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CRISTIANE C. L. DA SILVA | O SONHO
o sonho Cristiane C.l. da silVa
Morava numa casa modesta, uma roça que ficava afastada do tumulto da cidade. Não tinha vizinhos. Não a conhecia acordada. Andava pela casa inquieta, como se pressentisse que algo estranho estaria para acontecer. Fui ao banheiro e quando me olhei no espelho percebi que meu rosto se desfigurava. De imediato, pensei que poderia ser um processo alérgico, é costumeiro meus olhos incharem vez ou outra quando meu corpo está enfraquecido. Mas, para minha grande surpresa, meu rosto não derretia sozinho, todo o meu corpo o acompanhava. Diante do espelho só havia deformação, como uma gelatina líquida começando a endurecer. Meus braços estavam caídos, meu sexo se perdeu num montante de carne desfigurada, já não me reconhecia naquele rosto, lembrei-me de imediato de meus olhos que nasceram míopes, e que há muitos anos já tinham sido consertados. Nunca imaginaria que o estado embaçado das coisas voltaria, aquele mundo onde só existia manchas de cores e massas disformes sem linhas. Fiquei A-PA-VO-RA-DA! Logo eu? Que me apeguei tanto a mania de caçar o Belo e harmonia nas coisas do mundo? Como vou prosseguir assim? A cena de horror ia piorando, piorando, piorando... Corri para os espelhos da casa, havia um em cada canto e todos eles me escancaravam partes do meu corpo que não queria ver. Tinha me tornado uma criatura medonha, assustadora. Olhei toda a extensão do corpo, foi quando percebi que não havia mais nada a ser feito, a carne não voltaria ao normal. Fiquei um bom tempo me olhando no espelho, era preciso me aceitar como era agora: uma massa deformada viva. Foi quando naquele ser bizarro começou a nascer asas e a criatura voou para bem longe da casa, olhando-a do alto do céu.
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Cristiane C.L.da Silva |Niterói, Brasil |É Artista visual, Educadora e estudante da UFSJ em Artes Aplicadas. Dedica-se as áreas de gravura e cerâmica. Escreve como um meio de expressão.
OFICINA SONHOS PANDÊMICOS URBANOS E RURAIS | 9
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