscam compreender os mecanismos sociológicos que sustentam as trágicas estatísticas do trânsito no Brasil
96
EDUCaÇÃo CiEntÍfiCa Programa Mão na Massa promove a investigação científica aliada à expressão oral e escrita no ensino fundamental
notÍCias DE C&t
98
Tecnologia mais quente que o sol
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Lua de Saturno pode ter oceano
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Influenza A: vacina em fase de produção
101 102 105 106
Amazonas: um jovem de 11,8 milhões de anos
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Unila, a universidade repensada
112
In memoriam: Glaci Zancan, uma guerreira
114
A imagem eficaz
Cirurgia de diabetes Paraná aplicará R$ 124,6 milhões em C&T Evolução da pós-graduação no Paraná
MEMÓria
118
O Mez da Grippe
123
rEsEnHa MAURÍCIO TUFFANI e o jornalismo científico antideterminista
ENTREVISTA
luiz edSon Fachin
(re)descobrindo uma nação ana LUZia PaLKa
“BrasiL estÁ tentanDo DeMonstrar QUe É PossÍVeL ConstrUir UM estaDo soCiaL”
Joka madruga
Um dos mais respeitados juristas brasileiros na área do Direito Civil, Luiz edson fachin é frequentemente consultado nos momentos em que a sociedade se vê numa encruzilhada, sem saber se posicionar entre antigos e novos valores. foi assim, por exemplo, quando foi chamado à Câmara dos Deputados, em 1995, para dar seu parecer sobre o projeto de lei da ex-deputada Marta suplicy, que instituía a união civil entre pessoas do mesmo sexo. fachin defendeu a legalidade e a constitucionalidade do projeto que, entretanto, não foi aprovado. se nesse caso o peso do seu parecer não foi suficiente para mudar posições conservadoras, em outros temas suas argumentações têm sido decisivas para a solução de conflitos em tribunais de todo o país. atuou como colaborador do senado federal na elaboração do novo Código Civil, de 2002, e integrou a comissão do Ministério da Justiça para a reforma do Judiciário. Há cerca de três anos, personalidades políticas, jurídicas e empresariais do Paraná indicaram o seu nome ao presidente da república para uma vaga no supremo tribunal federal.
Professor de Direito Civil da UfPr e PUCPr, edson fachin está entre os juristas mais respeitados do país
nesta entrevista, o professor de Direito Civil das Universidades federal e Católica do Paraná, com vários livros publicados, discorre sobre temas polêmicos que fazem parte do cotidiano dos brasileiros. fachin faz também uma abordagem sobre os desafios que o país enfrenta para dar maior efetividade à justiça.
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SF Pesquisas científicas com embriões humanos, interrupção da gravidez em casos de fetos anencéfalos e legalização do aborto são algumas das questões para as quais se buscam respostas na ciência, na religião, na ética e no direito. Até que ponto a ordem jurídica consegue dar
“Estamos vivendo a travessia de um Poder
respostas a esses questionamentos?
muitos passos adiante do Direito”
Judiciário que tem suas raízes e tradições fincadas nos séculos 18 e 19, para um Poder Judiciário e uma ordem jurídica do século 21. E nesse sentido a ciência e a tecnologia estão
LuizFachin Somos formados por um modelo de Poder Judiciário bastante refratário às mudanças sociais,
fundamental. Porém, não coloco isso como condição
históricas e tecnológicas. Esse modelo foi aos poucos ruindo
para se adotar esse sistema. O estabelecimento
com a aplicação dos princípios constitucionais após 1988,
de cotas para os negros é uma ação afirmativa
e também por conta de alterações econômicas e sociais.
importante porque resgata uma dívida histórica do
Um conjunto de temas que eram tratados nos laboratórios,
nosso país. Não podemos esquecer que, há cerca de
nas universidades e nas academias, passou a ser tratado
dois séculos, tínhamos pessoas que em função da
no cotidiano das pessoas, e isso acabou levando essas
sua cor e raça eram objeto de compra e venda. Essa é
discussões para o Judiciário. Seria impensável no Brasil,
uma dívida que obviamente o Brasil tem a resgatar e
há 30 anos, o Supremo Tribunal Federal tratar de um tema
num determinado tempo. Por isso, deve ser de caráter
como o das células-tronco embrionárias. Estamos vivendo
transitório. A situação não pode se eternizar, sob pena
um processo em que as diversas instâncias da sociedade e
de infantilizar os sujeitos, como se o Estado estivesse
as mentalidades estão tentando andar num mesmo passo,
sempre aí à disposição para garantir benesses e
mas nem sempre de fato conseguem. Estamos vivendo
paternalisticamente cuidar das pessoas. Acredito que
a travessia de um Poder Judiciário que tem suas raízes
isso nem os movimentos sociais desejam. Se as cotas
e tradições fincadas nos séculos 18 e 19, para um Poder
não resolvem os problemas, elas estão simbolicamente
Judiciário e uma ordem jurídica do século 21. E nesse
a representar que temos uma dívida com os negros,
sentido a ciência e a tecnologia estão muitos passos
com os povos indígenas e com a escola pública.
adiante do Direito. Mesmo assim, o Direito é imprescindível. Para que exista liberdade de pesquisa é fundamental
“Se as cotas
SF
O princípio da igualdade previsto na Constituição não seria suficiente para fundamentar posições contrárias
não resolvem
ao sistema de cotas?
simbolicamente a
seja um tema para o Direito. É muito mais tema para um
LuizFachin
representar que
debate histórico, social, que se defina no desenvolver das
jurídicos contra o sistema de cotas. E
questões que são amadurecidas pela sociedade do que
um deles é que a Constituição brasileira
por meio de uma lei, de um decreto ou de uma sentença.
prevê o ingresso nas universidades
Mas é nessa travessia que nós nos encontramos e é isso
pelo mérito e que, portanto, o sistema
que faz todos esses desafios desaguarem para uma nova
de cotas estaria violando esse princípio
mentalidade jurídica que está se formando no Brasil.
de uma meritocracia e atentando
que uma ordem jurídica também estabeleça quais são os limites. E esses limites precisam ser estabelecidos democraticamente. Até onde a ordem jurídica pode definir qual é o início da vida? Tenho minhas dúvidas de que esse
Há fortes argumentos
os problemas, elas estão
temos uma dívida com os negros, com os povos indígenas e com a escola pública”
contra a igualdade de condições. Eu não abono esses argumentos, não os subscrevo porque entendo que
SF
Outro tema polêmico é a adoção do sistema de cotas nas universidades públicas brasileiras. O sistema foi implantado há cinco anos, mas continua sendo alvo de ações judiciais por parte daqueles que se sentem prejudicados nos concursos vestibulares. Qual é a sua posição?
LuizFachin
Sou favorável à adoção do sistema de
eles têm uma falsa premissa de imaginar que todos são iguais. Só se garante a igualdade para aqueles que são iguais. E numa sociedade de desiguais, o princípio da igualdade formal é no fundo uma injustiça e, portanto, no meu modo de ver, esse argumento é uma falácia.
cotas, mas não de uma maneira irrestrita. É evidente que não podemos resolver questões que estão no topo da pirâmide sem solucionar problemas básicos do ensino
“Numa sociedade de desiguais, o princípio da igualdade formal é no fundo uma injustiça”
semfronteiras |
5
SF
A legislação não contempla, mas já há decisões dos tribunais favoráveis à união civil de pessoas do mesmo sexo. É possível garantir
SF
proteção jurídica para os casais homossexuais?
bom ou ruim para a sociedade brasileira?
LuizFachin
e
LuizFachin No caso brasileiro, vejo a judicialização
matrimonializado é o modelo de família
das relações sociais como um fato positivo, porém
historicamente adotado no Brasil e é o que
transitório. É positivo porque transferiu alguns temas
está no centro da Constituição, ainda. Porém,
que antes eram reservados ao espaço privado para a
há duas coisas a ponderar. A Constituição não
esfera pública. Traz à tona certos temas que ficavam
restringe o conceito de família ao casamento
encobertos por tabus. A judicialização debate, por
e à heterossexualidade – não está dito na
exemplo, o nepotismo. Debate a mudança de nome
Constituição que não é família determinado tipo
que redesigna o sexo de uma pessoa. No caso do
de união. A Constituição diz que a família é a base
Brasil ela é oportuna, porque é um exercício de
do casamento, reconhece a união estável entre
cidadania, uma tomada de consciência de certos
o homem e a mulher, e também admite outras
direitos fundamentais. Se um portador do vírus HIV
O
modelo
heterossexual
formas de família, como, por exemplo, a família monoparental, sobre a qual ninguém tem muito preconceito porque já não envolve determinados tabus ou mitos sociais. Mulheres solteiras que têm filhos ou famílias monoparentais somam mais de 5 milhões no Brasil, segundo os últimos dados do IBGE. Portanto, do ponto de vista jurídico e apesar do lugar de destaque que se dá ao casamento heterossexual, não podemos reduzir a noção de família a esta dimensão unitária e unívoca. Família hoje tem um conceito plural. E o Congresso Nacional tem que enfrentar essa discussão, pois a lei deve compreender os fatos e não os fatos serem submetidos todos eles à lei. É por isso que recentemente os tribunais têm enfrentado a questão das uniões civis das pessoas do mesmo sexo. Julgo correta a orientação que os tribunais
A judicialização das relações sociais, entendida como uma crescente participação do Poder Judiciário na resolução de conflitos de toda natureza, é um fenômeno
demanda por um medicamento e o Estado não dá uma resposta, é legítimo sim que ele vá ao Poder Judiciário para que este supra a omissão do Estado. Portanto, no Brasil de hoje, o fenômeno da judicialização é positivo e é oportuno. Mas acredito que seja um fenômeno transitório. Apesar de todas as dificuldades que vivemos, estou entre aqueles que, entre o otimismo e o realismo, entendem que o Brasil está aos poucos tentando demonstrar que é possível construir um Estado social, onde as pessoas têm acesso aos direitos fundamentais. Com um patamar mínimo de distribuição de renda e de terra, com uma sociedade menos injusta, nós teremos estruturas microssociais também menos injustas. Se eu tenho um patamar mínimo de atendimento à saúde, não preciso ir ao Judiciário para reclamar certas atitudes prestacionais. O Brasil precisar responder a esse desafio. Ou ele cumpre com esse desafio, que eu chamaria de um pacto civilizatório, ou vamos também cair na barbárie.
“Ou o Brasil
têm dado até o momento, reconhecendo efeitos
cumpre o
jurídicos, assegurando direitos previdenciários
desafio, que
e sucessórios por analogia daquilo que se
eu chamaria
assegura às uniões estáveis. Portanto, entendo
de um pacto
que a diversidade de sexos não é uma condição
civilizatório,
para o reconhecimento de um ente familiar, ou
ou vamos cair
seja, as pessoas de um mesmo sexo juntas vivem
na barbárie. E
sim um modo de vida familiar, todavia entendo
vê alguma saída?
aí as soluções
que para ser admitido o casamento é preciso lei.
LuizFachin
democráticas
Nisso tenho uma posição um tanto conservadora,
humana para o Poder Judiciário. A nossa relação de
e pacíficas
mas acho que o Judiciário não pode substituir o
juízes por habitante é uma das mais altas da América
vão se tornar
legislador. Na questão específica do casamento,
Latina. Temos uma taxa temporal entre o início de um
cada vez mais
entendo não haver abrigo jurídico sem que haja
determinado processo e a prolação da sentença final
uma alteração legislativa.
que é inadmissível do ponto de vista da celeridade
difíceis”
6 | semfronteiras
E aí as soluções democráticas e pacíficas vão se tornar cada vez mais difíceis.
SF A crescente demanda judicial, entretanto, esbarra numa estrutura insuficiente. Os processos se acumulam, as decisões são lentas e a injustiça se perpetua. O senhor Há sim falta de estrutura técnica e
do Poder Judiciário. Mas a pergunta a se fazer é a
ENTREVISTA
seguinte: essa falta é casual ou também pode atender a um determinado tipo de interesse instalado na máquina do Estado? Tenho para mim que ela não é
políticas públicas, é o atendimento das necessidades
casual. Vamos imaginar uma empresa de prestação
fundamentais da população. E no plano da
de serviços de utilidade pública, como a de telefonia,
ordem jurídica, a compreensão de que os direitos
por exemplo, que tem um número elevadíssimo de
fundamentais não são direitos abstratos ou virtuais,
reclamações nos órgãos de defesa do consumidor, de
são prestacionais, ou seja, eu posso exigir que o
demandas no Juizado Cível e de processos nas varas
Estado cumpra essa prestação. É preciso que haja
judiciais. E as causas que dão base a essa demanda
um planejamento dos recursos disponíveis e das
não são resolvidas. A questão a se perguntar é se na
prioridades. Nesse sentido é fundamental ter uma
relação custo-benefício não seria mais proveitoso
gestão pública transparente, para saber onde os
para essas empresas ter as demandas do que solver
recursos estão sendo empregados, e também para
os problemas. Portanto, é preciso verificar a quem
ter uma sociedade que não apenas conheça seus
interessa a morosidade, a ausência de recursos e todas
direitos para exigi-los, mas também cumpra o seu
essas mazelas que o Judiciário de fato enfrenta. Por
dever de fiscalizar. É nesse patamar um pouco mais
outro lado, podemos encontrar mecanismos dentro
elevado do exercício da cidadania que vejo essa
do próprio Poder que resultam em determinadas
dupla saída: uma nas políticas públicas e outra no
soluções. A criação dos Juizados Especiais Cíveis foi
atendimento dos direitos fundamentais dentro da
uma boa iniciativa. A criação do Conselho Nacional
ordem jurídica. Portanto, é uma realidade dura, o
de Justiça, órgão de controle externo do Judiciário,
Brasil tem o seu dever de casa para fazer, não fez,
também foi muito importante. Um outro exemplo, a
mas pode fazer.
desjudicialização dos divórcios e dos inventários. E há outras iniciativas tramitando na Câmara dos Deputados, que têm o meu apoio e do Instituto Brasileiro de Direito de Família, do qual eu faço parte, que é acabar com o divórcio judicial. As dificuldades
SF
A Constituição brasileira precisa ser reformada para atender melhor às mudanças sociais e econômicas ocorridas nas duas últimas décadas?
da Justiça podem encontrar soluções em mecanismo
LuizFachin
pontuais, como esses, mas existe aquela questão mais
para mudar a Constituição. É bem verdade que as
ampla, que de fato precisa ser enfrentada.
mais de 50 emendas constitucionais desfiguraram
Sou contra qualquer convocação
o programa constitucional proclamado em 5 de
SF
Enquanto há uma evolução de mentalidades e na
própria gestão do Poder Judiciário, grande parte da população brasileira continua à margem da Justiça. O que fazer?
não é o caso de fazer nenhuma miniconstituinte para cuidar de reforma política ou para cuidar de reforma tributária. É claro que é preciso alguma alteração no campo político para dar estabilidade ao processo
LuizFachin excluídas
outubro de 1988. Não obstante isso, entendo que
do
Há uma margem elevada de pessoas processo
judicial
e
dos
legislativo, como também no campo tributário,
direitos
para corrigir algumas insanidades e disparidades
fundamentais. Elas são para a Justiça uma espécie de
tributárias que se tem no Brasil – e das quais o Paraná
não-sujeitos. Temos ainda grande parte da população
é uma das vítimas. Mas ainda estamos na fase da
que não tem seu direito à moradia, não tem água
efetividade constitucional. A Constituição brasileira
potável, não tem luz elétrica, não tem educação
nesses 20 anos adquiriu a maioridade apenas
para os seus filhos. Temos pessoas recolhidas nas
formal. Ela ainda precisa tornar-se verdadeiramente
cadeias e penitenciárias, cumprindo pena sem as
uma Constituição cidadã. Alguns dos direitos ali
condições mínimas de respeito à dignidade humana.
proclamados constituem o que a gente chama de
Não é o Direito que vai responder a esses desafios,
espelho invertido da realidade, exatamente porque
mas o Direito pode dar a sua contribuição. A saída
é um reconhecimento dos direitos que não se tem.
para isso, sem dúvida nenhuma, é um repensar das
Essa é uma fase que precisa ser vencida.
semfronteiras |
7
p er f i l
Moderno “sábio enciclopédico” Rodrigo Wolff Apolloni
Bruno Stock
Poucos instantes de boa conversa sobre ciência com o professor João José Bigarella são suficientes para o interlocutor menos informado perceber que não está na presença de um pesquisador comum. Melhor dizendo, é tempo suficiente para tomar contato com um tipo especial de cientista, um personagem capaz de devolver ao cânone dos saberes a figura arquetípica do “sábio enciclopédico” dos primórdios da ciência. Aos 87 anos, Bigarella — pesquisador responsável, há muitas décadas, por grandes contribuições à ciência brasileira — continua influenciando diretamente o espírito investigativo de jovens pesquisadores. Geólogo João José Bigarella
8 | semfronteiras
professor,
pesquisador
com
preparatório para a carreira
trabalhos realizados em várias partes do mundo,
de engenharia (o chamado
Bigarella nasceu em Curitiba, pela qual se declara
“Pré-engenharia”) no Colé-
apaixonado. “É um vírus de curitibano”, brinca,
gio
“que me faz sempre retornar para cá”. Pois foi
“Muitos dos conteúdos dessa
justamente em um desses “retornos” — ele acabava
época eu já havia visto nas
de voltar de atividades de campo no Parque
fases anteriores de estudo.
estadual de Vila Velha, em Ponta Grossa, onde
independente de a escola
participa da montagem do museu de Geologia e
ser pública ou privada, a
Paleontologia — que a reportagem da revista sem
qualidade da educação era
fronteiras foi encontrá-lo para conversar.
excepcional”, avalia.
no início
Manoel ribas assistente voluntário do Museu
estadual
do
bruno Stock
Geólogo,
Paraná.
“o Museu Paranaense foi a minha verdadeira universidade”
em 1944, foi nomeado pelo interventor
um “piá curitibano” das primeiras décadas do século XX a se interessar tão profundamente pela ciência e, em especial, pela Geologia, Bigarella diz que uma das razões foi a aproximação com idiomas ainda na infância. “Minha mãe pertencia à família schaffer e morava no Pilarzinho, bairro que, então, ficava muito longe do centro da cidade. Para garantir a educação dos filhos, meu avô contratou professores vindos da Morávia, região situada na atual república tcheca. Como eles falavam alemão, desde cedo ela aprendeu tanto esta língua quanto o português. Mais tarde, comigo, ela sempre falava alemão”, conta. no segundo ano do ensino primário, no Colégio Divina Providência, a conquista do idioma de Kant e nietzsche foi reforçada por muitas horas de leitura e escrita do gótico. “esse aprendizado, sozinho, foi de enorme valia”, pondera. “Mais tarde, quando várias vezes eu fui à europa com bolsas de estudo e pesquisa, podia ler em alemão e em gótico. Para a Geologia, em especial, esse saber foi de excepcional importância”. outro estímulo estava nos professores do Colégio Marista onde fez o ginásio. “o trabalho nos laboratórios e gabinetes de física, Química
Paranaense. Passou um ano lá, antes de ser encaminhado para o instituto de Biologia e Pesquisas tecnológicas (iBPt), um dos primeiros núcleos de ciência do Paraná. “o ano que passei no Museu Paranaense foi a minha verdadeira universidade”, recorda Bigarella. “o Museu não só fazia pesquisas, como também reunia professores de fora, da UsP, do rio de Janeiro e até do exterior. nós acompanhávamos essas pessoas e víamos como elas trabalhavam”. Uma delas foi reinhardt Maack, geólogo e autor do clássico “Geografia física do estado do Paraná”. Com Maack, Bigarella trabalharia por cinco anos, principalmente em atividades de campo. a essas atividades, o pesquisador ainda somou três anos no exército
arquivo pessoal
Questionado sobre os motivos que levaram
(na arma de artilharia do CPor), que lhe renderam preciosos conhecimentos na chamada topografia
expe-
dita, que permite a realização rápida
de levantamentos
topográficos. “a partir de todas
essas
referências
que eu estruturei minha car-
é o geólogo em trabalho de campo
reira”.
e História natural, assim como nas atividades de campo, abriram um enorme horizonte”. em
mundo afora
1941, ingressou na faculdade de filosofia do
Um dos primeiros trabalhos de João José
Paraná (no curso de Ciências Químicas), que
Bigarella foi a confecção, a partir de um extenso
cursaria até 1943. ao mesmo tempo, fazia o curso
trabalho de campo, dos mapas geológicos do
semfronteiras|| 9 9 semfronteiras
arquivo pessoal
Paraná. nesse período, ele também trabalhou na produção do mapa dos recursos minerais do norte do Paraná, bem como de uma série de cartas sobre a região Metropolitana de Curitiba. “na Universidade, onde eu comecei a lecionar em 1949, nós formávamos grupos que desenvolviam todos esses trabalhos”, conta. ele ministrava as
expedição a uma aldeia Cauiá
disciplinas de Mineralogia e Petrografia e, mais
arquivo pessoal
tarde (na escola de Química), Mineralogia e Geologia econômica. os anos de 1951 e 1952 foram passados nos estados Unidos, em pesquisas como bolsista da John simon Guggenheim Memorial
o pesquisador e seus colegas encontram pouso em uma casa de paraguaios e índios durante viagem ao Mato Grosso em 1948
foundation. esse momento, diz o pesquisador, foi fundamental para que ele aprimorasse a capacidade de leitura dos cortes geológicos. foi quando, inclusive, ele teve a oportunidade
arquivo pessoal
de conhecer e trabalhar com francis Parker shepard, cientista que é considerado o “pai da geologia marinha”. “a equipe do Laboratório do instituto oceanográfico da Califórnia estava no Golfo do México, em pesquisas ligadas ao setor petrolífero. eu acompanhei a expedição e isso foi
aula de campo em 1949 para alunos da faculdade de filosofia, Ciências e Letras do Paraná, depois UfPr
de grande valia para meus trabalhos posteriores, uma vez que acabei implantando aqui o mesmo sistema de trabalho”. o estágio nos estados
arquivo pessoal
Unidos – que incluiu um estágio com o exército, de prospecção de urânio — também permitiu aprimorar os conhecimentos sobre Geologia econômica, estratégicos para o desenvolvimento de setores econômicos paranaenses como o de exploração do calcário.
Bigarella e riad salamuni de Curitiba durante levantamento de recursos minerais para a indústria Muller, irmãos & Cia
no regresso ao Brasil, Bigarella seguiu trabalhando na Universidade e no iBPt. “na universidade, diversas
nós
áreas,
reunimos montamos
professores
de
laboratórios
e
arquivo pessoal
começamos a pesquisar. nessa época, o professor Brasil Pinheiro Machado [diretor da faculdade de filosofia, Ciências e Letras] me chamou e disse que havia recursos para pesquisas — bastava ter o projeto e solicitar. Logo depois, o professor riad salamuni passou a fazer parte do grupo e, com isso, foi fundado o instituto de Geologia da no deserto do saara, em 1970
10 | semfronteiras
universidade. aquilo foi fantástico!”, anima-se. a instituição — fundamental para o desenvolvimento
da Geologia no Paraná — produziu inúmeros trabalhos que
principal instituição do segmento petrolífero nos estados
foram traduzidos para o inglês e divulgados no exterior,
Unidos. “esse tipo de sedimento, de arenito, é o melhor
o que fez com que a ciência local se tornasse conhecida
reservatório natural de óleo. e, naturalmente, a prospecção
internacionalmente. em 1956, Bigarella obteve a cátedra de
em áreas com tais características era muito promissora”.
Mineralogia e Geologia econômica. a inclusão de Curitiba no mainstream da Geologia fez com que a universidade participasse, nos anos sessenta, de
futuro
um simpósio internacional sobre a Geologia do Gondwana
Mais do que as inúmeras homenagens — dentre as
(supercontinente do período Jurássico superior composto
quais, a Medalha de ouro José Bonifácio de andrade e silva
por américa do sul, África, Madagascar, antártica, Índia,
(conferida pela sociedade Brasileira de Geologia) e a Grã-
parte do sul da Ásia e austrália). a qualidade dos artigos
Cruz da ordem nacional do Mérito Científico, recebida no
apresentados abriu uma porta para que Bigarella realizasse
ano 2000 — o que anima João José Bigarella é trabalhar
pesquisas internacionais, inicialmente na África do sul e
com jovens pesquisadores. aposentado da UfPr em 1983,
namíbia e, mais tarde, em outros países.
desde 1985 ele é professor visitante da Universidade
Questionado sobre seus trabalhos mais importantes,
federal de santa Catarina, onde orienta doutorandos.
Bigarella — cuja produção acadêmica inclui cerca de 200
além disso, ao longo de sua carreira docente também foi
artigos, em periódicos científicos do Brasil, estados Unidos
responsável pela formação de quadros de graduação e
da américa, Canadá, alemanha, Holanda, inglaterra, rússia e
pós-graduação em várias universidades, dentre as quais a
África do sul, além de vários livros na área de Geociências —
UfrGs e a UsP. Convidado a dar um conselho para esses pesquisa-
global das dunas e a revisão da geologia e geomorfologia
dores, Bigarella é enfático: “não esqueçam jamais a
do quaternário brasileiro. a pesquisa relativa às dunas,
memória histórica da ciência. Hoje em dia, as pessoas vivem
inclusive, fez com que em 1972 ele recebesse uma
reinventando a roda — justamente porque desconhecem
homenagem do instituto americano do Petróleo (aPi),
os trabalhos de seus antecessores”.
bruno Stock
destaca as pesquisas sobre a deriva continental, a revisão
o cientista aos jovens pesquisadores: “não esqueçam jamais a história da ciência”
semfronteiras |
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ENSAIO imprecisa, controversa, ainda hoje, a idéia do pós-moderno resiste, parece, aos seus coveiros. Lá se vão cinquenta anos que, com maior ou menor visibilidade na mídia e na academia, ela mostra um vigor que somente a preguiça ou a má-consciência intelectual podem negar. De outro modo, como compreender, por exemplo, a mensagem da associação Humanista Britânica que circula nas laterais dos ônibus londrinos desde outubro de 2008: “Deus provavelmente não existe. então
o Pós-moderno e a “árvore da vida”
pare de se preocupar e curta sua vida”? temos aqui a metanarrativa religiosa, já sem legitimidade, sendo glosada pela ateologia que, graças aos empenhos em defesa da diversidade cultural, saiu do armário para o espaço público, a fim de privilegiar a única existência de que dispomos — aquela aqui e agora neste mundo intranscendente. atual, este episódio é perfeitamente inteligível dentro do vocabulário pós-moderno, o que atesta a vigência de um conjunto de práticas e valores postulados décadas atrás, entre eles: uma arquitetura irreverente que condenou o purgatório ortogonal moderno para equilibrar pela fantasia, a citação, as relações entre forma e função; o primado da tecnociência, incidindo sobretudo nas máquinas informacionais para ativar uma economia baseada no consumo; a
Jair Ferr e ira d oS Sa n toS
incorporação, ao discurso público, de novos atores sociopolíticos — as minorias sexuais, raciais, regionais e as feministas — consolidando a vitória do multiculturalismo; a retomada do pensamento antimoderno de nietzsche com foucault, Deleuze, Derrida, que nos ensinou a desconstruir a mitologia de dominação e saber implícita na cultura ocidental. isso perfaz, até aqui, uma ópera aberta e sem resumo, marcada pela emergência de deslocamentos e perspectivas inovadoras entre as quais foi escândalo a revisão do humanismo, censurando o homem por autoconceder-se a prerrogativa de reinar sobre a natureza, gesto que redundou na dramática relevância que não temos como não atribuir à questão ecológica. Perfil do qual sobressaem a estética, os temas sociais e políticos, a renovação filosófica. Com o fim da União soviética, em 1989, que consolidou a supremacia neoliberal sob a hegemonia norteamericana, o pós-moderno ostentaria um recorte fortemente pautado pela revolução tecnológica em curso nos anos 1990. a clonagem da ovelha Dolly e a expansão da internet, matriz para as sociedades em rede, engendrariam um novo léxico, novas idolatrias. enquanto o “neoliberalismo” promovia a festa aparentemente sem fim do “hiperconsumo”, a “biotecnologia” e a “realidade virtual” produzida no “ciberespaço” aprofundavam a interpenetração homem-máquinas cibernéticas, o que repercutiu como um passo firme na direção do “póshumano”. estava acabada a evolução natural do homem; começava ali sua evolução artificial, na trilha do cyborg.
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esse novo léxico tem uma dominante: somos pura informação processada tecnologicamente, haja vista a convergência entre as diferentes mídias com o telefone celular a nos converter em terminais incontextuais de mensagens, a comprimir o presente, antes coextensivo ao dia, na escala do agora, do momento on line. Disso emerge um sujeito mutante, estruturado via consumo, que é ao mesmo tempo tribal e isolado, hedonista, mas também vulnerável, adepto de identidades fictícias nos chats, porém apegado ao dionisismo grupal das raves, dos mega-shows musicais. se pensarmos na informação disponível na internet
erraticamente, sem origem, fim, critério, sequência, centro, como metáfora mais justa da existência. É da condição pós-moderna, hoje, quando o sagrado já não se manifesta e as religiões perderam força qualitativa para modelar a subjetividade, vivermos o melhor que pudermos numa realidade indeterminada e, em última instância, sem sentido. nossa filiação à incerteza é explícita e inegável — há teóricos denominando o contemporâneo “sociedade do risco” — mas essa injunção faz que superstições ou saberes conjecturais como o econômico, o político ou o teológico, antes onipotentes, pareçam agora capítulos do cômico.
como o espírito objetivo de Hegel ou a noosfera de
a isso, na pós-modernidade, os indivíduos respondem
teilhard de Chardin, percebemos o quanto vamos pouco
com uma impressionante fé na potência de existir, do estar
a pouco substituindo a transcendência pelos “infinitos
aqui e agora, que refunda a socialidade fragmentária pelo
artificiais” do ciberespaço e o outro mundo pela pesquisa
seu inverso — o prazer de estar junto, a prioridade à vida
astronômica deste mesmo mundo, isto é, o quanto
afetiva, para além das astúcias do mercado e à margem do
prescindimos do divino, do radicalmente outro para ser,
universo institucional, como se vê na profusão das formas
levando uma existência sem fundamento na imanência
de associação, na convivialidade virtual, nas expressões
absoluta. o emblema verdejante da “Árvore da Vida”,
culturais que florescem nas periferias urbanas. a esse
com seu percurso otimista das raízes até a apoteose da
desbordamento algo insondável pertence, atualmente, o
copa florada, vai-se esmaecendo ante o realismo isento,
imprevisível mas generoso campo do possível.
mas também, paradoxalmente, alegre e fantasioso do Jair Ferreira dos Santos é ficcionista, poeta e ensaísta.
Jon Worth/ British Humanist association
rizoma deleuziano, tal a grama que se espalha pelo solo
Mensagem da associação Humanista Britânica: “Deus provavelmente não existe. então pare de se preocupar e curta a vida”
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ilustração Simon ducroquet
CIêNCIA
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onde estão os filósofos da ciência? aDonai s. sant’anna
o papel do filósofo da ciência hoje deve ser diferente do que foi até o final do século 19. no passado, a filosofia se ocupava do estudo epistemológico, metodológico e ontológico das ciências. Hoje há uma grande distância entre filósofos da ciência e cientistas. os primeiros conhecem cada vez menos ciência e cientistas são pouco influenciados por filósofos. albert einstein foi um dos últimos a levar a sério trabalhos de Kant, spinoza e Hume, entre outros. Quanto aos filósofos, percebe-se que estão defasados em relação aos mais recentes avanços científicos. apesar do tradicional trabalho do filósofo ainda ter sua importância, há um novo papel que tem despontado. Patrick suppes, da Stanford University, considera que é um legítimo trabalho filosófico o de resolver problemas fundamentais em ciência. e este trabalho pode ser exercido até por cientistas. Há séculos questões científicas têm sido analisadas pela filosofia, como os métodos de Galileu para observar corpos celestes ou as discussões sobre o caráter antropomórfico do conceito de força em mecânica. Mas uma área da física que gerou uma onda sem precedentes de questionamentos filosóficos foi a física quântica, que hoje classificamos em mecânica quântica e teoria quântica de campos. apesar de não haver definição clara para o conceito de mecânica quântica, esta teoria trata de fenômenos microscópicos envolvendo partículas em escala subatômica sob regime não-relativístico. ela lida basicamente com fenômenos microscópicos de baixas energias. Já as teorias quânticas de campos tratam da interação entre partículas subatômicas, como elétrons, e as associadas a campos, como fótons. tais teorias são relativísticas, pois estão sujeitas aos princípios da relatividade restrita de einstein.
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As teorias quânticas dependem, do ponto
detalhes de sistemas muito complexos. Já na
de vista experimental, de testes muito sensíveis
mecânica quântica, o formalismo e a experiência
para sua corroboração. Bolas de bilhar, que
sugerem uma natureza intrinsecamente proba-
podem servir a testes da validade de teorias
bilística, sem necessariamente a interferência
clássicas como a mecânica de Newton, podem
de variáveis que nos escondem informações
ser observadas diretamente, sem perturbações
sobre como o mundo é. E a não-localidade indica
significativas ao sistema observado. Já na
que há sistemas com duas ou mais partículas
física quântica, há uma extrema sensibilidade
elementares (subatômicas) que não podem ser
em experiências de laboratório. Simples atos
divididos em subsistemas independentes, como
de observação com aparelhos macroscópicos
se faz na mecânica clássica.
de laboratórios provocam interações com sistemas microscópicos observados, a ponto de não ser possível acompanhar, por exemplo, a trajetória de um elétron.
No entanto, há interpretações que contestam algumas dessas idéias. Um exemplo bem conhecido é a interpretação de de BroglieBohm, na qual partículas como elétrons têm
experimental
posições e velocidades bem definidas, sem
de fenômenos microscópicos fornece pistas
contradizer dados experimentais que sugerem
indiretas sobre este mundo, o resultado foi
uma idéia aparentemente contrária.
Como
o
conhecimento
a proliferação de teorias matemáticas que apenas tangenciam a realidade inerente ao misterioso mundo das partículas subatômicas. Tanto é assim que os modelos matemáticos empregados em física quântica têm dado margem à existência de inúmeras interpretações sobre o que realmente acontece nesse
Mas quando digo que filósofos da ciência estão defasados sobre os avanços mais recentes da física, tomo o exemplo das teorias quânticas que, ironicamente, foram responsáveis por grande proliferação de discussões filosóficas. Algumas questões de caráter fundamental a serem resolvidas são as seguintes:
microcosmo. 1) Se físicos associam produtos internos Na
formulação
usual
da
mecânica
quântica via espaços de Hilbert, surgem consequências que viabilizam interpretações curiosas, como as seguintes: (i) partículas elementares não têm posição ou velocidade bem definidas; (ii) o mundo microscópico é essencialmente probabilístico; (iii) o mundo das partículas subatômicas é não-local etc. O
no espaço de Hilbert a probabilidades em mecânica quântica, por que não tornam explícito qual é o espaço amostral (sigmaálgebra) que serve de domínio para uma função de probabilidades? Essa não deixa de ser uma questão metodológica do emprego de matemática em física que só pode ser resolvida com muita conta.
papel de probabilidades em mecânica quântica
C i ê ncia
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é usualmente considerado como sendo muito
2) A relação spin-estatística é amplamente
diferente do que acontece na mecânica
empregada no regime não-relativístico da
estatística clássica, na qual probabilidades
mecânica quântica. Mas as demonstrações
traduzem nossa ignorância sobre todos os
dessa relação são feitas no regime relativístico
da eletrodinâmica quântica. Afinal, a relação
partículas são tratadas simplesmente como
spin-estatística deve ser postulada no regime
modos de campos. Enquanto uma partícula é
não-relativístico (para justificar seu uso) ou
um fenômeno localizado, um campo se espalha
pode ser demonstrada a partir dos princípios
por toda uma região do espaço. Não há uma
da mecânica quântica?
contradição entre a matemática dos físicos sem
e o discurso empregado em livros e artigos?
interação, que permitem fotografar um objeto
O discurso do físico pode ser reescrito em
macroscópico sem incidir fótons sobre ele, são
termos de campos? Qual é o papel dos sólitons
conhecidas há mais de dez anos. No entanto,
nessa discussão?
3)
As
técnicas
de
medição
não encontro discussões filosóficas sérias
Há outras questões. Mas o alerta é
sobre esse bizarro fenômeno que coloca em
que enquanto existirem artigos de filosofia
xeque a idéia de que todo ato de medição deve
da ciência escritos apenas por um autor, a
implicar uma interação direta entre objeto
qualidade deles continuará sendo questionável.
medido e instrumento de medição.
Faz-se necessária uma aproximação com a
4) Toda a literatura sobre eletrodinâmica
atividade científica, para que resgatemos o
quântica está repleta de considerações sobre
papel da filosofia perante a ciência. Afinal, as
partículas como elétrons, fótons e até mesmo
ciências têm evoluído consideravelmente. Se
fótons virtuais, muitas vezes associados ao
isso não ocorrer, filósofos da ciência serão
estado de vácuo quântico. No entanto, na hora
no futuro meros guerreiros a lutarem contra
de se fazer as contas, percebe-se que tais
moinhos de vento.
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CIÊNCIA
Outros olhares em 2009 Célio Yano
Ano Internacional da Astronomia coincide com o 400° aniversário das primeiras observações feitas por Galileu Galilei
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Em 4,5 bilhões de anos, nenhum período na Terra concentrou tantas possibilidades de acesso a conhecimentos sobre o estudo dos astros como 2009. Explica-se: em assembleia geral, a Organização das Nações Unidas definiu que este seria o Ano Internacional da Astronomia e, por conta disso, 136 países decidiram que formariam uma rede, batizada IYA2009, para organizar milhares de atividades de divulgação científica relacionadas ao tema em todo o mundo. O ano de 2009 foi escolhido para coincidir com o 400º aniversário das primeiras observações feitas com um telescópio por Galileu Galilei (1564-1642). Se a comemoração parece exagerada à primeira vista, o astrônomo Marcos Danhoni lembra que se não fossem os experimentos do italiano, possivelmente a teoria geocêntrica, que diz que a Terra é o centro do universo, ainda estaria sendo ensinada nas escolas. “Galileu não apenas consolidou a base da astronomia moderna, mas descobriu conceitos sobre os quais a Física se sustenta até hoje”, explica o astrônomo, professor da Universidade Estadual de Maringá (UEM). “Arrisco dizer que, sem ele, Isaac Newton (1643-1727) não teria sido quem foi”. É verdade que Galileu não é considerado oficialmente o inventor do telescópio – até porque o título segue ainda sem consenso. O matemático teria baseado a criação de sua primeira luneta, em 1609, em um instrumento desenvolvido por um fabricante de lentes holandês chamado Hans Lippershey (1570-1619). A diferença é que, enquanto Lippershey anunciava a utilidade de seu tubo de lentes para fins militares, Galileu apontou a invenção, pela primeira vez, em direção ao céu. “Assim, ele descobriu diversos fenômenos até então desconhecidos, como, por exemplo, as manchas solares, as crateras e o relevo lunar, as fases de Vênus e a existência de satélites de Júpiter”, conta Danhoni. “As observações do italiano foram fundamentais, ainda, para a confirmação da teoria heliocêntrica, que diz que o Sol — não a Terra — é o centro do sistema solar”, acrescenta o astrônomo Marcelo Emílio, professor da Universidade Estadual Pôster do Ano Internacional da Astronomia
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de Ponta Grossa (UEPG).
nasa/ Universidade de Michigan
Pintura de Justus sustermans/ 1636/ Wikipedia
Há 400 anos, as observações astronômicas de Galileu Galilei formaram as bases da astronomia moderna
rascunho de carta de Galileu ao Doge de Veneza, oferecendo seu novo instrumento óptico para ser usado pelo exército. abaixo da carta, anotações sobre a posição de Júpiter e seus satélites.
divulgação científica e interdisciplinaridade
Sidereus Nuncius (Mensageiro sideral), tratado publicado por Galileu em 1610 com os resultados de suas observações
Para emílio, a observação astronômica deveria ser
o Conselho nacional de Desenvolvimento Científico
encarada como um programa cultural, da mesma forma que
e tecnológico (CnPq) abriu edital para financiar projetos
ir ao cinema. Danhoni acredita que outro ponto fundamental
de difusão e popularização da astronomia. a ação,
que as palestras e oficinas itinerantes devem atingir é a
com recursos de r$ 2 milhões, apoia a realização das
desmistificação do tema. “Pode parecer ultrapassado, mas
atividades relativas ao ano internacional da astronomia.
ainda hoje existem pessoas que encaram a astronomia
foram aprovados 75 projetos, destes, quatro são do
com preconceito, por fazerem confusão com a astrologia”,
Paraná, coordenados pelas universidades estaduais de Londrina, Maringá e Ponta Grossa e Universidade federal do Paraná. além de levar à sociedade novos conhecimentos da área e despertar a vocação científica entre o público leigo, as atividades do iYa2009 têm um objetivo mais básico, porém não menos importante, explica emílio: satisfazer a curiosidade que as pessoas têm sobre os astros.
afirma. o professor da UeM esclarece que a astronomia compõe as ciências materiais e, por isso, foi essencial para a consolidação de campos científicos tão fundamentais como a física e a matemática. “trata-se de uma das primeiras ciências da história da humanidade, que abriu espaço para um campo gigantesco de discussões”, descreve.
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Hubble Space Telescope/ NASA/ ESA
Júpiter e Ganimedes, observados há 400 anos por Galileu, são captados em detalhes pelo telescópio Hubble
Não é demais lembrar que foi a
(MCT) da UEL e vice-presidente do Gedal
constatação do movimento dos astros que
(Grupo de Estudo e Divulgação de Astronomia
determinou a organização do tempo como a
de Londrina), vai além: “São os astrônomos
utilizamos atualmente. Além disso, na óptica,
que, um dia, poderão responder qual a
mecânica ou geografia, conceitos básicos
origem da vida”.
só puderam ser consolidados a partir das observações celestes. “Sem a astronomia, não teríamos televisão, telefone celular ou internet”, sintetiza Emílio. “A partir da observação de fenômenos climáticos em planetas com condições atmosféricas semelhantes às terrestres, é possível compreender as mudanças por que passamos aqui na Terra”, exemplifica Danhoni. Já o físico Ferdinando Zapparoli, orientador do Museu de Ciência e Tecnologia
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Astronomia e História do Brasil E para quem pensa que o caráter interdisciplinar da astronomia para por aí, o historiador Magnus Roberto de Mello Pereira faz questão de mostrar que não é bem assim. Ele é um dos coordenadores do Centro de Documentação e Pesquisa de História dos Domínios Portugueses (Cedope), da UFPR, e o único da área da história entre os projetos aprovados pelo edital do CNPq no Paraná.
Durante todo este ano, o Clube de Astronomia Bruno Stock
do Colégio Estadual do Paraná promoverá sessões gratuitas no planetário de Curitiba e no observatório de Campo Magro
Sua proposta: investigar as expedições
avançadíssimo”, conta o historiador. “Basta
do matemático paulista Francisco José de
imaginar como estabelecer uma fronteira que
Lacerda e Almeida (1753-1798).
cruza grande parte do Brasil, lembrando que
Lacerda e Almeida foi o principal
naquela época não existia o GPS ainda.”
responsável pela demarcação dos limites
O trabalho de pesquisa do Cedope,
entre as terras sob domínio de Portugal
que será realizado ao longo de todo o Ano
e Espanha na América. Formado pela
Internacional da Astronomia, dará origem a
Universidade
brasileiro
uma publicação. Conforme Pereira, a grande
utilizou o estudo dos astros de base não
importância do estudo está no resgate da história
apenas nessa tarefa, mas também para
da ciência. “Não é apenas o conhecimento
outras jornadas estratégicas solicitadas
científico em si que interessa ao pesquisador; a
pela Coroa, como a travessia da África,
forma como a humanidade chegou a ele é que
à contra costa, desde Moçambique até
faz com que cientista perceba o sentido de seu
Angola. “O conhecimento que Portugal
trabalho.” Neste caso, ele explica, a intenção
detinha sobre orientação e posicionamento
é esclarecer os brasileiros que a história da
geográfico com base em corpos celestes era
astronomia não é feita apenas por europeus.
de
Coimbra,
o
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eventos no Paraná
no
Brasil,
programaram apresentações palestras,
quase
eventos em
200 de
planetários,
conferências,
núcleos
observação,
entre
ajuda dos céus
cursos, outras
iniciativas. no Paraná, a coordenação regional ficou sob a responsabilidade da UePG, e entre as ações estão as atividades no observatório astronômico, reprodução de experimentos científicos clássicos com estudantes do ensino fundamental e médio, exposições de vídeos e minioficinas. a Universidade estadual de Londrina (UeL) e o Grupo de estudo e Divulgação de astronomia de Londrina (Gedal) são as entidades que organizam as atividades na cidade do norte paranaense. entre os dias 31 de outubro e 1º de novembro, Londrina recebe ainda a 1ª edição do encontro Latinoamericano de astronomia. “o objetivo é reunir
se na astronomia moderna os pesquisadores fazem questão de separar fatos de mitos, nos primórdios das observações celestes não era bem assim. e entre as tribos indígenas brasileiras, a confusão entre ciência e religião perdura, segundo estudos do etnoastrônomo Germano Bruno afonso, professor aposentado do Departamento de física da Universidade federal do Paraná. etnoastronomia, também chamada de astronomia antropológica, é a ciência que procura entender as concepções sobre o universo de diferentes grupos étnicos. no Brasil, afonso conta que é o único profissional dedicado à área. “Depois que me formei em astronomia me inclinei para a especialidade devido ao interesse que tinha por índios”, conta.
astrônomos profissionais e amadores e demais
o pesquisador estuda principalmente tribos da
interessados para a discussão de assuntos de
etnia tupi-Guarani, da qual domina a língua. ele conta
interesse da comunidade científica”, explica o
que o nível de conhecimento astronômico desses índios
físico ferdinando Zapparoli.
assemelha-se ao dos babilônios, povo que ocupou
em maio, foi inaugurado no Parque tecnológico de itaipu, em foz do iguaçu, o Polo astronômico Casimiro Montenegro filho, com direito a observatório e planetário. na mesma
a Mesopotâmia (onde atualmente situa-se o iraque) entre 3800 e 529 a.C. “a observação dos astros pelos indígenas serve basicamente para orientar atividades, como prazos para colheita, duração das marés ou
cidade, o grupo amador spysky promove, arquivo germano bruno afonso
durante todo o ano, observações quinzenais do céu noturno em locais de livre acesso. eventos semelhantes acontecem mensalmente em toledo, organizados pelo grupo Luna. em Curitiba, haverá palestras, exposições, minioficinas e distribuição de material didático durante observações públicas. Já em Maringá, dois livros serão lançados este ano sobre o mesmo assunto, fruto do trabalho do Programa de educação tutorial da Universidade estadual de Maringá (UeM) e do programa Universidade sem fronteiras.
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na região do céu onde a astronomia oficial enxerga a constelação de cisne, índios guarani veem um colibri
arquivo germano bruno afonso
CIêNCIA
a chegada das chuvas”, explica. “as conclusões, no entanto, estão sempre associadas a mitos e lendas”. assim como na chamada ‘astronomia oficial’, todos os povos identificam imagens em grupos de estrelas e batizam as formações visuais, geralmente para se orientar. “Índios, pescadores, populações africanas, quilombolas... todos os grupos que pesquiso são capazes de localizar direções apenas observando a posição dos astros”, conta afonso. “Mas cada um define constelações diferentes, nas mesmas regiões do céu”, ressalta. até eventos raros, como eclipses e passagem
arte rupestre representando a passagem de um cometa pelo céu
de cometas, embora associados a figuras mitológicas, são previstos pela maior parte das populações nativas, segundo ele. Para conseguir todas essas informações, o etnoastrônomo procura, além de resgatar registros históricos, entrar em contato direto com os líderes tribais. “Minha intenção é manter viva a cultura científica indígena dos antecipados nas novas gerações”, afirma. “Muito do que foi cultivado ao longo de séculos de história, inclusive o próprio idioma, está se perdendo”, lamenta.
arquivo germano bruno afonso
constelação do homem velho Lenda conta que esposa corta a perna do marido e o mata para ficar com o cunhado. Com pena dele, os deuses o transformam em constelação. na segunda quinzena de dezembro, quando o Homem Velho (tuya’i) surge ao anoitecer, no lado leste, é início do verão para os índios do sul e início da estação chuvosa para os do norte. a constelação do Homem Velho é formada pelas constelações ocidentais do touro e de Órion. a cabeça do Homem Velho é formada pelas estrelas do aglomerado estelar Híades, em cuja direção se encontra aldebaran, a estrela mais brilhante da constelação do touro, de cor avermelhada. acima da cabeça do Homem Velho fica o aglomerado estelar das Plêiades, um penacho amarrado à cabeça. a estrela Bellatrix fica na virilha do Homem Velho e a estrela vermelha Beltegeuse representa o lugar em que sua perna foi cortada. o Cinturão de Órion (três Marias) formado pelas estrelas Mintaka, alnilam e alnitak representa o joelho da perna sadia. a estrela saiph representa o pé da perna sadia. o braço esquerdo do Homem Velho é constituído por estrelas do escudo de Órion.
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a ligação entre o ser humano e o universo é maior do que nos damos conta. os próprios átomos que compõem nosso corpo foram
nosso lugar no universo HeLen MenDes
forjados no interior de estrelas; o carbono em nossa pele; e o nitrogênio e o oxigênio que respiramos estiveram um dia no centro de estrelas que há muito já apagaram. um dos objetivos da declaração de 2009 como o ano internacional da astronomia é resgatar nossas profundas conexões com o universo. nessa celebração internacional da astronomia, o brasil é o segundo país em número de atividades – só está atrás dos estados unidos. a programação completa pode ser conferida no endereço www.astronomia2009.org.br. entre as contribuições brasileiras à astronomia estão os estudos do astrônomo augusto damineli sobre a estrela eta carinae, que têm repercussão internacional. a estrela, a maior e mais brilhante da via láctea, além de ser uma das mais incomuns, está a 7500 anos-luz da terra e sua massa é de 100 a 150 vezes a do sol. recentemente, um apagão em eta carinae reforçou as teorias de damineli sobre a estrela. o apagão aconteceu exatamente na data prevista pelo astrônomo, 13 de janeiro de 2009, eliminando qualquer dúvida que ainda restava sobre a natureza dupla da estrela – eta carinae, na verdade, não é uma estrela única, mas sim um sistema de duas estrelas. outras importantes contribuições brasileiras à astronomia são a descoberta da maior estrela de diamante por Kepler de oliveira, uma série de trabalhos sobre a evolução da abundância dos elementos químicos por beatriz barbuy, estudos sobre a abundância dos elementos na via láctea por Walter maciel, a descoberta de grande número de estrelas variáveis cataclísmicas por João Steiner e de buracos negros gigantes por thaisa Storchi bergmann. além desses, há cerca de 70 anos, mário Schemberg descobriu o efeito urca, que regula a explosão das supernovas e mediu, com precisão, o tempo de vida do Sol. damineli, professor do iag-uSP (instituto de astronomia, geociências e ciências atmosféricas) e representante do brasil para o ano internacional da astronomia, conversou com a revista Sem Fronteiras sobre a profissão de astrônomo, seus estudos sobre a estrela eta carinae e o ano internacional da astronomia. no momento, o astrônomo e sua equipe estudam a via láctea, e pretendem localizar, de uma vez por todas, por onde passam os braços da galáxia. nascido em ibiporã, Paraná, o astrônomo se lembra dos velhos tempos no interior plantando e colhendo em um sítio na serra de Parati, para onde vai todo fim de semana. ele afirma que quando a internet chegar à roça, vai morar lá, já que telescópios, como o Soar, por exemplo, podem ser operados pela internet.
imagem da nebulosa Carinae, onde se encontra o sistema binário de eta Carinae, uma das maiores e mais luminosas da Via Láctea, objeto de estudo do astrônomo augusto Damineli
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hubble Space telescope/ naSa/ eSa
CIêNCIA
SF
O que a astronomia tem a ver com a nossa
desses é como se tivéssemos um dinossauro vivo no fundo do quintal.
vida? AugustoDamineli Quase tudo: toda a energia que circula na Terra vem do céu, toda a matéria
SF
veio de diferentes astros, como estrelas
superará o brilho de todas as galáxias do universo
mortas, a água veio dos cometas. Existem
local e será visível em todas elas. Como acontecerá
muitos conhecimentos práticos, como a
essa catástrofe astronômica?
marcação do tempo (calendários, estações do ano) e mapeamento do espaço (essencial para as navegações) que vieram da astronomia. Nossas raízes se encaixam mais fundo no céu do que no solo terrestre.
A explosão final da estrela Eta Carinae
AugustoDamineli Como ela tem alta rotação, ao acabar seu combustível nuclear, ela vai se achatar em forma de um disco girando rapidamente. Ao se formar um buraco negro no centro, ela emitirá um feixe de raios gama, paralelo ao eixo de rotação, que será visto dentro do raio
SF
Neste ano, um apagão na estrela Eta
Carinae aconteceu no dia em que o senhor
de visibilidade de nosso Universo. Felizmente, a Terra está fora da direção desse feixe.
havia previsto, reforçando suas teorias sobre a estrela. Como aconteceu esse apagão?
SF
Qual a influência das descobertas de Galileu,
AugustoDamineli O apagão aconteceu de fato
400 anos atrás, na astronomia e na ciência em
no dia previsto, resolvendo de forma definitiva
sua totalidade?
a querela que existia sobre a natureza dupla de Eta Carinae. O interessante foi que ela apagou com a precisão de um relógio, mas “acordou” 25 dias antes da data prevista. Isso não invalida a teoria binária, mas mostra que o apagão tem algum ingrediente a mais que
AugustoDamineli Galileu contribuiu com o método científico, que coloca as hipóteses sob prova experimental. Alem disso, usou a luneta para demonstrar que os astros são feitos de matéria comum. Também provou que os planetas
um eclipse. Ainda não sabemos tudo o que se
giram em torno do Sol, segundo a teoria de
passa durante o “apagão”.
Copérnico, e não em torno da Terra, como se acreditava há milênios.
SF O senhor foi um dos primeiros astrônomos a sugerir que Eta Carinae seria um sistema
SF
duplo, e não uma estrela única. Hoje há
como o Ano Internacional da Astronomia?
consenso sobre essa questão?
AugustoDamineli O objetivo é que cada pessoa
AugustoDamineli Sim, hoje ninguém tem a
redescubra seu lugar no Universo, sua intimidade
menor dúvida de que se trata de um sistema
cósmica. Que nosso cotidiano, que parece
duplo. A questão pendente é determinar as
minúsculo, está ligado a um cenário imenso no
massas das duas estrelas.
tempo e no espaço. Ao travar relação com esse
Qual é o propósito da declaração de 2009
cenário, a pessoa faz crescer seu espaço interior.
SF
Qual a importância de se estudar uma
estrela como Eta Carinae?
SF
AugustoDamineli Ela é um exemplar de
AugustoDamineli
uma classe de estrelas “supermassivas”,
desenvolvimento extraordinário nessa área.
que foi muito abundante nos primórdios do
Contamos com acesso modesto a telescópios
Universo. Essas estrelas tiveram grande papel
de grande porte, mas a situação está mudando
na evolução das galáxias e dos elementos
rapidamente. Temos estudantes talentosos, o
químicos. O fato de termos hoje um exemplar
que promete um futuro brilhante.
Como é ser astrônomo no Brasil? O
Brasil
tem
tido
um
semfronteiras |
27
CAPA
as engrenagens da crise CArLOS DrUMMOnD
na mÍDia E na intErnEt, DisCUtE-sE qUEm DEvE sEr rEsponsabiliZaDo
Da inDiGnação são mUitos E há listas DE sUpostos réUs.
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ilustração Simon Ducroquet
pEla traGéDia. os alvos
O
por
e derrubado o Glass-Steagal Act1,
do
figuram em várias listas. instituições
mercado financeiro e chefes de governo.
como os bancos de investimento,
O ex-presidente do Lehman Brothers,
que multiplicaram o risco dos títulos
Dick fuld, e o ex-secretário do Tesouro
subprime no mercado secundário, de
americano, Henry Paulson, que permitiu
revenda de ativos2; os hedge funds3 e os
a falência desse banco, abrem a lista,
administradores de produtos financeiros
seguidos do ex-presidente do federal
complexos e opacos estão entre os
reserve (fed, o banco central americano),
campeões de impopularidade.
exemplo,
jornal
britânico
culpou
Times,
personalidades
Alan Greenspan, acusado de favorecer
Muito além da linearidade das
a farra de crédito barato e fácil com a
listas, há um conjunto complexo de
sua política de juros baixos. O primeiro-
agentes e de causas inter-relacionadas
ministro britânico, Gordon Brown, é
na origem da crise. A elevação contínua
acusado de ter feito quase nada para
do consumo, a partir da década de
evitar a crise, que identificara há dez anos
1990, proporcionada, de um lado,
durante uma palestra em Harvard. O ex-
por juros baixos e dólar valorizado,
presidente George Bush, que governou
e de outro, pela disponibilidade de
os Estados Unidos durante a expansão
bens de consumo, ações e imóveis,
do crédito e a crise do mercado de
em abundância e baratos, acionou
hipotecas subprime (de má qualidade),
um circuito de oferta de crédito e
é presença obrigatória na maioria das
de valorização de ativos que nem
listas. O levantamento do Times inclui a diretora da Standard & Poor’s até 2007, Kathleen Corbet, por comandar uma das agências de avaliação de riscos que consideraram bons vários créditos podres
das
instituições
financeiras,
contribuindo para iludir investidores. Entre os responsáveis pela crise consta Angelo Mozila, ex-presidente da maior emissora de hipotecas subprime (de baixa qualidade) dos EUA, a Countrywide, acusado de estimular a concessão de crédito para tomadores que não tinham condições de honrá-los.
os políticos nem o Estado quiseram interromper. O consumidor americano estava
adorando
acumular
ações,
casas, carros, barcos e os políticos não queriam se indispor com o seu eleitorado. A exemplo do que ocorreu no final do século 19, o consumidor/ investidor não se importava com o risco de a festa um dia acabar. Tampouco se preocupou com a roubalheira de não poucas empresas e instituições financeiras, estimulada pelo afrouxamento da regulamentação, e se recusava a pensar que poderia figurar entre as suas vítimas. Mais do que isso:
O ex-presidente Bill Clinton e seu
em uma quantidade significativa de
secretário do Tesouro, robert rubin,
casos, identificou-se a existência de
acusados de terem inflado a bolha de
uma cumplicidade entre vítimas e
ações de tecnologia dos anos 1990
golpistas.
1 medida tomada pelo Congresso americano em 1933 e que estabeleceu o Federal Deposit insurance Corporation e ajudou a combater a especulação dos bancos, proposta pelo senador Carter Glass e pelo deputado henry steagall. o ato criou o seguro de depósito e proibiu bancos comerciais de lançarem e negociarem ações, forçando a separação dos ramos comercial e de investimento de uma mesma instituição.
2 ativos são bens e direitos de recebimento de empresas e de bancos. no balanço contábil, devem ter o mesmo valor total que os passivos, que são as obrigações a pagar. 3 Fundos mútuos organizados como sociedades limitadas, surgidos em 1972 e inicialmente dedicados a proteger operações contra riscos de oscilação de preços. tornaram-se famosos com as suas operações de investimento de alto risco e o uso de métodos especulativos para obter grandes lucros.
semfrOnTEirAS |
29
Fator China-EUa O
aumento
sem
precedentes
do
consumo nos Estados Unidos nos últimos anos parece ser a causa mais abrangente do terremoto econômico e financeiro. Tal fenômeno, entretanto, só foi possível no contexto das relações econômicas e financeiras de Estados Unidos e China. Há muitos anos os EUA precisam tomar emprestados do resto do mundo bilhões para cobrir o déficit do Tesouro. A China,
A simbiose explosiva
empréstimos e, ao mesmo tempo, o aumento da lucratividade das empresas. O
fenômeno,
relativamente
novo,
é uma economia sino-americana, como a denomina há anos o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, um dos primeiros a antecipar a presente crise em artigo escrito com o atual presidente do BnDES, Luciano Coutinho, publicado em 1998.
em situação oposta, tem obtido superávits
O sistema sino-americano continha,
em conta-corrente e se consolidou como a
no entanto, uma armadilha. A simbiose
maior emprestadora de dinheiro para os
financeira e econômica favoreceu o surto de
Estados Unidos.
empréstimos bancários e a multiplicação de
Enquanto a poupança chinesa permitiu
derivativos - ativos que derivam o seu valor
conservar as taxas de juros americanas
de outros ativos4 – e de hedge funds a partir
baixas, as importações da China permitiram
do ano 2000. Também contribuiu para o
aos EUA manter durante anos a inflação
inchaço do mercado de hipotecas, oferecidas
e os salários baixos nos Estados Unidos.
até para quem não tinha emprego, bens e
O
renda para pagá-las.
foi
o
barateamento
dos
SXC
resultado
4 Por exemplo, uma opção de compra de ações do Google é um derivativo que obtém o seu valor das ações do Google que podem ser compradas no vencimento do contrato de opção de compra, se esta opção for exercida.
As importações da China permitiram aos EUA manter durante anos a inflação e os salários baixos nos Estados Unidos
30 | semfrOnTEirAS
inovação E risCo A crise das hipotecas subprime sela o final trágico de quase meio século de inovações na forma de atuação dos bancos e que resultou na chamada financeirização da economia. O colapso financeiro e econômico concluiu a demolição do arcabouço regulatório construído depois da quebra da Bolsa de nova iorque em 1929.
A destruição das normas trouxeram mais risco e maior especulação para o sistema financeiro e a economia em geral. Cinco certificados
anos de
depois
do
depósitos
advento negociáveis,
dos o
professor de finanças e diretor de pesquisa do instituto de Estudos de negócios para a América Latina do Babson College, John C.
Com o Glass-Steagall Act e o New Deal,
Edmunds, defendeu em um artigo que a riqueza
o grande plano de recuperação econômica e
poderia ser aumentada sem criação nem
moralização financeira do presidente franklin
fabricação de coisa alguma, exceto de papéis
roosevelt, posto em prática entre 1933 e 1939, os
que rearranjassem e adicionassem valor e
bancos entenderam que seguir a nova legislação era uma questão de sobrevivência. não havia outro modo de reconquistar a confiança do público e os lucros. Entre as décadas de 1930 e de 1950, as ações, como regra, deixaram de financiar a especulação e passaram a ser fonte de recursos para projetos como a fabricação de motores, a construção de siderúrgicas e a expansão de novos negócios, como a produção
Em 1961, os bancos encontraram uma maneira de contornar a regulamentação relativa às taxas de juros. De acordo com a lei, não podiam remunerar depósitos de até 30 dias. Entretanto, vendessem
certificados
de
depósito
negociáveis com maturação superior a 30 dias, poderiam
existentes. Era a securitização de ativos, que se espalhou com grande velocidade, especialmente nos Estados Unidos. Estava formado o embrião financeiro da crise atual. “Depois da desregulamentação financeira, da expansão da chamada finança direta - que é a finança securitizada, em que predomina o crédito lastreado em securities
de computadores.
se
liquidez a operações de empréstimo novas ou já
remunerá-los.
Esses
certificados
também poderiam ser transacionados.
ou títulos negociáveis no mercado -, portanto depois que se fez aquilo que se chamou de descompressão ou desrepressão financeira, é que as crises começaram a se suceder”, observa Belluzzo. O negócio da securitização compreende duas categorias principais de produtos: títulos baseados em hipotecas (Mortgage-Backed Securities ou
O novo instrumento possibilitava aos
MBS) e títulos baseados em ativos (Asset-Backed
bancos correr mundo para levantar dinheiro com
Securities ou ABS). Os ABS incluem, em um punhado
a venda de certificados de depósitos. A inovação
de subcategorias, dois produtos frequentemente
proporcionara às empresas retorno crescente
ligados à habitação: obrigações baseadas em
para os seus depósitos. Os bancos mudaram
títulos (Collateralized Debt Obligations ou CDOs5)
o núcleo da sua ação da atividade tipicamente
e empréstimos baseados em ativos imobiliários
bancária, de captação de depósitos e realização
(Home-Equity Loans ou HELs). Estes são como
de empréstimos, para a de negociação de
que uma segunda hipoteca, na qual o dinheiro
dinheiro, mais lucrativa. Portfólios cada vez
levantado corresponde a um valor inferior ao da
mais diversificados e de tamanhos crescentes
operação original.
5 Título de investimento lastreado em um conjunto de outros títulos, o CDO é um personagemsímbolo da crise. O seu lastro é um conjunto de títulos, empréstimos e outros ativos, considerados tranches ou fatias. Cada fatia tem maturidade diferente e risco a ela associado. Quanto maior o risco, mais o CDO paga a quem o comprou. Esta última característica atraiu milhares de investidores, pouco interessados em conhecer o que havia por trás da sigla.
semfrOnTEirAS |
31
Encyclopedia Britannica
O lado perverso desse mecanismo de ampliação do crédito foi que empresas, instituições financeiras e governo estavam, todos eles, transferindo riscos e custos para os orçamentos das famílias comuns. A securitização era tão flexível que passou a ser usada para financiamento de receitas de todo tipo de receita futura. Os ingressos a receber de cartões de crédito, aluguéis de escritórios, taxas portuárias, bilheterias de estádios e de postos de gasolina eram trocados antecipadamente por dinheiro no mercado financeiro, com um desconto em
Fila do pão em nova iorque durante a Crise de 29
relação à entrada efetiva no caixa que ainda iria ocorrer. Os títulos representativos dessas Dorothea Lange
operações, as securities, eram, por sua vez, negociadas entre os bancos. Como boa parte apresentava riscos, inventou-se um sistema de seguros. O comprador de um título securitizado podia comprar um contrato de seguro que supostamente o protegeria contra a inadimplência do tomador. Esse seguro (Credit Default Swap, ou CDS), no entanto, diferentemente do seguro tradicional emitido por uma seguradora, podia ser comprado e vendido livremente no mercado. Os diferenciais de preços dos CDS foram amplamente aproveitados em movimentos especulativos dos hedge funds. Para complicar, muitas agências de avaliação de risco classificaram positivamente ativos muito ruins. O que não é de estranhar, visto que essas agências rotineiramente são pagas pelas mesmas instituições cujos riscos de ativos elas têm que aferir. Os bancos se tornaram superalavancados e subcapitalizados, em decorrência da adesão a esses incentivos perversos que os tornaram cada vez menos cautelosos e mais ambiciosos, até a explosão da crise das hipotecas subprime.
32 | semfrOnTEirAS
Cena da Depressão de 1930: Florence thompson, a “mãe imigrante”
O sistema financeiro submerso
A abundância de liquidez, a escassez de regulamen-
mercados de derivativos, emitindo títulos de securitização
tação e a fome de lucros e de consumo estimularam
de créditos e criando veículos especiais de investimento,
a informalização crescente de boa parte do sistema
os Special Investments Vehicles, SiV. Tratava-se, na
financeiro. O resultado foi o entrelaçamento crescente das
prática, de um conjunto de instituições que funcionava
instituições regulares do sistema financeiro com as que
como banco, sem sê-lo, captando recursos no curto prazo,
estavam longe do alcance da supervisão bancária feita pelas
operando altamente alavancadas e investindo em ativos
autoridades e integram o chamado global shadow banking
de longo prazo e ilíquidos. Displicentemente reguladas
system, um sistema bancário paralelo. As estrelas desse
e supervisionadas, sem reservas de capital, sem acesso
mundo semissubmerso, os hedge funds, foram classificadas
aos seguros de depósitos, às operações de redesconto e
como “armas de destruição em massa” pelo megainvestidor
às linhas de empréstimos de última instância dos bancos
Warren Buffet. Pouco fiscalizados, eram apropriados para a
centrais, eram muito vulneráveis, tanto a corridas de
expansão sem limites das operações financeiras.
investidores como a desequilíbrios patrimoniais.
As autoridades bancárias e do mercado de capitais dos
A dependência crescente das empresas, desde os
Estados Unidos fizeram vista grossa a essa informalização.
anos 60, de operações no mercado de capitais contribuiria
O fed e a Securities Exchange Commision (SEC), a comissão
para tornar, necessariamente, crises financeiras de
de valores mobiliários americana, atuaram com o apoio tácito
grandes proporções em colapsos da economia real. Jamais
do Congresso e mesmo da sociedade, nesse dar de costas à
as finanças tiveram tanta importância na economia, no dia
transgressão. A continuidade do consumo e do investimento
a dia das empresas e dos cidadãos, nas ações dos governos
das famílias interessava tanto a elas próprias quanto aos
e em uma quantidade infindável de decisões.
políticos, que sancionavam tudo.
A crise, que de início se mostrou essencialmente
Como explicam Marcos Antonio Macedo Cintra e Maryse
estadunidense e financeira, espraiou-se com grande rapidez
farhi, professores do instituto de Economia da Unicamp, no
pelo mundo e em direção à chamada economia real. Da
estudo A Crise financeira e o Global Shadow Banking Sistem,
Europa à Ásia e ao Brasil, não parece ter deixado nenhuma
os bancos buscaram diversas formas de retirar os riscos de
parte do mundo incólume. no Brasil, o crescimento
crédito de seus balanços com o objetivo de ampliar suas
acumulado dos últimos anos, embora discreto em termos
operações sem ter de reservar os coeficientes de capital
históricos, permitiu que a economia se encontrasse
requeridos pelos Acordos de Basiléia. fizeram isso de diversas
relativamente fortalecida quando da eclosão e difusão
maneiras: adquirindo proteção contra os riscos de crédito nos
do colapso. O sistema financeiro nacional mostrouse relativamente sólido em um cenário mundial de
Stock Photo / Kirby Hamilton
Encyclopedia Britannica
Dorothea Lange
o laDo EsCUro
insolvências. O mercado interno grande, embora limitado pela elevada concentração de renda, não deixa o país refém das exportações. A significativa diversificação e a complexidade da estrutura econômica brasileira, em que pese a inexistência de política industrial efetiva, resultam em uma capacidade de produção menos dependente de compras externas do que em países muito especializados que se tornaram pouco mais que plataformas de exportação. Mais resistente do que a média dos países, o Brasil não tinha como ficar de fora da globalização do desemprego, da
riscos e custos da crise foram transferidos para os orçamentos das famílias comuns
queda de investimentos, da insegurança e do estreitamento de horizontes que marcam a crise atual.
semfrOnTEirAS |
33
númEros Da CrisE Do império americano à simbiose sino-americana
Como se chegou à situação atual Participação do setor financeiro nos lucros das empresas de todos os setores nos Estados Unidos
45
35
40
30
China
Percent
Poupança líquida nacional como percentagem do Produto nacional Bruto de 1970 a 2006 China – Estados Unidos
Estados Unidos
35
25
30 20
25
15
20 15
10
10
5
5 0 1975
1980
1985
1990
1995
2000
19
1970
19 47 50 19 53 19 56 19 59 19 62 19 65 19 68 19 71 19 74 19 77 19 80 19 83 19 86 19 89 19 92 19 95 19 98 20 01 20 04 20 07
0 2005
fOnTE: The Ascent of Money, de niall ferguson
fOnTE: Bureau of Economic Analysis, national income and Product Accounts
A derrocada da Bolsa de Ações de Tecnologia
A escalada do endividamento americano
Índice nASDAQ de 1999 a 2002
Dívida total do mercado de crédito como parte do Produto interno Bruto dos Estados Unidos
4,000
3,000
2,000
1,000
01
:J
an Ap r Ju ly O 20 ct 02 :J an Ap r Ju ly O ct
ly
ct
O 20
ay
Ju
fe b
M
pt De c
Se
19
99
:J
an Ap r
0
fOnTE: Economic report of the President, 2003
335% 2006 304% 2004
300% 287% Desvalorização do dólar em 40% pelo presidente franklin Delano roosevelt
250
269% Auge do mercado de ações em 2000
200 Percent
5,000
Total credit market debt as share of U. S. gross dosmestic products
6,000
176% Auge do mercado de ações em 1929
150
100 0
‘24
‘44
‘64
‘84
fOnTE: Barron’s, 21 de fevereiro 2005, atualizada para 2006
34 | semfrOnTEirAS
‘04
A substituição da bolha de ações pela de imóveis como base da criação de riqueza nos estados Unidos
Os bancos e o negócio de hipotecas (1952-2004) Ativos relacionados a hipotecas sobre ativos totais, em %
Valor das ações e dos imóveis como percentagem do Produto nacional Bruto 150%
70%
60
125
50
Habitação 40
100
30
75
20
50
Ações 10
25
‘55
‘60
‘65
‘70
‘75
‘80
‘85
‘90
‘95
‘00
‘05
fOnTE: northern Trust Company
recessão 0 ‘95
‘96
‘97
‘98
‘99
‘00
‘01
‘02
‘03
‘04
A alta dos preços de imóveis residenciais entre 1995 e 2006
A redução dos gastos não essenciais das famílias $ 80,000
70,000
60,000
Preços médios por unidade familiar no Estado da Califórnia Gastos não essenciais Custos fixos (hipotecas,
$ 18,110
escola, seguro saúde,
$ 600,000 550,000
carro, impostos)
500,000 50,000
$ 55,660
450,000 400,000
40,000
$ 19,560
350,000 300,000
30,000
250,000 20,000
200,000
$ 22,890
150,000 Dec. Sept. June Mar. Dec. Sept. June Mar. Dec. Sept. June Mar. Dec. Sept. June ‘95 ‘96 ‘97 ‘98 ‘98 ‘99 ‘00 ‘01 ‘01 ‘02 ‘03 ‘04 ‘04 ‘05 ‘06
10,000
fOnTE: California Association of realtors
0
famílias com uma
famílias com duas
fonte de renda,
fontes de renda,
início dos anos 70
início dos anos 2000
fOnTE: Elizabeth Warren, “The Middle Class on the Precipice”, Harvard Magazine, Janeiro-fevereiro 2006, p. 30. inflation-adjusted. Updated from sources cited in Warren and Tyagi, The Two-income Trap
semfrOnTEirAS |
35
Filosofando sobre a crise
os EConomistas Estão UsanDo três lEtras para DEsCrEvEr a CrisE mUnDial: V, U E L. no V, a EConomia Cai, batE E volta, E tEm DUração méDia DE oito mEsEs. Está Fora, portanto. no U, há Uma CrisE intErmEDiária, DE Um oU Dois anos. no L, a EConomia Cai E FiCa. para o EConomista EDUarDo GiannEtti, a DisCUssão FiCa EntrE o U E o L. “é mais provávEl qUE sEja o U. não é Uma DEprEssão.”
36 | semfrOnTEirAS
Em entrevista recente a uma emissora de televisão o economista Eduardo Giannetti fez uma série de considerações
que esse psiquismo pré-racional é uma herança do ambiente ancestral.”
sobre a crise econômica, crenças e comportamentos. Segundo
O desejo mais ardente:
ele, a melhor imagem para o momento é uma metáfora de
“Há um filósofo francês (Malebranche, século XVII) que
Avicena, filósofo árabe do século 11: “Uma pessoa caminha
diz que o desejo mais ardente do ser humano é ocupar um
por uma tábua estreita sem nenhuma dificuldade enquanto
lugar de honra na mente de seu semelhante, e o econômico é
acredita que a tábua está apoiada no solo. No momento em
uma moeda para isso, você se diferencia dos outros e ocupa
que essa pessoa se dá conta de que a tábua está suspensa
um lugar de honra na mente das pessoas que importam
sobre o abismo ela vacila e despenca. Com a realidade objetiva
para você sendo vitorioso financeiro e econômico. Pode
é a mesma coisa. O mercado financeiro vinha caminhando feliz
ser o poder político, a beleza física, até a sabedoria, o
da vida numa tábua estreita acreditando que o mundo tinha
conhecimento, a virtude. A moeda dominante nesse jogo é o
solidez. De repente, apareceu uma crise do mercado imobiliário
econômico. Petrônio, um satírico romano, coloca na boca de
e, espera aí, a tábua não está tão firme assim, quebrou, é o
um milionário romano a seguinte frase: só me interessam os
abismo”. A seguir, outros trechos dessa entrevista:
bens que despertam no populacho a inveja de mim por possui-
Economia e ética: “A economia surgiu da filosofia moral, que é o estudo
los.” Quem faz esse relato é Marco Pólo, em suas viagens.
da ação humana na vida prática. Por que algumas pessoas
Mundo virtual, apego ao dinheiro e o neto de Gengis Khan:
valorizam mais o sucesso financeiro, outras a afetividade, a
“(...) é a mesma crise que você tem com o Real no seu
religião? De onde vêm a nossos valores, as nossas preferências,
bolso, é um papel pintado. Se as pessoas deixarem de acreditar
que tipo de sacrifício estamos dispostos a fazer agora para
que aquilo vale, ele deixa de valer. Muita coisa na vida é assim.
melhorar no futuro? São questões muito amplas e ligadas em
É um símbolo de valor. Teve um imperador mongol, o neto do
grande parte à ética. Todos os grandes economistas entendiam
Gengis Khan, que inventou um dinheiro que era uma casca de
a economia como componente de uma reflexão ética.”
árvore com o selo da família imperial. Quem não o aceitasse
Economia e liberdade: “No passado, os economistas achavam que o progresso econômico libertaria o ser humano da escravidão econômica, que nós ficaríamos livres para perseguir outros valores e
como pagamento era morto, esse dinheiro não podia ser usado para pagar os mercadores externos, aí era em ouro ou e prata. Ele só é aceito como valor se as pessoas acreditam ou são forçadas a acreditar, como era o caso da Mongólia.”
outras realizações, mas na prática não foi o que aconteceu.
“Nós vivemos nesse mundo, a diferença é que agora
Eu faço um paralelo com a saúde: quanto mais saudável é uma
existe uma tecnologia e uma criatividade financeira furiosa,
pessoa mais obcecada ela fica; se ela não tem saúde evidente
esses banqueiros são incrivelmente criativos para inventar
que isso domina, mas no momento em que ela se recupera
possibilidades de especulação - mercado futuro de café, de
isso a liberta, em tese, para viver a sua vida plenamente. Na
câmbio; você troca câmbio por juro, pega muitas hipotecas,
economia isso não acontece. A economia que deveria libertar
põe todas numa cesta, vende como uma dívida, e isso gera um
o ser humano parece que o enreda e o aprisiona cada vez
colateral que vai gerar outro financiamento; você pega em
mais.”
um empréstimo, compra ações, aí você oferece suas ações
A competição por bens e a herança ancestral: “A competição entre as pessoas não é por bens que possam ser democratizados, mas por aqueles que as diferenciam umas das outras, os chamados bens posicionais. É o paradoxo da corrida armamentista: dois países que estão
como garantia para um outro empréstimo, aí você compra um imóvel, pega o imóvel e o oferece como garantia para um outro empréstimo, e aí vai alavancando, não tem fim. Tem bancos que emprestaram vinte vezes o que tinham.” O ideal agora é...
se armando e investindo cada vez mais em armas deveriam se
“O ideal para o mundo agora é que os americanos poupem
sentir cada vez mais seguros, mas na medida em que os outros
mais e consumam menos e os asiáticos consumam mais e
países também se armam eles investem cada vez mais e se
poupem menos, aí o mundo volta a um certo equilíbrio.”
sentem cada vez mais inseguros. O jovem que tem sucesso no mercado financeiro e compra um carro importado último
Eduardo Giannetti é professor do Insper - Instituto de Ensino e Pesquisa
tipo passa a ser visto de maneira diferente pelas meninas.
de São Paulo.
Tem muito de socioideologia nessa estória, ela tenta mostrar
(Entrevista concedida em maio passado, à jornalista Marília Gabriela.)
semfrOnTEirAS |
37
o paraná na economia do conhecimento LyGiA PUPATTO
Muito tem se falado sobre a crise dos mercados
Para isso, precisamos compreender para onde se deslocou
financeiros, que se torna, gradativamente, uma crise geral
o verdadeiro poder que move suas engrenagens: é o
da economia e produção, emprego e renda da população.
poder da informação e do conhecimento. O domínio da
inescapável, também, o quase chavão das oportunidades
ciência, da tecnologia e da inovação vem significando, ao
que são geradas nesses momentos. no entanto, é nosso
longo de décadas, a detenção da riqueza, da supremacia
dever tentar sair um pouco do lugar comum e aprofundar a
e da soberania dos países mais ricos do planeta. Do
reflexão sobre o tempo que estamos vivendo e como vamos
horror da máquina de guerra à produção de alimentos,
sair dele.
das comunicações ao desenvolvimento de remédios,
na verdade, já antes da crise, nas últimas décadas,
dos transportes ao sucesso nas trocas comerciais. Este
vínhamos construindo pouco a pouco um mundo impossível:
é o verdadeiro poder, e democratizá-lo pode significar a
economicamente
construção de um mundo melhor, um sonho tão antigo
irracional,
socialmente
injusto
e
ambientalmente insustentável. Só não sabemos muito bem como pudemos caminhar tão persistentemente e durante
quanto a própria humanidade. Por
isso,
temos
falado
no
que
se
chama
tanto tempo para um desastre anunciado... De toda forma,
economia do conhecimento (esse termo deriva da
estamos evoluindo lentamente. De padrões de consumo
observação de que após a Segunda Guerra Mundial os
obscenos nos países ricos, níveis de poluição insuportáveis e
processos produtivos têm dependido cada vez mais de
desigualdades generalizadas e crescentes, expressões como
conhecimento). Sua estratégia global não é difícil de ser
consumo consciente, comércio justo, produção em ciclo
entendida: (a) transição para uma economia baseada
fechado, química verde, resíduos zero, energias renováveis
no conhecimento pela universalização da sociedade da
e economias locais vivas estão cada vez mais presentes em
informação, fomento ao desenvolvimento e inovação
nosso vocabulário. O que antes parecia utopia, hoje começa
para competitividade nos mercados; (b) modernização do
a delinear um mundo diferente, e possível.
modelo social com investimentos nas pessoas e combate
O prognóstico de Ladislau Dowbor, em artigo para o
à exclusão, promovendo a igualdade, a paz e a qualidade
Le Monde Diplomatique sobre a crise, é muito bom: “Tentar
de vida; e (c) políticas macroeconômicas articuladas para
restabelecer o sistema, irrigando-o com grande volume de
o crescimento sustentável, compatíveis com o consumo
verbas públicas não tem muito sentido. não se trata mais de
de recursos, com renovação garantida. não é pouco, mas
assegurar apenas que a intermediação financeira funcione,
devemos acreditar que é possível.
mas que a ajuda flua para onde é necessária, para o bem da humanidade e do planeta”.
Devemos acreditar que é possível inclusive porque essa estratégia não pode prescindir de um modelo aberto
Acredito que devemos ser ainda mais realistas se
e democrático de coordenação que lhe garanta uma
desejamos realmente mudar este sistema em longo prazo.
direção coerente, o acompanhamento do progresso das
38 | semfrOnTEirAS
ações e a salvaguarda da dimensão cultural, pelo reforço
Especialmente,
estamos
implementando
vários
da cidadania, promoção da igualdade de gênero e proteção
projetos voltados à melhoria da competitividade da micro
às diversidades étnica, linguística e religiosa. Aí está boa
e pequena empresa, com o desenvolvimento de novos
parcela da responsabilidade dos governos, que devem fazer
produtos, novos processos e melhorias de gestão, como
a sua parte.
o Extensão Tecnológica Empresarial, Extensão industrial
Estamos tentando fazer a nossa parte. O Governo do
Exportadora, Pró-APL e outros. Contribuímos, assim, para
Estado, por meio da SETi (Secretaria de Estado da Ciência,
o desenvolvimento econômico do nosso Estado, para a
Tecnologia e Ensino Superior), está desenvolvendo um
geração de melhores empregos e o crescimento da renda
conjunto importante de projetos dentro do programa
da população.
Universidade Sem fronteiras, com investimentos de r$
A matriz determinante é uma economia não só mais
40 milhões e que tem por objetivo levar a ciência e a
competitiva, com mais e melhores empregos e com maior
tecnologia que são produzidas nos laboratórios de suas
coesão social, mas também um espaço de cidadania e de
universidades e instituições de pesquisa para o beneficio
participação democrática.
de toda a sociedade. Participam professores, estudantes e recém-formados. Do apoio às licenciaturas à agricultura familiar, da pecuária leiteira às incubadoras de direitos sociais, das iniciativas culturais aos micronegócios da economia solidária, todos têm a oportunidade de acesso
Em nosso entendimento, isso é o que deve ser feito, e não para a superação de uma crise circunstancial, mas para a superação de um modelo de desenvolvimento que fracassou, e como um legado para que as novas gerações tenham meios de construir um mundo melhor.
ao conhecimento, melhorar, progredir e, ainda, ajudar as universidades a reposicionar suas prioridades, formar Lygia Pupatto é Secretária de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino
trabalho.
Superior do Paraná.
SETi
melhor seus estudantes e dar mais sentido ao seu
Presentes em todas as regiões do Paraná, as treze instituições
na economia do conhecimento a sinergia entre as instituições
estaduais de ensino superior (seis universidades e sete faculdades)
de ensino superior e de pesquisa tem, cada vez mais, efeito
terão cada vez mais um papel preponderante no desenvolvimento
positivo também sobre as perspectivas de emprego e de melhores
econômico e social do Estado. (Em vermelho, instituições estaduais
condições de vida das pessoas. (no mapa, as principais instituições
de ensino superior no Paraná. Em azul, instituições federais de ensino superior.)
de pesquisa sediadas no Paraná.)
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“Brasil precisa de um projeto de nação” SECS/Agência de notícias
SECS/AGênCiA DE nOTÍCiAS
O Governo do Paraná já realizou três seminários com o objetivo de elaborar diagnósticos e propor formas de superação da crise econômica. O primeiro ocorreu em 2008 e os dois últimos neste ano. Eminentes economistas do Brasil, de outros países latino-americanos e da Europa, estiveram presentes. O quarto seminário está agendado para o segundo semestre de 2009. “Já na primeira edição do seminário, dizíamos não querer uma solução lampedusiana, em que se muda alguma coisa para se
Governador do Paraná, roberto requião, abre o terceiro seminário sobre a crise, em Curitiba. À esquerda, o chefe da Casa Civil, rafael iatauro, e no meio, o presidente da Associação Paranaense de Supermercados, Joanir Zonta.
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deixar tudo como está”, afirmou o governador roberto requião na abertura do terceiro seminário, realizado em maio passado, em Curitiba.
“nos seminários anteriores, ouvimos a
Brasil Nação
proposta de reduzir os juros, ainda muito altos
“Ainda estamos tentando nos sintonizar com
no Brasil. Ouvimos que é preciso fomentar o
os teóricos do mercado. não podemos continuar ao
financiamento à economia, aumentar a geração
sabor das vontades do Consenso de Washington.
de empregos e de salários com investimentos. O
Estamos com políticas de direção certa, mas ainda
Programa de Aceleração de Crescimento (PAC)
extremamente fracas, subordinadas aos senhores
sinaliza isso, mas ainda é uma medida modesta”,
do mundo”, disse ao encerrar o terceiro seminário
destacou. “Aprendemos que é preciso desvincular
que trouxe a Curitiba os economistas Carlos Lessa,
nosso comércio das moedas fortes, do dólar, da
reinaldo Gonçalves e César Benjamin.
libra, do euro, e criar a moeda sul-americana. O governo federal já sinalizou nesse sentido, criando uma moeda gráfica com a Argentina.” O governador lembrou que a crise atual “nasce em Bretton Woods, na conferência pósSegunda Guerra, que tornou o dólar a moeda padrão da economia mundial. Em seguida, extinguiu-se a vinculação dólar-ouro, ao mesmo tempo em que os EUA se apropriaram do conhecimento científico e tecnológico mundial, consolidado em patentes, fazendo com que suas empresas crescessem de forma extraordinária. Com isso, o dólar sem lastro passou a comprar empresas, bancos e investimentos em todo o mundo”. “Os EUA acumulam capitais fantásticos, mas sem aumentar os salários dos seus trabalhadores. Assim, criaram-se empecilhos ao funcionamento da economia – sem consumo, a produção não avança. Surgem os empréstimos aos trabalhadores, que dão origem ao subprime, com juros altos e prazos longos”, explicou.“E a economia seguiu a girar, até que o trabalhador viu que não teria mais como pagar os empréstimos
“As políticas sociais como o Bolsa família, o Luz fraterna e a Tarifa Social, são anestésicos necessários. Mas, ainda que nos falte um projeto de nação, prefiro, mil vezes, a sensibilidade social do (presidente Luiz inácio) Lula (da Silva) do que a alternativa que teríamos. Com Lula, vemos a amenização do neoliberalismo e uma política social consistente”, comentou respondendo às críticas do economista e professor da UfrJ reinaldo Gonçalves à política econômica do governo federal. “Mas as críticas do professor reinaldo à nossa subordinação ao comércio de commodities com a China são perfeitas. Estamos de novo nos tornando uma plantation, um país produtor de commodities agrícolas, com todo o custo que isso traz ao meio ambiente. São críticas agudas, que têm de ser assimiladas”, destacou, acrescentando: “O Brasil tem progredido muito. não somos mais a fazenda de café que fomos um dia. Temos avançado, ainda que mais devagar que o resto do mundo. E, nos últimos anos, o crescimento veio acompanhado de mudança de foco, de políticas sociais. Mas ainda nos faz falta um projeto nacional”, falou requião.
que tomou. Essa inadimplência provocou o desabamento de um castelo de cartas. Se pudéssemos calcular hoje o que circula em dólares sem lastros e em títulos derivativos no
Mais informações sobre os seminários e a crise
mundo, veríamos 30 ou 40 vezes mais dinheiro
econômica, propostas e ações do governo paranaense
que o PiB de todo o planeta”.
no site www.crise.pr.gov.br
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tecnologia e inoVaÇÃo
Procuram-se engenheiros Claudia izique e lorena aubrift KlenK
universidade de são Paulo CalCula que as obras do PaC PreCisariam de 280 mil engenheiros em quatro anos
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stoCKPhoto
se a crise mundial não deixar grandes sequelas e se o crescimento do Produto Interno bruto (PIb) brasileiro voltar ao patamar de 5%, o país precisará importar engenheiros para empreender o crescimento. José roberto Cardoso, vice-diretor da escola Politécnica da universidade de são Paulo (usP), lança mão de um cálculo clássico entre os engenheiros para demonstrar a carência de mão de obra especializada: cada us$ 1 milhão investido exige um novo posto de engenheiro. “Veja o exemplo do Programa
Istockphoto
de aceleração do Crescimento (PaC), que prevê investimentos da ordem de r$ 280 bilhões, somando os recursos dos setores público e privado. Isso significa que, em quatro anos, precisaríamos de 280 mil engenheiros”, estima. Considerando que o brasil forma em torno de 26 mil engenheiros por ano, ao longo de quatro anos de implementação do PaC, ainda faltariam 176 mil profissionais para atender às demandas do mercado.
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Pablito Pereira/ Cohapar
Pr), sônia gurgel, há falta também de engenheiros elétricos e profissionais de nível técnico de áreas afins às engenharias. de um lado, carência de engenheiros justificada em parte pela escassez de mão de obra especializada; de outro, demissão em setores considerados estratégicos para o desenvolvimento do país. dados da Capes revelam que as áreas que mais titulam doutores no brasil são as Ciências agrárias, da saúde, humanas e biológicas. levantamento do Centro de gestão e estudos estratégicos (Cgee) que
obra do PaC em Campo magro, região metropolitana de Curitiba, onde estão sendo construídas 388 moradias
cruza dados do CnPq, Capes e rais (relação anual de informações sociais) indica que quase metade (44%) dos doutores brasileiros que tem empregos formais se
a carência de engenheiros é um problema apontado
concentra na área de educação (universidades e escolas)
pela Confederação nacional das indústrias (Cni) desde
e cerca de 43% deles ocupam cargos na administração
1999, quando foi constituído um grupo de trabalho para
pública, defesa e seguridade social.
avaliar essa questão, sublinha. enquanto o brasil analisava o problema, os países emergentes investiam maciçamente na formação desses profissionais. “em 1994, a China e
Saídas para a crise
os estados unidos formavam 92 mil engenheiros por
Para os cerca de cinco mil participantes do Congresso
ano. dez anos depois, os números norte-americanos
mundial de engenheiros (WeC 2008), realizado no final do
permaneceram mais ou menos no mesmo patamar, mas
ano passado, em brasília, a saída para a crise requer novos
os da China deram um salto: o país forma hoje 350 mil
investimentos públicos e privados para projetos e obras.
por ano e os cursos de engenharia somam quatro milhões
“engenharia e inovação, juntamente com responsabilidade
de estudantes”, compara Cardoso. o esforço da Coréia do
social, serão essenciais para nossa sobrevivência e
sul não foi diferente. em 1970, quando o Pib do país era
progresso”, declararam num documento.
semelhante ao de gana, formavam-se seis mil engenheiros;
nessa linha, o sistema Confea/Crea, mútua e
hoje, 80 mil novos profissionais chegam anualmente ao
entidades definiram, como ação para 2009, junto ao
mercado. “no brasil, com a crise dos anos 1980 e 1990, a
Congresso nacional, uma carteira de projetos voltados
oferta de trabalho caiu e afugentou os jovens”, observa.
para a inclusão social (projetos de acessibilidade), proteção
Com isso, o país conta com dois a três engenheiros por
ambiental (incentivo às energias renováveis) e redução
mil habitantes, bem abaixo da média do Japão, que tem
das desigualdades (parcelamento do solo e regularização
17 por mil habitantes, e dos países desenvolvidos, onde a
fundiária sustentável de áreas urbanas). esses projetos vêm
proporção é de 20 por mil.
na esteira da lei nº. 11.888/08, que assegura às famílias de
Pela ótica dos sindicalistas, a procura por engenheiros, sobretudo nos dois últimos anos, não configura uma falta
baixa renda assistência técnica pública e gratuita para o projeto e construção de habitação de interesse social.
crônica ou generalizada desses profissionais. segundo o
“Profissões tradicionais como as de engenheiro civil,
presidente do sindicato dos engenheiros no estado do
mecânico e elétrico deverão ter mais empregos no país se
Paraná (senge-Pr), valter fanini, isso pode ser constatado
as obras de construção de moradias populares do PaC forem
pelo nível salarial da categoria, “que não apresenta
concretizadas e também se os estudos sobre transportes
evolução”. “agora, se o Pib voltar ao patamar de 5% e
intermodais forem retomados”, opina o vice-presidente
for constante, concordo que poderá haver falta de mão de
do instituto de engenharia do Paraná (ieP), engenheiro
obra especializada, principalmente de engenheiros civis.
civil nivaldo almeida neto. nesse cenário, lembra ainda, a
mas num cenário de crise é temerário fazer projeções
tendência é que siderúrgicas e indústrias de cimento e de
de curto prazo”, completa. na avaliação da presidente
cerâmica também se movimentem e criem novos postos de
da associação brasileira de recursos humanos (abrh-
trabalho. “o desenvolvimento da infra-estrutura nacional
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necessitará de mão de obra especializada inclusive para
na universidade federal do Paraná, a taxa de evasão
a gestão empresarial, posto para o qual os engenheiros
nos cursos de engenharia chegou a 40% na década
costumam ser muito requisitados”.
passada, diz o diretor do setor de tecnologia, professor
no Paraná, acrescenta almeida neto, novos empregos
mauro lacerda santos filho. “hoje, temos no máximo
poderão ser gerados “se houver continuidade das usinas
30% de evasão e em alguns cursos ela foi zerada, mas
hidrelétricas de mauá, no rio tibagi, e do baixo iguaçu, no
os reflexos do problema ainda são sentidos no mercado”,
rio iguaçu”. ele diz ainda que já se observa, no estado, um
afirma. ele concorda que a explicação está no grau de
crescimento nas atividades de engenharia de alimentos
dificuldade dos cursos, que envolvem muito cálculo: “isso
como suporte ao agronegócio e da engenharia ambiental
desestimula muitos alunos”.
relativa ao tratamento de resíduos e a sustentabilidade de empreendimentos. a construção, já iniciada, de moradias populares por meio do PaC na região metropolitana de Curitiba, é outro indicativo da movimentação desse mercado para engenheiros.
Pós-graduação Com décadas de tradição na pesquisa e no ensino tecnológico, a universidade tecnológica federal do Paraná (utfPr) mantém em Curitiba, entre outros programas de pós-graduação, um mestrado em engenharia mecânica
Leilões e evasão
que nos últimos anos tem atraído em torno de 40 alunos
atualmente, as escolas de engenharia do país
por ano — menos da metade do esperado pela instituição.
oferecem cerca de 100 mil vagas/ano e formam pouco mais
falta de prestígio? não. a baixa procura decorre da
de um quarto disso — para 2012, a previsão do governo
mesma realidade que atinge o brasil e outros países, e
federal é aumentar em 35 mil as vagas nas universidades
que naturalmente não poupa o Paraná, resultando numa
federais. “os cursos de engenharia registram grande
acirrada disputa entre empresas para recrutar os melhores
evasão até o final do segundo ano. os alunos, na média,
quadros, com repercussão direta sobre os salários.
não têm boa formação em matemática e física e, por isso, não conseguem acompanhar o curso”, explica José roberto Cardoso. a escola Politécnica da usP (Poli), por exemplo, inicia o curso com 650 alunos e perde 100 logo nos primeiros anos. (Mais informações sobre este assunto em “Um problema fundamental”, reportagem publicada no número 1 da Revista Sem Fronteiras).
“o mestrado oferta bolsas de r$ 1 mil mensais, mas temos enfrentado dificuldade para captar candidatos, mesmo entre recém-formados, atraídos por altos salários nas empresas, que às vezes promovem verdadeiros leilões para garantir os melhores profissionais”, afirma o pró-reitor adjunto de relações empresariais e Comunitárias da utfPr, professor Carlos Cziulik, fazendo
o resultado é que os profissionais disponíveis são
questão de ressaltar que essa realidade pode mudar
disputadíssimos no mercado. no ano passado, por exemplo,
como resultado da crise econômica mundial. “assim
quando a economia brasileira ia de vento em popa, as empresas
como os engenheiros mecânicos, os profissionais das
promoviam verdadeiros leilões para contratar engenheiros
áreas de informática e design formados pela utfPr têm
civis que estavam concluindo o curso na Poli. “o salário
uma taxa de empregabilidade bem próxima de 100%” —
inicial, de r$ 1.200, saltou para r$ 4.500”, afirma. o curso alunos da usP, passou para a quarta posição, perdendo apenas para a engenharia de produção, mecatrônica e engenharia de computação. “os estudantes vivem antenados no mercado”,
Joka madruga
de engenharia civil, que era a opção menos procurada pelos
ele observa. a Poli planeja ampliar o número de vagas com a instalação de cursos noturnos. mas, acredita Cardoso, isso não vai resolver o problema. “temos, inicialmente, que aumentar o rendimento atual dos cursos e encontrar uma forma de resgatar os engenheiros que abandonaram a carreira na década de 1980”.
Professor da utfPr Carlos Cziulik em sala de aula
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o lado bom da mesma realidade que influencia a procura por determinados cursos de pós-graduação.
de acordo com ele, assim como acontece com os formados, os estagiários de engenharia também são muito valorizados: “o valor das bolsas para estagiários gira em torno de r$ 600 mensais. Para os de engenharia, é mais ou menos
Importação de cérebros
o dobro”. a idéia das empresas é simples: fazer do estágio
assim como a utfPr, o setor de tecnologia da ufPr
uma etapa de treinamento e seleção de futuros profissionais,
também tem dificuldades para atrair alunos para seus
que frequentemente acabam efetivados mesmo antes da
programas de pós-graduação. “Poucos trocam um salário
formatura.
de r$ 4 mil ou mais numa empresa por uma bolsa de r$ 1 mil mensais. mas é um problema bom”, diz lacerda. outra dificuldade para as universidades e empresas brasileiras, segundo ele, é competir com as ofertas de companhias estrangeiras, que há anos vêm “importando cabeças” do brasil e de outros países. a ufPr tem quase 90 alunos de cursos da área de tecnologia estudando em universidades do exterior, especialmente na frança e na alemanha. “a falta de engenheiros na europa é duplicada em relação ao brasil e eles procuram reter nossos talentos. muitos dos nossos
Conforme sônia gurgel, algumas companhias também têm recrutado profissionais aposentados e procurado estimular a procura por cursos de engenharia, por meio de campanhas em escolas de ensino médio. É uma tentativa de recuperar, aos olhos dos estudantes, o prestígio dessas profissões. “as engenharias mecânica e elétrica, por exemplo, perderam o glamour nas décadas de 1970 e 1980, não apenas no brasil, mas em várias partes do mundo. a procura pelos cursos caiu e o impacto disso está sendo sentido agora”, afirma a presidente da abrh-Pr.
alunos voltam para concluir o curso aqui já com propostas de emprego de grandes empresas”, conta o professor. Para lacerda, contudo, maior que o problema de falta de mão de obra é o baixo investimento em pesquisa tecnológica no brasil. “ainda estudamos muito pouco nessa área”, afirma. segundo ele, a ufPr tem feito um esforço para ampliar a pesquisa: nos últimos 15 anos, passou de um para nove cursos de pós-gradução em tecnologia, dos quais cinco doutorados e quatro mestrados. “os engenheiros das fábricas de automóveis não estão no brasil; aqui, a mão de obra está na montagem dos carros”, confirma valter fanini, do senge-Pr, para quem o maior desafio do país está no domínio de tecnologias industriais. “o mesmo ocorre com o setor da telefonia”, observa ainda. dados da Cni mostram que nas empresas nacionais P&d&i equivale
Iniciativas no Paraná, o governo do estado lançou em 2006 o Programa de residência técnica para recém-formados com oferta de curso de especialização de dois anos em obras públicas e bolsa de r$ 1.245,00. executado pela secretaria de Ciência, tecnologia e ensino superior em parceria com universidades e outros órgãos de governo, o programa qualificou até agora 60 profissionais nas áreas de engenharia civil e arquitetura, 80% dos quais já conseguiram emprego. “Passei por vários setores, desde o escritório regional em Ponta grossa até orçamento de obras, licitações e Contratos”, conta a engenheira ana modesto, hoje empregada na secretaria de estado de obras (seop).
ao treinamento de pessoas, despesas com produtos e
rodrigo leal/ aPPa
aquisição de máquinas.
Estágio, bolsa em dobro a
escassez
de
profissionais
tem
provocado
mudanças também nas estratégias de seleção. o estágio, concebido como uma ação de ensino, transformou-se para muitas empresas em ferramenta de recrutamento: “não conseguimos atender a demanda por estagiários de engenharia”, conta rodrigo Weber, gerente executivo do instituto euvaldo lodi (iel-Pr), que é vinculado à federação das indústrias do estado do Paraná (fiep) e tem cerca de 30 mil nomes em seu banco de estudantes.
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Programa “residência técnica”, do governo do Paraná, já qualificou 60 engenheiros civis
engenharias, um retrato brasileiro
Civil
29,50% 17,80%
mecânica
12,10% 9,20%
eletricista
6,40% 6,30%
existem hoje no brasil 421.649 mil engenheiros. aproximadamente 26 mil se formam a cada ano no país. Por volta de 50% deles são da área de engenharia Civil. o piso nacional do engenheiro é de 8,5 salários mínimos e meio.
química
3,60% 2,40%
telecomunicações
2,30% 1,60%
geociência
1,10% 1,10%
ambiental
1%
base: 2017 engenheiros
fonte: “Perfil dos profissionais filiados ao Crea-Pr”/Convênio Crea/sindicatos e utfPr
no Paraná, eles somam 37.095 mil, sendo 13.154 civis, 9.245 agrônomos, 5.386 eletricistas e 3.627 mecânicos. a maioria reside em Curitiba, seguida de londrina, maringá, Ponta grossa Cascavel, foz do iguaçu e são José dos Pinhais. dos engenheiros e arquitetos paranaenses, 81,7% são homens e 18,3% mulheres. a idade média é 30 e 40 anos. 44% formaram-se há mais de 15 anos. 38% ocupam função de gerência e 31% técnica e 31% dividem-se entre estas duas categorias. o Plano nacional de Pós-graduação prevê um crescimento de 135% na formação de doutores em engenharia e Computação e de 98% de mestres, até 2010.
fonte: isi Web of Knowledge - thomson scientific /Parcerias estratégicas, número 25. distribuição mundial por área das publicações qualificadas em engenharia.
hoje, no país, a fração de formação nessas áreas é de 13% do total de titulados. o brasil é o país mais produtivo em pesquisa científica em engenharia na américa latina. seu desempenho é apenas 4 a 5 vezes menor do que a frança, inglaterra e alemanha. no restante do mundo, as quinze maiores economias são as que mais publicam em engenharia. em termos absolutos, o número de cientistas e engenheiros atuando nas universidades brasileiras é superior ao da Coréia do sul. estados unidos e Japão têm 25 engenheiros para cada mil trabalhadores e a frança, 15 por mil. a China forma cerca de 300 mil engenheiros por ano; a Índia, 200 mil e a Coréia do sul, 80 mil. (rr)
fonte: isi Web of
Knowledge - thomson scientific /Parcerias estratégicas, número 25. Participação mundial na publicação qualificada em engenharia.
fonte: isi Web of Knowledge thomson scientific /Parcerias
fonte: Conselho federal de engenharia, arquitetura e agronomia (Confea), Conselho regional de engenharia e arquitetura (CreaPr), sindicato dos engenheiros do Paraná (senge-Pr), isi Web of Knowledge – thomson´s national indicators, PnPg/meC e World engineers Convention (WeC 2008).
estratégicas, número 25. distribuição brasileira por área das publicações qualificadas em engenharia.
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heitor marcon
Professor fabio lucio santos no laboratório de materiais do curso de engenharia mecânica da universidade estadual de maringá
tecnologia e inoVaÇÃo
lacerda conhece os dois lados da questão. “existe burocracia na universidade e muitas vezes as respostas são lentas. mas a iniciativa privada tem dificuldade de compreender que isso se deve ao fato de lidarmos com recursos públicos, o que exige seguir uma série de normas”, afirma. “Por outro lado, temos uma visão social mais profunda, de que a pesquisa deve dar mais frutos do que aqueles esperados pelas empresas”.
em 2006, a Confederação nacional da indústria (Cni),
Para lacerda, contudo, a distância entre esses dois
em conjunto com o senai e o iel, lançou o inova engenharia,
mundos vem diminuindo nos últimos anos. “a maioria dos
um conjunto de propostas para a expansão e modernização
projetos da pesquisa que realizamos hoje envolve a iniciativa
do ensino de engenharia no brasil, passo considerado
privada”, diz. segundo o professor, os currículos dos cursos
imprescindível para a ampliação da capacidade tecnológica
de graduação também refletem essa aproximação: “nenhum
do País. o documento parte de um diagnóstico que mostra
dos oito cursos do setor de tecnologia tem mais de dois anos
em números a realidade sentida no dia a dia por muitas
de existência. eles vêm sendo atualizados constantemente,
empresas. Cita estimativas do Confea (Conselho federal de
em função das demandas de mercado e das mudanças
engenharia, arquitetura e agronomia), de 2006, segundo
constantes no mundo do conhecimento”.
as quais quase a metade dos profissionais que se formam escolhe a engenharia Civil, enquanto nos demais países a maior parte opta por modalidades mais ligadas às áreas de alta tecnologia.
Doutores nas empresas Para Carlos eduardo baptista, analista do iel-Pr que
o inova engenharia também defende o fomento às
atua no programa antena abg — cujo papel é criar pontes
atividades de P&d nas indústrias, assunto sempre polêmico
entre empresas e universidades — , há problemas dos dois
quando se trata de analisar as razões da distância que
lados. “muitas empresas desconhecem as linhas de fomento
ainda separa universidades e empresas. mas, nesse aspecto,
à inovação, não sabem como fazer um projeto e imaginam,
há unanimidade: o brasil tem pouquíssimos cientistas
erroneamente, que precisam pagar salários astronômicos para
empregados no setor privado. estima-se que sejam 10 mil,
ter mestres e doutores em seus quadros. as universidades, por
enquanto na Coréia do sul o número chega a 125 mil e nos
outro lado, precisam se abrir mais, entendendo que atender
estados unidos, a 750 mil, a grande parte engenheiros.
à demanda do setor privado não vai desvirtuar a instituição,
“quando voltei do doutorado na inglaterra, bati à porta de muitas empresas, cheio de projetos para o desenvolvimento de novos produtos. mas a grande maioria ainda vê esse tipo de investimento como um custo e procura competir na base do preço, aniquilando a concorrência”, diz Carlos Cziulik, da utfPr. “há muita burocracia e resistência
nem impedir que continue produzindo conhecimento teórico”, afirma. a abg (associação bernard gregory) surgiu na frança em 1980 e hoje atua em vários países como agente de colocação profissional de doutores nas empresas. no brasil, é representada desde 2005 pelo sistema fiep, por meio do iel e do senai.
de setores que defendem a pesquisa pela pesquisa e
a Prati-donaduzzi — indústria de medicamentos gené-
encaram a aproximação com o setor privado quase como
ricos, similares e específicos instalada em toledo — foi a
uma rendição”, afirma sônia gurgel, da abrh.
primeira empresa a recorrer à antena abg no brasil. “a pesquisa na nossa área demanda um conhecimento muito grande, que só pode ser desenvolvido se tivermos pessoas de
Empresa x universidades
alta capacitação”, diz luiz donaduzzi, diretor-presidente da
Com uma longa trajetória no setor privado e atualmente
empresa, que, segundo ele, investe aproximadamente 8% de
dedicado apenas ao magistério na ufPr, o professor mauro
seu faturamento em inovação e produz 350 mil unidades/
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dia de medicamentos. de acordo com donaduzzi, há
jamais pensaram em deixar a carreira acadêmica para atuar
dificuldades para encontrar profissionais qualificados. além
numa indústria”, afirma baptista. segundo ele, o Portal
de formar pessoal no dia a dia, a Prati-donaduzzi recorreu
antena abg brasil — ambiente virtual para a integração
à abg para recrutar 20 mestres e doutores nas áreas de
entre o meio acadêmico e o setor empresarial — tem cerca
farmácia e engenharia química. sete já foram contratados e
de 200 profissionais cadastrados. um banco de talentos à
os outros estão em processo de recrutamento.
disposição de quem se dispuser a investir em pesquisa e
a equipe do iel que trabalha com a abg procura
desenvolvimento.
profissionais nas melhores universidades de todo o País.
Carreiras promissoras a tecnologia de extração de petróleo em águas profundas com participação da Coppe-rio (instituto alberto luiz Coimbra de Pósgraduação e Pesquisa em engenharia), e a indústria aeronáutica acoplada ao complexo Cta/ita (Centro tecnológico aeroespacial e instituto tecnológico da aeronáutica) são exemplos de sucesso constantes na área das engenharias no brasil. mas há outras áreas que fazem “fronteira” com as engenharias que prometem fazer diferença nos próximos anos. diego singh
uma pesquisa coordenada pelo professor Carlos brandão, do instituto de estudos avançados transdisciplinares (ieat), da universidade federal de minas gerais (ufmg), elaborou uma lista com 80 profissões do futuro a partir das tendências de mercado e de entrevistas com pesquisadores e professores de várias áreas no brasil. de acordo com essa pesquisa, uma das principais características do profissional do futuro será a capacidade de engenheiro ambiental Willian Padilha, transitar por mais de um coordenador de infraestrutura em uma campo de conhecimento e instituição financeira em Curitiba não ficar preso apenas ao seu segmento específico. ao mesmo tempo, ele terá que dar conta de desafios éticos, sociais, culturais e ambientais. entre as profissões citadas na pesquisa do ieat estão a de nanotecnólogo, que se encarregaria de projetar microrrobôs para inúmeras finalidades, desde operações geológicas até intervenções cirúrgicas; o cientista socioambiental; especialista
(Colaborou: Regina Rocha)
steferson faria/Petrobras
“muitos ficam surpresos quando são abordados, porque
até 2012, e sem considerar as demandas do Pré-sal, a Petrobras deverá contratar cerca de 12 mil novos profissionais, a maioria engenheiros, geólogos e geofísicos
em desastres e epidemias; o gestor de cidades; e o organizador de dados. a profissão de “lixólogo”, cuja responsabilidade seria encontrar soluções para um problema cada vez mais angustiante para as cidades, a gestão dos resíduos, também será bastante valorizada no futuro, de acordo com a pesquisa. em relação ao Paraná, e na pesquisa “setores portadores de futuro para o estado do Paraná”, elaborada pela federação das indústrias do estado do Paraná (fieP), os setores mais citados em quase todos os encontros de prospecção de futuro foram: biotecnologia aplicada aos setores agrícola, avícola e florestal (genômica, melhoria genética de espécies cultivadas e técnicas de cultivo in vitro); indústria alimentar (alimentos funcionais, produtos preparados e tecnologias de conservação e embalagem); e energia (biocombustíveis e eficiência energética em edificações). nessas áreas a presença de profissionais das mais diferentes áreas, entre as quais as engenharias, será fundamental para o desenvolvimento sócioeconômico do estado. (rr)
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Professores das seis universidades estaduais traçam perfil das engenharias hoje e falam sobre mercado de trabalho. CLEBER SANTIAGO ALVES, professor do departamento de engenharia mecânica da universidade estadual de maringá (uem) : “todos os egressos dos dois últimos anos do curso de engenharia mecânica estão bem colocados no mercado, a maioria fora do Paraná, em empresas de grande porte como a Petrobras e a indústria automobilística. outros conseguiram emprego antes mesmo de terminar o curso. no norte do Paraná, a procura por esses profissionais tem aumentado significativamente. uma indústria da região do setor de açúcar e álcool (do grupo usaçúcar), por exemplo, procurou a uem e solicitou ao departamento a criação de um curso de
Desafios e perspectivas
especialização em tecnologia mecânica, sendo que metade dos alunos, de um total de 30, é de engenheiros da própria empresa, que financia todas as bolsas. a procura pelo curso também é um indicativo desse boom das engenharias: a média, principalmente depois do último enade (2005), é de 40 candidatos por vaga, perdendo apenas para os cursos de medicina e arquitetura”. ARON LOPES PETRUCCI, professor do departamento de Construção Civil da universidade estadual de londrina (uel): “a procura pelo curso de engenharia Civil varia de acordo com o mercado. quando este está aquecido, aumenta, quando não, cai. em parte dos anos oitenta e noventa, por exemplo, por causa da instabilidade econômica, a procura foi menor, mas aqui na uel, nessa área, as vagas do primeiro ano da graduação sempre foram preenchidas, nunca ficaram ociosas. Já o lato sensu faz o caminho inverso ao do mercado, ou seja, é mais procurado quando este está em baixa. agora, com o PaC (Programa de aceleração do Crescimento), estamos observando que há um grande espaço a ser preenchido pelos engenheiros civis, eu diria até que esse programa é uma resposta pontual para a crise de hoje. mas eu sempre falo para os meus alunos: escolha essa profissão se você realmente gostar dela porque nunca se sabe, daqui a cinco anos a situação poderá ser completamente diferente, melhor ou pior”. ADRIANA SCOTON ANTONIO CHINELATTO, coordenadora do mestrado em engenharia e Ciência dos materiais da universidade estadual de Ponta grossa (uePg): “o engenheiro de materiais é um profissional versátil porque pode atuar tanto no desenvolvimento de produtos quanto no controle de processos, no chão de fábrica. Praticamente todos os alunos desse curso estavam sendo contratados após o período de estágio obrigatório, principalmente por montadoras de automóveis, indústrias de eletrodomésticos e fornecedoras de peças para a indústria automobilística, os setores mais afetados pela crise. alguns deles que faziam estágio e seriam contratados estão esperando essa crise passar. no momento, as indústrias estão preferindo contratar estagiários a profissionais formados. quando o mercado está em queda, a procura pela pós-graduação aumenta. É o que percebemos no mestrado em engenharia e Ciência dos materiais”.
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ROBIE ALLAN BOMBARDELLI, coordenador do Curso de engenharia de Pesca da universidade estadual do oeste do Paraná (unioeste): “nos últimos anos, a demanda por engenheiros de pesca aumentou devido ao fortalecimento da aquicultura no país. a indústria de pescado de mato grosso, por exemplo, está com falta de engenheiros de pesca para trabalhar com a criação e o processamento de pescados nativos da amazônia. temos ex-alunos trabalhando no equador, Paraguai, e em vários estados do brasil, como mato grosso do sul, mato grosso, alagoas, rio grande do sul e santa Catarina. muitos de nossos alunos também se interessam pela pesquisa e procuram os programas de mestrado e doutorado para seguir carreira acadêmica. Como esta engenharia trata de biologia e meio ambiente, e como o mercado tem se mostrado promissor, o engenheiro de pesca também pode trabalhar na adequação ambiental de propriedades rurais”. EDUARDO RANDO, diretor da universidade estadual do norte do Paraná (uenP), campus de bandeirantes: “alguns projetos que estamos desenvolvendo na uenP visam apoiar o setor do agronegócio a partir de tecnologias de engenharia de produção, inteligência artificial e mineração de dados. existe uma grande expectativa na utilização dessas tecnologias devido às novas alternativas que elas podem proporcionar e às melhorias que podem trazer aos processos já existentes. além disso, nossa instituição, preocupada com a capacidade de reposição de recursos do planeta, tem buscado cumprir seu papel na formação de cidadãos conscientes com a justiça social e com as questões de sustentabilidade ambiental. existe uma grande preocupação em educar a comunidade acadêmica e também a população para a conservação do meio ambiente e para que questionem o seu modo de vida de consumo exagerado, o que pode acabar devastando a vida em nosso planeta”. OSMAR ROBERTO DALLA SANTA, coordenador do curso de engenharia de alimentos da universidade estadual do Centro-oeste (unicentro): “atualmente, a maior parte dos recém-formados está em postos de trabalho. eles vão para as indústrias de alimentos, principalmente as pequenas, que precisam de profissionais qualificados para implantar seus programas de qualidade. quase todos os alunos que saem dos estágios são empregados. nós sentimos isso com o programa universidade sem fronteiras, que precisa de bolsistas recém-formados e tem dificuldade para encontrá-los. eles não estão disponíveis porque estão sendo empregados pelas indústrias. o setor de alimentos está aquecido e, por enquanto, não sentiu os efeitos da crise”. FABIANE ALBERTI, na empresa brasileira de aeronáutica (embraer), onde trabalha há dois anos, a engenheira de materiais fabiane alberti atua na produção de materiais compósitos e em contato com as áreas de suprimentos, produção, qualidade e processo, resolvendo problemas desde o recebimento de matérias-primas até a montagem de componentes para aviões. ela também apoia o cliente na resolução de problemas designando materiais e processos alternativos para reparos. formada pela universidade estadual de Ponta grossa (uePg), fabiane conseguiu emprego na embraer dois meses após a formatura, em abril de 2007. no último ano do curso, fez estágio em uma empresa paulista. “a universidade me ajudou muito, eu conseguia conciliar as disciplinas, a monografia e o estágio. Participei de diversos programas de trainee e fui chamada pela embraer num momento de aumento de produção e de contratação de pessoal”.
tecnologia e inoVaÇÃo semfronteiras |
51
Parcerias de resultados Claudia izique
InstItuIções De ensIno suPerIor são funDamentaIs na solução
antônio scarpinetti/ assessoria de Comunicação – unicamp
De Problemas regIonaIs
sistema de drenagem linfática tradicional (em azul, à esquerda) e o novo modelo (em branco, à direita), que melhora a mobilidade do paciente
52 | semfronteiras
A Lei de Inovação, instituída em 2004, recomenda
t e c n o l o g i a e INO V A Ç Ã O
que as universidades criem Núcleos de Inovação Tecnológica (NIT) para administrar sua política de
e 80 marcas no Instituto Nacional da Propriedade
desenvolvimento tecnológico, proteger a propriedade
Industrial
intelectual e garantir que a pesquisa, desenvolvida
licenciamento de tecnologia que lhe renderam R$ 301
nas bancadas, chegue à sociedade. A Universidade
mil em royalties no período. “O nosso objetivo não
Estadual de Campinas (Unicamp) e a Universidade
é o de trazer recursos financeiros para a Unicamp,
(INPI)
e
firmou
38
contratos
de
Federal da Minas Gerais (UFMG) se anteciparam e,
mas sim o de criar novas oportunidades para a que
antes mesmo da promulgação dessa lei, já contavam
a universidade execute melhor sua missão”, explica
com Agências de Inovação — a Inova Unicamp e Inova
Roberto Lotufo, diretor executivo da Agência.
UFMG — por meio da qual estreitam parcerias com empresas e órgãos públicos, entre outros. No Paraná, o agente promotor, nessa área, é a Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior/NITPAR.
A Inova UFMG já depositou oito patentes no INPI e licenciou cinco produtos nas áreas de biotecnologia e engenharia. Já graduou 15 empresas que, no mercado, registram faturamento médio de R$ 1 milhão anual.
A Agência de Inovação Inova Unicamp foi criada
“O grande diferencial dessas empresas é a geração
para ser um órgão de articulação e promoção de
de emprego e renda. Todas as vagas são ocupadas
pesquisa colaborativa, em associação com empresas
por profissionais com alto nível de especialização e
e setor público. Oferece suporte às ideias criativas
com título, no mínimo, de mestrado. Trata-se de uma
em tecnologia desenvolvidas por docentes e alunos,
forma segura de manter esses talentos no Estado e
colabora para que elas se transformem em novos
no país”, diz Ana Maria Serrão, gerente administrativa
empreendimentos, por meio de projetos de pré-
da Agência.
incubação, realizados em parceria com as Empresas Juniores, e ainda lhes dá acesso a mentores acadêmicos e empresariais para o desenvolvimento de planos de negócios. Ademais, prospecta parceiros e, em muitos casos, licencia a tecnologia.
Mas, além de compartilhar com o mercado o conhecimento gerado em ambiente acadêmico, as duas agências mudaram os paradigmas de pesquisa das
universidades.
“Atualmente,
recebemos
de
toda Unicamp cerca de dez novas comunicações de
A Inova-UFMG é uma incubadora de empresas
invenção por mês”, conta Lotufo. Um dos exemplos é o
de base tecnológica de caráter multidisciplinar,
da Faculdade de Ciências Médicas que, antes da Inova,
ligada à Coordenadoria de Transferência e Inovação
tinha quatro inventores e nenhum licenciamento.
Tecnológica da Universidade. O processo de seleção
“Hoje, são 33 inventores e quatro contratos de
de empresas é realizado por meio de edital público
licenciamento de patentes”, afirma Lotufo.
e as “vagas” na incubadora estão acessíveis não apenas a pesquisadores e alunos, como também a toda a comunidade. Além de preparar empresas para o mercado, a Inova UFMG atua ativamente na
Novos produtos Uma
das
tecnologias
desenvolvidas
pela
disseminação da cultura empreendedora, bem como
Faculdade de Ciências Médicas, e licenciada pela Inova
prospecta novos projetos e recursos para o seu
Unicamp à Kolplast no final do ano passado, foi a do
financiamento.
sistema de drenagem torácica, utilizada para eliminar
Em cinco anos de atuação, os resultados contabilizados pelas duas agências são surpreendentes. A Inova Unicamp depositou 537 pedidos de patentes
fluidos gasosos e líquidos do tórax de pacientes com traumas. O método tradicional, usado há mais de 150 anos, consiste na inserção de um tubo entre o pulmão
semfronteiras |
53
e a pleura ligado a um tubo de borracha, por
a inovação também é a marca regis-
meio dos quais os fluidos são drenados até
trada das empresas de base tecnológica
um frasco de plástico. o frasco, no entanto,
que cresceram incubadas na inova ufmg. a
comporta entre meio litro e um litro de água,
hPe, de engenharia elétrica, por exemplo,
o que dificulta o transporte de pacientes
tem como foco aplicações industriais e a
atendidos, por exemplo, em ambiente de emergência. a nova tecnologia, desenvolvida por alfio José ticani e gilson barreto, substitui o frasco e o tubo por um dispositivo pequeno e leve, que permanece junto à pele. em caso de necessidade, um saco plástico é conectado ao dispositivo, sendo trocado sempre que estiver cheio. o doente fica livre
três
tecnologias
por sua equipe de cientistas. outro exemplo é o da invent vision, especializada em sistemas de imagens e de visão, que utiliza sistemas desenvolvidos e produzidos pela própria empresa. um desses sistemas é o macro de vídeo, com capacidade de ampliação de 60 a 100 vezes, utilizado em análise de exames
para andar e deixar o leito precocemente. outras
comercialização de produtos desenvolvidos
licenciadas
laboratoriais, entre outras funcionalidades.
pela inova unicamp se transformaram em
a inova ufmg recebeu o Prêmio
produto, entre 2005 e 2007. a primeira foi
nacional de empreendedorismo inovador, e
um teste neonatal para surdez genética,
se prepara para crescer. “Começamos com
desenvolvido no laboratório de genética
três empresas incubadas e hoje, abrigamos
humana do Centro de biologia molecular
quatro. até 2010, a agência vai ganhar sede
e
unicamp.
própria, num prédio de dois andares, que nos
repassado à dle, empresa de diagnósticos
permitirá atender 20 novos projetos”, conta
engenharia
genética
da
laboratoriais, em 2004, um ano depois o teste
ana maria.
se consolidou no mercado. o fitoterápico
depois
à base de isoflavona aglicona, utilizado no
ganhar
destaque
num
tratamento dos sintomas da menopausa, foi
relatório da organização para Cooperação
desenvolvido pela faculdade de engenharia
e
de alimentos para a steviafarma, em 2004.
divulgado no final do ano passado, por
três anos depois, devidamente certificado
seu desempenho na área de patentes e
pela anvisa, o medicamento chegou ao
licenciamentos, a inova unicamp se prepara
consumidor.
o
terceiro
produto
é
desenvolvimento
econômico
(oCde),
um
para enfrentar novos desafios. “Precisamos
nanocompósito polimérico (nCP), para o qual
nos profissionalizar mais na gestão da
a inova registrou a marca imbrik ®, derivado
propriedade intelectual e na comercialização
da mistura de látex de borracha natural com
de
argila. “foi desenvolvido pela empresa orbys-
colaborativos para a unicamp, incentivar o
tecnologia de nanocompósitos Poliméricos, por meio de licenciamento exclusivo de uma patente do processo de produção de nCP em 2005”, lembra lotufo. em 2007, o imbrik ® foi aplicado como matéria-prima de uma nova bola de tênis, batizada de nanobal e produzida pela lCm bolas.
54 | semfronteiras
de
tecnologia,
trazer
mais
projetos
empreendedorismo tecnológico e o ambiente local de inovação”, enumera lotufo. “mas o maior desafio para 2009 é gerenciar bem os dez projetos financiados — seis deles iniciados esse ano — e que, juntos, somam r$ 12 milhões”.
multiplicação de ideias lorena aubrift KlenK
CRESCEM OS PROjETOS, AUMENTAM OS RECURSOS tal como no século passado, o principal
real as informações sobre o paciente para uma
motor da economia paranaense continua sendo o
central, por gPs e 3g (banda larga pelo celular). o
agronegócio. mas a capacidade de o estado produzir
aparelho já existe na versão monocanal, mas será
conhecimento e inovação estende-se hoje por
aprimorado para a versão 12 canais com a finalidade
setores que muitos paranaenses sequer imaginam.
de aumentar a precisão do diagnóstico. a ideia é
na medicina, na tecnologia da informação, na
comercializá-lo por um preço variável entre r$ 300
biotecnologia e em muitos outros segmentos, há
e r$ 600.
gente por todo o Paraná pensando e colocando em
fundada em 2003 por quatro ex-funcionários
prática projetos inovadores. o estado também vem
da sercomtel telecomunicações, a gelt investe,
obtendo um volume crescente de recursos oficiais
segundo novaes, cerca de 15% do orçamento em
para financiamento da inovação.
inovação — e está colhendo bons frutos. “em cinco
em 2006, quando a financiadora de estudos e Projetos (finep) lançou a linha de subvenção
anos, praticamente dobramos de tamanho a cada 18 meses”, afirma.
econômica, que libera recursos não-reembolsáveis, o Paraná recebeu r$ 8,5 milhões. no ano seguinte, o volume de recursos destinados ao estado subiu para
Plataforma para cadeirantes
r$ 14 milhões, divididos entre 11 projetos. em 2008,
“financeiramente, a implantação de projetos
dos r$ 450 milhões que a finep disponibilizou para
inovadores é extremamente positiva, porque favorece
todo o País, o Paraná ficou com r$ 29,5 milhões —
a abertura de novos mercados e aumenta o valor
recursos destinados a 18 projetos, selecionados
agregado da empresa”, reforça oscar Yamawaki,
de um total de 55 apresentados por empresas
diretor da daiken indústria eletrônica s.a., localizada
instaladas no estado.
em Colombo, na região metropolitana de Curitiba. segundo ele, 40% do faturamento da companhia tem
Telemedicina “inovar é fundamental para se sobressair no mercado”, diz tony novaes, diretor da gelt tecnologia e sistemas, de londrina, responsável por um dos 18 projetos paranaenses selecionados pela finep no
origem na comercialização de produtos lançados nos 24 meses anteriores – o que revela um investimento constante na produção de soluções inovadoras. a daiken atua em três áreas: bancária, automação de trens e acessibilidade. além de atender
edital mais recente. a empresa, que atua nos ramos de tecnologia da informação e telecomunicações, vai receber r$ 2,5 milhões para investir num projeto recursos próprios há três anos. trata-se de um aparelho de monitoramento e diagnóstico cardiológico, que transmite em tempo
divulgação daiken
de telemedicina que já vem desenvolvendo com Piloto automático para trens permite que a locomotiva seja conduzida por um computador de bordo
semfronteiras |
55
tecnologia e inoVaÇÃo ao mercado brasileiro, seus produtos são exportados para a África do sul, a argentina, a Índia e o vietnã. entre os
imcopa, empresa sediada em araucária, que é uma das
projetos atualmente nas pranchetas da daiken, destaca-se
maiores produtoras e exportadoras de derivados de soja
um piloto automático para trens, desenvolvido em parceria
não-transgênica do mundo. o óleo, desenvolvido com o
com a PuCPr. ele permite que a locomotiva seja conduzida
apoio da fundação universidade federal do rio grande
por um computador de bordo, reduzindo o consumo de
(furg), será utilizado na alimentação de peixes nobres
combustível e aumentando a segurança.
criados em cativeiro, em substituição à farinha e ao óleo
na área de acessibilidade, a empresa trabalha no
de peixe usados atualmente.
desenvolvimento de uma plataforma elevatória para
além de garantir uma alternativa sustentável para a
cadeirantes, projetada para permitir o livre acesso de pessoas
indústria de peixes nobres, a troca trará ganhos ambientais.
com limitações motoras a ambientes com arquitetura não-
o diretor de operações da imcopa, José enrique traver,
adaptada (locais com escadas, por exemplo). selecionado
explica que o óleo de peixe utilizado na ração é extraído
no edital 2008 da finep, o projeto vai receber r$ 1 milhão
de espécies de baixo valor comercial, tiradas dos oceanos
da financiadora. segundo Yamawaki, a finep responde por
em grande escala, por meio da pesca predatória, que
cerca de 30% dos investimentos em inovação da daiken. o
prejudica o equilíbrio ambiental. a previsão da imcopa é
restante é bancado com recursos da própria empresa, que
concluir em 2011 a pesquisa, na qual está investindo us$
destina aproximadamente 7,5% do orçamento para pesquisa
10 milhões, dos quais us$ 9 milhões liberados pela finep.
e desenvolvimento.
Internet para todos
Óleo de microalgas
em Cascavel, outra empresa — a sts telecom —
outro produto inovador que deverá sair do Paraná
planeja dedicar os próximos dois anos à concretização de
para o mercado dentro de algum tempo é um óleo derivado
um projeto que promete levar internet banda larga para
de microalgas marinhas que está sendo desenvolvido pela
divulgação imcopa
comunidades não atendidas por operadoras de telefonia convencional. batizado de “alcance iP”, o projeto prevê solução via rádio de baixo custo e longo alcance. o diretor da empresa, adriano stradiotto, diz que desenvolver uma cultura de inovação é a única maneira de garantir a sobrevivência das organizações modernas. “o mercado é dinâmico e isso implica novas necessidades, novas aplicações e novos produtos concorrentes e (ou)
divulgação invent vision
substitutos”, afirma.
Óleo derivado de microalgas para alimentação de peixes criados em cativeiro reduz impacto
Capacidade de ampliação do sistema de imagem e
ambiental
visãoé de 60 a 100 vezes
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alexandre Conter/seti
Catálogo de patentes em dezembro de 2008, a secretaria de estado da Ciência e tecnologia e ensino superior (seti) lançou a primeira edição do Catálogo de Patentes das instituições de Pesquisa, desenvolvimento e inovação do Paraná. a publicação reúne a descrição das patentes, solicitadas e concedidas, de quinze instituições do Paraná. a iniciativa foi do nitpar (núcleo de inovação tecnológica do Paraná), que visa encorajar a invenção,
Catálogo divulga principais linhas de pesquisa das instituições de C,t&i paranaenses
a criatividade e a inovação no Paraná. o catálogo é um conjunto das principais linhas de pesquisa das instituições paranaenses que chegaram a resultados promissores. “a divulgação das pesquisas que já têm resultados concretos facilita a formação de parcerias para novos desenvolvimentos e acelera o ciclo de inovação”, afirma a secretária lygia Pupatto. o catálogo pode ser atualizado diretamente no endereço www.nitpar.pr.gov.br ou pelo e-mail appi@tecpar.br.
Tatames especiais a primeira patente depositada pela universidade federal do Paraná (ufPr) é a dos “tatames especiais”, equipamentos que facilitam os cuidados com os portadores de deficiências múltiplas e de pessoas que precisam de reabilitação e atendimento especial. eles foram desenvolvidos Joka madruga
por estudantes de design da ufPr, em 2002, com apoio financeiro da secretaria de Ciência, tecnologia e ensino superior (seti). os tatames funcionam como suportes moduláveis, com rodízios que se conectam uns aos outros, formando diversos arranjos para atividades de reabilitação e estimulação, como fisioterapia, jogos e outros, e têm altura adequada a cadeiras de rodas e ao trabalho de atendimento. não existe nada similar no mercado nacional. os equipamentos disponíveis ou são muito caros ou Desenvolvidos com recursos do Fundo Paraná, os tatames são utilizados pela instituição “Pequeno Cotolengo”, que atende crianças carentes
não atendem às necessidades dos portadores de deficiência em toda a sua complexidade.
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Pesca duplamente generosa roDrIgo Wolff aPollonI
ProJeto VaI ensInar PesCaDores a CurtIrem Couro De PeIXes
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Nani Góis/ Arquivo SETI
tecnologia e inoVaÇÃo
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Joka madruga
Érika Prisco, artesã da comunidade da Vila das Encantadas, Ilha do Mel: “O artesanato deve contar a história do local”
João Lino de Oliveira, secretário da Associação dos Moradores das Prainhas da Vila das Encantadas, Ilha do Mel: “Os moradores poderão comercializar as peças durante o ano e ter uma renda fora da temporada”
Kátia Schwarz, chefe do Departamento de Ciências Biológicas da Fafipar: “A Ilha do Mel tem um grande potencial”
depois de dias no mar, os pescadores retornam com
com a comunidade — no litoral do Paraná. um deles
os barcos cheios. na praia, as famílias esperam ansiosas
acontece em Pontal do Paraná (o “Projeto Couro
para separar e distribuir os pescados. alguns irão para
de Peixe”) e o outro na ilha do mel (“resgate do
a panela, muitos para as pousadas e restaurantes da
artesanato dos moradores da ilha do mel, com Ênfase
região. À noitinha, em casa, as mulheres limpam os
no Couro de Peixe”), nas comunidades de encantadas e
peixes enquanto os homens, descansados, brincam com
brasília. ambos fazem parte do programa universidade
os filhos e pensam na próxima jornada. Para o cinema,
sem fronteiras, desenvolvido pela secretaria de
esse seria um final perfeito, certo? não para a ciência:
estado da Ciência e tecnologia (seti) para melhorar
afinal, o que as famílias fazem com os restos da limpeza
o Índice de desenvolvimento humano (idh) em áreas
dos pescados? no que depender de pesquisadores da
críticas do estado a partir de iniciativas fundamentadas
faculdade de filosofia, Ciências e letras de Paranaguá
na ciência.
(fafipar), parte dos rejeitos — a pele dos peixes — será
a coordenadora do trabalho, Kátia schwarz
curtida e transformada em couro, com aplicações no
— chefe do departamento de Ciências biológicas
artesanato local e possibilidade de venda ao longo de
da fafipar — explica que, no caso da ilha do mel, o
todo o ano.
trabalho com o couro representa 30% do projeto. em
o curtimento do couro é contemplado em dois
Pontal, é voltado totalmente à produção do couro.
projetos recém-iniciados — a fase é de aproximação
“na ilha, a ideia é resgatar o artesanato tradicional e
60 | semfronteiras
oferecer novos elementos — sem ferir ou abandonar
os turistas”. o suporte inclui, ainda, refrigeradores para
os costumes locais”, esclarece. ou seja: além de
estocar as peles não-processadas (um vai ficar na ilha
aprender a transformar a pele dos peixes em couro,
e o outro, em Pontal), barracas, a produção de uma
os participantes também terão apoio para produzir e
logomarca para o artesanato e a criação de uma página
vender as peças. “um levantamento indica que entre
na internet.
5% e 10% da população residente na ilha do mel possui alguma relação com a produção de artesanato. queremos valorizar essa produção, que é muito rica”. Como na ilha o manejo de substâncias químicas é restrito, em uma primeira etapa as comunidades vão fornecer a matéria-prima (a pele dos peixes) e trabalhar o couro já produzido no curtume de Pontal do Paraná. “no futuro, todo o processo será realizado na ilha”, informa Kátia. “estamos em contato com um pesquisador da universidade estadual do oeste, que desenvolveu uma técnica ecológica de curtimento”. no curtume de Pontal, a produção seguirá um rígido padrão de controle e manejo das substâncias envolvidas.
Originalidade Érika
Prisco
é
artesã
da
comunidade
de
encantadas. ela está especialmente interessada no couro de peixe, matéria-prima que, em sua opinião, guarda relação direta com a realidade da ilha do mel. “artesanato local deve ser feito com elementos locais, deve contar a história do local. uma bolsa de couro de boi, por exemplo, não é artesanato local – afinal, não existem bois aqui. no caso do couro de peixe, isso é diferente”, avalia. segundo Érika, o resgate do artesanato pode fazer com que antigos artesãos da comunidade voltem à ativa. “são pessoas talentosas que, por conta da competição com os produtos do
Envolvimento
Paraguai e de são Paulo, trocaram o artesanato por
os pesquisadores tiveram o cuidado de buscar
atividades de limpeza e coleta de lixo. não que esses
elementos na realidade das comunidades envolvidas.
trabalhos sejam indignos, mas é importante resgatar
Como a pesca é algo central na vida dessas pessoas,
esses talentos”.
Kátia acredita que a ideia tem tudo para vingar. mais
Possidio bresolin produz bijuterias e peças de
ainda porque ela percebe a importância de respeitar
decoração com cipós, bambus e sementes. Para ele, o
as preferências de cada participante. “nosso foco está
resgate do artesanato vai recolocar a atividade em seu
nas mulheres, que normalmente fazem a filetagem dos
lugar de direito. “vai recuperar algo que a comunidade
peixes. elas, assim como o restante da comunidade,
já conhecia e que, com o tempo, se perdeu. no caso
poderão participar de todas as etapas do processo ou,
do couro de peixe, é uma chance de fazer algo novo”,
então, das que preferirem”, explica. algumas pessoas
avalia. “no momento em que as pessoas pegarem
vão extrair a pele, outras vão participar do curtimento,
gosto pela coisa, vão produzir muito e, inclusive, ocupar
outras de sua transformação em artesanato e outras,
o tempo ocioso.”
ainda, da venda das peças.
Para o secretário da associação dos moradores das
Para todas as etapas — a ideia é que o projeto esteja
em
pleno
funcionamento
na
Prainhas da vila das encantadas, João lino de oliveira,
temporada
o projeto pode resgatar a capacidade de autosustento
2009-2010 — haverá capacitação. no caso da produção
dos nativos da ilha. “quando estiverem inseridos nessa
das peças, por exemplo, os artesãos terão informações
produção, eles terão condições de beneficiar, armazenar
sobre empreendedorismo, marketing e etiquetagem
e comercializar as peças de couro ao longo de todo o
dos trabalhos. “tudo, porém, centrado na tradição. a
ano. Com isso, ganharão uma fonte de renda fora da
ideia é fazer com que eles vendam na própria ilha, para
temporada, o que é algo muito importante”.
semfronteiras |
61
Couro de alta qualidade quando ouvi falar pela primeira vez em um
retiradas. tingidas, as escamas podem ser transformadas
projeto de curtimento de couro de peixe, confesso que
em matéria-prima para a produção de adereços. a
imediatamente relacionei a ideia aos popularmente
quarta etapa é a da chamada “calagem”, quando a pele
conhecidos “peixes de couro”, espécies desprovidas de
é colocada na cal para extrair a gelatina nela presente;
escamas como o bagre. a associação parecia ter lógica:
essa fase inclui outros processos químicos. a quinta
afinal, para produzir couro, só mesmo um “peixe de couro”, certo? errado. Como explica Kátia schwarz, a produção de couro nos projetos do litoral paranaense se baseia, principalmente, em espécies de escamas. até o momento foram contemplados linguados, tainhas,
etapa é a de curtimento e fixação com uso de tanino e, na técnica-padrão, de substâncias químicas como o cromo. a sexta etapa é a de coloração. a sétima é a de secagem — o couro é esticado e as rebarbas são recortadas.
peixes-batata, robalos (pega e flecha), paratis, caratingas
Como se pode presumir, a produção de couro a
e bagres — espécies mais do que conhecidas dos
partir dos peixes produz peças relativamente pequenas.
pescadores locais. “os peixes de escamas são preferidos
no caso do ambiente marinho (os projetos desenvolvidos
porque produzem um couro de melhor qualidade. além
no Paraná são pioneiros nesse cenário), os tamanhos
disso, cada espécie fornece um tipo diferente de couro”,
diferem ainda mais. esse fato, porém, não preocupa
revela.
a pesquisadora da fafipar, que observa que as peças
mas que “couro” é esse? na verdade, todos os peixes possuem pele, que, depois de processada, se converte em um couro ao mesmo tempo delicado (semelhante a uma pelica) e resistente. em linhas gerais, diz Kátia, o processamento pode ser resumido em sete
podem ser costuradas em mantas ou, então, usadas no artesanato a partir de suas medidas originais. e em termos econômicos, qual a vantagem? hoje, um quilo de couro (extraído de três ou quatro peixes) é vendido por r$ 1,00, o que, para os pescadores da ilha
ocorre durante a filetagem (isto é, a produção de filés)
do mel, pode representar um incremento mensal de r$
do peixe. na segunda etapa, a pele é enrolada em sentido
180,00 a r$ 250,00 na renda de cada família — um valor
contrário ao das escamas, como um “bife rolê”. na fase
nada desprezível, principalmente quando considerada a
seguinte, toda a carne aderida à pele e as escamas são
sazonalidade da atividade econômica em nosso litoral.
acervo do CPPom-PuCPr
Joka madruga
etapas. a primeira é a de retirada da pele, que em geral
Peixes de escamas são preferidos porque produzem um couro
tingidas, as escamas podem ser transformadas em matéria-
de melhor qualidade
prima para a produção de objetos de decoração
62 | semfronteiras
1. retirada da pele 2. a pele é enrolada em sentido contrário ao das escamas 3. a carne aderida à pele e as escamas são retiradas 4. a pele é colocada na cal para extrair a gelatina nela presente 5. Curtimento e fixação 6. Coloração 7. secagem
semfronteiras |
63
MEIO AMBIENTE
Terra verde Romeu de Bruns
O que o Paraná está fazendo para tornar a produção de alimentos
Nilton Rolin
menos agressiva para o meio ambiente
64 | semfronteiras
o agricultor Luiz antonio arruda, de são
convencional para adotar práticas orgânicas.
miguel do iguaçu, no oeste do Paraná, fez a
eles são assistidos — desde o plantio e o
conversão de sua propriedade para a agricultura
cultivo até o beneficiamento dos produtos e a
orgânica há sete anos. “estava enjoado de
comercialização — pelo Cultivando Água Boa,
mexer com veneno”, afirma o produtor, que
programa socioambiental da itaipu Binacional
chegou a ser internado, vítima de intoxicação
que reúne mais de dois mil parceiros, entre
por agrotóxicos. além da questão de saúde, ele
órgãos
enfrentava dificuldades para se manter com a
organizações não-governamentais, instituições
agricultura convencional, principalmente pela
de ensino e associações comunitárias, em torno
dependência de insumos. na época, plantava
de iniciativas que têm como principal objetivo
soja e mandioca.
diminuir os passivos ambientais da Bacia
de
governo
estaduais
e
federais,
Hoje, arruda trabalha com pepino, café,
do Paraná 3 (a parte que está conectada ao
acerola, goiaba e abacaxi, entre outros produtos
reservatório da hidrelétrica). o Cultivando Água
que são certificados pela Rede ecovida, ou
Boa figura entre as principais iniciativas em
seja, recebem um selo garantindo que a sua
curso no Paraná que têm o objetivo de promover
produção não envolve o uso de agroquímicos.
uma produção de alimentos que agrida menos o
a renda praticamente triplicou: ele recebe
meio ambiente.
mensalmente entre R$ 1.200 e R$ 1.500, com
Hoje,
segundo
a
emater,
o
estado
a comercialização em feiras, por meio da Cesta
soma 4.500 produtores orgânicos (30% do
Verde, de foz do iguaçu, e para o governo, por
total nacional), o que dá uma dimensão da
meio do programa fome Zero. e a mudança lhe
contribuição estadual para o destaque que o
permitiu abrir uma nova frente de negócios, o
Brasil vem conquistando nesse campo. o país
turismo rural. “Já recebi gente até da dinamarca,
é hoje o terceiro em áreas destinadas a esse
que vem conhecer essa forma de produção”,
tipo de plantação, com 1,7 milhão de hectares,
comemora.
superado apenas pela austrália e pela argentina,
arruda está entre os cerca de mil
de acordo com os dados mais recentes da
agricultores do oeste paranaense que nos
federação internacional de movimentos de
últimos
agricultura orgânica (ifoam).
anos
abriram
mão
da
produção
semfRonteiRas |
65
MEIO AMBIENTE
sustentabilidade AgriculturA orgânicA e AgroecologiA afinal, o que constitui uma agricultura sustentável? na
pois hoje acumula uma vasta gama de conhecimentos
opinião da doutora em meio ambiente e desenvolvimento
e de técnicas que permitem produzir com o mínimo de
econômico Vanessa fleischfresser, do instituto Paranaense
impacto ambiental, além de ter grande disponibilidade de
de
terras aptas a esse tipo de produção, com extensas áreas
desenvolvimento
econômico
e
social
(ipardes),
sustentabilidade é um conceito que envolve questões
planas e de alta fertilidade”, afirma Vanessa.
produtivas, ambientais e sociais, mas que está sujeito a uma
Como as visões sobre sustentabilidade variam,
grande variedade de interpretações. Para ela, uma atividade
mesmo a forma de produção orgânica está sujeita a
sustentável deve necessariamente gerar benefícios para a
controvérsias. segundo o coordenador do Programa de
sociedade, sem prejuízos para o meio ambiente.
Pesquisa em agroecologia do instituto agronômico do
disso decorre que toda a produção agrícola, pecuária
Paraná (PaG/iapar), dirk ahrens, a crítica mais forte à
e florestal pode ser sustentável, desde que não agrida o
produção orgânica é que ela apenas substitui insumos
solo, respeite as encostas de morros, observe a necessidade
agroquímicos e tóxicos por insumos alternativos, mas
de preservar a mata nativa dentro dos parâmetros
sem necessariamente preocupar-se com sustentabilidade.
estabelecidos por lei, e conserve as nascentes, os cursos
“a produção sustentável de alimentos muitas vezes
d’água e a biodiversidade. “o Paraná tem um grande
não acontece na produção orgânica, diferente da
potencial para desenvolver uma agropecuária sustentável,
agroecológica”, aponta ahrens. a agroecologia vai
divulgação iapar
além do conceito da agricultura orgânica, pois trabalha com uma visão de sistema agroecológico. Considerada por muitos uma ciência, ela trabalha com a proteção da biodiversidade, respeitando os ciclos biológicos e favorecendo a atividade biológica do solo. também busca otimizar o uso dos insumos, reduzindo ao mínimo a dependência de produtos externos. atuando nessa linha, o PaG/iapar foi criado em 2004 e reúne representantes do corpo técnico do Governo do estado e instituições de ensino e pesquisa. o programa coleciona dezenas de linhas de pesquisa, tais como: a melhoria do uso de biomassa na produção agrícola; o controle eficiente de pragas e doenças em hortaliças, Propriedade agroecológica em Colombo, região metropolitana de Curitiba. ao todo, o governo do Paraná apoia 50 projetos nessa área, em 121 municípios.
66 | semfRonteiRas
sobretudo para plantas de frutos (como tomate, pimentão e pepino) e tubérculos (batata, cebola); a investigação sobre produtos alternativos para alimentação de aves e suínos, e muitas outras.
divulgação iapar
Plantio direto BiomAssA que protege
Plantio direto, técnica que ajuda a diminuir os impactos ambientais
mesmo com a eficiência comprovada em diversas das técnicas da agroecologia, a realidade é que se trata de uma prática ainda distante para muitos produtores. Por isso, outras modalidades que não incluem todos os requisitos da sustentabilidade, mas que já possibilitam menos impactos ambientais, têm se propagado mais fortemente. o melhor exemplo disso é uma técnica genuinamente paranaense e que avançou muito nas últimas décadas: o plantio direto. Criada em 1970, essa modalidade de plantio consiste em deixar sobre o solo as palhas e restos vegetais de uma safra anterior. essa biomassa serve como adubo e também protege o solo no período de entressafra, quando, no plantio normal, a terra fica exposta e vulnerável a
sem considerar as pastagens, o Paraná tem sete milhões de hectares de terras agricultáveis com diversos graus de qualidade. desses, aproximadamente cinco milhões de hectares são cultivados sob o regime de plantio direto. Considerado por alguns um modelo de agricultura sustentável, para oferecer o máximo de benefícios, essa técnica precisa obedecer a três princípios: movimentação
alto
grau
agroecologia de fato. e essa é uma das novas linhas de pesquisa do iapar. “o cultivo orgânico exige muito conhecimento. o controle de plantas daninhas, por exemplo, apresenta muitas dificuldades. Por enquanto, tem-se observado um avanço maior das técnicas orgânicas nas culturas permanentes, como a fruticultura e o café, e nas hortaliças. nas culturas anuais, de áreas mais extensas, ainda está apenas engatinhando e as tecnologias agroquímicas imperam porque simplificam muito o manejo”, diz Rafael fuentes, pesquisador da Área de
de
disseminação
mestre em economia agrária e doutor em agronomia, fuentes coordena juntamente com a emater um projeto de redes de referência para a agricultura familiar. segundo ele, apesar de existirem grandes produtores do cerrado que adotam a linha da soja orgânica, por exemplo, ainda é na agricultura familiar que reside o maior potencial. “o sistema orgânico dá mais trabalho e a agricultura familiar é o setor que mantém mais gente envolvida. Por isso, tem capacidade
mínima do solo, manutenção e rotação de culturas. do
direto orgânico, como etapa intermediária para se alcançar a
socioeconomia do iapar.
situações de clima adverso.
apesar
do não emprego de agrotóxicos, para se chegar ao plantio
pelo
estado, essa técnica demonstra como é necessário um acompanhamento constante dos órgãos governamentais
de assumir mais tarefas”, completa.
Pilares de sustentação do sistema plantio direto
de pesquisa e de apoio ao meio rural, pois, com o tempo, muitos agricultores tendem a uma simplificação das práticas e já não obtêm os mesmos resultados. “tem produtor que alega que está perdendo água e solo, que a técnica já não está mais respondendo. mas, na verdade, não a utilizam como ela foi concebida”, afirma arnaldo Colozzi filho, diretor técnico-científico do iapar. “Para que haja eficiência, o solo precisa estar sempre coberto e a rotação e diversificação de culturas são fundamentais”. Como o plantio direto é uma técnica que melhora a produtividade e ao mesmo tempo diminui a necessidade de insumos, basta acrescentar um quarto princípio, o
A. não revolvimento do solo | B. diversificação de culturas (rotação, adubos verdes, lavoura pecuária) | C. cobertura vegetal permanente (viva ou morta) | D. manejo integrado (pragas, doenças, plantas invasoras)
semfRonteiRas |
67
manejo integrado de pragas reduzindo Agroquímicos
conhecimento científico para que se possa conviver com os insetos, artrópodes e aracnídeos da maneira mais
as facilidades proporcionadas pelos agroquímicos
racional possível. se existem alguns ácaros na lavoura,
no cultivo de grandes lavouras são grandes causadoras de
por exemplo, não necessariamente isso significa que seja
desequilíbrios. tentados a lançar mão de veneno diante
uma praga”, afirma morales, que espera uma redução de
de qualquer meia dúzia de insetos que apareça sobre as
10% nas aplicações de veneno na próxima safra.
plantas, os agricultores estão recorrendo cada vez mais aos
outra técnica que se ocupa da poluição ambiental
agrotóxicos. Há oito anos, eram 2,14 aplicações, em média,
e dos riscos para a saúde humana embutidos nos
por safra. Hoje, a quantidade praticamente dobrou e chega a
agrotóxicos, é a fixação biológica de nitrogênio. o
4,06 aplicações. “É um acréscimo de mais de 10% ao ano. se
assunto é tema de uma iniciativa que reúne o governo
não fizermos nada agora, imagine como estaremos daqui a
federal, Petrobras, fundações de apoio à pesquisa e
10 anos”, questiona Lauro morales, engenheiro agrônomo e
diversas universidades espalhadas pelo país, entre elas
entomologista da emater, em Londrina.
as paranaenses ufPR, unioeste, ueL e a uePG. Cada
Pensando nisso, a emater e a embrapa lançaram no
instituição tem um grupo que desenvolve suas pesquisas
Paraná o programa manejo integrado de Pragas, voltado
de forma integrada e complementar, com o objetivo de
principalmente às grandes lavouras de soja, milho e trigo.
entender os mecanismos moleculares envolvidos na
montado por entomologistas, o projeto tem como objetivo
fixação de nitrogênio, nas interações entre plantas e
reduzir o uso de agroquímicos entre 30% e 40% dentro dos
bactérias fixadoras, no desenvolvimento de variedades
próximos cinco anos. a iniciativa promoveu a capacitação
de culturas como cana-de-açúcar, arroz, trigo e milho que
de 70 técnicos em agronomia de diversas regiões do
respondam melhor aos processos de fixação, entre outras
estado. esses técnicos irão transmitir as informações que
linhas de investigação.
receberam para outros 600 técnicos. “a ideia é difundir o
Conforme o cientista fábio de oliveira Pedrosa, da
sXC
ufPR, trata-se de um projeto muito amplo e de grande repercussão para a agricultura brasileira. somente o uso da tecnologia de inoculação da soja com estirpes selecionadas das bactérias Bradyrhizobium japonicum e Bradyrhizobium elkanii representaria uma economia de cerca de 6 bilhões de dólares em fertilizante nitrogenado. “ao substituir o fertilizante nitrogenado químico, as bactérias fixadoras de nitrogênio praticamente acabam com a poluição ambiental provocada por esses compostos. dados experimentais demonstram que menos de 50% do fertilizante químico aplicado às culturas é efetivamente assimilado pelos vegetais. o restante ou é levado pela chuva indo poluir rios, lagos e aquíferos, ou é perdido O Manejo Integrado de Pragas pretende reduzir o uso de agrotóxicos nas lavouras paranaenses
para a atmosfera na forma de gases óxidos de nitrogênio capazes de promover o efeito estufa e contribuir para o aquecimento global”, explica Pedrosa.
68 | semfRonteiRas
Produção em harmonia seringueirAs e sigAtokAs dois projetos executados no Paraná demonstram
mediante o programa universidade sem fronteiras. a
que é possível conciliar a geração de renda com a
sigatoka é uma doença comum nos bananais localizados
preservação de matas nativas. o primeiro é a implantação
no litoral paranaense. Como há muitos produtores que se
de seringueiras na reserva legal. o iapar desenvolveu
encontram dentro da Área de Proteção ambiental (aPa)
uma pesquisa nesse campo que apurou as condições
de Guaraqueçaba e de antonina, existe a necessidade de
ideais de manejo, com espaçamento bem definido,
produzir de maneira sustentável.
intercalando essa espécie exótica com cinco espécies
“os resultados são preliminares, mas possibilitaram
nativas. “a seringueira é uma cultura estratégica para
verificar que houve significativa inibição no crescimento da
as funções ecológica e econômica, tem também uma dimensão social, que é a fixação do homem no campo”, afirma Jomar da Paes Pereira, consultor da fundação araucária que atua no projeto. o outro projeto é o Controle da sigatoka negra e da sigatoka amarela em sistemas orgânicos de Produção no Litoral do Paraná, financiado pela secretaria de estado da Ciência e da tecnologia do Paraná (seti),
sigatoka negra com água de xisto fixada, um subproduto do processo de extração de óleo de xisto da usina da Petrobrás em s. mateus do sul e ainda em estudo, e também extrato de alho”, afirma o pesquisador nilceu Ricetti de nazareno. “a importância do desenvolvimento de tecnologias alternativas, como o controle biológico de pragas e doenças, é cada vez maior à medida que aumenta a demanda do público consumidor para produtos de origem orgânica”.
divulgação iapar
o país, altamente rentável e que além de cumprir com
Pesquisadores do iapar estudam o controle da sigatoka negra e da sigatoka amarela, doença que ataca os bananais do litoral paranaense
semfRonteiRas |
69
integrAção e estABilidAde
Alexandre Marchetti
Pecuária
na fazenda star milk, em Céu azul, oeste paranaense, os dejetos da criação de gado são aproveitados para a geração de energia elétrica por meio de biodigestores
a pecuária figura entre as vilãs do meio ambiente,
de modo geral, têm apoiado as atividades de integração
haja vista que leva a fama — e com justiça — por grande
lavoura-pecuária porque é um sistema que traz maior
parte do desmatamento da amazônia, além da enorme
estabilidade aos produtores rurais, diminuindo os riscos de
quantidade de efluentes que produzem. Para se ter uma
insucesso”, completa alves.
idéia, um porco, por exemplo, produz 14 vezes mais esgoto
outro exemplo de iniciativa que visa diminuir os
do que um homem adulto. Por isso, falar em pecuária
impactos ambientais da pecuária vem do oeste paranaense,
sustentável é algo que pode fazer muitos ambientalistas
uma
torcerem o nariz. Porém, o iapar quer demonstrar que
agroindustriais e que soma cerca de 25 mil propriedades
a criação animal pode ser sustentável por meio da
rurais. mediante um trabalho feito em conjunto com a
integração Lavoura-Pecuária. segundo sérgio José
sanepar, a Copel e a Cooperativa Lar, a itaipu organizou um
alves, um dos técnicos responsáveis pelo projeto, trata-
conjunto de seis unidades que demonstram a viabilidade
se da implantação de um sistema com interfaces entre
técnica e econômica da produção de energia a partir de
pastagens e cultivos agrícolas, de maneira a gerar
dejetos, com o uso de uma metodologia conhecida como
benefícios para ambas as atividades e reduzir os impactos
geração distribuída (que no jargão técnico significa a
ambientais. “sistemas bem manejados de produção animal
geração energética junto ao local onde é consumida). agora,
integrados com agricultura têm permitido a obtenção
o programa parte para uma nova etapa, com a constituição
de altas produtividades de leite, carne e grãos, a custos
de um condomínio de energias renováveis, agrupando
competitivos e com alta sustentabilidade”, garante.
diversas propriedades rurais na bacia do rio ajuricaba, em
Para difundir essa técnica, o iapar tem trabalho
região
largamente
dependente
de
atividades
marechal Cândido Rondon.
principalmente com as cooperativas do estado. anual-
esse tipo de produção energética permite utilizar as
mente, em média, mais de cinco mil produtores par-
sobras do processo produtivo, principalmente os dejetos
ticipam dos dias de campo, palestras e treinamentos.
de suínos, bovinos de leite e aves, que são canalizados
de uma área inicial e de baixa tecnologia em integração
para um biodigestor, onde geram biogás que é utilizado
lavoura pecuária existente no Paraná, no final dos anos
como combustível em um motogerador. este, por sua vez,
90, estima-se que, atualmente, mais de 300 mil hectares
supre a eletricidade necessária às diversas atividades
estejam sendo utilizados nesse sistema. “as cooperativas,
em uma propriedade rural, como o aquecimento de um
70 | semfRonteiRas
aviário ou mesmo o abastecimento das residências.
remunerada pela Copel, algo até então inédito do país.
as sobras do processo podem ser utilizadas como
“além da dimensão ambiental, porque o dejeto que ia para
fertilizante natural.
o rio passa a ser tratado e aproveitado na propriedade, o
esse tipo de geração já é pesquisado no Brasil
projeto tem uma dimensão econômica muito forte, pois
desde meados do século passado, mas a novidade do
gera uma nova fonte de renda para produtores rurais, com
projeto está em um painel de controle que permite
a venda da energia excedente e também de créditos de
gerenciar o fluxo de energia e enviar o excedente
carbono, por meio dos projetos de mdL (mecanismo de
para a rede pública, transformando as fazendas
desenvolvimento Limpo)”, afirma o superintendente de
em microcentrais termelétricas movidas a biogás.
energias Renováveis da itaipu, o engenheiro agrônomo
essa sobra de energia vendida para o mercado é
Cícero Bley.
Joka madruga
Certificação pública o instituto de tecnologia do Paraná (tecpar) faz a certificação de produtos orgânicos com respaldo da international federation
of
organic
movements
(ifoam),
agriculture
instituição
alemã
reconhecida nesse setor. Para receber a acreditação, o tecpar precisou cumprir critérios rígidos e foi auditado pela international organic accreditation service (ioas). Para o produtor, o selo do instituto é garantia de novos mercados.
ipardes/iapar/seti
polos de certificação no paraná
Morango certificado pelo Tecpar
semfRonteiRas |
71
MEIO AMBIENTE
Tempo e tempestades
Antonio cruz
Romeu de BRuns
enchente no nordeste
72 | semfRonteiRas
o aqueCimento GLoBaL sinaLiZa PaRa um quadRo de CHuVas mais intensas
daniel marenco
e enCHentes, mas seRÁ que estamos PRontos PaRa enfRentÁ-Las?
seca no sul
semfRonteiRas | 73
a ideia de um país com características geológicas e
entre as previsões do instituto destaca-se o aumento
climáticas privilegiadas, à prova de tragédias como tantas
da intensidade de fenômenos mais extremos como secas
que já acometeram outras partes do mundo, não coincide
e tempestades. outros prognósticos têm sido apontados
com os fatos históricos. na cidade do Rio de Janeiro,
como otimistas demais, por exemplo, o aumento do nível
por exemplo, há registros de fortes cheias, com mortos,
dos oceanos, que subiria 60cm até 2100. em fevereiro
feridos e grandes prejuízos materiais, pelo menos desde
deste ano, dois cientistas, o alemão stefan Rahmstorff e a
o século 18.
francesa anny Cazenave, apresentaram na última reunião
no estreito espaço entre o oceano e a serra do mar,
da sociedade americana para o avanço da Ciência, em
com rios curtos sujeitos a cheias e montanhas de formação
Chicago, estudos independentes sobre a velocidade do
muito antiga, vulneráveis a desmoronamentos, tem-se o
mar, que seria o dobro do que foi medido no século 20; em
cenário perfeito para desastres como o que ocorreu em
2100, o nível do mar seria 1,80 m maior, segundo eles.
santa Catarina no final do ano passado, resultando em
ainda em Chicago, Chris field, que é membro do
mais de 100 mortos e 78 mil desabrigados. esse balanço
iPCC, afirmou que as temperaturas futuras vão ultrapassar
trágico provoca reflexões e lança desafios aos governos e
todas as previsões já feitas. nessa mesma reunião, outros
à sociedade, especialmente se for considerado que, quatro
cientistas divulgaram previsões sobre a calota polar ártica,
meses após o episódio, outras enchentes castigaram
a qual, segundo eles, deverá derreter completamente
minas Gerais, Rio de Janeiro e são Paulo, com mortes e
até 2030. neste caso, o derretimento também tem-se
danos materiais. afinal, que tipo de cidades e de planeta
verificado mais rápido do que se previa, tendo em vista que
desejamos para a atual e as futuras gerações?
o aquecimento global provocou uma reação em cadeia, com
as chuvas em santa Catarina e no sudeste do Brasil
as águas do atlântico, mais quentes, se deslocando para
ocorreram em paralelo a uma série de fenômenos climáticos
o norte, somando-se à atmosfera, também mais quente,
intensos mundo afora, como as nevascas na inglaterra
sobre a superfície do Ártico. ou seja, há derretimento em
(as piores dos últimos 18 anos), o inverno rigoroso nos
cima e embaixo da calota.
estados unidos e as chuvas torrenciais na indonésia, entre outros. esses acontecimentos correspondem ao quadro
dificuldades
de caos climático previsto pelo Painel intergovernamental
diante disso, é natural questionar se aqui no Brasil
de mudanças Climáticas (iPCC, em inglês) em 2007, como
João Carlos frigério
decorrentes do aquecimento global.
istockphoto
os desastres climáticos típicos — como as tradicionais
enchentes em santa Catarina deixaram mais de 100 mortos e 78 mil desabrigados em 2008
74 | semfRonteiRas
nevasca em nova iorque durante o inverno de 2008
município de Piên/divulgação/sema
Programa Mata Ciliar, do Governo do Paraná, ajuda a preservar rios e nascentes
enchentes do sul e do sudeste — já apresentam influência do
nobre, no entanto, ressalta que ainda é difícil
aquecimento global. os climatologistas brasileiros sinalizam
determinar
que sim, apesar de serem cautelosos ao estabelecer o grau
aquecimento global sobre desastres como o que ocorreu
exatamente
o
grau
de
influência
do
de parentesco entre esses fenômenos. Para Carlos nobre,
em santa Catarina. a Região sul costuma ser bastante
do instituto nacional de Pesquisas espaciais, e integrante
afetada pelos fenômenos el niño e La niña: o primeiro
do quarto e mais impactante relatório produzido pelo
provoca chuvas e o segundo secas como as que atingiram
iPCC, as mudanças climáticas já podem ser percebidas no país, especialmente na Região sul. a quantidade de chuva, por exemplo, por enquanto não apresentou mudanças significativas quanto à média anual, mas há indícios de que as tempestades estão ficando mais intensas, sugerindo uma sintonia com o tipo de quadro climático decorrente do aquecimento global previsto pelo iPCC.
a agricultura na argentina e o sul brasileiro recentemente. mas se a época era de La niña — portanto de seca — os fatores que provocaram fortes chuvas no estado deveriam ter sido outros. “as águas do oceano atlântico estavam com temperaturas acima do esperado para novembro. isto provocou um fluxo intenso de umidade do mar para
semfRonteiRas |
75
o continente. É uma situação difícil de ocorrer e analisar,
estudando isso, mas ainda é cedo para tirar conclusões. o
mas poderia ocorrer mesmo que o planeta não estivesse
que é seguro afirmar é que os efeitos do aquecimento global
aquecendo”, afirma o climatologista.
são mais visíveis nas regiões polares e subtropicais, onde as séries de informações são mais extensas”, completa nobre.
a dificuldade em se fazer uma análise mais precisa reside justamente na falta de séries históricas de dados climáticos com mais de 50 anos, que são raras no Brasil.
influência antrópica
na argentina, como esse acompanhamento é feito há mais
independente da influência do aquecimento global, o
tempo, foi possível detectar, por exemplo, que o número
fato é que as atividades humanas e principalmente a forma
de chuvas intensas (com mais de 100mm de precipitação
de ocupação do solo são fatores determinantes sobre o
em dois dias) aumentou muito nos últimos 20 anos, em
saldo de enchentes e outros desastres correlatos, como
comparação com meio século atrás, e é bastante provável
enxurradas e desabamentos de encostas. a hidróloga ingrid
que isso esteja ocorrendo também nas terras brasileiras
müller, do instituto de tecnologia para o desenvolvimento
mais meridionais.
(Lactec), de Curitiba, tem um histórico profissional de
a carência de estudos mais antigos dificulta, também,
diversas pesquisas sobre a influência antrópica sobre bacias
precisar a influência do desmatamento da amazônia, a
hidrográficas. entre as principais influências, destaca-se a
principal contribuição do país para o aquecimento global,
retirada da cobertura vegetal, o que acarreta o aumento da
sobre o regime de chuvas do sul do Brasil. “tem muita gente
velocidade do escoamento, ou seja, as águas chegam mais
Joka madruga
rapidamente aos rios. este tipo de situação ficou comprovado na Região oeste do Paraná, onde as vazões do Rio Paraná, na fronteira entre Brasil e Paraguai, são acompanhadas desde 1930. a colonização e o crescimento impulsionado pela agropecuária na região, nas décadas de 1950 e 1960, alteraram significativamente o regime fluvial na bacia. “o aumento médio das vazões afluentes a usina de itaipu após 1960 viabilizaram o acréscimo de duas turbinas ao projeto original da hidrelétrica de itaipu”, explica a hidróloga. nos deslizamentos de terra que ocorreram em santa Catarina no final do ano passado, a conexão com o desmatamento ficou evidente, já que 85% deles se deram em áreas que perderam a cobertura vegetal original. “as cidades raramente cumprem o que prevê o código florestal, que estabelece como área de proteção permanente 30 metros de matas em torno das margens e 50 metros em torno das nascentes dos rios. Como muitas coisas estão sendo reconstruídas no mesmo lugar, especialmente estradas e pontes, é uma questão de tempo até que a tragédia se repita”, prevê a professora da universidade de Blumenau Beate frank, que participa ativamente do Comitê da Bacia do Rio itajaí. esse comitê foi criado como resposta às enchentes de Troncos de árvores são expostos no centro de Curitiba para alertar
1983 e 1984 na região. Paralelamente, surgiu um grupo de
a população sobre os efeitos do desmatamento
estudos na universidade que, de lá para cá, acumulou uma
76 | semfRonteiRas
bagagem técnica e científica sobre enchentes, somando
conhecimentos
de
áreas
como
meteorologia, geologia, hidrologia e ciências sociais. “a experiência do grupo mostrou que
Contradições
há a necessidade de gestão local das bacias e a própria legislação estabelece que a gestão territorial cabe ao município”, ressalta Beate.
o Brasil tem assumido posições contraditórias
“mas existe uma dificuldade muito grande porque
em relação às medidas de combate ao aquecimento
a cada quatro anos tem-se que recomeçar do
global. o ministro do meio ambiente, Carlos minc, de sua parte, defende que os países adotem metas mais
zero”, afirma. outra
dificuldade
está
na
falta
de
articulação entre os municípios em torno dos problemas da bacia. Há o caso, por exemplo, de uma cidade do litoral catarinense que amenizou seus problemas com a implantação de uma
ousadas de redução das emissões de Co2. em fevereiro, em um evento promovido pelo Programa das nações unidas para o meio ambiente (Pnuma), ele apresentou uma proposta chamada espiral descendente de Carbono, que prevê a responsabilidade conjunta, mas diferenciada, de países desenvolvidos e em
obra que agravou a situação na cidade vizinha.
desenvolvimento. na ocasião, ele também apresentou
esse descompasso é influenciado pela própria
o Plano nacional de mudanças Climáticas, lançado em
complexidade do fenômeno climático: enquanto
2008, que estabeleceu como meta reduzir em 70% o
as enxurradas ocorrem dentro dos municípios,
desmatamento da amazônia até 2017.
as enchentes podem afetar toda uma bacia hidrográfica, um espaço geográfico mais amplo e que raramente conta com uma articulação político-administrativa. “apesar do esforço de um grande número de pessoas, a bacia não é tratada de forma sistêmica e por isso não se tem no país um resultado efetivo quanto ao melhor gerenciamento de desastres”, sublinha Beate.
mas, se por um lado o Brasil anuncia planos de reduzir o desmatamento (sua principal contribuição para o aquecimento global), de outro dá sinais de piora do efeito estufa, quando o assunto é produção de energia. o Plano decenal de expansão da energia, cuja consulta pública se encerrou no último dia 28 de fevereiro, prevê para o país uma matriz cada vez mais “suja”, contrariando a tendência internacional
um ponto positivo na prevenção de eventos
e amplamente defendida pela onu, de emprego
climáticos extremos é uma maior cooperação
crescente de fontes renováveis de energia como
entre serviços meteorológicos de países vizinhos
principal estratégia para o combate ao aquecimento
ao Brasil, o que tem permitido diagnósticos
global e às mudanças climáticas.
mais precisos sobre fenômenos que se formam
Conforme o plano, para produzir energia elétrica,
no Cone sul. trata-se de um centro virtual
o Brasil usará cada vez mais termelétricas movidas a
— portanto, uma rede de troca de dados via
combustíveis fósseis, perdendo a oportunidade de
internet — que reúne os sistemas nacionais de
ampliar a participação de fontes de baixo carbono,
meteorologia da argentina, Brasil e uruguai e
como é o caso da eólica, da solar e da biomassa. assim,
que foi inspirado por uma iniciativa semelhante
até 2017, a participação de hidrelétricas para a geração
na europa. o projeto surgiu a partir da ocorrência
de energia deverá ser reduzida de 84% para 76%,
do furacão Catarina na costa sul, em março de
enquanto as térmicas a gás, carvão e diesel deverão
2004, e vem sendo construído baseado na ideia
subir de 12% para 17%. a energia eólica, modalidade
de que somente com a sofisticação dos métodos
que mais cresce no mundo todo, terá um incremento de
e com a troca de informações é que será possível
apenas 2,7 pontos percentuais: de 1,3% para 4%.
prever eventos como esse.
semfRonteiRas |
77
MEIO AMBIENTE
Pesquisa confirma: Região sul está mais quente no estudo “aquecimento global e suas manifestações regionais e locais”, financiado pelos ministérios da saúde, da Ciência e tecnologia, pela unesco e pela secretaria de estado da Ciência, tecnologia e ensino superior (seti)/ fundação araucária, o professor de Geografia da universidade federal do Paraná, francisco mendonça, identificou um aquecimento de 1,3ºC nos últimos quarenta anos em várias localidades da Região sul do Brasil. o estudo abrangeu 38 localidades, sendo oito no Paraná, sete em santa Catarina e 23 no Rio Grande do sul, e teve como ponto de partida a base de dados meteorológicos do instituto nacional de meteorologia (inmet), instituto agronômico do Paraná (iapar), empresa de Pesquisa agropecuária de santa Catarina (epagri) e fundação de Pesquisa agropecuária do Rio Grande do sul (fepagro) 1961-2004. “os dados foram tratados estatisticamente por meio de tendência linear e polinomial. o primeiro exercício revelou tendência linear à elevação em cerca de 90% das localidades, fato que reflete a tendência geral de aquecimento da atmosfera do planeta na escala regional”, explica o fonte: “aquecimento global e suas manifestações regionais e locais”, de francisco mendonça
professor. segundo ele, os dados demonstram que o aquecimento na Região sul foi mais intenso na porção norte, ou seja, no estado do Paraná, onde se evidenciam invernos menos frios e chuvas mais concentradas nas últimas décadas. “mas nem toda a região tem indicado tendência ao aquecimento, sendo que numa parte o que se destaca é a tendência de resfriamento, como se pode notar nos indicadores da serra Gaúcha e de
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algumas localidades do Paraná. Há aí, nesta tendência
ambiental regional, pois quanto mais concentrados os
à redução térmica, um ponto importante para o
episódios pluviais tanto mais rápidos e concentrados
aprofundamento das pesquisas”, afirma o geógrafo.
também
se
desenvolvem
os
processos
erosivos.
Já as alterações no regime e no total das
“Considerando que parte representativa do oeste-
chuvas não são muito expressivas, observa. “elas
noroeste do Paraná e do sul-sudoeste do Rio Grande do
se manifestam principalmente na concentração da
sul já apresenta problemas relacionados a processos
queda d’água da atmosfera em eventos pluviais mais
erosivos, imagina-se que, com as alterações climáticas
extremos, ou seja, a elevação nos totais pluviométricos
observadas, estes venham a se agravar. tal concentração
não significa nem uma melhor distribuição sazonal nem
revela-se impactante também no processo de cheias,
espacial das chuvas no âmbito regional”.
enchentes e inundações que colocam em situação de
nesse contexto, conclui, a pluviosidade concentrada apresenta desafios ainda maiores ao equilíbrio
risco e vulnerabilidade um contingente cada vez maior da população regional”. (RR)
Cartilhas uma cartilha com “101 dicas que contribuem para a redução das mudanças climáticas” está sendo distribuída pelo governo paranaense. as dicas se concentram nos setores que mais emitem os gases de efeito estufa, como economia de energia elétrica; economia de combustíveis fósseis no transporte; plantio de árvores para sequestro de carbono; reciclagem e reuso de produtos para diminuir os resíduos. a cartilha é uma das contribuições do fórum Paranaense de mudanças Climáticas Globais, criado em 2005. a secretaria de estado do meio ambiente também elaborou “Comunicando mudanças climáticas”, “entendendo as mudanças climáticas” e “aquecimento global 51 coisas que podemos fazer”. mais informações sobre o fórum e artigos científicos sobre o tema em
divulgação sema
divulgação sema
www.meioambiente.pr.gov.br e www.ecoclima.org.br.
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humanidades
rede usada durante partida que marcou o milésimo gol de pelé e camiseta da seleção brasileira de Futebol vestida por Mané Garrincha
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Futebol, razões e sentimentos
Acervo Museu do Futebol-Maracanã/ Ivo Gonzalez/ Agência O Globo
Luiz Carlos Ribeiro
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escrever sobre futebol é falar da alma e do
século XiX, o esporte torna-se uma tradição
coração dos homens e das sociedades. Por mais que
entre as classes médias burguesas, composta
as ciências sociais insistam em ignorar a relevância
por comerciantes, profissionais liberais e jovens
do futebol como objeto de compreensão do social,
estudantes das public schools inglesas. É uma
ele se encontra profundamente imbricado com a
prática que se fortaleceu no corpo de uma
sociedade contemporânea. Mas o futebol fala de
complexa cultura de distinção burguesa de
lugares inatingíveis pelo racional-cientificismo.
classe. Precisando distinguir-se das altas classes
Lugares da paixão e dos sentimentos que borram
burguesas e da nobreza e, sobretudo, das massas
os limites da razão. e talvez seja por isso que o meio
proletárias, a emergente classe média britânica
acadêmico tem receio de falar dele. os cientistas
desenvolveu uma série de costumes de distinção
sociais preferem o campo seguro dos temas ditos
social, entre outra a da prática de esportes, como
sérios, como se estado, classes sociais ou partidos
o futebol (Hobsbawm, 1997:296).
políticos existissem sem sentimentos.
em síntese, o esporte moderno — como o
no Brasil, em especial, o identitário nacional é
futebol — nasce como uma atitude política de
carregado do imaginário mítico do futebol. Para uns,
classe, de ocupação de seu tempo livre. De forma
ele é a síntese de nosso “caráter nacional” mestiço
consciente ou inconsciente — é irrelevante em
e malandro, na linha da miscibilidade freyreana,
nosso raciocínio
também presente nas leituras apaixonadas de
política de distinção e afirmação de classe. o
um Darci ribeiro ou de um DaMatta sobre o povo
futebol era atividade física praticada aos sábados
brasileiro. Para este, o futebol — assim como os
à tarde e aos domingos e se realizava entre
passos do capoeira ou do sambista — deveria ser
amigos de trabalho, de bairro ou de escola, dentro
analisado como “um drama da vida social” brasileira.
ou fora de seus clubes sociais. a participação
só a dramatização do social poderia explicar a
era de tal modo discriminadora que seguir as
relação futebol e sociedade no Brasil, afirma o
regras do jogo e controlar a violência eram sinais
antropólogo (DaMatta, 1982:40). Para outros,
de honra e civilidade. Praticar apenas entre os
permanecendo ainda no campo da explicação
pares era uma forma de, pela exclusão, alienar o
mítico-ideológica, o futebol seria ópio, alienação.
esporte das tensões presentes na sociedade. Por
Por essa matriz de negação ou de incapacidade de
isso a defesa do esporte apenas como diversão,
o futebol explicar o real, seria inútil seu estudo.
desprendimento, amadorismo e fair play.
Mas o futebol é realmente uma forma de
o
—
amadorismo
essa atitude é uma ação
era
considerado
tanto
alienação. não no sentido hegeliano de que as
uma afirmação do desprendimento do atleta a
coisas aparecem independentes e indiferentes à
qualquer tipo de interesse que não exclusivamente
consciência. ou marxista, no sentido da incapacidade
a prática esportiva quanto a demonstração
de uma consciência social. essas fórmulas pro-
de capacidade moral de realizar um combate
duziram uma oposição simplista: a alienação como o
respeitando as regras que o definem.
lugar da inconsciência e de ausência da política. são teorias que trabalham com dicotomias do dentro e fora, consciência e inconsciência.
É evidente, nessa atitude, o preceito de
jogo
desinteressado
e
a
negação
à
conotação ideológica. É um discurso esportivo
o sentido original de alienação que pode ser
que pretende existir dentro de um campo
encontrado no futebol é o que explica o surgimento
despolitizado, alienado de qualquer interesse
dos esportes modernos na europa. a partir do
que não seja exclusivamente o cumprimento
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Bruno Stock
futebol amador na periferia de Curitiba
da regra específica da modalidade. É esse
externa ao sistema esportivo. o esporte, fundado
desprendimento que legitima sua autonomia.
nesses valores, era entendido como capaz de se
o princípio da honra exigia, portanto, que o
autorregular e legitimar sua autonomia.
jogo fosse praticado por indivíduos capazes de
não há, nesses pressupostos, qualquer
respeito civilizado às regras. os fundamentos
sentido de ingenuidade ou de mascaramento
de equilíbrio, solidariedade e fair play, centrais no esporte moderno, supunham assim uma equidade sociocultural.
político, mas sim uma convicção ideológica na formulação da autonomia do campo esportivo. o sentido ideológico da distinção é intrínseco
Desse modo, estavam estabelecidos os
à lógica dos seus formuladores. na verdade,
elementos da especificidade e da autonomia
o fundamento da autonomia do esporte era
do campo esportivo. Como os indivíduos
exatamente o da distinção moral e cultural, ou
que deveriam jogar entre si a princípio eram
seja, social.
socialmente iguais e reconheciam as regras e as praticavam sob a condição moral de respeitá-las, não havia a necessidade de qualquer intervenção
Desse modo, como forma de ocupação do tempo livre das classes burguesas, o esporte
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moderno nasce como afirmação política de
como mecanismos de disciplina. nas escolas, nas
classe. alienação como estratégia cultural
fábricas, nos clubes, cada vez mais os esportes,
e política de distanciamento, logo como
e em especial o futebol, eram utilizados como
manifestação de consciência de classe.
fator de controle social, a partir da instituição
o paradoxo é que simultâneo a esse exercício
de
poder
político
das
classes
de regras esportivas de disciplina e de controle/ autocontrole da violência.
burguesas ocorre na sociedade capitalista um
Por
processo de massificação e parlamentarização
distinção
da sociedade.
século XiX o futebol era um esporte popular e
extensão tornou-se
social,
aquilo
mimese.
ao
que
era
final
do
profissionalizado na inglaterra. Já em países
novos ordenamentos do controle social e a força
como a alemanha, itália e frança, apesar da
do campo esportivo como elemento de distinção
presença significativa das classes operárias (nos
revelou-se frágil e provisória. os esportes, assim
anos 1920/30 um terço dos atletas era de origem
como as escolas, precisaram ser disseminados
operária), o processo de profissionalização foi
agência o Globo
o crescimento da classe operária exigiu
Pelé salta sobre goleiro durante eliminatória da Copa do Mundo em 1970, no Maracanã: Brasil 6 X 0 Venezuela
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muito mais lento. o caso alemão é emblemático
a transformação em espetáculo, reunindo
nesse sentido. os constantes conflitos bélicos
milhares de pessoas nos estádios ou nas
vincularam, nesse país, a prática do esporte à
ruas, algumas vezes agindo com violência e
militarização e a honra nacional, fazendo com
se confundindo ora com as reivindicações
que o profissionalismo — mesmo entre a classe
das massas de desempregados e (ou) de
trabalhadora — fosse associado à ideia de falta
xenófobos, ora com movimentos do terrorismo
de patriotismo (eisenbeg, 1999).
internacional, fez com que o futebol se tornasse
após a segunda Guerra Mundial, no contexto de tensão ideológica da Guerra fria e do boom econômico dos anos 1960/70 e em especial após a experiência vitoriosa das Copas do Mundo dos anos 1950/60, o futebol tornouse definitivamente um esporte profissionalizado e massificado. Porém, como um elemento da indústria por um processo de espetacularização muito mais intenso do que qualquer outra atividade esportiva ou artística.
de alguns clubes e a formação de uma elite econômica no interior do sistema esportivo colocaram em xeque a administração tradicional do futebol, capitaneada por dirigentes da fifa,
Por pressão desses clubes ricos e de seus patrocinadores, a forma tradicional de gerenciamento
caracterizada
por
relações
escusas de favores e desmandos — sempre em nome da autonomia do esporte — começou a
as mudanças estruturais ocorridas a partir dos anos 1980, caracterizadas pela globalização e pela desregulamentação do mercado mundial, foram decisivas na transformação do futebol. a explosão da indústria de entretenimento — inicialmente com o sistema de tV aberta e fechada, em seguida com a internet —, associada à expansão do marketing esportivo, agregou ao futebol valores financeiros jamais imaginados
sofrer mudanças significativas. essa crescente atenção revela que a autonomia secular do futebol começou a se esgotar e a produzir novas configurações. a sua desautonomização provocou de tal modo ruídos sociais e inquietações políticas que promoveu um movimento de intervenção política sobre o sistema esportivo. estudos têm demonstrado a existência
(Proni, 2007). Mas, simultâneo, a desregulamentação mercado
Do mesmo modo, o crescimento financeiro
da Uefa, da CBf e de outras congêneres.
cultural de consumo de massa, o futebol passou
do
um problema de ordem social e política.
internacional
promoveu
um
enfraquecimento do estado, a flexibilização das relações trabalhistas e um aumento do fluxo migratório, em especial dos países pobres (da américa Latina, da África, da Ásia ou da europa do Leste) em direção aos países ricos europeus.
de um duplo movimento nesse processo: a reconfiguração
interna
preconizando
uma
presença gradativamente intensa do futebol em todos os campos da sociedade expôs e fragilizou aquela autonomia tradicional (ribeiro, 2007). ou seja, enquanto o futebol permaneceu com certa marginalidade cultural
Um quadro de reconfiguração dos movimentos
e, sobretudo, financeira e fiscal, conseguiu
sociais criou espaço para o crescimento da
se manter em um espaço próprio. seu
violência de grupos urbanos e rapidamente se
crescimento financeiro, tornando-se uma das
confundiu com a violência do terrorismo étnico-
mais importantes indústrias de entretenimento
religioso.
de massas, evidenciou a fragilidade da sua
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autorregulação, passando a exigir cada vez mais a
paixão versus consciência/razão é falsa para dar conta
intervenção e o controle externo.
da força do futebol nas sociedades contemporâneas.
É nesse contexto que o preceito da autonomia e de alienação do futebol pode ser revisitado. não temos
Luiz Carlos Ribeiro é professor do Departamento de
mais a distinção original que existia no século XiX,
História da Universidade Federal do Paraná — Núcleo de
fundado no desprendimento político e na autonomia
Estudos Futebol e Sociedade.
do campo futebolístico. encontramos no final do século XX uma retomada da bandeira da “autonomia do campo esportivo” e do fair play, mas agora sob a guarda atenta do estado, de poderosos agentes da indústria do entretenimento e de instâncias sociais as mais diversas. Como conclusão, podemos retomar as questões iniciais colocadas nesse artigo. o futebol atual continua imerso numa densa rede de paixões (clubísticas e nacionais), mas não guarda mais a ingenuidade amadora
bibLioGraFia
dos seus primórdios. o futebol é paixão porque é lúdico,
DAMATTA, R. et. al. Universo do Futebol. Rio de Janeiro:
imprevisto e alienação. em síntese, como afirmava o nosso sobrenatural nelson rodrigues, uma caixinha de surpresas. resta aguardar se o interesse dos investidores por resultados financeiros (a grande indústria do entretenimento) e as constantes investidas do poder público (na europa ou no Brasil) por um maior controle da segurança social poderão transformar o futebol em algo insípido e lógico. será a derrota do lúdico, do sobrenatural e a vitória da higiene social. o fim da história.
Pinakotheke, 1982. EisEnbEg, C.. Histoire du football professionnel en Allemagne. in: Hélal, H. ; Mignon, P. Football: jeu et société. Les Cahiers de L’INSEP. no 25, 1999, p. 163-188. EliAs, n. ; Dunning, E. A busca da excitação. lisboa: DiFEl, 1992. HobsbAwM, E. ; Ranger, T. (orgs.) A invenção das tradições. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997. lAnFRAnCHi, P. Histoire du professionalisme en France et en italie des débuts du professionalisme à la formation
felizmente alguns fatos recentes mostram que não.
des syndicats de jouers. In: Hélal, H. ; Mignon, P.
o mercado financeiro das mais sólidas economias do
Football: jeu et société. Les Cahiers de L’INSEP. no
mundo revela-se cada vez mais sobrenatural e irracional.
25, 1999,p. 189-205.
a alemanha, depois de mais de cinquenta anos de medo
PRoni, M. w. ; Zaia, F. H. gestão empresarial do futebol
de içar a bandeira e cantar o hino nacional, herança da
num mundo globalizado. in: Ribeiro, l. (org.) Futebol e
vergonha do holocausto, reencontrou nos estádios de
globalização. Jundiaí: Ed. Fontoura, 2007, p. 19-47.
futebol (em especial na Copa do Mundo de 2006) lugar para o reconhecimento de um pertencimento coletivo que se encontrava emudecido (sontag, 2008). o futebol perdeu a ingenuidade, mas não perdeu a força da paixão. em resumo, parece que a dicotomia alienação/
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RibEiRo, l. A crise da autonomia no futebol globalizado: A experiência européia (1985-2007). in: Ribeiro, l. (org.) Futebol e globalização. Jundiaí: Ed. Fontoura, 2007. sonTAg, A. Les identités du footbal européen. grenoble (FR): Presses universitaires de grenoble, 2008.
Diego singh
torcida, um patrimônio em análise
torcida do atlético Paranaense, um dos quatro clubes de futebol estudados para uma dissertação de mestrado sobre comportamento do consumidor
qual o valor de uma torcida de futebol? De acordo
no âmbito acadêmico, o desenvolvimento de
com uma pesquisa realizada por francisco rocha
métricas deste tipo vem sendo incentivado por um dos
dos santos para o mestrado em Comportamento do
mais importantes institutos científicos de marketing do
Consumidor da Universidade federal do Paraná, esse
mundo, o Marketing science institute (Msi), observa
valor, que pode ser calculado por meio do Customer
ainda o autor, que recorreu aos boletins financeiros das
Equity (Patrimônio da Carteira de Clientes), leva em conta, entre outras variáveis, o tamanho e a presença da torcida nos estádios de futebol e a margem média de contribuição (bilheteria) proporcionada aos clubes. a pesquisa parte do princípio de que o futebol
partidas de quatro grandes clubes profissionais que disputaram a “série a” do Campeonato Brasileiro entre 2004 e 2007 para realizar a sua pesquisa, totalizando 328 casos. os valores que cada torcedor destes clubes gerou, foram, em média: atlético-Pr: r$ 10,07; são Paulo: r$ 8,36; internacional: r$ 7,29; e Cruzeiro: r$ 5,52.
cresce como indústria de entretenimento exigindo regras
“Mas a bilheteria não é a única nem a mais
empresariais mais modernas e mais condizentes com
importante fonte de renda proveniente dos torcedores,
os tempos atuais. o conceito do Customer Equity já é
já que existem outras transações diretas, como a venda
usado por operadoras de telefonia celular, seguradoras,
de produtos oficiais, e indiretas, como a venda de direitos
montadoras de automóveis e companhias de cartão de
de transmissão para a tV”, lembra o autor. “a venda
crédito, entre outros segmentos de mercado, e também
de produtos oficiais, os patrocínios e os direitos de
pode ser aplicado no ambiente dos clubes de futebol
transmissão que são vendidos a emissoras de tV (a rede
já que os torcedores formam a base de clientes destas
Globo comprou os direitos do Campeonato Brasileiro de
organizações, segundo francisco. “quanto mais decisivas
2009 a 2011 por r$ 220 milhões) geram divisas aos clubes
as partidas mais receitas elas geram, independentemente
conforme a sua audiência, que está baseada no tamanho
do desempenho do time.”
das torcidas”. (rr)
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humanidades
Violência gratuita Ciméa Bevilacqua
Cientistas sociais buscam situar o desrespeito às regras de trânsito no Brasil
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semfronteiras |
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É impossível encontrar quem nunca tenha se
Conforme
apontam
as
professoras
da
alarmado com as estatísticas de acidentes e mortes
Universidade de são Paulo Maria Helena de Mello
no trânsito em cidades e rodovias brasileiras. segundo
Jorge e Maria sumie Koizumi, responsáveis pela
o sistema de informações sobre Mortalidade do
pesquisa “acidentes de trânsito no Brasil: um
Ministério da saúde, o trânsito é responsável por
atlas de sua distribuição”, amplo estudo estatístico
cerca de 36 mil mortes ao ano no país. De acordo com
publicado em 2007 pela associação Brasileira de
dados registrados pelo Departamento de trânsito do
Medicina de tráfego (aBraMet), fenômeno similar
Paraná (Detran), mais de sessenta mil pessoas foram
ocorreu no período imediatamente posterior à
vítimas de acidentes de trânsito no estado em 2008. o
promulgação do novo Código de trânsito Brasileiro.
número de mortos no local do acidente chegou a 1.590,
a mortalidade decorrente de acidentes de trânsito no
o que corresponde a uma média superior a quatro
país, que havia mantido valores estáveis entre 1996
mortos por dia, sem contar os óbitos ocorridos após a
e 1997, apresentou queda nos três anos seguintes,
remoção dos feridos, não computados pelos órgãos de
registrando nova ascensão a partir de 2001. Para as autoras, o decréscimo registrado a partir de 1997
trânsito brasileiros.
“pode corresponder a um reflexo da entrada em vigor
embora as estatísticas indiquem uma queda
do novo Código de trânsito Brasileiro, enquanto o
significativa da taxa de crescimento dos acidentes
novo aumento ocorrido a seguir pode ser atribuído,
com vítimas no Paraná em 2008 — 3,28%, contra
talvez, à flexibilização das medidas de fiscalização
um crescimento de 11,82% em 2007 —, a avaliação
e à inaplicabilidade das sanções previstas na nova
desse resultado requer alguma cautela. Por um lado,
legislação”.
os números absolutos continuam graves: foram 44,9
aliás, mesmo levando-se em conta o reforço da fiscalização após a chamada “lei seca”, os números
ano passado. Por outro, é possível que o decréscimo
continuam a revelar um descompasso entre o aumento
registrado em 2008 tenha caráter pontual, associado
da frota de veículos em circulação e o de infrações
à entrada em vigor, em junho passado, de uma das leis
autuadas. no ano de 2008, conforme dados do
mais rígidas do mundo na penalização do motorista
Detran, a frota de veículos do Paraná cresceu 8,97%
que exceder o limite de consumo de álcool.
em relação a 2007, o maior aumento nos últimos dez
seCs/agência de notícias
mil acidentes de trânsito com vítimas no estado no
Dados do Ministério das Cidades revelam que os acidentes
no Brasil é bastante comum o motorista decidir ele mesmo qual a
de trânsito constituem o segundo maior problema de saúde
velocidade é mais adequada e em que lugar
pública do país
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Bruno stock
tese de mestrado sobre o trânsito paulistano mostrou que o pedestre era percebido como um “obstáculo”
anos. são 4,35 milhões de veículos em circulação no estado, aproximadamente quarenta para cada cem habitantes. enquanto isso, as infrações registradas pelas diferentes instâncias de fiscalização cresceram a uma taxa ainda maior: o número de autuações no estado em 2008 chegou a 1,66 milhão, um crescimento de 10,52% em relação a 2007. Das
a socióloga alessandra olivato procurou apreender como cada
infrações que levam à suspensão do direito de dirigir
um via a si mesmo e aos outros, assim como a percepção dos
(pela somatória de 20 pontos), cerca de 35% dizem
motoristas sobre as leis de trânsito. as respostas mostraram que
respeito a excesso de velocidade.
o pedestre era percebido como um obstáculo e que a legislação
em termos mais gerais, parece claro que o rigor crescente das normas legais e o investimento sistemático em campanhas de conscientização dos
era considerada injusta pela maioria dos motoristas, de forma que sempre era possível invocar um motivo pessoal para atestar a inocência do infrator. os poucos entrevistados que disseram se esforçar para cumprir a lei e evitar acidentes não viam sua
motoristas não têm sido capazes de incidir com
atitude pelo prisma da cidadania, mas como resultado de uma
eficácia numa dinâmica cuja perversidade é bem
boa educação familiar e de princípios morais.
conhecida, mas cujas motivações mais profundas os números, por si sós, não permitem desvendar. não por acaso, o trânsito tem sido objeto da atenção de um número crescente de pesquisadores de diferentes áreas de conhecimento. À longa experiência acumulada por profissionais da área da saúde veio se somar um contingente expressivo de cientistas sociais que buscam situar o desrespeito às regras de trânsito no Brasil no quadro mais geral das condições sociológicas que favorecem aquilo que o jurista Joaquim falcão, referindo-se a outro contexto, chamou de “transgressões coletivizadas”, isto é, aquelas que são cometidas individualmente, mas
o estudo de olivato corrobora uma leitura clássica da sociedade brasileira, segundo a qual a lógica particularista do mundo privado e das relações pessoais se sobrepõe às normas impessoais que deveriam regulamentar as relações no espaço público. Um dos maiores expoentes dessa vertente interpretativa é o antropólogo roberto augusto DaMatta, autor de célebre estudo publicado no final dos anos 1970 sobre o uso no Brasil da expressão “você sabe com quem está falando?”. nesse ensaio, o antropólogo chamava atenção para o “dilema brasileiro” revelado nas situações mais corriqueiras da vida cotidiana: a lei impessoal, que deveria valer para todos, parece não se aplicar a certas pessoas, o que faz com que a relação entre a norma legal e a sociedade seja marcada pela ambiguidade. Como consequência,
cujas razões ultrapassam o indivíduo e são repetidas
quanto mais se criam leis para corrigir abusos, mais se reforçam
por milhões de outras pessoas que se encontrem na
as relações pessoais que sustentam as imunidades daqueles que
mesma situação.
se situam acima da lei.
o dilema brasileiro
anos depois. em livro recém-publicado pela editora saraiva —
Para DaMatta, essa interpretação continua válida trinta
ao
entrevistar
pedestres,
motoboys
e
motoristas de automóveis, ônibus e táxis para sua dissertação de mestrado sobre o trânsito paulistano, defendida em 2002 na Universidade de são Paulo,
e já na segunda edição — sobre a “Cultura das transgressões no Brasil”, que reúne ensaios de intelectuais de diferentes áreas, o antropólogo sugere que a transgressão assume estilos particulares em diferentes sociedades e reitera “a dificuldade de estabelecer elos igualitários e normas impessoais” como um
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“Onda vermelha” em Londrina a falta de sincronia de semáforos na cidade de Londrina, norte do paraná, criou uma espécie de “onda vermelha”, e o motorista é obrigado a parar constantemente, reduzindo a fluidez e aumentando o estresse no trânsito. o principal motivo dessa distorção é a existência
Parâmetros individuais costumam nortear conduta dos motoristas
de um grande número de semáforos antigos na
brasileiros
malha viária central. esses dados fazem parte da pesquisa “desenvolvimento de algoritmos para
Controle
de
tráfego
urbano”,
da
aspecto fundamental da vida brasileira. segundo o antropólogo,
professora silvia Galvão de souza Cervantes, do departamento de engenharia elétrica da
que passou a se dedicar recentemente ao estudo das relações
universidade estadual de Londrina (ueL).
no trânsito, este é um domínio privilegiado para a compreensão da dialética entre público e privado em nossa sociedade, “pois
o desafio é buscar alternativas para evitar dos
configura um espaço estruturalmente igualitário do qual os
semáforos é uma saída porque melhora o fluxo
motoristas, socializados num regime ideológico hierárquico,
dos veículos”, afirma a pesquisadora. “Mas não
tentam escapar por meio de espertezas e malandragens,
congestionamentos:
“a
sincronização
abre espaço para o motorista correr mais, o
todas motivadas pela perspectiva pessoal e justificadas pelo
que poderia aumentar o número de acidentes
axioma brasileiro segundo o qual obedecer à lei é um sinal de
e atropelamentos. Geralmente, a programação
inferioridade social”.
é feita para 50 quilômetros por hora, se ele ultrapassar essa velocidade, vai ter que parar
Pesquisas recentes do núcleo de Psicologia do trânsito da
no próximo sinal”, afirma a pesquisadora.
Universidade federal do Paraná, coordenado pela professora
“nossa proposta é que se façam planos de
iara Picchioni thielen, reforçam esse diagnóstico. ao estudar
tempo semafóricos de acordo com o horário e
as percepções dos motoristas sobre o excesso de velocidade no
fluxo de veículos. nos semáforos eletrônicos é possível fazer essa programação por horários
trânsito em Curitiba, thielen observou que, em lugar da lei e da
e dias.”
sinalização, as definições pessoais predominam no discurso dos
Contudo, diz ainda a professora, “o motivo
motoristas. “não importa se um motorista foi ou não multado,
dos congestionamentos não é o excesso de
a percepção que ele tem do parâmetro que norteia o excesso
veículos, mas a falta de sincronismo nos
de velocidade é semelhante: o centro do qual emanam as
semáforos, a falta de educação no trânsito e a
regulamentações é ele mesmo, significando que a velocidade
má sinalização. Caso esses problemas fossem
no trânsito se converte num fenômeno individual para o qual a
resolvidos o trânsito da cidade ficaria bem
maioria tem uma receita própria”. Desse modo, afirma thielen,
melhor. agora, congestionamentos em horários de pico sempre vão acontecer nas cidades de
“o trânsito, fenômeno público por excelência, transforma-se num
grande e médio porte”.
fenômeno individual, pessoal, privado”. segundo a professora,
(Colaborou: Assessoria de Imprensa da UEL)
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“os parâmetros individuais são sustentados pela percepção de que o controle da atividade de dirigir está centralizado na perícia do motorista, e não numa articulação entre os diversos fatores envolvidos no trânsito”.
o cipoal das leis
as pesquisas também indicam, contudo, que o
20%, em qualquer tipo de via, passou a ser considerado
viés individualista é apenas um dos lados da moeda:
infração média; de 20% a 50%, grave; e acima de 50%,
as constantes mudanças na legislação, por vezes
gravíssima.
contraditórias, também contribuem para que os moto-
“a contradição foi eliminada, mas a nova lei diz aos
ristas reinterpretem a lei à sua maneira. no caso dos
motoristas que ultrapassar o limite pode representar
limites de velocidade, estudo realizado pelas professoras
três categorias de risco, quando os estudos indicam
iara thielen e Maria Virgínia Grassi, da UfPr, revela
que todo excesso de velocidade é perigoso”, alertam as
um verdadeiro cipoal de normas oriundas de diferentes
pesquisadoras. “Uma legislação que corrobora a percepção
instâncias e com parâmetros definidos de forma diversa.
de ausência de perigo no excesso de velocidade dificulta
em 1997, o Código de trânsito Brasileiro (CtB)
a aceitação dos limites impostos, ou seja, estabelecer um
definiu limites de velocidade a partir de uma classificação
limite máximo que se torna elástico confunde todas as
dos tipos de vias, diferenciando também percentuais
pessoas que têm que se submeter a ele”. thielen e Grassi também chamam atenção para a
enquadrar a infração como grave ou gravíssima. no ano
norma baseada em parâmetros do inMetro (instituto
2000, uma resolução do Conselho estadual de trânsito
nacional de Metrologia, normalização e qualidade
(Cetran-Pr) estabeleceu que o excesso de velocidade nas
industrial) que estabelece sete quilômetros por hora
vias urbanas do estado deixaria de considerar a distinção
como diferença de precisão a ser considerada entre
entre tipos de vias definida em nível federal. Para fins de
os equipamentos de fiscalização e os velocímetros dos
penalização, passou a valer exclusivamente a diferença
veículos. “ao invés de entender essa norma como uma
entre exceder a velocidade permitida em até 50% ou acima
salvaguarda contra disparidades de equipamentos de
desse percentual. em 2006, nova mudança na legislação: a
medição, o motorista entende que existirá tolerância
Lei n.º 11.334 deu nova redação ao artigo 218 do Código
sobre o quanto ele pode desrespeitar a lei”, afirmam as
de trânsito Brasileiro, alterando os limites de velocidade
pesquisadoras. em resumo, “sem parâmetros seguros que
para fins de enquadramento infracional e penalização. a
norteiem seu comportamento em relação à velocidade,
partir daí foi estabelecido um critério único: transitar em
cada motorista se vê diante da alternativa de decidir ele
velocidade superior à máxima permitida para o local em até
mesmo que velocidade é adequada e em que lugar”.
Divulgação/Der
superiores ao máximo permitido (20% ou 50%) para
Cerca de 70 mil crianças foram atendidas pelo projeto “aprendendo e... Vivendo!”, da Coordenadoria de educação de trânsito do Departamento de estradas de rodagem (Der) neste ano
semfronteiras |
93
Jorge Brand
Scott Ehardt
humanidades
Jorge Brand
Ciclofaixas em Berlim, Alemanha
Wikipedia
Bicicletas em Amsterdã, Holanda
Bicicletas em Rennes, França
Sinaleiro para bicicletas em Barcelona, Espanha
A revolta das bicicletas brancas
Há tempos, movimentos reivindicam um trânsito mais humano. O Provos, grupo de jovens anarquistas de Amsterdã dos anos sessenta, por exemplo, provocava a lei, a monarquia e a sociedade de forma criativa e bem humorada. Seus planos refletiam uma preocupação com um ambiente mais saudável e visavam tornar públicas as propriedades privadas. O plano das bicicletas brancas,
Mobiliteitsmuseum
idealizado como uma solução ao “terrorismo de uma minoria motorizada ao trânsito”, propunha ao município a compra de bicicletas para uso público. A proposta foi vetada, mas o Provos respondeu pintando várias bicicletas de branco, chamando a população a fazer o mesmo. As bicicletas podiam ser usadas por qualquer pessoa e depois deixadas em algum lugar para que outros também as usassem. A polícia logo confiscou essas bicicletas porque elas violavam a lei que exigia o uso de cadeados. Os jovens não só providenciaram esses cadeados
Jovens do movimento Provos
como ainda pintaram nas próprias bicicletas a combinação para abri-los. Esse
elegem bicicleta como meio de
foi o embrião dos sistemas de bicicletas comunitárias aplicados hoje em muitos
transporte
semfronteiras 94 | semfronteiras
países. (HM)
Gulherme Caldas
Juan Parada
Ciclistas no Centro Cívico, em Curitiba
Cartaz para a “Bicicletada”
Mais informações www.bicicletadacuritiba.org
mobilidade sustentável a Bicicletada é um movimento que surgiu nos anos noventa em são francisco, estados Unidos, e que hoje acontece em mais de 200 cidades pelo mundo. em Curitiba, o movimento começou com uma pequena reunião de ciclistas e agrega hoje “para brasileiros,
um grande número de pessoas com o mesmo ideal: o direito de mais espaço e mais
uma das atrações
respeito nas ruas, onde os carros dominam.
turísticas em berlim é assistir às pessoas esperando disciplinadamente que o sinal abra para
Um dos eventos organizados pela Bicicletada Curitiba é o passeio ciclístico mensal, sempre aos sábados, que se tornou um ponto de encontro de entusiastas do ciclismo, organizações ambientais, artistas, universitários e pessoas que querem trocar ideias sobre mobilidade urbana e vida sustentável.
que elas atrevessem
eles já estiveram na Câmara Municipal de Curitiba propondo a implementação
a rua”
de políticas públicas que fomentem o uso da bicicleta, como a criação de ciclofaixas
depoimento de
e bicicletários. o grupo também produziu um mapa e um guia para o ciclista em
Jorge brand, do movimento “bicicletada”, de Curitiba
Curitiba, indicando trajetos e lugares que possuem facilidades para quem pedala. Como resultado das ações da Bicicletada, o uso da bicicleta na cidade vem crescendo, e muitos negócios, como restaurantes e mercados, perceberam a oportunidade de apoiar a mobilidade sustentável e atrair mais clientes, e estão reivindicando a construção de bicicletários na sua área. (HM)
semfronteiras |
95
Educação científica
Mão na massa CLAUDIA IZIQUE
Programa promove a investigação científica aliada à expressão Apesar de muitas pesquisas mostrarem que crianças de seis anos de idade já conhecem o mundo natural e têm capacidade de
oral e escrita no ensino fundamental
investigação cognitiva para aprender ciências e realizar investigações CCDC/ USP/São Carlos
simples, não é o que ocorre na maioria das escolas brasileiras. A falta de motivação nos primeiros anos do aprendizado tem reflexos no ensino médio e é um dos fatores que explica o péssimo desempenho que os jovens têm apresentado em rankings internacionais, como o Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Atualmente, mais de 30 países já adotam o ensino da ciência baseado em investigação, desde as primeiras séries escolares. O
CCDC/ USP/São Carlos
processo de ensino/aprendizagem busca estimular a articulação entre a experimentação e o desenvolvimento da expressão oral e escrita. Essa idéia — batizada de Hands on — foi aplicada na década de 1990, em bairros carentes de Chicago, por iniciativa do prêmio Nobel de Física, Leon Lederman, com crianças entre 5 e 12 anos. Em 1995, outro Nobel de Física, o francês Georges Charpak, em parceria com a Academia de Ciências de Paris, implantou o projeto Le Main à la Patê, destinado a crianças do ensino maternal e primário, priorizando as regiões menos favorecidas. Na França, o programa é um sucesso e está em expansão, CCDC/ USP/São Carlos
tendo sido incorporado às diretrizes do Ministério da Educação. O Brasil aderiu a esse projeto em 2001, quando a Academia Brasileira de Ciências (ABC) assinou acordo com a academia francesa e implantou no Brasil a versão nacional: o Programa ABC na Educação Científica — Mão na Massa. O programa iniciou com uma parceria entre a ABC, a Universidade de São Paulo (USP) — mais precisamente com os Centros de Divulgação Científica e Cultura (CDCC), em São Carlos, e a Estação Ciência, em São Paulo — com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro, e secretarias estaduais e municipais de educação. Ao longo de oito anos o programa cresceu e é executado, ainda como piloto, nas redes escolares em 10 cidades, distribuídas por seis estados.
96 | semfronteiras
Kits do Centro de Divulgação Científica e Cultural (CCDC) para ensino da astronomia, estados físicos da água e flutuação de corpos
Construindo conceitos com
em nível de especialização, foram capacitados dois
informações, material didático e metodologias para que
“formadores locais” — um professor e um coordenador
eles possam, em sala de aula, percorrer com os alunos o
— para cada uma das 29 regionais da secretaria, às quais
caminho da investigação científica: formular questões
estão vinculadas mais de 1.800 escolas. especializados
sobre a realidade concreta, elaborar hipóteses, testá-las,
em alfabetização científica, esses coordenadores e
debater idéias, argumentar e confrontar diversas opiniões.
professores têm autonomia para replicar o programa Mão
“o nosso objetivo é favorecer e estimular a articulação
na Massa e produzir materiais didáticos. “a intenção é
entre a experimentação e o desenvolvimento da expressão
valorizar a criação”.
a
finalidade
é
municiar
os
professores
oral e escrita na construção do conceito científico”,
os cursos, ministrados na sede da fiocruz, permitem
explica angelina orlandi Xavier, coordenadora adjunta do
a aproximação entre professores e cientistas, interação
programa Mão na Massa em são Carlos. nesse polo, já foram
desejável e prevista entre os objetivos do programa.
qualificados 1.200 professores em cursos organizados em
nesse relacionamento, os professores aprendem, por
módulos.
exemplo, que, mais do que dar respostas, a ciência avança
em são Carlos, esse percurso é feito a partir da problematização de temas relacionados ao cotidiano,
pela capacidade do investigador de “fazer perguntas”, explica Danielle.
como água, corpo humano, eletricidade, entre outros.
o envolvimento dos professores e coordenadores
“inicialmente, é definido um problema para a discussão
estimulou a fiocruz a criar cursos de mestrado e
e elaboração da hipótese que vai orientar a investigação.
doutorado stricto sensu. em dissertação de mestrado, da
em seguida, eles partem para a fase de experimentação,
qual Danielle foi orientadora, um dos coordenadores da
registro, pesquisa bibliográfica até chegar aos resultados,
regional do noroeste fluminense propôs parâmetros de
publicados num texto final”, descreve. a expectativa é que o
avaliação do programa. o estudo constatou, por exemplo,
mesmo procedimento seja aplicado em sala de aula — com
a redução do índice de repetência entre os alunos. “e isso
auxílio de kits didáticos elaborados pela equipe do CDCC
aconteceu, não em função de exigências do professor, mas
- de forma a iniciar as crianças na saborosa aventura da
do aumento do interesse”, explica Danielle. Cresceram
exploração do ambiente à sua volta e do conhecimento.
também os indicadores de rendimento, participação e
na estação Ciência, em são Paulo, o projeto abrange
colaboração.
cerca de cem escolas. a equipe elabora o material escrito
nos próximos meses, o Programa Mão na Massa será
e experimental, que é utilizado em módulos didáticos
objeto de uma ampla avaliação, envolvendo todos os polos
com sugestões de atividades, e atua na formação de
onde o projeto foi implementado. “todos os sinais são
coordenadores e professores em torno de três temas:
positivos. queremos, no entanto, realizar uma avaliação
solos, escola e Meio ambiente e ecossistemas Brasileiros.
crítica para ver, de fato, os resultados que o Mão na
o projeto visa enriquecer o trabalho do professor em sala
Massa traz para a alfabetização científica”, afirma Marcos
de aula e despertar o interesse das crianças para a ciência.
Cortesão Barnsley scheuenstuhl, secretário executivo do
o professor assume o papel de orientador, incentivando os
programa na academia Brasileira de Ciências. a avaliação
alunos a pensar, expor suas idéias, explicar o que vê, além
será patrocinada pela Petrobras.
de aprender ouvir o outro, e expressar-se por escrito e oralmente.
os resultados começam a despertar o interesse de outras regiões da américa Latina. no final de março, a academia Brasileira de Ciências coordenou um
Valorizando a criação no rio de Janeiro, o programa é desenvolvido pela fiocruz, em parceria com a secretaria estadual de educação. “o nosso foco de atuação é a formação de professores que são capacitados para replicar os princípios do Mão na Massa”, explica Danielle Grynszpan, pesquisadora do Departamento de imunologia da fiocruz e coordenadora do projeto. Por meio de cursos de 360 horas de duração,
encontro de representantes de 10 países, interessados na implantação do programa. “a argentina e o Chile já têm projeto semelhante, mas os demais, ainda não”, explica. a reunião foi organizada em dois módulos. no primeiro foram apresentados as metodologias e os princípios do programa e, no segundo, com duração de um semana, oferecidos cursos sobre temas desenvolvidos pelo Mão na Massa brasileiro: Diagnóstico ambiental; Planeta terra e Água e saúde.
semfronteiras |
97
N O T í c i a S d e C&t •
mundo
efDa – Jet
Tecnologia mais quente que o Sol
Vista do interior do reator do Jet, o maior equipamento de fusão do mundo, que atinge temperaturas dez vezes mais quentes que o núcleo do sol
no núcleo do sol, átomos de hidrogênio colidem
solução do problema mundial de demanda de energia. o
uns contra os outros a grandes velocidades, se fundem e
Jet é um reator do tipo tokamak, ou seja, é uma câmara
assim são transformados em átomos de hélio, em reações
toroidal (em forma de pneu) que produz um campo
que liberam imensas quantidades de energia para todo o
magnético para confinamento de plasma, que é aquecido
sistema solar. o núcleo do sol é uma fornalha responsável
a 100 milhões de graus Celsius.
pelo abastecimento de toda a vida na terra, e que consome
o Jet é capaz de produzir fusão nuclear há anos, mas
muito hidrogênio a temperaturas altíssimas (mais de 15
a energia consumida na reação sempre excedeu a energia
milhões de graus Celsius). Contudo, este não é o local mais
gerada. seus combustíveis são o deutério e o trítio, duas
quente do sistema solar.
formas de hidrogênio; 10 gramas de deutério e 15 gramas
Para
reproduzir
laboratórios
de trítio são suficientes para suprir as necessidades de
terrestres empregam reatores nucleares que atingem
energia de um cidadão de país desenvolvido por toda a
temperaturas muito mais altas que as do núcleo do
sua vida. o deutério é encontrado em abundância nos
sol. o maior deles em operação no momento é o Joint
oceanos, apenas um quilômetro cúbico de água do mar
European Torus (Jet), na cidade inglesa de Culham, cujos
contém o suficiente do elemento para gerar mais energia
experimentos pretendem dar um passo no caminho da
do que toda a reserva de petróleo do mundo.
98 | semfronteiras
essas
reações,
efDa – Jet
Lua de Saturno pode ter oceano Dois estudos publicados em junho na Nature discutem a existência de um oceano líquido sob a superfície congelada de encélado, uma das luas de saturno. a presença de água líquida e salgada, fator essencial para o surgimento e manutenção da vida como a conhecemos, tornaria o satélite um lugar promissor para a procura por sinais de vida extraterrestre.
Plasma aquecido no interior do Jet
no polo sul de encélado, grandes jatos de água brotam do chão como gêiseres, em erupções que alcançam centenas de quilômetros
no momento, o Jet serve como etapa
e se perdem no espaço. Uma hipótese para essas plumas de vapor
preparatória para outro reator, chamado
d’água e gelo seria o descongelamento repentino de blocos de gelo.
iter (reator termonuclear experimental
Mas a hipótese de um grande oceano permanente e subterrâneo ganhou força com análises da sonda Cassini; a sonda atravessou
internacional, na sigla em inglês), um
o anel e, de saturno, formado pelos jatos gelados de encélado, e
experimento científico em grande escala
detectou sal de cozinha na composição química de seus grãos
que pretende mostrar que é viável gerar
congelados. o sal de cozinha, ou cloreto de sódio, só é dissolvido
energia a partir da fusão nuclear em escala
em água líquida.
industrial.
De acordo com o artigo, assinado por pesquisadores europeus,
o iter, um projeto de colaboração
os compostos de sódio “exibem uma forte similaridade à composição
internacional nascido há 23 anos, e lançado
prevista para um oceano subterrâneo em encélado em contato com
formalmente em 2006, está sendo erguido
seu núcleo rochoso”.
no sul da frança. o plano era construir o
entretanto, outro estudo, publicado na mesma edição por
experimento de fusão mais avançado do
um grupo da Universidade de Colorado (eUa), examinou o vapor
mundo, em dez anos, com um orçamento
expelido por encélado a partir de observatórios em terra, em busca
de Us$ 6 bilhões. recentemente, ele voltou
de sinais de sódio, e a quantidade encontrada foi muito pequena,
ao noticiário porque o plano está sendo
menor do que seria esperado se as plumas fossem de fato gêiseres
ameaçado por altos custos, atrasos e desafios
de um oceano salgado próximo à superfície. Uma das hipóteses para
técnicos. a rede de notícias britânica BBC
a ausência de sódio seria a existência de um oceano mais profundo,
teve acesso a e-mails que indicam que o
que evapora lentamente, e assim, a água perderia o sódio.
custo total da construção do experimento ultrapassará os Us$ 16 bilhões. alguns
cientistas
não
são
muito
fusão se tornaram mais difíceis de serem superados, e que a fusão como uma fonte comercial de energia esteja distante pelo menos 100 anos. Membros do iter estão revisando os planos para entrar num acordo de redução das dimensões do projeto e estabelecimento de objetivos menos ambiciosos.
sonda Cassini NASA/ JPL/ Space Science Institute
otimistas e acreditam que os obstáculos da
sal de cozinha pode indicar oceano em encélado
semfronteiras |
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N O T í c i a S d e C&t •
mundo
Influenza A (H1N1), vacina em fase de produção em junho, a organização Mundial da saúde anunciou
se nota que eles não são particularmente similares. Mas
uma pandemia de gripe causada pelo vírus H1n1. essa
é possível que a resposta imunológica produzida por um
ação foi um reflexo do alastramento do novo vírus, e não
vírus confira proteção ao outro.
da severidade da doença causada por ele. Desde o anúncio
este mesmo estudo, conduzido na Universidade
da pandemia, o vírus continua a se espalhar. no Brasil
de Wisconsin-Madison e publicado na Nature em julho,
e em outros países do hemisfério sul, o número de casos
fez também experimentos em vários animais, incluindo
começou a aumentar com a chegada do inverno. entretanto,
ratos, porcos, ferrões e macacos. em todos eles, com
a maioria das pessoas infectadas se recupera sem precisar
exceção do porco, o vírus causa infecção pulmonar mais
de tratamento médico. Mas de onde surgiu esse vírus e por
severa do que o esperado com a gripe comum. estes
que ele preocupa tanto?
resultados reforçam outros dois estudos publicados pela
De acordo com um estudo publicado em junho na Nature, por pesquisadores da China, reino Unido e estados Unidos, o
Science também em julho, que dizem que o H1n1 é mais agressivo e provoca doenças mais severas em furões.
vírus H1n1 tem origens na gripe suína. Mais especificamente,
os pesquisadores usaram doses mais altas do
ele é o produto do rearranjo de algumas linhagens de vírus
vírus do que o que seria encontrado por humanos
da gripe suína que circula na europa e na Ásia. Uma dessas
uma prática comum nesses estudos. entretanto, uma
variantes tem alguns genes que incluem em seus históricos
característica alarmante foi vista nos macacos, que
ligações com formas da gripe aviária e do H3n2 (uma das
desenvolveram pneumonia em toda a extensão dos
—
o vírus da gripe atual tem semelhanças com o vírus que causou a pandemia de gripe de 1918. ele tem infectado os jovens com mais frequencia do que os idosos, um padrão incomum que sugere que pacientes mais velhos podem ter sido expostos ao vírus no passado. Um estudo sugere que quem tem a maior proteção imunológica ao novo vírus são aqueles que nasceram antes de 1918, que seriam mais propensos a produzir anticorpos capazes de neutralizar o vírus da gripe suína. olhando para os genes dos dois vírus,
imagem de microscopia eletrônica do vírus H1n1
100 | semfronteiras
CDC/ Centro de Prevenção e Controle de Doenças dos eUa
formas circulantes da gripe comum humana).
N O T í c i a S d e C&t •
brasil
o rio amazonas, o mais volumoso do planeta e responsável pelo desenvolvimento da floresta tropical mais diversa da terra, nasceu há 11,8 milhões de anos. a data de nascimento foi revelada por um estudo publicado no periódico Geology, coordenado por Jorge figueiredo, geólogo da Petrobras e doutorando da Universidade de
mais localizada, quande ela atinge todas as áreas do pulmão, se tem uma situação de alto risco. no
momento,
as
infecções
pelo novo vírus são moderadas, e a gravidade da pandemia não chega perto da gripe de 1918, mas especialistas temem que o novo vírus possa se tornar mais agressivo com o tempo. as primeiras doses de vacina — uma das maneiras mais eficazes de proteger a população durante uma pandemia — devem estar disponíveis em setembro, de acordo com a organização Mundial da saúde. até a disponibilização da vacina, as principais medidas preventivas são manter a higiene pessoal e evitar o contato com pessoas doentes: cobrir a boca e nariz quando tossir ou espirrar, lavar as mãos, evitar tocar os olhos, nariz ou boca. os infectados devem se afastar do trabalho e limitar o contato com
análises paleontológicas (de fósseis de animais e plantas) e de proveniência sedimentar, feitas em amostras coletadas em poços perfurados no oceano atlântico, na foz do rio, vislumbram os segredos da história do amazonas, sua infância e adolescência. o amazonas surgiu como um rio transcontinental entre 11,8 e 11,3 milhões de anos atrás, no Mioceno médio a superior (época em que o Homo sapiens ainda não existia). antes disso, ele era um rio pequeno, mas dois fatores colaboraram para a sua formação: o aumento do manto de gelo na antártida, que causou uma queda no nível do mar, e a elevação da Cordilheira dos andes. esses dois processos fizeram com que os lagos do lado oeste se unissem ao pequeno rio do lado leste, dando origem ao rio amazonas. a sua vida adulta começou há cerca de 2,4 milhões de anos, no Plioceno, quando o rio ganhou sua forma e tamanho atuais. a influência da elevação dos andes na formação do amazonas já era conhecida pelos estudiosos — este estudo apresenta uma data mais precisa do nascimento do rio. os resultados das análises têm implicações na compreensão da paleogeografia sul-americana e da evolução das espécies da região amazônica e da costa atlântica da américa do sul. (HM) nasa World Wind
pulmões. a pneumonia costuma ser
Amazonas: um jovem de 11,8 milhões de anos
Liverpool (reino Unido).
outras pessoas para não transmitir a doença. (HM)
rio amazonas ganhou uma certidão de nascimento
semfronteiras |
101
N O T í c i a S d e C&t + Paraná
Cirurgia de diabetes istockphoto
Um procedimento cirúrgico de reengenharia do aparelho digestivo, desenvolvido na Universidade estadual de Ponta Grossa (UePG), mostrou resultados muito
promissores
no
tratamento
do
diabetes
tipo 2. as pesquisas, fundamentadas em bases genético evolutivas, foram coordenadas em conjunto pelo biólogo roberto ferreira artoni, do Departamento de Biologia estrutural, Molecular e Genética da UePG, e Grande Omento
pelo médico cirurgião fábio Quirillo Milléo, do instituto de Pesquisa aplicada em Medicina (inspam).
Intestino delgado
Desde o início do projeto, 52 pacientes foram operados, ainda como parte da pesquisa. “100% dos casos apresentaram remissão do diabetes tipo 2”, afirma artoni. “É uma tecnologia social pronta para ser transferida à população”. os resultados da pesquisa foram publicados no periódico internacional Obesity
a cirurgia do diabetes consiste na redução do intestino delgado e na extirpação do grande omento (gordura aderida ao estômago)
Surgery e defendidos por Milléo em sua tese de doutorado, em 2007, no Programa de Pós-Graduação
para o tratamento do diabetes tipo 2. ela consiste em duas
em Cirurgia da UfPr, sob orientação do professor
técnicas; uma é a omentectomia, que é a extirpação do
antônio C. L. de Campos. a equipe trabalha atualmente
grande omento (gordura visceral aderida ao estômago).
para descobrir quais genes estão relacionados à
essa gordura, além de ser um grande depósito de energia,
produção de hormônios, como a insulina, que, quando
produz diferentes tipos de hormônios que interferem
deficientes favorecem o surgimento do diabetes.
no organismo. a outra é a enterotectomia, que visa à
o projeto é apoiado pela seti, com recursos
redução do intestino delgado.
do fundo Paraná de cerca de 700 mil reais, para equipamentos de laboratório e financiamento de trinta
Multidisciplinaridade
cirurgias, incluindo exames. “Graças à sensibilização
Para artoni, o grande mérito desse projeto é a
do governo, trinta cirurgias foram patrocinadas, além
sua equipe multidisciplinar, composta por médicos,
de todo o aparato genético. este é um projeto de
enfermeiros, bioquímicos e biólogos. “nós percebemos
cunho social, que envolve um procedimento barato
o quanto cada área cresceu. Quando esses profissionais
e que visa a não utilização de medicamentos”, diz
se propõem a conversar, o ganho é muito grande, pois
roberto artoni.
quanto mais visões diferenciadas, mais conseguimos
a cirurgia do diabetes, ou entero-omentectomia,
chegar a algum lugar”, afirma.
é uma fusão de outros processos já usados para outras
Há cinco anos, artoni entrou em contato com
finalidades. a inovação do procedimento é a sua aplicação
o cirurgião fábio Milléo, que realiza cirurgias para
102 | semfronteiras
o tratamento da obesidade. o médico procurava uma
Descompasso evolutivo
interpretação biológica para o tratamento que vinha
a reengenharia do aparelho digestivo se baseia no
realizando, que é o procedimento que deu origem à cirurgia
descompasso entre a evolução biológica e a evolução
do diabetes, e que envolve além da entero-omentectomia
cultural dos seres humanos; grande parte da população
a redução do estômago. as alterações hormonais eram
não está adaptada biologicamente para os novos hábitos
observadas nos pacientes tratados, e ele buscava as
alimentares e culturais.
causas disso.
a alimentação do homem primitivo era muito
a equipe se perguntava por que uma pessoa que se
mais voltada a vegetais. nossos ancestrais começaram
submete à cirurgia de redução de peso, com condições
então a manipular alimentos e a consumir proteína
associadas à obesidade como diabetes tipo 2, pressão
animal, primeiro crua. estes novos hábitos alimentares
alta, altos níveis de triglicerídeos e colesterol, apresenta
propiciaram mudanças como o aumento do cérebro e
uma melhora nos níveis de insulina e glicemia muito
alterações na posição de andar. Com a descoberta do fogo
rapidamente, chegando a suprimir o uso de medicamentos
e o consequente consumo de alimentos cozidos, passamos
para pressão alta e diabetes já quando recebem alta do
a economizar energia que era usada na digestão e a
hospital. “Baseados nesse contexto, pensamos em modelar
absorver mais facilmente as reservas.
uma situação para controle do diabetes em pessoas não obesas, que não precisam de redução de estômago”, descreve artoni. Daí surgiu o procedimento da enteroomentectomia, que é a retirada da gordura visceral e redução do intestino delgado. o procedimento foi aprovado pela Comissão de Ética em Pesquisa envolvendo seres Humanos, da UePG, e validado pela Comissão nacional de
e de fácil absorção. “Durante todo esse tempo, o homem teve pouquíssimas modificações na morfologia de seu aparelho digestivo. Por isso, ele não está completamente adaptado a algumas condições de alimentação, tamanha foi a evolução cultural na disponibilidade de alimentos”, explica artoni. “em última análise, comemos errado, não istockphoto
Ética em Pesquisa (Conep).
Hoje, consumimos alimentos muito ricos em energia
HOMeM prIMItIvO
HOMeM MODernO
‹
absorção dos nutrientes feita ao longo de todo o intestino
‹
Dieta hipercalórica, consumo de alimentos refinados, pobres em fibras, mais facilmente digeríveis absorção ocorre em picos na porção proximal do intestino, porção distal absorve menos nutrientes
‹
‹
‹
estômagos grandes para armazenar alimentos durante longos períodos intestinos longos para processar eficientemente a comida rica em fibras, evitando assim a perda de nutrientes
Dieta humana mudou ao longo do tempo com o controle do fogo e a agricultura
instintos alimentares desenvolvidos em tempos de fome e de escassez permanecem, enquanto nosso esforço físico é diminuído
‹
de
‹
‹ ‹
Dieta hipocalórica, composta alimentos crus e ricos em fibras
‹ ‹
abundância de alimentos
escassez de alimentos
intestino delgado longo não é mais adequado. Consequências: obesidade, hipertensão, diabetes tipo 2
semfronteiras |
103
cultivamos os hábitos que deveríamos ter, e agregam-
mais rapidamente e em maior volume no intestino
se a isso o sedentarismo e todas as facilidades
distal, para haver estimulação dos peptídeos”, explica
tecnológicas que nos poupam energia”, acrescenta.
Milléo.
Um dos reflexos desse descompasso é o tamanho
a
diabetes
tipo
2
integra
a
síndrome
do intestino delgado, que varia entre 3 e 11 metros
plurimetabólica, um problema que afeta cerca de
de comprimento. Um intestino muito comprido é
um quarto da humanidade, sem distinção de classes
uma característica dos animais herbívoros, como os
sociais, e inclui também altos níveis de colesterol e
ancestrais da nossa espécie. Um intestino muito longo,
triglicerídeos e hipertensão.
somado ao consumo de alimentos de rápida absorção, traz prejuízos ao homem moderno. os alimentos industrializados e refinados são de fácil absorção, ao contrário de alimentos mais duros, ricos em fibra e menos manipulados, que são absorvidos ao longo de todo o tubo digestivo. Quando consumimos vegetais, que contêm fibras, esse alimento chega em grande quantidade no final do intestino, estimulando células ali presentes a produzirem peptídeos, que regulam a produção de insulina, entre outras funções. Diferente de quando consumimos um sorvete, por exemplo, que é absorvido em pico nos primeiros segmentos do intestino e não estimula o intestino distal. a falta de estímulo adequado pode levar a um quadro de diabetes tipo 2. “o que a cirurgia tenta fazer é que a chegada do alimento aconteça
Após a operação no projeto piloto, que iniciou há quatro anos, foram operados 22 pacientes. De dois anos pra cá, foram operados os trinta pacientes patrocinados pelo estado. segundo artoni, “todos têm apresentado uma melhora muito rápida e manutenção desse estado até o momento. o diabetes não voltou. temos pacientes que utilizaram insulina durante anos, e agora não usam mais”. ainda de acordo com o biólogo, os pacientes liberados para o procedimento cirúrgico eram pessoas com diabetes de difícil controle. Um dos pacientes é o supervisor de equipe e.L.M.L., que foi operado em agosto de 2008. “no meu caso, houve uma mudança para melhor. eu fazia uso de medicamento para pressão alta e diabetes e agora não uso nenhum medicamento. não tenho restrições a
síndrome plurimetabólica Estima-se que essa síndrome afete até um quarto da população mundial. É uma combinação de fatores que aumentam o risco de doenças cardiovasculares e de diabetes tipo 2, tais como:
‹
obesidade abdominal
‹
resistência à insulina
‹
hipertensão arterial
‹
altos níveis de triglicerídeos
‹
altos níveis de colesterol LDL
‹
baixos níveis de colesterol HDL
‹
hiperglicemia
nenhum alimento, mas procuro ingerir mais vegetais e fibras”, conta o paciente, que perdeu 22 kg, e diz ainda que os resultados de seus exames após a cirurgia estão todos normais, incluindo o de glicose. a.a.s., que passou pela cirurgia em novembro de 2008, também deixou de tomar medicamentos para diabetes. “antes da cirurgia eu tomava quatro tipos de remédio e não comia como deveria. a partir da cirurgia, minha alimentação mudou e minha vida melhorou”.
validação genética no momento, os estudos estão na etapa da validação genética, que é a investigação de como o organismo está produzindo os hormônios e resolvendo essa situação para a qual não estava preparado. “e aí eu posso dizer que o Paraná, por meio da nossa pesquisa, é colocado em destaque
104 | semfronteiras
N O T í c i a S d e C&t + Paraná mundial, estamos na vanguarda do estudo o Governo do Paraná aplicará em 2009 r$ 124,6
do diabetes tipo 2. seja por meio cirúrgico,
milhões no desenvolvimento da ciência e tecnologia, sendo
seja na investigação genética”, observa o
50% em projetos estratégicos e de interesse da sociedade,
biólogo.
30% em programas de apoio ao desenvolvimento científico
Por meio de exames pré e pós-
e tecnológico da fundação araucária e 20% em programas
cirúrgicos, a equipe faz a chamada análise
do instituto de tecnologia do Paraná/tecpar. os recursos são
de expressão gênica, e investiga como as
do fundo Paraná, gerenciado pela secretaria de estado da
células produtoras de hormônios estão
Ciência, tecnologia e ensino superior. o orçamento foi aprovado durante reunião do Conselho
nesta análise permitiram concluir que não
Paranaense de Ciência e tecnologia (CCt/Pr), realizada em
apenas o volume de hormônio circulante está melhorando, mas que os genes estão funcionando de forma diferente; a equipe observou que as células responsáveis pela produção foram
de
determinados
estimuladas
a
hormônios
produzi-los
em
porcentagem maior. em análise do genoma humano, utilizando
amostras
do
pré
e
pós
operatório, os pesquisadores puderam ver, além dos genes que já se sabe que têm envolvimento no processo, outros genes também envolvidos, chegando a um total de 62. a equipe prepara agora dois artigos para encaminhar a periódicos da área de genética. “estamos com dados valiosos em mãos em termos de resultados genéticos, e estamos dando prosseguimento”, avalia.
prevenção Com a evolução dos estudos e a maior compreensão de como o diabetes se dá na pessoa, a ideia é ser preditivo: “não queremos que um quarto da população
precise
de
cirurgia
no
futuro. eu quero ver quais as formas de identificar na população quem está
R$ 124,6 milhões para a C&T em 2009
reagindo à cirurgia. os dados colhidos
fevereiro deste ano, no Palácio das araucárias, em Curitiba, e é superior ao de 2008, que somou aproximadamente r$ 90 milhões. os seis programas estratégicos de governo para 2009 (r$ 62,3 milhões) são: Programa de Ciência e tecnologia em saúde; Programa estadual de Pecuária Leiteira; Programa de Desenvolvimento do ensino superior do Paraná; Programa de aquicultura e Pesca; Programa de Popularização da Ciência, tecnologia e inovação e Programa Universidade sem fronteiras.
a fundação araucária de apoio ao Desenvolvimento Científico e tecnológico dará continuidade aos seus programas de fomento à produção científica e tecnológica, verticalização do ensino superior e formação de pesquisadores e disseminação de ciência e tecnologia, com recursos que chegam a r$ 37,4 milhões. os principais programas do tecpar que receberão recursos neste ano (r$ 24,9 milhões) estão relacionados à consolidação do instituto como centro de referência em desenvolvimento e produção de imunobiológicos e medicamentos com base em biotecnologia avançada, bem como à inovação de projetos de desenvolvimento tecnológico, entre os quais o biodisel.
2003
R$ 48.210.608,00
2004
R$ 67.436.878,00
2005
R$ 64.150.892,00
2006
R$ 72.266.458,00
2007
R$ 79.154.139,00
2008
R$ 89.299.192,00
2009
R$ 124.628.471,00
sujeito a desenvolver as mazelas na idade juvenil e adulta. nós queremos transferir a tecnologia que estamos desenvolvendo para uma condição de melhor análise de interferência, de diagnóstico para controle clínico e preditivo também”, afirma artoni. (HM)
recursos do fundo Paraná administrados pela seti
semfronteiras |
105
Evolução da pós-graduação stricto sensu no Paraná mARIA HELENA fuNgARo E LuIz AfoNSo fIguEIREDo fILHo
entomologista Padre Jesus santiago Moure, uma das maiores autoridades mundiais no estudo das abelhas
Médico Bioquímico Metry Bacila, talentoso e precoce pesquisador paranaense
arquivo pessoal
Geneticista newton freire Maia (1918-2003), responsável pela criação, no Brasil, da pesquisa em genética humana
reprodução/Do iBPt de Marcos augusto enrietti ao tecpar/Júlio Covello
arquivo pessoal
Gabriel Melo/Departamento de Zoologia da UfPr
Pioneiros da pós-graduação:
o curso de tecnologia de alimentos da Universidade estadual de Londrina foi criado pelo professor rui sérgio dos santos ferreira da silva
106 | semfronteiras
as
instituições
de
ensino
superior
brasileiro,
N O T í c i a S d e C&t + Paraná
públicas e privadas, abrigam cursos de graduação e de pós-graduação. a pós-graduação é estruturada em
“nO pArAná Os prIMeIrOs pAssOs
duas modalidades, lato sensu e stricto sensu. ambas as
fOrAM DADOs pelA UnIversIDADe
modalidades têm por finalidade aprimorar a formação
feDerAl DO pArAná”
superior, capacitando os titulados a disputar o mercado de trabalho, exercer com maior qualificação as diversas
as
primeiras
instituições
estaduais
de
ensino
profissões liberais e, principalmente, seguir a carreira
superior (iees) do Paraná (UeL — Universidade estadual
docente e de pesquisador. a pós-graduação lato sensu, ou
de Londrina, UeM — Universidade estadual de Maringá e
especialização, tem por objetivo o aperfeiçoamento técnico
UePG — Universidade estadual de Ponta Grossa) foram
profissional em uma dada área do saber, enquanto a pós-
criadas pela lei nº. 6.034, de seis de novembro de 1969,
graduação stricto sensu, mestrado e doutorado, prioriza
durante o governo Paulo Pimentel. a criação da UeL, UeM e
as atividades de pesquisa e de formação de pesquisadores,
UePG visava atender à formação de profissionais em nível
gerando novos conhecimentos e tecnologias.
de graduação. este papel tem sido muito bem cumprido
a pós-graduação stricto sensu está baseada em um
ao longo dos anos, sendo que vários cursos de graduação
sistema de créditos e exige o desenvolvimento de um
oferecidos pelas universidades estaduais têm recebido
trabalho que é supervisionado por um docente orientador
conceitos excelentes pelo sistema de avaliação empregado
ou comitê de orientação e cuja defesa é pública. os títulos
pelo Ministério de educação. as iees do Paraná, a exemplo
outorgados são de mestre e doutor. o mestrado pode ser
do que ocorreu em outros estados, são provenientes da
acadêmico ou profissional. esta última modalidade, apenas
agregação das faculdades isoladas, geralmente vinculadas
recentemente criada, é voltada a profissionais já inseridos
às prefeituras dos municípios.
no mercado de trabalho que querem atualizar ou adquirir
o
ensino
de
pós-graduação
nas
universidades
conhecimentos em uma área específica, para aplicação
estaduais do Paraná iniciou-se na UeL em 1976, com a
imediata em sua atividade profissional.
criação do mestrado em Ciência de alimentos. Passados
foi durante a década de 1960 que os cursos de pós-
15 anos houve a ampliação do Programa com a instituição
graduação iniciaram sua trajetória nas universidades
do Doutorado. este Programa pioneiro tem atualmente
brasileiras amparados pela lei de Diretrizes e Bases da
conceito cinco junto à CaPes.
educação de 1962. essa primeira lei geral de ensino
Considerando que o quadro docente das iees
considerou os cursos de pós-graduação como uma
do Paraná foi inicialmente formado por profissionais
categoria especial. no Paraná, os primeiros passos foram
graduados, um longo período foi necessário para qualificar
dados em meados desta década na Universidade federal do
o corpo docente nas tradicionais universidades federais
Paraná (UfPr), uma das primeiras universidades do país,
brasileiras. estes professores retornaram às instituições de
criada em 1912. Destacam-se como pioneiros os cursos de
origem, capacitados para realizar pesquisas e gerir grupos
mestrado em Bioquímica, entomologia e Genética, que
de pesquisa.
tiveram respectivamente como mentores, o Professor
foi neste contexto que nasceram os primeiros
Metry Bacila, o Professor Padre Jesus santiago Moure e o
cursos de pós-graduação, especialmente de mestrado. ao
Professor newton freire Maia.
contrário, as tradicionais universidades federais e a UsP
no decorrer desses 50 anos, observou-se um
lideraram a criação de cursos de pós-graduação no país
franco crescimento da pós-graduação no estado, tanto
sem que, necessariamente, seus docentes tivessem o título
quantitativo como qualitativo, e o Paraná, cada vez mais,
de doutor, a despeito de já desenvolverem pesquisa. Muitos
ganha respeito pela qualidade de sua produção científica.
destes pioneiros obtiveram seus títulos na europa e estados
semfronteiras |
107
“eM 2007, As
Unidos ou foram reconhecidos pelo seu
mas no período 2005-2008 o crescimento foi de 86%,
InstItUIções
notório saber, podendo orientar alunos
valor significativamente superior ao total brasileiro. no
em nível de pós-graduação.
mestrado foi observado um crescimento mais homogêneo
públIcAs
no decorrer dos anos, de 31% de 2002 a 2005, e de 37%
feDerAIs,
atualmente, as instituições estaduais
estADUAIs e
de ensino superior do Paraná oferecem 80
pArtIcUlAres
cursos de mestrado acadêmico, dois cursos
a CaPes, responsável pela avaliação dos programas
seDIADAs
de mestrado profissional e 28 cursos
stricto sensu, agrupa-os em nove grandes áreas do
nO pArAná
de doutorado. estes números colocam
conhecimento: Ciências agrárias; Ciências Biológicas;
tItUlArAM
o Paraná em segundo lugar no país em
Ciências da saúde; Ciências exatas e da terra; Ciências
2.110 Mestres
número de programas de pós-graduação
Humanas; Ciências sociais aplicadas; engenharias;
e 339
sediados em iees, superado apenas
Lingüística; Letras e artes; e Multidisciplinar.
DOUtOres”
pelo estado de são Paulo onde a UsP, a
o número de doutores titulados no estado demonstra
Universidade estadual Paulista Júlio de
a expressividade da área das Ciências agrárias: 22 cursos
Mesquita filho (UnesP) e a Universidade
de mestrado e 10 de doutorado. a título de informação,
estadual de Campinas (UniCaMP), todas
é nesta grande área onde estão alocados os cursos de
elas universidades estaduais públicas,
agronomia, Ciência e tecnologia de alimentos, engenharia
abrigam a grande maioria dos cursos de
agrícola, Medicina Veterinária, recursos florestais e
pós-graduação stricto sensu do estado.
engenharia florestal, recursos Pesqueiros e engenharia
de 2005 a 2008 (figura 1).
“nO períODO
em 2007, juntas, as instituições
de Pesca e Zootecnia. a área de agronomia é a que
2005-2008
públicas federais (UfPr e UtfPr), estaduais
conta com maior número de cursos: 10 mestrados e cinco
Os cUrsOs De
(UeL, UeM, UePG, Unioeste, UniCentro
doutorados. Com estes números o Paraná se configura
DOUtOrADO
e UenP) e particulares paranaenses
como o quarto estado brasileiro em formação de recursos
nAs
titularam 2.110 mestres e 339 doutores.
humanos na grande área de Ciências agrárias. De certa
InstItUIções
a UfPr foi a instituição que mais formou
estADUAIs
mestres e doutores no estado: 688 títulos
crescerAM
de mestres e 193 títulos de doutor foram
Um dos parâmetros frequentemente indicados como
outorgados. as iees foram responsáveis
mensurador de qualidade do ensino de pós-graduação do
por 40% dos títulos: foram concedidos 941
país é o conceito atribuído pela CaPes, cuja escala vai de
(812 de mestre e 129 de doutor). os demais
três a sete. no Paraná, 3% dos cursos de doutorado têm
títulos foram outorgados principalmente
conceito três, 66% conceito quatro, 26% conceito cinco
pela
Católica
e finalmente 5% conceito seis. nas instituições estaduais
do Paraná (270 de mestrado e sete de
ressaltam-se os programas Zootecnia da UeM e Ciências
doutorado) e Universidade tecnológica
ambientais também da UeM, que desenvolvem pesquisa
“O pArAná
federal do Paraná (108 de mestrado e oito
na área de Produção animal, Pastagens e forragicultura,
é O qUArtO
de doutorado).
ecologia de Áreas alagáveis e ecologia e Manejo de
86%”
Pontifícia
Universidade
forma, isto é esperado em face da vocação agropecuária do estado.
reservatórios. na UfPr os programas de pós-graduação
estADO eM
embora o número de cursos de
fOrMAçãO
mestrado e de doutorado nas iees, bem
De recUrsOs
como o número de titulados, seja ainda
segundo o atual presidente do CnPq, Professor Mário
HUMAnOs
tímido, é notável o crescimento ocorrido
antônio Zago, cerca de 80% das atividades de Pesquisa
nA áreA De
nos últimos três anos, especialmente
e Desenvolvimento do país estão nas universidades e
cIêncIAs
no nível de doutorado. o número de
no Paraná a situação não é muito diferente. embora a
cursos
produção científica não seja exclusividade do ensino de
AGrárIAs”
de
doutorado
manteve-se
praticamente estável de 2002 a 2005,
108 | semfronteiras
em Direito e em Bioquímica.
pós-graduação, a maior parcela está a ele vinculada.
“cresceM Os InvestIMentOs
instituições brasileiras, feito pelo instituto Lobo
eM cIêncIA e tecnOlOGIA nO pAís”
(http://www.institutolobo.org.br), identifica quatro universidades públicas paranaenses entre as que
o suporte financeiro à pesquisa científica e tecnológica no Brasil vem, basicamente, do setor público. isto explica as oscilações, ao longo dos anos, dos valores destinados pelo governo federal e estados à ciência e à tecnologia. atualmente, o país passa por uma fase em que há maior constância de recursos financeiros para a pesquisa, havendo um número considerável de programas de apoio
mais produziram artigos científicos no Brasil. a Universidade federal do Paraná esteve entre as 10 mais produtivas do nosso País. as Universidades estaduais de Londrina, Maringá e Ponta Grossa também estiveram entre o grupo das universidades de alta produtividade científica do país. esse
documento
mostra
que
a
pós-
à comunidade de pesquisadores, nas diversas áreas do
graduação nas universidades públicas do Paraná
conhecimento.
cresceu consideravelmente, notadamente nos
as principais agências federais de apoio à pesquisa
últimos anos, o que implica na existência de um
são o Conselho nacional de Desenvolvimento Científico e
grande número de cursos recém-iniciados e na
tecnológico (CnPq), a financiadora de estudos e Projetos
descentralização do ensino de pós-graduação no
(fineP), que são vinculadas ao Ministério de Ciência
estado. isso sinaliza a necessidade de continuar
e tecnologia, e a Coordenação de aperfeiçoamento
a investir para a consolidação desses cursos e
de Pessoal de nível superior (CaPes), vinculada ao
para a melhoria daqueles já bem classificados
Ministério de educação. os estados destinam verbas por
pela CaPes, a fim de que atinjam níveis de
meio das fundações de amparo à Pesquisa (faPs), que
excelência. É importante também ressaltar que
frequentemente são vinculadas às secretarias estaduais
todo o sistema deve estar atento para a criação
de Ciência e tecnologia. no Paraná, essa responsabilidade
de cursos que contemplem áreas inovadoras da
é da secretaria de estado de Ciência, tecnologia e ensino
ciência e tecnologia.
superior (seti), através de sua vinculada, a fundação araucária.
o maior mérito da pós-graduação stricto sensu no Paraná (e no país) está na formação de
as políticas de fomento das agências governamentais,
profissionais qualificados, mestres e doutores.
em âmbito nacional e estadual, são responsáveis pela
no entanto, além de produzir ciência de valor
ampliação da participação do Brasil e do estado do Paraná
internacional, o desenvolvimento de linhas de
na produção científica internacional. no mês de maio deste
pesquisa de interesse regional é de fundamental
ano, o ministro da educação, fernando Haddad, anunciou que
importância. sem desrespeitar a liberdade de
o Brasil ocupa o 13° lugar no ranking mundial da produção científica. esta estatística teve por base os dados do Institute for Scientific Information (http://www.isiwebofknowledge. com) que acompanha a publicação científica dos periódicos de prestígio internacional.
escolha do pesquisador, produzir ciência em benefício da sociedade, voltada às necessidades sociais e ao desenvolvimento regional do estado é a nossa sugestão!
Certamente, a pesquisa desenvolvida no estado do Paraná contribuiu para a obtenção da posição brasileira no cenário científico mundial. o levantamento da produção científica das
Maria Helena Fungaro e Luiz Afonso Figueiredo Filho são professores da Universidade Estadual de
“qUAtrO UnIversIDADes públIcAs pArAnAenses estãO entre As qUe MAIs prODUzIrAM ArtIGOs cIentífIcOs nO brAsIl”
Londrina e atuam na Coordenadoria de Ciência e Tecnologia da Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
semfronteiras |
109
evolução do número de cursos de pós-graduação stricto sensu nas instituições
Joka madruga
estaduais de ensino superior ANo
mESTRADo
DouToRADo
2002
45
14
2003
53
14
2004
56
14
2005
59
15
2006
66
18
2007
73
19
2008
82
28
fonte: MeC/ Capes/ seti
Joka Madruga
Total de alunos titulados na pós-graduação stricto sensu no Paraná em 2007
gRANDE ÁREA
mESTRADo DouToRADo
Ciências Agrárias
243
99
Ciências Biológicas
195
69
Ciências da Saúde
271
28
Ciências Exatas e da Terra
171
26
Ciências Humanas
393
22
Ciências Sociais Aplicadas
321
6
Engenharias
249
36
Línguas, Letras, Artes
106
24
multidisciplinar
161
29
2110
339
Total fonte: MeC/ Capes/ seti
N
110 | semfronteiras
A universidade repensada Um dos desafios da Universidade federal da integração Latino-americana (Unila), que deverá ser inaugurada ainda em 2009, na cidade de foz do iguaçu, será o de converter-se numa instituição inovadora, capaz de dar seguimento às novas tendências de reinvenção da universidade do século XXi. Para que isso se concretize, a Unila já consultou, além de inúmeros intelectuais brasileiros, cerca de 250 especialistas estrangeiros em educação superior da américa Latina, europa e estados Unidos. no depoimento a seguir, o presidente da comissão de instalação da Unila, professor Helgio trindade, dá mais detalhes. “a construção de uma universidade pública, com a vocação da Unila e com professores e alunos da américa Latina, precisa ser desenhada previamente numa perspectiva global. o primeiro desafio é o de situá-la no contexto de uma universidade para o século XXi, cujos conteúdos e métodos precisam voltar-se para as questões científicas, tecnológicas, humanísticas e artísticas com um olhar inovador. o segundo é o de desenvolver o ensino, a pesquisa e a extensão de forma orgânica, articulando-os sistemicamente. terceiro, conceber a organização acadêmica da Universidade e o espaço físico do futuro campus projetado por oscar niemeyer de tal forma que suas diferentes atividades-fim se combinem de forma harmoniosa e compatível em suas funções próprias. nessa perspectiva, a graduação, a pós-graduação e a pesquisa devem caminhar juntas desde o início da UniLa, por meio de um processo que será concebido em seu pólo internacional de inovação, o instituto Mercosul de estudos avançados (iMea). suas atividades de pesquisa de ponta e de ensino pós-graduado vão estabelecer os campos de atuação prioritários para enfrentar os grandes desafios da america Latina, desde a infraestrutura, o meio ambiente até as relações políticas, sociais e internacionais para contribuir ao avanço da integração regional. ao mesmo tempo, a Comissão de implantação da UniLa está trabalhando na elaboração de projetos de cursos de graduação em áreas inovadoras para a américa Latina, com uma estrutura interdisciplinar, um ciclo de formação comum, um ciclo profissional e um ciclo de integração latino-americana. esta é, em grandes linhas, a estratégia de implantação da UniLa que combina uma concepção da Universidade, um campus universitário integrado e um conjunto de cursos em todos os níveis, pesquisas
Divulgação/unila
avançadas e atividades de extensão dentro de sua vocação latino-americana para o século XXi”. (rr)
Idéia da integração latino-americana está presente no desenho de oscar Niemeyer
N O T í c i a S d e C&t
semfronteiras |
111
N O T í c i a S d e C&t + Paraná
In memoriam
Julio Covello
glaci zancan, uma guerreira
“Ética, seriedade, perseverança, destemor, inteligência e criatividade.” estas eram, segundo o pesquisador da UfPr fábio Pedrosa, as principais características da cientista.
Glaci Zancan (1935-2007) estava entre aqueles que
projetos por pares competentes; pela profissionalização do
acreditam que sem uma ciência forte, competitiva e de
docente universitário mediante qualificação e dedicação
alto nível, não há desenvolvimento científico e tecnológico.
integral ao ensino e à pesquisa; pela valorização do trabalho
era determinada e exigente, porém extremamente afável
e competência nas instituições de pesquisa e universidades;
e simples. Por causa do vasto conhecimento científico que
pela seriedade e ética na ciência; e pela excelência
possuía e da firmeza com que defendia suas ideias, suas
científica.
conferências despertavam grande interesse, inclusive de
entre suas muitas atividades dedicadas à pesquisa, pós-
leigos. Gaúcha de são Borja, ela viveu boa parte de sua
graduação e política científica, Glaci teve papel fundamental
vida em Curitiba, nos laboratórios e em sala de aula, na
na consolidação do curso de pós-gradução em Bioquímica
Universidade federal do Paraná, tendo falecido em 2007,
da Universidade federal do Paraná, que coordenou durante
aos 72 anos de idade.
11 anos. nessa instituição, onde ingressou em meados dos
responsável pela formação de 25 mestres e doutores
anos sessenta, começou como livre docente e chegou a
hoje atuantes em universidades e centros de pesquisa do
professor titular do Departamento de Bioquímica e Biologia
país, a professora Glaci Zancan ficou conhecida dentro
Molecular em 1971. aposentou-se após 45 anos de trabalho
e fora do meio acadêmico por suas ideias e lutas em
intenso, justo antes de completar 70 anos, para, segundo
favor da universalização da pesquisa nas universidades
ela, não ter que se submeter à aposentadoria compulsória.
brasileiras, lembra o pesquisador fábio Pedrosa, que
no Paraná, além de membro do Conselho estadual de
foi seu orientando. segundo ele, Glaci também lutou
educação e do Comitê assessor do Conselho de Ciência e
intensamente por uma rigorosa análise do mérito dos
tecnologia, Glaci Zancan foi uma incansável batalhadora pela
112 | semfronteiras
regulamentação do artigo 205 da
mulheres de Ciência
Constituição estadual, que garante 2% da arrecadação para a pesquisa científica e tecnológica.
em nível
nacional, foi duas vezes presidente
trOféU levA O nOMe DA pesqUIsADOrA GlAcI zAncAn, qUe DeDIcOU sUA vIDA à cIêncIA e à pOlítIcA cIentífIcA nAcIOnAl
eleita da sociedade Brasileira para
Como parte das comemorações ao Dia internacional da Mulher, a
o Progresso da Ciência (sBPC),
secretaria de Ciência, tecnologia e ensino superior instituiu o troféu
cargo que exerceu até 2003, além
“Mulheres de Ciência — Glaci Zancan”. o objetivo da premiação é valorizar
de secretária, conselheira e vice-
as cientistas e educadoras que contribuem para o avanço da ciência e da
presidente.
a
tecnologia e que participaram do processo de estruturação e consolidação
sociedade Brasileira de Bioquímica
das instituições de ensino e pesquisa paranaenses. o troféu homenageia
e Biologia Molecular, entidade que
também gestoras públicas que colaboram com a sociedade paranaense nas
também
presidiu
considerava sua segunda casa e foi por meio dela que pôde contribuir para a defesa da ciência brasileira nos vários momentos de crise por que o país passou. no Ministério da Ciência e tecnologia
atuou
como coorde-
nadora da escola Brasil argentina
diferentes áreas de atuação do estado. a solenidade de entrega aconteceu no dia 9 de março, em Curitiba. foram homenageadas 27 educadoras e pesquisadoras na categoria “Cientistas e educadoras”. elas foram indicadas pelas instituições de ensino e pesquisa paranaenses, públicas e privadas, com tradição na área de ensino e pesquisa. na categoria “Gestoras Públicas”, cinco secretárias de estado receberam a homenagem.
e
na ocasião, a secretária Lygia Pupatto fez uma reflexão a respeito da
foi membro do Comitê assessor
participação das mulheres em todas as atividades humanas — nas ciências,
do Centro Brasileiro argentino de
na educação, na gestão pública e também no cotidiano. ao final, fez um
Biotecnologia. Junto com Jorge
chamamento à luta: “se quisermos ser livres, temos de continuar lutando”.
de
Biotecnologia
(1987-1989)
Guimarães, atualmente presidente da Capes, a pesquisadora teve papel fundamental na implantação
fita de Moebius assinada
e consolidação deste centro que
pela
artista
plástica
e
hoje é considerado um modelo de
estudante de artes visuais na faculdade de
sucesso em relações binacionais
artes do Paraná (faP) Patrícia fumiko tristão,
e
governos
a escultura chamada “fita de Moebius” foi a
foi ainda
escolhida para o troféu “Mulheres de Ciência
membro da Comissão nacional de
— Glaci Zancan”, confeccionado em porcelana
Biodiversidade (MMa) do Conselho
branca com base de alumínio polido.
reconhecido
pelos
da américa Latina.
de
econômico
o nome “fita de Moebius” deve-
e social do Governo federal e do
Desenvolvimento
se ao formato da obra, que representa
Conselho superior da Capes. foi condecorada com a ordem do Mérito Científico, categoria GrãCruz, em 2000, e a ordem do Mérito educativo, em 2002. (rr)
o
espaço
topológico
composto
por
superfície de duas dimensões e um lado só. “a fita simboliza o infinito, e é isso o que desejamos ao prêmio, que ele se perpetue”, afirmou Patrícia. (HM)
troféu Glaci Zancan
semfronteiras |
113
A imagem eficaz REgINA RoCHA
Cartaz de Diana Carneiro para o XXVii Congresso Brasileiro de Zoologia, Curitiba/2007
114 | semfronteiras
N O T í c i a S d e C&t + Paraná
como Barbosa rodrigues, autor, em parceria
Ilustração científica além de um profundo conhecimento
com a esposa Constansa Parra, de extensa
científico e do domínio de técnicas
obra ilustrada sobre orquídeas nativas da
artísticas como luz e sombra, volume e
amazônia (1870), que a ilustração científica
perspectiva, mesmo o ilustrador científico
brasileira começou a ser reconhecida —
mais experiente precisa muitas vezes
também é de sua autoria, em 1903, quando
de meses para reproduzir um bioma em
diretor do Jardim Botânico do rio de Janeiro,
aquarela, por exemplo. Já a representação,
o importantíssimo e fartamente ilustrado
em bico de pena, de um exemplar vegetal a
Sertum palmarum Brasiliensis.
partir de uma exsicata (planta dessecada)
Mais recentemente, nos anos quarenta/
exige menos, entre 20 e 48 horas de
cinquenta, era comum a presença do
trabalho. outras vezes, uma ilustração
ilustrador científico dentro de um instituto
médica pode começar dentro de uma sala
de pesquisa — o Botânico de são Paulo,
de cirurgia e terminar semanas depois,
por exemplo, chegou a reunir uma dezena
noites adentro, tamanha a exigência de
em seu corpo de funcionários nessa época.
detalhes e necessidade de didatismo.
no Paraná mesmo, no antigo instituto de
nesta antiga profissão, ainda não regulamentada
pelo
governo
federal,
Biologia e Pesquisas tecnológicas (iBPt, atualmente tecpar), o primeiro núcleo de
seja
ciência do estado, augusto Comte, artista
apaixonado pelo trabalho que realiza. o
plástico reconhecido, era o encarregado
problema é a falta de conhecimento (e de
da ilustração científica oficial, mais tarde
reconhecimento) fora do meio acadêmico,
substituída pela fotografia.
é
difícil
encontrar
quem
não
especialmente por parte das editoras brasileiras.
apesar
disso,
ilustradores
científicos vêm lutando nos últimos dez anos para recuperar uma tradição que já estava presente entre nós desde os primeiros anos do século 18, quando da vinda das primeiras missões científicas européias ao Brasil e da instalação dos primeiros institutos de pesquisa no rio de Janeiro e em são Paulo.
Free-lancer segundo a bióloga e artista plástica Diana Carneiro, que há mais de vinte anos trabalha como ilustradora científica em Curitiba, a maioria dos profissionais é free-lancer junto a pesquisadores de universidades como a
UsP, Unicamp e
algumas instituições federais. alguns, como ela própria, trabalham para pesquisadores
Mas foi somente no século 19, e
que estão fora do país e que necessitam do
graças à atuação de cientistas de renome
trabalho minucioso do artista, principalmente
semfronteiras |
115
sérgio russo
representação de um pé (à esquerda) e de um cotovelo em aquarela e grafite de autoria de sérgio russo, um dos raros ilustradores médicos brasileiros
se este conseguir captar detalhes do
Para a curitibana renata Cunha, que
espécime em estudo a partir de fotos e
começou fazendo ilustração paleontológica
material exsicatado já que dificilmente o
em 2004 e hoje, além dessa área, também
ilustrador teria o material fresco como
se dedica às Ciências Biológicas e à
referência para o seu desenho.
Geologia, a valorização do trabalho do
nascido numa família de artistas da região de Cosenza, sul da itália, o médico e ilustrador sérgio russo, o único brasileiro filiado a association of Medical illustrators (aMi), e várias vezes premiado, tem a maior parte da sua produção feita fora do país, na alemanha principalmente, onde morou durante onze anos, cada um deles dedicado a um livro específico. “não existe no Brasil um curso de ilustração médica. os estudantes de Medicina e de
ilustrador científico depende em grande parte de divulgação junto ao público leigo. “Geralmente, esse trabalho fica restrito às publicações técnicas”, afirma. “infelizmente não temos nos currículos acadêmicos
das
nossas
universidades
cursos de bacharelado ou de pós-graduação específicos, capazes de garantir uma sólida formação desses profissionais”, afirma Diana, que foi curadora do ii encontro Brasileiro de ilustração Científica e da ii exposição nacional de ilustração Científica, eventos ocorridos em Curitiba em 2008. a
odontologia ainda aprendem nos livros
exposição, de caráter itinerante, também
cujas ilustrações são as mesmas há
pôde ser vista em Londrina no ano passado
décadas”, afirma. “Há uma falsa ideia no
e agora se encontra em Brasília.
país de que a fotografia substitui tudo”, acrescenta ainda.
116 | semfronteiras
ela lembra que a Universidade federal de Minas Gerais (UfMG) é hoje a única
theo Marques
instituição de ensino superior do país com curso de extensão em ilustração científica. entretanto, em algumas universidades inglesas a ilustração científica chega a ser uma exigência para o estudante ainda na graduação visando dar maior autonomia ao futuro pesquisador. Por aqui, há muito a ser feito ainda. “a ciência brasileira evoluiu bastante nos últimos anos e há uma demanda
maior
por
ilustrações
científicas, o que tem unido os ainda pouco compreendida no
profissionais que atuam nessa área”,
Brasil, a profissão de ilustrador
destaca a ilustradora. Pode-se dizer
científico exige profundos conhecimentos científicos e domínio de técnicas artísticas
que os principais embriões desse movimento estão em Minas Gerais, são Paulo, rio de Janeiro, Paraná e Brasília.
renata Cunha
Paraphysornis brasiliensis — do fóssil ao aspecto em vida
Mais informações sobre o trabalho dos ilustradores científicos nos endereços www.srusso.art.br www.netpar.com.br/dianacarneiro rfcunha.multiply.com
semfronteiras semfronteiras| |117 117
MEMÓRIA
O Mez da Grippe
O Mez da Grippe
Regina Rocha
“E era a pé. Iam carregando o caixão e as gentes a pé acompanhando pela cidade inteira até o Cemitério Municipal. Tinha os muito ricos que faziam enterro com carro, cavalos de penacho, pano preto, mas eram bem poucos. A maioria a pé, por muito tempo foi assim”. Dona Lúcia em depoimento a Valêncio Xavier, autor de O Mez da Grippe.
118 | semfronteiras
Pouco documentada pela história, a gripe
Schaiderman e Luiz Antonio de Figueiredo foram exceções, na
espanhola que contaminou mais da metade da
verdade os primeiros a reconhecer a singularidade da obra do
população de Curitiba entre novembro e dezembro
irreverente Valêncio.
de 1918, dos quais 384 foram a óbito, segundo dados
Uma dessas possibilidades é ler o Mez como se lê um
oficiais da época, foi reconstituída de forma genial pelo
jornal. “É como se o leitor primeiro olhasse a manchete,
escritor e cineasta Valêncio Xavier, falecido no ano
depois pulasse para a página de esportes e assim por diante”
passado em Curitiba, aos 75 anos de idade.
e, depois, no meio do caminho, topasse com achados do
Sob o olhar da literatura, O Mez da Grippe — novela
tipo “positivamente a vida humana não vale um caracol...”.
gráfico-polifônica para alguns, romance realista para
Outras vezes tem-se a impressão de uma colagem de textos
outros, inclusive para o autor, transformou-se na mais
e imagens com forte inspiração nas artes plásticas modernas:
importante experiência antecipadora da linguagem
a mensagem é reformulada, sugerindo uma narrativa
multimídia já feita no Brasil, de acordo com o teórico
descontínua, descontextualizada, logo desfeita.
da comunicação Décio Pignatari. Como narrativa, não exatamente prosa, mas com elementos de prosa também. Para escrever esse livro, Valêncio pesquisou e selecionou manchetes e textos de jornais sobre a gripe espanhola em O Diário da Tarde e Commercio do Paraná, já extintos. Ele também recuperou fotografias, cartões postais, santinhos de missa de sétimo dia e propagandas de remédios e de produtos de higiene usados para combater a doença, como a creolina, por
Curitiba e a gripe As notícias sobre a Primeira Guerra Mundial e os anúncios de filmes em cartaz em Curitiba no tempo da epidemia são colocados lado a lado, arrematados por uma nota minúscula do jornal Diário da Tarde: “Não morreu ninguém. Informa-nos o Sr. Benedicto Carrão, oficial do registro civil, que hontem, e hoje, não se registrou óbito algum nesta capital”. Ao mesmo tempo em que reproduz uma manchete de jornal relatando um pedido do papa para que a Bélgica não
exemplo.
fosse destruída pelos alemães, o autor insere um poema
Grippe, um dos 12 livros do autor — foi escrito em
erótico, um ofício do chefe de polícia local e um anúncio do
1981 e reconhecido pela crítica mais recentemente —,
“melhor desinfetante”, a creolina, usada contra a gripe, que,
são as mais variadas possíveis. Paulo Leminsky, Boris
diga-se de passagem, não poupou nem ricos nem pobres.
O Mez da Grippe
O Mez da Grippe
Por isso, as interpretações sobre O Mez da
Um cartão postal da Delegacia Fiscal do Tesouro de Curitiba, uma notícia e o símbolo “M”, de morte, técnica que reforça a idéia de literatura visual de Décio Pignatari
Anúncio de creolina, produto muito usado durante a epidemia da gripe espanhola, principalmente nas prisões
semfronteiras |
119
Na Sérvia, na Bélgica e na França os aliados avançam vitoriosos. Em Curitiba alguém do povo chamado José da Gaita publica no Diário da Tarde verso sobre a Hespanhola; há o Bromil, que cura as doenças do peito, pulmões e garganta; e a Igreja, que avisa que não realizará culto naquele 26 de outubro de 1918... Informações oficiais sobre a evolução da doença e os seus mortos são confrontadas com
depoimentos
de
uma
única pessoa, chamada de Dona Lúcia, ela própria vítima O Mez da Grippe
da gripe. E a impressão de narrativa descontínua é novamente logo desfeita... Famílias inteiras. Não houve casa que não tivesse alguém doente. Parecia a cidade dos mortos.
muita visita, não se davam com a gente do bairro. Os dois caíram com a gripe espanhola, ninguém notou. Imagine os dois, um num quarto, outro no outro, sofrendo sem assistência. Passaram muitos dias até que uma vizinha lá entrou e encontrou os dois...
Os primeiros mortos tinham mortalha, eu mesma costurei algumas. Depois era de qualquer jeito, faltou até caixão. Vinham buscar os mortos, antes de enterrar tiravam do caixão pra servir pra outro.
Um casamento... Transcrição de um trecho do relatório do diretor do Serviço Sanitário da época, doutor Trajano Reis,
Como saber quantos morreram? O governo não ia
sugere que a gripe espanhola teria sido levada do Rio de
dizer o número verdadeiro dos mortos para não alarmar.
Janeiro a Paranaguá, litoral do Paraná, por “alguns syrios
Até hoje ninguém sabe ao certo.
que estavam com o mal incubado”. Naquela cidade, eles assistiriam ao casamento da filha de um patrício.
Nova manchete sobre a Guerra, uma nota da Brazilian Railway informando sobre a suspensão dos bondes
No dia em que não houve caixões para serem
elétricos na cidade de Curitiba, um cartão postal do bairro
transportados os cadáveres, mandei-os fabricar e, quando
do Batel e dona Lúcia contando como um casal de alemães
faltaram animaes para conduzir os carros fúnebres,
caiu vítima da gripe:
mandei-os alugar pelo preço pedido, para que não ficassem insepultos os infelizes fallecidos.
Morava um casal de alemães, a mulher alta, loira,
Relatório do Sr. Dr. Trajano Reis, director do Serviço
muito bonita. Clara, isso, seu nome era Clara. Não recebiam
Sanitário, que integra a narrativa de O Mez da Grippe.
120 | semfronteiras
National Museum of Health and Medicine
cometido por causa de uma enfermidade incurável e não da gripe espanhola. Começa o mês de novembro de 1918 com o diretor do Serviço Sanitário da cidade tendo reconhecido que o “mal” havia tomado proporções assustadoras, invadindo “todas as classes sociais”. O “Louvre”, tradicional loja de armarinhos da Rua XV de Novembro, centro de Curitiba, publica anúncio sobre suas oficinas de costura; os cinemas funcionam três vezes por semana; a homeopatia entra em debate. Nesse mês, o prefeito do município, João Antonio
Índice de mortes por gripe espanhola nos Estados Unidos e Europa
Xavier, decide autorizar o comércio de “secos e molhados” e as farmácias a conservarem seus estabelecimentos
“Febre bastante forte no início, seguida de repetidos
abertos durante os domingos e feriados, “enquanto
arrepios de frio, violenta dor de cabeça, grande prostração
permanecer a epidemia reinante”. Um leitor chama
geral, e muito frequentemente dores bastante intensas das
atenção para o badalar dos sinos da Igreja do Rosário,
costas e cadeiras”. Esses eram os sintomas da doença descritos
“agora que o número de mortos aumentou”, espalhando
pelo médico Nilo Cairo e replicados no Diário da Tarde.
“esse som apreensão, mágoa e tristeza”. Sempre de acordo com a pesquisa feita por Valêncio
Um homem eu caminho sozinho
Xavier, o Diário da Tarde anuncia, em outubro de 1918, 21
Nesta cidade sem gente
óbitos, sendo 16 de gripe, e 24 já no dia seguinte. Quatro
As gente estão nas casas A grippe (Intervenção poética do autor)
Na Europa, as manchetes anunciam o fim da Primeira Guerra Mundial; por aqui, os jornais informam que os casos da gripe vêm aumentando. Os concertos de música que se realizavam na Praça Tiradentes, centro de Curitiba, chegam a ser interrompidos e um preso tenta pôr fim à sua vida tomando uma forte dose de creolina, cujo uso fora intensificado nas prisões a fim de se evitar a propagação da doença.
A vida continua, apesar de tudo... As notícias sobre o total de óbitos são desencontradas e quase sempre especulativas. O Commercio do Paraná primeiro informa que uma moradora da cidade, casada com o barbeiro da Praça Zacarias, teria tentado o suicídio, e depois volta atrás afirmando, com base no depoimento do marido, que, em verdade, o ato de desespero teria sido
Valêncio Xavier (1933 – 2008), com o Jabuti
semfronteiras |
121
dias depois esse mesmo jornal põe em dúvida as estatísticas
MEMÓRIA
oficiais, consumando-as em manchete estampadas na edição do dia 20: “A epidemia só declina para a ciência oficial”. Outro destaque do jornal: “Em 13 óbitos, 10 são de criança”.
Em 30 de novembro o tráfego de bondes é restabelecido Abandonado e só na Cascatinha...
e em primeiro de dezembro os cinemas in totun anunciam a
Casos como o do filho de “um tal de senhor” Telêmaco
reabertura com “exihibições novas de pelliculas attrahentes”.
Jardim, este próprio “quando atacado do mal abandonou
Pouco antes os dois jornais concorrentes divulgam mais
o lar e se foi deixar morrer, abandonado e só à beira da
uma “tragédia”, dessa vez no Hospício Nossa Senhora da
Cascatinha de Santa Felicidade...”, continuam despertando
Luz. A vítima, um jovem de 22 anos, e 32, de acordo com o
a curiosidade dos leitores e, já no final de novembro, com
Commercio do Paraná, havia tido um surto, não se sabe se
as notícias de recrudescimento da doença, a Diretoria do
devido à febre causada pela gripe ou se por outro motivo
Serviço Sanitário de Curitiba determina a extinção de postos
qualquer...
médicos especialmente criados para atender à população, bem como a suspensão da gratuidade dos remédios para
National Museum of Health and Medicine
os pobres. Hospital Militar de emergência em Camp Fuston, Kansas, Estados Unidos
Harris & Ewing
Pacientes de hospital em Washington, Estados Unidos, recebendo atendimento em corredor aberto
122 || semfronteiras semfronteiras 122
ng
re s e n h a
O jornalismo científico antideterminista MAURÍCIO TUFFANI
Ciência: Use com cuidado, de Marcelo Leite. Campinas: Editora Unicamp, 2008. 280 pp. R$ 46.
Uma das principais características da
sexo, emagrecimento e bem-estar mental, lembro-
atuação do jornalista Marcelo Leite em sua
me do agente do FBI Fox Mulder, da série de TV
coluna semanal na Folha de S. Paulo é a aposta
Arquivo X, obcecado com fenômenos paranormais
na capacidade de seus leitores de refletir sobre
e aliens: ‘Eu quero acreditar’.
as notícias sobre ciência. Nestes tempos de decadência midiática, em que a informação confunde-se com o entretenimento e grande parte do jornalismo opinativo mostra-se cada vez mais voltada a reforçar convicções e a servir de espelho para nichos definidos como público-alvo, esse colunista contrasta com sua persistência no exercício da crítica aplicado à discussão pública contemporânea da ciência. Lançado
recentemente
pela
Editora
Unicamp, o livro Ciência: Use com cuidado traz uma criteriosa seleção de 80 desses artigos que desde 2002 vêm sendo publicados nessa coluna. Além de terem sido escolhidos os textos menos presos ao momento específico em que foram redigidos, a cada um deles foi acrescentado um pós-escrito. Desse modo, o resultado editorial foi uma coletânea de maior permanência, que é o que se espera dos bons livros. É possível apresentar de uma forma bem sintética o espírito da coluna semanal de Marcelo Leite e, consequentemente, de seu novo livro, no seguinte trecho:
A função mais nobre do jornalismo científico é precisamente o contrário, ajudar o leitor a duvidar.” (pp. 28-29) Mais evidente na coletânea de artigos recémpublicada, essa atuação jornalística pode ser caracterizada também por sua atenção redobrada ao crescente determinismo na abordagem dos temas científicos na chamada esfera pública. Por exemplo, em relação ao senso comum de que “tudo está nos genes”, geneticistas e biólogos moleculares quase sempre argumentam que essa é uma visão caricata do genoma construída pela imprensa e que não tem nada a ver com os especialistas da área. Marcelo Leite, no entanto, ressalta que estes “não se esforçam muito para desfazer o equívoco. Seria o mesmo que um vendedor de Bíblias alertar o cliente potencial de que elas não contêm toda a verdade para guiar a vida”. (p. 217) Essa militância antideterminista é clara não só em relação ao senso comum, mas também a porta-vozes da própria comunidade científica. Por exemplo, em “Genomas para quê mesmo?” (pp.
“Sempre que topo com as inúmeras capas
218-221), em que o foco central foi Craig Venter,
de revistas semanais cheias de conselhos sobre
líder do consórcio privado Celera Genomics. Mas
semfronteiras |
123
ela foi muito mais contundente e abrangente em outros artigos, como “Determinismo genômico sai pela culatra”, de 21 de novembro de 2004, não incorporado a Ciência: Use com cuidado. Nesse texto, Leite ressaltou: “Foi com base na idéia de que os genes controlam tudo que a engenharia genética alavancou bilhões para erguer um novo ramo industrial e realizar o Projeto Genoma Humano. Se o DNA determina tudo, esse o raciocínio, sua manipulação permitiria desarmar todas as moléstias e todos os males do mundo”.
re s e n h a
É evidente que a exclusão nessa coletânea de alguns artigos mais contundentes se deveu ao já citado e justificado critério de maior atemporalidade temática. O preço dessa escolha, porém, parece ter sido, salvo melhor juízo, um
redução do tema aos seus aspectos políticos.
livro menos enfático do que o conjunto original
É neste ponto que vale ressaltar outra
de sua obra na crítica aos próprios cientistas
característica do trabalho do colunista da
que colaboraram para reforçar a percepção
Folha, que é o esforço para superar o chamado
pública determinista da genética. Seja como for,
abismo entre as duas culturas — de um lado, as
felizmente o livro não deixa de cumprir o papel
ciências naturais e as tecnologias, e, de outro, as
de fazer esse alerta ao leitor.
humanidades e as artes, como explicou o escritor
Ainda no campo da genética, o livro tem o mérito de perenizar um dos mais valiosos textos do jornalismo científico brasileiro sobre o tema dos transgênicos, ou organismos geneticamente modificados. Trata-se do artigo “Patacoadas transgênicas” (pp. 177-180), de 14 de setembro de 2003, no qual Marcelo Leite apresenta as conclusões de Allison Snow, da Universidade Estadual de Ohio (EUA), em seu artigo “Unnatural Selection” (seleção não-natural), da edição da revista Nature de 7 de agosto daquele ano. Mesmo sem ser contrária aos transgênicos, Snow
britânico Charles Percy Snow (1905-1980) em sua famosa conferência de 1959 na Universidade de Cambridge. Não se trata de abordar também temas de humanidades — que são igualmente contemplados na coletânea —, mas de considerar, sempre que forem relevantes, os aspectos multidisciplinares dos assuntos em questão, sejam eles das ciências naturais e das tecnologias, sejam das artes e humanidades. Nesse sentido, o esforço para superar a cisão entre as duas culturas e a atenção permanente às abordagens deterministas são inseparáveis.
evidenciou naquele seu trabalho suas objeções
Além de ser uma ótima leitura para todos
ao otimismo desenfreado de muitos entusiastas
os que se interessam por divulgação científica,
dessa tecnologia. Infelizmente, nas semanas
Ciência: Use com cuidado é também um
seguintes, em mais um capítulo da queda de
importante testemunho do trabalho para manter
braço entre adeptos dos OGMS e seus opositores,
vivo o espaço editorial da mais tradicional coluna
estes últimos nem sequer levaram em conta esse
de ciência do jornalismo brasileiro, a “Periscópio”,
estudo, preferindo investir na surrada retórica da
do incomparável José Reis (1907-2002).
Maurício Tuffani é jornalista especializado em ciência e meio ambiente e assessor-chefe de comunicação e imprensa da Unesp (Universidade Estadual Paulista).
124 | semfronteiras
LIVROs
Maria heLena De MoUra arias
DICIONÁRIO DO LIVRO — DA ESCRITA AO LIVRO
POPULAÇÃO, ESCRAVIDÃO E FAMÍLIA EM
ELETRÔNICO
GUARAPUAVA NO SÉCULO XIX
fernanDo franco neto
Maria isaBeL faria; Maria Da graÇa PerDicÃo
eDitora Unicentro
eDUsP
394 PÁginas; isBn 978-85-89346-504
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DistriBUiÇÃo gratUita — editora@unicentro.br
PreÇo: 120,00 — edusp@usp.br
Este
importante
funcionamento do período
de vinte e três mil verbetes
em questão. Por pequeno
mundo
que fosse o contingente local
do livro e de sua produção
de cativos, em comparação
apresentados
ordem
com o que se passava em
incluem
províncias como a Bahia,
alfabética,
em que
também inerente
ao
é
para o entendimento do
O dicionário comporta cerca
relacionados
livro
a à
Minas e São Paulo e Rio de
terminologia expressão
da
palavra, figuras de estilo,
Janeiro, o livro retrata de maneira competente uma cidade do interior refletindo o Brasil daquela época.
retórica, formas de linguagem, expressões que consignam o pensamento por escrito.
MONTEIRO LOBATO-LIVRO A LIVRO (OBRA INFANTIL)
Marisa LaJoLo; JoÃo LUÍs ceccantini (orgs) eDitora UnesP/iMPrensa oficiaL 509 PÁginas; isBn 85-7139-8291 PreÇo: 62,00 — feu@editoraunesp.br
Além de permitir um novo
olhar
sobre
expressividade
e
a o
significado de cada livro de
L I V RL IO Vs ROs LIVROs LIVROs
Monteiro
Lobato
direcionado às crianças, uma das novidades desta coletânea é apresentar o
percurso
cumprido
obra a obra, buscando recuperar
a
forma
como o autor se dedicava a reescrever seus textos, promovendo numerosas alterações e renovando, a cada edição, o pacto estabelecido com seus leitores.
semfronteiras |
125
LIVROs
GESTÃO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE — A
A POÉTICA DA LUZ NATURAL NA OBRA DE OSCAR
DINÂMICA DA HIDROELÉTRICA BINACIONAL DE
NIEMEYER
ITAIPU NOS MUNICÍPIOS LINDEIROS
PaULo Marcos Mottos BarnaBÉ
MarLi renate Von BorsteL roesLer
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208 PÁginas; 21 X 23cM; isBn 978-85-7216-499-3
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PreÇo: 15,00 — editora@unioeste.br
De acordo com o autor,
Sendo a gestão ambiental
Oscar Niemeyer é um dos
assunto dos mais complexos
poucos
e prioritários na agenda
já em seus memoriais e
política nacional e interna-
textos publicados deixava
cional porque tem como fun-
transparecer a preocupação
damento a interação entre a
em utilizar a luz como
sociedade e a natureza, este
elemento
livro é um convite à leitura
suas obras se caracterizavam
das reflexões e análises
pela
arquitetos
que
norteador,
experiência
pois com
críticas sobre as práticas
distintas camadas de opacidade e transparência. O livro
dos diversos atores sociais
apresenta uma relevante discussão sobre a obra de
lindeiros na promoção de um processo de desenvolvi-
Niemeyer e realça as significações presentes na luz do sol e
mento sustentável, democrático e participativo.
sua influência neste trabalho.
MEMÓRIAS DO INVISÍVEL — UMA REFLEXÃO
BIODIVERSIDADE — A HORA DECISIVA — 2ª. EDIÇÃO
SOBRE A HISTÓRIA NO ENSINO DE FÍSICA E A
Marc Jean DoUroJeanni; Maria tereZa Jorge PÁDUa.
ÉTICA DA CIÊNCIA
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Marcos cÉsar Danhoni neVes
284 PÁginas; 23cM; isBn 978-85-7335-075-3
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252 PÁginas; 23cM; isBn 978-85-85545-80-2 PreÇo: 45,00 — eduem@uem.br Este livro discute questões
Este
relacionadas à Física de
dilema da possibilidade
maneira bastante acessível.
de conservar a biodi-
O autor defende a inter-
versidade e explorá-la
disciplinaridade como ele-
com base nas experiências
mento fundamental para
observadas
estimular o pensamento dos
pelos autores em países
jovens e o entendimento
com
da Física e sugere que a
biológica como o Brasil
academia transponha seus
e o Peru. Segundo os
muros e veja que existe um
autores, a única razão
mundo ávido por conhecimento, democracia educação
para estabelecer áreas naturais é protegê-las contra
e cidadania.
as atividades econômicas.
126 | semfronteiras
livro
discute
e
o
vividas
megadiversidade
3 2
1
1 1
4
Mundo às Avessas nesta obra de arte do pintor Pieter Bruegel (o Velho – cerca de 1525-1569) estão representados 118 provérbios flamengos. em geral, esses provérbios eram retirados da experiência real de vida e serviam como um meio de expressão e de comunicação entre as pessoas. reza a lenda que Bruegel vestia-se de camponês para – disfarçado como um deles – conseguir, com olhar cético, transportar para a tela cenas do cotidiano da época. Quatro exemplos de provérbios e suas respectivas interpretações: 1) Mundo às avessas (ao contrário do que deveria ser); 2) Pescar por trás da rede (perder a oportunidade); 3) ele vê ursos dançar (a fome o atormenta de tal modo que ele vê ursos dançar); e 4) tem dificuldade de chegar de um pão ao outro (tem dificuldade em viver com o orçamento).
semfronteiras |
127
EXPEDIEnTE
REVISTA DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO sem FRONTeIRAs IssN 1984-7831
GOVERNADOR roberto requião VICE-GOVERNADOR
Primeiro semestre de 2009
Orlando Pessuti CONSELHO EDITORIAL
DIRETORA TÉCNICA
Patrícia de Castro Santos
EDITORA CHEFE
Regina Célia Rocha
EDITORA ASSISTENTE
Helen Mendes
REPORTAGEM
Ana Luzia Palka, Carlos Drummond, Célio Yano, Ciméa Bevilacqua, Claudia Izique, Lorena Aubrift Klenk, Rodrigo Wolff Apolloni, Romeu de Bruns
FOTÓGRAFOS
Bruno Stock, Diego Singh, Joka Madruga
ILUSTRAÇÕES E CAPA
Simon Ducroquet
SECRETÁRIA DE ESTADO DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA E ENSINO SUPERIOR Lygia Pupatto
DIRETOR GERAL Jairo Pacheco
PRESIDENTE
Antônio Alpendre, Jairo Pacheco, José Eduardo Gonçalves, José Tarcisio Pires Trindade, Patrícia Castro, Regina Célia Rocha
REVISÃO
Antônia Schwinden
COLABORADORES
Adonai S. Sant’Anna, Jair Ferreira dos Santos, Luiz Carlos Ribeiro, Maria Helena de Moura Arias, Maurício Tuffani
SECRETARIA
Marina Phonlor Lemos e João Manuel Martins
APOIO
Euzilene A. Silva, Marcelo Barão, Susana Branco
José tarcísio Pires trindade OS ARTIGOS ASSINADOS NÃO REFLETEM NECESSARIAMENTE A OPINIÃO DA SETI.
DIAGRAMAÇÃO IMPRESSÃO TIRAGEM CONTATO
Visualitá Programação Visual Imprensa Oficial do Estado 20 mil exemplares revistasemfronteiras@seti.pr.gov.br
SETI Avenida Prefeito Lothário Meissner, 350 – Jardim Botânico – CEP 80210-170 – Curitiba – PR – Telefone (41) 3281-7300 – Fax (41) 3281-7334 – www.seti.pr.gov.br
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